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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

DIREITO PENAL

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

SUMÁRIO

1.a. Dogmática jurídico-penal: teorias contemporâneas 2

1.b. Aplicação da pena. Código Penal e leis especiais. 16

1.c. Crimes contra a vida. Lesões corporais. Periclitação da vida e da saúde 26

2.a. Criminologia: teorias contemporâneas. 49

2.b. Concurso material, formal e continuidade delitiva. 52

2.c. Crimes contra a liberdade pessoal. 57

3.a. Política criminal e política de segurança pública: tendências contemporâneas. 62

3.b. Efeitos da condenação no Código Penal e em leis especiais. 64

3.c. Crimes contra a honra. 67

4.a. Princípios básicos do Direito Penal. Parte Geral. 71

4.b. Causas extintivas da punibilidade 86

4.c. Crimes contra a inviolabilidade do domicílio, de correspondência, dos segredos e de


interceptação de comunicações. 96

5.a. Lei penal no tempo 101

5.b. Prescrição Penal 106

5.c. Estatuto de Roma. 116

6.a. Aplicação da lei penal no espaço. 119

6.b. Crimes Políticos e Crimes Militares 127

6.c. Crimes contra o patrimônio: roubo, extorsão, extorsão mediante sequestro, esbulho
possessório e dano 136

7.a. Limites da aplicação da lei penal em relação às pessoas 147

7.b. Penas no direito brasileiro 150

A) Penas privativas de liberdade. (antigo ponto 17a)

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B) Penas de Multa (antigo ponto 18A).

C) Penas substitutivas das privativas de liberdade e penas pecuniárias (antigo ponto 19 A).

7.c. Crimes contra o patrimônio: estelionato e outras fraudes de competência da Justiça


Federal. 172

8.a. Princípio de interpretação e aplicação da lei penal. Concurso aparente de normas. 185

8.b. Direito penal e os indígenas 189

8.c. Tráfico de pessoas e redução a condição análoga à de escravo. 203

9.a.Teoria do crime 213

A) Tipo e tipicidade penal. Exclusão.

B) Tentativa e consumação. Crime impossível. Desistência voluntária e arrependimento


eficaz.

9.b. Crimes contra o patrimônio: apropriação indébita e receptação e crimes contra a


propriedade intelectual 229

B) Crimes contra a propriedade intelectual

9.C Crimes contra a administração pública praticados por funcionário público contra a
administração em geral. 248

10.a. Teoria da conduta 257

10.b. Crimes contra a organização do trabalho. 263

10.c. Crimes contra a administração pública praticados por particular.266

11.a. Relação de Causalidade. 284

11.b. Crimes comuns, crimes de responsabilidade e improbidade administrativa 289

11.c. Crimes contra a administração da Justiça. 295

12.a. Teoria do tipo doloso 304

12.b. Crimes contra o patrimônio: esbulho possessório, apropriação indébita e receptação


307

12.c. Crimes contra a fé pública: 308

A) Moeda falsa.

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B) Crimes Contra a Fé Pública: falsidades em geral.

C) Fraudes em certames de interesse público

13.a. Teoria do tipo culposo 324

13.b. Registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição. SINARM. Lei


10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento). 328

13.c. Crimes contra a ordem tributária e contra a seguridade social. 339

14.a. Teoria do tipo omissivo. 350

14.b. Crimes de tráfico ilícito e uso indevido de drogas. 354

14.c. Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e Mercado de Capitais. 369

15.a. Ilicitude. 386

15.b. Crimes contra o meio ambiente e o patrimônio cultural 393

15.c. Crimes de Lavagem de Dinheiro.404

16.a. Culpabilidade Penal. 423

16.b. Crimes contra a ordem econômica e contra as relações de consumo.435

16.c. Crimes contra a paz pública e organizações criminosas 444

17.a. O Erro no Direito Penal: espécies, requisitos e consequências. 478

17.b. Genocídio e Tortura 486

17.c. Crimes nas licitações públicas e crimes contra finanças públicas 499

CRIMES NAS LICITAÇÕES PÚBLICAS

CRIMES CONTRA AS FINANÇAS PÚBLICAS

18.a. Etapas da realização do crime 509

18.b. Corrupção. Quadrilha. 515

18.c. Crimes de preconceito e de discriminação. 520

19.a. Concurso de Pessoas 530

19.b. Crimes Cibernéticos (redação anterior: crimes via internet) 544

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19.c. Crimes de perigo comum, contra a segurança dos meios de comunicação e transporte
e outros serviços públicos. 555

20.a. Teoria da Pena. 562

20.b. Aspectos relativos à repressão penal contidas em convenções internacionais sobre


corrupção, organizações criminosas, tráfico de pessoas, tráfico de armas, terrorismo e
escravidão 567

20.c. Crimes contra a saúde pública e os relacionados à remoção e transplante de órgãos.


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Crimes relacionados à remoção e transplante de órgãos 616

Pontos Extras 625

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1.a. Dogmática jurídico-penal: teorias contemporâneas


Principais obras consultadas: Santo Graal 27; Queiroz, Paulo, 9ª edição; a) Silva
Sánchez, Jesús-María. Aproximación al derecho penal contemporâneo. Barcelona: J. M.
Bosch Editor S.A., 1992; b) Gomes, Luiz Flávio. Direito penal: parte geral: volume 2/ Luiz
Flávio Gomes, Antonio García-Pablos de Molina; Coordenação Luiz Flávio Gomes – São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2007; c) Queiroz, Paulo. Curso de Direito Penal: parte
geral: v. 1. 8ª edição. Salvador: Editora JusPodivm, 2012; d) GRECO, Rogério. Curso de
Direito Penal. 10ª edição. Rio de Janeiro: Impetus, 2008; e) Cunha. Rogério Sanches.
Manual de Direito Penal. Parte Geral. 1ª edição. Salvador: Ed. JusPodivm, 2013; f)
AZEVEDO, Marcelo André de. Coord. Leonardo de Medeiros Garcia. Direito Penal.
Salvador: Ed. JusPodivm, 2011.

Nas palavras de Jesús-María Silva Sánchez, “a elaboração categorial e a integração dos


diversos conceitos jurídico-penais em um sistema, características dos estudos dogmáticos,
proporcionam – seja qual for o método ou concepção dogmática da qual se parta – uma
segurança jurídica de outro modo inexistente”. Assim, para Artur Gueiros, a dogmática
serve ao estabelecimento de limites e garantias, de modo a evitar improvisações,
irracionalidades ou arbitrariedades na atividade estatal de punir. Segundo ele, decompõe-se
o conceito de delito para melhor ser compreendido, para ao final ser reagrupado
novamente, após a verificação se, de fato, ocorreu um fato definido como crime pela lei
penal. Por exemplo: Sujeito A dispara um tiro de revólver contra sujeito B, que vem a óbito
em razão do ferimento. Para saber se houve o crime, deve-se decompor o fato, de modo a
perquirir se houve a ação (disparo de arma de fogo), se a ação amolda-se objetiva e
subjetivamente ao tipo penal do homicídio, se não há causa de exclusão da antijuridicidade,
e se não há causa de exclusão da culpabilidade. Ao final de toda essa análise, se preencher
todos os pressupostos, chega-se a conclusão de que A praticou delito de homicídio tendo
como vítima B. Pode ocorrer ainda que A tenha disparado seu revólver contra B e o mesmo
não venha a falecer, configurando a tentativa. Ou, ainda, que terceiro C tenha emprestado a
arma de fogo ao sujeito A, vindo a ocorrer o concurso de pessoas. .

A conceituação de crime remonta a era greco-romana, bem como a Idade Média. Destarte,
em Platão, crime era sintoma de doença; em Aristóteles, o criminoso era o inimigo da
sociedade; em São Tomás de Aquino, a causa do crime era a miséria; em Thomas Morus, o
crime era o reflexo da sociedade. No entanto, apenas com o Iluminismo, foi-se e busca de
um conceito científico para o crime. Isso porque, se o Estado era uma opção racional
humana, ante a ideia de Contrato Social, as demais ações do homem em sociedade também
estavam submetidas aos ditames da razão, inclusive a prática de fato criminoso.

A partir de então, no âmbito da dogmática jurídico-penal, destacam-se as teorias do delito,


que conceituam e estruturam o crime sob diversas perspectivas. Tratar-se-á neste resumo,
portanto, das principais teorias que se propuseram a elaborar ou a aperfeiçoar uma visão
dogmática do delito. Artur Gueiros entende que são cinco fases na elaboração do Sistema
de Direito Penal, quais seja: a) O naturalismo, de base ôntica, que chegou ao apogeu com o

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sistema de von Liszt e Beling; b) O neokantismo, que proporcionou uma normatização do


sistema; c) A perspectiva totalizadora que, na verdade, conduziu a um irracionalismo
dogmático; d) O finalismo, que culminou com o ontologismo de Welzel e; e) As teorias
atuais que renormatizavam o sistema do Direito Penal, vinculando-o a determinados fins
(funcionalismo).

Vamos manter a nomenclatura até então adotada no Graal, sendo as seguintes fases a serem
estudadas: a teoria causal-naturalista; a neokantista; a finalista; a funcionalista (sob
diferentes critérios: teleológico-funcional de Roxin, funcionalista sistêmico de Jakobs,
funcionalista do controle social de Hassemer, reducionista de Zaffaroni, etc.).

Teorias do delito:

1) Teoria Causal-Naturalista. Esta teoria parte de uma influência positivista, formalista e


como diz o nome, naturalista, decorrente do método científico das ciências naturais
(dedutivo). Deste modo, tem uma maior preocupação com a causalidade existente entre a
prática de um ato e a produção de um resultado que representa a violação de um bem
jurídico. O crime é assim visto como fato natural e a ação humana da qual decorre, um
movimento corporal voluntário que causa modificação no mundo exterior. Não se fazia
qualquer valoração da conduta, não havia o aporte de elementos normativos na
conceituação analítica do delito. Aliás, o termo conduta somente foi introduzido por
Radbruch, para abarcar as omissões. A vontade compreendia duas partes: uma externa
(objetiva), que corresponde ao processo causal; e outra interna (subjetiva), que corresponde
ao conteúdo final da ação (dolo/culpa). Em consequência, pretendia-se uma divisão
bipartida do delito: uma parte objetiva (tipicidade e antijuridicidade) e outra subjetiva
(culpabilidade: imputabilidade e dolo/culpa). O dolo, aqui, era o “dolus malus”,
compreendendo consciência do fato e consciência da ilicitude. A tipicidade era indício da
antijuridicidade: ratio cognoscendi. Essa teoria foi desenvolvida, basicamente, por Franz
Von Liszt e Beling.

2) Teoria Neokantista (conceito neoclássico de delito). O neokantismo, surgido


principalmente com Mezger, se propôs a agregar elementos normativos à estruturação
analítica anterior. Parte-se de um enfoque deontológico (e não ontológico), de modo que a
definição dos conceitos depende muito mais do sujeito que interpreta o objeto, ou seja, dos
valores que o sujeito atribui a um dado objeto, que do objeto em si mesmo. Utiliza-se de
concepção filosófica fundada em três planos: o da realidade sensível, o dos valores e o das
significações. A realidade sensível, neste enfoque, não tem qualquer valor intrínseco,
absoluto, imutável ou universal (como proposto pelos naturalistas), os valores são dados
pelo sujeito que realiza uma compreensão do fenômeno, atribuindo-lhe significação
(valores condicionados subjetivamente, culturalmente). Deste modo, sugere-se um
deslocamento do método explicativo (próprio das ciências naturais) para o método
compreensivo (próprio das ciências humanas) – Silva Sánchez. Em consequência, a
tipicidade passa a ser encarada como a valoração negativa de uma conduta por parte do
legislador, contendo, inclusive, elementos normativos específicos, como “funcionário
público”, “coisa alheia” – Luiz Flávio Gomes. Considera-se o bem jurídico como realização
de um valor, e sua lesão como critério decisivo da interpretação dos tipos. A
antijuridicidade passa a ficar atrelada ao conceito de danosidade social e de princípios
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materiais, donde se parte para fundamentar a existência de causas supralegais de


justificação da conduta. Por fim, a culpabilidade passa a ser psicológico-normativa, uma
vez introduzido o elemento “exigibilidade de conduta diversa” neste requisito e agregando
ao dolo e a culpa a noção de reprovabilidade da conduta, contrária ao dever. A teoria ficou
marcada pelo excessivo subjetivismo epistemológico ou relativismo axiológico, embora
tenha agregado fundamentos indispensáveis à evolução dogmática no sentido da
interpretação valorativa e material dos requisitos do delito, além de ter agregado elementos
novos, como a exigibilidade de conduta diversa. A crítica a este sistema foi a de que seus
valores ainda eram muito vagos, no sentido de que a dogmática penal não acompanhava o
crescimento das ideologias totalitárias. Some-se a isso o fato de que a antijuridicidade ainda
ser muito objetiva, bem como o fato de o dolo estar ligado à consciência da
antijuridicidade, ou seja, perpetuava a ideia de que o dolo e a culpa integravam o juízo de
reprovabilidade.

TEORIA DOS ELEMENTOS NEGATIVOS DO TIPO. Foi nesta época, em que a filosofia
neokantiana estava em pleno vapor (meados do século XIX até o início do século XX), que
se desenvolveu a teoria dos elementos negativos do tipo, criada por Merkel e aperfeiçoada
por Frank e Radbruch. De acordo com essa teoria, o tipo penal já contém a antijuridicidade,
compondo-se de duas partes: uma positiva (realização dos elementos do tipo, no sentido
tradicional) e uma negativa, que corresponde à ausência de causas de justificação. Assim,
para que se possa dizer que um fato é típico, deve-se perquirir se é ilícito (tipo total de
injusto); se não for ilícito, não será típico. A tipicidade é a própria essência da
antijuridicidade (ratio essendi).

3) Teoria Finalista. Criação de Hans Welzel a partir de 1930, esta teoria partiu de uma
tentativa de frear o subjetivismo próprio da teoria neokantista, de modo a estabelecer um
conceito prévio de ação, baseando-se em estruturas lógico-objetivas, apto a vincular o
legislador. Assim, evita-se que o legislador/juiz exercite o poder de definir os conceitos a
partir de valores escolhidos de forma absoluta ou ilimitada. Parte-se, pois, de um enfoque
ontológico, em que se sustenta que a realidade já tem incorporada a dimensão de sentido.
Deste modo, o sujeito que interpreta o fenômeno apenas identifica as estruturas lógico-
objetivas da realidade e a partir daí conclui qual é a regulação jurídica que se deve dar aos
diferentes problemas penais – Silva-Sánchez. Neste sentido, conforme exemplo citado na
obra de Silva-Sánchez, é possível conferir a uma cadeira o mesmo regramento jurídico
dado a uma mesa, mas não se pode pretender conferir à cadeira a capacidade negocial dos
homens, já que falta à cadeira capacidade ontológica para isso. Mais precisamente no que
toca ao direito penal, as estruturas lógico-objetivas serão: a estrutura final da ação e a
estrutura da culpabilidade como poder atuar de outro modo. A estrutura final da ação,
concebida como atividade dirigida a um fim (já que é o fim que diferencia o delito – de
matar, no homicídio, de lesionar, na lesão), teve como consequência o deslocamento do
elemento subjetivo (dolo/culpa) para a tipicidade. Sim, porque se finalidade pressupõe dolo,
infere-se que o dolo pertence à ação. Ademais, se a conduta já possui um valor (ou
desvalor) em si mesma, uma vez dirigida a um fim desvalioso que poderia ser evitado
(estrutura final da ação+possibilidade de atuar de outro modo), o resultado no finalismo
deixa de ter maior importância, o delito passa a ser conceituado como violação ético-social,
e não como violação a bem jurídico (definição presente tanto no causalismo como no

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neokantismo). O finalismo pretende, pois, que os dois elementos lógico-objetivos


apontados sejam suficientes para evitar uma interpretação irracional do legislador, no
sentido de erigir como crime conduta destituída de intenção dirigida a uma violação ético-
social, ou ação justificável pela inexigibilidade de conduta diversa. Ainda como
consequência da teoria: abandona-se o dolo normativo e adota-se o natural (somente
consciência do fato); na antijuridicidade, o importante é analisar se o autor, na prática da
conduta, afastou-se das normas éticas tuteladas pela norma; a culpabilidade passa a ser
puramente normativa (imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de
conduta diversa); princípio da adequação social é utilizado para excluir a tipicidade.
Críticas: pouco explica os crimes omissivos e os culposos; centra-se no desvalor social da
ação e não do resultado; como não transcendeu à realidade ontológica para aproximar-se da
realidade concreta, pouco se preocupou com a solução justa para o caso concreto.

4) Teoria social da ação. Desenvolvida por Johannes Wessels e Hans-Heinrich Jescheck,


esta teoria acrescenta uma nova dimensão à sistematização em voga: a relevância ou
transcendência social da ação. “A conduta, para a teoria social, é o comportamento humano
voluntário psiquicamente dirigido a um fim socialmente reprovável”. Observa-se, assim,
que a teoria teve o objetivo de conferir nova definição ao conceito de conduta, de modo a
incorporar elemento negativo implícito no tipo. Melhor dizendo, em um exame concreto, se
a conduta tem adequação social, deixa de ser típica. Crítica: padeceu de excessiva vagueza,
ante a indefinição do que seja transcendência ou relevância social.

5) Teorias Funcionalistas. A partir dos anos 1970, o sistema do Direito Penal encontrava-
se exaurido em razão das discussões abstratas. Considerando tal contexto, Claus Roxin,
lançou as bases do funcionalismo penal, formulando o seguinte questionamento: “Para que
serve a solução de um problema jurídico que, apesar de harmonicamente claro e uniforme
é, sob o ponto de vista político criminal, errôneo?” Assim surgiu a dogmática funcionalista
ou teleológica, que trouxe um critério de sistematização especificamente jurídico penal,
qual seja, as bases político-criminais da moderna teoria dos fins da pena preventivo-geral e
preventivo-especial.

Emprega-se o termo “teorias”, assim no plural, tendo em vista que, apesar de voltadas a um
novo enfoque, de sistematização e interpretação dos conceitos de acordo com a função do
Direito Penal, representam distintas vertentes de orientação dogmática, justamente pela
multiplicidade de funções do Direito Penal a que se pode dar relevância. Como
característica comum, há uma superação do método dedutivo-abstrato para uma espécie de
sistema aberto, em que se combinam considerações tópicas (voltadas ao caso concreto) e
abstratas (no campo da valoração). Assim, referido sistema aberto de
interpretação/estruturação do crime, permite: a combinação necessária de elementos
externos ao Direito Penal, como a Política Criminal (Roxin), ou perspectivas de cunho
sociológico, como a teoria luhmaniana dos sistemas (Jakobs); a construção de uma ciência
evolutiva, atenta à evolução de conhecimento e comportamento; e a análise da realidade
concreta, como reflexo de uma maior preocupação com a solução mais justa dos casos.

Há um afastamento da compreensão ontológica, de forma radical (Jakobs) ou moderada


(Roxin), para dar ênfase à atividade valorativa do sujeito, que estaria limitada não pelas
categorias imanentes ao ser, mas por valores e princípios de política-criminal, direitos
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humanos e Estado Social e Democrático de Direito (Roxin), ou por um fim de estabilização


do sistema (Jakobs). Roxin, no entanto, mantém os limites do sentido ordinário de
linguagem, elementos de ordem ontológica, mas sempre sob a orientação político-criminal.
Jakobs, de sua parte, absolutiza o funcionalismo. Nas palavras de Silva Sánchez e LFG, a
referência a valorações político-criminais é a única forma de racionalizar o sistema penal
(coibir relativismos e arbitrariedades do legislador/julgador; reduzir a intervenção penal e
sua intensidade aos limites necessários), diante das inseguranças que os conceitos
ontológicos produzem em uma sociedade plural e pluricultural. Um dos pontos mais
relevantes do funcionalismo é, pois, a integração de uma tipicidade material ao modelo já
conhecido (formal+subjetivo). Nesta categoria, há o aporte de princípios e teorias, a
exemplo da teoria da imputação objetiva (Roxin e Jakobs) e da tipicidade conglobante
(Zaffaroni). Passemos à exposição das principais correntes funcionalistas, isoladamente.

5.1) ROXIN. CONCEITO TELEOLÓGICO-FUNCIONAL, funcionalista-teleológico ou


racional-final. Também chamado de funcionalismo moderado. Observa-se uma ênfase nos
fins e princípios da Política-Criminal (rompe-se a barreira entre Direito Penal e Política-
Criminal) e nas funções de prevenção geral e especial negativas. O crime é dividido em
tipicidade, antijuridicidade e responsabilidade. Assim, no exame de uma conduta à luz do
Direito Penal, verifica-se, primeiro, se é formalmente típica. Em seguida, se é
materialmente típica, analisando-se se houve “ofensa desvaliosa a bem jurídico relevante”
(conceito de crime para Roxin). Aqui incide uma série de princípios de Política-Criminal e
direitos humanos, que funcionam como guia da atividade valorativa/interpretativa, como o
princípio da intervenção mínima, a função da norma sob interpretação (prevenção geral de
lesões ao bem jurídico), além de uma teoria que exclui a imputação objetiva nos casos em
que não houve criação de “risco proibido, concretizado no resultado produzido”. A teoria da
imputação objetiva leva esse nome, tendo em vista que precede a análise do aspecto
subjetivo da tipicidade (dolo/culpa). Assim, somente se a conduta se amoldar à redação
legal e configurar ação/resultado relevantes para o Direito Penal, à luz dos princípios e
teorias citados, é que se passará ao exame do elemento subjetivo do tipo. Presente o dolo ou
a culpa, parte-se para a análise da antijuridicidade, também normativa, campo de
ponderação dos bens jurídicos envolvidos. Por fim, a responsabilidade, que é formada pela
culpabilidade, já conhecida, além de necessidade concreta da pena para fins de prevenção
do delito, aspecto individualizante da resposta penal (fim de prevenção especial) [ou seja: a
responsabilidade amplia o conceito de culpabilidade. Em outras palavras, é preciso verificar
se é conveniente a punição, tendo em contra razões preventivo-gerais (interesse da
coletividade) e preventivo-especiais (reprovação pessoal). A consequência disto é que
embora culpado, é possível que para atender finalidades políticos criminais, o agente possa
permanecer impune].

5.2) JAKOBS. CONCEITO FUNCIONALISTA SISTÊMICO. Para Jakobs, delito é toda


violação da norma, disfuncional às expectativas sociais de convivência. Delito é a
frustração das expectativas normativas. Pena é a confirmação da vigência da norma. O
Direito Penal existiria, assim, para proteger a norma e por via indireta, os bens jurídicos; é
um instrumento de estabilização do sistema. Verifica-se, pois, uma ênfase na função de
prevenção geral positiva da pena, no simbolismo da intervenção penal para garantir um
sentimento de preservação das normas e valores sociais. Parte da teoria luhmaniana dos

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sistemas, em que a presença dos riscos (da convivência em sociedade e do progresso) exige
um mecanismo de estabilização, que seria o sentimento geral de eficácia das normas
jurídicas regulatórias. Jakobs divide o crime em tipicidade (formal, material e subjetiva),
antijuridicidade e culpabilidade. Na tipicidade material, utiliza-se da teoria da imputação
objetiva com enfoque na representação de funções, de papéis na sociedade, e no princípio
da confiança, o que reflete sua preocupação com os sistemas e microssistemas. No campo
da culpabilidade, propõe um exame da conduta de modo atrelado à finalidade preventiva
geral: culpável é o agente que tenha alternativa de comportamento, mas não se motivou
pelo respeito à norma. A principal crítica que se faz a essa teoria é de que pode servir a um
Estado totalitário, porque não se questiona o conteúdo das normas, os valores sociais a que
se prestam. O sistema dogmático não conta com valores e princípios orientadores e
limitadores. O que vale é a estabilização do sistema, e não a proteção da dignidade do ser
humano, das garantias e direitos fundamentais do homem. Trata-se de um modelo mais
sociológico que dogmático-jurídico. Referida crítica foi agravada quando Jakobs passou a
defender a existência de dois Direitos Penais, um para o cidadão, com garantias; outro para
o inimigo, sem garantias.

HASSEMER. CONCEITO FUNCIONALISTA DO CONTROLE SOCIAL. Direito Penal é


meio formal de controle social, para manutenção de determinada ordem social. Delito é
conduta desviada e pena é reação social formal, sob garantias de Estado Democrático de
Direito. O Direito Penal existe para cumprir essas funções garantistas.

ZAFFARONI. FUNCIONALISMO REDUCIONISTA OU CONTENCIONISTA. Função


do Direito Penal é reduzir a violência do Estado de polícia, assim como sua seletividade
inerente. Também tem a função de tornar o poder punitivo menos irracional. Agrega à
tipicidade a teoria da tipicidade conglobante, de forma que a tipicidade penal seria formada
pela tipicidade legal (ou formal) + tipicidade conglobante (antinormatividade, violação da
norma subjacente ao tipo). A antinormatividade exige uma interpretação sistematizada, de
modo a excluir a tipicidade de condutas que, embora descritas num tipo penal, são
fomentadas por outras normas jurídicas. Paulo Queiroz critica a coerência e necessidade de
dita teoria, sob o argumento de que, em verdade, não há sequer tipicidade formal nos casos
citados por Zaffaroni, seja porque mesmo num juízo de subsunção é preciso fazer uso de
uma interpretação sistematizada e teleológica, seja porque há uma exclusão justificada pelo
estrito cumprimento de dever legal, seja porque não há criação de um risco proibido.

LUIZ FLÁVIO GOMES. Para LFG, crime envolve tipicidade e antijuridicidade, sendo a
culpabilidade um dos fundamentos da pena. Ademais, somente há efetividade na norma
quando há exigência de ameaça de pena (punibilidade), que transforma o crime em fato
punível. LFG dá especial ênfase ao princípio da ofensividade na análise da tipicidade
material, já que comunga da definição de delito como ofensa a bem jurídico relevante.
Propõe a exclusão da culpabilidade/punibilidade do conceito de crime para aperfeiçoar
algumas questões práticas: na receptação, haveria de se falar em crime anterior mesmo
quando o furto fora praticado por menor; quem auxilia filho a furtar o pai participaria de
crime, só não estaria alcançado pela escusa absolutória; quem auxilia embaixador
estrangeiro a matar pessoa do país acreditante pratica crime, só não estaria alcançado pela
imunidade. Em outras palavras, a diferença é que para uns o crime não terá efetividade.

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PAULO QUEIROZ. CONCEITO MONISTA-FUNCIONAL. Para Paulo Queiroz, não há


razão para a autonomia dos requisitos do crime (tipicidade, antijuridicidade, culpabilidade),
pois não passam de momentos, níveis ou graus de apuração do caráter criminoso do fato.
Defende, então, não só um entrelaçamento de tipicidade e antijuridicidade, como a teoria
dos elementos negativos do tipo já o propõe, mas também da culpabilidade. Explica-se: a
culpabilidade é expressão de exigibilidade de conduta diversa, tendo em vista os fins de
prevenção geral e especial, já que nos casos de ausência de culpabilidade o que se tem é
uma impossibilidade ou falta de razoabilidade de se exigir um comportamento conforme as
normas. Assim, nos termos de Paulo Queiroz: “a exigibilidade de uma conduta diversa
(conforme o direito) não é uma análise posterior, nem estranha à verificação do injusto
penal, nem é exclusividade da culpabilidade, visto que é contemporânea da própria
intervenção jurídico-penal, por ser uma consequência lógica da natureza instrumental (ou
funcional ou preventiva) do direito penal. Mais ainda: é a exigibilidade, em face da normal
motivabilidade, que determina, em última análise, a atipicidade do fato (mas não só ela,
pois contam, também, critérios de conveniência político-criminal) e a justificação de certos
comportamentos (causas de exclusão de ilicitude)”. Noutros termos, “se função do direito
penal é motivar comportamentos no sentido do comando normativo, segue-se que
semelhante tarefa somente pode ser dirigida àquele que se ache em condições físicas,
psíquicas, culturais, etc., de entender tais normas e de poder agir segundo a pretensão do
legislador que as editou”. Daí o autor explica que diversas causas de exclusão de conduta,
de atipicidade ou antijuridicidade se fundamentam na mesma questão: norma penal carece
do poder de motivar no caso concreto (a exemplo da coação física irresistível, conduta sem
dolo ou culpa, legítima defesa, etc.). Assim, a exigibilidade está presente em todos os
outros critérios, sendo o que se chama de culpabilidade mais um nome para designar casos
em que o legislador considera desnecessária a pena. A transferência de uma causa de
justificação de um requisito ao outro não tem qualquer repercussão prática, mas somente
sistemática, como ocorreu com o dolo e a culpa (transferidos para a tipicidade), como
ocorre com o consentimento do ofendido que é, para alguns (Roxin), causa de exclusão da
tipicidade e, para muitos outros, de antijuridicidade. Trata-se, pois, de interpretação que,
por ser essencialmente subjetiva, gera divergências de toda espécie. Deste modo, propõe
que a teoria dos elementos negativos do tipo seja revista “para compreender: a) a realização
de todos os elementos do tipo; b) a ausência de causas de justificação; e c) a ausência de
causas de exclusão de culpabilidade”.

PONTO EXTRA:

1. O CONCEITO DE DIREITO PENAL. VISÃO CLÁSSICA: Direito Penal é o


conjunto de normas jurídicas mediante as quais o Estado proíbe determinadas ações ou
omissões, sob ameaça da pena. A doutrina usualmente distingue duas classes de
enunciados normativos: normas primárias, que são proibitivas e dirigidas à regular a
conduta dos cidadãos, e normas secundárias, que estabelecem os princípios gerais e as
condições ou pressupostos de aplicação da pena e das medidas de segurança, que
igualmente podem ser impostas aos autores de fatos definidos como crime. VISÃO
MODERNA: a disciplina pode ser conceituada sob duas vertentes: a DINÂMICA e a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ESTÁTICA. DINÂMICA: o Direito Penal é o mais intenso mecanismo de controle


social formal, por intermédio do qual o Estado, mediante um determinado sistema
normativo, castiga com sanções negativas de particular gravidade as condutas
desviadas mais nocivas para a convivência, objetivando, desse modo, a necessária
disciplina social e a correta socialização dos membros do grupo. ESTÁTICA:
considera-se Direito Penal como sendo o conjunto de normas jurídico-públicas que
definem certas condutas como delito e associam às mesmas penas e medidas de
segurança, além de prever outras consequências jurídicas.

2. FINALIDADE E LEGITIMIDADE DO DIREITO PENAL. Proteção da convivência


humana em sociedade (primeira consiste em compreender o Direito Penal como um
dos instrumentos de convivência e controle social, caracterizado por selecionar os
comportamentos tidos como mais intoleráveis, prevendo e impondo sanções
institucionalizadas àqueles que o realizarem. A outra finalidade é visualizá-lo como um
conjunto de normas jurídicas editadas pelo Estado contendo a descrição de delitos e
cominação de penas - normas penais incriminadoras, bem como dos pressupostos para
a aplicação, substituição ou exclusão de tais sanções - normas penais não
incriminadoras).

SILVA SÁNCHEZ: Três níveis as funções do Direito Penal. O primeiro nível ocupa-se da
função ético social (busca em satisfazer as necessidades da psicologia social). Em um
segundo nível, faz-se alusão à função simbólica ou retórica (normas penais produzem na
opinião pública a impressão tranquilizadora de um legislador atento e decidido). Por fim,
apresenta a função repressiva e preventiva de delitos. Ressalte-se, todavia, que, de maneira
geral, a justificação do Direito Penal tem sido feita a partir da justificação da pena.

Há, em princípio, três orientações fundamentais quando à LEGITIMIDADE DA PENA: (1)


sustenta-se que a PENA É UM MAL, mas que se converte em bem, pois nega o mal que é o
delito e restaura o direito e a justiça; (2) sustenta-se que a PENA É UM MAL MENOR ou
socialmente útil; e (3) afirma-se que a PENA É ILEGÍTIMA, o que deveria conduzir à sua
abolição (e, por extensão, do Direito Penal).

Tais grupos de orientações se expressam a partir das teorias da pena (visa explicar o
fundamento da pena por meio das chamadas correntes absolutas, relativas e mistas ou
unitárias) que gravitam em torno de duas premissas fundamentais: a RETRIBUIÇÃO e a
PREVENÇÃO. Segundo as TEORIAS ABSOLUTAS, a pena é exigência de justiça (pena
um fim em si mesma e não serve a qualquer outro propósito que não seja o de
RECOMPENSAR O MAL COM O MAL). Os filósofos Kant e Hegel foram os maiores
teóricos desta corrente, tendo o primeiro formulado esta teoria do modo ilustrativo. Hegel,
por seu turno, desenvolveu a fórmula dialética sobre a essência de a pena ser a "negação da
negação do direito". As TEORIAS RELATIVAS, partindo de uma concepção utilitária da
pena, justificam-na por seus efeitos preventivos (finalidade da pena não seria punir todos os
crimes, mas PREVENIR TODOS OS CRIMES). a) PREVENÇÃO GERAL: é a
intimidação que se supõe alcançar por meio da ameaça da pena e de sua efetiva imposição,
atemorizando os possíveis infratores. Esta teoria tem em Anselm von Feuerbach o seu mais
eloquente representante, o qual expressou, em seu influente Tratado, toda a sistemática da
coação psicológica da pena. b) PREVENÇÃO ESPECIAL: atua sobre o autor do crime,
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

para que não volte a delinquir. A prevenção especial opera por meio da emenda do
condenado ou de sua intimidação, ou, ainda, da inocuização, no caso dos incorrigíveis.
Segundo Franz von Liszt, adepto dessa corrente, a pena tem a função única de defender a
sociedade de elementos que perturbam a sua organização (defesa social), por intermédio da
"atuação direta da execução da sanção na personalidade do criminoso". [OBS: Tanto a
teoria da prevenção geral como a da prevenção especial deixam sem explicação os critérios
mediante os quais deve o Estado recorrer à pena criminal]. c) TEORIAS MISTAS OU
UNITÁRIAS: combinam as teorias absolutas e as relativas, que não seriam excludentes
entre si. Parte-se, portanto, do entendimento segundo o qual a pena é retribuição, mas deve,
por igual, perseguir os fins de prevenção geral e especial. Segundo Eduardo Correa, é
concebível uma terceira via: o daquelas teorias que justamente entendem que o fim ou
razão de ser da sanção se cumpre ecleticamente, reagindo-se contra o passado e
procurando-se ao mesmo tempo evitar futuras violações. As teorias mistas não foram
suficientes para responder por completo ao problema da finalidade. Por isso, foi
desenvolvida a ideia de que a PREVENÇÃO PODE SER POSITIVA OU NEGATIVA.
Uma conteria a ideia de que a previsão ou a aplicação das penas teria a função de prevenir
delitos (prevenção negativa), e a outra reforçaria a validade das normas (prevenção
positiva), que significa restabelecer a confiança institucional no ordenamento, quebrada
com o cometimento do crime.

3. TENDÊNCIAS CONTEMPORÂNEAS DO DIREITO PENAL. Função de proteção


dos bens jurídicos e de prevenção dos delitos. São 03 posturas político-criminais básicas
que procuram compreender e dirigir as funções, os limites e os fins do Direito Penal
contemporâneo: a abolicionista, a ressocializadora e a garantista. São posturas reformistas
frente à realidade do sistema penal, pretendendo introduzir elementos de progresso, a partir
da formulação de críticas. a) ABOLICIONISMO: postula a eliminação do Direito Penal,
por ser sistema gerador da criminalidade: o monopólio estatal do uso da força seria também
violência. Nesse sentido, não haveria legitimidade no Direito Penal, devendo-se, pois,
abolir o sistema de penas positivadas, devendo os conflitos ser resolvidos de outra maneira.
Desperta a necessidade de uma humanização do sistema penal. b) A postura
RESSOCIALIZADORA diferencia-se da perspectiva abolicionista na medida em que se
manifesta como uma luta por um melhor Direito Penal (autêntica reinserção dos apenados,
a partir de mecanismos que eliminem, ou ao menos reduzam taxas de reincidência. Nessa
perspectiva, a ressocialização constitui uma variante contemporânea da doutrina da
prevenção especial). Critica-se também sua versão mais radical, que propõe a eliminação
das penas por medidas de segurança ou de correção, a partir de uma ideologia do
tratamento. c) Por sua vez, a proposta GARANTISTA surgiu para fazer frente à decepção
acerca da capacidade do ideal ressocializador. Propugna fundamentalmente as garantias
formais, buscando conciliar a prevenção geral dos delitos com exigências formais dos
princípios de proporcionalidade e humanidade, limitando a intervenção penal ao
estritamente necessário, não violando valores fundamentais consagrados em quase todas as
sociedades modernas. Nessa linha de pensamento, o Direito Penal mínimo buscou
reconhecer um núcleo rígido de infrações para as quais não se pode flexibilizar o sistema de
penas, sob o risco de cairmos no anarquismo e na prevalência dos argumentos do mais
forte. Ressalvado esse núcleo, o esforço deveria ser no sentido de descriminalizar e
despenalizar os fatos. d) Em sentido diametralmente oposto, os MOVIMENTOS DE LEI E

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ORDEM preconizam a política criminal denominada tolerância zero, voltada para a


repressão incondicional de pequenas infrações como maneira de se evitar a prática futura de
infrações de maior gravidade social. e) Nessa ótica, merece destaque a CONSTRUÇÃO
TEÓRICA DO DIREITO PENAL DO INIMIGO, essencialmente atribuída a Günther
Jakobs. Baseia-se na distinção do Direito Penal dos cidadãos, que sanciona delitos
cometidos por indivíduos infratores em meio às relações sociais e o Direito penal do
inimigo, que tem como destinatário indivíduos considerados como fonte de perigo, sendo,
por isso, despersonalizados pelo Direito. O Direito Penal do inimigo, classificado, segundo
Silva Sanchez, como o Direito Penal de terceira velocidade, refuta os postulados do Direito
Penal garantista, negando ao alegado inimigo direitos e garantias individuais nas esferas
material e processual penal.

4. Velocidades do Direito Penal: As velocidades do Direito Penal trabalham com o tempo


que o Estado leva para punir o autor de uma infração penal, mais ou menos, grave.
Quem idealizou as velocidades do Direito Penal foi Silva Sanches. a) Primeira
Velocidade: A primeira velocidade enfatiza infrações penais mais graves, punidas com
penas privativas de liberdade, exigindo procedimento mais demorado, observando
todas as garantias penais e processuais. Há um procedimento garantista. Ex: o Código
de Processo Penal. b) Segunda Velocidade: A segunda velocidade flexibiliza os direitos
e as garantias fundamentais, possibilitando punição mais célere, mas, em contrapartida,
prevê penas alternativas. O procedimento é flexibilizado. Ex: Lei 9.099 – Lei dos
Juizados, não tem direito a alegação final por escrito, tem que ser oral, estabelece
menor número de testemunhas. c) Terceira Velocidade: A terceira velocidade mescla as
duas anteriores. Defende a punição do criminoso com pena privativa de liberdade (1ª
velocidade), permitindo, para determinados crimes, flexibilização de direitos e
garantias constitucionais (2ª velocidade). O procedimento é flexibilizado. Ex: Lei
9.034/95 – Lei do Crime Organizado. d) Quarta Velocidade: Trata de bens difusos e
coletivos, não individuais (Silva Sanches não reconhece essa quarta velocidade).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

1.b. Aplicação da pena. Código Penal e leis especiais.


Obras consultadas: Santo Graal 27; Queiroz, Paulo, 9ª edição; Masson, Cleber. Direito
Penal – Parte Geral. 6ª edição, ed. Método, 2012. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado
de Direito Penal. Vol. 1: parte geral. 17ª ed. Saraiva: 2012. Resumo do 26 (mesma
bibliografia em edições anteriores).

Legislação básica: Código Penal (arts. 59 e ss.)

1. Aplicação da pena no Código Penal

Introdução: Cuida-se de ato discricionário juridicamente vinculado, pois adota-se o


sistema do livre convencimento, ou seja, a faculdade do juiz formar sua convicção com a
valoração fundamentada das provas, chegando-se à punição justa e adequada, conforme a
escala mínima e máxima fixada pelo legislador, sistemática está presente até os dias atuais.

Princípio da individualização da pena: É regida pelo princípio da individualização da


pena (art. 5º, XLVI, da CF/88), principal princípio a ser considerado. A orientação dada por
tal princípio ocorre em três momentos distintos: (i) individualização legislativa
(cominação): processo por meio do qual são selecionados os fatos puníveis e cominadas as
sanções respectivas, estabelecendo os limites e os critérios de fixação da pena; (ii)
individualização judicial: elaborada pelo juiz na sentença, é a atividade que concretiza a
individualização legislativa que cominou abstratamente as sanções penais, consistindo na
aplicação da pena; e (iii) individualização executória: é a que ocorre durante o
cumprimento da pena.

OBS: na individualização judicial, adota-se, no Brasil, o critério trifásico de aplicação da


pena (art. 68 do CP), de Nélson Hungria. Entretanto, para a pena de multa adotou-se o
sistema bifásico (art. 49 do CP); fixa-se inicialmente o número de dias multa e, após,
calcula-se o valor de cada dia-multa.

Entendimento prévio necessário: Para que se analise as fases de aplicação da pena, é


necessário que você saiba a distinção de elementar e circunstância, além da classificação
das circunstâncias. Em outros pontos do Santo Graal esse assunto está visto. Como nosso
proposta é fazê-lo ficar melhor do que sempre foi, ou seja, vitaminado, coloco abaixo texto
resumido retirado do livro do Artur Gueiros para que se entenda de forma sistematizada em
com uma visão global o que está sendo estudado. Se você domina o tema, passe para o
próximo ponto.

Elementos e circunstâncias na aplicação da pena: Elementares: os tipos penais


descrevem condutas ilícitas e estabelecem seus elementos essenciais. Esses fatores, sem os
quais inexiste o tipo, são chamados de elementares do crime. Para distinguir uma elementar
de uma simples circunstância do crime, basta que seja feita uma eliminação hipotética. Se o
crime desaparecer ou der causa a outro tipo penal, significa que se trata de uma elementar.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Todavia, se não houver alteração da caracterização do crime, estar-se-á diante de uma


circunstância. A relevância das elementares reside na vinculação do preceito secundário (a
sanção) com a realização, total ou parcial, do preceito primário (a conduta descrita no tipo).
Figurativamente, as elementares são uma espécie de conditio sine qua non para a atividade
de individualização judicial da pena, pois sem elas não haverá crime, tampouco pena.
Circunstâncias: (de circum stare, estar ao redor) são dados, fatos ou condições acidentais
que não integram a descrição típica, mas que, se presentes, influem na quantificação da
pena. A noção de circunstância é dada por exclusão: entende-se como tal tudo que não
componha a descrição típica (não for elementar), mas que é importante para o magistrado
quantificar a pena a ser imposta ao condenado. As circunstâncias podem ser divididas em
dois grandes grupos: circunstâncias objetivas (ou impessoais) e circunstâncias subjetivas
(pessoais). As circunstâncias objetivas são as que concernem ao tempo, lugar, modo de
execução e outros fatores externos ou ambientais (dia, noite, ocasião de incêndio ou
tumulto etc.), bem como às condições ou qualidades da vítima ou de terceiros (criança,
mulher, idoso, rica, pobre etc.). Diferentemente, as circunstâncias subjetivas dizem respeito
à pessoa do infrator (primário, reincidente, menor de 21 anos, embriagado, organizador das
atividades dos demais, portador de conduta ilibada etc.), às suas motivações (futilidade,
torpeza, relevante valor social ou moral, violenta emoção etc.). A presente classificação é
fundamental, visto que, somente as circunstâncias objetivas são comunicáveis aos
partícipes. A teor do art. 30, do CP, as circunstâncias subjetivas só se comunicam se
constituírem elementares do tipo. Qualificadoras: Dentre as circunstâncias, existem as
qualificadoras, que são tão importantes que aderem ao tipo regente e criam tipos derivados,
com penas próprias. É o caso do homicídio qualificado, previsto no art. 121, § 2º, CP.
Circunstâncias legais e circunstâncias judiciais: Além dessas, a lei prevê circunstâncias
judiciais e circunstâncias legais, que se subdividem em genéricas (agravantes e atenuantes)
e específicas (majorantes ou causas de aumento de pena e minorantes ou causas de
diminuição de pena). Diferença entre circunstâncias legais genéricas e específicas: As
circunstâncias legais genéricas são taxativamente previstas na lei (arts. 61, 62, 63 e 65, CP)
e tornam obrigatório o aumento ou a diminuição da pena. A lei não fixa o quantum desse
aumento ou diminuição, que é entregue, por completo, ao poder discricionário do juiz.
Além disso, agravantes e atenuantes não podem fazer a pena ultrapassar a pena mínima ou
a máxima cominada. Já as circunstâncias legais específicas estão previstas em qualquer
dispositivo da lei penal, que não os anteriormente mencionados, seja na Parte Geral ou na
Especial, têm limites de aumento e diminuição da pena fixados na lei e não precisam
respeitar os limites máximo e mínimo das penas.

Fases da aplicação da pena: A aplicação da pena é feita em três fases distintas e


sucessivas:

1ª) pena-base: a partir das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP.

Observações iniciais: 1) A pena deve ser fixada dentro dos limites previstos para aquele
crime. Assim, mesmo que todas as circunstâncias sejam favoráveis não pode o juiz reduzir
a pena abaixo do mínimo. 2) Para que haja o aumento acima do mínimo legal, basta uma
circunstância negativa. 3) O aumento da pena acima do mínimo legal deve ser motivado. 4)
O juiz, ao fundamentar o aumento da pena acima do mínimo legal, deve fazê-lo de forma

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

individualizada para o caso concreto, não podendo valer-se de argumentos abstratos. 5)


Elementos que já se encontram previstos no próprio tipo penal não podem ser utilizados
para aumentar a pena no momento da dosimetria.

Circunstâncias judiciais: São circunstâncias judiciais os dados, fatos ou condições,


constantes do caso concreto, que não constituam a definição do delito (elementares), que
não estão inscritas como agravantes ou atenuantes (circunstâncias legais), que não elevem
ou diminuem o quantum da pena (causas de aumento ou de diminuição) e, por fim, que não
qualifiquem ou privilegiem o tipo delitivo (qualificadoras ou privilégios). Ou seja, elas são
valoradas residualmente. Diante disso, pode-se dizer que embora sejam as primeiras a
constar na parte dispositiva da sentença condenatória (fase primária de aplicação da pena-
base), as circunstâncias judiciais serão as últimas a serem ponderadas na atividade
intelectual do julgador, pois elas aparecem por exclusão. Funções das circunstâncias
judiciais: Além de servirem para a fixação da pena-base, as circunstâncias judiciais também
cumprem outras relevantes funções. Aquele rol de fatores funciona como critério para a
análise de certos benefícios legais, tais como a aplicação de pena restritiva de direitos (art.
44, III, do CP), o reconhecimento do crime continuado contra vítimas diferentes (art. 71,
parágrafo único, do CP), o deferimento da suspensão condicional da pena (art. 77, II, do
CP), a concessão do livramento condicional (art. 83, I, do CP), e a concessão da transação
penal e da suspensão condicional do processo (arts. 76 e 89, da Lei nº 9.099/1995) etc.
Aplicação: As circunstâncias judiciais aplicam-se tanto para crimes dolosos como culposos;
para comissivos, omissivos e comissivos por omissão; para consumados ou tentados; para
os crimes tipificados no Código Penal e àqueles definidos na legislação penal especial, se
ela não dispuser de modo diverso (art. 12, do CP). Às oito circunstâncias discriminadas no
caput do art. 59 deve-se, ainda, agregar a contida no caput do art. 60 (situação econômica
do réu), pertinente para a quantificação da pena de multa.

Análise das circunstâncias judiciais: 1) Culpabilidade: A culpabilidade, além de se


constituir pressuposto do conceito analítico do crime – crime é a conduta típica, antijurídica
e culpável – , projeta-se para a Teoria da Pena, figurando como a primeira das diretrizes de
todo o processo de individualização da sanção penal. É o grau de reprovação da conduta.
Não se confunde com a culpabilidade como “fundamento da pena”, ou seja, aquela que
compõe a estrutura do crime (exigibilidade de conduta diversa, imputabilidade e potencial
consciência da ilicitude). Deve ser examinada com base na maior ou menor censurabilidade
do comportamento do agente. Quanto mais intenso for o dolo, maior será a censura. 2)
Antecedentes: Compreendem os episódios precedentes (vita anteacta) reputados relevantes
para a individualização da pena. Os antecedentes correspondem a condenações transitadas
em julgado que não sirvam para agravante de reincidência, por conta do princípio da
presunção de inocência, vide súmula 444 do STJ. [essa é uma circunstância do réu].
Atenção: Súmula nº 444/ STJ - É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais
em curso para agravar a pena-base (as anotações em curso não servem nem como maus
antecedentes, nem como má-conduta social, nem como personalidade voltada para o crime,
nem como nenhum outro elemento que eleve a pena base. [Olhar o Atenção abaixo]). Então
para que servem as anotações criminais que não configuram antecedentes se elas não
podem ser utilizadas na pena base? Elas servem para se saber a conduta da pessoa e será
utilizada em alguns momentos, como o artigo 89 da lei de juizados especiais o qual

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

estabelece que não pode estar sendo processado para obter a suspensão condicional do
processo. Então, nesse caso, os antecedentes servirão para saber se há ou não outro
processo em curso. E a reincidência? Cuidando-se do mesmo fato, não pode haver a
incidência cumulada de maus antecedentes e da reincidência. Diferentemente, tratando-se
de fatos distintos, mas referentes ao mesmo infrator, será possível o reconhecimento de
ambas as figuras. Atenção: A reincidência, por si só, não impede a aplicação do princípio da
insignificância. Mas o registro de antecedentes pode ser utilizado para afastar a aplicação
do princípio, pois pode caracterizar a periculosidade social do agente, que é um dos vetores
para aplicação dos princípios. 3) Conduta social: Conduta social significa não o delito
praticado, mas os atos de relevo do agente no âmbito familiar, no trato com vizinhos,
ambiente de estudo ou trabalho etc., que se fazem importantes para a dosimetria da pena. 4)
Personalidade do agente: Personalidade é o conjunto de fatores psíquicos que condicionam
ou influenciam o comportamento individual. Compreende os atributos de individualidade
do ser humano, isto é, seu sexo, sua idade, sua formação familiar, seu nível educacional e
profissional, suas convicções políticas, enfim, sua maneira de ser e de estar no mundo
circundante. 5) Motivos do crime: Atenção: se o motivo se constituir circunstância
agravante ou atenuante, ou ainda qualificadora ou privilégio, deve ser valorado em outra
etapa da aplicação da pena, não cabendo sua aferição também entre os elementos
norteadores da pena-base, sob pena de se incidir em intolerável bis in idem. Os motivos
determinantes do crime compreendem o primeiro dos critérios preponderantes do art. 67,
CP. 6) Circunstâncias do crime: Cuida-se de dados, fatos ou elementos externos à pessoa do
agente, isto é, relacionados com o tempo, lugar, modus operandi, instrumentos utilizados na
realização do delito, qualidades ou condições da vítima, dentre outros, reputados relevantes
para a dosimetria da pena. Atenção: As circunstâncias do crime abrangem os fatos residuais
que não se encontram especificados como circunstâncias agravantes ou atenuantes, ou
como causas de aumento ou de diminuição de pena. 7) Consequências do crime: Para que
não haja uma indevida valoração em duplicidade do mesmo objeto, é preciso que as
consequências do crime, levadas em consideração para a pena-base do art. 59, do CP, digam
respeito a fatos que extrapolem ao que de ordinário se verifica na violação de uma norma
penal, pois – repita-se – a carga punitiva cominada, em abstrato, nos tipos incriminadores,
já embute os efeitos do dano ou perigo ao respectivo bem jurídico. Se o agente, espontânea
e eficazmente, evita ou minimiza as consequências do crime, bem assim efetiva a reparação
do dano, não somente conseguirá neutralizar a incidência dessa circunstância judicial, como
fará jus à atenuante do art. 65, III, “b”, do CP. OBS: as consequências do crime são os
eventos extraordinários. Ex: o sujeito ficar 8 anos recebendo benefício previdenciário
obtido por fraude. O prejuízo causado pelo longo tempo pode ser considerado como
desfavorável na circunstância judicial consequência do crime. O comportamento da vítima
pode ser favorável ou negativo. 8) Comportamento da vítima: Leva em conta estudos de
vitimologia. Gueiros e STF (com julgado de 2013) entendem que se o comportamento da
vítima contribuir para o crime, apesar de não justificar, pode servir para abrandar a pena-
base. Porém, se a vítima em nada contribuiu, isso não pode ser usado para agravar a pena-
base, devendo ser considerado circunstância neutra, de modo que não pode ser utilizada
para aumentar a pena imposta ao réu. Logo, essa circunstância nunca poderá ser usada para
piorar a condição do réu, servindo apenas para melhorar a sua situação. É comum sua
análise no crime de estelionato.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

OBS: Não existe compensação entre as circunstâncias judiciais do artigo 59, CP. A doutrina
sugere que cada circunstância judicial seja equivalente a 1/8, já que são oito circunstâncias
judiciais. Se for desfavorável, sobe 1/8 para cada uma delas. ATENÇÃO: Se for favorável é
nada, não abaixa a pena em 1/8.

Jurisprudência de 2013 do STF: Crime de concussão praticado por policial: o juiz pode
aumentar a pena-base pelo fato de o réu ser policial. Para cometer o crime, basta ser
funcionário público, mas o grau de reprovabilidade do réu policial é maior, tendo em vista
que se trata de policial, agente público responsável pelo combate à criminalidade. Porém,
não pode aumentar a pena sob o argumento de que o agente queria lucro fácil, pois esse
objetivo é sempre existente na concussão e consiste na própria “vantagem indevida”, que é
uma das elementares do tipo.

STJ, 2014: Condenação por fato posterior ao crime em julgamento não gera maus
antecedentes. Na dosimetria da pena, as condenações por fatos posteriores ao crime em
julgamento não podem ser utilizados como fundamento para valorar negativamente a
culpabilidade, a personalidade e a conduta social do réu. [STJ. 6ª Turma. HC 189.385-RS,
Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 20/2/2014].

Atenção: Maus antecedentes e processo penal em curso: Vimos a regra atual acima, mas é
importante saber e acompanhar o julgamento pelo STF do Recurso Extraordinário (RE)
591054, com repercussão geral, iniciado em 05/06/2014, no qual se discute a
possibilidade de considerar como maus antecedentes, para fins de dosimetria da pena,
a existência de procedimentos criminais em andamento contra o sentenciado. O relator
do RE, ministro Marco Aurélio, em voto pelo desprovimento do recurso, lembrou que o
artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal traz a garantia de que ninguém será
considerado culpado antes do trânsito em julgado de sentença condenatória. O relator
observou que, caso os inquéritos ou processos criminais considerados como antecedentes
tenham desfecho favorável ao acusado, ainda assim ele sofrerá prejuízo, pois os
procedimentos terão sido utilizados para aumentar sua pena em processo no qual foi
efetivamente condenado. “O lançamento no mundo jurídico de enfoque ainda não definitivo
e portanto sujeito à condição resolutiva potencializa a não mais poder a atuação da polícia
judiciária e a precariedade de certos pronunciamentos judiciais”, argumentou. No
entendimento do ministro, os antecedentes mencionados no artigo 59 do Código Penal, que
trata da fixação da pena, não podem ser confundidos com o artigo 61, que fala das
circunstâncias agravantes. Em seu voto, destacou que não é incomum que os juízes
criminais se deparem com extensa ficha criminal de um determinado réu, muitas vezes por
fatos semelhantes ao que são objeto do julgamento, e que essas circunstâncias devem ser
levadas em consideração na dosimetria da pena. O MPF se posicionou favorável: O
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sustentou que o fato de o réu responder a
processos penais e a investigações criminais sem a ocorrência de condenação definitiva
deve merecer a atenção do julgador na fixação da pena, pois revela a conduta social do
apenado e a sua própria personalidade. Ele ressaltou que o artigo 59 do Código Penal, que
estabelece os critérios para o cálculo da pena, é multifacetário, não se restringindo aos
antecedentes criminais, mas levando em consideração também conduta social reprovável e
culpabilidade. No entendimento do procurador, esse procedimento não significa violação

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

do princípio constitucional da presunção da inocência, mas desconsiderar essas


circunstâncias ofenderia ao princípio da isonomia, pois o comportamento social e a
personalidade de réu que não responda a nenhum outro processo seria semelhante ao de
quem responde a outros processos e inquéritos.

2ª) pena-provisória: Na segunda fase do critério trifásico, analisam-se as agravantes (rol


taxativo dos arts. 61 e 62, sem prejuízo de normas especiais) e atenuantes (rol
exemplificativo). Também se verifica a reincidência no art. 63 do CP e no art. 7º da LCP.

MACETE: quadrinho da reincidência: Crime + crime: há reincidência. Crime +


contravenção: há reincidência. Contravenção + contravenção: há reincidência ( Atenção).
Contravenção + crime: não há reincidência ( Atenção). OBS: não importa se o crime ou
contravenção foi no Brasil ou no estrangeiro, o macete se aplica.

OBS 1: A reincidência, além de ser agravante da pena, influencia em outros momentos a


execução da pena: não influi na prescrição punitiva, apenas na executória (art. 110, CP); via
de regra, a reincidência impede a substituição da pena (art. 44, II, CP); via de regra, a
reincidência impõe o regime inicial fechado; influencia no livramento condicional (art. 83,
CP).

Atenção: Em 4/4/2013 do plenário do STF decidiu que a previsão da reincidência como


agravante da pena é constitucional.

OBS 2: a reincidência é regida pelo sistema da temporariedade, pois os efeitos negativos da


reincidência duram um determinado período de tempo, chamado de período depurador e
que dura por 5 anos. Logo, após esse período de 5 anos não poderá mais ser considerado
reincidente. Essa condenação que não pode ser mais considerada reincidência pode ser
considerada como maus antecedentes? Há divergência entre STF e STJ, vejamos:

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OBS 3: O art. 64 do CP traz ressalvas para a reincidência. O inciso I trata do elemento


temporal. Existe um período de depuração, que é de 05 (cinco) anos. O início da contagem
do período de depuração começa com o cumprimento da pena ou sua extinção. É
computado o período de sursis e livramento condicional, desde que não haja revogação.
OBS: o período de depuração é diferente da reabilitação. O período de reabilitação dura
dois anos após cumprida a pena. Ex: pegou proibição de dirigir. Dois anos depois de
cumprida a pena poderá se reabilitar. Completado esse período, deixa o sujeito de ser
reincidente e passa a ser primário com maus antecedentes [os maus antecedentes sempre
estarão na folha]. Vide súmula 241 do STJ: Súmula nº 241 / STJ - A reincidência penal não
pode ser considerada como circunstância agravante e, simultaneamente, como circunstância
judicial. Ex: Sujeito possui condenação nos últimos cinco anos (reincidente) e a folha de
antecedentes inclui diversas outras anotações anteriores aos cinco anos. Então, pode aplicar
a condenação mais recente como reincidência e as anotações anteriores como maus
antecedentes. Nesse caso, não incide bis in idem, pois são duas circunstâncias diferentes. O
que não pode é se utilizar da mesma anotação.

OBS 4: Em 2014 no julgamento HC 120165 o STF entendeu que as circunstâncias


agravantes genéricas não se aplicam aos crimes culposos, com exceção da reincidência.

Circunstâncias comuns e preponderantes: No concurso de agravantes e atenuantes


encontram-se circunstâncias comuns e preponderantes. As circunstâncias preponderantes

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são: os motivos determinantes, a personalidade e a reincidência. [Macete: R P M].

No concurso de agravantes e atenuantes equivalentes, haverá compensação, mantendo a


pena no mesmo lugar, pois uma neutraliza a eficácia da outra. [duas preponderantes ou duas
comuns]. Ex de agravantes equivalentes: crime praticado por motivo torpe (motivo
determinante – agravante preponderante), tendo como agente um menor de 21 anos
(personalidade – atenuante preponderante). Haverá compensação das agravantes, pois são
equivalentes e a pena ficará igual.

Havendo concurso de uma circunstância comum e uma preponderante, a preponderante


prevalece tanto para aumentar quanto diminuir a pena. OBS: Confissão: O STF entende que
a confissão não é preponderante por não ser inerente ao agente, mas sim, externa. O STJ
entende o contrário, alegando que a confissão faz parte da personalidade do agente, sendo,
por esse motivo uma circunstância preponderante. [Atenção: menor de 21a e maior de 70a
são consideradas como preponderante (personalidade) de modo pacífico na doutrina].

Proibição de ficar abaixo do mínimo e acima do máximo: O art. 65 do CP determina que


“sempre atenuam a pena”. Deve-se ter em mente, contudo, a súmula 231 do STJ: A
incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do
mínimo legal [a agravante também não pode ultrapassar o máximo]. Crítica à súmula 231,
STJ: No critério trifásico, não há norma expressa quanto a necessidade de se observar o
patamar de mínimo e máximo, entretanto, a jurisprudência entende que sim.

Atenua-se ou agrava-se que tanto? Não há fração pré-fixada para agravantes e atenuantes
no CP, diferentemente do CPM, que prevê limite específico. Nesse caso, em relação ao CP,
a doutrina adotou o critério de 1/6 (um sexto). Ex: Reconhecida a reincidência, aumenta-se
a pena de 1/6. Se o julgador decidir por fração maior, necessária se faz a fundamentação
idônea.

Atenuantes inominadas (art. 66 do CP): Dentre as atenuantes inominadas se encontra a co-


culpabilidade, que é a situação em que o agente (em regra, pobre e marginalizado) deve ser
punido de modo mais brando pelo motivo de a ele não terem sido conferidas, pela
sociedade e pelo Estado todas as oportunidades para o seu desenvolvimento como ser
humano. Quando houver duas qualificadoras, uma deverá ser valorada como tal e a outra
deverá ser considerada como agravante genérica, desde que elencada tal circunstância, caso
contrário deverá ser avaliada como circunstância judicial. O CP, em seu art. 67, determinou
ainda que são circunstâncias preponderantes os motivos do crime, a personalidade do
agente e a reincidência.

3ª) pena-definitiva: [relembrando: As elementares são componentes do tipo penal,


enquanto as circunstâncias são moduladoras da aplicação da pena, e são acidentais, isto é,
podem ou não existir na configuração da conduta típica. A forma mais segura para
distinguir se determinado fator previsto em lei constitui-se em elementar ou circunstância
se faz pelo critério da exclusão. Se a sua retirada resultar na atipicidade do fato ou na
desclassificação para outro delito, trata-se de elementar. Mas se subsistir o mesmo crime,
alterando-se somente a quantidade de pena, cuida-se de circunstância. As circunstâncias,
que não constituem e nem qualificam o crime, são conhecidas na doutrina como

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

circunstâncias judiciais (art. 59), circunstâncias legais e causas de aumento e de diminuição


da pena.]

Na terceira fase do critério trifásico serão analisadas as causas de aumento e redução de


pena (majorantes e minorantes). Limites: Doutrina e jurisprudência concordam que as
minorantes podem reduzir a pena abaixo do mínimo legal. A maioria entende, porém, que
as majorantes não poderão elevar a pena acima do máximo legal. Há causas de aumento e
redução de pena tanto na parte geral do CP quanto na parte especial. Aplicação: A regra de
aplicação é cumulativa e sucessiva umas sobre as outras a partir da pena intermediária
obtida na segunda fase [juros sobre juros]. Ex: Pena intermediária de 06 (seis) anos, sendo
o roubo com emprego de arma, aplica-se o §2º no inciso I do art. 157 (aumenta-se em 1/3),
e a pena aumenta para 08 (oito) anos. Entretanto, o crime foi tentado, reduzindo-se a pena
pela metade, que incide sobre os oito anos, ficando o agente com 4 anos de pena definitiva.
[não importa se aumenta ou reduz primeiro, pois a conta será a mesmo no final]. Há
exceção no art. 68, parágrafo único. [Art. 68 [...] Parágrafo único: No concurso de causas
de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só
aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou
diminua. [Ou seja: havia duas causas de aumento ou duas causa de diminuição. Ex: diante
de duas causas de aumento da parte especial, o juiz vai aplicar apenas a maior delas]]. Ex
da exceção: Art. 250, §1º, I, e art. 258, CP. [Art. 250 - Causar incêndio, expondo a perigo a
vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem: Pena - reclusão, de três a seis anos, e
multa. Aumento de pena: § 1º - As penas aumentam-se de um terço: I - se o crime é
cometido com intuito de obter vantagem pecuniária em proveito próprio ou alheio; Art. 258
- Se do crime doloso de perigo comum resulta lesão corporal de natureza grave, a pena
privativa de liberdade é aumentada de metade; se resulta morte, é aplicada em dobro. No
caso de culpa, se do fato resulta lesão corporal, a pena aumenta-se de metade; se resulta
morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço].
Conclusão do ex da exceção: Pode o juiz escolher apenas uma majorante, nesse caso. E a
outra causa de aumento fica de graça? Não, utiliza-se a outra como motivo do crime, o que
vai para a pena-base na análise das circunstâncias judiciais. ATENÇÃO: isso é uma
faculdade do juiz, pois ele pode aplicar as duas agravantes se quiser. As súmulas 442 e 443
do STJ tratam desse momento de aplicação da pena. A súmula 442 impede o hibridismo
penal e é amparada pelo princípio da razoabilidade e proporcionalidade. [Súmula nº 442 /
STJ - É inadmissível aplicar, no furto qualificado, pelo concurso de agentes, a majorante do
roubo. Súmula nº 443 / STJ - O aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime de
roubo circunstanciado exige fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua
exasperação a mera indicação do número de majorantes]. Fundamentação: A
fundamentação deve ser com base na gravidade concreta do fato.

OBS FINAL: Após estas três fases, será observada existência de concurso formal próprio
ou de continuação delitiva, quando então serão aplicadas as respectivas majorações.
Concluída a dosimetria da pena, a etapa seguinte consiste em determinar o regime inicial de
cumprimento da pena privativa de liberdade: fechado, semiaberto ou aberto. Após, o
magistrado deve analisar eventual possibilidade de substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direito ou multa. E se não for cabível a substituição, mas a pena
for igual ou inferior a 2 (dois) anos, exige-se manifestação fundamentada acerca da

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pertinência ou não da suspensão condicional da pena (sursis), se presentes os requisitos


legais.

Regras do sistema trifásico: A análise do CP autoriza a extração de algumas regras


inerentes ao critério trifásico: a) na pena-base o juiz deve navegar dentro dos limites legais
cominados à infração penal, isto é, não pode ultrapassar o patamar mínimo nem o patamar
máximo correspondente ao crime; b) se estiverem presentes agravantes e atenuantes
genéricas, a pena não pode ser elevada além do máximo abstratamente cominado nem
reduzida aquém do mínimo legal; c) as causas de aumento e de diminuição são aplicáveis
em relação à reprimenda resultante da segunda fase, e não sobre a pena-base. Havendo
causas de aumento/diminuição, a pena pode ser definitivamente fixada acima ou abaixo dos
limites máximos e mínimos fixados pelo legislador; d) na ausência de agravantes e/ou
atenuantes genéricas e também de causas de aumento/diminuição, a pena-base resultará
como definitiva.

2. Leis especiais.

Leis especiais: nenhuma lei esparsa consagra um modo especial de dosimetria da pena,
aplicando-se, por inteiro, as previsões do CP. Todavia, o art. 42 da Lei 11.343/2006
estabelece que o juiz considerará, com preponderância sobre o art. 59 do CP, a natureza e a
quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente. Há,
ainda, agravantes e atenuantes previstas em outras leis, como a Lei nº 9605.

3. Casuística.

Súmulas STF: 718: e 719.

Súmulas STJ: 231; 440; 443; e 444. A reincidência, consoante art. 67 do CP, é
circunstância preponderante, que prevalece sobre a confissão espontânea (STJ, HC
228.259). A atenuante da menoridade relativa prepondera sobre qualquer outra
circunstância, inclusive sobre a reincidência (STJ, HC 162.216). Não configura bis in idem
a utilização de condenações anteriores com trânsito em julgado, para caracterizar os maus
antecedentes e a reincidência, desde que uma delas seja utilizada para exasperar a pena-
base e a outra na segunda fase da dosimetria (STJ, HC 167.459). O critério de
acréscimo/diminuição na segunda fase é discricionário, cabendo ao juiz estabelecer um
valor proporcional e razoável, observado o caso concreto; o patamar de 1/6, embora erigido
pela jurisprudência e doutrina como fração média razoável e proporcional, não é
necessariamente o máximo a ser acrescido (STJ, HC 179.964). O quantum de redução pela
circunstância atenuante deve observar os princípios da proporcionalidade, razoabilidade,
necessidade e suficiência à reprovação e prevenção ao crime (STJ, HC 141.273). A
atenuante da confissão espontânea é inaplicável às hipóteses em que o agente é preso em
flagrante (STF, HC 102.002). Se a confissão espontânea do acusado foi utilizada para
corroborar o acervo provatório, embasando a condenação, é obrigatória a atenuação da
pena, ainda que tenha havido retratação em juízo (STJ, HC 161.194).

QUESTÕES DE PROVA: Pena. Discorre sobre a aplicação progressiva e regressiva da


pena no Dto brasileiro. É possível a aplicação da progressão de regime para presos

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estrangeiros?

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1.c. Crimes contra a vida. Lesões corporais. Periclitação da vida


e da saúde
Obras consultadas: Santo Graal 27º. MASSON, Cléber. Direito Penal, vol. 2, parte
especial (arts. 121 a 212). 3ª Ed. São Paulo: editora Método, 2011. Págs. 09-156; NUCCI,
Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal. 7ª Ed. São Paulo: RT, 2011. Pág. 673.
BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Crimes federais. 7ª ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2011. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal. 70 ed. São
Paulo: Saraiva, 2010. SANCHES, Rogério. Código Penal para Concursos. 5ª ed. Salvador:
JusPodivm, 2012.

Legislação básica. Arts. 121 a 136, Código Penal. Art. 5º, III, CF. Lei 9.455/97.

1. Homicídio simples: matar alguém (caput): pena - reclusão, de seis a vinte anos. Caso de
diminuição de pena: § 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante
valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta
provocação da vítima, ou juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. Homicídio
qualificado: § 2° Se o homicídio é cometido: I - mediante paga ou promessa de
recompensa, ou por outro motivo torpe; II - por motivo fútil; III - com emprego de veneno,
fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar
perigo comum; IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso
que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido; V - para assegurar a execução, a
ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime: pena - reclusão, de doze a trinta anos.
Homicídio culposo: § 3º Se o homicídio é culposo: pena - detenção, de um a três anos.
Aumento de pena: § 4o No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o
crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente
deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências do seu
ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada
de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de
60 (sessenta) anos. § 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar
a pena, se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a
sanção penal se torne desnecessária. § 6o A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até a
metade se o crime for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço
de segurança, ou por grupo de extermínio. (Incluído pela Lei nº 12.720, de 2012).

O homicídio privilegiado qualificado (homicídio híbrido) é admitido, diante de


qualificadoras de índole objetiva (inc. III e IV), e não é hediondo, para a doutrina e a
jurisprudência majoritária. Assim, pode haver crime com causa de diminuição de pena
concorrente com qualificadoras de natureza objetiva, mas não com as subjetivas. Terá
diminuição alguém que, sob violenta emoção após injusta provocação, matar com fogo
(qualificadora objetiva) ou explosivo o provocador. Responderá com diminuição da pena
(Damásio E. de Jesus e Cláudio H. Fragoso).

A jurisprudência mais recente do STF tem afastado a possibilidade de homicídio

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qualificado com dolo eventual, sustentando que é manifesta a incompatibilidade entre o


dolo eventual, que “implica numa mera aceitação de um resultado possível – e a
qualificadora do recurso que impossibilita a defesa da vítima, a qual reclama um
preordenamento do agente à conduta criminosa” (STF, HC 86.163).

Sujeito ativo: qualquer pessoa (crime comum).

Sujeito passivo: qualquer pessoa. OBS: Sujeito passivo especial: se for vítima o Presidente
da República, do Senado, Câmara ou STF, será crime contra a Segurança Pública (art. 29,
Lei 7.170/83 – lei de segurança nacional), e não homicídio.

Conduta: Matar pessoa. Qualquer pessoa que tenha rompido o saco amniótico (ser humano
nascido). É indiferente que tenha respirado ou não, que seja viável ou não. Se dá a partir do
nascimento, ou seja, das primeiras contrações expulsivas em que feto começa o
procedimento de saída, ou com a primeira incisão médica, na cesariana. Atenção:
Responderá por homicídio aquele que omitir seu dever legal de evitar o resultado morte,
ignorando sua condição de garante ou garantidor, nos termos do art. 13 §2º: dever + poder
(de prestar atendimento).

Materialidade do homicídio: é crime que deixa vestígios; na ausência do cadáver, admitem-


se outras provas, tais como o exame indireto (ex: perícia no local, nas roupas, carro) e
testemunho, como no caso de Elisa Samúdio e do ex-goleiro Bruno do Flamengo.

Tipo Subjetivo: A forma dolosa (direta ou eventual) está prevista no caput, §§1º e 2°. A
culpa vem tipificada no §3°. O homicídio preterdoloso (dolo na lesão e culpa na morte) se
ajusta ao disposto no art. 129, §3°.

Consumação e tentativa: Consuma-se com a morte, caracterizada pela cessação da atividade


encefálica do ofendido (crime material). Tratando-se de crime plurissubjetivo (admite
fracionamento da execução), a tentativa é possível.

ATENÇÃO: O homicídio será hediondo quando qualificado (não importando a


circunstância qualificadora) ou no caso de ser praticado em atividade típica de grupo de
extermínio (chacina, matança generalizada), mesmo que por um único executor do grupo.

OBS: Jurisprudência sobre embriaguez no trânsito e sobre morte em “racha” ou “pega” no


trânsito: em morte no trânsito com embriaguez, só se aplica a teoria da actio libera in
causa na embriaguez preordenada. Mas não se deve generalizar que qualquer homicídio na
direção embriagada de veículo seja doloso, salvo nos casos de embriaguez de preordenada.
A diferença entre dolo eventual e culpa consciente está no elemento volitivo do tipo penal.
E isso se faz pela observação de todas as circunstâncias objetivas do caso, sem adentrar na
psique do agente. Já o racha é caso de dolo eventual se houver morte ou lesão. A prática de
competição não autorizada no trânsito é crime autônomo, doloso e de perigo concreto no
CTB. Se resultar lesão ou homicídio, é progressão criminosa pra 129 (se houver lesão) ou
121 (se houver morte) dolosos. HC 101698/RJ, rel. Min. Luiz Fux, 18.10.2011. (HC-
101698)

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OBS: Gêmeo siamês ou xifópago (gêmeos ‘grudados’): haverá dois crimes de homicídio
doloso, ainda que deseje só a morte de um, pois será o caso de dolo necessário de 2º grau
(consequências necessárias): concurso material. Dolo abrange não só o objetivo perseguido,
mas também os meios escolhidos e as consequências inerentes. É diferente do dolo
eventual. É dolo direto de segundo grau. Dolo eventual é indireto. Explodir carro para
matar político é dolo direto de 1º grau para a morte dele; e há dolo direto de 2º grau para a
morte do motorista e dolo eventual para o ciclista ou pedestre que passava pelo local.

Diminuição da pena [homicídio privilegiado]: há três hipóteses. 1) Relevante valor social:


que tem motivação e interesse coletivos, nobre e altruístico, de todos em geral. Ex.:
homicídio por amor à pátria, amor paterno. 2) Relevante valor moral: liga-se aos interesses
individuais, particulares do agente, entre eles os sentimentos de piedade, misericórdia e
compaixão.. Ex: eutanásia. Há duas formas de eutanásia: ativa e passiva. Ativa pode ser
direta e ativa indireta. Como diz André Estefam, todas exigem consentimento do doente,
tácito ou real. Eutanásia ativa direta: há processo causal que o leva à morte. Ou seja, iria
morrer, mas ainda estava bem. Médicos desenganaram, mas o processo que fatalmente o
levaria à morte ainda não se iniciou. É crime. Mas, excepcionalmente, pode haver
inexigibilidade de conduta diversa supralegal, se estiver sob dor constante e insuportável, já
desenganada pelos médicos. Eutanásia ativa indireta (paliativa): estava morrendo e sua
morte é abreviada. Ex.: drogas são ministradas para aliviar a dor insuportável. Neste caso, a
morte não é desejada, mas é previsível. Pode ser invocado estado de necessidade.
Dignidade da pessoa humana. Eutanásia passiva ou ortotanásia: interrupção do tratamento
médico (desligar os aparelhos), processo causal mórbido já iniciado. Já estava praticamente
morto. Pode haver a morte lícita se paciente, em plena consciência, solicitar sua morte. 3)
Emoção violenta: transitória perturbação da afetividade, ocasionada repentinamente,
afetando o equilíbrio, o estado anímico do agente. Neste caso, o sujeito ativo, logo em
seguida a injusta provocação da vítima, reage, de imediato, sob intenso choque emocional,
capaz de anular sua capacidade de autocontrole durante o cometimento do crime. Em regra,
os Tribunais têm aceitado a violenta emoção do marido que colhe a mulher em flagrante
adultério. Requisitos: 1º: emoção violenta; 2º: injusta provocação da vítima; 3º: sucessão
imediata. Paixão: é a emoção em estado crônico, duradouro. Ex.: ódio, fanatismo, ciúme,
ambição. Logo, a paixão vem da emoção. Para fins penais, se equiparam. A provocação da
vítima deve ser injusta, mas não necessariamente ilegal. Se for uma agressão injusta contra
o agente, pode haver legítima defesa. Deve haver imediatidade, em breve espaço de tempo.
Se houver espaço de tempo para reflexão e preparo do crime, não há a privilegiadora. Ex:
sofro a injusta provocação, vou para a casa e premedito minha vingança privada – não terá
o benefício. A provocação pode ser contra terceiro ou até animal.

Atenção: Não se confunde com a atenuante genérica do art. 65, III, c do CP. No art. 121,
§1º, deve haver domínio de violenta emoção e a conduta deve ser logo após a provocação
da vítima. Na atenuante genérica, deve estar sob influência de emoção, não se exigindo
requisito temporal.

OBS: Reconhecido o homicídio privilegiado, a redução da pena é obrigatória, segundo o


entendimento majoritário da doutrina e da jurisprudência.

OBS: Não é admitido Concurso de pessoas em homicídio privilegiado: as circunstâncias


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são incomunicáveis entre os concorrentes. Logo, se sou injustamente provocado pela vítima
e, sob violenta emoção, mato o provocador, um amigo meu, que não tenha sido provocado
nem sentido a intensa emoção, não se aproveitará da privilegiadora, que me beneficiará. A
redução da pena, pelo STF, é obrigatória. Ou seja: O §1º traz circunstâncias, isto é, dados
eventuais, interferindo apenas na quantidade da pena e não na qualidade do crime, que
permanece o mesmo (homicídio). Por essa razão, na hipótese de concurso de pessoas, tais
circunstâncias minorantes - subjetivas - são incomunicáveis entre os concorrentes (art. 30
do CP).

2. Homicídio qualificado: a premeditação não constitui qualificadora. O homicídio


qualificado é hediondo em qualquer de suas modalidades.

a) Qualificado pela motivação (art. 121, § 2º, I e II): a.1) motivo torpe: é o moralmente
reprovável, desprezível, repugnante e abjeto. Ciúme não é necessariamente torpe ou fútil.
Dolo eventual é compatível com torpe e fútil. Cupidez é a ganância. Um crime privilegiado
não pode ser, ao mesmo tempo, torpe (STJ). Exemplos de torpeza: matar para obter droga,
por haver uma proibição de relacionamento (ex: os irmãos Cravinhos e Suzane). Pode haver
homicídio com dolo eventual que é qualificado pela torpeza; a.2) mediante paga ou
promessa de recompensa: Será qualificado para ambos (mandante e autor), segundo STJ; é
crime bilateral, em que o concurso de pessoas é necessário. Recompensas a posteriori não
qualificam. Exige-se acordo prévio. Prevalece na doutrina que a recompensa ou paga
devam ser de natureza econômica. a.3) Motivo fútil: é o motivo insignificante, bobo, banal,
desproporcional. Vingança não é motivo fútil, mas pode vir a ser torpe ou, dependendo, até
mesmo privilegiador. Vingança e ciúme podem ser privilegiado ou torpe ou fútil, a
depender do caso concreto. Um homicídio nunca será torpe e fútil ao mesmo tempo.
Ciúmes não é motivo fútil. Motivo não pode ser ao mesmo tempo torpe e fútil (STJ). O
dolo eventual é compatível com o motivo fútil. Ausência de motivo não significa motivo
fútil, pois isso seria analogia in mallan partem ,logo p homicídio sem motivo é simples
(posição de César R. Bittencourt). A rigor, não há crime algum que possa ser cometido por
absoluta ausência de motivação. Código adotou teoria actio libera in causa, de modo que
não se admite que embriaguez afaste, por si, a futilidade. André Estefam diz que o ato de
beber reduz ou retira freios inibidores e, quando o agente voluntariamente ingere álcool,
responde integralmente. Crime conexivo (V): crime para assegurar execução de outro e
para garantir ocultação, impunidade ou vantagem. Pelo art. 108 do CP, nos crimes conexos,
a extinção da punibilidade de um deles não impede, quanto aos outros, a agravação da pena
resultante da conexão. Ex: no homicídio praticado para assegurar a execução de outro
crime, a extinção da punibilidade com relação a este crime não impede o reconhecimento
da qualificadora.

STJ, AgRg no REsp 1.113.364-PE, 2013: se o fato surgiu por conta de uma bobagem
(motivo fútil), mas depois ocorreu uma briga e, no contexto desta, houve o homicídio, tal
circunstância pode vir a descaracterizar o motivo fútil. Vale ressaltar, no entanto, que a
discussão anterior entre vítima e autor do homicídio, por si só, não afasta a qualificadora do
motivo fútil. Assim, é preciso verificar a situação no caso concreto.

b) qualificado pelos meios (III): Emprego de veneno: é indispensável que a vítima


desconheça a circunstância de estar sendo envenenada (meio insidioso = falso, hipócrita);
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substância teoricamente inócua pode ser veneno, como o açúcar para o diabético. Veneno é
substância química, animal ou vegetal. Emprego de fogo ou explosivo: podem se constituir
meio cruel ou de que pode resultar perigo comum. Emprego de asfixia: pode ser mecânica
(ex: enforcamento, afogamento) ou tóxica (uso de gás). Tortura: se o agente quer matar
alguém através de dor intensa ou com sofrimento, é homicídio qualificado com tortura. Se o
agente quer torturar e, por excesso nos meios a pessoa vem a morrer, ocorro crime de
tortura com resultado morte (Lei 9.455/97). Se a pessoa quer torturar e, durante a conduta
ou após, quer matar e mata: ocorrem dois crimes em concurso material (tortura e
homicídio) para alguns ou progressão criminosa para outros, se no mesmo contexto fático.
Meio insidioso: dissimulado, hipócrita. Meio cruel: é o brutal, sem piedade, sofrimento
desnecessário. Meio que pode resultar em perigo comum é aquele que pode atingir um
número indefinido ou indeterminado de pessoas. Isso é diferente dos crimes de perigo
comum (Título VIII, Capítulo I do CP). Depende do elemento subjetivo, ou seja, da
vontade do agente em matar ou em só causar perigo comum. Nada impede que haja
concurso formal entre crime de perigo comum, desde que o meio escolhido, além de atingir
a vítima, crie também perigo concreto para número indeterminado de pessoas. Ex: incêndio
(art. 250), explosão (art. 251).

c) qualificado pelo modo de execução: são incompatíveis o dolo eventual e a qualificadora


da traição, emboscada, dissimulação, etc. À traição: ataque sorrateiro, inesperado. Traição
pode ser física ou moral (quebra de confiança). Surpresa é diferente de traição porque nesta
há quebra da lealdade, confiança. Na surpresa, o ataque é inesperado. Há quem entenda que
desentendimentos anteriores impedem surpresa. A superioridade de armas ou agentes não
qualifica, por si só, mas é possível qualificar se há evidente desproporção no número de
pessoas que dificulta a defesa. júri pode redefinir a classificação dada pela pronúncia,
mudando a qualificadora da traição pela surpresa. Emboscada: tocaia, a espreita, com
ocultação premeditada. Se a vítima teve tempo de fugir, não incide a qualificadora.
Mediante dissimulação: é a ocultação da intenção hostil. Absolvição de um por legítima
defesa impõe a absolvição de coautor. Latrocínio e roubo em concurso com homicídio
doloso (André Estefam): o elemento subjetivo será fundamental. Se houver a consumação
do roubo e, após, no mesmo contexto fático, tentar matar a vítima (‘animus necandi’), há
roubo cumulado com tentativa de homicídio (STF). Se pretender roubar, consumando-se
subtração e da violência resulta lesão grave, havendo intenção de matar, há três correntes:
tentativa de latrocínio (André Estefam); roubo agravado por lesão grave; STF: roubo
consumado com tentativa de homicídio, em concurso material. Logo, para o STF, se não
houve morte como resultado da violência, mas apenas lesão grave em uma das vítimas, há
homicídio tentado em concurso material com roubo, indo para júri (HC 91.585). Para
TJDFT, 2008 09 1 013276-2 apr - 0006725-31.2008.807.0009 (res.65 - cnj) , consumado o
roubo e tentada a morte, há latrocínio tentado. não há mero roubo qualificado (157, 2º, i) se
provado animus necandi. Recurso que dificulta ou impossibilita a defesa: se relaciona às
formas anteriores. Casos concretos: vítima dormindo, faca escondida, vítima concentrada
noutra situação. Não há surpresa se vítima percebeu a aproximação e a intenção.

d) Qualificadoras pelos fins (V): para assegurar execução, ocultação ou impunidade ou


vantagem em relação a outro crime.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

STJ, 2014: O juiz, na decisão de pronúncia, só pode fazer o decote (retirada) da


qualificadora imputada se ela for manifestamente improcedente, ou seja, se estiver
completamente destituída de amparo nos elementos cognitivos dos autos. Isso porque o
verdadeiro julgador dos crimes dolosos contra a vida são os jurados. O juiz togado somente
deve atuar em casos excepcionais em que a pretensão estatal estiver claramente destituída
de base empírica idônea. O fato de o agente ter praticado o crime com reiteração de golpes
na vítima, ao menos em princípio e para fins de pronúncia, é circunstância indiciária do
“meio cruel”, previsto no art. 121, § 2º, III, do CP. [STJ. 6ª Turma. REsp 1.241.987-PR,
Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 6/2/2014].

O homicídio pode ser privilegiado-qualificado? Sim, desde que a circunstância


qualificadora que concorre com o privilégio seja objetiva (incs. III e IV).

O homicídio privilegiado-qualificado é crime hediondo? Há duas correntes. Não: Fazendo


uma analogia ao disposto no art. 67 do CP, conclui que 0 privilégio, sempre subjetivo, é
circunstância preponderante, desnaturando a hediondez do delito (é a que prevalece no STF
e ST|). Sim: O art. 67 não serve para analogia, pois trata do concurso de agravantes e
atenuantes. No caso do homicídio privilegiado-qualificado estamos diante de um elemento
qualificador e de uma causa de diminuição de pena, situação claramente distinta. Esta
corrente lembra, ainda, que a Lei 8.930/94, ao incluir 0 homicídio qualificado no rol dos
delitos etiquetados como hediondos, não fez qualquer ressalva.

3. Homicídio Culposo (§ 3º): Se o homicídio culposo ocorreu na direção de veículo


automotor, aplica-se o disposto no art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro (princípio da
especialidade), com pena mais rigorosa (detenção, de 2 a 4 anos, e suspensão ou proibição
de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir). A diferença das reprimendas (apesar
de o mesmo resultado) faz com que parcela da doutrina questione a constitucionalidade das
consequências trazidas pelo CTB. Prevalece, todavia, que é constitucional, atentando-se
para o maior desvalor da conduta (negligência no trânsito é mais perigosa).

Homicídio culposo com causa de aumento de pena (§4º): terá causa de aumento de pena o
homicídio se resultar de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício: é
diferente da imperícia. Na imperícia, o profissional não tem a capacidade técnica que
deveria ter. Na inobservância, o profissional tem a capacidade técnica que deveria ter, mas
não a emprega ou a emprega mal. Se médico foi desidioso no curso de medicina e, depois
de formado, em ato cirúrgico que poderia realizar por ter habilitação para tanto, erra e causa
morte do paciente: caso de imperícia. Se pessoa que não é médica faz cirurgia e mata
paciente: imprudência ou até dolo eventual. Se médico não foi desidioso em sua formação e
realmente detém conhecimento da técnica, mas não a observa, vindo o paciente a morrer:
isso é inobservância regulamentar (§4º). Se médico capaz na sua formação, observando as
normas técnicas, vem a causar a morte, isso é erro profissional que não enseja
responsabilização penal, haja vista as limitações da ciência.

Omissão de socorro: aplicável nos casos em que o agente, após ferir culposamente a vítima,
sem risco pessoal, não lhe presta assistência, vindo ela a falecer. Não responderá pela
omissão de socorro do art. 135, mas por homicídio culposo qualificado pela omissão de
socorro.
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

STJ, HC 181.847-MS, 2013: É possível a aplicação da causa de aumento de pena prevista


no artigo 121, §4º, do CP no caso de homicídio culposo cometido por médico e decorrente
do descumprimento da regra técnica no exercício da profissão. Nessa situação, não há que
se falar em bis in idem.

STJ, 2014: Homicídio culposo cometido no exercício de atividade de transporte de


passageiros: Para a incidência da causa de aumento de pena prevista no art. 302, parágrafo
único, IV, do CTB, é irrelevante que o agente esteja transportando passageiros no momento
do homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor. [STJ. 6ª Turma. AgRg no
REsp 1.255.562-RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 4/2/2014].
Imagine agora a seguinte situação: Miguel, motorista do transporte coletivo, estava no final
de seu turno, levando o ônibus, vazio, de volta para a garagem da empresa. O condutor
acabou se distraindo e, com isso, atropelou e matou um ciclista.O agente irá responder pela
causa de aumento do art. 302, parágrafo único, IV, mesmo sem estar transportando nenhum
passageiro no momento do atropelamento? SIM. Segundo a jurisprudência, para a
incidência da causa de aumento de pena prevista no art. 302, parágrafo único, IV, do CTB,
é irrelevante que o agente esteja transportando passageiros no momento do homicídio
culposo cometido na direção de veículo automotor. Para que incida a majorante, é
suficiente que o agente, no exercício de sua profissão ou atividade, esteja conduzindo
veículo de transporte de passageiros, ainda que vazio.

Perdão Judicial (§ 5º): É causa extintiva de punibilidade (CP, art. 107, IX). O juiz,
analisando as circunstâncias que envolvem o caso concreto, decidirá sobre a sua aplicação.
Diferentemente do perdão do ofendido (CP, art. 107, V), o perdão judicial não precisa ser
aceito para gerar efeitos (ato unilateral). As consequências podem ser físicas ou morais.
Aplicáveis só a crime culposo. Ex: caso da morte da esposa de Herbert Viana. Cabe o
perdão judicial nos crimes do CTB (lesão e homicídio culposos), em que pese seja omisso.
O art. 291 do CTB manda aplicar o CP subsidiariamente. Mas tem que demonstrar que
sofrimento torna desnecessária a pena, não sendo o mero parentesco suficiente para tanto
(TJDFT, novembro de 2011).

4. Induzimento, auxílio ou instigação ao suicídio: Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a


suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça: pena - reclusão, de dois a seis anos, se o
suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão
corporal de natureza grave. Parágrafo único - A pena é duplicada: Aumento de pena I - se o
crime é praticado por motivo egoístico; II - se a vítima é menor ou tem diminuída, por
qualquer causa, a capacidade de resistência.

Haverá suicídio quando o ser humano, de forma direta, voluntária e consciente, elimina a
própria vida.

Objetividade jurídica: Tutela-se a vida humana.

Sujeito Ativo: Qualquer pessoa (crime comum).

Sujeito Passivo: Pessoa capaz (com consciência e discernimento). OBS: Sendo incapaz, o
crime praticado por quem a induziu, instigou ou auxiliou será de homicídio, encarando-se a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

incapacidade da vítima como mero instrumento daquele que lhe provocou a morte. OBS:
Não haverá crime se o induzimento for genérico, dirigido a pessoas incertas (ex.:
espetáculos, obras literárias endereçadas ao público em geral, discos etc).

Conduta: Existem três formas de se praticar o crime: Induzir é introduzir na pessoa uma
ideia que não existia. Instigar é incentivar uma ideia que já existia. Prestar auxílio é um agir
(conduta comissiva, e não omissiva), é ajudar materialmente (ex: fornecer arma, corda,
indicar lugar). OBS: O auxílio deve ser sempre acessório (cooperação secundária). Deixa
de haver participação em suicídio quando o auxílio intervém diretamente nos atos
executórios, caso em que o agente colaborador responderá por homicídio. Prevalece o
entendimento de que é admitida a conduta omissiva (garantidor).

Consumação e tentativa: o crime se consuma com a morte da vítima ou ocorrência de lesão


corporal grave (suicídio frustrado). É atípico diante de lesões leves. OBS: Se vítima não
tenta se matar, não há crime. Se vítima não tem discernimento, é homicídio. A participação
deve ser secundária, acessória; se for a causa direta e imediata, incorrer-se-á em homicídio.
Não há tentativa deste crime, cuja punibilidade exige o resultado morte ou lesão corporal de
natureza grave (crime condicionado)..

Tipo Subjetivo: Dolo. Não se admite a forma culposa. OBS: Caso um dos amantes resolva
cometer suicídio por estar inconformado com o rompimento do namoro, o outro
sobrevivente, em princípio, não responderá pelo crime, por falta de dolo.

Causa de aumento de pena: A pena será duplicada se o agente é movido por motivo
egoístico (exemplo: buscando receber a herança do suicida ou ocupar seu nobre cargo), ou
se a vítima é menor ou diminuída capacidade de resistência. OBS: Nossa lei não indicou
qual é a menoridade a que se refere o parágrafo único, fixando a doutrina nos 18 anos
incompletos, gozando, porém de certo grau de entendimento (não incapaz).

5. Infanticídio (Art. 123): Art. 123 - Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio
filho, durante o parto ou logo após: pena - detenção, de dois a seis anos.

Competência para julgamento: tribunal do Júri.

Objetividade jurídica: Tutela-se vida. Estamos diante de forma especial de homicídio (para
alguns, outra modalidade de privilégio). É o homicídio praticado pela genitora contra 0
próprio filho, influenciada pelo estado puerperal, durante ou logo após o parto.

Sujeito Ativo: Trata-se de crime próprio, só podendo ser praticado ela mãe (parturiente),
sob influência do estado puerperal.

Crime bi-próprio: exigem-se qualidades especiais tanto do sujeito ativo (mãe) quanto do
passivo (filho recém-nascido).

Sujeito Passivo: o ser humano, durante 0 parto ou logo após (nascente ou recém nascido).

Concurso de pessoas. Há três situações com a mesma conclusão: a) mãe, sob o puerpério, e

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

terceiro matam durante o parto ou logo após: ambos respondem por infanticídio. Teoria
unitária do delito (art. 29 do CP); b) mãe mata com ajuda acessória de terceiro: ambos
respondem por infanticídio; c) terceiro mata com ajuda acessória da mãe sob puerpério:
ambos respondem por infanticídio; d) mãe, sem estar acometida pelo puerpério, mata:
homicídio. OBS: Posição de Cezar R. Bittencourt: se não for o parto (rompimento do saco
amniótico) ainda, não há infanticídio, podendo haver aborto. ATENÇÃO: Discute-se qual o
crime praticado quando terceiro, sozinho, provoca a morte do recém nascido, incentivado
pela parturiente sob estado puerperal. Parece tecnicamente acertada a conclusão de que
ambos os participantes respondem por homicídio. Contudo, percebendo que se a mãe mata
a criança, responde por delito menos grave (infanticídio), a incoerência é solucionada com
os dois agentes (parturiente e médico) respondendo por infanticídio (nesse sentido,
Damásio, Delmanto, Noronha e Fragoso); para outros, o médico responde por homicídio e a
parturiente por infanticídio (Bento de Faria e Frederico Marques).

Conduta: Pune-se a conduta da parturiente que, sob influência do estado puerperal, mata o
próprio filho, nascente ou neonato. Percebe-se a existência de duas circunstâncias
elementares importantes, sem as quais não se cogita de infanticídio: a) Elemento
cronológico: causar a morte do próprio filho, durante ou logo após o parto; b) Elemento
etiológico: ter agido esta sob a influência do estado puerperal. Entende-se por estado
puerperal aquele que se estende do início do parto até a volta da mulher às condições pré-
gravidez (puerpério), trazendo profundas alterações psíquicas e físicas, transformando a
mãe, deixando-a sem plenas condições de entender o que está fazendo. Deve haver uma
relação de causa e efeito, colocando a parturiente em uma situação análoga à de semi-
imputabilidade, justificando-se assim a pena mais branda. o Brasil adotou o critério
fisiopsicológico. Desnecessidade de perícia: a jurisprudência não considera indispensável a
perícia médica para comprovar o estado puerperal.

Tipo Subjetivo: dolo (direto ou eventual) consistente na consciente vontade de matar o


próprio filho, estando a mãe sob a influência do estado puerperal. Atenção: Por qual crime
responde a mãe que, sob Influência do estado puerperal, imprudentemente mata o filho
recém-nascido? 1ª corrente: Nenhum, pois 0 fato é atípico, vez que é inviável, na hipótese,
atestar a ausência da prudência (diligência) normal em mulher desequilibrada
psiquicamente. 2ª corrente: Tipifica homicídio culposo. O estado puerperal será matéria
decisiva para a dosagem da pena. Corrente majoritária.

Infanticídio ≠ Abandono de recém nascido:

Infanticídio (art. 123) Abandono de recém nascido (art. 134 §2°)


É crime contra vida. É crime de periclitação da vida ou saúde.
É Julgado pelo tribunal do júri. É Julgado pelo Juízo singular.
O agente age com dolo de dano. O agente age com dolo de perigo.
A morte é dolosa. A morte é culposa.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

6. Aborto: Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento: art. 124 - Provocar
aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque: pena - detenção, de um a três
anos. Aborto provocado por terceiro: art. 125 - Provocar aborto, sem o consentimento da
gestante: pena - reclusão, de três a dez anos. art. 126 - Provocar aborto com o
consentimento da gestante: pena - reclusão, de um a quatro anos. Parágrafo único. Aplica-se
a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou débil
mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência. Forma
qualificada: art. 127 - as penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um
terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante
sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe
sobrevém a morte. Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico: I - se não há
outro meio de salvar a vida da gestante; II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é
precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

Classificação: natural: interrupção espontânea da gravidez (impunível); acidental: em


consequência de traumatismo (impunível); criminoso: arts. 124 a 127; legal ou permitido:
previsto no art. 128 e no caso de feto anencéfalo. OBS: ADPF nº 54: info. 661 – alguns
ministros consideraram esta conduta atípica, uma vez que o anencéfalo seria absolutamente
inviável e, portanto, não seria titular do direito à vida - critério da inviabilidade fetal. OBS:
Questão do concurso do MP SP 2011: “Aquele que encoraja a gestante a praticar um
aborto, acompanhando-a à clínica médica, mas sem participar fisicamente das manobras
abortivas, responde por participação na modalidade própria do aborto consensual ou
consentido”.

Conceito de feto: há feto quando o ocorre o fenômeno da nidação: é o momento em que, na


fase de blástula, o zigoto encontra-se com a placenta, ao final da 4ª semana de gestação
(Luiz Flávio Gomes). Não existe crime de lesão corporal a feto. OBS: Pílula do “dia
seguinte”: não há embrião ainda e por isso seu uso não caracteriza crime algum. OBS:
Gravidez molar e extrauterina: não há crime, pois o aborto pressupõe gravidez viável. OBS:
Aborto de gêmeos: concurso formal impróprio. Serão tantos crimes quanto forem os fetos.

Art. 124: Auto aborto ou consentir que outrem lho provoque. Conceito: interrupção da
gravidez com a consequente morte do feto. Após iniciado o parto, passa a ser homicídio ou
infanticídio. O correto, segundo o uso médico, seria chamar ‘abortagem’. Aborto é o
resultado do ato de abortagem. Sujeito Ativo: As duas condutas trazidas pelo tipo só podem
ser praticadas diretamente pela mulher grávida, prevalecendo tratar-se de crime de mão
própria. Admite-se o concurso de agentes apenas na forma de participação, pois o potencial
coautor responderá pelo crime previsto no art. 126, ou seja, o terceiro que promove a
execução material (enfermeira, anestesista etc.), responde pelo art. 126 (exceção à teoria
monista; para a maioria da doutrina, há adoção da teoria pluralista neste caso– cada autor
pratica um crime próprio, autônomo e distinto dos demais -, embora haja quem defenda ter
sido adotada a teoria dualista – há um crime para os autores e outro para os partícipes).
[portanto: No art. 124: a mãe provoca o aborto ou consente que outrem o faça: ambas são
crime de mão própria (só a mãe pode praticar), mas admitem participação (para instigar,
induzir ou auxiliar). No art. 124, aquele que provoca o aborto consentido, pratica o art.
126]. No 124, há crime de menor potencial ofensivo, e aí vai para o júri, onde serão

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

aplicados institutos da 9099. Sujeito ativo no auto-aborto (art. 124, 1ª parte): a mãe. É
crime de mão própria: somente a mãe pode praticá-lo. Mas, como qualquer crime de mão
própria, admite-se a participação, a quem se comunicam as condições da autora (art. 30
CP). Ex: noivo incentiva noiva a abortar pratica 124. Mas se participar dos atos executórios
(empregou, pessoalmente, meios abortivos), responde pelo 126. Se conduz à parteira,
remunerando esta, pratica 126 também (TJSP). Tipo Subjetivo: Pune-se o aborto somente a
título de dolo, consistente na consciente vontade de interromper a gravidez (ou consentir
para tanto). Nelson Hungria admite também o dolo eventual, exemplificando com o caso da
mulher que, sabendo-se grávida, tenta suicidar-se, resultando o aborto. Não se pune a
modalidade culposa. Caso provocado, culposamente, por terceiro, responde este por lesão
corporal culposa (art. 129, § 6.°, do CP). OBS: Existe aborto omissivo, uma vez que mãe e
médico que a atende têm dever jurídico de zelar pela vida

Art. 125: Provocar aborto, sem o consentimento da gestante. Aborto praticado por terceiro.
Duas modalidades: não concordância real (violência, grave ameaça ou fraude) e não
concordância presumida (menor de 14 anos, alienada ou débil mental – art. 126, parágrafo
único, pois se a gestante for menor de quatorze anos, alienada ou débil mental (qualidades
da grávida), ou se o consentimento é obtido mediante fraude (modo de execução), seu
consentimento não será valido, logo, será o mesmo que dizer que não houve
consentimento). Sujeito ativo: crime comum. Sujeito passivo: há dupla subjetividade
passiva, a gestante e a concepção. Tipo subjetivo: Dolo. Consumação e tentativa: Consuma-
se com a destruição do produto da concepção. Admite-se a tentativa (delito
plurissubsistente) caso o resultado não seja alcançado por circunstâncias alheias à vontade
do agente.

Art. 126: Provocar aborto com o consentimento da gestante. O caput do artigo presume a
capacidade da gestante em consentir, caso contrário a figura é a do parágrafo único. Sujeito
Ativo: Qualquer pessoa pode praticar este delito (crime comum). O concurso de agentes é
possível, nas suas duas formas (coautoria e participação). Sujeito Passivo: É apenas 0
produto da concepção. Conduta: A conduta típica permanece a mesma dos artigos
precedentes, ou seja, provocar (mediante ação ou omissão), a interrupção da gravidez,
extinguindo o produto da concepção, mas aqui, com o consentimento válido da gestante. Se
durante a prática das manobras abortivas, mas antes da interrupção da gravidez, a gestante,
arrependida, pede para interromper a operação, preferindo o terceiro provocador continuar
com sua ação delituosa até alcançar o resultado inicialmente visado, configura, para cada
personagem, qual crime? Entendemos que, para o terceiro provocador, aborto não
consentido (art. 125 do CP). Já para a gestante, consentimento criminoso (art. 124 do CP).
Não merece ela o benefício do arrependimento previsto no art. 16 do CP. É que, esgotando
os atos executórios (consentimento criminoso), seu arrependimento, para gerar o benefício
legal, deveria ser eficaz, leia-se, evitar, com sucesso, o resultado material. Haverá delito
impossível se as manobras abortivas forem realizadas em mulher que erroneamente se
suponha grávida (absoluta impropriedade do objeto material). Tipo Subjetivo: Dolo,
consistente na vontade consciente de provocar abortamento consentido. Consumação e
tentativa: Consuma-se com a interrupção da gravidez (crime material), sendo possível a
tentativa (delito plurissubsistente).OBS: Que crime pratica quem anuncia meios abortivos?
Art. 20 LCP. Anunciar processo, substância ou objeto destinado a provocar aborto: Pena -

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

multa.

Art. 127: Majorantes (apenas para os arts. 125 e 126): I) + 1/3, se, em consequência do
aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de
natureza grave; II) pena duplicada, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte. É
causa especial de aumento de pena. E o art. 124, por que não é abarcado pela majorante?
Porque o direito penal não pune a autolesão nem o ato de matar-se. Colaborador: O
colaborador do auto-aborto (ou aquele que apenas induziu a gestante a consentir para que
terceiro o provocasse) também não se submete à majorante, pois que praticante de conduta
inteiramente estranha à execução. Preterdolo: Em qualquer dos casos, faz-se presente a
figura do preterdolo. Querendo (dolo direto) ou assumindo (dolo eventual) o resultado mais
grave, o agente responderá pelos dois crimes (aborto e lesões corporais ou homicídio,
conforme o caso) em concurso formal (art. 70 do CP).

Art. 128: Aborto legal ou permitido - Apenas se praticado por médico: I (aborto necessário)
- se não há outro meio de salvar a vida da gestante; II (aborto sentimental) - se a gravidez
resulta de estupro (ou de outro ato libidinoso, ou de estupro de vulnerável, em face da
analogia “in bonam partem”). A natureza jurídica é controversa: exclusão de ilicitude
(Masson, p. 78), caso especial de estado de necessidade (Fragoso, Hungria, Frederico
Marques, Paulo José da Costa Júnior) ou de inexigibilidade de conduta diversa (Rogério
Greco). Com a ADPF nº 54, passou a se admitir, independente de autorização judicial ou
outra permissão estatal, o aborto de fetos anencéfalos, sob o argumento de envolver “a
dignidade da pessoa humana, o usufruto da vida, a liberdade, a autodeterminação, a saúde e
o reconhecimento pleno de direitos individuais, como, direitos sexuais e reprodutivos das
mulheres”. A antropóloga brasileira Débora Diniz, que atuou como amicus curiae no caso
da ADPF 54, por meio da ONG Anis, afirmou que, o que há no caso, em termos
sociológicos, é uma “antecipação terapêutica de parto” e não um aborto, no uso vulgar
dessa palavra, que está atrelada a uma conduta criminosa de maneira em geral. O feto
anencéfalo é inviável: jamais viverá; não é uma pessoa deficiente, porque “não existem
pessoas anencéfalas entre nós”. A antecipação do parto permite que esse feto, enfim, morra,
porque fora do útero não existe possibilidade de sobrevida a ele. Trata-se de uma
antecipação terapêutica sob o olhar médico e da mulher gestante. O uso da expressão
“antecipação de parto” não é apenas simples ajuste estético de palavras ou uso de
eufemismo. Mas, no universo judicial, o STF preferiu manter a expressão aborto ao longo
da ADPF 54. [Obs.: Para ampliar horizontes, sugiro a leitura do breve texto, de três páginas
curtas, de setembro de 2008, disponível em
http://www.anis.org.br/serie/visualizar_serie.cfm?IdSerie=72]. Agente que mata a mulher
que sabe estar grávida: responde por homicídio e aborto (dolo eventual) em concurso
formal impróprio (art. 70, único, do CP): mediante uma só conduta lesiona dois bens
jurídicos distintos, com dolo de consequência necessária. Agente que tem a intenção de
abortar e matar, com desígnios autônomos: o dolo é direto e será o caso de concurso formal
impróprio. Ou seja, o agente, com uma só conduta, deliberadamente quer lesionar dois bens
jurídicos; responderá por concurso formal com as penas somadas (e não com o aumento da
maior delas) como se concurso material fosse. Se a intenção é abortar e depois matar, há
desígnios autônomos e responderá em concurso material (70), havendo duas condutas
distintas: somam-se as penas dos dois crimes (art. 69). Agente, desconhecendo gravidez,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

quer causar lesão corporal na mulher e vem a causar o aborto em razão da violência: será
crime de lesão corporal gravíssima (art. 129, §2º, V). Ex: lesionar a gestante e,
culposamente, provocar o aborto: há crime preterdoloso (129, 2, V – lesão grave). Agente
que, sabendo grávida a mulher, lhe golpeia acarretando expulsão e morte do feto: aborto
provocado do art. 126 (e não lesão gravíssima), podendo haver as causas de aumento de
pena do 127 se a mãe morrer ou ficar gravemente lesionada.

Quadro resumo:

Aborto eugenésico (ou eugênico): é aquele praticado em face dos comprovados riscos de
que o feto nasça com graves anomalias psíquicas ou físicas. Como regra não é permitido
pela legislação brasileira, entretanto a doutrina e jurisprudência ainda fazem um verdadeiro
contorcionismo jurídico para admiti-lo em algumas hipóteses, como no caso de acefalia.

7. Lesões Corporais: Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem (art. 129 'caput'
e crime de menor potencial ofensivo). Lesão corporal de natureza grave se resulta (formas
qualificadas, não mais de menor potencial ofensivo, sujeitas a reclusão): I - Incapacidade
para as ocupações habituais, por mais de trinta dias; II - perigo de vida; III - debilidade
permanente de membro, sentido ou função; IV - aceleração de parto. § 2° (Lesão de

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

natureza gravíssima) Se resulta: I - Incapacidade permanente para o trabalho; II -


enfermidade incurável; III - perda ou inutilização do membro, sentido ou função; IV -
deformidade permanente; V – aborto. Lesão corporal seguida de morte se resulta morte e as
circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de
produzi-lo.

Tipo subjetivo: O crime de lesão corporal é punido a título de: Dolo (caput e §§1º e 2º),
culpa (§§6º e 7º) e preterdolo (§§1º, 2º e 3º)

Diminuição de pena: se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor
social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta
provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. Substituição da
pena: O juiz, não sendo graves as lesões, pode ainda substituir a pena de detenção pela de
multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis: I - se ocorre qualquer das hipóteses do
parágrafo anterior; II - se as lesões são recíprocas. Lesão corporal culposa é prevista. Cabe
perdão judicial. Violência Doméstica: se a lesão for praticada contra ascendente,
descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido,
ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de
hospitalidade: forma qualificada e crime de médio potencial ofensivo. Pessoa com
deficiência: A pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa
portadora de deficiência. Milícia: A pena é aumentada de um terço até a metade se o crime
for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou
por grupo de extermínio. A autolesão: não é crime, salvo se for elementar de outro crime,
como o estelionato. Lesão ocorrida na defesa de agressão: o agressor responde (posição de
C. R. Bitencourt) – Ex: alguém, agredido por outrem, para defender-se, acaba ferindo-se.
Para ele, a lesão é causa superveniente relativamente independente que não produziu, por si
só, o resultado. Para Luiz Flávio Gomes, faltaria domínio do fato neste caso, tornando o
fato atípico. Tipicidade objetiva (ou conduta típica): lesar a integridade física ou mental de
outrem. Crime material: exige modificação do organismo humano. Mero rubor facial não é
lesão (falta lesividade – princípio da insignificância) – STJ e STF. Mas empurrão ou tapa,
será contravenção penal de vias de fato. Uma pessoa, com uma só conduta, lesiona outras
três, com dolo de lesionar as três: haverá concurso formal impróprio: somam-se as penas,
pois há desígnios autônomos, como se concurso material fosse. Lesão em lutas (boxe),
dentro das regras do esporte: risco permitido e não é objetivamente imputável. Lesão para
brinco, tatuagem. Estão dentro do consentimento da vítima e da aceitação social. Falta,
nesses casos, imputação objetiva da conduta, o que exclui o crime. Tipo ou elemento
subjetivo: dolo ou culpa. Há dolo se houver vontade livre e consciente de ofender a
integridade física ou a saúde de outrem. Distinção entre lesão corporal e tentativa de
homicídio: é o elemento subjetivo: dolo de matar ou dolo de ferir. Consumação: com a
lesão efetiva à integridade ou à saúde, com o dano. Várias lesões numa única conduta: um
só crime. Se houver interrupção da atividade e nova determinação de vontade, haverá novo
crime. Há tentativa de lesão corporal quando o agente tenta ferir, mas é impedido por
terceiros. Se o meio empregado pelo agente é capaz de causar dano, não se pode falar em
tentativa de vias de fato. O objeto material inclui as próteses conectadas definitivamente.

Tipos de lesão:

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

1) Lesão leve (simples), grave e gravíssima:

a) lesão leve (caput): é a que não é grave ou gravíssima, tipificada no caput do artigo. É
conceito por exclusão;

b) lesão grave (§1º): são crimes qualificados pelo resultado em que este é querido (dolo) ou
provocado culposamente (preterdolo). Algumas qualificadoras são punidas somente a título
de preterdolo, pois, se dolosas também no resultado, o crime será outro (ex: II – perigo de
vida). Se resulta: b.1) incapacidade física ou mental para ocupações habituais por mais de
trinta dias (trabalho, asseio, diversão; a mera vergonha das marcas não aproveita; exige-se
perícia médica tempestiva; excepcionalmente a perícia pode ser substituída por prova de
outra natureza, como a testemunhal); b.2) perigo de vida (probabilidade séria e concreta de
perigo de vida, provado por perícia – ex: atingimento de órgão vital, hemorragia,
penetração no abdômen, desde que, nesses casos, tenha havido perigo real de morte); a
região da lesão, por si só, não faz presumir o perigo. Esta qualificadora que só admite o
preterdolo. b.3) debilidade permanente de membro, função ou sentido: acarreta a
diminuição ou enfraquecimento funcional, não importando se passível de correção por
aparelhos. Ex: lesão que afeta visão, audição, tato. b.4) aceleração de parto (expulsão
prematura do feto com vida, antes do previsto). Indispensável que agente saiba ou possa
saber grávida. Se não souber da gravidez, responderá por lesão leve. Se feto é expulso sem
vida ou vem a morrer logo à expulsão e em decorrência dos ferimentos, é lesão gravíssima
do §2º, V.

c) lesão gravíssima (§2º): Será gravíssima se: c.1) incapacidade permanente para o trabalho:
não há previsão de retorno ao trabalho; pode ser física ou psíquica; deve ser para todo e
qualquer trabalho, e não só o que se fazia antes. c.2) Enfermidade incurável, letal ou não.
Se a cura depender de cirurgia arriscada ou tratamento duvidoso, haverá a qualificadora. Se
intervenção médica segura puder reparar, não haverá a qualificadora. Ex: AIDS (STF e STJ:
160982 de 2012); c.3) Perda ou inutilização de membro, sentido ou função: o órgão se
torna inapto. É mais grave que a simples debilidade. Se forem membros ou órgãos duplos, a
lesão será qualificada como gravíssima se atingir ambos (Magalhães Noronha). Se um só,
será debilidade. A impotência para o sexo é lesão gravíssima. c.4) Deformidade permanente
(exigem-se: permanência, visibilidade, irreparabilidade, dano estético e sentimento
vexatório). Se houver cirurgia reparadora que corrija, afasta-se a qualificadora. Mas
enquanto não houver a cirurgia, haverá a qualificadora, pois não se pode obrigar a vítima a
encobrir os ferimentos. c.5) Aborto: prevalece que o sujeito tenha que saber que a mulher
esteja grávida. É crime preterdoloso, pois a lesão decorrerá de dolo e o abortamento de
culpa. Para Damásio E. de Jesus, se o agente quis o abortamento, responderá só por crime
de aborto (art. 125). Para Cezar R. Bitencourt, se o agente agiu com dolo, responderá por
lesão corporal e aborto em concurso formal impróprio (somam-se as penas), ou, ainda, por
aborto qualificado, se a lesão em si mesma for grave.

Coexistência de qualificadoras: é possível, inclusive com graves e gravíssimas. Ex: vítima


fica incapacitada para as funções por mais de 30 dias, tendo sofrido deformidade
permanente. O crime, no caso, será um só, aplicando-se as penas do parágrafo mais grave
(§2º), e o juiz, na fixação da pena-base, considerar as consequências sofridas pela vítima.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

2) Lesão corporal seguida de morte (§3º): chamado pela doutrina de homicídio


preterdoloso, pois há dolo nas lesões e culpa na morte. Não será julgado pelo tribunal do
júri, pois não é crime contra a vida. O liame entre conduta (agressão) e resultado morte
deve ser direto. Se a morte resultou de circunstâncias outras, não se pune pela morte, ou
seja, o caso fortuito, ou a imprevisibilidade do resultado, elimina a configuração do crime
preterdoloso, respondendo o agente apenas pelas lesões corporais. Exemplo: agente agride
vítima na região abdominal. Vítima cai, bate a cabeça e morre. Perícia aponta deficiência
craniana até então desconhecida do agente. Agente só responde por lesão simples. A
conduta precedente que constitui o crime-base e o resultado mais grave devem estar numa
relação de causalidade, de modo que o resultado mais grave decorra sempre da ação
precedente, e não de outras circunstâncias. STJ: AgRg no REsp 1.094.758-RS, Rel.
originário Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Min. Vasco Della Giustina, julgado
em 1º/3/2012.

3) Lesões corporais dolosas privilegiadas (§ 4º e 5º): são circunstâncias subjetivas e,


portanto, incomunicáveis. A redução é obrigatória, em que pese indicar que juiz “poderá”.
Para Damásio: a) se ambos se lesionam e um deles agiu em LD: absolve-se um e condena-
se o outro, com o privilégio; b) se ambos se lesionam e alegam LD, não havendo prova do
precursor: ambos serão absolvidos; c) se ambos se lesionam e não houve LD: devem ser
condenados com a privilegiadora.

4) Lesão corporal culposa (§6º): resulta de negligência, imprudência ou imperícia. Se for


lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, será crime do CTB (art. 303 da Lei
9.503/97). Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.424/DF, que pacificou a natureza
incondicionada para as ações penais que versem sobre lesões corporais sofridas pela mulher
em ambiente doméstico (RE 602.072/RS, em repercussão geral, o que fez mudar a então
contrária jurisprudência do STJ).

5) Violência doméstica e familiar (§§9º e 10º): Violência doméstica e familiar (§9 °): Trata-
se de qualificadora da lesão corporal dolosa de natureza leve (art. 129, caput), cuja pena
passa a ser de 3 meses a 3 anos de detenção, deixando, assim, de ser crime de menor
potencial ofensivo. Se além das hipóteses previstas no § 90, a vítima (homem ou mulher)
for portadora de deficiência, incidirá um aumento de pena de um terço (§ 11). O conceito
de pessoa portadora de deficiência é trazido pelos arts. 3° e 4“ do Decreto 3.298, de 20 de
dezembro de 1999, que regulamentou a Lei 7.853, de 24 de outubro de 1989. Violência
doméstica e familiar (§10): se presentes as mesmas circunstâncias do parágrafo anterior
(crime praticado contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com
quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações
domésticas, de coabitação ou de hospitalidade), aumenta-se em 1/3 a pena da lesão corporal
de natureza grave (§§ 1° e 2°) e seguida de morte (§ 3º).

STJ, 2014: Medida protetiva e Lei Maria da Penha: Em um caso de lesão corporal no
âmbito familiar, foi deferida medida protetiva determinando que o marido ficasse a, no
mínimo, 500 metros da mulher. Se ele descumprir essa medida protetiva estará sujeito a
execução da multa imposta; e a decretação de sua prisão preventiva (art. 313, III, do CPP).
Poderá também ser processado por crime de desobediência? NÃO. O descumprimento de
medida protetiva de urgência prevista na Lei Maria da Penha (art. 22 da Lei n.11.340/2006)
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

não configura crime de desobediência (art. 330 do CP). Não há crime de desobediência
quando a pessoa desatende a ordem e existe alguma lei prevendo uma sanção civil,
administrativa ou processual penal para esse descumprimento, sem ressalvar que poderá
haver também a sanção criminal. Resumindo: Regra: se na Lei, houver previsão de sanção
civil ou administrativa para o caso de descumprimento da ordem dada, não se configura o
crime de desobediência. Exceção: haverá delito de desobediência se, na Lei, além da sanção
civil ou administrativa, expressamente constar uma ressalva de que não se exclui a sanção
penal. [STJ. 6ª Turma. REsp 1.374.653-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em
11/3/2014.].

Outras considerações: é crime comum, doloso (animus laedendi ou animus vulnerandi),


culposo ou preterdoloso (nas suas diversas figuras), comissivo ou omissivo, material,
instantâneo e de resultado. Há causa supralegal de exclusão da ilicitude por consentimento
do ofendido, no caso de lesão corporal leve (ex.: tatuagem, piercing, artes marciais)
(Masson, p. 90). Lesões em atividades desportivas e esterilização de sexo configuram
exercício regular de direito (Masson, p. 91-103). A cirurgia de troca de sexo é caso de
atipicidade material, em face da melhoria da qualidade de vida do paciente e do propósito
terapêutico de adequar a genitália ao sexo psíquico (Resolução nº 1.652/CFM [Nucci, p.
673]). Os crimes afetos à Lei nº 11.340/2006 (lei Maria da Penha) são de ação penal pública
incondicionada (STF, ADI nº 4424).

Qual crime comete quem, contra sua vontade, corta os cabelos de determinada pessoa? A
doutrina diverge. Para uns, se a ação provoca uma alteração desfavorável no aspecto
exterior do indivíduo, de acordo com os padrões sociais médios, haverá lesão corporal. Para
outros, agindo o agente com a intenção de humilhar a vítima, caracterizará injúria real (KT
438/441). Temos, ainda, quem, lembrando que o cabelo pode ter valor econômico, ensina
haver furto. Por fim, não se descarta a tese de que, em certos casos, o fato será atípico, pois
socialmente aceito ("trotes" em calouros nas universidades).

Ação penal: Em regra, a pena do crime de lesão corporal será perseguida mediante ação
penal pública incondicionada. Excepcionalmente, porém, no caso da lesão dolosa de
natureza leve (art. 129,caput) e culposa (§ 6°), o oferecimento da ação penal dependerá de
representação da vítima ou de seu representante legal (art. 88 da Lei 9.099/95).

E no caso de violência doméstica e familiar? Temos que separar: a ) se a vítima for homem:
a ação penal será pública condicionada nas hipóteses dos §§ 9 e 11, pois, apesar de não
mais de menor potencial ofensivo, permanecem de natureza leve; a ação, contudo, será
pública incondicionada, se estivermos diante do §10 (lesão grave ou seguida de morte). b)
se a vítima mulher: não fica dúvida de que, na hipótese do § 10, a ação penal é pública
incondicionada. Já nas demais (§§ 9° e 11), havendo lesões somente leves, a discussão é
candente (bastante atual): considerando que foi a Lei 9.099/95 que alterou, nesses casos, o
tipo de ação penal, passando de incondicionada para condicionada; considerando, porém,
que o art. 41 da Lei 11.340/2006 proíbe aos crimes contraia mulher, no ambiente doméstico
e familiar, a aplicação dos dispositivos da citada lei (Lei 9.099/95), qual, afinal, o tipo de
ação penal? Temos duas correntes, assim resumidas em recentes julgados do STJ: 1ª
Corrente: I - AÇÃO PENAL PÚBUCA CONDICIONADA HABEAS CORPUS.
PROCESSO PENAL CRIME DE LESÃO CORPORAL LEVE. LEIMARIA DA PENHA.
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

NATUREZA DA AÇÃO PENAL REPRESENTAÇÃO DA VÍTIMA. NECESSIDADE.


ORDEM CONCEDIDA. A Lei Maria da Penha é compatível com o instituto da
representação, peculiar às ações penais públicas condicionadas e, dessa forma, a não-
aplicação da lei 9.099, prevista no art. 41 daquela lei, refere-se aos institutos
despenalizadores nesta previstos, como a composição civil, a transação penal e a suspensão
condicional do processo (5a T, Rei. Min. ARNALDO ESTEVES UMA, DJE 03/11/2009).
2ª corrente: II - AÇÃO PENAL PÚBUCA INCONDICIONADA PROCESSO PENAL
HABEAS CORPUS. LESÃO CORPORAL LEVE PRATICADA COM VIOLÊNCIA
FAMILIAR CONTRA A MULHER. INAPUCABIUDADE DA LEI 9-099/95 E, COM
ISSO, DE SEU ART. 88, QUE DISPÕE SER CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO 0
REFERIDO CRIME. AUSÊNCIA DE NUUDADE NA NÃO-DESIGNAÇÃO DA
AUDIÊNCIA PREVISTA NO ART. 16 DA LEI MARIA DA PENHA, CUJO ÚNICO
PROPÓSITO É A RETRATAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO. PARECER MINISTERIAL
PELA CONCESSÃO DO WRIT. ORDEM DENEGADA. Esta Corte, interpretando o a r t
41 da Lei 11.340/06, que dispõe não serem aplicáveis aos crimes nela previstos a Lei dos
Juizados Especiais, já resolveu que a averiguação da lesão corporal de natureza leve
praticada com violência doméstica e familiar contra a mulher independe de representação.
Para esse delito, a Ação Penal é incondicionada (REsp. 1.050.276/DF, Rei. Min. JANE
SILVA, DJU 24.11.08).

8. Periclitação da vida e da saúde: Reúne crimes de perigo individual, concreto ou


abstrato. A estrutura de alguns destes ilícitos prevê resultado preterdoloso, no caso de lesão
corporal grave/gravíssima ou de morte, seja como majorante (arts. 135 e 135-A), seja como
qualificadora (arts. 133, 134 e 136); caso haja dolo de incorrer nos artigos 121 e 129, §§ 1º
e 2º, estes dois tipos penais prevalecem, por força do princípio da consunção. Os crimes em
questão são: perigo de contágio venéreo (art. 130), perigo de contágio de moléstia grave
(art. 131), perigo para a saúde ou vida de outrem (art. 132), abandono de incapaz (art. 133),
exposição ou abandono de recém-nascido (art. 134), omissão de socorro (art. 135)
condicionamento de atendimento médico-hospitalar emergencial (art. 135-a) e maus-tratos
(art. 136). Trata-se dos crimes de perigo. O perigo gerado não é um perigo comum (perigo a
um número indeterminado de pessoas), mas a vítimas específicas. O bem jurídico tutelado é
a probabilidade de dano, não havendo exigência de lesão de fato. Há duas espécies de
periclitação: a) crime de perigo concreto; b) crime de perigo abstrato, em que o risco é
presumido pela lei. A tipicidade material (teoria da imputação objetiva) repudia o perigo
abstrato. Prevalece na jurisprudência que existe sim o crime de perigo abstrato (ex: porte de
arma, dirigir embriagado).

9. Perigo de contágio venéreo: (art. 130) Expor alguém, por meio de relações sexuais ou
qualquer ato libidinoso, a contágio de moléstia venérea, de que sabe ou deve saber que está
contaminado (menor potencial ofensivo). Se é intenção do agente transmitir a moléstia, será
qualificada. Ambas as formas se procedem mediante representação. Bem jurídico tutelado:
incolumidade física e a saúde. Crime próprio: exigem-se do sujeito ativo qualidades
especiais: ser portador da doença venérea. Não importa se a vítima sabe da contaminação.
O bem jurídico é indisponível. Tipicidade objetiva: é delito de ação vinculada, exigindo a
relação sexual ou outro ato libidinoso, expondo a perigo de contágio. Contato por outra
forma (ex: apertar as mãos, alimentação), poderá as formas dos arts. 131 e 132. Crime

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

somente punido na forma comissiva. Não se admite a forma omissiva. Trata-se de norma
penal em branco, pois CP não relacionou as doenças. O regulamento sanitário o fará. AIDS:
não é doença venérea. E a conduta do aidético crime do 131. STF, 2012: O Supremo
Tribunal Federal, no julgamento do HC 98.712/RJ, Rel. Min. MARCO AURÉLIO (1.ª
Turma, DJe de 17/12/2010), firmou a compreensão de que a conduta de praticar ato sexual
com a finalidade de transmitir AIDS não configura crime doloso contra a vida. Assim não
há constrangimento ilegal a ser reparado de ofício, em razão de não ter sido o caso julgado
pelo Tribunal do Júri. O ato de propagar síndrome da imunodeficiência adquirida não é
tratado no Capítulo III, Título I, da Parte Especial, do Código Penal (art. 130 e seguintes),
onde não há menção a enfermidades sem cura. Inclusive, nos debates havidos no
julgamento do HC 98.712/RJ, o eminente Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, ao
excluir a possibilidade de a Suprema Corte, naquele caso, conferir ao delito a classificação
de "Perigo de contágio de moléstia grave" (art. 131, do Código Penal), esclareceu que, "no
atual estágio da ciência, a enfermidade é incurável, quer dizer, ela não é só grave, nos
termos do art. 131". Na hipótese de transmissão dolosa de doença incurável, a conduta
deverá será apenada com mais rigor do que o ato de contaminar outra pessoa com moléstia
grave, conforme previsão clara do art. 129, § 2.º inciso II, do Código Penal. A alegação de
que a Vítima não manifestou sintomas não serve para afastar a configuração do delito
previsto no art. 129, § 2, inciso II, do Código Penal. É de notória sabença que o
contaminado pelo vírus do HIV necessita de constante acompanhamento médico e de
administração de remédios específicos, o que aumenta as probabilidades de que a
enfermidade permaneça assintomática. Porém, o tratamento não enseja a cura da moléstia.
E se havia relação íntima entre agente e vítima, vai para o juizado de violência doméstica
(20110020097394CCP). Tipicidade subjetiva (elemento subjetivo): na forma do caput: dolo
de perigo. Agente não busca o contágio, mas mantém a relação/ato, expondo a vítima ao
perigo. Ex: namorado sabe que está com doença venérea e, mesmo assim, faz sexo com a
namorada. O crime é a exposição ao perigo. Não chega a ser dolo eventual nem dolo direto
de segundo grau (de consequências necessárias). Se tem a intenção de transmitir, mas não
consegue: há o dolo de dano – incide a forma qualificada do § 1º. Consumação e tentativa:
Consuma-se no momento da prática do ato sexual capaz de transmitir a moléstia venérea
(crime formal). Não haverá o crime se, apesar da prática dos atos sexuais, a criação do risco
de contágio se mostrar impossível. Exemplo: uso de preservativos (afasta-se, inclusive, o
dolo do agente).

10. Perigo de contágio de moléstia grave (art. 131): Praticar, com o fim de transmitir a
outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio: médio
potencial ofensivo. Diferenças do art. 130: no 131, a doença não é venérea, mas grave; no
131, a forma de contaminação é livre (ato capaz), e não sexo ou ato libidinoso. Elemento
subjetivo: É dolo direto de dano, é “praticar, com o fim de transmitir”. É crime
incompatível com dolo eventual. Norma penal em branco: será complementada por norma
do Ministério da Saúde, que dirá quais são as doenças graves. Consumação: crime formal,
com a ação o ato capaz de produzir o contágio, não se exigindo o contágio. Admite-se
tentativa. Se ocorrer a contaminação, resultando lesão de natureza leve, ficará absorvida. Se
ocorrer o contágio, resultando lesão grave ou morte, responderá também por estes crimes,
em concurso formal. Não pode ser praticado por dolo eventual, dada a incompatibilidade.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

11. Perigo para a vida ou saúde de outrem (art. 132): Expor a vida ou a saúde de outrem
a perigo direto e iminente. A pena é aumentada de um sexto a um terço se a exposição da
vida ou da saúde de outrem a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de
serviços em estabelecimentos de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais. O
crime é colocar pessoa certa e determinada em perigo de dano direto, efetivo e iminente.
Trata-se de uma forma residual, de modo que, se não incidir o fato nos artigos anteriores,
haverá a incidência desta forma. É, portanto, um crime subsidiário. Disparo de arma de
fogo: A quer intimidar B e dispara contra ele para esse fim, expondo sua vida a risco real e
concreto – responderá pelo crime da Lei de Armas (Lei 10.826/03). Se uma pessoa, com
uma única ação, cria situação de perigo a várias pessoas identificadas e determinadas, há
concurso formal de crimes (Cezar R.). Se, com mais de uma conduta, cria situação de
perigo a mais de uma pessoa, devidamente individualizadas, haverá concurso material. Tipo
subjetivo: o dolo de perigo = vontade consciente de colocar a vida de pessoa determinada a
perigo. Se sobrevier dano efetivo, a responsabilização dependerá do seguinte (posição de
Luiz Flávio Gomes): a) se o resultado é mais relevante que a exposição a perigo (ex:
morte), haverá homicídio culposo apenas. Motivo: o crime do 132 é expressamente
subsidiário; b) se o resultado for menos relevante (ex: lesão leve), e demonstrado o dolo de
risco apenas, responderá apenas pelo crime de perigo. Ação penal: Crime de ação penal
pública incondicionada. JF: se envolver direitos coletivos de trabalhadores. RE 541627/PA,
rel. Min. Ellen Gracie (RE-541627).

12. Abandono de incapaz (Art. 133): Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda,
vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos
resultantes do abandono. Se do abandono resulta lesão corporal de natureza grave,
qualifica. Se resulta a morte, qualifica mais. As penas cominadas neste artigo aumentam-se
de um terço: I - se o abandono ocorre em lugar ermo; II - se o agente é ascendente ou
descendente, cônjuge, irmão, tutor ou curador da vítima. III - se a vítima é maior de 60
(sessenta) anos.

Sujeito ativo: crime próprio, pois se exigem do sujeito ativo o poder de cuidado, guarda,
autoridade e vigilância sobre a vítima. OBS: ATENÇÃO: Caso o sujeito ativo não possua a
qualidade de garantidor, a conduta pode configurar o crime de omissão de socorro (art. 135,
CP). Sujeito passivo: o incapaz, mas não necessariamente o incapaz civil. A doutrina
entende que o legislador se referiu a uma incapacidade a mais ampla possível. Logo, pode
ser um bêbado ou alguém afeto a transtorno mental ou físico passageiros. Relação entre
abandonado e agente do crime: deve haver relação de autoridade decorrente de lei, contrato
ou mesmo informal. Ex: tutor, curador, professores, médicos. Situações de fato também e
Damásio exemplifica o caso do criminoso que cuida do cativeiro. É o dever legal de
assistência. Se o agente não tiver o dever legal de assistência, responderá por omissão de
socorro (art. 135). Tentativa: admite-se. Qualificadoras: Configuram modalidades
preterdolosas do crime em estudo, o §i« (quando resulta lesão corporal grave) e 0 §2° (se
resultar a morte).. Diferenças do crime de omissão de socorro (art. 135): na omissão de
socorro, não há qualquer relação de dependência entre agente e vítima. Diferenças para o
crime de homicídio por dolo eventual: os limites são muito tênues. Dependendo do local do
abandono (absolutamente deserto, sendo praticamente certa a falta de socorro) pode
caracterizar o dolo eventual. No dolo eventual, o agente mata assumindo o risco de produzir

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

o resultado. No abandono com resultado morte, existe um crime preterdoloso (dolo na


antecedente e culpa no consequente). O resultado morte, no 134, não é querido pelo agente
que tampouco assume o risco de produzi-lo. Diferença para o crime de exposição ou
abandono de recém nascido (art. 134): ocorre no caso de abandono de recém nascido para
ocultar desonra própria. Diferença para o crime contra a assistência familiar (art. 244 a
247): o abandono moral (não físico) pode caracterizar esse crime. Questão de concurso
recente (Defensor Público do ES/2012): Para a caracterização do delito de abandono de
incapaz, impõe-se, além da existência de transgressão da relação particular de assistência
entre o agente e a vítima, a presença, ainda que por certo lapso temporal, de perigo concreto
para esta, sendo prevista, para o delito, tanto a forma comissiva quanto a omissiva.
CORRETO. Doutrina.

13. Exposição ou abandono de recém-nascido (art.134): Expor ou abandonar recém-


nascido, para ocultar desonra própria. Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave,
qualifica. Se resulta a morte, qualifica mais. A honra é o motivo do abandono. Crime
próprio: somente a mãe (posição de Cezar B.), mas isso é minoritário. A maioria entende
que parente próximo possa ser também. OBS: Marido da mulher inflei que abandona
recém-nascido adulterino não pratica o crime do art. 134, pois não age para ocultar desonra
própria, mas sim de terceiro. O caso se enquadra no art. 133 do CP (abandono de incapaz).
Admite-se coautoria e participação. Tipo objetivo: expor (ação) ou abandonar (omissão)
recém-nascido, colocando-o a perigo concreto real, visando a ocultar a desonra própria.
Exige-se que o nascimento tenha sido sigiloso, ou, pelo menos, que a mãe tenha tido a
cautela de não tornar pública a gravidez. No caso da mãe que abandonou a filha na Lagoa
da Pampulha, o nascimento não foi secreto e as pessoas do convívio da mãe sabiam do fato.
Tipo subjetivo: dolo de abandonar para ocultar a desonra própria. Não se pune a forma
culposa. Resultado: havendo lesão grave ou morte, haverá preterdolo; havendo, junto com o
abandono, vontade de ferir gravemente ou matar o recém-nascido, o crime será de lesão
grave ou homicídio. Qualificadoras: configuram modalidades preterdolosas do crime em
estudo, o §1° (quando resulta lesão corporal grave) e o §2° (se resultar a morte).

14. Omissão de socorro (Art. 135): Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo
sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao
desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da
autoridade pública. A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de
natureza grave, e triplicada, se resulta a morte. É dever de todos, quando possível (sem
risco pessoal), prestar assistência aos necessitados ou, se não for possível, chamar a
autoridade competente. Sujeito ativo: Crime comum praticável por qualquer pessoa, o que o
diferencia dos crimes anteriores. O agente do crime tem que estar na presença da pessoa em
perigo. Se estiver distante, souber e não for, não haverá o crime (posição de Cezar Roberto
Bitencourt). Damásio entende que o ausente que sabe do perigo por telefone e, podendo,
não vem intervir também responde por omissão de socorro. OBS: Não admite coautoria:
Considerando, como ressaltado, que o dever de assistência é imposição que recai sobre
todos, sem distinção, o delito em estudo não admite coautoria. Dessa forma, se várias
pessoas negam a assistência, todas respondem pelo crime de omissão de socorro. Contudo,
se apenas uma socorre a vítima necessitada, não o fazendo as outras, desaparece o delito,
sendo a obrigação de natureza solidária (nesse sentido: RT 497/337). Pessoas as serem

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

assistidas: a) criança abandonada ou extraviada; b) inválido ou ferido desamparado; c)


pessoa em grave ou iminente perigo. A falta de assistência só será punida se for ainda útil e
sem risco pessoal. Formas de conduta: Duas são as formas de conduta: a) Assistência
imediata: Ocorre quando o agente se omite em prestar auxilio diretamente. b) Assistência
mediata: Ocorre quando o agente, sem condições de prestar auxílio diretamente, não
solicita socorro à autoridade pública sem demora. OBS: não compete ao agente a escolha
entre uma ou outra forma de assistência. Ele deve sempre optar pela assistência imediata
"quando possível fazê-lo sem risco pessoal", não podendo simplesmente preferir a mediata
(subsidiária). OBS: O risco a que se refere o dispositivo deve ser pessoal (físico), concreto
e iminente. O risco meramente patrimonial ou moral não exclui a tipicidade. OBS:
Assistência tardia será apenas uma assistência aparente (simulada), equivalendo a uma
omissão do pedido de socorro. Consumação e tentativa: No caso de criança abandonada ou
extraviada é crime de perigo abstrato (ou presumido). Nos demais casos, de perigo
concreto, devendo ser demonstrado o risco sofrido pela vítima certa e determinada.
Tratando-se de crime omissivo próprio, a tentativa não é admissível, não havendo como
fracionar o iter criminis (delito unissubsistente). Omissão de socorro no Estatuto do Idoso
(Lei 10.741/2003): Pelo princípio da especialidade, deixar de prestar assistência ao idoso,
quando possível fazê-lo sem risco pessoal, em situação de iminente perigo, ou recusar,
retardar ou dificultar sua assistência à saúde, sem justa causa, ou não pedir, nesses casos, o
socorro de autoridade pública, configura o crime do art. 97 do Estatuto do Idoso (Lei
10.741/2003). Questão do concurso de Promotor do MP/SP 2011: “Pratica o crime de
omissão de socorro, previsto no art. 135 do Código Penal aquele que deixar de prestar
socorro à vítima em face de uma situação de perigo a que ele deu causa, sem dolo ou culpa
e desde que não haja risco pessoal.” Se pessoa, culposa ou dolosamente, causa dano (ex:
crime de lesão corporal grave) e, vendo a vítima em tal situação, não a socorre, responderá
apenas pela lesão. É crime omissivo puro ou próprio. Omissão de socorro no CTB (Lei
9.503/97): é tipo especial. [Essa pergunta saiu do livro do Noronha. Observe o trecho:
Como bem destacado por Mirabete, este crime "exige, como um dos elementos formadores
da omissão de socorro, que o autor da situação de perigo não seja o próprio causador
(doloso ou culposo) das lesões. Não comete o crime em questão aquele que, depois de ferir
outrem vulnerandi ou necandi animo ou culposamente, deixa-o privado de socorro.
Responderá, conforme o caso, por lesão corporal (dolosa ou culposa), ou tentativa de
homicídio, ou se a vítima vem a morrer, por homicídio (doloso, preterdoloso ou culposo tão
somente.

OBS: Art. 135-A. Exigir cheque-caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como
o preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento
médico-hospitalar emergencial: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.
Lei nº 12.653, de maio de 2012,

15. Maus-tratos: (Art. 136) (obs.: esse crime era objeto de menção expressa no edital
anterior) - Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou
vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de
alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou
inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina: menor potencial. § 1º - Se
do fato resulta lesão corporal de natureza grave, qualifica e será médio potencial. Se resulta

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

a morte, qualifica mais. Aumenta-se a pena de um terço, se o crime é praticado contra


pessoa menor de 14 (catorze) anos. Bem Jurídico: Tutela a vida e a incolumidade pessoal.
Crime próprio: exigem-se do sujeito ativo qualidades especiais; no caso, que tenha, em
razão de direito público (professor de escola pública), privado (tutor nomeado pelo pai) ou
administrativo (ex: carcereiro de presídio). O STJ já admitiu a responsabilização do sócio
que exerce a gerência de sociedade por cotas de responsabilidade limitada, dedicada à
exploração, com fins lucrativos, de clínica médica (HC 23362, DJ DATA: 01/08/2005).
Ausente essa vinculação jurídica, eventualmente, o crime poderá ser outro. Se for pessoa
idosa a vítima, é crime do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03): art. 99 – a pena do Estatuto do
Idoso é a mesma do CP, o que representa proteção deficiente ao idoso, mas tal dispositivo
não foi declarado inválido pelo Judiciário. CRIANÇA E ADOLESCENTE: cuidado com o
ECA, art. 232, onde a vida ou saúde da vítima não é exposta a perigo (seria o caso de uma
reprimenda abusiva em público – Masson). Objeto Material: Pessoa que sofre os maus-
tratos. Sujeito Passivo: Pessoas que estejam subordinadas aos pais, tutores, professores
carcereiros. Maus tratos (tipicidade objetiva): tratar pessoa com violência, agressão, lesão,
submissão a sofrimento físico ou mental, trabalho excessivo, desde que se queira educar,
ensinar, tratar, cuidar. Elemento Subjetivo: É o dolo. Para REGIS PRADO, trata-se de dolo
direto ou eventual. Caso a intenção do agente for de causar lesão (animus laedendi) ou
causar a morte da vitima (animus necandi), o crime será de lesão corporal ou homicídio ou
suas formas tentadas. Tortura X maus tratos do CP: a diferença está no elemento subjetivo
(ou volitivo) do agente. Para que se configure o delito de maus tratos é necessária a
demonstração de que os castigos infligidos tenham por fim a educação, o ensino, o
tratamento ou a custódia do sujeito passivo. Maus tratos: quis corrigir a pessoa, embora
usando meios desumanos, cruéis; tortura: usou de meios desumanos para fazer sofrer, sentir
prazer, por ódio. Considerações Gerais: Trata-se de crime de menor potencial ofensivo na
modalidade do caput. Crime de forma vinculada (a lei estabelece os modos pelos quais o
crime pode ser cometido, v.g, privação de alimentação; abuso do meio de correção, etc.).
Comissivo ou omissivo. De forma tentada (só na forma comissiva). Permanente na
modalidade de privação de alimentos, de cuidados necessários e sujeição a trabalho
excessivo ou inadequado; na modalidade de abuso de correção em regra é instantâneo, mas
admite a forma permanente (dependendo do caso concreto e do modo de atuação do agente,
conf. STF, HC 86.711). Unissubjetivo. Plurissubsistente. Crime de perigo concreto,
consuma-se com o efetivo perigo à saúde ou vida da vítima. Peculiaridades: Tipo misto
alternativo (haverá crime único em caso de condutas praticadas no mesmo contexto fático e
contra a mesma vítima, reflexo na dosimetria da pena). Para Regis Prado, se não forem
ultrapassados os limites legais do abuso dos meios de correção ou disciplina, é exercício
regular de direito (CR, artigo 229: dever paterno de educar os filhos menores; invoca
também CC 1634, I e VII). O animus corrigendi autorizaria privações curtas de liberdade e
castigos corporais leves, sendo elemento subjetivo daquela causa de justificação. Somente
se aplica aos próprios filhos, não existe um direito de correção dos filhos alheios, só se
houver consentimento dos pais. Entre marido e mulher não existe crime de maus-tratos,
pois não há hierarquia/subordinação entre eles na sociedade conjugal. Mesmo entendimento
em relação ao filho maior, pois não há qualquer vínculo jurídico de subordinação entre eles.
Elemento Objetivo: O núcleo é expor – colocar em risco a vida ou saúde de pessoa sob sua
autoridade, guarda ou vigilância, privando-a da alimentação ou cuidados indispensáveis,
sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado ou, ainda, abusando dos meios de correção

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

e disciplina. Se constituírem meio vexatório, o crime pode ser outro, v.g., castigar o filho
em publico configura o crime de injuria do art. 140, CP (CAPEZ/2008/p.266).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

2.a. Criminologia: teorias contemporâneas.


Principais obras consultadas: Santo graal 27. SOUZA, Artur de Brito Gueiros.
JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. Curso de Direito Penal: parte geral, v. 1. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2012; NASCIMENTO, José Flávio Braga. Curso de Criminologia. São
Paulo: Juarez de Oliveira, 2003; SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito Penal: parte geral. 3ª
ed. Curitiba: ICPC, Lumen Juris, 2008; CALLEGARI, André Luís. Criminologia e Temas
Atuais de Direito Penal. In: Caderno de Direito Penal nº 1. Escola da Magistratura do TRF
da 4ª Região, 2005. ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Do paradigma etiológico ao
paradigma da reação social. Artigo disponível na internet; MOLINÉ, Cid. Teorías
Criminológicas: explicación y prevención de la delincuencia. Barcelona: Bosch, 2001.

Numa concepção moderna, Criminologia é o conjunto de conhecimentos sobre o delito


como fenômeno social, abrangendo os processos de elaborar as leis, infringi-las e de reagir
à infração. Estuda o surgimento, a dinâmica e as variáveis do crime, contemplando-o como
fenômeno individual e como problema social. Não mais se restringe ao estudo empírico do
crime, mas também do criminoso, da vítima e dos mecanismos de reação social, por meio
de investigações sociológicas, psicológicas e biológicas, no escopo da compreensão global
da delinquência e das duas formas de prevenção ou neutralização.

A Antropologia Criminal de Lombroso e, depois, a Sociologia Criminal de Ferri


constituíam matrizes fundamentais da Criminologia etiológica, associada à tentativa de
conferir-lhe cientificidade, segundo os pressupostos epistemológicos do positivismo. Nessa
perspectiva, a Criminologia positivista é definida como uma ciência causal-explicativa da
criminalidade; ou seja, que, tendo por objeto a criminalidade concebida como um fenômeno
natural, causalmente determinado, assume a tarefa de explicar as suas causas segundo o
método científico ou experimental e o auxílio das estatísticas criminais oficiais e de prever
os remédios para combatê-la. Ela indaga, fundamentalmente, o que o criminoso faz e
porque o faz. Estabelece-se desta forma uma divisão “científica” entre o (sub)mundo da
criminalidade, marginalidade composta por uma “minoria” de sujeitos potencialmente
perigosos e anormais (o “mal”) e o mundo, decente, da normalidade (o “bem”). A
possibilidade de uma explicação “cientificamente” fundamentada das causas enseja, por
extensão, uma luta científica contra a criminalidade erigindo o criminoso em destinatário de
uma política criminal de base científica. A um passado de periculosidade confere-se um
futuro: a recuperação.

A introdução da ideia do “labeling approach” determinou, na Criminologia


contemporânea, a formação de uma alternativa ao paradigma etiológico: o paradigma da
“reação social” (“social reaction approach”) do “controle” ou da “definição”. O “labeling
approach” é também denominado pela doutrina como interacionismo simbólico,
etiquetamento, estigmatização, rotulação ou ainda por paradigma da “reação social” (social
reaction approach), do “controle” ou da “definição”. “Labeling” parte dos conceitos de
“conduta desviada” e “reação social”, como termos reciprocamente interdependentes, para
formular sua tese central: a de que o desvio não é uma qualidade intrínseca da conduta ou

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

uma entidade ontológica pré-constituída à reação social e penal, mas uma qualidade
(etiqueta) atribuída a determinados sujeitos através de complexos processos de interação
social; isto é, de processos formais e informais de definição e seleção.

A Criminologia contemporânea desenvolvida na base deste paradigma, especialmente a


Criminologia Crítica, tende a transformar-se, assim, de uma teoria da criminalidade para
uma teoria crítica e sociológica do sistema penal. O sistema penal se dirige quase sempre
mais contra certas pessoas do que contra certas ações legalmente definidas como crime.
Pois os grupos poderosos na sociedade possuem a capacidade de impor ao sistema uma
quase que total impunidade das próprias condutas criminosas.

As diversas teorias criminológicas são comumente divididas em teorias do conflito e


teorias do consenso. Na sociedade, existem diversos grupos sociais, cada um com seus
interesses. As teorias do consenso entendem que o Estado funciona como mediador dos
interesses contrapostos, e o Direito Penal representa um consenso social sobre a tutela
desses interesses. As teorias do conflito veem o Estado como representante dos detentores
do poder e o Direito como reflexo de seus interesses. Juarez Cirino dos Santos faz um
contraponto entre a criminologia etiológica e a criminologia crítica, cuja política criminal
alternativa propõe um “Direito Penal mínimo, orientado pela ideia de abolição do sistema
penal, como objetivo estratégico final”.

Teoria da Anomia: O delito é um fato normal na sociedade, pois sempre haverá alguém
que não reconheça a autoridade da norma. O anormal é tanto a diminuição como o aumento
brusco da criminalidade. Como o delito é um fator do funcionamento regular da vida social,
a anomia é a expressão da quebra das regras até então vigentes em uma sociedade concreta.
Quando se criam na sociedade espaços anômicos, ou seja, quando o indivíduo perde as
referências normativas, então se enfraquece a solidariedade social. O indivíduo sente-se
livre de vínculos sociais, tendo muitas vezes, um comportamento delituoso.

Teoria Ecológica (Escola de Chicago): Vê a grande cidade como uma unidade ecológica
responsável pela delinquência; paralelismo entre o crescimento da cidade e da
criminalidade; funda-se na desorganização do desenvolvimento e na falta de controle
social; deterioração da família, escola, perda das raízes, tentação pela riqueza vizinha e
descontrole social.

Teoria Espacial (Escola de Chicago): A análise da área social envolve o nível social, a
urbanização e a segregação; busca prevenir o crime mediante nova arquitetura do espaço
público. Propôs amplos programas comunitários para tratamento e prevenção da
criminalidade, planejamento por áreas definidas, programas comunitários de recreação e
lazer, reurbanização dos bairros pobres, alteração efetiva da situação socioeconômica das
crianças.

Teoria da Associação Criminal (ou diferencial): A conduta criminal, como qualquer outro
comportamento, é consequência do aprendizado ao largo de um processo de “interação”
com os demais. Para Sutherland: 1) o comportamento criminal aprende-se, não se herda
nem se inventa; 2) aprende-se pelo contato social em um processo de comunicação; 3) o
aprendizado dá-se, sobretudo, no interior de um grupo reduzido de relações pessoais; 4)

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

compreende o ensinamento de técnicas de cometimento da infração, a orientação dos


motivos, impulsos, razões e atitudes; 5) a orientação dos motivos está em função da
interpretação favorável ou desfavorável das disposições legais; 6) um indivíduo se converte
em criminoso quando as interpretações favoráveis à violação da lei preponderam sobre as
favoráveis à obediência, o que constitui o princípio da associação diferencial; 7) a
associação diferencial pode variar segundo a frequência, duração, prioridade e intensidade;
8) a formação criminal por associação é idêntica a qualquer outro processo de formação, ou
seja, não se adquire pela simples imitação; 9) o comportamento criminoso é a expressão de
um conjunto de necessidades e valores.

Teoria da Subcultura Delinquente: O bando delinquente surge como resultado da


estrutura de classes sociais. Cada grupo e subgrupo possui seu próprio código de valores,
que nem sempre coincidem com os valores majoritários e sociais. A conduta delitiva não
seria produto de desorganização ou ausência de valores sociais, mas o reflexo e a expressão
de outros sistemas de normas e valores: crime é sinônimo de protesto e status no seu grupo;
não utilitarismo da ação (muitos crimes não possuem motivação); a malícia da conduta
(prazer em desconsertar e em prejudicar o outro); negativismo da conduta (polo oposto aos
padrões da sociedade).

Teoria da Estigmatização (“labeling approach”): A estigmatização é o resultado negativo


atribuído pelos grupos representantes do poder, que, ao se aperceberem de um perigo,
fazem diferenças entre delinquentes e não delinquentes. A delinquência é consequência de
processos de atribuição de papeis a uma pessoa, através de um processo dinâmico de
interação entre o indivíduo e a sociedade, que origina naquele uma autoimagem
correspondente à que os demais fazem dele, dando lugar normalmente a uma “desviação
primária” (comportamento de defesa, ataque ou adaptação). A reação social posterior
encaminha o processo de “desviação secundária” com a formação de modelos mais firmes
de conduta desviada. A estigmatização pública como desviado ou criminoso implica a
atribuição à pessoa correspondente de um rol (papel) desviado que finalmente adota e
conforme o qual se comporta.

Teoria Crítica (Radical ou Nova Criminologia): Aceita as premissas do “labeling


approach”. Vincula delito e justiça social. Pretende defender o homem contra a sociedade
de exploradores e não aceitar a defesa da sociedade contra o crime, pois o Direito Penal
protege os interesses do grupo social dominante. Não é o criminoso que deve ser
ressocializado, mas a própria sociedade que deve ser transformada. Entende ser o
capitalismo a base da criminalidade, na medida em que promove o egoísmo, o qual leva os
homens a delinquir. Estuda o delito em um contexto histórico, social e econômico.

Teoria do Neorretribucionismo: Vertente surgida nos EUA, inspirada na Escola de


Chicago, dando um caráter sagrado aos espaços públicos. Também denominada movimento
de lei e ordem ou tolerância zero. Parte da premissa de que os pequenos delitos devem ser
rechaçados, o que inibiria os mais graves, atuando como prevenção geral, pois afirma que
existe uma relação de causalidade entre a desordem e a criminalidade (“broken windows”).

QUESTÕES DE PROVA: conceitue criminologia. Fale do etiologismo. Correntes


contemporâneas da criminologia. O que é vitimiologia.
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

2.b. Concurso material, formal e continuidade delitiva.


Principais obras consultadas: Santo Graal 27; Manual de DP de Cézar Roberto
Bittencourt, Curso de DP de Rogério Greco e INFO 651/STF (Mensalão).

Legislação básica: arts. 69, 70, 71, 72 e 119 do CP.

Considerações iniciais: Merece ser lembrado que o concurso de crimes não se confunde
com concurso aparente de normas, crime progressivo, crime complexo e crime permanente.
1) A diferença entre concurso de crimes e concurso aparente de normas (ou leis), reside no
fato de que, no primeiro, há a violação de mais de um bem jurídico, seja por conduta única
ou plúrima – ou seja, há concurso real de crimes. Diferentemente, no concurso aparente de
normas, somente um único bem é lesionado ou posto a perigo, muito embora a conduta se
encontre descrita em mais de um tipo penal. Como há a vedação do bis in idem, deve-se
apurar, por meio dos princípios de regência, qual norma deverá incidir, desprezando-se as
demais. 2) Na mesma medida, cabe distinguir concurso de crimes do crime progressivo.
Ocorre crime progressivo quando o agente, para alcançar a produção de um resultado mais
grave, passa, necessariamente, por outro menos grave. Cuida-se, novamente, de uma
questão que envolve o concurso aparente, visto que o crime de passagem resta absorvido
pelo crime-fim. Por sua vez, no concurso de crimes, com a mesma conduta, ou em condutas
paralelas ou sucessivas, há a realização de mais de um crime. 3) O crime complexo é aquele
cujo tipo penal é composto de fatos que, por si mesmos, constituem crime (art. 101, do CP).
Nas hipóteses de crime complexo não há que se falar em concurso de crimes, pois se cuida
de uma única conduta com um único resultado, ainda que vulnerando mais de um bem
jurídico. 4) Por último, concurso de crimes não se confunde com crime permanente. No
primeiro, cuidam-se de duas condutas que acarretam dois crimes, ou uma conduta que dá
ensejo a dois ou mais crimes, ou dois ou mais crimes da mesma espécie, praticados com
coincidências de tempo, lugar e modo de execução. No crime permanente, há crime único,
mas cujo momento consumativo se prolonga no tempo.

Princípios reguladores do concurso de crimes: 1) Princípio do cúmulo material:


preconiza que as penas referentes aos vários delitos devem ser calculadas em separado e,
em seguida, somadas. Cuida-se de uma operação meramente aritmética (quot delicta tot
poenae) sendo justamente por isso criticada pela doutrina ante o seu excessivo rigor. A
despeito do seu rigor, o sistema do cúmulo material foi adotado, entre nós, para regular o
concurso material (art. 69, do CP), o concurso formal impróprio (art. 70, parte final, do
CP), e o cumprimento da pena de multa (art. 72, do CP).2) Princípio do cúmulo jurídico:
desenvolvido por Mittermayer, determina que o aumento de pena relativa aos vários delitos
ocorra de maneira mais geométrica do que aritmética, ou seja, com a aplicação de sanção
mais severa do que a prevista para cada infração isoladamente, mas sem chegar ao
somatório global, de forma a abranger a gravidade dos fatos perpetrados. Esse sistema não
é mais previsto na legislação brasileira, conquanto tenha sido adotado pelo CP/1890. 3)
Princípio da absorção (que se assemelha ao princípio que, com a mesma denominação,
regula o concurso aparente de norma): aplica-se a sanção de um só dos delitos, em regra a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

mais grave, que absorve as penas dos demais. O princípio da absorção foi, em parte,
adotado pelo Código para regular o erro na execução e o resultado diverso do pretendido,
consoante o disposto na primeira parte dos arts. 73 e 74, desprezando-se a punição
pertinente à tentativa do delito pretendido pelo agente. 4) Princípio da exasperação:
determina a aplicação da pena de um dos delitos, se idênticas, ou a mais grave, se diversas,
aumentada em certa quantidade, sendo que a intensidade do aumento varia em escala
proporcional ao número dos delitos perpetrados pelo agente. A doutrina considera esse o
melhor dos sistemas, pois permite ao magistrado quantificar a pena de forma mais
adequada à quantidade dos fatos, mas sem atingir ou ultrapassar o rigor do cúmulo material.
Cumpre registrar que o sistema da exasperação foi adotado para regular o concurso formal
próprio (art. 70, 1ª parte, do CP), crime continuado (art. 71, do CP), e para o erro na
execução e o resultado diverso do pretendido (arts. 73 e 74, parte final, do CP), quando
também ocorrer o resultado que fora objetivado pelo agente. 5) Princípio do cumprimento
unificado e progressivo da pena: importa na projeção do princípio da individualização da
pena na sua fase executiva. Com efeito, mesmo que o agente possua diversas condenações,
fato é que no momento em que iniciar a execução penal todas as penas devem ser
unificadas perante o Juízo da Execução Penal. Essa é a mens do art. 1º, da LEP, secundado
pelos arts. 75, § 1º, do CP, e 111, da LEP. OBS: Com relação ao postulado da vedação da
pena de caráter perpétuo, de base constitucional (art. 5º, XLVII, “b”, da CF/1988), tem-se
que, independentemente do sistema porventura adotado – cúmulo material, exasperação,
absorção etc. –, o tempo de cumprimento efetivo de pena ou das penas unificadas, não
poderá ultrapassar o teto máximo que, no Brasil, é de trinta anos (art. 75, caput).

1) Concurso material (art. 69, CP): Ocorre quando o agente, mediante 2 ou mais
condutas, dolosas ou culposas, pratica 2 ou mais crimes, idênticos (concurso homogêneo)
ou não (concurso heterogêneo). Requisitos: Pluralidade de Condutas e Pluralidade de
Crimes. OBS: Portanto, é possível, portanto, concurso material entre crimes distintos, v.g.,
comissivos e omissivos, dolosos e culposos, consumados e tentados etc. Se as penas forem
de espécies diferentes – vale dizer, reclusão e detenção –, o art. 69, do CP, por influência do
princípio do cumprimento progressivo, determina que se execute, primeiramente, a
reclusão, por ser mais rigorosa do que a detenção. Critério de aplicação da pena: cúmulo
material, ou seja, as penas são aplicadas cumulativamente. No caso de condenação a penas
de reclusão e detenção, executa-se primeiro a reclusão. Se uma pena for privativa de
liberdade + restritiva de direitos, a situação é diferente. Veja: conforme dispõe o art. 69,
§1º, se o juiz não consegue suspender a pena privativa de liberdade para um dos crimes,
não poderá aplicar a pena restritiva de direitos aos demais, que deverá ser convertida. Por
fim, aplicadas duas penas restritivas de direitos, informa o §2º que o condenado as cumprirá
simultaneamente, se compatíveis, e sucessivamente, se incompatíveis. Obs.: a) suspensão
condicional do processo: A suspensão condicional do processo somente é admissível
quando, no concurso material, a somatória das penas mínimas cominadas não suplanta 1
ano (STF). b) Na prescrição, cada crime prescreve isoladamente (art. 119 do CP), não se
considerando o concurso de crimes. Até então, cuida-se da única situação em que as penas
não são somadas. c) Quando os crimes são objeto de processos diversos, aplica-se o art. 69,
III, a, da LEP, ou seja, essa norma dispõe que o juiz da execução tem a competência para
somar ou unificar as penas.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

2) Concurso formal ou ideal (art. 70, CP): Ocorre quando o agente, mediante 1 só
conduta, pratica 2 ou mais crimes, idênticos (concurso homogêneo) ou não (concurso
heterogêneo). Requisitos: Unidade de conduta e pluralidade de crimes. Classificação: a)
Próprio (ou perfeito): quando os crimes forem resultantes de 1 único desígnio (pena
aplicada pelo critério da exasperação, mas será aplicado o cúmulo material se mais benéfico
ao acusado); b) Impróprio (ou imperfeito): se forem dolosos, provenientes de desígnios
autônomos (pena aplicada pelo critério do cúmulo material). Crimes culposos: é possível o
concurso formal, desde que se trate de concurso formal próprio. Teorias: a) Subjetiva:
exige-se unidade de desígnios na conduta do agente para a configuração do concurso
formal; b) Objetiva: bastam a unidade de conduta e a pluralidade de resultados. É a teoria
acolhida pelo CP, já que o concurso formal imperfeito foi admitido como figura diversa.
Critérios para aplicação da pena: A) Concurso formal próprio: i. Homogêneo: Escolhe-se
qualquer uma das penas; ii. Heterogêneo: Escolhe-se a pena mais grave. Em ambos os
casos, escolhida a pena, esta é aumentada, na terceira fase de aplicação da pena, de 1/6 a
1/2 (sistema da exasperação). Segundo o STF, leva-se em conta o número de infrações
penais praticadas. Quanto mais infrações praticadas, mais próximo da metade; quanto
menos infrações penais praticar, mais próximo de 1/6. Mas atente: em casos como estes, o
concurso formal próprio/perfeito (que foi criado em benefício do réu) acaba sendo mais
prejudicial que o concurso material. Resolvendo a situação, dispõe o parágrafo único do art.
70 que “não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código
[concurso material]”. Aplica-se, então, o cúmulo de penas, mais justo (CÚMULO
MATERIAL BENÉFICO). B) Concurso formal impróprio: no caso do concurso formal
impróprio, afasta-se o sistema da exasperação, aplicando-se o sistema da cumulação de
penas.

OBS: Uma questão que suscita discussão quanto à existência ou não de desígnios
autônomos é a do roubo praticado contra vítimas diversas. A jurisprudência preponderante é
pelo reconhecimento do concurso formal impróprio. Isso se verifica tanto no STJ, como no
STF. Efetivamente, ao planejar e empreender as elementares do delito de roubo em locais
como transporte coletivo, condomínios residenciais, passeio público, dentre outros, o
agente atua, dolosamente, querendo a produção de mais de um resultado. O desígnio, não é
unitário, mas voltado, de forma independente, para a obtenção ilícita dos pertences de cada
qual dos lesados.

3) Crime continuado (art. 71, CP): Ocorre quando o agente pratica 2 ou mais crimes da
mesma espécie, mediante 2 ou mais condutas, os quais, pelas condições de tempo, lugar,
modo de execução e outras, podem ser tipos uns como continuação dos outros. [Conceito
nas palavras de Gueiros: Ocorre quando o agente, mediante condutas múltiplas, pratica dois
ou mais crimes, da mesma espécie, que devem ser considerados como se único fosse, haja
vista a semelhança das circunstâncias objetivas de tempo, lugar e forma de execução. Por
conta disso, a reprimenda penal há de ser aplicada não com penas cumuladas, mas, sim,
com uma pena única exasperada.]. Pressupostos ou requisitos: (1) pluralidade de
condutas; (2) pluralidade de delitos da mesma espécie; e (3) homogeneidade das
circunstâncias. Elo de Continuidade: Requisitos para o elo de continuidade (CEZAR
ROBERTO BITENCOURT): Condições de tempo (“uma certa periodicidade que permita
observar-se um certo ritmo, uma certa uniformidade, entre ações sucessivas”), Condições

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

de lugar, Maneira de execução (“A lei exige semelhança e não identidade).” Outras
condições semelhantes: “a doutrina aponta a mesma oportunidade e a mesma situação
propícias para a prática do crime”. Classificação: a) Comum (ou simples): quando
presentes os requisitos (71, caput); b) Específico (ou qualificado): quando, além dos
requisitos mencionados, tratar-se de crimes dolosos, praticados com violência ou grave
ameaça à pessoa e contra vítimas diferentes (71, §u). No crime continuado qualificado, são
seus requisitos: os mesmos do continuado genérico; crimes dolosos; praticados contra
vítimas diferentes; cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa. Obs.: É possível
continuidade delitiva nos crimes contra a vida, tendo o art. 71, parágrafo único, superado o
teor da súmula 605 do STF. Critério de aplicação da pena: exasperação (no continuado
comum aumenta-se a pena do crime mais grave de 1/6 a 1/3 e no continuado específico de
1/6 até o triplo). Natureza jurídica: a) Teoria da unidade real: os vários delitos consistem
num único crime; b) Teoria da ficção jurídica: há vários delitos, mas a lei presume a
existência de apenas 1, para efeito de aplicação da pena (adotada pelo CP, pois este trata do
tema como “concurso de crimes”); c) Teoria mista: é um terceiro delito. Teorias sobre a
unidade de desígnios: a) Puramente objetiva: o crime continuado fica caracterizado
quando presentes as mesmas condições objetivas de tempo, lugar, modo de execução etc.,
independentemente de ser aferido o caráter unitário do dolo; b) Objetivo-subjetiva: para
haver crime continuado, é necessário, além das condições objetivas, que o agente deseje
praticar um crime como se fosse continuação de outro, como se existisse um autêntico dolo
global [posição dominante na doutrina e jurisprudência. O STJ já teve a oportunidade de
enfrentar a presente questão, mais especificamente com relação à possibilidade de haver
crime continuado na chamada “criminalidade profissional”. Na ocasião, aquela Corte filiou-
se à moderna doutrina de cunho objetivo-subjetiva, entendendo que, para a caracterização
do crime continuado, torna-se necessário que os atos criminosos isolados apresentem-se
“subjetivamente enlaçados”, os subsequentes ligados aos antecedentes, ou porque fazem
parte do mesmo projeto criminoso, ou porque resultam de ensejo, ainda que fortuito,
proporcionado ou facilitado pela execução desse projeto (aproveitamento da mesma
oportunidade)]. Crimes da mesma espécie: para o STJ, são crimes da mesma espécie
aqueles que, além de tipificados pelo mesmo dispositivo (mesmo tipo penal), tutelem os
mesmos bens jurídicos. (REsp 751.002/RS, 2009). No mesmo sentido STF na AP 470
(Mensalão – Info/STF nº 691 -208).

OBS: Tempo: A doutrina considera pertinente o crime continuado entre infrações


perpetradas dentro do espaço de um mês ou nos limites geográficos de um município.
Entretanto, para outros, como, por exemplo, o crime de apropriação indébita previdenciária
(art. 168-A, do CP), que se pratica “mês a mês”, e empresarialmente, pode-se reconhecer o
crime continuado entre comportamentos desenvolvidos ao longo de meses (ou anos) ou
entre a sede e a filial da empresa situadas em municípios distintos.

OBS: Bens jurídicos personalíssimos de titularidade distinta: Outra das muitas polêmicas
que envolvem o crime continuado diz respeito ao seu reconhecimento quando as infrações
são cometidas contra bens jurídicos personalíssimos (vida, liberdade sexual etc.) de
titularidades distintas. Com a Reforma de 1984, passou-se a admitir, expressamente, a
ocorrência de crime continuado contra diversas vítimas. Em contrapartida, o legislador
facultou ao juiz a aplicação da pena única exasperada em até o triplo: nos crimes dolosos,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o
juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do
agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se
idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único
dos arts. 70 e 75, do CP. Atenção: A regra do parágrafo único do art. 71, do CP, exige, para
a sua incidência, a concorrência dos seguintes requisitos: (1) crimes dolosos; (2)
diversidade de vítimas; e (3) cometimento com violência ou grave ameaça à pessoa.
Faltando algum desses pressupostos, a disposição não será aplicada, podendo, a depender
do caso concreto, restar caracterizado o crime continuado do caput do art. 71, do CP, ou,
eventualmente, a figura do concurso material do art. 69, do CP.

OBS: Súmula 711 do STF.

OBS: Crimes sexuais: Com relação aos crimes sexuais, decidiu o STF que, com a edição da
Lei nº 12.015/2009, torna-se possível o reconhecimento da continuidade delitiva dos
antigos delitos de estupro e atentado ao pudor, quando praticados nas mesmas
circunstâncias de tempo, modo e local e contra a mesma vítima. Por se tratar de
reconhecimento de lei penal mais benéfica retroage alcançando os processos em
andamento, bem como aqueles já transitados em julgado, competindo, no último caso, ao
juízo das execuções penais (Súmula 611, do STF), proceder a nova dosimetria da pena,
afastando o concurso material e aplicando a regra do crime continuado.

OBS: Não tendo sido reconhecida a unidade de crimes, transitando em julgado as duas
sentenças, fará a unificação o juiz da execução (art. 66, III, “a” da LEP).

OBS: STF Súmula nº 723: Não se admite a suspensão condicional do processo por crime
continuado, se a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de
um sexto for superior a um ano.

OBS: Não se aplica o crime continuado para penas de multa. INFO 691/STF (Mensalão):
“Por fim, assinalou descaber a incidência da continuidade delitiva relativamente às penas
de multa, em virtude do disposto no art. 72 do CP”

OBS: Havendo crime continuado e crime formal no mesmo caso concreto, conforme já
decidido pelo STF, a regra do concurso formal foi concebida em favor do réu e só há de ser
aplicada quando efetivamente lhe trouxer proveito. Desta maneira, havendo, entre os
crimes, nexo de continuidade delitiva e concurso formal, apenas um aumento de pena – o
do crime continuado – deve prevalecer.

QUESTÕES DE PROVA: O que é o critério da exasperação? E da cumulação? E da


cumulação jurídica? É possível continuidade delitiva de concurso formal?

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

2.c. Crimes contra a liberdade pessoal.


Os crimes desta seção (Dos crimes contra a liberdade pessoal) são ditos subsidiários, ou
seja, são “reservas” de outros crimes, punidos apenas quando não associados à prática de
crimes mais graves, como estupro, extorsão, roubo.

1. Constrangimento ilegal: Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou


depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não
fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda. As penas aplicam-se
cumulativamente e em dobro, quando, para a execução do crime, reúnem-se mais de três
pessoas, ou há emprego de armas. Além das penas cominadas, aplicam-se as
correspondentes à violência. Não se compreendem na disposição deste artigo: I - a
intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento do paciente ou de seu representante
legal, se justificada por iminente perigo de vida; II - a coação exercida para impedir
suicídio (são causas de exclusão da tipicidade e não da antijuridicidade).

Sujeito ativo: Qualquer pessoal (crime comum). OBS: Se for praticado por funcionário
público no exercício da função, é crime do art. 350 do CP (exercício arbitrário ou abuso de
poder, que foi derrogado pela lei de abuso de autoridade) ou abuso de autoridade (Lei
4.898/65). Havendo essas outras formas criminosas, o crime de constrangimento será
absorvido.

Sujeito passivo: deve ter discernimento e poder de decisão sobre seus atos. Assim, crianças
pequenas, pessoas embriagadas e loucos não podem ser vítimas. Se for constrangimento
contra presidente da República, do STF, Senado e Câmara, é crime contra a Segurança
Nacional (Lei 7.170/83, art. 28).

Tipicidade objetiva (conduta): constranger: é coagir sem que lei imponha, de forma moral
(psíquica, e não fisicamente), para faça ou deixe de fazer algo que a lei não proíbe ou
manda; a pretensão do sujeito ativo tem que ser ilegítima, sob pena de virar a ser crime de
exercício arbitrário das próprias razões. Meios: a) violência (vis corporalis): uso de força
física; b) grave ameaça (vis compulsiva): a ameaça tem que ser séria e grave. Para Damásio
de Jesus, a ameaça pode ser em relação algo justo – ex: constranger alguém sob pena de
demissão do emprego. Mas para outra parte da doutrina, o mal prenunciado tem que ser
injusto (Celso Delmanto); c) outros meios capazes de reduzir a capacidade de resistência (é
a chamada violência imprópria). Ex.: droga, álcool, hipnose. A omissão pode ser forma de
conduta. Aníbal Bruno exemplifica o caso do não fornecimento de alimentação ao doente
visando a conseguir dele determinado comportamento.

Consumação e tentativa: quando a vítima, constrangida, deixa de fazer algo ou o faz contra
sua vontade. É crime plurissubsistente, cabendo a tentativa.

Causa de aumento de pena: O §1° dispõe que a pena será aumentada se houver o emprego
de arma (em sentido impróprio - doutrina majoritária). É imprescindível que seja o

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

instrumento efetivamente usado na execução do delito, não bastando o seu porte ostensivo,
em que pese corrente em sentido contrário. OBS: E se a arma for de brinquedo? A doutrina
majoritária entende que não haverá a causa de aumento, tendo em vista, inclusive, a
revogação da súmula 174, STJ.

Concurso de crimes: Além das penas cominadas ao crime de constrangimento ilegal,


aplicam-se as correspondentes à violência (§ 2º). Apesar de no presente caso o agente, com
uma só conduta, praticar dois crimes (constrangimento ilegal e lesão corporal), prevalece o
entendimento segundo o qual a redação do parágrafo em estudo não deixa dúvidas de que o
concurso será material (art. 69 do CP).

Exclusão do crime: O § 3º trás hipótese em que o agente não cometerá o crime em estudo.
A doutrina diverge sobre a natureza jurídica do dispositivo, caracterizando, para uns, causa
de atipicidade, para outros, antijuridicidade.

Código de Defesa do Consumidor: Será tipificado no art. 71 da Lei 8.078/90 o


comportamento daquele que utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação,
constrangimento físico ou moral, afirmações falsas, incorretas ou enganosas ou de qualquer
outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira
com seu trabalho, descanso ou lazer.

Lei de Tortura: Constitui crime de tortura constranger alguém com emprego de violência ou
grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico e mental, com o fim de obter informação,
declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa ou para provocar ação ou omissão
de natureza criminosa ou em razão de discriminação racial ou religiosa (art. 1.°, I, da Lei
9.455/97).

Estatuto do Idoso: o art. 107 do Estatuto pune com pena de reclusão de 2 a 5 anos aquele
que coage, de qualquer modo, o idoso a doar, contratar, testar ou outorgar procuração.

Casuística: agente em fuga que obriga motorista a levá-lo a outro lugar: é constrangimento
ilegal e não sequestro, haja vista o elemento subjetivo no caso. Ameaça (147) X
constrangimento (146): na ameaça, o medo é o próprio fim do agente, enquanto no
constrangimento ilegal a ameaça é um dos meios. Emprego de armas: há divergência na
doutrina se o conceito de armas engloba só as armas fabricadas para fins bélicos ou todos
os instrumentos com potencialidade lesiva. Prevalece esta última (todos os instrumentos
com potencial lesivo).

2. Ameaça: Art. 147 - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro
meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave.

Somente se procede mediante representação. Também é crime subsidiário, ou seja, existem


outras formas delituosas em que a ameaça é elemento do tipo (faz parte do crime), como
roubo, extorsão, sequestro.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Diferença entre constrangimento ilegal e ameaça: na ameaça, o prenúncio deve ser sobre
mal injusto e grave; no constrangimento ilegal, o mal pode ser simplesmente grave,
podendo ser justo (opinião de Fernando Capez). A outra diferença é o elemento subjetivo:
na ameaça, o agente visa a amedrontar a vítima; no constrangimento, ao fazer ou deixar de
fazer em desacordo à lei. O mal prenunciado pode ser de algo a ser efetivado no futuro ou
imediatamente (posição de Damásio de Jesus).

Crime de execução livre: escrito, gesto, palavra, pessoa interposta, desenho. A ameaça deve
ser séria e idônea, capaz de intimidar. Portanto não será ameaça se o mal não for crível, não
configurando ameaça a expressão "farei o mundo cair sobre sua cabeça", diante da sua
óbvia impossibilidade natural. Contudo, deve ser alertado que um mal, aparentemente
impossível, pode exprimir uma ameaça velada, como, por exemplo, dizer ao ofendido:
"Tiro o seu couro na unha".

Tipo Subjetivo: Pune-se a vontade consciente de amedrontar a vítima, manifestando idônea


intenção maléfica, mesmo que não seja o desígnio do agente cumprir o mal anunciado.

Consumação e tentativa: crime formal (de consumação antecipada), ou seja, haverá


consumação independentemente da obtenção do resultado material, no caso, o efetivo
temor. Então, se consuma quando o sujeito passivo toma conhecimento, sendo irrelevante
que fique com medo. Tentativa: admite-se, na forma escrita ou por interposta pessoa. O fato
da pessoa não estar calma, sem possibilidade de reflexão, não torna atípica a ameaça.

Sujeito passivo: vítima certa, determinada e capaz de entender a ameaça. Menores de idade
núbil, loucos, sob efeito de droga e pessoas indeterminadas não podem ser vítimas. Ameaça
contra o presidente da República, do Senado, da Câmara ou do STF: é crime contra a
Segurança Nacional (Lei 7.170/83). Rogério Sanches sustenta que, em face destas pessoas,
a ameaça, para ser crime contra a Segurança Nacional, há de ter cunho político. Prevalece
que não se exige a presença do sujeito passivo.

Casuística: ameaça e porte ilegal de arma: há concurso material de crimes; ameaça contra
várias pessoas no mesmo contexto fático: concurso formal de crimes. Ação penal pública
condicionada à representação.

Jurisprudência: STJ - REsp 1259012/DF 16/02/2012 RECURSO ESPECIAL. PENAL.


CRIMES DE AMEAÇA E DE LESÃO CORPORAL PERPETRADOS NO ÂMBITO
DOMÉSTICO OU FAMILIAR. ART. 16 DA LEI N.º 11.340/2006. (...) 1. O entendimento
desta Corte Superior de Justiça é firmado no sentido de que a audiência preliminar prevista
no art. 16 da Lei n.º 11.340/06 deve ser realizada se a vítima demonstrar, por qualquer
meio, interesse em retratar-se de eventual representação antes do recebimento da denúncia.

Jurisprudência: TJDFT – Acórdão 383860 do proc. 20081010005994 apj – 22/09/2009. 1.


O crime de ameaça é de natureza formal, consumando-se no momento em que a vítima é
alcançada pela promessa, manifestada pelo agente de forma verbal, por escrito ou gesto, de
que estará sujeito a mal injusto e grave, incutindo-lhe fundado temor, não reclamando sua
caracterização a produção de qualquer resultado material efetivo. 2. É certo que nos crimes
de ameaça, assim como em todos os delitos que ocorrem normalmente em locais

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

escondidos, longe dos olhares alheios, a palavra da vítima se reveste de grande valor,
máxime quando encontra amparo nas demais provas dos autos, bem como na confissão
extrajudicial do denunciado.

3. Sequestro e cárcere privado: Art. 148 - Privar alguém de sua liberdade, mediante
sequestro ou cárcere privado.

Forma qualificada: se a vítima é ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro do


agente ou maior de 60 (sessenta) anos; se o crime é praticado mediante internação da vítima
em casa de saúde ou hospital; se a privação da liberdade dura mais de 15 (quinze) dias; se o
crime é praticado contra menor de 18 (dezoito) anos; se o crime é praticado com fins
libidinosos. Maior forma qualificada: Se resulta à vítima, em razão de maus-tratos ou da
natureza da detenção, grave sofrimento físico ou moral.

Bem jurídico tutelado: liberdade de ir, vir e ficar (liberdade de movimento).

Sujeito ativo: Qualquer pessoa. OBS: Se praticado por funcionário público, é crime de
abuso de autoridade (princípio da especialidade).

Sujeito passivo: Qualquer pessoa. OBS: O consentimento da vítima exclui o crime, desque
que consciente e válido. OBS: Sequestro ou cárcere privado com fundamento político
contra presidente da República, SF, CD e STF: crime contra Segurança Nacional (art. 28 da
Lei 7.170/83).

Tipicidade objetiva: privar total ou parcialmente a liberdade de alguém por sequestro ou


cárcere. É crime de execução livre, podendo ser praticado mediante violência, grave
ameaça ou mesmo fraude (induzir a vítima em erro). Pode ser praticado por ação (afastar a
vítima do lugar em que vive para outro) ou omissão (médico que não concede alta para
paciente já curado).

Sequestro X Cárcere: sequestro é a forma geral. Cárcere é espécie de sequestro. No


sequestro, a privação da liberdade não implica confinamento (ex: manter numa chácara ou
sítio). No cárcere privado, a privação da liberdade ocorre em recinto fechado (quarto, sala).
O elemento comum é a restrição à liberdade da vítima.

Tipo objetivo: dolo, vontade livre e consciente de privar a liberdade, sem um fim especial.
Havendo um especial, poderá ser a forma qualificada do inciso V, redução à condição
análoga de escravo, extorsão mediante sequestro etc.).

Consumação e tentativa: com a privação da liberdade. Crime permanente: consumação se


prolonga no tempo. Tempo de privação: há duas correntes: 1ª É irrelevante o tempo de
privação, havendo crime desde o momento em que a vítima teve subtraído seu direito de
locomoção; 2ª Exige-se um tempo juridicamente relevante, sendo a privação momentânea
mera tentativa. Admite-se a tentativa.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Formas do parágrafo primeiro: são qualificadoras (novo preceito secundário mínimo e


máximo maiores). A forma qualificada do inciso V substituiu o crime de rapto (arts. 219 e
220). Não houve, com isso, abolitio criminis, pois a lei não aboliu a conduta. Houve
revogação, e os fatos praticados antes da nova lei ajustar-se-ão à nova, mas com a pena
anterior, que é mais favorável (ultratividade da lei penal mais benéfica). Portanto, o antigo
art. 219 (raptar mulher honesta, mediante violência ou grave ameaça, para fim libidinoso
deixou de existir, mas parte de sua conduta foi transferida para o art. 148.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

3.a. Política criminal e política de segurança pública: tendências


contemporâneas.
Obras consultadas: Santo Graal 27º. Texto: Da Criminologia à Política Criminal: Direito
Penal Econômico e o Novo Direito Penal - Artur de Brito Gueiros Souza. Nestor Sampaio
Penteado Filho. Manual Esquemático de Criminologia. Editora Saraiva, 2013.

1. Noções Gerais: O direito penal econômico surgiu no século XX, influenciado por
fatores como as grandes guerras mundiais, a sobrevinda do Estado Social, o incremento das
relações comerciais e financeiras internacionais e a constatação de que a criminalidade
organizada possui estreita relação com a criminalidade econômica. Nesse contexto, em
1939, durante a conferência Americana de Sociologia, Edwin Sutherland, inspirado em
Gabriel Tarde, apresentou a expressão White collar crimes (crimes do colarinho branco)
para designar autores de crimes específicos, cujo comportamento criminoso é aprendido,
criado ou desenvolvido pelo sujeito ativo (teoria da associação diferencial), em contraponto
ao criminoso “comum” (delinquente clássico) idealizado por Lombroso, que se
fundamentava em paradigmas biológicos e sociopatológicos. Nascia, então, o direito penal
econômico para reprimir infrações socioeconômicas que transcendiam a esfera individual.
Assim, sopesando o cenário de transformações, Arthur de Brito Gueiros analisa o papel
atual do Direito Penal Econômico no âmbito da Criminologia, da Dogmática e da Política
Criminal, para aferir sua legitimidade.

2. Abordagem criminológica ao direito penal econômico: Em oposição à teoria do


delinquente clássico, Sutherland desenvolveu a Teoria da Associação Diferencial, que se
fundamenta na premissa de que o “comportamento criminoso é consequência de um
processo que se desenvolve no meio de um grupo social”, tendo como principal elemento
a aprendizagem. Nessa linha de raciocínio, como desdobramento da teoria anterior,
Sutherland desenvolveu a teoria do criminoso do colarinho-branco (White-collar crime),
como sendo aquele “cometido por uma pessoa de respeitabilidade e status social elevado,
no curso de sua ocupação profissional”. A doutrina acrescenta ainda os seguintes
elementos: a) danosidade social (com vitimização difusa); b) impunidade da conduta; c)
ausência de notoriedade do fato. Hoje, segundo Gueiros, a delinquência econômica atinge
todas as camadas sociais, embora mais intensa nos estratos superiores, com maior poder
aquisitivo. Gueiros, então, arremata que “o original criminoso do colarinho branco não se
considera criminoso” e também não é visto como tal pela comunidade científica e pelos
práticos da justiça criminal que, por vezes, demonstram terem dificuldades em identificar
tais ações como efetivamente merecedoras de reprovação penal. Com isso, produzem teses
deslegitimadoras, que acarretam impunidade.

3. Abordagem Dogmática ao Direito Penal Econômico: Gueiros sustenta que há uma


autonomia relativa do Direito Penal Econômico em relação ao Direito Penal Nuclear
(tradicional), em razão de peculiaridades daquele em face deste último, tais como: a) bens
jurídicos supraindividuais ou coletivos e correspondente utilização de delitos de perigo
abstrato; b) técnicas especiais de tipificação (leis penais em branco e elementos normativos
64
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

do tipo) e erro de proibição; c) critérios específicos de autoria e participação nos crimes


empresariais; d) responsabilidade penal da pessoa jurídica; e) escolha da sanção adequada
ao delinquente econômico. O conceito de direito penal econômico é controvertido. Gueiros
filia-se a corrente segundo a qual o Direito Penal Econômico segue a “disjuntiva ampla e
estrita.” Em sentido estrito, é “a infração jurídico-penal que lesiona ou põe em perigo a
ordem econômica entendida como regulação jurídica do intervencionismo estatal na
economia de um país”. Em sentido amplo, compreende todo o processo econômico. No
mais, segundo Luis Arroyo Zapateiro, citado por Gueiros, as infrações no direito
econômico, em observância ao princípio da ultima ratio, devem assegurar: a) A capacidade
de intervenção financeira do Estado frente à diminuição fraudulenta de seus ingressos
fiscais e de seguridade social, bem como a obtenção e desfrute, sem fraudes, de suas
subvenções e prestações; b) As regras, estabelecidas por disposições legais, de
comportamento dos agentes econômicos nos mercados e; c) Os bens e direitos específicos
da participação dos indivíduos como agentes da vida econômica.

4. Abordagem político criminal: Há três correntes (Deslegitimadora, intermediária e


legitimadora). A primeira, oriunda da Escola de Frankfurt e fundada num discurso
reducionista, sustenta que a expansão do direito penal implica sacrifício de garantias
essenciais do Estado de Direito, de modo que muitos a associam com o garantismo penal de
Ferrajoli. Referida corrente possui muitos adeptos no Brasil, que se esmeram em criar teses
a favor do alto empresariado, banqueiros e os homens de negócios para afastar a aplicação
da lei penal. Já a posição intermediária, ou modelo dual, desenvolvida por Jesús-María
Silva Sánchez (direito penal de duas velocidades), afirma que a expansão do direito penal
decorre, “também, de profundas transformações vinculadas às expectativas que amplas
camadas sociais têm em relação ao papel que cabe ao Direito Penal”, ou seja, mais
proteção. Com isso, formam-se dois blocos do direito penal. No primeiro, para o criminoso
clássico, aplicar-se-iam penas privativas de liberdade, enquanto no segundo, no qual se
insere o direito penal econômico, aplicar-se-iam penas de multa e restritivas de direito. A
posição legitimadora, perfilhada por Gueiros, especialmente no direito penal econômico,
decorre da modernização do direito penal, que deve abranger o “enfrentamento de grandes
questões econômicas”, de natureza difusa, da sociedade moderna, de modo a reprimir as
condutas criminosas de “camadas mais elevadas” da sociedade.

QUESTÕES DE PROVA: Diferença entre sequestro e carcere privado. Conceitue


contrangimento ilegal. É preciso o animus serendi para configurar o crime de ameaça?
Quais os bens jurídicos protegidos no crime de redução à condição análoga a de escravo.
De quem é a competência para julgar o crime de redução à condição análoga a de escravo?

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

3.b. Efeitos da condenação no Código Penal e em leis especiais.


Obras consultadas: Santo Graal 27º. SOUZA, Artur de Brito Gueiros e JAPIASSÚ, Carlos
Eduardo Adriano. Curso de Direito Penal. 1ª Edição. Ed. Elsevier. Ano 2011;
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte 1. 15ª ed. Editora Saraiva.
2010.

Legislação básica: arts. 91 e 92 do CP. Arts. 5º, XLVI; 15, III; e 243 da CF. Art. 25 da Lei
nº 9605/98. Arts. 63 e 72 da Lei 11.343/06. Art. 7º, II, da Lei de Lavagem de Dinheiro. Art.
181 da Lei 11.101/05. Art. 1º, §5º, da Lei 9.455/97

Além da imposição de uma sanção penal, a sentença condenatória produz outros efeitos,
ditos secundários ou acessórios, de natureza penal (espalhados no CP, CPP e LEP) e
extrapenal. Os de natureza extrapenal podem ser divididos em efeitos genéricos (art. 91 do
CP) e efeitos específicos (art. 92 do CP).

1. Efeitos genéricos: Valem para todos os delitos e têm eficácia automática. A) Tornar
certa a obrigação de indenizar. A sentença penal condenatória pode ser executada no civil (é
título executivo judicial), desde que em face do réu (e não do responsável civil) ou de seus
herdeiros nos limites da herança (não é pena criminal, não se aplicando o princ. da
pessoalidade). Entretanto, a vítima não precisa aguardar o desfecho na esfera penal, o qual
somente impedirá eventual condenação civil se houver absolvição por inexistência
material do fato, não participação do autor no crime ou reconhecimento de excludente
de ilicitude. Caso o ofendido seja pobre, compete, a princípio (enquanto não estruturada a
Defensoria Pública), ao MP a propositura da ação civil ex delicto. A Lei nº 11.719/2008
passou a possibilitar a fixação imediata na sentença penal de um valor mínimo para
reparação dos danos causados pela infração (art. 387, IV, do CPP), o que já existia em leis
esparsas, como na Lei 9605/98 (art. 20) e no CTB (art. 297). B) Perda em favor da União
dos instrumentos e produtos do crime. Lei de Lavagem de Dinheiro tem previsão específica
no seu art. 7º, I. Instrumentos do crime são os objetos utilizados na execução do delito e
produtos do crime é qualquer proveito auferido, direta ou indiretamente, com a conduta
delituosa. Somente haverá a perda dos instrumentos cujo fabrico, alienação, uso, porte ou
detenção constitua fato ilícito, não podendo ser prejudicados o lesado ou o terceiro de boa-
fé. Trata-se de verdadeiro confisco, autorizado constitucionalmente (art. 5º, XLVI, b), cujos
bens serão destinados ao Fundo Penitenciário Nacional (Funpen), conforme art. 2º, IV, da
LC 79/94. A ação de sequestro somente pode recair sobre tais bens confiscáveis (art. 125 do
CPP). O art. 25 da Lei nº 9605/98 prevê a liberação dos animais apreendidos ao seu habitat
ou a zoológicos e a doação dos produtos perecíveis ou madeiras a instituições científicas,
hospitais e outras com fins beneficentes. Os instrumentos deverão ser vendidos, garantida a
sua descaracterização por meio da reciclagem. O art. 25 da Lei 10.826/03 determina o
encaminhamento das armas de fogo apreendidas ao Comando do Exército para destruição
ou doação. A Lei nº 11.343/06 prevê que os valores perdidos em favor da União deverão ser
revertidos diretamente ao Fundo Nacional Antidrogas (inclusive os imóveis expropriados
por força do art. 243 da CF), devendo as drogas serem destruídas (arts. 63 e 72). C)

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Suspensão dos direitos políticos enquanto perdurar os efeitos da condenação criminal 2012:
§ 1o Poderá ser decretada a perda de bens ou valores equivalentes ao produto ou proveito
do crime quando estes não forem encontrados ou quando se localizarem no exterior.
(Incluído pela Lei nº 12.694, de 2012) § 2o Na hipótese do § 1o, as medidas assecuratórias
previstas na legislação processual poderão abranger bens ou valores equivalentes do
investigado ou acusado para posterior decretação de perda. (Incluído pela Lei nº 12.694, de
2012)

2. Efeitos específicos: Não são automáticos, pois devem ser motivadamente declarados na
sentença. Tem por objetivo reforçar a proteção dos bens jurídicos violados e prevenção da
reiteração (afasta a situação criminógena). Eles não se confundem com as penas de
interdição temporária de direitos (subespécie da restritiva de direito), as quais são
consequências diretas (e não reflexas) do crime, permanecendo pelo mesmo tempo da
pena privativa que substituem. Já os efeitos específicos são permanentes. A) Perda do
cargo, função pública ou mandado eletivo. É definitiva, não sendo alcançada pela
reabilitação (art. 93, §ú. CP), salvo quanto a outro cargo, função ou mandato. A.1) Por
condenação superior a um ano, por crime praticado contra a Administração Pública.
Além da pena superior a um ano, é preciso comprovar que a infração foi praticada com
abuso de poder ou violação de dever inerente ao cargo ou função, independentemente de
estar no rol dos crimes funcionais (arts. 312 a 347 do CP). Para Bitencourt, só há a perda da
função por meio da qual foi praticado o crime, e não de qualquer cargo, tanto que o
funcionário não ficará impedido de ser investido em outra atividade pública. A.2)
Condenação superior a quatro anos, por qualquer outro crime. Aqui não é preciso o liame
entre a infração e a Adm. Pub., bastando a pena superior a quatro anos, reveladora de maior
desvalor do resultado. A Lei de Lavagem de Dinheiro prevê a interdição do exercício do
cargo público ou a de diretor/conselheiro das pessoas jurídicas utilizadas no crime em
questão pelo dobro da pena privativa de liberdade (art. 7º, II). O art. 15, III, da CF prevê a
suspensão dos direitos políticos pela condenação criminal transitada em julgado enquanto
durarem seus efeitos. A condenação pelo crime de tortura acarreta, automaticamente, a
perda do cargo/função/emprego público pelo dobro do prazo da pena (art. 1º, §5º, da Lei
9.455/97). B) Incapacidade para o exercício de pátrio poder, tutela ou curatela. É
necessária a prática de crime doloso em face de filho, tutelado ou curatelado, cuja pena
abstratamente cominada seja de reclusão (mesmo que não venha ser aplicada no caso
concreto). Não alcança os crimes contra a assistência familiar, pois não cominam pena de
reclusão, com exceção do art. 245, §§ 1º e 2º, do CP. Não precisa provar abuso no exercício
do pátrio poder. Se reabilitado, poderá ter novamente o poder familiar em relação a outros
filhos/tutelados/curatelados, mas não em face da sua vítima (art. 93, §ú, CP). C)
Inabilitação para dirigir veículo, utilizado em crime doloso. Ex.: prática de tráfico de armas
por meio de veículo (TRF 4, AC 20077010001827-8, 04/03/09). Não se confunde com a
proibição temporária – pena restritiva – aplicável para os crimes culposos no trânsito (art.
47, III, do CP) e nem com a pena principal (isolada ou cumulativamente imposta com
outras sanções) prevista pelo CTB, qual seja, a suspensão ou proibição de se obter a
permissão ou a habilitação para dirigir, a qual terá a duração de dois meses a cinco anos
(arts. 292/293). D) Inabilitação do empresário nos delitos falimentares (art. 181 da Lei
11.101/05). A condenação por crimes previstos na lei de falência tem por efeito secundário
a inabilitação para o exercício da atividade empresarial, direta ou indiretamente, além do

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

impedimento para o exercício de cargo ou função em conselho de administração ou


diretoria das sociedades sujeitas à referida lei. Tal efeito não é automático e perdurará por
até 5 anos após a extinção da punibilidade, podendo, contudo, cessar antes pela reabilitação
penal. E) Suspensão dos direitos políticos: art. 15, III da Constituição Federal, em face da
condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos. Esse efeito é
automático, prescindindo de motivação expressa na sentença condenatória, e a suspensão
abrange os direitos políticos de natureza ativa e passiva. Súmula 9 do Tribunal Superior
Eleitoral: “A suspensão dos direitos políticos decorrentes de condenação criminal transitada
em julgado cessa com o cumprimento ou a extinção da pena, independendo de reabilitação
ou prova de reparação dos danos”.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

3.c. Crimes contra a honra.


Legislação: Santo Graal 27º. art. 138 ao 145 do CP.

Honra: é “o complexo ou conjunto de predicados ou condições da pessoa que lhe conferem


consideração social e estima própria” (Noronha). É bem jurídico disponível. Honra
objetiva: é a reputação do indivíduo, conceito que os demais membros da sociedade têm a
respeito do indivíduo. Honra subjetiva: é o juízo que cada um tem de si, o sentimento da
própria dignidade ou decoro. Há críticas à distinção (Bitencourt, 2011a, 315).

Bem jurídico tutelado: honra objetiva na calúnia e na difamação; honra subjetiva na


injúria.

Sujeito ativo: qualquer pessoa. ATENÇÃO: os advogados, em razão do disposto no art. 7º,
§2º do EOAB, não estão imunes ao delito de calúnia, pertencendo ao raio da inviolabilidade
profissional penas a difamação e a injúria, desde que cometidas no exercício regular de suas
atividades.

Sujeito passivo: qualquer pessoa física, inclusive, inimputáveis e “desonrados”. Quanto


aos inimputáveis: no caso de injúria, é indispensável, porém, que tenham a capacidade de
entender o caráter ofensivo da conduta do sujeito ativo (Bittencourt, 2011a, p. 347). Quanto
às pessoas jurídicas: majoritariamente, entende-se que podem ser sujeito passivo de
difamação, mas não podem ser sujeito passivo de injúria, já que não possuem honra
subjetiva (nesse caso, os titulares da pessoa jurídica podem ter a honra lesada). Já quanto ao
crime de calúnia, há quem entenda que não podem ser sujeito passivo, pois “alguém” é
necessariamente pessoa natural, e há quem entenda que, no que diz respeito aos crimes
contra a ordem econômica e o sistema financeiro, a economia popular e o meio ambiente,
podem sê-lo, cf. art. 225, §3º, e 173, §5º, CR (Bitencourt, 2011a, p. 319). Com relação à
punição da calúnia contra os mortos (art. 138, §2º, CP): argumenta-se que o que se tutela é
a honra dos parentes vivos (Bittencourt, 2011a, p. 323).

Tipo subjetivo: dolo. Exige-se, ainda, elemento subjetivo especial, consistente no


propósito de ofender (animus calumniandi, animus diffamandi, animus injuriandi). Quanto
à calúnia, a figura do parágrafo 1º, art. 138, somente admite dolo direto.

Classificação: crimes formais, comuns, instantâneos, comissivos (admite-se a injúria


mediante omissão), dolosos, unissubsistentes quando praticados verbalmente e
plurissubsistentes quando praticados por escrito. Trata-se de delitos circunstanciados, pois,
excluída a calúnia, as expressões ofensivas são sempre relativas, variando com o tempo, o
lugar e as circunstâncias (uma expressão pode ser considerada injuriosa numa região e não
em outra).

Tipo objetivo:

a) Calúnia: É uma espécie de difamação qualificada. 1ª figura típica: Imputar, falsamente,


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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

fato definido como crime (caput). O fato tem que ser determinado, concreto, específico,
embora não se exijam detalhes minuciosos. A falsidade pode referir-se tanto ao fato em si
como à autoria. OBS.1: A imputação falsa de contravenção não constitui calúnia, mas pode
constituir difamação. OBS.2: discute-se se seria possível a imputação verdadeira constituir
crime quando não se admite exceção da verdade. OBS 3: A imputação caluniosa pode ser
equívoca ou implícita, bem como reflexa. 2ª figura típica: propalar ou divulgar a calúnia
(§1º). Não é necessário que um número indeterminado de pessoas tome conhecimento da
imputação. OBS: Configura-se o crime mesmo quando se divulga a quem já tem
conhecimento da calúnia, pois ela servirá de reforço na convicção do terceiro.

b) Difamação: Imputar fato desonroso, ofensivo à reputação de alguém, desde que não seja
criminoso. O fato há de ser determinado, específico e concreto. OBS 1: Há crime ainda que
o fato imputado seja verdadeiro, desde que desabonador, ou seja, não é admitida a exceção
da verdade na difamação. Porém, no caso do funcionário público a imputação de fato
desonroso verdadeiro descaracteriza o crime, em razão do interesse do Estado-
Administração em apurar a imputação, cabendo de forma excepcional a exceção da verade.
OBS 2: A propalação ou divulgação não foi prevista expressamente. Contudo, entende-se
que se trata de outra difamação. OBS 3: Discute-se sobre a configuração do crime quando o
fato imputado é notório. Pela não descaracterização do crime: Bittencourt, embora admita
em tese que a notoriedade pode tornar a conduta insignificante, excluindo a tipicidade
(2011a, 344). OBS 4: Admite-se a difamação implícita. OBS 5: Cuidado: pessoas que têm
inviolabilidade em suas opiniões e palavras não pode ser sujeito ativo.

c) Injúria: Ofender a dignidade, auto estima, aquilo que a pessoa pensa de si mesma ou
decoro de alguém, ou seja, sua honra subjetiva. Não há imputação de fatos, mas emissão de
conceitos negativos sobre a vítima. OBS 1: A injúria pode ser equívoca ou implícita, bem
como reflexa. OBS 2: Na provocação e retorsão previstas no §1°, pode haver a concessão
de perdão judicial para o provocado ou primeiro injuriado (retorsão imediata). A conduta do
agente não é lícita, mas é mais compreensível. OBS 3: Se for empregada violência ou vias
de fato, com caráter aviltante, configurar-se-á injúria real (forma qualificada). As penas da
violência são aplicadas cumulativamente. Se houver vias de fato, a contravenção fica
absorvida pela injúria real. OBS 4: Se o agente tiver o propósito discriminatório, poderá se
configurar injúria preconceituosa (forma qualificada). Exige-se o elemento subjetivo
especial, consistente no especial fim de discriminar (Bittencourt, 2011a, p. 363).

Injúria preconceito ≠ Racismo: A injúria qualificada pelo preconceito está no art. 140, §3º, e
não está ligada apenas à questão de cor, pois qualifica-se a injúria pelo preconceito a
utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de
pessoa idosa ou portadora de deficiência. O crime de racismo está previsto na Lei 7.716/89.
OBS: não se aplica o perdão judicial à injúria qualificada pelo preconceito, tendo em vista
que atinge um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (Art. 3º, IV,
CR). Além disso, o perdão judicial vem no §1º, logo, antes da injúria racial, demonstrando
pela sua posição topográfica que não se aplica.

Injúria preconceito (art. 140, §3º) Racismo (lei 7.716/89)


Dolo do agente: Injuriar pessoa determinada Discriminar grupo

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Prescrição: Prescritível (art. 109, CP) Imprescritível (CF, art. 5º, XLII).
Fiança: Afiançável Inafiançável
Ação penal: Pública, condicionada a Pública incondicionada
representação
Visão panorâmica:

Art. 138 Calúnia Imputar fato definido como crime, Honra objetiva
sabidamente falso. (reputação)
Admite prova da verdade (em regra).
Admite prova da notoriedade.
Art. 139 Difamação Imputar fato desonroso, em regra, não
importando se verdadeiro ou falso.
Admite prova da verdade somente
quando praticado o crime contra
funcionário público no exercício de
suas funções.
Admite prova da notoriedade.
Art. 140 Injúria Atribuir qualidade negativa. Honra subjetiva
Não admite exceção da verdade nem (dignidade ou decoro)
prova da notoriedade.
Consumação: a) Calúnia e difamação: consumam-se quando alguém que não é o sujeito
passivo toma conhecimento da imputação (falsa), não sendo necessário que fique ciente
uma pluralidade de pessoas. b) Injúria: consuma-se quando a ofensa irrogada chega ao
conhecimento do ofendido.

Consentimento do ofendido: figura como causa de justificação, excluindo a ilicitude da


conduta (Prado, 2010, p. 228); exclui a tipicidade (Bittencourt, 2011a, p. 316); torna atípica
a conduta se anterior ou contemporâneo à ofensa, mas, se posterior, pode significar apenas
a renúncia ao direito de queixa ou o perdão (Pierangeli, 2007). Para ser eficaz o
consentimento precisa ser expresso e outorgado por sujeito passivo capaz de consentir. Não
é válido o consentimento outorgado pelos representantes legais do menor ou incapaz
(Prado, 2010, p. 228).

Exceção da verdade: possibilidade de o sujeito ativo provar a veracidade do fato


imputado, através de procedimento especial. É uma forma de defesa indireta que deve ser
solucionada antes da decisão da causa ser proferida. Quanto ao ponto, o CP brasileiro
adotou o sistema misto (em oposição ao sistema ilimitado), pois não admite
indiscriminadamente a exceção da verdade. Na calúnia, admite-a como regra (excepcionada
quando o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível no caso de crime de ação
privada; quando o fato for imputado a presidente da República ou chefe de governo
estrangeiro; e se o ofendido foi absolvido do crime por sentença irrecorrível), e na

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

difamação, como exceção (somente quando o s.p. for funcionário público no exercício das
funções). Na injúria não é admitida, eis que não se imputa fato. Atenção para a hipótese de
ter o excepto tiver prerrogativa de foro (art. 85 CPP).

Exceção de notoriedade: Explica Fernando Capez que o art. 523 do CPP não faz menção
apenas à exceção de verdade, mas também à da notoriedade do fato Imputado. Consiste esta
na oportunidade facultada ao réu de demonstrar que suas afirmações são do domínio
público. A exceção de notoriedade é admitida tanto no crime de calúnia quanto no delito de
difamação. Assim se explica: se o fato já é de domínio público, não há como se atentar
contra a honra objetiva - assim, por exemplo, dizer que determinada pessoa sai com travesti

não implica difamação se ficar demonstrado que tal conduta já era de amplo conhecimento
público. [Minha percepção: Caros amigos, como estava no livro eu coloquei esse exemplo,
mas não sugiro que vc o use, tendo em vista a grande carga de preconceito que há].

Concurso de crimes: tem-se admitido a continuidade delitiva entre os delitos contra a


honra.

Disposições comuns: a) Formas Majoradas: se o crime é cometido 1) contra o Presidente


da República, ou contra chefe de governo estrangeiro; 2) contra funcionário público, em
razão de suas funções; 3) na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a
divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria; 4) contra pessoa maior de 60 (sessenta)
anos ou portadora de deficiência, exceto no caso de injúria; 5) mediante paga ou promessa
de recompensa. b) Hipóteses de exclusão do crime de calúnia e difamação (causas de
exclusão da pena, da antijuridicidade ou da tipicidade, conforme o entendimento): 1) ofensa
irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou por seu procurador; 2) opinião
desfavorável da crítica literária, artística ou científica, salvo quando inequívoca a intenção
de injuriar ou difamar; 3) conceito desfavorável emitido por funcionário público, em
apreciação ou informação que preste no cumprimento de dever do ofício. c) Possibilidade
de retratação antes da sentença nos crimes de calúnia e difamação: causa de extinção da
punibilidade (art. 107, VI, CP); d) Pedido de explicações. e) Ação penal: de regra é
exclusivamente privada. Será, porém, pública condicionada quando: a) praticada contra
Presidente da República ou contra chefe de governo estrangeiro (condicionada a requisição
do MJ); b) praticada contra funcionário público, em razão de suas funções (condicionada à
representação do ofendido).

Previsão de crimes contra a honra em leis especiais: Código Penal Militar, Código
Eleitoral, Lei de Segurança Nacional, Código Brasileiro das Telecomunicações. Havia
previsão na Lei de Imprensa de tais crimes, mas a ADPF 130 considerou tal lei não
recepcionada pela Constituição.

QUESTÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE SÃO PAULO – EXAME ORAL – DIA 06


DE ABRIL DE 2.006. 20. A pessoa jurídica pode ser vítima de crime contra a honra?

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

4.a. Princípios básicos do Direito Penal. Parte Geral.


Obras consultadas: Santo Graal 27º; Queiroz, Paulo, 9ª ed.; Código Penal Comentado.
Rogério Greco (2011). Direito Penal Parte Geral. Juarez Cirino dos Santos (2007).
BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal (1999). A moderna
teoria do fato punível. Juarez Cirino dos Santos (2007). Tratado de Direito Penal, Parte
Geral. C. Roberto Bitencourt (2011). Súmulas do STF comentadas. Roberval Rocha
Ferreira Filho e outro (2011). Código Penal para concursos. Rogério Sanches Cunha
(2011). Nilo Batista. Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro – Editora Revan, 2011.
MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado. 6.ed. São Paulo: Método, 2012.

Legislação básica: art. 1º, II; 5º, III; XLVII e XLIX, XLV da CF. Art. 59 do CP.

1 – Princípio da dignidade da pessoa humana ou da humanidade: Para Nucci, a


dignidade da pessoa humana é uma meta a ser atingida, e não um princípio penal. Mas para
a maioria da doutrina, trata-se de um princípio, que é o nascedouro dos demais princípios
penais. Para Cirino (2007), esse princípio proíbe infligir penas cruéis, de morte, perpétuas,
de trabalho forçado, assim também a execução cruel das penas legais ao cidadão (proibição
de condições indignas e desumanas dos presídios etc.).

2 – Princípio da Legalidade ou da Reserva Legal : O princípio da legalidade ou da


reserva legal está inscrito no art. 5º, XXXIX, da CF/1988, bem como no art. 1º, do Código
Penal. Sob a vertente latitudinal, cumpre salientar que o princípio da legalidade pode ser
encontrado em todos os sistemas jurídicos existentes no mundo – em Códigos Penais e em
Constituições –, bem como na Declaração Universal dos Direitos do Homem; na 3ª
Convenção de Genebra e em seus Protocolos Adicionais, além de tratados para a proteção
de direitos humanos como, exemplificativamente, o Pacto Internacional de Direitos Civis e
Políticos; o Convênio Europeu para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades
Fundamentais; a Convenção Americana de Direitos Humanos; e a Carta Africana de
Direitos Humanos e dos Povos. Sob a vertente longitudinal, princípio da reserva legal foi
previsto, de alguma maneira, tanto no direito romano como no direito medieval. No direito
inglês, o princípio foi inscrito na própria Magna Carta, aquela cláusula impunha uma
evidente limitação ao poder estatal em favor da liberdade individual. Demais disso, ela já
condicionava a atuação do poder público à existência de uma lei anterior, embora
representasse, concretamente, muito mais uma garantia processual do que de direito
substantivo. Após esse marco histórico, o princípio da legalidade associado à defesa dos
direitos individuais foi desenvolvido por filósofos como Locke, Montesquieu e Rousseau.
Na sistemática moderna, segundo Nilo Batista, o Princípio da Legalidade surge com o
Estado Moderno, no início do Estado Liberal, por influência das obras de Beccaria,
Feuerbach. O princípio surge na Constituição dos Estados da Virgínia e de Maryland, em
1776. O primeiro Código Penal a contemplá-lo é o CP da Bavária, em 1813, depois
Prússia e Alemanha (Cirino, 2007). O modelo formal do princípio da legalidade: não há
crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem o devido processo legal (constante nas
legislações citadas).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

A ideia material da legalidade compreende que a analogia e os bons costumes não podem
ser usados em DP em desfavor do réu; é corolário da reserva legal, que só leis podem tratar
de matéria penal (Lei ordinária, complementar ou tratado com força de lei – aqui há
controvérsia). Nucci diz que o Direito Penal não pode ser regulado por normas de gabinete.
Assim, no art. 5º, XXXIX da CRFB/88, ao se ler “crime”, deve-se acrescentar também as
contravenções penais, também incluídas no princípio da legalidade, fazendo uma
interpretação extensiva. O mesmo ocorre na pena, que se deve incluir também a medida de
segurança. OBS: Medida Provisória: Pela CF, Medida Provisória não pode tratar de matéria
penal, mas o STF e o STJ entende que MP não podem trazer matéria incriminadora ou mais
gravosa, mas pode trazer norma penal benéfica, como abolir crimes (ex: Estatuto do
desarmamento, lei do REFIS que está valendo; devolução de arma de fogo – quem devolve
não pratica crime).

Decorrências do Princípio da Legalidade (Cirino, 2007): Dele decorrem as seguintes


garantias/princípios: (i) criminal e penal: apenas a lei formal e escrita é fonte criadora de
crimes e sanções (pena e medida de segurança), sendo inconstitucional a utilização em seu
lugar de outros atos normativos, do costume ou do argumento analógico in malam partem
[Essa vertente da legalidade, que estabelece que somente a lei, em sentido formal, pode
incriminar condutas e agravar situações, é denominada de reserva legal]; (ii) jurisdicional e
penitenciária: pela primeira, “ninguém será processado nem sentenciado senão pela
autoridade competente” e, pela segunda, a sanção penal será executada na forma prescrita
em lei; (iii) irretroatividade da lei penal e suas exceções [salvo a lei penal mais benéfica,
pois ela retroage e não obedece vacatio legis, tendo aplicação imediata]; (iv) taxatividade e
determinação: exigem que o legislador descreva de forma mais clara possível o fato
punível, sendo vedada a utilização excessiva de elementos normativos, cláusulas gerais ou
conceitos indeterminados; estabelecem as margens penais às quais está vinculado o
julgador. Juarez Tavares e outros reconhecem a dificuldade de construir tipos culposos
fechados (de especificar falta do dever de cuidado), dada à impossibilidade de descrição
exaustiva de todas as modalidades de descumprimento de dever do cuidado. No
Informativo nº. 220 STF, RE 254818, foi dito que Medida Provisória poderia tratar de
matéria penal apenas para beneficiar o réu. Entretanto, a EC 32 determina o contrário, ou
seja, que MP não pode tratar de matéria criminal. A questão ainda será discutida nos
Tribunais. A esse respeito, a Lei do REFIS e a disciplina do prazo para a entrega de arma de
fogo são exemplos de MP benéfica para o réu.

Princípio da legalidade gera quatro importantes consequências para a dogmática penal: A)


Proibição da analogia (nullum crimen, nulla poena sine lege stricta): cuida-se da exclusão
da integração analógica das normas que definem crimes e estabelecem sanções ou medidas
de segurança, para abranger casos por elas não expressamente contemplados. B) Proibição
da utilização do costume para fundamentar ou agravar a pena (nullum crimen, nulla poena
sine lege scripta): não é possível, igualmente, admitir a criação de crimes e de penas ou a
sua majoração por normas consuetudinárias. C) Proibição da retroatividade da lei penal
(nullum crimen, nulla poena sine lege praevia): consiste no postulado de que a alteração
mais gravosa de dispositivos da lei penal não pode gerar a aplicação retroativa. Então, o art.
5º XL determina que a lei penal benéfica retroage, a lei penal maléfica não retroage.
Exceção – art. 3 do CP (leis temporárias e excepcionais tem ultratividade). Para Zaffaroni,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

o art. 3º é inconstitucional, pois apenas a CF poderia excepcionar outro princípio


constitucional. Para a doutrina e jurisprudência majoritária, o art. 3º é constitucional.
Quase exceção, súmula 711 do STF – pode ser aplicada a nova lei mais gravosa que surgir
durante a execução do crime continuado ou crime permanente. A Súmula 711 fere o art. 5º,
XL, da CF? Não, porque o crime estava sendo praticado. D) Proibição de incriminações
vagas e indeterminadas (nullum crimen, nulla poena sine lege certa): a só existência de lei
prévia não basta, pois nela devem ser reunidos certos caracteres, quais sejam, a concreta
definição de uma conduta, a delimitação de qual conduta é compreendida e a delimitação
de qual não é compreendida. Dessa maneira, uma incriminação vaga e indeterminada faz
com que, em realidade, não haja lei definindo como delituosa certa conduta, pois entrega,
em última análise, a identificação do fato punível ao arbítrio do intérprete ou do aplicador.
É também conhecido como princípio da taxatividade.

O termo “defina”: outro desdobramento do princípio da legalidade se extrai do termo


“defina”. Trata-se da tipicidade e da taxatividade. TIPICIDADE: Por tipicidade se entende
que o tipo penal possui função garantidora e somente se pode incriminar condutas através
dele. Todo tipo penal deve ser fechado, ou seja, aquele que define todos os seus elementos,
exigindo do legislador uma análise pormenorizada da conduta incriminada, de modo a não
incidir em um tipo vago. Excepcionalmente, há tipos penais abertos [ex: o tipo culposo
previsto no artigo 18, II, CP. Atenção: há tipos penais culposos fechados, mas isso é a
exceção da exceção, ex: art. 180, §3º, CP]. TAXATIVIDADE: como decorrência da
taxatividade temos as normas penais em branco. Há duas modalidades de norma penal em
branco: 1) Norma penal em branco primariamente remetida: apresenta lacuna no preceito
primário, ou seja, a definição da conduta punível é feita de forma lacunosa, incompleta,
necessitando de um complemento para sua integração e plena eficácia. Ex: art. 1º, parágrafo
único c/c art. 66 da Lei 11.343/06, os quais o conceito de drogas para outra lei ou Portaria
do Executivo. 2) Norma penal em branco secundariamente remetida: também chamada de
norma penal às avessas ou incompleta, quando a pena é remetida a outro tipo penal, estando
seu preceito secundário incompleto. Na norma penal em branco secundária, é necessário
que o legislador fixe precisamente a remição, em respeito ao Princípio da legalidade. Essa
norma também é sempre homogênea, obrigatoriamente remetida e somente lei penal pode
complementar a si mesma [pois somente lei em sentido formal pode definir pena, portanto a
norma penal em branco secundariamente remetida é sempre homogênea]. Outra
classificação da norma penal em branco: 1) A norma penal em branco homogênea também
é chamada homogênea em sentido amplo ou imprópria. É homogênea porque o
complemento é oriundo da mesma fonte legislativa. 2) A norma penal em branco
heterogênea, também chamada em sentido estrito ou própria, é aquela cujo complemento é
oriundo de outra fonte normativa. Normalmente, essa fonte é de hierarquia inferior à lei.
Ex: Decreto, Portarias, Regulamentos; A lei de Drogas é complementada por Portaria; A lei
de armas tem Regulamentos.

PONTO EXTRA DENTRO DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE:

1. Legalidade Formal X Legalidade Material: Legalidade Formal: Obediência ao


DEVIDO PROCESSO LEGISLATIVO. Se há a obediência a legalidade formal a LEI É
VIGENTE. Legalidade Material: Respeito OS DIREITOS E GARANTIAS DO

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

CIDADÃO. Se há obediência a legalidade material a LEI É VÁLIDA. Logo, nem sempre


uma Lei Vigente é Valida e vice-versa. O STF aplicou tal assertiva em face do art. 2º, § 1º,
da Lei 8.072 em relação ao regime integral fechado. Assim, o STF declarou que o artigo era
vigente, mas não era válido, pois não respeitou direitos e garantias do cidadão.

2. Princípio da Legalidade X Tipo Aberto e Norma Penal em Branco: O Princípio da


Legalidade exige a edição de lei certa, precisa e determinada. Classificação da Lei Penal: 1)
Completa: É aquela que dispensa complemento valorativo (dado pelo Juiz) ou normativo
(dado por outra norma). Ex: art.121 do CP - ‘Matar alguém’. 2) Incompleta: É a norma que
depende de complemento valorativo (dado pelo Juiz – tipo aberto) ou normativo (dado por
outra norma – norma penal em branco). Portanto, temos o seguinte panorama:

Valorativo à Norma penal em branco


Norma que depende à
de complemento
Normativo à Tipo aberto

TIPO ABERTO: Espécie de Lei Penal Incompleta que depende de complemento valorativo,
que será dado pelo Juiz na analise do caso em concreto. Ex: Crimes Culposos, pois são
descritos em tipos abertos, uma vez que o legislador não enuncia as formas de negligencia,
imprudência e imperícia, ficando a critério do Magistrado na analise do caso em concreto
[Art.121, §3º do CP: Se o homicídio é culposo. Pena - detenção, de um a três anos].
ATENÇÃO: Para não ofender o Princípio da Legalidade, a redação típica tem que trazer o
mínimo de determinação. MAS, tem um caso de tipo culposo que o legislador não deixou
margens para o juiz complementar valorativamente. Excepcionalmente o legislador
descreveu a negligência (em sentido amplo), subtraindo do Juiz, de forma legítima, a sua
valoração no caso concreto. Mas isso é a exceção da exceção, como vimos acima neste
Santo Graal Vitaminado, pois se trata de um tipo culposo fechado. [Ex: Art. 180 - Adquirir,
receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser
produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte: § 3º -
Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o
preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso:
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou ambas as penas.].

NORMA PENAL EM BRANCO OU PRIMARIAMENTE REMETIDAS: Espécie de lei


penal incompleta que depende de complemento normativo (dado por outra norma) para que
se possa compreender o âmbito de aplicação do seu preceito primário. Norma penal em
branco ou normas primariamente remetidas são aquelas em que seu preceito primário não é
completo. As normas penais em branco estabelecem a cominação penal, ou seja, a sanção
penal, mas remetem a complementação da descrição da conduta proibida para outras
normas legais, regulamentares ou administrativas.

Lei Penal à Complementada à Por outra Norma Penal

A Norma Penal em Branco é dividida em várias espécies: 1) Norma Penal em Branco


Própria ou Em Sentido Estrito ou Heterogênea ou heteróloga: O complemento normativo
76
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

NÃO EMANA DO LEGISLADOR, mas sim de FONTE NORMATIVA DIVERSA. Lei


penal à Norma (≠ Lei). Ex: Lei de drogas à Portaria. Complemento feito por uma
Portaria (feito pelo Poder Executivo), ao exemplo da Lei de Drogas, a Portaria 344/98 diz o
que é a ‘droga’. 2) Norma Penal em Branco Imprópria ou Em Sentido Amplo ou
Homogênea ou homóloga: O complemento normativo EMANA DO PRÓPRIO
LEGISLADOR. Assim trata-se de uma Lei complementando outra Lei. Mas a Normal
Penal em Branco Imprópria subdivide-se em mais duas subespécies. 2.1) Norma Penal em
Branco Imprópria Homovitelina ou Homóloga: Ex: art. 312, ‘funcionário publico’ está
conceituado no art. 327 do CP. 2.2) Norma Penal em Branco Imprópria Heterovitelina ou
Heteróloga: Casar com impedimentos. Ex: art. 237 CP, só que o que vem a ser
impedimentos esta no artigo 1521, CC/02. Portanto:

Completa

Tipo aberto
Norma penal em branco própria ou em sentido
Lei Penal estrito ou heterogênea ou heteróloga
Incompleta Norma penal Norma penal em branco Homovitelínea
em branco imprópria ou sentido amplo ou homóloga
ou homogênea ou Heterovitelínea
homóloga ou heteróloga
OBS 1: Pergunta de concurso: O que é norma penal em branco ao revés (ou invertida)? O
complemento refere-se à sanção, ao preceito secundário, não ao conteúdo proibitivo
(preceito primário). CUIDADO: O complemento deve ser necessariamente fornecido por
LEI. Jamais uma Portaria, por exemplo, vai complementar uma norma penal em branco ao
revés. Então, uma norma penal em branco invertida é necessariamente homogênea.
Norma Penal em Branco Norma Penal em Branco ao revés ou
Invertida

Lei Penal Lei Penal

Preceito Primário: conteúdo criminoso (ele é Preceito Primário: é completo e


incompleto) determinado

Preceito Secundário: sanção penal (não Preceito Secundário: a pena é incompleta.


precisa de complementação). Ela que dependerá de complemento. O
complemento é SEMPRE
LEI/HOMOGÊNEA.

Ex: Lei 2889/56 – Lei de Genocidio, o


preceito secundário (sanção penal) está
incompleta.
OBS 2: A Normal Penal em Branco Heterogênea ou Própria é constitucional? Lei penal à
Norma (≠ Lei. Ex: Portaria). 1ª Corrente: A NPB Heterogenia impossibilita a discussão

77
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

amadurecida da sociedade a respeito do complemento. Fere o artigo 22, I da CF. É


inconstitucional (Rogério Greco, Paulo Queiroz). 2ª Corrente (STF, Nucci, Prado): A NPB
Heterogênea é constitucional. O Legislador cria um tipo como todos os seus requisitos
dados. A remissão ao executivo é absolutamente excepcional e necessário por razões de
técnica legislativo. O Executivo só esclarece o requisito do tipo.

OBS 3: Administrativização do Direito Penal: O excesso de normas penais em branco


heterólogas é chamado de “fenômeno da administrativização do Direito Penal”. A
massificação provoca uma mudança qualitativa: através das leis penais em branco o
legislador penal está renunciando a sua função programadora de criminalização primária,
assim transferida a funcionários e Órgãos do Poder Executivo, e incorrendo, ao mesmo
tempo, na abdicação da “cláusula da ultima ratio”, própria do Estado de Direito.

3 - Princípio da Culpabilidade: Funda-se na ideia de que cada um responde por seus atos,
pois a responsabilização penal é pessoal e subjetiva. Entendida como juízo de reprovação, a
culpabilidade somente é penalmente relevante quando o agente, por sua própria conduta,
tenha dado causa a um resultado criminoso. Assume três sentidos: (i) fundamento da pena;
(ii) elemento de medição da pena, sendo um limite para toda punição (dosimetria da
punição. A culpabilidade é o parâmetro para a pena, pois não pode ser superior ou inferior à
culpa do agente); (iii) obsta a responsabilidade objetiva. Modernamente, diz-se que não há
uma culpabilidade em si, mas uma culpabilidade em relação aos demais membros da
sociedade. Daí falar-se em princípio da exigibilidade social; em co-culpabilidade. A
culpabilidade também funciona também como elemento da estrutura analítica do crime.
Existem resquícios no nosso ordenamento da responsabilidade penal objetiva que são a
teoria da actio libera in causa e a rixa qualificada - todos os indivíduos envolvidos
respondem pelo resultado. Sobre a embriaguez, para Cirino, nos crimes culposos, a
embriaguez funciona com violação do dever objetivo de cuidado. Relativamente aos crimes
dolosos, é necessário demonstrar que o agente previu e assumiu o risco de produzir o
resultado quando se embriagou. Ressalta que a culpabilidade pressupõe um tipo de injusto
(princípio da legalidade), com seu objeto de referência. Somente a prática do injusto pode
sofrer reprovação criminal.

4 – Princípio da Intervenção Mínima: o Direito Penal não deve proteger qualquer bem
jurídico, mas, somente, aquele que se concebe como um bem jurídico penal cujos valores
são mais caros à sociedade e sem os quais esta não terá condições de permanecer como tal.
Ademais, só deve ser utilizado quando os demais ramos fracassarem nessa missão de
proteção (princípio da ultima ratio). Se divide em fragmentariedade, subsidiariedade e
exclusiva proteção do bem jurídico: Fragmentariedade – ao DP importa punir as infrações
mais graves praticadas aos bens jurídicos mais importantes. A insignificância decorre da
fragmentariedade. Subsidiariedade – o DP só vai ser utilizado quando os demais ramos do
Direito fracassarem STF (HC 88 452/RS) – não há o crime de desobediência quando o
descumprimento de ordem de servidor administrativo tiver sujeito à penalidade
administrativa – o STF mitigou a ideia de independência das esferas. Cuidado: essa
subsidiariedade é princípio, não se confunde com a subsidiariedade do soldado de reserva.
Esses princípios são reconhecidos pelo STF (RHC 89 624/RS). Exclusiva proteção do bem
jurídico: O DP é exclusivo para a tutela do bem jurídico principal (não é qualquer bem). No

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Brasil não prevalece a ideia de Jakobs, para quem a função do Direito Penal é garantir a
identidade social por meio da imposição de penas àqueles que violam a norma penal
(proteção da norma penal).

5 - Princípio da adequação social: Foi criado por Welzel, para o qual condutas
conformadas socialmente carecem de tipicidade material: apontador do jogo do bicho – a
sociedade já incorporou esse comportamento, só que ainda o fato é crime no nosso código
penal. A crítica reside na imprecisão do princípio. Discute-se se afasta a tipicidade ou a
antijuridicidade; Welzel, em sua última posição, defendeu tal princípio apenas como um
“princípio geral de interpretação”. INFORMATIVO 505 STJ (2012): O ato de vender ou
expor à venda CDs e DVDs falsificados é conduta formal e materialmente típica, estando
prevista no art. 184, § 2º, do Código Penal. Assim, não se pode alegar que tal conduta
deixou de ser crime por conta do princípio da adequação social.

6 - Princípio da insignificância – Não surge no Direito Romano, como defende alguns


autores, como Capez (para quem o pretor não cuidava do mínimo). A origem próxima é
com Roxin, em 1964. Os autores ensinam que após a 1ª e 2ª guerra, tivemos na Europa o
aumento da criminalidade de crimes bagatelares (pequenos furtos em razão do caos
econômico). Então, Roxin sistematizou as seguintes considerações: se ocorreu uma lesão
ínfima ao bem jurídico tutelado, carece o fato de relevância penal. Princípio aplicável
apenas no exame da tipicidade material, pois exige critério valorativo, axiológico.
Situação atual: admitido pela doutrina e aplicado pela jurisprudência (há um projeto de Lei
para incluí-lo como princípio).

Requisitos objetivos para aplicação do princípio da insignificância (também chamado


de Vetores): 1) mínima ofensividade da conduta do agente: se o agente é criminoso
habitual, não há insignificância. 2) ausência de periculosidade social da ação; 3) reduzido
grau de reprovabilidade do comportamento; 4) inexpressividade da lesão jurídica provocada
(deve ser considerado não apenas o valor econômico do bem, mas também o valor
sentimental do bem para a vítima). [Paulo Queiroz diz que não há diferença entre esses
requisitos, pois estão rodando em círculo. Nem a jurisprudência os diferencia quando os
aplica].

OBS 1: Maus antecedentes: Há divergência na doutrina quanto a esse ponto: no STJ há


decisões no sentido de que os antecedentes não impedem a aplicação do princípio, então a
existência de inquéritos ou ações penais em andamento não ensejam o reconhecimento de
maus antecedentes (é necessário trânsito em julgado da condenação), sob pena de ofensa ao
princípio da não culpabilidade. Já o STF entende que maus antecedentes podem ser
extraídos de processos em andamento, ou de inquéritos, desde que o Juiz fundamente. Mas
tanto para o STF, como para o STJ, não se considera apenas o valor da res para aplicar a
insignificância. Por exemplo, no STJ, a Ministra Laurita, recentemente, deixou de aplicar a
insignificância pelo fato de a vítima do furto em plena via pública ter 68 anos de idade e ser
analfabeta (REsp 835.553). Isto é, o princípio só não foi aplicado em razão das
características da vítima e das circunstâncias do crime.

OBS 2: Reincidência: 6ª Turma do STJ: pode aplicar o princípio, pois as circunstâncias


pessoas do agente não impede. 5ª Turma do STJ: reincidência, maus antecedentes e outras a
79
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ações penais em curso afastam a aplicação do princípio da insignificância. Aconselha-se


sustentar que não é possível aplicar o princípio da insignificância no caso de réu
reincidente.

OBS 3: Ato infracional: Tanto STJ quanto STF aplicam o princípio da insignificância ao
ato infracional.

OBS 4: Não confundir o princípio da insignificância com Irrelevância penal do fato (esse
princípio não é aplicado no STF, há um julgado apenas no STJ). Na Irrelevância penal do
fato, o fato foi típico, ilícito e culpável – mas se verifica que não há necessidade da pena
(analisado abaixo).

Atenção: O Princípio da Irrelevância Penal do Fato [que não se confunde com o da


insignificância] permite não aplicar pena quando não houver a sua necessidade. Esse
princípio está totalmente relacionado como funcionalismo do Roxin, no qual a
culpabilidade é responsabilidade mais necessidade de pena. Luiz Flávio Gomes (LFG) diz
que pode se aplicado em crimes menos graves, cujo agente não têm antecedentes e reparou
o dano – possibilidade de resolver o conflito de outra forma. No Brasil, não está
consolidado ainda, havendo apenas julgados escassos, como por exemplo, no TJ/MG.
Maurício Antônio Lopes traz esse princípio em sua obra. Entretanto, ao analisar a ideia do
caráter retributivo da pena, fica difícil aplicar a irrelevância penal do fato, porque a
retribuição é consequência necessária de uma conduta desvalorada, com disse Kant.
Portanto irrelevância penal do fato tem necessária relação com as ideias de prevenção
geral e especial positivas. O CP, art. 59, adotou a teoria mista.

OBS 5: LFG defende que o princípio da insignificância pode ser aplicado na fase policial,
porém, neste caso, haveria ofensa ao princípio da separação dos poderes, pois não haverá o
conhecimento dos órgãos subsequentes. O MP é o titular do direito de punir, quando ele
promove o arquivamento, submete ao juiz, que poderá valer-se do art. 28 do CPP caso
discorde. O delegado só deve fazer o juízo de legalidade (não é obrigado a instaurar
inquérito de fato atípico), devendo agir se fato for formalmente típico.

OBS 6: Insignificância e furto de pequeno valor: O princípio da insignificância não é


baseado apenas no pequeno valor patrimonial do bem. Além do valor econômico, devem
ser analisados os fatores que impedem a aplicação do princípio, quais sejam: o valor
sentimental do bem, as condições pessoais do agente, as circunstâncias do delito e as
consequências do delito. Diferenças: O fato insignificante gera atipicidade material, ou seja,
restringe o alcance do tipo. E o furto de pequeno valor? É o furto privilegiado (Art. 155 §
2º), no qual temos criminoso primário e objeto de pequeno valor (segundo a doutrina um
salário mínimo). Nele, o juiz tem várias opções, podendo inclusive condenar.

OBS 7: Trânsito em julgado: O princípio da insignificância pode ser reconhecido mesmo


após o trânsito em julgado [Toffoli, HC 95570, 2010].

Casuística:

a) crimes que não admitem: 1 - contra a Administração Pública (mas há julgado em

80
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

contrário no STF - Ex-prefeito condenado pela prática do crime previsto no art. 1º, II, do
Decreto-Lei 201/1967, por ter utilizado máquinas e caminhões de propriedade da Prefeitura
para efetuar terraplanagem no terreno de sua residência - HC 104286); 2 - previstos na Lei
n. 11.343/06 – dizer o contrário significaria autorizar, à margem da lei, o consumo de
entorpecentes em pequena quantidade (STF, HC 102940, j. 15.02.2011); Outra justificativa
é a de que é um crime de perigo abstrato contra a saúde pública, a incolumidade pública; 3 -
posse e droga em estabelecimento militar (STF, HC 94685, j. 11.11.2010 – entendimento
que prevalece hoje, pois já foi admitida a insignificância do fato); 4 - tráfico internacional
de armas de fogo (STF, 97.777, j. 26.10.2010); 5- falsificação de moeda (STF, HC 96153,
j. 26.05.2009). O STF (informativo nº 514) decidiu, em um caso em que o sujeito falsificou
dez cédulas de cinco reais, pela não aplicabilidade do Princípio da Insignificância, porque o
bem tutelado é a fé pública (a confiança depositada pela sociedade nos papéis públicos, que
corresponde à credibilidade no sistema financeiro - HC 93.251); 6 – Contrabando: o que
impede não está liga ao valor insignificante ou não, e sim o fato de ser um produto proibido
no território nacional; 7 – Estelionato contra o INSS, FGTS e seguro desemprego: é
considerado como elevado grau de reprovabilidade, pois a sua reiteração poderia
inviabilizar a previdência, o FGTS e a seguridade social; 8 – Violação de Direito autoral:
em que pese a aceitação popular da pirataria, não se admite a aplicação do princ. da
insignificância. AgRg no REsp 1380149, 2013; 9 – Crime militar: não se aplica, pois seria
afronta à hierarquia e disciplina; 10 – Lesão corporal: em julgado de 2012 o STJ negou a
aplicação do princípio da insignificância em lesão corporal no âmbito familiar; 11- Roubo:
Em julgado de 19/11/2013 o STF negou a aplicação do princípio ao crime de roubo por se
tratar de delito complexo que envolve patrimônio, grave ameaça e integridade física e
psicológica da vítima, havendo interesse estatal na persecução penal; 12 – Violação de
direito autoral: em julgado de 2013 para o STJ não se aplica o princípio da insignificância
para o caso de pirataria de CD e DVD, mesmo havendo certa tolerância por parte do poder
público em relação a tal prática, já que a “conduta causa sério prejuízos à indústria
fonográfica”, sendo conduta materialmente típica (pois é meus amigos, é o STF tutelando o
interesse dos capitalistas e pau no povo!!!).

STJ, 2014: Importar gasolina sem autorização é crime de contrabando: A gasolina, por ser
monopólio da União, somente pode ser importada se houver prévia e expressa autorização
da Agência Nacional de Petróleo (ANP), sendo concedida esta apenas aos produtores ou
importadores. Assim, a introdução de gasolina, por particulares, em território nacional, É
CONDUTA PROIBIDA, constituindo o crime de contrabando. Aplica-se o princípio da
insignificância? Não é aplicável o princípio da insignificância em relação à conduta de
importar gasolina sem autorização e sem o devido recolhimento de tributos. Isso porque
essa conduta tem adequação típica ao crime de contrabando, ao qual não se admite a
aplicação do princípio da insignificância. [STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 348.408-RR,
Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 18/2/2014].

Veja a diferença entre contrabando e descaminho:

81
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

b) crimes que admitem: 1 – Crime de descaminho e crimes contra a ordem tributária –


Enunciado 40 (2ª CCR-MPF): “A COFINS e o PIS/PASEP devem ser computados para
aferir insignificância dos delitos de descaminho nos termos do caput, do art. 20, da Lei
10.522/2002, mesmo que haja pena de perdimento dos bens”. Sobre o descaminho: em
regra, o STF e STJ aplicam o princípio da Insignificância, por causa do art. 20 da Lei
10.522/2002 que autoriza a Procuradoria da Fazenda a não executar débitos inferiores a R$
10.000,00 (informativo nº 516). Porém, a 2ª CCR não aplica tal princípio para o caso de
contrabando, independentemente do valor, porque são mercadorias proibidas no Brasil e
atingem outros bens que não a arrecadação pública (ex.: cigarros, máquinas caça-níqueis).
Se a Procuradoria da Fazenda não tem interesse no caso, significa que o Direito Penal não
pode reprimir essa conduta, já que este é a ultima ratio. Débito de R$ 100,00 até 10.000,00
é arquivado sem baixa na distribuição (ficam aguardando a incidência de juros para atingir
o valor e se tem outro débito posterior, este será somado - há interesse fiscal em
determinado momento). De R$ 100,00 para baixo é arquivado com baixa na distribuição.
Foi editada a portaria MF nº 75, de 22 de março de 2012, da Fazenda Nacional, pela qual
determinar-se a não inscrição na Dívida Ativa da União o débito de valor consolidado igual
ou inferior a R$ 1.000,00 (mil reais); e o não ajuizamento de execuções fiscais de débitos
com a Fazenda Nacional, cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$ 20.000,00
(vinte mil reais). OBS: esses valores são aplicados apenas para crimes federais. OBS: olhar
o Atenção abaixo sobre a Portaria. 2 - apropriação indébita previdenciária – STF: há
decisões negando a aplicação do princípio (HC 102550, j. 20.09.2011; HC 98021, j.
22.06.2010); há decisões do STF admitindo a sua aplicação caso o débito não supere o
valor previsto no art. 1º, I, da Lei 9.441/9, de 1.000 reais (HC 100004, j. 20.10.09; HC
107331, j. 11.03.11); - STJ: incide o princípio quando o valor do débito não ultrapassar
10.000 reais (AgRg no RESP 1242127, j. 14/06/2011). 3 – Crimes ambientais: STF
(HC112563-SC, 2012) e STJ (R:HC 35.122-RS, 2013) admitem, mas exigem criteriosa
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

apuração de seus requisitos, tendo em vista que o bem jurídico protegido é a natureza. 4 –
Flanelinha: em julgado de 2013 o STF aplicou o princípio da insignificância ao caso de
violação do artigo 47 da Lei de Contravenções Penais, pois o flanelinha trabalhava sem o
registro determinado pela Lei 6242/75, afirmando que se há algum ilícito é de ordem
administrativa e não penal, entendo que é caso de atipicidade material.

