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LITERATURA E REPERTÓRIO CANTO I – EMAC/UFG – Prof. Angelo Dias


Encarte que acompanha os CDs 01 a 05
CD 01: Idade Média;Renascimento; Cantata & Paixão

Peças vocais solo da Idade Média & Renascimento:


01) Anônimo Medieval: L’Homme Armé. (Coro em uníssono).
Os primeiros registros desta canção anônima datam do século XV, mas acredita-se que ela possa ser
bem mais antiga. Ela foi uma das melodias mais famosas de seu tempo, servindo de origem para
incontáveis arranjos e versões, sendo uma das canções mais usadas por compositores do
Renascimento como cantus firmus geradores de missas polifônicas. Seu texto simples alerta que “O
homem armado deve ser temido! O aviso tem sido dado em todo lugar: todos deveriam armar-se
com uma roupa de malha [de ferro]!”
02) Carmina Burana: Exiit Diluculo. (Duas vozes femininas e cordas tangidas).
Carmina Burana [ou “Canções de Beuern”] foi o nome dado no século XIX a uma coleção de 200
poemas de amor (muitos deles obscenos) encontrados no Mosteiro de Benediktbeuren e com data
aproximada de 1230. O texto desta canção conta a estória de uma pastorazinha que saiu ao
amanhecer com seu pequeno rebanho: uma ovelha, uma vaca com seu bezerrinho, uma cabra e um
cabrito. De repente ela avistou um jovem estudante deitado na grama, dizendo: “O que você está
fazendo aí? Venha, venha se divertir comigo!” Foi desta mesma coleção que Carl Orff extraiu os
vinte e quatro poemas que utilizou em sua Carmina Burana.
03) Anônimo Medieval (Inglaterra): Novus Miles Sequitur. (Voz, rabeca alto, flauta doce,
percussão).
Este é um exemplo de um conductus do século XIII, e conta a estória do assassinato de São Thomas
Becket, arcebispo de Canterbury (Inglaterra), martirizado em 1170.
04) Giraut de Borneil (morreu circa 1215): Reis Gloriós (Duas vozes femininas, cornamusa [gaita de
foles], flautas doces, saltério, harpa, percussão).
Este arranjo exuberante mostra esta que foi uma das mais famosas melodias do século XIII. Apesar
de ser apenas vocalisada nesta versão, o texto original da canção conta a triste estória de uma mulher
que, todas as noites, olha para as estrelas esperando impaciente pelo alvorecer, fazendo uma prece ao
Rei Glorioso para que proteja seu amado, seu companheiro, que agora está em terras mui distantes.
05) Alfonso X, o Sábio (1121-1284): Ben Pode Santa Maria (CSM 189). (Voz, alaúde e percussão).
A coleção Cantigas de Santa Maria é um dos mais importantes documentos musicais da Idade
Média na Península Ibérica. Alfonso X, rei de Catella, compôs muitas das mais de quatrocentas
canções reunidas nesta compilação. Três das cópias existentes contém a música escrita junto aos
poemas. Os textos, em galício antigo (uma mistura de português e espanhol), são em louvor à
Virgem Maria, relatando estórias repletas de milagres e conversões, revelando a forte devoção
popular mariana daqueles países a partir do século XIII. A canção desta faixa é estrófica, com um
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refrão e quatro versos. O refrão diz: Bem pode Santa Maria curar a todos os que são envenenados,
pois Ela é mãe d’Aquele que pisa em monstros e dragões. As estrofes vão contando a estória de um
peregrino de Valência que, certa noite, errou o caminho e encontrou-se em lugar estranho, face a
face com um terrível monstro. Como era devoto de Santa Maria, ele rezou fervorosamente e atacou a
fera com sua espada, cortando seu coração em dois. Porém, o sangue que jorrou da besta envenenou-
o e queimou-lhe o rosto. Sem esmorecer, o peregrino retomou seu cajado e continuou sua jornada,
confiando em Santa Maria para obter a cura.
06) Anônimo da Bretanha: Greensleeves (Voz feminina, alaúde e cítara).
As origens desta famosíssima balada são completamente desconhecidas. Sua primeira publicação foi
em 1580, mas suas raízes parecem perder-se na poeira do tempo. Apesar da tradicional, mas errônea,
associação com o Natal, esta é uma legítima canção de amor. O poeta canta seu amor por uma dama
chamada Lady Greensleeves (ou “mangas verdes”), talvez um sobrenome ou um apelido que,
provavelmente, se refere à roupa que sua amada usava. Nas estrofes, ele pede-lhe que não o trate
com desprezo e volte a amá-lo, pois no refrão ele afirma: “Greesleeves era minha única alegria,
Greesleeves era minha única delícia, Greensleeves era meu coração dourado, quem mais [poderia
ser], além da minha Lady Greesleeves...?”
07) William Cornysh (1468-1523): Ah Robyn, Gentle Robyn. (Voz feminina, violino e flauta doce
baixo).
Esta é uma das muitas canções inglesas dedicadas a contar a lenda de Robin Hood, personagem meio
histórico, meio lendário, e que, segundo tantos relatos diferentes, parece ter vivido no século XIII.
William Cornish foi músico, dramaturgo e ator de certo renome na corte do rei inglês Henry VIII
(ele mesmo um bom músico e compositor amador!). Esta peça, com poema de Sir Thomas Wyatt, é
um cânone perfeito a três vozes, mas esta versão apresenta a melodia na voz feminina apenas na
terceira entrada do cânone, enquanto as duas primeiras entradas são executadas por instrumentos. O
texto diz: “Ah, Robyn, gentil Robyn, conte-me o seu segredo e saberás o meu. Minha dama é infiel,
eu sei, pois ela ama outro, mesmo assim, nega! [Robyn responde:] Não entendo esta desconfiança,
pois acho as mulheres sinceras. Minha dama ama-me fielmente e não me trocará por um novo
amor.”
08 & 09) Guillaume Dufay (1400-1474):
“Ele é o mais importante adorno de nossa época!” Assim Piero de’ Medici referiu-se a Dufay, numa
carta escrita em 1467. O compositor é um dos elementos de ligação entre os derradeiros clarões do
entardecer da Idade Média e o desabrochar do Renascimento. Seu melodismo e sua inventividade no
uso da polifonia abriram caminho para toda uma geração (incluindo Ockeghem e Josquin). Dufay
escreveu tanto música sacra, quanto secular, com a mesma genialidade. Suas chansons (polifônicas
ou monofônicas) foram famosas em seu tempo e suas melodias foram usadas como cantus firmus em
peças sacras, tanto por ele mesmo quanto por outros compositores.
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Se la Face ay Pale (Contratenor, tenor, rabeca e alaúde).


Esta é, sem dúvida, sua canção mais famosa. A melodia simples é acompanhada por duas outras
vozes (que podem ser tocadas ou cantadas). Sua inventividade está no colorido rítmico sincopado
(técnica da época conhecida como hoquetus, hocket, ou “soluço”) e na harmonia, um tanto ousada,
gerada pela livre combinação horizontal das vozes. Se la Face é uma Ballade (forma que integrava
as Formes Fixes medievais, juntamente com o Rondeau e o Virellai) e foi composta por volta de
1430. O poema diz: Se minha face está pálida, a causa é o amor... Apesar do desprezo que ela me
dá, amo minha lady de todo coração!
Ce Jour de l’An (Contratenor, viola da gamba, rabeca e alaúde).
Esta canção é um Rondeau, e relata as esperanças de um jovem mancebo no dia de Ano Novo. Ele
promete se esforçar daqui para frente e achar uma donzela amorosa que ele cobrirá de presentes e de
cuidados.
10) Anônimo Espanhol do séc. XV ou XVI: Rodrigo Martinez. (Contratenor, tenor, baixo, cornamusa,
pífaro, viola, vihuella, percussão).
Esta deliciosa canção foi tirada do Cancionero Musical de Palácio, uma das muitas coletâneas de
villancicos e canzones que circularam na Espanha e em Portugal no Renascimento. Dentre suas 551
canções (em sua maioria sem indicação de autor), fruto de diversos copistas e escritas em várias
línguas, apenas 460 sobreviveram, pois 54 páginas foram arrancadas do manuscrito original em
alguma circunstância desconhecida. Diz este texto que Rodrigo Martinez, tão bonito e tão forte, era,
em verdade, um louco de pedra que apascentava um rebanho de gansos pensando que eram vacas...
Ele assoviava e gritava com eles, e levando-os para o rio para beberem água. A água levou seu
rebanho! Hei!
11) Francisco Millán (Fl. Ca. 1500): Durandarte. (Narradores [feminino & masculino], ensemble de
violas, flautas doces).
Esta belíssima canção, também extraída do Cancionero de Palacio, foi arranjada de forma magistral
para esta gravação. A peça original é, aqui, tocada por um conjunto instrumental, inclusive a parte
vocal, enquanto os cantores declamam o texto. No diálogo, a mulher pede ao cavaleiro Durandarte
que, juntos, relembrem o tempo passado, quando ele ainda a amava e quando dedicou a ela sua
vitória contra o exército Mouro. Ele responde que as palavras dela são lisonjeiras, mas ele sabe que,
enquanto estava ausente, ela amou seu rival Gayferos. Para evitar sofrimento maior, ele prefere
morrer desesperado.
12) Anônimo: Ay Triste, que Vengo. (Voz, vihuella).
Também do Cancionero de Palacio, esta dolente canção narra os dissabores de um amável pastor
vencido pelo amor. Ele foi ao mercado e viu uma donzela. Ao aproximar-se, porém, ela mostrou-lhe
as garras... Melhor que não tivesse ido!
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13 & 14) Antoine de Févin (1470-1511/12):


Févin foi um dos primeiros grandes compositores de chansons do Renascimento francês. Suas obras,
às vezes, eram usadas até como inserções em peças de teatro, e demonstram um equilíbrio e uma
caracterização notáveis em relação às nuances do texto.
Il fait bon aimé l’oyselet (Três flautas doces, voz feminina, rabeca, alaúde).
“É bom amarmos o passarinho que canta tão naturalmente, afinal, é o mês de Maio (Primavera, na
Europa) e ele deve seguir seus instintos. Seu canto é reparador, e alguns, como o rouxinol, podem
cantar sua maravilhosa canção enquanto durar a noite.”
Faulte d’Argent (Voz feminina, flautas doces, rabecas, viola da gamba)
“Ah! A falta de dinheiro é uma dor sem igual! Sem ele, todos devem saber como agir,
principalmente as damas. Sou amado por uma formosa donzela, a mais bela deste país. Vai,
rouxinol, e diga-lhe que nos amaremos sem impedimento nenhum, e que, sem ela, morrerei!”
Obs. Este é, talvez, um arranjo de Févin, pois Faulte d’Argent também é atribuída a Josquin
Despréz.
15) Alessandro Grandi (1586-1630): O Quam tu pulchra es. (Soprano, chitarrone).
Com o desenvolvimento da monodia e do madrigal solo (substituindo o madrigal polifônico), os
motetos polifônicos também foram gradualmente compartilhando espaço com os motetos solo.
Grandi foi um dos contemporâneos de Monteverdi que trabalhou na Basílica de San Marco, em
Veneza. Seu estilo lírico e expressivo aplicou-se maravilhosamente a esta peça, cujo texto é
adaptado livremente do Cântico dos Cânticos (Antigo Testamento), versículos 1,2 & 8. “Ó, quão
formosa és, meu amor! Seus olhos são como os da pomba, seus cabelos são como um rebanho de
cabras (negros?). Venha do Líbano, minha bela. Ergue-te, minha noiva, minha delícia, minha
imaculada. Vem, pois sofro de amor!”
Obs. A despeito de ser originalmente destinado a um falsetista, este moteto solo é aqui cantado por
um soprano.

