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Nas próximas páginas, pretende-se propor a análise comparativa de dois textos que

remontam a expedição de Hernán Cortés ao território da “Nueva España”, hoje parte do


México. O primeiro deles corresponde ao documento produzido pelo próprio Cortés, as
chamadas ​Cartas de Relación​, enquanto o segundo, ​Historia verdadera de la conquista de la
Nueva España​, tem como autor Bernal Diáz del Castillo, soldado da expedição. Esta análise
baseia-se, como aporte teórico fundamental, na noção de estereótipo apresentada por Homi
K. Bhabha em seu livro ​O local da cultura​.
De acordo com o filósofo indiano, o estereótipo é a principal estratégia do discurso
colonial porque empreende uma maneira complexa, contraditória e ambivalente de
elaboração de um outro, de uma alteridade visível e reconhecível. Trata-se de um aparato que
se apoia, ambiguamente, no reconhecimento e no repúdio de diferenças raciais, culturais e
histórias para, dessa forma, “apresentar o colonizado como uma população de tipos
degenerados com base origem racial de modo a justificar a conquista e estabelecer sistemas
de administração e instrução” (BHABHA, 2013: 123-124). Para o autor, o estereótipo deve
ser lido em termos de fetichismo, enquanto recusa da diferença. Assim, no âmbito do
discurso, o fetiche compreende um movimento concomitante entre a metáfora e a metonímia:
é a coexistência entre o mascaramento da ausência e da diferença (reconhecimento) e o
registro intermitente da falta percebida (repúdio). No limite, o discurso colonial articula
quatro estratégias simultaneamente: metafórica/narcísica e metonímica/agressiva.
Os textos aqui analisados correspondem a dimensões diferentes do discurso colonial.
As ​Cartas de Relación​, de Cortés, têm como destinatário explícito o rei da Espanha, Carlos
V, e consiste fundamentalmente em um documento burocrático, oficial, com o intuito de
relatar a atuação nos territórios colonizados. No entanto, sabe-se que não se trata apenas de
um relato, mas de uma argumentação que, justamente, justifica a colonização.
Diferentemente, a ​Historia verdadera de la conquista de la Nueva España foi escrita por um
indivíduo que não tinha tais obrigações formais para com a Coroa e que, além disso, escrevia
do lugar de quem experienciava os acontecimentos que relatava. Parte-se já, portanto, de uma
diferença de extrema relevância: o propósito dos textos em análise.
Em sua “Segunda relación”, Cortés descreve a cidade de Tenochtitlán, capital do
império asteca. Começa relatando a localização da cidade, entre montanhas e lagos, e enfatiza
principalmente a sua grandeza: “Es tan grande la cibdad como Sevilla y Córdoba.”
(CORTÉS, 1993: 233-234). A comparação da capital asteca com cidades do reino espanhol é
recorrente (“Tiene otra plaza tan grande como dos vecez la plaza de la cibdad de Salamanca”
(1993: 234); “La [torre] más prencipal es más alta que la torre de la iglesia mayor de Sevilla.”
(1993: 237)), mas se estende para além das edificações e configurações da cidade: dá-se
também em relação aos artigos ofertados nas feiras (“Hay frutas de muchas maneras, en que
hay cerezas y ciruelas que son semejables a las de España.” (1993: 235); “Hay a vender
muchas maneras de filados de algodón de todas colores en sus madejicas, que paresce
propiamente alcacería de Granada en las sedas, aunque esto otro es en mucha más cantidad.
Venden colores para pintores cuantas se pueden hallar en España y de tan excelentes matices
cuanto pueden ser.” (1993: 236)) e até mesmo em relação aos homens que trabalham no
mercado (“Hay hombres como los que llaman en Castilla ganapanes para traer cargas.”
(1993: 235)). Em diversos momentos, o que se observa no discurso, portanto, é a emergência
do estereótipo por meio da busca por uma aproximação, uma semelhança: esforça-se em dar
ao desconhecido algum sentido tangível por meio daquilo que se conhece. Fica evidente,
aqui, uma das partes do movimento duplo do fetichismo apresentado por Bhabha: ao, de
alguma maneira, recusar a diferença, oculta-se a falta e torna-se reconhecível algo
desconhecido.
Ainda traçando elogios às edificações religiosas dos astecas, especialmente à sua
grandeza, Cortés afirma:
Hay en esta grande cibdad muchas mesquitas o casas de sus ídolos de muy hermosos
edeficios por las collaciones y barrios della. (...) Y entre estas mezquitas hay una que
es la prencipal que no hay lengua humana que sepa explicar la grandeza e
particularidades della, porque es tan grande que dentro del circuito della, que es todo
cercado de muro muy alto, se podía muy bien facer una villa de quinientos vecinos.
(1993: 237)

