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Capítulo 3

O TRIUNFO DA PEDAGOGIA CRISTÃ

[...] quando um povo sucumbe; quando sente desaparecer


definitivamente sua crença no futuro, sua esperança de liberda-
de quando a submissão como primeira utilidade, as virtudes do
submisso como condições de conservação lhe entram na cons-
ciência, então é preciso alterar também seu deus. Ele se torna
agora furtivo, temeroso, modesto, convida à "paz da alma", ao
não-mais odiar, à indulgência, ao "amor"mesmo para com o
amigo e o inimigo [...] Outrora representava um povo, a força
de um povo, toda a agressividade e sede de potência da alma de
um povo: agora é meramente o bom deus.
NIETZCHe, OAnticristo

1. Aldeamentos

o primeiro tratado teológico elaborado a partir da experiência missio-


nária no Brasil, O diálogo do padre Nóbrega sobre a conversão do gentio
(1556), de autoria do padre Manoel da Nóbrega, versa sobre o fracasso da
conversão dos índios e discute o árduo ofício de ser missionário numa terra

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em que "poucos vêm a lume". Das palavras dos dois personagens que com- A fim de reverter essa situação precária em que se encontrava o
põem o "Diálogo", Matheus Nogueira, "o ferreiro de jesus-Christo", e Gon- trabalho dos jesuítas, Mem de Sá, o terceiro governador-geral, firmou,
çalo Alves, I nota-se que, decorridos cinqüenta anos de trabalho de cate- em 30 de julho de 1556, um acordo com os missionários, que estabeleceu
quese, os poucos frutos colhidos entre os índios acarretaram descréditos a organização de aldeamentos nas cercanias dos principais núcleos colo-
e dúvidas com relação às estratégias empregadas pelos jesuítas. Nogueira, niais, considerados territórios livres e intocdoeis''
ante os efeitos praticamente nulos da pregação, aludiu claramente ao uso Essa política já constava do Regimento como imprescindível à crístía-
da violência: "Posto que com palavra não préga, fá-Io com obras e com nização dos índios. Citando o documento:
marteladas". 2
De fato, na segunda metade do século XVI, esvaiu-se completamente a [...] Porque parece que será grande inconvenienteos gen-
simpatia que os missionários devotavam aos índios. Aos olhos de Nogueira, tios, que se tomaram cristãos, morarem na povoação dos
outros e andarem misturados com eles, e que será muito
serviço de Deus e meu apartarem-nos de sua conversação,
[...] não passavam de cães em se comerem, e matarem
vos encomendo e mando que trabalheis muito por dar
e são porcos, por vícios, e na maneira de se tratarem e
ordem como que forem cristãos, morem juntos, perto das
esta deve ser a razão, por que alguns padres, que do
povoaçãos das ditas capitanias, para que convérsem com
reino vieram, os vejo resfriados, porque vinham cuidan-
os cristãos e não com os gentios, e possam ser doutrinados
do de converter a todo o Brasil em uma hora e vêm-se
e ensinados nas coisas de nossa santa fé.'
que não podem converter em um anno por sua rudeza
e bestialidade.'
Após malogradas tentativas de organização dos aldeamentos, os
A mudança de perspectiva que se operou nesses anos com relação agentes colonizadores retomaram, em 1552, essa política de isolar os
à catequese refletiu-se na imagem do índio criada pelos jesuítas. O papel índios cristãos dos índios pagãos. O padre Manoel da Nóbrega e o gover-
em branco prestes a ser preenchido pela doutrina cristã foi substituído nador-geral Mem de Sá tinham em mente as experiências missionárias
pelo ferro frio e sem virtude. Mas, comentou Nogueira, "mettido na forja, das Antilhas e do Peru. Segundo Hoornaert, tratava-se de "ajuntar" ín-
o fogo o toma, que mais parece fogo que ferro; assim todas as almas sem dios, "doutríná-los", para depois "repartí-los pelos moradores"."
graça e charidade de Deus, são ferros frios sem proveito, mas quanto Nóbrega esboçou o seu plano numa carta escrita em 1557:
mais se aquenta, tanto mais fazeis delles o que quereís".' O fogo e a forja
[... ] A ordem que desejamos era fazerem ajuntar ao gentio,
de Deus, "o verdadeiro ferreiro senhor do ferro", moldavam as almas à
este que está sojeito, em povoações convenientes, e fazer-
sua imagem e semelhança, ou as lançavam irremediavelmente ao fogo do
lhes favores em favor de sua conversão, e castigar nelIes os
inferno.
males que forem pera castigar, e mantê-los em justiça e
O historiador Luís Felipe Baêta Neves enumerou os motivos que verdade entre si como vassalosd'El-Rei,e sojeitos à Igreja"
levaram ao fracasso da conversão: a hostilidade dos índios; os efeitos
pouco duradouros dos batismos em massa; a escassez de missionários; o Deslocados do sertão para a região costeira, índios de diferentes
nomadismo indígena; e a distância entre as aldeias. 5 tribos eram reunidos em aldeamentos para que fossem convertidos ao

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cristianismo. A destribalização, portanto, promovia a perda da identidade Petiguares como das outras nações, em todas as obras
cultural desses povos. 10 públicas e do serviço de Sua Majestade, sendo cha-
A respeito dos primeiros aldeamentos da Bahia, informou Antonio mados dos Capitães, vieram sempre e ajudaram com
Blasquez: muita fidelidade, como foi nos Fortes do Recife e do
Rio Grande, e nas trincheiras e mais fortificações,
que se fizeram para defensão das terras e dos imigos, II
[...] Os Índios desta villa de S. Paulo querem em tudo que a ela viessem no que, por serviço de Sua Majes-
mudar os seus costumes e começam agora os que já tade e Bem Público, não levaram estipêndio algum,
são christãos a fazer casas separadas e de taipas para mas que a sustentação ordinária. Outrossim certifico
sempre viverem nellas, porque o seu costume dantes que os Índios ajudam comumente e de ordinário os
era cada dous ou tres annos renovarem as casas, mu- moradores em suas fazendas, assi nas plantas das
dando-se para outras partes. Venderam também toda roças e canaviais, como nas fábricas dos engenhos,
a plumagem que tinham para se vestirem elles e suas tanques, açudes e levadas, e para tudo o mais que
mulheres, e o terem feito isto é signal muito certo de deles se queiram servir, e, todas as vezes que vão
haver o Espírito Santo tocado os seus corações. 11 buscar os ditos Índios às Aldeias para seu serviço e
lhes pagam, os trazem, e por este respeito estão as
Essa descrição chama a atenção para o processo de ruptura da vida fazendas mais avanteajadas do que nunca estiveram.
coletiva que cedeu às imposições cristãs da individualização. A pedagogia E, servindo-se dos ditos Índios, é ocasião de se não
cristã convoca a uma trajetória solitária, seguindo os passos de Cristo. O levantarem e fugirem os que teem de Guiné, como
costumam, porque com muita vigilância acodem a
espaço dos aldeamentos, como observou Luís Felipe Baêta Neves,foi "cria-
estes alevantados."
do pela cultura cristã". 12 No terreiro onde tinha lugar o sacrifício ritual
plantou-se uma cruz. O tempo passou a ser marcado pelo ritmo das ora-
Ao servir como mão-de-obra da Colônia, os índios, embora fossem
ções, dos ensinamentos e do trabalho envolto numa rígida díscíplína." A
parcamente remunerados, não levando mais que a sustentação ordiná-
agricultura substituiu as práticas indígenas de caça e de pesca.
ria , tinham um estatuto diferente dos escravos da Guiné. A condição de
Civilizaros índios, eis a principal meta da política dos aldeamentos.
homens livres lhes conferia uma posição superior na rígida hierarquia
Para isso, conforme analisou Luís Felipe Baêta Neves, deve-se "aculturá-los
social. "O reconhecimento da liberdade civil dos índios - mesmo
progressiva e seguramente na totalidade do que seria a civilização". 14
quando se tratasse simplesmente de uma liberdade 'tutelada' ou 'prote-
Uma vez civilizados, os índios se tornaram mão-de-obra, prestan-
gida', segundo a sutil discriminação dos juristas - tendia a distanciá-
do serviços a particulares e ao governo mediante remuneração simbólica.
los do estigma social ligado à escravidão", comentou Sérgio Buarque de
O documento do licenciado Diogo de Douto, vigário da Igreja Matriz e
Holanda."
provisor da capitania de Pernambuco, Itamaracá e Paraíba, escrito no ano
A vida dos índios nos aldeamentos estava totalmente submetida
de 1610, ilumina, com precisão, a função dos índios aldeados.
ao crivo dos jesuítas, que julgavam-na favorável ou desfavorável à con-
[... ] Certifico que é verdade que os Índios das Aldeias, versão. No primeiro caso, incentivava-se a postura exemplar com prêmios,
que os Padres da Companhia teem a cargo, assim e, no segundo, aplicava-se o castigo corporal.

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o reconhecimento por parte dos padres de que os índios haviam O corpo que outrora exibia os sinais virtuosos da coragem passou
feito progressos espirituais em direção ao cristianismo levava-os a distri- a significar, no âmbito dos aldeamentos, o lugar onde se inscreviam as
buir bentinhos, relicários, agnus Dei, objetos que estimulavam a piedade marcas da humilhação e do pecado. "Aspenas (tronco, açoite e mutilação)
e utensílios, tal como demonstrou a prestação de contas do padre Beliar- tinham como objetivo esculpir no corpo uma retaliação que, pelas marcas
te: "Resgate de facas, anzóis, contas, espelhos, e outras coisas desta sorte, deixadas no corpo, permitirá uma 'leitura' da gravidade da transgressão
que levei por duas vezes e distribuí pelas Aldeias das Capitanias do Sul, dos condenados, e não castigará apenas o corpo, mas aprimorará a alma",
dando prêmios aos índios e índias, que sabiam melhor a doutrina cristã, analisa Luís Felipe Baêta Neves."
que montaram mais doze mil réís"." Já a carta do irmão Pero Correia, Na nova ordem cristã, os chefes indígenas tinham o cargo de meí-
escrita de São Vicente no ano de 1553, sugeria o incentivo de vantagens rinho, uma espécie de oficial de justiça, cujo ofício era punir os delin-
materiais aos índios cristãos. Segundo ele, "todos dizem que querem ser qüentes. Na verdade, tornaram-se os burocratas dos aldeamentos, encar-
cristãos mas convém que vejam nisto alguma utilidade material". 18 regados de vigiar e punir os índios que transgredissem as normas de com-
O outro lado da moeda era a prática de castigos corporais aos portamento, explicitadas numa carta do padre Antonio Pires: "[ ... ] nin-
desviantes. Logo em 1558, o irmão Antonio Blasquez associou o exercícío guém havia de ter mais do que uma mulher, [... ] não haviam de beber até
freqüente da punição aos frutos do cristianismo. Esboçando o quadro dos se embebedar como costumavam, e que não haviam de consentir aos
primeiros anos da catequese na Bahia, informou ele que feiticeiros, e que haviam todos de aprender e que não haviam de matar
nem comer carne humana". 24
[... ] começou já a castigar alguns e começa a pôl-os O ideal que se procurava alcançar com os aldeamentos, dizia Nóbrega,
em jugo, de modo que se leva outra maneira de proce-
der que até agora não se teve, que é por temor e sujei- [...] era ver o Gentiosujeito e mettido no jugo da obedíen-
ção e pelas mostras que isto dá no princípio, conhe- cia dos Christãos, para se nelles poder imprimir tudo
cemos o fructo que adiante se seguirá, porque com quanto quizessemos, porque é elle de qualidade que do-
isto todos temem e todos obedecem e se fazem aptos mado se escrevera em seus entendimentos e vontades
para receber a Fé.19 muito bem a fé de Christo, [...] e, si o deixam em sua
liberdade e vontade, como é gente brutal, não se faz nada
Para essa gente, comentou Anchieta, "não há melhor prégação do com elles como por experiencia vimos todo este tempo."
que espada e vara de ferro". 20
Aos olhos de todos postava-se um tronco para punir os transgres- No México, mais especificamente em relação à Nova Galícia, Ro-
sores. O castigo público servia de exemplo aos demais. Ruy Pereira reve- bert Ricard precisou: "quando a Coroa proibiu os castigos corporais da-
lou que o medo que os índios sentiam diante do tronco era tão grande dos aos índios pelos religiosos, muitos deixaram de assistir ao sermão, à
que "são elles causa de andarem no caminho e costumes que lhes pô- doutrina e à missa". 26 A catequese, portanto, caminhava junto com a
mos"." Além disso, cenas de horror criadas pelos jesuítas eram exibidas sujeição imposta pelos castigos: os índios escravizados eram a prova dos
pelos aldeamentos, como a ameaça de sepultamento e a de ser lançado à frutos colhidos pelo cristianismo. Depreende-se, assim, a necessidade de
fogueira," analisar a infiltração da doutrina cristã entre os escravos.