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Cantata & Paixão:
16) Johann Sebastian Bach (1685-1750): Cantata “Jauchzet Gott in allen Landen” - BWV 51.
Calendário litúrgico: 15º domingo depois da Trindade (et in ogni tempo). Estréia: 17/10/1730.
Primeiro movimento – Ária: Jauchzet Gott (Soprano, trompete solo, cordas, baixo contínuo).
Texto: “Louvai ao Senhor toda a terra! Toda a criação proclame Sua glória. Queremos trazer
oferendas a nosso Deus, pois Ele sempre está ao nosso lado na aflição e na necessidade”.
Em verdade, esta esplêndida cantata em três movimentos para soprano solo foi escrita para um
menino, o sopranino Christoph Nichelmann, de apenas 12 anos... Em vista das dificuldades técnicas
incorporadas por Bach, ele deve ter sido um cantor extraordinário, fazendo inveja a muitos sopranos
femininos de épocas posteriores. Esta cantata também pode ser considerada um moteto solo de largas
proporções, como o Exultate jubilate de Mozart.
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17) Bach: Cantata “Wachet auf, ruft uns die Stimme” - BWV 140.
Calendário litúrgico: 27º domingo depois da Trindade. Estréia: 25/10/1731.
Dueto: Mein Freund ist mein. (Soprano, baixo, oboé obbligato, baixo contínuo).
Texto: O soprano e o baixo representam, respectivamente, a alma e o Cristo. Sop.: “Meu amigo é
meu!” Bx.: “E eu sou teu (“dele”, em algumas versões). Ambos: “E nada vai separar nosso amor!
“Caminharemos juntos, em meio às rosas do céu, cercados por alegrias e bênçãos”.
A cantata é baseada na parábola das dez virgens (as prudentes e as insensatas), que saíram com
candeias de azeite à espera de seus noivos, segundo é narrado no Evangelho de Mateus (25: 1-13).
Num sentido mais profundo, todos os textos dos vários movimentos da obra toda se entrelaçam para
mostrar como a alma prudente se encontrará com seu noivo (Cristo).
18) Bach: Cantata “Ein feste Burg ist unser Gott” - BWV 80.
Calendário litúrgico: Festival da Reforma. Estréia da versão “definitiva”: 31/10/1724.
Ária: Komm in mein Herzenshaus. (Soprano, baixo contínuo).
Texto: “Venha para a morada do meu coração, Jesus, meu desejo. Expulse Satanás e o mundo de
dentro dele, e deixe Tua imagem lá brilhar renovada. Fora, maldade e pecado terríveis!”
As origens desta cantata não podem ser traçadas com precisão. Sabe-se que alguns de seus
movimentos já formavam outra cantata, escrita ainda no período em que Bach trabalhou em Weimar.
A versão “definitiva” que hoje conhecemos foi uma ampliação feita depois que ele passou a
trabalhar como mestre de capela em Leipzig. Como foi uma peça escrita para celebrar a Reforma,
nada mais apropriado que Bach usasse o coral Castelo Forte (Ein feste Burg) como melodia
centralizadora de vários movimentos da cantata. Curiosamente, as partes de trompetes e tímpanos
utilizadas hoje em dia foram adicionadas de forma genial, após a morte do pai, por um dos muitos
filhos de Bach que se tornou músico de renome: Willhelm Friedmann Bach.
19) Bach: “Schweigt stille, plaudert nicht!” (Cantata do Café) - BWV 211.
Ocasião: Alguma festividade não religiosa em 1734-35.
Ária: Hat man nicht mit seinen Kindern. (Baixo, cordas, baixo contínuo).
Texto: “Não tem um homem cem mil dores de cabeça com seus filhos??? Meus conselhos de todo
dia à minha filha Liesgen são infrutíferos”.
Dentre as quase 600 cantatas que, acredita-se, Bach escreveu, pouco mais de 200 sobreviveram à
passagem do tempo e ao descuido de seus herdeiros. Dentre estas, uma esmagadora maioria é de
obras sacras, mas as poucas cantatas seculares que restaram revelam um outro lado de Bach. Nelas,
não está representado o Mestre de Capela de São Tomás, em Leipzig, retratado com sua solene
peruca branca, mas o homem comum, de humor refinado e espontâneo, e que sabia muito bem como
usar sua soberba arte para entreter seus ouvintes. Nesta divertida cantata, o texto é do famoso
libretista Christian Heinrici, o “Picander”, autor de outros textos bachianos, como o de várias das
cantatas e o da Paixão Segundo Mateus. Aqui, um pai desesperado (baixo) tenta tirar de sua filha
Liesgen (soprano) um vício despudorado que ela adquiriu, o de tomar café! Nos vários movimentos,
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a trama desenrola-se com louvores e recriminações à bebida exótica. Porém, segundo as más línguas,
o que se esconde por detrás do texto é que o café seria uma alusão velada ao sexo...
20) Bach: Magnificat – BWV 243
Calendário litúrgico: Natal de 1723 (1ª versão – em Mib) e Natal de 1730 (versão revisada –
RéM)
Dueto: Et Misericordia (Alto, tenor, cordas com surdina, baixo contínuo)
Texto: E sua misericórdia está com todos que o temem, de geração em geração.
O Magnificat é, talvez, o texto bíblico mais associado à celebração do Natal. A passagem é o canto
de louvor de Maria narrado no Evangelho de Lucas. Ao visitar sua prima Isabel (mãe de João
Batista) a criança estremece em seu ventre e ela exclama: Minha alma glorifica o Senhor, e meu
espírito se alegra em Deus, meu Salvador. Para a primeira versão do Magnificat, Bach escreveu
quatro pequenos motetos extras (ou interpolações) para serem inseridas durante a celebração
litúrgica natalina. Na versão definitiva, porém, ele removeu estas peças e conservou apenas os
movimentos que descrevem literalmente o texto bíblico.
21) Bach: Oratório de Natal (Weihnachtsoratorium) - BWV 248
Calendário litúrgico: Celebrações natalinas, com partes apresentadas em seis dias diferentes:
os três dias do Natal, a Festa da Circuncisão, o primeiro domingo do Ano Novo, e a Epifania.
Estréia: Natal de 1734.
Ária da segunda cantata: Frohe, Hirten! (Tenor, flauta, baixo contínuo).
Texto: “Alegrai-vos, pastores, e corram a ver a adorável criança. Renovem seus corações e
mentes.”
Apesar do nome, este não é realmente um oratório, no sentido estrito da palavra. Esta obra
monumental é, de fato, um grande ciclo de seis diferentes cantatas, para serem executadas em seis
dias distintos das celebrações natalinas. Estilisticamente, o Oratório de Natal reúne procedimentos
musicais e poéticos que Bach já utilizava nas suas Paixões: narrativas em recitativo, representando o
Evangelista bíblico, que são entremeadas de árias (meditações), coros, e corais (hinos) da tradição
luterana.
22) Bach: Paixão Segundo São João (Johannespassion) - BWV 245.
Calendário litúrgico: Sexta-feira Santa. Estréia: 7/04/1724.
Ária: Von den Stricken meiner Sünden. (Alto, Oboés I/II, baixo contínuo).
Texto: Após o Evangelista ter descrito em recitativos a cena da prisão de Jesus, o contralto comenta
o fato, nesta ária de profunda beleza: “Para libertar-me dos grilhões do pecado, meu Salvador foi
agrilhoado! Para curar-me as feridas do vício, Ele deu seu corpo para ser flagelado.”
Acredita-se que Bach escreveu quatro Paixões, mas apenas duas sobreviveram, as de São João e São
Mateus. Existem alguns fragmentos de uma Paixão segundo Marcos, mas sua reconstrução é desafio
quem tem estimulado, e desanimado, muitos pesquisadores e regentes. A Paixão Segundo São João é
uma obra de vigor quase apocalíptico. O coro é usado como elemento fundamental e canta quase que
todo o tempo,seja nas passagens da turba dos Judeus, seja nos corais Luteranos. As árias são em
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número mais reduzido do que o usual. Talvez seguindo o vigor da narrativa de João (com alguns
empréstimos de Mateus), Bach criou um drama enérgico e que se desenrola vertiginosamente em
direção ao final.
23 & 24) Bach: Paixão Segundo São Mateus (Matthäuspassion) - BWV 244.
Calendário litúrgico: Sexta-feira Santa. Estréias: 17/04/1727 e/ou 15/04/1729.
Arioso (O Schmerz!) & corale (Ach, meine Sünden). (Coro I: Tenor solo, flauta I/II, oboé da
caccia I/II, baixo contínuo. Coro II: coro e orquestra).
Texto: Este movimento se passa no Getsêmane, logo após Jesus instruir os apóstolos que velem com
ele, pois seu coração está aflito. Neste diálogo dramático, o tenor comenta: “Que angústia e que dor
a de Cristo, ante o assalto das forças da escuridão. Até seus amigos o abandonarão. Ah, como
desejaria poder estar ao seu lado para confortá-Lo e tornar Sua dor suportável”. Entremeado com
esta meditação, o coro entoa um coral da tradição luterana, dizendo: “porque meu Salvador deve
sofrer? Ai de mim! Foi meu pecado que o levou aée onde se encontra. Deus tirou minha dívida e
entregou-a a Ti!”
Ária 27a (dueto): So ist mein Jesus nun gefangen /(attaca) Sind Blitze, sind Donner (coro).
(Soprano, Alto, oboé da caccia I/II, violinos I/II em basseto/ coro duplo e orquestra tutti).
Texto: Esta cena se passa após a prisão de Jesus. O soprano e o contratenor comentam: “Assim, meu
Jesus foi feito prisioneiro. Lua e estrelas se apagaram de dor, enquanto levaram-No preso por
grilhões.” Enquanto isso, o coro intervém vigorosamente aqui e ali, dizendo: Deixem-No, soltem-No,
não O prendam!” Bach, no entanto, reserva o gesto dramático para o final do dueto. O coro duplo
entra furiosamente exclamando: “Os relâmpagos e os trovões desapareceram por entre as
nuvens??? Então, abre teus abismos, Ó inferno, e destrói, devore e consuma a todos estes traidores
sem piedade!!!”
A Paixão Segundo São Mateus é, sem dúvida, uma das mais sublimes criações do gênero humano.
Diferente de sua irmã mais nova, a Segundo São João, esta é uma obra intimista e de profundo
significado espiritual. O enfoque dramático não tem o vigor frenético da primeira, mas uma
preocupação real em fazer o ouvinte meditar sobre cada passo tomado em direção ao Gólgota,
levando-o a compreender a verdade espiritual que se esconde por detrás do drama. O coro tem sua
importância um tanto reduzida, e as árias de meditação aumentam em número e força. O próprio
Cristo ganha um halo musical fornecido pelas cordas, envolvendo sua música de maneira suave.
Durante suas quase três horas de duração, a São Mateus leva o ouvinte de maneira lenta – mas
inevitável – a uma verdadeira catarse espiritual.
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LITERATURA E REPERTÓRIO CANTO I – EMAC/UFG – Prof. Angelo Dias


Encarte que acompanha os CDs 01 a 05
CD 02: Missa1

01) J. S. Bach (1685-1750): Grande Missa em Si menor - BWV 232.


