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NEUROCIRURGIA

BÁSICA

Sebastião Gusmão
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CAPÍTULO 1

SEMIOLOGIA NEUROLÓGICA
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O objetivo da observação clínica é o diagnóstico (gr. diagnósis, discernimento) da


doença por meio de suas manifestações fundamentais, que são os sintomas e os sinais;
geralmente, usa-se sintoma como sinônimo de sinal e sintoma. Síndrome é um conjunto
característico de sintomas e/ou sinais com denominação específica e que apresentam uma
mesma origem anatômica, funcional ou bioquímica. Numa analogia com a linguagem, os
sintomas e sinais seriam as letras, as síndromes seriam as palavras e a doenças seriam as
sentenças.
A doutrina semiológica clássica aconselha o médico a esboçar o diagnóstico
puramente clínico, ou seja, por meio apenas da anamnese e do exame físico, e, ao fazê-lo
deve procurar expressá-lo em termos anatômico, funcional e etiológico. Essa orientação
pretende habituá-lo aos caminhos do raciocínio clínico, que, com o tempo, acaba
consolidando sua competência pessoal intransferível. Quando isso não acontece, o médico
vai-se tornando cada vez mais dependente de exames complementares, freqüentemente
solicitados em bloco, na expectativa de que um deles atinja o alvo diagnóstico. Os exames
de fato complementares são aqueles que são solicitados com claro fundamento no exame
clínico e têm caráter comprobatório, ou então quantificador de lesão ou de disfunção, ou
ainda, em casos especiais, indispensável e inadiável para excluir determinada alternativa
diagnóstica.
Em razão de ser formado por um conjunto de unidades anatomo-funcionais
diferentes e com precisa organização, o sistema nervoso permite excepcional objetividade e
decorrente precisão na correlação anatomo-clínica. Os sintomas e sinais neurológicos devem
ser encarados como indicadores de alterações funcionais por lesão com precisa localização
anatômica. Assim, o sólido conhecimento da organização anatomo-funcional geral do
sistema nervoso é indispensável ao domínio da semiologia neurológica básica.
O diagnóstico de determinado acometimento neurológico envolve três passos
distintos. O primeiro é determinar as funções alteradas (diagnóstico funcional), o segundo é
identificar a lesão no sistema nervoso (diagnóstico anatômico) e o terceiro a investigação
etiológica. Determinado o local, é necessário ter em mente que doenças têm preferência
por ele. Assim, determinam-se os possíveis diagnósticos etiológicos diferenciais.
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Na sistematização do exame, avaliamos cada função (motoras, sensitivas,


sensoriais e superiores) referente a cada estrutura, com o objetivo de evidenciar para cada
uma sua integridade ou sua eventual alteração. Assim, o exame neurológico deve ser feito
segundo a seguinte sistemática:
motricidade do tronco e dos membros;
sensibilidade do tronco e dos membros;
funções da extremidade cefálica;
funções superiores.
Tal é o plano geral da exploração das funções neurológicas. Analisaremos cada
uma, de acordo com a seguinte seqüência:
conceito de função;
exploração da função, com definição da resposta normal;
anatomia funcional dos centros e vias, aplicada ao raciocínio clínico e
consequentemente ao diagnóstico topográfico.

1. ANAMNESE
A anamnese é de fundamental importância na avaliação do paciente com lesão do
sistema nervoso. Assim, a reconhecida relevância do exame físico não deve de modo algum
diminuir esse caráter fundamental da anamnese. O mesmo deve ser dito em relação aos
desenvolvimentos tecnológicos que a cada dia chegam em auxilio complementar ao
diagnóstico do paciente portador de doença neurológica.
O diagnóstico resulta da consistência entre a anamnese, o exame físico e os
exames complementares. Em muitos casos, a anamnese bem feita possibilita a formulação
do diagnóstico provável, antes mesmo do início do exame físico. Quando associada a um
exame físico preciso, permitirá, na maioria dos casos, o diagnóstico correto.
A anamnese nunca deverá ser procedimento burocrático, mas processo ativo
durante o qual as hipóteses sobre lesões e disfunções são formuladas e reformuladas. Na
coleta de informações não há pormenor de maior ou menor relevância. Nas três dimensões
do espaço diagnóstico - o paciente, a doença e as circunstâncias epidemiológicas - cada
indício deve concorrer e ser aproveitado para o raciocínio clínico. Neste aproveitamento
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jogam papel decisivo os conhecimentos prévios de anatomia e de fisiopatologia, tanto


quanto a cultura clínica do examinador.
Na anamnese, o paciente (ou seu acompanhante) é interrogado sobre a
história da moléstia atual, antecedentes pessoais e antecedentes familiares.

1.1. História da moléstia atual


Cada uma das queixas que o próprio paciente considera relacionadas à sua
moléstia atual deve ser pormenorizada conforme suas características completas: localização,
duração, intensidade, freqüência, tipo, fatores que desencadeiam, agravam ou atenuam e
manifestações associadas.
Localização: é a designação topográfica do local do corpo onde o paciente define
ou julga localizar-se o sintoma. Se possível, solicitar que ele aponte com o dedo esse local.
Duração: é o tempo decorrido a partir da data ou época aproximada do
surgimento do sintoma.
Intensidade: os sintomas ou sinais podem, em geral, ser quantificados em três
graus, por exemplo: forte, médio ou fraco. Quando se trata do sintoma universal dor, convém
desdobrar a escala, por exemplo: leve, moderada, intensa, muito intensa e intolerável.
Freqüência: anotar se o sintoma apresenta tendência à diminuição ou ao
desaparecimento espontâneos e se os intervalos respectivos são regulares ou não,
prolongados ou não. Os adjetivos clássicos de freqüência são: intermitente, a manifestação
desaparece e reaparece periodicamente ao longo da mesma doença; remitente, diminui sem
desaparecer; recorrente (ou recidivante) desaparece e reaparece como se fosse nova
doença. Por causa do uso impreciso, tais termos classificatórios devem ser substituídos por
descrição específica da freqüência do sintoma, se possível quantificado.
Tipo ou peculiaridade: deixar que o paciente descreva o tipo, o aspecto peculiar
ou a qualidade que atribui ao sintoma.
Fatores desencadeantes, agravantes ou atenuantes: são os fatores que o
paciente aponta espontaneamente como capazes de provocar, agravar ou melhorar o
sintoma. Caso não aponte, pode-se mencionar diretamente um ou mais fatores específicos,
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no caso de o clínico necessitar saber se de fato estão ausentes. Incluem-se aqui as


medicações ou recursos físicos e dietéticos eventualmente utilizados
Manifestações associadas: são outras manifestações subjetivas ou objetivas que
acompanham sempre ou ocasionalmente o sintoma.

1.2. Antecedentes pessoais


Os antecedentes pessoais referem-se a informações sobre a saúde do paciente
antes da doença atual. Anotam-se os antecedentes fisiológicos e patológicos desde o
período pré-natal até o momento atual.

1.3. Antecedentes familiares


Os antecedentes familiares (ou história familiar) permitem identificar doenças
neurológicas adquiridas por via genética, por via congênita ou pela coabitação.

A seguir analisa-se os sintomas mais freqüentemente relatados por pacientes com


doenças neurológicas: dor, parestesias, crises epilépticas, distúrbios motores, vertigem,
distúrbios visuais, distúrbios auditivos, distúrbios de outros nervos cranianos, alterações da
linguagem, alterações da consciência, sintomas viscerais e sintomas mentais.
Dor
É definida como sensação desagradável e experiência emocional associada a
dano tecidual real ou potencial. Na sua avaliação deve-se interrogar sobre: localização,
características, intensidade, modo de início, evolução, irradiação, fatores que agravam e
aliviam e tratamentos realizados.
É de grande importância o modo como os pacientes descrevem a dor. Assim, a
natureza da dor determinada por uma causa específica tende a ser descrita de forma
semelhante por diferentes pacientes, indicando que apresenta qualidades únicas. É fato
conhecido também que a vivência da descrição dada relacionar-se com a constituição
emocional do paciente, seu passado cultural e o significado da dor. A localização da dor e
suas qualidades permitem relacionar sua origem com determinado órgão ou parte do órgão.
Por ser fenômeno subjetivo (experiência emocional), torna-se difícil avaliar a
intensidade da dor. Em clínica empregamos habitualmente medidas subjetivas da dor, que
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permitem o uso da própria avaliação do paciente. Isto é realizado por meio da escala
analógica, que consiste de uma linha de 10 cm de comprimento em cujo lado esquerdo está
escrito: “Eu não sinto dor alguma” e, no lado direito “Minha dor não poderia ser pior”. Esta
escala é apresentada ao paciente, solicitando que faça uma marca na linha no ponto que
representa o nível da dor no momento da pergunta. A distância da marca a partir do lado
esquerdo da linha é medida em milímetros e denominadas de escore de dor. As medidas
podem ser repetidas várias vezes ao dia ou durante um período de tratamento de dor. Isto
permite medir a evolução temporal da intensidade da dor.
Crises epilépticas
Na epilepsia, a história da moléstia atual adquire especial importância, pois para o
diagnóstico correto dos tipos das crises, as maiores informações são obtidas na anamnese.
As observações feitas pelos pais ou familiares são necessárias e indispensáveis, já que o
diagnóstico do tipo de crise convulsiva será feito baseado nestas informações, desde que, de
maneira geral, o médico não presencia a crise. A colheita dos dados da anamnese e
especialmente das crises epilépticas deverá ser o mais completo possível e adota-se um
esquema que dará, após a sua análise, informação pormenorizada sobre as crises:
pródromos, precipitantes, aura, descrição da crise, duração, fenômeno pós-comiciais,
frequência e medicamentos.
Os pródromos não ocorrem em todos os pacientes porém, existem certos
pacientes que, algumas horas ou dias que antecedem a crise, tornam-se angustiados,
apresentando nítida mudança de comportamento. Ocasionalmente, quando se trata de
crianças, estas procuram as mães apresentando, por vezes, reações de medo, indisposição,
cefaléia ou outros sintomas.
As crises poderão ocorrer espontaneamente ou ser precipitadas por uma série de
fatores, seja de natureza emocional, seja de natureza tóxica, metabólica ou sensorial, ou por
retirada ou mudança brusca de medicamentos anticonvulsivantes. Cabe lembrar que os
precipitantes de natureza sensorial podem ocorrer nas chamadas “epilepsias reflexas” e,
dentre estas, as epilepsias provocadas por estimulação luminosa intermitente são as mais
freqüentemente encontradas.
A aura é um dos elementos mais importantes da crise epiléptica. Quando ocorre,
fornece, em muitos casos, elementos valiosos quanto à provável área de localização
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cerebral, pois nada mais representa que o início da crise, ainda sem propagação cerebral
difusa. A aura é especialmente de valor localizatório nos casos de alucinações auditivas,
visuais, olfativas ou gustativas; nas afasias, parrestesias e fenômenos motores numa parte
do corpo.
A descrição do tipo da crise e os acontecimentos desde seu início até o término
deverão ser anotados com precisão. É importante anotar nas epilepsias parciais motoras, por
exemplo, qual o membro que apresentou inicialmente movimentos convulsivos e a
propagação deste para outras regiões do corpo (crises jacksonianas), a seqüência das fases
tônicas ou clônicas, a presença ou não de incontinência urinária ou fecal, a presença ou não
de distúrbios da consciência.
A duração de cada crise deverá ser anotada, pois crises generalizadas ou parciais
de longa duração podem levar a coma pós-comicial mais prolongado ou mesmo produzir
paralisias prolongadas naqueles membros que apresentarem convulsões (paralisia de Todd).
Os fenômenos pós-comiciais são variáveis e podem incluir desde o coma de
duração variável até quadro de cefaléia, vômitos, dores generalizadas, confusão mental e
paralisias.
Deverão ser anotados a freqüência das crises ou intervalos máximo e mínimo das
mesmas. A data da primeira e da última crise. As crises podem ser, quanto à freqüência,
isoladas, como convulsões na infância, associadas a hipertermia ou podem ser repetidas,
quer espontaneamente ou como crises cíclicas, como por exemplo, no ciclo menstrual, no
ciclo da vigília, sono e gravidez. As crises podem ainda ser repetidas e prolongadas, dando
origem ao status epilepticus.
O paciente ou acompanhante deve ser interrogado sobre os medicamentos
administrados e as doses. Grande número de crises são decorrentes da brusca interrupção
do anticonvulsivante, ou de doses inadequadas ou de mudança rápida de anticonvulsivante.
Distúrbios Motores
Nos distúrbios motores, como paralisias, paresias, atrofia ou ataxia, devem ser
determinado o tempo e modo de início, a localização, a intensidade, o tipo e a progressão ou
regressão. Nas manifestações hipercinéticas determinam-se o tipo, a localização, modo de
início, duração, amplitude, frequência e fatores desencadeantes.
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Parestesias
São sensações desagradáveis descritas como formigamento, picada,
adormecimento e queimação. Traduzem geralmente irritação de nervos periféricos sensitivos
ou de raízes posteriores. As parestesias devem ser caracterizadas quanto à localização,
irradiação, tipo, modo de início, intensidade, freqüência, periodicidade e fatores agravantes
ou atenuantes.
Vertigem
É a perda da percepção normal de relação com o espaço circundante. Pode
manifestar-se unicamente como sensação subjetiva ou sob a forma de deslocamento
anormal e ilusório dos objetos. As manifestações de desequilíbrio podem consistir
unicamente numa sensação subjetiva de insegurança ou de queda, ou corresponder a
sensação objetiva de deslocamento linear ou rotatório do mundo circundante. É importante
diferenciar as manifestações bem sistematizadas do quadro de vertigem com a chamada
vertigem psicogênica, na qual ocorre um conjunto de sensações cinestésicas derivadas de
estado de ansiedade. Na vertigem orgânica é importante determinar a natureza, modo de
início, duração, freqüência, intensidade, direção e relação com a postura e mudança de
posição. As vertigens geralmente traduzem fenômenos subjetivos de disfunção vestibular.
Distúrbios Visuais
Quanto aos distúrbios visuais, o paciente pode queixar-se de diminuição da
acuidade visual, alterações do campo visual (escotomas, hemianopsias, quadrantopsias),
diplopia e alucinações visuais. A diminuição da acuidade visual poderá ser uni ou bilateral, de
instalação súbita ou progressiva (neurites ópticas, atrofias ópticas primárias, edema de
papila). Amaurose unilateral, de instalação súbita, pode indicar embolia da artéria central da
retina, insuficiência do território carotidiano homolateral ou crise enxaquecosa. As alterações
do campo visual indicam lesão da via visual em seu trajeto da retina ao córtex occipital. No
caso de diplopia, que traduz paralisia oculomotora, o paciente pode apresentar-se ao exame
fechando voluntariamente um olho com o objetivo de eliminar a imagem dupla. As
alucinações visuais podem manifestar-se como aura epiléptica, indicando foco occipital.
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Distúrbios auditivos
Manifestam-se por zumbidos, diminuição da acuidade auditiva e alucinações
auditivas. Zumbidos são ruídos percebidos pelo ouvido e que não correspondem a nenhum
fenômeno objetivo.
Distúrbios de outros nervos cranianos
As manifestações dos demais nervos cranianos incluem: distúrbios do olfato e do
paladar, salivação e lacrimejamento; paralisia da face; disartria; disfagia e regurgitação.
Alterações da linguagem
As anormalidades da linguagem podem manifestar-se por distúrbios da
compreensão e da expressão da linguagem falada e escrita. Afasia é a perda da linguagem
por lesão cerebral. Afonia é a perda ou diminuição da voz por lesão do órgão da fonação.
Disartria é a dificuldade de articulação das palavras.
Alterações da consciência
No paciente em coma (perda da consciência com preservação das funções
vegetativas) é fundamental determinar o modo de início da depressão do estado de
consciência: se a instalação do coma foi súbita (acidente vascular cerebral, epilepsia),
relativamente rápida (intoxicação exógena) ou gradual (lesões expansivas intracranianas,
distúrbios metabólicos).
Sintomas viscerais
Os principais sintomas viscerais conseqüentes à disfunção do sistema nervoso
autônomo são: alterações da ingestão de líquido e de alimentos, vômitos, retenção e
incontinência urinária e fecal, alterações da potência sexual e da libido, sudorese e distúrbios
vasomotores.
Sintomas mentais
Os sintomas mentais são devidos a alterações das seguintes funções: orientação,
consciência, atenção, memória, pensamento, senso-percepção e inteligência.
Orientação é a capacidade de estar orientado quanto à própria pessoa e quanto
ao tempo e ao espaço. A desorientação ocorre em quadros demenciais e nas confusões
mentais.
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Consciência é a capacidade de dar-se conta de si mesmo e do mundo externo. A


alteração observada é o abaixamento do nível da consciência. A falta de consciência é a
inconsciência, como ocorre no coma, e caracteriza-se pela ausência de atividade psíquica.
Atenção é a capacidade de a consciência focalizar, realçar e destacar
acontecimentos ou representações, dentre várias da realidade consciente. A diminuição da
atenção espontânea ou hipovigilância caracteriza-se por uma menor capacidade de estar
atento ao mundo circundante.
Memória é a função psíquica que permite conservar os dados vividos e
aprendidos. A hipomnésia ou amnésia de fixação é a diminuição ou incapacidade de gravar
fatos novos. A hipomnésia ou amnésia de evocação é a diminuição ou incapacidade para
recordar.
Pensamento inclui toda a atividade psíquica desde o ato de percepção até o da
linguagem. Entre as várias alterações do pensamento sobressaem-se as idéias delirantes,
que são caracterizadas por interpretações novas e anômalas da realidade.
Os estímulos que atingem a consciência geram a sensação, e esta sensação,
elaborada a partir da atividade intelectual e das recordações, determina a percepção. As
alterações da senso-percepção são as ilusões e as alucinações. As ilusões são deturpações
da realidade percebida. As alucinações são percepções sem objeto. Nas lesões cerebrais
podem ocorrer alucinações visuais, auditivas e olfatórias. No delirium tremens ocorrem as
alucinações visuais de animais (zoopsias). Nas auras epilépticas são freqüentes as
alucinações olfativas e gustativas desagradáveis. Outro tipo de alucinação é a
hemiassomatognosia, caracterizada por desconhecimento, por parte do enfermo, da metade
corporal contralateral; é determinada por lesão do lobo parietal do hemisfério não dominante.
Em caso de amputação de membros pode ocorrer a alucinação corporal conhecida como
membro fantasma, onde o paciente continua percebendo o membro amputado.
Inteligência é a capacidade geral de adaptar-se a novas situações, ou seja, de
resolver problemas novos. A oligofrenia e a demência são os distúrbios da inteligência de
importância clínica. A oligofrenia é o desenvolvimento intelectual insuficiente congênito ou
adquirido. É devida à falta ou parada do desenvolvimento da inteligência, conseqüente a
distrofias ou lesões do sistema nervoso. A demência é a perda da capacidade intelectual,
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podendo ser determinada por várias enfermidades que ocasionam lesão difusa do córtex
cerebral.

2. MOTRICIDADE DO TRONCO E MEMBROS


O exame da função motora compreende: motricidade voluntária, motricidade
automática, tono muscular e reflexos, coordenação motora e equilíbrio.
2.1. Motricidade voluntária
É a motricidade proposicional. É avaliada por meio do exame dos
movimentos espontâneos, da força muscular segmentar e das manobras para
testar déficits ou de sensibilização.
Movimentos espontâneos ou ativos: Solicita-se ao paciente que realize os
movimentos próprios dos diferentes segmentos do corpo.
Força muscular segmentar: Solicita-se ao paciente que execute determinado
movimento contra a resistência oferecida pelo examinador. Deverá ser realizada a
exploração sistematizada dos vários grupos musculares.
Manobras para testar déficits ou de sensibilização:
Manobra dos braços estendidos: os membros superiores são colocados
em posição horizontal (posição de juramento). Em caso de déficit motor, o
membro apresenta oscilações e tende a cair progressivamente.
Manobra de Mingazzini: paciente em decúbito dorsal, com as pernas
fletidas em ângulo reto sobre as coxas e estas sobre a bacia. Em caso de déficit,
ocorre queda progressiva da perna (déficit do quadríceps), da coxa (déficit do
psoas) ou de ambos os segmentos.
Manobra de Barré: em decúbito ventral, com as pernas fletidas em ângulo reto
sobre as coxas. Em caso de déficit, a perna cai progressivamente (déficit dos músculos
flexores da perna sobre a coxa).
Manobra do pé: em decúbito dorsal e membros inferiores em extensão,
com os pés em posição vertical. Em caso de déficit dos músculos rotatórios
internos dos membros inferiores, os pés desviam-se para fora. É manobra
importante no paciente em coma, quando indica hemiplegia.
O déficit motor é quantificado usando-se a seguinte escala:
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5 — força muscular normal;


4 — movimento com capacidade de vencer uma resistência;
3 — movimento capaz de vencer a força da gravidade;
2 — movimento possível após eliminação da ação da gravidade;
1 — fraca contração muscular sem deslocamento de segmento;
0 — ausência de contração muscular.
Anátomo-fisiologia
A via da motricidade voluntária compreende dois tipos de neurônios, um central
(neurônio motor superior) ligando o córtex aos núcleos dos nervos cranianos ou espinhais e
um periférico (neurônio motor inferior), que faz sinapse com o precedente nestes núcleos e
os conecta aos músculos estriados. O segmento central da via motora voluntária é
constituído pelos neurônios centrais agrupados, constituindo via compacta e cruzada.
Portanto, o déficit de tipo central é global, cruzado, se a via é atingida acima do
cruzamento, e homolateral, se atingindo abaixo. O segmento periférico é constituído pelos
neurônios periféricos (motoneurônios inferiores), tendo sua origem ao longo do corno anterior
da medula e distribuído pelas raízes, plexos e troncos nervosos periféricos. O déficit de tipo
periférico é, portanto, parcial, localizado em certos músculos. Os axônios dos neurônios
motores periféricos deixam a medula através da raiz anterior (motora) e dirigem-se, sem
interrupção, até o músculo estriado, onde fazem sinapse com a membrana da fibra muscular.
O segmento central da via motora voluntária (feixe córtico-espinhal ou piramidal)
apresenta o seguinte trajeto descendente: a) origem: no córtex, predominantemente no giro
pré-central (área motora 4). O déficit de tipo cortical é a hemiplegia cruzada incompleta e não
proporcional (uma das extremidades é mais acometida); b) centro oval: lesão aí determina
hemiplegia cruzada, incompleta e não proporcional, portanto, de tipo cortical; c) cápsula
interna: após atravessarem a substância branca subcortical (centro oval), as fibras do trato
piramidal ganham a cápsula interna (conjunto de fibras situadas entre o tálamo e o núcleo
lentiforme). Nessa região, as fibras corticofugais encontram-se condensadas em pequena
área e são, portanto, vulneráveis maciçamente. O déficit tipo capsular é representado por
hemiplegia cruzada, completa (face, membro superior e membro inferior) e proporcional
(déficit motor idêntico nos membros superior e inferior); d) tronco cerebral: o feixe córtico-
espinhal ocupa a parte média do pedúnculo cerebral, a parte ventral da ponte e finalmente a
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face ventral do bulbo (pirâmide bulbar). No bulbo, algumas fibras do feixe córtico-espinhal
dirigem-se ao funículo anterior homolateral da medula (feixe piramidal direto ou córtico-
espinhal ventral) e a grande maioria cruza a decussação das pirâmides, indo localizar-se no
lado oposto para formar o feixe piramidal cruzado ou córtico-espinhal lateral, localizado no
funículo lateral, o único importante do ponto de vista semiológico. A lesão da via motora junto
ao tronco cerebral geralmente determina hemiplegia alterna, isto é, hemiplegia contralateral
à lesão, acompanhada de sintomas e sinais homolaterais do acometimento de um ou mais
nervos cranianos; e) medula: o feixe piramidal lateral apresenta-se como via agrupada e
compacta na metade posterior do funículo lateral, já tendo cruzado a linha mediana. O déficit
tipo medular unilateral é a paralisia homolateral, global e proporcional abaixo da lesão. O
déficit tipo medular bilateral é a paralisia bilateral global e proporcional, abaixo da lesão; f)
término: no ápice dos cornos ventrais da medula (início da via final comum de Sherrington).
O segmento periférico da via motora voluntária (motoneurônio periférico ou
inferior) apresenta o seguinte trajeto: a) origem: nos cornos ventrais da medula; b) as raízes
ventrais estendem-se conforme os miótomos embrionários, portanto, com distribuição
topográfica e não funcional. O déficit radicular ou segmentar é homolateral, localizado em
determinados músculos pertencentes ao mesmo miótomo. Em razão de os músculos
apresentarem inervação pluri-radicular, o déficit radicular é sempre incompleto. As principais
raízes inervam os seguintes grupos musculares dos membros, enumeradas
esquematicamente:
C6 — músculos da região anterior do braço;
C7 — músculos das regiões posteriores do braço e antebraço;
C8 — músculos da região anterior do antebraço e lateral da mão;
L5 — músculos da região anterolateral da perna;
S1 — músculos da região posterior da perna.
c) Os plexos reagrupam os motoneurônios das raízes ventrais em troncos
nervosos periféricos, diferenciados funcionalmente. Assim, o déficit troncular atinge músculos
que têm a mesma função, sendo, portanto, de distribuição funcional e não topográfica. Cada
músculo recebe inervação de um só tronco e, portanto, o déficit troncular é sempre completo.
d) Os nervos, de forma esquemática, respondem pelas seguintes funções:
Axilar - abdução do braço;
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Músculocutâneo - flexão do antebraço;


Mediano - flexão do punho e dos dedos, pronação e pinça dos primeiro e segundo
dedos;
Ulnar - movimentos dos dedos (preensão e movimentos laterais dos dedos);
Radial - extensão do antebraço, da mão e dos dedos, supinação e abdução do
polegar;
Obturador - adução da coxa;
Femoral - extensão da perna;
Ciático - flexão da perna;
Tibial - flexão plantar do pé e dos pododáctilos;
Fibular - flexão dorsal do pé e dos pododáctilos (extensão).
2.2. Motricidade automática
A motricidade automática não resulta diretamente da vontade. É explorada nos
seguintes aspectos:
Movimentos automáticos normais: mímica, adaptações posturais: balanço dos
braços durante a marcha, gesticulação expressiva.
Pesquisa de movimentos anormais: acinesia, bradicinesia, movimentos coréicos,
movimentos atetóticos, balismos, tremor. Acinesia é a ausência completa de movimento
voluntário sem paralisia e bradicinesia é a lentificação anormal dos movimentos. Movimentos
coréicos consistem em contrações musculares involuntárias e desordenadas com
deslocamento de um segmento. Os movimentos atetósicos são movimentos involuntários,
lentos, de reptação, não domináveis pela vontade, acometendo freqüentemente as mãos e
pés. O hemibalismo manifesta-se por movimentos involuntários, violentos, desordenados, de
grande amplitude, limitados a uma metade do corpo. O tremor é movimento involuntário,
oscilatório, rítmico, rápido e de pequena amplitude, acometendo membros e cabeça.
Anátomo-fisiologia
O sistema extrapiramidal é formado pelos núcleos da base, área 6 do
lobo frontal, núcleos do tronco encefálico e as projeções destes núcleos para os
motoneurônios medulares. A síndrome piramidal determina alterações do tono
muscular e movimentos involuntários de vários tipos.
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2.3. Reflexos musculares e tono muscular


A base anatômica da motricidade reflexa e do tono é o arco reflexo, motivo pelo
qual são estudados em conjunto. O tono é o estado permanente de tensão dos músculos. O
reflexo pode ser definido como a resposta muscular, produzida por estímulos específicos,
que ocorre independentemente da vontade e que tem características semelhantes em vários
grupos animais e completa identidade na mesma espécie. Os reflexos são divididos em
musculares (miotáticos) ou profundos e cutâneos ou superficiais.
Os reflexos musculares profundos são manifestações fásicas particulares do
reflexo miotático ou de extensão. É importante a observação da simetria das respostas.
Portanto, é necessário usar de cada lado a mesma técnica e a mesma intensidade do
estímulo. Toda assimetria de resposta é patológica.
A intensidade da resposta reflexa é graduada de acordo com a seguinte escala: 0:
abolição; 1 a 3: presente e com intensidade crescente; 4: clono transitório; 5: clono
permanente.
Embora todos os músculos esqueléticos possam responder ao estímulo de
estiramento com contração reflexa, somente poucos reflexos são importantes do ponto de
vista clínico e incluídos no exame neurológico.
Reflexo bicipital (C5-C6. N. musculocutâneo)
Pesquisa-se com o antebraço apoiado e em semiflexão, estando a mão em
supinação. Percute-se o tendão do bíceps na dobra do cotovelo, com interposição do polegar
do examinador. A resposta consiste na contração do bíceps e conseqüente flexão e
supinação do antebraço.
Reflexo tricipital (C7. Nervo radial)
Estando o braço em abdução e sustentado pela mão do examinador, deixa-se cair
o antebraço em ângulo reto com o braço. Percute-se o tendão distal do tríceps. A resposta
consiste na contração do tríceps, com extensão do antebraço.
Reflexo braquiorradial ou estilorradial ou supinador (C5-C6; Nervo radial)
Com o antebraço em flexão sobre o braço e o punho sobre a mão do examinador,
é realizada a percussão sobre a apófise estilóide do rádio. A resposta consiste na contração
do músculo braquiorradial, com flexão e ligeira supinação do antebraço.
Reflexos dos flexores dos dedos (C8-T1; Nervos mediano e ulnar)
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O antebraço do paciente é colocado em semiflexão e supinação e os dedos em


leve flexão. O examinador coloca seus dedos médios e indicador sobre a superfície palmar
das falanges do paciente e percute os seus próprios dedos. A resposta consiste na contração
dos músculos flexores dos dedos. O limiar deste reflexo é variável, podendo manifestar-se
em alguns indivíduos e em outros estar latente. A resposta reflexa é geralmente discreta ou
nula em condições normais, tornando-se nítida nos casos de hiperatividade reflexa
conseqüente à lesão piramidal.
Reflexo dos quadríceps ou patelar (L2-L4; N. femoral)
Este reflexo pode ser pesquisado de duas formas: a) com o paciente sentado e as
pernas pendentes ou com uma das pernas cruzadas sobre o joelho oposto; b) com o
paciente deitado em decúbito dorsal, com o joelho semifletido e apoiado na mão do
examinador. Percute-se o tendão da patela junto à articulação do joelho. A resposta consiste
na contração do músculo quadríceps femoral com extensão da perna.
Reflexo dos tríceps sural ou aquileu (S1; Nervos ciático e tibial)
É pesquisado em três posições: a) com o paciente de joelhos sobre uma cadeira e
com os pés para fora do assento; b) com o paciente sentado e as pernas pendentes, o
tendão do tríceps sural é ligeiramente distendido pela dorsiflexão discreta do pé; c) com o
paciente em decúbito dorsal e uma das pernas cruzadas sobre o joelho oposto, mantendo-se
o pé em posição de ligeira flexão dorsal e apoiando-se a mão do examinador na parte
anterior da planta do pé. A percussão do tendão de Aquiles determina contração do tríceps
sural (músculos gastrocnêmio e sóleo), com extensão do pé sobre a perna (flexão plantar).
Nos reflexos cutâneos ou superficiais, o estímulo é aplicado à pele, evocando a
contração reflexa do músculo. Os mais importantes do ponto de vista clínico são os
seguintes:
Reflexo cutâneo-abdominal (T6-T12)
Este reflexo é obtido do estímulo da parede do abdome com objeto semi-
pontiagudo aplicado em sentido látero-medial, nas regiões epigástrica (reflexo abdominal
superior; T6-T8), umbilical (reflexo abdominal médio; T9-T10) e hipogástrica (reflexo
abdominal inferior; T11-T12). A resposta consiste na contração homolateral dos músculos
abdominais (reto e oblíquos), com desvio da linha alba e da cicatriz umbilical. O reflexo
cutâneo-abdominal é integrado em T6-T12 e facilitado pelo feixe piramidal. Portanto,
18

encontra-se abolido nas lesões segmentares da medula (T6-T12) e nas lesões piramidais
acima de T6.
Reflexo cutâneo-plantar (S1; Nervos ciático e tibial)
É pesquisado por meio da estimulação, com instrumento semipontiagudo, do
bordo externo da planta do pé, no sentido póstero-anterior. A resposta consiste na contração
dos músculos flexores dos pododáctilos. Este reflexo pode estar abolido (lesão da via
aferente e na fase aguda da síndrome piramidal) ou manifestar-se por inversão na resposta
(sinal de Babinski). O sinal de Babinski consiste na flexão dorsal (extensão) lenta do hálux,
provocada pela estimulação da planta do pé, com exceção da face plantar do próprio hálux.
O reflexo cutâneo-plantar em extensão indica disfunção piramidal, mas nas crianças pode
estar presente até o início da marcha. O sinal de Babinski deve ser referido como estando
presente ou ausente e não positivo ou negativo.
Reflexo anal (S3-5)
A estimulação, com um alfinete, da pele da região anal, determina a contração do
esfíncter externo do ânus.
Reflexo cremastérico (L1-2)
É pesquisado com o paciente em decúbito dorsal e com os membros inferiores em
extensão e abdução. Realiza-se a estimulação da face interna da coxa no seu terço superior.
A resposta consiste na contração do músculo cremáster e conseqüente elevação do testículo
homolateral.
O tono é avaliado por:
Palpação: verificação da consistência muscular;
Percussão: produção do fenômeno miotônico;
Movimentação passiva: avaliação da extensibilidade e da passividade;
Balanço passivo das articulações.
Anátomo-fisiologia
O reflexo miotático inicia-se nas terminações anulospirais das fibras intrafusais,
sensíveis ao estiramento. Os impulsos oriundos destes receptores são conduzidos pelas
fibras aferentes Ia, que fazem sinapse direta com os motoneurônios alfa (no corno anterior
da medula) e vão inervar o mesmo músculo estimulado. Assim, o estiramento do músculo
determina sua contração reflexa.
19

A interrupção do arco reflexo leva à diminuição ou abolição do reflexo


miotático e à hipotonia, traduzindo lesão neurogênica periférica (raiz dorsal ou
ventral, troncos nervosos periféricos ou corpos dos motoneurônios no segmento
medular). A lesão da via piramidal determina hipertonia ou espasticidade e
hiperreflexia tendínea.
O arco reflexo exteroceptivo (reflexos cutâneos) é formado pelas
fibras aferentes finas que, através de muitos interneurônios, vão estimular os
motoneurônios alfa. A via piramidal, através de suas fibras retículo-espinhais
laterais, facilita este reflexo polissináptico nociceptivo em flexão. A abolição de um
destes reflexos (cutâneo-abdominal, cremasterico e cutâneo-anal) traduz lesão do
arco reflexo simples (raízes dorsais ou ventrais e nervos periféricos). A abolição
de mais de um destes reflexos sinaliza, geralmente, lesão da via piramidal.
O reflexo cutâneo-plantar é, na realidade, um reflexo antigravitacional
em extensão, porque o músculo flexor curto do hálux, que determina a flexão
plantar do hálux, é extensor fisiológico (opõe-se ao efeito da gravidade). Ao
contrário do reflexo cutâneo-plantar, o reflexo nociceptivo em flexão é a contração
reflexa dos músculos flexores, em resposta à estimulação nociceptiva da pele. A
via piramidal exerce inibição sobre este reflexo de flexão, o que permite, no caso
particular do reflexo cutâneo-plantar, que a flexão plantar dos pododáctios se
manifeste, quando é estimulada a planta do pé. Este é o reflexo cutâneo-plantar
em flexão, um reflexo exteroceptivo antigravittacional. Se a inibição é alterada
(lesão da via piramidal), os reflexos em flexão ou de defesa dos membros
inferiores são liberados. No caso particular da estimulação da planta do pé, o
hálux responde com a extensão lenta. Esta resposta, ou sinal de Babinski, pode
ser o primeiro sinal de lesão da via piramidal, donde sua grande importância
semiológica. Na primeira infância, o sinal de Babinski está presente, em virtude da
imaturidade da mielinização do trato piramidal.
A lesão da via motora pode estar localizada junto ao neurônio motor
superior ou inferior, manifestando-se por duas síndromes distintas. A síndrome
do neurônio motor inferior (síndrome da paralisia flácida) caracteriza-se por: a)
diminuição da força muscular, b) hipotonia ou atonia muscular, c) hiporreflexia ou
20

arreflexia e d) degeneração muscular neurogênica com conseqüente atrofia. A


síndrome do neurônio motor superior (síndrome da paralisia espástica)
manifesta-se por: a) diminuição da força muscular, acompanhada de incapacidade
para os movimentos delicados, b) hipertonia muscular, c) hiperreflexia
proprioceptiva (miotática ou profunda), d) diminuição ou abolição dos reflexos
exteroceptivos (cutâneos ou superficiais), e) presença de sinal de Babinski e f)
ausência de atrofia muscular neurogênica.
2.4. Coordenação motora
A função de coordenação da motricidade harmoniza a atividade dos
diferentes motoneurônios, assegurando a execução correta dos movimentos no
tempo e no espaço. Para a realização de determinado movimento, é necessária a
existência de mecanismos reguladores, a fim de que, no tempo certo, os grupos
musculares agonistas se contraiam, os antagonistas se relaxem, os sinergistas
auxiliem a função dos agonistas e, ainda, os músculos fixadores fixem as
articulações envolvidas na função e, dessa forma, o movimento desejado seja
realizado de forma coordenada. A coordenação motora é explorada por meio das
seguintes manobras:
Prova índex-nariz: tocar a ponta do nariz com o indicador. Esta prova deverá ser
realizada acompanhada ou não pelo auxílio da visão.
Prova índex-nariz-índex: consiste em tocar o nariz com o índex e, posteriormente,
o índex do examinador de forma repetida e com deslocamento de posição do índex do
examinador.
Prova calcanhar-joelho-crista da tíbia: em decúbito dorsal, tocar o joelho com o
calcanhar do lado oposto e deslizar o calcanhar ao longo da crista da tíbia.
Prova dos movimentos alternados (prova das marionetes): efetuar movimentos
sucessivos de pronação e supinação das mãos.
Prova de Stewart-Holmes (ou do rechaço): executar uma flexão do antebraço
contra resistência oposta pelo examinador, que bruscamente a relaxa.
Marcha: testar, em linha reta, a marcha usual, no calcanhar e na ponta dos pés.
Anátomo-fisiologia
21

O cerebelo é responsável pela coordenação dos movimentos, que é realizada nos


planos espacial e temporal. As alterações da coordenação espacial do movimento
(dismetria), manifestam-se, nas provas, por meio de desvio da trajetória do movimento,
ultrapassagem do objetivo (hipermetria) e marcha atáxica. As alterações da coordenação
temporal do movimento (cronometria e sinergia) manifestam-se pela perturbação do
desenvolvimento temporal do movimento simples (discronometria) e pela perda da sinergia
dos componentes musculares dos movimentos, resultantes de defeito na coordenação dos
músculos agonistas e antagonistas (assinergia). A discronometria manifesta-se, nos testes,
por hpermetria, disdiadococinesia ou adiadococinesia (impossibilidade de executar
movimentos rápidos e alternados), alteração da palavra (voz escandida) e alteração da
escrita (macrografia). A assinergia manifesta-se por tremor cinético e decomposição do
movimento.
2.5. Equilíbrio
O equilíbrio compreende as intervenções automáticas capazes de assegurar que o
centro de gravidade do corpo se mantenha dentro do polígono de sustentação, tanto em
condições estáticas (posição de pé) quanto dinâmicas (principalmente em marcha). É
explorado por meio das seguintes manobras:
Pesquisa do sinal de Romberg: paciente em posição ereta, pés unidos e olhos
fechados.
Marcha: usual, na ponta dos pés, nos calcanhares e em linha reta.
Prova do índex: com os braços estendidos, manter os dedos indicadores na
mesma posição dos indicadores do examinador, após fechar os olhos.
Pesquisa do nistagmo: o nistagmo caracteriza-se por movimentos oscilatórios e
involuntários dos globos oculares no sentido horizontal, vertical ou rotatório.

Anátomo-fisiologia
A organização geral do equilíbrio é realizada a partir de informações vestibulares e
proprioceptivas periarticulares. As impressões visuais não são indispensáveis, mas são
capazes de compensar parcialmente um déficit das vias vestibulares ou proprioceptivas.
O aparelho vestibular ou labirinto é um órgão proprioceptivo e tem papel
fundamental na orientação espacial e na programação de percepção dos movimentos a
22

serem realizados. Ele é excitado pela força da gravidade e pelas acelerações angular e
linear. Os estímulos vestibulares iniciam-se no labirinto e são dirigidos pelo nervo vestibular
para os núcleos vestibulares. Dos núcleos vestibulares partem ordens motoras reflexas que
são enviadas aos núcleos dos nervos oculomotores (fascículo longitudinal medial) e aos
neurônios motores da medula (trato vestíbulo-espinhal), com a finalidade de regular os
movimentos oculares reflexos e o tono postural, para a manutenção do equilíbrio. Através
deste sistema de integração, a posição dos olhos é controlada pelos estímulos vestibulares
(reflexo de movimentação dos olhos por estímulos vestibulares ou reflexo óculo-cefálico),
com a finalidade de manter a fixação do olhar em um objeto determinado durante a
movimentação do corpo ou da cabeça.
Quando ocorre desequilíbrio na estimulação dos labirintos (como, por exemplo,
girando o paciente na cadeira de Barany e irrigando o conduto auditivo externo com água
quente ou fria), os olhos desviam-se para um lado e voltam-se rapidamente à posição
anterior (nistagmo) para logo iniciarem novo desvio. Além de horizontal, o nistagmo pode ser
vertical ou rotatório. Pode ser desencadeado por lesões do labirinto, nervo vestibular,
cerebelo e tronco encefálico.
As alterações do equilíbrio devidas à lesão do labirinto ou nervo vestibular
(síndrome vestibular periférica) caracterizam-se por: alargamento do polígono de
sustentação, desvio lateral da cabeça e do corpo para o lado da lesão, nistagmo com o
componente lento dirigido para o labirinto lesado, sinal de Romberg com tendência a queda
para o lado lesado e tendência durante a marcha a desvio para o lado da lesão.