Atenção 1: No final de 2013 o STJ (5ª e 6ª Turmas) apreciaram o tema e decidiram que o
valor de R$20.000,00, estabelecido na Portaria MF 75/2012, NÃO PODE ser considerado
para efeitos penais, ou seja, não deve ser utilizado como novo patamar para o princípio da
insignificância nos crimes contra a ordem tributária ou para o crime de descaminho, pois o
limite de R$20.000,00 somente é aplicado quando não houver, nos autos, garantia, integral
ou parcial, útil à satisfação do crédito, assim ,se não houver garantia a execução de até
R$20.000,00 será arquivada, mas se houver, prosseguirá. Todavia, no tocante ao valor de
R$10.000,00 não existe tal condição, pois havendo ou não garantia, haverá o arquivamento
quando o valor for este.

Atenção 2: O STF não enfrentou o tema em 2013. PORÉM, já enfrentou o tema em 2014 e
entendeu que se aplica o valor de R$20.000,00 previsto na Portaria MF como patamar para
a aplicação do princípio da insignificância nos crimes contra a ordem tributária.

Quadro resumo da divergência:

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Atenção: Para o STF o novo limite pode ser aplicado para fatos que aconteceram ANTES
da referida Portaria por ser norma mais benéfica para o réu.

c) crimes em que há divergência: 1) Crimes cometidos por prefeitos: STF: é possível.


Aplicou o princípio em julgado de 2011 a ex-prefeito que usou trator da prefeitura para
planar seu terreno. STJ: não é possível. Não aplicou em julgado de 2010, pois se exige do
prefeito em razão da condição que ostenta a conduta pauta na ética e na moral, não havendo
espaço para desvios. 2) Porte de drogas para consumo pessoal: STF: possui um precedente
de 2012 aplicando. STJ: possui forte entendimento, com precedente inclusive em 2013, no
sentido de que o crime de posse de drogas para consumo pessoal é crime de perigo abstrato
e presumido, não se aplicando o princípio. 3) Apropriação indébita previdenciária: STF: em
julgado de 2013 afirmou que o bem jurídico tutelado é a subsistência da previdência social,
não sendo possível aplicar o princípio a condutas que lhe causem prejuízo. STJ: tem
entendimento firmado, inclusive com julgados em 2013, de que é possível aplicar o
princípio da insignificância ao delito de apropriação indébita previdenciária desde que o
valor não ultrapasse os R$10.000,00. 4) Manter rádio comunitária clandestina: STF:
permite em casos excepcionais, desde que a rádio clandestina opere em baixa frequência e
longe dos grandes centros. STJ: é firme no entendimento de que não se aplica.

DECISÃO STJ (INFO 506, 2012): I – Não é possível a aplicação do princípio da


insignificância ao furto praticado mediante escalada (art. 155, § 4º, II, do CP). II – O
simples fato de o réu ter restituído os bens furtados à vítima NÃO SERVE como
justificativa, por si só, para aplicar o princípio da insignificância, especialmente se o valor
do objeto tem expressividade econômica. III – No crime de furto, não se pode confundir
“valor insignificante” (que gera aplicação do princípio da insignificância) com “pequeno
valor” (que proporciona apenas a redução da pena).

7 - Princípio da ofensividade: Para que se tipifique algum crime, em sentido material, é


indispensável que haja um dano ou perigo de dano a um bem jurídico penalmente
protegido. 2 funções: (i) político-criminal – serve de orientação à atividade legiferante; (ii)
interpretativa – o interprete deve encontrar no caso concreto a ofensa ao bem jurídico.
Diferença para o p. da exclusiva proteção de bens jurídicos: pelo p. da ofensividade só se
admite a configuração do delito quando o interesse já selecionado pelo tipo sofre uma
ofensa efetiva; pelo p. da exclusiva proteção de bens jurídicos, há uma limitação aos
interesses que podem receber a tutela do Direito Penal. Em decorrência, para alguns, os
crimes de perigo abstrato são inconstitucionais. Todavia, o CP está cheio de crimes de
perigo abstrato. E o STJ e STF (este com alguns precedentes em contrário - HC 97 511,
datado de 09/06/2009, 1ª Turma) aceitam esse tipo de crime, como o caso de posse de arma
de fogo desmuniciada. LFG discorda, entendendo-o inconstitucional. No geral, parece ser
esse um argumento a mais que é inserido na decisão para justificar a absolvição do autor do
fato em razão de outras circunstâncias que não propriamente tratar-se de um crime de
perigo abstrato. Ainda não há jurisprudência tranquila a respeito, mas tem prevalecido o
entendimento pela legitimidade da criminalização do porte de arma desmuniciada (STF, HC
104410 – 2012 e HC 103539, 17.4.2012).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

8 – Lesividade: É aquele segundo o qual somente pode ser considerada merecedora de


tutela penal, a conduta que seja apta a expor à risco ou causar dano a bem jurídico
penalmente relevante. Assim, veda-se o estabelecimento de delitos que sejam mera
infrações de obrigações ou deveres, o que significaria excessivo intervenção estatal.
Entende também que só pode haver crime quando a conduta ofender um bem jurídico de
terceiro. Para Cirino (2007), no seu aspecto qualitativo, o princípio da lesividade impede a
criminalização primária ou secundária redutora de liberdades constitucionais, tais como o
pensamento, a liberdade religioso, política, convicções políticas e filosóficas. No aspecto
quantitativo, se aproxima da noção de ofensividade, levando em consideração o grau ou
relevância da lesão ao bem protegido. Por este princípio, não haverá crime pela autolesão
(não se pune a autolesão). Portanto: Amputar seu próprio braço não é crime, mas é
estelionato se o fizer para receber o seguro (aqui o bem jurídico é o patrimônio da
seguradora, e não a integridade física do agente). E o uso de drogas? STJ e STF não
aceitam essa tese da autolesão. O bem jurídico não é a integridade física do usuário, mas a
saúde pública como um todo. Em contrário, a Suprema Corte da Argentina.

9 - Materialização do fato: Não se pode punir pensamento, opinião e o modo de vida de


uma pessoa. Tem que punir é o fato praticado pela pessoa. Esse princípio não é acolhido
pelo direito penal do inimigo, tal qual idealizado por Jakobs. Luiz Flávio Gomes ao
exemplificar uma violação a este princípio da materialização do fato, disse que não se pode
punir as condutas dos arts. 59 e 60 da Lei de Contravenções Penais (vadiagem e
mendicância). A mendicância foi revogada, a vadiagem não. Punir a vadiagem é punir o
sujeito pelo que ele é, e não pelo que ele fez. Contudo, há doutrina que defende que esses
artigos estão em sintonia coma a CF/88.

EXTRA:

STJ, 2013: É típica a conduta do acusado que, no momento da prisão em flagrante, atribui
para si a falsa identidade, ainda que em alegada situação de defesa. Logo, o princípio da
autodefesa não alcança aquele que se atribui falsa identidade.

PRINCÍPIOS DE DIREITO PENAL REFERENTES À APLICAÇÃO DA PENA

10 – Princípio da Humanidade ou da Humanização da Pena: Não podemos aplicar


penas que possam causar lesões físicas e psicológicas. Mas vejam que é impossível não
atingir a constituição psicológica do agente. Tem como raiz o Princípio da Dignidade da
Pessoa Humana. Por isso são proibidas as penas cruéis e as desumanas. Além disso, o
Brasil é signatário de tratados e convenções internacionais que proíbem esse tipo de pena.
Temos ainda a Lei 9.455, que trata do crime de tortura. Além disso, prevalece que o
condenado não pode cumprir pena mais grave em razão da falta de estrutura do Estado.
OBS: Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), art. 52 da LEP: quando foi implementado,
muitos diziam que seria declarado inconstitucional (que ofenderia o princípio da
humanidade). Mas, após a onda de crimes perpetrados pelo PCC em São Paulo, chegou-se à

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

conclusão de que isso é necessário. A lei permite que o preso permaneça no RDD por até
360 dias. Para Nucci, o RDD é constitucional, desde que ouvido o MP. O Diretor do
presídio somente pode aplicar a segregação por até dez dias. Trata-se aqui de uma
ponderação de princípios, devendo o RDD ser utilizado em situações drásticas.

11 - Princípio da responsabilidade pessoal ou Intranscendência: Para Cirino (2007), o


objeto da responsabilidade penal é o tipo de injusto, e seu fundamento, a culpabilidade.
Significa que a pena se restringe ao autor do fato, ao condenado, não pode alcançar seus
sucessores, pais, mães, e ninguém pode cumprir a pena no lugar do condenado. Cuidado.
Essa advertência serve para a pena privativa de liberdade, e para as penas privativas (só o
condenado pode cumpri-la). É admitido o pagamento de prestação pecuniária e de multa
por terceiros. A morte extingue apenas a pena de multa. No caso da perda de bens e
valores, como é consequência automática da sentença, no momento em que é prolatada, não
se considera seja ela estendida a seus sucessores – Ver art. 5º. A obrigação de reparar o dano
tem natureza cível. Ferrajoli diz que as penas pecuniárias e a de multa deveriam ser
abolidas, já que um terceiro pode pagá-la. Se o condenado não paga a multa converte em
pena de prisão? Não. Há um julgado no STJ admitindo a conversão em favor do réu, para
fins de detração. Com base nesse princípio, Cirino considera inconstitucional a punição
criminal das pessoas jurídicas: responsabilidade penal limita-se “aos seres humanos de
carne e osso”.

12 – Princípio da Proporcionalidade: Proporcionalidade (ou razoabilidade) significa


adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, mas o seu conteúdo básico
no direito penal é a proibição do excesso (princípio do devido processo legal material em
seu aspecto negativo) e a proibição da proteção deficiente (princípio do devido processo
legal material em seu aspecto positivo). Vale para o legislador e julgador. HC 92.525/1-RJ
STF. Celso de Melo disse que é inconstitucional a pena da receptação qualificada. O
princípio da proibição de insuficiência ou da idoneidade impõe ao Poder Público um
dever de efetiva proteção dos bens jurídicos penalmente relevantes. Exemplo: abuso de
autoridade: pena máxima de seis meses. Esta pena é desproporcional para o crime de abuso
de autoridade, porque acaba gerando impunidade. Outros exemplos: RE 418376 (j.
09.02.2006) e ADIN 3112 (j. 26.10.2007). O direito penal é a forma mais importante e
rigorosa de proteger os bens jurídicos e direitos fundamentais, não podendo o Estado
permanecer inerte nesta tarefa (decisão da Corte Interamericana no caso Damião Ximenes).
Para Cirino, na criação de tipos criminais há de serem observadas as possibilidades de
realidade (adequação e necessidade) e as possibilidades jurídicas (proporcionalidade em
sentido estrito). A pena criminal é um meio adequado e necessário para proteger o bem?
Consideradas suas consequências, a pena cominada é proporcional em relação à natureza e
extensão da lesão abstrata/concreta do bem jurídico? A proporcionalidade abstrata limita a
dita criminalização primária. A concreta limita a criminalização secundária, em relação
à aplicação e execução da pena criminal: custos sociais e à família do condenado que são
ocasionados pela imposição da pena criminal. Esse princípio se relaciona com o da
suficiência das penas: O art. 59 impõe que o juiz fixe uma quantidade de pena suficiente
para prevenir e reprovar o crime. Art. 44, III do CP: a substituição de pena deve ser
suficiente para prevenção e reprovação do crime. Há violação deste princípio se o julgador
não fixar uma pena suficiente para prevenção e retribuição da pena. Nucci diz que o juiz

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

deve fundamentar mesmo a aplicação da pena mínima.

13 – Vedação da dupla punição pelo mesmo fato ou ne bis in idem: ninguém pode ser
processado ou punido duas vezes pelo mesmo fato. Há discussão quanto à reincidência; o
STF entendeu em 2013 que é constitucional. A súmula 241 do STJ. O julgador não pode
considerar o motivo torpe como agravante se o júri condenou o réu por homicídio
qualificado pelo motivo torpe.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

4.b. Causas extintivas da punibilidade


Obras consultadas: Santo Graal 27. Código Penal Comentado. Rogério Greco (2011).
Direito Penal Parte Geral. Juarez Cirino dos Santos (2007). A moderna teoria do fato
punível. Juarez Cirino dos Santos (2007). Tratado de Direito Penal, Parte Geral. C. Roberto
Bitencourt (2011). Súmulas do STF comentadas. Roberval Rocha Ferreira Filho e outro
(2011). Código Penal para concursos. Rogério Sanches Cunha (2011). Nilo Batista.
Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro – Editora Revan, 2011.

Legislação básica: arts. 107 a 120 do CP. Art. 168, §2º. Art. 312, §3º. Art. 337-A, §1º. art.
5°, XLV da CF. Art. 2°, I Lei 8.072/90 e 1°, § 6° Lei 9.455/97. Lei 9.807/99. Art. 121, § 5°
e 129, § 8°do CP. Art. 140 § 1º, do CP. Art. 180, § 5°. Art. 29 da Lei 9.605/98.

Modificação legislativa: Lei 12.650/2012 acrescenta o inciso V ao art. 111 do CP: nos
crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes, previstos neste Código ou em
legislação especial, da data em que a vítima completar 18 (dezoito) anos, salvo se a esse
tempo já houver sido proposta a ação penal.

1. Conceito: Punibilidade é a consequência natural da prática do crime, na qual nasce para


o Estado o direito de satisfazer a pretensão de punição do agente. Para os defensores da
teoria quadripartite, a punibilidade seria elemento do crime, entretanto, essa posição é
minoritária.

A punibilidade se divide em dois aspectos: 1) pretensão punitiva: é o direito de o Estado


obter um provimento jurisdicional, reconhecendo a precedência da pretensão e condenando
o réu ao cumprimento de uma sanção penal; e 2) pretensão executória: nasce com o trânsito
em julgado, pela conversão da pretensão punitiva. [com o trânsito em julgado a pretensão
punitiva se transforma em pretensão executória].

OBS 1: Podemos executar a pena privativa de liberdade sem o trânsito em julgado? É


possível a execução provisória da pena privativa de liberdade mesmo sem o trânsito em
julgado, desde que benéfica ao réu e fundamentada as razões da custódia cautelar.

OBS 2: Podemos executar a pena restritiva de direitos sem o trânsito em julgado? Em caso
de substituição por pena restritiva de direitos não cabe a execução provisória da pena,
conforme art. 147 da LEP. [Atenção: para o STF cabe]. ATENÇÃO na OBS 2: O STF
admite execução provisória de pena restritiva de direitos quando o recurso defensivo não
tiver efeito suspensivo e evidenciada a intenção de impedir o trânsito em julgado.

2. Escusas absolutórias [causas negativas de punibilidade]: Escusas absolutórias são


condições pessoais negativas de punibilidade, ou seja, causas pessoais de exclusão da pena.
São incomunicáveis, segundo art. 30 do CP. [Art. 30 - Não se comunicam as circunstâncias
e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime]. O art. 181 do CP
prevê as escusas absolutórias nos crimes patrimoniais. [Art. 181 - É isento de pena quem

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo: I - do cônjuge, na


constância da sociedade conjugal; [+ companheiro] II - de ascendente ou descendente, seja
o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural]. Fazendo analogia in bonam
partem, o companheiro também se considera beneficiário da escusa, qualquer que seja a
estrutura da entidade familiar. ATENÇÃO: escusa absolutória é causa impeditiva ou
negativa de punibilidade. NÃO é causa de extinção de culpabilidade. É fato típico, ilícito e
culpável, mas não punível. Não haverá persecução penal. Não pode ser iniciada a ação
penal por ausência de justa causa.

Exceção na escusa absolutória: Há ressalvas no art. 183 do CP. Art. 183 - Não se aplica o
disposto nos dois artigos anteriores: I - se o crime é de roubo ou de extorsão, ou, em geral,
quando haja emprego de grave ameaça ou violência à pessoa; II - ao estranho que participa
do crime. III - se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a 60
(sessenta) anos. (Incluído pela Lei nº 10.741, de 2003).

Outro caso de escusa absolutória: O favorecimento pessoal, previsto no art. 348, §2º do CP,
também é reconhecido pela doutrina majoritária como escusa absolutória. [Art. 348 -
Auxiliar a subtrair-se à ação de autoridade pública autor de crime a que é cominada pena de
reclusão: Pena - detenção, de um a seis meses, e multa. § 1º - Se ao crime não é cominada
pena de reclusão: Pena - detenção, de quinze dias a três meses, e multa. § 2º - Se quem
presta o auxílio é ascendente, descendente, cônjuge ou irmão do criminoso, fica isento de
pena]. Orientação minoritária afirma que o artigo 348 se trata de inexigibilidade de conduta
diversa, excluindo a culpabilidade.

3. Extinção da punibilidade: As causas de extinção da punibilidade implicam renúncia,


pelo Estado, do exercício do direito de punir, seja pela não imposição de uma pena, ou pela
não execução/interrupção do cumprimento daquela. O artigo 107 do CP traz elenco de
causas extintivas da punibilidade em rol não taxativo.

Art. 107 - Extingue-se a punibilidade: I - pela morte do agente; II - pela anistia, graça ou
indulto; III - pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso; IV -
pela prescrição, decadência ou perempção; V - pela renúncia do direito de queixa ou pelo
perdão aceito, nos crimes de ação privada; VI - pela retratação do agente, nos casos em que
a lei a admite; IX - pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei. OBS): os pontos
sublinhados já foram abordados no item 5A (LEI PENAL NO TEMPO) e 5B
(PRESCRIÇÃO).

Rol exemplificativo: As causas extintivas encontram-se em diversos outros dispositivos,


tal como o ressarcimento do dano anterior à sentença irrecorrível no peculato culposo (Art.
312, § 3°), a restitutio in integrum no delito de subtração de incapazes (art. 249, § 2° -
perdão judicial), o pagamento de tributo ou contribuição antes do recebimento da denúncia
nos delitos definidos pela lei 8.137/90 (art. 34, Lei 9.249/95) e o laudo de constatação de
reparação do dano ambiental (art. 28, I, Lei 9.605/98). Reconhecida pelo juiz a extinção da
punibilidade, em qualquer fase do processo, cumpre-lhe declará-la de ofício. Havendo
requerimento das partes, o pedido será atuado em apartado (art. 61 do CPP). Indeferido o
pedido de reconhecimento da extinção da punibilidade, caberá Recurso em Sentido
Estrito (Art. 581, IX, do CPP). Crimes conexos: art. 108 CP.
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

4. Causas extintivas da punibilidade:

a) morte do agente: (art. 5°, XLV da CF) na esfera penal, não tem qualquer efeito a morte
presumida, admitida pelo direito civil (art. 6° do CC). A morte do ofendido acarreta a
extinção da punibilidade nos crimes de ação penal privada personalíssima. OBS 1:
Intranscendência da pena ≠ efeitos da condenação contra os sucessores: A obrigação de
reparar o dano não é pena e sim efeito da condenação (artigo 91, CP). A morte do
condenado não impediria a obrigação de reparar o dano, que seria executada contra os
sucessores. A segunda parte do inciso trata da decretação do perdimento de bens. O
perdimento de bens também pode ser um efeito da condenação (artigo 91, II, b CP). Porém,
o perdimento de bens também pode ser pena (artigo 43, II, CP c/c artigo 45, § 3º, CP).
Então, o princípio da intranscendência da pena tem como ressalva apenas os efeitos da
condenação ou também tem ressalva quanto à pena de perda de bens? Duas correntes: Há
quem entenda que o princípio da intranscendência da pena só traz ressalvas quantos aos
efeitos da condenação. Sendo assim, a pena de perda de bens e valores não alcançaria os
sucessores do condenado falecido [nenhuma pena passa para os sucessores, mas efeitos da
condenação sim. Então não existe ressalva ao princípio, pois ele estabelece que o que não
passa é pena]. Em sentido contrário, há quem entenda que o legislador permitiu uma
exceção ao princípio da intranscendência no que toca a referida pena. OBS 2: A pena de
multa transcende? Inicialmente, cabe ressalvar que a pena de multa não paga jamais poderá
ser convertida em privativa de liberdade. [o artigo 85 da lei dos juizados foi tacitamente
revogado]. Morreu o condenado, pode executar a pena de multa contra os sucessores? À luz
do art. 51 do CP, há doutrina no sentido de que a pena de multa pode ser executada contra
os sucessores, pois é dívida de valor. [isso violaria a intranscendência, pois é uma pena, não
obstante ser dívida de valor]. Em sentido contrário, sustenta-se que a pena de multa não
poderia ser objeto de transcendência, pois não há ressalta no texto constitucional. Não há
corrente majoritária, é tema polêmico, se cair será em discursiva. OBS 3: Necessidade da
certidão de óbito e sua falsidade: O art. 62 c/c art. 155, parágrafo único do CPP preveem o
que se segue. Art. 62. No caso de morte do acusado, o juiz somente à vista da certidão de
óbito, e depois de ouvido o Ministério Público, declarará extinta a punibilidade. Art. 155,
[...] Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições
estabelecidas na lei civil. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008). A certidão de óbito
extingue a punibilidade, mas, a ausência do réu, não, pois se segue o processo com a revelia
do acusado. [ausente aqui se refere ao lá do Código Civil, que precede a morte presumida].
Se comprovada a falsidade da certidão de óbito, como será feito com o trânsito em julgado
da sentença? Há duas correntes. [prova discursiva coloca as duas correntes, prova objetiva
adotar a do STF] [a falsidade da certidão é o ponto que mais cai em prova] A primeira
corrente afirma que não existe revisão em favor da sociedade, se comprovada a falsidade da
certidão, o que resta ao Estado é processar o autor pela falsidade. Para essa corrente, a
sentença que declara extinta a punibilidade é terminativa de mérito em sentido amplo e faz
coisa julgada. Em sentido contrário, a jurisprudência dos tribunais superiores afirma que se
revoga a decisão que declarou extinta a punibilidade fundamentada em documento
comprovadamente falso [o STF diz que deve ser revogada, não diz anulada]. Portanto, não
faz coisa julgada em sentido estrito porque o réu estaria se beneficiando de um fato ilícito e
o ato judicial fundou-se em fato juridicamente inexistente, não produzindo qualquer efeito.
O STJ entende que seria decisão interlocutória que não faz coisa julgada. A consequência é

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

que a ação penal retoma seu curso desde que não tenha ocorrido a prescrição, sem prejuízo
da persecução do falso.

b) anistia, graça e indulto:

Anistia: Própria ou imprópria: a anistia pode ser própria, quando concedida antes da
condenação, atingindo seus efeitos penais e extrapenais (ex: maus antecedentes,
reincidência) ou imprópria, se concedida após a prolação da sentença (nesse caso ocorrerá
algo semelhante à abolitio criminis, mas sem supressão da figura criminosa), mas não
atingirá os efeitos penais e extrapenais [logo, a diferença entre elas está nos efeitos].
Condicionada ou incondicionada: Não pode a anistia incondicionada ser recusada pelo
beneficiário, fato que não ocorre na anistia condicionada e, uma vez concedida, é
irrevogável. Geral ou parcial: Na anistia geral, todas as pessoas que praticaram determinado
fato são alcançadas. Na anistia parcial, somente determinadas pessoas, exemplo, somente
os não reincidentes. Restrita ou irrestrita quanto aos fatos: A anistia restrita se vincula
somente a determinados fatos, ex: aplicável somente a crimes militares. Na anistia irrestrita,
todos os fatos relacionados ao fato principal são incluídos. Anistia e delitos especiais e
crimes comuns: No geral, a anistia é concedida para delitos especiais, ex: crimes militares,
políticos, eleitorais. Mas, nada impede que a anistia seja concedida para crimes comuns.
Impossibilidade de anistia para TTT e crimes hediondos e equiparados: Os crimes
hediondos e equiparados não admitem concessão de anistia, graça ou indulto (art. 5° XLIII
CF; 2°, I Lei 8.072/90 e 1°, § 6° Lei 9.455/97).

Graça e indulto: também são manifestação da clemência soberana e extinguem a pena.


Então, o pressuposto é a sentença transitada em julgado. Extinguem a pretensão executória.
Nesse sentido, não afastam os efeitos da condenação, nem penais, nem extrapenais,
extinguindo apenas a execução da pena. Na visão do STF: graça é gênero e indulto é
espécie. O indulto é uma graça coletiva. A graça é individual. [Macete: Graça é nome de
pessoa, então é individual]. O art.188 da LEP não faz diferença e chama a graça de indulto
individual, vejamos: Art. 188. O indulto individual poderá ser provocado por petição do
condenado, por iniciativa do Ministério Público, do Conselho Penitenciário, ou da
autoridade administrativa. Competência: O art. 84, XII da CRFB trata da competência para
concessão de indulto. Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: [...] XII
- conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em
lei; [...] Parágrafo único. O Presidente da República poderá delegar as atribuições
mencionadas nos incisos VI, XII e XXV, primeira parte, aos Ministros de Estado, ao
Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União, que observarão os limites
traçados nas respectivas delegações. DICA: Graça: pode ser concedida por provocação.
Indulto: é competência privativa do Presidente da República. Comutação: A comutação
equivale a um indulto parcial, é um desconto de pena que não extingue a punibilidade. [se
combinado com outros benefícios pode levar à extinção da pena, como uma remissão mais
uma comutação sendo suficiente para extinguir a pena]. Pode conceder indulto para crimes
hediondos? O artigo 2º da lei de crimes hediondo proíbe a concessão de indulto para crimes
hediondos e equiparados. Há divergência quanto à constitucionalidade do dispositivo.
Parcela minoritária da doutrina sustenta a inconstitucionalidade da lei de crimes hediondos
no artigo 2º, pois o legislador ordinário foi além da vedação constitucional, que veda

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

apenas graça e anistia. [como comutação é tipo de indulto, ou seja, um indulto parcial,
também seria inconstitucional proibi-lo]. O STF entende não ser inconstitucional a lei de
crimes hediondos, pois graça é gênero e indulto é espécie. Se o constituinte vedou o gênero,
vedou também a espécie. [como comutação é tipo de indulto, ou seja, um indulto parcial,
também estaria proibido concedê-lo]. INFORMATIVO 502 STJ (2012): Não é possível a
concessão de indulto a réu condenado por tráfico ilícito de drogas, ainda que tenha sido
aplicada a causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06.

Comparação: De se ver que a anistia extingue os efeitos penais da condenação, o que não
ocorre nas hipóteses de graça ou indulto. De igual modo, a anistia pode ser concedida a
qualquer tempo, enquanto a graça e o indulto supõe o trânsito em julgado.

c) Abolitio criminis: supressão do tipo criminal. Se ocorrer a abolitio criminis antes do


trânsito em julgado: não há efeitos penais nem extrapenais. [Extingue a pretensão punitiva e
qualquer efeito de uma sentença penal condenatória, penais e extrapenais]. Se depois do
trânsito em julgado: extinguem a execução da pena e os efeitos penais [reincidência e maus
antecedentes], mas permanecem os efeitos extrapenais. Atenção: Observar a possibilidade
de continuidade normativo-típica nos casos de revogação da norma penal;

d) Renúncia: é ato pré-processual, unilateral e irretratável. Manifesta o desinteresse de


exercer o direito de queixa, que sé pode ocorrer em crimes de ação penal de exclusiva
iniciativa privada e antes desta ser iniciada. Após o recebimento da queixa, não há que se
falar em renúncia, porquanto já exercida, mas apenas em outras duas causas de extinção da
punibilidade, ex: o perdão do ofendido ou a perempção. A renúncia pode ser expressa
(declaração escrita), tácita (pratica de ato incompatível com a vontade de exercer a queixa)
e presumida (hipótese criada pela Lei 9.099/95, onde a homologação da composição dos
danos acarreta renúncia ao direito de queixa ou representação para os delitos sob o
JECRIM). A renúncia em relação a um dos autores do crime se estende a todos os outros.
Porém, havendo dois ofendidos, a renúncia de um deles não implica a do outro, em razão
do princípio da indivisibilidade da ação penal privada. Desistência da queixa crime antes de
recebida equivale à renúncia. OBS 1: retratação da representação ≠ renúncia: A retratação
da representação na ação penal pública condicionada a representação não se confunde com
a renúncia. A retratação pode ser feita antes do oferecimento da denúncia. Na Lei Maria da
Penha, a retratação só é admitida perante o juízo, em audiência firmada com tal finalidade,
conforme art. 16 da lei 11340. É possível a retratação da retratação da representação se
ainda estiver dentro do prazo decadencial. OBS 2: A renúncia para um dos envolvidos,
estende-se aos demais, visto o princípio da indivisibilidade da ação privada, segundo art. 48
e 49 do CPP. OBS 3: O MP deve requerer a intimação do querelante para aditar a queixa, e
não sendo feito o aditamento no prazo determinado, sua omissão é interpretada como
renúncia tácita.

e) Decadência: é a perda do direito de queixa ou representação em face da inércia de seu


titular durante o prazo legalmente previsto (Masson, p. 870). É causa de extinção da
punibilidade. Atinge tanto a ação penal privada, como a pública condicionada à
representação. Prazo: Em regra, o prazo decadência é de 06 meses, contado do
conhecimento inequívoco da autoria ou se for uma ação penal privada subsidiária da
pública, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia. A contagem
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

possui índole penal. O prazo é preclusivo e improrrogável, não se submetendo a incidência


de causas de interrupção e suspensão. No caso de crime continuado, o prazo é contado
separadamente para cada delito parcelar (aquele que compõe a série da continuidade
delitiva). A decadência do direito do ofendido não afeta o do representante legal, e vice-
versa, contados da data em que vierem a conhecer a autoria delitiva (Súmula 594 STF).
OBS: conforme início do artigo 38 há prazos específicos de decadência. Ex: artigo 529,
CPP que estabelece um prazo decadencial especial de 30 dias da homologação do laudo
para a queixa. [aplica-se nos crimes contra a propriedade industrial e imaterial da lei
9279/96, a qual sempre cai em prova federal].

f) Perempção: é a perda do direito de ação pela desídia processual do querelante na ação


penal privada originária (art. 107, IV, do CP). Justifica-se pelo fato de a lei exigir
comportamento permanente ativo do querelante, esperando deste observância rigorosa dos
prazos e procedimentos legais, na medida em que a imputação penal em juízo é suficiente
para atingir o estado de dignidade do cidadão. As hipóteses que ensejam a perempção são
previstas pelo artigo 60, incisos I a IV, do CPP em um rol taxativo. E se o querelante pedir a
absolvição do réu? Em uma interpretação é caso de perempção, pois se pediu absolvição é
por que não pediu condenação. Mas para o réu o que é melhor? Uma sentença de extinção
da ação por perempção ou uma sentença de mérito por absolvição? É melhor a absolvição.
Então o juiz deve dar uma sentença de mérito. Não é aplicável na ação penal privada
subsidiária da pública em nenhuma hipótese, pois, o art. 29 do CPP afirma que o MP pode
retomar a ação a qualquer tempo.

g) Perdão do ofendido: É causa de extinção da punibilidade. é ato bilateral (depende da


aceitação do querelado), que consiste na desistência do querelante de prosseguir na ação
penal de exclusiva iniciativa privada, sendo incabível na subsidiária da pública, sob pena de
autorizar sua retomada pelo MP. Ato informal, tendo lugar tanto extraprocessual como
processualmente. Mais de um réu: Como garantia da indivisibilidade, o perdão concedido a
um dos querelados estender-se-á aos demais. Exceção à indivisibilidade: se um dos
querelados não aceitar o perdão oferecido, seguirá a ação só contra este. Até o trânsito em
julgado da condenação, o perdão pode ser concedido (art. 106, §2º, do CP). Mais de uma
vítima: caso haja mais de um querelante, o perdão dado por um deles não prejudica o
direito dos outros de prosseguir com a ação penal, mantida a indivisibilidade, se houver
mais de um querelado. O perdão não se confunde com a renúncia, pois: 1) o perdão opera
na fase processual, enquanto a renúncia limita-se a fase pré-processual; 2) o perdão é ato
bilateral. Concedido o perdão, o querelado terá três dias para dizer se aceita ou não. Em
todo o caso, não havendo aceitação pelo réu, poderá ocorrer perempção; a renúncia é ato
unilateral, ou seja, independe de aceitação. Limite: Até que momento pode ser dado o
perdão? O momento para a concessão do perdão, nos termos do art. 106, §2º do CP será até
o trânsito em julgado da sentença condenatória, pois o ofendido é titular do ius persequendi.
O Estado é titular do ius puniendi, que poderá exercê-la após a consolidação da pretensão
executória. OBS: O art. 41 da Lei Maria da Penha assevera que não se aplica a regra dos
Juizados Especiais para as situações de violência doméstica. Outra peculiaridade da Lei
11.340/06 consiste na natureza incondicionada da ação penal pública por lesão praticada
contra mulher no ambiente doméstico, conforme entendimento do STF na ADI 4424.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

h) Perdão judicial: É possível que o magistrado, diante de determinadas circunstâncias


legalmente previstas, deixe de aplicar a sanção penal. Trata-se de direito subjetivo do réu,
e não de mera faculdade judicial. O perdão opera-se independentemente de aceitação, sendo
concedido na própria sentença ou acórdão. Discute-se na doutrina o caráter/natureza
jurídica da sentença penal que concede o perdão. Há quatro posições: 1) a sentença possui
natureza condenatória (Magalhães Noronha, Mirabete, Damásio); 2) trata-se de decisão
absolutória; 3) é decisão que extingue facultativamente a punibilidade; 4) é declaratória da
extinção da punibilidade. Esta última posição foi expressamente adotada no Brasil súmula
18 do STJ, que impõe não subsistir qualquer efeito condenatório desta decisão. Em igual
sentido dispõe o art. 120 do CP. São exemplos, previstas em lei, de cabimento de perdão
judicial: i) Delação premiada: Lei 9.807/99 estabelece uma hipótese de perdão judicial em
seu art. 13. Segundo Prado (2008: 654), basta o atendimento de uma das circunstâncias dos
incisos deste artigo para que o agente obtenha o benefício. Se ausente um desses requisitos
objetivos, poderá o condenado beneficiar-se de causa de diminuição de pena prevista no art.
14 da lei acima mencionada. O STJ afirma que a Lei de proteção à testemunha é a regra
geral do instituto da delação premiada, devendo seus requisitos serem aplicados em
qualquer caso, ex: no tráfico de drogas. Art. 159, [...] § 4º - Se o crime é cometido em
concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do
sequestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços.  então, mesmo a letra da lei do
tráfico não prevendo o perdão judicial, os requisitos da lei de proteção à testemunha devem
ser observados e se for o caso o juiz pode aplicar o perdão judicial. Portanto, o perdão
judicial no caso de delação premiada pode ser aplicado em qualquer caso em que haja
previsão de delação premiada se presentes os requisitos da lei de proteção à testemunha. ii)
Homicídio culposos e lesão corporal culposa: quando as consequências da infração
atinjam o próprio agente de forma muito grave, tornando a sanção desnecessária (art. 121, §
5° e art. 129, § 8°do CP); iii) Nos crimes de injúria: O juiz pode deixar de aplicar a pena: I
- quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria; II - no caso de
retorsão imediata, que consista em outra injúria (art. 140 § 1º, do CP); iv) No crime de
receptação: em sua modalidade prevista no § 3° do art. 180; v) No crime de subtração de
incapaz: art. 249 § 2º; vi) Na lei de crimes ambientais: (Lei 9.605/98): art. 29, § 2º. No
caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode
o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena; vii) Perdão judicial em
crime culposo de trânsito: há duas correntes. Para uma primeira orientação, partindo de
uma interpretação taxativa, não se admite o perdão nos crimes de trânsito, baseado em três
argumentos: i) não há previsão expressa no CTB e o rol em que cabe perdão judicial é
taxativo aos casos previstos em lei; ii) todo o instituto benéfico deve ser interpretado
restritivamente; iii) o Presidente da República vetou o art. 300, que continha expressa
previsão; iv) o art. 291, caput do CTB diz que aos crimes de trânsito aplicam-se
subsidiariamente às normas gerais do CP e CPP [o perdão está na parte especial do CP e só
se aplica subsidiariamente a parte geral do CP]. A orientação majoritária e favorável,
acolhida pela jurisprudência, aplica por analogia o perdão, pois a razão do veto do art. 300
indicava que o instituto é tratado de forma mais abrangente pelo CP. Pode-se também
aplicar o instituto do perdão judicial aos crimes culposos na direção de veículo automotor
com base na analogia in bonan partem, pois onde há a mesma razão, deve-se aplicar o
mesmo direito, além de uma questão de equidade.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

i) Pagamento ou parcelamento de Tributos: Art. 168 – A, § 2o. Art. 337 – A, d Código


Penal. Lei nº 9.249/95. Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei nº
8.137/90, e na Lei nº 4.729/65, quando o agente promover o pagamento do tributo ou
contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia. Por certo, a
regra do § 2º, do art. 9º, da Lei n.º 10.684/2003 por ser mais benéfica, no que tange ao
pagamento como causa de extinção da punibilidade, que as anteriores, previstas na lei nº
9249/95 e no artigo 168-A § 2º, passou a regulamentar integralmente a matéria com a
persistência apenas da hipótese prevista no § 1º, do art. 337-A, que por não se vincular ao
pagamento, com suficiência da confissão do débito e fornecimento de informações antes do
início da ação fiscal não sofreu revogação. A tranquilidade da matéria começou a ser
alterada com a edição da lei n.º 11.941/2009, que no art. 69 tratou da questão com a
seguinte redação: “Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no art. 68 quando a
pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos
de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de
concessão de parcelamento”. O art. 68 da Lei nº 11.941/2009 trata da mesma matéria
regrada pelo caput do artigo 9.º, da Lei nº 10.684/2003, o que fez o STF julgar prejudicada
a ADI nº 3002, intentada pelo PGR, ao fundamento de que o art. 68 da nova legislação
tacitamente revogou o 9.º da anterior. A indagação que se manteve foi se, para fins penais, a
regra do § 2º, do artigo 9º, da lei nº 10.684/2003 também foi revogada pela entrada em
vigor da lei nº 11.941/2009, alterando-se, assim o quadro das causas extintivas da
punibilidade pelo pagamento que sofreriam uma retração, pois o art. 69 deferiu a
possibilidade extintiva da punibilidade pelo pagamento apenas às hipóteses submetidas à
anterior parcelamento, já tendo sido revogadas as disposições da lei nº 9249/95 e do artigo
168-A, § 2.º, conforme acima analisado. Persistiriam, nessa ótica, apenas a extinção da
punibilidade pelo pagamento ao débito anteriormente parcelado e mesmo sem pagamento
na regulamentação do § 1º, do artigo 337-A, do Código Penal. Ocorre que melhor
interpretação passou a ser construída no sentido de que o artigo 69, da lei n.º 11.941/2009,
não revogou o § 2º, do artigo 9º, da lei nº 10.684/2003, porque tratou de situação diversa, o
que não implica, portanto, em revogação da lei mais antiga pela mais recente, dependendo
de revogação expressa, o que não correu (Luiz Flávio Gomes). O diferencial está
justamente no fato de que aquela lei vincula-se aos débitos que tenha sido objeto de anterior
parcelamento, enquanto esta se aplica a todos, mesmo que não submetidos ao regime de
parcelamento, sendo, portanto, hipótese mais ampla. Como se vê, é fundamental distinguir
o pagamento direto (sem parcelamento) do pagamento antecedido de parcelamento.
Atualmente, a Lei nº 12.382/2011 disciplina temática da extinção da punibilidade pelo
pagamento (antecedido de parcelamento). Há, assim, duas situações distintas: pagamento
direto (regido pela Lei 10.684/2003 - pode-se dar a qualquer tempo) e pagamento mediante
parcelamento (agora disciplinado na Lei 12.382/11). Ambos os pagamentos extinguem a
punibilidade nos crimes tributários, mas suas características são completamente distintas.
Obs.: CTN, art. 156: para Hugo de Brito Machado todas essas situações implicam a
extinção da punibilidade.

Descaminho: Por outro lado, nunca houve previsão específica de causa extintiva da
punibilidade para o delito de descaminho, embora consolidado o entendimento de que
constitui crime tributário, razão porque se impôs a aplicação da mais regra benéfica, ou
seja, a prevista na lei nº 9.249/95 (art. 34). Persiste a regra especial do artigo 337-A, § 1º,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

do CP. Obs.: STJ decidiu recentemente que não há justa causa para a ação penal quanto ao
crime de descaminho quando o crédito tributário não está devidamente constituído (RHC
31.368-PR, j. 8/5/2012).

j) Prescrição: verificar ponto 5, “b”, do resumo.

k) Retratação: A retratação é o ato pelo qual o sujeito retifica uma declaração


anteriormente realizada. Ela extingue a punibilidade nos casos em que a lei admite. Ela
deve ser cabal, não existe retratação parcial. Seu objetivo é minimizar o dano decorrente do
comportamento do agente. Ex 1: O crime do art. 143 do CP permite ao querelado, que antes
da sentença (vide art. 389 do CPP), retrate-se cabalmente da calúnia ou da difamação,
ficando isento de pena. Isso porque, na calúnia e na difamação existe uma imputação de
fatos, sendo que no primeiro há uma imputação falsa de fatos definidos como crime e, no
segundo, somente fatos ofensivos à reputação da vítima. Não será cabível retratação na
injúria, porque não há a imputação de qualquer fato. OBS do Ex 1: até quando cabe a
retratação? A retratação tem que ser feita antes da sentença, ou seja, antes da publicação da
sentença. O momento da publicação da sentença está previsto no artigo 389, CPP. Ex 2:
Nos crimes envolvendo a honra de funcionário público (calúnia, injúria e difamação) é
possível a retratação desde que o próprio ofendido tenha ajuizado a ação, conforme súmula
714 do STF. OBS do EX 2: observe que de acordo com a súmula a legitimidade é
concorrente. Isso não influencia em nada a retratação, a qual pode ser feita na ação privada
(queixa) ou na ação penal pública condicionada à representação. Isso porque o artigo 143,
CP permite a retratação antes da sentença independente de qualidade especial da vítima. Ex
3: Retratação no crime de falso testemunho (art. 342, §2º do CP). O fato deixa de ser
punível se antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, o agente se retrata. [a
retratação tem que ser antes da sentença no processo originário em que ocorreu o ilícito do
falso testemunho]. OBS do Ex 3: lembre-se, nessa retratação o fato deixa de ser punível,
então a retratação se aproveita a todos os co-réus. Nos outros casos de retratação ela
aproveita apenas a quem a fez. [isso foi visto no concurso de pessoas].

l) Artigo 108, CP: Art. 108 - A extinção da punibilidade de crime que é pressuposto,
elemento constitutivo ou circunstância agravante de outro não se estende a este. // Nos
crimes conexos, a extinção da punibilidade de um deles não impede, quanto aos outros, a
agravação da pena resultante da conexão. 1ª parte: A extinção da punibilidade de crime que
é pressuposto, elemento constitutivo ou circunstância agravante de outro não se estende a
este Ex de crime pressuposto: crime de lavagem de capitais. Para que haja a lavagem há
crime anterior que gerou o dinheiro para ser lavado. Não era necessário a disposição da lei
de lavagem, pois o artigo 108 já estabelece que a extinção da punibilidade do crime
pressuposto não se estende ao crime posterior. Uma ressalva é o perdão judicial. 2ª parte:
Nos crimes conexos, a extinção da punibilidade de um deles não impede, quanto aos outros,
a agravação da pena resultante da conexão.

m) Artigo 118, CP: Rehabilitação: Art. 119 - No caso de concurso de crimes, a extinção da
punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente. Ex: pratica o 168-A, CP 10
vezes em uma continuidade delitiva do artigo 71, CP. A pena base foi de 2 anos,
acrescentada da metade pela causa de aumento de ser crime continuado, indo a pena para 3
anos. A sentença, porém, leva 4 anos e 1 mês após o recebimento da peça acusatória para
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ser proferida e o MP não recorre, ocorrendo o trânsito em julgado para a acusação. Então o
crime prescreveu ou não? Para a pena de 3 anos a prescrição prevista no CP é de 8 anos, já
para a pena de 2 anos o CP prevê uma prescrição de 4 anos. Então, como o artigo 119, CP
determina que no caso do concurso de crimes haverá a análise isolada de cada crime para
aferir a extinção da punibilidade, o crime prescreveu, pois deve ser considerada a pena de 2
anos para se aferir o tempo da prescrição da pretensão punitiva (prescrição retroativa).
Então, o juiz tem que declarar extinta a punibilidade por causa da prescrição. Reforçando a
conclusão, existe a súmula 497, STF: SÚMULA Nº 497: QUANDO SE TRATAR DE
CRIME CONTINUADO, A PRESCRIÇÃO REGULA-SE PELA PENA IMPOSTA NA
SENTENÇA, NÃO SE COMPUTANDO O ACRÉSCIMO DECORRENTE DA
CONTINUAÇÃO. OBS: O artigo 119, CP se aplica também para o concurso formal e para
o concurso material.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

4.c. Crimes contra a inviolabilidade do domicílio, de


correspondência, dos segredos e de interceptação de
comunicações.
Principais obras consultadas: Santo Graal 27º. Luiz Regis Prado e Vitor Eduardo Rios
Gonçalves (Sinopse Saraiva).

Legislação básica: arts. 150 a 154 do CP.

1. Violação de domicílio: (art. 150) Aumenta-se a pena de um terço, se o fato é cometido


por funcionário público (conceito do art. 327) que não seja autoridade (se for autoridade,
será crime do art. 3º, b, da 4.898/65 - Art. 3º. Constitui abuso de autoridade qualquer
atentado: (...)b) à inviolabilidade do domicílio), fora dos casos legais, ou com
inobservância das formalidades estabelecidas em lei, ou com abuso do poder (somente pode
abusar quem tem poder para tanto, excedendo-se; ex: oficial de justiça que fica na casa
mais tempo que o necessário contra a vontade do morador). Não constitui crime a entrada
ou permanência em casa alheia ou em suas dependências durante o dia, com observância
das formalidades legais, para efetuar prisão ou outra diligência e a qualquer hora do dia ou
da noite, quando algum crime está sendo ali praticado ou na iminência de o ser, o que vem
ao encontro da CF: art. 5º, XI: A casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela
podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou
desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial. Conceito
de casa é amplo: qualquer compartimento habitado; aposento ocupado de habitação
coletiva; compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade.
Casa vazia habitada entra no conceito. Quem entra em casa vazia à venda não pratica o
crime, pois não há intimidade a ser violada. Bem jurídico tutelado: liberdade privada.
Sujeito ativo: crime comum, eis que pode ser praticado por qualquer pessoa. Podem
praticá-lo: locador (proprietário-possuidor indireto) em face do locatário (possuidor direto).
Sujeito passivo: morador, não necessariamente o proprietário. Podem ser vítimas: república
de estudantes (habitação coletiva), ocupante de quarto de hotel/motel, ocupante de trailer
(motor home), se veículo estiver parado e servindo de casa; se em movimento (trânsito),
não há a proteção domiciliar (tema controvertido). Residência com família e pais: os pais
são os titulares do direito de proibição, pois os filhos lhe são subordinados. Residência com
comunidade residente: também há subordinação. Ex: pensionato, colégio, convento,
mosteiro. Pais, reitor, pároco, diretor serão os sujeitos passivos. Na ausência deles, o direito
passa aos subordinados. Mesmo no regime de subordinação, os dependentes ou
subordinados têm direito sobre suas dependências exclusivas (quarto da freira dentro do
convento). Numa família, os titulares do direito de exclusão ou admissão são marido e
mulher. Filhos também têm direito de admitir terceiros nas dependências. Pai pode entrar
no quarto do filho e não haverá crime se for contra a vontade dele. Patrão tem direito de
entrar no quarto da empregada doméstica. Regime de igualdade: república de estudantes,
todos os moradores são titulares de admitir e excluir alguém, assim como marido e mulher
vivem em regime de igualdade. Tipo objetivo: entrar ou permanecer na casa alheia ou

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

dependências sem anuência. Casa alheia desabitada: é atípico. Casa alheia ausentes os
moradores: há crime, pois é habitada. Escritório ou local de trabalho de advogado segue Lei
8.906/94: Presentes indícios de autoria e materialidade da prática de crime por parte de
advogado, a autoridade judiciária competente poderá decretar a quebra da inviolabilidade
de que trata o inciso II do caput deste artigo, em decisão motivada, expedindo mandado de
busca e apreensão, específico e pormenorizado, a ser cumprido na presença de
representante da OAB, sendo, em qualquer hipótese, vedada a utilização dos documentos,
das mídias e dos objetos pertencentes a clientes do advogado averiguado, bem como dos
demais instrumentos de trabalho que contenham informações sobre clientes. (Incluído pela
Lei nº 11.767, de 2008) § 7o A ressalva constante do § 6o deste artigo não se estende a
clientes do advogado averiguado que estejam sendo formalmente investigados como seus
partícipes ou coautores pela prática do mesmo crime que deu causa à quebra da
inviolabilidade.

2. Violação de correspondência: (art. 151) Para Bittencourt, o caput do art. 151 e seu §1º
estão revogados pelo art. 40 da lei 6.538/78 (disciplina os serviços postais), que mantém o
preceito primário do caput (devassar indevidamente o conteúdo de correspondência
fechada, dirigida a outrem). Rogério Greco vai mais além e sustenta que todo o artigo está
revogado. Assim, a análise passa a ser do art. 40 da Lei 6.538/78 (devassar, indevidamente,
o conteúdo de correspondência fechada dirigida a outrem -detenção de 06 meses ou multa
de 20 dias-multa). Devassar é tomar conhecimento total ou parcial do conteúdo, ainda que
não rompa o envelope. O §1º do art. 40 prescreve que incorre nas mesmas penas quem se
apossa indevidamente de correspondência alheia, embora não fechada, para sonegá-la ou
destruí-la, no todo ou em parte; trata-se de um crime formal neste caso, com fim especial
de agir. Os incisos II e III do §1º do art. 151 tratavam de divulgação, transmissão a outrem,
utilização ou impedimento de comunicação telegráfica ou radioelétrica ou conversação
telefônica, o que restou, pelo menos na parte tocante à divulgação de conversa telefônica,
revogado pela Lei de Interceptação (9.296/96). Greco insiste que todo o art. 151 foi
revogado. Interceptação de correspondência de preso: Bittencourt afirma que todas as
autorizações legais relativas à inviolabilidade do sigilo de correspondência de presos são
inconstitucionais. Todavia, a doutrina e jurisprudência majoritárias (como cita Greco) são
favoráveis à quebra do sigilo da correspondência de presos ao argumento de que não
existem direitos absolutos, em nome da ordem pública. Excepcionalmente será possível à
administração penitenciária interceptar carta de presidiário sem autorização judicial, uma
vez que sigilo não pode salvaguardar práticas ilícitas (HC 70.815-5 SP, Celso de Melo).
Violação de correspondência entre marido e mulher: Greco e Nelson Hungria afirmam que
não há crime, pois há comunhão de vida. Damásio de Jesus lembra ser permitido ao curador
abrir carta endereçada ao doente mental e ao pai abrir a endereçada ao filho menor, pois,
embora este tenha direito à intimidade, tal direito não é absoluto, podendo ser violada a
carta sempre que verificada a existência de qualquer risco para o menor. Para que haja
crime, é necessário que a abertura da correspondência se dê de forma indevida (elemento
normativo do tipo), de modo que o consentimento do destinatário exclui a tipicidade.
Entendesse que, entre marido e mulher existe consentimento tácito quando se trata de
correspondência bancária ou comercial, presunção esta que cede quando se demonstra que
havia orientação expressa para que o cônjuge não abrisse a correspondência endereçada ao
outro. Tampouco existe tal presunção quando se trata de carta enviada por amigo ou

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

parente.

O tipo penal em análise se refere à correspondência fechada, não abrangendo o


conhecimento indevido de teor de correio eletrônico. Em relação a este, a violação constitui
crime especial previsto no art. 10 da Lei n. 9.296/96, que pune com reclusão, de dois a
quatro anos, e multa, quem realiza interceptação de comunicação telefônica, de informática
ou telemática. Quando a violação da correspondência constituir meio para a prática de
crime mais grave, ficará por este absorvida. Ex.: para descobrir segredos da vítima e depois
extorqui-la. (Caso Carolina Dieckmann). Pode ser qualquer pessoa. Trata-se de crime
comum. Se for cometido por funcionário público no desempenho das funções, a pena será
agravada nos termos do art. 43 da Lei n. 6.538/78, que, quanto a este aspecto, derrogou o
art. 3º, c, da Lei n. 4.898/65 (abuso de autoridade).

Art. 151, §1º: Se a correspondência tem valor econômico, a subtração constitui furto, e a
destruição crime de dano. Consumação: Ocorre no instante que o agente se apodera da
correspondência, sendo, portanto, crime formal, pois dispensa, para fim de consumação,
que o agente consiga sonegar ou destruir a correspondência. Essa conclusão decorre do
texto legal.

Art. 151, § 1º, II: (Violação de comunicação telegráfica, radioelétrica ou telefônica) As


condutas típicas são: a) divulgar — relatar o conteúdo a (várias) outras pessoas (para uma
só é atípico); b) transmitir — narrar o conteúdo à pessoa determinada; c) utilizar — usar
para qualquer fim. O delito somente se aperfeiçoa quando a divulgação ou transmissão são
feitas de forma indevida (elemento normativo) ou quando a utilização é feita de forma
abusiva. Em relação a conversações telefônicas, o tipo penal ainda pode ser aplicado para
quem, por exemplo, ouve conversa alheia em extensão telefônica e divulga seu conteúdo.
Atualmente, entretanto, constitui crime, bem mais gravemente apenado (reclusão, de dois a
quatro anos, e multa) “realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática
ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não
autorizados em lei”. Esse crime está descrito no art. 10, da Lei n. 9.296/96, para a qual o
agente comente o delito, independentemente da futura divulgação do conteúdo. Além disso,
como as gravações feitas de forma autorizada devem ser mantidas em sigilo, nos termos do
art. 8º da Lei n. 9.296/96, quem tomar conhecimento de seu conteúdo e der divulgação
cometerá também o delito, em sua parte final. Ex.: funcionário de Distrito Policial que
passa o conteúdo das gravações a órgãos da imprensa.

Correspondência comercial (art. 152): abusar da condição de sócio ou empregado de


estabelecimento comercial ou industrial para, no todo ou em parte, desviar, sonegar,
subtrair ou suprimir correspondência, ou revelar a estranho seu conteúdo: somente se
procede mediante representação.

3. Divulgação de segredo (art. 153): divulgar alguém, sem justa causa, conteúdo de
documento particular ou de correspondência confidencial, de que é destinatário ou detentor,
e cuja divulgação possa produzir dano a outrem; neste caso, somente se procede mediante
representação. O tipo penal em análise, portanto, diz respeito apenas ao segredo escrito. Se
não houver um segredo ou se não existir a potencialidade de provocar dano, a divulgação é
atípica. Assim, a divulgação de segredo que lhe foi confidenciado oralmente não constitui
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

crime, salvo se constituir violação de sigilo decorrente de dever profissional (art. 154) —
sacerdote que ouve confissão e a divulga — ou crime contra a honra — moça que conta em
segredo para uma amiga que teve relação sexual com dois homens ao mesmo tempo e esta
conta o que ouviu para inúmeras pessoas, cometendo, assim, crime de difamação. A
divulgação de segredo contido em documento público pode, eventualmente, caracterizar
crime de violação de sigilo funcional, quando praticado por funcionário público (art. 325).
Sujeito ativo: Somente o destinatário ou o detentor do documento particular ou de
correspondência confidencial pode cometer o presente crime. O destinatário sempre terá a
posse legítima do documento, indevidamente divulgando o seu conteúdo. O detentor, antes
de divulgar o conteúdo do documento ou correspondência, precisa violá-lo (art. 15 1 do
CP). Tal conduta pretérita ficará absorvida pelo crime do art. 153 do CP. Cumpre dizer que
o tipo não diferencia o detentor possuidor legítimo ou ilegítimo, ambos incorrendo no
mesmo crime. Sujeito passivo: pode ser o destinatário ou terceira pessoa interessada na
conservação do segredo. Consumação: No momento da divulgação do segredo,
independentemente da produção de qualquer dano. Trata-se, pois, de crime formal. Justa
causa: É imprescindível que a divulgação se dê sem justa causa (contrária ao direito).
Havendo justa causa para a divulgação de segredo, o fato é atípico.

Art. 153, § 1º-A: (Divulgar, sem justa causa, informações sigilosas ou reservadas, assim
definidas em lei, contidas ou não nos sistemas de informação ou banco de dados da
Administração Pública). Essa modalidade qualificada foi introduzida no Código Penal pela
Lei n. 9.983/2000 e se refere a outro tipo de informação sigilosa ou reservada, ou seja,
aquelas que sejam assim definidas expressamente em lei. Trata-se, pois, de norma penal em
branco a ser complementada por outras leis. A conduta típica é a mesma da modalidade
simples, divulgar sem justa causa.

Divulgação de informações sigilosas da Administração Pública (§ 1°-A): Trata-se de crime


comum, figurando como vítima o Estado. Não exige, para a consumação do crime, que a
indevida divulgação do segredo possa causar dano a outrem, bastando a sua mera
revelação.

Violação do segredo profissional (art. 154): revelar alguém, sem justa causa, segredo, de
que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa
produzir dano a outrem. Crime é sujeito à representação. Não se confunde com o crime do
art. 325 (violação de sigilo profissional: Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo
e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação), crime praticado por
funcionário público contra a administração pública em geral. Exige-se vínculo entre o
agente do crime e a vítima, de modo que o segredo tenha sido revelado por alguém que o
soube pela vítima em razão do ofício. Ex: tutor, curador. Ofício abrange serviços manuais
ou mecânicos (empregadas domésticas). Tem que existir potencialidade lesiva, sob pena de
vir a ser mero crime contra a honra (difamação, por exemplo). É crime formal (consuma-se
com a revelação), instantâneo, próprio quanto ao sujeito ativo, comum quanto ao passivo.
Excepcionalmente cabe a tentativa, se conduta for plurissubsistente. Se o agente toma
conhecimento do segredo em razão de função pública, a revelação constitui crime especial
previsto no art. 325 do Código Penal.

4. Contra a interceptação de comunicações: Art. 10. Constitui crime realizar


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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar


segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei. O
BEM JURÍDICO tutelado é a intimidade, bem como o bom andamento dos serviços
judiciários. Quanto SUJEITO ATIVO dos delitos há certa controvérsia. Damásio de Jesus,
Vicente Greco Filho, Fernando Capez (2006), Luiz Flávio Gomes e Ada Pelegrini Grinover
entendem que o crime de divulgar material que era segredo de justiça é crime próprio.
Damásio: Na primeira parte da norma incriminadora, que descreve a interceptação,
qualquer pessoa pode ser sujeito ativo (crime comum). Na segunda figura típica, que define
a quebra de segredo, o delito é próprio, só podendo ser cometido por quem tem obrigação
de guardar sigilo: Juiz de Direito, Promotor de Justiça, Delegado de Polícia, defensor,
agente da concessionária de serviço público, escrivão ou escrevente (art. 7 desta lei). Nesse
caso, o crime do art. 10 absorve o delito de violação de sigilo funcional (Código Penal, art.
325). JP Baltazar também entende que se trata de uma forma especial de violação de
segredo de justiça que afasta a incidência do tipo do art. 325 do CP. (Crimes Federais. p.
690). Solitariamente, Nucci (2008, p. 736) entende que qualquer pessoa pode invadir um
ofício judicial, coletar o apenso onde se encontram os dados coletados pela interceptação e
deles tomar conhecimento, divulgando-os a terceiro. Parece que a melhor doutrina é a do
professor da PUC-SP, que os dois crimes são comuns, apesar de em regra, o de divulgação
de matéria que está segredada, ser crime próprio àqueles que trabalham junto ao Judiciário.
O TIPO OBJETIVO é realizar a interceptação, ou seja, levar a efeito, efetivar, implementar
a interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática ou, ainda, revelar
o seu conteúdo. Também será criminosa a interceptação autorizada mediante introdução em
erro do magistrado, por exemplo, mediante introdução, entre os números-alvo da
investigação, de outro que não digam respeito ao fato, assim como a interceptação, a
pretexto de se realizar a investigação criminal, é utilizada com fins de espionagem
industrial ou de investigação privada. O TIPO SUBJETIVO é o dolo, não se exigindo
especial fim de agir. A CONSUMAÇÃO se dá com a interceptação, independente se há
gravação, divulgação ou aproveitamento. (Fonte: JP Baltazar. Crimes Federais).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

5.a. Lei penal no tempo


Principais obras consultadas: Santo Graal 27; Queiroz, Paulo. 9ªed.; BITENCOURT,
Cezar Roberto. Tratado de Direito penal: parte geral, volume 1, 10 ed. - São Paulo: Saraiva,
2006. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 10 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008.
GRECO, Rogério. Resumos Gráficos de Direito Penal. Parte Geral. 2 ed. Rio de Janeiro:
Impetus, 2012. MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado. 6.ed. São Paulo: Método,
2012.

Legislação Básica: artigos 2º, 3º e 4º do Código Penal.

Em regra, a lei penal aplica-se aos fatos ocorridos no período da sua vigência (“tempus
regit actum”). Uma lei vigora até ser revogada por outra. É o princípio da continuidade das
leis. A lei penal, todavia, depois de revogada, poderá continuar a regular fatos, desde que
para beneficiar o réu, o que se denomina extra-atividade. Esta possui espécies: a
retroatividade e a ultra atividade.

Princípios aplicáveis: a) irretroatividade da lei penal: corolário dos princípios da


legalidade e da anterioridade da lei penal (art. 1º do CP e 5º, XXXIX, CF); b) retroatividade
da lei mais benigna, os quais se encontram assentados na CF/88.

Hipóteses de conflitos de leis penais no tempo: Art. 2º - Ninguém pode ser punido por
fato que lei posterior deixa de considerar crime (lei abolicionista), cessando em virtude
dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. Parágrafo único - A lei
posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda
que decididos por sentença condenatória transitada em julgado

a) “Lex mitior”: a.1) Abolitio criminis: hipótese em que o legislador deixa de incriminar
determinada conduta. A lei nova, então, retroage para alcançar fatos praticados sob a égide
de outra lei (art. 2º, parágrafo único, CP), inclusive aqueles já definitivamente julgados,
fazendo desaparecer todos os efeitos penais, permanecendo apenas os civis. É uma causa
extintiva de punibilidade (art. 107, III, CP). OBS: Não se confunde com o princípio da
continuidade normativo-típica: caso em que a conduta proibida migra para outro tipo penal.
É a atipicidade relativa, tendo ocorrido com a conduta de raptar mulher honesta (que passou
a ser sequestro qualificado – art. 148, §1º, V, do CP). Atenção: A Lei 10.826/2003 (Estatuto
do Desarmamento) trouxe um caso de “abolitio criminis” temporária em seus art. 30 e art.
32 em relação aos possuidores de arma não registradas. Nesse caso, a atipicidade da
conduta somente ocorre durante o período em que a Lei assinala, não retroagindo efeitos
para o tipo penal previsto anteriormente (art. 16 da Lei nº 10.826/2003). STF, HC 90995,
Inf. 494. OBS: “Vacatio legis” indireta: De acordo com Rogério Greco é a hipótese em que
a lei, além do seu normal período de “vacatio legis”, prevê em seu próprio corpo outro
prazo para que determinados dispositivos possam ter aplicação, a exemplo do que ocorreu
com o art. 30 da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003 (Estatuto do Desarmamento);
a.2) Novatio legis in mellius: lei nova, sem descriminalizar a conduta, é mais favorável ao

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

réu. A lei nova retroage mesmo que já haja sentença condenatória em fase de execução,
permanecendo apenas os efeitos civis da decisão transitada em julgado (arts. 91 e 92, CP).

b) “Lex gravior”: b.1) novatio legis incriminadora: lei nova considera crime fato até então
não incriminado. A lei nova não retroage. A lei revogada possui ultra-atividade; b.2)
novatio legis in pejus: lei posterior que de qualquer modo agravar a situação do sujeito não
retroagirá. Atenção: Súmula 711/STF: a lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado
ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da
permanência. Para Bittencourt (2006, p. 207), toda lei penal, seja de natureza processual ou
material, que, de alguma forma, amplie as garantias de liberdade do indivíduo, reduza as
proibições e, por extensão, as consequências negativas do crime, seja ampliando o campo
da licitude penal, seja abolindo tipos penais, seja refletindo nas excludentes de
criminalidade ou mesmo nas dirimentes de culpabilidade, é considerada lei mais benigna.

OBS: Durante a sua vacatio legis, a lex mitior já pode ser aplicada aos fatos ocorridos
nesses período? Divergência doutrinária: Sim - Bittencourt (p. 210) e Hungria (1949,
p.119); não – Masson (2011, p. 115).

Competência para aplicar a lei penal mais benéfica: a) na fase do inquérito e até a
prolação da sentença - juiz de 1º grau; b) fase recursal – Tribunal; c) fase executória, com
decisão transitada em julgado – juízo da vara das execuções penais. Atenção: Súmula 611-
STF Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a
aplicação de lei mais benigna.

Lei intermediária: hipótese em que a lei a ser aplicada não seja nem aquela vigente à
época dos fatos, tampouco aquela em vigor quando da prolação da sentença. (Greco, pag.
112). Quando favorável ao réu, deve ser aplicada (STF, RE 418876, j. 30.03.04).

Conjugação/combinação de leis penais (lex tertia): Hungria refutava a hipótese, sob pena
de transformar o julgador em legislador. É a teoria da ponderação unitária que considera a
lei em sua totalidade, aplicando-se uma ou outra. F. Marques defende a combinação ao
argumento de que o julgador está apenas “movimentando-se dentro dos quadros legais” em
obediência ao princípio da equidade. A teoria da ponderação diferenciada consiste em
analisar cada disposição de cada lei, combinando-as em benefício do réu.

OBS 1: Lex tertia à É possível a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art.
33, § 4º, da Lei 11.343/2006 sobre condenações fixadas com base no art. 12, caput, da Lei
6.368/76? O STF possui a compreensão da impossibilidade de mesclar duas leis distintas,
sob pena de usurpação de poderes por parte do Judiciário, investindo o julgador em órgão
legiferante, pois se estará criando uma terceira lei. A seguir, um precedente em que se
encontra esposada a tese: PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE
ENTORPECENTES (ART. 12 DA LEI N. 6.368/76). PRETENSÃO DE INCIDÊNCIA
RETROATIVA DA MINORANTE PREVISTA NO § 4º DO ART. 33 DALEI N. 11.343/06
SOBRE A PENA COMINADA NO ART. 12 DA LEI 6.368/76 (ART. 5º, INC. XL, DA
CONSTITITUIÇÃO FEDERAL). IMPOSSIBILIDADE DE MESCLAR PARTES
FAVORÁVEIS DE LEIS CONTRAPOSTAS NO TEMPO, SOB PENA DE SE CRIAR,
PELA VIA DA INTERPRETAÇÃO, UM TERCEIRO SISTEMA (LEX TERTIA).

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USURPAÇÃO DE FUNÇÃO LEGISLATIVA. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA


SEPARAÇÃO DOS PODERES. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA LEI EM SUA
INTEGRALIDADE, COM O QUE RESTA ATENDIDO O PRINCÍPIO DA RETROAÇÃO
DA LEI BENÉFICA. CONCESSÃO DA ORDEM, EM PARTE, PELO STJ PARA QUE O
TJ/RS EXAMINASSE O CASO CONCRETO E APLICASSE, EM SUA
INTEGRALIDADE, A LEI MAIS FAVORÁVEL. MINORANTE DA LEI N. 11.343/2006
NEGADA PELA CORTE ESTADUAL EM RAZÃO DE O PACIENTE OSTENTAR
MAUS ANTECEDENTES, EMERGINDO FAVORÁVEL A FIXAÇÃO DA PENA
COMINADA NA LEI N. 6.368/76. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. 1.
A minorante do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 não incide sobre a pena cominada no
art. 12 da Lei n. 6.368, posto não ser possível mesclar partes favoráveis de normas
contrapostas no tempo para criar-se um terceiro sistema (lex tertia) pela via da
interpretação, sob pena de usurpação da função do Poder Legislativo e, em consequência,
de violação do princípio da separação dos poderes. 2. A aplicação da lei mais favorável,
vale dizer a Lei n. 6.368/76, sem a minorante do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06, ou a
novel Lei de Entorpecentes, com a minorante do § 4º de seu art. 33, atende ao princípio da
retroatividade da lei benéfica, prevista no art. 5º, inc. XL, da Constituição Federal, desde
que aplicada em sua integralidade. 3. In casu, o acórdão impugnado, perfilando o
entendimento acima, concedeu parcialmente a ordem para determinar ao TJ/RS que
verificasse qual a lei mais favorável, a Lei n. 6.368/76, vigente à época dos fatos, ou a Lei
n. 11.343/06, com a minorante prevista no § 4º de seu art. 33, sendo certo que a Corte
estadual entendeu inaplicável a minorante da novel Lei de Entorpecentes sob o fundamento
de que o paciente não preenche os requisitos exigidos, porquanto ostenta maus
antecedentes, emergindo mais benéfica a Lei n. 6.368/76, cuja pena mínima cominada é de
3 (três) anos, contrastando com a pena de 5 (cinco) anos cominada no art. 33 da Lei da Lei
n. 11.343/06. 4. Deveras, o § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 estabelece que “Nos
delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um
sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente
seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre
organização criminosa”, a evidenciar o acerto da decisão do Tribunal de Justiça ao negar a
aplicação da referida minorante, face à circunstância de que o paciente ostenta maus
antecedentes. Por isso a pertinente anotação do Ministério Público Federal de que “diante
dos registros de maus antecedentes do paciente, que cumpre pena de 30 (trinta) anos de
reclusão, pela prática dos delitos de furto, estupro e tráfico de drogas, a aplicação do art. 33
da Lei 11343/06 na integralidade lhe seria desfavorável, uma vez que incabível a minorante
do § 4º do art. 33 da referida lei”. 5. Ausência de constrangimento ilegal. 6. Ordem
denegada. (STF, 1º. Turma, HC 107583 / MG -Relator(a): Min. LUIZ FUX. Julgamento:
17/04/2012. Publicação: DJe-107 DIVULG 31-05-2012 PUBLIC 01-06-2012). No STJ, o
tema foi definido no sentido da impossibilidade da conjugação (Emb.Div. no RESP
1.094.499/MG). Entendimento defendido pelo MPF: impossibilidade de combinação, sob
pena de se formar uma 3ª lei. O CP Militar proíbe (art. 2, § 2º). Julgamento recente: “Frisou
que a Constituição disporia apenas que a lei penal deveria retroagir para beneficiar o réu,
mas não faria menção sobre a incidência do postulado para autorizar que algumas partes de
diversas leis pudessem ser aplicadas separadamente para favorecer o acusado”. RE
600817/MS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 7.11.2013. (RE-600817) [Informativo 727 de
nov. 2013]

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

OBS 2: no caso de sucessão de leis, se o Magistrado não conseguir identificar qual é a mais
benéfica para o réu, deve-se lembrar da lição de Nelson Hungria, segundo a qual deverá ser
ouvido o réu.

Leis excepcionais: são aquelas cuja vigência é limitada a um lapso temporal ou a uma
determinada situação de anormalidade. Possuem ultra-atividade (art. 3º, CP).

Leis penais em branco e conflito de leis no tempo: uma vez alterado o complemento da
lei penal em branco, posteriormente à realização da conduta, e beneficiando-se o agente,
deve se operar a retroatividade? Segundo Masson (2012, p.120), há divergência na
doutrina: sim – Basileu Garcia; não – Magalhães Noronha e José Frederico Marques.
Opinião do Masson (2012, p. 120): se o complemento se revestir de situação de
normalidade, a sua modificação favorável ao réu deve retroagir; se revestir situação de
excepcionalidade, aplica-se o art. 3º, CP, não há retroação. Esse entendimento parece ter
sido acolhido pelo STF no julgamento do HC 94397, j. 09/03/2010, no qual ficou decidido
que tem efeitos retroativos a retirada do cloreto de etila da lista de substâncias psicotrópicas
de uso proscrito.

Tempo do crime: adota-se a teoria da atividade (art. 4º, CP), inclusive para aferição da
imputabilidade (art. 26, CP). Exceção: a fluência da prescrição abstrata se inicia no dia da
consumação (teoria do resultado).

PONTO EXTRA:

1. LEI PENAL E NORMA PENAL.

As normas penais, da mesma forma que as outras normas, são dotadas dos caracteres da
generalidade, da abstração, da bilateralidade (estabelecem direitos e, em contrapartida,
impõem obrigações), bem como da coercibilidade e da imperatividade. São compostas de
duas partes, figurando, na primeira, o comando ou o preceito e, na segunda, a consequência
do seu descumprimento ou a sanção. As normas jurídico-penais têm por finalidade a
definição das infrações penais, o estabelecimento das respectivas consequências jurídicas
(imposição de penas ou de medidas de segurança), bem como os pressupostos de
cominação, aplicação e execução das suas disposições gerais.

Podem ser: a) normas incriminadoras: são aquelas que estabelecem as infrações penais,
descrevendo a conduta proibida e cominando a respectiva espécie e quantidade de pena.
Contêm determinações de proibições (não fazer) ou de mandatos (fazer). As normas
incriminadoras estão dispostas na Parte Especial do Código Penal, bem como na legislação
penal especial. b) normas não incriminadoras: são aquelas que não estabelecem delito ou
pena, tem por função regular os seus pressupostos de aplicabilidade, bem assim criar
espaços de licitude aptos a afastar a incidência daquelas. Subdividem-se em normas
explicativas ou complementares, de um lado, e normas permissivas, de outro. Todas estão
localizadas na Parte Geral do Código e, esporadicamente, em alguns dispositivos da Parte
Especial. A legislação penal especial também contém normas penais não incriminadoras.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Ex: art. 14, do CP, fundamenta a punição do crime tentado; o art. 29, do CP, esclarece a
punição em caso de concurso de agentes; o art. 23, do CP, contempla hipóteses de exclusão
da antijuridicidade; o art. 150, § 4o, e o art. 327, caput, do CP, dão a definição de “casa” e
“funcionário público” para fins penais, respectivamente.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

5.b. Prescrição Penal


Principais obras consultadas: Santo Graal 27º. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado
de Direito penal: parte geral, volume 1, 10 ed. - São Paulo: Saraiva, 2006. GRECO,
Rogério. Curso de Direito Penal. 10 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008. GRECO, Rogério.
Resumos Gráficos de Direito Penal. Parte Geral. 2 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2012.
MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado. 6.ed. São Paulo: Método, 2012.

Legislação Básica: Artigos 5º. CRFB, incisos XLII, XLIII, XLIV. Artigos 107, IV, e 109 ao
119, todos do CP.

Conceito: É a causa mais importante de extinção da punibilidade. É a perda do direito de


punir do Estado, pelo decurso de tempo, em razão do seu não exercício, dentro do prazo
previamente fixado. A prescrição constitui a regra, sendo a imprescritibilidade a exceção
estabelecida nas hipóteses fixadas pelo art. 5º, incisos XLII e XLIV, da CRFB/88 (racismo
e ações de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado
Democrático, respectivamente, além de outras hipóteses previstas pelo Direito
Internacional como, por exemplo, o crime de tortura). Consequência dessa exceção firmada
pela Carta Magna: tem-se que o legislador ordinário não pode instituir outros casos de
imprescritibilidade.

A prescrição como causa extintiva da punibilidade está prevista no art. 107, IV, primeira
figura, do CP e regulada nos art. 109 a 119 do mesmo diploma legal. A prescrição é matéria
de ordem pública, razão pela qual, pode ser reconhecida de ofício em qualquer fase do
processo nos termos do art. 61 do CPP, constituindo questão prejudicial ao conhecimento
do mérito da causa, razão pela qual eventual recurso da defesa não terá seguimento se a
prescrição for previamente reconhecida, por falta de interesse de agir.

Natureza jurídica: A prescrição tem natureza penal ou processual penal? Discute-se se a


prescrição é instituto de Direito Penal ou Processual Penal. 1ª corrente: natureza penal: tem-
se que ela atinge o direito de punir do Estado. 2ª corrente: natureza processual penal: tem-se
que, historicamente, a prescrição objetivou paralisar o prosseguimento da demanda penal
contra o infrator, sendo certo que não apenas a sua contagem, mas, também, as hipóteses de
suspensão ou interrupção, estariam vinculadas aos institutos processuais penais. Posição de
Gueiros: natureza mista. Parte penal e parte processual. Conservando parte de substância
penal, as alterações legais no terreno prescricional somente retroagirão quando
beneficiarem o réu (art. 512, XL, da CF/1988, e art. 22, parágrafo único, do CP), não
podendo ser aplicadas aos casos ocorridos antes da sua vigência se importarem em novatio
legis in pejus. Não há, portanto, a incidência da regra do art. 22, do CPP (aplicação
imediata). Conclui pela não aplicação da nova redação do art. 366, do CPP a crimes
anteriores, dada a “impossibilidade da aplicação da novel legislação de forma parcial” (HC
110767. STJ. Min. Napoleão Maia. Quinta Turma. OJ de 03/05/2010). Outro exemplo: a
prescrição obedece à regra do art. 10, do CP, ou seja, o dia do começo inclui-se no cômputo
do seu prazo.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Fundamento legal: artigos 107, IV, art. 109 a 119 do CP.

Crimes que nunca prescrevem: Rol exemplificativo da CF: 1) prática do racismo


(criminalizada na Lei 7.716/1989; justificativa: alerta às gerações de hoje e de amanhã,
"para que se impeça a reinstauração de velhos e ultrapassados conceitos que a consciência
jurídica e histórica não mais admitem"); 2) ações de grupos armados, civis ou militares
contra ordem constitucional e o Estado Democrático (esta figura típica pode ser extraída de
algumas figuras capituladas na Lei de crimes contra a segurança nacional, a ordem política
e social, 7.170/1984; ou no Código Penal Militar, a despeito desses dois diplomas preverem
a prescritibilidade de seus delitos. No plano supranacional: os delitos de genocídio, contra a
humanidade, de guerra e de agressão, tipificados, com exceção do último, no Estatuto do
Tribunal Penal Internacional (promulgado pelo Decreto nº 4.388/2002) - art. 29, do Estatuto
do TPI. Atenção: o rol da Constituição é exemplificativo, logo a lei ordinária pode ampliar.

Espécies: A legislação penal prevê duas espécies de prescrição: prescrição da pretensão


punitiva (ocorre antes do trânsito em julgado, é prescrição da ação) e prescrição da
pretensão executória (ocorre após o trânsito, é da condenação).

a) prescrição da pretensão punitiva: a prescrição da pretensão punitiva só poderá ocorrer


antes de a sentença penal transitar em julgado e tem como consequência a eliminação de
todos os efeitos penais do crime.

Termo inicial: O lapso prescricional começa a correr a partir da data da consumação do


crime ou do dia em que cessou a atividade criminosa (crime permanente – art. 111 do CP),
apresentando, contudo, causas que o suspendem (art. 116 do CP) ou o interrompem (art.
117). Exceções ou regras específicas: 1) Crimes contra a dignidade sexual de crianças e
adolescentes: o prazo começa a correr quando a vítima completar 18 (dezoito) anos, salvo
se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal, conforme lei 12.650/2012. 2) Crimes
permanentes: o prazo prescricional começa a correr do dia em que cessou a permanência. 3)

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Crime de bigamia: o prazo prescricional começa a correr do dia em que o fato se tornou
conhecido. 4) Crime de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil: o prazo
prescricional começa a correr do dia em que o fato se tornou conhecido.

A prescrição da pretensão punitiva subdivide-se em: a.1) prescrição propriamente dita:


Considera a pena abstratamente cominada para o crime. Se for concurso (formal, material
ou crime continuado), cada delito será analisado isoladamente (Súmula 497 STF). Nesta
contagem serão consideradas as causas de aumento e diminuição, sendo aplicados o maior
aumento ou a menor diminuição, sempre em favor da persecução penal. As agravantes e
atenuantes não serão consideradas, pois não podem ultrapassar os limites mínimo e máximo
da pena abstrata. Exceção: atenuante da menoridade ou da senilidade (art. 115 do CP). a.2)
prescrição retroativa: o prazo regula-se com base na pena aplicada na sentença penal
condenatória. A Lei 12.234/10 alterou o § 1° do art. 110 do CP. Com esta alteração, um dos
marcos temporais da prescrição retroativa foi suprimida. Anteriormente havia dois períodos
autônomos possíveis nesta modalidade de prescrição: 1º) da data do fato até o recebimento
da denúncia ou queixa; 2º) da data do recebimento da denúncia ou queixa até a publicação
da sentença. Eram períodos prescricionais autônomos (não podem ser somados). Com a
alteração legislativa, a prescrição retroativa somente ocorrerá entre a data do recebimento
da inicial e a sentença condenatória. Agora somente ocorrerá prescrição retroativa por
morosidade da atuação do judiciário (morosidade processual) e não por morosidade do MP
ou polícia na investigação; a.3) prescrição intercorrente ou subsequente ou
superveniente: a exemplo da retroativa, regula-se com base na pena em concreto; todavia,
a contagem de seu prazo volta-se para o futuro, começando a correr a partir da data da
sentença condenatória até o trânsito em julgado para acusação e defesa. Recentemente, o
STF considerou que o trânsito em julgado para a defesa deve ser computado no momento
em que cessa a possibilidade de haver recurso ordinário (termo final), se o Recurso
Especial (para o STJ ou TSE) ou o Recurso Extraordinário (STF) forem inadmitidos (HC
86.125).

b) prescrição da pretensão executória: a prescrição da pretensão executória se inicia


depois de transitar em julgado a sentença condenatória para a acusação, regulando-se pela
pena concretizada (art. 110 do CP) e verificando-se nos mesmos prazos fixados no art. 109
do CP. Porém, a prescrição da pretensão executória somente se verifica se ocorrer o trânsito
em julgado para ambas as partes. O decurso do tempo sem o exercício da pretensão
executória faz com que o Estado perca o direito de executar a sanção imposta na
condenação. O aumento pela reincidência só incide na prescrição executória.

Cuidado: O STJ enfrentou em 2013 a diferença entre o termo inicial e o efetivo


cumprimento da prescrição da pretensão executória [em dois julgados diferentes, ambos no
informativo 532]. A tese mostrada no Santo Graal até o 27 está desatualizada!!! Agora é
como mostrado acima, ou seja, transita em julgado para acusação e defesa em momentos
distintos e, não obstante a pena não poder ser executada por causa do princípio da
presunção de inocência vigorar até o trânsito em julgado final, o tempo da prescrição da
pretensão executória está correndo, porém, somente podendo ser implementado após o
trânsito em julgado para ambas as partes. Então, se o MP não apresentar recurso para a
sentença condenatória, apenas a defesa recorrendo, a sentença condenatória transita em

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

julgado para a acusação, iniciando-se a contagem do prazo de prescrição executória mesmo


ainda estando pendente a apreciação do recurso interposto pela defesa. Se liga num detalhe:
o que exige o trânsito em julgado para ambas as partes é a aferição da prescrição da
pretensão executória e não seu início, então, mesmo em tese ocorrendo o prazo da
prescrição da pretensão executória por ter ocorrido a transito em julgado para a parte que
não recorreu, mas se não tiver transitado em julgado para a outra parte este não poderá ser
reconhecido, PORÉM, e esse é o detalhe, poderá ser reconhecida a prescrição da pretensão
punitiva na modalidade intercorrente. [Tese ultrapassada: Pela literalidade do art. 112, inc.
I, a prescrição começa a fluir no dia em que transita em julgado para a acusação. Contudo,
este artigo tinha relação umbilical com a execução provisória. Só fazia sentido começar a
correr o prazo a partir do trânsito em julgado para a acusação, se o MP já pudesse desde
logo fazer cumprir a pena. Como agora o MP está proibido de exigir o cumprimento da
pena em segundo grau (e muito menos em primeiro grau), só a partir do trânsito em julgado
para as duas partes (acusação e defesa) é que o prazo prescricional pode correr, já que
somente a partir desta data que poderá ser executada a sanção. Ninguém pode ser punido
pela inércia se ele não pode agir. Douglas Fischer também defende isso, afirmando que
haveria uma inconstitucionalidade por arrastamento do art. 112, I, do CP. A aplicação literal
do art. 112, I, do CP nos leva a em uma interpretação absurda que obriga o MP a recorrer de
todas as sentenças condenatórias, mesmo das quais concorde, sob pena de prescreverem
todos os casos, afrontando o princípio da proibição da proteção deficiente dos bens
jurídicos].

OBS: Sentença ou acórdão? Discute-se se por data da sentença deve-se considerar a decisão
de 1° grau ou se deve ser compreendida a data da sentença com trânsito em julgado. Para
Nucci, a data a ser considerada é a da sentença de 1° grau. No STJ, a posição é no sentido
de que a data a ser considerada é a da decisão de 1° grau (RHC 26146, julg. em 04/03/10;
HC 86.320/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJU de 24/11/2006;
REsp 951510/DF, 5ª Turma, DJe de 04/08/2008). Porém, a posição do STF é diferente.

A jurisprudência do STF entende que a parte final do artigo 115, CP pode ser aplicada no
caso de acórdãos em três situações: 1) quando o acórdão foi proferido por tribunal no caso
de réu que possui foro por prerrogativa de função; 2) quando o acórdão reformou a
sentença que havia absolvido o réu [tornou-se o acórdão condenatório] e; 3) quando o
acórdão reformou parcialmente a sentença condenatória.

OBS: STJ, 2013: Crime de responsabilidade de prefeito e os efeitos da prescrição da pena


privativa de liberdade na inabilitação para o exercício de cargo ou função pública: A pena
de inabilitação para exercício de cargo/função pública, prevista no art. 1.º, § 2.º, do
Decreto-Lei 201/67, é extinta, necessariamente, se houver prescrição da pena privativa de
liberdade. Assim, conforme a jurisprudência do STF, do STJ e do TSE, extinta a pena
privativa de liberdade pela prescrição da pretensão punitiva, também terá o mesmo fim a
pena dela decorrente de inabilitação para o exercício de cargo ou função pública. [STJ. 5ª
Turma. AgRg no REsp 1.381.728-SC, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em
17/12/2013].

OBS: Prescrição virtual, pela pena ideal, projetada, antecipada, prognostical ou retroativa
em perspectiva: A prescrição pela pena ideal ou em perspectiva é o reconhecimento
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

antecipado da prescrição retroativa com base em uma pena hipotética. Não é aceita pelos
tribunais superiores por ausência de previsão legal. Isso porque fere a presunção de
inocência [pois antecipa uma prescrição se nem se sabe se ouve crime] e princípio da
legalidade. [Súmula 438 do STJ: É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição
da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da
existência ou sorte do processo penal]. Ex: Enunciado nº 28: Inadmissível o
reconhecimento da extinção da punibilidade pela prescrição, considerando a pena em
perspectiva, por ferir os primados constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa
e da presunção de inocência. Precedentes da 2ª CCR: Processos MPF nºs
1.00.000.008842/2003-13, 1.00.000.008516/2005-60, 1.31.000.000630/2005-75,
1.20.000.000187/2008-69, 1.00.000.009489/2008-95, 1.00.000.006134/2008-44,
1.00.000.011159/2007-89, entre outros. (Sessão 464ª, de 15.04.2009) Súmula STJ nº 438,
de 15/05/2010 (incluída na 001ª Sessão de Coordenação, de 17.05.2010).

Efeitos da prescrição:

Prescrição da pretensão punitiva Prescrição da pretensão executória

Extingue todos os efeitos de eventual Extingue apenas a pena (efeitos principal da


sentença condenatória já proferida. condenação).

Apaga a pena (efeito principal da Os efeitos secundários da condenação


condenação) e também todos os efeitos continuam valendo.
secundários (penais e extra penais)

Não gera reincidência. Tem força para gerar reincidência.

Não serve como título executivo no juízo Serve como título executivo do juízo cível.
cível.

Em resumo: se for reconhecida a prescrição Em resumo: com exceção da pena,


da pretensão punitiva, o réu não terá persistem todas as demais consequências
qualquer consequência negativa. negativas inerentes a uma condenação.

Causas impeditivas ou suspensivas da prescrição: há causas que impedem ou suspendem


o prazo prescricional, de modo que o prazo não corre, ficando suspenso e na dependência
daquela causa que a determina. O tempo transcorrido antes da causa de suspensão será
contado para efeito de verificação da extinção da punibilidade. São elas: enquanto não for
resolvida em outro processo questão de que dependa o reconhecimento da existência de
crime (essa hipótese é chamada de questão prejudicial); enquanto o agente cumpre penal no
estrangeiro; imunidade parlamentar; suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei
9.099/95); citação por edital, sem comparecimento ou constituição de defensor (art. 366 do
CPP); citação por meio de rogatória de acusado no estrangeiro; deferimento de
parcelamento de crédito tributário nos delitos fiscais - REFIS (art. 83, § 3º, da Lei n.
9.430/96, com redação dada pela Lei 12.382/2011); não corre a prescrição durante o

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

período de prova. [ex: pena máxima de 4 anos, então o prazo prescricional é de 8 anos. Se o
processo suspendeu a prescrição com 1 ano, após 8 anos revoga-se a suspensão e terá 7
anos para sentenciar, sob pena de prescrição]. Por fim, a prescrição executória suspende-se
enquanto o condenado estiver preso por outro motivo (art. 116, parágrafo único).

OBS: Sobre o artigo 366, CPP: Para o STF, como o art. 366 do CPC não determina prazo
de suspensão, então este terá a duração de ausência do réu, evitando-se que o sujeito se
beneficie da própria torpeza. Todavia, o STJ estabelece que período de suspensão seja
regulado pelo máximo da pena cominada, consoante súmula 415. Tal medida visa evitar a
imprescritibilidade. Ou seja: O artigo 366 do CP não estipulou prazo de suspensão da
prescrição. Logo, há possibilidade de se interpretar que a suspensão permanece até o dia em
que o réu for encontrado. Mas, assim pensando, o crime se tornaria imprescritível na
prática. Para a doutrina e a jurisprudência, o processo fica suspenso pelo prazo máximo em
abstrato previsto para o crime no art. 109; em seguida, retoma-se o curso de prescrição,
calculado pelo máximo da pena em abstrato prevista (NUCCI, p. 556). O STJ caminha
nessa direção. Contudo, o STF possui posição admitindo que a prescrição fique suspensa
indefinidamente (Ver Ext. 1042 e RE 460971).

Causas interruptivas da prescrição: As causas interruptivas têm o condão de fazer com


que o prazo, a partir delas, seja novamente reiniciado, ou seja, após cada causa interruptiva
da prescrição deve ser procedida nova contagem do prazo, desprezando-se, para esse fim, o
tempo anterior ao marco interruptivo (art. 117, § 2º do CP). São elas: recebimento da
denúncia ou da queixa; pronúncia; publicação da sentença ou acórdão condenatório
recorríveis; início ou continuação do cumprimento da pena; reincidência (art. 117 do CP).

STJ, HC 233.594-SP, 2013: Para efeito de configuração do marco interruptivo do prazo


prescricional a que se refere o artigo 117, IV, do CP, considera-se como publicado o
acórdão condenatório recorrível na data da sessão pública de julgamento, e não na data de
sua veiculação no Diário da Justiça ou em meio de comunicação congênere. A publicação
do acórdão nos veículos de comunicação oficial deflagra o prazo recursal, mas não
influencia na contagem do prazo da prescrição.

STF, RE 751394, 2013: No que tange o acórdão condenatório recorrível, para o STJ e STF
se o acórdão apenas confirma a condenação ou então reduz a pena do condenado, ele não
terá o condão de interromper a prescrição.

OBS: Reincidência: Se o réu for reincidente, regulam-se os prazos pela pena aplicada e
conforme os lapsos fixados pelo art. 109, acrescidos de 1/3. É importante registrar que a
reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva em quaisquer de suas
formas (súmula 220 do STJ). Portanto, a reincidência produz dois efeitos distintos: importa
em aumento do prazo prescricional e em interrupção do prazo da prescrição da pretensão
executória.

OBS: No cálculo da prescrição, influem as causas de aumento e diminuição da pena,


utilizando-se o limite máximo para o aumento e o percentual mínimo para a diminuição.
Para análise da prescrição é preciso levar em consideração o fato criminoso narrado na
denúncia, e não a classificação feita pelo autor da ação penal (NUCCI, p. 557).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Causas redutoras do prazo prescricional: O prazo prescricional é reduzido pela metade


quando o agente for, ao tempo do crime, menor de vinte e um anos, ou, na data da sentença,
maior de setenta. Ambos os fatores de redução aplicam-se tanto à prescrição da pretensão
punitiva como da executória (art. 115 do CP).

OBS: Data em que se completa 70 anos: existe uma situação em que o condenado será
beneficiado pela redução do artigo 115, CP mesmo tendo completado 70 anos após a sessão
de julgamento: isso ocorre quando o condenado opõe embargos de declaração contra o a
sentença condenatória e esses embargos são conhecidos. Nesse caso, o prazo prescricional
será reduzido pela metade se o réu completar 70 anos até a data do julgamento dos
embargos. Isso porque a decisão que aprecia os embargos de declaração possui função
integrativa, retificadora e complementar, servindo para substituir o acórdão que foi
impugnado. Logo, a sentença condenatória passou a ser a decisão dos embargos, que
substituiu a sentença anterior. Portanto, segundo o STF decidiu, em regra, para o réu se
beneficiar do artigo 11 do CP, ele deverá ter mais de 70 anos no momento da sessão de
julgamento em que foi condenado. Contudo, se ele opôs embargos de declaração e eles
foram conhecidos, a nova data para aferir se ele tem mais de 70 anos passa a ser o dia em
que os embargos forem julgados, pois a decisão dos embargos substitui a decisão anterior.
(STF, AP 516 ED/DF, Dez de 2013, info 731).

Prescrição da multa: ocorre em 2 anos quando a multa for a única cominada ou aplicada.
Caso contrário, no mesmo prazo estabelecido para prescrição da pena privativa de
liberdade. Às penas restritivas de direito aplicam-se os mesmos prazos das privativas de
liberdade (art. 109, parágrafo único).

Termo a quo da prescrição: Enuncia o art. 111 do CP que o prazo de prescrição antes do
trânsito em julgado se inicia da data em que se consumar o crime. É a aplicação à
prescrição da teoria do resultado, diversamente do que ocorre com a determinação do
tempo do crime, em que se adota a teoria da atividade. O mesmo dispositivo indica ainda
que o prazo de prescrição passa a correr no caso de tentativa, a partir da cessação da
atividade, assim como nos crimes permanentes, com o término da permanência. Quanto aos
crimes de bigamia e falsificação ou alteração de assentamento do registro civil, da data em
que o fato se tornar conhecido das autoridades responsáveis pela persecução penal (polícia,
MP ou juiz), prescindindo que seja manifestado formalmente.

Prescrição da medida de segurança:

Quais as conclusões que o juiz pode chegar com o incidente de insanidade? Após o
incidente e com base nas conclusões do médico perito, o juiz poderá concluir que o réu é:
Imputável: nesse caso, ele será julgado normalmente e poderá ser condenado a uma pena.
Inimputável: se ficar provado que o agente é inimputável, ou seja, que, por doença mental

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, ele era, ao tempo da ação ou da


omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de
acordo com esse entendimento, ele ficará isento de pena (art. 26 do CP) e poderá ou não
receber uma medida de segurança, a depender se existirem ou não provas de que praticou
fato típico e ilícito. Semi-imputável: se ficar provado que, em virtude de perturbação de
saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado, o agente não era
inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com
esse entendimento, ele será condenado, mas sua pena será reduzida de 1/3 a 2/3, nos termos
do parágrafo único do art. 26 do CP, ou se for melhor, o juiz poderá lhe aplicar medida de
segurança (art. 98, CP).

O instituto da prescrição aplica-se também para as medidas de segurança? SIM. Apesar de


o Código Penal não tratar expressamente sobre o tema, entende-se que as regras sobre a
prescrição (prazos, causas de interrupção etc.) também devem ser aplicadas às medidas de
segurança. Isso porque, conforme já explicado, elas são uma espécie do gênero sanção
penal.

Como é calculada a prescrição no caso de medidas de segurança? No caso de réu


inimputável: a sentença é absolutória imprópria, ou seja, o juiz aplica medida de segurança
diretamente. Logo, não existe uma pena concretamente aplicada. Diante disso, a prescrição
da medida de segurança imposta em sentença absolutória imprópria é regulada pela pena
máxima abstratamente prevista para o delito. Ex: se a pessoa foi acusada por furto, a
prescrição será calculada com base na pena máxima (4 anos), de forma que a medida de
segurança prescreve em 8 anos (art. 109, IV, do CP). No caso de réu semi-imputável: a
sentença é condenatória, ou seja, o juiz aplica uma pena, com a causa de redução prevista
no parágrafo único do art. 26 do CP e depois substitui a pena privativa de liberdade por
medida de segurança (art. 98) caso constate que o réu necessita de especial tratamento
curativo. Logo, existe uma pena concretamente aplicada e essa será utilizada no cálculo da
prescrição. Ex: se uma pessoa foi acusada por furto e ficou comprovado que ela era semi-
imputável, o juiz condena a 1 ano de reclusão, mas substitui por medida de segurança. A
prescrição será calculada com base na pena concreta (1 ano), de forma que a medida de
segurança prescreve em 4 anos (art. 109, V, do CP).

STJ, 2014: A prescrição da medida de segurança imposta em sentença absolutória


imprópria é regulada pela pena máxima abstratamente prevista para o delito. [STJ. 5ª
Turma. REsp 39.920-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 6/2/2014].

SÚMULAS SOBRE PRESCRIÇÃO.

STF - SÚMULA N 604: A prescrição pela pena em concreto é somente da pretensão


executória da pena privativa de liberdade.

STF - SÚMULA N 497: Quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela
pena imposta na sentença, não se computando o acréscimo decorrente da continuação.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

STF - SÚMULA N 146: A prescrição da ação penal regula-se pela pena concretizada na
sentença, quando não há recurso da acusação.

STJ - Súmula nº 438 - É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da


pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência
ou sorte do processo penal.

STJ – Súmula n. 415 O período de suspensão do prazo prescricional é regulado pelo


máximo da pena cominada

STJ – SÚMULA n. 338: A prescrição penal é aplicável nas medidas sócio-educativas.

STJ – SÚMULA n. 220: A reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão


punitiva.

STJ – SÚMULA n. 191: A pronúncia é causa interruptiva da prescrição, ainda que o


Tribunal do Júri venha a desclassificar o crime.

JURISPRUDÊNCIA DO STF & STJ SOBRE PRESCRIÇÃO:

Prescrição e art. 115 do CP: A causa de redução do prazo prescricional constante do art.
115 do CP (“São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era, ao
tempo do crime, menor de vinte e um anos, ou, na data da sentença, maior de setenta anos”)
deve ser aferida da sentença no momento penal condenatória. Com base nesse
entendimento, a 2ª Turma indeferiu habeas corpus em que se pleiteava o reconhecimento da
prescrição da pretensão punitiva em favor de condenado que completara 70 anos entre a
data da prolação da sentença penal condenatória e a do acórdão que a confirmara em sede
de apelação. HC 107398/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 10.5.2011. (HC-107398)

Prescrição e acórdão que reforma sentença absolutória: Acórdão condenatório que


reforma sentença penal absolutória interrompe o prazo prescricional por ser equiparado à
sentença condenatória recorrível. A 2ª Turma, ao aplicar, mutatis mutandis, essa orientação,
desproveu recurso ordinário em habeas corpus no qual se alegava não ser possível
considerar a publicação de acórdão condenatório como marco inicial para a prescrição da
execução da pena, uma vez que o Código Penal Militar alude a sentença condenatória e não
a acórdão [CPM: “Art. 126. A prescrição da execução da pena privativa de liberdade ou da
medida de segurança que a substitui (art. 113) regula-se pelo tempo fixado na sentença e
verifica-se nos mesmos prazos estabelecidos no art. 125, os quais se aumentam de um
têrço, se o condenado é criminoso habitual ou por tendência. §1º Começa a correr a
prescrição: a) do dia em que passa em julgado a sentença condenatória ou a que revoga a
suspensão condicional da pena ou o livramento condicional”]. No caso, o STM dera
provimento à apelação interposta pelo Ministério Público Militar contra sentença
absolutória para condenar os recorrentes pela prática do crime de estelionato (CPM, art.
251, § 3º) RHC 109973/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 22.11.2011. (RHC-109973)

Prescrição: recebimento da denúncia e autoridade incompetente: O recebimento da


denúncia por magistrado absolutamente incompetente não interrompe a prescrição penal

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

(CP, art. 117, I). Esse o entendimento da 2ª Turma ao denegar habeas corpus no qual a
defesa alegava a consumação do lapso prescricional intercorrente, que teria acontecido
entre o recebimento da denúncia, ainda que por juiz incompetente, e o decreto de
condenação do réu. Na espécie, reputou-se que a prescrição em virtude do interregno entre
os aludidos marcos interruptivos não teria ocorrido, porquanto apenas o posterior
acolhimento da peça acusatória pelo órgão judiciário competente deteria o condão de
interrompê-la. HC 104907/PE, rel. Min. Celso de Mello, 10.5.2011. (HC-104907)

ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. PRAZO PRESCRICIONAL: A quaestio juris


está em saber se o delito pelo qual foi condenada a paciente, de estelionato previdenciário
(art. 171, § 3º, do CP), possui natureza permanente ou instantânea, a fim de verificar a
prescrição da pretensão punitiva. Na espécie, a paciente foi condenada, pelo delito
mencionado, à pena de um ano, nove meses e dez dias de reclusão em regime fechado,
além de vinte dias-multa, por ter omitido o óbito de sua filha, portadora de deficiência,
ocorrido em 1º/5/2001, data a partir da qual começou a receber indevidamente o benefício
de aposentadoria pertencente ao de cujus, tendo a conduta perdurado até 12/2006. No writ,
busca a declaração da extinção da punibilidade devido à prescrição retroativa da pretensão
punitiva, sustentando que o crime de estelionato contra a Previdência Social é delito
instantâneo de efeitos permanentes. Nesse contexto, destacou-se que, no julgamento do HC
85.601-SP, o STF distinguiu duas situações para a configuração da natureza jurídica do
delito em comento. Para aquele que comete a fraude contra a Previdência e não se torna
beneficiário da aposentadoria, o crime é instantâneo, ainda que de efeitos permanentes.
Contudo, para o beneficiário, o delito continua sendo permanente, consumando-se com a
cessação da permanência. In casu, a paciente não apenas omitiu da Previdência Social o
óbito da verdadeira beneficiária da aposentadoria, mas também passou a receber
indevidamente os valores respectivos. Assim, sendo a paciente beneficiária da
aposentadoria indevida, que não apenas induziu, mas manteve a vítima (Previdência Social)
em erro, o delito possui natureza permanente, consumando-se na data da cessação da
permanência, no caso, 12/2006. Dessa forma, não há falar em prescrição retroativa, pois
não transcorreu o lapso prescricional devido (quatro anos) entre a data da consumação do
delito (12/2006) e o recebimento da denúncia (27/6/2008). Com essas, entre outras
considerações, a Turma, prosseguindo o julgamento, por maioria, denegou a ordem.
Precedentes citados do STF: HC 85.601-SP, DJ 30/11/2007, e HC 102.049-RJ, DJe
12/12/2011. HC 216.986-AC, Rel. originário Min. Vasco Della Giustina (Desembargador
convocado do TJ-RS), Rel. para acórdão Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em
1º/3/2012.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

5.c. Estatuto de Roma.


Principais obras consultadas: Santo Graal 27. Direito Internacional Público e Privado.
Paulo Henrique Gonçalves Portela.

Legislação básica: Estatuto de Roma.

O TPI foi criado em 1998 pelo Estatuto de Roma, do qual o Brasil é parte (Decreto 4.388,
de 25/09/2002). A Corte, sediada em Haia, na Holanda, iniciou suas atividades em 2003 e
tem personalidade jurídica de Direito Internacional Público própria, ou seja, não é órgão da
ONU. Entretanto, é parte do Sistema das Nações Unidas e mantém com ela laços de
cooperação, especialmente com o Conselho de Segurança, como veremos a diante.

A competência racionae loci do TPI poderá ser exercida no território de qualquer Estado
Parte e, por acordo especial, no território de qualquer outro estado (art. 4º, §2º). Também
pode exercer sua jurisdição sobre atos praticados a bordo de navios ou aeronaves
matriculados em Estados-membros do Tribunal ou que a este se submeta,
excepcionalmente, nas condições dos arts. 12, §2º, “b” e 13, “a” e “c” do Estatuto de Roma.

No que toca à competência racionae personae, importa salientar que o TPI adota o
princípio da responsabilidade criminal individual, razão pela qual a Corte não julgará
pessoas jurídicas, como Estados, organismos internacionais e ONGs. O Tribunal tem
jurisdição sobre as pessoas responsáveis pelos crimes de maior gravidade com alcance
internacional (art. 1º), sendo irrelevante a nacionalidade do réu, conquanto tenha sido o
ilícito praticado em território de Estado-parte ou que o Estado não parte tenha aderido,
excepcionalmente, à sua jurisdição. Também poderá exercê-la (jurisdição),
independentemente de onde o ato tenha sido praticado, sobre nacional de estado que não
seja signatário do Estatuto, mas que, excepcionalmente, tenha aderido à sua jurisdição. Vale
destacar que, nos termos do art. 26, o TPI não detém jurisdição sobre pessoas que, na data
do crime, não tenham completado 18 anos (art. 26).

Por fim, na ratione temporis incluem-se apenas os atos praticados após a entrada em vigor
do Estatuto de Roma, em 2002, e, para aqueles que anuíram posteriormente, a partir da data
da adesão, salvo se houver declaração expressa aceitando a jurisdição sobre crime pretérito.

O princípio da complementariedade ou subsidiariedade informa que o TPI só poderá agir


após o Estado tomar todas as providências cabíveis para processar e julgar os indivíduos
que cometeram crimes internacionais, ou seja, quando esgotados os recursos judiciais
internos, ou quando tais recursos não existem ou não funcionam de acordo com normas
internacionais ou, ainda, quando o Estado não tomar as providências cabíveis para a
apuração e punição dos crimes relacionados no Estatuto.

Dois são os poderes do Conselho de Segurança sobre a jurisdição do TPI, os quais estão
previstos nos arts. 13, (b), e 16 do Estatuto de Roma.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

1) O art. 13, (b), permite que o CS noticie ao Procurador do TPI, adotando resolução
vinculante, qualquer situação em que haja indícios de ter ocorrido a prática de crime
sujeitos à jurisdição do Tribunal. Trata-se de jurisdição universal incondicionada do TPI a
critério político do CS, sem qualquer relação com a vinculação ao local dos fatos ou
nacionalidade dos autores a Estados que ratificaram o Estatuto. Esse expediente foi
utilizado no Caso Bashir/Darfur, na Res. 1593 de 2005 (o Sudão não é parte do TPI) e no
Caso Kadafi, em 2011. ACR (2012, p. 133) elenca 3 requisitos práticos para aplicação do
art. 13, “b”: a) que o CS identifique um quadro que ameace ou já tenha rompido a paz e
segurança internacionais; b) um quadro generalizado de violações que supere meras
violações individuais de DH; c) e que o CS observe o princípio da complementaridade.

2) O art. 16 do Estatuto dispõe que nenhum inquérito ou procedimento-crime poderá ter


início ou prosseguir por um período de 12 meses a contar da data em que o CS assim o tiver
solicitado em resolução. Essa suspensão de 12 meses pode ser renovada indefinidamente.

A vedação de pena de caráter perpétuo pela CF e o Estatuto de Roma: O Estatuto de


Roma, que instituiu o Tribunal Penal Internacional, foi incorporado à legislação brasileira
pelo Decreto nº 4.388/2002.16. Segundo o Estatuto do TPI, a pena de prisão perpétua é
cominada aos crimes de sua competência, quando sua extrema gravidade e as
circunstâncias individuais do condenado justifiquem a sua imposição (art. 77, 1, "b").
Ocorre, porém, como visto anteriormente, que a Constituição Federal proscreve a prisão
perpétua. Instaurou-se, assim, a controvérsia sobre a constitucionalidade da adoção, via
Estatuto do TPI, desta modalidade punitiva, mesmo para os casos da competência daquele
Tribunal. Alguns autores, como Cezar Roberto Bitencourt, consideram que a pena de prisão
perpétua não pode ser instituída no Brasil, seja por tratado internacional, seja por emenda
constitucional, uma vez que as garantias do art. 5º, da CF/1988, configuram cláusulas
pétreas.18 Haveria, portanto, incompatibilidade entre o Estatuto de Roma (promulgado pelo
Decreto nº 4.388/2002) e a Constituição Federal. Contudo, apesar da existência de opiniões
no sentido de que o Estatuto do TPI não deveria ser ratificado pelo Brasil, prevaleceu o
entendimento de que o suposto conflito entre o texto do Estatuto de Roma e a Constituição
brasileira era apenas aparente, tornando possível a sua vigência no ordenamento jurídico
brasileiro sem qualquer necessidade de reforma constitucional. Alguns argumentos
embasaram esta posição: Primeiro: O elenco de direitos e garantias, contidos na Carta
Constitucional de 1988, vigora nas relações entre o Estado e o indivíduo em seu território.
Sendo assim, a disposição que veda a pena de prisão perpétua (art. 5º, XLVII, "b", da
CF/1988) encontra-se direcionada ao legislador interno, tendo em vista os crimes
domésticos, não cabendo restrições aos legisladores do Direito Internacional e, por essa
razão, não pode ser extensível aos crimes da competência do Tribunal Penal Internacional.
Segundo: Sob outra vertente, tem-se que a própria Constituição Federal de 1988 estabelece,
no seu art. 12, III, como um dos fundamentos da República, a "dignidade da pessoa
humana". Na mesma esteira, o texto constitucional, no seu art. 42, ll, dispõe que a
República Federativa Brasileira reger-se-á, nas suas relações internacionais, pela
prevalência do direitos humanos. Há, ainda, no Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias (ADCT), a norma do art. 'Jfl, de acordo com a qual o Brasil "propugnará pela
criação de um Tribunal Internacional de Direitos Humanos". Sendo assim, considerando
que os objetivos do TPI traduzem a prevalência da proteção de tais direitos, afirma-se sua

119
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

convergência com a Constituição de 1988. Terceiro: reside na constatação de que, no


próprio ordenamento jurídico brasileiro, há a previsão da pena de morte, para o caso de
guerra externa declarada, conforme cominado no Código Penal Militar. Sendo assim, por
não haver restrição na cominação da pena capital para conflitos bélicos internacionais,
pode- se concluir que a vedação das penas capitais e perpétua cuida-se de opção imposta ao
legislador interno, sem interferência nos crimes internacionais sob a jurisdição do Tribunal
Penal Internacional. Quarto: Cabe, ainda, destacar que, a despeito da previsão da pena de
prisão perpétua pelo Estatuto do TPI, sua ratificação pelo Brasil não implicou na admissão
desta modalidade punitiva pelo ordenamento jurídico interno. Isso porque, consoante o art.
80, do Estatuto do TPI, as penas nele cominadas não interferem nas penas previstas nos
respectivos direitos internos, ou a aplicação da legislação de Estados que não preveja as
penas referidas no Estatuto. Destarte, não é necessária a adoção interna da pena de prisão
perpétua para o Brasil se adequar ao Estatuto de Roma. Quinto: Por fim, com a Emenda
Constitucional 45/2004, houve a introdução de dispositivo na CF/1988, dispondo que o
Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha
manifestado adesão. Após essa inovação constitucional, tem-se que a controvérsia sobre a
compatibilidade das sanções cominadas no TPI com o ordenamento jurídico brasileiro,
particularmente no que tange à pena de prisão perpétua, perdeu fôlego entre os nossos
doutrinadores.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

6.a. Aplicação da lei penal no espaço.


Principais obras consultadas: Santo Graal 27; Gueiros, Artur. BITENCOURT, Cezar
Roberto. Tratado de direito penal. Vol. 1, 8ª edição. Editora Saraiva; NUCCI, Guilherme de
Souza. Código penal comentado. 10ª edição. Editora RT; GRECO, Rogério. Curso de
Direito Penal. 10ª edição. Rio de Janeiro: Impetus, 2008; AZEVEDO, Marcelo André de.
Coord. Leonardo de Medeiros Garcia. Direito Penal. Ed. Jus Podivm, 2011; Pedras,
Cristiano Villela. Jurisprudência sistematizada do STF e STJ. Rio de Janeiro: Impetus,
2011; FERREIRA FILHO, Roberval Rocha. Principais Julgamentos do STF e STJ. Ed. Jus
Podivm, 2012.

Legislação: Os princípios e normas de direito público interno, em especial os arts. 5° a 8°


do CP, definem a aplicação da lei penal no Brasil, como se demonstra.

Pretende-se basicamente evitar que ocorram lacunas de impunidade a respeito de ilícitos


que atinjam bens jurídicos tutelados, direta ou indiretamente, pelo ordenamento jurídico
brasileiro. Por esta mesma razão, a generalidade dos Estados adota também critérios de
incidência para as suas respectivas leis penais. A matéria envolve, portanto, o chamado
Direito Penal Internacional, ou seja, o ramo do Direito que define os crimes internacionais,
próprios ou impróprios, as regras relativas à aplicação territorial e extraterritorial do Direito
Penal, a imunidade de pessoas especialmente protegidas, a cooperação penal internacional
em todos os seus níveis, as extradições, as transferências de condenados entre países, a
determinação da forma e dos limites de execução de sentença penal estrangeira, a existência
e funcionamento de tribunais penais internacionais ou regionais.

Princípios aplicáveis: a) Princípio da territorialidade: Aplica-se a lei aos fatos puníveis


praticados no território nacional, independentemente da nacionalidade da vitima, agente ou
do bem jurídico lesado, com base na soberania do Estado. Regra geral no Brasil (art. 5º do
CP): territorialidade relativa ou mitigada, por permitir a aplicação de convenções, tratados e
regras de direito internacional, de forma a autorizar a incidência de lei estrangeira a um
crime praticado em território nacional (ex.: crime praticado por embaixador estrangeiro). b)
Princípio real, de defesa ou da proteção: aplica-se a lei brasileira aos crimes praticados no
estrangeiro que ofendam bens jurídicos considerados fundamentais para o Brasil (art. 7º,
inc. I, a, b, c do CP). Nucci aponta como casos: alínea “a” - arts. 121, 122 e 146 a 154 do
CP e arts. 28 e 29 da Lei 7170/83 (Lei de Segurança Nacional); alínea “b” – arts. 155 a 180
e 289 a 311 do CP; e alínea “c” – arts. 312 a 326 c/c 327 do CP. c) Princípio da
nacionalidade ou personalidade: aplica-se a lei brasileira aos crimes praticados no
estrangeiro por autor brasileiro (ativa) - art. 7º, inc. II, b e §2º do CP – exige que o agente
entre no território nacional, que o fato seja punível também no país em que foi praticado,
esteja o crime incluído entre aqueles que a lei brasileira admite a extradição, não tenha sido
o agente absolvido no estrangeiro ou não tenha aí cumprido a pena, não tenha sido o agente
perdoado no estrangeiro ou não esteja extinta a punibilidade por qualquer outro motivo,
segundo a lei mais favorável; contra vítima brasileira (passiva) – art. 7º, § 3º, do CP, com
mais requisitos além dos exigidos para o agente brasileiro (depois de ter entrado no Brasil e

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

estar sob julgamento por requisição do Ministro da Justiça, extradição ao país de origem
não foi pedida ou foi negada). d) Princípio da universalidade, justiça mundial, justiça
universal ou cosmopolita: permite a punição, por todos os Estados, dos crimes que forem
objeto de tratados internacionais, independentemente do lugar do delito, da nacionalidade
do agente ou da vitima ou do bem lesado. É característico da cooperação jurídica
internacional (art. 7º, II, a). A competência firma-se por prevenção, sendo caso de
extraterritorialidade condicionada, em regra (concurso das seguintes condições: que o
agente entre no território nacional, ser o fato punível também no país em que foi praticado,
estar o crime incluído entre aqueles que a lei brasileira admite a extradição, não ter sido a
agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena, não ter sido o agente
perdoado no estrangeiro ou não estar extinta a punibilidade por qualquer outro motivo,
segundo a lei mais favorável). Exceção: Lei 9455/97, art. 2º (Crimes de tortura: “O disposto
nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional,
sendo a vítima brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira”).
Para alguns autores, a segunda parte do dispositivo citado “ou encontrando-se o agente em
local sob jurisdição brasileira” trata de extraterritorialidade condicionada, seja porque exige
a presença do agente em território nacional, seja porque o art. 12 da Convenção Contra a
Tortura (ONU) e o art. 5º da Convenção Interamericana Para Prevenir e Punir a Tortura
determinam que a lei somente seja aplicada caso não haja extradição. No caso de genocídio
perpetrado por brasileiro ou domiciliado no Brasil, a extraterritorialidade é incondicionada
(não se aplicam as exigências do § 2º do art. 7º). Abrange a hipótese do genocídio (art. 7º, I,
d) e delitos previstos em Tratados ou Convenções subscritas pelo Brasil, nas quais o país se
obriga a efetuar a punição – exe.: tráfico de drogas, pirataria, tráfico de mulheres, tortura. e)
Princípio da representação, do pavilhão ou bandeira: aplica-se a lei brasileira aos crimes
cometidos em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada,
quando estiverem em território estrangeiro e aí não sejam punidas art. 7º, II, c do CP. É
princípio subsidiário, aplicável apenas quando o governo estrangeiro não demonstre
interesse em punir o criminoso.

Território nacional: Aplica-se a lei penal brasileira aos crimes cometidos no território
nacional. Trata-se da adoção do princípio da territorialidade, como regra geral deve ser
aplicado sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, como, por
exemplo, no caso das imunidades diplomáticas. O conceito jurídico de território decorre das
normas do Direito público e do Direito internacional, não se trata de um “conceito
geográfico”, mas, sim, político. Conceito: âmbito espacial sujeito ao poder soberano do
Estado. Segundo Bitencourt, “em sentido estrito, território abrange solo (e subsolo)
continuo e com limites reconhecidos, águas interiores, mar territorial (plataforma
continental) e respectivo espaço aéreo”. O território nacional subdivide-se em: a) efetivo
ou real: superfície terrestre (solo e subsolo), águas territoriais (fluviais, lacustres e
marítimas) e o espaço aéreo correspondente [espaço aéreo: definido segundo três teorias: a)
absoluta liberdade do ar; b) soberania limitada ao alcance de baterias antiaéreas, que
significariam o limite à soberania estatal; e c) soberania sobre a coluna atmosférica, que é
adotada pelo Código Brasileiro de Aeronáutica (Dec. 34/67)]. b) por extensão, por
equiparação ou flutuante: b.1) navios e aeronaves brasileiros públicos (de guerra, em
serviços militares, em serviços públicos, etc.) onde quer que se encontrem (alto mar, mar
territorial brasileiro ou estrangeiro e ou no espaço aéreo correspondente); b.2) navios

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

estrangeiros privados, desde que em mar territorial ou porto brasileiros; e aeronaves


estrangeiras privadas, desde que em pouso no território nacional ou no espaço aéreo
correspondente; b.3 – navios e aeronaves privados brasileiros, que estejam em alto mar ou
no espaço aéreo correspondente.

OBS 1: A lei penal brasileira é aplicável às aeronaves e embarcações estrangeiras, de


natureza privada, quando se acharem dentro do território nacional, isto é, em pouso no
território brasileiro ou no espaço aéreo correspondente (aeronaves) ou em porto ou no mar
territorial (embarcações). Às aeronaves e embarcações estrangeiras públicas (militares ou
não), pertencentes a outros países, não são aplicáveis a lei penal brasileira, mesmo que se
encontrem no território nacional, mas, sim, a do Estado que representam. Cuida-se de outra
exceção à regra do art. 5º, caput , do CP.

OBS 2: Mar territorial: Segundo a Convenção de Montego Bay (1982), os Estados costeiros
exercem plenamente sua soberania também sobre o mar territorial, bem como seu leito e
subsolo. [Mar territorial brasileiro: 12 milhas, a partir da linha de baixa mar do litoral
continente e insular (art. 1º da Lei 8.176/93)].

OBS 3: NOVO CP: JUSTIFICATIVA: Territorialidade. O artigo 5º trata da territorialidade,


isto é, a dimensão espacial da soberania penal brasileira. Corrige erro técnico existente no
atual Código Penal, ao equiparar o mar territorial, seu leito e subsolo e o espaço aéreo a ele
sobrejacente a nosso território. Por igual, evita área de atrito hoje existente entre as
disposições do Código Penal e aquelas constantes no Código Aeronáutico Nacional,
mencionando, tanto para as aeronaves quanto para as embarcações o direito de passagem
inocente. A zona marítima contígua ao território continental, a zona de exploração
econômica exclusiva e a plataforma continental são também equiparadas ao território
nacional desde que o crime seja praticado contra o meio marinho, os recursos naturais e
outros bens jurídicos relacionados aos direitos que o país possua sobre estas áreas. Esta
sugestão tem em conta a necessidade de defesa do interesse nacional em face da Amazônia
Azul, o oceano e seus importantes e cobiçados recursos.
Art. 5º. Aplica-se a lei brasileira ao crime cometido no território nacional,
salvo o disposto em tratados, convenções, acordos e atos internacionais
firmados pelo país.
§ 1º Considera-se território nacional o mar territorial, o seu leito e
subsolo, bem como o espaço aéreo sobrejacente, sendo reconhecido às
aeronaves e embarcações de todas as nacionalidades o direito de
passagem inocente.
§ 2º Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território
nacional:
I - as embarcações brasileiras, de natureza pública ou a serviço do
governo brasileiro, onde quer que se encontrem, bem como as
embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se
achem em alto-mar ou região que não pertença a qualquer Estado;
II - as aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo
brasileiro, onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves
brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem no espaço
aéreo sobrejacente ao alto-mar ou região que não pertença a qualquer

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Estado;
III - a zona contígua, a zona de exploração econômica e a plataforma
continental, desde que o crime seja praticado contra o meio marinho,
demais recursos naturais ou outros bens jurídicos relacionados aos direitos
de soberania que o Brasil possua sobre estas áreas.
A aplicação extraterritorial da lei penal brasileira: O art. 7º do CP trata da
extraterritorialidade. Fica submetido à lei brasileira o fato cometido fora do território
nacional, em razão de violação de interesse pátrio, pode ser: (i) incondicionada: aplicável
a lei brasileira a crimes (inciso I) praticados fora do território nacional, ainda que o agente
já tenha sido julgado no estrangeiro, independentemente da concordância do pais em que o
crime ocorreu, do ingresso do agente no Brasil ou do fato de se encontrar extinta a
punibilidade do agente. Funda-se nos princípios da defesa (alíneas “a”, “b”, “c”) e da
universalidade (alínea “d”). A Lei 9455/97, que define os crimes de tortura no Brasil, prevê
como hipótese de extraterritorialidade incondicionada o fato de ser a vítima brasileira ou de
se encontrar, o agente, em local sob a jurisdição brasileira (art. 2º). Tem como condição da
ação o interesse de agir, fundado na utilidade do processo, ou seja, eventual sentença deve
ser exequível. O § 1° do artigo 7° do CP determina que o Brasil poderá perseguir o
criminoso aqui, nos casos de extraterritorialidade incondicionada, mesmo após a
condenação ou cumprimento de pena no estrangeiro. Isto não configura bis in idem por
força do artigo 8° do CP, que prevê compensação: “a pena cumprida no estrangeiro
atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é
computada, quando idênticas”. (ii) condicionada: Com objetivo de evitar a impunidade, é
aplicável a lei brasileira aos crimes (previstos no inciso II e § 3º) praticados fora do
território nacional, desde que satisfeitas as condições de procedibilidade: entrar o agente no
território nacional; ser o fato punível também no pais em que praticado (dupla tipicidade),
observado o princípio do ne bis in idem (não pode ter sido absolvido ou cumprido pena no
estrangeiro); Estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a
extradição; Não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar
extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável, se o fato foi devidamente processado e
julgado pelas autoridades do país onde ocorreu, culminando no perdão judicial do agente ou
na extinção da sua punibilidade, v.g. , em razão de prescrição penal, anistia, indulto etc.,
descabe a incidência extraterritorial condicionada na nossa lei penal. Além dessas
condições, a aplicação da lei brasileira ao crime previsto no §3º (contra brasileiro) se
sujeita, ainda, às condições específicas: não ter sido pedida ou ter sido denegada a
extradição; requisição do Ministro da Justiça. Funda-se nos princípios da universalidade
(alínea a); da personalidade ativa (alínea “b”), da bandeira (alínea “c”) e da personalidade
passiva (§3º). Exige-se que o Ministro da Justiça dirija ao Procurador-Geral da República
requisição para que o Ministério Público deflagre ação penal contra o estrangeiro que
praticou o crime contra o nacional.
OBS: NOVO CP: JUSTIFICATIVA: Extraterritorialidade. A proposta remaneja as
disposições sobre a aplicação da lei penal brasileira a crimes cometidos fora de nosso
território (incluído o território por equiparação). Mantém a distinção tradicional entre
extraterritorialidade incondicionada e condicionada, reduzindo, embora, o campo de
aplicação da primeira. A extraterritorialidade independente de condições deve ser reservada
a crimes especialmente graves, praticados contra a humanidade ou contra bens
imprescindíveis à defesa da soberania nacional. Daí a menção ao genocídio, racismo,
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

terrorismo, tortura e outros crimes contra a humanidade e às infrações penais que lesem ou
exponham a perigo a ordem constitucional e o Estado Democrático de Direito. Crimes que
afetem a vida das mais elevadas autoridades nacionais (e chamadas, sucessivamente, para
substituir no cargo de Presidente da República) foram incluídos nesta figura de
extraterritorialidade. Note-se que não se usa mais a expressão limitativa “crimes contra a
vida”, mas crimes que afetem a vida, permitindo a inscrição, neste campo, de crimes que
tragam a morte como resultado qualificador ou agravador, como se dá com o latrocínio e a
extorsão mediante sequestro. A última figura de extraterritorialidade incondicionada são
crimes que, por tratados, convenções, acordos ou atos internacionais o Brasil se obrigou a
reprimir, sendo autorizada a interpretação de que, nestes casos, as condições para a
aplicação da lei penal serão aquelas dispostas nos documentos internacionais. Retirou-se,
desta esfera mais gravosa de sancionamento penal, os crimes praticados contra o
patrimônio, a fé pública e a administração pública dos entes federativos. Não mais se exige,
entre as condições para a aplicação de nossa lei a casos ocorridos fora de nosso território, a
requisição do Ministro da Justiça, incompatível, neste trecho, com a titularidade privativa
da ação penal pública dada pela Constituição Federal ao Ministério Público.

Extraterritorialidade Incondicionada
Art. 7º. Aplica-se também a lei brasileira, embora cometidos fora do
território nacional, aos crimes:
I – que lesam ou expõem a perigo de lesão a ordem constitucional e o
Estado Democrático de Direito;
II – que afetem a vida ou a liberdade do Presidente e Vice-Presidente da
República; do Presidente da Câmara dos Deputados, do Senado Federal
ou do Supremo Tribunal Federal;
III - de genocídio, racismo, terrorismo, tortura e outros crimes contra a
humanidade, quando a vítima ou o agente for brasileiro, ou o agente se
encontrar em território nacional e não for extraditado;
IV - que por tratados, convenções, acordos ou atos internacionais, o
Brasil se obrigou a reprimir;

Extraterritorialidade Condicionada
Art. 8º. Será também aplicável a lei brasileira, aos crimes praticados:
I - por brasileiro;
II - por estrangeiro contra brasileiro, desde que não ocorra a extradição;
III - em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de
propriedade privada, fora das hipóteses do artigo 5º deste Código;
IV - contra o patrimônio, fé pública ou administração pública de todos os
entes federados.
Parágrafo único. A aplicação da lei brasileira depende do concurso das
seguintes condições:
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato considerado crime também no local em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza
a extradição;
d) não se tratar de infração penal de menor potencial ofensivo, segundo a
lei brasileira;
e) não ter o agente sido absolvido ou punido no estrangeiro ou, por outro
motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Lugar do crime: teoria adotada pelo CP (art. 6º) é a teoria pura da ubiquidade, mista ou
unitária, pela qual lugar do crime pode ser o da ação, do resultado ou do lugar do bem
jurídico atingido (“... bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado”).
Outras teorias: teoria da ação ou da atividade; teoria do resultado ou do evento; teoria da
intenção; teoria do intermédio ou do efeito mais próximo (local onde energia é
movimentada); teoria da ação à distância ou longa mão (local do ato executivo); teoria
limitada da ubiquidade (local da ação ou do resultado final).

OBS: Crime à distância ≠ crime plurilocal: Crime à distância é diferente do crime


plurilocal. No crime à distância a conduta e resultado ocorrem em jurisdições diferentes,
ex: enviar carta-bomba do Brasil para explodir na Itália. No crime plurilocal a conduta se
dá em um local e o resultado em outro, mas dentro do mesmo país. A vantagem da teoria da
ubiquidade é alcançar o crime à distância e evitar o conflito negativo de jurisdição. O
inconveniente da teoria da ubiquidade é a possibilidade de bis in idem, pois dois países
julgarão o mesmo fato. O art. 8º do CP resolve esse problema ao cuidar das situações em
que incorrer bis in idem. Art. 8º A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no
Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas.

OBS: Qual é o lugar do crime no caso dos crimes omissivos? O lugar do crime é onde a
conduta deveria ter sido realizada ou o lugar do resultado.

Pena cumprida no estrangeiro: No caso de aplicação territorial ou extraterritorial


incondicionada da lei penal brasileira (art. 5 o , caput e §§, e art. 7 o , I, do CP) pouco
importa que o agente tenha sido julgado no estrangeiro pelo mesmo fato. Contra ele incidirá
a nossa lei penal e, caso condenado pela Justiça brasileira, sofrerá a respectiva sanção
penal. Portanto, entre nós não vigora o princípio – existente nos países que seguem o
modelo da common law – que veda a possibilidade de duplo julgamento ( double jeopardy).
Dito de outro modo, em tais hipóteses, haverá o bis in idem. Apenas a extraterritorialidade
condicionada é que se subsume a este princípio restritivo (cf. art. 7 o , § 2 o , “d”, do CP).
No entanto, para abrandar o rigor daquela disposição, a 1ª parte do art. 8 o , do CP diz que a
pena que foi cumprida no estrangeiro, pelo mesmo fato, atenua a pena a ser executada no
Brasil. A 2ª parte do art. 8º, do CP, assinala que se forem penas idênticas, ou seja, da mesma
espécie, deve o magistrado computar a pena estrangeira na pena brasileira. Computar, em
termos matemáticos, significa “abater” ou “subtrair”. OBS: Para alguns doutrinadores, a
regra do art. 8º, do CP, teria sido parcialmente revogada em razão da vigência da
Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de São José da Costa Rica (Decreto n
o 678/1992,) que, no seu art. 8º , §4º, dispõe que o acusado absolvido por sentença passada
em julgado não poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos. Dessa maneira,
argumenta-se que caso a Justiça estrangeira absolva o agente, não seria mais possível o
cumprimento de pena imposta pela Justiça brasileira, em razão da hierarquia de tratados de
direitos humanos – equiparados a “emendas constitucionais” por força do art. 5º, § 3 o , da
CF/1988, com a redação da Emenda Constitucional n o 45/2004.

Eficácia de sentença penal estrangeira: Segundo o art. 9º , do CP, a sentença estrangeira,


quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas consequências – isto é,
quando o fato também for crime no Brasil –, pode ser homologada para: (1) obrigar o
condenado à reparação do dano, restituição da coisa ou a outros efeitos civis; e (2) sujeitá-
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

lo à medida de segurança, no caso de inimputável ou semirresponsável que necessite de


especial tratamento curativo (cf. art. 26, caput , ou parágrafo único, do CP). O parágrafo
único, do art. 9º, do CP, estabelece os requisitos para a homologação da sentença penal
estrangeira, sendo certo que a competência para tanto é do Superior Tribunal de Justiça,
conforme o art. 105, I, “i”, da CF/1988, com a redação da Emenda Constitucional n o
45/2004. Não é admissível a homologação da sentença penal estrangeira para que no Brasil
surta seu principal efeito: a imposição de pena. Portanto, admite-se a homologação tão
somente para efeitos secundários. Em síntese, a homologação da pena estrangeira não pode
ocorrer no ordenamento jurídico brasileiro.

Transferência de presos: É o ato de colaboração penal internacional por meio do qual se


transporta a fase de cumprimento de determinada pena, em regra privativa de liberdade, do
país onde se encontra o condenado pela Justiça estrangeira para o país de sua
nacionalidade. E estão em vigor no Brasil tratados de transferência com Argentina, Canadá,
Chile, Espanha, Paraguai, Portugal e Reino Unido.

Direito de extradição: a extradição vem regulada na Constituição Federal de 1988, com a


garantia da não extradição de brasileiro, nato ou naturalizado, excepcionando, no último
caso, a hipótese de delito praticado antes da naturalização ou, a qualquer tempo, por seu
comprovado envolvimento no tráfico de drogas (art. 5 o , LI, da CF/1988). A Constituição
proíbe, ainda, a extradição por crime político ou de opinião (art. 5 o , LII, CF/1988).
Classificações: Ativa e Passiva: Ativa, quando o Brasil formula o pedido a outro país, e
passiva, quando o Brasil é demandado por outro para a entrega de foragido da Justiça
estrangeira; Instrutória e executória: Na primeira, almeja-se a captura do prófugo para ser
submetido a julgamento no Estado requerente e, na segunda, o objetivo é a entrega do
extraditando para o cumprimento de pena que lhe fora imposta pela Justiça do Estado
solicitante; Mais recentemente, surgiu a figura da extradição simplificada ou voluntária,
que consiste na aceitação imediata, por parte do indivíduo perseguido internacionalmente,
da efetivação da extradição, abreviando-se, sem maiores formalidades, o processamento da
demanda, bem como o tempo da sua custódia no Estado requerido. Requisitos para a
extradição: o Brasil pode extraditar estrangeiro e apátrida. Não cabe extradição do nacional,
nato ou naturalizado. Com relação ao brasileiro nato, a extradição é proibida, em caráter
absoluto, desde a Constituição de 1934. Acerca do naturalizado, em regra, não cabe
extradição, salvo em dois casos excepcionais: (1) crime comum, cometido antes da
naturalização; e (2) comprovado envolvimento em tráfico de drogas, na forma da lei (art. 5
o , LI, da CF/1988). Outro requisito exigido para a extradição é que se trate de crime
comum, excluindo-se os crimes políticos, de opinião ou puramente militares. OBS: A
extradição não pode ser concedida se importar na aplicação de pena de morte ou pena de
prisão perpétua. Dois outros requisitos extradicionais merecem destaque: (1) a exigência da
dupla tipicidade do fato; e (2) a observância do princípio da especialidade. Com relação ao
primeiro, também conhecido como “princípio da identidade da infração”, tem-se que
nenhuma extradição terá seguimento sem que o fato motivador do pedido seja qualificado
como crime, tanto no Estado requerente como no requerido. O princípio da especialidade
significa que, após concedida a extradição, o Estado requerente deve assumir o
compromisso de não julgar o extraditado por fatos anteriores àquele que fundamentou o
pedido (cf. art. 91, I, da Lei n o 6.815/1980). OBS: desejando o Estado requerente processar

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

o extraditado por fatos havidos antes ao pedido, mas somente descobertos após a sua
entrega, deve formular ao Estado requerido um pedido de extensão de extradição.

QUESTÃO DE PROVA: Fale sobre os princípios regentes da aplicação da lei penal do


espaço?

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

6.b. Crimes Políticos e Crimes Militares


Obras consultadas: Santo Graal 27º CPR.

Legislação: Lei 7170/83.

1. Crime político: aquele que ofende a soberania de um Estado, criando situações


desconexas com aquelas estabelecidas pelo regime político da Nação.

Dois tipos de crimes políticos: próprio: visa à desestruturação e à subversão apenas do


regime político de cada Estado e somente lesam ou põem em risco a organização política
(Celso Delmanto), sem atingir outros bens do Estado ou individuais. Impróprio: visa a
lesar, também, bens jurídicos individuais e outros que não a segurança do Estado; ou seja,
ofendem também outros interesses além da organização política.

Há três critérios para se definir o crime político: a) objetivo: ataque a bens jurídicos do
Estado Democrático, ao território nacional ou à soberania; b) subjetivo: motivação política;
c) misto: no Brasil vigora o critério misto, logo, é crime político (entre nós) o previsto na
Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/83), porém, desde que cometido por motivação ou
objetivo político. Exemplo: tentar desmembrar parte do território nacional para constituir
país independente (art. 11, da Lei). Cometido esse fato com motivação política, temos um
crime político.

OBS: Crimes violentos (homicídios, sequestros) podem ser tratados como políticos se
houver uma fundamentação direta e imediatamente política, num contexto de anormalidade
institucional (Não configura crime político, para fim de obstar a acolhimento de pedido de
extradição, homicídio praticado por membro de organização revolucionária clandestina,
em plena normalidade institucional de Estado Democrático de direito, sem nenhum
propósito político imediato ou conotação de reação legítima a regime opressivo
(Extradição 1085 – Tribunal Pleno). O STF acabou reconhecendo que os fatos imputados a
Cesare Battisti eram crimes comuns, autorizando sua extradição. LFG criticou essa decisão
por entender que os crimes de Battisti foram crimes políticos contra a humanidade, com
evidente finalidade política (disputa partidária). E, para LFG, crimes políticos contra a
humanidade, em que pese com estrito escopo político, são imprescritíveis, não anistiáveis e
extraditáveis.

CF trata de crime político em duas oportunidades: a) competência do judiciário (JF


competente para julgar o crime político e STF o recurso ordinário) e b) vedação de
extradição nos crimes políticos. CF não define crime político.

STF: atos de natureza terrorista não são crimes políticos, uma vez que CF repudia o
terrorismo (art. 4º). Logo, cabe extradição pela prática de atos terroristas. Genocídio não é
crime político e permite extradição.

Supremo Tribunal Federal e a doutrina pátria têm entendido que só há crime político

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

quando presentes os pressupostos do artigo 2º da Lei de Segurança Nacional (Lei nº


7.170/83), ao qual se integram os do artigo 1º: a materialidade da conduta deve lesar real,
ou potencialmente, ou expor a perigo de lesão a soberania nacional, o regime
representativo, a Federação e o Estado de Direito, por exemplo, de forma que, ainda que a
conduta esteja tipificada na Lei de Segurança Nacional, é preciso que se lhe agregue a
motivação política.

Lei 7.170/83: esta Lei prevê os crimes que lesam ou expõem a perigo de lesão: a
integridade territorial e a soberania nacional; o regime representativo e democrático, a
Federação e o Estado de Direito; a pessoa dos chefes dos Poderes da União. Quando o fato
estiver também previsto como crime no Código Penal, no Código Penal Militar ou em leis
especiais, levar-se-ão em conta, para a aplicação desta Lei: a motivação e os objetivos do
agente; a lesão real ou potencial aos bens jurídicos mencionados no artigo anterior.

Crimes da 7.170/83: entrar em entendimento ou negociação com governo ou grupo


estrangeiro, ou seus agentes, para provocar guerra ou atos de hostilidade contra o Brasil;
tentar submeter o território nacional, ou parte dele, ao domínio ou à soberania de outro país;
aliciar indivíduos de outro país para invasão do território nacional; tentar desmembrar parte
do território nacional para constituir país independente; importar ou introduzir, no território
nacional, por qualquer forma, sem autorização da autoridade federal competente,
armamento ou material militar privativo das Forças Armadas; na mesma pena incorre
quem, sem autorização legal, fabrica, vende, transporta, recebe, oculta, mantém em
depósito ou distribui o armamento ou material militar de que trata este artigo; comunicar,
entregar ou permitir a comunicação ou a entrega, a governo ou grupo estrangeiro, ou a
organização ou grupo de existência ilegal, de dados, documentos ou cópias de documentos,
planos, códigos, cifras ou assuntos que, no interesse do Estado brasileiro, são classificados
como sigilosos; Incorre na mesma pena quem promove espionagem; sabotagem contra
instalações militares, meios de comunicações, meios e vias de transporte, estaleiros, portos,
aeroportos, fábricas, usinas, barragem, depósitos e outras instalações congêneres; integrar
ou manter associação, partido, comitê, entidade de classe ou grupamento que tenha por
objetivo a mudança do regime vigente ou do Estado de Direito, por meios violentos ou com
o emprego de grave ameaça; tentar mudar, com emprego de violência ou grave ameaça, a
ordem, o regime vigente ou o Estado de Direito; tentar impedir, com emprego de violência
ou grave ameaça, o livre exercício de qualquer dos Poderes da União ou dos Estados;
apoderar-se ou exercer o controle de aeronave, embarcação ou veículo de transporte
coletivo, com emprego de violência ou grave ameaça à tripulação ou a passageiros;
devastar, saquear, extorquir, roubar, sequestrar, manter em cárcere privado, incendiar,
depredar, provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo, por
inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de
organizações políticas clandestinas ou subversivas; revelar segredo obtido em razão de
cargo, emprego ou função pública, relativamente a planos, ações ou operações militares ou
policiais contra rebeldes, insurretos ou revolucionários; fazer, em público, propaganda:de
processos violentos ou ilegais para alteração da ordem política ou social; de discriminação
racial, de luta pela violência entre as classes sociais, de perseguição religiosa; de guerra;
incitar: à subversão da ordem política ou social; à animosidade entre as Forças Armadas ou
entre estas e as classes sociais ou as instituições; à luta com violência entre as classes

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

sociais; à prática de qualquer dos crimes previstos nesta Lei; constituir, integrar ou manter
organização ilegal de tipo militar, de qualquer forma ou natureza armada ou não, com ou
sem fardamento, com finalidade combativa; fazer funcionar, de fato, ainda que sob falso
nome ou forma simulada, partido político ou associação dissolvidos por força de disposição
legal ou de decisão judicial; caluniar ou difamar o Presidente da República, o do Senado
Federal, o da Câmara dos Deputados ou o do Supremo Tribunal Federal, imputando-lhes
fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação; ofender a integridade corporal ou a
saúde de qualquer das autoridades mencionadas no artigo anterior; qualifica se resulta lesão
grave ou morte; matar qualquer das autoridades.

2. Crimes Militares:

Origem do direito militar no Brasil: 1808 (Conselho Supremo Militar de Justiça).

Conceito de crime militar: O Brasil adotou para definir como crime militar o aspecto
formal, ou seja, o legislador enumera, taxativamente, por meio de lei, as condutas tidas
como crime militar. Assim, em regra, crime militar são condutas descritas no Código Penal
Militar – CPM, Decreto-Lei nº 1.001 de 21 de outubro de 1969, o qual, também, por via do
seu artigo 9º estabelece outros critérios como em razão da pessoa, em razão do local.

Os crimes militares podem ser: a) puros ou próprios (puramente militares): somente estão
definidos no Código Penal Militar e cuja ação penal somente pode ser intentada contra
militares, ou seja, exige-se uma qualidade pessoal do agente, tais como a Deserção, a
Embriaguez em Serviço e a Violência contra Superior; em virtude da existência de delitos
militares que não possuem igual definição na lei penal comum e que são passíveis de
cometimento por civis (p. ex: Dos Crimes contra o Serviço Militar e o Dever Militar), não
se pode afirmar que crimes propriamente militares são todos aqueles que não possuam igual
definição na legislação comum, como alguns conceituam, uma vez que os delitos acima
mencionados não encontram definição no Código Penal e são cometidos por civis. b)
impróprios: aqueles cuja definição típica também está prevista na lei penal comum, como,
por exemplo, os crimes de peculato e falsidade ideológica. A natureza castrense do fato
delituoso, no caso de crime impróprio, resulta da conjugação de diversos elementos
definidos no art. 9º, II, "c", e no art. 10, III, ambos do CPM, dentre os quais se destacam a
condição funcional do agente e a do sujeito passivo da ação delituosa, impondo-se, ainda,
para a caracterização do ilícito penal militar, a condição do agente se encontrar em situação
de atividade (REsp 555396 / MS). Situação de atividade é aquela em que ele não está na
reserva ou reforma. Os crimes impropriamente militares, ou acidentalmente militares,
podem ser cometidos por militares e, em situações excepcionais, também por civis. Ou seja,
são os que, comuns em sua natureza, podem ser praticados por qualquer cidadão, civil ou
militar, mas que, quando praticados por militar em certas condições, a lei considera
militares, como os crimes de homicídio e lesão corporal, os crimes contra a honra, os
crimes contra o patrimônio, os crimes de tráfico ou posse de entorpecentes, o peculato, a
corrupção, os crimes de falsidade, entre outros. São também impropriamente militares os
crimes praticados por civis, que a lei define como militares, como o de violência contra
sentinela (CPM, art. 158)
131
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Art. 9º do CPM: o legislador adotou o critério 'ratione legis', isto é, crime militar é o que a
lei obviamente considera como tal. Como se observa abaixo, a lei adotou critérios
doutrinários como 'ratione materiae', 'loci', 'personae' ou 'ratione numeris'. Ou seja, os
crimes militares são aqueles definidos em lei, adotando-se, portanto, o critério ratione legis,
conforme se depreende da leitura do inciso LXI do artigo 5º, artigo 124 e § 4º do artigo
125, todos da Carta Magna.

Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz: I - os crimes de que trata êste
Código, quando definidos de modo diverso na lei penal comum, ou nela não previstos,
qualquer que seja o agente, salvo disposição especial; II - os crimes previstos neste
Código, embora também o sejam com igual definição na lei penal comum, quando
praticados: a) por militar em situação de atividade ou assemelhado, contra militar na
mesma situação ou assemelhado; b) por militar em situação de atividade ou assemelhado,
em lugar sujeito à administração militar, contra militar da reserva, ou reformado, ou
assemelhado, ou civil; c) por militar em serviço ou atuando em razão da função, em
comissão de natureza militar, ou em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à
administração militar contra militar da reserva, ou reformado, ou civil; d) por militar
durante o período de manobras ou exercício, contra militar da reserva, ou reformado, ou
assemelhado, ou civil; e) por militar em situação de atividade, ou assemelhado, contra o
patrimônio sob a administração militar, ou a ordem administrativa militar; III - os crimes
praticados por militar da reserva, ou reformado, ou por civil, contra as instituições
militares, considerando-se como tais não só os compreendidos no inciso I, como os do
inciso II, nos seguintes casos: a) contra o patrimônio sob a administração militar, ou
contra a ordem administrativa militar; b) em lugar sujeito à administração militar contra
militar em situação de atividade ou assemelhado, ou contra funcionário de Ministério
militar ou da Justiça Militar, no exercício de função inerente ao seu cargo; c) contra
militar em formatura, ou durante o período de prontidão, vigilância, observação,
exploração, exercício, acampamento, acantonamento ou manobras; d) ainda que fora do
lugar sujeito à administração militar, contra militar em função de natureza militar, ou no
desempenho de serviço de vigilância, garantia e preservação da ordem pública,
administrativa ou judiciária, quando legalmente requisitado para aquêle fim, ou em
obediência a determinação legal superior. Parágrafo único. Os crimes de que trata este
artigo quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil serão da competência da
justiça comum, salvo quando praticados no contexto de ação militar realizada na forma do
art. 303 da Lei no 7.565, de 19 de dezembro de 1986 - Código Brasileiro de Aeronáutica.
(Redação dada pela Lei nº 12.432, de 2011)

Art. 10. Consideram-se crimes militares, em tempo de guerra: I - os especialmente


previstos neste Código para o tempo de guerra; II - os crimes militares previstos para o
tempo de paz; III - os crimes previstos neste Código, embora também o sejam com igual
definição na lei penal comum ou especial, quando praticados, qualquer que seja o agente:
a) em território nacional, ou estrangeiro, militarmente ocupado; b) em qualquer lugar, se
comprometem ou podem comprometer a preparação, a eficiência ou as operações militares
ou, de qualquer outra forma, atentam contra a segurança externa do País ou podem expô-
la a perigo; IV - os crimes definidos na lei penal comum ou especial, embora não previstos
neste Código, quando praticados em zona de efetivas operações militares ou em território

132
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

estrangeiro, militarmente ocupado.

Subsunção nos crimes militares: não basta que ocorra a subsunção do fato à norma típica,
uma vez que os crimes militares apresentam tipicidade indireta, ou seja, há necessidade de
se complementar as normas da parte especial com algumas das situações elencadas nos
artigos 9º (em tempo de paz) ou 10 (em tempo de guerra) do CPM. Nesse contexto, diante
do caso concreto, deve-se primeiro verificar se o fato encontra subsunção em algum dos
delitos previstos no Livro I (Crimes militares em tempo de paz) ou no Livro II (Crimes
militares em tempo de guerra) para, em sequência, apontar se as circunstâncias que
envolvem o delito amoldam-se aos critérios previstos nos incisos I, II e III do artigo 9º e 10.
Poderíamos assim sintetizar a caracterização do crime militar, respondendo
afirmativamente às três assertivas abaixo: 1º) o fato está previsto na parte especial do
CPM? 2º) a conduta se amolda às circunstâncias previstas em algum dos incisos do artigo
9º? 3º) a Justiça Militar é competente para julgar o sujeito ativo do crime (justiça militar
estadual não julga civil)?

Atenção: O crime militar não se limita aos atos praticados por militares da ativa, mas
também se inserem nas condutas praticadas por militares inativos (reserva e reformado) e
civis. Não se pode confundir a figura do crime militar com os crimes praticados pelos
militares. O militar, estando de serviço ou de folga, pode praticar crimes definidos no CPM,
bem como crimes previstos em outras normas penais. Por outro lado, o CPM prevê diversas
figuras típicas que podem ser praticadas por civis.

CF: à Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei (artigo
124). Vê-se, portanto, que a Justiça Militar Federal tem sua competência delimitada ratione
materiae, ou seja, incumbe-lhe, sem exceções, julgar os delitos castrenses definidos em lei,
sejam estes praticados por militares da ativa, da reserva, reformados ou por civis,
apontando-se, em relação aos inativos e aos civis, que, nos exatos termos do inciso III do
artigo 9º, sua conduta deve ter por finalidade ofender as Instituições Militares. A Justiça
Militar Estadual, por sua vez, não possui competência tão abrangente quanto a sua
congênere. De acordo com o § 4º do artigo 125 da CF/88, compete-lhe processar e julgar os
militares dos Estados nos crimes militares definidos em lei. Nota-se, assim, que sua
competência é ratione materiae e ratione personae, ou seja, sua área de atuação é mais
restrita que a Justiça Militar Federal, uma vez que se lhe atribui competência para julgar,
apenas, os crimes militares praticados pelos militares estaduais, os quais, por força do
artigo 42, abrangem os membros das Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros
Militares. Justiça militar estadual não julga civil.

OBS: não cabe (Damásio de Jesus sustenta que cabe) aplicação dos institutos da 9099/95 na
justiça militar (o art. 90-A da 9.099/95 veda), mas cabe suspensão condicional da pena, na
forma do CPM.

Estrutura da Justiça Militar na CF:

Art. 122. São órgãos da Justiça Militar: I - o Superior Tribunal Militar; II - os Tribunais e
Juízes Militares instituídos por lei.

133
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Art. 123. O Superior Tribunal Militar compor-se-á de quinze Ministros vitalícios,


nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo Senado
Federal, sendo três dentre oficiais-generais da Marinha, quatro dentre oficiais-generais do
Exército, três dentre oficiais-generais da Aeronáutica, todos da ativa e do posto mais
elevado da carreira, e cinco dentre civis. Parágrafo único. Os Ministros civis serão
escolhidos pelo Presidente da República dentre brasileiros maiores de trinta e cinco anos,
sendo: I - três dentre advogados de notório saber jurídico e conduta ilibada, com mais de
dez anos de efetiva atividade profissional;II - dois, por escolha paritária, dentre juízes
auditores e membros do Ministério Público da Justiça Militar.

Art. 124. à Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei.
Parágrafo único. A lei disporá sobre a organização, o funcionamento e a competência da
Justiça Militar.

Art. 125. ... § 3º A lei estadual poderá criar, mediante proposta do T ribunal de Justiça, a
Justiça Militar estadual, constituída, em primeiro grau, pelos juízes de direito e pelos
Conselhos de Justiça e, em segundo grau, pelo próprio Tribunal de Justiça, ou por
Tribunal de Justiça Militar nos Estados em que o efetivo militar seja superior a vinte mil
integrantes. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) § 4º Compete à
Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares
definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a
competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir
sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças. (Redação dada
pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) § 5º Compete aos juízes de direito do juízo
militar processar e julgar, singularmente, os crimes militares cometidos contra civis e as
ações judiciais contra atos disciplinares militares, cabendo ao Conselho de Justiça, sob a
presidência de juiz de direito, processar e julgar os demais crimes militares. (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 45, de 2004) ...

1ª instância da Justiça Militar Federal: chama-se Conselho de Justiça, que tem como sede
uma auditoria militar. O Conselho de Justiça se subdivide em Conselho Permanente de
Justiça e Conselho de Justiça Especial. A 2ª instância é direta do STM. a) ao Conselho
Especial de Justiça: formado juiz auditor (juiz militar federal) e quatro oficiais militares,
sob a presidência do mais graduado: julgarão os oficiais das Forças Armadas. b) ao
Conselho Permanente de Justiça: formado por juiz auditor (juiz militar federal) e três
oficiais inferiores (até capitão-tenente ou capitão) e um oficial superior, que será o
presidente: julgarão os integrantes das Forças Armadas não oficiais (praças).

1ª instância da Justiça Militar Estadual: a) Juízes de Direito, a quem compete julgar os


crimes militares praticados contra civis e as ações judiciais contra atos disciplinares
militares (habeas corpus, mandado de segurança, ações civis ordinárias, etc.); b) Conselhos
de Justiça, presididos pelo Juiz de Direito e integrados por quatro oficias da ativa
escolhidos mediante sorteio realizado pelo Juiz togado. Há duas espécies de Conselhos de
Justiça: o Permanente, para julgar praças (do soldado ao subtenente) e praças especiais
(cadete e aspirante a oficial), e o Especial, para julgar os oficiais (do 2º tenente ao Coronel).
A 2ª instância em SP, MG e RS é do TJ Militar (com militares participando da composição).
Nos demais Estados a 2ª instância será uma Câmara Especializada do TJ.
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Observações finais e trechos de jurisprudência:

Justiça militar estadual não julga civil (Súmula 53 do STJ). Logo, civil que mata
dolosamente policial ou bombeiro militar em serviço ou em razão do serviço será julgado
pelo Júri estadual.

Crime militar e crime comum conexos: cisão processual.

Civil que mata dolosamente militar federal em serviço ou em razão do serviço: justiça
militar federal (STF HC 91003 BA). Não há tribunal do júri militar.

Militar federal ou estadual mata dolosamente civil: júri (federal ou estadual) julgará, e o
crime será o do art. 121 do CP. Se vítima for militar, crime militar e justiça militar julgará.

Crime de militar contra militar em folga: justiça comum. HC 110286/RJ, rel. orig. Min.
Dias Toffoli, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 14.2.2012. (HC-110286).

Se justiça comum julga militar por crime comum (ex: tortura), a justiça comum lhe
determina a perda do oficialato. A JM o faz nos crimes militares (STF, maio de 2012: AG.
REG. NO AI N. 769.637-MG)

Júri julgará (e não JM): militar mata por motivo privado, sem relação com as funções. HC
N. 103.812-SP.

Pode ocorrer de ser processado na JF e também na JM pelo mesmo contexto criminoso,


desde que por crimes distintos. Exemplo: responder na JF por crime de atentado contra a
segurança aérea (art. 261 do CP) e na JM por inobservância de lei, regulamento ou
instrução e por homicídio culposo.HC 105301/MT, rel. Min. Joaquim Barbosa, 5.4.2011.
(HC-105301)

PM atira culposamente em oficial do Exército dentro de quartel federal: justiça militar


federal julga, pois houve lesão indireta à União. CC 107.148-SP, Rel. Min. Maria Thereza
de Assis Moura, julgado em 13/10/2010.

Justiça comum julgar civil que causa lesão culposa em militar federal no serviço. HC
99671/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 24.11.2009. (HC-99671).

Crime militar praticado conexo (ligado, relacionado) a crime comum: haverá cisão
processual, ou seja, pelo crime militar responde-se no juízo militar, pelo comum, no
comum. Se foi absolvido do crime comum na justiça comum, isso não implica absolvição
no juízo militar. HC N. 97.572-SP

Furto de bem particular (pertencente a servidor militar) dentro de unidade militar: justiça
comum. Não houve violação (invasão) às instituições militares. CC 115.311-PA, 2011.

Justiça militar julga militar da ativa em crime contra civil em lugar sujeito à administração
militar: CC 106.623-DF.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Justiça militar: lesão corporal de militar contra civil. Não houve animus necandi. CC
120.201-RS, Rel.Min. Laurita Vaz, julgado em 25/4/2012.

Justiça militar não julga pichação em prédio residencial sujeito à administração militar. É
excepcional a prática, por civil, de crime militar. HC 100230/SP, rel. Min. Ayres Britto,
17.8.2010. (HC-100230) .

Policial militar reformado que injuria dois PM´s em serviço: juiz de direito. A competência
da justiça militar tem interpretação restritiva. HC 125.582-SP, em 27/4/2010.

Cabe à justiça comum (e não militar): homicídio culposo em acidente em que vítima e
acusado sejam militares, fora do serviço nem em lugar sujeito à administração militar
(concurso do TJ ES 2011).

Juízo comum pode decretar a perda da função pública por militar condenado por crime
comum (prova do TJ ES 2011).

Insignificância e crime militar: os requisitos para reconhecimento da insignificância no


crime militar são mais severos que no direito comum, pois se levam em conta hierarquia e
disciplina. Não cabe insignificância na posse de droga (art. 290 do CPM).

HC 107688 / DF - DISTRITO FEDERAL Julgamento: 07/06/2011: A questão da posse de


entorpecente por militar em recinto castrense não se define pela quantidade, nem mesmo
pelo tipo de droga que se conseguiu apreender. O problema é de qualidade da relação
jurídica entre o particularizado portador da substância entorpecente e a instituição castrense
de que ele fazia parte, no instante em que flagrado com a posse da droga em pleno recinto
sob administração militar. 2. A tipologia da relação jurídica em ambiente militar é
incompatível com a figura própria da insignificância penal, pois, independentemente da
quantidade ou mesmo da espécie de entorpecente sob a posse do agente, o certo é que não
cabe distinguir entre adequação apenas formal e adequação real da conduta ao tipo penal
incriminador

HC 108884 / RS - RIO GRANDE DO SUL, Julgamento: 12/06/2012: A pertinência do


princípio da insignificância deve ser avaliada considerando não só o valor do dano
decorrente do crime,mas igualmente outros aspectos relevantes da conduta imputada. 2. O
pequeno valor da vantagem auferida é insuficiente para aplicação do princípio da
insignificância ante a elevada reprovabilidade da conduta do militar da reserva que usa
documento falso para não pagar passagem de ônibus. 3. Aos militares cabe a guarda da lei e
da ordem, competindo-lhes o papel de guardiões da estabilidade, a serviço do direito e da
paz social , razão pela qual deles se espera, ainda que na reserva, conduta exemplar para o
restante da sociedade, o que não se verificou na espécie. 4. Ordem denegada.

Súmulas do STF e STJ sobre crimes militares:

STF

Súmula 694: Não cabe "habeas corpus" contra a imposição da pena de exclusão de militar

136
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ou de perda de patente ou de função pública.

Súmula 555: É competente o tribunal de justiça para julgar conflito de jurisdição entre juiz
de direito do estado e a justiça militar local.

Súmula 298: O legislador ordinário só pode sujeitar civis à justiça militar, em tempo de paz,
nos crimes contra a segurança externa do país ou as instituições militares.

STJ

Súmula 192: Compete ao juízo das execuções penais do estado a execução das penas
impostas a sentenciados pela justiça federal, militar ou eleitoral, quando recolhidos a
estabelecimentos sujeitos a administração estadual.

Súmula 172: Compete a justiça comum processar e julgar militar por crime de abuso de
autoridade, ainda que praticado em serviço.

Súmula 90: Compete a justiça estadual militar processar e julgar o policial militar pela
pratica do crime militar, e a comum pela pratica do crime comum simultaneo aquele.

Súmula78: Compete a justiça militar processar e julgar policial da corporação estadual,


ainda que o delito tenha sido praticado em outra unidade federativa.

Súmula 47: Compete a justiça militar processar e julgar crime cometido por militar contra
civil, com emprego de arma pertencente a corporação, mesmo não estando em serviço.

Súmula 6: Compete a justiça comum estadual processar e julgar delito decorrente de


acidente de transito envolvendo viatura de policia militar, salvo se autor e vitima forem
policiais militares em situação de atividade.

QUESTÕES DE PROVA: Classificação dos crimes políticos. Relevância dessa


classificação para a extradição. Classificação dos crimes militares.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

6.c. Crimes contra o patrimônio: roubo, extorsão, extorsão


mediante sequestro, esbulho possessório e dano

Principais obras consultadas: Santo Graal 27. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de
Direito Penal, Vol. 3, 2012; MASSON, Cleber. Direito Penal, Vol. 2, 2012. Resumo do 26º
Concurso.

Art. 157: Roubo.

1. Tipo Objetivo. Subtrair coisa alheia móvel, para si ou para outrem, “mediante violência
ou grave ameaça a pessoa” (violência própria), “ou depois de havê-la, por qualquer meio,
reduzido à impossibilidade de resistência” (violência imprópria) (roubo próprio) “ou
quando a violência ou ameaça é exercida após a subtração, para assegurar a impunidade do
crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiros” (roubo impróprio) – OBS1: roubo
impróprio não admite violência imprópria. OBS2: a subtração, mediante violência ou grave
ameaça, para assegurar a utilização transitória do bem (“roubo de uso”), para a grande
maioria da doutrina e para o STF, tipifica o crime de roubo.

2. Bem jurídico tutelado. Inviolabilidade do patrimônio (propriedade, posse e detenção),


liberdade individual e integridade corporal.

3. Sujeito Ativo. Qualquer pessoa, exceto o proprietário.

4. Sujeito Passivo. Qualquer pessoa, incluindo o possuidor ou o terceiro que sofra a


violência.

5. Tipo Subjetivo. Dolo e o especial fim de agir – o apossamento injusto da coisa em


benefício próprio ou alheio.

6. Consumação e Tentativa. Consumação: a) roubo próprio: STF e STJ adotam a Teoria da


Amotio ou Apprehensio, consoante a qual o crime se consuma no momento em que o agente
obtém a posse da res furtiva, ainda que não seja mansa e pacífica e/ou haja perseguição
policial, sendo prescindível que o objeto do crime saia da esfera de vigilância da vítima
(STJ, AgRg no REsp 1214179). Na doutrina, entretanto, prevalece a filiação à Teoria da
Ablatio, que tem a consumação ocorrida apenas quando há a posse mansa e pacífica da
coisa subtraída (Prado, p. 303); b) roubo impróprio: a consumação se dá com o emprego da
violência ou grave ameaça à pessoa, logo depois de subtraída a coisa. Tentativa: No tocante
à possibilidade de tentativa, há divergência doutrinária: uma corrente entende inadmissível,
em quanto outra admite o conatus, se a pessoa é flagrada no momento em que está fazendo
o uso de violência ou grave ameaça.

7. Causas de aumento de pena e tipos derivados. O §2º traz as hipóteses do roubo

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

circunstanciado (Conforme súmula 443/STJ, o aumento deve ser fundamentado, não


podendo considerar apenas o número de majorantes), quais sejam: emprego de arma de
fogo (Segundo a jurisprudência, não há necessidade de apreensão e perícia na arma, se for
possível confirmar o emprego desta e sua potencialidade lesiva por outro meio de prova -
STF, HC 103046). Com relação à arma desmuniciada existem dois posicionamentos: 1º)
STF: “É irrelevante saber se a arma de fogo estava ou não desmuniciada, visto que tal
qualidade integra a própria natureza do artefato. Não se mostra necessária, ademais, a
apreensão e perícia da arma de fogo empregada no roubo para comprovar o seu potencial
lesivo - HC 102263; e 2º) STJ: “A utilização de arma inidônea (constatado pela perícia),
como forma de intimidar a vítima do delito de roubo, caracteriza a elementar grave ameaça,
porém, não permite o reconhecimento da majorante de pena” - HC 175495. “Não incide o
aumento se a arma for de brinquedo”, pois a Súmula 174, STJ, foi cancelada). Concurso de
pessoas: no concurso de duas ou mais pessoas, se um dos agentes for menor de 18 anos, o
agente maior responderá pelo roubo majorado em concurso com o crime de corrupção de
menores. STF e STJ admitem, ou seja não configura bis in idem, o concurso material entre
o crime de roubo em concurso de pessoas e o crime de quadrilha ou bando [inclusive
armado], pois os bens jurídicos são distintos - STF, HC 85183). Concurso entre roubo e
sequestro e cárcere privado: Se a vítima está a serviço de transporte de valores, se o veículo
vier a ser transportado para outro Estado ou país (exige-se a efetiva transposição dos limites
territoriais para outro estado ou país), e se o agente mantém a vítima em seu poder,
restringindo sua liberdade (haverá concurso entre o crime de roubo na forma simples [ou
com outra causa de aumento de pena] e o crime de sequestro e cárcere privado se o agente
desejar cercear a liberdade de locomoção da vítima, por qualquer outro motivo, depois da
consumação do roubo, sem nenhuma conexão com sua execução). Roubo qualificado pelo
resultado: o §3º traz a figura do crime qualificado pelo resultado, que, se for a morte,
caracteriza o latrocínio (crime hediondo). Entende-se que a violência deve ser dolosa e
durante o roubo, ao passo que o resultado morte pode ser doloso ou culposo. Lembrar da
Súmula 610/STF (“Há crime de latrocínio, quando o homicídio se consuma, ainda que não
realize o agente a subtração de bens da vítima”), de a acordo com a qual se infere que a
consumação ou tentativa do latrocínio dependerá da consumação ou tentativa de morte da
vítima, sendo indiferente a consumação ou tentativa da subtração.

STJ, HC 201.175-MS, 2013: Latrocínio é o crime de roubo qualificado pelo resultado, em


que o dolo inicial é o de subtrair a coisa, sendo que as lesões corporais ou a morte são
decorrentes da violência empregada. Embora haja divergência, prevalece no STJ que, se o
agente consegue subtrair o bem da vítima, mas não tem êxito em matá-la, há tentativa de
latrocínio, desde que fique comprovado que havia o dolo de subtrair e o dolo de matar. Por
esta razão, a jurisprudência do STJ pacificou-se no sentido de que o crime de latrocínio
tentado se caracteriza independentemente da natureza das lesões sofridas pela vítima (leve,
graves ou gravíssimas), bastando que o agente, no decorrer do roubo, tenha agido com
desígnio de matá-la. Assim, como a gravidade das lesões experimentadas pela vítima não
influencia para a caracterização da tentativa de latrocínio, pouco importa que o laudo
pericial que atestou as lesões tenha irregularidades.

Resumo da consumação do latrocínio:


Subtração: Consumada Tentada Consumada Tentada

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Morte: Consumada Tentada Tentada Consumada


Latrocínio: Consumado Tentado Tentado Consumado
(súmula 610,
STF)

STF, RHC 116676-MG, 2013: Aumento decorrente da existência de majorantes: se houver


pluralidade de causas de aumento no crime de roubo, o juiz não poderá incrementar a pena
aplicada com base unicamente no número de majorantes nem se valer de tabelas
matemática com frações de aumento. Para se proceder ao aumento é necessário que o
magistrado apresente fundamentação com base nas circunstâncias do caso concreto.

OBS: Latrocínio e pluralidade de mortes: há duas situações possíveis: 1) Se o agente deseja


subtrair patrimônio único e causa pluralidade de mortes: haverá um só crime de latrocínio.
O fato de ter havido mais de uma morte servirá para agravar a pena na 1ª fase da
dosimetria, com base nas consequências do crime, circunstância judicial prevista no artigo
59, CP. 2) Se o agente deseja subtrair pluralidade de patrimônios e causa pluralidade de
mortes: haverá pluralidade de latrocínio cometidos em concurso formal.

OBS: Emprego de arma: Hoje os Tribunais Superiores entendem que o simulacro de arma
de fogo é apta apenas para configurar a grave ameaça caracterizadora do crime de roubo,
mas incapaz de gerar a majorante.

OBS: Quando um agente mata o outro para ficar com o produto do roubo há latrocínio? A
doutrina entende haver concurso de roubo e homicídio - e não latrocínio - quando um dos
assaltantes mata o outro, para, por exemplo, ficar com todo o dinheiro subtraído, ainda que
a morte ocorra durante o assalto. Isso porque, no caso, o resultado morte atingiu o próprio
sujeito ativo do roubo. Por outro lado, se o agente efetua um disparo para matar a vítima,
mas, por erro de pontaria, acaba atingindo e matando seu comparsa, o crime é de latrocínio.
Nesse caso, ocorre a chamada aberratio ictus (art. 73), em que o agente responde como se
tivesse atingido a pessoa visada.

OBS: Homicídio em concurso com furto: Se a intenção inicial do agente era apenas a morte
da vítima, mas após a consumação do crime de homicídio, resolve subtrair os bens da
vítima, responderá pelo crime de homicídio em concurso com furto.

8. Ação Penal. Pública incondicionada.

9. Jurisprudência. A jurisprudência do STF é firme no sentido de “configurar-se concurso


formal a ação única que tenha como resultado a lesão ao patrimônio de vítimas diversas, e
não crime único”, desde que no mesmo contexto fático (HC 91615). Tratando-se de crime
contra o patrimônio, entende o STF que se houver várias mortes mas apenas um
patrimônio, trata-se de crime único de latrocínio (HC71267).

Ponto extra: Como o latrocínio é crime hediondo, vamos aproveitar o momento para ver
tabela com diferenças entre crime hediondo e crime comum.
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Art. 158: Extorsão.

1. Tipo Objetivo. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a fazer, deixar
de fazer ou tolerar que se faça algo, com o intuito de obter vantagem econômica (art. 158,
CP).

141
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

STJ, REsp 1.207.155-RS, 2013: O STJ decidiu que a extorsão pode ser feita mediante
ameaça de causar um prejuízo econômico. Assim, não se exige que a ameaça se dirija
apenas contra a integridade física ou moral da vítima. No caso concreto julgado, o agente
estava com o carro da vítima e exigiu que ela fizesse o pagamento a ele de determinada
quantia em dinheiro. Caso o pedido não fosse atendido, ele prometeu destruir o veículo.
Dessa forma, o STJ decidiu que pode configurar o crime de extorsão a exigência de
pagamento em troca da devolução do veículo furtado, sob a ameaça de destruição do bem.

2. Bem jurídico tutelado. O patrimônio e a integridade física e psíquica do ser humano.

3. Sujeito Ativo. Qualquer pessoa.

4. Sujeito Passivo. Qualquer pessoa, inclusive quem sofre o constrangimento sem lesão
patrimonial.

5. Tipo Subjetivo. É o dolo e o elemento subjetivo do injusto consistente no fim de obter


indevida vantagem econômica.

6. Consumação e Tentativa. Trata-se de crime formal, consumando-se com o emprego da


violência ou grave ameaça, independentemente de obtenção da indevida vantagem (Súmula
96/STJ), e instantâneo. A obtenção da vantagem é mero exaurimento, que só interessa para
a fixação da pena. Cabe a tentativa.

Resumo:

Se o agente constrange a vítima, mas ela Tentativa.


não faz o exigido:
Se o agente constrange a vítima e ela faz o Consumado.
exigido, mas não se consegue a vantagem
econômica:
Se o agente constrange a vítima, ela faz o Consumado (a obtenção da vantagem
exigido e se consegue a vantagem econômica é mero exaurimento a ser
econômica: considerado na fixação da pena).
Se o agente constrange a vítima e ela faz o Consumado.
exigido, mas depois desfaz (ex: passa o
cheque exigido e depois o susta):
7. Conduta: A conduta constranger significa coagir alguém a fazer algo, tolerar que se faça
ou deixar de fazer alguma coisa. A conduta se dá mediante violência (física) ou grave
ameaça.

OBS: Extorsão ≠ Roubo ≠ Concussão: Diferencia-se do roubo pelo fato de, neste último, a
conduta da vítima é irrelevante para a subtração da coisa, enquanto que, na extorsão, a
participação da vítima é essencial para a obtenção da vantagem (PRADO, 2010, p. 332). A
extorsão não admite violência imprópria, ao contrário do roubo. Não se admite
continuidade delitiva entre roubo e extorsão já que não são delitos da mesma espécie, pois

142
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

previstos em tipos penais diversos, bem como seus modos de execução são distintos (STF,
HC 67181 e STJ, REsp 437157). Distingue-se da concussão, pois nesta o agente é
funcionário público que, sem usar violência à pessoa ou grave ameaça, exige vantagem
indevida em razão de sua função.

8. Causa de aumento de pena e tipos derivados.: No §1º, há causa de aumento de pena pelo
concurso de pessoas ou emprego de arma (“A Terceira Seção desta Corte Superior, após o
julgamento do EREsp n.º 961.863/RS, pacificou entendimento no sentido de serem
dispensáveis a apreensão da arma e a realização de exame pericial para que incida o
aumento na pena por uso de arma em roubo, quando existirem nos autos outros elementos
probatórios que levem a concluir pela sua efetiva utilização no crime” - STJ, HC 179596 de
26/06/12). Extorsão qualificada: No §2º, prevê-se a hipótese de crime qualificado pelo
resultado lesão corporal grave ou morte (que somente se caracteriza se a extorsão é pratica
mediante violência, não, pois, mediante grave ameaça). OBS: se houver morte é crime
hediondo. Sequestro relâmpago: E, no §3º, prevê-se o denominado “sequestro-relâmpago”,
muito comumente praticado quando a vítima, que tem sua liberdade restringida, é levada
para um caixa-eletrônico e forçada a fornecer a senha do cartão para que o agente efetue
saques em sua conta corrente. Distingue-se do roubo majorado do art. 157, § 2º, V, pois
aqui não há subtração, sendo exigido efetiva colaboração da vítima para a obtenção da
vantagem. OBS: Sequestro relâmpago com resultado morte é crime hediondo? Há
divergência na doutrina: 1ª corrente: Sanches: O art. 158, §30 nada mais é que
desdobramento formal do tipo do art. 158, §2°, pois o legislador apenas definiu um modus
operandís do crime de extorsão. Desta forma, se a extorsão com morte é crime hediondo, a
extorsão com morte, com restrição da liberdade da vítima como condição necessária para a
obtenção da vantagem econômica, também o é. Pouco importa a forma de execução do
delito (com privação ou sem privação ou restrição da liberdade da vítima). Toda extorsão
com morte (por vontade do legislador e da lei) é crime hediondo. O §3° do art. 158 apenas
detalhou uma forma de execução do delito (com privação ou restrição da liberdade da
vítima). O que vale para a extorsão (simples) com morte, vale também para a extorsão
(específica) com morte. Concluindo: o crime de extorsão previsto no § 3.° do art. 158 do
CP, quando resulta morte, é crime hediondo, por força de uma interpretação extensiva do
§2°. Mas nem todas as disposições da lei dos crimes hediondos são aplicáveis, ou seja,
somente as constitucionalmente legítimas é que podem ser sustentadas no Estado humanista
de Direito, que é a síntese do Estado legal, constitucional e internacional de Direito. 2ª
corrente: Guilherme de Souza Nucci: [corrente majoritária] leciona que o descuido do
legislador não permite considerar o sequestro relâmpago como crime hediondo, em
nenhuma de suas formas: "A forma eleita para transformar delitos em hediondos é a
inserção no rol do art. 1° da Lei 8.072/90. É o critério enumerativo (...). Não constar desse
rol elimina a infração penal do elenco dos hediondos. A falha é, pois, evidente. São
hediondos o roubo com resultado morte (mas não 0 roubo com resultado lesão grave), a
extorsão qualificada pela morte (mas não a extorsão com resultado lesão grave), a extorsão
mediante sequestro, com resultado lesão grave ou morte. Não se menciona a extorsão com
restrição à liberdade, mesmo que com resultado lesão grave ou morte (art. 158, § 3.0, CP)
(...). O novo delito do sequestro relâmpago, com resultado lesão grave ou morte da vítima,
tem penas compatíveis com a gravidade do fato, mas não ingressa no contexto da Lei
8.072/90”.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

9. Ação Penal. Pública incondicionada.

10. Prescrição: Como a extorsão é crime formal, o prazo prescricional tem início no dia em
que o agente constrangeu a vítima e esta fez o que foi exigido, não importando a data do
recebimento da vantagem.

Art. 159: Extorsão mediante Sequestro

1. Tipo Objetivo. Sequestrar pessoa, isto é, arrebatá-la, tirá-la de circulação, a fim de obter
vantagem (de natureza econômica), como condição ou preço do resgate.

2. Bem jurídico tutelado. Inviolabilidade patrimonial e liberdade pessoal.

3. Sujeito Ativo. Qualquer pessoa.

4. Sujeito Passivo. Qualquer pessoa, não sendo necessário que a vítima da privação da
liberdade seja a mesma que sofre a lesão patrimonial. OBS: Se um animal for enclausurado,
condicionando-se sua soltura ao pagamento de preço, estaremos diante do crime de
extorsão, previsto no art. 158 do CP.

5. Tipo Subjetivo. O dolo, consistente na vontade livre e consciente de sequestrar, e o


elemento subjetivo do injusto (fim de obter vantagem indevida).

6. Consumação e Tentativa. É crime formal, consumando-se com a privação da liberdade da


vítima, independentemente da obtenção da vantagem. É crime permanente, admitindo
flagrante a qualquer tempo da privação, começando a correr a prescrição somente depois da
liberdade da vítima.

7. Tipos derivados e causa de redução da pena. Qualificação pelo resultado: No §1º, há a


modalidade qualificada, quando o sequestro durar mais de 24 horas (trata-se de hipótese de
“crime a prazo”, uma vez que sua existência se condiciona ao transcurso de determinado
prazo legalmente previsto), se a vítima é menor de 18 anos ou maior de 60 (a idade da
vítima se afere por prova documental, bem como deve ser alcançada pelo dolo do agente,
sob pena de erro de tipo quanto à qualificadora), ou se o crime é praticado por quadrilha ou
bando (depende, portanto, da associação de mais de 3 pessoas). Qualificação pelo
resultado: Nos §§2º e 3º, há previsão do crime qualificado pelo resultado lesão corporal
grave ou morte da vítima (Há uma diferença em relação ao latrocínio e a extorsão simples
qualificada pelo resultado, pois aqui o resultado qualificador emana do “fato”, e não
necessariamente “da violência” tal como exigido naquelas outras figuras). Delação
premiada: Por fim, no §4º, há hipótese de causa especial de redução de pena, a delação
premiada, autorizando-se a redução da pena do agente que denunciar os comparsas,
facilitando a libertação da vítima [ou seja, os requisitos são: concurso de pessoas, que um
dos agentes denuncie e que efetivamente facilite a liberação do sequestrado]. OBS: Delação
premiada e pagamento do sequestro: o pagamento ou não do resgate não se insere dentre os
requisitos da delação premiada. Portanto, independentemente da diminuição patrimonial,

144
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

presentes os requisitos acima apontados, é imperiosa a redução de pena prevista no


dispositivo em comento.

8. Ação Penal. Pública incondicionada.

Art. 160: Extorsão Indireta.

Caracterizada por exigir ou receber, como garantia de dívida, documento que pode ensejar
procedimento criminal contra a vítima ou terceiro. Trata-se de crime comum, doloso
(acrescido do elemento subjetivo específico consistente no “dolo de aproveitamento”),
formal na hipótese de exigir e material na hipótese de receber, e instantâneo. “Para a
configuração do delito de extorsão indireta é necessário que o documento exigido ou
recebido pelo credor se preste à instauração de procedimento criminal viável contra o
devedor, o que não ocorre com o cheque pré-datado dado em garantia de dívida, porquanto
a sua emissão, em tais condições, não constitui crime” (STJ, RT 657/351 e RSTJ 7/426).
Pode haver concurso material com o crime de denunciação caluniosa previsto no art. 339
do CP.

ESBULHO POSSESSÓRIO (art. 161, §1º, II).

Observação inicial: o conceito penal de esbulho possessório é diverso e mais restrito do que
o civil. Para que haja esbulho possessório no campo penal é necessário que a invasão tenha
por fim o esbulho, e seja praticada, em terreno ou imóvel alheio, com violência à pessoa ou
grave ameaça, ou, ainda, em concurso de pessoas. A turbação da posse, sem o propósito de
desalojamento, é conduta atípica.

Bem jurídico tutelado: A propriedade e posse legítima do imóvel. Masson acrescenta que
são tuteladas igualmente a integridade física e liberdade individual do sujeito passivo, na
medida em que o crime pode ser praticado com violência ou grave ameaça à pessoa. Esta
proteção múltipla permite classifica-lo como crime complexo. Obs.: Se o bem é objeto de
financiamento do Sistema Financeiro de Habitação há o esbulho possessório previsto na lei
especial (art. 9º da Lei 5741/71), sendo que, segundo o STJ, não haverá atração da
competência federal uma vez que não se verifica a afetação de bens, serviços ou interesses
da União ou da Caixa Econômica (CC 28.707/SP de 2005).

Sujeito ativo: Qualquer pessoa, exceto o proprietário ou co-proprietário. Mesmo contra


possuidor direto exclui-se a possibilidade do proprietário devido a elementar “terreno ou
edifício alheio”. Se concorrem apenas duas pessoas é concurso eventual, nos termos do 29
do CP (desde que cometido mediante violência à pessoa ou grave ameaça). Mais de duas
pessoas configura o concurso necessário, elementar da estrutura típica do crime (sendo
dispensável, nesta hipótese, a violência à pessoa ou grave ameaça).

Sujeito passivo: O proprietário e/ou o possuidor do imóvel (proprietário, locatário,

145
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

arrendatário etc.).

Tipo objetivo (adequação típica): São elementos constitutivos: a) invasão de prédio alheio;
b) emprego de violência OU grave ameaça, OU concurso de mais de duas pessoas; c)
finalidade especial de esbulhar. O verbo invadir tem a significação de penetrar, ingressar.
Nada mais é do que o desalojamento total ou parcial (sob qualquer das 3 modalidades) do
possuidor, com invasão de seu terreno ou edifício.

Modalidades: para a tipificação do delito a lei exige que a invasão se faça,


alternativamente: a) com violência à pessoa; b) ou grave ameaça; c) mediante concurso de
mais de duas pessoas.

Na primeira hipótese (a), a violência deve ser física (vis absoluta) contra a pessoa (não
contra coisa). Na segunda hipótese (b), a ameaça deve ser grave (vis compulsiva), isto é,
séria, idônea a intimidar a pessoa coagida mediante demonstração da intenção de causar um
mal relevante a si ou a pessoa a ela ligada por laços parentesco ou amizade. Assim, pode-se
ter a violência real ou ficta (grave ameaça). Na terceira hipótese (c), mediante o concurso
de mais de duas pessoas (alguns doutrinadores identificam aqui uma situação de violência
presumida). Em vista da expressão usada na lei, a doutrina diverge a respeito da quantidade
de pessoas exigida para a configuração do crime nesta hipótese, havendo: o autor e mais
três, num total de 4 pessoas (Damásio, Fragoso, Delmanto, Regis Prado, etc.; majoritária),
enquanto outros (minoria) entenderam pelo mínimo de três pessoas, incluindo o autor
(Hungria, Bittencourt). OBS: O concurso de mais pessoas que o mínimo exigido pelo tipo
não é qualificadora ou majorante, mas serve apenas como elementar indicativa do modus
operandi escolhido pelo agente para vencer a resistência do possuidor.

Objeto material: é terreno ou edifício alheio, bem como a pessoa atingida pela violência ou
grave ameaça.

Tipo subjetivo: constituído pelo elemento subjetivo geral: Dolo (vontade livre e consciente
de invadir) e o elemento subjetivo especial do tipo para o fim de esbulho possessório, que é
o especial fim de agir. Basta que a finalidade da ocupação seja esta, sendo desnecessário
que agente efetivamente a consiga. No entanto, o intuito deve ser o de esbulho
(desapossamento) e não de mera turbação (perturbação). Não há modalidade culposa.

OBS: o STF entende que invasões de propriedades rurais (e também urbanas) praticadas
por movimento popular visando à implantação da reforma agrária caracteriza o crime em
questão, ainda que amparadas em uma suposta busca incessante por uma justa distribuição
de terras (ADI 2213 de 2002).

OBS: Se o esbulho for cometido contra imóveis vinculados ao Sistema Financeiro da


Habitação, aplica-se a Lei 5.741/71. Se o esbulho for cometido contra terras da União, dos
Estados e dos Municípios, ou de órgãos ou entidades federais, estaduais ou municipais,
destinadas à Reforma Agrária, aplica-se a lei 4.947/66.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Consumação: com a invasão (mediante violência ou grave ameaça ou concurso de duas ou


mais pessoas). É crime formal, não precisa concretizar o esbulho, que seria mero
exaurimento. Havendo, na prática do esbulho, alteração de limites, esta ficará absorvida.

Tentativa: admite-se já que se trata de delito plurissubsistente.

Usurpação em concurso com violência: O artigo 161, §2º, afirma que se o agente usa de
violência, incorre também na pena a esta cominada. A doutrina entende que esta previsão
vale para qualquer forma de caracterização do esbulho, tratando-se de concurso material
obrigatório (em sentido diverso, Bittencourt explica que se o ato de violência configura
crime haverá concurso formal [pois não haveria pluralidade de condutas] com cúmulo
material de aplicação de penas, e não concurso material.

Ação penal: Se a propriedade é particular e não há emprego de violência contra pessoa (é


indiferente a ameaça), a ação penal é de iniciativa privada (queixa-crime). A ação, porém,
será pública incondicionada, ocorrendo qualquer das hipóteses contrárias.

Classificação: Crime comum quanto ao sujeito, doloso, comissivo, formal, instantâneo e, às


vezes, permanente.

Art. 163: Dano

1. Tipo Objetivo. Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia (art. 163, CP). O dano pode
ser total ou parcial. O objeto material do crime é a coisa alheia (bens móveis ou imóveis,
públicos ou privados).

2. Bem jurídico tutelado. Patrimônio, visando a garantir a integridade da posse e a


propriedade. 3. Sujeito Ativo. Qualquer pessoa; excepcionalmente, o proprietário e o
condômino.

4. Sujeito Passivo. O proprietário ou possuidor.

5. Tipo Subjetivo. Dolo (não comporta modalidade culposa).

6. Consumação e Tentativa. O crime se consuma com a efetiva destruição, inutilização ou


deterioração da coisa alheia. Admite-se a tentativa. Como é delito que deixa vestígios de
ordem material (crime não transeunte), a materialidade do fato depende de prova pericial,
mas, desaparecidos os vestígios, admite-se suprimento por outros meios de prova,
notadamente a testemunhal (STJ, HC 148599 de 15/12/12).

7. Distinções quanto ao objeto material: 1) se for animal silvestre, doméstico ou


domesticado, nativo ou exótico, incide o crime específico do art. 32 da Lei 9605/98; 2) se
for documento (público ou particular), afastada a hipótese em que a conduta for cometida
unicamente com o propósito de prejudicar o patrimônio da vítima, poderão ocorrer os
crimes previstos no arts. 305, 356, 336, 337, todos do CP, ou ainda aquele previsto no art.
3º, inc. I, parte final, da Lei 8137/90; 3) ato de "pichação" atualmente se encontra tipificado
147
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

no art. 65 da Lei 9.605/98 (crimes contra 0 meio ambiente); 4) Destruir, inutilizar ou


deteriorar: I - bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial; II
- arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação científica ou similar protegido
por lei, ato administrativo ou decisão judicial, configura crime do art. 62 da Lei 9.605/98;
5) Deteriorar objetos destinados ao culto religioso gera o crime do art. 208 do CP; 6)
Danificar sepultura configura o crime do art. 210 do CP; 7) Dano sobre documento (público
ou particular), em benefício próprio ou alheio ou em prejuízo de terceiro, se ajusta ao
disposto no art. 305 do CP; 8) O dano praticado por militar se subsume ao art. 259 do Dec.-
lei 1.001/69 (Código Penal Militar).

8. Formas Qualificadas. Circunstâncias qualificadoras (art. 163, parágrafo único): mediante


violência ou grave ameaça à pessoa (I) - desde que constituam meio para a prática do dano
(STJ, APn 290 de 16/03/05); emprego de substância inflamável ou explosiva (II) -
expressamente subsidiário, ou seja, somente incidirá o dano qualificado quando a lesão ao
patrimônio alheio não caracterizar crime mais grave; ser praticado contra a União, Estados,
Municípios, concessionária de serviço público ou S.E.M (III).

OBS: STJ, 2013: A qualificadora não inclui o DF, autarquias, empresas públicas,
permissionárias, etc., pois não elas não foram incluídas no tipo penal incriminador, logo
não é possível analogia in malam partem.

OBS: Preso que danifica a cela para fugir pratica crime de dano? Aqueles que entendem ser
indispensável o animus nocendi, o fato será atípico, uma vez que a intenção do preso, no
caso, é somente a de fugir; Já para aqueles que entendem que o tipo não exige finalidade
especial (causar prejuízo), há o crime, não importando se a intenção do agente era somente
a de se evadir. A segunda posição foi acolhida pelo STF: "Comete o crime de dano
qualificado (art. 163, parágrafo único, III, do CP) o preso que, para evadir-se, danifica o
estabelecimento prisional. O dolo específico (vontade dirigida a causar dano em coisa
alheia) não é indispensável à caracterização do delito" (HC 73.189/MS, rei. Min. Carlos
Velloso, 23.02.1996).

OBS: No art. 164, tem-se o crime de introduzir ou deixar animais em propriedade alheia,
sem consentimento do proprietário, causando prejuízo (trata-se do crime de pastoreio
ilegítimo ou abusivo). Os crimes previstos nos arts. 165 e 166 foram tacitamente revogados
pelos arts. 62 e 63 da L. 9605/98.

9. Ação Penal: Os crimes do art. 163, caput (dano simples) e inciso IV do parágrafo único
(dano qualificado por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima) e do
art. 164 (introdução ou abandono de animais em propriedade alheia) são de ação penal
privada (art. 167).

QUESTÕES DE PROVA:

Qual o momento consumativo do roubo?

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Roubo impróprio admite tentativa?

O que é sequestro relâmpago?

Preso que danifica a cela para fugir comete crime de dano?

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

7.a. Limites da aplicação da lei penal em relação às pessoas


Obras consultadas: Santo Graal 27. SOUZA, Artur de Brito Gueiros e JAPIASSÚ, Carlos
Eduardo Adriano. Curso de Direito Penal.Ed. Elsevier. Ano 2012; BITENCOURT, Cezar
Roberto. Tratado de Direito Penal: parte 1. 15ª ed. Editora Saraiva. 2010; PORTELA,
Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. 3ª ed. Ed: Juspodivm.
2011.

Legislação básica: arts. 29, 30, 37, 22, 24 e 27, 2 da Convenção de Viena de 1961 sobre
Relações Diplomáticas – CVRD, promulgada pelo Brasil pelo Decreto 56.435/65. Arts. 27,
§1º, 29, VIII e 53 da CF.

1. Imunidade diplomática:

Conceito: São privilégios outorgados aos agentes diplomáticos, observado o princípio da


reciprocidade. São restrições impostas ao princípio da territorialidade temperada. As
imunidades dos diplomatas são amplas (aplicam-se a qualquer tipo de crime, inclusive
homicídios, agressões, etc.).

Espécies: Segundo Regis Prado (2008, p. 193), dividem-se em: (i) inviolabilidades
(imunidade material): a pessoa do diplomata, inclusive sua família, residência e pertences,
são invioláveis, não podendo sofrer nenhuma forma de detenção ou prisão; (ii) imunidade
de jurisdição penal e civil (imunidade formal, para o processo): o agente diplomático deve
ser processado e julgado no Estado que representa, o que é extensível à sua família e aos
membros do corpo diplomático (art. 37, §§1º, 2º e 3º da CVRD). Não está obrigado a
comparecer a qualquer juízo ou tribunal do país acreditado para testemunhar ou prestar
informações (art. 31 da CVRD). OBS 1: Como visto, as imunidades (material e formal) são
extensíveis à família do diplomata, desde que esta tenha sido incluída na lista diplomática e
seus membros não sejam nacionais do Estado acreditado. O pessoal de serviços da missão
diplomática, custeado pelo Estado acreditante, só goza de imunidade penal no que concerne
a seus atos de ofício. Criados particulares, pagos pelo próprio diplomata, não têm qualquer
imunidade. A natureza jurídica desse privilégio é de causa pessoal de exclusão de pena. A
imunidade pode ser renunciada pelo Estado acreditante, mas não pelo próprio agente
diplomático. OBS 2: Os funcionários da ONU e de outras organizações internacionais
(OEA), quando em missão no território nacional, também gozam de imunidade (art. 105 da
Carta da ONU).

2. Imunidade penal relativa dos agentes consulares:

Segundo a convenção de Viena sobre Relações Consulares de 1963 (Decreto 61078/67), a


inviolabilidade física e a imunidade de jurisdição dos cônsules apenas se aplicam aos seus
atos de oficio (p. ex.: crimes relacionados à função consular – outorga fraudulenta de
passaporte). Segundo RESEK (2011, p. 203), o privilégio não se estende a membros da
família do cônsul nem às suas instalações residenciais. A prisão preventiva é permitida,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

desde que autorizada por juiz e em caso de crime grave. No julgamento do HC n. 81.158-
RJ, o STF, em 2002, confirmou a legalidade da prisão preventiva do cônsul de Israel.

3. Imunidade de Chefes e ex-Chefes de Estado e Ministro das Relações Exteriores:

Os Chefes de Estado se beneficiam de imunidade cível e penal, extensiva a sua família e


comitiva, inclusive em viagens particulares ou de férias. Tal imunidade abrange, a
princípio, ex-Chefe de Estado. Entretanto, há uma tendência mundial de querer se
responsabilizar ex-Chefe de Estado quando tiver cometido grave violação aos direitos
humanos, crimes de guerra, contra a paz e os crimes contra humanidade, em razão do
princípio da justiça universal. Precedente: Conforme decidiu a CIJ no caso da Rep. Dem.
do Congo vs Bélgica, o Ministro das Relações Exteriores possui imunidade racione
personae absoluta, não podendo lhe ser aplicado o referido princípio da justiça universal no
enforcement indireto.

4. Imunidade em relação ao direito interno:

Presidente: imunidade formal para prisão (somente com condenação transitada em julgado
por crime comum); imunidade formal para o processo penal (instauração depende de 2/3
dos votos da Câmara – art. 51, I, da CF); imunidade penal relativa (somente para crimes
não relacionados à função, anteriores ou concomitantes ao mandato) – não inclui
responsabilização civil, política, administrativa, tributária ou fiscal. Governadores e
Prefeitos: aparentemente, não há extensão de qualquer imunidade. O STF julgou, no caso
do ex-Governador do DF, José Roberto Arruda, que não há imunidade para prisão. Assim, a
tendência parece ser de não extensão dos demais benefícios.

5. Imunidade parlamentar:

Há 3 correntes sobre a sua natureza jurídica: (i) excludente de crime; (ii) excludente de
pena; e (iii) causa de incapacidade penal. Expressiva parte da doutrina adota a primeira
corrente, assim como parece ser a postura do STF.

Prerrogativas irrenunciáveis, de Direito público interno e de cunho personalíssimo,


inerentes ao exercício do mandato parlamentar (visam garantir a liberdade deste exercício).

Para os parlamentares federais, a CF/88 prevê duas espécies: (a) imunidade absoluta,
material, inviolabilidade (art. 53, caput): protege os parlamentares em suas opiniões,
palavras e votos (decorre do regime democrático), desde que relacionados às suas funções,
mesmo que a manifestação se dê fora do recinto do Congresso Nacional. Prevalece ainda
que se trate de ofensa subversiva que constitua crime contra a segurança nacional (art. 26
da Lei 7170/1983). O STF tem considerado que a natureza jurídica da inviolabilidade é de
causa de atipicidade. Há divergência doutrinária sobre esse ponto; (b) imunidade formal,
processual: Tem duas espécies: (b.1) para a prisão (freedom from arrest - art. 53, §2º) –
desde a expedição do diploma, os parlamentares não poderão ser presos, salvo em flagrante
de crime inafiançável, hipótese em que os autos deverão ser remetidos à Casa respectiva,
para que, pelo voto da maioria (votação aberta), resolva sobre a prisão. O STF já decidiu
que essa regra não se aplica na hipótese de prisão fixada por sentença transitada em

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

julgado; (b.2) para o processo (art. 53, §§3º, 4º e 5º) – a partir da EC 35/2001, o STF passou
a ter poderes para receber denuncia contra parlamentar, por crime praticado após a
diplomação, independentemente de prévia licença da casa respectiva; recebida a denuncia,
o STF dará ciência à respectiva Casa, que, por iniciativa de partido político nela
representado e pelo voto da maioria absoluta de seus membros, poderá, até a decisão final
do processo penal, sustar o seu andamento. Essa ciência à Casa respectiva não é necessária
em relação à denuncia por crime praticado pelo parlamentar antes da diplomação; em
relação a esses crimes, não poderá haver sustação do processo por decisão da Casa.

OBS 1: Suplentes e imunidades: As imunidades parlamentares não se aplicam aos


suplentes. Elas se aplicam aos Deputados Estaduais (art. 27, §1º da CF/88). Segundo se
extrai do art. 29, VIII da CF/88, os vereadores possuem imunidade material no exercício de
seu mandato e na circunscrição do Município, mas não possuem imunidade formal (nem
para o processo, nem para prisão).

OBS 2: Afastamento e imunidades: As imunidades parlamentares não se mantêm durante o


afastamento do parlamentar do exercício de suas funções (embora o foro por prerrogativa
de função se mantenha), para o exercício, por exemplo, do cargo de Ministro, Secretário de
Estado ou de Município e encerram-se com o término do mandato.

QUESTÕES DE PROVA:

Limites da aplicação da lei penal em relação às pessoas. Fale sobre o tema.

Discorri longamente sobre aplicação da lei penal a pessoas físicas e jurídicas. Ele ouviu
com atenção, mas depois quis saber, fora desse tema, se havia exclusão da aplicação da lei
penal a certas pessoas no CP. Queria ouvir sobre excusas absolutórias, me perguntou o que
eram, e em que casos era prevista.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

7.b. Penas no direito brasileiro


A) Penas privativas de liberdade. (antigo ponto 17a)
Principais obras consultadas: Santo Graal 27. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de
Direito Penal: parte geral, 2012. MASSON, Cleber. Direito Penal: Vol. 1, 2012. CUNHA,
Rogério Sanches. Execução Penal para Concursos. Salvador: Juspodivm, 2012. PACELLI,
Curso de Processo Penal, 17ª ed., 2013. GUEIROS, Artur e JAPIASSÚ, Carlos. Curso de
Direito Penal, Parte Geral. Ed. Elsevier, 2012.

1. Espécies: O Código Penal prevê duas espécies de penas privativas de liberdade: a


reclusão e a detenção. A Lei de Contravenções Penais prevê uma terceira espécie, que é a
prisão simples. A prisão simples se aplica às contravenções penais, em regime semiaberto
ou aberto, sem nenhum rigor penitenciário, tampouco isolamento noturno.

2. Diferenças entre reclusão e detenção: a) a pena de reclusão deve ser cumprida


inicialmente em regime fechado, semiaberto ou aberto. A de detenção, em regime
semiaberto ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado (artigo 33,
“caput”, CP); b) no caso de concurso material, aplicando-se cumulativamente as penas de
reclusão e de detenção, executa-se primeiro a de reclusão (artigos 69, “caput”, e 76, do CP);
c) somente a prática de crime doloso, punido com reclusão, cometido contra filho, tutelado
ou curatelado gera, como efeito da condenação, a incapacidade para o exercício do pátrio
poder, tutela ou curatela (artigo 92, II, do CP); d) em relação à medida de segurança, se o
fato praticado pelo inimputável for punido com detenção, o juiz poderá submetê-lo a
tratamento ambulatorial (artigo 97 do CP), ao passo que se for punido com reclusão
acarreta internação em hospital de tratamento e custódia; e) somente os crimes punidos com
reclusão admitem interceptação telefônica.

Estabelecimentos penais: De acordo com o art. 82 da LEP, os estabelecimentos penais


destinam-se ao condenado, ao submetido à medida de segurança, ao preso provisório e ao
egresso. Há ressalvas quanto a determinados casos especiais, como o da mulher e do idoso,
bem como acerca da estrutura do estabelecimento, como previsto no art. 83 da mesma Lei.
Há diferenças quanto aos estabelecimentos no que concerne ao tipo de pena imposta. A)
Penitenciária: Estabelecimento destinado aos condenados à pena de reclusão, em regime
fechado. Arts. 87 e 88 da LEP. B) Colônia agrícola, industrial ou similar: Estabelecimento
penal destinado a abrigar pessoas presas que cumprem pena em regime semiaberto (art. 33,
§ 1º, "b", do CP, e art. 91 da LEP). C) Casa de albergado: Pessoas presas que cumprem
pena privativa de liberdade em regime aberto ou pena de limitação de fins de semana. D)
Cadeia pública:Recolhimento de pessoas presas em caráter provisório, sempre de segurança
máxima (art. 102, da LEP). E) Centro de observação: Estabelecimento onde devem ser
realizados os exames gerais e criminológicos, cujos resultados serão encaminhados às
Comissões Técnicas de Classificação. F) Hospital de custódia e tratamento psiquiátrico:
Destina- se a abrigar pessoas submetidas à medida de segurança de internação (art. 99 da
LEP).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

3. Regime de cumprimento da pena: Por regime prisional deve-se entender a forma por
intermédio da qual se dará o cumprimento da pena imposta na sentença condenatória.
Significa, em suma, a disciplina legal a ser observada na fase executiva do processo de
individualização da sanção penal. O Código Penal adotou um sistema progressivo, que se
destina a estimular o bom comportamento do preso, mantendo a disciplina e a ordem nas
prisões (art. 33, § 2º, CP).

Tipos de regime e gênero: Para o sexo masculino, há três regimes principais: fechado,
semiaberto e aberto (arts. 34, 35 e 36, do CP). Ao lado destes, podem ser apontadas, da
análise conjunta do Código Penal com a Lei de Execução Penal, outras formas de
cumprimento de pena: regime especial para as mulheres (art. 37 do CP), regime aberto
domiciliar (art. 117 da LEP) e regime disciplinar diferenciado (art. 52 da LEP), os dois
últimos válidos, em tese, para homens ou mulheres. A distinção de gênero justifica-se
porque, sob o aspecto criminológico, a mulher delinque significativamente menos do que o
homem. Com efeito, a variável do gênero -juntamente com o fator idade - condiciona
sobremodo o quantitativo de delitos, refletindo-se, obviamente, no coletivo de
encarcerados. Não obstante não existir, no Código Penal, previsão de regime fechado,
semiaberto ou aberto para as mulheres, nada impede que, na esfera da legislação
penitenciária concorrente, os Estados estipulem estabelecimentos prisionais de segurança
máxima para o coletivo feminino.

Requisitos: A fixação do regime inicial se opera com a observância de requisitos objetivos


(tipo e quantidade de pena, além das circunstâncias do art. 59 do CP), subjetivos
(primariedade/reincidência e circunstâncias do art. 59 do CP) e os critérios elencados no
artigo 59, CP, conforme artigo 33, § 3º, CP, que são as circunstâncias judiciais, pois se
aplicar a pena base acima do mínimo legal, mesmo a pena final ficando abaixo de 4 anos
pode-se utilizar desse argumento para não iniciar o regime de cumprimento de pena como o
aberto.

Regime inicial: Para fixar o regime inicial o juiz deve observar quatro fatores: 1) O tipo de
pena aplicada: se é reclusão ou detenção; 2) o quantum da pena definitiva; 3) Se o
condenado é reincidente ou não e 4) As circunstâncias judiciais.

A aplicação dos quatro fatores se dá assim: 1) Detenção: Fechado: Nunca; Semiaberto: se a


pena for > que 4 anos; Aberto: se a pena for até 4 anos, se o condenado for reincidente é o
semiaberto. 2) Reclusão: Fechado: se a pena superior a 08 anos ou pena superior a 04 anos
se reincidente; Semiaberto: se a pena for maior que 4 anos e menor que 8 anos, se o
condenado for reincidente é o fechado; Aberto: se a pena for igual ou inferior a 04 anos
para não reincidente, se for reincidente o regime inicial pode ser o semiaberto ou o fechado,
o que irá definir isso vão ser as circunstâncias judiciais [se desfavoráveis, vai para o
fechado; se favoráveis, vai para o semiaberto. Súmula 269, STJ: é admissível a adoção do
regime prisional semiaberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro
anos se favoráveis as circunstâncias judiciais].

[Portanto: Pena > 8: regime fechado. 4 < pena ≤ 8 : pode ser regime semi aberto, desde que
não seja reincidente. Pena ≤ 4: pode ser regime aberto, desde que não seja reincidente (ou
seja: se for reincidente irá para o regime fechado como regra)].
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Atenção: na detenção o regime inicial nunca será o fechado. Porém, no caso de falta grave
durante o cumprimento da pena é possível a regressão para o fechado, mas nesse caso não
se trata mais de regime inicial de cumprimento de pena.

OBS 1: Há quatro súmulas importantes: [Súmula nº 269 / STJ - É admissível a adoção do


regime prisional semiaberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro
anos se favoráveis as circunstâncias judiciais.] Então, pela súmula 269, STJ é possível
aplicar o regime semiaberto ao reincidente, por exceção. Afinal, se ele não fosse reincidente
seria regime aberto, mas mesmo sendo reincidente, como as circunstâncias judiciais foram
favoráveis, aplica-se o regime inicial o semiaberto. [Súmula nº 440 / STJ – Fixada a pena-
base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que
o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito.
Súmula nº 718 / STF – A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não
constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido
segundo a pena aplicada. Súmula nº 719 / STF - A imposição do regime de cumprimento
mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea]. Então, a gravidade
em abstrato do delito não é fundamentação para regime mais gravoso.

OBS 2: Quando houver condenação por mais de um crime, no mesmo processo ou em


processos distintos, a determinação do regime de cumprimento será feita pelo resultado da
soma ou unificação das penas, observada, quando for o caso, a detração ou remição.
Sobrevindo condenação no curso da execução, somar-se-á pena ao restante da que está
sendo cumprida, para determinação do regime. “Se a pena foi aplicada no mínimo legal,
por serem favoráveis as circunstâncias judiciais previstas pelo art. 59 CP não pode ser
aplicado regime prisional mais gravoso” (STJ, HC 101085/RJ).

OBS 3: É possível a aplicação de regime inicial mais severo do que o previsto para a
quantidade de pena aplicada: A imposição de regime mais severo do que a quantidade de
pena reclama fundamentação idônea (Súmula 719/STF), não se prestando a opinião do
julgador sobre a gravidade em abstrato do crime para tanto (Súmula 718/STF). Então, se as
circunstâncias judiciais forem favoráveis, não pode o juiz fixar regime inicial mais gravoso.
Atenção: Por outro lado, é viável a fixação de regime semiaberto para reincidente com pena
igual ou inferior a 04 anos, desde que favoráveis as circunstâncias judiciais (Súmula
269/STJ), ou seja, apesar de reincidente, o regime inicial não será o fechado.

4. Regime em espécie: Regime fechado: executado em estabelecimento de segurança


máxima ou média. Sujeita o condenado exame criminológico pela Comissão Técnica de
Classificação, ficando sujeito a trabalho diurno e isolamento noturno em penitenciária. O
trabalho, dever social do preso – salvo para o preso político e o preso provisório –, dá-se
dentro do estabelecimento, conforme suas aptidões e capacidades, sendo admissível o
trabalho externo, sob vigilância, desde que já tenha cumprido 1/6 de pena, em obras
públicas ou para entidades privadas, neste caso com o consentimento do preso, limitados
em 10% os presos empregados na mão de obra. Caberá ao órgão da administração, à
entidade ou à empresa empreiteira a remuneração desse trabalho. A prestação de trabalho à
entidade privada depende do consentimento expresso do preso. Pode receber “permissão de
saída” escoltada, deferida pelo diretor do estabelecimento nos casos de falecimento ou
doença grave de cônjuge, companheira, ascendente, descendente e irmão ou necessidade de
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

tratamento médico (benefício também aplicável aos presos do semiaberto e aos


provisórios). É imposto quando a reclusão exceder a oito anos ou, se a condenação for por
crime decorrente de organização criminosa (art. 10, lei 9.034/95) ou crime de tortura (art.
1º, §7º, Lei 9455/97). Regime semiaberto: O condenado deve ser submetido a exame
criminológico pela CTC – a LEP diz facultativo –, ficando sujeito a trabalho diurno
externo, sob vigilância, sem isolamento noturno, em colônia penal agrícola, industrial ou
similar. “Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em
decisão fundamentada” (Súmula 439/STJ). O preso pode, mediante o benefício da “saída
temporária” (deferido pelo juiz), frequentar cursos profissionalizantes, de segundo grau ou
superior, tendo direito a saídas externas, sem vigilância direta (o que não impede o uso de
monitoração eletrônica), para visita à família ou para participação de atividades para sua
reintegração social, desde que já tenha cumprido 1/6 de pena, se primário, ou 1/4 de pena,
se reincidente. “Para a obtenção dos benefícios de saída temporária e trabalho externo,
considera-se o tempo de cumprimento de pena no regime fechado” (Súmula 40/STJ). “Ante
a falta de vaga em estabelecimento adequado para o cumprimento da pena em regime
semiaberto, devo o recorrente aguardar a abertura de vaga em regime aberto” (STF, Info
651). Regime aberto: executado em casa do albergado ou estabelecimento adequado. É
fundado na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado que deverá, fora do
estabelecimento e sem vigilância, trabalhar, frequentar curso ou exercer outra atividade
autorizada, com recolhimento prisional no período noturno e nos dias de folga. O ingresso
do condenado em regime aberto supõe a aceitação do seu programa e das condições
impostas pelo juiz (art. 113 da LEP). “Admite-se a concessão da prisão domiciliar ao
apenado, cumprindo pena em regime aberto, que se enquadre nas hipóteses previstas no art.
117 da Lei de Execução Penal ou, excepcionalmente, quando se encontrar cumprindo pena
em estabelecimento compatível com regime mais gravoso, por inexistência de vagas em
casa de albergado (Precedentes). Não se encontrando o paciente em qualquer daquelas
hipóteses, a relativa distância entre o local em que se encontra a casa de albergado e a
cidade em que alega possuir residência e trabalho fixos não é razão que autoriza a
concessão da prisão domiciliar.” (STJ, HC 44.880/MT de 17-11-2005). No mesmo sentido
o STF, HC 94526/SP de 24/06/08. Regime especial: As mulheres e os homens maiores de
60 anos cumprem pena em estabelecimento próprio, observados os direitos e deveres
inerentes à sua condição pessoal.

Disciplina e o regime disciplinar diferenciado: A disciplina penal é definida como dever


geral do preso provisório e do condenado à pena privativa da liberdade ou restritiva de
direitos. O princípio da legalidade exige prévia e expressa definição legal das faltas e das
sanções disciplinares (art. 45 da LEP). As faltas disciplinares, conforme previsto na
legislação brasileira, são definidas como graves, médias e leves (art. 49 da LEP), sendo que
as primeiras são definidas pela própria Lei de Execuções, em seu art. 50, e as demais são
estabelecidas pelas legislações dos Estados brasileiros. São faltas graves: arts. 50 e 51 da
LEP. Se a prática de falta grave tiver como resultado a subversão da ordem e da disciplina
interna, pode acarretar a imposição do Regime Disciplinar Diferenciado (art. 52 da LEP).
No direito brasileiro, as sanções disciplinares são aplicadas levando em conta a natureza, os
motivos, as circunstâncias e as consequências do fato, a pessoa do condenado, e o tempo de
prisão (art. 57 da LEP). No que se refere ao procedimento disciplinar, assegura-se o direito
à defesa e à decisão motivada, sendo certo que durante esse período admite-se o isolamento

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

celular preventivo, no interesse da disciplina e da apuração do fato (arts. 59 e 60 da LEP).


Compete ao diretor do estabelecimento penitenciário a aplicação das sanções disciplinares,
mediante o procedimento específico (arts. 47 a 54, da LEP). A única exceção é a imposição
do regime disciplinar diferenciado, que depende de decisão judicial, precedida de
manifestação do Ministério Público e a defesa do condenado (art. 54, §§ 1º e 2º, da LEP). O
Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) constitui uma alteração recente na Lei de
Execuções Penais (incluída pela Lei nº 10.792/2003). É aplicável o RDD aos presos,
condenados ou provisórios, nos seguintes casos: (1) prática de crime doloso que determine
subversão da ordem ou da disciplina interna; (2) situações de alto risco para a ordem e a
segurança do estabelecimento penal ou da sociedade; (3) situações de fundadas suspeitas de
envolvimento ou participação em organizações criminosas, quadrilha ou bando (art. 52,§§
1º e 2º, da LEP). O procedimento para imposição do RDD se inicia por requerimento
circunstanciado do diretor do estabelecimento prisional, com manifestação do Ministério
Público e respeito ao direito de defesa, mediante decisão prévia e fundamentada do juiz de
execução, por prazo de 15 (quinze) dias. Excepcionalmente, a autoridade administrativa
pode decretar o isolamento do preso por até 10 (dez) dias, sendo certo que a inclusão no
RDD dependerá, necessariamente, de decisão judicial. Esse isolamento preventivo será
detraído no período de cumprimento da sanção disciplinar (art. 60, parágrafo único, da
LEP). O RDD vem sendo objeto de inúmeras e severas críticas por parte importante da
doutrina brasileira, sob o argumento da inconstitucionalidade de tal medida, por violar,
entre outros, o princípio da dignidade da pessoa humana. No mesmo sentido, ao editar a
Resolução n2 08/ 2004, o próprio Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária
(CNPCP) acolheu o Parecer contrário à instituição do RDD, aprovado, por unanimidade,
sustentando a violação da Constituição Federal, de Tratados Internacionais de Direitos
Humanos e das Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Prisioneiros.
Ademais, ressaltou-se a incompatibilidade da nova sistemática em diversos e centrais
aspectos, tais como a falta de garantia para a sanidade do encarcerado e duração excessiva,
implicando violação à proibição do estabelecimento de penas, medidas ou tratamentos
cruéis, desumanos ou degradantes, prevista nos instrumentos citados. Por fim, sustentou-se
que a falta de definição clara das condutas, além da ausência de correspondência entre a
suposta falta disciplinar praticada e a punição decorrente, revelam que o RDD não possui
natureza jurídica desanção administrativa, sendo, antes, uma tentativa de segregar presos do
restante da população carcerária, em condições não permitidas pela legislação.

5. Progressão de regime: O artigo 33, §2º, do CP determina que as penas privativas de


liberdade devem ser executadas de forma progressiva, segundo o mérito do condenado. A
progressão baseia-se em um critério objetivo (tempo mínimo de cumprimento de pena – em
regra, ao menos 1/6 da pena) e em um subjetivo (mérito do condenado – bom
comportamento carcerário comprovado pelo diretor do estabelecimento). A decisão será
sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor. Crimes
hediondos: A progressão nos crimes hediondos ocorrerá após o cumprimento de dois
quintos (2/5), sendo o apenado primário, e de três quintos (3/5), se reincidente. Progressão
per saltum: “É inadmissível a chamada progressão per saltum de regime prisional” (Súmula
491/STJ), com a passagem de regime mais rigoroso para o mais brando, sem estágio no
regime intermediário, mesmo na hipótese de já ter cumprido o condenado tempo de pena
suficiente no regime fechado [regressão pode per saltum]. Crime contra a administração

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

pública: O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime
do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do
produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais. HC e progressão de regime: não é
possível postular progressão de regime por intermédio de habeas corpus porque o requisito
subjetivo demanda a realização de provas. Não é necessário trânsito em julgado para a
progressão: “Admite-se a progressão de regime de cumprimento da pena ou a aplicação
imediata de regime menos severo nela determinada, antes do trânsito em julgado da
sentença condenatória” (Súmula 716/STF). “Não impede a progressão de regime de
execução da pena, fixada em sentença não transitada em julgado, o fato de o réu se
encontrar em prisão especial” (Súmula 717/STF). Cláusula rebus sic stantibus: Observa-se
que o direito adquirido à fruição de um determinado regime é sempre submetido aos termos
da cláusula rebus sic stantibus, ou seja, enquanto a progressão pressupõe o concurso dos
fatores lapso de tempo e mérito do apenado, a regressão se pauta apenas neste último.
Contagem do tempo para progressão: “Cometida falta grave pelo condenado no curso do
cumprimento da pena, inicia-se a partir de tal data a nova contagem da fração de um sexto
da pena como requisito da progressão” (STF, HC 85141). Exame criminológico e a
progressão de regime: A nova redação do art. 112, da LEP, trazida de Lei nº 10.792/2003,
omitiu qualquer referência ao exame criminológico, para fins de progressão de regime - e,
por extensão, ao livramento condicional. Sendo assim, o entendimento jurisprudencial que
se consolidou foi no sentido da perda da obrigatoriedade da sua realização. Dessa forma, a
submissão do condenado ao exame criminológico passou a se constituir numa faculdade a
ser determinada pelo juiz, sempre de maneira fundamentada.28 A propósito, dispõe a
Súmula 439, do STJ: "Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso,
desde que em decisão motivada".

6. Regressão de regime: (art. 118 da LEP) A execução da pena privativa de liberdade


ficará sujeita à forma regressiva, com a transferência para qualquer dos regimes mais
rigorosos (permitindo saltar regime), quando o condenado: I - praticar fato definido como
crime doloso ou falta grave (art. 50 LEP); II - sofrer condenação, por crime anterior, cuja
pena, somada ao restante da pena em execução, torne incabível o regime (artigo 111). § 1°
O condenado será transferido do regime aberto se, além das hipóteses referidas nos incisos
anteriores, frustrar os fins da execução ou não pagar, podendo, a multa cumulativamente
imposta. § 2º Nas hipóteses do inciso I e do parágrafo anterior, deverá ser ouvido
previamente o condenado. É possível a regressão por saltos: “Conforme a inteligência do
art. 118 da LEP, a regressão de regime pode ocorrer para qualquer um dos regimes mais
gravosos, sendo despicienda a observância da forma progressiva prevista no art. 112 do
mesmo diploma legal. Precedentes.” (STJ, HC 210880 de 14/10/11). PAD: “A Lei de
Execução Penal (art. 118, § 2º) somente exige, quando do reconhecimento da falta grave, a
oitiva prévia do apenado, em audiência de justificação, onde se resguardem o contraditório
e a ampla defesa, não se exigindo a instauração de Procedimento Administrativo
Disciplinar - PAD. 2. Todavia, na Sexta Turma, passou a prevalecer o entendimento de que,
para a apuração da prática de falta disciplinar, nos termos do art. 59 da LEP, revela-se
necessária a prévia instauração de procedimento, de molde a efetivar o direito de defesa do
apenado. 3. Ordem concedida para declarar insubsistentes a falta grave e a regressão de
regime do paciente, sem prejuízo de nova apuração da infração em prévio procedimento
administrativo disciplinar, na esteira do devido processo legal” (STJ, HC 165189 de

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

21/03/12). Na sindicância para apuração de falta grave exige-se a presença de defensor


quando da oitiva do acusado, não se aplicando a Súmula Vinculante 5/STF, pois os
precedentes que a embasam estão vinculados aos Direito Administrativo (STJ, HC 193321
de 31/05/11). “É possível a regressão de regime na hipótese em que o apenado comete, no
curso do cumprimento da pena no regime semiaberto, falta disciplinar grave correspondente
a crime doloso, e o processo penal relativo à nova infração ainda não foi finalizado, pois,
para a configuração da falta grave, não é necessária a condenação criminal transitada em
julgado, tratando-se a falta disciplinar de medida a ser tomada no âmbito administrativo,
desvinculada do término da ação penal, cujo caráter é judicial, devendo ser ressaltado que,
no curso da execução penal, o preso tem direitos e deveres, sobressaindo, dentre estes, o
relativo à disciplina.” (STJ, HC 171143 de 13/08/12). “Cometida falta grave pelo
condenado, é perfeitamente cabível a regressão cautelar do regime prisional, sem a oitiva
prévia do condenado, que somente é exigida na regressão definitiva. Precedentes” (STJ, HC
184988 de 18/02/13).

7. Remição da pena: (art. 126 da LEP): Remir significa resgatar, abater, descontar, pelo
trabalho realizado dentro do sistema prisional, parte do tempo de pena a cumprir. Chama-se
remição, na lei de execução penal, à possibilidade que tem o preso, em regime fechado ou
semiaberto, de remir parte da execução da pena pelo trabalho, à razão de um dia de pena
por três dias de trabalho, ou pelo estudo (presencial ou a distância), à razão de 1 dia de pena
a cada 12 horas de frequência escolar - atividade de ensino fundamental, médio, inclusive
profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional - divididas, no
mínimo, em 3 dias. Pode haver cumulação entre trabalho e estudo. O acidente de trabalho
não impede a remição. Esta deve ser declarada pelo juiz, ouvido o Ministério Público. A
remição, nos moldes previstos, também se aplica nos casos de prisão cautelar. “Não é
cabível no aberto, pois nesse caso, o trabalho ou sua imediata possibilidade é antes
condição para início de cumprimento em tal regime ou para progressão a essa modalidade
(STJ, REsp 894305 de 01.10.2007). Em caso de falta grave, o juiz poderá revogar até 1/3
(um terço) do tempo remido, observado o disposto no art. 57 (ou seja, levar em conta a
natureza, os motivos, as circunstâncias e as consequências do fato, bem como a pessoa do
faltoso e seu tempo de prisão), recomeçando a contagem a partir da data da infração
disciplinar. Segundo o STF, Lei 12.433/2011, que reformou o art. 127 da LEP, ao substituir
a imposição de perda de todos os dias remidos pelo novo critério mais favorável, deve
retroagir por consubstanciar “lex mitior” (HC 110040 de 08/11/11).

8. Direitos dos presos: Respeito à integridade física e moral, mantendo todos os direitos
não atingidos pela sentença penal (rol exemplificativo consta dos arts. 40 e 41 da LEP).
Trabalho do preso: É um dever, sendo sempre remunerado (mas não sujeito ao regime da
CLT) e com benefícios da Previdência Social.

9. Superveniência de doença mental: analisando o caso concreto do condenado a quem


sobrevém doença mental, o juiz da execução optará entre uma simples internação para
tratamento e cure de doença passageira, hipótese em que o tempo de tratamento considera-
se como pena cumprida, ou a substituição da pena privativa de liberdade em medida de
segurança em se tratando de anomalia não passageira, seguindo, no caso, os ditames dos
arts. 96 e ss. Do CP (STJ, HC 44972/SP). Neste último caso aplica-se o instituto da

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

conversão previsto no art. 183 da LEP. “A medida de segurança detentiva aplicável nos
termos do art. 183 da LEP não pode ter duração superior ao tempo restante de pena, sem
prejuízo do que, afinal, recomende-se a providência prevista no art. 682, §2º, do CPP (se a
internação se prolongar até o término do prazo restante da pena, o indivíduo terá o destino
aconselhado pela sua enfermidade, feita a devida comunicação ao juiz de incapazes,
ficando sujeito a internação de natureza civil)” – STJ, HC 12957.

10. Detração: Detração penal é o desconto ou abatimento, no tempo definitivo da pena ou


da medida de segurança imposta na sentença, do período em que o agente esteve privado da
liberdade, no Brasil ou no estrangeiro, em virtude de prisão processual, prisão
administrativa ou internação cautelar em hospital de tratamento e custódia, conforme
referido no art. 42, do CP. Exigência de vínculo entre a pena que priva a liberdade e a
privação da liberdade que lhe antecedeu: O artigo 111 da LEP admite a possibilidade de
detração penal em razão de processos distintos. No entanto, a doutrina e a jurisprudência
entendem que o crime cuja pena sofrerá detração deve ter sido cometido anteriormente ao
período da prisão provisória determinada no processo do qual não houve condenação, sob
pena de ser formar um indevido crédito a favor do condenado (STJ, HC 155049, de
1/03/11). Não se admite saldo credor se alguém, preso cautelarmente, é, no final, absolvido
(não se admite a detração nos processos relativos a crimes cometidos após a custódia
cautelar – STJ, 178129 de 7/06/11). O tempo de prisão, no máximo, pode gerar indenização
em face do Estado, mas não um crédito para ser utilizado em infração penal futura.
Devedor de alimentos: não cabe detração para os casos de prisão civil do devedor de
alimentos, (art. 5º, LXVII, da CF/1988), decorrente do atraso das respectivas prestações,
decretada nos termos do art. 733, do CPC. Dessa forma, ainda que esteja relacionado com o
delito capitulado no art. 244, do CP, mas por se tratar de prisão estritamente civil, resta
excluída a possibilidade de detração penal.

11. Detração penal e prescrição: Discute-se se a detração peal influencia ou não no


cálculo do prazo prescricional. Para quem admite essa possibilidade, fundada na aplicação
analógica do art. 113 CP, a prescrição deveria ser computada com base no tempo restante da
pena, ou seja, somente com o tempo ainda não cumprido pelo condenado. O STF, fundado
no princípio da estrita legalidade, tem posição diversa: o art. 113 do CP tem aplicação
vinculada às hipóteses de evasão do condenado ou de revogação do livramento condicional,
não se referindo ao tempo de prisão cautelar para efeito de cálculo da prescrição.

12. Detração e sentença penal condenatória: (Pacelli, Curso, 17ª ed., 2013, p. 666): a Lei
12.736/12 acrescentou o § 2º ao art. 387 do CPP, instituindo o dever de consideração do
prazo de prisão provisória, administrativa ou de internação, no BRA ou no estrangeiro, para
fins de fixação do regime de cumprimento de pena. Com isso, prevê-se, portanto, uma
diferente modalidade de detração já na própria sentença condenatória. Não se trata de
detração do tempo de privação da liberdade na pena e sim sua consideração na fixação do
regime penitenciário para o início de seu cumprimento. Assim, o magistrado não poderá
modificar a pena tornada definitiva na aplicação do art. 59 do CP, pelo tempo de prisão
anterior. O total da pena imposta, sem a detração, haverá de ser considerado para todos os
demais efeitos penais e incidentes na execução. E, evidentemente, o tempo de privação de
liberdade anterior somente será considerado na sentença se estiver relacionado com o delito

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

objeto da condenação. Se a prisão ocorrer por outro motivo (cautelar) e outra infração
penal, isto é, não decorrer de providências relacionadas ao crime objeto do processo, não
será objeto de detração.

13. Indígenas: Segundo o Estatuto do Índio - Art. 56. Parágrafo único. As penas de
reclusão e de detenção serão cumpridas, se possível, em regime especial de semiliberdade,
no local de funcionamento do órgão federal de assistência aos índios mais próximos da
habitação do condenado. Propostas processuais penais do Estatuto dos povos indígenas:
Art. 233,§1º. As penas de reclusão e de detenção serão cumpridas sempre que possível, em
regime aberto, na terra indígena ou no local de funcionamento da unidade administrativa do
órgão indigenista federal mais próxima do domicílio do condenado. §2º Se o juiz fixar o
regime inicial fechado, o indígena deverá cumprir a pena em estabelecimento distinto dos
não-indígenas, em respeito aos seus usos e costumes. §3º O juiz deverá adequar a pena
restritiva de direito aplicada ao indígena à sua realidade e à cultura de sua comunidade
indígena.

14. Trabalho do preso: O Código Penal e a Lei de Execução Penal referem-se ao trabalho
como mecanismo crucial ao processo de reintegração social do apenado. Deve ser
remunerado. A lei fixa, no entanto, que o produto da remuneração deve ser aplicado para
indenizar os danos causados pelo crime (se forem determinados judicialmente), na
assistência à família e no ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a
manutenção do condenado (art. 28, da LEP). A Lei de Execução Penal diz, ainda, que o
trabalho será em comum tanto para o regime fechado como para o semiaberto.
Paradoxalmente, cumpre observar a existência de uma exceção ao ideal ressocializador do
trabalho prisional. Cuida-se da regra do art. 200, da LEP, que diz que o condenado por
crime político não está obrigado ao trabalho. Excetuado o preso político, os demais
encarcerados têm o direito e o dever de desempenhar atividade laborativa no
estabelecimento penitenciário, sendo certo que ela há de ter finalidade educativa e
produtiva (art. 29, da LEP).

15. Remissão penal: Conceito: Remição significa o direito daquele que cumpre pena, no
regime fechado ou semiaberto, de abater, pelo trabalho, parte do tempo de pena que tem
que cumprir. Abatimento: O abatimento se processa à razão de 1 (um) dia de pena a cada 3
(três) dias de trabalho (art. 126, § 1º, II, da LEP). Remissão pelo estudo: A Lei nº 12.433, de
30/06/2011, alterou diversos dispositivos da Lei de Execução Penal, com o objetivo de
estender a possibilidade de remição penal não apenas para o trabalho, mas, também, para o
estudo prisional. Nesses termos, conforme a nova redação do art. 126 da LEP, o condenado
que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por
estudo, parte do tempo de execução da pena. No caso de estudo, a contagem de tempo deve
ser feita à razão de 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar (art.
126, § 1º, I, da LEP). OBS 1: É interessante, ainda, observar que a remição pelo estudo é
válida, inclusive, para o apenado que se encontra no regime aberto ou usufruindo
livramento condicional (art. 126, § 62, da LEP). Diferentemente, a remição pelo trabalho
não abrange o regime aberto e o livramento condicional, tendo em vista ser da essência
desses dois institutos a obrigatoriedade do desempenho de atividade laborativa (art. 114, I,
e art. 132, § 1º, "a", da LEP). OBS 2: Caso o preso fique impossibilitado, por acidente, de

161
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

prosseguir no trabalho ou nos estudos, continuará a beneficiar-se com a remição sob


consideração (art. 126, § 4ª, da LEP). Remissão cumulativa: Possibilidade de remição
cumulativa: art. 126, § 3º, da LEP. Falta grave e remissão: Em caso de falta grave, passa a
ser facultado ao juiz da execução penal impor a revogação de até 1/3 (um terço) do tempo
remido, recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar (art. 127, da LEP,
com a redação da Lei nº 12.433/ 2011) [não pode suprimir todo o tempo, é no máximo 1/3].
Uso do tempo remido para todos os fins: O tempo remido - isto é, devidamente
homologado judicialmente – será computado como pena cumprida, não somente para fins
de concessão de livramento condicional ou indulto, mas, sim, "para todos os efeitos" (art.
128 da LEP)

16. Superveniência de doença mental 2: Se durante o cumprimento da pena, sobrevier, ao


condenado, doença mental deve o mesmo ser recolhido a hospital de custódia e tratamento
psiquiátrico ou, à falta, a outro estabelecimento adequado (art. 41). Este incidente no curso
da execução penal é denominado de conversão da pena em medida de segurança, consoante
o disposto no art. 183, da LEP. Deve-se, contudo, atentar que embora convertida em medida
de segurança, o tempo de duração da pena inicialmente imposta continuará a ser observado.
Dessa maneira, conforme decidido pelo STJ, extrapolado o prazo máximo de pena privativa
de liberdade, não há como manter o paciente no cumprimento da medida de segurança, a
qual deve ser declarada extinta (HC 130160. STJ. Min. Arnaldo lima. Quinta Turma. DJ de
19/ 11/2009).

17. Monitoramento eletrônico: No âmbito federal, corno dito anteriormente, entrou em


vigor a Lei n. 12.258/2010, que alterou o Código Penal e a Lei de Execução Penal para
possibilitar a utilização de equipamento de vigilância indireta pelo condenado. Essa Lei
prevê as hipóteses em que caberá o monitoramento eletrônico. A lei federal prevê alterações
nos arts. 122, 124 e 146, todos da Lei de Execução Penal. Na hipótese do atual art. 122,
mesmo nos casos de ausência de vigilância direta será possível a colocação do condenado
sob monitoramento eletrônico quando houver determinação judicial, o que demonstra
apenas um aumento do controle penal por parte do Estado e não o cumprimento dos
objetivos da medida (diminuição dos custos e redução do número de encarcerados). Art.
124: versa a alteração sobre as condições impostas para a obtenção do benefício da saída
temporária. O art. 146-B define as hipóteses de cabimento do monitoramento eletrônico
pelo juiz quando este autorizar saídas temporárias no regime semiaberto e quando
determinar a prisão domiciliar. Com relação à saída temporária no regime semiaberto cabe
a mesma afirmação feita anteriormente, ou seja, haverá um aumento do controle penal por
parte do Estado em condenados que, em virtude de já terem cumprido parte de sua pena ou
por terem praticado crimes que permitam tal regime, já são considerados aptos a não
ficarem sob vigilância estatal permanente, não ocorrendo, entretanto, a diminuição dos
custos e a redução do número de encarcerados, como pretendido pelo legislador. O art. 146-
C versa sobre os cuidados que o condenado deverá ter com o aparelho que realizará a
vigilância e sobre os seus deveres, bem como as consequências para a violação de tais
regras. Além disso, prevê o dispositivo legal que o monitoramento eletrônico será revogado
depois de ouvido o Ministério Público e a defesa, o que garante ao condenado a
oportunidade de se manifestar a respeito do não cumprimento de suas obrigações. Por fim,
o art. 146-D versa sobre a revogação do monitoramento eletrônico quando este se

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

apresentar desnecessário ou inadequado e quando o acusado ou condenado violar os


deveres a que estiver sujeito ou cometer falta grave. Importante destacar que o artigo não
faz menção à necessidade de fundamentação da decisão judicial. Apesar disso, a decisão
judicial que revogar a medida deverá ser fundamentada, sob pena de nulidade (art. 93, IX,
da CF/1988) e, seguindo a regra do art. 146-C, o Ministério Público e a defesa deverão se
manifestar com relação à revogação.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

B) Penas de Multa (antigo ponto 18A).


Principais obras consultadas: Santo Graal 27º; Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de
Direito Penal - Parte geral - 1. 16ª Edição. Editora Saraiva - 2011. Ferrajoli, Luigi. Direito e
Razão - Teoria do Garantismo Penal. 3ª Edição. Editora Revista dos Tribunais. 2010.
Cunha, Rogério Sanches. CP para concursos. 5ª Edição. Editora Juspodivm. 2012.

Legislação básica: Código Penal (arts. 39-52).

1. Considerações gerais: O patrimônio é um bem jurídico que pode ser atingido por uma
pena. As penas incidentes sobre o patrimônio são denominadas patrimoniais e, quando
impostas em dinheiro, pecuniárias. A pena de multa é uma espécie de pena patrimonial, de
caráter pecuniário, consistente em pagamento ao fundo penitenciário de quantia fixada na
sentença e calculada em dias-multa [Há, pois, impropriedade no dispositivo legal, visto que
a multa não consiste no pagamento; este é a sua execução.]. A CF/88, art. 5º, XLVI,
exemplifica em suas alíneas as espécies de penas que o sistema penal brasileiro pode
adotar. Por sua vez, o Código Penal, art. 32, adotou o Sistema Tripartite de Penas, ao
verberar que “As penas são: I – privativas de liberdade; II – restritivas de direitos; III – de
multa”. Constata-se que a pena de multa não integra o gênero das penas restritivas de
direitos (sendo que este gênero engloba a “pena de prestação pecuniária”).

2. Natureza jurídica: a multa penal é, desde muito, reconhecida como verdadeira pena
pela doutrina e legislações modernas, estando, desse modo, submetida aos princípios que
norteiam as demais sanções criminais: o da legalidade, da culpabilidade, da
individualização da pena e o do devido processo judicial. A multa, em sendo sanção penal,
é rigorosamente pessoal, não se transmitindo aos herdeiros do réu ou a terceiros.

OBS: A vaquinha realizada pela internet pelos condenados do Mensalão colocou a pena de
multa em xeque.

Isolada ou cumulada: A pena de multa é sempre cominada, na hipótese de crime, de forma


alternativa ou cumulativa. Aparece, por vezes, isoladamente, nas contravenções. Nas
cominações da pena de multa na Parte Especial do CP não aparecem os limites a serem
observados. Esses limites estão previstos na Parte Geral (art. 49, CP).

3. Sistemas de cominação da multa penal: a) sistema clássico de multa: é aquele segundo


o qual o juiz, em uma única operação, condena a uma determinada quantia em concreto, de
conformidade com a gravidade da infração e a situação econômica do réu; b) sistema
temporal de multa: concebido na década de 60 por Baumann, na Alemanha, a pena de multa
é fixada em um número preciso de dias, semanas ou meses-tipo, correspondentes a cada
delito, segundo as condições pessoais e econômicas do autor, reservando-lhe um mínimo
indispensável à sua manutenção e à de sua família. O pagamento da multa não é efetuado
de uma vez e imediatamente, mas ao longo de certo período de tempo; c) sistema de dias-
multa: originariamente de construção brasileira e não escandinava, foi concebido

164
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

inicialmente, embora de forma rudimentar, pelo Código Criminal do Império do Brasil de


1830, em seu artigo 55. O sistema consiste em determinar a pena de multa não por uma
soma em dinheiro (quantidade fixa), mas por um número de unidades artificiais (dias-
multa), segundo a gravidade da infração. Cada dia-multa equivalerá a certo valor
pecuniário, variável de acordo com a situação econômica do condenado. Divide-se em duas
fases distintas: i) preliminarmente é estabelecido o número de dias-multa segundo a
culpabilidade do autor e considerações de ordem preventiva; ii) após, é arbitrado o valor do
dia-multa, em conformidade com a condição econômica do réu. Esse é o sistema adotado
pelo Código Penal em vigor. O cálculo do valor é realizado nos termos do artigo 68 do
Código Penal, aplicando-se as três fases distintas (pena-base, circunstâncias atenuantes e
agravantes e causas de diminuição e de aumento).

Análise mais detalhada do Sistema de dias-multa: Dispõe o art. 49, do CP, que a pena de
multa se consubstancia em dias-multa, a ser recolhida ao Fundo Penitenciário Nacional
(Funpen), sendo calculada, na sentença, em quantidade que varia entre o mínimo de 10
(dez) e o máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa, de acordo com a gravidade do
delito perpetrado. Após fixada a quantidade de dias-multa deve o magistrado informar, na
sentença condenatória, o valor de cada dia-multa, em conformidade com a capacidade
econômica do réu, em patamar que não pode ser inferior a 1/30 (um trigésimo) do maior
salário-mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse
salário (art. 49, parágrafo único, do CP). Complementando essa sistemática, o art. 60, do
CP, assinala que na fixação da multa o juiz deve atender, principalmente, à situação
econômica do réu, autorizando, inclusive, que se ultrapasse os limites do art. 49, até o
triplo, se o juiz considerar que, em virtude da situação econômica do réu é ineficaz, embora
aplicada no máximo. Na execução, será atualizado o valor pelos índices oficiais de correção
monetária. Quando possível, pode ocorrer por desconto no vencimento ou salário do
condenado (de 1/10 a ¼) e pode ser autorizado o pagamento em parcelas. A execução é
suspensa se sobrevém ao condenado doença mental. Legislação especial: Saliente-se, por
fim, que o sistema de dias-multa também é adotado pela legislação especial, embora com
algumas diferenças do Código Penal. Nesse sentido, a Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas)
estabelece, nos seus respectivos tipos penais, quantidades mínima e máxima de dias-multa,
fixando, no art. 43, o valor de cada dia-multa, consoante a condição econômica do acusado,
podendo, ainda, ser elevado até o décuplo, caso o valor máximo encontrado for considerado
ineficaz pelo magistrado sentenciante (art. 43, parágrafo único, da Lei nº 11.3434/2006).

4. Pagamento e execução da pena de multa: Segundo o art. 50, do CP, a multa deve ser
paga dentro de 10 dias depois de transitada em julgado a sentença condenatória. Faculta-se,
ainda, o seu pagamento em prestações mensais, podendo, eventualmente, vir a ser
descontada do salário ou dos vencimentos do condenado. Dívida de valor: A Lei nº
9.268/1996 atribuiu nova redação ao artigo 51 do Código Penal, estatuindo que, transitando
em julgado, a multa fixada na sentença penal será considerada dívida de valor, com
aplicação da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública Federal ou Estadual,
inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da cobrança do crédito
tributário. Com isso, restou revogada a norma que estipulava a conversão da pena de multa
em privativa de liberdade.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

5. Competência para Execução da multa: Após polêmica inicial, a questão se pacificou,


restando reconhecido que o MP não detém legitimidade para propor ação de execução da
pena de multa. [STJ: Resta pacificado o entendimento, neste Sodalício, de que o Parquet
não possui legitimidade para executar pena de multa, haja vista a nova redação dada ao art.
51 do CP pela Lei 9.268/96, cabendo à Fazenda Pública ajuizar eventual ação executiva. 2.
Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1169550/MG, Rel. Ministro
Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 26/10/2010, DJe 29/11/2010)]. OBS: Insta
acrescentar que a Lei nº 10.522/2002, que cuida do cadastro de créditos não quitados no
setor público federal (Cadin), determina o arquivamento das execuções fiscais de débitos
inscritos como Dívida Ativa da União de valor consolidado igual ou inferior a dez mil reais
(art. 20) [valor atualizado para R$20.000,00]. Diante disso, é forçoso reconhecer que um
número significativo de multas criminais, inferiores àquele valor, e não recolhidas pelo
condenado sequer serão objeto de ajuizamento de execuções fiscais. A tudo isso se soma o
exíguo prazo prescricional de dois anos (art. 114, do CP), que também contribui para a
perda da efetividade prática da pena de multa no Brasil. Sendo assim, tem-se que, na
atualidade, a pena de multa está muito aquém dos propósitos que conduziram a sua adoção
generalizada pelo legislador.

OBS: A única pena de multa que nunca será executada perante o juízo das execuções
fiscais será a aplicada no Juizado Especial Criminal, por força do art. 98, I, da CF, que
determina a competência deste juízo para executar seus próprios julgados.

5. A extinção da punibilidade não pressupõe pagamento da multa: Na nova redação do


dispositivo contido no comentado art. 51, já que o legislador ordinário retirou o caráter
punitivo da multa, na medida em que uma vez aplicada assumirá o caráter de dívida de
valor (extrapenal), não se deve aguardar o pagamento da multa para declarar-se a extinção
da punibilidade, pois já ocorreu o cumprimento integral da pena. Julgado: PENA
PRIVATIVA DE LIBERDADE (CUMPRIMENTO INTEGRAL). PUNIBILIDADE
(EXTINÇÃO). MULTA CRIMINAL (INADIMPLEMENTO). COBRANÇA (EXECUÇÃO
FISCAL). CARÁTER EXTRAPENAL (LEI Nº 9.268/96). 1. Com o advento da Lei nº
9.268/96, a multa criminal passou a ser considerada dívida de valor, devendo ser cobrada
por meio de execução fiscal, no juízo especializado para a cobrança da dívida, e não no da
vara de execuções penais. 2. Com a nova redação do art. 51 do Cód. Penal, ficaram
revogadas as hipóteses de conversão da multa em pena privativa de liberdade. Tal a
circunstância, só se pode atribuir à multa o caráter extrapenal. 3. No caso, cumpriu-se
integralmente a pena privativa. Assim, ainda que pendente de pagamento a multa, há de se
declarar extinta a punibilidade penal. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg no Ag
698137/RS, Rel. Ministro Nilson Naves, Sexta Turma, julgado em 05/12/2006, DJ
05/02/2007, p. 407).

