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Societário e a Reforma
da Lei das S/A – Vol. III
Interpretação da Lei nº 11.638/07
Direito Tributário,
Societário e a Reforma
da Lei das S/A – Vol. III
Interpretação da Lei nº 11.638/07
Revisão gramatical:
Capa:
ISBN 85-7674-
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busca e apreensão e indenizações diversas (arts. 101 a 110 da Lei 9.610, de 19.02.1998, Lei dos Direitos Autorais).
Combinação de
negócios: o ganho por
compra vantajosa
1 Lei nº 6.404/1976, art. 177, §5º – As normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários a que
se refere o §3º deste artigo deverão ser elaboradas em consonância com os padrões internacionais
de contabilidade adotados nos principais mercados de valores mobiliários.
2 Lei nº 6.404/1976, art. 177, §3º – As demonstrações financeiras das companhias abertas observarão,
ainda, as normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários e serão obrigatoriamente
submetidas a auditoria por auditores independentes nela registrados.
3 O caput do art. 10-A da Lei nº 6.385/1976, acrescido pela Lei nº 11.638/2007, permite à CVM
celebrar convênio com o CPC: Art. 10-A. A Comissão de Valores Mobiliários, o Banco Central
do Brasil e demais órgãos e agências reguladoras poderão celebrar convênio com entidade que
tenha por objeto o estudo e a divulgação de princípios, normas e padrões de contabilidade e
de auditoria, podendo, no exercício de suas atribuições regulamentares, adotar, no todo ou em
parte, os pronunciamentos e demais orientações técnicas emitidas.
4 Lei nº 6.404/1976, art. 177, §6º – As companhias fechadas poderão optar por observar as
normas sobre demonstrações financeiras expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários para
as companhias abertas.
Negócios conceituada pelo CPC 15, sempre que houver aquisição de controle6
de um negócio7 .
a. Identificação da Adquirente
A intenção do CPC 15 é a de que as transações que resultem em
Combinação de Negócios sejam contabilizadas considerando-se a sua essência
econômica, independentemente da forma jurídica da operação (incorporação,
fusão, aquisição, etc.). Além disso, deverá ser sempre identificada a entidade
adquirente e o negócio adquirido.
Será utilizada a orientação da IAS 27 – Demonstrações Financeiras
Consolidadas e Separadas (IAS 27) para se identificar o adquirente que obteve
o controle da adquirida. A IAS 27 define controle como o poder de gerir as
políticas financeiras e operacionais de uma entidade de forma a obter benefícios
das suas atividades.
Se a identificação do adquirente não for possível pela IAS 27, dever-se-á
verificar o exercício do controle de outras formas: (i) se a combinação de
negócios foi efetuada pela transferência de caixa ou outros ativos ou assunção
de passivos, a adquirente será a entidade que transferiu caixa, outros ativos ou
assumiu passivos, e (ii) se a combinação de negócios foi efetuada pela troca
de participações patrimoniais, o adquirente será a entidade que emitiu suas
participações patrimoniais, entretanto, (a) a adquirente poderá ser a entidade
combinante cujos proprietários, como um grupo, detêm a maioria do direito de
voto na entidade combinada, ou (b) a adquirente, no caso de controle difuso,
será a entidade combinante cujo único proprietário ou grupo organizado detiver
a maior participação minoritária com direito a voto na entidade combinada, ou
(c) a adquirente será a entidade combinante cujos proprietários têm a capacidade
de eleger, nomear ou destituir a maioria dos membros da administração da
combinada, ou (d) se a adquirente por meio de sua administração exercer o
domínio da administração da combinada, ou (e) a adquirente será a entidade
6 Controle é definido no CPC 15 como sendo “o poder para governar a política financeira e
operacional da entidade de forma a obter benefício de suas atividades”. Não há modificação
dessa definição na minuta de revisão em Audiência Pública.
7 Negócio é definido no CPC 15 como sendo “um conjunto integrado de atividades e ativos capaz
de ser conduzido e gerenciado para gerar retorno, na forma de dividendos, redução de custos ou
outros benefícios econômicos, diretamente a seus investidores ou outros proprietários, membros ou
participantes”. Não há modificação dessa definição na minuta de revisão em Audiência Pública.
que paga prêmio sobre o valor justo antes da combinação das participações
patrimoniais da outra entidade ou entidades combinantes. Outra forma de se
definir a adquirente é pelo porte relativo (de ativos, receitas ou lucros) que será
significativamente superior ao da outra entidade ou das entidades combinantes; ou
em caso que envolva mais de uma entidade combinante, a adquirente poderá ser
aquela que começou a combinação, levando-se em consideração o porte relativo
das combinantes. Por outro lado, a entidade criada com o propósito de realizar
a combinação de negócios não é necessariamente a adquirente do controle, que,
nesse caso, será aquela que se enquadre em um dos pontos acima mencionados.
b. Aquisições reversas
Exemplo claro de aquisição reversa ocorre quando uma companhia fechada
que quer abrir o capital tem suas ações incorporadas (ou adquiridas na linguagem
genérica adotada na combinação de negócios) por uma companhia aberta. Nesse
caso, a companhia aberta legalmente adquire a companhia fechada. Entretanto,
para fins contábeis, a adquirente será aquela que se enquadra nas formas de
controle mencionadas no parágrafo acima. A adquirente contábil, do exemplo
acima, será a companhia fechada, e a adquirida contábil a companhia aberta.
Deve-se acrescentar ainda que a adquirida contábil deverá atender à definição
de negócio para que a transação seja contabilizada como uma aquisição reversa.
Na aquisição reversa, a adquirente contábil não emite contrapartida pela
adquirida. A adquirida contábil emite ações aos proprietários da adquirente
contábil. A determinação do valor justo na data de aquisição da contrapartida
transferida pela adquirente contábil, por sua participação na adquirida contábil,
será baseada no número de participações patrimoniais que a controlada legal
teria que ter emitido para dar aos proprietários da controladora legal o mesmo
percentual de participação patrimonial na entidade combinante que resulta da
aquisição reversa. Assim, o valor justo do número de participações patrimoniais
calculado dessa forma pode ser usado como o valor justo da contrapartida
transferida em troca da adquirida.
Em diversos casos, alguns dos proprietários da adquirida legal (adquirente
contábil) podem não trocar participações patrimoniais por participações
patrimoniais da controladora legal (adquirente contábil). Nesse caso, esses
proprietários são tratados como participação não-controladora.
As demonstrações financeiras elaboradas após uma aquisição reversa são
emitidas em nome da controladora legal (adquirida contábil), constando nas
c. Operações societárias
A obtenção do controle de um negócio pode ser alcançada de diversas
formas, quais sejam: (i) pela aquisição de participação (originária ou derivada)
societária que garante o controle do capital social de outra entidade; (ii) pela
compra de todos ou parte dos seus ativos com assunção ou não de parte ou do
todo de seus passivos; (iii) pela incorporação das ações de uma entidade; (iv)
pela incorporação de uma entidade; (v) pela fusão; (vi) pela cisão para atingir
as hipóteses anteriores ou, ainda, (vii) pela aquisição, por qualquer outra forma,
de alguns dos ativos líquidos que, em conjunto, formem um ou mais negócios.
A Combinação de Negócios pode tornar-se também efetiva por meio
(i) de emissão de títulos representativos do capital próprio (emissão de ações
como forma de pagamento) para entrega aos acionistas ou cotistas da entidade
adquirida; (ii) de transferência de ativos (caixa, equivalentes de caixa ou outros
ativos líquidos); (iii) de operações de cisão, fusão, incorporação ou incorporação
de ações; (iv) de simples aquisição de participação societária mediante o
pagamento em caixa ou assunção de obrigações e, ainda, (v) de uma combinação
dessas ou outras alternativas.
Assim, dito de outra forma, a Combinação de Negócios pode ser
estruturada de diversas formas por razões legais, podendo envolver (i) a compra
por parte de uma entidade do capital próprio de outra entidade; (ii) a compra
de todos os ativos líquidos de outra entidade; (iii) a assunção de passivos de
outra entidade, ou (iv) a compra de alguns dos ativos líquidos de outra entidade
que em conjunto formem um ou mais negócios. Pode tornar-se efetiva (i)
pela emissão de ações; (ii) pela transferência de caixa; (iii) pela transferência
de equivalentes de caixa ou outros ativos, ou (iv) por uma combinação destes.
A transação pode ser (i) entre os acionistas das entidades sob controle
comum ou (ii) entre uma entidade e os acionistas de outra entidade. Pode
envolver o estabelecimento de uma nova entidade para (i) controlar as entidades
sob controle comum; (ii) deter os ativos líquidos transferidos, ou (iii) realizar
13 Os ativos e passivos afetados são aqueles enquadrados na IAS 12 – Imposto sobre Renda, na IAS
19 – Benefícios aos Empregados, na IFRS 2 – Pagamento baseado em ações e na IFRS 5 – Ativos
não correntes mantidos para venda e operações descontinuadas.
b. Período de mensuração
O período de mensuração ocorrerá após a aquisição. É um período razoável
para a adquirente levantar informações necessárias para identificar e mensurar
os ativos identificáveis adquiridos, a contrapartida transferida e o ágio resultante
ou o ganho em uma compra vantajosa. Se essas informações não estiverem
disponíveis na data da aquisição, a adquirente deverá determinar e reconhecer
valores provisórios até que as informações necessárias se tornem disponíveis.
Esse período se encerra a partir do momento em que a adquirente recebe
as informações necessárias sobre fatos e circunstâncias existentes na data de
aquisição ou toma conhecimento de que as informações não podem ser obtidas.
Entretanto, esse período não deve exceder um ano da data de aquisição.
Os ajustes ajudam a resolver as preocupações referentes à qualidade e à
disponibilidade de informações na data da aquisição quanto aos valores justos.
A preocupação é ainda maior quanto a passivos contingentes e à contrapartida
contingente, que podem afetar o valor do ágio ou do ganho reconhecido em
uma compra vantajosa.
O objetivo do período de mensuração é proporcionar um período para
obtenção de informações necessárias para mensurar o valor justo do ativo na
data de aquisição. A determinação de liquidação final de contingência ou de
outro item não são essenciais, pois incertezas sobre a época e o valor de fluxos
de caixa fazem parte da mensuração do valor justo de ativos e passivos.
5. Divulgações
A adquirente deverá divulgar as informações referentes à combinação de
negócios, de forma que o mercado em geral possa avaliar sua natureza e o efeito
financeiro ocorrido durante o período de relatório financeiro ou após a data do
relatório. Mas, tudo isso, antes da emissão das demonstrações financeiras. Os
ajustes decorrentes de combinação de negócio ocorridas no período corrente
ou em períodos anteriores deverão ser divulgados ao mercado.
Quando a data da aquisição de combinação de negócios for posterior ao
final do período de reporte, mas antes de as demonstrações contábeis estarem
autorizadas para publicação, o adquirente deve divulgar as informações requeridas
conforme exporemos em seguida, a menos que a contabilização inicial da
combinação estiver incompleta no momento em que as demonstrações contábeis
forem autorizadas para publicação. Nessa situação, o adquirente deve descrever
quais divulgações não puderam ser feitas e as respectivas razões para tal.
por ser uma transação em condições de venda forçada ou outra razão, mesmo
que a transação se dê entre partes interessadas, conhecedoras do negócio e
independentes entre si, com ausência de fatores que pressionem a liquidação
da transação ou que caracterizem uma transação compulsória.
Determinou o art. 20 do Decreto-Lei 1.598, de 26 de dezembro de 1977,
que o custo de aquisição de participação em uma sociedade por outra deve ser
desdobrado, apontando-se o valor de Patrimônio Líquido Contábil (PLC) do
investimento, e a diferença entre esse número e o custo de aquisição14. Referida
diferença constituía o ágio (quando custo de aquisição for maior que o PLC)
ou deságio (quando o custo de aquisição for menor que o PLC).
Quando o custo de aquisição era maior que o PLC, gerando, portanto,
ágio, este se justificava pela expectativa de rentabilidade futura.15 O ágio (valor
pago – PLC) transformava-se, então, “em um ativo diferido da incorporadora,
o qual continuava a ser amortizado mensalmente no mesmo ritmo previsto
para a amortização do ágio que lhe deu origem.”16
Quando o custo de aquisição era menor que o PLC, gerava-se um deságio,
presumindo-se que a companhia adquirente fez um bom negócio, denominado,
portanto, compra vantajosa.
O deságio, por sua vez, ocorre quando o valor líquido dos ativos
identificáveis e passivos assumidos exceder (i) a contraprestação transferida em
troca do controle da adquirida, para a qual se exige o “valor justo na aquisição”,
somada ao (ii) montante de qualquer participações de não controladores na
adquirida, se houver, e ao (iii) valor justo, na data da aquisição, da participação
do adquirente na adquirida imediatamente antes da combinação, em caso de
combinação de negócios realizada em estágios.
Por outro lado, com a convergência com o IFRS, o ágio passou a ser a
diferença entre o valor efetivamente pago e o “valor justo” do bem adquirido.
14 A norma foi reproduzida no art. 385 do Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999 (Regulamento
do Imposto de Renda – RIR/99).
15 Nos termos exatos do CPC 04: “O ágio derivado da expectativa de rentabilidade futura (goodwill)
reconhecido em uma combinação de negócios é um ativo que representa benefícios econômicos
futuros gerados por outros ativos adquiridos em uma combinação de negócios, que não são
identificados individualmente e reconhecidos separadamente”.
16 BRIGAGÃO, Gustavo, e SCHARFSTEIN, Carlos. Aproveitamento fiscal de ágio fundamentado em
perspectiva de rentabilidade futura, in ROCHA, Sérgio André. Direito Tributário, Societário e a
Reforma da Lei das S/A. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 257.
a. Compra vantajosa
As compras vantajosas são consideradas operações anômalas. Normalmente,
não há transações em que proprietários vendem consciente e voluntariamente
ativos ou negócios a preços abaixo de seus valores justos. Por seu turno, podem
existir hipóteses em que isso ocorra, tais como liquidação forçada ou venda por
necessidade na qual os proprietários precisam vender um negócio com mais
rapidez, o que pode resultar em um preço inferior ao valor justo.
O ganho econômico é inerente em uma compra vantajosa. Isso ocorrerá
quando, na data da aquisição, a adquirente tem um ganho no valor pelo
qual o valor justo do que é adquirido excede o valor justo da contrapartida
transferida. Entretanto, a aparência de uma compra vantajosa sem evidência
das razões subjacentes é preocupante, pois poderia ser decorrente da
existência de erros de mensuração do ativo ou negócio. Em razão disso,
sugere-se que seja verificado se houve erros na mensuração dos valores
justos da contrapartida paga pelo negócio e dos ativos adquiridos ou dos
passivos assumidos.
Nesse sentido, deve-se distinguir entre o que seja compra vantajosa ou
erros de mensuração. Os erros de mensuração, intencionais ou não, podem ser
minimizados por controle interno e uso de peritos ou empresas avaliadoras
e auditores externos. O IFRS optou por normatizar, pois normas para evitar
abusos inevitavelmente cancelariam a neutralidade. Exige-se que a adquirente
reavalie se tinha identificado corretamente todos os ativos adquiridos e
passivos assumidos antes de reconhecer o ganho de uma compra vantajosa. Tal
reavaliação compreenderia os ativos adquiridos e passivos assumidos, bem como
a participação não-controladora na adquirida (se houver), além da contrapartida
transferida; e na combinação realizada em etapas, a reavaliação da participação
patrimonial detida anteriormente pela adquirente na adquirida.
O objetivo é garantir que as informações disponíveis tenham sido
adequadamente consideradas na identificação dos itens a serem mensurados e
reconhecidos e na determinação dos valores justos.
O ganho da compra vantajosa e o ágio não podem ser reconhecidos
em uma mesma combinação de negócios. Assim, uma compra vantajosa é
mensurada com o excedente do valor líquido dos valores na data de aquisição
dos ativos identificáveis adquiridos e dos passivos assumidos sobre o valor justo
na aquisição da contrapartida transferida, somados ao valor reconhecido de
7. Conclusão
O ganho referente à compra vantajosa foi introduzido nas práticas
contábeis brasileiras em razão do processo de convergência dessas práticas
contábeis com normas internacionais de contabilidade do IFRS. Foi um
passo importante, pois, no passado, mesmo em se tratando de processos de
combinação de negócios envolvendo partes conhecedoras, independentes
entre si e interessadas em uma transação em condições de mercado (merge of
equals), havia um entendimento da CVM e das práticas contábeis de que essa
diferença resultante da combinação de negócios por compra vantajosa deveria
ser registrada como deságio na adquirente. Com o processo de convergência com
as normas internacionais de contabilidade, o adquirente passou, diferentemente
do tratamento anterior, a ter a obrigação de reconhecer o ganho resultante no
resultado na data da aquisição, devendo esse ganho ser atribuído ao adquirente.
A entidade adquirente, ao contabilizar combinação de negócios anteriores à
vigência do CPC 15, poderá ter reconhecido um deságio por expectativa de
prejuízos futuros (diferença negativa entre o custo da participação adquirida
e a parte da adquirente no valor justo dos ativos líquidos da adquirida) ou por
compra vantajosa. Se isso ocorrer, a entidade adquirente deverá baixar o valor
contábil desse deságio no início do primeiro período de reporte anual em que
o CPC 15 foi aplicado e fazer o ajuste correspondente em lucros acumulados
no balanço patrimonial de abertura naquela data.
O Aproveitamento
Fiscal do Ágio e
as Alterações da
Introdução
Como é cediço, a Lei nº 11.638/07, resultante do Projeto de Lei
nº 3.741/001, introduziu importantes alterações no texto da Lei nº 6.404/76,
tendo por objetivo principal adequar as práticas contábeis brasileiras àquelas
ditadas pelo International Accounting Standards Board (IASB) e observadas
internacionalmente.
A conclusão de tal processo de harmonização das práticas contábeis, dentre
os seus principais efeitos, será o aumento da transparência das informações
divulgadas pelas companhias em geral, o que possibilitará a comparabilidade
das demonstrações financeiras das empresas nacionais com aquelas divulgadas
por empresas estrangeiras. Isso, sem dúvida, será um importante facilitador da
análise das informações por seus usuários.
Por outro lado, por conta do lapso de tempo necessário à tramitação do
projeto no Congresso Nacional, as alterações promovidas ao texto da Lei nº
6.404/76, a par dos inegáveis avanços, não eliminaram todas as barreiras que
se impunham ao processo de convergência.
De fato, as normas internacionais avançaram, enquanto o projeto manteve-
se fiel às regras vigentes alhures à época de sua proposição, como bem advertem
Sérgio de Iudícibus, Eliseu Martins e Ernesto Rubens Gelbcke2: “um problema
surgiu do largo tempo que no então Projeto de Lei nº 3.741/00 levou no congresso
para se transformar na Lei nº 11.638/07: as normas internacionais evoluíram, e
sofreram grandes modificações em função inclusive da adesão da União Europeia,
mas o projeto de Lei não capturou essas inovações. Assim, a Lei nº 11.638/07 trouxe
grande evolução nas práticas contábeis no sentido da convergência internacional,
mas com algumas defasagens e alguns conceitos ultrapassados.”
1 Sobre os objetivos buscados pelo referido projeto de lei, Hugo Rocha Braga e Marcelo Cavalcanti
Almeida, atestam o seguinte:
“A finalidade maior do Projeto de Lei nº 3.741/2000 era possibilitar a eliminação de algumas
barreiras regulatórias que impediam a inserção total das companhias abertas no processo de
convergência contábil internacional, além de aumentar o grau de transparência das demonstrações
financeiras em geral, inclusive em relação às chamadas sociedades de grande porte não constituídas
sob a forma de sociedades por ações.” (BRAGA, Hugo Rocha e ALMEIDA, Marcelo Cavalcanti In:
Mudanças Contábeis na Lei Societária – Lei nº 11.638, de 28-12-2007. São Paulo: Editora Atlas,
2008, p. 2.)
2 IUDÍCIBUS, Sérgio de; MARTINS, Eliseu e GELBCKE, Ernesto Rubens In: Manual de Contabilidade
das Sociedades por Ações (Aplicável às Demais Sociedades) – Suplemento Rumo às Normas
Internacionais. 2ª Ed. São Paulo: Editora Atlas, 2009, p. 5.
6 “30. As mudanças na participação relativa da controladora sobre a controlada que não resultem em
perda de controle devem ser contabilizadas como transações de capital (ou seja, transações com
sócios, na qualidade de proprietários), e não no resultado ou no resultado abrangente.
31. Em tais circunstâncias, o valor contábil da participação da controladora e o valor contábil da
participação dos não controladores devem ser ajustados para refletir as mudanças nas suas participações
relativas na controlada. Qualquer diferença entre o montante pelo qual a participação dos não
controladores tenha sido ajustada e o valor justo da quantia recebida ou paga deve ser reconhecida
diretamente no patrimônio líquido atribuível aos proprietários da controladora.”
7 “65. (...) as negociações subsequentes em que a controladora adquire, dos sócios não controladores
desse mesmo patrimônio, novos instrumentos patrimoniais (ações ou cotas, por exemplo) de uma
controlada, passam a se caracterizar como sendo transações entre a entidade e seus sócios, a
não ser que seja uma alienação de uma investidora que caracterize a perda de controle de sua
controlada. Ou seja, trata-se de operações que se assemelham àquela em que a entidade adquire
ações ou cotas de seus próprios sócios.
66. Por isso o Pronunciamento Técnico CPC 36 – Demonstrações Consolidadas requer, em seus
itens 30 e 31, que as mudanças na participação relativa da controladora sobre uma controlada
que não resultem em perda de controle devem ser contabilizadas como transações de capital
(ou seja, transações com sócios, na qualidade de proprietários) nas demonstrações consolidadas.
Em tais circunstâncias, o valor contábil da participação da controladora e o valor contábil da
participação dos não-controladores devem ser ajustados para refletir as mudanças nas participações
relativas das partes na controlada. Qualquer diferença entre o montante pelo qual a participação
dos não-controladores tenha sido ajustada e o valor justo da quantia recebida ou paga deve ser
reconhecida diretamente no patrimônio líquido atribuível aos proprietários da controladora, e
não como resultado.”
8 “Art. 13 - Para efeito de contabilização, o custo de aquisição de investimento em coligada e
controlada deverá ser desdobrado e os valores resultantes desse desdobramento contabilizados
em sub-contas separadas:
(i) Equivalência patrimonial baseada em demonstrações contábeis elaboradas nos termos do art.
10; e
(ii) Ágio ou deságio na aquisição ou na subscrição, representado pela diferença para mais ou para
menos, respectivamente, entre o custo de aquisição do investimento e a equivalência patrimonial.”
10
Em que pese o método da aquisição importar na mensuração dos ativos e passivos que compõe
o negócio adquirido pelo seu valor justo, para fins de apuração do montante a ser registrado em
linha de investimento no ativo da adquirente e eventual goodwill (ou, conforme o caso, ganho
por compra vantajosa), a combinação de negócios não afeta o valor do patrimônio líquido da
sociedade adquirida. Ao contrário, as regras contábeis internacionais (editadas pelo IASB) não
contemplam o chamado “push down accounting”, isto é, a transferência, para a contabilidade da
sociedade investida, dos resultados obtidos na mensuração do valor justo de seus ativos e passivos
em conexão a uma combinação de negócios. Esta constatação pode ser extraída do item 45, da
Interpretação Técnica ICPC 09:
“45. (...) internacionalmente, os princípios contábeis geralmente aceitos em alguns países
admitem o tratamento do push down accounting, sempre em situações muito restritas, mas as
regras internacionais de contabilidade do IASB não prevêem essa forma de contabilização. (...)
Do ponto de vista contábil, e no nível de apresentação das demonstrações contábeis individuais
da entidade adquirida, a troca de acionistas controladores não deve implicar no estabelecimento
de uma nova base contábil dos ativos e passivos da adquirida ou na contabilização de ativos
intangíveis antes inexistentes, ficando essa nova base de mensuração aplicável apenas no nível
das demonstrações contábeis (individuais e consolidadas) da adquirente.”
13 Esta é a orientação que se extrai da conjugação dos itens 10, 18 e 19, do CPC 15:
“10. A partir da data de aquisição, o adquirente deve reconhecer, separadamente do ágio por
expectativa de rentabilidade futura (goodwill), os ativos identificáveis adquiridos, os passivos
assumidos e quaisquer participações de não-controladores na adquirida. O reconhecimento de
ativos identificáveis adquiridos e de passivos assumidos está sujeito às condições especificadas
nos itens 11 e 12.
18. O adquirente deve mensurar os ativos identificáveis adquiridos e os passivos assumidos pelos
respectivos valores justos da data da aquisição.
19. Em cada combinação de negócios, o adquirente deve mensurar qualquer participação de
não-controladores na adquirida pelo valor justo dessa participação ou pela parte que lhes cabe
no valor justo dos ativos identificáveis líquidos da adquirida.”
17 MACHADO, Paulo José; MORAES, Wilson José Osório e RELVAS, Tânia Regina Sordi. In: Manual
de Normas Internacionais de Contabilidade, Capítulo 15: “IFRS 3 – Combinações de Negócios”,
Editora Atlas, São Paulo: 2009, p.193.
18 Essa conclusão pode ser extraída do item 45 do Apêndice B, do CPC 15:
“B45. O valor justo por ação da participação do controlador pode ser diferente do valor justo
por ação da participação de não-controladores. A principal diferença, provavelmente, decorre
do prêmio pelo controle incluído no valor justo por ação da participação do adquirente na
adquirida ou, de forma contrária, do desconto por ausência de controle no valor justo por ação
da participação de não-controladores.”
que participe com 20% (vinte por cento) ou mais do capital social, e em sociedades controladas,
serão avaliados pelo valor de patrimônio líquido, de acordo com as seguintes normas:
I - o valor do patrimônio líquido da coligada ou da controlada será determinado com base em
balanço patrimonial ou balancete de verificação levantado, com observância das normas desta
Lei, na mesma data, ou até 60 (sessenta) dias, no máximo, antes da data do balanço da companhia;
no valor de patrimônio líquido não serão computados os resultados não realizados decorrentes
de negócios com a companhia, ou com outras sociedades coligadas à companhia, ou por ela
controladas;
II - o valor do investimento será determinado mediante a aplicação, sobre o valor de patrimônio
líquido referido no número anterior, da porcentagem de participação no capital da coligada ou
controlada;
III - a diferença entre o valor do investimento, de acordo com o número II, e o custo de aquisição
corrigido monetariamente; somente será registrada como resultado do exercício:
a) se decorrer de lucro ou prejuízo apurado na coligada ou controlada;
b) se corresponder, comprovadamente, a ganhos ou perdas efetivos;
c) no caso de companhia aberta, com observância das normas expedidas pela Comissão de Valores
Mobiliários.
§ 1º Para efeito de determinar a relevância do investimento, nos casos deste artigo, serão
computados como parte do custo de aquisição os saldos de créditos da companhia contra as
coligadas e controladas.
§ 2º A sociedade coligada, sempre que solicitada pela companhia, deverá elaborar e fornecer o
balanço ou balancete de verificação previsto no número I.” (grifos nossos)
21 “Art 20 - O contribuinte que avaliar investimento em sociedade coligada ou controlada pelo valor
de patrimônio líquido deverá, por ocasião da aquisição da participação, desdobrar o custo de
aquisição em:
I - valor de patrimônio líquido na época da aquisição, determinado de acordo com o disposto no
artigo 21; e
II - ágio ou deságio na aquisição, que será a diferença entre o custo de aquisição do investimento
e o valor de que trata o número I.
§ 1º - O valor de patrimônio líquido e o ágio ou deságio serão registrados em subcontas distintas
do custo de aquisição do investimento.
§ 2º - O lançamento do ágio ou deságio deverá indicar, dentre os seguintes, seu fundamento
econômico:
a) valor de mercado de bens do ativo da coligada ou controlada superior ou inferior ao custo
registrado na sua contabilidade;
b) valor de rentabilidade da coligada ou controlada, com base em previsão dos resultados nos
exercícios futuros;
c) fundo de comércio, intangíveis e outras razões econômicas.