3. SENSIBILIDADE DO TRONCO E DOS MEMBROS


O processamento neural da informação sensitiva (percepção) possibilita a
experiência consciente dos objetos e acontecimentos do mundo externo. Somestesia é o
nome usado para designar a sensibilidade geral do corpo.
Para a avaliação da sensibilidade, a participação do paciente é fundamental. Ele
deve estar alerta e ter capacidade intelectual e de concentração suficientes para informar de
modo apropriado. Descreve-se a exploração das diferentes formas de sensibilidade:
3.1. Dor
Pesquisa-se a dor por meio de alfinete ou agulha.
23

Manobra de estiramento da raiz ou sinal de Lasségue: com o paciente em


decúbito dorsal e o membro inferior estendido, faz-se a flexão passiva da coxa sobre a bacia.
Encontra-se positivo nas lombociatalgias.
Rigidez de nuca: resistência à flexão passiva da cabeça e indica síndrome de
irritação meníngea.
Sinal de Kernig: com o paciente em decúbito dorsal, flete-se a coxa sobre a bacia
e a seguir tenta-se estender a perna sobre a coxa. No caso de síndrome meníngea, ocorre
resistência a este movimento.
3.2. Temperatura
Utilizam-se dois tubos de ensaio, um com água gelada e outro com água quente.
3.3. Tato
É pesquisado com mecha de algodão ou pincel apropriado.
3.4. Sensibilidade cinético-postural
É pesquisada colocando-se passivamente o segmento do membro em
determinada posição e solicitando-se ao paciente que reconheça esta posição sem o auxílio
da visão. A noção dos movimentos passivos é pesquisada deslocando-se uma articulação
em diferentes direções e, finalmente, detendo-se numa posição qualquer, a qual o paciente
deve identificar.
3.5. Sensibilidade vibratória
Usa-se o diapasão em vibração aplicado em diversas saliências ósseas.
3.6. Estereognosia
O paciente, com os olhos fechados, deve identificar objetos conhecidos (chave,
moeda etc.) colocados em sua mão.
3.7. Grafestesia
O paciente, com os olhos fechados, deve reconhecer letras ou números escritos
em sua pele com objeto de ponta romba.
Anátomo-fisiologia
As alterações da sensibilidade manifestam-se por: a) dor: é definida como a
sensação desagradável, associada a emoção e causada por disfunção ou lesão do
organismo; b) parestesias: são sensações desagradáveis descritas como dormência,
24

formigamento, entorpecimento, picada e queimor; c) alterações sensitivas objetivas:


diminuição (hipoestesia) ou abolição (anestesia) dos diferentes tipos de sensibilidade.
A via da sensibilidade inicia-se junto aos receptores (mecanoceptores,
termoceptores e nociceptores) e apresenta dois segmentos, um periférico (troncos nervosos
periféricos e raízes posteriores) e outro central, composto de dois sistemas, o lemniscal
(sensibilidade discriminativa e proprioceptiva consciente) e o extralemniscal (dor e
temperatura). As fibras espessas das raízes posteriores, destinadas a formar o sistema
lemniscal, penetram no corno posterior da medula, sobem do mesmo lado, formando os
fascículos grácil e cuneiforme, e terminam fazendo sinapse, nos núcleos grácil e cuneiforme,
com o segundo neurônio. No bulbo, o segundo neurônio da via lemniscal cruza a linha
mediana para formar, já no hemitronco cerebral oposto, em posição mediana, o lemnisco
medial. Este segundo neurônio termina no núcleo ventro-lateral posterior do tálamo, onde faz
sinapse com o terceiro neurônio, que vai projetar-se no giro pós-central (área somestésica
primária).
O segmento periférico da sensibilidade é múltiplo e amplamente disseminado
(nervos e raízes posteriores), sendo que cada nervo e cada raiz conduzem todos os tipos de
sensibilidade oriundos de seu território de inervação. O déficit sensitivo periférico será
parcial, do ponto de vista topográfico (limitado ao território sensitivo do nervo ou raiz lesados)
e completo, do ponto de vista qualitativo (comprometimento de todos os tipos de
sensibilidade). A lesão junto a um tronco nervoso resulta em déficit motor e sensitivo
(hipoestesia e anestesia) na região cutânea correspondente ao nervo acometido. Os
processos periféricos geralmente acometem mais a sensibilidade exteroceptiva (térmica,
dolorosa e tátil), podendo estar preservadas as formas proprioceptivas (cinética, postural,
palestésica). As lesões irritativas (por exemplo, compressão por hérnia discal) da raiz dorsal
manifestam-se por dor (radiculalgia) de distribuição sistematizada, ocupando o dermátomo
correspondente à raiz atingida.
O segmento central reagrupa a sensibilidade em duas vias, a lemniscal (tato
epicrítico e propriocepção consciente) e extralemniscal ou espino-talâmico (tato protopático,
temperatura e dor). O déficit sensitivo do tipo central será, portanto, dissociado no plano
qualitativo (interessando o sistema lemniscal ou extralemniscal) e global no plano
25

topográfico, interessando toda a parte do corpo situada abaixo da lesão da via (déficit
sensitivo sublesional).
O déficit sensitivo tipo medular pode comprometer todos os tipos de sensibilidade,
como no caso das lesões medulares completas, ou pode apresentar-se dissociado. O déficit
sensitivo cordonal posterior é do tipo lemniscal (sensibilidade discriminativa: tato epicrítico,
cinético-postural, vibratória), homolateral e sublesional global. Na lesão do funículo posterior,
além dos distúrbios sensitivos, ocorre também alteração da motricidade, caracterizada por
ataxia sensitiva. O sinal de Romberg encontra-se presente. Na ataxia sensitiva os distúrbios
motores acentuam-se quando o paciente fecha os olhos, pois o controle visual permite
corrigir parcialmente os distúrbios motores. O déficit sensitivo cordonal lateral é do tipo
extralemniscal espino-talâmico (temperatura e dor), cruzado e sublesional global .
O déficit sensitivo do tronco encefálico é dissociado, sublesional, global e cruzado.
O déficit sensitivo medial ou lemniscal faz parte das síndromes alternas mediais, que são
caracterizadas por: hemiplegia cruzada, déficit sensitivo cruzado tipo lemniscal e paralisia de
um ou mais nervos cranianos.
O déficit sensitivo tipo talâmico é completo e cruzado, comprometendo
principalmente a sensibilidade lemniscal, mas também a extralemniscal. As lesões
localizadas no segmento posterior da cápsula interna comprometem as projeções tálamo-
corticais, determinando hemianestesia associada a hemiplegia. O déficit sensitivo do tipo
cortical parietal (giro pós-central) é cruzado e dissociado, comprometendo principalmente a
sensibilidade lemniscal discriminativa. Pode acompanhar-se de asterognosia ou agnosia tátil
e agrafestesia (incapacidade de conhecer letras ou números escritos na pele).

4. FUNÇÕES DA EXTREMIDADE CEFÁLICA (NERVOS CRANIANOS)


Os nervos cranianos constituem apenas a parte periférica das vias funcionais
(motoras, sensitivas e sensoriais) da extremidade cefálica.
As funções motoras da extremidade cefálica são: oculomotricidade, mastigação,
mímica, deglutição, fonação, cefalogiria e motricidade lingual. As funções sensitivas
compreendem a sensibilidade exteroceptiva da face e das mucosas palatina e faringeana. A
sensibilidade proprioceptiva da extremidade cefálica, representada pelo sistema vestibular,
26

que dá a noção de posição da cabeça no espaço, já foi estudada juntamente com a função
do equilíbrio. As funções sensoriais são representadas pela olfação, visão, audição e
gustação.
4.1. Oculomotricidade
Motricidade extrínseca dos olhos
Compreende o exame do movimento de cada globo ocular nas várias direções e
da elevação da pálpebra superior.
Motricidade extrínseca conjugada dos olhos
Exame do movimento conjugado dos olhos nas várias direções.
Motricidade intrínseca ou pupilar
diâmetro pupilar;
reflexo fotomotor;
reflexo de acomodação-convergência.
Anátomo-fisiologia
Os músculos extrínsecos oculares são inervados pelos nervos
oculomotor: reto medial (adução do globo), reto superior e oblíquo inferior
(elevação do globo), reto inferior (abaixamento do globo) e elevador da pálpebra
superior; troclear: oblíquo superior (abaixamento com adução e rotação interna do
globo); e abducente: reto lateral (abdução do globo).
A paralisia do nervo oculomotor manifesta-se por: ptose palpebral e desvio do
globo ocular para fora, por causa do predomínio do músculo reto lateral (estrabismo
divergente); o paciente não consegue elevar o globo ocular ou a pálpebra e nem desviar o
olho para dentro. Pelo acometimento das fibras parassimpáticas, a pupila encontra-se
dilatada (midríase paralítica) e o reflexo fotomotor abolido. A paralisia do nervo abducente
determina paralisia do músculo reto lateral do mesmo lado. O olho apresenta-se desviado
para dentro (estrabismo convergente) e o paciente não consegue desviar o globo ocular
comprometido para fora. A paralisia do nervo troclear determina paralisia do músculo
oblíquo superior; o olho acometido fica desviado para cima e para dentro.
O movimento voluntário dos dois olhos na mesma direção (movimento conjugado
do olhar) é comando pela área oculógira frontal (área 8 no giro frontal médio). Sua lesão
causa desvio do olhar para o hemisfério lesado (o doente olha sua lesão).
27

O reflexo fotomotor depende do sistema de motricidade intrínseca dos olhos


(sistema pupilar), determinado pelas fibras musculares lisas da íris. As fibras circulares
(esfíncter da íris), que contraem a pupila, são inervadas pelo parassimpático craniano, cujas
fibras correm junto ao nervo oculomotor (III). As fibras radiadas, com função dilatadora,
dependem do simpático cervical. O arco reflexo do reflexo fotomotor origina-se nas fibras
retinianas que conduzem os impulsos luminosos até a região pré-tectal do mesencéfalo. Daí
partem fibras que terminam no núcleo visceral do nervo oculomotor, homolateral e
contralateral. Destes núcleos (núcleos de Edinger-Westphal) partem fibras eferentes
parassimpáticas pré-ganglionares, associadas aos nervos oculomotores, que vão fazer
sinapse, nos gânglios ciliares, com fibras pós-ganglionares. Estas inervam as fibras
musculares circulares da íris, determinando a constrição das pupilas.
A motricidade intrínseca pode ser alterada por lesão nos seguintes locais: nervo
oculomotor, determinando midríase unilateral com abolição do reflexo fotomotor direto e
conservação do consensual; nervo óptico, caracterizando-se por midríase, com abolição do
reflexo fotomotor direto e conservação do reflexo fotomotor consensual (por iluminação da
pupila oposta); via simpática, determinando miose unilateral.
4.2. Mastigação
Exame dos movimentos da mandíbula.
Reflexo mandibular ou massetérico: percussão do mento, com
interposição do dedo do examinador, estando o paciente com a boca entreaberta.
A resposta consiste na elevação da mandíbula.
Anátomo-fisiologia
Os músculos da mastigação são inervados pela raiz motora do nervo trigêmeo e
sua lesão determina paralisia dos músculos da mastigação homolateral. Tanto a via aferente
como a eferente do reflexo mandibular estão localizadas no nervo trigêmeo. A percussão do
mento estira os músculos mastigadores, ativando os fusos musculares. Os impulsos
aferentes seguem pelo nervo mandibular e pela raiz mandibular do trigêmeo, até o núcleo
mesencefálico do trigêmeo. Os axônios dos neurônios deste núcleo fazem sinapse com os
neurônios do núcleo motor do trigêmeo, cujos axônios seguem também pela raiz mandibular
do trigêmeo. A atividade destes neurônios determina a contração dos músculos
mastigadores.
28

4.3. Mímica
No exame da mímica facial avalia-se:
Simetria facial em repouso
Contração dos músculos faciais - frontal: enrugar a fronte; orbicular das
pálpebras: fechar os olhos; orbicular dos lábios: fechar os lábios e assoviar; bucinador: retrair
os cantos da boca, como no riso; platisma: contrair os cantos da boca e a musculatura
cervical superficial.
Reflexo do orbicular das pálpebras: a percussão da região fronto-temporal,
especialmente na glabela (reflexo glabelar), na raiz do nariz (reflexo naso-palpebral) e na
região supra-orbitária (reflexo de Mac Carthy) determina a oclusão palpebral bilateral.
Reflexo do piscamento: quando se faz rápido movimento como se fosse tocar o
olho do paciente com a mão, ocorre oclusão palpebral.
Reflexo do orbicular dos lábios ou oro-orbicular: a percussão do lábio superior
determina a contração da musculatura perioral com a protrusão dos lábios.
Anátomo-fisiologia
A mímica é produzida pelos músculos cutâneos da face, inervada pelo nervo
facial. A lesão deste nervo traduz-se pela paralisia de todos os músculos da face (paralisia
facial periférica), ao passo que lesão apenas córtico-nuclear determina paralisia somente dos
dois terços inferiores da face (paralisia facial central). A conservação da motricidade do terço
superior da face resulta do fato de serem poupadas as fibras homolaterais (que vão para o
subnúcleo facial superior).
4.4. Motricidade lingual
O exame consiste, inicialmente, em inspeção estática (desvios, atrofias, fibrilações
ou fasciculações), seguida de exteriorização da língua e execução dos diversos movimentos.
Anátomo-fisiologia
O músculo genioglosso, inervado pelo hipoglosso (XII), age impulsionando a
língua para a frente e desviando-a para o lado oposto. Na lesão do nervo hipoglosso,
observa-se, em repouso, hemiatrofia da língua, com desvio para o lado normal, pela
prevalência dos músculos opostos não paralisados. Na protrusão da língua, ocorre desvio
para o lado paralisado, pela contração do genioglosso contralateral não paralisado.
4.5 Deglutição
29

Exame do palato em repouso e da parede posterior da faringe durante a emissão


do som “a”. Observa-se se há paresia unilateral do palato e do constritor superior da faringe.
No caso de paresia do palato, a úvula se desvia para o lado não acometido e, quando ocorre
paresia do constritor superior da faringe, a parede posterior da faringe desvia-se para o lado
não acometido (sinal da cortina de Vernet). A paralisia do palato pode determinar rinolalia
posterior e refluxo nasal ao deglutir. A paralisia da musculatura faríngea determina disfagia.
Deglutição de sólidos e líquidos.
Pesquisa do reflexo do vômito (faríngeo).Toca-se a mucosa da base da língua e
da faringe com uma espátula. A resposta consiste na elevação da musculatura da faringe e a
retração da língua, que pode ser acompanhada de sensação de náusea.
Anátomo-fisiologia
A deglutição representa a função motora da faringe e do palato, cujos músculos
são inervados pelos nervos glossofaríngeo (IX) e vago (X). As lesões dos nervos IX e X
traduzem-se por: disfagia, palato rebaixado do lado paralisado, à inspeção estática, desvio
da parede posterior da faringe para o lado não acometido, como cortina que se fecha,
quando o doente pronuncia a vogal “a” (sinal da cortina de Vernet) e abolição do reflexo do
vômito.
4.6. Fonação
É examinada por meio da observação das características da voz. A lesão do XI
bulbar manifesta-se por disfonia e paralisia das cordas vocais observada à laringoscopia.
Anátomo-fisiologia
A fonação é produzida pelos músculos da laringe e, em particular, pelos músculos
das cordas vocais, inervados pelo nervo acessório do vago ou XI bulbar. Sua lesão
determina paralisia dos músculos das hemilaringe, que manifesta-se por rouquidão,
diminuição da intensidade da voz e dificuldade para tossir.
4.7. Cefalogiria (rotação da cabeça)
Testa-se a elevação do ombro (trapézio) e a rotação da cabeça
(esternocleidomastóideo).
Anátomo-fisiologia
A cefalogiria é produzida pelos músculos esternocleidomastóideo e trapézio,
inervados pelo XI medular ou espinhal. O esternocleidomastóideo flete a cabeça, inclinando-
30

a lateralmente para o mesmo lado, ao mesmo tempo que gira a face para o lado oposto. Na
lesão do nervo espinhal, observa-se déficit na elevação do ombro (trapézio) e na rotação da
cabeça para o lado oposto à lesão (esternocleidomastóideo); a face fica desviada para o lado
paralisado.
4.8. Sensibilidade exteroceptiva
Exploram-se:
Tato
Dor
Temperatura
Reflexo corneano: piscamento quando se toca a borda da córnea com mecha de
algodão.
Anátomo-fisiologia
A sensibilidade da face e fronte provém do nervo trigêmeo, cujos neurônios estão
localizados no gânglio de Gasser. Os prolongamentos centrais destes neurônios chegam ao
tronco encefálico pela face lateral da ponte no ângulo ponto-cerebelar. Os prolongamentos
periféricos distribuem-se pelos três ramos terminais: oftálmico, maxilar e mandibular. Os
núcleos sensitivos do trigêmeo emitem fibras que vão incorporar-se ao lemnisco medial e ao
feixe espinotalâmico dorsal.
A lesão do nervo trigêmeo determina déficit sensitivo limitado ao território sensitivo
da raiz acometida. A estimulação da córnea é transmitida pelo nervo trigêmeo até o núcleo
do mesmo. Fibras cruzadas e não cruzadas originadas neste núcleo conduzem os impulsos
aos núcleos do facial, dos dois lados, de tal modo que a resposta motora se faz pelos dois
olhos (reflexo corneano).
4.9. Gustação
Explora-se colocando sobre a língua algodões embebidos em substância com
cada um dos quatro sabores clássicos: amargo, azedo, doce e salgado.
Anátomo-fisiologia
O segmento periférico da via gustativa é constituído pelo facial (dois terços
anteriores da língua), glossofaríngeo (terço posterior da língua) e vago (faringe), cujas fibras
vão terminar no núcleo do trato solitário. A ageusia unilateral pode ser produzida por lesão do
facial ou do nervo da corda do tímpano.
31

4.10. Olfação
Estando o paciente com as pálpebras cerradas, ele deve aspirar, em cada narina
em separado, substâncias aromáticas como pó de café e tabaco. O paciente deverá
identificar os odores das substâncias apresentadas.
Anátomo-fisiologia
No epitélio da mucosa olfatória encontram-se as células olfatórias, que dão origem
aos axônios do nervo olfatório. Suas fibras atravessam a lâmina crivosa do osso etmóide,
fazendo sinapse com as células mitrais do bulbo olfatório, localizado sob o lobo frontal. O
bulbo olfatório comunica-se posteriormente com o trato olfatório que, em sua extremidade
posterior, divide-se em estria olfatória medial e lateral. As fibras destinadas ao córtex olfatório
seguem pela estria olfatória lateral, terminando na parte anterior do uncus e do giro para-
hipocampal.
Lesões da via olfatória (nervo, bulbo e trato olfatório) determinam a diminuição ou
a perda do olfato homolateral (hiposmia e anosmia).
4.11. Audição
Os testes auditivos usuais são:
Teste da voz falada e sussurrada. Permite avaliar a condução aérea e a acuidade
auditiva. O examinador coloca-se ao lado do paciente e sussurra palavras que o mesmo
deverá repetir. O paciente deverá ocluir com o dedo o canal auditivo externo do ouvido
oposto.
Teste do roçar dos dedos. Após o paciente ocluir o ouvido contralateral ao testado,
o examinador executa o roçar dos dedos polegar e indicador em frente ao ouvido testado.
Este teste permite também a avaliação da condução aérea e da acuidade auditiva.
Teste do “tic-tac” do relógio. Permite a avaliação da condução aérea em altas
freqüências. Alguns pacientes portadores de perdas auditivas de alta freqüência, percebem o
déficit quando não conseguem ouvir seus relógios. O relógio é aproximado lentamente do
ouvido testado e determina-se a distância a partir da qual o paciente começa a ouvir o “tic-
tac” do relógio.
Teste do diapasão. É utilizado para testar tanto a condução aérea quanto a óssea.
É usado um diapasão com freqüência igual ou superior a 256 Hz. Com o diapasão realiza-se
os testes de Rinne, Weber e Schwabach. No teste de Rinne, o diapasão é aplicado à apófise
32

mastóide (condução óssea) e, quando o som deixa de ser percebido, o diapasão é colocado
próximo ao conduto auditivo externo (audição aérea). A resposta normal é ouvir o diapasão
adjacente ao pavilhão auditivo (condução aérea) após o mesmo não ser mais audível sobre a
mastóide. A duração da percepção é duas ou três vezes maior para a condução aérea em
relação a condução óssea. No teste de Weber, coloca-se o diapasão vibrando no vértice do
crânio. Normalmente a vibração é percebida com a mesma intensidade dos dois lados, sem
lateralização. No teste de Schwabach, coloca-se o diapasão em vibração em sua própria
mastóide e, a seguir, na do paciente.
Anátomo-fisiologia
Na cóclea encontra-se o órgão de Corti, estrutura de células auditivas receptoras.
Os corpos celulares dos neurônios aferentes que fazem sinapse com as células receptoras
estão localizados no gânglio espiral. Seus axônios formam o nervo coclear, que passa pelo
conduto auditivo interno, chega ao ângulo pontocerebelar, e termina nos núcleos cocleares.
Fibras cócleo-coliculares homo- e contralaterais ascendem pelo lemnisco lateral e fazem
sinapse com fibras colículo-geniculadas. Os neurônios genículo-corticais projetam-se nas
áreas 41 e 42 do giro temporal superior.
A lesão do nervo coclear determina a surdez de percepção. Nas lesões do
aparelho de transmissão (hipoacusia de condução), a prova de Weber está lateralizada para
o lado do ouvido atingido, porque o efeito mascarador do ruído ambiente está ausente no
lado enfermo; nas lesões das vias auditivas (hipoacusia de percepção), a lateralização é para
o lado do ouvido não lesado. Na prova de Rinne, a duração da percepção óssea e aérea
guardam razão de 1 para 2. Na hipoacusia de condução, a duração da percepção óssea está
normal e a aérea diminuída ou inexistente, ocorrendo alteração da proporção acima
mencionada. Na hipoacusia de percepção, a audição por via aérea é melhor que por via
óssea, porém, ambas estão diminuídas ( prova de Rinne positiva encurtada); a razão se
mantém, mas os tempos se acham diminuídos nas duas fases da prova.
4.12. Visão
A avaliação da função visual consiste no exame da acuidade visual, dos campos
visuais e do fundo do olho.
Acuidade visual: é testada em escalas com caracteres de dimensão variável. Para
cada olho, verifica-se a acuidade visual para longe, que será expressa em fração, ao lado
33

das diversas seqüências de caracteres. Estas escalas dão a acuidade visual desde um ou
20/20 (normal) até 1/10 ou 20/200. O paciente deve ser colocado a seis metros da escala,
para que não ocorra acomodação.
Campos visuais: o campo visual de cada olho é testado separadamente, pelo
método da confrontação, onde o examinador e o paciente se colocam um em frente ao outro,
fixando os respectivos olhos (olho esquerdo do examinador no olho direito do paciente e
vice-versa). O campo visual do examinador é, então, confrontado com o do paciente,
usando-se os dedos do examinador em movimentos nas extremidades do campo visual.
Exame oftalmoscópico: é o exame do fundo do olho, por meio de aparelho, para
observarem-se cor, forma, depressão fisiológica da papila, bordas do disco papilar, vasos e
pulso venoso, mácula e retina. Ao exame oftalmoscópico a papila óptica apresenta-se como
mancha rosa pálida, de forma arredondada, com a metade temporal ligeiramente mais pálida
que a metade nasal. Apresenta bordas nítidas, especialmente do lado temporal, e de seu
centro emergem os vasos retinianos. A papila é vista ligeiramente elevada, com a depressão
em seu centro. A artéria central da retina emerge do centro da papila óptica e divide-se em
arteríolas. As artérias são finas, de calibre menor que as veias, e apresentam trajeto
aproximadamente retilíneo. Têm aspecto brilhante. As veias são mais espessas, de trajeto
mais tortuoso e de intensa cor avermelhada. Lateralmente à papila, observa-se a mácula
lútea, pequena mancha de cor ligeiramente escura e desprovida de grandes vasos. A retina é
de cor vermelha e percorrida pelas artérias e veias.
Anátomo-fisiologia
A via óptica é formada pela retina, nervo óptico, quiasma óptico, trato óptico, corpo
geniculado lateral, trato genículo-calcarino (radiação óptica) e córtex visual.
A lesão do nervo óptico provoca cegueira do olho correspondente. A lesão da
parte mediana do quiasma óptico resulta em hemianopsia bitemporal, como conseqüência da
interrupção das fibras provenientes das retinas nasais, que se cruzam aí. A lesão
retroquiasmática unilateral (trato óptico, radiação óptica e córtex occipital) provoca
interrupção das fibras da retina temporal de um olho e nasal do outro olho, resultando em
hemianopsia homônima, com perda do campo visual contralateral à lesão.
A atrofia óptica resulta da degeneração das fibras visuais pré-geniculadas. O
nervo óptico é envolvido pelas meninges e banhado pelo líquor, o que explica o fato de as
34

alterações liquóricas (hemorragia, infecção, hipertensão intracraniana) refletirem-se no


próprio nervo. Assim, na hipertensão intracraniana, o líquor hipertenso comprime a veia
central da retina, dificultando o retorno venoso e determinando a estase papilar.

5. FUNÇÕES SUPERIORES
As funções superiores, integradas no córtex cerebral, representam o conjunto das
atividades ligadas aos vários processos mentais: linguagem, memória, praxia, gnosia.
5.1. Linguagem
A linguagem é a capacidade de exprimir e comunicar o pensamento por meio de
sinais vocais, que eventualmente podem ser transcritos. Assim, a linguagem refere-se à
etapa psíquica da elaboração do pensamento, enquanto a fala é processo puramente
mecânico, constituindo um dos veículos de expressão ideativa. Examinam-se as duas
vertentes da linguagem oral, a expressão e a compreensão:
Expressão
Linguagem espontânea: nome, profissão, história da doença
Repetição de palavras e frases
Denominação de objetos e imagens
Descrição de determinada imagem complexa
Compreensão
Designação de objetos e imagens
Execução de ordens simples: abrir os olhos, fechar a boca etc.
Execução de ordens complexas.
Anátomo-fisiologia
Quando a palavra é ouvida, o som é percebido no córtex auditivo primário (giro
temporal transverso de Herschl) e transmitido à área de Wernicke (porção posterior da
primeira circunvolução temporal do hemisfério dominante). Aí a informação auditiva é
processada, interpretada e transferida, através do fascículo arqueado, para a área de Broca
(parte opercular da terceira circunvolução frontal do hemisfério dominante), onde evoca
coordenado programa de vocalização. Este programa é transmitido para o córtex motor que,
através do feixe córtico-nuclear e nervos cranianos, estimula os músculos da fonação.
35

A afasia é o distúrbio adquirido da expressão e da compreensão dos símbolos


verbais (orais e gráficos) com conseqüente incapacidade para utilizar os códigos da
linguagem. A afasia de Broca (motora ou expressiva) é a afasia não-fluente. Caracteriza-se
por inibição e redução da expressão oral, associada a alteração da articulação das palavras.
A lesão, na afasia de Broca, localiza-se geralmente na porção posterior do giro frontal inferior
do hemisfério dominante (área de Broca).
A afasia de Wernicke (sensorial ou receptiva) é classicamente oposta à afasia de
Broca e caracteriza-se pela presença de alterações da compreensão da fala conseqüente à
decodificação incorreta dos fonemas, o que impossibilita o entendimento dos vocábulos. A
lesão, na afasia de Wernicke, localiza-se geralmente na porção posterior da primeira
circunvolução temporal do hemisfério dominante (áreas 21 e 22 de Brodmann).
5.2. Memória
A memória é a capacidade de armazenar informações com a possibilidade de
serem novamente expressas pela linguagem. Permite registrar e conservar os dados
apreendidos e evocá-los a qualquer momento.
A memória imediata é avaliada solicitando-se ao paciente que repita cinco a seis
palavras ou sete a oito números - ou então uma frase com 10 a 12 palavras. A memória a
médio prazo é verificada em testes, cuja finalidade é oferecer ao indivíduo novas
informações (estórias curtas, figuras geométricas, etc.) e, após decorrido curto tempo (mais
de três minutos), conferir as informações retidas. A memória a longo prazo (remota) é
pesquisada por meio da evocação de fatos pessoais e sociais. Tem por objetivo avaliar as
informações armazenadas mais remotamente e que fazem parte do estoque mnésico desde
a infância.
Anátomo-fisiologia
A atividade mnésica ocorre em quatro estádios: a) aprendizagem, que consiste no
registro da informação por meio dos sentidos e depende da atenção; b) memória imediata
em que o traço do evento sensorial recente é guardado; c) conservação (armazenagem ou
consolidação), responsável pela memória a médio e longo prazos; d) evocação ou
recordação, que consiste na recuperação da informação estocada.
Ainda não está esclarecido o mecanismo da memória, ou seja, a formação do
engrama (o correspondente físico da memória). Sugere-se que a fase de memorização
36

(registro) seja eletrofisiológica, enquanto a fase de consolidação seria bioquímica,


dependendo de alguma mudança funcional ou mesmo morfológica nas sinapses. A
memorização (formação de engramas) ocorreria principalmente no sistema hipocampo-
mamilar e posteriormente os engramas seriam transferidos para o neocórtex. As alterações
da memória podem ser classificadas em três grupos: a) amnésia anterógrada, caracterizada
pela impossibilidade de nova aprendizagem; b) amnésia retrógrada, caracteriza-se pela
dificuldade de evocar eventos ocorridos anteriormente à doença; c) amnésia global,
caracteriza-se pela impossibilidade de adquirir novas memórias e pelo apagamento parcial
ou total dos eventos antigos já consolidados. Nos processos orgânicos neurológicos, o
esquecimento ocorre dos fatos mais recentes para os mais antigos e a recuperação dá-se no
sentido inverso (lei de Ribot).
5.3. Praxia
Praxia é a faculdade de executar gestos voluntários sob comando, estando
ausentes alterações da motricidade e da coordenação.
Exploram-se os seguintes tipos de praxia:
Praxia Ideatória: Execução de atos que têm relação com o próprio corpo. Solicita-
se ao paciente que use o pente, a escova de dente, o anel e o relógio de pulso. A seguir
solicita-se que simule o uso destes objetos. Realização de atos complexos com objetos: usar
uma chave , colocar água no copo etc.
Praxia Ideomotora: Solicita-se ao paciente executar gestos de significação
simbólica tradicional: sinal da cruz, chamar alguém com a mão, gesto de despedida,
saudação militar, fazer positivo e negativo com o polegar etc. As ordens devem ser
adaptadas às condições socioculturais do paciente.
Praxia Construtiva: Solicita-se ao paciente para desenhar uma casa, uma árvore,
uma circunferência, um quadrado. A seguir oferecem-se ao paciente modelos de formas
geométricas simples para serem copiadas.
Praxia de Vestimenta: Solicita-se ao paciente que vista um casaco, coloque um
anel, dê o nó na gravata ou nos cordões dos sapatos.
Anátomo-fisiologia
37

As funções práxicas são integradas no córtex associativo parietal, onde ocorre a


elaboração motora dos gestos adquiridos pela aprendizagem. A impossibilidade de executar
determinados atos de forma correta é denominada apraxia.
A apraxia ideatória é caracterizada pelo distúrbio da representação mental do ato
a ser cumprido e manifesta-se pela utilização defeituosa dos objetos. É conseqüente à lesão
do lobo parietal do hemisfério dominante.
A apraxia ideomotora manifesta-se pela perturbação da representação simbólica
de uma ação ou atividade gestual de valor simbólico convencional. A lesão do lobo parietal
esquerdo determina a perturbação bilateral na execução dos gestos (apraxia).
A apraxia construtiva aparece nas atividades complexas que necessitam de
percepção e de representação das relações espaciais existentes entre diversos objetos ou
diversas partes do objeto. Caracteriza-se pela impossibilidade de o paciente executar um
desenho ou reproduzir uma figura geométrica. É determinada por lesões parieto-occipitais,
mais freqüentemente à direita.
A apraxia de vestimenta caracteriza-se pela desorganização dos gestos do ato
de vestir-se. É determinada por lesão do lobo parietal do hemisfério não-dominante.
5.4. Gnosia
Gnosia é a faculdade de identificar o mundo exterior por intermédio dos órgãos
sensoriais. Exploram-se os seguintes tipos de gnosia:
Estereognosia ou gnosia tátil: reconhecimento de objetos comuns pelo tato da
mão.

Gnosia visual: reconhecimento de imagens e objetos pela visão.


Gnosia auditiva: reconhecimento de sons familiares.
Somatognosia: reconhecimento das diferentes partes do corpo.
Pesquisa-se, em especial, a gnosia digital ou faculdade de reconhecer os dedos
da própria mão.
Anátomo-fisiologia
O reconhecimento de objetos ou gnosia é ato psíquico complexo, realizado por
síntese cerebral, que reúne as impressões sensoriais, vindas do mundo exterior, e as
recordações (engramas) armazenadas. Para que ocorra a percepção e o objeto seja
38

identificado, é necessário que as sensações elementares que chegam ao córtex cerebral


sejam selecionadas e analisadas e, posteriormente, integradas em padrões já conhecidos,
que são o resultado de experiências sensitivo-sensoriais anteriores. A agnosia é a
incapacidade de identificar objetos ou sons por intermédio dos órgãos dos sentidos.
A astereognosia ou agnosia tátil é definida como a incapacidade de reconhecer
os objetos pelo tato. É determinada por lesões do córtex parietal contralateral.
A autotopoagnosia caracteriza-se pela incapacidade do paciente em nomear e
localizar partes de seu corpo ou do corpo do examinador. Forma particular de
autotopoagnosia é a agnosia digital, que é a incapacidade para distinguir e nomear seus
próprios dedos ou aqueles do examinador. É determinada por lesão parietal posterior do
hemisfério dominante.
Na agnosia auditiva ou surdez verbal, intimamente relacionada à afasia
sensorial, ocorre a dificuldade ou impossibilidade de compreensão da palavra e agnosia dos
sons. Resulta de lesão das áreas secundárias do córtex auditivo do lobo temporal do
hemisfério dominante.
A agnosia visual caracteriza-se pela incapacidade de reconhecerr objetos,
pessoas, cores e símbolos gráficos, sob o controle visual e na ausência de déficit significativo
da visão. Decorre de lesão das áreas corticais de associação do lobo occipital.

6. ROTEIRO PARA O EXAME NEUROLÓGICO

IDENTIFICAÇÃO, ANAMNESE

FUNÇÕES SUPERIORES (ESTADO MENTAL)


Consciência: resposta verbal e motora ao comando e à estimulação dolorosa
Orientação: dados pessoais, tempo, espaço
Atenção: repetir palavras e números
Memória: recente e remota
Humor: observar fisionomia, atitude e reações emocionais
Linguagem: compreensão e expressão.
39

Praxia: execução de gestos e atos motores.


Gnosia: reconhecimento de objetos, partes do corpo e sons.

TRONCO E MEMBROS
1- Força muscular
Marcha
Força muscular segmentar
Manobras deficitárias:
Braços estendidos
Mingazzini
Barré
Manter-se sobre a ponta do pé
Manter-se sobre o calcanhar

2- Movimentos involuntários anormais

3- Coordenação
Prova índex-nariz
Prova dos movimentos alternados de pronação e supinação da mão
Prova da oposição do polegar com os demais dedos
Prova do rechaço (Stewart-Holmes)
Prova da marcha

4- Equilíbrio
Marcha
Sinal de Romberg
Prova dos braços estendidos

5- Tono
Inspeção
Palpação
40

Movimentação passiva

6- Reflexos musculares
Bicipital (C5-6; n. musculocutâneo)
Tricipital (C7; n. radial)
Braquiorradial (C5-6; n. radial)
Flexores dos dedos (C8-T1; n. mediano e ulnar)
Quadríceps ou patelar (L2-4; n. femoral)
Tríceps sural ou aquileu (S1; n. ciático e tibial)

7- Reflexos cutâneos
Cutâneo-abdominal (T6-12)
Cutâneo-plantar (S1; n. ciático e tibial)
Anal (S3-5)
Cremastérico (L1-2)

8- Sensibilidade
Superficial: tato, temperatura, dor
Profunda: cinético-postural, vibratória
De integração cortical: estereognosia, grafestesia

9- Sinais de irritação meníngea


Rigidez de nuca
Sinal de Brudzinski
Sinal de Kernig

10- Manobra de estiramento das raízes lombossacras


Sinal de Lassegue

EXTREMIDADE CEFALICA (NERVOS CRANIANOS)


41

1- Motricidade
Globo ocular
extrínseca (III, IV, VI):movimentos sob comandos; nistagmo
intrínseca:diâmetro pupilar (III parassimpático, simpático cervical)
Mímica
contração dos músculos da face e fronte e oclusão palpebral (VII)
abertura palpebral (III)
Mastigação: movimentos da mandíbula (V)
Língua (XII)
Deglutição (IX-X)
véu do palato e parede posterior da faringe
deglutição de sólidos e líquidos
Fonação (X): timbre da voz
Rotação da cabeça e elevação dos ombros(XI)

2- Reflexos
Fotomotor direto e consensual (II-III parassimpático)
Orbicular das pálpebras : glabelar e supraorbitário (V-VII)
Corneano ou córneo-palpebral (V-VII)
Orbicular dos lábios ou focinho (V-VII)
Palmo-mentoniano
Massetérico ou mandibular (V)
Faríngeo ou do vômito (IX-X)

3- Sensibilidade
Face, fronte e córnea (V)
Concha do pavilhão auricular (VII)

4- Funções sensoriais
Olfação (I)
Gustação (VII)
42

Audição (VIII)
Teste da voz falada
Teste do roçar dos dedos
Teste do “tic tac” do relógio
Teste do diapasão: Weber, Rinne
Visão (II)
Acuidade visual
Campos visuais
Fundo do olho

DIAGNOSTICO
Funcional
Topográfico
Etiológico
43

CAPÍTULO 2

SÍNDROMES NEUROLÓGICAS
44

O diagnóstico neurológico consiste das seguintes etapas:


- Coleta de dados: sintomas e sinais obtidos respectivamente pela história e
exame físico.
- Diagnóstico sindrômico: os sinais e sintomas que têm uma mesma origem
anatômica ou funcional são agrupados em síndromes.
- Diagnóstico anatômico ou topográfico: identificação da área do sistema
nervoso lesada que responde pelas alterações funcionais.
- Diagnóstico etiológico: a partir do diagnóstico anatômico e outros dados
clínicos, especialmente o modo de início, curso e evolução da doença, o envolvimento de
sistemas e órgãos, a história patológica pregressa e familiar e os achados laboratoriais,
deduz-se o diagnóstico etiológico.
Os sinais e sintomas representam signos de alterações anatomo-funcionais.
No raciocínio clínico, os sintomas e sinais são analisados e os sistemas funcionais
envolvidos pela doença são identificados. A seguir, procuramos determinar o local
anatômico específico onde uma lesão pode afetar estes sistemas funcionais. Como o
sistema nervoso é formado por unidades anatomo-funcionais com conexões neuronais
ordenadas com topografia definida, é possível um diagnóstico topográfico preciso.
O diagnóstico sindrômico e anatômico é induzido a partir dos sintomas e
sinais que indicam a alteração de função ou de estrutura anatômica. O conjunto de
sintomas e sinais com uma mesma origem anatômica ou funcional é denominado
síndrome. Assim, na realidade realizamos os diagnósticos sindrômicos funcional e
anatômico. Para analisar o quadro clínico de um paciente neurológico com vistas ao
diagnóstico da doença que o determina torna-se fundamental o conhecimento das
síndromes do sistema nervoso.

CLASSIFICAÇÃO DAS SÍNDROMES DO SISTEMA NERVOSO


45

Funcionais
Neurônio motor inferior
Neurônio motor superior ou piramidal
Extrapiramidal
Vestibular

Confusão mental
Demência
Anatômicas ou topográficas
Sistema nervoso periférico: raízes, plexos, nervos.
Sistema nervoso central: medula, tronco encefálico, cerebelo, cérebro
Difusas
Hipertensão Intracraniana
Meníngea

SÍNDROME DO NEURÔNIO MOTOR INFERIOR

A lesão do neurônio motor inferior determina quadro de paralisia flácida


caracterizado por:
Paralisia de um ou mais músculos
Hipotonia
Atrofia e fasciculações
Arreflexia

SÍNDROME DO NEURÔNIO MOTOR SUPERIOR (PIRAMIDAL)


A lesão do neurônio motor superior determina paralisia espástica com sinais
de déficit (ou negativos ou diretos), que traduzem um defeito na função motora na fase
aguda da lesão, e sinais de liberação (ou indiretos ou positivos), que derivam do distúrbio
provocado pela lesão piramidal no funcionamento de outros sistemas. A paralisia
(síndrome deficitária) resulta da interrupção das fibras motoras. A hipertonia
(espasticidade) é decorrente da liberação dos tratos vestíbulo-espinhal e retículo-espinhal
anterior pela lesão das vias inibidoras.
46

Seria a seguinte a sistematização fisiopatológica da síndrome piramidal:


a) Sinais de déficit
Déficit motor distal
Perda dos reflexos superficiais :cutâneo-abdominal, plantar, cremastérico
b) Sinais de liberação
Hiperreflexia e espasticidade
Sinal de Babinski (resposta plantar em extensão)

SÍNDROME EXTRAPIRAMIDAL
Os núcleos da base desempenham importante papel no controle da postura e
do movimento. A lesão dos mesmos determinam alterações do tono muscular e
movimentos involuntários de vários tipos. São os seguintes os principais sinais da
síndrome extrapiramidal:
Hipercinesia ou bradicinesia
Hipo ou hipertonia (rigidez)
Distonia (alteração de postura)
Reflexos musculares normais

SÍNDROME VESTIBULAR
O aparelho vestibular ou labirinto tem papel fundamental na orientação espacial
e na programação e percepção dos movimentos a serem realizados, regulando o
equilíbrio do corpo e a posição e a movimentação dos globos oculares. A síndrome
vestibular manifesta-se por:
Vertigem, náusea e vômito
Desvio da cabeça e do corpo
Nistagmo
Sinal de Romberg
Desvio da marcha

SÍNDROME DE CONFUSÃO MENTAL


47

A confusão mental é uma desorganização de toda a atividade psíquica em


relação com uma obnubilação da consciência. Trata-se de uma deterioração da funções
intelectuais de instalação aguda, caracterizada por distúrbios da atenção, da cognição, do
ciclo vigília-sono e do comportamento psicomotor. O termo delirium costuma ser usado
como sinônimo de confusão mental aguda.
A síndrome de confusão mental manifesta-se por:
Distúrbio da atenção
O paciente tem dificuldade de manter a atenção focalizada em determinado
estímulo externo. Desta dificuldade resultam distúrbios de memória e orientação, podendo
culminar com desorientação temporo-espacial.
Distúrbio do pensamento e da percepção
O paciente não consegue manter um fluxo coerente do pensamento. Podem
ocorrer idéias delirantes, ou seja, falsas interpretações ou deformações da realidade.
Distúrbio da percepção
Ocorre deficiência da discriminação perceptual, resultando em ilusões e
alucinações. Ilusão é a falsa identificação de estímulos sensoriais. Alucinação é a
percepção na ausência de estímulos sensoriais adequados.
Distúrbio do comportamento psicomotor

Pode ocorrer hiper ou hipoatividade, com intensa atividade ou apatia.