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2. Escravidão indígena e doutrina cristã de forma diversa ao dos colonos e aos da Coroa, mas os efeitos eram
absolutamente os mesmos"."
. ,A questão da escravidão indígena foi o cerne das disputas entre Como demonstraram as correspondências analisadas, os jesuítas,
jesuítas e colonos durante todo o período de colonização. Os crescentes de fato, não condenaram a escravidão. Desde 1549, por exemplo, Manoel I
I

conflitos gerados nesse âmbito culminaram na expulsão definitiva dos da Nóbrega parecia mais preocupado com a possibilidade de perder a sua
padres da Companhia de Jesus no ano de 1759. seara de almas para os colonos do que em condenar frontalmente a es-
. ,.Na fase inicial da catequese, porém, a posição assumida pelos mís- cravidão.
sionanos, em contraposição aos colonos, contava com o apoio da monar-
quia, responsável pela elaboração de leis que protegiam os índios da [...] Entre outros saltos que nesta costa são feitos, escre-
cobiçada escravidão. Entre elas, destaca-se a lei de 1587, que proibia as veu ele, um se faz há dous annos muito cruel, que foi
irem uns navios a um Gentio, que chamam os Carijós,
guerras de apresamento, e a lei de 1609, que declarava livre os indígenas
da América portuguesa. que estão além de S.Vicente,o qual dizem que o melhor
gentio desta Costa, e mais apparelhado para se fazer
. Por outro lado, os colonos assumiam abertamente uma posição es- fructo: elles somente tem duzentas leguas de terra: entre
crausta, em nome dos interesses econômicos. Algunsdepoentes da Primeira elles estavam convertidos e baptisados muitos."
Visitaçãodo Santo Ofícioda Barna (1591-1593) e de Pernambuco (1594-
1595), bem afinados com a mentalidade dos colonos, duvidavamda huma- Em 1550, Manoel da Nóbrega solicitou inquisidores para que li-
nidade dos índios. Ajustificativada escravidão assentava-se sobre a recor- bertassem os escravos apresados e os obrigassem a deixar os maus costu-
rente afirmação por parte dos colonos de que os índios não tinham alma. mes. Para o jesuíta,
F~~cisco L~s, colono de Pernambuco, foi denunciado por ter dito que "os
püiguares nao tinham alma mais que hu porco"." O soldado Gaspar Ma- [...] o melhor remédio destas cousas seria que o Rei
noel Machado declarou ao visitador que "todos tinhão alma racional e que mandasse inquisidores ou commissarios para fazer li-
quando eram brutos e alimárias tinham alma irracional".28 Gabriel Soares bertar os escravos, ao menos os que são salteados e
obríga-Ios a ficar com os Christãos, até que larguem os
e Amaro Cruz disseram que "estes gentios desta terra do Brasil não tem
maus costumes do Gentio já baptisado e que a nossa
alma", pois, acrescentou Cruz,"não creem em Deos e que quando morriam Companhia houvesse delles cuidado, amestrando-os na
lhes morriam o corpo e o espírito juntamente".29 Fé, da qual pouco ou nada podem aprender em casa
A prática iluminava a ambigüidade da ação dos missionários. dos senhores e antes vivemcomo Gentios, sem conheci-
He- loísa Belotto, ao analisar a política indigenista no Brasil colonial mento algum de Deus."
de 1570 a 1757, escreveu: "Ao reduzir os nativos à artificialidade da
nova religião imposta e ao prepará-los para uma divisão de trabalho em Naverdade, a escravidão indígena era fundamental no cotidiano da
oposição a que lhes indicava seus costumes tradicionais, os missionários catequese. Os missionários necessitavam de escravos nas novas constru-
preparavam-nos para a manipulação pelo branco, embora negando a ções, no zelo das casas dos meninos e nas roças, responsáveis em fornecer
aceitação da escravidão como tal. Os interesses podiam configurar-se alimentação para os padres e os catecúmenos.

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.. A_condição de escravos apartava os índios da aldeia, favorecendo a os que fossem para isso e fazel-os ir domingos e festas à
mfil~raçao do cristianismo. Para escapar ao fardo diário a que eram sub- missa e doutrina, que seriam melhores christãos que
~etIdos, os escravos foram os primeiros a aceitar a doutrina cristã a se seus amos, porque tirados do vício da carnalidade, tudo
I

mter~ss_ar pel~ Evangelho e a participar do teatro religioso cristão: f~stas, o mais nelles é muito venial." I'
pro~Is~oes, nussas e orações. A catequese, portanto, encontrou um terre-
no fértil entre os escravos. Principalmente na hora da morte, os escravos entregavam-se de
corpo e alma ao cristianismo, como observou Nóbrega em 1557: "Com a,
Gra~de .fOio contentamento de Nóbrega ao ver por ex- escravaria se faz muito fructo em sua doutrina e pregações na sua língua
penencía o fructo que se faz nos escravos dos Christãos, e confissões, maiormente as do artigo de morte, de que cremos resulta
os quaes com grande descuido dos seus senhores vivi- muito proveito a muitas almas".36
a~ gentilicamente em graves peccados. Agora o~vem A resignação dos índios escravizados, na proximidade da morte,
nussa ca~a Domingo e festa e têm doutrina e pregação sinalizava que, em algum nível, o escravo tinha consciência de que a sua
na sua hngua as tardes. Andam taes que assim festas
condição o levaria à morte, tal como circulava na boca dos feiticeiros.
como p~la semana o tempo que podem furtar vêm a que
lhes ensmemos as orações e muito antes de irem pescar Um exemplo concreto dessa situação é o caso de um índio escravizado
ou a seus trabalhos hão de ir resar à egreja e o mesmo que, ao abandonar o cristianismo, sublevou todos os outros escravos,
da tornada antes que entrem em casa." dizendo que "o Governador os quer matar a todos ou fazel-Ios escravos". 37
Outra direção sugerida pela situação exemplar do escravo na hora
. Aos olho~ ~os escravos, o cristianismo era uma via de libertação e da morte era a da projeção, no post mortem, de uma vida melhor, isenta
a.Igreja, um refúgio para onde acorriam, escapando, ainda que tempora- de trabalho forçado e de sofrimento. Nessa perspectiva, a via de liberta-
namente, ao domínio dos senhores. A carta de Ruy Pereira datada de ção talvez estivesse na conversão, na qual se renovava a esperança de par-
1561, demonstrou que a Igreja era um espaço concorridíssi~o pelos es- tilhar com seus antepassados uma existência divinizada, seja no paraíso
cra;s: "Depois qu~ viemos começamos a chamar a escravaria à doutrina indígena, seja no cristão. O irmão Antonio Blasquez aludiu ao fato de os
aon e acodem muitos, maximé aos domingos e dias santos nos quaís se' índios terem notícias de uma vida post mortem:
enche a eg . té , <U
reta a e a porta e apenas cabem os escravos machos" 34
Ao c~nt~ár!o dos índios libertos, os escravos mostrar~-se bas- o mais copioso fructo que se faz é com a escravatura
tante vulnerãveís as confissões, por meio das quais os jesuítas puderam dos Christãos em doutrina e confissões, mórmente com
os que morrem, porque, como já tem muita notícia da
conhecer ~elhor os costumes tribais, atacando-os com maior destre
Segundo Nobrega, za. Fé e crem haver outro mundo, onde se vive com Deus,
mais facilmente podemos movel-os à contricção dos seus
peccados e aborrecel-os"
[ ... J fora~ tão proveitosas estas confissões, que enxer-
gamos muíta emenda de seus VÍCiose maus costumes e Assim, a morte assumiu importância central no processo de cate-
temos ~lcançado, que si os senhores puzessem qu~l-
quização, pois abria, irremediavelmente, as janelas para a conversão. Como
quer cuidado em os fazer viver em bom estado, casando
os índios temessem qualquer outra morte que não fosse a ritual e uma vez

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impossibilitados de praticá-Ia, permitiram, neste momento, a infiltração, gou ao Brasil somente em 1562, irradiando-se da Bahia para diversos
sem resistência, da doutrina cristã. Como se verá a seguir, as ondas epidê- núcleos coloníaís."
micas que assolaram os aldeamentos, dizimando milhares de índios , con- Mas o fato é que as sucessivas ondas epidêmicas que se difundiram
tribuíram para que os jesuítas recrudescessem a esperança de efetivação nas regiões litorâneas, não poupando nem mesmo os sertões, provocaram
da catequese. um maciço declínio da população indígena, em especial dos Tupi-Guara-
ni. O historiador Warren Dean estimou que dos aproximadamente 103
mil tupinambás que viviamem 1501 nos arredores da capitania do Riode
3. Epidemias Janeiro, apenas 7 mil restavamno ano de 1600.44 Noinício do século XVIII já
não haviauma única tribo tupi em toda a região costeira.Deve-seconsiderar
Os aldeamentos floresceram praticamente em toda a costa da Amé- nesse processo demográficonão apenasas epidemias,mastambémas guerras
rica portuguesa, de Pernambuco a São Vicente, adentrando pelo interior organizadascontra esses índios considerados hostis.
do planalto de Piratininga. Em 1561, Serafim Leiteinformou que a Bahia De qualquer forma, o crescente desaparecimento da população
contava com 11 aldeias," das quais 3 chegaram a ter 4 mil índios em indígena assumiu proporções alarmantes no século XVI. Avaríola foi res-
cada uma delas. Essa concentração populacional verificada a partir da ponsável pela morte de cerca de 30 mil índios na Bahia num período de
segunda metade do século XVI, entretanto, favorecia a propagação de dois a três meses, o que correspondia, segundo Vainfas,a um quarto da
doenças. população local."
O freqüente contato com o mundo dos brancos trouxe para os Os surtos epidêmicos propiciaram, também, a difusão entre os
aldeamentos doenças ignoradas pelos índios. Varíola, sarampo, coque- índios de uma outra imagem de morte: a morte visível,cujos efeitos eram
luche, catapora, tifo, difteria, gripe, peste bubônica e, provavelmente, sentidos na gradual decomposição do corpo. Anchieta deu o seu testemu-
malária, propagavam-se pelos ald eamentos," ocasionando uma vultosa nho do cenário funesto em que se encontravam os índios em São Vicente:
depopulação indígena. Se, por um lado, essas doenças ceifavam centenas
de vidas em poucos dias, colocando em risco a própria continuidade dos [...] cobre-se todo o corpo dos pés à cabeça de uma
aldeamentos, por outro, garantiam, em troca do despovoamento da terra, lepra mortal que parece couro de cação e ocupa logo a
garganta por dentro e a língua de maneira que com
o povoamento do céu. Uma carta anônima do Espírito Santo, datada de
muita dificuldade se podem confessar e em trêsquatro
1558, revelou que essas eram ocasiões fecundas para "buscar thesouros dias morrem; outros vivem, mas fendendo-se todos e
de tão excelentes pedras"." quebra-se-Ihes a carne pedaço a pedaço com tanta po-
Embora sejam escassas as informações sobre as doenças que se dridão de matéria, que sai deles um terrível fedor, de
alastraram pelas populações indígenas, sabe-se que a varíola oupeste das maneira que acodem-lhe às moscas como à carne morta
bexigas foi responsável por grande parte da mortandade indígena que e apodrecida sobre eles e lhe põem gusanos que se não
ocorreu no século XVI. Segundo os dados de EuláliaMaria LahmeyerLobo, lhes socorressem, vivos os comeriam.f
"a varíola dizimou a população em 1554-1555, 1561-1564, finais da dé-
cada de 1570-1597 ".42 Para Ronaldo Vainfas,entretanto, a varíola che- Esboçava-se aí a própria imagem do inferno cristão: os índios ar-
dendo no fogo dos pecados. Adescrição de Anchietapautava-se nos sofri-

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I!

mentos do inferno, sobre os quais os jesuítas meditavam. Em A divina cima e muitas hervas, se estendiam ali tão cobertos de ar I

comédia, de Dante Alighieri, "Canto XXIXdo inferno", o poeta encontra- e tão vestidos como eles andam, e se assavam, os quais
se na décima vala do círculo 8 do inferno, onde avista as almas dos fal- comumente depois morriam, e suas carnes, assim como II
sários recobertas de lepra da cabeça aos pés: aquele fogo exterior como com o interior da febre, pa-
reciam assados."
Abatida, aos montões, aquela gente
jazia, num difícil tumultuar, Contrastando com esse quadro infernal de consumição dos corpos
procurando arrastar-se, inutilmente. dos adultos os jesuítas viam na morte das crianças batizadas os fluidos que
Os condenados esfregavam as costas: emanavam do paraíso cristão. Esta atitude foi notada por Gilberto Freyre: "A
e largas crostas iam arrancando, morte da criança passou a ser recebida quase com alegria (pelo menos
tal o peixe se vê sob o facão
sem horror) [...] Nos tempos da catequese, os jesuítas, talvez para ate-
do pescador, que o raspa, descamando." I!
nuar entre os índios o mau efeito do aumento da mortalidade infantil que
I
se seguiu ao contacto ou intercurso em condições disgênicas, entre duas
A descrição de Dante tem muitos pontos em comum com aquela feita II
raças, tudo fizeram para enfeitar ou embelezar a morte da criança. Não I
por Anchieta a propósito das epidemias. O terror e o medo causados pelas
era nenhum pecador que morria, ma.', um inocente que Nosso Senhor , I

doenças deixavam os índios à mercê da ação dos jesuítas. Afinal, a varíola era
chamava para junto de si" .52
a prova viva do apodrecimento do corpo, tão temido pelos Thpi-Guarani.
Nesse contexto, a varíola era, por um lado, uma exposição pública
Talmaneira de morrer estava em consonância com as imagens macabras
dos pecados nefandos dos índios adultos e, por outro, a possibilidad~ de
que circulavam na Europa nesse período. "O cadáver semi-decomposto", ana-
salvação. As crianças inocentes eram afortunadas, pois, quando mornam,
lisa Philippe Aries, "tornar-se-á o tipo mais freqüente de representação da
seguiam diretamente ao encontro do reino de Deus. Em Piratininga,
morte: o trespassado [...] É o principal figurante da iconografia macabra do
Anchieta comentou que a epidemia de varíola foi "boa renda para Nosso
século XIVao XVI".48
Senhor" ,53 pois morreram de três a quatro crianças por dia (às vezes, até
Os corpos acometidos pela varíola eram representações vivasdo maca-
mais), dados que confirmam o alto índice de mortalidade infantil na
bro. Segundo Michel Vovelle, o macabro era uma pedagogia simples e eâ-
Colônia.
caz." O sofrimento por que passavam os índios doentes não tinha medida. O
Porém, a valorização da morte da criança por parte dos jesuítas
tratamento dispensado pelos missionários consistia em fazer sangrias e esfolar
não significava, como sugeriu Gilberto Freyre, uma mera dissimulação da
as partes molestas dos corpos com uma tesoura,
mortalidade infantil. Essa atitude era apenas extensão de uma nova postura,
analisada por Philippe Aríês, que se traduziu pelo aparecimento, no início
[...] ficando em carne viva, [...] e lavando-Ihes aquela
corrupção com água quente." dos tempos modernos, de uma educação voltada para a criança. "As ordens
Outros enfermos que queriam escapar das mãos dos religiosas então fundadas, a dos jesuítas ou a dos oratorianos, tornam-se
padres, mandavam fazer umas covas longas á maneira ordens que ensinam e seus ensinamentos não se dirigem mais aos adultos
de sepulturas, e depois de bem quentes com muito fogo, como aquelas dos predicantes ou dos mendicantes da Idade Média, mas
deixando-as cheias de brazas e atravessando paus por estavam essencialmente reservadas às crianças e aos jovens.'?'

