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revista política social e desenvolvimento #01

como enfrentar a
crise das cidades?
erminia maricato humberto miranda

ano 01 _novembro de 2013


FOTO EDUARDO FAGNANI
Índice

Apresentação ....................................................................................06
Eduardo Fagnani

Problemática urbana brasileira ........................... 08


Um balanço de 60 anos Humberto Miranda

Cidades no Brasil ....................................................................... 16


Neo desenvolvimentismo ou crescimento periférico predatório? Erminia Maricato
Apresentação

Professor do Instituto de
Economia da UNICAMP

Eduardo Fagnani e pesquisador do CESIT

A melhor articulação entre as estratégias econômica e social engendrada nos últimos


anos teve impactos positivos sobre as condições de vida dos brasileiros. Não obstante,
a sociedade ainda é marcada por profundas desigualdades na distribuição da renda,
no mercado de trabalho, no acesso aos bens e serviços sociais públicos e universais e na
posse da propriedade rural e urbana. São traços do subdesenvolvimento que precisam
ser superados se queremos um país mais justo e civilizado.

Dadas as suas múltiplas interfaces, o enfrentamento dessas questões deve ser pensado na
perspectiva de um projeto nacional de desenvolvimento. Nos últimos anos o debate sobre
o tema voltou a ser objeto da reflexão de círculos de economistas. A chamada corrente
“social-desenvolvimentista” procura articular a estratégia macroeconômica com inclusão
social e distribuição da renda. Essas pistas são promissoras, mas ainda não dão conta da
dimensão social do desenvolvimento em suas múltiplas vertentes. O enfrentamento desse
desafio metodológico requer maior articulação da reflexão acadêmica entre economistas
e especialistas em políticas sociais.

Com o objetivo de fomentar esse debate, em maio de 2013 o Centro de Gestão de Estu-
dos Estratégicos (CGEE), o Instituto de Economia da Unicamp, a rede Plataforma Políti-
ca Social e a Rede Desenvolvimentista organizaram o Seminário “Desafios e Oportuni-
dades do Desenvolvimento Brasileiro”, integrado por dois módulos (aspectos econômicos
e aspectos sociais).
Os vídeos completos das 12 mesas
temáticas estão disponibilizados no site
da rede Plataforma Política Social
(www.politicasocial.net.br)

O evento sobre a dimensão social contou com a colaboração de 51 especialistas reunidos


em torno de diversas temáticas.

Após a sua realização foi solicitado aos membros da rede Plataforma Política Social que
escrevessem artigos voltados para avançar na perspectiva apontada pelo seminário. Esses
esforços, que resultaram em dezenas de contribuições, motivaram a criação da Revista
Política Social.

Esta edição inaugural reúne dois artigos sobre a questão urbana. O primeiro, escrito
por Ermínia Maricato, sustenta que sem reforma urbana (leia-se reforma fundiária e
imobiliária) não haverá desenvolvimento e sim “crescimento periférico predatório”, com
reprodução da forte desigualdade social e grave deterioração ambiental. Para a autora,
distribuição de renda é importante, mas insuficiente: “também é preciso distribuição de
cidade”, ou seja, ampliar o direito à cidade. O que está em questão é a apropriação das
rendas de localização urbana, afirma Maricato.

O segundo artigo, de autoria de Humberto Miranda, sublinha que “mais que em


qualquer outro período da economia nacional, o projeto nacional de desenvolvimento
reclama a centralidade da dimensão urbana”. O autor destaca que com a concorrência
capitalista no contexto da globalização o controle do espaço pelo capital passou a ocor-
rer “de fora do território e não se vincula, como no passado, à industrialização, mas ao
circuito mercantil das commodities”. Submetida a essa lógica, a expansão das fronteiras
agrícolas tem ampliado as heterogeneidades sociais e espaciais e agravado o padrão de
urbanização.

Nas próximas edições serão disponibilizadas as demais contribuições temáticas dos espe-
cialistas que integram a Plataforma Política Social.

Boa leitura!
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Problemática
urbana brasileira:
Doutor em
Um balanço de 60 anos
Desenvolvimento Econômico,
Professor do Instituto de
Economia e Pesquisador
do Centro de Estudos de
Desenvolvimento Econômico
Por Humberto Miranda
(CEDE / UNICAMP)

O crescimento da população urbana fragmentação urbana e enfraqueci-


no Brasil tomado em dois períodos mento do planejamento estatal, devi-
históricos longos, de trinta anos cada, do à abertura econômica e ao baixo
com o primeiro ocorrendo no auge crescimento. Entre os dois períodos,
desenvolvimentismo, de 1950 a 1980 o incremento líquido observado na
e o segundo, no auge do neoliberalis- população total do país foi pequeno,
mo, de 1980 a 2010, mostra a impor- de 0,6% ou cerca de 400 mil pessoas.
tância do nexo urbano-industrial no Já o incremento líquido na população
primeiro e a perda deste no segundo. urbana do país foi relativamente alto,
O processo de metropolização brasi- de 24,8% ou 15,7 milhões de pessoas
leiro inicia-se em 1950 e passa de uma entre os dois períodos. Foi neste úl-
urbanização suportável a problemáti- timo período (1980-2010), portanto,
ca nos anos de 1960 para uma urba- que o incremento líquido de popula-
nização acelerada nos anos de 1970 e ção urbana ganhou intensidade, sem
caótica nos 1980. O primeiro período se ter criado as condições necessárias
foi marcado pelo impulso dado à con- para suportá-lo ou autosustentá-lo
centração urbana e da renda, devido adequadamente.
ao avanço da industrialização pesada
e à intensificação do êxodo rural. Já O Brasil completou a transição rural
o segundo período foi marcado pela -urbana no primeiro período (1950-

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[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

1980), passando de 03 para 18 cidades médias se vincularam fortemente a ativi-


com mais de 500 mil habitantes, produ- dades dos setores agrominerais e agroin-
zindo uma urbanização concentrada. No dustriais e tem trajetórias particulares em
segundo, o crescimento das cidades entre cada contexto regional específico.
100 e 500 mil habitantes foi expressivo,
passando de 124 (1980) para 245 (2010), Completando esse quadro, podemos di-
sendo que as cidades com mais de 500 zer que a hierarquia urbana consolidou-
mil habitantes passaram de 18 para 38. se plenamente após 1980, com o fim do
Em termos líquidos — ou seja, conside- regime militar e com o aumento da par-
rando o saldo entre os dois períodos —, ticipação política da população, culmi-
estamos falando de um conjunto de 37 nando na promulgação da Constituição
cidades a mais, cada uma com 423,8 mil Federal de 1988. Estes fatos colaboraram
habitantes em média. O país responde, para estimular a criação (emancipação)
assim, por um sistema urbano concen- de municípios de mais baixa posição na
trado em termos metropolitanos e dis- hierarquia (até 100 mil habitantes) na
perso em termos espaciais, onde figura rede urbana nacional, bem como a o au-
também um conjunto mais expressivo de mento das cidades médias (entre 100 e
cidades médias. Esta configuração tor- 500 mil e entre 500 e 1 milhão de habitan-
nou-se complexa já que muitas cidades tes), passando de 133 para 270 (203%!)

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[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

como se pode constatar no QUADRO 01. da população total em 2010, que são um
conjunto de cidades intermediárias entre
Observa-se, de forma bem geral, que o o menor nível hierárquico e as cidades
nível hierárquico superior da rede urba- médias, sendo este um conjunto de ci-
na brasileira, no que tange aos municí- dades menos estudado e chamado ainda
pios com mais de um milhão de habitan- genericamente de cidade média, mas, na
tes, chega a concentrar 37,8 milhões de verdade, não conhecemos bem sua hie-
habitantes, cerca de 20% da população rarquia. O fato é que existem 607 muni-
total do país, em 12 cidades em 2010. Po- cípios, de um total de 5.565 — ou, apro-
rém, o nível hierárquico inferior (até 100 ximadamente, 11% municípios —, que
mil habitantes) concentra 95% do nú- concentram 127,8 milhões de habitantes.
mero de municípios e 45% da população O quadro regional permite especificar a
total. Como, aproximadamente, 35% da problemática como algo que caracteriza a
população brasileira estão concentradas urbanização subdesenvolvida, que recla-
em 270 municípios com mais de 100 mil ma soluções próprias.
e menos de um milhão de habitantes até
2010, se somarmos o nível metropolitano Através do gráfico 01 pode-se verificar
e o nível intermediário, veremos que 55% que no segundo período houve um incre-
da população brasileira estão concentra- mento de população urbana nas regiões
das em 282 municípios. Adicionalmente, Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Cada
temos 325 municípios com população região tem uma participação na distri-
entre 50 e 100 mil habitantes ou 11,7% buição dos incrementos populacionais

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[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

das suas cidades que reflete a importân- de acumulação do capital, mas também
cia de sua população no conjunto do país. “os pobres resultados do neoliberalismo”
neste continente após os anos de 1990,
A abertura externa da economia brasilei- especialmente por aumentar o nível de
ra nos anos de 1990 forjou novos deter- desigualdade e heterogeneidade territo-
minantes para o urbano, reiterando a ex- rial (urbano-regional). Este pesquisador
pansão da fronteira agrícola/mineral, que é bastante claro no que diz respeito ao de-
não estaria voltada para atender exclusi- safio à nossa cultura científica e política:
vamente aos objetivos de expansão inter-
na do produto industrial, mas também e
principalmente para atender aos impera- “... debemos construir nuestra propia
tivos do mercado mundial de commodi-
ties, com mais países consumidores (asi- cultura científica y política para expli-
áticos) e com a prática de melhores níveis car nuestra realidad particular y con-
de preços. Nesse ínterim, os anos de 1990
e 2000 mostram, de um lado, os grandes
frontarla críticamente con la venida
centros urbanos se saturando (de gente de fuera, del norte en particular; debe-
e atividades) e as cidades médias cres- mos construir las políticas territoriales
cendo vigorosamente e, de outro, novas
centralidades urbanas voltando a ocorrer para transformar nuestra realidad y
e pequenas cidades continuando a surgir resolver sus contradicciones, a partir
intermitentemente nas áreas de expansão
da fronteira agrícola. Em grande medida, de su explicación científica, los instru-
são importantes áreas das regiões Centro mentos disponibles, los intereses que
-Oeste, das franjas da região Nordeste e
dos fragmentos de área da região Norte
defendemos y nuestras posiciones en el
que alimentam esse incremento urbano abanico político-ideológico.”
no segundo período (1980-2010). Uma (COBOS, 2010:19)
urbanização que é explicada mais pela
relação com diversas atividades econô-
micas que por suposta dicotomia campo-
cidade. Deste ponto de vista, pode-se perceber
o mesmo caráter de ocupação do espaço
O caso brasileiro pode ser entendido urbano na América Latina, em que pe-
dentro do caráter mais amplo de ocupa- sem as especificidades de cada formação
ção territorial do capital em outros países nacional, que trazem a mesma problemá-
latino-americanos. Cobos (1989 e 2008) tica, a do subdesenvolvimento urbano,
discute a relação entre o agro e a urba- especialmente nas análises sobre as áre-
nização na América Latina, seu cresci- as metropolitanas. Contudo, seguindo o
mento urbano anárquico e as mudanças conselho de Cobos, precisamos entender
nos processos territoriais na nova fase as particularidades da urbanização sub-