Este é um exemplo clássico de Missa Cantata, com sua estrutura dividida em vários movimentos.
Quanto à sua gênese, o Kyrie e o Gloria (que formam a Missa Brevis Luterana) foram compostos em
1733. O Credo (Symbolum Nicenum), o Sanctus e o Agnus Dei foram compostos ou parcialmente
re-adaptados de outras obras sacras do próprio Bach, durante os anos seguintes, tendo sido a Missa
completada em 1749. Devido à utilização do Credo – que era parte da liturgia Católica, mas não da
Luterana – Bach, que era protestante convicto, criou uma espécie de “monumento artístico ao
ecumenismo”.
Ária: Agnus Dei. (Alto, violinos I/II em uníssono, baixo contínuo).
02) Giovanni Battista Pergolesi (1710-1736): Stabat Mater.
O grande poema medieval Sabat Mater, atribuído a Jacoponi da Todi (1236-1306), narra as sete
dores de Maria ao pé da cruz, em face da morte ignominiosa sofrida por seu amado Filho. Segundo
alguns autores, esta obra de Pergolesi foi sendo composta ao longo dos anos e, aparentemente,
terminada pouco antes da morte do compositor. Escrita para soprano e alto solistas e orquestra de
cordas, estruturada em forma de cantata em vários movimentos, incorpora os aspectos estilísticos
mais marcantes da música sacra católica do Barroco tardio. Conta-se que Pergolesi escreveu a obra
para rivalizar com um famoso Stabat Mater (para o mesmo tipo de vozes e orquestra) escrito por
Alessandro Scarlatti.
Dueto (1º movimento): Stabat Mater Dolorosa (Soprano, alto, cordas e baixo cantínuo)
03 & 04) Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791): Grande Missa em Dó menor - KV 427 (417a).
Composta em Viena, de forma incompleta, em 1783 (e deixada inacabada). Ela foi estreada em
Salzburg, tendo Constanze Mozart como uma das solistas.
Ária: Laudamus Te (Gloria). (Soprano II, oboés I/II, trompas I/II, cordas).
Dueto: Domine Deus (Gloria). (Soprano I/II, cordas).
05) W. A. Mozart: Requiem – KV 626.
Cercado de lendas e lances dramáticos quase teatrais, os detalhes da composição do Réquiem
ainda intrigam os estudiosos. Hoje, já se sabe que ele foi composto, em 1791, por encomenda de um
certo Conde Walsegg, que tinha por hábito comprar secretamente as obras de compositores e
apresentá-las como se fossem de sua autoria. A morte prematura de Mozart deixou incompleto o
trabalho no Réquiem, que foi terminado por seu pupilo Franz Xaver Süssmayr, aparentemente com
base em rascunhos deixados por seu mestre. A obra foi entregue a Walsegg como sendo de Mozart, o

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Apesar de, obviamente, não serem missas, o Stabat Mater, o Te Deum e o Magnificat são textos de grande importância
litúrgica e, por questões de adequação de espaço, aparecerão nos nossos CDs sempre associados a outros gêneros.
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dinheiro foi pago, e todos ficaram satisfeitos. No entanto... Desde que a verdade veio à tona,
musicólogos e regentes, insatisfeitos com o trabalho de Süssmayr, tentam se arrojar na tarefa de
completar o Requiem, ainda que sempre com base no material do pupilo de Mozart. As
reconstruções mais famosas são as de Franz Beyer (1983 – modesta e menos “comprometedora”),
Richard Maunder (1982) e Robert Levin (1994 – bastante ambiciosa, mas nem sempre feliz...).
Quarteto: Tuba Mirum [2º movimento da Sequentia “Dies Irae”] (SATB solo e orquestra)
06) Joseph Haydn (1732-1809): Missa de Santa Cecília – Hob. XXII #5.
Esta missa votiva, em louvor à Virgem Maria, foi composta por Haydn em 1766, em ação de graças
por ter conseguido seu primeiro grande emprego. Ele foi nomeado Mestre de Capela da corte da
família Esterházy (Hungria), após ter trabalhado lá algum tempo como assistente. Esta missa foi
escrita no modelo de missa cantata, e incorpora elementos arcaicos, fruto da formação meio
“Barroco tardio” de Haydn, e modernos (Classicismo), num equilíbrio realmente notável.
Ária & coro: Christe eleison (tenor solo, coro SATB e orquestra)
07) Joseph Haydn: Missa in Tempore Belli (Paukenmesse) - Hob. XXII:9.
Composta em 1796-97, é a 2ª no famoso grupo das “seis missas sinfônicas” (suas últimas missas),
escritas entre 1796 e 1802. O tom militar do Agnus Dei (com trompetes e tímpanos) tornou a obra
famosa, e deixa transparecer ecos das guerras napoleônicas que afligiam a Europa naquele período.
Seguindo o exemplo de Haydn, Beethoven também deu um tom militar, mas bem mais acentuado, ao
Agnus Dei de sua Missa Solemnis, escrita pouco mais de duas décadas depois. Este movimento em
particular, o Agnus Dei, foi escolhido por estes dois compositores porque seu texto é seguido do
Dona nobis pacem (Dá-nos paz!)
Ária: Qui Tollis Peccata Mundi [Extraída do Gloria]. (Baixo, Cello solo, cordas, coro)
08) Haydn: Theresienmesse (Missa Therese) - Hob. XXII:12.
Composta em 1799, é a 4ª no grupo das “seis últimas missas” mencionado acima. Seu caráter
festivo e delicado, quase íntimo, indica uma clara dedicatória à Virgem Maria. Haydn era um
fervoroso devoto “mariano”. Segundo ele mesmo relatou a um biógrafo, sempre que a inspiração o
abandonava ele dedilhava algumas Ave Marias em seu rosário e seu coração se abria novamente à
música. É nesta missa que os solistas vocais (em especial o contralto) desempenham, talvez, seu
papel mais marcante em toda a produção do compositor neste gênero.
Quarteto: Et Incarnatus est/Crucifixus (Credo). (SATB solo, orquestra)
09) Ludwig van Beethoven (1770-1827): Missa Solemnis – Op.123.
Escrita entre 1819 e 1823, esta missa é um tributo espetacular tanto à majestade divina, quanto à
fragilidade da condição humana. Beehtoven, já completamente surdo desde 1818, impregnou a obra
de uma angustiante intensidade emocional, tornando-a, talvez, a obra vocal mais grandiosa jamais
escrita. O Agnus Dei da Missa Solemnis – a exemplo do movimento homônimo da Missa in
Tempore Belli, de Haydn – utiliza-se de elementos de sonoridade militar (trompetes, tímpanos,
ritmos de marcha, etc.) para exprimir o horror que as guerras causam à humanidade. O início do
Agnus (aqui reproduzido) é uma das mais belas páginas da história da música.
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Quarteto & coro: Agnus Dei (SATB solo, coro e grande orquestra.)
10) Franz Schubert (1797-1828): Missa nº 6, em Mi bemol maior - D. 950.
Supostamente composta em 1828 (opiniões são divididas entre os estudiosos), sabe-se, porém, que
esta missa foi última obra de Schubert no gênero, e uma de últimas composições. Seu caráter
profundo, quase escuro e intimista, aparece com certeza como que sendo um reflexo de sua angústia
espiritual e emocional de um compositor que cada vez mais sentia proximidade da morte.
Trio: Et Incarnatus est [Extraído do Credo]. (Tenor I/II, soprano, orquestra).
11) Gioacchino Rossini (1792-1868): Stabat Mater
Composto em 1833, de forma incompleta, e terminado em 1842. São inegáveis os ecos da ópera
nesta obra – principalmente nos solos – não apenas por ser este o gosto do século XIX em relação à
música sacra, mas, especialmente, porque Rossini foi um dos maiores mestres da linguagem
operística no Romantismo Belcantista italiano. Não obstante sua teatralidade, a música não rouba o
caráter religioso à peça como um todo, exibindo um perfeito equilíbrio entre o humano e o divino. O
Stabat Mater segue o velho modelo de “missa Cantata”, sendo dividido em vários movimentos.
Ária: Cujus Animam Gementem. [2º movimento] (Tenor & orquestra)
12) Hector Berlioz (1803-1869): Te Deum - Opus 22.
Composto em 1849, este Te Deum incorpora a grandiosidade e a monumentalidade que se tornaram
características da música francesa pós-revolução de 1789. A música das grandes massas tinha que
ser feita com a magnificência (em quantidade de executantes e volume de sonoridade) necessária à
valorização da nova filosofia de universalidade e abrangência que tomou a França no século XIX.
Ária com coro (prière): Te ergo Quaesumus. (Tenor, SA coro, orquestra).
13) Giuseppe Verdi (1813-1901): Messa da Réquiem [ou simplesmente “Réquiem”]
Esta obra tem uma gênese curiosa. Verdi foi um dos vários compositores que, em 1871, participaram
de um esforço coletivo no intuito de compor um Réquiem que celebrasse a recente morte de Rossini.
Segundo o plano original, cada um comporia um movimento do que seria a grande obra final. Assim
nasceu o Libera Me de Verdi (última parte do Réquiem). Por diversas razões, o esforço acabou não
dando certo e, apesar de terminada, a chamada Messa per Rossini nunca foi executada, ficando
engavetada por quase um século. Apenas na década de 1990, por iniciativa do regente alemão
Hellmuth Rilling, a obra foi restaurada e gravada em CD e vídeo. Quanto ao Réquiem de Verdi, três
anos mais tarde, em 1874 o compositor decidiu aproveitar o Libera Me, que já estava pronto,
usando-o como ponto de partida para compor sua própria missa dos mortos. O mais genial da obra é
o fato de que Verdi foi aproveitando elementos musicais do Libera para escrever o resto da missa.
Assim sendo, o último movimento passou a ser, então, uma espécie de recapitulação musical de todo
o Réquiem.
Quarteto e coro: Kyrie Eleison/Christe Eleison. (SATB solo, coro, grande orquestra).
14) Johannes Brahms (1833-1897): Ein Deutsches Requiem (Um Requiem Alemão) - Opus 45.
Composto em 1866, o Réquiem Alemão é uma obra singular, sendo, a um só tempo, ecumênica,
universal e extremamente pessoal do ponto de vista do conteúdo espiritual do texto. Justamente pela
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utilização dos textos, ele não se enquadra numa definição tradicional de obra “litúrgica”, sendo mais
uma meditação e um consolo aos vivos do que uma súplica de clemência pela alma dos que
morreram. Neste aspecto, Brahms seguiu os passos de Heinrich Schütz (1585-1672) – a quem muito
admirava – e que já havia abordado o gênero sob ótica semelhante ao escrever suas Musikalisches
Exequien [Exéquias Musicais], em 1635. O movimento abaixo, com soprano e coro, foi acrescentado
por Brahms dois anos mais tarde, em 1868.
5º movimento: Ihr habt nun Traurigkeit. (Soprano, coro, cordas com surdina, sopros.
15) Giacomo Puccini (1858-1924): Messa di Gloria.
Puccini escreveu sua única missa em 1880, aos 22 anos, como projeto final de seu curso de
composição no conservatório da cidade de Lucca. Ela representa uma compilação de todos os seus
estudos, incluindo orquestração, contraponto e fuga. Seus traços mais marcantes, porém, são a
teatralidade e a emoção exacerbadas (bem ao gosto da música sacra do século XIX), características
que indicam claramente que o compositor já se preparava para uma gloriosa carreira operística.
Ária: Gratias Agimus Tibi [extraída do “Gloria” da missa] Tenor solo e grande orquestra.
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LITERATURA E REPERTÓRIO CANTO I – EMAC/UFG – Prof. Angelo Dias


