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ACOLHIMENTO: FATOR DIFERENCIAL NO CUIDADO PRÉ-NATAL(1)

Maria Alice Tsunechiro(2), Isabel Cristina Bonadio(2), Vilma Melo de Oliveira(3)


Extraído da Dissertação de Mestrado “Um lugar no cuidado pré-natal: possibilidades e opções das gestantes” apresentada à Escola de
(1)

Enfermagem da Universidade de São Paulo. (2)Enfermeira obstétrica. Professora Doutora do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil
e Psiquiátrica da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 – São Paulo, SP CEP 05403
000. (3)Enfermeira Obstétrica. Mestre em Enfermagem – Área Enfermagem Obstétrica e Neonatal, Escola de Enfermagem da Universidade
de São Paulo, em 2001.

Na construção da qualidade da atenção pré-natal preconizada pelo Ministério da Saúde está implícito a
valorização do acolhimento como um de seus componentes. O objetivo do presente artigo é apresentar os
resultados de uma pesquisa referente aos aspectos relacionais apontados por gestantes como razão para
continuarem freqüentando um serviço de pré-natal geograficamente distante de suas residências. Trata-se de
análise qualitativa de dados da pesquisa realizada no serviço de pré-natal do Amparo Maternal e referem-se aos
depoimentos de 211 gestantes residentes fora da área de abrangência da instituição e que compareceram no
mínimo a seis consultas. As respostas referentes à experiência da gestante como usuária do serviço foram
agrupadas nas dimensões administrativa, técnica e relacional. Os resultados evidenciam os aspectos relacionais e
técnicos como aqueles que as gestantes mais gostam no serviço e também como razão para continuarem
freqüentando o serviço. Todos os depoimentos demonstram o que as mulheres desejam: serem vistas e tratadas
como seres humanos, acolhidas, respeitadas, sem julgamentos ou preconceitos. Elas confiam na competência dos
profissionais que atuam na instituição.
Palavras-chave: cuidado pré-natal, acolhimento, relações interpessoais

RECEIVING: A DIFFERENTIAL FACTOR IN PRENATAL CARE


The construction of prenatal care quality as established by the Ministry of Health includes to valuation of
reception as one of its components. This paper aims to present the results of a research about relational factors
pointed out by a group of pregnant women as the reason for them to continue to attend a prenatal service far from
their homes. It is a qualitative data analysis held at the Maternal Support Prenatal Service, which refers to the
reports by 211 women who live outside the area covered by the institution and attended at least six appointments.
The answers related to the pregnant women’s experience as service users were categorized in the administrative,
technical and interpersonal relationship dimensions. Data show that interpersonal and technical aspects were
most appreciated in the service and were the reason for continued attendance. All reports demonstrate what the
women want: to be treated as human beings, to be received and respected without judgement and prejudice. They
trust in the competency of the professionals who work at the institution.
Key words: prenatal care, receiving, interpersonal relationships

INTRODUÇÃO
No Manual técnico sobre Assistência Pré-Natal do Ministério da Saúde, o acolhimento é um dos
componentes destacados, e o entendimento do “acolher” no sentido literal significa “Dar acolhida; dar agasalho
a; dar crédito, dar ouvidos a; admitir, aceitar, receber; tomar em consideração (AURÉLIO)”. Nesse sentido, na
construção da qualidade da atenção pré-natal, está implícita a valorização desses aspectos, traduzida em ações
concretas que permitam sua integração no conjunto das ações oferecidas às mulheres (BRASIL, 2000).
O Manual foi publicado com a finalidade de oferecer referências para a organização da rede
assistencial, capacitação profissional e normatização das práticas de saúde. O Ministro da Saúde José Serra
recomenda na apresentação do Manual que as secretarias estaduais e municipais de saúde adaptem, coloquem em
prática e avaliem a aplicação de tais normas, visando à melhoria da qualidade do pré-natal (BRASIL, 2000).