130 131
, 'I

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A criança passou a inspirar sentimentos de piedade e devoção.


Analisando a difusão de imagens da criança como representação de Cristo suscitavam tais cenas: 'Fizemos nove procissões aos nove coros d~s anj~s
contra todo o inferno e logo a morte cessou', diz uma carta escnta apos
propagada pela Igreja, Mary deI Priore escreveu: "As características hu-
manas - o olhar, o perfume e os gestos - desta criança divinizada, uma forte epidemia"." ,
Antonio Blasquez informou que, durante a epidemia de vanola
somadas a sua doçura, inocência e afabilidade, tocariam a todos que a
cercassem. Assim fora na manjedoura: infiéis e pagãos convertiam-se ante que devastou a povoação do Espírito Santo, os meninos, a fim de acalmar
a dulcíssima visão do pequeno e luminoso jesus''." a ira de Deus, realizaram uma grande procissão com "suas palmas nas
A morte da criança divinizada classificava-se, do ponto de vista mãos e suas grinaldas cheias de cruzes na cabeça"." , :
Muitos índios adultos, fragilizados pelas doenças, entregavam-se a I
do cristianismo, como uma boa morte. Vivenciada geralmente pelos
morte "com grandes sinais de fé e contrição, invoca~~o ser;:pre o. nom.e I
padres e santos, a boa morte era aquela em que não pesavam os tor-
mentos e as aflições da alma. O morto entregava-se voluntariamente ao
de Jesus", detalhou Anchíeta." Nesses momentos crítícos, crescia a ~-I
seu destino, envolto numa atmosfera de tranqüilidade. A morte esboça- nha do Senhor". Além disso, ~ume~tava. o co~tingente d.e escravos lllJ
dios, pois os que sobreviviam as epídemías nao conseguiam se mante \
va-se como um convite. De acordo com Michel Vovelle, muitos santos
sozinhos. Sobreveio aos surtos de varíola uma grande fome que assolou a
foram agraciados com visões que lhes anunciavam a morte. São João
capitania da Bahia. Impossibilitados de viverem do seu próprio sustento,
Evangelista, por exemplo, teve uma visão que lhe anunciou: "Venha,
meu bem-amado". 56 os índios "se vendiam e se iam meter por casa dos Portugueses a se fazer
escravos, vendendo-se por um prato de farinha, e outros diziam, que lhes
Embora os santos e as crianças tivessem seus lugares garantidos no .
céu, os primeiros diferenciavam-se pela vida exemplar, enquanto os últi- pusessem ferretes, que quenam ser escravos " .61 . _
A confiança do moribundo na doutrina cristã e a escravidão volun-
mos, pela curta e imaculada existência na terra. Na visão da Igreja, a
tária não eram os únicos efeitos dos surtos epidêmicos. Muitos índios
morte das crianças era uma benção divina, pois as livrava de uma vida
procuraram a salvação de suas vidas longe da esfera de ação dos jesuítas.
adulta pecaminosa. Os padres empenhavam-se em batizá-Ias in extremis.
Anchieta comentou que como muitos índios eram de "baixo e rude enten-
Do Espírito Santo escreveu o padre Pedro Costa: "Especialmente no tem-
dimento diziam que as sangrias os matavam, e escondiam-se de nós ou-
po das bexigas e doenças de camaras, que após ellas vieram, se bautísa-
tros"." Reforçando essa idéia, a carta anônima de 1558, do Espírito Santo,
ram muitos inocentes in extremis, dos quaes mui poucos escaparam;
destes passarião de cem almas". 57 informou que os índios "escondiam-se nas redes e as mães escondiam os
filhos e alguns por força do Demonio se alevantavam e pediam água pera
Durante as epidemias, acionava-se todo o aparato religioso cristão
se lavarem, porque chegando o Padre lhe parecesse que estavam valentes,
a fim de aplacar a ira de Deus. As procissões, que contavam com intensa
e perguntando-lhe como estavam respondiam que bem e que já não estav~
participação das crianças, foram um instrumento importante de conver-
doentes"." Não é gratuito o fato de o sacerdote cristão ser conhecido
são dos índios. Conforme elucidou Mary deI Priore, "[ ... ] a habilidade
nessa região como "o que leva os mortos".64 ,
jesuítica consistia em relacionar os momentos críticos vividos pelas co-
Atitudes de resistência indígena semelhantes tambem ocorreram
munidade indígenas, como os de tantos surtos epidêmicos, para acionar
nas regiões de colonização da América espanhola. Hector H. Bruit iluminou
a procissão de crianças e beneficiar-se do clima de devotada piedade que
o papel fundamental que exerceu a simulação como instrumento de defesa

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contra a cristianização. Tratava-se de "um mecanismo de defesa, de so- estabelecida, configurando-se como o avesso da região costeira da América
brevivência, de deculturação, de resistência, que não foi visualizado nem portuguesa. Praticamente imune às normas e leis que vigoravam nos núcleos
entendido pelas autoridades nem pela maioria dos espanhóis" ,65 que pas- litorâneos e longe da esfera da ação dos agentes coloniais, o sertão foi,
saram a ser ludibriados politicamente. até a segunda metade do século XVI,o abrigo daqueles que viviam à margem
No contexto da América portuguesa, o gesto de esconder os doentes do sistema colonial: aventureiros, párias, índios hostis e conversos, escravos
dos jesuítas também era uma forma de recusa do universo cristão. Essa fugidos (índios e negros da Guine). Em 1551, informou o padre Nóbrega:
atitude assumia proporções mais radicais quando se transformava no "O sertão está cheio de filhos de Christãos, grandes e pequenos, machos e
movimento de populações em direção às terras interiores, por onde ainda fêmeas, com viverem e se criarem no costume Gentio". 70
ecoava a promessa de uma terra sem mal. Contou o padre Ruy Pereira, A partir da última década do século XVI,entretanto, as autoridades
numa carta da Bahia de 1560, que os índios da aldeia de São] oão fugiram passaram a considerar o sertão uma ameaça ao sistema, porque se cons-
depois de uma solene procissão de Ramos e "se foram fugindo todos pelo tituía como guardião dos costumes indígenas e reduto da resistência ao
sertão tão secretamente, que, estando com elles o padre Leonardo do domínio dos brancos.
Valle, nunca sentiu a cousa, sinão depois de serem quase todos idos". 66 A devassa feita pela Primeira Visitação do Santo Offício na Bahia, da
Os ares da Colônia, como atestou uma oração compilada pelo histo- competência do visitador Heitor Furtado de Mendonça, lançou luz sobre as
riador Antônio Alcântara Machado, não estavam muito bons: "Em nome de vozes dissonantes dos habitantes do sertão. Depoimentos fragmentados pres-
Deus Padre, em nome de Deus Filho, em nome do Espírito Santo , ar vivo, ar tados pelos moradores, por itinerantes e por gente que ouviu dizer o que se
morto, ar de estupor, ar de perlesia, ar arrenegado, ar excomungado, eu te passava naquelas paragens, demonstraram que, até os anos de 1591 e 1592,
arrenego em nome da Santíssima Iríndade"," dizia a reza protetora. período em que se instalou a Mesa do Santo Ofício, muitos costumes indí-
genas permaneceram até então inviolados, enquanto outros renasciam com
muito vigor, eivados de elementos cristãos.
4. Ecos do sertão O depoente Domingos Femandes, o Tomacaúna de alcunha, é exem-
plo de um branco que se tornou índio ao percorrer o sertão. Por volta de
Em face das epidemias e da fome que se propagavam pelos aldea- 1570, quando foi ao interior da capitania de Porto Seguro,
mentos, dizimando milhares de vidas e levando os índios à escravidão,
restava como alternativa aos sobreviventes a fuga para o sertão. [... ] usou de usos e costumes dos gentios tingindo se
Lugar sem contornos precisos, sem limites definidos, o sertão lo- pellas pernas com hua tinta chamada urucu, e outra gení-
calizava-se à margem da administração colonial, deslocando-se para terras papo e empenando-se pela cabeça de penas e tangendo
os pandeiros dos gentios, que são uns cabaços com
interiores à medida que se aproximava a colonização. Segundo Alcântara
pedras dentro e tangendo seus atabaques e instrumentos
Machado, o sertão era o "centro solar"6s da Colônia, para onde convergiam bailando com elles cantando suas cantigas gentílicas pella
os anseios de enriquecimento e de liberdade da população. lingoa gentt1ica que elle bem sabe e que estas cousas fez
Esse território disperso, à semelhança do deserto medieval anali- por dar a entender aos gentios do ditto sertão que elle era
sado por ]acques Le Goff, 69 representava os valores opostos da sociedade valente e não os temia por andarem sempre em guerra."

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Viveufeito índio no sertão de Arabo e no sertão de Ilhéus: andava e Inácio Siqueira, apontou para o fato de os índios conversos emb~enha-
nu, tinha muitas mulheres, tatuava e tingia o corpo, bebia e bailava à rem-se no sertão apenas para receber bafos santos dos pajés: "E tanto
moda do gentio. O historiador Ronald Raminellichamou a atenção para a assim, que os carijós cristãos, que entre nós residem [no Rio de Janeiro],
dualidade desse testemunho que transitava entre a vila e o sertão , confir- se à sua pátria voltam, por nenhum caso perdem os perdões do bafo santo
mando a maleabilidade da cultura dos mamelucos. Embora as autoridades [do bafo do Caraíbebe] ".77
coloniais exigissem que os mamelucos fossem cristãos exemplares, eles se Cientes do carisma que esses homens santos exerciam, os jesuítas,
tornaram "os elementos mais ditantes das fronteiras da Cristandade".72 durante a fase inicial da catequese, equiparavam-se a eles, assumindo
Movimentos indígenas à procura de um paraíso terrestre continua- papéis proféticos e discorrendo sobre os poderes sobrenaturais. Em suas
ram a ocorrer por toda a América portuguesa, na tangência dos principais procissões eminentemente católicas valiam-se de artifícios indígenas para
núcleos coloniais: Pernambuco, Ilhéus, Porto Seguro, Rio de Janeiro e atrair seguidores e, desse modo, realizavam a transferência de conteúdos
Piratininga para os Tupi e Paraguai, e sul do continente americano para considerados pagãos para os conteúdos cristãos.
os índios guaranis.
Com a mesma idoneidade dos visionários, os jesuítas atravessavam
Entretanto, contaminado por doenças, fome e escravidão, o litoral terras inimigas com segurança. O salvo-conduto adquirido pelos padres
deixou de ser o destino dessas migrações, que se deslocaram para as estavagarantido sobretudo pelos instrumentos que traziam e pelas canções
brenhas do sertão. "Alterava-sea rota", comentou Ronaldo Vainfas,"man- que entoavam. A música e o canto, aos olhos dos jesuítas, impuseram-se
tinha-se o mito. O paraíso tupi parecia deslocar-se lentamente do litoral cedo como uma via suave de conversão do gentio. "Asensibilidade musical
para o interior, do mar para o sertão"." do indígena fazia crer aos jesuítas, que 'tocando e cantando entre eles os
Desse modo, esses movimentos indígenas configuravam-se como ganharíamos', e que 'se viesse cá um tamborileiro ou gaiteiro parece-me
messiânicos, pois, além de estarem escorados nos mitos, eclodiam em que não haveria principal que não desse os seus filhos que os ensinas-
resposta às "situações desfavoráveis de fome, de pobreza e de opressão", semos''', explicaMarydeIPriore. 78 Os missionários mantinham os mesmos
lembrou Egon Schaden." A tradição mitológica encontrou respaldo nos sons e melodias, mas acoplavam "Ias palavras en lovores de Dios".79
acontecimentos históricos. Ambos põem em cena a iminência da destrui- Peregrinando. de aldeia em aldeia, os meninos órfãos de Lisboa
ção e da morte. Tal situação impulsionou índios e oprimidos a unirem integravam o cortejo e realizavam prédicas a grandes vozes, bem à ma-
suas forças num "movimento de reação" 75 contra o domínio de uma soci- neira dos caraíbas, nas quais davam a conhecer o verdadeiro Deus, cria-
edade branca.
dor do céu e da terra, a quem doravante estariam obrigados a obedecer.
Essas ondas migratórias ficaram conhecidas, por meio dos depoi- Nas palavras cristãs, a verdadeira santidade não provinha do poder do
mentos do Santo Offício,como santidades:76 movimentos de cunho reli- fumo nem das cabaças, mas da cruz e das palavras cristãs. A cruz, toda
gioso e político que acrescentavam à busca da terra sem mal o sentido de pintada de pluma de Ia tierra, com um menino Jesus no alto em traje
liberdade, do qual se viam privados no mundo dos brancos. angélico com uma espada na mão," vinha à frente das procissões, aler-
As santidades eram conduzidas por porta-vozes cuja fama corria tando para o início da luta de cristianização dos índios. As penas, signos
pelos vilarejos e aldeamentos, atraindo novos adeptos em suas andanças. de honra e de respeito no mundo indígena, foram utilizadas pelos jesuítas
Eduardo Hoornaert, transcrevendo a relação dos padres João de Almeida para recobrir a cruz, sinalizando um novo objeto a ser cultuado.