Encarte que acompanha os CDs 01 a 05
CD 03: Oratório

1 & 2) Emilio de’ Cavalieri (ca. 1550-1602): Rappresentatione di Anima e di Corpo [Representação da
Alma e do Corpo] (1600).
Considerada o primeiro oratório escrito, esta obra é um misto de cantata, oratório e ópera,
incorporando as mais recentes técnicas de composição desenvolvidas pela Camerata Fiorentina
(Monodia com baixo contínuo e o Stile Rappresentativo) e que convivem lado a lado com certos
procedimentos madrigalescos herdados da Prima Prattica polifônica do Renascimento.
Arioso Recitado: La Nostra Vita in Terra. O Consiglio, ou a “Prudência”, uma das muitas
personagens alegóricas da obra, declara que a vida nada mais é do que uma guerra interminável
contra o pecado que rodeia o ser humano, e que, para combatê-lo, é preciso usar as armas da fé
verdadeira.
(Tenor & baixo contínuo).
Coro: Gloria sia a Dio. O coro angélico proclama a gloria do Criador. (Coro infantil e orquestra)
3) Heinrich Schütz (1585-1672): Weihnachts-Historie [A história do natal] (1664) - SWV 435
São nove Interdemedia (árias, coros, conjuntos etc.) separados por recitativos secco do narrador
(evangelista - tenor). O texto foi compilado dos Evangelhos de Lucas e Mateus, e narra de forma
quase cênica as circunstâncias que cercam o nascimento de Jesus: a adoração dos pastores e dos
magos, a perseguição de Herodes, a fuga para o Egito e o retorno a Israel.
Ária: Zihet hin! Nesta ária pomposa, cercada pela aura de majestade conferida pelos trompetes, o rei
Herodes ordena que procurem saber imediatamente o paradeiro do recém nascido, trazendo-lhe
notícias para que também ele possa ir adorar a criança.
(Baixo, violas da gamba, trompetes)
4 & 5) Alessandro Stradella (1644-1682): San Giovanni Battista (1675)
Oratório dramático em italiano, para solistas, cordas e baixo contínuo (órgão, cravo, teorba). A
estória gira em torno da narração bíblica da prisão e conseqüente degolação de São João Batista.
Como era comum nos oratórios e cantatas italianos do Barroco, a participação do coro era muito
discreta (ou nenhuma, como nesta obra), pois o enfoque era nas vozes solistas.
Arioso: Anco in cielo il biondo Auriga. Nesta ária, o Consigliero, ou Conselheiro, usa do artifício
de fazer uma comparação lisonjeira entre o rei Herodes (não o mesmo Herodes da época do
nascimento de Jesus, trinta anos antes) e a figura do deus grego Apolo. O objetivo é adulá-lo a fim
de convencê-lo a ceder ao pedido da esposa (e sobrinha...) Herodíades, que queria a cabeça de João
Batista, literalmente.
(Tenor, baixo contínuo, cordas)
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Trio: Non fia ver che mai si sciolga. Neste trio, Salomé, Herodiades e o Conselheiro celebram seu
plano, que culminará com a morte de João Batista
(Soprano, mezzo-soprano, tenor, cordas, baixo contínuo)
06) Alessandro Scarlatti (1660-1725): La Giuditta [Judite] (1693)
Oratório para solistas e orquestra, com libreto de Benedetto Pamphili. O enredo, extraído do Antigo
Testamento (na versão da Vulgata católica), se desenrola na fortaleza de Betúlia, na Judéia, sitiada
pelo general assírio Holofernes. Após longo e penoso período de cerco, os israelitas tentam um
último e arriscado plano. A piedosa (quem diria...) viúva Judite é enviada secretamente como serva
ao acampamento inimigo, à presença de Holofernes. Dias mais tarde, após ter conquistado a
confiança do general, a piedosa corta-lhe a cabeça e leva de volta para os israelitas. Derrotados, os
assírios são postos em fuga e Judite vira heroína. A história de Judite na faz parte da Bíblia
protestante.
Sinfonia Bellica & ária: Lampi e Tuoni!. Numa vigorosa Aria di Bataglia, Holofernes revela seu
amor pela guerra, marcada pelo retinir de sua espada na bigorna da morte! A sinfonia serve de
introdução e cria a atmosfera de força e coragem que definem o caráter do inimigo dos israelitas.
7 & 8) Georg Philip Telemann (1681-1767): Der Tag des Gerichts [O Dia do Juízo] - (1762).
Oratório alegórico-dramático para coro, solistas e orquestra. O poema é dividido em quatro
“Contemplações” que comentam o destino da humanidade ante o advento do Apocalipse.
Personagens: Razão, Fé, Devoção, Crente, Jesus etc.
Recitativo accompagnato: Ich sehe, Gott, den Engel deiner Rache! Numa cena musical
tipicamente “apocalíptica”, a personagem exclama “Eu vejo, senhor, o anjo da Tua vingança”.
(Alto, cordas, trompa solo)
Ária: Seid mir gesegnet, ihr Gerechten. Neste trecho de grande expressividade, Jesus conclama os
justos e puros de coração a herdarem o Reino de seu Pai. (Baixo, cordas, oboé obbligato)
9) George Frederic Handel (1685-1759): Samson [Sansão] - HWV 57
Oratório dramático, composto em 1741. Adaptado do livro Samson Agonistes, de John Milton (1608-
1674). Ao final do oratório, após a morte de Sansão – que recuperara sua força uma última vez,
destruindo as colunas do palácio filisteu e soterrando os inimigos de Israel – o povo Hebreu chora
sua partida. Porém, eles se lembram de que ele agora se tornou herói, sendo digno de honrarias.
Após seu funeral, todos cantam em louvor a Deus.
Ária: Let the bright Seraphim. Esta é a última ária da Capo do oratório. Uma mulher israelita
exclama que o Serafim resplandecente irá soprar sua trombeta em flamejante música. Na seção
central (B), mais calma, ela diz que as hostes de Querubins tocarão suas harpas douradas. Após a
ária, o magnífico coro final (que não coube aqui...) declara que todas as harmonias celestes e terrenas
celebrarão a glória de Deus.
(Soprano, cordas, trompete solo, e baixo contínuo)
14