6. Multa substitutiva: Há, ainda, a multa substitutiva, pela qual a pena privativa de
liberdade igual ou inferior a um ano pode ser substituída pela de multa, observados os
critérios do artigo 44 do CP. No caso de violência doméstica e familiar contra a mulher, o
artigo 17 da Lei nº 11.340/2006 veda a substituição da pena que implique o pagamento
isolado de multa.

7. Cumulação: Quando cominada em conjunto com a pena privativa de liberdade, a pena


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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

de multa pode ser fixada no patamar mínimo e a pena privativa de liberdade acima do
mínimo, já que essas modalidades de pena têm distintos critérios de fixação, embora deva
existir proporcionalidade entre as duas espécies de pena, não havendo uma
discricionariedade absoluta. Assim, segundo STJ, a aplicação da pena de multa orienta-se
pelo critério de proporcionalidade da pena reclusiva. (HC 224881/MS, Rel. Ministro
MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 27/03/2012, DJe
24/05/2012).

8. Fiança e multa: Nos termos do artigo 336 do Código de Processo Penal, com a redação
dada pela Lei nº 12.403/2011, o “dinheiro ou objetos dados como fiança servirão ao
pagamento das custas, da indenização do dano, da prestação pecuniária e da multa, se o réu
for condenado”.

9. Posição de Ferrajoli sobre a pena de multa: considera a pena pecuniária aberrante por
ser impessoal (outra pessoa pode pagar), desigual (afeta distintamente pobre e rico) e
desproporcional (no direito penal mínimo, as condutas não graves não deveriam estar
penalmente tuteladas; e a multa é muito leve para uma conduta grave. Ou seja, se a pena de
multa é suficiente, quer dizer que a conduta não deveria ser penalizada).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

C) Penas substitutivas das privativas de liberdade e penas pecuniárias


(antigo ponto 19 A).
Obras consultadas: Santo graal 27. Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal-
Parte geral-1. 16ª Edição. Editora Saraiva- 2011. Ferrajoli, Luigi. Direito e Razão- Teoria
do Garantismo Penal. 3ª Edição. Editora Revista dos Tribunais. 2010. Cunha, Rogério
Sanches. CP para concursos. 3ªEdição. Editora Juspodivm. 2010.

Legislação básica: Código Penal.

Considerações iniciais: Em nosso país, após o advento da Lei 7.209/1984, responsável


pela Parte Geral do Código Penal de 1940, acolheu-se o sistema de Alternativas penais ao
encarceramento (penas substitutivas). Tais penas têm caráter geral, haja vista que podem
substituir a pena privativa de liberdade abstratamente cominada na parte especial, desde
que presentes os requisitos autorizantes. São, de fato, substitutivas destas, de modo que sua
aplicação exige, em uma etapa preliminar, a fixação pelo juiz do quantum correspondente à
privação de liberdade, para ao depois proceder-se à sua conversão em pena restritiva de
direitos, quando isso for possível.

OBS: No Brasil, o legislador denominou as penas alternativas de restritivas de direito,


embora, a rigor, nem todas tenham por finalidade restringir o exercício de determinado
direito individual, como ocorre, por exemplo, com a pena de perda de bens e valores.

OBS: Importante mencionar que embora o artigo 44 do CP diga que as penas podem ser
autônomas, GRECO menciona que até a edição da Lei nº 11.343/2006 não existiam tipos
penais nos quais a pena prevista no seu preceito secundário fosse única e exclusivamente a
restrição de direitos (art. 28). A constitucionalidade desse artigo, inclusive, está sendo
analisada pelo STF, por meio de Repercussão Geral (RE 635659).

Regras de Tóquio: As penas restritivas de direito encontram-se em consonância com as


chamadas “Regras de Tóquio”, que recomendam ao juiz a aplicação, se necessário e
conveniente, de “qualquer outra medida que não envolva detenção pessoal”. As regras de
Tóquio foram estabelecidas como regras mínimas sobre as medidas não-privativas de
liberdade no 8° Congresso da ONU, realizado em 14 de dezembro de 1990.

Características: 1) Natureza jurídica autônoma de sanção penal: Ao tempo da redação


primitiva do Código, existiam as chamadas penas acessórias, subordinadas à pena privativa
de liberdade. No modelo atual, isso não mais ocorre. Com efeito, na atualidade, as penas
restritivas de direito têm natureza jurídica autônoma de sanção penal. Tanto é assim que
mesmo na hipótese de conversão em pena privativa de liberdade, deve-se proceder à
detração do tempo de cumprimento da pena restritiva (art. 44, § 4o, do CP). 2) Substitutivas
da pena de privação da liberdade: Demais disso, as penas restritivas são substitutivas da
pena de privação da liberdade. Isso porque, em regra, elas não estão previstas nos tipos
penais incriminadores. É necessário, primeiro, que o juiz condene o réu a uma quantidade

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

de pena privativa de liberdade e, em seguida, proceda, se cabível, à sua conversão em pena


restritiva de direitos. 3) Natureza condicional: Extrai-se daí a sua força cogente, pois o
descumprimento injustificado das condições estipuladas à pena restritiva de direito
condicionalmente imposta pode acarretar a sua conversão na pena privativa de liberdade
que fora fixada, conforme determina o § 4o, do art. 44, do CP. Paira, assim, uma espécie de
“ameaça latente” àquele que, injustificadamente, descumprir a pena restritiva de direito
imposta na sentença condenatória.

Classificação: a) genéricas: admitem a aplicação substitutiva em qualquer infração penal,


sem exigência específica (prestação pecuniária, perda de bens e valores, prestação de
serviços à comunidade ou a entidades públicas, limitação de fim de semana). b) específicas:
sua aplicação está limitada a determinados delitos perpetrados no exercício de certas
atividades, mediante violação do dever a elas inerentes, ou a delitos culposos (interdição
temporária de direitos).

Espécies: a) prestação pecuniária; b) perda de bens e valores; c) prestação de serviços à


comunidade ou a entidades públicas; d) interdição temporária de direitos; e) limitação de
fim de semana.

Requisitos para Substituição: Os requisitos são cumulativos, quais sejam: 1) Objetivos:


Os requisitos objetivos para a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos são os seguintes (art. 44, I, do CP): tratando-se de delito doloso, é necessário que a
pena privativa de liberdade imposta na sentença não seja superior a quatro anos. É preciso,
ainda, que o delito não tenha sido praticado com violência ou grave ameaça à pessoa.
Cuidando-se de crime culposo, a substituição pode se dar qualquer que seja a quantidade de
pena aplicada. 2) Subjetivos: O primeiro requisito subjetivo é o de não se tratar de
reincidente em delito doloso. O segundo é que a substituição seja indicada e suficiente.
Ademais, faz-se necessário que as circunstâncias judiciais lhes sejam favoráveis. Sobre a
reincidência, observa-se que ela somente impede a substituição se for em delito doloso e
que sua restrição foi relativizada pelo § 3º, do art. 44, ao permitir a substituição quando a
medida for socialmente recomendável, a critério do magistrado, e não se tratar de
reincidência específica, ou seja, na mesma figura típica pena.

STF, HC 114703/2013: Não cabe substituição de pena privativa de liberdade por restritiva
de direitos quando o crime for cometido com violência.

STF, 2013: É possível substituição em crime com violência contra coisa, pois a vedação é
com violência contra pessoa.

Quadro resumo:
1º requisito: objetivo. 2º requisito: subjetivo. 3º requisito: subjetivo.
Natureza do crime e Não ser reincidente em A substituição seja indicada
quantum da pena crime doloso. e suficiente.
a) Crime doloso: Regra: não ser reincidente A culpabilidade, os
em crime doloso. antecedentes, a conduta
- igual ou inferior a 4 anos;

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

- sem violência ou grave Exceção: §3º: se o social e a personalidade do


ameaça a pessoa. condenado for reincidente, o condenado, bem como os
juiz poderá aplicar a motivos e as circunstâncias,
b) Crime culposo:
substituição, desde que, em indicarem que essa
qualquer que seja a pena face de condenação anterior, substituição seja suficiente
aplicada. a medida seja socialmente (Princípio da suficiência da
recomendável e a resposta alternativa ao
reincidência não se tenha delito).
operado em virtude da
prática do mesmo crime.

Como se dá a substituição: Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode


ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos; se superior a um ano, a pena
privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou
por duas restritivas de direitos. Atenção: Se o condenado for reincidente, o juiz poderá
aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja
socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do
mesmo crime. O juiz pode deixar de converter a pena restritiva em caso de condenação à
pena privativa, caso seja possível o condenado a cumprir.

Quadro resumo:
Se a pessoa for condenada a... A pena privativa de liberdade aplicada
poderá ser substituída por:
Pena igual ou inferior a 1 ano de prisão a) Multa OU
b) 1 pena restritiva de direitos.
Pena superior a 1 ano (até 4 anos) a) 1 pena restritiva de direitos + multa OU
b) 2 penas restritivas de direitos.

Multa substitutiva: O Código contempla a pena de multa sob duas vertentes: a multa
propriamente dita (art. 49) e a multa substitutiva (art. 44, § 2o, e art. 60, § 2º, do CP). OBS:
a aplicação isolada da multa substitutiva será possível quando a pena privativa de liberdade
fixada na sentença for igual ou inferior a um ano. Porém, a multa poderá ser cumulada com
outra pena alternativa, se a pena privativa de liberdade imposta ao condenado for superior a
um ano, mas não exceder a quatro (art. 44, § 2º). Ponto polêmico 1: Discute-se se a regra do
art. 60, § 2º, do CP, ainda estaria em vigor. Isso porque, aquele dispositivo somente admite
a multa substitutiva para os casos de condenação em patamar inferior a seis meses. Porém,
como assinalado, a Lei n º 9.714/1998 ampliou esse patamar de substituição para até um
ano, acarretando, segundo alguns, a revogação tácita do mencionado § 2º, do art. 60. Essa
interpretação, contudo, deve ser rechaçada, não somente porque não houve a expressa
retirada do § 2º, do art. 60, mas, principalmente, porque ele contém norma mais benéfica
para o condenado, mesmo após a Lei nº 9.714/1998, na medida em que, nos casos de
condenação não superior a seis meses, o juiz somente poderá substituir a prisão pela multa,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

afastando-se a possibilidade de aplicação de pena restritiva de direitos. Ponto polêmico 2:


Diz respeito à possibilidade ou não da sua aplicação junto com a multa propriamente
considerada, nas hipóteses em que o tipo penal incriminador cominar esta última. Embora
possa se afigurar, em tese, inconveniente esse somatório de sanções pecuniárias, visto que a
multa – seja ela de qual natureza for – que não vier a ser paga pelo condenado não poderá
ser convertida em pena privativa de liberdade, fato é que nada impede que o magistrado
possa agir dessa forma, conforme reconhecido pelos tribunais, desde que se trate de delito
capitulado no Código Penal. OBS: Tratando-se de legislação especial que não preveja a
possibilidade da multa substitutiva, será inviável a aplicação cumulada desta alternativa
prisional com a multa cominada no respectivo tipo penal incriminador, conforme, inclusive,
dispõe a Súmula 171 do STJ.

Espécies de Penas restritivas de direitos:

1) Penas de prestação pecuniárias: Segundo o § 1º, do art. 45, do CP, a pena de prestação
pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade
pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a um
salário-mínimo nem superior a 360 salários-mínimos. É de se observar, assim, que a
prestação pecuniária, além da natureza penal, tem também cunho indenizatório, uma vez
que se destina os prejuízos sofridos pela vítima ou, alternativamente, aos seus dependentes.
Trata-se, pois, sanção de natureza civil elevada à categoria de pena criminal. Além disso, o
valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação civil ex delicto, se
coincidentes os beneficiários (art. 45, § 1º, in fine, do CP). Caso não seja possível o
pagamento de valores à vítima ou seus dependentes, permite-se que a pena seja convertida
em favor de entidade pública ou privada de natureza filantrópica.

OBS: Cuidado: Não confundir prestação pecuniária com pena de multa. A primeira
direciona-se ao pagamento de dinheiro ao lesado, seus dependentes ou, eventualmente, a
entidades públicas ou privadas com destinação social. A multa, por seu turno, destina-se
sempre ao Estado. Demais disso, caso venha a ser descumprida, prestação pecuniária
acarretará a sua conversão em pena privativa de liberdade, o que não ocorre com a pena de
multa. Veja as diferenças:

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

OBS: Prestação inominada: Segundo o art. 45, § 2º, é possível que a pena de prestação
pecuniária possa ser cumprida de forma diversa do pagamento em dinheiro, desde que haja
a aceitação por parte do beneficiário. Não se cuida, neste caso, de uma nova espécie de
pena restritiva incluída na anterior, mas tão somente da possibilidade de substituição do
objeto material da prestação – o dinheiro – por outro ativo.

2) Perda de bens e valores: está prevista o parágrafo 3.º do artigo 45 do Código Penal: “A
perda de bens e valores pertencentes aos condenados dar-se-á, ressalvada a legislação
especial, em favor do Fundo Penitenciário Nacional, e seu valor terá como teto – o que for
maior – o montante dos prejuízo causado ou do provento obtido pelo agente ou por terceiro,
em consequência da prática do crime”, e encontra fundamento constitucional na alínea b do
inciso XLVI do artigo 5.º da Constituição Federal.

Atenção: Trata-se de sanção penal, de caráter confiscatório, levando à apreensão definitiva


por parte do Estado de bens ou valores de origem lícita do indivíduo. Assim, difere-se do
confisco-efeito da condenação, que recai sobre os instrumentos e produtos do crime. A
perda de bens, enquanto pena, consiste em efeito primário da sentença condenatória, ao
passo que o perdimento do produto do crime deverá ser consequência secundária daquela
sentença. No mesmo sentido, a sanção de perdimento de bens e valores não poderá incidir
sobre os instrumentos do delito (art. 91, II, “a”), tendo em vista que estes não integram,
necessariamente, o patrimônio do condenado.

3) Prestação de serviço à comunidade ou a entidade assistencial: Condenações


superiores a 6 meses. Se a pena substituída for superior a um ano, é facultado ao condenado
cumprir a pena substitutiva em menor tempo, nunca inferior à metade da pena privativa de
liberdade fixada. A exigência de que a quantidade de pena privativa de liberdade aplicada
seja superior a seis meses, justifica-se por conta do fator de conversão de 1 (uma) hora de
tarefa por dia de condenação, fixado de forma a não prejudicar a jornada normal de trabalho
(art. 46, § 3º). Nesse sentido, cumpre observar que a atividade terá a duração máxima de
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

oito horas semanais e será realizada aos sábados, domingos e feriados, ou dias úteis, de
modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho, conforme estabelecido pelo juiz (art.
149, § 1º, da LEP). Determina, ainda, o Código, que a prestação de serviços gratuitos deve
ter a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída, ressalvado o seu
cumprimento em tempo menor, mas nunca inferior a seis meses (art. 55, do CP).

4) Interdição temporária de direitos: A pena prevista no art. 43, inc. V, do CP, desdobra-
se em quatro outras, que se relacionam com hipóteses fáticas específicas. Isso as difere do
conjunto de penas restritivas, visto que as demais têm alcance geral. Embora reunidas sob a
denominação de interdição temporária de direitos, as sanções indicadas no art. 47 são
bastante heterogêneas entre si. De comum, apenas o fato de que elas devem ser aplicadas a
situações nas quais o condenado tenha abusado de determinada faculdade ou direito.
Espécies: I - proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de
mandato eletivo [pressupõe o descumprimento das obrigações inerentes ao desempenho de
tais misteres. Ela é, portanto, incidente para condenações decorrentes dos denominados
crimes de peculato (arts. 312 e segs.), bem como quaisquer outros que tenham sido
praticados com a violação daqueles deveres, como, v.g., o estelionato em detrimento do
patrimônio público]; II - proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que
dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público (a I e II é
aplicada sempre que houver violação dos deveres que lhes são inerentes) [Faz-se
necessário, para a aplicação dessa proibição temporária, que o condenado tenha cometido o
crime no exercício da profissão, atividade ou ofício (art. 56), até porque a Constituição
assegura e valoriza o trabalho e a livre iniciativa (art. 170, CF/1988)]; III - suspensão de
autorização ou de habilitação para dirigir veículo; IV – proibição de frequentar
determinados lugares [só deve ser aplicada pelo magistrado se houver conexão entre o
delito praticado e o local objeto da pena restritiva de direitos]; V - proibição de inscrever-se
em concurso, avaliação ou exame públicos. OBS: Não se deve confundir as hipóteses de
interdição temporária de direitos com os efeitos da condenação disciplinados no art. 92, do
CP: Basicamente, a distinção se assenta o fato de que se trata de penas, ou seja, efeito
primário da condenação, ao contrário dos efeitos secundários regulados nos incisos do art.
92. Ademais, tendo em vista a vedação constitucional de penas de caráter perpétuo (art. 5º,
XLVII, “b”, da CF/1988), as penas de interdição são temporárias, ou seja, têm a mesma
duração da privação da liberdade substituída (art. 55), ao passo que os efeitos secundários
da condenação, uma vez declarados na sentença, desfazem, em definitivo, determinada
relação jurídica, e somente poderão ser atingidos na hipótese de decisão favorável no
processo de reabilitação (arts. 93 a 95).

5) Limitação de fim de semana: Segundo o art. 48, do CP, a pena privativa de liberdade
poderá ser substituída pela obrigação de permanecer, aos sábados e domingos, por cinco
horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado, período em que
poderão ser ministrados ao apenado cursos, palestras ou outras atividades educativas. Trata-
se de modalidade punitiva conhecida, no direito estrangeiro, como arrêt de fin de semaine e
tem por escopo evitar os efeitos da dessocialização, ou seja, a perda dos vínculos familiar e
social decorrente do encarceramento. No Brasil, cabe ao juiz da execução a indicação do
local, dia e horário em que deverá ser cumprida a referida sanção (art. 151, da LEP).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Conversão de penas:

1) Privativa de liberdade em RD: A Lei de Execução Penal, em seu art. 180, prevê a
possibilidade de que a pena privativa da liberdade, que não tenha sido substituída na
sentença penal condenatória, seja convertida, durante o cumprimento da pena, em restritiva
de direitos. Requisitos: a pena não ser superior a 2 (dois) anos; estar o condenado
cumprindo pena em regime aberto; ter cumprido ao menos 1/4 da pena; e os antecedentes e
a personalidade do agente indicarem ser a medida recomendável.

2) RD em privativa da liberdade: O art. 181, da LEP, admite hipótese inversa, na qual a


pena restritiva de direitos poderá ser convertida em privativa de liberdade. Ocorre, ainda, a
citada conversão, quando sobrevier condenação a pena privativa de liberdade, por outro
delito, quando, a critério do juiz da execução, não for possível ao condenado prosseguir no
cumprimento da pena substitutiva anterior (art. 44, §§ 4º e 5º, do CP). A conversão,
contudo, não se opera automaticamente. Dessa feita, antes de se decretar a conversão e a
subsequente expedição de mandado de prisão, o magistrado deve designar audiência
especial para oportunizar que o condenado apresente eventuais justificativas. Conversão
obrigatória (§ 4º): A pena restritiva de direitos será (re)convertida em privativa de liberdade
se o réu descumprir injustificadamente a restrição que lhe havia sido imposta. Em palavras
simples, se ele descumprir a pena restritiva de direitos, a pena volta a ser privativa de
liberdade. Conversão facultativa (§ 5º): Se, após a conversão da pena privativa de liberdade
em restritiva de direito, o apenado for condenado a nova pena privativa de liberdade, por
outro crime. Ocorrendo este fato, o juiz da execução penal decidirá se converterá
novamente a pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade, podendo deixar de
converter se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior.

STF, HC 256.036, SP, 2013: é possível a reconversão da pena restritiva de direitos em pena
privativa de liberdade, porém é necessário que o juiz da execução penal proceda à oitiva
prévia do condenado, em juízo, sob pena de ofensa ao direito de ampla defesa e
contraditório. [A reconversão é obrigatória quando o condenado descumprir
injustificadamente a restrição que lhe havia sido imposta. A reconversão é facultativa
quando o réu for condenado novamente a pena privativa de liberdade, por outro crime, pois
se for possível continuar a cumprir não será reconvertida em privativa de liberdade. Ex:
está cumprindo prestação de serviços e é condenado a regime fechado, não tem jeito, tem
que reconverter em privação de liberdade a prestação de serviços. Ex 2: está cumprindo
prestação pecuniária e é condenado a regime fechado, nesse caso são compatíveis, então a
conversão é facultativa].

STJ, HC 251.312-SP, 2014: É imprescindível a prévia intimação pessoal do reeducando que


descumpre pena restritiva de direitos para que se proceda à conversão da pena alternativa
em privativa de liberdade. Isso porque se deve dar oportunidade para que o reeduncando
esclareça as razões do descumprimento, em homenagem aos princípios do contraditório e
da ampla defesa.

Restritiva de Direitos em Crimes hediondos – a polêmica do tráfico de drogas:

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Consideração inicial: os ilícitos indicados nos incs. I a VII, do art. 1º, da Lei nº 8.072/1990,
não admitem penas alternativas, pois são condutas perpetradas com violência ou grave
ameaça à pessoa, não preenchendo, assim, o requisito do art. 44, inc. I, do Código. No
entanto, para hipóteses de falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto
destinado a fins terapêuticos ou medicinais, bem como para a associação ou a incitação de
genocídio (art. 1º, inc. VII-B, e parág. único, da Lei nº 8.072/1990), caberia, em tese, a
substituição ora considerada, uma vez que são situações que podem ser praticadas sem
violência física ou moral, desde que, é claro, a pena privativa de liberdade porventura
aplicada fique em patamar inferior a quatro anos. Contudo, diante do comando
constitucional que impõe um tratamento mais severo para os crimes hediondos e
equiparados, não parece ser recomendável ou indicada esta substituição. Tráfico de drogas:
com o advento da Lei nº 11.343/2006 (nova Lei de Drogas), passou-se a vedar, no seu art.
44, “a conversão de suas penas em restritivas de direitos”. Na mesma esteira, o § 1º, do art.
33, do mesmo diploma legal, ao prever a redução de pena privativa de liberdade, de um
sexto até dois terços, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se
dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa, proibiu, igualmente, a
“conversão em penas restritivas de direitos”. O STF decidiu que a lei não pode retirar do
magistrado a competência para impor a pena que ele reputar adequada ao caso concreto,
podendo – e devendo –, inclusive, proceder à substituição da pena privativa de liberdade
por restritiva de direito nas hipóteses de tráfico de drogas. Em suma, considerou-se
inconstitucionais a parte final do art. 44, da Lei nº 11.343/2006, bem assim a expressão
análoga “vedada a conversão em penas restritivas de direitos”, constante do § 4º, do art. 33,
do mesmo diploma legal, determinando-se, dessa feita, que, no caso em questão, o Juízo da
Execução Penal avaliasse o preenchimento das condições objetivas e subjetivas do paciente
para fins de concessão da referida substituição. [O Pleno do STF, no julgamento do Habeas
Corpus 97.256, decidiu que a expressão “vedada a conversão de suas penas em restritivas
de direitos” contida no art. 44 da Lei n.11.343/2006 era inconstitucional]. Em suma, não
mais existe na legislação brasileira qualquer vedação para que o juiz, ao condenar o réu
pelos crimes da Lei de Drogas, substitua a pena privativa de liberdade por restritivas de
direitos.

STJ, 2014: O fato de o tráfico de drogas ser praticado com o intuito de introduzir
substâncias ilícitas em estabelecimento prisional não impede, por si só, a substituição da
pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, devendo essa circunstância ser
ponderada com os requisitos necessários para a concessão do benefício. [STJ. 6ª Turma.
AgRg no REsp 1.359.941-DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 4/2/2014].

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7.c. Crimes contra o patrimônio: estelionato e outras fraudes de


competência da Justiça Federal.
Principais obras consultadas: Santo Graal 27. BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Crimes
Federais. 8ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012; BITENCOURT, Cezar Roberto.
Tratado de Direito Penal, Vol. 3, 2012; MASSON, Cleber. Direito Penal, Vol. 2, 2012.

Legislação: art. 171 e seguintes do CP.

Art. 171: Estelionato

1. Bem jurídico tutelado: é o patrimônio (secundariamente, porém, é protegida a boa-fé: a


confiança mútua nos relacionamentos patrimoniais individuais, a teor do TRF4, AC
20017011001423).

2. Sujeitos: Sujeito ativo: qualquer pessoa. Crime comum. Sujeito passivo: Qualquer pessoa
que sofra lesão patrimonial ou que foi enganada pela ação fraudulenta empreendida pelo
agente. Nem sempre o prejuízo econômico recairá sobre a pessoa que sofreu o enliço, caso
em que haverá duas vítimas. A vítima deve ser capaz, pois se exige a capacidade de ser
iludida. Vítima incapaz: o crime é o do art. 173 do CP (abuso de incapazes), que deixa de
admitir suspensão condicional do processo. A vítima deve ser certa e determinada, podendo
ser tanto quem sofre o prejuízo econômico quanto aquele que é enganado (STJ, RHC
2265/DF). No caso de vítima incerta: crime contra a economia popular (Lei nº 1.521/51).
Ex: Adulteração de balança e de taxímetro. “O sujeito passivo do delito de estelionato pode
ser qualquer pessoa, física ou jurídica. Mas a pessoa que é iludida ou mantida em erro ou
enganada pode ser diversa da que sofre a lesão patrimonial” (STF – Ext. 1029).

3. Elementos estruturais: fraude + vantagem ilícita + prejuízo alheio.

A) Fraude: Artifício: uso de objetos ou aparatos aptos a enganar; Ardil: é a conversa


enganosa (lábia); Qualquer outro meio: é o caso do silêncio, muito utilizado para manter a
vítima em erro, caracterizando-se, portanto, como um instrumento a possibilitar a utilização
da interpretação analógica. A fraude, contudo, tem que ser apta a enganar. Em se tratando
de fraude grosseira, haverá crime impossível. Fraude (torpeza) bilateral: prevalece que
constitui estelionato, pois a lei não exige boa-fé da vítima, pois Se o ofendido se deixou
enganar pelo engodo de outrem, ainda que movido por ganância, nem por isso se apaga a
conduta criminosa do estelionatário. Fraude civil: mero inadimplemento contratual, quando
não há o propósito ab initio da frustração do equivalente econômico. Estelionato Judiciário:
ação judicial como meio para a prática do crime. Muita divergência. Há, pois, 3 posições
acerca do tema: a) a primeira, a qual considera que tal fato se consubstancia
(independentemente se realizada unilateral ou bilateralmente) como um meio fraudulento e,
portanto, como um fato apto a caracterizar-se como crime de estelionato; b) a segunda, cuja
posição é pela atipicidade deste fato; c) a terceira, que caracteriza a mencionada conduta
como crime contra fé pública (art. 304 do CP); no STJ, contudo, prevalece se tratar de uma

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

conduta atípica (HC 136083, Sexta Turma, 2009). Súmula 17/STJ: “quando o falso se
exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido”. Princípio da
insignificância: tem aplicação no referido tipo penal quando se cuidar de conduta contra
particular; sucede, porém, que quando se tratar de conduta a causar danos ao patrimônio
público, predomina o entendimento pela inaplicabilidade do instituto (STJ, RHC
21670/PR).

B) Obter indevida vantagem: Prevalece que a vantagem deve ser necessariamente


econômica. OBS: Se a vantagem for devida, ou seja, lícita, o agente comete o crime de
exercido arbitrário das próprias razões (art. 345 do CP). A fraude em certames de interesse
público (concurso público avaliação ou exame públicos, processo seletivo para ingresso no
ensino superior ou exame ou processo seletivo previstos em lei) pode configurar o crime
previsto no art. 311-A, criado pela Lei 12.550/11.

C) Prejuízo alheio: deve ser econômico. STF (Inq. 1145): cola eletrônica não configura
estelionato (seja porque não há vítima determinada; seja porque não há prejuízo material).
Pode vir a configurar o crime de Fraude em certames de interesse público, previsto no Art.
311-A.

4. Tipicidade subjetiva: O crime é punido a título de dolo, com finalidade especial, qual
seja, obter vantagem indevida. A ocorrência de fraude bilateral não afasta o dolo do agente.

5. Consumação e tentativa: De duplo resultado: consuma-se com a obtenção da indevida


vantagem, seguida do prejuízo. Faltando a obtenção da vantagem ou o prejuízo, há
tentativa. Assim, se a vítima se apercebe, antes de propiciar a vantagem ilícita ao agente, de
que está sendo vítima de um engodo, o delito permanece na forma tentada. O lugar em que
o estelionato se consuma é aquele no qual ocorre o dano, vale dizer, aquele em que a coisa
passa da esfera de disponibilidade da vítima para aquela do infrator; os fatos sucessivos não
têm relevância jurídica.

OBS: Estelionato “de rendas”: Há discussão sobre a consumação do estelionato em que o


recebimento da vantagem se dá em prestações (benefício previdenciário de prestação
continuada), havendo 3 posições: a) a primeira, tratar-se de crime eventualmente
permanente (cujos principais efeitos jurídicos são: (i) minimizar o risco da prescrição ante o
condicionamento do inicio deste à cessação da permanência; (ii) ter como uma única
conduta a ocorrência de vários atos, ou seja, o recebimento de várias prestações, não
incidindo, assim, o aumento da pena decorrente da continuação); b) a segunda, cuidar-se de
crime continuado (mitigando, pois, os efeitos da prescrição, a despeito da possibilidade de
submetê-lo aos efeitos do aumento da continuidade delitiva quando da ocorrência de mais
de uma conduta); c) a terceira (prevalecente, segundo a posição do STF), tratar-se de crime
de “natureza binária”. “Isso porque é de se distinguir aquele que, em interesse próprio,
recebe o benefício ilicitamente daquele que comete uma falsidade para permitir que outrem
obtenha a vantagem indevida. No primeiro caso, a conduta, a despeito de produzir efeitos
permanentes no tocante ao beneficiário da indevida vantagem, materializa,
instantaneamente, os elementos do tipo penal. Já naquelas situações em que a conduta é
cometida pelo próprio beneficiário e renovada mensalmente, o crime assume a natureza
permanente, dado que, para além de o delito se protrair no tempo, o agente tem o poder de,
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

a qualquer tempo, fazer cessar a ação delitiva” (HC 101999).

6. Considerações Gerais.

A) Estelionato X furto mediante fraude: “No crime de estelionato a fraude antecede o


apossamento da coisa e é causa para ludibriar sua entrega pela vítima, enquanto no furto
qualificado pela fraude o artifício malicioso é empregado para iludir a vigilância ou a
atenção” (STJ, RT 768/527).

B) Estelionato X Curandeirismo mediante remuneração (art. 284, § Único/CP): a falsa


promessa de cura de problemas (físicos, psicológicos, amorosos, etc.) pode, dependendo do
caso, caracterizar curandeirismo ou estelionato. O curandeiro acredita ser capaz, com sua
atividade, de resolver os problemas da vítima, sendo os ‘trabalhos’ desenvolvidos para cura
dos males de quem o procurava, através de ‘baixa de espírito’, ‘passes’, ‘despachos’, etc.,
exigindo-se, portanto, a habitualidade da conduta. Ainda que cobre pelos “serviços”
prestados, o curandeiro tem a crença de solucionar o mal que acomete o ofendido. De outro
lado o estelionatário sabe ser o meio fraudulento por ele utilizado inidôneo a resolver as
necessidades da vítima, aproveitando-se da sua vulnerabilidade para obter vantagem ilícita,
em prejuízo alheio. Como o estelionato é crime de forma livre, o agente pode se valer
inclusive de atividades inerentes ao curandeirismo para enganar a vítima, mediante falsa
promessa de livrá-la dos seus malefícios. OBS: A examinadora Ela Wiecko considera o
curandeirismo e o charlatanismo figuras típicas inconstitucionais, porquanto violadoras de
direitos culturais e da liberdade de consciência e crença.

D) Estelionato X furto de energia elétrica: o furto de energia elétrica ocorrerá se o agente


captar a energia, antes que ela passe pelo relógio medidor. No caso de consumidor de
energia elétrica da empresa concessionária que altere o relógio de medição, haverá
estelionato.

C) Idoneidade do meio iludente: Seja qual for o meio empregado, só haverá o crime de
estelionato quando aquele for apto a iludir o ofendido, de acordo com suas características
pessoais e segundo o caso concreto. Súmula 73 do STJ: “A utilização de papel-moeda
grosseiramente falsificado configura, em tese, o crime de estelionato, de competência da
Justiça Estadual”. A fraude extremamente grosseira, inapta a iludir qualquer um, configura
fato atípico, sendo hipótese de crime impossível.

D) Reparação do dano no estelionato: a) antes do recebimento da denúncia – causa geral de


diminuição de pena (art. 16 CP, arrependimento posterior); b) depois do recebimento da
denúncia e antes da sentença – circunstância atenuante genérica (art. 65, III, “d”).

E) Compras com moeda falsa: Quem faz compras com moeda falsa se vale de artifício para
fins de obter vantagem ilícita em prejuízo alheio em regra, pratica crime de moeda falsa
(art. 289 ou ar. 290), entretanto, se a falsificação for grosseira será estelionato (art. 171), e a
competência é da Justiça Estadual - Súmula 73 do ST].

F) Estelionato E falsificação de documentos: o crime de estelionato, pela sua natureza, pode


vir acompanhado pelo ato de falsificação de documentos. Nessa hipótese discute-se se há

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

(ou não) 0 concurso de delitos, havendo três posicionamentos: a) De acordo com o STJ,
protegendo bens jurídicos diversos, o agente responde pelos dois crimes (estelionato e
falso), em concurso material (art. 69 do CP), considerando a pluralidade de condutas
produzindo vários resultados: Contudo, se o falso se esgota (se exaure) no estelionato, o
delito contra a fé-pública (falso) ficará absorvido pelo patrimonial (171). Nesse sentido é a
súmula 17 do STJ: "Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade
lesiva, é por este absorvido"; b) Segundo o STF o agente responderá pelos dois delitos,
porém em concurso formal, considerando haver uma conduta (dividida em dois atos)
produzindo pluralidade de resultados; c) O crime de falso absorve o estelionato, se 0
documento for público, já que a pena do falsum é mais severa (princípio da absorção).

7. Figura privilegiada (§1º ): Se o criminoso for primário e o prejuízo da vítima de pequeno


valor, o juiz deve substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois
terços, ou aplicar somente a pena de multa. Difere do furto privilegiado em que o que se
analisa é o pequeno valor da res furtiva.

8. Subtipos de estelionato (§2º).

A) Disposição de coisa alheia como própria (§2º, I). Crime comum. O sujeito passivo é o
comprador de boa-fé, ludibriado e enganado pelo agente que é a pessoa que vende. Os
verbos componentes do núcleo são: vender, permutar, dar em pagamento, locar ou dar em
garantia, tendo como objeto coisa alheia (móvel ou imóvel) como própria. Pelas
características da lei penal, que merece interpretação restritiva, a enumeração do tipo é
taxativa, não permitindo ampliação. O elemento subjetivo é o dolo, envolvendo a vontade
livre e consciente de praticar a ação incriminada. O agente deve ter consciência de que atua
no sentido de dispor de coisa alheia. O momento consumativo coincide com o da obtenção
da vantagem ilícita, tal como no caput, tendo como decorrência o prejuízo alheio. A
consumação deve ser estudada em função do verbo componente do núcleo do tipo. A
tentativa é admissível, tendo-se em conta a possibilidade de desdobramento do processo
executivo em qualquer das formas de ação. Pratica este delito quem furta um bem e, em
seguida, vende-o como próprio? Prevalece que o estelionato é um post-factum impunível
(princípio da consunção) do furto. Mas atente: há minoria entendendo que o agente
responde pelos dois crimes em concurso material (furto e estelionato), em razão de haver
duas vítimas: a do furto e a enganada.

B) alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria (§2º, II). Somente o dono da coisa
pode figurar como sujeito ativo. Na condição de sujeito passivo encontramos, de modo
geral, a pessoa que sofre a lesão patrimonial, dada a natureza do crime em estudo. A
doutrina, especificando, diz ser vítima aquele que recebe a coisa inalienável, gravada ou
litigiosa, ou, ainda, a pessoa que recebe a propriedade anteriormente prometida a terceiro,
ou a este próprio. Em qualquer das condutas, é indispensável que o agente iluda a vítima
sobre a condição da coisa (‘silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias’). Como no
inciso I, a enumeração deste também é taxativa; assim, por exemplo, a doação de coisa
alheia não é crime. A inalienabilidade pode ser legal, convencional ou testamentária. O
ônus pode ser legal ou contratual. Para que a coisa seja litigiosa é necessário que ele seja
objeto de demanda judicial. O objeto material é a coisa (móvel ou imóvel) própria
alienável, gravada de ônus ou litigiosa. O elemento subjetivo é o dolo, envolvendo a
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

necessidade de o agente ludibriar a vítima, característica marcante do estelionato.


Consuma-se o crime no momento em que o agente obtém a vantagem ilícita, momento este
que coincide com a produção do prejuízo alheio. A tentativa é admissível pelos mesmos
motivos anteriormente expostos.

C) Defraudação de penhor (§2º, III). Figura como agente o devedor que tem a posse do
objeto empenhado e como sujeito passivo o credo pignoratício. A ação física importa o
comportamento de defraudar (tomar com engano ou fraudulentamente, usar com astúcia),
indicando a lei as maneiras pelas quais o agente deve atingir o seu objeto: mediante
alienação (venda, troca, doação) não consentida pelo credor, ou “por outro modo” (desvio,
consumo, inutilização etc.) sempre sem a garantia do credor. O objeto material do delito
deve estar na posse do devedor. O elemento subjetivo é o dolo. O momento consumativo
coincide com o ato defraudador, em qualquer das modalidades previstas. Discute a doutrina
se se trata de crime material ou formal, havendo, para a primeira hipótese, a necessidade de
prejuízo alheio. A tentativa é admissível.

D) Fraude na entrega de coisa (§2º, IV). Sujeito ativo é aquele que tem a obrigação jurídica
de efetuar a entrega da coisa. Logo, sujeito passivo é a pessoa que tem o direito de receber
mencionada coisa. A ação física se perfaz com o comportamento de defraudar (desfalcar,
adulterar, trocar fraudulentamente) substância, qualidade ou quantidade de coisa que deve
entregar a alguém. Pressupõe, assim, uma relação jurídica entre os sujeitos do delito,
envolvendo a obrigação do agente de entregar alguma coisa à vítima. A relação, pois, deve
ser de caráter obrigacional. O elemento subjetivo do delito é o dolo, envolvendo a intenção
do agente de iludir a vítima. O momento consumativo coincide com a entrega efetiva da
coisa defraudada, de modo que o recebimento da coisa (móvel ou imóvel) pela vítima
traduz o sucesso da fraude empregada pelo agente. A tentativa é admissível, na hipótese do
destinatário que, iludido, consegue descobrir a fraude e recusa o recebimento da coisa.
OBS: Se a defraudação envolver substância ou produto alimentício (alterados em sua
substância), o crime será 0 previsto no art. 272 do CP; recaindo: sobre produtos destinados
a fins terapêuticos ou medicinais, 0 a r t 273 do CP, aliás, hediondo (Lei 8.072/90).

E) Fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro (§2º, V). O patrimônio do


segurador é o objeto da proteção penal. Figura com sujeito ativo o segurado ou outra pessoa
que venha a atuar a seu mando. Sujeito passivo é o segurador, seja pessoa física ou pessoa
jurídica. Tipo misto alternativo: a ação física do delito é representada pelas ações daquele
que destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa própria; ou lesa o próprio corpo ou
saúde; ou agrava as consequências da lesão ou doença, objetivando a indenização ou valor
do seguro. “É imprescindível que o dano seja idôneo para o recebimento de indenização ou
valor de seguro, caso contrário, haverá crime impossível (art. 17 do CP)”. O beneficiário
pode ser o próprio agente ou terceira pessoa. Este subtipo apresenta característica diversa
da modalidade fundamental de estelionato: não exige que haja efetiva lesão patrimonial a
ser suportada pelo sujeito passivo. Assim, o emprego do meio fraudulento já caracteriza o
crime que, por isso, é formal ou de consumação antecipada. Se ocorrer a obtenção do
proveito ilícito, o que deve ser reconhecer é o estelionato no seu tipo fundamental (Nelson
Hungria e jurisprudência majoritária), e não o exaurimento do crime em questão: se a
simples preparação ou tentativa de um crime é considerada entidade criminal autônoma,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

deve esta ser abstraída quando o fato é levado ad exitum, identificando-se o dito crime na
sua fase de consumação (salvo se a lei, na própria órbita da entidade criminal autônoma,
considere a superveniência do eventus damni como majorante, agravante especial ou
condição de maior penalidade). Em princípio, a prática de qualquer dos atos descritos não
configura ilícito penal. No entanto, dependendo do objetivo visado, envolvendo dano ou
probabilidade de dano a terceiro, a ilicitude deve ser reconhecida. A lesão do próprio corpo
não tipifica o crime de lesão corporal (princípio da alteridade). Pode, no entanto,
dependendo do fim colimado, dar margem ao reconhecimento do subtipo de estelionato em
estudo. O elemento subjetivo é o dolo, com o fim especial de agir. O momento consumativo
coincide com o momento da prática das ações, pois o crime é formal e independe de efetivo
resultado. A tentativa é admissível.

F) Fraude no pagamento por meio de cheque: O delito se configura quando ocorre


pagamento por meio de cheque sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado. O
agente emite o cheque sabendo-o desprovido de fundos. O sujeito ativo pode ser qualquer
pessoa titular de uma conta de movimento (emitente). A conta deve estar ativa; se o caso for
de pagamento com cheque de conta encerrada, teremos o crime de estelionato simples
(caput). Assim, também este se configurará se houver a emissão de cheque sem fundos com
nome falso, ou em conta de que não é titular. Tais delitos admitem participação; esta ocorre
na hipótese de aval simultâneo à emissão. O sujeito passivo é o tomador, isto é, o
beneficiário do cheque. A existência de fundos disponíveis é verificada no momento da
apresentação do cheque para pagamento (art. 4º, §1º da Lei do cheque). O concurso de
pessoas é admissível em face do art. 29 do CP. Todavia, quem entrega cheque sem fundos,
emitido por outrem, ciente da insuficiência, mas ocultando do recebedor, deve responder
pela figura do caput do art. 171 do CP, pois não o emitiu (neste sentido: STF). A ação
nuclear é emitir (pôr em circulação) e/ou frustrar (enganar, iludir a expectativa de alguma
coisa) o pagamento. Elemento subjetivo é o dolo, comportamento livre e voluntário no
sentido de emitir cheque para pronto pagamento, sabendo não existir fundos para sua
cobertura ou, tendo fundos, sabendo serem insuficientes. O momento consumativo coincide
com a recusa do pagamento do cheque pelo estabelecimento bancário. O crime de
estelionato, na modalidade em estudo, é crime material, que importa conduta e resultado,
com o desenvolvimento de um processo executivo. É admissível a tentativa, pois é possível
o fracionamento do iter criminis. É imprescindível a má-fé, nos termos da Súmula 246 do
STF: “comprovado não ter havido fraude, não se configura o crime de emissão de cheque
sem fundos”. Por isso, a emissão de cheque pós-datado (que perde sua natureza de ordem
de pagamento à vista, adquirindo a natureza de promessa de pagamento) sem fundos, em
regra, não configura crime, podendo, eventualmente, configurar estelionato na modalidade
fundamental, se demonstrado o dolo do agente em obter vantagem ilícita em prejuízo alheio
no momento da emissão fraudulenta do cheque. Súmula 554 do STF. O pagamento de
cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta ao
prosseguimento da ação penal. Competência: foro do local da recusa (Súmulas 244 do STJ
e 521 do STF) pelo Banco sacado. Cheque falsificado: foro do local da obtenção da
vantagem ilícita (Súmula 48 do STJ). OBS: Pratica crime quem dá sem cheque sem fundo
para pagar dívidas de jogo? NÃO. Cheque sem fundo para pagar dívidas de jogo ou aposta
não é crime, pois essas dívidas são inexigíveis, nos termos do art. 814 do CC. Assinatura
falsa: A conduta do agente que falsifica a assinatura do titular da conta-corrente não se

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

subsume ao inciso VI, mas à forma básica do caput, ocorrendo o mesmo no caso em que
titular emite o cheque estando a conta já encerrada. Nestas hipóteses, não se aplicam as
súmulas 521 e 554 do STF. Reparação do dano: Na modalidade de emissão de cheques sem
fundos, a reparação do dano antes do recebimento da inicial obsta a instauração da ação
penal (Súmula 554 do STF, a contrario sensu), não se aplicando o instituto do
arrependimento posterior, previsto no art. 16 do CP. Também está sumulado o entendimento
de competir ao juízo da Comarca em que houve a recusa do cheque por insuficiência de
fundos, processar e julgar o delito (Súmulas 521 STF e 244 STJ). Apesar de as duas
súmulas do Tribunal Supremo não fazer referência à modalidade de frustrar o pagamento de
cheque, não enxergamos razão para 0 tratamento desigual, merecendo, portanto, ser
também abrangida pelos entendimentos acima pacificados.

Causa de aumento de pena (§3º): 1/3: A razão do aumento é que nesses casos há lesão do
patrimônio de diversas vítimas, afetando o próprio interesse social ou o interesse particular
de numerosas vítimas, f deixa de caber suspensão condicional do processo. Incide nos
crimes contra o INSS e a Caixa Econômica Federal (instituição de economia popular). Não
incide nos crimes contra o Banco do Brasil. Correios: divergência.

STJ, 2014: A Súmula 554 do STF não se aplica ao estelionato no seu tipo fundamental (art.
171, caput): A jurisprudência afirma que a Súmula 554 do STF aplica-se unicamente para o
crime de estelionato na modalidade de emissão de cheque sem fundos (art. 171, § 2º, VI).
Assim, a referida súmula não se aplica ao estelionato no seu tipo fundamental (art. 171,
caput). Assim, não configura óbice ao prosseguimento da ação penal – mas sim causa de
diminuição de pena (art. 16 do CP) – o ressarcimento integral e voluntário, antes do
recebimento da denúncia, do dano decorrente de estelionato praticado mediante a emissão
de cheque furtado sem provisão de fundos. [STJ. 5ª Turma. HC 280.089-SP, Rel. Min.
Jorge Mussi, julgado em 18/2/2014].

Cuidado para não confundir. Vamos entender o julgado: SITUAÇÃO 1: Nivaldo, com a
intenção de ludibriar e obter vantagem ilícita em seu proveito, emitiu um cheque seu, sem
fundos, em favor de Carla. Em tese, ele praticou o crime de estelionato, previsto no art.
171, § 2º, VI, do CP [Art. 171 (...) § 2º - Nas mesmas penas incorre quem: VI - emite
cheque, sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado, ou lhe frustra o
pagamento]. Carla ficou extremamente contrariada e procurou a delegacia, tendo sido
instaurado um inquérito policial para apurar o fato. Percebendo que o caso ficou sério,
Nivaldo, antes que o Promotor de Justiça oferecesse denúncia contra ele, procurou a vítima
e pagou integralmente o valor do cheque. O pagamento do cheque (ressarcimento integral e
voluntário do dano) irá impedir o prosseguimento da ação penal? SIM. Para a
jurisprudência, se o agente que emitiu o cheque sem fundos pagá-lo antes de a denúncia ser
recebida, isso impedirá que a ação penal seja iniciada. Trata-se de uma exceção mais
favorável ao réu do que a regra do art. 16 do CP. Existe um enunciado antigo do STF, mas
ainda válido, sobre o tema: Súmula 554-STF: O pagamento de cheque emitido sem
provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta ao prosseguimento da ação
penal. SITUAÇÃO 2: Jair foi até o mercadinho e lá comprou 5kg de carne, pagando a conta
com um cheque furtado. Quando o dono da mercearia foi descontar o título, recebeu a
informação de que não havia fundos. Em tese, Jair praticou o crime de estelionato na figura

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

prevista no caput do art. 171 (e não no seu § 2º, VI). [Art. 171. Obter, para si ou para
outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro,
mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena - reclusão, de um a
cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis]. Foi instaurado inquérito
policial para apurar o fato e Jair, antes que o Promotor de Justiça oferecesse denúncia
contra ele, procurou a vítima e pagou integralmente o valor do cheque. O pagamento do
cheque (ressarcimento integral e voluntário do dano) irá impedir o prosseguimento da ação
penal? NÃO. A jurisprudência afirma que a Súmula 554 do STF aplica-se unicamente para
o crime de estelionato na modalidade de emissão de cheque sem fundos (art. 171, § 2º, VI).
Assim, a referida súmula não se aplica ao estelionato no seu tipo fundamental (art. 171,
caput). Desse modo, mesmo tendo pago integralmente o valor do cheque, o Promotor de
Justiça irá denunciar Jair e a ação penal contra ele prosseguirá normalmente. Mas ele terá
algum benefício por ter ressarcido o dano? SIM. Isso será considerado como causa de
diminuição de pena, nos termos do art. 16 do CP [Arrependimento posterior].

9. Estelionato previdenciário (§3º): A jurisprudência do STF se inclina no sentido de que o


estelionato previdenciário, quando praticado pelo próprio beneficiário das prestações, é
delito permanente (HC 107663/R], RHC 105183/IDiyHC 102493/RJ). No ST), porém, a
questão não está consolidada, havendo clara divergência entre turmas de julgamento a
respeito da natureza do delito. Na 5a Turma, por exemplo, é pacífico o entendimento de que
se trata de infração permanente (RHC 26737/RJ, HC 187201/RJ), ao passo que a 6a Turma
considera o crime do tipo instantâneo de efeitos permanentes (AgRg no HC 92903/ES,
AgRg no HC 130748/SP).

STJ, REsp 1.282.118-RS, 2013: Se a pessoa, após a morte do beneficiário, passa a receber
mensalmente o benefício em seu lugar, mediante a utilização do cartão magnético do
falecido, pratica o crime de estelionato previdenciário em continuidade delitiva. Segundo o
STJ, nessa situação, não se verifica a ocorrência de crime único, pois a fraude é praticada
reiteradamente, todos os meses, a cada utilização do cartão magnético do beneficiário
falecido. Assim, configurada a reiteração criminosa nas mesmas condições de tempo, lugar
e maneira de execução, tem incidência a regra da continuidade delitiva prevista no artigo
71, do CP. A hipótese, ressalte-se, difere dos casos em que o estelionato é praticado pelo
próprio beneficiário e daqueles em que o não beneficiário insere dados falsos no sistema do
INSS visando beneficiar outrem; pois, segundo a jurisprudência do STJ e do STF, nessas
situações, o crime deve ser considerado único, de modo a impedir o reconhecimento da
continuidade delitiva.

Art. 172: Duplicata Simulada

Objetividade jurídica: Protege-se tanto o patrimônio particular quanto a boa-fé, que deve
integrar as relações mercantis (espécie de delinquência empresarial).

Sujeito Ativo: Apenas aquele que emite o falso título. Os demais endossantes e o avalista,
sozinhos, não podem figurar no polo ativo, vez que endossar ou avalizar o título não se
enquadra na ação nuclear típica emitir (possível, no entanto, que sejam partícipes).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Sujeito Passivo: Poderá ser o sacado, quando aceita o título emitido de boa-fé (se de má-fé,
pode, conforme o caso, ser partícipe do crime) ou o tomador, que é aquele que desconta a
duplicata.

Conduta: Em sua redação original, o art. 172 punia: "Expedir ou aceitar duplicata que não
corresponda, juntamente, com a fatura respectiva, a uma venda efetiva de bens ou a uma
real prestação de serviço". Atualmente, com a alteração promovida pela Lei n° 8.137/90,0
núcleo consiste em emitir (produzir, lançar, compor):

Fatura Duplicata Nota de venda


Documento que comprova Título de crédito causal, Instrumento de outorga do
contrato de compra e venda emitido com base em crédito pelo fornecedor ao
mercantil. obrigação proveniente de titular.
compra e venda comercial
ou prestação de certos
serviços.
Conceito de duplicata: Duplicata é um título de crédito - que consiste em uma ordem de
pagamento emitida pelo próprio credor - por conta de mercadorias que ele vendeu ou de
serviços que prestou - e que estão representados em uma fatura - devendo ser paga pelo
comprador das mercadorias ou pelo tomador dos serviços.

Emissão da duplicata: O vendedor ou prestador dos serviços emite a fatura discriminando


as mercadorias vendidas ou os serviços prestados. Com base nessa fatura, esse vendedor ou
prestador poderá emitir a duplicata. Toda duplicata sempre terá origem em uma fatura. Uma
duplicata só pode corresponder a uma única fatura (art. 2°, § 2°, da Lei).

Duplicata simulada: O Código Penal prevê, sem seu art. 172, o delito de duplicata
simulada: [Art. 172. Emitir fatura, duplicata ou nota de venda que não corresponda à
mercadoria vendida, em quantidade ou qualidade, ou ao serviço prestado. Pena - detenção,
de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa]. Ex1: João emite uma duplicata afirmando que
vendeu 50 pares de sapato, mas, na verdade, foram 100 pares (não correspondência quanto
à quantidade). Ex2: João emite uma duplicata afirmando que vendeu 10 esculturas de
cobre, mas, na verdade, foram 10 de ouro (não correspondência quanto à qualidade).

OBS: Perceba que o tipo penal prevê que é crime a conduta de emitir duplicata dizendo que
vendeu certa quantidade, quando, na verdade, foi vendida outra. Também haverá o delito
quando se emitir a duplicata informando ter vendido um determinado tipo de mercadoria, e
a venda ter sido de outra espécie. A redação atual do art. 172, contudo, não fala,
expressamente, que é crime quando a pessoa emitiu a duplicata, mas não vendeu nada [uma
duplicata fria]. Diante disso, Fábio Ulhoa Coelho defendeu a tese de que a nova redação do
art. 172 tornou ATÍPICA a emissão de duplicata fria, ou seja, não fundada em efetiva
compra e venda mercantil. Para o doutrinador, o atual art. 172 somente se configuraria
quando, tendo havido um negócio real, a duplicata mencionasse qualidade ou quantidade
diversa da verdadeira. Logo, a conduta de emitir a duplicata e não vender nada ou não
prestar nenhum serviço seria atípica porque não estaria prevista no referido tipo penal. Essa
tese de Fábio Ulhoa Coelho foi aceita pelo STJ? NÃO. Para o STJ, se a pessoa emite uma
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

duplicata, mas não foi vendida mercadoria nenhuma nem prestado nenhum serviço, haverá
sim o crime do art. 172 do CP. O delito de duplicata simulada, previsto no art. 172 do CP,
configura-se quando o agente emite duplicata que não corresponde à efetiva transação
comercial, sendo típica a conduta ainda que não haja qualquer venda de mercadoria ou
prestação de serviço, ou seja, tanto duplicata simulada quanto duplicata fria configuram o
crime.

STJ, 2013: Se a pessoa emite uma duplicata, mas não foi vendida nenhuma mercadoria nem
prestado nenhum serviço haverá o crime do art. 172 do CP. O delito de duplicata simulada,
previsto no art. 172 do CP (redação dada pela Lei 8.137/1990), configura-se quando o
agente emite duplicata que não corresponde à efetiva transação comercial, sendo típica a
conduta ainda que não haja qualquer venda de mercadoria ou prestação de serviço. [STJ. 6ª
Turma. REsp 1.267.626-PR, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em
5/12/2013].

Crime próprio: somente pode ser praticado pelo comerciante que coloca em circulação a
fatura, duplicata ou nota de serviço, sem a correspondência com a mercadoria vendida ou
com o serviço prestado. Crime formal, que se consuma com a simples emissão da fatura,
duplicata ou nota de prestação de serviços. Duplicata simulada: é imprescindível a
assinatura do sacador.

Tipo Subjetivo: Consiste na vontade consciente de emitir o título, dispensando a


demonstração, da intenção do agente em descontá-lo. O tipo não prevê modalidade culposa.

Consumação e tentativa: A doutrina diverge quanto ao momento consumativo do delito.


Para uns, consuma-se com a colocação do título em circulação; Para outros, o momento
consumativo se dá com a emissão do título, ou seja, simples criação deste. Esta última
posição é sustentada por Fernando Capez em virtude da nova redação dada ao artigo pela
Lei 8.137/90, cujo núcleo do tipo passou de expedir para emitir. Tentativa: a doutrina
diverge. Para uns, a conduta criminosa pode ser fracionada, admitindo-se o conatus. Para
outros, o crime é unissubsistente, não se admitindo a tentativa.

Forma equiparada (parágrafo único): Embora se trate de crime de falsidade documental,


optou o legislador em classificá-lo como patrimonial. Aqui, o sujeito passivo é o Estado. O
empresário que emite duplicata deve manter, obrigatoriamente, no estabelecimento
comercial, um livro especial chamado "Registro de duplicatas". Pune-se quem falsificar
(inserção de dados inexatos) ou adulterar (modificação dos dados já existentes) este livro.
Se após o registro, o agente emitir a fraudulenta duplicata, a conduta do parágrafo único
será absorvida pelo delito previsto no caput (antefactum impunível). Trata-se portanto de
um "tipo de passagem", que será consumido (absorvido) pelo delito fim. Todavia, se,
emitida a duplicata, a falsificação ou a adulteração for praticada por pessoa diversa do
emitente, ocorrerão crimes autônomos.

Art. 173: Abuso de Incapazes

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

O abuso consiste em o agente valer-se da necessidade, paixão ou inexperiência da vítima


(tem que ser menor, alienado ou débil mental) e convencê-la a praticar um ato que possa
produzir efeito em seu próprio prejuízo ou de terceiro. Se o terceiro também teve prejuízo
ele também será sujeito passivo. Menor emancipado não poderá figurar como sujeito
passivo. Difere do estelionato porque não é cometido mediante fraude e é crime formal, que
se consuma com a prática de ato pela vítima, sem que seja necessário o auferimento de
vantagem pelo agente ou por terceiro (exaurimento). O ato suscetível de produzir efeito
jurídico significa a prática de qualquer conduta suficiente para gerar efeitos danosos ao
patrimônio da vitima.

Diferença para o estelionato:

OBS: Sendo a vítima pessoa idosa, poderá haver crime previsto na Lei 10.741/2003 –
Estatuto do Idoso, exemplo: Art. 106.

Art. 174: Induzimento à especulação

O crime também exige o abuso, mas a vítima (sujeito passivo) deve ser pessoa inexperiente,
simples ou com desenvolvimento mental deficiente. A lei visa proteger o patrimônio destas
pessoas, que são mais facilmente ludibriadas. Para configurar o crime é necessário que o
agente, para obter lucro para si ou para outrem, valha-se dessas condições para convencê-la
a praticar um ato (jogo, aposta, especulação com títulos ou mercadorias) que saiba lhe ser
ruinoso. Crime comum, formal de forma vinculada e que exige dolo específico.

Art. 175: Fraude no comércio

Para a grande maioria da doutrina, o art. 175 do CP foi revogado tanto pela Lei 8.078/90
(CDC) quanto pela Lei 8.137/90 (Crimes contra as relações de consumo).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Art. 176: Outras fraudes

Constituem figuras privilegiadas de estelionato.

Art. 177: Fraudes e abusos na fundação ou administração de S/A’s

Subsidiariedade expressa: Os crimes descritos apresentam caráter subsidiário, característica


esta que se depreende do fato de a própria lei, ao dispor sobre a pena (reclusão, de um a
quatro anos, e multa), declarar que a punição terá lugar “se o fato não constitui crime contra
a economia popular” (Lei nº 1.521/51). De modo geral, pode-se dizer que o objeto jurídico
desses delitos concerne ao interesse de ordem patrimonial dos titulares das ações, visando a
incriminação a evitar que esse tipo de sociedade venha a ser fraudulentamente fundado e
administrado. Em segundo plano, procurando resguardar o interesse patrimonial dos
acionistas, a norma, impondo pena ao seu descumprimento, tutela a autenticidade das
informações a respeito da fundação e administração dessas entidades, protegendo o capital
social e imprimindo a exigência da atividade correta de seus administradores.

Fraude na fundação de sociedade por ações (“caput”): Sujeito ativo será a pessoa que
promove a fundação; sujeito passivo, qualquer pessoa. A ação física compreende a conduta
do agente no sentido de promover a fundação de sociedade por ações, fazendo afirmação
falsa sobre a constituição da sociedade, ou ocultando fraudulentamente fato a ela relativo.
Essa informação deve estar relacionada a fato relevante, com possibilidade de produzir
dano. O meio de que se serve o agente é o prospecto (documento que apresenta as bases da
sociedade, a razão de sua constituição, sua finalidade, o valor do capital social, a forma de
subscrição das ações, etc.) ou comunicação ao público ou à assembleia. Crime informado
pelo dolo encontra o momento consumativo com a afirmação falsa ou a ocultação
fraudulenta, ações perfeitas, ainda que não se verifique prejuízo efetivo. A tentativa é
admissível. A ação penal é pública incondicionada.

Art. 178: Emissão irregular de conhecimento de depósito ou warrant

Crime próprio, formal, doloso e de forma livre. Lei penal em branco: preceito primário
deve ser complementado pelo Dec. 1.102/1903.

Art.179: Fraude à execução

Objetividade jurídica: Tutela-se o patrimônio do credor. Secundariamente, busca-se


proteger a autoridade das decisões judiciais.

Sujeito Ativo: É o devedor não comerciante (se comerciante, o crime será o do art. 168 da

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Lei 11.101/2005). Pode ocorrer, especialmente na modalidade de desvio, que terceiro


interessado em determinado bem a ser executado empregue, sozinho, a fraude, insciente o
devedor, hipótese em que responderá pelo delito em estudo (RT 613/339).

Sujeito Passivo: Será o credor.

[cuidado: pegadinha de prova afirma que o sujeito passivo é a administração da justiça para
te confundir quanto ao tipo de ação penal. Olhe essa questão do MP-PB 2010: o crime de
fraude à execução, por aviltar a regular Administração da Justiça, e apurado mediante ação
penal pública incondicionada. Tem dois erros. O sujeito passivo e o tipo de ação].

Conduta: Pune-se a conduta daquele que fraudar a execução, por ação ou omissão. A fraude
pode se dar de cinco formas: a) Alienação: o propósito fraudulento da alienação deve ser
devidamente comprovado. b) Desvio: é a destinação dada ao bem com a finalidade de
impossibilitar a penhora (exemplo: ocultação do bem); c) Destruição: é a eliminação do
bem objeto da execução; d) Danificação: é a ação de deteriorar o bem, diminuindo seu
valor, a fim de que se tome insuficiente à garantia da execução; e) Simulação de dívidas:
consiste na apresentação de dívida inexistente como verdadeira. OBS: Não há consenso
sobre se a fraude configuradora do crime pode ocorrer a qualquer tempo ou se pressupõe
processo civil já está instaurado (em fase de execução ou cognitiva). OBS: Partindo da
premissa de que a lide civil é indispensável, outra questão se impõe: há necessidade de que
o devedor tenha sido citado? Apesar de haver jurisprudência em sentido contrário (RT
520/478), entendemos desnecessário o chamamento do devedor, bastando a prova de que
este, no instante da fraude, tivesse conhecimento (mesmo que extrajudidalmente) de lide
pendente e que seus bens estavam na iminência de penhora. Essa é também a lição de
Pierangeli. OBS: É imperioso que a conduta empreendida pelo devedor o deixe sem
patrimônio suficiente para garantir a execução fraudada. Desse modo, nem sempre a
alienação do bem anteriormente oferecido em garantia pelo devedor configura o crime.
Remanescendo-lhe outro, apto a cumprir o mesmo papel, não se pode falar em fraude,
porquanto não obstada a pretensão do credor.

Tipo Subjetivo: Consiste no dolo de fraudar a execução, com a consciência e especial


vontade de prejudicar o autor/credor.

Consumação e tentativa: Consuma-se no momento em que o agente emprega a fraude. A


tentativa é admissível.

Ação penal: Somente se procede mediante queixa. (parágrafo único). Exceção: quando o
exequente for a Fazenda Pública: ação penal pública incondicionada: art. 24, §2º, do CPP.

QUESTÃO DE PROVA: Estelionato. Um servidor público insere dados falsos no sistema


da previdência social para conferir a alguém uma aposentadoria a que esta pessoa não tem
direito. Tipifica-se estelionato ou peculato?

188
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

8.a. Princípio de interpretação e aplicação da lei penal.


Concurso aparente de normas.
Principais obras consultadas: Santo Graal 27º.

Legislação básica: art. 5º, XXXIX e XL, da CF; arts. 1º e 12 do CP; art. 9º do Pacto de São
José da Costa Rica.

Interpretação: O Direito Penal não exige nenhum método particular de interpretação,


sendo aplicável a ele a interpretação jurídica geral, desde que observados os limites do
princípio da legalidade.

Classificação: 1) Quanto às fontes: a) Autêntica ou legislativa. É, em princípio


obrigatória, especialmente quando proveniente de outra lei, chamada de norma
interpretativa. Se a interpretação é inserida no próprio texto legal, diz-se que ela é
contextual. A lei interpretativa pode ser aplicada retroativamente se apenas aclarar o sentido
e o alcance do dispositivo interpretado. Todavia, caso inove, só poderá retroagir se tiver
natureza benéfica. b) Jurisprudencial. É por meio dela que a lei se encontra com o fato
concreto e com a realidade da vida. c) Doutrinária. Se há uniformização do entendimento
entre os doutrinadores, pode ser chamada de communis opinio doctorum. 2) Quanto aos
meios: a) Gramatical ou literal. Fixa-se no significado das palavras contidas no texto legal.
Tratando-se de termos jurídicos, deve-se dar preferência à linguagem técnica. Costuma-se
atribuir o menor grau hierárquico a esse meio de interpretação. No processo interpretativo,
não se pode olvidar que, ante o princípio da taxatividade, no Direito Penal o sentido literal
das palavras exerce função de garantia e, por isso, nunca pode ser ignorado (nullum crime
sine lege). b) Histórica. O ideal é entrelaçar tal método com a interpretação teleológica. c)
Sistemática ou lógico-sistemática. Busca-se situar a norma no conjunto geral do sistema
que a engloba, para justificar sua razão de ser, garantindo-se, assim, a unidade conceitual de
todo o ordenamento. 3) Quanto aos resultados: a) Declarativa. O texto não é ampliado
nem restringido, correspondendo exatamente a seu real significado. b) Restritiva. O alcance
do texto interpretado é reduzido ou limitado, partindo-se do pressuposto de que “a lei diz
mais do que quer”. c) Extensiva. Considerando que o sentido da norma fica aquém de sua
expressão literal, amplia-se o sentido ou alcance da lei examinada. Ex.: o art. 159 abrange a
extorsão mediante cárcere privado.

Aplicação: A analogia é uma forma de aplicação da norma legal, um método de integração


do sistema jurídico, que pressupõe a ausência de lei que discipline especificamente a
situação e enseja a extensão de uma norma jurídica de um caso previsto a um caso não
previsto, com fundamento na semelhança entre ambos. Pode ser chamada de analogia legis
(aplica-se uma norma legal a determinado fato não contemplado no texto de lei) ou
analogia juris (aplicam-se os princípios gerais do direito). Não pode ser utilizada nos casos
de leis penais incriminadoras, leis excepcionais e leis fiscais. Aplica-se às normas penais
não incriminadoras de caráter geral (ex.: excludentes de ilicitude e culpabilidade), desde
que não agravem a situação do infrator. A analogia não se confunde com interpretação

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

analógica, que é uma espécie de interpretação extensiva que decorre de determinação


expressa da própria lei (esta indica o meio para integrar o preceito normativo dentro da
própria norma, estendendo-o a situações análogas e pode ser aplicada às normas penais
incriminadoras).

Concurso aparente de normas:

Considerações Gerais: Conflito ou concurso aparente de normas é a circunstância em que


duas ou mais normas penais incriminadoras regulam, em tese, o mesmo caso concreto,
sendo que apenas uma efetivamente deverá ser aplicada. Muito se critica a expressão
“concurso aparente de normas”, eis que não ocorre um concurso, mas a primazia ou
exclusividade na aplicação de um dispositivo legal a certo fato. O que se observa, então,
não é um concurso, mas a unidade do ordenamento jurídico penal. Vale ressaltar que
concurso ou conflito aparente de normas não se confunde com o efetivo concurso de crimes
(concurso material, forma, crime continuado), no qual verdadeiramente há vulneração de
mais de um bem jurídico, seja da mesma espécie ou distintos. Do mesmo modo, não se
confunde com crime complexo (ou composto), que é aquele cujas elementares que o
integram são fatos que, por si mesmos, constituem crimes autônomos, vulnerando, portanto,
mais de um bem jurídico. Como é o exemplo do crime de roubo, o qual constitui crime de
furto e lesão corporal ou ameaça.

Critérios de Solução do Conflito Aparente de Normas: Em casos de ausência de disposição


legal expressa, compete à doutrina apresentar os critérios para a solução do conflito
aparente de normas, quais sejam, os princípios da especialidade, subsidiariedade,
consunção (ou absorção) e, para alguns autores, alternatividade (Gueiros discorda, pois
entende que se trata de critério para aplicação de uma única norma que contemple mais de
um verbo típico).

Nesse mister, o intérprete deve utilizar os seguintes princípios: a) especialidade (art. 12 do


CP): uma norma penal é considerada especial, em relação a outra geral, quando reúne todos
os elementos desta, acrescidos de mais alguns, denominados especializantes. Tal relação de
especialidade existe entre os tipos derivados e o tipo básico e nas hipóteses em que
determinada lei descreve como crime único dois pressupostos fáticos de crimes distintos
(ex.: o crime de roubo é o crime de furto praticado mediante violência ou grave ameaça). A
norma especial exclui a geral, independentemente da época em que foram promulgadas e da
quantidade da sanção penal prevista em cada uma delas. O princípio em apreço evita o bis
in idem e pode ser estabelecido in abstracto. Ainda, por ser o de maior rigor científico, é o
mais adotado pela doutrina. b) alternatividade: aplica-se aos casos em que dois tipos
contêm elementos incompatíveis entre si, excluindo-se mutuamente. Ex.: furto e
apropriação indébita. Muitos autores consideram esse princípio desnecessário. c)
subsidiariedade: há relação de primariedade e subsidiariedade entre duas normas se elas
descrevem graus de violação de um mesmo bem jurídico, de modo que a norma subsidiária
é afastada pela aplicação da norma principal. Se a pena do tipo principal é excluída, a do
tipo subsidiário apresenta-se como “soldado de reserva” (expressão de Nelson Hungria).
Portanto, aqui não ocorre a exclusão entre normas gerais e especiais, mas entre normas
190
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

primárias e secundárias. Vale dizer, a não subsunção do fato à norma que mais diretamente
o tutela, não importa em atipicidade, pois a norma auxiliar (subsidiária) poderá ser aplicada.
É a aplicação do lex primaria derogat legi subsidiariae. A subsidiariedade pode ser expressa
(ex.: art. 132 do CP) ou tácita, e sua constatação pressupõe o exame do fato in concreto; Há
duas espécies de subsidiariedade: expressa, que é quando a natureza subsidiária vem
prevista no próprio preceito secundário, por intermédio da expressão “se o fato não
constitui crime mais grave”; e tácita, que é quando cabe ao intérprete analisar, no exame do
caso concreto, se o fato se adequa ao tipo de maior ou menor gravidade. d) consunção (ou
absorção): o fato previsto em determinada norma é compreendido em outra, mais
abrangente, aplicando-se somente esta, desde que os delitos tenham ocorrido no mesmo
contexto fático. Assim, apesar de, em regra, o homicídio absorver o delito de porte ilegal de
arma, não haverá consunção se, por exemplo, após o agente perambular a noite inteira com
um revólver pela rua, ele encontrar uma vítima e matá-la. Pela diversidade de momento
consumativo e contexto, tratar-se-á de concurso de crimes. O crime consumado absorve o
tentado, e o de perigo é absorvido pelo crime de dano. Consoante parte da doutrina, nem a
diferença de bens jurídicos tutelados nem a disparidade de sanções cominadas impedem a
consunção. Nesse sentido, o STJ admite que o crime de estelionato absorva o delito de
falsificação de documento. Para o STF, o falso não resta absorvido pelo crime tributário nos
casos em que o documento falso continua passível de gerar lesões jurídicas (HC 91469, j.
20/5/8; HC 83115, j. 4/5/4). Note-se, ainda, que o princípio da consunção não se esgota na
solução de “conflitos aparentes de normas”, porquanto abrange situações em que há
pluralidade de fatos. Com efeito, deve-se considerar absorvido pela figura principal tudo
aquilo que, enquanto ação (anterior ou posterior), seja concebido como necessário, bem
como tudo o que, dentro do sentido de uma figura, constitua o que normalmente acontece.
Destarte, incide o princípio em comento quando há: 1) crime progressivo (tem-se a incursão
obrigatória pela infração penal menos grave – não se pode matar sem ferir); 2) progressão
criminosa; 3) fatos impuníveis: a) anteriores (são absorvidos pelo tipo principal, que pode
ser praticado sem violação da lei penal menos grave; b) concomitantes (ex.: ferimentos
leves suportados pela mulher vítima de estupro); c) posteriores (ex.: quem falsifica
documento e o usa apenas responde pelo falso – art. 297 do CP).

Jurisprudência: DIREITO PENAL. DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE DANO


COMETIDO CONTRA O PATRIMÔNIO DO DF. 1. A conduta de destruir, inutilizar ou
deteriorar o patrimônio do Distrito Federal não configura, por si só, o crime de dano
qualificado, subsumindo-se, em tese, à modalidade simples do delito. 2. Com efeito, é
inadmissível a realização de analogia in malam partem a fim de ampliar o rol contido no
art. 163, III, do CP, cujo teor impõe punição mais severa para o dano “cometido contra o
patrimônio da União, Estados, Municípios, empresa concessionária de serviços públicos
ou sociedade de economia mista”. 3. Assim, na falta de previsão do Distrito Federal no
referido preceito legal, impõe-se a desclassificação da conduta analisada para o crime de
dano simples, nada obstante a mens legis do tipo, relativa à necessidade de proteção ao
patrimônio público, e a discrepância em considerar o prejuízo aos bens distritais menos
gravoso do que o causado aos demais entes elencados no dispositivo criminal. HC
154.051-DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 4/12/2012.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

QUESTÕES DE PROVA:

1) O que vem a ser concurso aparente de normas e quais princípios vigentes?

2) Explique o que é princípio da especialidade.

3) Há outros princípios que regem o concurso aparente de normas?

4) É correto afirmar que a norma penal deve ser interpretada restritivamente?

5) O que é o princípio da interpretação analógica? É a mesma coisa que analogia?

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

8.b. Direito penal e os indígenas


Bibliografia: Santo Graal 27. Artigo Ela Wiecko - A Violência Domestica Contra os Povos
Indígenas; A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER NO ÂMBITO DOS
POVOS INDÍGENAS. Artigo Ela Wiecko - “O projeto de lei do senado n° 156, de 2009,
que institui o novo Código de Processo Penal e os crimes praticados contra os indígenas e
os por indígenas”. Artigos de Vitorelli e Baltazar. Alexandre Augusto Neves Figueiredo. O
TRATAMENTO JURÍDICO PENAL E PROCESSUAL PENAL DO INDÍGENA NO
MARCO DA PLURIETNICIDADE/MULTICULTURALIDADE.

LEGISLAÇÃO: Lei 6.001/73 (Estatuto do Índio – EI); Convenção 169 da OIT – OIT 169,
em especial seu artigo 8º; Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, art. 27.

1. Crimes contra os índios:

São tipificados na Lei 6.001/73 (Estatuto do Índio – EI), artigo 58, incisos I a III, sendo
todos dolosos e de menor potencial ofensivo. Edilson Vitorelli diz que o mais comum é a
impunidade ou a realização de transação penal.

O tipo do inciso I - tutela a cultura e as tradições indígenas, criminalizando o escárnio, o


vilipêndio ou a perturbação de cerimônias, ritos e costumes. Lembrar da previsão
constitucional acerca do reconhecimento e proteção destes aspectos (artigo 231), bem como
do marco internacional (Convenção 169 da OIT – OIT 169, em especial seu artigo 8º; Pacto
Internacional dos Direitos Civis e Políticos, art. 27). Para Baltazar, a concepção adotada
pela Constituição é a do direito à diferença. Superação do paradigma integracionista.

O tipo do inciso II - utilizar o índio ou comunidade indígena como objeto de propaganda


turística ou de exibição para fins lucrativos. Vitorelli observa que é muito comum observar,
mesmo em propagandas oficiais, utilização de indígenas como atrativo para turismo
exótico. Para Baltazar, a consumação independe da obtenção efetiva de lucro.

O tipo do inciso III - veda que se propicie, por qualquer meio, a aquisição, o uso e a
disseminação de bebidas alcoólicas nos grupos tribais ou entre índios não integrados. É o
que possui a maior pena. Vitorelli: como o tipo penal menciona a questão do índio “não
integrado” e a jurisprudência tem muita facilidade para considerar um índio como
integrado, a integração, a rigor, descaracterizaria o delito.

Tese do MPF: se a bebida é um elemento exógeno à comunidade, e está sendo introduzida


por um sujeito alheio a ela, incide a norma penal. Compatibiliza a proteção à liberdade do
índio que por vontade própria, deseja consumir álcool, com a proteção da comunidade
contra agentes que desejam usar a bebida como meio de degradação.

A Dra. Ela Wiecko no seu artigo: “A Violência Doméstica Contra os Povos Indígenas” –
relata que a bebida alcoólica é o principal motivo de violência contra a mulher no âmbito
familiar.
193
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

No que diz respeito à Lei Maria da Penha, esta é aplicável no âmbito indígena desde que se
atente e respeite os problemas práticos, que serão muitos, exigindo soluções as mais
diversas, inclusive híbridas. Necessária ponderação e cautela na aplicação da Lei Maria da
Penha à realidade indígena: tendo em vista o direito à autodeterminação dos indígenas,
deve-se ter cautela na aplicação da lei. Entende-se que são os povos indígenas que devem
decidir quais aspectos devem ou não ser preservados de acordo com sua organização social.

Competência: A jurisprudência atual e majoritária, segundo Vitorelli, é no sentido de que


somente as questões que envolvam interesse da União ou que tenham como motivação a
disputa de direitos atinentes à coletividade indígena (geralmente disputa por terras),
deslocam a competência da Justiça Estadual para a Federal.

STF, RE 419528/PR: COMPETÊNCIA CRIMINAL. Conflito. Crime praticado por


silvícolas, contra outro índio, no interior de reserva indígena. Disputa sobre direitos
indígenas como motivação do delito. Inexistência. Feito da competência da Justiça Comum.
Recurso improvido. Votos vencidos. Precedentes. Exame. Inteligência do art. 109, incs. IV
e XI, da CF. A competência penal da Justiça Federal, objeto do alcance do disposto no art.
109, XI, da Constituição da República, só se desata quando a acusação seja de genocídio,
ou quando, na ocasião ou motivação de outro delito de que seja índio o agente ou a vítima,
tenha havido disputa sobre direitos indígenas, não bastando seja aquele imputado a
silvícola, nem que este lhe seja vítima e, tampouco, que haja sido praticado dentro de
reserva indígena.

STJ – súmula 140: “Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar crime em que o
indígena figure como autor ou vítima”.

Posição da Dra. Ela: todo crime praticado por ou contra indígena deve ser de competência
da JF, que tem competência para julgar causas que envolvam direitos indígenas (CR 109,
XI), e está mais preparada para garantir o respeito a esses direitos e tradições. Superação da
referida Súmula, editada antes da CF/88.

Não cabe assistência da FUNAI no processo contra índio (STF HC 79530), por ser de
natureza civil a tutela cometida constitucionalmente à União, e não criminal.

Causas especiais de aumento de pena : O parágrafo único do art. 58 aumenta de um terço


a pena quando o crime for praticado por funcionário ou empregado do órgão de assistência
ao índio (maior censurabilidade). O art. 59 impõe idêntico aumento quando o crime for
praticado contra a pessoa, o patrimônio ou os costumes, em que o ofendido seja índio não
integrado ou comunidade indígena. Para Baltazar, incide este aumento em qualquer crime
praticado nestes termos, não só os previstos no EI.

Vitorelli ainda cita o genocídio como crime que pode ser praticado contra os índios (Lei
2.889/56), já que constituem um grupo étnico (art. 1º). O tipo tutela a vida em comum do
grupo de homens ou parte deste (não é crime contra a vida – STJ REsp 222653).

2. Crimes praticados por índios:

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Segundo o Estatuto do Índio - Art. 56. Parágrafo único. As penas de reclusão e de detenção
serão cumpridas, se possível, em regime especial de semiliberdade, no local de
funcionamento do órgão federal de assistência aos índios mais próximos da habitação do
condenado. Propostas processuais penais do Estatuto dos povos indígenas: Art. 233,§1º. As
penas de reclusão e de detenção serão cumpridas sempre que possível, em regime aberto, na
terra indígena ou no local de funcionamento da unidade administrativa do órgão indigenista
federal mais próxima do domicílio do condenado. §2º Se o juiz fixar o regime inicial
fechado, o indígena deverá cumprir a pena em estabelecimento distinto dos não-indígenas,
em respeito aos seus usos e costumes. §3º O juiz deverá adequar a pena restritiva de direito
aplicada ao indígena à sua realidade e à cultura de sua comunidade indígena.

A lei penal tem aplicabilidade diferenciada em relação a eles. A CF legitima este aspecto,
ao impor a necessidade de individualização da pena (art. 5º, XLVI); a OIT 169, nos seus
artigos 8º e 9º, também trata do assunto, impondo a necessidade de levar em conta as
tradições e costumes indígenas quando da aplicação da lei.

Para o MPF, o art. 56 do EI traz uma circunstância atenuante obrigatória (pena atenuada de
acordo com o grau de integração do índio), sendo que a maior ou menor compreensão do
índio acerca da cultura circundante serve apenas para graduar a atenuante, não para deixar
de aplicá-la.

Laudo antropológico: Prova pericial, produzida por profissional que tenha particular
conhecimento da cultura de um povo indígena específico, e que dela elaborará uma
descrição, para que juiz e MP formem convicção acerca do papel desempenhado pelas
especificidades culturais no cometimento do delito.

Posição da Dra. Ela Wiecko: para compreender o contexto cultural do depoente ou da


demanda, quando posta em favor ou contra indígenas, individual ou coletivamente, é
necessário o auxílio de alguém que conheça a organização sociopolítica e cultural do grupo
étnico. Em geral, será um(a) antropólogo(a) com especialização naquele grupo étnico.

OBS: A ausência de profissional capaz de estabelecer o diálogo intercultural faz com que o
sistema judicial ignore a diversidade cultural e aplique o direito sempre do ponto de vista
étnico/cultural dominante. Para Dra. Ela a falta de tradutor cultural configura ofensa ao
devido processo legal.

Chama o profissional de “tradutor cultural”.

Tese do MPF: imprescindível a realização deste laudo, sob pena de nulidade do processo.

Jurisprudência dominante: dispensabilidade, quando por outros meios o juiz puder verificar
que o índio é integrado (grau de escolaridade, título de eleitor, entendimento do idioma
oficial, etc. – STF HC 85198).

Regime de cumprimento de pena: O EI prevê que penas privativas de liberdade serão

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

cumpridas, se possível, em regime de semiliberdade, no local de funcionamento do órgão


federal de assistência mais próximo da habitação do condenado.

MPF: O art. 10, 1 e 2 da OIT 169, bem como o EI 56 (norma especial em relação ao CP),
garantem o direito a cumprir a pena em local que mantenha o índio em contato com sua
cultura, em geral sua própria tribo.

O STF, na ementa do HC 85198 (2010), diz que o regime de semiliberdade é direito


concedido pela simples condição de indígena, sem aprofundar no acórdão.

O STJ, no HC 30113 (2000 - impetrado pela Dra. Deborah Duprat), entendeu que o
benefício está ligado ao grau de integração do índio e à natureza do delito praticado.

Imputabilidade do índio: A doutrina tradicional elenca o indígena entre os inimputáveis,


por desenvolvimento mental incompleto ou retardado (Regis Prado e Rogério Greco, por
exemplo).

Para o MPF: o índio tem desenvolvimento pleno de suas faculdades mentais; pertencer a
uma cultura com valores diversos não significa ter desenvolvimento incompleto.

Desta feita, a punibilidade criminal do comportamento formalmente típico de um indígena


pode ser abordado tanto do ponto de vista da própria tipicidade quanto, especialmente, do
ponto de vista da culpabilidade, SEMPRE LEVANDO-SE EM CONSIDERAÇÃO O
CONTEXTO ÉTNICO, CULTURAL, POLÍTICO e ECONÔMICO no qual indivíduo se
insere ou ao qual inexoravelmente pertence.

No âmbito da tipicidade, AFFONSO DE LUCA esclarece que “algumas condutas dos


indígenas, inerentes à sua cultura, por serem fomentadas pelo Direito, não podem ser
criminalizadas, sendo, portanto, atípicas”, com base na Teoria da Tipicidade Conglobante
de ZAFFARONI. Isto é, se a própria CF determina que costumes e tradições indígenas
devem ser respeitados e protegidos (art. 231), formando, inclusive, o patrimônio cultural
brasileiro (art. 216), não se pode, ao mesmo tempo, tipificá-los como crimes.

No mesmo sentido é o entendimento de WIECKO ao afirmar que “as condutas de


charlatanismo e de curandeirismo, tal como definidos, deveriam ser descriminalizados,
principalmente o segundo, vez que evidente a colisão com os direitos de liberdade religiosa
e de práticas culturais de elementos formadores da nação brasileira (o índio e o negro),
agasalhadas na Constituição Federal”.

No âmbito da culpabilidade, WIECKO e BAJER afirmam que “a inimputabilidade dos


indígenas segue as regras gerais aplicáveis a todas as pessoas maiores de 18 anos (como já
ressaltado acima). Todavia, é possível excluir a culpabilidade pelo reconhecimento do erro
de proibição ou da inexigibilidade de conduta diversa. Villares (2009, p. 301) reporta a
doutrina penal latino-americana que desenvolve o conceito de ‘erro culturalmente
condicionado’, que se aplica à não compreensão do índio sobre a ilicitude de suas ações em
relação ao sistema de punição da sociedade não-índia”. Ressalta que Zaffaroni identifica
três formas desse conceito: erro de compreensão, consciência dissidente e justificação

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

putativa. Na primeira forma há uma dificuldade inata para a compreensão da proibição


normativa. A pessoa pode conhecer a norma, mas razões culturais impedem que ela aja de
modo diverso. Na segunda, a pessoa tem conhecimento da proibição e da ausência de
permissão legal, mas não se lhe pode exigir sua interiorização. Na justificação putativa um
indígena vê o não-índio como inimigo, o que justifica atitudes contrárias ao direito que
antecipam a ação inimiga”.

Em que pesem as considerações expendidas por WIECKO e BAJER com base nas lições de
LUIZ FERNANDO VILLARES, deve-se ter em mente que ZAFFARONI, na verdade, faz
uma análise das consequências jurídicas do condicionamento cultural em que se encontra
um indivíduo, e que pode dar azo a erros de compreensão que excluem a culpabilidade,
situações de justificação putativa e até mesmo a erros de tipo.

Erro culturalmente condicionado: Neste sentido, o erro culturalmente condicionado pode


gerar casos de atipicidade por erro de tipo quando, por exemplo, membros de uma
determinada cultura tenham um conhecimento da causalidade completamente falso e que os
coloca em situações de erro de tipo invencíveis, excludentes do dolo. Ex.: curandeiro que,
tentando curar uma ferida, utiliza substância que acaba por infeccionar a lesão, levando à
morte

Por outro lado, o erro culturalmente condicionado pode dar lugar a um erro de tipo
permissivo ou justificação putativa, como sucede com certos índios que atacam qualquer
“homem branco” pela crença de que este sempre terá a intenção de atacá-los. Outro
exemplo que pode ser citado é do indígena que querendo eliminar um “espírito maligno”
que lhe perseguia, mata na realidade uma anciã vizinha.

Por fim temos o erro de compreensão culturalmente condicionado que configura erro de
proibição. ZAFFARONI faz a seguinte divisão desta categoria jurídica em seu Manual (o
que não se verifica em seu Tratado): I – Erro que afeta o conhecimento da antijuridicidade,
que pode ser: a) direto, quando recai sobre o conhecimento da norma proibitiva, e b)
indireto, que recai sobre a permissão da conduta e que pode consistir ou na falsa suposição
de existência de uma permissão que a lei não outorga, ou na falsa admissão de uma situação
de justificação que não existe (justificação putativa); e II – Erro de compreensão que afeta a
compreensão da antijuridicidade, mas não o seu conhecimento.

De acordo com ZAFFARONI (tratado), o erro de compreensão da antijuridicidade ocorre


quando o agente possui um conhecimento (captação) de um determinado contexto jurídico,
mas não consegue se determinar de acordo com este conhecimento por não ter
“internalizado” ou “introjetado”, isto é, por não ser ou ter sido capaz de assimilar em seu
aparato psicológico tais normas de conduta. Ex.: sepultamentos ritualísticos que podem
propagar enfermidades perigosas, não poderão ser incriminados por eventual crime contra a
saúde pública, pois os agentes do aludido sepultamento não podem internalizar
(compreender) a antijuridicidade de suas condutas, porque diante da importância do ritual
funerário, o risco lhes parecerá sempre mínimo e não lhes poderá ser exigível que o
compreendam de outra maneira (ZAFFARONI, Tratado).

Infanticídio ritual: Quanto à questão do chamado infanticídio ritual, a punibilidade das

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

pessoas pode ser apreciada a partir de três soluções distintas: 1 - A solução da


inimputabilidade ou da imputabilidade diminuída (Aníbal Bruno): Alguns autores e
sistemas jurídicos defendem como solução geral para os fatos criminalmente ilícitos
praticados por membros dos povos "indígenas" a impunidade por falta de capacidade de
culpa ou a atenuação da pena em virtude de uma imputabilidade diminuída. Reconhecendo
que os "indígenas" vivem à luz de concepções morais e sociais diferentes das ocidentais, o
que dá origem a uma incompreensão quase total destas últimas antes de serem submetidos a
um "processo educativo", esta doutrina equipara a situação dos ditos indígenas à dos
menores. Aparentemente mais favorável e aberta às peculiaridades das formas de vida, esta
solução assenta numa visão racista e paternalista que não respeita a diferença de culturas e
uma perspectiva multicultural de abordagem dos problemas baseada no valor do
pluralismo. Um tal critério corresponde e obedece a uma estratégia política de assimilação e
adaptação cultural dos ditos "silvícolas" aos valores da vida "civilizada". 2 - A solução do
erro de compreensão culturalmente condicionado (Eugenio Zaffaroni): Trata-se de uma
especificação do erro de proibição que vale para aqueles casos em que, pese embora o
conhecimento da proibição, não é exigível ao agente a respectiva interiorização porque ela
é estranha à sua cultura, reconhecendo, no entanto, que o condicionamento cultural pode
dar lugar a outras espécies de erro. O "erro de compreensão culturalmente condicionado"
revela um grau de tolerância maior na resolução das situações de conflito pessoal entre
sistemas culturais distintos, dado que prescinde à partida da comprovação da
censurabilidade do erro. A admissão de um juízo de censurabilidade nas constelações a que
o erro se refere, pressupõe o reconhecimento da obrigatoriedade de assimilação dos valores
dominantes e isso representaria igualmente um desprezo pelas diferenças culturais. 3 - A
solução do erro sobre o objeto: Do ponto de vista da dogmática jurídico-penal, trata-se aqui
de uma espécie de erro sobre o objeto. Na base da deficiente identificação está, em suma,
um problema sensorial. Nesses casos, por detrás do erro está um problema de apreciação.
Não há dolo em qualquer das suas modalidades. Para a formação do dolo é decisivo, além
do conhecimento fático, o conhecimento das significações sociais dos elementos do fato
típico praticado. A concretização do "conhecer e querer", em que o dolo analiticamente se
decompõe, não requer a comprovação de qualquer estado psíquico do agente, mas a
determinação de se ele apreendeu e se identificou com os significados correntes e as
representações de responsabilidade existentes no seu mundo da vida. Posto isto, torna-se
necessário, mediação de um processo comunicativo entre dois polos constituídos pela
linguagem legal, necessariamente aberta, e a linguagem corrente na forma de vida do
agente, com vista ao estabelecimento das correspondências entre ambas. O juiz deverá
penetrar nas representações correntes do mundo da vida do agente e verificar se elas são ou
não conversíveis nas palavras da lei. O cumprimento do dever de cuidado deve aferir-se de
acordo com o padrão de uma pessoa média da comunidade tradicional e não segundo o
procedimento de um cidadão qualquer. Posição de DUPRAT: “fala-se que alguns grupos
indígenas praticam infanticídio, dentre eles os yanomami. Mais uma vez, a questão nuclear
é a definição de vida. A mulher yanomami, quando sente que é chegada a hora do parto, vai
sozinha para local ermo na floresta, fica de cócoras, e a criança cai ao chão. Nessa hora, ela
decide se a pega ao colo ou se a deixa ali. Se a coloca nos braços, dá-se, nesse momento, o
nascimento. Se a abandona, não houve, na concepção do grupo, infanticídio, pela singela
razão de que a vida não se iniciou”.

198
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Jurisprudência dominante: O EI só é aplicável ao índio “não integrado”. Aplicação do


direito penal indígena. O EI 57 foi recepcionado pela Constituição, pois reforça o
reconhecimento da organização social, costumes e tradições indígenas. Vide OIT 169, art.
9º, 1. Único limite: a devida observância aos direitos humanos internacionalmente
reconhecidos, não podendo o Judiciário ingressar no mérito, justiça ou suficiência da
punição.

Analise detalhada sobre a competência: O art. 109, XI, CF define como competente a
Justiça Federal para processar e julgar disputa sobre direitos indígenas, em princípio
quando está disputa tiver abrangência coletiva. A Sum. 140 do STJ se direciona neste
sentido quando dispõe que: “Compete a Justiça Comum Estadual processar e julgar crime
em que o indígena figure como autor ou vítima”. O Estatuto do Índio, por sua vez, diz caber
a FUNAI a defesa judicial e extrajudicial dos direitos dos indígenas e de suas comunidades
e que a União poderá propor, por meio do MPF (antes de 1988, hoje, leia-se AGU),
medidas judiciais adequadas à proteção da posse dos silvícolas sobre as terras que habitem.
Desta exposição tem-se que é competente a Justiça Federal os casos de crimes cometidos
em face de direitos indígenas quando entendidos como grupo social, coletivamente. Esse
ainda é hoje o fundamento utilizado pelo STF e STJ.

Ex: PENAL E PROCESSUAL PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE


COMPETÊNCIA. DENÚNCIA QUE ENVOLVE CRIMES DE
FAVORECIMENTO À PROSTITUIÇÃO, SUBMISSÃO À PROSTITUIÇÃO,
RUFIANISMO, VENDA DE BEBIDAS ALCOÓLICAS A ADOLESCENTES
E FORMAÇÃO DE QUADRILHA, PRATICADOS COM PARTICIPAÇÃO
DE ÍNDIOS E COM EXPLORAÇÃO SEXUAL DE ADOLESCENTES
INDÍGENAS. INEXISTÊNCIA DE CRIMES RELACIONADOS A DISPUTA
SOBRE DIREITOS INDÍGENAS. ART. 109, XI, DA CF/88. SÚMULA
140/STJ. INCIDÊNCIA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE DIREITO DA
COMARCA DE CORONEL BICACO/RS. I. Os delitos praticados são crimes
comuns, que não se relacionam com disputa sobre direitos indígenas, na forma
do art. 109, XI, da CF/88. II. O Plenário do Supremo Tribunal Federal já se
manifestou no sentido de que a competência da Justiça Federal, fixada no art.
109, XI, da Constituição Federal, "só se desata quando a acusação seja de
genocídio, ou quando, na ocasião ou motivação de outro delito de que seja
índio o agente ou a vítima, tenha havido disputa sobre direitos indígenas, não
bastando seja aquele imputado a silvícola, nem que este lhe seja vítima e,
tampouco, que haja sido praticado dentro de reserva indígena." (STF, RE
419.528, Rel. p/ acórdão Ministro CEZAR PELUSO, PLENO, DJU de
09/03/2007, p. 26). III. Caso é de aplicação da Súmula 140/STJ: "Compete a
Justiça Comum estadual processar e julgar crime em que o indígena figure
como autor ou vítima." . STJ, CC 38517 / RS, 24/10/2012

No entanto, importante salientar que, uma interpretação sistemática entre os arts. 109, XI e
231 da CF suscita que qualquer hipótese de cometimento de crimes contra ou por indígena
deveria ser da competência da Justiça Federal, tendo em vista ser de interesse da União
(diante da sua missão constitucional) os direitos indígenas contemplados também na sua

199
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

individualidade. Posto que, um crime cometido contra ou por um indígena atinge todo o seu
grupo. Este é o direcionamento dado pelo Projeto em tramitação do Novo CP, no que
concerne a crime praticado por índio e contra índio, assim vejamos como inovação:

Art. 36. Aplicam-se as regras do erro sobre a ilicitude do fato ao índio, quando
este o pratica agindo de acordo com os costumes, crenças e tradições de seu
povo, conforme laudo de exame antropológico. § 1º A pena será reduzida de um
sexto a um terço se, em razão dos referidos costumes, crenças e tradições, o
indígena tiver dificuldade de compreender ou internalizar o valor do bem
jurídico protegido pela norma ou o desvalor de sua conduta. § 2º As penas
privativas de liberdade serão cumpridas em regime especial de semiliberdade,
ou mais favorável, no local de funcionamento do órgão federal de assistência ao
índio mais próximo de sua habitação. § 3º Na medida em que isso for
compatível com o sistema jurídico nacional e com os direitos humanos
internacionalmente reconhecidos, deverão ser respeitados os métodos aos quais
os povos indígenas recorrem tradicionalmente para a repressão dos delitos
cometidos pelos seus membros.

Em seu relatório final, a comissão de juristas da elaboração do anteprojeto do Código Penal


apresenta a exposição de motivos das propostas efetuadas. No caso do art. 36, acima
descrito, a comissão expressa fundamento bastante condizente com o pensamento do MPF
em questões indígenas:

“Cultura indígena e erro de proibição. O trato penal das condutas praticadas


por índios não pode ser feito sem considerar que, nos termos da Constituição
Federal, “são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes,
línguas, crenças e tradições...”, art. 231. Este reconhecimento deve operar nos
diversos momentos relativos a prática de infrações penais, do exame da
culpabilidade ao modo e local de cumprimento de penas. O erro de proibição,
por si só, já permite mensurar o grau individual de compreensão dos
comportamentos penalmente vedados, considerando o ambiente econômico e
social do agente. Ele se mostra, portanto, sede favorável para a inserção da
questão do índio que tenha praticado fato típico e ilícito. Não é norma de
impunidade, mas de individualização da responsabilidade penal. Desponta a
utilidade do laudo antropológico, para se verificar em que medida aquela pessoa
indígena estava no manejo de identidades e valores culturais que podem ser
muito diversos dos seus. O tratamento como caso de erro de proibição permite,
se justificável o engano sobre o que se proíbe ou não, isentar de pena. Se o erro
não for justificável, será possível, para o índio, obter redução de pena de um
sexto a dois terços (mais do que na regra comum, na qual a redução é de um
sexto a um terço). Por fim, se mesmo o “homem branco” procura formas
alternativas de punir, negar esta possibilidade às comunidades indígenas seria
desarrazoado”.

No Capítulo VI (Crimes contra grupos vulneráveis), Seção III (Crimes contra os índios) do
Projeto do Novo CP, os arts. 486 e 487 são semelhante ao art. 58, I e III do Estatuto do
Índio.
200
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

OBS: Segundo a 2° Câmara de Coordenação e Revisão do MPF “Todos os casos que


envolvam delitos relacionados à cultura e organização social indígena atraem a
competência federal ”. O caso referia-se a delito de estelionato praticado contra indígenas e,
que, segundo o MPF, extrapolou a esfera individual, atingindo interesses efetivamente
coletivos. Boletim Ano II, n°27, 23 de Março/2012.

A 2°Câmara de Coordenação e Revisão do MPF entende que suposto crime de apropriação


indébita praticado por servidores da FUNAI em detrimento de indígenas exige uma
investigação mais aprofundada. Boletim Ano II, n°26, 2012.

Jurisprudência sobre crimes:

Supremo Tribunal Federal: HC 65.912-8 - MG Fatos delituosos praticados contra índios


dentro de reserva indígena. Interesse da União. Competência da Justiça Federal. HC
71.835-3 - MS Crime praticado por índio. Homicídio. Competência da Justiça Federal. HC
79.530-7 - PA Crime praticado por índio. Estupro. art. 213 do CP. Inexistência de disputa
sobre direitos indígenas. Competência da Justiça Estadual.HC 81.827-7 - MT Crime
praticado por índios. Homicídio. Delito comum. Ausência de disputa sobre direitos
indígenas. Competência da Justiça Estadual. HC 85.198-3 - MA Crimes praticados por
índio. Tráfico de entorpecentes. Associação para o tráfico. Porte Ilegal de arma. Laudo
antropológico desnecessário. RE 78.289 - PR Crime contra o patrimônio da Fundação do
Índio (FUNAI). Competência da Justiça Estadual RE 179.485-2 - AM Crime praticado
contra indígena. Genocídio. Disputa de terras. Direitos indígenas. Competência da Justiça
Federal. RE 192.473-0 RR Crime praticado contra silvícola. Homicídio. Competência da
Justiça Federal. RE 263.010-1 MS Crime praticado por índio contra índia. Inexistência de
direitos indígenas. Declinação de competência para a Justiça Estadual. RE 270.379-6 MS
Crime praticado contra indígena. Homicídio. Disputa de terras. Competência da Justiça
Federal. RE 351.487 - RR Crime de genocídio conexo com outros delitos. Competência da
Justiça Federal. RE 365.115 - TO Crime praticado por índio. Tráfico ilícito de
entorpecentes. Lei 6.368/76, art. 12. Competência da Justiça Estadual. RE 439.507 - PA
Crime praticado por índio. Rapto de criança de 7 anos. Inexistência de interesse da
coletividade indígena. Competência de Justiça Estadual. ROHC 84.308-5 - MA Crime
praticado por índio. Latrocínio. Competência da Justiça Estadual.

Superior Tribunal de Justiça: CC 35.489 - RS Crimes praticados por indígenas. Roubo.


Formação de Quadrilha. Resistência. Disputa por terras. Competência da Justiça Federal.
CC 39.389 - MT Crimes praticados por indígenas. Homicídios. Defesa do território.
Direitos étnicos. Competência da Justiça Federal. CC 43.155 - RO Crimes praticados por
indígenas. Disputa de terras. Competência da Justiça Federal.CC 45.127 - PE Crime
praticado por índio contra índio. Lesão corporal leve. Competência da Justiça Estadual. HC
22.834 - MA Crime praticado por índio. Latrocínio. Indígena integrado à sociedade.
Regime fechado de cumprimento de pena. HC 23.598 - PE Crime praticado por indígenas.
Homicídio qualificado. Prisão preventiva. Ameaça de testemunhas. Receio da comunidade
indígena. HC 30.113 - MA Crime praticado por indío. Tráfico de entorpecentes. Porte ilegal
de arma. Falta de perícia antropológica. Dispensabilidade. Indígena integrado à sociedade.
Pleito de concessão do regime de semiliberdade. Impossibilidade. HC 34.683 - PE Crime
praticado por indígenas. Roubo. Art. 157, §2º, I e II. Disputa de terras. Competência da
201
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Justiça Federal.HC 34.838 - PE Crime praticado por indígena. Furto de dois bois. Disputa
de terras. Aplicação do princípio da insignificância. Competência da Justiça Federal. REsp
625.100 - PR Crime praticado contra índio. Lesões corporais. Competência da Justiça
Estadual.

Justiça Federal: AP 2003.83.00.011297-6 PE- Crime praticado por índio contra índios.
Homicídio simples e qualificado. Porte ilegal de arma. Divergências entre facções na
comunidade indígena Xucuru.

Tribunal Regional Federal - 1ª Região: ACr 1999.37.01.000848-0 - MA Crime praticado


por índio. Roubo. Art. 157, §3º. ACr 2001.01.00.046953-4 - AM Crime praticado contra
indígenas. Etnia Tikuna. Crime de Genocídio. Competência do Juiz Singular. HC
1997.01.00.015592-9 - MA Crime contra a vida de silvícola. Disputa de terras indígenas.
Competência da Justiça Federal. HC 2005.01.00.072506-2 - MT Prisão preventiva. Delitos
ambientais. Operação "Curupira". Exploração de produtos florestais. Possível prática de
Genocídio contra indígenas. RC 95.01.22597-6 - AM Crime contra a vida de silvícola.
Disputa de terras. Competência da Justiça Federal. RC 1997.01.00.000453-4 - AC Crime
praticado contra índio. Competência da Justiça Federal. RC 1997.01.00.40591-3 - BA
Crime praticado por índio contra índio. Homicídio. Competência da Justiça Federal.RC
2003.42.00.001839-9 - RR Crime contra a vida de silvícola. Ocultação de cadáver. Recurso
em sentido estrito. Inexistência da alegações finais. Ausência de Nulidade.

Tribunal Regional Federal - 3ª Região: HC 2003.03.00.079577-9 - MS Crimes praticados


contra indígenas. Homicídio. Lesões corporais. Índios da Aldeia Taquara. Acampados em
área da Fazenda Brasília do Sul. Decreto de Prisão Preventiva. Concurso de Pessoas.
Alegação de desigualdade de tratamento. RC 2002.03.99.016415-4 - MS Crime praticado
por índio contra índio. Homicídio. Incompetência da Justiça Federal.

Tribunal Regional Federal - 4ª Região: RC 2002.04.01.041639-8 – SC - Crimes de


Cárcere Privado e de Extorsão. Morte e lesões a índios. Reserva Indígena Xapecó.
Competência da Justiça Federal. RC 2004.72.02.000942-2 - SC - Crimes praticados por
indígenas. Competência da Justiça Federal.

Jurisprudência sobre Competência:

Supremo Tribunal Federal: AG.REG. 307.401-9-SP Ação de Usucapião. Antigos


aldeamentos indígenas. Falta de interesse da União. Incompetência da Justiça Federal. HC.
65.912-8-MG Fatos delituosos praticados contra índios dentro de reserva indígena.
Interesse da União. Competência da Justiça Federal. HC.71.835-3-MS Crime praticado por
índio. Homicídio. Competência da Justiça Federal. HC 79.530-7-PA Crime praticado por
índio. Estupro. art. 213 do CP. Inexistência de disputa sobre direitos indígenas.
Competência da Justiça Estadual. HC 81.827-7-MT Crime praticado por índios. Homicídio.
Delito comum. Ausência de disputa sobre direitos indígenas. Competência da Justiça
Estadual. Rcl 2.833-0-RR Usurpação de competência. Processos judiciais que impugnam a
Portaria nº 820/98, do Ministério da Justiça. Ato Normativo que demarcou a reserva
indígena Raposa Serra do Sol, no Estado de Roraima. RE 78.289-PR Crime contra o
patrimônio da Fundação do Índio (FUNAI). Competência da Justiça Estadual. RE 179.485-

202
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

2-AM Genocídio praticado contra indígenas na disputa de terras. Direitos indígenas.


Competência da Justiça Federal. RE 183.188-0-MS Reintegração de Posse. Área
demarcada pela FUNAI. Ação possessória promovida por particulares contra silvícolas.
Intervenção da União Federal. Disputa sobre diretos indígenas. Incompetência da Justiça
Estadual. RE 192.473-0-RR Crime praticado contra silvícola. Homicídio. Competência da
Justiça Federal. RE 263.010-1-MS Crime praticado por índio contra índia. Inexistência de
direitos indígenas. Declinação de competência para a Justiça Estadual. RE 270.379-6-MS
Crime praticado contra indígena. Homicídio. Disputa de terras. Competência da Justiça
Federal. RE 351.487-RR Crime de genocídio conexo com outros delitos. Competência da
Justiça Federal. RE 365.115-TO Crime praticado por índio. Tráfico ilícito de entorpecentes.
Lei 6.368/76, art. 12. Competência da Justiça Estadual. RE 439.507-PA Crime praticado
por índio. Rapto de criança de 7 anos. Inexistência de interesse da coletividade indígena.
Competência de Justiça Estadual. ROHC 84.308-5-MA Crime praticado por índio.
Latrocínio. Competência da Justiça Estadual

Superior Tribunal de Justiça: CC 35.489 - RS Crimes praticados por indígenas. Roubo.


Formação de Quadrilha. Resistência. Disputa por terras. Competência da Justiça Federal.
CC 39.389 - MT Crimes praticados por indígenas. Homicídios. Defesa do território.
Direitos étnicos. Competência da Justiça Federal. CC 39.818 - SC Pedido de alvará judicial.
Levantamento de saldo em conta poupança de particular silvícola. Inexistência de direitos
indígenas. Competência da Justiça Estadual. CC 45.127 - PE Crime praticado por índio
contra índio. Lesão corporal leve. Competência da Justiça Estadual. CC n° 43.155 - RO
Crimes praticados por indígenas. Disputa de terras. Competência da Justiça Federal. HC
34.683 - PE Crime praticado por indígenas. Roubo. Art. 157, §2º, I e II. Disputa de terras.
Competência da Justiça Federal. HC 34.838 - PE Crime praticado por indígena. Furto de
dois bois. Disputa de terras. Aplicação do princípio da insignificância. Competência da
Justiça Federal. REsp 625.100 - PR Crime praticado contra índio. Lesões corporais.
Competência Estadual.

Justiça Federal: ACP 2005.81.00.001868-0 - CE Índios Tapebas. Terras tradicionalmente


ocupadas por indígenas. Livre acesso às lagoas nelas localizadas. Direitos indígenas.
Competência da Justiça Federal.

Tribunal Regional Federal - 1ª Região: ACi 2001.01.00.046953-4 - AM Crime praticado


contra indígenas. Etnia Tikuna. Crime de Genocídio. Competência do Juiz Singular. AI
93.01.22609-0 - DF Ação Civil Pública. Dano ao meio ambiente. Interesse da União.
Competência da Justiça Federal. AI 2000.01.00.134069-6 - DF Indenização por perdas e
danos. Terras declaradas de ocupação indígena. Desapropriação Indireta. Possibilidade de
propositura da ação no Distrito Federal. AI 2005.01.00.062286-0 - BA Incompetência do
juízo. Julgamento da Ação Cautelar e da Ação Civil Pública principal. Suspensão do
Licenciamento Ambiental. Implantação do Projeto de Integração do Rio São Francisco com
Bahias Hidrográficas do Nordeste Setentrional. CC 2000.01.00.027619-9 - DF Conflito de
Competência. Hidrovia Araguaia-Tocantins. Não caracterização de qualquer das situações
de conflito de competência. Conflito não conhecido. CC 2004.01.00.035208-7 - RR
Conflito de Competência. Suspender os efeitos da Portaria nº 820/98, do MJ. Demarcação
da terra indígena Raposa Serra do Sol. HC 1997.01.00.015592-9 - MA Crime contra a vida

203
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

de silvícola. Disputa de terras indígenas. Competência da Justiça Federal. HC


2005.01.00.072506-2 - MT Prisão preventiva. Delitos ambientais. Operação "Curupira".
Exploração de produtos florestais. Possível prática de Genocídio contra indígenas. RC
95.01.22597-6 - AM Crime contra a vida de silvícola. Disputa de terras. Competência da
Justiça Federal. RC 1997.01.00.000453-4 - AC Crime praticado contra índio. Competência
da Justiça Federal. RC 1997.01.00.40591-3 - BA Crime praticado por índio contra índio.
Homicídio. Competência da Justiça Federal.

Tribunal Regional Federal - 4ª Região: RC 2002.04.01.041639-8 - SC Crimes de Cárcere


Privado e de Extorsão. Morte e lesões a índios. Reserva Indígena Xapecó. Competência da
Justiça Federal.

Trechos de jurisprudência:

“Apuração da condição de indígena que deve observar a inteligência constitucional (art.


231 CF) e que não cabe à jurisdição criminal. Aferição do direito à assistência legal (art.
11-B, § 6º L. 9.028/95) pela autarquia fundacional que compete à Justiça Federal. Recurso
em mandado de segurança provido para anular o processo da ação penal desde a denúncia,
bem como da sentença e do acórdão, pondo-se o réu em liberdade e remetendo-se os autos
à Justiça Federal” (RMS 30675/AM / RT 917).

“Salientou-se que o grau de integração do índio à sociedade e a questão referente à sua


incapacidade não seriam pressupostos para definir a intervenção da Funai. Considerou-se,
ainda, que a definição da condição de índio deve ser dada pela antropologia e segundo
critérios estabelecidos em lei para os quais é irrelevante o grau de integração. Adotado o
normativo da Convenção OIT n. 169, o Estado brasileiro acolheu, formalmente, como
critério de identificação a autoidentificação, de tal modo que, para fins legais, é indígena
quem se sente, comporta-se ou afirma-se como tal, de acordo com os costumes,
organizações, usos, língua, crenças e tradições indígenas da comunidade a que pertença.
Por sua vez, consignou o Min. Relator que não cabe ao juiz criminal aferir a capacidade
civil do recorrente uma vez que se trata de questão prejudicial heterogênea de exame
exclusivo na jurisdição civil. Ao final, reconheceu-se a competência da Justiça Federal para
análise e julgamento da causa, tendo em vista a presença da autarquia federal no feito na
qualidade de assistente de indígena” (RMS 30.675-AM / inf. 488 STJ / 5ª Turma).

AÇÃO PENAL. INDÍGENA. ASSISTÊNCIA DA FUNAI.

A Turma deu provimento ao recurso para anular a ação penal na origem, desde o
recebimento da denúncia, inclusive, determinando, por conseguinte, a remessa dos autos à
Justiça Federal para o julgamento da causa, assegurado ao ora recorrente, indígena, sua
colocação em liberdade e a assistência da Funai. Na espécie, o recorrente, pertencente à
etnia Kokama da aldeia São José, situada no município de Santo Antônio do Iça-AM,
fronteira com a Colômbia, foi processado e condenado pelo juízo da vara criminal estadual

204
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 (Lei de Drogas). A
defesa sustentava a necessidade da intervenção da Funai no feito em razão da condição de
indígena do recorrente nos termos da legislação correspondente. Inicialmente, destacou-se
ser cabível a análise da matéria em mandado de segurança, porquanto constatada a omissão
da Justiça criminal em julgar o pedido de assistência de terceiro não integrante na relação
processual. No mérito, asseverou-se que a negativa do juiz criminal em permitir a
intervenção da Funai na ação penal pelo fato de ter sido o recorrente considerado integrado
à sociedade – pois ele possuía documentos comuns aos não índios (CPF, RG, título de
eleitor etc.) – seria incompatível com a nova inteligência constitucional. Afirmou-se que o
Estatuto do Índio (Lei n. 6.001/1973), concebido na vigência da CF/1967, não pode ser
interpretado na sua literalidade, sendo cabível sua análise conforme a inspiração
constitucional atual, nos termos dos arts. 231 e 232 da CF/1988. Salientou-se que o grau de
integração do índio à sociedade e a questão referente à sua incapacidade não seriam
pressupostos para definir a intervenção da Funai. Considerou-se, ainda, que a definição da
condição de índio deve ser dada pela antropologia e segundo critérios estabelecidos em lei
para os quais é irrelevante o grau de integração. Adotado o normativo da Convenção OIT n.
169, o Estado brasileiro acolheu, formalmente, como critério de identificação a
autoidentificação, de tal modo que, para fins legais, é indígena quem se sente, comporta-se
ou afirma-se como tal, de acordo com os costumes, organizações, usos, língua, crenças e
tradições indígenas da comunidade a que pertença. Por sua vez, consignou o Min. Relator
que não cabe ao juiz criminal aferir a capacidade civil do recorrente uma vez que se trata de
questão prejudicial heterogênea de exame exclusivo na jurisdição civil. Ao final,
reconheceu-se a competência da Justiça Federal para análise e julgamento da causa, tendo
em vista a presença da autarquia federal no feito na qualidade de assistente de indígena.
RMS 30.675-AM, Rel. Min. Gilson Dipp, julgado em 22/11/2011. (Inf. 488 – 5ª Turma)

CC. TENTATIVA. HOMICÍDIO. ADVOGADO. SILVÍCOLA. MENTOR.

Trata-se de conflito de competência (CC) em que figura como suscitante o juízo estadual e
como suscitado o TRF da 1ª Região. In casu, ocorreu tentativa de homicídio contra um
advogado, crime do qual seria mentor um silvícola. Nesta superior instância, ao apreciar o
conflito, inicialmente ressaltou o Min. Relator ser verdade que a competência federal penal,
principalmente nas causas que envolvam índios, é alvo de inúmeras dúvidas doutrinárias e
jurisprudenciais, sempre havendo vozes dissonantes. Entretanto, é possível valer-se de um
princípio para definir se determinada ação deve tramitar na Justiça Federal ou na Justiça
estadual: trata-se do princípio da preponderância do interesse da União. Na hipótese, a
motivação da tentativa de homicídio seria a penhora de um micro-ônibus pertencente à
associação indígena para saldar dívidas. Assim, entendeu o Min. Relator que, interpretando
em conjunto o art. 3º da Lei n. 6.001/1973 e o art. 231 da CF/1988, não há como negar que,
no caso, a motivação para o crime extrapolou o interesse privado (individual). É que, sendo
vedada a implantação de garimpos particulares em reservas indígenas, criou-se uma
maneira indireta de fazer a extração dos bens minerais escondidos em seu subsolo.
Convenceu-se a comunidade indígena daquela região acerca da necessidade de aquisição de
bens materiais modernos, sabendo-se que jamais seus membros teriam como quitar as

205
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

dívidas contraídas. Desse modo, não se aplica à espécie o enunciado da Súm. n. 140-STJ, já
que houve indubitavelmente disputa sobre direitos indígenas, o que atrai a competência da
Justiça Federal. Diante dessas considerações, entre outras, a Seção conheceu do conflito e
declarou competente a Justiça Federal, CC 99.406-RO, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em
13/10/2010. (Inf. 451 – 3ª Seção)

DIREITO PROCESSUAL PENAL. COMPETÊNCIA. CRIME PRATICADO CONTRA


INDÍGENA.

A competência da Justiça Federal para processar e julgar ações penais de delitos praticados
contra indígena somente ocorre quando o processo versa sobre questões ligadas à cultura e
aos direitos sobre suas terras. O STF, no RE 419.528, afirmou que a competência da Justiça
Federal, fixada no art. 109, XI, da CF, "só se desata quando a acusação seja de genocídio,
ou quando, na ocasião ou motivação de outro delito de que seja índio o agente ou a vítima,
tenha havido disputa sobre direitos indígenas, não bastando seja aquele imputado a
silvícola, nem que este lhe seja vítima e, tampouco, que haja sido praticado dentro de
reserva indígena". Não se verificando a circunstância diferenciadora para atrair a
competência da Justiça Federal, observa-se a Súm. n. 140/ STJ. Precedentes citados do
STF: RE 419.528-PR, DJ 9/3/2007; RHC 85.737-PE, DJ 30/11/2007; do STJ: CC 101.569-
PR, DJe 6/9/2010, e CC 43.328-MS, DJe 21/10/2008. CC 38.517-RS, Rel. Min. Assusete
Magalhães, julgado em 24/10/2012.

QUESTÕES DE PROVA: De que maneira o direito penal trata de um ilícito praticado por
um silvícola? Existe particularidade na execução penal do silvícola?

206
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

8.c. Tráfico de pessoas e redução a condição análoga à de


escravo.
Principais obras consultadas: Santo Graal 27. Cezar Roberto Bitencourt, Tratado de
Direito Penal, Parte Especial 2, 2009. Guilherme de Souza Nucci, Código Penal
Comentado, 2012. Rogério Sanches Cunha, “Código Penal para Concursos”, 2009.
Anotações de aulas (diversos). DELMANTO, Celso et alli. Código Penal comentado. 7. ed.
São Paulo: Renovar, 2007. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte especial.
Volumes 3 e 4. 5. ed. Niterói: Ímpetos, 2008. JESUS, Damásio E. de. Código Penal
anotado. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. CASTILHO, Ela Wiecko Volkmer.
Considerações sobre a interpretação jurídico-penal em matéria de escravidão. Estudos
Avançados, São Paulo, v. 14, n. 38, p. 51-65, 2000. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142000000100.
CASTILHO, Ela Wiecko Volkmer. Novas perspectivas para a tese da competência da
Justiça Federal para o crime de trabalho escravo. Boletim dos Procuradores da República,
n. 66, 2005. Disponível em:http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/atuacao-e-conteudos-de
apoio/publicacoes/trabalhoescravo/Artigo_Novas_Perspectivas_Dra_Ela.pdf. Acesso em
10/12/2011; CUNHA, Rogério Sanches. Código Penal para concursos. 5ª ed.
Salvador:Juspodivm, 2012; NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade
sexual, 3ª ed. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2012; GRECO, Rogério. Código Penal
Comentado, 6ª ed. São Paulo: Ímpetos, 2012. BITERCOURT, Cezar Roberto. Tratado de
Direito Penal – Parte Especial, vol. 4. 6ª ed. São Paulo:Saraiva, 2012.

Legislação básica: Código Penal, arts. 231 e 231-A.

Leituras complementares sugeridas: Convenção das Nações Unidas para Repressão do


Tráfico de pessoas e do lenocínio (Nova York, 1950) e Protocolo Adicional à Convenção
das Nações Unidas Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em
especial Mulheres e Crianças (“Protocolo de Palermo”).

1. Tráfico de pessoas (Arts. 231, 231-A, CP)

Observações iniciais: No plano internacional, destacam-se a Convenção das Nações Unidas


para Repressão do Tráfico de Pessoas e do Lenocínio (Nova York, 1950), ratificada pelo
Brasil em 1958, e o Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas Relativo à
Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças
(“Protocolo de Palermo”), Decreto nº 5.014/04, que conceitua o tráfico de pessoas. O art. 3º
do Protocolo Adicional à Convenção de Palermo apresenta a seguinte definição de tráfico
de pessoas: “a expressão tráfico de pessoas significa o recrutamento, o transporte, o
acolhimento (...) de pessoas, recorrendo à (...) fraude, ao engano, (...) ou à situação de
vulnerabilidade, (...) para fins de exploração. Rol exemplificativo das formas de
exploração: A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou
outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas
similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos”. Segundo Ela Wiecko (A

207
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

legislação penal..., p. 7), a definição engloba qualquer forma de exploração da pessoa


humana, pois tal enumeração é apenas ilustrativa. Com base no Protocolo, Samuel Miranda
Arruda (p. 6) sustenta que o tráfico de órgãos (tipificado no art. 15 da Lei nº 9.434/97) seria
uma espécie do gênero tráfico de seres humanos. Além disso, o autor (p. 2-3) critica a
ausência de uma diferenciação, na legislação criminal, entre o vendedor consciente e a
pessoa traficada, vitimada por organização criminosa. Na terminologia do Protocolo
Adicional à Convenção de Palermo, o trabalho escravo é considerado uma modalidade de
tráfico de pessoas (vide art. 3º, a).

Atenção: Na lei brasileira, ao contrário, a expressão tráfico de pessoas é utilizada, de forma


expressa, apenas para os casos de tráfico com fim de exploração sexual (CP, arts. 231 e
231-A). Porém, segundo José Paulo Baltazar Junior (p. 106), o Brasil dá cumprimento ao
Protocolo, ao menos do ponto de vista legislativo, na medida em que incrimina o trabalho
escravo (CP, art. 149), a exploração sexual (CP, arts. 227-230), o tráfico de pessoas (CP,
arts. 231 e 231-A), o tráfico de órgãos (Lei 9.434/97, arts. 14-20) e o tráfico de crianças
(ECA, art. 239). Em sentido contrário, Ela Wiecko (A legislação penal..., p. 7) denuncia
que o Brasil não criminaliza o tráfico internacional

Na legislação nacional, o Código Penal criminalizava, no texto original, apenas o tráfico de


mulheres (sujeito passivo próprio). Com a reforma promovida pela Lei nº 11.106/05, o
crime passou a ter sujeito passivo comum (“pessoa”) e foram criadas causas de aumento de
pena. Com a Lei nº 12.015/09, o CP passou a tipificar as condutas sexuais diversas da
prostituição e se distinguiu o Tráfico Internacional de Pessoa para fim de Exploração
Sexual (art. 231 do CP, redação dada pela Lei nº 12.015/09) do Tráfico Interno de Pessoa
para fim de Exploração Sexual (art. 231-A, acrescentado pela Lei nº 12.015/09).

Os bens jurídicos protegidos por ambos os tipos penais são a dignidade sexual em primeiro
lugar (sentimento de respeitabilidade e de autoestima à intimidade e à vida privada,
permitindo que o ser humano possa realizar-se sexualmente de forma livre, se quaisquer
constrangimentos ilegais – NUCCI, p. 35) e, de forma mediata, a liberdade pessoal e a
dignidade da pessoa humana ameaçada ou atingida pela exploração sexual. A infração está
inserida no Título dos Crimes contra a Dignidade Sexual (Lei nº 12.015/2009, que alterou o
Código Penal).

2. Tráfico Internacional de Pessoa para fim de Exploração Sexual (art. 231 do CP,
redação dada pela Lei nº 12.015/09):

Sujeito ativo: qualquer pessoa, seja atuando como “empresário ou funcionário do comércio
do sexo”, seja como consumidor do “produto” traficado. (crime comum);

Sujeito passivo imediato: qualquer pessoa, independente do sexo. Trata-se de uma inovação
da Lei nº 11.106/2005 (posteriormente alterada pela Lei nº 12.015/2009), que substituiu
“mulher” por “pessoa” – segundo Ela Wiecko (A criminalização..., p. 104), a redação
anterior traduzia discriminação de gênero. Além disso, adequou-se a lei brasileira ao
Protocolo, que tem como objeto o tráfico de “pessoas”, e não apenas de “mulheres”. É
irrelevante para a configuração do delito que a pessoa já se dedique à prostituição antes do
fato, o que poderá ser levado em conta na quantificação da pena-base (Ela Wiecko, A

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

criminalização, p. 120). Indiretamente, a sociedade também seria vítima (Baltazar, p. 107).

Se a vítima for criança ou adolescente levada para o exterior ou trazida para o Brasil para
fins de prostituição ou exploração sexual, há a incidência do art. 231 do CP com aumento
de pena (§2º).

OBS: Atenção, pois há crimes diferentes: a exploração da prostituição de adolescentes está


prevista como crime no art. 218-B do CP (revogando o artigo 244-A do ECA). A
exploração da prostituição de adultos está tipificada no artigo 288, CP. No artigo 231, pune-
se a exploração sexual da espécie tráfico interno. A pornografia envolvendo crianças e
adolescentes foi incriminada no ECA, nos artigos 240, 241, 241-A e 241-D. a pornografia
envolvendo adultos, em regra, não é crime. OBS: Discute-se na doutrina as relações deste
crime com o do art. 218-B do CP e do 239, ECA, caso a criança e/ou adolescente seja
efetivamente prostituída (se há absorção ou concurso formal impróprio – BALTAZAR
JUNIOR).

OBS: É irrelevante para a configuração do delito que a pessoa já se dedique à prostituição,


o que poderá ser levado em conta na quantificação da pena.

Sujeito passivo mediato: a coletividade.

Formas de exploração sexual: a exploração sexual pode ser feita de quatro formas:
prostituição, turismo sexual, pornografia e tráfico para fins sexuais.

Tipo objetivo: (a) promover (organizar, fazer acontecer ou dar impulso a uma atividade) ou
facilitar (tornar fácil, colaborando de alguma outra forma ou deixando de reprimir o ato
quando há o dever legal de fazê-lo) – tipo misto alternativo; (b) a entrada no território
nacional de alguém que veio nele exercer a prostituição ou outra forma de exploração
sexual; (c) a saída para o exterior de alguém que lá vá exercer a prostituição ou outra
forma de exploração sexual.

A facilitação poderá consistir tanto no fornecimento de meios materiais, como dinheiro,


passagens ou transporte, quanto passando informações sobre contatos ou locais. A conduta
de intermediar, suprimida na atual redação do artigo, poderá consistir em uma das
modalidades de facilitação. OBS: a prostituição, por si só, não é crime! O tipo penal pune
apenas os atos daqueles que, de alguma forma, se aproveitam da exploração sexual de
outrem.

Não se exige a pluralidade de vítimas para se caracterizar o crime, embora a regra seja a
pluralidade tendo em vista a busca do lucro.

A existência de mais de uma vítima, levada no mesmo contexto fático, não implica
concurso de crimes, mas crime único (crime plurissubsistente); mas admite-se a
continuidade delitiva (não é crime permanente).

Não se trata de crime habitual, bastando apenas um ato por parte do agente para que se
configure o delito.

209
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Na atual redação, dada pela Lei n. 12.015/09, foi suprimido o verbo intermediar, o que, no
entanto, não afasta a tipificação da atividade de intermediário, cuja conduta poderá consistir
em uma forma de facilitação, prevista no caput, ou uma das modalidades previstas no tipo
derivado do parágrafo 1o. (Baltazar, p. 108). A Lei n. 12.015/09 modificou ainda a redação
do tipo para incluir, além da prostituição, outras formas de exploração sexual (exemplo:
exibição em espetáculos de conteúdo sexual explícito).

O art. 231, §1º do CP traz a forma derivada, prevendo outras condutas. Diferentemente do
anterior, o texto atual não prevê qualificadoras, mas apenas causas de aumento de pena em
quantitativo fixo: de metade (art. 231, §2º do CP). Aplicam-se ainda as causas de aumento
gerais previstas no art. 234-A do CP.O crime de favorecimento de prostituição (art. 228 do
CP) é absorvido pelo crime de tráfico internacional de pessoas, aplicando-se o princípio da
consunção.

Elemento subjetivo (voluntariedade): dolo, que inclui a vontade livre e consciente de


praticar os verbos do tipo, bem como a ciência da atividade a ser exercida pelo sujeito
passivo. Nas formas equiparadas do §1º, transportar, transferir ou alojar vítima traficada, se
exige a ciência da condição de tráfico, logo aquele que hospeda pessoas na sua casa, a
pedido de um conhecido, achando que serão irão trabalhar na lavoura, não perfaz o tipo
penal. Atenção: O ânimo de lucro não é exigido para a configuração do crime, mas atrai a
incidência da pena de multa (art. 231, §3º do CP).

Elemento subjetivo específico: com a finalidade de exercer a prostituição (prática de atos


sexuais mediante pagamento) ou outra forma de exploração sexual (cláusula geral incluída
pela Lei nº 12.015/09 – ex.: participação em espetáculos de conteúdo sexual explícito,
gravação de vídeos pornográficos, “peep shows”, arrematação em “leilões de sexo”, etc.).
Discute-se se o efetivo exercício da prostituição ou de outra forma de exploração sexual é
elementar do tipo (crime material) ou apenas seu exaurimento (crime formal).

Consentimento da vítima: O consentimento da vítima não descaracteriza o crime, pois o


bem jurídico tutelado (dignidade sexual) é indisponível. Logo, o conhecimento da vítima
sobre a finalidade da viagem ou mesmo o seu consentimento não excluem o crime do art.
231 do CP. O consentimento forçado ou viciado, isto é, obtido com emprego de violência,
grave ameaça ou fraude, faz aumentar a pena (art. 231, §2º, IV do CP). Porém, na
perspectiva internacional, o consentimento livre exclui o tráfico, quando se tratar de
pessoas adultas, conforme art. 3º, b do Protocolo Adicional à Convenção de Palermo (Ela
Wiecko, A legislação penal..., p. 7). Nada impede que o Brasil continue desconsiderando o
consentimento válido de pessoa adulta no tráfico para o fim de prostituição (Ela Wiecko, A
legislação penal..., p. 10). No entanto, para a examinadora (A criminalização..., p. 114),
considerar que a mulher é um ser vulnerável ou estabelecer uma relação necessária entre
prostituição e escravidão revela “crença na subalternidade da mulher e não aposta no
exercício do seu direito à autonomia”. Divergência: o consentimento da vítima afasta a
ilicitude do fato, desde que não envolva qualquer forma de violência ou grave ameaça
(NUCCI, p. 162).

Consumação e tentativa: há divergência entre jurisprudência e doutrina. A doutrina


majoritária entende que, por se tratar de crime formal, a figura típica consuma-se com a
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

mera entrada ou saída da vítima no território nacional (há precedente do TRF4 nesse
sentido). A divergência entende se tratar de crime material, consumando-se com o efetivo
exercício da prostituição e admitindo tentativa (GRECO, NUCCI). BITENCOURT adota
posição intermediária: entende que o crime é formal, mas que admite tentativa.

Consumando-se com o ingresso ou a saída da vítima do território nacional, não se exigindo,


para a consumação, o efetivo exercício da prostituição por parte da vítima. Haverá tentativa
se as vítimas não chegam a alcançar o território do país de destino. É admitido o flagrante
se as vítimas estão sendo transportadas ao aeroporto internacional. Por outro lado, o
aliciamento também constitui tentativa. (Baltazar, p. 110-111).

Fica caracterizado o delito em caso de trânsito pelo território nacional, uma vez que o crime
não requer ânimo de permanência. Admite-se o flagrante.

Nas modalidades equiparadas do §1º, o delito se caracteriza com o agenciamento,


aliciamento ou compra da pessoa traficada, ou com o transporte, transferência ou
alojamento, sendo estas três últimas modalidades forma permanente do crime, admitindo
flagrante a qualquer tempo.

Figuras equiparadas (§1º): o §1º do art. 231 traz a forma derivada, prevendo as condutas
agenciar (atuar como agente, intermediário ou empresário, explorando a atividade da
vítima), aliciar (fazer a captação, recrutar, propagandear ou selecionar as pessoas para a
prostituição ou exploração sexual), comprar (adquirir, pagar um preço, sendo que a prática
de tal ato em relação a uma pessoa constitui intensa violação de sua dignidade), transportar
(levar de um lugar a outro, sendo a atividade essencial na dinâmica do tráfico), transferir
(ideia de que a pessoa foi levada de um lugar a outro) e alojar (dar pouso ou abrigo).

Atenção: O ATO DE VENDER PESSOA TRAFICADA NÃO É TÍPICO!

Causas de aumento de pena (§2º): diferentemente do anterior, o texto atual não prevê
qualificadoras, mas apenas causas de aumento de pena em quantitativo fixo: de metade. São
causas de aumento: (I) quando a vítima é menor de18 anos; (II) quando a vítima não tem,
por enfermidade ou doença mental, discernimento para a prática do ato; (III) o do agente é
ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador,
preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de
cuidado, proteção ou vigilância; ou (IV) há emprego de violência, grave ameaça ou fraude.
Aplicam-se ainda as causas de aumento gerais previstas no art. 234-A do CP.

“Tráfico internacional mercenário” (§3ª): embora o ânimo de lucro não seja exigido para a
configuração do crime, será cumulada pena de multa ao agente que praticar uma das
condutas típicas com esse intuito – embora não seja necessário o efetivo recebimento da
quantia em dinheiro.

Atenção: Aqui se pune com a multa o animus de obter lucro. Porém, se o agente
efetivamente lucra com a atividade de prostituição, há concurso de crimes com o do art.
230 do CP (Rufianismo).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Concurso de crimes: a existência de mais de uma vítima, levada no mesmo contexto fático,
não implica concurso de crimes, mas crime único. (TRF2, AC 9802422827/RJ). Para Ela
Wiecko (A legislação penal..., p. 4), se a vítima for criança ou adolescente levada para o
exterior ou trazida para o território nacional para fins de prostituição ou exploração sexual,
incide o art. 244-A do ECA, e não o art. 231 do CP (com a redação da Lei nº 11.106/2005).
Contra: José Paulo Baltazar Junior (p. 111) sustenta que haveria concurso formal impróprio
entre os dois crimes. O crime de favorecimento à prostituição (art. 228, CP) é absorvido
pelo crime de tráfico internacional de pessoas, aplicando-se o princípio da consunção
(TRF5, AC 20048100001979). Admite-se a continuidade delitiva quando presentes os
requisitos do art. 71 do CP. Se o agente lucra com a atividade de prostituição, há concurso
com o crime do art. 230 do CP.

Competência: da Justiça Federal, por cuidar-se de crime transnacional que o Brasil se


comprometeu a reprimir (art. 109, CRFB) ao firmar a Convenção para Repressão a Tráfico
de Mulheres e Crianças de Lake Success, bem como o Protocolo Adicional à Convenção da
ONU contra o Crime Organizado Transnacional relativo à Prevenção, Repressão e Punição
do Tráfico de Pessoas, em especial mulheres e crianças. Conferir: STJ, HC 208.421/BA,
Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 18/10/2011, DJe 09/11/2011.

As ações do crime em questão tramitam em segredo de justiça (art. 234-B do CP e art. 6º, l,
do Protocolo Adicional à Convenção de Palermo).

Considerações finais: “Para se por em sintonia com o Protocolo Adicional à Convenção de


Palermo, o Brasil necessita rever sua legislação penal de forma a definir um tipo básico
para o tráfico de pessoas e os tipos derivados, conforme a finalidade da exploração, e não
conforme os sujeitos passivos”. (Ela Wiecko, A legislação penal..., p. 10). Um dos objetivos
do Protocolo é justamente proteger e ajudar as vítimas do tráfico de pessoas, respeitando
plenamente os seus direitos humanos (art. 2º, b). Nesse sentido, “é preciso estabelecer a
todas as pessoas em movimento garantias mínimas de emprego legal, de assistência e de
retorno seguro aos países de origem”. (Ela Wiecko, A legislação penal..., p. 11).

3. Tráfico Interno de Pessoa para fim de Exploração Sexual (art. 231-A do CP, redação
dada pela Lei nº 12.015/09)

A disciplina é basicamente a mesma do art. 231, com as seguintes particularidades:

Sujeito passivo menor de idade: Discute-se em doutrina as relações deste crime com o do
art. 218-B do CP caso a criança ou adolescente seja efetivamente prostituída (se há
absorção ou concurso material).

Tipo objetivo: (a) promover (organizar, fazer acontecer ou dar impulso a uma atividade) ou
facilitar (tornar fácil, colaborando de alguma outra forma ou deixando de reprimir o ato
quando há o dever legal de fazê-lo) – tipo misto alternativo; (b) deslocamento dentro do
território nacional.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Consumação e tentativa: há divergência na doutrina. Há quem entenda se tratar de crime


formal, consumando-se a figura típica com o deslocamento da vítima dentro do território
nacional; por outro lado, há doutrina que entende se tratar de crime material, consumando-
se com o efetivo exercício da prostituição e admitindo tentativa (GRECO, NUCCI).
BITENCOURT adota posição intermediária: entende que o crime é formal, mas que admite
tentativa.

Figuras equiparadas (§1º): ao contrário do §1º do art. 231, O ATO DE VENDER PESSOA
TRAFICADA FOI EXPRESSAMENTE TIPIFICADO!

“Tráfico internacional mercenário” (§3ª): embora o ânimo de lucro não seja exigido para a
configuração do crime, será cumulada pena de multa ao agente que praticar uma das
condutas típicas com esse intuito – embora não seja necessário o efetivo recebimento da
quantia em dinheiro. Se o agente efetivamente lucra com a atividade de prostituição, há
concurso de crimes com o do art. 230 do CP (Rufianismo).

Consumação e tentativa: ao contrário do seu posicionamento quanto ao crime do art. 231,


CP, NUCCI entende que, após a Lei nº 12.015/09, o tráfico interno é crime formal e admite
tentativa. GRECO e BITENCOURT mantêm sua posição.

Competência: em regra, da Justiça Estadual.

4. Redução a condição análoga à de escravo (art. 149, CP)

OBS inicial: O plenário do Senado aprovou no dia 27/05/2014, por unanimidade, a


Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Trabalho Escravo, que determina a
expropriação de imóveis urbanos e rurais onde seja constatada a exploração de trabalho
análogo à escravidão, com destinação das terras para a reforma agrária. A promulgação está
marcada para o dia 05 de junho (hoje é dia 02 ainda). Então, quando vc estiver lendo essa
parte, vá lá na Constituição e pegue o texto correto.

Escravidão: o estado ou a condição de um indivíduo sobre o qual se exercem todos ou parte


dos poderes atribuídos ao direito de propriedade. Escravo é o indivíduo em tal estado ou
condição (Convenção sobre a Escravidão de 1926). Trabalho forçado ou obrigatório: todo
trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob a ameaça de sanção e para o qual não se
tenha oferecido espontaneamente (Convenção nº 29, OIT). Práticas análogas à escravidão:
a) Servidão por dívidas: estado ou condição resultante do fato de que um devedor se haja
comprometido a fornecer, em garantia de uma dívida, seus serviços pessoais ou os de
alguém sobre o qual tenha autoridade, se o valor desses serviços não for equitativamente
avaliado no ato da liquidação da dívida ou se a duração desses serviços não for limitada
nem sua natureza definida; b) Servidão: condição de qualquer um que seja obrigado pela
lei, pelo costume ou por um acordo, a viver e trabalhar numa terra pertencente a outra
pessoa e a fornecer a essa outra pessoa, contra remuneração ou gratuitamente, determinados
serviços, sem poder mudar sua condição; c) Toda instituição ou prática em virtude da qual
uma mulher é, sem que tenha o direito de recusa, prometida ou dada em casamento,
mediante remuneração em dinheiro ou espécie entregue a seus pais, tutor, família ou a
qualquer outra pessoa ou grupo de pessoas; o marido de uma mulher, a família ou clã deste

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

têm o direito de cedê-la a um terceiro, a título oneroso ou não; a mulher pode, por morte do
marido, ser transmitida por sucessão a outra pessoa; d) Toda instituição ou prática em
virtude da qual uma criança ou um adolescente menor de dezoito anos é entregue, quer por
seus pais ou um deles, quer por seu tutor, a um terceiro, mediante remuneração ou sem ela,
com o fim da exploração da pessoa ou do trabalho da referida criança ou adolescente
(Convenção Suplementar sobre Escravatura de 1956).

O crime também é chamado de Crime de Plágio, que significa a sujeição de uma pessoa ao
poder de outra. Por que o crime se chama redução a condição análoga à de escravo, e não
pune a reduzir a condição de escravo em si?: Escravo é uma situação de direito que o Brasil
não reconhece, não tem como ser reduzido a esta condição.

Bem jurídico protegido: status libertatis do ser humano, a liberdade individual, abrangendo
a esfera física e psíquica (Castilho, 2000, p. 55), liberdade pessoal no que diz respeito ao
trabalho (Castilho, 2005).

Sujeito ativo: qualquer pessoa. Em regra, é o empregador e seus prepostos.

Sujeito passivo (s.p.): pessoa vinculada a uma relação de trabalho. Antes da Lei nº
10.803/03 era qualquer pessoa.

Tipo objetivo: reduzir é subjugar, transformar à força, impelir a uma situação penosa. Antes
da Lei nº 10.803/03 não havia especificação dos meios pelos quais se poderia se reduzir
alguém à condição análoga à de escravo, o que levava à necessária e criticada utilização da
analogia.

Atualmente, o crime previsto no caput pode ser cometido por uma das seguintes formas: a)
submeter o s.p. a trabalhos forçados ou jornada exaustiva; b) sujeitar o s.p. a condições
degradantes de trabalho; c) restringir, por qualquer meio, a liberdade de locomoção do s.p.
em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto. Consentimento da vítima:
para Nucci, pode afastar a configuração do delito, desde que a situação na qual se veja
envolvido o ofendido não ofenda a ética social e os bons costumes (2006, p. 626). Para
Bitencourt, o consentimento do ofendido, ainda que validamente manifestado, não afasta a
contrariedade ao ordenamento jurídico (2011, p.428).

OBS: caso o meio lançado para a submissão do sujeito passivo seja o sequestro, ficará este
crime absorvido pelo 149, CP.

OBS: não é necessário a prática de maus-tratos ou de sofrimento ao sujeito passivo para


caracterizar esse crime.

Distinção em relação ao art. 203, §1º, I: neste o empregador obriga o trabalhador a usar
mercadoria de determinado estabelecimento com o fim de vinculá-lo pela dívida contraída,
ao seu posto de trabalho, mas sem afetar sua liberdade de locomoção (formal). No art. 149,
o patrão restringe a liberdade de locomoção, porque o empregado lhe deve algo em razão
da dívida (material).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Tipo subjetivo: dolo.

Classificação: crime comum; material; de forma vinculada; comissivo; permanente; de


dano; unissubjetivo; plurissubsistente.

Consumação e tentativa: Consuma-se com a efetiva redução da vítima a condição análoga à


de escravo, dispensando-se o sofrimento da vítima. Trata-se de crime material e
permanente. A tentativa é perfeitamente admissível, quando por circunstâncias alheias a sua
vontade, não consegue o agente compelir a vítima.

Concurso: a redução a condição análoga à de escravo absorve qualquer outro crime contra a
liberdade (Bittencourt, 2011a, p. 430).

Outras modalidades/figuras assimiladas: os incisos I e II constituem crimes autônomos e


exigem elemento subjetivo especial do injusto (especial fim de reter as vitimas no local de
trabalho).

Causas de aumento de pena: a) se o crime é cometido contra criança ou adolescente; b) se o


crime é cometido por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.

Competência: A jurisprudência do STF (RE 398.041, Plenário, 30/11/2006) e do STJ (RHC


25583/MT, 9/8/2012) pacificaram no sentido de que a competência é sempre da Justiça
Federal (Entendimento da Ela Wiecko, Enunciado 21 da 2ª CCR). No entanto, no próprio
julgado do STF, ressaltou-se que não seria uma posição permanente do Tribunal, o que deu
a entender que dependeria do caso concreto. OBS: há discussão na doutrina sobre a
competência, pois o bem jurídico tutelado é a liberdade individual. Assim, argumenta-se
que por esse motivo a competência é da Justiça Estadual. Somente seria competência da
justiça federal se o crime de plágio fosse em concurso com crime que contra a organização
do trabalho. Contudo, é crescente a voz na doutrina de que o crime de plágio é crime que
viola a organização do trabalho e subsidiariamente a liberdade individual. Sanches defende
ser competência da Justiça Estadual, Alice Bianchini também, tendo, inclusive, livro sobre
o tema. Bom, nos parece interessante que você adote a posição da Ela, que é também a
posição pacífica da Terceira Seção do STJ, conforme jurisprudência recente que colaciono
abaixo. Ademais, como futuro membro do MPF, eu quero ter a atribuição de investigar esse
crime.

STJ - AgRg no REsp 1067302/PA - 12/06/2012 - A Terceira Seção deste Sodalício Superior
pacificou entendimento segundo o qual compete à Justiça Federal processar e julgar os
sujeitos ativos do crime previsto no art. 149 do Código Penal, haja vista a violação aos
direitos humanos e à organização do trabalho.

Ação penal: ação penal pública incondicionada.

Jurisprudência:

Caso José Pereira: decisão da CIDH em 24 de outubro de 2003. A demanda foi levada a
corte pelas organizações não governamentais Watch e Centro pela Justiça e Direito

215
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Internacional contra o Brasil, tendo sido considerados violados os arts. I (vida), XIV
(trabalho e justa remuneração) e XXV (proteção contra detenção arbitrária) da Declaração
Americana e os arts. 6 (proibição da escravidão), 8 (garantias judiciais) e 25 (proteção
judicial) da Convenção Americana. Em 18 de setembro de 2003, firmou-se acordo de
solução amistosa em que o Brasil reconheceu a responsabilidade internacional e
estabeleceu compromissos relacionados ao julgamento e punição dos responsáveis. Jose
Pereira, aos 17 anos, fora retido contra sua vontade numa fazenda, juntamente a outros 60
trabalhadores, atraídos por promessas de trabalho. Lá, viviam submetidos a condições
desumanas e ilegais de trabalho e, ao tentar fugir, sofreu lesões que se tornaram
permanentes na mão e olho direitos, tendo sido indenizado em 52 mil reais (Lei 10.706/03).
O Brasil se comprometeu a implementar o Plano Nacional para Erradicação do Trabalho
Escravo, que inclui providencias legislativas (inclusão de figura da redução a condução
análoga à de escravo como infração à ordem econômica e modificações no art.149 do CP) e
judiciárias, tendo se comprometido, neste âmbito, a defender a competência da Justiça
Federal para o julgamento do delito do 149 do CP. Há compromisso de diligenciar junto aos
membros do MPF para que estes participem de ações de fiscalização do trabalho. Há
previsão de relatórios anuais para verificar o cumprimento dos compromissos, com
possibilidade de visitas in situ pela CIDH.

STJ - AgRg no REsp 1067302/PA - 12/06/2012 - A Terceira Seção deste Sodalício Superior
pacificou entendimento segundo o qual compete à Justiça Federal processar e julgar os
sujeitos ativos do crime previsto no art. 149 do Código Penal, haja vista a violação aos
direitos humanos e à organização do trabalho.

STF - Inq 3412 / AL - ALAGOAS - 29/03/2012 - PENAL. REDUÇÃO A CONDIÇÃO


ANÁLOGA A DE ESCRAVO. ESCRAVIDÃO MODERNA. DESNECESSIDADE DE
COAÇÃO DIRETA CONTRA A LIBERDADE DE IR E VIR. DENÚNCIA RECEBIDA.

Enunciado nº 41: Os crimes de redução a condição análoga à de escravo são de atribuição


do Ministério Público Federal. (003ª Sessão de Coordenação, de 31.05.2010)

QUESTÕES DE PROVA:

O crime de redução à condição análoga a de escravo (art. 149, CP) em que se diferencia dos
crimes contra a organização do trabalho, em especial o de frustração dos direitos
trabalhistas (art. 203, CP)?

Crimes de tráfico de pessoas, quais são as hipóteses? E o tráfico de pessoas para a


exploração sexual, qual bem jurídico protegido? Pode ser interno e externo? Existe
diferença entre prostituição e exploração sexual?

216
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

9.a. Teoria do crime

Na concepção tripartite, crime é fato típico, ilícito e culpável. Nessa visão, sem
culpabilidade não há crime.

Fato típico Ilícito Culpável


Elementos do fato típico:
1) conduta. - ratio cognoscendi. - É o juízo de reprovação.
2) tipicidade penal.
3) relação de causalidade. - Causas justificantes: - Elementos:
4) resultado 1) legais. 1) imputabilidade penal.
2) supralegais. 2) a potencial consciência
da ilicitude.
3) exigibilidade de conduta
diversa

A) Tipo e tipicidade penal. Exclusão.


Obras utilizadas: Santo Graal 27º. Masson, Cleber. Direito Penal, Vol. 1, Ed. Método, 6
edição, 2012. http://www.professorregisprado.com/Artigos/Nelson%20Roberto
%20Bugalho/sociedade%20de%20risco.pdf -
https://aplicacao.mp.mg.gov.br/xmlui/bitstream/handle/123456789/672/3.4.1%20Aplicação
%20dos%20critérios%20de%20exclusão.pdf?sequence=1 e
http://uj.novaprolink.com.br/doutrina/1808/o_consentimento_do_ofendido_na_teoria_do_d
elito - disponíveis em 16/02/13. Resumo do 26: Obras consultadas (Cezar Roberto
Bitencourt. Tratado de Direito Penal. 10ª Edição. Ed. Saraiva. José Henrique Pierangeli;
Eugenio Raul Zaffaroni. Manual de Direito Penal Brasileiro - Parte Geral - Vol. 1 - 4ª
Edição. Ed.RT (25º concurso) Luiz Regis Prado. Curso de Direito Penal Brasileiro,
Volume 1, 5ª edição, RT. (25º concurso) Celso Delmanto; Roberto Delmanto; Roberto
Delmanto Junior; Fabio M. de Almeida Delmanto. Código Penal Comentado. 8ª Edição.
Ed. Saraiva. Rogério Sanches da Cunha. Código Penal Para Concursos. 4ª Edição. Ed.Jus
Podivm. Anotações de aula do intensivo I do LFG professor Rogério Sanches da Cunha.

Legislação básica. CF art. 5º, XXXIX/ Arts. 1º e 20º do CP/ Pacto de são José da Costa
Rica art. 9º.

1. Noções Gerais: “O tipo de injusto é expressão mais elementar, ainda que parcial da
segurança decorrente do princípio da reserva legal. Todo cidadão, antes de realizar um fato,
deve ter a possibilidade de saber se sua ação é ou não punível. (...)

217
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Em verdade, o tipo cumpre, além da função fundamentadora do injusto, também a função


limitadora do âmbito penalmente relevante. Assim, tudo o que não corresponder a um
determinado tipo de injusto será penalmente irrelevante.” Bitencourt p. 325 (grifo meu)

2. Conceito de tipo: Tipo é o conjunto dos elementos do fato punível descrito na Lei penal
(...) é um modelo abstrato que descreve um comportamento proibido.

OBS: Tipo não se confunde com tipicidade penal nem com Juízo de tipicidade. Tipicidade é
a conformidade do fato praticado pelo agente com a moldura abstratamente descrita na lei
penal, ou seja, é a operação de ajusto do fato à norma. Juízo de Tipicidade consiste em
analisar se determinada conduta apresenta os requisitos que a lei exige, para qualificá-la
como infração penal.

TIPO: O tipo é a descrição abstrata de uma conduta, prevendo uma hipótese e uma
consequência penal (p. da legalidade). O fato típico é composto de conduta + nexo +
resultado. A função do tipo é conferir segurança aos jurisdicionados, estabelecendo com
precisão as condutas incriminadoras.

Geralmente, há três partes no tipo: (i) título ou nomen juris – o legislador explicita o bem
jurídico protegido, facilitando a hermenêutica; (ii) preceito primário – descrição da
conduta proibida (tipo incriminador, ex. “matar alguém”) ou descrição de uma conduta que
exclui a ilicitude (tipo permissivo, ex. legítima defesa); (iii) preceito secundário – parte
sancionadora.

As funções do tipo penal: garantia, fundamentadora (do direito de punir do Estado),


indiciária de ilicitude, diferenciadora do erro e seletiva (Masson, p. 254).

Fala-se em adequação típica de subordinação imediata (sujeição direta à lei penal


incriminadora) e mediata/ampliada/por extensão (quando a subordinação ocorre através de
dispositivo da parte geral do código penal, a exemplo da tentativa, da participação, dos
crimes omissivos impróprios) (Masson, p. 248). Os dispositivos legais utilizados neste
último caso são chamados de normas integrativas, de extensão ou complementares da
tipicidade.

Os tipos podem ser incriminadores (síntese legal da conduta criminosa) ou


permissivos/justificadores (situação em que a lei considera lícita a conduta de um fato
típico, são as causas de exclusão da ilicitude).

Os tipos incriminadores são formados pelo núcleo (verbo), pelos elementos e pelas
circunstâncias. As circunstâncias são presentes nas figuras qualificadas ou privilegiadas.

Os elementos são classificados em: Elementos objetivos: não dizem respeito à vontade do
agente, podendo ser: descritivos – captáveis pela verificação sensorial (ex. matar).
Exprimem juízo de certeza; normativos – desvendáveis por juízos de valoração cultural
(ex. ato obsceno) ou jurídica (ex. cheque); tais elementos tem a finalidade de se amoldarem
às circunstâncias, à época, ao lugar etc. Elementos subjetivos: relacionam-se à vontade ou
à intenção do agente; podem ser específicos se denotam alguma finalidade especial (ex.

218
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

para satisfazer interesse próprio ou alheio). Modais: (não são aceitos de modo unânime na
doutrina) expressam no tipo penal condições específicas de tempo, local ou modo de
execução, indispensáveis para caracterização do crime. Ex. infanticídio (Masson, p. 258).

Os tipos podem ser classificados de diversas formas: tipo fechado – constituído apenas de
elementos descritivos (mais garantista); tipo aberto – contém muitos elementos subjetivos
a ponto de sobrepujarem os objetivos; tipo básico – é a conduta nuclear com os seus
indispensáveis complementos. Em regra está previsto no caput. Exceção: o excesso de
exação está previsto no § 1 do art. 316;; tipo derivado – complementa um tipo básico,
implicando em maior reprovação social (tipo qualificado); tipo simples – via de regra,
contém apenas um verbo, uma única conduta; tipo misto – há mais de um verbo no tipo,
podendo ser tipo misto alternativo – mesmo se houver a prática de um ou mais de um dos
verbos ocorre apenas um crime (ex. tráfico); tipo misto cumulativo – ocorrendo dois ou
mais dos verbos, há mais de um crime. Cuidado para não confundir com o crime de
condutas conjugadas, nos quais o tipo prevê um núcleo, associado a diversas condutas. Ex.
abandono moral; tipo formal – descrição de uma conduta feita pelo legislador. É o
chamado juízo de subsunção, Beling fala na adequação ao catálogo (Masson, p. 244); tipo
material – real ofensa a bem jurídico tutelado pelo tipo formal; OBS: para aferir a
tipicidade material, vale-se dos princípios da adequação social e da insignificância, que são
causas implícitas da exclusão de tipicidade. Para haver tipicidade penal, devem existir
simultaneamente o tipo formal e o tipo material; tipo conglobante – visão do tipo em
conjunto com outras normas do ordenamento jurídico, com o objetivo de aferir se
determinada conduta é típica ou está fora do âmbito de incriminação, segundo o
ordenamento jurídico (Zaffaroni e Pierangeli). Assim, todo tipo penal se reveste de
antinormatividade (Masson, p. 246); tipo remetido – construção típica complexa, fazendo
referência a outros tipos (ex. falsidades); tipo normal – prevê apenas elementos objetivos;
tipo anormal – prevê elementos objetivos e subjetivos. (Masson, p. 259). Atenção: para os
adeptos do finalismos, todo tipo é anormal! Tipo congruente – há perfeita sintonia entre o
ato praticado e a vontade do agente. É o crime consumado; Tipo incongruente – não há
sintonia citada.

3. Aprofundamento tipo e tipicidade: Antes de Beling (1906), o crime era composto de


dois blocos: ilicitude, de ordem objetiva, e a culpabilidade, de natureza subjetiva (Masson,
p. 244). Não se falava em tipicidade. Mayer, em 1915, retoma os estudos de Beling e
acrescenta a tipicidade indícios de ilicitude. É a consagração do sistema tripartido do crime.
Mezger então, em 1931, inaugura a fase da tipicidade com essência de ilicitude. A crítica a
esta teoria se baseia na dificuldade de separação entre a tipicidade e a ilicitude. Segundo
Zaffaroni tipo é a fórmula que pertence à lei, enquanto a tipicidade pertence à conduta.
Prado leciona que o tipo legal engendra uma série de funções: a) função seletiva – indica os
comportamentos que são protegidos pela norma penal; b) função de garantia e de
determinação – diz respeito ao cumprimento do princípio da legalidade dos delitos e das
penas, formal e materialmente; c) fundamento da ilicitude (ilicitude tipificada); d) função
indiciária da ilicitude – é a tipicidade a ratio cognoscendi da ilicitude (presunção relativa de
conduta contrária ao direito – juízo de desvalor); e) criação do mandamento proibitivo – a
matéria proibida ou determinada; f) delimitação do iter criminis – assinala o início e o fim
do processo executivo do crime.

219
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

A adequação típica pode ocorrer de forma imediata ou mediata. Enquanto na adequação


imediata o fato se subsume diretamente ao modelo legal, sem a intermediação de outra
norma, na adequação mediata é necessária a concorrência de outra norma de cunho
extensivo que alarga a figura típica (v.g. tentativa, participação) (Bitencourt p. 324).

Teoria dos elementos negativos do tipo: não foi adotada pelo nosso CP. Preconizada por
Weber, defende existência do tipo total do injusto, com a junção dos elementos tipo e
ilicitude dentro do tipo total. As causas de exclusão da ilicitude seriam elementos negativo
do tipo penal. O crime seria então bipartido, formado pelo tipo total e pela culpabilidade.
(Masson, p. 246).

4. Exclusão da tipicidade: As excludentes legais estão dispersas pelo CP e como exemplo


temos (i) o crime impossível (art. 17); (ii) intervenção médico-cirúrgica e impedimento de
suicídio (art. 146, § 3º); (iii) retratação no crime de falso testemunho (art. 342, § 2º).

Ao lado dessas tem-se as excludentes supralegais, que são: 1) Tipicidade conglobante


como corretivo da tipicidade legal. A norma proibitiva que dá lugar ao tipo não está
isolada, mas permanece junto com outras normas também proibitivas, formando uma
ordem normativa, onde não se concebe que uma norma proíba o que outra ordena ou
fomenta. Portanto, a tipicidade penal não se reduz à tipicidade legal (adequação à
formulação legal), devendo evidenciar uma verdadeira proibição com relevância penal, para
o que é necessário que esteja proibida à luz da consideração conglobada da ordem
normativa. Consequências da tipicidade conglobante: O estrito cumprimento de um dever
legal e o exercício regular de um direito incentivado ao em vez de excluir a ilicitude,
excluem a própria tipicidade. (ratio essendi – absoluta dependência entre tipicidade e
antijuridicidade). Principais casos em que se configura a atipicidade conglobante: a)
Cumprimento de um dever jurídico; b) Intervenções cirúrgicas; c) Lesões desportivas. 2)
Princípio da insignificância: Requisitos para o STF e o STJ: Mínima ofensividade da
conduta; nenhuma periculosidade social da ação; reduzido grau de reprovabilidade do
comportamento; inexpressividade da lesão jurídica provocada. Não é possível seu
reconhecimento nos crime em que houver violência ou grave ameaça contra a pessoa. Obs:
o STF admite a aplicação do princípio da insignificância aos delitos funcionais, o STJ não.
Nem o STF, nem o STJ admitem a aplicação do princípio da insignificância aos delitos
contra a fé pública. Com relação ao tráfico de drogas e internacional de armas de fogo,
também não tem sido admitido (ressalva de decisões isoladas, mas recentes, com relação ao
de drogas). Ainda tem sido admitida nos crimes contra ordem tributária, considerando-se
patamar instituída para cobrança (atualmente de R$ 20 mil). A habitualidade tem sido
considerada como fator que não autoriza a aplicação do princípio da insignificância, mesmo
que o valor, naquele caso, se apresente inferior ao mínimo legal (Informativo STJ 338 -
DESCAMINHO. PRINCÍPIO. INSIGNIFICÂNCIA). Podem ser ponderados ainda para o
seu reconhecimento, as condições pessoais do agente e da vitima, a extensão do dano, o
valor sentimental do bem (Masson, p. 30-31) Sua importância é tamanha que o STF já
decidiu que o trânsito em julgado não impede seu reconhecimento (HC 95570/SC, Rel.
Dias Toffoli, 01.06.2010 – Informativo 589). 3) Princípio da adequação social: “Não pode
ser considerado criminoso o comportamento humano que, embora tipificado em lei, não
afrontar o sentimento social de justiça.” (Masson, p. 38) . Não deve ser confundida com a

220
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

teoria social da conduta (Wessels). Impossibilidade de se considerar como criminosa a


conduta tolerada ou aceita pela sociedade, ainda que se enquadre em uma descrição típica.
“Nessa linha de raciocínio, a teoria da adequação social se revela como um princípio
geral de interpretação dos tipos penais, posto que deles exclui os comportamentos
considerados socialmente adequados (aceitos). É possível afirmar que, em razão da sua
aplicação, não são consideradas típicas as condutas que praticadas dentro do limite de
ordem social normal da vida, haja vista serem, assim, compreendidas como toleráveis pela
própria sociedade. Note-se que o objeto dessa teoria não é a tipicidade formal da conduta.
Em outras palavras, o comportamento continua sendo formalmente típico, haja vista que
se subsume perfeitamente à norma penal incriminadora. O que se atinge com a sua
aplicação é a tipicidade material.” (http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?
story=20080611115833517&mode=print consulta em 05/06/2011). Atenção: Não foi dada
aplicação a este princípio no caso do jogo do bicho (STF - RE 608425/MG - Rel: AYRES
BRITTO -Julg: 22/06/2010 - DJe-141 DIVULG 30/07/2010 PUBLIC 02/08/2010), da casa
de prostituição (STF - Info 615 - RHC - 102984- DJE 10/05/2011) e da pirataria (STF -Info
583 - HC – 98898 - DJE 21/05/2010). 4) Princípio da Confiança: Baseia-se na premissa
de que se deve esperar das pessoas comportamentos responsáveis. Limita a imputação do
dever de cuidado de outrem. Inicialmente desenvolvida para delitos de trânsito. 5) Risco
Permitido: “(...) não podemos confundir o risco permitido (que exclui a tipicidade) com as
causas excludentes da antijuridicidade (leia-se: causas justificantes, como legítima defesa,
estado de necessidade etc.). O motorista de ambulância que conduz o veículo
normalmente cria um risco permitido (autorizado). Na eventualidade de que venha a se
envolver em algum acidente (por culpa exclusiva da vítima), não há que se falar em fato
típico. A criação de risco permitido é causa de exclusão da tipicidade. O mesmo motorista
que, para salvar uma vida, conduz o veículo de modo altamente arriscado (infringindo
normas regulamentares, passando no sinal vermelho etc.), pratica uma conduta que cria
risco proibido, porém, justificado (porque realizada para salvar bem jurídico de grande
valor). Na primeira hipótese temos uma causa de exclusão da tipicidade. Na segunda, em
razão do estado de necessidade, temos uma causa de exclusão da antijuridicidade (uma
justificante). Por força da teoria do interesse preponderante, pratica-se uma conduta
perigosa, mas para salvar um interesse de valor reconhecido, socialmente valioso.”
(http://www.ipclfg.com.br/teoria-constitucionalista-do-delito/risco-permitido-e-causas-de-
exclusao-da-antijuridicidade/consulta em 05/06/2012). Deve ser avaliado o risco no
contexto do conceito da sociedade de risco. 6) Consentimento do ofendido: Ë causa de
exclusão da tipicidade, mas só pode ser reconhecida quando envolver direitos disponíveis.
Ex. cirurgia de mudança de sexo, com retirada de órgão genital masculino. Francisco de
Assis exige como requisitos para seu reconhecimento: livre manifestação de vontade de
ofendido capaz, congruência entre o consentimento e o ocorrido.

221
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

B) Tentativa e consumação. Crime impossível. Desistência voluntária e


arrependimento eficaz.
Obras consultadas: Santo Graal 27º. Gueiros, Artur, 2012. Rogério Greco. Curso de
Direito Penal (Parte Geral) – Rio de Janeiro: Ímpetos, 2008. Jurisprudência sistematizada
do STF e STJ – Niterói, RJ: Ímpetos, 2011. Cristiano Villela Pedras e Leandro Velloso.
Principais julgamentos do STF e STJ. Editora JusPodivm, edição 2012. Org. Roberval
Rocha Ferreira Filho.

Legislação básica. CP: arts. 14, 15 e 17.

1. Tentativa e consumação.

Tentativa: A tentativa (conatus) é um tipo ampliador de normas penais incriminadoras. Ela


está na parte geral do CP (art. 14, II, CP), mas projeta seu raio de aço para os tipos
incriminadores da Parte Especial e para a Legislação Penal Especial. Damásio de Jesus a
chama de ‘causa de adequação típica de subordinação mediata’. Diz-se que é um tipo
ampliador porque as normas incriminadoras em regra não preveem a forma tentada, então,
se não fosse a norma da parte geral a tentativa seria atípica. Ex: o art. 121, CP não prevê a
forma tentada, logo, a tentativa de matar alguém seria fato atípico se o art. 14, II, CP não
viesse para ampliar o alcance da norma do art. 121, CP. Porém, ao mesmo tempo em que é
tipo ampliador a tentativa também é causa geral de diminuição de pena. Diz-se o crime
tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade
do agente. Pressuposto da tentativa: o pressuposto da tentativa é o início da execução. A
consumação não é alcançada por circunstâncias alheias ao agente, por fatores exógenos ao
dolo do agente, ou seja, ‘eu quero, mas não posso’. Pode ser que o agente faça toda a fase
executória e o crime não se consuma. Requisito objetivo: Início da execução, não
superveniência do resultado por circunstâncias alheias à vontade do agente [atenção: se o
que impede a consumação for um fator endógeno ao dolo do agente, ou seja, ‘eu posso, mas
não quero’, não estarão presentes os requisitos objetivos da tentativa e será caso de
abandono voluntário do crime cuja execução se iniciara, beneficiando-se o agente desse
instituto penal], dolo e outros eventuais elementos subjetivos correspondentes ao tipo
subjetivo. Requisito subjetivo: é o mesmo do dolo, pois na tentativa o animus é de realizar
o tipo. Classificação da tentativa: A) Quanto ao percurso da fase executória: A tentativa
acabada ou tentativa perfeita ou crime falho esgota a fase executória, não alcança o
momento consumativo. A redução da pena será de até 1/3 (um terço). A tentativa inacabada
ou imperfeita, por sua vez, ocorre quando se inicia a execução, mas não se esgota a fase
executória por alguma circunstância alheia a vontade do agente. A redução máxima será de
1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), conforme o desenvolvimento da fase executória. B)
Quanto ao atingimento do objeto material: Na tentativa branca ou incruenta, o objeto
material não é atingido. Ela pode ocorrer na tentativa perfeita e na imperfeita, mas será
melhor visualizada na perfeita. A tentativa vermelha ou cruenta atinge o objeto material,
mas não consuma o crime. Crimes que não admitem tentativa: A) Crimes culposos: Seria
incompatível com o instituto da tentativa, pois não há vontade dirigida a um resultado

222
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ilícito. Na culpa, a vontade é extra atípica, pois é para fim lícito, mas o agente de forma
descuidada produz o resultado ilícito. Exceção: Na culpa imprópria (ou culpa por
assimilação), a doutrina admite, em tese, tentativa nos casos de erro de tipo ou erro de tipo
permissivo. Esse é o único tipo de culpa que se admite a tentativa. Então, não cabe tentativa
nos crimes culposos, exceto para a culpa imprópria. B) Crimes com dolo eventual: Parte
minoritária da doutrina sustenta a inviabilidade de tentativa no dolo eventual, pois a palavra
vontade do art. 14, II, CP quer dizer dolo direto e no dolo eventual o agente assume o risco
de ocorrência de resultado, mas não o deseja [no dolo eventual não se fala em teoria da
vontade e sim em teoria do assentimento]. O STJ, porém, diz que seria possível a tentativa
no dolo eventual, pois aquele que atua com dolo eventual quer o resultado, ainda que
indiretamente, mesmo com dúvida. Então dolo é consciência e vontade, quando a
consciência tem certeza é dolo direto, quando a consciência tem dúvida, mas assume o
resultado tem dolo eventual. C) Contravenções penais: Com base no art. 109, IV da CRFB
e art. 4º da Lei de Contravenções penais não se pune a tentativa de contravenção penal. [na
verdade é fato atípico, pois o art. 4º da lei de contravenções penais afasta a aplicação do art.
14, II, por força do art. 14, § ú.]. Ex: A tentativa de vias de fato é irrelevante penal, é
situação de atipicidade, levando ao afastamento da norma de extensão do art. 14, II do CP.
D) Crimes de atentado: São aqueles em que a figura típica já traz, em si mesma, a tentativa.
Ou seja, tentar já é consumar. Ex 1: Art. 352 do CP – Evasão mediante violência contar a
pessoa. OBS: Prevalece o entendimento de que o preso responde por dano ao bem público,
se não usa de violência contra a coisa. Alguns entendem que se não há vontade de causar o
prejuízo, o agente não responderia pelo dano. Ex 2: Art. 3º da Lei 4.898/65 (Lei de abuso
de autoridade). Policial tenta agredir agente criminoso, entretanto, não o acerta. Ainda
assim, responderá por atentado à incolumidade física do agente. Não há adequação típica,
por isso não cabe tentativa. E) Crimes habituais: A maioria da doutrina entende que não
cabe tentativa no crime habitual, pois a conduta isolada é atípica. Ex: Art. 282 do CP requer
a reiteração a título profissional. OBS 1: Mirabete e Damásio, minoritariamente, admitem a
tentativa, pois no crime habitual basta a intenção do profissionalismo para sua
caracterização. Ex: Se um falso médico aluga uma sala, monta consultório, faz cartões e usa
jaleco, já demonstra a intenção de profissionalismo. Para quem entende que admite a
tentativa, também entende que caberia o flagrante. Ex: Art. 230 do CP requer que o sujeito
tenha habitualidade e dedicação para sua caracterização. [então, namorar com uma
prostituta e receber presentes dela não caracteriza rufianismo]. OBS 2: O crime
impropriamente habitual é aquele no qual um único ato será hábil a caracterizar o crime e a
pluralidade de atos pode ser considerada como crime único no mesmo contexto [ou seja, a
pluralidade de atos no crime impropriamente habitual não induz necessariamente à
pluralidade de crimes, ela pode ser considerada crime único]. Há posicionamento, com
aceitação dos tribunais superiores, entendendo que, para o crime de gestão fraudulenta,
previsto no art. 4º da Lei 7.492//86, bastaria um único ato de gestão para definir a conduta.
[corrente a ser adotada para a prova]. Há posição doutrinária, por outro lado, que entende
que se deve aplicar no conceito de gestão a ciência da administração [gerir é um conjunto
de atos, não havendo gestão de um ato só, necessitando de vários atos para caracterizar o
crime de gestão fraudulenta]. A mera prática de um ato fraudulento isolado seria
contemplada pelo art. 6º da referida lei. Ressalta-se que os tribunais superiores estão de
acordo com a primeira corrente, entendendo que basta apenas um ato para definir a conduta
de gestão fraudulenta. F) Crime omissivo próprio: São os crimes de mera conduta, em

223
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

regra, e, em alguns casos, pode ser formal. Ex 1: Art. 135 do CP crime de mera conduta. A
omissão própria é infracionável e a abstenção já consuma o crime. G) Crime omissivo
impróprio: No crime omissivo impróprio, a omissão do garantidor faz com que seja
atribuído a ele o resultado [pela ficção jurídica a omissão do garantidor é considerada uma
ação, por isso a ele é atribuído o resultado]. Cabe tentativa no crime omissivo impróprio?
Em tese, seria admitida a tentativa, se evidenciado que a omissão tenha sido dolosa e o
resultado, impedido de ocorrer, visto que crime omissivo impróprio é material. O tema é
alvo de divergência. H) Crime complexo: Cabe tentativa em crime complexo? Ex: tentativa
no crime de roubo, no qual a vítima não possui bens a serem subtraídos. Na posição dos
tribunais superiores, haverá tentativa de roubo, porque o crime é complexo e afeta dois bens
jurídicos, patrimônio e a integridade corporal. A falta da coisa alheia móvel a ser subtraída
configura impropriedade relativa do objeto. Orientação minoritária defendida por Paulo
Queiróz sustenta se tratar de crime impossível de roubo, pois o roubo é crime patrimonial e
não há objeto material a ser subtraído, havendo impropriedade absoluta do objeto, mas,
subsiste o crime contra a pessoa (ameaça, lesão, constrangimento). I) Crime impossível ou
tentativa inidônea ou tentativa inadequada ou quase crime ou crime oco: O crime
impossível previsto no art. 17 do CP é uma situação de atipicidade e, por isso, impede a
tentativa. Ex: falsificação grosseira de moeda. No crime de moeda falsa do art. 289 do CP, a
falsificação grosseira da moeda afasta o crime e leva a desclassificação do delito para o
estelionato (súmula 73, STJ), visto que ela não tem a aptidão para circular como se
verdadeira fosse e seria percebida a olho nu por qualquer cidadão. Para a moeda falsa, a
falsificação grosseira seria crime impossível [pela absoluta impropriedade do objeto] e,
para o estelionato, pode-se verificar, em tese, o contexto em que ela foi empregada. Ex:
nota do banco imobiliário é falso grosseiro pois sequer circula no meio bancário, porém, se
for passado em meio a um maço de notas, pode configurar o estelionato. Se for entregue
sozinha, nem estelionato configura, pois não é capaz de enganar ninguém, nem o mais
incauto. Atenção: a súmula 73 sempre cai em prova do MPF. O CP adota também, nesse
caso, a teoria objetiva temperada, pois se o meio é absolutamente ineficaz ou se o objeto é
absolutamente impróprio, o crime será impossível. Não se adota a teoria subjetiva, pois a
simples exteriorização da vontade já configuraria a tentativa do crime. A teoria sintomática
também não é adotada. Essa teoria leva em conta a periculosidade do agente, apesar de
impossível a consumação do delito. Ex 1: Uma jovem percebe que está grávida e uma
amiga lhe oferece um medicamento abortivo, ao tomar o remédio não sofre o aborto, pois o
comprimido estava vencido há 2 (dois) anos e o princípio ativo não funcionou. Nesse caso,
haverá crime impossível, por absoluta ineficácia do meio. Todavia, se o remédio estivesse
vencido há pouco tempo, dependendo da hipótese, poderia caracterizar a tentativa, havendo
a relativa ineficácia do meio. Ex 2: Há crime impossível por absoluta impropriedade do
objeto quando o agente pretende o crime de aborto sem a vítima estar grávida. Se for
relativa a impropriedade, caberá a tentativa. Ex 3: A súmula 145 do STF afirma que o
flagrante provocado incide em crime impossível, pois impede sua consumação de forma
absoluta, não havendo tentativa. [no flagrante provocado há o agente provocador, o qual
participa (induzindo, auxiliando) e ao mesmo tempo impede a consumação]. Com a
preparação do flagrante, ocorre o chamado crime de ensaio, pois o agente provocador
contribui com a prática criminosa, porém, impede a consumação do delito. Ex 4: Agente
provocador em crime permanente: Policial se passa por usuário de drogas e deseja adquiri-
la, quando o traficante vai ao depósito para obter a droga, o policial profere voz de prisão.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Nesse caso, não se aplica a súmula 145 do STF, pois se trata de crime permanente (guardar,
manter em depósito), já estando consumado. Não há crime impossível, em que pese a
provocação do policial. Ex 5: O sistema de vigilância de estabelecimento comercial não
torna o crime impossível, pois não existe provocação [primeiro argumento]. Haverá
flagrante esperado se o segurança da loja perceber que houve subtração de peças de roupa,
incidindo a tentativa. O sistema de vigilância não é o impedimento absoluto para a
consumação [segundo argumento], pois, mesmo assim, é possível a subtração. Não se
aplica a súmula 145 para o flagrante esperado. Ex 6: Não há tentativa se for detectada
drogas no raio-x do aeroporto. O crime estará consumado, pois o meio empregado não é
infalível, visto que todo sistema de vigilância possui falha. Mesmo que o agente não
consiga sair do território nacional, estará evidenciada a transnacionalidade. [Para
caracterizar o crime de tráfico internacional basta demonstrar que a droga era destinada
para outro país, não necessitando a efetiva transposição de fronteira, e que há ramificação
do grupo criminoso em outros países. Tentar já é consumar]. Ex 7: O art. 349-A do CP
independe de o agente conseguir realizar a entrega do aparelho de comunicação ao preso
[tentar já é consumar]. Ex 8: Há decisão afirmando que a existência de câmeras de
segurança e vigilantes não caracteriza crime impossível (STJ, HC208958, Rel. Min. Og
Fernandes, p. 17/08/2011). J) Crimes em que a tentativa é punida com as mesmas penas do
crime consumado (ex.: evasão mediante violência contra a pessoa). Punição da tentativa:
A punição da tentativa é orientada pela teoria objetiva temperada [pois o critério é objetivo
(o desvalor da ação é igual, mas o desvalor do resultado é diferente, de modo que a pena
deverá ser menor, haja vista o perigo proporcionado ao bem jurídico), admitindo a lei
exceções legais], nos termos do art. 14, parágrafo único do CP. O CP brasileiro não adota a
teoria subjetiva (o desvalor da ação é o mesmo, portanto, a pena deveria ser a mesma), na
qual o juiz, levando em conta a gravidade do fato, poderia aplicar a pena do crime
consumado, como assim adotou o Código Penal Militar. Portanto: O Brasil adota a teoria
objetiva, mas de forma mitigada, pois, há possibilidade de fixação de percentual diverso ou,
até mesmo, da mesma pena (crime de atentado). Então, a regra geral é que a tentativa é
punida com redução de 1/3 a 2/3 da pena prevista para o tipo (art. 14, parágrafo único, CP),
admitindo exceções. A fixação da causa de diminuição será feita de acordo com o grau de
realização do crime, isto é, quanto mais perto da consumação, mais a redução se aproxima
do mínimo de 1/3 (STJ, AgRg no Ag 1321548, Rel. Min. Laurita Vaz, p. 14/06/2011).

Consumação: É aquele em que o sujeito preencheu todas as elementares do tipo (art. 14, I,
CP). “Dá-se a consumação delitiva quando o autor realizou toda a conduta descrita no tipo
de injusto, provocando, ainda, o resultado, quando esse for por aquele exigido. Não se deve
confundir a consumação formal com a consumação material ou exaurimento, quando outros
resultados lesivos ocorrem - o autor alcançar o objetivo pretendido, além do resultado
consumativo.” (PRADO, 2010, p. 418).

2. Crime impossível.

Sinônimos: O Crime impossível também é chamado de tentativa inidônea ou tentativa


inadequada ou quase crime ou crime oco. Conceito: considera-se crime impossível o crime
quando não se pode passar, em absoluto, da fase do início da execução para a fase de
consumação. Observa-se, portanto, que o agente realiza, efetivamente, atos executórios,

225
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

mas estes jamais chegarão à meta inicial, seja pela absoluta ineficácia do meio ou pela
impropriedade absoluta do objeto. Com isso, diante de crime impossível, os atos realizados
serão atípicos [observe que o bem jurídico tutelado pela norma penal nunca ficou em risco,
pois a tentativa era inidônea, ou seja, o crime era impossível, por isso é figura atípica, do
contrário se estaria punindo o perigo potencial do agente à sociedade, ou seja, sua
periculosidade, o que não é o fundamento do Direito Penal]. Ex 1: se alguém, achando-se se
tratar de veneno, ministra açúcar para alguém, não haverá tentativa de homicídio, mesmo
com todos os atos executórios tendo sido realizados, pois há absoluta ineficácia do meio.
Ex 2: se alguém querendo matar seu alvo dispara arma de fogo supondo que ele está
dormindo, mas na verdade já estava morto, não haverá crime de homicídio, sequer na forma
tentada por absoluta impropriedade do objeto. OBS: o crime impossível é atípico, não
sendo punido sequer como tentativa por ser incapaz de colocar o bem jurídico tutelado em
risco, porém, se a tentativa não for absolutamente inidônea, mas se for uma tentativa
relativamente inidônea será caracterizado o crime tentado, pois o bem jurídico tutelado foi
exposto ao risco. Ex: ministra açúcar com o dolo de matar sabendo que o paciente era
diabético, mesmo se não morrer, será homicídio tentado. Não cabe tentativa: O crime
impossível previsto no art. 17 do CP é uma situação de atipicidade e, por isso, impede a
tentativa. O CP adota a teoria objetiva temperada, pois se o meio é absolutamente ineficaz
ou se o objeto é absolutamente impróprio, o crime será impossível. Não se adota a teoria
subjetiva, pois a simples exteriorização da vontade já configuraria a tentativa do crime. A
teoria sintomática também não é adotada. Essa teoria leva em conta a periculosidade do
agente, apesar de impossível a consumação do delito. Flagrante esperado, flagrante
provocado e flagrante forjado: no flagrante esperado a polícia tem notícia do crime e
aguarda que ele aconteça para agir, prendendo os agentes em flagrante delito, constituindo
crime. No flagrante provocado, preparado se trata de uma cena montada pela polícia na
qual o agente é atraído para cometer o crime, sendo que tal preparação impede que haja a
consumação, já que a polícia está de tocaia para agir quando o agente iniciar a execução.
Nesse caso é um verdadeiro crime de ensaio, sendo o agente um ator em uma cena montada
sem que ele saiba disso. A doutrina e jurisprudência entendem que nesse caso é crime
impossível, sendo um erro da polícia tal conduta. Como corolário há a súmula 145, STF
que diz que não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível
sua consumação. No flagrante forjado o policial coloca droga com a agente para acusá-lo
de tráfico, neste caso quem comete crime é a polícia. Análise da falsificação grosseira de
moeda: No crime de moeda falsa do art. 289 do CP, a falsificação grosseira da moeda afasta
o crime e leva a desclassificação do delito para o estelionato (súmula 73, STJ), visto que ela
não tem a aptidão para circular como se verdadeira fosse e seria percebida a olho nu por
qualquer cidadão. Para a moeda falsa, a falsificação grosseira seria crime impossível [pela
absoluta impropriedade do objeto] e, para o estelionato, pode-se verificar, em tese, o
contexto em que ela foi empregada. Ex: nota do banco imobiliário é falso grosseiro pois
sequer circula no meio bancário, porém, se for passado em meio a um maço de notas, pode
configurar o estelionato. Se for entregue sozinha, nem estelionato configura, pois não é
capaz de enganar ninguém, nem o mais incauto. Atenção: a súmula 73 sempre cai em prova
do MPF [Súmula 73 / STJ - A utilização de papel moeda grosseiramente falsificado
configura, em tese, o crime de estelionato, da competência da Justiça Estadual]. Casuística:
Ex 1: Uma jovem percebe que está grávida e uma amiga lhe oferece um medicamento
abortivo, ao tomar o remédio não sofre o aborto, pois o comprimido estava vencido há 2

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

(dois) anos e o princípio ativo não funcionou. Nesse caso, haverá crime impossível, por
absoluta ineficácia do meio. Todavia, se o remédio estivesse vencido há pouco tempo,
dependendo da hipótese, poderia caracterizar a tentativa, havendo a relativa ineficácia do
meio. Ex 2: Há crime impossível por absoluta impropriedade do objeto quando o agente
pretende o crime de aborto sem a vítima estar grávida. Se for relativa a impropriedade,
caberá a tentativa. Ex 3: A súmula 145 do STF afirma que o flagrante provocado incide em
crime impossível, pois impede sua consumação de forma absoluta, não havendo tentativa.
[no flagrante provocado há o agente provocador, o qual participa (induzindo, auxiliando) e
ao mesmo tempo impede a consumação]. Com a preparação do flagrante, ocorre o chamado
crime de ensaio, pois o agente provocador contribui com a prática criminosa, porém,
impede a consumação do delito. Ex 4: Agente provocador em crime permanente: Policial se
passa por usuário de drogas e deseja adquiri-la, quando o traficante vai ao depósito para
obter a droga, o policial profere voz de prisão. Nesse caso, não se aplica a súmula 145 do
STF, pois se trata de crime permanente (guardar, manter em depósito), já estando
consumado. Não há crime impossível, em que pese a provocação do policial. Ex 5: O
sistema de vigilância de estabelecimento comercial não torna o crime impossível, pois não
existe provocação [primeiro argumento]. Haverá flagrante esperado se o segurança da loja
perceber que houve subtração de peças de roupa, incidindo a tentativa. O sistema de
vigilância não é o impedimento absoluto para a consumação [segundo argumento], pois,
mesmo assim, é possível a subtração [Há decisão afirmando que a existência de câmeras de
segurança e vigilantes não caracteriza crime impossível (STJ, HC208958, Rel. Min. Og
Fernandes, p. 17/08/2011)]. Ex 6: Não há tentativa se for detectada drogas no raio-x do
aeroporto. O crime estará consumado, pois o meio empregado não é infalível, visto que
todo sistema de vigilância possui falha. Mesmo que o agente não consiga sair do território
nacional, estará evidenciada a transnacionalidade. [Para caracterizar o crime de tráfico
internacional basta demonstrar que a droga era destinada para outro país, não necessitando
a efetiva transposição de fronteira, e que há ramificação do grupo criminoso em outros
países. Tentar já é consumar]. Ex 7: O art. 349-A do CP independe de o agente conseguir
realizar a entrega do aparelho de comunicação ao preso [tentar já é consumar]. Ex 8: Não se
aplica a súmula 145 para o flagrante esperado, ou seja, é crime impossível apenas no caso
de flagrante preparado ou provocado, pois se trata de crime de ensaio.

3. Desistência voluntária e arrependimento eficaz.

A desistência voluntária e o arrependimento posterior são chamados de tentativa


qualificada.

3.1 Desistência voluntária: (também chamada de tentativa abandonada ou ponte de ouro).


A desistência voluntária está prevista no art. 15, primeira parte, do CP. A desistência
voluntária ocorre em um contexto de tentativa imperfeita (que é o não esgotamento da
potencialidade lesiva na fase executória). O agente irá responder apenas pelos atos já
praticados. [existe uma tentativa imperfeita, mas que é imperfeita porque o agende desiste
de prosseguir na execução e não porque uma circunstância alheia o impede de prosseguir].
Para auferir se houve desistência voluntária utiliza-se a fórmula de Frank. O agente
pergunta a si próprio "posso prosseguir?". A resposta deve ser afirmativa e inexistir fator
externo impeditivo ou ameaça externa para cessar o prosseguimento, ou seja, “posso, mas

227
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

não quero”. Atenção 1: A desistência exige a voluntariedade, sendo esta distinta da


espontaneidade. O ato espontâneo não é provocado, ele parte da própria iniciativa do
agente, porém, na voluntariedade o agente pode ser convencido a deixar de prosseguir na
ação, mas esses pedidos não o forçam, não o constrange. Portanto: Quando o agente não
prosseguir, por sua vontade, com os atos de execução, haverá desistência voluntária. Desta
feita se o agente resolver cessar os atos executórios por influência de terceiros, mesmo
assim haverá a figura a desistência voluntária, pois não se exige, para sua configuração, a
espontaneidade, bastando-lhe a voluntariedade.. Atenção 2: Há consunção ao avesso na
desistência voluntária, pois ocorre o ressurgimento da figura que seria absorvida pelo crime
fim. Ex: No furto em residência, o crime de violação de domicílio seria absorvido, mas com
a desistência voluntária, o agente responde somente pela violação de domicílio. OBS 1:
Não haverá desistência voluntária se o sujeito foi atemorizado ao ouvir uma sirene. OBS 2:
O STF entendeu ser desistência voluntária em um caso de roubo com emprego de arma de
fogo em que os agentes desistem do roubo [saem do carro em que estavam com a vítima,
mesmo com o carro em movimento]. Como se responde pelo que já fez, foi desclassificado
para constrangimento ilegal com emprego de arma de fogo [afastando o roubo tentado].
OBS 3: A presença de alguém no local é fator que impede o prosseguimento, sendo assim,
incidirá a tentativa e não a desistência voluntária (TJDFT – 15/05/2008. Acórdão nº 309219
do Processo nº20060310077507apr).

3.2 Arrependimento eficaz: O arrependimento eficaz está previsto no art. 15, segunda
parte, do CP. Conceito: O agente conclui a execução do crime, mas, antes de o resultado vir
a ser alcançado, pratica conduta contrária e dirigida a evitar a consumação do crime, isto é,
“impede que o resultado se produza” (art. 15, CP), incorrendo em tese em uma tentativa
perfeita, porém, por ela não responderá tendo em vista sua atuação para impedir
eficazmente o resultado. Comparando: No arrependimento eficaz, o sujeito esgota a
execução, mas neutraliza o resultado; na desistência voluntária, o sujeito pode prosseguir,
mas não o faz, porque desiste. Cabimento: O arrependimento eficaz só pode ser admitido
nos crimes materiais [pois o legislador fala em “resultado” e toda vez que o legislador fala
em resultado é resultado naturalístico. Não cabendo, portanto, o arrependimento eficaz para
crimes formais e de mera conduta]. Ex: Crime de concussão do art. 316 do CP. A mera
conduta já consuma o delito. OBS: É cabível o arrependimento eficaz, excepcionalmente,
no crime formal. Vejamos o crime de extorsão: O crime de extorsão previsto no art. 158 do
CP exige uma ameaça com intuito de obter indevida vantagem econômica. Esse crime
possui 3 (três) fases: (i) início da execução: ocorre a violência (súmula 96 do STJ); (ii)
consumação: a vítima se submete; e (iii) exaurimento: ocorre o exaurimento com a efetiva
obtenção da vantagem exigida. Assim, no crime de extorsão, o momento consumativo
depende do comportamento da vítima. Se a vítima não realiza a conduta, é possível o
arrependimento eficaz, mas é preciso evidenciar que o agente não desejava prosseguir com
o delito. O agente responde apenas pelo constrangimento praticado, seja violência ou
ameaça. Consequência: o agente apenas responderá pelos atos já praticados, ou melhor,
pelo resultado objetivo decorrente dos atos já praticados (lesão corporal, por ex.), de modo
que, evitado o dano maior à vítima (morte, por ex.), ele deixa de responder por seu dolo
inicial, nem a título de tentativa, e passa a ser responsabilizado pelo dolo do crime-meio
que por ventura tiver praticado (de homicídio tentado para lesão consumada, no exemplo).
Ineficácia do arrependimento: O agente que deseja o arrependimento posterior, e,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

contudo, não consegue impedir a ocorrência do resultado, mesmo que não o consiga fazer
por ação da vítima, ocorrendo a consumação do crime, não será beneficiado pelo instituto.
Sua conduta apenas será aproveitada como atenuante, nos termos do art. 65, III, b do CP.
Tal benefício encontra limites, conforme aduz a súmula 231 do STJ.

Natureza jurídica do arrependimento eficaz e da desistência voluntária: para doutrina


tradicional seria de causa de extinção da punibilidade não prevista no art. 107 do CP [não
aplica a pena em relação ao delito mais grave]. O Estado deixa de punir, pois o caráter
preventivo e retributivo da pena estariam esvaziados. A doutrina moderna, entretanto,
entende como causa de exclusão da tipicidade [absolve por atipicidade], pois o art. 15
afastaria a norma de extensão do art. 14, II do CP. Os delitos de passagem ressurgiriam e o
agente responderia pelo fato.

Trechos de jurisprudência:

A reparação do dano ocorrida após a efetiva consumação do crime, durante a instrução


processual, depois de já recebida a denúncia, não tem o condão de afastar a tipicidade do
delito, não se confundindo com os institutos da desistência voluntária e arrependimento
eficaz. STJ – 07/02/2012. HC 110504 / RJ

Uma vez interrompida a execução do iter criminis, em face do receio de ser descoberta a
identidade do autor do delito, estará configurada a tentativa e não a tese defensiva de
desistência voluntária. A voluntariedade não se manifestou como atitude advinda do
agente, o qual foi forçado a resignar-se com o malogro de sua ação, no momento em que foi
reconhecido pelo militar de quem retirou o fuzil. STM, 27/06/2012. Apelação - 0000002-
25.2011.7.02.0102/SP

O arrependimento eficaz é instituto a ser aplicado na terceira fase de aplicação da pena,


como causa de diminuição de pena prevista na Parte Geral do Código Penal, conforme se
denota do seu art. 16, não podendo ser utilizado como fundamento para a rejeição da
denúncia por ausência de justa causa, pois não conduz à atipicidade da conduta por
ausência de dolo. STJ, 02/08/2011. HC 197012 / RJ

O Supremo Tribunal Federal e este Superior Tribunal de Justiça, para balizar o debate sobre
a consumação do crime de roubo, adotam a teoria da apprehensio, também denominada de
amotio, segundo a qual se considera consumado o mencionado delito no momento em que
o agente obtém a posse da res furtiva, ainda que não seja mansa e pacífica e/ou haja
perseguição policial, sendo prescindível que o objeto do crime saia da esfera de vigilância
da Vítima. STJ, 06/11/2012. HC 179435 / ES

Para caracterizar o crime de tentativa de latrocínio, não é necessário aferir a gravidade das
lesões experimentadas pela vítima, bastando a comprovação de que, no decorrer do roubo,
o agente atentou contra a sua vida com o claro desígnio de matá-la. STJ, 06/03/2012. HC
169908 / SP

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

A jurisprudência consolidada desta Suprema Corte é no sentido de que, para a consumação


do crime de furto ou de roubo, não se faz necessário que o agente logre a posse mansa e
pacífica do objeto do crime, bastando a saída, ainda que breve, do bem da chamada esfera
de vigilância da vítima (v.g.: HC nº 89.958/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma,
un., j. 03.4.2007, DJ 27.4.2007). STF, 20/11/2012. HC 113279 / RR - RORAIMA

Não ocorre crime impossível na hipótese em que houve tentativa de furto a um


estabelecimento comercial e devido à vigilância integral e constante da loja por seguranças
e câmeras, o acusado não obteve êxito na consumação do crime, tendo em vista que o
monitoramento por meio de câmeras de vigilância, de sistemas de alarme ou a existência de
seguranças no estabelecimento comercial não tornam impossível a consumação da infração,
conforme jurisprudência pacífica deste Tribunal. STJ, 02/08/2012. AgRg no HC 230555 /
MS. No mesmo sentido, STJ – AgRG no Resp 1341302 – 18/10/2012, entre outros.

A decisão agravada, com base nas narrativas constantes da sentença e do acórdão recorrido,
concluiu que, demonstradas a consumação da subtração e a existência de animus necandi,
e não advindo o resultado morte por circunstância alheia à vontade do agente, a hipótese é
de tentativa de latrocínio, e não de roubo qualificado pelo resultado lesão corporal. STJ,
25/09/2012. AgRg no REsp 1107311 / SP

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. CRIME CONTRA A ORDEM


TRIBUTÁRIA (ART. 1º DA LEI Nº 8.137/1990). DELITO MATERIAL.
COMPETÊNCIA. LOCAL ONDE SE CONSUMOU O CRIME. MUDANÇA DE
DOMICÍLIO DO CONTRIBUINTE. IRRELEVÂNCIA. 1. Tratando-se de crime material
contra a ordem tributária (art. 1º da Lei nº 8.137/1990), a competência para processar e
julgar o delito é do local onde houver ocorrido a sua consumação, por meio da constituição
definitiva do crédito tributário, sendo irrelevante a mudança de domicílio fiscal do
contribuinte. 2. Aplica-se a regra prevista no art. 70 do Código de Processo Penal, que
determina a competência do Juízo do lugar em que se consumou o delito ou, na hipótese de
tentativa, do lugar em que foi praticado o último ato de execução. STJ, 08/08/2012. CC
120850 / BA

“Desistência voluntária e quesitação: A resposta afirmativa dos jurados à indagação sobre a


ocorrência de tentativa afasta automaticamente a hipótese de desistência voluntária.
Precedente citado: HC 89921/PR (DJe de 27.4.2007)”. (HC 112197/SP / 2ª Turma / inf. 669
STF).

A 2°Câmara de Coordenação e Revisão do MPF entende que falsificação grosseira é crime


impossível. Boletim Ano II, n° 22, 16 de novembro de 2011.

Questões de concurso: Questão 31) Quais são as hipóteses de crime impossível? Questão
32) O que você acha do legislador equiparar a tentativa ao crime consumado?

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

PONTO EXTRA:

Cuidado: não confundir arrependimento eficaz com arrependimento posterior.

1. Arrependimento posterior: O arrependimento posterior está previsto no art. 16 do CP.


O arrependimento posterior ocorre depois de consumado o delito e será causa obrigatória
de redução de pena. O crime consumado deveria ser punido com a pena completa. Porém,
o legislador, por expressa disposição legal, aplica as mesmas reduções da tentativa para o
crime consumado. Tal medida de política criminal tem o intuito de reduzir o prejuízo
sofrido pela vítima [é uma medida de política criminal]. Desde que preenchidos os
requisitos legais, a redução é obrigatória. O quantum de redução depende do percurso da
fase executória. Variando entre 2/3 (dois terços) e 1/3 (um terço). Quanto mais próximo da
consumação ocorrer o arrependimento maior será a redução, quanto mais próximo do
recebimento menor será a redução, mas ela ocorrerá, pois é obrigatória. Para a maioria da
doutrina, a restituição deve ser integral até o recebimento da denúncia ou queixa.
Reparação do dano: Tem que reparar o dano, consertando ou devolvendo a coisa, não pode
indenizar pelo equivalente para fazer jus ao benefício. Ex: No crime de dano deve haver a
reparação do dano material. Não se trata de mera indenização. Reparação e concurso de
agentes: a) reparação parcial: A doutrina entende que um dos ladrões arrependido que
devolve sua parte no roubo para a vítima será beneficiado, mas o outro não; b) reparação
integral: um dos ladrões se arrepende e devolve integralmente o produto do crime. A
jurisprudência do STJ entende que o coautor também será beneficiado pela causa de
diminuição de pena, pois a restituição integral é uma circunstância objetiva e, portanto,
comunica-se aos coautores, levando-se em conta a natureza do instituto; c) se um terceiro
estranho faz a restituição, a pedido de um dos réus, também se aplica o arrependimento
eficaz. OBS: Em doutrina minoritária, Alberto Silva Franco defende que se a vítima se
satisfaz com a restituição parcial, a menor redução deve ser aplicada, pois a política
criminal foi atendida. Essa situação agrega ao critério objetivo temporal [o recebimento da
denúncia ou queixa], o critério objetivo da parcialidade da reparação. Outros elementos do
arrependimento posterior: 1) exige ser crimes sem violência ou grave ameaça à pessoa. Não
pode ser vem violência própria nem imprópria. OBS: Também não cabe arrependimento
posterior no crime em que é aplicada violência imprópria (Ex: “Boa noite Cinderela”). Para
a corrente defensiva, minoritária, não há proibição legal expressa [não usar essa tese para
prova do MPF e Juiz Federal]. 2) exige ser ato de reparação voluntário do agente. Não é
necessária a espontaneidade, bastando a mera voluntariedade. Espontâneo: é apenas da
iniciativa da pessoa. Voluntariedade: basta não ser forçado, pode ter apelos ou conselhos de
outros. Ex: admite quando atendendo a orientação do advogado, o agente promove a
reparação do dano. 3) Cabe arrependimento posterior na ação pública ou privada, antes de
sua propositura. Se depois de iniciada a ação, é mera circunstância atenuante, com base no
art. 65, III, ‘b”, segunda parte, do CP. OBS 1: Cheque sem provisão de fundos. Súmula 554
do STF [Súmula Nº 554 / STF - O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos,
após o recebimento da denúncia, não obsta ao prosseguimento da ação penal]. A súmula
interpretada a contrario sensu diz que o pagamento de cheque sem provisão de fundos antes
do recebimento da denúncia obsta o prosseguimento, por falta de justa causa. A súmula 246
do STF complementa tal entendimento, pois o crime do art. 171, §2º, VI do CP exige o
animus fraudis. [Súmula Nº 246 / STF - Comprovado não ter havido fraude, não se

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

configura o crime de emissão de cheque sem fundos]. Conclusão da OBS 1: Então, diante
da análise conjunta do artigo 171, §2º e súmulas 246 e 554, aquele que paga o cheque antes
do início da ação penal evidencia que não teve intenção de fraudar. Logo, não há justa
causa. Atenção da OBS 1: Tal raciocínio não se aplica ao cheque falsificado (art. 171, caput
do CP), porque o dolo é evidente, cabendo apenas o arrependimento posterior. OBS 2:
Composição de danos e arrependimento posterior (Art. 74 da lei 9099/95). Na audiência
preliminar é facultada às partes a realização da composição de danos. Ex: O art. 163 do CP
versa sobre o crime de dano e a ação penal se procederá através de queixa. Assim, diante da
homologação da composição, entende-se que houve o arrependimento do agente e a
reparação do dano. A vítima demonstra a renúncia da queixa [efeito da homologação do
acordo]. Então, a renúncia extingue a punibilidade. O mesmo ocorre na ação condicionada
à representação. Na ação pública incondicionada também se admite a composição de danos
e observa o disposto no art. 76, §6º da Lei 9099/95.

2. Agravação pelo resultado: Nos crimes qualificados pelo resultado vigora o princípio da
culpabilidade, pois nulla poena sine culpa, conforme o art. 19 do CP. Esse artigo consagra o
princípio da culpabilidade, pois o CP adotou a previsibilidade objetiva. A primeira hipótese
é a de que no tipo subjetivo há o dolo [vontade de realizar] e no tipo objetivo, o resultado
agravador a título de culpa, por conta da previsibilidade [culpa no resultado], configurando
o crime preterdoloso. Ex: Art. 129, §3º do CP - Lesão corporal seguida de morte ou
homicídio preterdoloso. Houve dolo na lesão corporal, porém, o resultado morte era
previsível. OBS: A contrario sensu, o STF analisou um caso no qual o sujeito foi agredido
e, ao cair no chão, rompeu um aneurisma, situação esta desconhecida pela vítima e seus
familiares. O resultado agravador será afastado e o agente não responderá por ele, pois só
pode ser punido por culpa se houver previsibilidade objetiva. Segunda hipótese é a
modalidade de crime agravado pelo resultado é quando há dolo na conduta e dolo no
resultado agravador. Esse tipo não é incongruente, pois a vontade do agente se dirige ao
tipo objetivo e também ao resultado agravador. Ex: art. 129, §2º, IV [Lesão se resulta
deformidade permanente. Nesse caso, o resultado por ser por culpa ou por dolo. Então,
pode ser um crime preterdoloso ou um crime com dolo na lesão e no resultado]. Ex: jogar
ácido no rosto da ex-namorada para que ela fique deformada e não namore com mais
ninguém. A terceira hipótese é a de dupla tipicidade culposa (culpa na conduta e culpa no
resultado agravador). Ex: incêndio culposo do qual resulta lesão ou morte. Ocorre no
incêndio culposo (art. 250, §2º do CP). No art. 258, primeira parte do CP, haverá crime
preterdoloso, a culpa se localiza apenas no resultado agravador, porém, na segunda parte,
haverá crime qualificado pelo resultado, diante da lesão corporal, a pena é aumentada da
metade, e se resultar morte, aplica-se a pena do homicídio culposo, aumentada de um terço
[isso é culpa + culpa]. OBS: Existe culpa + dolo? O dolo no subsequente não será uma
figura qualificadora, não será um crime qualificado pelo resultado. Será caso de aumento de
pena pela reprovação à conduta do agente. Ex: causa lesão a uma pessoa por culpa e não
presta socorro dolosamente. Será lesão corporal com pena acrescida de 1/3 pela omissão do
socorro (art. 129, §7º, CP).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

9.b. Crimes contra o patrimônio: apropriação indébita e


receptação e crimes contra a propriedade intelectual

Art. 168 – Apropriação indébita.

Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção:


Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Aumento de pena
§ 1º - A pena é aumentada de um terço, quando o agente recebeu a coisa:
I - EM DEPÓSITO NECESSÁRIO;
II - NA QUALIDADE DE TUTOR, CURADOR, SÍNDICO, LIQUIDATÁRIO,
INVENTARIANTE, TESTAMENTEIRO OU DEPOSITÁRIO JUDICIAL;
III - EM RAZÃO DE OFÍCIO, EMPREGO OU PROFISSÃO.

Apropriação indébita X Estelionato: A distinção entre a apropriação indébita e o estelionato


é o chamado dolo ab initio do estelionato.

Apropriação Indébita Estelionato


O DOLO DE APROPRIAR-SE SURGE DOLO PRECEDE A AQUISIÇÃO DA
APÓS A LEGITIMA APROPRIAÇÃO DA POSSE OU DETENÇÃO. O agente
COISA. pretende enganar a vítima.

A Apropriação indébita é um crime de comprovação extremamente difícil, pois o individuo


agia como possuidor e depois passa a agir como se proprietário fosse.

OBS: Qual o foro competente da apropriação indébita? Para a jurisprudência a apropriação


indébita o foro competente é o do local da prestação de contas.

Objetividade jurídica: É a proteção da propriedade.

Sujeito Ativo: Prevalece tratar-se de crime comum, podendo ser praticado por qualquer
pessoa à quem seja confiada a posse ou a detenção de determinado bem móvel. OBS: Se
funcionário público, apropriando-se de coisa, pública ou particular, em seu poder em razão
do ofício, caracteriza o crime do art. 312 do CP (peculato).

Sujeito Passivo: Será aquele atingido em seu patrimônio pela indevida apropriação,
podendo ser pessoa física ou jurídica, não necessariamente aquele que entregou o bem ao
agente.

Conduta: O agente, abusando da condição de possuidor ou detentor, inverte o animus,


agindo arbitrariamente como se dono fosse. A ação deve recair sobre coisa alheia móvel

234
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

(possível de ser transportada de um local para outro). OBS: A posse ou a detenção exercida
pelo agente deve ser desvigiada (confiada sem vigilância) e legítima (com a concordância
expressa ou tácita do proprietário).

OBS: Apropriação indébita X estelionato: Haverá crime de estelionato se o dolo anteceder


à posse da coisa. Assim, caracteriza o crime do art. 171 do CP, e não do art. 168, a conduta
daquele que faz um contrato de locação como artifício para se locupletar com a apropriação
do bem locado.

OBS: Apropriação indébita X furto: Quem transporta malote lacrado ou cadeado para
outrem tem a posse legítima sobre o continente e não sobre o conteúdo. Portanto, se durante
o transporte, o agente inverte o animus da posse e rompe o lacre ou cadeado para apropriar-
se de valor que há dentro do malote, comete furto com rompimento de obstáculo, e não
apropriação indébita.

Tipo Subjetivo: O dolo subsequente à posse da coisa, representado pela vontade consciente
de se apropriar de objeto alheio móvel (animus rem sibi habendi).

Consumação: A apropriação é crime instantâneo consumando-se com a exteriorização da


vontade de não restituir a coisa. Caso se entenda que o crime seria plurissubsistente, seria
possível a tentativa, mas na prática não é possível.

OBS: Não existe apropriação indébita de uso, o que poderá ocorrer á um abuso da posse.

STJ, HC 174.013, 2013: o simples descumprimento de obrigação contratual, sem que


ocorra a indicação de elementos concretos de ilícito penal, não pode ensejar uma ação penal
contra o inadimplente. Assim, o STJ considerou atípica a conduta do advogado que,
contratado para patrocinar os interesses de determinada pessoa em juízo, não cumpriu o
pactuado, apensar do recebimento de parcela do valor dos honorários contratuais.

Art. 168-A – Apropriação indébita previdenciária.

Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no


prazo e forma legal ou convencional.

Consideração inicial: Há doutrina sustentando que o crime em estudo violado o art. 5°,
LXVII da Constituição Federal, que proíbe a prisão civil por dívida, com exceção das
hipóteses de inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e ao
depositário infiel, argumentando que o crime de apropriação indébita previdenciária seria
fruto de dívida junto à União, resultante do não pagamento de contribuição previdenciária.
Tal entendimento não é acolhido pelos Tribunais nem majoritário na doutrina, pois se trata
de um tipo penal, regularmente criado, com sua respectiva sanção penal. [Neste mesmo
sentido: STF, HC 91.704,2ª T, 06.05.2008, rel. Min. Joaquim Barbosa].

Natureza jurídica: STF entendeu ser natureza de crime omissivo material. É crime

235
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

instantâneo de efeitos permanentes.

Fundamento: indispensável a ocorrência de apropriação dos valores, com inversão da


posse respectiva.

Objeto jurídico protegido: Para o STF, é o patrimônio da Previdência Social (Informativo


498 do STF). Para o MPF, o bem jurídico tutelado é, primariamente, a seguridade social
(conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas
a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social);
secundariamente, é a livre concorrência (anticompetitive advantage) - aquele que não
recolhe se vale de uma ferramenta espúria para ter um preço melhor.

Sujeito ativo: Sujeito ativo do delito será o responsável tributário, ou seja, aquele que, por
lei, está obrigado a repassar a contribuição ao INSS recolhida dos contribuintes. Sócio com
poderes de gestão (é o responsável). Não basta provar que o cara era sócio – deve
estabelecer relação (liame fático) entre a posição do cara na sociedade e a conduta. Não
precisa descrever pormenorizadamente, mas é necessário estabelecer um liame mínimo
entre o comportamento do sócio e seu papel na sociedade. Consultor e contador: são
considerados partícipes (STJ). Se um deles embolsa o $ destinado ao INSS – aplica-se o art.
168 do CP – lesou o cliente dele, logo a competência não é federal, e sim estadual.
Participação por omissão: exemplo é o do membro do Conselho de Administração. Há uma
decisão do STJ que admitiu isso, mas os TRFs não têm admitido. Prefeito: se o Município
não tem regime próprio (servidores no RGPS), pode haver o crime do art. 168-A. Como o
art. 168-A é forma especial, prevalece em relação ao art. 1º, § 1º do DL 201/67. Contudo,
estranhamente, o STJ diz que essa conduta não caracteriza ato de improbidade, porque a
União vai poder limitar o repasse de recursos. Ocorre que há ofensa a princípio (art. 11, II,
da Lei 8429/92 – deixar de praticar ato de ofício).

Sujeito passivo: é a União, representada pela autarquia federal de previdência. O Estado,


quando dotado de entendida de natureza previdenciária, pode também figurar como vítima.

Objeto material: É a contribuição previdenciária descontada e não recolhida. Excluem-se a


cota patronal, FGTS, PIS, COFINS – estas podem caracterizar 337-a, mas não 168-a. O
mesmo se aplica em caso de loteria (contribuição sobre a receita de concursos de
prognósticos) – o valor é arrecadado do público, e não dos segurados – neste caso, incide o
art. 168, § 1º, I. Em caso de outros tributos, aplica-se o tipo do art. 2º, II, da Lei nº
8.137/90.

Elemento subjetivo: Dolo genérico (posição majoritária - STF, STJ, LRP), dispensando o
animus rem sibi habendi. Não é necessário haver intenção de se apropriar da contribuição
previdenciária, pois é um tipo penal congruente. OBS: O STJ tem vários julgados
reiterando sua posição de que não é necessário o dolo específico de se apropriar de valores
destinados à previdência social para caracterizar o crime, nem o objetivo de fraudar a
previdência social. Caso se admitisse esse entendimento, o crime restaria descaracterizado
pelo fato de o contribuinte declarar ao fisco a existência do débito, bem como pelo
recolhimento posterior, ainda que fora do prazo, pois estes atos são incompatíveis com o
ânimo de apropriação. (6ª Turma do STJ decidiu nesse sentido no final de 2013).

236
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

OBS: DIFICULDADES FINANCEIRAS: ESTADO DE NECESSIDADE OU


INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA: Diante de dificuldades comprovadas da
empresa, não é razoável exigir do empresário que sacrifique o pagamento dos salários e a
própria sobrevivência da empresa em favor do pagamento dos tributos. Mas não é qualquer
situação que vai permitir isso: a dificuldade deve ser extrema, beirando a impossibilidade
de recolhimento.

Consumação e tentativa: Consuma-se o delito no momento em que se exaure o prazo para o


repasse do valor da contribuição ao órgão governamental (dispensando o locupletamento do
agente ou efetivo prejuízo ao Erário). Para aqueles que defendem tratar-se de crime
omissivo, de mera conduta, a tentativa é inviável; já para os adeptos da tese do crime de
conduta mista, a tentativa é possível.

Extinção da punibilidade pelo pagamento: Com o aparecimento da Lei 10.684/2003 (Lei do


PAES), entendeu o STF (HC 85.452, rei. Min. Eros Grau, DJU 03.06.2005) que o
pagamento de tributo (inclusive contribuições previdenciárias) realizado a qualquer tempo,
gera a extinção da punibilidade, nos termos do seu art. 9°, §2°. Logo, o pagamento extingue
a punibilidade a qualquer tempo. Diante disso, devem ser ignorados os §§ do art. 168, pois
são inaplicáveis, pois o pagamento a qualquer tempo extingue a punibilidade.

Parcelamento: STJ (precedentes antigos): extingue a punibilidade. Mas recentemente


sucumbiu à jurisprudência do STF, passando a entender que se trata de suspensão da
pretensão punitiva. STF: suspende a “pretensão punitiva”. A Lei 12.382/11, dando redação
diversa ao artigo 83, §1º, da Lei 9430/96, determina que:

Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem
tributária previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e aos
crimes contra a Previdência Social, previstos nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei
no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), será encaminhada ao Ministério
Público depois de proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência
fiscal do crédito tributário correspondente.
§ 2o É suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos crimes previstos no
caput, durante o período em que a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o
agente dos aludidos crimes estiver incluída no parcelamento, desde que o pedido de
parcelamento tenha sido formalizado antes do recebimento da denúncia criminal.
§ 3o A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão
punitiva.
§ 4o Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput quando a pessoa física
ou a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos
oriundos de tributos, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de
parcelamento.
§ 5o O disposto nos §§ 1o a 4o não se aplica nas hipóteses de vedação legal de
parcelamento.
§ 6o As disposições contidas no caput do art. 34 da Lei no 9.249, de 26 de dezembro
de 1995, aplicam-se aos processos administrativos e aos inquéritos e processos em
curso, desde que não recebida a denúncia pelo juiz.

237
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Pacelli critica essa suspensão: não há como suspender a vontade de aplicação da lei penal –
tratar-se-ia de expressão inadequada. A expressão vem sendo interpretada como suspensão
da atividade persecutória, e não da pretensão punitiva.

Como fazer subir o RE para contestar parcelamento: quando o STJ entende que houve
extinção da punibilidade, está atacando o princípio acusatório do MP, que não pode agir.
Parcelamento contra legem: nemo potest venire contra factum proprio. Segundo o STJ, uma
vez concedido o parcelamento pela Administração, não pode haver mudança. Com isso, o
MPF passou a ajuizar ações de improbidade.

Perdão judicial e privilégio (§3°): Discute-se se a previsão de leque tão amplo de benesses
(§§ 2° e 3°) permite a aplicação do princípio da insignificância. Luiz Flávio Gomes, em
artigo publicado, defende que, em casos tais, deve-se preferir a consideração da
insignificância sobre o perdão judicial. Essa discussão não se restringe ao círculo
acadêmico, sendo óbvio seu interesse prático. Isto porque, se aplicadas as disposições do §
3° do artigo 168-A, com a concessão do perdão judicial, haverá uma sentença em que o juiz
reconhece a culpa, isto é, considera a repercussão social negativa da conduta, mas decide
que, objetivamente, a aplicação da pena é desnecessária. No entanto, se reconhecida a
insignificância do valor indevidamente apropriado, o juiz não irá atestar a existência das
circunstâncias objetivas e subjetivas que integram o delito, mas, sim, a atipicidade do fato.

Concurso de crimes: Concurso material: como o recolhimento é único, não há que se falar
em um crime para cada um dos empregados da empresa. O crime será único para cada
competência em que ocorrer a omissão – o mesmo vale para omissão em vários
estabelecimentos da mesma empresa num mesmo mês. Contudo, em caso de omissão
também do recolhimento de IPI, IRPF, aí sim haverá concurso material. Crime continuado:
uma única omissão já configura o crime, de modo que a cada omissão mensal, há crime
autônomo. Assim, se houver omissão em vários meses, pode-se falar em continuidade
delitiva. Ainda que haja intervalo de um ou dois meses, pode persistir a continuidade.

Possibilidade de continuidade delitiva: não obstante tipifiquem condutas absolutamente


diversas, o STJ considerou que os artigos 168-A e 337-A podem gerar continuidade
delitiva: “é possível o reconhecimento da continuidade delitiva entre o crime de
apropriação indébita previdenciária e o crime de sonegação previdenciária praticados na
administração de empresas de um mesmo grupo econômico. Apesar de os crimes estarem
tipificados em dispositivos distintos, são da mesma espécie, pois violam o mesmo bem
jurídico, a previdência social.

Quadro comparativo:

Apropriação Indébita – 168 Apropriação Indébita Previdenciária 168-A

Crime material. O resultado é essencial para Crime Omissivo Próprio. Consuma-se


o tipo penal. independentemente do resultado
naturalístico e dispensa do animus rem sibi
É indispensável a presença do animus rem habendi - STF HC 76978.
sibi habendi. Vontade de se tornar dono da

238
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

coisa alheia móvel. OBS: Inquérito 2537 Nova Decisão do


STF. Para a nova decisão do STF seria um
crime OMISSIVO MATERIAL, sendo
necessário o término do PAF para a
configuração do crime.

6ª Tuma do STJ: crime material.

Art. 180 – Receptação.

Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que
sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou
oculte: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

OBS: O crime de receptação é tido como acessório, pois pressupõe que haja outro crime.

Receptação dolosa simples:

Sujeito ativo: qualquer pessoa, exceto o participante do crime pressuposto. O partícipe e o


coautor do crime anterior não praticam o crime de receptação.

OBS: Excepcionalmente pode figurar como sujeito ativo o proprietário do bem, caso o
objeto esteja na posse legítima de terceiro.

OBS: Quem entra em entendimento com o ladrão e compra a própria coisa que foi roubada
pratica esse crime? Posição de Noronha: A respeito do proprietário, foi levantada por Leto a
questão de ser ou não receptador o proprietário, que, tendo sido furtado em coisa de sua
propriedade e desesperançado da ação policial, entra em entendimentos com o ladrão, e
compra deste, concluindo aquele escritor existir receptação, que, para ele, é crime contra a
administração da Justiça. Posição de Puglia: sustenta ser a receptação delito patrimonial e
que mesmo tivesse aquela natureza, nem por isso haveria crime, por ausência de dolo
específico, pois não se pode dizer querer dificultar ou impedir a ação da Justiça, quem,
vendo baldados os seus esforços, adquire a coisa que ela colimava entregar-Ihe, não sendo
possível falar-se em receptação. Não há delito patrimonial no fato de o proprietário reaver a
própria coisa, não gravada de Ônus que lhe impede o uso ou disponibilidade. Não há dolo.
Nem no caso, ele agiu em proveito próprio, pois não logra proveito quem compra coisa que
é sua”. [procurar jurisprudência sobre isso, pois é algo muito comum na periferia, já vi
acontecer diversas vezes, principalmente com motos que são roubadas para serem usadas
no tráfico, é só procurar o traficando dono do bairro e dar o alerta que quer recomprar a
moto, custa cerca de R$700,00 reaver uma Titan].

Sujeito passivo: é a mesma vítima do crime anterior.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Modalidades de receptação: pelo artigo 180 verifica-se que são puníveis: RECEPTAÇÃO
PRÓPRIA e RECEPTAÇÃO IMPRÓPRIA (artigo 180, caput, in fine).

Será própria nas situações dos núcleos “adquirir, “receber”, “transportar”, “conduzir” e
“ocultar”. É imprópria na hipótese do núcleo “influir”, convencendo terceiro de boa-fé a
adquirir produto de crime. PARA SER IMPRÓPRIA, O TERCEIRO NÃO PODE SER DE
MÁ-FÉ.

Produto de contravenção penal (MP/MG): não configura crime de receptação, que somente
ocorrerá diante da coisa que seja produto de crime, pois seria analogia in malam partem.

Se o produto do crime foi transformado desnatura-se a receptação? NÃO, configura-se


igualmente o crime de receptação.

Objeto material do crime de receptação: a lei não exige que a coisa seja móvel. Por outro
lado, o STF, acompanhando o posicionamento de Damásio, Hungria, e Magalhães Noronha,
entendeu que a própria palavra receptação significa dar abrigo, esconder, implicando
movimentação do objeto. O objeto material da receptação é o “produto de crime”. Este
pode se originar de qualquer delito

Natureza do crime pressuposto: não afasta o cabimento da receptação mesmo que não seja
contra o patrimônio.

Bem jurídico tutelado: patrimônio. Magalhães Noronha aduz que há um bem jurídico
secundário protegido, que é a administração da justiça, pois a administração da justiça fica
embaraçada pela ação do administrador.

Receptação da receptação: é perfeitamente possível, devendo a coisa manter na cadeia de


transmissão o seu caráter delituoso. É possível, desde que a coisa conserve seu caráter
delituoso.

Tipo Subjetivo: O caput é punido a título de dolo, devendo o agente ter certeza acerca da
origem criminosa da coisa (dolo direto). A dúvida, dependendo das circunstâncias, poderá
se configurar a receptação culposa, prevista no § 3°.

OBS: Receptação ≠ favorecimento real (Art. 349, CP): O tipo também exige um fim
especial de agir, que é o de obter vantagem ilícita para si ou para outrem. Se agir como
simples forma de auxiliar o autor do delito antecedente praticará favorecimento real, e não
receptação.

RECEPTAÇÂO (ART. 180) FAVORECIMENTO REAL (ART. 349)


Crime contra o patrimônio Crime contra o patrimônio
O agente busca vantagem pessoal ou de O agente não busca vantagem pessoal, mas
terceiro (que não o autor do crime anterior). assegurar vantagem do autor do crime
anterior, prestando-lhe auxílio.
Dolo direto ou dolo eventual (MP/MG): A doutrina é divergente sobre a possibilidade de

240
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

cabimento do dolo eventual. O MP/MG considerou que NÃO abrange o dolo eventual. A
maioria assim se posiciona. Dolo superveniente configura esse crime? Ou seja, o indivíduo
adquiriu a coisa de boa-fé, mas só depois soube que era produto de crime. Uma parcela da
doutrina entende que o dolo superveniente desconfigura o crime. NELSON HUNGRIA, de
modo diverso, entende que a lei não faz distinção nesse sentido. Nos dois itens sobre o dolo
a doutrina e a jurisprudência estão muito divididas, não há como saber qual prevalece.

Conduta: O tipo penal deve ser dividido em duas partes: receptação própria (art. 180, caput,
1a parte) e imprópria (art. 180, caput, 2a parte). Nos dois casos o tipo é misto alternativo
(de ação múltipla ou de conteúdo variado). Na receptação própria o agente, sabendo ser a
coisa produto de crime, a adquire, recebe, transporta, conduz ou oculta. Já na receptação
imprópria incrimina-se a conduta do intermediário, isto é, da pessoa que se coloca entre o
autor do crime anterior e o terceiro de boa-fé, potencial adquirente da coisa produto de
crime. OBS: O terceiro deve, obrigatoriamente, agir de boa-fé, pois, do contrário, será
rotulado como receptador próprio, e aquele que o influenciou responderá como partícipe da
conduta descrita na primeira parte do caput.

Consumação da receptação própria: nas modalidades do caput, primeira parte, consuma-se


com a prática das condutas; entretanto, nas modalidades TRANSPORTAR, CONDUZIR e
OCULTAR há crimes permanentes porque as condutas se protraem no tempo (admitindo
flagrante a qualquer tempo). Consuma-se com a prática de qualquer um dos núcleos do tipo
previsto no caput.

Consumação da receptação imprópria: a receptação imprópria pune o intermediário,


havendo consumação com a mera INFLUÊNCIA, pouco importando se o terceiro adquiriu
ou não a coisa. Trata-se de crime formal.

Tentativa: a maioria da doutrina entende que a receptação própria admite tentativa, mas a
receptação imprópria não admite.

Diferença entre receptação e favorecimento real (art. 349 CP): na receptação, o agente
pratica as condutas agindo em proveito próprio ou de terceiro que não o criminoso anterior;
no favorecimento, há auxílio ao criminoso anterior. No crime de receptação, cabe observar
que o dolo é específico de obter alguma vantagem para si ou para outrem. Se o agente não
possui essa intenção, somente poderá haver crime de FAVORECIMENTO REAL.

Sentença condenatória do crime pressuposto (art. 180, § 4º): NÃO é necessária para a
configuração do crime anterior. Basta saber da sua existência, mesmo que haja a extinção
da punibilidade (artigo 108), ou não se saiba a autoria.

Privilégio (art. 180, 5º):

RECEPTAÇÃO CULPOSA RECEPTAÇÃO DOLOSA


Réu primário Réu primário
Circunstâncias Coisa de pequeno valor
O entendimento majoritário determina que se aplica o privilégio à receptação dolosa
241
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

qualificada.

Receptação dolosa qualificada: Art. 180, § 1º - Adquirir, receber, transportar, conduzir,


ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de
qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial
ou industrial, coisa que deve saber ser produto de crime: Pena - reclusão, de três a oito
anos, e multa. § 2º - Equipara-se à atividade comercial, para efeito do parágrafo anterior,
qualquer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercício em residência

É qualificada porque o agente está em atividade industrial ou comercial, situação que faz
facilitar a transferência da coisa ao terceiro de boa-fé. No §1º, estão enquadrados os
desmanches de veículos. OBS: Não basta ser comerciante e adquirir a coisa. A coisa
adquirida deve estar ligada, direta ou indiretamente, ao comércio que exerce.

Sujeito ativo: o crime é próprio, porque exige que o indivíduo seja comerciante ou
industrial.

É um tipo misto alternativo, já que é composto por uma pluralidade de núcleos. Se o agente
pratica mais de um núcleo dentro do mesmo contexto fático, o crime é único, mesmo em
decorrência da prática de dois núcleos do tipo.

Tipo subjetivo: QUE SABE ser produto de crime (caput, artigo 180) (PENA – 01 a 04
anos). DEVE SABER (§ 1o., artigo 180) (PENA – 03 a 08 anos) gera posições distintas: a)
abrange somente o dolo eventual (DAMÁSIO = com a aplicação da pena do caput, por
inconstitucionalidade da pena do § 1º ser maior que a do caput); b) abrange o dolo eventual
(que é o menos) e o dolo direto (que é o mais) (MAJORITÁRIA). c) STF: RHC 117143-
RS, 2013: o STF entende que o §1º do artigo 180 do CP pune o dolo eventual de forma
mais gravosa do que o dolo direto e que isso é constitucional.
Receptação simples Receptação qualificada Receptação culposa
O agente SABE ser produto O agente DEVE SABER ser O agente DEVE
de crime. produto de crime. PRESUMIR ser produto de
crime.
1 a 4 anos 3 a 8 anos 1 mês a 1 ano.

Consumação: ocorre com a prática de qualquer um dos núcleos, lembrando-se de que


alguns são permanentes.

Tentativa: admite a tentativa.

Receptação culposa: Art. 180, § 3º. § 3º - Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza
ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve
presumir-se obtida por meio criminoso: Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou

242
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ambas as penas. § 4º - A receptação é punível, ainda que desconhecido ou isento de pena o


autor do crime de que proveio a coisa.

Condutas: basta o preenchimento de somente uma das situações, os pressupostos não são
cumulativos, são alternativos.

Consumação: Crime instantâneo; consuma-se no momento em que o agente adquire a coisa.

Tentativa: por ser um crime culposo, não admite tentativa.

Perdão judicial: Art. 180, § 5º. § 5º - Na hipótese do § 3º, se o criminoso é primário, pode
o juiz, tendo em consideração as circunstâncias, deixar de aplicar a pena. Na receptação
dolosa aplica-se o disposto no § 2º do art. 155.

O art. 180, § 5º, 1º parte, do CP traz o perdão judicial, que é cabível na receptação culposa e
tem como pressupostos: (i) primariedade do receptador; e (ii) grau da culpa – a culpa deve
ser levíssima, pouco importando o valor da coisa.

O art. 180, § 5º, 2ª parte, do CP traz o privilégio e ele é cabível na receptação dolosa. É
possível o privilégio mesmo na forma qualificada. Os pressupostos são: (i) primariedade do
agente; e (ii) pequeno valor da coisa. [Costuma cair em prova com a seguinte pergunta: É
possível receptação qualificada privilegiada? O tipo penal não restringe à modalidade
simples (como fez o parágrafo seguinte), logo, a resposta parece ser positiva. Há, porém,
entendimento de que á gravidade da qualificadora é incompatível com o privilégio].

Aplica-se somente à receptação culposa, exigindo que o criminoso seja primário e as


circunstâncias indiquem o cabimento da medida. Não há necessidade de que a coisa seja de
pequeno valor; basta a culpa levíssima do agente.

Causa de aumento de pena: Art. 180, § 6º. § 6º - Tratando-se de bens e instalações do


patrimônio da União, Estado, Município, empresa concessionária de serviços públicos ou
sociedade de economia mista, a pena prevista no caput deste artigo aplica-se em dobro.

ATENÇÃO: esse aumento de pena aplica-se somente à MODALIDADE DE


RECEPTAÇÃO SIMPLES.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

B) Crimes contra a propriedade intelectual

Obras consultadas: Santo Graal do 27º; (FRANCO, Alberto Silva; STOCO, Rui, CP e sua
interpretação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. PRADO, Luiz Regis. Curso de
Direito Penal Brasileiro - Parte Especial, v.3. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010;
MASSON, Cleber Rogério. Direito Penal Esquematizado - Parte Especial, v.2. 3ª ed. São
Paulo: Método, 2011. NUCCI, Guilherme de Souza. CP Comentado. 9ª ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2009; NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais
penais comentadas. 4ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009).

Legislação básica. CF, CP, arts. 184 a 186; Lei 9.279/96; Lei 9.609/98; Lei 9.610/98; Lei
nº 10.695/2003; CPP, arts. 525 a 530-I.

1. CONSIDERAÇÕES GERAIS: A tutela penal da propriedade material encontra


fundamento constitucional nos artigos 5º, incisos IX e XXVII, bem como no art. 216 da
Carta Magna. Segundo FRANCO e STOCO, o objetivo das normas penais em questão é
tutelar os direitos autorais, assim entendidos os direitos de autor e os que lhe são conexos,
conforme expressamente previsto na Lei 9.610/98, conhecida como Lei de Direitos
Autorais (doravante referida apenas como LDA).

2. CONCEITO, NATUREZA E ÂMBITO DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS DE


AUTOR: Segundo Carlos Alberto Bittar (apud MASSON), “direito autoral é o ramo do
Direito Privado que regula as relações jurídicas advindas da criação e da utilização
econômica de obras intelectuais estéticas e compreendidas na literatura, nas artes e na
ciência. As relações regidas por este direito nascem com a criação da obra, insurgindo do
próprio ato criador direitos respeitantes à sua face pessoal e de outro lado, com sua
comunicação ao público, os direitos patrimoniais. Assim, podem ser direitos morais e
patrimoniais”. Conforme PRADO, os direitos autorais em sentido lato possuem natureza
mista, de cunho pessoal ou moral e patrimonial, tal como se pode extrair das disposições da
própria LDA que, em seu art. 1º, estabelece que sob a denominação “direitos autorais”
entende-se “os direitos de autor e os que lhe são conexos”. Os direitos morais de autor
relacionam-se com a paternidade do autor sobre a obra, à indicação do nome do autor ou
intérprete na utilização da sua obra, à conservação de obra inédita, à garantia de integridade
da obra, à modificação da obra, à retirada da obra de circulação ou suspensão da utilização
já autorizada e ao acesso a exemplar único e raro da obra que esteja, legitimamente em
poder de terceiro, conforme o art. 24 da LDA. Os direitos patrimoniais de autor são os que
dizem respeito à gravação ou fixação, à extração de cópias para comercialização, à
sincronização ou inserção em filmes, em geral, à tradução, adaptação e outras
transformações e à execução pública de obra. ATENÇÃO: Segundo a doutrina majoritária
(FRANCO e STOCO, NUCCI, MASSON), a atividade intelectual do ser humano só
alcança a proteção do Direito quando se materializa em obras literárias, científicas ou
artísticas e invenções de um modo geral, a partir da interpretação dada ao art. 22 da LDA

244
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

que assim dispõe: “Pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que
criou”. Por direitos conexos aos de autor deve ser entendido aqueles relativos “aos direitos
dos artistas intérpretes ou executantes, dos produtores fonográficos e das empresas de
radiodifusão”, conforme o art. 89 da LDA. Segundo Carlos Alberto Bittar (apud
MASSON), “direitos conexos são os direitos reconhecidos, no plano dos de autor, a
diversas categorias que auxiliam na criação e na produção ou, ainda, na difusão da obra
intelectual.” Ex.: direitos das gravadoras de discos e editoras de livros.

3. DELIMITAÇÃO: O CP não trata de todos os crimes contra a propriedade imaterial,


pois a Lei 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial), em seu Título V, passou a tratar dos
crimes contra a propriedade industrial, revogando as disposições do CP referentes aos
crimes contra o privilégio de invenção, crimes contra as marcas de indústria e comércio e
crimes de concorrência desleal. Por outro lado, a violação de direitos autorais de autor de
programas de computador (softwares) é tratada pela Lei 9.609/98 (conhecida como Lei do
Software, artigo 12).

4. DO CRIME DE VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL: Art. 184, caput.

4.1. Bem Jurídico: Garantir ao autor o direito à paternidade da obra, bem como dela retirar
os benefícios pecuniários advindos da sua reprodução, representação, execução, recitação,
adaptação, transposição, arranjos, dramatização, tradução e radiodifusão. O que se protege
é a obra intelectual em geral (artística, literária, científica, etc.), não a ideia. Estas,
separadas de sua expressão (a obra), constituem patrimônio cultural comum da
humanidade. Entende-se por direitos autorais os morais (que não são suscetíveis de
alienação, e são imprescritíveis e irrenunciáveis) e os patrimoniais (aqueles que dizem
respeito à exploração econômica) sobre uma obra literária, artística ou científica. Os
direitos autorais serão exercidos durante toda a vida do autor, sendo sucessíveis causa
mortis. Neste caso, os herdeiros terão o direito de utilizar, fruir e dispor da obra pelo prazo
de setenta anos, contados a partir do dia 1º de janeiro do ano subsequente ao falecimento do
autor (art. 41 da Lei 9.610/98).

4.2. Tipo Objetivo (conduta): Violar significa ofender ou transgredir, tendo por objeto o
direito de autor ou a sua produção intelectual. Trata-se de norma penal em branco, cujo
conteúdo (direito de autor) deve ser complementado pela Lei n° 9.610/98. Este diploma,
aliás, ao mesmo tempo em que dispõe acerca das violações dos direitos autorais,
considerando ilícita a contrafação da obra (artística, científica ou literária), traz hipóteses de
atipicidade (artigo 46). Com isso, diferenciou o plágio (crime) da simples imitação
(indiferente penal).

ATENÇÃO: (1) Segundo PRADO, é indispensável que a obra seja original (criação própria,
primígena), mas não se exige que seja inédita, isto é, que jamais tenha sido apresentada na
doutrina, no mundo artístico ou científico, por exemplo. (2) Verificar que os arts. 46 a 48 da
LDA dispõem sobre as exclusões, limitações e exceções à proteção dos direitos autorais,
estabelecendo condutas que não constituem ofensa a direitos autorais, estabelecendo,
assim, causas de atipicidade para o delito em comento (artigo 184, §4º, CP). (3) FRANCO
e STOCO, com forte inspiração em valores morais, entendem que os vídeos obscenos e
pornográficos, por reputarem ilegais, não são protegidos pela norma, entendimento este, no
245
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

entanto, que encontra respaldo em outros doutrinadores como PRADO, NUCCI e


MASSON. (4) se CD/DVD falsificado conter um programa de computador, o tipo será o do
artigo 12, da Lei 9.609/98. Alexandre Salim e Marcelo André afirmam que na prática (STJ,
HC 150901, J. 22/02/11) se tem sustentado a atipicidade da conduta em razão do princípio
da adequação social (SALIM, Alexandre e Marcelo André de Azevedo. Direito Penal Parte
Geral. Ed. Juspodivm. 2012. Pagina 312).

4.3. Tipo Subjetivo: Segundo PRADO é o dolo, direto ou eventual (FRANCO e STOCO
não mencionam o dolo eventual). Não se exige, no caput, a finalidade de obtenção de lucro.
Não se admite a modalidade culposa, bem como não se exige nenhuma finalidade
específica.

4.4. Sujeitos: Ativo e Passivo. Segundo PRADO, qualquer pessoa pode cometer o delito
em questão, admitindo-se coautoria e participação, como por exemplo, do editor do livro
plagiado. Sujeito passivo é a pessoa física criadora da obra. Por serem alguns dos aspectos
dos direitos autorais transmissíveis por herança, falecendo o autor, o sujeito passivo serão
seus herdeiros e sucessores. Pessoa jurídica de direito privado ou público pode ser sujeito
passivo, desde que cessionárias dos direitos sobre a obra. Não é necessário que o autor da
obra tenha registrado sua criação, pois o registro não é constitutivo da titularidade e não se
compõe como elemento necessário ao tipo penal ora descrito. O registro tem a função de
provar a autoria.

4.5. Consumação e tentativa. Consuma-se com a violação de qualquer dos aspectos dos
direitos de autor e dos que lhe são conexos. Pode se consumar de várias formas, desde a
simples reprodução ou cópia não autorizada (contrafação, atinge o aspecto patrimonial) até
o plágio (afeta principalmente o aspecto moral, porque há a usurpação da autoria). Não
exige resultado naturalístico (crime formal). É possível a tentativa já que se trata de crime
plurissubsistente. OBS: A jurisprudência vem decidindo que a imitação grosseira não
caracteriza o crime.

4.6. Concurso de crimes. Segundo FRANCO e STOCO “todas as formas de concurso são
admissíveis nos crimes contra a propriedade intelectual descritos no CP” (artigos 69 a 71),
porém a contrafação de vários exemplares contrafeitos pode influir na pena, mas não na
caracterização do concurso, pois tal hipótese configurará CRIME ÚNICO. Ademais, se a
pessoa que reproduz a obra teatral é a mesma que a representa, trata-se de crime único, pois
haveria progressividade criminosa e não conexidade.

4.7. Objeto material. É a obra intelectual violada (que não se confunde com a propriedade
intelectual, que configura a objetividade jurídica do delito).

Classificação Doutrinária. Trata-se de crime comum, formal, doloso, de forma livre (pode
ser cometido por qualquer meio de execução), comissivo, e, excepcionalmente comissivo
por omissão, instantâneo, unissubjetivo ou de concurso eventual (pode ser praticado por um
só agente, mas admite concurso) e plurissubsistente (em regra vários atos integram a
conduta). Não há previsão legal de forma culposa.

4.8. Figuras qualificadas.

246
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

1) Art. 184, § 1o, do CP: Reprodução não autorizada. Análise Geral: Consiste na utilização
do núcleo base da modalidade simples do caput associado a uma maneira especial de
empreendê-lo, isto é, mediante reprodução, e agrega o especial fim de agir que consiste no
intuito de lucro (direito ou indireto segundo PRADO). Trata-se de tipo misto alternativo.
Introduziu-se um elemento normativo do tipo, qual seja: “sem autorização do produtor ou
de quem o represente”. Segundo PRADO, reprodução, obra intelectual, interpretação
execução e fonograma são expressões cujo conceito legal é fornecido pela LDA
(respectivamente, artigos 5º, inciso VI, 7º [de forma exemplificativa], e art. 5º, incisos XIII
e IX), tratando-se, portanto, de norma penal em branco. CONTROVÉRSIA: a doutrina
diverge acerca da configuração ou não do crime caso o objeto material do delito seja um
“VIDEOFONOGRAMA”. Para Bittencourt, tendo em vista que o preceito penal não inclui
o ‘videofonograma’, o princípio da reserva legal autoriza concluir que há uma lacuna na
medida em que a previsão legal não abrange aquelas hipóteses da locadora de vídeo (VHS,
DVD’s, BD, HD-DVD, etc.) que aluga ou comercializa cópias originais desses vídeos,
adquiridas licitamente, mas que não são autorizadas à locação ou comercialização. Em
sentido contrário, FRANCO e STOCO entendem que ‘videofonogramas’ estão abrangidos
pelo conceito geral de obra intelectual; além disso, geralmente (sic) essa forma de fixação
contém fonogramas. Não se discute que os fonogramas de uso doméstico, se exibidos
publicamente com intuito de lucro e sem autorização, caracterizará o crime de violação de
direito autoral. ATENÇÃO: (1) segundo FRANCO e STOCO, a reprodução de filmes
(videofonogramas) através de download pela internet, desde que com intuito de lucro,
constitui o crime do § 1º, do art. 184. (2) caso o objeto material da conduta seja programa
de computador (software), a conduta se amoldará ao tipo penal previsto do art. 12 previsto
na Lei 9.609/98. (3) Tipo Subjetivo: segundo PRADO, é o dolo direito ou eventual, aliado à
finalidade específica caracterizada pelo intuito de lucro direito ou indireto. (4)
Consumação: ocorre com a simples reprodução ilegal, com intuito de lucro direito ou
indireto, ainda que não ocorra a posterior venda. É admissível a tentativa.