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Ao final da pregação na aldeia, os missionários asseguravam às O discurso dos porta-vozes das santidades, portanto, remetia no-
populações indígenas que os antepassados, ao contrário dos pressupostos vamente às tradições tribais, procurando romper com a ordem estabele-
religiosos tupi-guarani, haviam sido conduzidos ao encontro da morte , cida. As santidades atacavam fazendas e engenhos, pregavam a volta
enquanto os cristãos seriam beneficiados com a imortalidade. Os cristãos dos ancestrais mortos em um navio para livrar os índios da escravidão e
não morriam, escreveu Francisco Pires, "porque creían en Ia verdadera massacrar ou transformar os portugueses em peixes, porcos ou outros
santidad", mas já "los malos que morían yvan al infierno a arder com los anímaís."
diablos, 10 qualles metia gran medo y espanto"." A metamorfose de homens em animais, embora estivesse ausente
Apesar do esforço dos missionários, os índios não se persua- da esfera de ação dos xamãs tupis, era um poder atribuído aos feiticeiros
diram do advento de uma nova santidade e continuaram fiéis aos seus guaranis. Segundo Métraux, a forma preferida desses xamãs era a do ti-
antigos profetas. A partir da metade do século XVI, as crescentes difi- gre." O tema das metamorfoses animalescas, explicou Carlo Ginzburg,
culdades que cercavam as populações indígenas, geradas pelo contato radicou-se na cultura folclórica européia, após ter composto o núcleo de
com os brancos, favoreceram o recrudescimento de movimentos em crenças xamânicas dos caçadores da Síbéria."
busca da terra sem mal. Se, de acordo com a tradição mitológica, os As santidades que floresceram entre os Guarani pregavam explici-
índios pretendiam escapar do fim do mundo, da destruição da terra, tamente a morte dos padres e a volta aos costumes indígenas. Ruiz de
os acontecimentos históricos davam uma face visível e nova ao inimigo: Montoya compilou o seguinte discurso de uma santidade que visitou a
o homem branco e a Igreja. redução de San Francisco Xavier:
Em 1556, Anchieta aludiu a uma santidade que andava nas cerca-
nias de Piratininga, dizendo que "há de passar por aqui a guerra dos [...] Vivamos (dezia) ai modo de nuestros passados,
contrários e que da tornada há de destruir esta igreja cuja fama anda por que halla estos Padres de mal, en que tengamos muge-
todo o sertão"." Configurando-se como movimentos anticristãos, as san- res en abundancia? Porcierto que es loucura que dexa-
das los costumbres y buen modo de vivir de nuestros
tidades, em última instância, punham em xeque o próprio sistema colo-
mayores, nos sujetemos a Ias novedades que estos Pa-
nial, motivo pelo qual os agentes colonizadores procuravam eliminá-Ias.
dres quieren introduzir, el mejor remedio que hallo a
Relatou o padre Nóbrega que uma santidade que passou pelo enge- estes males, que quitemos Ia vida a este Padre."
nho da Bahia:
Nesse evento, o padre saiu ileso, mas, em muitas outras reduções,
[... ] fizera bailar o engenho e ao senhor com elle , e os índios, incitados pelas santidades, tiraram a vida dos jesuítas.
que converteria a todos os que queriam em pássaros,
Entre as santidades tupis a mais conhecida foi a de ]aguaripe, a
e que matava a lagarta das roças que entonces havia, e
qu.e nós não éramos para a matar e que havia de des- que inúmeros depoentes da Primeira Visitação do Santo Offício fizeram
truir a nossa egreja, e os nossos casamentos que não referência. Fundada pelo índio converso Antônio, que fugira de um aldea-
prestavam, que o seu Santo dizia que tivessem muitas mento em Tinharé, na capitania de Ilhéus, a santidade instalou-se em
mulheres e outras cousas desta qualidade." Palmeira Comprida, nas proximidades da serra de Orobó, congregando,
por volta de 1580, centenas de cristãos, índios forros e escravos, mame-

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lucos e alguns negros da Guiné. Aproximadamente em 1585, a santidade


o ingresso de novos membros na santidade de ]aguaripe ficava a
cargo de Antônio, o dito Papa, e pressupunha batismo e renomeação dos
foi acolhida nas terras do senhor de engenho Fernão Cabral, onde perma-
indivíduos. Confessou Domingos Fernandes que faziam "entressi bautismos
neceu cerca de cinco meses até ser completamente destruída pelas auto-
com candeas acesas lançando ágoa pellas cabeças dos bautizados e pu-
ridades coloniais. "Temia-se muito que se alevantassem contra esta cida-
nhão lhe nomes a seu modo os quais bautismos fazia o ditto chamado
de", declarou o depoente Diogo Dias, justificando as medidas adotadas
Papa autor e inventor da ditta erronia e abusão"."
contra a santidade de ]aguaripe pelo então governador-geral, Manoel Telles
Enquanto, no plano da aparência, a santidade assemelhava-se a um
Barrete." Em 1586, o capitão Álvaro Roiz matou os principais integrantes
movimento cristão, ou ainda, a um cristianismo mal compreendido, suas
da seita e prendeu vários de seus adeptos.
raízes remetiam-na às tradições indígenas. A língua que se falava entre os
Note-se, portanto, que o substrato religioso das santidades confi-
adeptos da seita era desconhecida dos brancos. Pouco se sabe a seu res-
gurava-se predominantemente indígena, enquanto o aparato e os orna-
peito, apenas o seu nome: roiguasu ou roigaçú, que significavafrio grande.
mentos eram oriundos do mundo cristão. Assim, a construção da igreja,
Diogo Dias e Domingos Fernandes afirmaram que era uma língua inventa-
altar, pia, sacristia, confessionário; a utilização de objetos, como contas
da," muito embora pareça inegável a sua raiz tupi.
bentas de madeira, livros de madeira e cruzes, além da presença de no-
As práticas que, no profetismo tupi, estavam circunscritas a um
mes cristãos entre os freqüentadores (Papa, Santa Maria, São Luiz...),
profeta passaram, no âmbito da santidade, ao domínio da coletividade.
indicavam a absorção de elementos cristãos, só que reinterpretados pela
Desse modo, a língua que veiculava a comunicação dos pajés com os
cultura indígena.
mortos passou a ser proferida por todos os integrantes da santidade, o
Nesse contexto tinha lugar a adoção do batismo e toda a cerimônia
mesmo ocorrendo com os gestos de transe. Domingos Fernandes descre-
que o circunda. A fala dos padres e o anseio dos índios convergiam na
veu a santidade em movimento pelo sertão: "Í ...] e o dicto chamado Papa
mesma direção: o acesso ao paraíso e o reencontro com os antepassados.
que vinha na diantera e os mais que o seguiam em fileiras vinhão fazendo
A adoção de nomes de santos e de autoridades espirituais por parte dos
meneos e movimentos com os pés e mãos e pescoço e falando certa língo-
líderes do movimento sugeria uma proximidade maior com o outro mun-
agem nova que tudo era invenção e ceremonia daquela abusão chamada
do, e, portanto, com o paraíso, seja ele cristão ou indígena, visto que
sanctidade" .93
ambos se confundiam aos olhos da população colonial.
Além disso, o uso do fumo e a defumação saíram do círculo restrito
Antônio, o Papa, dizia ter escapado do dilúvio de Noé, "mettido no
dos caraíbas, abrindo as portas do sobrenatural para todos que partilhas-
olho de uma palmeira" ,89 numa nítida fusão entre o mito da destruição do
sem dos preceitos da santidade. O espírito da santidade, confessou Gon-
mundo tupi-guaraní e o dilúvio de Noé do Antigo Testamento. Para Ronaldo
çallo Fernandes, tornou-se acessível a seus membros, pois "defumavam-
Vainfas, Antônio legitimava-se como reencarnação de um dos gêmeos mítí-
se com fumos de ervas que chama erva santa e bebiam o dito fumo até
cos que viera repovoar a terra e conduzir o seu povo à terra sem mal." Por
que caíam bêbados com ele dizendo que com aquele fumo lhe entrava o
outro lado, no âmbito do cristianismo, Antônio identificara-se com Noé.
espírito da sanctídade"."
Tanto um quanto o outro tinham em comum a missão de iniciar uma nova
Havia, ainda, um ídolo de pedra sobre o altar que era cultuado à
humanidade depois que a terra e os homens fossem destruídos. Antônio
semelhança dos maracás. Supunha-se que emitia mensagens dos antepas-
imbuíra-se claramente desse papel de salvador.

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sados, veiculadas por Antônio. O teor do discurso, como vimos, incidia Exortava o padre a certo gentio velho que se baptizasse,
e ele respondeu que o faria para quando Deus encar-
sobre a libertação do domínio dos brancos. Informou Luisa Barbosa que
nasse a segunda vez, e, dando fundamento do seu dito,
cristãos e gentios diziam que:
acrescentou que, assim como Deus encarnara uma vez
em uma donzela para remir os Brancos, assim havia de
[...] aquella sua sanctidade era hum Deus que elles ti- encarnar outra vez em uma donzela índia para remir os
nhão que lhes dizia que não trabalhassem por que os Índios, e que então se baptízaría.'?'
mantimentos por si próprios aviam de nascer e que
quem não cresse naquella santidade se avya de conver-
Nesse contexto, o batismo ou o desbatismo parecia assumir um
ter em sapos e em pedras, e que a gente branca se avya
de converter em caça para elles comerem e que aquella significado de libertação.
sua sanctidade era a sancta e boa e que a lei dos cristãos Consoante a essa profecia, havia outra, bastante difundida, que
não prestava e assim diziam e tinhão outors muitos des- dizia que Deus queria dar uma volta no mundo, "fazendo que o Céu fique
propósitos."
para baixo e a Terra para cima, e assim os Índios hão de dominar os
Brancos, assim como agora os Brancos dominam os Índios" .101 Aidéia de
Gonçallo Fernandes acrescentou em seu depoimento: "seu Deus
inversão da ordem estabelecida não era estranha ao pensamento europeu
vai lívrá-Ios do cativeiro em que estavam e fazellos senhores da gente
dos séculos XVI e XVII,conforme explicitou o historiador Stuart Clark.'?'
branca e que os brancos aviam de ficar seus captivos e que quem não Em relação ao caso da santidade de ]aguaripe, a Inquisição classi-
cresse naquella sua abusão e idolatria a que elles chamavão Santidade se ficou-a como heresia, condenando seus adeptos à morte e ao presídio.
avia de converter em passaro e em bichos do mato". 96 Isso porque, explicou Ruiz de Montoya, "Ias pláticas eram enderezadas al
As santidades guaranis realizavam ritos de anulação do batismo em descredito de Ia Fé y Ia Religion Christiana" .103
suas igrejas. Os santos lavavam os corpos dos novos adeptos dizendo a Os próprios participantes desconfiavam de heresia ou senão de apos-
frase: "Yo te desbautízo"." O xamã guarani Nheçu, vestindo o hábito tasia. Gonçallo Fernandes alegou que a dita idolatria costumava "contrafa-
sacerdotal, lançava água quente sobre o corpo das crianças, "a fim de zer as cerimônias da igreja" .104 Bras Dias afirmou que havia "muitas emper-
apagar a marca dos santos óleos, esfregando-lhes a língua com argila e feições e despropósitos como cousa de negros que são de pouco saber" .105
uma concha para suprimir o gosto do sal", 98 banhando-lhes os pés e não
Contudo, não se tratava de ignorância religiosa, uma vez que a
a cabeça como faziam os jesuítas. Integrante da seita, uma mulher afir- santidade invertia as práticas cristãs e reinterpretava os símbolos cris-
mava ser deusa do sol, da lua e dos planetas, o que lhe dava poderes de tãos à luz dos profetas indígenas. Nesse contexto, elucidou Ronaldo
controlar a luz. Desse modo, incitava os índios a destruírem as populações Vainfas, as santidades classificavam-se como idolatrias insurgentes, pois
cristãs, "ofreciendo ella quitar-les Ia luz en el conflicto; quedando de estavam "marcadas antes de tudo pelo caráter sectário dos movimentos
suyos en luz clara". 99
e pelo discurso hostil ao europeu, sobretudo à exploração colonial e ao
Profecias como essa ocorreram em vários lugares onde se verificou a cristianismo" .106
presença dos brancos; No século XVI,o padre Antônio Vieira compilou duas
No México também foi patente o descrédito do frei Bernard Sahágun
profecias que circulavam nas povoações dos índios tobajaras, na serra de
com relação à cristianização dos índios:
Ibiapaba, no Ceará, significativas pela proposta de inversão da ordem social.