§ 3º - O lançamento com os fundamentos de que tratam as letras a e b do § 2º deverá ser baseado
em demonstração que o contribuinte arquivará como comprovante da escrituração.”
25 DONIAK JR., Jimir. In: Análise da Amortização de Ágio frente às Leis nºs 11.638/07 e 11.941/09,
Direito Tributário, Societário e a Reforma da Lei das S/A – Vol. II, Editora Quartier Latin, São Paulo:
2010, p. 312.
26 “Art. 11. As disposições normativas serão redigidas com clareza, precisão e ordem lógica,
observadas, para esse propósito, as seguintes normas: (...)” [Grifos nossos]
adquirida, haverá ágio, cuja amortização será passível de dedução fiscal, uma
vez observados os requisitos impostos pela legislação tributária.
Qualquer construção que se pretenda fazer acerca da existência de
sobreprincipios que orientam ou graduam a aplicação de quaisquer regras legais,
prescinde da verificação de espaço normativo para tanto. Ali, onde houver regra
de densidade normativa absoluta, não há que se falar em espaço para integração,
ao menos na dimensão que parte minoritária da doutrina pretenda27.
O que se pode e deve avaliar, em cada caso, é a correção e a legitimidade
dos instrumentos utilizados para a avaliação do negócio e, consequentemente,
do ágio, bem como os critérios para a sua aferição. Aliás, não há como se
negar que, se a lei contábil traz conceito novo, de valor justo, como forma de
avaliação de ativos e passivos, nada impede, ao contrario, impõe-se que estes
sejam utilizadas nos estudos e laudos que suportem o sobrevalor pago por
determinada participação societária28.
34 A redação do inciso III, do artigo 7º, da Lei nº 9.532/97 foi alterada pela Lei nº 9.718/98:
“Art. 7º (...)
III - poderá amortizar o valor do ágio cujo fundamento seja o de que trata a alínea “b” do § 2,
do art. 20 do Decreto-lei nº 1.598, de 1977, nos balanços correspondentes à apuração de lucro
real, levantados posteriormente à incorporação, fusão ou cisão, à razão de um sessenta avos, no
máximo, para cada mês do período de apuração; (...)”
35 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. In: Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Editora Quartier
Latin, 2008, p. 770.
37 De se notar que, ainda sob a égide da Instrução CVM nº 247/96, o ágio qualificável, para fins fiscais,
na alínea “c”, do § 2º, do Decreto-Lei nº 1.598/77 (fundo de comércio, intangíveis ou outras razões
econômicas), não mais subsistia para fins societários (art. 14, § 5º, da ICVM nº 247/96). Apenas
o ágio fundado em mais-valia de ativos ou rentabilidade futura, inclusive atrelada a contratos
de concessão, permissão ou direitos de exploração, poderia ser registrado e, consequentemente,
amortizado.
38 “Art. 6º (...)
§ 3º - Na determinação do lucro real poderão ser excluídos do lucro líquido do exercício:
a) os valores cuja dedução seja autorizada pela legislação tributária e que não tenham sido
computados na apuração do lucro líquido do exercício;
b) os resultados, rendimentos, receitas e quaisquer outros valores incluídos na apuração do lucro
líquido que, de acordo com a legislação tributária, não sejam computados no lucro real;
c) os prejuízos de exercícios anteriores, observado o disposto no artigo 64.”
39 “Art 8º - O contribuinte deverá escriturar, além dos demais registros requeridos pelas leis comerciais
e pela legislação tributária, os seguintes livros:
I - de apuração de lucro real, no qual:
a) serão lançados os ajustes do lucro líquido do exercício, de que tratam os §§ 2º e 3º do artigo 6º;
b) será transcrita a demonstração do lucro real (§ 1º);
c) serão mantidos os registros de controle de prejuízos a compensar em exercícios subseqüentes
(art. 64), de depreciação acelerada, de exaustão mineral com base na receita bruta, de exclusão
por investimento das pessoas jurídicas que explorem atividades agrícolas ou pastoris e de outros
valores que devam influenciar a determinação do lucro real de exercício futuro e não constem
de escrituração comercial (§ 2º).”
40 Não há regra análoga que regule a dedutibilidade de despesas tidas por desnecessárias para fins
de apuração da base cálculo da CSLL.
41 “Art. 299. São operacionais as despesas não computadas nos custos, necessárias à atividade da
empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47).
§ 1º São necessárias as despesas pagas ou incorridas para a realização das transações ou operações
exigidas pela atividade da empresa (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47, § 1º).
§ 2º As despesas operacionais admitidas são as usuais ou normais no tipo de transações, operações
ou atividades da empresa (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47, § 2º).
§ 3º O disposto neste artigo aplica-se também às gratificações pagas aos empregados, seja qual
for a designação que tiverem.”
“(...) a citada instrução CVM foi editada tão somente para a normatização
dos procedimentos contábeis das sociedades de capital aberto, sem
qualquer efeito para as empresas de capital fechado e muito menos, sem
competência para alterar as bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, o que
somente é factível com a edição de lei.
É importante destacar que as instruções emanadas pela CVM são atos
administrativos, portanto, infralegais, que não geram quaisquer efeitos
fiscais, visto que têm por objeto a regulação das normas contábeis e são
endereçadas as companhias de capital aberto. (...)
Não vejo nenhum empecilho para as empresas sujeitas as
determinações da CVM em atenderem aos dois dispositivos (a
instrução CVM e a norma legal), visto que no caso da instrução,
para fins de apuração do lucro contábil, não existe um prazo pré-
estabelecido para a amortização do ágio, visto que o mesmo fica
vinculado ao prazo da concessão, enquanto que a lei fiscal prevê
a amortização em 60 meses, independentemente do prazo de
concessão.
Com isso, fica bem claro que as determinações emanadas pela CVM não
possuem qualquer cunho tributário, visto que objetivam regular o mercado
de ações e, em especial a relação dos investidores com as empresas.” [sic]
E, também, em diversas outras oportunidades, o extinto Conselho de
Contribuintes do Ministério da Fazenda julgou no sentido de afastar alegados
efeitos fiscais de normas contábeis. Tal é o caso das normas editadas pelo Banco
Central para regular a contabilidade de instituições financeiras:
“IRPJ – CUSTOS/DESPESAS OPERACIONAIS E ENCARGOS
– PROVISÃO PARA CRÉDITOS DE LIQUIDAÇÃO
DUVIDOSA – INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. Nos anos-
calendário de 1995 e 1996 vigorava o artigo 43 e seus §§ da Medida
Provisória n° 812/94, convertida em Lei n° 8.981/95. A Resolução n°
1.748/90 do Banco Central do Brasil dizia respeito apenas aos aspectos
contábeis e estatísticos das instituições financeiras, sem qualquer efeito
na determinação do lucro real.” (Acórdão nº 101-93.519, 1ª Câmara
do 1º Conselho de Contribuintes, Conselheira Relatora Sandra Maria
Faroni, julgado em 11.10.2001)
Em que pese, como visto, não estarmos diante de uma discussão nova, a
mesma aparente antinomia normativa tem sido discutida por conta da edição
42 Nos termos do § único, do artigo 3º, da Lei nº 11.638/07. “considera-se de grande porte, (...) a
sociedade ou conjunto de sociedades sob controle comum que tiver, no exercício social anterior,
ativo total superior a R$ 240.000.000,00 (duzentos e quarenta milhões de reais) ou receita bruta
anual superior a R$ 300.000.000,00 (trezentos milhões de reais).”
43 “Art. 150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; (...)”
47
O conceito de patrimônio líquido não sofreu alterações relevantes, conforme se constata da
comparação entre as definições veiculadas pela Estrutura Conceitual Básica (“CPC 00” - regra
nova) e pela NBC T 3.2 (regra antiga):
Estrutura Conceitual Básica (“CPC 00”)
“Posição Patrimonial e Financeira
49. Os elementos diretamente relacionados com a mensuração da posição patrimonial financeira
são ativos, passivos e patrimônio líquido. Estes são definidos como segue:
(a) Ativo é um recurso controlado pela entidade como resultado de eventos passados e do qual
se espera que resultem futuros benefícios econômicos para a entidade;
(b) Passivo é uma obrigação presente da entidade, derivada de eventos já ocorridos, cuja liquidação
se espera que resulte em saída de recursos capazes de gerar benefícios econômicos;
(c) Patrimônio Líquido é o valor residual dos ativos da entidade depois de deduzidos todos os
seus passivos.” [Grifos nossos]
O NBC T 3.2
“3.2.2 – Conteúdo e Estrutura
3.2.2.1 – O balanço patrimonial é constituído pelo ativo, pelo passivo e pelo Patrimônio Líquido.
a) O ativo compreende as aplicações de recursos representadas por bens e direitos;
b) O passivo compreende as origens de recursos representadas por obrigações;
c) O Patrimônio Líquido compreende os recursos próprios da Entidade, ou seja, a diferença a
maior do ativo sobre o passivo. Na hipótese do passivo superar o ativo, a diferença denomina--se
“Passivo a Descoberto” [Grifos nossos]
49 “Art. 17. Na ocorrência de disposições da lei tributária que conduzam ou incentivem a utilização
de métodos ou critérios contábeis diferentes daqueles determinados pela Lei nº 6.404, de 15 de
dezembro de 1976, com as alterações da Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e dos arts.
37 e 38 desta Lei, e pelas normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários com base na
competência conferida pelo § 3º do art. 177 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, e demais
órgãos reguladores, a pessoa jurídica sujeita ao RTT deverá realizar o seguinte procedimento:
I – utilizar os métodos e critérios definidos pela Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, para
apurar o resultado do exercício antes do Imposto sobre a Renda, referido no inciso V do caput
do art. 187 dessa Lei, deduzido das participações de que trata o inciso VI do caput do mesmo
artigo, com a adoção:
a) dos métodos e critérios introduzidos pela Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos
arts. 37 e 38 desta Lei; e
b) das determinações constantes das normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários,
com base na competência conferida pelo § 3º do art. 177 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro
de 1976, no caso de companhias abertas e outras que optem pela sua observância;
II – realizar ajustes específicos ao lucro líquido do período, apurado nos termos do inciso I do
caput deste artigo, no Livro de Apuração do Lucro Real, inclusive com observância do disposto
no § 2º deste artigo, que revertam o efeito da utilização de métodos e critérios contábeis diferentes
daqueles da legislação tributária, baseada nos critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro
de 2007, nos termos do art. 16 desta Lei; e
III – realizar os demais ajustes, no Livro de Apuração do Lucro Real, de adição, exclusão e
compensação, prescritos ou autorizados pela legislação tributária, para apuração da base de
cálculo do imposto.
§ 1º Na hipótese de ajustes temporários do imposto, realizados na vigência do RTT e decorrentes
de fatos ocorridos nesse período, que impliquem ajustes em períodos subsequentes, permanece:
I – a obrigação de adições relativas a exclusões temporárias; e
II – a possibilidade de exclusões relativas a adições temporárias.
§ 2º A pessoa jurídica sujeita ao RTT, desde que observe as normas constantes deste Capítulo,
fica dispensada de realizar, em sua escrituração comercial, qualquer procedimento contábil
determinado pela legislação tributária que altere os saldos das contas patrimoniais ou de resultado
quando em desacordo com:
I – os métodos e critérios estabelecidos pela Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, alterada
pela Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos arts. 37 e 38 desta Lei; ou
II – as normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários, no uso da competência conferida
pelo § 3º do art. 177 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, e pelos demais órgãos
reguladores.”
50 MARTINS, Natanael e RODRIGUES, Daniele Souto. In: O Direito à Amortização Fiscal do Ágio,
Direito Tributário, Societário e a Reforma da Lei das S/A – Vol. II, São Paulo: Editora Quartier
Latin, 2010, pp. 478/479.
Em outras palaras. Não há, no que se refere ao ágio para fins fiscais,
subsunção direta à legislação societária ou contábil. As regras tributarias têm
sentido completo e não foram revogadas. Como já se mencionou, o objetivo
das alterações na norma societária tem justificativa na harmonização e
transparência para a melhor avaliação de negócios. A regra tributaria, noutro
giro, tem fundamento na necessidade de incentivar operações societárias que
fortalecessem o mercado de capitais e a economia nacional51.
Seja como for, sem a necessária revogação das normas insertas nos artigos
7º e 8º da Lei nº 9.532/97 e artigo 20 do Decreto-Lei nº 1.598/77, não se pode
alegar alteração nessa sistemática por ofensa reflexa de uma legislação contábil
produzida e implementada com objetivos totalmente diversos daqueles que
justificaram a regra fiscal.
Conclusões:
Em conclusão, pode-se afirmar que as alterações promovidas na legislação
societária e nas regras para demonstrações financeiras foram fundadas na necessidade
de harmonização dessas normas, com aquilo que vige internacionalmente.
Essa harmonização, também influenciada pela recente crise financeira
de 2009, teve como principal característica a melhor divulgação e reflexo
da realidade de negócios na contabilidade das empresas, de maneira a que o
mercado possa melhor avaliar o valor de uma sociedade ou os efeitos que a
combinação de empresas pode gerar para o negócio e o mercado, como um todo.
No Brasil, até o advento da Lei 11.638/07, a contabilidade societária e
tributária ligavam-se umbilicalmente, a ponto de diversas regras contábeis e
societárias terem sido editadas com nítidas motivações fiscais. Como se disse, o
cenário foi alterado. A contabilidade tem o seu objetivo e as regras tributárias idem.
Nesse diapasão, a nova lei societária e a sua regulamentação, tanto em
nível contábil quanto em nível societário, precisam ser corretamente estudadas
e conhecidas, pois, como se disse, é a partir do seu correto conhecimento que
51 Argumento que pode ser levantado, ainda, funda-se no fato de que o valor pago na aquisição do
negócio, que sobejar o PL ajustado da adquirida (ágio), necessariamente, gera ganho de capital para
os acionistas vendedores. Ganho de capital, esse, sujeito a regular tributação. Em outras palavras,
poder-se-ia, ainda, afirmar, que a regra introduzida pela Lei nº 9.532/97, em verdade, apenas
reconheceu que, aquele que paga antecipadamente por resultados que espera auferir, deve e
precisa, se reembolsar do imposto que vier a apurar, a partir da realização desta sua expectativa.
Não se pode, mais uma vez, nesse assunto, penalizar aqueles que agem
ao encontro dos interesses da norma, valendo-se de estruturas legítimas, em
função de negócios praticados de forma simulada ou viciada por parte de alguns
contribuintes, esses sim passíveis de dura repressão por parte das Autoridades
Fiscais. O ordenamento jurídico, de há muito, municia a Fazenda com as
ferramentas necessária para coibir esse tipo de prática condenável. Essas práticas,
porém, não podem levar a Fazenda a pretender restringir ou amesquinhar os
conceitos e os objetivos da norma tributária que expressamente estimula a
relação de negócios, através da permissão de dedução da amortização do ágio.
Melhor seria, em se querendo atacar esse direito vigente, seguir o processo
legislativo próprio e alterar as regras do jogo. A revogação dos artigos 20, do
Decreto-Lei nº 1.598/77, 7º e 8º, da Lei nº 9.532/97, ou ao menos a alteração
dessas regras, de forma a que as mesmas albergassem diretamente os novos
conceitos da legislação comercial, teriam o condão de impedir a utilização da
amortização do ágio como despesa dedutível, desde que respeitado o direito
adquirido pelos Contribuintes diante do preenchimento dos requisitos impostos
pela legislação tributária, preservando-se, com o isso, a segurança jurídica que
deve nortear as relações entre estes e o Estado. Isso bastaria aos propósitos do
Fisco e preservaria, ao menos, o sistema jurídico vigente.
Aspectos Tributários e
Societários/Contábeis
da Depreciação de Bens
do Ativo Imobilizado
à Luz do Regime
Tributário de Transição
1. Introdução
O avanço do processo de globalização e o aumento dos investimentos no
país levaram à necessidade de se conferir maior segurança para os investidores
estrangeiros, bem como maior transparência na contabilidade das empresas
brasileiras. Diante desse cenário, o Brasil iniciou o processo de convergência
de suas normas contábeis para o padrão internacional, conhecido como
International Financial Reporting Standards – IFRS.
As modificações nas regras contábeis brasileiras foram basicamente
introduzidas pela Lei nº 11.638, de 28.12.2007 (Lei nº 11.638/07), que alterou
e revogou dispositivos da Lei nº 6.404, de 15.12.1976 (Lei das S/A) e da Lei
nº 6.385, de 7.12.1976 (Lei nº 6.385/76). Todavia, em 3.12.2008, o Governo
Federal editou a Medida Provisória nº 449 (MP nº 449/08), com o objetivo
de neutralizar os impactos fiscais decorrentes dos novos métodos e critérios
contábeis, na apuração das bases de cálculo de tributos federais, de modo a
reduzir a insegurança jurídica gerada nos contribuintes.
Cumpre ainda mencionar que a MP nº 449/08, posteriormente convertida
na Lei nº 11.941, de 27.5.2009 (Lei nº 11.941/09), criou o Regime Tributário
de Transição (RTT), cuja aplicação era opcional para os anos de 2008 e 2009.
No entanto, a partir de 2010, a adoção do RTT passou a ser obrigatória, até a
entrada em vigor de lei que discipline os efeitos tributários dos novos métodos
e critérios contábeis.
O RTT foi criado com a finalidade de se preservar o princípio da neutralidade
fiscal das mudanças inseridas no padrão contábil brasileiro, devendo ser aplicável às
pessoas jurídicas sujeitas ao Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) de acordo
com a sistemática de apuração pelo lucro real ou lucro presumido.
Não obstante, ao adotar o RTT para o IRPJ, a pessoa jurídica também
ficará obrigada a aplicar o regime para: (i) a Contribuição Social sobre o
Lucro Líquido (CSLL); (ii) a Contribuição para o Programa de Integração
Social (PIS); e (iii) a Contribuição para o Financiamento da Seguridade
Social (COFINS).
O presente estudo foca-se na análise da nova sistemática de depreciação
dos bens do ativo imobilizado, bem como nos efeitos fiscais e contábeis da
aplicação dos novos critérios definidos pela Lei nº 11.638/07, que provocaram
alterações na vida útil dos ativos e, por consequência, modificações nas taxas
de depreciação.
1 PEDREIRA, J. L. Bulhões. Imposto sobre a Renda. Rio de Janeiro: APEC, 1969, pp. 6-56.
2 PN nº 192/72: O desgaste provocado pelo uso intensivo ou anormal dos bens pertencentes
ao ativo imobilizado das pessoas jurídicas de direito privado poderá determinar a adoção de
taxas especiais de depreciação, devendo as interessadas comprovar a adequação das taxas que
utilizarem, ou, em caso de dúvida, justificá-las com base em laudo técnico expedido por órgão
oficial competente. As empresas que empreguem os coeficientes de depreciação acelerada em
decorrência de expressa previsão legal poderão também utilizar taxas especiais de depreciação,
quando estas se fizerem necessárias, observadas as regras pertinentes, desde que o seu montante
não ultrapasse em qualquer tempo o custo de aquisição dos bens, atualizado monetariamente. As
taxas anuais de depreciação a serem calculadas pelas empresas com base no custo de aquisição dos
bens atualizado monetariamente são as resultantes da jurisprudência administrativa nos termos do
item 63 da Instrução Normativa nº 2 de 12.9.69. 2. Sendo estas taxas determinadas em função dos
prazos considerados ideais para a utilização econômica dos bens, em condições normais, aplicam-
se indistintamente a todas as empresas. 3. Entretanto, quando os bens são submetidos a condições
anormais de utilização, o desgaste decorrente poderá justificar a majoração das taxas. Para tanto,
o emprego de taxas especiais de depreciação deve proceder da necessidade comprovada de
submeter os bens a condições anormais de uso, sendo de fundamental interesse a existência de
prova cabal da ocorrência do desgaste ou inutilização prematura destes mesmos bens. Tal é o
sentido dos §§ 3º e 4º do artigo 186 do RIR (Decreto 58.400, de 10.05.66). 4. Considerando-se
que a majoração das taxas de depreciação decorre de situação especialíssima, o próprio legislador
admitiu que, nas casos de dúvida, as empresas e a própria autoridade lançadora poderão solicitar
perícias ao Instituto Nacional de Tecnologia ou a outras entidades oficiais de pesquisa científica
ou tecnológica, acatando-se as opiniões destes órgãos, as quais prevalecerão enquanto não forem
modificadas por decisões das autoridades competentes, conforme o disposto no § 5º do artigo
186 do RIR. 5. De se notar que esta providência também se aconselha às empresas que exerçam
atividades técnicas e que em virtude desta condição estejam aptas a realizar estudos com a
finalidade de adotar, nos termos do § 5º do artigo 186 do RIR., taxas especiais de depreciação já
que as suas conclusões em causa própria não preenchem os objetivos do citado dispositivo. 6.
Outro tipo de depreciação prevista em lei é a acelerada - (art. 57., § 5º da Lei 4.506, de 30.11.64),
destinada a aplicação somente quanto a atividades ou indústrias expressamente previstas em atos
do Poder Executivo (vide Decretos 54.298, de 29.09.64; 60.943, de 5.7.67; 61.083, de 27.7.67 e
61.979, de 28.12.67). 7. A depreciação acelerada é restrita aos casos especialmente previstos e
tem por finalidade exclusiva estimular a renovação e modernização dos equipamentos utilizados
por determinados tipos de indústrias ou atividades, independendo, para a sua aplicação, do
desgaste anormal dos bens, por força do que dispõe o artigo 186 § 6º do RIR. 8. Desta afirmativa
se infere que as empresas alcançadas pela faculdade da depreciação acelerada, e enquanto
esta durar, podem utilizá-la tomando por base as taxas especiais de depreciação. 9. Por todo o
exposto conclui-se que as empresas podem adotar taxas adequadas de depreciação dos bens
independentemente de prévia audiência da Repartição, cabendo se valer, quando não tiverem
absoluta certeza do acerto do seu procedimento, de perícia do Instituto Nacional de Tecnologia
ou de outras entidades oficiais de pesquisa científica ou tecnológica. 10. Em qualquer situação,
entretanto, as empresas não poderão contabilizar como custo ou despesa operacional, em face
das taxas adotadas, cotas de depreciação superiores ao custo de aquisição dos bens atualizados
monetariamente e as que se utilizarem dos coeficientes de depreciação acelerada, nas condições
estabelecidas pela legislação específica, poderão, quando for o caso, aplicá-los, tomando por
base as taxas especiais de depreciação.
Art. 313. Com o fim de incentivar a implantação, renovação ou modernização de instalações e
equipamentos, poderão ser adotados coeficientes de depreciação acelerada, a vigorar durante
prazo certo para determinadas indústrias ou atividades (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 5º). § 1º
A quota de depreciação acelerada, correspondente ao benefício, constituirá exclusão do lucro
líquido, devendo ser escriturada no LALUR (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 8º, inciso I, alínea
“c”, e § 2º). § 2º O total da depreciação acumulada, incluindo a normal e a acelerada, não poderá
ultrapassar o custo de aquisição do bem (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 6º). § 3º A partir do período
de apuração em que for atingido o limite de que trata o parágrafo anterior, o valor da depreciação
normal, registrado na escrituração comercial, deverá ser adicionado ao lucro líquido para efeito de
determinar o lucro real. § 4º As empresas que exerçam, simultaneamente, atividades comerciais e
industriais poderão utilizar o benefício em relação aos bens destinados exclusivamente à atividade
industrial. § 5º Salvo autorização expressa em lei, o benefício fiscal de que trata este artigo não
poderá ser usufruído cumulativamente com outros idênticos, exceto a depreciação acelerada em
função dos turnos de trabalho.
Com a edição da Lei nº 11.638/07, que alterou a Lei das S/A e, com ela,
o padrão contábil brasileiro, as sociedades por ações e as sociedades de grande
porte passaram a aplicar critérios mais específicos e rigorosos no tratamento
dos efeitos contábeis da depreciação dos bens do ativo imobilizado.
Ressalte-se que as sociedades limitadas também estão sujeitas às novas
regras contábeis brasileiras, mesmo quando não estiverem enquadradas como
sociedades de grande porte. Nesse sentido, cumpre expor os ensinamentos de
LYGIA CAROLINE SIMÕES CARVALHO:
“Mesmo que as sociedades limitadas não tenham seu estatuto jurídico
regrado pela Lei 6.404/76, os dispositivos do Código Civil não dispõem
sobre padrões contábeis mais detalhados. Devido à tal ausência, devem ser
observados os dispositivos da Lei das Sociedades por Ações (lei 6.404/76).
Ademais, os sócios quotistas poderão prever no contrato social a regência
supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima,
obrigando a aplicação das regras contábeis previstas na lei 6.404/76 (...)
Portanto, as sociedades limitadas, mesmo que não enquadradas como
sociedades de grande porte, não estão excluídas das regras dos novos
padrões contábeis brasileiros. As normas contábeis instituídas pela lei
12 BIFANO, Elidie Palma. O Direito Contábil da Lei Nº 11.638/07 à Lei Nº 11.941/09. In: ROCHA,
Sérgio André (org.). Direito Tributário, Societário e a Reforma da Lei das S/A – Vol.II. São Paulo:
Quartier Latin, 2010, Capítulo VII, p. 172.
registrada contabilmente seja maior que a taxa recomendada pelo Fisco, gerando
um aumento nas despesas e diminuição do lucro líquido, a base tributável do
imposto deve ser aumentada a fim de corrigir as distorções tributárias decorrentes
de uma alteração na contabilidade. Por outro lado, há a possibilidade de a taxa de
depreciação contábil ser menor do que a taxa admitida para fins tributários e, nesse
caso, deve-se diminuir a base tributável do imposto.
Esse procedimento foi ainda detalhado e regulamentado pela Instrução
Normativa RFB nº 949, de 16.6.2009 (IN nº 949/09), que criou também o
chamado Controle Fiscal Contábil de Transição (FCONT). O FCONT faz o
papel da escrituração fiscal em um sistema de partidas dobradas, feita de modo
auxiliar e separado da escrituração contábil das empresas na aplicação do RTT.
No que tange à finalidade do FCONT, convém mencionar as lições de
IAN MUNIZ:
“O objetivo do FCONT é registrar as diferenças existentes entre
o resultado apurado, em conformidade com os métodos e critérios
contábeis aplicáveis à legislação tributária, ou seja, aqueles vigentes em
31 de dezembro de 2007. Assim, deverão ser registradas, em partidas
dobradas, os valores que afetem as contas patrimoniais e de resultado,
de forma a reconciliar o resultado apurado entre os métodos e critérios
contábeis e aqueles aplicáveis à legislação tributária.”13
Com efeito, nos termos do artigo 16, parágrafo único da Lei nº
11.941/09, todos os comentários acima referentes à neutralização promovida
pelo RTT aplicam-se igualmente às normas expedidas pela CVM, bem
como aos demais órgãos reguladores que visem a alinhar a legislação
específica com os padrões internacionais de contabilidade, tais como o CPC,
o Conselho Federal de Contabilidade (CFC), dentre outros.
Em resumo, para as empresas sujeitas ao RTT, a determinação das bases
de cálculo do IRPJ, da CSLL, do PIS e da COFINS será efetuada com base
na legislação tributária atual, conforme aplicada sobre os critérios contábeis
vigentes em 31.12.2007, ou seja, sem se levar em conta os efeitos das alterações
societárias/contábeis introduzidas pela Lei nº 11.638/07, pelos artigos 37 e 38
13 MUNIZ, Ian e MONTEIRO, Marco Antonio. O RTT e a Neutralidade Fiscal. In: ROCHA, Sérgio
André (org.). Direito Tributário, Societário e a Reforma da Lei das S/A – Vol.II. São Paulo: Quartier
Latin, 2010, Capítulo XIII, p. 273.