2) Art. 184, § 2o, do CP: Guarda e comércio de reprodução não autorizada. Análise Geral:
Segundo o STJ, em face do princípio da especialidade, o crime do art. 184, § 2º, do CP,
prevalece sobre o delito de descaminho, independentemente da origem do fonograma ou
videofonograma reproduzido com violação ao direito do autor. (RHC 21.841, DJ
05.11.2007 p. 293). Tipo misto alternativo. Exige especial fim de agir consistente no intuito
de lucro. Presente dois elementos normativos do tipo: a) “com violação de direito de autor”
na primeira parte e b) “sem a expressa autorização dos titulares dos direitos ou de quem os
represente”, na parte final. Recebe as mesmas classificações do caput, exceto pelas formas
ocultar, expor a venda e ter em depósito que são formas de crime permanente. Foi
introduzida pela Lei 10.695/2003 a figura típica daquele que aluga original ou cópia de
obra reproduzida legitimamente, mas sem a autorização do titular ou de quem o represente.
Segundo PRADO, consuma-se com a efetiva distribuição, venda, locação, aquisição
(delitos de resultado); com a exposição à venda, ocultação ou depósito (delitos
permanentes) ou com a introdução no País de obra intelectual ou fonograma produzidos
com violação de direito autoral (delitos de mera atividade). Admite-se a tentativa.
ATENÇÃO: segundo FRANCO e STOCO, pode haver concurso formal de crimes se, além
de expor à venda CDs de música, oferece gravações de software, pois este tipo de
contrafação constitui crime previsto no art. 12, § 2º, da Lei 9.609/98 (“Na mesma pena do

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

parágrafo anterior [reclusão de um a quatro anos e multa] incorre quem vende, expõe à
venda, introduz no País, adquire, oculta ou tem em depósito, para fins de comércio, original
ou cópia de programa de computador, produzido com violação de direito autoral”.)

3) Art. 184, § 3o, do CP: Oferecimento público não autorizado. Análise Geral: Dispositivo
incluído para adequar a lei às inovações tecnológicas, consistindo no oferecimento ao
público de obra ou produção e exigindo também o intuito de lucro.

4.9. Art. 184, § 4o, do CP. Redução do âmbito de abrangência da tipicidade. PRADO e
NUCCI consideram o dispositivo desnecessário e supérfluo, pois determina a não aplicação
dos parágrafos anteriores do artigo quando a cópia se dê em um exemplar para uso privado
e sem intuito de lucro. Na verdade, a simples ausência do intuito de lucro, por si só, já
afastaria a aplicação dos parágrafos mencionados. Ademais, tais limitações já se encontram
dentre aquelas previstas na LDA.

4.10. Ação Penal: art. 186 do CP. Ação Privada (no caso do caput do art. 184). Ação
Pública condicionada (caso do § 3º do art. 184). Ação Pública incondicionada (casos dos §§
1º e 2º do art. 184 e quando o crime for cometido contra entidades de direito público,
autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou fundação instituída pelo Poder
Público).

4.11. Competência. Via de regra, conforme entendimento do STJ é estadual (Segundo o


STJ: Compete à Justiça Estadual processar e julgar crimes contra a propriedade intelectual,
quando não praticados em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas
entidades autárquicas e empresas públicas. Não opera o deslocamento da competência para
a Justiça Federal a circunstância de que os produtos teriam sido adquiridos no exterior, uma
vez que, in casu, o recorrente não foi denunciado por crime de descaminho. (RHC
21.791/PR,DJ 05.11.2007). No mesmo sentido: CC 48.178-SP, Rel. Min. Og Fernandes,
julgado em 25/3/2009; HC 163716/RS, DJe 16/05/2012.).

No caso de conexão entre crime de violação de direito autoral e descaminho, aplica-se a


Súmula 122/STJ: Compete à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes
conexos de competência federal e estadual, não se aplicando a regra do Art. 78, II, "a", do
Código de Processo Penal (Segundo o STJ: Havendo indicações da relação entre os
apontados fatos criminosos – descaminho e violação de direito autoral (mercadorias de
origem estrangeira, entre as quais "CDs gravados") –, há, em consequência, conexão, isto é,
trata-se de crimes conexos. (...) Conflito de atribuições do qual se conheceu como conflito
de competência, tendo a Seção proclamado competente a Justiça Federal para, também,
processar e julgar a indicada violação de direito autoral. (CAt .180/RS, DJ 06.03.2006).

No entanto, existem alguns julgados do TR4 firmando a competência da Justiça Federal


com base na Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, com
vigor no Brasil a partir do Decreto Presidencial nº 75.699, de 06 de maio de 1975,
conforme se vê a seguir: (1) PENAL E PROCESSUAL. ART.184, § 2º DO CP. DIREITOS
AUTORAIS. CD’S (“PIRATAS”) DE AUTORES BRASILEIROS E ESTRANGEIROS.
COMPETÊNCIA FEDERAL. MATERIALIDADE E AUTORIA. ESTADO DE
NECESSIDADE. ERRO DE PROIBIÇÃO. NÃO-APLICABILIDADE. CONDENAÇÃO

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

MANTIDA. 1. A introdução em território nacional de CD’s tidos como piratas de cantores


brasileiros e estrangeiros caracteriza a violação de direitos autorais (art. 184, § 2º, do CP)
de competência da justiça federal, a teor do inc. V do art. 109 da CF/88 (Convenção de
Berna para a Proteção de Obras Literárias). Precedentes. 2. A materialidade e autoria
restaram devidamente comprovadas, uma vez que o acusado, de forma consciente, trouxe
do Paraguai, com o intuito de lucro, cópias de fonogramas (CD’s) produzidos de forma
irregular. (...). ACR 200070020042427, DJ 05/05/2004. (2) PROCESSO PENAL.
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME DE VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL
DE ESTRANGEIRO. ARTIGO 184 DO CP. DECRETOS NºS 75.699/75 E 76.906/75.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. ARTIGO 109, INCISO V, DA CARTA
MAGNA. - As convenções internacionais que tratam do direito de propriedade intelectual -
das quais o Brasil é signatário - acabaram por incorporar as normas penais dos países
contratantes relativas à matéria, não se distinguindo estas dos demais dispositivos
originalmente previstos. - A interpretação de dispositivos constitucionais exige menor
rigidez, pois neles predomina o elemento político, resultando maior mutabilidade nas
relações e nos conceitos. - Recurso provido. RSE 200271070059150, DJ 10/03/2004. (3)
DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. VIOLAÇÃO DE DIREITO
AUTORAL. COMPETÊNCIA. CONVENÇÃO DE BERNA. 1. Cabível a aplicação do
princípio da insignificância quanto ao delito de descaminho quando não há lesão
significativa para caracterizar crime. 2. Versando a questão sobre músicos estrangeiros,
titulares de direitos autorais, que tiveram sua obra contrafeita, caberá ao Juiz Federal
processar e julgar o delito previsto no § 2º do art. 184 do CP, a teor do inc. V do art. 109 da
CF (Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas). 3. Recurso
parcialmente provido para determinar a remessa dos autos ao Juízo a quo para o juízo de
admissibilidade da peça inicial acusatória quanto ao delito de violação de direito autoral.
RSE 200104010688680, Relator MANOEL LAURO VOLKMER DE CASTILHO, DJ
15/05/2002. (relator marido da Ela Wiecko).

4.12. Questões Processuais previstas no CPP. O CPP traz nos arts. 524 a 530-I os
procedimentos para o processo e julgamento dos crimes contra a propriedade imaterial,
sendo que, no caso de haver o crime deixado vestígio, a queixa ou denúncia somente será
recebida se for instruída com EXAME PERICIAL dos objetos que constituam o corpo de
delito. A diligência de busca ou de apreensão deve ser realizada por dois peritos. Ao
prolatar a sentença condenatória, o juiz poderá determinar a destruição dos bens
ilicitamente produzidos ou reproduzidos, e o perdimento dos equipamentos apreendidos.
Para o STF, nos crimes de ação privativa do ofendido fundada em busca e apreensão, o
prazo para o exercício do direito de queixa é de 30 dias e não de seis meses (afastada,
portanto, a incidência do art. 38 do CPP), contados da data em que o querelante teve ciência
da homologação do laudo pericial – RHC 60835.

5. DO CRIME DE VIOLAÇÃO DE DIREITO DE AUTOR DE PROGRAMA DE


COMPUTADOR – ART. 12, CAPUT, DA LEI 9.609/98 (LEI DO SOFTWARE):

5.1. Considerações Gerais. De acordo com a exposição doutrinária feita por NUCCI, valem
aqui, com as peculiaridades a serem analisadas a seguir, as mesmas considerações feitas em
249
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

relação aos crimes de violação de direito autoral previstos no CP (bem jurídico, norma
penal em branco, consumação e tentativa, concurso de crimes, etc.). O bem jurídico
tutelado é a propriedade intelectual do autor de programa de computador. A figura típica é
bastante parecida com o tipo genérico de violação de direito autoral, apenas com a
peculiaridade de que recai sobre a modalidade específica de direito de autor de programas
de computador. O conceito de programa de computador vem previsto no art. 1º da Lei n°
9.609/98. OBS1.: O conceito de software abrange não somente o programa de computador,
indo muito além disso e atingindo a sua apresentação verbal ou esquemática, e também os
materiais descritivos e instruções para os usuários. Apenas no seu sentido restrito, o
software, chega a coincidir com o programa pois ele é um bem intangível, que como o
programa, tem a necessidade de ser materializado em um corpo físico, como por exemplo,
um disquete ou um disco óptico. OBS2.: A proteção dada pela Lei 9.609/98 aos direitos aos
direitos de autor de programa de computador possui algumas especificidades se comparada
à proteção dada aos direitos de autor em geral pela LDA, exemplo: Art. 2º, § 1º Não se
aplicam ao programa de computador as disposições relativas aos direitos morais,
ressalvado, a qualquer tempo, o direito do autor de reivindicar a paternidade do programa
de computador e o direito do autor de opor-se a alterações não-autorizadas, quando estas
impliquem deformação, mutilação ou outra modificação do programa de computador, que
prejudiquem a sua honra ou a sua reputação.

5.2. Tipo Objetivo e Consumação. A expressão “violar direitos de autor de programas de


computador” é muito geral, podendo ser enquadrados nessa imputação diversos crimes a
ele conexos, como a denominada “pirataria de software”, ou seja, a cópia desautorizada de
um programa, para uso próprio ou comercialização. Dentre esse tipo de delito amplo
podemos enquadrar diversas condutas delituosas, a seguir explicitadas: a) A divulgação do
programa computadorizado, de suas instruções técnicas, manuais etc.; b) Utilização de
modo contrário ao estipulado no contrato de um programa de computador; c) Modificações
realizadas no sistema do computador, sem a anuência do proprietário, como a retirada ou
substituição de trechos existentes nos programas, dentre outras ações delituosas que podem
ser enquadradas na modalidade descrita no art. 12 da Lei 9.609/98. Consumação e tentativa.
Consuma-se com a violação de qualquer dos aspectos dos direitos de autor de programa de
computador. Por não exigir a ocorrência de resultado naturalístico, trata-se de crime formal.
É possível a tentativa já que a conduta do agente pode se desdobrar em vários atos sendo,
assim, crime plurissubsistente.

5.3. Tipo Subjetivo. É o dolo. Não há, na figura do caput, elemento subjetivo específico,
bem como não se admite a modalidade culposa.

5.4. Sujeitos Ativo e Passivo. O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Segundo NUCCI, o
sujeito passivo é qualificado, só podendo ser o autor de programa de computador, bem
como seus herdeiros e sucessores, até o limite fixado em lei, ou seja, 50 anos (art. 2º, § 1º,
da Lei 9.609/98).

5.5. Objeto Material. É o programa de computador.

5.6. Classificação Doutrinária. De acordo com NUCCI, trata-se de crime comum, formal
(não depende de efetivo prejuízo para qualquer pessoa), de forma livre, comissivo (o verbo
250
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

indica ação), instantâneo (a consumação ocorre em momento definido), excepcionalmente


pode adquirir a forma permanente desde que a utilização indevida do programa seja
contínua, unissubjetivo ou de concurso eventual e plurissubsistente.

5.7. Figuras Qualificadas.

1) Art. 12, § 1º, da Lei 9.609/98: Reprodução não autorizada com finalidade comercial.
Análise Geral. Consiste na utilização do núcleo base da modalidade simples do caput
associado a uma maneira especial de empreendê-lo, isto é, mediante reprodução, agregada
ao especial fim de agir que consiste na finalidade de comércio. Trata-se de tipo misto
alternativo. Introduziu-se um elemento normativo do tipo, qual seja: “sem autorização
expressa do autor ou de quem o represente”. Classificação doutrinária: idem à do caput,
com a peculiaridade de que a violação de direito de autor deve se ocorrer mediante
reprodução. Consumação: ocorre com violação de direito de autor de programa de
computador mediante reprodução, total ou parcial, não autorizada.

2) Art. 12, § 2º, da Lei 9.609/98: Comércio ou guarda de programa original ou cópia não
autorizado. Análise Geral. Tipo misto alternativo. Exige especial fim de agir consistente na
finalidade de comércio. Presente elemento normativo do tipo: “com violação de direito
autoral”. ATENÇÃO: aqui não se incrimina a reprodução de programa de computador, mas
sim da circulação ou graúda de original ou cópia destes programas com a finalidade de
comércio. Consuma-se com a efetiva venda, aquisição; com a exposição à venda, ocultação
ou depósito (delitos permanentes) ou com a introdução no País de original ou cópia de
programa de computador, produzido com violação de direito autoral (delitos formais).
Admite-se a tentativa. Classificação doutrinária: é crime comum, formal (no sentido de que
não depende da realização do ato de comércio), de forma livre, comissivo, instantâneo nas
formas vender, introduzir e adquirir, mas permanente nas modalidades expor à venda,
ocultar e ter em depósito, unissubjetivo ou de concurso eventual, plurissubsistente, admite
tentativa.

5.8. Exclusões, limitações e exceções à proteção aos direitos de autor de programa de


computador. Previstos nos incisos do Art. 6º da L 9.609/98. Na esteira do entendimento da
doutrina majoritária a respeito dos crimes contra a propriedade intelectual, as hipóteses
acima arroladas configuram causas de atipicidade.

5.9. Ação Penal. Art. 12, § 3º, da Lei 9.609/98: Nos crimes previstos neste artigo, somente
se procede mediante queixa, salvo: (I) - quando praticados em prejuízo de entidade de
direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou fundação
instituída pelo poder público; (II) - quando, em decorrência de ato delituoso, resultar
sonegação fiscal, perda de arrecadação tributária ou prática de quaisquer dos crimes contra
a ordem tributária ou contra as relações de consumo. A regra é a ação penal privada, exceto
nos casos expressamente previstos no § 3º do art. 12, quando se procederá por ação pública
incondicionada. As exceções ocorrem quando o crime for cometido em prejuízo de entidade
do Poder Público ou quando do crime resultar sonegação fiscal, perda de arrecadação
tributária ou prática de crime contra ordem tributária ou contra as relações de consumo.
Percebe-se que o legislador utilizou-se de hipóteses subjetivas para a delimitação da
competência para a propositura da ação penal, principalmente no caso da perda de
251
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

arrecadação, que na prática é de difícil enquadramento.

5.10. Violação de direito de autor de programa de computador e crimes contra a ordem


tributária ou contra as relações de consumo. Art. 12, § 4º. Segundo a jurisprudência do STF,
a ação penal quanto aos crimes contra a ordem tributária independe de representação fiscal,
mas, conforme a Súmula Vinculante nº 14 do STF: Não se tipifica crime material contra a
ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento
definitivo do tributo. Assim, a ação penal respectiva somente pode ser proposta após o
esgotamento das vias administrativas.

5.11. Questões Processuais. Art. 13. Segundo NUCCI, por vistoria deve entender-se
inspeção judicial que, no caso, é facultativa, devendo preferencialmente ser realizada por
oficial de justiça com autorização judicial de busca e apreensão (nos termos do art. 240 e
seguintes do CPP), acompanhado, se as circunstâncias demandarem, de perito e policiais.
Uma vez provada a utilização indevida, deve o juiz determinar a apreensão das cópias
produzidas ou comercializadas com violação de direito autoral, além de outras versões e
derivações, em poder do criminoso ou de outra pessoa. Por isso o ideal é determinar a
realização da diligência de busca e apreensão nos moldes previstos no art. 527 do CPP.

252
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

9.C Crimes contra a administração pública praticados por


funcionário público contra a administração em geral.
Legislação: art. 318 a 327 do CP. Santo Graal 27º.

Noções Gerais: Objetividade jurídica: Administração Pública em sentido amplo.


Perseguem-se fatos que impedem ou perturbam o desenvolvimento regular da atividade do
Estado e de outros entes públicos. A condenação criminal inviabiliza o arquivamento ou
absolvição por insuficiência de provas no âmbito administrativo.

Crimes funcionais próprios: a função pública é elemento essencial do crime. A ausência


da qualidade de funcionário torna a conduta atípica. Admitem coautoria e participação pelo
intraneus (outro funcionário público) e pelo extraneus (particular pratica o crime em
conjunto com o funcionário público). Para que o particular responda pelo crime funcional, é
necessário que ele saiba que coopera com um funcionário público, sob pena de
responsabilidade objetiva.

Crime funcionais impróprios: a ausência da qualidade de funcionário público pode


configurar outro crime. Fala-se em atipicidade relativa.

Funcionários públicos para fins penais: regra geral: pessoa que exerça, a qualquer título,
ainda que transitoriamente e sem remuneração, função pública.

Funcionário público por equiparação: Alteração imposta pela lei 9.983/2000, que
ampliou o conceito de modo a contemplar que exerce cargo, emprego ou função pública em
entidade paraestatal ou trabalha para prestadora de serviço contratada ou conveniada para a
execução de atividade típica da administração pública. Tal lei, por ser mais gravosa, não
retroage.

OBS: Não se pode confundir o exercício de uma função pública (ex.: jurado/mesário –
exercício de um dever) com o encargo público (prestador de favor, e não dever). O
administrador judicial exerce mero munus/encargo público. Também exercem mero encargo
inventariante dativo, o tutor dativo e o curador dativo. Já o advogado dativo, para o STJ, é
funcionário público para fins penais, pois ele faz às vezes da Defensoria Pública, agindo em
razão de um convênio com o Estado e recebendo remuneração deste. Funcionários das
franquias da EBCT: para a doutrina majoritária, não são funcionários públicos. Funcionário
direto da EBCT: são funcionários públicos para fins penais, assim como os médicos do
SUS.

O §2º do art. 327 prevê uma majorante de pena de 1/3, se os autores do crime forem
ocupantes de cargo em comissão, função de direção ou assessoramento. Cuidado: não há
previsão de aumento de pena para ocupante de cargo ou função em autarquia. Prefeitos,
governadores e o Presidente da República incidem no aumento, pois exercem cargo/função
de direção do órgão que representam (STF, Inq. 1769-PA).

253
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Sempre que o sujeito ativo for Prefeito municipal o Código Penal funciona como norma
geral, enquanto que o DL 201/67 funciona como norma especial. Logo, somente se a
conduta não estiver prevista no DL 201/67 é que se aplica o CP.

Peculato:

O caput do art. 312 contém duas modalidades, o peculato apropriação e o peculato desvio.
O primeiro tem a significação de apossar-se, assenhorar-se, enquanto o segundo o núcleo é
desviar.

O Objeto material é amplo e recai sobre dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel.

Sujeito Ativo: Crime próprio, só podendo ser cometido por funcionário público (no sentido
amplo trazido pelo art. 327 do CP). O particular que, sabendo da qualidade funcional do
agente, concorre, de qualquer modo, para o evento, responde como partícipe do peculato,
por força do art. 30 do CP. OBS: se comprovado que o particular desconhecia a qualidade
funcional do agente, responde por apropriação indébita (art. 168 do CP).

Diretor de sindicato pratica peculato? Art. 552 da CLT faz uma equiparação objetiva. Para a
maioria da doutrina, esse artigo não foi recepcionado pela CF/88, mas STJ discorda.

Para doutrina majoritária, a posse deve ser entendida em sentido amplo, de modo a
compreender tanto posse indireta quanto à detenção.

É imprescindível o animus de apoderamento definitivo. Se agente age com animus de uso,


há o delito? Se for coisa consumível sim, se for coisa não consumível, não. Mão de obra
não é coisa, mas serviço. Assim, não existe peculato de mão de obra. OBS: Mas quando o
agente for Prefeito, o peculato de uso é sempre crime, não importando se a coisa é
consumível ou não, pois existe lei específica nesse sentido. Até o uso de mão de obra é
crime, caso o agente seja Prefeito, por previsão do DL 201/67.

Princípio da insignificância: no STF prevalece que cabe, no STJ que não cabe, pois tal
crime não resguarda apenas o aspecto material, mas principalmente a moral administrativa
(HC 115.562, DJe 21.06.2010).

Peculato-furto: subtrai ou concorre para a subtração. É imprescindível que o agente atue


valendo-se da facilidade proporcionada pela qualidade de ser funcionário. OBS: Caso o
agente não seja funcionário público, ou sendo, não se utilize das facilidades que o cargo lhe
proporciona para a subtração, incorrerá nó crime de furto (art. 155 do CP).

Peculato culposo: A reparação do dano antes da sentença irrecorrível acarreta extinção da


punibilidade. Se posterior, reduz a pena pela metade. Pratica este crime, por exemplo, o
funcionário público incumbido de fiscalizar o serviço.

Peculato mediante erro de outrem: (art. 333) Pune-se a conduta do agente que invertei; no
exercício do seu cargo, a posse de valores recebidos por erro de terceiro. O bem apoderado,
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ao contrário do que ocorre no peculato apropriação, não está naturalmente na posse do


agente, derivando de erro alheio. O erro deve ser espontâneo. Se o terceiro errou provocado
pelo funcionário público, o delito será o de estelionato.

Peculato Eletrônico: [art. 313-A - inserção de dados falsos em sistema de informações]


Trata-se de crime próprio, que somente poderá ser praticado pelo funcionário público
autorizado, isto é, aquele que estiver lotado na repartição encarregada de cuidar dos
sistemas informatizados ou banco de dados da Administração Pública. Logo, não é qualquer
funcionário público que pode cometer o presente delito, mas somente o funcionário público
autorizado a inserir, alterar ou excluir dados nos sistemas informatizados ou banco de
dados. O funcionário não autorizado que pratica o art. 313-A reponde pelo crime de
falsidade ideológica (art. 299 do CP). Por não ser autorizado, o funcionário será equiparado
ao particular.

Peculato de uso: o STF entendeu que é atípica a conduta de peculato de uso de um veículo
(bem infungível) para a realização de deslocamentos por interesse particular (STF, 2013,
Info 712). O caso concreto se referia ao uso de um veículo de serviço da prefeitura pelo
servidor para ir a motel no seu horário de almoço. OBS 1: não obstante a conduta ser
atípica, considerada como peculato de uso pelo STF, há que se observar que configura
improbidade administrativa. OBS 2: se o bem fosse fungível ou consumível estaria
caracterizado o peculato, pois haverá o fato típico na conduta do servidor que se utilizar de
dinheiro público federal para pagar suas contas pessoais, ainda que restitua integralmente a
quantidade antes que descubram. Exceção: no caso de prefeito existe lei específica DL
201/67 o determina que o uso de bem infungível também é crime.

Nomenclatura Localização Conduta nuclear


Peculato apropriação Art. 312, caput, 1ª parte Apropriar-se
Peculato desvio Art. 312, caput, 2ª parte Desviar
Peculato furto Art. 312, §1º Subtrair ou concorrer para que
seja subtraído
Peculato culposo Art. 312, § 2° Concorrer culposamente
Peculato mediante erro Art. 313 Apropriar-se após ter recebido
de outrem por erro de outrem
(Peculato-estelionato)
Peculato eletrônico Art. 313-A Inserir ou facilitar inserção; e
alterar ou excluir dados

Art. 313-B Modificar ou alterar sistema, ou


programa

255
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Questão 96 do 26º concurso: “A energia de valor econômico pode ser objetivo material do
crime de peculato”

Jurisprudência: Dar às verbas ou rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em lei.


Objeto jurídico: a regularidade da Administração Pública. “Se o orçamento fora aprovado
por decreto do próprio Poder Executivo, e não por lei, falta o requisito que o art. 315 exige
(STF, RT 617/336).

Concussão:

A conduta típica se consubstancia em exigir o agente, por si ou por interposta pessoa,


explícita ou implicitamente, vantagem indevida, abusando da sua autoridade pública como
meio de coação (metus publicae potestatis). Trata-se de uma forma especial de extorsão,
executada por funcionário público. Se o sujeito ativo for fiscal de rendas, aplica-se o art. 3º,
II, da Lei 8.137/90 (neste caso, temos um crime funcional contra a ordem tributária, e não
contra a Administração Pública. O mesmo ocorre na corrupção passiva). Prevalece que a
vantagem pode ser de qualquer natureza (sexual, moral, econômica etc.). Se a vantagem for
devida, o agente poderá praticar outro crime. Se essa vantagem devida for tributo ou
contribuição social, o delito será o de excesso de exação (art. 316, §1º, do CP). Se a
vantagem for qualquer outra, desde que devida, haverá o crime de abuso de autoridade.
Para configurar a concussão, é imprescindível que o agente tenha competência ou
atribuição para concretizar o mal que prometeu, caso contrário estará configurado o crime
de extorsão. É preciso, porém, não confundir exigência com solicitação, porque, no caso de
mero pedido, o crime será outro: corrupção passiva, previsto no art. art. 317 do CP.

Roubo Extorsão Concussão Corrupção passiva


Subtrair Constranger Exigir Solicitar
(violência) (violência) (grave ameaça) Receber
(grave ameaça) (grave ameaça) Aceitar promessa
Para corrente majoritária, o crime de concussão é formal, de modo que se consuma com a
exigência, independentemente do recebimento da vantagem. Corrente minoritária afirma
que é de mera conduta (STF, RTJ 71/651)

Corrupção passiva:

Verbo: solicitar, receber ou aceitar promessa. Se o funcionário, em razão da vantagem ou


promessa, retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever
funcional tem-se a figura qualificada, em que a pena é aumentada em um terço. Se
praticado por influência de outrem, tem-se a figura privilegiada, que não se confunde com
prevaricação pela ausência do elemento subjetivo “satisfazer interesse ou sentimento
pessoal”.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

OBS: A Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção adota uma definição ampla de
corrupção, de modo a incluir diversos crimes contra a Administração Pública. (MPF 26,
questão 97)

OBS: “Pequena doações ocasionais, como as costumeiras ‘boas festas’ de Natal ou Ano
Novo, não configuraram crime” (Capez, pag. 443).

Sujeito Ativo: o agente deve ser funcionário público (art. 327 do CP), incluindo também
aquele que, apenas nomeado, embora ainda não esteja no exercício da sua função, atue
criminosamente em razão dela.

Sujeito Passivo: Será o Estado ou, mais especificamente, a Administração Pública, bem
como a pessoa constrangida pelo agente público, desde que, é claro, não tenha praticado o
crime de corrupção ativa. OBS: Particular: O particular só será vítima se a corrupção partir
do funcionário corrupto. Se o particular oferecer ou prometer vantagem, responderá por
corrupção ativa (art. 333 do CP), um caso típico de exceção pluralista à teoria monista ou
unitária do concurso do concurso de pessoas (art. 29 do CP).

Conduta: Todas as condutas típicas acabam por enfocar a mercancia do agente com a
função pública. Existe corrupção ainda que a vantagem seja entregue ou prometida não
diretamente ao funcionário, mas a um familiar seu (mulher, filhos etc.). É imprescindível,
para a existência do crime, haver um nexo entre a vantagem solicitada ou aceita e a
atividade exercida pelo corrupto. Assim, embora funcionário público, caso não seja o
agente competente para a realização do ato comercializado, não há que se falar em crime de
corrupção, faltando-lhe um dos extremos legais constitutivos do tipo, podendo, nessa
hipótese, ocorrer exploração de prestígio, estelionato etc. No que concerne ao caráter da
vantagem indevida solicitada, recebida ou prometida, a mesma discussão travada no crime
de concussão aqui se repete. Classifica-se como imprópria a corrupção que visa a pratica de
ato legítimo, e, como própria, a que tiver por finalidade a realização de ato injusto.Se a
vantagem ou recompensa é dada ou prometida em vista de uma ação, positiva ou negativa,
futura, a corrupção denomina-se antecedente; se é dada ou prometida por uma ação,
positiva ou negativa, já realizada, chama-se subsequente.

Consumação e tentativa: Nas modalidades solicitar e aceitar promessa de vantagem, o


crime é de natureza formal, consumando-se ainda que a gratificação não se concretize. Já
na modalidade receber, 0 crime é material, exigindo efetivo enriquecimento ilícito do autor.
Admite-se a tentativa apenas na modalidade solicitar, quando formulada por meio escrito
(carta interceptada).

Causa de aumento de pena (§1°): a pena será aumentada de 1/3 se o corrupto retarda ou
deixa de praticar ato de ofício ou 0 pratica com infração do dever funcional. O que seria
mero exaurimento passou a ser considerado causa de aumento de pena (exaurimento
penalizado). Aqui, o agente cumpre o prometido, realizando a pretensão do corruptor.

Atenção: Se a violado praticada pelo agente público constitui, por si só, um novo crime,
haverá concurso formal ou material (a depender do caso concreto) entre a corrupção
passiva e a infração dela resultante. Nessa hipótese, no entanto, a corrupção deixa de ser

257
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

qualificada, pois do contrário estaríamos no campo do bis ih idem, considerando-se o


mesmo fato duas vezes em prejuízo do funcionário réu.

Corrupção passiva privilegiada (§2°): será privilegiado o crime se o agente pratica, deixa de
praticar ou retardar ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido,
pressão ou influência de outrem (art. 317, § 2.°, do CP), não percebendo qualquer vantagem
indevida.

Atenção: As condutas praticar, deixar de praticar ou retardar ato de ofício com infração de
dever funcional estão previstas tanto na corrupção passiva privilegiada (§2°) quanto na
causa de aumento de pena (§1°). O que diferencia a subsunção do fato à norma é a
existência ou não de vantagem ou promessa indevida.

Facilitação de contrabando ou descaminho: Só pode ser praticado pelo funcionário


público com o dever funcional de fiscalização ou repressão do contrabando. Trata-se de
crime próprio. O funcionário sem tal incumbência e o particular podem ser partícipes,
desde que tenham conhecimento da condição de funcionário público do autor.

Prevaricação: A prevaricação "consiste essencialmente no fato de espontaneamente o


funcionário se desgarrar do sentido de finalidade pública que deve ser a de toda a sua vida
funcional, para, no caso, em vez disto, ter a sua ação norteada para o que se lhe afigure 0
seu interesse ou lhe pareça condizente com sentimento seu, pessoal".

Caracteriza-se o tipo subjetivo pelo dolo do agente, ou seja, vontade consciente de retardar,
omitir ou praticar ilegalmente ato de ofício, acrescido do intuito de satisfazer interesse ou
sentimento pessoal (elemento subjetivo do tipo), colocando o seu interesse particular acima
do interesse público.

São três modalidades: Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício ou


praticá-lo contra disposição expressa de lei. Imprescindível demonstrar o elemento
subjetivo “satisfazer interesse ou sentimento pessoal), sendo requisito da denúncia.

A prevaricação não se confunde com a corrupção passiva privilegiada (§ 2.° do art. 317):
Nesta, o funcionário atende a pedido ou influência de outrem. Naquela (prevaricação) não
há tal pedido ou influência. 0 agente busca satisfazer interesse ou sentimento pessoal.

Prevaricação imprópria (art. 319-A):

Protege-se a administração pública contra comportamentos de funcionários que, ignorando


o seu dever funcional, colocam em risco a segurança interna e externa (da sociedade em
geral) aos presídios, não vedando o acesso dos presos a aparelhos de comunicação.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

A vedação é de aparelho telefônico, de rádio ou similar em presídios. Qualquer outro


acessório (chips, baterias, carregadores de celular), a princípio, não poderia ser objeto
material, sob pena de haver analogia in malam partem. O STJ, no entanto, já estendeu a
incriminação aos acessórios (HC 154.356/SP, DJe 18/10/2010). Trata-se de crime omissivo
próprio, de modo que não é possível tentativa. Aqui não se exige o elemento subjetivo
“para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”.

Sujeito Ativo: O sujeito ativo não poderá ser qualquer funcionário público, mas aquele que,
no exercício das suas funções, tem o dever de evitar o acesso do preso aos aparelhos de
comunicação proibidos.

Preso surpreendido com o aparelho: em princípio, pratica, falta grave, estando sujeito a
sanção disciplinar (art. 50, inc. VII, da LEP).

Particular que fornece o aparelho para o preso: comete o crime do art. 349-A do CP.

E se o funcionário, ao invés de apenas permitir o acesso ao aparelho, pessoalmente entregá-


lo ou, então, deixar de retirar do preso aparelho que já está em sua posse? Nucci, nos dois
casos, defende a tipicidade, argumentando que a expressão acesso ao aparelho não deve ser
interpretada restritivamente. "Ao contrário, merece ser dada à expressão o seu real alcance.
Portanto, se o funcionário público deixar de retirar o celular das mãos de um preso, esteja o
aparelho em uso ou não, constitui o crime previsto no art. 319-A. Do mesmo modo, se ele
mesmo,servidor público, fizer chegar às mãos do preso o referido aparelho. Embora o tipo
penal seja omissivo (deixar de cumprir seu dever de vedar o acesso), a partir do momento
em que se fornece o aparelho (atitude comissiva), está-se, logicamente, deixando de vedar o
acesso ao mesmo. Em suma, o agente público deve fiscalizar, revistar, buscar e impedir que
presos tenham ou usem qualquer meio de comunicação telefônico, de rádio ou similar. A
famosa vista grossa, que significa fingir não ver o aparelho ou sua utilização é suficiente
para, quando houver dolo, gerar o crime previsto no novo tipo penal" (Código Penal
Comentado, p. 1018).

Condescendência criminosa. Sujeito Ativo: Só pode ser o funcionário público


hierarquicamente superior ao servidor infrator. Sujeito Passivo: É o Estado ou, mais
especificamente, a Administração Pública, afetada com a conduta imoral do seu
funcionário. Conduta: A conduta criminosa punível é a de tolerar o funcionário público a
prática, por parte de seu subordinado, de infração administrativa ou penal, no exercício do
cargo, deixando de responsabilizá-lo ou, faltando-lhe tal atribuição, não comunicando a
violação à autoridade competente para aplicar a sanção. Se o superior hierárquico se omite
por sentimento outro que não indulgência, espírito de tolerância ou concordância, o crime
poderá ser outro, como, por exemplo, prevaricação ou corrupção passiva. Ressalte-se que
eventuais irregularidades praticadas pelo subordinado extra officio (fora do cargo) e
toleradas pelo superior hierárquico, não configura o crime em comento. Contém duas
modalidades: Deixar de responsabilizar subordinado que cometeu infração e não levar ao
conhecimento de autoridade competente. É crime formal. Tipo Subjetivo: É o dolo,
entendido como a vontade consciente do superior de não responsabilizar o seu funcionário

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

subordinado (ou, faltando-lhe tal atribuição, não comunicar o fato à autoridade


competente), movido pelo sentimento de indulgência (condescendência para com 0
subordinado infrator). Exige-se que o agente tenha conhecimento não apenas da infração
ocorrida, mas também da sua autoria. Consumação e tentativa: O crime se consuma no
momento em que o funcionário superior, depois de tomar conhecimento da infração,
suplanta prazo legalmente previsto para a tomada de providências contra o subordinado
infrator. Não havendo prazo, consuma-se o delito com o decurso de prazo juridicamente
relevante, a ser aquilatado pelo juiz no caso concreto.

Advocacia Administrativa: Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a


administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário. Núcleo é apadrinhar,
patrocinar. Sujeito Ativo: Só o funcionário público, nos termos do art. 327 do CP (crime
próprio). OBS: Admite-se o concurso de terceiro não qualificado, na modalidade de
coautoria ou participação, desde que conhecedor da condição funcional do agente público
(art. 30 do CP).

A advocacia administrativa exige mais do que um mero ato de encaminhamento ou


protocolado de papéis. É curial que se verifique o efetivo patrocínio de uma causa,
complexa ou não, perante a administração. OBS: A Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da
Concorrência - SBDC (Lei 12.529/2011, com início de vigência em 28/05/2012) adscreve
como crime de advocacia administrativa a conduta do ex-presidente ou ex-conselheiro do
Tribunal Administrativo de Defesa Econômica que "representar qualquer pessoa, física ou
jurídica, ou interesse perante o SBDC, ressalvada a defesa de direito próprio" no ("período
de 120 (cento e vinte) dias, contado da data em que deixar o cargo". (art. 8°, §§1° e 3°).

Na figura do caput, pouco importa se o interesse é justo. A figura qualificada incide quando
o interesse é ilegítimo ,sendo punido de forma mais grave.

Extravio, sonegação ou inutilização de livro ou documento: Conflito aparente de leis. Se


há especial fim de agir, art. 305. Se o agente não tiver a guarda ou não for funcionário, art.
307 do CP. Se a sonegação é de papel ou objeto de valor probatório, recebido pelo agente
na qualidade de advogado ou procurador, art. 356 do CP. Se o extravio, sonegação ou
inutilização acarretar pagamento indevido ou inexato de tributo ou contribuição social., art.
3º, I, da Lei 8137/90) (Delmanto).

Violação de sigilo funcional: Trata-se de crime subsidiário. Quando o segredo for


referente a interesses protegidos pela lei de Segurança Nacional, ela se aplica, em
homenagem ao princípio da especialidade. Para a ocorrência é imprescindível que o fato
revelado tenha chagado ao conhecimento do agente em razão do exercício do cargo (sob
pena de haver outro crime, como o art. 154), conforme ficou decidido no famoso julgado da
transgressão do painel eletrônico do Senado (STF, Inq. 1.879/DF, J. 10/09/2003). Com a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

edição da lei da Lei 11.343/2006, o crime que antes era tipificado pelo art. 17 da Lei
6.368/76 passou a sofrer incidência do art. 325 do CP, não tendo ocorrido a abolitio
criminis, aplicando-se, então, o art. 17 aos crimes praticados sob sua vigência, por ser
norma mais favorável e ultra ativa.

Obs.: art. 7, I, do CP: extraterritorialidade incondicionada. Art. 33, §4º, do CP: Nos crimes
contra a administração pública a progressão de regime é condicionada reparação do dano.

Jurisprudência: COMPETÊNCIA. DOCUMENTOS FALSOS. PECULATO. Trata-se de


recurso em habeas corpus contra acórdão que manteve a condenação do paciente à pena de
quatro anos e dois meses de reclusão em regime semiaberto e pagamento de 31 dias-multa,
pela suposta prática dos delitos previstos nos arts. 304 e 312, caput, do CP. Consoante os
autos, o paciente fora condenado porque teria usado cartões de ponto ideologicamente
falsos nos autos de reclamação trabalhista, além de ter-se apropriado, em proveito próprio,
de bem móvel de que tinha a posse em razão do cargo, já que teria subtraído os documentos
comprobatórios de seu horário de trabalho da autarquia municipal em que exercia a função
de superintendente. Portanto, pretende-se, em síntese, a decretação da nulidade da ação
penal que culminou com a condenação do recorrente ou, alternativamente, a redução da
pena imposta a ele. A Turma, entre outras questões, consignou que, na hipótese, no que se
refere ao delito de uso de documento falso, o juiz estadual, prolator da sentença, é
absolutamente incompetente, pelo que se impõe a anulação do édito repressivo quanto ao
ponto, facultando-se a ratificação, pela Justiça Federal (competente para o julgamento de tal
crime), dos demais atos processuais anteriormente praticados, inclusive os decisórios não
referentes ao mérito da causa. Por outro lado, quanto ao crime de peculato-apropriação,
registrou-se que, para a configuração, é imprescindível que o funcionário público se
aproprie de coisa que possua significação patrimonial, de modo que simples cartões de
ponto, embora posteriormente utilizados para pleitear verbas trabalhistas indevidas, não
podem ser considerados objeto material do mencionado ilícito porque não possuem
qualquer valor monetário, já que, por si só, não representam acréscimo ao patrimônio do
agente ou de quem quer que seja. Ressaltou-se que, mesmo não se admitindo a aplicação do
princípio da insignificância nos crimes contra a Administração Pública, o certo é que, no
peculato-apropriação, o bem objeto da conduta do funcionário público deve possuir, em si
mesmo, algum significado patrimonial, ainda que ínfimo, o que não se verifica no tocante
aos comprovantes de frequência supostamente apropriados indevidamente pelo ora
recorrente. Desse modo, constatou-se a ausência de justa causa para a ação penal no que se
refere ao crime previsto no caput do art. 312 do CP, impondo-se o trancamento da ação
penal. Precedentes citados do STF: HC 88.262-SP, DJ 30/3/2007; HC 83.006-SP, DJ
29/8/2003; do STJ: CC 109.021-RS, DJe 19/3/2010; CC 85.803-SP, DJ 27/8/2007; HC
117.722-PR, DJe 13/4/2009; HC 76.946-SP, DJe 16/3/2009, e HC 160.623-RS, DJe
6/12/2010. RHC 23.500-SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 5/5/2011. (inf. 471 – 5ª
Turma)

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

10.a. Teoria da conduta


Obras consultadas: Santo Graal 27º; Masson, Cleber. Direito Penal, Vol. 1, Ed. Método, 6
edição, 2012. SOUZA, Artur de Brito Gueiros; JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. Curso
de Direito Penal, v. 1. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012 GRECO, Rogério. Curso de Direito
Penal. 7ª ed. Rio de Janeiro: Ímpetos, 2006. PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal
Brasileiro, v. 1. 4ª ed. São Paulo: RT, 2004. SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito Penal:
parte geral. 4ª ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010.

Na concepção tripartite, crime é fato típico, ilícito e culpável. Nessa visão, sem
culpabilidade não há crime.

Fato típico Ilícito Culpável

1) conduta. - ratio cognoscendi. - É o juízo de reprovação.


2) tipicidade penal.
3) relação de causalidade. - Causas justificantes: - Elementos:
4) resultado 1) legais. 1) imputabilidade penal.
2) supralegais. 2) a potencial consciência
da ilicitude.
3) exigibilidade de conduta
diversa

Uma vez constatada a existência de conduta penalmente relevante, analisa-se as demais


categorias do conceito de delito. Caso não haja conduta penalmente relevante, é um
indiferente penal (nullum crimen sine conducta).

1. Fases evolutivas do Direito Penal: “A teoria geral do delito não foi concebida como
uma construção dogmática acabada, pelo contrário, é fruto de um longo processo de
elaboração que acompanha a evolução epistemológica do Direito Penal e apresenta-se,
ainda hoje, em desenvolvimento” (Bitencourt).

- Modelo positivista do séc. XIX (conceito clássico de delito ou científico-naturalista –


Von Liszt e Beling): fruto do pensamento filosófico da época, que pregava o positivismo
científico, o delito era entendido na sua acepção formal (juízo de fato). Havia absoluta
separação entre os elementos objetivos (tipo e injusto) e subjetivos (culpabilidade). Não
havia qualquer juízo de valor. Crítica: o objeto da ciência jurídica não pode estar limitado
tão somente ao direito positivo e, por fim, não se lhe pode atribuir simplesmente sua análise
e sistematização através do método indutivo de construção jurídica.

- Modelo neokantista (Mezger e Sauer): ruptura epistemológica na dogmática penal


262
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

(início do séc. XX). Substituiu a coerência formal de um pensamento jurídico circunscrito


em si mesmo por um conceito de delito voltado para os fins pretendidos pelo Direito
Penal e pelas perspectivas valorativas que o embasam (teoria teleológica do delito) –
“compreender e valorar”. Superação da concepção de crime como fenômeno físico,
causador de resultados naturalísticos: crime é identificado axiologicamente por
categorias jurídicas. Crítica: não deixou de ser um conceito positivista-causal, apenas
acrescentou o elemento valorativo à conduta (conceito neoclássico de delito – a norma
continuou a ser o objeto central da análise do delito).

OBS: o positivismo clássico e o neokantismo são doutrinas FENOMENOLÓGICAS,


enquanto que o finalismo é ONTOLÓGICO (preocupa-se com a investigação do ser e não
dos fenômenos).

- Finalismo (Welzel): efetiva superação do positivismo com a concepção de que o homem


é sujeito autodeterminável (livre arbítrio), precedendo a conduta a qualquer qualificação
que se queira dar; retira-se do centro da análise do Direito Penal a própria norma e coloca-
se a conduta humana. Dessa forma, (i) o conceito ontológico de ação humana é uma
atividade dirigida a um fim; e (ii) o conceito de culpabilidade é eminentemente
normativo, situando-se o dolo/culpa na própria conduta.

- Normativismo: reação ao finalismo, com base no pensamento hegeliano e neokantiano,


isto é, há certa volta à concepção positivista (neopositivista) devido à elaboração de
conceitos com base em juízos de valor, voltando a ter a norma a centralidade na teoria do
delito. Essa escola divide-se em duas modalidades: (i) normativismo funcionalista
teleológico (Roxin) – conceito de delito (dogmática) está ligado às finalidades político-
criminais do Direito Penal (preocupação de ordem prática). Cada delito possui uma
função político-criminal. (ii) normativismo funcionalista sistêmico (Jakobs) –
influenciado pela doutrina de Luhmann (autopoiesis = autoprodução) que prega a
circularidade dos sistemas biológicos e sociais, entende-se que no Direito Penal o indivíduo
não possui centralidade, mas sim a norma, de modo que a proteção é voltada ao sistema
normativo e à prevenção geral. Críticas: diante da descentralidade do homem na concepção
de Direito Penal pelas doutrinas normativistas, elas deixam de possuir caráter humanista,
legítima e democrática, passível de legitimar qualquer regime autoritário, sob o pretexto de
resguardar o sistema normativo. A doutrina critica por demais tais escolas, por entender que
não há prestígio suficiente do Estado Democrático Direito e da dignidade humana.

2. Teorias da Conduta: Majoritariamente, a doutrina divide a conduta em ação ou


omissão típica, antijurídica e culpável.

1) Conceito causal (ou clássico): conduta penalmente relevante é o comportamento humano


que causa um resultado no mundo exterior, ou que não o evita, no caso da omissão. Agir é,
com movimentos físicos, dar ensejo à causação de resultados típicos – sejam simples
movimentos corporais (crimes de mera atividade), sejam efetivas modificações no mundo
exterior (delitos materiais ou de resultado). Com a orientação neokantiana, procurou-se
adaptar o conceito de conduta ao mundo dos valores. Assim é que Regis Prado fala em
duas espécies de teorias causais: 1ª) teoria causal-naturalística: com expoentes em Liszt e
Beling, tem como ponto central a causalidade de ordem puramente objetiva (não admite
263
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

valoração). Críticas: não abrange os crimes omissivos ao dizer que conduta é ação, e não
aborda elementos subjetivos do injusto. 2ª) teoria causal-valorativa: tendo como principais
expoentes Mezger e Sauer, inspira-se na filosofia neokantiana, trazendo um conceito
valorativo de ação – o conceito de ação, bem como o de culpabilidade, passa a ser também
normativo. Críticas: conserva o conceito causal de conduta (inadequado para explicar a
omissão e a tentativa branca, da qual não resulta nenhuma alteração exterior).

A fórmula da causalidade natural não diferencia o comportamento humano de outros


eventos naturais ou de animais (seria necessária a noção de dirigibilidade do curso causal),
e traz o problema do regresso ao infinito.

2) Conceito final: com Welzel, ressalta-se que o que caracteriza o agir humano é a
capacidade de dirigir a causalidade de acordo com a sua vontade (iniciar uma conduta para
atingir determinado fim). Tornou-se a teoria preponderante na dogmática penal. Críticas:
crimes culposos, já que não há a vontade do agente em atingir qualquer resultado. Mas
Welzel reformulou sua teoria original e passou a entender que a culpa abrange a falta de um
dever objetivo de cuidado. Tentando superar esta crítica, Welzel defendeu a teoria
cibernética, na etapa final de seus estudos. Ela considera o controle da vontade.
Atualmente, trata-se esta teoria como equivalente a finalista penal.

3) Conceito social: aqui correntes voltadas a situar o conceito de ação dentro de um marco
normativo da relevância social, tendo como pano de fundo concepções causalistas ou
finalistas. Para Schmidt, partindo do causalismo, conduta seria a voluntária causação de
consequências previsíveis e socialmente relevantes. Para Wessels, há que se falar em
conduta socialmente relevante, dominada ou dominável pela vontade humana. Já para
Jescheck ação é um comportamento humano com transcendência social, englobando a ação
final e a omissão, esta a demandar um juízo normativo da expectativa de um
comportamento. Críticas: não restam atendidas as funções limitadora e de classificação
(excessivamente abstrata a expressão “fato socialmente relevante”).

4) Teoria jurídico-penal: sustentada por Francisco de Assis Toledo. Tenta superar os


entraves das teorias clássica e finalista. Para ele, “ação é o comportamento humano,
dominado ou dominável pela vontade, dirigido para a lesão ou para exposição a perigo de
um bem jurídico, ou, ainda, para a causação de uma previsível lesão a um bem jurídico”
(Masson, p. 216). Aqui a ação é tomada em seu conceito amplo, abrangendo também a
omissão.

5) Conceito negativo (funcionalismo): lastreia-se no princípio da evitabilidade, dividindo-se


principalmente em duas correntes: 1ª) Herzberg: não evitar o evitável na posição de
garantidor, o que incluiria tanto fatos comissivos como omissivos. Autor é quem não evita
um resultado evitável, quando o direito ordenou sua evitação. 2ª) Jakobs: conduta como a
causação do resultado individualmente evitável – abarcando o atuar doloso, culposo e
omissivo. A conduta como descumprimento das normas vigentes na sociedade (o que,
segundo Schunemann, é definição tautológica). OBS: Para Juarez Cirino, o princípio da
evitabilidade integra todas as categorias do conceito de crime, constituindo princípio geral
de atribuição que não pode ser tido como específico do conceito de ação.

264
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

6) Conceito pessoal de conduta (funcionalista): segundo Claus Roxin, conduta é a


manifestação da personalidade humana a ser devidamente valorada pelo Direito Penal –
engloba todo comportamento, positivo ou negativo, que expresse a personalidade do
sujeito. Nesse sentido, as hipóteses de ação que partem unicamente da massa mecânica do
homem, sem submissão ao seu “eu” não são conduta, o mesmo se dizendo de impulsos
anímico-espirituais que não se exteriorizam. Esse conceito abrange a voluntariedade da
causalidade, a finalidade de Welzel, a relevância social de Jescheck e a não-evitação de
Jakobs, cumprindo a tríade de funções exigidas pela dogmática. Artur Gueiros parece se
alinhar a essa concepção.

OBS 1: Para Juarez Cirino, contudo, há críticas: essa teoria deixa de lado a realização do
propósito, a natureza constitutiva dos atos psíquicos para a estrutura da ação humana; além
disso, há manifestações da personalidade independentes do controle do ego e indiferentes
às conveniências do superego, vindo como assaltos de pulsões instintuais reprimidas do id.

Atenção: Seja qual for a corrente adotada, em todas é indispensável o binômio vontade e
consciência para a conduta ser penalmente relevante. A vontade é o querer ativo do ser
humano, apto a desencadear movimentos corpóreos tendentes à realização dos seus
propósitos. A consciência é a possibilidade que o ser humano possui de separar o mundo
que o cerca dos próprios atos, realizando um julgamento moral das suas atitudes. Significa
ter noção clara da diferença existente entre realidade e ficção.

3. Funções da Teoria da Conduta: A teoria da conduta tem três funções: a) Função de


Classificação: Significa que a conduta deve consistir no denominador comum de todas as
formas de manifestação delitiva, seja de modo ativo ou omissivo, doloso ou culposo,
consumado ou tentado, autoria ou participação etc. b) Função de Definição (enlace ou
união): Além de determinar a si própria, a conduta condiciona o que se entende por
tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade, constituindo-se a “coluna vertebral” do delito.
c) Função de Delimitação (exclusão de indiferentes penais): Deve excluir os conceitos tidos
como penalmente irrelevantes. Trata-se de excluir certos fatos, como catástrofes naturais,
ações de animais, atos de pessoas incapazes.

4. Modalidades de conduta: Há duas modalidades de conduta: 1ª) Ação: É a conduta


comissiva, que exige um fazer. 2ª) Omissão: Há a não a realização de um comportamento
previsto no tipo penal, ou seja, é não realizar um comportamento esperado, e que pode, no
caso concreto, realizar alguma outra coisa. Divide-se em omissão própria ou pura e omissão
imprópria ou comissiva por omissão. Omissão própria ou pura: É a que se perfaz com a
simples não realização da atividade determinada pelo tipo penal incriminador. O agente
deixa de realizar o comportamento descrito pela norma mandamental. É classificado ainda
como crime de mera conduta. O agente ao não fazer o que é esperado, viola o mandamento
positivo. Omissão imprópria ou comissiva por omissão: Corresponde à hipótese em que o
agente se coloca numa posição de proteção para com o bem jurídico. Assume a função de
garantidor de que o bem jurídico não sofrerá determinada lesão. Na omissão imprópria, se
trata, na verdade, de um delito comissivo, mas, diante da posição de garantidor, o agente se
omite, respondendo, portanto, pelo delito (art. 13, §2º, do CP).

OBS 1: Ausência de Conduta: Se não há manifestação da personalidade do agente


265
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

(voluntariedade) não há conduta, que é o caso de uma coação física irresistível, ou casos de
completa inconsciência. Entretanto, há conduta nos movimentos impulsivos ou instintivos.
A consequência de ausência de conduta é a desnecessidade de ser perquirir acerca dos
demais pressupostos do crime.

OBS 2: Coação física irresistível: É também chamada de vis absoluta. É a força física
superior que retira do agente, a voluntariedade em seus atos, tornando o hipotético “autor
do fato” (coato) mero instrumento do verdadeiro autor, ou seja, do coautor. Isso porque não
há manifestação da personalidade do coato. Não se deve confundir coação física irresistível
com coação moral irresistível, haja vista que nesta última há conduta (expressão do eu),
embora esteja viciada, o que permite o reconhecimento da exculpante de inexigibilidade de
conduta diversa.

OBS 3: Atos reflexos: Atos ou movimentos reflexos são aqueles em que a inervação
muscular ou sua ausência é acarretada por estímulos dirigidos diretamente ao sistema
nervoso autônomo. O movimento reflexo pode, em certas situações, acarretar a exclusão da
conduta em situações penalmente relevantes, por exemplo, se alguém ao volante sofre
ataque epilético e vem a atropelar pedestre, que falece em consequência do atropelamento.
No entanto, tem que ser mencionado que a doutrina diferencia atos reflexos de excludentes
de conduta das reações explosivas (como raiva e ódio), que geram reações desmesuradas.
Do mesmo modo, atos reflexos não se confundem com atos rotineiros ou repetitivos. Em
ambas as situações, há voluntariedade no agir humano. Atenção: nos movimentos
semiautomáticos, que são passíveis de dominação, a conduta é penalmente relevante.

OBS 4: Estados de inconsciência: Não há conduta em determinados estados do organismos


humano que anulam o caráter pessoal da conduta, como sonambulismo, hipnose ou
narcolepsia (doença que provoca acessos repentinos de sono, transportando o enfermo a um
estado de irrealidade, permitindo-lhe, no entanto, continuar a ter movimentos e relações
com o meio ambiente). Atenção: Caso uma pessoa saiba do seu sonambulismo ou
narcolepsia e nada faça para tratá-la, em sendo praticado um crime nessas condições, a
conduta é penalmente punível, pela aplicação da teoria da actio libera in causa (ação livre
na origem)..

OBS 7: As ações em curto-circuito são reações primitivas do ser humano, nas quais existe
um estímulo externo, surgindo ações momentâneas e impulsivas ou mecanismos anímicos
profundos, bem como reações explosivas. Majoritariamente, a doutrina entende que são
condutas penalmente puníveis, pois existe um querer prévio (aplicação da teoria da
actio libera in causa). É importante diferenciar tais ações dos movimentos reflexos, este
sim impuníveis, pela inexistência de conduta.

5. Resultado: Resultado jurídico: Do ponto de vista normativo ou jurídico, resultado


compreende a lesão ou o perigo de lesão a determinando bem jurídico. Assim, não há delito
sem resultado, pois todo ato ilícito acarreta lesão ou a ameaça de lesão ao bem jurídico
(princípio da ofensividade). Resultado material: Aqui se trata da consequência da conduta
realizada. Assim, é a alteração do mundo exterior, prevista em determinados tipos penais
(delitos materiais ou delitos de resultado), mas ausente em outros. Vale ressaltar que, sob o
enfoque material, há delito sem resultado, como ocorre com os chamados delitos formais
266
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ou de mera conduta (o qual só descreve a conduta, ou, descrevendo o resultado, não é


imprescindível para a sua configuração). Em linhas gerais, no que se refere ao resultado
naturalístico, há três categorias de crimes: a) o tipo penal exige o resultado para sua
configuração (crimes materiais); b) o tipo penal descreve o resultado, mas não o exige para
sua caracterização (crimes formais ou de consumação antecipada); c) não há descrição de
resultado naturalístico, bastando a realização da conduta que se amolda à descrição (crimes
de mera conduta ou mera atividade).

6. Elementos da conduta:

267
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

10.b. Crimes contra a organização do trabalho.


Principais obras consultadas: Santo graal 27º CPR; CAPEZ, Fernando. Código Penal
Comentado. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012; GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal.
Vol. 3. 8ª. ed. Niterói: Impetus, 2011. PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal
Brasileiro. 6ª ed. Revista dos Tribunais, 2010.

Legislação básica: arts. 197 a 207 do Código Penal.

Dupla objetividade jurídica: a) proteção dos direitos individuais e coletivos dos


trabalhadores; b) proteção da própria organização do trabalho.

Competência. Embora a CF (art. 109, VI) sugira serem todos os crimes contra a
organização do trabalho de competência da Justiça Federal, tradicionalmente o STF e o STJ
fazem importante distinção. Entende-se que o art. 109, VI, da Carta deve ser conjugado
com o 109, IV. Apenas quando as condutas delituosas ofenderem o sistema de órgãos e
instituições federais destinadas a preservar coletivamente o trabalho é que haverá
competência da Justiça Federal. Quando se der violação dos direitos individuais de
trabalhadores, há competência da Justiça Estadual.

Redução a condição análoga à de escravo ou plagium (art. 149 do CP) e RE 398.041/PA. O


tipo do art. 149 do CP está na Seção que objetiva a proteção da liberdade pessoal, razão
pela qual é tradicional dizer que o bem jurídico tutelado é o status libertatis. Porém, há
recente decisão do STF que sustenta que o bem jurídico principal protegido pelo art. 149 é
a organização do trabalho coletivamente considerada e tão-somente secundária é a tutela da
liberdade pessoal. Diz-se que há conduta que ofende a dignidade da pessoa humana na
relação de trabalho, ensejando competência federal. O tema, porém, persiste polêmico.

Ver ainda o item 8 C, onde tal crime é detidamente analisado.

Características comuns dos crimes contra a organização do trabalho. A ação penal pública
incondicionada; quando a violência é destacadamente meio para a prática de algum delito
contra a liberdade do trabalho, expressamente, não há absorção (v. arts. 197, 198, 199, 200
e 203).

Considerando que são mais de 11 tipos diferentes, tratou-se aqui apenas de parte.

Atentado contra a liberdade de trabalho. Art. 197. Constranger alguém, mediante violência
ou grave ameaça: I – exercer ou não arte, ofício, profissão ou indústria, ou a trabalhar ou
não trabalhar durante certo período ou em determinados dias; II – a abrir ou fechar o seu
estabelecimento de trabalho, ou a participar de parede ou paralisação de atividade
econômica. Objeto jurídico é a liberdade de trabalho. É tipo especial em relação ao
constrangimento ilegal (art. 146 do CP). Sujeito passivo é qualquer pessoa no inciso I e o
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

proprietário do estabelecimento no inciso II, primeira parte; qualquer pessoa no inciso II,
segunda parte. O crime será único, ainda que várias sejam as vítimas, todavia, a pena
relativa à violência, a ser aplicada conjuntamente com a o art. 197, corresponderá a tantos
delitos contra a pessoa quantos forem os cometidos.

Atentado contra a liberdade de contrato de trabalho e boicotagem violenta. Art. 198.


Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a celebrar contrato de
trabalho, ou a não fornecer a outrem ou não adquirir de outrem matéria-prima ou produto
industrial ou agrícola. Há um aspecto interessante: o artigo contém duas figuras delitivas
(tipo misto cumulativo), o atentado contra a liberdade de trabalho (constranger alguém,
mediante violência ou grave ameaça, a celebrar contrato de trabalho) e a boicotagem
violenta (não fornecer a outrem ou não adquirir de outrem matéria-prima ou produto
industrial ou agrícola).

Paralisação de trabalho seguida de violência ou perturbação da ordem. Art. 200. Participar


de suspensão ou abandono coletivo de trabalho, praticando violência contra pessoa ou
contra coisa: Parágrafo único. Para que se considere coletivo o abandono de trabalho é
indispensável o concurso de, pelo menos, três empregados. O objeto jurídico é a liberdade
de trabalho. Prevalece o entendimento de que a figura inclui tanto a greve dos empregados
(abandono coletivo) quanto o lockout (suspensão), realizado pelos empregadores. O núcleo
participar exige pluralidade de pessoas (ao menos três empregados). Ocorre o crime
independentemente de a greve ser legal ou ilegal, já que o que se pune é a forma violenta.
Se for praticado mediante grave ameaça, será o crime de constrangimento ilegal.

Frustração de direito assegurado por lei trabalhista. Art. 203. Frustrar, mediante fraude ou
violência, direito assegurado pela legislação do trabalho. § 1º Na mesma pena incorre
quem: I - obriga ou coage alguém a usar mercadorias de determinado estabelecimento,
para impossibilitar o desligamento do serviço em virtude de dívida (se o trabalhador tem
restringida a sua liberdade de locomoção em razão de dívida que possui com o empregador
ou preposto, há o crime do art. 149 do CP, “redução a condição análoga de escravo”); II -
impede alguém de se desligar de serviços de qualquer natureza, mediante coação ou por
meio da retenção de seus documentos pessoais ou contratuais. § 2º A pena é aumentada de
um sexto a um terço se a vítima é menor de dezoito anos, idosa, gestante, indígena ou
portadora de deficiência física ou mental. Sendo qualquer pessoa o sujeito ativo, não é
necessário haver relação de trabalho entre o sujeito ativo e o sujeito passivo.

Aliciamento para o fim de emigração. Art. 206. Recrutar trabalhadores, mediante fraude,
com o fim de levá-los para território estrangeiro. Só se pune se houver fraude (antes
bastava o aliciamento). Ex.: Recrutar o trabalhador com falsas promessas ou prometer a

269
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

uma mulher trabalho no exterior e depois submetê-la à exploração sexual. O tipo penal fala
em recrutar trabalhadores no plural, recrutar um único trabalhador é fato atípico. Alguns
autores, como Regis Prado, sustentam o mínimo de três trabalhadores, pois, em outros
crimes, a lei foi expressa ao mencionar dois. Consumação com o simples recrutamento,
ainda que o trabalhador não saia do território nacional. Se a finalidade for aliciar o
trabalhador para levar a outro local do Brasil, será o crime do art. 207.

Aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional. Art. 207.


Aliciar trabalhadores, com o fim de levá-los de uma para outra localidade do território
nacional: § 1º Incorre na mesma pena quem recrutar trabalhadores fora da localidade de
execução do trabalho, dentro do território nacional, mediante fraude ou cobrança de
qualquer quantia do trabalhador, ou, ainda, não assegurar condições do seu retorno ao
local de origem. § 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de
dezoito anos, idosa, gestante, indígena ou portadora de deficiência física ou mental. Crime
não exige fraude! Régis Prado diz que será crime se os trabalhadores forem levados a um
local distante, pois se for local próximo (cidade vizinha) não há lesão ao bem jurídico. O
simples fato de aliciar, mesmo que com promessas reais de melhora de vida, já configura o
delito. Procura-se evitar o êxodo de mão de obra. Aliciar um único trabalhador é fato
atípico. Alguns autores, como Regis Prado, sustentam o mínimo de três trabalhadores.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

10.c. Crimes contra a administração pública praticados por


particular.
Obras consultadas: Santo Graal 27º. BALTAZAR JR, José Paulo. Crimes Federais.
Livraria do Advogado, 5a edição, 2010 e 7ª edição, 2011.

Usurpação de função pública – art. 328

Sujeito ativo: “particular que usurpa função pública, podendo o crime ser cometido
igualmente pelo funcionário, desde que aja completamente fora da área de suas atribuições,
sem relação com estas (STJ, AP 329/PB, Carvalhido, CE, u., 20.9.06). Necessário distinguir
a usurpação da função pública com a incompetência na realização desta, de modo que não
comete o crime o funcionário incompetente que pratica o ato exorbitante dos limites de suas
atribuições, como se o mesmo estivesse compreendido na órbita funcional do seu cargo.”
(BALTAZAR, 168)

Distinções: “Diferencia-se do estelionato porque neste o bem jurídico violado é o


patrimônio, enquanto no segundo protege-se a credibilidade da Administração Pública. Se o
agente, praticando ato de ofício de forma ilícita, obtém vantagem, comete usurpação de
função pública qualificada. Quando intitular-se funcionário público é meio para obtenção
indevida de vantagem econômica é estelionato.” (BALTAZAR, 170)

Simulação da qualificada de funcionário (LCP, art. 45): “A mera apresentação do agente


como funcionário público, sem a prática de qualquer ato, configura a contravenção da
simulação da qualidade de funcionário (LCP, art. 45).” (BALTAZAR, 170).

Atribuir-se falsamente autoridade para celebração de casamento – tipo especial, art. 238 do
CP.

TIPO SUBJETIVO: É o dolo de usurpar, consistente na consciente vontade de


desempenhar o agente, ilegitimamente, uma função pública, pouco importando, em
princípio, o motivo da usurpação.

Resistência – art. 329

Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo. OBS: o sujeito ativo pode ser pessoa alheia à
execução do ato legal. Ex: pai que procura resistir à prisão legítima do filho mediante
violência ou ameaça.

Conduta: A conduta se consubstancia em se opor, positivamente, à execução de ato legal,


mediante violência (emprego de força física) ou ameaça (constrangimento moral, não
necessariamente grave), contra a pessoa do funcionário executor ou terceiro que o auxilia,

271
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

representantes da força pública. OBS: É imprescindível que a oposição seja positiva, não se
considerando crime a "resistência passiva", destituída de qualquer conduta agressiva por
parte do agente (ex: a fuga, recusa em fornecer nome ou abrir portas, xingamentos),
podendo configurar, conforme o caso, crime de desobediência (art. 330), desacato (art. 331)
ou ato contravencional (art. 68 da LCP). OBS: Não configura o crime a violência contra
coisa. Não há hipótese de violência presumida. As vias de fato podem configurar violência.
OBS: Quando não há violência, pode ocorrer crime de desobediência. OBS: Deve ser
observado, também, que os atos de resistência devem ser usados para impedir o
cumprimento da ordem (durante sua execução). Se empregados antes ou após, estaremos,
certamente, diante de outro crime (arts. 129,147 ou 352, todos do CP). OBS: A Lei do
Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência -SBDC (Lei 12.529/2011, com início de
vigência em 28/05/2012) estabelece em seu art. 1 1 1 "Todo aquele que se opuser ou
obstaculizar a intervenção [judicial na empresa] ou, cessada esta, praticar quaisquer atos
que direta ou indiretamente anulem seus efeitos, no todo ou em parte, ou desobedecer a
ordens legais do interventor será; conforme o caso, responsabilizado criminalmente por
resistência, desobediência ou coação no curso do processo, na forma dos arts. 329, 330 e
344 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal".

Forma qualificada (§1°): O sucesso do opositor (frustração da realização do ato), que seria
mero exaurimento do delito, redunda em pena qualificada [resistência qualificada].

Para configurar-se o crime de resistência, o ato do funcionário precisa ser legal (TRF5,
AC153/AL, José Delgado, 2ª T., u., DOE 10.11.89). A ‘contrario sensu’, é lícita a
resistência contra ato ilegal, respondendo o agente, em tal caso, somente pela violência. Por
outro lado, a ilegalidade do ato não se confunde com a justiça ou injustiça da decisão de
que deriva, de modo que, sendo o ato regular na sua forma e se fundamente, em tese, em
preceito legal, já não é permitida a resistência.” (BALTAZAR, 171)

Não há crime no caso de oposição à prisão em flagrante levada a efeito por qualquer do
povo, na forma do art. 301 do CPP (BALTAZAR, 188 – 7ª edição).

Deve ocorrer durante ou antes a prática do ato pelo funcionário; depois somente persiste o
crime decorrente da violência.

Crime é formal, basta a prática da violência ou ameaça, o efetivo impedimento caracteriza a


forma qualificada.

Há concurso material com as penas dos respectivos atos de violência (art. 329, § 2º), apesar
de, em tese, a situação configurar hipótese de concurso formal.

No caso de crime anterior em que o uso da violência é elemento do tipo (como o roubo), há
duas correntes quanto à configuração ou não da desobediência, quando os agentes são
perseguidos logo após o delito: 1) há concurso material; 2) não há crime de desobediência,
mas simples desdobramento da violência caracterizadora do delito anterior.

São absorvidas: lesão corporal leve, desacato e desobediência.

272
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Art. 69 da Lei n.º 9.605/98: tipo especial, contra agentes de fiscalização ambiental.

TIPO SUBJETIVO – “É o dolo (TRF4, AC 20010401064378-7/RS, Fábio Rosa, u., TE, DJ


13.2.02), caracterizado ‘pela vontade livre e consciente do agente de se opor à obediência
de ato legal proveniente de funcionário público competente para executá-lo’ (TRF4, AC
20007000010365-4/PR, Germano, 7ª T., u., 24.6.03)”.

Embriaguez – “Em minha posição, é irrelevante, em caso de violência, não havendo razão
para afastar a disciplina do art. 28, II, do CP. Em caso de ameaça, poderá ser afastado o
crime pela falta de potencialidade de intimidação na ameaça do ébrio.” (BALTAZAR, 172)

Desobediência – art. 330

A posição mais tradicional é no sentido de que, por estar o crime no capítulo relativo aos
delitos praticados por particular contra a Administração em Geral, não pode ser praticado
por funcionário público no exercício das funções (STF, HC 7688/PI, Velloso, Inf. 132,
25.11.98; TRF1, HC 01019935/MT, Leite Soares, 4ª T., u., DJ 15.10.90), sendo cabível,
eventualmente, sanção de ordem administrativa ou processual (...) A segunda posição, pela
possibilidade da prática do crime por parte de funcionário público no exercício das funções,
é dominante na jurisprudência na jurisprudência atual do STJ (STJ, HC 12008/CE, Fischer,
5ª T., u., DJ 2.4.01; STJ, REsp. 422073/RS, Fischer, 5ª T., u., 23.3.04), em especial no caso
de ordem judicial (STJ, REsp. 442035/RS, Dipp, 5ª T., u., 2.9.03; STJ, REsp. 556814/RS,
Arnaldo Lima, 5ª T., u., 7.11.06). No mesmo sentido: TRF5, HC 92.05.00260/PE, Hugo
Machado, 1ª T., u. O STF, a seu turno, admitiu a possibilidade de ser cometido em questão
por Oficial de Registro de Imóveis, delegatário de função pública (HC 85911/MG, Marco
Aurélio, 1ª T., 25.10.05).” (BALTAZAR, 173).

Prefeito Municipal: pratica tipo especial contido no art. 1º, XIV, do DL 201/67.

Quanto à possibilidade de advertência no bojo de ordem escrita de autoridade, há duas


correntes: 1) pela legalidade da advertência; 2) pela impossibilidade, por configurar
constrangimento ilegal, uma vez que não cabe prisão em flagrante diante do menor
potencial ofensivo do delito.

Não configura o delito a recusa em praticar ato que possa autoincriminar o agente.

A tipicidade é afastada sempre que houver, para a mesma conduta, previsão de sanção civil,
processual ou administrativa, sem a ressalva expressa de que a infração admite,
cumulativamente, responsabilização penal (BALTAZAR, 7ª edição, 195). *(existe ressalva
no art. 453 do CPP (de modo que haverá o crime); de outro lado, não há ressalva no
dispositivo respectivo do CPC – ausência de testemunha intimada, de modo que no
processo civil, a falta não configurará o crime, mas ensejará somente a imposição de multa.

Jurisprudência do STJ: “PENAL – CRIME DE DESOBEDIÊNCIA – DETERMINAÇÃO


JUDICIAL ASSEGURADA POR SANÇÃO DE NATUREZA CIVIL – ATIPICIDADE DA

273
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

CONDUTA. As determinações cujo cumprimento for assegurado por sanções de natureza


civil, processual civil ou administrativa, retiram a tipicidade do delito de desobediência,
salvo se houver ressalva expressa da lei quanto à possibilidade de aplicação cumulativa do
art. 330, do CP. Ordem concedida para cassar a decisão que determinou a constrição do
paciente, sob o entendimento de configuração do crime de desobediência.” (HC 16.940/DF,
Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, QUINTA TURMA, julgado em 25/06/2002, DJ
18/11/2002, p. 243)

Sobre o caráter instantâneo ou permanente, há 2 correntes: 1) é permanente enquanto não


cumprida a ordem (variante: se há prazo cominado, deixa de ser permanente quando
exaurido o prazo); 2) é instantâneo.

Tipos especiais que afastam a incidência do tipo em exame:

a) exercício de atividade com infração de decisão administrativa (art. 205 do CP);

b) desobediência à ordem judicial de interdição de direito (art. 359 do CP);

c) negativa em fornecer documentos requisitados pelo MP para instruir ação civil pública
(art. 10 da Lei 7347/85);

d) deixar de cumprir, retardar ou frustrar, sem justo motivo, a execução de ordem judicial
expedida na ação civil a que alude a Lei 7853/89 (proteção aos portadores de deficiência);

e) negativa em entregar documentos requisitados pela administração fazendária (art. 1º, §


1º, da Lei 8137/90);

f) deixar de cumprir, retardar ou frustrar, sem justo motivo, a execução de ordem judicial
expedida nas ações em que for parte ou interveniente idoso (art. 101 da Lei 10.741/03);

g) desobediência no âmbito eleitoral (art. 347 do CE);

h) não cumprimento de decisões proferidas em MS, sem prejuízo das sanções


administrativas e da aplicação da lei do MS.

Ordem Ilegal – “Se a ordem é ilegal, não há crime (STJ, REsp. 66.854/DF, Cernicchiaro, 6ª
T., u., DJ 16.12.96; ...” (BALTAZAR, 175)

Desacato – art. 331

Noção: “O desacato é interpretado como uma ofensa ao funcionário assemelhando-se com a


injúria da qual constitui forma especial (Costa Jr., 1997; 03)” (BALTAZAR, 180)

Presença do funcionário: “É indispensável por ocasião da ofensa. Assim, haverá injúria, e


não desacato se for praticada por escrito, e não na presença do funcionário. Assim, por
exemplo, no caso de ofensas ao Juiz e ao Promotor contidas em petições assinadas por

274
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

advogados (STJ, RHC 923/RJ, Assis Toledo, 5ª T., u., DJ 4.2.91)” (BALTAZAR, 181). Não
se exige a presença de um terceiro. Requer nexo com o exercício da função pela vítima.

Conduta: Pode o crime ser praticado por ação (ex.: xingamento) ou omissão (ex.: não
responder a cumprimento). OBS: A Exposição de Motivos da Parte Especial do Código
Penal (item 85) esclarece: O desacato se verifica não só quando o funcionário se acha no
exercício da função (seja, ou não, o ultraje infligido propter offlcium), senão também
quando se acha extra offlcium, desde que a ofensa seja propter offlcium.

Advogado e imunidade: O STF na ADI 1127 entendeu que “a imunidade profissional do


advogado não compreende o desacato, pois conflita com a autoridade do magistrado na
condução da atividade jurisdicional.”

Sujeito ativo: 2 correntes – crime comum (funcionário tb pode praticar) ou crime próprio
(somente particular, funcionário não).

Concurso: absorve injúria, mas se houve calúnia, difamação ou injúria qualificada


(utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião ou origem) desacato é que
será absorvido.

Tipo Subjetivo: É o dolo, consistente na vontade deliberada de desprestigiar a função


exercida pelo sujeito passivo.

Consumação e tentativa: Consumando-se no momento em que o funcionário público toma


conhecimento (direto) do ato humilhante e ofensivo. Pouco importa se o funcionário
público efetivamente se sentiu menosprezado ou se agiu com indiferença (crime formal).
Sendo indispensável a presença da vítima no momento da ofensa, entende parcela da
doutrina impossível a tentativa.

Ação penal: Ação é pública incondicionada.

OBS: A Relatoria para Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos


Humanos já concluiu que as leis nacionais que estabelecem crimes de desacato são
contrárias ao artigo 13 da CADH. Desta forma, ninguém poderia ser condenado
criminalmente e ter a sua liberdade pessoal restringida por uma norma de direito interno
que colidisse com a Convenção.

Tráfico de Influência – art .332

Sujeito Ativo: O crime é comum, isto é, qualquer pessoa poderá figurar como sujeito ativo,
até mesmo funcionário público.

Sujeito passivo: Sujeito passivo será, primeiramente, o Estado. Figura também neste polo,
de modo secundário (mediato) aquele que paga pela suposta mediação (corruptor putativo).

“Para o TRF1 : ‘O comprador de prestígio, inobstante a imoralidade de sua conduta, é

275
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

sujeito passivo secundário e não coautor do crime de tráfico de influência.’ (TRF1,


0100000055595, Carlos Olavo, 4ª T., u., DJ 19.7.02)” (BALTAZAR, 183)

Tipo objetivo: O tipo traz quatro núcleos: solicitar, exigir, cobrar ou obter vantagem ou
promessa de vantagem (para si ou para outrem). O sujeito ativo pratica tais verbos
simulando ter poder de influência sobre ato de funcionário público. Assim, no crime de
tráfico de influência, o traço marcante é a expressão a pretexto de, que denota o fato de que
o agente não detém, efetivamente, a possibilidade de influenciar o funcionário, fazendo
uma verdadeira venda de fumaça. OBS: Situação diferente é se o agente que exige, solicita
ou cobra a vantagem está em conluio com o funcionário, na qual o que se tem é a
participação pelo agente no crime do funcionário público. Imagine-se que o funcionário
corrupto tem um terceiro que faz a cobrança pelo ato. Esse terceiro não faz a cobrança a
pretexto de influir e por isso responde pelo crime de corrupção passiva ou concussão em
concurso com o funcionário. OBS: A influência prometida deve ser sobre ato de funcionário
público no exercício da função (se for sobre ato de particular, poderá haver crime de
estelionato).

Atenção: No caso do crime de tráfico de influência, o funcionário que está sofrendo a


influência não sabe que a pessoa que lhe pede alguma coisa em nome de outra está
cobrando alguma vantagem dessa outra pessoa para influir.

Atenção: O crime não se confunde com a atividade de lobby, sendo atípico o ‘oferecimento
de serviço de divulgação e esclarecimento junto a parlamentares, sem exploração de
prestígio ou propaganda de capacidade de influência por condições pessoais em relação ao
agente público’ (TRF3, AC 200000399046338-0/SP, Cecília Mello, 2ª T., u., 27.11.07).”
(BALTAZAR, 184)

Consumação: Crime formal, não se exige recebimento da vantagem.

Causa de aumento: Pena é aumentada da metade se agente alega ou insinua que a vantagem
é destinada também ao funcionário.

São absorvidos: crimes de calúnia e estelionato.

Confronto: Se o tráfico indevido de influência (a influência jactanciosa) recair sobre juiz,


jurado, órgão do Ministério Público, funcionário de justiça, perito, tradutor, intérprete ou
testemunha, será tipificado de acordo com o delito previsto no art. 357, punido com
reclusão, de um a cinco anos, e multa.

Estelionato (171) Tráfico de influência ( 332) Exploração de prestígio (357)


Crime contra o patrimônio Crime contra a Crime contra a Administração
Administração Pública da Justiça
Crime comum Crime comum Crime comum
Consiste em "obter" Consiste em solicitar, exigir, Solicitar ou receber (dinheiro
vantagem ilícita em cobrar ou obter vantagem ou ou utilidade) a pretexto de

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

prejuízo alheio mediante promessa de vantagem a influir em juiz, jurado, órgão


fraude (artifício, ardilou pretexto de influir em ato do Ministério Público,
qualquer outro meio praticado por funcionário funcionário de justiça, perito,
fraudulento). público. tradutor, intérprete ou
testemunha.

O agente visa obter O agente visa obter O agente visa obter vantagem
vantagem ilícita em vantagem ilícita. ilícita.
prejuízo alheio.
Consuma-se com o duplo Consuma-se com a Consuma-se com a solicitação
resultado (vantagem ilícita solicitação, exigência, (delito formal) ou com o
e prejuízo alheio) - o cobrança (delito formal) ou recebimento (delito material).
delito é material. com a obtenção da
vantagem (delito material).

Corrupção ativa – art. 333

Noção: “A matéria é objeto de preocupação no âmbito internacional, dispondo o item a do


art. 8º da Convenção de Palermo, que trata do Crime Organizado Transnacional, o seguinte:
‘1. Cada Estado-parte adotará as medidas legislativas e outras que sejam necessárias para
caracterizar como infrações penais os seguintes atos, quando intencionalmente cometidos:
a) prometer, oferecer ou conceder a um agente público, direta ou indiretamente, um
benefício indevido, em seu proveito próprio ou de outra pessoa ou entidade, a fim de
praticar ou se abster de praticar um ato no desempenho de suas funções oficiais.’ (…)
cuida-se de exceção dualista à teoria monista, pois há um crime para o funcionário e outra
para o particular.” (BALTAZAR, 185).

Tipo objetivo: a corrupção ativa verifica-se quando alguém, por meio de promessas,
dádivas, recompensas, ofertas ou qualquer utilidade, procura induzir um funcionário
público, diretamente ou por interposta pessoa, a praticar, ou se abster de praticar ou
retardar, um ato de ofício ou cargo, embora seja conforme a lei ou contra ela. Assim,
oferecer é exibir, expor, apresentar, mostrar, dispor-se a entregar. Prometer é afirmar
entrega futura, comprometendo-se a entregar.

OBS: É mais difícil a solução, porém, quando o funcionário apenas solicitou a vantagem, e
o particular cedeu. Tenho que não poderá ser considerado autor de corrupção ativa, pois as
condutas de oferecer ou prometer pressupõem iniciativa do particular (TRF1, AC
20033400029962-5/DF, Mário Ribeiro, 4ª T., 12.6.07).

OBS: O particular será vítima secundária da corrupção ativa quando não souber da
irregularidade da proposta, como no caso em que o Procurador da Fazenda solicita a
vantagem de devedores alegando que se trata de ‘encargos’ (TRF4, AC 20050401009806-
7/PR, Tadaaqui Hirose, 7ª T., u., 1.7.08).

277
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

OBS: A solução de considerar o particular nessa circunstância sempre como vítima tem,
porém, o inconveniente de deixar impunes situações em que há um conluio, um interesse e
até uma vantagem para o particular em prejuízo da administração ou de outros cidadãos, de
modo que não há uma preservação adequada do bem jurídico. Bem por isso, caracteriza-se
a corrupção ativa em caso de oferecimento de ‘vantagem pecuniária a funcionário público,
em contraproposta ao valor por este solicitado para que deixasse de praticar ato de ofício,
consistente na lavratura de multas relativas a um imóvel de propriedade do paciente’ (STF,
HC 81303/SP, Ellen Gracie, 1ª T., u., 5.2.02, Caso da Máfia dos Fiscais.

OBS: se o particular oferece ou promete a vantagem indevida, e o funcionário a aceita,


haverá corrupção ativa e passiva. Mas atenção: a bilateralidade não é requisito para
configurar os crimes.

OBS: Ao contrário da corrupção passiva, que pode ser posterior à prática do ato, a
corrupção ativa somente se configura antes desse momento. Logo, pela locução "determiná-
lo" o particular não é alcançado pela figura típica quando ofereça ou prometa vantagem, ou
a entregue efetivamente, ao funcionário, depois de ter ele praticado o desejado ato. Ao
contrário do que acontece no art. 317 do CP, pune-se somente a corrupção ativa
antecedente, mas não a subsequente.

OBS: Não se configura a infração penal quando a oferta ou promessa tem o fim de impedir
ou retardar ato ilegal.

OBS: o particular só responderá por corrupção ativa se este oferecer ou prometer vantagem
indevida. A simples entrega de vantagem ilícita SOLICITADA por funcionário público não
configura crime. Nestes casos, o particular será vítima secundária de corrupção passiva (art.
317 do CP).

OBS: Doutrinariamente se ensina também não haver corrupção ativa nos casos em que o
particular se limita a pedir ao servidor "dar um jeitinho" ou "quebrar o galho". A respeito,
ressaltamos o teor do seguinte julgado: "A expressão 'quebrar o galho', que
costumeiramente é empregada no sentido de afastar um obstáculo, remover algum
impedimento, não completa uma infração penal, pois não encerra, só por si, a oferta de
qualquer vantagem indevida. Muitas vezes objetiva, tão-somente, pedir a razoável
compreensão do empregado público, para a obtenção do que possa se r lícito e esteja em
área de seu simples arbítrio" (RT 380/69).

Tentativa: É de difícil ocorrência, pois basta o oferecimento para que se configure o crime,
não sendo punível a mera cogitação (TRF4, AC 20007108008170-1/RS, Fábio Rosa, 7ªT.,
u., DJ 14.503).” (BALTAZAR, 186/187) – crime formal.

Causa de aumento de pena: Se o funcionário retarda, omite ou pratica o ato com infração do
dever funcional, incide causa de aumento de pena.

A Convenção da ONU contra a corrupção também prevê, em seu art. 3º, que a incidência do
tipo independe da produção de dano ou prejuízo patrimonial ao Estado.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Concurso material: possível com o contrabando e frustração do caráter competitivo do


procedimento licitatório.

Foram condenados nas penas deste tipo durante o julgamento do mensalão: José Dirceu,
José Genuíno, Delúbio Soares, Marcos Valério, entre outros.

Contrabando e descaminho – art. 334

Súmula 151/STJ: “A competência para o processo e julgamento por crime de contrabando


ou descaminho define-se pela prevenção do Juízo Federal do lugar da apreensão dos bens”.

Noção: “Embora a rubrica do art. 334 do CP mencione contrabando ou descaminho, as duas


figurar delitivas são distintas. 1) O contrabando, objeto da primeira parte do dispositivo,
consiste na importação ou exportação de mercadoria proibida, atentando contra a saúde ou
a moralidade públicas, além da administração pública. A proibição pode ser absoluta ou
relativa. A proibição absoluta, como a do cigarro, é incontornável, ainda que o importador
queira pagar todos os tributos devidos, tanto é assim que, quando o cigarro exportado é
apreendido novamente no Brasil, é destruído. A hipótese, então, é de proibição absoluta
(TFR, AC. 4.174, DJ 22.2.80; TRF1, AC 20000100015074-5/AC, 3ª T., u., 21.11.00; TRF4,
RCCR 20017002001703-6/PR, Fábio Rosa, 7ª T., u., 25.9.01; TRF4, AC 20040401044263-
1/PR, Penteado, 8ª T., u., 3.8.05). A mercadoria será relativamente proibida, quando for
necessário prévia autorização ou licença de autoridade administrativa para a introdução no
país, ocorrendo o crime na falta desta.” (BALTAZAR, 189/190). A caracterização do crime,
pois, é regulada por norma penal em branco. A modificação circunstancial das normas
complementares, no entanto, não acarreta descriminalização. 2) Já o descaminho, objeto da
segunda parte, consiste na ilusão do pagamento de tributo em operação envolvendo
mercadoria permitida, ofendendo, primordialmente, a ordem pública. O que diferencia o
descaminho da sonegação é a especificidade do tributo, envolvendo operações de
importação, exportação e consumo de mercadorias (IPI, que antes era chamado de imposto
de consumo). A depender da quantidade de mercadoria, não incide o IPI e, neste caso, não
haverá crime. A caracterização do crime independe da utilização de qualquer meio ardiloso
para a introdução da mercadoria sem o pagamento do tributo.

Legislação específica: As seguintes mercadorias são objeto de delito específico, previsto, na


maior parte dos casos, em legislação especial, afastando a incidência do tipo em questão
(contrabando do CP): moeda falsa ou alterada, peles e couros de anfíbios e répteis,
espécime animal, agrotóxicos, produto medicinal, armas, drogas, gasolina em quantidade
expressiva.

Exceção à teoria monista: Se agente for servidor público com atribuição de reprimir o
contrabando e descaminho, responde pelo delito do art. 318 do CP (exceção dualista à
teoria monista).

Quota legal para isenção de bagagem de turistas: se ultrapassada, haverá descaminho.

279
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Consumação e tentativa: Na importação ou exportação de mercadoria proibida, o crime se


consuma com passagem pelos órgãos alfandegários. Entretanto, se o agente se utilize de
meios ocultos (clandestinos), a consumação depende da transposição das fronteiras do país.
O descaminho, por sua vez, se aperfeiçoa com a liberação pela alfândega, sem o pagamento
dos impostos inerentes. Tentativa: possível (mercadoria apreendida na zona aduaneira
primária ou enquanto o agente cruza a ponte internacional).

Descaminho majorado: quando utilizada por transporte aéreo do tipo aeronave privada ou
em voo clandestino. Atenção: a majorante está limitada aos voos clandestinos, excluídos os
regulares, de carreira. Quanto a estes, existe a fiscalização aduaneira, não havendo motivo
para a agravação da pena.

Concurso de crimes: “Há crime único, e não concurso material ou formal, quando o agente
ingressa no território nacional, trazendo, simultaneamente, mercadorias cuja importação
seja proibida, o que configuraria contrabando, e outras de importação permitida, mas sem o
pagamento dos tributos devidos, o que levaria à tipificação de descaminho (TRF4, AC
9704467885/PR Fábio Rosa, 1ª T., u., 14.7.99; TRF4, AC 20007002001875-9/PR, Élcio
Pinheiro de Castro, 8ª T., u., 3.12.03; TRF4, AC 19997109000929-0, Penteado, 8ª T., u.,
23.8.06).” (BALTAZAR, 191). No caso de concurso entre as formas básicas do caput e os
delitos do § 1º, há também crime único, cuidando-se de progressão criminosa em crime de
conduta múltipla, respondendo o agente pelo último ato praticado. Na hipótese de saída de
veículo furtado para o exterior, não há incidência do tipo, competindo à Justiça Estadual o
julgamento dos delitos decorrentes. O descaminho absorve o uso de nota fiscal falsa.
Quando se verifica também violação de direito autoral, há 2 orientações: a) concurso
formal; b) subsiste apenas o delito de violação de direito autoral (de competência da Justiça
Estadual).

Objeto material: Podem ser objeto material de descaminho mercadorias de fabricação


nacional, reintroduzidas no país (STJ, CC 47649/MA, Arnaldo Lima, 3ª S., u., 24.8.05;
TRF3, AC 19996000004904-4/MS, Ramza Tartuce, 5ª T., u., 29.10.02) (BALTAZAR, 199).

Lançamento definitivo: ação penal não está subordinada a questões prejudiciais de natureza
administrativa ou fiscal, como a constituição definitiva do crédito, até porque, em se
tratando de descaminho, não há lançamento do tributo. [esse entendimento está adotando a
posição majoritária de que o descaminho é crime formal]. OBS: Crime de descaminho tem
o lançamento como condição objetiva de punibilidade? Para o crime de descaminho há
divergência quanto à condição objetiva de punibilidade, pois a 5ª Turma do STJ e a 2ª
Turma do STF entendem que o descaminho é crime formal, enquanto que a 6ª Turma
entende que é crime material. Entende-se que a posição majoritária é que é crime formal.
Logo, dispensa o lançamento.

Descaminho como crime formal ou material? Em julgamento do ano de 2013 a 5ª Turma do


STJ mudou seu entendimento, passando a entender que o crime de descaminho é crime
tributário formal. Com isso não é mais necessário a configuração do crédito tributário para
que seja proposta a ação penal, não se aplicando ao caso a súmula vinculante nº 24. Esse é
o entendimento da 2ª Turma do STF. OBS: a 6ª Turma do STJ continua entendendo,
inclusive com julgado em 2013, que o descaminho é crime tributário material.
280
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Veja quadro para memorizar essa divergência:

Crime formal Crime material


O descaminho é crime tributário FORMAL. O descaminho é crime tributário
Logo, para que seja proposta ação penal por MATERIAL.
descaminho não é necessária a prévia Logo, para que seja proposta ação penal por
constituição definitiva do crédito tributário. descaminho É necessária a prévia
constituição definitiva do crédito tributário.
Não se aplica a Súmula Vinculante 24.
Aplica-se a Súmula Vinculante 24.
O crime de descaminho se perfaz com o ato Nos crimes contra a ordem tributária
de iludir o pagamento de imposto devido previstos no art. 1º da Lei 8.137/90 a
pela entrada de mercadoria no pais. Não é constituição definitiva do crédito tributário
necessária, assim, a apuração com a fixação do valor devido e o
administrativo-fiscal do montante que consequente reconhecimento de sua
deixou de ser recolhido para a configuração exigibilidade configura condição objetiva de
do delito. punibilidade. (SV 24/STF).
Trata-se, portanto, de crime formal, e não O crime de descaminho, descrito na
material, razão pela qual o resultado da segunda figura Crimes Contra a
conduta delituosa relacionada ao quantum Administração em Geral, tem como bem
do imposto devido não integra o tipo legal. jurídico tutelado a Administração Fiscal,
configurando modalidade especial de Crime
O bem jurídico protegido pela norma em
Contra a Ordem Tributária, cuja
tela é mais do que o mero valor do imposto.
consumação também ocorre somente após
Engloba a própria estabilidade das
lançamento definitivo do crédito tributário,
atividades comerciais dentro do país,
quando a existência de tributo iludido torna-
refletindo na balança comercial entre o
se certa e seu valor líquido e exigível.
Brasil e outros países. O produto inserido
no mercado brasileiro, fruto de descaminho, STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1379695/PR,
além de lesar o fisco, enseja o comércio Rel. Min. Assusete Magalhães, julgado em
ilegal, concorrendo, de forma desleal, com 03/10/2013.
os produzidos no país, gerando uma série de
prejuízos para a atividade empresarial.
Em suma: a configuração do crime de
descaminho, por ser formal, independe da
apuração administrativo-fiscal do valor do
imposto iludido, embora este possa orientar
a aplicação do princípio da insignificância
quando se tratar de conduta isolada.
STJ. 5ª Turma. HC 218.961/SP, Rel. Min.
Laurita Vaz, julgado em 15/10/2013.
Atenção: tem que vigiar a 6ª Turma do STJ para ver como ela vai se posicionar diante da
mudança de entendimento da 5ª Turma.

281
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

MS sobre bens apreendidos: deve ser ajuizado junto ao juízo criminal, uma vez instaurada a
ação penal ou inquérito, ainda que antes o juízo cível tenha suspenso a apreensão
determinada pela administração fazendária.

Extinção da punibilidade: jurisprudência majoritária defende tese de que não se aplica ao


descaminho a causa de extinção pelo pagamento do tributo devido. A 6ª T do STJ já
afirmou, porém, que não há fundamento para distinguir tal delito dos de sonegação, de
modo que haveria extinção da punibilidade no caso de pagamento do tributo antes do
recebimento da denúncia, tendo em vista a natureza tributária do delito. [Atenção: essa
discussão não se aplica ao contrabando, pois nesse caso não se trata de uma questão
tributária, já que o produto é ilícito].

Perdimento dos bens deve ser determinado na sentença e destinação será dada pela Receita
Federal.

Info 523, STJ, 2013: Falsidade ideológica como crime-meio e pagamento do tributo devido
no descaminho: responderá apenas pelo delito de descaminho, e não por este em concurso
com o de falsidade ideológica, o agente que, com o fim exclusivo de iludir o pagamento do
tributo devido pela entrada de mercadoria no território nacional, alterar a verdade sobre o
preço desta. O pagamento do tributo extingue a punibilidade do descaminho. No caso em
que a falsidade ideológica tenha sido praticada com o fim exclusivo de proporcionar a
realização do crime de descaminho, a extinção da punibilidade quanto ao descaminho –
diante do pagamento do tributo – impede que o agente seja punido apenas pelo crime-meio.
Exaurindo-se o crime-meio pa prática do crime-fim, cuja punibilidade não mais persista,
falta justa causa para a persecução pelo crime de falso, por quanto carente de autonomia.

Entendimentos do STF e STJ sobre aplicação ou não do princípio da insignificância ao


crime de descaminho:

Foi publicada a Portaria MF nº 75, de 29/03/2012, na qual o Ministro da Fazenda


determinou, em seu art. 1º, inciso II, “o não ajuizamento de execuções fiscais de débitos
com a Fazenda Nacional, cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$ 20.000,00
(vinte mil reais).

No final de 2013 o STJ (5ª e 6ª Turmas) apreciaram o tema e decidiram que o valor de
R$20.000,00, estabelecido na Portaria MF 75/2012, NÃO PODE ser considerado para
efeitos penais, ou seja, não deve ser utilizado como novo patamar para o princípio da
insignificância nos crimes contra a ordem tributária ou para o crime de descaminho, pois o
limite de R$20.000,00 somente é aplicado quando não houver, nos autos, garantia, integral
ou parcial, útil à satisfação do crédito, assim ,se não houver garantia a execução de até
R$20.000,00 será arquivada, mas se houver, prosseguirá. Todavia, no tocante ao valor de
R$10.000,00 não existe tal condição, pois havendo ou não garantia, haverá o arquivamento
quando o valor for este. Portanto, o STJ entende pela possibilidade desde que o valor
sonegado não seja superior a R$10.000,00 (art. 20 da Lei 10.522/02).

“1. Consoante julgados do STJ e do STF, aplicável, na prática de descaminho ou de


contrabando, o princípio da insignificância quando o valor do tributo suprimido é

282
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

inferior a R$ 10.000,00. 2. As contribuições instituídas pela Lei n.º 10.865/04, nos


termos do seu art. 2º, inciso III, não incidem sobre bens estrangeiros que tenham sido
objeto de perdimento, motivo pelo qual "o montante do valor devido do crédito
tributário, referente às mercadorias estrangeiras apreendidas, deve ser calculada sem a
incidência do PIS e do COFINS" (REsp n.º 1220448/SP, Rel. Min. CELSO LIMONGI
(Desembargador convocado do TJ/SP), DJe de 18/04/2011.) 3. Agravo regimental
desprovido. (STJ, 5ª Turma, Dj01/08/2012)

O STF não enfrentou o tema em 2013. PORÉM, já enfrentou o tema em 2014 e entendeu
que se aplica o valor de R$20.000,00 previsto na Portaria MF como patamar para a
aplicação do princípio da insignificância nos crimes contra a ordem tributária.

Quadro resumo da divergência entre STJ e STF:

Atenção: Para o STF o novo limite pode ser aplicado para fatos que aconteceram ANTES
da referida Portaria por ser norma mais benéfica para o réu.

Inutilização de Edital ou Sinal – art. 336

Rasgar ou, de qualquer forma, inutilizar ou conspurcar edital afixado por ordem de
funcionário público; violar ou inutilizar selo ou sinal empregado, por determinação legal ou

283
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

por ordem de funcionário público, para identificar ou cerrar qualquer objeto. Sujeito ativo
pode também ser o funcionário quando não esteja no exercício da função. Dolo não exige
qualquer fim especial.

Subtração ou Inutilização de Livro ou Documento – art. 337

Subtrair, ou inutilizar, total ou parcialmente, livro oficial, processo ou documento confiado


à custódia de funcionário, em razão de ofício, ou de particular em serviço público. Suj.
ativo: qualquer pessoa, inclusive funcionário que não esteja no exercício da função. Tipo
especial: art. 314 (servidor como sujeito ativo) e 356 (advogado como sujeito ativo).

Sonegação de contribuição previdenciária – 337-A

O tipo ora introduzido constitui forma específica daquele do art. 1º da Lei 8.137/90,
distinguindo-se pelo objeto, que é aqui a contribuição social previdenciária, enquanto o
crime da lei especial pode recair sobre qualquer outro tributo. O delito em exame submete-
se, no geral, ao mesmo regime do crime contra a ordem tributária previsto no art. 1º da Lei
8.137/90, exigindo-se, por conseguinte, o lançamento definitivo para o oferecimento da
denúncia. (BALTAZAR, 217/218).

O STF e STJ exigem a constituição definitiva do crédito tributário para propositura da ação
penal, sob pena de carência de justa causa.

A exigência de fraude é o principal traço distintivo em relação ao crime de apropriação


indébita previdenciária. A fraude pode ocorrer quando o agente:

I - omitir de folha de pagamento da empresa ou de documento de informações


previsto pela legislação previdenciária segurados empregado, empresário,
trabalhador avulso ou trabalhador autônomo ou a este equiparado que lhe
prestem serviços; (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
II - deixar de lançar mensalmente nos títulos próprios da contabilidade da
empresa as quantias descontadas dos segurados ou as devidas pelo empregador
ou pelo tomador de serviços; (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
III - omitir, total ou parcialmente, receitas ou lucros auferidos, remunerações
pagas ou creditadas e demais fatos geradores de contribuições sociais
previdenciárias.
Além da exigência de constituição definitiva do crédito para propositura da
ação penal, o próprio CP estabelece situações em que poderá ser declarada
extinta a punibilidade do agente, não aplicada ou reduzida a pena, nos seguintes
termos:
§ 1o É extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara e confessa

284
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

as contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à


previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da
ação fiscal. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
§ 2o É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa
se o agente for primário e de bons antecedentes, desde que o valor das
contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele
estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o
mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais. (Incluído pela Lei nº
9.983, de 2000)
§ 3o Se o empregador não é pessoa jurídica e sua folha de pagamento mensal
não ultrapassa R$ 1.510,00 (um mil, quinhentos e dez reais), o juiz poderá
reduzir a pena de um terço até a metade ou aplicar apenas a de multa. (Incluído
pela Lei nº 9.983, de 2000). § 4o O valor a que se refere o parágrafo anterior
será reajustado nas mesmas datas e nos mesmos índices do reajuste dos
benefícios da previdência social. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000).
A Lei 9.983/00 introduziu, ainda, nova modalidade de extinção da punibilidade: quando
houver mera declaração antes de formalizado o ato de fiscalização por parte da Receita.

A Lei 10.684/03 e, atualmente, a 11.941/09 previram, também, hipóteses de extinção da


punibilidade pelo pagamento integral e suspensão da punibilidade pelo parcelamento da
dívida.

Princípio da insignificância é aplicável se valor do tributo sonegado for inferior ao limite


mínimo para execução judicial de dívida ativa da União.

Tipo subjetivo: dolo, não há forma culposa.

Consumação: crime material, exige efetiva supressão ou redução da contribuição


previdenciária, dá-se com o lançamento definitivo.

Absorve a falsidade, perpetrada como meio para execução da sonegação.

Admite continuidade delitiva.

“Em relação ao débito reconhecido pela Justiça do Trabalho, há duas orientações. Para a
primeira são executadas, de ofício, por aquela justiça especializada, não haveria
necessidade de lançamento por parte da autoridade fiscal, realizando-se a discussão sobre a
constituição do crédito na própria ação trabalhista, de modo que a denúncia poderia ser
proferida com base no laudo e na sentença ali elaborados, com respeito ao contraditório e
ao direito de defesa do contribuinte-denunciado (TRF4, HC 20080400012221-9, Néfi
Cordeiro, 7ª T., u. 17.6.08). Para a segunda, a existência de sentença trabalhista que
reconheceu a existência de pagamento por força da folha de pagamento não dispensa a
exigência de lançamento por parte da autoridade fiscal (TRF4, RSE 20077205004690-
2/SC, Élcio Pinheiro de Castro, 8ª T., u. 25.6.08)” (BALTAZAR, 219).

No âmbito da CCR tem-se a seguinte decisão:

285
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

“A constituição do crédito tributário, para fins de caracterização do crime do art. 337-A, do


CP, nos casos em que a existência do crédito é reconhecida em sede de sentença proferida
em reclamação trabalhista, dá-se quando da liquidação da sentença, prescindindo-se, nesse
caso, de autuação fiscal (2ª CCR, Processo 1.17.001.000148/2010-61).”

Todavia, também a CCR trouxe outra decisão onde:

“177. Processo: 1.13.000.000927/2011-05 Voto: 2447/2011 Origem: PR/AM


Relatora: Dra. Mônica Nicida Garcia
Ementa: Peças de informação. Possível crime de sonegação previdenciária. art.
337-A do CP.
Ausência de recolhimento de contribuição previdenciária. Sentença trabalhista
que reconhece a ausência de recolhimento, mas representa ao INSS para que
seja constituído o respectivo crédito previdenciário. Ausência de constituição
definitiva.
Súmula Vinculante 24 do STF. Homologação do arquivamento.
Decisão: Acolhido por unanimidade o voto da Relatora. Participaram da
votação a Dra. Raquel Elias Ferreira Dodge e o Dr. Douglas Fischer.”
Todavia, a CCR tem o seguinte entendimento para a apropriação indébita
previdenciária, cabível por analogia no caso de sonegação de contribuição
previdenciária:
“EMPREGADOR. SUPOSTA APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE VALORES
DESCONTADOS DA REMUNERAÇÃO DE EMPREGADO A TÍTULO DE
CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. CRIME DEFINIDO NO ART. 168-A,
CP. CRIME FORMAL. DESNECESSIDADE DE CONSTITUIÇÃO
DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. VALORES JÁ APONTADOS
NA SENTENÇA TRABALHISTA. 1. In casu, o Procurador oficiante arquivou
o feito ao entender adequado encaminhar imediatamente cópia dos autos à
Delegacia da Receita Federal para que insira o fato investigado na próxima
fiscalização a ser efetuada no âmbito do Município empregador, constituindo-se
ao final o crédito tributário correspondente e, se for o caso, apresentando ao
Ministério Público Federal a correspondente Representação Fiscal para Fins
Penais. 2. Ocorre que, enquanto subsistirem posições de Ministros e Turmas do
Supremo Tribunal Federal no sentido de que o delito do artigo 168-A do Código
Penal é formal e não depende da constituição definitiva do crédito tributário,
não se exigindo o esgotamento da via administrativa para a propositura da ação
penal, descabe ao Ministério Público abdicar da ação antecipadamente, por
força, inclusive, da indisponibilidade da ação penal. Precedentes desta 2ª
Câmara. 3. Ademais, no caso em apreço, a sentença trabalhista apontou os
valores constituintes da base de cálculo das contribuições não repassadas. 4.
Voto pela designação de outro membro do Parquet Federal para dar
prosseguimento à persecução penal (2ª CCR 1.35.000.000612/2009-78)”
Entendimentos do STF e STJ a respeito do tema:

286
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

“EMENTA HABEAS CORPUS. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE


CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. PRINCÍPIO DA
INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. ORDEM DENEGADA. 1. O
princípio da insignificância, cujo escopo é flexibilizar a interpretação da lei em
casos excepcionais, para que se alcance o verdadeiro senso de justiça, não pode
ser aplicado para abrigar conduta cuja lesividade transcende o âmbito individual
e abala a esfera coletiva. 2. A Portaria n.º 4.910/1999 do Ministério da
Previdência e Assistência Social, em seus arts. 1º e 4º, estabeleceu os valores
mínimos para o início do processo judicial para a cobrança dos créditos, não se
referindo, contudo, à extinção dos débitos, nem tampouco se prestando a
estabelecer critérios de aplicação do princípio da insignificância. 3. Ordem
denegada.” (HC 107041, Relator (a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma,
julgado em 13/09/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-193 DIVULG 06-10-
2011 PUBLIC 07-10-2011)
“AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. LEI
N. 11.457/2007. DELITO PREVIDENCIÁRIO. SONEGAÇÃO.
APROPRIAÇÃO INDÉBITA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.
POSSIBILIDADE. PATAMAR INFERIOR AO ESTABELECIDO NA LEI N.
10.522/2002. ACÓRDÃO A QUO EM CONSONÂNCIA COM A
JURISPRUDÊNCIA DESTE TRIBUNAL. SÚMULA 83/STJ.
1. Cinge-se a controvérsia à possibilidade de aplicação do princípio da
insignificância em relação ao crime de sonegação de contribuição
previdenciária (art. 337-A do CP) cujo débito tributário foi apurado em valor
inferior a R$ 10.000,00.
2. O Superior Tribunal de Justiça entende que a Lei n. 11.457/2007 considerou
como dívida ativa da União também os débitos decorrentes das contribuições
previdenciárias, dando-lhes tratamento semelhante ao fornecido aos créditos
tributários. Por conseguinte, não há porque fazer distinção, na seara penal, entre
os crimes de descaminho e de sonegação de contribuição previdenciária, razão
pela qual deve ser estendida a aplicação do princípio da insignificância a este
último delito quando o valor do débito não for superior R$ 10.000,00.
3. A tese esposada pelo Tribunal Regional consolidou-se em reiterados julgados
da Sexta Turma deste Tribunal (Súmula 83/STJ).
4. A violação de princípios, dispositivos ou preceitos constitucionais revela-se
quaestio afeta à competência do Supremo Tribunal Federal, provocado pela via
do extraordinário; motivo pelo qual não se pode conhecer do recurso especial,
nesse aspecto, em função do disposto no art. 105, III, da Constituição Federal.
5. O agravo regimental não merece prosperar, porquanto as razões reunidas na
insurgência são incapazes de infirmar o entendimento assentado na decisão
agravada.
6. Agravo regimental improvido.” (AgRg no REsp 1024828/SC, Rel. Ministro
SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 17/04/2012, DJe
10/05/2012)

287
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

“RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. SONEGAÇÃO DE


CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. LANÇAMENTO DEFINITIVO
DESCONSTITUÍDO POR AÇÃO DECLARATÓRIA. PENDÊNCIA DO
PROCESSO ADMINISTRATIVO EM QUE SE DISCUTE A
EXIGIBILIDADE DAS CONTRIBUIÇÕES. FALTA DE JUSTA CAUSA
PARA A AÇÃO PENAL. CONCESSÃO DA ORDEM.
1. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o
entendimento alinhavado na Súmula Vinculante n.º 24 do Supremo Tribunal
Federal aplica-se ao crime descrito no art. 337-A do Código Penal, cuja
caracterização, em razão de sua natureza material, depende da constituição
definitiva do valor sonegado. Precedentes.
2. No caso, depreende-se dos documentos juntados aos autos que ainda não
houve análise dos recursos apresentados contra a Decisão-Notificação n.º
45.20.30.25.00/0191/2077, que julgara procedente a NFDL n.º 37.060.439-3.
3. Caso a conclusão aqui alcançada se desse no bojo do recurso próprio, qual
seja, o recurso especial, a consequência não seria outra que não a absolvição
dos recorrentes. Contudo, como tal juízo tem sido reiteradamente vedado por
esta Corte na via estreita do habeas corpus ou do recurso ordinário em habeas
corpus, por demandar, necessariamente, revolvimento do conjunto fático-
probatório, a melhor solução é a concessão da ordem a fim de trancar a ação
penal. Precedentes.
4. Recurso ordinário a que se dá provimento a fim de trancar a Ação Penal n.º
2008.72.05.000291-5.” (RHC 24.876/SC, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO
BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 14/02/2012, DJe 19/03/2012).

Extinção da punibilidade (§1°): Ocorrerá caso o agente, espontaneamente, declare e


confesse as contribuições, importâncias ou valores e preste as informações devidas à
previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal.
OBS: Ao contrário do que se verifica no art. 168-A, não se exige do agente o efetivo
pagamento do tributo sonegado, mas somente o reconhecimento da omissão, com a
consequente confissão da dívida em momento anterior ao início da ação fiscal (notificação
do lançamento do tributo). Ressaltamos, todavia, que a extinção só tem cabimento quando a
confissão da dívida é espontânea, isto é, sem influência externa, não bastando ser
voluntária.

Perdão judicial ou aplicação de pena de multa (§2º): Só será possível se, cumulativamente,
o agente cumprir os seguintes requisitos: a) ser primário (não reincidente); b) ter bons
antecedentes; c) se r pequeno o valor da dívida (menor àquele estabelecido pela previdência
social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções
fiscais). OBS: Preenchidos os requisitos para concessão, é dever dó juiz conceder o perdão
ou aplicar a pena de multa. Trata-se de direito público subjetivo do réu.

288
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

11.a. Relação de Causalidade.


Obras consultadas: Santo Graal 27º; Artur Gueiros, 2012. GRECO, Rogério, Curso de
Direito Penal, Vol. I, Parte Geral, Ed. Ímpetos, 10ª edição, revista e atualizada, 2008;
BITENCOURT, Cezar Roberto, Manual de Direito Penal, Parte Geral, Ed. Saraiva, 6ª
edição, revista e atualizada, 2000.

Na concepção tripartite, crime é fato típico, ilícito e culpável. Nessa visão, sem
culpabilidade não há crime.

Fato típico Ilícito Culpável

1) conduta. - ratio cognoscendi. - É o juízo de reprovação.


2) tipicidade penal.
3) relação de causalidade. - Causas justificantes: - Elementos:
4) resultado 1) legais. 1) imputabilidade penal.
2) supralegais. 2) a potencial consciência
da ilicitude.
3) exigibilidade de conduta
diversa

Considerações Gerais: Nos crimes materiais, que dependem da superveniência de


resultado, deve-se estabelecer a relação de causalidade entre a ação e o resultado. O
resultado integra a descrição da conduta proibida e dele depende a tipicidade. O art. 13, do
CP dispõe que a existência do delito depende da ocorrência do resultado, atribuindo-o a
quem lhe deu causa, sendo a causa, a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria
ocorrido. É a teoria da equivalência dos antecedentes causais. Ressalte-se que o resultado a
que se alude é o resultado natural, no mundo real. Há duas críticas relevantes a esta teoria: a
problemática do regressus ad infinitum e os chamados cursos causais extravagantes ou
aventureiros. OBS: Não há nexo causal nos crimes omissivos puros e nos crimes de simples
atividade.

1. Conceito e teorias: O nexo causal, ou relação de causalidade, é aquele elo necessário


que une a conduta praticada pelo agente ao resultado por ela produzido. As principais
teorias sobre o tema são:

A) Teria da causalidade adequada (von Kries, von Bar): causa é a condição necessária e
adequada a determinar a produção do evento. São levadas em consideração apenas as
circunstâncias que, além de indispensáveis, sejam idôneas à causa do evento. Tal
idoneidade se baseia em um juízo de probabilidade, de regularidade estatística. Em suma,
esta teoria distingue as consequências normais das consequências anormais ou
extraordinárias, excluindo destas últimas o nexo causal. Desta feita, elimina-se o problema
do regressus ad infinitum e dos cursos causais extravagantes, haja vista que para esta

289
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

corrente causa é a condição mais adequada ao resultado. Aqui, então, utiliza-se o juízo de
prognose objetivo-posterior, ou seja, o juiz deve se colocar, objetivamente, na posição de
alguém que estivesse de posse das informações disponíveis sobre certo episódio. A crítica a
esta teoria é que a mesma se baseia em conceito de possibilidade, porém não existe a
possibilidade do evento, mas sim onde existe a realidade de um evento. OBS: De certa
forma, o §1º, do art. 13, do CP acolheu esta teoria, nas hipóteses de cursos causais
extravagantes ou aventureiros.

B) Teoria da relevância: causa é a condição relevante para o resultado. Luís Greco afirma
que só o que é objetivamente previsível é relevante. Não é relevante, por exemplo, a
conduta daquele que joga um balde d’água em uma represa completamente cheia, fazendo
com que se rompa o dique.

C) Teoria da equivalência dos antecedentes causais ou Teoria equivalência das condições ou


Teoria conditio sine qua non (von Buri): É a teoria adotada pelo Código Penal. Diz que
causa é a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. Logo, é causa de um
resultado todas as condições que colaboram para a sua produção independentemente de sua
maior ou menor proximidade ou grau de importância. Por toda a condição ser importante,
elas se equivalem. Como decidir qual condição é importante: Verifica-se se o fato
antecedente é causa do resultado a partir de uma eliminação hipotética. Se, suprimido
mentalmente o fato, vier a ocorrer uma modificação no resultado, é sinal de que aquele é
causa deste último. Este é o chamado processo hipotético de eliminação de Thyrén. Crítica
à teoria: permite considerar como causa eventos extremamente remotos, em uma regressão
ad infinitum. Outra crítica que se faz a esta teoria é que se equiparam a conexão causal e a
responsabilidade, eis que uma vez demonstrada a relação causal entre o ato de vontade do
sujeito e o resultado, aparece como certa a responsabilidade penal do agente. Desta forma,
para evitar tal regressão, devemos interromper a cadeia causal no instante em que não
houver dolo ou culpa por parte daquelas pessoas que tiveram alguma importância na
produção do resultado (teoria da imputação subjetiva).

OBS: Da superveniência causal: É sabido que no art. 13, caput, do CP, foi adotada a Teoria
da Equivalência, porém, reconhecendo suas limitações, nos parágrafos do referido artigo
estão as hipóteses irrespondíveis pela conditio sine qua non. Vale dizer, a exclusão do nexo
de causalidade quando sobrevém concausa que se situe fora do desdobramento normal do
curso causal. No que se refere às causas imprevisíveis, o §1º, do art. 13, do CP, diz que a
superveniência de causa relativamente independente rompe a imputação quando, por si só,
produziu o resultado. Vale mencionar que os cursos de causas concorrentes, também
denominadas concausas, podem ser antecedentes, concomitantes ou supervenientes. Ou
ainda, por outra ótica, com relação à origem, podem ser absoluta ou relativamente
independentes da causa original. Somente as concausas absolutamente independentes
rompem o nexo causal. As concausas relativamente independentes não rompem porque é
relativamente dependente da causa originária.

D) Teoria da imputação objetiva: busca afastar a tipicidade ainda na análise da parte


objetiva do tipo. Surge para limitar o alcance da teoria da equivalência dos antecedentes
causais sem, contudo, abrir mão desta última. O fundamento é o chamado princípio do
risco. Cria-se vários critérios valorativos (juízo de valor) para verificar se o resultado
290
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

causado pode ser atribuído ao autor como obra própria dele. Dentre as Teorias da
Imputação Objetiva, dar-se-á atenção a duas delas: a teoria do risco (Roxin) e a teoria dos
papéis (Jakobs).

Claus Roxin (Teoria do risco): parte-se da premissa de que não se pode vincular a
realidades ontológicas prévias, mas às finalidades político-criminais do Direito Penal.
Assim, sob tal enfoque, o autor vincula as categorias jurídico-penais às concepções
contemporâneas dos fins preventivos da pena. De acordo com a Teoria do Risco, então,
somente se pode imputar a determinado tipo objetivo penal o resultado causado pelo sujeito
A, se a sua conduta causou um risco não permitido ao bem jurídico. O tipo objetivo tem
dois requisitos: verificar se a realização da conduta criou um risco não permitido de lesão
ao bem jurídico, bem como se esse risco não permitido se materializou no resultado. A
partir daí, Roxin desenvolveu casos de exclusão da imputação ao tipo objetivo e ao
desenvolver a teoria, aponta quatro vertentes que impedirão a imputação objetiva: a)
criação de um risco proibido: Não ocorre quando se diminui o risco. No exemplo de Roxin,
se A empurra B para que a pedra que já iria mesmo atingir este último o atinja em região
que lhe causará menos dano, não se pode imputar a A ação típica. A conduta, na verdade,
reduz a probabilidade de uma lesão. b) criação de um risco juridicamente relevante: Se a
conduta do agente não é capaz de criar um risco juridicamente relevante, ou seja, se o
resultado por ele pretendido não depender exclusivamente de sua vontade, este deverá ser
atribuído ao acaso. Ex. A presenteia B com bilhete aéreo esperando que o avião caia. Não
há aumento significativo do risco quando não se tem o domínio do processo causal. c)
aumento do risco permitido: Se a conduta do agente não houver, de alguma forma,
aumentado o risco de ocorrência do resultado, este não lhe poderá ser imputado. O
resultado tem que ser fruto daquele risco proibido que o agente criou. d) esfera de proteção
da norma como critério de imputação: somente haverá responsabilidade quando a conduta
afrontar a finalidade protetiva da norma. Ex: se A atropela B e, com isto, a mãe de B,
sofrendo um abalo muito grande, também falece, A não será responsabilizado por esta
última morte. Resumindo: Sendo assim, resumindo a teoria de Roxin, após a verificação da
causalidade, devem ser examinados os critérios da imputação objetiva e somente então
verificar se pode atribuir o resultado a alguém. Os requisitos são: diminuição do risco (se
houver diminuição não há imputação do resultado); criação de risco juridicamente
relevante,; o incremento do risco deve estar dentro do alcance protetivo da norma

Günther Jakobs (Teoria dos papéis): fundamenta-se no argumento de que cada um de nós
exerce determinado papel na sociedade. Para a responsabilização penal deve-se aferir quem
não exerceu ou exerceu de maneira deficiente seu papel na sociedade. A partir daí, Jakobs
traça quatro instituições jurídico-penais sobre as quais desenvolve a teoria da imputação
objetiva: a) risco permitido: O risco inerente à configuração social deve ser tolerado como
risco permitido. Assim, se cada um se comporta de acordo com um papel que lhe foi
atribuído pela sociedade, mesmo que crie risco de lesão ou perigo de lesão aos bens de
terceira pessoa, se o risco se mantiver dentro dos padrões aceitos pela sociedade, advindo
da conduta algum resultado lesivo, o mesmo será imputado ao acaso. b) princípio da
confiança: As pessoas que convivem numa sociedade devem confiar umas nas outras.
Confiar que cada uma cumpra seu papel, observe seus deveres e obrigações, evitando
danos. É o que nos permite, por exemplo, atravessar um cruzamento quando o sinal está

291
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

verde, confiando que o motorista da outra pista irá parar perante o sinal vermelho. Não se
imputarão os resultados a quem obrou confiando em que outros se manterão dentro dos
limites do perigo permitido. c) proibição do regresso: Se determinada pessoa atuar de
acordo com os limites de seu papel, sua conduta, mesmo contribuindo para o sucesso da
infração penal, não poderá ser incriminada. Ex: Padeiro que, mesmo sabendo que certo
cliente comprou um pão para envenená-lo e servi-lo a um desafeto, não responderá pela
morte, pois a atividade de vender pães consiste no seu papel de padeiro. d) competência
(capacidade) da vítima: Jakobs agrupa duas situações que merecem destaque. A primeira
diz respeito ao consentimento do ofendido; a segunda, às chamadas ações a próprio risco.
Esta última se refere a infrações dos deveres de autoproteção. Assim, aquele que se dispõe a
praticar esportes radicais, sabe que corre o risco de se lesionar, não podendo tal fato ser
atribuído a seu instrutor, que agiu de acordo com sua capacidade, observando seu dever de
cuidado.

2. Espécies de causas (concausas):

As causas podem ser absoluta ou relativamente independentes. Ambas se subdividem em


preexistentes, concomitantes e supervenientes, de acordo com o tempo de sua ocorrência
em relação à conduta do agente.

Quando uma causa absolutamente independente gera o resultado, este não é atribuído à
conduta do agente, o qual responderá apenas pela tentativa.

Quando causa relativamente independente concorre para o resultado, a regra é a de que o


resultado seja atribuído também à conduta do agente, respondendo este pelo delito em sua
forma consumada, salvo no caso da causa relativamente independente que, por si só,
produzir o resultado.

Tipos: a) Causa pré-existente absolutamente independente: Ex: A, imbuído de animus


necandi, atira em B, que havia ingerido veneno antes do disparo e morre em
exclusivamente em razão do envenenamento. b) Causa concomitante absolutamente
independente: Ex: Se A e B atiram ao mesmo tempo em C, sem que aqueles estejam agindo
em concurso, comprovando-se que o disparo de A foi o que exclusivamente causou a morte
de C, tendo o tiro de B atingido a vítima no braço. c) Causa superveniente absolutamente
independente: Ex: A, imbuído do animus necandi, atira em B, causando-lhe um ferimento
que o levaria à morte, porém, o prédio onde ambos estavam desaba e B morre
exclusivamente em razão do desabamento. d) Causa preexistente relativamente
independente: Ex: A, querendo matar B e sabendo de sua condição de hemofílico, nele
desfere golpe de faca em região não letal, mas que, em razão da hemofilia, acarreta séria
hemorragia na vítima, causando-lhe a morte. e) Causa concomitante relativamente
independente: Ex (Damásio): A, imbuído de animus necandi, desfecha um tiro em B, no
exato instante que este está sofrendo um colapso cardíaco, restando provado que a lesão
contribuiu para a eclosão do êxito letal. f) Causa superveniente relativamente
independente: É aquela ocorrida posteriormente à conduta do agente e que com ela tenha
ligação. Estas se subdividem em: as que por si sós causam o resultado (Ex.: A, imbuído de
animus necandi, atira em B, que é levado para um hospital e, chegando lá, o prédio desaba,
causando sua morte, respondendo A somente pela tentativa); as que não por si sós causam o
292
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

resultado. Estas últimas são as que estão na linha de desdobramento natural da conduta do
agente (Greco). Há uma “soma de esforços”, uma “soma de energias” com a conduta do
agente, gerando o resultado (Bitencourt). Ex: A, imbuído de animus necandi, fere B com
uma lâmina enferrujada em região não letal, porém, B contrai tétano e morre. A responde
por homicídio consumado.

3. Omissão como causa do resultado: A omissão também poderá ser considerada causa do
resultado, conforme dispõe o caput do art. 13 do CP. Para tanto, o omitente deve ter o dever
jurídico de impedir, ou pelo menos tentar impedir, o resultado lesivo. Nos termos do § 2º do
art. 13 do CP, a omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para
evitar o resultado. A lei penal exige, portanto, o dever de agir e o poder agir. Os crimes
omissivos podem ser: a) Crimes omissivos próprios, puros ou simples, segundo Mirabete
“são os que objetivamente são descritos com uma conduta negativa, de não fazer o que a
lei determina, consistindo a omissão na transgressão da norma jurídica e não sendo
necessário qualquer resultado naturalístico. Para a existência do crime basta que o autor
se omita quando deve agir”. Ex: Omissão de socorro, art. 135 do CP. São normas
mandamentais. b) Crimes omissivos impróprios, comissivos por omissão ou omissivos
qualificados são aqueles em que, por sua configuração, é preciso que o agente possua um
dever de agir para evitar o resultado (há a previsão de um resultado que deve ser evitado –
nexo de evitação). Este dever é atribuído por lei a pessoas com qualidades específicas, que
são chamadas garantidores ou garantes, os quais estão elencadas no § 2º do art. 13 do CP
(tipicidade indireta/mediata, pois depende da conjugação da norma incriminadora
comissiva + art. 13, §2º). Esta espécie de crime omissivo admite tanto a inação dolosa
quanto a inação culposa como meio para se atribuir o resultado ao agente. Ex: salva vidas
que negligentemente é tardio no socorro. Encontram-se na posição de garantidor: a) tenha
por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância (Ex: a obrigação dos pais em relação a
seus filhos); b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado (Ex:
alguém em uma praia que se disponibiliza a vigiar o filho de um pai enquanto este dá um
mergulho no mar). c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do
resultado (Ex: aquele que, num acampamento, depois de acender o fogo para fazer sua
comida, não o apaga posteriormente, permitindo que se inicie um incêndio). Há divergência
doutrinária sobre a necessidade de o comportamento anterior se dar ao menos culposamente
(Luiz Regis Prado) ou se necessita ser um ilícito (Juarez Cirino) ou se não precisa nem de
dolo nem de culpa (Bitencourt), bastando que o agente tenha com sua ação proporcionado
alguma situação de risco para o resultado.

293
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

11.b. Crimes comuns, crimes de responsabilidade e improbidade


administrativa

1. Crimes de Responsabilidade (Lei nº 1.079 e Decreto-Lei nº 201/67).

Principais obras consultadas: Santo Graal 27º. Jurisprudência do STF.

Noções gerais: O DL 201 não é exclusivamente penal, trazendo também sanções de ordem
política e civil em relação a infrações cometidas por prefeitos. Embora sejam conhecidos,
impropriamente, como crimes de responsabilidade, os crimes do art.1º do DL 201/67 são
crimes comuns, ou seja, infrações de natureza penal, julgadas pelo Poder Judiciário,
independentemente de manifestação da Câmara dos Vereadores. Não devem ser
confundidos, assim, com os crimes de responsabilidade em sentido estrito, objetos do art.4º,
que têm natureza política, ou seja, de infrações político-administrativas e são julgados pelo
Poder Legislativo Municipal, puníveis com a perda do mandato. De todo modo, a expressão
é equívoca, pois o CPP a utiliza no Capítulo II do Título II do Livro II, fazendo referência,
em verdade, a crimes funcionais.

De acordo com o STF, é válida a criação de tipo penal por DL, devendo ser apreciado o
aspecto formal de acordo com a regra constitucional então vigente. Sobre a recepção do DL
201 pela CF de 1988, a súmula 496 do STF: “São válidos, porque salvaguardados pelas
Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1967, os decretos-leis
expedidos entre 24 de janeiro e 15 de março de 1967”.

Destaca-se, ainda, que o art.2º do DL 201, que atribuía a competência para julgamento do
Prefeito ao juiz singular, quando do cometimento de crimes comuns, encontra-se, nesta
parte, derrogado pelas disposições constantes do art.29, X, da CF, que a atribui ao TJ.

Bem jurídico: O bom andamento da administração pública, tanto em seu aspecto


patrimonial, quanto de respeito à moralidade administrativa. Assim, para uma primeira
corrente (STJ, 6ª Turma - HC 178774, julgado em 19/06/2012; STJ, 5ª Turma – HC
145114, julgado em 17/08/2010), o princípio da insignificância não seria aplicável, tendo
em vista que os delitos ora em comento protegem não apenas o patrimônio público, mas
também o princípio da moralidade administrativa que não comporta quantificação. Em
sentido contrário, decidiu a 2ª Turma do STF, no HC 104286, julgado em 03/05/2011, com
fundamento no princípio da proporcionalidade.

Sujeito passivo: Em regra, será o Município em si ou entidade da administração municipal


indireta. Eventualmente, poderão ser vítimas o Estado ou a União, o que determinará, no
último caso, alteração de competência.

Sujeito ativo: Cuida-se de crimes funcionais de mão própria, que somente podem ser

294
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

cometidos pelo Prefeito Municipal ou por quem esteja no exercício desse cargo (Vice ou
Presidente da Câmara de Vereadores). O término do mandato não impede que o agente seja
processado pelos fatos cometidos durante o seu exercício (S.703 do STF e S.164 do STJ).
Admitem-se, no entanto, coautoria e participação por parte de outros agentes, caso em que
a qualidade de Prefeito, por ser elementar do delito, comunica-se aos demais (art.30 do CP),
desde que cientes da especial qualidade do coautor.

Tipo subjetivo: É o dolo, em todas as modalidades, não havendo previsão de forma culposa.
Se o Prefeito concorrer culposamente para crime de terceiro, poderá, eventualmente,
responder por peculato culposo (art.312, §2º, do CP).

Jurisprudência: Passaremos a expor alguns destaques da Jurisprudência do STF acerca do


tema em estudo: “(...) se revela imprópria a locução constitucional ‘crimes de
responsabilidade’, que compreende, na realidade, infrações de caráter político-
administrativo, em oposição à expressão (igualmente inscrita no texto da Constituição)
‘crimes comuns’. Com efeito, o crime comum e o crime de responsabilidade são figuras
jurídicas que exprimem conceitos inconfundíveis. O crime comum é um aspecto da
ilicitude penal. O crime de responsabilidade refere-se à ilicitude político-administrativa. O
legislador constituinte utilizou a expressão crime comum, significando ilícito penal, em
oposição a crime de responsabilidade, significando infração político-administrativa. (...) O
Código Penal está em vigor, cuidando dos crimes contra a administração pública, que
podem ser cometidos, inclusive por Prefeitos. O Prefeito pode perfeitamente ser julgado,
pelo Tribunal de Justiça, no caso de cometer peculato, emprego irregular de verbas
públicas, concussão, prevaricação, tudo isso não é crime de responsabilidade; tudo isso é
crime comum que o Prefeito pode cometer e ser julgado pelo Poder Judiciário. Ao lado
disso, existe o crime de responsabilidade, que é uma infração político-administrativa (...)”
(ADI 4.190-MC, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, DJE de 4-8-2009). "São
da competência legislativa da União a definição dos crimes de responsabilidade e o
estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento" (STF, Súmula 722).

A Lei 1.079/50 "Define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de


julgamento". Apesar de aludir ao vocábulo "crime", o referido diploma legislativo trata, em
verdade, de infrações de natureza político-administrativa, às quais não são cominadas penas
corporais, mas sim perda do cargo (impeachment) e inabilitação para o exercício da função
pública pelo prazo de oito anos (CF, art. 52, parágrafo único). Estão sujeitos ao regime da
Lei 1.079/50 o Presidente e o Vice-Presidente da República, os Ministros de Estado, aos
Ministros do Supremo Tribunal Federal, o Procurador-Geral da República, e os
Governadores e Secretários dos Estados.3 Essa especial categoria de responsabilidade não
alcança os membros do Congresso Nacional.

"Crime de responsabilidade ou impeachment, desde os seus primórdios, que coincidem com


o início de consolidação das atuais instituições políticas britânicas na passagem dos séculos
XVII e XVIII, passando pela sua implantação e consolidação na América, na Constituição
dos EUA de 1787, é instituto que traduz à perfeição os mecanismos de fiscalização postos à
disposição do Legislativo para controlar os membros dos dois outros Poderes. Não se
concebe a hipótese de impeachment exercido em detrimento de membro do Poder
Legislativo. Trata-se de contraditio in terminis. Aliás, a Constituição de 1988 é clara nesse
295
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

sentido, ao prever um juízo censório próprio e específico para os membros do Parlamento,


que é o previsto em seu artigo 55. Noutras palavras, não há falar em crime de
responsabilidade de parlamentar". (Pet 3923 QO, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA,
Tribunal Pleno, DJe de 26-09-2008).

"No sistema atual, da Lei 1.079, de 1950, não é possível a aplicação da pena de perda do
cargo, apenas, nem a pena de inabilitação assume caráter de acessoriedade (...). A
existência, no "impeachment" brasileiro, segundo a Constituição e o direito comum (C.F.,
1988, art. 52, parag. único; Lei n. 1.079, de 1950, artigos 2., 33 e 34), de duas penas: a)
perda do cargo; b) inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública. VI. - A
renuncia ao cargo, apresentada na sessão de julgamento, quando já iniciado este, não
paralisa o processo de "impeachment" (MS 21689, Rel. Min. CARLOS VELLOSO,
Tribunal Pleno, DJ 07-04-1995).

O Dec.-Lei 201/67 trata da responsabilidade dos Prefeitos e Vereadores. Diferentemente da


Lei 1.079/50, o Dec.-Lei 201/67, em seu art. 1º, caput, faz alusão a "crimes de
responsabilidade" não para designar infrações de natureza político-administrativa, mas sim
para tipificar verdadeiros ilícitos penais. Com efeito, as condutas tipificadas no rol do art.
1º, do Dec.-Lei 201/67, são crimes comuns, sujeitos que estão ao julgamento do Poder
Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores, e são
sancionados com pena de 02 (dois) a 12 (doze) anos de reclusão, nos casos dos incisos I e
II, e com pena de 03 (três) meses a 03 (três) anos de detenção nos casos incisos III a XXIII.

Além da pena privativa de liberdade, a condenação em qualquer dos crimes definidos neste
artigo, acarreta a perda de cargo e a inabilitação, pelo prazo de 05 (cinco anos), para o
exercício de cargo ou função pública (art. 1º, § 2º). É pacífico na jurisprudência que a pena
de inabilitação não tem natureza acessória, e assim possui prazo prescricional próprio e
distinto da pena privativa de liberdade. "A pena de inabilitação para cargo ou função
pública prevista no § 2º do artigo 1º do Decreto-Lei nº 201/67 é independente e autônoma
em relação à pena privativa conjuntamente aplicada, sendo que seus prazos prescricionais
são distintos" (AI 742100 AgR, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, DJe de 29-03-
2011).

Os crimes tipificados no art. 1º, do Dec.-Lei 201/67 são crimes próprios. "Os delitos
referidos no art. 1º do Dec.-lei 201/67 só podem ser cometidos por prefeito, em razão do
exercício do cargo ou por quem, temporária ou definitivamente, lhe faça às vezes. Assim, o
presidente da Câmara Municipal, ou os vereadores, ou qualquer servidor do Município não
podem ser sujeito ativo de nenhum daqueles crimes, a não ser como co-partícipe (...)"
(RHC 107675, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, DJe de 11-11-2011). "A extinção do
mandato do prefeito não impede a instauração de processo pela prática dos crimes previstos
no art. 1º do Decreto-Lei 201/1967" (STF, Súmula 703).

"O Decreto-Lei nº 201/67 está voltado não apenas à proteção do patrimônio público como
também da moral administrativa, pelo que não há como agasalhar a óptica do crime de
bagatela" (HC 85184, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, DJ 08-04-2005).

Em sentido contrário: "Habeas Corpus. 2. Ex-prefeito condenado pela prática do crime

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

previsto no art. 1º, II, do Decreto-Lei 201/1967, por ter utilizado máquinas e caminhões de
propriedade da Prefeitura para efetuar terraplanagem no terreno de sua residência. 3.
Aplicação do princípio da insignificância. Possibilidade. 4. Ordem concedida" (HC 104286,
Rel. Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, DJe de 20-05-2011, RT v. 100, n. 909,
2011, p. 425-434).

Se o art. 1º, do Dec.-Lei 201/67, como visto, tipifica condutas que culminam na
responsabilidade penal do Prefeito, o art. 4º contempla em seus incisos um rol de infrações
político-administrativas sujeitas ao julgamento pela Câmara dos Vereadores e sancionadas
com a cassação do mandato (impeachment). Quanto aos Vereadores, o Dec.-Lei 201/67 não
prevê infrações de cunho penal, mas somente as de natureza político-administrativas
previstas no art. 7º, segundo o qual "A Câmara poderá cassar o mandato de Vereador,
quando: I - Utilizar-se do mandato para a prática de atos de corrupção ou de improbidade
administrativa; II - Fixar residência fora do Município; III - Proceder de modo incompatível
com a dignidade, da Câmara ou faltar com o decoro na sua conduta pública".

Concluída a análise jurisprudencial do STF sobre o tema, discorreremos sobre pontos


pertinentes ao concurso, inclusive com supedâneo no entendimento de nossas cortes
superiores.

Penas: Não se aplica aos crimes da lei em comento a agravante do art.61, II, g, do CP,
relativa ao abuso de poder ou violação de dever inerente ao cargo, o que configuraria dupla
valoração da mesma circunstância, que é inerente aos tipos penais (STJ, REsp. 1042595).
Entendeu-se inaplicável ao Prefeito, igualmente, a causa de aumento do §2º do art.327 do
CP (STJ, HC 17223).

Efeitos da condenação: O §2º do art.1º do DL 201/67 prevê a perda do cargo e a


inabilitação para o exercício de cargo ou função pública, eletivo ou de nomeação, pelo
prazo de cinco anos, sendo que a sua execução fica condicionada ao trânsito em julgado.
Sobre os critérios para a perda do cargo e inabilitação, para posição majoritária (STJ, HC
945828), ao contrário do que se dá com o afastamento cautelar, a perda do mandato e a
inabilitação são medidas decorrentes de mera condenação, não sendo exigida, para sua
imposição, fundamentação específica (não se aplica o regime do art.92 do CP). Os efeitos
da condenação previstos no §2º do art.1º do DL 201 são autônomos em relação à pena
privativa de liberdade, estando sujeitos, ainda, a prazos prescricionais distintos, considerado
que a duração de suspensão é de cinco anos.

Ação penal: É pública e incondicionada. A denúncia não fica subordinada a


pronunciamento prévio da Câmara de Vereadores, como deixa expresso o caput do art.1º,
estando superada a súmula 301 do STF. Se a conduta imputada ao agente constitui crime
em tese e também infração político-administrativa, ambas as responsabilidade podem
coexistir, não se falando em afronta ao art.4º do DL 201. O oferecimento da denúncia não
fica subordinado ao término do processo administrativo em trâmite no TC. Não se exige,
aliás, que tenha sido iniciado processo administrativo. Do mesmo modo, a aprovação das
contas municipais pelo TC não prejudica a ação penal.

Competência: Em regra, é do TJ. Será do TRF nos casos em que o crime seria de

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

competência da JF, por paralelismo, como consolidado na súmula 702 do STF 4 . Em caso
de transferência de verbas federais, aplicam-se a súmulas 208 e 209 do STJ 5 . A CF não
exige que o julgamento se dê pelo Plenário do Tribunal, de modo que é possível o
julgamento por órgão fracionário do TJ ou TRF, conforme dispuser o seu regimento
interno. O término do mandato não impede a instauração ou prosseguimento da ação penal,
mas implica perda do foro privilegiado, passando a competência ao magistrado de primeiro
grau (inconstitucionalidade dos §§1º e 2º do art.84 do CPP).

Rito: Atualmente, por força do disposto na Lei 8658/93, aplica-se o rito da Lei 8038/90,
caso o acusado esteja no exercício do cargo. Com o término do mandato e baixa dos autos à
primeira instância, o rito passa a ser aquele previsto no CPP, mantendo-se, porém, a
obrigatoriedade da intimação para apresentação de defesa prévia (STJ, AgREsp. 958634).

Denúncia: A competência para o se recebimento é do colegiado e não do relator, de acordo


com o art.6º da Lei 8038. Antes, porém, do advento da Lei 8658/93, tal decisão competia ao
relator, nos termos do art.557, parágrafo único, a, do CPP.

Defesa prévia: É necessária (art.2º, II, do DL 201 e art.4º da Lei 8038/90), sendo que a sua
falta é causa de nulidade absoluta.

2. A tutela penal da probidade administrativa.

Principais obras consultadas: Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves, Improbidade


Administrativa, 6ª ed., ed. Lumen Juris, 2011.

Legislação básica: Lei n. 8.429/92 e CP. Convenções da OEA e da UNU contra a


Corrupção

TUTELA PENAL DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA: Ponderação de Emerson


Garcia (p. 301/302): "É sabido que a tipificação penal dos atos de corrupção [o autor
enquadra a improbidade como espécie do gênero corrupção], tanto ativa, como passiva,
encontra-se centrada na ação de receber ou de oferecer uma vantagem, não amparada pela
ordem jurídica, associada à infração de um dever jurídico prestacional. (...) Como ambos os
envolvidos no ato de corrupção são sujeitos ativos de uma infração penal, é evidente a
dificuldade enfrentada pelos órgãos de persecução na identificação desse tipo de prática.
(...) Daí a constatação de que o combate à corrupção, no plano penal, é historicamente
ineficaz". Em face dessa dificuldade de responsabilização penal da improbidade através dos
tipos penais de corrupção ativa e passiva, o autor sustenta que o Brasil cumpra as
Convenções da OEA e da UNU contra a Corrupção e tipifique o crime de enriquecimento
ilícito, caracterizado pelos sinais exteriores de aumento patrimonial de um servidor,
incompatível com sua renda.

A responsabilização prevista na Lei n. 8.429/92 é de natureza administrativa e suas sanções

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

independem da responsabilização penal e civil (art. 12). Para apurar qualquer ilícito
previsto naquela lei, o MP, de ofício, a requerimento de autoridade administrativa ou
mediante representação formulada por interessado, poderá requisitar a instauração de
inquérito policial ou procedimento administrativo (art. 22). Constitui crime a representação
por ato de improbidade contra agente público ou terceiro beneficiário, quando o autor da
denúncia o sabe inocente, cuja pena é de detenção de seis a dez meses e multa (art. 19).

Vários atos previstos na lei como de improbidade administrativa também encontram


equivalente na legislação penal, como por exemplo: art. 9, inciso I, equivale ao crime de
corrupção passiva; art. 9, inciso IV, e o art. 10, inciso I, ao crime de peculato; art. 9, inciso
V, e o art. 11, II, ao crime de prevaricação; art. 9, inciso VI, ao de falsidade ideológica; art.
10, inciso VIII, ao do art. 89 da Lei n. 8.666/93, etc.

299
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

11.c. Crimes contra a administração da Justiça.


Obras consultadas: Santo graal 27º. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito
Penal: parte 5. 4ª ed. Editora Saraiva. 2010. BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Crimes
Federais. 6ª ed. Editora Livraria do Advogado.2010. CUNHA, Rogério Sanches. Código
Penal para Concursos. 4ª ed. Editora JusPodivm. 2011. www.stj.jus.br. Uso de celular em
presídio passa a ser crime na proposta do novo Código Penal. Notícia do dia 07.05.2012.
http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?
tmp.area=398&tmp.texto=94935&tmp.area_anterior=44. Acessado em 18.05.2012.
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=121244. Acessado em
18.05.2012..

Legislação básica: arts. 338 a 359 do Código Penal.

Está inserido dentro do título “DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO


PUBLICA”. Tratam-se de tipos penais onde se criminalizou condutas que “atingem a
justiça como instituição e como função, prejudicando-a em sua realização prática e
ofendendo lhe o prestígio e a confiança que deve imperar”.

Considerando que são mais de 20 tipos diferentes, tratou-se apenas da maior parte deles e
de maneira muito sintética.

Reingresso de Estrangeiro Expulso – Art. 338

1) SUJEITO ATIVO: O estrangeiro expulso. É delito de mão própria (para Bitencourt), mas
há quem diga ser crime próprio.

2) TIPO OBJETIVO: Reingressar no território nacional. Reingresso significa volta, retorno.


A expressão território há de ser interpretada estritamente, correspondendo ao espaço onde o
estado exerce sua soberania, incluindo o espaço aéreo e o mar territorial. Segundo Damásio,
para os fins desse artigo, não se considera o território por ficção mencionado no art. 5º, §1º,
do Código Penal. Bitencourt e Mirabete lecionam contrariamente, considerando também o
território por extensão ou flutuante.

De acordo com Bitencourt, o crime é instantâneo de efeitos permanentes, consumando-se


no momento em que o agente penetra em qualquer ponto do território nacional (há
precedentes no STJ dizendo que é permanente – STJ, CC 40338/RS, DJU 21.03.2005).

4) TIPO SUBJETIVO: Dolo genérico.

5) CONSUMAÇÃO: O crime é consumado no momento em que o agente, regularmente


expulso do nosso país, para cá retorna. É preciso haver o reingresso, não configurando o
crime a recusa do estrangeiro expulso em deixar o país. Ainda que a expulsão seja injusta,

300
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

tal fato não exclui o dolo, pois basta a regularidade formal e a execução legal do ato do
Presidente. Trata-se de crime de mão própria (o nacional pode ser partícipe); formal; admite
tentativa, de forma livre; comissivo; unissubjetivo; plurissubsistente.

6) COMPETÊNCIA. Da Justiça Federal, conforme art. 109, X, da CF.

Denunciação caluniosa – Art. 339.

Também chamada de calúnia qualificada.

1) SUJEITO ATIVO: Qualquer pessoa (crime comum), inclusive autoridades policiais,


promotores , juízes, e advogados (RT 658/285).

3) TIPO OBJETIVO: Dar causa (provocar) à instauração de investigação policial, de


processo judicial, de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade
administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente.

4) TIPO SUBJETIVO: Dolo, somente na sua forma direta. O agente há de ter consciência
clara de que a vítima é inocente. Além deste requisito, é preciso que haja a individualização
da pessoa acusada e a definição dos delitos falsamente imputados. Não se trata de crime
complexo (fusão de dois tipos legais) e sim de crime progressivo (para atingir o resultado
pratica-se crime menor que fica absolvido). O investigado que nega autoria imputando
falsamente o delito a terceiro pratica crime de denunciação caluniosa, embora haja
divergência na jurisprudência. Ainda que o fato imputado seja impunível penalmente,
poderá ocorrer o presente crime se der causa à instauração de procedimento adm. Ao
contrário da calúnia, não se pune a denunciação caluniosa contra mortos. Embora haja
discussão, entende-se majoritariamente (inclusive o Bitencourt) que é preciso haver o
arquivamento do procedimento a que o agente injustamente deu causa.

5) CONSUMAÇÃO. Com a deflagração das diligências investigativas, dispensando a


instauração do inquérito, ou com a instauração dos demais procedimentos elencados no
tipo. Se o agente apenas comunica à autoridade crime ou contravenção que sabe não se ter
verificado, mas não imputa a nenhuma pessoa determinada ou imputa a pessoa fictícia,
ocorrerá o crime de comunicação falsa (art. 340) e não de denunciação caluniosa.

Auto-acusação falsa: Art. 341:

1) BEM JURÍDICO PROTEGIDO: A administração da justiça, evitando que, por fantasia


ou para proteger terceiro, o agente possa dar-se como autor de crime inexistente, ou assumir
responsabilidade de delito que não praticou (auto-calúnia). Diferente dos crimes
antecedentes (arts. 339 e 340), a auto-acusação falsa não pode ser objeto de contravenção
penal, pois o tipo fala somente em crime.

2) SUJEITO ATIVO: Qualquer pessoa (crime comum).


301
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

3) TIPO SUBJETIVO: Dolo direto, para Fragoso. Nucci menciona ainda o elemento
subjetivo do injusto consistente na vontade de prejudicar a administração da justiça.

Falso testemunho ou falsa perícia. Art. 342.

1) SUJEITO ATIVO: Testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete. Trata-se de crime


de mão própria (de atuação pessoal ou conduta infungível). Admite-se participação nos
crime de mão própria (posição majoritária no STF), como em alguns casos de advogado
que induz testemunha a mentir. No delito de falta perícia, quando esta for subscrita por
mais de um expert, pode haver inclusive co-autoria neste crime de mão própria. Há grande
discussão a respeito da possibilidade do informante (testemunha não compromissada, arts.
206 e 208 CPP) ser responsabilizado por tal crime. Nélson Hungria, Magalhães Noronha,
Luiz Regis Prado entendem que sim (predominando este entendimento segundo Baltazar
Júnior), uma vez que a lei não distingue e sem a necessidade de falar a verdade, o seu
testemunho seria inútil (RT 321/71, 392/155, 415/63). Ademais, o compromisso não
entrega mais o tipo, e o depoimento também forma a convicção do juiz. STJ já decidiu
neste sentido, porém afastou a culpabilidade da esposa que mentiu para ajudar o marido no
processo criminal, por entender que não podia ser-lhe exigida a verdade naquela situação
(HC 92.836-SP, DJ. 27/04/2010, Inf. 432). Mirabete, Heleno Fragoso, Nucci e Bitencourt
discordam, pois a lei não submete o informante ao compromisso de dizer a verdade,
devendo o juiz receber as suas palavras como meras informações, não havendo prejuízo ao
seu livre convencimento motivado (RT 597/333, 607/305, 693/348, 710/267). Não responde
pelo crime o partícipe ou co-autor do crime que é objeto do processo em que prestado o
depoimento falso, ainda que não tenha sido denunciado por ser menor (STJ, RHC
16248/SP, 25.04.06). A vítima ou ofendido (art. 201 CPP) por não ser testemunha, não
pratica este crime e sim, no máximo, a denunciação caluniosa, por exemplo. Pelo projeto do
novo CP, que ainda está sendo elaborado, a vítima passaria a ter que dizer a verdade,
podendo ser responsabilizada pelo presente delito.

2) TIPO OBJETIVO: fazer afirmação falsa, negar ou calar a verdade (crime de ação
múltipla), podendo ocorrer inclusive em juízo arbitral. Se o crime se der em Comissão
Parlamentar de Inquérito (CPI), a conduta estará tipificada no art. 4º, II, da Lei 1.579/52.
Há bastante divergência nos casos em que a mentira recai sobre a sua identificação
(qualificação). Para Magalhães Noronha e Nélson Hungria, há crime, pois influencia o
próprio mérito, lesionando o bem jurídico protegido. Heleno Fragoso e Mirabete discordam
argumentando que a falsidade não seria sobre os fatos da causa e sim sobre a condição
pessoal da testemunha, podendo incidir no crime do art. 307 do CP. Luiz Regis Prado e
Bitencourt defendem a importância da qualificação correta, porém por esta não fazer parte
do depoimento (declaração cognitiva dos fatos da causa), não há ocorrência do presente
crime.

3) TIPO SUBJETIVO: Dolo. Não haverá dolo se agente faltar com a verdade em
decorrência de um defeito de percepção da realidade, sem a intenção de enganar (erro ou
ignorância). A falsidade não se extrai da comparação entre o depoimento e a realidade dos
fatos (teoria objetiva) e sim do contraste do depoimento e a ciência da testemunha (teoria
302
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

subjetiva).

4) CONSUMAÇÃO. No momento que termina o depoimento, lavrando a sua assinatura ou


na entrega do laudo, parecer ou documento, independentemente de efetivo prejuízo à Adm.
da Justiça, bastando a potencialidade do dano (crime formal - STJ, HC 73059/SP,
17.05.07). Em caso de carta precatória, a consumação se dá no local do depoimento mendaz
(STJ, CC 30309/PR, 28.11.01). A tentativa é admissível para os depoimentos escritos e
perícias. Se o perito, contador, tradutor ou interprete solicita, recebe ou aceita promessa de
vantagem, mas não nega a verdade, incorrerá no crime de corrupção passiva, pois a falsa
perícia exige a efetiva afirmação falsa.

5) CAUSA DE AUMENTO DE PENA (§1º). Quando praticado mediante suborno, para


produzir efeitos em processo penal ou em processo civil em que for parte entidade da Adm.
Pub. direta ou indireta. Quem suborna pratica o crime do art. 343 do CP; se utilizar de
violência ou grave ameaça, o delito será o de coação no curso do processo (art. 344).

6) EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE (§2º). Para haver a retratação, não basta confessar o


crime, é preciso retirar o que se afirmou falsamente ou revelar o que ocultou, demonstrando
sincero arrependimento. Não pode ser feita a retratação após a publicação da sentença,
ainda que anteriormente ao seu trânsito em julgado (RT 565/312, 602/339, 641/314). A
retratação comunica-se aos partícipes, porque “o fato deixa de ser punível” (entretanto,
Bitencourt discorda por entender ser uma circunstância subjetiva, de caráter pessoal).

7) AÇÃO PENAL. É pública incondicionada, embora haja decisões condicionando o seu


ajuizamento ao término do processo em que se deu o depoimento, em razão da
possibilidade da retratação (RT 321/71). Contudo, há posicionamento em contrário, pois o
falso testemunho não se consuma com o fim da oportunidade da retratação (é crime
formal), sendo esta apenas uma causa extintiva da punibilidade (e não excludente do
crime), tratando-se de condição resolutiva e não suspensiva. Porém, para haver condenação,
é preciso estar preclusa a possibilidade de retratação (STJ, REsp 596500/DF, 21.10.04; STJ,
HC 73059/SP, 17.05.07). Há ainda duas outras correntes, a saber: uma que defende a
possibilidade de início e conclusão da ação que apura o falso testemunho antes de prolatada
a sentença no processo anterior; outra que exige a sentença para o início da ação pelo falso
testemunho, mas não o seu trânsito em julgado.

8) COMPETÊNCIA. Compete à Justiça Federal o julgamento do falso testemunho ocorrido


na Justiça do Trabalho (súmula 165 do STJ), na justiça eleitoral, na justiça estadual, no
exercício da competência federal delegada, e na justiça federal (mesmo quando declinado
posteriormente para a Just. Est.).

Fraude processual. Art. 347:

Também chamado de estelionato processual.

1) SUJEITO ATIVO: qualquer pessoa (crime comum), inclusive vítima, acusado ou

303
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

advogado, tendo ou não interesse no processo. Se o advogado for conivente com a fraude
do cliente, mas não praticá-la, não responderá por crime, mas estará sujeito a medidas
disciplinares.

2) TIPO OBJETIVO: Se a inovação se der em processo civil ou adm., haverá a necessidade


de existência do processo. No caso de processo penal, este não precisa ter-se iniciado
(aplicando-se as penas em dobro: §ú). Para Bittencourt, embora o ato possa se dar em fase
de inquérito, é preciso aguardar a abertura do processo penal para se falar em fraude
processual, pois a inovação tem que se destinar a produzir efeitos neste último. É preciso
que a falsidade seja capaz de iludir, prescindindo, contudo, que o juiz ou perito sejam
efetivamente enganados, pois trata-se de crime formal, consumando-se com a inovação. É
também infração subsidiária, sendo absorvida quando a finalidade constituir crime mais
grave (ex.: fraude a execução ou ocultação à cadáver, STF, HC 88733, Dj. 17.10.2006). Há
discussão sobre a existência de inexigibilidade de conduta diversa em caso de autor do
crime que inova para esconder vestígios do delito. Já se entendeu que sim na hipótese de
sumiço da arma utilizada no homicídio, por ser exercício do direito natural de autodefesa
(RF 258/356). Porém, no recente caso dos Nardoni, tanto STJ (HC 137206) como o STF
(HC 102828) negaram ordem de HC (este último apenas em caráter liminar, não tendo
julgado o mérito ainda), por entenderem que “os pacientes não foram obrigados a produzir
prova contra si, uma vez que os vestígios do crime que eles são acusados de tentar esconder
já haviam sido produzidos”. Além disso, decidiu-se que o direito constitucional que garante
à pessoa não se auto-incriminar “não abrange a possibilidade de os acusados alterarem a
cena do crime, levando peritos e policiais a cometerem erro de avaliação”. Porém, Eugênio
Aragão, sub-procurador que atuou no HC impetrado no STJ, havia opinado (opinião
pessoal dele) pela violação ao princ. do nemo tenetur se detegere.

Favorecimento pessoal. Art. 348:

1) SUJEITO ATIVO: qualquer pessoa (crime comum), inclusive vítima do delito a que se
furta o criminoso. Não se responsabiliza o autor que participou, de qualquer modo (ainda
que apenas moralmente), do crime anterior.

2) TIPO OBJETIVO: o auxílio deve ser concreto (efetivo). Não responde por este crime o
advogado que oculta o paradeiro de seu cliente, desde que não tenha prestado amparo
material para fuga (RJDTACRIM 27/240). Não há crime se o fugitivo tiver sendo acusado
de contravenção ou tiver agido mediante causa excludente da ilicitude, da culpabilidade,
extintiva de punibilidade ou escusa absolutória. É necessária, nas ações penais
condicionadas ou privadas, a provocação do ofendido para poder se falar em foragido. Se
este for absolvido, há quem defenda que tal fato impede a condenação de quem o auxiliou
(Bitencourt, Nucci, Noronha, Victor Rios Gonçalves) e há quem sustente a não interferência
no crime de favorecimento pessoal (Nélson Hungria). O crime é comissivo, sendo atípica a
mera omissão do auxiliador.

3) TIPO SUBJETIVO: Dolo. Não importa se o agente acredita ou não que a perseguição é
justa, pois se houver dúvida acerca da existência do fato atribuído ao fugitivo, já haverá o

304
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

dolo eventual.

4) CONSUMAÇÃO: Há discussão se o crime é formal (independe do efetivo sucesso do


auxílio) ou material (necessário o sucesso, ainda que momentâneo), prevalecendo esta
última posição. Bittencourt defende ser crime formal.

5) ESCUSA ABSOLUTÓRIA (§2º): será isento de pena se o agente auxilia ascendente,


descendente, cônjuge ou irmão. Por analogia in bonam partem, inclui-se o companheiro
neste rol.

Favorecimento real. Art. 349:

1) SUJEITO ATIVO: qualquer pessoa (crime comum), excluindo aquele que de qualquer
forma participou no crime antecedente (não basta ser contravenção). Se o conluio se der
antes da consumação, haverá concurso de agentes e não este crime.

2) TIPO OBJETIVO: difere do favorecimento pessoal porque não há auxílio ao criminoso


em si (apenas indiretamente), pois o que se assegura para ele é a ocultação da coisa, o
proveito do crime. Os instrumentos do crime não são sinônimos de proveito do delito, não
podendo ser objeto material deste crime, mas sim do de favorecimento pessoal (se a
intenção é auxiliar a subtrair o agente da ação da autoridade). Difere igualmente da
receptação, na qual o agente atua para favorecer a si mesmo ou a terceiro que não o autor
do crime anterior, além de não abranger interesses extrapatrimoniais (ex.: adquire
mercadoria furtada para revender). Para Mirabete, Bitencourt e Baltazar Júnior, não se
exige a condenação transitada do crime pressuposto, bastando a certeza de sua ocorrência,
que pode ser provada no próprio processo do presente delito. Entretanto, há quem defenda
que a expressão “criminoso” (e não acusado) indica a necessidade desta condenação, em
razão do princípio da presunção de inocência.

3) CONSUMAÇÃO: com a efetiva prestação do auxílio, ainda que não asseguro o proveito
do delito (crime formal). Nisto se difere do favorecimento pessoal, além de não admitir a
escusa absolutória do §2º do art. 348.

Entrada de aparelho telefônico em estabelecimento prisional. Art. 349-A.

Até março de 2007 a introdução de aparelho de comunicação no presídio não gerava


qualquer consequência para nenhuma das três partes envolvidas. Após a Lei 11.466/07, tal
fato passou ser considerado falta grave para o preso que tiver em sua posse, utilizar ou
fornecer tal aparelho (art. 50, VII, da LEP) e também crime para o diretor de Penitenciária
e/ou agente público que deixa o preso ter acesso a referido aparelho (art. 319-A do CP –
espécie de prevaricação). Porém, somente com a Lei 12.012/2009, é que o particular
(qualquer pessoa) que ingressa, promove, intermedeia, auxilia ou facilita a entrada do
aparelho em questão nos presídios passou a ser apenado criminalmente em razão do tipo

305
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

descrito neste art. 349-A.

1) TIPO OBJETIVO: é necessário a falta de autorização legal para as condutas descritas no


tipo (elemento normativo).

2) CONSUMAÇÃO: trata-se de crime de mera conduta. Ressalta-se que a comissão que


elabora o anteprojeto de lei do novo Código Penal aprovou a criminalização do uso de
aparelhos de comunicação pelos detentos dentro de presídios. Isto é, a conduta deixaria de
ser apenas uma falta grave, passando a ser também crime.

Evasão mediante violência contra a pessoa. Art. 352.

1) SUJEITO ATIVO. Crime próprio, somente praticado por preso (administrativo, civil ou
penal, provisório ou definitivo) ou o internado.

2. TIPO OBJETIVO. Para Noronha e Bitencourt, não é preciso o recolhimento do


custodiado a estabelecimento, podendo ser praticado, por exemplo, durante o seu
transporte, pois basta que esteja legalmente custodiado. Hungria discorda, já que entende
haver crime de resistência neste último caso (fuga extra muros).

3. CONSUMAÇÃO. Consuma-se com o emprego dos meios necessários para a fuga,


acompanhada de violência à pessoa (ameaça e violência contra coisa não tipificam a
conduta). A evasão por si só não é crime, é preciso haver a violência. Trata-se de crime
excepcional, punindo-se a tentativa com a mesma consequência do crime consumado
(delito de atentado ou de empreendimento). A violência empregada, se criminosa, será
punível em concurso formal impróprio, uma vez que o preceito secundário dispõe: “(...)
além da pena correspondente a violência.”

Patrocínio infiel. Art. 355.

1) SUJEITO ATIVO. Crime próprio, somente praticado por advogado ou procurador


judicial (inclusive defensor público, AGU, PFN, Procuradorias e Consultorias Jurídicas da
Adm. Púb. direta e indireta) devidamente inscrito na OAB. Não se inclui os promotores ou
procuradores de justiça, os quais poderão incidir em outros crimes, como corrupção passiva
ou prevaricação. Admite-se a participação de 3º, como estagiário.

2) TIPO OBJETIVO. Pode-se dar por ação (ex.: fazer acordo prejudicial ao cliente) como
por omissão (ex.: não recorrer, deixar ocorrer a perempção etc.). A maior parte da doutrina
entende não configurar este crime caso o advogado se aproprie de valores devidos ao
cliente ou, sendo dativo, cobre honorários (mas há jurisprudência em contrário RT510/443,
520/494). O simples abandono da causa criminal não configura o presente delito, ficando o
advogado sujeito as consequências do art. 265 CPP. O patrocínio infiel só se dá em causa
judicial (civil, penal, de jurisdição contenciosa ou voluntária etc.), e não extrajudicial (fase

306
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

de inquérito policial ou civil, sindicância, mera consulta etc.). Se o interesse do cliente for
ilegítimo, não terá o advogado o dever profissional de defendê-lo. Para Bitencourt, o
consentimento do interessado exclui a própria tipicidade quando se tratar de interesse
disponível, o que não ocorre na causa criminal. Para Mirabete, exclui a antijuridicidade.

3) CONSUMAÇÃO. Com a ocorrência do efetivo prejuízo ao patrocinado, ainda que a


situação possa ser revertida. A tentativa é admitida na forma comissiva.

4) PATROCÍNIO SIMULTÂNEO OU TERGIVERSAÇÃO (parágrafo único). O patrocínio


simultâneo se dá quando o advogado concomitantemente zela (ainda que por interposta
pessoa) os interesses das partes contrárias e a tergiversação se dá quando o causídico
renuncia ao mandato de um parte (ou é por ela dispensado) e passa, em seguida, a
representar a outra. Não é necessário que o patrocínio se dê no mesmo processo, bastando
ser a mesma causa. Ao contrário do patrocínio infiel, não precisa do efetivo prejuízo, sendo
crime formal. Tentativa é admissível. É comum chegar à Justiça Federal crime em que a
empresa contrata advogado para ajuizar reclamação trabalhista, em nome de funcionário e
em face daquela, apenas para posteriormente fazer acordo que interessa somente à parte
empregadora (TRF 3, RCCR 20026106007108-2/SP, Johonsom, 1ª Turma, DJU 30.08.05;
TRF4, AC 20057206001389-1/SC, Marcos Santos, 7ª Turma, DJU 22.07.08).

Sonegação de papel ou objeto de valor probatório. Art. 356.

1) SUJEITO ATIVO. Crime próprio, somente praticado por advogado ou procurador


judicial.

2) TIPO OBJETIVO. Há forma ativa (inutilização) e a passiva (deixar de restituir).


Inutilização parcial deve atingir parte juridicamente relevante do objeto material, não
equivalendo a este fato a inutilização “jurídica”, como no caso em que deixa ocorrer a
prescrição. Os objetos devem ter sido entregues ao agente por causa da sua qualidade de
advogado ou o procurador.

3) CONSUMAÇÃO. No momento em que se perde o valor probatório (inutilizar – tentativa


possível) ou no momento em que o causídico, intimado (TRF4, AC 20027000064601-4/PR,
8ª T., 27.02.2005), não devolve o objeto (conatus impossível), embora haja quem defenda a
desnecessidade da intimação por não ser elementar do tipo (STJ, RHC 19930016927-0/RJ,
30.08.1993).

4) DISTINÇÃO. É forma especial dos delitos tipificados nos arts. 305, 314 e 337 do CP,
dos quais se distingue, essencialmente, pelo sujeito ativo próprio.

Exploração de prestígio. Art. 357.

1) SUJEITO ATIVO. Qualquer pessoa (crime comum).

307
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

2) TIPO OBJETIVO. A contraprestação oferecida pelo agente (influenciar as pessoas


descritas no caput) não passa de uma fraude para obter injusta vantagem. Diferencia-se do
crime de tráfico de influência (332 do CP) pela condição especial do servidor invocado pelo
agente (juiz, jurado, órgão do MP, funcionário da justiça, perito, tradutor, intérprete ou
testemunha). É delito especial em relação ao estelionato (art. 171 do CP), em que o agente
deve obter (no presente crime basta solicitar ou receber) vantagem ilícita mediante qualquer
fraude. Se o agente realmente estiver em conluio com o servidor, haverá outro crime
(corrupção passiva). Difere também do crime de advocacia administrativa (art. 321 do CP),
o qual é praticado por funcionário público que efetivamente patrocina interesse privado
perante a Adm. Pub., valendo de sua qualidade.

3) CONSUMAÇÃO. A conduta de solicitar se consuma com o simples pedido (crime


formal). Já a ação de receber se perfaz com o indevido enriquecimento (delito material).

308
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

12.a. Teoria do tipo doloso


Principais obras consultadas: Santo Graal 27. Gueiros, Artur, 2012; Cezar Roberto
Bitencourt, Tratado de Direito Penal, 2009. Paulo Queiroz, Direito Penal, 2011. Cleber
Masson, Direito Penal Esquematizado, 2011. Guilherme de Souza Nucci, Código Penal
Comentado, 2012. Rogério Greco, Curso de Direito Penal, 2009.

Legislação básica: Art. 18, inc. I, CP.

Conceito: Dolo é a vontade consciente de praticar a conduta típica (visão finalista).

Previsão legal: CP, Art. 18 - Diz-se o crime: I - doloso, quando o agente quis o resultado ou
assumiu o risco de produzi-lo.

Elementos: a) Consciência atual dos elementos integradores do tipo penal (difere da


consciência de ilicitude, que está deslocada para a culpabilidade). b) Elemento volitivo:
deve abranger a ação ou omissão, o resultado e o nexo causal.

Características: Para Nucci (p. 213), o dolo tem como características: a) abrangência
(envolve todos os elementos do delito); b) atualidade (deve estar presente no momento da
ação); c) possibilidade de influenciar o resultado (a vontade do agente deve ser capaz de
produzir o evento típico).

Funções da teoria do tipo: Possui três funções primordiais: função sistemática, dogmática
e político-criminal. A função sistemática significa que o tipo abarca o conjunto dos
elementos que possibilitam informar se e qual delito ocorreu no caso concreto. A função
político-criminal, por sua vez, significa que o Direito Penal não cuida da atitude interna,
mas é um Direito Penal do fato, e não Direito Penal do autor. Por fim, a função dogmática
consiste em descrever os elementos, cujo desconhecimento exclui o dolo. Tanto é assim,
que o art. 20, caput, do CP cuida do erro sobre o elemento constitutivo do tipo, que exclui o
dolo.

Tipicidade Penal: Tipicidade é a correspondência entre o fato praticado pelo agente e a


descrição de cada espécie de infração contida na lei penal incriminadora. a) Adequação
típica imediata: Somente se verifica se o fato amolda-se ao tipo descrito na norma, sem
necessidade de concurso de qualquer outra norma. b) Adequação típica mediata: Embora a
conduta não se amolde imediatamente na norma prevista na lei pena, em razão da norma de
extensão, que amplia a incidência de tal norma típica, permite a tipicidade da conduta. É o
caso da tentativa e do concurso de agentes.

Teorias: a) Teoria da representação: A configuração do dolo exige apenas a previsão do


resultado. Pouco importa se o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo,
basta que o resultado tenha sido antevisto pelo sujeito. b) Teoria da vontade (clássica): o
dolo consiste na intenção mais ou menos perfeita de praticar um ato que se conhece
contrário à lei. A essência do dolo deve estar na vontade, não de violar a lei, mas de realizar
309
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

a ação e obter o resultado. Exige a previsão do resultado. c) Teoria do assentimento


(consentimento): Há dolo não somente quando o agente quer o resultado, mas também
quando realiza a conduta, assumindo o risco de produzi-lo. OBS: O Código Penal adotou a
teoria da vontade na primeira parte do inc. I, do art. 18 (dolo direto), e a teoria do
assentimento na segunda parte (dolo eventual).

Elementos do tipo objetivo: É composto por um núcleo, representado por um verbo (ação
ou omissão) e por elementos secundários, como objetivo da ação, resultado, nexo causal,
autor, etc. Elementos descritivos: Expressões que são compreendidas de imediato, pela
simples constatação sensorial. Elementos normativos: Demanda uma atividade valorativa
no campo da tipicidade, como a noção de documento, casamento, dentre outros.

Podem ser jurídicos, extrajurídicos ou culturais.

Elementos do tipo subjetivo: É constituído por um elemento geral (dolo) e, por vezes,
acompanhado de elementos especiais (intenções e tendências), os quais são elementos
acidentais. O dolo como elemento subjetivo geral: a) Aspecto cognitivo do dolo: É a
consciência, que deve ser efetiva e atual. Deve se ter consciência da representação dos
elementos integradores do tipo penal, bem como a previsão de todos os elementos
essenciais do tipo, sejam descritivos ou normativos. b) Aspecto volitivo do dolo: Aqui se
pressupõe a previsão fática (aspecto cognitivo), abrangendo a conduta, o resultado e o nexo
causal. Segundo Ihering, a vontade se constitui no fato e com o fato. Modalidades: Dolo
genérico: vontade de praticar a conduta, sem qualquer finalidade específica. Dolo
específico: vontade de praticar uma conduta com finalidade especial.Obs. A despeito de
alguns autores (Cleber Masson, Cezar R. Bitencourt) afirmarem que essa distinção
encontra-se superada com o advento da teoria finalista, os Tribunais continuam adotando a
classificação. A título de ilustração, o STJ, em recentes julgados, vem decidindo pela
exigência de dolo específico de causar dano ao erário para a configuração do crime do art.
89 da Lei 8.666/93 (“Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas
em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade”)
(HC 190782/BA, Dje de 17/12/2012). Espécies de dolo: 1) Dolo direto de primeiro grau: é
a intenção do agente, voltada a determinado resultado, efetivamente perseguido,
abrangendo os meios empregados para tanto. 2) Dolo direto de segundo grau: é a intenção
do agente, voltada a determinado resultado, efetivamente desejado, embora na utilização
dos meios para alcançá-lo, termine por incluir efeitos colaterais certos. Ex. Estourar uma
bomba em um local público, sabendo que irá atingir outras pessoas, mas com a intenção de
matar determinada pessoa. 3) Dolo eventual (indireto): O agente não quer o segundo
resultado diretamente, embora sinta que ele pode se materializar juntamente com aquilo que
pretende, o que lhe é indiferente. Dolo eventual não se compatibiliza com a qualificadora
do art. 121, § 2º, IV (traição, emboscada,dissimulação). (STF, HC 111442, Relator(a): Min.
GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 28/08/2012). O dolo eventual, na
prática, não é extraído da mente do autor, mas, isto sim, das circunstâncias. Nele, não se
exige que o resultado seja aceito como tal, o que seria adequado ao dolo direto, mas, isto
sim, que a aceitação se mostre no plano do possível, provável (STJ, REsp 247.263/MG).
Dolo natural e normativo: A divisão relaciona-se com a teoria adotada para a definição da
conduta. Segundo a teoria clássica (causal), o dolo estava alojado no interior da

310
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

culpabilidade, que era revestido da consciência da ilicitude do fato. É o chamado dolo


normativo. Para a teoria finalista (adotada pelo CP), o dolo foi transferido da culpabilidade
para a conduta (fato típico). Tal dolo, livre da consciência da ilicitude, é chamado de dolo
natural. Dolo alternativo: É o que se verifica quando o agente deseja, indistintamente, um
ou outro resultado. Dolo geral (aberratio causae): É o engano no tocante ao meio de
execução do crime, mas que termina por determinar o resultado visado. É um erro sobre a
causalidade, mas nunca quanto aos elementos do tipo nem tampouco quanto à ilicitude do
que se pratica.

Elemento subjetivo do tipo: Também chamado de dolo específico. É o especial fim de


agir, que amplia o aspecto subjetivo do tipo, mas não integra o dolo e nem com ele se
confunde, pois o dolo se esgota na consciência e vontade de realizar a ação e a finalidade de
obter o resultado ou assunção do reisco de produzi-lo. Logo, podemos dizer que o dolo é o
elemento subjetivo geral dos comportamentos dolosos, mas não é o único componente
subjetivo dos crimes dolosos. Podem também ser encontradas determinadas características
psíquicas complementares diferentes do dolo, sob a forma de intenções, ou tendências
especiais, ou de atitudes pessoais necessárias para precisar a imagem do crime ou para
qualificar ou privilegiar certos comportamentos criminosos. Espécies: a) Delitos de
intenção: Não precisa se realizar concretamente, mas deve existir no psiquismo do autor. É
o caso dos crimes de falso, em geral. b) Delitos de tendência: Há uma tendência afetiva do
autor, que impregna a ação típica. É o caso dos crimes sexuais, quando há tendência do
autor, de modo voluptuoso que adere à ação típica, atribuindo o caráter sexual ao
comportamento do autor. c) Delitos de atitude: É a existência de estados anímicos que
informam a dimensão subjetiva do tipo e intensificam ou agravam o conteúdo do crime,
mas não representam um valor social independente, como a má-fé, que qualifica certos
tipos penais.

Crime preterdoloso: Ocorre quando a conduta dolosa acarreta a produção de um resultado


mais grave do que o desejado pelo agente. O propósito do autor era praticar um crime
doloso, mas, por culpa, sobreveio resultado mais gravoso (Ex. Art. 129, §3º, CP – lesão
corporal seguida de morte). A culpa que agrava especialmente o resultado deve ser provada
(não é presumida). Afasta-se a figura da versari in re illicita (quem se envolve com coisa
ilícita é responsável também pelo resultado fortuito).

311
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

12.b. Crimes contra o patrimônio: esbulho possessório,


apropriação indébita e receptação

Este ponto é a repetição de vários crimes contidos no 9B e no 6C do presente edital e no


16B do edital antigo.

312
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

12.c. Crimes contra a fé pública:

A) Moeda falsa.
Obras consultadas: Santo Graal 27º. Código Penal Comentado. Rogério Greco (2011).
Direito Penal Parte Geral. Juarez Cirino dos Santos (2007). A moderna teoria do fato
punível. Juarez Cirino dos Santos (2007). Tratado de Direito Penal, Parte Geral. C. Roberto
Bitencourt (2011). Súmulas do STF comentadas. Roberval Rocha Ferreira Filho e outro
(2011). Código Penal para concursos. Rogério Sanches Cunha (2011). Nilo Batista.
Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro – Editora Revan, 2011.

Legislação básica: artigo 289 do CP. Súmula 73, STJ.

Previsão legal: art. 289 do CP.

Bem jurídico: proteção da fé pública, notadamente a segurança da sociedade em relação à


circulação da moeda, sendo de competência da Justiça Federal, haja vista que a emissão de
moeda é competência exclusiva do Banco Central. É crime comum.

Sujeito passivo: O sujeito passivo imediato é o Estado, sendo que o particular poderá ser
atingido apenas mediatamente.

Conduta: No art. 289, caput, CP, a conduta consiste em falsificar moeda metálica ou papel-
moeda em curso legal no país ou no exterior. Há duas formas de se praticar o delito: A
falsificação pode ser a fabricação de moeda falsa (cédula nova) ou a alteração de moeda
verdadeira (alteração do valor de 10 para 100 reais, p. ex). OBS: somente se configura o
crime se a alteração for no sentido de atribuir maior valor à cédula ou à moeda metálica.
Assim, se o agente altera somente números ou símbolos que nada têm a ver com o aumento
do valor da moeda, não pratica o crime em apreço. Bem assim, não ocorre o delito na
hipótese em que a alteração faz com que o valor nominal seja diminuído em relação ao
verdadeiro. Para Hungria, tal indivíduo não deveria ser submetido a processo penal, mas a
processo de interdição, por tal comportamento ser indício forte de loucura.

Atenção: Se for outro tipo de moeda, como a de curso convencional (Dotz, Bitcoin etc.),
poderá estar configurado o crime de estelionato (Greco, 2011).

Importante: Quanto às moedas convencionais ganha destaque o Bitcoin. Trata-se da moeda


virtual mais conhecida da internet e que está se tornando um modelo para uma revolução
nos meios de pagamentos e recebimentos em todo o mundo. Nas transações por Bitcoin não
há bancos como intermediários, afinal, é uma moeda convencional. O que nos interessa
alertar aqui quanto ao Bitcoin nem é o que tange às possibilidades de sua falsificação, mas
seu uso como uma nova e eficiente forma de lavagem de dinheiro internacional, tendo em

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

vista que a transferência de valores ocorre de forma anônima. Os governos da China e da


Tailândia proibiram o Bitcoin. O motivo oficial é o temor [leia-se: já ocorre de forma
intensa] de que a moeda seja usada em lavagem de dinheiro. Sua ampla utilização na "Silk
Road" (Rota da Seda), um "esconderijo" na internet onde se comercializam drogas e armas,
também deu uma pinta marginal à moeda, o que vem causando problemas para o avanço do
Bitcoin. Em 14/04/2014 o empresário e operador Charlie Shrem foi indiciado por um júri
federal em Nova York acusado de lavagem de dinheiro para o site de operações financeiras
Silk Road, pois estava intermediando venda de U$$ 1 milhão em Bitcoins para usuários da
referida rede de tráfico de armas e drogas, apesar de seu conhecimento que o Silk Road é
usado para tal fim. Especula-se no meio da informática que é justamente o Charlie Shrem o
criado do Bitcoin, apesar de ele não assumir a paternidade da ideia.

Objeto material: isto é, a moeda ou o papel precisam estar em curso legal, isto é, devem
representar a moeda vigente no país ou no exterior, não sendo possível o crime de moeda
falsa em relação à moeda retirada de circulação (poderá haver estelionato) ou inexistente
(PRADO, 2010, f. 206).

Falsificação grosseira: É imprescindível que a falsificação seja convincente, isto é, capaz de


iludir os destinatários da moeda (ímitatio veri). Atenção: Nem sempre a falsificação
grosseira constituirá fato atípico. Já que este ocorrerá somente quando não haja qualquer
possibilidade de iludir alguém. Do contrário, poderá se configurar o crime de estelionato.
Este, aliás, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, na Súmula 73: A utilização de
papel-moeda grosseiramente falsificado configura, em tese, o crime de estelionato, de
competência da Justiça Estadual.

Por que a pena do 297 é mais branda do que a da falsificação de moeda, o papel moeda não
é documento público? Qual seria a diferença entre eles? A diferença entre ambos os delitos
está no dano social que podem causar. I- - Normalmente no art. 289 o agente não se limita a
falsificação de um único papel moeda, normalmente se falsifica um volume muito grande o
que a diferencia do art. 297, onde se falsifica na grande maioria dos casos um único
documento. II - Possui uma grande potencialidade lesiva porque a moeda circula e pode
causar inúmeros prejuízos.

Voluntariedade: é o dolo de falsificar, fabricando ou alterando. OBS: Não se exige


finalidade especial de agir por parte do agente, nem mesmo que pretenda colocar a moeda
falsificada em circulação. Logo, se a pessoa falsificar moeda de uso curso legal no país ou
no estrangeiro com o intuito apenas de mostrar sua alta capacidade de falsificação comete o
crime na sua forma consumada.

Forma equiparada: No art. 289, §1º, CP, há previsão de outras condutas (importar, exportar,
vender, introduzir em circulação etc.), caracterizando crime de ação múltipla. Segundo a
doutrina, o autor da falsificação não responde pelo §1º, mas apenas pelo caput, tratando-se
de hipótese de post factum impunível – progressão criminosa (PRADO, 2010, f. 209). A
introdução de várias cédulas em circulação, no mesmo contexto fático, configura crime
único (e não continuado). Ambos os tipos exigem dolo direto, inexistindo hipótese de crime
culposo ou de dolo eventual. Não se exige especial fim de agir (dolo específico), tal como o
lucro. Se da conduta advém lucro, o estelionato fica absorvido pela moeda falsa. Trata-se de
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

crime formal, no qual a consumação ocorre com a prática da conduta, independentemente


da ocorrência de resultado material (é indiferente se houve ou não a efetiva introdução da
moeda).

Forma privilegiada: No art. 289, §2º, CP, tem-se tipo privilegiado, pois, neste caso, o
sujeito recebe a nota falsa sem saber, só vindo a tomar conhecimento posteriormente,
quando, para não ficar no prejuízo, busca repassá-la a terceiros. Pune-se a reintrodução da
moeda. Para ocorrer a desclassificação do caput/§1º para o §2º, requer-se: prova
inequívoca, a cargo da defesa, na forma do art. 156 do CPP, de que a moeda falsa foi
recebida de boa-fé.

Falsificação funcional (§3°): Trata-se de crime próprio, pois só pode ser cometido por
funcionário público (art. 327 do CP), diretor, gerente, ou fiscal de banco de emissão que
fabrica,, emite ou autoriza a fabricação ou emissão de moeda ou papel-moeda.

Desvio e circulação antecipada ( §4°): Equipara-se à conduta anterior, punindo quem desvia
e faz circular moeda, cuja circulação não estava ainda autorizada. Neste caso, autorizou-se
somente a emissão da moeda, mas não sua circulação, que depende da análise de fatores
econômicos. Não se exige qualidade especial do agente, sendo possível a prática do crime
por qualquer pessoa (delito comum).

Considerações importantes: Não se aplica o princípio da insignificância. É crime que deixa


vestígios, sendo necessária perícia. A fabricação, no mesmo contexto, de diversas cédulas
falsas caracteriza crime único. A falsificação precisa ser de boa qualidade, apta a ludibriar o
homem-comum (imitativo veri). Caso seja grosseira, a falsificação ensejará a prática de
estelionato (Súmula 73, STJ). O juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo verificar,
pessoalmente, a qualidade da falsificação. Moeda falsa e petrechos de moeda falsa: para o
TRF1, TRF3 e TRF4, no caso de o mesmo agente for encontrado na posse de petrechos
para falsificação e de moedas falsas, haverá consunção, constituindo o primeiro crime
antefato impunível. O crime de moeda falsa é o crime fim.

Crimes assimilados ao de moeda falsa (art. 290 CP): Conduta delituosa: consiste em: a)
formar cédulas, notas ou bilhete representativo de moeda com fragmentos de cédulas, notas
ou bilhetes verdadeiros; b) suprimir, em nota, cédula ou bilhete recolhidos, para o fim de
restituí-los à circulação, sinal indicativo de sua inutilização; c) restituir à circulação cédula,
nota ou bilhete já recolhidos para o fim de inutilização. Quanto ao recorte e colagem de
pedaços de cédula verdadeira em outra, para o fim de aumentar o valor, o STF entendeu
configurado o crime do art. 289 do CP. (RTJ 33/506). O objeto material é, em relação às
três condutas descritas, respectivamente: a) moeda formada com fragmentos; b) moeda com
sinal de inutilização suprimido; c) moeda recolhida para o fim de inutilização. Sujeitos do
delito: O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Sujeito passivo é o Estado. Elemento
subjetivo: O dolo é a vontade de formar moeda, com a consciência de que ela poderá
circular. Quando se trata de supressão de sinal indicativo de inutilização, exige-se a
finalidade especial de restituir a moeda à circulação. Consumação e tentativa: O crime se
consuma, em relação às condutas: a) com a efetiva formação de cédula idônea a enganar; b)
com a supressão do sinal indicativo de inutilização; c) com a restituição à circulação.
Admite-se a tentativa nas três modalidades. Figura qualificada (art. 290, parágrafo único). A
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

reprovabilidade da conduta é maior, haja vista que o funcionário que trabalha na repartição
tem fácil acesso e é quem deve zelar pela manutenção da idoneidade dos papéis referidos.

Petrechos para falsificação de moeda (Art. 291): Conduta delituosa: consiste em: a) fabricar
(construir, manufaturar, produzir); b) adquirir (obter, comprar); c) fornecer (entregar,
propiciar, prover, abastecer), a título gratuito ou oneroso; d) possuir (ter a posse ou a
propriedade); e) guardar (ter sob a guarda, obrigar). Objeto material: maquinismo, aparelho,
instrumento ou qualquer objeto especialmente destinado à falsificação da moeda. Sujeitos
do delito: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, inclusive o funcionário da instituição em
que imprime a moeda (servidor da Casa da Moeda). Sujeito passivo é o Estado. Elemento
subjetivo: o dolo é a vontade livre e consciente de praticar as ações incriminadas, com o
conhecimento da destinação dos objetos. Consumação e tentativa: se consuma com a
efetiva prática de uma das ações. Nas modalidades de possuir e guardar é crime
permanente. Admite-se a tentativa. A ação penal é pública incondicionada e o crime é
também é de competência da Justiça Federal.

Emissão de título ao portador sem permissão legal (art. 292 CP): Conduta delituosa: emitir
(colocar em circulação), sem permissão legal, nota, bilhete, ficha, vale ou título que
contenha promessa de pagamento em dinheiro ao portador ou que falte a indicação do nome
da pessoa a quem deva ser pago. Objeto material: é qualquer dos títulos inscritos no tipo
penal, desde que contenha promessa de pagamento em dinheiro ao portador, não o
caracterizando aquele que tem valor para serviços, utilidades ou mercadorias, ou a que falte
indicação do nome da pessoa a quem deva ser pago, sem permissão legal. Sujeitos do
delito: sujeito ativo é quem emite título ao portador, sem permissão legal, não exigindo
qualquer qualidade especial. O subscritor, caso não seja o autor da emissão, é co-autor.
Sujeito passivo é o Estado e eventualmente terceiro lesado pela conduta. Elemento
subjetivo: o dolo. O agente deve ter conhecimento de todos os elementos constantes do tipo
penal em estudo. Consumação e tentativa: é crime formal. Consuma-se com a circulação do
título, independente da produção de dano. Admite-se a tentativa, ressalvando a existência
de corrente doutrinária contrária (Guilherme de Souza Nucci).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

B) Crimes Contra a Fé Pública: falsidades em geral.


Obra consultada: Santo graal 27º. Rogério Greco. Curso de Direito Penal – Parte
Especial. Vol IV. 5ª Edição. Ed. Impetus, 2009. http://www.ambito-
juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5333.
http://www.pucrs.br/direito/graduacao/tc/tccII/trabalhos2007_2/Viviane_Souza.pdf

Legislação básica. Arts. 289 a 311 do Código Penal.

1. Noções Gerais: A fé pública é o bem jurídico tutelado por meio dos tipos penais
constantes no título X do Código Penal. A fé pública é a crença na veracidade dos
documentos, símbolos e sinais que são empregados pelo homem em suas relações em
sociedade.

Características dos crimes de falsidade: A imitação da verdade é o elemento típico dos


crimes de falso, uma vez que se pretende enganar o sujeito passivo. Deve haver
potencialidade lesiva, ou seja, o falso deve possuir a capacidade de iludir e causar o dano.
Na hipótese da falsificação ser grosseira, a conduta poderá configurar o crime de
estelionato (súmula 73 do STJ). Todos os crimes contra a fé pública são dolosos.

2. Da Falsificação de papéis públicos (art. 293 CP): crime comum, doloso, comissivo, de
forma livre. O delito se consuma com a prática de qualquer dos comportamentos previstos
pelo art. 293. A tentativa será possível em algumas hipóteses, quando puder ser fracionado
o iter criminis.

3. Petrechos de falsificação (art. 294 CP): Conduta delituosa: consiste em: a) fabricar
(construir, manufaturar, produzir); b) adquirir (obter, comprar); c) fornecer (entregar,
propiciar, prover, abastecer), a título gratuito ou oneroso; d) possuir (ter a posse ou a
propriedade); e) guardar (ter sob a guarda, abrigar). Objeto material: maquinismo, aparelho,
instrumento ou qualquer objeto especialmente destinado à falsificação de quaisquer dos
papéis referidos no art. 293 do CP. Não é preciso que o petrecho sirva exclusivamente à
falsificação. Sujeitos do delito: Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Sujeito passivo é o
Estado. Consumação e tentativa: Se consuma com a efetiva prática de uma das ações.
Admite-se a tentativa.

4. Da falsidade documental - Falsificação do selo ou sinal público (art. 296 CP):


Conduta delituosa: conduta de falsificar, fabricando ou alterando, selo público destinado a
autenticar atos oficiais ou selo ou sinal atribuído por lei a entidade de direito público, ou a
autoridade, ou sinal público de tabelião; usar selo ou sinal falsificado; utilização indevida
de selo ou sinal verdadeiro em prejuízo de outrem ou em proveito próprio ou alheio;
alteração, falsificação ou sinal indevido de marcas (sinais que se fazem em coisas para
reconhecê-las), logotipos (conjuntos de letras unidas em um único tipo, formando siglas ou
palavras), siglas (sinais convencionais) ou quaisquer outros símbolos (sinais, signos)
utilizados ou identificadores de órgãos da Administração Pública. A falsificação poderá

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ocorrer por meio da contrafação (fabricação, com a criação de selo ou sinal público) ou pela
alteração (modificação do verdadeiro). Sujeitos do delito: sujeito ativo pode ser qualquer
pessoa. Sujeito passivo, primeiramente é o Estado, em segundo lugar, o particular
eventualmente prejudicado. Elemento subjetivo: é o dolo. Consumação e tentativa: o crime
consuma-se com a falsificação do selo ou sinal público, na hipótese do caput do artigo 296.
Na hipótese do parágrafo primeiro do art. 296, o crime se consuma com a prática de
qualquer dos verbos. Admite-se tentativa.

5. Falsificação de documento público (art. 297 CP): Conduta delituosa: a falsidade que
este art. 297 pune é a material, ou seja, aquela que diz respeito à forma do documento. São
duas as condutas previstas: a) Falsificar, no todo ou em parte, documento público. É a
contrafação, a formação do documento. No todo, é a contrafação integral; ou em parte,
quando se acrescentam mais dizeres ao documento verdadeiro; b) ou alterar documento
público verdadeiro. Nesta modalidade, há alteração (modificação) do teor formal do
documento. Objeto material: é o documento público, considerando-se como tal o elaborado,
de acordo com as formalidades legais, por funcionário público no desempenho de suas
atribuições. É abrangido pelo conceito tanto o documento formal e substancialmente
público, como o formalmente público, mas substancialmente privado (por exemplo, as
declarações de vontade recebidas de particulares e redigidas por funcionários públicos).
Também é incluído o documento público estrangeiro, desde que originariamente
considerado público e atendidas às formalidades legais exigidas no Brasil. São também
documentos públicos as certidões, traslados, fotocópias autenticadas e o telegrama emitido
com os requisitos de documento público. As fotocópias ou xerox não autenticadas não
podem ser considerados documentos, para fins penais. Existe controvérsia doutrinária sobre
a obrigatoriedade de o documento ser um escrito e constante em um papel (ponto polêmico
discutido no item 20). Sujeitos do delito: sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Se
funcionário público vide § 1o. Sujeito passivo é o Estado, primeiramente; e a pessoa em
prejuízo de quem foi o falso praticado, secundariamente. Elemento subjetivo: exige-se o
dolo. Não há punição a título de culpa. Consumação e tentativa: consuma-se com a efetiva
falsificação ou alteração. Admite-se tentativa. Documentos públicos por equiparação (art.
297, §2º): para fins penais, são equiparados a documento público: a) o documento emanado
de entidade paraestatal; b) o título ao portador ou transmissível por endosso (cheque, nota
promissória, duplicata, warrant, etc.); c) as ações de sociedade comercial; d) os livros
mercantis e o testamento particular (não abrange o codicilo). Figuras equiparadas (art. 297,
§3o): buscando tutelar os interesses da Previdência Social e, subsidiariamente, do próprio
beneficiário, a Lei nº 9.983/00, acrescentou o § 3o a este art. 297, punindo com as mesmas
do caput aquele que inserir ou fizer inserir, nos documentos que enumera, determinados
fatos falsos ou diversos dos que deveriam constar. O inciso I pune a conduta daquele que
insere ou faz inserir, na folha de pagamento ou em outro documento de informações
destinado a fazer prova perante a Previdência Social, pessoa que não possua a qualidade de
segurado obrigatório. De acordo com o art. 11 da Lei 8213/91, atualizada pelas Leis
9876/99 e 10403/02, entre outras, são segurados obrigatórios as seguintes pessoas físicas: o
empregado, o empregado doméstico, o contribuinte individual, o trabalhador avulso e o
segurado especial. O inciso II incrimina a conduta de quem inserir ou fizer inserir, na
CTPS, ou em documento que deve produzir efeito perante a Previdência, declaração falsa
(contrária à realidade, fictícia) ou diversa (diferente, distinta) da que deveria ter sido escrita.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

O inciso III tipifica como crime a conduta daquele que insere ou faz inserir, em documento
contábil ou em qualquer outro referente às obrigações da empresa perante a Previdência
Social, declaração falsa ou diversa da que deveria ter constado. O objeto material são os
documentos enumerados nos incisos I, II e III. Em face da inserção deste § 3o no art. 297,
que cuida da falsificação de documento público, restaram equiparados a este, além dos já
previstos no § 2o, os documentos mencionados nos incisos I, II, e III. Sujeito ativo é
qualquer pessoa. Tratando-se de funcionário público, não incidirá a causa especial de
aumento de pena do § 1o, a qual, por sua localização neste artigo, aplica-se apenas ao
caput. Sujeito passivo, primeiramente é o Estado, representado pela Previdência Social,
secundariamente, o segurado e seus dependentes que vierem ser prejudicados. Ao contrário
do caput, a falsidade empregada pelo agente neste § 3o é a ideológica, que se refere ao
conteúdo do documento. As condutas previstas nos três incisos são comissivas. A inserção
de pessoa que não seja segurado obrigatório, ou de declaração falsa ou diversa da que
deveria constar, deve ser juridicamente relevante e ter potencialidade para prejudicar
direitos. Elemento subjetivo é o dolo. Não há punição a título de culpa. O delito consuma-
se com a efetiva inserção dos dados falsos. Outra figura equiparada (art. 297, §4o): objeto
jurídico, objeto material, sujeitos ativo e passivo idênticos ao § 3o. Enquanto o § 3o trata de
condutas comissivas, esta figura equiparada incrimina condutas omissivas, punindo com as
mesmas penas do caput aquele que omitir, nos mesmos documentos enumerados no § 3o,
as seguintes informações: o nome do segurado e seus dados pessoais, a sua remuneração, a
vigência do contrato de trabalho ou de prestação de serviços. Na primeira hipótese só
haverá crime se houver a omissão concomitante do nome dos segurados e de seus dados
pessoais. A omissão empregada pelo agente deve ser juridicamente relevante e ter
potencialidade para prejudicar direitos. Trata-se de crime doloso. Consuma-se a partir do
momento em que a inserção das informações referidas for juridicamente exigível pela
legislação previdenciária e/ou trabalhista. Não se admite tentativa.

Competência dos delitos previstos no art. 297, §3o e §4o: divergência entre o STF, STJ e o
MPF. I) MPF enunciado nº 27 da 2CCR: “A persecução penal relativa aos crimes previstos
nos §§ 3º e 4º do art. 297 do Código Penal é de atribuição do Ministério Público Federal,
por ofenderem a Previdência Social”. II) STJ editou a súmula 62: “Compete à Justiça
Estadual processar e julgar o crime de falsa anotação na Carteira de Trabalho e Previdência
Social, atribuído à empresa privada”. Apesar do entendimento cristalizado na súmula, o STJ
possui julgados divergentes, posicionando-se ora pela competência da Justiça Estadual (CC
20334, 46029, CC 98.006, 100532) ora pela da Federal (CC 58443, 97485). No conflito de
competência n. 99.451, a Corte estabeleceu a seguinte diferença: “Duas são as situações
fáticas que devem ser analisadas para fins de fixação de competência: (i) a primeira é a
hipótese em que determinada empresa privada deixa de anotar o período de vigência de
contrato de trabalho de um empregado na CTPS ou anota período menor do que o
realmente trabalhado com o fito de não reconhecer o vínculo empregatício e assim frustrar
os direitos trabalhistas do indivíduo; (ii) a segunda hipótese é aquela em que são inseridos
dados falsos na CTPS, fazendo constar como período de trabalho que na realidade não
existiu, com o fito de serem criadas condições necessária para se pleitear benefício
previdenciário junto ao INSS. Na primeira, não se vislumbra qualquer prejuízo a bens,
serviços ou interesses da União, senão, por via indireta ou reflexa, do INSS na anotação da
carteira, dado que é na prestação de serviço que se encontra o fato gerador da

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

contribuição previdenciária. Entendimento da Súmula 62 do STJ. Na segunda, a lesão à


União é evidente, porque a conduta é cometida com a intenção de obter vantagem indevida
às custas do patrimônio público”. III) O STF, na ACO 1479 / PR e na ACO 1310 / SP,
decidiu pela atribuição do MPF, pois o objeto jurídico protegido pelos §§ 3º e 4º do art. 297
do CPB é a fé pública, em especial a veracidade dos documentos relacionados à
Previdência Social. Considerações: prevalece o entendimento de que não há concurso com
o crime de uso previsto no art. 304 do CP. Quando a falsidade do documento público foi o
meio para prática de estelionato, divide-se a jurisprudência e a doutrina, dando lugar a
cinco correntes diferentes: 1) O estelionato absorve a falsidade, quando esta foi o meio
fraudulento empregado para a prática do crime-fim que era o estelionato (Súmula 17 do
STJ – “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este
absorvido”); 2) O crime de falsificação de documento público absorve o crime de
estelionato; 3) Há concurso formal; 4) O crime de falso prevalece sobre o estelionato; 5) Há
concurso material. É necessário exame de corpo de delito. Se a falsidade é usada como
crime-meio para a prática de sonegação fiscal, esta a absorve.

Enunciado nº 26: A omissão de registro de vínculo empregatício em Carteira de Trabalho e


Previdência Social subsumi-se ao tipo do art. 297, § 4º, do Código Penal. Precedentes da 2ª
CCR: Processos MPF n.os 1.20.000.000763/2008-78, 1.20.000.000752/2008-98,
1.25.003.006907/2007- 11, 1.34.012.000447/2008-71, 1.20.000.000815/2006-44,
1.34.012.000594/2008-41, entre outros. (Sessão 464ª, de 15.04.2009)

6. Falsificação de documento particular. Conduta delituosa: o que se frauda é a própria


forma do documento, que é alterada, no todo ou em parte, ou é forjada pelo agente, que cria
um documento novo. Objeto material: é o documento particular falsificado ou alterado.
Considera-se como tal o que não está compreendido como documento público, ou que não
é a este equiparado para fins penais. O próprio documento público, quando nulo por falta de
formalidade legal, poderá ser considerado documento particular. Para a lei penal,
documento é todo escrito devido a um autor determinado, contendo exposição de fatos ou
declaração de vontade, dotado de significação ou relevância jurídica (Heleno Fragoso). São
requisitos do documento: a) forma escrita. Não se incluem as fotografias, as reproduções
fotográficas (xerocópias) não autenticadas de documentos, as gravações, pinturas, etc. Deve
o escrito ser feito sobre coisa móvel, transportável e transmissível. Exige-se certa
permanência, embora não precise ser indelével. É irrelevante o meio empregado para
escrevê-lo, desde que seja idôneo para a documentação. No caso de reprodução mecânica é
indispensável à subscrição manuscrita, não se considerando documentos os impressos; b)
que tenha autor certo. O escrito anônimo não é documento. A identificação deve advir da
assinatura ou do próprio teor do documento; c) Seu conteúdo deve expressar manifestação
de vontade ou exposição de fatos. A simples assinatura em papel em branco não é
documento, como também não o é o escrito ininteligível ou desprovido de sentido; d)
relevância jurídica. É necessário que seu conteúdo seja juridicamente apreciável, que possa
ter consequência no plano jurídico. Elemento subjetivo: Somente o dolo. Sujeitos do delito:
É crime comum. O sujeito passivo é o Estado e, secundariamente, a pessoa prejudicada pela
falsidade. Consumação e tentativa: Consuma-se com a efetiva falsificação ou alteração.
Admite-se tentativa. Comentários: Não há concurso com o crime de uso, previsto no art.
304, segundo a doutrina e jurisprudência dominantes. Quando a falsidade foi meio para

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

prática de estelionato, vide comentário do artigo anterior.

7. Falsidade ideológica (art. 299 CP). Conduta delituosa: a falsidade que este artigo
incrimina é a ideológica, que se refere ao conteúdo do documento. São três as modalidades
alternativamente previstas: a) Omitir, em documento público ou particular, declaração que
dele devia constar. A conduta é omissiva; b) Inserir declaração falsa ou diversa da que devia
ser escrita. O agente, diretamente, insere a declaração; c) Fazer inserir declaração falsa ou
diversa da que devia ser escrito. O comportamento é semelhante, mas o agente atua
indiretamente, fazendo com que outrem insira a declaração falsa ou diversa. Em qualquer
das modalidades, é indispensável que a falsidade seja capaz de enganar e tenha por objeto
fato juridicamente relevante. Quanto à simulação, não é pacífica na doutrina a sua
caracterização como falsidade ideológica. Na hipótese de abuso de folha assinada em
branco, exige-se que se trate de papel entregue ou confiado ao agente para preenchimento,
caso contrário, o falso será material. Objeto material: é o documento público ou particular.
Sujeitos do delito: sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Sujeito passivo, idem ao crime
anterior. Elemento subjetivo: trata-se de crime doloso com especial fim de agir: prejudicar
direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobra fato juridicamente relevante.
Consumação e tentativa: consuma-se no instante em que o documento é criado,
independente de sua utilização. Admite tentativa salvo na hipótese omissiva.

8. Falso reconhecimento de firma ou letra (art. 300 CP): Conduta delituosa: o núcleo é
reconhecer (atestar, certificar) como verdadeira, no exercício de função pública, firma
(assinatura, seja por extensão ou mesmo abreviada, de alguém) ou letra (sinal gráfico
elementar com que se representa o vocábulo da língua escrita) que não o seja. Objeto
material: firma ou letra que não seja verdadeiro. Sujeitos do delito: trata-se de crime
próprio, somente podendo ser praticado por funcionário com fé pública para reconhecer.
Elemento subjetivo: trata-se de crime doloso. Consumação e tentativa: consuma-se com o
efetivo reconhecimento. Admite-se a tentativa.

9. Certidão ou atestado ideologicamente falso (art. 301 CP ): Conduta delituosa: atestar


ou certificar falsamente, em razão de função pública, fato ou circunstância que habilite
alguém a obter cargo público, isenção ou ônus de serviço de caráter público, ou qualquer
outra vantagem. Objeto material: atestado ou certidão falso. Sujeitos do delito: trata-se de
crime próprio, somente podendo ser praticado por funcionário competente. Elemento
subjetivo: trata-se de crime doloso. Consumação e tentativa: consuma-se no instante em
que o documento é criado, independente de sua utilização. Admite-se a tentativa.

10. Falsidade de atestado médico (art. 302 CP): Conduta delituosa: o que se pune é dar
(entregar, fornecer, produzir) atestado falso. A falsidade deve ser praticada por escrito (pois
se trata de atestado) e relacionada com o exercício médico do atestante. A falsidade deve
referir-se a fato juridicamente relevante. Objeto material: é o atestado médico falso.
Sujeitos do delito: crime próprio, somente praticado por médico, no exercício da sua
profissão. Elemento subjetivo: trata-se de crime doloso. Consumação e tentativa: consuma-
se com a efetiva entrega do atestado ao beneficiário ou a outrem.

11. Reprodução ou adulteração de selo ou peça filatélica (art. 303 CP): tipo revogado
pelo art. 39 da Lei n. 6538/1978.
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

12. Uso de documento falso (art. 304 CP): Conduta delituosa: a conduta punível é fazer
uso, que tem a significação de empregar, utilizar, valer-se. Incrimina-se, assim, o
comportamento de quem faz uso de documento materialmente falsificado, como se fosse
autêntico; ou emprega documento que é ideologicamente falso, como se verdadeiro fosse. A
conduta é comissiva e o documento deve ser utilizado em sua destinação própria, com
relevância jurídica. Exige-se o uso efetivo, não bastando à mera alusão ao documento. Não
haverá o crime de uso, se faltar ao documento requisito necessário à configuração do
próprio falso. Objeto material: é qualquer dos papéis falsificados ou alterados a que se
referem os arts. 297 a 302. Sujeitos do delito: Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa,
todavia, predomina o entendimento de que o autor do falso não pode responder, também,
pelo uso. Sujeito passivo é o Estado primeiramente; a pessoa prejudicada com o uso,
secundariamente. Elemento subjetivo: crime doloso. Consumação e tentativa: Consuma-se
com o efetivo uso. É admissível a tentativa. Comentários: Súmula 200 do STJ: “O Juízo
Federal competente para processar e julgar acusado de crime de uso de passaporte falso é o
do lugar onde o delito se consumou”.

13. Supressão de documento (art. 305 CP): Conduta delituosa: são três os núcleos
alternativamente indicados; a) destruir (eliminar, extinguir); b) suprimir (fazer desaparecer
sem destruir nem ocultar); c) ocultar (esconder, colocar em lugar onde não possa ser
encontrado). Objeto material: é documento público ou particular verdadeiro, de que não
podia dispor. Assim, desaparece a ilicitude quando o agente pode, livremente, desfazer-se
do documento. Sujeitos do delito: trata-se de crime comum. Sujeito passivo é o Estado e,
secundariamente, a pessoa prejudicada com a supressão. Elemento subjetivo: trata-se de
crime doloso com especial fim de agir, vale dizer, trazer benefício para si ou outrem ou
causar prejuízo alheio. Para muitos há ainda a finalidade de atentar contra a integridade do
documento, como meio de prova.

14. Falsificação do sinal empregado no contraste de metal precioso ou na fiscalização


alfandegária, ou para outros fins (art. 306 CP): Conduta delituosa: falsificar, fabricando
ou alterando, marca ou sinal empregado pelo poder público no contraste de metal precioso
(que serve para atestar o título ou quilate) ou na fiscalização alfandegária (usado para
assinalar as mercadorias liberadas); ou usar marca ou sinal dessa natureza, falsificado por
outrem. Objeto material: é a marca ou sinal empregado pelo poder público no contraste de
metal precioso ou na fiscalização alfandegária. Sujeitos do delito: crime comum. Na
conduta de utilização de marca ou sinal falsificado, somente poderá ser praticado por quem
não for o próprio falsificador. Sujeito passivo, o Estado. Elemento subjetivo: trata-se de
crime doloso. Consumação e tentativa: consuma-se com a fabricação ou alteração idônea,
ou com o uso efetivo. A tentativa é admissível, embora seja difícil ocorrer na modalidade
“usar”. Modalidade privilegiada: tem incidência se a marca ou sinal falsificado for o usado
pela autoridade pública para o fim de fiscalização sanitária, ou para autenticar ou encerrar
determinados objetos, ou comprovar o cumprimento de formalidade legal.

15. Falsa identidade (art. 307 do CP): Conduta delituosa: a conduta punida é atribuir-se
ou atribuir a terceiro falsa identidade. O silêncio ou consentimento tácito a respeito da falsa
identidade atribuída por outrem não se enquadra no dispositivo. Por identidade, entende-se
o conjunto de caracteres próprios de uma pessoa, que permite identificá-la e distingui-la das

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

demais. Sujeitos do delito: crime comum. Elemento subjetivo: Trata-se de crime doloso,
com especial fim de agir: obtenção de vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou causar
dano a outrem. Ressalta-se que a vantagem não pode ser econômica, pois assim o agente
incorrerá no delito de estelionato. Consumação e tentativa: consuma-se com a atribuição,
sem necessidade da ocorrência do fim desejado. O delito é expressamente subsidiário, e
deve ser absorvido por outro crime mais grave, quando constitui elemento deste.
Autodefesa: o agente que atribui falsa identidade perante autoridade policial, mesmo que
para ocultar maus antecedentes, incorre no crime em estudo. Nesse sentido, STF: RE
640139 RG e RE 639732 AgR. STJ: HC 151.802/MS. Mas há jurisprudência do STJ em
contrário.

16. Uso de documento de identidade alheia (art. 308 do CP): Conduta delituosa: usar
(efetiva utilização), como próprio, passaporte, título de eleitor, caderneta de reservista ou
qualquer documento de identidade alheia; ceder, de forma gratuita ou remunerada, a
outrem, para que o utilize, documento dessa natureza, seja próprio ou de terceiro. Sujeitos
do delito: crime comum. Objeto material: todo documento admitido como prova de
identidade. Elemento subjetivo: trata-se de crime doloso. Consumação e tentativa:
consuma-se com o uso efetivo para prova de identidade, na primeira conduta; na segunda,
com a efetiva entrega (em ambos os casos, sem dependência de outro resultado). Admite-se
a tentativa apenas na forma de ceder. É delito expressamente subsidiário.

17. Fraude de lei sobre estrangeiro (art. 309): Sujeitos do delito: por se tratar de crime
próprio, somente o estrangeiro pode ser o sujeito ativo. Consumação e tentativa: consuma-
se com o efetivo uso do nome que não o seu para entrar ou permanecer, ainda que não
consiga atingir a finalidade. Não se admite a tentativa. Elemento subjetivo: trata-se de
crime doloso. Modalidade qualificada: atribuir a estrangeiro falsa qualidade (termo amplo,
que abrange os dados que podem servir para identificá-lo), com a finalidade de promover
sua entrada em território nacional; nessa hipótese, o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa.

18. Falsidade em prejuízo da nacionalização de sociedade (Simulação da figura de


proprietário ou possuidor em nome próprio) (art. 310): Conduta delituosa: O tipo penal
pune a simulação. Sujeitos do delito: crime comum. Consumação e tentativa: consuma-se
com a efetiva substituição do verdadeiro possuidor ou proprietário. Admite a tentativa.
Elemento subjetivo: trata-se de crime doloso.

19. Adulteração de sinal identificador de veículo automotor (art. 311 CP): Conduta
delituosa: adulterar (mudar, alterar, modificar) ou remarcar (tornar a maca) número de
chassi ou qualquer outro sinal identificador de veículo automotor, de seu componente ou
equipamento, a fim de não permitir identificação original do veículo. Objeto material:
número do chassi ou qualquer outro sinal identificador de veículo automotor, de seu
componente ou equipamento. Sujeitos do delito: Trata-se de crime comum. Sujeito passivo
é o Estado e, secundariamente, o terceiro prejudicado pela adulteração ou remarcação.
Elemento subjetivo. Crime doloso. Consumação e tentativa. Consuma-se com adulteração
ou remarcação idônea a enganar. Admite tentativa.

Ponto Polêmico: Documento eletrônico. Conceito: Toda e qualquer representação de um


fato, decodificada por meios utilizados na informática, nas telecomunicações e demais
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

formas de produção cibernética, não perecível e que possa ser traduzido por meios idôneos
de reprodução. Legislação: a medida provisória n. 2.200-2, primeiro documento legal a
tratar do tema, instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileiras, disciplinando a
autenticidade, integralidade e validade jurídica de documentos eletrônicos com assinatura
digital. A Lei n° 11.419 de 2006 reforçou o reconhecimento do documento eletrônico e
realizou uma série de definições importantes acerca das relações entre o documento físico e
o eletrônico e entre as noções de original e cópia. Tipos penais protetivos: objetivando
proteger a segurança e a regularidade dos sistemas informatizados de informações ou banco
de dados da Administração Pública, o legislador inseriu no Código Penal os tipos de
inserção de dados falsos em sistema de informações, art. 313-A, e modificação ou alteração
não autorizada de sistema de informações, art. 313-B. Possibilidade de o documento
eletrônico ser objeto material dos crimes contra a fé pública: Existem duas correntes que
procuram esclarecer o conceito de documento: teoria estrita e teoria ampla. Pela teoria
estrita, o documento deve ser escrito, mas não obrigatoriamente em papel. Pela teoria
ampla, documento não é somente o escrito, mas todo suporte material que expresse ou
incorpore dados, fatos ou narrações com eficácia probatória ou qualquer outro tipo de
relevância jurídica (conceito adotado pelo Código espanhol). Entendo que as duas correntes
abrangem o documento eletrônico, o que possibilita a conclusão de que essa espécie pode
constituir objeto dos crimes de falsidade.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

C) Fraudes em certames de interesse público


Obras consultadas: Santo Graal 27º. Resumo do TRF 5 (2012), site Dizer o Direito
(http://www.dizerodireito.com.br/2011/12/comentarios-ao-novo-art-311-do-cp.html).
GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Curso de Direito Penal Esquematizado. Vol. II.

Legislação: art. 311 A.

Fraudes em certames de interesse público (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)


Art. 311-A. Utilizar ou divulgar, indevidamente, com o fim de beneficiar a si ou a
outrem, ou de comprometer a credibilidade do certame, conteúdo sigiloso de: (Incluído
pela Lei 12.550. de 2011).
I - concurso público; (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)
II - avaliação ou exame públicos; (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)
III - processo seletivo para ingresso no ensino superior; ou (Incluído pela Lei 12.550.
de 2011)
IV - exame ou processo seletivo previstos em lei: (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. (Incluído pela Lei 12.550. de
2011)
§ 1o Nas mesmas penas incorre quem permite ou facilita, por qualquer meio, o acesso
de pessoas não autorizadas às informações mencionadas no caput. (Incluído pela Lei
12.550. de 2011)
§ 2o Se da ação ou omissão resulta dano à administração pública: (Incluído pela Lei
12.550. de 2011)
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)
§ 3o Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o fato é cometido por funcionário
público. (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)

Objetividade jurídica: Tutela-se a credibilidade (lisura, transparência, legalidade,


moralidade, isonomia e segurança) dos certames de interesse público.

Sujeito Ativo: O crime é comum, razão pela qual qualquer pessoa pode praticá-lo e, sendo
funcionário público, a pena é aumentada de um terço (§ 3°).

OBS: a divulgação, pelo servidor público do conteúdo de provas de concurso, não mais se
enquadra no tipo penal da violação de sigilo – art. 325/CP, haja vista a criação do tipo
fraude em certames de interesse público, pela lei n. 12.550/2011.

Parte da doutrina afirma que, caso o servidor público aja em razão de vantagem, há
concurso material com o crime de corrupção passiva (e ativa para o particular que prometeu
a vantagem).

Passivo: É o Estado, e, secundariamente, eventuais lesados pela ação delituosa do agente.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Segundo Victor Eduardo Gonçalves, no caso em que o candidato obtenha a informação


maliciosamente também responde pelo crime, podendo o juiz aplicar como pena
substitutiva à prisão, a interdição temporária de direitos, consistente na proibição de
inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos (art. 47, V, do Código Penal).

OBS 1: Antes da nova Lei, a “cola eletrônica” (utilização de aparelho transmissor e


receptor em prova), foi julgada atípica pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do
Inquérito nº 1.145, uma vez que a referida fraude não se enquadraria nos tipos penais em
vigor, em face do princípio da reserva legal e da proibição de aplicação da analogia in
malam partem. (Cf. Informativo STF nº 453, de 18 e 19 de dezembro de 2006).

OBS 2: No mesmo sentido o Superior Tribunal de Justiça:

Inquérito. 1. Denúncia originariamente oferecida pela Procuradoria-Regional


da República da 5ª Região contra deputado estadual. 2. Remessa dos autos ao
Supremo Tribunal Federal (STF) em face da eleição do denunciado como
deputado federal. 3. Parlamentar denunciado pela suposta prática do crime de
estelionato (CP, art. 171, § 3o). Peça acusatória que descreve a suposta
conduta de facilitação do uso de "cola eletrônica" em concurso vestibular
(utilização de escuta eletrônica pelo qual alguns candidatos - entre outros, a
filha do denunciado - teriam recebido as respostas das questões da prova do
vestibular de professores contratados para tal fim). 4. O Ministério Público
Federal (MPF) manifestou-se pela configuração da conduta delitiva como
falsidade ideológica (CP, art. 299) e não mais como estelionato. 5. A tese
vencedora, sistematizada no voto do Min. Gilmar Mendes, apresentou os
seguintes elementos: i) impossibilidade de enquadramento da conduta do
denunciado no delito de falsidade ideológica, mesmo sob a modalidade de
"inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de
prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato
juridicamente relevante"; ii) embora seja evidente que a declaração fora
obtida por meio reprovável, não há como classificar o ato declaratório como
falso; iii) o tipo penal constitui importante mecanismo de garantia do acusado.
Não é possível abranger como criminosas condutas que não tenham
pertinência em relação à conformação estrita do enunciado penal. Não se pode
pretender a aplicação da analogia para abarcar hipótese não mencionada no
dispositivo legal (analogia in malam partem). Deve-se adotar o fundamento
constitucional do princípio da legalidade na esfera penal. Por mais reprovável
que seja a lamentável prática da "cola eletrônica", a persecução penal não
pode ser legitimamente instaurada sem o atendimento mínimo dos direitos e
garantias constitucionais vigentes em nosso Estado Democrático de Direito. 6.
A tese vencida, iniciada pelo Min. Carlos Britto, e acompanhada pelos
Ministros Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio, baseou-se
nos seguintes argumentos: i) o acusado se defende de fatos, e não da respectiva
capitulação jurídica. É indiferente à defesa do acusado a circunstância de a
denúncia haver inicialmente falado de estelionato, enquanto sua ratificação,
pelo Procurador-Geral da República, redefiniu a questão para focá-la na

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

perspectiva da falsidade ideológica. Para a tese vencida, os fatos narrados não


passaram por nenhuma outra versão, permitindo, assim, o desembaraçado
manejo das garantias do contraditório e da ampla defesa; ii) o caso tem
potencialidade de acarretar prejuízo patrimonial de dupla face: à Universidade
Federal da Paraíba, relativamente ao custeio dos estudos de alunos
despreparados para o curso a que se habilitariam por modo desonesto, de
parelha com o eventual dever de anular provas já realizadas, e, assim instaurar
novo certame público; e àqueles alunos que, no número exato dos
"fraudadores", deixariam de ser aprovados no vestibular; iii) incidência de
todos os elementos conceituais do crime de estelionato: obtenção de vantagem
ilícita, que, diante do silêncio da legislação penal, pode ser de natureza
patrimonial, ou pessoal; infligência de prejuízo alheio, que há de ser de índole
patrimonial ou por qualquer forma redutível a pecúnia, pois o crime de
estelionato insere-se no Título do Código Penal destinado à proteção do
patrimônio; utilização de meio fraudulento; e induzimento ou manutenção de
alguém em erro; iv) seja no delito de estelionato, ou no de falso, a denúncia
parece robusta o suficiente para instaurar a ação penal; e, por fim, v) a
tramitação de projeto de lei no Congresso Nacional para instituir um tipo
criminal específico para a cola eletrônica não se traduz no reconhecimento da
atipicidade da conduta do acusado. 7. Denúncia rejeitada, por maioria, por
reconhecimento da atipicidade da conduta descrita nos autos como "cola
eletrônica". (Inq 1145, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno,
julgado em 19/12/2006, DJe-060 DIVULG 03-04-2008 PUBLIC 04-04-2008
EMENT VOL-02313-01 PP-00026 RTJ VOL-00204-01 PP-00055)

Atenção: Apesar de muitos acreditarem que a “cola eletrônica”, agora, passou a ser crime,
pensamos que a tipicidade vai depender da análise do caso concreto. Vejamos: 1) Se o
modo de execução envolve terceiro que, tendo acesso privilegiado ao gabarito da prova,
revela ao candidato de um concurso público as respostas aos quesitos, pratica, junto com o
candidato beneficiário, o crime do art. 311-A (aquele, por divulgar, e este, por utilizar o
conteúdo secreto em benefício próprio). Já nos casos em que o candidato, com ponto
eletrônico no ouvido, se vale de terceiro expert para lhe revelar as alternativas corretas,
permanece fato atípico (apesar de seu grau de reprovação social), pois os sujeitos
envolvidos (candidato e terceiro) não trabalharam com conteúdo sigiloso (o gabarito
continuou sigiloso para ambos). 2) Nas mesmas penas incorre quem permite (dar liberdade)
ou facilita (tornar mais fácil a execução), por qualquer meio, o acesso de pessoas não
autorizadas às informações mencionadas no caput. 3) Elemento Subjetivo: É o dolo,
consistente na vontade de praticar uma das condutas previstas no tipo, com o fim de
beneficiar a si ou a outrem, ou de comprometer a credibilidade do certame.

Na hipótese do § 1º, basta o dolo, dispensando fim especial do agente.

Consumação e tentativa: a consumação se dá com a simples divulgação ou utilização do


conteúdo sigiloso, dispensada a obtenção da vantagem particular buscada pelo agente ou
mesmo eventual dano à credibilidade do certame (crime formal ou de consumação
antecipada). Aliás, se da ação ou omissão resulta dano (material ou não) à administração

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

pública, o crime será qualificado.

A tentativa é admissível.

OBS: Deve-se deixar claro que o “concurso” versado pela Lei 8.666/93 não se confunde
com o “concurso público” para seleção de servidores. Enquanto o aprovado no concurso
público tem como objetivo o provimento em cargo público, no concurso – modalidade de
licitação – a contrapartida é somente um prêmio ou remuneração, e não a investidura da
pessoa, ou seja, ela não será contratada pelo Poder Público.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

13.a. Teoria do tipo culposo


Obras consultadas: Santo Graal 27º. Gueiros, Artur, 2012. resumo trf5 2012

Considerações iniciais: No Brasil, os crimes, em regra, são punidos a título de dolo. O tipo
culposo tem de estar expressamente previsto na lei (excepcionalidade do crime culposo),
conforme determina o art. 18, parágrafo único, do CP. Nos crimes culposos, só há
antijuridicidade na medida em que violava o cuidado exigido no âmbito da vida de relação,
de modo que o elemento decisivo da ilicitude do fato culposo reside no desvalor da ação e
não do resultado. Isso permitiu a elaboração da estrutura do crime culposo. Estrutura do
crime culposo, diferentemente daquela relativa ao crime doloso, engloba: conduta humana,
resultado e nexo de causalidade, além de compreender a imputação objetiva.

Crime culposo: CP, art. 18, II. Diz-se o crime: II - culposo quando o agente deu causa ao
resultado por imprudência, negligência ou imperícia.

Conceito: Culpa é a conduta voluntária que realiza um fato ilícito não querido pelo
agente, mas que foi por ele previsto (culpa consciente) ou lhe era previsível (culpa
inconsciente) e que podia ser evitado se o agente atuasse com o devido cuidado. OBS: De
acordo com a maioria, trata-se de elemento psicológico-normativo implícito na conduta.

Elementos da conduta culposa: 1) Conduta humana voluntária e lícita: Ação ou


omissão. A vontade do agente limita-se à realização da conduta, e não à produção do
resultado. No caso de culpa a vontade é dirigida a outros fins. Não obstante, o agente causa
o resultado porque atuou sem observar as normas de atenção, cuidado ou diligência
impostas pela vida de relação, tendo-se em vista as circunstâncias do fato concreto. A
conduta amolda-se no tipo culposo não por querer realizá-lo (fim), mas por causa do meio
utilizado que viola determinado dever de cuidado, cuidado existente quando é previsível a
ocorrência de um resultado desvalioso. Quando isto ocorre, fica caracterizada a tipicidade
culposa. 2) Violação de um dever de cuidado objetivo: O agente atua em desacordo com
o que esperado pela lei e pela sociedade (se atuasse com prudência e discernimento, evitaria
o evento). ATENÇÃO: A violação desse dever pode manifestar-se de várias formas
(modalidades de culpa). Imprudência: Afoiteza (conduta positiva – ação). Negligência: falta
de precaução (conduta negativa – omissão). Imperícia: falta de aptidão técnica para o
exercício de arte, ofício ou profissão. Pergunta de concurso: Na denúncia, o MP imputou ao
acusado conduta culposa por imprudência. O julgador, porém, percebeu tratar-se em
verdade de questionamento sobre imperícia. Nesse caso, deve o magistrado determinar a
baixa dos autos ao MP para emendar a denúncia (mutati libelli) ou pode simplesmente
“capitular” corretamente na decisão (emendatio libelli)? O MP tem que aditar a denúncia.
O réu se defendeu da imprudência, não lhe foi oportunizado defender-se e demonstrar que
era perito. Trata-se de caso de mutatio libelli (CPP, art. 384). 3) Resultado involuntário:
Haverá, pois, crime culposo quando o agente não deseja e nem assume o risco de produzir o
resultado criminoso previsível, mas, ainda assim, o produz. Se, ao contrário, houver a
inobservância de um dever objetivo de cuidado, mas não ocorrer a produção de um

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

resultado criminoso, não advirá crime culposo. A inevitabilidade do resultado exclui a


própria tipicidade, visto que a inobservância do cuidado devido deve ser causa do resultado
em caso de crime culposo. Em regra, o crime culposo é material (exige resultado
naturalístico). Pergunta de concurso: Existe delito culposo não material, isto é, sem
resultado naturalístico? Excepcionalmente, sim. Ex.: Lei 11.343/2006, art. 38. Prescrever
ou ministrar, culposamente, drogas, sem que delas necessite o paciente, ou fazê-lo em doses
excessivas ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Na modalidade
“prescrever”, o crime se consuma com a entrega da receita (ainda que o paciente não venha
a adquirir/utilizar a droga). 4) Nexo entre conduta e resultado. 5) Previsibilidade: é
exigível o cuidado objetivo quando o resultado era previsível para uma pessoa razoável e
prudente (homo medius), nas condições em que o agente atuou (previsibilidade objetiva).
Todavia, para estabelecer a culpa, ou seja, reprovabilidade pessoal, é necessária a
previsibilidade para o agente, nas circunstâncias concretas em que atuou e tendo-se em
vista suas condições pessoais (previsibilidade subjetiva). A previsibilidade objetiva,
todavia, é o limite mínimo da ilicitude nos crimes culposos. Portanto, apesar de típico e
antijurídico o fato, o autor pode ser desculpado ante a imprevisibilidade subjetiva, ou, em
outras palavras, o direito não lhe podia exigir, naquelas circunstâncias, um comportamento
diverso. A imprevisibilidade, por sua vez, afasta a prática de crime culposo e pode levar ao
caso fortuito. OBS: Previsibilidade (possibilidade de conhecer o perigo) não se confunde
com previsão (o agente conhece o perigo). ATENÇÃO: Na culpa consciente, o agente tem
previsão. A previsibilidade é só para a culpa inconsciente. 6) Tipicidade: CP, art. 18, par.
único. Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como
crime, se não quando o pratica dolosamente. Deve haver previsão legal da culpa para a
existência do crime culposo.

Espécies de culpa: há duas espécies de culpa: 1) Culpa consciente ou Culpa com previsão:
é aquela em que ocorre a efetiva previsão do resultado (sem aceitar o risco de produzi-lo).
No caso, o autor, deixando de observar a diligência a que estava obrigado, prevê o
resultado, que era previsível, mas confia convictamente que ele não ocorrerá – é a previsão
do previsível, mas não tolerável. 2) Culpa inconsciente ou Culpa com previsibilidade: O
agente não prevê o resultado, que, entretanto, era previsível. Ou seja: a culpa será
inconsciente se o agente não tiver previsto o resultado que poderia e deveria ter previsto.
Tendo em vista que previsível é o fato cuja possível superveniência não escapa à
perspicácia comum, na culpa inconsciente, também chamada de culpa sem previsão.

OBS: Culpa própria é aquela em que o agente não quer e não assume o risco de produzir o
resultado..

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

OBS 1: Dolo eventual e culpa consciente: Dolo eventual e culpa consciente apresentam um
traço comum, que, por conseguinte, dificulta a sua distinção: em ambos os casos, o agente
prevê o resultado. No dolo eventual, o indivíduo não se importa com o resultado. Já na
culpa consciente, o autor da infração penal não acredita que o resultado pode advir. Para
diferenciá-los, é preciso recorrer às chamadas teorias do dolo eventual.

OBS 2: Culpa imprópria ou Culpa por extensão ou por assimilação ou por equiparação: A
chamada culpa imprópria é, na verdade, uma conduta dolosa à qual a lei reservou a pena de
um crime culposo, pelo fato de a pena do crime culposo ser mais branda do que a do crime
doloso. É aquela em que o agente, por erro evitável, fantasia certa situação de fato,
supondo estar agindo acobertado por uma excludente de ilicitude (descriminante putativa).
Aqui, o agente supõe agir licitamente porque imagina, por erro, existir situação de fato que,
se existisse, tornaria a ação legítima. Em razão disso, provoca intencionalmente um
resultado ilícito. Apesar de a conduta ser dolosa, o agente responde por culpa (CP, art. 20,
par. 1º, segunda parte). A estrutura do crime é dolosa, porém é punido como se culposo
fosse por razões de política criminal. Atenção: Por isso, a culpa imprópria,
excepcionalmente, admite tentativa.

OBS 3: Pergunta de concurso: O que é culpa in re ipsa (também chamada de culpa


presumida)? R. Tratava-se de modalidade de culpa admitida pela legislação penal antes do
Código Penal de 1940. Consistia na simples inobservância de uma disposição regulamentar.
CUIDADO: Hoje, a culpa não mais se presume; deve ser comprovada.

OBS 4: O Direito Penal não admite compensação de culpas, diferentemente do Direito


Civil. Havendo concorrência de culpas, isto é, cada um violando o seu dever de cuidado,
haverá a punição isolada de cada autor (autoria colateral). Não se admite a chamada
compensação de culpas, ficando cada um responsável pelo dever de cuidado inobservado.
Da mesma forma, eventual culpa concorrente da vítima (exemplo: atravessar fora da faixa
de pedestre) não exclui a do agente (que avançara o sinal vermelho). Só há a exclusão
quando ocorrer a culpa exclusiva da vítima. Somente a culpa exclusiva da vítima isenta o
agente de responsabilidade penal.

OBS 5: EMBRIAGUEZ AO VOLANTE COM RESULTADO MORTE: Os Tribunais


Superiores têm entendido tratar-se de culpa consciente.

OBS 6: RACHA: Em regra é dolo eventual. No entanto, nos casos concretos, é possível
dolo eventual ou culpa consciente, de acordo com as circunstâncias.

Crime preterdoloso ou preintencional: É o crime agravado pelo resultado (CP, art. 19).
Dolo no antecedente + culpa no consequente. Análise de casos: Crime doloso qualificado
dolosamente (ex. homicídio qualificado); Crime culposo qualificado culposamente (ex.
incêndio culposo qualificado por morte culposa); Crime culposo qualificado dolosamente
(ex. homicídio culposo qualificado pela omissão de socorro); Crime doloso qualificado
culposamente (ex. lesão seguida de morte). Só a quarta hipótese acima prevista é o
preterdolo (dolo no antecedente + culpa no consequente). No crime preterdoloso, o
agente comete crime distinto do que havia projetado cometer, advindo resultado mais grave
decorrente da negligência em sentido amplo. Cuida-se, assim, de espécie de crime

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

qualificado pelo resultado, com dolo no antecedente e culpa no consequente. É uma figura
híbrida. Elementos do crime preterdoloso: Conduta dolosa visando determinado resultado;
Resultado culposo mais grave do que o projetado; Nexo causal entre conduta e resultado.
ATENÇÃO: Quando o resultado mais grave advém de caso fortuito ou força maior, não se
imputa ao agente a qualificadora.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

13.b. Registro, posse e comercialização de armas de fogo e


munição. SINARM. Lei 10.826/2003 (Estatuto do
Desarmamento).
Obras consultadas: Santo Graal 27º. Guilherme de Souza Nucci. Leis Penais e
Processuais Penais comentadas. Ed. Revista dos Tribunais. 3ª Edição. 2008; Gabriel
Habib. Leis Penais Especiais. Ed. Juspodivm. 2ª Edição, 2010; e informações obtidas na
Delegacia de Controle de Armas e de Produtos Químicos (DELEAQ) da Superintendência
da Polícia Federal no DF.

Legislação básica: Lei 10.826/03. Decretos 5.123/2004 e 3.665/2000.

1. Noções Gerais: Como o edital expressamente consigna no ponto “registro”, “porte” e


“SINARM”, faz-se importante um detalhamento sobre essas duas autorizações
administrativas, bem como sobre o sistema. Inicialmente, vale expor que registro,
transferência, aquisição e porte são coisas diferentes. A autorização para aquisição viabiliza
que a pessoa compre a arma no comércio, ou seja, adquira uma nova arma de fogo em loja
autorizada pela PF; adquira uma nova arma, que ingressará em circulação. A transferência
regulariza a titularidade sobre a arma de fogo, nas hipóteses em que uma pessoa vende a
terceiro uma arma de fogo sob sua posse, ou seja, que já está no mercado, portanto.
Registro e porte serão explicados abaixo, pois são os focos deste ponto do edital. A
autorização para aquisição ou para transferência não implica em automática e consequente
autorização para porte, cujo pedido deverá ser formalizado perante a PF e poderá ser
negado. A análise dos portes é rigorosa, e atualmente mais de 90% dos pleitos é indeferido
(Dados do Gabinete da SR/DPF/DF - atualmente, atuo como delegada-assistente da
Superintendente).

Registro: o certificado de Registro de Arma de Fogo, com validade em todo o território


nacional, autoriza o seu proprietário a manter a arma de fogo exclusivamente no interior de
sua residência ou domicílio, ou dependência desses, ou, ainda, no seu local de trabalho,
desde que seja ele o titular ou o responsável legal pelo estabelecimento ou empresa. (“Art.
3o É obrigatório o registro de arma de fogo no órgão competente. Parágrafo único. As
armas de fogo de uso restrito serão registradas no Comando do Exército, na forma do
regulamento desta Lei.”). A regulamentação das armas de fogo é feita pelo Ministério do
Exército, através do Regulamento para a fiscalização de produtos controlados, o R-105. Ele
expõe quais são as armas de uso permitido e uso restrito. A título de curiosidade, para fins
práticos: as armas de fogo de uso permitido são aquelas de calibres mais baixos (com
menos potência) como o revólver calibre 38 e o calibre 380. As armas de fogo de uso
restrito são as de calibres mais pesados, como a pistola semi-automática 9 mm (de uso
padrão dos policiais federais), as pistolas automáticas, fuzil FAL, submetralhadora HK
MP5, calibre .40; em geral, armas de uso de forças de segurança pública, além de carabinas,
rifles e semelhantes, semi-automáticos, de calibre superior a .22.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Porte: confere prerrogativa de portar arma fora de residência e local de trabalho de que é
titular. Ou seja, a pessoa poderá transitar em vias e logradouros públicos e privados com a
arma de fogo. Por lei, têm porte os integrantes das Forças Armadas, órgãos de segurança
pública (DETRAN não), das guardas municipais das capitais dos Estados e dos Municípios
com mais de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, limitada ao município e mesmo fora de
serviço (os integrantes das guardas municipais dos Municípios com mais de 50.000 e
menos de 500.000 habitantes, quando em serviço); os agentes da ABIN e do GSI, policiais
da Câmara e do Senado (a lei não prevê os das assembleias legislativas), agentes e guardas
prisionais (só no exercício da função; Dilma vetou em janeiro de 2013 o porto externo), as
empresas de segurança privada e de transporte de valores, integrantes das entidades de
desporto legalmente constituídas, auditores e analistas da Receita Federal, fiscais do
trabalho, servidores designados de tribunais e de MP´s, além de membros de MP e Justiça.
Existe uma discussão no âmbito da Justiça Federal de Brasília quanto aos oficiais de
Justiça. A PF não concede o porte, mas os juízes federais concedem, passando por cima da
lei federal, já que a regra é, segundo o artigo 6º do Estatuto, que “é proibido o porte de
arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação
própria e para” as pessoas previstas na legislação.

As armas de fogo utilizadas pelos empregados das empresas de segurança privada e de


transporte de valores serão de propriedade, responsabilidade e guarda das respectivas
empresas, somente podendo ser utilizadas quando em serviço. A autorização para o porte de
arma de fogo de uso permitido, em todo o território nacional, é de competência da Polícia
Federal e somente será concedida após autorização do SINARM, com eficácia temporária e
territorial limitada, e dependerá de demonstrar a sua efetiva necessidade por exercício de
atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física. A autorização de porte
de arma de fogo, prevista neste artigo, perderá automaticamente sua eficácia caso o
portador dela seja detido ou abordado em estado de embriaguez ou sob efeito de
substâncias químicas ou alucinógenas.

Questão prática: A Polícia Federal (Superintendência da PF no DF) lida com inúmeros


mandados de segurança que impugnam o ato decisório de não autorização de porte. O
principal argumento dos impetrantes é o de que se trata de um ato administrativo com
natureza de licença, o que implicaria que, se o impetrante cumpre aos requisitos do artigo 4º
do Estatuto do Desarmamento, ele tem direito subjetivo ao porte (“Art. 4o Para adquirir
arma de fogo de uso permitido o interessado deverá, além de declarar a efetiva
necessidade, atender aos seguintes requisitos: I - comprovação de idoneidade, com a
apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça
Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a
processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos; (Redação dada pela
Lei nº 11.706, de 2008) II – apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita
e de residência certa; III – comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica
para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento desta
Lei”). Ocorre que a licença é um tipo de ato enunciativo cujas características — como ato
vinculado e com contornos de definitividade — confrontam fortemente com a mens legis
do Estatuto do Desarmamento, cujo escopo, imposto pelo Poder Legislativo e não pela
Polícia Federal, é o de desarmar a população. O porte é ato administrativo enunciativo do

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

tipo autorização, ou seja, discricionário e precário. Afinal, como poderia a Polícia Federal
agir para pôr em prática a política de monitoramento e de controle da circulação de armas
no país — em prol da segurança pública, cuja tutela, especificamente no caso de armas de
fogo, lhe compete, por designação constitucional e legal — se acaso estivesse vinculada ao
preenchimento objetivo de requisitos e se sua decisão eventual fosse definitiva?

SINARM: o Sistema Nacional de Armas, instituído no Ministério da Justiça, no âmbito da


Polícia Federal, é responsável pelo controle de armas de fogo em poder da população.
Resumo da competência do SINARM (art. 2º): cadastrar: as características e a propriedade
de armas de fogo, as armas de fogo produzidas, importadas e vendidas no País; as
autorizações de porte e as renovações expedidas pela PF; as transferências de propriedade,
extravio, furto, roubo e outras ocorrências, inclusive as decorrentes de fechamento de
empresas de segurança privada e de transporte de valores; os produtores, atacadistas,
varejistas, exportadores e importadores autorizados de armas de fogo, acessórios e
munições. De outro lado, ao SIGMA (sistema gerenciado pelo Exército) compete controlar
armas das Forças Armadas, das PM´s, bombeiros, ABIN e do GSI.

Alteração legislativa de julho de 2012 – Lei 12.694/2012, que alterou a 10.826/03: Art. 7o-
A. As armas de fogo utilizadas pelos servidores das instituições descritas no inciso XI
(tribunais, MP´s, para uso exclusivo de servidores de seus quadros pessoais que
efetivamente estejam no exercício de funções de segurança) do art. 6o serão de
propriedade, responsabilidade e guarda das respectivas instituições, somente podendo ser
utilizadas quando em serviço, devendo estas observar as condições de uso e de
armazenagem estabelecidas pelo órgão competente, sendo o certificado de registro e a
autorização de porte expedidos pela Polícia Federal em nome da instituição. § 2o O
presidente do tribunal ou o chefe do Ministério Público designará os servidores de seus
quadros pessoais no exercício de funções de segurança que poderão portar arma de fogo,
respeitado o limite máximo de 50% (cinquenta por cento) do número de servidores que
exerçam funções de segurança. § 3o O porte de arma pelos servidores das instituições de
que trata este artigo fica condicionado à apresentação de documentação comprobatória do
preenchimento dos requisitos constantes do art. 4o desta Lei, bem como à formação
funcional em estabelecimentos de ensino de atividade policial e à existência de
mecanismos de fiscalização e de controle interno, nas condições estabelecidas no
regulamento desta Lei. § 5o As instituições de que trata este artigo são obrigadas a
registrar ocorrência policial e a comunicar à Polícia Federal eventual perda, furto, roubo
ou outras formas de extravio de armas de fogo, acessórios e munições que estejam sob sua
guarda, nas primeiras 24 (vinte e quatro) horas depois de ocorrido o fato.