Geralmente estão presentes distúrbios do ciclo vigília-sono.

SÍNDROME DEMENCIAL
A demência (lat. demens, estar fora da própria mente) traduz-se por
deterioração das funções intelectuais de instalação progressiva e irreversível. O acesso à
representação simbólica e à organização programada do comportamento depende do
neocórtex, especialmente da áreas de associação temporais, parietais e frontais. A
demência manifesta a dissolução deste nível de organização com regressão das
capacidades intelectuais e a consequente perturbação das funções cognitivas por perda
neuronal.
Demência refere-se a síndrome clínica e não a entidade patológica específica.
É determinada por um grupo de doenças cerebrais, cujo aspecto primordial é a perda
48

persistente da capacidade intelectual de intensidade suficiente para interferir com as


funções sociais e a ocupação do indivíduo, com modificações no comportamento e na
personalidade. As lesões cerebrais são difusamente localizadas. A doença de Alzheimer é
a causa mais freqüente de demência.
O diagnóstico baseia-se na semiologia clínica e o quadro demencial
caracterizada por:
Perda da memória recente

É, geralmente, o primeiro problema a surgir e a

chamar a atenção da família. Manifestam-se por dificuldade

de aprendizagem, limitando a aquisição de novas

informações, e dificuldade para evocar informações. As

informações novas são rapidamente perdidas, não sendo

possível estocá-las para posterior evocação.

Diminuição da informação geral

É consequente à dificuldade de aprendizagem para aquisição de novas


informações.
Desorientação têmporo-espacial

É consequente a distúrbios visuoespaciais relacionados a alterações em áreas


parietoocipitais. O paciente se perde facilmente em trajetos habituais.

Alterações de linguagem

Os aspectos fonológicos e sintáticos da linguagem podem ser mantidos até


mais tardiamente no curso da demência, enquanto que os aspectos semânticos se
alteram rapidamente. As alterações de linguagem mais precoces são a anomia
(dificuldade para encontrar palavra) e o circunlóquio (perífrase, rodeio de palavras).
Modificações da personalidade e comportamento.
Manifestam-se por: 1) Acentuação de traços anteriores da personalidade; 2)
Depressão; 3) Distração, acentuada por fadiga; 4) Apatia; 5) Inquietação e agitação
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psicomotora; 6) Crises de explosões emocionais, com irritação, choro, expressão de raiva,


podendo culminar com comportamento agressivo; 7) Moria ou jocosidade inapropriada; 8)
idéias delirantes e alucinações.

SÍNDROMES DOS NERVOS ESPINHAIS


A lesão de um nervo manifesta-se pela associação de déficit motor (lesão do
motoneurônio alfa), déficit sensitivo, dor e parestesias (lesão da fibra sensitiva periférica)
e hipo ou arreflexia muscular (interrupção do arco reflexo).
A seguir expõe-se as síndromes dos principais nervos espinhais.
N. Radial (C5-C8)
Na lesão do nervo radial ocorre comprometimento dos seguintes músculos:
tríceps (extensor do antebraço), extensores do carpo e dos dedos e abdutor longo do
polegar. Os reflexos tricipital (C6-C8) e estilorradial (C5-C6) encontram-se hipoativos ou
abolidos. O déficit sensitivo acomete a face posterior do braço e antebraço, metade lateral
do dorso da mão e face dorsal dos primeiros quatro dedos.
N. Mediano (C5-T1)
A lesão do nervo mediano no braço determina paresia ou paralisia dos
músculos pronador do antebraço, flexor radial do carpo, palmar longo (flexor do punho),
flexor dos dedos, abdutor curto do polegar e oponente do polegar. A atrofia dos
músculos da eminência tenar (abdutor curto e oponente do polegar) faz com que a face
palmar do polegar fique no mesmo plano do resto da palma da mão, caracterizando a
mão achatada ou simiesca. O reflexo flexor dos dedos é abolido e o déficit sensitivo e as
parestesias localizam-se na parte lateral da palma da mão, face palmar dos três primeiros
dedos e metade do quarto dedo.
A lesão no antebraço manifesta-se por paralisia dos músculos tenares e
anestesia da mão no território do mediano. O déficit dominante é a perda da oposição do
polegar. A flexão do polegar, do índex e do médio é possível, por causa da preservação
da inervação do flexor longo do polegar, do flexor profundo comum e do flexor superficial
comum dos dedos.
A compressão do nervo mediano no punho, quando ele passa entre os ossos
do carpo e o ligamento anular anterior do carpo (síndrome do túnel do carpo), determina:
50

1) dor em queimação na mão, ocorrendo com maior intensidade durante a noite; 2) atrofia
da eminência tenar, com paresia do abdutor curto do polegar e oponente do polegar; 3)
déficit sensitivo na parte lateral da palma da mão, na face palmar dos três primeiros dedos
e metade do quarto dedo e na face dorsal das falanges distais destes mesmos dedos; 4)
sensibilidade aumentada das fibras nervosas à compressão mecânica, sendo que a
percussão sobre o nervo, no túnel do carpo, pode determinar sensação parestésica na
distribuição do nervo mediano (sinal de Gilliat e Wilson) e a flexão ou hiperextensão do
punho pode causar o aparecimento ou intensificação da dor (sinal de Phalen).
N. Ulnar (C7-T1)
A lesão do nervo ulnar no braço e no cotovelo determina paresia ou paralisia
da flexão da mão, da flexão da terceira falange dos dedos anular e mínimo, da adução e
abdução dos dedos, da adução do polegar e dos movimentos de flexão, adução e
oposição do dedo mínimo. Os dedos anular e mínimo apresentam-se com a primeira
falange em extensão e as demais em flexão, configurando a mão em garra. O déficit
sensitivo localiza-se na metade medial da mão, no dedo mínimo e metade interna do dedo
anular.
A lesão do ulnar no antebraço e no punho determina o mesmo quadro anterior,
exceto por poupar o flexor ulnar do carpo e o flexor profundo dos dedos.
N. Femoral (L2-L4)
Sua lesão manifesta-se por: atrofia da face anterior da coxa; paresia ou
paralisia da flexão da coxa sobre a bacia (iliopsoas) e da extensão da perna (quadríceps
femoral); parestesias e hipoestesia na face anterior da coxa e face na medial do joelho, da
perna e do pé; e abolição ou diminuição do reflexo patelar.
N. Ciatico (L4-S3)
Na lesão do tronco do nervo ciático, ocorre paralisia dos músculos da face
posterior da coxa (flexão da perna), inervados pelos ramos colaterais, e dos músculos da
perna, do pé e dos artelhos (flexão e extensão do pé e dos artelhos; rotação do pé),
inervados pelos ramos terminais (tibial e fibular). O reflexo aquileu é abolido. Ocorre
déficit sensitivo na face ântero-lateral da perna e do dorso do pé (nervo fibular) e na
planta do pé e dos pododáctilos (nervo tibial).
N. Tibial (S1)
51

A lesão do nervo tibial resulta em paresia ou paralisia da flexão plantar e


inversão do pé, bem como da flexão plantar, adução e abdução dos artelhos. O pé
permanece em extensão e em rotação externa, por causa da ação dos antagonistas. A
marcha é feita sobre o bordo interno do pé e sobre o calcanhar. O paciente não consegue
manter-se na ponta dos pés. O reflexo aquileu é abolido. O déficit sensitivo localiza-se na
face posterior da perna, planta do pé e artelhos.
N. Fibular (L5)
A lesão do nervo fibular comum determina déficit motor da extensão do pé e
dos artelhos e da rotação externa do pé, resultante da paralisia dos músculos da loja
ântero-lateral da perna. O pé permanece caído (equinismo), em virtude da paralisia dos
músculos extensores, e, em rotação interna, conseqüente à paralisia dos músculos
fibulares. O paciente não consegue manter-se de pé sobre os calcanhares. O déficit
sensitivo localiza-se na face ântero-lateral da perna e na face dorsal do pé e dos artelhos.

SÍNDROMES RADICULARES
O princípio da localização das lesões radiculares consiste na distribuição
segmengtar das alterações da força muscular, da sensibilidade e dos reflexos. O exato
nível da lesão pode ser determinado através do exame da motricidade, da sensibilidade e
dos reflexos. Os músculos e os territórios sensitivos radiculares têm uma inervação
pluriradicular, razão pela qual a lesão de uma única raiz leva apenas a moderado déficit
motor (paresia) e sensitivo (hipoestesia). Fenômenos dolorosos e parestésicos são
comuns nas síndromes radiculares.
A seguir, descrevemos o quadro clínico (músculos e reflexos comprometidos e
área de déficit sensitivo) da lesão das principais raízes medulares.
C5

Músculos do ombro e da região anterior do braço: deltóide (abdução do braço );


bíceps (flexão do antebraço).
Reflexo: bicipital; estilorradial.
Sensibilidade: face lateral do braço.
52

C6

Músculos da região anterior do braço: extensor radial do carpo; bíceps (flexão


do antebraço).
Reflexo: bicipital; estilorradial.
Sensibilidade: face lateral do antebraço e mão; polegar e indicador.
C7

Músculos das regiões posteriores do braço e antebraço: tríceps (extensão do


antebraço); extensor do carpo; extensor comum dos dedos; extensor do polegar.
Reflexo: tricipital.
Sensibilidade: dedo médio.
C8

Músculos da região anterior do antebraço e da mão: flexores dos dedos;


interósseos (abdução e adução dos dedos).
Reflexo: flexor dos dedos.
Sensibilidade: borda medial da mão e dedos anular e mínimo.
T1

Músculos da mão: interósseos (abdução e adução dos dedos).


Reflexo: flexor dos dedos.
Sensibilidade: borda medial do antebraço.
Torácicas

Sensibilidade: mamilos -T4, umbigo -T10, apêndice xifóide-T7, dobra inguinal-


T12
L4

Músculos da região anterior da coxa: quadríceps (extensão da perna).


Reflexo: patelar (quadríceps).
Sensibilidade: face medial da perna.
L5

Músculos da região anterolateral da perna: tibial anterior (extensão e inversão


do pé); extensor dos pododáctilos; extensor longo do hálux.
53

Sensibilidade: face lateral da perna e dorso do pé.


S1

Músculos da região posterior da perna: gastrocnêmio, sóleo e tibial posterior


(flexão plantar do pé); flexor dos pododáctilos; flexor do hálux; fibulares (eversão do pé).
Reflexo: aquileu.
Sensibilidade: borda lateral e planta do pé.

SÍNDROMES MEDULARES

Do ponto de vista funcional a medula é via de transmissão e órgão provido de


funções próprias (integração dos reflexos medulares). As vias (tratos e fascículos)
ascendentes (sensitivos) e descendentes (motoras), localizadas na substância branca,
ligam a medula aos centros supra-segmentares. A substância cinzenta medular pode ser,
esquematicamente, interpretada como a superposição de segmentos, delimitados pela
emergência das raízes. Cada segmento tem um território motor (miótomo) e sensitivo
(dermátomo).
Em virtude de sua dupla função (via de passagem e centro de integração de
reflexos), as lesões medulares manifestam-se por dois tipos de sinais: 1) Sinais lesionais,
que indicam o segmento medular lesado. Traduzem-se por distúrbios motores (paralisia
flácida) e sensitivos (anestesia ou dor), de topografia radicular, e de reflexos (hipo ou
arreflexia); 2) Sinais sublesionais, conseqüentes à separação da medula, situada abaixo
da lesão, dos centros encefálicos. Manifestam-se por paralisia e anestesia abaixo da
lesão e fenômenos de liberação medular (hiperreflexia).
A seguir descreve-se as principais síndromes topográficas da medula.
Síndrome de secção medular

Na transecção medular, tratos ascendentes e descendentes são interrompidos


(perda das funções motora e sensitiva abaixo da lesão). Inicialmente ocorre arreflexia
miotática e hipotonia dos esfíncteres vesical e retal (fase de choque medular), seguidas
de hiperreflexia miotática e espasticidade dos esfíncteres (fase de automatismo medular).
As lesões acima da medula sacra determinam a bexiga neurogênica reflexa, com
preservação dos reflexos bulbocavernoso e anal. Nas lesões do cone medular (medula
54

sacra) e cauda eqüina observa-se a bexiga neurogênica autonômica associada à


anestesia em sela e ausência dos reflexos bulbocavernoso e anal. Este tipo de bexiga
neurogênica está também presente na fase de choque medular das lesões acima da
medula sacra. Os reflexos sexuais (reflexos de ereção e ejaculação) estão alterados.
Junto ao segmento lesado aparecem sinais de lesão do neurônio motor inferior
(paresia, atrofia, fasciculações e arreflexia), com distribuição metamérica (acometendo o
miótomo do segmento medular ou raiz lesada), conseqüentes à lesão das células do
corno anterior da medula.
Síndrome de hemissecção medular (s. Brown-Sequard)
O quadro clínico é conseqüente à lesão dos principais tratos da metade da
medula e manifesta-se por déficit abaixo da lesão (sublesional):
Trato piramidal: paralisia espástica homolateral;
Funículo posterior: perda da propriocepção consciente e do tato epicrítico
homolateral;
Trato espino-talâmico lateral: anestesia térmica e dolorosa contralateral.
Síndrome do funículo posterior

A lesão dos funículos posteriores determina perda das sensibilidades


proprioceptivas conscientes (cinético-postural, vibratória e discriminação tátil). Como
resultado da lesão das fibras grossas aferentes, ocorre arreflexia e hipotonia muscular
(interrupção do arco reflexo miotático). Com a ausência da sensibilidade proprioceptiva, a
marcha apresenta-se atáxica, com piora à oclusão palpebral e o sinal de Romberg está
presente. O exemplo clássico desta síndrome cordonal posterior é a tabes dorsalis
conseqüente à neurossífilis.
Síndrome do funículo ântero-lateral

A lesão do trato córtico-espinhal manifesta-se por síndrome piramidal deficitária


(paresia ou paralisia) e de liberação (hiperreflexia, clono, sinais de automatismo medular,
hipertonia e sinal de Babinski). O comprometimento dos tratos espinocerebelares
determina a incoordenação dos movimentos, com ataxia, dismetria e disdiadococinesia. A
lesão do trato espino-talâmico lateral provoca a anestesia térmica e dolorosa contralateral.
55

Síndrome centromedular

A lesão da substância cinzenta central leva à interrupção das fibras que vão
formar o trato espino-talâmico, quando elas cruzam ventralmente o canal central. Ocorre,
portanto, a perda da sensibilidade térmica e dolorosa (dissociação siringomiélica da
sensibilidade) bilateralmente, nos dermátomos relacionados com as fibras lesadas. Em
decorrência da sistematização das fibras no trato espino-talâmico (sensibilidade das
raízes cervicais em posição dorsomedial e das sacrais em posição ventrolateral), a
sensibilidade das raízes sacras (períneo) pode estar preservada nas lesões centrais da
medula. A siringomielia e os tumores intramedulares representam as principais causas da
síndrome centromedular.

SÍNDROMES DOS NERVOS CRANIANOS

A lesão das vias dos nervos cranianos pode ocorrer no segmento periférico ou
no central. Na lesão periférica (núcleo e tronco do nervo), os sintomas e sinais
observados são decorrentes da disposição anatômica do nervo. A sua origem e término
no encéfalo explicam a ocorrência de síndromes alternas que associam o
comprometimento cruzado das vias longas do tronco cerebral à paralisia homolateral do
nervo craniano. A proximidade do trajeto intracraniano de alguns nervos e a emergência
da base do crânio, através de orifícios comuns, explicam as lesões associadas dos nervos
cranianos. Nas paralisias centrais (supranucleares), estão sempre associados sinais de
lesão de estruturas do encéfalo e o comprometimento das motricidades voluntária e
automática pode estar associado.
Nervo olfatório (N. I)
As lesões que causam anosmia podem estar localizadas na mucosa olfativa,
nos filetes olfatórios, no bulbo, no trato ou nas estrias. As causas mais comuns são o
trauma crânioencefálico e os tumores da base do lobo frontal. Admite-se que as lesões do
córtex olfatório podem provocar parosmia (perversão do olfato), cacosmia (odores
desagradáveis) e alucinações olfativas.
Nervo óptico (N. II) e vias visuais

Resume-se as alterações conseqüentes a lesão da via visual.


56

Retina

Nas lesões da retina, a acuidade visual está normal, quando a mácula é


preservada, e diminuída, quando a mesma está comprometida. Pode estar presente
escotoma central (lesão macular) ou periférico (lesões da retina periférica).
Nervo óptico

A acuidade visual está diminuída e poderá estar presente escotoma monocular


nas lesões unilaterais. O reflexo fotomotor é alterado por lesão da via aferente do arco
reflexo. Em muitas lesões ocorre papiledema seguido de atrofia óptica.
Quiasma

Quando a porção medial do quiasma é lesada, a acuidade visual poderá estar


diminuída em ambos os olhos e ocorrerá a hemianopsia bitemporal, por interrupção das
fibras nasais cruzadas.
Trato óptico

Manifesta-se por acuidade visual normal e hemianopsia homônima


contralateral.
Radiação óptica

A acuidade visual é normal. As lesões totais manifestam-se por hemianopsia


homônima contralateral. As lesões parietais determinam quadrantopsia inferior e as
temporais quadrantopsia superior. As fibras aferentes do reflexo fotomotor não são
alteradas. Não ocorrem alterações no fundo do olho.
Córtex calcarino

Nas lesões unilaterais, o defeito do campo visual é representado por


hemianopsia homônima contralateral. Como nas lesões do trato óptico, a acuidade visual,
o reflexo fotomotor e o exame do fundo de olho são normais.
Nervos oculomotores (N. III, IV e VI)
A lesão do nervo oculomotor (III) manifesta-se por paralisia dos músculos
extrínsecos do globo ocular, com exceção do reto lateral e oblíquo superior, ptose
palpebral e midríase, com abolição do reflexo fotomotor. O nervo pode ser lesado no
57

mesencéfalo (núcleo e fibras radiculares), no espaço subaracnóideo, no seio cavernoso,


na fissura orbital superior e na órbita.
A lesão da porção anterior do mesencéfalo pode comprometer as fibras
radiculares do nervo oculomotor (oftalmoplegia) e o pedúnculo cerebral (hemiplegia
contralateral), caracterizando a síndrome peduncular anterior de Weber. No espaço
subaracnóideo, o nervo pode ser lesado por compressão, sendo as causas mais comuns
os aneurismas da artéria comunicante posterior e a hérnia do uncus.
As lesões compressivas do seio cavernoso comprometem os nervos motores
oculares (III, IV e VI) e o ramo oftálmico do trigêmeo (síndrome do seio cavernoso de
Foix). As lesões compressivas da fissura orbitária superior atingem os mesmos nervos
(síndrome da fissura orbitária superior de Rochon-Duvigneuad).
A lesão do nervo troclear determina paralisia do músculo oblíquo superior,
resultando em desvio do olho comprometido para cima, com discreta rotação interna. Esta
lesão ocorre, geralmente, no seio cavernoso (síndrome do seio cavernoso de Foix) e na
fissura orbitária superior (síndrome da fenda esfenoidal de Rochon-Duvigneaud) e está
associada a comprometimento dos nervos III, IV e VI e do ramo oftálmico do trigêmeo. Na
prática raramente se observam lesões isoladas deste nervo.
Na paralisia do nervo abducente (VI), o globo ocular está desviado para dentro
e com paralisia do movimento lateral (estrabismo convergente). Esta paralisia ocorre
freqüentemente na hipertensão intracraniana e nas lesões do ângulo ponto-cerebelar.
Lesões junto ao seio cavernoso e à fissura orbitária superior comprometem os nervos
motores oculares (III, IV e VI) e o ramo oftálmico do trigêmeo.
Nervo trigêmeo (N. V)
A raiz do trigêmeo pode ser lesada em seu percurso cisternal, no ângulo ponto-
cerebelar. Manifesta-se por dor facial homolateral e déficit sensitivo. Pode ocorrer
abolição do reflexo corneano e paresia dos músculos da mastigação. É freqüente estar
associada lesão dos demais nervos que passam pelo ângulo ponto-cerebelar (VII, VIII). O
gânglio de Gasser pode ser comprometido nas lesões da fossa média, manifestando-se
por dor e déficit sensitivo na hemiface ou apenas em áreas de inervação de ramos
específicos do trigêmeo.
Nervo facial (N. VII)
58

Nas lesões supranucleares ocorre a paralisia contralateral dos dois terços


inferiores da face com preservação da musculatura do terço superior (paralisia facial
central). A parte superior da face é poupada por possuir controle supranuclear bilateral,
enquanto a parte inferior apresenta apenas conexão supranuclear contralateral. A lesão
do nervo, especialmente no ângulo ponto-cerebelar determina a paralisia facial periférica
homolateral, déficit da sensibilidade gustativa e alteração da secreção lacrimal (paralisia
facial periférica).
Nervo vestíbulo-coclear (N. VIII)
O VIII nervo craniano, nervo vestíbulo-coclear ou estato-acústico, apresenta
dois componentes funcionais distintos que podem ser considerados como nervos
separados: o nervo coclear e o nervo vestibular, relacionados, respectivamente, um com a
audição e o outro com o equilíbrio.
A lesão do nervo coclear no ângulo ponto-cerebelar manifesta-se por tinitus e
surdez homolateral. Pela proximidade com o nervo coclear, os nervos vestibular e facial
são freqüentemente também atingidos. A lesão do nervo vestibular manifesta-se por
vertigem e alterações vegetativas como náusea, vômitos, palidez e sudorese. Os sinais
objetivos de lesão vestibular são representados pelo nistagmo e pelas alterações do
equilíbrio.
Nervo glossofaríngeo (N. IX)
A lesão do glossofaríngeo manifesta-se por: 1) perda da sensibilidade gustativa
(ageusia) no terço posterior da língua; 2) anestesia da porção superior da faringe, da
região amigdaliana e da base da língua; 3) flacidez do palato mole do lado paralisado e
desvio da úvula para o lado normal, durante a fonação; 4) disfagia de grau leve; e 5)
abolição do reflexo nauseoso.
Nervo vago (N. X)
A lesão do vago é seguida de paralisia dos músculos da laringe, que manifesta-
se por disfonia (voz bitonal) e, ao exame laringoscópico, a corda vocal do lado atingido
está imóvel e em adução.
Nervo espinhal (N. XI)
A lesão do nervo espinhal resulta em paresia e atrofia dos músculos
esternocleidomastóideo e trapézio. A paresia do esternocleidomastóideo manifesta-se por
59

fraqueza na rotação da cabeça para o lado e a do trapézio por dificuldade na elevação do


ombro.
Nervo hipoglosso (N. XII)
A lesão do hipoglosso manifesta-se por paresia, atrofia e fibrilações da metade
homolateral da língua. Quando o paciente projeta a língua, ocorre o desvio da mesma
para o lado lesado, pelo fato de o músculo genioglosso normal empurrar a respectiva
metade da língua mais para a frente. O paciente não consegue movimentar a ponta da
língua para o lado não comprometido. Quando mantida em repouso dentro da boca, a
língua é, ao contrário, desviada para o lado normal, em virtude da predominância dos
músculos retratores estiloglosso e hioglosso.
Síndromes associadas dos nervos cranianos

A proximidade do trajeto intracraniano de alguns nervos e a emergência da


base do crânio, através de orifícios comuns, explicam as lesões associadas dos nervos
cranianos. Diferentes combinações de lesões de nervos cranianos configuram as
clássicas síndromes dos nervos cranianos. As três mais importantes são:
1- Seio cavernoso : III, IV, VI, V1
2- Angulo ponto-cerebelar : VII, VIII e sinais cerebelares e pontinos
3- Forame jugular : IX, X, XI
SÍNDROMES DO TRONCO ENCEFÁLICO

No tronco encefálico encontram-se os núcleos dos nervos cranianos (III a XII) e


as vias de projeção ascendentes ou sensitivas (lemnisco medial e trato espino-talâmico
lateral) e descendentes ou motoras (trato córtico-espinhal ou piramidal).
A lesão do núcleo de nervos cranianos e das vias longas no tronco encefálico
explicam a paralisia homolateral do nervo craniano e o comprometimento cruzado das
vias motora e sensitiva que caracterizam as síndromes alternas do tronco encefálico. A
síndrome do tronco encefálico caracteriza-se por:
Hemiplegia contralateral
Hemianestesia superficial e profunda contralateral
Comprometimento de nervos cranianos homolaterais
mesencéfalo: III, IV
ponte: V, VI, VII
60

bulbo: IX, X, XI, XII

SÍNDROME CEREBELAR

O cerebelo é responsável pela coordenação dos movimentos. Ele realiza a


coordenação temporal do movimento e do conjunto de movimentos que concorrem para a
realização de um ato complexo. A lesão cerebelar determina uma perturbação do
desenvolvimento temporal do movimento simples (discronometria) e por uma perda da
sinergia dos componentes musculares dos movimentos (assinergia). Estas alterações
determinam os seguintes sinais, que constituem a síndrome cerebelar:
Dismetria
Decomposição dos movimentos
Disdiadococinesia
Tremor durante a realização de movimentos
Marcha atáxica
Hipotonia
É clássico dividir a síndrome cerebelar em síndrome vermiana ou mediana e
síndrome hemisférica ou lateral:
Síndrome vermiana ou mediana

Ataxia axial
Nistagmo
Síndrome hemisférica ou lateral

Incoordenação apendicular homolateral


Disartria
Hipotonia

SÍNDROMES CEREBRAIS

O telencéfalo ou cérebro compreende o córtex cerebral, as comissuras inter-


hemisféricas e a substância branca subcortical. O agrupamento dos sintomas e sinais de
lesões de diferentes áreas cerebrais em síndromes deriva do princípio de localizações
cerebrais. O mapa funcional do córtex cerebral foi elaborado a partir de dados
61

anatomopatológicos e experimentais (lesões, estimulações). A seguir, descreve-se as


síndromes dos diferentes lobos cerebrais.
Síndrome do lobo frontal

O lobo frontal pode ser dividido em duas regiões. A região frontal posterior (pré-
rolândica ou pré-central), formada pela circunvolução frontal ascendente ou giro pré-
central, é o centro motor cortical (área somato-motora). A parte anterior do lobo frontal
não apresenta nenhum centro primário e sua lesão unilateral determina alterações
mínimas. Somente quando a lesão é bilateral é que ocorrem alterações do
comportamento, da personalidade e do humor.
As alterações decorrentes da lesão frontal são: 1)Hemiplegia espástica
contralateral; 2) Alterações do comportamento motor; 3) Alterações da marcha: são
variáveis, podendo ocorrer marcha em pequenos passos, alterações do equilíbrio e
retropulsão. Pode ocorrer a apraxia de marcha, em que o paciente parece estar colado ao
solo e apresenta dificuldade para elevar cada pé para dar o próximo passo; 4) Alterações
reflexas: As lesões frontais podem acompanhar-se do reaparecimento de certos reflexos,
denominados arcaicos: reflexo de preensão (“grasping reflex”), “prout reflex” ou reflexo do
focinho; reflexo palmo-mentoniano exaltado; 5) Alteração da oculomotricidade com
redução ou abolição da motricidade ocular voluntária para o lado oposto à lesão (lesão da
área oculomotora frontal); 6) alteração da articulação da palavra por perturbação da
programação da musculatura vocal (afasia motora de Broca) por lesão do giro frontal
inferior do hemisfério dominante; 7) Alterações da personalidade, do humor e do
comportamento social.
Apesar de a semiologia da síndrome frontal ser bastante complexa, é possível
realizar, de forma esquemática, a classificação topográfica dos sinais e sintomas.
Lesão frontal posterior ou motora (giro pré-central):
Área da face (porção inferior): paresia facial central
Área do membro superior (joelho médio): paresia braquial
Área do membro inferior (porção paramediana): paresia crural.
Lesão do lobo frontal anterior (pré-frontal):
F1: incontinência urinária e reflexos primitivos
F2: paralisia do olhar conjugado
62

F3: afasia de Broca


Polo frontal : alterações afetivas, da personalidade e do comportamento social
Síndrome do lobo occipital

A lesão do lobo occipital manifesta-se por hemianopsia homônima


contralateral, por lesão da área estriada (área 17).
Síndrome do lobo parietal

A lesão do lobo parietal manifesta-se por:


Déficit sensibilidade discriminativa (cortical) contralateral
Negligência do espaço contralateral
Negligência e agnosia de partes do corpo contralateral
Apraxia construtiva e de vestimenta
Quadrantopsia inferior contralateral
Síndrome do lobo temporal
Manifesta-se por:
Afasia de Wernicke
Quadrantopsia superior contralateral
Crises parciais complexas ou psicomotoras

SÍNDROME DE HIPERTENSÃO INTRACRANIANA

Fisiopatologia

O sistema nervoso central encontra-se na cavidade cérebro-espinhal, que, no


adulto, é um reservatório inextensível de volume constante. Três elementos ocupam esta
cavidade: O parênquima cerebral, sistema vascular e o líquido cefalorraquidiano (LCR),
sendo que estes dois últimos componentes correspondem aproximadamente a 10% do
conteúdo intracraniano.
O parênquima cerebral tem um volume constante e, do ponto de vista
mecânico, pode ser interpretado como uma esponja submicroscópica, formada de
material visco-elástico. O sistema venoso intracraniano pode, durante um aumento da
pressão venosa devida a um aumento da pressão intracraniana (PIC), reajustar sua
distribuição de pressão, expulsando parte do volume sangüíneo para o sistema venoso
63

extracraniano, comportando-se como um elemento elástico e amortizador das variações


da PIC.
O LCR é produzido essencialmente no plexo coróide e retorna à circulação
sangüínea através das vilosidades aracnóides situadas no seio longitudinal superior. A
pressão do LCR, ou seja, a PIC origina-se da diferença entre a formação e a reabsorção
de um certo débito (D) de LCR, porque esta reabsorção ocorre contra uma certa
resistência ao escoamento (R). Isto pode ser expresso pela equação : PIC = D. R .
Em condições normais de formação e resistência à absorção, a pressão
hidrostática do LCR, com o indivíduo em decúbito lateral, oscila entre 50 e 200 mm de
água e é a mesma ao nível dos ventrículos, cisterna magna e fundo de saco lombar (lei
de Pascal).
Os três compartimentos intracranianos - o parênquima cerebral, o
compartimento vascular e o compartimento líquido extracelular - estão ligados entre si
por uma relação volumétrica expressa, depois de 1738, pela lei de Monro-Kellie-Burrows :
a soma dos volumes dos três compartimentos é constante, igual ao volume do recinto
ósseo-dural que os contém. Esta lei pode ser também expressa pela forma: a soma
algébrica das variações de volume dos três setores é nula, ou seja, qualquer alteração
volumétrica em um dos componentes intracranianos (cérebro, LCR e sangue) é
imediatamente compensada por uma alteração oposta no volume dos demais
componentes.
Langfitt mostrou que a expansão de um balão intracraniano numa velocidade
constante em primata sub-humano determinava elevação muito discreta da PIC
inicialmente, até o volume do balão atingir um ponto crítico, a partir do qual a expansão
adicional do balão produziria elevação constante da PIC. Este volume crítico do balão foi
considerado equivalente ao volume de sangue deslocado da cavidade craniana. O
crescimento progressivo de uma lesão expansiva determina um aumento da PIC que
segue uma característica curva exponencial volume/pressão. Nos estágios iniciais do
aumento volumétrico, o aumento de pressão é pequeno devido aos mecanismos de
compensação. No início do aumento volumétrico ocorre um deslocamento do LCR em
direção ao canal raquiano. Posteriormente, diminui o volume sangüíneo por compressão
do sistema venoso. Caso a lesão expansiva continue poderá ocorrer bloqueio das vias
64

liquóricas com reduções das cisternas e colapso dos forames dos ventrículos. Quando
novas reduções do volume de líquido cefalorraquiano ou do sangue não sejam possíveis,
ocorre herniação do tecido cerebral provocada por gradientes de pressão de um
compartimento em relação a outro, com compressão e encarceramento tecidual a nível da
foice do cérebro, da tenda do cerebelo ou do forame magno.
A HIC altera a função neurológica através da diminuição do fluxo sangüíneo
cerebral e das hérnias cerebrais.
O fluxo sangüíneo cerebral (FSC) é igual à relação entre a pressão de
perfusão cerebral (PPC) e a resistência vascular cerebral (RVC). O fluxo sangüíneo
cerebral é mantido estável `as custas de adaptações da RVC, que é modificada por
mecanismos de auto-regulação. A pressão de perfusão cerebral pode ser definida como a
diferença entre a pressão arterial média (PAM) e a pressão venosa. Para efeitos práticos
a pressão no interior das veias cerebrais é igual à PIC. Por isso, a pressão de perfusão
cerebral tem valor aproximado da diferença entre a pressão arterial e a intracraniana.
Estas relações podem ser sistematizadas na seguinte equação:
FSC = PPC / RVC = (PAM - PIC) / RVC
Em um líquido, as variações locais de pressão são transmitidas em todos os
pontos do mesmo (princípio de Pascal), enquanto que as forças externas que atuam
sobre um corpo sólido são transmitidas de forma direcional, originando um estresse
interno com deslocamento em massa do corpo sólido. O parênquima cerebral será,
portanto, submetido a um estresse, enquanto que o LCR e o sistema circulatório
transmitirão pressões.
Devido às características físicas do encéfalo e à inextensibilidade da caixa
craniana, uma lesão expansiva intracraniana causa estresse e deslocamento do tecido
cerebral de um compartimento para outro (hérnia cerebral interna) desde que se
estabeleça um gradiente de pressão.
Nas lesões expansivas unilaterais, as estruturas da linha média são desviadas
para o lado oposto. O septo interventricular e o terceiro ventrículo são desviados e o giro
do cíngulo se projeta sob a borda livre da foice do cérebro (hérnia supracalosa ou
subfalciforme ou do giro do cíngulo). Nos casos mais intensos, a hérnia subfalciforme
65

pode comprimir uma ou ambas as artérias pericalosas, com conseqüente infarto nos
respectivos territórios de irrigação.
A hérnia tentorial ou cone de pressão tentorial apresenta-se sob duas
formas : a hérnia tentorial lateral (ou hérnia do uncus) e a hérnia tentorial central do
tronco encefálico. A hérnia tentorial lateral ou uncal consiste na passagem parcial do
uncus e da porção medial do giro parahipocampal entre a borda livre da tenda e o
mesencéfalo. Em conseqüência, o mesencéfalo é comprimido no sentido lateral,
ocorrendo o alongamento de seu diâmetro ântero-posterior. Poderá ocorrer também a
compressão do nervo oculomotor e da artéria cerebral posterior.
Na hérnia transtentorial central ocorre deslocamento para baixo de
todo o tronco encefálico através do buraco de Pacchioni. É causada principalmente por
lesões expansivas de localização frontal ou parietal ou por lesões expansivas bilaterais.
Durante este processo, ocorre o estiramento das artérias perfurantes do tronco encefálico
oriundas da artéria basilar, em virtude de o tronco encefálico deslocar-se para baixo,
enquanto a artéria basilar mantém-se relativamente fixa. O estiramento produz isquemia e
hemorragia nas proximidades da linha média do tronco encefálico, denominada de
hemorragia de Duret.
Se a compressão supratentorial prossegue e a pressão intraventricular
excede de aproximadamente 10 mmHg a pressão subaracnóidea cervical, o quadro de
hérnia tentorial é seguido pelo de hérnia das tonsilas ou amigdalas cerebelares. As
tonsilas cerebelares se insinuam, então, através do forame magno, obliterando a cisterna
magna e comprimindo o bulbo.
Quadro clínico

A tríade sintomática básica da HIC consiste de cefaléia, vômito e edema de


papila. Além destes podem ocorrer também os seguintes sintomas e sinais: alterações do
nível de consciência, crises convulsivas, tonturas, macrocefalia, paralisia dos nervos
motores oculares e alterações da pressão arterial, da respiração e da freqüência cardíaca.
Nas crianças com as suturas ainda não soldadas, o aumento da PIC pode ser
compensado, temporariamente, pela disjunção progressiva das suturas com conseqüente
aumento do perímetro cefálico (macrocefalia).
66

O nervo abducente é freqüentemente comprometido na HIC, mas a lesão do


mesmo não tem valor de localização. É atribuído ao seu estiramento pelo deslocamento
caudal do tronco encefálico.
As hérnias que ocorrem durante a evolução da HIC podem ser diagnosticadas
por meio dos sinais de compressão das estruturas nervosas e vasculares. A hérnia
supracalosa não apresenta maiores implicações clínicas, exceto quando comprime as
artérias pericalosas, determinando infarto isquêmico nos seus territórios de irrigação.
O primeiro sinal da hérnia de uncus é a dilatação da pupila (midríase)
homolateral por compressão do nervo oculomotor contra o ligamento petroclinóideo. A
insinuação da porção medial do lobo temporal no forame de Pacchioni comprime o
pedúnculo cerebral com o conseqüente desenvolvimento de hemiparesia contralateral por
compressão da via piramidal homolateral. A compressão progressiva do mesencéfalo leva
à depressão gradual do nível de consciência por comprometimento da formação reticular.
Na hérnia transtentorial central ocorre deterioração progressiva do nível de
consciência, postura de decorticação ou descerebração, alteração do ritmo respiratório e
dilatação das pupilas.
A hérnia tonsilar ou das amígdalas cerebelares manifesta-se por parada
cardiorrespiratória súbita com miose bilateral.

SÍNDROME MENINGEA

Líquido cefalorraqueano (LCR)

O LCR encontra-se contido nas cavidades ventriculares e no espaço


subaracnóideo. No interior das cavidades ventriculares projetam-se os plexos corióides,
formados de redes vasculares. No espaço subaracnóideo da convexidade cerebral
encontram-se as vilosidades aracnóideas que são projeções da aracnóide para o interior
dos seios venosos da dura-máter. Quando visíveis a olho nu, são denominadas
granulações de Pacchioni.
No adulto o volume do LCR oscila entre 90 e 150 ml. É formado nos plexos
corióides e reabsorvido nas vilosidades aracnóideas. É límpido e incolor, com pressão de
5 a 20 cm de água, no decúbito lateral e contém até quatro células (linfomononucleares)
67

por mm3. A taxa de coretos é de, aproximadamente, 700 mg/100 ml, a de glicose de 60
mg/100 ml, e a de proteínas totais de até 40 mg/100 ml no LCR lombar.
O LCR hemorrágico é encontrado em processos hemorrágicos
intracraniorraqueanos. Nas meningites agudas a vírus o LCR pode apresentar-se
hipertenso e turvo e com pleocitose por linfomononucleares. Nas meningites agudas
bacterianas o LCR apresenta-se fortemente turvo, podendo ser purulento. A pleocitose
por polimorfonucleares neutrófilos é intensa. A taxa de proteínas totais é geralmente muito
alta. Na cisticercose do sistema nervoso central são comuns pleocitose,
hiperproteinorraquia e presença de anticorpos específicos. Na esquistossomose, o LCR
pode ser normal ou apresentar pleocitose discreta, presença de células eosinófilas,
hiperproteinorraquia e positividade da reação de fixação do complemento para
esquistossomose.
Sinais e sintomas da síndrome meníngea

Os sinais de irritação meníngea ocorrem mais frequentemente nos processos


inflamatórios meníngeos e na presença de material estranho no espaço subaracnóideo,
como na hemorragia subaracnóidea. As manifestações objetivas são, geralmente,
secundárias à tensão das raízes espinhais inflamadas.
O principais sintomas e sinais de irritação meníngea são: cefaléia com
nucalgia, irritabilidade, fotofobia, náusea e vômitos. A rigidez de nuca (resistência à flexão
passiva da cabeça) é o mais consistente sinal de irritação meníngea. No sinal de Kernig
ocorre resistência à extensão da perna sobre a coxa, estando o paciente em decúbito
dorsal e com a coxa fletida sobre a bacia. Os sinais de rigidez de nuca e de Kernig são
conseqüentes à tensão sobre as raízes irritadas.