Porém, a disponibilidade de serviços de saúde, especialmente a atenção ao pré-natal e parto, tem levado
as mulheres à peregrinação. Tsunechiro et al. (1998) relatam que muitas gestantes para obter assistência pré-natal
precisam descolar-se para outras regiões geograficamente distantes de sua residência, até mesmo para outros
municípios. Bonadio (1996) relata a dificuldade que a mulher grávida tem em receber atendimento pré-natal e
mostra que as mulheres que freqüentaram um serviço em uma instituição filantrópica vem aumentando a cada
ano, referindo que as gestantes “continuam vindo de longe, preferindo aguardar a manhã toda para serem
atendidas”, justificando que, nas unidades básicas de saúde, sua espera seria ainda maior e insistem no “aqui sou
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atendida” ou “aqui recebo atenção”. A escolha dessa instituição foi observada anteriormente por Barros (1990)
pois, apesar do acesso ao atendimento pré-natal em instituições de saúde próximas às suas residências, várias
gestantes optavam pela assistência oferecida nesse serviço. Ao considerar o trânsito caótico e o serviço de
transporte coletivo precário, essas mulheres utilizam duas ou, às vezes, três conduções para chegar a esse serviço
de saúde, gastando neste percurso, horas de seu tempo, além de dinheiro e de implicar em cansaço físico e
psicológico, expondo-se a uma violência urbana perversa.
Sendo a cidade de São Paulo um município com uma extensa área geográfica, com aproximadamente
614.804 km2, possuindo inúmeras unidades de serviço de saúde pública, distribuídas em todas as regiões da
cidade, despertou-nos o interesse em compreender por que, algumas gestantes submetem-se a um longo percurso
geográfico para receberem um atendimento pré-natal. O que realmente elas buscam?
Oliveira (2000) com o propósito de compreender os motivos da procura por assistência pré-natal em
serviço geograficamente distante de sua residência realizou um estudo no Pré-natal do Amparo Maternal e os
resultados revelaram que, apesar de todas as dificuldades para freqüentar esse serviço, as usuárias têm aderência
ao serviço, não faltam às consultas e são pontuais na medida que o trânsito metropolitano permite. Quando
analisadas as respostas referentes à freqüência ao pré-natal, os relatos foram agrupados em três dimensões:
administrativa, técnica e relacional. O estudo revelou, com grande destaque, os aspectos relacionais como razão
para continuar freqüentando o serviço. Esses aspectos dizem respeito ao que o Ministério da Saúde conceitua
como acolhimento. Para o presente artigo, propomo-nos a apresentar esses aspectos, pois constituíram o fator
diferencial no cuidado pré-natal oferecido à essa clientela.
METODOLOGIA
O estudo consistiu em uma análise qualitativa de dados da pesquisa intitulada “Um lugar no cuidado
pré-natal: possibilidades e opções das gestantes” (OLIVEIRA, 2000). A pesquisa original foi um estudo
descritivo, cujo objetivo foi estudar o acesso de mulheres à assistência pré-natal em serviço geograficamente
distante de sua residência.