O uso de expressões como “muy hermosos edeficios” ou “no hay lengua humana que sepa
explicar la grandeza e particularidade della” valoram positivamente os templos religiosos
astecas, mas até certo ponto, apenas. O repúdio, complementar ao reconhecimento,
evidencia-se neste episódio.
Se, no discurso colonial, a falta do autóctone americano é a verdadeira fé, cristã, e,
por isso, ele é bárbaro, é justamente na dimensão religiosa que se constroi o repúdio, que se
evidencia contiguamente a diferença. Isso porque é também através dessa estratégia
discursiva que se justifica o próprio processo de colonização. Assim, no momento em que
entra na mesquita, Cortés logo tira dos altares e joga escada abaixo aqueles que eram “los
más prencipales ídolos y en quien ellos más fee y creencia tenían” (1993: 237), manda limpar
a capela e coloca no lugar imagens de Nossa Senhora e outros santos, apesar dos avisos
cautelosos de Montezuma e seus acompanhantes a respeito de um possível levantamento do
povo contra o espanhol. Cortés então “os faz entender” que aqueles ícones a que idolatravam
eram impuros, e que só havia um Deus, que havia criado a todos, astecas e espanhois, e que
era nesse Deus que deviam crer. O que o relato evidencia é o caráter universal atribuído à
verdade dos conquistadores e, portanto, o domínio de um conhecimento que falta aos astecas,
diferenciando-os e, consequentemente, rebaixando-os à condição de bárbaros. É curioso
notar, também, que ao afirmar os fazer entender que estavam enganados ao crer nessas
figuras, faz também com que transfiram a ele a fonte do saber religioso: “(...) y que yo, como
más nuevamente venido sabría las cosas que debían tener y creer mejor que no ellos, que se
las dijese e hiciese entender, que ellos harían lo que yo les dijese que era lo mejor.” (1993:
237).
O episódio da visita à mesquita é notório para a compreensão do caráter ambíguo e
ambivalente do discurso colonial e do estereótipo enquanto estratégia discursiva:
reconhece-se, nas construções, edificações, formas de troca e até mesmo nas características
físicas humanas, aspectos semelhantes aos conhecido no reino espanhol, construindo assim o
reconhecimento por meio da metáfora, mas, ao mesmo tempo, aparece o repúdio, enquanto
falta de cristandade, como forma de diferenciação e subsequente subjugação e dominação do
outro.
Em determinado momento de sua ​Historia verdadera de la conquista de la Nueva
España​, Díaz del Castillo relata o mesmo episódio da visita à mesquita asteca. Considerando
a diferença fundamental nos propósitos de ambos os textos, no que diz respeito aos seus
respectivos destinatários, a noção de estereótipo emerge, em Díaz del Castillo, de maneira
mais sutil do que no relato de Cortés, mas não menos potente para a manutenção do discurso
colonial.
Em sua descrição de Tenochtitlán, também aparece a quantidade de produtos
ofertados e a dinâmica intensa do mercado, bem como a comparação por semelhança às feiras
de Medina del Campo:
Comencemos por los mercaderes de oro y plata y piedras ricas y plumas y mantas y
cosas labradas y otras mercaderías de indios esclavos y esclavas; digo que traían
tantos dellos a vender aquella gran plaza como traen los portugueses los negros de
Guinea, e traíanlos atados en unas varas largas con colleras a los pescuezos, por que
no se les huyesen, y otros dejaban sueltos. Luego estaban otros mercaderes que
vendían ropa más basta y algodón e cosas de hilo torcido, y cacahueteros que vendían
cacao, y desta manera estaban cuantos géneros de mercaderías hay en toda a Nueva
España, puesto por su concierto de la manera que hay en mi tierra, ques Medina del
Campo, donde se hacen las ferias, que en cada calle están sus mercaderías por sí; ansí
estaban en esta gran plaza (...) (DÍAZ DEL CASTILLO, 1975: 191)