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desenvolvida na maneira como ela se dade regional e condições socioeconômi-


projeta para além das áreas metropolita- cas próprias. A intensidade da urbaniza-
nas. Afinal, são nas áreas não metropoli- ção na região sudeste reflete seu padrão
tanas onde o espaço urbano se entrelaça industrial presente no primeiro período
mais fortemente com o espaço rural nos (1950-1980). As demais seguem a dinâ-
países latino-americanos e manifesta ca- mica de integração econômica de seus
balmente as implicações das desigualda- espaços regionais acionados por políticas
des e heterogeneidades socioespaciais. nacionais ou em reação à integração com
o mercado externo, especialmente no
No GRÁFICO 02 pode-se verificar a segmento de produtos primários.
maior intensidade do crescimento da po-
pulação urbana no segundo período. Esta Salienta-se que no período 2000-2010
intensidade é medida pela razão entre o aprofunda-se o processo de desconcen-
crescimento da população urbana sobre tração produtiva regional engendrado na
a população total, sendo que um valor década de 1990, embora com algumas di-
acima de um significa que a população ferenças fundamentais: a reversão do dé-
urbana cresce a taxas superiores à total. ficit comercial em superávits crescentes
Aqui há que se levar em conta a diversi- a partir de 2002, como consequência da

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[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

desvalorização cambial de 1999; a redu- diversas regiões, pois estas são diferente-
ção lenta e contínua das taxas de juros no- mente alcançadas pela expansão da fron-
minais a um patamar inferior aos 26,5% teira agrícola e pelas migrações inter-re-
de 2003; o crescimento contínuo do PIB gionais.” (SANTOS, 2009, p. 34)
agropecuário no período pós-desvalo-
rização cambial (1999-2004), conforme São “cidades agrícolas” aquelas que sur-
aponta Balsadi (2008); o chamado “efeito gem dotadas de um fato urbano próprio
China”, devido as suas altas e sucessivas e sob o efeito do alcance do processo de
taxas de crescimento econômico. Foram expansão da fronteira agropecuária e das
priorizadas as iniciativas de desenvolvi- migrações entre regiões, transferindo
mento local com maior inserção externa contingentes social e culturalmente di-
das regiões rurais, principalmente nos ferenciados de populações para subespa-
anos 2000, explicitando uma forte contra- ços regionais que se caracterizam como
dição entre a expansão da fronteira agro- verdadeiras plataformas exportadoras de
pecuária e a exploração extensiva (espa- grãos ou carne bovina ou como retaguar-
cialmente) e intensiva (ecologicamente) das territoriais para realização da produ-
da base de recursos naturais, já que não ção agropecuária. São cidades agrícolas
resulta de ganhos de produtividade por no sentido de abrigarem no interior do
hectare cultivado, mas da facilidade em município ou da hinterlândia modalida-
manter a itinerância territorial (consultar des de produção agropecuária, e o fato
CANO, 2002; e MIRANDA, 2012) como urbano se manifesta de modo uniforme,
solução de conjunto para o crescimento como um “implante urbano”, para favo-
da agricultura brasileira. recer a logística de escoamento dessa
produção. O espaço rural do município,
O geógrafo Milton Santos, no livro “A todavia, perde características naturais e
urbanização brasileira”, de 1993, já ha- singularidades.
via chamado a atenção para as diferenças
entre população urbana, rural e agrícola, Em síntese: o que parecia para muitos
mostrando que a queda relativa da po- uma dualidade ou contraste gerado pela
pulação rural era mais acentuada que o especificidade do processo de desen-
da população agrícola no Brasil. Santos volvimento brasileiro, crescimento das
(2009) aponta dois elementos para expli- cidades e “esvaziamento” do rural, hoje
car o fenômeno, um deles é a expansão da pode parecer uma regularidade da for-
fronteira agrícola e o outro as migrações ma de inserção da economia brasileira
inter-regionais. no mundo globalizado, embora esta não
seja necessariamente decorrente de um
“O fenômeno não se dá de maneira homo- “esvaziamento” do rural. O que parecia
gênea, uma vez que são diferentes os graus contraste torna-se complementaridade;
de desenvolvimento e ocupação prévia das o que era dualidade torna-se possibilida-

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[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

de de maior articulação rural-urbana ou das commodities, especialmente, após a


perspectiva de maior integração territo- ascensão da China.
rial. O que estava definido como espaço
residual, para além dos perímetros ur- De modo geral, considera-se que a di-
banos, hoje, o rural, parece mais “preen- nâmica urbana dos espaços “inter-intra”
cher” a dinâmica urbana do que ser seu regionais brasileiros modificou-se. Se du-
pressuposto negativo, o não urbano. As rante muito tempo entendeu-se a urbani-
regiões são mais agrícolas ou agromine- zação como um fenômeno socioespacial
rais que rurais e as regiões urbanas não derivado da dinâmica engendrada por
prescindiram necessariamente de áreas determinações mais amplas da indus-
agrícolas, especialmente no caso das ci- trialização e de seu produto principal, a
dades médias que se tornaram ainda mais metropolização, hoje, embora a questão
importantes regionalmente. metropolitana seja central nos estudos
do subdesenvolvimento latino-ameri-
As áreas não metropolitanas podem re- cano, outro fenômeno reclama atenção:
produzir ou mimetizar o processo de o avanço da urbanização em áreas não
urbanização das áreas metropolitanas, metropolitanas, criando novas áreas de
mas o que chama atenção é o aumento da concentração populacional em direção às
desigualdade e heterogeneidade socio- regiões centro-oeste/norte/nordeste do
espacial na urbanização periférica. Co- Brasil. Estão no centro dessa discussão
bos (2008) tem chamado a atenção para os efeitos do avanço da fronteira agrícola
o fato que o desenvolvimento desigual sobre o padrão de urbanização. Do pon-
produziu, nos últimos anos na América to de vista do subdesenvolvimento, isto
Latina, da pequena cidade à extensa ci- significa aumento de heterogeneidades
dade-região, múltiplas formas urbanas socioespaciais, reforçando o status quo
que se combinam complexamente, com agrário como um bloqueio estrutural à
tamanhos populacionais e estruturas eco- melhor distribuição territorial das cida-
nômico-sociais muito distintas (COBOS, des e o status quo urbano através da se-
2008: 151-152). Embora Cobos discuta gregação socioespacial nas cidades.
esse problema ao analisar as metrópoles
periféricas, aqui neste artigo tentou-se Diante de tal complexidade, com níveis
mostrar que o processo engloba tam- de hierarquização diferenciados por es-
bém o avanço da fronteira agrícola e, por tratos de população, com problemas tipi-
conseguinte, está presente em áreas não camente metropolitanos penetrando ou-
metropolitanas, todavia, com novas de- tros níveis hierárquicos intermediários,
terminações: o controle do espaço pelo devido ao processo físico de conurbação
capital acontece de fora do território e e de interpenetração das relações capita-
não se vincula, como no passado, à in- listas via ampliação do circuito imobiliá-
dustrialização, mas ao circuito mercantil rio e financeiro, bem como pela crescente

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[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

processo de periferização nas cidades em que se está dando ou que se dará à ques-
praticamente todos os níveis hierárqui- tão urbana. Mais que em qualquer outro
cos, levando à generalização do fenô- período da economia nacional, o projeto
meno da segregação socioespacial, não nacional de desenvolvimento reclama a
se pode negar que o enfrentamento dos centralidade da dimensão urbana.
problemas socioeconômicos nacionais
passa necessariamente pelo tratamento

Bibliografia

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ES-


BALSADI, Otávio. O mercado de trabalho assalariado TATÍSTICA – IBGE (2010). Censo Demográfico. Brasil.
na agricultura brasileira e suas diferenciações regionais Rio de Janeiro. Disponível em: http://www.censo2010.
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CANO, W. (2002). Ensaios sobre a formação econômica SANTOS, M. (1993). A urbanização brasileira. 5ª
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pp. 147-181.

COBOS, Emilio P. (1989). “Acumulación de capital y


estructura territorial en América Latina”, en LUNGO,
Mario (comp.). Lo urbano: Teoría y métodos. CSUCA,
Editorial Universi¬taria Centroamericana, San José,
Costa Rica.
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[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Cidades no Brasil:
Neo desenvolvimentismo ou
crescimento periférico predatório1

Professora da Pós
Graduação da Faculdade de
Arquitetura da USP e
Professora Visitante do
Instituto de Economia da Por Erminia Maricato
UNICAMP

INTRODUÇÃO - CIDADES dutiva, gestão de políticas sociais e até


GLOBAIS NO CONTEXTO DO para política urbana3.
CAPITALISMO PERIFÉRICO
A nova fase de internacionalização
País subdesenvolvido, país do sul, de- dos capitais e dos mercados ganhou
pendente, periférico, semi-periféri- o glamouroso nome de globalização e
co, em desenvolvimento, emergente, acompanhando a tendência algumas
são algumas das classificações, que cidades foram cunhadas como glo-
foram atribuídas à condição do Bra- bais4.
sil, dependendo, inclusive, da filiação
ideológica ou acadêmica de quem as A globalização nada mais é do que
atribui. A sigla BRICS expressa o pres- uma etapa específica do velho proces-
tígio que alguns países, e entre eles o so de internacionalização do capital
Brasil, passaram a gozar a partir de (CHESNAIS, 1996). Em 1945 Caio
um determinado momento, no início Prado Junior, primeiro historiador
do século XXI, marcado pela mudan- marxista brasileiro, afirmava que no
ça na geo-política mundial2. Um país mundo contemporâneo não há mais
que servia de piada para estrangeiros história econômica de cada país, mas
e brasileiros, torna-se um player inter- a história da humanidade. Ele não
nacional e modelo, segundo a mídia ignorou as especificidades do país
do mainstream, para a inovação pro- quando escreveu “História econômica

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[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

do Brasil” tanto que destacou a herança nal para superar as condições atrasadas
colonial portuguesa, a escravidão resis- dos países latino-americanos em relação
tente, a desigualdade persistente, o papel à condição dos países centrais do capi-
ambíguo dos homens brancos na socie- talismo e se essa saída deveria seguir os
dade escravocrata, a dominância da mo- passos daquela industrialização. Trata-se
nocultura de exportação, como heranças de reafirmar a heterogeneidade estrutu-
que contribuíram para o travamento do ral que nos separa (e que nos une). Longe
desenvolvimento do país. Mas em cada de desaparecer, essa relação se mantém e
uma dessas características específicas
Caio Prado via também a predominância
da presença internacional (PRADO JR,
1972).
“A nova fase de internacio-
Essas lembranças pretendem apenas tra-
nalização dos capitais e dos
zer para o começo desse texto alguns con-
ceitos que a globalização sufocou durante
mercados ganhou o glamou-
um certo período. Estamos nos referindo roso nome de globalização
às teorias sobre desenvolvimento/subde-
senvolvimento que se seguiram ao esfor- e acompanhando a tendên-
ço da CEPAL- Comissão Econômica para
América Latina e Caribe, para explicar o cia algumas cidades foram
atraso econômico das sociedades latino
americanas, em meados do século XX, e cunhadas como globais”
que hoje voltam a ocupar os estudiosos
no Brasil5. Apesar de criticada em sua
visão dualista a CEPAL constituiu, nes- até se aprofunda, especialmente nas cida-
se período, um momento de produção des, com a globalização como vamos ver.
teórica inovador e independente sobre a Percebemos uma certa dificuldade em
condição dos países latino americanos na usar as classificações desenvolvido e sub-
divisão do poder mundial. desenvolvido, já que não somos nem um
nem outro, mas recusamos a concepção
Constatada a situação do subdesenvolvi- etapista presente no conceito “em desen-
mento, ocuparam-se, os formuladores da volvimento”. Vamos reafirmar a manu-
CEPAL, em traçar estratégias de desen- tenção da leitura dialética entre setores
volvimento as quais geraram as propostas desenvolvidos (ou neo-desenvolvidos) e
de industrialização (tardia) por substitui- setores atrasados (ou neo atrasados) para
ção de importações, política conhecida explicar a realidade interna e externa de
por desenvolvimentismo. países como o Brasil no contexto mun-
dial revolucionado pelo avanço tecnoló-
Não se trata, neste texto sobre cidades, gico das comunicações e pela mudança
de discutir se existiria uma saída nacio- geopolítica.