A pesquisa foi realizada no serviço de pré-natal do Amparo Maternal, uma Instituição filantrópica da
cidade de São Paulo que atende prioritariamente gestantes caracterizadas como de baixo risco obstétrico. Além
do hospital-maternidade, a Instituição conta com Ambulatório, Laboratório de Análises Clínicas e Alojamento
Social para gestantes. O atendimento da clientela não é regionalizado e a Instituição atende por dia,
aproximadamente 30 partos e 25 consultas pré-natais, com recursos financeiros provenientes do SUS e de
doações. Nesse serviço a consulta da gestante é de responsabilidade de enfermeiras obstétricas, docentes de
Enfermagem e, recentemente, enfermeira contratada pela Instituição. Participam, também, alunos de graduação e
pós-graduação da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP). Atualmente, as atividades do
serviço estão vinculadas ao Projeto “Cuidando e Aprendendo com Gestantes” que integra a assistência, o ensino
de enfermagem e a pesquisa (TSUNECHIRO; BONADIO, 1999). O atendimento é realizado durante todo o ano,
de segunda a sexta-feira, nos períodos da manhã e da tarde, sendo as gestantes atendidas mediante a ordem de
chegada ao serviço. O cronograma de atendimento é o preconizado pela Secretaria de Estado da Saúde de São
Paulo. As consultas são mensais até a 32ª semana de idade gestacional, quinzenais da 32ª a 36ª semanas e
semanais a partir da 36ª semana da gestação. Atende mulheres que comparecem ao Ambulatório
independentemente da idade gestacional. Além das consultas, estão previstas ações educativas para grupos de
gestantes. Os grupos são formados de acordo com a disponibilidade das gestantes e são coordenados por pós-
graduandas da EEUSP e psicólogas voluntárias.
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Os dados apresentados neste artigo referem-se aos depoimentos de 211 gestantes matriculadas no
primeiro semestre de 2000, residentes fora da área de abrangência da Instituição e que compareceram, no mínimo
a seis consultas pré-natais. As respostas das perguntas que tratavam da percepção da experiência da gestante
como usuária do serviço foram agrupadas nas seguintes dimensões: administrativa, as manifestações alusivas aos
aspectos organizacionais e de estrutura do serviço; técnica, as referentes aos procedimentos e ou à consulta de
pré-natal propriamente dita e à competência técnica do profissional; relacional, as manifestações alusivas ao
relacionamento interpessoal e a sentimentos de satisfação ou insatisfação.
A pesquisa original foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da EEUSP e as entrevistas com as
gestantes aconteceram, após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
RESULTADOS
A maioria das mulheres (66,8%) iniciou a assistência pré-natal no segundo trimestre da gravidez, da 13ª
a 25ª semanas, semelhante aos achados de Barros (1990). Cerca de um terço (30,6%) eram adolescentes.
As respostas evidenciam a aderência e a opção da gestante em dar continuidade ao controle pré-natal,
apesar da localização distante de sua residência. O que as gestantes mais gostam no pré-natal do Amparo são
aspectos relativos às dimensões relacional (98,1%) e técnica (91,9%) e as razões para elas continuarem
freqüentando o serviço também se referem aos aspectos relacionais (88,1%) e técnicos (62,0%). Chama a atenção
que nenhuma gestante referiu incomodar-se por fatores ligados aos aspectos relacionais ou técnicos, enquanto
36,0% incomodam-se ou mudariam “coisas” que dizem respeito à estrutura e funcionamento do serviço
(dimensão administrativa). A maioria (64,0%) referiu que nada incomodava ou mudaria no serviço. Podemos
atribuir tal fato à forma comparativa entre as experiências, própria ou de outras, que as mulheres usam para
qualificar os serviços de saúde por não terem outras referências de qualidade.
Um dos fatores importantes apontados pelas gestantes para a opção pelo acompanhamento pré-natal no
Amparo Maternal é a postura dos profissionais relacionada sobretudo ao julgamento de valores, à não
discriminação da usuária quanto ao estado civil, condições socioeconômicas entre outras, como exemplificam as
seguintes falas: "As pessoas me tratam bem, dão atenção, não discriminam a gente que ficou grávida e não
casou"; "... o não preconceito com mãe solteira"; "... as pessoas me tratam bem, não tem diferença, não tem
preconceito pelo modo de ser pobre"; "Eu gosto da falta de preconceito. Aqui vocês não tratam a gente
diferente. São todos iguais ..."; "A doutora (termo que representa, na perspectiva da gestante, o profissional que faz o
atendimento na consulta pré-natal. Cabe esclarecer que todas as gestantes são informadas na primeira consulta, que o profissional

responsável pelo atendimento é a enfermeira obstétrica e ou estagiários de enfermagem com supervisão direta.) não tem
discriminação comigo, não me olha feio, me trata bem"; "O bom atendimento, tratam a gente com carinho e
atenção. O povo aqui olha para a gente”.