14 ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. IRPJ Lucro Real: O efeito contábil do ajuste da taxa de
depreciação, amortização e exaustão não está sujeita às regras do RTT. Fiscosoft. 2010/1933,
p. 2. Disponível em: <http://www.fiscosoft.com.br//main_online_frame.php?home=
federal&secao=1&page=bfbf.php?s=1¶ms=F::expressao=ajuste%20da%20taxa%20 de%20
deprecia%E7%E3º>. Acessado em 20.5.2011.
5. Conclusão
Com base no acima exposto, conclui-se que, apesar de o tratamento da
depreciação de bens integrantes do ativo imobilizado ter passado a se sujeitar
a critérios societários/contábeis mais específicos e distintos dos que vinham
sendo praticados, anteriormente à edição da Lei nº 11.638/07, a nosso ver, tal
fato não acarretará conseqüências tributárias para os contribuintes.
Com efeito, à luz do RTT instituído pela Lei nº 11.941/09, a determinação
das bases de cálculo do IRPJ, da CSLL, do PIS e da COFINS permanece sendo
feita com observância da legislação tributária atual. Assim, o contribuinte pode
utilizar os prazos de depreciação previstos na IN nº 162/98, para fins tributários,
independentemente da nova sistemática de depreciação utilizada para fins
societários/contábeis.
Isso significa que, na prática, o contribuinte deverá manter, para fins
tributários, a sistemática de depreciação prevista nos artigos 305 a 323 do
RIR/99, e para fins societários/contábeis, será obrigada a tratar a depreciação
do seu ativo imobilizado segundo as disposições do CPC 01 e do CPC 27.
No entanto, a empresa deverá se utilizar do FCONT para reverter, no
LALUR, o efeito da utilização de critérios societários/contábeis diferentes,
daqueles vigentes antes da edição da Lei nº 11.638/07.
Todo esse processo de conversão das normas contábeis brasileiras aos
padrões internacionais tem como finalidade o aumento da transparência nas
demonstrações contábeis, principal fonte de informação da saúde financeira
e econômica das empresas. O objetivo maior de todas essas transformações é
contribuir para a real expansão dos negócios das empresas brasileiras, facilitando
o ingresso de capitais estrangeiros e o desenvolvimento do país como um todo,
o que é de se louvar.
6. Bibliografia
ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. IRPJ Lucro Real: O efeito contábil do ajuste da taxa de
depreciação, amortização e exaustão não está sujeita às regras do RTT. Fiscosoft. 2010/1933.
Disponível em: <http://www.fiscosoft.com.br//main_online_frame.php?home=federal
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BIFANO, Elidie Palma. O Direito Contábil da Lei Nº 11.638/07 à Lei Nº 11.941/09. In:
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CARVALHO, Lygia Caroline Simões. Os novos critérios contábeis do ativo imobilizado e os reflexos
tributários. Fiscosoft. 2011/2012. Disponível em:<http://www.fiscosoft.com.br//main_
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Acessado em 20.5.2011.
MUNIZ, Ian e MONTEIRO, Marco Antonio. O RTT e a Neutralidade Fiscal. In: ROCHA,
Sérgio André (org.). Direito Tributário, Societário e a Reforma da Lei das S/A – Vol.II. São
Paulo: Quartier Latin, 2010, Capítulo XIII.
PEDREIRA, J. L. Bulhões. Imposto sobre a renda. Rio de Janeiro: APEC, 1969.
Os possíveis efeitos
tributários relacionados
aos critérios contábeis
para o reconhecimento
do ativo imobilizado e
suas peças de reposição
Daniel Dix Carneiro
Mestrando em Direito Internacional na UERJ. Pós-Graduado em Direito
Tributário pela FGV e em Direito pela Escola da Magistratura do Estado
do Rio de Janeiro – EMERJ. Bacharel em Direito pela UFF. Advogado e
consultor tributário no Rio de Janeiro.
Marcio Oliveira
Economista formado pela UFRJ. Professor nos cursos de Pós-Graduação em
Direito Tributário da UFF e da Universidade Cândido Mendes. Professor
na Universidade Petrobras, através de convênio firmado com a PUC-RJ.
Consultor tributário no Rio de Janeiro.
1. Introdução
O presente ensaio pretende identificar as principais consequências
tributárias, no que tange aos novos critérios contábeis para o reconhecimento
do ativo imobilizado e suas eventuais peças sobressalentes, que devem ser
observados a partir do advento da Lei n.º 11.638/2007, diploma que inseriu
alterações pontuais, porém, extremamente significativas no regramento
contábil nacional.
No intuito de atingirmos os anseios perquiridos por este estudo,
analisaremos mesmo que de forma breve, as razões que deram origem
à aprovação da Lei n.º 11.638/2007, além de identificarmos qual será o
novo padrão contábil que deverá ser observado pelas sociedades nacionais
(companhias abertas e sociedades denominadas como de grande porte)1.
Passada essa abordagem inicial, analisaremos as principais alterações,
no que se refere aos critérios contábeis para reconhecimento do ativo
imobilizado e suas peças de reposição, fato que nos possibilitará apontar
as eventuais consequências tributárias resultantes dessas mudanças.
Devemos frisar, entretanto, que não temos, com este trabalho,
a pretensão de esgotar toda a matéria relativa aos efeitos contábeis
e tributários relacionados aos critérios de reconhecimento do ativo
imobilizado e suas peças sobressalentes, isso porque o referido tema, ainda
se encontra bastante incipiente, especialmente, no mundo jurídico, tendo
sido objeto, até o momento, apenas de abordagens doutrinárias jurídicas
e contábeis esparsas.
1 A Lei nº°11.638/2007 estabeleceu, em seu art. 3.°, que as disposições da Lei nº°6.404/1976 (que
dispõe sobre as sociedades por ações), já com as alterações promovidas por aquele diploma, no
que se refere à escrituração e elaboração de demonstrações financeiras e à obrigatoriedade de
auditoria independente por auditor registrado na Comissão de Valores Mobiliários – CVM, deverão
também ser aplicadas às sociedades de grande porte, ainda que não constituídas sob a forma de
sociedades por ações. Dessa forma, mesmo as sociedades consideradas de grande porte que não
sejam abertas e constituídas sob a forma de ações deverão se nortear pelos preceitos contábeis
previstos pela Lei das S/A, fato que não era obrigatório anteriormente. É importante esclarecer que
o parágrafo único do art. 3.° da Lei nº 11.638/2007 considera como de grande porte a sociedade
ou conjunto de sociedades sob controle comum que tiver, no exercício social anterior, ativo
total superior a R$ 240.000.000,00 (duzentos e quarenta milhões de reais) ou receita bruta anual
superior a R$ 300.000.000,00 (trezentos milhões de reais).
2 Nesse item, pedimos vênia para mantermos e reproduzirmos as considerações feitas por
CARNEIRO, Daniel Dix em seu artigo intitulado: Os novos critérios de avaliação do ativo e
do passivo de longo prazo e suas possíveis conseqüências tributárias. In: FERNANDES, Edison
Carlos e PEIXOTO, Marcelo Magalhães (orgs.). Aspectos tributários da nova lei contábil – lei
11.638/07. São Paulo: MP Editora, 2010, p. 71-110.
3 Conforme se depreende do comunicado público feito pela Comissão de Valores Mobiliários ao
Mercado, constante do sítio <http://www.cvm.gov.br/port/infos/Esclarecimento.pdf> (acesso em
12 de junho de 2011).
4 BIFANO, Elidie Palma. Aspectos contábeis da lei 11.638/07. In: ROCHA, Sergio André (org.).
Direito tributário, societário e a reforma da lei das S/A. São Paulo: Editora Quartier Latin, 2008,
p. 49.
5 BIFANO, Elidie Palma. Op. Cit. p. 49.
6 No que se refere à tendência cada vez maior de internacionalização das sociedades, denominadas
como transnacionais, e aos obstáculos por elas encontrados nesse processo, recomendamos a
leitura de RIBEIRO, Marilda Rosado de Sá. As empresas transnacionais e os novos paradigmas
do comércio internacional, In: DIREITO, Carlos Alberto Menezes; TRINDADE, Antônio Augusto
Cançado e PEREIRA, Antônio Celso Alves (org.). Novas Perspectivas do Direito Internacional
Contemporâneo, Estudos em homenagem ao Prof. Celso de Albuquerque Mello. Rio de Janeiro,
São Paulo e Recife: Editora Renovar, 2008, p. 455-492.
7 ENGSTRÖM, Jan. Prefácio. In: MACMANUS, Kieran John. IFRS – Implementação das normas
internacionais de contabilidade e da Lei n.° 11.638 no Brasil. São Paulo: Editora Quartier Latin,
2009, p. 9-10.
8 São membros do CPC: a Associação Brasileira das Companhias Abertas – ABRASCA, a Associação
dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais – APIMEC NACIONAL,
a Bolsa de Valores de São Paulo – BOVESPA, o Conselho Federal de Contabilidade – CFC, o
Instituto dos Auditores Independentes do Brasil – IBRACON e a Fundação Instituto de Pesquisas
Contábeis, Atuarias e Financeiras – FIPECAFI.
9 A visualização de cada um dos Pronunciamentos Técnicos editados pelo CPC pode ser verificada
no sítio <http://www.cpc.org.br/pronunciamentosIndex.php> (acesso em 12 de junho de 2011).
10 O art. 9.° da Lei nº°11.638/07 estabelece sua entrada em vigor no primeiro dia do ano de 2008,
sendo, portanto, seus preceitos aplicáveis aos fatos ocorridos a partir daquela data. Por sua vez,
o art. 1.° da Instrução CVM n.° 469/08 preceitua que as disposições da referida lei deverão ser
observadas somente para as demonstrações financeiras de encerramento do ano 2008, sendo
opcionais a sua aplicação para as informações trimestrais (ITR) referentes ao mesmo ano.
(...)
43. Cada componente de um item do ativo imobilizado com
custo significativo em relação ao custo total deve ser depreciado
separadamente.
44. A entidade aloca o valor inicialmente reconhecido de um item
do ativo imobilizado aos componentes significativos desse item
e os deprecia separadamente. Por exemplo, pode ser adequado
depreciar separadamente a estrutura e os motores de aeronave, seja
ela de propriedade da entidade ou obtida por meio de operação de
arrendamento mercantil financeiro. De forma similar, se o arrendador
adquire um ativo imobilizado que esteja sujeito a arrendamento
mercantil operacional, pode ser adequado depreciar separadamente
os montantes relativos ao custo daquele item que sejam atribuíveis
a condições do contrato de arrendamento mercantil favoráveis ou
desfavoráveis em relação a condições de mercado. [grifo nosso]
Diante dessas previsões, parece-nos que o momento em que as peças
sobressalentes são adquiridas, se simultaneamente ou não ao ativo imobilizado,
é um dado de extrema relevância a partir do qual o operador da informação
contábil, mediante a sua conjugação com outras circunstâncias de igual relevo
(tais como materialidade, funcionalidade e vida útil), deverá definir a correta
classificação desse item na contabilidade como ativo imobilizado ou não.
Dessa forma, para tornarmos nosso estudo mais didático, abordaremos
em separado as situações em que as peças sobressalentes foram adquiridas ou
não de forma simultânea ao ativo imobilizado ao qual serão vinculadas.
· Peças sobressalentes adquiridas simultaneamente ao ativo fixo:
Nos termos das normas e procedimentos contábeis brasileiros acima
abordados, quando ao mesmo momento da compra de um determinado
equipamento é adquirida uma série de peças ou conjuntos importantes e
essenciais ao funcionamento de tal maquinário, principalmente no caso de
eventual necessidade de substituição, tais peças sobressalentes poderão ser
contabilizadas como ativo imobilizado e serem depreciadas em base similar à
do equipamento correspondente, mesmo se não estiverem em uso.
Porém, o procedimento mais recomendado – quando os ativos
componentes de um determinado equipamento tiverem vidas úteis distintas
da do equipamento principal – deve ser o seu registro feito em separado no
contribuintes optava, mesmo para fins contábeis pela simples utilização das
taxas de depreciação previstas na IN SRF n.º 162/1998, as quais são publicadas
periodicamente pela Receita Federal do Brasil nos termos do § 1.º, do art. 310
do RIR/1999, as quais deveriam ser aplicadas com base no método linear.
Independentemente do método utilizado (vida útil ou taxas definidas
pela RFB), a depreciação somente será dedutível a partir do momento em
que o bem é instalado, posto em serviço ou em condições de produzir e terá
sempre como referência para aplicação da taxa o custo de aquisição do bem
passível de depreciação.
Vale destacar que ao garantir o direito do contribuinte de utilizar como
referência a vida útil do bem para fins de determinação da taxa de depreciação,
a legislação tributária reforça que a depreciação dedutível para fins de apuração
do IRPJ e da CSLL é aquela que melhor representa a perda do valor dos bens
em função do seu uso ou desgaste, observando-se a legislação comercial e os
princípios contábeis. Para tanto, deve-se levar em conta todas as especificações
técnicas do bem e suas condições de utilização econômica no tipo de atividade
em que o mesmo será empregado.
Assim, como já mencionamos, a Sociedade deverá estar apta a comprovar,
mediante laudos técnicos, que tal método ou taxa aplicada é o mais adequado por
refletir com mais exatidão os custos gerados pela depreciação e amortização dos
ativos, confrontando com os rendimentos gerados pela utilização desses bens.
Ressalte-se que a adoção de critérios ou taxas de depreciação diferentes
daqueles que foram estabelecidos pelas Instruções Normativas da Receita
Federal implica a assunção pelo contribuinte do ônus da prova da adequação do
método. Todavia, nos termos do parágrafo 2.º do artigo 310 do RIR/1999, em
caso de dúvida, o contribuinte ou as autoridades fiscais poderão solicitar perícia
ao Instituto Nacional de Tecnologia ou de outra entidade oficial de pesquisa
científica ou tecnológica, prevalecendo os prazos de vida útil recomendados
por essas instituições, enquanto os mesmo não forem alterados por decisão
administrativa superior ou decisão judicial fundadas em laudos idôneos.
Ademais, para os bens que trabalham em dois ou três turnos, poderá
ainda ser adotada a depreciação acelerada contábil, reconhecendo e registrando
contabilmente a diminuição acelerada do valor do bem, em função do desgaste
pelo uso em regime de operação superior ao normal.
12 Art 67. Este Decreto-Lei entrará em vigor na data da sua publicação e a legislação do imposto
sobre a renda das pessoas jurídicas será aplicada, a partir de 1.º de janeiro de 1978, de acordo
com as seguintes normas:
(...)
XI - o lucro líquido do exercício deverá ser apurado, a partir do primeiro exercício social iniciado
após 31 de dezembro de 1977, com observância das disposições da Lei n.º 6.404, de 15 de
dezembro de 1976.
13 Art. 15. Fica instituído o Regime Tributário de Transição – RTT de apuração do lucro real, que
trata dos ajustes tributários decorrentes dos novos métodos e critérios contábeis introduzidos pela
Lei n.° 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos arts. 37 e 38 desta Lei.
§ 1.° O RTT vigerá até a entrada em vigor de lei que discipline os efeitos tributários dos novos
métodos e critérios contábeis, buscando a neutralidade tributária.
§ 2.° Nos anos-calendário de 2008 e 2009, o RTT será optativo, observado o seguinte:
I – a opção aplicar-se-á ao biênio 2008-2009, vedada a aplicação do regime em um único ano-
calendário;
II – a opção a que se refere o inciso I deste parágrafo deverá ser manifestada, de forma irretratável,
na Declaração de Informações Econômico-Fiscais da Pessoa Jurídica 2009;
III – no caso de apuração pelo lucro real trimestral dos trimestres já transcorridos do ano-calendário
de 2008, a eventual diferença entre o valor do imposto devido com base na opção pelo RTT e o
valor antes apurado deverá ser compensada ou recolhida até o último dia útil do primeiro mês
subsequente ao de publicação desta Lei, conforme o caso;
IV – na hipótese de início de atividades no ano-calendário de 2009, a opção deverá ser
manifestada, de forma irretratável, na Declaração de Informações Econômico-Fiscais da
Pessoa Jurídica 2010.
§ 3.° Observado o prazo estabelecido no § 1o deste artigo, o RTT será obrigatório a partir do ano-
calendário de 2010, inclusive para a apuração do imposto sobre a renda com base no lucro
presumido ou arbitrado, da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, da Contribuição
para o PIS/PASEP e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS.
14 O Art. 21 da Lei 11.941/2009 também estende o RTT aos elementos que afetam a apuração das
Contribuições para Financiamento da Seguridade Social (COFINS) e para o Programa de Integração
Social (PIS).
15 Em que pese a criação do Controle Fiscal de Transição (FCont), na prática, todas as empresas
após 2009 – quando o RTT deixou de ser uma opção e tornou-se uma obrigação – tiveram que
manter uma contabilidade paralela, sobretudo aquelas em que o sistema de custeio foi afetado
pelas alterações na Legislação Societária.
16 Redação conferida pela Lei nº 11.941/2009, mas que apenas introduziu os intangíveis ao
texto original.
19 Um bom exemplo está na depreciação de fornos destinados à produção de vidro. De acordo com
as disposições previstas na IN SRF n.º 162/1998, esse item de ativo pode ser depreciado em apenas
3 (três) anos, ao passo que a sua vida útil é usualmente superior a 20 (vinte) anos.
20 Ver art. 3.º, § 1.º, inciso III das Leis nº s. 10.637/2002 e 10.833/2003.
21 Acerca da taxa de depreciação a ser utilizada para fins de apropriação de créditos e de eventual
ajuste ao RTT vide os comentários feitos por ocasião do item 6 do presente.
22 Ressaltamos que, recentemente, no intuito de estimular os investimentos por parte dos
empreendedores, o Governo Federal fez editar a Medida Provisória nº°540/2011, no âmbito do
Programa Brasil Maior, cujo art. 4.º alterou a redação do art. 1.º da Lei nº°11.774/2008, para
24 GRECO, Marco Aurélio. Não-cumulatividade no PIS e na COFINS, In: PAULSEN, Leandro (Coord.).
Não-cumulatividade do PIS/PASEP e da COFINS. Porto Alegre: edição do Instituto de Estudos
Tributários e da IOB Thompson, 2004, p. 101-122.
26 Deve, contudo, ser salientado que, apesar desse entendimento por parte do STJ, essa questão
no âmbito das Administrações Tributárias Estaduais ainda permanece controversa, isso porque
alguns Estados entendem que aqueles produtos consumidos no processo industrial, mas que
não são incorporados ao produto final devem ser entendidos como sendo material de uso em
consumo, cujo crédito do ICMS encontra-se atualmente vedado (art. 33, inicio I da LC n.° 87/1996.
Nesse aspecto podemos citar como exemplo desse posicionamento contrário à pretensão dos
contribuintes os termos do acórdãos n.° 5.172/2007 e n.° 5.237, proferidos pelo órgão pleno do
Conselho de Contribuintes do Estado do Rio de Janeiro.
27 STJ, RESP n.º 183610-SP, Relator Ministro Hélio Mosimann, D.J.U. de 07.08.1995.
28 STF, AI nº 127762, Relator Ministro Aldir Passarinho, D.J.U. de 29.06.1990.
29 REIS, Maria Lúcia Américo do; e BORGES, José Cassiano. O IPI ao Alcance de Todos. Rio de
Janeiro: Forense, 1999, p. 9.
30 Art. 20 (...)
(...)
§ 5.° Para efeito do disposto no caput deste artigo, relativamente aos créditos decorrentes
de entrada de mercadorias no estabelecimento destinadas ao ativo permanente, deverá ser
observado:
(...)
III – para aplicação do disposto nos incisos I e II deste parágrafo, o montante do crédito a ser
apropriado será obtido multiplicando-se o valor total do respectivo crédito pelo fator igual a 1/48
(um quarenta e oito avos) da relação entre o valor das operações de saídas e prestações tributadas
e o total das operações de saídas e prestações do período, equiparando-se às tributadas, para
fins deste inciso, as saídas e prestações com destino ao exterior ou as saídas de papel destinado
à impressão de livros, jornais e periódicos;
IV – o quociente de um quarenta e oito avos será proporcionalmente aumentado ou diminuído,
pro rata die, caso o período de apuração seja superior ou inferior a um mês;
31 Questão que pode se afigurar controversa refere-se ao momento para apropriação do ICMS
incidente sobre a aquisição de bens destinados ao ativo imobilizado de contribuinte que se
32 Devemos salientar, entretanto, que esta questão não se encontra totalmente pacificada perante as
Administrações Tributárias Estaduais, de forma que outros entes federados poderão ter entendimento
diverso daquele exarado pelo Estado de São Paulo, com o qual, aliás, exaramos nossa concordância.
Regime Tributário de
Transição – RTT:
Que Neutralidade?
Introdução
1 Nesse sentido, além do registro contábil do investimento em participação societária, a lei tributária
determinava o registro da provisão para devedores duvidosos, da depreciação e a ausência de
reconhecimento de provisões para contingências, dentre outros.
contábil tal como disciplinada pela legislação societária (Lei n° 6.404, de 1976)
em 31 de dezembro de 2007. Acontece que, mesmo segregadas, a influência
recíproca das normas societária e tributária continua existindo (até porque é
inevitável), restando, então, ser definido qual o alcance da neutralidade inserta
no Regime Tributário de Transição – RTT.
Novos aspectos do
Direito Contábil: Lei
nº 11.638/2007, suas
alterações e variações
sobre a interpretação da
norma contábil.
1. Apresentação do tema
4 Aspectos Contábeis da Lei 11.638/2007: Reflexos Legais, in Direito Tributário, Societário e a reforma
da lei das S/A – Inovações da Lei 11.638, coord. Sergio André Rocha.São Paulo: Quartier Latin,
2008, pp.43-74; O Direito Contábil: Da Lei 11.638/2007 à Lei 11.941/2009, in Direito Tributário,
Societário e a reforma da lei das S/A – Alterações das Leis nº 11.638/07 e n°11.941/09, coord.
Sergio André Rocha. São Paulo: Quartier Latin, 2010, pp.17-204; Contabilidade e Direito:a Nova
Relação, in Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e Distanciamentos), coord. Roberto
Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, pp 116-137, 2010; As
Novas Normas de Convergência Contábil e seus Reflexos para os Contribuintes, in Controvérsias
Jurídico-Contábeis (Aproximações e Distanciamentos), coord. Roberto Quiroga Mosquera e
Alexsandro Broedel Lopes, 2°vol. São Paulo: Dialética, p.p. 51-68, 2011.
5 Cf. Elidie Palma Bifano, Aspectos contábeis da Lei 11.638/07: Reflexos Legais, in Direito Tributário,
Societário e a reforma da lei das S/A – Inovações da Lei 11.638, coord. Sergio André Rocha. São
Paulo: Quartier Latin, 2008, pp. 46.
7 Neste estudo será utilizada a palavra “entidade” para designar o sujeito da obrigação de fazer
a escrituração contábil e elaborar demonstrações financeiras, sendo irrelevante sua natureza
societária e seu objeto social. Para fins contábeis, entidade “que reporta é aquela para a qual
existem usuários que se apoiam em suas demonstrações contábeis como fonte principal de
informações patrimoniais e financeiras sobre a entidade.” (Pronunciamento Conceitual Básico
CPC, item 8).
10 Sobre o tema veja-se Elidie Palma Bifano, As Novas Normas de Convergência Contábil e
seus Reflexos para os Contribuintes, in Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e
Distanciamentos), coord. Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes, 2°vol. São
Paulo: Dialética, pp. 51-68, 2011.
com a jurisprudência antes que a lei, valoriza a essência econômica, antes que a
jurídica, suporta-se no costume e na equidade e aplica-se a comunidades com
regras diversas que precisam, por razões políticas, convergir, como é o caso da
Europa, berço de tais normas.
Os reflexos da aplicação dos novos padrões contábeis foram muito bem
examinados por Ricardo Mariz de Oliveira11 que afirma, por força do disposto
no art. 176 da lei societária, deverem as demonstrações financeiras exprimir,
com clareza, a situação do patrimônio da sociedade e as mutações nele ocorridas
durante o exercício social. Prossegue, afirmando que, sendo o patrimônio, por
definição legal, uma universalidade jurídica, e não uma universalidade de fato,
integrada por um conjunto de relações jurídicas, como disposto no Código
Civil, não é possível dissociar o patrimônio da entidade (balanço) das normas
jurídicas aplicáveis às relações nele contidas; por consequência, olvidado esse
aspecto, a contabilidade não mais se prestará a servir como meio de prova, como
determina a lei. Conclui, com muito acerto, que os novos padrões contábeis
nasceram e prosperaram à sombra de sistemas jurídicos diversos dos nossos,
razão pela qual tantas dificuldades se apresentam sobre a matéria.
As Ls. 11.638/2007 e 11.941/2009 lograram realizar a segregação das
práticas contábeis de quaisquer outras, especialmente aquelas voltadas a
finalidades tributárias, preceito de longa data contido na lei societária, mas até
então não concretizado em sua plenitude.12 Assim, o art. 177, § 2º determina
que a entidade observe em registros auxiliares, sem modificação da escrituração
mercantil, as disposições de lei tributária ou de outra legislação especial, que
prescrevam, conduzam ou incentivem a utilização de métodos ou critérios
contábeis diferentes ou determinem registros, lançamentos ou ajustes ou a
elaboração de outras demonstrações financeiras. A absoluta segregação das
práticas contábeis e tributárias se deu com a introdução do chamado Regime
Tributário de Transição/RTT, o qual determinou que os padrões contábeis
aplicáveis, para fins tributários, seriam aqueles vigentes em 31 de dezembro
de 2007 (arts. 16 e segs. da L. 11.941/2009).
13 Sobre as dificuldades que resultam da positivação dos padrões contábeis, veja-se Elidie Palma
Bifano, Aspectos contábeis da Lei 11.638/07: Reflexos Legais, in Direito Tributário, Societário e a
reforma da lei das S/A – Inovações da Lei 11.638, coord. Sergio André Rocha. São Paulo: Quartier
Latin, 2008, pp. 45-47.
dimensões, inserido que está em nosso sistema jurídico: essas várias dimensões
determinarão quem são os usuários e destinatários dessas regras, formadoras
do Direito Contábil, a quem caberá sua interpretação, sem que, entretanto,
estejam eles assumindo a função que aos contadores cabe.
nele contidas; uma vez incorporado ao sistema jurídico, por agente regulador
ou por norma específica, caberá seu exame a partir da natureza jurídica que
lhe foi atribuída pela lei, aplicando-se seu conteúdo econômico, nos estritos
termos e situações em lei definidos.
5.7 Conclusão
A matéria aqui tratada demonstra que estamos apenas no início de
um novo período envolvendo o Direito e a Contabilidade não cabendo, em
nenhuma hipótese, a afirmativa de que a interpretação da matéria contábil é de
exclusiva competência do contador ou de que o estudioso do Direito deva dela
afastar-se. O que é certo é que as diversas dimensões do IFRS permitem concluir
que um Pronunciamento contábil envolve a participação de muitos especialistas,
uma vez que a Contabilidade volta-se a fatos econômicos que nascem no
seio da atividade empresarial, cuja riqueza imensa exige o conhecimento e a
participação de muitas áreas do saber.
O Regime Tributário do
Consórcio de Empresas
1. Introdução
3 Cf. trecho da análise relativa à relevância e urgência da Medida Provisória nº 510, promovida
pelo Senador Gim Argello, quando da elaboração do parecer aprovando o PLV nº 6, de 2011.
Disponível no sítio eletrônico do Senado Federal: http://www.senado.gov.br/atividade/Materia/
detalhes.asp?p_cod_mate=99546. Acesso em: 24.05.2011.
2. Arcabouço legislativo
2.1. LSA
A Lei nº 6.404/76 dispõe sobre as Sociedades por Ações (Lei das
Sociedades por Ações – LSA). Em capítulo específico, a lei disciplina os aspectos
societários do consórcio nos arts. 278 e 279.