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[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Precedendo os estudos da Cepal ou por cidades) pelos próprios moradores (traba-


vezes seguindo o caminho aberto por ela, lhadores de baixa renda), aos poucos, du-
estudiosos brasileiros, weberianos e mar- rante seus horários de folga, ao longo de
xistas, estudaram a condição estrutural do muitos anos, ignorando toda e qualquer
Brasil no capitalismo periférico que muito legislação urbanística, em áreas ocupadas
nos ajuda a entender as cidades6. ilegalmente.

Desigual e combinado, ruptura e conti- Francisco de Oliveira forneceu a chave


nuidade, modernização do atraso, mo- explicativa para a gigantesca prática da au-
dernização conservadora, capitalismo toconstrução da moradia ilegal (uma es-
travado, são algumas das definições que pécie de produção doméstica) pelos traba-
explicam o paradoxo evidenciado por um lhadores ou pela população mais pobre de
processo que se moderniza alimentando- um modo geral. Ela está no rebaixamento
se de formas atrasadas, e, frequentemente, do custo da força de trabalho, que ocupa
não capitalistas, strictu senso. As cidades seus fins de semana (horários de descan-
são evidencias notáveis dessa construção so) na construção da casa (OLIVEIRA,
teórica e nelas, o melhor exemplo talvez 1972).
seja a construção da moradia (e parte das

Zona Norte de São Paulo

Fonte: SEHAB/PMSP, 2004.


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[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Essa prática contribuiu para a acumula- damental para o processo de acumulação


ção capitalista durante todo período de capitalista nacional e internacional. Ela
industrialização no Brasil, particular- se aplicou perfeitamente à produção das
mente de 1940 a 1980 quando o país cres- cidades que receberam a indústria auto-
ceu a taxas aproximadas de 7% ao ano e o mobilística a partir de 1950 - Volkswa-
processo de urbanização cresceu 5,5% ao gen, Chrysler, Mercedes Benz - e se aplica
ano (IBGE). À industrialização com bai- hoje nas cidades que podemos chamar de
xos salários correspondeu a urbanização globais.
com baixos salários. (MARICATO, 1976,
1979, 1996). O exemplo revela que uma A tabela abaixo mostra que mais de 80%
certa modernização e um certo desenvol- dos domicílios em favelas (aglomerados
vimento (industrialização de capital in- subnormais contabilizadas pelo IBGE, e
tensiva, produção de bens duráveis) de- praticamente um terço do déficit habita-
penderam de um modo pré-moderno, ou cional, estavam nas principais metrópo-
mesmo pré-capitalista (a autoconstrução les brasileiras de acordo com o Censo de
da casa) de produção de uma parte da ci- 2000 (IBGE - Instituto Brasileiro de Geo-
dade. Essa imbricação foi (e ainda é) fun- grafia e Estatística).

Figura: Concentração e desigualdade

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[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

A população moradora de favelas cresceu bia. Essa marca, a da desigualdade, está


mais do que a população total ou do que presente em qualquer ângulo pelo qual se
a população urbana nos últimos 30 anos, olha o país e, portanto, também nas ci-
isto é, de 1980 a 2010 (IBGE)7. dades8.

A terra urbana (assim como a terra rural) Evidentemente para esse capitalismo
ocupa um lugar central nessa socieda- “funcionar” como parte da divisão inter-
de. O poder social, econômico e político nacional do trabalho, os trabalhadores
sempre esteve associado à detenção de urbanos integrados ao processo produ-
patrimônio seja sob a forma de escravos tivo, mas excluídos de grande parte dos
(até 1850) seja sob a forma de terras ou benefícios que o mercado de consumo
imóveis (de 1850 em diante). Essa marca assegura e especialmente excluídos da
– patrimonialismo - se refere também à cidade, são submetidos a uma poderosa
privatização do aparelho de Estado tra- máquina ideológica quando não pode ser
tado como coisa pessoal. O patrimonia- simplesmente repressora. Além da pode-
lismo está ligado à desigualdade social rosa máquina midiática a generalização
histórica, notável e persistente que marca do débito político, o favor como media-
cada poro da vida no Brasil. E essas ca- ção universal, são relações que explicam
racterísticas, por outro lado, estão ligadas muito a cidade e uma sui generis forma
ao processo de exportação da riqueza ex- de cidadania no Brasil: Direitos para al-
cedente para os países centrais do capi- guns, modernização para alguns, cidade
talismo. Celso Furtado mencionou várias para alguns ... (CASTRO e SILVA, 1997)9.
vezes em seus trabalhos o convívio da ex-
portação da riqueza excedente com uma Não sendo o caso de desenvolver aqui
estreita elite nacional consumidora de essas ideias, vamos resumir as caracterís-
produtos de luxo. Esse quadro forneceria ticas históricas da metrópole no capitalis-
as características de um mercado, por as- mo periférico da seguinte forma10:
sim dizer, travado (FURTADO, 2008).
1) A persistente ilegalidade fundiá-
Recente relatório da ONU - HABITAT ria e imobiliária forma a periferia urbana
“Estado de las Ciudades de América La- que frequentemente se configura como
tina y el Caribe 2012” mostra que o Bra- um depósito de pessoas em áreas não
sil, a sexta economia do mundo, mantém servidas ou precariamente servidas pela
uma das piores distribuições de renda no infraestrutura urbana e que não conta
continente mesmo após os avanços, nes- também com equipamentos sociais pú-
se sentido, verificados nos governos do blicos e privados. Em algumas capitais
Presidente Lula. São mais desiguais do de Estados, os domicílios ilegais são mais
que o Brasil, na América Latina, apenas numerosos do que os domicílios legais
os países Guatemala, Honduras e Colôm- revelando que a “exceção é mais regra do

20
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

que exceção e a regra é mais exceção do tensa exploração da mão de obra.12


que regra”. São os casos das capitais dos
estados do norte e nordeste (Manaus, Be- 4) As leis avançadas e detalhadas e
lém, São Luiz, Fortaleza, Teresina, Recife, o prestígio dos Planos Urbanísticos con-
Maceió, Natal). Entretanto, mesmo nas trastam com a fragilidade operacional do
cidades importantes do sul, do sudeste e Estado. Leis e planos que não se aplicam
do leste, a porção urbana ilegal varia en- ou são aplicados para uma parte da cida-
tre 15%, nos municípios centrais de regi- de (leia-se, de acordo com as circunstân-
ões metropolitanas (São Paulo, Curitiba), cias) revelam a importância da retórica,
25% (Belo Horizonte, Porto Alegre) ou dos discursos e a desimportância da re-
mais de 30% (Salvador, Rio de Janeiro)11. alidade urbana quando se refere a de-
terminadas classes sociais13. O poderoso
2) Ligada a esse fato está a falta de aparato jurídico e burocrático do Estado
controle do Estado sobre o uso e a ocu- no Brasil contrasta com as frágeis esferas
pação do solo urbano, em uma parte da operacionais fazendo lembrar um ... Ele-
cidade e exatamente aquela de residência garça, ou seja, elefante com pés de garça.
da população pobre. Impedidos de ocu- O poder está nos gabinetes incluindo me-
par a cidade formal (ou do mercado) a lhores salários, mais recursos, mais equi-
população pobre ocupa as áreas que “so- pamentos.14
bram” ou que não interessam ao mercado
imobiliário. Grande parte dessas áreas é “O Elegarça”
ambientalmente frágil (mangues, dunas,
matas preservadas por lei, Área de Pro-
teção de Mananciais, Áreas de Proteção
Permanente, Parques Nacionais e Estadu-
ais, encostas de morros). Além da agres-
são ambiental estão presentes os riscos de
desmoronamentos que a cada temporada
de chuvas são responsáveis por acidentes
com mortes.

3) Também como variável compon-


do esse quadro está o mercado residen-
cial restrito, ou seja, mercado capitalista
formal, legal ou como queiram chamar,
para uma pequena parcela da população.
A esse mercado de luxo ou especulativo,
notadamente fundiário/rentista, corres-
ponde um patamar produtivo baixo e in-

21
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

A aplicação da legislação urbana tem clientelismo, a privatização da esfera pú-


um papel estratégico nas relações sociais blica mediam as relações sociais e se apli-
marcando os excluídos com a condição cam inclusive nas relações entre o exe-
de ilegalidade. Leis e planos, isto é, a for- cutivo, o legislativo e o judiciário. Essa
malização do uso do solo acarreta a ex- “flexibilização” se combina, contradito-
pulsão. Os pobres não cabem na cidade riamente, a uma notável burocratização
legal. Diversas teses e mestrados sobre a resultante de procedimentos exagerados
cidade de Curitiba revelam esse fato15. e legislação detalhista. Elaborar planos
é fácil. O difícil é implementá-los nesse
5) A universalização do favor, o contexto.

Rocinha – Rio de Janeiro

22
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Rocinha e Ipanema – Rio de Janeiro

Vamos tratar dos impactos trazidos pela xa renda e do boom do mercado imobili-
globalização a essa cidade no contexto es- ário residencial, os padrões periféricos de
pecífico da sociedade brasileira que para urbanização se reproduzem (incluindo a
alguns está vivendo um neo-desenvolvi- nova ocorrência do loteamento fechado),
mentismo, para outros um desenvolvi- agravando o presente e comprometendo
mentismo de esquerda ou social desen- o futuro da cidade global periférica.
volvimentismo. Apesar do aumento da
capacidade de consumo nas faixas de bai-

23
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

METRÓPOLES BRASILEIRAS E A nais – principais motores da globalização


GLOBALIZAÇÃO NEOLIBERAL - envolvidos com a produção/explora-
ção e exportação de commodities como
As mudanças que acompanharam a rees- grãos, carne, celulose, minérios e etanol,
truturação capitalista internacional im- lograram reorientar a secular ocupação
pactaram fortemente o território brasilei- urbana que se manteve, após o século
ro dando novos rumos para as dinâmicas XVII até poucas décadas atrás, próxima
demográfica, social, econômica e terri- ao litoral. A interiorização das cidades
torial (portanto também rural, urbana e acompanhou a estruturação de um pode-
ambiental). roso setor de agrobusiness de corte capi-
talista, tecnologicamente avançado e isso
Os grandes conglomerados transnacio- mudou o cenário de muitas regiões além
de mudar também a relação entre elas.

Figura: Brasil pré-globalização - A herança histórica: concentração urbana na faixa litorânea

24
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Contrariando tendência anterior, o cen- modelo, o Brasil se divide ao meio, em


so de 1980 já apontava que as metrópo- 2000, como mostram os levantamentos
les passavam a crescer menos do que as coordenados pela profa. Tania Bacelar,
cidades de porte médio (entre 100.000 incorporando ao sudeste e ao sul, regiões
e 500.000 habitantes) e dentre as me- tradicionalmente mais ricas e desenvol-
trópoles cresceram mais as do norte e vidas, o centro-oeste, território ocupado
do centro-oeste. Após 2,5 décadas desse pelo agro-negócio.