Muitas mulheres não são atendidas como desejam, recebendo do profissional pré-natalista um
atendimento que não permite o estabelecimento de um vínculo de confiança, ou seja, um atendimento
despersonalizado, com impaciência e pressa, o que as leva a qualificarem a assistência como de má qualidade.
Na vigência dessas situações, muitas gestantes não tem aderência ao serviço e buscam outro que possa lhes
oferecer o que procuram, sobretudo o trato humanístico. Bonadio (1996) chama a atenção para a necessidade das
mulheres no período da gravidez do chão seguro proporcionado por vínculo de suporte e de confiança. Quando a
assistência pré-natal proporciona, além do controle biológico, continente ou chão seguro para a mulher e sua
família, constitui-se em fator de coesão, viabiliza o cuidado de enfermagem humanizado e integral, podendo
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tornar-se um eficiente fator de redução da morbimortalidade materna e perinatal e transformar a realidade


vivenciada pelas mulheres durante o período da gravidez.
Para pensar a questão da maternidade, Diniz (1998) considera essencial o direito à condição de pessoa
como um dos principais aspectos dos direitos humanos básicos. Comenta que “Apesar do senso comum achar
que a gravidez é uma situação de beatitude, em que a mulher é bem tratada, em que é bem acolhida e assistida, há
muita discriminação”. Essa observação é bem retratada nos depoimentos apresentados ao longo deste tópico.
Algumas gestantes ao se manifestarem a respeito do que mais gostam no serviço de pré-natal do
Amparo, fizeram comparações com outros serviços, muitas vezes carregadas de sentimentos negativos,
evidenciando o descaso e a falta de respeito que elas sentem por parte de alguns profissionais pré-
natalistas. "Aqui, atendem sempre de bom humor, sem cara feia. Atendem bem, tratam a gente com educação.
Atendem a gente que é pobre com jeito e não com nojo. Outros lugares tratam a gente como se fosse um
inseto"; "... A recepção é muito boa. As doutoras são muito competentes e sérias, me sinto bem aqui. Eles olham
para mim como gente, diferente das doutoras do posto de saúde"; "Pelo bom atendimento que tive aqui, me
respeitaram. A doutora me trata realmente como ser humano e não como "mais um"; "Tudo aqui é bom, desde
as faxineiras até as doutoras ... tratam a gente de igual, não tem aquilo de médico e paciente... É um sacrifício
acordar cedo, mas é melhor do que quando chegamos no posto e o médico não vai, aí, eles não aceitam a gente.
"
Vale ressaltar a valorização do profissional que cuida da gestante, vendo-o como pessoa que cuida de
pessoa, evidenciando a utilização do potencial terapêutico do profissional: a dimensão humana. Bonadio et al.
(1997) comprovam que o uso de técnicas de comunicação terapêutica aliadas à competência técnica e ao trabalho
interdisciplinar têm proporcionado o continente tão necessário à pessoa que atravessa o período de transição
existencial, como o período gestatório. Seguem abaixo alguns relatos das gestantes a respeito: "Eu gosto da
minha doutora, confio nela e ela em mim. Confiança e respeito eu sinto aqui”; “... a doutora deixa a gente
falar, tira as dúvidas, pergunta ...”; “... as pessoas transmitem calma e confiança”; “Não há pressa. As
doutoras explicam tudo, me examina bem, com delicadeza, ela toca na gente. Olha para o meu rosto”; “As
doutoras são especializadas em gestantes... têm paciência com as mulheres ... se preocupa com a gente”; "As
doutoras são pessoas ótimas, fazem as coisas direitinho e com carinho. Atendem melhor que os postos. Não são
estúpidos. A gente vem porque tratam a gente bem. A gente pergunta e elas respondem."; "As doutoras escutam
a gente. Aqui são feitos todos os exames. Sou bem examinada e recebo orientação... Aqui é o melhor lugar que
conheci para fazer pré-natal, todos são educados e eficientes. A consulta é muito boa".