RESUMO DAS PRINCIPAIS SÍNDROMES NEUROLÓGICAS

S. NEURÔNIO MOTOR INFERIOR


Paralisia de um ou mais músculos
Hipotonia
Atrofia e fasciculações
Arreflexia
S. NEURÔNIO MOTOR SUPERIOR (PIRAMIDAL)
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Déficit motor distal


Perda dos reflexos superficiais :cutâneo-abdominal e plantar, cremastérico
Hiperreflexia e espasticidade
Sinal de Babinski (resposta plantar em extensão)
S. EXTRAPIRAMIDAL
Hipercinesia ou bradicinesia
Hipo ou hipertonia (rigidez)
Distonia (alteração de postura)
Reflexos musculares normais
S. VESTIBULAR
Vertigem, náusea e vômito
Desvio da cabeça e do corpo
Nistagmo
Sinal de Romberg
Desvio da marcha
S. DE CONFUSÃO MENTAL
Desorientação temporo-espacial (respostas verbais confusas)
Ilusões e alucinações
Sonolência ou agitação
S. DEMENCIAL
Perda da memória recente
Desorientação têmporo-espacial
Diminuição da informação geral
Dificuldade de abstração
Dificuldade para julgamentos
Modificações da personalidade e comportamento
S. NERVO, PLEXO E RAIZ
Déficit motor
Hipo ou arreflexia muscular
Deficit sensitivo
Dor e parestesias
Alterações autonômicas e tróficas
S. MEDULAR
- Secção medular
Paralisia
Anestesia
Hiperreflexia muscular
Alteração dos reflexos de micção, defecação e sexuais
- Hemissecção medular (S. Brown-Séquard)
Paralisia homolateral
Anestesia profunda (cinético-postural, vibratória) homolateral
Anestesia dolorosa contralateral
S. NERVOS CRANIANOS
- Seio cavernoso : III, IV, VI, V1
- Angulo ponto-cerebelar : VII, VIII e sinais cerebelares e pontinos
- Forame jugular : IX, X, XI
S. TRONCO ENCEFÁLICO
69

Hemiplegia contralateral
Hemianestesia superficial e profunda contralateral
Comprometimento de nervos cranianos homolateral
S. CEREBELAR
Dismetria
Decomposição dos movimentos
Disdiadococinesia
Tremor durante a realização de movimentos
Marcha atáxica
Hipotonia
S. DO LOBO FRONTAL POSTERIOR OU MOTORA (GIRO PRÉ-
CENTRAL)
Área da face : paresia facial central
Área membro superior : paresia braquial
Área membro inferior : paresia crural
S. DO LOBO FRONTAL ANTERIOR (PRÉ-FRONTAL)
F1 :incontinÍncia urinária
reflexos primitivos
F2: paralisia do olhar conjugado
F3: afasia de Broca
Pólo frontal: alterações afetivas, da personalidade e do comportamento
social
S. LOBO OCCIPITAL
Hemianopsia homônima contralateral
S. LOBO PARIETAL
Déficit da sensibilidade discriminativa (cortical) contralateral
Negligência do espaço contralateral
Negligência e agnosia de partes do corpo contralateral
Apraxia construtiva e de vestimenta
Quadrantopsia inferior contralateral
S. LOBO TEMPORAL
Afasia de Wernicke
Quadrantopsia superior contralateral
Crises parciais complexas ou psicomotoras
S. HIPERTENSÃO INTRACRANIANA
Cefaléia
Vômito
Papiledema
S. MENINGEA
Cefaléia, vômitos, fotofobia
Rigidez de nuca
Sinais de Kernig e Brudzinski
70

CAPÍTULO 3

LESÃO DOS NERVOS RAQUIANOS


71

A ) - Bases anátomo-funcionais
Os nervos periféricos são feixes de fibras nervosas encerradas em
um invólucro glio-conjuntival. Estas fibras representam os prolongamentos axonais
dos neurônios cujos corpos celulares estão situados no corno anterior da medula,
no caso dos motoneurônios, no gânglio raquiano, no caso dos nervos sensitivos, e
nos gânglios para-vertebrais, no caso das fibras autonômicas.
A unidade funcional do nervo periférico é a fibra nervosa, que é
constituída por um prolongamento do neurônio (axônio ou dendrito), recoberto por
uma delicada bainha denominada neurolema ou bainha de Schwann. Entre o
axônio e o neurolema forma-se a bainha de mielina. Esta bainha origina-se a partir
do envolvimento do axônio por prolongamentos das células de Schwann, que
começam a enrolar-se várias vezes em torno dele e, a medida que isto vai
ocorrendo, a membrana da célula de Schwann de um lado entra em contato com a
do lado oposto e se unem. Neste processo, o citoplasma da célula de Schwann é
comprimido em direção ao corpo celular e as membranas dos prolongamentos das
células de Schwamm que giram sobre o axônio formam uma capa de várias
camadas lamelares denominada bainha de mielina, que é constituída
fundamentalmente por um lipídio, a esfingomielina. Esta bainha não é contínua e
apresenta constrições denominadas de nodos de Ranvier. Nas fibras não
mielinizadas a bainha de mielina é constituída por apenas uma camada de células
de Schwann e nas fibras mielinizadas ela é formada por múltiplas camadas
lamelares. Admite-se que, nas fibras mielinizadas, uma célula de Schwann envolve
apenas um axônio e que nas fibras não mielinizadas, uma célula envolve várias
fibras. O tronco do nervo é formado por fibras nervosas (axônios mielinizados
envoltos pela célula de Schwann) protegidas por algumas bainhas conjuntivas.
Assim, de forma esquemática, a estrutura interna do nervo apresenta a seguinte
organização:
-Endoneuro: membrana conjuntiva frouxa que forma pequenas
lojas dentro das quais caminham os axônios.
72

-Perineuro: representa a bainha que individualiza os fascículos


nervosos no sentido neurocirúrgico do termo.
-Epineuro: bainha de tecido conjuntivo denso entre os fascículos e
que se condensa na periferia do tronco nervoso, envolvendo o nervo.
Os fascículos nervosos, definidos pelo perineuro, representam a
unidade microcirúrgica do nervo periférico. O fascículo apresenta rica
vascularização anastomótica, o que explica a resistência à isquemia e o baixo risco
de desvascularização na cirurgia dos nervos periféricos. A lesão de um nervo
manifesta-se pela associação de déficit motor (motoneurônio alfa), deficit
sensitivo, dor e parestesias (fibra sensitiva periférica) e hipo ou arreflexia muscular
(interrupção do arco reflexo).
Os nervos são geralmente mistos do ponto de vista funcional, pois
incluem fibras motoras, sensitivas e autonômicas.
Define-se como unidade motora o complexo formado pelo
neurônio e as fibras musculares por ele inervadas.
As principais lesões cirúrgicas dos nervos periféricos são por
traumatismo, por compressão e por tumores.

B) - TRAUMATISMO
O traumatismo constitui a causa mágna das mononeuropatias.
Dependendo da energia do agente traumático, a lesão do nervo pode ser
completa, parcial ou simplesmente irritativa. A injúria traumática pode ser direta,
seccionando, comprimindo ou distendendo o nervo, ou indireta, através de
hematoma, calo ósseo ou cicatriz.
• Fisiopatologia
73

Quando uma fibra nervosa é seccionada em determinado ponto,


ela sofre alterações proximais e distais ao local da lesão: no corpo celular, no coto
proximal e no coto distal.
As alterações no corpo celular iniciam-se cinco a seis horas após a
secção do axônio, quando o corpo celular começa a desenvolver um processo
denominado de reação retrógrada ou reação axonal do corpo celular à lesão ou
cromatólise. Esta reação caracteriza-se morfologicamente por um aumento de
volume da célula com deslocamento do núcleo para a periferia e aparente redução
da substância de Nissl por aumento do retículo endoplasmático granular e
aumento das organelas das células e dos ribossomos.
Após a secção, os cotos proximais dos axônios sofrem processo
retrógrado de redução no seu diâmetro e na bainha de mielina.
A degeneração walleriana, descrita por Waller em 1851, constitui
no conjunto de alterações e modificações estruturais e bioquímicas da fibra
nervosa separada do corpo celular por secção. A degeneração do segmento distal
da fibra nervosa se caracteriza por lesões que afetam o axônio, as células de
Schwann e a bainha de mielina. As diversas alterações do axoplasma levam a uma
retração e posteriormente a uma fragmentação do axônio, que se completa 48
horas após a lesão. A mielina começa a se fragmentar um dia após a lesão e se
retrai a partir dos nódulos de Ranvier. Todas as alterações descritas anteriormente
(fragmentação do axônio e da mielina) ocorrem dentro de um tubo cujas paredes
são constituídas pelas células de Schwann e pela lâmina basal. O endoneuro não
sofre alterações. As células de Schwann do segmento distal reagem à lesão
proliferando, migrando e fagocitando os restos do axônio e da mielina. A
multiplicação começa a partir do primeiro dia após a lesão da fibra nervosa. As
células de Schwann da extremidade proximal do segmento distal migram para a
extremidade distal do segmento proximal a partir do primeiro dia e estabelecem
uma ponte celular ou cordão de Bungner com as células de Schwann que provêm
do segmento proximal. Os fragmentos de mielina e o axônio são fragmentados
entre o quinto e o trigésimo dia pelas células de Schwann. Assim, como resultado
74

final da degeneração walleriana ocorre a formação no segmento distal de cordões


ou tubos de células de Schwann, envoltas pela lâmina basal e endoneuro; os
segmentos proximal e distal são ligados pelas células de Schwann que se
multiplicam (tubos de Bungner)
A regeneração da fibra nervosa se faz às custas do crescimento do
axônio, que implica em aumento das atividades de biossíntese do corpo celular. A
extremidade distal do axônio emite por brotamento numerosas expansões
filiformes (cones de crescimento). Estes brotos axonais são prolongamentos
protoplasmáticos que originam-se no coto proximal dos axônios e atravessam o
segmento lesado através de tubos formados pelas células de Schwann (tubos de
Bungner) que servem de guia para o crescimento do axônio. Quando uma das
expansões filiformes penetra em um tubo de Bungner as outras expansões
regridem. O broto axonal caminha por este tubo, atinge o um tubo de endoneuro
do segmento distal e posteriormente a fibra muscular. Cada axônio do coto
proximal origina até 50 brotos, mas somente alguns deles alcançam um tubo
endoneural. O axônio se regenera a uma velocidade de 1mm por dia.
O sinal de Tinel é indicativo de regeneração neurítica pós-
traumática: a percussão, ou leve pressão digital sobre o ponto onde se supõe
esteja a interrupção do nervo, desperta sintomas parestésicos à jusante, até à
região distal onde já existam fibras em processo de regeneração.
• Etiopatogenia
As lesões traumáticas agudas dos nervos periféricos podem ser
consequente aos seguintes mecanismos:
-Lesões diretas
Nas lesões abertas ou feridas pode ocorrer uma secção completa
ou parcial do nervo. São causadas por instrumentos penetrantes, por fragmentos
ósseos resultantes de fraturas e por arma de fogo. Nas feridas por objeto
cortante a perda de substância é mínima e é possível a realização de uma sutura
primária. Nas lacerações ou feridas contusas, a perda de substância são
75

importantes e pode ser necessário a realização de enxerto com fascículos de um


nervo doador.
Nas lesões fechadas ou por contusão pode tratar-se de uma
neuropraxia e a recuperação espontânea é possível. Mas pode também ocorrer
esmagamento do nervo com interrupção da continuidade axonal (axoniotmese).
- Lesões mecânicas indiretas: estiramento
Estas são as lesões mais extensas em comprimento, o que torna
difícil a recuperação. São acompanhadas de desmielinização segmentar,
segmentação dos axônios e fibrose intersticial. São ocasionadas por movimentos
exagerados na articulação do ombro com ou sem luxação articular. Os elementos
superiores do plexo braquial são atingidos com maior frequência. Todos os graus
de lesão podem ocorrer, desde a avulsão de raízes da medula até a lesão de um
tronco que permanece em continuidade e que pode apresentar axonotmese. A
avulsão radicular pode acompanhar-se de ruptura da dura-máter, formando-se um
divertículo ou meningocele pós-traumática. Uma causa relativamente frequente de
lesão do plexo braquial por estiramento é o acidente com motocicleta, em que o
indivíduo é arremessado do veículo e choca o ombro contra o solo. Geralmente, a
lesão ocorre de forma mais intensa no tronco superior, mas o comprometimento
pode ser mais extenso, inclusive com avulsão completa das raízes e paralisia e
anestesia do membro superior. As lesões do plexo braquial por trauma de parto
são resultantes do estiramento do plexo durante as manobras de liberação da
criança durante o parto. O tipo mais comum é consequente às manobras de
liberação forçada dos ombros, com tração cefálica, nos partos com apresentação
cefálica, com comprometimento dos elementos superiores do plexo (paralisia do
tipo superior ou de Duchene-Erb).
-Lesões por compressão e isquemia
Este mecanismo pode ocorrer por pressão externa nas posturas
viciosas ou na compressão por torniquetes ou por talas de gesso. A lesões por
isquemia podem ir desde alterações discretas da mielinização até a degeneração
76

walleriana completa. As lesões isquêmicas isoladas de um nervo são raras,


podendo ocorrer nos casos de fibrose inter-fascicular.
• Classificação
Seddon, baseado na intensidade do comprometimento das
estruturas do nervo e na intensidade das manifestações clínicas, classificou as
lesões dos nervos periféricos em três tipos elementares:
-Neuropraxia: consiste apenas bloqueio funcional da condução
nervosa no local lesado, geralmente conseqüente a um processo de compressão
intrínseca ou extrínseca, de curta duração e que provoca uma anóxia local nos
axônios por compressão dos vasos sangüíneos; não ocorre lesão anatômica dos
axônios. Uma vez removido o processo compressivo, ocorre a remielinização e a
condução nervosa reaparece em um curto período de tempo, com recuperação
completa da função. A eletromiografia mostra potenciais de inserção normais.
Alguns exemplos típicos de neuropraxia são as paralisias parciais do nervo fibular
que aparecem após a permanência das pernas cruzadas por tempo prolongado, as
paralisias do nervo radial resultante do apoio prolongado da cabeça sobre o braço
(paralisia do sábado à noite) e a paralisia do nervo interósseo dorsal por
compressão ao dormir com a cabeça apoiada sobre o antebraço.
-Axoniotmese: o processo restringe-se ao neurônio, que sofre
degeneração walleriana. Caracteriza-se por parada da continuidade do fluxo
axônico e da condução nervosa até que ocorra uma possível regeneração. O
quadro clínico é de uma paralisia sensitivo-motora completa. Em consequência da
redução do calibre axonal, a velocidade de condução está diminuída no segmento
proximal à lesão. A eletromigrafia mostra potenciais de desnervação (fibrilações).
Se a compressão for removida, ocorre a regeneração axonal e da bainha de
mielina, com recuperação espontânea da função. Uma vez que os tubos de
endoneuro estão preservados, a regeneração de cada axônio deverá ocorrer
dentro do seu respectivo tubo, garantindo a reinervação das estruturas dentro do
padrão original, com recuperação completa da função.
77

-Neurotmese: ocorre nas lesões em que há algum


comprometimento da estrutura de sustentação conjuntiva e do axônio do nervo. A
lesão pode apresentar-se com aparente continuidade do tronco do nervo, mas
com comprometimento total dos elementos neurais, ou com transecção do nervo.
Nas lesões em que há solução de continuidade de parte ou de todo o arcabouço
conjuntivo de sustentação, as fibras em regeneração não conseguem encontrar um
caminho para percorrer e formam um enovelado no local da lesão que, juntamente
com a proliferação de tecido conjuntivo e das células de Schwann, formam um
abaulamento local denominado neuroma.
• Avaliação clínica
A interrupção de um nervo misto determina uma série de eventos
sintomáticos, clinicamente esquematizados em paralisia, anestesia e alterações
autonômicas.
A avaliação inicial deve procurar por em evidência um déficit
motor, uma modificação objetiva ou subjetiva da sensibilidade e alterações
vasomotoras e tróficas.
Na avaliação da motricidade deve-se avaliar individualmente os
diferentes músculos e quantificar a força muscular segundo a escala clínica de
Higuet:
- 0: paralisia total
- 1: fibrilação muscular
- 2: contração sem força da gravidade
- 3: contração contra a força da gravidade
- 4: contração contra contra resistência
- 5: função normal
O déficit motor e a correlata atrofia dos músculos tributários do
nervo è patognomônica para cada nervo. A paralisia é flácida e acompanhada de
arreflexia e atrofia. Os músculos desenervados podem apresentar pequenas
contrações denominadas de fasciculações.
78

Nas neuropatias o distúrbios sensitivos são habitualmente mais


exuberantes e variados do que os de caráter motor. A anestesia por lesão de um
nervo periférico é do tipo periférico e acomete todas as formas de sensibilidade,
mas a zona de anestesia pode não corresponder precisamente ao território
sensitivo do nervo lesado; ela pode ser menos extensa em consequência da
superposição dos territórios dos nervos vizinhos. O território inervado por um
nervo cutâneo é constituído de duas zonas: uma central ou autônoma, devida
exclusivamente ao nervo e uma periférica, onde as alterações de sensibilidade são
cada vez menos acentuadas à medida que se distancia da zona central. O bloqueio
de todas as formas de sensibilidade define a anestesia; quando o bloqueio é
parcial, permitindo alguma sensibilidade, tem-se a hipoestesia, que pode
acompanhar-se por sensações adulteradas, como as parestesias, as hiperestesias e
a dor.
As alterações vasomotoras e simpáticas ocorrem à distância do
traumatismo e a intensidade das mesmas varia em função dos nervos lesados,
sendo, por exemplo mais importantes para o nervo mediano que contém um
grande número de fibras simpáticas.
Os principais troncos nervosos acometidos são os nervos mediano,
ulnar radial e fibular.
A paralisia do nervo mediano caracteriza-se pela incapacidade de
pronar o antebraço, de fletir os três primeiros dedos e de realizar a oposição do
polegar. A atrofia tenar e a postura do polegar, que se coloca ao lado do indicador,
conferem à mão o aspecto de mão simiesca. A hipoestesia ocorre no território
terminal de distribuição do nervo (lado externo da face palmar da mão).
A lesão do nervo ulnar manifesta-se pela impossibilidade de flexão-
adução do punho, de flexão das primeiras falanges, de abdução e adução dos
dedos (paralisia dos interósseos), de adução do polegar e do movimento do dedo
mínimo. A hipoestesia acomete o dedo mínimo e a metade interna do dedo
anular.
79

A lesão do nervo radial determina déficit dos músculos extensores


do antebraço, da mão e dos dedos e do músculo braquiorradial. O resultado é a
presença da “mão caída”. As alterações sensitivas limitam-se ao dorso da primeira
falange do polegar e à zona vizinha do primeiro espaço interósseo.
A lesão do nervo fibular determina paralisia da flexão dorsal e da
abdução do pé e da extensão dos pododáctilos. As alterações da sensibilidade
localizam-se na face lateral da perna e no dorso do pé.
• Exames eletrofisiológicos
Os três exames mais importantes para a avaliação eletrofisiológica
dos nervos periféricos são o teste de estimulação dos troncos nervosos, a
eletroneurografia (potencial evocado dos nervos) e a eletromiografia. Os dois
primeiros são capazes de detectar o processo de degeneração axonal muma fase
precoce, enquanto que o último é útil quando a degeneração já ocorreu.
O teste da estimulação consiste na aplicação de um estímulo
elétrico no tronco do nervo e na verificação da contração muscular. Dependendo
do grau da lesão, ocorre alteração de intensidade variável na condução do
estímulo nervoso e, conseqaüentemente, na contração do músculo. Assim, nos
casos de lesão leve (neuropraxia), a condução nervosa ocorre abaixo da lesão,
havendo um bloqueio do movimento voluntário. Quando ocorre comprometimento
do axônio e degeneração walleriana (axonotmese), haverá condução do estímulo
distalmente à lesão apenas nos primeiros dias, antes que a degeneração se
complete, com resposta muscular ainda presente neste período, ou então, a
resposta será obtida com um estímulo mais intenso que o normal. Quando existe a
ruptura da fibra nervosa e dos envoltórios conjuntivos (nerotmese), a degeneração
walleriana instala-se rapidamente, sendo a condução nervosa interrompida
precocemente. Neste caso, mesmo com estimulação nervosa abaixo do ponto de
lesão, não se observa resposta muscular, independentemente da intensidade do
estímulo.
A eletroneurografia (potencial de ação evocado do nervo) consiste
na captação de potenciais evocados em um ponto de um tronco nervoso distal a
80

uma lesão em continuidade, após um estímulo efetuado em um nervo, proximal à


lesão, ou vice-versa. A captação de potenciais abaixo da lesão, após o estímulo
proximal, depende da presença de fibras mielínicas de médio e de grosso calibres
no coto distal, ou seja, fibras que atravessam o local lesado. A regeneração destas
fibras geralmente possibilita o retorno da função, indicando um bom prognóstico.
O princípio da eletromiografia repousa sobre o registro dos
potenciais de ação da unidade motora ao nível do músculo, durante a execução de
movimentos voluntários ou por estimulação elétrica dos nervos. O músculo normal
não apresenta atividade elétrica em repouso e quando ele contrai os potenciais
podem ser registrados. É o exame mais importante para demonstração da
degeneração axonal e é, também, útil para detectar um processo de regeneração
incipiente. Normalmente, o músculo apresenta uma atividade ou potencial de
inserção quando nele é inserida uma agulha. Após a inserção da agulha, o músculo
em repouso não apresenta potenciais e, quando solicita-se ao paciente a execução
de um movimento voluntário, observa-se uma série de potenciais (potenciais de
unidade motora). Quando um músculo é desnervado, o silêncio elétrico é
substituído por numerosas pequenas deflexões denominadas de potenciais de
fibrilação, que refletem uma hiperexcitabilidade das células musculares. As
tentativas de contração voluntárias não modificam o registro elétrico. As fibrilações
aparecem somente duas a três semanas após o traumatismo, quando a
degeneração walleriana é completa.
• Regeneração
Tempo e distância na regeneração
A regeneração ocorre em ritmo definido e os sinais de sua
ocorrência pode ser esperados a partir da época do trauma ou da sutura. Se o
primeiro músculo alvo começa a apresentar função no tempo previsto, a decisão
contra a exploração cirúrgica é clara. Se o resultado não é obtido no tempo
previsto, a intervenção está indicada.
O tempo necessário para regeneração axonal envolve as seguintes
considerações: 1) há um intervalo de tempo antes dos axônios em regeneração
81

alcançarem o nervo distal ao local da lesão ou da sutura; este intervalo é de


aproximadamente duas semanas nos casos de axonotmese e de até quatro
semanas após uma sutura; 2) uma vez no coto distal, os axônios em regeneração
crescem a um ritmo de 1mm por dia. Se o nível da lesão é conhecido, pode-se
determinar o tempo que as fibras levarão para alcançar os músculos; 3) há um
intervalo final de semanas ou meses entre a chegada das fibras nervosas aos seus
alvos e a maturação dos axônios e seus receptores para permitir a função máxima.
Evidências de regeneração
A avaliação da possibilidade de regeneração espontânea e, caso
isto seja possível, a estimativa aproximada do tempo em que ocorrerá, pode ser
feita através dos exames clínico e eletrofisiológico.
O exame clínico consiste na avaliação da força muscular, da
sensibilidade, do sinal de Tinel e da sudorese.
Para melhor avaliação da recuperação da função, a força muscular
nos segmentos lesados pode ser classificada em graus, baseando-se em
movimentos padronizados. A classificação de força muscular mais utilizada é a
escala clínica de Higuet, exposta anteriormente. A recuperação da força muscular
pode ser avaliada empregando-se gradações como a proposta pelo British Medical
Research Council:
M5 Recuperação completa
M4 Todos os movimentos sinérgicos e independentes são
possíveis.
M3 Todos os músculos importantes tem ação contra a resistência.
M2 Retorno de contração perceptível nos músculos proximais e
distais.
M1 Retorno de contração perceptível nos músculos proximais.
M0 Ausência de contração.
A recuperação sensitiva é de difícil avaliação em consequência da
superposição de inervação adjacente. A zona autônoma do nervo mediano inclui as
superfícies dorsal e volar do indicador e a superfície volar do polegar. O nervo
82

radial não tem uma zona autônoma definida mas, quando há perda sensitiva, ela
ocorre na tabaqueira anatômica. As zonas autônomas do nervo tibial incluem o
calcanhar e uma parte da planta do pé, enquanto o nervo peroneiro apresenta
uma zona autônoma menos consistente sobre o dorso do pé. O retorno da
sensibilidade a uma área autônoma é posterior ao retorno do primeiro sinal de
motricidade após uma sutura. A avaliação da recuperação da sensibilidade é mais
difícil que a motora. Pode ser avaliada por meio da escala proposta pelo British
Medical Research Council:
S4 Recuperação completa
S3+ Alguma recuperação da discriminação de dois pontos na
área autônoma.
S3 Retorno das sensibilidades superficial tátil e dolorosa na área
autônoma e desaparecimento de alguma reação de
hipersensibilidade prévia.
S2 Retorno de algum grau da sensibilidade superficial tátil e
dolorosa na área autônoma do nervo.
S1 Recuperação da sensibilidade cutânea profunda na área
autônoma do nervo.
S0 Ausência de sensibilidade na área autônoma.
O sinal de Tinel é obtido percutindo algum ponto no trajeto do
nervo; o paciente refere parestesias que cursam distalmente ao ponto de
percussão através da lesão até o sistema nervoso central. A presença deste sinal
indica que existe continuidade entre fibras sensitivas desde o ponto de percussão
através da lesão até o sistema nervoso central. Se a resposta move distalmente
com o tempo indica regeneração de fibras sensitivas em direção ao coto distal. O
sinal de Tinel não obtido no local no local da lesão após quatro a seis semanas
(tempo necessário para regeneração de fibras sensitivas finas), é forte evidência
contra regeneração. O sinal de Tinel, portanto, é comparável ao achado de
parestesias no trajeto distal do nervo à estimulação elétrica. A ausência de
resposta distal sensorial sugere fortemente interrupção neural total.
83

O retorno da sudorese em uma zona autônoma indica


regeneração. As fibras finas autonômicas são de fino calibre e regeneram-se
rapidamente. O retorno da sudorese pode preceder o retorno das funções sensitiva
e motora em semanas ou meses.
Os exames eletrofisiológicos, especialmente a estimulação nervosa
e a eletromiografia) são úteis para demonstrar evidências de regeneração
adequada. Na estimulação nervosa, a resposta muscular à estimulação elétrica do
nervo precede, em até um mês, o movimento voluntário. A eletromiografia pode
ser de grande valor na avaliação das lesões de nervos periféricos, principalmente
quando realizada de forma seriada. Não há atividade eletromiográfica
imediatamente imediatamente após uma lesão completa mas, após duas ou três
semanas, aparecem fibrilações e potenciais de desnervação e a atividade
insercional à introdução da agulha está diminuída. Com a regeneração, a atividade
insercional começa a reaparecer e os potenciais de fibrilação e desnervação
começam a diminuir em número e, algumas vezes, são substituídos por potenciais
de ação motores nascentes ocasionais. Os potenciais motores nascentes são
potenciais polifásicos de baixa voltagem, resultantes de descargas neuronais
assincrônicas, porque as fibras percorrem diferentes distâncias até alcançar a placa
motora. A eletromiografia é importante porque dá evidência de regeneração
semanas ou meses antes de ser detectada função motora voluntária.
Além dos fatores próprios do nervo, a degeneração muscular
constitui uma limitação para a reinervação. Após 18 meses de secção de um
nervo instala-se a atrofia muscular.
A ausência de evidência clínica ou eletrofisiológica de recuperação
após a lesão de um nervo periférico é um fator fundamental para o cirurgião
decidir por uma exploração precoce do ferimento. A observação de
descontinuidade anatômica grosseira justifica a ressecção imediata dos cotos e
sutura para restabelecer os condutos necessários para a regeneração axonal.
Entretanto, na maioria das lesões dos nervos periféricos ocorre continuidade à
84

inspeção macroscópica, tornando difícil a decisão a ser tomada em relação à


ressecção ou não da lesão.

• Tratamento cirúrgico
A cirurgia dos nervos periféricos evolui significativamente com a
introdução das técnicas microcirúrgicas por Jacobson, em 1963, e Smith, em 1964.
Três técnicas cirúrgicas básicas são utilizadas no tratamento da
lesão traumática aguda do nervo periférico: neurólise, sutura direta e enxerto de
nervo.
A neurólise consiste na ressecção de tecido cicatricial do tronco
nervoso. Pode ser externa, quando a ressecção é efetuada em torno do epineuro,
liberando-o de aderências aos tecidos vizinhos, e interna ou fascicular, quando o
epineuro é aberto e a ressecção de tecido cicatricial é efetuada entre os fascículos,
com o objetivo de descomprimir o tronco nervoso e os fascículos. A neurólise é
indicada nas lesões com continuidade do arcabouço conjuntivo do nervo, como na
fibrose.
A sutura direta do nervo tem por objetivo a aproximação dos
condutos de endoneuro para possibilitar a passagem das fibras em regeneração
através da lesão em que houve solução de continuidade do arcabouço conjuntivo.
Nos nervos monofasciculares (como os troncos do plexo braquial) ou com poucos
fascículos, a sutura perineural permite a anastomose com boa coaptação. Nos
nervos multifasciculares, uma melhor coaptação é obtida através da aproximação
individual de fascículos, com sutura realizada no perineuro ou no epineuro /
perineuro. A sutura direta é efetuada quando a aproximação direta dos cotos for
possível. É fundamental evitar-se a tensão na zona de sutura para prevenir a
fibrose e a isquemia.
O enxerto interfascicular permite de resolver o problema da tensão
em caso de perda de substância. É indicado quando não é possível a aproximação
85

dos cotos proximais em consequência da perda de substância do nervo. Como


enxerto utiliza-se um segmento de nervo retirado de um nervo sensitivo,
geralmente o nervo sural, que sofrerá um processo de degeneração e funcionará
apenas como condutos para os axônios do segmento proximal em regeneração
atingirem o coto distal do nervo lesado.

C) - NEUROPATIAS POR COMPRESSÃO


As neuropatias por compressão ou síndromes canalares
(entrapment neuropathy) são resultantes clínicas de um conflito continente-
conteúdo: de um lado o tronco nervoso e de outro uma região anatômica de um
segmento desse tronco onde as condições locais podem ser responsáveis por
múltiplos microtraumatismos que levam ao sofrimento progressivo do nervo.
Estas síndromes de compressão caracterisam-se:
-do ponto de vista histológico, por fenômenos inflamatórios que
levam progressivamente à formação de um espessamento localizado do nervo com
produção de fibrose cicatricial.
-do ponto de vista etiológico, por alguns fatores predisponentes,
como profissão, traumatismo e fatores endocrinianos; entretanto, a maioria dos
casos são idiopáticos, relacionados somente com as condições locais.
-do ponto de vista clínico, manifestam-se por dor de tipo troncular
no território sensitivo do nervo acometido; ocorre predominância de disestesias e
parestesias no mesmo território com predominância durante a noite.
Um nervo, quando passa através de um canal estreito, pode ser
sujeito a compressões constantes. O epineuro e perineuro tornam-se bastante
86

espessados, estrangulando o nervo e determinando desmielinização. Os dois


nervos mais comumente comprometidos são o mediano, o ulnar e o fibular.

1. Síndrome do túnel do carpo


Trata-se de neuropatia compressiva do nervo mediano que
manifesta-se por dores e parestesias. Acomete preferencialmente as mulheres em
idade próxima da menopausa.
Embora tenha sido descrita em 1854 por Sir James Paget, somente
cem anos mais tarde é que Phalen tornou a síndrome do túnel do carpo bem
conhecida. Marie e Fox, em 1913, correlacionaram esta síndrome com a
compressão mecânica do nervo mediano no túnel do carpo, quando investigaram o
papel do ligamento anular anterior na patogenia da atrofia da eminência tenar.
As manifestações clínicas traduzem-se, fundamentalmente, por
distúrbios sensitivos do tipo dor e parestesia, sendo que essa última acomete na
fase precoce as pontas dos dedos polegar, indicador, médio e metade radial do
anular. A dor, sob a forma de queimação, localiza-se na porção anterior do punho
com irradiação para a mão; pode ocorrer também uma irradiação com caráter
ascendente, para o antebraço e o braço. É comum a ocorrência ou intensificação
da dor durante a noite. As parestesias traduzem-se por formigamentos e sensação
de dormência nos três primeiros dedos da mão. Nas fases mais avançada da
doença pode ocorrer atrofia da eminência tenar, acompanhada de déficit motor
dos três primeiros dedos.
O aumento da sensibilidade das fibras nervosas lesadas e a
deformação mecânica é a base das três provas clínicas para detectar a lesão do
nervo mediano no canal do carpo. O sinal de Tinel é provocado pela percussão
sobre o nervo, ao nível do túnel do carpo, determinando uma sensação parestésica
na distribuição do nervo mediano na mão. A flexão ou hiperextensão do punho
pode determinar o aparecimento ou intensificação da dor (sinal de Phalen). A
prova da compressão com manguito (Guilliat e Wilson) que, quando inflado em
87

pressão superior à pressão sistólica, desencadeia sintomas sensitivos por bloqueio


do retorno venoso.
A eletromiografia evidencia um alongamento da latência motora
distal do nervo mediano, enquanto que a velocidade de condução motora entre o
cotovelo e o punho encontra-se normal. O mecanismo da neuropatia do nervo
mediano é essencialmente uma lesão mecânica dentro de um canal ósseo-fibroso
inextensível que se torna muito estreito pela hipertrofia de um dos elementos de
sua parede ou de um dos elementos que o atravessa. O quadro costuma ser
unilateral, podendo ocasionalmente acometer ambas as mãos. O canal do carpo,
delimitado anteriormente pelo ligamento anterior do carpo e posteriormente pela
goteira óssea do carpo, é uma região estreita onde o nervo mediano encontra-se
associado aos tendões dos flexores dos dedos. Na extremidade distal do canal
carpiano, o nervo mediano geralmente se divide em ramo motor e sensitivo. Na
mão, as fibras sensitivas do nervo mediano inervam os três primeiros dedos e as
fibras motoras inervam o adutor curto do polegar, o oponente do polegar, a
metade radial do flexor breve do polegar e os lumbricóides para o dedo indicador e
o dedo médio. Fibras autônomas integradas ao nervo mediano suprem o arco
superficial palmar e os vasos dos dedos. Estas fibras autônomas são responsáveis
pela transpiração e explicam a hipohidrose observada nas lesões do nervo
mediano.
O tratamento de escolha é cirúrgico em todos os pacientes com
quadro clínico clássico caracterizado por parestesias, hipotrofia tenar ou com
sintomas incapacitantes de longa duração e evolução progressiva, já que nestes
casos o tratamento conservador (imobilização, infiltração com corticóides ou
fisioterapia) produzem melhora apenas temporária. Os pacientes devem ser
operados o mais cedo possível, pois quanto menor o tempo de compressão
melhores são os resultados pós-operatórios. A técnica cirúrgica consiste em
exposição do ligamento transverso do carpo no punho através de incisão
longitudinal, feita sobre a prega mediopalmar e transversa à prega de flexão do
punho. Sob anestesia local, é incisada a pele, o tecido celular subcutâneo e a fina
88

fáscia palmar, expondo o ligamento transverso do carpo (flexor retinaculum). O


ligamento é seccionado paralelamente ao nervo mediano e perpendicularmente às
suas fibras. Utiliza-se imobilização por quinze dias com tala gessada e punho em
posição neutra.
2. Síndrome do túnel do nervo ulnar no cotovelo
Esta síndrome é explicada pela grande vulmerabilidade do nervo
ulnar na junção bráquio-antebraquial: trata-se de uma região anatômica de
transição onde o nervo encontra-se praticamente subcutâneo e atravessa um tunel
òsseo-fibroso formado goteira epitròclea-olecraniana.
O quadro clínico caracteriza-se por:
- disestesias e parestesias nos dois últimos dedos e no
bordo ulnar da mão;
- aparecimento progressivo de hipoestesia;
- déficit dos movimentos finos da mão e dos dedos,
dificuldade crescente de afastar os dedos, déficit da adução do quinto dedo.
O diagnóstico é confirmado pela eletromiografia que evidencia um
bloqueio de condução ao anél do cotovelo.
O tratamento cirúrgico consiste na abertura da goteira epitróclea-
olecraniana e, quando necessário, transposição do nervo ulnar.
3. Compressão do nervo fibular ao nível do colo da fíbula
A etiologia mais comum é a compressão do nervo fibular quando
ele contorna a cabeça da fíbula. Ao nível da cabeça da fíbula, o nervo fibular
atravessa uma fenda intermuscular, passando da loja posterior para a loja lateral
da perna. Ele situa-se dentro de um verdadeiro túnel ósseo-muscular, repousando
diretamente sobre a face externa do colo da fíbula.
A sintomatologia motora pura é a mais frequentemente
encontrada. Caracteriza-se por déficit motor da flexão dorsal do pé e dos
pododáctilos. Ao déficit motor pode associar-se dor, disestesia e parestesia na face
externa da perna e no dorso do pé.
89

O diagnóstico baseia-se no quadro clínico e na eletromiografia que


evidencia um bloqueio de condução do nervo ao nível do colo da fíbula.
O tratamento é essencialmente cirúrgico.

D) - TUMORES DOS NERVOS RAQUIANOS


Os tumores dos nervos raquianos mais frequentes são o
schwannoma e o
Neurofibroma.
• Schwannoma
Trata-se de tumor originário das células de Schwann que
apresenta-se bem delimitado, que afasta os fascículos vizinhos, criando a figura
análoga aos meridianos em um globo terrestre.Origina-se de um fascículo e
empurra os demais. Manifesta-se por déficit sensitivo ou motor. O tratamento é
cirúrgico.
• Neurofibroma
Associado à neurofibromatose, é formado por células de Schwann
com produção importante de colágeno e fibroblastos. Não apresenta limite nítido
com o nervo de origem, realizando uma desorganização dos fascículos, mas é bem
delimitado em relação aos tecidos vizinhos. Manifesta-se por déficit sensitivo ou
motor. Pode estar presente sinais cutâneos de neurofibromatose. O tratamento é
cirúrgico.
90
91

CAPÍTULO 4

RADICULALGIAS
92

RADICULAGIAS:LOMBOCIÁTICA E CERVICOBRAQUIALGIA

Existem 31 pares de raízes espinhais (8 cervicais, 12 torácicas, 5


lombares, 5 sacrais e 1 coccígea. As sete primeiras raízes levam o nome da
vértebra situada abaixo de sua emergência no forame de conjugação. A raiz C1
emerge entre o occípeto e C1 e a raíz C8 entre C7-T1. A partir de T1 elas
recebem o nome da vértebra situada acima. As raízes anteriores e posteriores
unem-se justamente antes de atravessar o forame de conjugação para formar o
nervo raquidiano.
As raízes passam pelo desfiladeiro interdisco-articular que precede
o forame de conjugação, formado na frente pelo disco intervertebral e atrás pela
articulação vertebral posterior. É ao nível desse desfiladeiro que pode ocorrer as
compressões radiculares de origem discal ou vertebral. Elas são especialmente
frequentes na coluna cervical baixa e na coluna lombossacra. Na coluna cervical é
frequente um osteófito de origem unco-vertebral ou uma hérnia discal comprimir a
raiz, especialmente em C5-C6 e C6-C7, determinando uma cervicobraquialgia. As
raízes L5 e S1 estão, ao nível de suas emergências, especialmente em contato
com o disco intervertebral sobrejacente. Uma hérnia discal L4-L5 determina
compressão da raiz L5 e uma hérnia do disco L5-S1 comprime a raiz S1.
• Lombociática
O disco intervertebral (núcleo pulposo e anel fibroso periférico) é
delimitado posteriormente pelo ligamento vertebral comum posterior, que é muito
inervado. A sua compressão pelo disco determina a dor raquiana e a contratura
muscular reflexa (lombalgia). A migração de um fragmento do núcleo pulposo
93

através da parte posterior do anel fibroso, acompanhado às vezes de ruptura do


ligamento vertebral comum posterior, determina a compressão de uma raíz
nervosa e consequente ciática. A hérnia discal ocorre mais frequentemente ao
nível dos dois últimos discos lombares. Ela é geralmente lateral, comprimindo a
raiz que passa junto a ela. Às vezes ela penetra no forame de conjugação (hérnia
foraminal). A hérnia discal representa geralmente a última fase da deterioração
do disco intervertebral. A lombociática ou ciática resulta geralmente do conflito
entre a raiz L5 ou S1 e o disco intervertebral correspondente. A ciática radicular
por hérnia discal é muito frequente no adulto e representa de 25 a 30% da
atividade neurocirúrgica. O comprometimento radicular por hérnia discal
representa 95% das ciáticas.
O sintoma essencial do comprometimento radicular é a dor no
trajeto de uma raíz (ciática), que é exacerbardo pela tosse, pela defecação pela
mobilização da coluna e pelas manobras de estiramento da raíz. A anamnese
geralmente evidencia uma lombalgia antiga que evolui para crises cada vez mais
duradouras e separadas por menor intervalo de tempo. No final da evolução da
lombociática, aparece uma ciática isolada; o desaparecimento da lombalgia indica
a ruptura do ligamento vertebral comum posterior. Um déficit motor e a abolição
de um reflexo muscular pode completar o quadro clínico. A forma de instalação da
lombociática pode ser brusca ou rapidamente progressiva, precedida de lombalgia.
O trajeto doloroso é aquele do nervo ciático. A dor é exarcebada pelos
movimentos e pela tosse. A flexão do membro inferior sobre a bacia é limitada
pela dor. Esta manobra constitui o sinal de Lasségue que permite de avaliar
aproximadamente a intensidade da lombosciática em função do ângulo de
aparecimento da dor. Este sinal é pesquisado com o paciente em decúbito dorsal e
o membro inferior estendido; realiza-se a flexão passiva da coxa sobre a bacia. O
exame neurológico inclui o estudo da sensibilidade cutânea, da força muscular e
dos reflexos musculares.
Na lombociática L5 a dor manifesta-se na face póstero-externa da
coxa, na face externa da perna e no dorso do pé. O déficit sensitivo pode ser
94

colocado em evidência na porção medial do dorso do pé. Quando ocorre déficit


motor, ele é mais evidente nos músculos extensor longo dos pododáctilos e
extensor longo do hálux; o paciente apresenta dificuldade em manter-se sobre o
calcanhar. È determinada por hérnia do disco intervertebral L4-L5.
Na lombociática S1 a dor localiza-se na face posterior da coxa e da
pena e na planta do pé. O déficit sensitivo, quando presente, é mais evidente na
planta e na borda lateral do pé. O reflexo aquileu pode estar abolido. O déficit
motor é mais evidente nos músculos flexores longo dos pododáctilos e flexor longo
do hálux; o paciente apresenta dificuldade em manter-se sobre a ponta do pé. È
determinada por hérnia do disco intervertebral L5-S1.
Os exames complementares fundamentais são: radiografia simples
da coluna lombossacra, tomografia computadorizada e ressonância magnética.
O RX simples permite verificar o estado da coluna: anomalias
transicionais, estado dos discos intervertebrais e sinais de artrose e de
estreitamento do canal lombar.
A tomografia computadorizada coloca em evidência a hérnia discal
e permite avaliar também uma possível compressão de origem óssea. A
ressonância magnética está indicada nos caos em que a tomografia deixa dúvidas
e especialmente nos casos de recidiva após intervenção cirúrgica.
A lombociática evolui geralmente para melhora com o tratamento
conservador (repouso e analgésicos), mas as recidivas são frequentes. Apenas
uma pequena percentagem de lombociáticas têm indicação cirúrgica. Esta
indicação recai sobre aqueles casos que não melhoram com o tratamento
conservador e os exames de imagem evidenciam uma hérnia discal.
• Cervicobraquialgia
A hérnia discal cervical, da mesma forma que a lombar, é
decorrente de uma degeneração do anel fibroso com migração de parte do núcleo
pulposo para o canal raquiano. A hérnias póstero-laterais a disco-uncoartrose
determinam cervicobraquialgia e as medianas provocam uma compressão medular.
95

Os espaços intervertebrais C5-C6 e C6-C7 são os mais frequentemente


acometidos.
A cervicobraquialgia é ocasionada geralmente por um conflito
disco-radicular sobre uma das raízes do plexo braquial, especialmente C5, C6, C7 e
C8. Elas caracterizam-se por uma síndrome radicular do membro superior
(cervicobraquialgia) e uma síndrome da coluna cervical (raquialgia).
A cervicobraquialgia C5 manifesta-se por dor e déficit sensitivo no
ombro e pode acompanhar-se de paresia do músculo deltóide.
A cervicobraquialgia C6 irradia-se para a face anterior do braço, a
parte externa do antebraço e o polegar, com deficit sensitivo nesse dedo. O déficit
motor pode ocorrer nos músculos supinador longo, no bíceps, no braquial anterior.
Pode ocorrer abolição dos reflexos bicipital e estilo-radial.
A cervicobraquialgia C7 ocupa a face posterior do braço e do
antebraço, o dedo médio, onde pode ocorrer deficit sensitivo. Deficit motor pode
ocorrer no músculo extensor comum dos dedos.
A cervicobraquialgia C8 ocupa a face interna do braço e do
antebraço e o dedo mínimo, que pode apresentar deficit sensitivo. Pode ocorrer
deficit dos músculos flexores do dedos e dos interósseos.
A confirmação diagnóstica é feita por meio do exame radiológico
simples, da tomografia computadorizada e da ressonância magnética.
O tratamento clínico da cervicobraquialgia inclui repouso,
analgésicos, antiinflamatórios e miorelaxantes. A indicação cirúrgica restringe-se
aos casos com déficit motor, apresentando concordância clínico-radiológica e
resistência ao tratamento conservador.
96
97

CAPÍTULO 5

LESÃO MEDULAR
98

LESÃO MEDULAR

Sob este título descrevemos a compressão medular, os tumores


intramedulares e o traumatismo raquimedular.