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Lo que sucede en realidad [... ) es que los índios han Para efeito didático da conversão, os jesuítas colocaram os índios
consentido en recibir el bautismo, en hacerse exterior- na mesma encruzilhada em que se via o homem medieval, apresentando
mente cristianos, pero en el fondo de su corazón no se
apenas dois destinos para suas almas: o céu para os batizados e o inferno
resuelven a abandonar Ias antíguas costumbres, Ias
viejas tradiciones y el culto de sus divindades.':" para os pagãos. O padre Gaspar Lourenço descortinou, diante do índio
que havia se recusado a receber o batismo, "a glória do paraíso e as penas
As santidades tupis sobreviveram até o século XVII,enquanto os do inferno, e que mui breve ou elle se fazia filho de Deus e herdeiro da
movimentos guaranis persistiram até o século XIX.No arcabouço cristão, gloria, ou servo perpétuo do Diabo e morador do inferno". III
vivificou o mito da terra sem mal, mobilizando milhares de índios a Na verdade, a idéia de céu era facilmente assimilável pelos índios,
deslocarem-se em busca do paraíso terrestre. Para alguns guaranis de ansiosos por conquistá-lo. Buscavam num outro conjunto simbólico, no
hoje, a morte não garante mais o acesso a essa morada dos antepassados, caso o cristão, o meio de alcançar a existência sem dor e sem morte, o
uma vez que, como escreveu Egon Schaden, estão "cheios de fraquezas e que ia ao encontro da promessa lançada pelos padres. Asvisões dos ín-
_. "108p
d e VICIOS dios, na ocasião da chegada dos jesuítas, traduziam o desejo de alcançar
. ara outros, como para o nanderú Bastião de Araribá , o
acesso à terra sem mal fazia-se somente pela morte, pois, conforme disse o paraíso. Um deles, que supostamente havia sentido os efeitos imediatos
do batismo, disse que "estivera com Deus no Paraíso"!" Contou Vicente
o índio SilvinoRufino, nandéva do Itariri, "se até Deus quando esteve no I Rodrigues que outro índio "se achava na Glória, cantando pela sua arte, e
mundo, e que não era pecador, teve de morrer antes de ir para o Céu,
quanto mais nós pecadores". 109
I dizia muitas cousas que lá vira de nossa fé". 113
Entre os Tupinambá do Maranhão, o capuchinho Claude d'Abeville
disse ter encontrado um índio acometido por uma grande diarréia que
5. Trânsito com o sobrenatural "por muitas noites pareceu lhe ver o Céu aberto, e os Caraíbas, Padres ou
Profetas (assim chamam eles os Religiosos) lá entrando, e um voz dizer-
lhe: - Se queres salvar-te, é necessário que te laves com a água com que
Os jesuítas procuraram reorganizar o mundo dos mortos, enqua-
fôste aspergido" .114 No século XVIII,entretanto, a tolerância dos missio-
drando-os na topografia tripartida em céu, inferno e purgatório. Esta com-
nários em relação às visões e aos sonhos dos índios desapareceu comple-
partimentalização cristã dos mortos só foi assimilada pela mentalidade
tamente, tendo sido colocados sob suspeita de manifestações heréticas.
indígena muito lentamente e depois de um sofrido processo de destríba-
Na carta do padre Antonio Blasquez, de 23 de setembro de 1561, o
lização, quando a existência dos índios deixou de ser tribal e coletiva.
diálogo entre um padre e um índio moribundo referia-se ao céu, como
Até meados do século XVII,a catequese seguiu o modelo binário
um lugar exclusivo dos cristãos, e ao batismo, como a única via possível
de além, que, segundo Michel Vovelle,vigorou na Europa até a virada do
de alcançá-Io.
século XIII, tendo dominado a escatologia medieval. Santo Agostinho
afigurou-se como um dos maiores defensores da bipartição do mundo
Disse o índio: - Baptísa-me que conheço que não tenho
dos mortos: "Que não haja mais engano, existem apenas dois lugares", de durar muito.
afirmou ele."? Padre: - Para que te tenho de baptisar?
Índio enfermo: - Para ir para o céu.

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Padre: - Como? Não poderás ir para o céu se não Iôres mais freqüentes. "O Céu, na verdade, por sua própria beatitude, escapa à
batisado. experiência humana. Não podemos descrevê-Io nem sequer imaginá-Io,
Índio enfermo: - Para lá não vão sinão os que forem
sem dímínuí-Io", comentou Décio de Almeida Prado.!"
christãos. ll5
A imagem do paraíso é, como disse Michel Vovelle, evanescente, 119
O modelo bipartido do mundo dos mortos também foi adotado na enquanto a do inferno é mais passível de ser visualizada com nitidez, por
conversão dos povos indígena em outros países da América. Na Nicarágua, significar a potencialização dos sofrimentos humanos. Padre Leonardo Nu-
as respostas de um índio a um interrogatório conduzido pelo frei Francis- nes escreveu, em 1551, que os índios têm "grandíssimo desejo de conhecer
co Bobadilha, em 1538, sugerem uma padronização simplificada do além a Deus e de saber o que hão de fazer para se salvar, porque temem muito a
morte e o dia do Juízo e o Inferno, de que têm já alguma notícia" .120
cristão (céu-inferno).
O mundo das trevas era objeto de meditação dos jesuítas junta-
mente com os temas dos anjos rebelados e de Adão e Eva, exemplos de
Pergunta: - És cristão?
Resposta: - Sim, sou cristão. desobediência a Deus. Pautando-se nas descrições feitas por Ignácio de
Pergunta: - É bom ser cristão? Loyola, Roberto Gambini comentou que os jesuítas deveriam "ouvir os
Resposta: - Creio que sim. gritos dos condenados, respirar o fedor do enxofre, do porão úmido de
Pergunta: - Por que crês? um navio e de coisas podres, experimentar coisas amargas com lágrimas,
Resposta: - Porque os cristãos disseram-me que o cris- tristeza e vermes que corroem a consciência, e tocar o fogo que consome
tão quando morre, vai ao Paraíso, e quem não é, vai as almas". 121
para o Inferno com o dernônío.!"
Ora, foi justamente nesse cenário infernal que se descortinaram os
surtos epidêmicos de varíola, de acordo com a descrição citada do padre
Observa-se, portanto, que a fórmula céu-inferno foi rapidamente Anchieta: os gritos dos enfermos, as carnes em decomposição exalando a
digerida pelos índios. Houve, porém, alguns índios que preferiram a dis- "podridão da matéria", moscas e vermes circundando e devorando os
tância dos cristãos no post mortem. O cacique Hatuey, por exemplo, ao corpos debilitados. Por esse viés, os índios, de fato, vivenciaram o inferno.
se defrontar em Cuba com o padre que acompanhava Diogo Velázquez, Na verdade, o cristianismo recomendava aos mortais que aceitassem bem
recusou o batismo e, conforme o documento de Las Casas, "tomou a os sofrimentos terrenos, já que eram transitórios, com o intuito de não
perguntar se os cristãos iam para o céu; o padre disse que sim, que iam os sofrerem eternamente. "Fere-vos com enfermidade e doença para que es-
que eram bons: concluiu dizendo que não queria ir para lá, pois eles para capeis daquela doença incurável do inferno [... ], onde não há mezinha
lá iam e estavam. Isto aconteceu ao mesmo tempo em que o queriam nem remédio", aconselhava Anchíeta.!" No decorrer do século XVI, as
queimar, e assim puseram imediatamente fogo à lenha e o queimaram" .117 doenças purgavam os pecados, assumindo o papel poste-riormente atri-
A recusa do mundo cristão era punida com a morte na terra e a condena- buído ao purgatório.
ção da alma às chamas do inferno. Os autos que eram encenados nos aldeamentos tupis, de autoria
No entanto, à medida que avançava o processo de catequização na do padre José de Anchieta, também apresentavam a divisão binária do
América portuguesa e aflorava a resistência indígena, o céu cristão toma- mundo sobrenatural. No palco travavam-se verdadeiras lutas entre o bem
va-se cada vez mais inacessível aos índios adultos e as notícias do inferno, e o mal, os defensores de Deus e os seguidores do diabo, cujo desfecho

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dava vitória aos aliados da invencível Igreja católica. A mensagem reli- cometera em vida, visando encontrar uma brecha para condená-Ia ao fogo
giosa que subjazia às representações consistia em condenar ao fogo do eterno. A alma recorreu então à confissão, capaz de perdoar todos os
inferno as almas indígenas que persistissem nos "velhos maus hábitos". pecados, mas os diabos apontaram para os pecados que não haviam pas-
Segundo Décio de Almeida Prado, o teatro, no século XVI,era instrumento sado no crivo da confissão. À beira da condenação, o anjo da guarda
da catequese, cuja função era "sujeitar a alma indígena [... ] , intimidando- apareceu para salvar a alma, argumentando que ela não escondeu as suas
a com as chamas do Inferno, pretendendo dobrá-Ia pelo terror". 123 ações, apenas as esqueceu, e a libertou-a para a glória de Deus; os diabos
Escrita em Iupi, a peça Na aldeia de Guaraparim, representada voltaram então às chamas do inferno. O auto finaliza com um apelo feito
entre os anos de 1589 e 1594, destinava-se exclusivamente ao público pelo anjo para que se extirpasse definitivamente o mal de Guaraparim,
indígena. Por meio dela pode-se entrever os mecanismos de intimidação isto é, que os indígenas abandonassem os seus costumes e abraçassem em
da cultura indígena. O auto punha em cena uma personagem original no definitivo a religião cristã:
teatro catequético, a alma, ao lado de um anjo e de quatro diabos de
nomes tupis, transfigurações dos índios hostis: Anhangaçu, Tatapitera- Evitai,
de hoje em diante, serdes maus,
Arongatu, Cauguaçu-Caumondá, Moroupiara-Mboiuçu-Anhangobi.
para extinguirdes vossos velhos hábitos
Assumindo feições humanas, os amigos e os inimigos da Igreja
- a bebida, o fétido adultério,
entravam em cena. "Ninguém, na verdade, sabia dizer onde terminava a mentiras e brigas,
terra e onde principiava o Céu ou o Inferno", comentou Décio de Almeida ferimentos mútuos, guerras.
Prado. 124 [ ... ]
Num conciliábulo, os diabos pretendiam atacar a aldeia de Guara- Vinde,
parim, no Espírito Santo, incitando os índios a voltarem a seus costumes para o lado de Deus, no céu.
Trazendo-o em vosso coração,
pecadores, de modo a "arrastá-Ios todos, depois de sua morte, a tomba-
ireis gozar
rem no meu fogo", conforme anunciou um dos diabos. O plano, contudo, junto dos que lhes são queridos,
foi interrompido quando viram erguer-se num vôo a alma de um índio, pousando-lhes aos pés.!"
recém-emigrada do corpo. Aalma de Pirataraca aparentava estar perdida:
Simulou-se, nessa peça, a vitória das forças cristãs sobre o mundo
"Onde será meu caminho? tribal. A individualização, necessária para a apreensão da concepção do
Jesus, talvez me tenha enganado purgatório, começou a ser valorizada nesse auto. A mensagem veiculada
Dirijo-me ao reino de Deus,
resumia-se na responsabilidade individual pelos atos que seriam submeti-
Para lá é que devo ir.
Não sei se será aqui". 125 dos a um julgamento, depois do qual a alma se destinaria ao inferno ou à
glória. A noção de pecado, ausente da religião tupí-guaraní, passava a ser
Pressentindo a presa fácil, os diabos assediaram-na e tentaram acoplada aos costumes indígenas.
persuadi-Ia do caminho que deveria seguir com o secreto intuito de cha- Como bem apontou Egon Schaden, os índios guaranis das redu-
muscá-Ia e de assá-Ia. Para tanto, desfiaram todos os pecados que a alma ções tinham muita dificuldade em apreender noções de moral, como

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pecado, culpa e castigo, pouco desenvolvidas na cultura índígena.:" Os cera da terra, dinheiro e outras coisas, no que eles são devotos e liberais" .132
autos de Anchieta eram, portanto, instrumentos eficazes para dar concre- Cabe lembrar que a criação de confrarias que cuidavam dos mortos foi
tude ao mundo sobrenatural nos moldes cristãos, ao mesmo tempo em posterior aos surtos epidêmicos que mataram milhares de índios.
que ridicularizavam e infernalizavam o universo indígena. "O que An- Contudo, essas medidas práticas adotadas em benefício das almas
chieta via era, de um lado, indígenas e colonos europeus, ou tentados do purgatório não garantiam que este houvesse sido incorporado à men-
pelo diabo ou seus representantes no Brasil; de outro, anjos, santos, Nossa talidade indígena e à prática da catequese. Na verdade, os padres não o
Senhora", detalhou Décio de Almeida Prado.!" consideravam como uma opção para o destino da alma do índio, como
O uso de alegorias com conteúdos doutrinários era bastante útil à vimos, e não há, em toda a correspondência jesuítica quinhentista, ne-
catequese. "A alegoria exerce um poder singular de persuasão, não raro nhum indício capaz de conduzir ao imaginário do purgatório. Nas rápidas
terrível pela simplicidade das suas imagens e pela uniformidade da leitura alusões a esse terceiro lugar que integra o além, não há qualquer referência
coletiva. Daí o seu uso como ferramenta de aculturação, daí a sua presença à topografia ou à intercessão dos vivos no destino dos mortos. Por ora, é
desde a primeira hora da nossa vida espiritual, plantada na Contra- Reforma preciso frisar que a concepção de purgatório estava praticamente ausente
que unia as pontas do último Medievo e do primeiro Barroco, analisou da Colônia no século XVI, enquanto o céu e o inferno faziam parte das
Alfredo Bosi." 129 preocupações cotidianas dos índios em contato com os brancos.
Quanto ao purgatório, embora tivesse sido inserido na cartografia Discussões em torno do mundo sobrenatural eram freqüentes no
do além da Igreja durante o século XVI,só tornou-se foco das preocupa- dia-a-dia dos habitantes, conforme se deduz dos depoimentos da Primeira
ções de índios e colonos a partir do século XVII. Desde a chegada dos Visitação do Santo Offício. Laura de Mello e Souza observou que "a religião,
jesuítas na América portuguesa, corriam notícias e práticas de orações e seus símbolos e dogmas ocupavam espaço considerável nas preocupações
procissões às almas do purgatório, na Bahia e em Ilhéus. cotidianas do homem colonial". 133
Desse modo, o além concretizava-se e assumia feições materiais na
[... ] Agora vivemos de maneira que temos disciplina às visão dos colonos. O mameluco Lazaro Aranha, por exemplo, disse que
sextas-feiras, e alguns nos ajudam a disciplinar: é por os "neste mundo avia huã couza immortal a qual era o carvão metido debaixo
que estão em peccado mortal e conversão deste Gentio,
da terra" .134
e por as almas do Purgatório, e o mesmo se diz pelas
ruas, com uma campainha, segundas e quartas-feiras,
Recorrente era o desejo de ser senhor do próprio destino após a
assim como nos Ilhéos", informou o padre Nóbrega.!" morte. Gaviam, homem velho que morava em Ilhéus, disse que "se elle
avia de esperar tanto à porta do paraízo quanto o padre Francisco Pires da
Em meados do século XVIforam criadas as primeiras confrarias para Companhia de Jesus estava no pulpeto a pregar antes não queria ir ao
cuidar dos enterros e dos sufrágios das almas. De acordo com Serafim Leite, paraízo" .135 Na porta da igreja de Nossa Senhora da Victória, onde espera-
as primeiras confrarias das almas formaram-se nas aldeias da Bahia, em va para entrar, o dito homem falou que "se tanto avia de esperar à porta
1573.131 Quirino Caxa acrescentou ainda que "uma confraria de defuntos" do Paraízo que antes queria ir ao inferno" .136 Antonio Serrão, morador da
tinha obrigação de enterrar os mortos e zelar pelo bem de suas almas. A cidade da Bahia, comentou com Margarida Pachequa que mesmo que "lho
confraria, esclareceu ele, "sustenta-se com esmolas que êles dão, com farinha, rogassem não iria ao paraíso". 137