10, 11 & 12) G. F. Handel: Judas Maccabaeus [Judas Macabeu] - HWV 63


Oratório dramático, composto em 1747; O libreto do Reverendo Thomas Morell foi baseado em
I Macabeus (Antigo Testamento). A história narra a luta do povo israelita, liderado por Judas
Macabeu, contra o domínio do rei sírio Antioco IV.
Recitativo & ária: I feel the Deity within/ Arm, arm ye brave! Após um recitativo accompagnato,
no qual revela a inspiração divina que o motiva, Simão incita os israelitas à batalha numa ária de
grande vigor. (Baixo, cordas, oboés, baixo contínuo)
Recitativo, ária & coro: My arms! / Sound na Alarm! / We hear, we Hear! Judas se prepara para a
batalha, pedindo que “chamem apenas os bravos de coração e soem o alarme com as trombetas
prateadas”, ao que o povo (coro) responde prontamente “Nós ouvimos e estamos prontos! Se
preciso for, pereceremos em defesa da Lei, da Religião e da Liberdade!”
Ária: Father of Heaven. Após a campanha vitoriosa de Judas Macabeu contra o inimigo de Israel,
esta ária serena e introspectiva convida o povo à celebração da “Festa das Luzes”. Esta é,
certamente, uma das mais belas árias de todo o repertório para contralto, por sua expressividade, e
sua elegância na escrita melódica e sonoridade (as cordas tocam em surdina).
13) Joseph Haydn (1732-1809): Die Schöpfung [A Criação] - Hob XXI:2
Estreado em 1798, com libreto (em alemão) do Barão Van Swieten, este oratório foi baseado no
romance inglês Paradise Lost [O Paraíso Perdido], publicado em 1667 por John Milton. Dividido em
três partes, as duas primeiras narram a criação do mundo e das criaturas, utilizando-se, para
descrevê-los, de gestos pictórico-musicais espetaculares na escrita para orquestra, coro e solistas. A
terceira e última parte contém singelos duetos de amor, cantados por Adão e Eva, secundados pelo
coro celeste.
Recitativo & Ária: Und Gott sprach.../ Auf starkem Fittiche. Esta ária luminosa descreve a criação
dos pássaros, desde a majestosa águia, que corta os ares, ao rouxinol, que canta docemente nos
arbustos. Não podia faltar, é claro, a menção aos pombinhos enamorados que murmuram na
ramagem...
14) J. Haydn: Die Jahreszeiten [As Estações] - Hob XXI:3
Estreado em 1802, também com libreto em alemão do Barão Van Swieten, As Estações é baseado na
ode pastoral The Seasons, escrita em 1730 pelo autor inglês James Thomson. Com três personagens
(Hanne, Lukas e Simon), o oratório é, naturalmente, dividido em Primavera, Verão, Outono e
Inverno, contendo cenas típicas de cada estação, representadas musicalmente de forma magistral.
Curiosamente, o que parece ser apenas um libreto pastoral sobre as estações do ano transforma-se, na
representação do Inverno, numa comparação sutil – mas inevitável – entre o enredo e as quatro fases
da vida humana: infância, juventude, idade adulta e velhice.
Trio & Coro: Dann bricht der grosse Morgen an! Este é o movimento final do oratório, que
termina de forma laudatória. As três personagens e o coro afirmam que, mesmo após o sofrimento do
“Inverno da vida” (a velhice), virá, com a morte, o renascimento para a eternidade, o descanso
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merecido dos infortúnios e labores da vida terrena. Enfim, uma outra Primavera está à espera, para
que o ciclo se renove. (Soprano, tenor, baixo, coro & orquestra)
15) Felix Mendelssohn (1809-1847): Elijah [Elias] - Op. 70.
Escrito sob encomenda para o Birmingham Music Festival (Londres), em 1846, este oratório
representa a perpetuação de uma longa linhagem de obras do gênero escritas na (ou para a)
Inglaterra, desde os tempos de Handel. Ao lado de O Messias (Handel) e de A Criação (Haydn),
Elias é um dos oratórios mais populares de todos os tempos. O texto narra a saga do profeta bíblico,
e sua luta incansável pela reconversão do povo israelita, há longo tempo devotado ao culto do deus
pagão Baal.
Quarteto: O come everyone that thirsteth. No final do oratório, após inúmeros eventos dramáticos,
incluindo a ascensão de Elias ao céu num turbilhão de fogo, os solistas convidam a todos que têm
sede para que venham beber na fonte das águas refrescantes do Espírito de Deus. (Sop, alto, tenor,
baixo, orquestra).
16 & 17) Mendelssohn: Paulus – Op.36
Primeiro oratório de Mendelssohn, Paulus foi estreado em 1836, na Gewandhaus, na cidade de
Leipzig (ainda hoje uma das mais tradicionais salas de concerto do mundo). Esta obra prima, muitas
vezes eclipsada pela imensa popularidade do Elias, estreado uma década mais tarde, conta a estória
da conversão de Saulo na estrada que levava a Damasco, na Síria. Na segunda parte do oratório, o
novo apóstolo, agora chamado de Paulo, espalha a mensagem de amor do Cristo, muitas vezes de
forma desafiadora e impetuosa.
Recitativo dramático (com orquestra): Und Paulus kamm zu der Gemeinde. O soprano solista
conta como Paulo foi a templo e pregou fervorosamente, sendo, então, escolhido pelo Espírito Santo,
juntamente com seu companheiro Barnabé, para cumprir a divina missão a eles destinada.
Dueto: So in nun wir Botschafter. Após o recitativo acima, Paulo e Barnabé cantam este duetino,
repassado de humildade e devoção, aceitando o fato de haverem se transformado em mensageiros do
Cristo. (Barítono, tenor e orquestra)
18) Hector Berlioz (1803-1869): L’Enfance du Christ [A Infância de Cristo] - Op. 25
Terminado em 1854, o oratório é dividido em três partes: O Sonho de Herodes, A fuga para o Egito
e A Chegada a Saís. Após o período fecundo vivido pela música francesa no século XVII e primeira
metade de século XVIII, tempo em que o oratório floresceu com compositores como Marc-Antoine
Charpentier (1643-1704), este gênero pareceu ter perdido seu status naquele país. Assim sendo, A
Infância do Cristo representa quase que a redescoberta do oratório na França, após quase um século
de esquecimento. A visão de Berlioz em relação ao texto, às vezes mística, às vezes de um realismo
cruel, repassa a música de uma aura mágica e pastoral a princípio, mas sombria e angustiante durante
o sonho de Herodes e a fuga para o Egito.
Cena & ária: Dans cette ville immense! Após longa e extenuante jornada por desertos cheios de
perigos, a Santa Família chega finalmente à cidade de Saís, no Egito. Desesperados, José e Maria
batem de porta em porta, tentando conseguir abrigo para seu bebê exausto, já quase sem vida em
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virtude dos sofrimentos da viagem. Finalmente, um Père de famillie (Pai de família) os acolhe
carinhosamente em sua casa. (Soprano, Barítono & orquestra)
19) Camille Saint-Saëns (1935-1921): Oratorio de Noël [Oratório de Natal] – 1858
Este oratório possui um caráter mais contemplativo do que dramático. Apesar de ter sido escrito
quando o compositor tinha apenas 23 anos, ele já deixa transparecer um domínio seguro da técnica
composicional e uma exploração consciente dos recursos expressivos oferecidos pelo texto. A
abertura baseia-se na pifa (sinfonia pastoral) do Oratório de Natal, de Bach. Contrariando a prática
já disseminada de se usar o vernáculo nos libretos de oratórios, a obra de Saint-Saëns foi escrita
utilizando-se dos textos bíblicos em Latim, extraídos da Vulgata.
Trio: Tecum Principium. Para este trecho de rara beleza (bastante “francês” em relação à
sonoridade), o texto foi extraído do Livro do Profeta Daniel: “Contigo estava o princípio, no dia da
tua força; Contigo está o princípio, no esplendor dos santos.” (Soprano, tenor, barítono, harpa e
órgão)
20) César Franck (1822-1890): Les Béatitudes [As Bem-aventuranças]
Esta obra de suprema beleza foi terminada em 1879, após dez anos de um trabalho lento e cuidadoso,
interrompido de quando em quando para a composição de outras obras. Ele reflete o profundo
sentimento do povo francês pelo recém proclamado dogma do Sagrado Coração de Jesus, pelo Papa
Pio IX, que inspira devoção piedosa, retidão de conduta na vida terrena e confiança na recompensa e
redenção eternas que sobrevirão às agruras da existência humana. O libreto, escrito por madame J.
Colombe é estruturado em um prólogo e oito cenas (ou episódios) que descrevem e comentam cada
uma das bem-aventuranças proclamadas pelo Cristo no Sermão da Montanha (Mateus, 5). A cada
uma delas é associada uma aflição humana, para a qual elas representam a promessa de consolo. Os
solistas são muitos, e o coro tem papel fundamental na ação dramática.
Quarta Bem-aventurança (excerto): Puisque partout où nous etraîne um sort fatal. “Bem-
aventurados os que têm fome e sede de justiça, pois serão saciados”. O solista comenta que o mal
reina sobre a alma humana na terra, e que, quando abre as asas, o coração sente apenas instintos
rebeldes. Porém, há também em nosso coração uma chama inextinguível que clama: “Oh Ideal, Oh
Santidade, Oh Justiça, vinde! E possa tua luz pura, Oh Verdade, expulsar as trevas da terra para
sempre!” (Tenor & orquestra.)
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LITERATURA E REPERTÓRIO CANTO I – EMAC/UFG – Prof. Angelo Dias


Encarte que acompanha os CDs 01 a 05
CD 04: Ópera Barroca

1 & 2) Claudio Monteverdi (1567-1643): L’Orfeo (Favola in Musica)


Composta em 1607 e publicada em 1609. Apesar de ter sido concebida sete anos após as óperas
Euridice, escritas individualmente e a duas mãos por Caccini e Peri, L’Orfeo é considerada a
primeira ópera no sentido moderno do termo. Isso se deve à genial relação drama/música que a
permeia. O libreto de Alessandro Striggio baseia-se na lenda grega do bardo Orfeo, que encantava o
povo antigo com sua lira e seu canto. Quando sua amada Euridice morre no dia do casamento, picada
por uma serpente, Orfeo decide descer até os Campos Elísios (morada dos mortos) e, através de sua
música, sensibilizar os deuses para que permitam o retorno da sombra de sua consorte de volta à
Terra.
Ariosos & Balletti: Rosa del ciel (Orfeo)/ Io non dirò qual sia (Euridice); Lasciate i monti/ Vieni,
Imeneo (Coro). Orfeo, Euridice, ninfas e pastores cantam alegremente, preparando-se para as
núpcias que serão celebradas dentro em pouco.
Arioso & Lamento das Ninfas e Pastores: Tu sei morta (Orfeo)/ Ahi, caso acerbo! (coro). Após o
anúncio da súbita morte de Euridice, Orfeo canta este pungente lamento. Em seguida, todos
deploram o cruel destino que separou os jovens amantes.
3) Francesco Cavalli (1602-1676): La Calisto
Ópera cômica composta em Veneza, em 1652. O libreto de Giovanni Faustini baseia-se nas
Metamorfoses, do poeta romano Ovídio (43 a.C./17 d.C.). Discípulo de Monteverdi, Cavalli levou a
ópera a um novo estágio de desenvolvimento musical e dramático. Sua linguagem, bem mais
acessível ao gosto popular da época, incorpora belas melodias e efeitos teatrais. Na divertida
embrulhada que é o libreto, Jove [Zeus] apaixona-se por Calisto, devotada sacerdotisa de Diana,
deusa da caça e da natureza. A moça recusa-se a ceder aos apelos do rei dos deuses, mas este se
disfarça assumindo a forma de Diana e, assim, consegue seduzir Calisto, levando-a para passear na
floresta, enquanto se lobo apronta... Mais tarde, ao encontrar-se com a verdadeira Diana, Calisto
começa a relembrar à deusa estupefata os beijos apaixonados que trocaram. A confusão, claro, torna-
se geral e envolve até Juno, a enfurecida esposa de Jove. Após mil peripécias, Calisto é transformada
numa ursinha e acaba virando uma constelação (Ursa Menor).
Ária: Piante ombrose. No início da ópera, a jovem Calisto chora em meio a uma floresta devastada
pelas guerras que assolavam o mundo. (Já naquela época...) Seu canto relembra com tristeza a
sombra fresca que outrora existira por entre aquelas árvores mortas. (Soprano, orquestra, baixo
contínuo).
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4 a 9) George Frederic Handel (1685-1759): Giulio Cesare [Júlio César] - Londres,1724.