A) - COMPRESSÃO MEDULAR
Sob esse título descreve-se essencialmente as compressões
medulares por processos neoplásicos extradurais e intradurais extramedulares.
• Quadro clínico
1- Síndrome lesional - Os sinais lesionais indicam o segmento
medular lesado. Traduzem-se por distúrbios motores (paralisia flácida) e sensitivos
(anestesia ou dor), de topografia radicular, e reflexos (hipo ou arreflexia). A
radiculalgia é o sintoma dominante.
2- Síndrome sublesional – Os sinais sublesionais, consequentes à
separação da medula, situada abaixo da lesão, dos centros encefálicos.
Manifestam-se por paralisia e anestesia abaixo do nível da lesão e fenômenos de
liberação medular (hiperreflexia). As alterações esfincterianas, classicamente
tardios, limitam-se a perturbações da micção: polaciura, micções imperiosas e
episódios de retenção urinária.
3- Síndrome raquiana – Manifesta-se por contratura muscular
paravertebral, retificação segmentar da coluna, dor provocada pela compressão de
um processo espinhoso. Na criança é frequente encontrar-se escoliose ou xifose.
4- Síndrome liquórica – Os exames de imagem diminuíram muito a
importância da punção lombar. Na compressão medular o líquor encontra-se de
99

aspecto xantocrômico, com dissociação albumino-citológica, proteinorraquia


elevada e bloqueio na prova de Queckenstedt.
5- Formas topográficas – O nível da compressão permite de
individualizar formas topográficas no sentido vertical. Na compressão da medula
cervical (nível raquidiano de C1 a C7) a síndrome radicular manifesta-se sob a
forma de cervicobraquialgia, acrescida às vezes de síndrome de Claude Bernard-
Horner nas compressões baixas. As compressões altas podem complicar-se com
uma paralisia do nervo frênico. A síndrome sublesional manifesta-se por uma
tetraparesia ou paraparesia espástica com acometimento motor parcial dos
membros superiores. A diplegia braquial pura é rara. A compressão da medula
torácica (nível raquidiano de C7 a T10) manifesta-se por dor radicular do tipo
neuralgia intercostal com hipoestesia e parestesia e paraparesia espástica. A
compressão da medula lombossacra e do cone terminal (nível raquiano de T10 a
L1-L2) manifesta-se por dor radicular e alterações de esfíncter e de função sexual
(incontinência, impotência); pode ocorrer déficit motor tipo flácido-espástico.
Diferentes síndromes parciais por lesões anatômicas assimétricas ou dissociadas
podem ser individualizadas. A mais característica é a síndrome de Brown-Séquard
(paralisia homolateral, anestesia profunda homolateral e anestesia dolorosa
contralateral), mais ou menos completa, por compressão de hemi-medula em
contato com uma lesão lateralizada.
• Diagnóstico
O diagnóstico baseia-se no quadro clínico e nos exames
complementares. A punção lombar pode confirmar a compressão, mas com os
modernos exames de imagem tem pouca indicação. Anomalias ósseas podem ser
postas em evidência por meio de exame radiológico simples e de tomografia
computadorizada. Esse exame pode evidenciar a lesão compressiva e precisar o
nível. Às vezes deve ser associado a mielografia (mielo-tomografia) para melhor
demonstrar o nível do bloqueio. A ressonância magnética é o exame mais
importante, fornecendo informações quando à deformação da medula, alterações
100

de seu parênquima sob a forma de sinais medulares anormais, demonstração


direta da lesão compressiva e do bloqueio liquórico.
• Tipos de compressão
1-Compressão epidural
Os tumores raquianos representam a causa mais frequente de
compressão epidural. Manifestam-se essencialmente por dor, sinais neurológicos e
deformação vertebral. A dor está presente na grande maioria dos casos,
constituindo-se no sinal inicial. Ela pode ser de origem vertebral por infiltração das
estruturas ósseas, ou radicular por compressão tumoral das raízes, ou medular por
compressão das fibras longas. Os sinais neurológicos podem aparecer tardiamente
e o quadro clínico é aquele de compressão medular caracterizado por déficit motor
e sensitivo que marca o nível da compressão, associado a alterações
esfincterianas. Geralmente ocorre uma paraplegia espástica, quando a instalação é
progressiva, e flácida, quando a instalação é aguda (choque medular). Abaixo de
L2, a compressão epidural manifesta-se por síndrome da cauda equina.
Em casos mais raros, o tumor raquiano manifesta-se por uma
tumefação dolorosa, especialmente nos casos de sarcomas. Pode ocorrer também
deformações vertebrais sob a forma de escoliose e xifose.
A radiografia simples da coluna pode evidenciar diferentes tipos de
lesões ósseas. As lesões osteolíticas são mais frequentes, sobretudo nos tumores
metastáticos (pulmão, seio, rins, mieloma) e nos tumores malignos primitivos. O
desaparecimento de um pedículo é geralmente o primeiro sinal de lesão
metastática. As lesões osteoblásticas (imagens de condensação óssea) são mais
raras e são observadas especialmente nas metástases de câncer de próstata e nos
tumores primitivos benignos (osteoma osteóide e osteoblastoma). As lesões
osteolíticas podem provocar fratura vertebral e xifose.
Na tomografia computadorizada o tumor raquiano aparece como
uma zona osteolítica, sendo possível precisar seus limites, a extensão para dentro
do canal vertebral e a invasão dos tecidos paravertebrais. Em alguns caos pode ser
associada à mielografia (mielo-tomografia), permitindo demonstrar uma expansão
101

epidural do tumor e um bloqueio de tipo epidural. A cintilografia óssea permite


detectar metástases ósseas. A ressonância magnética permite precisar os limites
do tumor, as estruturas ósseas comprometidas, a importância da compressão
medular e a extensão tumoral aos tecidos vizinhos.
Os tumores raquianos podem ser primitivos ou secundários
(metástases). Os primitivos classificam-se em benignos (osteoma osteóide, tumor
de células gigantes, cistos ósseos aneurismais e hemangioma) e malignos
(plasmocitoma, mieloma múltiplo, cordoma, osteosarcoma, condrossarcoma e
sarcoma de Ewing). As metástases são os tumores raquianos mais frequentes
(70% dos casos). A lesão metastática pode ocorrer em um paciente com câncer
primitivo conhecido ou revelar um câncer oculto. As origens mais frequentes de
metástases são os tumores de seio, pulmão e próstata. A localização mais
frequente é lombar ou torácica. A compressão medular ou da cauda equina pode
ser por invasão epidural do tumor ou por fratura do corpo vertebral e xifose.
O tratamento pode ser por meio de cirurgia, radioterapia e
quimioterapia. A escolha vai depender do estado geral do paciente, da extensão da
lesão tumoral, do tipo de tumor e do grau de comprometimento neurológico.
Após os tumores raquianos, o linfoma é uma das causas mais
frequentes de compressão epidural, especialmente na faixa etária entre os 50 e 60
anos. O mais comum é a localização torácica que manifesta-se inicialmente por
raquialgia ou radiculalgia, seguindo-se de paraparesia. A laminectomia pode
permitir a exérese completa do tumor com melhora do déficit. O tratamento deve
ser complementado com radioterapia e quimioterapia. O prognóstico vital e
funcional é significativamente melhor do que nas demais compressões epidurais
por tumores malignos.
As metástases epidurais puras sem participação óssea são raras.
Na ausência de neoplasia visceral conhecida, trata-se usualmente de descoberta
histológica após laminectomia realizada para tratar compressão medular de
instalação rápida.
102

Os neurinomas em ampulheta têm um prolongamento epidural,


apresentando nesses casos sinais de compressão óssea.
2- Compressão intradural extramedular
É provocada essencialmente pelos meningiomas e neurinomas
intraraquianos. O meningioma representa entre 15 a 20% das causas de
compressão medular tumoral. Ocorre predominantemente no sexo feminino, após
os 60 anos e localiza-se sobretudo na coluna torácica alta (T1 a T4). O quadro
clínico manifesta-se geralmente por síndrome radicular. A mielografia evidencia o
meningioma sob forma de bloqueio regular e a ressonância magnética sob a forma
de massa extra-axial que capta gadolíneo. O tratamento é cirúrgico.
O neurinoma intraraquiano tem aproximadamente a mesma
frequencia dos meningiomas. Apresenta predominância cervical baixa e acomete
mais o adulto jovem do sexo masculino. O quadro clínico dominante é de síndrome
radicular, sendo a dor agravada pelo decúbito. O exame radiológico simples e a
tomografia computadorizada podem mostrar uma dilatação do forame de
conjugação. A mielografia evidencia uma compressão tipo intradural-extramedular:
parada do contraste “em cúpula”. Na ressonância magnética a fixação do
gadolíneo é menos homogênea do que nos meningiomas. O tratamento é
cirúrgico.
103

C) - TUMORES INTRAMEDULARES
Os tumores intramedulares representam 5% dos tumores
primitivos do sistema nervoso central e 30% dos tumores intraraquianos
intradurais. Trata-se geralmente de tumores gliais primitivos: astrocitoma e
ependimoma.
O astrocitoma ocorre principalmente na medula cérvico-dorsal
(80%). Podem ser de baixo grau (tipo papilar) ou de alto grau. Os ependimomas
ocorrem também de forma preferencial na medula cérvico-dorsal (90%). São
geralmente tumores benignos, sendo o aspecto histológico de tipo papilar.
Os sintomas iniciais não são específicos e têm uma evolução
lentamente progressiva. Dor ocorre em mais da metade dos casos, sendo
incaracterística ou do tipo radicular ou cordonal. O comprometimento medular
manifesta-se por déficit motor, déficit sensitivo objetivo e parestesias e alterações
esfincterianas.
A tomografia computadorizada evidencia uma medula alargada. A
ressonância magnética é o exame ideal. A sequência em T1 mostra um tumor
intramedular, estando a medula aumentada de volume em um ou vários
segmentos; o tumor apresenta um sinal hipo-intenso em relação à medula. Na
sequência de T2 ocorre geralmente um hipersinal. A injeção de gadolíneo mostra
na maioria dos casos uma fixação de contraste de homogeinidade variável,
permitindo uma delimitação do tumor, da medula e dos cistos.
O tratamento dos astrocitomas e ependimomas intramedulares é
cirúrgico. Os ependimomas são bem delimitados em relação à medula, tornando a
exérese mais fácil. Os astrocitomas apresentam maior dificuldade técnica em
consequência do caráter infiltrativo; as recidivas são frequentes.
104
105

CAPÍTULO 6

HIPERTENSÃO INTRACRANIANA (HIC)


106

HIPERTENSÃO INTRACRANIANA
1 ) – CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A hipertensão intracraniana (HIC) é o denominador comum de
várias condições neurológicas e constitui uma emergência médica. O aumento da
pressão no interior do crânio pode ser conseqüente a várias doenças que afetam o
encéfalo, como lesões vascular, tóxica, inflamatória, parasitária, neoplásica e
traumática. É especialmente freqüente no trauma cranioencefálico, onde é causada
pela tumefação cerebral e pelos hematomas intracranianos (ADAMS, 1992;
PITTELLA, GUSMÃO, 1993).

2 ) - FISIOPATOLOGIA

A) - Pressão intracraniana
A pressão intracraniana (PIC) depende da anatomia do espaço
craniorraquiano, das propriedades físicas do tecido cerebral, da dinâmica da
circulação sanguínea e liquórica e das reações desses fatores às alterações
patológicas (GAAB, HEISSLER, 1984). O sistema nervoso central encontra-se no
recinto cérebro-espinhal, que, no adulto, é um reservatório inextensível de volume
constante. Três elementos ocupam esta cavidade: O parênquima cerebral, sistema
vascular e o líquido cefalorraquidiano (LCR), sendo que estes dois últimos
componentes correspondem aproximadamente a 10% do conteúdo intracraniano.
O parênquima cerebral tem um volume constante e, do ponto de
vista mecânico, pode ser interpretado como uma esponja submicroscópica,
formada de material visco-elástico. Dentro deste parênquima, dois compartimentos
ou cavidades podem ser isolados : o compartimento venoso e o líquido
extracelular. Eles representam a compressibilidade do parênquima cerebral por
estarem ligados ao sistema venoso extracraniano exposto à pressão atmosférica. O
107

tecido cerebral por si mesmo não é compressível, mas sua deformação elástica é
possível, graças à presença dos compartimentos de líquidos, semelhantes ao que
ocorre com uma esponja. Assim, a elasticidade do cérebro é devida a uma
propriedade de seus tecidos e a sua compressibilidade à possibilidade de contração
dos sistema de líquidos.
O sistema vascular intracraniano está em comunicação com o
sistema vascular extracraniano. O sistema venoso intracraniano pode, portanto,
durante um aumento da pressão venosa devida a um aumento da PIC, reajustar
sua distribuição de pressão, expulsando uma parte do volume sanguíneo para o
sistema venoso extracraniano, comportando-se como um elemento elástico e
amortizador das variações da PIC.
O LCR é produzido essencialmente ao nível do plexo coróide e
retorna à circulação sanguínea através das vilosidades aracnóideas situadas ao
nível do seio longitudinal superior. As granulações de Pacchioni representam os
aspectos morfológicos das vilosidades aracnóideas. A secreção do LCR proveniente
do plexo coróide flui dos ventrículos laterais aos corpúsculos ou granulações de
Pacchioni, passando por diferentes forames, aquedutos e espaços subaracnóideos
cisternais, até drenar-se no sistema venoso. A pressão do LCR, ou seja, a PIC
origina-se da diferença entre a formação e a reabsorção de um certo débito (D) de
LCR, porque esta reabsorção ocorre contra uma certa resistência ao escoamento
(R). Isto pode ser expresso pela equação : PIC = D. R . Em condições normais de
formação e resistência à absorção, a pressão hidrostática do LCR, com o indivíduo
em decúbito lateral, oscila entre 50 e 200 mm de água e é a mesma ao nível dos
ventrículos, cisterna magna e fundo de saco lombar (lei de Pascal). Quando o
paciente se encontra de pé, a pressão intraventricular normal ao nível do forame
de Monro é, em média, de 70 mm negativos de água, o que corresponde à
distância entre o orifício de Monro e a grande cisterna, onde a pressão é próxima
de zero.
A monitorização da PIC é importante pelo fato de que a HIC
geralmente precede a deterioração clínica. Lundberg introduziu a medida contínua
108

da pressão intraventricular. Posteriormente foi desenvolvido sensores que podem


ser colocados nos espaços extradural, subdural ou subaracnóideo. Diversos
sistemas de monitorização têm sido propostos, sendo os de coluna líquida os mais
utilizados. Estes estabelecem comunicação do transdutor com espaços liquóricos
naturais (ventrículo ou espaço subaracnóideo) e medem, portanto, uma pressão
hidrostática que, pela lei de Pascal, é aproximadamente a mesma em qualquer
ponto do espaço intracraniano, desde que haja livre comunicação dos sistemas
fluidos. Além dos sistemas que se utilizam da pressão hidrostática, há outros que
transmitem uma pressão pneumática através de um cabo que conecta um sensor
intracraniano ao monitor. Lundberg descreveu as ondas de pressão durante o
registro da PIC. As ondas A ou ondas em platô são consideradas patológicas e
geralmente estão associadas a sintomas e sinais de HIC. As ondas B podem
ocorrer em situações fisiológicas, mas freqüentemente estão associadas a
situações patológicas. As ondas C representam a repercussão dos batimentos
cardíacos no registro da HIC. O desaparecimento das ondas de pressão é
decorrente da falência vasomotora e indica mau prognóstico.

B) - Relação pressão-volume
Os três compartimentos intracranianos - o parênquima cerebral, o
compartimento vascular e o compartimento líquido extracelular - estão ligados
entre si por uma relação volumétrica expressa, depois de 1738, pela lei de Monro-
Kellie-Burrows : a soma dos volumes dos três compartimentos é constante, igual
ao volume do recinto ósseo-dural que os contém. Esta lei pode ser também
expressa pela forma : a soma algébrica das variações de volume dos três setores é
nula, ou seja, qualquer alteração volumétrica em um dos componentes
intracranianos (cérebro, LCR e sangue) é imediatamente compensada por uma
alteração oposta no volume dos demais componentes. O aumento de volume de
um dos componentes da cavidade intracraniana (hidrocefalia ou tumefação
cerebral) ou a presença de uma lesão expansiva provoca o deslocamento destes
componentes. Para que a PIC se mantenha inalterada é necessário que saia da
109

cavidade intracraniana um volume de líquido igual ao volume acrescentado.


Quando o novo volume torna-se superior a 10% do espaço intracraniano, inicia-se
a alteração da PIC.
Langfitt e seus colaboradores mostraram que a expansão de um
balão intracraniano numa velocidade constante em primata sub-humano
determinava elevação muito discreta da PIC inicialmente, até o volume do balão
atingir um ponto crítico, a partir do qual a expansão adicional do balão produziria
elevação constante da PIC. Este volume crítico do balão foi considerado
equivalente ao volume de sangue deslocado da cavidade craniana. O crescimento
progressivo de uma lesão expansiva determina um aumento da PIC que segue
uma característica curva exponencial volume/pressão. Nos estágios iniciais do
aumento volumétrico, o aumento de pressão é pequeno devido aos mecanismos
de compensação. No início do aumento volumétrico ocorre um deslocamento do
LCR em direção ao canal raquiano. Posteriormente diminui o volume sanguíneo por
compressão do sistema venoso. Caso a lesão expansiva continue poderá ocorrer
bloqueio das vias liquóricas com reduções das cisternas e colapso dos forames dos
ventrículos. Caso novas reduções do volume de líquido cefalorraquiano ou do
sangue não sejam possíveis, ocorre herniação do tecido cerebral provocada por
gradientes de pressão de um compartimento em relação a outro, com compressão
e encarceramento tecidual a nível da foice do cérebro, da tenda do cerebelo ou do
forame magno. Denomina-se complacência a capacidade da cavidade intracraniana
de adaptar-se ao aumento de volume em seu interior. O processo descrito pode
ser ilustrado por uma curva exponencial (curva de Langfitt), também denominada
curva de complacência cerebral, que estabelece a relação pressão-volume. Esta
curva relaciona no eixo horizontal o volume de determinado processo expansivo e,
no eixo vertical, a PIC que, inicialmente, se mantém estável devido aos
mecanismos de compensação (porção horizontal da curva) e, posteriormente, à
medida que ocorre maior expansão volumétrica, o aumento de pressão resultante
segue uma curva exponencial, discretamente ascendente no início e que apresenta
brusca elevação (porção vertical da curva),e portanto a complacência diminui,
110

quando se esgotam os mecanismos compensadores de espaço. A porção horizontal


da curva é denominada de período de compensação espacial e a porção vertical de
período de descompensação espacial. O teste de avaliação da complacência,
durante a medida contínua da PIC, consiste na injeção ou remoção no espaço
intraventricular de 1 ml de líquido, o que provoca uma modificação de pressão.
Esta modificação de pressão constitui a resposta volume-pressão, cuja importância
clínica reside na possibilidade de detectar um esgotamento dos mecanismos de
compensação intracranianos antes de haver significativas modificações da PIC.
A HIC evolui em quatro fases. O aumento inicial da PIC é
assintomático devido aos mecanismos de acomodação mecânica e compensação
volumétrica (fase 1). Esta compensação volumétrica é feita às custas de
dimimuição do LCR e do sangue circulante no leito venoso. Quando os mecanismos
compensatórios se esgotam surgem os sintomas clínicos que coincidem com as
ondas em platô ou ondas A (fase 2). Estas ondas tornam-se mais frequentes e
com maior amplitude, indicando uma lesão do tronco encefálico por hérnia
cerebral interna (fase 3). Nesta fase os sintomas de compressão do tronco
encefálico tornam-se evidentes e há comprometimento do nível de consciência.
Finalmente a PIC iguala-se à pressão arterial média, interrompendo a circulação
cerebral (fase 4). Isto pode ser evidenciado através de angiografia cerebral por
parada do contraste ao nível do sifão carotidiano. Nesta última fase ocorre coma
e alterações da pressão arterial, da freqüência cardíaca e do ritmo respiratório; a
morte ocorre por parada cardiorrespiratória. O aumento da pressão arterial
sistêmica em resposta à queda da pressão de perfusão cerebral (fenômeno de
Cushing) é atribuída a um aumento da resistência vascular sistêmica produzida por
isquemia do tronco encefálico.
A HIC altera a função neurológica através da diminuição do fluxo
sanguíneo cerebral e das hérnias cerebrais.
C) - Efeito da PIC sobre o fluxo sanguíneo cerebral
O fluxo sanguíneo cerebral (FSC) é igual à relação entre a pressão
de perfusão cerebral (PPC) e a resistência vascular cerebral (RVC). O fluxo
111

sanguíneo cerebral é mantido estável `as custas de adaptações da RVC, que é


modificada por mecanismos de auto-regulação. A pressão de perfusão cerebral
pode ser definida como a diferença entre a pressão arterial média (PAM) e a
pressão venosa. Para efeitos práticos a pressão no interior das veias cerebrais é
igual à PIC. A pressão venosa cerebral deve ser mantida pouco acima da PIC para
impedir o colapso das veias. Quando a PIC sobe, a pressão nas veias cerebrais de
paredes finas aumenta na mesma proporção. Se isto não ocorresse, as veias
colapsariam com consequente interrupção do fluxo sanguíneo cerebral. Por isso, a
pressão de perfusão cerebral, que consiste na diferença entre a pressão arterial e
a venosa, tem valor aproximado da diferença entre a pressão arterial e a
intracraniana. Estas relações podem ser sistematizadas na seguinte equação :
FSC = PPC / RVC = (PAM - PIC) / RVC
A manutenção da PPC, obtida pela diferença entre a PAM e a PIC,
é fundamental para a manutenção do FSC. O FSC é governado
primariamente pelo fenômeno de auto-regulação cerebral, que pode ser definido
como a tendência intrínseca do cérebro para manter um fluxo sanguíneo constante
em resposta às moderadas variações na pressão de perfusão (LASSEN, 1959). As
pequenas variações da pressão arterial e da PIC são compensadas por alterações
na resistência cerebrovascular. À medida que a PPC cai, seja por causa da
hipotensão arterial ou da HIC, ocorre dilatação progressiva das arteríolas e
pequenas artérias cerebrais. A resistência vascular então cai para compensar a
queda da pressão de perfusão, mantendo o FSC constante. Quando a auto-
regulação encontra-se íntegra, a PPC pode ser reduzida para 40 mm Hg antes de
ocorrer redução importante do FSC. Este processo é denominado auto-regulação,
porque é relativamente independente de influências extracerebrais. Quando a PIC
adquire um valor próximo daquele da pressão arterial (diferença de 40 mm de Hg
entre a PAM e a PIC) , atinge-se o ponto crítico, e o aumento ulterior da PIC
determina a diminuição pari passu da PPC e do FSC. Esta alteração do FSC é
devida à ação da HIC sobre os vasos encefálicos, acarretando diminuição do
diâmetro dos mesmos e consequente aumento da RVC. A vasoconstrição causa
112

queda do FSC, que determina anoxia cerebral. A redução do FSC e a anóxia


provocam aumento da concentração de óxido de carbono (CO2), que, por sua vez,
determina vasodilatação e aumento do fluxo sanguíneo cerebral. Estes, porém,
terminam por agravar a HIC.
A HIC influi também sobre o FSC através da elevação da pressão
arterial. Esta elevação teria como objetivo restaurar o FSC. A elevação da
pressão arterial, a bradicardia e a arritmia respiratória na fase final da evolução da
HIC constitui a tríade de Cushing

D ) - Hérnias cerebrais
Em um líquido, as variações locais de pressão são transmitidas em
todos os pontos do mesmo (princípio de Pascal), enquanto que as forças externas
que atuam sobre um corpo sólido são transmitidas de forma direcional, originando
um estresse interno com deslocamento em massa do corpo sólido. O parênquima
cerebral será, portanto, submetido a um estresse, enquanto que o LCR e o sistema
circulatório transmitirão pressões.
Devido às características físicas do encéfalo e à inextensibilidade
da caixa craniana, uma lesão expansiva intracraniana termina por provocar um
estresse e deslocamento do tecido cerebral de um compartimento para outro
(hérnia cerebral interna) desde que se estabeleça um gradiente de pressão. A
gravidade de uma hérnia cerebral ou cone de pressão está na dependência do
comprometimento secundário do tronco encefálico ao nível da incisura da tenda e
do buraco occipital.
Para se compreender as hérnias através dos compartimentos
intracranianos é fundamental o conhecimento da anatomia da foice do cérebro e
da tenda do cerebelo que dividem a cavidade intracraniana em compartimentos.
A foice do cérebro é um prolongamento vertical e mediano da
dura-máter, situado na cisura inter-hemisférica, que separa os dois hemisférios
cerebrais. Apresenta uma base que insere-se perpendicularmente sobre a parte
mediana da tenda do cerebelo, que ela eleva e mantém tensa. Sua borda superior
113

ocupa a linha mediana da crista galli até a protuberância occipital interna. A borda
inferior corresponde à face superior do corpo caloso; mas ela repousa diretamente
sobre ele somente na sua porção posterior (esplênio); anteriormente ela afasta-se
progressivamente desta estrutura. Forma-se, portanto, a este nível, entre o corpo
caloso e a borda inferior da foice do cérebro, um espaço triangular de ângulo
posterior, na área do qual os dois hemisférios estão diretamente em contato,
podendo ocorrer uma hérnia subfalciforme em caso de compressão de um
hemisfério cerebral.
A tenda do cerebelo é uma membrana transversal, situada na
parte posterior da cavidade craniana, entre os lobos occipitais, que estão acima, e
o cerebelo, que encontra-se abaixo. Ela é acentuadamente inclinada de cima para
baixo e da frente para trás, formando uma cobertura de duas vertentes laterais
(como uma tenda). Apresenta a forma de um croissant ou de lua crescente com
abertura anterior, apresentando portanto duas faces, duas circunferências e duas
extremidades.
A face superior, mais elevada na parte média que nas laterais,
está em contato com a face inferior dos lobos occipitais que repousam sobre ela. A
face inferior, em forma de abóbada, recobre a face superior dos hemisférios
cerebelares.
A circunferência posterior ou borda externa, de forma convexa vai
de uma apófise clinóide posterior à outra. Insere-se sucessivamente sobre :
protuberância occipital interna, porção horizontal do sulco transverso, borda
superior do rochedo e clinóide posterior.
A circunferência anterior ou borda livre ou borda interna, de
forma parabólica ou côncava, estende-se por cima da goteira basilar e forma, com
a extremidade desta, um orifício alongado da frente para trás - é o forame oval de
Pacchioni ou hiato tentorial ou incisura tentorial. O hiato tentorial é o orifício que
comunica as cavidades supra e infratentoriais, sendo limitado na porção anterior
pelos processos clinóideos posteriores e dorso da sela, na lateral, pela borda livre
da tenda e ligamento petroclinóideo e, na posterior, pela confluência da tenda e da
114

foice do cérebro no seio reto. A incisura tentorial corresponde posteriormente aos


tubérculos quadrigêmeos, à porção mais alta do vermis cerebelar (culmen) e à
porção mais interna e superior dos lobos laterais do cerebelo; ântero-lateralmente
aos pedúnculos cerebrais (mesencéfalo). Da face anterior do mesencéfalo, na
fossa interpeduncular, emergem os nervos oculomotores, que dirigem-se
obliquamente para a parede externa do seio cavernoso. Em posição superior em
relação ao nervo oculomotor estão as artérias comunicante posterior e cerebral
posterior, esta última cruzando o nervo no ponto em que se dirige para a fossa
supratentorial. Separando o mesencéfalo do clivus e da borda livre da tenda,
encontra-se anteriormente a cisterna interpeduncular, lateralmente a cisterna
peripeduncular (asas da cisterna ambiens) e posteriormente a cisterna ambiens. A
face mesial do úncus e da porção inicial do giro parahipocampal ultrapassam
ligeiramente a porção anterior da incisura tentorial. Chegando à borda superior do
rochedo, à frente do forame oval, a borda livre da tenda passa sobre este osso e
sobre a circunferência posterior, um pouco por fora da apófise clinóide posterior, e
vem se fixar sobre a borda externa da apófise clinóide anterior. Lateralmente à
sela túrcica as extremidades anteriores das circunferências anterior e posterior
delimitam uma pequena região de forma triangular, parede superior do seio
cavernoso, cujos três lados são formados : 1- do lado externo pelo prolongamento
da borda livre da tenda; 2- do lado posterior, pelo prolongamento da grande
circunferência da tenda que vai se inserir sobre a apófise clinóide posterior; 3- do
lado interno, por uma linha fictícia que une as duas apófises clinóides do mesmo
lado. O nervo troclear atravessa a dura-máter no ponto onde se entrecrusam as
duas circunferências da tenda e penetra na parede externa do seio cavernoso. O
nervo oculomotor cruza a borda posterior do triângulo limitado pelo cruzamento
dos dois prolongamentos da tenda do cerebelo, tangenciando o lado externo da
apófise clinóide posterior. A seguir aplica-se sobre a parede superior do seio
cavernoso e, dirigindo-se obliquamente para frente, perfura a dura-máter em um
ponto ao nível da metade do trajeto entre os dois processos clinóideos do mesmo
lado para penetrar na parede externa do seio cavernoso.
115

Nas lesões expansivas unilaterais, as estruturas da linha média são


desviadas para o lado oposto. O septo interventricular e o terceiro ventrículo são
desviados e o giro do cíngulo se projeta sob a borda livre da foice do cérebro
(hérnia supracalosa ou subfalciforme ou do giro do cíngulo). Nos casos mais
intensos, a hérnia subfalciforme pode comprimir uma ou ambas as artérias
pericalosas, com conseqüente infarto nos respectivos territórios de irrigação
(ADAMS; GRAHAM, 1972).
A hérnia tentorial ou cone de pressão tentorial apresenta-se
sob duas formas : a hérnia tentorial lateral (ou hérnia do úncus) e a hérnia
tentorial central do tronco encefálico.
A hérnia tentorial lateral ou uncal consiste na passagem parcial
do úncus e da porção medial do giro parahipocampal entre a borda livre da tenda
e o mesencéfalo. Em conseqüência, o mesencéfalo é comprimido no sentido
lateral, ocorrendo o alongamento de seu diâmetro ântero-posterior. Poderá ocorrer
também a compressão do nervo oculomotor e da artéria cerebral posterior. O
exame anatomopatológico pode mostrar, na fase aguda, a presença de um sulco
na superfície inferior do lobo temporal (giro parahipocampal), melhor observado
nos cortes coronais do cérebro (ADAMS, GRAHAM, 1976). Quando a cunha de
necrose por pressão é hemorrágica, a mesma pode ser identificada
macroscopicamente, principalmente nos cortes coronais do cérebro. Quando não
existe hemorragia, sua identificação pode exigir o exame microscópico (MILLER;
ADAMS, 1992). Em alguns casos ocorre hemorragia no nervo oculomotor
homolateral. Poderá também ser evidenciado infarto do córtex occipital medial
homolateral, conseqüente à oclusão da artéria cerebral posterior. Este infarto é
geralmente hemorrágico, porque a oclusão da artéria é incompleta, permitindo a
passagem de algum sangue pelo vaso alterado, que tende a romper-se (ADAMS,
1992). A hérnia do úncus é encontrada nos processos expansivos do lobo temporal
ou da região lateral da fossa média acompanhados ou não de HIC, mas pode
ocorrer com qualquer processo expansivo supratentorial.
116

Na hérnia transtentorial central ocorre deslocamento


para baixo de todo o tronco encefálico através do buraco de Pacchioni. É causada
principalmente por lesões expansivas de localização frontal ou parietal ou por
lesões expansivas bilaterais. Durante este processo, ocorre o estiramento das
artérias perfurantes do tronco encefálico oriundas da artéria basilar, em virtude de
o tronco encefálico deslocar-se para baixo, enquanto a artéria basilar mantém-se
relativamente fixa (HASSLER, 1967). O estiramento produz isquemia e hemorragia
nas proximidades da linha média do tronco encefálico, denominada de hemorragia
de Duret (KLINTWORTH, 1965).
Se a compressão supratentorial prossegue e a pressão
intraventricular excede de aproximadamente 10 mmHg a pressão subaracnóidea
cervical, o quadro de hérnia tentorial é seguido pelo de hérnia das tonsilas ou
amigdalas cerebelares. As tonsilas cerebelares se insinuam, então, através do
forame magno, obliterando a cisterna magna e comprimindo o bulbo (ADAMS,
GRAHAM, 1976).
A HIC é diagnosticada no exame anatomopatológico através dos
seguintes sinais: sulco ou necrose no giro parahipocampal, hemorragia pontina ou
mesencefálica, infarto occipital, substância negra abaixo da linha do tentório e
sulco ou necrose na amígdala cerebelar (ADAMS, 1992). Dentre estes sinais o
mais importante do ponto de vista anatomopatológico é a hérnia
parahipocampal, por constituir-se em indicador fidedigno de que o paciente
apresentou HIC (ADAMS, GRAHAM, 1976).

3) - MANIFESTACÕES CLÍNICAS
A tríade sintomática básica da HIC consiste de cefaléia, vômito e
edema de papila. Além destes podem ocorrer também os seguintes sintomas e
sinais : alterações do nível de consciência, crises convulsivas, tonturas,
117

macrocefalia, paralisia dos nervos motores oculares e alterações da pressão


arterial, da respiração e da freqüência cardíaca.
A cefaléia é de caráter progressivo e mais intensa durante a noite.
É causada pela dilatação e tração dos grandes vasos, compressão e distensão dos
nervos cranianos sensitivos e da dura-máter por eles inervados. A cefaléia é mais
intensa pela manhã, ao acordar e melhora após o vômito. Sabe-se que a PIC
aumenta durante o sono e pode atingir níveis muito elevados nos pacientes com
lesão expansiva intracraniana. Isto parece ser devido à retenção de dióxido de
carbono levando a dilatação vascular e conseqüente aumento do volume
sanguíneo cerebral. Ocorre melhora da cefaléia após o vômito por diminuição do
edema cerebral que se segue à hiperventilação provocada pelo ato de vomitar.
Lundberg observou que as ondas de pressão terminavam após o vômito quando o
ato de vomitar era acompanhado por hiperventilação.
O vômito ocorre com maior freqüência pela manhã. Pode ser
ou não precedido por náusea; neste último caso é denominado de vômito em jato
e sugere origem neurológica. Parece ser devido à compressão da área postrema
(área do assoalho do quarto ventrículo imediatamente lateral ao trígono do nervo
vago).
O edema de papila é o sinal mais característico da HIC. No exame
oftalmoscópico normal, a papila apresenta a forma de um disco plano, de cor rosa,
com bordas nítidas e uma escavação fisiológica no centro. No edema de papila
resultante de HIC, as bordas ficam borradas, as veias ingurgitadas e o pulso
venoso desaparece. Nos papiledemas avançados, pode ocorrer hemorragia na
retina. O nervo óptico é envolvido pelas meninges e banhado pelo líquor. Assim,
na HIC, o líquor hipertenso comprime a veia central da retina, dificultando o
retorno venoso e determinando a estase papilar. O sangue venoso da retina é
represado, as veias tornam-se túrgidas e sinuosas, provocando o edema e, nos
casos mais avançados, hemorragias.
As alterações do nível de consciência iniciam-se com sonolência,
podendo evoluir até o coma progressivamente mais profundo.
118

As crises convulsivas generalizadas podem constituir a


manifestação inicial ou manifestar-se durante a doença.
As tonturas sem caráter giratório resultam do edema de labirinto
secundário à comunicação existente entre a cavidade intracraniana e o ouvido
interno.
Nas crianças com as suturas ainda não soldadas, o aumento da
PIC pode ser compensado, temporariamente, pela disjunção progressiva das
suturas com conseqüente aumento do perímetro cefálico (macrocefalia).
O nervo abducente é freqüentemente comprometido na HIC, mas
a lesão do mesmo não tem valor de localização. É atribuído ao seu estiramento
pelo deslocamento caudal do tronco encefálico.
Nas fases finais de evolução da HIC ocorre alterações da pressão
arterial, da respiração e da frequência cardíaca.
As hérnias que ocorrem durante a evolução da HIC podem ser
diagnosticadas através dos sinais de compressão das estruturas nervosas e
vasculares.
A hérnia supracalosa não apresenta maiores implicações clínicas,
exceto quando comprime as artérias pericalosas, determinando infarto isquêmico
nos seus territórios de irrigação.
O primeiro sinal da hérnia de úncus é a dilatação da pupila
(midríase) homolateral por compressão do nervo oculomotor contra o ligamento
petroclinóideo. Em um estágio posterior, a artéria cerebral posterior pode ser
comprimida contra a borda livre da tenda do cerebelo, resultando em hemianopsia
por isquemia do lobo occipital. A insinuação da porção medial do lobo temporal no
forame de Pacchioni comprime o pedúnculo cerebral com o consequente
desenvolvimento de hemiparesia contralateral por compressão da via piramidal
homolateral. Mais raramente, a compressão do pedúnculo cerebral contralateral
contra a borda livre da tenda determina uma hemiplegia homolateral. A
compressão progressiva do mesencéfalo leva à depressão gradual do nível de
consciência por comprometimento da formação reticular.
119

Na hérnia transtentorial central ocorre deterioração progressiva do


nível de consciência, postura de decorticação ou descerebração, alteração do ritmo
respiratório e dilatação das pupilas.
A hérnia tonsilar ou amigdaliana manifesta-se por parada
cardiorrespiratória súbita com miose bilateral.
Nas hérnias transtentoriais e de amígdala cerebelar ocorre
interrupção da circulação liquórica entre a cavidade intracraniana e o espaço
intrarraquídeo. Assim, a punção lombar ou da cisterna magna é contra-indicada na
HIC porque a retirada de LCR levaria a um maior gradiente de pressão entre a
cavidades craniana e raquiana, o que poderia desencadear hérnia ou agravar
uma já existente.
Além dos sinais e sintomas gerais e de compressão das hérnias, o
paciente pode apresentar também sintomas e sinais focais resultantes de
comprometimento da região onde está localizada a lesão responsável pela HIC.

4) - TRATAMENTO
O objetivo do tratamento é de reduzir a PIC, o que pode ser
conseguido através da redução do conteúdo intracraniano.
1- Redução do volume do LCR
Pode ser obtido através da punção lombar nas hemorragias
subaracnóideas, nas meningites e nas hidrocefalias comunicantes. Mas este
procedimento está contra-indicado nos casos de HIC secundárias a processos
expansivos unilaterais. Nas hidrocefalias crônicas o tratamento preferencial é a
derivação do LCR da cavidade ventricular para a cavidade peritoneal ou para o
átrio direito. A fim de evitar o colapso completo do sistema ventricular usa-se uma
válvula com certo grau de resistência interposta no sistema de drenagem
ventricular.
A redução do volume do LCR pode ser feita através de drenagem
liquórica por cateter ventricular. Nos casos em que o cateter está no ventrículo
contralateral à lesão, e se há importante desvio do plano mediano, corre-se o risco
120

de agravar o desvio e, consequentemente, o estado clínico do paciente.