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Outros ainda presumiam a integridade do corpo no post mortem, senão ao limbo e elle denunciante o reprehendeo e lhe
como foi o caso do mameluco Manoel Gonçalves, que falava que "ho deixas- declarou a verdade como morrendo os gentios hiam ao
inferno e que os pagãos que hiam ao limbo erão os meni-
sem fornicar bem nesta vida por que na outra bem fornicado havia de ser". 138
nos filhos de cristãos que morrião antes do baptísmo.v'
Mas, na mentalidade popular, o outro mundo estava sobretudo re-
pleto de dúvidas. João Soares Pereira duvidou da existência do Inferno.I"
Conversas acerca do purgatório revelavam que as informações que
Antonio Carvalho, ao comentar a morte de seu irmão, mostrou-se cético:
circulavam nessas terras a respeito do além eram, em parte, provenientes
"dizem que há outro mundo, não sei, não sei".140O depoente Luís Serrão
dos homens que chegavam do Velho Mundo, trazendo os ares da Reforma
escandalizou-se com o dito Francisco Ruiz, que afirmava não haver limbo
Protestante.!" Gonçalo Rebello foi denunciado por haver dito, 11 anos
para abrigar as almas das crianças sem batismo.
fazia, em Iamego, Portugal, que "não avia purgatório, mas somente quando
O nascimento do limbo, embora tenha um estatuto diferente, foi
as pessoas morriam dava Deos as almas as penas em huma parte ou na outra
contemporâneo ao nascimento do purgatório na Europa. Segundo Iacques
onde Deos queria e que não avia outro purgatório nenhumr.!" Antonio
te Goff, "refere-se aos casos dos seres humanos que não carregam nenhum
Vilhete, flamengo que viveu muitos anos em Portugal, cuja profissão na
pecado pessoal, somente o pecado original, enquanto o Inferno, o Purgatório
América era de encaixador de açúcar, foi denunciado várias vezes em Per-
e o Paraíso referem-se a três categorias de pecados pessoais entre os quais
nambuco por dizer com escárnio que "não avia purgatório separado porque
existe uma hierarquia de responsabilidade e de destino". 141
ho purgatório era ao pee de hum paao, ou do engenho, ou de hum cami-
EmA divina comédia, obra que fixou as imagens do além, o limbo
nho".146 Somando-se ao rol dos estrangeiros, Domingos Ferreira, natural
era o primeiro dos círculos do inferno, onde se encontravam as almas das
do arcebispado de Braga, em Portugal, confessou em Pernambuco ter afir-
crianças mortas sem batismo e as grandes figuras do paganismo, inclusive o
mado, por ignorância, que "quem não pagava cá nesta vida seus pecados
poeta Virgílio. Essas almas não estavam sujeitas às penas materiais, mas
que morrendo confessado e comungado não os pagava na outra, nem por
sofriam espiritualmente. O "Canto IV do inferno" descreve o estado das
isso ia ao purgatório". 147
almas que não foram conduzidas ao batismo:
Simão Pires, natural da terra e tendo estudado alguns anos no co-
Ali, como era logo de notar légio da Companhia de Jesus, disse:
ouviam-se suspiros, não lamentos,
apenas, na aura eterna a perpassar; [... ] algumas vezes, em algumas partes, perante algumas
e provinham dos males incruentos pessoas, não se lembrava quais, que ele duvidava pode-
de que sofria aquela turba imensa, rem se absolver e salvar as pessoas cristãs, nem irem à
crianças, mulheres e varões, aos centos.'? glória as almas do purgatório com bulas dos papas, nem
com contas bentas que dizem ter indulgências concedi-
O destino dos índios depois da morte também era motivo de polê- das pelos papas, e que isto mesmo poder assim ser du-
mica nas conversas cotidianas da Colônia. Falou Amador Gonçalves que, vidava ele mesmo consigo e ele mesmo per si lhe pare-
cia que as ditas bulas e contas bentas concedidas pelos
papas não podiam ter virtude para as almas.!"
[... ] estes gentios deste Brasil sendo gentios não ruam ao
inferno por que erão pagãos, e que os pagãos não hiam

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Do ponto de vista da própria Igreja, o purgatório implicava noções geral antes de meados do século XVII (é raramente encontrado nos testa-
complexas. A aprovação de um catecismo pelos prelados do III Concílio mentos parisienses antes de 1640)".152
Provincial de Lima, em 3 de agosto de 1583, revelou que o purgatório Se criava uma comunidade cristã dos mortos, o purgatório exigia,
fazia parte dos ensinamentos daqueles que são capazes e dos que fre- paradoxalmente, a individualização dos vivos. Sua existência remetia "à idéia
qüentam a escola. Em forma de diálogo, o catecismo instruía sobre os de responsabilidade individual, de livre arbítrio do homem, culpável por
mistérios da religião cristã, conforme a capacidade de compreensão dos natureza, em razão do pecado original, mas julgado conforme os pecados
índios. Vale citar o trecho do catecismo que orientava a ajudar os defuntos: cometidos sob sua responsabilidade" .153 O purgatório, comentou Gurevic,
era o lugar do arrependimento e da purificação dos pecados. 154
P: Por que rogamos pelos defuntos? Sob o prisma cristão, os vivos poderiam atenuar as penas sofridas
R: Porque há o purgatório na outra vida, onde padecem pelas almas do purgatório por meio dos sufrágios: rezas, missas e esmo-
os que saíram desta vida na graça de Deus, mas ainda las. Segundo Iacques Le Goff, a duração das penas dependiam então dos
levaram pecados de que se purgar e por isso a santa
méritos pessoais do defunto adquiridos durante sua vida e dos sufrágios
Igreja fazmemória pelos fiéis defuntos, e é obra de grande
mérito e misericórdia rogar a Deus e fazer o bem por eles da Igreja suscitados pelos parentes e amigos do defunto. 155 Tal sistema,
para que sejam perdoados e levados para a glória. 149 portanto, estabelecia um trânsito intenso entre o mundo dos vivos e o
mundo dos mortos.
Oficializado pelo Segundo Concílio de Lyon, em 1274, esse lugar No século XVII,os jesuítas difundiam nas reduções guaranis o mode-
intermediário entre o céu e o inferno, a morte e a ressurreição, reforçava o lo tripartido do além: céu, inferno e purgatório. Segundo o jesuíta Ruiz
vínculo entre os vivos e os mortos, já que os primeiros podiam intervir no de Montoya, esse modelo era anunciado pelos mortos, que assumiam um
destino dos últimos, abreviando suas penas. "Os mortos só existem para e papel ativo na conversão dos povos indígenas.
pelos vivos. Inocente III disse: os vivos se ocupam dos mortos, porque são O padre Martim Vitacum - que morrera acamado e triste, por-
eles mesmos futuros mortos. E na sociedade cristã, sobretudo na Idade que desejava morrer "hecho en pedazos por lesu Christo" - mostrou-se
Média, o futuro não tem somente um sentido cronológico, ele tem primeiro uma noite a um religioso, em meio a "una grande clarídad", dizendo-lhe:
e sobretudo um sentido escatológico", escreveu jacques Le Goff.150 "Desta glória gozan los que trabajan por Dios" .156
Na Europa, o sistema binário foi sendo substituído pelo sistema ter- Relatos de mortos que ressuscitaram e visitaram o outro mundo
nário por meio de uma categoria intermediária, na virada do século XII. são recorrentes na obra de Montoya. Na redução de Loreto, um índio que
Analisa Le Goff: "O Purgatório é um lugar duplamente intermediário: lá nós havia sido sepultado ressuscitou com o rosto "muy agradable y alegre" e
não estamos nem tão felizes como no Paraíso nem tão infelizes quanto no contou que sua alma havia se deparado com um demônio que pretendia
Inferno e ele durará apenas até o Julgamento Final. É suficiente para torná- levá-Ia. Nesse instante, dois anjos apareceram, são Miguel e são Pedro, e
10 verdadeiramente intermediário situá-lo entre o Paraíso e o Inferno" .151 afugentaram o demônio. A alma, em companhia desses seres celestiais,
No entanto, a imagem do purgatório popularizou-se e difundiu-se passaram por uns "ameníssímos campos llegaron a vistas de una muy gran
somente no século XVII.Depois de uma minuciosa análise dos testamentos, ciudad cercada, de Ia qual salía muy gran c1aridad, y resplendor".'? São
Philippe Aríês notou que o purgatório "quase não aparece no consenso Pedro lhe explicou que era a cidade de Deus. O morto anunciou a todos que

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deveria ser novamente enterrado três dias depois da aparição e que sua escapar para breves aparições aos vivos cujo zelo em lhes socorrer será
missão era avisar aos índios que seguissem os ensinamentos cristãos. insuficiente" .161
Ruiz de Montoya relata também o caso de Isabel, índia falecida na Um padre da redução de Loreto viu em sonho uma alma atormen-
missão Loreto, que voltou à vida para narrar a sua viagem ao além. Disse tada entrar na Igreja, ajoelhar-se, demonstrando arrependimento e dor, e,
que foi levada ao Inferno, onde viu fogo horrendo e nele conseguiu perceber em seguida, sair pela porta fechada. Quando o missionário despertou
alguns conhecidos que padeciam de muitos tormentos. Em seguida, foi pela manhã, viu a alma cercada de gente, confirmando a sua aparição
conduzida ao céu, "donde via nuestra Madre, tan hermosa, tan resplande- noturna. Em outra ocasião, os missionários vislumbraram uma figura "a
cente, y linda, tan adorada, y servida de todos los bien aventurados, y en modo de nube blanca" que era transparente ao passar pela luz de uma
su compafíia innumerables Santos hermosíssimos, y resplandecientes" e vela e, testemunha Ruiz de Montoya, "caminando el modo de nube (era
todos lhes deram os parabéns por fazer parte desta comunidade. Voltava à de estatura humana, sin distincion de partes) se fue para el Padre, y le
terra para dizer aos que aqui viviam que "seais verdadeiros Christianos". penetró, passando por su cuerpo, sintió un contacto, al modo de un cris-
Voltou a morrer e, depois de oito ou nove meses, desenterraram-na com tal sintiera" .162 O missionário não duvidou de que se tratasse de uma
"Ias carnes enteras, flegíbles, y sin ningun mal olor". 158 alma do purgatório. À meia-noite, apareceu-lhe um amigo que já havia
Outra mulher ressuscitada, contou o padre Ruiz de Montoya, foi morrido, com rosto de defunto, muito triste, pedindo-lhe que socorresse
salva de uma tropa de demônios com garfos pelo anjo da guarda que suas penas. 163
empunhava uma espada. O anjo a conduziu ao inferno, onde os condenados Na província de Tayaoba, os jesuítas ouviram "un ay dolorido e
padeciam no fogo. Testemunhou a alma: "oí alli grandes aullidos de peros, repetido", que vinha das montanhas, cortando a noite. Semelhante a um
bramidos de toros, silvos de serpientes q. davan los demonios; alli vi raio em forma de vulto, entrou na Igreja e, a poucos passos da entrada,
como aporreavãn, y atormentavan Ias animas q alli estavãn''.'? Depois desapareceu. Montoya logo desconfiou de uma alma atormentada do pur-
disso, o anjo a levou para o céu, onde viu Deus "en assiento y trono hermo- gatório. As almas, esclareceu [acques Le Goff, foram dotadas de "uma
síssimo, rodeado de infinitos bien aventurados". Disse ela: "Era un resplan- materialidade sui generis e as penas do Purgatório também podem ator-
deciente ser infinitamente mas q el fuego, no quema, alegra, y regozija el mentá-Ias corporalmente" .164
alma su vista [...] Solo los Angeles q vi son mas q Ias arenas, y mas que Ias Um jovem índio, cheio de dúvidas em relação às penas do purgató-
hojas de Ias arboles destos montes", descreveu a viajante do mundo dos rio, entreviu, quando estava para adormecer, pessoas vestidas de branco
mortos. 160 que lhe disseram:
Embora padronizados, esses relatos refletiam a incorporação do além
cristão por parte dos índios. Os índios procuravam identificar na viagem ao Venimoste a ensenar 10 que son Ias penas del Purgatório,
mundo dos mortos, seja no céu, no inferno ou no purgatório, pessoas co- y le metieron en un fuego terrible, y le dixeron: Aqui has
nhecidas ou do círculo afetivo. Uma vez mais, manifestava-se o desejo de de estar solos cinco dias, despues de los quales te sacare-
mos, sintió crueJissimos tormentos, tales que jusgava avia
reencontrar os antepassados, traço marcante da cultura tupi-guarani.
estado alli muchos anos, y quexandose les dixo: lComo
O purgatório legitimou uma nova aparição dos mortos na terra. me aveís enganado, pues há muchos anos que me teneis
Segundo Jacques Le Goff, "este será a sua prisão, mas lhes será permitido aqui? Enganaste (le dixeron) porque aún no há passado