Sua mais famosa opera seria; Libreto: Nicola Francesco Haym, baseado em obra homônima de G. F.
Bussani (1677). Como de praxe na opera seria, as diversas cenas de cada ato são compostas de
recitativos seguidos de árias Da Capo; Alguns papéis, notadamente os de César e Sesto, foram
escritos para altos castrati. A história passa-se no Egito, em 48 a.C., e mescla tramas político-
militares (a conquista do Egito ptolomaico pelo Império Romano) e o romance entre César e
Cleópatra.
Ária: Va tacito. Nesta ária Da caccia (“de caça”, devido à trompa), César compara um traidor a
um caçador que dissimula para capturar sua presa.
(Alto, trompa solo, orquestra, baixo contínuo)
Ária: Venere bella. Aguardando a chegada de César, Cleópatra pede à deusa Vênus que torne sua
beleza irresistível, para que possa seduzir o poderoso romano. (Soprano, orquestra, baixo contínuo)
Ária: Al lampo dell’armi. Uma agitada ária de vendetta (“vingança”) na qual César jura vingar-se
dos conspiradores que tramam sua morte. (Alto, orquestra, baixo contínuo)
Recitativo accompagnato: Che sento? Cleópatra acabou de saber que aqueles que conspiram contra
a vida de César também planejam assassiná-la. (Soprano, orquestra, baixo contínuo)
Ária: La giustizia. Sabendo que César sobreviveu ao ataque dos conspiradores, o confiante Sesto
afirma que a justiça triunfará e os malfeitores serão punidos. (Alto, orq, baixo contínuo).
Cena com ariosos e recitativos: Voi, che miei fide ancelle. Prisioneira em seus aposentos, e não
tendo ainda conhecimento de que César sobreviveu aos conspiradores, Cleópatra lamenta-se com
suas aias. Subitamente, César entra com seus centuriões para libertar sua amada.
(Soprano, oboé solo, orquestra + Alto, baixo cont.)
10) Henry Purcell (1659-1695): Dido and Aeneas [Dido e Enéias].
Ópera em três atos com libreto de Nahum Tate, estreada em Londres em 1689. A trágica história foi
extraída da Eneida, obra clássica do poeta romano Virgílio (70-19 a.C.). Seguindo o modelo da
Odisséia de Homero, nascida alguns séculos antes (e que narra os dez anos de aventuras do grego
Ulisses durante seu retorno à ilha de Ítaca, após o fim da guerra de Tróia), a Eneida revela a odisséia
de Enéias, troiano que foge da cidade derrotada e vaga com seus navios pelo mar, pois os deuses
ordenaram que fosse para uma terra distante fundar uma cidade poderosa, que mais tarde seria
conhecida como Roma. Uma de suas paradas é na ilha de Cartago, onde se apaixona pela rainha
Dido. Enéias decide ficar na ilha e lá erguer a cidade que lhe prometeram os deuses. Os céus, porém,
tinham outros planos: os deuses ordenam que o troiano recolha âncoras e siga viajem, pois seu
destino repousa em outras terras, a despeito do amor que vota a Dido.
Recitativo & ária em passacaglia: Thy hand, Belinda/ When I am laid. Dido, rainha de Cartago,
está morrendo, desolada com a partida de seu amado Enéias. Nesta pungente ária ela canta sua
tristeza, pedindo que seja lembrada no futuro, mas que seu destino adverso seja esquecido. (Soprano,
cordas, baixo contínuo em passacaglia).
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11) Henry Purcell: The Fairy Queen [A Rainha das Fadas]


Mistura de masque e ópera, The Fairy Queen foi levada à cena em 1692. O libreto, atribuído a
Elkanah Settle, é uma livre adaptação da peça Sonho de uma Noite de Verão, de Shakespeare.
Curiosamente, a partitura perdeu-se em diversas ocasiões. Chegou-se a anunciar uma recompensa
pela partitura no jornal London Gazette, no final do século XVII. A obra foi encontrada e re-
encenada em 1703, apenas para ser perdida de novo! A partitura foi finalmente localizada em 1901
e, até que enfim, não foi mais perdida...
Ária: Hark! Hark! The echoing air. No epílogo da ópera, Titânia, rainha das fadas, celebra o
desfecho feliz de uma noite inteira de confusões, desencontros, amores trocados e correrias na
floresta.
12) Jean-Baptiste Lully (1632-1687): Atys
Tragèdie Lyrique em um prólogo e cinco atos. Libreto de Philippe Quinault; Estreada em 1676.
A história se passa na Frígia, nos tempos mitológicos gregos. Atys, que acreditava ser incapaz de
amar, apaixona-se por Sangaride, uma ninfa já prometida em casamento ao rei frígio Celenus. De
fato, Sangaride também ama Atys, mas sabe que não pode fugir de seu compromisso com o rei. Não
mais resistindo ao amor que os une, os dois acabam por se entregar e juram amor eterno. O destino,
porém, foi cruel com os amantes, pois o jovem Atys é sacerdote da deusa Cybele, que também o ama
secretamente. Ao saber da dupla traição de Atys e Sangaride, o rei Celenus e Cybele planejam uma
terrível vingança: enlouquecido por um artifício da deusa e sem consciência de seus atos, Atys
confunde Sangaride com um monstro e, atirando-se contra ela, crava-lhe um punhal no peito.
Recobrando a consciência, e percebendo o que acabara de fazer, Atys tenta se matar, mas Cybele o
detém e o transforma num pinheiro. Ao contemplar a tragédia que acabara de acontecer, a deusa
percebe que, apesar do sucesso de sua vingança, havia perdido seu amado Atys para sempre.
Scène du sommeil [cena do sono], com introdução e concertato: Dormons, dormons!
No terceiro ato da ópera, com languidez e serenidade, a orquestra prepara uma ambientação de
repouso, enquanto Morfeo e as divindades do sono mergulham Atys num sono profundo. Será neste
sono que Cybele aparecerá a ele em sonho para declarar seu amor. (T,T,Br,B, orq, baixo cont)
13) Jean-Baptiste Lully: Armide [Armida]
Tragèdie Lyrique em um prólogo e cinco atos, com libreto de Philippe Quinault; Estreada em 1686,
meses antes da morte do compositor. Muitos especialistas consideram Armide o exemplo mais
perfeito da união drama/música na ópera francesa do século XVII. A trama foi retirada de forma
magistral de um dos episódios do grande poema épico Jerusalém Libertada de Torquato Tasso
(1544-1595), que narra histórias ligadas às aventuras dos cavaleiros cristãos nas Cruzadas. A cidade
de Damasco encontra-se sitiada pelos cruzados. Graças a seus poderes mágicos, a princesa Armide
tem conseguido derrotar todos os mais valentes cavaleiros cristãos e manter a cidade protegida. O
destino, porém, faz com que ela capture o cruzado Renaud. Ao vê-lo indefeso e amarrado por
guirlandas de flores, o ódio de Armide transforma-se em profundo amor. Armide enfeitiça Renaud e
foge com ele para um castelo encantado, mesmo sabendo que seu amor é correspondido apenas
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devido à sua influência mágica. O refúgio dos amantes é descoberto pelos cristãos e Renaud desperta
de seu torpor mágico, reafirmando seu juramento de cavaleiro. Abandonada, Armide invoca os
poderes infernais para se vingar, mas o mal se volta contra ela e seu castelo desaba, soterrando-a.
Gran scène: Enfin il est en ma puissance! No segundo ato da ópera, após uma cena de
encantamento mágico, Armide celebra a captura de Renaud. A seqüência é cheia de efeitos especiais
(trovões e relâmpagos) que realçam a atmosfera de mistério da cena. Este monólogo, com recitativos
dramáticos e altamente expressivos, é uma das obras primas de Lully. (Soprano, orquestra, baixo
contínuo)
14) Marc-Antoine Charpentier (1643-1704): La Malade Imaginaire [O doente imaginário]
Musica incidental (interlúdios), escrita em 1673, para a peça homônima, que foi a última de Molière
(1622-1673). Molière passou a trabalhar com Charpentier após seu rompimento com Lully. A
personagem central, Argan é um homem terrivelmente hipocondríaco. Todos os dias, ele testa novos
tratamentos e remédios para suas doenças imaginárias e há um médico e um farmacêutico que vivem
quase que exclusivamente às suas custas. Entre mil peripécias, Argan quer casar sua filha com seu
médico para que tenha atendimento constante em sua própria casa.
Arietta cômica em italiano: Zerbinetti. A personagem Un Vieille (“um velho”) canta os dissabores
de quem se entrega às ilusões de um amor mentiroso. (Contratenor, orquestra, baixo contínuo)
15) Jean-Philippe Rameau (1683-1764): Les Indes Galantes [Os Índios Galantes]
Opéra-ballet heróica em um prólogo e quatro atos com libreto de Louis Fuzelier, estreada em 1735.
Cada um dos quatro atos ou “entradas” se passa numa das “Índias” mais famosas do mundo da época
(Turquia, Peru, Pérsia e América do Norte). As tramas simples são usadas apenas como pano de
fundo para o elemento mais importante da ópera: o balé. O quarto ato foi incorporado à ópera algum
tempo após a estréia.
Cena, dueto e coro: Forêts paisables. Danse des Sauvages [Dança dos Selvagens]. Nesta cena de
dança, extraída do quarto ato da ópera, os índios (ou selvagens) da fronteira americana de dominação
franco/espanhola se preparam para fumar o cachimbo da paz. (Soprano, barítono, coro, orquestra).
16) Jean-Philippe Rameau: Nélée et Myrthis.
Apesar do manuscrito de Nélée ser um dos raros originais de Rameau a sobreviver à passagem dos
séculos, pouco ou nada se sabe sobre suas origens e possível data de composição. Aparentemente,
esta “entrada” ou “ato” separado foi (ou iria ser) parte de uma opèra-ballet maior. Pelas correções
feitas nos manuscritos, em especial nas partes de orquestra, acredita-se que a obra foi levada à cena.
O libreto é padronizado: o jovem Nélée, vencedor dos jogos da ilha de Argos, diverte-se colocando à
prova o amor de sua amada Myrthis, fingindo estar interessado em Corinne, sua melhor amiga. A
situação se complica, pois Myrthis é escolhida para coroá-lo de louros por sua vitória nos jogos. O
final feliz, claro, é obrigatório para este tipo de espetáculo, e traz a verdade à tona, reunindo
novamente os dois amantes em perfeita harmonia.
Scène & choer: Entrada triunfal: Muses, filles du ciel.. Nélée está pronto a receber a coroa de
louros. Numa bela cena de invocação, Myrthis conclama as musas, “cujas canções de glória são
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intérpretes dos deuses”, para que “abram as portas do Templo da Memória” e imortalizem o nome de
seu amado. (Soprano, coro, orquestra).
17) Carl Heinrich Graun (1703-1759): Cleopatra et Cesare.
Ópera pouco conhecida sobre a história de César e Cleópatra. Estreou em 1742, com libreto de
Botarelli, baseado na obra homônima de Corneille (1606-1684).
Ária: Tra procelle assorto. (Ária de Cleópatra) (Soprano e orquestra)
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LITERATURA E REPERTÓRIO CANTO I – EMAC/UFG – Prof. Angelo Dias