O referido Estatuto visa tutelar a segurança pública e a incolumidade pública, buscando


punir comportamentos irregulares relacionados à arma de fogo, acessório ou munição. O
diploma legal, além de estabelecer tipos penais referentes ao porte e uso de armas de fogo,
também dispõe acerca de questões administrativas atinentes ao registro, posse e
comercialização de armas de fogo e munição, constituindo, portanto, um “estatuto”.

Salienta-se que o fato de haver o controle de armas pelo SINARM, órgão pertencente ao
Ministério da Justiça, não fixa abstratamente a competência da Justiça Federal para apreciar
os delitos previstos no Estatuto, ainda que a arma for de uso restrito ou privativo das Forças
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Armadas (STJ, CC 40393, 10/03/04) ou tiver sido armazenada em quartel, por militar, uma
vez que não se cuida de crime militar (STJ, CC 28251, 28/09/08). Assim, a competência
será da Justiça Federal quando for constatado que a infração foi praticada em detrimento de
bens, serviços ou interesse da União e suas entidades autárquicas ou empresas públicas, ou
quando ocorrer qualquer outra hipótese prevista no art. 109. É o caso do delito previsto no
art. 18 (tráfico internacional de arma de fogo), que é crime que se inicia no território
nacional e tende à consumação no estrangeiro (ou vice-versa), tendo o Brasil assumido, no
plano internacional, o compromisso de reprimi-lo por meio da Convenção Interamericana
de 1997 (decreto 3229/99) e também o Protocolo contra a Fabricação e o Tráfico de Armas
de fogo e componentes – complementando a Convenção das NU contra o Crime
Organizado, Decreto 5.941/06).

Destinação: armas, acessório e munições apreendidos que não mais interessarem ao


processo penal devem ser encaminhados ao Comando do Exército que poderá destruí-los ou
doá-los a órgão de segurança pública ou às Forças Armadas (art. 25 da Lei 10826/03 –
TRF3, AC 97030375685, 12/05/00). Por fim, o STF já declarou a inconstitucionalidade dos
dispositivos contidos na lei que vedavam a concessão de fiança e de liberdade provisória a
alguns crimes previstos no Estatuto. Vide: ADI 3112/DF.

2. Posse irregular de arma de fogo de uso permitido (art. 12):

Conduta delituosa: possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição
de uso permitido em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Esse elemento
normativo do tipo tem complemento em outras normas, especialmente nos decretos citados
na legislação básica.

Diferença entre posse e porte: por posse, entende-se a conduta de manter a arma intra
muros, no interior de sua residência ou local de trabalho de que é o responsável. Já porte é
extra muros, fora da residência ou local de trabalho. O transporte de arma de fogo no
interior do veículo, ainda que seja instrumento de trabalho como táxi e caminhão, configura
o crime de porte ilegal de arma. Vide STJ: AgRG no HC 83680, HC 116052.

Sujeitos do delito: crime comum na primeira parte. Na hipótese de possuir ou manter arma,
acessório ou munição no local de trabalho é crime próprio, pois o tipo exige que o agente
seja o titular ou responsável pelo estabelecimento ou empresa. Sujeito passivo é o Estado.

Consumação e tentativa: consuma-se o crime no momento em que o agente tem a arma de


fogo, acessório ou munição sob sua disponibilidade. A doutrina é controversa sobre a
possibilidade de tentativa (Nucci admite).

Objeto material: arma de fogo (instrumento que funciona através de deflagração de carga
explosiva, lançando ao ar projétil), acessório (é o apetrecho da arma de fogo), munição (é o
artefato explosivo utilizado pelas armas de fogo).

Classificação doutrinária: crime de perigo abstrato, doloso, de mera conduta.

Posse ou porte e concurso com tráfico: STJ HC 182359 / RJ, 27/11/2012: a absorção do

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

crime de porte ou posse ilegal de arma pelo delito de tráfico de drogas, em detrimento do
concurso material, deve ocorrer quando o uso da arma está ligado diretamente ao comércio
ilícito de entorpecentes, ou seja, para assegurar o sucesso da mercancia ilícita. Nesse caso,
trata-se de crime meio para se atingir o crime fim que é o tráfico de drogas; exige-se o nexo
finalístico entre as condutas de portar ou possuir arma de fogo e aquelas relativas ao tráfico.
Abolitio criminis indireta ou descriminalização temporária: É considerada atípica a conduta
relacionada ao crime de posse de arma de fogo, acessórios e munição seja de uso permitido
ou de uso restrito, incidindo a chamada abolitio criminis temporária nas duas hipóteses, se
praticada no período compreendido entre 23 de dezembro de 2003 a 23 de outubro de 2005.
Contudo, este termo final foi prorrogado até 31 de dezembro de 2008 somente para os
possuidores de armamentos permitido (art. 12), nos termos da Medida Provisória n.º 417 de
31 de janeiro de 2008, que estabeleceu nova redação aos arts. 30 a 32 da Lei n.º 10.826/03,
não mais albergando o delito previsto no art. 16 do Estatuto - posse de arma de fogo,
acessórios e munição de uso proibido ou restrito. Com a publicação da Lei n.º 11.922, de 13
de abril de 2009, o prazo previsto no art. 30 do Estatuto do Desarmamento foi prorrogado
para 31 de dezembro de 2009 no que se refere exclusivamente à posse de arma de uso
permitido. O Decreto n.º 7.473/11 e a Portaria n.º 797/2011 não estenderam o prazo para a
entrega de armas de uso permitido, nem poderiam fazê-lo, uma vez que ambas de
hierarquia inferior à lei que estabeleceu mencionado prazo. A presunção de boa-fé a que se
refere tais normas restringe-se àquele que entregar espontaneamente sua arma à Polícia
Federal, não abrangendo o possuidor ou proprietário que a mantiver ilegalmente em sua
posse/propriedade. Veja: HC 185338 / RJ, em 21/08/2112: A Sexta Turma, a partir do
julgamento do HC n.º 188.278/RJ, passou a entender que a abolitio criminis, para a posse
de armas e munições de uso permitido, restrito, proibido ou com numeração raspada, tem
como data final o dia 23 de outubro de 2005. Dessa data até 31 de dezembro de 2009,
somente as armas/munições de uso permitido (com numeração hígida) e, pois, registráveis,
é que estiveram abarcadas pela abolitio criminis. Desde 24 de outubro de 2005, as pessoas
que possuam munições e/ou armas de uso restrito, proibido ou com numeração raspada,
podem se beneficiar de extinção da punibilidade, desde que, voluntariamente, façam a
entrega do artefato. Para julgado do STJ, a abolitio criminis temporária alcança as posses
irregulares de arma de uso permitido e restrito também sob a égide da lei 9437/97 - HC
44267 / PA 03/12/2009.

Jurisprudências do final de 2012: caminhão não pode ser entendido como “lugar de
trabalho”. Arma em caminhão será porte ilegal. Veículo é usado profissionalmente, mas não
é endereço fixo, ou seja, não é lugar de trabalho. REsp 1.219.901-MG, 24/9/2012. Não há
como se aplicar a causa especial de aumento de pena prevista no art. 40, IV, da Lei n.
11.343/2006 em substituição à condenação pelo art. 16 da Lei n. 10.826/2003 quando
verificado que o crime de tráfico de drogas e o de posse ou porte ilegal de arma de fogo de
uso restrito são autônomos (HC 154060 / RJ, 26/11/2012). A mera ocorrência, em uma
mesma circunstância, dos delitos de porte ilegal de arma de fogo e contrabando não enseja
a reunião dos processos, pois, na espécie dos autos, um crime ou sua prova não é elementar
do outro, não se vislumbrando a existência da relação de dependência entre os delitos
(24/10/2012 - CC 120630 / PR). A mera ocorrência, em uma mesma circunstância, dos
delitos de posse ilegal de arma de fogo e tráfico internacional de drogas não enseja a
reunião dos processos, pois, na espécie dos autos, um crime ou sua prova não é elementar

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

do outro, não se vislumbrando a existência da relação de dependência entre os delitos –


24/10/2012 - CC 121535 / PR. A controvérsia cinge-se ao reconhecimento da possibilidade
de subsunção típica ao crime de posse irregular de arma de fogo de uso permitido na
hipótese de se encontrar o artefato bélico sem munição (arts. 12 e 14 da Lei n.
10.826/2003). A arma de fogo representa um instrumento eficiente para alcançar objetivos
espúrios, uma vez que intimida, constrange, violenta, transformando-se, assim, em um risco
objetivo à paz social. É irrelevante aferir a eficácia da arma para a configuração do tipo
penal, que é misto-alternativo, em que se consubstanciam, justamente, as condutas que o
legislador entendeu por bem prevenir, seja ela o simples porte de munição ou mesmo o
porte de arma desmuniciada. 21/08/2012 - AgRg no REsp 1326383 / DF.

3. Omissão de cautela (art. 13):

Conduta delituosa: deixar de observar as cautelas necessárias (é o dever de cuidado


objetivo, imposto a todos os que vivem sociedade) para impedir que menor de dezoito anos
ou pessoa portadora de deficiência mental se apodere de arma de fogo que esteja sob sua
posse ou que seja de sua propriedade.

Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o possuidor ou proprietário da arma de fogo, tanto faz se
legal ou ilegalmente. O sujeito passivo é a sociedade. Secundariamente, a integridade do
menor, do deficiente ou do prejudicado pelo emprego indevido da arma de fogo.

Consumação e tentativa: consuma-se com o efetivo apoderamento da arma pelo


inimputável. Inadmissível a tentativa por ser crime culposo.

Objeto material: é a arma de fogo que esteja sob a posse, ou seja, da propriedade do agente.

Classificação doutrinária: crime culposo, praticado por negligência, omissivo próprio, de


mera conduta, instantâneo e de perigo abstrato. Concurso de crimes: arma ilegal na mão de
menor – há concurso material de crimes (Guilherme de S. Nucci).

Conduta incriminada: no parágrafo único, do artigo, é incriminada a conduta do


proprietário ou diretor responsável de empresa de segurança e transporte de valores que
deixarem de registrar ocorrência policial e de comunicar à Polícia Federal (nota-se a dupla
obrigação: registrar a ocorrência em qualquer repartição policial estadual e comunicar a
Polícia Federal) perda, furto, roubo ou outras formas de extravio de arma de fogo, acessório
ou munição que estejam sob sua guarda, nas primeiras 24 (vinte quatro) horas depois de
ocorrido o fato. Trata-se de crime próprio, pois somente podem ser sujeitos ativos os
proprietários ou diretores responsáveis de empresas de segurança e de transporte de valores;
doloso, pois é necessário que o agente tome conhecimento do fato e se omita no dever de
comunicá-lo à Polícia Federal e registrar a ocorrência (o registro e a comunicação podem
ser feitos por prepostos). Trata-se de crime omissivo próprio, logo não admite a tentativa.

4. Porte Ilegal de arma de fogo de uso permitido (art. 14):

Conduta delituosa: portar (carregar consigo), deter, adquirir, fornecer, receber, ter em
depósito, transportar (levar o instrumento de um local para outro), ceder, ainda que

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo,
acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com
determinação legal ou regulamentar.

Sujeitos do delito: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito passivo é o Estado.

Consumação e tentativa: consuma-se quando o agente realiza um dos verbos. Em tese, é


possível a tentativa (em algumas condutas), embora seja difícil configurá-la, pois, de regra,
o início de um ato executório de uma conduta já configura a consumação de outra.

Arma desmuniciada: discussão doutrinária gira em torno da configuração, ou não, do crime


(se o bem jurídico é ameaçado ou lesionado) se a arma que o agente porta ou transporta está
desmuniciada e a munição não se encontrava em local próximo, que possibilite a sua pronta
utilização. O STF (HC 103539, HC 104410, HC 88757, HC 101994 e HC 107447) e o STJ
(HC 177232, HC 211823) estão se posicionando pela tipicidade da conduta, justificando no
fato de se tratar de crime de perigo abstrato. Haverá crime impossível, todavia, se a arma
estiver avariada, restando impedido, de forma permanente, o seu funcionamento (STJ, HC
26444, DJU 09/09/08).

Arma de brinquedo. Não é arma em sentido próprio, podendo ser objeto apenas de
contrabando (STJ, REsp 213054,24/10/01.

Elemento subjetivo: trata-se de crime doloso. Até a Lei 11.706/08, o art. 25 exigia perícia
na munição. Após a esta lei, que mudou a 10.826, não é mais necessária perícia na
munição. Mas se o crime foi antes desta lei, tem que ter havido perícia.

HC 97209/SC, rel. Min. Marco Aurélio, 16.3.2010. (HC-97209). Trata-se de tipo misto
alternativo (e não misto cumulativo). Portar ou ter em depósito armas de uso permitido e
restrito, no mesmo contexto fático, crime único, sem concurso formal (STJ).

HC 148.349-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 22/11/2011,


agravando-se, contudo, a pena-base. Concurso de porte ilegal e outros crimes: para maioria
da jurisprudência, não haverá concurso material se o porte da arma estiver no contexto do
crime consuntivo (que consome o outro, dito consumido ou consunto), sendo o caso de
progressão criminosa, em que o porte será consumido pelo roubo (fenômeno da
consunção). Se o porte da arma não estiver no contexto do crime consuntivo, haverá
concurso material. Arma periciada por quem não tem curso superior: por si só a nulidade da
perícia não invalida a caracterização do crime.

HC 98306/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 29.9.2009. (HC-98306). Mais jurisprudências


atualizadas: um só projétil sem arma: porte de munição é crime de perigo abstrato, mas, no
caso concreto, demonstrada a falta de lesividade (um só projétil), não há lesividade, não há
crime.

HC 194.468-MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 17/4/2012.CC 112314 / MA.
Prática de crime de porte de arma de fogo, previsto em lei especial (Lei nº 10.826/03) e sem
correspondência no Código Penal Militar, em local sujeito à administração militar, não

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

configura crime militar, nos termos do art. 9º do Código Penal Milita; conforme
entendimento desta Corte Superior de Justiça, a competência da Justiça Militar é firmada
pela natureza da infração, não pela condição de militar do agente. STJ: 11/11/2012 - HC
182359 / RJ: a absorção do crime de porte ou posse ilegal de arma pelo delito de tráfico de
drogas, em detrimento do concurso material, deve ocorrer quando o uso da arma está ligado
diretamente ao comércio ilícito de entorpecentes, ou seja, para assegurar o sucesso da
mercancia ilícita. Nesse caso, trata-se de crime meio para se atingir o crime fim que é o
tráfico de drogas, exige-se o nexo finalístico entre as condutas de portar ou possuir arma de
fogo e aquelas relativas ao tráfico. Não há como se aplicar a causa especial de aumento de
pena prevista no art. 40, IV, da Lei n. 11.343/2006 em substituição à condenação pelo art.
16 da Lei n. 10.826/2003 quando verificado que o crime de tráfico de drogas e o de posse
ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito são autônomos. O que importa para a
caracterização do delito descrito no art. 16, parágrafo único, IV, da Lei n. 10.826/2003 é o
porte de arma de fogo com numeração raspada, independentemente de ser arma de uso
restrito ou proibido, pois constitui espécie de crime autônomo, não vinculado à restrição
feita no caput. 20/11/2012 - REsp 1105890 / RS. HC 250853 / RS, de 13/11/2012. O crime
de porte de arma de fogo é de perigo abstrato, sendo desinfluente aferir se a arma de fogo é
capaz de produzir lesão real a alguém. AgRg no HC 236396 / ES (28/11/2012): no
julgamento do Recurso Especial n.º 1.193.805/SP, ficou assentado nesta Turma que o porte
de arma de fogo é delito de perigo abstrato, sendo irrelevante a circunstância de o artefato
estar ou não municiado. O crime previsto no art. 14 da Lei 10.826/2003, por ser delito de
mera conduta ou de perigo abstrato, configura-se com a simples conduta de portar a arma,
sendo "despicienda a ausência ou nulidade do laudo pericial da arma por ter sido realizado
por peritos sem conhecimento técnico especializado" (STF, HC 93188, 1.ª Turma, Rel. Min.
Ricardo Lewandowski, DJe de 5.2.2009) - HC 180717 / MG 26/10/2012. O porte ilegal de
arma de fogo não depende de lesão ou perigo concreto para caracterizar sua tipicidade, pois
o objeto jurídico tutelado não é a incolumidade física, e sim a segurança pública e a paz
social, colocados em risco com a posse ou o porte de armas à deriva do controle estatal,
mostrando-se irrelevante, portanto, o fato de a arma estar desmuniciada ou desmontada para
a configuração do crime. Constatado que o crime de porte de arma é conexo com o de
homicídio qualificado, e demonstrados os requisitos suficientes para a pronúncia, deve ele
ser submetido e decidido pelo Conselho de Sentença, conforme previsto no art. 78, I, do
Código de Processo Penal, preservada a competência constitucional do Tribunal do Júri
AgRg no HC 162322 / DF 19/09/2012.O princípio da consunção pressupõe que seja um
delito meio ou fase normal de execução do outro crime (crime fim), sendo que a proteção
de bens jurídicos diversos e absorção de infração mais grave pelo de menor gravidade não
são motivos para, por si sós, impedirem a referida absorção. Precedentes. Tendo o Tribunal
a quo afirmado que o crime de porte ilegal de arma de fogo fora meio necessário para a
perpetração do delito de caça, exaurindo-se ali sua potencialidade, entendimento em sentido
contrário quanto à autonomia e independência de tais comportamentos, demandaria
revolvimento do material fático/probatório dos autos, inviável em sede de recurso especial
ante o óbice contido na Súmula n.º 7/STJ. AgRg no REsp 1252305 / MG 14/09/2012.
Ademais, este Tribunal já firmou entendimento segundo o qual o porte ilegal de arma de
fogo desmuniciada e o de munições configuram hipóteses de perigo abstrato, bastando
apenas, para a consumação do crime, a prática do ato de levar consigo. Portanto, não se
mostra viável a aplicação do princípio da insignificância, tendo em vista que, embora não

340
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

seja expressiva a quantidade da munição apreendida (02 cartuchos de calibre 7,65), ela
apresenta potencialidade lesiva, mormente em poder de réu já condenado pelos crimes de
roubo e furto. Precedentes. HC 168656 / SP 5/9/2012. Se comprou a arma sabendo-a de
origem ilícita (crime de receptação) e depois vem a portá-la ou guardá-la em contextos
diferentes (momentos consumativos diferentes), não há consunção, mas concurso material.

REsp 1.133.986-RS, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 4/5/2010.

5. Disparo de arma de fogo (art. 15):

Conduta delituosa: disparar arma de fogo ou acionar munição em lugar habitado ou em suas
adjacências, em via pública ou em direção a ela, desde que essa conduta não tenha como
finalidade a prática de outro crime. Trata-se de crime subsidiário.

Distinção com o crime de periclitação da vida (art. 132 do CP): nesse crime, o disparo
ocorre no interior de local habitado, colocando em risco pessoa certa e determinada. Já no
crime de disparo de arma de fogo, o disparo ocorre em local aberto, colocando em risco um
número indeterminado de pessoas.

Sujeitos do delito: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito passivo é o Estado.

Consumação e tentativa: com o primeiro disparo da arma de fogo ou o acionamento da


munição. A tentativa é cabível.

Classificação doutrinária: crime comum, de perigo abstrato, de mera conduta, doloso.


Crime subsidiário: será o crime do art. 15 se não houver finalidade da prática de outro (ex:
tentativa de homicídio). Havendo outra finalidade, haverá consunção. A “outra finalidade”
pode ser crime mais grave (ex: tentativa de homicídio) ou menos grave (ex: ameaça).
Disparo absorve o porte ilegal (princípio da consunção), se esgotado este naquele.

6. Posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito (art. 16):

Conduta delituosa: possuir (manter a arma no interior de residência ou local de trabalho),


deter, portar (carregar a arma para fora da residência ou local de trabalho), adquirir,
fornecer, receber, ter em depósito, transportar (levar a arma de um local para outro), ceder,
ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar
arma de fogo, acessório ou munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em
desacordo com determinação legal ou regulamentar. As armas de uso proibido ou restrito
estão elencadas nos decretos de números 5.123/2004 e 3.665/2000.

Consumação e tentativa: em tese, é possível a tentativa (em algumas condutas), embora seja
difícil configurá-la, pois, de regra, o início de um ato executório de uma conduta já
configura a consumação de outra.

Sujeitos do delito: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito passivo é o Estado.

Classificação doutrinária: crime comum, de perigo abstrato, e de mera conduta, doloso,


comissivo.
341
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Condutas equiparadas: descritas nos seis incisos do parágrafo único do artigo: supressão
(fazer desaparecer, raspar) ou alteração (modificação ou remarcação) de numeração ou
qualquer sinal identificador da arma de fogo ou do artefato; modificar as características da
arma de fogo, de modo a torná-la equivalente a de uso proibido ou restrito, com especial
fim de induzir a erro a autoridade policial, perito ou juiz; posse, detenção, fabricação ou
emprego (utilização) de artefato explosivo ou incendiário; porte, na posse ou aquisição
(compra), transporte ou fornecimento, ainda que gratuitamente, de arma de fogo com a
numeração ou sinal identificador raspado (processo de raspagem), suprimido (a supressão
pode ser não só através da raspagem, mas também com a utilização de produtos químicos)
ou adulterado (remarcação); vende (comercializa), entrega (transmite a posse) ou fornece,
ainda que gratuitamente, arma de fogo (de uso permitido ou não), acessório, munição ou
explosivo à criança (até doze anos incompletos) ou adolescente (de 12 anos até 18 anos);
produzir, recarregar ou reciclar, sem autorização legal, ou adulterar, de qualquer forma,
munição ou explosivo. Jurisprudência: o porte ilegal de arma de fogo não depende de lesão
ou perigo concreto para caracterizar sua tipicidade, pois o objeto jurídico tutelado não é a
incolumidade física, e sim a segurança pública e a paz social, colocados em risco com a
posse ou o porte de armas à deriva do controle estatal, mostrando-se irrelevante, portanto, o
fato de a arma estar desmuniciada ou desmontada para a configuração do crime. 02/10/2012
- AgRg no AREsp 190443 / SC. Posse de arma com numeração raspada: art. 16, não
importando se o calibre é menor. REsp 1.036.597-RJ, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em
21/8/2008.

7. Comércio Ilegal de Arma de fogo: adquirir, alugar, receber, transportar, conduzir,


ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, adulterar, vender, expor à venda, ou
de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade
comercial ou industrial (o legislador equiparou à atividade industrial ou comercial a
qualquer forma de prestação de serviços, fabricação ou comércio irregular ou clandestino,
inclusive o exercido em residência) arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização
ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. É necessária para a
configuração do delito a prova da permanência da atividade comercial, industrial ou
prestação de serviços, já que a lei exige que seja “no exercício”.

Consumação e tentativa: consuma-se com a prática de qualquer das condutas. Admite


tentativa.

Sujeitos do delito: crime próprio, pois o sujeito exige a condição de comerciante ou


industrial; O sujeito passivo é o Estado.

Elemento subjetivo: é o dolo. Há elemento subjetivo específico, qual seja, “em proveito
próprio ou alheio”. Causa aumento de pena da metade se a arma, acessório ou munição
forem de uso proibido ou restrito (art. 19).

8. Tráfico internacional de arma de fogo:

Sujeito ativo: Qualquer pessoa. OBS: Crime especial em relação aos tipos dos artigos 334 e
318 do CP. Ex: Por força do princípio da especialidade, se um funcionário público
favorecer a entrada ou saída de arma de fogo, acessório ou munição deverá responder por

342
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

este crime, não se lhe aplicando o artigo 318,CP. OBS: Se houver motivação política,
haverá o crime do art. 12 da Lei de Segurança Nacional.

Conduta delituosa: importar, exportar, favorecer a entrada ou saída do território nacional (o


autor dessas duas últimas condutas pode ser funcionário público ou não), a qualquer título,
de arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização da autoridade competente (norma
penal em branco – autoridade competente é o Comando do Exército – art. 24). É tipo misto
alternativo, pois se praticar todos os núcleos do tipo incorrerá em apenas umcrime. Não se
exige habitualidade.

Conceito de arma de fogo: é dado pelo Decreto 3229/99, que promulgou a Convenção
Interamericana contra a fabricação e o tráfico ilícito de armas de fogo, munições,
explosivos e outros materiais correlatos. Arma de fogo é: a) qualquer arma que conste de
pelo menos uma cano pelo qual uma bala ou projétil possa ser expelido pela ação de um
explosivo, que tenha sido projetada para isso, ou que possa ser convertida facilmente para
tal efeito, excetuando-se as armas antigas fabricadas antes do século XX, ou suas réplicas;
ou b) qualquer arma ou artefato destrutivo, tal como bomba explosiva, incendiária ou de
gás, granada, foguete, lança-foguete, míssil, sistemas de míssil ou mina. OBS: ficando
comprovada a absoluta inaptidão para efetuar disparos, não poderemos identificar o objeto
como arma de fogo (STJ, HC 26444, 2003).

OBS: E as peças de reposição que não são acessórios? Baltazar entende que é atípica a
conduta que tenha por objeto peças de reposição, que não são, propriamente, acessórios,
sendo necessário, aqui aperfeiçoar o tipo legal, para incluir, expressamente, as peças ou
partes de armas no objeto destes e dos demais delitos.

Sujeitos do delito: crime próprio. A participação das pessoas mencionadas nos arts. 6 a 8
(aquelas autorizadas a usar armas) determina a incidência de causa de aumento de pena.

Consumação e tentativa: com a prática de qualquer uma das condutas (tipo misto
alternativo), independente de resultado. A tentativa é admissível (TRF da 4ª, 11/12/2012,
ACR 0001129-90.2007.404.7002: Tendo o agente sido abordado com munições e pequena
quantidade de medicamentos na zona primária, resta configurada a tentativa de tráfico
internacional de munições e descaminho. Impossível aplicação do princípio da
insignificância em razão do alto grau de reprovabilidade da conduta e da potencialidade
lesiva do objeto (STJ, HC 45099, 15/08/06). Tráfico de drogas e de armas no mesmo
contexto fático (única apreensão) é concurso formal perfeito, segundo TRF da 4ª
(12/12/2012 ACR 500229596.2012.404.7002): Não obstante a diversidade dos bens
jurídicos tutelados, esta Corte vem entendendo que a única conduta de importar drogas e
armas configura hipótese de concurso formal, sendo cabível, na cumulação de apenas dois
crimes, a majoração da pena no patamar de 1/6 (um sexto).

Causa aumento de pena: metade se a arma, acessório ou munição forem de uso proibido ou
restrito (art. 19). OBS: concurso entre as causas de aumento: se um agente autorizado a
portar arma de fogo importa uma arma de uso restrito, estaria caracterizado o crime do
artigo 18 e as causas de aumento de pena dos artigos 19 e 20. Há entendimento doutrinário
no sentido da possibilidade de se aplicar ao caso, por analogia, o artigo 68, § único, CP, que

343
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

dispõe que “no concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na partes


especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo,
todavia, a causa que mais aumente ou que mais diminua”.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

13.c. Crimes contra a ordem tributária e contra a seguridade


social.
Obras consultadas: Santo Graal 27º. Crimes federais. José Paulo Baltazar Júnior. 3ª
edição. 2008. Curso de Direito Previdenciário. Fábio Zambitte Ibrahim. 16ª edição. 2011.
Crimes federais. Adel El Tasse. 2011.

Legislação básica. Lei 8137/90. Art. 168-A do CP. Art. 337-A do CP. Art. 297 do CP. Art.
313-A e B do CP. Art. 171 do CP. Sumula vinculante nº 24.

Olhar o ponto 10c.

1. Ordem tributária.

A lei fundamental sobre o tema é a 8.137/90, sendo que os arts. 1º e 2º descrevem os crimes
em geral, enquanto o art. 3º trata dos crimes funcionais. Os arts. 1º, 2º e 3º da Lei 8.137/90
referem-se a normas penais em branco, que merecem complementação por elementos
conceituais próprios do Direito Tributário (Adel El Tasse, p. 26).

O bem jurídico afetado pelos crimes tributários é a ordem tributária, e não o tributo em si
considerado. Deve haver relevância econômica para que se configure o delito.

Nesse contexto, cabe a jurisprudência definir qual o valor mínimo para que incidam os
delitos.

Foi publicada a Portaria MF nº 75, de 29/03/2012, na qual o Ministro da Fazenda


determinou, em seu art. 1º, inciso II, “o não ajuizamento de execuções fiscais de débitos
com a Fazenda Nacional, cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$ 20.000,00
(vinte mil reais).

No final de 2013 o STJ (5ª e 6ª Turmas) apreciaram o tema e decidiram que o valor de
R$20.000,00, estabelecido na Portaria MF 75/2012, NÃO PODE ser considerado para
efeitos penais, ou seja, não deve ser utilizado como novo patamar para o princípio da
insignificância nos crimes contra a ordem tributária ou para o crime de descaminho, pois o
limite de R$20.000,00 somente é aplicado quando não houver, nos autos, garantia, integral
ou parcial, útil à satisfação do crédito, assim ,se não houver garantia a execução de até
R$20.000,00 será arquivada, mas se houver, prosseguirá. Todavia, no tocante ao valor de
R$10.000,00 não existe tal condição, pois havendo ou não garantia, haverá o arquivamento
quando o valor for este. Portanto, o STJ entende pela possibilidade desde que o valor
sonegado não seja superior a R$10.000,00 (art. 20 da Lei 10.522/02).

“1. Consoante julgados do STJ e do STF, aplicável, na prática de descaminho ou de


contrabando, o princípio da insignificância quando o valor do tributo suprimido é

345
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

inferior a R$ 10.000,00. 2. As contribuições instituídas pela Lei n.º 10.865/04, nos


termos do seu art. 2º, inciso III, não incidem sobre bens estrangeiros que tenham sido
objeto de perdimento, motivo pelo qual "o montante do valor devido do crédito
tributário, referente às mercadorias estrangeiras apreendidas, deve ser calculada sem a
incidência do PIS e do COFINS" (REsp n.º 1220448/SP, Rel. Min. CELSO LIMONGI
(Desembargador convocado do TJ/SP), DJe de 18/04/2011.) 3. Agravo regimental
desprovido. (STJ, 5ª Turma, Dj01/08/2012)

O STF não enfrentou o tema em 2013. PORÉM, já enfrentou o tema em 2014 e entendeu
que se aplica o valor de R$20.000,00 previsto na Portaria MF como patamar para a
aplicação do princípio da insignificância nos crimes contra a ordem tributária.

Quadro resumo da divergência entre STJ e STF:

Atenção: Para o STF o novo limite pode ser aplicado para fatos que aconteceram ANTES
da referida Portaria por ser norma mais benéfica para o réu.

Todavia, não é este o entendimento defendido por parte da doutrina, principalmente por
membros do MPF. Como exemplo, o Procurador da República Juliano Baggio Gasperin,
dispõe: “O que ocorre é que a Administração Fazendária considera que pode ser mais
dispendioso ao erário promover a cobrança judicial de débitos inscritos como dívida ativa
em valor igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais). Nesse caso, a ausência de

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

cobrança na esfera cível não deve influir na configuração do crime, ante a separação e
independência da esfera penal. (...). Por fim, não há dúvida que se poderia adotar como
critério de significância para os crimes contra a ordem tributária e descaminho valor de
R$100,00 (cem reais), previsto no § lº do art. 18, pois se procede o cancelamento do débito
inscrito na Dívida Ativa da União”.

Condição objetiva de punibilidade para os crimes contra a ordem tributária:

O crime tributário material somente se constitui com o lançamento definitivo do tributo


(Súmula vinculante nº 24 do STF).

Para o STF, desde o HC 86.236/PR – a falta de procedimento administrativo fiscal significa


que não existe ELEMENTO NORMATIVO DO TIPO. Conforme decidido e reiterado pelo
STF.

Como adverte Régis Prado, "a exata definição das condições objetivas de punibilidade é
questão assaz tormentosa. Embora majoritariamente aceita a existência de tais condições,
sua natureza jurídica é polêmica ainda não solucionada pelos cientistas do Direito Penal".
(...) Há autores que defendem que "as condições objetivas de punibilidade integram a noção
de tipo penal em sentido amplo, isto é, aquele engloba não apenas os elementos que
fundamentam positivamente o injusto, mas também os que condicionam a sua punibilidade.
As condições objetivas de punibilidade pertencem, pois, ao tipo penal porque condicionam
sua objetiva relevância penal" (Mir Puig, Mezger, 'apud' Régis Prado).

Em termos práticos, decisão paradigmática do STF sobre a matéria foi dada pelo Plenário
no HC 81.611 (rel. Min. Sepúlveda Pertence), em que se considerou tratar-se o lançamento
definitivo de "condição objetiva de punibilidade". Essa conclusão me parece irretocável
quando se toma em conta que "as condições objetivas de punibilidade são alheias à noção
de delito - ação ou omissão típica, ilícita ou antijurídica e culpável - e, de conseguinte, ao
nexo causal. Ademais, atuam objetivamente, ou seja, não se encontram abarcadas pelo dolo
ou pela culpa. São condições exteriores à ação e delas depende a punibilidade do delito, po
razões de política criminal (oportunidade, conveniência)" (Régis Prado).

Não desconsidero, entretanto, o voto proferido pelo Min. Peluso no HC 83.414, que
considerou o lançamento definitivo como "elemento normativo do tipo". Relendo várias
vezes o art. 1o da 8.137 não consegui encontrar, todavia, nenhuma menção à "constituição
definitiva do crédito" ou "lançamento definitivo". É pertinente, aqui, a lição de Paulo
Baltzar Jr.: "do ponto de vista dogmático, essa decisão está sujeita às críticas de ignorar a
diferença entre obrigação e crédito tributário, sendo este, e não aquela, constituída pelo ato
administrativo do lançamento. Demais disso, subordina a consumação do delito a um fato
externo ao agente".

Julgado que entende ser condição objetiva de punibilidade:


“CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (ARTIGO 1º DA LEI
8.137/1990).AUSÊNCIA DE CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA NA ESFERA
ADMINISTRATIVA QUANDO DO OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. FALTA DE
JUSTA CAUSA PARA A PERSECUÇÃO CRIMINAL. CONDIÇÃO OBJETIVA DE

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

PUNIBILIDADE. LANÇAMENTO DEFINITIVO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO NO


CURSO DA AÇÃO PENAL. CONVALIDAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. NULIDADE
ABSOLUTA.
1. Consoante o disposto na Súmula Vinculante 24, "não se tipifica crime material
contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da lei nº 8.137/90, antes do
lançamento definitivo do tributo".
2. No caso, estando pendente na seara administrativa a discussão acerca do débito
tributário, não há justa causa para a deflagração da ação penal.
3. O lançamento definitivo do tributo no curso da persecutio criminis, não convalida os
atos processuais até então praticados, eis que a inobservância da condição objetiva de
punibilidade constitui nulidade de natureza absoluta.
4. Recurso especial provido para anular toda a ação penal.” (REsp 1100959 / RJ, Rel:
Ministro Jorge Mussi, DJe 27/10/2011).
OBS: Crime de descaminho é crime formal: Para o crime de descaminho há divergência
quanto à condição objetiva de punibilidade, pois a 5ª Turma do STJ e a 2ª Turma do STF
entendem que o descaminho é crime formal, enquanto que a 6ª Turma entende que é crime
material. Entende-se que a posição majoritária é que é crime formal. Logo, dispensa o
lançamento.

Sujeito ativo: Nos arts. 1º e 2º da Lei 8.137/90, a conduta pode ser praticada por qualquer
pessoa, sem que haja exigência de condições especiais.

Para o cometimento do delito do art. 3º da Lei nº 8.137/90, é necessário que o agente exerça
função pública e que o ato praticado ocorra em razão desta função. O conceito de
funcionário público é retirado do art. 327 do CP.

Sujeito passivo: é o Estado, sempre afetado pelos crimes contra a ordem tributária.

A doutrina ainda aduz que, como o art. 1º fala em supressão ou redução de tributo, ele se
caracteriza como material. Já o art. 2º da Lei 8.137/90 tem natureza formal.

No tocante à pena de multa, há regra específica, presente nos arts. 8° e 10:


Art. 8°. Nos crimes definidos nos arts. 1° a 3° desta lei, a pena de multa será fixada
entre 10 (dez) e 360 (trezentos e sessenta) dias-multa, conforme seja necessário e
suficiente para reprovação e prevenção do crime.
Parágrafo único. O dia-multa será fixado pelo juiz em valor não inferior a 14
(quatorze) nem superior a 200 (duzentos) Bônus do Tesouro Nacional BTN.

Art. 10. Caso o juiz, considerado o ganho ilícito e a situação econômica do réu,
verifique a insuficiência ou excessiva onerosidade das penas pecuniárias previstas
nesta lei, poderá diminuí-las até a décima parte ou elevá-las ao décuplo.”
Diga-se, por fim, que como o objetivo destes crimes é proporcionar a arrecadação de verbas
para o Estado, criaram-se causas específicas de extinção de punibilidade, consubstanciadas
no pagamento integral, assim como no parcelamento do tributo, as quais se somam às
causas gerais de extinção de punibilidade previstas no art. 107 do CP (Baltazar, p. 454).

Na Lei 9.249/95, o art. 34 prevê a extinção de punibilidade dos crimes da Lei 8.137/90,

348
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

desde que seja promovido o pagamento integral do tributo ou contribuição social, inclusive
acessórios, antes do recebimento da denúncia.

No entanto, sobrevieram as regras do art. 15 da Lei 9964/00 (REFIS), art. 9º da Lei nº


10.684/03 (PAES ou REFIS II), que reconheceram os efeitos do parcelamento.

Ainda, conforme Baltazar, o art. 9º da Lei 10.684/03 regulou de forma ampla o tema da
extinção de punibilidade, tendo revogado o art. 34 da Lei 9.249/95. Assim, tem-se: 1) o
pagamento integral, mesmo após o transito em julgado, determina a extinção da
punibilidade para os crimes contra a ordem tributária em geral e crimes contra a ordem
tributária previdenciária, restando excluído o descaminho e outros crimes contra a
previdência social, como o estelionato; 2) o parcelamento, a qualquer tempo, determina a
suspensão da punibilidade, em regime que abrange os crimes contra a ordem tributária em
geral, bem como a sonegação de contribuição previdenciária, excluída a apropriação
indébita previdenciária (art. 168-a do CP); 3) o art. 9º da Lei n 10684/03 é regra
permanente e sua aplicação não fica limitada aos parcelamentos concedidos no regime do
PAES, mas tem efeito também em relação aos parcelamentos ordinários ou regulados por
leis posteriores; 4) o art. 34 da Lei 9249/95 foi revogado por incompatibilidade com o art.
9º da Lei 10684/03, de modo que não há falar em extinção de punibilidade em razão do
mero parcelamento, ainda que anterior ao recebimento da denúncia, o que possibilitará tão
somente a suspensão da punibilidade, operando-se a extinção apenas com o pagamento
integral.

Verifica-se que jurisprudência recente do STJ também aduz que o pagamento do tributo a
qualquer tempo, mesmo que após o transito em julgado, acarreta a extinção da punibilidade.
Veja-se:
HABEAS CORPUS. PENAL. ICMS. CRIME CONTRA ORDEM TRIBUTÁRIA.
ADESÃO AO PROGRAMA DE PARCELAMENTO INCENTIVADO (PPI) E
POSTERIOR PAGAMENTO DO DÉBITO, APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO.
EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 9.º, § 2.º, DA LEI
N.º 10.684/2003. PLEITO DE SOBRESTAMENTO DA EXECUÇÃO PENAL ATÉ O
JULGAMENTO DE REVISÃO CRIMINAL. HABEAS CORPUS CONCEDIDO.
1. O art. 9.º, § 2.º, da Lei n.º 10.684/2003 estabelece expressamente que da quitação
integral do débito tributário pela pessoa jurídica, decorre a extinção da punibilidade.
2. É entendimento jurisprudencial desta Corte Superior que com o advento da Lei n.º
10.684/03 o pagamento do tributo a qualquer tempo extingue a punibilidade quanto aos
crimes contra a ordem tributária. Precedente.
3. Habeas corpus concedido para sobrestar a execução do feito até que se julgue a
Revisão Criminal. (HC 232376 / SP, Relator: Ministra Laurita Vaz, DJe 15/06/2012.)
Obs.

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. CRIME CONTRA A ORDEM


TRIBUTÁRIA (ART. 1º DA LEI Nº 8.137/1990). 1. Tratando-se de crime material
contra a ordem tributária (art. 1º da Lei nº 8.137/1990), a competência para processar e
julgar o delito é do local onde houver ocorrido a sua consumação, por meio da
constituição definitiva do crédito tributário, sendo irrelevante a mudança de domicílio
fiscal do contribuinte. 2. Aplica-se a regra prevista no art. 70 do Código de Processo

349
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Penal, que determina a competência do Juízo do lugar em que se consumou o delito ou,
na hipótese de tentativa, do lugar em que foi praticado o último ato de execução. STJ,
08/08/2012. CC 120850 / BA

2. Seguridade social.

Duas figuras merecem realce quando se trata dos crimes contra a seguridade social. São os
crimes dos arts. 168-A, 337-A, todos do CP. Ainda, deve ser visto o estelionato em face do
INSS, razão pela qual se remete para o ponto pertinente.

Art. 168-A do CP: a conduta fundamental está prevista no caput, enquanto no par. 1º
constam as figuras equiparadas. O pressuposto fundamental, segundo Adel El Tasse (p. 33),
para que se tenha a tipificação da conduta do caput é o efetivo recebimento da contribuição
previdenciária. Em outras palavras, existe a conduta com o recebimento ou recolhimento da
contribuição e falta de repasse pelo sujeito ativo aos cofres públicos. É importante destacar
que o STJ, em 2010 (REsp 1113735/RS) uniformizou entendimento no sentido de que basta
o dolo genérico, não sendo necessária a prova do “animus rem sibi habendi” para a
configuração do tipo previsto no art. 168-A do CP. O bem jurídico tutelado é o patrimônio
da Previdência. Quanto à natureza jurídica deste crime, o STF (Inq 2537 AgR/GO, Relator
Ministro Marco Aurélio, 10/03/2008), afirmou que o crime de apropriação indébita
previdenciária não se consubstancia crime formal, mas omissivo material, no que é
indispensável a ocorrência de apropriação dos valores, com inversão da posse respectiva, e
tem por objeto jurídico protegido o patrimônio da previdência social. Em relação à extinção
da punibilidade, o par. 2º prevê que ela será extinta se o agente, espontaneamente, declarar,
confessar e efetuar o pagamento das contribuições, importâncias ou valores e prestar as
informações devidas à Previdência Social, antes do início da ação fiscal. Para a exclusão,
segundo Zambitte (p. 468), cabe o recolhimento integral do devido antes da ação fiscal, que
se inicia, em regra, pelo termo de início da ação fiscal – TIAF. O recolhimento posterior
não exclui a punibilidade, podendo, conforme o caso, gerar perdão judicial, se feito antes da
denúncia ou arrependimento posterior, se feito antes do recebimento da denúncia; ou trazer
circunstância atenuante, se feito após o recebimento da denúncia. No tocante ao
parcelamento, conforme Baltazar (p. 57), o delito do art. 168-A do CP não está abrangido
pela regra do art. 9º da Lei 10.648/03 na parte em que admite a suspensão da punibilidade
pelo parcelamento. Assim, sendo considerado revogado o art. 34 da Lei 9249/95 e superada
a interpretação jurisprudencial que emprestava ao parcelamento o efeito de extinção de
punibilidade imediata, tem-se que, para o delito do art. 168-A do CP, somente o pagamento
integral tem o efeito de determinar a extinção de punibilidade. O STJ aponta:
“RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA
PREVIDENCIÁRIA (ART. 168-A DO CÓDIGO PENAL). RESPONSABILIDADE
PENAL DA PESSOA JURÍDICA. RESTRIÇÃO A CRIMES AMBIENTAIS.
ADESÃO AO REFIS. DESCUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES. NECESSIDADE
DE PAGAMENTO INTEGRAL DO DÉBITO. DATA DO PARCELAMENTO.
APLICAÇÃO DA LEI Nº 9.964/2000. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE.
IMPOSSIBILIDADE. RETIRADA DA SOCIEDADE. IRRELEVÂNCIA. DOLO
ESPECÍFICO. DIFICULDADE FINANCEIRA DA EMPRESA NÃO

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

EVIDENCIADA. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. TESE A SER


ANALISADO APÓS A INSTRUÇÃO CRIMINAL. RECURSO IMPROVIDO.
1. A única previsão legal para a responsabilização criminal de pessoa jurídica ocorre
nas hipóteses de crimes ambientais e, mesmo assim, desde que haja também imputação
à pessoa física que por ela responde.
2. A adesão ao REFIS não implica, necessariamente, na extinção da punibilidade, que
está condicionada ao pagamento integral do débito. Considerando que a inclusão no
REFIS ocorreu em 28.04.00, quando já em vigor a Lei nº 9.964, publicada em
11.04.00, é esta a norma a ser aplicada, daí decorrendo a exigência de pagamento
integral do débito para a extinção da punibilidade.
3. O fato de o paciente não mais integrar a sociedade no momento do descumprimento
das obrigações assumidas no REFIS não altera esse quadro, considerando que a
punibilidade estava apenas suspensa, ficando sua extinção condicionada ao pagamento
integral do débito, o que não ocorreu.
4. O tipo previsto no art. 168-A do Código Penal não se esgota somente no "deixar de
recolher", isto significando que, além da existência do débito, deve ser analisada a
intenção específica ou vontade deliberada de pretender algum benefício com a
supressão ou redução do tributo, já que o agente "podia e devia" realizar o
recolhimento.
5. Não se revela possível reconhecer a inexigibilidade de conduta se não ficou
evidenciada a alegada crise financeira da empresa, cabendo ao magistrado de primeiro
grau melhor examinar a matéria após a instrução processual.
6. Recurso improvido. ” (RHC 20558 / SP, Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS
MOURA, DJe 14/12/2009).
Ao contrário do que falou o professor Baltazar, o professor Zambitte (p. 470) assevera que
o STF vem decidindo que é possível a suspensão da pretensão punitiva nos crimes de
apropriação indébito previdenciária, mesmo quando o parcelamento é feito após a sentença
condenatória, desde que antes do trânsito em julgado. Veja:
Ementa: Penal e tributário. Habeas corpus. Adesão ao REFIS. Parcelamento do tributo
na vigência da Lei n. 10.684/2003. Suspensão da pretensão punitiva. Pretendida
aplicação do art. 34 da Lei n. 9.249/1995. Indiferença para o deslinde da causa. 1. As
Leis ns. 10.684/2003 e 9.249/1995 condicionam a extinção da punibilidade ao
pagamento integral do tributo ou contribuição social, inclusive acessórios. 2.
Consectariamente, não cabe confundir pagamento com parcelamento, mercê de que
este tem como consequência lógica a suspensão da pretensão punitiva, ao passo que a
quitação do tributo, esta sim, implica a extinção da punibilidade. 3. In casu, no dia 15
de dezembro de 2009, os recorrentes firmaram acordo judicial para parcelar o débito
tributário apurado no auto de lançamento nº 0016759729, acarretando a suspensão da
ação penal. 4. Obviamente, o parcelamento projeta a dívida para o futuro e, por isso,
somente há que se falar em ausência de justa causa para a persecução penal após o
cumprimento integral da obrigação tributária, com a consequente extinção do feito
administrativo consubstanciado no auto de lançamento que deu suporte à denúncia, até
porque o descumprimento do que pactuado tem como consequência a retomada do
curso da ação penal, qual revelado pela literalidade de ambos os textos legais.
Precedentes: RHC 89.152/SC, 1ª T, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, DJ de
22/09/2006; HC 102.348/SC, 1ª T, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, DJe de 25/08/2011; HC
99.844/SP, 1ª T, Rel. Ministro DIAS TOFFOLI, DJe de 18/06/2010; E HC 96.681/SP,
1ª T, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, DJe de 10/02/2011. 5. Recurso Ordinário em
Habeas Corpus ao qual se nega provimento. (STF, RHC 109651, Relator (a): Min.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

LUIZ FUX, Julgamento: 22/05/2012 Órgão Julgador: Primeira Turma)”.

DENÚNCIA - INÉPCIA – OPORTUNIDADE DA ARTICULAÇÃO. O vício relativo


à denúncia há de ser veiculado na primeira oportunidade que a parte tiver para falar no
processo. DENÚNCIA – PARÂMETROS LEGAIS. Atendendo a denúncia ao figurino
legal, descabe cogitar de defeito a ponto de prejudicar a defesa. PROVA – PERÍCIA. O
pleito para realização de perícia deve ser formalizado no momento adequado e não
merece acolhida quando houver no processo documentos incontroversos. AÇÃO
PENAL – PROPOSITURA – CRIME TRIBUTÁRIO. A ação penal pode basear-se em
prova documental decorrente do crivo do fisco. PENA – DOSIMETRIA –
CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. Observados núcleos do artigo 59 do Código Penal,
não se pode falar de vício na fixação da pena-base acima do mínimo previsto para o
tipo. CRIME TRIBUTÁRIO – ARTIGO 9º DA LEI Nº 10.684/2003. Uma vez
alcançado o parcelamento do débito tributário, a teor do disposto no artigo 9º da Lei nº
10.684/2003, impõe-se a suspensão da pretensão punitiva e dos prazos prescricionais,
sendo que a liquidação do débito implica a extinção da punibilidade. ”(STF, HC 96681,
Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO
Julgamento: 13/04/2010 Órgão Julgador: Primeira Turma).
Nota-se portanto que o tema da suspensão da pretensão punitiva no art. 168-A é
controverso, mas há tendência em admiti-la, da mesma forma que ocorre nos demais crimes
tributários.

Art. 337-A do CP: o crime é o de sonegação de contribuição previdenciária, que está


formalmente inserido entre os crimes contra a Administração Pública, mas é crime contra a
ordem tributária (Baltazar, p. 415). O bem jurídico é a integridade ao erário ou a ordem
tributária, entendida como o interesse do Estado na arrecadação dos tributos. Conforme art.
337, par. 1º, extingue-se a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara e confessa as
contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social,
na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal. Atenção: ao
contrário do art. 168-A do CP que vincula a causa extintiva de punibilidade ao pagamento,
o art. 337-A aduz a mera confissão de dívida antes do início da ação fiscal. Atualmente, o
documento mais utilizado pelas empresas para tal fim é a GFIP.

O professor Zambitte (p. 472) entende que, por analogia in bonam partem, seria possível a
exclusão da punibilidade pelo pagamento, ainda que posterior ao início da ação fiscal.

Parcelamento:

No tocante ao parcelamento, a questão é polêmica. Antes do início da ação fiscal, a


punibilidade é necessariamente extinta, pois o parcelamento implica confissão de dívida
(Zambitte, p. 472). Mas e depois? Temos a seguinte pergunta: É possível que o réu, após ter
sido condenado com trânsito em julgado, faça o parcelamento do débito tributário? Nesse
caso, a execução da pena ficará suspensa? Se ele pagar integralmente a dívida, haverá a
extinção da punibilidade? Trata-se de tema polêmico, mas também prevalece que SIM.
Entende-se que as diversas leis que preveem parcelamento (inclusive o art. 69 da Lei nº
11.941/2009) não trazem nenhuma limitação de tempo para a quitação do débito e a
consequente extinção da punibilidade. Logo, o pagamento do tributo poderia ocorrer a
qualquer tempo, extinguindo assim a punibilidade. Como não há qualquer restrição quanto
352
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ao momento ideal para realização do pagamento, não cabe ao intérprete impor limitações ao
exercício do direito postulado. Incide, dessa maneira, o disposto no art. 61, caput, do CPP:
Art. 61. Em qualquer fase do processo, o juiz, se reconhecer extinta a punibilidade, deverá
declará-lo de ofício.

Decisão do STJ de 2013: PARCELAMENTO DO DÉBITO TRIBUTÁRIO APÓS A


CONDENAÇÃO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO E SUSPENSÃO DA
EXECUÇÃO: O simples requerimento de inclusão no parcelamento instituído pela Lei nº
11.941/2009, sem demonstração da correspondência dos débitos tributários sonegados com
os débitos objeto do requerimento, não acarreta a suspensão da execução de pena aplicada
por crime contra a ordem tributária. É necessária a comprovação de que o débito objeto de
parcelamento diga respeito à ação penal ou execução que se pretende ver suspensa, sendo
insuficiente a mera adesão ao Programa de Recuperação Fiscal III. [STJ. 5ª Turma. REsp
1.234.696-RS, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 17/12/2013].

Outros crimes que envolvem a seguridade social:

De início, a falsificação de documento público dos pars. 3º e 4º do art. 297, que tratam da
inserção ou omissão de dados relativos à Previdência Social. Enquanto o par. 3º trata de um
crime comissivo, o par. 4º versa sobre um crime omissivo. Caso a falsidade tenha sido feita
no intuito de deixar de pagar contribuição previdenciária, ela será absorvida pelo crime de
sonegação de contribuição previdenciária, não se configurando concurso de crimes (RHC
1506/SP, STJ) – Zambitte, p. 475. Ainda, é de se mencionar a inserção de dados falsos em
sistema de informações (art. 313-A), que se caracteriza como formal, próprio (só o
funcionário autorizado pode praticá-lo) e comissivo. Também, pode envolver aspectos de
natureza previdenciária, o crime do art. 313-B, que alude à modificação ou alteração não
autorizada de sistema de informações. É crime próprio. A diferença básica deste para o
crime do art. 313-A é a ausência de dolo específico, já que a mera modificação ou alteração
dolosa, com qualquer fim, caracteriza o tipo penal. Por fim, cumpre mencionar o
estelionato do art. 171, par. 3º, do CP (estelionato previdenciário), que lesiona o patrimônio
da seguridade social, sendo material (concretiza-se com a obtenção da vantagem indevida).
Há bastante divergência sobre a natureza deste ilícito: permanente, continuado ou
instantâneo? Acerca deste assunto o STF atribui ao delito a classificação de acordo com o
sujeito ativo. Em relação ao terceiro responsável pela realização da fraude que dará origem
ao recebimento ilícito, o delito é instantâneo de efeito permanente, enquanto que para o
beneficiário, que recebe os valores mensalmente, ele é permanente. Na primeira hipótese, o
termo inicial para a contagem do lapso prescricional é a data do recebimento indevido da
primeira prestação do benefício obtido pelo terceiro beneficiado pela fraude. Na segunda
hipótese, o termo a quo do prazo prescricional é a data da cessação do percebimento
indevido do benefício obtido mediante fraude praticada por ato próprio (art. 111, Inc. III,
CP).
“É firme a jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal no sentido de que o crime de
estelionato previdenciário praticado pelo próprio beneficiário tem natureza
permanente, e, por isso, o prazo prescricional começa a fluir a partir da cessação da
permanência e não do primeiro pagamento do benefício”. (STF, HC 113179,
julgamento: 22/05/2012, Ministra Carmen Lúcia).

353
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

“1. O agente que perpetra a fraude contra a Previdência Social recebe tratamento
jurídico-penal diverso daquele que, ciente da fraude, figura como beneficiário das
parcelas. O primeiro pratica crime instantâneo de efeitos permanentes; já o segundo
pratica crime de natureza permanente, cuja execução se prolonga no tempo,
renovando-se a cada parcela recebida da Previdência. 2. Consectariamente, em se
tratando de crime praticado pelo beneficiário, o prazo prescricional começa a fluir da
cessação da permanência”. Precedentes: HC nº 99.112, rel. Min. Marco Aurélio, j.
20/4/2010, 1ª Turma; HC 101.481, rel. min. Dias Toffoli, j. 26/4/2011, 1ª Turma; HC
102.774/RS, rel. Min. Ellen Gracie, j. 14/12/2010, 2ª Turma, DJ de 7/2/2011. (STF, HC
102049, Relator: Ministro Luiz Fux, DJ 12-12-2011).

MPF: A 2°Câmara de Coordenação e Revisão do MPF entende que crime praticado em


detrimento da Previdência Social não permite a aplicação do princípio da insignificância.
Boletim Ano II, n° 30, de Junho de 2012. A 2°Câmara de Coordenação e Revisão do MPF
entende que em crimes contra a ordem tributária, o princípio da insignificância aplica-se
apenas ao descaminho. Boletim Ano II, n°28, 2012. A 2°Câmara de Coordenação e Revisão
do MPF decide que apropriação indébita previdenciária é crime formal e independe da via
administrativa para o início da ação penal. Boletim Ano II, n°26, 2012. A 2°Câmara de
Coordenação e Revisão do MPF entende que parcelamento de tributo não é causa para
arquivamento, mas tão somente para sobrestamento das investigações. Boletim Ano II,
n°26, 2012. A 2°Câmara de Coordenação e Revisão do MPF entende que a extinção da
punibilidade de crime tributário só se consuma mediante pagamento integral do débito
tributário. Boletim Ano II, n°19, 2011.

Trechos de jurisprudência:

“O termo inicial do prazo prescricional do crime previsto no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990
é a data da entrega de declaração pelo próprio contribuinte, e não a inscrição do crédito
tributário em dívida ativa”. HC 236.376-SC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em
19/11/2012.

“Quando interrompido pelo pedido de adesão ao Refis, o prazo prescricional de 5 anos para
a cobrança de créditos tributários devidos pelo contribuinte excluído do programa reinicia
na data da decisão final do processo administrativo que determina a exclusão do devedor do
referido regime de parcelamento de débitos fiscais”. O Programa de Recuperação Fiscal
Refis, regime peculiar de parcelamento dos tributos REsp 1.144.963- SC, Rel. Min.
Herman Benjamin, julgado em 20/11/2012.

“A incompatibilidade entre os rendimentos informados na declaração de ajuste anual e


valores movimentados no ano calendário caracteriza a presunção relativa de omissão de
receita”. Precedentes citados: RHC 20.438-SP, DJ 17/12/2007, e REsp 792.812-RJ, DJ
2/4/2007. REsp 1.326.034-PE, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 2/10/2012.

“A Turma entendeu que não há justa causa para a ação penal quanto ao crime de
descaminho quando o crédito tributário não está devidamente constituído”. Precedentes
citados: HC 139.998-RS, DJe de 14/2/2011, e HC 48.805-SP, DJ de 19/11/2007. RHC

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

31.368-PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 8/5/2012.

“A Turma entendeu que é possível o reconhecimento da continuidade delitiva entre o crime


de sonegação previdenciária (art. 337-A do CP) e o crime de apropriação indébita
previdenciária (art. 168-A do CP) praticados na administração de empresas de um mesmo
grupo econômico”. Precedente citado do STF: AP 516-DF, DJe 6/12/2010; do STJ: HC
86.507-SP, DJe 1º/7/2011, e CC 105.637-SP, DJe 29/3/2010. REsp 1.212.911-RS, Rel. Min.
Sebastião Reis Júnior, julgado em 20/3/2012.

“Uso de recibos ideologicamente falsos. Declaração de irpf. Tipificação: Constitui mero


exaurimento do delito de sonegação fiscal a apresentação de recibo ideologicamente falso à
autoridade fazendária, no bojo de ação fiscal, como forma de comprovar a dedução de
despesas para a redução da base de cálculo do imposto de renda de pessoa física (IRPF),
(Lei n. 8.137/1990)”. (HC 131.787-PE / 5ª Turma / inf. – 502, STF).

“Medidas investigatórias. Delitos conexos a crimes contra a ordem tributária. Ausência de


lançamento definitivo: Não há nulidade na decretação de medidas investigatórias para
apurar crimes autônomos conexos ao crime de sonegação fiscal quando o crédito tributário
ainda pende de lançamento definitivo. Conforme a jurisprudência do STF, à qual esta Corte
vem aderindo, não há justa causa para a persecução penal do crime de sonegação fiscal
antes do lançamento do crédito tributário, sendo este condição objetiva de punibilidade”.
(HC148.829-RS / 5ª Turma / inf. – 502 STF).

“CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA PRATICADO POR FUNCIONÁRIO


PÚBLICO (ARTIGO 1º, INCISO II, COMBINADO COM OS ARTIGOS 11 E 12 DA LEI
8.137/1990, NA FORMA DO ARTIGO 71 DO CÓDIGO PENAL). 1. O procedimento
especial previsto nos artigos 513 a 518 do Código de Processo Penal só se aplica aos delitos
funcionais típicos, descritos nos artigos 312 a 326 do Código Penal”, STJ.

“O crime previsto no inciso V do artigo 1º da Lei nº 8.137/90 - "negar ou deixar de


fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de
mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo
com a legislação" - prescinde do processo administrativo-fiscal e a instauração deste não
afasta a possibilidade de imediata persecução criminal”. (HC 96200 / RT 900). STF.

“No âmbito dos crimes contra a ordem tributária, tem-se admitido, tanto em sede
doutrinária quanto jurisprudencial, como causa supralegal de exclusão de culpabilidade a
precária condição financeira da empresa, extrema ao ponto de não restar alternativa
socialmente menos danosa que não a falta do não recolhimento do tributo devido.
Configuração a ser aferida pelo julgador, conforme um critério valorativo de razoabilidade,
de acordo com os fatos concretos revelados nos autos para a configuração do crime de
apropriação indébita previdenciária, basta a demonstração do dolo genérico, sendo
dispensável um especial fim de agir, conhecido como animus rem sibi habendi (a intenção
de ter a coisa para si). Assim como ocorre quanto ao delito de apropriação indébita
previdenciária, o elemento subjetivo animador da conduta típica do crime de sonegação de
contribuição previdenciária é o dolo genérico, consistente na intenção de concretizar a
evasão tributária”. AP N. 516-DF, STF.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

14.a. Teoria do tipo omissivo.


Principais textos consultados: Santo Graal 27; Gueiros, Artur, 2012; Resumos trf1 e
5/2012.

Legislação: art. 13 do CP.

Galvão: defende que os crimes omissivos e sua incriminação, citando o princípio da


posição de garantidor, insere-se no princípio da adequação social.

Gueiros: Omissão é abstenção de atividade que o agente podia e devia realizar. Omissão,
em consequência, não é mero não fazer, mas, sim, não fazer algo que, nas circunstâncias,
era ao agente imposto pelo direito e que lhe era possível submeter ao seu poder final de
realização. O dever de agir é essencial à omissão.

Histórico (Galvão): As condutas podem ser comissivas (positivas) ou omissivas


(negativas). Crimes comissivos: o agente direciona a sua conduta a uma finalidade ilícita.
Crimes omissivos: há uma abstenção de uma atividade que era imposta pela lei ao agente,
como no crime de omissão de socorro (art. 135).

A causalidade na omissão: A teoria da omissão adotada pelo CP foi a teoria normativa,


pois não é possível estabelecer nexo causal entre um omissão e um resultado naturalístico.
Ou seja: Tratando-se de um conceito normativo, não se considera apropriado falar na
existência de uma relação de causalidade física (material) entre a omissão e o resultado,
visto que, como é de conhecimento geral, do nada, nada surge (ex nihilo nihil fit) [Nélson
Hungria diz que querer demonstrar que a omissão é mecanicamente causal equivale a
querer provar a “quadratura do círculo”]. Assim, caberá a lei penal trazer a omissão como
relevante, devendo ser valorada se a omissão gera responsabilidade do indivíduo. OBS:
Não impedir o resultado, quando aquele tinha obrigação de impedi-lo, equivale como se
tivesse ocasionado o resultado.

OBS 1: diante da Teoria normativa, podemos dizer que na omissão, não há o nexo de
causalidade, há o nexo de não impedimento. A omissão se relaciona com o resultado pelo
seu não impedimento e não pela sua causação. E esse não impedimento é erigido pelo
Direito à condição de causa, isto é, como se fosse a causa real, determinando-se a
imputação objetiva do fato. Atenção: Saliente-se, contudo, que a relação de não
impedimento só é decisiva para a tipificação do crime comissivo por omissão, uma vez que
no omissivo puro não há que se falar em relação entre determinada conduta e o resultado,
pois o último é desnecessário, já que o fato se amolda diretamente no tipo definidor da
conduta omissiva. Trata-se, pois, de um puro exercício de tipicidade.

OBS 2: Nexo de evitação: Termo utilizado por Zaffaroni. É sinônimo de nexo de não
impedimento, ou seja, é o nexo entre conduta omitida e resultado nos crimes omissivos
impróprios.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Classificação: Os crimes omissivos podem ser próprios (puros ou simples) ou impróprios


(comissivos por omissão ou omissivos qualificados). 1) Crimes omissivos próprios, puros
ou simples: são os que objetivamente são descritos como uma conduta negativa, de não
fazer o que a lei determina, consistindo a omissão na transgressão da norma jurídica e não
sendo necessário qualquer resultado naturalístico. São delitos nos quais existe o chamado
dever genérico de proteção. Aqui há omissão de ação própria. Ele é calcado em um dever
de solidariedade humana que deve existir no meio social (Juarez Cirino dos Santos). Há
quem diga que não cabe a teoria normativa em tais casos. 2) Crimes omissivos
impróprios, impuros, promíscuos, espúrios, qualificados ou comissivos por omissão:
são aqueles que se perfazem quando o omitente, pela posição especial em que se colocou,
não evita a produção do resultado a que estava obrigado a impedir. Para essa categoria
delitiva a lei impõe ao agente não apenas o dever de motivar-se, mas, igualmente, o dever
de atuar para impedir a ocorrência do evento desvalioso. Esses indivíduos especialmente
vinculados com determinados bens jurídicos, são chamados de garantidores, pois são a
garantia de que um resultado lesivo não ocorrerá, pondo em risco ou lesando um interesse
tutelado pelo Direito. Só podem ser praticados pelas pessoas referidas no § 2º do art. 13
(cláusula geral), uma vez que para elas existe um dever especial de proteção, razão pela
qual cabe a análise do nexo de não impedimento. São elas: I – pessoa que se encontre na
posição de garante ou garantidor, ou seja, que tenha a obrigação legal de cuidado, proteção
ou vigilância; II – Pessoa que, de outra forma, assuma a responsabilidade de impedir o
resultado [é a assunção voluntária da missão de garantidor e essa assunção pode se dar
formal ou informalmente (até mesmo com um simples gesto positivo ou acenar a cabeça)];
III – Pessoa que, com seu comportamento anterior, tenha criado o risco da ocorrência do
resultado (No caso, a responsabilidade origina-se da atuação precedente que cria ou acentua
um estado de perigo para o bem jurídico. Trata-se do princípio da ingerência. Pouco
importa que esse comportamento anterior tenha sido doloso ou culposo. Em qualquer
hipótese, em virtude da situação de risco criada, deve o garantidor agir para evitar o
resultado latente. Conforme lecionado pela doutrina, quem cria o perigo de dano tem a
obrigação ou dever jurídico de afastá-lo).

Coautoria em crimes omissivos (próprios e impróprios): segundo entendimento


majoritário é possível a coautoria em comissivos. O mesmo ocorre com a participação.
Dissecando melhor: Coautoria e tentativa em crimes omissivos próprios: Para Nilo
Batista, não se cogita de coautoria nos delitos omissivos, uma vez que cada agente possui o
seu dever de agir de forma individualizada. Artur Gueiros: A culpa stricto sensu geralmente
não é prevista nos crimes omissivos próprios, assim como a tentativa no crime omissivo
próprio está categoricamente afastada, uma vez que se trata de delito unissubsistente (delito
com um único ato executório). Da mesma maneira, não há coautoria ou participação
punível em crime omissivo próprio. Por fim, se alguém, pela violência ou ameaça, impede a
ação salvadora devida, praticará crime comissivo, tendo em vista o resultado. Não há
autoria mediata em crime omissivo. A instigação, igualmente, é ação e se resolve segundo
os critérios dos crimes comissivos. Coautoria em crimes omissivos impróprios: A
tentativa é perfeitamente possível nos crimes de omissão imprópria, pois como se trata de
um delito material, o resultado poderá não se verificar por circunstâncias alheias à vontade

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

do garantidor(posição majoritária). Quanto ao concurso de agentes, vale ressaltar que o


delito de omissão imprópria requer do sujeito uma qualidade especial. Em razão disso, não
cabe falar em coautoria ou em participação, uma vez que cada garantidor viola, por si só, o
seu dever de agir, vinculando-se, isoladamente, por força da lei, ao resultado. OBS 1: para
que aconteça o crime comissivo por omissão é necessário que a pessoa tenha o poder de
agir, pois não se pode exigir do garantidor que está no RJ que evite o resultado que está por
acontecer em SP. OBS 2: Se se tratar de crime comissivo por omissão doloso, o tipo
subjetivo requer a consciência da posição de garantidor. O erro quanto a esse estado é o
erro de tipo, que exclui o dolo. No crime comissivo por omissão culposo, o agente viola
duas ordens normativas: a primeira corresponde ao referido dever de agir; a segunda, ao
dever objetivo de cuidado.

Tabela resumo (cortada em duas partes):

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

QUESTÃO DE PROVA: Crimes omissivos. O que é o garantidor? Pode concurso de


pessoas? Pode tentativa?

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

14.b. Crimes de tráfico ilícito e uso indevido de drogas.


Bibliografia: Santo Graal 27º; Baltazar Júnior, José Paulo. Crimes Federais. 7ª. edição rev.
e atualizada. Editora Livraria do Advogado,2011.

Referência Legislativa: Lei n. 11.343/2006.

A Lei n. 11.343/06 adotou a expressão “drogas” para definir o objeto material (art. 1º,
parágrafo único). Abandonou-se, portanto, a distinção entre entorpecentes e outras drogas.

O bem jurídico protegido é a saúde pública. “Bem por isso, critica-se a incriminação das
condutas praticadas pelo usuário ao argumento de que, sendo o bem jurídico protegido a
saúde pública, o usuário não a ofenderia, uma vez que só prejudica a si mesmo (princípio
da alteridade). O contra-argumento é que a saúde de cada cidadão integra a saúde
pública” (Baltazar, pág.828).

Considera-se crime de perigo abstrato.

Os crimes da Lei 11.343/06 são comuns, com exceção daquele do art. 38, na modalidade
prescrever, que é próprio, pois o ato é privativo de médico ou dentista. O sujeito passivo é a
coletividade.

Consideração inicial: O procedimento especial: A Lei n. 11.343/2006 tipifica os delitos


envolvendo drogas. Além de prever os crimes, a referida Lei também traz o procedimento,
ou seja, o rito que deverá ser observado pelo juiz. Desse modo, a Lei n. 11.343/2006 traz
um procedimento especial que possui algumas diferenças em relação ao procedimento
comum ordinário previsto no CPP. Uma das diferenças reside no momento em que é
realizado o interrogatório do réu. Vejamos:
CPP (art. 400) Lei nº 11.343/06 (art. 57)
O art. 400 do CPP foi alterado pela Lei O art. 57 da Lei de Drogas prevê que, na
n.11.719/2008 e, atualmente, o audiência de instrução e julgamento, o
interrogatório deve ser feito depois da interrogatório do acusado é feito antes da
inquirição das testemunhas e da realização inquirição das testemunhas. Em suma, o
das demais provas. Em suma, o interrogatório é o primeiro ato da audiência
interrogatório passou a ser o último ato da de instrução.
audiência de instrução (segundo a antiga
previsão, o interrogatório era o primeiro
ato).

Portanto: mesmo sendo mais favorável ao réu ser ouvido depois, pois após o acusado ouvir
o relato trazido pelas testemunhas poderá decidir a versão dos fatos que irá apresentar [se,
por exemplo, avaliar que nenhuma testemunha o apontou como o autor do crime, poderá
361
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

sustentar a negativa de autoria ou optar pelo direito ao silêncio. Ao contrário, se entender


que as testemunhas foram sólidas em incriminá-lo, terá como opção viável confessar e
obter a atenuação da pena], a lei de drogas tem rito especial, afastando a regra geral do CPP.
Assim decidiu o STJ em 2014.

STJ, 2014: No procedimento da Lei de Drogas, o interrogatório continua sendo o primeiro


ato da audiência: Não gera nulidade o fato de, no julgamento dos crimes previstos na Lei
11.343/2006, a oitiva do réu ocorrer antes da inquirição das testemunhas. Segundo regra
contida no art. 394, § 2º, do CPP, o procedimento comum será aplicado no julgamento de
todos os crimes, salvo disposições em contrário do próprio CPP ou de lei especial. Logo, se
para o julgamento dos delitos disciplinados na Lei 11.343/2006 há rito próprio (art. 57, da
Lei 11.343/2006), no qual o interrogatório inaugura a audiência de instrução e julgamento,
é de se afastar o rito ordinário (art. 400 do CPP) nesses casos, em razão da especialidade.
[STJ. 5ª Turma. HC 275.070-SP, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 18/2/2014].

Art. 33, Lei n. 11.343/06:

Quanto ao sujeito ativo, o delito admite coautoria ou participação, respondendo o agente


que de outra forma contribuiu para o fato, ainda que não tenha praticado a conduta descrita
no verbo nuclear do tipo, como o transporte da droga, não sendo exigida a posse direta para
o reconhecimento do delito.

O fato de ser o agente usuário ou dependente não impede que responda pelo crime de
tráfico, previsto atualmente no art. 33 da Lei n. 11.343/06, quando a quantidade e outras
circunstâncias indicarem que a droga não era destinada ao consumo próprio.

O art. 12 da Lei n. 6.368/76 corresponde ao art. 33 da Lei atual, havendo apenas duas
alterações de relevo na nova redação: 1) aumento da pena mínima e; 2) criação de um
dispositivo autônomo para o fornecimento gratuito (art. 33, §3º).

Importar é trazer a droga do exterior para dentro do Brasil. Não se exige, para a
configuração da modalidade, que o agente tenha trazido a droga pessoalmente. Exportar é
levar a substância para o exterior. Remeter é enviar, seja por via postal, por serviço de
encomenda de empresa de transporte, ou por terceiro contratado para o transporte,
conhecido por “mula”. Característica dessa conduta é que o agente não traz consigo ou
transporta a droga, o que deixa claro que o tipo não exige posse direta. Preparar consiste
em deixar a droga pronta para o consumo, por composição ou decomposição química.
Produzir e fabricar são verbos assemelhados, consistindo em dar existência, criar,
diferenciando-se apenas porque no segundo há um processo mecânico ou industrializado,
enquanto no primeiro os componentes já existem. Adquirir é comprar, conduta pela qual
responde aquele que, sem transportar ou ter consigo, acerta preço, quantidade e qualidade
da droga, a ser trazida por terceiro. Vender é fechar um negócio de compra e venda. Expor
à venda é fazer oferta pública, de modo expresso ou tácito. Diferencia-se da conduta
vender, porque quem expõe à venda não vende necessariamente, de modo que o mero
oferecimento já constitui o crime, ainda que não tenha ocorrido a venda efetiva. Ter em

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

depósito é manter, armazenar, conservar ou reter à disposição a substância, por conta


própria. Guardar é armazenar, ter sob vigilância ou cuidado, em favor de terceiro.
Transportar é levar de um lugar a outro, dentro de um veículo. Trazer consigo é transportar
a droga junto ao corpo. Prescrever é receitar. Ministrar é aplicar, dar para consumir, aplicar,
inocular, injetar. Entregar a consumo é tipo genérico, a ser aplicado caso a conduta não seja
enquadrável nas demais modalidades. Fornecer é prover, entregar, gratuitamente ou não.

Não há necessidade de que as matérias primas tenham de per si os efeitos farmacológicos


dos tóxicos a serem produzidos; basta que tenham as condições e qualidades químicas
necessárias para, mediante transformação, adição, etc., resultarem em entorpecentes ou
drogas análogas. São matérias-primas o éter e a acetona. (vários precedentes do STF nesse
sentido)

É tranquilo o entendimento no sentido de que o delito em exame não supõe


necessariamente a prática de atos onerosos ou de comercialização (STF, HC 69806/GO).
Tal situação não foi alterada pela introdução do delito do §3º do art. 33, pois o delito do
caput ainda pode ocorrer sem finalidade lucrativa (STJ, REsp 763213/GO).

Não é exigida habitualidade ou reiteração para o reconhecimento do delito (STJ, REsp


763213/GO).

A posse direta não é necessária para o reconhecimento do crime.

O objeto do crime são as drogas assim consideradas as substâncias ou os produtos capazes


de causar dependência especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas
periodicamente pelo Poder Executivo da União. Na elaboração da lista, a Administração
está vinculada ao requisito de que se trate de substâncias ou produtos que causem
dependência, bem como aqueles aptos a sua preparação. Uma vez incluída a substância na
lista, presume-se que tenha ela potencial lesivo, não se exigindo exame pericial para tal
finalidade (STF, HC 104382/RJ). Cuida-se de norma penal em branco a ser complementada
por ato da administração sanitária.

Qualquer dessas condutas somente será delituosa quando praticada sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar. Cuida-se de elementar normativa a ser
aferida concretamente.

O tipo subjetivo é o dolo, sendo desnecessário especial fim de agir. É também admissível o
dolo eventual, como no caso de “cigarreiros” que assumem o risco de transportar
mercadoria que possivelmente é droga.

É da defesa o ônus de provar o erro de tipo ou de proibição. Quanto ao erro de proibição, é


irrelevante a alegação de desconhecimento das propriedades toxicológicas da substância,
ainda que se trate de lança-perfume, pois o desconhecimento da lei é inescusável e o
produto é proibido no Brasil. Por outro lado, no que toca ao erro de tipo, a alegação no
sentido do desconhecimento acerca do conteúdo da coisa transportada, deve ser avaliada no
caso concreto.

363
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

A alegação de dificuldade financeira como motivo para o tráfico não é suficiente para a
caracterização da inexigibilidade de conduta diversa ou do estado de necessidade.

Quanto à consumação, cuida-se de tipo multinuclear ou de ação múltipla ou de conteúdo


variado, de modo que, praticada qualquer das condutas ali descritas, estará consumada.
Cuida-se de crime de perigo abstrato. Assim, por força do princípio da alternatividade,
mesmo que realiza mais de um núcleo com relação ao mesmo objeto material, responderá
por crime único, devendo a pluralidade de verbos efetivamente praticados ser considerada
pelo juiz na fixação da pena. Porém, se faltar proximidade comportamental entre as várias
condutas haverá concurso de crimes (material ou mesmo continuado).

É possível o concurso material entre a associação e o tráfico.

O crime se consuma com a prática de qualquer um dos núcleos trazido no tipo, não se
exigindo efetivo tráfico.

De acordo com o STF (HC 74510/SP), não fica evidenciada hipótese de crime provocado
ou de flagrante forjado se os agentes participam da obtenção, da guarda e do transporte de
cocaína, que se destina ao exterior, consistindo a atividade da polícia apenas em obter
informações sobre o propósito deles e em acompanhar os passos até a apreensão da droga,
em pleno transporte, ainda no Brasil, tendo-se, na verdade, hipótese de ação controlada
admitida pelo art. 2º, II, da Lei n. 9.034/95, bem como pelo art. 53, II, Lei n. 11.343/06.
Também o flagrante preparado, em operação de venda de droga, não anula o processo-
crime se a condenação está fundada também na posse preexistente à simulação policial
(STF, HC 72674/SP).

Nas modalidades guardar, ter em depósito, trazer consigo e transportar, o delito é


considerado permanente, o que dificulta a possibilidade de tentativa.

STF, HC 107448-MG, 2013: Ônus da prova da traficância: O réu não tem o dever de
demonstrar que a droga encontrada consigo seria utilizada apenas para consumo próprio.
Cabe à acusação comprovar os elementos do tipo penal, ou seja, que a droga apreendida era
destinada ao tráfico. Em suma, se a pessoa é encontrada com drogas, cabe ao MP
comprovar que o entorpecente era destinado ao tráfico. Não fazendo esta prova, prevalece a
versão do réu de que a droga era para consumo próprio.

Matéria-prima, insumo ou produto químico (art. 33, §1º, I):

O §1º do art. 33 tem como objeto não só a matéria-prima, mas também insumo ou produto
químico destinado à preparação de drogas, com o que resta indiscutível a inclusão no tipo
penal de outros produtos precursores, ainda que não sejam essenciais ou não tenham como
destinação exclusiva a produção da droga.

364
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Semeadura, cultivo e colheita (art. 33, §1º, II):

Tipo objetivo: Semear é pôr a semente na terra. Cultivar é trabalhar a terra, dedicar-se à
cultura de determinada plantação, incluindo toda a atividade de cuidado com a planta.
Fazer a colheita é uma conduta típica, porque nem sempre aquele que semeou ou cultivou é
quem faz a colheita da planta destinada à produção de drogas.

O tipo subjetivo é o dolo, sendo dispensada qualquer finalidade específica.

Não se exige a finalidade de lucro.

Na modalidade plantar, cuida-se de delito instantâneo, enquanto que o cultivo é


permanente.

Utilização ou consentimento de utilização de local (art. 33, §1º, III):

O sujeito ativo é o proprietário, possuidor, como o locatário, por exemplo, o administrador,


guarda ou vigilante do local.

Quanto ao tipo objetivo, incide nas penas do inciso aquele que consente que, em imóvel de
sua propriedade, componentes de uma mesma quadrilha internacional de preparo e tráfico
de drogas se utilizem dele para armazenar, preparar e distribuir a droga.

O tipo subjetivo é o dolo, admitida a modalidade eventual.

O crime é permanente.

Induzimento, instigação ou auxílio (art. 33, §2º):

Tipo objetivo: induzir é estimular em outrem a vontade de utilizar a droga. Auxiliar é


colaborar materialmente para a utilização. Instigar é convencer ao uso, mas aproveitando-
se de vontade preexistente. Na lei atual, aboliu-se a conduta de apologia ao tráfico ou uso
de drogas.

O tipo subjetivo é o dolo.

Quanto à consumação, a literalidade do dispositivo aponta para a consumação com o mero


induzimento, instigação ou auxílio, independentemente da efetiva utilização por terceiro.
Na doutrina, a exemplo de Vilmar Pacheco e Gilberto Thums (2007), há posição contrária
no sentido de que o crime estaria consumado apenas com a efetiva utilização por parte do
terceiro.

Se a pessoa induzida, instigada ou auxiliada for criança, adolescente ou quem tenha, por
qualquer motivo diminuída ou suprimida sua capacidade de entendimento e determinação,

365
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

o delito permanece o mesmo. Porém, com a pena aumentada nos termos do artigo 40, VI.

Fornecimento gratuito para consumo em conjunto (art. 33, §3º):

A incidência do §3º requer não só a gratuidade, mas também a finalidade de consumo


conjunto, que constitui elemento subjetivo específico do tipo em questão.

OBS: se o oferecimento for frequente e/ou visar enriquecimento do fornecedor, mesmo que
indireto, o crime passa a ser o tráfico (art. 33, caput).

Levando-se em conta os termos do art. 44 da nova lei, bem como a opção pela pena de
detenção, não pode haver dúvida de que o fornecimento gratuito não é crime equiparado a
hediondo.

O sujeito ativo consiste em qualquer pessoa que seja das relações de quem recebeu a oferta.
O terceiro a quem a droga é oferecida responderá, eventualmente, pelo delito do art. 28.

Tipo objetivo: oferecer é ofertar ou colocar à disposição. Exige-se ainda que a oferta seja
eventual e que seja oferecido a pessoa das relações do agente (amigo, parente, conhecido,
vizinho, colega de trabalho, namorado, etc.). É ônus da acusação demonstrar que o
fornecimento é usual ou que já aconteceu outras vezes, concluindo-se pela ausência da
elementar na falta de indícios nesse sentido.

O tipo subjetivo é o dolo acompanhado do elemento subjetivo específico no caso do delito


do §3º do art. 33 em se requerer que o fornecimento, além de gratuito, se dê com a
finalidade de consumo em comum.

A consumação se dá com o mero oferecimento, independentemente da concretização da


oferta ou do efetivo consumo em conjunto.

A peculiaridade do novo tipo é a possibilidade de aplicação das medidas do art. 28,


aplicáveis aos delitos de consumo próprio, em cúmulo material com as penas de detenção e
multa previstas no tipo penal.

Traficante privilegiado (art. 33, §4º):

Também chamado de traficância menor ou traficância eventual. O dispositivo é aplicável


apenas aos delitos do caput e §1º do art. 33. É causa de diminuição da pena de 1/6 a 2/3.
Tem como requisitos cumulativos: réu primário, bons antecedentes, que não se dedique a
atividade criminosa nem integre organização criminosa. O juiz não pode negar a aplicação
da causa de diminuição alegando apenas que o réu se dedica à atividade criminosa porque
pratica tráfico de drogas, pois se isso fosse possível ninguém seria beneficiado pela causa
de diminuição (STJ, 2012). Porém, o juiz pode negar a aplicação da causa de diminuição,
alegando que além do tráfico o réu praticou o delito de associação para o tráfico do artigo

366
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

35 (STJ, 2013). Mulas: o STF tem precedente nos dois sentidos, que pode e que não pode
aplicar o tráfico privilegiado às mulas. Penso que a quantidade de droga aprendida não é
suficiente por si só para afirmar que o réu integra organização criminosa e negar a aplicação
da causa de diminuição [e isso é trecho de um voto de 2013].

OBS: O texto da lei fala que é vedado a conversão em restritiva de direitos. Porém, o STF
já declarou de forma incidental que é inconstitucional, podendo haver a substituição se o
caso concreto cumprir os requisitos do artigo 44 do CP.

OBS: Lex Tertia rechaçada pelo STF em 2013: a defesa estava tentando aplicar o §4º do
artigo 33 da atual lei de drogas com a pena da revogada lei 6.368/76, combinando as leis da
forma mais favorável ao réu como se o preceito secundário não caracterizasse combinação
de leis. O STJ editou a súmula 501: É cabível a aplicação retroativa da lei 11.343/06, desde
que o resultado da incidência das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do
que o advindo da aplicação da lei 6.368/76, sendo vedada a combinação de leis. O STF em
repercussão geral: no final de 2013 o STF decidiu em sede de repercussão geral que a
combinação de leis não é admitida nem para beneficiar o réu. OBS: se o réu praticou o
tráfico de drogas antes da nova lei o juiz deverá ver no caso qual lei é mais vantajosa para
ele, mas deve aplicar uma ou outra na integralidade.

OBS: Ressalte-se que o reconhecimento da causa de diminuição não afasta a aplicabilidade


da lei de crimes hediondos, nem afasta a vedação do indulto contida no art. 44 da Lei n.
11.343/06. Além disso, os requisitos são cumulativos, de modo que, na falta de um deles,
deve ser negada a redução. Por outro lado, presentes os requisitos, o acusado tem direito
subjetivo à redução.

STF, 2014: DROGAS. HEDIONDO. A aplicação da causa de diminuição de pena prevista


no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 não afasta a hediondez do crime de tráfico de drogas,
limitando-se, por critérios de razoabilidade e proporcionalidade, a abrandar a pena do
pequeno e eventual traficante, em contrapartida com o grande e contumaz traficante, ao
qual a Lei de Drogas conferiu punição mais rigorosa que a prevista na lei anterior. Assim,
se o indivíduo é condenado por tráfico de drogas e recebe a diminuição prevista no § 4º do
art. 33, mesmo assim terá cometido um crime equiparado a hediondo. [STF. 1ª Turma. RHC
118099/MS e HC 118032/MS, rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 4/2/2014. Info734].

Petrechos para preparação, fabricação ou transformação (art. 34):

O tipo do art. 34 corresponde ao do art. 13 da Lei n. 6.368/76, apresentando, porém, novas


modalidades típicas não previstas no texto anterior, a saber: utilizar, transportar, oferecer,
distribuir e entregar a qualquer título. Cuida-se de tipo antecipado, incriminando-se a posse
dos utensílios utilizados para fabricar, preparar, produzir ou transformar drogas. É crime
permanente, pois as condutas descritas nos artigo 34 são permanentes, podendo ser preso
em flagrante delito imediatamente, sem ordem judicial. Trata-se de delito subsidiário, sendo
aplicável apenas quando não verificada a prática das condutas do art. 33, caput. A maior
parte da doutrina entende que é crime equiparado a hediondo.

367
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Atenção: Em 2013, o STJ discutiu em dois precedentes se o artigo 34 era ou não absorvido
pelo artigo 33, ou seja, se é ou não delito subsidiário. Chegou-se a duas conclusões:

Associação para o tráfico (art. 35):

Cuida-se de forma especial do crime de quadrilha ou bando (art. 288, CP), na qual é
exigido um número menor de agentes: bastam dois agentes para a ocorrência do crime de
associação para o tráfico.

O crime de associação para o tráfico não é considerado comparado a hediondo, não estando
abrangido pela referência ao tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins contida no art. 2º
da Lei n. 8.072/90. No entanto, o art. 44 da Lei n. 11.343/06 expressamente incluiu o delito
de associação no regime dos delitos inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto,
anistia e liberdade provisória.

OBS: O advento da Lei n. 11.343/06 não implicou abolitio criminis em relação ao art. 12,
§2º, II da Lei n. 6.368/76, pois a conduta segue sendo incriminada, estando ela espalhada
em mais de um artigo da nova lei. Desse modo não houve abolitio criminis. Portanto, o
princípio da continuidade normativo-típica não é necessariamente de artigo para artigo. É a
continuidade da criminalização da conduta, apenas.

Comete esse crime quem se junta a outra pessoa de forma estável e permanente com o
objetivo de praticar tráfico de drogas, condutas equiparadas ao tráfico de drogas ou o
tráfico de maquinários. OBS: se a associação não for estável e permanente, sendo apenas
eventual ou acidental não haverá o crime do artigo 35 e será mero concurso de pessoas.
OBS: Como é crime de concurso necessário, a associação tem de ser de duas ou mais
pessoas, porém não importando se a outra pessoa é imputável.

368
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Atenção: o delito do artigo 35 é crime autônomo, então ele se consuma independente dos
outros delitos acontecerem ou se ficaram apenas na cogitação ou preparação. Se os delitos
referidos no tipo acontecerem, haverá concurso material de delitos.

Quanto ao sujeito ativo, trata-se de crime comum.

Tipo objetivo: associar-se é reunir-se em sociedade, tornar-se sócio, ocorrendo o delito em


questão apenas quando a finalidade da associação é cometer os crimes dos arts. 33, caput e
§1º, e 34. Foi introduzido tipo autônomo, com pena idêntica, em caso de associação para o
cometimento do crime do art. 36.

O tipo subjetivo é o dolo consubstanciado na vontade de associar-se.

Quanto à consumação, o delito é formal, consumando-se no momento da constituição da


associação para o tráfico, independentemente da prática efetiva de atos criminosos. Além
disso, trata-se de crime permanente, cuja situação de flagrância se protrai no tempo.

Em regra a competência é da Justiça Estadual.

Financiamento ou custeio (art. 36):

Cuida-se de novidade trazida pela Lei n. 11.343/06, tendo como sujeito ativo qualquer
pessoa.

O tipo subjetivo é o dolo que deve abranger a ciência da finalidade da operação custeada ou
financiada, inexistindo forma culposa.

Tipo objetivo: financiar é propiciar a realização do tráfico, emprestando o dinheiro para


aquisição da própria droga ou de meios para o seu transporte, preparação, remessa ou
qualquer conduta prevista nos tipos do caput e §1º do art. 33 ou no art. 34 da lei, com a
promessa de remuneração ou participação no resultado da operação. Custear traduz a ideia
de fazer frente aos custos para a realização dos demais delitos, mas sem a entrega do
dinheiro ao responsável pelos fatos anteriores, mas promovendo, por exemplo, o pagamento
dos encarregados do transporte ou da distribuição ou ainda o aluguel de imóveis ou
veículos para o transporte. Somente são incriminados o financiamento ou custeio dos
delitos previstos nos arts. 33, caput e §1º e 34.

A consumação se dá com a prática dos atos de financiamento, como a entrega do dinheiro,


ou custeio, como o pagamento dos transportadores, independentemente da consumação do
delito posterior.

Autofinanciamento ou custeio com recursos próprios: Há duas soluções possíveis: 1) Se o


agente financia ou custeia o tráfico, mas não pratica nenhum verbo do art. 33: responderá
apenas pelo art. 36 da Lei de Drogas. 2) Se o agente, além de financiar ou custear o tráfico,
também pratica algum verbo do art. 33: responderá apenas pelo art. 33 c/c o art. 40, VII da
Lei de Drogas (não será condenado pelo art. 36). [STJ. 6ª Turma. REsp 1.290.296-PR, Rel.
369
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 17/12/2013: O agente que atua
diretamente na traficância, executando, pessoalmente, as condutas tipificadas no art. 33 e
que também financia a aquisição das drogas, deve responder apenas pelo crime previsto no
art. 33 com a causa de aumento prevista no art. 40, VII, sendo afastado o crime do art. 36.
O financiamento ou custeio ao tráfico ilícito de drogas (art. 36) é delito autônomo aplicável
somente ao agente que NÃO tem participação direta na execução do tráfico, limitando-se a
fornecer os recursos necessários para subsidiar a mercancia. Ao prever como delito
autônomo a atividade de financiar ou custear o tráfico (art. 36), o objetivo do legislador foi
estabelecer uma exceção à teoria monista e punir o agente que não tem participação direta
na execução no tráfico e que se limitada a fornecer dinheiro ou bens para subsidiar a
mercancia, sem praticar qualquer conduta do art. 33. Assim, nas hipóteses em que ocorre o
AUTOFINANCIAMENTO para o tráfico ilícito de drogas, como no caso concreto, não há
que se falar em concurso material entre os crimes dos arts. 33 e 36, devendo o agente ser
condenado pela pena do tráfico (art. 33), com a causa de aumento de pena do art. 40, VII,
da Lei de Drogas. Se o agente que faz autofinanciamento fosse condenado pelos arts. 33 e
36, haveria bis in idem. Além disso, chegaríamos à conclusão de que o art. 40, VII nunca
poderia ser aplicado em conjunto com o art. 33].

Colaboração como informante (art. 37):

Também não encontra paralelo no texto da Lei n. 6.368/76, consistindo em forma específica
de participação ou coautoria na associação, objeto do art. 35, erigido à categoria de delito
autônomo, com pena menor [ou seja: se não existisse esse tipo seria partícipe, sendo o
artigo 37 uma exceção à teoria monista]. O tipo é dirigido aos sinalizadores ou fogueteiros
que, sem participar diretamente da comercialização, alertam para a chegada da polícia ou
de grupos rivais.

Pode ser sujeito ativo qualquer pessoa (crime comum), tendo como elemento subjetivo o
dolo traduzido na vontade de informar, com a ciência de que o grupo, organização ou
associação é destinado à prática dos delitos mencionados no dispositivo. Não há forma
culposa.

OBS: se o sujeito ativo for funcionário público e agiu no exercício de sua função temos
duas possibilidades: 1) se não tiver solicitado nem recebido qualquer vantagem indevida
deve responder pelo crime do artigo 37 da LD, com a majorantes prevista no artigo 40, II.
2) se tiver solicitado ou recebido vantagem indevida responde pelo artigo 37 em concurso
material com o crime de corrupção passiva (artigo 317, CP). Nesse caso, não haverá a
incidência da majorante do artigo 49, II, LD, considerando que a condição de servidor
público já foi utilizada para caracterizar o crime do artigo 317.

Tipo objetivo: colaborar é auxiliar, ajudar, trabalhar em conjunto. O tipo menciona grupo,
organização ou associação destinada à prática dos delitos dos arts. 33 e 34 como
destinatária da colaboração consistente na prestação de informação. A associação será
aquela objeto do art. 35.

370
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

A organização é a organização criminosa quem tem por objetivo específico o tráfico,


utilizando-se o conceito da Convenção de Palermo. Em relação ao grupo, entende-se como
qualquer reunião de pessoas com o objetivo de tráfico, ainda que reunidas de forma
eventual.

A consumação se dá com a colaboração, independentemente da prática efetiva dos atos de


traficância pela associação ou organização.

Atenção: para que o agente responda por esse delito sua colaboração como informante tem
que ser eventual. Se ficar provado que o agente estabeleceu um vínculo associativo estável
e permanente com os destinatários da informação, passando a agir como um s ods
integrantes da associação criminosa, tendo como função precípua exatamente a prestação
das informações, sua conduta deverá ser tipificada no artigo 35, LD.

Atenção: o artigo 37 é delito subsidiário, somente sendo aplicado se não ficar caracterizado
delito mais grave. Então não se pode condenar por tráfico do artigo 33 e no artigo 37 por
atuar como olheiro do tráfico, pois isso seria punir duplamente em um bis in idem.

Prescrição ou aplicação culposa por profissional da saúde (art. 38):

Ao contrário do texto anterior, o texto atual não delimita o sujeito ativo, no entanto, na
modalidade prescrever, o delito é próprio dos profissionais da área de saúde com atribuição
para tanto, ou seja, médicos e odontólogos. O elemento subjetivo é a culpa. Se a prescrição
ou aplicação for dolosa, em desobediência às normas legais ou regulamentares, ocorrerá o
crime do art. 33.

Circunstâncias judiciais específicas:

O art. 42 da Lei n. 11.343/06 considera como circunstâncias judiciais específicas, a serem


consideradas com preponderância sobre aquelas do art. 59 do CP: a) a qualidade e a
quantidade do produto ou substância; b) a personalidade; c) a conduta social.

A natureza e a quantidade da droga podem ser utilizadas para aumentar a pena no artigo 42
e também para afastar o tráfico privilegiado? Há divergência. STJ e 1ª Turma do STF: Sim,
pois se trata de momentos distintos da aplicação da pena. 2ª Turma do STF: Não, pois é bis
in idem, já que a quantidade e qualidade da droga serão invocados na 1ª fase de
individualização da pena, sendo impróprio invocá-las novamente por ocasião de escolha do
fator de redução previsto no §4º do artigo 33 da LD. [ambas as correntes com julgados em
2013 e 2014]. Veja quadro resumo:

371
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Causas de diminuição e de aumento de pena:

Causas de diminuição: visto acima sob o título de tráfico privilegiado.

O art. 40 da Lei n. 11.343/06 traz causas de aumento de pena de um sexto a dois terços. São
elas: I - a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as
circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade do delito; II - o agente praticar o
crime prevalecendo-se de função pública ou no desempenho de missão de educação, poder
familiar, guarda ou vigilância; III - a infração tiver sido cometida nas dependências ou
imediações de estabelecimentos prisionais, de ensino ou hospitalares, de sedes de entidades
estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas, ou beneficentes, de locais de trabalho
coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de qualquer natureza, de
serviços de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social, de unidades
militares ou policiais ou em transportes públicos; IV - o crime tiver sido praticado com
violência, grave ameaça, emprego de arma de fogo, ou qualquer processo de intimidação
difusa ou coletiva; V - caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o
Distrito Federal; VI - sua prática envolver ou visar a atingir criança ou adolescente ou a
quem tenha, por qualquer motivo, diminuída ou suprimida a capacidade de entendimento e
determinação; VII - o agente financiar ou custear a prática do crime.

OBS: Transnacional X internacional: Com as mudanças introduzidas com a Lei 11.343/06 o


Brasil atende as recomendações internacionais, em especial à Convenção de Palermo. A
diferença é significativa no que tange à troca da expressão internacional (situação ou ação
concernente a duas ou mais nações) por transnacional (situação ou ação além de nossas
fronteiras). Antes, ao se referir ao tráfico internacional, não gerava o aumento o simples
fato da aquisição da droga na Bolívia, exigindo-se vínculo entre nacionais e estrangeiros em
atividade. Com a mudança, basta que a infração tenha a sua execução iniciada ou terminada
fora dos limites do nosso território (em águas internacionais, por exemplo). Para sua
configuração, inclusive, dispensa-se a habitualidade, sendo suficiente a intenção de querer
fazer a droga sair dos limites do país.

372
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Regime inicial de cumprimento de pena:

O texto da lei prevê que para os crimes do art. 33, com exceção do fornecimento gratuito, o
regime inicial é o fechado, por se tratar de crime equiparado a hediondo, atraindo a
incidência do §1º do art. 2º da Lei n. 8.072/90. Isso está ultrapassado.

Porém, o Plenário do STF em 2012 entendeu que é inconstitucional a obrigatoriedade do


regime inicial fechado, pois o regime inicial para os crimes hediondos e equiparados não
tem que ser necessariamente o fechado, podendo também ser o regime semiaberto ou
aberto, desde que presentes os requisitos do artigo 33, §2º, alíneas b e c do CP.

Pena restritiva de direito:

A Lei n. 11.343/06 vedava, expressamente, no §4º do art. 33 e no art. 44, a substituição da


pena privativa de liberdade por restritiva de direito para os delitos previstos em seus arts.
33, caput e §1º, e art. 34 a 37. Entretanto, o STF declarou incidentalmente a
inconstitucionalidade da expressão “vedada a conversão em penas restritivas de direitos”,
constante do §4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06, e da expressão “vedada a conversão de suas
penas em restritivas de direitos”, contida no art. 44 (HC 97.256/RS).

Competência federal – art. 70:

Art. 70. O processo e o julgamento dos crimes previstos nos arts. 33 a 37 desta Lei, se
caracterizado ilícito transnacional, são da competência da Justiça Federal.
Parágrafo único. Os crimes praticados nos Municípios que não sejam sede de vara
federal serão processados e julgados na vara federal da circunscrição respectiva.

O § único trouxe regra nova em relação à legislação anterior, pois quando o crime de tráfico
internacional era praticado em Município que não fosse sede de Justiça Federal, a Justiça
Estadual exercia jurisdição federal por delegação.

Agora, se não houver sede de vara federal no Município, o crime de tráfico transnacional
será julgado pela vara federal da circunscrição respectiva.

Ex: se o crime internacional ocorresse em Porto Seguro (Município que não é sede de Vara
Federal), a Justiça Estadual seria competente para julgar o caso. Agora, com a nova regra,
será competente a Vara Federal de Eunápolis (pois ela possui jurisdição federal sobre o
Município de Porto Seguro).

SÚMULAS E JURISPRUDÊNCIAS APLICÁVEIS AO TEMA.

STF - SÚMULA VINCULANTE No 26 - PARA EFEITO DE PROGRESSÃO DE

373
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

REGIME NO CUMPRIMENTO DE PENA POR CRIME HEDIONDO, OU


EQUIPARADO, O JUÍZO DA EXECUÇÃO OBSERVARÁ A
INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 2o DA LEI N. 8.072, DE 25 DE JULHO DE
1990, SEM PREJUÍZO DE AVALIAR SE O CONDENADO PREENCHE, OU NÃO, OS
REQUISITOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS DO BENEFÍCIO, PODENDO
DETERMINAR, PARA TAL FIM, DE MODO FUNDAMENTADO, A REALIZAÇÃO DE
EXAME CRIMINOLÓGICO

STF - SÚMULA 698: Não se estende aos demais crimes hediondos a admissibilidade de
progressão no regime de execução da pena aplicada ao crime de tortura.

Art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 e fundamentação:

A 2ª Turma concedeu habeas corpus para determinar a magistrado que reduzisse a pena
imposta ao paciente, considerada a incidência da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da
Lei 11.343/2006 no patamar máximo de 2/3. Ademais, ordenou que fixasse o regime inicial
de cumprimento da reprimenda de maneira fundamentada, com o afastamento da regra do §
1º do art. 2º da Lei 8.072/90 (na redação conferida pela Lei 11.464/2007), obrigatoriedade
declarada inconstitucional pelo STF. Na espécie, o tribunal de justiça local, ao dar parcial
provimento a recurso da acusação, condenara o paciente pela prática do delito de tráfico de
drogas (Lei 11.343/2006, art. 33). Explicitou-se que a Corte estadual definira a pena-base
no mínimo legal. Obtemperou-se que aquele tribunal não agira bem ao estabelecer, em
seguida, a minorante em 1/6 sem oferecer a devida justificação. Por fim, salientou-se que o
réu apresentaria bons antecedentes, não faria parte de grupo criminoso, enfim, ostentaria
todos os requisitos para que a benesse fosse conferida em grau máximo. Precedente citado:
HC 111840/ES (acórdão pendente de publicação, v. Informativos 670 e 672).

HC 114830/RS, Órgão Julgador: 2. Turma. rel. Min. Ricardo Lewandowski, 12.3.2013.


(Informativo 697).

EMENTA HABEAS CORPUS. LIBERDADE PROVISÓRIA NO CRIME DE


E TRÁFICO DE DROGAS.PRESSUPOSTOS E FUNDAMENTOS DA PRISÃO
PREVENTIVA. RISCO DE REITERAÇÃO DELITIVA E À ORDEM PÚBLICA.

1. O Plenário desta Corte, no julgamento do Habeas Corpus 104.339/SP, decidiu pela


inconstitucionalidade da vedação abstrata à concessão de liberdade provisória em crimes
de tráfico de drogas, invalidando parcialmente a provisão da espécie contida no art. 44 da
Lei nº 11.343/2006. Não obstante, a Corte também ressalvou a possibilidade da decretação
da prisão cautelar em processos por crimes de tráfico de drogas. 2. Se as circunstâncias
concretas da prática do crime indicam o envolvimento significativo do agente com
o tráfico de drogas e, por conseguinte, a periculosidade e o risco de reiteração delitiva, está
justificada decretação ou a manutenção da prisão cautelar para resguardar a ordem pública,
desde que igualmente presentes boas provas da materialidade e da autoria. 3. O efeito

374
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

disruptivo e desagregador do tráfico de drogas, este associado a um mundo de violência,


desespero e morte para as suas vítimas e para as comunidades afetadas, justifica tratamento
jurídico mais rigoroso em relação aos agentes por eles responsáveis a refletir na análise dos
casos concretos. 4. Ordem denegada.

(HC 113853 / RS. Órgão Julgador: Primeira Turma. Relator(a): Min. ROSA WEBER.
Julgamento: 19/03/2013).

EMENTA DIREITO PENAL. HABEAS CORPUS. DOSIMETRIA DA PENA.


CONFISSÃO. TRÁFICO DE DROGAS EM TRANPORTE PÚBLICO. O reconhecimento
de atenuante não autoriza a redução da pena para aquém do mínimo legal. O inciso III do
art. 40 da Lei nº 11.343/2006 visa a punir com maior rigor a comercialização de drogas em
determinados locais, como escolas, hospitais, teatros e unidades de tratamento de
dependentes, entre outros. Pela inserção da expressão “transporte público” nesse mesmo
dispositivo, evidencia-se que a referência há de ser interpretada na mesma perspectiva, vale
dizer, no sentido de que a comercialização da droga em transporte público deve ser apenada
com mais rigor. Logo, a mera utilização de transporte público para o carregamento da droga
não leva à aplicação da causa de aumento do inciso III do art. 40 da Lei 11.343/2006.

HC 109538/MS. Órgão Julgador: Primeira Turma. Relator(a): Min. LUIZ FUX.


Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROSA WEBER. Julgamento: 15/05/2012 (Noticiado no
INFO 666).

OBS: Tal entendimento adotado pelo STF não encontra respaldo no texto da lei, o
qual não faz qualquer menção à necessidade de demonstrar a comercialização da
droga no interior do transporte público (Vale a pena conferir a crítica tecida ao
aludido julgado no site http://mpbertasso.wordpress.com/2012/05/25/trafico-itinerante-a-
nova-invencao-do-garantismo/).

QUESTÃO DE PROVA: Diferença da lei anterior? Pena maior e causa de redução. Crime
do uso. Crime de associação. Diferença para associação do código penal. Diferença para o
informante? Como definir quem é só informante e quem é associado?

375
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

14.c. Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e Mercado de


Capitais.
Principais obras consultadas: Santo Graal 27º. BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Crimes
Federais. 8ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. PRADO, Luiz Regis. Direito
Penal Econômico. 5ª ed. RT, 2012. MAIA, Rodolfo Tigre. Dos Crimes Contra o Sistema
Nacional, São Paulo, Malheiros, 1998. TÓRTIMA, José Carlos. Crimes Contra o Sistema
Financeiro Nacional, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2002.

Referência Legislativa: Lei nº 7.492/86.

1) Considerações Gerais: Essa lei é conhecida como lei do “colarinho branco”. Ela visa a
um tipo de criminoso mais sofisticado, mais rico, por isso que ela é conhecida como lei dos
crimes do “colarinho branco”, tendo em vista que durante muito tempo nas fábricas os
operários usavam uniformes azuis, tendo suas golas azuis, e os empresário, camisas brancas
de golas brancas, o que marcou a diferença levando Sutherland, primeiro criminólogo a
apontar a criminalidade dos ricos, a nomear os crimes praticados por eles como crimes do
colarinho branco. Até então os estudos criminológicos estavam pautados no pressuposto da
falta, ou seja, o crime era consequência da pobreza, pois se o sujeito não tinha ele roubava.
Esse pensamento fazia com que as condutas realizadas por ricos fossem imunes ou
impunes, ou seja, sequer criminalizada primariamente fosse ou, se fosse típica, não seria
dada a chancela penal na criminalização secundária. A partir dos estudos de Sutherland a
criminalidade dos ricos passa a ser mais estuda e também passa a ser denunciada a
perseguição estatal aos pobres. Como resposta estatal, inicia-se a criminalização primária
com o advento de leis. Desenvolve-se a teoria do Labelling e depois as teorias críticas de
base marxista, como a criminologia radical e a criminologia crítica. Depois de Sutherland, a
etiologia perde sua centralidade como explicação do crime e o reconhecimento de que
todos somos criminosos ocorre, ao mesmo tempo em que se percebe que os aparelhos de
repressão irão apenas criminalizar parte da população, a parte escolhida para ser controlada
pelo sistema penal.

Mas o que vem a ser o Sistema Financeiro Nacional? Nós temos SFN em sentido estrito e
SFN em sentido lato. Sistema Financeiro em sentido estrito é apenas o que se refere à
política monetária do governo, abrangendo instituições como BACEN, BNDES, BB. No
sentido estrito, o Sistema Financeiro tem a ver apenas com as finanças públicas, ou seja,
com a gestão dos recursos públicos pelo Estado. Ou seja, tem a ver apenas com a massa de
crédito e de dinheiro geridas pelo Estado. Sistema Financeiro em sentido amplo/lato
(referido na Lei 7.492/86) além do sistema de finanças públicas do Estado, inclui também o
mercado privado de capitais, abrangendo o mercado de seguros, câmbio, consórcios,
capitalização ou qualquer outra forma de poupança, ou seja, a questão está mais para o
Direito Econômico do que o Direito Financeiro. A presente lei tem por fim proteger a
política cambial, a qual é espécie dentro do gênero política econômica.

2) Bens jurídicos protegidos: a) Principal: higidez do sistema financeiro nacional em

376
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

sentido amplo. Esse bem jurídico é supra-individual. Portanto, os crimes contra o sistema
financeiro fazem parte do Direito Penal secundário (que advieram posteriormente); b)
Secundários: são aqueles que acabam sendo tutelados reflexamente, quais sejam:
Patrimônio dos investidores; Adm. Pública; Fé Pública; Saúde Financeira da instituição
financeira. OBS: Nesse sentido RESP 585770/RS. Nesse julgado o STJ confirma os bens
jurídicos secundários supra.

3) Não há necessidade de esgotamento da via administrativa, a qual é independente à


penal (STJ, HC 49667, j. 09.03.06, Hamilton Carvalhido). Outrossim, o parcelamento do
débito, mediante adesão ao REFIS, não suspende o curso do processo para apuração de
infração contra esta lei (nesse sentido: TRF4, HC 2007.04.00.037014-4, Oitava Turma,
Relator Paulo Afonso Brum Vaz, D.E. 28/11/2007).

4) Competência: Por força do art. 109, VI, da CF c/c art. 26 desta lei, a competência será
sempre federal, mesmo que o prejuízo seja de uma instituição financeira privada (HC
93.733, julgamento em 17-6-08).

5) Comentários aos artigos:

Art. 1º: “Considera-se instituição financeira...” A parte do artigo que falava em recursos
“próprios” foi vetada. Logo, não se configura “instituição financeira”, para os fins desta lei,
quando for caso de uso recursos “próprios”.

Parágrafo Único: “Equipara-se à instituição financeira...” a) PJ de direito público (BACEN,


BNDES, BB) ou de direito privado que tenham como atividade principal ou acessória
cumulativa ou isolada, a captação, a intermediação, a aplicação, ou o gerenciamento de
recursos financeiros de terceiros; b) Seguradoras, casas de câmbio, empresas de consórcio,
de capitalização, de poupança, ou qualquer outra que envolva recursos econômicos de
terceiros. (art. 1° § único, inciso I da lei); c) Pessoa Física que exerça qualquer das
atividades previstas no artigo 1° caput, e no artigo 1° § único, inciso I, ainda que de forma
eventual. (art. 1° § único, inciso II da lei); Há também um rol complementar de instituições
financeiras previsto na LC 105/01 em seu artigo 1°, §1° da referida lei.

OBS 1: Empresas de FACTORING são instituições financeiras? R: Sim. Nos termos do


artigo 1°, §2° da LC 105/01; NÃO (“As empresas popularmente conhecidas como
factoring desempenham atividades de fomento mercantil, de cunho meramente comercial,
em que se ajusta a compra de créditos vencíveis, mediante preço certo e ajustado, e com
recursos próprios, não podendo ser caracterizadas como instituições financeiras.” STJ, CC
98062, DJe 06/09/2010).

Posição do STJ sobre Factoring: Factoring não é instituição financeira, nem instituição
financeira por equiparação. Ela não pode emprestar dinheiro. O que factoring faz é comprar
títulos de crédito que ainda não venceram, fazendo com que a empresa aumente seu capital
de giro.

Se o dono da factoring utiliza a empresa para emprestar dinheiro pratica o crime do artigo
16? Depende. Se o fez com recursos próprios pratica o crime do artigo 4º da lei 1.521/51 e

377
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

a competência seria da Justiça Estadual. Se o faz com recursos de terceiros incorrerá no


artigo 16 e a competência será da Justiça Federal.

Observe julgado em que Factoring foi considerada como instituição financeira: STJ, CC
115.338-PR, 2013: compete à Justiça Federal processar e julgar a conduta daquele que, por
meio de pessoa jurídica instituída para a prestação de serviço de factoring, realiza, sem
autorização legal, a captação, intermediação e aplicação de recursos financeiros de
terceiros, sob a promessa de que estes receberiam, em contrapartida, rendimentos
superiores aos aplicados no mercado. Isso porque a referida conduta se subsume, em
princípio, ao tipo do artigo 16 da lei 7492/86. Ademais, nessa hipótese, apesar de o delito
haver sido praticado por maio de pessoa jurídica criada para a realização de atividade de
factoring, deve-se considerar ter esta operado como verdadeira instituição financeira,
justificando-se, assim, a fixação da competência na Justiça Federal. OBS: se a factoring
tivesse operado com recursos próprios seria o crime do artigo 4º da lei 1.521/51 e a
competência seria da Justiça Estadual.

OBS 2: Operadoras de cartão de crédito são instituições financeiras? São instituições


financeiras pela doutrina com base na Súmula 283 do STJ (“As empresas administradoras
de cartão de crédito são instituições financeiras e, por isso, os juros remuneratórios por elas
cobrados não sofrem as limitações da Lei de Usura”), mas, segundo julgado deste próprio
Tribunal, não são (STJ R-HC 4.783/SP).

OBS 3: Jurisprudência pacífica do STJ diz que o artigo 1° da Lei 7.492/86 foi recepcionado
pela CF/88, quando considera instituições financeiras, as casas de câmbio, administradora
de seguros, empresas de capitalização ou de poupança.

OBS 4: Os fundos de pensão ou entidades fechadas de previdência (Ex: PREVI – caixa de


previdência dos funcionários do BB), também são instituições financeiras de acordo com o
STF e o STJ.

OBS 5: O ESTADO pode ser considerado “instituição financeira” quando emite TÍTULOS
DA DÍVIDA PÚBLICA? R: Não. O STF e o STJ decidiram que o Estado não pode ser
considerado instituição financeira quando emite títulos da dívida pública e os coloca no
mercado para obter dinheiro para os cofres públicos. (STF - AP 351/SC em 12/08/04) e
(STF IP 1960/PE, pleno, em 04/02/03).

OBS 6: E o AGIOTA? Não, pois não opera com valores de terceiros, mas sim com recursos
próprios – poderá responder por crime de usura (STJ, CC 21.358/PB).

OBS 7: E os “DOLEIROS”? Trata-se do blequeiro, blequista ou cambista (TRF4, AC


20017103001826-0/RS de 25/05/05), ou da pessoa jurídica que realiza operações de câmbio
à margem do sistema oficial (STJ, RHC 9281/PR de 13/09/00).

OBS 8: Se o crime não envolver instituição financeira não se aplica a Lei 7.492/86. Aplica-
se o CP ou outra lei, como a lei de usura.

378
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Art. 2º: Crime comum. Poderá ocorrer o crime, tendo em vista o art. 225 do CC, que
equipara ao documento as “reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros
fonográficos e, em geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou
de coisas”, restando, portanto, equiparadas a documentos para fins penais (STF, RHC
95689/SP de 02/09/08).

Parágrafo único: Crime formal, não se exigindo prejuízo efetivo para terceiros.

Art. 3º: Crime de perigo abstrato e de mera conduta. Crime doloso (vontade livre e
consciente de divulgar informação falsa ou prejudicialmente incompleta).

TRF3, AC 20006181001250-0/SP, de 01/09/03: Crime configurado: “a mensagem de


correio eletrônico foi remetida para vários destinatários, foi tornada pública a outras
instituições financeiras. O texto continha informações potencialmente prejudiciais a uma
instituição financeira. O mercado é sensível a boatos ou notícias infundadas e o balanço do
Bradesco demonstra que o texto era falso em seu conteúdo”.

OBS: não pratica esse crime a divulgação de informação verídica (ainda que prejudicial À
instituição financeira) nem tampouco a incompleta que não ocasione prejuízo.

Art. 4º: Há divergência se precisa ter reiteradas ações ou se basta apenas uma ação para
configurar este crime, ou seja, se é crime habitual ou não. Exige reiteração: José Carlos
Tortima; Delmanto; Mazlun; Antônio Rodrigues da Silva; TRF4, 200270000788647, Des.
Élcio Castro, DJ 17.05.06. Não exige [majoritária]: STF, HC 89364, j. 23.10.07, Rel. Min.
Joaquim Barbosa; STJ, HC 39908, Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 03.04.06; Rodolfo Tigre
Maia; Rodolfo Amodeo e Nucci. Este autor, inclusive, classifica o delito como “habitual
impróprio”/“acidentalmente habitual”, a saber: “em que uma única ação tem relevância
para configurar o tipo, porém a sua reiteração não configure pluralidade de crimes”. Um
dos fundamentos desta última corrente é de que um único ato pode ser mais lesivo ao SFN
do que a reiteração.

Crime formal, de perigo (abstrato, para Tigre Maia; concreto, para José Carlos Tortima).
Basta o dolo “genérico”. Crime próprio. Sujeito ativo só pode ser o administrador, gerente,
interventor da administração financeira. Detalhe: o gerente de agência bancária pode ser
sujeito ativo, conforme jurisprudência do STJ. É admitida a participação de terceira pessoa.
Ex: gerente de agência bancária; pessoa física que capta dinheiro da população para
construção de casa própria. OBS: conselheiro estatutário que não tem poderes de gestão,
não pode ser autor desse crime. (STJ – Apn 481/SP em 20/08/08). Sujeitos passivos são a
instituição financeira e as pessoas prejudicadas pela má gestão.

OBS 1: Há muita discussão na doutrina e jurisprudência dos TRFs acerca de eventual


conflito entre este crime de gestão fraudulenta e o de apropriação do art. 5º. Uns entendem
que o crime de apropriação fica absorvido pela gestão fraudulenta. Outros que, pelo
princípio da especialidade, aplica-se apenas o art. 5º. Mas, a posição do STJ (Min. Gilson
Dipp, REsp. 585779, j. 16.11.04) e de Rodolfo Tigre Maia é de que não há conflito aparente
de normas, porque os bens jurídicos tutelados são distintos, aplicando-se a regra do
concurso formal.

379
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

OBS 2: Não admite aplicação do princípio da insignificância, por ser crime de perigo
formal (STJ, REsp 637.742/PR, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, julgado
em 28.09.2005, DJ 07.11.2005 p. 344).

CRIME DE MÃO-PRÓPRIA OU PRÓPRIO? Duas correntes: 1ª corrente (prevalece) - é


crime PRÓPRIO. Logo admite tanto coautoria como participação de pessoas que não sejam
aquelas do artigo 25. Nesse sentido, Manoel Pedro Pimentel, Rodolfo Tigre Maia. 2ª
corrente - é crime de mão-própria. Logo, só admite participação e não coautoria. Corrente
defendida por LFG.

Bem jurídico: a proteção do sistema financeiro lato senso. A credibilidade no mercado


financeiro, a proteção do investidor.

Tipo objetivo: a conduta é gerir, e gerir é administrar, gerenciar, dirigir. Mas tem que ser
uma gestão fraudulenta, não havendo necessidade de que terceiros sejam induzidos em erro.

Tipo subjetivo: é o DOLO. Não há a forma culposa do delito. Embora existe doutrina
minoritária que entende ser cabível a forma culposa. Consumação: o crime é de mera
conduta, ou para alguns é crime formal. Ou seja, ele se consuma com a simples prática de
atos de gestão fraudulenta ou temerária, ainda que tais atos não acarretem prejuízos a
terceiros. Nesse sentido decidiu o STF no HC 95515/RJ em 30/09/08 e o STJ no RESP
637742/PR em 28/09/05.

OBS: o STF já entendeu, ao tempo da vigência da Lei 1.521/51, cuidar-se de crime


eventualmente permanente, iniciando-se o prazo prescricional com a cessação da
permanência (HC 76.441 de 30/10/98). OBS2: a doutrina afirma que se trata de crime
habitual, mas o STF já entendeu que se trata de delito apenas acidentalmente habitual ou
habitual impróprio (HC 89364/PR de 23/10/07; no mesmo sentido o STJ, REsp
200701930872 de 19/10/10).

CRIME CONFIGURADO: a) empréstimos fictícios que não serão pagos (caso do


mensalão); b) manter “caixa 2”, ou seja, manter uma contabilidade paralela; c) permitir, o
gerente de agência de estabelecimento de crédito, o saque sobre saldo bloqueado; autorizar,
indevidamente, desbloqueio de cheques antes do prazo de compensação; determinação de
reapresentação de cheques devolvidos; retardar cheque, sem suficiente provisão de fundos,
retardando o lançamento na conta do cliente, e, assim, causando prejuízo ao banco autorizar
o pagamento de cheques sem disponibilidade de saldo (TRF1, AC 01.01576 de 01/04/96);
d) operações de aplicação de recursos de fundo de pensão pelo Banco G. S/A, instituição
dirigida pelo presidente e vice-presidente do fundo, contrariando norma estatutária
proibitiva de transações nas descritas condições e mediante dissimulação da condição dos
agentes como administradores da instituição bancária (TRF3, AC 19990399039158-3 de
25/03/03); e) apropriação e desvio de recursos de grupos de consórcios (TRF4, AC
5170/RS de 24/04/02) ou de recursos dos próprios consorciados (TRF4, AC
20020401007239-9/RS de 02/04/03); abertura e movimentação de contas-fantasmas, ou
seja, contas bancárias em nome de pessoas físicas ou jurídicas fictícias – empresas
fantasmas (TRF4, AC 200170010038810 de 02/06/09) – ou mediante a utilização indevida
da razão social da empresas existentes (STJ, RHC 14236 de 11/12/07); f) na prática de

380
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

operações “esquenta-esfria”, caracterizadas pela realização simultânea de dois negócios de


compra e venda dos mesmos ativos, em bolsa de valores, a fim de provocar lucros para um
e prejuízo para outro comitente, ambos os clientes da mesma corretora ou de corretoras
concertadas, em operações day trade, em um negócio simulado (TRF3, AC
20010399057006-1/SP de 16/07/07) – OBS: a operação day trade é lícita, mas a operação
esquenta-esfria não.

Parágrafo único: É tipo autônomo. Crime formal e de perigo (abstrato, Rodolfo Tigre Maia;
concreto, José Carlos Tórtima). Obs.: segundo a doutrina, trata-se de crime habitual (o STF,
em caso no qual se discutia o termo inicial do prazo prescricional, afirmou incidentalmente
o caráter habitual – HC 87987/RS de 09/05/06), mas o STJ já reconheceu a gestão
temerária com base em ato único, quando evidenciada a temeridade (REsp 200602086152
de 10/08/10). Não há punição por culpa, por ausência de previsão legal. Caracteriza-se
basicamente por assumir riscos desarrazoados (por exemplo: violando regras
regulamentares, empréstimo sem garantias, etc.). Rodolfo Tigre Maia faz a seguinte
distinção entre os dois crimes: “A distinção essencial entre a modalidade do caput e a do
parágrafo único deste art. 4º reside, essencialmente, no meio executivo peculiar ao primeiro
– fraude - e, estando presente tal elemento, haverá o afastamento da gestão temerária com a
prevalência, pelo princípio da especialidade, da gestão fraudulenta. É que gerir
fraudulentamente é, intrinsecamente, também, temerário pelos riscos que traz à empresa”.
Na gestão temerária, o dolo é eventual (RHC 6368, j. 12.08.97, STJ), ao contrário da
fraudulenta que é direto. Sujeito ativo, passivo e bem jurídico: aplica-se o que foi dito
quanto ao delito do caput. Tipo objetivo: praticar atos perigosos, imprudentes, temerosos.
Por exemplo: fazer empréstimos a devedores cadastrados na SERASA.

OBS: Toda doutrina diz que esse tipo penal é extremamente vago e impreciso, portanto
inconstitucional por violar o princípio da taxatividade. Mas o STF e o STJ considera o tipo
constitucional.

Tipo subjetivo: é punido a título de DOLO. Porque a conduta punida é a gestão e não a
temeridade dela. Isso segundo a doutrina e jurisprudência dominantes. Mas há uma minoria
que entende que o crime de gestão temerária é culposo. ATENÇÃO: O STF já decidiu que o
crime de gestão temerária admite a forma CULPOSA (STF – HC90.156/PE, Min. Rel.
Marco Aurélio). Consumação e tentativa: idem ao artigo 4° caput.

CRIME CONFIGURADO: a) autorização de empréstimo a empresa reconhecidamente


inadimplente (STJ, REsp 5835); b) concessão de fiança bancária, no valor de 60 milhões de
dólares, que garantiria, empréstimo concedido pelo BB à C.A.C., cuja péssima situação
financeira por demais conhecida não permitiria que uma instituição financeira assumisse o
risco de deferir (TRF3, HC 9603020224-0/SP de 04/02/97 – Caso Banespa); c) concessão
de empréstimos de capital de giro sem garantias suficientes, contrariando as regras de boa
administração bancária (TRF3, CC 9703072283-0/SP de 06/10/99); d) conduta do agente
que, como membro do Conselho de Administração de Sociedade Cooperativa, teria
concedido crédito aos associados, sem a devida observância às normas legais e às
recomendações do BACEN, sem garantia e em valores superiores aos limites permitidos
(STJ, HC 22769/GO de 13/05/03); e) na conduta de aprovar e conceder créditos “sem o
devido apego a normas administrativas do BACEN e sem os elementares cuidados de
381
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

controle e recuperação das quantias mutuadas, eventualmente inadimplidas” (STF, HC


87440 de 08/08/06).

Art. 5º: Crime próprio. Inverter arbitrariamente o titulo da posse, passando a dispor como
proprietário. Pressupõe a posse lícita da coisa, ou seja, a disponibilidade física ou jurídica,
fora da esfera de vigilância de terceiro, como se dá nos delitos de apropriação indébita. Os
bens devem estar depositados ou custodiados na instituição financeira (José Carlos
Tórtima), pois se os bens não estiverem nessa condição irá configurar outro crime [como o
artigo 168, CP, p. ex.]. A expressão “qualquer outro bem” autoriza interpretação extensiva,
analógica. Exige dolo específico, pois requer a vontade de apossar-se da coisa ou de obter
proveito próprio ou alheio. Protege-se também o patrimônio dos investidores, por isso o
STJ o considera em concurso formal com o art. 4º. Crime instantâneo, consumando-se no
momento da inversão da posse ou do desvio.

Parágrafo único: Crime próprio, pressupõe a posse da coisa e é caracterizado pela ausência
de autorização do titular do direito ou proprietário dos títulos, agindo o responsável pela
custódia por conta própria (negociação não autorizada). Segundo Baltazar, ao contrário da
modalidade do caput, esta figura não pode ter por objeto dinheiro, mas apenas direito título
ou qualquer outro bem móvel ou imóvel, já que o dinheiro, por ser coisa fungível, não pode
ser objeto de negociação não autorizada.

Art. 6º: Crime formal, que se consuma pela indução ou manutenção em erro a partir da
sonegação de informação (modalidade omissiva) ou da prestação de informação
(modalidade comissiva). Admite-se a tentativa desde que a conduta não tenha resultado na
indução ou manutenção em erro da vítima.

Art. 7º: Crime formal e de perigo abstrato.

Art. 8º: Quando a exigência decorrer de operação com recursos próprios, geralmente
ocorrida entre particulares pela prática de agiotagem, entende-se ser crime de usura do art.
4º da Lei 1.521/51, cuja competência é da justiça estadual (STJ, CC 39.744/SP, j.
23.06.2004, entre tantos outros), mas a propriedade dos valores, em si, é irrelevante para a
configuração do delito (TRF5, AC 1440/CE de 04/05/98). É norma penal em branco. Não
basta mera solicitação, deve existir a exigência (Tórtima, Rodolfo Tigre Maia, Pimentel,
Toron e Torihara; TRF4, AC 20050401023831-0/RS de 06/08/08). Crime formal, pouco
importando se o sujeito passivo cede à exigência.

Art. 9º: Trata-se de forma especial de falsidade ideológica. Se a conduta do réu tiver por
objetivo a fiscalização tributária, então, pelo princípio da especialidade (pela presença do
elemento especializante), aplica-se tão-só o art. 1º, II da Lei n. 8.137/90, segundo José
Carlos Tórtima. Delito de mera atividade que independe de qualquer resultado material
posterior. Deve ser aplicada a mesma lógica de que o falso grosseiro não configura o crime,
e sim estelionato, conforme súmula 73, STJ.

Art. 10: Pressupõe-se que seja cometido no âmbito de uma instituição financeira, sendo
delito comum na modalidade fazer inserir, e próprio (Baltazar) ou de mão própria (Luiz
Regis Prado - de quem tem o dever jurídico de agir conforme o comando legal) na

382
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

modalidade omitir. Não respondem pelo crime os auditores independentes externos, que
não eram responsáveis pela escrituração ou documentação da contabilidade da instituição
(STJ, HC 125853 de 02/02/10). Se for para iludir o fisco, será caso do art. 1º, II, da Lei
8.137/90.

Art. 11: Trata-se da prática conhecida como “caixa 2”. Aplicável apenas às instituições
financeiras, não abrangendo a manutenção de contabilidade paralela em empresas
comerciais ou industriais que não sejam instituições financeiras. Crime próprio (somente as
pessoas descritas no art. 25). Para Baltazar, o objeto material deste delito abrange também
os recursos próprios. Na conduta de manter a doutrina tem exigido o requisito da
habitualidade, além de caracterizá-lo como crime permanente. Na conduta de movimentar
tem-se que o crime é instantâneo e de mera conduta. O elemento subjetivo é o dolo.

Art. 12: crime próprio e omissivo puro. Elemento subjetivo é o dolo. Consuma-se com o
término do prazo final para a entrega das informações, declarações ou documentos.

Art. 13: O fundamento da proibição veiculada por este tipo penal encontra-se no art. 36 da
Lei 6.024/74: “Os administradores das instituições financeiras em intervenção, em
liquidação extrajudicial ou em falência, ficarão com todos os seus bens indisponíveis não
podendo, por qualquer forma, direta ou indireta, aliená-los ou onerá-los, até a apuração e
liquidação final de suas responsabilidades”. Delito especial próprio (somente o ex-
administrador de instituição financeira). O objeto material é o bem alcançado pela
indisponibilidade legal. O desvio poderá ocorrer fisicamente ou ainda de forma fraudulenta,
como no caso de realização de operações de abertura de crédito, de empréstimo ou
financiamento e dação em garantia de bem, da liquidanda e de seus administradores, em
data posterior à decretação da liquidação, ou ainda no caso de colocação dos bens em nome
de terceiros. Consuma-se com o efetivo desvio do bem, sendo admissível a tentativa.

Parágrafo único: Crime próprio do interventor, liquidante ou síndico. Aqui se pune não só o
desvio, como também a apropriação (assenhorear-se, passar a agir em relação ao bem como
se fosse dono – crime instantâneo que se consuma no momento em que se inicia esse agir).

Art. 14: Modalidade específica do crime de falso, que tem por objetivo a obtenção de
prejuízo para terceiro. Crime comum e de mera conduta (independe de prejuízo ou
proveito), sendo inadmissível a tentativa, salvo na modalidade de juntar título falso ou
simulado.

Parágrafo único: Crime próprio do ex-administrador que se consuma como o


reconhecimento do crédito como verdadeiro.

Art. 15: Modalidade específica do crime de falsidade ideológica. Crime próprio (Baltazar
chega a afirmar que é, inclusive, de mão própria, tendo em vista que a manifestação é
personalíssima). Crime de mera conduta (que se consuma com a simples manifestação
falsa) e de perigo abstrato.

Art. 16: Crime comum. Crime formal, de mera conduta e de perigo (Abstrato para Tigre
Maia e concreto para Regis Prado). Posição majoritária não se exige reiteração (nesse

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

sentido: STJ, HC 42346, j. 14.03.06), bastando a prática de apenas uma operação de


instituição financeira. Configura este crime até mesmo uma estrutura rudimentar, não sendo
necessário que tenha estrutura de banco. Rodolfo Tigre Maia: “basta o reconhecimento do
exercício desautorizado de qualquer ato negocial característico de tais instituições,
consoante definidas pelo art. 1º da Lei de Regência, para conformar a incidência típica,
independente de a mesma se dar no âmbito, ou não, de um arcabouço estrutural similar ao
usado por esta, ou de ser reiteradamente praticada, aos moldes da primeira enunciação”.
Não se configura com a mera apreensão de valores em moeda estrangeira, se não há provas
do câmbio (TRF4).

Distingue-se da agiotagem porquanto nesta o agente não se enquadra no conceito de


instituição financeira, bem como não opera com recursos captados do mercado, mas sim
próprios.

Factoring: Factoring não é instituição financeira, nem instituição financeira por


equiparação. Ela não pode emprestar dinheiro. O que factoring faz é comprar títulos de
crédito que ainda não venceram, fazendo com que a empresa aumente seu capital de giro.
Se o dono da factoring utiliza a empresa para emprestar dinheiro pratica o crime do artigo
16? Depende. Se o fez com recursos próprios pratica o crime do artigo 4º da lei 1.521/51 e
a competência seria da Justiça Estadual. Se o faz com recursos de terceiros incorrerá no
artigo 16 em comento e a competência será da Justiça Federal.

STJ, CC 115.338-PR, 2013: compete à Justiça Federal processar e julgar a conduta daquele
que, por meio de pessoa jurídica instituída para a prestação de serviço de factoring, realiza,
sem autorização legal, a captação, intermediação e aplicação de recursos financeiros de
terceiros, sob a promessa de que estes receberiam, em contrapartida, rendimentos
superiores aos aplicados no mercado. Isso porque a referida conduta se subsume, em
princípio, ao tipo do artigo 16 da lei 7492/86. Ademais, nessa hipótese, apesar de o delito
haver sido praticado por maio de pessoa jurídica criada para a realização de atividade de
factoring, deve-se considerar ter esta operado como verdadeira instituição financeira,
justificando-se, assim, a fixação da competência na Justiça Federal. OBS: se a factoring
tivesse operado com recursos próprios seria o crime do artigo 4º da lei 1.521/51 e a
competência seria da Justiça Estadual.

Art. 17 e Parágrafo único: Crime próprio, admite coautoria e participação. Respondem


pelo crime tanto o tomador, quanto o concedente do mútuo. Para o STJ e Rodolfo Tigre
Maia, é indiferente, para a caracterização do delito, a origem do recurso do empréstimo,
mesmo que seja do próprio controlador, de terceiro ou do consorciado, pois a
criminalização não recai sobre a origem dos valores e sim sobre a conduta em si. Para essa
corrente majoritária, trata-se de crime de mera conduta (STJ, REsp 328913/SP, julgado em
23.11.2004), sendo irrelevante o estorno da operação ou o pagamento do empréstimo. Há,
entretanto, precedentes do TRF3 em sentido contrário, basicamente relacionando esse
dispositivo com o do art. 1º, para sustentar que não há crime quando o recurso é próprio, tal
como quando da definição de “instituição financeira”. Ademais, a concessão com recursos
próprios não lesionaria o SFN, sustenta essa segunda corrente (minoritária). A fraude não é
elementar do delito, exceto no inc. II (“de forma disfarçada”).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Art. 18: Derrogado em parte pelo art. 10 da LC 105/01 (A quebra de sigilo, fora das
hipóteses autorizadas nesta Lei Complementar, constitui crime e sujeita os responsáveis à
pena de reclusão, de um a quatro anos, e multa, aplicando-se, no que couber, o Código
Penal, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.) porque a LC 105/01 é menos abrangente
na conceituação de Instituição Financeira (não contempla empresa de consórcios e seguros,
por ex.). Trata-se de delito especial próprio (o agente é aquele que tem acesso às
informações sigilosas sobre operação ou serviço prestado pela instituição, em razão de seu
ofício); porém, o delito previsto no art. 10 da LC 105/01 é comum, pois não há delimitação
do sujeito ativo. A conduta será quebrar, abrangendo tanto aquele que obtém acesso aos
documentos ou dados sigilosos, cometendo intrusão, quanto aquele que, tendo tido acesso
legítimo aos documentos ou dados, os divulga indevidamente (STF, Pet 3898, Caso
Palocci). São crimes formais e de perigo abstrato, não sendo necessária a ocorrência de
efetivo prejuízo para sua perfectibilização.

Art. 19: É crime material e de perigo. É, por isso, tipo raro. Consuma-se no momento em
que é assinado o contrato (“obter... financiamento”), sendo desnecessária a existência de
efetivo prejuízo para a instituição financeira, por isso que o agente responderá pelo crime
mesmo que comprove haver adimplido todas as parcelas do financiamento. O recebimento
do valor, após a assinatura do contrato, é mero exaurimento (STJ, REsp. 682181, j.
26.09.05). ATENÇÃO: Para o TRF4 e José Carlos Tórtima, se não for para finalidade
vinculada (e.g., financiamento de um carro, automóvel, etc.), será estelionato (em regra,
competência estadual), pois não se enquadra na definição técnica de “financiamento”, mas,
sim, de mero empréstimo bancário. Para o STJ, há precedentes nos dois sentidos. Pelo
crime desta lei, entendendo que não há distinção entre empréstimo e financiamento e que,
portanto, qualquer obtenção fraudulenta de crédito em instituição financeira configura o
delito em exame, é o REsp. 661755, j. 26.04.05 (no mesmo sentido, agora no STF, é o Inq
1441 de 01/12/05. Em sentido contrário, distinguindo entre o estelionato e o presente crime
contra o SFN: “A obtenção de empréstimo, mediante abertura fraudulenta de conta
corrente, não é o mesmo que ‘obter, mediante fraude, financiamento em instituição
financeira’ (art. 19, Lei 7.492/86). Não há que se admitir que a obtenção de empréstimo,
operação financeira que não exige destinação específica, seja tida como equivalente a
operação de financiamento, para a qual se exige fim certo, para os efeitos do que dispõe a
norma penal. Se os fatos não encontram previsão na Lei 7.492/86, não há que se falar em
crime contra o Sistema Financeiro Nacional. Afastada a competência da Justiça Federal se
não versa a hipótese sobre interesse federal ratione materiae, ou se não há delito praticado
em detrimento de bens, serviços ou interesses da União Federal ou de suas autarquias ou
empresas públicas. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da 2ª
Vara de Cachoeirinha – RS” (CC 37187/RS, julgado em 08.11.2006, DJ 07.05.2007 p. 275).
No mesmo sentido: CC 65074, j. 24.10.07.

Parágrafo único: A pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é cometido em


detrimento de instituição financeira oficial ou por ela credenciada para o repasse de
financiamento.

Enunciado nº 48: CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL

É de atribuição do Ministério Público Federal a persecução penal do crime de obtenção


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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

fraudulenta de financiamento em instituição financeira para aquisição de automóvel,


tipificado no artigo 19 da Lei nº 7.492/86. Precedentes:1.00.000.008902/2012-81;
1.00.000.008878/2012-80; 0003211-32.2012.403.6102; 0007962-62.2012.4.03.6102;
000521372.2012.403.6102; 0004155-34.2012.403.6102, entre outros. (061ª Sessão de
Coordenação, de 04.03.2013)

Art. 20: Norma penal em branco, complementada pela lei ou pelo contrato. Dolo direto ou
dolo eventual. Crime comum e formal, o ressarcimento não afasta o crime.

Art. 21 e Parágrafo único: Forma específica de falsa identidade, na forma básica, e de


falsidade ideológica, na modalidade do parágrafo único. A conduta deve ser praticada no
âmbito do mercado cambial. Crime comum e formal (consuma-se no momento da
atribuição de falsa identidade. Não se exige a saída ou ingresso de valores. O MPF tenta
enquadrar a conduta de ingresso irregular de valores neste tipo penal, mas não tem tido
sucesso nas apelações.

Art. 22: Crime de evasão de divisas. Exige-se o dolo específico (“com o fim”). Sem a
intenção de promover a evasão, não configura o delito deste artigo. Crime comum e formal.
Protegem-se, em primeiro lugar, as políticas cambiais e o patrimônio fiscal. A mera troca de
moedas (câmbio), sem intenção de evasão, não é crime. Devem estar presentes os dois
pressupostos: a) a operação de câmbio deve ser não autorizada, ou seja, à margem dos
meios oficiais e b) com o fim de promover a evasão de divisas. Atenção: para a
consumação, não se exige, ao contrário da figura típica do parágrafo único, a saída efetiva
de divisas (STJ, CC 88.159/SP, julgado em 24.10.2007, entre outros). São necessárias
provas da operação de câmbio. Alguns entendem que havendo o câmbio e a remessa, há
progressão criminosa para a conduta do §único do 22. Há divergência quanto à tipicidade
da falta de liquidação de contrato de câmbio (ex. Houve exportação de mercadoria - logo
câmbio, mas não se comprovou o ingresso dos valores respectivos - Baltazar entende
atípica porque só houve a evasão da mercadoria e não de divisas.). É comum ocorrer o
crime nas importações superfaturadas (o agente importa bens por valor notoriamente
superior ao real, em evidente superfaturamento e com o fim de promover a evasão de
divisas. Há restrição quanto ao câmbio em espécie, devendo ser a regra da entrada e saída
de moeda estrangeira apenas processados por transferência bancária, por instituições
autorizadas. Quando há um mercado clandestino, configura-se o chamado dólar-cabo
(assim denominado por que as ordens de pagamentos aos doleiros são realizadas em regra
por telefone, internet, etc.).

Parágrafo único, primeira parte: Incorre na mesma pena quem, a qualquer título, promove,
sem autorização legal, a saída de moeda ou divisa [são as conversíveis em moeda, tais
como: cheques, ouro, ou todo título capaz de gerar riqueza no exterior], para o exterior, (...).
A primeira conduta é crime material e instantâneo (só se consuma com a “saída” da moeda
ou divisa); já a segunda conduta, constante na parte final (“mantiver”), é de mera conduta e
permanente. É uma lei penal em branco (“sem autorização legal”). Como já destacado, deve
ocorrer a efetiva saída do país para a consumação, ao contrário da conduta do “caput”. Se
houver sonegação de tributos, não há falar em conflito aparente de normas, mas, sim, em
concurso de crimes (TRF4, 200071000192744, j. 12.05.04). Igualmente, haverá concurso
formal entre evasão de divisas e gestão fraudulenta (TRF4, ACR 2004.04.01.039552-5,
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

D.E. 20/02/2008). Em caso de subfaturamento na exportação, para o TRF4 e para José


Carlos Tórtima não será caso de evasão, por falta de adequação típica. Nesse sentido: “não
se pune a conduta de quem deixa de trazer moeda ou divisa para o País. 3. Conforme, bem
ponderou o custos legis, mercadorias exportadas não podem ser consideradas como
elemento normativo do tipo, no caso "divisas". Logo, do ponto de vista penal, a conduta é
atípica, restando, tão-somente, eventual infração administrativa” (TRF4, ACR
2004.71.00.035645-0 de 20/09/2006). Até R$ 10.000,00, não precisa de declaração (não
será crime, pois). Acima, deve haver a Declaração de Porte de Valores (DPV, Resolução
2524/98). Se houver alteração desse limite, não terá efeito retroativo, pois essa norma é
temporária (art. 3º do CP). Toda exportação acima de R$ 10.000,00 exige contrato de
câmbio. O tipo exige “a saída” de moeda ou divisa. Por isso, a entrada de moeda não é
crime (pode ser, eventualmente, infração administrativa), conforme já decidiu o STJ (REsp.
189.144, j. 17.02.05) e o STF (HC 88087/RJ de 17/10/06). Para o prof. Andrei Schmidt, a
“repartição federal competente” (referida na segunda parte) que deve ser informada é o
BACEN, pois cabe a essa autarquia federal o controle da política cambial, e não à Receita
Federal como entende parcela da jurisprudência. E mais: o art. 26, parágrafo único, desta
lei, é expresso em mencionar o BACEN como possível assistente, a revelar que é ele o
titular da proteção almejada. A declaração requerida pelo tipo tem por fim saber quanto de
recurso existe no mercado estrangeiro.

Parágrafo único, segunda parte: Incorre na mesma pena quem (...), nele [no exterior]
mantiver depósitos não declarados à repartição federal competente. Embora previsto no tipo
da evasão de divisas, é crime autônomo (a demandar descrição própria na denúncia – STJ,
HC 48969/DF de 17/10/06). Por força de Circulares do BACEN (desde a 3225/04 até a
3342/09), até US$ 100.000,00. Para o STJ: “6. Até o advento da Circular do Banco Central
nº 3.071/2001, havia discussão acerca da autoridade destinatária da declaração, mas não
quanto ao montante a ser declarado. Somente com a reformulação da política cambial é que
o Banco Central passou a dispensar dados sobre depósitos mantidos no exterior a partir de
determinados valores (2001: R$ 10.000,00; 2002: R$ 300.000,00, e, desde 2003, US$
100.000,00). Assim, não se poderá cogitar de retroatividade desses limites para os fatos
anteriores às respectivas circulares do BACEN, ante o caráter excepcional dessas
normativas, devendo, pois, ser aplicada a regra da ultratividade, segundo a máxima tempus
regit actum. (TRF4, ACR 2000.71.00.021894-0 de 16/05/2007). Não é proibido manter
valores no exterior, mas consuma-se este crime quando não há informação sobre eles. Na
prática, verifica-se se há omissão e se havia saldo na conta no dia 31/12. Este delito nem
sempre pressupõe o crime prévio de evasão, embora isso geralmente ocorra. Por exemplo:
trabalho realizado no exterior, com remuneração depositada em conta estrangeira e sem
declaração ao BACEN (lembre-se: excedente ao limite). O fato tão-só de manter depósito
no exterior, sem autorização, não caracteriza, em concurso material, o crime de lavagem.
Uma só conduta não pode gerar dois crimes. Nesse sentido: “Para a configuração dos
crimes de lavagem de dinheiro (money laundering) ou lavagem de instrumentos monetários
(laundering of monetrary instruments), exige-se um nexo de origem entre o crime anterior -
no caso, a remessa ilegal de dinheiro para o exterior - e o agir ocultando ou dissimulando a
natureza, origem, localização, disposição, movimentação de (no caso) dinheiro, proveniente
de determinados crimes (na hipótese, crime contra o sistema financeiro nacional). Um só
modo de agir não pode servir de base para a prática de dois crimes, ou seja, a remessa e a

387
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

manutenção em depósito no exterior constitui crime contra o sistema financeiro nacional,


mas não há lavagem de dinheiro nesse só ato. Esta ocorreria se o dinheiro sujo fosse
convertido em lícito, legal, ou seja, se o acusado adquirisse propriedades e bens, pagasse
dívidas, constituísse empresas. (TRF1, Rel. Tourinho Neto, j. 29.04.05).

Art. 23: Tipo especial de prevaricação cometido por funcionários encarregados da


fiscalização (crime próprio). Não se exige notificação prévia para o recebimento da
denúncia. O objeto material da conduta é o ato de ofício. Nas modalidades omissivas o
crime se consuma com o retardamento ou a omissão, enquanto que na modalidade
comissiva o crime se aperfeiçoa com a efetiva prática do ato.

6) DA APLICAÇÃO E DO PROCEDIMENTO CRIMINAL.

Art. 25: “São penalmente responsáveis...”. Desde que, é claro, presente dolo ou culpa,
conforme o crime. Este dispositivo deve ser entendido, apenas, como um mero indicativo,
sem valor absoluto em matéria de responsabilização penal. Conforme decidido pelo TRF4
“a norma não produz presunção absoluta da responsabilização dos controladores, diretores,
gerentes e demais administradores da instituição financeira. Se assim não fosse, estaríamos
perante a imputação objetiva, defesa no ordenamento pátrio” (HC 11416-0 de 05/05/2004).
E mais: “O simples fato de figurar no contrato social não gera responsabilidade penal. Se a
apelada não detinha, de fato, qualquer poder de mando ou gerencial, deve ser excluída do
polo passivo da ação criminal. Aquele que efetivamente administra a empresa, responde
pelos atos praticados” (TRF4, ACR 7175 de 19/06/2002).

§ 1º: Equiparam-se aos administradores de instituição financeira (Vetado) o interventor, o


liquidante ou o síndico.

§ 2º: Nos crimes previstos nesta Lei, cometidos em quadrilha ou coautoria, o coautor ou
partícipe que através de confissão espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a
trama delituosa terá a sua pena reduzida de um a dois terços. (Incluído pela Lei nº 9.080, de
19.7.1995).

OBS: Terceiros que não sejam as pessoas acima podem responder por crimes contra o SFN,
pois aqueles sujeitos ativos são elementares, logo comunicam-se a terceiros nos termos do
artigo 30 do CP. Esses terceiros atuam na condição de partícipe ou coautores daqueles
sujeitos ativos. É posição pacífica do STF. Além disso, existe alguns crimes na lei que são
crimes comuns, ou seja, que não exige aquelas qualidades dos sujeitos ativos.

Art. 26 e Parágrafo Único: Esse dispositivo diz que os crimes contra o SFN é de ação
penal PÚBLICA INCONDICIONADA. Traz ainda a competência que será da JUSTIÇA
FEDERAL, em regra, porque o artigo 109, inciso VI, da CF/88, diz são de competência da
justiça federal nos casos previstos em lei, e no caso o artigo 26 da Lei 7.492/86 prevê que é
da justiça federal.

Existem EXCEÇÕES (criadas pela jurisprudência do STJ e STF) em que os crimes não
serão julgados pela justiça federal quando não atingirem interesses diretos e específicos da
União. É a mesma jurisprudência aplicada para os crimes ambientais. Assim, quando os

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

crimes não atingem os interesses diretos e específicos da União, a competência será da


justiça estadual. Por exemplo: uma operação de consórcio que lesa dois particulares, pois
nesse caso o interesse da União é genérico, indireto. Nesse sentido é que o STJ e o STF
vêm decidindo (STF REXT 902.915/SP).

OBS 1: Muitos estados, por normas estaduais criaram varas especializadas em crimes
contra o SFN. O STF já decidiu que essas varas são constitucionais (não viola o princípio
do juiz natural e do devido processo legal), e possuem competência ABSOLUTA, pois é
competência em razão da matéria. Nesse sentido (STF HC 91.024/RN em 05/08/08).

OBS 2: No caso do Banestado (caso das chamadas contas CC5), foram denunciadas
dezenas e dezenas de pessoas dos mais diferentes locais do Brasil. O STJ decidiu que,
embora conhecidos os locais da consumação dos crimes, a competência pode,
EXCEPCIONALMENTE, ser fixada pelo domicílio ou residência dos acusados, tendo em
vista o grande número de réus de diferentes localidades. O fundamento foi o princípio da
celeridade processual. Isso foi decidido pelo STJ no HC 85951/PR 5ª turma em 28/05/08.

Art. 27: Não impossibilita a ação privada subsidiária, conforme José Carlos Tórtima.

Art. 28 e Parágrafo único: Sem comentários.

Art. 29: O MPF não pode proceder à quebra do sigilo financeiro sem autorização judicial,
pois “somente autorização expressa da Constituição legitimaria o MP a promover,
diretamente e sem intervenção da autoridade judiciária, a quebra do sigilo bancário de
qualquer pessoa” (STF, RE 215.301/CE de 28/08/99). De modo que não consubstancia
crime de desobediência a negativa de atendimento a requisição do MP de informações
sobre o assunto protegido pelo sigilo bancário (STJ, REsp 79026/DF de 03/05/99).
PORÉM, o STF já entendeu, em mandado de segurança impetrado por Instituição
Financeira, não ser oponível ao MP o sigilo financeiro, no caso concreto, diante da origem
pública de parte do dinheiro envolvido nas operações, levando em conta o princípio da
publicidade insculpido no art. 37 da CF (MS 21729 de 19/10/01).

Art. 33: Na fixação da pena de multa relativa aos crimes previstos nesta lei, o limite a que
se refere o § 1º do art. 49 do Código Penal, aprovado pelo Decreto-lei nº 2.848, de 7 de
dezembro de 1940, pode ser estendido até o décuplo, se verificada a situação nele cogitada.

ATENÇÃO: Ainda há 3 artigos na Lei 6.385/76 que estabelecem crimes contra mercado de
capitais.

1. As “Eficiências” protegidas pela Lei 6.385/76. Eficiência de alocação ou de atribuição de


recursos: ocorre quando o mercado consegue transferir os recursos dos investidores às
unidades demandantes de capital; Eficiência Informativa: estará presente quando
demonstrada a capacidade dos mercados em incorporar toda a informação disponível nos
preços. Para garantir um mercado de concorrência perfeita, a informação deve ser pública,
franqueada indistintamente, possibilitando que todos os agentes participem do mercado de
capitais em verdadeira igualdade de condições, ou, mais precisamente, sob concreta
simetria informacional.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

2. Crimes em Espécie:

Art. 27-C: Manipulação de mercado: Realizar operações simuladas ou executar outras


manobras fraudulentas, com a finalidade de alterar artificialmente o regular funcionamento
dos mercados de valores mobiliários em bolsa de valores, de mercadorias e de futuros, no
mercado de balcão ou no mercado de balcão organizado, com o fim de obter vantagem
indevida ou lucro, para si ou para outrem, ou causar dano a terceiros. O legislador tentou
conjugar 03 ilícitos administrativos: (1) criação de condições artificiais de demanda, oferta
ou preços de valores mobiliários; (2) operação fraudulenta; e (3) manipulação de preços.
Trata-se de tipo penal extremamente confuso (Carvalhosa e Eizirik). Um dos tipos penais
mais complexos do direito penal brasileiro (Bitencourt), exigindo 3 dolos específicos. Bem
jurídico: transparência, regularidade na formação dos preços dos valores mobiliários e
igualdade de oportunidades – genericamente a estabilidade do mercado. O processo de
formação de preços que se procura tutelar é o do mercado secundário. A alteração artificial
de preços somente ocorre no mercado secundário, onde há cotação dos valores mobiliários.
Sujeito Ativo: crime comum. Tipo objetivo: a conduta é realizar operações simuladas OU
executar outras manobras fraudulentas: ex. para gerar aparência de liquidez, emitir novas
ações com base no valor de mercado, comprar ações, etc. Um exemplo de como estas
condutas afetam o funcionamento do mercado ocorre quando manipulações do mercado
simulam um risco elevado para uma determinada ação, o que acarretará numa
desvalorização desta, visto que poucos investidores gostariam de comprar um papel com
alto risco, sendo que poderiam comprar um outro com menor risco que geraria o mesmo
lucro, logo, reduziria, artificialmente a demanda – e como diz a já mencionada lei da
economia, quando menor a demanda, menor o preço. Com esta desvalorização, o autor do
crime poderia comprar estes papéis a preços muito baixos e revendê-los em seguida a
preços mais altos após a normalização do mercado. Além de prejudicar o investidor
individual, tal conduta prejudica, como visto, todo o mercado. Um outro exemplo de
manipulação de mercado ocorre quando algumas pessoas realizam uma série de operações
seguidas de compra e venda que vão evoluindo de modo a criar a ilusão de que o preço das
ações são muito maiores do que eles realmente valem, o que prejudica investidores de boa-
fé que comprarem estes ativos supervalorizados. Consumação (matéria controvertida):
crime material (Carvalhosa e Eizirik); crime formal – dispensa-se a obtenção de vantagem
indevida ou lucro, que deverão ser considerados na dosimetria da pena (Bitencourt).

Art. 27-D: Uso de Informação Privilegiada, a qual deveria ter sigilo, para obter vantagens
indevidas: É o famoso Insider Trading. Razões pelas quais o ‘insider trading’ deve ser
reprimido: a) Não proporciona a alocação eficiente dos recursos na economia. A
companhia, em verdade, é prejudicada, pois os seus administradores (insiders) lucram
secretamente em detrimento dos acionistas. b) A afirmação de que, quando o insider
negocia ele indica para o mercado a direção correta para os demais investidores também
não pode ser acatada, haja vista que, normalmente, o mercado desconhece os motivos pelos
quais o insider negocia, isto é, ele não sabe, de antemão, se o insider está, ou não, se
utilizando de informação privilegiada. c) Aqueles que detêm informações relevantes e a
utilizam no mercado de capitais valem-se de diversos expediente para acobertar a sua
identidade e, assim, não alertar os demais investidores, de sorte a garantir a maximização
do lucro. d) Para valorizar suas ações, a administração da companhia pode entregar

390
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

informações em parcelas, em conta-gotas, levando, com isso, a um aumento da volatilidade


dos ativos. e) O uso de informação privilegiada afeta negativamente o funcionamento
interno e o desenvolvimento das companhias abertas, bem como a sua boa governança,
incentivando os administradores a perpetrar condutas lesivas aos interesses da pessoa
jurídica e dificultando os processos internos de tomada de decisões. Bem jurídico protegido
(matéria controvertida): a) a confiança dos investidores no mercado; b) o adequado
funcionamento do mercado; c) a função pública da informação no mercado; d) a
estabilidade do mercado de capitais; e) o processo de ‘disclosure’: transparência; f) bem
jurídico pluriofensivo: dever de transparência, de informação plena do mercado de capitais
e de lealdade dos administradores das sociedades. Sujeito Ativo: crime próprio: somente
quem tem o dever de sigilo. Art. 155, § 1º, da Lei 6.404/1976 e do art. 8º da Instrução CVM
N.º 358/2002. O administrador tem o dever específico de guardar sigilo sobre qualquer
informação que ainda não tenha sido divulgada para conhecimento do mercado, obtida em
razão do cargo e capaz de influir de modo ponderável na cotação de valores mobiliários.
Pelo art. 8º da Instrução CVM n.º 358/2002 o dever de sigilo das informações relativas a
ato ou fato relevante alcança os acionistas controladores, diretores, membros do conselho
de administração, do conselho fiscal e de quaisquer órgãos com funções técnicas ou
consultivas, criados por disposição estatutária, e empregados da companhia. Quanto ao tipo
objetivo, deve-se notar que não basta que a informação seja sigilosa, ou seja, aquele que a
detém deve manter segredo, ela não pode ter sido divulgada. Desta forma, só existe o crime
quando o agente age antes da referida divulgação. Um exemplo prático para compreender
esta conduta seria o caso de uma empresa que produz vigas e outros produtos derivados do
ferro, de grande porte, que está pensando em comprar um lucrativa empresa que produz
minérios de ferro, sua matéria-prima. Com essa compra, seu custo de produção cairia
muito, além do que a outra companhia geraria lucros também. Se, a empresa decida
realmente comprar a outra, geraria uma valorização de seus papéis no mercado. Assim, se
alguém (por ex. um diretor) se utilizasse de informações internas, antes da divulgação da
compra, para comprar os papéis antes da valorização, estaria incluído na conduta prevista.
Consumação: com utilização da informação sigilosa. Por se tratar de crime formal não é
necessário nenhum resultado, ou seja, é prescindível a obtenção de vantagem. O que é
informação relevante? É aquela capaz de influir, de modo ponderável, na cotação dos
valores mobiliários (art. 155, §1º, da Lei de S/A). Conceito de ato ou fato relevante – art. 2º
da Instrução nº 358 da CVM: “Considera-se relevante, para os efeitos desta Instrução,
qualquer decisão de acionista controlador, deliberação da assembleia geral ou dos órgãos de
administração da companhia aberta, ou qualquer outro ato ou fato de caráter político-
administrativo, técnico, negocial ou econômico-financeiro ocorrido ou relacionado aos seus
negócios que possa influir de modo ponderável: I – na cotação dos valores mobiliários de
emissão da companhia aberta ou a eles referenciados; II – na decisão dos investidores de
comprar, vender ou manter aqueles valores mobiliários; III – na decisão dos investidores de
exercer quaisquer direitos inerentes à condição de titular de valores mobiliários emitidos
pela companhia ou a eles referenciados”.

Art. 27-E: Atuar, ainda que a título gratuito, no mercado de valores mobiliários, como
instituição integrante do sistema de distribuição, administrador de carteira coletiva ou
individual, agente autônomo de investimento, auditor independente, analista de valores
mobiliários, agente fiduciário ou exercer qualquer cargo, profissão, atividade ou função,

391
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

sem estar, para esse fim, autorizado ou registrado junto à autoridade administrativa
competente, quando exigido por lei ou regulamento.

QUESTÕES DE PROVA: Crimes contra mercado de capitais. O que protege? Diferença


do crime contra sistema financeiro? Crime de gestão fraudulenta. Tipo? Precisa fraude? É
crime próprio? Gestão temerária. Diferenças? Norma penal em branco? Sem norma que
complementa é impossível punir? Manipulação no mercado de capitais. Diferença da gestão
fraudulenta? Pode punir pelos dois?

392
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

15.a. Ilicitude.
Obras consultadas: Santo Graal 27; GUEIROS, Artur, 2012. BITENCOURT, Cezar
Roberto. Tratado de Direito penal: parte geral, volume 1, 11 ed. - São Paulo: Saraiva, 2007.
ROXIN, Claus. Derecho Penal. Parte Geral. Fundamento. La estructura de la teoria del
delito. Madrid: Civitas, 2006. TOLEDO, Francisco de Assis. Ilicitude Penal e causas de sua
exclusão. Rio de Janeiro: Forense, 1984. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 10 ed.
Rio de Janeiro: Ímpetos, 2008. MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado. 2.ed. São
Paulo: Método, 2009.

Legislação Básica: artigos 23, 24, 25, 128, 142, 146, §3, I, 150, §3, I e II ; art. 156, §2 do
Código Penal. art. 10 da Lei n. 6.538/78; art. 1210, §1 do CC ; art. 37, I da Lei 9.605/98

Na concepção tripartite, crime é fato típico, ilícito e culpável. Nessa visão, sem
culpabilidade não há crime.

Fato típico Ilícito Culpável

1) conduta. - ratio cognoscendi. - É o juízo de reprovação.


2) tipicidade penal.
3) relação de causalidade. - Causas justificantes: - Elementos:
4) resultado 1) legais. 1) imputabilidade penal.
2) supralegais. 2) a potencial consciência
da ilicitude.
3) exigibilidade de conduta
diversa

Considerações gerais: Ilicitude é a contrariedade entre o fato típico e o ordenamento


jurídico, capaz de lesionar ou expor a perigo de lesão bens jurídicos. É a conduta típica não
justificada.

Terminologia: Antijuridicidade e ilicitude: A rigor, antijuridicidade e ilicitude são


expressões equivalentes. A opção entre uma ou outra expressão varia de autor para autor, de
escola para escola. Antijuridicidade e antinormatividade: Welzel distingue
antijuridicidade de antinormatividade. A antinormatividade é a contradição do fato
realizado para com a norma proibitiva do tipo penal pertinente. A realização da conduta
típica acarreta sua antinormatividade. Mas, para que haja antijuridicidade, é preciso cotejar
o fato com o conjunto das normas proibitivas e permissivas (ordenamento como um todo).
Antijuridicidade e tipicidade conglobante: Para Zaffaroni a tipicidade penal pressupõe a
tipicidade legal, exigindo, porém, que a conduta seja antinormativa. É a chamada teoria da
tipicidade conglobante. Ilicitude e injusto penal: Segundo Zaffaroni, ilicitude é diferente
de injusto penal. A ilicitude é apenas uma característica do injusto. O injusto, por sua vez, é
a conduta típica e antijurídica, envolvendo a compreensão social acerca da justiça (conceito

393
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

que envolve aspectos subjetivos). Já a ilicitude é a contrariedade do fato típico à norma


(aspecto objetivo). É por essa razão que a antijuridicidade da conduta típica é determinada
por um critério negativo, qual seja, a ausência de causas de justificação. Mais adiante,
veremos que tal entendimento influencia na divisão entre ilicitude objetiva e ilicitude
subjetiva.

Algumas classificações: I. Ilicitude Formal X Material: A ilicitude formal é a mera


contradição entre a conduta e o ordenamento jurídico. Já a ilicitude material revela-se no
caráter antissocial do comportamento (conteúdo material do injusto). Na doutrina,
prevalece o caráter formal, apesar de somente a concepção material autorizar a criação de
causas supralegais de exclusão. Há, ainda, uma concepção unitária (surgida na Alemanha e
defendida por Bettiol e Francisco de Assis Toledo), segundo a qual a ilicitude é uma só (não
cabendo a separação vista antes, já que para ser ilícito o comportamento precisa lesionar
bens jurídicos); II. Ilicitude Objetiva X Ilicitude Subjetiva: Na ilicitude objetiva, basta a
contrariedade do fato típico ao ordenamento. As notas pessoais do agente (ex.:
imputabilidade) não afetam a ilicitude e devem ser analisadas posteriormente. Já a ilicitude
subjetiva exige a capacidade de conhecimento do agente acerca da ilicitude de sua conduta
(Ex: imputabilidade). Em nosso sistema penal a ilicitude é objetiva (Cleber Masson, pag.
349); III. Ilicitude Genérica X Ilicitude Específica: A genérica é a que se posiciona
externamente ao tipo incriminador, enquanto que a específica é a que funciona como
elemento normativo do tipo (o tipo tem em seu interior elementos de ilicitude). Cezar
Roberto Bittencourt, diversamente, emprega as expressões antijuridicidade genérica e
específica para distinguir a ilicitude penal e a extrapenal (p. 296).

Relação entre tipicidade e licitude: existem as seguintes teorias: a) Teoria da autonomia


ou da absoluta independência: não há relação entre tipicidade e ilicitude; b) Ratio
cognoscendi ou teoria da indiciariedade: É a que prevalece na doutrina. A tipicidade
presume a ilicitude. Esta é afastada somente diante de prova em sentido contrário. O ônus
de prova da causa de exclusão da ilicitude é da defesa (aqui, não se aplica o in dubio pro
reo); c) Teoria da absoluta dependência ou da ratio essendi: a ilicitude é a essência da
tipicidade. O fato só é típico se também ilícito (tipo total do injusto). OBS: não se confunde
com a tipicidade conglobante (que admite a existência da ilicitude e não trabalha com a
ratio essendi).

Causas de exclusão da ilicitude ou Descriminantes ou Justificantes: São encontradas:


Parte Geral: art. 23 do CP; Parte Especial: arts. 128 (aborto); 142 (injúria e difamação);
146, §3, I (constrangimento ilegal); 150, §3, I e II (violação de domicílio); art. 156, §2
(furto de coisa comum). Leis Extrapenais: art. 10 da Lei n. 6.538/78 (possibilidade de
serviço postal abrir carta com conteúdo suspeito = exercício regular do direito); art. 1210,
§1 do CC (legítima defesa do domínio); art. 37, I da Lei 9.605/98 (abatimento de animal
para saciar a fome= estado de necessidade). Causa Supralegal: consentimento do ofendido.

I - Causas de exclusão da parte geral:

1) Estado de Necessidade: Estado de necessidade consiste em hipótese em que o agente


pratica conduta típica, mas, por força de colisão de dois ou mais interesses juridicamente
protegidos, o sacrifício de um para salvaguardar a sobrevivência do outro estará
394
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

considerado como justificado, diante da impossibilidade de salvamento de todos os bens


postos em perigo. Assim, considera-se em estado de necessidade quem pratica um fato
típico, sacrificando um bem jurídico, para salvar, de perigo atual, direito próprio ou alheio,
cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. Requisitos objetivos: A)
Perigo atual e inevitável: que pode ser gerado por fato humano, comportamento de animal
ou fato da natureza. Para maioria doutrinária, diferentemente da legítima defesa, o estado
de necessidade não abrange o perigo iminente; B) Não tem destinatário certo
(diferentemente da legítima defesa); C) Situação de perigo não causada voluntariamente
pelo agente. Não pode invocar o estado de necessidade quem, por sua vontade, provocou o
perigo. O que é ser causador voluntário? 1a Corrente: é quem age com dolo. Logo, a culpa
permitiria alegar estado de necessidade (CLAUS ROXIN- pág., 698). Essa corrente é a que
prevalece. 2 a Corrente: Causador voluntário é quem age com dolo ou culpa. Através de
interpretação sistemática, essa corrente usa a ideia de garantidor do art. 13, §2, “c” do CP
(NUCCI, NELSO HUNGRIA, JOSÉ FREDERICO MARQUES); D) Salvar direito próprio
(estado de necessidade próprio) ou alheio (estado de necessidade de terceiro). Na doutrina,
prevalece que, no estado de necessidade de terceiro, não é necessária a autorização do
terceiro ou posterior ratificação; E) Inexistência do dever legal de enfrentar o perigo: Não
pode alegar estado de necessidade quem tem o dever legal de enfrentar o perigo (CP, art.
24, § 1o). É claro que a exigência tem caráter relativo, diante do princípio da razoabilidade,
não se podendo esperar que o bombeiro se lance ao prédio já tomado pelas chamas para
salvar uma vítima. Dever de enfrentar o perigo não significa a necessidade de heroísmo,
que, em última análise, não pode ser exigido de quem quer que seja. O que se entende por
dever legal? 1ª corrente: Interpretação restritiva do art. 13, § 2º do CP: dever legal é apenas
o decorrente de lei em sentido amplo (medida provisória, decreto, regulamento). Logo, os
garantes das alíneas “b” e “c” do art. 13, § 2º poderiam alegar estado de necessidade
(NELSON HIUNGRIA). 2ª Corrente: Defende a interpretação extensiva para abranger
qualquer dever jurídico (BENTO DE FARIA, COSTA E SILVA). Nenhum garante do art.
13, § 2º do CP pode alegar estado de necessidade. Corresponde ao art. 21 da Exposição de
motivos do CP. Para Cleber Masson, é a corrente mais certa. F) Inevitabilidade do
comportamento lesivo: A fuga é sempre preferível; G) Inexigibilidade de sacrifício do
interesse ameaçado. Aqui, existem duas teorias: a) Teoria unitária: Só há estado de
necessidade justificante, devendo o bem sacrificado ser de valor igual ou inferior ao bem
preservado. Adotada pelo art. 24 do CP, havendo causa de diminuição da pena quando
razoável exigir o sacrifício do direito ameaçado (art. 24 § 2º). b) Teoria diferenciadora: Há
o estado de necessidade justificante (que exclui a ilicitude e envolve apenas o sacrifício do
bem de menor valor) e o estado de necessidade exculpante (que exclui a culpabilidade,
sendo o bem sacrificado de valor igual ou maior que o protegido). Teoria adotada pelo
CPM. Requisito subjetivo: (criado pela doutrina), é o conhecimento da situação de fato
justificante. Ou seja: é a consciência e vontade de agir justificadamente. É, pois,
indispensável que o agente atue para salvar o bem ameaçado, ou seja, deve ter consciência
da situação de perigo e agir para evitar a lesão. A inexistência desse momento subjetivo faz
desaparecer o estado de necessidade, sendo a ação antijurídica. Algumas espécies de
Estado de Necessidade: I) REAL: efetivamente existe perigo. Exclui ilicitude;
PUTATIVO: perigo imaginário pode excluir a tipicidade ou a culpabilidade. II)
DEFENSIVO: o agente sacrifica bem jurídico do próprio causador do perigo (não precisa
reparar o dano); III) AGRESSIVO: sacrifício de bem jurídico de pessoa alheia à

395
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

provocação do perigo. Na prática, o agente vai ter que reparar dano, podendo entrar com
ação regressiva contra o causador do perigo. OBS 1: Não se pode alegar estado de
necessidade em crime habitual ou permanente, pois não há os requisitos da atualidade do
perigo e da inevitabilidade do fato necessitado. OBS 2: Furto famélico: para que haja
estado de necessidade, devem estar presentes os seguintes requisitos: Que o fato seja
praticado para mitigar a fome + Que seja o único e derradeiro recurso do agente + Que haja
subtração de coisa capaz de diretamente contornar a emergência + basta a insuficiência de
recursos do agente (não precisa estar desempregado). OBS 3: Estado de necessidade
justificante e estado de necessidade exculpante: Sobre o estado de necessidade existe a
discussão entre as chamadas teorias unitária ou diferenciadora, ou seja, se haveria
unicamente o chamado estado de necessidade justificante (excludente da ilicitude) ou se
existiria, ao lado deste, o chamado estado de necessidade exculpante (excludente da
culpabilidade). No Brasil, todavia, a lei e a maior parte da doutrina não fazem essa
distinção. Em suma, pela análise do art. 24, não se pode inferir a adoção da teoria
diferenciadora, mas, somente, da teoria unitária, isto é, o sacrifício de bens de igual
hierarquia será considerado, entre nós, como estado de necessidade justificante.

2) Legítima Defesa: Requisitos objetivos: A) Agressão injusta: abrange apenas a conduta


humana. E no caso de ataque de animal? Se for ataque espontâneo, teremos estado de
necessidade, mas se o ataque for provocado pelo dono do animal, teremos legítima defesa
(animal usado como instrumento). Para doutrina, pode haver legítima defesa de omissão
injusta. A agressão tem que ser injusta apenas para o agredido (pouco importa a consciência
do agressor). Logo, se admite legítima defesa em face de doente mental. A doutrina faz a
seguinte observação sobre a configuração de agressão injusta: LD real x LD real→ não é
possível, pois não há agressão injusta; LD real x LD putativa: é possível, pois a imaginária
é agressão injusta; LD putativa x LD putativa: é possível, já que ambas são agressões
injustas. B) Agressão atual ou iminente Atual é a agressão presente. Já a eminente é aquela
que está prestes a ocorrer. C) Reação usando moderadamente os meios necessários: uso do
meio menos lesivo dentre os meios à disposição do agredido, porém capaz de repelir a
injusta agressão. D) Proteção do direito próprio (LD própria) ou de outrem (LD de
terceiro); Requisito subjetivo: E) Conhecimento da situação de fato justificante: Ao lado
desses elementos objetivos deve estar presente o elemento subjetivo, isto é, o animus
deffendendi. O propósito de reagir em autodefesa ou na defesa de terceiro é o que coloca na
esfera da licitude um comportamento objetivamente típico. O dolo de realizar o tipo para se
defender é o que atribui um significado positivo a uma conduta objetiva desvaliosa.
Espécies de legítima defesa: a) Legítima defesa agressiva: A reação constitui fato típico. b)
Legítima defesa defensiva: a reação não constitui fato típico. c) LD subjetiva: é o excesso
exculpável na legítima defesa, pois qualquer pessoa, nas mesmas circunstâncias, se
excederia (elimina a culpabilidade, sendo caso de inexigibilidade de conduta diversa); d)
LD sucessiva: ocorre na repulsa contra o excesso abusivo do agente. Há duas legítimas
defesas (uma depois da outra), e) Legítima defesa putativa: É a que decorre de erro acerca
da existência dos elementos objetivos, na qual o agente pode se imaginar erroneamente em
situação de agressão injusta. OBS 1: Aberratio ictus em legitima defesa: Para a corrente
majoritária, um agente, ao repelir a injusta agressão, pode, por erro, acabar por lesar bem
jurídico de terceiro inocente, aplicando-se o art. 73 do CP ao caso (aberratio ictus). Nesse
caso, consideram-se as qualidades da vítima ideal e não da vítima real. OBS 2: Distinção

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

entre legítima defesa e estado de necessidade: A diferença fundamental entre estado de


necessidade e legítima defesa (que é uma espécie do estado de necessidade) é que, no
primeiro, há uma ação e, na segunda, uma reação. É assim, pois, no estado de necessidade,
há o ataque a um bem jurídico protegido em razão de uma situação de perigo, enquanto
que, na legítima defesa, ocorre uma reação a uma agressão humana injusta. Em síntese, no
estado de necessidade ocorre uma ação predominantemente agressiva com aspectos
defensivos. Por sua vez, na legítima defesa observa-se uma ação predominantemente
defensiva com aspectos agressivos.

3) Estrito cumprimento de um dever legal: Os agentes públicos, no desempenho de suas


atividades, devem agir interferindo na esfera privada dos cidadãos, exatamente para
assegurar o cumprimento da lei. Dentro de limites aceitáveis (proporcionalidade e
razoabilidade) tal intervenção é justificada pelo estrito cumprimento de um dever legal. O
dever legal engloba qualquer obrigação resultante direta ou indiretamente de lei (tomada no
sentido amplo, abrangendo portarias, instruções, decretos, LO, LC, decisão judicial, etc.). O
dever legal também pode originar-se de decisão administrativa, desde que de caráter geral,
pois se tiver caráter específico o agente estará protegido pela obediência hierárquica (causa
de exclusão da culpabilidade). Como requisito subjetivo, tem-se a necessidade do agente ter
conhecimento da situação de fato justificante. OBS 1: o cumprimento de dever moral,
social ou religioso não autoriza a excludente em exame. OBS 2: A questão do excesso por
parte do funcionário público: O excesso por parte do servidor público poderá acarretar a
tipicidade de uma das ações contidas na Lei de Abuso de Autoridade (Lei no 4.898/1965)
ou mesmo no Código Penal, na parte que trata dos crimes praticados por funcionários
públicos (arts. 312 e segs.). Exige-se, por óbvio, que o agente atue ciente de estar
estritamente cumprindo sua missão legal. OBS 3: Violência policial e estrito cumprimento
do dever legal: A questão do estrito cumprimento do dever legal é mais saliente, no Brasil,
quando conjugada com a questão da violência policial, até porque não existe entre nós, em
regra, um suposto dever legal de matar traficantes, bandidos etc. É por isso que a doutrina
prefere enfrentar a questão do confronto policial com resultado de morte de suspeitos, bem
assim os chamados autos de resistência, não dentro da teoria do estrito cumprimento do
dever legal, mas, sim, sob os parâmetros da legítima defesa. Atenção: A violência policial é
lida a partir da teoria da criminologia crítica, não como estrito cumprimento do dever legal
nem como legítima defesa, mas sim como um projeto genocida do Estado Penal brasileiro,
no qual há legitimidade estatal para o extermínio do jovens negros pobres, tendo em vista
sua dispensabilidade aparente do processo produtivo na atual fase do capitalismo neoliberal
[caro colega, cuidado ao sustentar essa argumentação, vc tem que ser pica das galáxias em
criminologia para debater isso com a Ela Wiecko ou com o Gueiros, principalmente com a
Ela, pois ela é pica no assunto. Somente diga uma leitura criminológica se é capaz de
sustentar um discurso. Se vc consegue fazer isso, vai colocar os dois na sua mão, pois
revela que vc pensa o Sistema Penal em termos críticos. Não coloque esse pensamento em
prova discursiva, é perigoso demais correr o risco de não ser entendido, na oral vc tá vendo
a cara deles e percebendo que eles estão entendendo seu posicionamento crítico. Eu sou
Mestre no assunto, mesmo assim eu pisaria em ovos para falar sobre isso com um
examinador, mas falaria para me diferenciar dos demais e elevar minha nota compensando
possíveis erros em outras respostas e tb para carregar a oral para um caminho que eu
domino e gastar o tempo do examinador, é uma questão de estratégia, então adote a sua de

397
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

acordo com seus pontos mais fortes. Beijo!].

4) Exercício regular de direito: Compreende ações do cidadão comum autorizadas pela


existência de direito definido em lei e condicionadas à regularidade do seu exercício.
Diferencia-se do estrito cumprimento do dever legal pelo fato de que este está ligado aos
agentes públicos e é compulsório (o agente público é obrigado a cumprir a lei), enquanto
que no exercício regular do direito tem-se um caráter facultativo: o ordenamento autoriza o
particular a agir, mas a ele pertence a opção. São espécies de exercício regular de direito:
A) A situação pro magistratu: são situações em que o Estado não pode estar presente para
evitar a lesão ao bem jurídico ou recompor a ordem pública (EX: prisão em flagrante delito
por qualquer do povo; desforço incontinenti; penhor legal) B) Direito de castigo: educação
dentro do poder familiar. Requisitos do Direito de castigo: indispensabilidade +
Proporcionalidade + Conhecimento da situação justificante; C) Lesões corporais praticadas
em atividades esportivas: O choque e as agressões havidas nos termos das práticas
desportivas são considerados, pela doutrina majoritária, o exercício regular de um direito.
Assim, mesmo que acarretem lesões graves ou mesmo a morte de um dos competidores,
como, por exemplo, numa luta de boxe ou numa disputada partida de futebol, não haverá a
antijuridicidade por conta desta hipótese excludente, desde que respeitas as regras
regulamentares respectivas.

OBS 1: Impende observar que, para a teoria da tipicidade conglobante, o estrito


cumprimento de um dever legal e o exercício regular de um direito são excludentes da
tipicidade, pois são considerados atos normativos (determinados por lei).

OBS 2: Ofendículas: Trata-se de aparato preordenado para a defesa do patrimônio. Há


divergência quanto à sua natureza jurídica: 1ª corrente: legítima defesa preordenada
(Magalhães Noronha, Frederico Marques); 2ª corrente: exercício regular de direito (Bettiol;
Aníbal Bruno); 3ª corrente (Prevalece): enquanto a ofendícula não é acionado é exercício
regular de direito, mas uma vez acionado passa a ter natureza de legítima defesa; 4ª
corrente: diferencia ofendícula da defesa mecânica predisposta. A ofendícula é um aparato
visível, configurando exercício regular de direito. Já a defesa mecânica predisposta é um
aparato oculto e se acionado configura legítima defesa.

OBS 3: Excesso nas causas justificantes: A questão do excesso se verifica nas hipóteses em
que, embora agindo, inicialmente, acobertado por uma justificante, o agente extrapola a
autorização legal, lesando desarrazoadamente bem jurídico alheio. Espécies: I – Excesso
crasso: o agente desde o princípio já atua completamente fora dos limites legais. É um
excesso absurdo; II – Excesso extensivo ou excesso na causa: o agente reage antes da
efetiva agressão, futura, mas esperada. Não exclui a ilicitude (que exige agressão atual ou
iminente), mas pode excluir a culpabilidade (pela inexigibilidade de conduta diversa); III –
Excesso intensivo: o agente, que inicialmente agia dentro do direito, mas intensifica a ação
justificada e ultrapassa os limites permitidos. Se o excesso foi doloso, responde por dolo; se
culposo, por culpa; IV – Excesso acidental: o agente, ao reagir moderadamente, por força
de acidente, causa lesão além da reação moderada (hipótese de caso fortuito ou força
maior). OBS: a doutrina admite o excesso sem dolo e sem culpa, quando é caso de excesso
exculpante (erro inevitável), tendo sido previsto no art. 45 do CPM. Fora do CPM atua
como causa supralegal de exclusão da culpabilidade.
398
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

II - Causa supralegal de exclusão de ilicitude:

Consentimento do ofendido: Requisitos: I – O não consentimento da vítima não pode


integrar o tipo (porque aí excluiria a tipicidade); II – O ofendido tem que ser pessoa capaz;
III – O consentimento deve ser válido, livre e consciente; IV - O bem deve ser disponível;
V – Deve ser bem próprio; VI – Consentimento dado antes ou durante a lesão. Se for dado
depois (que ratificou a lesão) pode configurar causa de extinção da punibilidade (renúncia
ou perdão do ofendido); VII – Deve ser expresso; VIII – O agente deve ter ciência do
consentimento da vítima (requisito subjetivo).

III - Descriminantes putativas:

São excludentes de ilicitude que aparentam estar presentes em uma determinada situação,
quando, na realidade, não estão. Apesar de as descriminantes significarem excludentes de
ilicitude, quando associadas à situação de putatividade, como se verá, excluirão ora a
tipicidade, ora a culpabilidade. Espécies: 1) Imaginar situação justificante em razão de erro
quanto à existência ou limite da discriminante: Não há qualquer equívoco em relação à
situação de fato. O agente sabe o que faz e imagina que está autorizado a agir. Trata-se de
erro de proibição indireto ou erro de permissão; 2) O agente engana-se quanto aos
pressupostos fáticos do evento: Aqui, há duas correntes: 2.1) Teoria Extremada da
Culpabilidade: a hipótese é de erro de proibição (se inevitável, isenta o agente de pena; se
evitável, diminui a pena). 2.2) Teoria Limitada da Culpabilidade: o caso é de erro de tipo
(se inevitável exclui dolo e culpa; se evitável pune-se a título de culpa). O art. 20, §1º, do
CP na primeira parte repete o que diz a extremada, e na segunda a limitada. Assim, para
LFG o citado art. adotou uma teoria extremada sui generis, punindo erro evitável, não com
mera diminuição de pena, mas a título de culpa por razões de política criminal. Pega
emprestada a consequência a limitada. Todavia, prevalece o entendimento de que o CP
adotou a teoria limitada, com base nos seguintes fundamentos: A) a expressão isento de
pena também é consequência da exclusão de dolo e culpa, fruto do erro de tipo inevitável;
B) na localização topográfica a descriminante putativa sobre pressupostos fáticos está
prevista no §1º do art. 20 do CP que trata do erro de tipo. C) A exposição de motivos do CP
é clara em dizer que foi adotada a teoria limitada da culpabilidade.

399
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

15.b. Crimes contra o meio ambiente e o patrimônio cultural


Obras consultadas: Santo Graal 27º. Baltazar, edição 2012. Romeu Thomé e Leonardo
Garcia da Jus Podivm, 3a edição, 2011.

Legislação: Lei 9605/98.

1. Definição: crime ambiental é qualquer dano ou prejuízo causado aos elementos que
compõem o meio ambiente, i.e., o conjunto de condições, leis, influências, alterações e
interações de ordem física, química e biológica, que permite, obriga e rege a vida em todas
as suas formas, descritos na legislação pertinente.

2. Considerações Gerais: com a entrada em vigor da Lei 9.605, de 13/02/98 (Lei dos
Crimes Ambientais), o Brasil deu um grande passo legal na proteção do meio ambiente,
pois a nova legislação traz inovações modernas e surpreendentes na repreensão aos delitos
ambientais. Em seus 82 artigos, a referida lei atualiza a legislação esparsa, revogando
muitos dispositivos, bem como apresentando novas penalidades, reforçando outras
existentes e impondo mais agilidade ao julgamento dos crimes, com possibilidade de
aplicação de institutos dos juizados especiais (art. 27 da Lei 9605/98 c/c. Lei 9.099/95).
Ademais, a Lei Ambiental possibilita a corresponsabilidade entre as diversas pessoas que
tenham participado do delito, sejam executores ou mandantes, o que inclui a pessoa física
do diretor, administrador ou membro da sociedade com poderes decisórios (art.2º). Assim,
A LCA consolidou em um único diploma, as infrações administrativas e os delitos
ambientais. São aplicáveis subsidiariamente as regras do CP e do CPP, por força do
disposto no art. 79.

3. Bem jurídico: É o meio ambiente entendido como: “o conjunto de condições, leis,


influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a
vida em todas as suas formas” (Lei 6.938/81, art. 3º, I). “O bem jurídico protegido pela lei
ambiental diz respeito a áreas cujas dimensões e tipo de vegetação efetivamente integrem
um ecossistema.

A Lei continua inovando ao tipificar os atos degradatórios da flora como crimes (art. 38 a
53): a extração de florestas de domínio público ou consideradas de preservação permanente
ou unidade de conservação, sem prévia licença, permissão ou autorização competente; a
extração de pedra, areia, cal ou quaisquer espécies minerais; prevendo penas de detenção de
seis meses a um ano e multa (art. 44). CELSO FIORILLO afirma que “os arts. 29 a 37
procuram de fato trazer proteção à fauna enquanto bem ambiental, na medida em que os
animais não são sujeitos de direitos, porquanto a proteção do meio ambiente existe para
favorecer o próprio homem e, somente por via reflexa, as demais espécies”. Ademais,
contém previsão de crimes de poluição a vários elementos como o ar, a água, e demais
componentes do meio ambiente que venham a resultar danos à saúde humana ou
provoquem mortandade de animais ou destruição significativa da flora (art. 54). Ainda,
elenca os crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural (art. 62 a 65).

400
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ATENÇÃO: A recente lei 12.408/2011 alterou art. 65, que trata do crime de pichação de
edificações ou monumentos urbanos, criando uma nova excludente de ilicitude no que se
refere ao ato de grafitar (há vários requisitos a serem cumpridos). Importante ressaltar que
possibilita a condenação do autor do crime ambiental a custear programas ambientais e
contribuir com entidades ambientais ou culturais, públicas ou privadas (art. 23,I e IV). No
mesmo diapasão, as multas administrativas ficaram bem mais inibidoras, podendo atingir
significativas cifras, como R$ 50 milhões de reais (art. 75). Em síntese, a Lei 9605 de 12 de
fevereiro de 1998 prevê um capítulo dedicado aos crimes contra o meio ambiente,
apresentando-se subdividido em 05 seções, respectivamente, reservadas: aos crimes contra
fauna (Seção I); aos crimes contra a flora (Seção II); à poluição e outros crimes ambientais
(Seção III); aos crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural (Seção IV) e
aos crimes administração ambiental (Seção V).

4. Princípio da Insignificância: Há duas posições, predominando a que admite a


aplicabilidade do princípio da insignificância. 1ª) Admite: A própria LCA aponta em tal
sentido, ao admitir a possibilidade do perdão judicial nos casos do § 2º do art. 29. 2ª) Não
admite: Os argumentos da corrente contrária, que não admite a aplicação do princípio da
insignificância, são, resumidamente, os seguintes: a) não é possível mensurar os seus
efeitos; b) a Lei 9.605/98 prevê em seu bojo penas geralmente mais leves, c) cuida-se de
direito indisponível, é essencial à vida e à saúde de todos , viola a reserva legal em matéria
penal, previsto na CF; d) porque se cuida de bem jurídico insuscetível de avaliação
econômica, não desestimular os infratores, gerando, como consequência, a impunidade e
desestimulando os Agentes de Fiscalização a cumprirem com suas obrigações. OBS: STF
(HC112563-SC, 2012) e STJ (R:HC 35.122-RS, 2013) admitem, mas exigem criteriosa
apuração de seus requisitos, tendo em vista que o bem jurídico protegido é a natureza.

5. Sujeito ativo: LCA, art. 2º: Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes
previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade,
bem como o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o
gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de
outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la.

Para que a omissão seja penalmente relevante, o agente precisa ter o dever jurídico de
impedir o resultado, assumindo a posição de garantidor, nos moldes do art. 13, § 2º do
Código Penal. Já se afirmou, em sede de habeas corpus que: “O fato de os pacientes terem
sido excluídos do quadro societário em momento anterior a ocorrência do acidente não tem
o condão de afastá-los indubitavelmente da decisão gerencial omissiva que culminou no
desastre ambiental (...)” (TRF2)

O art.3º traz a maior novidade da lei, estabelecendo a responsabilização penal da pessoa


jurídica independente da pessoa física (“sistema da dupla imputação”).

STF, RE 548181,PR, 2013: É admissível a condenação de pessoa jurídica pela prática de


crime ambiental, ainda que absolvidas as pessoas físicas que figuravam na ação penal.
[observe que nesse caso a pessoa física também foi denunciada, apenas não sendo também
condenada. Assim, respeitou-se a dupla imputação, que não significa dupla condenação. O
que é importante saber é se a pessoa jurídica pode ser denunciada sozinha, pois é essa a real
401
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

novidade vinda da jurisprudência no ano de 2013. Isso será visto abaixo].

5.1 Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica:

Admissibilidade: A LCA estabeleceu a responsabilização penal das pessoas jurídicas “nos


casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual,
ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade”. O sentido da regra é
o de obviar as dificuldades probatórias em relação aos mandantes, comum aos crimes
empresariais, cujas decisões são tomadas de forma colegiada e privada e motivados pelo
lucro.

Os argumentos contrários à responsabilização penal da pessoa jurídica são, basicamente, os


seguintes: a) inconstitucionalidade do art. 3º da LCA; b) ausência de conduta; c) ausência
de vontade; d) incompatibilidade das penas criminais com a natureza das pessoas jurídicas;
e) inexistência de dogmática penal adequada às pessoas jurídicas; f) inexistência de uma
legislação de adaptação falta de regulamentação suficiente a assegurar o devido processo
legal.

A constitucionalidade do art. 3º da LCA decorre da própria opção do constituinte que


determinou a adoção da responsabilização penal em matéria ambiental no § 3º do art. 225,
em um verdadeiro mandado constitucional de criminalização.

Em relação à conduta e à vontade, o STJ entendeu que: “A atuação do colegiado em nome e


proveito da pessoa jurídica é a própria vontade da empresa”

Quanto à culpabilidade, afirmou o STJ que: “A culpabilidade, no conceito moderno, é a


responsabilidade social, e a culpabilidade da pessoa jurídica, neste contexto, limita-se à
vontade do seu administrador ao agir em seu nome e proveito”. [No mesmo sentido: TRF4
ao dispor que “Em conclusão, a responsabilização decorre “de uma escolha política, como
forma não apenas de punição das condutas lesivas ao meio-ambiente, mas como forma
mesmo de prevenção geral e especial”.

A responsabilização penal da pessoa jurídica está limitada aos crimes ambientais.


(Atualmente)

Dupla Imputação: Adotou-se o sistema da dupla imputação ou da coautoria necessária,


traduzida na obrigatória responsabilização das pessoas físicas ao lado das pessoas jurídicas,
na medida de sua culpabilidade (art. 3º, p.u., da LCA). Não se trata, porém, de caso de
aplicação do princípio da indivisiblidade, que não tem aplicação na ação penal pública
(STJ).

São requisitos para a responsabilização da pessoa jurídica que a infração penal tenha sido
cometida: a) por decisão de seu representante legal ou contratual; b) no interesse ou em
benefício da pessoa jurídica.

Porém, em agosto de 2013, por maioria de votos, a Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal (STF) reconheceu a possibilidade de se processar penalmente uma pessoa jurídica,

402
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

mesmo não havendo ação penal em curso contra pessoa física com relação ao crime. A
decisão determinou o processamento de ação penal contra a Petrobras, por suposta prática
de crime ambiental no ano de 2000, no Paraná. Para a relatora do RE, a Constituição não
estabelece nenhum condicionamento para a previsão, como fez o STJ ao prever o
processamento simultâneo da empresa e da pessoa física. Nem sempre é o caso de se
imputar determinado ato a uma única pessoa física, pois muitas vezes os atos de uma
pessoa jurídica podem ser atribuídos a um conjunto de indivíduos. “A dificuldade de
identificar o responsável leva à impossibilidade de imposição de sanção por delitos
ambientais”. A exigência da presença concomitante da pessoa física e da pessoa jurídica na
ação penal esvazia o comando constitucional.

Esse julgamento criou uma divergência entre o STJ e o STF, vejamos:

Divergência entre o STF e o STJ acerca da forma de se buscar a responsabilidade penal da


pessoa jurídica [teoria da dupla imputação].

Posição do STF: é plenamente possível a Posição do STJ: é possível a


responsabilização penal da pessoa jurídica responsabilização da pessoa jurídica, desde
no caso de crimes ambientais porque assim que em conjunto com a pessoa física. Tem
determinou o §3º do art. 225, CF. A pessoa que ser em conjunto tanto na denúncia
jurídica pode ser punida penalmente por quanto na condenação. Isoladamente,
crimes ambientais ainda que não haja apenas a pessoa física pode ser denunciada
responsabilização de pessoas físicas. ou condenada.
Observe que o STF não obriga que haja a
denúncia dupla, podendo a pessoa jurídica
ser denunciada sozinha.

Penas para Pessoas Jurídicas: As penas podem ser aplicadas de forma isolada, cumulativa
ou alternativa (art. 21), são elas: a) multas; b) restritivas de direitos; c) prestação de
serviços à comunidade. Muito embora no sistema do CP a prestação de serviços à
comunidade seja uma modalidade de pena restritiva de direitos, observa-se que as penas
previstas na LCA amoldam-se à natureza das pessoas jurídicas. OBS: A duração da pena, na
omissão da lei, deverá ser limitada à duração da pena privativa de liberdade que seria
aplicável às pessoas físicas. OBS: A pena imposta à pessoa jurídica deve guardar
proporcionalidade com aquela que tenha sido aplicada ao seu dirigente pelos mesmos fatos.

Atenção: As penas restritivas de direitos para pessoas jurídicas são originárias, não
substitutivas.

Multa: O quantitativo da multa será determinada pela gravidade da conduta e a situação


financeira da empresa, por aplicação dos arts. 18 e 6º, III da LCA. TRF1, RSE
200137000062988, 4ª T, 2009: A pena de multa não é a única aplicável às pessoas jurídicas
(LCA, art. 21), de modo que a prescrição não se dá em dois anos (CP, art. 114, I), mas no
mesmo prazo da pena privativa de liberdade prevista em cada tipo penal, nos termos do inc.
II do art. 114 do CP.

Penas Restritivas de Direitos: São aplicáveis as seguintes penas restritivas de direitos às

403
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

pessoas jurídicas (art. 22):

Pena Critério de Aplicação Duração


Máxima
Suspensão parcial ou total Desobediência às disposições legais ou Prazo
de atividades regulamentares, relativas à proteção do meio máximo da
ambiente (§ 1º) PPL
Interdição temporária de Quando o estabelecimento, obra ou atividade Prazo
estabelecimento, obra ou estiver funcionando sem a devida autorização, máximo da
atividade. ou em desacordo com a concedida, ou com PPL
violação de disposição legal ou regulamentar
(§ 2º).
Proibição de contratar - Dez anos (§
com o Poder Público, bem 3º)
como dele obter subsídios,
subvenções ou doações.
OBS: A suspensão parcial ou total e a interdição temporária somente poderão ser aplicadas
quando presentes as situações dos §§ 1º ou 2º do art. 22. A suspensão e a interdição não são
limitadas à atividade, estabelecimento ou obra em situação irregular, que seria uma mera
consequência da falta de autorização, podendo ser adotada até mesmo administrativamente.

OBS: A LCA não prevê requisito específico para a proibição de contratar com o Poder
Público, que poderá, portanto, ser aplicada, cumulativamente com outras penas, na grande
maioria dos casos de crimes ambientais.

OBS: Prestação de Serviços à Comunidade: Visa a reduzir o impacto do significativo dano


ambiental originado da destruição da floresta e poderá consistir em (art. 23): I – custeio de
programas e de projetos ambientais; II – execução de obras de recuperação de áreas
degradadas; III – manutenção de espaços públicos; IV – contribuições a entidades
ambientais ou culturais públicas.

OBS: Somente aquelas dos incisos II e III têm, efetivamente, a natureza de prestação de
serviços, pois as modalidades dos incisos I e IV traduzem-se, em verdade, no pagamento de
prestações em dinheiro.

Efeito da Condenação: O art. 24 prevê a possibilidade de liquidação forçada da pessoa


jurídica constituída ou utilizada preponderantemente com o fim de permitir, facilitar ou
ocultar a prática de crime ambiental, sendo o seu patrimônio considerado instrumento do
crime, e, assim, perdido em favor do FUNPEN. Trata-se aqui de drástico efeito da
condenação, aplicável somente em casos extremos, a ser motivadamente declarado na
sentença.

Prescrição: A prescrição em abstrato é regulada pelo máximo da pena privativa de


liberdade prevista para a pessoa física, enquanto a prescrição em concreto é calculada pelo
tempo de duração da pena imposta. OBS: A empresa não se beneficia da redução do prazo

404
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

prescricional por conta da idade do acusado pessoa física, que conta mais de 70 anos.

Ação Penal contra Pessoa Jurídica: Uma vez recebida a denúncia contra a pessoa jurídica,
não é possível a sua exclusão, ao argumento de manifesta ilegitimidade de parte, com
fundamento no revogado inc. III do art. 43 do CPP, vigente à época, o que somente poderá
ser reconhecido por ocasião da sentença.

Denúncia: A denúncia deve conter a narração do fato delituoso, bem como a imputação em
relação aqueles que tinham poder de decisão na empresa.

Citação: Deve dar-se na pessoa do representante legal da empresa, e não em relação a quem
não tem poderes para recebê-la.

Mandado de Segurança: O MS é a ação adequada quando a ação penal está dirigida apenas
contra a pessoa jurídica.(STJ; TRF1, TRF4). Em sentido contrário: STF e TRF1.

Interrogatório: O interrogatório deve ser conduzido na pessoa do seu representante legal ou


do dirigente responsável pelo ato, e não de preposto. Em caso de empresas de grande porte,
não será razoável determinar o comparecimento do Presidente da empresa, sendo mais
adequado que o interrogatório seja conduzido pelo dirigente da subsidiária ou agência local,
que provavelmente estará até mesmo mais informado sobre os fatos.

Interdição Cautelar: Não é cabível a interdição cautelar da empresa madeireira


regularmente constituída e autorizada para empreender atividades nesse ramo, sem
especificar atos criminosos que tenham sido ali praticados.

6. Competência: A competência é, em regra, da JE, uma vez que a proteção do meio


ambiente é de competência comum, razão pela qual foi cancelada a Súmula 91 do STJ, que
estabelecia a competência federal para crimes contra a fauna. Sendo assim, aplicam-se as
regras gerais de competência federal estabelecidas no art. 109 da CF. Em caso de conexão:
havendo a prescrição em relação ao crime de competência federal, o feito deverá ser
remetido à JE para julgamento do delito remanescente. OBS: Já se admitiu mandado de
segurança a fim de conferir efeito suspensivo a RSE interposto contra decisão que
declinava da competência para a JE em caso de competência da JF (TRF2, MS
200902010010451).

Justiça Estadual: A competência será da JE nos seguintes casos: rol de condutas, quando
não for competência da JF. Atenção: Não determina a competência da JF o fato de que
tenha o agente sido autuado pelo IBAMA (TRF1, RCCR 200639000077160, u.,27.2.07).
Em sentido contrário, minoritariamente, afirmando a competência da JF se o crime ocorre
na Amazônia Legal: TRF1, RSE 200831000015210, 3ª T., u., 22.6.09.

Justiça Federal: Segue a casuística dos fatores que determinam a competência federal: 1)
Bens da União: A competência será da JF sempre que o delito afetar bens da União, como
nos casos seguintes: a) de crime praticado em ilha costeira de propriedade da União; b) se o
crime ocorreu em área de treinamento do Exército; c) quando ocorrer em terreno de
marinha; d) do crime de lavra irregular (LCA, art. 55), sendo que não afasta a competência

405
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

federal o fato de o meio ambiente constituir patrimônio da coletividade; e) de extração de


areia em local de propriedade da União (Lei 8.176/91, art. 2º). 2) Águas da União: A
competência será da JF quando o delito ocorrer em águas de propriedade da União,
especificamente, em lago de usina hidrelétrica formado por rio ou rios interestaduais (STJ),
uma vez que é considerado bem da União o reservatório formado pela acumulação artificial
de suas águas; A competência da JF se estende aos delitos ocorridos nas margens dos
referidos cursos d’água. 3) Serviço da União ou de Autarquia Federal: A competência será
da JF por afetar o serviço da União ou de Autarquia Federal, notadamente o IBAMA, nos
casos de crimes: a) praticados por funcionário público federal (STJ, Súmula 147), ainda que
por equiparação (CP, art. 127, § 1º), b) consubstanciado na inobservância de regulamentos
administrativos do IBAMA ou com o objetivo de ludibriar ou dificultar a sua ação
fiscalizatória; c) quando instaurada a ação penal com base em laudo da fiscalização do
IBAMA, a quem competia expedir a licença faltante ; d) de crime ocorrido no interior de
outras Unidades de Conservação criadas e administradas pelo Poder Público Federal,
incluindo, por exemplo, Centro Experimental de Criação de Animais Nativos de Interesse
Científico e Econômico – CECAN –, criado por Lei Municipal e integrante do Sistema
Municipal de Unidades de Conservação, mas que teve sua administração conferida, de
forma expressa, ao IBAMA, que é autarquia federal ou sujeitas à fiscalização do IBAMA.
4) Interesse da União ou Ente Federal: O interesse da União ou de Ente Federal foi
reconhecido como fundamento da competência federal nos seguintes casos: a) de “ação
penal que tenha por objeto crime ambiental envolvendo espécie da fauna em perigo de
extinção, tendo em vista o manifesto interesse do IBAMA; b) de falsificação de ATPF, que
ofende interesse da União; c) de crime ocorrido em terras indígenas, como no caso em que
havia indícios de que a madeira foi retirada de reserva indígena; d) de depósito indevido de
terra em área de proteção ambiental sujeita a incentivos e investimentos do Governo
Federal”. 5) Internacionalidade: A internacionalidade determina a competência federal: a)
no caso dos delitos dos arts. 30, 31 e 29, III, caracterizando o tráfico internacional de; b)
quando o delito do art. 56 se dá mediante transporte internacional de combustível e em
quantidade expressiva (TRF4, RSE 2006.71.03.001954-6/RS,) ou outros produtos de
origem estrangeira (TRF3, AC 200161060091714, 15.12.09); Em sentido contrário,
afirmando que o transporte de gasolina, em pequena quantidade, não configura transporte
de resíduo perigoso (Convenção de Basileia, D. 875/93), sendo a competência, portanto, da
JE, uma vez que não resta configurado o delito do tratado, de modo que não incide o inc. V
do art. 109 da CF: TRF4, EDRSE 2007.71.03.000577-1/RS, 13.8.08. 6) Áreas de Entorno:
É controvertida a jurisprudência em relação aos crimes ocorridos no entorno de UC federal.
A primeira corrente afirma a competência federal: a) se o delito ocorreu no entorno de UC
federal (STJ, CC 100852, 28.4.10; TRF2, Inq. 367, Abel Gomes, Pl., u., 3.4.08; TRF4, AC
2005.71.00.022340-4/RS, 3.12.08), faz incidir na espécie o disposto no art. 9º da Lei nº
4.771/65 (Código Florestal), verbis: as florestas de propriedade particular, enquanto
indivisas com outras, sujeitas a regime especial, ficam subordinadas às disposições que
vigorarem para estas” (STJ, CC 92722, 24.3.10); b) quando o fato causar danos em “área de
preservação permanente instituída em favor de rio da União (CF, art. 20, III), transcendendo
o interesse local, por se tratar de rio que banha mais de um Estado da Federação”, tratando-
se, ademais, de área sujeita à fiscalização do IBAMA (TRF1, HC 200901000218066,
2.6.09). Em sentido contrário, afirmando a competência estadual: TRF4, RSE
2007.71.01.000983-7/RS, 24.10.07). 7) Propriedade Particular: A competência será, em

406
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

regra, da JE, mas há alguns casos, além daquele das áreas de entorno, em que se entendeu
haver particularidade a determinar a competência federal, como no caso dos delitos
ocorridos: a) em propriedade particular que integra “Área de Relevante Interesse Ecológico
– ARIE criada pelo CONAMA/MME”, o que determina o interesse da União (STJ); b)
praticados em reserva particular do patrimônio natural, de interesse público, na forma da
Lei 9.985/00 (STJ). No entanto, de acordo com o STJ: “A proximidade da APA, por si só,
não serve para determinar o interesse da União, visto que o Decreto nº 99.274/90 estabelece
tão-somente que a atividade que possa causar dano na área situada num raio de 10 km da
Unidade de Conservação ficará sujeita às normas editadas pelo CONAMA, o que não
significa que a referida área será tratada como a própria Unidade de Conservação,
tampouco que haverá interesse direto da União sobre ela” (STJ, 6ª T). 7) APP: Também é
controvertida a questão dos delitos ocorridos em APP. Há corrente que afirma ser
competente a JF quando se tratar de delito cometido em área de preservação permanente,
ainda que particular (TRF1), em especial quando a área está localizada às margens de rio
que banha mais de um Estado da Federação (TRF3), caso de interesse da União, com
fundamento no inc. III do art. 20 da CF (STJ, CC 55130/SP, Maria Thereza Moura, 3ª S., u.,
28.2.07), incluída a mata ciliar de tais rios (STJ, HC 111317/MG, 11.11.08); Para a segunda
corrente, a competência será da JE, ainda que a área particular seja de preservação
permanente (STJ, REsp.592009/TO, 5ª T., 12.4.05), que não é bem da União (CF, art. 20),
nem se enquadra na definição de UC, nos termos da Lei 9.985/00 (TRF1, RSE
200840000062996, 14.7.09). 8) APA: Há corrente que afirma a competência da JF quando
o delito se dá em APA criada por D. Federal, pelos seguintes motivos: a) é ofendido
interesse da União (TRF1), em razão da restrição administrativa ao uso da propriedade
privada (STJ, AGREsp. 1046202, 2.12.10); b) o art. 15, § 1º, da Lei 9.985/00, que
regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII, da CF, instituindo o SNUC, prevê que a
APA é formada por terras públicas ou privadas (TRF1, RCCR 2006.38.09.004558-2/MG,
18.12.07); c) sendo a área supervisionada, administrada e fiscalizada pelo IBAMA, trata-se
de bem privado protegido por ente público (TRF2, HC 200802010031401, 14.5.08), em
especial quando atribuído ao IBAMA o dever de cuidado e manutenção (TRF2, RSE
200651070005746, 14.8.07); d) a área seja considerada indispensável à proteção ambiental,
nos termos do inc. II do art. 20 da CF (TRF1, RSE 200540000062697, 11.5.09); OBS: Em
sentido contrário, afirmando que o fato da criação por D. Federal não importa o
deslocamento da competência para a JF: STJ, CC 97372, 3ª S., 24.3.10.

OBS: Justiça Militar: Compete à Justiça Militar o processo e julgamento de crime de lesões
corporais e ameaça praticados por militar em serviço contra detido em área de proteção
ambiental (STJ)

OBS: JEC: Como se dá no processo penal comum, não se exige a lavratura de termo
circunstanciado ou procedimento administrativo para iniciar a ação penal no JEC, quando o
MP conta com elementos suficientes que dão suporte à inicial acusatória.

OBS: Varas Ambientais Especializadas: Há no âmbito da 4ª Região da JF, pela Res. 55/05.
A competência não é da vara ambiental, porém, no caso de denúncia oferecida
exclusivamente pelo crime de usurpação, nos termos do art. 2º da Lei 8.176/91 (TRF4, RSE
200572000028221, 3.3.10).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

7. Fundamentos: fundamentos constitucionais para que possam ser estabelecidas sanções


penais ambientais: (segundo CELSO FIORILLO): 1- Obediência aos fundamentos do
estado democrático de direito (art. 1°CF); 2- Obediência aos objetivos fundamentais da
República Federativa do Brasil (art. 3°CF); 3- Adequação ao direito criminal constitucional
e ao direito penal constitucional como instrumentos de defesa da vida de brasileiros e
estrangeiros residentes no país (art. 5°CF); 4- Obediência e adequação ao direito ambiental
constitucional (art. 225 CF). Condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente
sujeitam os infratores a sanções penais. Pessoas físicas e jurídicas são consideradas
constitucionalmente infratoras diante da condição de poluidoras e estarão sujeitas a sanções
penais (art. 225 § 3° CF).

8. Transação: De acordo com o art. 27: “Nos crimes ambientais de menor potencial
ofensivo, a proposta de aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multa, prevista
no art. 76 da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, somente poderá ser formulada desde
que tenha havido a prévia composição do dano ambiental, de que trata o art. 74 da mesma
lei, salvo em caso de comprovada impossibilidade”. (Fundamento na CF, art. 225, § 1º, I).
OBS: O requisito da reparação do dano é entendido como o ajuste para a reparação do dano
e não para a reparação em si, que poderá prolongar-se no tempo, de acordo com a extensão
dos danos. OBS: Haverá impossibilidade de reparação, por exemplo, quando não houver
lesão a ser reparada ou existir impossibilidade fática ou financeira por parte do responsável.
Consoante decidido pelo STJ: “Se o paciente se obrigou à reparação de toda a área
danificada, no acordo celebrado quando da transação penal homologada, é descabido o
pleito de reparação apenas parcial dos danos ambientais causados” (HC 14957/SP, Dipp, 5ª
T., u., 9.4.02). Uma vez aceita e cumprida a transação no JEC Estadual, não se admite a
instauração de ação penal, pelos mesmos fatos, na JF (TRF1, HC 200801000305898,
18.11.08), devendo ser proposta a execução do acordo, no juízo cível.

9. Suspensão Condicional do Processo: São aplicáveis à suspensão do processo em


matéria de crime ambiental as condições listadas no art. 89 da Lei 9.099/95, pois o inc. III
do art. 28 da LCA afasta a aplicação das condições previstas nos incisos II, III e IV do §1º
do art. 89 da Lei 9.099 durante o período de prorrogação (STJ, HC 39576/BA, Quaglia
Barbosa, 6ª T., u., 24.2.05). OBS: Nos termos do art. 28 da LCA, a extinção da punibilidade
depende de: laudo de constatação da reparação do dano ambiental ou comprovação da
impossibilidade de fazê-lo. Para tanto, a forma de reparação e a advertência a respeito
deverá figurar na decisão que defere a suspensão condicional (TRF3, RSE
199961060094299, 17.9.07).

10. Termo de Compromisso (art. 79-A): “Para o cumprimento do disposto nesta Lei, os
órgãos ambientais integrantes do SISNAMA, responsáveis pela execução de programas e
projetos e pelo controle e fiscalização dos estabelecimentos e das atividades suscetíveis de
degradarem a qualidade ambiental, ficam autorizados a celebrar, com força de título
executivo extrajudicial, termo de compromisso com pessoas físicas ou jurídicas
responsáveis pela construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e
atividades utilizadores de recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente
poluidores” (art. 79-A).
408
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Atenção: a jurisprudência vem se orientando no sentido de que a assinatura de termo de


compromisso não afasta a tipicidade penal da conduta (STF, HC 86362/SP, Direito, 1ª T.,
u., 16.10.07), não impedindo, portanto, a instauração da ação penal, ante a independência
entre as esferas penal e administrativa (STJ, HC 82911/MG, 5ª T., 5.5.09). Nada impede
que o fato seja considerado na dosimetria da pena (TRF4, AC 200472040043356, 25.3.09).

Na mesma linha, a prestação pecuniária não se confunde com o valor a ser aplicado pelo
réu em um Plano de Recuperação de Área Degradada, definido em ação civil pública
(TRF4, AC 200472010077157, 24.2.10).

11. Denúncia: Em se cuidando de crime societário, a denúncia não precisa descrever


detalhadamente a participação de cada um dos sócios, mas deve indicar, ainda que
brevemente, a sua vinculação ao fato, sendo insuficiente a tanto a mera invocação da
condição de sócios da empresa (STJ, HC 58157, 6ª T., 18.8.09). OBS: Baltazar entende que
é requisito essencial da denúncia a data do fato. Já se afirmou, porém, que não é inepta a
denúncia omissa a respeito, desde que esse dado figure no inquérito policial (STJ, REsp.
969160, 5ª T., 6.8.09).

12. Perícia: A exigibilidade de laudo pericial segue, no que couber, as regras gerais do
processo penal (CPP, arts. 158-184). Com a seguinte exceção: Art. 19. A perícia de
constatação do dano ambiental, sempre que possível, fixará o montante do prejuízo causado
para efeitos de prestação de fiança e cálculo de multa. Parágrafo único. A perícia produzida
no inquérito civil ou no juízo cível poderá ser aproveitada no processo penal, instaurando-
se o contraditório. OBS: Já se entendeu que é impedido para atuar como perito oficial (CPP,
arts. 158-159) o servidor do IBAMA, ao argumento de que teria interesse na causa (TRF1,
HC 200901000168877, 9.6.09).

13. Apreensão de Bens: “Verificada a infração, serão apreendidos seus produtos e


instrumentos, lavrando-se os respectivos autos” (art. 25).A apreensão é cabível não só em
caso de crime, mas também de infrações administrativas (LCA, art. 72, § 6º). A LCA não
menciona o proveito do crime, como a paga ou recompensa. Mas deve ser aplicada aqui a
regra geral do CP. Ocorre, que, em matéria ambiental, muitas vezes, a apreensão recai sobre
bens perecíveis, ou de difícil e custosa guarda ou manutenção. Daí, entre o momento da
apreensão e sua destinação na sentença, devem ser levadas em conta as particularidades da
natureza dos bens apreendidos.

Enunciado nº 30: O processo e julgamento do crime de pesca proibida (art. 34, caput e
parágrafo único da Lei n.º 9.605/98) competem à Justiça Federal quando o espécime for
proveniente de rio federal, mar territorial, zona econômica exclusiva ou plataforma
continental. Precedentes: Processo n.º 1.13.000.000480/2009-41; 1.13.000.000469/2009-81
(rios federais); 1.00.000.000221/2009-95; 1.00.000.003522/2009-54 (mar territorial). (001ª
Sessão de Coordenação, de 17.05.2010)

Enunciado nº 31: O crime ambiental tipificado no art. 50 da Lei n.º 9.605/98, praticado em
faixa de fronteira, é de atribuição do Ministério Público Federal por afetar interesse direto
da União. (001ª Sessão de Coordenação, de 17.05.2010)

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Enunciado nº 39: A persecução penal da conduta ilícita de transportar madeira sem a


devida guia (“ATPF”), tipificada no parágrafo único, do art. 46, da Lei nº 9.605/98, não é
da atribuição do Ministério Público Federal, exceto quando o produto transportado for
oriundo de área pertencente ou protegida pela União. (003ª Sessão de Coordenação, de
31.05.2010)

Enunciado nº 43: A persecução penal dos crimes contra a flora, previstos na Lei nº
9.605/98, é da atribuição do Ministério Público Federal apenas quando o ilícito ocorrer em
área pertencente ou protegida pela União. Precedentes: 1.23.003.000059/2007-01,
1.00.000.014235/2010-11, 1.11.000.001349/2010-18, 1.23.002.000124/2010-03,
1.00.000.001591/2011-48, 1.00.000.002439/2011-82, entre outros, entre outros. (021ª
Sessão de Coordenação, de 11.04.2011)

Enunciado nº 44: A persecução penal do crime previsto no artigo 29 da Lei nº 9.605/98 é


da atribuição do Ministério Público Federal apenas quando o espécime da fauna silvestre
estiver ameaçada de extinção ou quando oriundo de área pertencente ou protegida pela
União. Precedentes: 1.00.000.016072/2010-01, 1.22.011.000130/2010-81,
1.30.020.000197/2010-34, 1.33.001.000527/2010-16, 1.30.010.000007/2011-89,
1.34.008.000490/2010-11, entre outros. (021ª Sessão de Coordenação, de 11.04.2011)

Enunciado nº 45: A persecução penal do crime previsto no artigo 60 da Lei nº 9.605/98 é


da atribuição do Ministério Público Federal apenas quando o ilícito ocorrer em área
pertencente ou protegida pela União.” Precedentes: 1.00.000.001352/2010-23,
1.00.000.016509/2010-07, 1.12.000.000707/2010-20, 1.33.003.000333/2010-92,
1.34.010.001254/2010-72, 1.00.000.002069/2011-83, entre outros. (021ª Sessão de
Coordenação, de 11.04.2011)

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

15.c. Crimes de Lavagem de Dinheiro.


Fonte: Santo Graal 27º. Lei 9.613/98 com as modificações da Lei 12.683/12. Pacelli,
Eugênio. Atualização do Curso de Processo Penal – 16ª edição – 2012 (disponibilizada na
internet). Wiecko, Ela. Crimes antecedentes e lavagem de dinheiro (artigo). Parecer em ADI
4841.

1. Disposições Gerais: A preocupação com a incriminação da lavagem de dinheiro surge


na Convenção das Nações Unidas contra o tráfico ilícito de entorpecentes, concluída em 20
de dezembro de 1988 em Viena (Decreto 154, de 26.6.91). Porém, somente em junho de
1998, quase dez anos depois de assinar a convenção comentada é que a conduta de omitir
ou dissimular a origem ilícita de ativos decorrentes de algumas atividades criminosas
passou a ser crime no Brasil. Também a Convenção de Palermo (Decreto 5.015, de
12.03.04) estabeleceu a obrigação dos Estados partes em criminalizar a ocultação ou
dissimulação da origem ilícita dos bens que possam ter origem em infrações penais. A
importância da Lei de Lavagem de Dinheiro (LLD) está em atacar a criminalidade
organizada no aspecto financeiro, perseguindo o produto e o proveito de determinados
crimes, especialmente o dinheiro obtido pelas organizações criminosas com o tráfico de
drogas.

Essa expressão é criticada pela doutrina (NUCCI), porém é utilizada porque foi incorporada
pelo seu uso em geral e no mercado financeiro. Tem origem em 1920, nos EUA: money
laundering. A máfia usava de lavanderias para dar aspecto lícito aos recursos obtidos de
ilícitos. Em alguns países, como Espanha, França e Portugal, usa-se a expressão
"branqueamento de capitais". No Brasil, para evitar discussões estéreis e inoportunas de
cunho racista que o termo "branqueamento" poderia sugerir, preferiu-se falar "lavagem"
porque é uma expressão consagrada no idioma brasileiro e está de acordo com a expressão
em inglês. À exceção da ementa, a LLD não faz uso as expressão "lavagem" e a ementa se
refere a lavagem de bens, direitos ou valores e não lavagem de dinheiro.

Conceito: Lavagem de dinheiro é a atividade de desvinculação ou afastamento do dinheiro


da sua origem ilícita para que possa ser aproveitado. Em outras palavras, pode-se
conceituar lavagem de dinheiro como o processo por meio do qual bens, direitos ou valores,
provenientes, direta ou indiretamente, de infrações penais, são integrados ao sistema
econômico e financeiro, com a aparência de terem sido obtidos de maneira lícita". Não é
necessário que os bens, direitos ou valores sejam vultosos. Qualquer quantia implicará no
crime, desde que não seja insignificante.

Pacelli esclarece que o crime de lavagem se configura quando da reintrodução dos valores
obtidos de forma ilícita, de modo dissimulado ou clandestino. Assim, o desvalor da ação de
lavagem não pode ser considerado como extensão da infração penal antecedente. Não é
necessário que as quantias envolvidas sejam vultosas (STF).

A primeira ação com nova lei foi do MPF/GO, onde JF decidiu cautelar de arresto de bens

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

(caso “Juquinha” divulgado no sítio da PGR em julho/2012). Convenção de Viena de 1988


(Decreto 154/91) estabeleceu mandado convencional de tipificação da lavagem de recursos
oriundos do tráfico de drogas.

2. Gerações da legislação e fases da lavagem:

2.1 Gerações de legislação de lavagem: A doutrina aponta três gerações de leis tendentes a
criminalizar a conduta de ocultar ou dissimular a origem criminosa de bens, direitos e
valores. A legislação de 1ª geração tinha como único antecedente o crime de tráfico de
drogas. Já a legislação de 2ª geração ampliou o rol dos crimes antecedentes. Apesar disso, o
fez em numerus clausus, ou seja, em rol taxativo. Era o caso da lei brasileira até a edição da
Lei 12.683/2012. Somente a ocultação ou dissimulação dos "ativos" econômicos e
financeiros provenientes dos crimes que eram listados nos incisos do art. 1º da Lei 9.613/98
é que constituía o crime de lavagem. Por fim, há a legislação de 3ª geração, que considera
crime de lavagem a ocultação ou dissimulação de ativos provenientes de qualquer tipo ou
espécie de crime. É o caso da Argentina e da Espanha e, agora, também do Brasil, eis que a
Lei 12.683/2012, excluiu o rol de crimes antecedentes, bastando que os bens, direitos ou
valores sejam provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal. OBS: Ela Wiecko,
em artigo sobre o tema, já criticava a adoção de rol de crimes antecedentes, dizendo, dentre
tantas críticas, que se o objetivo era punir a ocultação ou dissimulação de bens, direitos ou
valores produto de crime, isto deveria ser aplicado para qualquer crime.

2.2 Fases da lavagem de dinheiro: O processo de lavagem de dinheiro não é estanque, de


modo que a sua divisão em fases se faz apenas para fins didáticos. 1ª fase: A 1ª fase é
denominada de "colocação" ou placement. Consiste na separação física do dinheiro dos
autores da infração penal. É antecedida pela captação e concentração do dinheiro. É,
basicamente, a introdução do dinheiro ilícito no sistema financeiro. Dentre as diversas
técnicas, destaca-se o smurfing, baseada no fracionamento de uma grande quantidade de
dinheiro em pequenos valores, de modo a escapar do controle administrativo das
instituições financeiras. No Brasil, atualmente, esse valor é de R$ 5.000,00 (cinco mil
reais). Exemplos: aplicação no mercado informal mediante depósitos em banco, troca por
moeda estrangeira, remessa ao exterior por mulas, transferências para paraísos fiscais,
importações subfaturadas; aquisição de joias, obras de artes, imóveis etc. 2ª fase: A 2ª fase
é chamada de "dissimulação" ou layering. Se dá com a realização de uma série de negócios
ou movimentações financeiras a fim de impedir o rastreamento dos valores. Caracteriza-se
pela realização de múltiplas transações anteriores, por meio de várias empresas e contas, de
modo a que se perca a trilha do dinheiro (paper trail) e impeça a vinculação do ativo à sua
origem ilícita. Consiste a lavagem propriamente dita. A finalidade desta fase é impedir a
identificação da origem ilícita dos valores, bens ou dinheiro. Ex: várias transferências por
cabo (wire transfer) ou sucessivos empréstimos. 3ª fase: A 3ª fase que é a "integração",
integration ou recycling. Já com a aparência lícita, os ativos são formalmente incorporados
ao sistema econômico, seja por meio de investimentos no mercado mobiliário ou
imobiliário, ou no financiamento da própria atividade ilícita. Nesse momento o criminoso
assume ares de respeitável investidor, atuando em conformidade às regas do sistema. No
direito americano (EUA) há como exemplo o caso "Franklin Jurado". Ex: compra de
empresa já existente e em funcionamento; aquisição de imóveis, veículos, ações em bolsas

412
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

etc.

São três tipos penais básicos de lavagem de dinheiro: a) o tipo penal de intenção, que é a
conversão ou transferência do patrimônio ilícito com uma dada finalidade; b) a ocultação,
caracterizado por encobrir a origem ilícita; c) tipo penal de aquisição ou posse dos objetos
com aparência de lícitos.

Atenção: Não é necessária a ocorrência dessas três fases para que haja a consumação do
delito. Neste sentido o RHC n. 80.816/SP: EMENTA: Lavagem de dinheiro: L. 9.613/98:
caracterização. O depósito de cheques de terceiro recebidos pelo agente, como produto de
concussão, em contas-correntes de pessoas jurídicas, às quais contava ele ter acesso, basta a
caracterizar a figura de "lavagem de capitais" mediante ocultação da origem, da localização
e da propriedade dos valores respectivos (L. 9.613, art. 1º, caput): o tipo não reclama nem
êxito definitivo da ocultação, visado pelo agente, nem o vulto e a complexidade dos
exemplos de requintada "engenharia financeira" transnacional, com os quais se ocupa a
literatura. (RHC 80816, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma,
julgado em 18/06/2001, DJ 18-06-2001 PP-00013 EMENT VOL-02035-02 PP-00249).

3. Inovações da Lei 12.693/12: segundo Márcio André Lopes Cavalcante (in Dizer o
Direito):

a) infração penal ao invés crime como fato antecedente. Agora, até contravenção penal (ex:
jogo do bicho) pode ser infração antecedente, não havendo mais um rol taxativo (3ª
geração);

b) caberá ao juiz competente da lavagem decidir sobre a unidade de processo e julgamento


entre lavagem e antecedente (art. 2º), conforme conveniência;

c) cabíveis: fiança e liberdade provisória (revogou-se art. 3º que as vedava), o que veio ao
encontro das recentes decisões do STF, no sentido de que mesmo o crime inafiançável
permite liberdade provisória, tornando praticamente inútil o instituto da inafiançabilidade;

d) medidas assecuratórias: foram previstas no art. 4º a decretação de ofício (Pacelli critica,


se na fase de investigação, com base no princípio acusatório), requerimento do MP ou
representação do delegado (neste caso, o MP deve se manifestar em 24h), de medidas
assecuratórias (ao invés de apreensão ou sequestro de antes, que gerava divergência acerca
do cabimento ou não de arresto e hipoteca legal) de bens, direitos e valores do investigado
ou acusado ou existentes em nome de interpostas pessoas, que sejam instrumento, produto
ou proveito dos crimes previstos nesta Lei ou das infrações penais antecedentes. Pacelli
entende que houve uma ampliação do conceito de sequestro, pois antes o mesmo só
abarcava o móvel ou imóvel produto de infrações penais e agora abrange quaisquer valor
ou produto de crime. O arresto e a hipoteca legal poderão ser usados para garantir a
reparação, seja na prestação pecuniária, seja em multas e custas processuais. São medidas
para arrecadação cautelar para posterior confisco. Se o crime for contra o Estado, o
perdimento de bens será em favor desta fazenda;

e) alienação antecipada (art. 4º, §1º): proceder-se-á à alienação antecipada (leilão) para

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

preservação do valor dos bens sempre que estiverem sujeitos a qualquer grau de
deterioração ou depreciação, ou quando houver dificuldades para sua manutenção. O §1º
anterior afirmava que seriam levantadas as medidas assecuratórias se não intentada a ação
penal em 120 dias da conclusão da diligência. Agora, não há mais prazo, salvo ser for
medida de sequestro, a ser regulada pelo CPP, com prazo de 60 dias (art. 131 do CPP).
Nenhum pedido de liberação será conhecido sem o comparecimento pessoal do acusado ou
de interposta pessoa;

f) a ação controlada foi mantida;

g) são efeitos da condenação (art. 7º) a perda, em favor da União ou dos Estados (se crime
estadual) de todos os bens, direitos e valores direta ou indiretamente relacionados (do crime
de lavagem e do antecedente), inclusive os utilizados para prestar fiança, ressalvado o
direito do lesado ou terceiro de boa fé [quanto aos demais crime aplica-se a regra geral de
perda em favor da União, independente do crime ser de competência federal ou estadual,
conforme dispõe o artigo 91, II, CP]. Nos processos na JF, caberá a utilização, por órgãos
federais encarregados da prevenção, do combate, da ação penal e do julgamento, de bens,
direitos e valores objeto de perdimento; ou seja, MPF e JF poderão ser agraciados, além de
PF e COAF;

h) a nova lei aumentou a responsabilidade de pessoas físicas em informar transações


financeiras, equiparando-as a pessoas jurídicas (art. 9º);

i) composição do COAF: incluirá também representantes da ABIN, MJ, Ministério da


Previdência. Não inclui MP nem Justiça;

j) poder de requisição de dados cadastrais do Delegado e do MP (art. 17-B), matéria não


sujeita à reserva jurisdicional: autoridade policial e MP terão acesso, exclusivamente, aos
dados cadastrais do investigado que informam qualificação pessoal, filiação e endereço,
independentemente de autorização judicial, mantidos pela justiça eleitoral, empresas
telefônicas, instituições financeiras, provedores de internet e administradoras de cartão de
crédito. Pacelli afirma que o MP poderia ter tal atribuição deduzida da própria lei orgânica,
mas sustenta a inconstitucionalidade no que se refere a autoridade policial;

k) afastamento de servidor público em caso de indiciamento (duvidosa


constitucionalidade): em caso de indiciamento de servidor público, este será afastado, sem
prejuízo da remuneração e demais direitos, até o que o juiz competente autorize seu
retorno;

l) cooperação internacional (art. 8º): o juiz determinará, na hipótese de existência de


convenção internacional (ou reciprocidade) e por solicitação de autoridade estrangeira
competente, medidas assecuratórias sobre bens, direitos ou valores oriundos de crimes
descritos no art. 1o praticados no estrangeiro, repartidos meio a meio, se não houver
previsão diferente.

4. Competência: para julgamento: regra geral, justiça comum estadual.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Será da justiça comum federal se o crime antecedente for de processamento e julgamento


por ela (ex: crime contra o sistema financeiro) ou quando houver interesse, ou for bem ou
serviço da União, na forma do art. 109 da CF.

EXTRATERRITORIALIDADE: 1) O delito de lavagem de dinheiro será punido no Brasil


ainda que praticado no exterior, em função do princípio da justiça universal ou cosmopolita.
Para isso, devem estar presentes os requisitos do art. 7º, I, "b", II, "a" e §2º, do Código
Penal. 2) Também não impede a aplicação da lei brasileira, o fato de o delito antecedente
ter sido praticado no exterior (LLD, 2º, II). No entanto, o STJ já entendeu que para a
aplicação da Lei de Lavagem de Dinheiro o fato anterior deve ser considerado crime no
país em que foi cometido (dupla imputação).

Questão do TRF 5ª 2011: para lavagem, não se exige prova da participação do acusado no
crime antecedente.

5. Bem jurídico: divergência doutrinária. A primeira corrente entende que a lei de lavagem
tutela o mesmo bem jurídico protegido pelo crime antecedente. Crítica: a lei tutelaria bens
muito variados. A segunda corrente entende que o bem jurídico seria a administração da
Justiça (Rodolfo Tigre Maia). A terceira corrente entende que o bem jurídico seria a ordem
econômico-financeira. Esse entendimento é o prevalecente na doutrina. A quarta corrente
entende que o bem jurídico tutelado é tanto a ordem econômico-financeira, quanto o bem
jurídico tutelado pelo crime antecedente (Alberto Silva Franco).

6. Tipicidade: A palavra infração penal está no tipo penal do delito de lavagem de capitais.
O delito de lavagem de capitais é um delito acessório, ou seja, a palavra infração penal
funciona como uma elementar do delito de lavagem de capitais (art. 1º). Embora acessório,
não se exige a prévia condenação do agente responsável pelo crime anterior, sendo
suficiente a prova da existência do mencionado crime e que o objeto material do crime de
lavagem seja produto de infração penal. Então, para que o delito de lavagem seja punível, a
conduta antecedente deve ser típica e ilícita (princípio da acessoriedade limitada) [bastando
indícios de sua existência].

OBS: Ainda que a infração penal tenha sido apenas tentada, se da tentativa se produziu bens
aptos a serem lavados, haverá o crime de lavagem.

Atenção: O crime de lavagem e a infração penal antecedente não precisam ser apurados no
mesmo processo. Os processos são autônomos e podem ser apurados inclusive em foros
diferentes.

E se houver a absolvição do agente da acusação de crime antecedente? A depender do


fundamento, o agente poderá responder ou não pelo crime de lavagem. Para que o delito de
lavagem de capitais seja punido, a conduta antecedente deve ser típica e ilícita (princípio da
acessoriedade limitada). Portanto, caso o autor do delito antecedente seja absolvido com
base na atipicidade de sua conduta ou com base em uma excludente de ilicitude, não será
possível a condenação por lavagem (art. 386, I, III e VI, primeira parte). Porém, se o autor
da infração penal antecedente for absolvido com base um excludente da culpabilidade ou
em virtude de causa extintiva da punibilidade [como a prescrição], nada impede sua

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

condenação pelo crime de lavagem.

Atenção: há duas causas extintivas da punibilidade que impede a condenação pelo crime de
lavagem: "abolitio criminis" e anistia, em relação ao delito antecedente.

O crime de lavagem é denominado de crime parasitário, acessório ou derivado, "porque


surge em razão de um crime anterior" (STJ – AP 472/ES). Também são exemplos de crimes
parasitários o favorecimento real (CP, 345) e a receptação (CP, 180). Não se admite crime
de lavagem de dinheiro de infração penal posterior aos atos de lavagem.

7. Sujeito ativo: O crime é comum, pode ser praticado por qualquer pessoal.

O autor do crime antecedente também responde pelo crime de lavagem? Há duas correntes:
1ª) Não, pois para ele a ocultação dos valores configura mero exaurimento do delito (da
mesma forma que ocorre com o crime de favorecimento real, 349 do CP e receptação, 180
do CP). O crime do art. 349 é o crime de quem não praticou o delito (Roberto Delmanto),
aplica-se o princípio da consunção. 2ª) Sim, nada impede a condenação do autor do crime
antecedente pelo crime de lavagem. Não é possível a aplicação do princípio da consunção,
pois a ocultação do produto do crime antecedente configura delito autônomo, eis que atinge
bem jurídico distinto (Baltazar Jr).

Atenção: o autor do delito de lavagem de capitais não necessariamente precisa ter


participado no crime antecedente. Deve, porém, ter consciência quanto à origem ilícita dos
ativos. Conforme a opção do legislador brasileiro, pode o autor do crime antecedente,
responder por lavagem de dinheiro, dada à diversidade dos bens jurídicos atingidos e à
autonomia deste delito. Posição do STJ: a participação no crime antecedente não é
indispensável à adequação da conduta de quem oculta ou dissimula a natureza, origem,
localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores
provenientes direta ou indiretamente, de crime, ao tipo do art. 1º, da Lei 9.613/98. (APn .
458/SP, CORTE ESPECIAL, 2009). A participação no crime antecedente não é
indispensável à adequação da conduta de quem oculta ou dissimula a natureza, origem,
localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores
provenientes, direta ou indiretamente, de crime, ao tipo do art. 1.º, da Lei n. 9.613/98.
(RMS 16.813/SP, 5ª T, 2004).

Coautoria e participação: É possível a coautoria e a participação, desde que presente o dolo,


o qual deve abranger, ainda, e ao menos em forma eventual a infração penal antecedente,
ainda que o agente não tenha total conhecimento de como este ocorreu.

Pessoa Jurídica: O art. 173, §5º, da CF, permite a responsabilização da pessoa jurídica pelo
crime de lavagem de dinheiro. Entretanto, a Lei 9.613/98 somente prevê a responsabilidade
penal da pessoa física, o que impede a responsabilização da pessoa jurídica.

GAFI – Grupo de Ação Financeira Sobre Lavagem de Dinheiro: O GAFI recomenda a


punição da pessoa jurídica. No Brasil, a pessoa jurídica pode ser punida
administrativamente, e, por isso, não se considera o Brasil inadimplente com as normativas
internacionais.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

8. Sujeito Passivo: É a coletividade, ou o Estado. Secundariamente, poderá ser outra


pessoa que sofreu prejuízo econômico.

9. Tipo principal - art. 1º: Antes da mudança da lei, STF (HC 109151/RJ, rel. Min. Rosa
Weber, 12.6.2012. (HC-109151) entendeu que o crime antecedente praticado por
“organização criminosa” não possui previsão legal no Brasil, não sendo o Decreto 5.015/04
(que internalizou a Convenção de Palermo) suficiente para tanto. É o pensamento de LFG
(falta normatividade suficiente, não sendo uma convenção lei em sentido formal e
material). Não é o entendimento do MPF. Essa discussão perde muito da razão de ser, pelo
menos na lei de lavagem, porque qualquer infração penal é crime antecedente e devido a
previsão do art. 2º.

Comparativo entre convenção de Palermo e lei 12.694/12:

CONVENÇÃO DE PALERMO LEI 12.694/12

grupo estruturado de três ou mais pessoa associação, de 3 (três) ou mais pessoas

existente há algum tempo e atuando estruturalmente ordenada e caracterizada


concertadamente pela divisão de tarefas, ainda que
informalmente

com a intenção de obter, direta ou com objetivo de obter, direta ou


indiretamente, um benefício econômico ou indiretamente, vantagem de qualquer
outro benefício material natureza

com o propósito de cometer uma ou mais mediante a prática de crimes cuja pena
infrações graves ou enunciadas na máxima seja igual ou superior a 4 (quatro)
Convenção anos ou que sejam de caráter transnacional

10. Rito: processo seguirá rito comum ordinário. Independem do processo e julgamento das
infrações penais antecedentes, ainda que praticados em outro país, cabendo ao juiz
competente para os crimes previstos nesta Lei a decisão sobre a unidade de processo e
julgamento; Bastam indícios suficientes do crime antecedente.

Logo, pode haver condenação por lavagem de dinheiro decorrente do narcotráfico ainda
que o réu não tenha sido condenado por narcotráfico. Se o crime antecedente teve extinta
sua punibilidade (prescrição, por exemplo), isso não afetará a persecução pela lavagem
(STJ): HC 207.936-MG, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 27/3/2012. A lei agora é
expressa nesse sentido (art. 2º, §2º).

Julgamento defensor dativo se citado por edital não comparece: não se aplica o disposto no
art. 366 do Código de Processo Penal.

11. Bitcoin: Trata-se da criptomoeda virtual (moeda convencional) mais conhecida da

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

internet e que está se tornando um modelo para uma revolução nos meios de pagamentos e
recebimentos em todo o mundo. Um bitcoin pode ser transferido por um computador ou
smartphone sem recurso a uma instituição financeira intermediária. O conceito foi
introduzido em 2008 num paper publicado por um programador com o pseudônimo de
Satoshi Nakamoto que o chamou de sistema eletrônico de pagamento peer to peer. Logo,
nas transações por Bitcoin não há bancos como intermediários, afinal, é uma moeda
convencional. O que nos interessa alertar aqui quanto ao Bitcoin é o seu uso como um novo
e eficiente meio de lavagem de dinheiro internacional, tendo em vista que a transferência de
valores ocorre de forma anônima, o que facilita por demais a ocultação do delito
antecedente. Os governos da China e da Tailândia proibiram o Bitcoin. O motivo oficial é o
temor [leia-se: já ocorre de forma intensa] de que a moeda seja usada em lavagem de
dinheiro. Sua ampla utilização na "Silk Road" (Rota da Seda), mercado negro on-line
encoberto pela rede Tor, que somente aceita bitcoins e funciona como um "esconderijo" na
internet onde se comercializam drogas e armas, também deu uma pinta marginal à moeda, o
que vem causando problemas para o avanço do Bitcoin. Em 14/04/2014 o empresário e
operador de Bitcoins Charlie Shrem foi indiciado por um júri federal em Nova York
acusado de lavagem de dinheiro para o site de operações financeiras Silk Road, pois estava
intermediando venda de U$$ 1 milhão em Bitcoins para usuários da referida rede de tráfico
de armas e drogas, apesar de seu conhecimento que o Silk Road é usado para tal fim.
Especula-se no meio da informática que é justamente o Charlie Shrem o criado do Bitcoin,
apesar de ele não assumir a paternidade da ideia.

Hoje, a China é o maior mercado que aceita Bitcoins. Em 13 de novembro de 2013 a


cotação do Bitcoin ultrapassou R$ 1.100,00 reais. A valorização do Bitcoin se dá devido a
movimentação do mercado chinês no BTC China, que hoje ocupa o primeiro lugar entre os
sites de câmbio Bitcoin.