A comparação também aparece no âmbito das edificações, com um tom de deslumbramento:

E ansí dejamos la gran plaza sin más la ver y llegamos a los grandes patios y cercas
donde está el gran cu; y tenía antes de llegar a él un gran cercuito de patios, que me
paresce que eran más que la plaza que hay en Salamanca, y con dos cercas alrededor
de calicanto, e el mismo patio y sitio todo empedrado de piedras grandes de losas
blancas y muy lisas, e adonde no había de aquellas piedras estaba encalado y bruñido
y todo muy limpio, que no hallaran una paja ni polvo en todo él. (1975: 192)

No entanto, a maneira como relata o encontro e o diálogo entre Cortés e Montezuma é


bastante distinta da descrição anterior. Segundo Díaz del Castillo, as escadas do templo
religioso os levaram a uma sala, cujo chão estava sujo do sangue do sacrifício do dia, com
grandes pedras, que formavam altares para os sacrifícios, e outras que serviam de apoio para
as imagens de seus deuses, às quais se refere como “malas”. Montezuma os convida a
observar a cidade e seus arredores de cima e, neste momento, o relato apresenta certo encanto
com a vista: “e ansí lo estuvimos mirando, porque desde aquel grande y maldito templo
estaba tan alto que todo lo señoreaba muy bien.” (1975: 192). De alguma forma, o encontro
dos adjetivos “grande” e “maldito”, que caracterizam “templo”, já dá indícios e talvez até
sintetize o caráter ambíguo e ambivalente do discurso colonial: a grandeza das edificações (e
deste templo especificamente) é comparável àquilo que se tem no reino espanhol e, por isso,
conforma o reconhecimento; no entanto, o que está no interior desse templo, o paganismo, a
não cristandade, tornam o lugar desconhecido, maldito, e portanto, configuram o repúdio e a
sua consequente inferiorização.
Quando os espanhois seguem para uma próxima sala, Montezuma os mostra os bustos
de dois deuses.
Y luego que con ellos hobo hablado [Montezuma] dijo que entrásemos en una
torrecilla e apartamiento a manera de sala, donde estaban dos como altares, con muy
ricas tablazones encima del techo, e en cada altar estaban dos bultos, como de
gigante, de muy altos cuerpos y muy gordos, y el primero, questaba a mano derecha,
decían que ra el de Vichilobos, su dios de la guerra, y tenía la cara y rostro muy
ancho y los ojos disformes e espantables; (...). E otro ídolo pequeño que allí cabél
estaba, que decían que era su paje, le tenía una lanza no larga y una rodela muy rica
de oro e pedrería (...) porque, según decían, entrambos eran hermanos, y este
Tezcatepuca era el dios de los infiernos, y tenía cargo de las ánimas de los mejicanos,
y tenía ceñido al cuerpo unas figuras como diabillos chicos, y las colas dellos como
sierpes, y tenía en las paredes tantas costras de sangre y el suelo todo bañado dello,
como en los mataderos de Castilla no había tanto hedor. (1975: 193)
Nesse momento, é interessante notar a presença do verbo “decían” (e de “según decían”)
porque ele de alguma forma coloca em xeque a veracidade daquilo que é dito por Montezuma
e transmite desconfiança daquele que escreve em relação às figuras religiosas astecas e à
própria religiosidade; é quase como se estivesse sendo irônico ao repor a fala do outro,
imbuindo nesses termos a certeza de o mito religioso asteca é, justamente, um mito, uma
invenção, e que não corresponde à sua verdade universal, seu Deus universal e único. Além
disso, a reprodução da explicação de Montezuma é rapidamente seguida por um comentário a
respeito das paredes e do forte odor de sangue que infestava o local, conferindo aspecto
nojento e quase grotesco a ele. Nesse momento, a comparação acontece, novamente, mas de
modo a aproximar o templo religioso, sagrado, aos matadouros de Castilla, e assim atribuindo
à capela valor extremamente rebaixado. O desagrado com o odor se repete mais duas vezes
na página seguinte, com grande intensidade:
Éste decían quel cuerpo dél estaba lleno de todas las semillas de había en toda la
tierra, y decían que era el dios de las sementeras y frutas; no se me acuerda el
nombre, y todo estaba lleno de sangre, así paredes como altar, y era tanto el hedor,
que no víamos la hora de salirnos afuera. Y allí tenían un atambor muy grande en
demasía, que cuando le tañían el sonido dél era tan triste y de tal manera como dicen
estrumento de los infiernos, y más de dos leguas de allí se oía; decían que los cueros
de aquel atambor era de sierpes muy grandes. E en aquella placeta tenían tantas cosas
muy diabólicas de ver, de bocinas y trompetillas y navajones, y muchos corazones de
indios que habían quemado, con que sahumaron a aquellos sus ídolos, y todo cuajado
de sangre. Tenían tanto, que los doy a la maldición; y como todo hedía a carnecería,
no víamos la hora de quitarnos de tan mal hedor y peor vista.(1975: 194)