2- Redução do volume de sangue encefálico


O volume sanguíneo cerebral varia diretamente com a PaCO2. A
resposta vasomotora à PaCO2 é mediada através do efeito do pH do líquido
extracelular sobre a musculatura lisa arteriolar pré-capilar. O aumento do volume
sanguíneo do encéfalo pode ser causada por acúmulo de CO2 ou por
vasodilatação cerebral secundária a comprometimento do mecanismo de auto-
regulação do FSC. No traumatismo cranioencefálico é freqüente a tumefação
cerebral causada por aumento do volume sanguíneo secundário a vasodilatação. A
redução aguda do tono vasomotor resultaria em vasodilatação cerebral, no
aumento do volume sanguíneo e na HIC (LANGFITT, TANNANBAUN, KASSEL,
1966). O tratamento indicado é a hiperventilação que reduz a pressão parcial de
dióxido de carbono do sangue arterial, provocando vasoconstrição e redução do
volume sanguíneo intracraniano; a conseqüência é uma redução da PIC. A pressão
parcial de dióxido de carbono (PaCO2) é reduzida dos níveis basais de de 30 a 35
mm Hg para os níveis terapêuticos de 25 a 30 mm Hg. A hiperventilação não é
eficaz quando instala-se a paralisia vasomotora, ou seja, quando ocorre perda da
auto-regulação vascular.
3- Redução do edema cerebral
O edema conseqüente a aumento do teor de água no tecido
nervoso central pode ser tratado com soluções hipertônicas (diuréticos osmóticos)
e corticosteróides.
As soluções hipertônicas aumentam a pressão osmótica
intravascular, criando um gradiente osmótico transcapilar (entre o sangue e o
líquido intersticial cerebral), de forma que ocorra uma migração de água do
parênquima nervoso para o espaço vascular através da barreira hematoencefálica.
O resultado final é uma diminuição da PIC por redução do conteúdo líquido
intracraniano. O diurético osmótico mais usado é a solução de manitol a 20%
como infusão intravenosa rápida, na dose de 1 g / kg. Pode também ser
121

administrado intermitentemente na dose de 0,30 g / kg / hora. O efeito inicia-se


após 10 minutos e se prolonga por quatro horas devendo ser repetido
periodicamente.
Os corticóides são eficazes na redução do edema cerebral das
neoplasias e inflamações. Admite-se que atuam na permeabilidade celular
melhorando o seu desempenho. A eficácia dos mesmos nos traumas
cranioencefálicos é discutível. O mais utilizado é a dexametasona devido ao seu
elevado efeito antiinflamatório e à menor retenção de sódio. É empregada na
dose inicial de 10 mg e a seguir 4 mg cada 4 ou 6 horas, podendo ser
administrada por vias intravenosa, intramuscular e oral. A principal complicação é
a hemorragia digestiva que pode ser prevenida com a utilização de antiácidos. A
retirada da dexametasona deve ser feita gradativamente.
122

CAPÍTULO 7

HIDROCEFALIA
123

HIDROCEFALIA

1 )( - FISIOPATOLOGIA
A hidrocefalia é definida do ponto de vista morfológico como o
aumento do tamanho dos ventrículos. Sua fisiopatologia está ligada à circulação e
reabsorção do líquor.
A pressão intracraniana (PIC) depende da anatomia do espaço
craniorraquiano, das propriedades físicas do tecido cerebral, da dinâmica da
circulação sanguínea e liquórica e das reações desses fatores às alterações
patológicas. O sistema nervoso central encontra-se no recinto cérebro-espinhal,
que, no adulto, é um reservatório inextensível de volume constante. Três
elementos ocupam esta cavidade: O parênquima cerebral, sistema vascular e o
líquido cefalorraquidiano (LCR), sendo que estes dois últimos componentes
correspondem aproximadamente a 10% do conteúdo intracraniano.
O parênquima cerebral tem um volume constante e, do ponto de
vista mecânico, pode ser interpretado como uma esponja submicroscópica,
formada de material visco-elástico. Dentro deste parênquima, dois compartimentos
ou cavidades podem ser isolados : o compartimento venoso e o líquido
extracelular. Eles representam a compressibilidade do parênquima cerebral por
estarem ligados ao sistema venoso extracraniano exposto à pressão atmosférica. O
tecido cerebral por si mesmo não é compressível, mas sua deformação elástica é
possível, graças à presença dos compartimentos de líquidos, semelhantes ao que
ocorre com uma esponja. Assim, a elasticidade do cérebro é devida a uma
propriedade de seus tecidos e a sua compressibilidade à possibilidade de contração
dos sistema de líquidos.
O sistema vascular intracraniano está em comunicação com o
sistema vascular extracraniano. O sistema venoso intracraniano pode, portanto,
124

durante um aumento da pressão venosa devida a um aumento da PIC, reajustar


sua distribuição de pressão, expulsando uma parte do volume sanguíneo para o
sistema venoso extracraniano, comportando-se como um elemento elástico e
amortizador das variações da PIC.
O LCR é produzido essencialmente no plexo coróide (0,35 ml /
minuto) e retorna à circulação sanguínea através das vilosidades aracnóideas dos
seios venosos da dura-máter. As granulações de Pacchioni representam os
aspectos morfológicos das vilosidades aracnóideas. A secreção do LCR proveniente
do plexo coróide flui dos ventrículos laterais aos corpúsculos ou granulações de
Pacchioni, passando por diferentes forames, aquedutos e espaços subaracnóideos
cisternais, até drenar-se no sistema venoso. Essa reabsorção do líquor para dentro
do sangue venoso é um fenômeno passivo determinado pelo gradiente de pressão
entre o espaço subaracnóideo e o seio. A pressão do LCR, ou seja, a PIC origina-
se da diferença entre a formação e a reabsorção de um certo débito (D) de LCR,
porque esta reabsorção ocorre contra uma certa resistência ao escoamento (R).
Isto pode ser expresso pela equação : PIC = D.R . Em condições normais de
formação e resistência à absorção, a pressão hidrostática do LCR, com o indivíduo
em decúbito lateral, oscila entre 50 e 200 mm de água e é a mesma ao nível dos
ventrículos, cisterna magna e fundo de saco lombar (lei de Pascal). Quando o
paciente se encontra de pé, a pressão intraventricular normal ao nível do forame
de Monro é, em média, de 70 mm negativos de água, o que corresponde à
distância entre o orifício de Monro e a grande cisterna, onde a pressão é próxima
de zero.
Os três compartimentos intracranianos - o parênquima cerebral, o
compartimento vascular e o compartimento líquido extracelular - estão ligados
entre si por uma relação volumétrica expressa, depois de 1738, pela lei de Monro-
Kellie-Burrows : a soma dos volumes dos três compartimentos é constante, igual
ao volume do recinto ósseo-dural que os contém. Esta lei pode ser também
expressa pela forma : a soma algébrica das variações de volume dos três setores é
nula, ou seja, qualquer alteração volumétrica em um dos componentes
125

intracranianos (cérebro, LCR e sangue) é imediatamente compensada por uma


alteração oposta no volume dos demais componentes. O aumento de volume de
um dos componentes da cavidade intracraniana (hidrocefalia ou tumefação
cerebral) ou a presença de uma lesão expansiva provoca o deslocamento destes
componentes. Para que a PIC se mantenha inalterada é necessário que saia da
cavidade intracraniana um volume de líquido igual ao volume acrescentado.
Quando o novo volume torna-se superior a 10% do espaço intracraniano, inicia-se
a alteração da PIC.
A hidrocefalia é uma alteração da hidrodinâmica do líquor com
aumento de seu volume. Quando ocorre um aumento da produção ou da
resistência à reabsorção, a pressão intracraniana aumenta, ocosionando o
aumento dos ventrículos. As três causas teóricas de hidrocefalia são, portanto: 1- a
superprodução de líquor nos caos de papiloma do plexo coróide; 2- a dificuldade
de reabsorção do líquor por aumento da resistência das vias de circulação do
mesmo; 3- a elevação da pressão venosa. A quase totalidade das hidrocefalias é
secundária a uma perturbação da circulação do líquor por bloqueio das vias de
escoamento: bloqueio leptomeníngeo responsável pela hidrocefalia comunicante e
bloqueio do sistema ventricular por malformação congênita ou processo expansivo
responsáveis pela hidrocefalia não comunicante.
O conteúdo da caixa craniana está em situação de equilíbrio sob o
efeito de dois fatores: a viscoelasticidade do tecido cerebral e a pressão efetiva do
líquor. Em condições normais, a pressão efetiva do líquor determina uma força
expansiva que age sobre as paredes ventriculares, pois a pressão intraventricular
é maior que a pressão venosa. Esta força que se exerce sobre o parênquima
cerebral mantém os ventrículos em uma certa forma, mas não provoca nem
distorção parenquimatosa e nem dilatação ventricular. Assim, quando, durante a
cirurgia, praticamos uma punção ventricular com retirada de líquor podemos ver o
cérebro “murchar” devido à diminuição da pressão dos ventrículos e colabamento
dos mesmos. Por outro lado, se injetamos sôro fisiológico dentro dos ventrículos
ocorre uma “expansão” do cérebro. Se a pressão efetiva do líquor aumenta por um
126

bloqueio das vias de escoamento, isto irá ocasionar um estresse adicional com
deformação do parênquima cerebral, deslocamento de líquidos para fora da
“esponja cerebral” e aumento do tamanho dos ventrículos. Essa fase inicial da
hidrocefalia desenvolve rapidamente e é reversível, podendo o parênquima
cerebral retornar à sua condição anterior, se a pressão retornar aos valores
normais. O grau de expansão ventricular será moderado no adulto, onde o
cérebro, já completamento desenvolvido, cede pouco à compressão dentro de uma
caixa craniana de volume fixo, enquanto que será considerável nos lactentes que
apresentam o crânio aberto e o cérebro imaturo que opõe menor resistência. Se o
aumento da pressão efetiva do líquor se mantém durante algumas semanas ou
meses, vai ocorrer uma diminuição do leito sanguíneo cerebral com isquemia
secundária. Esta isquemia determina atrofia cerebral.
O aumento da superfície ventricular determina uma reabsorção
transependimária. Um novo estado de equilíbrio vai instaurar-se: a formação do
líquor continua pouco ou nada alterada, enquanto que a resistência ao escoamento
diminui progressivamente. À fase de hipertensão inicial da hidrocefalia segue-se
uma fase de compensação, com a pressão do líquor retornando aos valores
normais. Esta situação é classicamente denominada de hidrocefalia de pressão
normal: os ventrículos continuam dilatados e o estado clinico do paciente
permanece alterado, apesar da pressão efetiva do líquor ser normal.
Esta situação aparentemente paradoxal foi explicada por Hakim
em 1965. A incapacidade dos ventrículos de retornarem ao tamanho normal e a
persistência da sintomatologia clínica são devidas à persistência de um estresse
anormal sobre o parênquima cerebral. Existe um certo equilíbrio entre o
parênquima cerebral e o sistema liqórico, equilíbrio este realizado através de um
sistema de forças. A força efetiva de distensão ventricular é o resultado da
pressão exercida sobre a superfície ventricular (F=P x A; onde F é a força, P a
pressão e A a área). A diferença entre essa força sobre a superfície ventricular e a
força oposta da pressão venosa determina o aumento ou a diminuição do tamanho
dos ventrículos. Na hidrocefalia com pressão normal, as duas forças que agem
127

sobre o parênquima cerebral se encontram em desequilíbrio, apesar de uma


pressão normal do líquor. Esse desequilíbrio é determinado essencialmente pela
maior superfície ventricular. A incapacidade dos ventrículos de retornar ao
tamanho normal e a persistência da sintomatologia clínica (distúrbios mentais,
alteração da marcha e incontinência urinária) são devidas à persistência do
estresse anormal sobre o parênquima cerebral.
A hidrocefalia do lactente é diferente daquela do adulto, quanto ao
aspecto mecânico, devido ao seu crânio ser maleável. No adulto, o
desenvolvimento do estresse subdural na periferia do córtex acompanha-se de
uma reação igual e oposta do crânio rígido, mas não leva a um aumento do
perímetro craniano. O crânio maleável e com suturas abertas do lactente permite,
pelo contrário, um aumento do perímetro craniano.
2) - ETIOLOGIA
1- Hemorragia subaracnóidea
Geralmente secundária à ruptura de um aneurisma intracraniano,
constitui uma das causas mais frequentes de hidrocefalia. Na fase aguda o sangue
obstrui as vias de escoamento do líquor (aqueduto cerebral, cisternas e espaços
subaracnóideos). Na fase de reabsorção ocorre aderências inflamatórias e
depósitos de fibrina nos espaços subaracnóideos.
2- Meningite
Determinam hidrocefalia por aderências nos espaços
subaracnóideos ou por estenose inflamatória do aqueduto de Sylvius.
3- Traumatismo cranioencefálico
Neste caso a hidrocefalia é geralmente consequente a hemorragia
ou infecção.
4- Tumores intracranianos
Ocorre principalmente nos tumores próximos das vias de
circulação do líquor: intraventriculares, supraselares e da fossa posterior
5 - Estenose malformativa do aqueduto de Sylvius
128

Determina uma dilatação ventricular limitada ao terceiro ventrículo


e aos ventrículos laterais. A estenose do aqueduto cerebral pode ser congênita ou
adquirida (infecção, hemorragia).
3) - QUADRO CLÍNICO
1- Hipertensão intracraniana
O quadro clínico de apresentação varia com a idade. O sinal mais
comum na hidrocefalia do lactente é a macrocefalia. Pode associar-se sinais que
indicam hipertensão intracraniana como: a- tensão excessiva da fontanela anterior;
b- disjunção das suturas que pode ser visível ou observada pela palpação; c- pele
do crânio fina e percorrida por veias salientes; d- olhar de sol poente que
manifesta-se por desvio conjugado dos globos oculares para baixo com retração da
pálpebra superior
A hipertensão intracraniana, presente nas hidrocefalias de
instalação aguda ou subaguda da criança e do adulto, manifesta-se pela tríade
sintomática: cefaléia, vômitos e edema de papila. Com a evolução pode associar-se
depressão do nível de consciência, tipo sonolência, torpor e coma.
2- Síndrome da hidrocefalia crônica
Manifesta-se pela tríade de Hakim e Adams: alteração da marcha,
distúrbios da micção e alterações psíquicas.
4) - EXAMES COMPLEMENTARES
1 - Tomografia computadorizada
Evidencia a dilatação ventricular e o fator etiológico e mostra sinais
de reabsorção do líquor através da parede ependimária. Esta reabsorção
transependimária traduz-se por uma hipodensidade periventricular que predomina
nos cornos frontais e occipitais.
2 - Ressonância magnética
Permite uma melhor definição da morfologia dos ventrículos e
permite o estudo das alterações parenquimatosas associadas à dilatação
ventricular: a- alterações de sinal na região subependimária consequente à
reabsorção transependimária; b- imagens de leuco-encefalopatia ou de leucoariose
129

e que sinalizam um processo vascular. Apresenta o inconveniente de exigir uma


imobilização prolongada, o que limita o seu uso em crianças menores.
5) - TRATAMENTO
Nas hidrocefalias secundárias a um processo expansivo que obstrui
as vias liqóricas procura-se fazer o tratamento etiológico. O tratamento sintomático
usual é a derivação ventrículo-peritoneal com interposição de válvula. Válvula é um
sistema de regulação de uma corrente líquida assegurando sua passagem em um
único sentido. Uma derivação interna de líquor com válvula compreende três
partes:1- um dreno superior, ventricular; 2- uma válvula que oferece resistência ao
escoamento do líquido a ser drenado; 3- um dreno inferior, geralmente peritoneal.
Estas três partes são ligadas entre si por conexões. Todas as válvulas são a
pressão diferencial, isto é, elas funcionam porque existe uma diferença de pressão
entre o orifício de entrada e o orifício de saída. As principais complicações da
derivação liquórica são a infecção e as inadequações hidrodinâmicas
(hipodrenagem com persistência da dilatação ventricular e hiperdrenagem levando
a ventrículos em fenda e a hematoma subdural).
Mais recentemente tem sido utilizado a ventriculo-cisternostomia
sob controle endoscópico, realizada através do assoalho do terceiro ventrículo para
estabelecer uma comunicação entre esse ventrículo e os espaços subaracnóideos
ao nível da cisterna interpeduncular.
130
131

CAPÍTULO 9

ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL


132

ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL


1) INTRODUÇÃO
As doenças circulatórias do SNC são responsáveis por
aproximadamente 50% dos distúrbios neurológicos em pacientes internados.
Constituem, nos países industrializados, a terceira causa de morte após os
canceres e as doenças cardiovasculares. Dois mecanismos determinam distrbios
circulatórios no SNC : isquemia e hemorragia.

2) CIRCULAÇÃO CEREBRAL
FSC = PPC / R = PA - PIC / R
O fluxo sanguíneo cerebral (FSC) depende da pressão de perfusão
cerbral (PPC) e da resistência vascular cerebral (R). A PP pode ser obtida pela
diferença entre a pressão arterial (PA) e a presão intracraniana (PIC). A circulação
cerebral apresenta a propriedade de autoregulação, ou seja, a capacidade de
manter um FSC constante durante as variações do pressão arterial por meio da
alteração da resistência vascular. O cérebro é altamente vulnerável à falta de dois
substratos energéticos: oxigênio e glicose. Os mesmos são levados ao neurônio
através do fluxo sanguíneo cerebral.
A principal função do oxigênio no SNC é manter níveis adequados
de formação de ATP por meio do metabolismo oxidativo da glicose. A maior parte
da energia derivada deste metabolismo é consumida na manutenção dos
potenciais de membrana e dos gradientes eletroquímicos dos neurônios e na
transmissão sináptica. Durante a isquemia cerebral, seja por trombose ou embolia,
a interrupção focal e abrúpta do fluxo sanguíneo, se não for reversível e se tornar
133

permanente, leva à morte neuronal através de mecanismos bioquímicos numa


cadeia em cascata. A falta de oxigênio e de glicose leva a um consumo excessivo
de ATP pelo metabolismo glicolítico anaeróbio desencadeando uma despolarização
do potencial de membrana, levando à falha dos mecanismos iônicos de
estabilização da membrana com falência da bomba de sódio, extravazamento
maciço de potássio para o compartimento extracelular e acidose lática com
liberação de radicais livres.

3) – TIPOS DE AVC
3.1 – AVC Isquêmico
A diminuição do fluxo sanguíneo cerebral (isquemia), resultante da
queda da pressão arterial, do aumento da pressão intracraniana ou do aumento da
resistência vascular cerebral, determinará a diminuição do consumo cerebral de
oxigênio, com consequente infarto ou amolecimento cerebral (necrose) e bloqueio
da produção de ATP. A queda de ATPase Na / K-dependente altera o transporte
ativo de íons através das membranas, com acúmulo de Na no compartimento
intracelular, aumento da osmolaridade e entrada de água na célula, resultando em
edema celular. A interrupção da circulação cerebral rapidamente determina perda
da função neuronal, podendo causar lesão irreversível.
O AVC isquêmico é consequente à uma redução crítica do FSC em
aval à oclusão parcial ou total de uma artéria cerebral. Distingue-se
esquematicamente dois tipos de AVC : 1-o infarto cerebral, ou seja o AVC durável;
2-o ataque isquêmico transitório, cujos deficit regridem em menos de 24 horas.
O infarto cerebral é a necrose de parte do encéfalo consequente à
redução acentuada ou interrupção do FSC por oclusão arterial (trombose e
embolia). As alterações macroscópicas do infarto consistem de tumefação e
diminuição da consistência (amolecimento cerebral). Ao redor da área de necrose,
134

forma-se faixa de edema. Durante a fase de organização, a área de necrose torna-


se friável, iniciando-se a desintegração e cavitação da região infartada. As
consequências dos infartos dependem da extensão e da função do território
vascular atingido.
Admite-se que a etiopatogênese do AIT seja a mesma dos infartos
cerebrais, ou seja, oclusão arterial por êmbolos diminutos originados nas carótidas
ou no coração ou dependa de um mecanismo hemodinâmico. Corresponde a uma
isquemia passageira, não determinando uma lesão. O AIT constituí um fator de
risco importante de infarto cerebral.
• Quadro clínico do infarto cerebral
Traduz-se pelo aparecimento súbito de um deficit neurológico cuja
fórmula depende do território arterial acometido. O infarto da artéria cerebral
média ou silviana é o mais frequente (80%). Evidencia-se por hemiplegia de
predominância fáscio-braquial, hemianestesia, hemianopsia lateral homônima,
desvio da cabeça e dos olhos para o lado da lesão; ocorre afasia nos casos de
comprometimento do hemisfério dominante. O infarto do território da artéria
cerebral anterior manifesta-se por uma paralisia predominante do membro inferior
(crural); pode ocorrer indiferença e alteração do comportamento urinário.
A tomografia computadorizada é normal nos primeiros dias. A
seguir o infarto torna-se visível sob a forma de uma hipodensidade. Duas a três
semanas após, a TC com injeção de contraste mostra um “reforçaneto” da lesão,
que torna-se hiperdensa, traduzindo uma alteração da barreira hemato-encefálica.

• Quadro clínico do AIT


O AIT é por definição um episódio neurológico que se resolve em
menos de 24 horas ( geralmente em alguns minutos). A manifestação clínica no
território carotidiano traduz-se por um deficit motor ou alteração sensitiva de um
hemicorpo ou alteração de linguagem. No território vértebro-basilar pode
expressar-se por vertigem, diploplia, disfagia e drop-attack.
• Causas de AVC isquêmico
135

A trombose e a embolia representam as principais causas de


infarto cerebral. A trombose cerebral ocorre principalmente na aterosclerose, que
acomete os grandes vasos do polígono de Willis. A placa de ateroma, que é a lesão
fundamental, desenvolve-se ao nível da íntima, podendo determinar infarto
cerebral por obstrução da luz do vaso (mecanismo hemodinâmico) ou por
embolia, a partir da fragmentação do trombo. A placa é constituída de depósitos
nodulares de gorduras na íntima do vaso, sequenciando-se por deposição cálcica
que produz graus variáveis de calcificações desta lesões.
Na embolia cerebral os êmbolos geralmente originam-se no
coração esquerdo. São a principal causa de AVC isquêmico antes dos 40 anos.
Certos fatos podem evocar a origem embólica de um AVC isquêmico : idade
inferior a 45 anos, existência de embolias em outros territórios, início súbito do
deficit neurológico e evidência de cardiopatia (fibrilação auricular, cardiopatia
valvular e infarto do miocárdio).

3.2 - AVC Hemorrágico


As duas principais causas de hemorragia intracraniana não traumática são a
hemorragia cerebral e a hemorragia subaracnóide.

HEMORRAGIA CEREBRAL
As hemorragias intracerebrais espontâneas podem ocorrer em
qualquer parte do encéfalo (hemisférios cerebrais e cerebelares e tronco
encefálico) e levam à formação de um hematoma intracerebral espontâneo,
relacionado ou não à hipertensão arterial. Sob o termo de hematoma intracerebral
primitivo é reagrupado os hematomas intracerebrais relacionados a uma
hipertensão arterial e os hematomas sem causa evidente. Eles acometem mais
frequentemente o sexo masculino e após os 40 anos de idade. Em metade dos
casos está associada uma hipertensão arterial.
• Patogenia
136

A patogênese da hemorragia cerebral na hipertensão arterial


parece depender, além do estado hipertensivo, das lesões da parede arterial sob a
forma de microaneurismas de Charcot-Bouchard. Esses são constituídos por
dilatações saculares microscópicas envolvendo as artérias lentículo-estriadas, com
interrupção da elástica interna e da musculatura lisa da média em correspondência
com a parede do aneurisma. A predominância das lesões vasculares na artérias
lentículo-estriadas explica o fato dos hematomas intracerebrais espontâneos
ocorrerem mais frequentemente na região dos núcleos da base (35 a 50% dos
casos). Trabalhos mais recentes indicam a hialinose como o fator predisponente
das hemorragias espontâneas.
Trabalhos experimentais demonstraram que o hematoma
intracerebral determina lesões isquêmicas no parênquima cerebral em torno do
hematoma. Foi sugerido que estas lesões são determinadas por compressão da
microcirculação pelo próprio hematoma e pelo edema cerebral. Estas alterações
seriam responsáveis pela piora progressiva do estado clínico que ocorre nas
primeiras 24 horas. Muitos estudos demonstraram que a própria composição do
sangue determina irritação do parênquima cerebral. A liberação de ferro e de
potássio pelo hematoma ativa os radicais livres ou agem diretamente sobre a
microcirculação determinando uma vasoconstrição. A consequência é uma
diminuição do débito sanguíneo regional com aparecimento de áreas isquêmicas e
necróticas no parênquima que circunda o hematoma.
A formação rápida do hematoma intracerebral determina uma
elevação da pressão intracraniana que aumenta até à morte do paciente ou à
parada da hemorragia por um fenômeno de tamponamento. Secundariamente
entra em ação mecanismos compensatórios (especialmente a reabsorção de líquor)
que permitem a normalização da pressão intracraniana.
• Quadro clínico
A sintomatologia clínica depende da localização do hematoma e de
seu volume.
137

Os sinais de localização instalam-se de forma rapidamente


progressiva para alcançar o máximo em 10 a 30 minutos. Em alguns caos este
intervalo pode ser de apenas alguns segundos a poucos minutos. As alterações de
consciência ocorrem nos hematomas volumosos e são consequentes à hipertensão
intracraniana. Por outro lado, os hematomas talâmicos e pontinos, mesmo quando
de pequeno volume, determinam alteração da consciência por acometimento da
formação reticular.
Quando a alteração de consciência é breve ou ausente geralmente
ocorre uma evolução favorável. Os pacientes que apresentam coma imediato
falecem na quase totalidade nas primeiras 24 horas independentemente da
terapêutica realizada.
• Exames complementares
Os exames fundamentais para o diagnóstico do hematoma
intracerebral são a tomografia computadorizada e a ressonância magnética.
A hemoglobina dos glóbulos vermelhos determina a
hiperdensidade do hematoma na fase aguda. Na ressonância magnética, em
sequências ponderadas em T2, o hematoma aparece hipointenso em seu centro e
hiper-intenso na periferia. A hemoglobina é responsável pelo sinal hipointenso. A
sinal hiper-intenso na periferia pode corresponder ao edema da substância branca
circunvizinha ou a uma coleção de soro em torno do coágulo.
• Classificação
Os hematomas intracerebrais espontâneos são classificados quanto
ao volume e quanto a localização.
É clássico definir como hematoma intracerebral quando a coleção
de sangue no cérebro tem mais de 3 cm em seu diâmetro maior, mais de 2 cm no
cerebelo e mais de 1cm no tronco encefálico. Kaufman classificou os hematomas
em três grupos:
- Pequenos, quando o maior diâmetro é maior que 4
cm ou o volume é inferior a 35 cm3 ; têm geralmente um bom prognóstico e não
necessitam de tratamento cirúrgico.
138

- Médios, quando o maior diâmetro varia de 4 a 5,5


cm (volume de 33,5 a 87 cm3 ); o prognóstico desses hematomas é desfavorável
quando não são tratados cirurgicamente.
- Grandes, quando o maior diâmetro é superior a 5,5
cm (volume de superior a 87 cm3); esses hematomas são geralmente fatais,
independentemente do tratamento cirúrgico.
São classificados em quatro grupos, seguindo o critério de
topografia:
- basais ou capsulares, que podem ser do tipo lateral
(putâmen) ou mesial (tálamo e núcleo caudado);
- lobares, que correspondem a 26% das hemorragias
cerebrais, ocorrem na substância branca dos lobos cerebrais;
- ventriculares, que se fazem através da cabeça do
núcleo caudado ou do tálamo;
- tronco encefálico,
- cerebelo.

Em 80% dos casos os hematomas intracerebrais estão localizados


nos hemisférios cerebrais e em 20% no tronco encefálico e cerebelo. Os sítios
mais frequentes de hemorragia hipertensiva são o putâmen, a cápsula externa e o
claustro, áreas supridas pelas artérias lenticuloestriadas.
• Tratamento
Pode ser conservado ou cirúrgico. As bases do tratamento
conservador são semelhantes àquelas do tratamento dos traumatismos cranianos.
As indicações do tratamento cirúrgico são ainda controversas. Com base nas
grandes estatísticas, as seguintes conclusões podem ser tiradas quanto ao
tratamento:
139

- Nos pacientes apresentando um bom estado clínico


inicial (11 a 15 pontos na escala de comas de Glasgow) ou com hematoma de
volume inferior a 30 cc deve adotar-se uma conduta conservadora.
- Os melhores candidatos à intervenção cirúrgica são
os pacientes com 7 a 10 pontos na escala de coma de Glasgow ou cujo volume do
hematoma encontra-se entre 30 e 85 cc. As indicações devem ser ampliadas nos
casos de hematomas subcorticais ou intracerebelares.
- As primeiras 24 horas representam o período ideal
para a intervenção cirúrgica.

HEMORRAGIA SUBARACNOIDEA
Por definição, hemorragia subaracnóidea ou meningea significa
sangramento na cavidade craniana, que ocorre primariamente no espaço
subaracnóideo. O espaço subaracnóideo situa-se entre a aracnóide e a pia-máter.
Este espaço contem líquor e é atravessado, na base do crânio, pelos vasos que
vão irrigar o encéfalo. Isto explica porque a maioria dos aneurismas intracranianos
produzem hemorragia subaracnóidea quando se rompem, pois eles se localizam
na base do crânio, formando o polígono de Willis, contido no espaço
subaracnóideo.
• Etiologia
A hemorragia subaracnóidea espontânea é geralmente
consequente a aneurismas saculares, que são dilatações localizadas da parede de
uma artéria cerebral. Os aneurismas saculares de origem degenerativa ou
malformativa representam 97% dos aneurismas intracranianos. Aneurismas de
origem infecciosa ou traumática são raros. Mais raramente os aneurismas
intracranianos são fusiformes, sendo que nesses casos localizam-se
preferencialmente no tronco basilar e da artéria cerebral média. São encontrados
em 6% das necrópsias de adultos. São múltiplos em 20% dos casos. A sede mais
comum é o polígono de Willis (mais particularmente na sua parte anterior),
localizando-se sempre em bifurcações arteriais. A parede de uma artéria
140

intracraniana é constituída de vária camadas como nas artérias periféricas (íntima,


camada elástica interna, média e adventícia), mas ela não tem a camada elástica
externa. Os aneurismas são verdadeiras hérnias da parede arterial, que apresenta-
se delgada, sem a camada média e a limitante elástica interna. Uma lesão da
parede vascular é o fator primordial para o desenvolvimento de um aneurisma. Os
fatores responsáveis por esta lesão continuam desconhecidos. Segundo a hipótese
de uma origem congênita, a origem do aneurisma depende de uma anomalia
congênita da parede que seria agravada por fatores hemodinâmicos. De acordo
com a hipótese da anomalia adquirida, o aneurisma seria uma lesão secundária e
agravada por fatores evolutivos comparáveis àqueles da doença ateromatosa. Os
aneurismas aumentam progressivamente de volume sob a influência de fatores
hemodinâmicos. Este aumento de volume leva à uma fragilidade da sua parede.
Por este motivo a ruptura é o modo de descoberta mais frequente dos aneurismas.

Outras causas de hemorragia subaracnóidea são: malformações


arteriovenosas, discrasias sanguíneas, traumatismo cranioencefálico. Em 80% dos
casos de hemorragia subaracnóidea não traumática, a causa é um aneurisma, em
15% a hemorragia é idiopática e em 5% é determinada por outras causas.
A hemorragia subaracnóidea idiopática ou sem causa reconhecida
é a segunda causa de hemorragia subaracnóidea não traumática. A tomografia
computadorizada mostra, na metade dos casos, uma hemorragia
perimesencefálica, ou seja em torno do tronco encefálico. O diagnóstico é de
exclusão frente a uma angiografica normal. Em razão dos casos de exame falso
negativo, a angiografia deve ser repetida um mês após. A hemorragia
subaracnóidea idiopática apresenta na grande maioria dos casos uma evolução
favorável, sendo raro as recidivas.
• Quadro clínico
A grande maioria dos aneurismas intracranianos são descobertos
por ocasião da ruptura dos mesmos. Esta hemorragia pode estar localizada apenas
141

dentro das cisternas aracnóideas (hemorragia subaracnóidea) ou pode ocorrer


também um hematoma intracerebral. A gravidade do quadro clínico inicial depende
diretamente da quantidade de sangue extravasado. O sangue presente dentro das
cisternas subaracnóideas, em contato com os vasos intracranianos, é o fator
determinante de duas complicações: a hidrocefalia e o vasoespasmo.
A hemorragia subaracnóide manifesta-se clinicamente por cefaléia,
vômitos, náuseas e sinais de meningismo, achados estes decorrentes do aumento
súbito da pressão intracraniana e da irritação das raízes nervosas produzidas pela
presença de sangue no espaço subaracnóide. A cefaléia é a manifestação mais
frequente, estando presente em praticamente todos os casos. A dor é sempre de
início súbito, podendo ser seguida ou não de perda da consciência. Ela dura por
vários dias, marcando a evolução da hemorragia subaracnóidea. A cefaléia é
explicada pela presença de sangue nos espaços subaracnóideos ou pela
hipertensão intracraniana geralmente presente nestes casos. A rigidez de nuca é o
sinal mais importante de síndrome meníngea. É explicada pela contratura reflexa
antiálgica dos músculos paravertebrais. A hemorragia subaracnóidea pode também
se manifestar por perda de consciência de curta duração, convulsão ou coma. Os
sinais neurológicos deficitários podem ocorrer, como paralisia oculomotora e
hemiparesia ou hemiplegia. O deficit motor dos membros é geralmente
consequente à formação de hematoma intracerebral. O acometimento do nervo
abducente, que manifesta-se por estrabismo interno, não tem valor localizador. A
lesão do nervo oculomotor, caracterizada por ptose, midríase e impossibilidade de
elevação, abaixamento e adução do olho, é determinada por compressão desse
nervo, no espaço subaracnóideo, por um aneurisma da face posterior da artéria
carótida, próximo da origem da artéria comunicante posterior.
O quadro inicial de ruptura de um aneurisma pode manifestar-se
por:
- cefaléia intensa de início súbito,
- crise convulsiva,
- perda de consciência breve ou prolongada,
142

- coma.
Certas circunstâncias parecem favorecer a ruptura do aneurisma
em razão de uma possível elevação fisiológica da pressão arterial, como por
exemplo:
- uma modificação de postura
- uma situação de esforço
- uma situação de emoção intensa.
Exames complementares
A confirmação da ruptura do aneurisma pode ser feita por meio da
tomografia computadorizada ou de uma punção lombar.
A tomografia computadorizada, realizado no dia da hemorragia,
detecta a presença de sangue intracraniano em 95% dos casos, localiza a ruptura
do aneurisma em 45% e mostra o aneurisma em 5%. Por tal motivo a tomografia
computadorizada deve ser realizada o mais rápido possível nos pacientes com
quadro clínico de hemorragia subaracnóidea e antes da punção lombar; quando
positivo exclui a necessidade de punção lombar. A positividade da tomografia decai
rápido com o tempo em consequência da lavagem do sangue pelo líquor e da
queda da densidade do sangue pela degradação da hemoglobina. Assim, no
terceiro dia após a hemorragia a tomografia computadorizada apresenta apenas
75% de possibilidade de evidenciar a hemorragia subaracnóidea. A acumulação
localizada de sangue em uma determinada cisterna pode indicar a ruptura do
aneurisma de um vaso próximo. Assim, quando a hemorragia concentra-se
predominantemente anterior ao terceiro ventrículo ou dentro do sulco inter-
hemisférico a possibilidade maior é de uma aneurisma da artéria comunicante
anterior. Quando localizada na fissura silviana indica ruptura de aneurisma da
divisão da artéria cerebral média.
A punção lombar só é realizada quando a tomografia
computadorizada é normal ou não pode ser realizada. Ela é contra-indicada nos
pacientes em coma ou com déficit neurológico. A retirada de líquor diminui a
pressão que é aplicada sobre a parede externa do aneurisma, favorecendo uma
143

nova ruptura. A punção lombar confirma o diagnóstico quando evidencia um


líquor de cor uniformemente vermelho ou xantocrômico. O sangue misturado ao
líquor sofre uma hemólise imediata que prolonga-se por vários dias, acentuando-se
após o terceiro dia. Esta hemólise traduz-se pelo aparecimento de pigmentos que
tornam o líquor amarelo.
A angiografia cerebral é realizada para demonstrar a causa da
hemorragia subaracnóidea e a localização de um possível aneurisma. Em razão dos
aneurismas múltiplos (20% dos casos) é necessário a realização da angiografia das
duas carótidas e das duas vertebrais. Os aneurismas intracranianos localizam-se
em 94% dos casos no polígono de Willis; 6% encontram-se no sistema vértebro-
basilar.
A angiografia mostra que o aneurisma:
- é único em 80% dos casos,
- é inferior a 12 mm em 80% dos casos
- situa-se na parte anterior do polígono de Willis em
95% dos casos.
♦ Complicações da hemorragia subaracnóidea
Três importantes complicações precoces podem ocorrer na
hemorragia subaracnóidea: hidrocefalia, isquemia cerebral e resangramento.
A hidrocefalia, ou seja, aumento do volume do líquor com
consequente dilatação ventricular, ocorre em aproximadamente 15% dos casos. É
consequente ao bloqueio das cisternas aracnóideas e obstrução das granulações
de Pachioni. O aumento da resistência à absorção do líquor determina hipertensão
intracraniana seguida de dilatação ventricular em razão do gradiente de pressão
entre os ventrículos e as cisternas aracnóideas da base. A hidrocefalia manifesta-
se por alteração progressiva da consciência que pode ir de um estado de confusão
mental e agitação ao coma. Deve ser suspeitada no paciente no qual o estado
inicial grave não melhora ou naquele em que ocorre uma agravação progressiva.
Ela é confirmada pela tomografia computadorizada que evidencia um aumento do
tamanho dos quatro ventrículos. A hidrocefalia aguda constitui uma ameaça vital
144

em razão da hipertensão intracraniana e consequente redução da pressão de


perfusão cerebral (pressão de perfusão = pressão arterial – pressão intracraniana).
Estas alterações podem determinar uma isquemia tardia. O tratamento é realizado
por meio da derivação ventricular.
A isquemia cerebral tardia localiza-se preferencialmente nos
territórios das artérias cerebrais médias e anteriores. Ela ocorre mais
frequentemente quando a hemorragia meníngea é grave. Ela é geralmente
localizada e manifesta-se por déficit neurológico focal. Às vezes ela é fatal e na
maioria dos casos determina sequelas motoras, afásicas ou mentais. O diagnóstico
baseia-se no deficit motor ou de linguagem e em alterações da consciência e da
vigilância. A tomografia computadorizada permite excluir outras complicações
(hidrocefalia, ressangramento); a isquemia cerebral só mostra alterações
tomográficas alguns dias mais tarde sob a forma de uma ou mais hipodensidades
corticais. A isquemia cerebral é determinada por uma série de fatores, sendo o
mais importante o vasoespasmo.
Designa sob esse termo vasoespasmo a redução do calibre das
artérias intracranianas visível na angiografia. Pode ser focal ou difuso e manifesta-
se em intensidade máxima entre o quinto e décimo-segundo dia após a
hemorragia subaracnóidea. Geralmente ele é mais evidente nas artérias próximas
do aneurisma, ou seja, justamente no local onde a quantidade de sangue
extravasado é maior. A degradação progressiva desse sangue libera a oxi-
hemoglobina que é reconhecida como a causa principal do vasoespasmo. A
natureza do vasoespasmo é controvertida. Duas hipóteses foram aventadas:
contração prolongada das células musculares lisas da média e lesão estrutural da
parede realizando uma verdadeira angiopatia proliferativa. O vasoespasmo pode
determinar uma isquemia cerebral. Esta relação pode ser escrita da seguinte
forma: redução do calibre da artéria (vasoespasmo) = diminuição do débito
sanguíneo cerebral = isquemia cerebral.
O ressangramento por nova ruptura do aneurisma é uma das
principais causas de mortalidade e morbidade. No primeiro dia de hemorragia
145

meníngea o risco de ressangramento é de 4,8%. Depois ele evolui para um risco


de 1,5% ao dia. Ao longo do primeiro mês o risco de ressangramento é de 35%
com uma mortalidade de 50%. O diagnóstico de ressangramento é confirmado
pela tomografia computadorizada que evidencia um aumento da quantidade de
sangue nas cisternas aracnóideas ou um hematoma intracerebral.

♦ Tratamento
O objetivo do tratamento do aneurisma intracraniano é
realizar sua exclusão da circulação arterial respeitando a
permeabilidade do vaso portador do aneurisma e de seus ramos. Essa
exclusão é geralmente feita por meio da colocação de um clipe
metálico no colo do aneurisma por via cirúrgica. Os aneurismas
situados na parte anterior do polígono de Willis (comunicante anterior,
cerebral média, carótida interna e comunicante posterior) são
operados por via fronto-têmporo-esfenoidal (pterional). Os aneurismas
do topo da artéria basilar são abordados preferencialmente através da
craniotomia fronto-órbito-zigomática. Os aneurismas da artéria
vertebral são abordados abordados por craniectomia suboccipital
lateral. Mais recentemente tem evoluído progressivamente a técnica da
oclusão por via endovascular do aneurisma por meio de fio metálico ou
balão destacável.
Em razão do risco de resangramento o aneurisma
rompido deve ser tratado precocemente, antes do terceiro dia após a
hemorragia. Entretanto isso não é possível em todos os casos. Uma
cirurgia tardia, após a primeira semana, apresenta menos riscos mais
146

aumenta as possibilidades de resangramento. A definição da data ideal


para a intervenção é ainda controversa.
147
148

CAPÍTULO 10

TUMORES INTRACRANIANOS
149

TUMORES INTRACRANIANOS
♦ CLASSIFICAÇÃO
A classificação dos tumores intracranianos baseia-se
essencialmente no tecido que deu origem ao tumor.
1-Tumores do tecido neuroepitelial
1.1-Tumores astrocitários
Astrocitoma
Astrocitoma anaplásico (maligno)
Glioblastoma
1.2-Tumores oligodendrogliais
Oligodendroglioma
1.3-Tumores ependimários
Ependimoma
1.4-Tumores do plexo coróide
150

Papiloma do plexo coróide


1.5-Tumores pineais
Pineocitoma
Pineoblastoma
1.6-Tumores embrionários
Meduloblastoma
2-Tumores dos nervos cranianos
Schwannoma (neurinoma)
Neurofibroma
3-Tumores das meninges
Meningioma
4-Cistos e lesões semelhantes a tumores
Cisto epidermóide
Cisto colóide do III ventrículo
5-Tumores da região selar
Adenoma hipofisário
Craniofaringioma
6-Tumores metastáticos
7-Tumores ósseos

♦ INCIDENCIA
A incidência é de 1 : 5.000 habitantes / ano. Os tumores
intracranianos representam 9% dos tumores primitivos. Os primitivos representam
o principal grupo (65%) dos tumores intracranianos e as metástases 20%. Aqui
serão abordados apenas os tumores intracranianos mais frequentes.

Astrocitomas 40%
Metástases 20%
Meningioma 15%
Schwanoma 8%
151

Ependimoma 7%
Adenoma hipofisário 7%
Oligodendroglioma 5%

A maioria das neoplasias primitivas do SNC deriva de células gliais


(gliomas). Este termo genérico indica neoplasias derivadas do neurectoderma
primitivo, ou seja, da neuróglia, da linhagem neuronal e de células embrionárias.
Os gliomas constituem de 40-50% de todos os tumores intracranianos primitivos e
metastáticos e 60% dos intracranianos primitivos. No adulto, 70% dos gliomas
são supratentoriais, sendo mais frequente o glioblastoma (55%) e o astrocitoma
(20%); na criança, 70% são infratentorias, sendo mais frequente o astrocitoma
(48%) e o meduloblastoma (44%).