O caput do art. 278 preceitua que as companhias e quaisquer outras
sociedades, sob o mesmo controle ou não, podem constituir consórcio para
executar determinado empreendimento, observado o disposto neste capítulo da lei.
A execução de determinado empreendimento capaz de motivar a
constituição do consórcio geralmente dá-se por prazo determinado. Todavia,
é possível que o sucesso da constituição do consórcio leve a uma (ou mais)
prorrogação(ões) e, no limite, permaneça até por tempo indeterminado.
A despeito de não ter personalidade jurídica, o consórcio é administrado
pela empresa consorciada líder. A relação entre as pessoas jurídicas envolvidas
na constituição do consórcio é contratual, e é nessa medida (proporção) que
cada uma responde por suas obrigações, além das demais condições ali previstas.
Não há presunção de solidariedade.4
Esse é o teor do § 1º do art. 278, que dispõe: “O consórcio não tem
personalidade jurídica e as consorciadas somente se obrigam nas condições
previstas no respectivo contrato, respondendo cada uma por suas obrigações,
sem presunção de solidariedade”.
O art. 279 dispõe sobre os requisitos necessários à elaboração do contrato
referente à constituição do consórcio:
“Art. 279. O consórcio será constituído mediante contrato aprovado
pelo órgão da sociedade competente para autorizar a alienação de
bens do ativo não-circulante, do qual constarão:
4 A respeito da solidariedade dos sujeitos passivos, o Código Tributário Nacional preceitua que: “Art.
124. São solidariamente obrigadas: I – as pessoas que tenham interesse comum na situação que
constitua fato gerador da obrigação principal; II – as pessoas expressamente designadas por lei.
Parágrafo único. A solidariedade referida neste artigo não comporta benefício de ordem. Art.
125. Salvo disposição de lei em contrário, são os seguintes os efeitos da solidariedade: I – o
pagamento efetuado por um dos obrigados aproveita aos demais; II – a isenção ou remissão de
crédito exonera todos os obrigados, salvo se outorgada pessoalmente a um deles, subsistindo,
nesse caso, a solidariedade quanto aos demais pelo saldo; III – a interrupção da prescrição, em
favor ou contra um dos obrigados, favorece ou prejudica os demais”.
5 Confira a redação original dos dispositivos em foco: “§ 2º. O consórcio deverá manter registro
contábil das operações em Livro Diário próprio, devidamente registrado; § 3º. O registro
contábil das operações no consórcio deverá corresponder ao somatório dos valores das parcelas
das pessoas jurídicas consorciadas, individualizado proporcionalmente à participação de cada
consorciado no empreendimento; § 4º. Sem prejuízo do disposto nos §§ 2º e 3º, a escrituração
das operações objeto do consórcio, relativas à participação das pessoas jurídicas consorciadas,
deverá ser efetuada em suas respectivas contabilidades, em livros contábeis, fiscais e auxiliares
próprios; § 5º. Os livros utilizados para registro das operações do consórcio e os documentos que
permitam sua perfeita verificação deverão ser mantidos pelo consórcio e pelas pessoas jurídicas
consorciadas pelo prazo de decadência e prescrição estabelecidos pela legislação tributária”.
6 Essa redação do § 1º do art. 4º da IN RFB nº 834/2008 foi dada pela IN RFB nº 917/2009. Eis
a redação original: “Nas hipóteses autorizadas pela legislação do Imposto sobre Operações
relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual
e Intermunicipal (ICMS), a Nota Fiscal ou Fatura de que trata o caput poderá ser emitida pelo
consórcio, observada a apropriação de que trata o caput do art. 3º”.
7 Esta dicção do dispositivo contempla a redação dada pela IN RFB nº 1.057/2010. Eis a redação anterior:
“Às operações de consórcio autorizado por órgão competente de defesa da ordem econômica
aplica-se o disposto nesta Instrução Normativa. § 1º. O disposto no caput aplica-se inclusive na
hipótese de venda de bens ou de serviços de forma continuada, ainda que por intermédio das
pessoas jurídicas consorciadas. § 2º. Na hipótese do § 1º, se das operações do consórcio decorrer
industrialização de produtos: I – os créditos referentes às aquisições de matérias-primas, de produtos
intermediários e de material de embalagem e os débitos referentes ao IPI serão computados e
escriturados, por estabelecimento da pessoa jurídica consorciada, proporcionalmente à sua
participação no empreendimento industrial, conforme documento arquivado no órgão de registro;
II – o consórcio deverá figurar no documento fiscal de aquisição. § 3º. O disposto neste artigo
aplica-se inclusive no caso de as pessoas jurídicas operarem sob a forma de condomínio em um
mesmo estabelecimento industrial”. O art. 10 da IN RFB nº 834/2008 foi revogado pela IN RFB nº
1.057/2010 e tinha a seguinte redação: “Art. 10. O regime fiscal de que trata o art. 8º depende de
autorização da Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) que disporá sobre o regime especial
de escrituração fiscal e de apuração do IPI e das contribuições, bem assim os termos, limites e
condições para sua implementação. Parágrafo único. O descumprimento das normas estabelecidas
no regime especial de que trata o caput acarretará o cancelamento da autorização”.
8 Essa redação foi dada pela IN RFB nº 917/2009. Confira a redação anterior: “Art. 9º. Para efeito
do disposto nesta Instrução Normativa, não será admitida a comunicação de créditos e débitos
da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins ou do IPI entre pessoas jurídicas consorciadas ou
entre os estabelecimentos destas”.
9 Seguiu-se então uma sucessão de atos regulamentares que revogaram e substituíram os anteriores:
em 20.01.2000, foi publicada a IN SRF nº 01; em 08.01.2001, foi publicada a IN SRF nº 2; em
01.10.2002, foi publicada a IN SRF nº 200; em 12.09.2005, foi publicada a IN RFB nº 568; em
02.07.2007, foi publicada a IN RFB nº 748; e, por último, em 09.02.2010, foi publicada a IN
RFB nº 1.005, que revogou a anterior.
10 Nesta hipótese, a empresa administradora deverá apresentar à unidade pagadora os documentos de
cobrança, acompanhados das respectivas notas fiscais, correspondentes aos valores dos fornecimentos
de bens ou serviços de cada empresa participante do consórcio, consoante dispõe o § 1º.
11 Em seguida, a IN SRF nº 480, de 15.12.2004, publicada em 29.12.2004 e republicada em
31.12.2004, reproduziu as mesmas regras acima, agora previstas no art. 16 e corrigiu o erro
material contido na referência ao art. 19 que, na realidade, se cuidava do art. 29.
12 Além disso, o decreto estadual prevê que a empresa líder agirá como mandatária das demais
consorciadas e deve registrar todas as operações da atividade consórtil em livros fiscais do
próprio consórcio, ficando responsável pela apuração e recolhimento do ICMS, aplicando-se-
lhes a legislação pertinente às empresas em geral no que se refere às obrigações principal e
acessórias. Se ocorrer saldo credor, ele pode ser transferido para as consorciadas na proporção
de sua participação no consórcio. As empresas consorciadas respondem solidariamente pelas
obrigações tributárias relacionadas com a atividade consórtil, nos termos do art. 124 do CTN e
do art. 38, inciso II, da Lei nº 9.478/97.
3. Jurisprudência e orientações
Nesse tópico, cabe verificar como a jurisprudência nacional cuida dos
assuntos tributários relacionados ao consórcio e às empresas consorciadas. Além
de trazer alguns julgados oriundos de diferentes tribunais do Poder Judiciário,
enriqueceremos o estudo com ementas e trechos de acórdãos oriundos de órgãos
administrativos, como o antigo Conselho de Contribuintes (atual Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais) e algumas orientações emanadas pelas
autoridades administrativas fiscais através de soluções de consultas.
Com isso, completaremos o quadro evolutivo normativo e jurisprudencial
existente no momento de edição da Lei nº 12.402/2011. Dentre os julgados
provenientes do antigo Conselho de Contribuintes (CC), destacaremos alguns
que podem ilustrar os diferentes tipos de litígios em matéria tributária e com
o envolvimento direto da figura do consórcio.
3.1. Administrativa
Em julgamento ocorrido em 06.12.2005, o então Conselho de Contribuinte
decidiu negar provimento ao recurso voluntário, por unanimidade de votos,
quanto ao faturamento proveniente da venda de produtos obtidos na atividade
do consórcio. De fato, constou na ementa que: “O consórcio de empresa não
possui personalidade jurídica própria, sendo contribuinte da COFINS cada
empresa consorciada, que recolhe a Contribuição na proporção do rateio de
receitas estabelecido em contrato”.13
13 No trecho do voto do Conselheiro Relator pertinente ao presente estudo, ele cotejou o exame da
LSA com o contrato específico de consórcio celebrado pelas empresas consorciadas, destacando
que: “as duas consorciadas ‘sempre serão consideradas individualmente (e não solidariamente)
responsáveis perante terceiros por suas respectivas obrigações’ (cláusula 3.01); “a Petrobrás obriga-
se a dar destinação comercial ao petróleo produzido a partir do Campo de Marlim (cláusula 8.01,
h)”; a Receita Real do Consórcio, dada pelo número de barris de petróleo extraídos multiplicado
pelo valor em Reais do preço do produto, é repartida entre a Petrobrás e a Marlim, cabendo a
esta um percentual que varia de 2% a 30%, exceto nos anos
de 1999 e 2002, quando o percentual máximo da Marlim poderá alcançar 70%” (cláusulas 9 e
10); “os custos e despesas do consórcio serão rateados na mesma proporção da Receita Real do
Consórcio (cláusula 15)”. Registrou, ademais, que: “Embora somente a Petrobrás seja responsável
pela comercialização do petróleo extraído, a receita é repartida conforme a fórmula estabelecida
no contrato (cláusulas 9 e 10), de modo que a cada transferência da Petrobrás para a Marlim há
incidência da COFINS e do PIS, sobre o montante da receita transferida”. Em seguida, consignou
que: “No caso da Petrobrás ter faturado pelo total do óleo vendido (é o que informa a recorrente),
deve haver a repartição do valor global, na forma do estabelecido pelo contrato do consórcio”.
O Relator concluiu que: “(...) a Petrobrás não é responsável pelo recolhimento total, incluindo
a parte transferida à Marlim. Se agiu assim e recolheu PIS e COFINS sobre receita alheia, faz jus
à repetição do indébito respectivo” (2º CC – 3ª Câmara – Ac. 203-10.571, Rel. Cons. Emanuel
Carlos Dantas de Assis, j. 06.12.2005, DOU 12.03.2007).
14 Nesse caso, o Conselheiro Relator entendeu que: “(...) no tocante aos eventuais valores recolhidos
a maior, como são recolhimentos efetuados em nome do consórcio, caracterizam-se como
recolhimentos indevidos, não podendo ser compensados na apuração do valor do auto de infração.
Cabe ao consórcio providenciar eventual pedido de restituição” (2º CC – 1ª Câmara – Ac. 201-
80.596, Rel. Cons. José Antonio Francisco, j. 20.09.2007, DOU 13.11.2007).
15 Cf. 1º CC – 7ª Câmara – Ac. 107-08.961, Rel. Cons. Natanael Martins, j. 29.03.2007, DOU
07.05.2007.
27 O Conselheiro Relator entende que: “A Lei de fato não é expressa no sentido de que deva
necessariamente dar ao contrato uma duração determinada. O empreendimento objetivado pela
união das sociedades por ter uma amplitude muito grande, inclusive no seu aspecto temporal” (1º
CC – 7ª Câmara – Ac. 107-08.961, Rel. Cons. Natanael Martins, j. 29.03.2007, DOU 07.05.2007).
28 Cf. 1º CC – 7ª Câmara – Ac. 107-08.961, Rel. Cons. Natanael Martins, j. 29.03.2007, DOU
07.05.2007.
29 Em seguida, o Relator Conselheiro destacou que: “E, de fato, seria injustificável atribuir interpretação que
transformaria o instituto do consórcio numa espécie de sociedade para um negócio singular e ocasional,
tornando-o incompatível com o seu escopo principal, que é a colaboração entre empresas para
realizar um objetivo comum, a qual, longe de ser eventual ou temporária, reveste-se, cada vez mais,
do caráter permanente”. Concluindo, afirmou que: “Parece-nos plenamente admissível, portanto,
constituir-se consórcio tanto para realizações temporárias quanto para atividades permanentes,
existindo a imposição legal apenas a que se faça precisa descrição da operação que pretendem
realizar as partes consorciadas, por meio da colaboração interempresarial. Nesta linha de raciocínio,
injustificado, ainda, cogitar-se que desfiguraria a natureza de consórcio com base na permanência
do objeto, quando presentes todos os elementos essenciais no contrato de constituição, nos termos
da lei, sobretudo a especificação da duração e a possibilidade de sua prorrogação” (1º CC – 7ª
Câmara – Ac. 107-08.961, Rel. Cons. Natanael Martins, j. 29.03.2007, DOU 07.05.2007).
30 A esse respeito, confira: “Consórcio de empresas. Nacional e estrangeira. Autonomia das consorciadas.
Emissão de notas fiscais, Escrituração. Determinação da divisão das receitas. Regime aplicável. O
consórcio, constituído nos termos dos arts. 278 e 279 da Lei das SA, não possui personalidade jurídica
própria, mantendo-se a autonomia jurídico-tributária de cada uma das consorciadas. A emissão das
notas fiscais da comercialização daquilo que há de ser produzido em consórcio pode ser tanto feita
pela administradora do consórcio, fazendo-se referência à existência deste e à parcela que cabe à
outra consorciada, como também pode ser feita por ambas as consorciadas, proporcionalmente à
parcela de receita que cabe a cada uma, devendo a forma escolhida constar no contrato de consórcio
e ser utilizada uniformemente durante o empreendimento. Os registros das operações relativas ao
consórcio podem ser feitos pela consorciada-administradora em livros específicos para efeitos de
controle, mas a respectiva receita bruta que lhe couber deverá ser levada ao seu próprio resultado.
Devido à autonomia que cada empresa mantém, apenas a parcela correspondente à participação
da consorciada irá compor a base de cálculo do IRPJ por ela devido, bem como, por óbvio, as
despesas ou custos incorridos pela outra consorciada não podem ser aproveitados. A determinação
das proporções de receita atribuídas às duas consorciadas, nacional e estrangeira, que integram um
mesmo grupo econômico, não está submetida às regras dos preços de transferência, eis que entre
elas não haverá operação de importação, exportação ou aquisição, aplicando-se, apenas, as regras
gerais relativas à distribuição disfarçada de lucros” (Solução de Consulta nº 207, de 26.07.2001).
31 Solução de Consulta nº 217, de 28.11.2007.
32 Nesse sentido: “REGIME ESPECIAL DE TRIBUTAÇÃO – RET. Não há previsão legal para que o
consórcio, constituído nos termos dos arts. 278 e 279 da Lei nº 6.404, de 1976, possa optar pelo
Regime Especial de Tributação – RET. Entretanto, consórcio pode ser contratado para construir
unidades habitacionais de valor comercial de até R$ 75.000,00 (setenta e cinco mil reais) no âmbito
do Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV, de que trata a Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009,
ficando autorizadas as pessoas jurídicas participantes do consórcio, em caráter opcional,
a efetuar o pagamento unificado de tributos equivalentes a um por cento da receita mensal auferida
pelo contrato de construção, proporcionalmente à participação de cada uma no empreendimento”
(Solução de Consulta nº 385, de 28.10.2010).
33 Nesse sentido: “CONSÓRCIO. EMPRESA ESTRANGEIRA. RETENÇÃO DE IRRF. Na remuneração de
serviços técnicos prestados por empresa domiciliada na França integrante de consórcio constituído
nos termos dos artigos 278 e 279 da Lei nº 6.404/76, a retenção e o recolhimento do IRRF devem
ser efetuados em nome da pessoa jurídica consorciada, na proporção da sua participação na
execução do contrato” (Solução de Consulta nº 74, de 29.05.2008).
34 Nesse sentido: “CONSÓRCIO DE EMPRESAS. RENDIMENTO DO TRABALHO. Consórcio de
empresas, constituído por tempo determinado para execução de obras contratadas por órgão
público, não possui personalidade jurídica, cabendo a cada uma das empresas consorciadas
assumir obrigações e responsabilidades a elas atribuídas bem como prestações específicas. Sendo
assim, a empresa consorciada que contratar pessoa física como assalariada ou autônoma, mesmo
que para exercer atividades de interesse comum a todas as consorciadas, dever reter o imposto
de renda na fonte incidente sobre a remuneração do trabalho” (Solução de Consulta nº 102, de
18.08.2009).
35 A respeito, confira:eu não posso olhar pra cara de ninguém que ele esteja conversando “O consórcio
constituído em conformidade com os artigos 278 e 279 da Lei nº 6.404/76 não é dotado de
personalidade jurídica, motivo pelo qual a contratação de pessoal, a contratação de subempreiteiras,
a prestação de declarações ao fisco bem como a celebração de negócios jurídicos em geral devem
ser levadas a cabo pelas pessoas jurídicas participantes, nos termos e condições fixadas no contrato
de constituição, desde que este não desnature o instituto nem contrarie seus elementos essenciais.
Cabe às contratantes, e não ao consórcio, a retenção de contribuições previdenciárias referentes
aos serviços prestados pelas subempreiteiras e o respectivo recolhimento no CNPJ destas, mediante
o código de pagamento 2631. Entende-se por competência, para fins de retenção de contribuições
previdenciárias, o mês em que a nota fiscal de serviços/fatura foi emitida. Para que o consórcio possa
gozar do benefício de que trata o art. 170 da IN MPS/SRP nº 3/05 é estritamente necessário que a
descrição dos serviços bem como os respectivos valores estejam detalhadamente discriminados na
nota fiscal de serviços/fatura. Caso contrário, aplicar-se-á a retenção sobre o valor bruto constante
da NFS” (Solução de Consulta nº 57, de 06.07.2009).
3.2. Judicial
Na seara judicial, encontramos poucos julgados versando sobre temas
relacionados ao regime tributário do consórcio de empresas. Quando encontramos
no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, se limitaram a decidir a questão de
fundo sem maiores considerações acerca da condição peculiar do consórcio ou,
ainda, a cuidar de aspectos formais e processuais envolvendo a representação
processual, pouco importando o direito material subjacente que certamente
seria mais interessante ao desenvolvimento desse trabalho de pesquisa. Na esfera
dos tribunais federais, contudo, logramos pinçar algumas ementas e trechos de
acórdãos que tratam efetivamente de aspectos referentes às obrigações tributárias,
principais e acessórias, dos consórcios e das empresas consorciadas.
No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, restou decidido que, quando
há eleição da empresa líder com exclusividade para a representação processual do
consórcio, não pode as demais pessoas jurídicas consorciadas exercer a ação, ainda
que em defesa dos interesses do consórcio. Nesse sentido, o STJ decidiu que:
“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO
ESPECIAL. CONSÓRCIO DE EMPRESAS. ELEIÇÃO
DE EMPRESA LÍDER. IRREGULARIDADE NA
REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. EXTINÇÃO DO
PROCESSO POR ILEGITIMIDADE. DESPROVIMENTO DO
RECURSO ESPECIAL.
1. ‘O consórcio não é uma pessoa jurídica, mas uma associação de
empresas que conjugam recursos humanos, técnicos e materiais para a
36 Nesse sentido: “As obrigações tributárias, principais e acessórias, decorrentes das operações
praticadas pelo consórcio, são de responsabilidade das próprias consorciadas, que devem
responder proporcionalmente à sua participação no empreendimento. Opcionalmente, a partir
de 29.10.2010, o consórcio que realize a contratação, em nome próprio, de pessoas jurídicas e
físicas, pode efetuar a retenção de tributos administrados pela RFB e o cumprimento das respectivas
obrigações acessórias, utilizando seu próprio CNPJ, ficando nessa situação as consorciadas como
solidariamente responsáveis” (Solução de Consulta nº 47, de 14.06.2011).
39 A respeito, confira o seguinte trecho do voto: “Por conseguinte, é fato que, conforme discorre a
impetrante, existem nítidas diferenças entre os consórcios e as empresas, tais como a existência
de personalidade jurídica e de patrimônio próprio e a habitualidade do desenvolvimento de suas
atividade, que só estão presentes nas empresas. Não obstante, isso não faz com que, pelo simples
fato de consistir em um consórcio, a impetrante seja excluída do rol de sujeitos passivos das
contribuições previdenciárias; para os fins da Lei nº 8.212/91, é necessário apenas o vínculo de
prestação de serviços, com pagamento de remuneração, entre a entidade e segurados obrigatórios,
o que ocorre no caso” (TRF/2ª Região – 4ª Turma – AMS 2004.51.10.007081-7, Rel. Des. Fed.
Luiz Antonio Soares, j. 02.09.2008, DJE 06.11.2008).
40 TRF/2ª Região – 7ª Turma – AC 1997.51.01.071705-2, Rel. Des. Fed. Reis Friede, j. 07.12.2005,
DJU 22.02.2006.
41 TRF/2ª Região – 4ª Turma – AMS 2002.51.01.002602-8, Rel. Des. Fed. Alberto Nogueira, j.
09.03.2010, DJE 13.04.2010.
possui personalidade jurídica, nem patrimônio próprio, certo é que não se poderá negar a
legitimatio ad causam das autoras, ora apelantes, em cujos patrimônios incidirão diretamente todos
os encargos ou vantagens decorrentes do procedimento licitatório” (TRF/3ª Região – 4ª Turma –
AC 0751451-28.1986.4.03.6100, Rel. Des. Fed. Marli Ferreira, j. 27.09.2010, DJE 15.10.2010).
44 Eis a dicção dos dispositivos: “Art. 132. A pessoa jurídica de direito privado que resultar de fusão,
transformação ou incorporação de outra ou em outra é responsável pelos tributos devidos até a
data do ato pelas pessoas jurídicas de direito público fusionadas, transformadas ou incorporadas.
Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se aos casos de extinção de pessoas jurídicas
de direito privado, quando a exploração da respectiva atividade seja continuada por qualquer
sócio remanescente, ou seu espólio, sob a mesma ou outra razão social, ou sob firma individual.
Art. 133. A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por qualquer
título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e continuar
a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou sob firma ou nome individual,
responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido, devidos até a data do
ato: I – integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade; II
– subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar dentro de 6 (seis)
meses, a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio,
indústria ou profissão. (...)”.
45 TRF/3ª Região – 5ª Turma – AG 168.997, Rel. Des. Fed. André Nabarrete, j. 27.06.2005, DJU
31.08.2005.
46 TRF/4ª Região – 2ª Turma – AC 2007.71.00.030008-0, Rel. Des. Fed. Luciane Amaral Corrêa
Münch, j. 28.04.2009, DJE 18.06.2009. No mesmo sentido: TRF/4ª Região – 1ª Turma – Reex.
2007.71.08.009564-0, Rel. Des. Fed. Joel Ilan Paciornik, j. 18.02.2009, DJE 25.03.2009. O
dispositivo referido preceitua que: “§ 4º. Não poderá se beneficiar do tratamento jurídico
4.1. A MP 510
Em 29.10.2010, foi publicada a Medida Provisória nº 510, que regulou
o cumprimento de obrigações tributárias por consórcios que realizem negócio
jurídico em nome próprio e deu outras providências.
O art. 1º dispôs que: “Os consórcios cumprirão as respectivas obrigações
tributárias sempre que realizarem negócios jurídicos em nome próprio, inclusive
na contratação de pessoas jurídicas ou físicas, com ou sem vínculo empregatício”.
O § 1º do art. 1º previu que: “As empresas consorciadas serão solidariamente
responsáveis pelas obrigações tributárias decorrentes dos negócios jurídicos de
que trata o caput, não se aplicando, para efeitos tributários, o disposto no § 1º do
art. 278 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976” (grifamos).
O § 2º do art. 1º estabeleceu que: “O disposto neste artigo aplica-se
somente aos tributos federais”.
A Exposição de Motivos com que a Subchefia para Assuntos Jurídicos
recebeu do Ministério da Fazenda o então projeto de Medida Provisória e
submeteu ao Presidente da República, trouxe a seguinte justificativa, no que
interessa ao presente estudo:
diferenciado previsto nesta Lei Complementar, incluído o regime de que trata o art. 12 desta
Lei Complementar, para nenhum efeito legal, a pessoa jurídica: I – de cujo capital participe
outra pessoa jurídica; II – que seja filial, sucursal, agência ou representação, no País, de pessoa
jurídica com sede no exterior; III – de cujo capital participe pessoa física que seja inscrita como
empresário ou seja sócia de outra empresa que receba tratamento jurídico diferenciado nos
termos desta Lei Complementar, desde que a receita bruta global ultrapasse o limite de que
trata o inciso II do caput deste artigo; IV – cujo titular ou sócio participe com mais de 10% (dez
por cento) do capital de outra empresa não beneficiada por esta Lei Complementar, desde que
a receita bruta global ultrapasse o limite de que trata o inciso II do caput deste artigo; V – cujo
sócio ou titular seja administrador ou equiparado de outra pessoa jurídica com fins lucrativos,
desde que a receita bruta global ultrapasse o limite de que trata o inciso II do caput deste artigo;
VI – constituída sob a forma de cooperativas, salvo as de consumo; VII – que participe do capital
de outra pessoa jurídica; VIII – que exerça atividade de banco comercial, de investimentos e de
desenvolvimento, de caixa econômica, de sociedade de crédito, financiamento e investimento
ou de crédito imobiliário, de corretora ou de distribuidora de títulos, valores mobiliários e
câmbio, de empresa de arrendamento mercantil, de seguros privados e de capitalização ou de
previdência complementar; IX – resultante ou remanescente de cisão ou qualquer outra forma
de desmembramento de pessoa jurídica que tenha ocorrido em um dos 5 (cinco) anos-calendário
anteriores; X – constituída sob a forma de sociedade por ações”.
49 Cf. tramitação do PLV nº 6, de 2011, disponível no sítio eletrônico do Senado Federal: http://www.
senado.gov.br/atividade/Materia/detalhes.asp?p_cod_mate=99546. Acesso em: 24.05.2011
50 O resultado final da votação foi o seguinte: Sim 43, Não 14, Total 57.
2011
52 Nesse sentido, cf. o áudio ref. a Mesa de Debates promovida pela Associação Brasileira de Direito
Financeiro – ABDF, ocorrida no dia 26.05.2011, em sua sede, que tratou da Lei nº 12.402/2011
e o tratamento das obrigações tributárias.
53 Nesse sentido, cf. o áudio ref. a Mesa de Debates promovida pela Associação Brasileira de Direito
Financeiro – ABDF, ocorrida no dia 26.05.2011, em sua sede, que tratou da Lei nº 12.402/2011
e o tratamento das obrigações tributárias.
54 Em sítio eletrônico especializado em informações fiscais e legais, foi divulgado informativo no
qual constou: “Por esse motivo, os consórcios que tenham realizado algum recolhimento em
nome próprio a título de IRPJ, CSLL, PIS/PASEP ou COFINS no período compreendido entre 29
de outubro de 2010 e 2 de maio de 2011 deverão adequá-lo à regra contida na Lei nº 12.402
de 2011 [art. 1º]”. O referido informativo concluiu que: “As obrigações tributárias instituídas por
meio da Medida Provisória nº 510 de 2010 tornaram-se sem efeitos desde 29 de outubro de 2010,
considerando-se a retroatividade dos efeitos da nova redação dada ao artigo 1º, quando de sua
conversão na Lei nº 12.402 de 2011”. Além disso, cabe registrar que: “Os tributos devidos no
período compreendido entre 29 de outubro de 2010 e 2 de maio de 2011, salvo normatização
em contrário, deverão ser recolhidos em nome das empresas consorciadas,
5. Considerações finais
Nos últimos anos o Brasil ensaia dar os seus mais importantes passos em
direção ao tão esperado ciclo virtuoso rumo ao pleno desenvolvimento, com o
fortalecimento da economia, a geração de mais empregos, com mão-de-obra
qualificada e uma distribuição mais justa da riqueza que circula no País.