O Banco Central Europeu não reconhece o Bitcoin como moeda eletrônica, por deixar de
preencher alguns dos requisitos exigidos pela diretiva que orienta as transações com e-
money, a Electronic Money Directive. De acordo com o documento, para ser considerada
moeda eletrônica, faz-se necessário que tenha a capacidade de ser armazenada
eletronicamente, ser aceita como forma de pagamento por instituições diversas da que a
originou e ser emitida com base na recepção de fundos em quantidade não inferior ao valor
monetário emitido. As duas condições iniciais estão satisfeitas, ao contrário da última, que
conflita com a dinâmica de geração da moeda, denominada “mineração”, que mais se
assemelha a uma competição matemática do que a uma operação financeira. Ao contrário
dos mineradores de metais preciosos, como o ouro, que têm como desafio encontrá-los nas
rochas ou no leito dos rios, os de Bitcoins tratam com dados. Toda a rede é garantida e
regulada através de criptografia

O FBI classificou como alta a probabilidade de cibercriminosos se apropriarem


indevidamente de bitcoins alheias constantes em carteiras individuais ou de interferirem
nos serviços de validação da transação, utilizando-se de malwares ou invasões a sistemas
computacionais.

O fato de não haver uma autoridade ou base de dados central, pois se trata de uma rede
descentralizada e baseada em P2P, faz com que seja um grande desafio aos agentes da lei
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

detectar atividades suspeitas, identificar usuários, obter registros das transações e,


consequentemente, iniciar uma ação penal.

12. Ação Penal: A ação penal é pública incondicionada e não depende da conclusão do
processo referente à infração penal de onde decorreu o proveito econômico. O rito é
ordinário (inciso I).

Competência: A competência não é, de per si, da Justiça Federal. Não havendo afetação ao
patrimônio da União ou entes federais no crime antecedente, a competência caberá à Justiça
Estadual. Será da competência da Justiça Federal nas hipóteses do inciso III, cabendo
destacar que para Baltazar os conceitos de SFN e da ordem econômica, para fins de
lavagem de dinheiro, são mais amplos que o previsto na Lei 7.492/86. Desse modo, toda
lavagem de dinheiro com utilização de instituição financeira pública ou privadas será da
competência da Justiça Federal. Também será desta Justiça a competência quando o crime
de lavagem ou antecedente for em detrimento de ente federal ou se o crime antecedente
também for federal, como é o caso do tráfico transnacional de drogas; contrabando e
descaminho contra o SFN; tráfico interno quando julgado pela JF em conexão com
falsificação de passaporte; quando o delito de lavagem for transnacional, em razão dos
compromissos internacionais assumidos pelo Brasil. Também será da competência da JF
quando a lavagem for conexa com a sonegação de tributos federais.

Reunião dos feitos: Embora seja possível a conexão probatória ou teleológica, caberá ao
juiz verificar, caso a caso, a conveniência de reunião dos processos. Isso porque na
apuração do crime de lavagem a colheita da prova poderá ser muito mais complexa que a
do crime antecedente, de modo que será da análise do caso concreto que o juiz poderá
concluir pela reunião ou não.

Varas Especializadas: A JF especializou varas nas capitais para processar e julgar crimes de
lavagem de dinheiro. Embora a especialização tenha se dado por resolução, tanto o STJ
quanto o STF consideraram legais e constitucionais esta prática, destacando que não se
configuram tribunais de exceção.

Independência: O crime de lavagem de dinheiro é independente de processo e julgamento


do crime antecedente, mesmo que praticado em outro país. Entretanto, é indispensável
haver a prova da existência do crime e que o objeto material do delito de lavagem seja
decorrente de infração penal.

Atenção: Se fato anterior à vigência da Lei 12.683/12, há necessidade de o crime ser um


dos contidos o extinto rol do art. 1º.

OBS: Para Baltazar é suficiente a comprovação de que o valor, bem ou direito a ser lavado
seja proveniente de infração penal. Mas adverte que a questão não é tranquila, sobretudo
quando a sentença do crime anterior afirmar a inocorrência do fato ou mesmo a falta de
prova de existência do crime antecedente, fatos estes que o juiz não poderá ignorar. Se o
agente do delito anterior for absolvido em face de prova de que o fato não ocorreu, não
poderá haver condenação por lavagem. Porém, no caso de absolvição do autor de delito
anterior por: descriminantes putativas; erro de proibição; inimputabilidade; prescrição;

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ausência de prova da autoria; irregularidade formal ou extinção da punibilidade, não se


afastará a responsabilidade pela lavagem de dinheiro. OBS: Baltazar admite ser possível a
conclusão da ação penal pelo crime de lavagem de dinheiro anteceder à conclusão do
processo que apura a infração penal antecedente. Porém ressalva as dificuldades que
poderão advir desta prática se há condenação pelo crime de lavagem e absolvição pelo
delito anterior em uma das hipóteses que possa afetar o crime de lavagem. Sugere-se a
suspensão do processo de lavagem quando o juiz vislumbrar essa possibilidade.

Denúncia: O §1º não exige prova cabal do crime antecedente.Para Baltazar, é essencial que
a denúncia indique, na narrativa, qual o crime antecedente, apontando os indícios ou a
prova de sua ocorrência. Anota que eventual equívoco na indicação do crime antecedente
não torna a denúncia inepta, desde que dos fatos seja possível identificar corretamente o
crime anterior. Ex de indícios citados por Baltazar: expressivo patrimônio em nome de
traficante não declarado à Receita Federal; descompasso entre os rendimentos do acusado e
sua movimentação financeira. Ex de denúncia inepta: Baltazar aponta decisão do TRF 1
considerando inepta a denúncia que não mencionou, de forma expressa, a tipificação de um
dos crimes antecedentes. OBS: Se a lavagem se deu no âmbito de empresa, é necessário
que a denúncia especifique e indique o vínculo dos acusados com os fatos, não sendo
suficiente apenas indicar o fato de ocupar cargo de direção.

Citação por edital: O §2º afasta a suspensão do processo se o réu for citado por edital.
Embora parcela da doutrina veja inconstitucionalidade no prosseguimento da ação, Baltazar
entende que a opção do legislador é válida e não fere o direito de ampla defesa, pois este
dispositivo deve ser compreendido em seu contexto, dado que muitas os autor do delito se
utiliza de pessoas interpostas para a prática do crime, sendo esta a causa da opção
legislativa.

Investigação: A investigação do crime de lavagem, muitas vezes, por ser bastante


complexa, eis que a prática do crime tem por finalidade exatamente ocultar a ilicitude do
capital a ser convertido em ativos lícitos. Portanto, o autor destaca ser de suma importância
os relatórios de inteligência financeira, os quais poderia servir para fundamentar pedido de
interceptação telefônica ou quebra de sigilo financeiro. O STJ, recentemente, decidiu que o
Relatório de Inteligência Financeira encaminhado pelo COAF permitiria a instauração de
inquérito policial. Entretanto, seria vedada a representação da quebra do sigilo fiscal, pela
autoridade policial, fundado unicamente no mencionado relatório, eis que a "simples
atipicidade de movimentação financeira não caracteriza crime". Nesse caso, a autoridade
policial deveria buscar outros meios de provas ou demonstrar a inexistência de outra forma
de apurar o crime, que não a quebra do sigilo fiscal ou bancário. (STJ-HC 191.378/DF, DJe
05/12/2011). Para o STJ, a invasão da privacidade do investigado somente estará autorizado
se não houver outra meio menos gravoso de produção da prova.

Provas: Destaca a grande dificuldade de demonstração da origem ilícita dos bens e do


conhecimento por parte do agente, de modo que muito importante será a prova indiciária
(TRF 4, AC 200670000200420). Exemplos de prova indiciária: fraude na identificação das
compras de moedas em quantia superior a dez mil dólares (STF); incremento patrimonial
injustificado; guarda ou transporte de elevadas quantias em dinheiro; inexistência de
negócios lícitos; vinculação com pessoas ligadas a negócios ou atividades ilícitos;
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

utilização de: empresas de fachadas, pessoas interpostas, documentos falsos, contabilidade


irregular etc.; pagamentos de comissões não usuais a intermediários etc. Prova emprestada:
É possível aproveitar a prova do crime antecedente produzida em processo judicial.

Ação Controlada: Antes da Lei 12.683/12 esta medida estava contida no art. 4º, §4º, da Lei
9.613/98. Agora foi transportado para o art. 4º-B: [Art. 4º-B. A ordem de prisão de pessoas
ou as medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores poderão ser suspensas pelo juiz,
ouvido o Ministério Público, quando a sua execução imediata puder comprometer as
investigações]. Trata-se de permissão para o retardo da atuação das autoridades, a fim de
esperar o momento mais conveniente para a ação. Baltazar sugere, de lege ferenda, a
inclusão do monitoramento ou acompanhamento de movimentação financeira, distinto da
quebra do sigilo, para permitir melhor investigação e mais eficiência na repressão do delito.

Prisão em flagrante: Destaca as modalidades guardar, ter em depósito e ocultar como


modalidades de crime permanente, o que autoriza a prisão em flagrante a qualquer tempo.

13. Aplicação da Pena:

Primeira fase: O juiz pode valorar negativamente o "objetivo do lucro fácil e o


enriquecimento ilícito", pois não são inerente ao tipo da lavagem de dinheiro. Ex: HC
200101946473, STJ, 2003: Não há que se falar em bis in idem na aplicação da pena-base
se, para a sua majoração, o Julgador monocrático procedeu ao correto exame das
circunstâncias judiciais, destacando as que foram reputadas favoráveis ao paciente, e
considerando as peculiaridades concretas dos delitos pelos quais foi condenado em questão,
tais como o objetivo de lucro fácil e enriquecimento ilícito, aspectos caracterizadores das
referidas práticas criminosas e que não são inerentes ao tipo penal.

Segunda fase: Não se aplica a agravante do art. 61, II, "b", eis que faz parte do tipo penal de
lavagem assegurar a ocultação ou vantagem do crime anterior.

Terceira fase: Incide os §§4º e 5º do art. 1º: [§ 4º A pena será aumentada de um a dois
terços, se os crimes definidos nesta Lei forem cometidos de forma reiterada ou por
intermédio de organização criminosa. § 5º A pena poderá ser reduzida de um a dois terços e
ser cumprida em regime aberto ou semiaberto, facultando-se ao juiz deixar de aplicá-la ou
substituí-la, a qualquer tempo, por pena restritiva de direitos, se o autor, coautor ou
partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que
conduzam à apuração das infrações penais, à identificação dos autores, coautores e
partícipes, ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime]. I) Causa de
aumento (§4º): Antes da Lei 12.683/12, o §4º falava em "crime habitual" e vinculava a
causa de aumento apenas aos crimes dos incisos I a VI, do caput do art. 1º. Agora, a lei fala
em reiteração criminosa e estende a causa de aumento a todos os delitos previstos no art. 1º.
Assim, deve-se ficar atendo para a data do cometimento do delito a fim de respeitar o
princípio da legalidade. A doutrina já criticava a ausência de definição, pela lei, do que seria
"crime habitual" por falta de parâmetros objetivos para se identificar o que poderia ser
considerado "crime habitual". A crítica permanece atual, porque não há definição na lei o
que seria "forma reiterada". Defende-se que a forma reiterada seria ou a situação do
criminoso profissional ou quanto o agente pratica vários delitos de forma continuada. Além

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

da reiteração na prática de crime de lavagem, também constituiu causa de aumento da pena


o fato de o delito ser praticado por organização criminosa. Sempre se criticou a ausência do
conceito legal do que vem a ser "organização criminosa". René Ariel Dotti (Boletim
IBCCRIM, n. 198), seguindo a opinião de Antônio Sérgio Pitombo, afirmou: Tenho a
convicção de que Antônio Sérgio Pitombo decifrou o enigma ao responder que a
organização criminosa nada mais é que um concurso de pessoas qualificado pelo número
mínimo de quatro sujeitos culpáveis, com maior ou menor poder de ação violenta ou
astuciosa e que desenvolvem, em caráter estável e permanente, atividades com o fim de
cometer crimes. Em 2012, o STF concluiu pela atipicidade do tipo "organização criminosa"
no HC 96.007. Porém, edita-se a Lei 12.694, destinada a regular o julgamento colegiado em
primeiro grau e em seu art. 2º define o que considera organização criminosa: Art. 2º Para os
efeitos desta Lei, considera-se organização criminosa a associação, de 3 (três) ou mais
pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que
informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer
natureza, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4 (quatro)
anos ou que sejam de caráter transnacional. Logo, uma organização, ainda que
estruturalmente ordenada, em que haja divisão de tarefas e ainda que atue de forma
astuciosa para explorar o jogo do bicho não poderá ser classificada como organização
criminosa. Se não resolve o problema, ao menos a Lei 12.694/2012 tenta dar uma pista.
Fato é que se for possível a prática de crime de lavagem de dinheiro por organização
criminosa, este fato será suficiente para autorizar a incidência da causa de aumento de pena.
II) Causa de diminuição (§5º): a delação premiada pode resultar na concessão de três
benefícios: 1) Diminuição da pena e fixação do regime aberto; 2) Perdão judicial, com a
consequente extinção da punibilidade; 3) Substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos. [Atenção: A escolha dos benefícios se dará de acordo com o grau de
colaboração e a concessão, doravante, pode dar-se a qualquer tempo e ainda que o réu
esteja preso no estrangeiro]. Alguns questionam o valor probatório da delação premiada.
Afirmam que a delação, por si só, não é suficiente para servir de base à condenação do
acusado. Por isso, Baltazar afirma que os fatos relatados pelo delator devem ser
comprovados por outros elementos ou provas independente ou com pontos de
convergência. A colaboração pressupõe que o acusado confesse, além de revelar pelo
menos mais uma infração penal. Nos EUA há recomendações para se formular um acordo
escrito, com a possibilidade de perda dos benefícios caso as informações não sejam
confirmadas. No julgamento do HC 90.688/PR, afirmou o Ministro RICARDO
LEWANDOWKI que "a delação premiada constitui um meio de prova introduzido na
legislação brasileira por inspiração do sistema anglo-saxão de justiça negociada". O
Ministro MENEZES DIREITO, divergiu, afirmando que se trata de um instrumento de
prova e não meio de prova propriamente dito. Tem-se, em verdade, que a delação premiada
se trata de um acordo entre coautores ou partícipes de crimes com o Estado, acordo esse
homologado em juízo e de caráter sigiloso. Portanto, não é meio de prova, mas instrumento
para se encontrar provas que serão, depois, ratificadas em juízo observando o contraditório
e a ampla defesa. Exatamente por ser sigiloso, não poderá, só por si, sustentar um édito
condenatório. (...) Sigilo do acordo de delação que, por definição legal, não pode ser
quebrado. (HC 90688, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma,
julgado em 12/02/2008, DJe-074 DIVULG 24-04-2008 PUBLIC 25-04-2008 EMENT
VOL-02316-04 PP-00756 RTJ VOL-00205-01 PP-00263 LEXSTF v. 30, n. 358, 2008, p.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

389-414). Todavia, se os elementos coligidos no acordo de delação premiada estiverem


consentâneos com as demais provas dos autos, aí sim pode compor o conjunto probatório a
justificar uma condenação. O que não se permite é utilizar tão só da delação premiada para
condenar, conforme se vê no seguinte julgado: CRIMINAL. PROVA. CONDENAÇÃO.
DELAÇÃO DE CORRÉUS. INVOCAÇÃO DO ART, 5º, INCISOS LIV E LV, DA
CONSTITUIÇÃO: AFRONTA INOCORRENTE. É certo que a delação, de forma isolada,
não respalda decreto condenatório. Sucede, todavia, que, no contexto, está consentânea com
as demais provas coligidas. Mostra-se, portanto, fundamentado o provimento judicial
quando há referência a outras provas que respaldam a condenação. (...) (RE 213937,
Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Primeira Turma, julgado em 26/03/1999, DJ 25-06-
1999 PP-00030 EMENT VOL-01956-06 PP-01181). OBS: tanto a autoridade policial
quanto o Ministério Público deve alertar o acusado ou indicado dos benefícios da delação.
Caso haja consenso, pode ser lavrado um acordo sigiloso entre a acusação e defesa, a ser
submetido ao juiz para homologação. Porém, não se aplica os benefícios se a colaboração
do agente se limita a crimes contra o SFN conexo com a lavagem de dinheiro. Em verdade,
deverá auxiliar no combate ao crime de lavagem e não só a crimes conexos.

14. Medidas assecuratórias: A incriminação dos atos de lavagem de dinheiro pretende


exatamente atacar o braço financeiro da criminalidade organizada e evitar a prática delitiva.
Por isso, há uma gama de medidas cautelares previstas em lei, as quais foram aprimoradas
com a Lei 12.683/12. Estas medidas não violam as garantias constitucionais da presunção
de defesa, nem do direito de propriedade, dada sua natureza cautelar. Antes da Lei
12.683/12, ao decretar as medidas assecuratórias o juiz deveria agir na forma dos art. 125 a
144 do CPP. A novel lei, contudo, tratou de regular mais detidamente essas medidas, não
mais mencionando o CPP. Enquanto não transitada em julgado a decisão na ação penal de
lavagem de dinheiro, não haverá a efetiva perda dos bens, mas apenas a sua restrição.
Legitimidade para Postular: As medidas assecuratórias podem ser postuladas pela
autoridade policial, pelo MP e até mesmo serem decretadas de ofício. Limites: Permite-se a
constrição de bens, direitos ou valores que sejam instrumento, produto ou proveito do crime
de lavagem, razão pela qual os bens que integrem o patrimônio do acusado, mas sem
qualquer relação com os crimes, não podem ser afetados (STF). Atenção: Antes da Lei
12.683/68, o art. 4º da Lei 9.613/98 permitia a apreensão apenas dos bens do acusado,
deixando de fora pessoas interpostas. Agora, além do patrimônio do acusado, também
podem ser atingidos os bens, direitos ou valores do investigado ou acusado, ou existentes
em nome de interpostas pessoas, que sejam instrumento, produto ou proveito dos crimes
previstos nesta Lei ou das infrações penais antecedentes. OBS: Baltazar defende não haver
impedimento de afetar-se todo o patrimônio do acusado, desde que seja necessário em
razão do valor do arbitramento da responsabilidade, incluindo o prejuízo causado, bem
como as despesas processuais e o valor provável das penas pecuniárias. Hipóteses nas quais
é passível a constrição de bens: bens dos acusados sócios de uma empresa; valores
expressivos transferidos para conta corrente da mãe do investigado; patrimônio de terceiro
que não foi réu em processo, por participar de empresa utilizada para lavagem; imóvel em
que o agente reside, dada a alienação de má-fé dos outros bens que possuía. Casuística: A
apreensão exige a particularização dos bens, não sendo correta uma ordem de afetação
genérica; Já se permitiu a constrição de bens alienados fiduciariamente, considerando que
as prestações foram pagas com produto do crime. Para o autor, nestes casos o bem deve ser

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

vendido e o valor correspondente ao das parcelas pagas serem apreendidas e o restante


devolvido ao agente financeiro; Para não inviabilizar as atividades de empresas, já se
permitiu que continuassem a usar os bens imóveis afetados e a devolução da metade dos
valores apreendidos em conta corrente. Requisitos: Não se exige maior rigor probatório na
comprovação da suspeita e da vinculação do patrimônio à origem ilícita, bastando indícios
suficientes da origem ilícita dos bens. São suficientes indícios mínimos e não veementes,
aplicando-se o princípio in dubio pro societate. Porém, não se admite a mera suspeita. O
perigo da demora é presumido de modo absoluto, sendo dispensável a prova de estar o
agente dilapidando o seu patrimônio. Alienação antecipada: A Lei 12.683/12 trouxe amplos
dispositivos regulando com minúcias a possibilidade de venda antecipada dos bens, sempre
que for necessária à preservação de valor de bens sob constrição. A alienação antecipada
poderá ser decretada de ofício ou a requerimento do MP ou da parte interessada. Não se
permite a substituição de dinheiro apreendido por outros bens, pois tal proceder iria de
encontro à finalidade da lei e da própria apreensão, que é a de evitar o aproveitamento do
produto de crime ou dos lucros da atividade ilícita. Pedido de Restituição: O §3º do art. 4º
da Lei 9.613/98 impõe como condição de procedibilidade do pedido de restituição, que se
passou a chamar "pedido de liberação" com a Lei 12.683/12, o comparecimento pessoal do
acusado ou de interposta pessoa (laranjas). Trata-se de regra especial em relação ao
disposto no CPP. O fundamento de se exigir a presença reside no fato de que, muitas vezes,
o dinheiro apreendido está em nome de pessoas interpostas, conhecidas como laranjas.
Casos de indeferimento do pedido de restituição ou liberação: a) suspeita de o sujeito ter
emprestado o nome para viabilizar a lavagem; dúvidas acerca da propriedade de joias
apreendidas e sem que haja comprovação da origem lícita dos bens; dúvidas quanto à
propriedade de veículo apreendido, dada a evidente desproporção entre o valor do bem e a
capacidade financeira ostentada. Casos de deferimento do pedido de liberação: a) evolução
patrimonial justificada mediante apresentação de declarações de renda e comprovação de
atividade lícita; informação da CEF confirmando premiação em concurso de prognóstico.
Atenção: Não se admite MS ou HC como sucedâneo do pedido de restituição. Legitimidade
para Pedido de Restituição: Quando os bens integrarem a meação, a legitimidade será da
mulher e não do acusado. Da mesma forma, o acusado não tem legitimidade para postular a
liberação de bens de terceiros. Terceiro de Boa-Fé: A lei protege a boa-fé. Mas, como a
lavagem normalmente pode envolver terceiros como forma de viabilizar a prática do crime,
há de se ter cautela em pedidos de terceiro. Porém, demonstrada a boa-fé o juiz deverá
liberar o bem. A análise, contudo, deve ser rigorosa. Já se negou liberação de bens de
empresário experiente que se envolveu em sucessivas operações atípicas. Inversão do Ônus
da Prova: De acordo com o art. 4º, §2º, se o agente comprovar a licitude da origem dos bens
o juiz deve ordenar a liberação total ou parcial. Ainda assim, poderá manter a constrição
dos bens, direitos ou valores necessários e suficientes à reparação dos danos e ao
pagamento de prestações pecuniárias, multas e custas decorrentes da infração. A inversão
do ônus probatório assegura apenas a liberação antecipada dos bens, antes do término da
ação penal, não importando em presunção e nem representando ofensa indevida ao direito
de propriedade do investigado, à presunção de inocência, ao devido processo legal ou à
ampla defesa. A perda do bem somente poderá ser decretada se a acusação comprovar a
origem ilícita. Assim, se ao final o acusado é absolvido, os bens, valores ou direitos devem
ser liberados, não podendo ser exigido a prova da origem lícita. Prazo do Levantamento das
Medidas Assecuratórias: O §1º do art. 4º da LLD estabelecia que se a ação penal não fosse

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

iniciada no prazo de 120 dias as medidas assecuratórias deveriam ser levantadas. A Lei
12.683/12 alterou a redação do mencionado dispositivo e não mais prevê qualquer prazo
especial. Assim, aplica-se subsidiariamente as hipóteses do art. 131 do CPP. O inciso I do
art. 131 do CPP prevê que o sequestro será levantado se a ação penal não for intentada no
prazo de 60 dias, contados da data em que ficar concluída a diligência. O entendimento do
STF (Inq-QO 2248/DF) é que a contagem do prazo não se inicia enquanto não forem
concluídas as diligências necessárias à determinação da origem dos valores, o que
equivaleria a dizer que o prazo somente teria início com a conclusão do inquérito policial.
Atenção: O prazo (120 ou 60 dias) não se aplica quando a coisa apreendida se destinar à
produção de prova e não como medida assecuratória. No entanto, mesmo a busca e
apreensão não pode ter duração indefinida. No TRF 2 determinou-se prazo para a conclusão
de inquérito policial que se arrastava por 5 anos, sob pena de devolução dos bens
apreendidos. OBS: Há decisões que consideraram que o prazo não seria peremptório, eis
que eventual complexidade do caso em julgamento e a existência de fortes indícios da
proveniência ilícita dos bens justificar a manutenção da constrição dos bens. Determinou-se
a liberação dos bens quando: decorridos mais de 2 anos e não oferecida denúncia (TRF 4);
Decorridos 3 anos e não se colheu elementos suficientes ao início da ação penal (TRF 3).
Administração dos Bens: Não se recomenda que o próprio réu seja nomeado administrador
nem fiel depositário (TRF 4). A Lei 12.683/12 alterou ligeiramente estes dispositivos,
permitindo que a administração se dê por pessoa física ou jurídica qualificada para a
administração, sempre mediante termo de compromisso. O deferimento pressupõe prévia
oitiva do MP. O administrador fará jus a uma remuneração, fixada pelo juiz e satisfeita com
o produto dos bens objetos da administração. Caução: A possibilidade de restituição dos
bens apreendidos mediante caução somente é dada a terceiro a quem tiverem sido
transferidos os bens e não ao próprio acusado ou investigado.

15. Cooperação Jurídica Internacional: O art. 8, §1º, da LLD, permite a cooperação


internacional, a fim de se apreender bens, direitos ou valores decorrentes de infrações
penais cometidas no estrangeiro. A Convenção de Palermo prevê a cooperação
internacional para fins probatórios ou qualquer outro tipo de assistência. O STF concedia
exequatur às cartas rogatórias para fins de quebra de sigilo financeiro, desde que versassem
sobre matéria penal e presentes indícios da prática do delito. Porém, negava o exequatur
quando a finalidade fosse o sequestro de valores depositados em contas, exigindo para isso
a homologação de sentença estrangeira. Com a EC 45, a competência desta matéria passou
ao STJ, que alterou a orientação do STF e passou a entender pela desnecessidade de
homologação da sentença estrangeira para dar maior efetividade à cooperação
internacional, sobretudo em casos de crime organizado transnacional, em razão de expressa
autorização pelos art. 12, partes 6 e 7; 13, parte 2 e 18 da Convenção de Palermo. Adotou,
até mesmo, o deferimento de liminar inaudita altera pars, com contraditório diferido.

16. Controle Administrativo: Nos artigos 9º e seguintes a LLD instituiu um sistema de


controles administrativos em matéria de lavagem de dinheiro, a fim de monitorar operações
e negócios que possam detectar – e prevenir – qualquer forma de lavagem de dinheiro. A
criação deste sistema visa cumprir compromisso assumido pelo Brasil no art. 7º, letra "a",

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

da Convenção de Palermo, qual seja, o de instituir um regime interno completo de


regulamentação e controle dos bancos e instituições financeiras não bancárias e, quando
justificado, de outros organismos que possam ser usados para a lavagem de dinheiro. Dar
execução a este sistema de controle não é fácil. De um lado o aumento dos controles
administrativos tem efeitos colaterais que afetam o próprio país, freando a atividade
econômica. De outro, os agentes monitorados também resistirão à prestação de
informações, eis que auferem lucro com as operações de lavagem. Atualmente são os
seguintes órgãos de controle administrativo: BACEN: fiscaliza instituições financeiras,
empresas de compra e venda moeda estrangeiro ou ouro, arrendamento mercantil a
administradoras de consórcio; CVM: fiscaliza as corretoras e distribuidoras de títulos e
valores mobiliários; bolsa de valores; bolsas de mercadorias e futuros; SPC (Secretaria de
Previdência Complementar) fiscaliza as entidades fechadas de previdência complementar
(fundos de pensão); SUSEP: fiscaliza as entidades de seguro e capitalização; COAF: possui
competência residual e fiscaliza empresas que exploram cartões de crédito, meios
eletrônicos ou magnéticos para transferência de fundos, factoring, sorteios e promoção
imobiliária ou compra e venda de imóveis. O COAF poderá requerer aos órgãos da
Administração Pública as informações cadastrais bancárias e financeiras de pessoas
envolvidas em atividades suspeitas [ou seja: o COAF poderá ter acesso a informações
cadastrais (dados pessoais como estado civil, número de documentos, filiação endereço,
telefones etc., relação de atividades desenvolvidas, patrimônio declarado), mas não sobre
movimentações financeiras ou bancária, salvo prévia autorização judicial devidamente
fundamentada]. O COAF comunicará às autoridades competentes para a instauração dos
procedimentos cabíveis, quando concluir pela existência de crimes previstos nesta Lei, de
fundados indícios de sua prática, ou de qualquer outro ilícito.

17. Pessoas obrigadas: Com o advento da Lei 12.683/12 houve significativa ampliação do
rol de pessoas obrigadas. Antes, apenas as pessoas jurídicas tinham obrigações de prestar
informações e, excepcionalmente, algumas pessoas físicas que atuassem em áreas sensíveis
(representação de empresas estrangeiras, comerciantes de obras de artes ou artigos de luxo
etc.). Agora, também pessoas físicas que atuem nas atividades listadas tem o mesmo dever
de informar. O item que até o momento tem gerado ampla discussão é que determinou a
inclusão de profissionais liberais no rol dos obrigados a prestar informações ao COAF (art.
9º, inciso XIV): [XIV - as pessoas físicas ou jurídicas que prestem, mesmo que
eventualmente, serviços de assessoria, consultoria, contadoria, auditoria, aconselhamento
ou assistência, de qualquer natureza, em operações: a) de compra e venda de imóveis,
estabelecimentos comerciais ou industriais ou participações societárias de qualquer
natureza; b) de gestão de fundos, valores mobiliários ou outros ativos; c) de abertura ou
gestão de contas bancárias, de poupança, investimento ou de valores mobiliários; d) de
criação, exploração ou gestão de sociedades de qualquer natureza, fundações, fundos
fiduciários ou estruturas análogas; e) financeiras, societárias ou imobiliárias; e f) de
alienação ou aquisição de direitos sobre contratos relacionados a atividades desportivas ou
artísticas profissionais]. A inclusão de profissionais liberais entre as pessoas sujeitas aos
mecanismos de controle suscitou reação da Confederação Nacional das Profissões Liberais
(CNPL), a qual levou a questão ao STF na ADI 4.841, questionando os dispositivos que
incluem os profissionais liberais entre as pessoas sujeitas aos mecanismos de controle.
Argumentou que estes profissionais estão sujeitos ao poder-dever de sigilo em suas relações

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

com os clientes, de acordo com as leis próprias de cada atividade. Assim, A Lei 12.683/12
teria vulnerado os princípios constitucionais da proporcionalidade/proibição de
excesso/razoabilidade. Posição da OAB: A OAB/SP consultou a OAB Nacional se a norma
acima se aplicaria aos advogados e sociedade de advogados. Em sessão realizada no dia
21/08/2012, O Órgão Especial do Conselho Federal deliberou que a Lei. 12.683/12 não
seria aplicável aos advogados e sociedades de advogados, porque constituiria violação das
prerrogativas profissionais dos advogados, pois estes profissionais estão protegidos pela
garantia do sigilo profissional pela Lei 8.906/94 (lei especial) e pelo artigo 133 da
Constituição Federal. Posição do MPF: Deborah Duprat, em parecer na citada ADI,
defendeu a possibilidade de esta exigência, opinando pela improcedência do pedido, com
base na existência de sérios indícios do crime de lavagem. Contextualizou a exigência na
esfera internacional, especificamente nas resoluções da GAFI (Groupe d’Action
Financière), criada pelo G7. Nada obstante, o MPF reconheceu no mencionado parecer que
os advogados e sociedades de advogados não estariam sujeitos ao dever de informar,
quando suas atividades fossem desenvolvidas no âmbito de consultas ou assessorias
destinadas à prevenção de litígios judiciais ou administrativos, inclusive arbitragem,
porque, caso contrário, atingiria o núcleo essencial dos princípios do contraditório e da
ampla defesa. Mas, fora desta órbita, e no exercício de ponderação de interesses, poderia
ser exigido do advogado, sem que tal imposição se contaminasse de inconstitucionalidade,
a comunicação ao COAF das operações previstas nas letras "a" a "f" do inciso XIV do
parágrafo único do art. 9º da Lei 9.613/98, com da redação dada pela Lei 12.683/12.

Saliente-se que, apesar da posição do MPF, o COAF publicou a resolução 24/13, com o
objetivo estabelecer normas gerais de prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento
do terrorismo e determinou a exclusão dos advogados do seu âmbito de aplicação. Isto
porque os mesmos se sujeitariam a regulação da OAB e a regra dispõe especificamente
sobre os procedimentos por pessoas não submetidas à regulação de órgão próprio.

Hoje, dia 07/06/14 os autos da ADI ainda estão conclusos para o relator.

18. Deveres de Colaboração: O controle administrativo de prevenção do delito de lavagem


de dinheiro impõe os seguintes deveres: Identificação: trata-se do dever de bem conhecer o
seu cliente e, também, o seu empregado. A LDD exige dos agentes que devem prestar os
serviços de informação aos órgãos de controle que mantenham a vigilância por sistemas
confiáveis de identificação do cliente e de suas atividades, a estrutura das pessoas jurídicas
e das propriedades de seus clientes, em resumo: conheça o seu cliente. Também devem
conhecer seus empregados, a fim de que não sejam cooptados pelos agentes que desejem
lavar dinheiro. Trata-se, portanto, de um dever de vigilância para que não seja usado como
instrumento do delito de lavagem de capitais. Manutenção de registros: não basta conhecer
clientes e empregados. Os agentes encarregados de prestar informações devem manter
banco de dados em que arquivem as informações obtidas, sobretudo a que dizem respeito à
identificação das pessoas envolvidas nas transações e operações em que atuar.
Comunicação de Operações Suspeitas ou Atípicas: esse dever de comunicação, na chamada
política de abertura (disclosure), decorre naturalmente do dever de vigilância previsto no
art. 11 da LLD. Assim, sempre que identificar uma operação suspeita, o agente deve
comunicar o órgão competente a que estiver sujeito: BACEN, CVM, COAF, SUSEP, SPC.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Ex de operações suspeitas: transações de altos valores em espécie, salvo quando compatível


com a atividade do cliente; falta de comprovação documental de negócios de alto valor;
operações atípicas e arriscadas; altas transações em dinheiro; riqueza incompatível com o
perfil do cliente; realização de operações estruturadas de grandes quantias, as quais são
fracionadas em repetidas transações de pequeno valor para ficarem abaixo dos limites
(smurfing) etc.

19. Efeitos da Condenação: O art. 7º da LLD trás outros efeitos além daqueles previstos
no CP especificamente para o crime de lavagem de dinheiro: perda de bens e interdição do
exercício de cargo ou função. Estes efeitos não são automáticos, devendo o juiz declarar
precisamente os bens que serão perdidos e em favor de quem. Para garantir o efetivo
combate à lavagem de dinheiro, a LDD prevê o confisco de bens, direitos e valores
relacionados, direta ou indiretamente, à prática dos crimes previstos na LDD, inclusive
aqueles utilizados para prestar fiança, ressalvados os direitos de terceiros de boa-fé. Nesse
ponto a nova lei endureceu os efeitos da condenação. Antes, o réu perdia apenas os objetos
do crime. Agora perderá, além dos objetos do crime, também a parcela de bens que forem
utilizados, ainda que de forma indireta, para a prática do crime.

OBS: O art. 17-B autoriza que o MP e a autoridade policial tenham acesso, unicamente, a
dados cadastrais do investigado que informem: qualificação pessoal, filiação e endereço
mantidos pela Justiça Eleitora, empresas telefônicas, instituições financeiras, provedores de
internet e administradoras de cartão de crédito

Quadro resumo retirado do livro do Baltazar:


TIPO PENAL Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/98, art. 1º)
NOÇÃO Processo pelo qual o autor do crime transforma recursos ou bens oriundos de certos
crimes(até 09/07/2012) / infrações penais(a partir de 10/07/2012) em ativos com origem aparentemente
legal.
BEM JURÍDICO Crime pluriofensivo, que atenta contra: a) a administração da justiça; b) a ordem
econômica; c) o bem jurídico protegido pelo crime antecedente.
SUJEITO ATIVO Qualquer pessoa, incluindo o autor do crime antecedente.
SUJEITO A coletividade.
PASSIVO
TIPO OBJETIVO VERBOS OBJETO OBJETO PROVENIÊNCIA CRIMES
NUCLEARES MATERIAL ANTECEDENTES
Ocultar Natureza Bens Direta Tráfico de drogas
Dissimular Origem Direito Indireta Tráfico de armas
Localização Valores Extorsão med.
Sequestro
Disposição Contra Adm. Pública
Propriedade Contra SFN
Praticado Org.
Criminosa
Contra Adm. Pública
Estrang.
PRINCÍP. É aplicável
INSIGNIFICÂNCIA
TIPO SUBJETIVO É o dolo, admitida a forma eventual. Não há forma culpável. Admite-se a prova indiciária
para a comprovação do dolo.
CONSUMAÇÃO Na modalidade básica, com a efetiva ocultação ou dissimulação.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Na modalidade do §1º do art. 1º, com a mera prática de condutas com a finalidade de
ocultação ou dissimulação.
TENTATIVA É possível, em tese, para a forma básica, embora seja de difícil ocorrência.
PENA É aumentada de 1 a 2/3 em casos de crime habitual(até 09/07/2012) / cometido de forma
reiterada(a partir de 10/07/2012) ou por meio de organização criminosa.
AÇÃO PENAL - Pública incondicionada, de competência da JF sempre que: a) causar prejuízo à União,
suas autarquias ou empresas públicas; b) o crime antecedente for de competência federal;
c) a lavagem for internacional. É da JE nos demais casos.
- Em razão da relativa independência do crime de lavagem de dinheiro, bastam indícios
da ocorrência do crime antecedente para o oferecimento da denúncia por lavagem de
dinheiro (art. 2º, I e §1º).
- Não se aplica a suspensão do processo em caso de citação por edital. O art. 366 do CPP
é afastado pelo art. 3º, §2º, LLD.
MEDIDAS - Podem ser apreendidos ou sequestrados bens que sejam objeto do crime (até 09/07/2012) e os
ASSECURATÓRIAS bens, direitos ou valores do investigado ou acusado, ou existentes em nome de
interpostas pessoas, que sejam instrumento, produto ou proveito dos crimes previstos
nesta Lei ou das infrações penais antecedentes (a partir de 10/07/2012), sendo de 60 (sessenta) dias
o prazo para oferecimento da denúncia.
- A comprovação da origem lícita dos bens autoriza a devolução antecipada.
- O conhecimento do pedido de restituição requer comparecimento pessoal do requerente.
CONTROLE - A LLD estabelece, em seus art. 9º a 11, um sistema de controle administrativo pelo qual
ADMINISTRATIVO várias pessoas físicas e jurídicas, que operam em atividades que possam ser utilizadas
para lavagem de dinheiro, financeiras ou não, são obrigadas, conforme instruções e
limites específicos para cada segmento, a: a) identificar seus clientes; b) manter registros
das suas operações; c) atender requisições das autoridades de controle; d) comunicar a
ocorrência de operações suspeitas.
- A omissão desses deveres autoriza a imposição de pesadas sanções administrativas e
multas, sendo que estas podem chegar ao valor de R$ 20 milhões.
- A novidade da Lei 12.683/12 foi a inclusão de profissionais liberais no rol de pessoas
obrigadas a comunicar o COAF sobre operações suspeitas. Já foi ajuizada ADI (4.841) no
STF questionando esta inclusão. A OAB entende que os advogados e sociedade de
advogados não estão sujeitos à obrigação de comunicar o COAF. O MPF, em parecer na
mencionada ADI 4.841, concluiu que os advogados somente estão isentos de prestar
informações quando atuarem na defesa de seus clientes em processos judiciais,
administrativos ou em caso de arbitragem.
COAF O Conselho de Controle de Atividades Financeiras é a unidade financeira de
inteligência do Brasil, a quem cabe disciplinar, receber comunicações de operações
suspeitas e aplicar penalidades à pessoas obrigadas, com exceção daquelas sujeitas a
outros órgãos de fiscalização.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

16.a. Culpabilidade Penal.


Obras consultadas: Santo Graal 27. ARTUR GUEIROS e CARLOS JAPIASSU, Curso de
Direito Penal, Parte Geral, Ed. 2012, Ed. Campus Jurídico.

Legislação básica: CP

Na concepção tripartite, crime é fato típico, ilícito e culpável. Nessa visão, sem
culpabilidade não há crime.

Fato típico Ilícito Culpável

1) conduta. - ratio cognoscendi. - É o juízo de reprovação.


2) tipicidade penal.
3) relação de causalidade. - Causas justificantes: - Elementos:
4) resultado 1) legais. 1) imputabilidade penal.
2) supralegais. 2) a potencial consciência
da ilicitude.
3) exigibilidade de conduta
diversa

1. Conceito: Possui três sentidos: (i) fundamento da pena: fato de ser ou não possível a
aplicação de uma pena ao autor de um fato típico e antijurídico, Liga-se ao conceito
dogmático de culpabilidade. É elemento do crime, o qual, por sua vez, é pressuposto da
sanção penal; (ii) elemento de medição da pena; (iii) conceito contrário à responsabilidade
objetiva. A culpabilidade tem como pressuposto lógico a liberdade de decisão ou de
escolha da pessoa humana, ou, em outras palavras, a capacidade antropológica de se
determinar no sentido da norma jurídica. A responsabilidade penal somente pode incidir
sobre aquele que possua aptidão de dominar seus instintos ao invés de cometer o fato
antijurídico. Conforme explicitado por Jeschek, no terreno da culpabilidade, faz-se
necessário apartar os processos causais naturais da força da vontade humana. Para o Direito
Penal, a reprovabilidade se assenta no juízo de comparação dentro da situação na qual se
encontrava o agente. Deve-se, portanto, indagar se o autor poderia ter atuado de outra
forma, na medida em que – segundo a experiência em casos similares – qualquer outro em
seu lugar se comportaria de modo diverso ante a tensão da força de vontade que
possivelmente lhe falhou.

2. Evolução do conceito de culpabilidade: 2.1) Teoria psicológica (Von Liszt): relaciona-


se ao naturalismo-causalista, fundado no positivismo do século XIX. Culpabilidade era o
vinculo psicológico que unia o autor ao resultado produzido por sua ação. Dolo e culpa são
a própria culpabilidade, ou suas espécies. A imputabilidade era pressuposto da
culpabilidade. Foi dominante até parte do sec. XX, quando foi superada pela teoria
psicológico-normativa. 2.2) Teoria psicológico-normativa (Frank): aparece no contexto de

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

superação do positivismo-naturalista e sua substituição pela metodologia kantiana, com o


conceito neoclássico do delito. Culpabilidade era, ao mesmo tempo, uma relação
psicológica e um juízo de reprovação. Dolo/culpa passam a ser seus elementos, ao lado da
imputabilidade e da exigibilidade de outra conduta (Freudenthal). O dolo deixa de ser
apenas psicológico, e passa a ser também normativo (dolus malus), constituído por vontade,
previsão e consciência atual da ilicitude (dolo híbrido); 2.3) Teoria normativa pura:
relaciona-se ao finalismo welziano. A culpabilidade é resumida como a reprovação pessoal
que se faz contra autor pela realização de um fato contrário ao direito, embora houvesse
podido atuar de modo diferente. É integrada pela imputabilidade, potencial (e não mais
atual) consciência da ilicitude (que é retirada do dolo) e pela exigibilidade de conduta
diversa; o dolo (natural, puramente psicológico, composto por consciência e vontade) e a
culpa são deslocados para o tipo. A essência da culpabilidade reside em “poder agir de
outro modo”.

3. Elementos da culpabilidade: (i) imputabilidade: capacidade ou aptidão para ser


culpável, o que pressupõe a compreensão do injusto e a determinação da vontade conforme
essa compreensão. Segundo Artur Gueiros, é a capacidade de livre autodeterminação. Ou,
dito de outra forma, é o conjunto de condições pessoais que dão ao agente a faculdade de
atuar de modo distinto, permitindo, assim, que lhe seja atribuída juridicamente, a
responsabilidade pelo injusto típico. Ausente a imputabilidade, não haverá que falar em
liberdade de autodeterminação, sendo, portanto, desculpável pelo fato que praticou.
Critério: Existem os critérios biológico, psicológico e biopsicológico. O CP adotou o
critério Biopsicológico, pois a responsabilidade é afastada se: (1) o agente sofrer de
enfermidade ou retardo mental (ex: esquizofrenia, psicose maníaco-bipolar, oligofrenia); e
(2) se no momento da conduta era incapaz de entendimento ou de controle dos seus
impulsos antijurídicos. OBS 1: Menores: apenas no tocante à menoridade penal é que se
adotou o sistema biológico. OBS 2: Imputabilidade diminuída ou semi-imputabilidade: o
que pode sofrer variação é o nível da responsabilidade penal. Constatada a imputabilidade
diminuída ou semi-imputabilidade, o parágrafo único, do art. 26, do CP, determina a
incidência de uma causa de diminuição de pena ou, dependendo do caso, a substituição da
pena por medida de segurança. Trata-se do chamado sistema vicariante, ou seja, de
imposição de pena ou de medida de segurança. (ii) possibilidade de conhecimento da
ilicitude do fato: exige um juízo geral acerca do caráter ilícito do fato, e a possibilidade de
se atingir esse juízo, mediante um simples e exigível esforço da consciência – consciência
profana do injusto. OBS: Erro de proibição: A ausência ou errônea compreensão da ilicitude
do fato acarreta aquilo que se denomina de erro sobre o que é proibido (erro de proibição).
Se o agente não sabia e nem poderia atingir aquele conhecimento, tratar-se-á de um erro
invencível ou escusável. Ao revés, se o agente, com um pouco de cuidado ou diligência,
pudesse atinar para a antijuridicidade do fato, o erro de proibição passará a ser vencível ou
inescusável. Nos termos do art. 21, caput e parágrafo único, do CP, na primeira vertente, a
culpabilidade será excluída; na segunda, atenuada.; (iii) exigibilidade de conduta diversa
ou de obediência ao direito: Uma vez configurada a imputabilidade do agente, bem como
o conhecimento da antijuridicidade ou a possibilidade de se atingir tal consciência, é
conclusão lógica a que se chega que lhe era esperado um comportamento diverso; que
agisse conforme, e não contrariamente ao Direito. por isso é a possibilidade concreta de o
autor adotar sua decisão de acordo com o conhecimento do injusto. Na hipótese de não

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

poder se exigir que o agente atuasse de modo diverso, será excluído o juízo de censura e a
consequente culpabilidade.

OBS 1: A culpabilidade é pressuposto da pena? Segundo Artur Gueiros, trata-se de


polêmica que já foi intensa no Brasil, mas que, na atualidade, perdeu importância. Verifica-
se que uma conduta típica e antijurídica só se converte em crime se for possível a
reprovação de seu autor. Sem a culpabilidade, não há delito e, sim, um injusto típico, um
fato descrito na norma penal e contrário ao direito. René Ariel Dotti e Damásio de Jesus
sustentam que a culpabilidade não seria elemento ou requisito do crime, funcionando, tão
somente como pressuposto da pena. Para estes autores, o conceito de delito compreenderia
a conduta típica e antijurídica, recaindo o juízo de reprovabilidade sobre o sujeito que o
praticou. Numa palavra, a culpabilidade funcionaria como condição de imposição da pena.
Exemplificando tal posição, a receptação (art. 180 do CP) seria tipificada, mesmo quando
isento de culpabilidade o autor do delito antecedente. De maneira diversa, a maioria da
doutrina pátria, na esteira do entendimento prevalecente no direito estrangeiro, considera
que o fato típico e antijurídico somente se converte em delito quando se reprova o seu
autor. Faz-se, assim, necessário o juízo de censura sem o qual não se completa o conceito
analítico de delito. Evidentemente, dada a sua riqueza e complexidade teórica, o juízo de
culpabilidade, além de ser um dos elementos essenciais do delito, projeta-se para a etapa
subsequente, ou seja, para o momento de quantificação da consequência jurídica do delito e
critério mensurador da aplicação da pena. Nesse sentido, Cezar Roberto Bitencourt, ao
analisar a tese de que a culpabilidade constituir-se-ia unicamente pressuposto da pena,
sustenta que tanto tipicidade quanto antijuridicidade também seriam pressupostos da pena,
visto que a sanção penal é consequência jurídica do crime, este, com todos os seus
elementos, é pressuposto daquela. Assim, não somente a culpabilidade, mas igualmente a
tipicidade e a antijuridicidade, seriam pressupostos da pena, que é sua consequência.
Assim, uma ação típica e antijurídica somente se converte em crime se houver o acréscimo
da culpabilidade.

OBS 2: No que consiste a crise do conceito de culpa jurídico-penal? Conforme as


considerações antropológicas, o fundamento da reprovabilidade repousa na capacidade de
livre decisão do sujeito. Ocorre, todavia, que a premissa do poder agir de outro modo, que
se encontra no âmago do conceito da culpa jurídico-penal é, como visto, empiricamente
indemonstrável. Desta maneira, se a pena pressupõe a culpa e a reprovação, própria da
culpabilidade, se baseia num fundamento impossível de se comprovar, logo a culpabilidade
não poderia, cientificamente, servir de fundamento da pena. Essa constatação acarretou
aquilo que se pode denominar de crise do conceito de culpabilidade. Isso fez com que
alguns autores passassem a buscar outro fundamento cientificamente válido para a
reprovabilidade do autor do injusto típico. Posicionamento de Juarez Cirino dos Santos:
sustenta a incapacidade da culpabilidade funcionar como fundamento da pena, advogando,
simplesmente, que a mesma deve ser utilizada como critério de limitação do poder de punir,
ou, com a troca de uma função metafísica – indemonstrável – de legitimação da retribuição
por uma função política de garantia da liberdade individual – garantia de que a pena não
passará do grau de reprovabilidade do sujeito. Desse modo, seguindo pensamento daquele
autor, a responsabilidade pelo comportamento antissocial parece ser imprescindível à
sobrevivência da sociedade, mas juízos de culpabilidade ou reprovação fundados na

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

liberdade de vontade perderam toda e qualquer base científica: a ideia de liberdade de


vontade representaria, no máximo, um sentimento pessoal. Nesse contexto, conclui Juarez
Cirino, a definição de culpa como agir conforme o direito pareceria digna de registro por
dois motivos: preservaria a função de garantia política do princípio da culpabilidade como
limitação do poder de punição e indicaria a gênese da responsabilidade pessoal pelo
comportamento antissocial, sem necessidade de pressupostos metafísicos indemonstráveis.
Em síntese, a propalada crise da culpabilidade não infirma a compreensão normativa no
sentido do ser humano, dotado de certas faculdades, fazer-se responsável por seus atos. Por
conta disso, o estudo da culpa jurídico-penal consiste na pesquisa de defeitos na formação
da vontade ilícita: (1) no campo da capacidade de vontade, vale dizer, a existência ou não
de defeitos orgânicos ou funcionais do aparelho psíquico; (2) na área do conhecimento do
injusto, ou seja, a verificação de condições internas negativas, desse conhecimento(o
denominado erro de proibição); e (3) no terreno da exigibilidade, vale sublinhar, na
pesquisa de condições externas negativas do poder de dirigibilidade normativa, como
pressões, restrições, coações etc.

OBS 3: Imputabilidade do índio: o simples fato de ser índio não exclui nem diminui sua
imputabilidade (ZAFFARONI e PIERANGELI, p. 559; posição da examinadora Ela
Wiecko). Para o índio ser inimputável, exige-se a presença das dirimentes de doença mental
(art. 26, caput), de menoridade (art. 27) ou de embriaguez completa e involuntária (art. 28,
§1º), tal como para qualquer pessoa. Portanto, a imputabilidade não afasta a culpabilidade
do índio, a qual pode ser afastada por outra causa, como o erro culturalmente condicionado
(posição da examinadora Ela Wiecko).

4. Excludentes da culpabilidade: 4.1) causas de inimputabilidade: (a) menoridade; (b)


doença mental e desenvolvimento mental incompleto ou retardado (art. 26, caput): inclui
problemas de ordem toxicológica, a embriaguez patológica, os estados emocionais
patológicos e surtos psicóticos; se tal estado biológico apenas reduzir a consciência/
autodeterminação do agente, haverá a culpabilidade diminuída, com redução da pena (art.
26, p. único). A maioria da doutrina ainda situa os silvícolas como inimputáveis por
desenvolvimento mental retardado, mas esse entendimento não subsiste diante no atual
paradigma da plurietnicidade, de modo que, conforme defende ELA WIECKO: “a
inimputabilidade dos indígenas segue as regras gerais aplicáveis a todas as pessoas maiores
de 18 anos. Todavia, é possível excluir a culpabilidade pelo reconhecimento do erro de
proibição ou da inexigibilidade da conduta diversa”; (c) embriaguez completa e acidental
(art. 28, §1º, CP): em razão de caso fortuito ou força maior, o agente perde integralmente a
capacidade de entendimento e de autodeterminação; se for acidental e incompleta, haverá
culpabilidade diminuída, com pena reduzida (art. 28, §2º) [é a única hipótese de
embriaguez que exclui a culpabilidade]. Bittencourt critica essa previsão legal e defende
que, na embriaguez acidental incompleta, deve-se afastar a presunção de culpabilidade,
aferindo-se se estão presentes, no caso concreto, os pressupostos da responsabilidade penal.
Para o CP (art. 28, II), não são causas de inimputabilidade a embriaguez não acidental
(dolosa ou culposa) e a embriaguez preordenada (art. 62, II, L), em razão da adoção da
teoria da actio libera in causa, segundo a qual se considera como marco da imputabilidade
o período anterior à embriaguez, em que o agente espontaneamente decidiu consumir
bebida alcoólica, ainda que, no momento do fato, ele esteja inconsciente. A doutrina critica

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

a aplicação dessa tese à embriaguez não acidental, que levaria à responsabilização objetiva,
entendo-a aplicável apenas à embriaguez preordenada. Isso porque a actio libera in causa
foi, inicialmente, construída para justificar a punição nos casos de embriaguez preordenada,
ou seja, quando o agente, dolosamente, intoxicava-se para praticar determinados atos
comissivos ou omissivos. Posteriormente, que ela foi ampliada, abrangendo as hipóteses de
embriaguez voluntária ou imprudente, nas quais não havia nenhuma pretensão delituosa
anterior. 4.2) causas de exclusão da potencial consciência da ilicitude: erro de proibição
escusável (art. 21-CP). 4.3) inexigibilidade de conduta diversa: têm-se admitido causas
supra legais de inexigibilidade. No CP: (a) coação moral irresistível: se for resistível, incide
atenuante genérica para o coagido e agravante para o coator; (b) obediência hierárquica a
ordem não manifestamente ilegal: a doutrina tradicional requer uma relação de direito
público. Bittencourt critica (2011, p. 423 e 424), defendendo sua incidência nas relações de
direito privado. Se o subordinado cumprir ordem manifestamente ilegal, tanto ele quanto o
seu superior são puníveis, em concurso. OBS: Emoção e paixão: Embora não exclua a
culpabilidade, aqueles estados de afetação humana podem incidir como causas de
diminuição de pena, como ocorre nos crimes de homicídio e lesões corporais, nos
chamados crimes passionais, tornando-os privilegiados (arts. 121, § 1o, e 129, § 4o, CP),
podendo mesmo chegar ao perdão judicial (art. 139, § 1o) ou, ainda, à circunstância
atenuante contemplada no art. 65, III, “c”, todos do CP.

OBS 1: Estado de necessidade exculpante: Consoante estudado, a lei penal brasileira


reconhece, apenas, a figura do estado de necessidade justificante (art. 24, do CP). Aquilo
que corresponderia ao estado de necessidade exculpante, ou seja, o sacrifício de bem maior
valor do que aquele salvaguardado funciona, somente, como atenuação da reprovabilidade
(art. 24, § 2o). O Código não adotou, em suma, a teoria diferenciadora do estado de
necessidade, que permitiria a exclusão da culpabilidade. O Código Penal de 1969 previa
essa hipótese no seu art. 25 e o vigente Código Penal Militar a acolheu, conforme a redação
do art. 39. Diante disso, parte da doutrina sustenta que a teoria diferenciadora pode ser
aplicada como causa supralegal de exclusão da culpabilidade, quando não puder ser exigido
do agente, no caso concreto, um comportamento conforme o Direito.

5. Excludentes da culpabilidade: (outra classificação) As excludentes de culpabilidade


dividem-se quanto (I) ao agente do fato; (II) ao fato, sendo estas de cunho (I.1) legal; ou
(I.2) supralegal.

[A imputabilidade penal é o pressuposto da responsabilidade penal, porquanto é a


capacidade de ser culpável, ou seja, “é o conjunto das condições pessoais, envolvendo
inteligência e vontade, que permite ao agente ter entendimento do caráter ilícito do fato,
comportando-se de acordo com esse conhecimento. O binômio necessário para a formação
das condições pessoais do imputável consiste em sanidade mental e maturidade”. OBS: o
inimputável não comete crime, mas fato típico e antijurídico, passível de aplicação de
medida de segurança, de finalidade terapêutica. Os critérios para averiguar a
inimputabilidade por insanidade mental (falta de higidez mental), em tese, podem ser três:
1) biológico: “leva-se em conta exclusivamente a saúde mental do agente, isto é, se o
agente é, ou não, doente mental ou possui, ou não, um desenvolvimento mental incompleto
ou retardado”; o juiz fica atrelado ao laudo pericial; 2) psicológico: “capacidade que o

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

agente possui para apreciar o caráter ilícito do fato ou de comportar-se de acordo com esse
entendimento”; o juiz pode apreciar com ampla liberdade da imputabilidade; 3)
biopsicológico: “verifica-se se o agente é mentalmente são e se possui capacidade de
entender a ilicitude do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento – adotado
pelo art. 26 do CP: É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento
mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente
incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento; “logo, não é suficiente que haja algum tipo de enfermidade mental, mas que
exista prova de que esse transtorno afetou, realmente, a capacidade de compreensão do
ilícito, ou de determinação segundo esse conhecimento, à época do fato”.]

I - Excludentes quanto ao agente do fato: pode ser por doença mental ou por
desenvolvimento mental incompleto ou retardado. 1) Doença mental: considerado em
sentido lato, abrangendo doenças de origem patológica e de origem toxicológica (ex.
epilepsia, histeria, neurastenia, psicose maníaco-depressiva, melancolia, paranoia,
alcoolismo, esquizofrenia, demência, psicose carcerária, senilidade etc.); 2)
Desenvolvimento mental incompleto ou retardado: limitada compreensão do ilícito ou da
falta de condições de se autodeterminar; OBS 1: Doenças da vontade e personalidades
antissociais: não são doenças mentais, por isso, não excluem a culpabilidade (ex. desejo de
aparecer, defeitos ético-sexuais, resistência à dor etc.). OBS 2: Laudo pericial: para a
identificação da inimputabilidade é essencial o laudo pericial que ateste a doença mental e a
impossibilidade de o agente entender o caráter ilícito do fato; porém, é comum que haja
dúvidas e não se chegue, mesmo após sucessivas perícias, a alguma conclusão peremptória
sobre a capacidade do agente; nesse caso, a melhor alternativa é verificar a situação
concreta e aplicar a medida mais vantajosa ao réu; ademais, deve-se lembrar do art. 183 da
LEP que permite a conversão da pena em medida de segurança. OBS 3: Perturbação da
saúde metal: segundo o art. 26, par. ún. do CP, é causa de diminuição da pena, por não
retirar inteiramente a culpabilidade do agente e a sua condição de entender o caráter ilícito
da conduta. OBS 4: Embriaguez decorrente do vício: o alcoolismo é a embriaguez crônica,
caracterizada como doença mental, que torna o agente isento de culpa. OBS 5: Menoridade:
é a presunção absoluta de desenvolvimento mental incompleto que utiliza um critério
unicamente biológico, previsto no art. 228 CF e 28 CP: Os menores de 18 (dezoito) anos
são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação
especial; para o autor, não se trata de direito fundamental, apenas sendo norma
formalmente constitucional, passível de ser alterada por emenda constitucional; segundo a
sua opinião, o mais adequado seria diminuir a maioridade penal, adotando um critério
biopsicológico, para que aqueles que fossem menor de 18 e entendessem o caráter
criminoso da ação pudessem responder criminalmente pelos seus atos [marco temporal do
início da maioridade penal é a primeira hora do dia do aniversário!]. OBS 6: O erro de
proibição, vencível ou invencível, exclui ou atenua a culpabilidade, respectivamente

II - Excludentes quanto ao fato: 1) Coação moral irresistível: “é uma ameaça feita pelo
coator ao coacto, exigindo deste último que cometa uma agressão contra terceira pessoa,
sob pena de sofrer um mal injusto e irreparável”; a ameaça deve ser irresistível. Não se
adota o padrão do homem médio, mas sim o caso concreto. Entende de forma contrária,
mas em posição isolada, Nelson Hungria. A coação resistível pode configurar atenuante.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

OBS: em regra a coação moral irresistível demanda a participação de três personagens:


coator, coacto e vítima; porém, admite-se apenas duas partes envolvidas, quando o coagido
acaba matando o próprio coator ou o agente coator seja a sociedade. 2) Obediência
hierárquica: “é a ordem de duvidosa legalidade dada pelo superior hierárquico ao seu
subordinado, para que cometa uma agressão a terceiro, sob pena de responder por
inobservância da determinação”. OBS: a ordem não pode ser manifestamente ilegal e
precisa existir uma relação de subordinação de direito público. 3) embriaguez em caso
fortuito ou força maior: decorre de acaso ou acidente quando o agente não tem a vontade de
mudar o seu estado físico (ex. mistura de remédios com alguma outra substância), prevendo
o art. 28, § 1º, CP a falta de culpabilidade: É isento de pena o agente que, por embriaguez
completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da
omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de
acordo com esse entendimento. OBS 1: Embriaguez voluntária ou culposa: é a embriaguez
livremente desejada pelo agente ou decorrente da imprudência do bebedor; segundo o art.
28, II, CP, essa hipótese não elide a culpabilidade, em que pese a doutrina majoritária
preveja que o agente no momento do ato não tenha consciência alguma do seu ato (dolo ou
culpa); logo, se o agente se embriagou sem preordenação da sua conduta posterior, nem
tinha previsibilidade da mesma, a sua responsabilização é possível por expressa disposição
legal, embora se esteja tratando de responsabilidade objetiva, por evidente razão de política
criminal [Actio libera in causa: é a tese de que se o agente, dolosa ou culposamente, dá
causa a uma condição que o impede de ter domínio do fato (ação livre na origem); não será
por isso que deixará de responder pelo crime (causa da causa também é causa do que foi
causado); assim, se o sujeito bebe para cometer o crime ou tem a previsibilidade para tanto,
responderá subjetivamente pelo crime; para alguns doutrinadores, o art. 28, II, CP teria se
utilizado dessa tese, porém majoritariamente não se aceita essa justificação, prevalecendo o
entendimento da responsabilidade objetiva]. 4) Inexigibilidade de conduta diversa: ela
permeia as demais modalidades de exclusão da culpabilidade, notadamente a coação moral
irresistível e a obediência hierárquica superior; como modalidade autônoma é subsidiária
das demais, que são expressamente previstas pela lei.

Teorias da culpabilidade: Vejamos quadro sinótico:

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

OBS: Artur Gueiros faz menção a novas teorias da culpabilidade, são elas: a) Teoria da
atitude interna deficiente: Enquanto que para o finalismo o juízo de culpabilidade se
formava em razão da valoração da vontade de ação, autores subsequentes sustentam que o
juízo de reprovabilidade possui um objeto próprio: a atitude interna juridicamente
deficiente do autor, a partir da qual se originou a resolução do cometimento do fato. Nesse
sentido, Jeschek afirma que a atitude interna deve ser entendida não como uma
predisposição do agente, mas, sim, uma inclinação factual na formação da resolução
delitiva. Portanto, a culpabilidade significaria a reprovabilidade do fato diante da atitude
interna desaprovada que ativa sua perpetração. Segundo Jeschek, o que se reprova é sempre
o fato, e não somente a atitude interna. Contudo, a reprovação apenas estará justificada na
medida em que a atitude interna do autor se manifesta de forma contrário ao Direito ou,
mais exatamente, contrariamente à pretensão de respeito do correspondente bem jurídico ao
qual se dirige. É por isso que a atitude interna, relativamente à pretensão de validade do
bem jurídico protegido, é o motivo pelo qual, em maior ou menor medida, reprova-se o
autor ante a perpetração do fato. B) Funcionalismo teleológico-racional: Claus Roxin
agregou à culpabilidade a categoria superior da responsabilidade. Dessa maneira, para
fazer-se merecedor da pena, não basta o preenchimento da culpabilidade do agente,
devendo-se verificar as necessidades preventivas da sanção penal (geral e especial). Sendo
assim, conforme teorizado por Roxin, a pena pressupõe sempre a culpabilidade, de modo
que nenhuma necessidade de punição, por maior que seja, pode justificar uma sanção penal
que contrarie o princípio da culpabilidade. Contudo, exige-se o requisito adicional da
responsabilidade, restringindo-se a possibilidade de punição da conduta culpável quando,
por razões político-criminais, a mesma não for preventivamente imprescindível.

Previsão constitucional do princípio da culpabilidade: No artigo 5º, inciso XVII da


nossa Constituição Federal, tem-se: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em
julgado de sentença penal condenatória”. A culpabilidade também está inserida, no texto
constitucional quando da obrigatoriedade de individualização da pena prevista no artigo 5º,
inciso XLVI, pois a aplicação da pena ao autor do delito tem como fundamento e limitação
a sua culpabilidade.

Contrastes entre a culpabilidade em Welzel e em Roxin: Para Roxin, o finalismo se


diferencia fundamentalmente da clássica tripartição positivista-causal, mas, não confere
espaço autônomo a diretrizes político-criminais na dogmática. Para ele, cada categoria do
delito (tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade) deve ser “observada, desenvolvida e
sistematizada sob o ângulo de sua função político-criminal” (Roxin, 2002, p. 27). O autor
considera um grande avanço o conceito normativo de culpabilidade em detrimento do
conceito psicológico de culpabilidade; pois, enquanto neste há um puro estado psíquico,
aquele faz uma valoração do acontecer do fato. Mas, segundo ele, este conceito de
reprovabilidade é uma forma incompleta de valoração, pois há referência somente à
culpabilidade. Culpabilidade que, na doutrina finalística leva em consideração apenas a
imputabilidade, a possibilidade de conhecimento da antijuridicidade e a exigibilidade de
conduta conforme à norma. No entanto, para Roxin, este conceito normativo de
reprovabilidade é uma condição necessária, mas ainda não é suficiente para a conformação
da “responsabilidade”. Para ele, o conceito normativo de culpabilidade tem que se
aperfeiçoar em direção de um conceito normativo de responsabilidade. (Roxin, 2007, p.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

796-797). Aqui há uma busca de um conceito material de culpabilidade. Ou seja, para o


autor, a “culpabilidade formal” é um pressuposto decisivo para a “responsabilidade”, pois
põe um limite ao poder punitivo do Estado; mas, não é o único. Para que esta missão de por
limite ao poder punitivo estatal seja devidamente cumprida, deve-se levar em consideração
o conteúdo do conceito de culpabilidade. Roxin defende que a “culpabilidade” deve ser
cunhada político-criminalmente pela teoria dos fins da pena, para ele, materialmente mais
correto seria falar em “responsabilidade” em vez de culpabilidade. Pois, na sua teoria ele
considera a culpabilidade como sendo apenas um dos fatores que decidem sobre a
responsabilidade penal. Roxin apresenta a construção do sistema racional-final ou
teleológico (funcional) do direito penal rejeitando o ponto de partida do sistema finalista,
ou seja, partindo da hipótese de que a formação do sistema jurídico-penal não pode
vincular-se a realidades ontológicas prévias (v.g.: ação, causalidade, estruturas lógico-
reais), mas tão só unicamente pode guiar-se pelas finalidades do direito penal. Neste
sistema, as necessidades de prevenção e a culpabilidade se limitam reciprocamente e em
conjunto dão lugar à “responsabilidade” pessoal do autor com a consequente imposição de
pena (Costa, p.02). Em Roxin a culpabilidade é normativa, mas também leva em
consideração os fins da pena. Ou seja, há a culpabilidade stricto sensu, mas pela não
necessidade de aplicação da pena, há a exclusão da culpabilidade no sentido amplo, é dizer,
há a exclusão da responsabilidade, porque político-criminalmente não seria necessária nem
adequada a imposição da pena. Roxin critica, totalmente, o conceito ontológico de Welzel,
por considerar impossível um conceito ontológico pré-jurídico. Critica a culpabilidade de
Welzel baseada no livre arbítrio que, para ele, é indemonstrável. Roxin alerta para a
necessidade de ver a questão da legitimidade de punir não de forma isolada, apartada de
uma política criminal, mas que carregue nas suas soluções o homem como parte da
sociedade. Para ele, a pena tem uma função e, esta função, deverá nortear a sua legitimação
(Roxin, 2006, p. 163). Segundo o autor, a sua teoria da responsabilidade penetra em searas
que a culpabilidade, finalisticamente falando, não visa alcançar. Ou seja, para ele a
culpabilidade no finalismo falha por não incluir em seus critérios elementos da política
criminal que em conjunto com a dogmática penal só deverá admitir a punição se
estritamente necessária. Seguindo este raciocínio, Roxin leciona que a culpabilidade deve
converter-se em um conceito maior que é a responsabilidade integrada a pressupostos
preventivos da necessidade da pena. Além disto, Roxin salienta o argumento de que não há
como provar cientificamente a liberdade do homem (o atuar livremente); desta feita, o
pensamento atual não teve outro remédio senão recorrer à ideia de prevenção, porém,
baseado sempre na ideia de Estado Social Democrático de Direito, na qual existem bens
que se reconhecem em uma sociedade livre.

Questões de provas anteriores: Questão 29) Falar da evolução das teorias da


culpabilidade. Questão 30) Culpabilidade faz parte do conceito de crime? (Ela é tripartite,
mesmo acarretando mais responsabilidade para o MP provar o crime, mas na prática as
denúncias são oferecidas somente com base na tipicidade e na ilicitude, deixa a
culpabilidade para provar depois).

Jurisprudência: FURTO QUALIFICADO MEDIANTE CONCURSO DE DUAS


PESSOAS - ALEGAÇÃO DE PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA. ... A
PROPÓSITO, VEM GANHANDO PRIMAZIA NOS TRIBUNAIS A TEORIA DO

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

DOMINIO DO FATO, IDEALIZADA POR CLAUS ROXIN, QUE CONSIDERA


TAMBÉM CO-AUTOR O AGENTE QUE PARTICIPA DE UM PLANO
ADREDEMENTE PREPARADO, COM DIVISÃO DE TAREFAS, INFLUINDO,
DECISIVAMENTE, COM A SUA CONDUTA, NO RESULTADO FINAL DO ILÍCITO. 1.
O princípio da insignificância não deixa de ser tema recorrente, e tem o intuito dar a
determinadas situações tratamento diverso do especificamente penal...' E colho de Roxin
('Problemas fundamentais de Direito Penal', 1986, Vega, págs. 28/9) o seguinte: (I) 'onde
bastem os meios do direito civil ou do direito público, o direito penal deve retirar-se'; (II)
'porque é evidente que nada favorece tanto a criminalidade como a penalização de qualquer
bagatela'. STJ, 07/04/2011. RHC 26682 / SP

Responsabilidade penal da pessoa jurídica:


Obras consultadas: Santo graal 27; MASSON, Cleber. Direito Penal – Parte Geral. 6
edição, 2012. BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Crimes federais. 7ª ed., 2011; CUNHA,
Rogério Sanches. Código Penal para concursos. 4ª ed., 2011; GARCIA, Leonardo de
Medeiros; THOMÉ, Romeu. Direito Ambiental. 3ª ed., 2011; GRECO, Rogério. Curso de
Direito Penal – parte geral, vol. 1. 13ª Ed., 2011; ZAFFARONI, Eugenio Raúl;
PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro – vol. 1. 9ª Ed., 2011;
WIECKO, Ela. O projeto de Lei do Senado nº 156, de 2009, que institui novo Código de
Processo Penal e os crimes praticados contra indígenas ou por indígenas, 2009.

Legislação básica. Arts. 173, § 5º, 225, § 3º, e 228 da CRFB/88, arts. 26, 27, 28, 61, II, l,
65, III, c, 97, 98, 121, § 1º, 173, § 5º, 225, § 3º, do CP, arts. 3º, 21, 22 e 23 da Lei 9.605/98.

Responsabilidade penal da pessoa jurídica (PJ): Tradicionalmente, vigorou nos


ordenamentos jurídicos de filiação romano-germânica a máxima societas delinquere non
potest (a sociedade não pode delinquir). Modernamente, contudo, essa premissa tende a ser
superada, tendo em vista a expansão da economia mundial, o aumento da criminalidade
financeira e econômica e as violações cada vez em maiores proporções do meio ambiente e
dos demais direitos difusos mediante a utilização de entes coletivos. Vejamos os principais
argumentos contra e a favor da responsabilidade penal da PJ (v. BALTAZAR JUNIOR, p.
676): Argumentos contrários: 1) inconstitucionalidade do art. 3º da Lei nº 9.605/98; 2)
ausência de conduta e de vontade, conforme teoria da ficção de Savigny, pela qual as
pessoas jurídicas têm existência fictícia ou irreal, não sendo capazes de delinquir; 3)
incompatibilidade das penas criminais com a natureza das PJs; 4) inexistência de dogmática
penal adequada; 5) falta de regulamentação suficiente a assegurar o devido processo legal.
Argumentos favoráveis (tese majoritária na jurisprudência): 1) a própria CRFB/88
prevê expressamente a responsabilização penal da PJ em matéria ambiental (art. 225, § 3º)
e também estabelece a possibilidade de a lei sujeitar as PJs às punições compatíveis com
sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a
economia popular (art. 173, § 5º); 2) de acordo com a teoria da realidade (também chamada

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

da personalidade real ou orgânica), cujo precursor foi Otto Gierke, a PJ não é um ser
artificial, criado pelo Estado, mas sim um ente real, independente dos indivíduos que a
compõem. Assim, a PJ pode praticar condutas típicas e tem vontade própria, manifestada
pela atuação do seu colegiado; 3) a dogmática penal aplicável às PJs assenta-se no conceito
moderno de culpabilidade como responsabilidade social (STJ, REsp 564960, j. em
2/6/2005).

Responsabilidade penal da PJ em matéria ambiental: no REsp 610114, j. em


19/12/2005, o STJ admitiu expressamente a responsabilidade penal da PJ em matéria
ambiental, destacando que, “se a pessoa jurídica tem existência própria no ordenamento
jurídica e pratica atos no meio social através da atuação de seus administradores, poderá vir
a praticar condutas típicas e, portanto, ser passível de responsabilização penal [...] A
culpabilidade, no conceito moderno, é a responsabilidade social”. Requisitos: O art. 3º da
Lei nº 9.605/98 exige dois requisitos para a responsabilização penal da PJ: a) “que a
infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão
colegiado”; b) “no interesse ou benefício” da entidade.

Teoria da dupla imputação: Além disso, de acordo com a teoria da dupla imputação, o
delito jamais pode ser imputado exclusivamente à PJ (STJ, REsp 865864, j. em
10/09/2009). Deve ser imputado à pessoa física responsável pelo delito e à pessoa jurídica,
tratando-se de responsabilidade penal cumulativa. Consequentemente, “excluída a
imputação aos dirigentes responsáveis pelas condutas incriminadas, o trancamento da ação
penal, relativamente à pessoa jurídica, é de rigor” (STJ, RMS 16696, DJ 13/03/2006);
obviamente, a recíproca não é verdadeira, de modo que a ação penal pode prosseguir em
face do dirigente, caso excluída a imputação em face da PJ. Por essas razões, afirma-se que
a responsabilidade da PJ é por ricochete, indireta ou mediata, pois o principal responsável
pelo delito é uma pessoa física. A PJ responde pelo fato de modo indireto.

Quanto às PJs de direito público, existe controvérsia: 1ª corrente (Paulo Afonso Leme
Machado): é possível a responsabilização penal; 2ª corrente: não é possível, pois as PJs de
direito público são distintas das PJs de direito privado, estando vinculadas à legalidade,
moralidade e probidade. Assim, um crime não pode ser praticado em benefício da PJ de
direito público, não se aplicando o art. 3º da Lei 9.605/98. Ademais, a aplicação de sanções
criminais às pessoas jurídicas de direito público pode implicar prejuízos à própria
coletividade (GARCIA; THOMÉ, p. 309). Além disso, não há como a conduta ser praticada
no seu interesse ou benefício.

Penas: De acordo com o art. 21 da Lei nº 9.605/98, as penas aplicáveis isolada, cumulativa
ou alternativamente às PJs são de (I) multa, (II) restritivas de direitos ou (III) prestação de
serviços à comunidade. OBS: Ao contrário do que se ocorre em relação às pessoas físicas,
as penas restritivas de direitos para PJs são originárias, e não substitutivas. Isso porque não
há possibilidade de pena privativa de liberdade, não se admitindo, por esse motivo, a
utilização de habeas corpus para PJ (STJ, RHC 16762, DJ 01/02/2005), embora seja
possível o manejo de mandado de segurança para, p. ex., trancar a ação penal (STJ,
AGRMS 13533, j. em 23/06/2008). Duração: A duração das penas aplicáveis à PJ, na
omissão da lei, é limitada à duração da pena privativa de liberdade que seria aplicável às
pessoas físicas. Aliás, a pena imposta à PJ deve guardar proporcionalidade com aquela
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

aplicada ao seu dirigente pelos mesmos fatos (BALTAZAR JR., p. 678). Multa: A multa
não ganhou tratamento específico para a PJ, aplicando-se o art. 18 da Lei nº 9.605/98.
Como não é a única pena aplicável às PJs, sua prescrição não se dá em dois anos (art. 114,
I, do CP), mas sim no mesmo prazo da pena privativa de liberdade prevista em cada tipo
penal (art. 114, II, do CP). Restritivas de direitos: As penas restritivas de direitos (PRD) da
pessoa jurídica estão especificadas no art. 22 da Lei nº 9.605/98, e são distintas daquelas
aplicáveis às pessoas físicas (art. 8º). São elas: (I) a suspensão total ou parcial de atividades,
(II) a interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade e (III) a proibição de
contratar com o Poder Público, que pode ser de até 10 anos (para a pessoa física, essa
proibição tem prazo 5 anos para crimes dolosos e 3 anos para crimes culposos, cf. art. 10).
A duração máxima, no caso dos incisos I e II, corresponde ao prazo máximo da pena
privativa de liberdade. Prestação de serviços à comunidade pela PJ: Por fim, a prestação de
serviços à comunidade pela PJ está prevista no art. 23 da Lei 9.605/98, abrangendo (I)
custeio de programas e de projetos ambientais; (II) execução de obras de recuperação de
áreas degradadas; (III) manutenção de espaços públicos; (IV) contribuições a entidades
ambientais ou culturais públicas. Liquidação forçada da PJ: O art. 24 da Lei 9.605/98 ainda
prevê a possibilidade de decretação da liquidação forçada da PJ constituída ou utilizada
preponderantemente para a prática de crimes ambientais, hipótese na qual seu patrimônio
será considerado instrumento do crime e como tal perdido em favor do Fundo Penitenciário
Nacional. A doutrina afirma que, se a liquidação forçada pressupõe a prática de crime, ela
só pode ser aplicada como efeito de sentença penal condenatória transitada em julgado,
devidamente fundamentada (BALTAZAR JR., p. 679). Ademais, é necessário que tenha
pedido expresso da condenação para aplicar a liquidação forçada, a qual pode ser objeto de
ação própria no juízo cível proposta pelo MP.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

16.b. Crimes contra a ordem econômica e contra as relações de


consumo.
Principais obras consultadas: Santo Graal 27º. PRADO, Luiz Régis. Direito Penal
Econômico, 4ª ed. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2011; BALTAZAR JUNIOR, José
Paulo. Crimes Federais, 8ª ed. Porto Alegre:Livraria do Advogado, 2012. Ricardo Antônio
Andreucci. Legislação Penal Especial. 8ª Edição. Ed. Saraiva.

Legislação básica: CRFB, art. 173, §4º; Lei nº 8.137/90; Lei nº 8.176/91; Lei nº 1.521/51;
CDC (Lei nº 8.078/90, arts. 63 a 74).

A Lei nº 8.137/90 trata dos crimes contra a ordem tributária (arts. 1º à 3º), econômica e as
relações de consumo (arts. 4º à 7º).

A pena de detenção ou reclusão dos crimes contra a ordem econômica e as relações de


consumo prevista na Lei 8.137/90 pode ser convertida em multa, nos termos do art. 9º,
independentemente da quantidade de pena aplicada.

A Lei nº 12.529/2011, que versa sobre o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência,


dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica, alterou
dispositivos da Lei nº 8.137/90. A novel legislação entrou em vigor em 02.12.2011. Foram
revogados os arts. 5º e 6º da 8.137/90, e alterada a redação do art. 4º, que passou a
contemplar, de modo mais aberto, todos os delitos antes discriminados, com a redação
genérica: “constitui crime contra a ordem econômica: I – abusar do poder econômico,
dominando o mercado ou eliminando, total ou parcialmente, a concorrência mediante
qualquer forma de ajuste ou acordo de empresas.” Assim, a lei deixa de prever condutas
específicas de Crimes contra a Ordem Econômica e passa a ter uma figura típica mais
aberta, ampla, aduzindo a respeito de qualquer forma de ajuste ou acordo de empresas.

A Lei nº 1.521/51 versa sobre os chamados Crimes contra a Economia Popular, sendo que
diversos tipos penais passaram a constar da Lei nº 8.137/90, tendo sido revogadas
tacitamente algumas disposições da Lei nº 1.521/51.

Para Baltazar, atualmente, o direito penal tributário é composto pelos seguintes delitos:

Crime tributário aduaneiro: tem por Descaminho (334, CP)


objeto tributos externos, decorrentes de
exportaçaã o ou importaçaã o.

Sonegação (condutas fraudulentas) 8137/90, art. 1 (sonegaçaã o fiscal).


8137/90, art. 2, I, III, IV, V (Correlatos).
CP, 337-A (Sonegaçaã o de contribuiçaã o
previdenciaá ria).

Apropriação indébita (consiste na 8137/90, art. 2, II (Apropriaçaã o indeá bita

443
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

omissaã o do repasse de tributo devido por tributaá ria).


terceiro, descontado ou cobrado) CP, 168-A (apropriaçaã o indeá bita previdenciaá ria).

Crimes funcionais (saã o crimes proá prios de 8137/90, art. 3 (extravio, sonegaçaã o ou
servidores puá blicos fazendaá rios ou inutilizaçaã o de documento corrupçaã o, concussaã o e
encarregados da repressaã o a delitos advocacia administrativa).
aduaneiros) CP, 316, §1º (Excesso de exaçaã o).
CP, 318 (Facilitaçaã o de contrabando ou
descaminho).

Falsidades (formas especíáficas de crimes CP, 293, I e V (Falsificaçaã o de papeá is puá blicos)
contra a feá puá blica).

Direito Penal Tributário: Enquanto o Direito Tributário Penal se ocupa das sanções e
infrações administrativas, o Direito Penal Tributário dos crimes contra a ordem tributária e
suas penas. Bem por isso, não tem a aplicação, no âmbito penal o art. 112 do CTN
(interpretação da lei tributária de modo mais favorável ao contribuinte).

Classificação: Espécie de crimes econômicos, ao lado dos crimes contra a econômica


popular (Lei 1521/51), contra o sistema financeiro nacional (Lei 7492/86), contra o
consumidor (Lei 8078/90) e as relações de consumo (Lei 8137, art. 7º) e a ordem
econômica (Lei 8137, arts. 4 ao 6 e Lei 8176/90).

Bem jurídico: Os bens jurídicos protegidos são a livre concorrência e a livre iniciativa,
contra atos que impliquem a dominação de mercado, a eliminação da concorrência e o
aumento arbitrário dos lucros (CRFB, art. 173, §4º); e os interesses sociais e econômicos do
consumidor.

Princípios: Dois princípios devem ser relembrados, tendo em vista a vasta legislação acerca
do mesmo tema: 1) Princípio da especialidade: a norma especial prevalece sobre a geral; 2)
Princípio do “ne bis in idem”: um mesmo fato não pode ser punido mais de uma vez.

Sonegação e Fraude:

O crime contra a ordem tributária, com exceção da apropriação indébita (art. 2, II)
pressupõe, além do inadimplemento, alguma forma de fraude, que poderá estar
consubstanciada na omissão de alguma declaração, na falsificação material ou ideológica
de documentos, no uso de documentos material ou ideologicamente falsos, na simulação
etc. Eis a distinção de inadimplemento e sonegação: a fraude.

Inadimplemento É a mera falta do pagamento do tributo


Elisão fiscal ou planejamento É a prática lícita que visa a evitar a ocorrência do fato
legal tributário gerador ou diminuir o valor dos tributos devidos, sema
utilização de fraude.
Sonegação fiscal ou evasão É a redução ou supressão do pagamento do tributo,

444
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

fiscal mediante emprego de fraude.

Crimes contra a Ordem Econômica (art. 4º da Lei nº 8.137/90 e Lei nº 8.176/91):

Sujeito ativo: basicamente, o empresário (excluído o empregado, pois este não tem poder
decisório e, por consequência, não pode ser responsabilizado pelas condutas tipificadas
como crime) e, no art. 2º da Lei nº 8.176/91, aquele que possua título autorizativo – ambas
as hipóteses são de crimes próprios. Apesar de não haver a menção expressa à figura do
empresário, as condutas tipificadas só podem ser exercidas no exercício da empresa (art.
966, CC). Responsabilidade penal da pessoa jurídica: conferir tópico adiante. Em relação
ao art. 1º da Lei nº 8.176/91, trata-se de crime comum. Sujeito passivo: empresários
concorrentes prejudicados e, em alguns casos, os consumidores. Em relação à Lei nº
8.176/91, são a União e as empresas autorizadas por lei a produzir bens ou explorar
matéria-prima a ela pertencentes. Programa de leniência: a Lei nº 12.529/2011 (Nova Lei
do CADE), entre outras coisas, revogou o art. 35-c da Lei nº 8.884/94 e o substituiu por um
programa de leniência que abrange não apenas os Crimes contra a Ordem Econômica (art.
87), mas também as infrações administrativas contra a Ordem Econômica (art. 86). Na
esfera criminal, o programa de leniência tem como principal consequência a extinção da
punibilidade do agente beneficiário, em caso de cumprimento. Durante o curso do
programa de leniência: (1) o prazo prescricional do Crime contra a Ordem Econômica
objeto do programa é suspenso; e (2) não se pode oferecer denúncia contra o agente
beneficiário.
Art. 87. Nos crimes contra a ordem econômica, tipificados na Lei nº 8.137, de 27 de
dezembro de 1990, e nos demais crimes diretamente relacionados à prática de cartel,
tais como os tipificados na Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, e os tipificados no
art. 288 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, a
celebração de acordo de leniência, nos termos desta Lei, determina a suspensão do
curso do prazo prescricional e impede o oferecimento da denúncia com relação ao
agente beneficiário da leniência.
Parágrafo único. Cumprido o acordo de leniência pelo agente, extingue-se
automaticamente a punibilidade dos crimes a que se refere o caput deste artigo.
Causas de aumento de pena de 1/3 até 1/2: ocasionar grave dano à coletividade; ser o crime
cometido por servidor público no exercício de suas funções; ser o crime praticado em
relação à prestação de serviços ou ao comércio de bens essenciais à vida ou à saúde (art.
12). Todos os crimes são de AÇÃO PENAL PÚBLICA (art. 15). CONFISSÃO
ESPONTÂNEA: redução de pena de 1/3 à 2/3 para o coautor ou partícipe que por meio de
confissão espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa (art.
16p.u.).

Lei 8.176/91 (Crimes contra a Ordem Econômica):

Noções gerais: Versa sobre os crimes contra a ORDEM ECONÔMICA, trazendo em seu
art. 1º delitos de uso irregular de combustíveis, e no art. 2º delitos contra o patrimônio na
445
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

exploração de matéria prima pertencente à União sem autorização para tanto. Objetividade
jurídica: política econômica do Estado relativa ao abastecimento nacional de petróleo,
combustíveis derivados, álcool, além do Sistema Nacional de Estoque de Combustíveis.
Sujeito ativo: proprietário, gerente ou diretor do estabelecimento no caso de aquisição dos
combustíveis em desacordo com normas legais (art. 1º, I); e qualquer pessoa no caso de uso
de gás liquefeito quando não autorizado. Sujeito passivo: a coletividade e, secundariamente,
a pessoa eventualmente lesada. Elemento subjetivo: dolo, não se pune a modalidade
culposa. Consumação: dá-se com a efetiva aquisição, distribuição, revenda e utilização (no
caso do inciso II). Não se admite tentativa. A ação penal é pública. A competência entende
o STF, é da justiça estadual, mas ANDREUCCI entende que é da justiça federal
(ANDREUCCI, p. 122). Sobre o tema, o Enunciado nº 38 da 2ª CCR: A persecução penal
da conduta ilícita de adquirir, distribuir e revender combustíveis em desacordo com as
normas estabelecidas no art. 1º, da Lei nº 8.176/91, não é da atribuição do Ministério
Público Federal, exceto quando houver interesse direto e específico da União, nos termos
do art. 109, IV da Constituição Federal. (Precedentes do STF) (001ª Sessão de
Coordenação, de 17.05.2010).

Lei 1.521/51 (Crimes contra a Economia Popular):

Noções gerais: a Lei nº 1.521/51 versa sobre os chamados CRIMES CONTRA A


ECONOMIA POPULAR, sendo que diversos tipos penais passaram a constar da Lei nº
8.137/90, tendo sido revogadas tacitamente algumas disposições da Lei nº 1.521/51. O
estudo dos crimes contra a economia popular integra o Direito Penal Econômico, que tutela
bens e interesses relacionados à política econômica estatal. Sujeito ativo: proprietário,
diretor ou gerente de estabelecimento industrial ou comercial (excluído o empregado, pois
este não tem poder decisório e, por consequência, não pode ser responsabilizado pelas
condutas tipificadas como crime). Sujeito passivo: a coletividade, que tem seus interesses
difusos lesados (mediata e eventualmente, atinge-se o indivíduo); Objeto material:
doutrinariamente falando, é o patrimônio do povo em geral (número indefinido de pessoas),
pois a economia popular é um bem coletivo sujeito a dano efetivo ou potencial causado
pelos gananciosos nas relações econômicas, os quais procuram auferir lucros exorbitantes e
desproporcionais à custa da coletividade. O objeto material é, conforme alguns Tribunais, a
“bolsa do consumidor” (daí a relação existente com a objetividade jurídica tutelada pelo
CDC). Inclui-se no objeto material a livre concorrência (art. 3º da Lei nº 1.521/51), eleita
pela Constituição Federal de 1988 como um dos princípios da ordem econômica (art. 170,
inciso IV), pois integra o patrimônio econômico da coletividade. Elemento subjetivo: dolo
(vontade consciente e livre) específico de auferir lucros indevidos em detrimento do povo
(obter vantagem ilícita através de fraude). Inexiste a modalidade culposa, mas a Lei nº
8.137/90 a prevê nas seguintes hipóteses: art. 7º, incisos II, III e IX. Tentativa:
inadmissível, pois os crimes de que ora se trata são, em sua maioria, formais. Entretanto,
algumas figuras penais admitem-na, a exemplo das seguintes: art. 3º, incisos I e II, da Lei
nº 1.521/51, bem como art. 4º, incisos I e II, da Lei nº 8.137/90. Penas: detenção e multa,
consoante a Lei nº 1.521/51.

Nessa espécie de crime se insere o pichardismo.


446
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Pichardismo é modalidade criminosa contra a economia popular com previsão legal no


artigo 2º da lei 1.521/51, a seguir:

Art. 2º: IX – obter ou tentar obter ganhos ilícitos em detrimento do povo ou de número
indeterminado de pessoas mediante especulações ou processos fraudulentos (“bola de
neve”, “cadeias”, “pichardismo” e quaisquer outros equivalentes);

ANDRÉ LUIZ PRIETO, sobre a origem da palavra, diz o seguinte “Pichardismo” é um


nome que deriva do autor do famoso “golpe”, o italiano Manuel Severo Pichardo, que
consiste na promessa fraudulenta, ao comprador, do fornecimento de determinada
mercadoria e, após algum tempo, restituir-lhe os valores pagos, em sistema de “corrente”.

O pichardismo é também conhecido como pirâmide, situação na qual a pessoa ludibriada


entrega determinado valor econômico com a pueril ilusão de devolução futura. O MPF
atuou contra essa conduta ilícita no caso do Avestruz Master.

Cabe salientar que a essencial diferença entre pichardismo e estelionato reside no número
de vítimas atingidas. Se o crime atingir um número indeterminado de pessoas estará
caracterizado o delito previsto na lei 1.521/51. Caso a vítima seja pessoa identificada, o
crime cometido será de estelionato. A simples tentativa de obter ganhos ilícitos em
detrimento de número indeterminado de pessoas já configura o crime de pichardismo.
Portanto, para que se dê a consumação do pichardismo não é necessário o recebimento da
vantagem, sendo esta, mero exaurimento do crime.

Crimes contra as Relações de Consumo (Lei nº 8.137/90, art. 7º):

Além da Lei nº 8.137/90, o CDC (Lei nº 8.078/90) também traz disposições penais nos arts.
61 a 80, elencando outras figuras típicas que constituem Crimes contra as Relações de
Consumo.

Sujeito ativo: basicamente, o fornecedor (crime próprio). Apesar de não haver a menção
expressa à figura do empresário, as condutas tipificadas só podem ser exercidas por pessoas
que estejam nas posições do art. 7º, I a IX do CDC. Em matéria penal, entretanto, não há
previsão da responsabilidade da pessoa jurídica. O art. 11 restringe o conceito de
fornecedor em determinadas circunstâncias, não alcançando o distribuidor e o revendedor.
Sujeito passivo: a coletividade de consumidores e, indiretamente, a pessoa física ou
jurídica. Elemento subjetivo: dolo em regra; no entanto, as condutas dos incisos II, III e IX
são puníveis a título de culpa, reduzindo-se 1/3 da PPL ou 1/5 da multa (art. 7º, p.u.).
admite-se a culpa excepcionalmente, como nos arts. 63, §2º, e 66, §2º. Natureza jurídica:
controverte a doutrina sobre ser de perigo abstrato ou concreto, controvérsia que tem
reflexo na necessidade ou não de perícia para comprovar a potencialidade lesiva do produto
vencido exposto, por exemplo. Programa de leniência: de acordo com a literalidade do art.
87 da Lei nº 12.529/2011 (Nova Lei do CADE), não é possível realizar programa de
leniência em relação aos Crimes contra as Relações de Consumo. Aliás, este é o
entendimento adotado pelo STJ em relação à extensão do revogado art. 35-C da Lei nº

447
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

8.884/94 (antiga Lei do CADE) – conferir: STJ, RHC 24.499/SP, Rel. Ministra MARIA
THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 20/09/2011, DJe
03/10/2011. Crimes em espécie: (i) substância avariada (art. 62) – foi vetado, mas seu teor
foi reproduzido no art. 7º, IX, da Lei 8.137/90 (vender, ter em depósito matéria-prima ou
mercadoria em condições impróprias para consumo), há também modalidade culposa; (ii)
omissão de dizeres ou sinais ostensivos sobre a nocividade ou periculosidade do produto
(art. 63) – há também modalidade culposa no §2º; (iii) omissão de comunicação de
nocividade ou periculosidade de produtos (art. 64) – somente dolo; (iv) execução de serviço
de alto grau de periculosidade (art. 65) – somente dolo e fora das determinações legais; (v)
propaganda enganosa (art. 66)– fazer informação falsa ou enganosa ou omitir informação
relevante (admite culpa); (vi) publicidade enganosa (art. 67) – fazer propaganda que sabe
ou deveria saber abusiva, pode ser por dolo direto ou eventual, difere-se do crime do art. 7º,
VII, da Lei 8.137/91 por ser crime de perigo abstrato, punindo-se a abusividade potencial,
já no crime da Lei 8.137/91 deve haver erro e prejuízo efetivos; (vii) publicidade capaz de
induzir o consumidor (art. 68) – publicidade apta a induzir o consumidor a praticar conduta
perigosa à saúde ou segurança (dolo direto e eventual); (viii) omissão na organização de
dados que dão base à publicidade (art. 69) – não organizar os dados que deram base à
publicidade; (ix) emprego de peças ou componentes de reposição usados (art. 70) – discute
a doutrina se é ou não crime de perigo abstrato; (x) cobrança vexatória (art. 71) – ameaçar,
coagir, constranger física ou moralmente, utilizar informações falsas ou incorretas para
cobrar dívida; (xi) impedimento de acesso às informações (art. 72); (xii) omissão da
correção de informações inexatas (art. 73) – pessoa responsável por banco de dados e
cadastro que deixa de corrigir informação correta (dolo direto e eventual); (xiii) omissão de
entrega de termo de garantia. Outros diplomas legais: ANDREUCCI afirma que também
são crimes contra às relações de consumo a apropriação indébita (art. 168 do CP) o
estelionato (art. 171 do CP) que ocorre com fornecedores que propõem entrega de bens ou
serviços, mas com a intenção inequívoca de ficar com o sinal ou princípio de pagamento.
Há também a fraude no comércio (art. 175 do CP), a defraudação da entrega da coisa (art.
171, §2º, IV, do CP) – reparador do produto que substitui peça nova por usada. No CP há
ainda o art. 268 (infração a medida sanitária preventiva) e o art. 272 (corrupção,
adulteração ou falsificação de substância alimentícia ou medicinal), quando no contexto de
relação de consumo. Já na Lei 8.137/90 há o art. 7º, II, que trata do crime de “vender
mercadoria cuja embalagem, tipo, especificação, peso ou composição esteja em desacordo
com as prescrições legais, ou que não corresponde à respectiva classificação final”.

OBS: Necessidade de perícia: Para a demonstração da materialidade do crime previsto no


art. 7º, IX, da Lei nº 8.137/1990, é imprescindível a realização de perícia para atestar se as
mercadorias apreendidas estavam em condições impróprias para o consumo. [STJ. 5ª
Turma. AgRg no Resp 1.111.736-RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em
17/12/2013].

Disposições comuns:

Conversão da PPL em pena de multa: A pena de detenção ou reclusão dos crimes contra
a ordem econômica e as relações de consumo prevista na Lei 8.137/90 pode ser convertida
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

em multa, nos termos do art. 9º, independentemente da quantidade de pena aplicada. Este
artigo prevê o valor das multas em BTN (Bônus do Tesouro Nacional). Se o juiz,
considerando o ganho ilícito e a situação econômica do réu, verifica a insuficiência ou a
excessiva onerosidade das penas pecuniárias previstas na Lei nº 8.137/90, pode diminuí-las
até a décima parte ou elevá-las ao décuplo (art. 10). Causas de aumento de pena: a lei prevê
hipóteses em que a pena será aumentada de 1/3 a metade, no caso de o crime ocasionar
grave dano à coletividade; ser o crime cometido por servidor público no exercício de suas
funções; ser o crime praticado em relação à prestação de serviços ou ao comércio de bens
essenciais à vida ou à saúde (art. 12). Confissão Espontânea: causa de redução de pena de
1/3 a 2/3 para o coautor ou partícipe que através de confissão espontânea revelar à
autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa (art. 16, parágrafo único). Cabe ao
intérprete fixar tal alcance no caso concreto, de acordo com a extensão da trama delituosa
revelada. Todos os crimes são de ação penal pública incondicionada (art. 15). Tentativa:
em regra, inadmissível, pois os crimes de que ora se trata são, em sua maioria, formais.
Entretanto, algumas figuras penais admitem-na, a exemplo das seguintes: art. 3º, incisos I e
II, da Lei nº 1.521/51, bem como art. 4º, incisos I e II, da Lei nº 8.137/90; Competência
para julgamento: da Justiça Federal para Crimes contra a Ordem Econômico-Financeira,
nos casos determinados por lei (CRFB/88, art. 109, VI). Ante a inexistência de previsão
legal de competência federal, será competente a Justiça Federal quando estes delitos forem
praticados em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, suas entidades
autárquicas ou empresas públicas federais (art. 109, IV, CF).

Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica: Não obstante o direito brasileiro ser de


raízes romano-germânicas, que negam a possibilidade de sociedade cometer delito penal,
ao contrário do direito anglo-saxão, que a admite, a CF/88 previu duas hipóteses de
responsabilização penal da pessoa jurídica: 1) Crimes ambientais: art. 225, §3º, CF/88,
regulamentado pela Lei nº 9.605/98 (art. 3º); 2) Crimes contra ordem econômica: o art. 173,
§4º, CF/88, aduz que a pessoa jurídica será responsabilizada pelos atos praticados contra a
ordem econômica e financeira e contra a economia popular, sujeitando-se a punições
compatíveis com sua natureza. Não houve regulamentação deste dispositivo constitucional
no sentido de atribuir responsabilidade penal à pessoa jurídica por crimes contra a ordem
econômica, entretanto, parte da doutrina defende esta possibilidade.

Jurisprudência selecionada:

“(...) CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE E DELITO CONTRA A ORDEM


ECONÔMICA. ART. 55 DA LEI N.º 9.605/98 E ART. 2.º, CAPUT, DA LEI N.º 8.176/91.
CONFLITO DE NORMAS. PROTEÇÃO A BENS JURÍDICOS DISTINTOS. (...) 1. Não
existe conflito aparente de normas entre o delito previsto no art. 55 da Lei n.º 9.605/98, que
objetiva proteger o meio ambiente, e o crime do art. 2.º, caput, da Lei n.º 8.176/91, que
defende a ordem econômica, pois tutelam bens jurídicos distintos, existindo, na verdade,
concurso formal. Precedentes. (...)” (STJ, AgRg no Ag 1409550/RO, Rel. Ministra
LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 22/11/2011, DJe 01/12/2011)
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

“(...) 2. O paciente está sendo acusado pela prática de crime contra a ordem econômica, por
ter supostamente, juntamente com outros denunciados, abusado do poder econômico
dominando o mercado de transporte rodoviário de veículos novos mediante ajuste ou
acordo. Esta Corte de Justiça possui entendimento no sentido de que os crimes contra a
ordem econômica, previstos na Lei nº 8.137/90, são, em regra, de competência da Justiça
Estadual, salvo se comprovada a efetiva lesão a bens, interesses ou serviços da União, a
teor do artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal. Na hipótese, o eventual monopólio
de empresas responsáveis pelo transporte interestadual de veículos novos, na verdade,
somente teria o condão de causar dano às montadoras e aos consumidores finais dos
automóveis, não se vislumbrando ofensa direta a interesses, serviços e bens da União.
Precedente da 3ª Seção. Fixação da competência da Justiça Estadual. (...)” (STJ, AgRg no
HC 166.909/RS, Rel. Ministro HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR
CONVOCADO DO TJ/CE), SEXTA TURMA, julgado em 19/05/2011, DJe 08/06/2011)

Realização de perícia para configuração do crime de venda de produto impróprio para


consumo – a jurisprudência do STJ (consolidando-se nas duas turmas) e do STF tem se
firmado no sentido da necessidade da realização do exame, tendo em vista que deve haver
perigo concreto para haver tipicidade material do crime de venda de matéria prima ou
mercadoria em condição imprópria para o consumo (assim, o crime não seria de perigo
abstrato):

“HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE


CONSUMO. ART. 7.º, INCISO IX, DA LEI N.º 8.137/90. INDICIAMENTO FORMAL
APÓS O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL
CONFIGURADO. MERCADORIA IMPRÓPRIA PARA CONSUMO. PERÍCIA.
NECESSIDADE PARA CONSTATAÇÃO DA NOCIVIDADE DO PRODUTO
APREENDIDO. ORDEM CONCEDIDA. 1. É consolidada a jurisprudência desta Corte no
sentido de que constitui constrangimento ilegal o indiciamento formal do acusado após
recebida a inicial acusatória. 2. Para caracterizar o elemento objetivo do crime previsto no
art. 7.º, inciso IX, da Lei n.º 8.137/90, referente a mercadoria "em condições impróprias ao
consumo", faz-se indispensável a demonstração inequívoca da potencialidade lesiva ao
consumidor final. 3. No caso, evidenciam os autos, mormente a sentença condenatória e o
acórdão que a confirmou, que não houve a realização de perícia para atestar a nocividade
dos produtos apreendidos. 4. Ordem concedida para anular o indiciamento formal do
Paciente e trancar a ação penal.” (STJ, HC 132257 / SP, Ministra LAURITA VAZ, T5,
julgado em 23/08/2011).

“AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA AS RELAÇÕES


DE CONSUMO. ART. 7º, INCISO IX, DA LEI Nº 8.137/1990. PRODUTO IMPRÓPRIO
PARA CONSUMO. PERÍCIA. NECESSIDADE PARA CONSTATAÇÃO DA
NOCIVIDADE DO PRODUTO APREENDIDO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTOS
IDÔNEOS A INFIRMAR A DECISÃO AGRAVADA. 1 - À míngua de argumentos idôneos
a infirmar a decisão agravada, mantenho-a por seus próprios fundamentos. 2 - Agravo
regimental a que se nega provimento.” (STJ, AgRg no REsp 1202213/RS, Ministro
HAROLDO RODRIGUES, T6, julgado em 19/05/2011).

450
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Houve decisão do STJ em 2011 de que não seria necessária a realização de perícia para
configurar o crime de venda de matéria prima ou mercadoria em condição imprópria para o
consumo, por se tratar de crime formal e de perigo abstrato (art. 7º, inciso XI, da Lei nº
8.137/90):

“CRIMINAL. RESP. FABRICAÇÃO E MANUTENÇÃO EM DEPÓSITO DE VINHO


PARA CONSUMO EM DESACORDO COM AS NORMAS REGULAMENTARES.
CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO. DESNECESSIDADE DE LAUDO
PERICIAL PARA A CONSTATAÇÃO DA IMPROPRIEDADE DA MERCADORIA.
DELITO DE PERIGO ABSTRATO. RECURSO PROVIDO. O tipo do inciso IX do art.
7.º, da Lei n.º 8.137/80 trata de crime formal, bastando, para sua concretização, que se
coloque em risco a saúde de eventual consumidor da mercadoria. Cuidando-se de crime
de perigo abstrato, desnecessária se faz a constatação, via laudo pericial, da
impropriedade do produto para consumo. Precedentes.(...)” (STJ, REsp 1163095/RS, Rel.
Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 09/11/2010, DJe 22/11/2010).

Mas o STF possui precedente no sentido de não obstante se tratar de crime formal, ser
necessária a realização de perícia para comprovar que a matéria prima ou mercadoria era
imprópria para o consumo:

“HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO.


FABRICAÇÃO E DEPÓSITO DE PRODUTO EM CONDIÇÕES IMPRÓPRIAS PARA
O CONSUMO. INCISO IX DO ART. 7º DA LEI 8.137/90, COMBINADO COM O
INCISO II DO § 6º DO ART. 18 DA LEI Nº 8.078/90. CONFIGURAÇÃO DO DELITO.
CRIME FORMAL. PRESCINDIBILIDADE DA COMPROVAÇÃO DA EFETIVA
NOCIVIDADE DO PRODUTO. REAJUSTAMENTO DE VOTO. NECESSIDADE DE
DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA DA IMPROPRIEDADE DO PRODUTO PARA
USO. (...) 2. São impróprios para consumo os produtos fabricados em desacordo com as
normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação. A criminalização da
conduta, todavia, está a exigir do titular da ação penal a comprovação da impropriedade
do produto para uso. Pelo que imprescindível, no caso, a realização de exame pericial
para aferir a nocividade dos produtos apreendidos. (...)” (STF, HC 90779, Relator(a):
Min. CARLOS BRITTO, Primeira Turma, julgado em 17/06/2008, DJe-202 DIVULG 23-
10-2008 PUBLIC 24-10-2008 EMENT VOL-02338-02 PP-00244).

STF, RHC 108822-GO, 2013: o tipo penal do artigo 3º, II, da Lei 8.137/90 descreve crime
de mão própria praticado por funcionário público, mas não exige que o servidor tenha
atribuição específica de lançamento tributário.

451
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

16.c. Crimes contra a paz pública e organizações criminosas

I – CRIMES CONTRA A PAZ PÚBLICA:

Obras consultadas: Santo Graal 27. Baltazar Júnior, José Paulo. Crimes Federais. 3ª ed.
rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008; Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado
de Direito Penal. Vol. 4. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009; Sanches, Rogério. Código Penal
para concursos. 5ª ed. 2012.

Legislação básica. Lei 12.850/13; Lei 12.694/12.

Considerações iniciais: Somente três crimes, ao contrário das legislações alienígenas,


integram o Título IX do Código Penal pátrio: incitação ao crime (art.286), apologia de
crime ou criminoso (art.287) e associação criminosa (art.288) e o crime de constituição de
milícia privada, tipificado no art. 288-A. O legislador de então teve em vista fatos que, na
sua ótica, atentariam contra a tranquilidade social, a paz coletiva e o sentimento de sossego,
que é indispensável a toda vida comunitária. Nos crimes insertos neste Título, não há
necessidade de uma perturbação efetiva da paz pública, no sentido material, sendo
suficiente que produza aquele sentimento generalizado de alarma, vindo a comprometer o
sentimento de paz e tranquilidade.

1. Incitação ao crime (art.286).

Objetividade jurídica: tutela a paz pública. Sujeito ativo: qualquer pessoa (crime comum).
Sujeito passivo: a coletividade, abalada na sua tranquilidade (crime vago) e,
secundariamente, o próprio Estado, que tem a obrigação de garantir a segurança e o bem-
estar de todos. Conduta: consubstancia-se em incitar (induzir, provocar, estimular, instigar),
publicamente, a prática de determinado crime. Neste ponto, conclui-se que (i) inexiste a
infração quando a incitação visar à prática de contravenção penal, ato apenas imoral ou
delito culposo. Se a pessoa é incitada ao suicídio, o instigador responderá pelo crime do
art.122; se estimulada a prostituir-se, haverá o crime do art.228 (favorecimento de
prostituição ou outra forma de exploração sexual); (ii) é imprescindível que a incitação seja
feita publicamente, atingindo número indeterminado de pessoas, podendo ocorrer das mais
diversas formas (crime de ação livre); (iii) não é bastante que o agente incite publicamente
a prática de delitos de forma genérica para que se configure o crime, devendo apontar fato
determinado, como, por exemplo, conclamar publicamente titulares de determinado direito
a fazer justiça com as próprias mãos, o que constitui crime de exercício arbitrário das
próprias razões. Ensina Hungria que o crime não se configura quando apenas se faz a
defesa de uma tese sobre a ilegitimidade ou sem-razão da incriminação de tal ou qual fato
452
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

(ex. o homicídio eutanásico). Não há, aqui, o animus instigandi delicti, mas apenas uma
opinião no sentido da exclusão do crime, de lege ferenda. Tipo subjetivo: é o dolo,
consistente na vontade consciente de incitar, publicamente, a prática de crime (fato
determinado), sabendo que se dirige a número indeterminado de pessoas. Consumação e
tentativa: a consumação ocorre com a incitação, independentemente da prática do crime
incitado (perigo abstrato). Vindo o instigado a praticar o crime, o instigador poderá (se
comprovado nexo causal) responder também por ele, em concurso material. De qualquer
sorte, é fundamental que a ação do agente se limite ao “estímulo”, sem a efetiva e direta
intervenção na deliberação concreta do agir do incitado, sob pena de aquele transformar-se
em verdadeiro partícipe do crime incitado. A tentativa é possível, desde que não se trate de
incitação oral.

2. Apologia de crime ou criminoso (art.287).

Objetividade jurídica: tutela-se a paz pública. Sujeito ativo: qualquer pessoa (crime
comum). Sujeito passivo: a coletividade (crime vago). Conduta: no delito anterior, a
instigação é explícita, enquanto neste, o induzimento é implícito, feito através de elogios,
exaltação a fatos criminosos ou a seus autores. Consiste a figura delituosa em fazer,
publicamente, apologia (elogio, exaltação) de fato criminoso ou de autor de crime. Afasta-
se o crime na hipótese de o agente se referir à contravenção ou ao contraventor. Apologia
de crime culposo não é punível, pois não pode haver instigação à prática de ato
involuntário. Referindo-se a lei à apologia a fato criminoso, entende parcela da doutrina
que o delito elogiado deve ser passado (se futuro, incitação ao crime). Hungria discorda:
para ele, pouco importa que o fato criminoso seja considerado in concreto ou in abstracto,
como episódio já ocorrido ou acontecimento futuro. É controvertida a necessidade de
existência de sentença condenatória irrecorrível contra o autor do crime elogiado. Tipo
subjetivo: é o dolo de fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime,
sabendo que se dirige a número indeterminado de pessoas. Consumação e tentativa:
consuma-se o crime com a apologia, independentemente da efetiva perturbação da ordem
pública (perigo abstrato). A tentativa é admissível.

Jurisprudência: recentemente, o STF afastou a tese de apologia ao crime nas denominadas


“Marcha da Maconha”, destacando que não há apologia ou incitação a fato criminoso, mas
sim a discussão a respeito da descriminalização desta conduta (liberdade de reunião e
expressão). Neste sentido, ver ADPF 187 (liberdades fundamentais e marcha da maconha –
inf. 631 STF) e ADI 4274 (inf. 649 STF). Art. 33, § 2º, da Lei 11.343/2006 e
criminalização da “Marcha da Maconha”: 1. O Plenário julgou procedente pedido
formulado em ação direta, ajuizada pela Procuradora-Geral da República em exercício, para
dar interpretação conforme a Constituição ao § 2º do artigo 33 da Lei 11.343/2006 [“Art.
33... § 2º Induzir, instigar ou auxiliar alguém ao uso indevido de droga. Pena - detenção de
1 (um) a 3 (três) anos, e multa de 100 (cem) a 300 (trezentos) dias-multa”], com o fim de
dele excluir qualquer significado que ensejasse a proibição de manifestações e debates
públicos acerca da descriminalização ou da legalização do uso de drogas ou de qualquer
substância que leve o ser humano ao entorpecimento episódico, ou então viciado, das suas
faculdades psicofísicas. No mérito, reiterou-se o que afirmado quando do julgamento da
453
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ADPF 187/DF (Informativo 631), em que assentado que essas manifestações


representariam a prática legítima do direito à livre expressão do pensamento, propiciada
pelo exercício do direito de reunião. ADI 4274/DF, rel. Min. Ayres Britto, 23.11.2011. Art.
33, § 2º, da Lei 11.343/2006 e criminalização da “Marcha da Maconha”: 2. O Min. Ayres
Britto, relator, enfatizou que as liberdades de pensamento, de expressão, de informação e de
comunicação fariam parte do rol de direitos individuais de matriz constitucional, tidos
como emanação direta do princípio da dignidade da pessoa humana e da cidadania.
Registrou que o direito de reunião seria insusceptível de censura prévia e poderia ser visto
como especial veículo da busca de informação para uma consciente tomada de posição
comunicacional. Salientou, por outro lado, que a única vedação constitucional,
relativamente a esse direito, diria respeito a convocação cuja base de inspiração revelasse
propósitos e métodos de violência física, armada ou beligerante. [...] Por sua vez, o Min.
Celso de Mello [...] asseverou que a defesa em espaços públicos da legalização das drogas
não caracterizaria ilícito penal — quer sob a égide do Código Penal, quer sob o que
estabelecido na regra em comento —, mas sim o exercício legítimo do direito à livre
manifestação do pensamento, sendo irrelevante, para o efeito de proteção constitucional, a
maior ou a menor receptividade social da proposta. ADI 4274/DF, rel. Min. Ayres Britto,
23.11.2011. (ADI-4274)

3. Associação criminosa (art.288).

[Atenção: era chamado de quadrilha ou bando antes da Lei 12.850/13]

Objetividade jurídica: tutela-se a paz pública. Sujeito ativo: qualquer pessoa. Trata-se de
crime coletivo, plurissubjetivo ou de concurso necessário, de condutas paralelas (umas
auxiliando as outras), estabelecendo o tipo incriminador a presença de, no mínimo, quatro
associados (computando-se inimputáveis e pessoas não identificadas). Sujeito passivo: a
coletividade. Conduta: pune-se a associação de três ou mais pessoas para o fim específico
de cometer uma série indeterminada de crimes. Elementos: (i) associação é a reunião de
pessoas para determinado fim. A vinculação deve ser sólida, quanto à estrutura, e durável,
quanto ao tempo, o que não significa perpetuidade; (ii) pluralidade de pessoas - é
indiferente a posição ocupada por cada associado na organização, se conhecem uns aos
outros ou se há ou não hierarquia (poder de mando); identificando-se o vínculo associativo
estável e permanente, haverá o crime (diferencia-se do concurso de pessoas, já que este é
eventual e direcionado para a prática de crime determinado); (iii) finalidade é a de praticar
uma série indeterminada de crimes (e não contravenções penais). Tipo subjetivo: é o dolo,
havendo um elemento subjetivo especial do injusto, que é a finalidade de cometer crimes,
sem a qual o delito não se configura. Consumação e tentativa: a consumação do delito se
verifica no momento em que aperfeiçoada a convergência de vontades entre três ou mais
pessoas. Para o agente que adere depois de formada a quadrilha, o momento a ser
considerado será o da adesão. Trata-se de crime autônomo (posição pacífica nos Tribunais
Superiores), razão pela qual a punição dos membros integrantes independe de condenação
pela prática de algum dos crimes pretendidos pelo bando. Trata-se de crime permanente,
cuja consumação se protrai no tempo. A retirada de um associado, deixando o grupo com
menos de 4 agentes, cessa a permanência, mas não interfere na existência do crime, já
454
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

consumado para todos (Hungria). A tentativa é inadmissível, pois os atos praticados com a
finalidade de formar a associação criminosa, anteriores à execução, são meramente
preparatórios.

Observações: as observações foram atualizadas considerando o novo nome do crime. OBS


1: o parágrafo único do dispositivo em análise prevê pena aumentada até a metade se a
associação é armada ou se houver a participação de criança ou adolescente. Não configura
bis in idem a condenação por associação criminosa armada (basta que um só de seus
integrantes esteja a portar armas – STF) e roubo majorado pelo emprego de armas, porque
além de configurarem delitos autônomos e distintos, no primeiro, o emprego de arma está
calcado no perigo abstrato e, no segundo, no perigo concreto (STJ). OBS 2: admite-se,
outrossim, o concurso material entre associação criminosa e um crime qualificado pela
presença do concurso de pessoas. OBS 3: Admite-se o concurso entre associação criminosa
armada e porte ilegal de arma. OBS 4: A extinção da punibilidade nos crimes tributários
pelo pagamento não afasta a punibilidade do crime de associação criminosa. OBS 5:
Tratando-se de crime permanente, há a cessação da associação criminosa por ocasião do
recebimento da denúncia (STJ - HC 123763) ou da prisão do réu, se antes do recebimento
(STJ - HC 91428).

3.1 Observações quanto às inovações legislativas:

1) O próprio nomen iuris foi alterado e passou a ser chamado de associação criminosa.

2) A quantidade mínima de participantes também foi alterada, sendo crime plurissubjetivo:


passou a exigir apenas três pessoas, sendo que na redação anterior clássica, exigia-se mais
de três (quatro).

3) A principal alteração, no entanto, ocorre no parágrafo primeiro do art. 288, que agrava a
pena prevista no caput. Vejamos. No texto revogado constava que “A pena aplica-se em
dobro, se a quadrilha ou bando é armado”; com a alteração, preceitua o texto novo que: “A
pena aumenta-se até a metade se a associação é armada ou se houver a participação de
criança ou adolescente”. Em análise, nota-se que a agravante que poderia gerar uma pena
máxima de até 6 (seis) anos (o dobro do máximo), agora só poderá originar pena máxima
de 4 anos e 6 meses (pena máxima mais metade), razão pela qual estamos diante de uma
norma penal in mellius, que retroagirá, portanto, para beneficiar os agentes que cometeram
tal delito com incidência da agravante de “uso de armas” antes da entrada em vigor da Lei
12.850/13. Entretanto, por outro lado, temos uma inovação normativa in pejus, no que se
refere à agravante de “participação de criança ou adolescente”, que não alcançará, portanto,
os fatos ocorridos antes de 19 de setembro de 2013.

3.2 Diferenciando de outros tipos:

Com a irrupção de um novo crime em nossa legislação, necessária se torna a reanálise do


ordenamento jurídico-penal pátrio, a fim de estabelecer os limites de aplicação da novatio
legis incriminadora, conforme, por evidente, a taxatividade penal imposta, mas também
tendo como parâmetro os outros delitos que vigoram no país, elucidando os eventuais
aparentes conflitos de normas. Nesse diapasão, destacam-se os fatos que possam compor,

455
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

por subsunção, os crimes de associação criminosa (novo art. 288 do CP – vide tópico 6),
associação para o tráfico (art. 35, Lei 11.343/06), associação para o genocídio (art. 2º, Lei
2.882/56) e constituição de milícia privada (art. 288-A, CP) em conflito, ilusório, com o
crime de organização criminosa do art. 2º da Lei 12.850/13.

Destarte, vejamos a análise caso a caso:

1) Associação Criminosa vs. Organização Criminosa: não se confundem. O primeiro requer


a participação de no mínimo 3 (três) pessoas, enquanto que neste o número mínimo de
integrantes deverá ser 4 (quatro). A finalidade da associação criminosa é especificamente
cometer crimes; enquanto que na organização criminosa o objetivo é obter, direta ou
indiretamente, vantagem de qualquer natureza, tendo como caminho a prática de infrações
penais graves. Com efeito, caso uma associação, visando obtenção de vantagem, composta
de quatro ou mais pessoas, pratique crimes que tenham pena máxima superior a 4 anos
cometerá o delito previsto na Lei 12.850; se, no entanto, faltar qualquer desses requisitos,
ou seja: se o crimes cometidos tiverem pena máxima igual ou inferior a quatro anos; se o
grupo for composto por menos de quatro sujeitos ou se o objetivo não for a obtenção de
vantagem, estaremos diante, em tese, de um crime de Associação Criminosa. Por fim,
válida a lembrança de que não basta para a caracterização da Organização Criminosa a
junção de um grupo criminoso, tendo este que ser estruturado e caracterizado pela divisão
interna de tarefas. Logo, o art. 288 do Código Penal é mais genérico e, portanto,
subsidiário.

2) Constituição de Milícia Privada vs. Organização Criminosa: não há maiores embaraços


aqui. Nesse contexto, bem explica o professor Adel El Tasse: “elemento de distinção
importante é a necessidade de observância, em relação à “Constituição de Milícia Privada”,
de que não é qualquer reunião de pessoas que dá margem a esta tipificação, mas apenas a
que atende ao dado específico de constituir-se numa reunião de pessoas que promova a
formação de organização paramilitar, milícia particular, grupo ou esquadrão”. Assim, como
a Constituição de Milícia Privada é especializada, age como requisito negativo para
configuração do crime de Organização Criminosa, isto é, para este restar configurado se faz
necessário que o grupo não tenha característica paramilitar; nem atue como milícia ou
esquadrão.

3) Associação para o Tráfico vs. Organização Criminosa: reside aqui, sob nossa ótica, uma
distinção que requer maior cautela para correta tipificação no caso prático. Essa análise
prudente detém como base a seguinte dicotomia: caso a organização criminosa pratique o
crime de tráfico de drogas, estaremos diante de uma associação para o tráfico (art. 35, Lei
11.343/06); se a organização criminosa, porém, pratica vários crimes, entre eles o de tráfico
de drogas, então entendemos que fica caracterizado o crime do art. 2º da Lei 12.850/13,
afastando-se a incidência da associação para o tráfico. Defendemos, assim, que não cabe
aqui o concurso de crimes, sob pena de bis in idem. Com efeito, temos uma pluralidade de
normas que engloba o mesmo conjunto de fatos, que protege o mesmo bem jurídico (paz
pública) e tem os mesmos sujeitos passivos (a coletividade), razão pela qual só haverá uma
norma incriminadora aplicável aos fatos. Resta saber como os Tribunais superiores se
posicionarão a respeito desta temática, porquanto, caso seja enquadrada a conduta como
organização criminosa, o agente terá restrições significativas, a saber: submissão aos meios
456
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

de prova da Lei 12.850; sujeição ao RDD (LEP, art. 52, §4º); realização do interrogatório
por videoconferência (CPP, art. 185, §2º, I); impossibilidade do tráfico privilegiado de
drogas (Lei 11343, art. 33, §4º). Por fim, imprescindível saber que a associação para o
tráfico requer, para sua caracterização, um número mínimo de duas pessoas; enquanto que a
organização criminosa necessita de quatro.

4) Associação para o Genocídio vs. Organização Criminosa: entendemos que se aplicam


aqui as mesmas regras expostas no tópico anterior.

4. Constituição de milícia privada (art. 288-A, CP):

Definir, com precisão, o conceito de milícia, não é tarefa fácil. Historicamente, voltando à
época do Império, os portugueses entendiam como “milícia” as chamadas tropas de
segunda linha, que exerciam uma reserva auxiliar ao Exército, considerado como de
primeira linha. Como a policia militar, durante muito tempo, foi considerada como uma
reserva do Exército, passou, em virtude disso, ser considerada como milícia.

No meio forense, não era incomum atribuir-se a denominação “milícia” quando se queria
fazer referência à Policia Militar. Assim, por exemplo, quando, na peça inicial de acusação
ou da lavratura do auto de prisão em flagrante, ou mesmo em qualquer manifestação escrita
nos autos, era comum referir-se aos policiais militares, que efetuaram a prisão, como
“milicianos”.

Nos dias de hoje, já não se pode mais utilizar essa denominação sem que, com ela, venha
uma forte carga pejorativa. Existe, na verdade, uma dificuldade na tradução do termo
“milícia”. Essa dificuldade foi externada, inclusive, no Relatório Final da Comissão
Parlamentar de Inquérito (Resolução nº 433/2008), da Assembleia Legislativa do Estado do
Rio de Janeiro, presidida pelo Deputado Marcelo Freixo, destinada a investigar a ação
dessas novas “milícias”, no âmbito daquele Estado.

Tal dificuldade de conceituação pode ser vislumbrada já no início do referido Relatório


(página 34), quando diz que: “Desde que grupos de agentes do Estado, utilizando-se de
métodos violentos passaram a dominar comunidades inteiras nas regiões mais carentes do
município do Rio, exercendo à margem da Lei o papel de polícia e juiz, o conceito de
milícia consagrado nos dicionários foi superado. A expressão milícias se incorporou ao
vocabulário da segurança pública no Estado do Rio e começou a ser usada frequentemente
por órgãos de imprensa quando as mesmas tiveram vertiginoso aumento, a partir de 2004.
Ficou ainda mais consolidado após os atentados ocorridos no final de dezembro de 2006,
tidos como uma ação de represália de facções de narcotraficantes à propagação de milícias
na cidade.

Embora de difícil tradução, pode-se, inicialmente, subdividir as milícias em públicas, isto é,


pertencentes, oficialmente, ao Poder Público, e privadas, vale dizer, criadas às margens do
aludido Poder.

457
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Dessa forma, as milícias podem ser consideradas, ainda, militares ou paramilitares.


Militares são as forças policiais pertencentes à Administração Pública, que envolvem não
somente as Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica), como também às forças
policiais (policia militar), que tenham uma função específica, determinada legalmente pelas
autoridades competentes. Paramilitares são associações não oficiais, cujos membros atuam
ilegalmente, com o emprego de armas, com estrutura semelhante à militar. Essas forças
paramilitares se utilizam das técnicas e táticas policiais oficiais por elas conhecidas, a fim
de executarem seus objetivos anteriormente planejados. Não é raro ocorrer e, na verdade,
acontece com frequência, que pessoas pertencentes a grupos paramilitares também façam
parte das forças militares oficiais do Estado, a exemplo de policiais militares, bombeiros,
agentes penitenciários, policiais civis e federais.

As milícias consideradas como criminosas, ou seja, que se encontram à margem da lei,


eram, inicialmente, formadas por policiais, ex-policiais e também por civis (entendidos aqui
aqueles que nunca fizeram parte de qualquer força policial).

Suas atividades, no começo, cingiam-se à proteção de comerciantes e moradores de uma


determinada região da cidade. Para tanto, cobravam pequenos valores individuais, que
serviam como renumeração aos serviços de segurança por elas prestados. Como as milícias
eram armadas, havia, normalmente, o confronto com traficantes, que eram expulsos dos
locais ocupados, como também os pequenos criminosos (normalmente pessoas que
costumavam praticar crimes contra o patrimônio).

A diferença fundamental, naquela oportunidade, entre a milícia e as forças policiais do


Estado era que os milicianos não somente expulsavam os traficantes de drogas, por
exemplo, mas também se mantinham no local, ocupando os espaços por eles anteriormente
dominados, ao contrário do que ocorria com as forças policiais que, após algum confronto
com criminosos da região, saiam daquela região, permitindo que a situação voltasse ao
status quo, ou seja, retornava ao domínio do grupo criminoso que ali imperava. Atualmente,
com a implementação das Unidades de Policia Pacificadora (UPP), como vem acontecendo
na cidade do Rio de Janeiro, a policia vem ocupando os espaços que, antes, ficavam sob a
custodia ilegal dos traficantes de drogas, que as mantinham sob o regime de terror.

Essa situação original da milícia a identificava como um grupo organizado, não


formalizado, ou seja, sem a regular constituição de empresa, voltado à prestação de serviço
de segurança em determinada região. Quando havia empresa constituída, esta era
puramente de fachada, ou seja, utilizada para dar uma aparência de legalidade aos serviços
de segurança prestados que, na verdade, eram impostos, mediante violência e ameaça, à
população.

Nesses locais é que se costumava ocorrer o chamado “bico” por parte dos integrantes das
forças policiais. O “bico” diz respeito a atividade remunerada do policial, quando deixa seu
turno de serviço, que é proibido em grande parte dos Estados da federação, e tolerado em
outros, permitindo que o policial consiga auferir um ganho alem do seu soldo ou
vencimentos, auxiliando nas suas despesas pessoais.

Normalmente, as milícias exercem uma vigilância da comunidade, através de pessoas

458
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

armadas que se revezam em turnos, impedindo, assim, a ação de outros grupos criminosos.

Com o passar do tempo, os membros integrantes das milícias despertaram para o fato de
que, além do serviço de segurança, podiam também auferir lucros com outros serviços, por
eles monopolizados, como aconteceu com os transportes realizados pelas “vans” e
motocicletas, com o fornecimento de gás, TV à cabo (vulgarmente conhecido como
“gatonet”), fornecimento ilegal de água, luz etc.

Passaram, outrossim, a exigir que os moradores de uma determinada região somente


adquirem seus produtos e serviços, através da imposição do regime de terror. A violência,
inicialmente voltada contra os traficantes e outros criminosos, passou a ser dirigida também
contra a população em geral, que se via compelida a aceitar o comando da milícia e suas
determinações. Para elas não havia concorrência, ou seja, ninguém, além dos integrantes da
milícia, podia explorar os serviços ou mesmo o comércio de bens por eles monopolizado.
Em caso de desobediência, eram julgados e imediatamente executados, sofrendo em seus
corpos a punição determinada pela milícia (normalmente lesões corporais ou mesmo a
morte).

Por sua vez, pode-se tomar como parâmetro, para efeitos de definição de milícia privada, as
lições do sociólogo Ignácio Cano, citado no Relatório Final da Comissão Parlamentar de
Inquérito da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (pág. 36), quando aponta
as seguintes características que lhe são peculiares: 1. controle de um território e da
população que nele habita por parte de um grupo armado irregular; 2. o caráter coativo
desse controle; 3. o ânimo de lucro individual como motivação central; 4. um discurso de
legitimação referido à proteção dos moradores e à instauração de uma ordem; 5. a
participação ativa e reconhecida dos agentes do Estado.

A Lei nº 12.720, de 27 de setembro de 2012 tipifica o delito de constituição de milícia


privada, inserindo o art. 288-A no Código Penal, dizendo, textualmente: Art. 288-A
Constituir, organizar, integrar, manter ou custear organização paramilitar, milícia particular,
grupo ou esquadrão com a finalidade de praticar qualquer dos crimes previstos neste
Código: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos.”

A nova Lei criou nova forma de associação criminosa, reunião estável e permanente de
pessoas com fim (criminoso) comum. Elegeu como núcleos: constituir (significa compor a
organização, o grupo criminoso); organizar (é encontrar a melhor maneira de agir);
integrar (é fazer parte); manter ou custear (significa sustentar, pagar o custo, não apenas
financeiramente, mas com o fornecimento de materiais, instrumentos bélicos etc). Não
importa o núcleo praticado, estamos diante de comportamentos cometidos por associados
(fundadores ou não) do grupo criminoso.

Chama a atenção o fato de o legislador ter enunciado grupos que, na prática, se confundem,
como acontece com o “grupo de extermínio” e “esquadrão”.

Paramilitares são associações civis, armadas e com estrutura semelhante à militar. Possui as
características de uma força militar, tem a estrutura e organização de uma tropa ou exercito,
sem sê-lo. Não se pode ignorar que o art. 24 da Lei 7.710/83 pune com 2 a 8 anos,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

constituir, integrar ou manter organização ilegal de tipo militar, de qualquer forma ou


natureza armada ou não, com ou sem fardamento, com finalidade combativa, sendo
imprescindível a motivação política do grupo.

Tipificando a nova associação apenas quando tiver como finalidade a prática de crimes
previstos no CP, não se cogita deste delito quando visar a prática de crimes estampados em
legislação extravagante, sob pena de analogia incriminadora.

A constituição de grupo criminoso já é suficiente para caracterizar o crime do art. 288-A do


CP, dispensando a prática de qualquer dos crimes visados pela associação, o qual,
ocorrendo, gera o concurso material de delitos. Assim, grupo de extermínio que promove
matanças, responde pelos crimes dos arts. 288-A e 121, § 6º, ambos do CP, em concurso
material, não se cogitando de bis in idem, pois são delitos autônomos e independentes,
protegendo, cada qual, bens jurídicos próprios. O mesmo raciocínio já é aplicado pelo STF
para não reconhecer bis in idem quando se está diante de quadrilha ou bando armado e
roubo majorado pelo emprego de arma.

Insta destacar que a Assembleia Geral das Nações Unidas, em dezembro de 1989, por meio
da resolução 44/162, aprovou os princípios e diretrizes para a prevenção, investigação e
repressão às execuções extralegais, arbitrárias e sumárias, anunciando: “Os governos
proibirão por lei todas as execuções extralegais, arbitrárias ou sumárias, e zelarão para que
todas essas execuções se tipifiquem como delitos em seu direito penal, e sejam
sancionáveis com penas adequadas que levem em conta a gravidade de tais delitos. Não
poderão ser invocadas, para justificar essas execuções, circunstâncias excepcionais, como
por exemplo, o estado de guerra ou o risco de guerra, a instabilidade política interna, nem
nenhuma outra emergência pública. Essas execuções não se efetuarão em nenhuma
circunstância, nem sequer em situações de conflito interno armado, abuso ou uso ilegal da
força por parte de um funcionário público ou de outra pessoa que atue em caráter oficial ou
de uma pessoa que promova a investigação, ou com o consentimento ou aquiescência
daquela, nem tampouco em situações nas quais a morte ocorra na prisão. Esta proibição
prevalecerá sobre os decretos promulgados pela autoridade executiva”.

Fonte: http://www.rogeriogreco.com.br/?p=2096

II – ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS.

Obras consultadas: Santo Graal 27º. BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Crimes Federais.
8ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. CASTILHO, Ela Wiecko Volkmer de.
Crimes antecedentes e lavagem de dinheiro. Revista Brasileira de Ciências criminais, n. 47,
p. 46-59, mar./abr. 2004. GOMES, Luiz Flávio. O conceito de organização criminosa é um
fantasma. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2011-mar-03/coluna-lfg-brasil-
conceito-organizacao-criminosa-fantasma; GOMES, Luiz Flávio. Que Se Entende por
Crime Organizado (Parte 1). Disponível em http://www.lfg.com.br - 2 de março de 2010.
GOMES, Luiz Flávio. Que se entende por crime organizado (Parte 2). Disponível em
http://www.lfg.com.br - 3 de março de 2010. GOMES, Rodrigo Carneiro. O Crime

460
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Organizado na Visão da Convenção de Palermo. 2ª ed, Belo Horizonte: Del Rey, 2009.
GRUPO DE TRABALHO 1 DA 2ª CCR. Terrorismo e Investigação de Organizações
Criminosas, pág. 08. Brasília, 12 a 14 de dezembro de 2011. Disponível em:
http://2ccr.pgr.mpf.gov.br/docs_institucional/eventos/xi-encontro-nacional-2011/Grupo
%201%20-%20Terrorismo%20e%20Investigacao%20de%20Organizacoes%20Criminosas
%20.pdf)

Legislação básica. Lei 12.850/13; Lei 12.694/12; Lei 9.613/98; Lei 11.343/06, art. 33, § 4º;
Lei 2.889/56, art. 2º; Lei 7.170/83, art. 16; Convenção das Nações Unidas sobre o Crime
Organizado Transnacional (Convenção de Palermo); Convenção das Nações Unidas contra
a Corrupção (Convenção de Mérida).

Atenção meu grupo: O Santo Graal falava sobre o crime organizado, sua história, busca
por conceito e considerava apenas a Lei 12.694/12, a qual não tipifica organização
criminosa como um crime, mas como um meio de cometer crimes. Sendo assim, optei por
manter o texto original no início para que o histórico seja entendido [com as devidas
atualizações onde necessário, como o número de componentes para o crime de associação
criminosa, antigo quadrilha ou bando], sendo que mais à frente o crime de organização
criminosa tipificado no artigo 2º da Lei 12.850/13 será analisado.

Considerações iniciais: A questão do crime organizado se insere no campo do Direito


Penal, do Direito Processual penal e da Cooperação Jurídica Internacional em matéria
penal. No Direito Penal se insere a partir da discussão da existência ou não de tipificação
e/ou conceituação legal do fenômeno “organização criminosa” (e sua eventual remissão à
Convenção de Palermo que, dentre inúmeras de suas diretrizes e mandamentos, orienta a
elaboração de leis por parte dos países signatários, com destaque para a responsabilização
penal de pessoas jurídicas neste contexto), especialmente por sua implicação nos seguintes
casos: (1) crime antecedente praticado por organização criminosa para configuração do
crime de lavagem de capitais (Lei 9.613/98) [o que não existe mais como limitador pois a
lavagem de capitais pode ter qualquer infração penal como delito antecedente diante da
última alteração legislativa]; (2) um dos requisitos negativos para a aplicação de causa de
diminuição de pena aos que praticarem condutas de tráfico de drogas (Lei 11.343/06, art.
33, § 4º); (3) associação para o genocídio (Lei 2.889/56, art. 2º); (4) ou para crimes
políticos (Lei 7.170/83, art. 16).

No Direito Processual Penal se inseria a partir da Lei 12.850/13 (que revogou a lei
9.034/95) quanto em virtude da Convenção das Nações Unidas sobre o Crime Organizado
Transnacional (Convenção de Palermo, com vigor no Brasil a partir do Decreto
Presidencial n. 5.015 de 12 de março de 2004) que, dentre várias outras medidas (observa-
se que a Convenção já traz mandamentos de criminalização e persecução penal da
corrupção, ou seja, antes da assinatura, pelo Brasil, da Convenção de Mérida - Convenção
das Nações Unidas contra a Corrupção, em vigor no Brasil por intermédio do Decreto
Presidencial nº 5.687, de 31 de janeiro de 2006), trata da possibilidade de investigação e

461
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

treinamento conjuntos e técnicas especiais de investigação (como a ação controlada,


infiltração de agentes e vigilância eletrônica), bem como da instituição de unidades de
inteligência financeira com a finalidade de reunir informações sobre as atividades
criminosas.

No campo da Cooperação Jurídica Internacional, a Convenção de Palermo prevê a


assistência judiciária recíproca (na modalidade do auxílio direto) sobre várias medidas
(especialmente sobre provas, sua obtenção e compartilhamento), serve de base para
extradição, prevê a transferência de processos penais, o confisco e apreensão de bens e
instrumentos dos crimes, assim como recuperação e partilha de ativos entre os Estados
signatários (a partilha denomina-se asset sharing agreement – PROVA OBJETIVA DO 25º
CONCURSO), e programas de formação específicos entre os países signatários,
especialmente sobre as seguintes questões: métodos de combate ao crime organizado
transnacional por equipamentos de informática e redes de telecomunicações; técnicas de
controle de portos de zonas francas; rotas e técnicas utilizadas pelas pessoas suspeitas;
métodos utilizados para a proteção de vítimas e testemunhas; etc. (GOMES).

1. Escorço histórico:

Até pouco tempo não tínhamos, no Brasil, uma lei que definisse organização criminosa,
dificultando a aplicação dos meios operacionais para a prevenção e repressão de ações de
grupos estruturados para a prática de crimes, quando não estruturados em quadrilha ou
bando [que agora se chama associação criminosa].

A omissão legislativa incentivava parcela da doutrina a emprestar a definição dada pela


Convenção de Palermo (sobre criminalidade transnacional), assim redigida: “(…) grupo
estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente
com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na Convenção,
com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro
benefício material”.

Nessa esteira de raciocínio, a 5ª T do STJ, no HC 77.771-SP , entendeu viável a acusação


contra casal denunciado por lavagem de dinheiro, tendo como delito antecedente a
organização criminosa:

“HABEAS CORPUS. LAVAGEM DE DINHEIRO. INCISO VII DO ART. 1.º


DA LEI N.º9.613 /98. APLICABILIDADE. ORGANIZAÇAO CRIMINOSA.
CONVENÇAO DE PALERMO APROVADA PELO DECRETO
LEGISLATIVO N.º 231 , DE 29 DE MAIO DE 2003 E PROMULGADA
PELO DECRETO N.º 5.015 , DE 12 DE MARÇO DE 2004. AÇAO PENAL.
TRANCAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS
SUFICIENTES PARA A PERSECUÇAO PENAL.

1. Hipótese em que a denúncia descreve a existência de organização criminosa


que se valia da estrutura de entidade religiosa e empresas vinculadas, para

462
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

arrecadar vultosos valores, ludibriando fiéis mediante variadas fraudes –


mormente estelionatos -, desviando os numerários oferecidos para determinadas
finalidades ligadas à Igreja em proveito próprio e de terceiros, além de
pretensamente lucrar na condução das diversas empresas citadas, algumas por
meio de” testas-de-ferro “, desvirtuando suas atividades eminentemente
assistenciais, aplicando seguidos golpes.

2. Capitulação da conduta no inciso VII do art. 1.º da Lei n.º 9.613 /98, que não
requer nenhum crime antecedente específico para efeito da configuração do
crime de lavagem de dinheiro, bastando que seja praticado por organização
criminosa, sendo esta disciplinada no art. 1.º da Lei n.º 9.034 /95, com a
redação dada pela Lei n.º 10.217 /2001, c.c. o Decreto Legislativo n.º 231 , de
29 de maio de 2003, que ratificou a Convenção das Nações Unidas contra o
Crime Organizado Transnacional, promulgada pelo Decreto n.º 5.015 , de 12 de
março de 2004. Precedente”.

A decisão não escapou das críticas de importante setor da doutrina. Luiz Flávio Gomes, de
forma pioneira, logo anunciou três vícios estampados no citado acórdão: 1º) a definição de
crime organizado contida na Convenção de Palermo é muito ampla, genérica, e viola a
garantia da taxatividade (ou de certeza), que é uma das garantias emanadas do princípio da
legalidade; 2º) a definição dada vale para nossas relações com o direito internacional, não
com o direito interno; 3º) definições dadas pelas convenções ou tratados internacionais
jamais valem para reger nossas relações com o Direito penal interno em razão da exigência
do princípio da democracia (ou garantia da lex populi ), permanecendo atípica a conduta.

Essa lição (crítica) foi acolhida recentemente pelo STF no HC 96.007-SP, oportunidade em
que o Min. Marco Aurélio definiu como atípica a conduta atribuída a quem comete crime
de lavagem de dinheiro, tendo como fundamento a hipótese prevista no artigo 1º, inciso VII
(organização criminosa), da Lei 9.613/98. De acordo com o voto do eminente Ministro, a
atipicidade decorre de inexistir no ordenamento jurídico definição do crime de organização
criminosa, que vem apenas definido na Convenção de Palermo de 2000, introduzida no
Brasil “por meio de simples Decreto”.

Agora, com o advento da Lei 12.694/12, o legislador, finalmente, definiu organização


criminosa para o Direito Penal interno, anunciando no seu art. 2º:

2. Conceito de organização criminosa:

[Advertência: muita atenção nesse ponto, pois não há resposta tendo em vista o aparente
conflito entre leis. Vamos ter que esperar a jurisprudência se posicionar se houve ou não
revogação tácita. Veja abaixo a discussão.]

A Convenção de Palermo, em seu art. 2º, “a”, considera organização criminosa como grupo
estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente
com o fim de cometer infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício


material.

Antes da Lei 12.694/12, havia uma corrente doutrinada (LFG) afirmando que tratados e
convenções não podem servir de fonte do Direito penal incriminador, ao fundamento de
que restaria violada a dimensão democrática do princípio da legalidade, pois no processo de
incorporação destes documentos internacionais o que resulta aprovado pelo Parlamento
brasileiro, por decreto legislativo, não é fruto ou expressão das discussões parlamentares,
que não contam com poderes para alterar o conteúdo do que foi celebrado pelo Presidente
da República. No entanto, este não era a posição da 2ª CCR/MPF, veja-se: “é
equivocada a interpretação sobre a necessidade de um conceito legal e de tipificação
criminal de organização criminosa”, pois “seu conceito já está internalizado pelo Decreto
5015/2004 (Convenção de Palermo)”, havendo a “necessidade de que a questão (em análise
no HC 96007) seja afetada ao Plenário do STF” (GRUPO DE TRABALHO 1 DA 2ª CCR.
Terrorismo e Investigação de Organizações Criminosas, pág. 08. Brasília, 12 a 14 de
dezembro de 2011: http://2ccr.pgr.mpf.gov.br/docs_institucional/eventos/xi-encontro-
nacional-2011/Grupo%201%20-%20Terrorismo%20e%20Investigacao%20de
%20Organizacoes%20 Criminosas%20.pdf).

Então, tínhamos a seguinte divergência: Posição do STF: não pode utilizar o conceito da
Convenção de Palermo [1ª Turma do STF (HC 96007/SP, rel. Min. Marco Aurélio, julgado
em 12.6.2012)]. Posição do STJ: entende que o conceito de organização criminosa já foi
integrado ao ordenamento jurídico brasileiro pela Convenção de Palermo (HC 171912,
11/2011, 5ª T; HC 129035, 08/2011, 6ª T).

Em tese, essa divergência quanto existir ou não o conceito de organização criminosa


deveria ser superada tendo em vista o disposto no artigo 2º, da Lei 12.694/12 de
24/07/2012. Porém, como a Lei 12.850/13, que também disciplinou o conceito de
organização criminosa, teremos, então, um aparente conflito positivo de conceitos,
vejamos:

O artigo 2º, da Lei 12.694/12 definiu organização criminosa nos seguintes termos:
considera-se organização criminosa, para os efeitos desta lei, a associação, de 03 ou mais
pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que
informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer
natureza, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 04 anos
ou que sejam de caráter transnacional.

PORÉM, a Lei 12.850/13, disciplinou no artigo 1º, §1º organização criminosa nos
seguintes termos: Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais
pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que
informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer
natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4
(quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional. [Além de definir o conceito, a Lei
12.850/13 também tipificou o crime de organização criminosa no artigo 2º, o que veremos à
frente].

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

E agora? É um conflito legislativo?

Diferenças entre os dois conceitos: a) a Lei nº 12.694/12 exige três ou mais pessoas para a
existência de uma organização criminosa, enquanto que a Lei nº 12.850/2013 exige quatro
ou mais; b) a Lei nº 12.694/12 considera organização criminosa aquela que pratica crimes
cuja pena máxima seja igual ou superior a quatro anos ou que sejam de caráter
transnacional. Já a Lei nº 12.850/13 considera organização criminosa aquela que pratica
infrações penais – e não somente crimes – cujas penas máximas sejam superiores a quatro
anos, ou que sejam de caráter transnacional.

Possíveis soluções para o aparente conflito: como o conflito de normas em Direito Penal é
apenas aparente, a doutrina esboça três possíveis soluções. Vejamos: 1ª) Conjugar a redação
de ambas as leis: nasceria uma Lex tertia, a qual combinaria o melhor de ambos
dispositivos. A solução, contudo, é inadequada por dois motivos. O primeiro deles, e mais
evidente, é a criação de uma terceira lei penal a partir da conjugação de duas outras. Ainda
que haja doutrina favorável, é certo que prevalece o entendimento que a combinação de leis
é impossível. É neste caminho que também trilha a jurisprudência. O segundo problema
consiste na indicação de qual combinação melhor se estrutura: aquela mais favorável ao réu
(em atenção à vedação da aplicação da novatio legis in pejus) ou o contrário (em benefício
de uma política criminal punitiva mais rigorosa). 2ª) Coexistência de ambos os conceitos no
ordenamento jurídico brasileiro: haveria um conceito de organização criminosa próprio
para o caso da Lei nº 12.694/12, isto é, aplicável somente para permitir o julgamento
colegiado em primeira instância e outro da Lei nº 12.850/13 para atender aos efeitos penais,
um conceito material. Neste diapasão, o conceito da Lei nº 12.694/12 seria meramente
processual, enquanto que o da Lei nº 12.850/13 seria material. O fundamento desta solução
está no fato de não ter havido revogação expressa do artigo 2º da Lei nº 12.694/12, da
maneira como manda o artigo 9º da Lei complementar nº 95/98. 3ª) Revogação tácita do
conceito presente na Lei nº 12.694/12 pela Lei nº 12.850/13 em franca aplicação do artigo
2º, parágrafo 1º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro: o conceito trazido
pela Lei nº 12.850/13 regula inteiramente a matéria da Lei nº 12.694/12 e, consoante visto
nas soluções apresentadas anteriormente, com esta se mostra incompatível. Assim, como
lex posterior derogat legi priori, prevalece o conteúdo da Lei nº 12.850/13. Conclusão: A
solução mais adequada pare ser a que defende a revogação tácita do conceito de
organização criminosa trazido pela Lei nº 12.694/12 pela regra da lex posterior derogat legi
priori. Infelizmente esta alternativa acaba por tornar o Estado brasileiro novamente
inadimplente com o compromisso firmado em Palermo, haja vista que no caso de
agrupamento de três pessoas e de crime de com pena máxima de quatro anos, a lei
brasileira não considera organização criminosa, ao contrário do tratado internacional. O
ideal seria uma revisão legislativa, alterando o conceito de organização criminosa para
aquele previsto na Lei nº 12.694/12, pois em conformidade com a Convenção de Palermo.
Enquanto isto não ocorre, acredita-se que os intérpretes devem se utilizar do conceito da
Lei nº 12.850/13 tanto para efeitos penais quanto para a formação do colegiado de juízes
em primeira instância.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

3. Características e requisitos:

[Atenção: acrescentei mais uma coluna à tabela e atualizei o texto com as diferenças para a
Lei 12.850/13, deixando as duas possibilidades interpretativas. Se até a nossa prova não
tiver um posicionamento do STJ ou STF teremos que ficar com o discurso nessa corda
bamba entre as leis].

Os autores divergem sobre quais são as características da organização criminosa. O maior


especialista no Brasil em crime organizado, o Juiz Federal José Paulo Baltazar Júnior,
afirma que existem características essenciais (sempre presentes) e outras que seriam
acidentais (como a transnacionalidade), ou seja, que poderiam ou não estar identificadas, a
depender do modelo de organização criminosa.

Características Art. 2º da Lei 12.694/12 Art. 1º, §1º da Lei 12.850/13


a) pluralidade de agentes “3 ou mais pessoas”. “4 ou mais pessoas”.
(concurso necessário).
b) estabilidade ou “associação” / “mediante a “associação” / “mediante a
permanência (pretensão de prática de crimes”. prática de infrações penais”.
praticar série indeterminada
de crimes).
c) organização (estrutura “estruturalmente ordenada”. “estruturalmente ordenada”.
empresarial)
d) divisão de tarefas (divisão “caracterizada pela divisão “caracterizada pela divisão
de atribuições próprias para de tarefas, ainda que de tarefas, ainda que
membros diferentes da informalmente”. informalmente”.
organização).
e) finalidade de lucro ou de “com objetivo de obter, “com objetivo de obter,
outras vantagens não direta ou indiretamente, direta ou indiretamente,
econômicas. vantagem de qualquer vantagem de qualquer
natureza”. natureza”.
f) restrito a crimes “crimes cuja pena máxima “infrações penais cujas
abstratamente mais graves seja igual ou superior a 04 penas máximas sejam
ou de caráter transnacional. anos ou que sejam de caráter superiores a 4 (quatro) anos,
transnacional”. ou que sejam de caráter
transnacional”.
Tradicionalmente, afirma-se que a organização criminosa possui como uma de suas
características a finalidade lucrativa. A Lei n. 12.694/2012 foi além e afirmou que a
organização criminosa pode ser caracterizada mesmo que a prática dos crimes não tenha
por finalidade o lucro. Assim, pela definição legal, a organização criminosa pode ter outras

466
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

finalidades que não apenas econômicas, como por exemplo, sexuais, segregacionistas,
religiosas, políticas, entre outras.

Outras características doutrinárias, apresentadas antes da Lei 12.694/12: (1) Hierarquia:


(STJ, HC 16334 de 2001) presente de modo menos marcante nas chamadas “redes
criminosas”, e mais intensas nas organizações de modelo empresarial; (2) Disciplina: já foi
reconhecida pela jurisprudência (STJ, HC 16334 de 2001), mas não é traço essencial de
toda e qualquer organização; (3) Conexão com o Estado: um dos principais traços
definidores da criminalidade organizada, seja mediante corrupção de servidores públicos
encarregados da repressão da criminalidade (STJ, HC 75459 de 2007 e HC 76114 de 2007),
seja mediante prática de “clientelismo”, consistente na relação de reciprocidade entre os
mencionados servidores e os grupos criminosos organizados em que ambas as partes se
favorecem, seja mediante violência contra tais servidores (Segundo BALTAZAR, é no
clientelismo que reside a principal diferença entre organizações criminosas e grupos
terroristas, pois enquanto estes últimos pretendem a tomada do poder ou a substituição do
grupo governante, as organizações criminosas valem-se dos contatos com o Estado para a
obtenção de lucros); (4) Violência: emprego de métodos violentos dirigidos ora contra os
próprios membros do grupo para manter a disciplina, hierarquia e o silêncio, ora quanto a
testemunhas e agentes públicos em geral (STJ, HC 45949 de 2007); (5) Entrelaçamento ou
Relações de Rede com outras Organizações: substituição do modelo ou paradigma
mafioso, da organização monopolística e fortemente hierarquizada, pela ideia de
cooperação e relações mais ou menos frouxas entre vários grupos criminosos conforme
suas necessidades, formando-se vínculos horizontais e não verticais entre os indivíduos e os
grupos (facilitado pelas modernas técnicas de comunicação), podendo ocorrer o
entrelaçamento (ou formação do “novo” modelo de “rede criminosa”) tanto em função da
especialização dos grupos ou indivíduos em tarefas determinadas, quanto no
aproveitamento de habilidades, rotas e contatos para mais de uma forma de atividade
criminosa; (6) Flexibilidade e Mobilidade dos Agentes: consiste na enorme capacidade do
crime organizado para adequar-se às relações sociais modernas (em especial, ao processo
de globalização), sobretudo no âmbito econômico-empresarial; (7) Mercado Ilícito ou
Exploração Ilícita de Mercados Lícitos: é típico das organizações criminosas a atuação no
mercado de produtos ou serviços proibidos (e portanto ilícito) com alto grau de demanda
social, tais como drogas, armas, prostituição e jogos de azar, porém, alternativamente,
também há a exploração ilícita de mercados lícitos, em condições mais vantajosas ou em
concorrência desleal com o comércio regular, exp.: descaminho e contrabando de cigarros,
produtos de informática, eletrônicos, etc.; (8) Monopólio ou Cartel: consiste na imposição
de um monopólio ou a divisão do mercado entre certos setores do ilícito, característica esta
que tem sido questionada tem em vista a evolução acima apontada do modelo mafioso para
o modelo de rede das organizações criminosas; (9) Controle Territorial: consiste no
estabelecimento de um controle territorial de longo prazo de modo que as organizações
possam se apresentar como realidades sociais de poder estável, capazes não apenas de criar
redes de colaboração com autoridades legítimas e instituições oficiais, mas também de
exercer pressão sobre elas. É típica das organizações mafiosas no sul da Itália, e que no
cenário brasileiro se apresentam nos casos do jogo do bicho e do tráfico de drogas nas
favelas do Rio de Janeiro, prática na qual os “donos” da boca mantém o monopólio das
vendas em regiões marcadas pela pobreza e segregação social, realizando benfeitorias para

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

a população local (bicas d’água, campos de futebol, etc.), passando a ser considerados por
esta como benfeitores. Estes territórios são chamados zonas liberadas, onde a polícia não
entra, ou então onde a população tem obrigações para com o chefão local; (10) Uso de
Meios Tecnológicos Sofisticados; (11) Transnacionalidade ou Internacionalidade: não se
trata de característica essencial, podendo ser pensada, do ponto de vista da criação de um
tipo penal, nas construção de um tipo penal agravado. Guarda relação com a facilitação ou
barateamento do transporte de bens e pessoas, assim como de comunicações, com a
abertura de fronteiras e intensificação do comércio internacional no processo de
globalização. Fenômeno comum especialmente em relação a mercados nos quais os países
produtores ou fornecedores (geralmente periféricos onde a persecução penal é menos
eficiente) não são os maiores centros consumidores dos produtos, como é o caso do tráfico
de drogas, armas, animais e pessoas (neste último caso, seja no fornecimento de mão de
obra ilegal, ingresso ilegal de emigrantes ou ainda tráfico de mulheres e crianças); (12)
Embaraço do Curso Processual: consiste no sistemático emprego de meios para evitar ou
dificultar a produção de provas, seja de forma antecipada pela imposição da lei do silêncio
(como fundamento para decretação de prisão preventiva - STF, HC 85964 de 2005), seja no
curso do processo, com ofertas de cooptação, pressão, violência efetiva ou disposição para
o uso de violência contra testemunhas, peritos e agentes públicos da persecução penal em
geral (STJ, HC 30048 de 2003); (13) Compartimentalização: ligada à hierarquia, consiste
na criação de uma cadeia de comando, de modo que o executor dos atos criminosos não
recebe as ordens diretamente do líder da organização criminosa, que se protege ao não
praticar os delitos com suas próprias mãos. Aliada à imposição da lei do silêncio e a uma
eventual violência contra um dos elos da cadeia, constrói-se em sistema criminoso eficiente
semelhante à criação da estrutura de células estanques adotadas por grupos terroristas.
[OBS: o texto foi mantido como estava, fique atento para as duas diferenças trazidas pela
12.850/13: nº de pessoas e infração penal].

4. Convenção de Palermo X Lei 12.694/12 X Lei 12.850/13:

Convenção de Palermo Lei 12.694/12 Lei 12.850/13


Grupo estruturado de três ou Associação de 3 ou mais Associação de 4 ou mais
mais pessoas. pessoas. pessoas.
Existente há algum tempo e Estruturalmente ordenada e Estruturalmente ordenada e
atuando concertadamente. caracterizada pela divisão de caracterizada pela divisão de
tarefas, ainda que tarefas, ainda que
informalmente. informalmente.
Com a intenção de obter, Com objetivo de obter, Com objetivo de obter,
direta ou indiretamente, um direta ou indiretamente, direta ou indiretamente,
benefício econômico ou vantagem de qualquer vantagem de qualquer
outro benefício material. natureza. natureza.
Com o propósito de cometer Mediante a prática de crimes Mediante a prática de
uma ou mais infrações cuja pena máxima seja igual infrações penais cujas penas
graves ou enunciadas na ou superior a 04 anos ou que máximas sejam superiores a
Convenção. sejam de caráter 4 (quatro) anos, ou que

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

transnacional. sejam de caráter


transnacional.
Do exposto, extraímos os seguintes requisitos: 1) É imprescindível a reunião sólida (quanto
a estrutura) de um número plural de pessoas 2) A caracterização da organização criminosa
depende da existência de hierarquia e divisão de funções. 3) A finalidade da organização
deve ser a obtenção de vantagem (não necessariamente econômica). 4) Percebe-se que, no
Brasil, a organização criminosa não precisa ter, obrigatoriamente, caráter transnacional. Se
nacional, depende da prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4 anos; se
transnacional, essa restrição objetiva desaparece.

5. Jurisprudência: 07/02/2013 – DECISÃO: Sexta Turma do STJ aplica conceito de


organização criminosa definido no julgamento do mensalão. No caso analisado, a
defesa de um acusado pedia o reconhecimento de que, por não haver organização
criminosa, não haveria crime antecedente ao crime de lavagem de dinheiro, o que não
justificaria a ação penal. A Turma entendeu que não há necessidade da descrição específica
do crime antecedente ao de lavagem quando os recursos financeiros foram obtidos por
organização criminosa. Os ministros levaram em consideração precedente do próprio STJ,
segundo o qual “a participação no crime antecedente não é indispensável à adequação da
conduta de quem lava valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime (APn 458).
Os ministros ressaltaram que “organização criminosa” não é tipo penal, mas sujeito ativo.
O artigo 1º da Lei 9.613/98 não se refere a um “crime de organização criminosa” como
antecedente do crime de lavagem de ativos. O referido dispositivo se refere a um crime
praticado por uma organização criminosa. Durante a análise do caso, foi citado esse
conceito de organização criminosa adotado pelo STF no julgamento da APn 470. O
julgamento do “mensalão” firmou a posição do STF quanto ao tema. O Tribunal discutia
sobre a inexistência de definição, no ordenamento jurídico brasileiro, do termo
“organização criminosa”, o que implicaria reconhecimento da ilegalidade quanto à
imputação pelo crime de lavagem, que possui como pressuposto a participação em
organização criminosa.

6. Crime de Organização criminosa (Análise da Lei nº 12.850/2013):

Introdução: A Lei nº 12.850, de 2 de agosto de 2013 dispôs sobre a organização criminosa.


Além de introduzir a desejada tipificação do crime de organização criminosa em seu art.
2º, cuidou no capítulo II, da investigação e dos meios de obtenção da prova, incluindo a
colaboração premiada, a ação controlada, a infiltração de agentes, o acesso a registros pelo
Delegado de Polícia e pelo Ministério Público, além de tipificar delitos que ocorram
durante a investigação e a obtenção de prova.

Tipo legal: O crime de organização criminosa está tipificado no art. 2º da Lei nº


12.850/2013: “Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta
pessoa, organização criminosa. Pena – reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem

469
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais praticadas.”

A Lei 12.850/13, disciplinou no art. 1º, §1º o conceito de organização criminosa nos
seguintes termos: Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais
pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que
informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer
natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4
(quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.

Quase um ano depois da instituição do anterior delito de "constituição de milícia" (Lei nº


12.720, de 27 de setembro de 2012), surge o crime de organização criminosa, reclamado
pela doutrina em razão do vácuo criado pela Lei nº 9.034/95, expressamente revogada pelo
art. 27 desta lei. Quanto à pena, não foi feliz o legislador porquanto sabedor da aplicação da
aplicação da "pena no mínimo legal", acabou por diminuir de quatro para três anos em
confronto com o delito do art. 288-A do CP. Poderia ter colocado no mínimo, uma pena de
quatro anos e um mês, obrigando à imposição do regime semiaberto e vedando a
substituição por pena restritiva de direitos.

Objetividade jurídica: A paz pública. O crime é formal e de perigo abstrato. Não exige a lei
que se evidencie o perigo, de forma a presumi-lo.

Sujeitos do delito: Sujeito ativo: qualquer pessoa. Trata-se de crime plurissubjetivo.


Segundo o art. 1º, § 1º da Lei, considera-se a associação de quatro ou mais pessoas. Sujeito
passivo: é a coletividade.

Tipo objetivo: O tipo penal é misto alternativo: existem várias condutas, mas praticando
mais de uma, responde por um só crime. A lei fala primeiro em “promover” que significa
impulsionar. Em segundo lugar, menciona o tipo o verbo “constituir” que significa
estruturar, formar, criar a essência. Não se confundem os dois termos. É possível não
participar da fundação da organização, mas promove-la posteriormente. O tipo penal
também fala em “integrar” a organização que consiste simplesmente em fazer parte da
organização. A "integração" pode ser através de atuação direta ou pessoal ou através de
interposta pessoal (o chamado "testa de ferro").

O objeto é a organização criminosa: associação estruturalmente ordenada e caracterizada


pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com o objetivo de obter, direta ou
indiretamente, vantagem de qualquer natureza (não necessariamente econômica, podendo
ser outra), mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a
quatro nãos, ou que sejam de caráter transnacional.

O conceito de estabilidade e permanência extraídos do art. 288 do CPP são levados em


conta, sendo exigidos na tipificação do delito. Assim, que promove a organização deve ser
punido se ficar caracterizada esta estabilidade e permanência. A vantagem desejada pode
ser a econômica ou não e o crime não pode ser de pequeno ou médio potencial ofensivo,
devendo ter a pena em abstrato superior a quatro anos (tráfico de drogas, furto qualificado,
roubo, homicídio doloso etc). Pode ainda de formal alternativa (ou), ser de caráter
transnacional, que envolva além do Brasil, um ou mais países. É exemplo a organização

470
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

criminosa que explore o narcotráfico Brasil-Bolívia-Colômbia. Tenha-se em conta que


deverá prevalecer quanto ao delito de tráfico de drogas, o crime de associação do art. 35 da
Lei de Drogas, exceto se houver esse caráter de transnacionalidade, quando prevalecerá o
crime de organização criminosa.

Tipo subjetivo: O dolo, consistente na vontade do agente criminoso em promover,


constituir, financiar ou integrar organização criminosa. Inclui ainda o elemento subjetivo do
tipo consistente em objetivar vantagem de qualquer natureza mediante a prática de
infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a quatro anos ou de caráter
transnacional. Trata-se nesse ponto, de norma penal em branco em sentido lado, sendo o
tipo penal complementando pela própria lei 12.850.

Os crimes objetivados podem ser da mesma espécie ou não. O tipo fala em “crimes”,
portanto, se a quadrilha objetivar cometer uma contravenção ou ilícito administrativo, o
fato é atípico (Cezar Roberto Bittencourt, Tratado de direito penal, parte especial, v. 4, p.
283). Também é atípica a conduta de objetivar praticar crimes culposos ou preterdolosos.

Consumação: Tratando-se de crime formal, consuma-se com a simples prática dos verbos
(“convergência de vontades”), não sendo necessário que se efetivem os crimes. A efetiva
associação deve ser demonstrada por elementos sensíveis, demonstrando a convergência de
vontades, tendo a esta associação estruturação ordenada e divisão de tarefas. Pode haver
também consumação naquele que ingressa em organização já formada.

No delito de “constituir”, o agente só responde portanto depois de algum tempo


juridicamente relevante. Se participou da constituição, mas a organização não se prolongou
minimamente, o fato é atípico eis que a tentativa não é punida. Responde nesse caso, se
participou da constituição, a organização se manteve, mas depois o agente deixa tal
organização. Isso porque o abandono posterior da organização não configura desistência
voluntária, porquanto o crime já estava consumado. Existe assim, uma necessidade de
dupla tipicidade. Basta a prática de um dos verbos, mas exige-se uma mínima consolidação
da organização criminosa. A tentativa não existe, vez que a lei tornou o ato preparatório
(não punível normalmente) em crime. Dessa forma, ou houve efetiva constituição por
exemplo da milícia privada, ou não se pune o delito.

É crime permanente nos verbos promover, constituir ou integrar, permitindo a prisão em


flagrante. No caso do verbo financiar, depende. Se houver continuidade no financiamento,
poder-se-á falar em permanência. Mas se houver um único aporte de capital, o crime será
instantâneo sobre uma organização com estabilidade e permanência.

Conduta equiparada: Incorre nas mesmas penas, aquele que impede ou embaraça a
investigação criminal, podendo ser sujeito ativo o policial que obsta essas investigações.

Causa de aumento: Arma de fogo (art. 2º, § 1º). As penas aumentam até 1/2 se na atuação
da organização criminosa houver emprego de arma de fogo. Nesse caso, basta que seja
apreendida uma arma de fogo, não sendo válido o simulacro de arma e nem arma branca.

Aumento de 1/6 a 2/3 (art. 2º, § 4º): I - participação de criança ou adolescente

471
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

(equiparando-se a verdadeira corrupção de menores, como ocorre no tráfico de drogas.


Todavia, sobre este prevalece o art. 35 da Lei de Drogas). II - concurso de funcionário:
nesse caso, deve a organização criminosa se valer dessa condição para a prática da infração.
Ex: furto a caixas eletrônicos, sendo as informações repassadas por policiais que ainda dão
cobertura à conduta criminosa. Nesse caso, a Corregedoria deverá instaurar inquérito e
comunicar ao MP para acompanhamento (art. 2º, § 7º). III - produto ou proveito da infração
destinar-se no todo ou em parte ao exterior. IV - se a organização criminosa mantém
conexão com outras organizações criminosas independentes. V - se as circunstâncias do
fato evidenciarem a transnacionalidade da organização. Nesse último item, nota-se um
verdadeiro “bi in idem”, já que o crime de organização criminosa na segunda forma, já
prevê a transnacionalidade como “elementar”.

Circunstância agravante: Exercício do comando, individual ou coletivo (art. 2º, § 2º). Nesse
trata-se de uma circunstância agravante pois o legislador não estipulou fração. Deve haver
punição para o autor que possui o "domínio do fato", que comanda um por um, os
integrante (comando individual) ou de forma genérica (comando coletivo). Sem a
necessidade de praticar atos de execução nos crimes objetivados pela organização, sendo
um partícipe destacado como verdadeiro autor.

6.1 Diferenciando alguns tipos:

Com a irrupção de um novo crime em nossa legislação, necessária se torna a reanálise do


ordenamento jurídico-penal pátrio, a fim de estabelecer os limites de aplicação da novatio
legis incriminadora, conforme, por evidente, a taxatividade penal imposta, mas também
tendo como parâmetro os outros delitos que vigoram no país, elucidando os eventuais
aparentes conflitos de normas.

Nesse diapasão, destacam-se os fatos que possam compor, por subsunção, os crimes de
associação criminosa (novo art. 288 do CP – vide tópico 6), associação para o tráfico (art.
35, Lei 11.343/06), associação para o genocídio (art. 2º, Lei 2.882/56) e constituição de
milícia privada (art. 288-A, CP) em conflito, ilusório, com o crime de organização
criminosa do art. 2º da Lei 12.850/13.

É importante ter em mente que organização criminosa é gênero, cujas espécies são
definidas em diversos preceitos devidamente contemplados no ordenamento pátrio.
Justamente esse é o entendimento do STF proferido em voto durante o julgamento do HC
108.715 em 24/09/2013, onde entendeu que o crime cometido por qualquer das espécies de
organização criminosa que conhecemos (Decreto nº 5.015/04, art. 288 do Código Penal, art.
35 da Lei nº 11.343/06 etc.) é apto a figurar como antecedente da lavagem de dinheiro, seja
qual for a sua natureza. [atente para o fato de que atualmente o crime de lavagem não exige
mais um rol taxativo de delitos antecedentes].

Destarte, vejamos a análise caso a caso:

1) Associação Criminosa vs. Organização Criminosa: não se confundem. O primeiro requer

472
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

a participação de no mínimo 3 (três) pessoas, enquanto que neste o número mínimo de


integrantes deverá ser 4 (quatro). A finalidade da associação criminosa é especificamente
cometer crimes, sendo dispensável o objetivo de lucro; enquanto que na organização
criminosa o objetivo é obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, tendo
como caminho a prática de infrações penais graves. Com efeito, caso uma associação,
visando obtenção de vantagem, composta de quatro ou mais pessoas, pratique crimes que
tenham pena máxima superior a 4 anos cometerá o delito previsto na Lei 12.850; se, no
entanto, faltar qualquer desses requisitos, ou seja: se o crimes cometidos tiverem pena
máxima igual ou inferior a quatro anos; se o grupo for composto por menos de quatro
sujeitos ou se o objetivo não for a obtenção de vantagem, estaremos diante, em tese, de um
crime de Associação Criminosa. Por fim, válida a lembrança de que não basta para a
caracterização da Organização Criminosa a junção de um grupo criminoso, tendo este que
ser estruturado e caracterizado pela divisão interna de tarefas, pois o crime de associação
criminosa dispensa a organização, sendo indiferente a posição ocupada por cada associado.
Logo, o art. 288 do Código Penal é mais genérico e, portanto, subsidiário.

OBS: Reunião de três pessoas, com hierarquia e divisão de tarefas, para praticar roubos, ao
praticar um crime (apenas), responderá por roubo majorado pelo concurso de agentes, na
forma de organização criminosa, sem implicar em associação criminosa.

2) Constituição de Milícia Privada vs. Organização Criminosa: não há maiores embaraços


aqui. Nesse contexto, o elemento de distinção importante é a necessidade de observância,
em relação à “Constituição de Milícia Privada”, de que não é qualquer reunião de pessoas
que dá margem a esta tipificação, mas apenas a que atende ao dado específico de constituir-
se numa reunião de pessoas que promova a formação de organização paramilitar, milícia
particular, grupo ou esquadrão. Assim, como a Constituição de Milícia Privada é
especializada, age como requisito negativo para configuração do crime de Organização
Criminosa, isto é, para este restar configurado se faz necessário que o grupo não tenha
característica paramilitar; nem atue como milícia ou esquadrão.

3) Associação para o Tráfico vs. Organização Criminosa: reside aqui, sob nossa ótica, uma
distinção que requer maior cautela para correta tipificação no caso prático. Essa análise
prudente detém como base a seguinte dicotomia: caso a organização criminosa pratique o
crime de tráfico de drogas, estaremos diante de uma associação para o tráfico (art. 35, Lei
11.343/06); se a organização criminosa, porém, pratica vários crimes, entre eles o de tráfico
de drogas, então entendemos que fica caracterizado o crime do art. 2º da Lei 12.850/13,
afastando-se a incidência da associação para o tráfico. Defendemos, assim, que não cabe
aqui o concurso de crimes, sob pena de bis in idem. Com efeito, temos uma pluralidade de
normas que engloba o mesmo conjunto de fatos, que protege o mesmo bem jurídico (paz
pública) e tem os mesmos sujeitos passivos (a coletividade), razão pela qual só haverá uma
norma incriminadora aplicável aos fatos. Resta saber como os Tribunais superiores se
posicionarão a respeito desta temática, porquanto, caso seja enquadrada a conduta como
organização criminosa, o agente terá restrições significativas, a saber: submissão aos meios
de prova da Lei 12.850; sujeição ao RDD (LEP, art. 52, §4º); realização do interrogatório
por videoconferência (CPP, art. 185, §2º, I); impossibilidade do tráfico privilegiado de
drogas (Lei 11343, art. 33, §4º). Por fim, imprescindível saber que a associação para o

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

tráfico requer, para sua caracterização, um número mínimo de duas pessoas; enquanto que a
organização criminosa necessita de quatro.

4) Associação para o Genocídio vs. Organização Criminosa: entendemos que se aplicam


aqui as mesmas regras expostas no tópico anterior.

6.2 Infiltração de agentes:

História e Conceito: Trata-se de instrumento investigativo com origem ligada ao período do


Absolutismo Francês e conhecido mundialmente como Undercover Operations. A
infiltração de agentes afigura-se como método de investigação em que membro da polícia
judiciária se infiltra na organização criminosa participando da trama organizativa,
utilizando-se de uma identidade falsa, concedida pelo Estado, e que possui como finalidade
detectar a comissão de delitos e informar sobre suas atividades às autoridades competentes.
Tudo isso com o escopo primordial de obter provas da prática de crimes e proceder à
detenção de seus autores. No Direito Comparado, a infiltração de agentes é meio
investigativo e de prova encontrado em quase todos os países do mundo, à exceção de
Luxemburgo, ainda que em alguns ordenamentos esta figura não esteja positivada. O
instituto emerge no Direito Brasileiro a partir da Lei 10.217/01, que alterou a atualmente
revogada e tão criticada Lei 9.034/95. No que concerne às críticas, uníssona doutrina
questionava a falta de regulamentação da infiltração de agentes, que, por via de
consequência, tornava inexequível a aplicação do instituto em termos práticos. Nesse
diapasão, como um avanço legislativo, eis que surge a Lei 12.850/2013, revogando a Lei
9.034/95 e regulamentando o procedimento da infiltração de agentes, de modo a tornar
palpável e exequível o procedimento que outrora era apenas uma falácia jurídica.

Conforme Marcelo Batlouni sustenta: “As vantagens que podem advir da infiltração de
agentes são de suma importância para a persecução penal, desvendando: fatos criminosos
não esclarecidos, modus operandi da organização, nome dos “cabeças”, “testas de ferro”,
bens, plano de execução do crime, agentes públicos envolvidos, nomes de empresas e
outros mecanismos utilizados para lavagem do dinheiro”. Destarte, o ordenamento jurídico
brasileiro passa a dispor de um mecanismo de grande efetividade probatória que auxiliará a
Polícia Judiciária e o Ministério Público a alcançar os fins coligidos pela norma
constitucional e processual penal.

A aplicação da medida de infiltração de agentes: A novel lei expõe que a investigação


através da infiltração de agentes deverá ser representada pelo Delegado de Polícia ou
requerida pelo Ministério Público, após manifestação técnica do Delegado de Polícia
quando solicitada no curso de inquérito policial, será precedida motivada e sigilosa
autorização judicial, que estabelecerá seus limites. Infere-se do texto que há uma nova
atribuição da autoridade policial, qual seja, de se manifestar quanto à infiltração de agentes.
Parece-nos que o legislador reconhece a autoridade policial como capacitada para emitir
parecer técnico e logístico a respeito da viabilidade da infiltração de agentes. Esta
manifestação prévia, inegavelmente, tem natureza jurídica de ato administrativo e, por
certo, não vincula a opinião do Ministério Público e nem mesmo do Juiz, possuindo caráter

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

meramente informativo para fins de ulterior decisão do parquet e do magistrado.

Convém notar que a Lei 12.850/13 compatibiliza-se com o entendimento sufragado pela
Súmula Vinculante 14, pois, segundo expressa previsão legal, o pedido e a autorização
judicial referente à infiltração de agentes serão sigilosos, de modo a garantir a higidez
probatória e a segurança do agente policial. Destarte, sob a inteligência da referida
jurisprudência constitucional, nem mesmo o advogado do suposto autor do delito poderá ter
acesso ao pedido ou autorização da infiltração de agentes, uma vez que o conhecimento da
diligência não só fulminaria a colheita probatória como também seria uma “sentença de
morte” ao policial infiltrado.

Ademais, a Lei 12.850/13 condiciona a infiltração de agentes à existência de indícios da


infração de Organização Criminosa, hoje crime autônomo, além de dispor que a medida
somente será admitida se a prova não puder ser produzida por outros meios disponíveis.
Nesse sentido, depreende-se que a infiltração de agentes, em razão do alto grau de
periculosidade proporcionado ao agente policial, bem como da incerteza do sucesso
probatório, deve ser aplicada como ultima ratio probatória, ou seja, somente aplicada se
demonstrado que os outros meios de prova são inviáveis à persecução penal, inclusive no
que tange à interceptação telefônica estatuída na Lei 9.296/96. A análise de necessidade da
medida deve ser pautada no Princípio Constitucional da Proporcionalidade, hipótese em
que será averiguado se o meio é adequado a atingir o fim pretendido (adequação); se o meio
é o menos gravoso para atingir determinado fim (necessidade); e se os benefícios
proporcionados por aquele meio superam os prejuízos acarretados através do meio adotado
(Proporcionalidade em sentido estrito).

Ato contínuo, é de bom alvitre ressaltar que a análise da proporcionalidade para fins de
adoção do procedimento de infiltração de agentes é trilateral, visto que o Juiz poderá fazê-
la quando do momento da autorização, o Ministério Público através da oitiva prévia e, a
partir da inovação legislativa, o Delegado de Polícia, em seu parecer técnico, deverá
ponderar a adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito da medida.

No Brasil, o agente infiltrado é sempre um policial, enquanto que em outros países, a


atribuição recai em um funcionário público ou mesmo um particular. Oportuno lembrar que
a antiga lei permitia o procedimento de infiltração por agentes da polícia e de inteligência,
fato que se alterou com a inovação legislativa, permitindo apenas o procedimento por
intermédio de agentes da polícia. Parece-nos que a revogação ratifica a tese de
incompatibilidade de atribuição dos membros da ABIN diante do procedimento
investigativo em questão. Ademais, imperioso lembrar ao intérprete que somente policiais
dos órgãos repressivos de Segurança Pública podem atuar como agentes infiltrados, o que,
por via de consequência, afasta a possibilidade de um policial militar ser inserido em um
programa de infiltração.

Outrossim, a Lei 12.850/13 inovou ao apresentar um limitador temporal de 6 (seis) meses


para fins de duração da infiltração, podendo ser renovado, desde que comprovada a sua
necessidade. Entendemos, com fulcro na inteligência interpretativa do Supremo Tribunal
Federal sobre a renovação do prazo das interceptações telefônicas – Lei 9.296/96 -, que não
há qualquer vedação quanto à multiplicidade de renovações do prazo da infiltração, desde
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

que comprovada sua necessidade.

Da segurança jurídica e pessoal do agente infiltrado: Quanto à atuação do infiltrado, o


novel diploma legal é explícito ao afirmar que o agente atua albergado por excludente de
culpabilidade fundamentada na inexigibilidade de conduta diversa. Nessa seara, vale
lembrar que parcela da doutrina não admitia que o agente infiltrado cometesse qualquer
crime, pois inexistiria excludente ao seu favor. Destarte, esse posicionamento normativo é
deveras importante para findar com a grande divergência doutrinária sobre o tema e,
principalmente, proporcionar maior segurança jurídica aos agentes que atuarão infiltrados.

Entrementes, não obstante haja permissivo legal à atuação do agente infiltrado, sua atuação
deve ser proporcional à finalidade da investigação, não sendo afastada sua responsabilidade
diante de excessos praticados. Ademais, havendo indícios seguros de que o agente infiltrado
sofre risco iminente, a operação será sustada mediante requisição do Ministério Público ou
pelo Delegado de Polícia, dando-se imediata ciência ao Ministério Público e à autoridade
judicial.

Corroborando com a maior proteção ao agente infiltrado, a Lei 12.850/13 dispõe que a
participação no procedimento é voluntária e também pode ser interrompida a critério do
agente, sendo direito seu ter sua identidade alterada, ter seu nome, sua qualificação, sua
imagem, sua voz e demais informações pessoais preservadas durante a investigação e o
processo criminal e não ter sua identidade revelada, nem ser fotografado ou filmado pelos
meios de comunicação, sem sua prévia autorização por escrito.

6.3 Ação controlada:

O novo conceito legal de Ação Controlada: A própria Lei 12.850/13 conceitua a Ação
Controlada: “art. 8º – Consiste a ação controlada em retardar a intervenção policial ou
administrativa relativa à ação praticada por organização criminosa ou a ela vinculada, desde
que mantida sob observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no
momento mais eficaz à formação de provas e obtenção de informações”.

A principal alteração da conceituação legal reside na inclusão dos órgãos administrativos


como legitimados para realizar a Ação Controlada, conhecida pela Doutrina também como
Flagrante Postergado ou Diferido. Desta forma, incluiu o novel estatuto os agentes
integrantes da Agência Brasileira de Inteligência, fiscais das receitas federais e estaduais,
entre outros. Não é mais, por conseguinte, ato exclusivo das instituições policiais.

O fim da Ação Controlada Descontrolada: Não obstante a recenticidade da Lei 12.850/13, o


fim ou não da chamada Ação Controlada Descontrolada (nome dado pela Doutrina) trata-se
de uma das questões mais controversas ocasionadas pelo novo Diploma. A Lei anterior (Lei
9.034/95) já tratava do instituto da Ação Controlada, porém, apenas timidamente o
conceituava, razão pela qual a Doutrina afirmava de forma uníssona que para sua aplicação
não se fazia necessária uma autorização judicial. Desta forma, o flagrante postergado
aplicado às Organizações Criminosas, ao contrário do que ocorria na Lei 11.343/06 (Lei de

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Drogas), era descontrolado, desprovido de limitação jurisdicional, ficando a cargo da


Autoridade Policial realizar a operação e só posteriormente comunicar o fato ao
Magistrado.

Com efeito, o §1º do art. 8º da nova Lei, alterando esse cenário, trouxe o seguinte texto: “O
retardamento da intervenção policial ou administrativa será previamente comunicado ao
Juiz competente que, se for o caso, estabelecerá os seus limites e comunicará ao Ministério
Público” (grifos nossos). Destarte, antes de agir o Delegado de Polícia deverá, agora,
comunicar sua pretensão e os motivos que ensejaram essa escolha no caso concreto,
justificando, portanto, o diferimento do flagrante ao órgão jurisdicional competente.

De acordo com o texto legal, o Magistrado, conforme o caso, estabelecerá os limites da


ação, podendo inclusive, no nosso entendimento, recusá-la, caso entenda que não exista
necessidade da postergação ou não haja proporcionalidade da medida. Com isso, questiona-
se: não poderia o Magistrado desautorizar a Ação Controlada? Não dependeria o Delegado
de Polícia, portanto, de uma autorização, ainda que tácita, do Juiz? São esses os
questionamentos que já causam furor na Doutrina.

Há quem defenda que, embora a Lei traga o vocábulo “comunicação”, na verdade o


legislador referiu-se a uma espécie de “autorização”, de “controle” jurisdicional, seguindo a
mesma linha da Lei de Drogas de 2006. Assim, o Delegado, ao comunicar e justificar seu
anseio ao Juiz, dependeria de uma concordância deste, que pode limitar a ação parcialmente
ou em seu todo.

Para Rogério Sanches, contudo, não há necessidade de uma autorização judicial: “Questão
tormentosa se refere à necessidade de prévio mandado judicial para que seja autorizado o
retardamento da ação. A revogada Lei nº 9.034/95 (lei das organizações criminosas),
quando tratava singelamente da matéria em seu art. 2º, inc. II, não exigia a prévia
autorização judicial. Era o entendimento da jurisprudência. Já a lei de drogas (Lei nº
11.343/2006), como se depreende do teor do caput de seu art. 53, é expressa ao exigir o
mandado judicial para a diligência”. Adiante, explica o ilustre professor que quando a Lei
12.850/13 exige autorização judicial nas diligências, como ocorre na Infiltração de Agentes,
ela traz expressamente esta obrigatoriedade.

Sem dúvida, será um dos temas que gerará debates na Doutrina e nos Tribunais Superiores
dentro de breve. Na nossa ótica, seja qual for a corrente adotada, estamos diante do fim da
Ação Descontrolada, como consequência da obrigatoriedade de comunicação prévia e da
possibilidade de limitação pelo Juiz.

6.4 Colaboração premiada:

Introdução: O instituto da delação premiada foi inserido no ordenamento jurídico brasileiro


no ano de 1990, quando da edição da Lei Federal nº 8.072, a chamada Lei dos Crimes
Hediondos. Trata-se de instrumento de política criminal importado do Direito Italiano que
tem por objetivo precípuo combater o pacto do silêncio absoluto que predomina diante das

477
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

organizações criminosas.

Preliminarmente, impende assinalar que, apesar de ser um eficaz instrumento à persecução


penal, o procedimento carecia de regulamentação que garantisse o devido processo legal e,
principalmente, a segurança jurídica e pessoal ao delator. Por oportuno, com o advento da
Lei 12.850/13, a medida foi precisamente regulamentada, adquirindo contornos normativos
claros, de modo a garantir maior eficácia e exequibilidade.

Nas palavras do emérito Guilherme de Souza Nucci: “A delação premiada significa a


possibilidade de se reduzir a pena do criminoso que entregar o(s) comparsa(s). É o
‘dedurismo’ oficializado, que, apesar de moralmente criticável, deve ser incentivado em
face do aumento contínuo do crime organizado. É um mal necessário, pois trata-se da forma
mais eficaz de se quebrar a espinha dorsal das quadrilhas, permitindo que um de seus
membros possa se arrepender, entregando a atividade dos demais e proporcionando ao
Estado resultados positivos no combate à criminalidade”.

Análise comparativa da Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro: A novel lei


não apenas proporciona uma grande evolução ao combate das organizações criminosas,
como também revoluciona ao alterar o nomen juris da medida para Colaboração Premiada.
No ordenamento jurídico brasileiro, o instrumento é conhecido como Delação Premiada e
não é exclusivo ao combate das organizações criminosas, permeando diversos dispositivos
legais, dentre os quais: Código Penal (arts. e 159, §4º, e 288, p.u.), Lei do Crime
Organizado – nº 9.034/05 (art. 6º), Lei dos Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional –
nº 7.492/86 (art. 25, §2º), Lei dos Crimes de Lavagem de Capitais – nº 9.613/88 (art. 1º,
§5º), Lei dos Crimes contra a Ordem Tributária e Econômica – nº 8.137/90 (art. 16, p.u.),
Lei de Proteção a vítimas e testemunhas – nº 9.807/99 (art. 14), Nova Lei de Drogas – nº
11.343/06 (art. 41), e, mais recentemente, na Lei que trata do Sistema Brasileiro de Defesa
da Concorrência – nº 12.529/2011 (art. 86). Nesse sentido, em caráter didático,
colacionaremos cada hipótese para melhor análise:

A) Lei 7.492/86 (Crimes Financeiros): “Art. 25. São penalmente responsáveis, nos termos
desta lei, o controlador e os administradores de instituição financeira, assim considerados
os diretores, gerentes (Vetado). §1º Equiparam-se aos administradores de instituição
financeira (Vetado) o interventor, o liquidante ou o síndico. §2º Nos crimes previstos nesta
Lei, cometidos em quadrilha ou co-autoria, o co-autor ou partícipe que através de confissão
espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa terá a sua pena
reduzida de um a dois terços”.

B) Lei 8.072/90 (Crimes Hediondos): “Art. 8º Será de três a seis anos de reclusão a pena
prevista no art. 288 do Código Penal, quando se tratar de crimes hediondos, prática da
tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ou terrorismo. Parágrafo único. O
participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando
seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços”.

C) Lei 8.137/90 (Crimes Tributários): “Art. 16. Qualquer pessoa poderá provocar a
iniciativa do Ministério Público nos crimes descritos nesta lei, fornecendo-lhe por escrito
informações sobre o fato e a autoria, bem como indicando o tempo, o lugar e os elementos

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

de convicção. Parágrafo único. Nos crimes previstos nesta Lei, cometidos em quadrilha ou
co-autoria, o co-autor ou partícipe que através de confissão espontânea revelar à autoridade
policial ou judicial toda a trama delituosa terá a sua pena reduzida de um a dois terços”.

D) Lei 9.269/96 (Altera o §4º do art. 159 do CPB): “(Extorsão mediante sequestro) Art. 159
– Seqüestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como
condição ou preço do resgate: (…) §4° Se o crime é cometido em concurso, o concorrente
que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do seqüestrado, terá sua pena
reduzida de um a dois terços”.

E) Lei 9.613/98 (Lavagem de Capitais e ativos): “Art.1. (…) §5º A pena poderá ser
reduzida de um a dois terços e ser cumprida em regime aberto ou semiaberto, facultando-se
ao Juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la, a qualquer tempo, por pena restritiva de direitos,
se o autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando
esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais, à identificação dos autores,
coautores e partícipes, ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime”.

F) Lei 11.343/06 (Tráfico ilícito de entorpecentes): “Art. 41. O indiciado ou acusado que
colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na
identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial
do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a dois terços”.

G) Lei 9.807/99 (Proteção a testemunhas e réus colaboradores): “(CAPÍTULO II DA


PROTEÇÃO AOS RÉUS COLABORADORES) Art. 13. Poderá o Juiz, de ofício ou a
requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a conseqüente extinção da
punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente
com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado: I –
a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa; II – a localização da
vítima com a sua integridade física preservada; III – a recuperação total ou parcial do
produto do crime. Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a
personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social
do fato criminoso”; “Art. 14. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a
investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou
partícipes do crime, na localização da vítima com vida e na recuperação total ou parcial do
produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um a dois terços”.

H) Lei 9.034/95 (Antiga Lei de Organização Criminosa): “Art. 6º Nos crimes praticados em
organização criminosa, a pena será reduzida de um a dois terços, quando a colaboração
espontânea do agente levar ao esclarecimento de infrações penais e sua autoria”.

Colaboração Premiada na Nova Lei de Organizações Criminosas: O mecanismo de


colaboração premiada estatuído na Lei 12.850/13 apresenta grandes alterações ao que era
previsto na revogada Lei 9.034/05, trazendo requisitos objetivos e subjetivos à concessão
do benefício processual. Quanto aos requisitos objetivos, a lei expõe que a delação deve
resultar em: I – a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa
e das infrações penais por eles praticadas; II – a revelação da estrutura hierárquica e da
divisão de tarefas da organização criminosa; III – a prevenção de infrações penais

479
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

decorrentes das atividades da organização criminosa; IV – a recuperação total ou parcial do


produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa; V – a
localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada. Ademais, o
Ministério Público poderá deixar de oferecer denúncia se o colaborador não for o líder da
organização criminosa ou for o primeiro a prestar efetiva colaboração, desde que
alcançados os resultados objetivos retro citados. Imperioso destacar que não estamos diante
de requisitos cumulativos, ou seja, basta que a delação atinja um dos resultados previstos na
norma para fins de aplicabilidade do instituto.

Quanto aos requisitos subjetivos, a lei explicita que, em qualquer caso, a concessão do
benefício levará em conta a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a
gravidade e a repercussão social do fato criminoso e a eficácia da colaboração. Nessa seara,
em seu brilhante artigo sobre a novel lei, Eugênio Pacelli posiciona-se com louvor: “No
particular, o legislador brasileiro parece ter um fetiche com a personalidade do agente! Ora,
não há tecnologia ou ciência suficientemente desenvolvida, ou cujo conhecimento técnico
seja seguro quanto aos vários e possíveis diagnósticos acerca da personalidade de quem
quer que seja! Certamente não se trata de questão jurídica, o que, já por aí, tornaria o Juiz
refém de laudos médicos, psicológicos ou psiquiatras”.

No que concerne à natureza jurídica da colaboração premiada, a nova lei se reveste de


causas de diminuição e substituição de pena e perdão judicial, como se vê: “Art. 4º O Juiz
poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois
terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que
tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal,
desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados”.

O Princípio da Irretroatividade da norma penal é previsto no artigo 5º, inciso XL, da


Constituição Federal, contudo, com uma importante ressalva: “a lei penal não retroagirá,
salvo para beneficiar o réu”. Em termos comparativos, pode-se constatar que a L. 12.850/13
apresenta-se como lex mellius, ou seja, norma que apresenta contornos mais benéficos ao
réu ao prever a possibilidade de aplicação de perdão judicial. Assim, o novel diploma legal
poderá retroagir a crimes ocorridos no passado – Teoria da Atividade – a fim de perquirir o
Direito Subjetivo Constitucional do réu em ter aplicada a norma mais favorável, ainda que
superveniente, seguindo o Princípio da Extratividade da norma penal.

Nesse contexto, o ilustre Eugênio Pacelli aduz que estamos diante de norma mais favorável
e que deve ser estendida às demais hipóteses de delação premiada previstas em nosso
ordenamento jurídico. Conquanto o brilhantismo do referido autor, à luz do Princípio da
Especialidade e Princípio da Reserva Legal, entendemos que as consequências jurídicas da
novel colaboração premiada somente são aplicáveis às organizações criminosas,
respeitando a especificidade das demais previsões do instituto.

Outro ponto relevante da alteração é a exigência da colaboração voluntária, ao revés do que


era requerido pela antiga norma, que exigia colaboração espontânea. Como se sabe, são
conceitos díspares, situação em que colaboração espontânea é aquela que não pode sofrer
qualquer influência externa, partindo de motivação interna do agente; enquanto a voluntária
aceita influências externas. Destarte, acertadamente veio a inovação legislativa, pois,
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

segundo a antiga lei, mero aconselhamento por parte de terceiros seria suficiente para
refutar a concessão da benesse processual.

Em caráter revolucionário, permite-se a suspensão do prazo para oferecimento da denúncia


e da prescrição por até 6 (seis) meses, prorrogáveis por igual período, até que sejam
cumpridas as medidas de colaboração. Parece-nos que o legislador, nesse ponto, entende a
complexidade de investigações envolvendo organizações criminosas e proporciona uma
ampliação dos direitos do Estado a fim de garantir maior eficácia da persecução penal.

Ademais, a L. 12.850/13 traz o que chamamos de “Colaboração Posterior”, hipótese em


que, se a colaboração for posterior à sentença, a pena poderá ser reduzida até a metade ou
será admitida a progressão de regime ainda que ausentes os requisitos objetivos. Como se
vê, o instituto da colaboração tem cabimento em sede de inquérito policial, fase processual
e de execução da pena. Todavia, para concessão do benefício, o réu deverá apresentar
condições subjetivas positivas, pois a lei somente traz exceção ao requisito objetivo.

Do requerimento e representação da medida de colaboração premiada: No que tange ao


requerimento e representação da medida, considerando a relevância da colaboração
prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o Delegado de Polícia, nos autos do
inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou
representar ao Juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador. Havendo discordância
entre a opinio juris do Ministério Público e a convicção do Magistrado, aplica-se o
Princípio da Devolução, de modo que a divergência deverá ser encaminhada para o
Procurador Geral de Justiça para fins de aplicação do que dispõe o art. 28 do Código de
Processo Penal. Por óbvio, não se aplica o referido procedimento quando a divergência
ocorre entre a autoridade policial e o Ministério Público, hipótese em que o juiz deverá
analisar a concessão da medida representada pelo Delegado de Polícia, mesmo que o
Ministério Público seja desfavorável.

O dispositivo retro citado ratifica a independência técnico-jurídica da autoridade policial


preconizada na Lei 12.830/13, situação em que a decisão sobre o cabimento da medida será
realizada posteriormente pelo juiz. Sobre essa temática, é de grande relevância para a
sociedade que não deixemos brigas institucionais – como a que houve com a PEC 37 –
deturparem a hermenêutica que deve ser extraída do novo diploma legal, pois uma
persecução penal hígida e eficaz exige a cooperação do Ministério Público em ampla
simbiose com a Polícia Judiciária.

Convém notar que a norma torna o Juiz equidistante ao acordo de colaboração premiada a
fim de preservar a imparcialidade. Assim, infere-se que o Juiz não poderá participar da
formalização do acordo, sendo responsável apenas pela sua homologação, desde que
preenchidos os requisitos da Lei.

Não obstante a norma seja recente, já há vozes na doutrina assinalando a


inconstitucionalidade do dispositivo sob alegação de que o diploma está concedendo
capacidade postulatória ao Delegado de Polícia. Data maxima venia, a tese não merece
prosperar. A nova norma tão somente concede à autoridade policial a possibilidade de
realizar o acordo e representar pela concessão da colaboração premiada que, a posteriori

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

será avaliada pelo Juiz. Essa exegese parte da interpretação lógico-sistemática de todo
ordenamento jurídico, pautando-se na capacidade que o Delegado possui em representar
pelas demais medidas cautelares do ordenamento jurídico. Ademais, no Brasil, ao contrário
de alguns países europeus, o Delegado de Polícia não atua sob delegação do Ministério
Público, possuindo, assim, autonomia técnico-jurídica para atuar, com discricionariedade,
na persecução penal pré-processual.

Outrossim, por amor incondicional ao debate, importante colacionar a tese de


inconstitucionalidade da representação do Delegado de Polícia quanto ao pedido de
concessão da delação premiada emitida pelo emérito Eugênio Pacelli: “A Constituição da
República comete à polícia, inquinada de judiciária, funções exclusivamente investigatórias
(art. 144, §1º, IV, e §4º). E, mais, remete e comete ao Ministério Público a defesa da ordem
jurídica (art. 127) e a promoção privativa da ação penal (art. 129, I). Ora, a atribuição
privativa da ação penal pública significa a titularidade acerca do juízo de valoração
jurídico-penal dos fatos que tenham ou possam ter qualificação criminal. Não se trata,
evidentemente, e apenas, da simples capacidade para agir, no sentido de poder ajuizar a
ação penal, mas, muito além, decidir acerca do caráter criminoso do fato e da viabilidade de
sua persecução em juízo (exame das condições da ação penal). Em uma palavra: é o
Ministério Público e somente ele a parte ativa no processo penal de natureza pública (ações
públicas). E o que fez a Lei 12.850/13? Dispôs que o Delegado de Polícia, nos autos do
inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderá representar ao Juiz
pela concessão de perdão judicial ao colaborador (art. 4º, §2º)!!! Naturalmente, o mesmo
dispositivo defere semelhante capacidade e legitimidade também ao Ministério Público! O
desatino não poderia ir tão longe…”.

Respeitosamente, a medida pleiteada pela autoridade policial possui inequívoca natureza


investigativa, compatibilizando-se com a exegese do art. 144, §1º, IV, e §4º da Constituição
Federal. Nesse diapasão, a colaboração proporcionará ao Delegado diligenciar com maior
precisão através das informações adquiridas pelo delator e, principalmente, culminará em
eficaz colheita probatória e grande instrumento formador da justa causa. Ademais, a tese
retro citada não encontra amparo legal e conceitual, visto que o Ministério Público – órgão
de controle externo das atividades investigativas – poderá se manifestar acerca da
representação da autoridade policial. Assim, em consonância com a sistemática processual,
pode-se constatar que a titularidade da ação penal do Ministério Público não fora, de forma
alguma, suprimida pelo novel diploma normativo. Se assim o fosse, a autoridade policial
careceria da legitimidade em representar por todas as demais medidas cautelares
disciplinadas em nosso ordenamento jurídico.

Dando continuidade ao tema, o pedido de homologação do acordo será sigilosamente


distribuído, contendo apenas informações que não possam identificar o colaborador e o seu
objeto. Convém notar que a Lei 12.850/13 compatibiliza-se com o entendimento sufragado
pela Súmula Vinculante 14, pois, segundo expressa previsão legal, o pedido de concessão
da colaboração criminosa será sigiloso, de modo a garantir a higidez probatória. Destarte,
sob a inteligência da referida jurisprudência constitucional, nem mesmo o advogado do
suposto autor do crime poderá ter acesso ao referido pedido, uma vez que o conhecimento
do acordo pode não só prejudicar a colheita probatória como colocar em risco a integridade

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

do delator.

O acesso aos autos será restrito ao Juiz, ao Ministério Público e ao Delegado de Polícia,
como forma de garantir o êxito das investigações, assegurando-se ao defensor, no interesse
do representado, amplo acesso aos elementos de prova que digam respeito ao exercício do
direito de defesa, devidamente precedido de autorização judicial, ressalvados os referentes
às diligências em andamento.

O acordo de colaboração premiada deixa de ser sigiloso assim que recebida a denúncia,
observados os direitos do colaborador em: I – usufruir das medidas de proteção previstas na
legislação específica; II – ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais
preservados; III – ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e
partícipes; IV – participar das audiências sem contato visual com os outros acusados; V –
não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou
filmado, sem sua prévia autorização por escrito; VI – cumprir pena em estabelecimento
penal diverso dos demais corréus ou condenados.

O acordo de colaboração: Realizado o acordo, o respectivo termo, acompanhado das


declarações do colaborador e de cópia da investigação, será remetido ao Juiz para
homologação, o qual deverá verificar sua regularidade, legalidade e voluntariedade,
podendo, para este fim, sigilosamente, ouvir o colaborador na presença de seu defensor.
Caso a proposta não atenda aos requisitos legais, o Juiz poderá recusar homologação à
proposta ou adequá-la ao caso concreto. Não se pode olvidar que o colaborador assina o
termo de cooperação antes de iniciar a colaboração e, supervenientemente, no momento da
sentença, o Juiz apreciará os termos do acordo homologado e sua eficácia processual.

O termo de acordo da colaboração premiada deverá ser feito por escrito e conter: I – o
relato da colaboração e seus possíveis resultados; II – as condições da proposta do
Ministério Público ou do Delegado de Polícia; III – a declaração de aceitação do
colaborador e de seu defensor; IV – as assinaturas do representante do Ministério Público
ou do Delegado de Polícia, do colaborador e de seu defensor; V – a especificação das
medidas de proteção ao colaborador e à sua família, quando necessário. Por conseguinte, as
informações pormenorizadas da colaboração serão dirigidas diretamente ao Juiz a que
recair a distribuição, que decidirá no prazo de 48 (quarenta e oito) horas.

Outrossim, a norma prevê a possibilidade de retratação do acordo de colaboração, hipótese


em que as provas autoincriminatórias produzidas pelo colaborador não poderão ser
utilizadas exclusivamente em seu desfavor. Trata-se de exegese do nemo tenetur se
detegere, tutelando o direito do réu em quedar-se inerte, de modo a não produzir provas
contra si mesmo. In casu, enquanto em colaboração, o delator está protegido por estar
comungando com o interesse estatal, de modo que as provas produzidas não poderão ser
utilizadas em seu desfavor se decidir não mais cooperar. Nada mais justo, pois, mesmo que
opte por cessar a medida colaborativa, há grande possibilidade do agente já ter auxiliado de
forma satisfatória em termos de diligência ou mesmo em âmbito processual, para fins de
formação da convicção do Juiz quanto a todo o complexo estrutural da organização
criminosa.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Corroborando com a sistemática constitucional, em todos os atos de negociação,


confirmação e execução da colaboração, o colaborador deverá estar assistido por defensor.
Assim, nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu defensor,
ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade.

Quanto à validade probatória da colaboração premiada, a lei é clara e afirma que nenhuma
sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de agente
colaborador. Como se vê, a própria norma mitiga de certa forma o valor processual da
colaboração premiada, sendo necessário que ela esteja colimada com demais aparatos
probatórios para fins de ulterior condenação.

6.5 Acesso a registros, dados cadastrais, documentos e informações:

O legislador, em ato digno de aplausos, sob a égide da novel Lei 12.850/13, dispõe que o
Delegado de Polícia e o Ministério Público terão acesso, independentemente de autorização
judicial, apenas aos dados cadastrais do investigado que informem exclusivamente a
qualificação pessoal, a filiação e o endereço mantidos pela Justiça Eleitoral, empresas
telefônicas, instituições financeiras, provedores de internet e administradoras de cartão de
crédito.

Conforme se nota, há flagrante ampliação de poderes da autoridade policial, visto que o


novo diploma permite a representação por dados cadastrais do investigado sem a
necessidade de autorização judicial. Indubitavelmente, trata-se de um avanço legislativo
que proporcionará maior agilidade investigativa e, por conseguinte, maior probabilidade de
sucesso na persecução penal.

Entrementes, antes que os garantistas hiperbólicos monoculares digam que a medida


afronta o Direito de Intimidade tutelado no art. 5º, X da Constituição Federal, faz-se
imperioso ressaltar que a medida não se imiscui no íntimo do ser humano, sendo
direcionada apenas para garantir maior agilidade à persecução penal. Nesse sentido, até o
maior crítico da novel Lei de Organizações Criminosas, o ilustre Eugênio Pacelli, se
posiciona: “É que não se cuida de acesso aos dados de movimentação financeira, nem
àqueles relativos aos valores eventualmente depositados à titularidade do investigado, e,
tampouco, ao montante de gastos efetuados com o sistema de telefonia ou de administração
de crédito. O que a lei autoriza é que tais instituições informem o nome, estado civil,
filiação e endereço da pessoa. Há, portanto, redução sensível quanto ao conteúdo de
privacidade a ser acessado, ainda que se reconheça, como o fazemos, que a medida ostenta
dimensão mais alargada da privacidade e da intimidade do investigado. Por isso,
sustentamos a validade constitucional da medida”.

Para fins do exposto, as empresas de transporte possibilitarão, pelo prazo de 5 (cinco) anos,
acesso direto e permanente do Juiz, do Ministério Público ou do Delegado de Polícia aos
bancos de dados de reservas e registro de viagens. Ademais, as concessionárias de telefonia
fixa ou móvel manterão, pelo prazo de 5 (cinco) anos, à disposição das autoridades
mencionadas, registros de identificação dos números dos terminais de origem e de destino

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

das ligações telefônicas internacionais, interurbanas e locais.

Convém salientar que, não obstante ser recente a alteração normativa, parcela da doutrina
já se posiciona quanto à extensão deste método investigativo às infrações de outra natureza.
Contudo, entendemos que a autoridade policial somente poderá diligenciar diretamente
quanto ao acesso a registros, dados cadastrais, documentos e informações diante de crime
de organização criminosa, fulcro no Princípio da Reserva Legal.

6.6 Revogação formal da vedação à liberdade provisória e ao cumprimento da pena


em regime inicial fechado:

A vedação à liberdade provisória e o cumprimento obrigatório de pena em regime inicial


fechado fazem parte de uma grande celeuma doutrinária e jurisprudencial. Fato é que a
antiga Lei 9.034/95, em seu berço normativo, previa tanto a referida vedação quanto a pena
ser cumprida em regime inicial, obrigatoriamente, fechado. Sobre estas temáticas, o STF já
se pronunciou insurgindo-se e afirmando que legislador retirara do judiciário o poder de
aplicar a proporcionalidade ao caso concreto, criou restrição fundamentada na gravidade
abstrata do crime e, também, afrontou asperamente o princípio da individualização da pena.
Nesse sentido, importante destacar que o STF realizou controle difuso de
constitucionalidade posicionando-se pela inconstitucionalidade dos referidos dispositivos
sob a égide dos fundamentos retro citados e, principalmente, por haver grave ofensa ao
Princípio da Presunção de Inocência previsto no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição
Federal.

Corroborando com o entendimento sufragado pelo Supremo Tribunal Federal, a novel Lei
de Organizações Criminosas, sabiamente, revogou os dispositivos em comento de modo a
compatibilizar o ordenamento jurídico com toda a sistemática constitucional. Por oportuno,
convém socorrermo-nos ao diálogo das fontes para concluir que estamos diante do famoso
fenômeno da Constitucionalização do Direito, de modo que os princípios e valores
constitucionais devem permear os demais ramos do direito, devendo a eles se
compatibilizarem. A constitucionalização do direito acarreta uma releitura de todas as
normas do ordenamento jurídico a partir desses princípios e valores constitucionais.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

17.a. O Erro no Direito Penal: espécies, requisitos e


consequências.
Principais obras consultadas: Santo Graal 27º. Gueiros, Artur, 2012. Ênfase 2013.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral, 2012. ZAFFARONI,
Eugênio Raul e PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro. 4ª ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. ZAFFARONI, Eugênio Raul. Tratado de Derecho
penal – Parte General, Tomo IV. Buenos Aires, 1999. SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito
Penal – Parte Geral. Curitiba: ICPC; Lumen Juris, 2006. GUEIROS, Artur e JAPIASSÚ.
Curso de Direito Penal, Parte Geral. Ed. Elsevier, 2012.

Consideração inicial: O erro relevante em Direito Penal é aquele que vicia a vontade,
causando uma falsa percepção da realidade, e também aquele que vicia o conhecimento da
ilicitude. Nesses termos, o erro tanto pode incidir sobre os elementos estruturais do delito
(erro de tipo) quanto sobre a ilicitude da ação (erro de proibição). Em síntese, o erro é uma
falsa representação de alguma coisa, ou seja, de uma dada realidade jurídica ou fática. Não
é puramente a ignorância de algo. Deve-se buscar na teoria do delito quais de seus
elementos estruturais são compostos por aspectos psicológicos que exigem uma
representação correta da realidade.

Evolução Teórica do Erro: a) As teorias do dolo, derivadas do modelo causalista de crime,


situam o dolo na culpabilidade e a consciência da ilicitude (que deve ser atual para a
variante “extremada do dolo” e presumida para a variante “limitada do dolo”) no próprio
dolo. Defende, consequentemente a existência de um dolo normativo (“dolus malus”),
constituído de: vontade, previsão e conhecimento da realização de uma conduta proibida
(consciência atual da ilicitude). Para essa teoria, o erro jurídico-penal, independentemente
de ser erro de tipo ou erro de proibição, exclui sempre o dolo, quando inevitável, por anular
ou o elemento normativo (consciência da ilicitude) ou o elemento intelectual (previsão) do
dolo. Equipara, assim, as duas espécies de erro quanto aos seus efeitos, pois qualquer deles
incidirá sempre em um elemento do dolo. b) A teoria extremada da culpabilidade parte da
reelaboração dos conceitos de dolo e de culpabilidade, empreendida pela doutrina finalista
(Welzel, Maurach e Kaufmann). Essa teoria separa o dolo da consciência da ilicitude.
Assim, o dolo, no seu aspecto puramente psicológico — dolo natural —, é transferido para
o injusto, passando a fazer parte do tipo penal. A consciência da ilicitude e a exigibilidade
de outra conduta passam a fazer parte da culpabilidade, num puro juízo de valor. A
culpabilidade passa a ser um pressuposto básico do juízo de reprovação. Dolo e consciência
da ilicitude são, portanto, para esta teoria, conceitos completamente distintos e com
diferentes funções dogmáticas. O conhecimento da antijuridicidade, tendo natureza distinta
do dolo, não requer o mesmo grau de consciência; o conhecimento da antijuridicidade não
precisa ser atual, pode ser simplesmente potencial...”, enquanto a consciência do dolo
(previsão) deve, necessariamente, ser atual. Os efeitos do erro agora, com essa nova
estrutura da conduta punível, dependerão do seu objeto. Se o erro incidir sobre o elemento
intelectual do dolo, a previsão, certamente o excluirá, chamando-se erro de tipo, por recair

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

sobre um dos elementos constitutivos do tipo penal. No entanto, se, nas circunstâncias, o
erro incidir sobre a potencial consciência da ilicitude, o dolo continuará intacto, afastando,
porém, a culpabilidade, uma vez que aquela é elemento constitutivo desta. Esse erro sobre a
ilicitude chama-se erro de proibição. c) diferentemente da teoria extremada da
culpabilidade, para a qual qualquer erro que recaia sobre uma causa de justificação é erro
de proibição, na teoria limitada da culpabilidade há distinção entre duas espécies de erro:
uma, a que recai sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação, a que considera
tratar-se de erro de tipo permissivo; outra, a que recai sobre a existência ou a abrangência
da causa de justificação, a que considera erro de proibição. Para a teoria limitada, que
entende que o erro sobre os pressupostos fáticos constitui um erro de tipo permissivo, tem o
mesmo efeito do erro de tipo: exclui o dolo, mas permite a punição como crime culposo, se
houver previsão legal da modalidade culposa. No caso, porém, de o erro incidir sobre a
existência ou os limites de uma causa de justificação, configura o erro de proibição, cujas
consequências são as já examinadas: exclui a culpabilidade, se inevitável, ou atenua a pena,
se evitável. A Reforma Penal de 1984, seguindo a tradição do Código Penal de 1940,
adotou a teoria limitada da culpabilidade, deixando expresso item 19 da Exposição de
Motivos.

Erro de tipo: Conceito: consiste na falsa representação que recai sobre algum elemento do
tipo penal (descritivo ou normativo), ou seja, sobre a consciência e vontade de realização de
algum elemento constitutivo do tipo. Também entende-se que o erro de tipo pode recair
sobre qualquer outro dado relevante que se agregue à determinada figura típica
(qualificadoras, causas de aumento, agravantes, etc.). Como na estrutura da tipicidade é o
dolo, enquanto consciência e vontade de realização dos elementos constitutivos do tipo
penal, que exige a representação sobre elementos da realidade, a falsa representação desta
exclui o dolo, desse modo, se o tipo não comportar modalidade culposa, inexistirá o crime.
Consequências: Em regra, o erro de tipo exclui o dolo, e impede a configuração do delito.
Entretanto, como visto, há situações em que se permite a punição em virtude de sua
conduta culposa, se houver previsão legal. Pode-se falar então em erro de tipo invencível
(escusável, justificável, inevitável) e erro de tipo vencível (inescusável, injustificável,
evitável). Ocorre o erro de tipo invencível quando o agente, nas circunstâncias em que se
encontrava, não tinha condições de evitá-lo, mesmo tomando todas as cautelas necessárias
que estavam ao seu alcance. Sendo invencível o erro, afasta-se o dolo e o fato é atípico (a
ausência de qualquer dos elementos do tipo elimina o próprio tipo). Tem-se como evitável o
erro naquelas situações em que, caso o agente tivesse atuado com a diligência exigida,
poderia ter evitado o resultado. Sendo evitável o erro, embora o agente não responda pelo
resultado a título de dolo, poderá ser-lhe atribuído a título de culpa, se houver previsão
legal para esta modalidade de conduta. OBS 1: Aferição da culpa: Se houver previsão de
culpa, deve se verificar se o erro é vencível ou invencível. Erro invencível: o agente, nas
circunstâncias em que se encontra, não tem como evitar o erro, mesmo tomando as cautelas
necessárias. Se for invencível o erro, afasta-se o dolo, bem como a culpa e a situação é
atípica. Erro vencível: se o agente atua com a diligência exigida, pode-se evitar o resultado
a título de dolo, mas ser-lhe-á atribuído a título de culpa imprópria. OBS 2: O erro de tipo é
o reverso do dolo do tipo: quem atua 'não sabe o que faz', faltando-lhe, para o dolo do tipo.
Falta ao agente o conhecimento ou representação necessários para a formação da vontade
livre e consciente de praticar a conduta incriminada. OBS 3: o erro que recai sobre requisito

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

da ilicitude contido no tipo (ex. indevidamente, sem autorização legal, etc.) exclui a
tipicidade, e não a ilicitude. Ocorre uma antecipação de parte do juízo de valor acerca da
ilicitude da conduta para o âmbito da tipicidade. OBS 4: Alguns doutrinadores classificam
o erro de tipo como essencial e acidental. O erro essencial, relacionado às categorias
anteriormente introduzidas, traz consequências para os pressupostos do conceito do crime
(tipicidade e culpabilidade). No entanto, o erro acidental – ou residual – diz respeito a
pequenos desvios no processo de representação, que não comprometem o enquadramento
dogmático do fato ou a sua antijuridicidade, mas possibilitam uma punição diferenciada. Na
verdade, apenas o erro de tipo essencial é erro de tipo, pois o erro acidental (por alguns
chamados de erro de tipo acidental) não recai sobre elemento do tipo e sim sobre dados
acessórios, por isso veremos abaixo [Erro de tipo essencial: recai sobre circunstância que
configura elemento essencial do tipo; percepção da realidade sobre um elemento do crime.
Pode ocorrer nos crimes omissivos impróprios, por ex. quando o agente desconhece sua
posição de garantidor. Quando inevitável (não deriva de culpa), afasta o dolo e a culpa,
excluindo a tipicidade; quando evitável (provem da culpa do agente) também exclui o dolo,
mas permite a punição a título de culpa].

Erro Acidental: Também chamado de erro de tipo acidental. Recai sobre dados diversos
dos elementos constitutivos do tipo penal (ou seja, sobre aspectos ou dados secundários que
não alteram a subsistência da figura típica). Tanto é assim que Cirino dos Santos trata de
tais figuras sob a rubrica “Atribuição subjetiva do resultado em desvios causais”. O erro
acidental não recai sobre elementos do tipo e sim sobre dados acessórios, como a
identificação da vítima, na execução, resultado atinge bem jurídico diverso do pretendido,
erro sobre o objeto. Tipos de erro acidental: (i) erro sobre a pessoa: art. 20, §3º, CP.
Atinge-se pessoa diversa daquela inicialmente pretendida (a execução foi perfeita, porém,
houve erro na representação da vítima). Consequência: Não se consideram as condições ou
qualidades da vítima (real), senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime
(vítima virtual); (ii) erro sobre o objeto (error in objecto): O erro recai sobre o objeto
material do crime, ou seja, sobre a coisa onde recai a ação criminosa. Não tem previsão
legal. É uma criação doutrinária. Consequência: Irrelevante. Não exclui o dolo, não exclui a
culpa e não isenta o agente de pena, por si só. Ex: objeto visado era um relógio de ouro e,
na verdade, o objeto levado foi um relógio de latão. Ele vai responder por furto, mas sobre
qual relógio? Pelo relógio de ouro (objeto visado) ou relógio de latão (objeto levado)? R:
Prevalece que o crime considera o objeto levado e não o visado. Mas não é majoritário,
Zaffaroni diz que nesse caso, por não haver previsão legal, deve ser aplicado o princípio do
in dubio pro reo; (iii) erro sobre o nexo causal (aberratio causae): aqui o agente se
equivoca sobre o nexo de causalidade de sua conduta, ou seja, provoca o resultado
pretendido, mas mediante nexo causal (efetivo) diverso do imaginado; é irrelevante para o
direito penal; Há duas espécies: a) erro sobre o nexo causal (aberratio causae) em sentido
estrito: o agente, mediante um único ato, provoca o resultado desejado, porém, com nexo
diverso do pretendido. Ex: empurro a vítima do penhasco para que morra afogada. Na
queda, bateu a cabeça contra uma rocha, morrendo por traumatismo craniano. b) Erro
sucessivo (chamado pela doutrina minoritária de dolo geral): há a prática de dois ou mais
atos por parte do agente que provoca o resultado desejado, porém com nexo diverso do
pretendido. Ex: depois de atirar contra a vítima e imaginar que esta já está morta, arremesso
o corpo desta ao mar, que vem então a morrer por afogamento. Consequência: responde

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

pela tentativa de homicídio [1º ato], pela fraude processual [crime formal do 2º ato] e pelo
efetivo homicídio [2º ato] a título de culpa se considerado o erro vencível ou não responde
pelo efetivo homicídio se considerado erro invencível; (iv) erro na execução (aberratio
ictus ou desvio de golpe – art. 73, CP): o agente não se engana quanto à pessoa que
desejava atacar, mas age de modo desastrado, errando seu alvo e acertando pessoa diversa.
Espécies: (a) com unidade simples: o agente atinge apenas a pessoa diversa da desejada,
sendo punido cf. art. 20, §3º; (b) com unidade complexa: atinge a pessoa inicialmente
desejada e outra pessoa, aplicando-se a regra do concurso formal próprio. Caso haja dolo
eventual em relação às demais pessoas atingidas, aplica-se a regra do concurso formal
impróprio; (vi) resultado diverso do pretendido (aberratio criminis ou erro sobre o bem
jurídico - art. 74, CP): por acidente ou erro no uso dos meios de execução, sobrevém
resultado diverso do pretendido. Aqui o desvio ocorre na relação coisa-pessoa ou pessoa-
coisa, ao contrário da aberractio ictus em que a relação é “pessoa-pessoa”. Ex 1: erro de
pessoa para coisa: O sujeito deseja atingir a integridade física de outra pessoa com uma
pedra, mas atinge o vidro de um carro. No erro de pessoa pra coisa, o sujeito quer causar
lesão em alguém, mas erra e quebra o vidro do carro. Nesse caso, responderá pela tentativa
do crime contra a pessoa [do contrário seria um prêmio à incompetência, por isso não se
aplica o art. 74]. Como não há culpa para dano, o dano será considerado na dosimetria da
pena [consequências do crime]. Ex 2: Erro de coisa para pessoa: Se inversamente, o agente
pretende atingir a coisa, mas atinge a integridade corporal, responde a título de culpa,
aplicando-se o art. 74. No erro de coisa pra pessoa, aplica-se o art. 74 do CP e o agente
responde a título de culpa no crime contra a pessoa. E se atingir os dois? A coisa e a pessoa
por erro? Responde pelo dano e a título de culpa pela lesão à pessoa.Espécies: (a) com
unidade simples: o agente atinge somente bem jurídico diverso do pretendido, respondendo
por culpa, se o fato for previsto como crime culposo. Entretanto, segundo parte da doutrina,
se o resultado previsto como crime culposo for menos grave ou se o crime não tiver
modalidade culposa, deve-se desprezar a regra do art. 74; (b) com unidade complexa:
atinge o bem jurídico desejado e, culposamente, outro bem; aplica-se a regra do concurso
formal próprio. Caso haja dolo eventual em relação aos demais bens atingidos, aplica-se a
regra do concurso formal impróprio.

Questão oral do MP-RJ: Marido quer matar esposa e coloca veneno no remédio, a
empregada sem saber do veneno, retira o remédio e a esposa não o toma. Ao chegar a casa,
o marido vê a esposa dormindo e acredita que esta tomou o veneno e está morta na cama.
Sendo assim, atira na vítima, com o dolo de vilipendiar cadáver de tanta raiva que sentia
dela, vindo a matá-la com o tiro. Dessa forma, visto que a mulher estava viva, o agente
cometeu crime impossível por absoluta impropriedade do objeto com base no art. 17, CP,
pois não havia cadáver. Ocorreu erro de tipo invencível, ficando o agente isento de pena.
Não há tentativa no primeiro ato, pois o que houve foram apenas atos preparatórios [a
execução seria feita pela própria vítima, pois ela que tomaria o remédio]. Resposta: o
agente não responde por nada. [exemplo dado em sala de aula no Curso Ênfase 2013].

Erro de proibição: É o erro incidente sobre a ilicitude do fato. O agente atua sem a
consciência de ilicitude, servindo, pois, de excludente de culpabilidade. Apesar de ser
situação excepcional, é possível que o agente pratique uma conduta típica sem ter noção de
que é proibida. Exemplo dado por Nucci: um soldado, perdido de seu pelotão, sem saber

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

que a paz foi celebrada, mata um inimigo, acreditando ainda estar em guerra. Trata-se de
um erro quanto à ilicitude do fato, uma vez que, durante o período de guerra, é lícito
eliminar o inimigo. Modalidades de erro de proibição (sobre a ilicitude): a) erro de
proibição direto: incide sobre a existência, validade ou significado da lei penal, ou seja, o
agente engana-se a respeito da norma proibitiva. Aqui o agente age sem a necessária
representação da antijuridicidade de sua conduta (ex. estudante holandês que traz maconha
para o BRA em suas férias, desconhecendo a proibição legal); b) erro de proibição indireto:
é o erro de permissão, que tem por objeto a existência (legal) de uma causa de justificação
inexistente, ou os limites jurídicos de uma causa de justificação existente. Na primeira
hipótese o autor supõe existir uma causa de justificação não reconhecida em lei (castigar
crianças alheias por grosseiras, no suposto exercício de direito de correção), ao passo que
na segunda hipótese o autor atribui à justificação limites jurídicos diferentes dos atribuídos
pelo legislador (ao realizar uma prisão em flagrante, o cidadão comum produz lesão
corporal grave na pessoa do preso); c) erro mandamental: ocorre nos crimes omissivos,
próprios ou impróprios. O erro recai sobre uma norma mandamental, sobre uma norma
imperativa, sobre uma norma que manda fazer. Se alguém deixa de prestar socorro, por
exemplo, porque acredita, erroneamente, que essa prestação de socorro lhe acarretaria risco
pessoal, comete erro de tipo. Agora, se esse mesmo alguém, embora consciente da ausência
de risco pessoal, consciente da situação de perigo, da necessidade de socorro, deixar de
prestá-lo, por que acredita que não está obrigado, incorre em erro de proibição. Também
pode haver erro de mandamento em crime comissivo por omissão. Se alguém se engana
sobre a existência de perigo, sobre a identidade da pessoa que tem a responsabilidade de
proteger, sobre a existência dos meios, sobre a sua capacidade de utilizá-los, tudo isso
constitui erro de tipo. Mas se erra sobre a existência do dever, sabendo da situação de
perigo, sabendo que a pessoa é aquela que deve ser protegida, sabendo que tem os meios e
que pode usá-los, mas acha que não precisa, que não deve, porque, por exemplo, crê que o
seu dever não envolve necessariamente risco pessoal. Ou, então, o caso do plantão, por
exemplo, cujo horário de saída é às dezessete horas. Imagina que a partir daí não é mais
responsável, afinal, azar do outro que se atrasou. Errado, continua responsável. Erra a
respeito dos limites do dever, erra sobre a norma mandamental, sobre o dever em si, e não
sobre a situação fática do dever ou sobre os seus pressupostos, mas sobre o dever
propriamente. Esses são erros de mandamento, erros sobre a ilicitude, portanto.

OBS: Ignorância da lei e ignorância da antijuridicidade: Não há que confundir


ignorância ou erro sobre a vigência da lei com ignorância ou erro sobre a antijuridicidade
do fato. A primeira (ignoratia legis), por razões de segurança do ordenamento jurídico, não
pode ser alegada para fins de eximir-se do seu comando ou de sua sanção. Nesse sentido,
dispõe a 1a parte do art. 21, do CP e o art. 3o, da LINDB. . Porém, eu posso conhecer a lei,
mas achar que, no caso concreto, a minha conduta não está errada, não é ilícita. Eu posso
errar sobre o juízo acerca daquilo que faço, se é certo ou é errado. É possível, porém, que,
numa dada situação, haja, ao mesmo tempo, desconhecimento da lei e desconhecimento da
ilicitude. Isso ocorre se o dispositivo legal não espelhar um desvalor entranhado na cultura
social. O dispositivo legal trata de uma norma que não está, ainda, consagrada e difundida
como desvaliosa.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Erro de tipo Dolo é = Se a consciência é inidônea, houve erro ou


Artigo 20, CP. Consciência idônea ignorância.
(essencial) + - Erro à falsa representação da realidade
Vontade livre [não sabe o que faz].
OBS: o erro de - A consciência inidônea leva a uma vontade
tipo está vinculado não-livre.
à tipicidade.
1º) o erro de tipo exclui o dolo.

2º) existe modalidade culposa?


Não à não responde por nada, o fato é
atípico por ausência de adequação.
Sim à tem que analisar se o erro era
vencível ou invencível. [para saber se é
vencível ou invencível analisa-se a
previsibilidade]
- Erro vencível: responde por culpa.
- Erro invencível: não responde por nada, é
atípico.

Erro de proibição Artigo 21: O erro é quanto à ilicitude do fato [não é


Artigo 21, CP. quanto a elemento constitutivo do crime].
- Isento de pena
OBS: o erro de A pessoa sabe o que faz, mas pensa que é
proibição está - Redução de pena lícito.
vinculado à
culpabilidade.

OBS 1: Erro culturalmente condicionado (Zaffaroni): Cumpre alertar que,


diferentemente da doutrina nacional, que trata do erro de proibição a partir do potencial
conhecimento da antijuridicidade, Zaffaroni faz a seguinte divisão daquela categoria
jurídica em seu Manual: I – Erro que afeta o conhecimento da antijuridicidade, que pode
ser: a) direto, quando recai sobre o conhecimento da norma proibitiva, e b) indireto, que
recai sobre a permissão da conduta e que pode consistir ou na falsa suposição de existência
de uma permissão que a lei não outorga, ou na falsa admissão de uma situação de
justificação que não existe (justificação putativa); e II – Erro de compreensão que afeta a
compreensão da antijuridicidade, mas não o seu conhecimento. O erro de compreensão da
antijuridicidade ocorre quando o agente possui um conhecimento (captação) de um
determinado contexto jurídico, mas não consegue se determinar de acordo com este
conhecimento por não ter “internalizado” ou “introjetado”, isto é, por não ser ou ter sido
capaz de assimilar em seu aparato psicológico tais normas de conduta (tradução livre).
Explica o autor (manual) que “compreender ou entender implica, pois, conhecer e também
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

internalizar, porque a internalização requer o conhecimento prévio. (...) A lei não pode
exigir uma compreensão efetiva da antijuridicidade, porque ela quase nunca ocorre”. São as
“circunstâncias pessoais e sociais, ou mesmo a combinação de ambas, [que] nos revelarão o
grau de esforço do sujeito, que estará sempre em relação inversa com a reprovabilidade:
quanto maior for o esforço que o sujeito deva fazer para internalizar a norma, menor será a
reprovabilidade de sua conduta e vice-versa” . Portanto, o erro de compreensão
culturalmente condicionado configurador do erro de proibição excludente da culpabilidade
incide precipuamente em indígenas que eventualmente detém potencial conhecimento da
antijuridicidade do seu comportamento, mas não conseguem se comportar com base neste
conhecimento por não lhes ser exigível que entendam, internalizem ou introjetem em suas
consciências o caráter antijurídico do fato, pois sua educação e mentalidade foram
conformadas, desde criança, de acordo com um esquema complexo de valores, costumes,
tradições e esquemas socioculturais extremamente distintos daqueles vivenciados pela
sociedade não indígena. São exemplos de tal hipótese os casos de sepultamentos
ritualísticos levados a cabo por comunidades indígenas segundo seus costumes e tradições,
que bem podem conhecer as leis e saber que estes sepultamentos em tais condições podem
propagar enfermidades perigosas, não poderão ser incriminados por eventual crime contra a
saúde pública, pois os agentes do aludido sepultamento não podem internalizar
(compreender) a antijuridicidade de suas condutas, porque diante da importância do ritual
funerário, o risco lhes parecerá sempre mínimo e não lhes poderá ser exigível que o
compreendam de outra maneira (Zaffaroni, Tratado).

OBS 2: O erro e as descriminantes putativas: ao lado das hipóteses de erro de tipo e de


erro de proibição, figuram as descriminantes putativas. No caso, o equívoco ocorre não
naquilo que o agente ignora que realiza, ou na equivocada suposição de agir de forma
permitida, mas, sim, na irreal avaliação da situação concreta justificante. Portanto, as
descriminantes são as causas legais que afastam a ilicitude da conduta do agente (legítima
defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de
direito). A putatividade se refere àquelas situações imaginárias, que só existem na mente do
agente. Somente o agente acredita, por erro, que aquela situação existe. As descriminantes
putativas são, portanto, aquelas situações em que agente imagina, por erro, estar em uma
situação de descriminante, quando na verdade não está. O agente, por exemplo, atua
pensando estar em legítima defesa. Esses erros de tipo permissivo, sobre as descriminantes
putativas, podem ser escusáveis ou inescusáveis (art. 20, § 1º, CP). Como dito, esses erros
sobre as descriminantes putativas constituem o chamado erro de tipo permissivo, assim
chamado porque tem o mesmo efeito do erro de tipo: exclui o dolo (se inevitável), mas
permite a punição como crime culposo (se evitável), se houver previsão legal da
modalidade culposa (trata-se da “culpa imprópria”; em tais hipóteses de culpa imprópria é
que a doutrina vislumbra a possibilidade de tentativa em delitos culposos). Para que se
verifique este erro de tipo permissivo, é preciso que o agente erre sobre uma situação de
fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Quando o erro do agente recair sobre a
existência ou mesmo sobre os limites de uma causa de justificação, o problema não se
resolve como erro de tipo, mas, sim, como erro de proibição, nos termos do art. 21 do
Código Penal. Com efeito, há efetivamente um misto de erro de tipo permissivo e erro de
proibição indireto, podendo-se afirmar que se trata de um erro eclético, com estrutura
parecida com o erro de tipo, mas com consequência semelhante ao erro de proibição.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

OBS 3: Erro sobre a pessoa: Decorre de um defeito no processo mental de representação,


por intermédio do qual o agente atinge pessoa diversa da pretendida. Não há que falar de
erro essencial, pois o tipo penal tutela a toda e qualquer pessoa. Contudo, prevalecendo, o
desvalor da ação sobre o desvalor do resultado, determina a lei que o agente deva responder
como se tivesse atingindo a vítima que pretendia atingir. Nesse sentido, dispõe o art. 20, §
3o, do CP. O erro sobre a pessoa não deve ser confundido com o erro na execução
(aberratio ictus): Este é o erro que ocorre não na representação mental do fato, mas, sim, na
sua realização concreta. Por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, que
pretende atingir determinada pessoa, finda por atingir pessoa diversa. Segundo os termos do
art. 73, do CP, a solução da aberratio ictus deve seguir a mesma disciplina do erro sobre a
pessoa. Há ainda figura assemelhada, mas não idêntica, prevista no art. 74, do CP: o
resultado diverso do pretendido (aberratio criminis): Aqui, há hipótese em que vem a ser
atingido bem jurídico de diversa espécie e, dessa maneira, o acidente ou o erro na execução
se dá de pessoa para coisa, de coisa para pessoa ou de coisa para coisa. Sendo assim, por
não envolver mais as características pessoais da vítima que se pretendia atingir, como nas
hipóteses anteriores, a solução para essa modalidade de erro acidental é diversa. Com
efeito, determina o art. 74, do CP, que quando sobrevém resultado diverso do pretendido, o
agente deve responder por culpa, se o fato é previsto como crime culposo. Porém, se ocorre
também o resultado pretendido, aplica-se a regra do concurso formal de crimes (art. 70, do
CP).

OBS 4: Erro sobre o objeto: O erro sobre o objeto (error in objecto) processa-se sobre o
objeto material do crime, ou seja, sobre a coisa onde recai a ação criminosa. Por exemplo,
há erro sobre o objeto quando o agente supõe destruir o automóvel de seu rival quando, na
verdade, destruiu idêntico modelo de carro pertencente a outra pessoa. Muito embora não
previsto no art. 20, § 3o, do CP, pode-se sustentar que essa modalidade de erro acidental
pode ser considerada por ocasião da dosimetria da pena, tendo em vista que um dos fatores
que guiam o processo de individualização é, justamente, a motivação do crime.

OBS 5: Erro provocado por terceiro: Cuida-se, em verdade, de uma das modalidades de
autoria mediata. Evidentemente, aquele que dá causa ao resultado por ter sido induzido a
erro por terceiro, não age com dolo. Portanto, para ele, cuida-se de um erro de tipo
essencial. Nesse sentido, dispõe o art. 20, § 2o, que responde pelo crime o terceiro que
determina o erro. Muito embora não haja dolo, pode o executor imediato operar em erro
vencível, dando azo a sua punição à título de culpa. Ou seja, se fosse possível a ele, com
atenção ou o cuidado exigido em certas situações, constatar o equívoco produzido por
terceiro – impedindo, pois, a superveniência do resultado desvalioso –, poderá responder
por crime culposo, se previsto em lei.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

17.b. Genocídio e Tortura

I - TORTURA:

Bibliografia: Santo Graal 27º. BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Crimes federais. 7 ed.
Porto Alegre: Livraria do advogado, 2011.

Legislação: Lei 9.455/97.

1. Considerações Gerais: No CP, a tortura é agravante (61, II, d) ou qualificadora (121,


§2º, III).

O Brasil subscreveu a Convenção da ONU contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas


Cruéis, Desumanos ou Degradantes, de 1984, adotada pelo D.40/91, bem como a
Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, de 1985, adotada pelo D.
98.386/89. É nítida a influência deste último diploma na construção dos tipos da Lei de
Tortura.

Há também previsão do crime de tortura no Estatuto de Roma, qualificando como crime


contra a humanidade, imprescritível e passível de julgamento pelo Tribunal Penal
Internacional.

Vale ressaltar que nos tratados internacionais, o crime de tortura é próprio; assim, só pode
ser praticado por quem ostenta uma condição especial: detentor de poder estatal,
representante do Estado.

A CF proíbe a tortura ou tratamento desumano ou degradante (art. 5º, III), equiparando-a a


crime hediondo. Contudo, a Lei 9.455/97 tratou o crime de tortura como crime comum,
destoando da previsão deste delito em outros ordenamentos.

Assim, no Brasil é tortura a ação praticada, tanto pelo policial que tortura um preso para
praticar um crime, quanto o credor que tortura o devedor para confessar uma dívida. Até o
advento da Lei 9.455/97, havia um caso de tortura especial, prevista no art. 233 do ECA
(vítima criança ou adolescente). Com o surgimento da LT, esse artigo foi revogado e toda a
matéria sobre tortura está regulamentada neste diploma.

A lei de tortura não define o que é tortura, mas quais são os comportamentos que
constituem crime de tortura. (Quadro: aulas de Rogério Sanches - Intensivo II LFG)

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

2. Bem Jurídico: A dignidade da pessoa humana, sua integridade física e mental.

3. Tipo Objetivo: Constrangimento, ou seja, sujeição, anulação da liberdade de vontade.

4. Consumação e Tentativa: O crime do inciso I (alíneas a, b e c) se consuma com a


provocação do sofrimento físico ou mental, independentemente da obtenção da finalidade
visada - obtenção da informação, a ação criminosa ou a efetiva discriminação (STJ: CC
102833 e REsp 610395). Prevalece que para haver tortura (alínea b do inciso I) deve-se
buscar do torturado crime, não basta contravenção penal. Neste último caso, pode
responder por lesão corporal, por homicídio, etc. No caso da tortura-discriminação, só há o
crime quando a discriminação se refere à raça ou religião. Homofobia não configura
tortura-discriminação, pois esta não abrange a discriminação sexual, a econômica, ou a
social.

Art. 1º, II (tortura-castigo): crime é bipróprio! Só pode ser praticado por quem tem
autoridade ampla sobre a vítima. Ex.: Pai com filho, tutor com tutelado, curador com
curatelado, babá com relação à criança cuidada (STJ - HC 169379 / SP – Sexta Turma- DJE
31/08/11), enfermeira com relação ao idoso. A diferença da tortura para o crime de maus-
tratos, do art. 136, do CP, está na intensidade do sofrimento da vítima, isto é, se não for

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

intenso, aplica-se o art. 136 do CP. De acordo com o STJ, “enquanto na hipótese de maus-
tratos, a finalidade da conduta é a repreensão de uma indisciplina, na tortura, o propósito é
causar o padecimento da vítima” (RESP 610395, DJ DATA:02/08/2004).

Modo de execução: nos incisos I e II é a violência ou grave ameaça (ex.: roleta russa;
Baltazar enfatiza a dificuldade probatória no caso de tortura psíquica). Já no § 1º não
precisa ser com violência ou grave ameaça, bastando que seja um ato ilegal. É a tortura do
encarcerado: para Baltazar, crime próprio de funcionário público (agente penitenciário,
policial, etc.), contra qualquer preso (mesmo civil, preso definitivo ou provisório ou o
sujeito a medida de segurança detentiva). Elemento normativo do § 1º (tortura do
encarcerado): o ato não pode estar previsto em lei ou resultar de medida legal. Ex.: privar
o detento de sono, confiná-lo em espaço minúsculo, em cela escura.

Tipo Subjetivo: Crime doloso, não se exige finalidade específica. Aqui o sofrimento físico
ou mental também não precisa ser intenso. Diferente dos incisos I e II, no §1º o torturador
age sem uma finalidade (tortura pela tortura).

Qualificadoras pelo resultado: O artigo 1º, §3º traz figuras preterdolosas, qualificadas
pelo resultado lesão grave ou morte. Atentar para o dolo: se a intenção do agente, desde o
início, era lesionar ou matar, mediante tortura, incide o CP. Se o agente queria tortura, mas
decidiu matar depois, pode-se falar em progressão criminosa ou concurso de crimes.

Omissão frente à tortura (1º, §2º): pena substancialmente reduzida (possível suspensão
condicional da pena e substituição por pena restritiva de direitos) e regime inicial aberto.
Críticas: a autoridade superior que se omite estaria na posição de garante (art. 13, §2º do
CP). Crime próprio, doloso. Não exige resultado para sua consumação (omissivo próprio).

Competência: da JF quando o delito for praticado, no exercício das funções, por agente
federal, bem como militar das Forças Armadas (não é crime militar – STF, RE 407721).