♦ PRINCIPAIS TUMORES INTRACRANIANOS

 ASTROCITOMA
Os astrocitomas são constituídos por astrócitos da glia. Podem
apresentar todos os graus de malignidade de I a IV : grau I - astrocitoma
pilocítico do cerebelo; grau II - astrocitoma propriamente dito; grau III -
astrocitoma anaplásico; grau IV - gliobastoma.
O astrocitoma propriamente dito ou astrocitoma grau II é
constituído por astrócitos fibrosos e, menos comumente, por astrócitos
protoplasmáticos e gemistocíticos. O astrocitoma fibrilar localiza-se
preferencialmente nos hemisférios cerebrais, onde ocupa o segundo lugar em
frequência, após o glioblastoma. Em crianças pode localizar-se no tronco
encefálico. Tem crescimento infiltrativo difuso, com limites imprecisos. O tumor é
róseo-acinzentado. Histologicamente, é constituído por astrócitos bem
diferenciados, com produção de grande quantidade de fibras gliais, o que lhe
confere consistência firme; não ocorrem mitoses, necrose ou hemorragia. A
sintomatologia se inicia e progride lentamente. A aceleração dos sintomas indicam
152

transformação maligna. Na tomografia computadorizada (TC) é caracterizado por


áreas de hipodensidade, as quais praticamente não retêm o meio de contraste.
Como se trata de tumores derivados do próprio tecido cerebral, os astrocitomas
não se delimitam em relação a este tecido e, por isso, a sua extirpação completa é
praticamente impossível, ocorrendo sempre recidiva. Quando o astrocitoma
encontra-se circunscrito nos lobos frontal ou occipital ou temporal direito a
lobectomia está indicada.

 ASTROCITOMA ANAPLASICO (MALIGNO)


Este termo designa qualquer astrocitoma que apresente áreas de
anaplasia. Caracteriza-se por hemorragias, áreas de necrose e áreas granulosas,
que mostram aumento da celularidade, atipias nucleares, figuras de mitose e
proliferação endotelial vascular (astrocitoma grau III). Leva rapidamente ao óbito.

 GLIOBLASTOMA
Corresponde ao astrocitoma grau IV, sendo o glioma mais comum
(55%). É a mais frequente neoplasia do SNC do adulto (40-50%) e perfaz 25%
dos tumores cerebrais. Incide entre os 45-65 anos. O termo glioblastoma
multiforme, frequentemente usado, refere-se ao aspecto multiforme e variado dos
cortes desse tumor, caracterizado pela presença de áreas de hemorragia e de
necrose. É um tumor tipicamente supratentorial, ocorrendo mais frequentemente
nos lobos frontais, seguindo-se os temporais e parietais, acometendo mais a
metade anterior dos hemisférios. O tumor é friável, granuloso, acinzentado, com
focos hemorrágicos e de necrose. Invade com freqüência o corpo caloso e o
hemisfério oposto, apresentando, num corte frontal, imagem semelhante a uma
borboleta (“glioma em borboleta’). Histologicamente apresenta hipercelularidade,
com proliferação de células imaturas, pequenas, arredondadas ao lado de células
fusiformes e células polimorfas e atípicas. As mitoses são frequentes. Ocorre
presença constante de necrose e proliferação de vasos de parede malformada. As
áreas de necrose podem se tornar císticas. Devido ao crescimento rápido, à
153

destruição de tecido nervoso e ao edema intenso que provoca, a evolução do


glioblastoma é rápida (sintomatologia recente) e o prognóstico é sombrio, e a
sobrevida média oscila em torno de 6 meses após o diagnóstico. As manifestações
clínicas são devidas aos efeitos indiretos que levam a aumento da pressão
intracraniana (a clássica tríade de cefaléia, vômitos e edema de papila) e aos
efeitos diretos da presença da massa tumoral nos hemisférios cerebrais (sinais
focais). Acomete pessoas de meia-idade e idosas. Na TC o meio de contraste se
acumula formando muitas vezes imagens típicas, de contornos anulares ou
policísticos. Na maioria dos casos observa-se uma massa de atenuação mista,
captação irregular e de espessura variável do contraste em disposição anular, ao
redor de uma área central de baixa densidade, que pode ser única ou septada. Na
suspeita de glioblastoma, recomenda-se confirmar o diagnóstico mediante biópsia
estereotáxica, sempre que o tumor estiver localizado em áreas cerebrais
funcionalmente importantes ou de localização profunda. Estes casos seriam
tratados apenas com corticóide e radioterapia. Nos demais casos recorre-se a
extirpação cirúrgica, mas as recidivas manifestam-se no máximo dentro de um
ano, não obstante a aplicação da radioterapia no pós-operatório.

 ASTROCITOMA PILOCÍTICO
É formado por astrócitos alongados, fusiformes, ricos em fibras
gliais. Ocorre em crianças, na região hipotalâmica, no quiasma e nervos ópticos e
no cerebelo. Cresce muito lentamente, sendo designado como astrocitoma grau I.
Apresenta bordas bem definidas que permitem a excisão total e a cura em muitos
casos.
O astrocitoma cerebelar é o tumor da fossa posterior em crianças
mais frequente após o meduloblastoma. É formado geralmente por um cisto com
um nódulo mural. Manifesta-se geralmente por um quadro cerebelar lateralizado,
mas pode ser axial. A TC mostra a lesão cística com o nódulo mural. O tratamento
é cirúrgico, com bom prognóstico.
154

O glioma de tronco é mais frequente em crianças.


Macroscopicamente, caracteriza-se pelo aumento do volume do tronco encefálico.
O quadro clínico caracteriza-se pelo aparecimento progressivo de sinais de
comprometimento de nervos cranianos (principalmente VI e VII), síndrome
piramidal e cerebelar, sem quadro de hipertensão intracraniana. O dado mais
importante na TC é o aumento da distância entre o clivus e o assoalho do quarto
ventrículo; o tumor costuma ser isodenso ou hipodenso. Apesar de serem
histologicamente benignos na maioria dos casos, esses tumores são clinicamente
malignos, pois não existe terapêutica curativa.

 OLIGODENDROGLIOMA
É um tumor benigno, de crescimento lento, formado por
oligodendrócitos da glia cerebral. Representa 5% dos tumores intracranianos do
adulto. Localiza-se mais frequentemente nos lobos frontal, temporal e parietal
(metade anterior dos hemisférios). É um tumor sólido, de limites nítidos, róseo, de
pouca consistência. Apresenta com frequência áreas de calcificação.
Histologicamente observa-se oligodendrócitos, células ovóides ou arredondadas,
com membrana celular nítida, citoplasma ocupado por único vacúolo, em cujo
centro se localiza o núcleo, arredondado e hipercromático. Não há mitoses. O
tumor tem crescimento lento. O diagnóstico e a conduta terapêutica são
semelhantes ao astrocitoma.

 EPENDIMOMA
Tumor benigno, derivado da célula ependimária que reveste os
ventrículos, de localização mais frequente no III e IV ventrículos. Representa 7% e
12% dos tumores intracranianos no adulto e na criança, respectivamente. É
também o glioma mais comum (63%) da medula espinhal. Trata-se de tumor
sólido, firme, acinzentado, de aspecto granuloso e limites nítidos. Histologicamente
é formado de células ependimárias : são cilíndricas, com citoplasma claro,
155

granuloso, núcleo ovóide e pobre em cromatina. Não há atipias nem figuras de


mitose.

 MEDULOBLASTOMA
Faz parte do grupos dos tumores neuroectodérmicos primitivos,
sendo também conhecido como PNET cerebelar. E um tumor maligno, de
crescimento rápido. Representa 19% dos tumores intracranianos da infância e
44% dos gliomas intracranianos da infância, sendo superado apenas pelo
astrocitoma. É o mais frequente tumor da fossa posterior em crianças (36%). Na
criança localiza-se habitualmente no verme e ocupa o quarto ventrículo, dilatando-
o. O tumor é bem delimitado, mole, róseo-acinzentado. A histologia mostra
hipercelularidade com células pequenas, redondas ou ovóides, com citoplasma
escasso; o núcleo é hipercromático e apresenta mitoses frequentes. Ao comprimir
o quarto ventrículo, bloqueando a circulação liquórica, provoca hidrocefalia. O
quadro clínico manifesta-se por cefaléia, vômitos e ataxia axial; a rigidez de nuca é
comum. Na TC sem contraste, o meduloblastoma costuma aparecer como área
relativamente regular, pouco hiperdensa, ocupando o quarto ventrículo.
Geralmente o tumor retém contraste de maneira homogênea. É tratado por meio
da ressecção cirúrgica completada por radioterapia e quimioterapia.

 SCHWANNOMA (NEURINOMA) DO VIII


Acomete a raiz vestibular do VIII nervo craniano. É mas frequente
na meia-idade e no sexo feminino, representando 8% dos tumores intracranianos
e constitui 70-90% das lesões que ocorrem no ângulo pontocerebelar, região
látero-anterior da fossa posterior, em correspondência com a face posterior do
rochedo). O tumor é encapsulado, bem delimitado, esférico ou ovóide e de
consistência firme. Histologicamente é classificado em dois tipos. O tipo
fasciculado é formado por células alongadas, dispostas em feixes entrelaçados. No
tipo reticular as células são polimorfas e delimitam pequenos vacúolos que
conferem ao tumor aspecto em favo de mel. O neurinoma do acústico é um tumor
156

benigno, de crescimento progressivo, inicialmente dentro do meato acústico


interno e, depois, invade o ângulo pontocerebelar. Os sintomas iniciais de
acometimento do oitavo nervo craniano são perda auditiva, zumbidos, tonteiras e
vertigens. Com o crescimento tumoral ocorre envolvimento dos nervos trigêmeo,
glossofaríngeo e vago e compressão do hemisfério cerebelar e do tronco
encefálico. O diagnóstico é feito por meio da TC e da RM. Os neurinomas do
acústico apresentam-se na TC como massas isodensas ou hipodensas; ocorre
impregnação rápida pelo contraste iodado. O tratamento é cirúrgico.

 MENINGEOMA
Representam 15% dos tumores intracranianos no adulto,
acometendo mais o sexo feminino. Originam-se das células da aracnóide e atingem
preferencialmente áreas ricas em granulações da aracnóide. Em 50% dos casos
situam-se ao lado do seio sagital superior, especialmente no seu terço médio, zona
de maior concentração das granulações aracnóideas. Os restantes localizam-se nas
imediações do sulco lateral, nas eminências parietais, nos seios laterais, na base
do crânio (crista esfenoidal, tubérculo da sela, região paraselar e sulco olfatório),
ângulo pontocerebelar e sistema ventricular. Ocorrem com maior frequência a
partir da quarta década de vida, com nítido predomínio em mulheres. Apresentam-
se como massas nodulares solitárias, de consistência firme. Deslocam e deformam
o encéfalo sem invadi-lo. Possuem cápsula, que deriva da leptomeninge. O aspecto
histológico do meningioma é muito variado, sendo diferenciado em meningotelial,
fibroso, transicional, psamatoso e angiomatoso. A imagem tomográfica dos
meningeomas caracteriza-se por massa bem circunscritas e habitualmente de
aspecto homogêneo. Pode ocorrer edema cerebral circunjacente. Nos exames sem
contraste, os meningeomas aparecem isodensos em relação à substância cerebral
ou com densidade discretamente elevada. Após a administração de contraste,
usualmente, há opacificação homogênea, com aumento da densidade. O
tratamento é cirúrgico.
157

 ADENOMA HIPOFISÁRIO
São tumores benignos que derivam dos diferentes tipos de células
do lobo anterior da hipófise. Representam 7% dos tumores intracranianos. São
classicamente classificados em cromófobos, eosinófilos e basófilos. Atualmente
usa-se a classificação funcional dos adenomas, dividindo-os em duas categorias :
funcionantes e não-funcionantes.
1-Adenoma cromófobo não-funcionante - representa cerca de 80%
dos adenomas hipofisários. É mole, branco-acinzentado, róseo, com zonas de
hemorragias e degeneração cística. É formado por células pequenas, com
citoplasma escasso e núcleo central, esferóide, rico em cromatina. Cresce
lentamente, dilata a sela túrcica e provoca erosão de seu assoalho. Leva a
destruição do tecido hipofisário e à insuficiência endócrina do lobo anterior. Se
rompe o diafragma da sela, cresce no espaço supra-selar, comprimindo o quiasma
óptico, estirando os vasos do polígono de Willis e fazendo saliência no III
ventrículo. A compressão do quiasma óptico determina hemianopsia bitemporal.
2-Adenomas funcionantes - são classificados nos seguintes tipos :
a)adenoma secretante GH, que determina gigantismo e acromegalia; b)adenoma
secretante prolactina, responsável pela síndrome de galactorréia e amenorréia;
c)adenoma secretante ACTH, que causa a síndrome (ou doença) de Cushing.
As manifestações clínicas dos adenomas hipofisários são traduzidas
por alterações visuais, quando existe compressão do quiasma óptico; por
hipofunção endócrina, se há compressão da hipófise, ou hiperfunção, quando
existe uma secreção hormonal autônoma desses tumores. Ocasionalmente, como
ocorre nos grandes adenomas, instala-se uma hidrocefalia por obstrução dos
forames de Monro. O diagnóstico baseia-se no exame endocrinológico, no exame
dos campos visuais, na radiografia de crânio e na TC. A radiografia de crânio pode
evidenciar uma dilatação da sela túrcica. A TC mostra o adenoma principalmente
na incidência coronariana. A bromocriptina é indicada nos adenomas produtores de
prolactina. O tratamento cirúrgico pode ser por via transcraniana (acesso
158

subfrontal) nos tumores que ultrapassaram em muito o diafragma da sela túrcica.


Nos demais casos o acesso é através da via transesfenoidal.

 CRANIOFARINGIOMA
Representa 3% dos tumores intracranianos e acomete
principalmente a infância e a adolescência. Pode apresentar crescimento intra ou
supra-selar. É uma neoplasia benigna, bem circunscrita, cística; contém líquido
espesso, acastanhado, rico em cristais de colesterol. Em seu interior encontram-se
focos de calcificação. À microscopia encontra-se áreas constituídas por células
cubóides ou colunares delimitando cistos e separadas por células estreladas que se
anastomosam frouxamente entre si; outras áreas são formadas por células
escamosas com acentuada tendência à corneificação. O tumor, embora dotado de
cápsula fibrosa, quando entra em contato com o tecido nervoso provoca gliose
reacional, que torna difícil sua enucleação. Tem crescimento lento, mas, devido à
sua localização, provoca sinais e sintomas neurológicos e endócrinos
precocemente. Os craniofaringeomas situam-se, mais frequentemente, logo acima
do diafragma da sela e crescem em direção ao assoalho do terceiro ventrículo.
Nesse trajeto, o quiasma óptico é elevado ou comprimido, o mesmo acontecendo
com os núcleos hipotalâmicos. O quadro clínico pode ser agrupado em três
síndromes : síndrome neuroftalmológica, síndrome de hipertensão intracraniana e
síndrome neuroendócrina. A compressão do quiasma óptico determina
hemianopsia bitemporal. Os tumores que se dirigem para cima podem alcançar o
terceiro ventrículo e comprimir os forames de Monro, determinando obstrução do
sistema ventricular com consequente hipertensão intracraniana que se manifesta
pela tríade clássica : cefaléia, vômitos e edema de papila. A localização do
craniofaringeoma interrompendo o eixo hipotalâmico-hipofisário é responsável por
um conjunto de alterações endócrinas. As manifestações mais típicas são as que
surgem em crianças e correspondem a um hipopituitarismos anterior. Quando a
expansão supra-selar atinge o hipotálamo, a manifestação mais frequente é o
diabete insípido que é caracterizado pela eliminação de volume urinário crescente
159

com baixa densidade. O diagnóstico baseia-se nas dosagens hormonais, na


radiografia de crânio, na TC e na RM. O tratamento é essencialmente cirúrgico por
meio de abordagem subfrontal ou transesfenoidal ou a combinação de ambas. A
remoção radical do tumor nem sempre é possível.

 NEOPLASIAS METASTÁTICAS
As metástases podem ocorrer por continuidade (carcinomas da
faringe e das fossas nasais e sarcomas) eu pela via hemática. Representam 20%
dos tumores intracranianos no adulto e 10% dos tumores intracranianos
operados.. Os tumores malignos extracranianos produzem metástases em 15%
dos casos. As origens mais frequentes são : carcinoma broncopulmonar (52,3%) e
carcinoma de mama (9,9%). Apresentam-se como nódulos esferoidais, bem
delimitados do tecido nervoso circunvizinho, que fica edemaciado. Pode ser
observado áreas de necrose, hemorragia e degeneração cística. Os nódulos
metastáticos são geralmente múltiplos. A sede principal das metástases é na
junção do córtex com a substância branca subcortical dos hemisférios cerebrais,
sendo mais afetados os lobos occipital, parietal e frontal (região de irrigação da
artéria cerebral média). O cerebelo é também frequentemente sede de
metástases. Os sintomas mais comuns são a cefaléia e as crises convulsivas. A TC
das metástases se caracteriza pelo aparecimento de três sinais principais : uma
grande área de edema; presença de nódulo tumoral de localização superficial
(cortical ou subcortical); maior opacificação da camada externa do nódulo, com
área de menor captação no seu interior (necrose central). A extirpação cirúrgica é
realizada na metástase cerebral solitária.

♦ ALTERAÇÕES MORFOLOGICAS DO ENCEFALO


As lesões expansivas ou processos que ocupam espaço, como os
tumores intracranianos, podem determinar as seguintes alterações do encéfalo :
1-Hidrocefalia
160

Determinada pela obstrução do III ventrículo, aqueduto cerebral


ou do IV ventrículo.
2-Edema de papila (papiledema)
É causado pela compressão da veia central da retina pelo líquor
hipertenso que envolve a bainha do nervo óptico em seu trajeto intracraniano.
3-Edema cerebral
A neoplasia interfere com a circulação venosa regional, o que
determina estase, aumento da permeabilidade vascular e, portanto, edema
cerebral, que seria predominantemente vasogênico.
4-Hérnias
Devido às características físicas do encéfalo e à inextensibilidade
da caixa craniana, uma lesão expansiva intracraniana termina por provocar um
estresse e deslocamento do tecido cerebral de um compartimento para outro
(hérnia cerebral interna) desde que se estabeleça um gradiente de pressão.
4.1-Hérnia do giro do cíngulo
Nas lesões expansivas frontoparietais unilaterais, as estruturas da
linha média são desviadas para o lado oposto. O septo interventricular e o terceiro
ventrículo são desviados e o giro do cíngulo se projeta sob a borda livre da foice
do cérebro (hérnia supracalosa ou subfalciforme ou do giro do cíngulo). Nos casos
mais intensos, a hérnia subfalciforme pode comprimir uma ou ambas as artérias
pericalosas, com conseqüente infarto nos respectivos territórios de irrigação.
4.2-Hérnia temporal ou para-hipocampal
A hérnia para-hipocampal ou tentorial lateral ou uncal consiste na
passagem parcial do úncus e da porção medial do giro parahipocampal entre a
borda livre da tenda e o mesencéfalo. Em conseqüência, o mesencéfalo é
comprimido no sentido lateral, ocorrendo o alongamento de seu diâmetro ântero-
posterior; pode ocorrer hemorragias mediana ou paramediana no tegmento do
mesencéfalo ou da ponte (hemorragias de Duret). Poderá ocorrer também a
compressão do nervo oculomotor e da artéria cerebral posterior com consequente
infarto do córtex occipital medial homolateral. A hérnia do úncus é encontrada nos
161

processos expansivos do lobo temporal ou da região lateral da fossa média


acompanhados ou não de HIC, mas pode ocorrer com qualquer processo
expansivo supratentorial.
4.3-Hérnia cerebelar ou tonsilar
Quando a hipertensão intracraniana é transmitida à região
infratentorial, as tonsilas cerebelares se insinuam através do forame magno,
obliterando a cisterna magna e comprimindo o bulbo.

♦ CORRELAÇÕES ANÁTOMO-CLINICAS
Os tumores intracranianos podem determinar sinais e sintomas
gerais e focais (de localização)
1-Sinais e sintomas gerais
Decorrem da hipertensão intracraniana e são representados por :
cefaléia, vertigens, vômitos, distúrbios psíquicos, convulsões generalizadas,
papiledema e alterações dos sinais vitais. A cefaléia resulta da tração sobre as
artérias, seios durais e alguns nervos cranianos (V, IX e X). A vertigem é causada
pelo edema do labirinto. Os vômitos são causados pela hipertensão intracraniana,
ou diretamente por tumores sobre o centro do vômito, na fossa posterior. Os
distúrbios psíquicos derivam principalmente de disfunção dos lobos frontais. O
edema de papila (papiledema) é causado pela compressão da veia central da
retina pelo líquor hipertenso que envolve a bainha do nervo óptico; quando de
longa duração provoca atrofia secundária do nervo óptico. Os sinais vitais são
consequentes ao sofrimento do tronco encefálico e consistem em bradicardia,
hipertensão arterial e alteração do rítmo respiratório.

2-Sinais e sintomas focais


São representados pelas paresias ou paralisias espásticas
contralaterais, convulsões focais, ataxia, comprometimento de nervos cranianos,
agnosias, afasias, apraxias e manifestações endócrinas. Podem ocorrer de forma
associada, caracterizando as seguintes síndromes :
162

S. nervos cranianos
1- Seio cavernoso : III, IV, VI, V1
2- Angulo ponto-cerebelar : VII, VIII e sinais cerebelares e
pontinos
3- Forame jugular : IX, X, XI
S. paraselar
disfunções endócrinas : diabetes insipidus, hipopituitarismo
deficit visual por comprometimento do n. óptico e quiasma
sinais hipotalâmicos : alterações do sono, do apetite e da
regulação térmica
hipertensão intracraniana por obstrução do III ventrículo.
S. tronco encefálico
Hemiplegia contralateral
Hemianestesia superficial e profunda contralateral
Comprometimento de nervos cranianos homolateral
S. cerebelar
Dismetria
Decomposição dos movimentos
Disdiadococinesia
Tremor durante a realização de movimentos
Marcha atáxica
Hipotonia
S. do lobo frontal posterior ou motora (giro pré-central)
Area da face : paresia facial central
Área do membro superior : paresia braquial
Area membro inferior : paresia crural
S. do lobo frontal anterior (pré-central)
F1 : incontinência urinária
reflexos primitivos
F2: paralisia do olhar conjugado
163

F3 : afasia de Broca
Pólo frontal :
alterações afetivas
alterações da personalidade
alterações do comportamento social
S. lobo occipital
Hemianopsia homônima contralateral
S. lobo parietal
Deficit da sensibilidade discriminativa (cortical) contralateral
Negligência do espaço contralateral
Negligência e agnosia de partes do corpo contralateral
Apraxia construtiva e de vestimenta
Quadrantopsia inferior contralateral
S. lobo temporal
Afasia de Wernicke
Quadrantopsia superior contralateral
Crises parciais complexas ou psicomotoras
164
165

CAPÍTULO 11

TRAUMATISMO CRÂNIOENCEFÁLICO (TCE)


166

TRAUMATISMO CRANIOENCEFÁLICO(TCE)

1 - Introdução
Os acidentes acompanhados de trauma crânio encefálico são uma causa
significante e crescente de morte e morbidade em crianças e adultos jovens. As
complicações e sequelas dos traumatismos crânio-encefálicos trazem muitos
problemas quanto à conduta a ser tomada, algumas das quais podem requerer
supervisão médica constante. (1,2)

2- Definição
O traumatismo crânio-encefálico pode ser definido como qualquer lesão que
envolva não somente o encéfalo, como inicialmente se imagina, mas que acometa
a calota craniana e o SNC. É importante ainda, na definição desta entidade, saber
diferenciar concussão de contusão, que são termos utilizados com frequência, no
vocabulário médico, como se tivessem o mesmo significado.
A palavra concussão implica em violento movimento do encéfalo resultando em
acometimento transitório das funções neurológicas, ou seja, é definido como uma
paralisia traumática reversível das funções nervosas. Já o termo contusão é
empregado, quando seguido do trauma, observa-se hemorragias no parênquima,
com ou sem alterações na consciênica, podendo ou não obter reversibilidade das
funções nervosas inicialmente acometidas.(1,2)
167

3 - Epidemiologia:
O traumatismo craniano é a maior causa de morte, especialmente entre adultos
jovens. Quase 10% de todas as mortes nos EUA são causadas por trauma, e cerca
de metade destas lesões traumáticas envolvem o cérebro. Nos Estados Unidos, o
trauma craniano ocorre a cada 7 segundos, com morte, em decorrência deste, a
cada 5 minutos.(2)
Dos pacientes admitidos em hospitais nos Estados Unidos, 5% são classificados
como possuidores de um traumatismo grave e se mostram em coma(Glasgow<8).
Cerca de 5 a 10% apresentam trauma craniano moderado, com o escore de
Glasgow entre 9 e 12. A maioria, cerca de 85 a 90% são admitidos com
traumatismo craniano leve, sendo que podem não evidenciar nenhuma ou
pequenas alterações na consciências, com Glasgow de 13-15. (1) As fraturas são
frequentes no trauma do crânio e guardam relação com a gravidade do mesmo.
(2)
Os custos do trauma craniano para a sociedade são difíceis de serem
calculados, mas com certeza são elevados, a ver pelo número de admissões que
podem chegar a 400.000 por ano e 70.000 mortes anuais( dados referentes ao
ano de 1984) . (1.2)

4 - Incidência :
O trauma crânio - encefálico ocorre em todas as idades, mas o pico de maior
incidência se dá em adultos jovens, com idades entre 15 a 24 anos. Os homens
são mais frequentemente acometidos que as mulheres, cerca de 3 a 4 vezes.(1,2)

5 - Classificação :
O TCE pode ser inicialmente classificado em três grupos de acordo com a
natureza do trauma. O primeiro grupo é aquele nos quais as lesões cranianas
decorrentes do trauma são fechadas, o segundo abrange os pacientes que
mostram ao exame fraturas deprimidas do crânio e por fim o grupo das fraturas
168

compostas, que são aquelas em que se observa solução de contiguidade entre a


pele, osso e encéfalo.(1,2)

Outra forma de se classificar os pacientes com TCE, é de acordo com a


severidade do mesmo. Desta forma teríamos os pacientes pertencentes ao grupo
de TCE de baixo risco, os quais seriam aqueles pacientes assintomáticos, ou com
queixas de cefaléia, zumbido, sem distúrbios de consciência, ou com breve perda
da consciência e com Glasgow de 13 a 15. A idade no grupo de baixo risco tem um
fator prognóstico importante, pacientes mais idosos tendem a ter mais sequelas,
do que os mais novos . Ao TCE moderado pertenceriam os pacientes que não
ficaram comatosos em consequência do traumatismo, porém tiveram seu nível de
consciência deprimido por várias horas ou dias. No TCE moderado o Glasgow deve
se situar em um intervalo entre os índices de 9-12. Quase sempre estes pacientes
apresenta dificuldades na cognição e comportamentais durante longo tempo. A
depressão é frequente e pode responder bem a antidepressivos tricíclicos. Já no
TCE de alto risco encontraremos nível de consciência bastante deprimido, sinais
neurológicos focais estão presentes com relativa frequência, os pacientes podem
estar comatosos e o Glasgow se situaria entre 3-8 .(1,2,3)

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E DIAGNÓSTICO

6- Sintomas e sinais

6.1- Gerais :
169

Os paciente que sofreram TCE podem se apresentar desde assintomáticos até


com sintomatologia bastante variada. Os principais sintomas e sinais seriam:

1 - Distúrbios da consciência : - Deficiência de memória


- Desorientação têmporo-espacial
- Diminuição da capacidade de concentração
- Deterioração do pensamento lógico
- Sonolência
- Confusão mental
- Apatia
- Irritabilidade
2 - Cefaléia
3 - Vertigens e Zumbidos
4 - Crises convulsivas
5 - Síncope
5 - Ansiedade e depressão
6 - Alterações motoras
7 - Alterações sensitivas
8 - Outros sinais neurológicos focais(1,2,3,4)

6.2- Distúrbios da consciência :

O distúrbio de consciência é o sintoma mais comum do trauma craniano. O


paciente pode apresentar desde leves alterações na consciência até perda
completa do contato com o ambiente, o coma. Outros achados que podem ser
observados em pacientes confusos é a perda da orientação têmporo espacial e
alterações da memória.
O coma pode ser mais prolongado, durando muitas horas, dias ou semanas
quando existem outras alterações associadas como swelling, hemorragia, contusão
ou laceração do córtex. A duração do coma depende do sítio e da severidade do
trauma, ou seja, dependendo do local do trauma a perda de consciência pode ser
170

mais ou menos exacerbada, por exemplo: penetração de um pequeno projétil na


região dos lobos parietais ou frontais pode não causar perda considerável de
consciência, enquanto que o mesmo projetil ao passar pelo osso petroso e atingir
a fossa posterior, poderá produzir um coma grave de muitos dias de duração. A
recuperação do coma também está na dependência da extensão e gravidade do
trauma sofrido e de sua localização.
A amnésia pós-traumática que é aquela que ocorre para eventos imediatamente
após o trauma; a amnésia anterógrada que consiste no esquecimento de fatos
recentes e por fim a amnésia retrógrada, que é menos frequente e expressa-se
pelo esquecimento de fatos mais remotos, podem estar presentes após um TCE.
Estes quadros de amnésia, principalmente o de amnésia anterógrada, podem
perdurar por um tempo variado, na maioria das vezes este intervalo de tempo
correlacionam-se à gravidade do trauma.
Por ser o distúrbio de consciência um dos sinais mais precoces e portanto mais
importantes que podem se mostrar presentes durante a avaliação de um paciente
com TCE, portanto se faz fundamental que ao usarmos termos como “esturpor,
“semicomatosos”, “Obnubilação”, “inconsciente” especifiquemos bem quais são
nossos reais achados, pois estes termos são pouco confiáveis já que cada um pode
ter significado diferente se o avaliador for diferente, o que dificultaria
sobremaneira o seguimento do estado de consciência dos pacientes.(1,2,3,4)

6.3 - Cefaléia pós- traumática :

A dor de cabeça após o TCE é normalmente generalizada, bilateral, pungente e


associada com sensibilidade do couro cabeludo sobre a parte contundida do
crânio.
Embora uma cefaléia pós-truamática possa ser notada imediatamente após o
TCE, devemos nos lembrar que seu início pode também ser tardio. A dor de
cabeça é o sintoma proeminente e geralmente persiste após o período esperado
para a resolução do edema cerebral( 30 a 50% por mais de dois meses). Uma
171

cefaléia por mais de dois meses após TCE é denominada cefaléia pós-traumática
crônica.
A severidade da cefaléia pós-traumática não pode ser relacionada à severidade
do trauma, usando parâmetros como a amnésia, coma, elevação da pressão
intracraniana ou alterações eletroencefalográficas. Muitas cefaléias pós-traumáticas
intensas ocorrem após lesões triviais.
Uma cefaléia do tipo tensão muscular pode persitir nestes casos após o trauma.
Os nervos sensitivos no couro cabeludo podem causar neuralgias, com dores e
hipersenssibilidade do crânio. Cefaléias enxaquecosas também podem ser
provocadas por trauma.

6.4 - Epilepsia pós- traumática :


Crises convulsivas são sintomas frequentes na fase aguda do trauma craniano.
Elas podem ocorrer imediatamente depois ou poucas horas após o TCE. As crises
podem ser de qualquer tipo exceto as de ausência, mas em ordem de frequência
encontramos inicialmente as crises generalizadas seguidas pelas focais.
A incidência é de 2,5 a 40% e aumenta 50% quando existe perfuração da dura,
laceração e contusão cortical. O risco de crises é de 15% com contusão ou
hematomas cerebrais.
Em crianças as crises convulsivas aparecem em até 30% dos casos com edema
cerebral, Glasgow <12 ou presença de hematoma subdural.
A frequência de crises varia de paciente para paciente, alguns com um episódio,
crises ocasionais até pacientes que mostram várias crises pós-traumáticas.
O EEG é de valor diagnóstico.

7 - Abordagem inicial do paciente com TCE

O diagnóstico vai depender de uma história minuciosa e detalhada, já que


achados objetivos podem ser mínimos. É estimado que 60% dos TCE(s) fatais
ocorrem antes dos pacientes serem admitidos no hospital, sendo que 40% no local
172

do acidente e 20% na sala de emergência, daí a necessidade de se ter uma boa


equipe de emergência, com bom entrosamento equipe médica e de enfermagem.
Inicialmente o paciente tem que ser avaliado para detectar os sinais de
catástrofe sistêmica, os quais seriam a avaliação da função respiratória do paciente
e da função cardíaca. No TCE os sinais vitais da vítima têm que ser
cuidadosamente avaliados e monitorizados. A hipóxia é percebida em uma grande
maioria dos pacientes que não demostram grandes dificuldades respiratórias.
Arritimias cardíacas podem complicar ainda mais o quadro traumático, bem como
respostas hipertensivas.
Deve-se proceder com a avaliação neurológica enquanto ou após as funções
cardiorrespiratórias já estiverem sendo observadas. A escala de Glasgow é
largamente usada como uma medida da severidade da lesão cerebral e também
pode ser um guia prognóstico. Porém, esta escala, não é válida para crianças ou
para pacientes em choque, intoxicados, hipóxicos ou em período pós-ictal.
Sinais de decorticação rígida( flexão dos braços, extensão das pernas) ou
descerbração rígida( extensão das pernas e braços), podem também estar
presentes ao exame. Prontamente a cabeça deve ser examinada a procura de
lesões do couro cabeludo ou calota craniana, tais como afundamentos, fraturas
simples e/ ou compostas.
Associado ao Glasgow devemos sempre avaliar a função dos pares cranianos,
dando especial atenção ao movimento ocular e das pupilas, mas o exame
neurológico completo deve ser realizado quando se fizer necessário e quando
possível. Sabe-se que a maior parte dos pacientes com TCE fechado com ou sem
sintomas terão o exame negativo.

Na avaliação do TCE, devemos ter em mente, que existem algumas diferenças


entre o TCE em crianças e nos adultos. Os traumatismos nas crianças respondem
por aproximadamente 15% das internações de crianças em enfermarias. Após o
173

TCE as crianças desenvolvem o edema cerebral traumático com muito mais


facilidade do que me adultos, levando rapidamente à confusão mental e à
sonolência. As crises epilépticas também são mais frequentes em crianças. O
crânio elástico das crianças é mais dificilmente fraturado do que o dos adultos e
fraturas da base são menos frequentes em crianças.

8 - Diagnóstico e seguimento dos pacientes:

8.1 - Métodos de imagens mais utilizados:


Os principais métodos de imagem atualmente disponíveis são o RX de crânio, a
tomografia computadorizada (TC) e a RNM do encéfalo.
Quando pensamos em realizar um método de imagem em casos de TCE, várias
são as dúvidas que geralmente podem aparecer tais como:
- Qual o melhor método ?
- Quando usar cada método ?
- TC x RNM, vantagens e desvantagens de cada método ?
É nosso objetivo aqui tentarmos esclarecer um pouco estes questionamentos.

8.1.1 - RX de crânio :
O valor da radiografia do crânio na identificação de lesões intracranianas não
tem sido satisfatoriamente definida.
Para melhor avaliarmos a importância do RX de crânio podemos dividir os
pacientes vítimas de TCE em três grandes grupos, os de alto risco de lesão
intracraniana, os de baixo risco e os de risco moderado.
O grupo de alto risco consiste de pacientes com fraturas compostas ou fechadas
da cabeça, com quadro clínico exacerbado e óbvio. Estes pacientes podem ser
diretamente levados a realização de uma TC do encéfalo. O grupo de baixo risco
incluiria aqueles pacientes assintomáticos, ou oligossintomáticos, com queixas de
cefaléia, zumbido, sem alterações de consciência, ou náuses ou vômitos. A
imagem radiográfica não é recomendada para este grupo, tendo em vista a pouca
174

chance de acometimento grave que estes pacientes possam apresentar. Por fim no
grupo de pacientes com risco moderado, ou seja aqueles pacientes sintomáticos,
cefaléia, zumbido, náuseas, vômitos, hematomas no couro cabeludo, sinais de
distúrbios da cosnciência e outros, a radiografia é sempre importante como
método de triagem de lesões mais graves, já que estes pacientes tem chance
maior de apresentar fraturas.
Esta divisão dos pacientes em três grupos foi proposta em um trabalho que
analisou 7035 casos de TCE, observando que o número de RX de crânios pedidos
era extremamente elevado e desnecessário .O objetivo era do de propor, através
desta separação em grupos, uma redução do número de RX pedidos e ao mesmo
tempo dar mais segurança ao médico para não pedí-los.

8.1.2 - Tomografia Computadorizada(TC) :


Introdução :
Hounsfield desenvolveu a tomografia computadorizada em 1972 revolucionando
os cuidados de pacientes com trauma cranioencefálico agudo. A possibilidade de
uma avaliação rápida, de forma não invasiva, permitiu maior rapidez no
diagnóstico e possibilidade de intervenção rápida e adequada.
Com a introdução da TC do encéfalo, outros métodos anteriormente utilizados
para avaliar o trauma craniano foram caindo em desuso ou evidenciaram
diminuição significativa de seu uso, como :
- RX de crânio- reduziu em 24%
- Angiografias - reduzir em 84%
- Intervenção cirúrgica exploratória- reduziu em 58%
175

Considerações técnicas :
O protocolo de TC para a avaliação de vítimas de TCE incluem de 10 a 15 cortes
axiais sem contraste feitos paralelos à base do crânio ou na linha órbito-meatal.
Os cortes são realizados geralmente com 5mm de distância na fossa posterior e
10mm na região supratentorial. O tempo de revelação pode variar de 1 a
8segundo de acordo com o aparelho tomográfico utilizado. A resolução das
imagens também está na dependência do equipamento utilizado.
As alterações tomográficas decorrentes do TCE são muitas e podem
inicialmente serem divididas em dois grandes grupos, os de processos extra-axiais
e os de processos intra-axiais.
Os riscos associados com a radiação ionizante e uso de material para realização do
contraste são algumas das desvantagens que poderiam ser mencionadas quando
usamos a TC como método diagnóstico .
Processos extra-axiais :
1 - Hematoma epidural :
O hematoma epidural ocorre no espaço existente entre a tábua óssea interna e
a dura. Coleções sanguíneas neste espaço assumem conformação lenticular, ora
biconvexa.
O sangramento é arterial na maioria das vezes, sendo a artéria meníngea média
a maior responsável por tais sangramentos. Apesar de pouco frequente existem
casos em que o hematoma epidural tem origem de sangramentos venosos,
principalmente do seio sagital superior.
Em uma série de estudos em 80 pacientes realizado por Tapero et al em 1984,
observou-se que o hematoma epidural em cerca de 68% dos casos se acompanha
de outras anormalidades intracranianas. As fraturas estão presentes em cerca de
82% dos pacientes, mas as fraturas deprimidas e compostas são menos
frequentes, quando presentes se situam principalmente nas regiões parietal,
temporal e occipital.
Os hematomas epidurais em sua fase aguda são, com grande frequência,
uniformemente hiperdensos, mas existem casos em que podemos encontrar
176

bolhas, estas que se originam do aumento dos gazes liberados pelas membranas,
ou então em decorrência da fratura que pode estar contígua à lesão.

2 - Hematoma subdural:
O hematoma subdural desenvolve-se no espaço subdural, entre a dura e a
membrana aracnóide.
Os hematomas subdurais tem localização mais comum nas convexidades do
cérebro, com maior frequência do mesmo lado do trauma, mas cerca de 33% dos
hematomas podem se mostrar presentes contralateralmente ao trauma.
Normalmente o hematoma subdural tem o sangramento de origem venosa, mas
raramente, em casos de traumas mais graves, uma artéria do parênquima
contíguo à lesão pode se romper e promover um hematoma subdural. Mesmo os
hematomas subdurais pequenos se associam a efeitos de massa sobre os
ventrículos, em um estudo observou-se que cerca de 95% dos hematomas
subdurais promovem efeito de massa. A mortalidade dos hematomas subdurais é
extremamente alta quando não submetido à cirurgia em tempo hábil.
O hematoma subdural pode ser classificado tomograficamente em três fases,
aguda, subaguda e crônica. A fase aguda compreende um período inferior à uma
semana do trauma, nesta a imagem se mostra hiperdensa. A fase subaguda pode
ainda ser subdividida em duas outras fases que seriam a subaguda recente e a
tardia. A subaguda recente seria aquela situada num intervalo de tempo de 1
semana a 2 semanas, já a tardia compreenderia os traumas ocorridos num
período de 2 semanas a 1 mês. Tanto na fase subaguda recente quanto tardia, o
hematoma tenderá a ficar mais isodenso. Por fim a fase crônica, é a que
envolveria os hematomas subdurais com mais de um mês de evolução, a imagem
se mostraria hipodensa à tomografia.
Em estudo retrospectivo de 28 pacientes, observou-se que 10 pacientes
apresentavam imagem tomográfica muito semelhante à um hematoma epidural, o
que dificultaria o diagnóstico, sendo que todos estes 10 pacientes tiveram suas
tomografias realizadas em um período inferior a 6 horas após o trauma. Este
177

achado sugere que o hematoma subdural necessite em média de 6 horas para


assumir sua forma de crescente, ou seja côncavo convexa.
Em uma série de 87 pacientes descritos por Moller e Ericson 25% apresentam
lesões isodensas. estas são vistas cerca de 1 a 3 semanas após o trauma, com um
pico entre 2 a 6 semanas. Nestes pacientes o hematoma subdural pode não se
mostrar evidente na tomografia e deve ser suspeitado quando correlaciona-se
história de trauma com efeito de massa sobre os ventrículos. Novos tomógrafos
lançados no mercado já visam tentar solucionar tal problema. Esta mesma imagem
pode aparecer na ressonância nuclear magnética de forma bem hiperdensa em T2,
facilitando assim o diagnóstico.