Figura: Brasil na globalização - A herança da desigualdade – renda per capita

FIGURA 1 E 2 - Extraído da apresentação “Globalização e Território: Debate mundial e leitura a partir do Brasil”
de Tania Bacelar. São Paulo, maio 2008

25
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Apesar da persistência de forte desigual- loteamentos fechados que passam a dis-


dade, todas as regiões brasileiras cresce- putar as terras da periferia urbana com a
ram mais do que o sudeste (que mantem população de baixa renda.16
o epicentro industrial e pós-industrial do
Brasil) o que implica numa diminuição Não cabe qualquer dúvida sobre o forte
efeito negativo que a globalização, domi-
nada pelo ideário neoliberal, impôs, com
“Talvez, o indicador que a anuência das elites nacionais, às metró-
poles brasileiras, nas décadas de 80 e 90.
mais evidencia o que po- As principais causas dessa tendência, já
tratada em vasta bibliografia, se deveram
demos chamar de tragédia à queda brusca do crescimento econômi-
co com aumento do desemprego e à retra-
urbana é a taxa de homicí- ção do investimento público em políticas
sociais. A sistematização das propostas
dios, que cresceu 259% no contidas no Consenso de Washington
Brasil entre 1980 e 2010.” mostra a força de tal dominação políti-
ca que consegue impor, a uma sociedade
desigual, em parceria com as elites locais,
ações que seguem um caminho contrário
da desigualdade regional. O VTI- Valor ao interesse e necessidades da maior par-
da Produção Industrial do Estado de São te da população (CANO, 1995; TAVARES
Paulo cai, de 80,7% em 1970 para 61,8% e FIORI, 1997) As três políticas públicas
em 2005, em relação ao conjunto do país. urbanas estruturais (ligadas à produção
A região metropolitana de São Paulo era do ambiente construído) – transporte,
responsável, em 1970 por 61,8% do VTI habitação e saneamento - foram ignora-
brasileiro e em 2005 passa a 43,5%, em- das ou tiveram um rumo errático, com
bora a cidade continue a manter sua he- baixo investimento, por mais de 20 anos.
gemonia no território brasileiro. Os precários times de funcionários pú-
blicos existentes no Estado brasileiro e as
O espraiamento das metrópoles pelas re- instituições, que se formaram, estavam
giões fica evidenciado por meio das no- em ruínas, quando investimentos foram
vas estratégias de localização e logística retomados em 2003 na gestão do presi-
de setores produtivos e comerciais, ativi- dente Lula (MARICATO, 2011b).
dades industriais inovadoras, ampliação
dos serviços vinculados à comunicação, Talvez, o indicador que mais evidencia o
finanças e educação, arranjos urbanos re- que podemos chamar de tragédia urbana
gionais ligados à produção para exporta- é a taxa de homicídios, que cresceu 259%
ção, e especialmente, os condomínios ou no Brasil entre 1980 e 2010. Em 1980, a

26
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

média de assassinatos no país era de 13,9 transformou numa das principais marcas
mortes para cada 100 mil habitantes, em das cidades brasileiras.
2010 passou para 49,917.
Nem todos os indicadores sociais são ne-
Certamente essa ocorrência não se deveu gativos no processo de urbanização con-
apenas a esses fatores e nem se limita às comitante ao processo de industrialização
cidades brasileiras. Não é possível abor- que se deu no decorrer do século XX e
dar um assunto tão estudado em poucas mais exatamente a partir de 1930. A mor-
palavras. Mas não há dúvida de que ela talidade infantil, a expectativa de vida, o
compõe o quadro de abandono do Esta- nível de escolaridade, o acesso à água tra-
do provedor. Ainda que tratemos do pro- tada, a coleta do lixo a taxa de fertilidade
vedor na periferia capitalista onde a pre- feminina, apresentam uma evolução po-
vidência não era universal assim como a sitiva a partir de 1940 até nossos dias exa-
saúde ou a habitação. O tema da violência tamente devido à mudança de vida com a
cujas origens estão na sociedade escravis- urbanização. (IBGE, 2008).
ta que formalmente resistiu até 1888, se

Figura: IndicadoresHuman Development


de desenvolvimento humano Indicators

Life Expectancy- Infant Mortality Rate-

72,8 150,0
70,4
62,5 124,0

48,0
40,7 82,8

29,6
23,3

1940 1960 1980 2000 2008 1940 1960 1980 2000 2008

Literacy Rate (ages 15 and above)- Fertility Rate (births per woman)-

86,4 90,0 6,1 6,2


74,5
60,4 4,3

44,1
2,4
1,9

1940 1960 1980 2000 2008 1940 1960 1980 2000 2008

Source: IBGE; Ministry of Health,

27
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

No entanto o estudo de cada caso revela ABC e a de Barueri), uma delas construí-
as mesmas contradições que encontra- da há mais de 20 anos. É de conhecimen-
mos na macro-escala. to geral que as obras relativas às redes de
esgotos não têm visibilidade e, portanto
Apenas para dar um exemplo da lógica não interessa aos governos providenci-
que orienta esses serviços, lembremos á-las.
que aproximadamente 20% dos domicí- NAS DÉCADAS PERDIDAS:
lios não estão ligados à rede de esgotos LUTA SOCIAL PELA CIDADE
na Região Metropolitana de São Paulo. DEMOCRÁTICA
Boa parte dos esgotos produzidos é lan-
çada pelas redes nos rios que cortam a Após um longo período de crescimento,
metrópole. No entanto há duas estações sem distribuição de renda, (1940 a 1980)
de tratamento de efluentes com capacida- a economia brasileira entra em declínio
de ociosa na Região Metropolitana (a do pressionada pela crise fiscal.

Figura: Indicadores de desenvolvimento humano

FONTE: IPEADATA* DADOS PRELIMINARES. TERCEIRO TRIMESTRE EM COMPARAÇÃO COM O


MESMO PERÍODO DO ANO ANTERIOR.

28
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Movendo-se contra a corrente mundial ciais), entidades sindicais (urbanitários,


de enfraquecimento dos partidos de es- sanitaristas, setor de transportes), lide-
querda18, do declínio do crescimento eco- ranças de movimentos sociais, ONGs,
nômico e da retração do Estado provedor, pesquisadores, professores, intelectuais,
o Brasil dos anos 80 mostrava um quadro entre outros. Por sua influência foram
contrastante. Enquanto a economia mos- criadas comissões parlamentares e foram
trava uma queda acentuada, ao mesmo eleitos prefeitos, vereadores e deputados.
tempo em que lutavam contra o governo
ditatorial movimentos sociais e operários No que se refere ao destino das cidades,
elaboravam plataformas para a mudan- na agitada cena política estavam presen-
ça políticas com propostas programáti- tes: a) as mobilizações sociais, os sindica-
cas. Na década de 80 foram criados no- tos e os partidos políticos, b) a produção
vos partidos como o PT, outros partidos acadêmica que passa a desvendar a cida-
de esquerda saíram da clandestinidade de real (com diagnósticos sobre as estra-
como, por exemplo, o PC do B - Partido tégias de reprodução dessa força de tra-
Comunista do Brasil e o PCB - Partido balho de baixos salários) desmontando
Comunista Brasileiro. As lutas operárias e as construções simbólicas e ideológicas
sindicais lograram a construção da CUT dominantes sobre as cidades e c) gover-
– Central Única dos Trabalhadores, e os nos municipais inovadores que experi-
nascentes movimentos sociais urbanos – mentaram novas agendas com programas
uma novidade na cena política brasileira, sociais, econômica e politicamente inclu-
pelo menos nessa escala – criaram a CMP dentes e participativos.
- Central de Movimentos Populares.
Durante o regime de exceção (1964-
Um vigoroso Movimento Social pela Re- 1985) os prefeitos das capitais eram indi-
forma Urbana recuperou as propostas cados pelos governadores que eram indi-
elaboradas na década de 1960, no contex- cados pelo Presidente da República que
to das lutas revolucionárias latino-ame- eram indicados pelas Forças Armadas.
ricanas. Tratava-se de construir a ponte Portanto as experimentações de gestão
com uma agenda que a ditadura havia local democrática se davam nos demais
interrompido a partir de 1964. Na década municípios onde havia eleição direta para
de 1960 o Brasil tinha 44,67% da popula- prefeito. Entre os urbanistas ganhou im-
ção nas cidades (censos IBGE). Em 1980 portância nessa fase as experiências de
já eram 67,59%. Houve um acréscimo de Diadema, município operário da Região
cerca de 50 milhões de pessoas nas cida- Metropolitana de São Paulo, com suas
des e os problemas urbanos se aprofun- propostas de inclusão social e urbana ela-
daram. Esse movimento reunia entidades boradas em contexto de forte luta social19.
profissionais (arquitetos e urbanistas, Após 1985, quando a eleição direta retor-
engenheiros, advogados, assistentes so- na às capitais, ganha destaque a inovado-

29
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

ra experiência do Orçamento Participati- Os principais programas relacionados à


vo em Porto Alegre20. Em São Paulo, duas política urbana eram os seguintes:
mulheres foram eleitas com um intervalo
entre elas – Luiza Erundina (1989-1992) a) Em relação ao passivo urbano:
e Marta Suplicy (2001 e 2004) para go-
vernar a cidade mais importante do país. Grande parte das cidades, que era extre-
Propostas originais podem ser encontra- mamente precária, invisível para os car-
das nas áreas de habitação, assistência tões postais e por vezes, até mesmo para
social, transporte coletivo, cultura entre os mapas das secretarias de planejamen-
outras21. Muitas outras cidades também to, exigia intervenção urgente na busca
apresentaram novidades que extravasam de melhorias habitacionais, urbanas, pai-
o espaço desse paper: Recife, Belo Hori- sagísticas, de saneamento, de drenagem e
zonte, Fortaleza, Belém, Aracaju, entre ambientais. A urgência se refere à elimi-
outras22. nação de risco de vida devido a enchentes,
desmoronamentos, epidemias, insalu-
Os governos municipais que inaugura- bridade, dificuldade de mobilidade. As-
ram gestões inovadoras, autodenomi- segurar boas condições de saneamento,
nada de “democrática e popular” prio- drenagem, retirada de lixo, iluminação,
rizavam a “inversão de prioridades” na circulação viária ou de pedestre, limpeza
discussão do orçamento público e a par- urbana, e instalar também alguns equipa-
ticipação social em todos os níveis. Os mentos públicos (saúde e educação) sem
governos do PT foram tão bem sucedidos remover a maior parte da população que
que passaram a se diferenciar sob a mar- tinha apego à sua casa e ao bairro, exigia
ca do “modo petista de governar”23. As planos detalhados.
propostas eram criativas e efetivas, res-
pondendo com originalidade os proble- O programa mais importante nessa linha
mas colocados pela realidade local. Nesse de intervenção foi o de urbanização de fa-
sentido os projetos arquitetônicos, urba- velas ou recuperação de áreas degradadas.
nísticos e legais, relacionados ao “passivo Foram muitas as experiências em todo o
urbano” (cidade ilegal, auto-construída, Brasil que contribuíram para buscar uma
e precariamente urbanizada) ganha im- normatização para obras que apresentam
portância, pois sempre foi ignorado pelo muitas particularidades. Praticamente
urbanismo do main stream. Por isso, os cada caso é um caso que exige projeto es-
programas de governo se dividiam entre pecífico definindo os domicílios a serem
os que buscavam recuperar a cidade ile- removidos (e evidentemente a solução
gal consolidada (onde não houvesse obs- para estas famílias deveria ser providen-
táculo ambiental para isso) e a produção ciada com antecedência) devido à passa-
de novas moradias e novas áreas urbanas. gem das redes de água, esgoto, drenagem

30
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

e circulação viária e de pedestre. Outros


motivos também geram necessidade de Construção em mutirão - Gestão Luiza
remoção em tais obras como a proteção e Erundina. (Fonte: SEHAB/PMSP, 1990)
recuperação ambiental24.