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Ia mitad de medio quarto de hora, en 10 qual echarás de acumulado de todos os bens, sem receio de jamais per-
ver que tales son Ias penas de purgatorio, com que quedó dê-lo; não há lá noite, nem calor, nem frio, nem mudan-
bien ensefíado de su duda.l" ças de ar senão um perfeito dia, alegre, claro, sereno,
, 169
cheio de toda a seguridade para sempre.
No século XVIII, concepções indígenas conviviam com as cristãs. O
mameluco de nome Pedro Rodrigues, reputado "feiticeiro, adivinhador e Já o inferno era representado como uma "fuma horrenda", em que
oráculo entre os índios", foi denunciado por tentar persuadir as índias a almas dos condenados eram lançadas à força no centro da terra, onde
as " a
"matar dentro do ventre as crianças que tem concebido", assegurando-Ihes as "feras infemaes" as despedaçavam a cada instante, I7~emnunca:~ -
de que não era "pecado", porque "as almas das mesmas crianças assim barem de padecer, e para sempre [...] atormentados". O purgatono,
mortas nos ventres matemos lhe vem depois falar do outro mundo a ele por sua vez, traduzia-se numa alma agonizan~o em ardentes chamas, lem-
Pedro Rodrigues".166 Receber mensagens do mundo dos mortos e praticar brando aos vivos de que precisava ser socornda:
infanticídio,167 práticas eminentemente Indígenas, coexistiam com a noção
de pecado exclusivamente cristã. O capitão Marçal Agostinho, índio denun- Estou no Purgatório padecendo
ciado pelos mesmos motivos, para melhor persuadir os seus seguidores Castigo dos peccados cometidos,
E por isso estou sempre gemen d o. 171
"forma vozes mudadas, e desconhecidas para que os miseráveis entendam
que são pronunciadas por almas do Outro Mundo" .168
Para que os cristãos tivessem as penas abreviadas no post mortem,
Assim, muito embora as concepções indígenas do outro mundo o peregrino recomendou:
ainda vigorassem em muitas regiões da América portuguesa, a visão tri-
partida sobrepôs-se, dominando o imaginário dos colonos no século XVIII. [... [ buscar um lugar perto de alguma igreja, aonde possais
A preocupação com a salvação da alma tomara-se moeda corrente nesse todos os dias ir ouvir Missa, e nas festas confessar-vos,
período. Imagens de céu, inferno e purgatório ganharam contornos mais fazendo aquella penitência, que vos der vosso Confe~sor
nítidos e mais específicos na vida colonial. e vossas forças vos ajudarem. E no mais tempo tr~tare~de
ouvir os Sermões e principalmente os de doutnna: lede
A obra de Nuno Marques Pereira, o Compêndio narrativo dope-
também livros espirituais e vidas de Santos: conversa com
regrino daAmérica, de grande circulação na Colônia, fixou o imaginário homens virtuosos, que tudo são meios por onde melhor
do além. Seu tema central era a salvação da alma dos homens. Encamando se vem ao conhecimento da suma verdade. E vendo Deus
a moral jesuítica, o autor relatou uma viagem imaginária da Bahía para que vós fazeis de vossa parte por alcançar a sua graça,
São Paulo realizada por um peregrino que se empenhou em fazer discursos não vos há de faltar com os seus divinos auxílios.!"
espirituais e morais para vários estratos da sociedade colonial, fazendo
constantes alusões à topografia do outro mundo. Verifica-se, portanto, que no século XVIII as relações dos vivos co~ os
O céu revestia-se de riqueza, segurança e estabilidade: mortos na sociedade colonial convergiram para um complexo sistema vmcu-
lado ao socorro das almas do purgatório que legava aos vivos num~ro~as
Porque tudo é glória e riquezas em casa de Deus, sem que obrigações - sofisticados funerais, auxílios espirituais, fomen~odas me~açoes
alli se padeça de necessidade alguma: tudo é um bem celestes e doações de bens materiais -, em troca da conquista do ceu.

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11 "Cópia de uma do padre Antonio Blasquez que escreveu da Bahia do Salvador a 10 de


setembro de 1559 para o padre geral", in Azpicuelta Navarro, Cartas avulsas: 1560-
1568, Belo Horizonte-São Paulo, Itatiaia-EDUSP, 1988, pp. 254-5.
12 Luís Felipe Baêta Neves, O combate dos soldados, op. cit., p. 117.
13 Segundo Luiz Koshiba, os jesuítas introduziram "uma disciplina de horário na vida
indígena", idem, A honra e a cobiça, voI. 1, tese de doutoramento Departamento
de História da FFLClI-USP, São Paulo, 1988, p. 191. Quanto aos ensinamentos,
escreve Ronald Raminelli, "o gentio recebia noções básicas de tradição católica,
conheciam passagens bíblicas, os significados da virgindade de Maria, da paixão e
ressurreição de Cristo, da Trindade, o simbolismo da hóstia e da missa". Ron~ld
Raminelli, Tempo de visitações: cultura e sociedade em Pernambuco e Bahia:
1591-1620. Dissertação de mestrado, Departamento de História da FFLClI-USP,
1990, p. 207.
14 Luís Felipe Baêta Neves, O combate dos soldados, op. cit., p. 117.
NOTAS 15 Serafim Leite, História da Companhia de jesus, tomo II, op. cit., pp. 497-498.
16 Sérgio Buarque de Holanda, Raízes do Brasil, 17ª ed., Rio de Janeiro, José Olympio,
984, p. 25.
I Os irmãos Matheus Nogueira e Gonçalo Alves, além de interlocutores do "Diálogo", 17 Serafim Leite, História da Companhia de jesus, op. cit., p. 34.
contribuíram de fato na conversão dos Índios no Brasil de 1549 a 1568. IH Thales de Azevedo, "Catequese e aculturação", in Egon Sachaden, Leituras de
2 Manoel da Nóbrega, "Diálogo do padre Nóbrega sobre a conversão do gentio", in etnologia brasileira, Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1976, pp. 381-2.
Cartas do Brasil, Belo Horizonte-São Paulo, Itatiaia-Ejnjsr, 1988, p. 229. 19 "Carta que o irmão Antonio Blasquez escreveu da Bahia do Salvador, das partes do
3 Manoel da Nóbrega, Cartas do Brasil, op. cit., p. 320. Brasil, o anno de 1558, a nosso padre geral", in Azpicuelta Navarro, Cartas avulsas,
4 Idem, p. 238. op. cit., pp. 214-5.
20 José de Anchieta, "Ao geral Diogo Lainez, de São Vicente, a 16 de abril de :563" in
5 Luís Felípe Baêta Neves, O combate dos soldados de Cristo na terra dospapagaios,
Cartas, informações,fragmentos históricos e sermões, Belo Horizonte-São Paulo,
Rio de Janeiro, Forense, 1978, pp. 113-4.
Itatiaia-EDusP, 1988, p. 196.
6 Eduardo Hoornaert, A Igreja no Brasil-Colônia (1550-1800), São Paulo, BrasiUense,
1982, p. 17. 21 "Carta do padre Ruy Pereira aos padres e irmãos da Companhia da província de
Portugal, da Bahia a 15 de setembro de 1560", in Azpicuelta Navarro, Cartas avulsas,
7 Serafim Leite, História da Companhia deJesus no Brasil, tomo 11, Lisboa-Rio de op. cit., p. 286.
Janeiro, Livraria Portugália-Civilização Brasileira, 1938, p. 141.
22 Luiz Koshiba,A honra e a cobiça, op. cit., p. 189.
8 Eduardo Hoornaert (org.), História da Igreja no Brasil: ensaio de interpretação a 23 Luís Felipe Baêta Neves, O combate dos soldados op. cit., p. 122.
partir do povo: Primeira Época, 2ª ed., Petrópolis, Vozes, 1979, p. 131.
24 "Carta que escreveu o padre Antonio Pires do Brasil, para os padres e irmãos da
9 "Do padre Manoel da Nóbrega ao padre Miguel de Torres, Lisboa, Baía (Rio Vermelho), Companhia de Jesus em o mez de outubro de 1560", in Azpicuelta Navarro, Cartas
agosto de 1557", in Serafim Leite, Cartas dos primeiros jesuítas do Brasil, voI. Il, avulsas, op. cit., p. 304.
São Paulo, Comissão do IV Centenário da Cidade de São Paulo, 1954, p. 401.
25 Manoel da Nóbrega, "A Thomé de Sousa" (1559), in Azpicuelta Navarro, Cartas do
10 Ver a análise de Roberto Gambini, O espelho índio: os jesuítas e a destruição da Brasil, op. cit., p. 193.
alma indígena, Rio de Janeiro, Espaço e Tempo, 1988, p. 192. 26 Robert Ricard, La conquista espiritual de México, México, Fondo de Cultura
Económica, 1986, pp. 392-3.

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Glória Kok OS VIVOS E os MORTOS NA AMÉRICA PORTUGUESA: DA ANTROPOFAGIA À ÁGUA DO BATISMO

27 Primeira Visitação do Santo Offício às partes do Brasil pelo licenciado Heitor 44 Eulália Maria Lahmeyer Lobo, op. cít., p. 112.
Furtado de Mendonça-Denunciações de Pernambuco: 1593-1595, São Paulo, 45 Ronaldo Vainfas, "Milenarismo"; op. cit., p. 16.
Editor Paulo Prado, 1922, p. 415.
46 José de Anchieta, "Ao geral Diogo Lainez, de São Vicente, janeiro de 1565", injosé de
28 Idem, p. 416.
Anchieta, Cartas..., op. cít., p. 248.
29 Primeira oisitação do Santo Offício às partes do Brasil pelo licenciado Heitor 47 Dante Alighieri, A divina comédia, vol, 1, tradução de Cristiano Martins, Belo Hori-
Furtado de Mendonça - da Bahia: 1591-1593, São Paulo, Editor Paulo Prado, zonte, Itatiaia, 1989, p. 354.
1925, p. 55.
48 Philippe Ariés, O homem diante da morte, 2~ ed., tradução de Priscila Vianna de
30 Heloísa Liberalli Belotto, "Política indigenista no Brasil colonial (1570-1575)", in Siqueira, vol. 1, Rio de Janeiro, Ed. Francisco Alves, 1977, p. 120.
Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, São Paulo, nº 29, 1988, p. 51.
49 Michel Vovelle, La mort e l'Occident de 1300 à nosjours, Paris, Editions Gallimard,
31 "Carta do padre Nóbrega ao padre mestre Simão, Bahía, 9 de agosto de 1549", in 1983, p. 246.
Azpicuelta Navarro, Cartas do Brasil, op. cit., p. 82.
50 José de Anchieta, "Ao geral Diogo Lainez, de São Vicente, janeiro de 1565", injosé de
32 "Carta do padre Nóbrega ao padre mestre Simão Rodrigues, Porto Seguro, 6 de
Anchieta, Cartas..., op. cit., p. 249.
janeiro de 1550, in Azpicuelta Navarro, Cartas do Brasil, op. cit., p. 110.
51 Ibidem.
33 Manoel da Nóbrega, "Para os irmãos do Col1egio de Jesus de Coimbra'', C 15 51), in
Azpicuelta Navarro, Cartas do Brasil, op. cit., p. 120. 52 Gilberto Freire, Casagrande e senzala, vol. 1, Rio de Janeiro, São Paulo, Livrariajosé
Olympio, 1946, pp. 269-70.
34 "Carta que escreveu o padre Ruy Pereira do Brasil para os padres e irmãos da Compa-
53 José de Anchieta, "Ao geral Diogo Lainez, de São Vicente, janeiro de 1565", injosé de
nhia em Portugal no anno de 1561, a 6 de abril, que foi dia da Paschoa", in Azpicuelta
Navarro, Cartas avulsas, op. cit., pp. 313-4. Anchieta, Cartas..., op. cit., p. 249.
54 Philippe Aríes, L'enfant et Ia viefamiliale sous l'Ancien Régime, Paris, Éditions du
35 Manoel da Nóbrega, "Quadrimestre de janeiro até abril de 1557, ao padre Ignácio",
in Manoel da Nóbrega, Cartas do Brasil, op. cít., pp. 160-1. Seuil, 1980, p. 313.

36 "Carta do padre Nóbrega para o provincial de Portugal, Bahía, 1557", in Manoel da 55 Mary dei Priore, "O papel branco, a infância e os jesuítas na Colônia" in Mary dei
Nóbrega, Cartas do Brasil, op. cit., p. 174. Priore (org.), História da criança no Brasil, São Paulo, Contexto, 1991, p. 12.
56 Michel Vovelle, La mort ..., op. cít., p. 68.
37 "Carta do padre Nóbrega ao padre Simão Rodrigues, Porto Seguro, 6 de janeiro de
1550", in Manoel da Nóbrega, Cartas do Brasil, op. cit., p. 104. 57 "Carta que escreveu o padre Pedro Costa do Espírito Santo aos padres e irmãos da casa
38 "Carta que o irmão Antonio Blasquez escreveu da Bahia do Salvador, das partes do de S. Roque, de Lisboa, anno de 1565", in Azpicuelta Navarro, Cartas avulsas,
op. cit., p. 488.
Brasil, o anno de 1558, a nosso padre geral", in Azpicuelta Navarro, CartasAvulsas,
op. cít., p. 210. 58 Mary dei Priore, "O papel do branco", op. cit., p. 21.
39 Serafim Leite, História da Companhia de jesus, op. cit., p. 59. 59 "Carta de Antonio Blasquez para o padre provincial de Portugal da Bahía de 30 de
40 Manuela Carneiro da Cunha, "Introdução a uma história indígena", in Manuela maio de 1564" in Azpicuelta Navarro, Cartas avulsas, op. cit., p. 437.
Carneiro da Cunha (org.), História dos índios no Brasil, São Paulo, Companhia das 60 "Carta trimensal de maio a agosto de 1556 pelo irmão José de Anchieta, São Paulo de
Letras, 1992, p. 12. Piratininga, agosto de 1556", in Serafim Leite, Cartas dosprimeiros jesuítas, vol, lI,
41 "Carta escripta do Espírito Santo sem nome de autor nem data", in Azpicuelta Navarro, op. cit., p. 314.
Cartas avulsas, op. cit., p. 234. 6I José de Anchieta, "Informação dos primeiros aldeamentos da Baía", in José de Anchieta,
42 Eulália Maria Lahmeyer Lobo, "Bartolomé de Ias Casas e a lenda negra", in Ronaldo Cartas..., op. cit., p. 364.
Vainfas (org.), América em tempo de conquista, Rio de Janeiro, Editora Jorge 62 José de Anchieta, "Ao geral Diogo Laines, de São Vicente, janeiro de 1565", injosé de
Zahar, 1992, p. 112. Anchieta, Cartas, op. cit., pp. 249-50.
43 Ronaldo Vainfas, "Milenarismo indígena e idolatria no Brasil colonial: as santidades", 63 "Carta escripta do Espírito Santo sem nome de autor nem data", in Azpicuelta Navarro,
artigo apresentado no XVI Simpósio Nacional da ANPUH, p. 2. Cartas avulsas, p. 234.

