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janeiro de 2018
Na última coluna, mencionou-se como em 2005 a derrota da ALCA (iniciativa estadunidense para
o controle político-econômico dos povos americanos) abalou a hegemonia geopolítica dos EUA.
Continuando a retrospectiva, recordemos este caso, e alguns golpes ou tentativas deles ocorridos
em nossa América desde então, para que assim se possa ter mais nítida a construção do atual
projeto reacionário, em que elites bananeiras vêm promovendo a destruição rápida e por variados
flancos dos mais ínfimos direitos dos trabalhadores conquistados ao longo de um século.
[*Nota sobre as recentes agressões à liberdade de expressão – Antes de enveredar pelo tema,
cabe desde logo destacar a gravidade do atual contexto fascista e persecutório da (ainda discreta)
nova ditadura civil brasileira, em que liberdades mínimas estão sendo subtraídas: é lamentável o
interrompimento da revista Caros Amigos em sua edição impressa, fato que se segue à saída do ar
por meses do portal Carta Maior, dentre outros meios de informação crítica que vêm sendo
asfixiados pelos golpistas através de mecanismos econômicos como a súbita quebra de contratos,
dentre outros procedimentos mesquinhos, legais e ilegais (caso do financiamento de grupelhos
ultraconservadores de propaganda difamatória). Como se sabe, o controle da imprensa nas mãos de
algumas famílias a se contar nos dedos – ou mais especificamente, a censura das “edições” da
quase totalidade do que lemos e pensamos a respeito do mundo –, é um dos principais meios de se
manter a população entorpecida e sem ação frente à retirada de seus próprios direitos, ao lado
obviamente de um sistema educativo hiperprecarizado (veja-se o sucateamento das universidades
públicas, ou a supressão até mesmo do leite que as famílias com crianças recebiam nas creches
paulistanas).]
Os Estados Unidos sofriam assim uma de suas maiores derrotas da história. A partir deste
episódio, seus olhos vidrados, dispersos há tempos pelo Oriente, famintos pelos recursos
energéticos asiáticos – casos das guerras do Iraque (desde 2003) e Afeganistão (desde 2001), além
da custosa e desmoralizante sustentação do criminoso governo sionista –, atentariam de novo às
riquezas da América; em especial após a crise de 2008, quando o desequilíbrio produtivo e
financeiro passam a exigir do capital um novo sangue a ser usurpado.
No novo ato geopolítico, o neogolpismo se agrava. Já não se exige somente a cabeça do “fora-da-
lei” Chávez, mas até mesmo se põe como alvo o reformismo lento – lulista ou kirchnerista
(antineoliberal, mas não anticapitalista) –, fundado na inofensiva aliança de classes.
Os motivos básicos que geram tais manobras vão desde os citados fatores econômicos de curto
prazo, até os fatores ideológicos (culturais, educacionais) de médio prazo, pois que diante de uma
crise violenta e para a qual não se avista um final feliz, a opinião pública gradualmente pauperizada
não pode ser minimamente consciente dos fatos (e dá-lhe MBL).
Todavia, essa “nova era golpista” tem sua cara própria. Como afirma o analista Pablo Ruiz (da
Telesur), os EUA agora evitam agredir usando de seu “poder duro” (“hard power”), optando sempre
que possível pelas táticas subterrâneas do “poder brando” (“soft power”) – em que às armas, direta
ou indiretamente aplicadas, precede a cooptação dos tradicionalmente sujos poderes
parlamentares, judiciários, econômicos e de comunicação (todos eles historicamente ligados à
sujeira das classes patronais – da escravidão e grilagem, aos super-salários e sonegação de
impostos).
Como bem analisa Samuel, o Paraguai passa portanto a ser peça fundamental para a política
externa dos Estados Unidos, pois a entrada da Venezuela no Mercosul lhe traria sérios revezes ao
Império, a saber: dificultaria um golpe contra Chávez, e subsequentemente a reincorporação à
superpotência daquele enorme potencial energético; e atravancaria a retomada do projeto
derrotado da ALCA, que agora tentava uma nova via – mediante a “fusão” dos acordos bilaterais de
comércio que vinham sendo alinhavados pelo país do Norte, caso da Aliança do Pacífico (Chile,
Colômbia, México e Peru), e do Tratado de Livre Comércio da América do Norte (México e Canadá).
Com o apoio tácito dos EUA ao reacionarismo paraguaio, os tradicionais partidos Colorado e
Liberal não se furtam a derrubar o bispo eleito presidente, Fernando Lugo – quem interrompera o
continuísmo colorado de seis décadas –, sabendo que qualquer sanção contra seu golpe seria bem
amortecida pelas benesses vindas do Norte. Utilizando-se da infiltração de mercenários franco-
atiradores, os golpistas promovem uma matança entre sem-terras e policiais, pretexto para
poderem submeter o presidente a um julgamento político relâmpago (de apenas 36 horas!), que
teve por resultado seu impedimento.
Simbolicamente, os EUA, a monarquia da Espanha, o absolutismo católico do Vaticano e a
comandante da UE, Alemanha, são os primeiros a darem seu aval aos golpistas.
Outro aspecto não mencionado aqui pelo diplomata, mas que não pode deixar de ser
considerado, é o interesse geoestratégico dos EUA na Tríplice Fronteira Brasil-Argentina-Paraguai,
posto que aí se encontra um dos maiores reservatórios de água do mundo, o Aquífero Guarani;
ademais, com uma base no centro do território sul-americano, ficaria facilitada a tarefa de controle
de recursos latino-americanos – como as reservas do pré-sal.
Contudo, o que nem os países apoiadores do golpe (representantes do centro capitalista
mundial), nem os próprios golpistas contavam, era com a nova ousadia dos governos reformistas do
Sul, que após derrubarem a ALCA, agora se uniam para suspender o Paraguai, e em seguida aprovar
a entrada venezuelana no Mercosul.