Completando essas obras que se desti-


navam a levar “cidade” para áreas de-
gradadas e sem urbanização estavam os
programas pelos quais os movimentos
sociais haviam lutado muito como a re-
gularização urbanística e jurídica.25

Os cortiços nas áreas centrais também


constituíam um passivo social que exi-
giam atenção. Estudos haviam mostra-
do que a renda de aluguéis em cômodos
estreitos e insalubres resultava maior
do que nas condições do aluguel formal
(KOHARA, 1999). Além de fazer exigên-
cias sobre as condições de higiene e se-
gurança, as prefeituras garantiram assis-
tência jurídica gratuita para a população
pobre. Esse programa inspirou uma lei
municipal N. 10.928/2001 que pretendia
forçar donos de cortiços implementar
melhorias nos imóveis.

Essa assistência jurídica também se dedi-


cava à defesa contra o despejo e a buscar
novas formas de posse de imóveis que se
encontrassem em áreas públicas. de destacada qualidade arquitetônica,
bem equipado, que oferecia cursos regu-
Uma das iniciativas mais importantes lares, cinema, ginástica, artes plásticas,
que buscava dar mais qualidade para a programas teatrais e musicais, inéditos
vida de crianças e adolescentes nos bair- nos bairros pobres. Incluiu-se no centro
ros pobres foi a construção e operação dos bairros periféricos um pedaço de um
de CEUs (Centros Educacionais Unifi- universo discrepante em relação ao en-
cados)26. Tratava-se de criar um edifício torno precário.

31
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Conjunto COPROMO-Osasco, Mutirão com projeto da Assessoria Usina, 1996 (Acervo João S. Whitaker)

b) Em relação à produção de novos Reforma ou construção, individual ou


espaços na cidade: coletiva com assistência técnica gratuita
de engenheiros e arquitetos com especial
A produção de novos espaços urbanos atenção para a participação social desde
e habitacionais visava, nessa perspectiva a escolha do terreno, elaboração de pro-
de justiça social, dar alternativas habita- jeto e construção de moradias, foi um
cionais para minimizar o crescimento ou caminho muito profícuo seguido pelos
adensamento das favelas existentes ou movimentos sociais e Escritórios de As-
formação de novas. Propiciar novas opor- sistência Técnica. A verba destinada à as-
tunidades para a inserção dos pobres nas sistência técnica que prestava assessoria
cidades abrindo um caminho novo para a às entidades sociais organizadas deveria
construção da cidade democrática. estar incluída no orçamento da obra. A
criação dessas ONGs ou pequenas em-

32
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

presas foi o caminho usado por jovens produção, controlar a qualidade do que
arquitetos, engenheiros e advogados que era produzido e aprofundar a organiza-
não queriam trabalhar para o mercado ção social28.
de luxo ou mercado formal da moradia
em São Paulo e demais capitais. Toda Várias prefeituras também investiram na
uma geração de arquitetos se formou (e instalação de Usinas de pré fabricação de
continua se formando) com essa prática, peças de argamassa armada visando a ur-
buscando garantir a implementação do banização de novas áreas ou complemen-
“direito à arquitetura” e do “direito à ci- tação de áreas precariamente urbaniza-
dade”27. das. As peças eram utilizadas também na
construção de equipamentos públicos29.
A construção por mutirão foi motivo de
muitos debates entre arquitetos e depois Na área de drenagem engenheiros, ge-
entre arquitetos e a população organiza- ólogos e ambientalistas que passaram a
da que, inicialmente, preferia construir ocupar cargos nas prefeituras utilizaram
por mutirões para dominar o processo de novas técnicas para urbanização de cór-

CEU da PAZ – Brasilândia. Fonte: Google Maps, 2012.

33
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

regos a céu aberto (corrigindo a engenha- nização de renovações de áreas nobres.


ria que durante décadas contribuiu para o Foram eles: Operação Urbana visando a
tamponamento de córregos e impermea- recuperação de áreas que pudessem fi-
bilização em fundo de vales com avenidas nanciar a moradia social, Zonas Especiais
asfaltadas) que tinham a finalidade paisa- nas quais uma das partes do empreendi-
gística, mas acima de tudo ambiental. mento (privado) deveria ser destinada a
moradia social, Zonas Especiais voltadas
c) Em relação à legislação urbana: para a urbanização ou regularização da
moradia autoconstruída, impostos pro-
Foram elaborador e aprovados novos ins- gressivos e novos cadastros imobiliários
trumentos legais que buscavam remeter visando arrecadação com justiça social,
à responsabilidade do mercado respon- novas regras para o projeto arquitetônico
der por parcela da produção da moradia visando ampliar o “direito à arquitetura”
social ou responder pelo custo da urba- e especialmente buscava-se aplicar algu-

Ceu da PAZ – Brasilândia. Fonte; Google Street View, 2012.

34
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

ma punição ao imóvel considerado ocio- Urbanismo. Se antes esses agentes eram


so, com mais razão, se estivesse servido críticos do Estado e das políticas públicas,
de infraestrutura urbana. Nos projetos de a partir da conquista das novas prefeitu-
urbanização de favelas diversos estudos ras, e com o crescimento dos partidos de
buscavam definir padrões urbanísticos esquerda, notadamente do PT, eles foram
adaptados a uma situação de ocupação se apropriando de parcelas do aparelho
sinuosa e espontânea muito diferente dos de Estado nos executivos, nos parlamen-
padrões ortogonais modernistas, de ruas tos e com menos importância, até mesmo
largas da cidade formal. Algumas dessas do judiciário. Novos programas, novas
propostas integravam Planos Diretores práticas, novas leis, novos projetos, novos
ou legislação complementar que preten- procedimentos, sempre com participação
diam reorientar o crescimento da cidade social, permitiram o desenvolvimento
desigual garantindo o objetivo de nossa também de quadros técnicos e de know
busca obsessiva: a função social da pro- -how sobre como perseguir maior quali-
priedade, ou seja, a subordinação da pro- dade e justiça urbana. As travas da ma-
priedade ao interesse social e o controle croeconomia estavam colocadas como
do Estado sobre o uso do solo. obstáculos a serem resolvidos no futuro.

A inexperiência inicial daqueles que ali- Essa dinâmica política que incluía três
mentavam a utopia de construir uma ci- frentes- produção acadêmica, movimen-
dade mais democrática obrigou muitos tos sociais e prefeituras democráticas
ativistas a refletir sobre as limitações e a - avançaram conquistando importantes
consequente adaptação que deveria ser marcos institucionais além da eleição do
feita nas propostas.30 Os conflitos diários Presidente da República em 2002. Dentre
vinham dos movimentos sociais que co- eles destacam-se a) um conjunto de leis
bravam mais agilidade da parte do gover- que, a partir da Constituição Federal de
no e também de adversários que podiam 1988, aporta instrumentos jurídicos vol-
fazer parte da Câmara Municipal, do Ju- tados para a justiça urbana, sendo o Esta-
diciário quase sempre conservador, mas, tuto da Cidade a mais importante delas31
em especial e de modo generalizado, da b) um conjunto de entidades, como o
mídia do main stream, que atuou como Ministério das Cidades (2003) e as secre-
partido político representando a elite do tarias nacionais de habitação, mobilidade
país. urbana, saneamento ambiental e progra-
mas urbanos, que retomava a questão
Com o passar do tempo, durante as déca- urbana agora de forma democrática e c)
das de 80 e 90, pesquisadores, professores consolidação de espaços dirigidos à par-
universitários e profissionais de diversas ticipação direta das lideranças sindicais,
áreas, socialmente engajados, criaram o profissionais, acadêmicas e populares
que podemos chamar de Nova Escola de como as Conferências Nacionais das Ci-

35
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

dades (2003, 2005, 2007) e Conselho Na- Para garantir a posse, caso fosse eleito,
cional das Cidades (2004)32. Lula firmou, em 2002, um compromisso
com as forças do mercado financeiro que
A RETOMADA DO impuseram uma limitação ao seu gover-
INVESTIMENTO PÚBLICO: NEO- no. O começo do governo foi marcado
DESENVOLVIMENTISMO? pela afirmação do ideário neoliberal que
por outro lado estava presente nas rotinas
da máquina pública. As poucas brechas
se deram na forma de gastos focados na
“Não há dúvida de que as extrema pobreza, como, aliás, era orien-
políticas sociais fizeram di- tação do BIRD - Banco Mundial. Já em
2003 decidiu-se aplicar recursos onero-
ferença na vida de milhões sos no saneamento básico, seguindo ou-
tra regra do receituário do BIRD, ou seja,
de brasileiros. Os principais a de retorno dos recursos investidos (cost
recovery) apesar dos protestos da equipe
programas sociais do gover- de profissionais ativistas que ocupavam o
no Lula que tiveram conti- Ministério das Cidades.

nuidade na gestão de Dil- Mas as rígidas regras do FMI - Fundo


Monetário Internacional- não eram as
ma Rousseff foram: Bolsa únicas que impediam realizar o interesse
social na execução orçamentária. De ou-
Família, Crédito Consigna- tro lado estava o tradicional clientelismo
do, Programa Universidade que impunha aplicação pulverizada de
recursos pelo território brasileiro em tro-
para todos – ProUni (bolsa ca do apoio parlamentar nas votações do
Congresso. Como planejar nesse contex-
de estudo em universidades to? Isso não impediu que todos os Minis-
térios que tinham orientação progressista
privadas trocadas por im- ou de esquerda fossem tomados por uma
postos), Programa de For- febril elaboração de planos. Tratava-se de
retomar o papel planejador, regulador e
talecimento da Agricultura promotor do Estado.

Familiar - Pronaf e Progra- Com o passar do tempo, parte do ideário


neoliberal foi abandonado. Isso tem iní-
ma Luz para Todos.” cio com a entrada de Dilma Rousseff na
Casa Civil e a substituição do Ministro

36
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

da Fazenda, Antonio Palocci por Guido O Ministério das Cidades começou por
Mantega. seguir a orientação do Projeto Moradia
elaborado com a coordenação de Lula
Não há dúvida de que as políticas sociais em 2001. A tese central do Projeto era a
fizeram diferença na vida de milhões de seguinte: ampliar o mercado residencial
brasileiros. Os principais programas so- privado para abranger a classe média
ciais do governo Lula que tiveram con- (considerando as mudanças necessárias
tinuidade na gestão de Dilma Rousseff para isso) para que o Estado se ocupe das
foram: Bolsa Família, Crédito Consigna- camadas de baixa renda com alocação de
do, Programa Universidade para todos subsídios.33 Uma proposta relativa aos
– ProUni (bolsa de estudo em universi- recursos financeiros necessários para im-
dades privadas trocadas por impostos), pactar o déficit habitacional e outra que
Programa de Fortalecimento da Agri- tratava da reforma fundiária permitiram
cultura Familiar- Pronaf e Programa Luz elaborar um projeto acompanhado de or-
para Todos. Garantiu-se um aumento çamento e cronograma. Políticas setoriais
real do salário mínimo (de cerca 55%, de transporte e saneamento complemen-
entre 2003 e 2011, conforme DIEESE). tavam o quadro de propostas. Como qua-
Além desses programas o crescimento da se 1/3 do déficit habitacional brasileiro
economia e do emprego, propiciado por está nas metrópoles estas foram conside-
condições de troca internacional, trou- radas prioridade para o Projeto Moradia.
xeram alguma perspectiva de esperança
de dias melhores. Para viabilizar a ampliação do mercado re-
sidencial em direção à classe média foram
Ao invés de reforçar explicações que propostos ao Congresso Nacional alguns
veem, no aumento da renda de uma gran- projetos de lei sobre a atividade empresa-
de camada, a emergência de uma nova rial e tomadas algumas medidas regulado-
classe média, Marcio Pochmann classifica ras do financiamento cujos fundos prin-
como um reforço das camadas que se en- cipais foram os mesmos utilizados pela
contram na base da pirâmide social. Es- significativa atividade de construção re-
tes aumentaram sua participação relativa sidencial havida durante os governos mi-
na renda que estava abaixo de 27% para litares (especialmente entre 1970 e 1980):
46,3% entre 1995 e 2009. Os classificados SBPE- Sistema Brasileiro de Poupança e
em “condição de pobreza” diminuíram Empréstimo (um sistema de poupança
sua representação de 37,2% para 7,2% privada) e o FGTS – Fundo de Garantia
nesse mesmo período. Parte dessa popu- por Tempo de Serviço, gerido pelo Estado
lação que migrou da condição de pobreza em parceria com entidades de trabalhado-
para a base da pirâmide empregou-se na res (um sistema de poupança compulsória
construção civil (POCHMANN, 2012). que servia também como fundo desem-
prego para trabalhadores formais).