Os mega projetos e empreendimentos que atualmente estão em foco no
campo da infra-estrutura são múltiplos e variados, o que indica auspicioso
futuro nos próximos anos, como o PAC, a construção de refinarias de petróleo,
a construção do “trem-bala”, a exploração do Pré-Sal, o recrudescimento da
indústria naval, o crescimento da indústria aeronáutica, a realização da Copa
das Confederações da FIFA em 2013, da Copa do Mundo da FIFA em 2014
e das Olimpíadas em 2016, dentre tantos outros.
Dada a complexidade e o vulto de tais mega projetos e empreendimentos,
surge a crescente necessidade de conjugar esforços em prol do objetivo comum
de duas ou mais grandes empresas que, sozinhas, possivelmente não teriam
condições para alcançar a sinergia ou o resultado pretendido.
Se a operacionalização da exploração do negócio que se busca não contar
com uma reestruturação societária ou participação acionária entre duas ou
mais pessoas jurídicas interessadas na sua consecução, com vistas a otimizar
as possíveis sinergias que envolvem as suas atividades, então a constituição do
consórcio passa a ser uma alternativa interessante a ser considerada. Nela, a
autonomia jurídico-tributária de cada uma das empresas envolvidas é mantida
intacta e o consórcio não é dotado de personalidade jurídica.
Como decorrência disso, as obrigações tributárias (principais e acessórias)
referentes à realização do negócio próprio do consórcio devem ser suportadas
pelas pessoas jurídicas que o compõem. Assim, a regra de ouro na relação
contratual referente ao consórcio é a proporção da participação de cada empresa
consorciada no empreendimento (constante no contrato de constituição do
Depreciação de Bens e
a Neutralidade Fiscal
do Regime Tributário de
Transição – RTT
1. Introdução
Com o advento da Lei nº 11.638/2007, promulgada em 28 de dezembro de
2007, ocorreram significativas alterações na legislação societária, em particular
na parte da Lei nº 6.404/76 (que disciplina a sociedade por ações) que trata,
dentre outros assuntos, das demonstrações financeiras das empresas, do lucro
e sua apuração, dos dividendos e sua distribuição, contabilização de operações
societárias como fusão e incorporação, dos investimentos em outras sociedades
e sua contabilização, e critérios de valorização dos ativos das pessoas jurídicas.
O principal objetivo das alterações trazidas pela Lei nº 11.638/2007 foi
o alinhamento das regras contábeis adotadas no Brasil as normas contábeis
internacionais, editadas pelo International Accounting Standard Board (“IASB”),
entidade técnica responsável pela emissão do conjunto de normas contábeis
de aplicação global denominado International Financial Reporting Stantards
(“IFRS”).
O IRFS, por sua vez, tem como objetivo a convergência de normas e
princípios contábeis, de sorte que sua adoção por empresas ao redor do globo
facilite a divulgação de informações econômicas e financeiras para os usuários
de demonstrações contábeis.
A partir do advento da referida lei, embora no âmbito contábil tenha
ocorrido uma positivação de novos padrões e princípios contábeis, ocasionando
uma alteração da forma por meio da qual determinadas operações deveriam
ser contabilizadas, no âmbito tributário, a Lei nº 11.638/2007 determinou que
os lançamentos efetuados em decorrência da adoção dos novos parâmetros
contábeis não poderiam ter impactos nas apurações dos tributos incidentes
sobre a renda e a receita das empresas.
Com a entrada em vigor da Lei nº 11.941/2009, resultante da conversão
da Medida Provisória nº 449/20081, houve a instituição do denominado Regime
Tributário de Transição (“RTT”), cujo objetivo era neutralizar os efeitos das
novas regras contábeis para fins fiscais. Assim, para a apuração do lucro real da
pessoa jurídica, não deveriam ser considerados os novos parâmetros contábeis
introduzidos por meio da Lei nº 11.638/2007, devendo ser utilizados os critérios
anteriores à entrada em vigor desta Lei.
2 Efeitos tributários da lei nº 11.637/07. São Paulo: Ed. do Autor, 2008, p. 38.
3 Op. cit., pp. 103-104.
11.638, de 2007 – deve prolongar-se pelos próximos anos, razão pela qual,
há necessidade de que o RTT não seja aplicável apenas no ano de 2008,
mas também no ano de 2009, e, se necessário, nos anos subseqüentes,
quando, então, ao se descortinar o novo padrão da contabilidade
empresarial a ser adotado no País, possa-se regular definitivamente o
modo e a intensidade de integração da legislação tributária com os novos
métodos e critérios internacionais de contabilidade. Nesse contexto, o §
1º do art. 15 da proposição em tela prevê a aplicação do RTT até que seja
editada lei regulando definitivamente os efeitos tributários das mudanças
nos critérios contábeis, a qual pretende-se que seja neutra, ou seja, que
não afete a carga tributária.
10. O RTT será facultativo para os anos-calendário de 2008 e 2009,
para que não ofenda o princípio da irretroatividade tributária, previsto
na alínea “a” do inciso III do art. 150, e a regra do § 2º do art. 62, da
Constituição Federal de 1988, pois, a adoção do referido regime importa não
apenas em desonerações, mas em sujeição completa aos critérios e métodos
contábeis da legislação fiscal em 31 de dezembro de 2007. A partir de 2010,
caso ainda não esteja em vigor o ajuste da legislação tributária aos novos
critérios contábeis, o RTT será obrigatório.” (não destacado no original)
Verifica-se que o RTT nasceu por meio da Medida Provisória nº 449/2008
que, em seus artigos 15 a 22, disciplinou os meios pelos quais os contribuintes
sujeitos à adoção do regime em questão deveriam ajustar o seu resultado.
Com a conversão da Medida Provisória nº 449/2008 na Lei
nº 11.941/2009, a instituição do RTT se deu de forma definitiva, devendo ser
observado por pessoas jurídicas sujeitas à apuração do IRPJ e da CSLL pelo
lucro real, facultativamente nos anos-calendários de 2008 e 2009, e obrigatória
a partir do ano de 2010.
2.2. Instituição
Por meio das alterações trazidas pela Lei nº 11.638/2007, houve uma
positivação de determinados parâmetros contábeis, o que, por conseqüência,
terminou por gerar uma reafirmação da separação entre as normas contábeis
e tributárias e a alteração da forma pela qual a empresa apurava o seu
resultado em um determinado período.
Visando não impactar o lucro real, a referida lei trouxe um dispositivo
estabelecendo que os lançamentos efetuados em observância às novas regras contábeis
não deveriam surtir reflexos tributários. Todavia, deve-se atentar para o fato de que
a Lei nº 11.638/2007, embora tenha expressado em seu conteúdo a preocupação do
legislador no que tange à neutralidade fiscal, não previu um mecanismo para que, na
prática, esta neutralidade pudesse ser alcançada pelos contribuintes.
Esta situação se alterou com o advento da Lei nº 11.941/2009, resultante
da conversão da Medida Provisória nº 449/20084, que revogou o parágrafo 7º,
do artigo 177, da Lei nº 6.404/76, instituindo, em seu lugar, por meio de seu
artigo 15, o RTT, cujo objetivo foi o de conceber um meio de neutralizar os
efeitos das novas regras contábeis para fins fiscais. Assim, para a apuração do
lucro real da pessoa jurídica, não devem ser considerados os novos parâmetros
contábeis introduzidos por meio da Lei nº 11.638/07, devendo ser utilizados
os critérios anteriores à entrada em vigor desta lei.
A instituição do RTT veio através dos artigos 15 a 17 da Lei
nº 11.941/2009, ao determinarem que tal regime teria por objetivo possibilitar a
neutralidade fiscal dos lançamentos realizados sob a égide dos novos parâmetros
contábeis, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios
contábeis vigentes em 31 de dezembro de 20075§. Esse mesmo tratamento deve
ser dado às normas expedidas pela CVM e pelos demais órgãos reguladores que
visem alinhar a legislação específica com os padrões internacionais de contabilidade.
O RTT, segundo o artigo 15 da Lei nº 11.941/2009, in verbis, terá vigência
até a entrada em vigor de lei que discipline os efeitos tributários dos novos
métodos e critérios contábeis, sendo que os ajustes necessários à neutralidade
fiscal serão controlados no Livro de Apuração do Lucro Real (“LALUR”).
“Art. 15. Fica instituído o Regime Tributário de Transição – RTT de
apuração do lucro real, que trata dos ajustes tributários decorrentes
dos novos métodos e critérios contábeis introduzidos pela Lei nº
11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos arts. 37 e 38 desta Lei.
§ 1º O RTT vigerá até a entrada em vigor de lei que discipline os
efeitos tributários dos novos métodos e critérios contábeis, buscando
a neutralidade tributária.
6 Frise-se que o artigo 2º da Instrução Normativa RFB nº 949/09, que regulamentou o RTT, ratificou
expressamente a questão da neutralidade fiscal para os contribuintes que aderirem ao Regime,
verbis:
“Art. 2º As alterações introduzidas pela Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos arts. 37
e 38 da Lei nº 11.941, de 2009, que modifiquem o critério de reconhecimento de receitas, custos
e despesas computadas na escrituração contábil, para apuração do lucro líquido do exercício
definido no art. 191 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, não terão efeitos para fins de
apuração do lucro real e da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL)
da pessoa jurídica sujeita ao RTT, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e
critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput às normas expedidas pela Comissão de Valores
Mobiliários (CVM), com base na competência regulamentar conferida pelo § 3º do art. 177 da Lei
nº 6.404, de 1976, e pelos demais órgãos reguladores que visem alinhar a legislação específica
com os padrões internacionais de contabilidade.” (não destacado no original)
7 Imposto de Renda das Empresas. São Paulo: Ed. Atlas, 2010, p. 641.
Questão a ser verificada, portanto, para que se conclua pela aplicação ou não
do RTT é se houve, nos termos das alterações previstas nas Leis nº 11.638/2007
e 11.941/2009, mudança de critério contábil em determinados lançamentos
realizados sob a égide dos dispositivos legais em tela, em especial no que tange
aos critérios e regras para as taxas de depreciação e reconhecimento das despesas
geradas pela diminuição do valor do ativo imobilizado.
3. Depreciação
3.1 Considerações Iniciais
No cotidiano das empresas, em decorrência do uso, ou mesmo por ação
da natureza ou obsolescência, os bens de seu ativo imobilizado têm um prazo
limitado de vida útil econômica, na medida em que estes se desgastam no
decorrer da atividade operacional, acarretando a diminuição do seu valor, que
deverá ser reconhecido nas demonstrações financeiras das pessoas jurídicas em
contas denominadas pela contabilidade como “depreciação”.
A regulação da forma por meio da qual a depreciação deve ser contabilizada
se dá por meio da alínea a, dos parágrafos 2º e 3º, do artigo 183, da Lei nº
6.404/76, com redação dada pela Lei nº 11.941/2009, in verbis:
Art. 183: (...)
§ 2o A diminuição do valor dos elementos dos ativos imobilizado e
intangível será registrada periodicamente nas contas de: (Redação
dada pela Lei nº 11.941, de 2009)
a) depreciação, quando corresponder à perda do valor dos direitos
que têm por objeto bens físicos sujeitos a desgaste ou perda de
utilidade por uso, ação da natureza ou obsolescência;
§ 3o A companhia deverá efetuar, periodicamente, análise sobre a
recuperação dos valores registrados no imobilizado e no intangível,
a fim de que sejam: (Redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009)
I – registradas as perdas de valor do capital aplicado quando houver
decisão de interromper os empreendimentos ou atividades a que
10 Novo Padrão Contábil Brasileiro e os Impactos Fiscais no Registro das Despesas de Depreciação,
in Revista Dialética de Direito Tributário nº 166, p. 12.
11 Sergio de Iudícibus (Et. Alli). Manual de Contabilidade Societária. São Paulo: Editora Atlas, 2010,
p. 249.
12 Op. cit, pp. 249-250.
13 Art. 305. Poderá ser computada, como custo ou encargo, em cada período de apuração, a
importância correspondente à diminuição do valor dos bens do ativo resultante do desgaste pelo
uso, ação da natureza e obsolescência normal (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57).
14 Art. 305. (...)
§ 1º A depreciação será deduzida pelo contribuinte que suportar o encargo econômico do
desgaste ou obsolescência, de acordo com as condições de propriedade, posse ou uso do bem
(Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 7º).
§ 2º A quota de depreciação é dedutível a partir da época em que o bem é instalado, posto em
serviço ou em condições de produzir (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 8º).
§ 3º Em qualquer hipótese, o montante acumulado das quotas de depreciação não poderá
ultrapassar o custo de aquisição do bem (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 6º).
§ 4º O valor não depreciado dos bens sujeitos à depreciação, que se tornarem imprestáveis ou
caírem em desuso, importará redução do ativo imobilizado (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 11).
§ 5º Somente será permitida depreciação de bens móveis e imóveis intrinsecamente
relacionados com a produção ou comercialização dos bens e serviços (Lei nº 9.249, de 1995,
art. 13, inciso III).
que somente será permitida a depreciação de bens móveis ou imóveis cujo uso
esteja intrinsecamente relacionado com a produção ou comercialização dos
bens e serviços.
Merece destaque também o disposto nos artigos 309 e 310 do RIR/99.
No que tange ao disposto no artigo 309 do Regulamento15 em tela, o seu caput
determina que a quota de depreciação registrável na escrituração como custo
ou despesa operacional será determinada mediante a aplicação da taxa anual
de depreciação sobre o custo de aquisição dos bens depreciáveis:
Ademais, a análise dos parágrafos 1º e 2º do referido dispositivo
legal permite verificar que a quota anual de depreciação será ajustada
proporcionalmente, no curso do ano exercício, no caso de período de apuração
com prazo de duração inferior a 12 meses, e/ou nas hipóteses de acréscimo ou
baixa de bem no ativo da empresa.
Há ainda, nos termos dos dispositivos legais tratados em questão, a
possibilidade de a depreciação ser apropriada em quotas mensais, sendo
dispensado o ajuste da taxa para os bens postos em funcionamento ou baixados
no curso do mês.
O parágrafo 3º do artigo 309 do RIR/99 determina que a taxa anual de
depreciação será fixada em função do prazo durante o qual se possa esperar utilização
econômica do bem pelo contribuinte, na produção de seus rendimentos.
O artigo 310 do RIR/9916, por sua vez, determina em seu parágrafo 1º
que caberá a RFB, periodicamente, publicar o prazo de vida útil admissível
para fins fiscais, em condições normais ou médias, para cada espécie de bem,
ficando assegurado ao contribuinte o direito de computar a quota efetivamente
adequada às condições de depreciação de seus bens, desde que, em se tratando
de taxa diferente, fazendo a prova dos motivos pelos quais adotou uma taxa
diferente da publicada pelo Fisco.
Vê-se, portanto, que existe a possibilidade do contribuinte adotar os
valores fixados pela RFB ou, alternativamente, utilizar a quota efetivamente
depreciada, devendo, neste caso, fazer prova dessa adequação, através de um
laudo emitido pelo Instituto Nacional de Tecnologia, ou de outra entidade
oficial de pesquisa científica ou tecnológica, prevalecendo os prazos de vida
útil recomendados por essas instituições.
O Parecer Normativo CST nº 79/76 estabeleceu que se a pessoa jurídica
adotar taxa de depreciação inferior à permitida como dedutíveis, na apuração do
lucro real, não poderá utilizar taxas mais elevadas a fim de ajustar a depreciação
acumulada à taxa normal.
Pelo Parecer Normativo CST nº 192/72 (“PN CST 192/92”), o desgaste
provocado pelo uso intensivo ou anormal dos bens pertencentes ao ativo
imobilizado das pessoas jurídicas de direito privado poderá determinar a adoção
de taxas especiais de depreciação, devendo haver a comprovação da adequação
das taxas que utilizarem, ou, em caso de dúvida, justificá-las com base em laudo
técnico expedido por órgão oficial competente.
Ainda nos termos do PN CST 192/72, as empresas que empreguem os
coeficientes de depreciação acelerada em decorrência de expressa previsão
legal poderão também utilizar taxas especiais de depreciação, quando estas se
§ 1 A Secretaria da Receita Federal publicará periodicamente o prazo de vida útil admissível, em
condições normais ou médias, para cada espécie de bem, ficando assegurado ao contribuinte o
direito de computar a quota efetivamente adequada às condições de depreciação de seus bens,
desde que faça a prova dessa adequação, quando adotar taxa diferente (Lei nº 4.506, de 1964,
art. 57, § 3º).
§ 2 No caso de dúvida, o contribuinte ou a autoridade lançadora do imposto poderá pedir
perícia do Instituto Nacional de Tecnologia, ou de outra entidade oficial de pesquisa científica ou
tecnológica, prevalecendo os prazos de vida útil recomendados por essas instituições, enquanto
os mesmos não forem alterados por decisão administrativa superior ou por sentença judicial,
baseadas, igualmente, em laudo técnico idôneo (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 4º).
§ 3 Quando o registro do imobilizado for feito por conjunto de instalação ou equipamentos, sem
especificação suficiente para permitir aplicar as diferentes taxas de depreciação de acordo com a
natureza do bem, e o contribuinte não tiver elementos para justificar as taxas médias adotadas para
o conjunto, será obrigado a utilizar as taxas aplicáveis aos bens de maior vida útil que integrem
o conjunto (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 12).
17 Art. 311. A taxa anual de depreciação de bens adquiridos usados será fixada tendo em vista o
maior dos seguintes prazos:
I – metade da vida útil admissível para o bem adquirido novo;
II – restante da vida útil, considerada esta em relação à primeira instalação para utilização do bem.
Depreciação Acelerada Contábil
Art. 312. Em relação aos bens móveis, poderão ser adotados, em função do número de horas
diárias de operação, os seguintes coeficientes de depreciação acelerada (Lei nº 3.470, de 1958,
art. 69):
I – um turno de oito horas............................1,0;
II – dois turnos de oito horas.......................1,5;
III – três turnos de oito horas.......................2,0.
Parágrafo único. O encargo de que trata este artigo será registrado na escrituração comercial.
Art. 313. Com o fim de incentivar a implantação, renovação ou modernização de instalações e
equipamentos, poderão ser adotados coeficientes de depreciação acelerada, a vigorar durante
prazo certo para determinadas indústrias ou atividades (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 5º).
§ 1º A quota de depreciação acelerada, correspondente ao benefício, constituirá exclusão do
lucro líquido, devendo ser escriturada no LALUR (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 8º, inciso
I, alínea “c”, e § 2º).
§ 2º O total da depreciação acumulada, incluindo a normal e a acelerada, não poderá ultrapassar
o custo de aquisição do bem (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 6º).
§ 3º A partir do período de apuração em que for atingido o limite de que trata o parágrafo anterior,
o valor da depreciação normal, registrado na escrituração comercial, deverá ser adicionado ao
lucro líquido para efeito de determinar o lucro real.
§ 4º As empresas que exerçam, simultaneamente, atividades comerciais e industriais poderão
utilizar o benefício em relação aos bens destinados exclusivamente à atividade industrial.
§ 5º Salvo autorização expressa em lei, o benefício fiscal de que trata este artigo não poderá ser
usufruído cumulativamente com outros idênticos, exceto a depreciação acelerada em função dos
turnos de trabalho.
2005 2009
2005 2009
que ultrapassarem a taxa fixada pela RFB, que não estiverem de acordo com os
preceitos estabelecidos no artigo 310,§ 2º do RIR/99, serão indedutíveis para
efeito de apuração do IPRJ e da CSLL, devendo, nestes casos, haver a adição
do valor dos encargos de depreciação para efeito de determinação da base de
cálculo do IRPJ e da CSLL.
Assim, sob a argumentação de que a RFB conduzia e incentivava a adoção
das taxas por ela publicadas, a maioria das empresas adotava estas taxas também
para fins societários antes do advento das novas regras contábeis, sendo, de tal
sorte, legítimo enquadrar suas diferenças em relação às novas taxas, no comando
do art. 17 da nº Lei 11.941/2009.
Ademais, as disposições da legislação societária, especialmente, e de forma
mais enfática, a partir da edição da Lei nº 11.638/2007, determinam que a
depreciação deve levar em consideração a efetiva vida útil do bem para cada entidade,
em função de sua realidade técnica e econômica, transformaram a então exceção a
regra anteriormente vigente em regra a ser seguida na seara societária.
Na sistemática vigente antes das alterações das Leis nº 11.638/2007 e
11.941/2009, regulamentada pela NBCT 19.5, aprovadas pela Resolução CFC
nº 1.027/2005, as empresas adotavam, mesmo para fins contábeis, os valores
fixados pela RFB, não obstante as regras societárias de depreciação contábil
existente na Lei nº 6.404/76.
Todavia, com as alterações promovidas pelas referidas leis, houve a
necessidade da análise e do ajuste periódico do valor de recuperação dos valores
registrados no ativo imobilizado, bem como a revisão e alteração dos critérios
utilizados, tanto para a determinação da vida útil econômica do bem, quanto
para cálculo da depreciação. Dessa forma, não poderá mais ser adotada a prática
anterior das empresas em simplesmente utilizar, também para fins contábeis,
os valores das taxas de depreciação fixados pela RFB.
É importante destacar que as alterações dos métodos de registro das taxas
de depreciação é um exemplo da consolidação da dicotomia depreciação fiscal
versus depreciação contábil, oriunda da harmonização das regras contábeis
adotadas no Brasil com o padrão IFRS terminou por consolidar.
Assim, no que tange a depreciação contábil, o CPC 27 determinou que os
critérios utilizados para a verificação da vida útil econômica estimada do bem e
para o cálculo da depreciação deverão ser periodicamente ajustados e revisados,
pelo menos ao final do exercício, quando da elaboração das demonstrações
financeiras anuais.
A revisão e os ajustes dos critérios utilizados para a verificação da vida
útil econômica estimada do bem e para o cálculo de sua depreciação, conforme
estabelecido pelo CPC 27, se deve à necessidade de evitar que os ativos não
estejam registrados contabilmente por um valor superior àquele passível de ser
recuperado no tempo.
Nos termos do CPC 27, para se determinar o valor recuperável do ativo e
sua expectativa de vida útil econômica, deve se utilizar o denominado método do
impaiment, aplicando-se, para tal, o disposto em outro pronunciamento técnico
contábil, o CPC 01, que determina, independentemente de existir ou não
indício de desvalorização, que a entidade deverá testar, no mínimo anualmente,
a redução ao valor recuperável de um determinado ativo, comparando-se o seu
valor contábil com seu valor recuperável.
Para se realizar ao teste em questão, deve-se comparar o valor contábil com
o valor a ser recuperado, sendo este último o valor mais alto entre: (i) o valor
justo menos o custo de venda do bem, que corresponde ao valor de mercado
do referido bem, o qual pode vir a ser auferido por meio do levantamento do
valor de venda deste, ajustando-se por meio da adição de eventuais custos
incrementais decorrentes da alienação do ativo; ou, (ii) o valor em uso do
respectivo bem que corresponde ao valor presente nos fluxos de caixas futuros
que a entidade espera obter na utilização do referido bem.
Na hipótese do valor recuperável do ativo ser inferior ao seu valor
contábil, este valor deve ser reduzido para o seu valor recuperável, configurando
esta redução como uma perda por impairment, a qual deve ser tratada como
decréscimo de reavaliação e reconhecida no resultado da empresa.
O novo valor contábil resultante do teste por impairment será a base de
cálculo para a depreciação futura, voltando-se, a partir deste ponto, a aplicar a
sistemática de depreciação regulada pelo CPC 27.
No que concerne ao valor depreciável de determinado bem, importante
destacar que, segundo Fábio Piovesan Bozza, “o valor depreciável na contabilidade
corresponde ao custo de aquisição deduzido do valor residual, que é o montante líquido
que a empresa espera obter, com razoável segurança, por um ativo no fim da sua vida
útil econômica, deduzidos dos gastos esperados para a sua alienação (...). Significa
que o cálculo da depreciação contábil nunca terá por base todo o custo de aquisição do
bem. (...) a depreciação fiscal exibe características substancialmente diferentes daquelas
depreciação até então vigente, incluindo-se, assim, no rol das mudanças de método
ou critério contábil e, como tal, poderiam ser enquadradas no RTT, conforme será
a seguir demonstrado.
pelo Fisco, desde que obtenha laudo de entidade oficial de pesquisa científica
ou tecnológica recomendando tais taxas22.
Através do Parecer Normativo CST 96/78, as autoridades fiscais já
se pronunciaram no sentido de que “o LALUR não pode ser utilizado para
nele serem consignadas as exclusões que possam resultar da falta de registro,
na escrituração comercial, de custos ou despesas operacionais, ou, ainda, as que
tenham por objetivo complementar valor da mesma natureza insuficientemente
registrado (como é o caso da depreciação), uma vez que os valores que podem ser
excluídos do lucro líquido, na determinação do lucro real, são aqueles que, em
virtude da natureza exclusivamente fiscal, não reúnem requisitos para poderem
ser registrados na escrituração comercial, tais como os decorrentes de depreciação
acelerada e de exaustão mineral com base na receita bruta.”.
Com o advento do RTT, no entanto, a utilização do LALUR foi
ampliada23, tendo em vista que se permite neutralizar os efeitos, como já
mencionamos, das diferenças de métodos e critérios previstos na legislação
societária em relação àqueles adotados para fins fiscais.
Desta forma, a adoção do RTT permitiria às empresas continuar
considerando, para fins fiscais, as taxas de depreciação que adotavam até 31 de
22 “Art. 310. A taxa anual de depreciação será fixada em função do prazo durante o qual se possa
esperar utilização econômica do bem pelo contribuinte, na produção de seus rendimentos.
§1º A RFB publicará periodicamente o prazo de vida útil admissível, em condições normais ou
médias, para cada espécie de bem, ficando assegurado ao contribuinte o direito de computar a
quota efetivamente adequada às condições de depreciação de seus bens, desde que faça a prova
dessa adequação, quando adotar taxa diferente.
§2º No caso de dúvida, o contribuinte ou a autoridade lançadora do imposto poderá pedir
perícia do Instituto Nacional de Tecnologia, ou de outra entidade oficial de pesquisa científica ou
tecnológica, prevalecendo os prazos de vida útil recomendados por essas instituições, enquanto
os mesmos não forem alterados por decisão administrativa ou por sentença judicial, baseadas,
igualmente, em laudo técnico idôneo.”
23 Lei 11.941/2009:
“Art. 39. Os arts. 8o e 19 do Decreto-Lei no 1.598, de 26 de dezembro de 1977, passam a vigorar
com a seguinte redação:
“Art. 8o (...) § 2o Para fins da escrituração contábil, inclusive da aplicação do disposto no § 2o do
art. 177 da Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976, os registros contábeis que forem necessários
para a observância das disposições tributárias relativos à determinação da base de cálculo do
imposto de renda e, também, dos demais tributos, quando não devam, por sua natureza fiscal,
constar da escrituração contábil, ou forem diferentes dos lançamentos dessa escrituração, serão
efetuados exclusivamente em:
I – livros ou registros contábeis auxiliares; ou
II – livros fiscais, inclusive no livro de que trata o inciso I do caput deste artigo.
§ 3o O disposto no § 2o deste artigo será disciplinado pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.”
dezembro de 2007, sem prejuízo de vir a adotar outras para fins societários,
face aos ajustes na estimativa de vida útil a que ficam submetidas a partir de
2008, na vigência da Lei nº 11.638/2007. Para tanto, devem controlar tais
diferenças através de escriturações distintas, cujo elo de conciliação deve ser
informado através do FCONT.
Destaca-se o fato de que o parágrafo 3º, do artigo 183, da Lei das
Sociedades Anônimas, com redação dada pelas Leis nº 11.638/2007 e
11.941/2009, determina que a empresa deve efetuar análise sobre a recuperação
dos valores registrados no imobilizado e no intangível, de forma periódica,
de maneira que possa haver a revisão e ajuste dos critérios utilizados para
determinação da vida útil econômica estimada e, conseqüentemente, para
cálculo da depreciação.