O uso do aparelho sonar-Doppler nas consultas de pré-natal foi um recurso extremamente valorizado
pelas gestantes. Ficou evidente que, ouvir o coração do filho ainda no seu ventre, permite à gestante constatar as
condições físicas do bebê; isso oferece segurança e satisfação. Assim, a ausculta fetal com sonar consiste em
estratégia de consulta pré-natal eficiente e de favorecimento de melhor interação mãe-filho. Além disso,
evidenciou-se como um dos atributos favoráveis de “boa consulta”. "Gostei daqui. Sou bem atendida, poderia
pegar até três conduções que eu continuaria vindo aqui. Eu tenho confiança que o meu filho está bem, porque
elas escutam sempre o seu coração, faço vários exames”; "Eu gosto do bom atendimento, a conversa com a
doutora, a explicação que ela dá para tudo, e escutar o coração do nenê”; "As doutoras dão atenção. São
simpáticas, escutam o coração do neném, explicam as coisas” ; "... Elas examinam muito a gente, escutam o
coração do bebê”.
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A disponibilidade de local para realizar os exames de laboratório e a ultra-sonografia no próprio serviço,


bem como a garantia de um lugar para o parto são motivos que favorecem a opção da gestante para a procura e
continuidade do acompanhamento pré-natal. Ter a garantia de um lugar para dar à luz, numa cidade como São
Paulo, de certa forma traz segurança e satisfação, evitando a tão comentada “peregrinação” por assistência no
momento do parto. “Não precisa procurar local para fazer exames. Aqui dá pra fazer exames de laboratório e
ultra-sonografia ...”; “Fazemos todos os exames aqui e o lugar de ganhar neném próximo ao lugar de fazer o
pré-natal”; “O lugar certo para ter o bebê. Os exames são feitos aqui. A garantia de saber que vou ser
atendida no dia marcado”; “Aqui já é maternidade”; “Aqui temos a facilidade da maternidade ao lado para
qualquer problema”; “Aqui tenho segurança de onde vou ganhar o nenê”.
Mais um fato que nos chamou a atenção e que merece melhor avaliação, é as mulheres considerarem o
serviço um lugar de cuidado para pessoas sadias e de exclusividade para gestantes. “Aqui só tem mulher
grávida, com isso diminui o risco de pegar doenças. Aqui não tem gente doente e faz exames para saber se você
tem Aids e tudo” ; “... Aqui é calmo e não há pessoas doentes, só gestantes”; “O lugar é limpo, só tem gestantes
sadias”; “O Amparo só tem gestantes e não me assusta. Parece uma casa de repouso”.
Todos os depoimentos expressam o que as mulheres desejam: serem vistas e tratadas como seres
humanos. As equipes de saúde devem repensar suas estratégias para oferecer à população o acesso e a qualidade
que estão previstos nos programas dos serviços públicos de saúde. Essas mulheres não precisaram somente
procurar por um lugar que oferecesse o cuidado pré-natal, mas a atenção e a preocupação deste serviço em
oferecer uma assistência adequada que atendesse às reais necessidades e às expectativas das gestantes.
Se as mulheres grávidas fossem encaradas como agentes e não meramente como pacientes, a assistência
pré-natal poderia resultar em reflexos positivos nos indicadores epidemiológicos na área de saúde materna e
perinatal (BONADIO; TSUNECHIRO, 2000). Dessa forma, confirma-se que tão importante quanto conseguir a
vaga em um serviço pré-natal é a qualidade como este é realizado. Essas mulheres fizeram a opção por um
serviço, por valorizarem um lugar que atenda a seus anseios.
As respostas evidenciaram também dois fatos relativos à dimensão administrativa: a longa espera para
ser atendida e a descontinuidade do atendimento no momento do parto: " A demora para ser atendida.