37
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Figura: PIB Brasil x PIB Construção Civil

A retomada dos investimentos começou a infraestrutura social (água, esgoto, dre-


lentamente, freada pelas travas neo libe- nagem, destino do lixo, recursos hídricos,
rais que proibiam gastos sociais, ainda pavimentação).
que os recursos não fossem exatamente
públicos mas a partir de 2007 o governo O PAC federalizou o Programa de Urba-
federal lançou o programa PAC – Progra- nização de Favelas. Finalmente o Estado
ma de Aceleração do Crescimento e em brasileiro reconhecia a cidade ilegal e o
2009 lançou o Programa MCMV - Mi- passivo urbano buscando requalificar e
nha Casa Minha Vida. Com o primeiro a regularizar áreas ocupadas ilegalmente.
atividade de construção pesada começa a Muitos bairros pobres de um universo gi-
decolar e com o segundo é a construção gantesco passaram por projetos de recu-
residencial que decola. peração urbanística elevando a condição
sanitária e de acessibilidade, entre outras.
O PAC se destina a financiar a infraes- Com o MCMV é diferente. Retoma-se a
trutura econômica (rodovias, ferrovias, visão empresarial da política habitacio-
portos, aeroportos e toda a infraestrutura nal, ou seja, de construção de novas ca-
de geração e distribuição de energia) e sas, apenas, sem levar em consideração o

38
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

espaço urbano em seu conjunto, e muito do o fim do sistema que foi realizado
menos a cidade já comprometida pela durante a ditadura com as instituições
baixa qualidade.34 centrais- Banco Nacional de Habitação,
Plano Nacional de Saneamento e Agen-
Com a finalidade explícita de enfrentar cia Nacional de Transporte Urbano.
a crise econômica de 2008 o MCMV
apresenta pela primeira vez uma po- Uma das principais finalidades do Pro-
lítica habitacional com subsídios do grama MCMV foi a reversão do impacto
governo federal. Desenhado pela Casa da crise de 2008 no Brasil e para tanto o
Civil do Governo Federal (com Dilma Programa foi bem sucedido.
Rousseff à frente) em parceria com os
maiores empresários do setor, o pro-
grama inclui regras para a securitiza-
ção do empréstimo. Buscava-se evitar o
saldo desastroso que havia caracteriza-

Figura: Taxa de desemprego x total de atividades x construção

39
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Em 2007, 17 empresas brasileiras de cons- moradias. O MCMV, de cuja formulação


trução e incorporação haviam aberto ca- esses empresários participaram, respon-
pital na bolsa de valores. Compraram um de a essa necessidade e as empresas pas-
estoque de terras e estavam justamente saram imediatamente a construir febril-
aguardando fundos para a provisão de mente (FIX, 2011 ROYER, 2009).

Figura: FGTS – Valor dos subsídios concedidos entre 2003 e 2011 (valores em R$ mil)

Planos, estratégias e critérios de aplica- gação se deu pela agressividade com que
ção dos investimentos desenvolvidos no os capitais imobiliários reassumiram o
Ministério das Cidades não contaram mercado de terras expulsando literal-
muito para a elaboração do MCMV.35 mente, até mesmo com despejos vio-
Apesar da ampliação do mercado que, lentos ou incêndios cujas origens nun-
nesse período passou a incluir a classe ca foram bem explicadas, as favelas ou
média (5 a 10 salários mínimos) do es- ocupações ilegais situadas em áreas com
forço do governo federal para a produ- algum potencial de valorização.36
ção de moradias para a baixa renda, a
reprodução da desigualdade e da segre-

40
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Figura: Financiamento Habitacional SBPE - No Financiamentos concedidos

Figura: Financiamento Habitacional SBPE – valores (R$ bilhões)

41
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Incêndio em favela da Zona Sul de São Paulo - Foto: Evelson de Freitas/AE

Vivemos um paradoxo, quando final- cidades brasileiras (FIPE ZAP)38. E tudo


mente o Estado brasileiro retomou o especialmente porque a terra se mante-
investimento em habitação, saneamen- ve com precário controle estatal apesar
to e transporte urbano de forma mais das leis e dos planos que objetivavam o
decisiva, depois de 29 anos Um intenso contrário. No mais dos casos as Câmaras
processo de especulação fundiária e imo- municipais e prefeituras flexibilizaram a
biliária promoveu a elevação do preço da legislação, ou apoiaram iniciativas ilegais
terra e dos imóveis considerada a “mais para favorecer empreendimentos pri-
alta do mundo”37. Entre janeiro de 2008 vados.39 Uma simbiose entre Governos,
e setembro de 2012 o preço dos imóveis parlamentos e capitais de incorporação,
subiu 184,9% no Rio de Janeiro e 151,3% de financiamento e de construção pro-
em São Paulo, à semelhança tantas outras moveu um boom imobiliário que tomou

42
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

as cidades de assalto.40 Se nos EUA o mote quando se trata de região metropolitana.


da bolha imobiliária foi a especulação fi- Mas nenhuma instância de governo to-
nanceira, cremos que no Brasil o core do cou nas propostas da Reforma Urbana,
boom foi a histórica especulação fundiá- sequer em discurso. A centralidade da
ria (patrimonialista) que se manteve no terra urbana para a justiça social desapa-
contexto da financeirização. O “nó da ter- receu. Aparentemente a política urbana
ra” continua como trava para a superação é resultado da soma de obras descom-
do que podemos chamar de subdesenvol- prometidas com o processo de planeja-
vimento urbano. mento. Os planos cumpriram o papel do
discurso mas não orientaram os investi-
Para esboçar alguma defesa do governo mentos. Outros fatores como os interes-
Federal é preciso lembrar que a questão ses do mercado imobiliário, o interesse de
urbana/fundiária é de competência cons- empreiteiras, a prioridade às obras viárias
titucional dos municípios, ou estadual ou de grande visibilidade, deram o rumo

Reintegração de posse Pinheirinho – São José dos Campos/SP - Foto: Roosevelt Cassio/Reuters

43
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Reintegração de posse Pinheirinho – São José dos Campos/SP - Foto: Roosevelt Cassio/Reuters

para aplicação dos recursos. O que mais pela esfera institucional. Atualmente, a
se vê atualmente são planos sem obras e maior parte deles está em cargos públicos
obras sem planos. ou ao redor deles. (MARICATO, 2011a).
O pragmatismo tomou conta dos prin-
Os motivos do enfraquecimento das for- cipais partidos de esquerda que abando-
ças que lutaram pela Reforma Urbana naram os princípios éticos. Foram sendo
ou que puseram de pé e implementaram abandonados os processos de ampliação
uma política urbana que contrariou, ain- da consciência social sobre a manipula-
da que por um período limitado, a cidade ção dos orçamentos públicos e o desres-
selvagem, ainda estão a espera de melho- peito aos direitos legais.
res análises mas sem dúvida muitos dos
participantes dessa luta foram engolidos

44
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

MEGAEVENTOS: à futura campanha eleitoral, e empresas


COPA E OLIMPÍADAS privadas locais e internacionais. A biblio-
grafia repete a receita dessa nova frente
O Brasil foi escolhido para sediar a Copa de acumulação de determinados capitais
do mundo de 2014 e as Olimpíadas de analisando casos de diferentes países.43
2016 (Rio de Janeiro). Depois de esco-
lhido como “emergente” o país está qua- O IMPERIO DO AUTOMÓVEL.
lificado para sofrer o ataque dos capitais TRANSPORTE COLETIVO EM RUÍNAS
que acompanham os megaeventos. Serão
acrescentados mais alguns graus na febre Após muitos anos de ausência de inves-
que acompanha o atual boom imobiliá- timentos nos transportes coletivos (de
rio. Seguindo a trajetória dos países que 1980 até 2009, aproximadamente), com
sediam esses grandes eventos, a “máqui- algumas exceções, a condição de mo-
na do crescimento” é posta a funcionar bilidade nas cidades tornou-se um dos
buscando legitimar, com o urbanismo do maiores problemas sociais e urbanos. É
espetáculo, gastos pouco explicáveis para importante dar alguns dados para quali-
um país que ainda tem enorme precarie- ficar esse quadro de inacreditável irracio-
dade na área da saúde, da educação, do nalidade para a mobilidade social, mas de
saneamento e dos transportes coletivos. efetiva racionalidade para certos capitais.

Muitos exemplos poderiam ser dados O tempo médio das viagens em São Pau-
sobre a truculência com que as grandes lo era de 2:42 h.44 Para 1/3 da população
obras expulsam moradores das redonde- esse tempo é de mais de 3 hs. Para 1/5 são
zas para viabilizar um processo de expan- mais de 4 horas, ou seja, uma parte da
são imobiliária e de construção de um vida é vivida nos transportes, seja ele um
pedaço do cenário urbano global.41 Boa carro de luxo ou então o que é mais co-
parte dessas grandes obras resta subuti- mum e atinge os moradores da periferia
lizadas após abocanhar um significativo metropolitana, num ônibus ou trem su-
naco dos cofres públicos em sua constru- perlotado.45 Estresse, transtornos de an-
ção.42 A dinâmica que acompanha os me- siedade, depressão, são doenças que aco-
gaeventos articula, de um modo geral, os metem 29,6% da população de São Paulo
arquitetos do star system, como nomeia segundo pesquisa do Núcleo de Epide-
Otília Arantes, legisladores que acertam miologia Psiquiátrica da USP.46 Dentre
um conjunto de regras de exceção para cidades de 24 países pesquisados, São
satisfazer as exigências das agencias in- Paulo é a cidade que apresenta o maior
ternacionais esportivas ou culturais, go- comprometimento da população e parte
vernos de diversos níveis que investem importante dessas mazelas é atribuída ao
em obras visando a visibilidade e o re- tráfego de veículos.
torno financeiro sob a forma de apoio