Portanto, verifica-se que ocorreu uma mudança nos métodos e critérios
contábeis da depreciação, alteração de parâmetro esta que se não vier a ser
ajustada por meio do RTT surtirá efeitos significativos na apuração tanto do
IRPJ quanto da CSLL.
Neste sentido, podem ser destacados os processos de Solução de Consulta
nº 15/2011, proferido pela RFB da 10ª Região Fiscal, e 11/2011, proferido
pela RFB da 5ª Região Fiscal, a seguir transcritos:
SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 15 de 18 de Fevereiro de 2011
ASSUNTO: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ
EMENTA: LUCRO REAL. ENCARGOS DE DEPRECIAÇÃO.
AJUSTES DECORRENTES DA LEGISLAÇÃO SOCIETÁRIA.
EFEITOS TRIBUTÁRIOS. Os ajustes no cálculo da depreciação
de bens do ativo imobilizado determinados pelo art. 183, § 3º, inciso
II, da Lei nº 6.404, de 1976, com as alterações introduzidas pelo art.
1º da Lei nº 11.638, de 2007, e pelo art. 37 da Lei nº 11.941, de
2009, não terão efeitos para fins de apuração do lucro real da pessoa
jurídica sujeita ao Regime Tributário de Transição (RTT), devendo
ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios contábeis
vigentes em 31 de dezembro de 2007.
Dispositivos legais: Lei nº 6.404, de 1976, art. 183, § 3º, II; Lei nº
11.638, de 2007, art. 1º; Lei nº 11.941, de 2009, arts. 15, 17 e 37;
Decreto nº 3.000, de 1999 (RIR/1999), arts. 305, 307, 309, 310 e
312; IN RFB nº 949, de 2009.
Bibliografia
BOZZA, Fábio Piovesan. Novo Padrão Contábil Brasileiro e os Impactos Fiscais no Registro das
Despesas de Depreciação, in Revista Dialética de Direito Tributário nº 166, São Paulo: 2009.
HIGUCHI, Hiromi (et. Alli.). Imposto de Renda das Empresas. São Paulo: IR Publicações
Ltda., 2010.
IUDICIBUS, Sergio de (et. Alli.). Manual de Contabilidade Societária. São Paulo: Ed. Atlas,
2010.
MCMANUS, Kieran John. IFRS – Implementação das Normas Internacionais de Contabilidade
e da Lei nº 11.638/07 no Brasil. São Paulo. São Paulo: Ed. Quartier Latin, 2009.
OLIVEIRA, Edmar Andrade de. Efeitos tributários da lei nº 11.637/07. São Paulo: Ed. do
Autor, 2008.
OLIVEIRA, Edmar Andrade de. Imposto de Renda das Empresas. São Paulo: Ed. do Atlas,
2010.
Discussão sobre a
Aplicabilidade, para
Fins Tributários, da
Primazia da Essência
Gustavo Brigagão
Sócio Conselheiro do Ulhôa Canto, Rezende e Guerra – Advogados; Professor
de Direito Tributário no “Curso de Educação Continuada – Direito
Tributário” e no “Curso Aplicado de Indiretos” promovidos pela Fundação
Getúlio Vargas – FGV; Conferencista na Escola da Magistratura do Estado
do Rio de Janeiro – EMERJ; General Council Member da International
Fiscal Association – IFA; Diretor Secretário-Geral da Associação Brasileira
de Direito Financeiro – ABDF; Diretor Executivo do Centro de Estudos das
Sociedades de Advogados – CESA; Presidente da Câmara Britânica – RJ –
BRITCHAM-RJ; e Presidente do Comitê Legal da BRITCHAM-RJ.
1. Introdução
que tal orientação não pode ser aplicada para fins tributários (seja em interesse
do fisco, para que os tributos fossem quantificados a maior, seja em interesse dos
contribuintes, para que, eventualmente, os tributos fossem quantificados a menor).
E por que será que se concluiu que a aplicação, para fins tributários, da
segunda acepção da Primazia da Essência Sobre a Forma é inviável? Arriscamo-
nos a responder: porque logo se percebeu que fazê-lo equivaleria a defender
a Interpretação Econômica da Legislação Tributária, o que nos pareceria,
cumulativamente: (i) inviável; (ii) desnecessário e (iii) indesejável.
Passamos, a seguir, a nos aprofundarmos sobre cada uma dessas afirmações,
acrescentando ainda que, em nossa opinião (e observadas certas peculiaridades),
as mesmas também se aplicam à primeira acepção da Primazia da Essência
Sobre a Forma (aquela dirigida ao órgão regulador).
10 “A Interpretação das Leis Tributárias e a Teoria do Abuso das Formas Jurídicas e da Prevalência
do Conteúdo Econômico. Publicado pelo próprio autor. Porto Alegre: 1965, p. 7.
11 A Elisão Tributária e a Interpretação Econômica. Direito Tributário Atual, nº 24. São Paulo: Ed.
Dialética, 2010. p. 212.
12 A Interpretação Econômica no Direito Tributário. São Paulo: Editora Resenha Tributária, 1982. p.
19.
13 Curso de Direito Tributário. 29ª ed. São Paulo: Ed. Malheiros, 2008. p. 113.
14 Op. cit., p. 11.
15 Direito Tributário e Direito Privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. pp. 205-210.
16 Tradução de Alfredo Augusto Becker.
17 Op. cit., p. 210.
18 Fato Gerador da Obrigação Tributária. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977. pp. 75-76.
19 Isso não significa que inexistam decisões rejeitando a prática de operações artificiais, realizadas
sem substância econômica. A grande questão é que, ao fazê-lo, tais decisões não se valeram da
teoria da Interpretação Econômica da Legislação Tributária. Esse assunto será aprofundado adiante.
20 Op. cit., p. 7.
21 Elisão e evasão. Caderno de Pesquisas Tributárias. Vol. 13. São Paulo: Ed. Resenha Tributária,
p. 26.
22 Tipicidade da Tributação, Simulação e Norma Elisiva. São Paulo: Dialética, 2001. p. 40.
23 Curso de Direito Tributário Brasileiro. 9ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 233.
24 Op. cit., p. 213.
25 O Absurdo da Interpretação Econômica do Fato Gerador – Direito e sua autonomia – O Paradoxo
da Interdisciplinaridade. Revista de Direito Tributário, nº 97. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 7.
26 Planejamento Tributário. 2ªed. São Paulo: Dialética, 2008. p. 414.
Todavia, salvo melhor juízo, não nos parece que essa conclusão seja a mais
acertada. Ainda que se considere que o CPC nº 39 é regra legal, também o
são os artigos da LSA que dizem que a remuneração fixa paga a um acionista
preferencial resgatável é dividendo (arts. 17, 111, 203 etc.), e também o é o
art. 10 da Lei nº 9.249/95, que dispõe que os dividendos são isentos de imposto
de renda. Nesse caso, portanto, surgiria, quando muito, um conflito entre
normas legais, devendo prevalecer aquela que é de hierarquia superior e/ou que é
compatível com o nosso sistema constitucional e com o CTN. Neste particular,
não podemos esquecer que a contabilização pela forma jurídica é, também,
decorrente de normas legais.
Em suma, partindo da premissa de que as normas do Comitê de
Pronunciamentos Contábeis sejam regras legais, ter-se-ia a seguinte situação:
toda vez que a aplicação da essência econômica conduzisse a uma contabilização
distinta da resultante da forma jurídica, surgiria um conflito normativo; contudo,
como a contabilização pela forma jurídica resulta de norma superior, e, além
disso, é a única aceita pela Constituição Federal e pelo CTN como apta a gerar
efeitos tributários, parece-nos que a mesma deveria prevalecer.
Para encerrar, citamos João Francisco Bianco28, cujo texto bem sintetiza
o que foi dito nesta Seção:
“Mas, se para a contabilidade os eventos devem ser registrados em
função da sua essência econômica, como fica o Direito Tributário, onde
prepondera a natureza jurídica dos atos praticados? A incompatibilidade
entre os dois critérios é evidente, sendo absolutamente impossível
pretender conferir efeitos fiscais aos lançamentos contábeis feitos em
consonância com o princípio da prevalência da essência econômica
sobre a natureza jurídica. Isso por dois motivos.
Primeiro, porque não é possível que os membros do Comitê de
Pronunciamentos Contábeis possam editar resoluções que tenham
como consequência alterar a base de cálculo do imposto que
incide sobre a renda, nem, tampouco, alterar o disposto no próprio
CTN sobre o assunto. Semelhante pretensão seria evidentemente
inconstitucional, por desrespeito ao princípio da legalidade.
29 A conceituação de cada um destes institutos e teorias, bem como a relação existente entre cada
um deles, é assunto de alta complexidade que não integra o objeto deste artigo. Assim, não nos
aprofundaremos sobre isso, deixando para fazê-lo em outra oportunidade. Da mesma forma, nos
furtaremos de tecer qualquer juízo de valor sobre a aplicação dos mesmos pelos precedentes
administrativos que serão citados.
30 No momento em que este artigo foi escrito, em maio de 2011, foi noticiada a prolação de um
terceiro acórdão da CSRF neste caso, no qual se teria reformado o segundo e cancelado a autuação
fiscal. Esse terceiro acórdão ainda não foi formalizado, e, pelo que se divulgou na mídia, ele
se apoiou em uma questão processual (a incompetência da Delegacia de Julgamento de Porto
Alegre para interpor os embargos de declaração que foram recebidos com efeitos infringentes).
Seja como for, tais considerações não são relevantes para as conclusões apresentadas neste artigo.
31 Op. cit., p. 213.
35 Frisamos o “poderia” porque tais elucubrações são meros exercícios de imaginação e, ao aplicá-las
a um caso concreto, haveria outras variáveis a serem consideradas, que, em algumas situações,
poderiam até levar a uma carga tributária maior.
4. Conclusão
Embora a aplicabilidade para fins tributários da Primazia da Essência
Sobre a Forma apenas tenha começado gerar mais polêmica com a edição do
PCB e dos demais CPCs, que dispuseram que as DFs devem ser elaboradas
com base na essência econômica das transações, o fato é que essa determinação,
em sua segunda acepção (aquela dirigida aos contadores), já existe desde 1985,
quando o IBRACON emitiu a ECBC.
Sendo assim, no que diz respeito à segunda acepção da Primazia da Essência
Sobre a Forma, não nos parece que haja qualquer razão substancialmente nova em
defesa da aplicação da mesma para fins tributários, de sorte que as razões que a
preveniram nos últimos vinte e cinco anos continuam plenamente válidas.
No que se refere à primeira acepção (aquela dirigida ao órgão regulador,
isto é, a que determina que o próprio Comitê de Pronunciamentos Contábeis
deve editar normas que privilegiem a essência econômica em detrimento da
natureza jurídica), reconhecemos que ponderações adicionais podem se fazer
necessárias, mas que, ao final, ainda que se considerasse que os CPCs, ICPCs
e OCPCs são normas legais, elas deveriam ser igualmente inaplicáveis para
fins tributários sempre que conduzissem a uma contabilização conflitante com
a forma jurídica.
Nesse particular, parece-nos que a aplicação tributária da Primazia da
Essência Sobre a Forma, em quaisquer de suas acepções, seria, ao mesmo tempo:
(i) inviável; (ii) desnecessária; e (iii) indesejável.
A aplicação tributária da Primazia da Essência Sobre a Forma
seria inviável porque ela resultaria na cobrança de tributos com base nos
aspectos econômicos do fato gerador, o que equivaleria à implementação,
em caráter genérico, da teoria da Interpretação Econômica da Legislação
Tributária. Além de não ter sido criada com essa finalidade (desde sua
O Contrato de
Consórcio e a Lei nº
12.402/2011
Ian Muniz
· Comentários Introdutórios
O consórcio é um contrato que tem por objetivo permitir que duas ou
mais pessoas se associem para a execução de determinado empreendimento
econômico, sem que para tanto sejam considerados como tendo constituído
uma pessoa jurídica. Em suma, o atributo mais importante do consórcio
está no fato de que o mesmo não possui personalidade jurídica. Ou seja,
cada consorciado mantém a sua individualidade e autonomia como pessoa.
A utilidade do consórcio como instrumento para atividade empresarial
é inestimável, principalmente no que tange às atividades de construção e
operação de ativos de grande porte ou de infra-estrutura. Por exemplo,
a construção de uma usina hidrelétrica requer talentos diversificados,
abrangendo desde a atividade de construção civil até o fornecimento de
equipamentos tais como turbinas e geradores. Em muitos casos, é quase
impossível pretender que uma única empresa disponha de capacidade técnica,
financeira e industrial para para executar o contrato em sua completude.
Pretender que todos os ‘players’ em um empreendimento de grande
porte e complexidade sejam obrigados a constituir uma pessoa jurídica
para adimplir tal projeto (menos ainda se fundirem) seria pouco funcional
e produtivo. Permitir que essas empresas mantenham sua autonomia
e independência operacional, ainda que, por contrato de consórcio, se
obriguem a trabalhar de uma forma coordenada, resulta em uma melhor
alocação de ativos empresariais com flexibilidade e eficiência. Em suma,
obtém-se maior produtividade econômica, com maior proveito social.
Com efeito, na constituição de uma pessoa jurídica, os empresários
seriam forçados a transferir ativos empresariais para a referida sociedade,
o que na maioria das vezes não é seu desejo, haja vista que tais ativos serão
utilizados em benefício do consórcio apenas por um tempo limitado. Se
um empresário dispõe de um know-how, ou de uma máquina que lhe
confere uma vantagem competitiva em relação ao mercado, esse empresário
possivelmente estará disposto a ceder o uso desta máquina temporariamente
em benefício do empreendimento objeto do consórcio, mas não cogitaria em
1 Revista de Direito Mercantil – Industrial, econômico e financeiro; abr.-jun., 2005; vol. 138;
Malheiros, p. 203.
Do Objeto do Consórcio
A doutrina no Brasil é claramente polarizada no que tange ao objeto do
consórcio. De um lado, há autores, como o já acima citado José Alexandre Tavares
Guerreiro2, que adotam um posicionamento bastante restritivo no que tange ao
objeto do consórcio. Segundo essa corrente doutrinária, o consórcio constitui
uma associação empresarial de caráter temporário e uninegocial. Ou seja, um
consórcio somente poderia ter por objeto um único empreendimento.
Por outro lado, há autores que sustentam posição diametralmente oposta,
no sentido de que tal interpretação é excessivamente acadêmica e equivocada,
criando uma limitação socialmente indesejável ao objeto do consórcio.
O pomo da discórdia, quer dizer, divergência de opiniões, decorre da
redação do art. 278 e art. 279 da Lei de Sociedades por Ações (Lei nº 6.404/76
– LSA), que dispõe o que segue:
Art. 278. As companhias e quaisquer outras sociedades, sob o
mesmo controle ou não, podem constituir consórcio para executar
determinado empreendimento, observado o disposto neste Capítulo.
(...)
Art. 279. O consórcio será constituído mediante contrato aprovado
pelo órgão da sociedade competente para autorizar a alienação de
bens do ativo permanente, do qual constarão:
(...)
II – o empreendimento que constitua o objeto do consórcio;
III – a duração, endereço e foro;
Em suma, o fato de a LSA utilizar a frase “(...) executar determinado
empreendimento (...) no art. 278 e se referir ao objeto como “o empreendimento”
no singular no art. 279 autorizaria, no entender de um grupo de autores, a
conclusão de que o consórcio somente poderia contemplar como seu objeto um
único empreendimento. Ainda, tal empreendimento deveria ter uma limitação
clara no tempo, não sendo aceitável que o mesmo tenha existência por tempo
2 No mesmo sentido João Luiz Coelho da Rocha, no artigo Os Consórcios de Empresas e seu Trato
Tributário, Revista Dialética de Direito Tributário; vol.83; agosto de 2002; pp. 83-84.
Da Lei nº 12.402/2011
Há muito que o mercado ansiava pela possibilidade jurídica de o consórcio
celebrar contratos e cumprir com determinadas obrigações tributárias em
nome próprio, como, por exemplo, a emissão de notas fiscais ou a contratação
de empregados (com o cumprimento das obrigações acessórias decorrentes).
Entretanto, tal pretensão sempre esbarrou no fato de que, na ausência
de personalidade jurídica, faleceria aos consórcios capacidade para cumprir
com determinadas obrigações acessórias. Por exemplo, proceder à retenção
de imposto de renda na fonte sobre pagamentos feitos (folha de salários etc.);
emissão de faturas e o decorrente recolhimento de ICMS, IPI e PIS/COFINS
em relação a tal faturamento, etc.
(...)
Com efeito, perante terceiros o consórcio não se apresenta como
uma pluralidade inorgânica, atomística e desgarrada de consorciados,
atuando cada um por si, a seu livre critério. Não. Perante terceiros o
consórcio apresenta-se como um agrupamento coordenado que pode
(nuns casos) e deve (noutros) atuar coletivamente, “de mãos dadas”.
Voltando à análise da evolução da legislação tributária, no que tange
aos consórcios, cabe inicialmente citar o Parecer Normativo CST nº 05/76,
que reconhecia a inexistência de personalidade jurídica nos consórcios,
determinando o que segue:
Deste modo, considerada a forma complexiva da apuração do
lucro tributável, deve cada uma das pessoas jurídicas, apropriando
individualmente suas receitas e despesas, apresentar sua declaração
de rendimentos como contribuinte do imposto de renda, definido
no art. 95 do Regulamento aprovado pelo Decreto nº 76.186/75.”
Em suma, já na década de setenta (e antes mesmo da publicação da
LSA), havia o reconhecimento pelo fisco federal de que o consórcio não possui
personalidade jurídica, inclusive para fins do imposto de renda de pessoas
jurídicas. Cabe ainda citar o Ato Declaratório Normativo nº 21/84, que
esclarecia que os consórcios não estavam obrigados a apresentar declaração de
rendimentos, devendo o imposto de renda retido na fonte sobre os rendimentos
pagos ao consórcio ser compensado nas declarações de rendimentos dos
consorciados na proporção de suas participações.
Posteriormente, a Instrução Normativa SRF nº 14/98 veio a instituir a
obrigatoriedade de os consórcios se inscreverem no então Cadastro Geral de
Contribuintes – CGC (hoje Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas – CNPJ).
Cabe ainda transcrever o Processo de Consulta nº 70/2005 (SRRF/8ª
Região Fiscal):
DISPENSA DE ENTREGA DE DECLARAÇÕES. Os consórcios
não estão sujeitos à apresentação da Declaração de Informações
Econômico-Fiscais da Pessoa Jurídica (DIPJ), como também da
Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF),
da Declaração do Imposto de Renda Retido na Fonte (DIRF) e do
Demonstrativo de Apuração de Contribuições Sociais (Dacon). Cabe
a cada empresa consorciada, por ocasião da apresentação de suas
(...)
Art. 6º Nos pagamentos decorrentes das operações do consórcio
sujeitos à retenção na fonte do imposto de renda, da CSLL da
Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, na forma da legislação em
vigor, a retenção e o recolhimento devem ser efetuados em nome de
cada pessoa jurídica consorciada, proporcionalmente à sua participação
no empreendimento.
Art. 7º Nos recebimentos de receitas decorrentes das operações do
consórcio sujeitas à retenção do imposto de renda, da CSLL, da
Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, na forma da legislação em
vigor, a retenção deve ser efetuada em nome de cada pessoa jurídica
consorciada, proporcionalmente à sua participação no empreendimento.
Os leitores desculpem a longa transcrição acima, mas pareceu-nos
importante transcrever as partes mais relevantes da referida instrução normativa,
que em verdade tornou-se praticamente um regulamento do regime tributário
aplicável aos consórcios. Em suma, em consonância com o entendimento
doutrinário, todas as implicações tributárias em nível de tributos federais
deveriam ser levadas a efeito guardando estrita proporcionalidade entre a divisão
de receitas, custos e despesas, inclusive no que tange ao PIS/COFINS, seus
créditos para quem estiver no regime da não cumulatividade, e ao IPI.
Mais relevante, a instrução normativa já admitia a possibilidade de
os consórcios emitirem nota fiscal única em nome do consórcio, desde que
admitido pela legislação do ICMS e do ISS e que em seguida as receitas fossem
partilhadas, em função da proporcionalidade acima mencionada.
Mas no que tange às obrigações tributárias federais, prevalecia a
obrigatoriedade de todos os pagamentos e recebimentos sofrerem as devidas
retenções de fonte proporcionalmente em nome de cada consorciado. Em suma,
se houvesse a contratação de empregados em nome do consórcio, as obrigações
tributárias decorrentes da folha de pagamentos (IRF, previdência, etc.) deveriam
ser recolhidas proporcionalmente em nome de cada consorciado.
Claramente a solução preconizada na Instrução Normativa RFB
nº 834/2008 para fins dos tributos federais era insatisfatória para o mercado.
Com efeito, em 2010 a Associação Brasileira de Engenharia Industrial
(Abemi) ingressou com uma solicitação junto à Receita Federal no sentido de
aceitar a titularidade passiva dos consórcios em relação aos tributos federais
Considerações Gerais
sobre a Adaptação da
Legislação do Imposto
sobre a Renda às Novas
Normas Contábeis
I – Considerações introdutórias
1 Nas palavras do “Anteprojeto de Alteração da Lei nº 6.404/76, que dispõe sobre as Sociedades
por Ações”: “O anteprojeto de lei, embora atento à nossa realidade, procurou criar condições para
harmonizar as práticas contábeis adotadas no País e respectivas demonstrações contábeis com
as práticas e demonstrações exigidas nos principais mercados financeiros mundiais, tendo como
arcabouço teórico básico as recomendações do International Accounting Standards Committee
(IASC) (...)”.
2 Recentemente a Receita Federal expediu até mesmo o Parecer Normativo nº 1, de 29.07.11, a
propósito das diferenças no cálculo da depreciação de bens do ativo imobilizado decorrentes
da alteração da Lei nº 6.404/76. Foi exposta a opinião de que elas não terão efeitos para fins de
apuração do lucro real e da base de cálculo da CSL da pessoa jurídica sujeita ao RTT.
3 No referido PN 1/11 foi reafirmada a chamada neutralidade tributária das novas disposições da
contabilidade: “Ressalte-se que o disposto no art. 16 da Lei nº 11.941, de 2009, corrobora o
entendimento de que se deve buscar a neutralidade tributária durante o período de sujeição ao
RTT, seja ele facultativo ou obrigatório”.
5 P. ex.: RE 117.887-SP (“(...) não me parece possível a afirmativa no sentido de que possa existir renda
ou provento sem que haja acréscimo patrimonial, acréscimo patrimonial que ocorre mediante o
ingresso ou o auferimento de algo, a título oneroso” – Min. Carlos Velloso) e RE 172.058-1 (“O
elemento essencial do fato gerador é a aquisição da disponibilidade de riqueza nova, definida
em termos de acréscimo patrimonial” – Min. Marco Aurélio).
6 RE 210.465-6/MG, Min. Nelson Jobim.
7 Observe-se, porém, que afirmar que “o lucro real é conceito puramente legal e decorrente
exclusivamente da lei” (destacamos), como fez o STF no RE 210.465-6/MG (Min. Nelson Jobim),
tem um conteúdo de forte retórica. Transmite a sensação de que o legislador tem liberdade maior
do que a verdadeiramente possui. Se a renda da pessoa jurídica é aferida, nos termos da legislação
ordinária, por um entre três regimes, sendo um deles o chamado de lucro real, é óbvio que o
conceito de lucro real é puramente legal e decorrente exclusivamente da lei enquanto e somente
na medida em que se insere no conceito constitucional pressuposto de renda. Inversamente, é
não menos que óbvio que não se fixa a base de cálculo do IRPJ por meio apenas do conceito de
renda contido na Constituição e no CTN. Tal conceito dá um parâmetro, mas seus limites ainda
são largos de modo a conceder discricionariedade ao legislador.
8 Disse-o bem o STF: o lucro real não é um “(...) conceito ontológico, como se existisse, nos fatos,
uma entidade concreta denominada de ‘LUCRO REAL’. Não tem nada de material ou essencialista”
(RE 210.465-6/MG, Min. Nelson Jobim). Feliz também a colocação de Silvania C. Tognetti: “Como
sabemos, toda a forma de apuração da renda sempre permitirá uma
por meio da apuração das receitas e das despesas efetivamente apuradas pelo
contribuinte (segundo os critérios e regras vigentes em cada época e local).
De outro lado, a base de cálculo também pode ser aferida aplicando-se um
percentual, previsto na legislação, sobre a receita bruta, que, idealmente, não
deve se distanciar muito das efetivas margens de lucro.
Deve-se ter presente, porém, que, se a Constituição Federal e o CTN
não contêm um conceito de lucro real, sem dúvida elas trazem limitações ao
que pode ser determinado pela legislação ordinária, inclusive no que se refere
à apuração da base de cálculo do tributo.
Por isso, é afetada por tais limitações até mesmo a decisão discricionária
do legislador a respeito de qual será a relação do lucro tributável com o lucro
contábil ou societário, que é uma das muitas decisões sobre a apuração da
base de cálculo do IR. A respeito de tal relação, há três modelos distintos,
seguindo a lição de José Casalta Nabais13: (a) o modelo de dependência
total, de coincidência do lucro tributável com o lucro contábil; (b) o modelo
de autonomia, no qual o lucro tributável é apurado de maneira totalmente
autônoma face à apuração do lucro contábil; e (c) o modelo de dependência
parcial, intermediário entre os dois anteriores, em que o lucro tributável utiliza
princípios, conceitos, regras e até mesmo a própria apuração contábil concreta,
mas com adaptações que a adéquem aos objetivos visados pelo Estado para a
apuração tributária.
Nos termos do “caput” do artigo 6º do Decreto-Lei nº 1.598/77, era
adotado no Brasil o último modelo, de dependência parcial: “Lucro real é o lucro
líquido do exercício ajustado pelas adições, exclusões ou compensações prescritas ou
autorizadas pela legislação tributária”14. Já lucro líquido “(...) é a soma algébrica
base uma série de pressupostos que são mais construídos e convencionados do que efetivamente
verificados. O autor, baseando-se na lição de Einaudi, chega a comparar a busca do rendimento real
a um ‘puro mito’, ‘uma vã glória’, na qual somente os contabilistas acreditam” (Ob. cit., p. 258).
13 “Direito fiscal”, 4ª ed., Almedina, 2007, p. 576.
14 Bulhões Pedreira explica que isso seria inovação do Decreto-Lei: “A definição do lucro real
por referência ao lucro comercial é inovação do Decreto-Lei. Na legislação anterior, embora a
escrituração comercial fosse o meio de comprovar o lucro real (Lei nº 2.354/54, art. 2º; RIR/75,
art. 135), a própria lei tributária definia todos os elementos que deviam ser computados na
determinação do lucro real e não adotava claramente o montante do lucro apurado na escrituração
comercial como valor a ser ajustado para se chegar ao lucro real” (“Imposto sobre a renda – Pessoas
jurídicas”, vol. I, Justec, 1979, p. 223-224).
de lucro operacional (art. 11), dos resultados não operacionais, do saldo da conta
de correção monetária (art. 51) e das participações, e deverá ser determinado com
observância dos preceitos da lei comercial” (§ 1º).
Dentro da escolha feita pelo modelo de dependência parcial, o legislador
exerceu sua liberdade discricionária na fixação da base de cálculo do IRPJ. Ele
não atuou e não pode atuar com arbitrariedade, pois está limitado por todas
as determinações, diretas ou indiretas, explícitas ou implícitas, de matéria
especificamente tributária ou gerais, contidas na Constituição e no Código
Tributário Nacional15. O legislador é delimitado seja pelos princípios jurídicos
mais gerais (como o da dignidade da pessoa humana) aos mais específicos
(como a progressividade).
Iremos mencionar algumas dessas delimitações ao poder discricionário do
legislador. Mais adiante, ao tratar de certas alterações da nova contabilidade,
ver-se-á a relevância específica de tais limitações.