Extraterritorialidade da lei brasileira (art.2º): Criou-se mais um caso de


extraterritorialidade incondicionada da lei penal brasileira se a vítima for brasileira ou se o
agente se encontrar em local sob jurisdição brasileira. A disciplina legal brasileira dá
cumprimento ao disposto nos arts.5º e 8º, da Convenção contra a Tortura.

Ação penal: É pública incondicionada.

Liberdade provisória: Embora vedada a fiança (art.1º, §6º), é possível a liberdade


provisória sem fiança.

Concurso aparente de crimes: O delito de tortura absorve, por consunção, os crimes de


constrangimento ilegal (art.146 do CP), ameaça (art.147 do CP), lesão corporal leve
(art.129, caput, do CP), abuso de autoridade (Lei 4.898/65), violência arbitrária (art.322 do
CP) e exercício arbitrário ou abuso de poder (art.350 do CP).

Tortura e maus-tratos (art.136 do CP): No caso de maus-tratos, a finalidade é repreender,


enquanto na tortura o objetivo é fazer a vítima sofrer, havendo intenção de causar intenso

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

sofrimento físico ou mental, sem o objetivo de educação (STJ).

Sequestro ou cárcere privado (art.148 do CP) e extorsão mediante sequestro (art.159


do CP): O inciso III do §4º do art.1º da Lei 9.455/97 prevê causa de aumento de 1/6 a 1/3
para o caso de ser o crime de tortura cometido mediante sequestro. Somente haverá o crime
da lei especial quando a vítima for privada de sua liberdade para o fim de ser torturada com
a presença de um dos elementos objetivos da tortura. Se o sofrimento físico ou mental for
decorrente das condições do cativeiro, o crime será um daqueles do CP, com agravante
decorrente da tortura (art.61, II, d, do CP). Caso presentes desígnios autônomos para a
prática de ambos os delitos, o caso será de concurso formal impróprio.

Penas: Causas de aumento (art.1º, §4º):devem incidir também sobre as formas qualificadas.
A primeira delas diz respeito ao crime cometido por agente público, a qual não incide na
modalidade do §2º, uma vez que se trata de crime próprio de funcionário público, a fim de
evitar o bis in idem. Efeitos da condenação (§5º): o efeito da condenação, que se aplica
também ao crime omissivo, é automático, dispensando declaração ou motivação na
sentença, como se conclui da redação, que é imperativa, afirmando que a condenação
acarretará a perda do cargo, função ou emprego público independentemente do tempo da
pena aplicada. Regime inicial: o regime de cumprimento de pena seria o inicialmente
fechado, pelo que dispõe o art.1º, §7º, da Lei 9.455. Ocorre que o Plenário do STF,
recentemente, em 27/06/2012, em conclusão ao julgamento do HC 111.840, noticiado por
meio do Informativo 672 , entendeu pela inconstitucionalidade do §1º do art.2º da Lei
8.072/90, segundo o qual “Os crimes hediondos, a prática de tortura, o tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de [...] §1º A pena por crime
previsto neste artigo será cumprida em regime inicialmente fechado”. Concluiu o STF, pois,
que a definição do regime de cumprimento da pena deve se dar no caso concreto,
independentemente da natureza da infração. Substituição de pena: neste ponto, segundo
Baltazar, a substituição de PPL por PRD esbarra no preenchimento de seus requisitos
legais, já que é inerente à prática da tortura a violência ou grave ameaça no modo de
execução e, em tais casos, a substituição é vedada textualmente pelo inciso I do art.44 do
CP. Defende-se, porém, a possibilidade de suspensão condicional da pena.

Vedações: Vedadas a fiança (LT 1º, §6º), a graça e a anistia (com interpretação ampliativa
para incluir o indulto). É possível, ademais, a liberdade provisória sem fiança.

Anistia e graça: Tal qual a redação do inciso XLIII do art.5º da CF, a Lei 9.455/97 diz ser o
crime de tortura insuscetível de graça ou anistia. A interpretação a ser dada é extensiva, no
sentido de que está vedado também o indulto para o crime de tortura.

O tema foi enfrentado pelo STF (ADPF 153), que, embora afirmando a necessidade de
revelação da verdade em relação aos atos praticados, entendeu pela impossibilidade de
rever a Lei de Anistia (Lei 6.683/79), em relação aos atos praticados por agentes públicos
durante o regime militar, pelos seguintes argumentos: a) anistia bilateral, tanto em relação
aos agentes públicos, quanto aos seus opositores; b) lei de efeitos concretos, devendo ser
interpretada conforme contexto histórico em que editada; c) a Convenção das Nações
Unidas contra a Tortura, em vigor desde 1987, bem como o inciso XIII do art.5º da CF são
posteriores à Lei 6.683/79; e d) não é dado ao Poder Judiciário rever anistia já consumada.
497
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

No plano internacional, porém, predomina o entendimento contrário à admissão de leis


gerais e incondicionadas de anistia em relação a violações graves contra os direitos
humanos, incluída a tortura.

498
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

II - GENOCÍDIO:

Obras consultadas: Santo Graal 27º. resumo do TRF 5/2012, Baltazar, 2012.

Legislação: Decreto 30822. Leitura complementar: RE 351487/RR (professor Marcelo


Uzeda aponta como monografia sobre o assunto o voto condutor). Ver ainda os pontos de
internacional atinentes.

1. Considerações iniciais: O termo deriva da junção da expressão grega “genos” (raça) e


da expressão latina “cidio” (matar). Historicamente, aponta Baltazar, as práticas tendentes à
eliminação de certas raças é antiga, como dos indígenas na América; entretanto, o
surgimento da palavra surge durante a II Guerra Mundial.

A Organização das Nações Unidas fez aprovar Convenção para Prevenção e Repressão do
Crime de Genocídio em 1948, a qual foi ratificada pelo Brasil e promulgada por meio do
Decreto n° 30.822, de 6 de maio de 1952. Nesse ato internacional, são definidos como
genocídio os atos cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo
nacional, étnico, racial ou religioso, aí compreendido: assassínio de membros do grupo;
dano grave à integridade física ou mental de membros do grupo; submissão intencional do
grupo a condições de existência que lhe ocasionem a destruição física total ou parcial;
medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo; e transferência forçada de
menores do grupo para outro grupo.

Nos trabalhos preparatórios, a Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1946, esclareceu
as diferenças entre genocídio e homicídio nos seguintes termos: “O genocídio é a negação
ao direito à existência de grupos humanos inteiros, enquanto que o homicídio é a negação
do direito à vida de um indivíduo humano”.

Em tal Convenção, há previsão de punição para: o genocídio; o conluio para cometer


genocídio; a incitação pública e direta a cometer genocídio; a tentativa de genocídio; e a
cumplicidade no genocídio. No Estatuto do TPI, o genocídio é previsto como crime contra
a humanidade (art. 6º), sendo crime internacional, e, no Brasil, é qualificado como crime
hediondo.

Extraterritorialidade: nos termos do art. 6° da Convenção, as pessoas acusadas de genocídio


ou de qualquer dos outros atos enumerados no artigo 3.º serão julgadas pelos tribunais
competentes do Estado em cujo território o ato foi cometido ou pelo tribunal criminal
internacional que tiver competência quanto às Partes Contratantes que tenham reconhecido
a sua jurisdição. Portanto, os Estados contratantes não são obrigados pela Convenção a
punir o genocídio ocorrido fora do seu território, mas nada impede que o façam.

Em virtude de tal tratado e dos efeitos do período de guerra, foi editada a Lei 2889 em 1º de
outubro de 1956, atendendo ao mandado de criminalização imposto pela Convenção
Internacional e definindo o crime de genocídio como o comportamento com a intenção de
destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso - e, com extrema

499
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

sensibilidade, não o considerava crime político, para efeito de extradição, corroborando,


induvidosamente, o espírito do povo brasileiro, avesso a qualquer discriminação, já que
produto de um amálgama de povos e etnias, às mais diversas, desde suas origens.

Tal crime não é considerado crime político para fins de extradição (art. 6° da Convenção).

O genocídio costuma ser chamado de delito de intenção, em razão de se distanciar das


condutas típicas do homicídio ou da lesão corporal precisamente pela impessoalidade que
reveste a vítima da agressão no genocídio, que é atingida pela só condição de fazer parte do
grupo étnico, religioso, etc.

2. Bem jurídico: a sobrevivência de grupo humano, que possua traço que o identifique; é o
direito à vida do grupo ou da existência, ou seja não protege o direito à vida de membro do
grupo individualmente considerado. STJ: a vida em comum do grupo de homens ou parte
dele.

O Estatuto de Roma considera o genocídio modalidade de crime contra a humanidade, pois


não se busca tutelar bem jurídico de natureza individual. Ou seja: não se pretende tutelar os
bens jurídicos de cada membro do grupo, individualmente considerados, mas sim a própria
existência do grupo (nacional, étnico, racial ou religioso).

Porém, naturalmente que também ocorra a lesão a bens jurídicos individuais. Nesse caso,
lesiona-se o bem jurídico supraindividual, consistente na existência do grupo, bem como os
bens jurídicos individuais (vida humana) dos membros do grupo. Estaremos, então, diante
de concurso de crimes (genocídio e homicídio).

3. Sujeito ativo: embora seja sempre presente a ideia de que o genocídio seja praticado por
governantes ou funcionários públicos, é pacífico hoje o entendimento de que qualquer
pessoa pode ser sujeito ativo do delito ,sendo o genocídio crime comum. Neste diapasão, a
Convenção prevê que sejam punidos pelo cometimento de genocídio e dos demais atos ao
mesmo equiparados tanto governantes e funcionários, quanto particulares. Pode ser
membro do próprio grupo (autogenocídio).

Baltazar aponta que pode ser um dos crimes militares se preenchidos os requisitos de tais
crime.

Não se cuida de crime de concurso necessário (não obstante, no mais das vezes, verifique-
se multiplicidade de agentes), e inexiste impedimento ao fato de os autores do delito serem
também integrantes do grupo vitimado (“autogenocídio”). A lei não traz regra específica
acerca da imunidade, aplicando-se, portanto, as regras da CF sobre imunidade do
Presidente da República e inviolabilidade de parlamentares.

4. Sujeito passivo: Já o sujeito passivo “pode ser qualquer pessoa enquanto integrante de
determinado grupo nacional, étnico, racial ou religioso e que seja atingida como tal. "

Embora a definição do delito se refira a "membros de um grupo", pode configurar-se o


crime ainda que um só seja vítima, desde que atingido em caráter impessoal, como membro

500
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

de um grupo nacional, étnico, racial ou religioso (tais termos se sobrepõem e


complementam). "A pluralidade de vítimas é irrelevante para a configuração do delito,
devendo ser levado em conta na medida da pena" segundo ainda observa Heleno Cláudio
Fragoso.

5. Tipo objetivo: o delito se configura com a prática de alguma das condutas arroladas no
art. 1°.

Atenção: O chamado genocídio cultural ( prática visando a destruição do idioma, religião


ou cultura de determinado povo) não é incriminado nem pela Convenção nem pela lei
2.889/56. Também não é crime ato contra grupos análogos, como mesma orientação
política, ideológica, cultural, situação econômica, jurídica ou física (como PNEs). Porém,
Baltazar aponta que a lacuna em tal ponto é suprida parcialmente pelo Estatuto de Roma ao
considerar como crime contra a humanidade a prática de homicídio, extermínio, etc. como
parte de um amplo ou sistemático ataque contra qualquer população civil.

Grupo nacional: aquele relativo à nação (grupo de indivíduos que falam a mesma língua e
tem tradições comuns, formando uma unidade política, com território determinado e
governados por legislação própria e um poder central).

Grupo étnico: designa o grupo de indivíduos unidos por uma cultura e língua comuns, ainda
que divididos em distintas nações.

Grupo racial: a expressão perdeu, de certa forma, aplicabilidade no Brasil, tendo em vista a
afirmação, pelo STF, da inexistência de diferença racial propriamente dita entre pessoas,
todas pertencentes à raça humana (HC 82424/RS, 19.3.04), todavia ainda é amplamente
utilizada como abrangente de grupos étnicos, nacionais ou religiosos.

Grupo religioso: aquele que professa determinada religião.

OBS: STF, HC 82424/RS: o termo racial perdeu sentido, porque se sabe hoje que todos
pertencem à raça humana, tendo valor histórico e uso amplo na linguagem popular,
abrangendo-se nos grupos étnicos nacionais ou religiosos.

A definição do grupo é positiva, e não negativa (destruir todos os que não sejam do grupo
X).

OBS: não se exige situação de guerra.

6. Conduta: o delito pode ser classificado em genocídio físico (atos que levam à morte dos
membros do grupo – “a”, “b” e “c”) ou genocídio biológico (atos que não levam à morte
dos membros do grupo, mas ao término do grupo como tal, ao impedir o seu
desenvolvimento e renovação – “d” e “e”).

Admite-se a prática do delito tanto na modalidade comissiva quanto omissiva, e é


desnecessária a pluralidade de atos (um único ato poderá, em tese, configurar genocídio,
desde que comprovada a intenção de destruição de determinado grupo).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

As condutas, por ação ou omissão, incriminadas são (art. 1° da lei 2.889/56 – rol
exaustivo):

1) Matar membros do grupo: é a ocisão violenta de pessoas.

2) Causar lesão grave à integridade física ou mental de membros do grupo: a violação à


integridade física em muito se aproxima do crime de lesões corporais; no aspecto mental, a
violação pode se dar por meio de tortura psicológica, violência sexual, escravidão, etc.

3) Submeter intencionalmente o grupo a condições de existência capazes de ocasionar-lhe a


destruição física total ou parcial: cuida-se de delito permanente, e a duração da imposição
das condições que pretendem levar à extinção deve ser analisada no caso concreto (inexiste
duração predeterminada).

4) Adotar medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo: é a chamada


limpeza étnica, que pode se dar por meio de esterilizações em massa, separação forçada de
casais, proibição de casamento, etc.

5) Efetuar a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo: o conceito de


criança adotado aqui é o do art. 1° da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da
Criança (criança é todo ser humano menor de 18 anos), abrangendo, portanto, de acordo
com a lei brasileira, também os adolescentes. A transferência forçada de adultos é atípica do
ponto de vista da lei ora analisada.

Lembre-se: as condutas não precisam ser tomas em tempo de guerra para se caracterizar
genocídio.

7. Consumação: verifica-se com a prática das condutas descritas no art. 1° da lei 2.889/56,
independentemente da efetiva destruição do grupo-vítima. OBS: As condutas descritas nas
alíneas “a”, “b” e “e” são crimes materiais, razão pela qual, em tais circunstâncias, possível
a tentativa. As demais hipóteses (“c” e “d”) são delitos formais.

Tentativa: A tentativa é punível de acordo com regra especial do art. 5° da lei 2.889/56
(aplicação de 2/3 da pena prevista para o fato consumado de modo fixo), restando afastada
a regra geral do art. 14 do CP.

Crime Militar: há formas especiais previstas nos arts. 208, 401 e 402 do CPM, em
contornos assemelhados, quando caracterizado crime militar.

8. Elemento subjetivo: é o dolo, além do fim específico de destruir, ou seja, aniquilar, o


grupo nacional, étnico ou religioso, no todo ou em parte. Não há forma culposa. Não afasta
o crime o fato de o agente tenha agido de acordo com uma política estatal.

9. Pena e Norma Penal em Branco ao Revés: exige um complemento normativo que diz
respeito à sanção aplicável (norma secundariamente remetida), pois se afirma que um
dito crime possuirá a mesma pena de um outro (ex: L. 2889/56 - genocídio, que remete às
penas do homicídio, lesões corporais, etc.).

502
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

As penas são cominadas por remissão a delitos análogos previstos, de forma geral, no CP:

1) Matar membros do grupo – 10 a 30 anos de reclusão (delito análogo: homicídio


qualificado [art. 121, §2°, do CP]).

2) Causar lesão grave à integridade física ou mental de membros do grupo – 2 a 8 anos de


reclusão (delito análogo: lesões corporais gravíssimas [art. 129, §2°, do CP]).

3) Submeter intencionalmente o grupo a condições de existência capazes de ocasionar-lhe a


destruição física total ou parcial – 10 a 15 anos de reclusão (delito análogo: envenenamento
de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal [art. 270 do CP]).

4) Adotar medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo¬– 3 a 10 anos de


reclusão (delito análogo: aborto provocado por terceiro [art. 125 do CP]).

5) Efetuar a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo – 1 a 3 anos de


reclusão (delito análogo: sequestro e cárcere privado [art. 148 do CP]).

OBS: TRF1, 2009: admitiu-se o exame de corpo de delito indireto.

OBS: O professor Marcelo Uzeda aponta que existe controvérsia sobre a natureza de tal
crime, sendo que o MPF, em alguma prova passada, entendeu que seria genocídio tentado
mesmo na hipótese em que houve envenenamento de água para a morte do grupo, que não
ocorreu, mas levou à esterilização.

10. Exame de corpo de delito: admite-se o exame de corpo de delito indireto.

11. Tribunal Penal Internacional (TPI): a competência do TPI para o julgamento do


crime de genocídio é subsidiária/complementar (requer ausência ou deficiência da
jurisdição nacional no julgamento do delito). Os Estados têm, todavia, obrigação de
cooperar com o TPI (o que inclui o dever de dar cumprimento às ordens de prisão
emanadas do tribunal e de entrega da pessoa procurada).

12. Prescrição: o delito de genocídio está sujeito à prescrição (porquanto inexiste regra
específica a respeito na Convenção, na lei 2.889/56 ou na CF).

13. Extradição: o genocídio não é considerado crime político, para fins de extradição (art.
6° da Convenção).

14. Concurso de crimes: Se o genocídio é consubstanciado em homicídio com concurso


autônomo com desígnios autônomos, concurso formal impróprio; se continuado,
apenamento até o triplo (art. 71 do CP), segundo afirmado por Peluso obter dictum no
julgamento abaixo transcrito (Baltazar).

15. Competência: O crime de genocídio é de competência do juiz singular da Justiça


Federal.

Em caso de genocídio consubstanciado em homicídio, a competência será do júri federal, e

503
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

não do juiz federal singular (STF, RE 351487/RR, 3.8.06).

Genocídio é julgado pelo tribunal do Júri? STF: Não. RE 351.487: no genocídio, não se
está diante de crime contra a vida e, por conseguinte, não é o Tribunal do Júri o órgão
competente para o seu julgamento, mas sim o juízo singular.

OBS: Quando há concurso de crimes, todavia, a competência do Tribunal do Júri atrai o


genocídio.

No caso de ser genocídio com mortes contra indígenas, a competência é da JF (art.


109,CF). Como o genocídio é da competência da Justiça Federal, é um exemplo de que se
houver homicídio em concurso com o genocídio, o genocídio será atraído pela competência
do Júri o qual será federal.

[Informativo n.º 434 do STF – O massacre de Haximu]: O Tribunal negou provimento a


recurso extraordinário, remetido pela 1ª Turma ao Plenário, em que se discutia a
competência para processar e julgar os crimes cometidos por garimpeiros contra índios
ianomâmis, no chamado massacre de Haximu. O objeto jurídico tutelado imediatamente
pelos crimes dolosos contra a vida difere-se do bem protegido pelo crime de genocídio, o
qual consiste na existência de um grupo nacional, étnico, racial ou religioso. Assim, não
obstante a lesão à vida, à integridade física, à liberdade de locomoção etc. serem meios de
ataque a esse objeto jurídico, o direito positivo pátrio protege, de modo direto, bem jurídico
supranacional ou coletivo. Logo, no genocídio, não se está diante de crime contra a vida e,
por conseguinte, não é o Tribunal do Júri o órgão competente para o seu julgamento, mas
sim o juízo singular. Desse modo, não se negou, no caso, ser a Justiça Federal competente
para a causa. Ademais, considerou-se incensurável o entendimento conferido pelas
instâncias inferiores quanto ao fato de os diversos homicídios praticados pelos recorrentes
reputarem-se uma unidade delitiva, com a consequente condenação por um só crime de
genocídio. Esclareceu-se, no ponto, que para a legislação pátria, a pena será única para
quem pratica as diversas modalidades de execução do crime de genocídio, mediante
repetições homogêneas ou não, haja vista serem consideradas como um só ataque ao bem
jurídico coletivo. Ressaltou-se, ainda, que apesar da cominação diferenciada de penas (Lei
2.889/56, art. 1º), a hipótese é de tipo misto alternativo, no qual, cada uma das
modalidades, incluídos seus resultados materiais, só significa distinto grau de desvalor da
ação criminosa. Em seguida, entendeu-se que a questão recursal não se esgotaria no
reconhecimento da prática do genocídio, devendo ser analisada a relação entre este e cada
um dos 12 homicídios praticados. Nesse sentido, salientou-se que o genocídio corporifica
crime autônomo contra bem jurídico coletivo, diverso dos ataques individuais que
compõem as modalidades de sua execução. Caso contrário, ao crime mais grave, aplicar-se-
ia pena mais branda, como ocorrera no caso. No ponto, afastou-se a possibilidade de
aparente conflito de normas. Considerou-se que os critérios da especialidade (o tipo penal
do genocídio não corresponderia à soma de um crime de homicídio mais um elemento
especial); da subsidiariedade (não haveria identidade de bem jurídico entre os crimes de
genocídio e de homicídio) e da consunção (o desvalor do homicídio não estaria absorvido
pelo desvalor da conduta do crime de genocídio) não solucionariam a questão, existindo,
pois, entre os diversos crimes de homicídio continuidade delitiva, já que presentes os
requisitos da identidade de crimes, bem como de condições de tempo, lugar e maneira de
504
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

execução, cuja pena deve atender ao disposto no art. 71, parágrafo único, do CP. Ademais,
asseverou-se que entre este crime continuado e o de genocídio há concurso formal (CP, art.
70, parágrafo único), uma vez que no contexto dessa relação, cada homicídio e o genocídio
resultam de desígnios autônomos. Por conseguinte, ocorrendo concurso entre os crimes
dolosos contra a vida (homicídios) e o crime de genocídio, a competência para julgá-los
todos será, por conexão, do Tribunal do Júri (CF, art. 5º, XXXVIII e CP, art. 78, I).
Entretanto, tendo em conta que, na espécie, os recorrentes não foram condenados pelos
delitos de homicídio, mas apenas pelo genocídio, e que o recurso é exclusivo da defesa,
reconheceu-se incidente o princípio que veda a reformatio in pejus. Os Ministros Carlos
Britto, Marco Aurélio e Sepúlveda Pertence ressalvaram seu entendimento no tocante à
adoção da tese de autonomia entre os crimes genocídio e homicídio quando este for meio
de execução daquele. RE 351487/RR, rel. Min. Cezar Peluso, 3.8.2006. (RE-351487)

III - OS CRIMES DEFINIDOS NA LEI Nº 2.889/56:

Ao lado da previsão na Convenção da ONU, o Brasil editou norma legal interna, específica,
criminalizando tal conduta. É a Lei n° 2.889, de 1° de Outubro de 1956:
Art. 1º - Quem, com intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional,
étnico, racial ou religioso, como tal:
a) matar membros do grupo;
b) causar lesão grave à integridade física ou mental de membros do grupo;
c) submeter intencionalmente o grupo a condições de existência capazes de
ocasionar-lhe a destruição física total ou parcial;
d) adotar medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo;
e) efetuar a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo.
Será punido:
Com as penas do art. 121, § 2º, do Código Penal, no caso da letra a; [Pena -
reclusão, de doze a trinta anos.]
Com as penas do art. 129, § 2º, no caso da letra b; [Pena - reclusão, de dois a
oito anos.\'7d
Com as penas do art. 270, no caso da letra c; [Pena - reclusão, de dez a quinze
anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de 25.7.1990)]
Com as penas do art. 125, no caso da letra d; [Pena - reclusão, de três a dez
anos.]
Com as penas do art. 148, no caso da letra e; [Pena - reclusão, de um a três
anos.]

Art. 2º Associarem-se mais de 3 (três) pessoas para prática dos crimes


mencionados no artigo anterior: Pena: Metade da cominada aos crimes ali
previstos.
OBS: Baltazar: é forma especial do delito de quadrilha, com finalidade específica.

Art. 3º Incitar, direta e publicamente alguém a cometer qualquer dos crimes de

505
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

que trata o art. 1º: Pena: Metade das penas ali cominadas.
§ 1º A pena pelo crime de incitação será a mesma de crime incitado, se este se
consumar.
§ 2º A pena será aumentada de 1/3 (um terço), quando a incitação for cometida
pela imprensa.
OBS: Baltazar: a conduta deve ser de forma direta e pública; a mera afirmação racista sem
menção à destruição de grupo pode ser o crime de preconceito do art. 20 da lei 7716/89.

OBS: É um crime de perigo, ou seja, não exige a efetiva ocorrência do genocídio, basta a
caracterização da incitação. Se o genocídio efetivamente ocorrer, a incitação será punida
com pena idêntica à do genocídio em sua forma básica.
Art. 4º A pena será agravada de 1/3 (um terço), no caso dos arts. 1º, 2º e 3º,
quando cometido o crime por governante ou funcionário público.
OBS: Os crimes previstos na lei de genocídio são crimes comuns. A condição de
funcionário público aqui prevista constitui mera causa de aumento de pena e não elementar
do crime.
Art. 5º Será punida com 2/3 (dois terços) das respectivas penas a tentativa dos
crimes definidos nesta lei.
A tentativa tem punição diferenciada e fixa, o que é explorado diuturnamente em provas
objetivas.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

17.c. Crimes nas licitações públicas e crimes contra finanças


públicas

CRIMES NAS LICITAÇÕES PÚBLICAS


Principais obras consultadas: Santo Graal 27º. José Paulo Baltazar Junior. Crimes
Federais, 7ª Edição. Editora Livraria do Advogado. Guilherme de Souza Nucci. Leis
Penais e Processuais Penais Comentadas. 5ª Ed. RT.

Legislação básica: Lei nº 8.666/93.

1. Noções Gerais: Bem jurídico: moralidade administrativa e princípios da competitividade


e isonomia. Sujeito passivo: o ente público e, secundariamente, o servidor e demais
licitantes. Sujeito ativo: é o servidor público (definido segundo o art. 84, que traz definição
mais ampla do que o art. 327 do CP, prevendo, em acréscimo aos entes em que há
equiparação com a condição de servidor, as entidades controladas, direta ou indiretamente
pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios) ou o beneficiário, dependendo do tipo.
O prefeito municipal, como ordenador de despesa, pode ser sujeito ativo do crime, não
implicando bis in idem a tipificação também pelo DL 201/67 (STJ, REsp 504785),
ressalvada a hipótese de consunção deste como crime meio (STF, Inq 3108). O servidor
público condenado por crime de licitações estará sujeito à perda do cargo, emprego, função
ou mandato eletivo (art. 83). Tipo subjetivo: todos os tipos penais da Lei n. 8.666/93 são
dolosos apenas. Ação penal: é pública incondicionada (com expressa admissão da ação
penal privada subsidiária da pública – art. 103) e independe do resultado de processo
perante o TCU. Competência: será da Justiça Federal quando a licitação for promovida pela
União, autarquia, fundação ou empresa pública federal, ou quando o contrato for pago com
verba federal sujeita a prestação de contas ao TCU ou que não tiver sido incorporada ao
patrimônio de outro ente federativo (súmulas 208 e 209 do STJ). O STF tem entendido que,
ainda que não haja verba federal envolvida, pode haver a competência da Justiça Federal,
em razão de lesão de índole eminentemente institucional, como no caso do FUNDEF (HC
100772). A pena de multa não segue o sistema do CP: deve ser calculada com base em
percentual do valor da vantagem efetivamente obtida ou potencialmente auferível pelo
agente, não podendo ser inferior a 2% nem superior a 5% do valor do contrato licitado, e
reverte em favor da Fazenda Pública lesada no caso concreto.

2. Principais Crimes em espécie:

Art. 89. Dispensa ou inexigibilidade ilegais de licitação:

[Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de
observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade: Pena - detenção, de 3
(três) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo
507
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa


ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.]

Bem jurídico: Protege a regularidade e a lisura do procedimento licitatório, especialmente a


moralidade pública.

Sujeito Ativo: É caso de exceção dualista à teoria monista, pois o delito do caput é próprio
de servidor público nos termos do art. 84 da Lei 8666/93, já o crime do parágrafo único é
comum. Prefeito: tem prevalecido a tese no STJ de que o prefeito pode ser responsabilizado
penalmente nos termos do art. 89 em concurso de crimes com o art. 1º, II e XIV do DL
201/67, sem que incorra em vedado bis in idem. Todavia, em relação ao inciso X do DL
201/67, no resumo sobre “crimes de prefeitos” foi feito apontamento no sentido de
especialidade no previsto no art. 89 da Lei , afastando o crime do inciso X, art. 1º do DL
201\67, em concurso aparente de crimes.

Tipo objetivo: Caput: trata-se de crime próprio de servidor público. Há duas formas
comissivas, dispensar ou inexigir, sendo a terceira “deixar de observar as formalidades”,
omissiva. É norma penal em branco, pois os casos de inexigibilidade e dispensa (art. 24 da
Lei 8666\93) e as formalidades a serem observadas estão dispostas na Lei de Licitações,
pois o Administrador Público deve agir somente secundum lege. Para o STJ , a alteração de
limite de dispensa ou inexigibilidade, sem alteração do tipo previsto, não implica em
descriminalização da conduta.

Parágrafo único: Contempla o particular, em exceção dualista à teoria monista. O particular


há de beneficiar-se da ilegal dispensa ou inexigibilidade, sendo que o TRF4 entende que há
crime quando o administrador deixa de manifestar os motivos de contratação direta, em
detrimento do art. 26 da Lei 8666\93.

Tipo subjetivo: É o dolo, consubstanciado na ação livre e consciente de burlar o


procedimento licitatório . Quanto à necessidade de elemento subjetivo específico Baltazar é
pela desnecessidade e colaciona antigo precedente do STJ pela suficiência do dolo .
Todavia, recentes julgados do STJ (em linha com o STF no Inq. 2482) são no sentido da
necessidade de dolo específico, consubstanciado no fim de causar dano ao erário . Quanto
ao dolo eventual o STJ não admite. É certo que não há forma culposa.

Consumação: É tema divergente na jurisprudência. Nos termos do Inq. 2482 de 15.09.2011


(info 640) em decisão Plenária o Min. Luiz Fux registrou na ratio decidendi que se trata de
crime de resultado e não de mera conduta. Porém, Baltazar defende ser de mera conduta,
por isso para ele a consumação se dá no momento da prática do ato de dispensa ou
inexigibilidade e aquele do particular, no momento da contratação, havendo respaldo na
jurisprudência também do STJ pela desnecessidade da configuração do resultado danoso ao
erário, desde que comprovado o especial fim de agir (causar dano ao erário).

Concurso de crimes: Concurso material. É possível com o crime de corrupção, pois o


oferecimento de vantagem não é fase necessária da frustração do crime do art. 89 da Lei
8666/93. Também há entendimento de concurso material entre o crime do art. 89 com o art.
1º, II e XIV da DL 201/67. Concurso aparente. Não há consunção entre o delito do art. 89 e

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

art. 90 ambos da Lei 8666/93.

Art. 90. Frustrar ou fraudar competição em licitação:

[Art. 90. Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o
caráter competitivo do procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para
outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação: Pena - detenção, de 2
(dois) a 4 (quatro) anos, e multa].

Noção: As figuras podem ocorrer, por exemplo, mediante cláusulas discriminatórias ou


ajustes entre os participantes. Sujeito ativo: É crime comum. Baltazar entende que nas
modalidades “ajuste” e “combinação” há concurso necessário, porém a jurisprudência do
TRF4 nega essa relação. Sujeito ativo: O ente licitante e o concorrente prejudicado. Tipo
Objetivo: Admite-se a interpretação analógica, pois “qualquer outro expediente”, recurso ou
meio assemelhado ao ajuste ou combinação poderá dar ensejo à incidência do tipo. Exige-
se, no entanto, que o ajuste ou combinação representem frustração do caráter competitivo
do procedimento, sob pena de o delito ser o do art. 93 e não o do art. 90. Tipo subjetivo: É o
dolo acompanhado da finalidade específica de obter, para si ou para terceiro, vantagem
decorrente da adjudicação do objeto. Não forma culposa. Consumação: É crime formal ,
pois a tipifica a conduta praticada com o “intuito de”, que se consuma com o mero ajuste,
combinação ou adoção de qualquer outro expediente, Independe da efetiva adjudicação ou
obtenção de vantagem econômica. Concurso de crimes: Há concurso material entre o delito
do artigo 93 e corrupção ativa e passiva. Porém, em relação ao peculato do art. 312, caput,
2ª figura do CP ou DL 201/67, art. 1º, I, o crime do artigo 93 da Lei 8666/93 será
absorvido, sendo mero concurso aparente. Distinção: O crime do art. 90 tem por fim a
frustração do caráter competitivo, quer dizer, não há efetivamente competição em razão do
ajuste da combinação ou uso de meio análogo, sendo que no art. 93 o procedimento
licitatório já teve início. E também o artigo 95, que é forma especial dos artigos 90 e 93.

Art. 91. Patrocínio de interesse privado:

[Art. 91. Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a Administração,


dando causa à instauração de licitação ou à celebração de contrato, cuja invalidação vier a
ser decretada pelo Poder Judiciário: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e
multa].

Noção: Cuida-se de forma especial do crime de advocacia administrativa, previsto no art.


321 do CP, com pena maior. Sujeito ativo: É crime comum. Seja funcionário público ou
qualquer pessoa desde que leve à invalidação do procedimento pelo Poder Judiciário. OBS:
Porém, se o crime for cometido por funcionário e houver invalidação pelo poder Judiciário,
o crime do CP restará absorvido pelo especial, que é mais grave, para não se punir
particulares de modo mais severo do que o servidor. Tipo objetivo: A invalidação do
contrato pelo Poder Judiciário é condição objetiva de punibilidade, desde que tenha relação
de causa e efeito com irregularidade provocada pelo autor do patrocínio. OBS: Se o agente
é constituído como procurador para defender interesses legítimos do licitante, há exercício
regular de um direito. Tipo subjetivo: É o dolo com fim específico de representar um
interesse escuso perante a administração. Consumação: Com o trânsito em julgado da

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

decisão que invalida o procedimento, sendo crime material. Não haverá crime se a
invalidação se der apenas no âmbito da própria administração. Distinção: Se o interesse for
defendido por funcionário público, ocorrerá o crime do art. 321 do CP, mas se houver a
invalidação pelo Poder Judiciário então será absorvido pelo crime do art. 91 da Lei
8666/93, que é mais grave.

Art. 92. Modificação ou vantagem contratual na fase executória:

O tipo do caput abrange 2 delitos distintos, praticados na fase posterior à licitação: (a)
modificação ilegal do contrato; (b) pagamento antecipado.

Modificação ilegal do contrato (92, 1ª parte): [Art. 92. Admitir, possibilitar ou dar causa a
qualquer modificação ou vantagem, inclusive prorrogação contratual, em favor do
adjudicatário, durante a execução dos contratos celebrados com o Poder Público, sem
autorização em lei, no ato convocatório da licitação ou nos respectivos instrumentos
contratuais...]. Bem jurídico: É a regularidade do procedimento licitatório, em especial os
princípios da moralidade, competitividade e isonomia e também quanto à vinculação ao
instrumento convocatório. Sujeito ativo: É crime próprio de servidor que tenha competência
para decidir ou influir sobre a modificação do contrato, bem como para determinar o
pagamento. Tipo Objetivo: As prorrogações e alterações permitidas são aquelas previstas
nos arts. 57 e 65 da Lei 8666/93. Exige-se também, para a ocorrência do crime que a
modificação ou prorrogação ilegais impliquem favorecimento ao contratado. Se dá na fase
posterior à licitação propriamente dita, o que distingue esse tipo daquele previsto no art. 93.
Tipo Subjetivo: É o dolo. Não admite forma culposa. Consumação: Com o favorecimento
efetivo do adjudicatário, tratando-se de crime material. A mera modificação sem o efetivo
favorecimento configurará tentativa.

Pagamento antecipado (92, 2ª parte): [...ou, ainda, pagar fatura com preterição da ordem
cronológica de sua exigibilidade, observado o disposto no art. 121 desta Lei: (Redação dada
pela Lei nº 8.883, de 1994) Pena - detenção, de dois a quatro anos, e multa. (Redação dada
pela Lei nº 8.883, de 1994) (...)]. Sujeito ativo: É crime próprio do funcionário que tenha
competência para determinar o pagamento, ou seja, o ordenador de despesas. O particular
favorecido responderá também pelo crime em concurso de pessoas. Tipo Objetivo:
Concretiza a proteção da ordem de pagamento estabelecida no art. 5º da Lei 8666/93 . O
art. 121 é norma temporária. Tipo subjetivo: É o dolo. Consumação: Com o efetivo
pagamento. Admite tentativa.

Favorecimento do contratado (92, parágrafo único): [Art. 92. (...) Parágrafo único. Incide
na mesma pena o contratado que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação
da ilegalidade, obtém vantagem indevida ou se beneficia, injustamente, das modificações
ou prorrogações contratuais]. Sujeito ativo: É crime de particular, sendo exceção dualista à
teoria monista em relação à primeira parte do art. 92. É crime próprio do contratado, a
pessoas física ou o administrador da pessoa jurídica contratada. Tipo Objetivo: Assim como
no crime básico relaciona-se ao art. 5º da Lei 8666/93. Exige-se ainda que o contratado
tenha concorrido para a ilegalidade, podendo esse concurso ocorrer de forma comissiva ou
omissiva. Há elemento normativo do tipo nas elementares vantagem “indevida” ou
benefício “injusto”, de modo que não há crime quando a modificação ou prorrogação
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

estiverem devidamente justificados pelas circunstâncias do caso concreto. Tipo subjetivo: É


o dolo. Consumação: Favorecimento efetivo. A modificação sem o efetivo favorecimento
configura tentativa. Concurso de crime: Esse tipo afasta a incidência do peculato-desvio
(art. 312, caput, do CP).

Art. 93. Atentar contra ato do procedimento licitatório:

[Art. 93. Impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento


licitatório: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa].

Bem jurídico: É o regular andamento do certame. Sujeito ativo: É crime comum. Tipo
objetivo: O art. 93, subsidiário do art. 90, juntamente com o art. 95, é revogador do art. 335
do CP. O dispositivo em questão é mais amplo. Se o documento falso não é essencial para a
habilitação, não há crime. Tipo Subjetivo: É o dolo. Consumação: É crime formal, assim
basta mera perturbação ou fraude independentemente de efetivo impedimento ou
interrupção do procedimento licitatório, bem como de prejuízo. Concurso de crimes: São
absorvidos os delitos tipificados nos arts. 297 , 301 e 304 do CP. Ação Penal: A decisão
favorável do TCU não obsta o prosseguimento da ação penal por crime de fraude em
licitação. Competência: É do JEC. E a territorial é a do local da apresentação do
documento, ainda que a falsidade tenha se dado em outra localidade.

Art. 94. Quebra de sigilo de proposta:

[Art. 94. Devassar o sigilo de proposta apresentada em procedimento licitatório, ou


proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo: Pena - detenção, de 2 (dois) a 3 (três) anos,
e multa].

Noção: O sigilo é essencial para a regularidade da licitação e preservação da


competitividade, sendo assegurado pelo §3º do art. 3º da Lei 8666/93 . Tanto assim, que a
conduta já era assegurada pelo art. 326 do CP, revogado por esse artigo em comento.
Sujeito ativo: É crime comum, sendo que na segunda figura o terceiro que quebra o sigilo
também responderá pelo crime. Tipo objetivo: É modalidade específica de sigilo funcional.
Tipo subjetivo: É o dolo. Não há forma culposa. Consumação: Pelo mero acesso indevido à
informação sigilosa, independentemente de sua divulgação ou prejuízo ou proveito de quem
quer que seja.

Art. 95. Afastar ou procurar afastar licitante, por meios ilegais:

[Art. 95. Afastar ou procurar afastar licitante, por meio de violência, grave ameaça, fraude
ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo: Pena - detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro)
anos, e multa, além da pena correspondente à violência. Parágrafo único. Incorre na mesma
pena quem se abstém ou desiste de licitar, em razão da vantagem oferecida].

Noção: A parte final do art. 335 do CP foi revogada pelo artigo em comento. Sujeito ativo:
É crime comum. Também pelo funcionário público. Responde também o licitante que cede
ao oferecimento da vantagem responde pelo crime. Mas não o licitante agredido. Ameaçado
ou ludibriado, pois é vítima. Tipo Objetivo: A vantagem de qualquer tipo pode ser,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

inclusive, sexual. Tipo Subjetivo: É o dolo. Consumação: É crime de atentado, que se


configura com o mero fato de procurar afastar o licitante. Não cabe tentativa. Pena: Em
concurso material com a correspondente à violência. Distinção: É especial em relação aos
arts. 90 e 93.

Art. 96. Fraude à licitação:

[Art. 96. Fraudar, em prejuízo da Fazenda Pública, licitação instaurada para aquisição ou
venda de bens ou mercadorias, ou contrato dela decorrente: I - elevando arbitrariamente os
preços; II - vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria falsificada ou deteriorada;
III - entregando uma mercadoria por outra; IV - alterando substância, qualidade ou
quantidade da mercadoria fornecida; V - tornando, por qualquer modo, injustamente, mais
onerosa a proposta ou a execução do contrato: Pena - detenção, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e
multa].

Sujeito ativo: É crime próprio, pois como se dá no momento da execução do contrato,


somente poderá ser autor o contratado ou o administrador da empresa contratada. Tipo
objetivo: É o mais grave crime, aplicando-se apenas para vendas de bens ou mercadorias,
sendo atípicas quando o objeto for serviço. Consumação: Exige-se o efetivo prejuízo.

3. Considerações finais:

Ação penal: É pública incondicionada. Não estando subordinada à conclusão de processo


administrativo no TCU. Admite-se ação penal privada subsidiária da pública (art. 103).

Justiça Federal: Quando a licitação for promovida pela União, suas autarquias ou
empresas públicas ou quando o contrato for pago com verba federal sujeita à prestação de
contas do TCU. Recente decisão do STJ definiu a competência da Justiça Federal quando
for crime de malversação de recursos do FUNDEF em razão do caráter nacional da política
de educação, independentemente de repasse de recursos da União.

Rito: Com a reforma do CPP, o §4º do art. 394 determinou que as disposições dos arts. 395
a 398 aplicam-se a todos os procedimentos de primeiro grau, isso cumulado com o art. 108
da Lei 8666/93, tem-se que deve ser oportunizada a apresentação da defesa escrita antes do
interrogatório (art. 396, CPP), devendo o disposto no art. 104 da Lei de licitações (Recebida
a denúncia e citado o réu, terá este o prazo de 10 (dez) dias para apresentação de defesa
escrita, contado da data do seu interrogatório, podendo juntar documentos, arrolar as
testemunhas que tiver, em número não superior a 5 (cinco), e indicar as demais provas que
pretenda produzir), ser interpretado sistematicamente a fim de oportunizar a defesa escrita
antes do interrogatório.

Interceptação telefônica: Como são apenados com detenção somente poderá valer-se de
interceptação quando houver conexão com delitos apenados com reclusão.

Efeito da condenação: A perda do cargo deve ser aplicada independentemente do

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

quantitativo de pena imposta, diferentemente do art. 92 do CP: Art. 83. Os crimes definidos
nesta Lei, ainda que simplesmente tentados, sujeitam os seus autores, quando servidores
públicos, além das sanções penais, à perda do cargo, emprego, função ou mandato eletivo.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

CRIMES CONTRA AS FINANÇAS PÚBLICAS:


Obras consultadas: Santo Graal 27. DAMÁSIO. Código Penal Anotado. 18ª ed. Ed.
Saraiva; MIRABETE. Júlio Fabrini; 2 edição, Editora Atlas. BALTAZAR Jr.. Crimes
Federais, 2012.

Legislação básica: Artigos 359 “A” e seguintes do código penal, com redação dada pela lei
10028/2000; LC 101 (responsabilidade fiscal); lei 4320 (normas gerais de direito
financeiro).

Criados pela Lei 10.028/00 no título do CP destinado aos crimes contra a Administração
Pública. Tutelam o bem jurídico finanças públicas, pela observância de normas constantes
da Constituição (arts. 163-169) e da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF – LC 101/00).
Para Regis Prado, algumas das condutas previstas como delitos por essa lei não deveriam
passar de infrações administrativas, tendo em conta os princípios penais fundamentais da
fragmentariedade e da ultima ratio. Mesma opinião de Damásio: ilícitos administrativos
praticados no exercício da função pública, no que tange ao controle, aplicação e
disponibilidade do erário, ganham status de crimes.

Baltazar louva a responsabilização de agentes políticos do Executivo federal e estadual,uma


vez que antes a responsabilização era praticamente limitada aos Prefeitos Municipais.

Todos são crimes dolosos, sem elemento finalístico específico. Todos de ação penal pública
incondicionada. Sujeito ativo: crimes próprios (funcionários públicos).

Geralmente formais e de perigo abstrato (exceções discriminadas abaixo). Prescindem de


efetiva lesão ao erário (dispensam resultado naturalístico, com consumação na prática dos
verbos núcleos). Para Regis Prado, são normas penais em branco, por necessitarem, para
sua compreensão, de complementação por normas de Direito Financeiro. Quatro dos crimes
são de pequeno potencial ofensivo (competência dos JECrimF); os outros quatro, de médio
potencial ofensivo (nenhuma pena máxima em abstrato supera quatro anos). A violação de
dever para com a Administração Pública, para Masson, é inerente aos crimes contra as
finanças públicas, o que viabiliza, caso seja aplicada pena privativa de liberdade igual ou
superior a um ano, a decretação da perda do cargo, função pública ou mandato eletivo do
agente público, como efeito da condenação (CP 92, I, a).

CP 359-A (Contratação de operação de crédito sem prévia autorização legislativa ou fora


dos limites legais). Menor potencial ofensivo.

As figuras do parágrafo único são lei penal em branco, segundo Prado, porque remetem ao
limite a ser observado, que deve constar de lei ou resolução do Senado Federal.

Tutela o LRF 32, incisos I e IV. Na modalidade realizar, é delito de resultado. Punição ao
desrespeito ao princípio da legalidade administrativa, quando realizadas sem prévia
autorização do Legislativo (expressão “sem prévia autorização legislativa” é elemento

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

normativo do tipo, e não se confunde com autorização legal, a qual também é exigida,
segundo Baltazar; há julgado do STF de 2008 que a existência de autorização legal afasta o
crime). Expressão “interno ou externo” permite criminalização em operações de crédito
nacional ou internacional. Sujeito ativo é agente público + quem tem competência para
ordenar ou autorizar operação creditícia. PREFEITOS: tipo especial no Decreto-lei
201/1967 (art. 1º, XX). PRESIDENTE DA REPÚBLICA: tipo especial na Lei 1079/50 (art.
10).

CP 359-B (Inscrição de despesa irregular em restos a pagar). Menor potencial ofensivo. Lei
penal em branco. Vide Lei 4.320/64, artigo 36. Elemento subjetivo é o dolo, sem exigência
de algo específico. Elemento normativo “que exceder limite estabelecido em lei”.
Revogação ou anulação ato administrativo não desconfiguram o crime (mas acarreta
atenuante genérica). Podem Presidente e Prefeitos cometerem tal crime.

CP 359-C (Assunção de obrigação irregular nos dois últimos quadrimestres do mandato).


Médio potencial ofensivo. Tutela o LRF 42. Não permitir ao administrador assumir
obrigações financeiras sem que haja recursos disponíveis para futuro pagamento. O tipo
possui elemento temporal expresso. Não se exigem finalidades específicas (prejudicar
sucessor ou rival político). Elemento normativo do tipo é “que exceda limite estabelecido
em lei”. Crime praticado por ato administrativo (crime unissubsistente, que impede
tentativa), sendo que anulação e revogação administrativa não excluem a tipicidade (sem
prejuízo de atenuante genérica).

CP 359-D (Ordenação de despesa não-autorizada). Médio potencial ofensivo. Agente


públicos + competência à autorização de gerar despesas públicas. Damásio usa expressão
“dolo abrangente”: sem finalidade específica + conhecimento que despesa não se encontra
autorizada em lei. Crime unissubsistente (sem tentativa), pouco importa que ordem seja
anulada/revogada que tipo permanece (permite atenuante). Discute-se a constitucionalidade
da tipificação nos casos em que a despesa não autorizada traz benefício para a
Administração; para Masson, o crime é formal e de perigo abstrato, prescindindo do
prejuízo ao erário, presumido, de forma absoluta, pelo tipo. Também o princípio da
legalidade legitimaria a previsão. Outra discussão: o estado de necessidade (CP 23, I e 24)
albergaria a hipótese de despesa feita em caso de calamidade pública, por exemplo. Prado
admite, genericamente, a incidência de causa de justificação. Masson entende que a
Constituição não traz exceção à exigência de autorização normativa da despesa pública;
situações emergenciais seriam contempladas pela previsão do artigo 167, §3º da
Constituição (MP para despesas imprevisíveis e urgentes).

CP 359-E (Prestação de garantia graciosa). Menor potencial ofensivo. Tutela a observância


do LRF 29, IV e 40, §1º LC 101 (garantias exigem contragarantias em valores iguais ou
superiores ao das garantias concedidas). Dolo não exige finalidade específica (favorecer
políticos amigos). Delito de resultado, consuma-se com a efetiva prestação da garantia.
Para Luiz Flávio Gomes e Alice Bianchini, é crime de perigo concreto, lição adotada
acriticamente por Masson (Prado e Damásio não se posicionam). O mesmo autor entende
que o estado de necessidade legitima a conduta – seria o caso da União prestar garantia
graciosa a instituição financeira, garantindo empréstimo a Estado atingido por enchentes.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

CP 359-F (Não cancelamento de restos a pagar). Proteção à transição dos agentes públicos
(contas públicas dentro da regularidade, a se evitar efeito “bola de neve” em governos
sucessivos). Menor potencial ofensivo. Crime omissivo próprio (independe ulterior dano ao
patrimônio – impossibilidade de tentativa). Elemento normativo do tipo é valor superior
“ao permitido em lei”, sendo que se irregularidade for por outro motivo o fato será atípico
(pode ser responsabilização administrativa). Para Masson, exceção pluralística à teoria
monista no tocante ao concurso de pessoas. O funcionário público que deixa o cargo após
inscrição incorre no CP 359-B; aquele que assume o cargo, no CP 359-F. Os dois agentes
contribuem para o mesmo resultado, mas incidem tipos distintos. Se o mesmo funcionário
cometer 359B e 359F, responde apenas pelo primeiro, comissivo (Baltazar).

CP 359-G (Aumento de despesa total com pessoal nos últimos 180 dias de mandato). É a
incriminação de conceder aumento ao final do mandato, um velho costume político no
Brasil (Damásio). Médio potencial ofensivo. Tutela a observância do CF 169 e LRF 18 e
21, parágrafo único. Não importa que haja recursos para honrar a despesa (diferentemente
do CP 359-C). O tipo possui expresso elemento temporal – a conduta só é crime se
praticada nos últimos cento e oitenta dias do mandato ou legislatura; aumento de gastos
fora desse período é conduta atípica. Na modalidade executar, é crime de resultado.

CP 359-H (Oferta pública ou colocação no mercado de títulos da dívida pública


irregulares). Médio potencial ofensivo. Tutela o LRF 61. Proíbe operações com títulos que
não tenham sido criados por lei ou que não tenham sido registrados em sistema centralizado
de liquidação e custódia. Para Regis Prado, na modalidade promover, é crime de resultado.
Sujeitos ativos somente os chefes do Executivo.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

18.a. Etapas da realização do crime


Principais obras consultadas: Santo Graal 27º. Cezar Roberto Bitencourt, Tratado de
Direito Penal, 2009. Paulo Queiroz, Direito Penal, 2011. Cleber Masson, Direito Penal
Esquematizado, 2011. Guilherme de Souza Nucci, Código Penal Comentado, 2012.
Rogério Greco, Curso de Direito Penal, 2009.

Legislação básica: Art. 14, inc. II, CP.

Conceito de iter criminis: O iter criminis ou itinerário do crime significa o conjunto de


etapas que se sucedem, cronologicamente, no desenvolvimento do delito. Tal discussão se
atém ao crime doloso, pois na culpa não há que se falar em cogitação ou vontade de
produzir o resultado e, portanto, essas etapas acerca do caminho do crime são
incompatíveis com o tipo penal culposo.

OBS para os colegas: Alguns autores analisam o iter criminis por duas fases: uma interna e
outra externa. Outros autores analisam por 4 etapas: cogitação, preparação, execução e
consumação. Originalmente o Santo Graal está por fases, mas como por etapas é muito
difundido na doutrina, apresentaremos dos dois modos.

ANÁLISE PELAS FASES: Fase interna: Ocorre na mente do agente. É a chamada


cogitatio (cogitação), o momento de ideação do deito, ou seja, quando o agente tem a ideia
de praticar o crime. Considerando que a fase interna não é exteriorizada, por óbvio também
não é punida. Além da fase de cogitação, Nucci ainda subdivide a fase interna em mais duas
fases: (ii) deliberação – momento em que o agente pondera os prós e contras da atividade
criminosa idealizada; (iii) resolução – cuida do instante em que o agente decide,
efetivamente, praticar o delito. Fase externa: A fase externa inicia-se com o preparação, ou
seja, o agente começa a se preparar com o fim de obter êxito em sua empreitada criminosa.
Nessa etapa, o agente realiza atos externos, que passa da cogitação à ação objetiva, arma-se
dos instrumentos necessários à prática da infração penal, procura o local mais adequado ou
a hora mais favorável. Em suma, o agente pratica atos que começam a materializar a
perseguição ao alvo idealizado. O Código Penal brasileiro não admite a punição da
preparação. No entanto, o legislador por vezes transforma esses atos, que seriam
“meramente preparatórios”, em tipos penais autônomos (v.g. petrechos para falsificação de
moeda, quadrilha ou bando, etc.). Após os atos preparatórios, dá-se início à fase da
execução, na qual começa a realização da conduta designada pelo núcleo do tipo penal,
constituída, em regra, de atos idôneos e unívocos para chegar ao resultado, mas também
daqueles que representares atos imediatamente anteriores a estes, desde que se tenha a
certeza do plano concreto do autor (teoria objetivo-individual, abaixo explicada). A conduta
aqui já é punível (crime tentado), como preconiza o art. 14, inc. II do CP. Por fim, a fase da
consumação, o momento de conclusão do delito, reunindo todos os elementos do tipo penal.
OBS: Alguns autores como Rogério Greco acrescentam ainda a fase de exaurimento, que
ocorreria apenas em alguns tipos de infrações penais. Significa a produção de resultado
lesivo a bem jurídico após o delito já estar consumado.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Passagem da preparação para a execução: Há, basicamente, duas teorias: a) subjetiva:


Essa teoria se satisfaz tão somente com o fato do agente revelar sua intenção criminosa
através de atos inequívocos, não fazendo distinção entre atos preparatórios e atos
executórios. A vontade criminosa é que importa, e está presente, de maneira nítida, tanto na
preparação quanto na execução do crime. b) objetiva: adotada pelo Código Penal, o início
da execução é, invariavelmente, constituído de atos que principiem a concretização do tipo
penal. Se subdivide em: a) teoria da hostilidade ao bem jurídico: atos executórios são
aqueles que atacam o bem jurídico, retirando-o do “Estado de paz” (Nelson Hungria, Max
Ernst Mayer e José Frederico Marques) a) teoria objetivo-formal: ato executório é aquele
que constitui uma parte real do fato incriminado pela lei, são os que fazem parte do núcleo
do tipo; b) teoria objetivo-material: atos executórios são aqueles em que se começa a
prática do núcleo do tipo, e também os imediatamente anteriores ao início da conduta
típica, de acordo com a visão de terceira pessoa, alheia aos fatos; teoria objetivo-individual:
Atos executórios são os relacionados ao início da conduta típica, e também os que lhe são
imediatamente anteriores, em conformidade com o plano concreto do autor, sem se
preocupar com a figura do terceiro observador (Zaffaroni e Pierangeli). Exemplo
esclarecedor (Nucci): Se alguém saca seu revólver, faz pontaria, pretendendo apertar o
gatilho para matar outrem, somente seria ato executório o momento em que o primeiro tiro
fosse disparado (teorias objetivo-formal e da hostilidade ao bem jurídico), tendo em vista
que unicamente o disparo poderia atacar o bem jurídico. Para as teorias objetivo-material e
individual, poderia ser o agente detido no momento em que apontasse a arma, com nítida
intenção de matar. OBS: Deve-se ressaltar, por fim, que qualquer teoria (objetiva), à luz do
caso concreto, pode ganhar contornos diferenciados, pois tudo depende das provas
produzidas nos autos do inquérito ou do processo. Portanto, a aplicação das teorias pela
jurisprudência depende da situação concreta.

ANÁLISE POR ETAPAS:

1ª etapa: cogitação: A primeira etapa do iter criminis é a cogitação, que se dá no âmbito


interno do agente. Essa fase não é punível, pois o Direito Penal é da conduta, do fato.
Então, porque se analisa a fase de cogitação? Através da análise da cogitação se averigua o
dolo do agente, por exemplo. O melhor momento é o interrogatório do réu, pois nele se
descobre eventual erro de tipo, manifestação de vontade na decisão, escolha dos meios, a
representação do resultado [para analisar culpa consciente e dolo eventual, p. ex.], entre
outras coisas. Tais elementos são analisados na individualização da pena. Em suma, a
cogitação é uma fase interna e subjetiva que se passa na mente do criminoso.

2ª etapa: preparação: A segunda etapa é a preparação, na qual há a exteriorização da


vontade. Os atos preparatórios são aqueles comportamentos exteriorizados que conduzem o
agente à realização da infração penal desejada, sem realizá-la ainda. Em regra, a preparação
é impunível, mas existem atos preparatórios que, por colocarem em risco determinados bem
jurídicos, já são considerados crimes autônomos. Ex 1: Art. 291 do CP (petrechos para
falsificação de moeda). Pelo princípio da consunção, na modalidade de antefato impunível,
o art. 291 do CP acaba absorvido pelo crime do art. 289 do CP. Porém, se não houver o
crime fim, que era falsificar moeda, o ato preparatório será punido, sendo crime autônomo.
518
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

[Então, a preparação é ato preparatório que será absorvido pelo crime fim; porém, se o
crime fim não ocorrer, será punido autonomamente]. Ex 2: Se quatro pessoas se reúnem
com a finalidade de praticar crimes, não sendo uma reunião eventual, mas sim de caráter
duradouro, o que seria um mero ato preparatório é elevado ao status de infração autônoma,
ou seja, o crime do art. 288 do CP (quadrilha) [mesmo se não realizarem nenhum dos
crimes pretendidos]. Tal conduta é ato preparatório e crime formal, entretanto, nesse caso,
haverá concurso material entre quadrilha e os demais crimes, pois os bens jurídicos são
diferentes. [então, quadrilha é um ato preparatório em que haverá concurso material com o
crime fim]. Ex 3: Roubo com emprego de arma de fogo. O porte de arma de fogo também é
crime de perigo abstrato, para doutrina majoritário no STJ. A doutrina e jurisprudência
entendem que basta a posse. Nesse caso, a aquisição da arma caracteriza um crime
autônomo (art. 14 da Lei de armas), se a arma foi empregada no roubo, sua aquisição (que
seria momento antecedente ao roubo) acaba sendo absorvida pelo delito-fim, visto que no
roubo já há aumento de pena pelo emprego da arma de fogo. OBS: Contudo, se o agente é
encontrado portando arma de fogo, após revista policial, antes que tenha efetivamente
iniciado a execução de roubar alguém. Nesse caso, o ato preparatório do roubo (que seria o
porte ilegal), vai figurar como crime autônomo, pois a segurança pública já foi colocada em
risco. Acontece a mesma coisa se a pessoa for pega após o roubo, portanto arma de fogo. O
porte ilegal da arma será considerado crime autônomo e também será considerado o
aumento de pena pelo emprego de arma de fogo.

3ª etapa: execução: A terceira etapa é a execução. Há várias teorias. O Código Penal adota
a teoria objetivo-formal para os atos executórios. Para essa teoria, o ato executório ocorre
quando o sujeito realiza o comportamento descrito no tipo penal. Por exclusão, ato
preparatório é tudo que vem antes e conduz à realização da conduta. Ex: Pela teoria
objetivo-formal, o ato executório no crime de homicídio praticado com arma de fogo se
inicia com o acionamento do gatilho. Tudo o que vem antes desse momento é ato
preparatório. Para a teoria subjetiva, o ato de execução ocorre quando o sujeito, de modo
inequívoco, exterioriza sua vontade de praticar a infração penal. Para essa teoria, não há
diferença entre ato preparatório e executório e, por conta disso, não foi adotada pelo Código
Penal brasileiro. Ex: Praticaria um homicídio tentado aquele que, depois de ter sido
agredido por outrem, fosse rapidamente até a sua casa buscar uma arma para, logo em
seguida, colocar-se à espera de seu agressor, no caminho em que este habitualmente
passava, mas que por desconfiar da vingança do agente toma rumo diverso. Tais atos já
demonstrariam, de maneira inequívoca, a intenção criminosa do agente, razão pela qual
deveria responder pela tentativa, uma vez que a consumação só não ocorrerá por
circunstâncias alheias à sua vontade [pela teoria objetiva é mero ato preparatório]. A teoria
objetivo-material afirma que o ato executório é aquele comportamento vinculado à conduta
típica [ao tipo penal] e que crie uma situação de risco para o bem jurídico. Essa teoria tenta
compatibilizar o aspecto objetivo com a exposição do bem jurídico a um risco. Ex: Para
essa teoria, apontar a arma municiada para a vítima já é ato de execução, pois esse ato
vinculado ato tipo matar alguém já expõe o bem jurídico a risco. Por fim, para a teoria da
hostilidade ao bem jurídico, o ato executório é aquele que ataca, efetiva e imediatamente, o
bem jurídico tutelado. Portanto, ato preparatório é toda conduta mediata que leva à
execução. Essa teoria é vaga, pois não vincula o ato executório ao tipo penal, se
preocupando apenas com o bem jurídico.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

4ª etapa: consumação: Depois da execução, a quarta etapa do iter criminis é a


consumação, que está definida no art. 14, I do CP e se constitui pela presença de todos os
elementos constitutivos do tipo. OBS 1: Crime instantâneo: O crime instantâneo é aquele
que se consuma em momento determinado, ou seja, a lesão jurídica se aperfeiçoa em um
único momento. Em uma representação matemática, sua consumação seria um ponto. Ele
pode ter efeitos permanentes, sendo um crime instantâneo de efeitos permanentes, ou seja,
o crime se consuma em momento exato, porém projeta os efeitos para o futuro,
estabelecendo desdobramentos da lesão jurídica no tempo. Em alguns casos, esses efeitos
são irreversíveis, ex: o crime de homicídio. Em outros casos, há a possibilidade de reversão
dos efeitos no futuro, ex: no crime de estelionato previdenciário, para o fraudador que não
seja o beneficiário, é um crime instantâneo de efeitos permanente e se consuma com o
pagamento da primeira parcela indevida [a inscrição fraudulenta é ato executório, a
consumação é com o pagamento mesmo], para o que irá receber as parcelas indevidas o
crime é permanente, pois é o comportamento dele ao receber as parcelas mês a mês que
mantém a lesão ao bem jurídico. [o efeito permanente do crime de quem fraudou é o
próprio crime permanente do que recebe as parcelas indevidas – há divergência entre
jurisprudência e doutrina, veja abaixo]. OBS 2: Crime permanente: O crime permanente é
aquele em que a lesão ao bem jurídico é ininterrupta e se mantém à custa do
comportamento do agente. A jurisprudência do tribunais superiores sustenta que o
beneficiário no crime de estelionato previdenciário pratica crime permanente, pois mês a
mês saca o pagamento indevido, mantendo em erro a Autarquia previdenciária. Se o INSS
suspende o pagamento do benefício, cessa a permanência. Quando, após isso, a pessoa
consegue o restabelecimento através de Mandando de segurança, a primeira corrente
entende que a autarquia não está mais induzida a erro, pois está cumprindo determinação
judicial [o marco da prescrição começa da suspensão do pagamento, mesmo sendo
restabelecido por MS depois. Para decisões dessa corrente o MP recorre]; e outra corrente
entende que o benefício continua fraudulento e não há a cessação da permanência do crime
[então para essa segunda corrente o marco da prescrição somente vai começar quando o
pagamento cessar. Para decisões dessa corrente o advogada da pessoa que recorrerá quando
ocorrer a cessação do pagamento]. Os tribunais superiores já afirmaram que o crime de
estelionato previdenciário é dual, binário, visto ser instantâneo de efeitos permanentes para
o fraudador e crime permanente para o beneficiário. A doutrina diverge, entendendo que o
crime é sempre instantâneo de efeitos permanentes. [essa divergência é cobra em prova
discursiva]. OBS 3: Crimes qualificados pelo resultado: Nos crimes qualificados pelo
resultado, a consumação se dá com o resultado agravador. No crime de lesão corporal
seguida de morte, o momento consumativo é quando ocorre a morte, ou seja, o resultado
agravador, pois o resultado morte não era desejado e o risco não foi assumido. É preciso o
resultado agravador para que se possa fazer a adequação do fato ao tipo penal, sob pena de
desclassificação do crime [no caso seria desclassificado para lesão corporal com perigo de
morte]. Nos crimes preterdolosos não cabe tentativa. Ou acontece ou será desclassificado
para outro crime. No caso do art. 129, § 1º, I do CP, o resultado agravador de incapacidade
para ocupações habituais por mais de 30 dias deve ser previsível e pode ser desejado pelo
agente. Se ficar evidenciado que o resultado ocorreu, o agente responde pelo art. 129, § 1º,
I, quando demonstrada a lesão e a incapacidade e o resultado agravador foi doloso. O tipo
também contempla o resultado agravador previsível, mas quando o agente não assumiu o
risco nem desejou o resultado, nesse caso, responderá o agente pela figura preterdolosa.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

[Ou seja: é o mesmo crime a título de dolo e a título de culpa na figura do preterdolo]
[Atenção: e se a pessoa se recuperar antes do 30 dias? Terá que ser analisado a intenção do
agente. Se quis ou assumiu o risco de produzir o resultado, responderá por tentativa. Se não
quis o resultado, ocorrendo ele por culpa após o dolo do resultado menor, então o fato de
não haver a incapacidade afasta o aperfeiçoamento do crime qualificado pelo resultado e
como não há tentativa em crime culposo será responsabilizado apenas pela lesão leve]. No
aborto qualificado pelo resultado, o crime é preterdoloso, pois deve ficar evidenciado que o
sujeito não queria provocar lesão grave ou morte na gestante. Se o feto sobrevive, mas a
gestante morre por infecção, a maioria da doutrina entende que o aborto tentado estará
qualificado pelo resultado, reconhecido com a incidência do art. 127, CP, pois o resultado
agravador recai sobre a gestante, cabendo tentativa por haver lesão a dois bens jurídicos
diferentes. O agente responderia pelo art. 126 na forma do art. 14, II c/c art. 127, todos do
CP. Segunda corrente, minoritária, sustenta que nesse caso seria crime consumado, pois o
crime preterdoloso não admite tentativa, mesmo que o aborto não tenha sido efetivamente
consumado. Terceira corrente, minoritária, entende que se o aborto é consumado, aplica-se
o art. 127, pois crime preterdoloso não admite tentativa; se o aborto é tentado, deve-se
fracionar o aborto tentado com a lesão corporal ou homicídio culposo sobre a gestante.

5ª etapa: exaurimento: Parte da doutrina entende que há uma quinta e última etapa do iter
criminis que é o exaurimento. Outra parte, como Bittencourt, entende que o exaurimento
não é etapa do iter criminis, sendo apenas consequência da consumação. Entretanto, para a
maioria da doutrina, exaurimento é fase posterior à consumação. O exaurimento é o
esgotamento total da figura típica. O crime formal se consuma com a prática da conduta. Ex
1: Na extorsão [crime formal], a consumação ocorre quando a vítima faz, deixa de fazer ou
tolera que se faça aquilo que o agente queria; a obtenção da vantagem não é exigida para a
consumação, ficando no campo do exaurimento, conforme súmula 96 do STJ. Ex 2: O
crime de corrupção passiva pode ser na modalidade formal (solicitar ou aceitar) ou material
(receber), vide art. 317 do CP. Se o agente solicitou ou aceitou a promessa, já está
consumado o crime, mesmo que o agente não venha efetivamente a receber a vantagem
[pois para essas condutas é crime formal]. Logo, o exaurimento ocorrerá quando se der o
recebimento da vantagem (no crime formal). Porém, receber é crime material, que se
consuma com a entrega da vantagem. Portanto: Solicitar ou aceitar: consuma com o ato de
solicitar ou aceitar, sendo o recebimento da vantagem mero exaurimento. Receber:
consuma com o recebimento da vantagem. Atenção: Em alguns casos o exaurimento possui
uma punição extra e em outros casos, não. Ex: na corrupção, a punição é o aumento da pena
em 1/3. Quando não há punição, residualmente, o exaurimento pode ser colocado na
dosimetria da pena como circunstância judicial, pois é consequência do crime.

Questão de prova: um fazendeiro oferece R$5.000,00 reais ao delegado para que ele
conclua o inquérito policial sobre um roubo que aconteceu em sua propriedade. Há crime?
Sim, é crime de corrupção imprópria, é vantagem indevida, mesmo que para um fim lícito,
devido. Porém, não se aplica o §1º, pois pratica o dever funcional e não o infringi.

QUESTÕES DE PROVA: Perguntou sobre as etapas do crime. Se o exaurimento era etapa


da consumação do crime. Como distinguir a tentativa dos atos preparatórios? Queria que
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

explicasse as teorias tal qual caiu na 2ª fase (há essa abordagem no livro do examinador).

Minhas impressões: O examinador foi muito educado e atencioso. Algumas vezes que eu
falava e ele parecia estar anotando. Quando eu parava de falar ele já vinha com perguntas
sobre determinados temas. Afirmei um termo errado tecnicamente e ele inteligentemente
me arguiu sobre isso.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

18.b. Corrupção. Quadrilha.

Principais obras consultadas: Texto de Válter Kenji Ishida [Promotor de Justiça das
Execuções Criminais designado junto à Procuradoria de “habeas corpus” . Professor
Universitário. Autor do Curso de Direito Penal, pela Editora Atlas]. Link para o texto:
http://www.midia.apmp.com.br/arquivos/pdf/artigos/2013_crime_organizacao.pdf

Atenção: ver 9c e 10c para análise dos crimes de corrupção.

Associação criminosa (art.288).

[Atenção: era chamado de quadrilha ou bando antes da Lei 12.859/13]

Objetividade jurídica: tutela-se a paz pública. Sujeito ativo: qualquer pessoa. Trata-se de
crime coletivo, plurissubjetivo ou de concurso necessário, de condutas paralelas (umas
auxiliando as outras), estabelecendo o tipo incriminador a presença de, no mínimo, quatro
associados (computando-se inimputáveis e pessoas não identificadas). Sujeito passivo: a
coletividade. Conduta: pune-se a associação de três ou mais pessoas para o fim específico
de cometer uma série indeterminada de crimes. Elementos: (i) associação é a reunião de
pessoas para determinado fim. A vinculação deve ser sólida, quanto à estrutura, e durável,
quanto ao tempo, o que não significa perpetuidade; (ii) pluralidade de pessoas - é
indiferente a posição ocupada por cada associado na organização, se conhecem uns aos
outros ou se há ou não hierarquia (poder de mando); identificando-se o vínculo associativo
estável e permanente, haverá o crime (diferencia-se do concurso de pessoas, já que este é
eventual e direcionado para a prática de crime determinado); (iii) finalidade é a de praticar
uma série indeterminada de crimes (e não contravenções penais). Tipo subjetivo: é o dolo,
havendo um elemento subjetivo especial do injusto, que é a finalidade de cometer crimes,
sem a qual o delito não se configura. Consumação e tentativa: a consumação do delito se
verifica no momento em que aperfeiçoada a convergência de vontades entre três ou mais
pessoas. Para o agente que adere depois de formada a quadrilha, o momento a ser
considerado será o da adesão. Trata-se de crime autônomo (posição pacífica nos Tribunais
Superiores), razão pela qual a punição dos membros integrantes independe de condenação
pela prática de algum dos crimes pretendidos pelo bando. Trata-se de crime permanente,
cuja consumação se protrai no tempo. A retirada de um associado, deixando o grupo com
menos de 4 agentes, cessa a permanência, mas não interfere na existência do crime, já
consumado para todos (Hungria). A tentativa é inadmissível, pois os atos praticados com a
finalidade de formar a associação criminosa, anteriores à execução, são meramente
preparatórios.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Observações: as observações foram atualizadas considerando o novo nome do crime. OBS


1: o parágrafo único do dispositivo em análise prevê pena aumentada até a metade se a
associação é armada ou se houver a participação de criança ou adolescente. Não configura
bis in idem a condenação por associação criminosa armada (basta que um só de seus
integrantes esteja a portar armas – STF) e roubo majorado pelo emprego de armas, porque
além de configurarem delitos autônomos e distintos, no primeiro, o emprego de arma está
calcado no perigo abstrato e, no segundo, no perigo concreto (STJ). OBS 2: admite-se,
outrossim, o concurso material entre associação criminosa e um crime qualificado pela
presença do concurso de pessoas. OBS 3: Admite-se o concurso entre associação criminosa
armada e porte ilegal de arma. OBS 4: A extinção da punibilidade nos crimes tributários
pelo pagamento não afasta a punibilidade do crime de associação criminosa. OBS 5:
Tratando-se de crime permanente, há a cessação da associação criminosa por ocasião do
recebimento da denúncia (STJ - HC 123763) ou da prisão do réu, se antes do recebimento
(STJ - HC 91428).

Observações quanto às inovações legislativas:

1) O próprio nomen iuris foi alterado e passou a ser chamado de associação criminosa.

2) A quantidade mínima de participantes também foi alterada, sendo crime plurissubjetivo:


passou a exigir apenas três pessoas, sendo que na redação anterior clássica, exigia-se mais
de três (quatro).

3) A principal alteração, no entanto, ocorre no parágrafo primeiro do art. 288, que agrava a
pena prevista no caput. Vejamos. No texto revogado constava que “A pena aplica-se em
dobro, se a quadrilha ou bando é armado”; com a alteração, preceitua o texto novo que: “A
pena aumenta-se até a metade se a associação é armada ou se houver a participação de
criança ou adolescente”. Em análise, nota-se que a agravante que poderia gerar uma pena
máxima de até 6 (seis) anos (o dobro do máximo), agora só poderá originar pena máxima
de 4 anos e 6 meses (pena máxima mais metade), razão pela qual estamos diante de uma
norma penal in mellius, que retroagirá, portanto, para beneficiar os agentes que cometeram
tal delito com incidência da agravante de “uso de armas” antes da entrada em vigor da Lei
12.850/13. Entretanto, por outro lado, temos uma inovação normativa in pejus, no que se
refere à agravante de “participação de criança ou adolescente”, que não alcançará, portanto,
os fatos ocorridos antes de 19 de setembro de 2013.

Conflitos aparentes entre normas penais:

Com a irrupção de um novo crime em nossa legislação, necessária se torna a reanálise do


ordenamento jurídico-penal pátrio, a fim de estabelecer os limites de aplicação da novatio
legis incriminadora, conforme, por evidente, a taxatividade penal imposta, mas também
tendo como parâmetro os outros delitos que vigoram no país, elucidando os eventuais
aparentes conflitos de normas. Nesse diapasão, destacam-se os fatos que possam compor,
por subsunção, os crimes de associação criminosa (novo art. 288 do CP – vide tópico 6),
associação para o tráfico (art. 35, Lei 11.343/06), associação para o genocídio (art. 2º, Lei
2.882/56) e constituição de milícia privada (art. 288-A, CP) em conflito, ilusório, com o
crime de organização criminosa do art. 2º da Lei 12.850/13.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Destarte, vejamos a análise caso a caso:

1) Associação Criminosa vs. Organização Criminosa: não se confundem. O primeiro requer


a participação de no mínimo 3 (três) pessoas, enquanto que neste o número mínimo de
integrantes deverá ser 4 (quatro). A finalidade da associação criminosa é especificamente
cometer crimes; enquanto que na organização criminosa o objetivo é obter, direta ou
indiretamente, vantagem de qualquer natureza, tendo como caminho a prática de infrações
penais graves. Com efeito, caso uma associação, visando obtenção de vantagem, composta
de quatro ou mais pessoas, pratique crimes que tenham pena máxima superior a 4 anos
cometerá o delito previsto na Lei 12.850; se, no entanto, faltar qualquer desses requisitos,
ou seja: se o crimes cometidos tiverem pena máxima igual ou inferior a quatro anos; se o
grupo for composto por menos de quatro sujeitos ou se o objetivo não for a obtenção de
vantagem, estaremos diante, em tese, de um crime de Associação Criminosa. Por fim,
válida a lembrança de que não basta para a caracterização da Organização Criminosa a
junção de um grupo criminoso, tendo este que ser estruturado e caracterizado pela divisão
interna de tarefas. Logo, o art. 288 do Código Penal é mais genérico e, portanto,
subsidiário.

2) Constituição de Milícia Privada vs. Organização Criminosa: não há maiores embaraços


aqui. Nesse contexto, bem explica o professor Adel El Tasse: “elemento de distinção
importante é a necessidade de observância, em relação à “Constituição de Milícia Privada”,
de que não é qualquer reunião de pessoas que dá margem a esta tipificação, mas apenas a
que atende ao dado específico de constituir-se numa reunião de pessoas que promova a
formação de organização paramilitar, milícia particular, grupo ou esquadrão”. Assim, como
a Constituição de Milícia Privada é especializada, age como requisito negativo para
configuração do crime de Organização Criminosa, isto é, para este restar configurado se faz
necessário que o grupo não tenha característica paramilitar; nem atue como milícia ou
esquadrão.

3) Associação para o Tráfico vs. Organização Criminosa: reside aqui, sob nossa ótica, uma
distinção que requer maior cautela para correta tipificação no caso prático. Essa análise
prudente detém como base a seguinte dicotomia: caso a organização criminosa pratique o
crime de tráfico de drogas, estaremos diante de uma associação para o tráfico (art. 35, Lei
11.343/06); se a organização criminosa, porém, pratica vários crimes, entre eles o de tráfico
de drogas, então entendemos que fica caracterizado o crime do art. 2º da Lei 12.850/13,
afastando-se a incidência da associação para o tráfico. Defendemos, assim, que não cabe
aqui o concurso de crimes, sob pena de bis in idem. Com efeito, temos uma pluralidade de
normas que engloba o mesmo conjunto de fatos, que protege o mesmo bem jurídico (paz
pública) e tem os mesmos sujeitos passivos (a coletividade), razão pela qual só haverá uma
norma incriminadora aplicável aos fatos. Resta saber como os Tribunais superiores se
posicionarão a respeito desta temática, porquanto, caso seja enquadrada a conduta como
organização criminosa, o agente terá restrições significativas, a saber: submissão aos meios
de prova da Lei 12.850; sujeição ao RDD (LEP, art. 52, §4º); realização do interrogatório
por videoconferência (CPP, art. 185, §2º, I); impossibilidade do tráfico privilegiado de
drogas (Lei 11343, art. 33, §4º). Por fim, imprescindível saber que a associação para o
tráfico requer, para sua caracterização, um número mínimo de duas pessoas; enquanto que a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

organização criminosa necessita de quatro.

4) Associação para o Genocídio vs. Organização Criminosa: entendemos que se aplicam


aqui as mesmas regras expostas no tópico anterior.

Ver a seguinte reportagem: MPF apresenta ações de combate à corrupção a representantes


da OEA. 21/3/2012

Representantes da Organização dos Estados Americanos estão em visita ao Brasil para


análise da implementação da Convenção Interamericana contra a Corrupção no país. O
Ministério Público Federal, nesta quarta-feira, 21 de março, apresentou suas ações e
problemas para a efetiva persecução de crimes de corrupção no Brasil aos membros do
Mecanismo de Seguimento da Implementação da Convenção Interamericana contra a
Corrupção (Mesicic) da Organização dos Estados Americanos (OEA). Os representantes da
Mesicic vieram ao Brasil para a 4ª rodada de avaliação da implementação da Convenção
Interamericana contra a Corrupção no país. A apresentação do MPF foi realizada pela
subprocuradora-geral da República Ela Wiecko, pela procuradora regional da República
Mônica Nicida Garcia, pelo secretário-geral do MPF, Lauro Cardoso, e pelo procurador da
República Roberto Antônio Dassié. Entre os problemas enfrentados pelo MPF nas ações de
combate à corrupção foram elencados a rigidez do acesso do Ministério Público aos sigilos
bancário e fiscal, os marcos de prescrição, a definição do poder investigatório do Ministério
Público, a lacuna na investigação do Sistema em Defesa Concorrencial, a necessidade de
normatização de procedimentos investigatórios de improbidade administrativa em inquérito
civil, além do uso excessivo de habeas corpus, o que prejudicaria as investigações em casos
de corrupção. Em algumas ações, existem questionamentos se o Ministério Público pode ou
não produzir determinadas provas. “O Ministério Público, como titular da ação penal
pública, tem poderes implícitos de buscar provas que sejam necessárias na condução da
ação penal. Isso não se confunde com atividades típicas de polícia judiciária, que seriam
atividades de busca e apreensão, condução coercitiva, vigilância, acompanhamento”,
afirmou o secretário-geral do MPF, Lauro Cardoso.

Ações – De acordo com levantamento da 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, no


período de outubro de 2010 a setembro de 2011, foram abertos pelo Ministério Público
Federal 820 procedimentos administrativos relacionados à corrupção. Desse total, 368
viraram inquéritos policiais instaurados, 59 denúncias e 16 se transformaram em ações
penais. Uma das formas de compilar esses dados é o Sistema Único, lançado no ano
passado pelo MPF para integrar ações de todas as instâncias e cujo desafio é integrar com
os cerca de 200 sistemas do Judiciário.

A busca pela transparência também é prioridade no MPF, por meio do Portal da


Transparência, da Corregedoria. Um anteprojeto para a criação da Ouvidoria do MPF está
sob consulta pública com o objetivo de ampliar o acesso ao cidadão.

Mesicic – O Mecanismo de Acompanhamento da Implementação da Convenção


Interamericana contra a Corrupção foi criado pelos Estados que integram a OEA com a

526
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

finalidade de promover a implementação da Convenção da OEA, acompanhar o


cumprimento dos compromissos nela assumidos e analisar o modo como vêm sendo
implementados. O Mesicic visa, ainda, a facilitar a execução das atividades de cooperação
técnica, o intercâmbio de informações, experiências e melhores práticas, bem como a
harmonização da legislação dos Estados Partes

A Convenção Interamericana contra a Corrupção foi firmada em 1996 e aceita pelo Brasil
em 2002. A Convenção tem como objetivo prevenir, detectar, punir e erradicar a corrupção,
bem como adotar ações que assegurem a cooperação entre os países signatários.

QUESTÕES DE CONCURSO: Pediu para falar do crime de corrupção tanto ativa quanto
passiva. Qual o bem jurídico na passiva? Se para existir a corrupção passiva é necessária a
ativa? Distinguir a corrupção passiva do concussão? Quem a vítima desses crimes?

Falar sobre o crime de quadrilha. Ele falou que era o que estava no edital e eu acabei
explicando ela, mas com a ressalva que foi revogada pelo crime de associação criminosa
que possui as mesmas características, mas com número diferente de agentes. Qual o bem
jurídico do crime de quadrilha?

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

18.c. Crimes de preconceito e de discriminação.

I - Crimes contra as pessoas com deficiência. Crimes contra os idosos.

Principais obras consultadas: Santo Graal 27º.

Legislação básica: Crimes contra pessoas com deficiência - CRFB/88, art. 7º, XXXI;
Convenção de Nova York sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – Dec. Leg. n.º
186/08; Lei 7.853/89; Crimes contra os Idosos - CRFB/88, art. 230, §§ 1º e 2º; Lei
0.741/03 (Estatuto do Idoso).

Leituras complementares sugeridas: Convenção sobre os Direitos das Pessoas com


Deficiência e de seu Protocolo Facultativo (Nova York, 2007).

1. Crimes contra as pessoas com deficiência:

A Lei 7.853/89, art. 8º, criminaliza diversas condutas, com reclusão de 1 a 4 anos e multa,
quais sejam: I - recusar, suspender, procrastinar, cancelar ou fazer cessar, sem justa causa, a
inscrição de aluno em estabelecimento de ensino por motivos derivados de deficiência; II -
obstar, sem justa causa, o acesso de alguém a qualquer cargo público, por motivos
derivados de sua deficiência; III - negar, sem justa causa, a alguém, por motivos derivados
de sua deficiência, emprego ou trabalho; IV - recusar, retardar ou dificultar internação ou
deixar de prestar assistência médico-hospitalar e ambulatorial, quando possível, a portador
de deficiência; V - deixar de cumprir, retardar ou frustrar, sem justo motivo, a execução de
ordem judicial expedida na ação civil prevista nessa lei; VI - recusar, retardar ou omitir
dados técnicos indispensáveis à propositura dessa ação civil, quando requisitados pelo
Ministério Público.

“(...) 2. A conduta do professor que impede aluno portador de deficiência física de assistir
aula na sala em que leciona não se subsume ao tipo penal do artigo 8º, inciso I, da Lei
7.853/89, que incrimina a conduta de ‘recusar, suspender, procrastinar, cancelar ou fazer
cessar, sem justa causa, a inscrição de aluno em estabelecimento de ensino de qualquer
curso ou grau, público ou privado, por motivos derivados da deficiência que porta’.” (STJ,
REsp 1022478/RN, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA
TURMA, julgado em 04/10/2011, DJe 09/11/2011).

“CRIMINAL. AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. DENÚNCIA. CRIME CONTRA


PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. OBSTAR, SEM JUSTA CAUSA, O ACESSO A
CARGO PÚBLICO. CONCURSO PARA MAGISTRATURA DO TRABALHO.
IMPROCEDÊNCIA DA ACUSAÇÃO. INDEFERIMENTO DE INSCRIÇÃO
DEFINITIVA DEVIDAMENTE MOTIVADO. JUSTA CAUSA CONFIGURADA.
528
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

CONDUTA ATÍPICA. ACUSAÇÃO ATRIBUÍDA À SEGUNDA ACUSADA, NÃO


SUJEITA À JURISDIÇÃO DESTA CORTE, QUE TAMBÉM NÃO CONFIGURA
ILÍCITO PENAL. ACUSAÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.

Hipótese em que a denúncia trata da suposta prática de crime contra pessoa portadora de
necessidades especiais, consistente em obstar, sem justa causa, o acesso a qualquer cargo
público, por motivos derivados de sua deficiência, pois a acusada teria indeferido a
inscrição definitiva de candidato ao XXIX Concurso para a Magistratura do Trabalho da 2ª
Região, sendo ele portador de sequelas de paralisia cerebral decorrente de traumatismo de
parto. (...) O indeferimento da inscrição, procedido pela primeira denunciada, detentora
de prerrogativa de foro, foi devidamente motivado, eis que as necessidades especiais do
candidato, relacionadas a dificuldades com motricidade, conjunto de funções nervosas e
musculares que permite os movimentos voluntários ou automáticos do corpo, e à dicção,
maneira de articular ou pronunciar as palavras, mostram-se incompatíveis com o
exercício do cargo de Juiz do Trabalho, caracterizado pela realização de grande número
de audiências, oportunidades em que o uso desenvolto da palavra é imprescindível. O
tipo visa a impor sanção penal ao agente que discriminar deficientes quanto ao acesso a
cargo público, sendo indispensável, para a configuração do delito, a inexistência de justa
causa, pois o que se pretende submeter à persecução penal do Estado é a simples
discriminação, por si só, o preconceito, a intolerância, ensejadores do óbice ao exercício
de cargo público, pelo simples fato de alguém ser portador de deficiência. (...) O óbice ao
acesso ao cargo de Juiz do Trabalho não resultou de mera discriminação pelos simples fato
de o candidato ser portador de deficiência física. Caracterizada, in casu, a justa causa
para o óbice ao cargo público, o que afasta a tipicidade da conduta da denunciada. (...)”
(Apn .324/SP, Rel. Ministro GILSON DIPP, CORTE ESPECIAL, julgado em 04/05/2005,
DJ 13/06/2005, p. 153)

2. Crimes contra idosos:

A Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso) prevê crimes contra pessoas maiores de 60 anos, todos
de ação penal pública incondicionada, que não se submetem aos arts. 180 e 181 do CP,
tipificando diversas condutas (arts. 96 a 108), a saber: art. 96 - o desdém, a humilhação, a
discriminação ou o menosprezo de pessoa idosa, por qualquer razão; art. 97 - o
impedimento de acesso a operações bancárias, meios de transporte ou ao direito de
contratar, em razão da idade da pessoa idosa; art. 98 - a omissão de socorro de idoso ou
dificultar sua assistência à saúde ou o socorro de autoridade pública; art. 99 - o abandono
material de idoso, bem como em hospitais, casas de saúde ou entidades de longa
permanência; art. 100 - os maus tratos que exponham a perigo a integridade física ou
psicológica de idoso, qualificado quando resulta em lesão corporal ou em morte; art. 101 -
o impedimento de acesso a cargo público, emprego ou trabalho, à assistência à saúde, à
execução de ordem judicial na ação civil prevista no Estatuto do Idoso, bem como o não
fornecimento de dados técnicos para essa ação, o não cumprimento da forma devida de
ordem judicial em ação em que for parte ou interveniente idoso; art. 102 - a apropriação ou
desvio da finalidade de bens e quaisquer proventos; art. 103 - a negativa de acolhimento de
idoso, em abrigo, ante a recusa de outorga de procuração a entidade de atendimento; art.
529
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

104 - a retenção de cartão magnético de conta relativa a quaisquer proventos, bem como de
outro documento visando ao recebimento ou ressarcimento de dívida; art. 105 - a exibição
por qualquer meio de comunicação de informações ou imagens depreciativas ou injuriosas
de idoso; art. 106 - induzir idoso sem discernimento a outorgar procuração para
administração ou disposição de seus bens; art. 107 - a coação de idoso para doar, contratar,
testar ou outorgar procuração; art. 108 - a lavratura de ato notarial que envolva idoso sem
discernimento, sem a devida representação legal.

Jurisprudência selecionada: 1) Aos crimes previstos no Estatuto do Idoso com pena


máxima que não ultrapasse 04 anos, aplica-se a Lei 9.099/95, estritamente nos seus
aspectos processuais, para dar celeridade ao processo, sem quaisquer de suas medidas
despenalizantes ou benéficas ao réu (STF, ADI nº 3096 - ajuizada pelo PGR).

2) É assegurada prioridade na tramitação dos processos e procedimentos, inclusive os


criminais e na execução dos atos e diligências judiciais em que figure como parte ou
interveniente pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, em qualquer
instância (STF: HC nº 102.015, Relator(a) p/ Acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Primeira
Turma, julgado em 09/11/2010, DJe-074 DIVULG 18-04-2011 PUBLIC 19-04-2011).

3) Apropriação de imóvel pertencente aos pais idosos caracteriza crime do artigo 102,
mesmo que a conduta tenha iniciado antes da Lei nº 10.741/03, por caracterizar crime
permanente (STJ, HC nº 111.120/DF, DJe 17/12/2010).

4) “ESTATUTO DO IDOSO. REDUÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL.


INADMISSILIBILIDADE. (...) 5. A circunstância do critério cronológico adotado pelo
Estatuto do Idoso ser de 60 (sessenta) anos de idade não alterou a regra excepcional da
redução dos prazos de prescrição da pretensão punitiva quando se tratar de pessoa maior de
70 (setenta) anos de idade na data da sentença condenatória. (...)” (STF, HC nº 88.083,
Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 03/06/2008, DJe-117
DIVULG 26-06-2008 PUBLIC 27-06-2008 EMENT VOL-02325-02 PP-00353 RTJ VOL-
00205-03 PP-01230 RT v. 97, n. 876, 2008, p. 514-517).

II - Crimes decorrentes de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência


nacional

(antigo ponto 17c).

Principais obras consultadas: BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Crimes Federais. 8ª ed.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e
processuais penais comentadas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. Resumo do 27º
Concurso.

Legislação: Lei 7.716/89

530
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

A Lei 7.716/89 adotou a técnica legislativa de enumerar os elementos normativos de seus


tipos penais no artigo 1º, em vez de repetir todos esses elementos normativos em cada tipo
penal. Logo, todos os tipos penais da lei exigem a presença dos elementos normativos
previstos no artigo 1º.

1. Conceitos importantes:

A) Discriminação: ato de diferenciar pessoas ou coisas. Pode ser positiva (são as ações
afirmativas - programas e medidas especiais adotados pelo Estado e pela iniciativa privada
para a correção das desigualdades raciais e para a promoção da igualdade de oportunidades)
ou negativa (crime). O art. 1º, § único, I, do Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/10),
na senda do art.1, 1, da Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Racial (D. 65.810/69) conceitua discriminação racial ou étnico racial como
“toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou
origem nacional ou étnica que tenha por objeto anular ou restringir o reconhecimento, gozo
ou exercício, em igualdade de condições, de direitos humanos e liberdades fundamentais
nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida
pública ou privada”.

B) Preconceito: segundo Sérgio Salomão Shecaira, “é o conceito ou opinião que se tem


antes de ter os conhecimentos adequados”, ou seja, que não levam em conta o fato que os
conteste e que traduzem suspeita, intolerância, ódio irracional ou aversão a outras raças,
credos, religiões, etc. (Baltazar). C) Raça: Este é o elemento normativo que gera mais
controvérsias em sua definição. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento histórico do
Habeas Corpus 82.424, entendeu que a prática do racismo abrange o antissemitismo, bem
como que, em termos biológicos e antropológicos, o ser humano não pode ser dividido em
raças, pois existe apenas uma raça: a raça humana. Com efeito, o termo raça deve ser
compreendido mediante aspectos históricos, políticos, sociais e culturais, abrangendo todo
agrupamento humano que possa ser identificado historicamente, politicamente, socialmente
e culturalmente como distinto dos demais grupos humanos. Além da definição do termo
raça, outro ponto importante do julgamento do STF foi a definição do termo racismo.
Prevaleceu o entendimento de que, para se caracterizar o racismo, deve-se considerar os
elementos de eventual discurso racista. Logo, é racista o discurso que considera
determinado agrupamento humano uma raça inferior, que deve ser tratada como tal. Trata-
se da ideia de que alguns seres humanos são superiores a outros. O pensamento racista pode
partir da minoria considerada inferior ou da maioria considerada superior. No Brasil, por
força do Decreto n. 5.397/2005, compete ao Conselho Nacional de Combate à
Discriminação – CNCD acompanhar as políticas públicas de afirmação das minorias e de
redução das intolerâncias.

D) Grupo étnico: é definido, além de outros fatores biológicos, por dados culturais,
psicológicos e mesmo políticos, ou ainda o grupo cultural e linguisticamente homogêneo,
como, por exemplo, a comunidade indígena (TRF4 AC 200371010018948/RS).

E) Religião: é a fé ou crença em Deus ou outra forma de poder sobrenatural e superior do

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

qual depende a existência humana, expressada mediante um conjunto de práticas, rituais e


preceitos seguidos pelo grupo religioso. Para Baltazar, a discriminação baseada no ateísmo
não é abrangida pelo tipo penal.

F) Procedência nacional: é expressão que define, primeiramente, o preconceito ou


discriminação contra nacionais de outro estado-Membro ou região do mesmo País,
reconhecíveis pelo modo de falar e aparência física, ou ainda pelo conhecimento direto por
parte do autor do crime a respeito desta circunstância, como é o caso de preconceito contra
nordestinos, nortistas, cariocas, paulistas, gaúchos, baianos, ou mesmo contra moradores de
certas regiões dentro de um mesmo Estado, etc. Para Baltazar e para o STJ (HC 63350) a
expressão procedência nacional também serve para incriminar o preconceito ou
discriminação em razão da nacionalidade, como no caso do preconceito contra brasileiros,
paraguaios, argentinos, etc.

2. Características do crime de racismo.

2.1. Inafiançável: não será concedida liberdade provisória mediante pagamento de fiança
(STF, HC 82424), o que não impede, porém, a concessão de liberdade provisória sem
fiança.

2.2. Imprescritível: a pena é perene, não ficando Estado impedido de punir a qualquer
tempo o autor do delito. Jurisprudência STF: “7. A Constituição Federal de 1988 impôs aos
agentes de delitos dessa natureza, pela gravidade e repulsividade da ofensa, a cláusula de
imprescritibilidade, para que fique, ad perpetuam rei memoriam, verberado o repúdio e a
abjeção da sociedade nacional à sua prática. 8. Racismo.” (HC 82.424-RS).

2.3. Efeitos da condenação: Art. 16. Constitui efeito da condenação a perda do cargo ou
função pública, para o servidor público, e a suspensão do funcionamento do
estabelecimento particular por prazo não superior a três meses. Art. 18. Os efeitos de que
tratam os arts. 16 e 17 (que foi vetado) desta Lei não são automáticos, devendo ser
motivadamente declarados na sentença.

3. Considerações sobre os tipos penais.

3.1. Bem jurídico: Os tipos penais da Lei 7.716/89 são complexos ou pluriofensivos, pois
tutelam dois bens jurídicos principais: igualdade e pluralismo, dois direitos fundamentais
preciosamente protegidos pela Constituição da República.

3.2. Elemento subjetivo: são exclusivamente dolosos, não existindo modalidade culposa.
Além do dolo, há um elemento subjetivo especial, um especial motivo de agir, que é o
preconceito decorrente de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Afasta-se o
delito se houver outro ânimo, como por exemplo, o de brincar (animus jocandi), fazer uma
descrição ou uma crítica artística, entre outros fatores. Outrossim, como o preconceito é
uma condição de caráter pessoal e elementar dos crimes da Lei 7.716/89, comunica-se aos
demais coautores e partícipes, nos termos do artigo 30 do Código Penal, desde que estejam
na esfera de conhecimento dos participantes.

532
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

3.3. Sujeito passivo: pessoa discriminada.

3.4. Objeto material: a pessoa discriminada.

3.5. Consumação e tentativa. Os crimes da Lei 7.716/89 são crimes formais, consumam-se
com a realização da conduta e independem da ocorrência do resultado material. A tentativa
somente é possível se os crimes forem praticados por mais de um ato (plurissubsistente),
pois só assim eles deixam de ser unissubsistente, adquirindo um iter criminis que pode ser
fracionado.

4. Tipos em Espécie.

Art. 3: Tipo objetivo: Impedir é criar obstáculo, proibir, obstruir, estorvar, embaraçar, de
qualquer maneira, o acesso de alguém, que esteja habilitado, a qualquer cargo, nas
entidades descritas. Obstar é opor-se, causar embaraço. Ambos os verbos são sinônimos.
Para Baltazar, como a lei menciona apenas ‘cargo’, é atípica a conduta que tiver por objeto
emprego ou função pública, que poderão configurar, no entanto, o crime do art. 20, na
modalidade de ‘praticar’. Se se tratar de obstrução ou impedimento de alguém não
habilitado, forçosamente não se há de configurar o crime. Evidentemente, este impedimento
deve calcar-se em motivos de preconceito ou discriminação. Sujeito ativo: pessoa que
detém poder para impedir ou obstar. Sujeito passivo: pessoa discriminada. Elemento
subjetivo: dolo. Para alguns doutrinadores, existe especial fim de agir, que seria a vontade
de discriminar, para outros não. Classificação: crime próprio, formal, de forma livre,
comissivo, instantâneo, unissubjetivo, unissubsistente ou plurissubsistente.

Art. 4º: Emprego é relação jurídica celetista. Segundo Baltazar, este tipo abrange apenas a
empresa privada, não se subsumindo a este tipo a prática por empregador doméstico ou no
âmbito de entidades sem fins lucrativos (que não são empresas). (§1º) Discriminação na
vigência do contrato: Estabelece casos específicos de discriminação motivada pelos
critérios vedados nesta lei, após a contratação do empregado, ou seja, na vigência do
contrato. (§2º) Recrutamento: Forma especial que, se inexistente, poderia ser considerada
enquadrada no caput, como obstar, ou mesmo no art. 20. Não há possibilidade de aplicação
de pena privativa de liberdade. Somente haverá o crime quando as ‘atividades não
justifiquem’ as exigências de raça ou etnia. Exemplo de exigência justificada seria a
contratação de ator ou figurante para interpretar o papel de um personagem que tenha
determinadas características raciais.

Art. 5: Tipo objetivo: permitir o ingresso, mas não atender, servir, ou receber, calcado em
preconceito ou discriminação, também é crime, porque de nada adiantará o dispositivo, se,
embora permitido o acesso, o cliente ou comprador não for atendido, recebido ou servido.
Cometerá o crime o preposto, o dono ou o empregado do estabelecimento. Estabelecimento
comercial aqui significa o local físico onde a empresa comercial explora atividade. Se o
estabelecimento for industrial e não comercial, como descrito, dar-se-á o crime? Segundo
Baltazar não, uma vez que o emprego de analogia é vedada em matéria penal. Sujeito ativo:
pessoa que detém poder para impedir ou obstar. Diretor, gerente, vendedor, fornecedor,
preposto. Sujeito passivo: Cliente ou cliente em potencial. Classificação: crime próprio,
formal, de forma livre, comissivo, instantâneo, unissubjetivo, unissubsistente ou

533
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

plurissubsistente.

Art.6º: Tipo objetivo: recusar e negar tem o mesmo sentido: opor-se, rejeitar. É o bastante a
recusa de inscrever ou impedir o ingresso de aluno em estabelecimento de ensino, não
importa se público ou privado, nem de que grau seja. Para a ocorrência do crime não
importa tratar-se de estabelecimento regular, reconhecido ou não, pelo Poder Público. Há
divergência se escolas ou cursos livres não integrantes do sistema nacional de ensino, tais
como Escolas de dança, datilografia, informática, cursos pré-vestibulares, preparatórios
para concursos, ou outros tantos, estarão enquadradas neste dispositivo. Sujeito ativo:
pessoa que detém poder para impedir ou obstar. Diretor, gerente, preposto. Classificação:
crime próprio, formal, de forma livre, comissivo, instantâneo, unissubjetivo, unissubsistente
ou plurissubsistente. Causa de aumento de pena: se o crime for praticado contra menor de
18 anos a pena é aumentada em 1/3.

Art. 7º: Tipo objetivo: o tipo penal vale-se de interpretação analógica para ampliar as
possibilidades de aplicação, quando assevera que qualquer estabelecimento similar poderá
ser enquadrado no tipo. Assim, podem-se considerar, para efeitos da lei, casas, hotéis,
pensões e albergues. Sujeito ativo: pessoa que detém poder para impedir ou obstar. Diretor,
gerente, preposto. Classificação: crime próprio, formal, de forma livre, comissivo,
instantâneo, unissubjetivo, unissubsistente ou plurissubsistente.

Art. 8º: Valem para esse crime todos os comentários ao artigo 5º. Há possibilidade de se
fazer interpretação analógica, pois o legislador utilizou a expressão “locais semelhantes”,
que torna o tipo bastante abrangente.

Art. 9º: impedir acesso abrange tanto as condutas de não permitir o ato de associar-se, a
adesão ou compra de título ou quotas de clube (STJ, HC 137248 de 05/10/10). Para que
haja a incidência do tipo penal, o local deve ser aberto ao público. Se for local fechado ou
de acesso restrito, não se caracteriza o crime de racismo, por não estar aberto ao público.
Todavia, ainda que os clubes sociais sejam locais fechados, de acordo com Nucci, o
ingresso de novos sócios não pode ser obstado com base em critérios racistas, sob pena de
se configurar o crime do art. 9º. Assim, o STJ já reconheceu o crime na “recusa de
admissão no quadro associativo de clube social”, argumentando que “a faculdade,
estatutariamente atribuída à diretoria, de recusar propostas de admissão em clubes sociais,
sem declinação dos motivos, não lhe atribui a natureza especial de fechado, de maneira a
subtraí-lo da incidência da lei” (RHC 12809 de 22/03/05). Valem para esse crime os
comentários do artigo 8º.

Art. 10: Não importa o nome que ser der a estes locais ou estabelecimentos, porque o
legislador visa a resguardar o bem protegido valendo-se de interpretação analógica. Valem
os comentários do art. 8º.

Art. 11: Consuma-se o crime ao se impedir qualquer pessoa de ter acesso a esses locais,
determinando-lhe uma entrada específica e causando-lhe constrangimento e vergonha. Não
há que impedir a um empregado, a empregada ou a um entregador de alimentos, por
exemplo, o acesso pela entrada ou pelo elevador social, sob pena de, assim o fazendo,
cometer o crime acima descrito. É comum o síndico de prédios residenciais, calcado em

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

convenções de condomínio, regulamento ou regimento arcaicos e inconstitucionais, proibir


o acesso de empregados ou entregadores, pela entrada ou pelo elevador social. Neste caso,
é fora de dúvida que estará cometendo o ilícito penal, pois não poderá alegar estar
cumprindo norma estatutária, se contrária ao direito e corresponder a um tipo penal.
Curiosidade: no ano de 2007, a proposta de criação de entradas separadas para os
empregados terceirizados na Procuradoria-Geral da República, em Brasília, causou grande
polêmica entre os procuradores que defendiam a ilicitude dessa prática. Valem os mesmos
comentários do art. 5º.

Art. 12: Qualquer outro meio de transporte concedido (ou objeto de permissão) permite a
interpretação analógica, pois não faz sentido impor qualquer restrição nos meios de
transporte. Assim, o helicóptero, o táxi aéreo, a charrete, o táxi e a "motocicleta - táxi"
estão perfeitamente enquadrados. Valem os mesmos comentários do art. 5º.

Art. 13: O obstáculo ou o impedimento de acesso ao serviço das Forças Armada é conduta
punível. As polícias militares e os corpos de bombeiros, como forças auxiliares e reserva do
Exército, não escapam a essa norma, assim que também é crime obstar ou impedir o acesso
ao serviço dessas corporações (Contra: Baltazar).

Art. 14: Meio é o recurso empregado para atingir um objetivo. Tem como sinônimo
expediente, método. Forma é o jeito, o modo, a maneira. Não são expressões sinônimas. A
lei resguarda a família, que é o sustentáculo da sociedade, e tem proteção especial do
Estado (art. 227, CF). A família abrange não só o marido e a mulher, unidos pelo casamento
civil ou religioso, na conformidade da lei, e os filhos, como também a união estável entre o
homem e a mulher e, para alguns doutrinadores, como Maria Berenice Dias, a união de
duas pessoas do mesmo sexo com o objetivo de construir uma vida comum. A lei é bastante
ampla, na sua expressão. Ao grifar a convivência familiar (que significa qualquer forma de
contato mais próximo, fora do âmbito familiar), envolve também os membros ligados por
laços de parentesco e tem uma indicação certa: qualquer obstáculo ou impedimento a esta
comunhão ou convívio constitui crime, não importando a forma ou os meios utilizados. E,
mais, a proteção, vai além, porque também o convívio social, entre amigos, ou pessoas que
têm o trato diário, por exemplo, não necessariamente, parentes, recebe o beneplácito deste
diploma legal.

Art. 20, caput: Tipo objetivo: ‘praticar’, que reflete qualquer conduta discriminatória
expressa, possuindo forma livre, abrangendo qualquer ato, desde que idôneo a produzir a
discriminação. Também significa qualquer conduta capaz de exteriorizar o preconceito ou
revelar a discriminação, englobando-se, por exemplo, gestos, sinais, expressões, palavras
faladas ou escritas e atos físicos. Bem por isso é conduta que se confunde, em muitos casos,
com as práticas já descritas nos demais tipos penais, de modo que a presente figura típica
aplica-se de forma subsidiária. ‘Induzir’ é criar em alguém a ideia discriminatória. ‘Incitar’
é reforçar a ideia discriminatória preexistente. CRIME CONFIGURADO: a) na conduta de
“escrever, editar, divulgar e comerciar livros fazendo apologia de ideias preconceituosas e
discriminatórias contra a comunidade judaica (STF, HC 82424 de 17/09/03); b) no caso do
agente que manifestou, em programa de televisão, ideias preconceituosas e discriminatórias
em relação à raça indígena; b) do agente que externa pensamentos pessoais desairosos e
notoriamente etnocêntricos, imbuídos de aversão e menosprezo indistinto a determinado
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

grupo social que apresenta homogeneidade cultural e linguística (comunidade indígena); na


veiculação de preconceito contra negros, nordestinos e judeus, além da defesa do nazismo,
em página na internet (TRF3 AC 00084398120084036181 de 20/10/11). Tipo subjetivo é o
dolo. segundo o STJ exige-se, além do dolo, a intenção de menosprezar raça ou etnia, de
modo que resta afastado quando a manifestação estiver contida nos limites da liberdade de
manifestação do pensamento (REsp 911183 de 04/12/08), como, por exemplo, quando o
agente estiver imbuído de mero ‘animus narrandi’. Não há exclusão em razão do ‘animus
jocandi’. LIBERDADE DE EXPRESSÃO X RACISMO: Esta exigência do especial ânimo
de menosprezar, discriminar, segregar, mostrar-se superior, para o reconhecimento do crime
é importante para o fim de preservar o direito fundamental à liberdade de expressão, que
poderá entrar em colisão com a proteção da dignidade dos grupos ameaçados com a prática
criminosa. De fato, como qualquer outro direito fundamental, a liberdade de expressão não
é ilimitada (STF, HC 82424) e o próprio art. 19 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e
Políticos aponta como limites “dos direitos e da reputação das demais pessoas”, bem como
“a segurança nacional, a ordem, a saúde ou a moral pública”. ATENÇÃO: uma forma
específica de limitação da liberdade de expressão, baseada na dignidade da pessoa humana
e na ordem pública, é a proibição do discurso de ódio ou ‘hate speech’, isto é, o discurso
que carrega o significado de ódio por um grupo, como uma raça particular, especialmente
em circunstâncias nas quais a comunicação pode provocar violência. A possibilidade de
limitação à luz do direito internacional se torna mais clara, especialmente em relação ao
hate speech ou hate propaganda, no art. 20 do PIDCP, no art. 4º da Convenção para a
Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial e 13, 5, do Convenção
Interamericana de Direitos Humanos. CLASSIFICAÇÃO: crime comum, formal, forma
livre, comissivo, instantâneo, unissubjetivo, unissubsistente ou plurissubsistente, admitindo
tentativa nessa última forma. Causa de aumento de pena (art. 20, §2º): se o crime for
cometido através dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza a
pena é de reclusão de dois a cinco anos e multa, desaparecendo a possibilidade de
suspensão condicional do processo. CONFLITO APARENTE com o art. 140, §3º, CP: O
artigo 140 do Código Penal trata do crime de injúria. Enquanto a injúria do Código Penal se
refere a um individuo em específico, a injúria da Lei n. 7.716/89 diz respeito a um grupo de
pessoas, residindo exatamente aí seu ponto de distinção. Essa diferenciação é bem
complicada, pois se faz necessário saber se a intenção do sujeito ativo foi ofender o
individuo pelas suas características ou o grupo a que ele faz parte.

Art. 20, §1º: (Tipo objetivo) fabricar, comercializar, distribuir, veicular; (objeto material)
símbolo, emblema, ornamento, distintivo ou propaganda que use a cruz suástica ou
gamada; (especial fim de agir) para fins de divulgação do nazismo. Para Baltazar, a
proibição se limita à utilização da cruz suástica ou gamada, mas não à divulgação do
ideário nazista ou de outros símbolos, como a imagem de Hitler ou a águia nazista. Sujeito
ativo: qualquer pessoa. Sujeito passivo: sociedade. Elemento subjetivo: dolo e o especial
fim de agir. Classificação: comum, de mera conduta, forma livre, comissivo, instantâneo,
unissubjetivo, unissubsistente ou plurissubsistente, admitindo tentativa nessa última forma.
Medidas cautelares (art. 20, §3º): o juiz poderá, ouvido o Ministério Público ou a pedido
deste, (a) determinar o recolhimento (quando estiver em local acessível e sem necessidade
de mandado judicial) ou a busca e apreensão do material (quando estiver em local
inviolável, ocasião em que se fará necessário o mandado judicial) ou (b) determinar a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

cessação imediata da divulgação do material racista pela televisão ou rádio. Efeitos


específicos da condenação (art. 20, §4º): a destruição do material recolhido ou aprendido.

III – Crimes contra pessoas portadoras do vírus da imunodeficiência humana (HIV) e


doentes de AIDS.

LEI Nº 12.984, DE 2 JUNHO DE 2014.


Define o crime de discriminação dos portadores do vírus da
imunodeficiência humana (HIV) e doentes de AIDS.
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso
Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Constitui crime punível com reclusão, de 1 (um) a 4
(quatro) anos, e multa, as seguintes condutas discriminatórias contra
o portador do HIV e o doente de AIDS, em razão da sua condição
de portador ou de doente:
I - recusar, procrastinar, cancelar ou segregar a inscrição ou impedir
que permaneça como aluno em creche ou estabelecimento de ensino
de qualquer curso ou grau, público ou privado;
II - negar emprego ou trabalho;
III - exonerar ou demitir de seu cargo ou emprego;
IV - segregar no ambiente de trabalho ou escolar;
V - divulgar a condição do portador do HIV ou de doente de AIDS,
com intuito de ofender-lhe a dignidade;
VI - recusar ou retardar atendimento de saúde.
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 2 de junho de 2014;

QUESTÕES DE CONCURSO: Pediu para eu começa falando sobre os crimes de


preconceito e de discriminação. Falei e distingui da injúria racial. Perguntou se esta era
crime de preconceito e discriminação. Pediu exemplos do crime crimes de preconceito e de
discriminação.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

19.a. Concurso de Pessoas


Obras consultadas: Santo Graal 27; Luiz Regis Prado. Curso de Direito Penal Brasileiro.
Volume 1. 10ª Edição. Ed. Revista dos Tribunais. Cezar Roberto Bitencourt. Tratado de
Direito Penal. Parte Geral 1. 12ª Edição. Ed. Saraiva. Cleber Masson. Direito Penal. Vol. 1.
Parte Geral. 4ª Edição. Ed. Método. Rogério Greco/2011, Cláudio Brandão/2008.

Legislação básica. Código Penal – artigos 29 a 31;

1. Noções Gerais: Concurso de pessoas é a colaboração empreendida por duas ou mais


pessoas para a realização de um crime ou de uma contravenção penal. . A cooperação pode
ocorrer desde a elaboração intelectual até a consumação do delito. Tanto pode referir-se a
autoria (co-autoria) ou a participação (co-participação).

Crime unisubjetivo e plurissubjetivo: No crime unisubjetivo, o tipo penal exige apenas uma
pessoa para que ele seja realizado, que é a regra, podendo haver eventualmente o concurso
de pessoas. No crime plurissubjetivo (também chamado de crime de concurso necessário), a
figura típica exige pluralidade de pessoas para sua configuração. Aqui não há aplicação da
regra do concurso de pessoas do artigo 20, CP uma vez que a pluralidade é elemento
necessário do tipo. Ex: Art. 288, 288-A e 137 do CP. Comparação: Nos crimes de concurso
necessário, a pluralidade de pessoas é um requisito penal. Nesse caso, a adequação típica é
direta. No crime unisubjetivo, basta uma única pessoa para sua realização, mas poderá
haver convergência de agentes. Nesse caso, será preciso aplicar uma norma de extensão
(art. 29 do CP), que consagra a teoria monista no concurso de pessoas, porque nem sempre
se perceberá quem realizou o comportamento típico. A teoria unitária ou monista é
consagrada no art. 29 do CP, que permite a imputação a qualquer um que tenha concorrido
para a prática penal, ainda que não tenha praticado o ato descrito no tipo. Essa teoria é
corolário da teoria da equivalência dos antecedentes causais (teoria da conditio sine qua
non). O ordenamento jurídico brasileiro adota a teoria monista moderada ou temperada,
pois contempla diversas exceções. [A teoria monista pura não difere autor de partícipe,
punindo todos igualmente. Isso não ocorre no ordenamento jurídico brasileiro, pois cada
um responde na medida de sua culpabilidade]. OBS 1: Mesmo que haja inimputáveis entre
as pessoas, o crime estará consumado. OBS 2: A rixa é formada por pelo menos três
pessoas e é um crime plurissubjetivo em que os agentes estão uns contra os outros e não
agindo conjuntamente como uma quadrinha. OBS 3: Nada impede que nos crimes de
concurso necessário também ocorra o concurso eventual, ou seja, a participação episódica
de terceiros. Exemplo disso é o auxílio pontual (fornecimento de piquetes, p. ex.) a um
motim de presos.

Iter criminis e concurso de pessoas: O concurso de pessoas compreende: autoria, coautoria,


autoria colateral e participação em sentido estrito. É matéria frequentemente discutida no
cotidiano dos tribunais. Com relação às etapas do iter criminis, o concurso de pessoas pode
se dar desde a fase de cogitação até a fase da consumação. Na fase de exaurimento, não
cabe, podendo constituir um indiferente penal ou outro delito (ex: receptação, ocultação de

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

cadáver, favorecimento real ou pessoal.).

2) Teorias sobre o concurso de pessoas: 2.1) Monista (ou monística ou unitária): Trata-
se de uma teoria objetiva. Foi a teoria adotada pelo Código Penal de 1940, a qual determina
que todo aquele que concorre para o crime responde pelas penas a este cominadas, na
medida de sua culpabilidade (art. 29, CP). Não faz qualquer distinção entre autor e
partícipe, instigação e cumplicidade. Todo aquele que concorre para o crime causa-o em sua
totalidade e por ele responde integralmente. Guarda profunda relação com a teoria da
equivalência dos antecedentes causais, constituindo-se a infração produto da conduta de
cada um, independentemente do ato praticado, desde que tenha alguma relevância causal
para o resultado. O fundamento maior dessa teoria é político-criminal, que prefere punir
igualmente a todos os participantes de uma mesma infração penal. A Reforma Penal de
1984, apesar de manter a teoria monista, atenuou os seus rigores, distinguindo com precisão
a punibilidade de autoria e participação, estabeleceu alguns princípios disciplinando
determinados graus de participação, adotou como exceção a concepção dualista mitigada,
distinguindo a atuação de autores e partícipes, permitindo uma adequada dosagem de pena
de acordo com a efetiva participação e eficácia causal da conduta de cada partícipe, na
medida da culpabilidade individualizada. OBS 1: Assim, a unicidade do crime frente à
pluralidade de agentes não implica na unicidade de pena, pois esta é aplicada segundo a
culpabilidade de cada um. OBS 2: Exceções à teoria monista: nesses casos os agentes vão
responder por crimes diferentes. Ex: art. 124 CP, art. 126. CP; art. 343, CP, 319-A, CP; 349-
A, CP; art. 318 e 334 do CP. 2.2) Dualista (ou dualística): para essa teoria há dois crimes -
os coautores incorrem num crime (realizam a atividade principal) e os partícipes
(desenvolvem uma atividade secundária), noutro. 2.3) Pluralista (ou pluralística): trata-se
de uma teoria subjetiva. A participação é tratada como autoria ou crime autônomo, a cada
participante corresponde uma conduta própria, um elemento psicológico próprio e um
resultado igualmente particular. Existem tantos crimes quantos forem os participantes do
fato delituoso. Adotada excepcionalmente em nosso ordenamento no caso do crime de
aborto consentido pela gestante; no de corrupção ativa e passiva; no de contrabando e no de
facilitação de contrabando ou descaminho.

Posicionamento do STF/2009: segundo a teoria monista ou unitária, havendo pluralidade


de agentes e convergência de vontades para a prática da mesma infração penal, todos
aqueles que contribuem para o crime incidem nas penas a ele cominadas, ressalvadas as
exceções de aplicação da teoria pluralista. Ocorre, contudo, que o Código de 1940 não
conseguiu estabelecer um rompimento absoluto com a sistemática anterior, pois os seus
arts. 45 e 48, II, e parágrafo único (atuais art. 62 e 29, §§ 1o e 2o, do CP/1984), ao tratarem
da aplicação de pena, mantiveram como agravantes e atenuantes, hipóteses de maior ou
menor reprovabilidade dos concorrentes, evidenciando a permanência da regra da
acessoriedade. Mitigou-se a teoria monística, permitindo a punição dos codelinquentes na
medida das suas culpabilidades. Serviu de solução intermediária entre as correntes unitária
e dualista, servindo de consenso entre todos os diplomas penais anteriores. Pode-se, dessa
forma, concluir que, na atualidade, o Direito Penal brasileiro acolhe a teoria monística
temperada ou teoria eclética. Nesse sentido, a 1a parte da cabeça do art. 29, do Código
Penal, espelha a teoria monística, mas a sua parte final, bem como seus §§ 1o e 2o, além
das hipóteses agravantes do art. 62, reconhecem a teoria dualista no tocante à dosagem da

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

pena de cada concorrente.

3) Requisitos: a) pluralidade de pessoas e de conduta: o concurso de pessoas depende de


pelo menos duas pessoas, e, consequentemente, de ao menos duas condutas penalmente
relevantes. b) relevância causal de cada conduta (nexo causal eficaz para o resultado):
a conduta deve ser relevante, de maneira a influir efetivamente no resultado. A contribuição
deve ser prévia ou concomitante à execução (a concorrência posterior à consumação
configura crime autônomo – receptação, favorecimento real ou pessoal, por exemplo). Mas
é possível a contribuição após a consumação, desde que tenha sido ajustada anteriormente.
Ex: A se compromete, perante B, a auxiliá-lo a fugir e a escondê-lo depois de matar C. Será
partícipe do homicídio. A participação inócua é irrelevante para o Direito Penal. c) liame
subjetivo ou psicológico entre as pessoas (concurso de vontade): consciência deve ser
idêntica ou juridicamente uma unidade para todos a contribuir para uma obra comum. Os
agentes devem revelar vontade homogênea, visando à produção do mesmo resultado. É o
que se convencionou chamar de princípio da convergência. Sem esse requisito estaremos
diante da famosa autoria colateral. Contudo, o vínculo subjetivo não depende do prévio
ajuste entre os envolvidos (pactum sceleris), bastando a ciência por parte de um agente no
tocante ao fato de concorrer para a conduta de outrem – consciente e voluntária cooperação.
OBS 1: Nada obsta que haja concurso de pessoas tanto nos delitos culposos, quanto nos
dolosos. OBS 2: Autoria colateral: é a convergência objetiva sem o vínculo psicológico.
Ainda que o comportamento contribua de forma relevante para o resultado, não responderá
o agente pelo resultado. Não há concurso de pessoas, pois não há liame subjetivo. Cada um
responderá separadamente pelo fato, pelo que fez. Ex: questão do CESPE: em perseguição
policial, vários policiais atiram no carro que está em fuga, cujo motorista é atingido e
morre. Não há liame subjetivo entre os policiais, então o que acertou o tiro responde por
homicídio consumado, os que erraram respondem por homicídio tentado, o policial que
dirigia não responde por nada, pois não há liame de sua conduta de dirigir com os atos de
atirar, ainda que tenha contribuído. OBS 3: Desvio subjetivo de condutas ou cooperação
dolosamente distinta (art. 29, §2º do CP): Uma pessoa quis participar do crime menos
grave, mas outra desviou a conduta para um crime mais grave [havia o liame subjetivo, mas
em um determinado momento um agente rompe e pratica crime mais grave]. Aplica-se a
pena do crime menos grave para aquele que quis participar deste. Trata-se de exceção à
teoria monista. Se houver previsibilidade da ocorrência de crime mais grave, responde pelo
crime da pena menos grave aumentada até a metade. [ex: 3 agentes combinam um furto em
uma casa que acreditam estar vazia. Dois entram e um fica do lado de fora para vigiar a rua.
Porém, lá dentro encontram o morador e decidem matar o morador com uma paulada na
cabeça. Pelo que respondem? Os dois que estavam dentro por roubo seguido de morte e o
que estava do lado de fora por furto]. OBS 4: Autoria mediata ou indireta: não configura o
concurso de pessoas, porque falta liame subjetivo. O autor mediato não realiza o fato, mas
se vale de um instrumento para a realização do crime. A definição da autoria mediata
decorre da teoria do domínio do fato. O autor mediato domina o fato indiretamente, através
do domínio da vontade do instrumento. A vontade do instrumento não é livre, ele é apenas a
longa manus do agente, por isso não há liame subjetivo, já que o instrumento não tem
vontade livre. Hipóteses de autoria mediata: - O primeiro caso de autoria mediata é a
coação irresistível (física ou moral). Na física irresistível há ausência de conduta. Na
coação moral irresistível há exclusão da culpabilidade por inexigibilidade de conduta

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

diversa. - O segundo caso é o induzimento a erro invencível. - O terceiro é o erro de


proibição. Se escusável, fica o agente isento de pena e quem responde é o terceiro mediato
que induziu ao resultado. Ex: manter relações sexuais com menor de 14 anos por acreditar
que com aquela menina em específico pode ocorrer o ato por ela já ter tido relação sexual
com outras pessoas. Dependendo das condições pessoais do agente esse erro será vencível
ou invencível. - Outro caso é o erro de tipo. - Outro caso é a utilização de inimputável sem
discernimento. É necessário ser sem discernimento, pois em alguns casos, haverá o
pseudoconcurso (menor de 17 anos que pratica crime junto com maior), é pseudoconcurso
pois há liame subjetivo entre os agentes [nesse caso o agente é menor de idade, mas não é
sem discernimento]. Pode-se considerar no Direito Penal, o menor de catorze anos como
sendo sem discernimento. Ex.: Maior instiga menor de 14 anos a se jogar do prédio
fazendo-o acreditar que é um x-man. O agente responderá por homicídio com autoria
mediata. Inclui-se também, como utilização de inimputável, o induzimento a suicídio do
embriagado involuntariamente. [Portanto: < 18a e > 14a: é pseudoconcurso, pois tem
discernimento. < 14a: é instrumento de autoria mediata, pois não tem discernimento]. - O
último caso de autoria mediata é a estrita obediência hierárquica, na qual haverá a exclusão
da culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa. Diferença entre a autoria mediata e
o autor intelectual: Autor intelectual está diretamente ligado ao crime, apesar de não o
realizar materialmente o fato, pois se vale de um executor. Não se fala em autoria mediata
porque a vontade do autor executor é livre, contribuindo voluntariamente com a vontade do
autor intelectual. Na autoria intelectual há autoria direta ou imediata. // Na autoria mediata,
o autor mediato domina indiretamente o fato através do domínio da vontade do instrumento
[que é inimputável, induzido a erro, coagido...]. [Portanto: Autoria mediata: autoria indireta.
Autoria intelectual: autor direto (teoria do domínio do fato também se aplica aqui)]. OBS 5:
O liame subjetivo não exige o prévio ajuste: É o caso da coautoria sucessiva. Coautoria
sucessiva ocorre quando, sem que haja ajuste prévio, um sujeito adere ao comportamento
de outro que já havia se iniciado. Inexiste coautoria sucessiva após a consumação. Ex:
agente está furtando uma TV em uma residência e ao passar pela casa, outro agente percebe
e adere ao furto ajudando a carregar para fora da casa o bem furtado, ajustando que ficará
com parte do valor da venda. OBS 6: Caso Mensalão (STF): “Não procede a alegação da
defesa no sentido de que teria havido mero concurso de agentes para a prática, em tese, dos
demais crimes narrados na denúncia (lavagem de dinheiro e, em alguns casos, corrupção
passiva). Os fatos, como narrados pelo Procurador Geral da República, demonstram a
existência de uma associação prévia, consolidada ao longo do tempo, reunindo os requisitos
estabilidade e finalidade voltada para a prática de crimes, além da união de desígnios entre
os acusados.” (Inq. 2.245, rel. Joaquim Barbosa, Tribunal Pleno, julgado em 12.08.2007).
d) identidade do ilícito penal: o delito deve ser idêntico ou juridicamente uma unidade
para todos. Adotou-se, como regra, a teoria unitária ou monista.

4) Teorias sobre autoria e participação: A) Autoria e A’) Coautoria; B) Participação,


B.1)- instigação, B.2)-cumplicidade.

A) Autoria:

A.1) Teorias sobre o concurso de pessoas: A.1.1) Pluralística (subjetiva): a cada


participante corresponde uma conduta própria, um elemento psicológico próprio e um

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

resultado igualmente particular. Existirão tantos crimes quanto forem seus autores; desse
modo, cada coautor do delito responderá por um crime diferenciado. Oferece dificuldades
quanto a prova. A.1.2) Dualista: os autores deverão responder conjuntamente por um
crime, enquanto os partícipes responderão conjuntamente por outro. A.1.3) Monista ou
unitária (objetiva): apregoa a unicidade de crime em face da pluralidade de agentes. Por
conseguinte, tanto os autores quanto os partícipes responderão por um único crime. Essa foi
a teoria adotada pelo CP. Porém, os seus parágrafos aproximaram a teoria monista da teoria
dualista ao determinar a punibilidade diferenciada á participação (teoria unitária temperada,
teoria dualista mitigada).

OBS 1: Concurso de pessoas e crime culposo: O concurso de pessoas nos crimes culposos é
aceito à luz do art.18, II do CP. Análise pelo critério finalista: Contudo pelo critério
finalista, a coautoria em crime culposo é inadmissível, por falta de liame subjetivo. A
doutrina finalista também não admite participação culposa, pois falta o liame subjetivo de
participar em crime alheio. Do mesmo modo, a participação culposa em crime doloso
alheio é inadmissível, pela ausência de liame subjetivo. [então o critério finalista não se
ajusta ao concurso ou participação em crime culposo]. OBS 1: Parte minoritária da doutrina
admite a participação dolosa (instigação) em crime praticado a título de culpa. Ex:
motorista é instigado pelo passageiro a dirigir em alta velocidade e acaba atingindo o
resultado típico. Autor (motorista) responde por culpa e partícipe (passageiro) por dolo.
Esse posicionamento é criticado, pois quebra a identidade do ilícito penal. OBS 2: A
cooperação a título de dolo em crime culposo acarreta outras soluções: cada um responderia
autonomamente pelo crime, o que levaria a uma forma heteróloga de autoria colateral, pois
um responderia por culpa e outro, por dolo (cabível em hipóteses de induzimento a erro
invencível, a título de culpa – art. 20, §2º); E se os dois atuam culposamente? A orientação
minoritária sustenta que cada um responde per si, separadamente, a título de culpa, pois não
é possível fracionar a violação do dever objetivo de cuidado. Jurisprudência e doutrina
majoritárias entendem que é possível a coautoria culposa, desde que se tenha uma
proximidade física das condutas com inobservância do dever de cuidado, somada a
concausalidade. Ex: dois pedreiros jogam uma viga do segundo andar de uma obra por
acreditarem que por estar no horário de almoço ninguém passaria no térreo, mas outro
pedreiro passa e morre na hora [os dois agem com culpa e um sozinho não conseguiria
arremessar o peso da viga, então os dois com a soma de suas forças causam o resultado].
OBS 3: Gueiros conclui que: (1) a participação em sentido estrito está categoricamente
afastada nos crimes culposos; (2) alguns autores admitem a hipótese da coautoria, tão
somente para a criação da situação de violação conjunta do dever de cuidado; (3) outros
autores denominam esta mesma hipótese de autoria colateral, tomando, como referencial, o
resultado desvalioso; e (4) estes dois entendimentos não são, na essência, excludentes entre
si, distinguindo-se sob o aspecto terminológico (coautoria até a violação do dever de
cautela; e autoria colateral no resultado que integra o tipo culposo).

OBS 2: Concurso de pessoas e crime omissivo: Os crimes omissivos são crimes de dever e
a base da responsabilidade não alcança qualquer omitente, mas apenas aquele que está
comprometido por um concreto dever de atuação. Pela estrutura dos crimes omissivos,
deve-se abandonar a ideia do domínio final do fato, em favor da preponderância da
violação do dever. O autor do crime omissivo é quem tem o domínio potencial do fato e

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

viola o dever de atuação. Com base nessa concepção, o entendimento majoritário admite o
concurso de pessoas em crime omissivo, desde que o dever de agir seja comum entre eles e
haja também um vínculo psicológico que corresponde à anuência quanto à abstenção. Ex:
Dois salva-vidas decidem não salvar criança que se afoga na piscina. Em sentido contrário,
doutrina minoritária afirma que não admite divisão de tarefas, porque a omissão é
infracionável. Para essa orientação, o crime omissivo não admite coautoria. No crime
omissivo próprio, o dever de agir está no tipo penal e, no crime omissivo impróprio, a
relação de garantidor que determina o dever de atuar.

A.2) Teorias que buscam fornecer o conceito de autor: 1) Conceito restritivo de autor:
autor é aquele que pratica o verbo núcleo do tipo. Realizar a conduta típica é objetivamente
distinto de favorecer a sua realização. Desta feita, autoria e participação também devem ser
distinguidas através de critérios objetivos. O conceito restritivo de autor necessita ser
complementado por uma teoria objetiva de participação, que pode assumir dois aspectos
distintos: a) teoria objetivo-formal: define como autor aquele cujo comportamento se
amolda ao círculo abrangido pela descrição típica e, como partícipe, aquele que produz
qualquer outra contribuição causal ao fato (teoria adotada pelo CP); b) teoria objetivo-
material: para distinguir autor de partícipe, considera a maior perigosidade que deve
caracterizar a contribuição do autor em comparação com a do partícipe. Apesar do conceito
restritivo de autor distinguir autoria e participação, não contempla a figura do autor
mediato; c) Teoria do domínio do fato (teoria finalista ou normativa): busca distinguir com
clareza autor de executor, admitindo a figura do autor mediato, além de possibilitar melhor
compreensão da co-autoria. Surgiu em 1939 com o finalismo de Hans Welzel. Para essa
concepção, autor é quem possui controle sobre o domínio do fato, domina finalisticamente
o trâmite do crime e decide acerca da sua prática, suspensão, interrupção e condições. A
teoria do domínio do fato, que se assenta em princípios relacionados à conduta delitiva,
estabelece a seguinte distinção: autor é quem domina finalisticamente o decurso do crime e
decide sobre sua prática e circunstâncias, distinguindo-se do partícipe, que não tem o
domínio do fato, apenas cooperando, induzindo, incitando, nos termos do artigo 29 do
Código Penal. Amplia-se o conceito de autor, de maneira que, mesmo não realizando o
núcleo do tipo penal, é possível falar em autoria, desde que o agente tenha o controle final
do fato criminoso. Nesse cenário, o conceito de autor compreende os seguintes tipos: o
autor propriamente dito (aquele que realiza o núcleo do tipo), o autor intelectual (aquele
que planeja a empreitada criminosa, já que tem poderes para controlar a realização do fato),
o autor mediato (é autor mediato quem realiza o tipo penal servindo-se, para a execução da
ação típica, de outra pessoa como instrumento. O autor mediato realiza a ação típica através
de outrem, que atua sem culpabilidade, encontrando-se absolutamente subordinado em
relação ao mandante. As hipóteses mais comuns de autoria mediata decorrem do erro de
tipo escusável provocado por terceiro – art. 20, 2º do CP; da coação moral irresistível – art.
22 do CP; da obediência hierárquica - art. 22 do CP; e do uso de inimputáveis para a prática
de crimes – embriaguez ou doença mental. Também quando o agente autua sem dolo ou
culpa – coação física irresistível, no sonambulismo e na hipnose), os coautores (quando o
núcleo do tipo penal é realizado por mais de um agente, visto que cada um desempenha
uma função fundamental na consecução do objetivo comum). Essa teoria também admite a
figura do partícipe, aquele que de qualquer modo concorre para o crime, desde que não
realize o núcleo do tipo penal nem possua controle final do fato. A maioria da doutrina

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admite a aplicação desta teoria para os casos de autoria mediata. Importante salientar que o
âmbito de aplicação da teoria do domínio do fato se restringe aos delitos dolosos, pois os
delitos culposos caracterizam-se exatamente pela perda desse domínio. Também não
explica a co-autoria nos crimes omissivos. 2) Conceito extensivo de autor: tem como
fundamento dogmático a idéia básica da teoria da equivalência das condições. Essa teoria
não distingue autoria e participação. É autor todo aquele que contribui com alguma causa
para o resultado. Para ela, instigador e cúmplice são igualmente autores.

OBS 1: Teoria do domínio funcional do fato e Teoria do domínio da organização: Artur


Gueiros faz essa distinção, pois para ele enquanto a construção do domínio funcional do
fato pressupõe a divisão racional do trabalho numa vertente horizontal, a teoria do domínio
do fato por aparato organizado de poder – também chamada de domínio da organização –
pressupõe a mesma noção, mas sob a perspectiva vertical. Exemplo: “A”, integrante de
organização criminosa comandada por “B”, efetua, a mando deste, mas de forma
plenamente imputável, sem erro ou coação, a eliminação de “C”, rival dos negócios ilícitos.
Fundamenta a punição, a título de autor, daquele que se encontra no ápice de uma estrutura
organizada de poder, para não puni-lo apenas a título de partícipe. Dessa forma, a
caracterização da figura da autoria em virtude dos aparatos organizados de poder requereria
a presença de três requisitos: (1) estrutura hierárquica rígida; (2) fungibilidade do autor
imediato; e (3) organização estabelecida fora da ordem jurídica (já que, nas organizações
estruturadas dentro da legalidade, a normalidade jurídica afastaria a transmissão da vontade
do dirigente da organização). Entretanto, há autores que propugnam a aplicação da teoria
dos aparatos organizados de poder para organizações que operam dentro do Estado de
Direito (conselhos de administração de empresas, etc.).

OBS 2: DICA: somente considere a teoria finalista em uma resposta se a questão também a
considerar na pergunta. Se a questão falar em “de acordo com o concurso de pessoas
segundo o Código Penal...” isso significa que é para adotar a teoria objetiva como
parâmetro de resposta. Ex: João tem uma ideia de crime e chama Marcos e José para
realizar um roubo em uma joalheria. João ensina como será o roubo, fornecendo os
instrumentos necessários, os três combinam e marcam o dia. Um dia antes, Marcos e José
vão e realizam o roubo, ficando João em casa. De acordo com o Código Penal os agentes
responde por qual crime? Marcos e José em coautoria por roubo consumado e João por
participação [de acordo com a teoria objetiva o partícipe é quem induz, auxilia, exatamente
o que João fez].

OBS 3: Como distinguir o autor do partícipe? Resposta: O autor, pela teoria objetiva, é
quem executa o comportamento descrito no tipo penal. O partícipe é quem coopera
secundariamente, induzindo, instigando, auxiliando, prestando colaboração sem executar o
tipo penal. Pela teoria subjetiva, o autor é quem tem vontade de autor, em outras palavras,
ele deseja o crime como próprio [independente de executar o crime]. O partícipe tem
vontade somente de colaborar. [essa teoria alcança a autoria intelectual, o mandante]. A
teoria finalista ou normativa afirma que o autor possui o domínio final do fato, porque ele
tem a disponibilidade da decisão sobre a consumação ou a desistência do delito. O autor
domina o decorrer do acontecimento típico. Agrega-se a essa ideia o domínio funcional do
fato (Roxin), baseado no critério de divisão de tarefas, no qual o agente não precisa

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dominar toda a empreitada criminosa, basta que tenha o domínio da sua parte, que deve ser
essencial para que o objetivo comum seja alcançado. Na visão finalista, o partícipe colabora
dolosamente sem o domínio do fato na ação delitiva de outrem com atividades secundárias.
Não existe participação culposa. MACETE: para saber se é autor ou partícipe crie um filtro
com as teorias, se passar por todas as etapas sem que seja autor então será partícipe.

A’) Coautoria:

Duas ou mais pessoas executam o núcleo do tipo penal. a) coautoria parcial ou funcional:
é aquela em que os diversos autores praticam atos de execução diversos, que somados
produzem o resultado almejado. b) coautoria direta ou material: todos os autores efetuam
igual conduta criminosa. OBS 1: Os crimes próprios podem ser praticados em coautoria
(art. 30 do CP). OBS 2: Os crimes de mão própria são incompatíveis com a coautoria.
Exceção: dois ou mais peritos subscrevem dolosamente o mesmo laudo falso (art. 342 do
CP). OBS 3: Executor de reserva: agente que acompanha a execução do crime, ficando à
disposição, se necessário, para nela intervir. Se intervier, será coautor, se não, será partícipe.
OBS 4: Coautoria sucessiva: ocorre quando a conduta, iniciada em autoria única, se
consuma com a colaboração de outra pessoa, com forças concentradas, mas sem prévio e
determinado ajuste. Aqui, o acordo de vontades ocorre após o início da execução. OBS 5:
Coautoria em crimes culposos: a doutrina alemã não admite. A doutrina brasileira admite a
coautoria em crime culposo, mas rechaça a participação. Aqueles que cooperam na causa,
isto é, na falta do dever de cuidado objetivo, agindo sem a atenção devida, são coautores.
Ex: passageiro que induz motorista de táxi a dirigir em velocidade excessiva e contribui
para um atropelamento seria coautor. Entretanto, não se admite a participação em crimes
culposos, segundo a doutrina majoritária. OBS 6: Coautoria em crimes omissivos: duas
posições. A primeira corrente afirma que seria possível, sejam eles próprios ou impróprios,
bastando que dois agentes, vinculados pela unidade de propósitos, prestem contribuições
relevantes para a produção do resultado (Bitencourt e Nucci). Ex: duas pessoas, ao verem
uma terceira ferida na rua, uma conhecendo a conduta da outra e até havendo incentivo
recíproco, resolvem ir embora. Seriam coautoras do crime de omissão de socorro. A
segunda corrente não admite, qualquer que seja a natureza do crime omissivo, já que cada
um dos sujeitos detém o seu dever de agir de modo individual, indivisível e indelegável

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

(Nilo Batista). OBS 7: Autoria intelectual: como toda ação é a unidade dialética entre
vontade dirigida a um fim e modificação do mundo exterior, assim, a ação tem uma fase
intelectual e uma fase material. Se alguém elabora a fase intelectual do crime é chamado de
autor intelectual. OBS 8: Autoria mediata: o autor se serve de outra pessoa para o
cometimento do delito, como um instrumento humano e este age sem ser autor ou partícipe
(ex: coação moral irresistível), quem se serve de alguém que age sem culpabilidade e que se
aproveita ou provoca erro de tipo ou de proibição no seu “instrumento”. O CP prevê quatro
casos de autoria mediata: art. 20,§2°; art. 22, primeira parte; art. 22, segunda parte; art. 62,
III, segunda parte. OBS 9: A autoria mediata é incompatível com os delitos culposos. OBS
10: É possível a autoria mediata nos crimes próprios, desde que o autor mediato detenha
todas as qualidades ou condições pessoais reclamadas pelo tipo penal. OBS 11: Não é
possível a autoria mediata, nem a coautoria em crimes de mão própria. OBS 12: Autor por
determinação (Zaffaroni): seria alguém, que se valendo de outro, que não realiza conduta
punível por ausência de dolo, em um crime de mão própria, ou ainda o sujeito que não
reúne as condições legais exigidas para a prática de um crime próprio, quando se utiliza de
quem possui tais qualidades e se comporta de forma atípica, ou acobertado por uma
cláusula de exclusão de ilicitude ou da culpabilidade. Não é autor direto, não é autor
indireto, nem partícipe do delito, mas sim autor da determinação para o crime. OBS 13:
Autoria de escritório: agente que transmite a ordem a ser executada por outro autor direto,
dotado de culpabilidade e passível de ser substituído a qualquer tempo por outra pessoa, no
âmbito de uma organização ilícita de poder. Exemplo: líder do PCC. OBS 14: Autoria
colateral - não é concurso de pessoas, tendo em vista a ausência de vínculo subjetivo entre
os agentes. Ex. A e B atiram em C, com desígnios autônomos. Se C morre atingido pela
munição de A, A reponde por homicídio consumado e B por tentativa. OBS 15: Autoria
incerta – espécie de autoria colateral em que não se sabe quem acertou C. A e B respondem
por tentativa (in dubio pro reo). Mas, se A ou B incidiu em crime impossível, a causa de
atipicidade a todos se estende (ninguém responde). OBS 16: Autoria desconhecida –
instituto ligado ao Direito Processual Penal. Ao contrario da autoria incerta, não se sabe
quem cometeu o crime. OBS 17: Autor por convicção – o autor conhece efetivamente a
norma, mas a descumpre por razões de consciência. OBS 18: Cumplicidade e
favorecimento real. Se o auxílio foi proposto antes da consumação da infração pretendida
pelo autor, então haverá cumplicidade (auxílio material); se foi posterior a sua consumação,
haverá favorecimento real.

B) Participação:

Entende-se por participação strito sensu a colaboração dolosa em um fato alheio. O sujeito
não realiza diretamente o núcleo do tipo penal, mas de qualquer modo concorre para o
crime. Tem, pois, sempre natureza acessória. Assim, a ação do partícipe é atípica e, por
conseguinte, sua participação é uma ampliação do tipo penal, vez que o tipo não prevê a
conduta do partícipe. É uma conduta acessória que gravita em torno da conduta principal do
autor. A incriminação do partícipe fundamenta-se pela teoria da acessoriedade, assim
haverá uma impunibilidade se não houver uma ação do autor, ao menos, tentada (art. 31,
CP). Requisitos: 1) propósito de colaborar para a conduta do autor (principal); 2)
colaboração efetiva, por meio de um comportamento acessório que concorra para a conduta
principal. Elementos: 1) Elemento objetivo: comportamento no sentido de auxiliar,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

contribuir (cooperação); 2) Elemento subjetivo: ajuste, acordo de vontades, suficiente a


voluntária adesão de uma atividade a outra. O partícipe deve agir com consciência e
vontade de contribuir para a prática do delito (dolo). Daí, não se falar em participação
dolosa em crime culposo, ou em participação culposa em crime doloso. Espécies: 1)
Induzimento ou Instigação: induzimento: induzir intencionalmente outro a cometer o delito,
isto é, fazer nascer na mente de outrem a vontade criminosa, mediante influência moral ou
por qualquer outro meio; instigação: reforçar a vontade criminosa que já existe na mente de
outrem. 2) Cumplicidade: prestar auxílio, colaborar, cooperar, contribuir de forma material.
Nada impede que a cumplicidade também ocorra sob a forma de omissão, quando o
partícipe tem o dever genérico de agir, como seria o caso do vigilante que deixa
propositalmente aberta a porta do estabelecimento para facilitar a ação do autor do furto.

Teorias sobre a participação: 1) Teoria da promoção: A teoria da promoção fundamenta


a punição do partícipe. O fundamento da punibilidade da participação se encontra no
desvalor intrínseco da sua colaboração para um fato socialmente intolerável. O partícipe
promove a infração penal, ainda que não a realize. 2) Acessoriedade da participação: A
participação é sempre acessória. Por ser acessório, o partícipe depende de um
comportamento do autor fundamental. Como a conduta do partícipe tem natureza acessória,
somente haverá eficácia penal quanto aderida à conduta principal do autor. A adequação
típica tem subordinação mediata, por força da norma de extensão pessoal prevista no art. 29
do CP. Para a punição do partícipe, deve ser iniciada a execução do crime pelo autor. Nesse
cenário, algumas teorias procuram limitar o alcance da acessoriedade da participação,
havendo quatro teorias: 1) Teoria da acessoriedade mínima: para que se puna o partícipe é
suficiente que a ação principal seja típica, sendo indiferente sua antijuridicidade. Desta
feita, uma ação justificada para o autor constitui crime para o partícipe. 2) Teoria da
acessoriedade limitada: exige que a conduta do autor seja típica e ilícita. É a posição
adotada pela maioria da doutrina, apesar de não resolver os problemas inerentes à autoria
mediata. A doutrina entende que o CP adota essa teoria [não exige que o autor seja
culpável, ex: não importa se o autor é inimputável, que é o caso também do
pseudoconcurso, no qual o menor entre 14a e 18a pode ser até o mentor do crime]. 3)
Teoria da acessoriedade máxima ou extrema: exige que a conduta do autor seja típica,
ilícita e culpável. 4) Teoria da hiperacessoriedade: o fato deve ser típico, ilícito e culpável e
o partícipe responderá também pelas agravantes e atenuantes pessoais do autor [nesse caso
o amigo partícipe que ajuda o filho a furtar o pai também seria alcançado pela não
punibilidade do furto contra ascendente].

OBS: Participação mediante ações neutras: Há soluções discrepantes e ainda não


pacificadas sobre este tema, que é tormentoso para juristas e magistrados. São condutas que
contribuem a um fato ilícito praticado por terceiro que, à primeira vista, parecem
completamente normais. Ex: “A”, taxista, transporta um assassino até o local onde uma
pessoa cometerá um homicídio. São comportamentos socialmente úteis, e, em princípio,
adequados, embora possam ser incorporadas pelo autor ao seu plano delitivo. De forma
praticamente unânime, o problema é colocado na tipicidade. Há, no entanto, discussão se é
questão de tipo objetivo ou de tipo subjetivo e há, ainda, posições mistas.

OBS DIVERSAS: OBS 1: É possível a participação por omissão, desde que o omitente,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

além de poder agir no caso concreto, tivesse ainda o dever de agir para evitar o resultado,
nos casos previstos no art. 13, 2º do CP. Ex. é partícipe do furto o policial militar que
presencia a subtração de bens de uma pessoa e nada faz porque estava fumando um cigarro
e não queria apagá-lo. OBS 2: Participação sucessiva: quando um mesmo sujeito é
instigado, induzido ou auxiliado por duas ou mais pessoas, cada qual desconhecendo o
comportamento alheio, para executar uma infração penal. OBS 3: Participação em cadeia
ou participação da participação: alguém induz ou instiga uma pessoa,para que esta
posteriormente induza, instigue ou auxilie outra a cometer determinado crime. OBS 4:
Crimes culposos: É firme o entendimento doutrinário de que não é possível a participação
em crimes culposos. OBS 5: Não há tentativa em participação, pois, se não houver qualquer
ato de execução, a participação é um indiferente penal. OBS 6: Ocorrendo a desistência
voluntária ou o arrependimento eficaz do autor, o partícipe não será beneficiado com a
regra contida no art. 15 CP.Essa é a opinião de Rogério Greco, mas há controvérsia na
doutrina. OBS 7: ocorrendo o arrependimento do partícipe, este somente não será
responsabilizado penalmente se conseguir fazer com que o autor não pratique a conduta
criminosa. OBS 8: A participação pode ser: moral: que incide sobre o psiquismo do agente
como induzimento e instigação, contudo é necessário que a participação moral seja uma das
causas do resultado ou faltará o nexo de causalidade entre a conduta do agente e o
resultado; material: que se opera no mundo exterior, se verificando na fase de execução do
crime que pode ser uma participação quando do fornecimento de meios (instrumentos do
delito) ou modo (formas de execução). OBS 9: A participação moral é impossível de ser
realizada por omissão. Já a participação material, sim. OBS 10: Cabe cumplicidade por
omissão? (Exemplo: Empregada desejando se vingar de seus patrões, deixa a porta da casa
aberta para facilitar a entrada de terceiro, pois sabia que tinha ladrão rondando a área, sem
liame subjetivo entre ambos.) Resposta: Parte majoritária da doutrina entende que a
cumplicidade por omissão é impunível, pois o agente não é garantidor, não havendo
também liame subjetivo. A mera postura de não impedir, a princípio, é irrelevante. Se o
agente for garantidor, responde pelo resultado, mas sem concurso de pessoas, por não haver
liame subjetivo entre os sujeitos envolvidos. Há posicionamento doutrinário muito
minoritário que é possível a cumplicidade por omissão, respondendo como partícipe.

Princípio da executividade e participação: A conduta do partícipe não é punível se pelo


menos não houver início de execução pelo autor, de acordo com o art. 31 do CP. [Art. 31 -
O ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa em contrário,
não são puníveis, se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado]. Porém, existem
condutas de partícipe que foram elevadas a categoria de crime autônomo, sendo punidas
como crime próprio. [Art. 318 - Facilitar, com infração de dever funcional, a prática de
contrabando ou descaminho (art. 334): Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e
multa.Art. 334 Importar ou exportar mercadoria proibida ou iludir, no todo ou em parte, o
pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de
mercadoria: Pena - reclusão, de um a quatro anos.] [O 318 seria a atuação do partícipe, mas
que aqui está como figura autônoma. O 334 é a atuação do autor. É uma exceção dualista,
apesar de a regra ser a teoria monista]. OBS 1: E se o autor desistir voluntariamente? Ex: o
agente decide fazer um homicídio, mas por pedidos de clemência do alvo desiste de dar o
tiro final, deixando-o apenas com o tiro no pé. O autor responde apenas pelos atos até então
praticados, não respondendo nem pela tentativa do crime mais grave. Então o autor só

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

responde por lesão corporal. E o partícipe responde pelo quê? Resposta: há três correntes.
[Isso é tema para cair na prova discursiva. Tem que colocar todas as três soluções. Caiu na
magistratura federal em 2011]. 1ª) a primeira solução é a impunibilidade do partícipe; 2ª) se
o autor só responde pelos atos até então praticados, o partícipe também (o acessório
acompanha o principal); 3ª) a desistência voluntária é ato pessoal e incomunicável,
respondendo o partícipe pela tentativa do crime mais grave [ele não desistiu de nada,
continua com o dolo de matar. A desistência do autor, além de circunstância pessoal do
autor, é circunstância alheia a sua vontade] [é o contrário da cooperação dolosamente
distinta, pois um dos concorrentes quis participar de crime menos grave ao desistir. Seria
uma cooperação dolosamente distinta às avessas]. OBS 2: Tratando-se de arrependimento
eficaz, as soluções são as mesmas.

5) Punibilidade da participação no concurso de pessoas: a) Participação de menor


importância: Art. 29, do CP: “Se a participação for de menor importância, a pena pode ser
diminuída de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço).” Cuida-se de causa de diminuição de pena,
de caráter obrigatório, segundo doutrina majoritária, podendo ser aplicada a sanção penal
aquém do mínimo legal, segundo Regis Prado. Importante salientar que não é possível a
diminuição da pena ao coautor, tampouco ao autor intelectual, que, embora seja
considerado partícipe, tenha arquitetado o crime (evidentemente sua participação não pode
ser considerada de menor importância). Obs. a participação inócua, aquela que não
contribui para o resultado, é penalmente irrelevante. b) cooperação dolosamente distinta
(desvio subjetivo de conduta, participação em crime menos grave): Art. 29, 2°, do
Código Penal: “Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á
aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até ½ (metade), na hipótese de ter sido
previsível o resultado mais grave.” Trata-se de regra para temperar a teoria monista ou
unitária, implicando a reafirmação do caráter individual da culpabilidade, pois em caso de
desvio subjetivo de conduta – quando um dos intervenientes queria participar do delito
menos grave e não do mais grave realizado por outro concorrente – a culpabilidade será
mensurada individualmente, com aplicação proporcional da penal. Todavia, sendo
previsível do resultado, responderá o partícipe pelo crime menos grave, com a pena
aumentada da metade. c) Participação impunível: art. 31 – “o ajuste, a determinação ou
instigação e o auxílio, salvo disposição expressa em contrário, não são puníveis, se o crime
não chega, pelo menos, a ser tentado”. Essa regra decorre do caráter acessório da
participação, pois o comportamento do partícipe apenas adquire importância penal se o
autor iniciar a execução do crime. A locução “salvo” remete-se a situações taxativamente
previstas em lei nas quais a punição do ajuste, da determinação, da instigação e do auxílio
são previstas como crime autônomo (ex. art. 286 e 288 do CP). d) Circunstâncias
incomunicáveis: São aquelas que não se transmitem aos coautores ou partícipes de um
crime, pois se referem exclusivamente a determinado agente. Segundo o art. 30 do Código
Penal, as circunstâncias e as condições de caráter pessoal não se comunicam, salvo quando
elementares do crime.

Estudo mais detalhado da incomunicabilidade das circunstâncias: Segundo o art. 30 do


Código Penal, as circunstâncias e as condições de caráter pessoal não se comunicam, salvo
quando elementares do crime. Circunstâncias: As circunstâncias são dados periféricos, pois
não integra o tipo penal, e que podem influenciar na aplicação da pena. A retirada ou

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

inclusão de uma delas não interfere na essência da figura típica. [não se comunicam porque
são circunstâncias subjetivas. Ex: motivo torpe, relevante valor moral]. [Art. 30 - Não se
comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares
do crime]. Ex: Mulher quer matar marido por relevante valor moral. O matador de aluguel
deseja matar por motivo torpe. Essas circunstâncias estão na órbita da figura típica. Caráter
pessoal: diz respeito ao autor do fato: homem ou mulher, jovem ou idoso..., ao seu
relacionamento com os demais, inclusive a vítima (amigo ou inimigo etc.), bem como a
motivação para delinquir (torpeza, piedade, ganância, altruísmo etc.). O que for pessoal e
estiver contemplado no tipo, comunica-se ao concorrente. O que for pessoal, mas não
estiver no tipo, não se comunica. Por outro lado, impessoal ou objetivo compreende tudo o
que está fora do autor do crime (o modo da sua execução, os instrumentos utilizados, o
tempo, lugar, as características da vítima etc). O que for impessoal comunica-se ao coautor
ou partícipe. Elementares: Elementares são dados essenciais da figura típica, uma vez
extraídos, tem-se o fenômeno da atipicidade, que pode ser relativa ou absoluta, ou seja,
pode haver uma desclassificação ou situação de irrelevante penal. Ex: Crime de
infanticídio: Matar quem? O próprio filho; Como? Sob influência do estado puerperal. Se
tirar uma elementar dessas será outro crime: homicídio ou auto-aborto. No caso de
pai/namorado/enfermeira que auxilia a mãe a realizar a morte do bebê, há duas orientações
quanto ao tema: Ele responde por homicídio ou infanticídio? i) Posição minoritária entende
que o pai responde por homicídio, porque o estado puerperal é condição personalíssima
incomunicável. Haveria uma quebra da teoria monista; ii) Para a posição majoritária,
aplica-se o art. 30, porque o estado puerperal, apesar de ser condição pessoal, é elementar
do crime [devendo seguir a regra da comunicabilidade], desde que o agente tenha ciência
da condição pessoal do concorrente (posicionamento de Gueiros). Para essa corrente o
artigo 30, CP não faz distinção entre condição pessoal e condição personalíssima. Ex 1:
peculato ou furto? Caso: funcionário junto com particular se apropria de um bem que tem a
posse em razão da função. O particular responderá também pelo peculato se souber da
condição de funcionário público do concorrente. Se não souber responderá pelo seu dolo
[furto ou apropriação]. Ex 2: No art. 297, §1º do CP, há o crime de falsificação de
documento público com circunstância pessoal incomunicável que acarreta o aumento da
pena. [Art. 297 - Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento
público verdadeiro: Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa. § 1º - Se o agente é
funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de
sexta parte]. OBS 1: As circunstâncias objetivas sempre serão comunicáveis, desde que
sejam do conhecimento dos concorrentes. Ex: lesão corporal praticada contra gestante que
resulta aborto. Os concorrentes respondem pelo aborto se tiverem conhecimento da
gravidez. [o artigo 30 somente fala das circunstâncias subjetivas]. OBS 2: O
arrependimento posterior do agente que restitui a coisa ou repara o dano se caracteriza
como circunstância objetiva. Se apenas um agente restitui a coisa, todos os demais serão
beneficiados pelo arrependimento. OBS 3: A retratação como causa de extinção da
punibilidade é incomunicável, porque é pessoal, aplicando-se o art. 30 do CP, nesse caso.
Ex: artigo 143, CP c/c artigo 107, VI, CP: o agente que se retrata de calúnia ou difamação
fica isento de pena. [Atenção: não existe retratação para injúria]. Exceção da OBS 3: O art.
342, §2º do CP é outra modalidade de retratação. A doutrina majoritária entende que essa
retratação é circunstância objetiva, se comunicando ao concorrente [pois o fato deixa de ser
punível e não o agente que deixa de ser apenado]. [Art. 342 [...] § 2º O fato deixa de ser

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

punível se, antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, o agente se retrata ou
declara a verdade]. OBS 4: A doutrina entende que há diferença entre circunstância e
condição pessoal. Circunstância pessoal é uma questão subjetiva que envolve o agente sem
ser inerente a ele [Ex: a confissão envolve o agente e é uma circunstância pessoal.]. Já a
condição pessoal é inerente ao sujeito [Ex: ser menor de 21 anos é inerente à pessoa, sendo
esta uma condição pessoal.].

Jurisprudência:

“O fato de o crime ter sido praticado em concurso de pessoas não deve ser utilizado para
fins de incremento da pena na primeira fase de sua fixação, pois constitui causa de
aumento, a ser sopesada na terceira etapa da dosimetria”. STJ, 16/08/2012. HC 106472 /
MS

“QUANDO A DENÚNCIA DESCREVE A PARTICIPAÇÃO DE MENOR NO CRIME,


EXISTE CONCURSO DE PESSOAS, PORQUE A LEI PENAL NÃO DISTINGUE
QUANTO À CAPACIDADE DAQUELES QUE SE INSEREM NO CONCURSO DE
PESSOAS. 5. A ABSOLVIÇÃO DE UM DOS RÉUS NO CASO EM QUE A DENÚNCIA
APONTA PARA O CONCURSO DE PESSOAS, NO CRIME DE ROUBO, NÃO LEVA
NECESSARIAMENTE À ABSOLVIÇÃO DO CO-RÉU. TJDFT, 16/08/2007”. Acórdão nº
285501 do Processo nº20010810016525apr

“Os desígnios autônomos que caracterizam o concurso formal impróprio referem-se a


qualquer forma de dolo, direto ou eventual. Precedentes citados do STF: HC 73.548-SP,
DJ 17/5/1996; e do STJ: REsp 138.557-DF, DJ 10/6/2002. HC 191.490-RJ, Rel. Min.
Sebastião Reis Júnior, julgado em 27/9/2012”.

“O fato de o crime ter sido cometido por duas pessoas, sendo uma delas menor inimputável,
não tem o condão de descaracterizar o concurso de agentes, de modo a excluir a causa de
aumento prevista no inciso II do § 2º do art. 157 do Código Penal” (inf. 674 STF).

A caracterização do concurso de agentes não exige a identificação do corréu, sendo


suficiente a indicação da participação de uma ou mais pessoas na execução do crime. Essa é
a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aplicada pelos ministros da Sexta
Turma no julgamento de um habeas corpus.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

19.b. Crimes Cibernéticos (redação anterior: crimes via


internet)
Principais obras consultadas: Santo Graal 27º. Janice Agostinho Barreto Ascari.
Cybercrimes e a atuação do Ministério Público Federal. In Direito e Processo na Justiça
Federal – Coord. Eugênio Pacelli. São Paulo: Editora Atlas, 2011; Douglas Ficher. A
competência para julgar delitos de “pedofilia” praticados por intermédio da internet. In
Direito e Processo na Justiça Federal – Coord. Eugênio Pacelli. São Paulo: Editora Atlas,
2011; Ministério Público Federal. Crimes Cibernéticos – Manual Prático de Investigação.
São Paulo, 2006). Texto da 2ª CCR: http://2ccr.pgr.mpf.gov.br/coordenacao/eventos/viii-
encontro/ata_grupo_sobre_crimes_ciberneticos.pdf

Legislação básica. Convenção sobre a Cibercriminalidade e artigos citados no resumo.

1. NOÇÕES GERAIS: Diferenciam-se os conceitos de crimes cibernéticos e os crimes


cometidos com auxilio de computador (ASCARI, p. 149). “Cybercrime” é o termo
específico usado para identificar qualquer atividade criminal cometida ou facilitada pela
Internet, o abuso ou mau uso de sistemas e aplicativos. “Computer crime” designa qualquer
ato criminoso cometido com o auxilio de um computador, seja via Internet ou não, como
roubo de componentes, falsificação, pirataria digital, lesão a direitos autorais, hacking ou
pornografia infantil. “Computer-related crime” ou “computer-facilited crime” são termos
usados para englobar as atividades criminosas nas quais um computador foi envolvido em
algum momento, ainda que perifericamente.

Foco internacionalista: previsão no âmbito da OEA para que os países tipifiquem os crimes
praticados no âmbito da internet. Igualmente, a “Convenção sobre a Cibercriminalidade”,
adotada pelo Conselho da Europa em 2001 e aberta à assinatura por todos os países do
globo, obriga os Estados a tipificar diversas condutas (Crimes Cibernéticos – Manual
Prático de Investigação, p. 9-10).

Quanto à classificação, leciona Vladimir: Não há consenso e a taxionomia mais aceita é a


propugnada por HERVÉ CROZE e YVES BISMUTH: (a) os crimes cometidos contra um
sistema de informática, seja qual for a motivação do agente; (b) os crimes cometidos contra
outros bens jurídicos, por meio de um sistema de informática. No primeiro caso, temos o
delito de informática propriamente dito, aparecendo o computador como meio e meta,
podendo ser objetos de tais condutas o computador, seus periféricos, os dados ou o suporte
lógico da máquina e as informações que guardar. No segundo caso, o computador é apenas
o meio de execução, para a consumação do crime-fim, sendo mais comuns, nesta espécie,
as práticas ilícitas de natureza patrimonial, as que atentam contra a liberdade individual e
contra o direito de autor.

2. CRIMES VIA INTERNET: São modalidades de crimes cibernéticos a subtração de


identidade (subtração de dados pessoais), a pirataria (envolvendo direitos autorais), as
fraudes bancárias, hacking (no qual há quebra de sistemas de segurança), phishing

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

(dissiminação de vírus, worms, trojans, spywares, bots, sites falsos, e-mails simulados etc.),
ciberbullying (assédio cometido pela Internet, englobando todas as suas formas), o racismo
e a discriminação, bem como a pornografia infantil e juvenil (a pedofilia pela Internet).
Alguns tipos penais (ficou extenso, mas o intuito é agilizar o conhecimento dos tipos):

a) art. 10 da Lei n. 9.296/96, que considera crime, punível com reclusão de 2 a 4 anos e
multa, realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou
quebrar segredo de Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em
lei (ver sobre o item 4C).

b) art. 153, §1º-A, do CP: Divulgar, sem justa causa, informações sigilosas ou reservadas,
assim definidas em lei, contidas ou não nos sistemas de informações ou banco de dados da
Administração Pública, punindo-o com detenção de 1 a 4 anos, e multa.

c) art. 313-A, do CP: Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados


falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou
bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si
ou para outrem ou para causar dano, punindo-o com pena de reclusão, de 2 (dois) a 12
(doze) anos, e multa.

d) art. 313-B, do CP: Modificar ou alterar, o funcionário, sistema de informações ou


programa de informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente,
cominando-lhe pena de detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa;

e) art. 325, §1º, incisos I e II: (I) – permite ou facilita, mediante atribuição, fornecimento e
empréstimo de senha ou qualquer outra forma, o acesso de pessoas não autorizadas a
sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública e de quem (II) – se
utiliza, indevidamente, do acesso restrito, ambos sancionados com penas de detenção de 6
meses a 2 anos, ou multa.

f) art. 12, caput, §§1º e 2º, da Lei n. 9.609/98, que tipifica o crime de violação de direitos de
autor de programa de computador, punindo-o com detenção de 6 meses a 2 anos, ou multa;
ou com pena de reclusão de 1 a 4 anos e multa, se o agente visa ao lucro (ver sobre o item
9C).

g) art. 2º, inciso V, da Lei n. 8.137/90, que considera crime utilizar ou divulgar programa de
processamento de dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir
informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública.

h) art. 72 da Lei n. 9.504/97, que cuida de três tipos penais eletrônicos de natureza eleitoral:
crimes, puníveis com reclusão, de cinco a dez anos: I - obter acesso a sistema de tratamento
automático de dados usado pelo serviço eleitoral, a fim de alterar a apuração ou a contagem
de votos; II - desenvolver ou introduzir comando, instrução, ou programa de computador
capaz de destruir, apagar, eliminar, alterar, gravar ou transmitir dado, instrução ou programa
ou provocar qualquer outro resultado diverso do esperado em sistema de tratamento
automático de dados usados pelo serviço eleitoral; III - causar, propositadamente, dano
físico ao equipamento usado na votação ou na totalização de votos ou a suas partes.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

i) Lei Carolina Dieckmann (Lei 12.737, de 30.11.2012) criou novo tipo penal: artigo 154-A
(invadir dispositivo informático alheio, conectado ou não à rede de computadores, mediante
violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim de obter, adulterar ou destruir
dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou
instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1
(um) ano, e multa. § 1º. Na mesma pena incorre quem produz, oferece, distribui, vende ou
difunde dispositivo ou programa de computador com o intuito de permitir a prática da
conduta definida no caput. § 2º. Aumenta-se a pena de um sexto a um terço se da invasão
resulta prejuízo econômico. § 3º. Se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de
comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações
sigilosas, assim definidas em lei, ou o controle remoto não autorizado do dispositivo
invadido: Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, se a conduta não
constitui crime mais grave. § 4º. Na hipótese do § 3º, aumenta-se a pena de um a dois terços
se houver divulgação, comercialização ou transmissão a terceiro, a qualquer título, dos
dados ou informações obtidos. § 5º. Aumenta-se a pena de um terço à metade se o crime for
praticado contra: I - Presidente da República, governadores e prefeitos; II - Presidente do
Supremo Tribunal Federal; III - Presidente da Câmara dos Deputados, do Senado Federal,
de Assembleia Legislativa de Estado, da Câmara Legislativa do Distrito Federal ou de
Câmara Municipal; ou IV - dirigente máximo da administração direta e indireta federal,
estadual, municipal ou do Distrito Federal), determinando no artigo 154-B a regra da ação
penal pública condicionada, salvo se o crime é cometido contra a administração pública
direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União, Estados, Distrito Federal ou
Municípios ou contra empresas concessionárias de serviços públicos.

j) Lei Carolina Dieckmann (Lei 12.737, de 30.11.2012, entrando em vigência 120 dias após
a sua publicação): O artigo 266, CP passa a vigorar com a seguinte redação: Interrupção ou
perturbação de serviço telegráfico, telefônico, informático, telemático ou de informação de
utilidade pública - artigo 266: (...) § 1o Incorre na mesma pena quem interrompe serviço
telemático ou de informação de utilidade pública, ou impede ou dificulta-lhe o
restabelecimento. § 2o Aplicam-se as penas em dobro se o crime é cometido por ocasião de
calamidade pública.

k) Lei Carolina Dieckmann (Lei 12.737, de 30.11.2012, entrando em vigência 120 dias
após a sua publicação): O artigo 298, CP passa a vigorar com a seguinte redação:
Falsificação de documento particular – artigo 298: (...) Falsificação de cartão: Parágrafo
único. Para fins do disposto no caput, equipara-se a documento particular o cartão de
crédito ou débito.

l) Lei nº 12.735, de 30.11.2012 alterou a Lei 7.716, que define os crimes resultantes de
preconceito de raça ou de cor, dando nova redação ao inciso II, §3º do artigo 20: Art. 20.
Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou
procedência nacional. Pena: reclusão de um a três anos e multa. (...). § 2º Se qualquer dos
crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou
publicação de qualquer natureza: Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa. § 3º No caso
do parágrafo anterior, o juiz poderá determinar, ouvido o Ministério Público ou a pedido
deste, ainda antes do inquérito policial, sob pena de desobediência: I - o recolhimento

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

imediato ou a busca e apreensão dos exemplares do material respectivo; II - a cessação das


respectivas transmissões radiofônicas, televisivas, eletrônicas ou da publicação por
qualquer meio. III - a interdição das respectivas mensagens ou páginas de informação na
rede mundial de computadores.

Observações: (1) Lei nº 12.735, de 30.11.2012, em seu artigo 4º determina que: Os órgãos
da polícia judiciária estruturarão, nos termos de regulamento, setores e equipes
especializadas no combate à ação delituosa em rede de computadores, dispositivo de
comunicação ou sistema informatizado. (2) Como o edital do 27CPR faz menção aos
crimes militares, faz-se oportuno mencionar a mensagem de veto n. 525, referentes à Lei
12.739/12: “Art. 2º. O art. 298 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - CP,
passa a vigorar acrescido do seguinte parágrafo único: ‘Art. 298 (...) Falsificação de cartão
de crédito. Parágrafo único. Equipara-se a documento particular o cartão de crédito ou
débito.’ (NR)” Razão do veto: “O veto faz-se necessário para garantir a coerência da
legislação pátria e evitar a coexistência de dois tipos penais idênticos, dada a sanção do
crime de falsificação de cartão, com nomen juris mais adequado, ocorrida nesta data.” Já a
Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e o Ministério da Justiça
opinaram pelo veto ao dispositivo a seguir transcrito: “Art. 3º. Os incisos II e III do art. 356
do Decreto-Lei no 1.001, de 21 de outubro de 1969 - CP Militar, passam a vigorar com a
seguinte redação: ‘Favor ao inimigo. Art. 356 (...) II - entregando ao inimigo ou expondo a
perigo dessa consequência navio, aeronave, força ou posição, engenho de guerra
motomecanizado, provisões, dado eletrônico ou qualquer outro elemento de ação militar;
III - perdendo, destruindo, inutilizando, deteriorando ou expondo a perigo de perda,
destruição, inutilização ou deterioração navio, aeronave, engenho de guerra
motomecanizado, provisões, dado eletrônico ou qualquer outro elemento de ação militar.
Razão do veto: “A amplitude do conceito de dado eletrônico como elemento de ação militar
torna o tipo penal demasiado abrangente, inviabilizando a determinação exata de incidência
da norma proibitiva.”

3 – PRECEDENTES:

No HC 54544, o STJ entendeu que “a reiteração criminosa, constatada pelas evidências


concretas do caso em tela, é suficiente para fundamentar a segregação do paciente para
garantia da ordem pública nos crimes via internet” (STJ, HC 54544, j. 12/06/2006). No
mesmo sentido ver STJ - HC 53062, no qual houve a prática de fraude financeira em
detrimento da CEF por meio de programa denominado TROJAN. Idem: STJ - HC 81638.

Na vigência da Lei de Imprensa, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que uma (...)
entrevista concedida em um chat (sala virtual de bate-papo) se reveste de publicidade
bastante para se subsumir ao art. 12 da Lei nº 5.250/67 (STJ, AgRg na APn 442, j.
07/06/2006).

No AgRg no CC 74225, o STJ firmou entendimento no sentido de que o “(...) saque


fraudulento em conta corrente por meio de internet configura o delito de furto mediante
fraude, mas não o de estelionato”. Logo, ele se consuma no momento em que o agente se
torna possuidor da res furtiva, sendo competente o juízo de onde se localiza a conta
fraudada e não do lugar onde se efetuou o saque (STJ. AgRg no CC 74225, j. 25/06/2008).
555
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

No mesmo sentido ver : STJ - CC 81477. Idem: STJ - CC 67343 e CC 86.241.

De outra parte, o STJ já se decidiu que a consumação do ilícito previsto no art. 241, do
ECA, ocorre no ato de publicação das imagens pedófilo-pornográficas, sendo irrelevante,
para fins de fixação da competência, o local em que se encontra sediado o responsável pelo
provedor, pois será competente o juízo do local onde está o computador (STJ, CC 29886, j.
12/12/2007 e STJ, CC 66.981, j. 16/02/2009). Além disso, na análise do contexto do art.
241 do ECA, a conversa realizada em "sala de bate papo" da internet, não está amparada
pelo sigilo das comunicações (STJ, RHC 18116, j. 16/02/2006).

O STI entendeu que só o fato de o crime ser praticado pela rede mundial de computadores
não atrai a competência da Justiça Federal, exigindo-se o requisito da transnacionalidade
para atrair a sua competência (STJ, CC 111338, j. 01/07/10). Entretanto, para Douglas
Fischer, todos os casos que vierem a tratar de disponibilização (publicação ou divulgação)
de material pornográfico envolvendo crianças e ou adolescentes na internet são,
inegavelmente e por interpretação, de competência federal, conforme art. 109, V, da CF.
Isso porque este é um delito previsto em convenção internacional (Convenção da ONU
sobre os Direitos da Criança de 1989), cuja consumação pode ocorrer em qualquer parte do
mundo, haja vista que qualquer pessoa conectada à Internet poderá ter acesso ao material
proibido. Neste sentido, seria incabível exigir comprovação de que houve acesso do
conteúdo no exterior, pois tratar-se-ia de prova diabólica, excluindo quase por completo a
competência federal. Por isso, aqui deve ser utilizado o mesmo raciocínio aplicado para o
caso de tráfico internacional de entorpecentes sob a modalidade de exportar, quando este se
consuma ainda no Brasil. Contudo, a simples troca de e-mails de material pornográfico não
seria de competência federal, por aí falta a divulgação, permanecendo apenas entre duas
pessoas.

Já a “(...) divulgação, pela internet, de técnicas de cultivo de planta destinada à


preparação de substância entorpecente não atrai, por si só, a competência federal” (STJ,
CC 62949, j. 11/10/2006).

Há precedente do STJ no sentido de que não há ilegalidade qualquer na prova obtida a


partir da atuação dos Auditores Fiscais que, de forma legal e constitucional, solicitaram aos
provedores de internet, as declarações falsas enviadas pelo paciente (STJ, HC 26769, j.
08/03/2005).

Entende o STJ que a competência será do local onde está o agente que pratica o crime
contra a honra ou o racismo, independentemente de onde esteja localizado o provedor ou a
vítima. Nesse sentido: STJ, CC 106625, j. 25/05/10; STJ, CC 107938, j. 08/11/10.

Por fim, o STF já entendeu que o crime de falsidade informática, previsto no art. 4º da Lei
portuguesa nº 109/91, não encontrava correspondente na legislação brasileira, deferindo,
em parte a extradição, quanto ao delito de burla informática, tipificado no art. 221º do CP
português, pois encontrava correspondência normativa com a figura do estelionato – art.
171 do CP brasileiro (STF, Ext 1029, j. 13/09/2006).

556
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

4 – PERGUNTA ORAL DO 26º (respondida por Giovana Noronha):

Quando que o MPF atua no caso de crimes praticados pela internet. Fale da discussão
acerca da competência federal ou estadual.

Resposta: A primeira observação a ser feita é no sentido de que somente atrairá a


competência da justiça federal se o crime ofender bens serviços ou interesses da União,
entidade autárquica ou empresa pública (acrescente-se também a fundação pública), ou o
crime esteja previsto em tratado ou convenção internacional em que o Brasil se
comprometeu a combater, quando, iniciada a execução no país, o resultado tenha ou
devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou vice-versa. (art. 109, IV e V, CRFB/88). Feita essa
introdução, passa-se à análise da jurisprudência do STJ, que frequentemente tem julgado
três tipos de crimes cometidos via internet. (a) Crimes contra a honra. Os delitos virtuais
cometidos contra a honra por meio da rede mundial de computadores, ainda que em páginas
eletrônicas internacionais, tais como as redes sociais "facebook", "orkut" e "twitter", não
atraem, por si só, a competência da justiça federal, sendo necessário o preenchimento das
condições acima elencadas. (CC 121.431/SE. 3ª Seção, julgado em 11/04/2012). Assim, em
virtude de tratado, poderá haver atração da justiça federal se o crime contra honra for
cometido contra criança ou adolescente através das redes sociais, dada sua
internacionalidade. (CC 112616/PR, 3ª Seção, julgado em 13/04/2011). Quanto ao local do
crime, o STJ, através da 3ª Seção, firmou entendimento no sentido de que nos crimes contra
a honra praticados via internet ensejam a competência do juízo do local onde foi concluída
a ação delituosa, ou seja, onde se encontrava o responsável pela veiculação e divulgação de
tais notícias. Tratando-se de blog, a competência territorial é da localização do provedor do
site onde se hospede o blog, no qual foi publicado o texto calunioso. (CC 125125/SP, 3ª
Seção, julgado em 28/11/2012). (b) Crimes de divulgação de imagens pornográficas
envolvendo crianças ou adolescentes. O fato de Brasil ser signatário da Convenção sobre
direitos da Criança adotada pela Assembleia Geral das nações Unidas (Decreto 99.710/90)
não atrai, por si só, a competência da justiça federal quando houver o cometimento de um
crime de divulgação de imagens pornográficas envolvendo crianças. Somente será firmada
a competência da justiça federal em tais crimes quando o conteúdo pedófilo-pornográficos
ultrapassar os limites territoriais do país, ou seja, quando cumprir o requisito da
transnacionalidade. Nas hipóteses em que os crimes são cometidos por meio das redes
sociais (exemplos: "facebook" e "orkut") a transnacionalidade é ínsita, vez que qualquer
pessoa, em qualquer lugar do mesmo, desde que conectada à internet e pertencente aos
sítios de relacionamentos, poderá acessar a página publicada com tais conteúdos. (CC
120999/CE, 3ª Seção, julgado em 24/10/2012). Por outro lado, em se evidenciando que os
crimes de divulgação de fotografias e filmes pornográficos ou de cenas de sexo explícito
envolvendo crianças e adolescentes não se deram além das fronteiras nacionais,
restringindo-se a uma comunicação eletrônica entre duas pessoas residentes no Brasil, a
competência será da justiça estadual. (CC 57.411/RJ, Rel. 3ª Seção, julgado em 13/02/200).
Quanto ao local do crime, a jurisprudência entende que o delito se consuma no ato de
publicação das imagens, de forma que não se mostra relevante, para fins de fixação de
competência, neste caso, o local em que se encontra sediado o provedor de acesso ao
ambiente virtual. (CC 66.981/RJ, 3ª Seção, julgado em 16/02/2009). (c) Crimes contra o
patrimônio: Inobstante divergência inicial quando a capitulação do delito virtual de

557
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

transferência de valores, mediante fraude via internet, se configuraria estelionato ou furto


mediante fraude, prevaleceu no Superior Tribunal de Justiça a segunda tese (furto mediante
fraude), de forma que a competência será do local onde ocorreu a consumação do delito, ou
seja, o local da conta bancária que teve os valores subtraídos. (CC 121.096/PR, 3ª Seção,
julgado em 12/09/2012). Nas hipóteses de delito de furto mediante fraude a competência
somente será da justiça federal se atingir bens, interesses ou serviços da União, autarquias,
empresas públicas ou fundações públicas. É o caso de furto mediante fraude for contra a
Caixa Econômica Federal. (AgRg no CC 110767/SP, julgado em 09/02/2011).

Casuística: (1) O delito do artigo 183 da Lei nº 9.472/97 (desenvolver clandestinamente


atividades de telecomunicações), praticado mediante transmissão de sinal de internet é da
competência da justiça federal, vez que se trata de serviço cuja exploração é atribuída à
União, nos termos do artigo 21, XI, da CRFB/88. (AgRg no CC 111056/SP, 3ª Seção,
julgado em 25/08/2010).

(2) A competência para apreciar pedido de quebra de sigilo de dados, referente a


procedimento criminal para apurar a conduta de invadir site do Governo de Hong
Kong⁄China, utilizando-se de provedor de acesso à internet e com sede na cidade de Santa
Cruz do Sul⁄RS é da justiça estadual. (CC 33871/RS, 3ª Seção, julgado em 13/12/2004). (4)
O racismo praticado via internet, por meio de redes sociais de relacionamento, atrairá a
competência da justiça federal em razão de o Brasil ser signatário da Convenção
Internacional sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial (Decreto nº
65.810/1969). (CC 107938/RS, Rel. 3ª Seção, julgado em 27/10/2010).

5 – BREVES COMENTÁRIOS SOBRE A LEI 12.737/12: (síntese do texto extraído do


site dizer o direito, por Márcio André Lopes Cavalcante, juiz federal substituto da 1ª
região).

5.1 INVASÃO DE DISPOSITIVO INFORMÁTICO:

Bem jurídico protegido: O bem jurídico protegido é a privacidade, gênero do qual são
espécies a intimidade e a vida privada. Desse modo, esse novo tipo penal tutela valores
protegidos constitucionalmente (art. 5º, X, da CF/88).

Sujeito ativo: crime comum. Obviamente que não será sujeito ativo desse crime a pessoa
que tenha autorização para acessar os dados constantes do dispositivo.

Sujeito passivo: Em regra, a vítima é o proprietário do dispositivo informático, seja ele


pessoa física ou jurídica. No entanto, é possível também identificar, em algumas situações,
como sujeito passivo, o indivíduo que, mesmo sem ser o dono do computador, é a pessoa
que efetivamente utiliza o dispositivo para armazenar seus dados ou informações que foram
acessados indevidamente. É o caso, por exemplo, de um computador utilizado por vários
membros de uma casa ou no trabalho, onde cada um tem perfil e senha próprios. Outro
exemplo é o da pessoa que mantém um contrato com uma empresa para armazenagem de
dados de seus interesses em servidores para acesso por meio da internet (“computação em

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

nuvem”, mais conhecida pelo nome em inglês, qual seja, cloud computing).

Análise das elementares do tipo: Invadir (Ingressar, sem autorização, em determinado local.
A invasão de que trata o artigo é “virtual”, ou seja, no sistema ou na memória do
dispositivo informático). Dispositivo informático (Em informática, dispositivo é o
equipamento físico – hardware - que pode ser utilizado para rodar programas – softwares -
ou ainda para ser conectado a outros equipamentos, fornecendo uma funcionalidade).
Alheio (quando você faz o desbloqueio do IPhone ou do IPad por meio de um software
chamado “Jailbreak” não configura o crime, por ser dispositivo próprio). Conectado ou não
à rede de computadores (do indivíduo que, na hora do almoço, aproveita para acessar, sem
autorização, o computador do colega de trabalho, burlando a senha de segurança).
Mediante violação indevida de mecanismo de segurança (Somente configura o crime se a
invasão ocorrer com a violação de mecanismo de segurança imposto pelo usuário do
dispositivo. Não haverá crime se não tiver mecanismo de segurança [antivírus, anti-
malware, antispyware, senha para acesso], nem se alguém encontra o pen drive não
protegido por senha de seu colega de trabalho e decide vasculhar os documentos e fotos ali
armazenados). Com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem
autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo. Ou com o fim de instalar
vulnerabilidades para obter vantagem ilícita.

Elemento subjetivo: dolo + especial fim de agir.

Consumação: crime formal. Consuma-se com a invasão, não se exigindo a ocorrência do


resultado naturalístico. Desse modo, a obtenção, adulteração ou destruição de dados do
titular do dispositivo ou a instalação de vulnerabilidades não precisam ocorrer para que o
crime se consuma. Em regra, para que seja provada a invasão, será necessária a realização
de perícia (art. 158 do CPP). No entanto, é possível que o delito seja comprovado por
outros meios, como a prova testemunhal (art. 167 do CPP).

Obtenção de vantagem: Para a consumação do crime do art. 154-A não se exige que o
invasor tenha obtido qualquer vantagem. Basta que tenha havido a invasão. No entanto, se
houver prejuízo econômico por parte da vítima, haverá causa de aumento prevista no § 2º
do art. 154-A: § 2º Aumenta-se a pena de um sexto a um terço se da invasão resulta
prejuízo econômico. Atenção: se a vítima sofreu prejuízo econômico porque o invasor dela
subtraiu valores, não haverá o crime do art. 154-A, com essa causa de aumento do § 2º, mas
sim o delito de furto qualificado.

Tentativa: possível.

Pena: A pena é irrisória e representa proteção insuficiente para um bem jurídico tão
importante.

Infração de menor potencial ofensivo: O art. 154-A do CP é crime de menor potencial


ofensivo, sujeito à competência do Juizado Especial Criminal (art. 61 da Lei n. 9.099/95).

Delegacias especializadas em crimes virtuais: Vale ressaltar que a Lei n. 12.735/2012,


publicada na mesma data desta Lei, determinou que os órgãos da polícia judiciária (Polícia

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Civil e Polícia Federal) deverão estruturar setores e equipes especializadas no combate à


ação delituosa em rede de computadores, dispositivo de comunicação ou sistema
informatizado (art. 4º).

Invasão de dispositivo informático (art. 154-A) x Furto mediante fraude (art. 155, § 4º, II):
Se o agente invade o computador da vítima, lá instala um malware (programa malicioso),
descobre sua senha e subtrai valores de sua conta bancária, comete qual delito? O
entendimento consolidado, até então, era o de que se tratava de furto mediante fraude (art.
155, § 4º, II). Essa posição deve ser alterada com o novo art. 154-A? A referida conduta
pode ser classificada como invasão de dispositivo informático? Reputo que não. O art. 154-
A prevê como crime invadir computador, mediante violação indevida de mecanismo de
segurança, com o fim de instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita. O art. 155, §
4º, por sua vez, pune a conduta de subtrair coisa alheia móvel (dinheiro, p. ex.) mediante
fraude (inclusive por meio virtual). Desse modo, parece que a conduta narrada amolda-se,
de forma mais específica e completa, no art. 155, § 4º, sendo o delito do art. 154-A o crime
meio para a obtenção da finalidade do agente, que era a subtração. Aplica-se, no caso, o
princípio da consunção, punindo o agente apenas pelo furto, ficando a invasão absorvida.
Em suma, essa conduta não deixou de ser furto. Vamos, no entanto, imaginar outras
situações correlatas: (1) O agente tenta invadir o computador da vítima com o objetivo de
instalar o malware e obter a senha para realizar o furto, mas não consegue: responderá por
tentativa de invasão (art. 154-A) e não por tentativa de furto qualificado (art. 155, § 4º, II);
(2) O agente invade o computador da vítima com o objetivo de instalar o malware e obter a
senha para realizar o furto, porém não inicia os atos executórios da subtração: responderá
por invasão consumada (art. 154-A) e não por tentativa de furto qualificado (art. 155, § 4º,
II); (3) O agente invade o computador da vítima com o objetivo de instalar o malware e
obter a senha para realizar o furto, inicia o procedimento para subtração dos valores, mas
não consegue por circunstâncias alheias à sua vontade: responderá por tentativa de furto
qualificado (art. 155, § 4º, II); (4) O agente invade o computador da vítima com o objetivo
de instalar o malware e obter a senha para realizar o furto, conseguindo efetuar a subtração
dos valores: responderá por furto qualificado consumado (art. 155, § 4º, II).

Figura equiparada: § 1º do artigo 154-A. É o caso, por exemplo, do indivíduo que


desenvolve um programa do tipo “cavalo de troia” (trojan horse), ou seja, um malware
(software malicioso) que, depois de instalado no computador, libera uma porta para que
seja possível a invasão da máquina. O § 1º menciona tanto programas de computador
(softwares) como também dispositivos (hardwares) destinados à invasão indevida de outros
dispositivos informáticos, como é o caso dos chamados “chupa cabra”. Segundo o § 1º,
tanto quem produz, como quem oferece, distribui, vende ou divulga o programa ou
dispositivo é punido. Nesse sentido, existem inúmeras páginas na internet que divulgam
softwares espiões e invasores. Deve-se ter cuidado com a divulgação de tais conteúdos
porque essa conduta passa a ser crime pela nova Lei se ficar provado que a finalidade do
agente.

Invasão qualificada pelo resultado (qualificadora): Haverá a qualificadora prevista neste §


3º se, com a invasão, o agente conseguir obter o conteúdo de: (1) Comunicações eletrônicas
privadas (e-mails, SMS, diálogos em programas de troca de mensagens etc); (2) Segredos

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

comerciais ou industriais; (3) Informações sigilosas (o sigilo que qualifica o crime é aquele
assim definido em lei). Incidirá também a qualificadora no caso do invasor conseguir obter
o controle remoto do dispositivo invadido. Esse § 3º constitui exemplo de aplicação do
princípio da subsidiariedade expressa (explícita), considerando que o próprio tipo penal
prevê que não haverá invasão qualificada se a conduta do agente constituir um crime mais
grave.

Causa de aumento de pena: O § 4º traz uma causa de aumento específica para o delito
previsto no § 3º. Assim, o agente responderá pela pena aumentada se, além de obter,
divulgar, comercializar ou transmitir a outros o conteúdo contido em: (1) Comunicações
eletrônicas privadas (e-mails, SMS, diálogos em programas de troca de mensagens etc.); (2)
Segredos comerciais ou industriais; (3) Informações sigilosas. Caso o agente pratique o art.
154-A, §§ 3º e 4º o delito deixa de ser de competência do Juizado Especial Criminal,
considerando que, aplicada a causa de aumento sobre a reprimenda prevista no § 3º o crime
terá pena máxima superior a 2 anos.

Causa de aumento de pena: O § 5º traz causas de aumento para os casos em que a invasão
de dispositivo informático ocorrer contra determinadas autoridades. Entendo que essa causa
de aumento incide tanto para o crime cometido no caput do art. 154-A como também para a
figura qualificada do § 3º.

5.2 INSERÇÃO DO § 1º AO ART. 266 DO CÓDIGO PENAL:

[Interrupção ou perturbação de serviço telegráfico ou telefônico. Art. 266. Interromper ou


perturbar serviço telegráfico, radiotelegráfico ou telefônico, impedir ou dificultar-lhe o
restabelecimento: Pena - detenção, de um a três anos, e multa. § 1º Incorre na mesma pena
quem interrompe serviço telemático ou de informação de utilidade pública, ou impede ou
dificulta-lhe o restabelecimento. (inserido pela Lei n. 12.737/2012). § 2º Aplicam-se as
penas em dobro se o crime é cometido por ocasião de calamidade pública]. Indaga-se: se o
agente perturbar (atrapalhar), sem interromper, serviço telemático ou de informação de
utilidade pública, ele pratica crime? Não. Houve falha da Lei n. 12.737/2012 ao não
tipificar tal conduta, como é feito no caso do caput, para os serviços telegráfico,
radiotelegráfico ou serviço telefônico.

5.3 INSERÇÃO DO PARÁGRAFO ÚNICO AO ART. 298 DO CÓDIGO PENAL:

A Lei n. 12.737/2012 inseriu o parágrafo único ao art. 298 do Código Penal. [Art. 298 -
Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular
verdadeiro: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa. Falsificação de cartão. Parágrafo
único. Para fins do disposto no caput, equipara-se a documento particular o cartão de
crédito ou débito]. Se o agente faz a clonagem do cartão e, com ele, realiza saques na conta
bancária do titular, qual crime pratica? A jurisprudência do STJ entendia tratar-se de furto
mediante fraude (art. 155, § 4º, II). E qual será o delito se o agente faz a clonagem do cartão
e, com ele, realiza compras em estabelecimentos comerciais? Nessa hipótese, o STJ já
decidiu que haverá o crime de estelionato. Com a mudança da Lei será possível reconhecer
concurso material entre a falsificação do cartão (art. 298, parágrafo único) e o furto ou
estelionato? Penso que não. Apesar de se tratarem de bens jurídicos diferentes (a falsidade

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

protege a fé pública, enquanto que o furto e o estelionato o patrimônio), entendo ser o caso
de aplicação do princípio da consunção, por razões de política criminal. Logo, é de se
aplicar o raciocínio que motivou a edição da Súmula 17 do STJ: Quando o falso se exaure
no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido. Assim, se o agente faz
a clonagem do cartão e, com ele, realiza saques na conta bancária do titular, pratica apenas
furto mediante fraude, ficando, em princípio, absorvida a falsidade. De igual sorte, se o
sujeito faz a clonagem do cartão e, com ele, realiza compras em estabelecimentos
comerciais incorre em estelionato, sendo absorvida a falsidade, se não houver mais
potencialidade lesiva (Súmula 17 do STJ). Uma última indagação: se o cartão de crédito ou
de débito for emitido por uma empresa pública, como por exemplo, a Caixa Econômica
Federal, ele será considerado documento público? Não. Quando a CEF emite um cartão de
crédito/débito ela está atuando no exercício de uma atividade privada concernente à
exploração de atividade econômica. Logo, não há sentido de se considerar como documento
público. Além disso, o cartão de crédito e débito é equiparado a documento particular, pelo
parágrafo único do art. 298, sem qualquer ressalva quanto à natureza da instituição
financeira que o emitiu.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

19.c. Crimes de perigo comum, contra a segurança dos meios de


comunicação e transporte e outros serviços públicos.
Principais obras consultadas: Santo Graal 27º. Guilherme Souza Nucci, Código penal
comentado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.

Legislação básica: Código penal brasileiro, Código de processo penal brasileiro.

Noções gerais: Os crimes de perigo comum estão previstos nos arts. 250 a 259 do CP. Os
crimes contra a segurança dos meios de comunicação e transporte e outros serviços
públicos estão previstos nos arts. 260 a 266 do CP. Os dois subgrupos, separados em
capítulos distintos, fazem parte do Título VIII, da Parte Especial: Crimes contra a
Incolumidade Pública.

Enquanto o delito de dano consuma-se com a efetiva lesão a um bem juridicamente


tutelado, o crime de perigo contenta-se com a mera probabilidade de dano.

Segundo Nucci, a melhor teoria definidora do perigo é a mista ou integrativa, para a qual o
perigo é tanto uma hipótese quanto um trecho da realidade.

A finalidade da punição dos crimes de perigo é evitar um mal maior.

Os arts. 250/259 tratam de crimes que oferecem perigo a toda a coletividade (perigo
coletivo), não cingindo seu potencial lesivo a um determinado grupo de pessoas (perigo
individual).

O exemplo mais considerável é o incêndio (art. 250), com hipóteses majoradas (§1º). Há
modalidade culposa (§2º). Cuida-se de crime de perigo concreto, sendo indispensável, para
sua consumação, a prova do risco iminente de dano surgido para outrem, ainda que não seja
pessoa determinável. Incêndio é o fogo intenso que tem forte poder de destruição e de
causação de prejuízos.

O dolo consiste na vontade de gerar um risco não tolerado a terceiros. Se a intenção é expor
a perigo determinada pessoa, haverá o tipo do art. 132 (perigo para a vida ou saúde de
outrem); se a intenção é atingir determinado patrimônio, ocorre a conduta do art. 163,
§único, II (dano qualificado).

É crime comum, formal (o dano é mero exaurimento), comissivo (excepcionalmente


omissivo impróprio), admitindo tentativa na forma plurissubsistente.

O exame pericial é imprescindível, nos termos do art. 173 do CPP. O bem jurídico é a
incolumidade pública.

Distingue-se do art. 41 da Lei 9.605/98, que tutela bem jurídico distinto: mata ou floresta.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

No mesmo capítulo, há o crime de explosão (art. 251). Possui hipóteses majoradas (iguais à
de incêndio) e modalidade culposa. É de perigo concreto – tal qual o crime de incêndio,
impondo-se o perigo a um nº indeterminado de pessoas.

Não havendo perigo concreto à coletividade, pode estar configurado o art. 28 da Lei de
Contravenções Penais. Crime comum, formal, instantâneo e plurissubsistente.

É de forma vinculada, porque o tipo define o modo de conduta (mediante explosão,


arremesso/colocação de engenho de dinamite ou substância análoga), valendo-se de
interpretação analógica. Tutela o mesmo bem que o tipo de incêndio.

Temos no art. 252 o crime de uso de gás tóxico ou asfixiante. Admite a forma culposa
(§único). Crime comum, formal, instantâneo.

Com exceção do tipo do art. 253 e 257, todos crimes de perigo comum são de perigo
concreto (a probabilidade de dano deve ser provada pelo órgão acusatório, em
contraposição aos crimes de perigo abstrato, em que a probabilidade de dano é presumida
por lei).

Art. 253 prevê o crime de fabrico, fornecimento, aquisição, posse ou transporte de


explosivos ou gás tóxico, ou asfixiante. Crime comum, formal, instantâneo (porém
permanente nas modalidades possuir e transportar), comissivo, de perigo abstrato.

Art. 254 prevê o crime de inundação. É possível a modalidade culposa. Trata-se da conduta
de provocar, dar origem ou produzir alagamento ou enchente. Crime comum, formal,
comissivo, instantâneo, admitindo tentativa na forma plurissubsistente.

Art. 255 está o crime de perigo de inundação. Crime comum, formal, comissivo,
instantâneo, não admitindo tentativa, pois é fase preparatória do crime de inundação
(exceção de tipificação de ato preparatório).

Art. 256 prevê o crime de desabamento ou desmoronamento. Admite-se a forma culposa


(§único). Crime comum, formal, comissivo, instantâneo, admitindo tentativa na forma
plurissubsistente.

Art. 257 tipifica o crime de subtração, ocultação ou inutilização de material de salvamento.


É indispensável que o instrumento seja especificamente voltado ao combate ao perigo, à
prestação de socorro ou ao salvamento ou manifestamente adequado ao serviço de
debelação do perigo ou de salvamento, como bombas de incêndio, alarmes, extintores,
salva-vidas, escadas de emergência, medicamentos etc. Crime comum, formal, comissivo,
instantâneo (permanente na forma ocultar), de perigo comum abstrato, admitindo tentativa
na forma plurissubsistente.

Art. 258 prevê as formas qualificadas do crime de perigo comum, se, das condutas típicas
dos arts. 250 a 257, resultar lesão grave ou morte.

Ocorrerá, assim, crime preterdoloso: o resultado deve resultar somente de culpa (REsp

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

945311, em 28.4.08). Art. 259 incrimina a difusão de doença ou praga.

Nucci diz que o art. 61 da Lei 9605/98 (Disseminar doença ou praga ou espécies que
possam causar dano à agricultura, à pecuária, à fauna, à flora ou aos ecossistemas)
prevalece sobre o art. 259 do CP, não somente por ser lei especial, mas também por ser a
mais recente. Ou seja, o art. 259 CP encontra-se tacitamente revogado. A única alteração
com a Lei 9605/98 é a extinção da forma culposa, que passa a ser fato atípico.

Já os crimes contra a segurança dos meios de comunicação, transportes e outros serviços


públicos são todos de perigo concreto, à exceção do art. 264, 265 e 266.

O primeiro tipo é o perigo de desastre ferroviário (art. 260, caput). Material rodante são os
veículos ferroviários, que compreendem os de tração, como as locomotivas, e os rebocados,
como os carros de passageiros e vagões de carga. Material de tração é o veículo ferroviário
que serve de tração para os demais. Obra de arte são as estruturas que se repetem ao longo
de uma estrada ou linha férrea, tais como pontes, viadutos, túneis, muros de arrimo e
outros. É possível o concurso com o crime de furto, já que o agente pode retirar, com
intuito de lucro, as peças de linha férrea, assumindo o risco de perigo de desastre
ferroviário (dolo eventual). Trata-se de crime formal, comum, comissivo, instantâneo,
admitindo a tentativa. Já o §1º prevê o desastre ferroviário – crime preterdoloso (dolo no
antecedente e culpa no consequente). O §2º prevê o crime qualificado pelo resultado (culpa
tanto no antecedente como no consequente). O §3º conceitua o que se entende por estrada
de ferro (Para os efeitos deste artigo, entende-se por estrada de ferro qualquer via de
comunicação em que circulem veículos de tração mecânica, em trilhos ou por meio de
cabo aéreo).

Outro tipo importante é o atentado contra a segurança de transporte marítimo, fluvial ou


aéreo (art. 261), que abriga modalidade (i) preterdolosa, quando resulta naufrágio,
submersão ou encalhe da embarcação ou queda ou destruição da aeronave; modalidade (ii)
qualificada, quando praticado o crime com finalidade de lucro; e modalidade (iii) culposa,
que exige a ocorrência de desastre (TRF1, ACR 200041000026424). Por ser crime de
perigo comum, se aplica apenas a transporte coletivo (público ou privado, de pessoas e
coisas). O tipo não faz menção ao transporte lacustre, aplicando-se o subsidiário art. 262,
que serve para qualquer meio de transporte público, porém não abrangidos pelo 260 e 261.
Para todos estes tipos (260-263) há modalidade majorada na ocorrência de lesão corporal
(não diz grave) ou morte.

Caso Legacy: atentado contra a segurança de transporte aéreo, modalidade culposa (art.
261, §3º). O STJ decidiu que os controladores de voo responderiam perante a Justiça
comum e perante a Justiça Militar, pelo mesmo fato, sem violação ao ne bis in idem.

O art. 264 incrimina o arremesse de projétil. Projétil é qualquer objeto sólido que serve para
ser arremessado, inclusive por arma de fogo. Apesar do tipo exigir que o veículo esteja em
movimento, Nucci entende que abrange o veículo que se encontra parado em um
congestionamento, somente não se configurando o art. 264 quando o veículo estiver
estacionado. Trata-se de crime comum, formal, comissivo, instantâneo, de perigo comum
abstrato, admitindo tentativa na forma plurissubsistente. O parágrafo único prevê o crime

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

qualificado pelo resultado – culpa no consequente (lesão corporal ou morte).

O art. 265 prevê o crime de atentado contra a segurança de serviço de utilidade pública.
Trata-se de crime comum, formal, comissivo, instantâneo, de perigo abstrato, não se
punindo a tentativa por ser crime de atentado, ou seja, a lei já pune como crime consumado
o mero início da execução. Delmanto e Paulo José da Costa Jr. entendem possível a
tentativa no caso, reputando, porém de difícil ocorrência prática.

Já o art. 266 do CP incrimina a interrupção ou perturbação de serviço telegráfico ou


telefônico. Trata-se de crime comum, formal, comissivo, instantâneo, de perigo comum
abstrato, admitindo tentativa na forma plurissubsistente. Dobra-se a pena do agente quando
a interrupção ou perturbação dos serviços ocorrer durante estado de calamidade pública,
tendo em vista a maior reprovabilidade da conduta (parágrafo único).

PONTO EXTRA:

CRIMES DE TELECOMUNICAÇÕES (LEIS 4.117/62 E 9.472/97);

Noções gerais: Já se decidiu pela constitucionalidade dos tipos penais dos arts.70 da Lei
4.117/62 e 183 da Lei 9.472/97, ao fundamento de que não representam restrição indevida
da liberdade de expressão (art.5º, IX, da CF), que não é direito absoluto, pois a própria CF
condiciona a exploração dos serviços de radiodifusão à autorização prévia do poder
público, em seus arts.21, XII, a e 223. A necessidade de autorização decorre do fato de que
o espectro de radiofrequências constitui bem público, que não é ilimitado, cabendo ao
Estado disciplinar seu uso racional, o que torna legítima a exigência de autorização prévia
para radiodifusão, assim como a incriminação da operação clandestina.
Art. 70, Lei 4.117/62: Constitui crime punível com a pena de detenção de 1
(um) a 2 (dois) anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro, a
instalação ou utilização de telecomunicações, sem observância do disposto
nesta Lei e nos regulamentos.
Parágrafo único. Precedendo ao processo penal, para os efeitos referidos neste
artigo, será liminarmente procedida a busca e apreensão da estação ou aparelho
ilegal.

Art. 183 da Lei 9.472/97: Desenvolver clandestinamente atividades de


telecomunicação:
Pena - detenção de dois a quatro anos, aumentada da metade se houver dano a
terceiro, e multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, direta ou indiretamente,
concorrer para o crime.
Legislação aplicável: A Lei 4.117/62 institui o Código Brasileiro de Telecomunicações e a
Lei 9.472/97, por sua vez, dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações, a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

criação e o funcionamento de um órgão regulador e outros aspectos institucionais. Este


último diploma legal, em seu art.215, inciso I, estabeleceu que: “Ficam revogados: I – a Lei
4.117/62, salvo quanto à matéria penal não tratada nesta Lei e quanto aos preceitos relativos
à radiodifusão”.A partir daí, instalou-se dissenso na jurisprudência sobre a revogação, ou
não, do precitado art.70 da Lei 4.117/62 pelo art.183 da Lei 9.472/97. Sobre o tema, o autor
sintetiza 05 correntes ou variantes, sem apontar a existência de uma posição majoritária.

Baltazar filia-se a uma primeira corrente, segundo a qual o art.70 encontra-se em vigor,
mesmo após o advento da nova lei, considerando que (1) a CF, em seu art.21, incisos XI e
XII, a, diferencia os serviços de telecomunicações e radiodifusão, sendo aplicável a lei nova
aos primeiros, e a antiga, aos segundos, e que (2) a própria Lei 9.472/97 ressalvou a
vigência da Lei 4.117/62, quanto à matéria penal não tratada na lei nova e aos preceitos
relativos à radiodifusão.

Segunda corrente faz distinção entre a atividade exercida sem observância do disposto na
lei ou no regulamento – caso em que seria aplicável a lei antiga – e atividade exercida de
forma clandestina – quando incidiria a lei nova (art.184 ). Essa é a posição do STJ, veja:

Art. 70 da Lei nº 4.117/62 Art. 183 da Lei nº 9.472/97


Pune-se o agente que, apesar de autorizado Pune o agente que desenvolve atividades de
anteriormente pelo órgão competente, age telecomunicações de forma clandestina, ou
de forma contrária aos preceitos legais e seja, sem qualquer autorização prévia do
regulamentos que regem a matéria. Poder Público.
Tinha uma autorização prévia e extrapolou. Nunca teve uma autorização prévia (a
atividade é clandestina).

Art. 184. São efeitos da condenação penal transitada em julgado:


I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime;
II - a perda, em favor da Agência, ressalvado o direito do lesado ou de terceiros
de boa-fé, dos bens empregados na atividade clandestina, sem prejuízo de sua
apreensão cautelar.
Parágrafo único. Considera-se clandestina a atividade desenvolvida sem a
competente concessão, permissão ou autorização de serviço, de uso de
radiofrequência e de exploração de satélite.
Uma terceira corrente entende revogado o art.70 da Lei 4.117/62, mas inaplicável o art.183
da Lei 9.472/97, trazendo por consequência a atipicidade da conduta, em se tratando de
radiodifusão, que restaria sancionada apenas administrativamente.

Quarta corrente é pela revogação do art.70, aplicando-se o art.183 aos fatos posteriores à
sua entrada em vigor, tanto em casos que envolvam telecomunicações em sentido estrito
quanto radiodifusão. Em favor de tal entendimento, diga-se que o próprio STF, em
precedente de 1995, já admitiu que a expressão telecomunicações é abrangente da
radiodifusão.

Uma quinta variante afirma a incidência do art.183 em caso de atividade praticada de forma

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

habitual, enquanto o art.70 da Lei 4.117/62 seria aplicado em caso de prática eventual. Essa
é a posição do STF. Observe: De acordo com o STF, o crime do art. 183 da Lei n. 9.472/97
somente ocorre quando houver habitualidade. Se esta estiver ausente, ou seja, quando o
acusado vier a instalar ou se utilizar de telecomunicações clandestinamente, mas apenas
uma vez ou de modo não rotineiro, a conduta fica subsumida no art. 70 da Lei 4.117/62,
pois não haverá aí um meio ou estilo de vida, um comportamento reiterado ao longo do
tempo, que seria punido de modo mais severo pelo art. 183 da Lei 9.472/97 (STF. HC
93870/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, 20.4.2010).

Então, quanto à posição do STF e do STJ temos dois critérios: 1) STF - habitualidade: se
praticado com habitualidade: art. 183 da Lei 9.472; se praticado sem habitualidade: art. 70
da Lei 4.117; 2) STJ - Existência de autorização: comete o crime do art. 183 da Lei 9.472
quem pratica atividade de telecomunicação sem a devida autorização dos órgão públicos
competentes (clandestinamente); e comete o crime do art. 70 da Lei 4.117 aquele que, tendo
obtido prévia autorização para a exploração desse tipo de atividade, exerce-a sem
observância dos preceitos legais e dos regulamentos que a regem.

Bem jurídico: É a segurança das telecomunicações, pois a radiodifusão e o uso de aparelhos


de telecomunicações de forma clandestina podem gerar interferência em serviços regulares
de rádio e televisão, bem como sobre as comunicações das autoridades policiais e na
navegação marítima ou aérea.

Sujeito ativo: É crime comum, admitida a participação.

Tipo objetivo: A conduta prevista no art.183 da Lei 9.472/97 é de desenvolver


clandestinamente atividade de telecomunicação, o que pressupõe que se faça operar,
efetivamente, o aparelho, sendo insuficiente a mera posse. Assim, já se decidiu pela não
configuração do crime quando o aparelho não tem condições de funcionamento. Exige-se,
ainda, que a atividade seja clandestina, ou seja, não autorizada, ainda que não haja
simulação, ocultação ou disfarce. É insuficiente, para descaracterizar a clandestinidade, a
existência de informação ou regularização posterior ao início das atividades, bem como o
deferimento da operação por MS com efeitos meramente civis. Não há que falar em
clandestinidade, no entanto, se o agente protocolou requerimento para outorga de permissão
de funcionamento junto à ANATEL.

O serviço de televisão a cabo é considerado serviço de telecomunicação, nos termos dos


arts.1º e 60, §1º, da Lei 9.472/97, estando, portanto, sujeito à disciplina do referido diploma
legal.

Princípio da insignificância: Há divergência.

A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que não se aplica o princípio da


insignificância: (...) Prevalece no Superior Tribunal de Justiça entendimento no sentido de
não ser possível a incidência do principio da insignificância nos casos de prática do delito
descrito no art. 183 da Lei n.9.472/1997. De fato, a instalação de estação clandestina de
radiofrequência, sem autorização dos órgãos e entes com atribuições para tanto - Ministério
das Comunicações e ANATEL -, já é, por si, suficiente para comprometer a segurança, a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

regularidade e a operabilidade do sistema de telecomunicações do país, não podendo,


portanto, ser vista como uma lesão inexpressiva. (...) STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp
1336203/PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 19/11/2013.

Já o STF, possui precedentes no sentido de que, em casos excepcionais, é admitido a


aplicação do princípio da insignificância desde que a rádio clandestina opere em baixa
frequência e em localidades afastadas dos grandes centros:

(...) Consta dos autos que o serviço de radiodifusão utilizado pela emissora é considerado
de baixa potência, não tendo, deste modo, capacidade de causar interferência relevante nos
demais meios de comunicação. II – Rádio comunitária localizada em pequeno município do
interior gaúcho, distante de outras emissoras de rádio e televisão, bem como de aeroportos,
o que demonstra que o bem jurídico tutelado pela norma – segurança dos meios de
telecomunicações – permaneceu incólume. (...) STF. 1ª Turma. HC 104530, Relator Min.
Ricardo Lewandowski, julgado em 28/09/2010.

(...) Rádio comunitária que era operada no KM 180 da BR 230 (Rodovia Transamazônica),
comunidade de Santo Antônio do Matupi, Município de Manicoré/AM, distante,
aproximadamente, 332 km de Manaus/AM, o que demonstra ser remota a possibilidade de
que pudesse causar algum prejuízo para outros meios de comunicação. IV – Segundo a
decisão que rejeitou a denúncia, o transmissor utilizado pela emissora operava com
potência de 20 watts e o funcionamento de tal transmissor não tinha aptidão para causar
problemas ou interferências prejudiciais em serviços de emergência. (...) STF. 2ª Turma.
RHC 118014, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 06/08/2013.

Tipo subjetivo: É o dolo, sendo desnecessária qualquer indagação sobre o objetivo do


agente.

Consumação: Cuida-se de crime formal abstrato, não se exigindo resultado danoso, de


modo que a consumação se dá com a colocação em funcionamento da estação ou aparelho.
Trata-se de crime permanente.

Atenção: Em 2014 a segunda Turma STF exigiu perícia para configurar o crime, veja: No
crime do art. 183 da Lei nº 9.472/97, a prova pericial é necessária para que se constate, in
loco, se a rádio comunitária operava ou não com potência efetiva radiada acima do limite
de segurança. Diante da ausência de perícia, não se pode comprovar a materialidade do
crime. Logo, é possível absolver o réu porque não ficou constatada a lesão aos bens
jurídicos penalmente tutelados. Restará ao Poder Público adotar apenas as medidas
administrativas contra a rádio clandestina. [STF. 2ª Turma. RHC 119123/MG, Rel. Min.
Cármen Lúcia, julgado em 11/3/2014].

Pena: O art.183 da Lei 9.472/97 comina ao crime de desenvolvimento clandestino de


telecomunicações, cumulativamente com a pena de detenção, multa fixa de R$ 10 mil.
Predomina na jurisprudência, porém, o entendimento de que a pena fixa viola a garantia
constitucional da individualização da pena, devendo a pena de multa ser fixada conforme os
critérios do CP.

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Ação penal: É pública, exigindo-se, porém, como condição de procedibilidade, a apreensão


do equipamento, de modo a viabilizar a perícia que comprove a sua potencialidade lesiva.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

20.a. Teoria da Pena.


Principais obras consultadas: Santo Graal 27. Artur Gueiros 2012. MAYA, André
Machado. Ciências Penais e Sociedade Complexa II. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2009.
DELMANTO, Celso et al. Código Penal Comentado. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
Resumo elaborado por Roberta de Lima Pretto.

Legislação básica: Código Penal (art. 59) e Lei de Execução Penal.

Considerações gerais: Considera-se sanção penal o gênero do qual pena e medida de


segurança são as espécies existentes no ordenamento jurídico brasileiro. Pena e medida de
segurança pressupõem a prática de uma conduta típica e antijurídica, variando, contudo, a
incidência de uma ou outra, conforme constatada ou ausente a culpabilidade do agente. A
função e a razão de ser da pena encontram-se umbilicalmente vinculadas à função e à razão
de ser do Direito Penal, como instrumento excepcional e subsidiário de controle social,
visando a proteger bens considerados essenciais à vida harmônica em sociedade. Sociedade
que pressupõe igualdade de direitos e respeito ao próximo em sua mais ampla acepção,
fomentando-se o desenvolvimento de cada um dos seres humanos que a integram em sua
plenitude. OBS: A pena é a perda de um direito imposta pelo Estado em razão da prática de
uma infração penal. Já as medidas de segurança são medidas terapêuticas aplicáveis aos
inimputáveis e aos semi-imputáveis, no caso da prática de uma conduta que corresponda a
um crime, por lhes faltar sanidade.

A pena, enquanto instituto vinculado ao Direito Penal e ao Direito de Execução Penal visa
ao futuro, pois, não obstante a punição tenha que se fundamentar na existência de um fato
criminoso que comprovadamente provou-se ter ocorrido, mediante o devido processo penal,
a pena imposta ao infrator da lei penal, e, sobretudo, a sua execução, tem na ressocialização
e na reintegração social do condenado a sua razão de ser. Não se pode buscar “reparar” o
dano causado pelo crime com a inflição da pena, mesmo porque uma vez cometido, não se
volta no tempo, como lembra Giorgio del Vecchio: “cada delito cometido é, a rigor,
qualquer coisa de irreparável”. A matéria, no entanto, não é pacífica.

Teorias sobre dos fins da pena: 1) Teoria Retribucionista: A punição como vingança
(seja como satisfação devida à vítima, seja como uma exigência decorrente de sentimento
de indignação da sociedade) assume um caráter absoluto, sem função social qualquer. Na
filosofia encontra apoio em Kant, para quem retribuição e justiça são inseparáveis, sendo a
lei penal um imperativo categórico, e em Hegel, ao defender que o delito é a negação do
direito e a pena a negação desta negação. Essa teoria assegura a proporcionalidade, pois
pune de acordo com a gravidade do delito (“olho por olho, dente por dente”, já que a Lei de
Talião é um exemplo de sua aplicação). Crítica: A concepção da pena como retribuição é
ínsita ao sentimento de vingança, uma das reações menos nobres do ser humano, sendo até
mesmo considerada como qualificadora em alguns crimes (ex. Homicídio qualificado pelo
motivo torpe). A vingança, também, é algo personalíssimo, ligado a um sentimento da
vítima e de seus familiares, não podendo ser um sentimento do Estado. Também, a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

retribuição é insustentável diante da finalidade do Direito Penal em tutelar a vida


harmônica em sociedade, não sendo lógico compensar ou suprimir um mal (o delito)
causando outro mal adicional (o sofrimento da pena). 2) Teoria da pena como prevenção
especial: A prevenção especial pode atuar de três formas: “assegurando, com a prisão, a
comunidade diante dos delinquentes; intimidando o autor, por meio da pena, para que não
cometa futuros delitos; e preservando-o da reincidência mediante a sua correção, conforme
Claus Roxin. Tem-se a ideia de ressocialização. Crítica: Contudo, o efeito mais grave em se
adotar exclusivamente a teoria da prevenção especial é que ela levaria a penas sem limite
de duração, já que estaria o condenado preso “o tempo necessário até que estivesse
ressocializado”, o que é algo subjetivo e de difícil avaliação sem a pessoa ser posta em
liberdade. OBS: Todo ser humano tem o direito de ser diferente, arcando, evidentemente,
com as consequências de sua opção, sendo por isso que a ressocialização há que ser obtida
mediante estímulo ao condenado, oferecendo-lhe benefícios como o da progressão e do
livramento condicional e não como algo forçado, obrigatório. 3) Teoria da pena como
prevenção geral: A pena não deve atuar especificamente sobre o condenado, mas
genericamente sobre a sociedade. A lei deve intimidar a todos os cidadãos, ainda que a pena
deva ser executada a quem infringiu a lei penal. Tem-se, assim, a dúplice vertente da
prevenção geral: uma negativa, isto é, servindo de contra-estímulo, de inibição do impulso
violador de bens jurídicos protegidos pela lei penal; outra positiva, reafirmando-se à
sociedade os seus valores, mediante a efetividade do sistema penal, o que tem um efeito
pedagógico, um efeito de conferir à população a necessária confiança no Poder Judiciário e
nas suas instituições, e um efeito pacificador, já que a aplicação da lei penal a quem
cometeu crimes tranquiliza a consciência jurídica geral. Crítica: É teoria irracional e
antijurídica, porque se vale de um homem como instrumento para a sua simbolização, o usa
como um meio e não como um fim em si, “coisifica” um homem, desconhece-lhe
abertamente o caráter de pessoa, com o que viola o princípio fundamental em que se
assentam os Direitos Humanos. 4) Teoria Unitária: O legislador de 1894 (posição do CP e
da LEP) adotou a denominada teoria unitária, atribuindo à pena tríplice função: de
retribuição, de prevenção especial e de prevenção geral, sendo o art. 59 do CP expresso em
afirmar que a pena será estabelecida pelo juiz “conforme seja necessário e suficiente para a
reprovação e prevenção do crime”. Pode-se dizer que o objetivo do processo de execução
penal é a ressocialização do condenado, a ser alcançada mediante a individualização da
pena em um ambiente prisional saudável, com assistência social, assistência médica etc. É
importante, por isso, conhecer os princípios da sanção penal, previstos na nossa
Constituição e na Convenção Americana de Direitos Humanos: a) Legalidade e
anterioridade: a pena deve ser prevista por lei vigente à data do fato, inclusive quanto à
execução, retroagindo só no que beneficiar o condenado; b) Humanidade: Com fundamento
no valor da dignidade do ser humano, que exige respeito à integridade física, psíquica e
moral da pessoa, incompatível com a imposição de tormentos insuportáveis, inadmitindo-se
penas de morte (salvo em caso de guerra declarada), perpétuas, de trabalhos forçados, de
banimento, cruéis, e desumanas ou degradantes. Inadmissível, assim, o cumprimento de
pena privativa de liberdade em estabelecimentos que não garantam um mínimo de
condições humanitárias; c) Pessoalidade e Individualização: Ninguém pode ser punido por
conduta alheia, devendo a pena ser individualizada em cada caso, não só no momento da
sua cominação, como também no decorrer da execução. A individualização ocorre no
momento da cominação em abstrato, pelo sistema de penas relativamente indeterminadas,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

em que o legislador estabelece uma baliza entre o mínimo e o máximo, no momento da


aplicação da pena pelo juiz e no momento da execução. d) Proporcionalidade (proibição do
excesso): As penas devem sempre guardar razoável proporção com o delito perpetrado e
com a forma de sua execução. A proporcionalidade deve ser observada na atividade
legislativa e na atividade judiciária, ao aplicá-las e executá-las. e) Proibição da dupla
punição (ne bis in idem): Ninguém pode ser punido (nem processado) duas vezes pelo
mesmo fato. f) Jurisdicionalidade: Só o Poder Judiciário pode impor pena e executá-la,
respeitando o devido processo legal. g) Igualdade e Ressocialização: É vedada a
discriminação entre pessoas presas e soltas, não se podendo marginalizar indevidamente as
primeiras (art. 38, CP); deve-se com elas sempre dialogar, a fim de buscar sua readaptação
social (Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de Nova York e Convenção
Americana de Direitos Humanos).

Penas proibidas e penas permitidas: Há no Direito Penal e Constitucional brasileiro as


penas proibidas e as permitidas. As penas proibidas são a pena de morte (salvo em caso de
guerra declarada), pena de caráter perpétuo (o CP prevê prazo máximo de 30 anos para o
cumprimento das penas privativas de liberdade), pena de trabalhos forçados, pena de
banimento e penas cruéis. As penas permitidas são as penas privativas de liberdade, as
penas restritivas de direitos e a pena pecuniária.

OBS: A vedação de pena de caráter perpétuo pela CF e o Estatuto de Roma: O Estatuto de


Roma, que instituiu o Tribunal Penal Internacional, foi incorporado à legislação brasileira
pelo Decreto nº 4.388/2002.16. Segundo o Estatuto do TPI, a pena de prisão perpétua é
cominada aos crimes de sua competência, quando sua extrema gravidade e as
circunstâncias individuais do condenado justifiquem a sua imposição (art. 77, 1, "b").
Ocorre, porém, como visto anteriormente, que a Constituição Federal proscreve a prisão
perpétua. Instaurou-se, assim, a controvérsia sobre a constitucionalidade da adoção, via
Estatuto do TPI, desta modalidade punitiva, mesmo para os casos da competência daquele
Tribunal. Alguns autores, como Cezar Roberto Bitencourt, consideram que a pena de prisão
perpétua não pode ser instituída no Brasil, seja por tratado internacional, seja por emenda
constitucional, uma vez que as garantias do art. 5º, da CF/1988, configuram cláusulas
pétreas.18 Haveria, portanto, incompatibilidade entre o Estatuto de Roma (promulgado pelo
Decreto nº 4.388/2002) e a Constituição Federal. Contudo, apesar da existência de opiniões
no sentido de que o Estatuto do TPI não deveria ser ratificado pelo Brasil, prevaleceu o
entendimento de que o suposto conflito entre o texto do Estatuto de Roma e a Constituição
brasileira era apenas aparente, tornando possível a sua vigência no ordenamento jurídico
brasileiro sem qualquer necessidade de reforma constitucional. Alguns argumentos
embasaram esta posição: Primeiro: O elenco de direitos e garantias, contidos na Carta
Constitucional de 1988, vigora nas relações entre o Estado e o indivíduo em seu território.
Sendo assim, a disposição que veda a pena de prisão perpétua (art. 5º, XLVII, "b", da
CF/1988) encontra-se direcionada ao legislador interno, tendo em vista os crimes
domésticos, não cabendo restrições aos legisladores do Direito Internacional e, por essa
razão, não pode ser extensível aos crimes da competência do Tribunal Penal Internacional.
Segundo: Sob outra vertente, tem-se que a própria Constituição Federal de 1988 estabelece,
no seu art. 12, III, como um dos fundamentos da República, a "dignidade da pessoa
humana". Na mesma esteira, o texto constitucional, no seu art. 42, ll, dispõe que a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

República Federativa Brasileira reger-se-á, nas suas relações internacionais, pela


prevalência do direitos humanos. Há, ainda, no Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias (ADCT), a norma do art. 'Jfl, de acordo com a qual o Brasil "propugnará pela
criação de um Tribunal Internacional de Direitos Humanos". Sendo assim, considerando
que os objetivos do TPI traduzem a prevalência da proteção de tais direitos, afirma-se sua
convergência com a Constituição de 1988. Terceiro: reside na constatação de que, no
próprio ordenamento jurídico brasileiro, há a previsão da pena de morte, para o caso de
guerra externa declarada, conforme cominado no Código Penal Militar. Sendo assim, por
não haver restrição na cominação da pena capital para conflitos bélicos internacionais,
pode- se concluir que a vedação das penas capitais e perpétua cuida-se de opção imposta ao
legislador interno, sem interferência nos crimes internacionais sob a jurisdição do Tribunal
Penal Internacional. Quarto: Cabe, ainda, destacar que, a despeito da previsão da pena de
prisão perpétua pelo Estatuto do TPI, sua ratificação pelo Brasil não implicou na admissão
desta modalidade punitiva pelo ordenamento jurídico interno. Isso porque, consoante o art.
80, do Estatuto do TPI, as penas nele cominadas não interferem nas penas previstas nos
respectivos direitos internos, ou a aplicação da legislação de Estados que não preveja as
penas referidas no Estatuto. Destarte, não é necessária a adoção interna da pena de prisão
perpétua para o Brasil se adequar ao Estatuto de Roma. Quinto: Por fim, com a Emenda
Constitucional 45/2004, houve a introdução de dispositivo na CF/1988, dispondo que o
Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha
manifestado adesão. Após essa inovação constitucional, tem-se que a controvérsia sobre a
compatibilidade das sanções cominadas no TPI com o ordenamento jurídico brasileiro,
particularmente no que tange à pena de prisão perpétua, perdeu fôlego entre os nossos
doutrinadores.

Princípios constitucionais para a aplicação da pena: O primeiro deles, que está previsto
no art. 5º, XLV, da CF/ 1988, é o princípio da personalidade da pena, que significa dizer
que a pena não passará da pessoa do condenado. Cuida-se de uma conquista do Iluminismo,
que cerceou o arbítrio estatal, com a limitação dos efeitos da punição ao condenado, não
atingindo terceiros a ele relacionados, como seus descendentes que, no passado, sofriam,
por exemplo, a "infâmia do nome". No art. 52, XLVI, da CF/1988, há o princípio da
individualização da pena, que determina que todo indivíduo tem o direito de ter a pena a ele
aplicada individualmente, consideradas todas as características e condições pessoais, além
de se valorar o que efetivamente fez. Ainda que haja concurso de pessoas, não pode haver
uma aplicação de sanção idêntica a todos, sob pena de violação daquele princípio.

Espécies de penas privativas de liberdade: As espécies de penas privativas de liberdade


são a reclusão, a detenção e a prisão simples. As restritivas de direito são a prestação de
serviços à comunidade, a limitação de fim de semana, a interdição temporária de direitos, a
perda de bens e valores e a prestação pecuniária (5 espécies). A pena pecuniária, que não se
confunde com a pena restritiva de direito de prestação pecuniária, é a multa. Diferenças
entre a pena de reclusão e a de detenção: Uma das diferenças entre a pena de reclusão e a
de detenção é o regime de cumprimento. A pena de reclusão pode ser cumprida em regime
fechado, semi-aberto ou aberto, enquanto que a pena de detenção, apenas nos regimes semi-
aberto e aberto. Os regimes de cumprimento das penas fazem parte do sistema de execução
progressiva, aos cuidados do juiz da execução, visando à ressocialização do apenado. Há a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

progressão, ou seja, a transferência para regime menos rigoroso, de acordo com o mérito do
condenado (bom comportamento carcerário), após cumprido um sexto da pena, ao menos,
no regime anterior. A Lei 10.792/03, que alterou a LEP, não mais exige parecer pela
Comissão Técnica de Classificação, bem como a realização de “exame criminológico”
como condição à progressão, embora parcela da jurisprudência entenda que o juiz da
execução, de modo fundamentado, poderá determinar a realização do exame se as
peculiaridades do caso recomendarem. Há a regressão, isto é, a volta ao regime mais
severo, quando houver prática de crime doloso ou falta grave, ou quando sofrer condenação
por crime anterior, cuja pena, somada ao restante da pena em execução, tornar incabível o
regime mais benéfico. Antes de sofrer a regressão deverá o condenado ter respeitado seu
direito de defesa.

Aplicação da pena: O art. 59 estabelece três etapas de aplicação da pena, quais sejam: Na
primeira etapa, têm-se os incisos I e II, nos quais o juiz estabelece as espécies (pena
privativa de liberdade) e a quantidade de pena (critério trifásico do artigo 68, CP). Na
segunda etapa, tem-se o inciso III, que trata da fixação do regime inicial para o
cumprimento da pena privativa de liberdade (art. 33 do CP). Na terceira etapa, tem-se o
inciso IV, que trata a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos e/ou multa (vide art. 44 do CP), ou o sursis, levando em conta os
critérios do art. 77 do CP. OBS 1: Cabe substituição de pena na lei Maria da Penha?
Depende. Cabe desde que o crime não seja com violência ou grave ameaça e a pena não se
limite à prestação pecuniária. OBS 2: Cabe substituição em um crime de estelionato? Cabe,
mas não pode ter violência e tem que atender aos outros requisitos também. OBS 3: não há
vedação de sursis para crime hediondo. Há vedação de sursis para o crime de tráfico de
drogas.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

20.b. Aspectos relativos à repressão penal contidas em


convenções internacionais sobre corrupção, organizações
criminosas, tráfico de pessoas, tráfico de armas, terrorismo e
escravidão
Fonte: Santo Graal 27º. Shaw, Malcolm N. Direito Internacional. 2010. Editora Martins
Fontes; Portela, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. Ed.
Jus Podium. 3 edição: 2011; Piovesan, Flávia. Direitos Humanos e Justiça Internacional. 2
edição: 2011. Ed. Saraiva; Júnior Baltazar, José Paulo. Crimes Federais. Editora Livraria do
Advogado. Sétima edição: 2011; Sobrinho, Mario Sergio. Crime organizado – Aspectos
Processuais. Coord: Antonio Scarance Fernandes. Editora Revista dos Tribunais: 2009;
Campedelli, André Collins. Terrorismo, libertação nacional e proibição de ataques
contra civis: cláusulas de exclusão de aplicação da convenção ampla sobre terrorismo das
Nações Unidas - Dissertação (orientador: Eugênio Aragão). Artigos: Wiecko, Ela. A
Criminalização do tráfico de mulheres: proteção das mulheres ou reforço da violência de
gênero; Wiecko, Ela. Tráfico de Pessoas: da Convenção de Genebra ao Protocolo de
Palermo; Wiecko, Ela. A Legislação Penal brasileira sobre o tráfico de pessoas e a
imigração ilegal/irregular frente aos Protocolos Adicionais à Convenção de Palermo;
Wiecko, Ela. Novas Perspectivas para a tese da competência da Justiça Federal para o
Crime de Trabalho Escravo; Wiecko, Ela. Considerações sobre a interpretação jurídico-
penal em matéria de escravidão; Manual “AGU no Combate à Corrupção”; Kovac, Matija.
International Criminalisation of Terrorism; Macedo, Paulo Emílio Vauthier Borges de. A
Aplicação da Convenção Interamericana contra o Terrorismo no Brasil; Garcia, Mônica
Nicida. TRÊS CONVENÇÕES INTERNACIONAIS ANTICORRUPÇÃO E SEU
IMPACTO NO BRASIL. Disponível em http://2ccr.pgr.mpf.gov.br/coordenacao/grupos-de-
trabalho/combate-crimes-cirberneticos/artigos-1/Tres%20Convencoes%20Internacionais
%20Anticorrupcao%20e%20seu%20impacto%20no%20Brasil.pdf.

Legislação: Decreto 5687/06 (Convenção de Mérida). Decreto 5014/04 (Convenção de


Palermo). Decreto 5017/04 (Tráfico de pessoas).

Saliente-se que os tratados a seguir analisados representam instrumentos multilaterais de


cooperação penal e processual penal. De qualquer maneira, deve restar claro que pode
haver cooperação entre os entes estatais, mesmo que não haja tratado para tanto. A
fundamentação pode constar unicamente dos ordenamentos internos.

Corrupção:

Não é difícil constatar hoje que a corrupção está globalizada e intrinsecamente relacionada
aos delitos transnacionais, como lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e de pessoas, etc.
Deste modo, a prevenção e repressão da corrupção deve ocorrer também de forma

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

globalizada. Esta atuação conjunta é possibilitada pelos tratados internacionais sobre o


tema.

Em primeiro lugar, o bem afetado pela corrupção é o patrimônio e a moralidade


administrativa. Apesar de haver conexão imediata com o patrimônio público, as
preocupações iniciais com a corrupção se fundamentaram no patrimônio privado (empresas
com atuação no comércio internacional). Assim, foi aprovada a Convenção sobre
Corrupção de Funcionários Públicos em Transações Comerciais Internacionais (Decreto n.
3678/00). Em consonância com este acordo internacional, foram tipificadas as condutas de
favorecimento a funcionário público, como preceituam os arts. 337-B, 337-C e 337-D do
Código Penal.

O Brasil recebeu então, em uma segunda fase de aplicação do referido tratado,


recomendação para prever sanções às pessoas jurídicas praticantes do crime de corrupção
do funcionário estrangeiro. Saliente-se que, no projeto do novo Código Penal, há previsão
sobre o tema, em atendimento à recomendação.

Posteriormente, foi assinada e ratificada pelo Brasil a Convenção Interamericana contra a


Corrupção (1996 – adotada no âmbito da OEA) (Decreto n. 4410/02). Pode-se afirmar que
ela foi o primeiro instrumento dedicado especificamente ao combate à corrupção, como
resultado da transcendência internacional da corrupção e da necessidade de viabilizar a
cooperação entre países. Isto porque, apesar de ter sido promulgada após a Convenção
sobre Corrupção de Funcionários Públicos, a mesma já existia no contexto internacional.

No âmbito legislativo, pode-se dizer que o Brasil cumpre com a maior parte das
recomendações presentes neste instrumento. O problema é que há dispersão destas normas
entre os vários ramos do direito. A convenção deve atuar como catalisador para criação de
um sistema de combate à corrupção.

Para que fique claro, o único ato previsto na convenção ainda não tipificado como crime
pelo ordenamento brasileiro é o de enriquecimento ilícito. Ainda assim, apesar de não
configurar crime, já há repressão da conduta, vez que reconhecida como de improbidade
administrativa, motivo pelo qual não é possível afirmar descumprimento ao tratado. De
qualquer modo, também no projeto do novo Código Penal, existe previsão deste delito.

Por último, foi promulgada pelo Brasil a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção
(2003 - Convenção de Mérida) (Decreto n. 5687/06). Este instrumento é bem mais
detalhado que os anteriores.

O Capítulo III trata das condutas que devem ser penalizadas no âmbito penal. Fala-se da
necessidade de prazos prescricionais dilatados, apreensão e confisco de bens, indenizações,
etc.

Exemplificativamente, o tratado prevê as condutas típicas de suborno, seja de funcionário


nacional, seja estrangeiro, de peculato, de tráfico de influência, de abuso de funções, de
enriquecimento ilícito, etc.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Ela estabelece a necessidade de indicar autoridades especificamente para combate à


corrupção. Incentiva ainda não apenas a cooperação entre órgãos públicos, mas entre estes e
o setor privado (art. 35 a 37).

O Capítulo IV trata da cooperação internacional, enquanto o capítulo V, por sua vez, trata
da recuperação de ativos (art. 51). É a primeira previsão internacional de recuperação total
dos ativos e estímulo à criação de uma cultura anticorrupção.

Organizações Criminosas:

1) Convenção de Palermo:

A Convenção das Nações Unidas contra o crime organizado transnacional (Palermo, 2000)
(Decreto n. 5014/04) é conhecida também como convenção de Palermo. Seu objetivo,
como o nome já indica, é o combate ao crime organizado transnacional.

O glossário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) dispõe que crime organizado


transnacional é ato criminoso cuja execução ocorre em mais de um Estado, mas também
aquele que produz efeitos em mais de um Estado ou cujo produto é levado para fora do
Estado em que foi cometido. Essa atividade utiliza as facilidades conectivas da
globalização para expandir sua área de influência pelo mundo e para dificultar o trabalho
estatal de fiscalização e manutenção da segurança.

A aplicação da Convenção é delimitada pelos termos dos artigos 2 e 3. O primeiro lista uma
série de definições necessárias a um entendimento uníssono do conteúdo da Convenção e o
segundo determina o âmbito de aplicação das normas da Convenção. De tal modo, é
fundamental o entendimento de certas definições tais como a de “grupo criminoso
organizado” (item a), “infração grave” (item b), “grupo estruturado” (item c), “bloqueio”
ou “apreensão” (item f), “confisco” (item g) e “entrega vigiada” (item i) para a utilização
desta norma de forma mais completa. Destarte, considera-se aplicável à referida Convenção
a investigação, instrução e julgamento das infrações já enunciadas e das infrações graves
(conforme o item b do artigo 2) desde que estas infrações tenham caráter transnacional ou
envolvam um grupo criminoso organizado. Assim, não há um rol exaustivo das infrações
objeto de repressão pelo tratado em análise, pois qualquer infração que se amolde ao
conceito de “infração grave”pode ser objeto.

Deste modo, alguns fatores determinam a transnacionalidade do delito, como ser cometido
em mais de um Estado, envolver participação de grupos organizados de mais de um país ou
produzir efeitos substanciais em territórios de entes distintos, entre outros.

O conceito de grupo criminoso organizado, por sua vez, é grupo estruturado de três ou mais
pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer
uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de
obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material (art. 2,
a).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Dentre as medidas que podem ser tomadas, citam-se: confisco e apreensão do produto das
atividades ilícitas; restituição do produto ou bens confiscados ao Estado onde se encontrem
as vítimas; extradição; transferência de processos e de presos; assistência judiciária
recíproca; e investigações conjuntas (Portela, p. 472).

Os efeitos da cooperação são delimitados no artigo 18, item 3, como seguem: a) Recolher
testemunhos ou depoimentos; b) Notificar atos judiciais;c) Efetuar buscas, apreensões e
embargos; d) Examinar objetos e locais; e) Fornecer informações, elementos de prova e
pareceres de peritos; f ) Fornecer originais ou cópias certificadas de documentos e
processos pertinentes, incluindo documentos administrativos, bancários, financeiros ou
comerciais e documentos de empresas; g) Identificar ou localizar os produtos do crime,
bens, instrumentos ou outros elementos para fins probatórios; h)Facilitar o comparecimento
voluntário de pessoas no Estado Parte requerente; i) Prestar qualquer outro tipo de
assistência compatível com o direito interno do Estado Parte requerido.

A referida foi suplementada por três protocolos, que abordam áreas específicas de atuação
do crime organizado: Protocolo para prevenir, suprimir e punir o tráfico de pessoas,
especialmente mulheres e crianças; Protocolo contra o contrabando de imigrantes por terra,
ar e mar; Protocolo contra a fabricação ilegal e o tráfico de armas de fogo, inclusive peças
acessórios e munições. Cada qual será analisado nos crimes a seguir relacionados.

Os Estados podem recusar, excepcionalmente, a execução do pedido de Cooperação. Esta


recusa se fundamenta no princípio da soberania estatal, tal como quando o Estado requerido
considere que a execução do pedido pode afetar sua soberania, sua segurança, sua ordem
pública, ou outros interesses essenciais ou quando o pedido for de encontro ao sistema
jurídico no que concerne à cooperação judiciária ou, pelo princípio do ne bis in idem, se tal
crime já ser alvo de processo ou investigação no país requerido.

Analisado a norma internacional que versa sobre o tema, necessária uma incursão em nosso
ordenamento jurídico.

2. Ordenamento jurídico brasileiro:

Até pouco tempo não tínhamos, no Brasil, uma lei que definisse organização criminosa,
dificultando a aplicação dos meios operacionais para a prevenção e repressão de ações de
grupos estruturados para a prática de crimes, quando não estruturados em quadrilha ou
bando [que agora se chama associação criminosa].

A omissão legislativa incentivava parcela da doutrina a emprestar a definição dada pela


Convenção de Palermo (sobre criminalidade transnacional), assim redigida: “(…) grupo
estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente
com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na Convenção,
com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro
benefício material”.