45
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Os congestionamentos de tráfego nes- Sabemos todos que, em todo mundo,


sa cidade, onde circulam 5,2 milhões de mesmo cidades que contam com boa
automóveis, chegam a atingir 295 km de rede de transporte apresentam congestio-
vias.47 A velocidade media dos automó- namentos de tráfego devido ao conforto
veis em São Paulo, entre 17:00 h e 20:00 e ao fetiche representado pelo automóvel.
h em junho de 2012 foi de 7,6 km/h, ou Mas é preciso conhecer os impactos eco-
seja, quase a velocidade de caminhada a nômicos, ambientais e na saúde que esse
pé. Durante a manhã a velocidade passa modo de transporte implica nas cidades
a ser de 20,6 km/h, ou seja, de uma bici- brasileiras para compreender e passar à
cleta.48 Todas as cidades de porte médio e perplexidade inevitável.
grande estão apresentando congestiona-
mentos devido à avalanche de automóveis Comparado com os transportes coletivos,
que entram nelas a cada dia. O consumo os automóveis são responsáveis por 83%
é incentivado pelos subsídios dados pelo dos acidentes e 76% da poluição.51
governo Federal e alguns governos esta-
duais para a compra de automóveis.49 Em Segundo o Ministério da Saúde, nos úl-
2001 o número de automóveis em 12 me- timos 5 anos morreram em acidentes de
trópoles brasileiras era de 11,5 milhões e trânsito 110 pessoas por dia e aproxima-
em 2011 era de 20,5 milhões. Nesse mes- damente 1.000 ficaram feridas. Quase o
mo período e nessas mesmas cidades o dobro do número de pessoas mortas em
número de motos passou de 4,5 milhões acidentes de trânsito fica com algum grau
para 18,3 milhões. Em diversas metrópo- de deficiência. Em São Paulo, no ano de
les o número de automóveis dobrou nesse 2011 morreram em acidentes de trânsito
período. 1365 pessoas sendo que 45,2% (617) fo-
ram atropeladas o que revela a inseguran-
O governo brasileiro deixou de recolher ça de pedestres. Desses acidentes ainda,
impostos no valor de R$ 26 bilhões des- 512 vitimaram motociclistas. A moto foi
de o final de 2008 (nesse mesmo período a forma encontrada para driblar os con-
foram criados 27.753 empregos) e US$ gestionamentos e fazer entregas rapida-
14 bilhões (quase o mesmo montante dos mente. Raramente esses chamados moto-
subsídios) foram enviados ao exterior, boys respeitam regras de trânsito pois a
para as matrizes das empresas que estão rapidez é sua vantagem competitiva.52
no Brasil aliviando a crise que estas es-
tavam vivendo na Europa e Estados Uni- A tabela abaixo, retirada do Relatório Ge-
dos.50 ral de Mobilidade Urbana 2010 da ANTP
- Associação Nacional de Transportes

46
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Públicos traz dados sobre o modo das raramente há bons equipamentos de saú-
viagens nas 438 cidades brasileiras com de, abastecimento, educação, cultura, es-
mais de 60.000 habitantes. O dado que porte, etc. E como o transporte é ruim e
mais chama atenção é o número de via- caro os moradores, em especial os jovens,
gens a pé, ou seja, pelo menos em um ter- vivem o destino do “exílio na periferia”,
ço dos moradores das cidades com mais como cunhou Milton Santos (SANTOS,
de 1 milhão de habitantes. Esse dado não 1990). Nunca é demais lembrar que po-
indica que as cidades atingiram o equilí- breza e imobilidade é receita para a vio-
brio de aproximar casa, trabalho, estudo lência.
e demais equipamentos e serviços urba-
nos que demandam viagens diárias. Ao
contrário, nas periferias metropolitanas

Figura: Porcentagem de viagens por modos e população da cidade

Fonte: ANTP, 2012

47
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

Em que pese a ainda baixa participação móvel acarreta para a qualidade de vida
dos automóveis no número de viagens em qualquer cidade como impermeabi-
e o estímulo dado ao seu consumo, fal- lização do solo, espraiamento da urbani-
ta lembrar que as obras viárias ganham zação ou outras mazelas que ocuparam
prioridade sobre, por exemplo, as obras longas horas em seminários acadêmicos
de saneamento, nos orçamentos munici- ou profissionais. Muito papel com análi-
pais. De fato elas têm mais visibilidade e ses críticas e muitas propostas foram ela-
prestígio acabando por influenciar os vo- boradas para melhorar esse quadro, mas
tos nas eleições. essa prioridade indiscutível que é dada
ao automóvel na matriz urbana não está
O impacto da poluição do ar promovida afirmada em nenhum documento, dis-
por tal condição de mobilidade sobre a curso ou plano, no Brasil. Ao contrário,
saúde vem sendo estudado pelo profes- todos os anos as autoridades comemo-
sor da USP, Paulo Saldiva e sua equipe. ram o Dia Mundial sem Carro (22 de se-
Vamos reproduzir suas próprias palavras: tembro) com a repetidas ênfases sobre a
importância da bicicleta e da caminhada
De acordo com a OMS, os elevados níveis para a saúde.
de poluição na cidade de São Paulo são
responsáveis pela redução da expectativa CONCLUSÃO: RUMO À TRAGÉDIA
de vida em cerca de um ano e meio. Os três URBANA. CRESCIMENTO
motivos que encabeçam a lista são: câncer INSUSTENTÁVEL
de pulmão e vias aéreas superiores; infarto
agudo do miocárdio e arritmias; e bron- Numa das vezes que retornou ao Brasil
quite crônica e asma. Estima-se que a cada vindo do exílio imposto pela ditadura
10 microgramas de poluição retiradas do militar, Celso Furtado encontrou, no iní-
ar há um aumento de oito meses na expec- cio dos anos 80, um país que estava sob o
tativa de vida (...). impacto da crise fiscal. A desigualdade se
Aproximadamente 12% das internações aprofundara apesar do alto crescimento
respiratórias em São Paulo são atribuíveis econômico das décadas anteriores agra-
à poluição do ar. Um em cada dez infartos vando a pesada herança histórica. Com a
do miocárdio são o produto da associação lucidez de um brilhante analista e a gene-
entre tráfego e poluição. Os níveis atuais de rosidade de quem se comprometia com
poluição do ar respondem por 4 mil mor- a ação, julgou necessária uma atitude de
tes prematuras ao ano na cidade de São prevenção em relação ao cenário que via
Paulo. Trata-se, portanto, de um tema de se desenrolar à sua frente. Destacou que
saúde pública.53 a subordinação aos bancos e ao FMI nos
conduziria à recessão e ao desemprego
Poderíamos citar outros impactos nega- especialmente no que se referia ao trata-
tivos que a mobilidade baseada no auto- mento da Dívida Externa (FURTADO,

48
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

1983). Infelizmente sua premonição se nhada liberdade individual, mas atravan-


confirmou e o Brasil viveu a década per- car nossa mobilidade (LUDD, 2004). Os
dida (ou décadas perdidas) que acarretou pobres com automóveis continuarão na
muito sofrimento na vida de uma parce- ilegalidade, sem o “direito à cidade”. Os
la da população do país. Sua convicção, jovens nas favelas terão computadores,
muito repetida, era de que o país deveria MP3 ou qualquer “gadget” semelhante,
fazer reformas estruturais, especialmente mas não terão casas dignas, saudáveis e
com a distribuição dos ativos, terra (re- seguras. Como lembra Francisco de Oli-
forma agrária) e educação. veira, na globalização, o informal é ao
mesmo tempo, trabalhador e mercado
Acompanhando a história das cidades de consumo para as transnacionais (OLI-
brasileiras por 40 anos e conhecendo as VEIRA, 2003).
forças que orientam sua forte dinâmica
de crescimento, atualmente, poderíamos
repetir Celso Furtado. Sendo mais espe- “Mas nossas energias não
cíficos, já que tratamos de cidades, po-
demos afirmar que sem reforma urbana se devem esgotar em per-
(leia-se reforma fundiária e imobiliária)
não haverá desenvolvimento mas apenas plexidade e indignação.
crescimento com reprodução da forte
desigualdade social e profunda predação Mais importante é encon-
ambiental. Distribuição de renda é im-
portante, mas não garante a “distribuição trar uma pista que nos
de cidade”, ou seja, o direito à cidade. O
que está em jogo é a apropriação das ren- conduza à saída do sub-
das de localização e os pobres, quando
próximos, deprimem o valor dos imóveis terrâneo a que fomos con-
por isso são “empurrados”, em grande
parte, para fora das áreas urbanizadas
finados.”
consolidadas. O que está em jogo é quem
manda nas cidades.
Celso Furtado 1983, p.10
Distribuição de renda e diminuição de Temos leis festejadas no mundo todo, te-
impostos sobre determinados produ- mos Planos Diretores em todas as cidades
tos como o automóvel pode incentivar com mais de 20.000 habitantes com ins-
o consumo, garantir empregos, mas não trumentos jurídicos inovadores, temos
garantirá cidades melhores e mais igua- conhecimento técnico, temos experiên-
litárias. A ampliação da propriedade do cia acumulada, mas nossas cidades estão
automóvel para todos não vai levar à so- piorando... A lógica dominante da atual

49
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

“máquina de crescimento” que insufla des e nas sociedades mundiais entre o


nossas cidades não é, como sabemos, a da final do século XX e começo do século
racionalidade social ou ambiental, mas é XXI. A conclusão sobre a ampliação do
sim formada pelos interesses dominantes domínio do fetichismo da mercadoria e
que lideram os demais: do capital imobi- da derrota das ideologias de esquerda, ou
liário, das empreiteiras de construção pe- mesmo social-democratas, parecia inevi-
sada e das indústrias automobilísticas em tável, mas a poesia cobrou o lugar da es-
simbiose com o financiamento de campa- perança.
nhas eleitorais.
A consideração aos mais jovens exige
Durante muitos anos trabalhamos na ela- esforços em duas direções: a) que sejam
boração de propostas de políticas públi- informados da experiência que vivemos
cas para as cidades sem deixar de conhe- em perseguição à utopia da cidade mais
cer as limitações dadas pelo estágio do justa num determinado contexto histó-
capitalismo contemporâneo na periferia rico e geográfico e b) que busquemos
latino-americana ou no resto do mundo. “uma pista que nos conduza à saída do
Tratava-se “apenas” de minimizar desi- subterrâneo” a que nossas cidades foram
gualdades por meio de reformas susten- confinadas.
tadas por ampla movimentação social e
sustentação partidária. Reconhecer que Para garantir uma metrópole mais demo-
depois de muitas conquistas institucio- crática, mais solidária e mais sustentável
nais nossas cidades estão piorando e que no Brasil, é preciso levar em consideração
fomos atropelados pela voracidade do a centralidade da questão da terra urbana
“boom” imobiliário, em sua versão peri- e garantir, entre muitas outras iniciativas
férica54, é difícil, mas necessário. previstas nas plataformas da Reforma Ur-
bana: a) a aplicação do instrumento legal
Durante o V Fórum Urbano Mundial – da função social da propriedade previs-
FUM (Rio de Janeiro, março de 2010), to no Estatuto da Cidade b) o controle
Peter Marcuse lembrou, com sua voz cal- público sobre a propriedade e o uso da
ma e pausada, que nem tudo que fazemos terra e dos imóveis (conforme compe-
está subordinado ao mercado. Há muito tência legal constitucional), e c) tomar
de trabalho voluntário ou de ação livre, os transportes coletivos e transporte não
espontânea, quando cuidamos das crian- motorizado como prioridade da matriz
ças, ou dos mais velhos, quando nos en- de mobilidade urbana.
contramos com os amigos, quando pra-
ticamos esporte, quando fazemos amor... Trata-se de uma reforma possível que de-
Sem dúvida, Peter estava querendo que- pende da correlação de forças pois o qua-
brar o clima de desesperança numa reu- dro jurídico/institucional e a experiência
nião que pretendia fazer um balanço do técnico/administrativa já existem.
impacto da política neoliberal nas cida-

50
Notas de 8. ONU/Habitat, 2012.
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]
Rodapé 9. A baixa escolaridade e o baixo nível de infor-
mação combinam-se a uma forte indústria cultural
(especialmente a TV) que se comporta como um partido
classista (FONSECA, 2010).