Entre elas estão o próprio conceito, genérico que seja, de renda e proventos
de qualquer natureza. Como explicou o STF, não pode haver tributação sem
que exista um acréscimo patrimonial, que se dá por fluxo de riqueza nova que
se acrescenta ao patrimônio pré-existente, por meio de ato oneroso. Como
diz Ricardo Mariz de Oliveira, Constituição e CTN ficaram em um terreno
híbrido em que as teorias clássicas da renda – renda-produto e renda-acréscimo
patrimonial – foram acolhidas16.
Ao mencionar fluxo e uma realidade pré-existente, tem-se de imediato
a idéia de tempo. Com efeito, é inviável discorrer sobre renda sem levar em
consideração um intervalo de tempo que possibilite a comparação do patrimônio
existente em certo momento com o patrimônio de momento posterior. Assim,
para verificar qual foi a renda, analisa-se período passado.
Renda, porém, não é receita. Para obter esta é necessário assumir custos e
despesas, sem os quais a renda não é gerada. Daí que só haverá efetiva tributação
15 Explica Humberto Ávila: “É que o conceito constitucional de renda não será fornecido pelo exame
isolado dos dispositivos que expressa e imediatamente digam respeito à matéria tributária, em
especial ao imposto sobre a renda”. E complementa: “O conjunto de normas pertencentes ao
direito tributário será fornecido, outrossim, pela compreensão sistemática dos dispositivos que
expressa ou implicitamente, imediata ou mediatamente, entrem em contato com os bens jurídicos
restringidos na concretização da relação obrigacional tributária (que envolva o imposto sobre a
renda)” (“Conceito de renda e compensação de prejuízos fiscais”, Malheiros, 2011, p. 14).
16 “Fundamentos do imposto de renda”, Quartier Latin, 2008, p. 200.
17 Bulhões Pedreira: “Diz-se que determinado bem do ativo da pessoa jurídica contém lucro potencial
quando seu valor no mercado excede o contábil, ou escritural, de modo que a pessoa jurídica tem a
possibilidade de, mediante troca no mercado, obter fluxo de renda que acrescerá a seu patrimônio.
(...) Esse lucro ainda é, todavia, apenas potencial: com modalidade de renda financeira, o lucro
pressupõe (por definição) um fluxo de dinheiro (ou de outros direitos patrimoniais) que acresce
ao patrimônio” (ob. cit., p. 278). Ricardo Mariz de Oliveira segue o mesmo caminho, fazendo
referência à compra de um bem por valor inferior ao que ele efetivamente vale no mercado ou
o caso de um ganho potencial que vai se formando paulatinamente, por meio da valorização do
bem. E afirma: “Assim, somente pela venda e pela aquisição da disponibilidade jurídica sobre o
ganho, embutido no preço de venda, ocorre a realização da renda. E, antes disso, não há o que
tributar” (ob. cit., p. 374).
18 Contudo, a realidade não é feita de separações evidentes, como compartimentos estanques
que não se comunicam um com o outro. Bem diferentemente, a configuração de certo dado de
fato muitas vezes acontece paulatinamente, sem que se possa identificar, com objetividade não
questionável, quando ele se faz presente. Assim, p. ex., pode ser difícil precisar quando uma perda
está caracterizada, deixando de ser meramente potencial (vide as discussões sobre a PDD). Daí
a legislação criar parâmetros.
19 O grau exato de segurança jurídica é decisão que cabe ao legislador, novamente dentro de sua
discricionariedade. É certo, porém, que a exigência de segurança é maior no direito tributário
(assim como no penal) do que em outras áreas do direito.
20 “Direito tributário, direito penal e tipo”, 2ª ed., RT, 2007, pp. 138-139.
e 11.941/09”, in “Direito tributário, societário e a reforma da Lei das S/A – vol. II”, coord. Sergio
André Rocha, 2010, p. 77). A existência de aspectos positivos e negativos da influência das regras
fiscais na apuração contábil é reconhecida também pelos respeitados autores do “Manual de
contabilidade societária”, Sérgio de Iudícibus, Eliseu Martins, Ernesto Rubens Gelbeck e Ariovaldo
dos Santos, da FIPECAFI: “A contabilidade sempre foi muito influenciada pelos limites e critérios
fiscais, particularmente os da legislação do Imposto de Renda. Esse fato, ao mesmo tempo em que
trouxe à Contabilidade algumas contribuições importantes e de bons efeitos, limitou à evolução
dos Princípios Fundamentais de Contabilidade ou, ao menos, dificultou a adoção prática de
princípios contábeis adequados, já que a Contabilidade era feita pela maioria das empresas
com base nos preceitos e formas de legislação fiscal, a qual nem sempre se baseava em critérios
contábeis corretos” (Atlas, 2010, p. 1). E não se trata de algo restrito ao Brasil. Eldon S. Hendriksen
e Michael F. Van Breda fazem comentário semelhante: “Isto não quer dizer que as várias leis
de imposto não tenham exercido um impacto significativo sobre a prática da contabilidade em
muitas áreas. Foram importantes para colocar a prática contábil média no nível das melhores
empresas de sua época. Isto produziu um aperfeiçoamento das práticas gerais de contabilidade
e ajudou a preservar uniformidade” (“Teoria da contabilidade”, trad. da 5ª ed. americana, Atlas,
1999, p. 23). Por fim, vale fazer referência também ao português Saldanha Sanches: “O Código
do IRC não se limita à sua função primordial, que é a de regular o balanço fiscal. Preenchendo
o vazio existente no ordenamento jurídico português no campo do Direito do Balanço, contém
normas gerais tão importantes para a quantificação do patrimônio das sociedades comerciais
como para a determinação – e é este o objectivo central do IRC – do lucro tributável” (“Do plano
oficial de contabilidade aos IAS/IFRS”, in “O direito do balanço e as normas internacionais de
relato financeiro”, org. Francisco de Souza Câmara et alii, Coinbra Editora, 2007, p. 61). Se tal
influência foi importante historicamente, porém, é certo ser recomendável a maior separação entre
contabilidade societária e contabilidade fiscal objetivada pela Lei nº 11.638/2007.
22 Daí a definição de ativo, dado pelo Pronunciamento Conceitual Básico (Delib. CVM 539/08) do
CPC: “Ativo é um recurso controlado pela entidade como resultado de eventos passados e do
qual se espera que resultem futuros benefícios econômicos para a entidade”. Note que o ponto
fulcral da definição não se pauta em critérios jurídicos.
23 “Essência sobre a forma e valor justo: duas faces da mesma moeda”, in “Controvérsias jurídico-
contábeis – Aproximações e distanciamentos”, coord. Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro
Broedel Lopes, Dialética, 2010, p. 465.
“Para que a informação represente adequadamente as transações e outros eventos que ela
se propõe a representar, é necessário que essas transações e eventos sejam contabilizados
e apresentados de acordo com a sua substância e realidade econômica, e não meramente
sua forma legal. A essência das transações ou outros eventos nem sempre é consistente
com o que aparenta ser com base na sua forma legal ou artificialmente produzida”.
A contabilidade, então, não se ampara em critérios jurídicos, sempre
mais objetivos, mas, sim, em critérios econômicos, de maior subjetividade e
imprecisão24. Trata-se de opção, não certa ou errada, mas adequada ou não
para os fins visados. Acredita-se que os usuários das informações contábeis
(investidores atuais e potenciais, empregados, bancos e eventuais credores de
empréstimos, fornecedores, clientes, governo e público em geral) têm uma
maior necessidade de informações que reflitam não tanto a situação patrimonial
jurídica da sociedade, mas sim sua situação econômica efetiva.
Daí a imposição de critérios de forte caráter subjetivo, como valor justo,
valor em uso, “impairment” e outros. Isso traz certo grau de inexatidão aos
registros contábeis, mas não se deve confundir subjetivismo com arbitrariedade.
Daí Sérgio de Iudícibus falar de um “subjetivismo responsável”25.
Esse maior nível de subjetivismo é obviamente acompanhado de maior
atenção às situações específicas de cada empresa. Cada caso deve ser analisado
em função de suas características particulares, com o objetivo de identificar a
realidade econômico-empresarial individual.
Entende-se com isso porque a nova contabilidade é pautada muito mais
em princípios do que em regras. Estas são mais objetivas e determinadas,
padronizam o tratamento, sem dar tanta margem à situação individual, que os
princípios propiciam. Não que não existam regras, elas existem, mas devem
se limitar fortemente a ser uma forma para aplicar princípios. Desse modo, as
normas contábeis atuais podem até ser “(...) razoavelmente detalhadas mas não
24 Óbvio que não falamos em termos absolutos: nem há total objetividade nos critérios jurídicos,
nem total subjetividade de critérios econômicos. Trata-se, sim, de uma tendência maior ou menor
em um ou em outro sentido.
25 “Subjetivismo responsável é a faceta moderna da objetividade tradicional, às vezes por demais
apegada à forma, aos documentos comprobatórios e ao que é tangível. (...) significa desvendar
a incerteza naquela parcela que se apresenta como risco calculável, utilizando as técnicas
de previsão, quantitativas e de análise mais avançadas. No fundo, saber usar o subjetivismo
responsável é tudo que se requer de um contador moderno, principalmente na ótica da nova
Contabilidade brasileira, atrelada à internacional” (ob. cit., p. 466).
28 Diz Bulhões Pedreira: “Demonstrações financeiras são quadros elaborados com base em
escrituração mercantil e acompanhados de notas explicativas que apresentam, de modo resumido
e com disposição que facilita sua compreensão, informações quantificadas sobre o patrimônio da
companhia. Esses quadros são designados demonstrações porque revelam, ou dão a conhecer,
aspectos do patrimônio, e são financeiros porque fornecem informações sobre as finanças da
companhia” (“Finanças e demonstrações financeiras da companhia”, Forense, 1989, p. 627).
29 Convém insistir que não há objetividade absoluta nas normas tributárias (assim como não há
subjetividade absoluta nas normas contábeis, o que seria sinônimo para arbitrariedade). Há,
sim, um nível de objetividade superior. Todavia, ela é alvo de disputas constantes, seja em
discussões teóricas e abstratas, seja em casos concretos. O tema de planejamento fiscal é excelente
exemplo disso. Aqueles que anseiam por maior poder para Administração Fiscal controlar atos
elisivos defendem normas de maior conteúdo subjetivo, enquanto aqueles que acreditam que as
normas superiores garantem maior liberdade aos contribuintes pregam a objetividade das normas.
Em casos concretos não é diferente, a depender da situação, pode-se flagrar Administração Fiscal
e contribuintes ora sustentando a objetividade na interpretação das normas, ora a subjetividade,
conforme a situação em que estejam.
30 Maior ou menor amparo é sempre uma idéia relativa, no caso, em comparação com a nova
contabilidade.
32 Eldon S. Hendriksen e Michael F. Van Breda assim se expressam sobre esse ponto: “Quando
exploramos as origens teóricas da contabilidade fiscal, descobrimos rapidamente que os objetivos
da contabilidade fiscal são muito distintos dos objetivos de divulgação de dados financeiros. O
IRS não está tão interessado em medir o lucro de uma empresa quanto em determinar a base para
fins de tributação. Em conseqüência, as conclusões da contabilidade fiscal são irrelevantes, para
nossos fins.” (ob. cit., p. 23).
33 “Essa independência da Contabilidade em relação à tributação é essencial ao processo de
convergência às normas internacionais de contabilidade. (...) Ou seja, a chamada neutralidade
fiscal é uma condição para o processo de convergência. As normas fiscais não podem interferir
na contabilidade se quisermos um padrão contábil internacional único” (Alexsandro Broedel
Lopes e Roberto Quiroga Mosquera, ob. cit., p. 80). Igualmente: “Do ponto de vista tributário, há
margem de licitude para a utilização dos conceitos intermediários fiscais quando se der renúncia
fiscal. Mas, sob a perspectiva societária, a obrigatoriedade de seu uso é prejudicial em termos
de reconhecimento, mensuração e evidenciação dos fenômenos econômicos interpretados pela
Contabilidade, trazendo prejuízos aos usuários das demonstrações financeiras. Fenômeno que o
legislador, enfim, não deve ignorar” (Alexandre S. Pacheco, “O uso de conceitos intermediários
contábeis, jurídicos e fiscais em matéria tributária”, in “Controvérsias jurídico-contábeis –
Aproximações e distanciamentos”, coord. Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel
Lopes, Dialética, 2010, p. 50).
efeitos fiscais da nova contabilidade não interessa apenas àqueles que analisam o
tema sob a ótica tributária, mas também aos que se detêm sob a ótica contábil.
Contudo, não se trata de uma imposição, mas, sim, de uma escolha entre
opções possíveis. Como dissemos, a escolha do modelo de relação da apuração
do lucro tributável com a apuração contábil está no poder discricionário do
legislador. Este pode optar por manter o modelo de dependência parcial.
Todavia, se o fizer, deverá ter cuidado acentuado na adoção do tratamento
contábil para a apuração fiscal e garantir o respeito às normas jurídicas
superiores de apuração do lucro tributável. Inevitavelmente, haverá maior grau
de separação entre lucro tributável e lucro contábil, com acréscimo de trabalho
e complexidade para realizar as adaptações necessárias.
Independentemente dessa conclusão, é pertinente analisar alguns dos
pontos da nova sistemática contábil, para verificar sua adequação à apuração
do lucro tributável.
38 O presente estudo não é o local para discutir a admissibilidade de negócios jurídicos indiretos
com fins exclusivamente tributários, a caracterização de abuso de direito e fraude à lei no campo
tributário e a viabilidade de sua desconsideração pela Administração Fiscal. Com o objetivo de
simplificar, fazemos referência, neste estudo, apenas a negócios indiretos.
39 Ricardo Mariz de Oliveira também observa este ponto: “Esta dissidência também pode se manifestar
(com quase certeza vai se manifestar) perante um negócio jurídico indireto, ou melhor, a prática de
um negócio jurídico indireto muito provavelmente vá colocar o encarregado da contabilidade da
empresa contratante na posição de ter que ignorar o que a empresa contratou, como no clássico
exemplo do emprego adequado de um contrato de compra e venda com pacto de retrovenda,
que as partes tenham contraído validamente (porque sem simulação ou qualquer outra infração
legal) em substituição a um contrato de mútuo com garantia real” (ob. cit., pp. 408-409).
40 O Pronunciamento Técnico CPC 01 prevê quais ativos não estão submetidos à sistemática em
questão.
que não exceda seus valores de recuperação. Um ativo está registrado contabilmente por
valor que excede seu valor de recuperação se o seu valor contábil exceder o montante a
ser recuperado pelo uso ou pela venda do ativo. Se esse for o caso, o ativo é caracterizado
como sujeito ao reconhecimento de perdas, e o Pronunciamento Técnico requer que a
entidade reconheça um ajuste para perdas por desvalorização. O Pronunciamento
Técnico também especifica quando a entidade deve reverter um ajuste para perdas por
desvalorização e estabelece as divulgações requeridas”.
A premissa do teste de “impairment” e do “valor recuperável” é de que a
entidade, cujos ativos são contabilizados, tem o objetivo final de gerar receitas,
de tal modo que todo ativo é relevante na medida em que igualmente seja
capaz de gerar tais receitas, sendo possível, dessa forma, recuperar o custo
envolvido na sua aquisição. Não é exato, portanto, manter ativos por valor
superior àquele passível de recuperação.
Nota-se não só a concordância de tal tratamento com os parâmetros
fundamentais da nova contabilidade, como também a decorrência lógica deles:
as transações, os eventos e os bens devem ser registrados por sua substância
econômica e um ativo, para uma entidade empresarial, só tem valor enquanto
for possível ao menos recuperar seu valor de alguma forma. Assim, se um ativo
tiver sido adquirido ou estiver registrado por uma quantia superior ao seu valor
recuperável, isso deve ser acusado, diminuindo-se o valor do bem. No entanto,
isso é feito – mantendo-se a característica da prudência – apenas para reduzir
o valor dos ativos, não para aumentá-los.
É igualmente perceptível, no teste de “impairment”, a visão prospectiva,
para o futuro. Embora, p. ex., o ativo tenha sido adquirido por certa quantia e
tenha sofrido depreciação parcial, o seu valor na contabilidade não deverá estar
ligado (apenas) a esses fatores passados. O registro contábil terá ligação com essa
previsão de futuro: qual o valor passível de recuperação econômica desse ativo.
Nos termos do Pronunciamento Técnico CPC 01: “Valor recuperável de
um ativo ou de unidade geradora de caixa é o maior montante entre o seu valor justo
líquido de despesa de venda e o seu valor em uso”. Já valor justo líquido de despesa
de venda “(...) é o montante a ser obtido pela venda de um ativo ou de unidade
geradora de caixa em transações em bases comutativas, entre partes conhecedoras e
interessadas, menos as despesas estimadas de venda”. E valor em uso “(...) é o valor
presente de fluxos de caixa futuros esperados que devem advir de um ativo ou de
unidade geradora de caixa”.
41 Não somos radicais ao ponto de entender que jamais deverá ocorrer tal efeito. Pode chegar
um momento em que ocorra tal desenvolvimento das regras e da prática contábeis e
amadurecimento de contribuintes e Administração Fiscal que as desvantagens apontadas
sejam superadas.
VII – Depreciação
O item 6 do Pronunciamento Técnico CPC 27 (Delib. CVM 583/2009)
conceitua depreciação como “a alocação sistemática do valor depreciável de um
ativo ao longo de sua vida útil”. Como regra, os elementos que integram o Ativo
Imobilizado têm um período limitado de vida útil econômica. Com o decorrer
do tempo, eles se desgastam, perdem sua utilidade, podendo se tornar obsoletos.
“Desta forma, o custo de tais ativos deve ser alocado de maneira sistemática aos
exercícios beneficiados por seu uso no decorrer de sua vida útil econômica. (...) Logo,
a depreciação é o pedaço do caixa investido que precisa ser recuperado pelo caixa a ser
produzido pelas receitas outras da empresa de venda de produtos, serviços, receitas
financeiras, de aluguéis etc.”42.
Trata-se, portanto, de elemento de grande importância para a correta
informação da situação econômico-financeira de uma empresa. Assim é não
somente para checar a robustez patrimonial, mas também para bem aferir os
custos de produção e os lucros da empresa.
A depreciação também é relevante na apuração do lucro tributável. Uma
maior taxa de depreciação aumentará os custos e despesas, que reduzirão o
lucro e diminuirão o IRPJ e a CSL a pagar. Daí a atenção de contribuintes e
Administração Fiscal com este tema.
Justamente por isso, ao longo do tempo o Poder Público aprovou normas
com vistas a evitar que a depreciação fosse super-dimensionada, diminuindo
os tributos no momento inicial, o que representaria uma forma de as empresas
se financiarem com recursos que pertencem à sociedade. Novamente tendo
em vista a praticabilidade e a segurança, foram estabelecidas regras gerais,
padrões aplicáveis igualitariamente aos contribuintes. De outro lado, abria-
se a oportunidade de a empresa provar sua situação específica, com taxa de
depreciação diferente da padrão, de modo a aumentá-la.
Ocorre que um grande número de empresas simplesmente adotava na
apuração contábil as taxas admitidas pela legislação fiscal. Isto tinha o potencial
de deturpar a real situação econômico-financeira da empresa. Com efeito, bens
que na vida real se depreciavam mais lentamente, rapidamente tinham seu
43 “62 – Vários métodos de depreciação podem ser utilizados para apropriar de forma sistemática
o valor depreciável de um ativo ao longo da sua vida útil. Tais métodos incluem o método da
linha reta, o método dos saldos decrescentes e o método de unidades produzidas. A depreciação
pelo método linear resulta em despesa constante durante a vida útil do ativo, caso o seu valor
residual não se altere. O método dos saldos decrescentes resulta em despesa decrescente durante
a vida útil. O método de unidades produzidas resulta em despesa baseada no uso ou produção
esperados. A entidade seleciona o método que melhor reflita o padrão do consumo dos benefícios
econômicos futuros esperados incorporados no ativo. Esse método é aplicado consistentemente
entre períodos, a não ser que exista alteração nesse padrão.”
44 Exemplo de subjetivismo é o item 57 do CPC 27: “57. A vida útil de um ativo é definida em
termos da utilidade esperada do ativo para a entidade. A política de gestão de ativos da entidade
pode considerar a alienação de ativos após um período determinado ou após o consumo de uma
proporção específica de benefícios econômicos futuros incorporados no ativo. Por isso, a vida
útil de um ativo pode ser menor do que a sua vida econômica. A estimativa da vida útil do ativo
é uma questão de julgamento baseado na experiência da entidade com ativos semelhantes.”
45 Douglas G. Odorizzi, “Depreciação no resultado tributável”, Valor Econômico, Cad. Legislação
& Tributos, 11.05.2011.
46 Já enquanto durar o RTT, deve-se seguir as regras fiscais, como acertadamente decidiu a
Superintendência Regional da Receita Federal da 5ª Região Fiscal, no Processo de Consulta
nº 11/2011: “REGIME TRIBUTÁRIO DE TRANSIÇÃO – RTT. DEPRECIAÇÃO. CRITÉRIOS DE
CONTABILIZAÇÃO. PROCEDIMENTOS DE REVERSÃO DOS EFEITOS. A pessoa jurídica sujeita
ao Regime Tributário de Transição – RTT deve adotar o procedimento previsto no artigo 17 da
Lei nº 11.941, de 2009, no tocante ao registro contábil da depreciação e à reversão dos
Também aqui somos de opinião que convém manter a separação das esferas
contábil e fiscal. A preocupação da Administração Fiscal de que contribuintes
exagerariam nas taxas de depreciação, para com isso reduzir tributos, tem certa
procedência. Tal prática seria igualmente deletéria para as demonstrações
financeiras, deturpando a situação econômico-financeira real. Ainda que grandes
empresas e as de capital aberto estejam submetidas a cuidadosas auditorias,
esta não é a realidade de muitas empresas.
Ao menos no cenário atual, sem maior amadurecimento da aplicação da
nova sistemática contábil e em um quadro de elevada desconfiança mútua entre
Administração Fiscal e contribuintes, é difícil conceber que a Administração
possa dispensar padronizações como a que vigora atualmente em relação ao
tema da depreciação. Vislumbramos igualmente insegurança e incerteza para os
contribuintes, que estariam permanentemente submetidos ao risco de agentes da
Administração Fiscal entenderem inadequadas as taxas de depreciação adotadas.
De outro lado, a não adoção integral do tratamento contábil de depreciação
não impede que a legislação fiscal venha a ser parcialmente afetada (via expedição
de novas normas e regulamentações) pelo tratamento contábil, de modo a
aproximar a depreciação para efeitos fiscais da depreciação contábil e, portanto,
da realidade econômica. Assim, a aplicação das taxas reais de depreciação trará
um dado de fato que deverá ser considerado pela Administração Fiscal para
estabelecer, se o caso, novas taxas-padrão de depreciação. Outras normas fiscais
poderiam ser alteradas, como a do artigo 311 do RIR/99, que fixa a taxa anual
de depreciação de bens adquiridos usados como a maior dos seguintes prazos:
metade da vida útil admissível para o bem adquirido novo ou o restante da vida
útil, considerada esta em relação à primeira instalação para utilização do bem47.
Em outras palavras, mesmo adotando-se o modelo de autonomia, isso
não significa que a apuração do lucro tributável não possa ser afetada pela
sistemática de apuração contábil. Ao se determinar a tributação da renda,
IX – Ágio e deságio
Nos termos do Pronunciamento Técnico do CPC nº 15 (Delib. CVM
nº 580/09), ágio por rentabilidade futura ou “goodwill” “(...) é um ativo
que representa benefícios econômicos futuros resultantes dos ativos adquiridos
em combinação de negócios, os quais não são individualmente identificados e
separadamente reconhecidos”. Ou seja, ágio por rentabilidade futura, para a
CVM e o CPC, é somente o benefício econômico futuro esperado em razão de
bens não identificados individualmente. Dessa forma, torna-se necessário em
primeiro lugar verificar o valor justo de cada um dos bens da empresa/negócio
adquirida/o (bem como de seus passivos) e somente o que exceder a isso – se
houver tal parcela – será caracterizado com ágio por rentabilidade futura48.
O tratamento na contabilidade do ágio por rentabilidade futura foi
modificado: antes da Lei nº 11.638/2007 ele era amortizado, mesmo sem
incorporação, fusão ou cisão; após, ele não pode mais ser amortizado, devendo
ser testado periodicamente para verificar se sua substância econômica permanece
(teste de “impairment”). “A amortização do goodwill por um determinado período
inferia que aquele ativo geraria benefícios por um período determinado. Por outro
lado, não efetuar a amortização do goodwill significa dizer que não há um período
específico para que aquele ativo traga benefícios econômicos, ou seja, a empresa pode
considerar que aquele goodwill vai gerar benefícios eternamente e consequentemente
afetar toda a geração de caixa futura decorrente daquela combinação de negócios,
dando bastante subjetividade ao assunto e tornando-o mais complexo”49.
48 Tivemos oportunidade de analisar este ponto em mais detalhes em trabalho anterior: “Análise
da amortização de ágio frente às Leis nºs 11.638/2007 e 11.941/2009”, in “Direito tributário,
societário e a reforma da Lei das S/A – vol. II”, coord. Sergio André Rocha, 2010, p. 301).
49 Paulo José Machado, Wilson José Ozório Moraes e Tânia Regina Sordi Relvas, in “Manual de normas
internacionais de contabilidade – IFRS versus normas brasileiras”, Ernest & Young e Fipecafi, Atlas,
2009, p. 193. Como explicam Luciana Rosanova Galhardo e Jorge Ney de Figueirêdo Lopes Junior,
a “justificativa para o tratamento contábil a ser aplicado ao ágio por rentabilidade futura – de que
esse ágio seria um ativo de duração indefinida e nessa condição não poderia ser amortizado – soa
coerente com os princípios que norteiam as normas contábeis internacionais, inclusive o de primazia
da essência sobre a forma. (...) não se pode perder de vista que as normas contábeis são elaboradas
com vistas a viabilizar o bom funcionamento do mercado” (ob. cit., p. 230).
50 Item 34 do CPC 15: “Ocasionalmente, um adquirente pode realizar uma compra vantajosa, assim
entendida uma combinação de negócios cujo valor determinado pelo item 32(b) é maior que
a soma dos valores especificados no item 32(a). Caso esse excesso de valor permaneça após a
aplicação das exigências contidas no item 36, o adquirente deve reconhecer o ganho resultante
no resultado do período, na data da aquisição. O ganho deve ser atribuído ao adquirente.”
51 “Manual de contabilidade societária – FIPECAFI”, Altas, 2010, p. 422.
52 Nesse sentido, entre outros, Gustavo Brigagão e Carlos Scharfstein, “Aproveitamento fiscal de ágio
fundamentado em perspectivas de rentabilidade futura após o advento das Leis nºs 11.638/07 e
11.941/09”, in “Direito tributário, societário e a reforma da Lei das S/A – vol. II”, coord. Sergio
André Rocha, 2010, p. 248).
no plano federal. Serviu, com isso, como um estímulo a mais para a compra de
empresas públicas a serem privatizadas52. A despeito disso, não se pode dizer
que tal tratamento seja inapropriado. Se o ágio é parte do custo da participação
societária e tem como fundamento a perspectiva de lucros futuros, tais lucros,
quando se realizarem, não configurarão, para o investidor, verdadeiro ganho, mas
apenas confirmação de valor que já foi arcado por ele. Logo, amortizar o ágio
contra o lucro não significaria mais que ligar uma coisa à outra e demonstrar
a inexistência de ganho.