Chegamos cedo e temos que esperar duas ou três horas para ser atendida”; " A doutora que faz o pré-natal,
não fazer o parto. Queríamos que o parto fosse feito, pela mesma doutora que atende o pré-natal” .
Estes aspectos, de certa forma, eram esperados. O atendimento pré-natal é realizado por ordem de
chegada da gestante. Assim, conforme a demanda de atendimento daquele dia e da hora de sua chegada, a
gestante aguarda durante horas a sua vez. Essa queixa foi expressa por poucas gestantes. A nosso ver, para a
maioria delas essa espera é tolerada ou nem é percebida; pois a espera é “compensada” sobretudo por outras
qualidades que o serviço oferece, não considerando, dessa maneira, a demora no atendimento como “algo
negativo”, como se observa nas falas: “... Aqui nada é apressado. A consulta é demorada e bem feita. Ninguém
corre. Na consulta, tenho o tempo que eu quiser para perguntar tudo. Elas explicam tudo”; “As pessoas aqui
são alegres, de bem com a vida”; “É um sacrifício acordar cedo, mas é melhor do que quando chegamos no
posto e o médico não vai, aí eles não aceitam a gente”; “Aqui venho a várias consultas, só tenho alta quando
ganhar o bebê. No posto, quando entramos no nono mês eles não atendem mais a gente”; “... Aqui é muito
melhor do que nos postos. Sou respeitada! Sou atendida rápido, não preciso ficar o dia inteiro esperando”; “...
Aqui eu sou atendida em qualquer dia que eu vier. Sempre tem profissionais para atender”; “... As doutoras
nunca faltam, estão sempre de bom humor ... elas tocam na gente”.
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Está demonstrado que a adesão das mulheres ao pré-natal está relacionada com a qualidade da
assistência prestada pelo serviço e pelos profissionais de saúde. A assistência ao pré-natal é o primeiro passo
para o parto e nascimentos humanizados. O conceito de humanização da assistência ao parto pressupõe a relação
de respeito que os profissionais de saúde estabelecem com as mulheres durante o processo de parturição,
compreende a promoção e manutenção do bem-estar físico e emocional ao longo do processo da gestação, parto
e nascimento, entre outras atividades (BRASIL, 2000).
Os processos cognitivos e culturais das usuárias também determinam sua acessibilidade concreta aos
serviços de saúde, independentemente da distância geográfica (COHN et al., 1991). As mulheres querem receber
atenção e respeito nestes serviços. Não bastam as unidades existirem fisicamente, porém devem ser funcionais,
oferecendo algo mais às suas usuárias. Elas desejam ser tratadas como gente.
As gestantes desejam ser acolhidas, respeitadas; ter uma escuta aberta, sem julgamentos ou preconceitos
que lhes permitam falar de sua intimidade com segurança, o diálogo franco. A sensibilidade e a capacidade de
percepção de quem acompanha o pré-natal são condições básicas para que o saber em saúde seja colocado à
disposição da mulher e sua família, que são os atores principais da gestação. Agindo assim, os profissionais pré-
natalistas fortalecerão as gestantes em seus caminhos até o parto e ajudarão a construir o conhecimento sobre elas
próprias, levando a um nascimento tranqüilo e saudável (BRASIL, 2000). Porém, a realidade do cotidiano dessas
mulheres não é a esperada pelos técnicos do Ministério da Saúde. A prática profissional mostrou-nos que a
qualidade humana do atendimento realizado por alguns profissionais da rede pública e privada reflete o
despreparo de alguns profissionais em abrir mão de papéis predeterminados socialmente como aproximar-se de
cada usuária respeitando sua singularidade, sem perder de vista seu contexto familiar e social; escutar o próximo;
reaprender a fala popular; ou seja, ser ético e humano no trato com suas clientes, respeitando e valorizando as
necessidades alheias, assim como a cultura desta população.