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DOBATISMO

64 Idem, p. 233.
83 Manoel da Nóbrega, "Aos padres e irmãos de Portugal (1559)", in Manoel da Nóbrega,
65 Héctor H. Bruit, "O visível e o invisível na conquista hispânica da América", in Ronaldo Cartas do Brasil, op. cit., p. 180.
Vainfas (org.),América em tempo de conquista, op. cit., p. 90.
84 Thales de Azevedo, "Catequese e aculturação", op. cit., p. 382.
66 "Carta do padre Ruy Pereira aos padres e irmãos da Companhia da Província de
85 Alfred Métraux, A religião dos Tupinamhas e suas relações com a das demais
Portugal, da Bahiaa 15 de setembro de 1560", inAzpicuelta Navarro, Cartas avulsas,
op. cit., p. 291. tribos tupis-guaranis, São Paulo, Ed. Nacional, EDUSP,1979, p. 68.
86 Carlo Ginzburg considera que o vôo mágico, difundido na cultura folclórica euro-
67 José de Alcântara Machado, Vida e morte do bandeirante, Belo Horizonte-São
Paulo, Itatiaia-EDusp, 1980, p. 115. péia, também tem suas raízes entre os caçadores da Sibéria. Carlo Ginzbu~g, Histó-
ria noturna: decifrando o sabá, tradução de Nilson Moulin Louzada, Sao Paulo,
68 José de Alcântara Machado, Vida e morte do bandeirante, op. cit., p. 231.
Companhia das Letras, 1991, p. 191. Pode-se acrescentar a esse núcleo de crenças
69 Jacques Le Goff, O maravilhoso e o quotidiano no Ocidente medieval, tradução de xamânicas a micolatria, que teve origem nessa mesma região e ingressou na América
José Antonio Pinto Ribeiro, Lisboa, Edições 70, 1983, p. 51. Central. Ver Gordon Wasson, The wondrous mushroom: mycolatry in mesoame-
70 Manoel da Nóbrega, "A el-rei (D.]oão III) (1551) ", in Manoel da Nóbrega, Cartas rica, Nova York, SI. Louis, San Francisco, McGraw-Hill Book Company, 1980.
do Brasil, op. cit., p. 124. 87 Ruiz de Montoya, Conquista espiritual hechapor los religiosos de Ia Compaiíia de
71 Primeira Yisitação do Santo Ofício - Confissões da Bahia: 1591-92, com prefá- Jesus en Iasprovincias deI Paraguay,Paraná, Uruguayy Tape, Madri, 1639, p. 72.
cio de J. Capistrano de Abreu, São Paulo, Editor de Paulo Prado, 1922, pp. 220-1. 88 Primeira Visitação do Santo OjJício às partes do Brasil pelo licenciado Heitor
72 Ronald Raminelli, Tempo de visitação - Cultura e sociedade em Pernambuco e Furtado de Mendonça - Denundações da Bahia, 1591-1593, São Paulo, Ed.
Bahia: 1591-1620. Dissertação de mestrado, Departamento de História, daFFLcH- Paulo Prado, 1925, p. 474.
USp, São Paulo, 1990, pp. 218-9.
89 Primeira Visitação do Santo OjJício - Denunciaçôes da Bahia, op. cit., p. 277.
73 Ronaldo Vainfas, "Idolatrias luso-brasileiras: santidades e milenarismos indígenas",
90 Ronaldo Vainfas, "Milenarismo indígena e idolatria no Brasil colonial: as santida-
in Ronaldo Vainfas (org.),América em tempo de conquista, op. cit., p. 177.
des", op. cit., 1991, p. 18.
74 Egon Schaden, A mitologia heróica de tribos indígenas do Brasil: ensaio etno-
91 Primeira visitação do Santo OjJício às partes do Brasil pelo licenciado Heitor
sociológico, 3' ed., São Paulo, EDUSP,1988, p. 39.
Furtado de Mendonça - Confissões da Bahia, 1591-1592, op. cit., p. 233.
75 Maria Isaura Pereira de Queiroz, O messianismo no Brasil e no mundo, São Paulo,
92 Primeira visitação do Santo OjJício- Denunciações da Bahia, op. cit., pp. 473-4.
Dominus Ed. e EDUSP,1965, p. 193.
93 Primeira visitação do Santo Ofício - Confissões da Bahia, op. cit., p. 225.
76 Para um estudo aprofundado desse fenômeno chamado santidade, ver Ronaldo
Vainfas, A heresia dos índios. Catolicismo e rebeldia no Brasil colonial, São 94 Idem, p. 111.
Paulo, Companhia das Letras, 1995. 95 Idem, p. 84.
77 Eduardo Hoornaert (org.), História da 19rejano Brasil, op. cit., p. 399. 96 Idem, p. 111.
78 Mary dei Priore, "O papel branco", op. cito p. 20. 97 Ruiz de Montoya, Conquista espiritual, op. cit., p. 89.
79 "Carta dos Meninos órfãos, escrita pelo padre Francisco Pires ao padre Pero Doménech, 98 M. Haubert, A vida quotidiana no Paraguai no tempo dos jesuítas, Lisboa, Ed.
Lisboa, Bahia, 5 de Agosto de 1552", in Serafim Leite, Cartas dosprimeiros jesuítas, Livros do Brasil, s/d, p. 167.
op. cit., tomo I, p. 387.
99 Ruiz de Montoya, Conquista espiritual, op. cit., p. 89.
80 Ibidem.
100 Antonio Vieira, "Relação da missão da serra de Ibíapaba'', in Obras escolhidas,
81 Idem, pp. 386-7.
vol. XI, com prefácio e notas de Antonio Sérgio e Hernâni cidade, Lísboa, Livraria Sá
82 José de Anchieta, "Quadrimestre de setembro até o fim de dezembro de 1556, de da Costa, 1954, pp. 114-5.
Piratininga, abril de 1557", in josé de Anchieta, Cartas..., op. cit., pp. 108-9. 101 Idem, pp. 115-6.

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102 Stuart Clark, "Inversíon, misrule and the meaning of wítchcraft", ín Past present, 123 Décio de Almeida Prado, "O teatro como instrumento da catequese", op. cit., p. 88.
nº 87, maio 1980. Nesse artigo, o autor demonstra que a inversão é uma tendência 124 Idem, p. 78.
da mentalidade européia dos séculos XVI e XVII.
125 José de Anchieta, Poesias, Belo Horizonte, Itatiaia, 1989, p. 632.
103 Ruiz de Montoya, Conquista espiritual, op. cit., p. 89.
126 Idem, p. 647.
104 Primeira uisitaçdo do Santo Officio - Confissões da Babia, op. cit., p. 111.
127 Egon Schaden, "A religião guarani e o cristianismo", op. cit., p. 18.
105 Idem, p. 160.
128 Décio de Almeida Prado, "O teatro como instrumento da catequese", op. cit., p.87.
106 Ronaldo Vainfas, "Idolatrias e milenarismos", op. cit., p. 3l.
129 Alfredo Bosi, Dialética da colonização, São Paulo, Companhia das Letras, 1992, p. 81.
107 Robert Ricard, La conquista espiritual de México, op. cit., p. 399.
130 Manoel da Nóbrega, "Ao padre mestre Simão" (I 549), in Manoel da Nóbrega, Cartas
108 Egon Schaden, Aspectos fundamentais da cultura guarani, 3ª ed., São Paulo, EPU, do Brasil, op. cit., p. 87.
1974, p. 168.
131 Serafim Leite, História da Companhia de jesus, op. cit., tomo lI, p. 326.
109 Idem, p. 169.
132 "Carta de Caxa, 2 de dezembro de 1573", in Serafim Leite, História da Companhia
110 Michel Vovelle, La mort, op. cit., p. 58. de jesus, op. cit., p. 326.
111 "Carta do padre Antonio Blasquez do Brasil, da cidade do Salvador, Bahia de Todos os 133 Laura de Mello e Souza, O diabo e a Terra de Santa Cruz, São Paulo, Companhia das
Santos, para o mestre geral Diogo Laynez e aos mais padres e irmãos da Companhia, Letras, 1986, p. 130.
de 23 de setembro de 1561. Recebida em Lisboa a8 de março de 1562", inAzpicuelta 134 Primeira visitação do Santo Offício -Denunciações da Bahia, op. cit., p. 283.
Navarro, Cartas avulsas, op. cit., p. 328.
135 Idem, p. 348.
112 Manoel da Nóbrega, "Ao doutor Navarro, seu mestre de Coimbra" (1549), in Manoel
da Nóbrega, Cartas do Brasil, op. cit., p. 95. 136 Idem, p. 367.

113 Vicente Rodrigues, in Azpicuelta Navarro, Cartas avulsas, op. cit., p. 143. m Idem, p. 393.
138 Primeira visitação do Santo Offício às partes do Brasil pelo licenciado Heitor
114 Claude d' Abeville, História da missão dospadres capuchinhos na ilha do Maranhão
Furtado de Mendonça - Denunciações de Pernambuco, 1593-1595, São Paulo,
e terras circunvizinhas, tradução de Sérgio Milliet, Belo Horizonte-São Paulo,
Itatiaia-Brmsr, 1975, p. 292. Ed. Paulo Prado, 1929, p. 95.
139 Idem, p. 103.
115 "Carta do padre Antonio Blasquez do Brasil, da cidade do Salvador, Bahía de Todos os
Santos, para o padre mestre geral Diogo Laynez e aos mais padres e irmãos da Compa- 140 Idem, p.104.
nhia, de 23 de setembro de 1561. Recebida em Lisboa a 8 de março de 1562", in 141 Jacques Le Goff, La naissance du purgatoire, Paris, Éditions Gallimard, p. 299.
Azpicuelta Navarro, Cartas avulsas, op. cit., p. 329. 142 Dante Alighieri,A divina comédia, op. cit., vol. I, p. 129.
116 Hector H. Bruit, "O visível e o invisível", op. cit., p. 97. 143 Primeira visitação do Santo Offício - Confissões da Bahia, op. cit., p. 154.
117 Paulo Suess, A conquista espiritual da América Espanhola, Petrópolis, Vozes, 144 Escreveu Michel Vovelle: "Erasmo, em O elogio da loucura, Lutero em suas proposi-
1992, p. 83. ções, Calvino em um dos seus primeiros tratados (Psychoparmychia, 1534-1545)
118 Décio de Almeida Prado, "O teatro como instrumento da catequese", in NossaAmé- filiam-se, cada um à sua maneira, às indulgências e ao purgatório ...'', idem, La mort,
rica, São Paulo, Novo Tempo, maio-jun. 1989, p. 82. op. cit., p. 207.
119 Michel Vovelle, La mort, op. cit., p. 306. 145 Primeira visitação do Santo Offício - Denunciações da Bahia, op. cit., p. 497.
120 "Outra do padre Leonardo Nunes, de S. Vicente, a 20 de junho de 1551", inAzpicuelta 146 Ibidem.
Navarro, Cartas avulsas, op. cit., p. 92. 147 Primeira oisitação do Santo Offício - Confissões de Pernambuco, op. cit., p. 139.
121 Roberto Gambini, O espelho índio, op. cit., p. 107. 148 Ibidem.
122 José de Anchieta, "Sermão de 1567", in josé de Anchieta, Cartas, op. cit., p. 505. 149 Paulo Suess, A conquista espiritual, op. cit., p. 363.

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150 Jacques Le Goff, La naissance, op. cit., p. 284.


151 Idem, p. 305.
152 Philippe Aríês, O homem diante da morte, op. cít., voI. 1, p. 214.
153 Jacques Le Goff, La naissance, op. cit., p. 15.
154 A. Gurevic, "Au Moyen Age: conscience individuelle et image de l'au-delà" , inAnnales:
Economies, Societés, Civilisartions, 37 annés, n" 2, Paris, Librairie Armand Colin,
mar.-abr., 1982, p. 271.
155 Jacques Le Goff, La naissance, op. cit., p. 285.
156 Ruiz de Montoya, Conquista espiritual, op. cit., p. 19.
157 Idem, p. 22.
158 Idem, pp. 56-7.
159 Idem, p. 58.
160 Ibidem.
161 Jacques Le Goff,La naissance, op. cit., p.l14.
162 Ruiz de Montoya, Conquista espiritual, op. cít., p. 25.
163 Idem, p. 40.
164 Jacques Le Goff, La naissance, op. cít., p. 18.
165 Ruiz de Montoya, Conquista espiritual, op. cit., p. 60.
166 Livro da uisitação do Santo OjJício da lnquisição ao Estado do GrãoPará (1763-
1769}, texto inédito, apresentação de José Roberto do Amaral Lapa, Petrópolis,
Vozes, 1978, p. 225.
167 José de Anchieta, in Cartas..., op. cit., p. 159, "Ao padre geral, de São Vicente, a 1"
de julho de 1560", escreve que as mulheres brasílicas por qualquer ocasião "rnui
levianas matam os filhos".
168 Livro da uisitação do Santo OjJício da Inquisição ao estado do Pará (1763-
1769), op. cít., p. 226.
169 Nuno Marques Pereira, Compêndio narrativo doperegrino daAmérica, 6ª ed., Rio
de Janeiro, Publicações da Academia Brasileira, 1939,2 voI., pp. 191-2.
170 Idem, p. 338.
171 Idem, p. 347.
172 Idem, p. 188.

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