Encarte que acompanha os CDs 01 a 05
CD 05: Ópera no Classicismo

1 & 2) Christoph Willibald Gluck (1714-1787): Orfeo ed Euridice


Ópera em 3 atos com libreto de Ranieri da Calzabigi. Estréias: Viena, 1762 (em italiano); Paris, 1774
(em francês). Importante obra de transição entre a opera seria do Barroco e a nova linguagem
dramático-musical do Classicismo, ela apresenta de forma clara os ideais reformistas de Gluck:
menos ênfase em números isolados (árias, duetos etc.), escrita contínua e mais concisa – sem
exibicionismo vocal – na qual a música está inteiramente a serviço do texto. Esta é mais uma das
inúmeras óperas dedicadas aos infortúnios e à coragem de Orfeo, diante da morte de Eurídice. A
trama começa com uma grande cena tombeau [tumba], já após a morte de Eurídice, e termina com
um final feliz (lieto fine): o deus Amor intervém junto aos outros deuses para que os amantes possam
ser reunidos, mesmo depois de quebrarem o pacto que Orfeo fizera inicialmente e de Eurídice ter
sido levada aos Campos Elíseos uma segunda vez. Compare com Monteverdi (CD 04 – Faixas 01 e
02)
Ária (Rondó): Chiamo il mio ben così (Ato I - cena 1). Ao lado da tumba de sua amada Euridice,
Orfeo (contratenor) lamenta a desditosa sorte que os separou. Em agonia, ele chama seu nome, mas
apenas o eco responde (representado por ecos na orquestra).
Ária (Rondó): Che farò senza Eurídice? (Ato III – cena 1) Segundo o acordo feito com os deuses
para permitir o resgate da sombra de Euridice, os dois amantes não poderiam olhar-se enquanto não
atingissem a superfície da terra. Porém, sem saber direito o que estava acontecendo, Eurídice insiste
em ver a face de Orfeo. Quando ele, por fim, mostra o rosto, o espírito de Eurídice é tragado de volta
para os Campos Elíseos. Neste momento, Orfeo canta esta ária, perguntando tristemente “que farei
sem Eurídice? Para onde irei sem o meu bem?”
3) Giuseppe Gazzaniga (1743-1818): Don Giovanni (ossia Il Convitato di Pietra) [ou O Convidado de
Pedra]
Ópera buffa em ato único, com libreto de Giovanni Bertati (1735-1815), e estreada em Veneza em
fevereiro de 1787, apenas alguns meses antes da versão de Mozart ser lançada em Praga. Gazzaniga
foi um compositor muito respeitado em seu tempo, principalmente na Itália e, mais tarde, em Viena,
onde levou à cena sua ópera Il Finto Cieco (1786), com libreto de Lorenzo da Ponte. Portanto, não é
de se estranhar que Mozart e Da Ponte fossem se interessar pelo Don Giovanni de Gazzaniga e
utilizar o libreto de Bertati como ponto de partida para uma nova ópera. De fato, Bertati foi um
libretista de renome, pois sucedeu Da Ponte no posto de dramaturgo da corte vienense, quando este
partiu às pressas em 1791, fugindo aos credores. Em 1792, Bertati escreveu o libreto daquela que
seria uma das mais famosas comédias musicais do repertório lírico: Il Matrimonio Segreto, de
Domenico Cimarosa. As aventuras de Don Juan (ou Don Giovanni) foram muito exploradas no
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século XVIII, tanto nos teatros, quanto pelas trupes mambembes da comedia dell’arte e pelas nas
casas de ópera. A mistura estonteante de moral, sexo, paixão, humor, misticismo e aventura capa-e-
espada fez do enredo um dos favoritos do público. Don Giovanni, ou Don Juan de Molina, aparece
pela primeira vez na obra El Burlador de Sevilla, do espanhol Tirso de Molina (1571-1641). Entre os
autores que também se dedicaram ao tema estão Molière (Le festin de pierre - 1665), Shadwell (The
Libertine, 1676), e o grande Cesare Goldoni (Don Givanni Tenorio - 1738). As obras que narram a
estória de Don Giovanni quase sempre levam um título complementar, entre eles “Il convitato di
pietra” (O convidado de pedra), “Il dissoluto punito” (O dissoluto punido) e até “L’ateo fulminato”
(O ateu fulminado). A trama central é bem simples. Don Giovanni é um rico nobre que seduz
literalmente todas as mulheres que pode, ajudado por seu fiel valete Leporello (ou Pasquariello).
Durante uma de suas conquistas, ele mata em duelo o pai de Donna Anna, um velho Comendador,
que tentava defender a honra da filha. A certa altura da trama, fugindo de um bando de maridos
ultrajados que queriam matá-lo, o Don vai esconder-se num cemitério e acaba perto da tumba do
Comendador assassinado. Em um ato de pura arrogância, convida a estátua de sua vítima para jantar
em sua casa. Quem diria, no final da ópera a estátua do falecido Comendador (o “convidado de
pedra”) aparece para jantar e, apertando a mão do libertino, sela seu destino: a boca do inferno se
abre e traga Don Giovanni para as chamas eternas.
Ária/dueto: Dell’Italia ed Alemagna (Cena 7). Esta cena deliciosa é uma típica “ária de lista”,
muito comum nos gêneros cômicos, especialmente na comedia dell’arte. A título de consolo,
Pasquariello (baixo) mostra a Donna Elvira (uma abandonada perene de Don Giovanni) uma lista
onde estão cuidadosamente registradas as incontáveis conquistas de seu patrão. De todas as idades,
gordinhas ou magrinhas, loiras ou morenas, ricas ou pobres, nobres ou plebéias, não importa: basta
que usem saias e ele... Diferentemente do que acontece neste trecho na versão de Mozart, na ópera
de Gazzaniga Donna Elvira participa da cena com algumas frases cantadas.
4) W. A. Mozart (1756-1791): Idomeneo, Rè di Creta [Idomeneo, Rei de Creta]
Opera seria em três atos, encomendada pela Ópera de Munique, e lá estreada em 1781. O libreto do
abade Giambattista Varesco baseou-se em Idomenée, um outro libreto escrito pelo poeta francês
Antoine Danchet, e posto em música por Andrè Campra, em 1712. Musicalmente falando, Idomeneo
pertence a um tipo de ópera que já caíra um tanto em desuso à época de sua composição. A
genialidade de Mozart, no entanto, criou uma obra de intenso vigor, misturando o velho e o novo,
exigindo o máximo da bravura técnica e interpretativa dos cantores. O papel de Idomeneo foi criado
para o grande tenor Anton Raaf, então com 66 anos de idade, e está entre os mais difíceis do
repertório lírico. A parte do jovem Idamante, filho de Idomeneo, foi escrita originalmente para o
castrato Del Prato, mas transposta para a tessitura de tenor na montagem vienense preparada pelo
próprio Mozart, em 1786. Atualmente, é comum usar-se mezzo-sopranos em roupas masculinas para
interpretar o papel de Idamante. O libreto conta a história do rei cretense Idomeneo. Durante sua
viajem de retorno da guerra de Tróia, Idomeneo viu seus navios atingidos por terrível tempestade.
Para garantir a segurança da frota, o rei faz um pacto com Netuno, deus dos mares, prometendo
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sacrificar em honra do deus a primeira criatura viva que avistasse ao lançar os pés em terra. Como
não poderia deixar de ser, a primeira criatura que encontra é seu filho Idamante, então enamorado da
princesa troiana Ilia (filha do rei Príamo, irmã do herói Heitor), há muito enviada a Creta como
prisioneira de guerra. Mais adiante, após muitos prenúncios trágicos, Netuno fala através de um
oráculo e perdoa a dívida sagrada do rei, mas determinando que, em troca, ele renuncie ao trono em
favor do filho. Tudo acertado, todos celebram em júbilo a volta da paz em Creta.
Ária: Non ho colpa e mi condanni (Ato I – cena 1) Nesta ária de grande beleza, escrita
originalmente para castrato, Idamante declara seu amor por Ilia, suplicando que não o condene por
amá-la. (Afinal, ele era grego e ela troiana)
5 a 7) Mozart: Le Nozze di Figaro [As Bodas de Figaro].
Ópera buffa em 4 atos, estreada em Viena, em 1786. O extraordinário libreto de Lorenzo da Ponte
foi baseado no segundo episódio (então recém escrito) daquela que se transformaria mais tarde na
famosa trilogia Le Mariage de Figaro, do dramaturgo francês Pierre-Augustin Beaumarchais. Os
episódios da trilogia são: 1) Le Barbier de Séville, de1775; 2) Le Mariage de Figaro, de 1784; e 3)
La Mère Coupable, de 1792. Devido ao seu conteúdo altamente crítico – principalmente expondo a
nobreza a questionamentos morais e políticos, ainda que envoltos pela aura de comédia – as obras de
Beaumarchais haviam sido banidas dos teatros austríacos. Entretanto, Mozart e Da Ponte
encontraram uma solução para ter sua ópera aprovada: o enfoque da estória foi mudado, fixando-se
principalmente na divertida trama amorosa que se desenrola entre servos e senhores. O Conde de
Almaviva decide fazer valer um antigo direito feudal, já então abolido em suas terras, e que garantia
ao suserano o direito de dormir a primeira noite com qualquer moçoila recém casada com algum de
seus vassalos. Tudo isso porque o Conde está apaixonado por Susanna, noiva de seu fiel valete
Figaro. A esperta criadinha, porém, sempre resistiu bravamente às investidas do patrão. Após muitas
peripécias, a Condessa, aliada a seus servos Susanna e Figaro, passa um “carão” no Conde, fazendo
o marido desistir de seus planos sedutores.
Ária: Non più andrai (Ato I - cena 8). Descobrindo as confusões amorosas provocadas pelo jovem
e fogoso Cherubino, papel cantado por um mezzo-soprano em roupas masculinas, o Conde de
Almaviva resolve mandá-lo para seu exército, dando, assim, algum sossego às mulheres do feudo
(incluindo “sua” Susanna e a própria Condessa). Nesta ária de sabor militar, Figaro (baixo) descreve
em tom jocoso a nova vida de “muita honraria e pouco dinheiro” que espera o pobre Cherubino na
caserna.
Ária: Voi Che sapete (AtoII – cena 3). Ajudado por Susanna, Cherubino é trazido aos aposentos da
Condessa para que mostre a ela uma canzonetta que acabou de escrever. Com acentos delicados, ele
canta e pede a elas que lhe falem sobre o amor, pois está confuso com tantas sensações e anseios
causados por mal tão doce, mas ainda incompreensível para alguém tão jovem quanto ele
(danadinho...)
Cena (recitativos) e sexteto: È decisa la lite/ Riconosci in questo amplesso. (Ato III – cena 5)
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Nesta cena brilhantemente construída, o tabelião Don Curzio (gago, nesta montagem) e Don Bartolo
anunciam a Figaro que a lei deve ser cumprida: de acordo com um contrato lavrado, ou ele paga o
que deve à velha Marcelina ou casa-se com ela. Figaro se defende, dizendo que não pode casar-se
sem o consentimento dos pais, já que é de origem nobre. Ante a surpresa geral (pois ele é criado do
Conde) ele conta ter sido raptado próximo a um castelo por uma trupe cigana quando ainda criança.
Numa virada teatral verdadeiramente sensacional, Figaro revela uma marca de nascença em seu
braço, ao que Marcelina e Don Bartolo reconhecem nele seu filho Rafaelo, fruto de um amor de sua
juventude. Para espanto geral, Marcelina passa de futura amante a mãe amorosa! Bartolo, que