Observamos em nossa experiência que muitos dos profissionais da rede pública ou privada de serviços
de saúde não possuem perfil, preparo e vontade de atuar com essa clientela, mas, por razões não esclarecidas
aqui acabam sendo muitos os profissionais existentes que essas mulheres encontram na prestação da assistência à
sua saúde.
As mulheres estudadas neste trabalho são provenientes de todas as regiões da cidade e de outros
municípios da região metropolitana de São Paulo. Estas gestantes procuraram o Amparo Maternal pela
acessibilidade oferecida pela Instituição em qualquer momento do processo gestacional e pela qualidade técnica
e humana de seus profissionais. Apesar de não haver articulação funcional da assistência do pré-natal, parto e
puerpério, ou seja, um trabalho em equipe, o que otimizaria a atenção à saúde materna e perinatal, a garantia do
atendimento no momento do parto é um dos fatores que determinam a opção da gestante.
Para finalizar, reforçamos a premência de investir nos recursos humanos, ou seja na formação
profissional e pessoal e rever as condições de trabalho dos profissionais de saúde, capacitando e motivando esses
indivíduos que detêm um sutil poder de aproximar ou afastar os clientes das portas dos serviços de saúde. Há
também necessidade da participação da mulher nas reivindicações de assistência, não apenas no âmbito
biológico, mas de modo mais abrangente que a atenda de forma integral. É preciso que elas se tornem sujeitos do
cuidado pois uma relação de ajuda, pressuposta no acolhimento, sofre influências tanto da formação do
profissional quanto da situação de cidadania das mulheres.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROS, S.M.O. Análise da qualidade da assistência pré-natal prestada pela enfermeira obstetra no
Amparo Maternal. São Paulo, 1990. 100p. Dissertação (Mestrado)- Escola Paulista de Medicina.
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BONADIO, I.C. “Ser tratada como gente”: a vivência de mulheres atendidas no serviço de pré-natal de uma
instituição filantrópica. São Paulo, 1996. 200p. Tese ( Doutorado)- Escola de Enfermagem, Universidade de
São Paulo.
BONADIO, I.C. et al. A comunicação terapêutica no cuidado pré-natal. Rev Paul.Enf, v.16, n.1/3, p.5-11,
1997.
BONADIO, I.C, TSUNECHIRO, M.A. A gestante no pré-natal: paciente ou agente? Revista de APS (Atenção
Primária à Saúde), Ano 2, n.6, p.20-3, 2000.
BRASIL. Ministério da Saúde. Assistência pré-natal: manual técnico. 3. ed. Brasília, Secretaria de Políticas
de Saúde, 2000.
COHN, A. et. al. A saúde como direito e como serviço. São Paulo, Cortez, 1991.
DINIZ, S.G. Direitos reprodutivos e maternidade. In: SEMINÁRIO DIREITOS REPRODUTIVOS,
EXCLUSÃO SOCIAL E AIDS, 1., São Paulo, 1998. Rio de Janeiro, Programa de Estudos e Pesquisa em
Gênero, Sexualidade e Saúde – IMS/UERJ, 1998. p.28-31.
OLIVEIRA, V.M. Um lugar no cuidado pré-natal: possibilidades e opções das gestantes. São Paulo, 2000.
131p. Dissertação (Mestrado) – Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo.
TSUNECHIRO, M.A., BONADIO, I.C. Saúde materna e perinatal: Projeto “Cuidando e Aprendendo com
Gestantes”. Rev Estudos Avançados, v.13, n.35, p.24-5, 1999 /Suplemento/.
TSUNECHIRO, M.A.et al. Acesso ao pré-natal em São Paulo: o contexto das mulheres de uma instituição
filantrópica. In: ENFERMAGEM E TECNOLOGIA, 6ª, São Paulo, 1998. Anais, São Paulo, Centro de Estudos
8 de Agosto do Hospital Nove de Julho, 1998. p.657-60.

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