A mudança no próprio discurso de Diáz del Castillo é significativa: a vista, que antes
era deslumbrante e arrebatadora, agora é ainda pior que o mau odor. Nesse trecho, a
referência a “estrumento de los infiernos” e “cosas muy diabólicas”, além de “que los doy a la
maldición”, terminam por imputar ao templo religioso e aos próprios astecas caráter
diabólico, maldito, diminuído e evidenciar o horror, o repúdio e, consequentemente, a
superioridade dos espanhois.
Em comparação com as ​Cartas de Relación de Cortés, o relato de Diáz del Castillo se
mostra mais sutil no que diz respeito à presença do estereótipo enquanto estratégia discursiva
colonial. Isso se justifica, entre outros motivos, pela própria finalidade dos textos: enquanto o
relato de Cortés tem como destinatário o rei Carlos V e se trata de um documento burocrático
oficial, o do soldado se configura quase como um diário de viajante. O uso do discurso direto,
no diálogo entre Cortés e Montezuma, e a referência explícita aos leitores (“Dirán agora
algunos letores muy curiosos que cómo pudimos alcanzar a saber que en el cimiento de aquel
gran cu echaron oro y plata e piedras de chachivis ricas y semillas, y lo rociaban con sangre
humana de indios que sacrificaban, habiendo sobre mill años que se fabricó y se hizo” (1975:
195)) deixam transparecer o caráter quase literário do texto, aspecto fundamental para a
compreensão da formação da cultura letrada na América Latina.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BHABHA, Homi K. “A outra questão. O estereótipo, a discriminação e o discurso do


colonialismo”. In: O local da cultura. Belo Horizonte. Editora UFMG, 2013.

CORTÉS, Hernán. "Segunda relación", en ​Cartas de relación​. Edición de Ángel Delgado


Gómez. Madrid. Castalia, 1993.

DÍAZ DEL CASTILLO, Bernal. ​Historia verdadera de la conquista de la Nueva España​.


Madrid. Austral, 1975.

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