Nessa esteira de raciocínio, a 5ª T do STJ, no HC 77.771-SP , entendeu viável a acusação


contra casal denunciado por lavagem de dinheiro, tendo como delito antecedente a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

organização criminosa:

“HABEAS CORPUS. LAVAGEM DE DINHEIRO. INCISO VII DO ART. 1.º


DA LEI N.º9.613 /98. APLICABILIDADE. ORGANIZAÇAO CRIMINOSA.
CONVENÇAO DE PALERMO APROVADA PELO DECRETO
LEGISLATIVO N.º 231 , DE 29 DE MAIO DE 2003 E PROMULGADA
PELO DECRETO N.º 5.015 , DE 12 DE MARÇO DE 2004. AÇAO PENAL.
TRANCAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS
SUFICIENTES PARA A PERSECUÇAO PENAL.

1. Hipótese em que a denúncia descreve a existência de organização criminosa


que se valia da estrutura de entidade religiosa e empresas vinculadas, para
arrecadar vultosos valores, ludibriando fiéis mediante variadas fraudes –
mormente estelionatos -, desviando os numerários oferecidos para determinadas
finalidades ligadas à Igreja em proveito próprio e de terceiros, além de
pretensamente lucrar na condução das diversas empresas citadas, algumas por
meio de” testas-de-ferro “, desvirtuando suas atividades eminentemente
assistenciais, aplicando seguidos golpes.

2. Capitulação da conduta no inciso VII do art. 1.º da Lei n.º 9.613 /98, que não
requer nenhum crime antecedente específico para efeito da configuração do
crime de lavagem de dinheiro, bastando que seja praticado por organização
criminosa, sendo esta disciplinada no art. 1.º da Lei n.º 9.034 /95, com a
redação dada pela Lei n.º 10.217 /2001, c.c. o Decreto Legislativo n.º 231 , de
29 de maio de 2003, que ratificou a Convenção das Nações Unidas contra o
Crime Organizado Transnacional, promulgada pelo Decreto n.º 5.015 , de 12 de
março de 2004. Precedente”.

A decisão não escapou das críticas de importante setor da doutrina. Luiz Flávio Gomes, de
forma pioneira, logo anunciou três vícios estampados no citado acórdão: 1º) a definição de
crime organizado contida na Convenção de Palermo é muito ampla, genérica, e viola a
garantia da taxatividade (ou de certeza), que é uma das garantias emanadas do princípio da
legalidade; 2º) a definição dada vale para nossas relações com o direito internacional, não
com o direito interno; 3º) definições dadas pelas convenções ou tratados internacionais
jamais valem para reger nossas relações com o Direito penal interno em razão da exigência
do princípio da democracia (ou garantia da lex populi ), permanecendo atípica a conduta.

Essa lição (crítica) foi acolhida recentemente pelo STF no HC 96.007-SP, oportunidade em
que o Min. Marco Aurélio definiu como atípica a conduta atribuída a quem comete crime
de lavagem de dinheiro, tendo como fundamento a hipótese prevista no artigo 1º, inciso VII
(organização criminosa), da Lei 9.613/98. De acordo com o voto do eminente Ministro, a
atipicidade decorre de inexistir no ordenamento jurídico definição do crime de organização
criminosa, que vem apenas definido na Convenção de Palermo de 2000, introduzida no
Brasil “por meio de simples Decreto”.

Com o advento da Lei 12.694/12, o legislador, finalmente, definiu organização criminosa


para o Direito Penal interno, anunciando-o no seu art. 2º.

580
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

3. Conceito de organização criminosa:

[Advertência: muita atenção nesse ponto, pois não há resposta tendo em vista o aparente
conflito entre leis. Vamos ter que esperar a jurisprudência se posicionar se houve ou não
revogação tácita. Veja abaixo a discussão.]

A Convenção de Palermo, em seu art. 2º, “a”, considera organização criminosa como grupo
estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente
com o fim de cometer infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a
intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício
material.

Antes da Lei 12.694/12, havia uma corrente doutrinada (LFG) afirmando que tratados e
convenções não podem servir de fonte do Direito penal incriminador, ao fundamento de
que restaria violada a dimensão democrática do princípio da legalidade, pois no processo de
incorporação destes documentos internacionais o que resulta aprovado pelo Parlamento
brasileiro, por decreto legislativo, não é fruto ou expressão das discussões parlamentares,
que não contam com poderes para alterar o conteúdo do que foi celebrado pelo Presidente
da República. No entanto, este não era a posição da 2ª CCR/MPF, veja-se: “é
equivocada a interpretação sobre a necessidade de um conceito legal e de tipificação
criminal de organização criminosa”, pois “seu conceito já está internalizado pelo Decreto
5015/2004 (Convenção de Palermo)”, havendo a “necessidade de que a questão (em análise
no HC 96007) seja afetada ao Plenário do STF” (GRUPO DE TRABALHO 1 DA 2ª CCR.
Terrorismo e Investigação de Organizações Criminosas, pág. 08. Brasília, 12 a 14 de
dezembro de 2011: http://2ccr.pgr.mpf.gov.br/docs_institucional/eventos/xi-encontro-
nacional-2011/Grupo%201%20-%20Terrorismo%20e%20Investigacao%20de
%20Organizacoes%20 Criminosas%20.pdf).

Então, tínhamos a seguinte divergência: Posição do STF: não pode utilizar o conceito da
Convenção de Palermo [1ª Turma do STF (HC 96007/SP, rel. Min. Marco Aurélio, julgado
em 12.6.2012)]. Posição do STJ: entende que o conceito de organização criminosa já foi
integrado ao ordenamento jurídico brasileiro pela Convenção de Palermo (HC 171912,
11/2011, 5ª T; HC 129035, 08/2011, 6ª T).

Em tese, essa divergência quanto existir ou não o conceito de organização criminosa


deveria ser superada tendo em vista o disposto no artigo 2º, da Lei 12.694/12 de
24/07/2012. Porém, como a Lei 12.850/13, que também disciplinou o conceito de
organização criminosa, teremos, então, um aparente conflito positivo de conceitos,
vejamos:

O artigo 2º, da Lei 12.694/12 definiu organização criminosa nos seguintes termos:
considera-se organização criminosa, para os efeitos desta lei, a associação, de 03 ou mais
pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que
informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer
natureza, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 04 anos

581
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ou que sejam de caráter transnacional.

PORÉM, a Lei 12.850/13, disciplinou no artigo 1º, §1º organização criminosa nos
seguintes termos: Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais
pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que
informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer
natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4
(quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional. [Além de definir o conceito, a Lei
12.850/13 também tipificou o crime de organização criminosa no artigo 2º, o que veremos à
frente].

E agora? É um conflito legislativo?

Diferenças entre os dois conceitos: a) a Lei nº 12.694/12 exige três ou mais pessoas para a
existência de uma organização criminosa, enquanto que a Lei nº 12.850/2013 exige quatro
ou mais; b) a Lei nº 12.694/12 considera organização criminosa aquela que pratica crimes
cuja pena máxima seja igual ou superior a quatro anos ou que sejam de caráter
transnacional. Já a Lei nº 12.850/13 considera organização criminosa aquela que pratica
infrações penais – e não somente crimes – cujas penas máximas sejam superiores a quatro
anos, ou que sejam de caráter transnacional.

Possíveis soluções para o aparente conflito: como o conflito de normas em Direito Penal é
apenas aparente, a doutrina esboça três possíveis soluções. Vejamos: 1ª) Conjugar a redação
de ambas as leis: nasceria uma Lex tertia, a qual combinaria o melhor de ambos
dispositivos. A solução, contudo, é inadequada por dois motivos. O primeiro deles, e mais
evidente, é a criação de uma terceira lei penal a partir da conjugação de duas outras. Ainda
que haja doutrina favorável, é certo que prevalece o entendimento que a combinação de leis
é impossível. É neste caminho que também trilha a jurisprudência. O segundo problema
consiste na indicação de qual combinação melhor se estrutura: aquela mais favorável ao réu
(em atenção à vedação da aplicação da novatio legis in pejus) ou o contrário (em benefício
de uma política criminal punitiva mais rigorosa). 2ª) Coexistência de ambos os conceitos no
ordenamento jurídico brasileiro: haveria um conceito de organização criminosa próprio
para o caso da Lei nº 12.694/12, isto é, aplicável somente para permitir o julgamento
colegiado em primeira instância e outro da Lei nº 12.850/13 para atender aos efeitos penais,
um conceito material. Neste diapasão, o conceito da Lei nº 12.694/12 seria meramente
processual, enquanto que o da Lei nº 12.850/13 seria material. O fundamento desta solução
está no fato de não ter havido revogação expressa do artigo 2º da Lei nº 12.694/12, da
maneira como manda o artigo 9º da Lei complementar nº 95/98. 3ª) Revogação tácita do
conceito presente na Lei nº 12.694/12 pela Lei nº 12.850/13 em franca aplicação do artigo
2º, parágrafo 1º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro: o conceito trazido
pela Lei nº 12.850/13 regula inteiramente a matéria da Lei nº 12.694/12 e, consoante visto
nas soluções apresentadas anteriormente, com esta se mostra incompatível. Assim, como
lex posterior derogat legi priori, prevalece o conteúdo da Lei nº 12.850/13. Conclusão: A
solução mais adequada pare ser a que defende a revogação tácita do conceito de
organização criminosa trazido pela Lei nº 12.694/12 pela regra da lex posterior derogat legi
priori. Infelizmente esta alternativa acaba por tornar o Estado brasileiro novamente
inadimplente com o compromisso firmado em Palermo, haja vista que no caso de
582
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

agrupamento de três pessoas e de crime de com pena máxima de quatro anos, a lei
brasileira não considera organização criminosa, ao contrário do tratado internacional. O
ideal seria uma revisão legislativa, alterando o conceito de organização criminosa para
aquele previsto na Lei nº 12.694/12, pois em conformidade com a Convenção de Palermo.
Enquanto isto não ocorre, acredita-se que os intérpretes devem se utilizar do conceito da
Lei nº 12.850/13 tanto para efeitos penais quanto para a formação do colegiado de juízes
em primeira instância.

4. Características e requisitos:

[Atenção: acrescentei mais uma coluna à tabela e atualizei o texto com as diferenças para a
Lei 12.850/13, deixando as duas possibilidades interpretativas. Se até a nossa prova não
tiver um posicionamento do STJ ou STF teremos que ficar com o discurso nessa corda
bamba entre as leis].

Os autores divergem sobre quais são as características da organização criminosa. O maior


especialista no Brasil em crime organizado, o Juiz Federal José Paulo Baltazar Júnior,
afirma que existem características essenciais (sempre presentes) e outras que seriam
acidentais (como a transnacionalidade), ou seja, que poderiam ou não estar identificadas, a
depender do modelo de organização criminosa.

Características Art. 2º da Lei 12.694/12 Art. 1º, §1º da Lei 12.850/13


a) pluralidade de agentes “3 ou mais pessoas”. “4 ou mais pessoas”.
(concurso necessário).
b) estabilidade ou “associação” / “mediante a “associação” / “mediante a
permanência (pretensão de prática de crimes”. prática de infrações penais”.
praticar série indeterminada
de crimes).
c) organização (estrutura “estruturalmente ordenada”. “estruturalmente ordenada”.
empresarial)
d) divisão de tarefas (divisão “caracterizada pela divisão “caracterizada pela divisão
de atribuições próprias para de tarefas, ainda que de tarefas, ainda que
membros diferentes da informalmente”. informalmente”.
organização).
e) finalidade de lucro ou de “com objetivo de obter, “com objetivo de obter,
outras vantagens não direta ou indiretamente, direta ou indiretamente,
econômicas. vantagem de qualquer vantagem de qualquer
natureza”. natureza”.
f) restrito a crimes “crimes cuja pena máxima “infrações penais cujas
abstratamente mais graves seja igual ou superior a 04 penas máximas sejam
ou de caráter transnacional. anos ou que sejam de caráter superiores a 4 (quatro) anos,
transnacional”. ou que sejam de caráter
transnacional”.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Tradicionalmente, afirma-se que a organização criminosa possui como uma de suas


características a finalidade lucrativa. A Lei n. 12.694/2012 foi além e afirmou que a
organização criminosa pode ser caracterizada mesmo que a prática dos crimes não tenha
por finalidade o lucro. Assim, pela definição legal, a organização criminosa pode ter outras
finalidades que não apenas econômicas, como por exemplo, sexuais, segregacionistas,
religiosas, políticas, entre outras.

Outras características doutrinárias, apresentadas antes da Lei 12.694/12: (1) Hierarquia:


(STJ, HC 16334 de 2001) presente de modo menos marcante nas chamadas “redes
criminosas”, e mais intensas nas organizações de modelo empresarial; (2) Disciplina: já foi
reconhecida pela jurisprudência (STJ, HC 16334 de 2001), mas não é traço essencial de
toda e qualquer organização; (3) Conexão com o Estado: um dos principais traços
definidores da criminalidade organizada, seja mediante corrupção de servidores públicos
encarregados da repressão da criminalidade (STJ, HC 75459 de 2007 e HC 76114 de 2007),
seja mediante prática de “clientelismo”, consistente na relação de reciprocidade entre os
mencionados servidores e os grupos criminosos organizados em que ambas as partes se
favorecem, seja mediante violência contra tais servidores (Segundo BALTAZAR, é no
clientelismo que reside a principal diferença entre organizações criminosas e grupos
terroristas, pois enquanto estes últimos pretendem a tomada do poder ou a substituição do
grupo governante, as organizações criminosas valem-se dos contatos com o Estado para a
obtenção de lucros); (4) Violência: emprego de métodos violentos dirigidos ora contra os
próprios membros do grupo para manter a disciplina, hierarquia e o silêncio, ora quanto a
testemunhas e agentes públicos em geral (STJ, HC 45949 de 2007); (5) Entrelaçamento ou
Relações de Rede com outras Organizações: substituição do modelo ou paradigma
mafioso, da organização monopolística e fortemente hierarquizada, pela ideia de
cooperação e relações mais ou menos frouxas entre vários grupos criminosos conforme
suas necessidades, formando-se vínculos horizontais e não verticais entre os indivíduos e os
grupos (facilitado pelas modernas técnicas de comunicação), podendo ocorrer o
entrelaçamento (ou formação do “novo” modelo de “rede criminosa”) tanto em função da
especialização dos grupos ou indivíduos em tarefas determinadas, quanto no
aproveitamento de habilidades, rotas e contatos para mais de uma forma de atividade
criminosa; (6) Flexibilidade e Mobilidade dos Agentes: consiste na enorme capacidade do
crime organizado para adequar-se às relações sociais modernas (em especial, ao processo
de globalização), sobretudo no âmbito econômico-empresarial; (7) Mercado Ilícito ou
Exploração Ilícita de Mercados Lícitos: é típico das organizações criminosas a atuação no
mercado de produtos ou serviços proibidos (e portanto ilícito) com alto grau de demanda
social, tais como drogas, armas, prostituição e jogos de azar, porém, alternativamente,
também há a exploração ilícita de mercados lícitos, em condições mais vantajosas ou em
concorrência desleal com o comércio regular, exp.: descaminho e contrabando de cigarros,
produtos de informática, eletrônicos, etc.; (8) Monopólio ou Cartel: consiste na imposição
de um monopólio ou a divisão do mercado entre certos setores do ilícito, característica esta
que tem sido questionada tem em vista a evolução acima apontada do modelo mafioso para
o modelo de rede das organizações criminosas; (9) Controle Territorial: consiste no
estabelecimento de um controle territorial de longo prazo de modo que as organizações
possam se apresentar como realidades sociais de poder estável, capazes não apenas de criar
redes de colaboração com autoridades legítimas e instituições oficiais, mas também de

584
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

exercer pressão sobre elas. É típica das organizações mafiosas no sul da Itália, e que no
cenário brasileiro se apresentam nos casos do jogo do bicho e do tráfico de drogas nas
favelas do Rio de Janeiro, prática na qual os “donos” da boca mantém o monopólio das
vendas em regiões marcadas pela pobreza e segregação social, realizando benfeitorias para
a população local (bicas d’água, campos de futebol, etc.), passando a ser considerados por
esta como benfeitores. Estes territórios são chamados zonas liberadas, onde a polícia não
entra, ou então onde a população tem obrigações para com o chefão local; (10) Uso de
Meios Tecnológicos Sofisticados; (11) Transnacionalidade ou Internacionalidade: não se
trata de característica essencial, podendo ser pensada, do ponto de vista da criação de um
tipo penal, nas construção de um tipo penal agravado. Guarda relação com a facilitação ou
barateamento do transporte de bens e pessoas, assim como de comunicações, com a
abertura de fronteiras e intensificação do comércio internacional no processo de
globalização. Fenômeno comum especialmente em relação a mercados nos quais os países
produtores ou fornecedores (geralmente periféricos onde a persecução penal é menos
eficiente) não são os maiores centros consumidores dos produtos, como é o caso do tráfico
de drogas, armas, animais e pessoas (neste último caso, seja no fornecimento de mão de
obra ilegal, ingresso ilegal de emigrantes ou ainda tráfico de mulheres e crianças); (12)
Embaraço do Curso Processual: consiste no sistemático emprego de meios para evitar ou
dificultar a produção de provas, seja de forma antecipada pela imposição da lei do silêncio
(como fundamento para decretação de prisão preventiva - STF, HC 85964 de 2005), seja no
curso do processo, com ofertas de cooptação, pressão, violência efetiva ou disposição para
o uso de violência contra testemunhas, peritos e agentes públicos da persecução penal em
geral (STJ, HC 30048 de 2003); (13) Compartimentalização: ligada à hierarquia, consiste
na criação de uma cadeia de comando, de modo que o executor dos atos criminosos não
recebe as ordens diretamente do líder da organização criminosa, que se protege ao não
praticar os delitos com suas próprias mãos. Aliada à imposição da lei do silêncio e a uma
eventual violência contra um dos elos da cadeia, constrói-se em sistema criminoso eficiente
semelhante à criação da estrutura de células estanques adotadas por grupos terroristas.
[OBS: o texto foi mantido como estava, fique atento para as duas diferenças trazidas pela
12.850/13: nº de pessoas e infração penal].

5. Convenção de Palermo X Lei 12.694/12 X Lei 12.850/13:

Convenção de Palermo Lei 12.694/12 Lei 12.850/13


Grupo estruturado de três ou Associação de 3 ou mais Associação de 4 ou mais
mais pessoas. pessoas. pessoas.
Existente há algum tempo e Estruturalmente ordenada e Estruturalmente ordenada e
atuando concertadamente. caracterizada pela divisão de caracterizada pela divisão de
tarefas, ainda que tarefas, ainda que
informalmente. informalmente.
Com a intenção de obter, Com objetivo de obter, Com objetivo de obter,
direta ou indiretamente, um direta ou indiretamente, direta ou indiretamente,
benefício econômico ou vantagem de qualquer vantagem de qualquer

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

outro benefício material. natureza. natureza.


Com o propósito de cometer Mediante a prática de crimes Mediante a prática de
uma ou mais infrações cuja pena máxima seja igual infrações penais cujas penas
graves ou enunciadas na ou superior a 04 anos ou que máximas sejam superiores a
Convenção. sejam de caráter 4 (quatro) anos, ou que
transnacional. sejam de caráter
transnacional.
Do exposto, extraímos os seguintes requisitos: 1) É imprescindível a reunião sólida (quanto
a estrutura) de um número plural de pessoas 2) A caracterização da organização criminosa
depende da existência de hierarquia e divisão de funções. 3) A finalidade da organização
deve ser a obtenção de vantagem (não necessariamente econômica). 4) Percebe-se que, no
Brasil, a organização criminosa não precisa ter, obrigatoriamente, caráter transnacional. Se
nacional, depende da prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4 anos; se
transnacional, essa restrição objetiva desaparece.

6. Jurisprudência:

07/02/2013 – DECISÃO: Sexta Turma do STJ aplica conceito de organização


criminosa definido no julgamento do mensalão. No caso analisado, a defesa de um
acusado pedia o reconhecimento de que, por não haver organização criminosa, não haveria
crime antecedente ao crime de lavagem de dinheiro, o que não justificaria a ação penal. A
Turma entendeu que não há necessidade da descrição específica do crime antecedente ao de
lavagem quando os recursos financeiros foram obtidos por organização criminosa. Os
ministros levaram em consideração precedente do próprio STJ, segundo o qual “a
participação no crime antecedente não é indispensável à adequação da conduta de quem
lava valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime (APn 458). Os ministros
ressaltaram que “organização criminosa” não é tipo penal, mas sujeito ativo. O artigo 1º da
Lei 9.613/98 não se refere a um “crime de organização criminosa” como antecedente do
crime de lavagem de ativos. O referido dispositivo se refere a um crime praticado por uma
organização criminosa. Durante a análise do caso, foi citado esse conceito de organização
criminosa adotado pelo STF no julgamento da APn 470. O julgamento do “mensalão”
firmou a posição do STF quanto ao tema. O Tribunal discutia sobre a inexistência de
definição, no ordenamento jurídico brasileiro, do termo “organização criminosa”, o que
implicaria reconhecimento da ilegalidade quanto à imputação pelo crime de lavagem, que
possui como pressuposto a participação em organização criminosa.

7. Crime de Organização criminosa (Análise da Lei nº 12.850/2013):

Introdução: A Lei nº 12.850, de 2 de agosto de 2013 dispôs sobre a organização criminosa.


Além de introduzir a desejada tipificação do crime de organização criminosa em seu art.
2º, cuidou no capítulo II, da investigação e dos meios de obtenção da prova, incluindo a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

colaboração premiada, a ação controlada, a infiltração de agentes, o acesso a registros pelo


Delegado de Polícia e pelo Ministério Público, além de tipificar delitos que ocorram
durante a investigação e a obtenção de prova.

Tipo legal: O crime de organização criminosa está tipificado no art. 2º da Lei nº


12.850/2013: “Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta
pessoa, organização criminosa. Pena – reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem
prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais praticadas.”

A Lei 12.850/13, disciplinou no art. 1º, §1º o conceito de organização criminosa nos
seguintes termos: Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais
pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que
informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer
natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4
(quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.

Quase um ano depois da instituição do anterior delito de "constituição de milícia" (Lei nº


12.720, de 27 de setembro de 2012), surge o crime de organização criminosa, reclamado
pela doutrina em razão do vácuo criado pela Lei nº 9.034/95, expressamente revogada pelo
art. 27 desta lei. Quanto à pena, não foi feliz o legislador porquanto sabedor da aplicação da
aplicação da "pena no mínimo legal", acabou por diminuir de quatro para três anos em
confronto com o delito do art. 288-A do CP. Poderia ter colocado no mínimo, uma pena de
quatro anos e um mês, obrigando à imposição do regime semiaberto e vedando a
substituição por pena restritiva de direitos.

Objetividade jurídica: A paz pública. O crime é formal e de perigo abstrato. Não exige a lei
que se evidencie o perigo, de forma a presumi-lo.

Sujeitos do delito: Sujeito ativo: qualquer pessoa. Trata-se de crime plurissubjetivo.


Segundo o art. 1º, § 1º da Lei, considera-se a associação de quatro ou mais pessoas. Sujeito
passivo: é a coletividade.

Tipo objetivo: O tipo penal é misto alternativo: existem várias condutas, mas praticando
mais de uma, responde por um só crime. A lei fala primeiro em “promover” que significa
impulsionar. Em segundo lugar, menciona o tipo o verbo “constituir” que significa
estruturar, formar, criar a essência. Não se confundem os dois termos. É possível não
participar da fundação da organização, mas promove-la posteriormente. O tipo penal
também fala em “integrar” a organização que consiste simplesmente em fazer parte da
organização. A "integração" pode ser através de atuação direta ou pessoal ou através de
interposta pessoal (o chamado "testa de ferro").

O objeto é a organização criminosa: associação estruturalmente ordenada e caracterizada


pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com o objetivo de obter, direta ou
indiretamente, vantagem de qualquer natureza (não necessariamente econômica, podendo
ser outra), mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a
quatro nãos, ou que sejam de caráter transnacional.

587
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

O conceito de estabilidade e permanência extraídos do art. 288 do CPP são levados em


conta, sendo exigidos na tipificação do delito. Assim, que promove a organização deve ser
punido se ficar caracterizada esta estabilidade e permanência. A vantagem desejada pode
ser a econômica ou não e o crime não pode ser de pequeno ou médio potencial ofensivo,
devendo ter a pena em abstrato superior a quatro anos (tráfico de drogas, furto qualificado,
roubo, homicídio doloso etc). Pode ainda de formal alternativa (ou), ser de caráter
transnacional, que envolva além do Brasil, um ou mais países. É exemplo a organização
criminosa que explore o narcotráfico Brasil-Bolívia-Colômbia. Tenha-se em conta que
deverá prevalecer quanto ao delito de tráfico de drogas, o crime de associação do art. 35 da
Lei de Drogas, exceto se houver esse caráter de transnacionalidade, quando prevalecerá o
crime de organização criminosa.

Tipo subjetivo: O dolo, consistente na vontade do agente criminoso em promover,


constituir, financiar ou integrar organização criminosa. Inclui ainda o elemento subjetivo do
tipo consistente em objetivar vantagem de qualquer natureza mediante a prática de
infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a quatro anos ou de caráter
transnacional. Trata-se nesse ponto, de norma penal em branco em sentido lado, sendo o
tipo penal complementando pela própria lei 12.850.

Os crimes objetivados podem ser da mesma espécie ou não. O tipo fala em “crimes”,
portanto, se a quadrilha objetivar cometer uma contravenção ou ilícito administrativo, o
fato é atípico (Cezar Roberto Bittencourt, Tratado de direito penal, parte especial, v. 4, p.
283). Também é atípica a conduta de objetivar praticar crimes culposos ou preterdolosos.

Consumação: Tratando-se de crime formal, consuma-se com a simples prática dos verbos
(“convergência de vontades”), não sendo necessário que se efetivem os crimes. A efetiva
associação deve ser demonstrada por elementos sensíveis, demonstrando a convergência de
vontades, tendo a esta associação estruturação ordenada e divisão de tarefas. Pode haver
também consumação naquele que ingressa em organização já formada.

No delito de “constituir”, o agente só responde portanto depois de algum tempo


juridicamente relevante. Se participou da constituição, mas a organização não se prolongou
minimamente, o fato é atípico eis que a tentativa não é punida. Responde nesse caso, se
participou da constituição, a organização se manteve, mas depois o agente deixa tal
organização. Isso porque o abandono posterior da organização não configura desistência
voluntária, porquanto o crime já estava consumado. Existe assim, uma necessidade de
dupla tipicidade. Basta a prática de um dos verbos, mas exige-se uma mínima consolidação
da organização criminosa. A tentativa não existe, vez que a lei tornou o ato preparatório
(não punível normalmente) em crime. Dessa forma, ou houve efetiva constituição por
exemplo da milícia privada, ou não se pune o delito.

É crime permanente nos verbos promover, constituir ou integrar, permitindo a prisão em


flagrante. No caso do verbo financiar, depende. Se houver continuidade no financiamento,
poder-se-á falar em permanência. Mas se houver um único aporte de capital, o crime será
instantâneo sobre uma organização com estabilidade e permanência.

Conduta equiparada: Incorre nas mesmas penas, aquele que impede ou embaraça a

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

investigação criminal, podendo ser sujeito ativo o policial que obsta essas investigações.

Causa de aumento: Arma de fogo (art. 2º, § 1º). As penas aumentam até 1/2 se na atuação
da organização criminosa houver emprego de arma de fogo. Nesse caso, basta que seja
apreendida uma arma de fogo, não sendo válido o simulacro de arma e nem arma branca.

Aumento de 1/6 a 2/3 (art. 2º, § 4º): I - participação de criança ou adolescente


(equiparando-se a verdadeira corrupção de menores, como ocorre no tráfico de drogas.
Todavia, sobre este prevalece o art. 35 da Lei de Drogas). II - concurso de funcionário:
nesse caso, deve a organização criminosa se valer dessa condição para a prática da infração.
Ex: furto a caixas eletrônicos, sendo as informações repassadas por policiais que ainda dão
cobertura à conduta criminosa. Nesse caso, a Corregedoria deverá instaurar inquérito e
comunicar ao MP para acompanhamento (art. 2º, § 7º). III - produto ou proveito da infração
destinar-se no todo ou em parte ao exterior. IV - se a organização criminosa mantém
conexão com outras organizações criminosas independentes. V - se as circunstâncias do
fato evidenciarem a transnacionalidade da organização. Nesse último item, nota-se um
verdadeiro “bi in idem”, já que o crime de organização criminosa na segunda forma, já
prevê a transnacionalidade como “elementar”.

Circunstância agravante: Exercício do comando, individual ou coletivo (art. 2º, § 2º). Nesse
trata-se de uma circunstância agravante pois o legislador não estipulou fração. Deve haver
punição para o autor que possui o "domínio do fato", que comanda um por um, os
integrante (comando individual) ou de forma genérica (comando coletivo). Sem a
necessidade de praticar atos de execução nos crimes objetivados pela organização, sendo
um partícipe destacado como verdadeiro autor.

7.1 Diferenciando alguns tipos:

Com a irrupção de um novo crime em nossa legislação, necessária se torna a reanálise do


ordenamento jurídico-penal pátrio, a fim de estabelecer os limites de aplicação da novatio
legis incriminadora, conforme, por evidente, a taxatividade penal imposta, mas também
tendo como parâmetro os outros delitos que vigoram no país, elucidando os eventuais
aparentes conflitos de normas.

Nesse diapasão, destacam-se os fatos que possam compor, por subsunção, os crimes de
associação criminosa (novo art. 288 do CP – vide tópico 6), associação para o tráfico (art.
35, Lei 11.343/06), associação para o genocídio (art. 2º, Lei 2.882/56) e constituição de
milícia privada (art. 288-A, CP) em conflito, ilusório, com o crime de organização
criminosa do art. 2º da Lei 12.850/13.

É importante ter em mente que organização criminosa é gênero, cujas espécies são
definidas em diversos preceitos devidamente contemplados no ordenamento pátrio.
Justamente esse é o entendimento do STF proferido em voto durante o julgamento do HC
108.715 em 24/09/2013, onde entendeu que o crime cometido por qualquer das espécies de
organização criminosa que conhecemos (Decreto nº 5.015/04, art. 288 do Código Penal, art.

589
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

35 da Lei nº 11.343/06 etc.) é apto a figurar como antecedente da lavagem de dinheiro, seja
qual for a sua natureza. [atente para o fato de que atualmente o crime de lavagem não exige
mais um rol taxativo de delitos antecedentes].

Destarte, vejamos a análise caso a caso:

1) Associação Criminosa vs. Organização Criminosa: não se confundem. O primeiro requer


a participação de no mínimo 3 (três) pessoas, enquanto que neste o número mínimo de
integrantes deverá ser 4 (quatro). A finalidade da associação criminosa é especificamente
cometer crimes, sendo dispensável o objetivo de lucro; enquanto que na organização
criminosa o objetivo é obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, tendo
como caminho a prática de infrações penais graves. Com efeito, caso uma associação,
visando obtenção de vantagem, composta de quatro ou mais pessoas, pratique crimes que
tenham pena máxima superior a 4 anos cometerá o delito previsto na Lei 12.850; se, no
entanto, faltar qualquer desses requisitos, ou seja: se o crimes cometidos tiverem pena
máxima igual ou inferior a quatro anos; se o grupo for composto por menos de quatro
sujeitos ou se o objetivo não for a obtenção de vantagem, estaremos diante, em tese, de um
crime de Associação Criminosa. Por fim, válida a lembrança de que não basta para a
caracterização da Organização Criminosa a junção de um grupo criminoso, tendo este que
ser estruturado e caracterizado pela divisão interna de tarefas, pois o crime de associação
criminosa dispensa a organização, sendo indiferente a posição ocupada por cada associado.
Logo, o art. 288 do Código Penal é mais genérico e, portanto, subsidiário.

OBS: Reunião de três pessoas, com hierarquia e divisão de tarefas, para praticar roubos, ao
praticar um crime (apenas), responderá por roubo majorado pelo concurso de agentes, na
forma de organização criminosa, sem implicar em associação criminosa.

2) Constituição de Milícia Privada vs. Organização Criminosa: não há maiores embaraços


aqui. Nesse contexto, o elemento de distinção importante é a necessidade de observância,
em relação à “Constituição de Milícia Privada”, de que não é qualquer reunião de pessoas
que dá margem a esta tipificação, mas apenas a que atende ao dado específico de constituir-
se numa reunião de pessoas que promova a formação de organização paramilitar, milícia
particular, grupo ou esquadrão. Assim, como a Constituição de Milícia Privada é
especializada, age como requisito negativo para configuração do crime de Organização
Criminosa, isto é, para este restar configurado se faz necessário que o grupo não tenha
característica paramilitar; nem atue como milícia ou esquadrão.

3) Associação para o Tráfico vs. Organização Criminosa: reside aqui, sob nossa ótica, uma
distinção que requer maior cautela para correta tipificação no caso prático. Essa análise
prudente detém como base a seguinte dicotomia: caso a organização criminosa pratique o
crime de tráfico de drogas, estaremos diante de uma associação para o tráfico (art. 35, Lei
11.343/06); se a organização criminosa, porém, pratica vários crimes, entre eles o de tráfico
de drogas, então entendemos que fica caracterizado o crime do art. 2º da Lei 12.850/13,
afastando-se a incidência da associação para o tráfico. Defendemos, assim, que não cabe
aqui o concurso de crimes, sob pena de bis in idem. Com efeito, temos uma pluralidade de
normas que engloba o mesmo conjunto de fatos, que protege o mesmo bem jurídico (paz
pública) e tem os mesmos sujeitos passivos (a coletividade), razão pela qual só haverá uma
590
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

norma incriminadora aplicável aos fatos. Resta saber como os Tribunais superiores se
posicionarão a respeito desta temática, porquanto, caso seja enquadrada a conduta como
organização criminosa, o agente terá restrições significativas, a saber: submissão aos meios
de prova da Lei 12.850; sujeição ao RDD (LEP, art. 52, §4º); realização do interrogatório
por videoconferência (CPP, art. 185, §2º, I); impossibilidade do tráfico privilegiado de
drogas (Lei 11343, art. 33, §4º). Por fim, imprescindível saber que a associação para o
tráfico requer, para sua caracterização, um número mínimo de duas pessoas; enquanto que a
organização criminosa necessita de quatro.

4) Associação para o Genocídio vs. Organização Criminosa: entendemos que se aplicam


aqui as mesmas regras expostas no tópico anterior.

7.2 Infiltração de agentes:

História e Conceito: Trata-se de instrumento investigativo com origem ligada ao período do


Absolutismo Francês e conhecido mundialmente como Undercover Operations. A
infiltração de agentes afigura-se como método de investigação em que membro da polícia
judiciária se infiltra na organização criminosa participando da trama organizativa,
utilizando-se de uma identidade falsa, concedida pelo Estado, e que possui como finalidade
detectar a comissão de delitos e informar sobre suas atividades às autoridades competentes.
Tudo isso com o escopo primordial de obter provas da prática de crimes e proceder à
detenção de seus autores. No Direito Comparado, a infiltração de agentes é meio
investigativo e de prova encontrado em quase todos os países do mundo, à exceção de
Luxemburgo, ainda que em alguns ordenamentos esta figura não esteja positivada. O
instituto emerge no Direito Brasileiro a partir da Lei 10.217/01, que alterou a atualmente
revogada e tão criticada Lei 9.034/95. No que concerne às críticas, uníssona doutrina
questionava a falta de regulamentação da infiltração de agentes, que, por via de
consequência, tornava inexequível a aplicação do instituto em termos práticos. Nesse
diapasão, como um avanço legislativo, eis que surge a Lei 12.850/2013, revogando a Lei
9.034/95 e regulamentando o procedimento da infiltração de agentes, de modo a tornar
palpável e exequível o procedimento que outrora era apenas uma falácia jurídica.

Conforme Marcelo Batlouni sustenta: “As vantagens que podem advir da infiltração de
agentes são de suma importância para a persecução penal, desvendando: fatos criminosos
não esclarecidos, modus operandi da organização, nome dos “cabeças”, “testas de ferro”,
bens, plano de execução do crime, agentes públicos envolvidos, nomes de empresas e
outros mecanismos utilizados para lavagem do dinheiro”. Destarte, o ordenamento jurídico
brasileiro passa a dispor de um mecanismo de grande efetividade probatória que auxiliará a
Polícia Judiciária e o Ministério Público a alcançar os fins coligidos pela norma
constitucional e processual penal.

A aplicação da medida de infiltração de agentes: A novel lei expõe que a investigação


através da infiltração de agentes deverá ser representada pelo Delegado de Polícia ou
requerida pelo Ministério Público, após manifestação técnica do Delegado de Polícia
quando solicitada no curso de inquérito policial, será precedida motivada e sigilosa

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

autorização judicial, que estabelecerá seus limites. Infere-se do texto que há uma nova
atribuição da autoridade policial, qual seja, de se manifestar quanto à infiltração de agentes.
Parece-nos que o legislador reconhece a autoridade policial como capacitada para emitir
parecer técnico e logístico a respeito da viabilidade da infiltração de agentes. Esta
manifestação prévia, inegavelmente, tem natureza jurídica de ato administrativo e, por
certo, não vincula a opinião do Ministério Público e nem mesmo do Juiz, possuindo caráter
meramente informativo para fins de ulterior decisão do parquet e do magistrado.

Convém notar que a Lei 12.850/13 compatibiliza-se com o entendimento sufragado pela
Súmula Vinculante 14, pois, segundo expressa previsão legal, o pedido e a autorização
judicial referente à infiltração de agentes serão sigilosos, de modo a garantir a higidez
probatória e a segurança do agente policial. Destarte, sob a inteligência da referida
jurisprudência constitucional, nem mesmo o advogado do suposto autor do delito poderá ter
acesso ao pedido ou autorização da infiltração de agentes, uma vez que o conhecimento da
diligência não só fulminaria a colheita probatória como também seria uma “sentença de
morte” ao policial infiltrado.

Ademais, a Lei 12.850/13 condiciona a infiltração de agentes à existência de indícios da


infração de Organização Criminosa, hoje crime autônomo, além de dispor que a medida
somente será admitida se a prova não puder ser produzida por outros meios disponíveis.
Nesse sentido, depreende-se que a infiltração de agentes, em razão do alto grau de
periculosidade proporcionado ao agente policial, bem como da incerteza do sucesso
probatório, deve ser aplicada como ultima ratio probatória, ou seja, somente aplicada se
demonstrado que os outros meios de prova são inviáveis à persecução penal, inclusive no
que tange à interceptação telefônica estatuída na Lei 9.296/96. A análise de necessidade da
medida deve ser pautada no Princípio Constitucional da Proporcionalidade, hipótese em
que será averiguado se o meio é adequado a atingir o fim pretendido (adequação); se o meio
é o menos gravoso para atingir determinado fim (necessidade); e se os benefícios
proporcionados por aquele meio superam os prejuízos acarretados através do meio adotado
(Proporcionalidade em sentido estrito).

Ato contínuo, é de bom alvitre ressaltar que a análise da proporcionalidade para fins de
adoção do procedimento de infiltração de agentes é trilateral, visto que o Juiz poderá fazê-
la quando do momento da autorização, o Ministério Público através da oitiva prévia e, a
partir da inovação legislativa, o Delegado de Polícia, em seu parecer técnico, deverá
ponderar a adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito da medida.

No Brasil, o agente infiltrado é sempre um policial, enquanto que em outros países, a


atribuição recai em um funcionário público ou mesmo um particular. Oportuno lembrar que
a antiga lei permitia o procedimento de infiltração por agentes da polícia e de inteligência,
fato que se alterou com a inovação legislativa, permitindo apenas o procedimento por
intermédio de agentes da polícia. Parece-nos que a revogação ratifica a tese de
incompatibilidade de atribuição dos membros da ABIN diante do procedimento
investigativo em questão. Ademais, imperioso lembrar ao intérprete que somente policiais
dos órgãos repressivos de Segurança Pública podem atuar como agentes infiltrados, o que,
por via de consequência, afasta a possibilidade de um policial militar ser inserido em um
programa de infiltração.
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Outrossim, a Lei 12.850/13 inovou ao apresentar um limitador temporal de 6 (seis) meses


para fins de duração da infiltração, podendo ser renovado, desde que comprovada a sua
necessidade. Entendemos, com fulcro na inteligência interpretativa do Supremo Tribunal
Federal sobre a renovação do prazo das interceptações telefônicas – Lei 9.296/96 -, que não
há qualquer vedação quanto à multiplicidade de renovações do prazo da infiltração, desde
que comprovada sua necessidade.

Da segurança jurídica e pessoal do agente infiltrado: Quanto à atuação do infiltrado, o


novel diploma legal é explícito ao afirmar que o agente atua albergado por excludente de
culpabilidade fundamentada na inexigibilidade de conduta diversa. Nessa seara, vale
lembrar que parcela da doutrina não admitia que o agente infiltrado cometesse qualquer
crime, pois inexistiria excludente ao seu favor. Destarte, esse posicionamento normativo é
deveras importante para findar com a grande divergência doutrinária sobre o tema e,
principalmente, proporcionar maior segurança jurídica aos agentes que atuarão infiltrados.

Entrementes, não obstante haja permissivo legal à atuação do agente infiltrado, sua atuação
deve ser proporcional à finalidade da investigação, não sendo afastada sua responsabilidade
diante de excessos praticados. Ademais, havendo indícios seguros de que o agente infiltrado
sofre risco iminente, a operação será sustada mediante requisição do Ministério Público ou
pelo Delegado de Polícia, dando-se imediata ciência ao Ministério Público e à autoridade
judicial.

Corroborando com a maior proteção ao agente infiltrado, a Lei 12.850/13 dispõe que a
participação no procedimento é voluntária e também pode ser interrompida a critério do
agente, sendo direito seu ter sua identidade alterada, ter seu nome, sua qualificação, sua
imagem, sua voz e demais informações pessoais preservadas durante a investigação e o
processo criminal e não ter sua identidade revelada, nem ser fotografado ou filmado pelos
meios de comunicação, sem sua prévia autorização por escrito.

7.3 Ação controlada:

O novo conceito legal de Ação Controlada: A própria Lei 12.850/13 conceitua a Ação
Controlada: “art. 8º – Consiste a ação controlada em retardar a intervenção policial ou
administrativa relativa à ação praticada por organização criminosa ou a ela vinculada, desde
que mantida sob observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no
momento mais eficaz à formação de provas e obtenção de informações”.

A principal alteração da conceituação legal reside na inclusão dos órgãos administrativos


como legitimados para realizar a Ação Controlada, conhecida pela Doutrina também como
Flagrante Postergado ou Diferido. Desta forma, incluiu o novel estatuto os agentes
integrantes da Agência Brasileira de Inteligência, fiscais das receitas federais e estaduais,
entre outros. Não é mais, por conseguinte, ato exclusivo das instituições policiais.

O fim da Ação Controlada Descontrolada: Não obstante a recenticidade da Lei 12.850/13, o


fim ou não da chamada Ação Controlada Descontrolada (nome dado pela Doutrina) trata-se

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

de uma das questões mais controversas ocasionadas pelo novo Diploma. A Lei anterior (Lei
9.034/95) já tratava do instituto da Ação Controlada, porém, apenas timidamente o
conceituava, razão pela qual a Doutrina afirmava de forma uníssona que para sua aplicação
não se fazia necessária uma autorização judicial. Desta forma, o flagrante postergado
aplicado às Organizações Criminosas, ao contrário do que ocorria na Lei 11.343/06 (Lei de
Drogas), era descontrolado, desprovido de limitação jurisdicional, ficando a cargo da
Autoridade Policial realizar a operação e só posteriormente comunicar o fato ao
Magistrado.

Com efeito, o §1º do art. 8º da nova Lei, alterando esse cenário, trouxe o seguinte texto: “O
retardamento da intervenção policial ou administrativa será previamente comunicado ao
Juiz competente que, se for o caso, estabelecerá os seus limites e comunicará ao Ministério
Público” (grifos nossos). Destarte, antes de agir o Delegado de Polícia deverá, agora,
comunicar sua pretensão e os motivos que ensejaram essa escolha no caso concreto,
justificando, portanto, o diferimento do flagrante ao órgão jurisdicional competente.

De acordo com o texto legal, o Magistrado, conforme o caso, estabelecerá os limites da


ação, podendo inclusive, no nosso entendimento, recusá-la, caso entenda que não exista
necessidade da postergação ou não haja proporcionalidade da medida. Com isso, questiona-
se: não poderia o Magistrado desautorizar a Ação Controlada? Não dependeria o Delegado
de Polícia, portanto, de uma autorização, ainda que tácita, do Juiz? São esses os
questionamentos que já causam furor na Doutrina.

Há quem defenda que, embora a Lei traga o vocábulo “comunicação”, na verdade o


legislador referiu-se a uma espécie de “autorização”, de “controle” jurisdicional, seguindo a
mesma linha da Lei de Drogas de 2006. Assim, o Delegado, ao comunicar e justificar seu
anseio ao Juiz, dependeria de uma concordância deste, que pode limitar a ação parcialmente
ou em seu todo.

Para Rogério Sanches, contudo, não há necessidade de uma autorização judicial: “Questão
tormentosa se refere à necessidade de prévio mandado judicial para que seja autorizado o
retardamento da ação. A revogada Lei nº 9.034/95 (lei das organizações criminosas),
quando tratava singelamente da matéria em seu art. 2º, inc. II, não exigia a prévia
autorização judicial. Era o entendimento da jurisprudência. Já a lei de drogas (Lei nº
11.343/2006), como se depreende do teor do caput de seu art. 53, é expressa ao exigir o
mandado judicial para a diligência”. Adiante, explica o ilustre professor que quando a Lei
12.850/13 exige autorização judicial nas diligências, como ocorre na Infiltração de Agentes,
ela traz expressamente esta obrigatoriedade.

Sem dúvida, será um dos temas que gerará debates na Doutrina e nos Tribunais Superiores
dentro de breve. Na nossa ótica, seja qual for a corrente adotada, estamos diante do fim da
Ação Descontrolada, como consequência da obrigatoriedade de comunicação prévia e da
possibilidade de limitação pelo Juiz.

7.4 Colaboração premiada:

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Introdução: O instituto da delação premiada foi inserido no ordenamento jurídico brasileiro


no ano de 1990, quando da edição da Lei Federal nº 8.072, a chamada Lei dos Crimes
Hediondos. Trata-se de instrumento de política criminal importado do Direito Italiano que
tem por objetivo precípuo combater o pacto do silêncio absoluto que predomina diante das
organizações criminosas.

Preliminarmente, impende assinalar que, apesar de ser um eficaz instrumento à persecução


penal, o procedimento carecia de regulamentação que garantisse o devido processo legal e,
principalmente, a segurança jurídica e pessoal ao delator. Por oportuno, com o advento da
Lei 12.850/13, a medida foi precisamente regulamentada, adquirindo contornos normativos
claros, de modo a garantir maior eficácia e exequibilidade.

Nas palavras do emérito Guilherme de Souza Nucci: “A delação premiada significa a


possibilidade de se reduzir a pena do criminoso que entregar o(s) comparsa(s). É o
‘dedurismo’ oficializado, que, apesar de moralmente criticável, deve ser incentivado em
face do aumento contínuo do crime organizado. É um mal necessário, pois trata-se da forma
mais eficaz de se quebrar a espinha dorsal das quadrilhas, permitindo que um de seus
membros possa se arrepender, entregando a atividade dos demais e proporcionando ao
Estado resultados positivos no combate à criminalidade”.

Análise comparativa da Delação Premiada no Ordenamento Jurídico Brasileiro: A novel lei


não apenas proporciona uma grande evolução ao combate das organizações criminosas,
como também revoluciona ao alterar o nomen juris da medida para Colaboração Premiada.
No ordenamento jurídico brasileiro, o instrumento é conhecido como Delação Premiada e
não é exclusivo ao combate das organizações criminosas, permeando diversos dispositivos
legais, dentre os quais: Código Penal (arts. e 159, §4º, e 288, p.u.), Lei do Crime
Organizado – nº 9.034/05 (art. 6º), Lei dos Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional –
nº 7.492/86 (art. 25, §2º), Lei dos Crimes de Lavagem de Capitais – nº 9.613/88 (art. 1º,
§5º), Lei dos Crimes contra a Ordem Tributária e Econômica – nº 8.137/90 (art. 16, p.u.),
Lei de Proteção a vítimas e testemunhas – nº 9.807/99 (art. 14), Nova Lei de Drogas – nº
11.343/06 (art. 41), e, mais recentemente, na Lei que trata do Sistema Brasileiro de Defesa
da Concorrência – nº 12.529/2011 (art. 86). Nesse sentido, em caráter didático,
colacionaremos cada hipótese para melhor análise:

A) Lei 7.492/86 (Crimes Financeiros): “Art. 25. São penalmente responsáveis, nos termos
desta lei, o controlador e os administradores de instituição financeira, assim considerados
os diretores, gerentes (Vetado). §1º Equiparam-se aos administradores de instituição
financeira (Vetado) o interventor, o liquidante ou o síndico. §2º Nos crimes previstos nesta
Lei, cometidos em quadrilha ou co-autoria, o co-autor ou partícipe que através de confissão
espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa terá a sua pena
reduzida de um a dois terços”.

B) Lei 8.072/90 (Crimes Hediondos): “Art. 8º Será de três a seis anos de reclusão a pena
prevista no art. 288 do Código Penal, quando se tratar de crimes hediondos, prática da
tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ou terrorismo. Parágrafo único. O
participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando
seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços”.
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

C) Lei 8.137/90 (Crimes Tributários): “Art. 16. Qualquer pessoa poderá provocar a
iniciativa do Ministério Público nos crimes descritos nesta lei, fornecendo-lhe por escrito
informações sobre o fato e a autoria, bem como indicando o tempo, o lugar e os elementos
de convicção. Parágrafo único. Nos crimes previstos nesta Lei, cometidos em quadrilha ou
co-autoria, o co-autor ou partícipe que através de confissão espontânea revelar à autoridade
policial ou judicial toda a trama delituosa terá a sua pena reduzida de um a dois terços”.

D) Lei 9.269/96 (Altera o §4º do art. 159 do CPB): “(Extorsão mediante sequestro) Art. 159
– Seqüestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como
condição ou preço do resgate: (…) §4° Se o crime é cometido em concurso, o concorrente
que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do seqüestrado, terá sua pena
reduzida de um a dois terços”.

E) Lei 9.613/98 (Lavagem de Capitais e ativos): “Art.1. (…) §5º A pena poderá ser
reduzida de um a dois terços e ser cumprida em regime aberto ou semiaberto, facultando-se
ao Juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la, a qualquer tempo, por pena restritiva de direitos,
se o autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando
esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais, à identificação dos autores,
coautores e partícipes, ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime”.

F) Lei 11.343/06 (Tráfico ilícito de entorpecentes): “Art. 41. O indiciado ou acusado que
colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na
identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial
do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a dois terços”.

G) Lei 9.807/99 (Proteção a testemunhas e réus colaboradores): “(CAPÍTULO II DA


PROTEÇÃO AOS RÉUS COLABORADORES) Art. 13. Poderá o Juiz, de ofício ou a
requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a conseqüente extinção da
punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente
com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado: I –
a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa; II – a localização da
vítima com a sua integridade física preservada; III – a recuperação total ou parcial do
produto do crime. Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a
personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social
do fato criminoso”; “Art. 14. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a
investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou
partícipes do crime, na localização da vítima com vida e na recuperação total ou parcial do
produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um a dois terços”.

H) Lei 9.034/95 (Antiga Lei de Organização Criminosa): “Art. 6º Nos crimes praticados em
organização criminosa, a pena será reduzida de um a dois terços, quando a colaboração
espontânea do agente levar ao esclarecimento de infrações penais e sua autoria”.

Colaboração Premiada na Nova Lei de Organizações Criminosas: O mecanismo de


colaboração premiada estatuído na Lei 12.850/13 apresenta grandes alterações ao que era
previsto na revogada Lei 9.034/05, trazendo requisitos objetivos e subjetivos à concessão
do benefício processual. Quanto aos requisitos objetivos, a lei expõe que a delação deve

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

resultar em: I – a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa


e das infrações penais por eles praticadas; II – a revelação da estrutura hierárquica e da
divisão de tarefas da organização criminosa; III – a prevenção de infrações penais
decorrentes das atividades da organização criminosa; IV – a recuperação total ou parcial do
produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa; V – a
localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada. Ademais, o
Ministério Público poderá deixar de oferecer denúncia se o colaborador não for o líder da
organização criminosa ou for o primeiro a prestar efetiva colaboração, desde que
alcançados os resultados objetivos retro citados. Imperioso destacar que não estamos diante
de requisitos cumulativos, ou seja, basta que a delação atinja um dos resultados previstos na
norma para fins de aplicabilidade do instituto.

Quanto aos requisitos subjetivos, a lei explicita que, em qualquer caso, a concessão do
benefício levará em conta a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a
gravidade e a repercussão social do fato criminoso e a eficácia da colaboração. Nessa seara,
em seu brilhante artigo sobre a novel lei, Eugênio Pacelli posiciona-se com louvor: “No
particular, o legislador brasileiro parece ter um fetiche com a personalidade do agente! Ora,
não há tecnologia ou ciência suficientemente desenvolvida, ou cujo conhecimento técnico
seja seguro quanto aos vários e possíveis diagnósticos acerca da personalidade de quem
quer que seja! Certamente não se trata de questão jurídica, o que, já por aí, tornaria o Juiz
refém de laudos médicos, psicológicos ou psiquiatras”.

No que concerne à natureza jurídica da colaboração premiada, a nova lei se reveste de


causas de diminuição e substituição de pena e perdão judicial, como se vê: “Art. 4º O Juiz
poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois
terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que
tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal,
desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados”.

O Princípio da Irretroatividade da norma penal é previsto no artigo 5º, inciso XL, da


Constituição Federal, contudo, com uma importante ressalva: “a lei penal não retroagirá,
salvo para beneficiar o réu”. Em termos comparativos, pode-se constatar que a L. 12.850/13
apresenta-se como lex mellius, ou seja, norma que apresenta contornos mais benéficos ao
réu ao prever a possibilidade de aplicação de perdão judicial. Assim, o novel diploma legal
poderá retroagir a crimes ocorridos no passado – Teoria da Atividade – a fim de perquirir o
Direito Subjetivo Constitucional do réu em ter aplicada a norma mais favorável, ainda que
superveniente, seguindo o Princípio da Extratividade da norma penal.

Nesse contexto, o ilustre Eugênio Pacelli aduz que estamos diante de norma mais favorável
e que deve ser estendida às demais hipóteses de delação premiada previstas em nosso
ordenamento jurídico. Conquanto o brilhantismo do referido autor, à luz do Princípio da
Especialidade e Princípio da Reserva Legal, entendemos que as consequências jurídicas da
novel colaboração premiada somente são aplicáveis às organizações criminosas,
respeitando a especificidade das demais previsões do instituto.

Outro ponto relevante da alteração é a exigência da colaboração voluntária, ao revés do que


era requerido pela antiga norma, que exigia colaboração espontânea. Como se sabe, são
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

conceitos díspares, situação em que colaboração espontânea é aquela que não pode sofrer
qualquer influência externa, partindo de motivação interna do agente; enquanto a voluntária
aceita influências externas. Destarte, acertadamente veio a inovação legislativa, pois,
segundo a antiga lei, mero aconselhamento por parte de terceiros seria suficiente para
refutar a concessão da benesse processual.

Em caráter revolucionário, permite-se a suspensão do prazo para oferecimento da denúncia


e da prescrição por até 6 (seis) meses, prorrogáveis por igual período, até que sejam
cumpridas as medidas de colaboração. Parece-nos que o legislador, nesse ponto, entende a
complexidade de investigações envolvendo organizações criminosas e proporciona uma
ampliação dos direitos do Estado a fim de garantir maior eficácia da persecução penal.

Ademais, a L. 12.850/13 traz o que chamamos de “Colaboração Posterior”, hipótese em


que, se a colaboração for posterior à sentença, a pena poderá ser reduzida até a metade ou
será admitida a progressão de regime ainda que ausentes os requisitos objetivos. Como se
vê, o instituto da colaboração tem cabimento em sede de inquérito policial, fase processual
e de execução da pena. Todavia, para concessão do benefício, o réu deverá apresentar
condições subjetivas positivas, pois a lei somente traz exceção ao requisito objetivo.

Do requerimento e representação da medida de colaboração premiada: No que tange ao


requerimento e representação da medida, considerando a relevância da colaboração
prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o Delegado de Polícia, nos autos do
inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou
representar ao Juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador. Havendo discordância
entre a opinio juris do Ministério Público e a convicção do Magistrado, aplica-se o
Princípio da Devolução, de modo que a divergência deverá ser encaminhada para o
Procurador Geral de Justiça para fins de aplicação do que dispõe o art. 28 do Código de
Processo Penal. Por óbvio, não se aplica o referido procedimento quando a divergência
ocorre entre a autoridade policial e o Ministério Público, hipótese em que o juiz deverá
analisar a concessão da medida representada pelo Delegado de Polícia, mesmo que o
Ministério Público seja desfavorável.

O dispositivo retro citado ratifica a independência técnico-jurídica da autoridade policial


preconizada na Lei 12.830/13, situação em que a decisão sobre o cabimento da medida será
realizada posteriormente pelo juiz. Sobre essa temática, é de grande relevância para a
sociedade que não deixemos brigas institucionais – como a que houve com a PEC 37 –
deturparem a hermenêutica que deve ser extraída do novo diploma legal, pois uma
persecução penal hígida e eficaz exige a cooperação do Ministério Público em ampla
simbiose com a Polícia Judiciária.

Convém notar que a norma torna o Juiz equidistante ao acordo de colaboração premiada a
fim de preservar a imparcialidade. Assim, infere-se que o Juiz não poderá participar da
formalização do acordo, sendo responsável apenas pela sua homologação, desde que
preenchidos os requisitos da Lei.

Não obstante a norma seja recente, já há vozes na doutrina assinalando a


inconstitucionalidade do dispositivo sob alegação de que o diploma está concedendo

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

capacidade postulatória ao Delegado de Polícia. Data maxima venia, a tese não merece
prosperar. A nova norma tão somente concede à autoridade policial a possibilidade de
realizar o acordo e representar pela concessão da colaboração premiada que, a posteriori
será avaliada pelo Juiz. Essa exegese parte da interpretação lógico-sistemática de todo
ordenamento jurídico, pautando-se na capacidade que o Delegado possui em representar
pelas demais medidas cautelares do ordenamento jurídico. Ademais, no Brasil, ao contrário
de alguns países europeus, o Delegado de Polícia não atua sob delegação do Ministério
Público, possuindo, assim, autonomia técnico-jurídica para atuar, com discricionariedade,
na persecução penal pré-processual.

Outrossim, por amor incondicional ao debate, importante colacionar a tese de


inconstitucionalidade da representação do Delegado de Polícia quanto ao pedido de
concessão da delação premiada emitida pelo emérito Eugênio Pacelli: “A Constituição da
República comete à polícia, inquinada de judiciária, funções exclusivamente investigatórias
(art. 144, §1º, IV, e §4º). E, mais, remete e comete ao Ministério Público a defesa da ordem
jurídica (art. 127) e a promoção privativa da ação penal (art. 129, I). Ora, a atribuição
privativa da ação penal pública significa a titularidade acerca do juízo de valoração
jurídico-penal dos fatos que tenham ou possam ter qualificação criminal. Não se trata,
evidentemente, e apenas, da simples capacidade para agir, no sentido de poder ajuizar a
ação penal, mas, muito além, decidir acerca do caráter criminoso do fato e da viabilidade de
sua persecução em juízo (exame das condições da ação penal). Em uma palavra: é o
Ministério Público e somente ele a parte ativa no processo penal de natureza pública (ações
públicas). E o que fez a Lei 12.850/13? Dispôs que o Delegado de Polícia, nos autos do
inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderá representar ao Juiz
pela concessão de perdão judicial ao colaborador (art. 4º, §2º)!!! Naturalmente, o mesmo
dispositivo defere semelhante capacidade e legitimidade também ao Ministério Público! O
desatino não poderia ir tão longe…”.

Respeitosamente, a medida pleiteada pela autoridade policial possui inequívoca natureza


investigativa, compatibilizando-se com a exegese do art. 144, §1º, IV, e §4º da Constituição
Federal. Nesse diapasão, a colaboração proporcionará ao Delegado diligenciar com maior
precisão através das informações adquiridas pelo delator e, principalmente, culminará em
eficaz colheita probatória e grande instrumento formador da justa causa. Ademais, a tese
retro citada não encontra amparo legal e conceitual, visto que o Ministério Público – órgão
de controle externo das atividades investigativas – poderá se manifestar acerca da
representação da autoridade policial. Assim, em consonância com a sistemática processual,
pode-se constatar que a titularidade da ação penal do Ministério Público não fora, de forma
alguma, suprimida pelo novel diploma normativo. Se assim o fosse, a autoridade policial
careceria da legitimidade em representar por todas as demais medidas cautelares
disciplinadas em nosso ordenamento jurídico.

Dando continuidade ao tema, o pedido de homologação do acordo será sigilosamente


distribuído, contendo apenas informações que não possam identificar o colaborador e o seu
objeto. Convém notar que a Lei 12.850/13 compatibiliza-se com o entendimento sufragado
pela Súmula Vinculante 14, pois, segundo expressa previsão legal, o pedido de concessão
da colaboração criminosa será sigiloso, de modo a garantir a higidez probatória. Destarte,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

sob a inteligência da referida jurisprudência constitucional, nem mesmo o advogado do


suposto autor do crime poderá ter acesso ao referido pedido, uma vez que o conhecimento
do acordo pode não só prejudicar a colheita probatória como colocar em risco a integridade
do delator.

O acesso aos autos será restrito ao Juiz, ao Ministério Público e ao Delegado de Polícia,
como forma de garantir o êxito das investigações, assegurando-se ao defensor, no interesse
do representado, amplo acesso aos elementos de prova que digam respeito ao exercício do
direito de defesa, devidamente precedido de autorização judicial, ressalvados os referentes
às diligências em andamento.

O acordo de colaboração premiada deixa de ser sigiloso assim que recebida a denúncia,
observados os direitos do colaborador em: I – usufruir das medidas de proteção previstas na
legislação específica; II – ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais
preservados; III – ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e
partícipes; IV – participar das audiências sem contato visual com os outros acusados; V –
não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou
filmado, sem sua prévia autorização por escrito; VI – cumprir pena em estabelecimento
penal diverso dos demais corréus ou condenados.

O acordo de colaboração: Realizado o acordo, o respectivo termo, acompanhado das


declarações do colaborador e de cópia da investigação, será remetido ao Juiz para
homologação, o qual deverá verificar sua regularidade, legalidade e voluntariedade,
podendo, para este fim, sigilosamente, ouvir o colaborador na presença de seu defensor.
Caso a proposta não atenda aos requisitos legais, o Juiz poderá recusar homologação à
proposta ou adequá-la ao caso concreto. Não se pode olvidar que o colaborador assina o
termo de cooperação antes de iniciar a colaboração e, supervenientemente, no momento da
sentença, o Juiz apreciará os termos do acordo homologado e sua eficácia processual.

O termo de acordo da colaboração premiada deverá ser feito por escrito e conter: I – o
relato da colaboração e seus possíveis resultados; II – as condições da proposta do
Ministério Público ou do Delegado de Polícia; III – a declaração de aceitação do
colaborador e de seu defensor; IV – as assinaturas do representante do Ministério Público
ou do Delegado de Polícia, do colaborador e de seu defensor; V – a especificação das
medidas de proteção ao colaborador e à sua família, quando necessário. Por conseguinte, as
informações pormenorizadas da colaboração serão dirigidas diretamente ao Juiz a que
recair a distribuição, que decidirá no prazo de 48 (quarenta e oito) horas.

Outrossim, a norma prevê a possibilidade de retratação do acordo de colaboração, hipótese


em que as provas autoincriminatórias produzidas pelo colaborador não poderão ser
utilizadas exclusivamente em seu desfavor. Trata-se de exegese do nemo tenetur se
detegere, tutelando o direito do réu em quedar-se inerte, de modo a não produzir provas
contra si mesmo. In casu, enquanto em colaboração, o delator está protegido por estar
comungando com o interesse estatal, de modo que as provas produzidas não poderão ser
utilizadas em seu desfavor se decidir não mais cooperar. Nada mais justo, pois, mesmo que
opte por cessar a medida colaborativa, há grande possibilidade do agente já ter auxiliado de
forma satisfatória em termos de diligência ou mesmo em âmbito processual, para fins de
600
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

formação da convicção do Juiz quanto a todo o complexo estrutural da organização


criminosa.

Corroborando com a sistemática constitucional, em todos os atos de negociação,


confirmação e execução da colaboração, o colaborador deverá estar assistido por defensor.
Assim, nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu defensor,
ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade.

Quanto à validade probatória da colaboração premiada, a lei é clara e afirma que nenhuma
sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de agente
colaborador. Como se vê, a própria norma mitiga de certa forma o valor processual da
colaboração premiada, sendo necessário que ela esteja colimada com demais aparatos
probatórios para fins de ulterior condenação.

7.5 Acesso a registros, dados cadastrais, documentos e informações:

O legislador, em ato digno de aplausos, sob a égide da novel Lei 12.850/13, dispõe que o
Delegado de Polícia e o Ministério Público terão acesso, independentemente de autorização
judicial, apenas aos dados cadastrais do investigado que informem exclusivamente a
qualificação pessoal, a filiação e o endereço mantidos pela Justiça Eleitoral, empresas
telefônicas, instituições financeiras, provedores de internet e administradoras de cartão de
crédito.

Conforme se nota, há flagrante ampliação de poderes da autoridade policial, visto que o


novo diploma permite a representação por dados cadastrais do investigado sem a
necessidade de autorização judicial. Indubitavelmente, trata-se de um avanço legislativo
que proporcionará maior agilidade investigativa e, por conseguinte, maior probabilidade de
sucesso na persecução penal.

Entrementes, antes que os garantistas hiperbólicos monoculares digam que a medida


afronta o Direito de Intimidade tutelado no art. 5º, X da Constituição Federal, faz-se
imperioso ressaltar que a medida não se imiscui no íntimo do ser humano, sendo
direcionada apenas para garantir maior agilidade à persecução penal. Nesse sentido, até o
maior crítico da novel Lei de Organizações Criminosas, o ilustre Eugênio Pacelli, se
posiciona: “É que não se cuida de acesso aos dados de movimentação financeira, nem
àqueles relativos aos valores eventualmente depositados à titularidade do investigado, e,
tampouco, ao montante de gastos efetuados com o sistema de telefonia ou de administração
de crédito. O que a lei autoriza é que tais instituições informem o nome, estado civil,
filiação e endereço da pessoa. Há, portanto, redução sensível quanto ao conteúdo de
privacidade a ser acessado, ainda que se reconheça, como o fazemos, que a medida ostenta
dimensão mais alargada da privacidade e da intimidade do investigado. Por isso,
sustentamos a validade constitucional da medida”.

Para fins do exposto, as empresas de transporte possibilitarão, pelo prazo de 5 (cinco) anos,
acesso direto e permanente do Juiz, do Ministério Público ou do Delegado de Polícia aos

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

bancos de dados de reservas e registro de viagens. Ademais, as concessionárias de telefonia


fixa ou móvel manterão, pelo prazo de 5 (cinco) anos, à disposição das autoridades
mencionadas, registros de identificação dos números dos terminais de origem e de destino
das ligações telefônicas internacionais, interurbanas e locais.

Convém salientar que, não obstante ser recente a alteração normativa, parcela da doutrina
já se posiciona quanto à extensão deste método investigativo às infrações de outra natureza.
Contudo, entendemos que a autoridade policial somente poderá diligenciar diretamente
quanto ao acesso a registros, dados cadastrais, documentos e informações diante de crime
de organização criminosa, fulcro no Princípio da Reserva Legal.

7.6 Revogação formal da vedação à liberdade provisória e ao cumprimento da pena em


regime inicial fechado:

A vedação à liberdade provisória e o cumprimento obrigatório de pena em regime inicial


fechado fazem parte de uma grande celeuma doutrinária e jurisprudencial. Fato é que a
antiga Lei 9.034/95, em seu berço normativo, previa tanto a referida vedação quanto a pena
ser cumprida em regime inicial, obrigatoriamente, fechado. Sobre estas temáticas, o STF já
se pronunciou insurgindo-se e afirmando que legislador retirara do judiciário o poder de
aplicar a proporcionalidade ao caso concreto, criou restrição fundamentada na gravidade
abstrata do crime e, também, afrontou asperamente o princípio da individualização da pena.
Nesse sentido, importante destacar que o STF realizou controle difuso de
constitucionalidade posicionando-se pela inconstitucionalidade dos referidos dispositivos
sob a égide dos fundamentos retro citados e, principalmente, por haver grave ofensa ao
Princípio da Presunção de Inocência previsto no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição
Federal.

Corroborando com o entendimento sufragado pelo Supremo Tribunal Federal, a novel Lei
de Organizações Criminosas, sabiamente, revogou os dispositivos em comento de modo a
compatibilizar o ordenamento jurídico com toda a sistemática constitucional. Por oportuno,
convém socorrermo-nos ao diálogo das fontes para concluir que estamos diante do famoso
fenômeno da Constitucionalização do Direito, de modo que os princípios e valores
constitucionais devem permear os demais ramos do direito, devendo a eles se
compatibilizarem. A constitucionalização do direito acarreta uma releitura de todas as
normas do ordenamento jurídico a partir desses princípios e valores constitucionais.

Tráfico de pessoas:

O glossário do CNJ define o tráfico de pessoas como recrutamento, transporte,

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

transferência, alojamento ou acolhimento de pessoas mediante ameaça ou uso da força ou


outras formas de coação: rapto, fraude, engano, abuso de autoridade ou situação de
vulnerabilidade ou entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o
consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A
exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de
exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à
escravatura, servidão ou remoção de órgãos.

A preocupação inicial com o tráfico de pessoas foi com o tráfico de negros, objeto de
comércio. O mesmo tratado sobre a Abolição da Escravatura, em 1956, estipulou a
obrigação de definir como crimes a conduta de transportar ou tentar transportar escravos de
um país a outro.

Depois veio a preocupação com o tráfico de mulheres brancas para prostituição. Em 1904,
foi firmado Acordo para a Repressão do Tráfico de Mulheres brancas. A partir de então,
foram assinados vários tratados sobre o tema.

Essa sucessão histórica pode ser dividida em duas fases: antes e depois da Convenção de
1949, ou seja, no contexto da Liga das Nações e no âmbito da ONU, com expressa
anulação e substituição das normas anteriores. Na primeira fase, entendia-se que o
consentimento de mulheres maiores excluiria a infração. Esta ideia foi modificada pela
Convenção de 1933.

A Convenção de 1949 veio valorizar a dignidade e o valor da pessoa humana, como bens
afetados pelo tráfico. Vítima podia ser qualquer pessoa, independentemente de sexo ou
idade. Aqui, a pessoa que exerce a prostituição é tratada como vítima, enfatizando a
obrigação estatal de prevenção, reeducação e readaptação social. Esta nova postura, de
proteção total em face da vítima do crime de tráfico, acaba por desconsiderar a liberdade do
indivíduo. Este tópico será melhor analisado quando do estudo do consentimento.

A ineficácia da Convenção de 1949 foi reconhecida pela Convenção sobre eliminação de


todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (1979), que obriga os Estado a tomar
medidas contra o tráfico e a prostituição.

Em 1994, resolução da Assembleia Geral da ONU define o tráfico como movimento ilícito
ou clandestino de pessoas através das fronteiras nacionais e internacionais, principalmente
de países em desenvolvimento ou países com economia em transição, com o fim de forças
crianças e mulheres a situações de opressão e exploração sexual ou econômica (...).

Em 1995, na Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher foi reconhecido o conceito de


prostituição forçada como violência. A contrario sensu, a prostituição livremente exercida
não representaria violação dos direitos humanos. Isto significa uma alteração do paradigma
da Convenção de 1949. É o resgate dos direitos da personalidade da própria vítima.

Pelo Estatuto do TPI, o conceito de escravidão sexual tem como elemento o exercício de
um atributo de direito de propriedade.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

A Convenção Interamericana de 1998 sobre o Tráfico Internacional de Menores trata do


tráfico como a transferência/subtração/retenção de menor com fins ilícitos, elencando entre
eles a prostituição, servidão, etc.

Em meio a este contexto disperso de dispositivos normativo, a Assembleia Geral da ONU


aprovou o Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado
Transnacional (Palermo, 2000) (Decreto n. 5017/04). Em seu art. 3 define:

Para efeitos do presente Protocolo: a) A expressão "tráfico de pessoas" significa o


recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas,
recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao
engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação
de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha
autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a
exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou
serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção
de órgãos; b) O consentimento dado pela vítima de tráfico de pessoas tendo em vista
qualquer tipo de exploração descrito na alínea a) do presente Artigo será considerado
irrelevante se tiver sido utilizado qualquer um dos meios referidos na alínea a); c) O
recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de uma criança
para fins de exploração serão considerados "tráfico de pessoas" mesmo que não envolvam
nenhum dos meios referidos da alínea a) do presente Artigo; d) O termo "criança" significa
qualquer pessoa com idade inferior a dezoito anos.

O conceito trazido de exploração é mais amplo que o de prostituição, pois engloba o


turismo sexual, o casamento forçado, a pornografia infantil, entre outros.

Os Estados que ratificaram a Convenção de 1949 continuam obrigados a eles até a sua
denúncia.

No contexto internacional, atualmente, não há limitação quanto aos sujeitos protegidos e há


condenação de todas as formas de exploração. Atualmente, pode-se dizer que a repressão ao
tráfico de pessoas não se fundamenta apenas na prostituição, mas em qualquer fim ilícito.

Com relação ao consentimento, foi feito uma diferenciação, pois este só será válido se não
forem vítimas crianças ou adolescente. Deve ser salientado que o nosso ordenamento
interno não o previu como causa de exclusão da antijuridicidade. A doutrinadora Ela
Wiecko defende a validade do consentimento, afirmando inclusive que sua
desconsideração, no caso da vítima mulher, poder reforçar a discriminação de gênero. Isto
porque haveria desconsideração da liberdade individual da mulher, capaz de tomar suas
próprias decisões.

Em nosso ordenamento, o crime de tráfico internacional de pessoas foi tipificado no art.


231 do Código Penal.

Outro tipo foi previsto no art. 207 do CP, que trata do aliciamento de trabalhadores. Este
também configura tráfico internacional de pessoas, mas com afronta a organização do

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

trabalho. O art. 245 do CP trata da entrega de filho menor. Ainda quando a vítima for
criança ou adolescente, ver art. 239 e 244-A do Estatuto da Criança e do Adolescente.

A criminalização existente diferencia-se pelo objeto protegido. Assim, no tráfico


internacional par afins de prostituição, é a moralidade pública; no recrutamento fraudulento
de trabalhadores, é a organização do trabalho; no tráfico de crianças e adolescentes, é a
família; na introdução clandestina de estrangeiro é a fé pública ou a administração pública.

Para ficar em sintonia com o Protocolo Adicional à Convenção de Palermo, o Brasil precisa
rever a legislação penal, para definir um tipo básico de tráfico de pessoas e os tipos
derivados, inclusive para manter congruência entre as penas cominadas. Para tanto,
necessário modificar o modo de sistematização do Código Penal, organizado de acordo
com o bem jurídico protegido. Uma das sugestões é a criação de um capítulo de crimes
contra a dignidade humana.

O tráfico internacional de pessoas para fins de prostituição (art. 231), assim como o de
crianças e adolescentes (art. 239 do ECA), o aliciamento para fins de emigração (art. 207
do CP) e a introdução clandestina de estrangeiro (art. 125, XII, da lei 6815/90) por
definição são crimes transnacionais.

Atualmente, pode-se dizer que a repressão ao tráfico de pessoas não se fundamenta apenas
na prostituição, mas em qualquer fim ilícito.

Tráfico de armas:

A Convenção Interamericana contra a Fabricação e o Tráfico Ilícito de Armas de Fogo,


Munições, Explosivos e outros Materiais Correlatos, promulgada pelo Decreto 3229/99,
trata da repressão ao tráfico de armas, com objetivo também de fomentar a cooperação
entre os países.

O art. I traz algumas definições, saltando a importância do que é considerado fabricação


ilícita (com componentes ou peças ilicitamente traficados; ou sem licença de uma
autoridade governamental competente do Estado Parte onde se realizar a fabricação ou
montagem; ou quando as armas de fogo para as quais se requeira marcação não forem
marcadas no momento de fabricação), para fins de abrangência da convenção em análise.

O tráfico ilícito, por sua vez, relaciona-se com a existência de autorização dos países que
exportarão ou importarão as armas, munições e demais artefatos objeto de controle.

O compromisso internacional foi cumprido com a edição do Estatuto do Desarmamento.


Deste modo, o tráfico internacional de armas de fogo foi tratado pelo diploma n. 10.826/03,
especificamente no art. 18. Antes desta previsão, a conduta de traficar armas era
enquadrada no tipo de contrabando. Os tipos são de perigo abstrato.

Ainda no contexto internacional, recentemente, foi concluído um Tratado sobre Comércio

605
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

de Armas, no âmbito da ONU. O mesmo ainda não está em vigor, pois depende da
assinatura de 50 países para tanto. Também não foi assinado pelo Brasil, mas pela sua
importância e provável adesão, alguns comentários são necessários.

Inicialmente, nota-se que o tratado não destoa de previsões anteriores nos instrumentos
internacionais já analisados. Sua importância se deve a intenção de universalização de seus
preceitos. O Artigo 2 lista quais as armas englobadas pelo tratado, assim como quais
condutas devem ser rechaçadas. Estas previsões não devem ser interpretadas
restritivamente, em virtude mesmo dos conceitos amplo que o texto utilizou.

Mesmo nos casos em que a comercialização não é proibida, o tratado prevê regras de
controle das armas.

Análise do artigo 18, Lei 10.826/03:

[Art. 18. Importar, exportar, favorecer a entrada ou saída do território nacional, a qualquer
título, de arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização da autoridade competente:
Pena – reclusão de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa].

NOÇÃO: com a incriminação de condutas relativas a armas de fogo (Estatuto do


Desarmamento), o Brasil deu cumprimento a compromissos assumidos no cenário
internacional. Antes da lei 10.826/03, inexistia tipo específico para o tráfico internacional
de armas, com o que a conduta configurava contrabando. BEM JURÍDICO: cuida-se de
crimes de perigo abstrato, os quais protegem, de forma antecipada, a segurança da
coletividade (STJ, HC 22662/MG, 7.11.02), a incolumidade pública, a segurança nacional e
a paz social (STJ, HC 45099/AC, 15.8.06 e TRF4, AC 20047003000812-4/PR, 29.3.05),
além da indústria nacional de armas de fogo. SUJEITO ATIVO: o crime é comum, podendo
ser praticado por qualquer pessoa. TIPO OBJETIVO: não há exigência de habitualidade,
trato comercial lucrativo ou prática de atos negociais. Poderão ser objeto do crime arma de
fogo, acessório ou munição (TRF4, HC 20060400000158-4/PR, 15.3.06). Não se exige que
a arma esteja pronta para o uso (pode estar desmontada ou desmuniciada), todavia, não há
crime, por impossibilidade absoluta do objeto, quando a arma está avariada, impedida
permanentemente de funcionar, ainda que possa ser concertada ou suas peças usadas em
outra arma (STJ, HC 26444/RJ, 2.10.03, e TRF4, RSE 20067002010364-9/PR, 9.9.08).
Arma de brinquedo ou simulacro de arma não pode ser objeto do crime em questão (STJ,
REsp. 213.054/SP, 24.10.01). É atípica a conduta que tenha por objeto peças de reposição
para armas. Afirmou-se igualmente atípica a conduta em caso de “aquisição de pequena
quantidade de munição de calibre permitido, para uso próprio em arma para o qual o
adquirente apresenta porte legal” (TRF4, AC 0002547-13.2005.404.7106/RS, 27.7.10).
Norma Penal em Branco: somente há crime quando a importação/exportação ocorre sem a
autorização da autoridade competente (Comando do Exército), de modo que se cuida de
norma penal em branco. Princípio da Insignificância: inaplicável, tendo em vista o alto grau
de reprovabilidade da conduta delituosa e a potencialidade lesiva do objeto (STJ, HC
45099/AC, 15.8.06, e TRF4, AC 20047003000812-4/PR, 29.3.05). TIPO SUBJETIVO: é o
dolo, sendo desnecessária indagação sobre o objetivo do agente (TRF4, AC
20077010001827-8/PR, 4.3.09). Não é exigido o ânimo de lucro e não há forma culposa.
Erro de Proibição: é de difícil ocorrência (pois a proibição é universal e conhecida, de
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

modo geral), mas o TRF4 já reconheceu a ocorrência de erro de proibição evitável em


hipótese na qual um camelô importou munição de arma de fogo (TRF4, AC
20047003000812-4/PR, 29.3.05). CONSUMAÇÃO: ocorre com o efetivo ingresso em
território nacional, ou com a efetiva saída deste, ainda que não haja dano concreto (crime
de perigo abstrato). Trata-se de crime de conduta múltipla ou conteúdo variado (TRF4, AC
20077010001827-8/PR, 4.3.09). Tentativa: é possível, na hipótese de apreensão em zona
aduaneira (TRF4, ACR 001849-86.2009.404.7002, 29.5.12). Para Baltazar, no entanto, na
atual formulação, a tentativa seria impossível (o crime de atentado já estará consumado, na
modalidade “favorecer a entrada ou saída do território nacional”). CONCURSO DE
CRIMES: Crime Único: a importação de duas armas, no mesmo contexto fático, configura
crime único, e não concurso formal (TRF3, AC 200560040004890, 3.3.09). É único
também o crime quando o agente importa e, após, mantém sob guarda o armamento (pós-
fato impunível). Contrabando: o art. 18 do Estatuto afasta a aplicação do art. 334 do CP por
aplicação do princípio da especialidade, não havendo falar em concurso de crimes.
Facilitação de Contrabando ou Descaminho: em sendo o crime cometido por funcionário
público, ainda que na modalidade “favorecer”, responde pelo crime em comento, e não pelo
delito do art. 318 do CP (princípio da especialidade). Concurso Formal: se o agente traz
drogas, além de arma de fogo, acessório ou munição, há concurso formal próprio com o
crime de tráfico de drogas (TRF4, AC 200772000136245, 27.10.09). Já se admitiu o
concurso dos delitos dos arts. 12, 14 e 16 da lei ora analisada com o do art. 33 da lei de
drogas (STJ, HC 76248, 20.11.08). PENA: Pena em Abstrato: não há inconstitucionalidade
na fixação de pena em abstrato mais expressiva que aquela cominada aos arts. 14 e 16 da
lei, tendo em vista a diferenciação no desvalor das condutas (TRF4, AC
2005.71.10.004171-3, 3.9.08). Primeira Fase: nas circunstâncias judiciais, poderão ser
levadas em conta a quantidade e a qualidade das armas apreendidas (o TRF4 já entendeu
descabido o aumento de pena pelas circunstâncias de ter o agente transportado 49 cartuchos
calibre .38 junto ao corpo [TRF4, AC 20077004000397-5/PR, 22.1.08]). Terceira Fase: a
pena é aumentada em ½ quando a arma, acessório ou munição for de uso proibido ou
restrito, nos termos do art. 19 da lei (TRF4, AC 20057002005702-7/PR, 22.1.08). Efeito da
Condenação: cabível a inabilitação para dirigir veículo automotor pelo tempo da
condenação se o crime for cometido com o uso de automóvel (TRF4, AC 20077010001827-
8/PR, 4.3.09). AÇÃO PENAL: é pública e incondicionada, de competência da JF, no caso
específico do tráfico internacional (crime que se inicia em território nacional e tende à
consumação no estrangeiro ou vice-versa). Nos demais casos, se não houver conexão com
delito de competência federal, a competência é da JE. Liberdade Provisória: é possível
(vide ADIN 3112-1/DF, que reconheceu a inconstitucionalidade do art. 21 da lei ora
analisada). Destinação: com a alteração introduzida pela lei 11.706/08, de acordo com
Baltazar, ao juiz é dado, no caso de armas que tenham relação com o processo penal,
autorizar a cessão para autoridade policial, por exemplo, quando houver interesse. Por fim,
de acordo com o TRF4, “afastado de suas funções, o policial não mantém o livre porte de
arma de fogo de uso restrito, mas nada impede que, estando registrada, a guarde
exclusivamente no interior de sua residência...” (AC 20047002008765-9/PR, 18.3.09).

Terrorismo:

607
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Ele é considerado uma delito internacional. Esta posição é confirmada pelas declarações da
ONU, que reconhecem que atos de terrorismo agridem os direitos humanos, a democracia,
etc. De forma genérica, atingem interesses da comunidade internacional.

A definição do terrorismo é uma grande dificuldades. O glossário do CNJ define o


terrorismo como uso ou ameaça de uso premeditado de violência ou brutalidade espetacular
e indiscriminada para a consecução de um objetivo político, por meio da intimidação ou
produção do medo dirigido para uma audiência maior que suas vítimas diretas (POLETTO,
Ricardo dos Santos. Terrorismo e contra-terrorismo na América do Sul: as políticas de
segurança de Colômbia, Argentina e Peru. 2009. Dissertação (Mestrado em Relações
Internacionais) - Instituto de Relações Internacionais, Universidade de Brasília, 2009.
Disponível em: http://www.cnj.jus.br/handle/26501/1311. Acesso em: 19 fev. 2010).

Em sua dissertação, Capendelli, diz que “De acordo com Alex P. Schmid, existem 10
elementos que estão presentes na maioria dos atos terroristas e podem ser encontrados nas
definições acadêmicas e de governos. Ele afirma que nenhum desses elementos precisa
estar presente em todos os casos, necessariamente. Além disso, ele afirma que é possível
que dois incidentes de terrorismo não tenham nenhum elemento coincidente, com base na
ideia de semelhança familiar.33 Os elementos são estes: 1. O uso demonstrativo de
violência contra seres humanos; 2. A ameaça (condicional) de (mais) violência;3. A
produção deliberada de terror/medo em grupo alvo;4. Determinar civis, não combatentes e
inocentes como alvo; 5. O propósito de intimidação, coerção e/ou propaganda; 6. O fato de
que se trata de um método, tática ou estratégia de lutar em conflitos; 7. A importância de
comunicar o(s) ato(s) de violência a audiências maiores;8. A natureza ilegal, criminosa e
imoral do(s) ato(s) de violência;9. O caráter predominantemente político do ato; 10. Seu
uso como instrumento de guerra psicológica para mobilizar ou imobilizar setores do
público.”

Não se entende que o terrorismo é apenas aquilo que as convenções que descrevem atos
específicos preveem, embora não haja uma convenção vigente de alcance universal
elaborada para lidar com o terrorismo de modo genérico. Implicitamente, reconhece-se que
o terrorismo é um tipo de crime genérico, com características próprias, que se manifesta por
meio desses atos específicos que são descritos nas convenções respectivas. Isso é
demonstrado pela adoção de definições genéricas em tratados regionais, em legislações
nacionais e em resoluções de órgãos da ONU. Nessas resoluções, inclusive, ressalta-se a
preocupação de manter o conjunto de instrumentos jurídicos que lidam com o terrorismo
sob contínua revisão, para garantir que não haja manifestações de terrorismo que não
estejam previstas.

As normas que proíbem o terrorismo no direito internacional penal estabelecem um


“sistema de implementação indireta”. O sistema de implementação indireta depende dos
sistemas judiciais nacionais e baseia-se no princípio aut dedere aut judicare. Os tratados de
alcance universal sobre terrorismo têm uma estrutura bastante semelhante. Eles não
estabelecem penas para os crimes definidos, mas obrigam os Estados parte a determinar
penas para os crimes em sua legislação interna, pois os responsáveis são julgados pela
justiça doméstica dos Estados parte. Isso pode ser criticado, pois nenhuma consequência é
prevista para o descumprimento da obrigação. Além disso, não há uma hierarquia de
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

importância entre as obrigações de extraditar ou de processar para garantir que o processo


seja justo e efetivo.

Um marco para análise do fenômeno do terrorismo é o ataque aos EUA, em 11 de


setembro.

A questão deve ser aprofundada. Desde o Pacto Briand-Kellog (Pacto de Paris de 1928), a
guerra foi proscrita como meio válido de solução de controvérsias. Até então, o jus ad
bellum era meio legítimo de assegurar pretensão no direito internacional.

As exceções ao uso da força serão, atualmente, reconhecidas em situações específicas pelo


Conselho de Segurança (casos de guerra defensiva).

No século XIX, considerava-se legal o uso da força para proteger cidadãos e patrimônio de
um Estado no exterior. Atualmente, este quadro não é mais aceito. A questão atual é o uso
da legítima defesa nesses casos. Não deve ser aceito este instituto, pois o mesmo serve à
defesa de um Estado e não de indivíduos específicos (Shaw, p. 851). Os EUA tem se valido
deste argumento, a exemplo da intervenção em Granada (1984) e no Panamá (1989). Nestes
casos, questionou-se, inclusive, a proporcionalidade do nível de ameaça aos cidadãos norte-
americanos.

Lembrando ainda o Caso das Malvinas (Reino Unido x Argentina), posição mais aceita
defende que um Estado pode se valer de legítima defesa mesmo quanto esteja em discussão
a posse do território (Shaw, p. 853).

A questão é um pouco complexa, pois o conceito de guerra sempre foi atrelada ao de


estado, tanto que o art. 1 define agressão como uso de força armada por um Estado contra a
soberania de outro. Assim, apesar de a Al-Qaida não ser reconhecida sequer pelo direito
interno, o fato de o Afeganistão ser conivente à prática do terrorismo o colocou em posição
de agressor, de acordo com EUA. O Conselho não reconheceu a invasão dos EUA como
agressão, mas reconheceu a legítima defesa.

A Resolução n. 3314/74, por sua vez, reconhece a legítima defesa no caso de agressão
armada indireta (tese americana na guerra do Vietnã), mas este conceito não é bem aceito
no direito internacional. A Corte Internacional de Justiça, por exemplo, não reconheceu a
hipótese no caso de assistência a rebeldes (não configurando operação de vulto), seja pelo
envio de pessoas, seja pelo envio de dinheiro ou armamentos.

Foi também editada uma Resolução Antiterrorismo (n. 1373/01) pelo Conselho, alargando
ainda mais os poderes do órgão, pois permite atuação preventiva. Antes o Conselho só
poderia se manifestar sobre o caso concreto. Também há uma convocação dos Estados a
repressão ao terrorismo, tornando obrigatórias normas internacionais que os Estados não
ratificaram. Fala-se em uma “legislação internacional”. É norma de soft law, com efeitos
nada soft.

Além disso, a resolução determina que os Estado não devem conceder condição de
refugiado aos terroristas, com repercussão na Convenção Interamericana contra o

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Terrorismo.

Deve-se ter em mente que as hipóteses previstas no art. 3 da Carta não são taxativas, assim
não se pode dizer que o Conselho agiu contra legem.

O Conselho de Segurança das Nações Unidas concedeu carta branca ao EUA, após 11 de
setembro, através da resolução 1368/2001, que classifica o terrorismo como ameaça à paz e
à segurança e permite o direito de legítima defesa. Não foi definido contra quem ela seria
oposta. A questão é que a legítima defesa já estava prevista como direito natural no art. 51
da Carta. O exercício deste não depende de qualquer autorização. Basta o Estado afrontado
comunicar seus atos posteriormente.

O Conselho de Segurança, por sua vez, tem atuado ativamente, classificando atos terroristas
como ameaça à paz e à segurança mundiais.

Piovesan alerta para a doutrina de segurança adotada pelos EUA: unilateralismo, ataques
preventivos e hegemonia do poderio militar norte-americano. Argumenta que os ataques
preventivos, se alegados por todos os Estados, causariam a morte do Direito internacional.

O terror causado pelo terrorismo contextualiza o Estado de polícia no campo internacional,


desafiando a construção de um Estado de Direito Internacional. A autora defende que o
combate ao terrorismo deve se dar através da consolidação dos delineamentos de um
Estado de Direito no plano internacional (p. 61).

Questiona-se ainda a existência de legítima defesa antecipada (Shaw, p. 848-849), citando-


se casos como o ataque de Israel aos vizinhos árabes, após bloqueio no Porto de Eilat. A
questão é que a depender do grau de antecipação, a “legítima defesa” poderia se configurar
em uma agressão. Em geral, pode-se dizer que os Estados não se sentem a vontade com o
termo, preferindo flexibilizar com o conceito de ataque armado. Fato é que os conceitos de
necessidade e proporcionalidade constituem núcleo da definição da legítima defesa.

Outra controvérsia é a possibilidade de um Estado agir em legítima defesa de outro, através


da denominada legítima defesa coletiva. Esta pode ser conceituada como a combinação de
diversos direitos individuais à legítima defesa ou como uma instituição específica ou ainda
como base de sistemas abrangentes de segurança regional (Shaw, p. 853). Na prática, os
Estados adotaram a segunda interpretação (Caso Nicarágua). Foi exigida a uma declaração
prévia por parte do Estado agredido e um pedido de assistência.

Após os atentados do 11 de setembro, a Assembleia da OEA editou a Resolução 1840/02,


que proclama a Convenção Interamericana contra o terrorismo. Já existia esta preocupação
desde 1998, através de comitê criado para tanto, mas os atentados deram mais força aos
trabalhos. Mesmo antes disso, já havia outros diplomas que versavam sobre o tema. Os
atentados também foram considerados atos de guerra no contexto interamericano.

A Convenção Interamericana contra o Terrorismo, em ser art. 215 , fala em delitos e não
agressão armada. Assim, se tais atos receberam apoio ou cobertura de um Estado,
configurarão atos de guerra. Também se iniciou a discussão sobre o fato do crime do

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

terrorista ser ou não um crime político, com (im)possibilidade de concessão de asilo. O art.
11 da Convenção estabeleceu a inaplicabilidade da exceção do delito político. Nos art. 12 e
13, proíbe-se a concessão de condição de refugiado ou de asilo, quando houver fundadas
suspeitas de ato terrorista.

O art. 4, §4, da Convenção em análise define que não poderá ser aplicada a pena de morte
nem por delitos políticos, nem por delitos comuns.

Por outro lado, o Pacto de San José da Costa Rica permite, em seu art. 27, §1, que algumas
garantias sejam suspensas, em caso de guerra. Excepciona a pena de morte ao crime
político, mantendo sua vedação mesmo nestes casos de suspensão autorizada. Com relação
aos delitos comuns, a garantia contra a pena de morte poderia ser suspensa.

O ordenamento brasileiro, por sua vez, erigiu o repúdio a terrorismo como princípio
constitucional, a orientar o Estado nas suas relações internacionais. São ainda vedados
fixação de fiança, concessão de graça ou anistia. Em função destas disposições, Celso de
Melo (Extradição n. 855/04) entendeu que não se pode conferir o mesmo tratamento
privilegiado concedido ao criminoso político, no caso do terrorista. O terrorismo configura
afronta às próprias instituições democráticas.

Com relação ao crime político, existem as teorias objetiva (considera o bem jurídico
afetado), a subjetiva (considera a motivação do agente) e a mista (mais aceita). Fala-se
ainda em teorias extensivas (não apenas os atentados contra organização política, mas
qualquer ato com motivação política) ou restritivas (somente condutas que lesionam a
existência constitucional do país e tenham fins políticos). A questão é que estas
classificações diferenciam o crime político do crime comum, mas não conseguem fazê-lo
com tanta clareza com relação ao crime de terrorismo.

Luiz Regis Prado (citado no artigo A Aplicação da Convenção Interamericana contra o


Terrorismo no Brasil) tenta diferenciá-los pela sua escala. No caso do terrorismo, não há
exaurimento nas condutas criminosas, pois se objetiva desequilibrar a ordem vigente.
Simplificando a questão, afirma que se apenas um país for atingido, haverá crime político.
Se forem dois ou mais, haverá terrorismo.

A ausência de uma definição clara do conceito de terrorismo no nosso ordenamento causa


insegurança. A lei 10.744/03, em seu art. 1, §4, diz que “Entende-se por ato terrorista
qualquer ato de uma ou mais pessoas, sendo ou não agentes de um poder soberano, com
fins políticos ou terroristas, seja a perda ou dano dele resultante acidental ou intencional”.
Pela leitura, depreende-se que existiram várias dúvidas quando de sua aplicação. E, mais,
não há a definição típica do crime de terrorismo. De qualquer forma, mesmo que não haja
conceito unívoco, a indefinição é diminuída pelos diversos tratados sobre a matéria.

A lei de segurança nacional (lei 7170/83), por seu lado, foi editada em época ditatorial. Seu
conteúdo ainda não foi declarado inconstitucional, mas pairam sobre ela várias suspeitas.
Em seu art. 20, ela traz a seguinte previsão: “Devastar, saquear, extorquir, roubar,
seqüestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar, provocar explosão, praticar
atentado pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas.


Pena: reclusão, de 3 a 10 anos. Parágrafo único - Se do fato resulta lesão corporal grave, a
pena aumenta-se até o dobro; se resulta morte, aumenta-se até o triplo.” Apesar de trazer o
termo terrorismo, ela não a conceitua, permanecendo os mesmos questionamentos.

Por causa do já dito, a Convenção Interamericana deve encontrar dificuldade em sua


aplicação no Brasil.

Em conclusão, pode-se dizer que o terrorismo, quando responsabilizado o indivíduo, é


crime comum; mas, quando responsabilizado o Estado, é crime político.

Como ficariam os direitos humanos dos terroristas? Dworkin (citado no artigo “A


Aplicação da Convenção Interamericana contra o Terrorismo no Brasil)” afirma que um
direito humano só pode ser limitado por outro direito humano. No caso do terrorismo, a
limitação ocorre por medida de persecução penal.

No caso dos prisioneiros de Guantánamo, a própria Corte americana decidiu que os


mesmos teriam direito a advogado, entre outras garantias, não aceitando a classificação
dada pelo governo americana de unlawful combatants (categoria não prevista na
Convenção de Genebra).

Finalmente, antes de concluir este ponto, devem ser diferenciados os casos de uso da força
e o da autodeterminação, quando um povo recorre à força contra o poder colonial. Isto
porque o Conselho de Segurança entende que os Estados devem evitar o uso da força nos
casos em que indivíduos pleiteiem seu direito a autodeterminação (caso de Goa e Índia)
(Shaw, p. 855). Esta posição foi cristalizada em dois protocolos adicionais às convenções
da “Cruz Vermelha” ou Convenções de Genebra (1949). Estas questões deixaram de ser
vistas como assunto interno e passaram a ser tratadas como conflito armado num contexto
internacional.

Esta diferenciação é importantíssima, tendo em vista a aplicação do princípio da não


intervenção no direito internacional, o qual dispõe que cada Estado deve decidir livremente
sobre suas questões internas em respeito a sua soberania. Ressalte-se, contudo, que, salvo
os casos de autodeterminação, o direito internacional considera as guerras civis uma
questão interna (Shaw, p. 857). Não há norma contra rebelião no direito internacional.
Apesar desta diferenciação, não se deve admitir o uso de técnicas terroristas por parte
destes grupos emancipatórios. O fim legítimo não autoriza a utilização de qualquer meio.

A classificação ofertada aos rebeldes determinará o tratamento oferecido. Se forem tratados


como criminosos, apenas o Estado interessado poderá interferir. Se forem tratados como
insurrectos (insurreição), os demais Estados poderão decidir quais direitos irão conceder.
Este é um status intermediário. A beligerância, por sua vez, é um status formal, que envolve
direitos e deveres. Para tanto, o direito internacional relacionou alguns requisitos:
existência de conflito armado de natureza geral, ocupação de porção substancial do
território, condução de hostilidades de acordo com normas da guerra e grupos organizados,
etc. (Shaw, p. 858).

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

A assistência de um Estado para reprimir uma revolta em outro Estado é, em regra,


legítima, desde que solicitado por este. Em algumas situações, contudo, a própria definição
de quem é autoridade governamental competente pode ficar confusa.

A contrario sensu, a ajuda aos rebeldes seria inicialmente ilegal. A Declaração sobre os
Princípios do Direito Internacional (1970) determina que “nenhum Estado poderá
organizar, ajudar, fomentar, financiar, incitar ou tolerar atividades subversivas, terroristas
ou armadas, visando a derrubada pela violência do regime de outro Estado, ou interferir em
um conflito civil em outro Estado” (Shaw, p. 860).

Com relação a chamada intervenção humanitária, já se entendeu possível para proteger


cidadãos, mesmo que de nacionalidade diversa da do Estado interveniente, em situação pré-
estabelecidas. Shaw (p. 862) pondera com o conceito de integridade territorial trazido pela
Carta da ONU, demonstrando que esta exceção já fui utilizada de modo distorcido.
Reconhece, contudo, que a comunidade internacional pode deixar de aplicar sanções
quando a conduta do Estado interventor tenha salvado muitas vidas.

Como variante do princípio da intervenção humanitária, tem-se admitido intervenção para


fins de reestabelecer uma democracia. Shaw (p. 864) esclarece que os termos da Carta da
ONU não autorizam esta conduta.

Em 1996, foi criado, no âmbito da ONU, um Comitê Ad Hoc (Resolução 51/210) para
elaborar pactos sobre terrorismo, dos quais resultaram as Convenções para Supressão de
Atentados Terroristas com Bombas (1997) e sobre Financiamento do Terrorismo (1999).

Escravidão:

A Declaração Universal dos Direitos do Homem, em seu art. 4 preceitua que “ninguém será
mantido em escravidão ou servidão, a escravidão e o tráfico de escravos são proibidos em
todas as formas”. Em 1956, a Convenção Suplementar sobre a Abolição da Escravatura
(Decreto n. 46981/59), ampliou o conceito, inserindo as formas análogas à escravidão (ex.
servidão por dívida e cessão de pessoas, através de costumes – direitos hereditários sobre
mulher viúva). Esta última convenção exige dos países signatários o compromisso de
tipificar tais condutas como crimes. Atualmente, a escravidão, em determinadas condições é
considerada crime contra a humanidade, devendo ser julgada pelo tribunal penal
internacional.

Assim, a Convenção, em 1926, das Nações Unidas (Decreto n. 58563/66), em 1926,


considerou escravidão como “estado ou condição de indivíduo sobre o qual se exercitam os
atributos do direito de propriedade ou de alguns deles”.

O art. 149 do CP formalizou a exigência de tipificação do delito de escravizar pessoas,


contido nos citados instrumentos internacionais. A lei brasileira ordena os tipos penais de
acordo com o bem jurídico tutelado pelos mesmos. Pela análise do tipo, nota-se que não se
fala em crime de escravidão propriamente dito, mas em reduzir alguém à condição análoga

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

a de escravo. É o que alguns doutrinadores chamam de escravidão moderna, solicitando do


Estado postura mais atuante, não apenas para impedir o cárcere de tais trabalhadores, mas
para garantir direitos em patamares mínimos, sem os quais os mesmos poderiam ser
comparados a escravos.

Assim, pode-se dizer que o tipo em análise tutela a liberdade individual de acordo com
maioria doutrinária. Para os defensores da competência da justiça federal nos crimes do art.
149 do CP, o bem jurídico não é apenas a liberdade individual, mas sim a própria
organização do trabalho. Ademais, a União teria interesse na repressão de tais condutas,
diante de seu comprometimento nos tratados internacionais. Outro argumento seria que os
crimes contra direitos dos trabalhadores causariam prejuízo a previdência social, seja na
omissão de informações, seja na ausência de recolhimento das contribuições. A
examinadora não adota a diferenciação entre direitos dos trabalhadores coletivamente
considerados e individualmente. Ela defende a competência da justiça federal em todos os
casos. Esta revisão da jurisprudência pode ser causada pelo reconhecimento da
responsabilidade do Estado brasileiro, na Corte Interamericana de Direitos Humanos, no
caso José Pereira.

Redução a condição análoga à de escravo (art. 149, CP)

OBS inicial: O plenário do Senado aprovou no dia 27/05/2014, por unanimidade, a


Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Trabalho Escravo, que determina a
expropriação de imóveis urbanos e rurais onde seja constatada a exploração de trabalho
análogo à escravidão, com destinação das terras para a reforma agrária. A promulgação está
marcada para o dia 05 de junho (hoje é dia 02 ainda). Então, quando vc estiver lendo essa
parte, vá lá na Constituição e pegue o texto correto.

Escravidão: o estado ou a condição de um indivíduo sobre o qual se exercem todos ou parte


dos poderes atribuídos ao direito de propriedade. Escravo é o indivíduo em tal estado ou
condição (Convenção sobre a Escravidão de 1926). Trabalho forçado ou obrigatório: todo
trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob a ameaça de sanção e para o qual não se
tenha oferecido espontaneamente (Convenção nº 29, OIT). Práticas análogas à escravidão:
a) Servidão por dívidas: estado ou condição resultante do fato de que um devedor se haja
comprometido a fornecer, em garantia de uma dívida, seus serviços pessoais ou os de
alguém sobre o qual tenha autoridade, se o valor desses serviços não for equitativamente
avaliado no ato da liquidação da dívida ou se a duração desses serviços não for limitada
nem sua natureza definida; b) Servidão: condição de qualquer um que seja obrigado pela
lei, pelo costume ou por um acordo, a viver e trabalhar numa terra pertencente a outra
pessoa e a fornecer a essa outra pessoa, contra remuneração ou gratuitamente, determinados
serviços, sem poder mudar sua condição; c) Toda instituição ou prática em virtude da qual
uma mulher é, sem que tenha o direito de recusa, prometida ou dada em casamento,
mediante remuneração em dinheiro ou espécie entregue a seus pais, tutor, família ou a
qualquer outra pessoa ou grupo de pessoas; o marido de uma mulher, a família ou clã deste
têm o direito de cedê-la a um terceiro, a título oneroso ou não; a mulher pode, por morte do
marido, ser transmitida por sucessão a outra pessoa; d) Toda instituição ou prática em
virtude da qual uma criança ou um adolescente menor de dezoito anos é entregue, quer por
seus pais ou um deles, quer por seu tutor, a um terceiro, mediante remuneração ou sem ela,
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

com o fim da exploração da pessoa ou do trabalho da referida criança ou adolescente


(Convenção Suplementar sobre Escravatura de 1956).

O crime também é chamado de Crime de Plágio, que significa a sujeição de uma pessoa ao
poder de outra. Por que o crime se chama redução a condição análoga à de escravo, e não
pune a reduzir a condição de escravo em si?: Escravo é uma situação de direito que o Brasil
não reconhece, não tem como ser reduzido a esta condição.

Bem jurídico protegido: status libertatis do ser humano, a liberdade individual, abrangendo
a esfera física e psíquica (Castilho, 2000, p. 55), liberdade pessoal no que diz respeito ao
trabalho (Castilho, 2005).

Sujeito ativo: qualquer pessoa. Em regra, é o empregador e seus prepostos.

Sujeito passivo (s.p.): pessoa vinculada a uma relação de trabalho. Antes da Lei nº
10.803/03 era qualquer pessoa.

Tipo objetivo: reduzir é subjugar, transformar à força, impelir a uma situação penosa. Antes
da Lei nº 10.803/03 não havia especificação dos meios pelos quais se poderia se reduzir
alguém à condição análoga à de escravo, o que levava à necessária e criticada utilização da
analogia.

Atualmente, o crime previsto no caput pode ser cometido por uma das seguintes formas: a)
submeter o s.p. a trabalhos forçados ou jornada exaustiva; b) sujeitar o s.p. a condições
degradantes de trabalho; c) restringir, por qualquer meio, a liberdade de locomoção do s.p.
em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto. Consentimento da vítima:
para Nucci, pode afastar a configuração do delito, desde que a situação na qual se veja
envolvido o ofendido não ofenda a ética social e os bons costumes (2006, p. 626). Para
Bitencourt, o consentimento do ofendido, ainda que validamente manifestado, não afasta a
contrariedade ao ordenamento jurídico (2011, p.428).

OBS: caso o meio lançado para a submissão do sujeito passivo seja o sequestro, ficará este
crime absorvido pelo 149, CP.

OBS: não é necessário a prática de maus-tratos ou de sofrimento ao sujeito passivo para


caracterizar esse crime.

Distinção em relação ao art. 203, §1º, I: neste o empregador obriga o trabalhador a usar
mercadoria de determinado estabelecimento com o fim de vinculá-lo pela dívida contraída,
ao seu posto de trabalho, mas sem afetar sua liberdade de locomoção (formal). No art. 149,
o patrão restringe a liberdade de locomoção, porque o empregado lhe deve algo em razão
da dívida (material).

Tipo subjetivo: dolo.

Classificação: crime comum; material; de forma vinculada; comissivo; permanente; de


dano; unissubjetivo; plurissubsistente.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Consumação e tentativa: Consuma-se com a efetiva redução da vítima a condição análoga à


de escravo, dispensando-se o sofrimento da vítima. Trata-se de crime material e
permanente. A tentativa é perfeitamente admissível, quando por circunstâncias alheias a sua
vontade, não consegue o agente compelir a vítima.

Concurso: a redução a condição análoga à de escravo absorve qualquer outro crime contra a
liberdade (Bittencourt, 2011a, p. 430).

Outras modalidades/figuras assimiladas: os incisos I e II constituem crimes autônomos e


exigem elemento subjetivo especial do injusto (especial fim de reter as vitimas no local de
trabalho).

Causas de aumento de pena: a) se o crime é cometido contra criança ou adolescente; b) se o


crime é cometido por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.

Competência: A jurisprudência do STF (RE 398.041, Plenário, 30/11/2006) e do STJ (RHC


25583/MT, 9/8/2012) pacificaram no sentido de que a competência é sempre da Justiça
Federal (Entendimento da Ela Wiecko, Enunciado 21 da 2ª CCR). No entanto, no próprio
julgado do STF, ressaltou-se que não seria uma posição permanente do Tribunal, o que deu
a entender que dependeria do caso concreto. OBS: há discussão na doutrina sobre a
competência, pois o bem jurídico tutelado é a liberdade individual. Assim, argumenta-se
que por esse motivo a competência é da Justiça Estadual. Somente seria competência da
justiça federal se o crime de plágio fosse em concurso com crime que contra a organização
do trabalho. Contudo, é crescente a voz na doutrina de que o crime de plágio é crime que
viola a organização do trabalho e subsidiariamente a liberdade individual. Sanches defende
ser competência da Justiça Estadual, Alice Bianchini também, tendo, inclusive, livro sobre
o tema. Bom, nos parece interessante que você adote a posição da Ela, que é também a
posição pacífica da Terceira Seção do STJ, conforme jurisprudência recente que colaciono
abaixo. Ademais, como futuro membro do MPF, eu quero ter a atribuição de investigar esse
crime.

STJ - AgRg no REsp 1067302/PA - 12/06/2012 - A Terceira Seção deste Sodalício Superior
pacificou entendimento segundo o qual compete à Justiça Federal processar e julgar os
sujeitos ativos do crime previsto no art. 149 do Código Penal, haja vista a violação aos
direitos humanos e à organização do trabalho.

Ação penal: ação penal pública incondicionada.

Jurisprudência:

Caso José Pereira: decisão da CIDH em 24 de outubro de 2003. A demanda foi levada a
corte pelas organizações não governamentais Watch e Centro pela Justiça e Direito
Internacional contra o Brasil, tendo sido considerados violados os arts. I (vida), XIV
(trabalho e justa remuneração) e XXV (proteção contra detenção arbitrária) da Declaração
Americana e os arts. 6 (proibição da escravidão), 8 (garantias judiciais) e 25 (proteção

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

judicial) da Convenção Americana. Em 18 de setembro de 2003, firmou-se acordo de


solução amistosa em que o Brasil reconheceu a responsabilidade internacional e
estabeleceu compromissos relacionados ao julgamento e punição dos responsáveis. Jose
Pereira, aos 17 anos, fora retido contra sua vontade numa fazenda, juntamente a outros 60
trabalhadores, atraídos por promessas de trabalho. Lá, viviam submetidos a condições
desumanas e ilegais de trabalho e, ao tentar fugir, sofreu lesões que se tornaram
permanentes na mão e olho direitos, tendo sido indenizado em 52 mil reais (Lei 10.706/03).
O Brasil se comprometeu a implementar o Plano Nacional para Erradicação do Trabalho
Escravo, que inclui providencias legislativas (inclusão de figura da redução a condução
análoga à de escravo como infração à ordem econômica e modificações no art.149 do CP) e
judiciárias, tendo se comprometido, neste âmbito, a defender a competência da Justiça
Federal para o julgamento do delito do 149 do CP. Há compromisso de diligenciar junto aos
membros do MPF para que estes participem de ações de fiscalização do trabalho. Há
previsão de relatórios anuais para verificar o cumprimento dos compromissos, com
possibilidade de visitas in situ pela CIDH.

STJ - AgRg no REsp 1067302/PA - 12/06/2012 - A Terceira Seção deste Sodalício Superior
pacificou entendimento segundo o qual compete à Justiça Federal processar e julgar os
sujeitos ativos do crime previsto no art. 149 do Código Penal, haja vista a violação aos
direitos humanos e à organização do trabalho.

STF - Inq 3412 / AL - ALAGOAS - 29/03/2012 - PENAL. REDUÇÃO A CONDIÇÃO


ANÁLOGA A DE ESCRAVO. ESCRAVIDÃO MODERNA. DESNECESSIDADE DE
COAÇÃO DIRETA CONTRA A LIBERDADE DE IR E VIR. DENÚNCIA RECEBIDA.

Enunciado nº 41: Os crimes de redução a condição análoga à de escravo são de atribuição


do Ministério Público Federal. (003ª Sessão de Coordenação, de 31.05.2010)

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

20.c. Crimes contra a saúde pública e os relacionados à remoção


e transplante de órgãos.
Obras consultadas: Santo Graal 27º. Ela Wiecko Volkmer de Castilho. Artigo: Crimes
contra a saúde pública. In: ARANHA, Márcio Iorio (org.). Direito sanitário e saúde
pública. Brasília: Ministério da Saúde, 2003. p. 113-124; Cezar Roberto Bitencourt.
Tratado de Direito Penal, volume 4. 16ª Edição. Ed. Saraiva..

Legislação básica: Arts. 267-285 do CP.

Observação inicial: também existem crimes contra a saúde pública definidos em leis
especiais, tais como a Lei nº 11.343/2006 (tráfico de drogas) e a Lei nº 7.649/88 (o art. 9º
determina que o descumprimento das suas normas configura o crime previsto no art. 268 do
CP). Por outro lado, a Lei nº 9.605/98 (crimes ambientais) traz, nos arts. 54 e 56, o perigo
de dano à saúde humana como elemento do tipo. Por fim, na Lei de Contravenções Penais,
a emissão de fumaça, vapor ou gás (art. 38), classificada na categoria geral das
contravenções referentes à incolumidade pública, é a única que mais especificamente
protege a saúde pública. (Ela Wiecko, p. 116). No Código Penal, os crimes contra a saúde
pública formam um capítulo dentro do título Crimes contra a Incolumidade Pública.

Bem jurídico tutelado: a incolumidade pública, particularmente em relação à saúde


pública. Segundo Hungria, incolumidade pública é o estado de preservação ou segurança
em face de possíveis eventos lesivos (apud Bitencourt, 2011b, p. 293). Também se protege
a integridade física e a saúde das pessoas atingidas pelas condutas incriminadas. Segundo
Ela Wiecko (p. 114), o perigo abstrato ou concreto deve apresentar-se a um número
indeterminado de pessoas (e não a uma pessoa em particular), sem embargo de vir a ocorrer
lesão em uma ou mais pessoas determinadas. Sujeito ativo: qualquer pessoa,
independentemente de qualquer qualidade ou condição especial. Exceções: a) Omissão de
notificação de doença (art. 269) – apenas o médico; b) Medicamento em desacordo com
receita médica (art. 280) – para alguns, qualquer pessoa (Bitencourt, 2011b, p. 329); para
outros, como Hungria, trata-se de crime próprio (apud Prado, 2010, p. 200); c) Exercício
ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica, na modalidade “excedendo-lhe os
limites” (art. 282, segunda parte) – apenas o médico, o dentista ou farmacêutico. Sujeito
passivo: a coletividade (“crimes vagos”) e as pessoas eventualmente afetadas pelas
condutas. Tipo subjetivo: dolo (consciência de que pode criar perigo para a saúde pública).
Em geral, para a caracterização dos crimes contra a saúde pública, não tem relevo os
motivos ou a finalidade. No entanto, o exame desses aspectos é importante porque, presente
determinada finalidade na conduta, o enquadramento há de ser outro (Ela Wiecko, p. 122).
Exigem elemento subjetivo especial (especialmente finalidade econômica): arts. 272, §1º-
A; 273, §§1º e 1º-B; 276; 278; 282, parágrafo único; 284, parágrafo único (Ela Wiecko, p.
121). Preveem modalidade culposa: arts. 267,0270; 271; 272; 273; 278; 280. Classificação:
1) Crimes formais (arts. 268 e 270, §1º), materiais (arts. 267, 270, 271, 272, 273) ou de
mera conduta (os demais). (Ela Wiecko, p. 120). 2) Crimes de forma livre. Exceções: a)
Epidemia (art. 267); b) Omissão de notificação de doença (art. 269); c) Curandeirismo (art.
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

284). 3) Crimes de perigo abstrato. Exceções (crimes de perigo concreto): a) Falsificação,


corrupção, adulteração ou alteração de substância ou produtos alimentícios (art. 272); b)
Outras substâncias nocivas à saúde pública (art. 278) (Ela Wiecko, p. 120). Obs.: Epidemia
(art. 267), para alguns é crime de perigo abstrato (Bitencourt, 2011b), para outros é de
perigo concreto, sendo que outros (Ela Wiecko, p. 119), ainda, exigem concomitantemente
dano para as pessoas atingidas e perigo para as demais. Na modalidade qualificada,
certamente é crime de dano, pois exige o resultado morte. 4) Crimes comissivos. Exceção:
a) Omissão de notificação de doença (art. 269). 5) Crimes instantâneos. Exceções: 5.1)
Crimes permanentes: arts. 270; 272, §1º-A; 273; 276; 277; 278; 5.2) Crimes habituais: a)
Exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica (art. 282); b) Curandeirismo
(art. 284). 6) Crimes unissubjetivos. 7) Crimes plurissubsistentes. 8) Normais penais em
branco: a) Infração de medida sanitária preventiva (art. 268); b) Omissão de notificação de
doença (art. 269); c) Emprego de processo proibido ou de substância não permitida (art.
274); d) Exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica (art. 282) (Ela Wiecko,
p. 117; a autora acrescenta que a complementação heteróloga de tais normas seria de
“constitucionalidade discutível”, à luz do princípio da “reserva absoluta da lei penal”, além
de permitir alegação de erro de tipo ou erro de proibição). Apresenta causa de aumento de
pena: Infração de medida sanitária preventiva (art. 268). Apresentam qualificadora(s): a)
Epidemia (art. 267); e b) Exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica (art.
282). No entanto, há uma forma qualificada aplicável a quase todos os crimes do capítulo.
Atenção: se do crime doloso contra a saúde pública resulta lesão corporal de natureza
grave, a pena privativa de liberdade é aumentada de metade; se resulta morte, é aplicada em
dobro (forma preterdolosa). No caso de culpa, se do fato resulta lesão corporal, a pena
aumenta-se de metade; se resulta morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo,
aumentada de um terço (art. 285 c/c art. 258). Exceção: Epidemia (art. 267), pois já tem a
lesão corporal como integrante da conduta típica e a morte como resultado qualificador. São
hediondos: a) Epidemia com resultado morte (art. 267, §1º); b) Falsificação, corrupção,
adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais em todas as
suas modalidades dolosas (art. 273).

Distinção entre Exercício Ilegal da Medicina, Arte Dentária ou Farmacêutica,


Charlatanismo e Curandeirismo: No exercício ilegal da medicina, o agente entende ser
eficaz o tratamento ou meio por ele prescrito, enquanto que no charlatanismo, o agente
(ainda que seja médico) conhece a ineficácia do meio por ele inculcado ou anunciado. No
exercício ilegal da medicina, o agente demonstra aptidões e conhecimentos médicos,
embora não seja autorizado a exercer a medicina, enquanto que no curandeirismo, o agente
é pessoa ignorante e rude, que se dedica à cura de moléstias por meios grosseiros
(Bitencourt, 2011b, p. 334 e p. 336).

Impropriedades e inadequações da lei (Ela Wiecko, p. 121): As alterações legislativas,


inspiradas no movimento “lei e ordem”, desorganizaram a escala de proporcionalidade
entre crimes e penas. Por exemplo, a falsificação de um produto alimentício, tornando-o
nocivo à saúde, tem uma pena cominada de reclusão, de 4 a 8 anos, enquanto a venda de
cosmético, sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária, tem uma pena
prevista de 10 a 15 anos.

619
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Por outro lado, “as condutas de charlatanismo e de curandeirismo, tal como definidos,
deveriam ser descriminalizados, principalmente o segundo, vez que evidente a colisão com
os direitos de liberdade religiosa e de práticas culturais de elementos formadores da nação
brasileira (o índio e o negro), agasalhadas na Constituição Federal”.

Análise tipo a tipo:

1) Causar epidemia: [art. 267 - Causar epidemia, mediante a propagação de germes


patogênicos. Se do fato resulta morte, a pena é aplicada em dobro].

Há forma culposa. Sujeito passivo: a coletividade. Consumação: com o aparecimento de


inúmeros casos de pessoas doentes. É crime hediondo. Conceito de epidemia: doença ou
síndrome (conjunto de sintomas) que surgem de modo rápido e se prolifera a pessoas
indeterminadas. É propagar os agentes biológicos (germes, vírus) da doença. Admite-se
tentativa. Se causar várias mortes, não haverá concurso formal; será circunstância judicial
do art. 59 do CP. Se o crime for por inconformismo político ou para obtenção de fundos
destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas, poderá ser
atos de terrorismo, sendo o crime do art. 20 da LSN.

2) Infringir determinação do Poder Público: [Art. 268 - Infringir determinação do poder


público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa]

A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a


profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro. Exemplos do crime: abater aves
ou gado usando técnicas não permitidas, ou em áreas proibidas (centros urbanos, v.g.).
Norma penal em branco. Infringir medidas genéricas de higiene, sem a finalidade específica
de impedir a introdução ou propagação de doenças contagiosas, será mero ilícito
administrativo. Revogação da determinação do Poder Público: se a determinação se deu por
temporariedade ou excepcionalidade, a revogação não importará retroatividade da lei para
descriminalizar a conduta.

3) Omissão de notificação de doença: [Art. 269 - Deixar o médico de denunciar à


autoridade pública doença cuja notificação é compulsória]

Trata-se de norma penal em branco. Hoje vige a Portaria 1100 do Ministério da Saúde, de
1996. Crime próprio: só médico pode praticar. Trata-se de crime omissivo puro, e, portanto,
não se admite a tentativa.

4) Envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal: [art. 270 -


Envenenar água potável, de uso comum ou particular, ou substância alimentícia ou
medicinal destinada a consumo]

Está sujeito à mesma pena quem entrega a consumo ou tem em depósito, para o fim de ser
distribuída, a água ou a substância envenenada. Há forma culposa. Sujeito passivo: a
coletividade (número indeterminado de pessoas). Crime de perigo abstrato, sendo
desnecessário prova da exposição concreta a perigo. Envenenar não é apenas corromper ou
poluir.

620
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

5) Corrupção de água: [Art. 271 - Corromper ou poluir água potável, de uso comum ou
particular, tornando-a imprópria para consumo ou nociva à saúde]

Há forma culposa. Corromper é alterar, adulterar a composição da água. Poluir é sujar.


Água dever ser destinada ao consumo de um número indeterminado de pessoas. Crime de
perigo abstrato. Crime consuma-se com a corrupção ou poluição. Admite tentativa.

6) Falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de substância ou produtos alimentícios:


[Art. 272 - Corromper, adulterar, falsificar ou alterar substância ou produto alimentício
destinado a consumo, tornando-o nociva à saúde ou reduzindo-lhe o valor nutritivo]

Incorre nas penas deste artigo quem fabrica, vende, expõe à venda, importa. Inclui bebidas,
com ou sem teor alcoólico. Há forma culposa.

7) Falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos


ou medicinais: [Art. 273 - Falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a
fins terapêuticos ou medicinais: Pena - reclusão, de 10 (dez) a 15 (quinze) anos, e multa.
Nas mesmas penas incorre quem importa, vende, expõe à venda, tem em depósito para
vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo o produto falsificado,
corrompido, adulterado ou alterado. Incluem-se entre os produtos a que se refere este artigo
os medicamentos, as matérias-primas, os insumos farmacêuticos, os cosméticos, os
saneantes e os de uso em diagnóstico. Está sujeito às penas deste artigo quem pratica as
ações previstas no § 1º em relação a produtos em qualquer das seguintes condições: sem
registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente; em desacordo com a
fórmula constante do registro previsto no inciso anterior; sem as características de
identidade e qualidade admitidas para a sua comercialização; com redução de seu valor
terapêutico ou de sua atividade; de procedência ignorada; adquiridos de estabelecimento
sem licença da autoridade sanitária competente]

Há forma culposa.

Jurisprudência atualizada sobre o art. 273:

- STJ RHC 25572 / SP: é cediço que o verbo "importar", constante do tipo penal em
questão, significa trazer do exterior, ou seja, fazer ingressar no Brasil produtos destinados a
fins terapêuticos ou medicinais falsificados, corrompidos, adulterados, alterados ou sem
registro, sendo que, no caso dos autos, de acordo com a denúncia e o próprio interrogatório
judicial prestado pelo acusado, os remédios foram comprados de um desconhecido em Foz
do Iguaçu, no Paraná, ou seja, foram adquiridos dentro do território nacional, pelo que se
mostra totalmente impertinente a acusação formulada pelo Parquet. Por outro lado, é certo
que as ações de adquirir e transportar os fármacos falsificados e sem registro não estão
abrangidas pela figura típica em comento, que pune, unicamente, quem importa, vende,
expõe à venda, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma,distribui ou entrega a
consumo o produto falsificado, corrompido ou alterado, tal como asseverado
alhures.Constata-se, portanto, que a conduta atribuída ao paciente não se adéqua a nenhuma
das ações abstratamente elencadas pelo legislador ordinário como caracterizadoras do delito
de falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos

621
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ou medicinais, ou equiparados. Recurso provido para trancar a ação penal instaurada contra
o recorrente.

- STJ: se o remédio é proibido no Brasil e foi importado (demonstrada a internacionalidade


no caso concreto), é crime do art. 273, de competência da JF. Ex: Foi apreendido cytotec
com indícios de importação pelo agente: É da competência da Justiça Federal a apuração do
crime de incolumidade pública (art. 273 do CP) quando caracterizada a procedência
internacional do medicamento. In casu, a denunciada foi detida com medicamento de
origem estrangeira irregular – cytotec 200 mcg – guardado em sua bolsa durante viagem de
Foz do Iguaçu-PR a Araraquara-SP. A produção do medicamento se deu na Itália e sua
aquisição provavelmente se deu no Paraguai. A Seção ratificou o entendimento de que,
apurada a importação de medicamentos proibidos, revela-se a existência de lesão a bens,
interesses ou serviços da União, porquanto presentes indícios de que o acusado é o
responsável pelo ingresso do produto em território nacional, o que configura a
internacionalidade da conduta. Precedentes citados: CC 85.634-SP, DJe 18/12/2008, e CC
95.721-SP, DJe 30/9/2010. CC 116.037-SP, Rel. Min. Gilson Dipp, julgado em 9/11/2011.

- STJ e Anabolizante (suposta sem registro no exterior, proibido no exterior ou de


procedência ignorada): crime do art. 273. Será justiça estadual se não houver prova da
internacionalidade, não se presumindo a ciência de que era internacional. No caso, já estava
a venda em estabelecimento comercial. STJ CC 110.497-SP, Rel. Min. Maria Thereza de
Assis Moura, julgado em 23/3/2011.

- STJ: HC 217944 / DF, 18/10/2012: dispensável a perícia nos medicamentos. Tribunal


de origem, ao julgar a apelação do corréu, entendeu que para configurar-se a conduta
tipificada no art. 273, § 1º-B, do Código Penal, faz-se necessária a demonstração de que os
produtos em depósito tinham fins terapêuticos ou medicinais, o que não teria ocorrido na
espécie, visto que os medicamentos apreendidos, na ocasião do flagrante, não foram
periciados. Cumpre registrar que Quinta Turma desta Corte de Justiça vem se decidindo no
sentido de que, para a configuração do tipo penal em questão, basta a ausência de
autorização legal para a comercialização do produto, sendo prescindível a perícia técnica
para atestar se a substância seria capaz de produzir danos à vida ou à saúde humana.

- Obs: o TRF da 4ª é o principal julgador do crime do art. 273, mas nem sempre sua
jurisprudência é a mesma do STJ (ex: STJ aceita a pena do art. 273, não permitindo adoção
de pena de outro crime). TRF da 4ª (09/01/2013) ACR 000684-59.2009.404.7016: há o
crime do art. 273: importação e comercialização de medicamentos desprovidos de regular
documentação da ANVISA, se não for para consumo próprio. A pena do art. 273 é
desproporcional e permite ajuste principiológico da norma, aplicando analogia in bonam
partem para adotar a pena da 11.343/06 (mesmo bem jurídico). As consequências do delito
devem ser valoradas negativamente tendo em vista a quantidade grande de medicamento e
a natureza das substâncias. É cabível a aplicação da majorante do art. 40, I da Lei 11.343/06
(transnacionalidade), bem como a causa de diminuição do art. 33, parág. 4º. A introdução
clandestina no Brasil de produto de origem estrangeira destinado a fins terapêuticos ou
medicinais somente é crime hediondo quando o medicamento é falsificado, corrompido,
adulterado ou alterado. Cabe substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direito (art. 44 do CP). Mas 5ª T do STJ (02/12/2012 REsp 1050890 / PR) não aceitou a
622
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

adoção de preceito secundário (pena abstrata) de outro tipo: Não é dado ao juiz, em razão
do princípio da proporcionalidade, aplicar ao réu condenado a determinado tipo penal
sanção diversa daquela legalmente prevista (preceito secundário da norma). 2. In casu, a
aplicação, pelo Juiz sentenciante, da reprimenda prevista para o delito de contrabando (art.
334, caput, do CP) ao réu condenado pelo crime tipificado art. 273, § 1º-B, incs. I, V e VI,
do CP) foi incorreta, do mesmo modo a aplicação da pena do tráfico de drogas realizado
pelo Tribunal a quo. Mais TRF da 4ª (14/12/2012 ACR 5006391-28.2010.404.7002): se a
quantidade for pequena e não houver adulteração, corrupção, alteração, não há crime contra
a saúde pública, mas mero contrabando. Na importação de pequenas quantidades de
medicamentos, ainda que de uso controlado, porém, sem especial potencial lesivo à saúde
pública, incide a norma geral de punição do contrabando. TRF da 4ª (12/12/2012 - ACR
5000615-41.2010.404.7004): importação irregular de cytotec é crime do art. 273, e não
334. TRF da 4ª (12/12/2012 – Recurso Criminal em Sentido Estrito 5011311-
74.2012+404.7002): A importação irregular de grande quantidade de medicamentos de
origem estrangeira sem registro no órgão de vigilância sanitária, com princípio ativo sujeito
a controle especial, amolda-se, em tese, à conduta prevista no artigo 273 do Código
Penal.Não havendo prova de que os medicamentos se destinassem ao uso próprio do
agente, não é cabível a desclassificação do fato para o contrabando, antes da instrução do
feito. Quando a conduta perpetrada vincula-se à importação de medicamentos
"clandestinos" em pequena quantidade, esta, em princípio, enquadra-se no tipo penal
insculpido no artigo 334 do Código Penal, na modalidade de contrabando, não incidindo,
por conseguinte, o artigo 273, §§1° e l°-B, do Estatuto Repressor, em observância aos
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Quem introduz clandestinamente em
solo nacional, com finalidade comercial, quantidade elevada de medicamentosde origem
estrangeira destinado a fins terapêuticos ou medicinais, sem registro no Órgão de Vigilância
Sanitária competente, pratica o delito capitulado no art. 273, § 1º-B, incisos I e V, do CP,
não sendo cabível a desclassificação para o delito do art. 334 do CP. Se a apreensão dos
remédios pela autoridade policial ocorre na zona primária alfandegária (Ponte Internacional
da Amizade), não se consumando a importação por fato alheio à vontade do agente, trata-se
de crime tentado (art. 14 do CP).2. Para a configuração do erro de tipo, é necessário que o
agente tenha uma falsa percepção da realidade, o que não ocorreu no caso dos autos. Uma
vez comprovada a intenção livre e deliberada do réu de importar remédio de procedência
estrangeira e sem registro na Anvisa, não há falar em desclassificação da conduta para a
figura culposa do art. 273, § 2º, do CP. 3. Em que pese não haja inconstitucionalidade nas
penas fixadas ao delito do artigo 273 do Estatuto Repressivo, estas se mostram
desproporcionais à repressão da conduta sob análise, motivo pelo qual cabível o
apenamento aplicado ao crime de tráfico de entorpecentes. 4. A fixação das penas, em
hipóteses como a dos autos, deve levar em consideração também a aplicação das causas de
aumento e diminuição de pena previstas ao delito de tráfico de drogas (Lei nº 11.343/06).
Cabível a aplicação da majorante do art. 40, inciso I, da Lei nº 11.343/06, haja vista a
manifesta internacionalidade do delito. 5. O critério a nortear a atividade do julgador na
determinação do patamar de redução de pena a ser aplicado em face do reconhecimento do
crime tentado é o iter criminis percorrido pelo agente. Se os atos executórios voltados à
importação dos medicamentos foram interrompidos pela diligente fiscalização dos policiais
rodoviários federais na aduana brasileira, a mitigação da sanção deve ser feita na maior
fração prevista no parágrafo único do artigo 14 do CP. TRF da 4ª (14/12/2012 – Recurso

623
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Criminal em Sentido Estrito 5010350-36.2012.404.7002): o delito do art. 273, 1º, 1º A e 1º


B, I, é tipo especial em relação aos delitos do 334 e possui como objeto jurídico a saúde
pública, cuja competência legislativa e material é concorrentes, ou seja, de responsabilidade
de todos os três entes da Federação. Tratando de medicamentos adquiridos no Brasil,
ausentes indícios da internacionalidade da conduta, afastada está a competência da Justiça
Federal. TRF da 4ª (10/01/2013 – ACR 0002852-13.2008.404.7002): A forma equiparada
ao artigo 273 do Código Penal, é de ação múltipla ou de conteúdo variado, bastando a
realização de apenas um dos verbos nucleares para a sua caracterização. A introdução
clandestina em território nacional de produto destinado a fins medicinais sem registro no
órgão competente configura o delito capitulado no art. 273, §1º-B, I, sendo irrelevante a
destinação a ser conferida aos medicamentos. Em tais casos, a conduta enseja a dosimetria
nos parâmetros da Lei de Tóxicos vigente ao tempo do fato. Precedentes deste Tribunal.
Considerando que o flagrante ocorreu por fiscalização aduaneira na Ponte Internacional da
Amizade, deve ser reconhecido o delito tentado, à luz do disposto no art. 14, II, do Código
Penal

8) Medicamento em desacordo com receita médica: [Art. 280 - Fornecer substância


medicinal em desacordo com receita médica]

Há forma culposa. Sujeito ativo: quem fornece medicamento. Na maioria das vezes será o
farmacêutico ou funcionário de farmácias, drogarias. Não é elementar do tipo o ânimo de
lucro. O desacordo com a receita pode ser em relação à quantidade, qualidade ou natureza
do produto. É elementar do tipo a receita médica. Logo, recitas de terapeuta, dentista,
psicólogo não aproveitam. Consumação: com a tradição. Admite-se tentativa.

9) Exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica: [Art. 282 - Exercer, ainda
que a título gratuito, a profissão de médico, dentista ou farmacêutico, sem autorização legal
ou excedendo-lhe os limites. Se o crime é praticado com o fim de lucro, aplica-se também
multa]

São duas as condutas: 1ª) Exercer sem autorização legal (gratuitamente ou não). 2ª)
Exceder os limites da autorização. Logo, aqui é crime próprio.

Exercício irregular de outras profissões: art. 47 da Lei de Contravenções. Crime habitual:


exige-se reiteração de atos. Consumação: com a habitualidade.

10) Charlatanismo: [Art. 283 - Inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível: o
Charlatão sabe que sua cura é falsa].

É diferente do curandeirismo, pois curandeirismo não emprega meio secreto ou infalível. O


agente charlatão aconselha, recomenda, propõe, anuncia, divulga uma cura. E essa cura,
pelo que demonstra o criminoso, é secreta ou infalível. Meio secreto: o agente do delito
afirma que só ele conhece os meios de cura. Meio infalível: afirma que o meio, embora
possa ser conhecido de outros, é infalível. Não é crime habitual. Se houver fim lucrativo,
será o crime de estelionato (absorvendo-se o 283).

11) Curandeirismo: [Art. 284 - Exercer o curandeirismo: prescrevendo, ministrando ou

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

aplicando, habitualmente, qualquer substância; usando gestos, palavras ou qualquer outro


meio; fazendo diagnósticos. Se o crime é praticado mediante remuneração, o agente fica
também sujeito à multa].

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Crimes relacionados à remoção e transplante de órgãos


Principais textos consultados: Santo Graal 27º. Questões da EMAGIS.

Legislação: Lei 9434/97

Os crimes relacionados à remoção e ao transplante de órgãos estão contidos nos artigos da


Lei 9434/97.

A polícia federal entende que o tráfico de órgãos é o terceiro crime organizado mais
lucrativo no mundo. Só perde para o de drogas e o de armas.

Estima-se que de 15 mil a 20 mil rins sejam vendidos ilegalmente em todo o mundo por
ano, segundo a Organs Watch, um grupo de direitos humanos em Berkeley, Califórnia, que
acompanha o comércio ilegal de órgãos. A Organização Mundial da Saúde estima que
apenas 10% das necessidades globais para transplantes de órgãos estão sendo supridas.

É um crime de grande dificuldade de enfrentamento, tendo em vista a transnacionalidade de


sua execução, pois a pessoa que vende o órgão é levada para um terceiro país para a
retirada do órgão.

Segundo dados da OMS, a cada ano, no mundo, são executados cerca de 22 mil
transplantes de fígado, 66 mil transplantes de rim e 6 mil transplantes de coração. Cerca de
5% dos órgãos utilizados nessas intervenções provêm do mercado negro, com um volume
de negócios estimado entre 600 milhões e 1,2 bilhão de dólares.

A maior parte dos órgãos vendidos espontaneamente por doadores no mercado negro é
constituída de rins: A extração e implantação desse órgão não exige operações
particularmente complexas e não necessita de equipamentos sofisticados nem de
competência de altíssimo nível.

Os principais exportadores desse "produto" são a Índia e o Paquistão onde, segundo a


OMS, a cada ano pelo menos duas mil pessoas vendem os próprios órgãos a intermediários
inescrupulosos. Nesses países, nos últimos anos, foram criadas organizações especializadas
no turismo dos transplantes. Elas se encarregam de por em contato o doador e o comprador
e organizam as intervenções em hospitais e clínicas complacentes localizadas em países do
Extremo Oriente e outros situados no Hemisfério Sul. Os preços? Variam muito segundo a
procedência: de 20 mil dólares por um rim indiano a 160 mil por um rim proveniente de
Israel. Ao doador é dada apenas uma migalha: em média, não mais de 1.000 dólares.

Disposições gerais:

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Algumas das condições para a doação são: (i) gratuidade da disposição – art. 10; (ii)
exames prévios do doador – art. 2º, p. u.; (iii) realização por equipe médica autorizada pelo
SUS – art. 2º.

No caso de doador vivo, também deve: (i) capacidade jurídica do doador – art. 9º; (ii)
receptor cônjuge ou parente sanguíneo até o 4º grau, sendo que outras hipóteses somente
com autorização judicial – art. 9º; (iii) unidade de órgão duplo, ou partes que não impeçam
a vida do doador nem risco para sua integridade, nem grave comprometimento de suas
aptidões físicas ou mentais nem cause mutilação ou deformação inaceitável – art. 9º, p. 3º
(ex. fígado); e (iv) prova de necessidade indispensável do receptor – art. 9º, p. 3º.

No caso de doador morto, os requisitos são: (i) diagnóstico prévio de morte encefálica de
dois médicos distintos do que vai realizar a cirurgia – art. 3º; (ii) autorização do cônjuge
ou parente em linha reta ou colateral até o 2º grau – art. 4º; e (iii) recomposição condigna
do cadáver – art. 8º.

A Lei proíbe: (i) publicidade de estabelecimento autorizado; (ii) apelo público para
doação; (iii) apelo público para arrecadação de fundos.

Crimes em espécie:

Art. 14. Remover tecidos, órgãos ou partes do corpo de pessoa ou cadáver, em


desacordo com as disposições desta Lei: Pena - reclusão, de dois a seis anos, e
multa, de 100 a 360 dias-multa.

É importante ressaltar que o crime também pode ser cometido em cadáveres. Observe essa
notícia de 06/06/2014 sobre investigação do MP-SP sobre o tráfico de órgãos de pessoas
que já morreram:

O Ministério Público Estadual de São Paulo (MP-SP) investiga a suposta


comercialização ilegal de órgãos pelo Serviço de Verificação de Óbito da
capital (SVO), órgão vinculado à Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo (USP) responsável por necropsias em casos de morte natural. A
suspeita surgiu a partir de investigação da promotora Eliana Vendramini, do
Programa de Localização e Identificação de Desaparecidos, que apontou que o
SVO classificou como indigentes milhares de mortos que tinham identificação.
A informação foi revelada nesta sexta-feira (6) no site da BBC Brasil. A
estimativa da Promotoria é de que mais de 3 mil pessoas tenham sido enterradas
dessa forma na capital paulista nos últimos 15 anos, sem que o SVO tenha
tentado contato com as famílias dos mortos. Durante esse processo de
investigação, iniciado no fim do ano passado, surgiu a suspeita de que os
cadáveres enterrados incorretamente como indigentes teriam seus órgãos e
tecidos retirados para serem vendidos ilegalmente para hospitais e institutos de
pesquisa que dependem de partes do corpo humano para a realização de
estudos. O caso, então, foi repassado para o Grupo de Atuação Especial de

627
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) do MP-SP, que instaurou inquérito


criminal para apurar a eventual comercialização desses órgãos. De acordo com
a assessoria de imprensa do MP, o procedimento tramita em sigilo e, por isso,
detalhes sobre a investigação não podem ser divulgados. O órgão afirmou
apenas que ainda não se sabe a identificação dos autores das supostas infrações.
A reportagem apurou que a venda de partes do corpo humano pelo SVO foi
confirmada por testemunhas ouvidas pelos promotores do Gaeco. Procurada, a
direção do Serviço de Verificação de Óbito afirmou que não foi notificada
oficialmente pelo Ministério Público a respeito dessa investigação específica.
"Sem essa notificação e o teor dessa investigação, a direção do serviço não tem
condições de se pronunciar", disse o órgão, em nota. A Lei federal 8.501, de
novembro de 1992, prevê que apenas corpos não reclamados podem ser usados
para fins de estudos ou pesquisas científicas. Mesmo assim, nem os corpos nem
partes deles podem ser comercializados.

§ 1.º Se o crime é cometido mediante paga ou promessa de recompensa ou por


outro motivo torpe:
Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa, de 100 a 150 dias-multa.
§ 2.º Se o crime é praticado em pessoa viva, e resulta para o ofendido:
I - incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias;
II - perigo de vida;
III - debilidade permanente de membro, sentido ou função;
IV - aceleração de parto:
Pena - reclusão, de três a dez anos, e multa, de 100 a 200 dias-multa.
§ 3.º Se o crime é praticado em pessoa viva e resulta para o ofendido:
I - Incapacidade para o trabalho;
II - Enfermidade incurável ;
III - perda ou inutilização de membro, sentido ou função;
IV - deformidade permanente;
V - aborto:
Pena - reclusão, de quatro a doze anos, e multa, de 150 a 300 dias-multa.
Os parágrafos § 2º e 3º do dispositivo diz: “se o crime é praticado contra pessoa viva e
resulta” e depois o legislador copiou e colou os §§ 1º e 2º do art. 129 do CP. O que
diferencia é justamente a finalidade do crime.

§ 4.º Se o crime é praticado em pessoa viva e resulta morte:


Pena - reclusão, de oito a vinte anos, e multa de 200 a 360 dias-multa.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Art. 15. Comprar ou vender tecidos, órgãos ou partes do corpo humano:


Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa, de 200 a 360 dias-multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem promove, intermedeia, facilita
ou aufere qualquer vantagem com a transação.
A finalidade é coibir o tráfico, seja nacional ou internacional, de órgãos, atividade bastante
lucrativa e que possui infraestrutura de elevada sofisticação, contando com representantes
de localidades várias e incluindo médicos, tendo em vista a necessidade de conhecimentos
técnicos para a prática de crimes.

Veja indiciamento em 2014: Dois dias após o TJ-MG (Tribunal de Justiça de Minas Gerais)
ter reformado sentença do juiz da Vara Criminal de Poços de Caldas (a 344 Km de Belo
Horizonte), Narciso Alvarenga Monteiro de Castro, reduzindo a pena de quatro médicos
envolvidos na venda ilegal de órgãos e tecidos humanos para transplantes na cidade, o
magistrado indiciou neste quinta-feira (27/02/2014)) mais nove anestesistas,
neurocirurgiões e clínicos gerais envolvidos no esquema. Esses profissionais são acusados
de retirar órgãos e tecidos humanos sem autorização e por dois homicídios qualificados. O
atendimento médico às vítimas era negligenciado, causando-lhe a morte, para que os
médicos retirassem e vendessem seus órgãos e tecidos para realização de transplantes na
cidade, feitos por eles mesmos.

Famoso caso de esquema irregular de transplantes e vendas de órgãos e tecidos aconteceu


em Poços de Caldas, no início da década de 2000, do garoto Paulo Pavesi, 10 anos. Ele
passou por procedimentos inadequados e teve os seus órgãos removidos, quando ainda
estava vivo, para posterior transplante, por meio de diagnóstico forjado de morte encefálica.

Não interessa se foi obtido legal ou ilegalmente.

Quanto à compra efetuada por parentes de pessoas em estado terminal e que só poderão
salvar-se com o devido transplante, apesar de continuar a ser uma conduta reprovável, não
se pode deixar de levar em conta os motivos que determinaram tal ação quando da fixação
da pena base pelos critérios do Art. 59, CP

Art. 16. Realizar transplante ou enxerto utilizando tecidos, órgãos ou partes do


corpo humano de que se tem ciência terem sido obtidos em desacordo com os
dispositivos desta Lei:
Pena - reclusão, de um a seis anos, e multa, de 150 a 300 dias-multa.
Art. 17. Recolher, transportar, guardar ou distribuir partes do corpo humano de
que se tem ciência terem sido obtidos em desacordo com os dispositivos desta
Lei:
Pena - reclusão, de seis meses a dois anos, e multa, de 100 a 250 dias-multa.
Art. 18. Realizar transplante ou enxerto em desacordo com o disposto no art. 10
desta Lei e seu parágrafo único:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Art. 19. Deixar de recompor cadáver, devolvendo-lhe aspecto condigno, para


sepultamento ou deixar de entregar ou retardar sua entrega aos familiares ou
interessados:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
O objeto jurídico de tal artigo é o sentimento de respeito aos mortos, seja por meio de seu
aspecto físico, seja por seus familiares, que objetivam ter o cadáver de entes queridos
próximos de si para as últimas despedidas e realização das cerimônias religiosas
competentes. Há proximidade entre a tipicidade objetiva aqui de tal crime e a dos crimes
previstos no Capítulo II, do Título V, da Parte Especial do Código Penal.

Art. 20. Publicar anúncio ou apelo público em desacordo com o disposto no art.
11:
Pena - multa, de 100 a 200 dias-multa.
As campanhas que são feitas em sinal de trânsito, internet, televisão, etc. pedindo a doação
ou uma ajuda financeira para o transplante, em tese, os agentes estariam enquadrados nesse
crime do art. 20 (ver art. 11, “b” e “c” L. 9437/97). A lei proíbe essa prática porque, sua
intenção, é de que o Estado, uma vez organizado, atenderá aos casos de transplantes. Isso é
para não criar desigualdade de tratamento. Não configuraria crime se a pessoa já estivesse
morrendo, precisando urgentemente do transplante.

Competência: não é necessariamente da JF, podendo sê-la, por exemplo, nos casos de
tráfico internacional de órgãos (ver julgado do TRF5 transcrito). Ver ainda os seguintes
julgados do STJ:

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL


DE ÓRGÃOS HUMANOS E FORMAÇÃO DE QUADRILHA.
INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. ALEGAÇÃO JÁ APRECIADA
E AFASTADA POR ESTA CORTE, POR OCASIÃO DA APRECIAÇÃO DO
HC Nº 34.614/PE, IMPETRADO EM FAVOR DE CO-RÉU. DEMAIS
ALEGAÇÕES DA IMPETRAÇÃO QUE NÃO FORAM ANALISADAS NO
ACÓRDÃO HOSTILIZADO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. 1. A alegação
de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, já foi
apreciada e afastada, de forma unânime, por esta Corte, por ocasião da análise
do HC n.º 34.614/PE, impetrado em favor do co-réu Eliezer Ramon, razão pela
qual adoto os mesmos fundamentos utilizados no referido habeas corpus, para
denegar a impetração nessa parte. 2. Compete à Justiça Federal julgar os crimes
"previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução
no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou
reciprocamente." (Constituição Federal, artigo 109, inciso V). 3. Na hipótese,
os fatos tidos por delituosos se iniciavam no Brasil, com os procedimentos
relacionados ao recrutamento e seleção dos doadores, bem como a realização
dos exames preliminares, enquanto que o resultado deveria ocorrer na África do
Sul, onde seriam realizados os exames complementares e a realização da

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

extração dos órgãos humanos. Em sendo assim, resta evidenciada a


competência da Justiça Federal para o processamento e julgamento da causa em
questão. 4. As questões referentes à ilicitude das provas produzidas, à apreensão
de documentos com violação de domicílio e uso indevido de provas
emprestadas, não foram objeto de análise no acórdão ora hostilizado, razão pela
qual não há como serem conhecidas, diante da flagrante incompetência desta
Corte Superior Tribunal de Justiça para apreciar originariamente a matéria, sob
pena de supressão de instância. Precedente desta Corte. 5. Habeas corpus
conhecido parcialmente e, na parte conhecida, denegada a ordem. (HC
58.120/PE, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em
27/03/2008, DJe 22/04/2008)

Remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano. Sistema Nacional de


Transplante. Lei nº 9.434/97. Decreto nº 2.268/97. Competência
federal/estadual. 1. O sistema organizado pelo Decreto nº 2.268/97, ao dispor
que o Ministério da Saúde exercerá as funções de órgão central, não remeteu à
Justiça Federal toda a competência para as questões penais daí oriundas. 2. No
caso, a remoção dos órgãos ou partes do cadáver foi consequência da ação de
homicídio, essa a ação principal. A precedência do homicídio para a remoção de
órgãos ou partes de cadáver, portanto, foi a mais ampla possível tanto em
relação à censurabilidade das condutas quanto no que diz respeito à ordem
natural dos acontecimentos. 3. Sendo, pois, hipótese de homicídio, o caso é de
competência estadual. 4. Conflito do qual se conheceu, declarando-se
competente o suscitante. (CC 200900327852, CC - CONFLITO DE
COMPETENCIA – 103599, Relator(a) NILSON NAVES, Órgão julgador:
TERCEIRA SEÇÃO, Fonte: DJE DATA:22/10/2009 ..DTPB: STJ)

Julgado interessante: este julgado é bastante interessante, especialmente o que foi


sublinhado:

CONSTITUCIONAL. PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO


CRIMINAL. TRÁFICO DE ÓRGÃOS HUMANOS (RINS) NA
MODALIDADE PROMOVER, INTERMEDIAR, FACILITAR E AUFERIR
VANTAGEM COM A TRANSAÇÃO. FORMAÇÃO DE QUADRILHA E
CRIME CONTINUADO. CRIMES PREVISTOS NOS ARTIGOS 15 DA LEI
Nº 9.434/97 C/C 288 E 71 DO CPB. PRELIMINARES: DE
INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA O PROCESSAMENTO
E JULGAMENTO DO FEITO; CERCEAMENTO DE DEFESA POR
SUSPOSTA OFENSA AO CONTRADITÓRIO EM FACE DO
DESMEMBRAMENTO DO FEITO (ARTIGO 80 DO CPP) E DE
ATIPICIDADE DA CONDUTA E DE INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO
ACOLHIMENTO DAS PRELIMINARES. AUTORIA E MATERIALIDADE
COMPROVADAS. CONFISSÃO. PROVA TESTEMUNHAL. PROVAS EM
CONSONÂNCIA COM O CONTRADITÓRIO E A AMPLA DEFESA.
CONFIRMAÇÃO DO DECISUM SINGULAR [CONDENAÇÃO PELO
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

ARTIGO 15 DA LEI Nº 9.434/97 (COMERCIALIZAR ÓRGÃOS) C/C


ARTIGO 288 E 71 DO CPB E ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO AO CRIME
PREVISTO NO ARTIGO 16 DA LEI Nº 9.437/97
(REALIZARTRANSPLANTE - POST FACTUM IMPUNÍVEL]. CONCURSO
MATERIAL ENTRE OS CRIMES DO ARTIGO 15 E 16 DA LEI Nº 9437/97.
AUSÊNCIA. CONTINUIDADE DELITIVA. EXISTÊNCIA. VÁRIOS
CRIMES DA MESMA ESPÉCIE EM CIRCUNSTÂNCIAS SEMELHANTES.
EXACERBAÇÃO DAS PENAS COMINADAS. INEXISTÊNCIA. RÉUS
PRIMÁRIOS DETENTORES DE BONS ANTECEDENTES. DOSIMETRIA
DA PENA. GRAU DE REPROVABILIDADE DA CONDUTA DE CADA
RÉU. OBSERVÂNCIA DOS ARTIGOS 59 E 68 DO CPB. RAZOABILIDADE
E PROPORCIONALIDADE DAS PENAS IN CONCRETO ( PRIVATIVA DE
LIBERDADE E MULTA). CONFIRMAÇÃO DO DECRETO
CONDENATÓRIO SINGULAR. PRISÃO PREVENTIVA. CONVALIDADA
EM PRISÃO AD PENAM. INCIDENTES RELATIVOS AO CUMPRIMENTO
DAS PENAS. MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DA EXECUÇÃO PENAL. 1. In
casu, conforme noticia a denúncia, o esquema do tráfico de órgãos tinha início
no Brasil e findava no exterior, exsurgindo, assim, a competência da Justiça
Federal para processar e julgar crimes em tais hipóteses, pois na dicção do
artigo 109, inciso V da CF/88 compete ao juízes federais processar e julgar os
crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a
execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou
reciprocamente. 2. O artigo 189 do CPP preceitua: 'se houver co-réus, cada um
deles será interrogado separadamente". Tal comando visa impedir que cada um
dos acusados se beneficie das respostas dadas pelo réu que o antecedeu, ou seja,
impedir a ciência pelo co-réu do depoimento do outro acusado - é o interesse do
Estado-acusador em tal preceito. 3. Por seu turno, o artigo 80 do CPP permite
ao juiz separar/desmembrar o feito penal por qualquer motivo relevante, em
benefício dos acusados ou a da própria administração da justiça - é um juízo de
conveniência facultado ao juiz pela lei. 4. A juíza singular, ao desmembrar o
processo, separando entre os réus que compunham a quadrilha internacional
organizada com o fim de exercer o tráfico de órgão, daqueles réus que foram
aliciados a venderem seus rins, atendendo o disposto no artigo 80 do CPP,
autorizou que as provas colhidas num ou noutro processo poderiam ser
colacionadas aos autos do outro, desde que pertinentes aos respectivos réus,
oportunizando, assim, aos réus o direito de oposição, e os mesmos não se
manifestaram. 5. Oportunizado aos réus o direito ao contraditório e, estando o
desmembramento do feito autorizado por força do artigo 80 do CPPB, não há
que se falar em cerceamento de defesa. Ademais, a violação da regra do artigo
80 do CPP geraria uma nulidade relativa, condicionada, pois, a nulidade, para
ser acolhida, à demonstração de prejuízo, que, na hipótese, inexistiu. 6. O
Magistrado ao apreciar a denúncia, deve, nessa medida, estar atento não só para
a presença das condições da ação, como também para o aspecto formal da
petição inicial, cujos requisitos mínimos vêm estabelecidos pelo artigo 41 do
CPP. A errônea classificação do crime na denúncia não acarretará sua rejeição
se os fatos estiverem bem descritos. Como é cediço, o réu se defende dos fatos

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

articulados na denúncia e não da classificação do crime dada pelo Ministério


Público, até por que o Juiz pode dar ao fato definição jurídica diversa (art.
383,CPP). 7. Por outro lado, a denúncia ofertada pelo Ministério Público, com
37 laudas, assinadas por cinco Procuradores da República que atuam no
Ministério Público Federal na cidade do Recife/PE, descreve de forma clara,
individualizada e completa a conduta de cada acusado, bem como define,
dentro da organização criminosa, a função de cada um ('diretor', 'assessor',
'gerente'), bem como a posição ocupada por cada um deles na hierarquia da
quadrilha, preenchendo, assim, todos os pressupostos exigidos pelo artigo 41 do
CPPB. 8. Preliminares Rejeitadas. 9. A preservação da integridade física da
pessoa humana, pela sua importância, está prevista como dever dos Estados na
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, da Revolução
Francesa. 10. Tais bens, integridade física e dignidade, são facetas dos direitos
da personalidade humana - inerentes a esta - e desta forma inalienáveis e
indisponíveis. 11. Em se tratando da Lei nº 9.434/97, que dispõe sobre a
remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e
tratamento, ao definir como crime a conduta de vender órgãos do corpo
humano, visa proteger o bem jurídico violado, na hipótese - a integridade física
e a dignidade do transplantado. 12. Autorizando os Autos a afirmar-se que os
réus, ora apelantes e apelados, promoveram, intermediaram a comercialização
de rins, em associação e, em continuidade delitiva, impõe-se a confirmação da
sentença singular, na parte que condenou os réus como incursos no crime do
artigo 15 da Lei 9434/97, bem como no crime de quadrilha - artigo 288 do CPB
c/c artigo 71 do CPB. 13. Inexistindo prova cabal de qualquer ação ou
participação dos réus no tocante à realização da cirurgia, no exterior, não há
como identificar-se nas condutas a perfeição do tipo definido no artigo 16 da
Lei nº 9434/97, pelo que se confirma a absolvição dos acusados, sob o
fundamento de 'post factum impunível' em relação à conduta de comprar ou
intermediar a compra de órgão humano, afastando-se, de tal sorte, a alegação de
existência do concurso material entre tais crimes, como pretendia a Acusação.
14. Provas em consonância com o contraditório e a ampla defesa, pelo que se
confirma a sentença condenatória, rica na sua fundamentação fática e jurídica,
em todos os seus termos, inclusive no quanto da dosimetria da pena, que, além
de obedecer os comandos legais dos artigos 59 e 68 do CPB, se houve com
razoabilidade e proporcionalidade em face do grau de reprovabilidade da
conduta de cada acusado, não tendo que se falar, na hipótese, em majoração ou
diminuição das penas cominadas, sejam as privativas de liberdade, sejam as
pecuniárias 15. Mantidas as condenações dos réus, após o trânsito em julgado,
não há que se falar em pena ad cautelam e, restando pena a ser cumprida,
qualquer incidente relativa à execução estará adstrita ao juízo da execução
penal, inclusive, pedido de progressão da pena em relação aos réus que tiveram
como regime inicial do cumprimento da pena - o fechado - por disposição
expressa do artigo 10 da Lei nº 9.034/95. 16. Apelações improvidas. TRF5,
ACR 200383000274400, Relator(a): Desembargador Federal Petrucio Ferreira,
Órgão julgador: Segunda Turma, Fonte: DJ - Data::04/09/2006 - Página::684 -
Nº::170

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

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PONTOS EXTRAS:
1. Enunciado nº 47 da 2ª Câmara:

A persecução penal dos crimes sexuais contra vulnerável (capítulo II do título VI da parte
especial do Código Penal), por si só, não é de atribuição do Ministério Público Federal,
salvo se cometidos a bordo de navio ou aeronave, ou incidir em outra hipótese especifica de
competência federal ou tiver conexão com crime federal. Precedentes:
1.15.002.000102/2012-79; 1.34.004.001135/2012-61; 1.34.004.001228/2012-95;
1.34.004.001304/2012-62; 1.34.001.005188/2012-81, entre outros. (061ª Sessão de
Coordenação, 04.03.2013)

2. Sujeitos do crime:

Sujeito ativo: É o ser humano, dotado de compreensão e determinação. Pode ser autor e,
eventualmente, partícipe. Para compreender a figura do autor utiliza-se a teoria de Adolphe
Quetelet, o qual desenvolveu o conceito de homem médio. Assim, o homem médio é uma
criatura imaginária, dotada do padrão de comportamento condizente com o resultado médio
relativo ao que os homens fazem em sociedade.

OBS: Responsabilidade penal da pessoa jurídica: Muito se discute se é possível atribuir


sanções de natureza penal para a pessoa jurídica, por conta de ações ou omissões realizadas
pela pessoa humana que lhe representa e em seu proveito. Não há um consenso acerca
dessa possibilidade, porém o certo é que quem define é o legislador, por razões de política-
criminal. Em linhas gerais, pode-se afirmar que os países que utilizam o modelo common
law permitem essa punição, ao passo que os que utilizam o modelo civil law não admitem.
O Brasil relativizou o princípio da societas delinquere non potest, na medida em que a
Constituição de 1988 previu, nos artigos 173, §5º e 225, §3º a possibilidade das sanções
penais para as pessoas jurídicas. Do mesmo modo, a Lei 9605/98 legislou sobre o assunto,
prevendo a responsabilização administrativa, cível e criminal, em casos em que a infração
seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão
colegiado, no interesse ou benefício da entidade (art. 3º). A Lei 9605/98 foi inspirada no
Código Penal Francês de 1992, trazendo o modelo de imputação subsequente ou imputação
por ricochete, por intermédio da qual para que seja atribuída a responsabilidade penal ao
ente moral, a pessoa física a ela vinculada tenha que ter agido em benefício ou interesse da
pessoa jurídica. No Supremo Tribunal Federal, o pressuposto para a admissibilidade da
responsabilização da pessoa jurídica é que sejam acusadas, também, as pessoas naturais que
tenham atuado em nome e em benefício, direto ou indireto, da pessoa jurídica.

Sujeito Passivo: É o titular do bem jurídico objeto de lesão ou ameaça. O Estado pode ser
vítima, na medida em que possui interesse em manter a ordem jurídica.

Objeto do Crime: É o bem ou interesse protegido pela norma penal incriminadora. É


sinônimo de bem jurídico-penal.

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Objeto Material: É a pessoa ou a coisa sobre a qual incide a conduta delituosa, ou seja, é
para onde converge a ação ou omissão descrita no tipo penal. Por exemplo, o objeto
jurídico é a vida, enquanto que o objeto material é o corpo humano.

3. Classificações do crime:

a) Ilícito penal e ilícito civil: A diferença entre eles está na consequência jurídica. No ilícito
penal ocorre a imposição de pena ou medida de segurança, ao passo que o ilícito civil
acarreta outra penalidade, qual seja, a obrigação de compor o prejuízo, seja pela restituição
ou indenização.

b) Crime ou delito e contravenção penal: Crime ou delito são sinônimos. A diferença entre
crime e contravenção penal é a gravidade e a pena cominada ao fato. Crime ou delito são
infrações penais mais graves, às quais a lei penal comina pena de reclusão ou detenção
isolada, cumulada ou alternada com pena de multa. Já contravenções são as infrações de
menor gravidade ao qual a lei comina pena de prisão simples isolada, cumulada ou
alternada com multa.

c) Crime doloso, culposo ou preterdoloso: Esta classificação leva em conta o aspecto


subjetivo do delito. Doloso é o crime em que o agente quer o resultado (dolo direto) ou
assume o risco de produzi-lo (dolo eventual). O agente atua com consciência e vontade de
praticar o resultado. Crime culposo, por sua vez, é aquele em que o agente atua com
negligência, imprudência ou imperícia. Não há vontade de praticar o resultado, apenas há
violação do dever de cautela, ante a previsibilidade. O crime preterdoloso, em seu turno, é o
que há dolo na conduta inicial e culpa no resultado subsequente. O agente queria um minus,
mas produz um majus.

d) Crime consumado e crime tentado: Aqui importa a existência ou não do delito em sua
inteireza. No crime consumado, há conduta e resultado, todas as elementares. Ao passo que
no tentado, há a conduta, o início da execução, porém o resultado não ocorre por
circunstâncias alheias à vontade do agente.

e) Crime comissivo, omissivo ou comissivo por omissão: Crime comissivo é a realização


positiva de uma conduta, conforme descrito no tipo. Crime omissivo é o crime de inação,
da não realização da conduta determinada no verbo do tipo (por exemplo, a omissão de
socorro). Já o crime comissivo por omissão ou omissivo impróprio é aquele em que o tipo
descreve uma conduta positiva, sendo que o agente o pratica por meio de uma inação. No
caso, o agente é garantidor da não ocorrência do resultado e deveria agir para evita-lo.

f) Crime instantâneo, permanente ou instantâneo de efeitos permanentes: Aqui se cuida da


definição do tempo do crime, com reflexos na irretroatividade da lei penal e início da
contagem da prescrição. No crime instantâneo, a consumação ocorre num único momento,
sem prolongamentos. No crime permanente, ocorre a prolongação da consumação no
tempo, consoante a vontade do agente. No crime instantâneo de efeitos permanentes,
guarda relação com questões processuais penais. Por deixar vestígio, necessitam de exame

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

de corpo de delito. Aqui a perpetuação dos efeitos não dependem da vontade do agente.

g) Crime de dano e crime de perigo (concreto ou abstrato): Crime de dano são os que
causam lesão efetiva ao bem jurídico. Já os crimes de perigo se contentam com a mera
exposição de lesão ao bem jurídico, bastando a mera ameaça para a sua consumação. Os
crimes de perigo dividem-se em perigo concreto, onde se exige a comprovação de que o
bem jurídico foi exposto ao risco de lesão; e os crimes de perigo abstrato, onde a lei
presume, de forma absoluta, o rsico de lesão. Não há que se comprovar o risco.

h) Crime material formal ou de mera conduta: Crime material é crime de conduta e


resultado naturalístico, sendo necessária a investigação se há relação de causalidade ou de
imputação entre conduta e resultado. Crime formal é o que descreve conduta e resultado,
porém não exige a superveniência do resultado, para considerar consumado. Basta
comprovar a pratica da conduta. Por fim, crime de mera conduta é o crime em que o tipo
descreve apenas a conduta, não descrevendo o resultado.

i) Crime unissubjetivo e crime plurissubjetivo: Crime unissubjetivo ou de concurso


eventual é aquele em que o tipo descreve a realização por apenas um sujeito, ainda que
possa, eventualmente, ser praticado por mais de uma pessoa. A maioria dos crimes é
unissubjetivo. Já o crime plurissubjetivo ou de concurso necessário necessita da presença
de mais de uma pessoa. Subdividem-se em crimes de condutas paralelas (motim de presos),
condutas convergentes (bigamia) ou condutas contrapostas (rixa).

j) Crime unissubsistente e crime plurisubsistente: Importa para verificar a admissão da


tentativa e concurso de crimes. Crime unissubsistente se dá num único ato, não admite
fracionamento. Os crimes plurissubsistentes admitem o fracionamento da conduta em
diversos atos.

k) Crime comum, próprio ou de mão própria: Crime comum é o que pode ser praticado por
qualquer pessoa, não há nenhuma condução especial descrita no tipo. Crime próprio é o que
exige uma condição ou qualidade esecial ao sujeito ativo. Pode ser praticado por interposta
pessoa. Crime de mão própria é o que só pode ser praticado pelo autor pessoalmente, não
pode ser praticado por pessoa interposta, ou seja, através de autoria mediata.

4. Transação penal:

Considerações gerais: Na atualidade, fixou-se o entendimento de que a pena de prisão deve


ser adstrita aos casos de evidente necessidade. Dessa forma, foram criadas alternativas para
impedir ou substituir a prisão, bem como abreviar o seu tempo de duração, tais como a
transação penal, a suspensão condicional do processo, a suspensão condicional da pena e o
livramento condicional.

Conceito de transação penal: A Constituição de 1988 previu, em seu art. 98, inc. I, a figura
da transação penal, com o objetivo de conciliar os interesses da Administração da Justiça,
do acusado e do lesado. Rompeu-se com a antiga concepção de que o direito de punir era

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

monopólio estatal, intransigível, inalienável e inegociável, introduzindo-se a ideia de justiça


penal consensual, por meio da qual se tem a faculdade de se transigir com aqueles direitos
tidos como absolutos (ius puniendi e o ius libertatis). A previsão constitucional foi
implementada pela Lei n. 9.099/95, a qual foi influenciada por correntes abolicionistas,
segundo as quais, sempre que possível, deve-se evitar a imposição de pena de prisão
(despenalização), quando não a própria abolição do crime (descriminalização).

Infrações de menor potencial ofensivo: De acordo com o art. 61 da Lei n. 9.099/95:


“Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as
contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois)
anos, cumulada ou não com multa”. Não estão excluídos desse conceito os delitos que se
submetem a procedimento especial.

Conceito de transação penal: Transação penal é o acordo entre o acusador e o imputado


autor da infração penal de menor potencial ofensivo, por meio do qual aquele deixa de
propor ação penal, bem como de perseguir a aplicação da pena de prisão, em troca da
aceitação, por parte deste, do cumprimento imediato de uma pena alternativa, conforme
explicitado na respectiva proposta. Existem vantagens para ambos os lados. Para o
Ministério Público ou o ofendido, nos casos de ação penal privada, a transação penal é
vantajosa na medida em que não fica obrigado a propor ação penal, bem como do ônus
probatório correspondente. Desafoga-se, consequentemente, a Justiça Criminal, permitindo-
se, assim, uma persecução mais racional e célere dos delitos que lesam ou ameaçam bens
jurídicos de maior importância. Para o infrator, o interesse maior está na certeza de que não
irá sofrer a pena de prisão. Há, também, a conveniência da imediata resolução do conflito
em que se envolveu, desobrigando-se do comparecimento aos atos do processo que teria de
responder, bem assim dos custos patrimoniais e morais que teria que arcar em virtude da
deflagração da ação penal e de uma possível sentença condenatória (criminalização
secundária). Para que a transação penal seja aplicada, o autor do fato deve manifestar sua
concordância de forma consciente e voluntária. Não basta que ele subscreva uma
procuração a alguém com poderes para transigir, pois o que está sendo renunciado é uma
parcela da liberdade individual. Ele deve, portanto, estar presente ao ato. Se não puder ser
localizado, a proposta do Ministério Público restará inviabilizada. Nesse sentido, o § 3º, do
art. 76, da Lei n. 9.099/95 determina que a concordância seja tanto do autor como do seu
defensor, além de submetida ao controle jurisdicional na respectiva audiência de
homologação.

Requisitos para a transação penal: a) Prática de infração de menor potencial ofensivo –


contravenções penais e crimes cuja pena privativa de liberdade, abstratamente cominada,
não seja superior a dois anos. b) Autor da infração não tenha sido condenado, pela prática
de crime, à pena de prisão, por sentença definitiva – Em homenagem à presunção de
inocência, o acordo poderá ser feito se não houver sentença definitiva. Na mesma esteira, se
o autor tiver tido a pena anterior substituída por pena alternativa ou tiver-se beneficiado da
suspensão da pena poderá obter a transação penal. Acresça-se, ainda, que a condenação pela
prática de contravenção penal não impede a formulação da transação. c) Agente não tenha
sido beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela aplicação de pena restritiva ou
multa, nos termos da Lei n. 9.099/95 – Cuida-se do único efeito “negativo” do acordo

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

formulado entre as partes, pois a transação penal não gera reincidência nem poderá constar
como registro de maus antecedentes. d) Os antecedentes, a conduta social e a personalidade
do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, indicarem a necessidade e suficiência
da adoção da medida – Assim, poderá o Ministério Público/querelante deixar de formular
ou, caso o faça, poderá o juiz deixar de homologar a transação penal, quando não
recomendarem os quatro fatores anteriormente pormenorizados. É preciso, contudo, que
seja devidamente fundamentado o motivo da recusa. Tem-se, dessa forma, que a proposta
de transação penal não é direito subjetivo do réu/querelado (STJ, HC 147251/BA, AgRg no
REsp 1356229/PR).

Período de prova da transação penal: O período de prova da transação penal importa no


cumprimento da pena restritiva de direitos ou multa, pactuada pelas partes e homologada
judicialmente (art. 76, § 4º, da Lei n. 9.099/95). A pena de multa, homologada, deve ser
paga na Secretaria do Juizado (art. 84 da Lei n. 9.099/95). Devidamente cumpridas as
condições impostas, deverá o juiz declarar extinta a punibilidade do agente, consoante o
disposto no art. 76, § 6º, e art. 84, parágrafo único, da Lei n. 9.099/95.

Descumprimento injustificado e revogação: Iniciado o período de prova, pode ocorrer do


beneficiário não cumpriras condições impostas pela transação penal. Em tal hipótese, deve-
se perquirir o motivo do descumprimento, via de regra por meio de uma audiência especial.
Caso as razões sejam reputadas injustificadas ou, ainda, caso a parte sequer compareça
àquela audiência, a consequência será a revogação da medida. Os efeitos da revogação
dependerão da natureza da pena aplicada na transação penal. A multa, caso não seja paga,
será considerada dívida de valor, aplicando-se-lhe as normas da legislação relativa à dívida
ativa da Fazendo Pública. Entretanto, na hipótese de a transação redundar na obrigação do
cumprimento de pena restritiva de direito, a Lei n. 9.099/95 não disciplinou qual seria a
respectiva consequência jurídica. O STF, em questão de ordem, reconheceu a Repercussão
Geral da matéria e, no mérito, reafirmou a sua jurisprudência no sentido de que, em caso de
descumprimento das medias estabelecidas na transação penal, “deve-se proceder à remessa
dos autos ao Ministério Público a fim do prosseguimento da ação penal” (RE 602.072/RS).
Segundo Gueiros, essa é a solução mais adequada, pois a homologação da transação penal
não faz coisa julgada material e, descumpridas as condições, há de ser retornar ao status
quo ante.

Cumprimento integral e extinção da punibilidade: Homologada a transação penal, inicia-se


o respectivo período de prova. Devidamente cumprida a pena restritiva de direito ou a
multa, há de ser declarada extinta a punibilidade do autor da infração. Cuida-se de uma
causa de extinção de punibilidade não prevista no art. 107 do Código Penal, não gerando
reincidência, maus antecedentes ou obrigação de reparação civil do dano, guardando-se o
registro tão somente para fins de obstar nova transação penal no prazo de cinco anos (art.
76, §§ 4º e 6º, da Lei n. 9.099/95).

5. Suspensão condicional do processo:

Considerações gerais: A suspensão condicional do processo, em que pese ser regulada pelo

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

art. 89 da Lei n. 9.099/95, possui amplitude maior do que a transação penal. Enquanto a
transação penal se limita às infrações de menor potencial ofensivo, a suspensão condicional
do processo pode ser aplicada para todas as infrações penais, desde que se observe o limite
da pena mínima igual ou inferior a um ano. Assim, não se limita ela à competência dos
Juizados Especiais Criminais.

Conceito de suspensão condicional do processo: Suspensão condicional do processo é o


acordo judicial pelo qual a ação penal é paralisada pela aceitação, por parte do acusado, do
cumprimento das condições estipuladas na proposta formulada pelo Ministério Público.
Após o decurso do respectivo período de prova, e devidamente cumpridas as condições, a
suspensão condicional do processo acarreta a extinção da punibilidade do agente. Cuida-se,
portanto, de um instituto de caráter despenalizador, visto que proporciona uma resposta
estatal ao cometimento do delito sem a imposição da pena de prisão, além de objetivar a
reparação da lesão acarretada ao lesado. Alinha-se, assim, à moderna tendência de uma
justiça penal consensual e reparadora.

Pressupostos da suspensão condicional do processo: a) Crime com pena mínima,


abstratamente considerada, igual ou inferior a um ano – Tratando-se de concurso de crimes,
a jurisprudência não admite o deferimento da suspensão condicional do processo nos casos
em que, abstratamente, o cômputo da pena de cada delito, agregado à exasperação mínima
de 1/6, for superior ao patamar ora considerado. Nesse sentido, tem-se a súmula 723 do
STF: “Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado, se a soma
da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de um sexto for superior a
um ano”, bem como a súmula 243 do STJ: “O benefício da suspensão do processo não é
aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal
ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela
incidência da majorante, ultrapassar o limite de um (01) ano”. b) Acusado não esteja sendo
processado por outro crime (processo penal em curso) – Cuida-se de requisito que procura
contrabalancear o caráter liberal da medida com o rigor relacionado com os bons
antecedentes do acusado. Por conta desse mesmo motivo, entende-se que o presente
requisito não ofende o princípio constitucional da presunção de inocência. Todavia, se ele
estiver respondendo a inquérito policial, ou, ainda, se o processo decorrer de contravenção
penal, será possível a obtenção do benefício, visto que o dispositivo alude ao acusado que
“não esteja sendo processado por outro crime”. c) Acusado não tenha sido condenado por
outro crime – O art. 89 da Lei n. 9.099/95 não estabelece lapso de tempo no qual a
condenação anterior surtiria efeitos impeditivos da medida. Parte da doutrina utiliza como
parâmetro a norma que regula os efeitos da reincidência (art. 64, inc. I, do CP). Assim, não
prevaleceria os efeitos da condenação anterior se passados mais de cinco anos da sua
extinção. Entretanto, o STJ não tem acolhido esse entendimento. De acordo com esta Corte,
a suspensão condicional do processo não pode ser concedida àquele que possui condenação
anterior, ainda que a pena tenha sido extinta há mais de cinco anos. Dessa forma, para a
jurisprudência, o Ministério Público pode deixar de formular, ou o juiz deixar de
homologar, o sursis processual, quando o acusado possuir condenações pretéritas, ainda que
superiores ao lapso temporal de cinco anos. d) Acusado atenda aos requisitos do art. 77 do
CP – Dois requisitos do art. 77 do CP são pertinentes: (1) não reincidência em crime
doloso; e (2) culpabilidade, antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

como os motivos e circunstâncias sinalizarem a favor do deferimento da medida. O


requisito contido no inc. III do art. 77 do CP não se mostra adequado, uma vez que a
suspensão condicional do processo se dá no liminar da ação penal.

Não formulação da proposta pelo Ministério Público: O Ministério Público pode deixar de
elaborar a proposta de suspensão condicional do processo, desde que o faça
fundamentadamente. Caso o juiz discorde do entendimento ministerial e diante do princípio
da independência funcional (art. 129 da CF/88), a solução a ser dada é a da aplicação
analógica da regra do art. 28 do CPP, enviando-se os autos ao órgão superior de revisão do
Ministério Público para a reanálise da questão, ratificando a decisão anterior ou designando
outro membro do Parquet para formular a proposta. Nesse sentido, tem-se a súmula 696 do
STF: “Reunidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo,
mas se recusando o Promotor de Justiça a propô-la, o Juiz, dissentindo, remeterá a questão
ao Procurador-Geral, aplicando-se por analogia o art. 28 do Código de Processo Penal”.

Cumprimento das condições e período de prova: As condições dividem-se em legais e


judiciais. a) Condições legais: estão presentes no art. 89, § 1º, da Lei 9.099/95: i.
Reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo; ii. Proibição de frequentar
determinados lugares – Deve preponderar o critério da razoabilidade na fixação dos locais
interditos ao beneficiário da medida. iii. Proibição de se ausentar da comarca onde reside,
sem autorização do Juiz – A prática temperou o rigor legal, passando-se a exigir, nos
Juizados Especiais Criminais, a prévia autorização somente nos casos de viagem para fora
do Estado da Federação ou para o exterior. iv. Comparecimento pessoal e obrigatório a
juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades – Se o objetivo político-
criminal da suspensão do processo é o de estancar os efeitos deletérios do strepilus fori,
exigir-se, em contrapartida, que o beneficiário da medida disponibilize, mensalmente, um
dia útil de trabalho, para comparecer ao fórum e justificar as suas atividades, impediria, na
grande maioria dos casos, a obtenção de ocupação lícita. Assim, na prática, os Juizados
Especiais Criminais têm abrandado o rigor desse requisito, fixando um prazo maior para o
comparecimento judicial, com intervalos de dois ou até três meses. b) Condições judiciais:
o juiz deve impor, além das condições legais acima mencionadas, “outras que lhe pareçam
adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado, desde que respeitados os direitos
individuais” (REsp 799.021). c) Período de prova: O período de prova da suspensão
condicional do processo varia entre dois a quatro anos. Embora não exista nenhuma
determinação legal, na prática, somente razões particulares justificariam a imposição de
período acima do mínimo de dois anos. Saliente-se que, durante o referido lapso de tempo,
ficará suspenso não apenas o processo, mas também a contagem do prazo prescricional (art.
89, § 6º, da Lei n. 9.099/95).

Descumprimento das condições e revogação do benefício: Durante a suspensão, o acusado


deverá atender às condições previstas no acordo. O injustificado descumprimento do que
fora pactuado acarretar-lhe-á consequências negativas, ou seja, a revogação do benefício e
o retorno à regular marcha processual. Nesse sentido, as causas de revogação da suspensão
do processo dividem-se em obrigatórias e facultativas. Segundo o § 3º, do art. 89, da Lei n.
9.099/95, o benefício será revogado se, no curso do prazo, o réu vier a ser processado por
outro delito, independentemente deste ter sido praticado antes ou durante a vigência da

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

suspensão. A segunda causa de revogação obrigatória consiste no descumprimento, sem


justa causa, do dever de reparar o dano. Surge, então, a questão: em que momento a
revogação do benefício deve ser feita? Dispõe o art. 89, § 5º, da Lei n. 9.099/95 que,
expirado o prazo sem revogação, o juiz declarará extinta a punibilidade. Dessa forma,
literalmente, a decisão deveria ser tomada antes de expirado aquele lapso de tempo (decisão
em tempo real). Os autores que se filiam a esse entendimento sustentam que o ônus de
fiscalizar adequadamente o cumprimento de medida recai sobre o aparelho estatal, não se
podendo penalizar o acusado pela incúria alheia, além de gerar uma insegurança jurídica
caso fosse admitida uma hipotética revogação retroativa. Em sentido inverso, argumenta-se
que o atendimento das condições é inerente ao instituto da suspensão condicional do
processo. Desse modo, estando o processo suspenso, o desfecho favorável da medida – isto
é, a extinção da punibilidade do acusado – há de ficar subordinado à constatação de que,
naquele mesmo período, ocorreu, de fato, o cumprimento das condições impostas. Por
conta disso, a “decisão que revoga a suspensão condicional pode ser proferida após o termo
final do seu prazo, embora haja de fundar-se em fatos ocorridos até o termo final dele”
(STF, HC 80.747). Assim, a sentença que declare extinta a punibilidade é o limite máximo
para que haja a revogação do benefício, pois, do contrário, violaria o princípio da coisa
julgada (art. 5º, XXXVI, da CF/88). É este, inclusive, o entendimento predominante nos
tribunais superiores. No STJ, há decisões afirmando que, se o acusado vier a ser processado
por outro crime, a teor do art. 89, § 3º, da Lei n. 9.099/95, impõe-se a revogação da
suspensão condicional do processo, ainda que essa decisão venha a ser proferida após
transcorrido o período de prova, mas desde que não tenha sido proferida sentença extintiva
da punibilidade. Tratando-se, contudo, de descumprimento de condição facultativa (art. 89,
§ 4º, da Lei n. 9.099/95 – “se o acusado vier a ser processado, no curso do prazo, por
contravenção, ou descumprir qualquer outra condição imposta”), a praxe dos Juizados
Especiais sinaliza no sentido de ser designada uma audiência especial para a oitiva do
acusado. Não se costuma, assim, proceder-se a uma revogação automática daquela espécie
de condição, visto ser possível que o benefício tenha tido um justo motivo para não cumprir
o que lhe fora imposto. Ademais, embora injustificado, poderá o juiz optar por não revogar,
mas, sim, prorrogar o prazo, mantendo ou alterando as condições de suspensão.

Cumprimento integral e extinção da punibilidade: O cumprimento integral, sem revogação,


das condições da suspensão condicional do processo acarreta a extinção da punibilidade do
acusado (art. 89, § 5º, da Lei n. 9.099/95). Cuida-se de sentença declaratória de extinção da
punibilidade, baseada em causa não contemplada no rol do art. 107 do CP.

6. Suspensão condicional da pena:

Considerações gerais: A suspensão condicional da pena data do século XIX, tendo sido
originalmente concebida para atender a necessidades de política criminal em relação,
inicialmente, a menores infratores. No Brasil, o instituto surgiu por meio do Decreto nº
16.588/1924, sob a denominação de “condenação condicional”. Aplica-se a condenados que
não haviam revelado traços de “caráter pervertido ou corrompido”. Na realidade, não se
tratava de uma condenação condicional, mas sim de uma condenação cuja execução estava
condicionalmente suspensa. Diante disso, passou a ser identificada com a expressão
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

francesa sursis à l’éxectution de la peine. Mais recentemente, o instituto encontrou guarida


no CP, CPP, Lei de Contravenções Penais, tendo sido reformulado pela Reforma de 1984.
Entretanto, na atualidade, o sursis tem sua aplicabilidade bastante reduzida, pois, conforme
o CP/84,terá lugar quando não for possível fazer a substituição da pena privativa de
liberdade por restrita de direitos, situação hoje excepcional. Remanesce um espaço bem
limitado de aplicação do sursis, como no caso de condenações de penas privativas de
liberdade superiores a 4 anos ou crimes cometidos com violência ou grave ameaça. O
sursis alcança somente as penas privativas de liberdade, não abrangendo pena restritiva de
direito ou multa.

Conceito de suspensão condicional da pena: A suspensão condicional da pena é


determinada pelo juiz, quando da prolação da sentença condenatória. Nesse momento, o
juiz decide se o condenado à pena não superior a 2 anos pode deixar de cumpri-la mediante
a observância de condições fixadas na própria sentença. [Art. 77 - A execução da pena
privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos, poderá ser suspensa, por 2 (dois) a 4
(quatro) anos, desde que: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) : I - o condenado
não seja reincidente em crime doloso; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984); II - a
culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os
motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício;(Redação dada pela Lei nº
7.209, de 11.7.1984); III - Não seja indicada ou cabível a substituição prevista no art. 44
deste Código. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)]. Para a doutrina majoritária,
trata-se de direito público subjetivo de liberdade. Ou seja, se o condenado preencher os
requisitos do art. 77 CP, o juiz estaria vinculado à concessão da suspensão condicional da
pena. Como há requisitos subjetivos, sujeitos à apreciação judicial, os autores preferem
considerar o sursis como alternativa penal.

Espécies de suspensão condicional da pena: Simples (art. 78, p.1º e 79 CP): o condenado,
no primeiro ano da pena, fica sujeito ao dever de prestar serviços comunitários ou
submeter-se a limitação de final de semana. Especial (art. 78, p.2 CP): destinado à
condenado não reincidente em crime doloso, que tenha reparado o dano e cujas
circunstâncias judiciais (art. 59) sejam favoráveis. O condenado fica sujeito às seguintes
condições: a) proibição de freqüentar determinados lugares; (Redação dada pela Lei nº
7.209, de 11.7.1984) b) proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem
autorização do juiz;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) c) comparecimento
pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades.
(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984). Etário ou humanitário (art. 77, p.2º CP): §
2o A execução da pena privativa de liberdade, não superior a quatro anos, poderá ser
suspensa, por quatro a seis anos, desde que o condenado seja maior de setenta anos de
idade, ou razões de saúde justifiquem a suspensão. (Redação dada pela Lei nº 9.714, de
1998). As condições serão as mesmas do sursis simples, mas o prazo da suspensão será
dilatado.

Pressupostos da suspensão condicional da pena (art. 77 CP): Em regra, são extensíveis à


suspensão condicional do processo contemplada pela Lei nº 9099/95. Pena privativa de
liberdade igual ou inferior a 2 anos (para o sursis etário, esse patamar é elevado para 4
anos): O sursis pode ser concedido no caso de concurso material, formal ou crime

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

continuado, mas desde que a soma das penas não ultrapasse o referido limite. Condenado
não reincidente em crime doloso: No caso de a condenação anterior por crime doloso ter
sido imposta no estrangeiro, não é necessária a homologação da sentença estrangeira para
que surta efeito nesse particular. Circunstâncias judiciais favoráveis: culpabilidade, os
antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as
circunstâncias. Não seja indicada ou cabível a substituição da pena privativa de liberdade
por restritiva de direitos: Como a aludida substituição pode ocorrer no caso de crimes cuja
pena não ultrapasse 4 anos, a aplicabilidade do sursis restou bastante mitigada.

Cumprimento das condições de prova: Durante o sursis, não há exatamente uma suspensão
da pena, mas sim a suspensão da pena de prisão, mediante o cumprimento de determinadas
condições, que, em última instância, assemelham-se a penas alternativas. O período de
prova corresponde ao interregno em que o condenado tem a execução da pena privativa de
liberdade suspensa:

Sursis simples e especial: período de prova varia de 2 a 4 anos / Sursis etário: período de
prova varia de 4 a 6 anos.

A fixação do período de prova, se no mínimo ou máximo, permite certa flexibilidade por


parte do juiz, que deve analisar as circunstâncias concretas. Art. 81§ 3º - Quando facultativa
a revogação, o juiz pode, em vez de decretá-la, prorrogar o período de prova até o máximo,
se este não foi o fixado. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984). De acordo com
arts. 158 a 160 LEP, a suspensão condicional da pena tem lugar a partir da audiência
admonitória, realizada após o trânsito em julgado da sentença condenatória. Só então
poderá ser contado o período de prova. Na audiência admonitória, deve o juiz advertir o
condenado sobre as consequências de nova infração ou descumprimento das condições
fixadas, a saber, revogação do sursis e imediata execução da pena privativa de liberdade.

Descumprimento das condições e revogação do sursis: As causas de revogação podem ser


obrigatórias ou facultativas. É obrigatória a revogação nos seguintes casos: Art. 81 - A
suspensão será revogada se, no curso do prazo, o beneficiário: (Redação dada pela Lei nº
7.209, de 11.7.1984). I - é condenado, em sentença irrecorrível, por crime doloso; (Redação
dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984). Basta que a nova condenação transite em julgado no
período de prova, sendo irrelevante se o crime foi praticado antes ou durante esse lapso
temporal. Para a doutrina, se a segunda condenação impuser somente a pena de multa, ela
não terá o condão de revogar o sursis. Isso por força do art. 77 § 1º - A condenação anterior
a pena de multa não impede a concessão do benefício.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984). II - frustra, embora solvente, a execução de pena de multa ou não efetua, sem
motivo justificado, a reparação do dano; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).
Como se sabe, os deveres de quitar a multa e reparar o dano não são suspensos. III -
descumpre a condição do § 1º do art. 78 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984). Refere-se ao descumprimento do dever de prestar serviços à comunidade ou de
se submeter à limitação de final de semana. Essas condições podem ser impostas em todas
as espécies de sursis e durante o primeiro ano de prova. IV – não comparecimento
injustifcado, no prazo de 20 dias, após intimação pessoal ou por edital, à audiência
admonitória. Essa previsão está no art. 161 LEP: Se, intimado pessoalmente ou por edital
com prazo de 20 (vinte) dias, o réu não comparecer injustificadamente à audiência
644
Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

admonitória, a suspensão ficará sem efeito e será executada imediatamente a pena. É


facultativa a revogação nas seguintes hipóteses: Art. 81 § 1º - A suspensão poderá ser
revogada se o condenado descumpre qualquer outra condição imposta ou é
irrecorrivelmente condenado, por crime culposo ou por contravenção, a pena privativa de
liberdade ou restritiva de direitos. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).
Entretanto, a revogação pode ser preterida pela expansão do período de prova. Art. 81 § 3º -
Quando facultativa a revogação, o juiz pode, ao invés de decretá-la, prorrogar o período de
prova até o máximo, se este não foi o fixado. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)

Prorrogação do sursis: Art. 81§ 2º - Se o beneficiário está sendo processado por outro crime
ou contravenção, considera-se prorrogado o prazo da suspensão até o julgamento definitivo.
(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Atenção: não se prorroga o sursis por
instauração de IP ou de investigação conduzida pelo MP, mas sim pela deflagração de
processo penal (denúncia judicialmente recebida – art. 396 CPP).

7. Livramento condicional:

Considerações gerais: O livramento condicional é fruto da racionalização dos sistemas


penitenciários (século XIX), consistindo numa etapa entre o aprisionamento e a plena
liberdade. O livramento condicional orienta-se pelo escopo de ressocialização do preso,
fazendo sobressair, também, um papel de prevenção especial da pena. Há Países que, a
despeito de adotarem pena perpétua, admitem a concessão de livramento condicional,
depois de cumprida determinada parcela da pena. A expectativa da liberdade guarda íntima
relação com a dignidade da pessoa humana (A Corte Europeia de DH decidiu que a
imposição de pena perpétua não se confunde com penas degradantes e desumanas,
justamente porque há a possibilidade de livramento condicional). No Brasil, o instituto foi
pioneiramente previsto no CP/1890, não chegando a ser aplicado sob o argumento de
carência de regulamentação. Atualmente, o livramento condicional é possível para
condenações superiores a 2 anos.

Conceito e natureza jurídica do livramento condicional: O livramento condicional pode ser


compreendido como a liberdade antecipada daquele que cumpriu parte da pena imposta,
mediante a observância de determinadas condições. Visa a verificar a aptidão do condenado
a se reinserir socialmente. O instituto tem particular importância para a execução penal,
sendo considerado majoritariamente como direito subjetivo do apenados, uma vez
cumpridos os requisitos. Para os autores, trata-se de fase executiva da pena. O período de
prova não é fixo, como se passa no sursis, e, durante aquele lapso, a prescrição é suspensa.
De todo o modo, o livramento é considerado como uma alternativa penal.

Pressupostos (art. 83 CP): a) pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos.
As penas de infrações diversas podem ser somadas para fins de livramento (art 84 CP). b)
que tenha cumprido mais de 1/3 da pena se o condenado não for reincidente em crime
doloso e tiver bons antecedentes (chamado livramento especial); c) que o condenado tenha
cumprido mais de ½ da pena se for reincidente em crime doloso, pouco importando se

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

portador de bons ou maus antecedentes (chamado livramento ordinário). Súmula 715 STF:
A pena unificada para atender ao limite de trinta anos de cumprimento, determinado pelo
art. 75 do Código Penal, não é considerada para a concessão de outros benefícios, como o
livramento condicional ou regime mais favorável de execução. d) que tenha cumprido mais
de 2/3, se condenado por crime hediondo ou equiparado, salvo se reincidente específico em
crimes dessa natureza. Quanto à reincidência específica, há duas correntes: i) restritiva
(minoritária) : considera reincidência específica se o mesmo bem jurídico é tutelado ou
incorrência no mesmo tipo penal; ii) ampliativa: reincidência específica dá-se com a prática
de quer dos crimes previstos na Lei nº 8.072/90. Pela jurisprudência, não há diferença
interna entre crimes hediondos e equiparados, para fins de reincidência específica. Ou seja,
há 3 espécies de livramento condicional: i) especial (cumprido 1/3 da pena); ii) ordinário
(cumprida a ½ da pena); iii) extraordinário (cumpridos 2/3 da pena). e) comportamento
satisfatório durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído
e aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto. • Comportamento
satisfatório durante a execução da pena. A LEP foi alterada pela Lei nº 10.792/2003,
passando-se a se exigir do condenado “a ostentação de bom comportamento carcerário”
(art. 112). Faltas disciplinares (art. 49) podem gerar rebaixamento classificatório do
apenado, podendo ser recuperada nota boa ou excelente após o transcurso de determinado
período. O cometimento de falta grave (art. 50) não interrompe o prazo exigido para o
livramento condicional, ante a falta de previsão legal. S. 441 STJ Súmula 441: “A falta
grave não interrompe o prazo para obtenção de livramento condicional”. • Bom
desempenho no trabalho que lhe foi atribuído. O trabalho prisional é um direito e também
um dever do apenado. O problema maior reside na não atribuição de trabalho ao apenado
por parte da administração penitenciária, sendo que o condenado não pode ser prejudicado
por isso. • Aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto. Isso pode
ser aferido, p.ex, pelo bom desempenho em trabalho interno e frequência em cursos
profissionalizantes. f) reparação do dano, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo. A
obrigação de reparar o dano é um dos efeitos extrapenais da condenação. A reparação de
dano causado ao erário é condição para a própria progressão de regime (art. 33, p.4º CP).
Parte da remuneração do trabalho do condenado deve ser revertida para a indenização dos
danos, desde que determinada judicialmente e o dano não tenha sido reparado por outros
meios (art. 29, p.1º, a LEP). g) No caso de condenado por crime doloso, cometido com
violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada
à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a
delinqüir. (art. 83, p.único). Esse requisito é aferido pela submissão a exame criminológico.
Pelo art. 112 LEP, o referido exame não é mais obrigatório para quaisquer incidentes na
execução penal (consequentemente, não é obrigatório para o livramento condicional).

Livramento condicional para preso estrangeiro: No geral, doutrina e jurisprudência são


contrários à concessão de livramento condicional a preso estrangeiros. Para os autores, os
argumentos levantados não são insuperáveis. Além disso, STF tem precedente nos
seguintes termos: “O fato de o condenado por tráfico de droga ser estrangeiro, estar preso,
não ter domicílio no país e ser objeto de processo de expulsão, não constitui óbice à
progressão de regime de cumprimento da pena” (HC 97147).

Unificação de penas e livramento condicional: Pelo art. 84 CP - As penas que

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

correspondem a infrações diversas devem somar-se para efeito do livramento. (Redação


dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984). Compete ao juiz da execução penal unificar as penas
(art. 66, III, a). Conferir art. 111 LEP e art. 75, p.1º CP. Se sobrevier nova condenação
quando o apenado estiver no gozo do livramento condicional, a unificação das penas só
pode ser realizada se a 2ª condenação decorrer de crime cometido ANTES da vigência do
livramento (art. 86, II CP e art. 141 LEP).

Cumprimento das condições e período de prova: A sentença que concede o livramento deve
especificar as condições a que o apenado fica sujeito (art. 85 CP e art. 132 LEP). Art. 132
LEP § 1º Serão sempre impostas ao liberado condicional as obrigações seguintes: a) obter
ocupação lícita, dentro de prazo razoável se for apto para o trabalho; b) comunicar
periodicamente ao Juiz sua ocupação; c) não mudar do território da comarca do Juízo da
execução, sem prévia autorização deste. Art. 133. Se for permitido ao liberado residir fora
da comarca do Juízo da execução, remeter-se-á cópia da sentença do livramento ao Juízo do
lugar para onde ele se houver transferido e à autoridade incumbida da observação cautelar e
de proteção. É possível ainda a transferência de condenados, de modo que a execução da
pena se dê no estrangeiro, podendo o período de prova ser lá cumprido.

Condições facultativas: Art. 132 § 2° Poderão ainda ser impostas ao liberado condicional,
entre outras obrigações, as seguintes: a) não mudar de residência sem comunicação ao Juiz
e à autoridade incumbida da observação cautelar e de proteção; b) recolher-se à habitação
em hora fixada; c) não freqüentar determinados lugares. A legislação brasileira não fixa um
lapso temporal de período de prova para o livramento condicional, devendo corresponder
ao restante da pena imposta ao acusado. Mais uma evidência de que o livramento
condicional consiste na continuidade da execução da pena, porém de forma externa à
prisão.

Descumprimento das condições e revogação do benefício: O descumprimento das


condições impostas na sentença implica revogação do livramento. I – Revogação
obrigatória (art. 86 CP): a) Condenação irrecorrível por crime cometido durante o período
de prova: Art. 86 - Revoga-se o livramento, se o liberado vem a ser condenado a pena
privativa de liberdade, em sentença irrecorrível: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984). I - por crime cometido durante a vigência do benefício; (Redação dada pela Lei
nº 7.209, de 11.7.1984). No caso de crime praticado no período de prova, não é possível a
unificação das penas, como acima dito. Assim, o condenado deve retornar à prisão, para
continuar a cumprir a pena que gerou o benefício. Como não há unificação das penas,
cumpre-se a primeira sanção imposta, para, logo em seguida, iniciar o cumprimento da
segunda pena. Somente em relação a essa última pena o condenado poderá requerer novo
livramento. STF, nessa situação de crime praticado no período de prova, decidiu que não se
deve contar como tempo de pena cumprida o lapso temporal em que o condenado gozou do
livramento condicional. b) Condenação irrecorrível por crime cometido antes do
livramento condicional Art. 86 Revoga-se o livramento, se o liberado vem a ser condenado
a pena privativa de liberdade, em sentença irrecorrível: [...] II - por crime anterior,
observado o disposto no art. 84 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984). Nesse caso é possível a unificação de penas e o aproveitamento, em favor do
apenado, do período em que esteve em liberdade. Art. 141 LEP. Se a revogação for

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

motivada por infração penal anterior à vigência do livramento, computar-se-á como tempo
de cumprimento da pena o período de prova, sendo permitida, para a concessão de novo
livramento, a soma do tempo das 2 (duas) penas. II – Revogação facultativa: Art. 87 - O
juiz poderá, também, revogar o livramento, se o liberado deixar de cumprir qualquer das
obrigações constantes da sentença, ou for irrecorrivelmente condenado, por crime ou
contravenção, a pena que não seja privativa de liberdade.(Redação dada pela Lei nº 7.209,
de 11.7.1984) Mesmo no caso de revogação facultativa, aplica-se art. 88 CP: Revogado o
livramento, não poderá ser novamente concedido, e, salvo quando a revogação resulta de
condenação por outro crime anterior àquele benefício, não se desconta na pena o tempo em
que esteve solto o condenado. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).

Suspensão do livramento condicional: De acordo com art. 145 LEP, praticada pelo liberado
outra infração penal, o Juiz poderá ordenar a sua prisão, suspendendo o curso do livramento
condicional, cuja revogação, entretanto, ficará dependendo da decisão final. O que
diferencia a revogação da suspensão é que essa última é provisória, pois dependente de
decisão final. A suspensão do livramento tem natureza de cautelar.

Prorrogação do livramento condicional: A possibilidade de prorrogação é objeto de


controvérsia doutrinária. Para os autores, a possibilidade de prorrogação inexiste no
ordenamento brasileiro. O art. 89 (O juiz não poderá declarar extinta a pena, enquanto não
passar em julgado a sentença em processo a que responde o liberado, por crime cometido
na vigência do livramento.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) não autoriza o
instituto. Isso porque o dispositivo apenas possui regramento impeditivo da extinção da
pretensão punitiva estatal, pois, no caso de condenação, será revogado o livramento
condicional até então suspenso, desconsiderando-se o período de prova no cômputo da pena
cumprida. STJ e STF também entendem inexistir possibilidade de prorrogação.

Cumprimento integral e extinção da punibilidade: Decorrido o período de prova, sem que


tenha havido suspensão ou revogação, extingue-se a pena privativa de liberdade (art. 90 CP
e art. 146 LEP). É causa extintiva da punibilidade não prevista no art. 107 CP.

8. Efeitos da condenação:

Considerações Gerais: O primeiro efeito de qualquer condenação penal é a imposição de


uma sanção penal, seja ela privação da liberdade, restrição de direitos, multa ou medida de
segurança. Este é o efeito primário da condenação. Os efeitos secundários de natureza penal
encontram-se espalhados ao longo do Código, bem como CPP e na LEP. Por seu turno, os
efeitos secundários extrapenais encontram-se discriminados nos artigos 91 e 92 do CP.

Efeitos secundários de natureza penal: Estão previstos em diversos pontos da legislação


penal, bem como do CPP e da LEP. Destacam-se: a) gerar a reincidência; b) impedir a
concessão de substitutivos penais (transação, suspensão condicional do processo, suspensão
condicional da pena); c) acarretar a revogação do sursis; d) acarretar a revogação do
livramento condicional; influir na contagem do prazo prescricional da pretensão executória;
e) impedir o reconhecimento do privilégio (no furto, na apropriação indébita, no

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

estelionato, na receptação); f) impedir a propositura da exceção da verdade no crime de


calúnia; g) ser expedida guia de recolhimento para execução; h) ser o réu preso ou
conservado na prisão; i) ser o nome do réu lançado no rol dos culpados.

Efeitos secundários de natureza extrapenal: A Reforma Penal de 1984 manteve a disciplina


relativa aos efeitos gerais da sentença penal condenatória (art. 91) e transformou as penas
acessórias em efeitos específicos (art. 92), sendo aqueles automáticos e, estes,
motivadamente declarados. No direito estrangeiro observa-se sistemática semelhante, ou
seja, tais efeitos secundários à punição vêm etiquetados como efeitos da condenação ou
como penas acessórias. No particular, Jescheck informa que o Código Alemão prevê, ao
lado das penas, a ocorrência de conseqüências adicionais, cuja natureza jurídica é de difícil
caracterização. Conforme adiantado, há duas sortes de efeitos: (1) genéricos (art. 91, do
CP), que valem para todos os delitos e têm incidência automática; e (2) específicos (art. 92,
do CP), que se encontram relacionados com determinados ilícitos e cuja aplicabilidade
exige motivação expressa na sentença.

A obrigação de reparar o dano: Segundo o art. 91, I, do CP, a sentença penal condenatória
torna certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo delito. Esta conseqüência não se
confunde com a pena de prestação pecuniária (art. 43, I, do CP). Diz-se, assim, que a
sentença penal faz coisa julgada no cível, valendo como título executivo judicial, nos
termos do art. 584, II, do CPC. Significa dizer que fatos provados na esfera penal não
precisam ser demonstrados perante o juízo cível. Dessa maneira, não se poderá mais
discutir, no juízo extrapenal, se deve ou não indenizar (an debeatur), mas, somente, o
montante da indenização (quantum debeatur). Observa-se que a Lei no 11.719/2008, alterou
diversos dispositivos do CPP, possibilitando a fixação imediata, na sentença penal
condenatória, de um valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração,
considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido (cf. art. 387, inc. IV, do CPP).

Ação Civil ex delicto: A parte ofendida, seu representante legal ou seu herdeiro não
necessita, contudo, aguardar o encerramento da discussão penal, para, só então, executar no
juízo cível a sentença penal condenatória. O art. 64, do CPP, dispõe que a ação para
ressarcimento do dano poderá ser proposta no juízo cível, contra o autor do crime e, se for o
caso, contra o responsável cível. Nesse caso, contudo, intentada a ação penal, poderá o juiz
cível suspender o curso da ação civil ex delicto, até o julgamento definitivo da respectiva
ação penal. Objetiva-se, assim, evitar sentenças (cível e penal) colidentes. O ordenamento
jurídico brasileiro adotou, no particular, o sistema da relativa separação das instâncias penal
e extrapenal. Quando ela, sentença penal, adentrar no mérito da discussão, seja para
condenar ou para absolver o acusado, isso traz conseqüências na seara extrapenal. Diante
disso, tem-se que, em regra, a sentença penal gera efeitos nas esferas civil e administrativa,
mas a recíproca não é verdadeira. A sentença penal absolutória pode, igualmente, gerar
efeitos condicionantes na esfera cível e administrativa. É o que se verifica com a decisão
penal que reconheça estar provada a inexistência do fato ou estar provado que o réu não
concorreu para a infração penal (art. 387, I e IV, CPP). Nesse sentido, o art. 65, do CPP,
assinala que “faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato
praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever
legal ou no exercício regular de direito”. Ainda nesse terreno, pode acontecer de não haver

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

prova suficiente da existência do fato delituoso ou não haver prova suficiente para a
condenação do réu (v.g., art. 386, incs. II e VII, CPP). Pode, ainda, ser declarada extinta a
punibilidade do autor, como, por exemplo, diante da prescrição da pretensão punitiva.
Nessas hipóteses, a sentença penal absolutória não irá influir na discussão da causa no juízo
extrapenal.

Perdas dos instrumentos e dos produtos do crime: Segundo o art. 91, II, do CP, é efeito da
condenação a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de
boa-fé: (1) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico,
alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito; e (2) do produto do crime ou de
qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato
criminoso. Cuida-se de modalidade especial de confisco, decorrente de razões superiores de
bom-senso (ou de lógica jurídica), qual seja, a de que a ordem jurídica não pode tolerar que
certos objetos, em si lesivos à coletividade, bem assim a espúria vantagem obtida com a
violação da norma penal, permaneçam na posse ou detenção do delinqüente ou de terceiros
de má-fé. Não há que confundir, contudo, o confisco ora analisado com a pena restritiva de
direitos de perda de bens e valores, prevista nos arts. 43, II, e 45, § 3o, do CP, uma vez que
esta é efeito direto da condenação, embora também se reverta em favor do Fundo
Penitenciário Nacional (Funpen).

Instrumentos do crime (instrumenta sceleris): Consoante o exposto, o art. 91, II, “a”, do CP,
determina-se a perda dos objetos utilizados na perpetração do delito, desde que consistam
em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito. Roberto Lyra
esclarece que ao limitar a perda àqueles instrumentos que por si só constituam fato ilícito, a
citada norma objetivou evitar a perda dos utensílios profissionais, materiais de trabalho,
além de outros bens de posse ou detenção lícita, ainda que circunstancialmente utilizados
na ação criminosa.

Produto do crime (producta sceleris): Não pode, evidentemente, o Direito compactuar com
o enriquecimento ilícito de quem quer que seja. Há de ser determinado, na sentença
condenatória, o perdimento a favor da União, da vantagem auferida em razão do ilícito.
Faz-se, assim, indispensável demonstrar a relação de causalidade, direta ou indireta, entre o
comportamento delituoso e o incremento patrimonial subseqüente. Roberto Lyra assinala
que o dispositivo sob comento compreende as coisas adquiridas diretamente com o crime,
ou mediante sucessiva especificação, ou conseguidas mediante alienação ou criadas com o
crime. Anote-se, por fim, que os bens confiscados, por força do presente dispositivo, devem
ser destinados ao Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN), consoante especificado no art.
2º, inc. IV, da Lei Complementar no 79/1994, objetivando, dentre outras providências,
“financiar e apoiar as atividades e programas de modernização e aprimoramento do Sistema
Penitenciário Brasileiro”.

Efeitos específicos da condenação: Cuidam-se de conseqüências vinculadas a determinadas


hipóteses delitivas ou certas qualidades especiais da pessoa do infrator. Ressalte-se que tais
efeitos, diferentemente dos anteriores, não são automáticos, devendo constar expressamente
mencionados na sentença condenatória.

Perda do cargo, função pública ou mandato eletivo: Conforme o art. 92, I, do CP, são
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

também efeitos da condenação, a perda do cargo, função pública ou mandato eletivo


decorrente de duas hipóteses: a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo
igual ou superior a 1 (um) ano, quando o ilícito for praticado com abuso de poder ou
violação dos deveres funcionais; ou b) quando aplicada pena de prisão por tempo superior a
4 (quatro) anos, nos demais casos. Na primeira vertente (pena igual ou superior a um ano),
a perda do cargo, função pública ou mandato eletivo abrange não somente os chamados
delitos funcionais (arts. 312 e segs., do CP), mas, igualmente, todo e qualquer delito no
qual o agente tenha abusado de seus poderes ou descumprido seus deveres de servidor
público. No segundo caso (pena igual ou superior a quatro anos), em razão da aplicação de
uma sanção elevada, o servidor torna-se indigno para exercer o cargo, a função ou o
mandato eletivo custeado pelo contribuinte brasileiro. Cuidando-se de Deputado Federal ou
Senador, a Constituição prevê que a perda do mandato decorrerá, dentre outras hipóteses,
da condenação criminal em sentença definitiva (art. 55, VI, da CF/1988), sendo que, neste
caso, a destituição do parlamentar “será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo
Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva
Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa”
(art. 55, § 2o, da CF/1988).

Incapacidade para o exercício do poder familiar, tutela ou curatela: Para que se verifique
este efeito faz-se necessário que se cuide de crime doloso praticado contra filho, tutelado ou
curatelado, e punido com pena de reclusão. Trata-se de efeito vinculado a delitos cuja
prática denote incompatibilidade com o exercício do poder familiar, tutela ou curatela,
evidenciando que o condenado, de maneira reprovável, abuse dos deveres inerentes àqueles
institutos do Direito de Família. Decretada, na sentença penal, de forma motivada, a
referida incapacidade, o condenado jamais poderá reavê-la com relação ao filho, tutelado
ou curatelado vitimado por sua conduta delituosa. Poderá vir a exercer tais prerrogativas
relativamente a outros menores ou interditados. Sequer a reabilitação penal possibilita o
retorno ao status quoante (art. 93, do CP).

Inabilitação para dirigir veículo utilizado em crime doloso: São efeitos que se projetam para
a esfera administrativa, e que pressupõem a presença de dois requisitos: (1) delito doloso; e
(2) a utilização do veículo como meio para a perpetração do ilícito. Por conta disso, não se
deve confundir esta conseqüência secundária da sentença penal condenatória com os crimes
de trânsito. Na mesma esteira, vale ressaltar que a inabilitação, como conseqüência
definitiva da condenação, difere da pena restritiva de suspensão de autorização ou de
habilitação para dirigir veículo (art. 47, inc. III, do CP), que possui caráter temporário. É
conveniente, ainda, lembrar que a disposição abrange não apenas a condução de
automóveis, mas todos os veículos de tração motora, tais como motocicletas, caminhões,
ônibus, tratores, aeronaves ou embarcações. Portanto, a inabilitação deverá ser comunicada
pelo juiz sentenciante aos órgãos competentes.

Inabilitação do empresário nos delitos falimentares: Nos casos de delitos relacionados com
a recuperação judicial, extrajudicial e falência do empresário ou da sociedade empresarial,
dispõe o art. 181, da Lei no 11.101/2005, que a condenação acarretará o efeito secundário
da inabilitação do réu para o exercício da atividade empresarial, direta ou indiretamente,
além do impedimento de exercício de cargo ou função em conselho de administração ou

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

diretoria das sociedades sujeitas àquela lei especial. No caso, tais efeitos também devem ser
motivadamente declarados na sentença, e perdurarão até cinco anos após a extinção da
punibilidade, podendo, contudo, cessar antecipadamente em virtude da reabilitação penal
(art. 181, § 1o, da Lei no 11.101/2005).

Reabilitação penal: Na atualidade, a reabilitação se aproxima mais da noção de


ressocialização, podendo, de certa maneira, ser entendida como a plena reinserção social do
apenado. A reabilitação penal apresenta três objetivos basilares: (1) neutralizar os efeitos de
quaisquer das penas aplicadas em sentença definitiva; (2) neutralizar, igualmente, os efeitos
indiretos da condenação; e (3) assegurar ao condenado o sigilo dos registros sobre seu
processo e condenação. Todavia, o instituto carece de utilidade prática. Isso porque, não há
sentido em se prever que ela alcança quaisquer das penas aplicadas, pois um dos
pressupostos para a sua dedução é, justamente, o de que a sanção penal já se encontre
extinta ou devidamente cumprida, há mais de dois anos (art. 94, caput, do CP). Ora, uma
vez esgotada a pretensão punitiva do Estado, não há mais pena alguma a ser alcançada pela
reabilitação. De mais a mais, relativamente aos efeitos secundários da condenação, a
reabilitação apenas pode suspender um deles, qual seja, a inabilitação para dirigir veículo
(art. 92, III, do CP). Quanto aos demais efeitos, o Código é expresso em retirá-los do
alcance da reabilitação (art. 92, parágrafo único, do CP). Com relação ao objetivo de
assegurar o sigilo do processo e da condenação, é de se observar que igual providência já se
encontra determinada pelo art. 202, da LEP, de forma até mais ampla do que no Código
Penal, pois alude a qualquer notícia ou referência à condenação, o que transcende ao mero
sigilo dos registros. A Lei no 11.971/2009, ao disciplinar a expedição de certidões pelos
Ofícios de Registro de Distribuição e Distribuidores Judiciais, derrogou o art. 93, do CP, e o
art. 202, da LEP, estabelecendo que os ofícios do Registro de Distribuição, serviços
extrajudiciais, e os Distribuidores Judiciais farão constar em suas certidões,
obrigatoriamente, a distribuição dos feitos ajuizados ao Poder Judiciário e o resumo de suas
respectivas sentenças criminais condenatórias.

Pressupostos para a reabilitação: Consoante normatizado no art. 94, do CP, a reabilitação


poderá ser requerida perante o Juízo da condenação, após o decurso de dois anos da
extinção da sanção penal, bem como do término da respectiva execução, podendo-se
computar o período de prova da suspensão da pena e o do livramento condicional, se não
sobrevier a revogação de um ou de outro. Além do lapso temporal de dois anos, faz-se
necessário o atendimento de outras exigências.

Domicílio no País no prazo de dois anos: Cuida-se de requisito criticado por parte da
doutrina, no entanto, fato é que essa exigência justifica-se na medida em que viabiliza o
aferimento do bom comportamento social, circunstância que dificilmente poderia ser
atestada caso o requerente estivesse domiciliado no estrangeiro.

Demonstração efetiva e constante de bom comportamento público ou privado: Via de regra,


por meio de declarações abonatórias ou de certidões negativas de Registros de Distribuição,
atesta-se, de fato, o cumprimento deste requisito.

Reparação do dano causado pelo crime ou comprovação da absoluta impossibilidade de o


fazer, até a data do pedido, ou comprovação da renúncia expressa da vítima ou novação da
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

dívida: O presente requisito pressupõe, sucessivamente, que haja a reparação do dano, a


prova da absoluta impossibilidade de o fazer, a renúncia expressa da vítima e, por último, a
novação da dívida. Ressalte-se, por oportuno, que no caso de indeferimento em razão do
não atendimento das exigências ora apresentadas, pode-se reapresentar, a qualquer tempo, o
pedido, desde instruído com novos elementos comprobatórios dos requisitos necessários.
Em suma, o que se veda, implicitamente, é a mera reiteração do pedido, desacompanhado
de novas provas.

Revogação da reabilitação: A reabilitação apenas suspende alguns dos efeitos secundários


da condenação. Dessa maneira, ela pode vir a ser revogada, segundo o art. 95, do CP, caso o
reabilitado venha a ser condenado, como reincidente, a pena diversa da multa. Este
dispositivo sinaliza no sentido de que a revogação somente pode se operar dentro do lapso
de cinco anos, contados da extinção ou do cumprimento da pena, pois é exatamente esse o
prazo no qual a reincidência pode surtir efeitos, conforme o disposto no art. 64, inc. I, do
CP. O segundo requisito para a revogação do benefício diz respeito à condenação
superveniente a uma pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos. A condenação em
pena de multa não interfere na vigência da reabilitação. O juízo competente para a dedução
do pedido é o da condenação – e não o da execução penal –, tendo em vista o disposto no
art. 743, do CPP. A reabilitação é pessoal e intransferível.

9. Medida de segurança:

Conceito e natureza jurídica das medidas de segurança: As medidas de segurança são


conseqüências jurídicas da prática de fato definido como crime, por indivíduos que não
possuam culpabilidade, por lhes faltar sanidade. O objetivo da medida de segurança é
impedir que a pessoa volte a delinqüir, a fim de que possa levar uma vida sem conflitos
com a sociedade. Excepcionalmente, a medida de segurança pode ser imposta ao
semirresponsável que necessitar de especial tratamento curativo. Como visto, ela tem
inequívoca natureza de sanção penal. No entanto, enquanto a pena é dotada de natureza
retributivo-preventiva (geral e especial), a medida de segurança possui, somente, natureza
preventiva (especial). Sendo assim, por possuir natureza jurídica de sanção penal, a conduta
típica e antijurídica deve estar comprovada no caso concreto para a imposição de medida de
segurança ao inimputável ou, excepcionalmente, ao semirresponsável. A propósito, dispõe
o parágrafo único do art. 96, do CP, que a extinção da punibilidade do fato determina a não
imposição da medida de segurança ou a insubsistência daquela porventura existente. É o
que ocorre com a superveniência da prescrição (art.107, IV, do CP). O STJ já teve
oportunidade de enfrentar a presente discussão, fixando o entendimento de que os prazos
prescricionais do art. 109, do CP, são extensíveis às medidas de segurança, sendo certo que
no caso de absolvição por inimputabilidade, a prescrição obedecerá a pena em abstrato e,
no caso de medida de segurança substitutiva para o semi-imputável, deve-se seguir a pena
em concreto aplicada. O STF firmou jurisprudência nesse mesmo sentido. Sistemas do
duplo binário e vicariante: Segundo dispunha o CP/1940, a medida de segurança era
destinada não somente aos inimputáveis, mas, também, ao imputáveis ou semirresponsáveis
que, mesmo após o cumprimento da pena, denotassem ser perigosos. Adotava-se, portanto,
o chamado sistema do duplo binário ou da dupla via. Nesse sentido, o primitivo art. 82, do
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

CP/1940 estabelecia que o indivíduo era submetido à medida de segurança, depois de


cumprida a pena privativa de liberdade. Diante dos questionamentos e das críticas que se
formaram, a Reforma Penal de 1984 substituiu o duplo binário pelo sistema vicariante ou
da única via, em que o juiz deve escolher entre a imposição de uma pena ou de medida de
segurança. Vicariante é o que substitui ou faz as vezes de outrem, ou seja, seguir um ou
outro caminho. Em suma, etimologicamente, vicariante é a antítese de duplicidade. Nesses
termos, a sistemática que passou a ser adotada pelo CP/1984 foi a seguinte: para o
imputável, somente caberá a imposição de pena; para o inimputável (art. 26,caput, do CP),
há a aplicação de medida de segurança; e para o semirresponsável (art. 26, parágrafo único)
aplica-se pena ou, alternativamente, medida de segurança. Nesse último caso, o que irá
fundamentar a decisão judicial por uma ou outra via será a necessidade de especial
tratamento curativo (art. 98, do CP). Em suma, pela sistemática atual, o imputável jamais
sofrerá medida de segurança; o inimputável jamais receberá pena; e o semi-imputável
receberá uma ou outra sanção, jamais as duas.

Diferenças entre pena e medida de segurança: Conforme ressaltado, pena e medida de


segurança são espécies do gênero sanções penais. Entretanto, a doutrina aponta as seguintes
distinções entre elas: (1) a pena tem caráter retributivo-preventivo (art. 59, caput, do CP), a
medida de segurança tem caráter preventivo (art. 96, do CP); (2) o fundamento para a
imposição da pena é a prática de fato típico, antijurídico e culpável; para a medida de
segurança, basta o fato típico e antijurídico; (3) a pena tem tempo de duração determinada
na sentença; a medida de segurança vigora por tempo indeterminado; (4) a pena destina-se
ao imputável e, em regra, ao semirresponsável; a medida de segurança é destinada ao
inimputável e, excepcionalmente, ao semirresponsável que necessitar de especial
tratamento curativo.

Periculosidade como pressuposto da medida de segurança: No caso do inimputável que


realiza fato típico e antijurídico, o art. 97, do Código, presume a sua periculosidade. Já para
o semirresponsável, há de ser aferida, no caso concreto, a periculosidade do infrator, vale
dizer, a referida necessidade de tratamento curativo (art. 98, do CP). Observa-se, assim, que
a chamada periculosidade presumida decorre do enquadramento do infrator à hipótese
regulada na cabeça do art. 26, do CP, ao passo que a periculosidade real diz respeito àquele
que se subsume ao disposto no parágrafo único do art. 26.

Espécies de medida de segurança: Internação em hospital psiquiátrico: Também


denominada de medida de segurança detentiva, executa-se em hospital de tratamento e
custódia, isto é, privando-se o agente da liberdade de locomoção. Tratamento ambulatorial:
Denominada, igualmente, de medida de segurança restritiva, o agente não é privado da
liberdade, mas sujeito à obrigatoriedade de comparecer regularmente ao posto de
atendimento médico, para fins de consulta e recebimento da medicação adequada. Caso ele
descumpra a determinação judicial, poderá o Juiz da execução proceder à conversão do
tratamento ambulatorial em internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico.

Escolha da medida de segurança: Cumpre salientar que a escolha entre internação e


tratamento ambulatorial não obedece a critérios concretos da gravidade do fato perpetrado,
comportamento do agente ou sua presumida periculosidade, mas somente a verificação se o
delito em tese praticado é apenado com reclusão ou detenção (art. 97, parte final, do CP).
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Inobstante a lei vincular pena de reclusão à internação, razões superiores de política


criminal – ou de justiça no caso concreto – podem levar o magistrado a adotar uma
interpretação sistêmica, integrando o critério apriorístico do art. 97, do CP, com o critério
de necessidade do art. 98, do CP, decidindo não impor medida de segurança de internação
ao agente que perpetrou fato punido com reclusão, sujeitando-o, assim, ao comparecimento
ao posto de saúde para tratamento ambulatorial. O STJ já acolheu essa orientação
progressista, entendendo que a medida de segurança deve se ajustar, no caso concreto, à
natureza do tratamento de que necessita o agente inimputável ou semirresponsável. Com
advento da Lei no 10.216/2001, a chamada lei antimanicomial, tal questão se exacerbou,
por força da previsão de seu art. 4º, a internação, em qualquer de suas modalidades, só será
indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.

Cumprimento da medida de segurança: A medida de segurança, tal como a pena, só pode


ser executada, segundo o art. 171, da LEP, após transitar em julgado a sentença penal
(vedação à execução provisória da sentença penal – princípio da presunção de inocência),
que, no caso, denomina-se de absolvição imprópria. Iniciado, efetivamente, o cumprimento
da medida, deve-se proceder, após o decurso do prazo de 1 (um) a 3 (três) anos, ao exame
médico para averiguação da cessação de periculosidade (art. 97, § 1º, do CP). Após esse
marco inicial, a perícia médica passa a ser repetida de ano em ano, ou a qualquer tempo, se
o determinar o Juiz da execução (art. 97, § 2º, do CP). Em complemento, o art. 176, da
LEP, diz que o exame de cessação de periculosidade pode ser realizado a qualquer tempo,
inclusive antes do decurso do prazo referencial mínimo.

Suspensão e extinção da medida de segurança: Iniciado o cumprimento da medida e


submetido ao regime regular de perícia anual, pode ocorrer de ser detectada, pelo exame
das condições pessoais do agente, a cessação da sua periculosidade, culminando, portanto,
com a decisão judicial de desinternação. Esta desinternação ou liberação gradual dar-se-á,
consoante o § 3º, do art. 97, do CP, sempre a título provisório. Ultrapassado o período de
observação, cumprindo, o liberado, as condições dos arts. 132 e 133, da LEP, bem assim,
constatando-se que não houve a prática de fato indicativo de persistência de sua
periculosidade, será declarada, por sentença do Juiz da execução, a extinção da medida de
segurança. Caso contrário, haverá o restabelecimento da medida de segurança
anteriormente fixada.

Limite máximo de cumprimento da medida de segurança: Pode acontecer de os exames


regulares indicarem a manutenção do quadro de periculosidade do agente e, portanto, a
necessidade do prosseguimento do tratamento. Surge, assim, a indagação a respeito do
prazo máximo de duração da medida de segurança. De antemão, assinala--se que, para a
hipótese do semirresponsável (art. 26, parágrafo único, do CP), parece existir consenso
doutrinário e jurisprudencial no sentido de que o prazo máximo de duração da medida será
aquele inicialmente fixado na sentença que aplicara a pena privativa de liberdade. Se
remanescer a necessidade de cuidados médico-assistenciais, dever-se-á proceder nos termos
da lei civil. Entretanto, para o inimputável (art. 26, caput, do CP), há divergência
doutrinária, pois alguns admitem que a medida de segurança possa vir a se eternizar caso
não haja alteração do quadro de periculosidade do agente. Nesse sentido, Guilherme Nucci
entende que, enquanto não for devidamente curado, deverá a pessoa submetida à internação

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

permanecer em tratamento sob custódia do Estado. A despeito do ponderado, há outro


entendimento que considera que justamente em razão da vedação constitucional de penas
de caráter perpétuo (art. 5o, XLVII, “b”, da CF/1988), a medida de segurança não pode
durar para sempre. E isso por se tratar justamente de espécie do gênero sanção penal.
Posiciona-se, como dito, no sentido de que para os inimputáveis a medida não pode
perdurar por mais de trinta anos (art. 75, caput, do CP). Os tribunais têm sufragado esse
entendimento, consoante os julgados do Supremo Tribunal. Em suma, “a medida de
segurança fica jungida ao período máximo de trinta anos”. Sendo assim, após o decurso dos
trinta anos de cumprimento da medida, deve-se aplicar, por analogia, a norma contida no
art. 75, do CP e, por interpretação sistemático--teleológica, a regra do art. 682, § 2o, do
CPP. Ou seja, deve o Parquet deflagrar processo de interdição civil do liberado no juízo
cível competente, na conformidade dos arts. 1.769 e segs., do CC. Anote-se, por derradeiro,
existir uma terceira corrente que defende a tese de que, no caso de inimputável, a duração
máxima da medida de segurança não deve ser trinta anos, mas, sim, do tempo máximo
cominado, em abstrato, no tipo penal em que o agente restou incurso. Este entendimento foi
adotado pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, através do Decreto n.
6.706/2008, do Decreto n. 7.0462009 e do Decreto n. 7.420/2010. Assim, pode-se dizer que
foi estabelecido um limite à medida de segurança de acordo com o máximo de pena, por
força de decisão presidencial, diferindo do que consta no Código Penal ou na jurisprudência
dos tribunais superiores.

Conversão da pena em medida de segurança: A primeira hipótese se dá no caso de semi-


imputável que necessitar de especial tratamento curativo (art. 98, do CP). A segunda
hipótese ocorre em razão de superveniência de doença mental de quem já se encontrava
cumprindo a pena. Neste caso, o art. 41, do CP, e o art. 183, da LEP, dispõem que o juiz
deve determinar a substituição da pena por medida de segurança, transferindo o preso do
estabelecimento em que se encontra para um hospital de tratamento e custódia. Deverá,
dessa feita, o transferido cumprir o restante da pena transformada em medida de segurança.
Se houver melhora do estado de saúde mental, retornará ao estabelecimento prisional para
cumprir o restante da pena, detraindo-se o tempo em que esteve sob a medida de
internação. Por outro lado, se a internação se prolongar até o término do prazo restante da
pena originalmente imposta, dispõe o § 2º, do art. 682, do CPP, que o indivíduo terá o
destino aconselhado pela sua enfermidade, feita a devida comunicação ao juiz de incapazes.
Corroborando a validade desta norma, decidiu o STJ que, nos termos do artigo 183 da LEP,
a duração da medida substitutiva não poderá ser superior ao tempo restante para
cumprimento da reprimenda.

Jurisprudência:

STJ, 2014: É ilegal a manutenção da prisão de acusado que vem a receber medida de
segurança de internação ao final do processo, ainda que se alegue ausência de vagas em
estabelecimentos hospitalares adequados à realização do tratamento. Com efeito, o
inimputável não pode, em nenhuma hipótese, ser responsabilizado pela falta de manutenção
de estabelecimentos adequados ao cumprimento da medida de segurança, por ser essa
responsabilidade do Estado. [STJ. 6ª Turma. RHC 38.499-SP, Rel. Min. Maria Thereza De
Assis Moura, julgado em 11/3/2014].

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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

10. Ação Penal:

Considerações Gerais: O Estado tomou para si o monopólio do magistério punitivo.


Contudo, a faculdade da imposição de sanção penal – o jus puniendi – não é arbitrária, mas,
ao contrário, está submetida aos princípios e regras do ordenamento jurídico, a começar
pelo princípio da legalidade. Com efeito, o direito de punir enquanto tal legitima-se com a
entrada em vigor da lei que tipifica determinado comportamento desvalioso, cominando-lhe
a respectiva sanção penal. Ocorre, porém, que a pretensão punitiva não pode ser
autoexecutada. O Poder Judiciário é por natureza inerte, e só se movimenta mediante
provocação do interessado.Sendo assim, pode-se conceituar direito de ação como sendo o
direito de invocar o Judiciário para fins de aplicação da norma legal em desfavor daquele
que a transgrediu, quando a mesma não pode ser exercitada unilateralmente. A seu turno,
ação penal consiste no direito de obter o pronunciamento do Judiciário sobre a procedência
da pretensão punitiva estatal. Tem base constitucional além de serem públicas, na medida
em que exercitadas perante o Judiciário, e possuírem caráter autônomo, vale dizer, elas
existem independentemente da procedência ou não do direito material que se pretende ver
efetivado ao final do respectivo processo. É nítido o conteúdo processual do direito de
ação. Sem ação penal, não há processo e, sem processo, não há sanção penal. Portanto, de
pouco serviriam normas gerais sobre o delito e a pena, bem como a capitulação dos delitos
na Parte Especial, se o Código Penal dispusesse, minimamente, acerca dos pressupostos
gerais para que o jus puniendi em abstrato seja convertido ao plano concreto. Cuida-se,
portanto, de um instituto de natureza mista, ou seja, de conteúdo penal e processual. Em
razão disso, toda alteração legislativa que envolva a ação penal sofrerá, inexoravelmente, os
influxos próprios da nossa disciplina, em particular a consideração acerca da sua aplicação
retroativa ou não (art. 5o, XL, da CF/1988 e art. 2º, do CP).

Espécies de ação penal: Sob o enfoque penal, tem-se que o magistério punitivo pertence à
Sociedade, por intermédio do Estado, uma vez que foram abolidas as formas de vingança
privada. Conquanto monopólio estatal, é possível que, por razões de política criminal, a lei
condicione a atuação do órgão acusador à prévia manifestação de vontade do lesado ou de
outro órgão público. São situações em que, ao lado do interesse geral na punição do
infrator, há um interesse de igual relevo, de natureza privada ou política, que faz com que,
sem esta concordância, o órgão de persecução penal não possa atuar. Há, ainda, hipóteses
mais extremas nas quais o interesse do particular é superior ao interesse público. Isso
ocorre quando há o predomínio de razões de foro íntimo. Dessa maneira, a lei pode
conceder, exclusivamente, ao ofendido a decisão sobre a dedução ou não da ação penal.
Sobre a matéria, o art. 100, caput, do CP, diz que, em regra, a ação penal será pública
incondicionada. A norma geral só será excepcionada quando houver expressa referência na
lei, geralmente no próprio dispositivo que descreve o delito e a pena.

Ação penal pública: A ação penal pública, incondicionada ou condicionada, é aquela


promovida pelo Ministério Público: arts. 100, caput ou § 1º, do CP; art. 24, CPP; e art. 129,
I, da CF/1988. Saliente-se, por oportuno, que a denúncia poderá ser oferecida quando
contiver suporte probatório mínimo de autoria de materialidade, a chamada justa causa,
além de outros requisitos legais pertinentes (arts. 41 e 395, do CPP).
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

Representação do ofendido e requisição do Ministro da Justiça: Em alguns casos, embora


pública, a ação penal dependerá de representação do ofendido ou de requisição do Ministro
da Justiça (art. 100, § 1º, do CP). Trata-se de uma condição de procedibilidade, sem a qual a
ação penal não poderá ser instaurada. Sequer o inquérito policial poderá ser aberto sem a
concordância do lesado, nos casos em que a lei assim determina. A requisição do Ministro
da Justiça – hipótese cada vez mais rara –, é, igualmente, uma manifestação de vontade,
pautada, no caso, por razões de conveniência política.

Retratação da representação: Saliente-se que a representação não exige qualquer


formalidade, bastando que o lesado ou seu representante legal manifeste, inequivocamente,
o interesse na apuração dos fatos e na condenação do infrator. A representação pode ser
escrita ou oral, sendo, no último caso, reduzida a termo e assinada para fins de
comprovação jurídica. Todavia, a lei prevê a possibilidade de o ofendido se retratar.
Segundo o art. 102, do CP, após o oferecimento da denúncia, a representação é irretratável.
Sobre o assunto, a doutrina indaga se seria admissível a retratação da retratação, A rigor,
tem-se que a propalada retratação da retratação é, na verdade, a formulação de nova
representação, em tese perfeitamente possível, desde que não tenha se operado o respectivo
lapso decadencial.

Ação penal no crime complexo. A questão da ação penal nos crimes sexuais: Com relação
ao crime complexo, isto é, aquele cujos elementos constitutivos consistam em fatos que,
por si mesmos, constituem crimes, dispõe o Código que caberá ação pública em relação
àquele, desde que, em relação a qualquer destes, se deva proceder por iniciativa do
Ministério Público (art. 101, do CP). Em outros termos, assinala o legislador penal que
quando um dos vários tipos que compõem o crime complexo for de ação pública, ele
também será de ação pública. Na atualidade, tem-se defendido uma utilidade para o art.
101, do CP, qual seja, a de solucionar o problema causado pela Lei no 12.015/2009, que, ao
alterar diversos artigos referentes aos crimes sexuais (Título VI, da Parte Especial do
Código), fez com que o (novo) delito de estupro, na forma simples ou qualificada pela lesão
corporal grave ou pela morte, passasse a ser de ação pública condicionada à representação
(art. 225, do CP, com a redação da Lei no 12.015/2009). No entanto, é forçoso reconhecer
que essa possível solução para a alteração da ação penal promovida pela Lei no
12.015/2009, esbarra no óbice intransponível do princípio da especialidade: o art. 225 é
norma especial frente ao art. 101, do CP. Sendo assim, considera-se que o melhor caminho
é a declaração de inconstitucionalidade do novo art. 225, do CP, com ou sem redução de
texto, pela violação do princípio da dignidade da pessoa humana e a vedação da proteção
deficiente de bens jurídicos.

Ação penal do crime conexo e no concurso de crimes: Havendo conexão entre crimes de
ação pública e de ação privada, não poderá o MP oferecer denúncia em relação a ambos,
havendo, assim, necessidade de se observar a regra geral do art. 100, do CP. Segundo
Frederico Marques, nas hipóteses de crime conexo, concurso material e formal, faz-se
imprescindível que se forme um “litisconsórcio entre o Promotor e o titular do jus
querelandi, para que ambos os delitos sejam objeto de acusação e possam ser apreciados
conjuntamente na sentença”.

Ação penal privada: Ação penal exclusivamente privada: Aqui, o ofendido é denominado
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Santo Graal Vitaminado – Atualizado por: Vanessa Maria Feletti.

querelante e, o autor do fato, querelado (art. 100, § 2º, do CP). Sendo menor de 21 anos e
maior de 18, o ofendido e seu representante legal exercem, concorrentemente, o direito de
queixa (Súmula 594, do STF). Tratando-se de ofendido menor de 18 anos, a queixa pode
ser deduzida por seu representante legal. A propósito, constata-se a tendência no sentido da
extinção da ação penal privada. De lege ferenda, todas as ações penais tenderão a ser
públicas incondicionadas e, em certas hipóteses, públicas condicionadas à representação,
mas com a resolução extrapenal dos conflitos particulares entre autor e lesado obstando o
prosseguimento da representação. Numa palavra, em breve a ação penal privada tende ir
para os anais da História, para fazer companhia à extinta ação penal popular. Ação penal
privada subsidiária da pública: A ação penal privada subsidiária da pública, regulada no art.
100, § 3º, do CP, bem como no art. 5o, LIX, da CF/1988, surge na hipótese do Ministério
Público não oferecer a denúncia no prazo legal. Esta modalidade de ação penal objetiva
evitar que, por conta da inércia, desinteresse ou mesmo por injunções políticas ou ilícitas se
dê a impunidade do infrator. Observe-se, porém, que inércia não se confunde com adoção
de medidas diversas do oferecimento de denúncia, como, por exemplo, a requisição de
diligências complementares ou a propositura do arquivamento do inquérito policial. Em
suma, inércia é a inação que denota a reprovável desídia ou desinteresse do órgão acusador.
Ação penal privada personalíssima: Uma hipótese particular de ação penal privada cuja
titularidade é única e exclusiva do ofendido, não podendo substituí-lo nem mesmo o seu
representante legal. Em outros termos, falecendo o querelante, extinguir-se-á a punibilidade
do querelado, ante a impossibilidade de se prosseguir na ação pena. O único exemplo
remanescente seria do delito de induzimento a erro essencial e a ocultação de impedimento,
tendo em vista dispor que a ação penal depende de queixa do contraente enganado (art. 236,
parágrafo único, do CP).

Decadência do direito de queixa ou de representação: Se o legislador, por razões político-


criminais, concede, em determinadas situações, ao ofendido o direito de representar ou
ofertar a queixa-crime, por outro lado estipula-se um prazo para que o faça, sob pena de
incidir os efeitos da decadência. Pode-se definir a decadência como sendo o escoamento do
prazo previsto na lei sem que tenha havido a representação ou o oferecimento da queixa.
Segundo o art. 103, do CP, salvo disposição expressa em contrário, o ofendido decai do
direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro do prazo de seis meses,
contado do dia em que veio a saber que é o autor do crime ou, no caso do § 3º do art. 100,
do dia em que se esgota o prazo para oferecimento da denúncia. Enquanto não identificado,
pela vítima ou seu representante legal, o autor do delito, este prazo não começa a ser
contado. A propósito, não há que confundir decadência com a prescrição penal, que vem a
ser perda do próprio direito de punir do Estado, embora ambas sejam formas da extinção da
punibilidade (art. 107, III, do CP).

Renúncia ao direito de queixa: A renúncia ao direito de queixa significa que o lesado,


apesar de poder iniciar a ação penal privada, não a deflagra. Atente-se que a renúncia só
cabe na ação penal privada. E só pode ocorrer antes dela se iniciar. Conquanto sejam causas
de extinção da punibilidade, renúncia não se confunde com perdão e perempção, pois ela
somente pode se dar antes de iniciada a ação penal. Segundo o Código, a renúncia pode ser
expressa ou tácita (art. 104, do CP). Renúncia expressa é aquela feita por escrito. A seu
turno, renúncia tácita significa a prática de ato incompatível com a vontade de exercer o

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direito de queixa (art. 104, parágrafo único, do CP). Não implica, todavia, em renúncia
tácita a circunstância de receber, o ofendido, a indenização do dano causado pelo crime. No
entanto, cuidando-se de infração de menor potencial ofensivo, a composição civil dos
danos, devidamente homologada, acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação.

Perdão do ofendido: Segundo o art. 105, do CP, o perdão do ofendido, nos crimes em que
somente se procede mediante queixa, obsta o prosseguimento da ação penal. Nos termos do
art. 106, do CP: (1) o perdão concedido a qualquer dos querelados, a todos aproveita; (2) se
concedido por um dos ofendidos, não prejudica o direito dos demais ofendidos; e (3) se o
querelado recusa, não produz efeito. Observa-se, pois, que o perdão do ofendido é um
instituto de natureza bilateral, diferentemente da renúncia, que é unilateral. Cumpre
registrar que o perdão do ofendido somente pode ser admissível até o trânsito em julgado
da sentença condenatória (art. 106, § 2º, do CP).

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