aporrinhava Figaro para casá-lo com Marcelina, vira pai zeloso; Susanna, que entra sem saber do
acontecido, descobre que sua antiga rival Marcelina virou sua futura sogra (até que não mudou
muito...!). E Figaro, livrando-se de duas pedras no sapato (Marcelina e Don Bartolo), tem sua dívida
perdoada e descobre seus pais desaparecidos. Só mesmo um gênio como Mozart poderia compor
música à altura de uma cena tão singular quanto esta.
8 a 11) Mozart: Don Giovanni (ossia Il Dissoluto Punito) [ou O Dissoluto Punido]
Opera buffa em 2 atos, com libreto de Lorenzo da Ponte, contando as façanhas, e eventual
condenação às chamas eternas, do obcecado conquistador Don Juan. Estréia: Praga, 1787. Apesar de
assim ter sido descrita por seus criadores, a classificação de “buffa” só com um certo esforço se
aplica por completo ao obscuro, e por vezes tenebroso, enredo da ópera. Don Giovanni, foi a
segunda colaboração entre Mozart e Da Ponte (a primeira foi Le Nozze di Figaro, de 1786, e a
terceira foi Così fan Tutte, de 1790). (Para maiores detalhes da trama e da origem do enredo veja a
faixa 4 deste CD)
Ária: Madamina, il catalogo è questo (Ato I – cena 6). Esta é uma das mais famosas árias de
Mozart para a voz de baixo. Retirando do bolso uma caderneta (em algumas montagens, um imenso
rolo de papel que se desenrola interminavelmente), Leporello (baixo) relata à incrédula Donna Elvira
as conquistas de seu patrão, registradas com cuidado naquele precioso documento. Compare esta
“ária de lista” com a do Don Giovanni de Gazzaniga (faixa 4), escrita com texto similar e para a
mesma personagem.
Ária: Batti, batti, o bel Masetto (Ato I – cena 16). Don Giovanni preparou-se para sua próxima
conquista: a camponesa Zerlina (soprano ou mezzo-soprano agudo), noiva do valente Masetto
(baixo). Durante uma festa para celebrar as iminentes núpcias, o libertino aproxima-se abertamente
de Zerlina a convence a dar uma voltinha em seu castelo. Apesar das negativas da noiva, Masetto
acredita piamente que algo aconteceu. Nesta ária, Zerlina aplaca sua ira dizendo insinuante “pode me
bater, Masetto; a tua Zerlina vai estar aqui como uma cordeirinha esperando seus golpes...”
Cena (recit.) & Ária: In qualli eccessi, o Numi!/Mi tradì quell’alma ingrata (Ato II - cena 10).
Nesta dramática cena, Dona Elvira (soprano), apenas uma entre milhares de mulheres enganadas
cruelmente por Don Giovanni, lamenta sua existência miserável. Ao final do recitativo, porém, seu
coração se desmancha por um instante, e ela dá-se conta de que ainda ama o libertino. [Ainda bem
que coisas assim só acontecem no mundo da ópera, não é mesmo...?] Ela canta, então, sua bela ária.
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Gran scena: Don Giovanni, a cenar teco m’invitasti (Ato II – cena 15). Esta é, talvez, a mais
espetacular seqüência dramática de toda a história da ópera. Em meio a harmonias embasadas
predominantemente em tons menores e timbres graves na orquestra, as vozes das três personagens
(três baixos) unem-se ao coro masculino (cantando fora de cena), criando uma atmosfera de
intensidade quase inacreditável. A cena abre com a estátua do Comendador anunciando a Don
Giovanni que, respondendo ao seu convite, ela aqui está para jantar. Leporello prepara um lugar na
mesa, ao que a estátua replica: “quem come a comida celeste não come a comida dos mortais”...
Advertido de que sua hora é chegada, Don Giovanni é exortado a arrepender-se de sua vida
dissoluta, ao que ele responde veementemente: Não! Ante o olhar incrédulo de Leporello, o libertino
é tragado pelas chamas infernais. Originalmente, a ópera tem uma espécie de lieto fine (“final feliz”),
no qual as outras personagens invadem a cena e são informados por Leporello do destino trágico,
mas merecido, de Don Giovanni. Todos, então, cantam em louvor ao triunfo da moral e celebram a
lição que o ocorrido nos oferece. No entanto, este final foi omitido por Mozart após a estréia em
Praga (1787), quando a ópera foi levada à cena em Viena, em 1788. Este procedimento tornou-se
quase tradicional em montagens posteriores no século XIX, mas deixou a ópera com um final por
demais trágico. Já no século XX o lieto fine voltou a ser incorporado gradualmente à obra,
devolvendo-lhe a feitura original.
12 & 13) Mozart: Così fan Tutte (ossia La Scuola degli Amanti) [Assim Fazem Todas] (Ou seja “A
Escola dos Amantes) Ópera buffa em dois atos, com libreto de Lorenzo da Ponte; estréia: Viena,
1790. Esta comédia, de trama não muito crível, foi encomendada pelo imperador José II, sendo a
terceira e última grande colaboração entre Mozart e Lorenzo Da Ponte. No enredo, dois jovens
oficiais, Ferrando e Guglielmo, fazem uma aposta com o cínico solteirão Don Alfonso, confiantes
que suas noivas, as formosas irmãs Fiordiligi e Dorabella, são modelos de fidelidade. Os três
tramam, então, um plano tão absurdo que só mesmo numa ópera poderia ser levado a contento:
os dois rapazes fingem uma viajem e voltam disfarçados de “albaneses” (irreconhecíveis com suas
roupas extravagantes e longos bigodes!), passando cada um, então, a cortejar a namorada do outro...
Logicamente, Don Alfonso suborna a criada Despina para que o ajude a introduzir seus
novos amigos nas graças de suas patroas. Após uma certa resistência – e para desespero dos rapazes
– suas noivas acabam por ceder aos encantos dos novos conquistadores. Como era de se esperar, no
dia marcado para o casamento os dois “albaneses” não aparecem, mas os jovens oficiais voltam
milagrosamente de sua viajem. Tudo explicado, Don Alfonso ganha a aposta e os amantes são
novamente reunidos, cada um com seu verdadeiro par.
Sexteto: Alla bella Despineta (Ato I cena 11). Don Alfonso (baixo) apresenta os dois “albaneses” a
Despina (soprano soubrette) pela primeira vez. Sem reconhecê-los como os noivos de suas patroas,
Despina repara furtivamente em suas figuras exóticas e antiquadas, sem saber ao certo se são
chineses ou turcos. Os dois rapazes são introduzidos na sala cantando duetinos deliciosos, cheios de
reverências bem polidas. Fiordiligi e Dorabella (soprano e mezzo-soprano) entram em seguida,
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furiosas e ultrajadas com a presença dos estranhos amigos de Don Alfonso. Secretamente, Ferrando
e Guglielmo cantam, confiantes, sua alegria ante a reação decidida de suas noivas.
Ária: Ah! Lo veggio (Ato II – cena 6). Nesta cena, Fiordiligi entra correndo, seguida por Ferrando
(noivo de sua irmã Dorabella, mas disfarçado de “albanês”), em vão tentando resistir às suas
investidas amorosas. Após breve e agitado recitativo ela amolece e deixa escapar um suspiro de
afeto. Percebendo que ela está para ceder, Ferrando canta, então, sua vitória nesta formidável ária de
bravura, sem dúvida uma das mais difíceis de todo o repertório para tenor. Ela tem, sozinha, treze Si
bemóis, mais do que tem muitos papéis completos em outras óperas.
14 a 16) Mozart: Die Zauberflöte [A Flauta Mágica].
Singspiel em 2 atos com libreto de Emanuel Schikaneder. Estréia: Viena, 1791. Uma das mais
misteriosas, singelas e geniais criações do mundo da ópera, a Flauta representa uma perfeita
combinação entre fantasia e realidade; entre fábula e drama; entre o amor elevado e o desejo puro e
simples de se ter alguém como companheiro(a); e entre os altos ideais da humanidade e as
necessidades diárias do homem comum. Usando uma linguagem altamente simbólica, elementos de
iniciação maçônica e de esoterismo são apresentados de maneira quase hermética, inacessíveis ao
público leigo, mas claramente perceptíveis à platéia iniciada. Schikaneder – amigo de Mozart e
membro da mesma loja maçônica freqüentada pelo compositor – era empresário de uma companhia
teatral e ator de considerável fama: o grande musicólogo Alfred Einstein (1880-1952) – primo do
cientista, Albert – defendia ter sido ele um dos primeiros Hamlets alemães. A idéia original do
libreto de A Flauta era para que fosse um espetáculo de marionetes, baseado numa antologia de
narrativas orientais reunidas por Wieland, sob o título de Dschinnistan. Enquanto Schikaneder
trabalhava o libreto, outro teatro vienense levou à cena um espetáculo parecido, obrigando seu
libreto a tomar um novo enfoque. A maçonaria havia sido proibida na Áustria pela imperatriz Maria
Theresa, tornando-se, assim, o assunto da moda. O novo espetáculo de Schikaneder e Mozart tornou-
se, então, um singspiel maçônico: as provas de Tamino e Pamina imitam rituais de iniciação;
Zarastro é alto sacerdote da deusa egípcia Ísis; e a trama se dá no Egito, onde, acredita-se, foi
fundada a maçonaria. Além disso, a música é solene e envolta numa aura de nobreza e elevação,
emprestando à obra a “força dos mistérios sagrados”.
Cena e trios: Zu Hilfe! Zu Hilfe! (Ato I – cena 1) O príncipe Tamino (tenor) entra em cena gritando
por socorro, perseguido por uma serpente gigante. Já cansado e sem forças, ele desmaia. Surgem,
então, três damas misteriosas (soprano, mezzo-soprano e contralto) vestidas de negro e armadas de
lanças, que matam a serpente e salvam o jovem. Mais tarde, saberemos serem elas as damas de
companhia da poderosa Rainha da Noite (que começa a ópera como mocinha e termina como
bandida!). Em uma seqüência de trios belíssimos, as damas ficam maravilhadas com a formosura do
príncipe desmaiado, discutindo entre si qual delas tomará conta dele e será merecedora da
recompensa amorosa por tê-lo salvo. Antes que o jovem recobre a consciência, as três damas saem
apressadas.
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Ária: Dies Bildnis (Ato I - cena 4). Após salvarem o príncipe Tamino do terrível monstro, as três
damas misteriosas desaparecem por um momento. Ao retornarem, elas entregam a ele um retrato da
bela Pamina, filha da Rainha da Noite, e que fora raptada pelo Grão Sacerdote Zarastro. As damas
partem. Sozinho novamente, contemplando, estático, a pequena imagem de Pamina, Tamino
apaixona-se imediatamente (Ah, a ópera...) e decide enfrentar tudo e todos para salvar a donzela.
Ária: Der Hölle Rache kocht in meinem Herzen (Ato II cena 8). Dentro dos muros do templo de
Ísis, onde passou de prisioneira a convidada do Sacerdote Zarastro, Pamina recebe a visita secreta de
sua mãe, a Rainha da Noite. Ao saber pela filha que Tamino, enviado para salvá-la, acabou
debandando para o lado de Zarastro, a Rainha é tomada pela fúria. Arrancando um punhal e
entregando-o à filha, ordena que ela mate Zarastro e roube o Círculo do Sol. Ante a recusa de
Pamina, a Rainha (do pití...) canta esta ária furiosa, cheia de gritos histéricos (no Fá 5), jurando
vingança contra Zarastro!

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