10. Esse resumo foi extraído dos trabalhos da autora


(MARICATO, 1996, 2000, 2011).
1. Texto para discussão para II Lehmann Dia-
logues – Harvard 2012. Proibida reprodução das ima-
11. Não há dados rigorosos sobre essa ocorrência já
gens. A elaboração desse texto contou com a edição de
que a metodologia do IBGE não dimensiona a totalidade
Leticia Sigolo e Karina Leitão.
de assentamentos precários e irregulares no país, pois
o instituto não dispõe de informações sobre a condição
2. BRICS foi uma sigla bem sucedida criada pela
fundiária dos domicílios. Essas estimativas se baseiam
Goldman Sachs (a empresa que definia risco de países
em levantamentos municipais, pesquisas acadêmicas ou
como o Brasil, mas esqueceu de olhar seu próprio risco,
opiniões de especialistas incluindo a autora deste texto.
pois quase foi à bancarrota em 2008). A Revista The
Ver a respeito MARICATO, 2001.
Economist reconhece que a sigla “garantiu aos ban-
cos muitos negócios” (Encarte de Carta Capital/jan/
12. O boom imobiliário no Brasil, a partir do final
fev.2011)
da primeira década do século XXI, está ampliando o
acesso da classe média à moradia impactando o nível de
3. Comenta-se, sem provas, que o presidente
produtividade de forma sempre contraditória como rev-
francês Charles De Gaulle afirmou, durante visita ao
elam as pesquisas de José Baravelli, aluno do doutorado
país: “O Brasil não é um país para ser levado a sério”.
da FAUUSP.
Sobre inovações e criatividade dos BRICS, ver fonte da
nota anterior. Ver elogios ao urbanismo brasileiro na
13. Sergio Buarque de Holanda, Celso Furtado, Flo-
Bienal de Arquitetura de Roterdã no jornal Folha de São
restan Fernandes, se referem a essa tradição discursiva e
Paulo. Uma pinguela em Roterdã. Folha de São Paulo, 15
distância da ação, na sociedade brasileira.
de julho de 2012. Disponível em http://www1.folha.uol.
com.br/fsp/ilustrissima/54483-uma-pinguela-em-roter-
14. O elegarça foi criado pela autora e seu estagiário
da.shtml.
em 2010, Fernando Mendes Castro. Essas ideias aqui re-
sumidas foram desenvolvidas em dois livros MARICATO
4. Saskia Sassen talvez seja a autora que mais
1996 e 2011.
divulgou o conceito de cidade global baseada no novo
papel que as metrópoles, transformadas pelo setor de
15. PILOTTO (2010); ALBUQUERQUE (2007);
serviços e finanças, desempenham no mundo.
MOURA (2001); OLIVEIRA (2000); GARCIA (1993).
5. A discussão gira eminentemente em torno da
16. Os loteamentos fechados constituem empreen-
natureza do recente processo de crescimento econômico
dimentos ilegais diante da Lei Federal n. 6766 de 1979.
no país e suas reais possibilidades de reverter dinâmicas
Ruas e áreas verdes são públicas pela lei e não poderiam
sociais estruturantes. Cf. http://www.cartamaior.com.br/
estar muradas. No entanto, eles proliferam no entorno
templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=5537.
das cidades já que são o produto de maior taxa de lucro
do mercado imobiliário, Constatamos que moram nos
6. Sobre os autores marcados pela “obsessão de ex-
loteamentos fechados juízes, promotores públicos entre
plicar o Brasil no contexto do capitalismo internacional”
outros operadores do direito e proprietários dos meios de
ver ARANTES e ARANTES, 1997.
comunicação.
7. Dados sobre população em favelas na cidade
17. Mapa da Violência 2012, disponível em http://
de São Paulo, entre 1973 e 2007, ver Saraiva e Marques
mapadaviolencia.org.br.
(2011).

51
18. ANDERSON, Perry. Spectrum: From Right to tos, nos materiais, na produtividade, exigia, para serem
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]
Left in the World of Ideas.London: Verso, 2005. incorporados à produção de moradias, mudanças na
sociedade brasileira, a começar pela aplicação da função
19. Sobre as experiências em Diadema, ver: HERE- social da propriedade. Como as mudanças não vieram
DA, Jorge Fontes; ALONSO, Emílio. “Política urbana e essas experiências continuam a existir como casos de
melhoria da qualidade de vida em Diadema”. In BON- exceção. A respeito da experiência de mutirões, ver BIS-
DUKI, Nabil (org.), Habitat: As práticas bem-sucedi- ILLIAT-GARDET, 1990.
das em habitação, meio ambiente e gestão urbana nas
cidades brasileiras, Studio Nobel, São Paulo, 1996. 29. A Prefeitura de São Paulo criou em 1990, uma
Usina para produção de placas de argamassa armada
20. GENRO, T.; DUTRA, O. O desafio de adminis- para canalização de córregos a céu aberto e produção de
trar Porto Alegre. Porto Alegre, 1989. equipamentos coletivos. A linha de produção e os desen-
hos foram inspirados no trabalho do notável arquiteto
21. Os programas da prefeitura de São Paulo du- brasileiro Lelé (João Filgueiras Lima).
rante as gestões de Luiza Erundina (1989/1992) e Marta
Suplicy (2001-2004) foram objeto de um grande número 30. Embora a governabilidade buscada nas alianças
de teses e dissertações acadêmicas. As que se referem à que incluem conservadores seja explicada como uma
política urbana, à política de habitação e ao direito social necessidade para governar nesse contexto muitos dos
à arquitetura podem ser encontradas especialmente nas governos municipais bem sucedidos não ampliaram
bibliotecas dos cursos de pós-graduação em arquitetura e demais o arco de alianças.
urbanismo da USP - Universidade de São Paulo.
31. Um conjunto de novas leis constituiu um novo
22. A autora deste texto foi Secretária de Habitação quadro jurídico após a Constituição Federal de 1988:
e Desenvolvimento Urbano do Município de São Paulo Estatuto da Cidade 2001, Lei dos Consórcios Públicos
entre 1989/1992. 2005, Marco legal do Saneamento, 2007, Lei dos resíduos
sólidos 2011, Lei federal da Mobilidade Urbana 2012
23. Sobre o “modo petista de governar” ver: (CARVALHO & ROSSBACH, 2010.).
MAGALHÃES, I.; BARRETO, L.; TREVAS, V. (org.)
Governo e Cidadania: Balanço e reflexões sobre o modo 32. O Instituto Cidadania, que tinha Lula como
petista de governar. São Paulo, Ed. Fundação Perseu presidente, uma ONG destinada a formular propos-
Abramo, 1999. tas de políticas públicas, formulou em 2001 o Projeto
Moradia visando enfrentar o problema da habitação no
24. Cf. BUENO, 2000; CARDOSO, 2009; DENAL- Brasil. A proposta de criar um Ministério voltado para
DI, 2003; LABHAB, 1999, MINISTÉRIO DAS CI- as cidades fez parte desse projeto, mas já estava presente
DADES, 2010. nos programas de Governo do PT durante as campanhas
eleitorais dos anos 90.
25. Essas ações nada tiveram a ver com as teses do
peruano Hernando de Sotto ou do Banco Mundial. Elas 33. Praticamente 90% do déficit habitacional bra-
foram resultado de mobilização dos moradores que que- sileiro estava concentrado nas famílias que ganhavam de
riam a segurança contra despejos. 3 salários mínimos para baixo. Nesse período (2001) o
mercado privado atendia quase que somente as famílias
26. Os CEUs foram criados na gestão da prefeita que ganhavam de 10 salários mínimos para cima.
Marta Suplicy em São Paulo a partir de 2001. Projetos (MARICATO, 2001)
elaborados por arquitetos funcionários públicos.
34. O Ministério das Cidades exige um plano
27. A Federação Nacional de Sindicato de Arquite- habitacional e de saneamento para liberar recursos oner-
tos conseguiu fazer aprovar uma lei federal que institui osos ou de subsídios.
a assistência técnica pública ligada a essa experiência.
Trata-se de mais uma lei que espera aplicação. 35. Em 2006, foi contratado o Plano Nacional de
Habitação – PLANHAB pela Secretaria Nacional de
28. A generalização dos avanços incluídos nos proje- Habitação do Ministério das Cidades. Ele usou uma

52
forma inovadora de diagnóstico – a tipologia de cidades Metro de São Paulo, em 2007.
[ revista política social e desenvolvimento
– para definir prioridades orçamentárias.
45.
#01 ]
Dados da Rede Nossa São Paulo, http://www,re-
36. Ver a respeito a significativa e suspeita relação denossasaopaulo.org.br mai/2012 de pesquisa contratada
entre incêndio em favelas e a proximidade de grandes ao IBGE.
obras de infraestrutura ou áreas valorizadas. Entre ja-
neiro e agosto de 2012, 46 favelas vivenciaram incêndios 46. Mental Disorders in Megacities: Findings from
em São Paulo. (Para remoções forçadas ver Observatório the São Paulo Megacity Mental Health Survey, Brazil,
de Remoções de São Paulo - http://observatoriodere- de Laura Andrade e outros, pode ser lido em www.
mocoes.blogspot.com.br/ - e sobre Incêndios nas favelas plosone.org/article/info%3Adoi%2F10.1371%2Fjournal.
da cidade ver Fogo no Barraco - http://fogonobarraco. pone.0031879.
laboratorio.us/)
47. Essa marca recorde foi atingida no dia 1 de jun-
37. “Imóveis a maior alta do mundo”. In: Revista ho de 2012.
Exame 18/05/2011. Disponível em http://exame.abril.
com.br/revista-exame/edicoes/0992/noticias/a-maior-al- 48. Os dados são da CET- Companhia de Engenha-
ta-do-mundo. ria de Tráfego e foram divulgados pelo Jornal O Estado
de São Paulo, 23/09/2012
38. Disponível em: http://www.zap.com.br/imoveis/
fipe-zap. 49. Quando não constar fonte específica, os dados
que se seguem estão na matéria Especial Trânsito do
39. Ver a respeito os estudos de Ana Fernandes e informativo digital Carta Maior de setembro de 2012.
Jurema Rugani que se referem a Salvador e Belo Hori- (disponível em: http://www.cartamaior.com.br/tem-
zonte. Em São Paulo as ZEIS- Zonas Especiais de Inter- plates/index.cfm?home_id=144&alterarHomeAtual=1)
esse Social foram modificadas por decreto do prefeito.
50. Artigo de Nazareno Stanislau Afonso na revista
40. Os capitais financeiros não se comportam no do IPEA
Brasil de forma semelhante à da bolha americana.
Apesar dos esforços de “copiar” as incríveis criações de 51. Relatório Geral de Mobilidade Urbana 2010.
que o capital fictício foi capaz nos EUA os empresários e ANTP (disponível em: http://portal1.antp.net/site/simob/
representantes de bancos não lograram avançar muito no Downloads/Relat%C3%B3rio%20Geral%202010.pdf)
Brasil, nessa direção (FIX, 2011; ROYER, 2009)
52. O filme brasileiro “Os 12 trabalhos de Hércules”
41. Ao todo 170.000 moradores estão sendo re- (dirigido por Ricardo Elias) mostra um dia na vida de
movidos diretamente pelas obras da Copa do Mundo, um motoboy, morador da periferia de São Paulo, com
no Brasil, e das Olimpíadas, especificamente no Rio de riqueza de detalhes.
Janeiro. Muitos deles estão organizados em torno de
comitês populares (ver Comitê Popular da Copa http:// 53. Professor da Faculdade de Medicina da Uni-
portalpopulardacopa.org.br) versidade de São Paulo. Ver entrevista: http://www.
cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?mate-
42. Ver a respeito ARANTES, 2000, 2011, 2012, ria_id=20651
VAINER, 2000, ROLNIK, 2012. Na cidade de Natal, um
estádio de futebol que raramente ficava lotado foi posto 54. O papel específico do mercado imobiliário em
abaixo para dar lugar à construção de outro maior para países da América Latina foi desenvolvido no trabalho
atender às exigências do evento. Na África do Sul e na de LESSA e DAIN, 1980.
China, a ociosidade de algumas grandes obras tem dado
motivos para a discussão sobre o que fazer com elas.

43. Idem.

44. Segundo pesquisa Origem destino da Cia do

53
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56
[ revista política social e desenvolvimento #01 ]

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