3 - Hemorragia subaracnóide:
A causa mais comum de hemorragia subaracnóide é o trauma craniocerebral. A
porção intradural da carótida interna e os componentes vasculares do polígono de
Willis são os mais frequentemente envolvidos.
Processos intra-axiais:
1 - Edema e efeito de massa :
Por definição, o diagnóstico de edema relaciona-se com um aumento de água
no cérebro. O efeito de massa poderia ser decorrente a um edema presente em
um hemisfério ou circundando por exemplo um hematoma intraparenquimatoso,
ou contusões.
Tomografiacamente o cérebro edemaciado é hipodenso e perde-se um pouco
ou totalmente a capacidade de se diferenciar a substância branca da cinzenta.
2 - Contusões:
Patologicamente, as contusões cerebrais são lacerações no parênquima com
hemorragias no local do impacto ou contralateralmente, em decorrência do
contragolpe. Frequentemente esta área de sangramento é irregular e associada a
parênquima necrosado, o que confere um aspecto de imagem hiperdensa com
pequans porções hipodensas de parênquima necrosado associado.
3 - Hematoma intraparenquimatoso:
178

Em determinadas ocasiões se torna difícil diferenciar esta entidade de casos de


contusões, mas para tanto, podemos observar se a região acometida evidencia
pequenas áreas hipodensas ou se mostra apenas como uma imagem hiperdensa.
No primeiro caso é mais provável que seja uma contusão, pois nesta temos, como
citado anteriormente, presença de parênquima lesado, já a imagem unicamente
hiperdensa é mais certa de ser um hematoma intraparenquimatoso, já que este é
composto de sangue, mas não de parênquima necrosado.
4 - Lesão axonal difusa:
A lesão axonal difusa é a degeneração difusa da substância branca cerebral,
sendo considerado o fator mais importante para se determinar a morbidade e a
mortalidade no TCE. É lesão primária do encéfalo. Representa o substrato
morfológico da inconsciência traumática de instalação imediata. Presente em
aproximadamente 50% dos TCE(s) graves, sendo também a maior causa de
sequelas após o TCE levando os sobreviventes à vida vegetativa.
As regiões acometidas pela lesão axonal difusa são as regiões subcorticais, que
próximas a superfície absorvem parte da energia cinética imposta ao encéfalo,
principalmente em pólos frontais e temporais. Também são muito susceptíveis a
LAD, a cápsula interna e regiões situadas em linha média, como a supracalosa e o
mesencéfalo. Estas alterações podem ser vistas à tomografia, mas quando não
são hemorrágicas sua visualização somente é possível mediante a RNM.
Podem ser classificadas em três graus :
- Primeiro grau: existem penas alterações microscópicas dos axônios. Incidência
em média de 20% das LAD.
- Segundo grau: além das lacerações microscópicas, há lesão do corpo caloso,
representando uma maior gravidade do TCE. Em media correspondem a 50% das
LAD(s).
- Terceiro grau: além das alterações microscópicas, lesão do corpo caloso, há
lesões de tronco encefálico. Tem incidência em média de 30% das LAD(s).
5 - Fraturas :
179

São mais bem visualizadas na tomografia computadorizada, quando pede-se


realização de janela óssea.

8.1.3 - Ressonância Nuclear Magnética( RNM)

No passado o desenvolvimento da tomografia computadorizada(TC) teve grande


impacto na avaliação do trauma de crânio, contribuindo muito para a diminuição
da morbidade e mortalidade, mas não era raro os achados na TC não se
correlacionarem com o estado neurológico do paciente e seu estado de
consciência.
Em 1980 a primeira imagem de RNM do cérebro foi publicada demostrando-se
ser superior à TC em demostrar os detalhes anatômicos e algumas lesões que
anteriormente não poderiam ser visíveis após o trauma mediante uso da TC.
Vários estudos tem evidenciado que a RNM é um método que se mostra com a
mesma eficiência do que a tomografia computadorizada para avaliar agudamente
o trauma, salvo casos de lesão axonal difusa com alterações não hemorrágicas,
traumas na fossa posterior e tronco encefálico, mas com maior sensibilidade para
o estudo tardio do trauma, ou seja em fases subagudas e crônicas.
Mesmo diante de tantas vantagens e vários estudos que preconizam a utilização
da RNM em substituição a TC na avaliação do trauma craniano, 0qualquer que seja
sua fase, esta não é uma realidade que possa ser aplicada em casos de trauma
agudo. Os pacientes com traumatismo craniano frequentemente se encontram em
respiração mecânica, ou agitados o que dificultaria muito a realização deste
método. Além disso a RNM gastaria um tempo muito maior para nos fornecer um
resultado da extensão da lesão deste paciente, tempo este que poderia ser
precioso para tratamento rápido do trauma. Por outro lado a RNM é muito mais
cara do que a TC, e se tais exames fossem de responsabilidade dos hospitais
públicos, com certeza estes não poderiam realizá-los, além disso não é todo
180

paciente, porque não afirmar, a grande maioria que é capaz de financiar um


exame deste porte.
8.2 - Seguimento dos pacientes: Monitorização da Pressão Intracraniana.

O paciente que se na ECG mostra índice menor ou igual a 8, ou que evidencie


alterações ao exame tomográfico que demonstre edema cerebral ou lesão axonal
difusa deve receber monitorização da pressão intracerebral.

A monitorização da pressão intracraniana pode ser efetuada mediante dois


acessos, o primeiro, mais utilizado e’ o que o monitor é instalado no espaço
subdural, já o segundo menos preferível, já que pode levar a colabamento
ventricular é o que o cateter de medição é colocado dentro do ventrículo.
A pressão intracraniana normal situa-se entre 15 e 20 mmHg. Quando esta
aumenta a valores iguais ou acima de 20mmHg, considera-se um quadro e
hipertensão intracraniana e o tratamento para tal entidade deve ser então iniciado.

9 - Sequelas do TCE :
9.1 - Infecções :

As infecções da cavidade intracraniana em decorrência do trauma podem ser do


tipo extradural, subdural, subaracnóide(meningites), ou intracerebral (abcessos) .

9.2- Fístulas :

Ocorrem em cerca de 3% dos pacientes com trauma craniano e em 5 a 10%


dos TCE com fratura de base de crânio. O diagnóstico frequentemente é fácil e é
feito mediante relato e observação de drenagem de fluido nasal cerca de 48 horas
após o trauma. Muitas fístulas fecham espontaneamente, mas o tratamento
cirúrgico deve ser pensado em caso de mais de duas semanas sem observação de
melhoria do quadro.
181

9.3 - Pneumocele :

É definido como sendo a presença de ar dentro da cavidade, ocorrem em raras


complicações do TCE. O ar está situado usualmente na região frontal e
frequentemente associado a fraturas de um ou mais sinos do seio frontal. A
pneumocele pode ser assintomática ou estar associada a relatos de cefaléia, ou
distúrbios da cognição. Em caso da absorção espontânea do ar não ocorrer, deve-
se proceder com a cirurgia.

9.4 - Paralisia de funções dos nervos cranianos :

Alterações das funções dos nervos cranianos é uma frequente complicação após
um TCE com fratura de base de crânio. As alterações dos nervos cranianos podem
ser identificadas com frequência rapidamente ou tão logo ocorra recuperação do
nível de consciência do paciente. Alguns nervos acometidos são o facial e o
olfatório, este último que pode sofrer alterações decorrentes apenas do movimento
do encéfalo.

9.5 - Epilepsia :

As crises convulsivas são um sintoma pouco frequente na fase aguda do


trauma. A exata incidência de crises convulsivas após o trauma não está bem
definida e situa-se em um intervalo amplo que varia de 2,5 a 40%.
O risco aumenta em casos de contusões, hematomas cerebrais e nos casos de
crianças este risco se eleva quando na presença de edema cerebral, ECG menor
que 12 após o TCE.
Um fato interessante é que se as crises ocorrem durante a fase aguda do
trauma é pouco provável que elas tornem a se repetir.
Pensa-se que o mecanismo de instalação da epilepsia tardia decorra do
fenômeno conhecido como Kindling, que no Brasil receberia a tradução de
182

abrasamento. Este fenômeno corresponderia a ocorrência de descargas


sublimiares em regiões do cérebro, incapazes de provocar alterações, mas que
com o decorrer do tempo levem a crises convulsivas repetidas, ou seja ao quadro
de epilepsia.

ANATOMIA PATOLÓGICA DO TCE

O trauma é uma das causas mais freqüentes de lesão


encefálica.
Essas são classificadas segundo os critérios temporal e
topográfico. A lesão encefálica primária ocorre no momento do trauma e
corresponde principalmente à contusão cerebral e à LAD. A lesão secundária é
determinada por processos iniciados no momento do trauma, mas clinicamente
evidentes algum tempo depois. São lesões secundárias: os hematomas
intracranianos, a tumefação cerebral, a lesão cerebral secundária à hipertensão
intracraniana e a lesão cerebral hipóxica.
Do ponto de vista anatomopatológico a tendência é classificar
tipograficamente as lesões, em focais e difusas . As lesões focais caracterizam-se
por serem geralmente macroscópicas e limitadas a determinada área. São
conseqüentes ao trauma localizado, sendo encontradas em cerca da metade dos
pacientes com lesão cerebral grave e causam dois terços das mortes por TCE . São
lesões focais: a contusão cerebral, o hematoma intracraniano, bem como a
hemorragia e o infarto do tronco encefálico conseqüentes à hipertensão
intracraniana. As lesões difusas, por seu lado, são geralmente microscópicas e
estão associadas à disfunção difusa do encéfalo. São representadas pela LAD, a
lesão cerebral hipóxica, a tumefação cerebral difusa e a lesão vascular focal
múltipla . São observadas em aproximadamente 40% dos pacientes com lesão
183

cerebral grave, causam um terço das mortes por TCE e representam a origem mais
freqüente de incapacidade neurológica persistente.

1 - CONTUSÃO CEREBRAL
Nos estádios iniciais (contusões recentes) são caracterizadas por
hemorragias perivasculares puntiformes na superfície cortical (cúpulas dos giros).
Em casos de maior intensidade, a hemorragia pode estender-se para dentro da
substância branca. Quando em grande número e intensos, os extravasamentos de
sangue podem unir-se, tornando difícil a distinção entre a contusão e o hematoma
intracerebral. Os neurônios do córtex adjacente à hemorragia desenvolvem
necrose isquêmica. A área contusa torna-se tumefeita e a contusão aguda e
hemorrágica evolui para cicatriz cuneiforme glial, de cor castanho-ferruginosa
produzida pela hemossiderina.
Classicamente distingue-se a contusão da laceração. Na contusão
a integridade da pia-máter e da aracnóide é mantida, e não há solução de
continuidade do tecido nervoso. Na laceração ocorre ruptura da pia-máter, da
aracnóide e do tecido nervoso subjacente. Entretanto, os dois termos geralmente
são usados como sinônimos.
Por ser facilmente observável ao exame anatomopatológico, a
contusão cerebral foi considerada como a lesão fundamental do TCE. As evidências
clínicas e experimentais, no entanto, vieram a indicar que a contusão cerebral,
mesmo extensa, pode estar associada ao pleno estado de consciência e à evolução
clínica favorável, desde que não ocorram complicações e que não haja associação
com a LAD. A contusão é lesão essencialmente focal que acomete áreas não vitais
do cérebro. Clinicamente sobressaem as contusões dos pólos frontal e temporal,
pois no período imediato após o trauma, apresentam propensão ao sangramento
ou à tumefação , comportando-se, assim, como lesões expansivas intracranianas.
Independente do local do impacto sobre o crânio, as contusões
apresentam localização típica. Distribuem-se principalmente junto aos pólos
184

frontais, à superfície orbital dos lobos frontais, aos pólos temporais, às superfícies
lateral e inferior dos lobos temporais e ao córtex próximo ao sulco lateral.
Geralmente são múltiplas e bilaterais, porém assimétrica.
As contusões subjacentes ao local do impacto (contusões por
golpe) resultam da deformação provocada pela depressão óssea com conseqüente
lesão da superfície cortical e dos vasos da pia-máter. A teoria da aceleração
do encéfalo (HOLBOURN, 1943, 1945) é a mais aceita atualmente para explicar a
patogenia da contusão distantes da área de impacto (por contragolpe). No
momento do impacto com a cabeça em movimento, a aceleração do crânio é
interrompida de modo abrupto, mas o encéfalo continua em movimento em
virtude de sua maior inércia em relação ao crânio. Assim, opõe maior resistência à
parada do movimento, por causa de
sua maior massa. Em conseqüência deste movimento diferencial entre crânio e
encéfalo, ocorre maior atrito quando o deslizamento do encéfalo é retardado,
especialmente pela base irregular do crânio, onde a superfície do cérebro colide
com relevos ósseos, como a asa menor do osso esfenóide e o teto da órbita. Assim
se explica a maior freqüência das contusões junto à base do lobo frontal, ao pólo
temporal e às bordas do sulco lateral.

2 - HEMORRAGIA INTRACRANIANA

A hemorragia intracraniana é complicação freqüente do TCE,


especialmente naqueles pacientes com fratura de crânio. Pode ocorrer
sangramento nos espaços extradural, subdural e subaracnóideo, no cérebro e
nos ventrículos.
A maioria dos hematomas intracranianos está presente nas
primeiras 48 horas após o trauma.
Os hematomas intracranianos são classificados em epidural ou
extradural e intradurais (localizadas no interior do espaço delimitado pela dura-
máter craniana), sendo os últimos divididos em subdurais e intracerebrais. Esta
185

classificação leva em conta os fatos de que os hematomas epidurais e intradurais


apresentam patogenias diferentes e de que os hematomas subdurais e
intracerebrais estão freqüentemente associados na entidade denominada explosão
lobar.
Os hematomas intradurais podem apresentar-se sob três formas:
hematoma subdural, hematoma intracerebral e explosão lobar.

2.1 - Hemorragia subaracnóidea


Trata-se da presença de sangue entre a aracnóide e a pia-máter,
no espaço ocupado pelo liquor. Quase todos os casos de TCE de intensidade
significativa estão associados a algum grau de hemorragia subaracnóidea. É
provocada, na maioria dos casos, pela rotação do encéfalo no interior do espaço
subaracnóideo. Este movimento determina a ruptura de pequenos vasos
subaracnóideos, levando a sangramento que geralmente não tem maior
significação clínica.

2.2 - Hemorragia intraventricular


Ocorre de forma relativamente freqüente no TCE associado à
lesão cerebral profunda, principalmente quando se verifica comprometimento do
corpo caloso, do septo pelúcido e do fórnix. Pode também ser conseqüente à
extensão de um hematoma intracerebral para dentro dos ventrículos.

2.3 - Lesão vascular focal múltipla


A presença de pequenas hemorragias disseminadas pelo encéfalo
é observada em pacientes que morreram rapidamente após o TCE, sendo lesão
incompatível com a vida.
É uma lesão cerebral difusa primária, que ocorre no momento do
impacto. É praticamente restrita ao acidente de trânsito, e parece que a força
inercial seria a responsável pela ruptura dos pequenos vasos.
186

2.4 - Hematoma extradural


O hematoma extradural ou epidural é a coleção de sangue
coagulado situada entre a dura-máter e o osso. À medida que o hematoma
extradural aumenta de volume ocorre gradual descolamento da dura-máter em
relação ao crânio e formação de massa ovóide de sangue coagulado. O efeito
patológico do hematoma extradural é, inicialmente, a compressão cerebral
subjacente, em seguida, a tumefação do hemisfério cerebral comprometido e,
enfim, a hipertensão intracraniana que tende a comprimir o tronco encefálico por
hérnia tentorial lateral (FORD & MCLAURIN, 1963; ADAMS, 1984).
Pela pequena espessura da escama do osso temporal, pelo contato
das artéria e veia meníngeas médias com a tábua interna deste
osso, e pela menor
aderência entre a dura-máter e a tábua interna dos ossos temporal e parietal
(zona descolável de Gerard Marchand), aproximadamente 70% dos hematomas
extradurais ocorrem na região têmporo-parietal. São circunscritos em
conseqüência de a dura-máter ser relativamente aderida ao crânio, sendo
descolada com dificuldade.
O hematoma extradural predomina no sexo masculino em
80% (quatro homens para uma mulher) e é próprio do adulto jovem, sendo mais
freqüente entre os 20 e 40 anos.O hematoma extradural é lesão de contato,
resultante do impacto sobre o crânio. Está freqüentemente associado a fraturas,
geralmente lineares.

2.5 - Hematoma subdural


Esta lesão consiste no acúmulo de sangue entre a dura-máter e a
aracnóide. Em contraste com o espaço extradural, este espaço é facilmente
dilatado, o que possibilita o grande acúmulo de sangue com tendência do
hematoma subdural a cobrir todo o hemisfério cerebral.
187

Do ponto de vista neurocirúrgico, o hematoma subdural é


classificado em agudo, subagudo e crônico. Na condição aguda, o hematoma é
formado apenas por coágulos, na subaguda existe a mistura de coágulo e sangue
líquido e, na crônica, a coleção é apenas líquida.
HOLBOURN (1943, 1945) postulou que, durante o movimento do
encéfalo, que acompanha a aceleração ou desaceleração da cabeça ao impacto, as
margens superiores dos hemisférios cerebrais seriam submetidas a grande força
de cisalhamento. Como a dura-máter está aderida ao crânio, o que então
ocorreria, durante o movimento diferencial do encéfalo em relação ao crânio, seria
o deslizamento da aracnóide em relação à dura-máter. Com isso, se daria a
ruptura das veias-ponte (veias córtico-meníngeas) que cruzam o espaço subdural,
formando-se o hematoma subdural, não associado à contusão cerebral.
O hematoma subdural crônico pode ocorrer semanas ou
meses após o trauma craniano, incidindo quase que exclusivamente em pacientes
idosos ou alcoólatras com atrofia cerebral.

2.6 - Hematoma intracerebral


Trata-se de coleção compacta de sangue situada dentro do
parênquima cerebral. É mais comum nos lobos frontal e temporal, mas ocorre
também profundamente nos hemisférios cerebrais. Pode ser múltiplo (JENNETT &
TEASDALE, 1981). Sugere-se que a aceleração angular determina a lesão
simultânea de vasos cerebrais intrínsecos e dos axônios, no momento do trauma
(lesão primária). A ruptura vascular seria conseqüente à força de cisalhamento por
movimento diferencial entre áreas do cérebro.

2.7 - Explosão lobar


Caracteriza-se pela coexistência de contusão cerebral, sangue no
espaço subdural, causado por hemorragia dos vasos corticais superficiais, e
hematoma no interior da substância branca, na profundidade da contusão.
188

Este tipo de lesão decorre da aplicação de força inercial sobre a


cabeça e ao conseqüente movimento do encéfalo em relação ao crânio e à dura-
máter. Este movimento gera forças de tensão e de cisalhamento na superfície do
cérebro, com conseqüente deformação dos tecidos e lesão de neurônios e vasos
sangüíneos. Resulta em contusões nos locais em que a superfície do encéfalo
(pólos dos lobos temporal e frontal) atrita contra acidentes ósseos da base das
fossas anterior e média. De fato, 80 a 90% dos hematomas intracerebrais
associados a contusões e a hematomas subdurais (explosões lobares) são
encontrados na substância branca dos pólos dos lobos temporal e frontal.

3 - LESÃO CEREBRAL HIPÓXICA


A lesão hipóxica é uma das causas de coma traumático na
ausência de lesão expansiva intracraniana. É o segundo achado mais freqüente
(depois da LAD) em pacientes que permanecem em estado vegetativo ou com
incapacidade grave após o TCE (GRAHAM et al., 1983; CLIFTON et al., 1981).
A lesão cerebral hipóxica distribui-se fundamentalmente sob três
padrões: 1) nas zonas de transição da irrigação das grandes artérias cerebrais,
principalmente entre os territórios das artérias cerebrais anterior e média; 2)
difusa no córtex de ambos os hemisférios cerebrais; 3) nos territórios de irrigação
das artérias cerebrais anterior e média (ADAMS, 1984).
As alterações estruturais do neurônio determinadas pela hipóxia
iniciam-se pela retração do corpo celular que se torna triangular e passa a conter
um núcleo hipercromático. A seguir, ocorre maior retração do citoplasma e
aparecem grândulos pequenos e densos (incrustações) na periferia do pericário.
Finalmente, o citoplasma torna-se progressivamente descorado e hemogêneo e o
núcleo diminui de tamanho. Após 24 horas, ocorrem alterações reativas nos
astrócitos, na micróglia e nas células endoteliais. Depois de um episódio de
hipóxia, a necrose pode permanecer limitada à célula nervosa (necrose neuronal
seletiva) ou pode comprometer também a glia e os vasos (infarto).
189

A distribuicão da lesão cerebral isquêmica era mais freqüente no


hipocampo (80%), seguido pelos núcleos da base (79%), o córtex cerebral (46%)
e o cerebelo (44%).
A hipóxia é definida como a redução da tensão de oxigênio nos
alvéolos pulmonares, levando a correspondente hipoxemia. Os seguinte tipos de
hipóxia cerebral são de ocorrência freqüente no TCE (GRAHAM, 1992): a)
isquêmica, quando o cérebro ou algumas de suas partes tem o suprimento
sangüíneo interrompido; b) hipóxica, quando a tensão reduzida de oxigênio nos
alvéolos leva à hipoxia do tecido cerebral através de hipoxemia; c) anêmica,
quando, por redução da taxa de hemoglobina, há conseqüente diminuição do
conteúdo de oxigênio no sangue. A tensão de oxigênio no sangue arterial é de 96
mmHg. Sinais de hipóxia cerebral surgem quando a tensão arterial de oxigênio cai
abaixo de 50 mmHg, ocorrendo, então, perda rápida da capacidade de julgamento
crítico e diminuição do nível de consciência; quando atinge 30 mmHg, ocorre
inconsciência.
Algumas evidências experimentais sugerem que, após o TCE, o
cérebro torna-se particularmente susceptível à hipóxia.
A insuficiência energética por isquemia determina a despolarização
da membrana celular, tornando deficiente o transporte ativo dos íons. O
conseqüente aumento da concentração intracelular de cálcio leva a alterações
bioquímicas que resultam em lesão celular.

4 - TUMEFAÇÃO CEREBRAL
O aumento da massa cerebral decorre de diferentes lesões, sendo
conseqüente a dois mecanismos: a) congestão causada por aumento do volume
sangüíneo dos vasos cerebrais e b) edema conseqüente a aumento do teor de
água no tecido cerebral.
190

No TCE observam-se três tipos de tumefação cerebral: 1)


tumefação adjacente a uma contusão, 2) tumefação difusa de apenas um
hemisfério, e 3) tumefação difusa de ambos os hemisférios.
A tumefação da substância branca adjacente à contusão é de
ocorrência comum. A contusão é circundada por alteração dos vasos; o aumento
da permeabilidade vascular permite o escapamento dos constituintes do soro,
sendo a difusão dos mesmos impulsionada pela pressão hidrostática da circulação
sistêmica. A tumefação cerebral focal pode complicar as contusões e hematomas
dos pólos frontal e temporal. Neste caso, a tomografia computadorizada mostra a
diminuição de densidade em torno da área lesada e, durante a cirurgia
descompressiva, observa-se o cérebro amolecido e necrótico.
A tumefação de apenas um hemisfério cerebral é observada mais
freqüentemente em associação com o hematoma subdural agudo homolateral.
Quando o hematoma é drenado, ocorre a expansão rápida do cérebro para
ocupação do espaço criado. Atribui-se o fenômeno ao enchimento do leito vascular
que se torna não reativo (paralisia vasomotora cerebral), em virtude da isquemia
por hipertensão intracraniana.
A tumefação de ambos os hemisférios cerebrais ocorre
principalmente em crianças e adolescentes A quase totalidade dos pacientes com
tumefação cerebral difusa é vítima de trauma com aceleração e desaceleração. A
estimulação do tronco encefálico, especialmente da formação reticular pontina e
mesencefálica, pode determinar aumento do fluxo sangüíneo cerebral. Sugere-se
que, no trauma grave, por mecanismo de aceleração ou de desaceleração, possa
ocorrer comprometimento de centros vasomotores do hipotálamo e do tronco
encefálico, determinando paralisia vasomotora, com aumento rápido do volume
sangüíneo cerebral. A congestão vascular determinaria hipertensão intracraniana,
compressão das veias cerebrais, aumento da resistência cerebrovascular,
diminuição do fluxo sangüíneo cerebral, isquemia e edema. A vasodilatação
poderia também ser resposta direta dos vasos cerebrais ao trauma mecânico.
191

5 - LESÃO AXONAL DIFUSA


A LAD, descrita por STRICH (1956), é considerada o fator mais
importante na determinação da morbidade e da mortalidade no TCE e o substrato
morfológico da inconsciência traumática de instalação imediata. As anormalidades
estruturais fundamentalmente encontradas na LAD são: a lesão focal do corpo
caloso, a lesão focal do quadrante dorsolateral da porção rostral do tronco
encefálico adjacente ao pedúnculo cerebelar superior e as alterações morfológicas
dos axônios.
A lesão focal do corpo caloso é hemorrágica e localiza-se
preferencialmente na porção inferior, lateralmente à linha média.
A lesão focal do tronco encefálico é lateral, tegmental e
geralmente unilateral, ocorrendo em tronco encefálico não deformado. Consistem
em áreas de necrose isquêmica e hemorragias petéquiais ou microhemorragias,
associadas à ruptura e degeneração de axônios. A lesão focal do tronco encefálico
localiza-se tipicamente na porção dorsolateral da ponte e do mesencéfalo,
geralmente envolvendo o pedúnculo cerebelar superior.
As alterações microscópicas da LAD apresentam-se sob três
formas: esferóides de retração, estrelas de micróglia e degeneração walleriana. A
força de cisalhamento, conseqüente à aceleração rotacional da cabeça, é o
mecanismo da lesão axonal.
A movimentação da cabeça leva à lesão estrutural de neurônios e
vasos, através de dois mecanismos. O primeiro é o movimento diferencial do
crânio e do cérebro, conseqüente à inércia de cada um. É responsável pelas
contusões nos locais em que a superfície do encéfalo atrita contra acidentes
ósseos da base do crânio. O movimento diferencial do encéfalo em relação ao
crânio é também responsável pela ruptura das veias-ponte e conseqüente
formação do hematoma subdural. O segundo mecanismo de lesão por aceleração
é o cisalhamento (deformação que sofre um corpo quando sujeito à ação de
forças cortantes) de estruturas do encéfalo. Com exceção da fratura de crânio e do
192

hematoma extradural (lesões de contato), praticamente todos os tipos de lesões


cerebrais podem ser produzidas pela aceleração angular da cabeça.

6-TRAUMA PENETRANTE DO CRÂNIO


Vários tipos de objetos que caem ou são impulsionados (mísseis)
podem provocar lesão cranioencefálica. O mais importante é o trauma por projétil
de arma de fogo. A capacidade de um projétil de arma de fogo para destruir o
tecido está diretamente relacionada à sua energia cinética no momento do
impacto. À medida que o projétil penetra no encéfalo, o parênquima cerebral é
lacerado, criando uma cavidade permanente que é ligeiramente maior do que o
diâmetro do projétil. Uma secção de lesão cerebral provocada por projétil mostra
três diferentes áreas : uma central que contém tecido cerebral lacerado e sangue,
uma intermediária de necrose tecidual e uma marginal de tecido cerebral
descolorido. No momento de penetração do projétil ocorrem ondas de choque que
determinam um aumento momentâneo da pressão intracraniana. Esta hipertensão
intracraniana pode produzir hérnia e lesão do parênquima cerebral (contusão e
hemorragia) em torno do trajeto do projétil e à distância. O edema cerebral ocorre
frequentemente nas primeiras 12 horas e pode ser observado minutos após o
trauma. Supõe-se que o impacto do projétil seria transmitido aos vasos cerebrais
com consequente alteração da barreira hematoencefálica.
193

EPILEPSIA
194

A epilepsia é condição heterogênea, que compreende ampla


variedade de sinais e sintomas complexos, decorrentes de alterações de
funções cerebrais, secundários a grande número de processos patológicos.
Para o diagnóstico de epilepsia é necessário que haja recorrência
de crises epilépticas (não necessariamente crises convulsivas, que exigem
presença de manifestações motoras, como as crises tônicas ou tônico-
clônicas). Esses eventos paroxísticos também devem ser espontâneos. Exige-
se pelo menos duas crises epilépticas, separadas por um período de 24 horas.
Devem ser excluídas condições toxico-metabólicas ou febris.
As crises epilépticas são sintomas comuns de doenças
neurológicas agudas, como meningoencefalite, trauma cranioencefálico,
acidente vascular cerebral ou doenças clínicas como anóxia, hipoglicemia,
insuficiência hepática ou renal. Nesses casos, entretanto, não se denomina
epilepsia. São crises relacionadas a circunstâncias.
As crises epilépticas são causadas por descargas elétricas
anormais, excessivas e transitórias das células nervosas, resultantes de
correntes elétricas que são fruto da movimentação iônica através da membrana
celular.

Incidência e prevalência

A incidência da epilepsia varia de 11 a 131/100.000 habitantes


por ano e a prevalência de 1,5 – 30/1.000. Dados nacionais encontram
prevalência de epilepsia de 11,9/1000 em São Paulo e de 16,5 a 20,3/1000 em
Porto Alegre, de quadros ativos e inativos, respectivamente.
195

A faixa etária mais acometida é a infantil, particularmente abaixo


dos dois anos. Em segundo lugar encontram-se os idosos, além de 65 anos.
Estudos revelam discreto predomínio no sexo masculino.
Estima-se que 1% da população tenha epilepsia aos 20 anos de
idade e mais de 3% terá o diagnóstico até os 80 anos.

Diagnóstico
É necessário definir, a partir de anamnese detalhada, a natureza
epiléptica dos eventos. O diagnóstico depende da descrição pormenorizada das
crises por parentes e testemunhas. Devem ser interrogados fatores
precipitantes, ocorrência de aura ou aviso, área do corpo inicialmente afetada,
progressão do episódio, duração da crise, momento de ocorrência no dia.
Também devem ser observados movimentos involuntários,
automatismos, como mastigação ou estalar de lábios, alteração da consciência,
liberação de esfíncter, confusão mental, mordedura da língua e, após a crise,
distúrbios de linguagem, de humor, cefaléia, apatia.
O exame neurológico convencional é geralmente normal em
pacientes com epilepsia. A presença de anormalidades sugere que as crises são
secundárias a doença cerebral orgânica. O exame físico geral deve ser dirigido
para sinais de doenças específicas ou malformações que causam epilepsia,
como a presença de manchas café com leite na neurofibromatose, manchas
hipocrômicas e adenomas sebáceos faciais na esclerose tuberosa, etc.
Assimetrias em face ou extremidades também podem sugerir lesões
lateralizadas.
196

Classificação das crises e síndromes epilépticas


Existem duas classificações. A primeira distingue os vários tipos
de crises. O que diferencia as crises parciais simples das crises parciais
complexas é o comprometimento da consciência nesta. Abaixo temos a versão
resumida da Classificação Internacional das Crises Epilépticas

Classificação das Crises Epilépticas


1. Crises parciais (ou focais)
Crises parciais simples (CPS)
• com sinais motores
• com sinais sensitivos somatossensoriais ou especiais
• com sinais ou sintomas autonômicos
• com sintomas psíquicos
Crises parciais complexas (CPC)
• início de crise parcial simples seguida de alteração da consciência
• alteração da consciência desde o início
Secundariamente generalizadas
• CPS evoluindo para crises tônico-clônicas generalizadas (CTCG)
• CPC evoluindo para CTCG
• CPS evoluindo para CPC e então para CTCG
2. Crises generalizadas desde o início
• CTCG
• Crises de ausência
• Crises de ausência atípica
• Crises mioclônicas
• Crises tônicas
• Crises clônicas
197

• Crises atônicas
3. Crises inclassificáveis (informações incompletas ou inadequadas).

Estado de mal epiléptico é definido como uma crise prolongada, com


duração maior que trinta minutos ou como crises repetidas, sem recuperação
de consciência entre elas. A princípio todas as crises mencionadas podem
ocorrer como estado de mal. É uma emergência médica, requerendo
tratamento imediato.
A classificação das síndromes epilépticas é baseada em semelhanças
em relação ao tipo de crise, idade de início, sinais clínicos/neurológicos
associados, história familiar, achados eletroencefalográficos e prognóstico.
Reproduzimos a Classificação das síndromes epilépticas a seguir.

Classificação Internacional das Síndromes Epilépticas e condições


relacionadas

1. Síndromes e epilepsias localizadas (focais ou parciais)


1.1. Idiopática
• Epilepsia benigna da Infância com paroxismos centro-temporais
• Epilepsia benigna da infância com paroxismos occipitais
• Epilepsia primária da leitura
1.2. Sintomática
• Epilepsia parcial contínua
• Síndromes com quadros específicos de manifestação
- Epilepsia do lobo temporal
- Epilepsia do lobo frontal
- Epilepsia do lobo parietal
198

- Epilepsia do lobo occipital


1.3. Criptogênica
2. Síndromes e epilepsias generalizadas
2.1. Idiopáticas
• Convulsão neonatal familiar benigna
• Convulsão neonatal benigna
• Epilepsia mioclônica benigna do lactente
• Epilepsia ausência da infância
• Epilepsia ausência juvenil
• Epilepsia mioclônica juvenil
• Epilepsia com crises tônico-clônicas ao despertar
• Outras epilepsias generalizadas
• Epilepsias desencadeadas por modos específicos de ativação
2.2. Criptogênicas ou sintomáticas
• Síndrome de West
• Síndrome de Lennox-Gastaut
• Epilepsia mioclono-astática
• Epilepsia com ausências mioclônicas
• Sintomática
-Etiologia inespecífica – Encefalopatia mioclônica precoce
- Encefalopatia epiléptica infantil precoce com
surto-supressão
-Etiologia específica–crises epilépticas complicando outras doenças
3. Síndromes e epilepsias indeterminadas se focais ou generalizadas
3.1. Com crises focais e generalizadas
• Crises neonatais
• Epilepsia mioclônica grave do lactente
199

• Epilepsia com ponta-onda contínua durante sono lento


• Afasia epiléptica adquirida
• Outras epilepsias indeterminadas
3.2. Sem inequívocas características focais ou generalizadas
4. Síndromes especiais
4.1. Crises circunstanciais
• Convulsões febris
• Crises isoladas ou estado de mal isolado
• Crises ocorrendo somente em evento tóxico ou metabólico

As chamadas epilepsias idiopáticas referem-se a epilepsias


transmitidas geneticamente, com maior expressão em determinadas faixas
etárias. Sintomáticas são epilepsias cujas etiologias são identificadas.
Criptogênicas são epilepsias de presumível base orgânica, sem etiologia
definida.
Nos últimos anos a melhor caracterização clinico-vídeo-EEGráfica
tem permitido ainda a identificação de certas síndromes e subsíndromes, como
a epilepsia do lobo temporal, frontal, parietal e occipital.
A epilepsia do lobo temporal vem sendo reconhecida como síndrome
específica por sua alta prevalência e frequente refratariedade ao tratamento
medicamentoso. Em geral inicia-se na infância. Metade dos adultos com
epilepsia tem epilepsia do lobo temporal e o controle completo das crises
ocorre em menos de 50% . Existem CPS e CPC. A generalização secundária é
pouco frequente. História familiar positiva e antecedente de convulsão febril
prolongada na infância são relativamente comuns. São frequentes período
“silencioso” ou de fácil controle entre o início das manifestações e o período
200

de crises frequentes ou refratárias à medicação. Há uma perda neuronal seletiva


no hipocampo, podendo ser visível atrofia hipocampal na Ressonância Nuclear
Magnética do Encéfalo.

Diagnóstico diferencial
Certos distúrbios paroxísticos podem simular crises epilépticas,
como:
1. Enxaqueca – aura visual pode ser semelhante a CPS, há dor após os
eventos. Mas raramente na enxaqueca há alteração da consciência,
automatismos. O EEG costuma ser normal. Na enxaqueca vertebrobasilar
há cefaléia não lateralizada, vertigem, ataxia, distúrbios visuais bilaterais e
de nervos cranianos.
2. Pseudocrises –observa-se no caso que não há mudança com a medicação,
que em geral não há trauma decorrente, nem incontinência esfincteriana,
raramene têm ocorrência noturna ou levam a confusão pós-ictal, apatia,
sonolência ou mordedura da língua. Em geral não são completamente
estereotipados e aumentam com o stress. A presença de choro durante a
crise também fala a favor de pseudocrise
3. Síncope – frequentemente existem fatores precipitantes. É raro haver
sintomas motores, o EEG costuma ser normal e só há grau leve de confusão
mental, quando ocorre.
4. Perda de fôlego – ocorre em crianças de 6 meses a 4 anos, geralmente
frustradas ou enraivecidas. Há apnéia e cianose, após o choro, e precedendo
a alteração de consciência.
5. Distúrbios de sono – parassonias, como terror noturno, sonambulismo,
pesadelos, narcolepsia podem se assemelhar a crises epilépticas
201

6. Síndrome do descontrole episódico – ataques recorrentes de raiva


incontrolável. Em geral ocorre em crianças ou adolescentes. Há explosiva
violência física primitiva ou, em mulheres, agressividade verbal

Etiologia
Até há alguns anos cerca de 70% das epilepsias eram idiopáticas
ou criptogênicas. Com o advento de modernas técnicas de neuroimagem o
número de epilepsias sintomáticas tem crescido substancialmente.
Quase todas doenças que atingem substância cinzenta e algumas
patologias da substância branca (ex. doenças metabólicas) e inúmeras doenças
sistêmicas podem estar envolvidas.
Entre as causas de epilepsia podemos citar fatores genéticos e
perinatais, distúrbios do desenvolvimento, doenças infecciosas, fatores tóxicos,
trauma, distúrbios vasculares, metabólicos e nutricionais, doenças
degenerativas e hereditárias.
Em nosso meio é frequente o achado de formas inativas
(calcificações) ou ativas (cistos) em adolescentes e adultos. Mas a relação
causal dessas patologias frequentes às vezes pode ser difícil.

Diagnóstico
O diagnóstico deve ser feito com exames laboratoriais,
neurofisiológicos e de neuroimagem. O EEG é exame funcional insubstituível.
Importante para ajudar a estabelecer o diagnóstico, ajudar na diferenciação de
síndromes focais e generalizadas, revelar padrões característicos de
determinada síndrome. Mas o diagnóstico é essencialmente clínico. O EEG
deve ser interpretado por especialista experiente e familiarizado com variantes
normais.
202

O EEG não necessariamente acompanha o controle clínico.


Também não exclui o diagnóstico de epilepsia. EEGs de repetição não são
necessárrios, exceto quando houver possibilidade de alterar conduta terapêutica
ou resultar em reavaliação do diagnóstico. Um EEG de vigília pode ser normal
em 30 a 40% dos casos e nesses casos é aconselhável repetir o exame em sono.

Tratamento
O tratamento é sintomático. Visa primariamente o controle das
crises. A seleção da droga antiepiléptica é baseada primariamente em sua
eficácia para tipos específicos de crises e epilepsias. Mas outros aspectos
devem ser levados em conta, como efeitos colaterais, idade do paciente,
interações com outras drogas e custo do tratamento.
Deve-se tentar preferencialmente monoterapia, por ser mais
efetivo, mais simples, com menor toxicidade, menos potencial para interações
e menor custo. Excecões são feitas em casos de epilepsias muito graves,
múltiplos tipos de crise e certos tipos de crise e síndrome.
Não há droga antiepiléptica ideal, que garanta controle completo,
seja efetiva para todos os tipos de crise, não leve a efeitos colaterais, seja de
fácil monitorização, possa ser administrada uma ou duas vezes ao dia e seja
barata.
Um resumo das principais drogas antiepiléptica está apresentado a
seguir.
DROGA APRESENT. DOSE ÈFEITOS INDICAÇÃO
COLATERAIS
Carbamazepina Comp. 200 e 10-20MG/KG Rash, CPS, CPC,
400 mg Dose média depressão CTCG
Tegretol – adultos:800 medula óssea, primária ou
Tegretard mg/dia hiponatremia, secundária
203

nistagmo,
sedação, ataxia
Fenitoína Comp 100 mg 4-7 mg/kg Rash, CPS, CPC,
Susp. Dose média depressão CGTC,
5m/100mg adultos: 300 medula óssea, primária e
Amp. mg pseudolinfoma, secundária
250mg/5ml ataixa,
Epelin, hipertrofia
Hidantal gengival, acne,
hirsutismo,
neuropatia
periférica
Fenobarbital Comp 50 e 100 Em crianças, Sedação, rash, CPS, CPC,
mg.Amp 200 3-4 mg/kg. Em ataxia, alt. CGTC
mg Gardenal adultos, dose comportament
média de 100- o,dist.
150 mg Cognitivos e
da potência
sexual
Ác. Valpróico Cáp.250 mg 20-60 mg/kg. Pancreatite, Crises de
Comp. 300 e Dose média de insuficiência ausência,
500 mg adultos :1 a 3 g hepática, mioclônicas,
Susp. 5m/250 depressão TCG, etc.
mg – 1 medula óssea,
ml/200mg efeitos
Depakene, gastrointestinai
Valpakine, s, ganho ou
Epilenil perda de peso

Podemos também utilizar primidona, doses de manutenção de 6-


20 mg/kg/dia, com dose média para adultos de 750 a 1250 mg. Pode levar a
sedação, vômito, impotência, irritabilidade. Ou clobazam (Urbanil,
Frisium), na dose de 0,1 a 1,0 mg/kg/dia, em comprimidos de 10 ou 20 mg.
Ou clonazepam (Rivotril), na dose de 0,01-0,2 mg/kg/dia, disponível em
comprimidos de 0,5 ou 2 mg ou solução de 2,5 mg/ml. Ou nitrazepam
(sonebom, nitrazepol), na dose de 0,1 a 1,0 mg/kg, em comprimidos de 5
mg. São drogas pouco potentes, utilizadas em geral em associação.
204

Já disponíveis no mercado, temos as seguintes drogas novas: 1.


1.Oxcarbazepina (Trileptal, Auram), na dose de 10-40mg/kg/dia, ou em
adultos 300-3000mg/dia. Existem comprimidos de 300 e 600 mg e solução
de 300mg/5ml
2. Vigabatrina (Sabril) – comp de 500 mg. Dose de 45-150 mg/kg em
crianças e 1 a 4 g/dia em adultos.
3. Lamotrigina (Lamictal, Neurium)- comp de 25, 50 e 100 mg. Dose de 2
(se uso concomitante de ácido valpróico) ou 10 mg/kg/dia. Em adultos
dose média de 50 a 700 mg/dia. E se uso associado de ácido valpróico, 25-
300 mg/dia
4 Gabapentina (Neurontin, Progresse) Comp de 300 ou 400 mg. Dose de
10 mg/kg/dia (iniciar com 1mg/kg/dia). Em adultos dose média de 200-400
mg/dia.
5. E ainda levetiracetam, zonisamida, tiagabida.

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