A legislação tributária, porém, nunca estabeleceu claramente requisitos
para classificar o ágio em um ou outro fundamento econômico. Isso não
representava um problema originariamente, quando não estava previsto
tratamento diferente para os distintos tipos de ágio. Ocorre que tal quadro
continuou quando a legislação estipulou a diferença de tratamento para o ágio
por rentabilidade futura53 . Os contribuintes passaram a desejar classificar o ágio
sob esse fundamento e a encontrar resistência da Administração Fiscal. Em
síntese, a deficiência na legislação fiscal – não quanto ao tratamento, mas sim
quanto à falta de clareza em relação à existência de requisitos para identificar
o fundamento do ágio e quais seriam eles – tem gerado desnecessárias disputas
e insegurança na relação Fisco-contribuinte54.
Com a perspectiva de normas para adaptar a legislação fiscal, de forma
não temporária, à nova contabilidade, coloca-se a questão se seria aceitável e
recomendável a adoção do tratamento contábil do ágio por rentabilidade futura,
vedando sua amortização.
53 Natanael Martins comenta este ponto: “Em segundo lugar, é necessário também ter em mente que,
desde o advento do Dec.-lei 1.598/77, quando o ágio pago na subscrição de ações ou na aquisição
de investimentos somente tinha relevância quando da alienação ou liquidação de investimentos,
o legislador não se preocupou em tratar de regras sobre a sua formação, apenas dispondo que o
lançamento do ágio ou deságio deverá indicar, dentre os seguintes, seu fundamento econômico:
(...) Por outro lado, mesmo com o advento da Lei 9.532/97, em que o legislador, em operações de
cisão, incorporação e fusão, passou a admitir que o ágio pago na subscrição ou na aquisição de
investimentos pudesse ser amortizado também para efeitos fiscais nas condições que estabeleceu,
o legislador também não se preocupou em traçar regras sobre a formação do ágio” (“A reforma
da Lei das Sociedades Anônimas: Lei 11.638/2007 e seus impactos na área tributária”, in “Direito
tributário, societário e a reforma da Lei das S/A”, coord. Sergio André Rocha, Quartier Latin, 2008,
pp. 373-374).
54 Há quem sustente que haveria uma espécie de preferência ou hierarquia entre os fundamentos do
ágio em função da ordem das alíneas que prevêem tais fundamentos, há também quem defende existir
outra ordem (obrigatória, mas não em função da ordem das alíneas), por fim, há aqueles para quem
os fundamentos são alternativos, embora sendo exigível a correta demonstração. Este nos parece o
tratamento mais correto. Tal divergência demonstra a insegurança que cerca tal assunto.
55 Paulo José Machado, Wilson José Ozório Moraes e Tânia Regina Sordi Relvas (ob. cit., p. 194) dão
conta disso: “As Bases de Conclusão da IFRS 3 descrevem a posição dos participantes do IASB
que discordaram no quesito de perda de valor de ativos versus amortização do goodwill. Esses
dissidentes destacaram que a amortização do goodwill era uma prática amplamente difundida e
entendida por todos, e a alteração dessa prática poderia vir a trazer dificuldades na elaboração,
no entendimento e na comparabilidade das demonstrações financeiras entre as empresas. O
benefício da amortização seria a sua simplicidade, transparência e a premissa de que o goodwill
tem um objetivo específico, para determinado período. Os dissidentes enfatizaram que, apesar
de a amortização desse ágio ser uma prática arbitrária, considerando que a determinação do
prazo de amortização é inerentemente difícil de mensurar, a adoção da amortização reduziria
o risco de distorções nas demonstrações financeiras, em relação ao teste de perda de valor de
ativos. Os dissidentes acreditam também que efetuar apenas o teste de perda de valor de ativos é
inconsistente com o princípio de que o goodwill gerado internamente não deva ser reconhecido.”
56 Insista-se que se trata de análise quanto à possibilidade de legislação futura. No presente, o
tratamento fiscal do ágio por rentabilidade futura previsto na Lei nº 9.532/97 persiste (nesse sentido,
nosso trabalho anterior já referido: “Análise da amortização de ágio frente às Leis nºs 11.638/07
e 11.941/09”, in “Direito tributário, societário e a reforma da Lei das S/A – vol. II”, coord. Sergio
André Rocha, 2010).
57 Pode-se optar por manter a amortização, como uma forma de incentivo a operações societárias que
formem empresas maiores e mais sólidas, inversamente, também é viável afastar a amortização,
com base na premissa de que, ainda que fundamentado em rentabilidade futura, esta não se
esgota em um tempo certo, sendo indefinida em sua duração.
58 “Para fins tributários, receitas e rendimentos ‘ganhos’ devem ser calibrados pelo ‘princípio da
capacidade de pagamento’, ou ‘princípio da realização dos resultados em moeda’. O que demanda
o ajustamento pela legislação tributária desses conceitos intermediários contábeis, para fins de
apuração e recolhimento dos tributos.” (Alexandre S. Pacheco, ob. cit., p. 53).
base em seus fundamentos, nem o resultado tributável tal qual existe hoje,
com base em premissas adequadas às normas superiores. O tratamento dado
a determinado fato econômico (seja na apuração tributária, seja na apuração
contábil) não se dá arbitrariamente, mas como decorrência lógica de premissas
maiores. No caso da nova contabilidade, as premissas da visão econômico-
financeira, da substância sobre a forma, da visão prospectiva, da permissão e
mesmo ônus de maior subjetivismo.
Por tais motivos, concluímos também aqui não ser recomendável transpor
o regime contábil para a apuração do lucro tributável.
Não descartamos a possibilidade de vir a ser estabelecido um novo
tratamento fiscal para o ágio e o deságio, até mesmo com certa proximidade
com o regime contábil. Todavia, isso não deverá ser feito por simples desejo
de assemelhar parcialmente os dois regimes. Fazer isso poderia levar a um
tratamento destituído de racionalidade econômica e jurídica.
Um novo tratamento fiscal – se vier a ser cogitado – deverá ser independente
do que é previsto na nova contabilidade e coerente por si só. Tenha-se presente,
porém, que o sistema atual, de amortização do ágio por rentabilidade futura em
caso de incorporação, não é condenável tecnicamente. Não se pode confundir
dificuldades práticas de aplicação do regime com a existência de eventual falha
conceitual, que condene todo o regime. Talvez este deva ser aperfeiçoado, p.
ex., estabelecendo regras claras para classificar o fundamento do ágio, evitando
disputas entre contribuintes e Administração que geram insegurança.
Em síntese, a conclusão final, também neste ponto, é de não ser recomendável
a simples migração do novo regime contábil para a apuração do lucro trbutável.
X – Conclusão geral
A comparação que fizemos entre, de um lado, o conceito de renda e lucro real,
com as limitações impostas ao legislador, e, de outro lado, a nova contabilidade nos
levou a concluir ser difícil a continuidade da adoção do modelo de dependência
parcial entre a apuração contábil e a apuração do lucro tributável59. Tal modelo
59 Essa também parece ser a opinião de Ricardo Mariz de Oliveira, em recente artigo: “Com a
harmonização das normas contábeis brasileiras às praxes internacionais, introduzida pela Lei nº
11.638, mais do que nunca ficou necessária a absoluta segregação entre o contábil e o fiscal, eis
não é totalmente inviável, mas não nos parece aconselhável. É melhor passar
a adotar o modelo de autonomia (que é o que foi feito com a adoção do RTT,
embora, ao menos no momento inicial, transitoriamente). Assim é não somente
porque seria mais fácil e seguro garantir a obediências às normas tributárias
superiores, mas também para melhor atender os interesses da apuração contábil
independentemente de interferências do legislador tributário.
Caso seja mantido o regime de dependência parcial (e quando nos
referimos à dependência da contabilidade estamos nos referindo à nova/atual
contabilidade), serão imprescindíveis várias e indetermináveis adaptações.
De uma forma ou de outra, é inegável o maior afastamento entre apuração
contábil e apuração fiscal.
Analisamos também alguns pontos da nova contabilidade: a característica
geral da prevalência da substância econômica sobre a substância jurídica e os
tratamentos do teste de “impairment”, da depreciação e do ágio e deságio. A
análise desses quatro sub-temas confirma ser mais aconselhável a adoção do
modelo de autonomia entre a apuração contábil e a apuração do lucro tributável.
que as normas contábeis afastaram-se substancialmente dos preceitos da lei tributária, a ponto
de se tornarem absolutamente inconciliáveis.” (“Questões atuais sobre o ágio – Ágio interno –
Rentabilidade futura e intangível – Dedutibilidade das amortizações – As inter-relações entre a
contabilidade e o direito”, in “Controvérsias jurídico-contábeis”, 2º vol., coord. Roberto Quiroga
Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes, Dialética, 2011, pp. 212-213).
Determinação e
Fundamentação
Econômica do Ágio
Apurado na Aquisição
de Investimentos:
Regimes Fiscal e
Bruno Fajersztajn
Advogado em São Paulo.
1. Introdução
1 O RTT, que antes era opcional, atualmente é compulsório para todos os contribuintes.
2 O RTT também se presta para efeito de apuração das bases de cálculo das contribuições ao PIS
e COFINS, nos termos do parágrafo 3º do art. 15 e do art. 21 da Lei n. 11.941/2009.
tais como obter sinergias, eliminar um concorrente, reduzir custos com fornecedores,
obter uma rápida expansão dos pontos de venda, dentre outros.
Não se deve confundir o motivo com a causa do negócio jurídico. O motivo
é a razão pela qual determinada vontade é manifestada, ao passo que a causa
é a função prática de determinado contrato. Assim, no negócio jurídico de
compra e venda, a sua causa é a transferência da propriedade do bem alienado
em troca do pagamento do preço.
Sobre o assunto, são esclarecedoras as lições do Ministro Moreira Alves 4:
“(...) motivo seriam as razões de ordem subjetiva que levam alguém a
celebrar um negócio jurídico. (...) Assim, por exemplo, na compra e
venda, a causa seria a troca de coisa por dinheiro enquanto o motivo
seria a razão subjetiva de se realizar, de se celebrar o negócio de compra
e venda. (...)”.
O motivo não altera a causa do negócio jurídico, nem o invalida, até porque
é algo precedente ao negócio. Mas mesmo assim, o motivo tem sua relevância
no direito civil, podendo ser fundamento para a declaração de nulidade, quando
for determinante do negócio e for ilícito (Código Civil, art. 166, III). Ao tratar
de erro substancial, como fator passível de anulação do negócio, o Código Civil,
nos art. 138 e 139, também deu relevância ao motivo. E o art. 140 trata do falso
motivo, enquanto vício da declaração de vontade.
Como se vê, a motivação é um dado relevante na teoria dos negócios jurídicos.
E sendo vinculada à manifestação de vontade, é matéria de foro íntimo daqueles
que a expressam e diretamente relacionada com a liberdade de contratar.
Portanto, uma empresa que adquire determinada participação
societária, ao manifestar sua vontade, realizando o negócio jurídico de
aquisição daquele bem, tem a prerrogativa de definir qual foi a motivação do
ato praticado. E sendo o fundamento econômico do ágio decorrente dessa
motivação, é claro que a prerrogativa de determinação desse fundamento
é exclusivamente da empresa adquirente.
Daí porque o parágrafo 2º do art. 20 do Decreto-lei n. 1.598/77, acima
transcrito, ao estabelecer a obrigação de indicação do fundamento econômico do
5 “Imposto de Renda – Pessoas Jurídicas” – Justec-Editora Ltda., Rio de Janeiro, 1979, pp. 271-534.
6 “Imposto de Renda – Pessoas Jurídicas” – Justec-Editora Ltda., Rio de Janeiro, 1979, p. 267.
dentre outros. Normalmente esse tipo de ativo não está lançado na contabilidade.
E quando da alienação da empresa, certamente irá afetar o seu preço.
Se o motivo do pagamento de preço superior ao valor do patrimônio
líquido contábil da empresa adquirida for a existência desses bens intangíveis,
o ágio terá como fundamento econômico cada um deles.
O fundo de comércio também é um bem intangível e o legislador fez bem
em elencá-lo ao lado dos demais intangíveis, na alínea c do parágrafo 2º do art.
20 do Decreto-lei n. 1.598, dentre os possíveis fundamentos econômicos para
a apuração de ágio na aquisição de investimentos.
O fundo de comércio é um instituto regulado pelo direito. A jurisprudência
tem examinado detidamente o conceito de fundo de comércio quando de sua
avaliação para fins de determinação do valor de indenizações decorrentes de
desapropriações de bens imóveis objeto de contrato de locação, assim como para fins
de determinação de responsabilidade tributária do seu adquirente, por sucessão, nos
termos do art. 133 do Código Tributário Nacional (CTN). O fundo de comércio
também tem sido analisado nos casos de determinação do valor de indenizações
decorrentes de rescisões de contratos de locação ou de franquia comercial.
Na doutrina, a expressão fundo de comércio tem sido entendida como
sinônimo de estabelecimento comercial. Adotam esse entendimento Rubens
Requião, Amador Paes de Almeida, Fabio de Ulhôa Canto, Carvalho de
Mendonça, Nelson Nery Junior, dentre outros.
Essa posição, embora majoritária, não é unânime. Parte da doutrina
entende que o fundo de comércio é um instituto jurídico, enquanto o
estabelecimento tem conotação física, do local onde a empresa é desenvolvia.
Amador Paes de Almeida 7, em obra sobre o tema, cita Ercole Vidari,
comercialista italiano, segundo o qual “fundo de comércio representa o complexo do
ativo e passivo, dos direitos e obrigações pertinentes a um negócio ou estabelecimento
mercantil, ao passo que o estabelecimento representa o lugar onde o comerciante exercita
o comércio e administra os seus negócios.”
Já Rubens Requião 8, por outro lado, entende que “fundo de comércio ou
estabelecimento comercial é o instrumento da atividade do empresário. Com ele o empresário
7 “Locação Comercial (Ação Renovatória)”. 10ª Ed. São Paulo. Saraiva, 1999. p. 3.
8 “Curso de Direito Comercial”. 16ª Ed. São Paulo. Saraiva, 1985.
comercial aparelha-se para exercer sua atividade. (...) Compõe-se o estabelecimento comercial
de elementos corpóreos e incorpóreos, que o empresário une para o exercício de sua atividade.
Fran Martins conceitua fundo de comércio como “o conjunto de elementos
corpóreos e incorpóreos utilizados pelos comerciantes para exercerem com sucesso suas
atividades, visando sempre à atração da freguesia 9.”
O Fisco Federal também considera fundo de comércio sinônimo de
estabelecimento, como se vê no Parecer Normativo CST n. 2, de 1972:
“5. Resta examinar o que seja ‘fundo de comércio’ e ‘estabelecimento
comercial’. Essas expressões são sinônimas. ‘Fundo de comércio’ é
expressão importada do francês ‘fonds de commerce’ que corresponde
à expressão vernácula ‘estabelecimento comercial’”
A seguir, o mesmo parecer normativo define os institutos:
“Designa o complexo de bens, materiais ou não, dos quais o comerciante
se serve na exploração de seu negócio. ‘Ê uma universalidade expressiva
de corpo certo, individualizado, apesar das modificações sucessivas
que podem sofrer seus elementos” (Bento de Faria. Direito Comercial;
Hanus, Études du fonds de commerce).”
Essa equiparação também pode ser percebida na exposição de motivos
do anteprojeto do Código Civil, ao tratar do Livro II – Atividade Comercial,
elaborada por Miguel Reale, como se verifica pelo trecho a seguir transcrito:
“Dessarte, o tormentoso e jamais claramente determinado conceito
de “ato de comércio” é substituído pelo de “empresa”, assim como a
categoria de “fundo de comércio” cede lugar a estabelecimento.”
Nesse contexto, o estudo da matéria demanda a análise da definição de
estabelecimento comercial contida no art. 1.142 do Código Civil de 2002.
Confira-se:
“Art. 1.142. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens
organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por
sociedade empresária.”
Analisando esse dispositivo, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade
Nery10 assim lecionam:
11 Conforme determinam os itens 19 e seguintes da Instrução Técnica ICPC n. 09, emitida pelo
Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC).
12 Pronunciamento Técnico CPC 14.
4. Conclusões.
Com base nas considerações anteriores, sobre os regimes contábil e fiscal
a que se submete o ágio pago na aquisição de investimento, pudemos verificar
que são completamente diferentes os métodos – fiscal e contábil – de apuração e de
demonstração do ágio na aquisição de investimentos avaliados por equivalência
patrimonial.
De fato, o único ponto comum entre os dois critérios, além do fato de
que ambos se prestam para o registro de participações societárias avaliadas
por equivalência patrimonial, é que os dois têm como referência o preço pago
na aquisição de um investimento. Mas enquanto para fins fiscais esse preço é
comparado com o tradicional valor do patrimônio líquido da empresa investida,
para fins contábeis o mesmo preço é comparado com o valor justo dos ativos e
passivos da empresa investida.
Assim, como são apurados com base em elementos diferentes (patrimônio
líquido contábil x patrimônio líquido calculado pelo valor justo), o valor do
ágio verificado na aquisição de investimentos nunca poderá ser equivalente ao
goodwill registrado contabilmente.
tendo ocorrido qualquer alteração nele, forçoso reconhecer a sua plena vigência.
O contador não precisa averiguar os porquês do pagamento daquele preço
pela aquisição do investimento, como necessita o jurista. Para o contador, esse
dado não tem qualquer interesse, bastando a ele o registro do investimento pelo
seu valor justo, ficando a diferença entre esse valor e aquele efetivamente pago
na aquisição a ser contabilizado como goodwill ou deságio.
Comparando os dois regimes e os procedimentos a serem adotados para a
determinação dos correspondentes valores, é possível verificar que a seqüência de
procedimentos utilizada pelo contador para desdobrar o custo de aquisição de um
investimento é diferente da seqüencia de procedimentos exigida pela lei fiscal.
Enquanto, para fins fiscais, primeiro verifica-se o motivo que justificou o
pagamento do preço pela compra do investimento para depois registrar o ágio
de acordo com ele, para fins contábeis primeiro apura-se o valor justo dos ativos
e passivos da empresa adquirida, depois identifica-se o goodwill e, ao final,
assume-se, sem questionar, que este tem fundamento em rentabilidade futura.
Em outras palavras, enquanto para fins fiscais é relevante a razão, o motivo,
da compra de um investimento por aquele preço, contabilmente o importante
é a determinação do valor justo dos ativos e passivos da empresa adquirida,
pois a partir dele é que se apura o valor do goodwill.
A diferença apontada nos dois parágrafos anteriores também interfere
na comprovação que serve de suporte para os registros contábil e fiscal do
ágio. Enquanto para fins contábeis é necessário um laudo de avaliação para
demonstrar o valor justo dos ativos e passivos da empresa adquirida, para fins
fiscais é necessário comprovar o motivo do pagamento daquele preço pelo
negócio praticado, missão essa que não é tão simples, pois vinculada às razões
gerenciais do administrador da empresa investidora.
Geralmente essa prova se faz por declaração (uma espécie de confissão)
por parte da empresa, ou nos “considerandos” contidos nos instrumentos de
aquisição do investimento, devendo tal declaração estar apoiada em laudo de
avaliação do valor da empresa adquirida. Normalmente esse laudo justifica o
motivo do pagamento do preço.
É por isso também que, em regra geral, o laudo de avaliação para fins
fiscais é elaborado em momento anterior à realização do negócio, pois este será
utilizado nas tratativas entre as partes para a fixação do preço a ser pago. Já o
laudo que suporta o lançamento contábil refere-se a momento imediatamente
14 Tais ajustes devem ser feitos em livro fiscal chamado FCONT, instituído pela Instrução Normativa
RFB n. 949/2009.
1. Nota Introdutória
1 Art. 7º A pessoa jurídica que absorver patrimônio de outra, em virtude de incorporação, fusão ou
cisão, na qual detenha participação societária adquirida com ágio ou deságio, apurado segundo
o disposto no art. 20 do Decreto-Lei nº 1.598, de 26 de dezembro de 1977:
I – deverá registrar o valor do ágio ou deságio cujo fundamento seja o de que trata a alínea a do
§ 2º do art. 20 do Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, em contrapartida à conta que registre o bem
ou direito que lhe deu causa;
II – deverá registrar o valor do ágio cujo fundamento seja o de que trata a alínea c do § 2º do art.
20 do Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, em contrapartida a conta de ativo permanente, não sujeita
a amortização;
III – poderá amortizar o valor do ágio cujo fundamento seja o de que trata a alínea b do § 2º
do art. 20 do Decreto-lei nº 1.598, de 1977, nos balanços correspondentes à apuração de lucro
real, levantados posteriormente à incorporação, fusão ou cisão, à razão de um sessenta avos, no
máximo, para cada mês do período de apuração;
IV – deverá amortizar o valor do deságio cujo fundamento seja o de que trata a alínea b do § 2º
do art. 20 do Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, nos balanços correspondentes à apuração de lucro
real, levantados durante os cinco anos-calendários subseqüentes à incorporação, fusão ou cisão,
à razão de 1/60 (um sessenta avos), no mínimo, para cada mês do período de apuração.
2. Aspectos Regulatórios
2.1 A relevância do ágio em matéria de regulação do
mercado financeiro e de capitais
balanço da controladora, a matéria vem sendo alvo de análise cada vez mais
detida pelos entes reguladores, especialmente no que concerne a operações de
aquisição de participação acionária realizadas entre pessoas jurídicas ligadas.
O motivo mais evidente para este cuidado com as operações que envolvam
pagamento de ágio nas operações antes referidas – interno ou externo – repousa
na possibilidade de dar-se ensejo à denominada “assimetria informacional”, que
consiste na diferença de quantidade e qualidade das informações disponíveis para
os agentes do mercado, criando condições desiguais de competição.
Joseph Stiglitz, com muito brilhantismo, explica o conceito, partindo do
pressuposto de que a informação é um bem público3: “Information is, in many
respects, a public good. Giving information to one more individual does not reduce
the amount others have. Efficiency requires that information be freely disseminated
or, more accurately, that the only charge be for the actual cost of transmitting the
information. The private market will often provide an inadequate supply of
information, just as it supplies an inadequate amount of other public goods” 4.
Mas não é apenas na questão da assimetria informacional que reside
o principal aspecto da questão. Como se sabe, o mercado financeiro e de
capitais, assim como os demais mercados, apresenta diversas falhas, que tornam
conveniente a existência de certo nível de intervenção estatal, que, através da
imposição de normas regulatórias, passa a corrigir (ou atenuar) esses problemas.
Ainda de acordo com Joseph Stiglitz, há, basicamente, seis tipos de falhas
de mercado, quais sejam: (i) competição imperfeita, pois, para a existência
de um resultado “Pareto Eficiente” é preciso que haja competição perfeita,
de modo que nenhum competidor possa controlar os preços praticados; (ii)
existência de bens públicos “puros”, que não podem ser supridos pelo mercado
ou não podem ser supridos em quantidade suficiente, em virtude do fato de
que são genericamente aproveitáveis (não há um custo individualizado de
aproveitamento ou não se pode impedir um indivíduo de usufruir do bem); (iii)
ocorrência de externalidades (positivas e negativas); (iv) existência de mercados
incompletos, ou seja, o mercado não fornece determinados bens demandados
3 A expressão bem público é utilizada aqui em seu sentido econômico, não necessariamente
coincidente com a acepção jurídica do termo.
4 STIGLITZ, Joseph. Economics of the Public Sector. New York: Norton, 2000, p. 84.
ainda que o custo de sua produção seja inferior ao preço que os consumidores
estão dispostos a pagar; (v) falhas informacionais; e (vi) desemprego, inflação
e desequilíbrio5.
No mercado financeiro e de capitais a regulação destina-se, sobretudo,
a corrigir os problemas apontados nos itens (i), (iii), (iv) e (v) mencionados
acima, pois, como leciona Otavio Yasbek, “as funções da regulação financeira
são: (a) controlar as posições de poder no mercado (das situações de monopólio ou de
oligopólio, entre outras distorções); (b) controlar e administrar as externalidades que
podem decorrer das atividades financeiras (risco de contágio e outras questões de ordem
sistêmica); e (c) proteger clientes, dada a assimetria informacional característica de
sua relação com as instituições por intermédio das quais operam6”.
São atinentes à questão do ágio os dois últimos objetivos mencionados,
visto como são capazes de gerar distorções na percepção que os agentes do
mercado possuem acerca da saúde financeira, solvabilidade e rentabilidade
das empresas que possuem títulos e valores mobiliários postos em negociação
pública, captando poupança através deste mercado.
No que se refere às externalidades, é importante observar que o ágio
traz um componente intrínseco de risco sistêmico: a avaliação do valor pago a
título de goodwill é uma avaliação que emprega critérios subjetivos, o que gera,
evidentemente, uma maior volatilidade dos preços.
O ágio representa, ainda, um risco para a solidez e confiabilidade
das informações financeiras, pois, a partir do momento em que o valor
do investimento (nele contido o ágio) impacta o patrimônio líquido da
controladora, há uma “objetivação” do valor do prêmio, que, em sua formação,
foi constituído por critérios significativamente subjetivos.
Imagine-se, a título de exemplo, que a empresa B tenha adquirido uma
participação na Empresa A, pagando um ágio de X. Se, posteriormente,
a empresa C vier a adquirir uma participação na Empresa B, o balanço
patrimonial da Empresa C será impactado pelo ágio pago pela empresa B
na aquisição das ações de A. Todavia, esse ágio estará “embutido” no valor
patrimonial das ações da Empresa B, de sorte que, o componente subjetivo
do ágio deixa de ser visível para aquele que avalia o balanço patrimonial
da Empresa C.
seus livros a valores de custo (Empresas B e C), e, através de uma operação societária
de aumento do capital em uma terceira controlada (Empresa D), integralizou
tal aumento com as ações de emissão daquelas duas controladas (B e C), agora
reavaliadas pelo método do desconto do fluxo de caixa projetado. Com isso, a
companhia (Empresa A) registrou um ágio no valor da diferença entre a avaliação
original, pelo custo de aquisição, e a reavaliação econômica sustentada em laudo.
3. Aspectos tributários
3.1 Ágio – Um conceito em crise
Antes de prosseguir na análise dos aspectos tributários relativos ao ágio
interno, que constitui o objeto principal deste estudo, faz-se necessário discorrer
um pouco sobre o próprio conceito de “ágio”, que, assim como “lucro” e “fundo
de comércio” está longe de ser unívoco.
Isso porque, a partir das alterações introduzidas pelas Leis nº 11.638/2007 e
nº 11.941/2009 e, notadamente, com o advento do Pronunciamento do CPC nº
18, aprovado pela Deliberação CVM nº 605/2009, criou-se um profundo abismo
entre o conceito de ágio para a “contabilidade comercial” e a “contabilidade fiscal”.
Para as companhias obrigadas a observar o CPC-18 o ágio é sempre igual ao
custo de aquisição diminuído da participação da investidora no “valor justo” dos
ativos e passivos identificados, não sendo passível de amortização na investidora.
11 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. Renovar: 2008, p. 246.
12 Op. Cit.
13 Segundo o professor Hugo de Brito Machado, “Entende-se por propósito negocial o business
purpose dos americanos, expressão com a qual se referem ao propósito ligado à atividade
empresarial. É o propósito ligado aos objetivos visados pela empresa, ou de algum modo ligados
a sua atuação no mercado. Assim, os atos ou negócios jurídicos praticados pelas empresas em
geral teriam de estar ligados às suas finalidades, á sua atuação no mercado. A ausência dessa
ligação poderia ser acolhida pela autoridade da Administração Tributária para desconsiderar o
ato ou negócio jurídico do qual resulta a exclusão ou a redução de um tributo, ou a postergação
de seu pagamento”. MACHADO, Hugo de Brito. A falta de propósito negocial como fundamento
para exigência de tributo. Revista Dialética de Direito Tributário nº 143, pp. 48-49.
14 GRECO, Marco Aurélio. Planejamento Tributário. 2ª ed. São Paulo: Dialética: 2008, pp. 203-204.
4. Conclusão
Se por um lado é verdade que as operações que envolvem a formação de
ágio interno merecem atenção especial não só dos entes reguladores e fiscais,
mas como do próprio mercado, por outro prisma, não se pode permitir que
desse fato resulte uma regra generalizada de vedação ao ágio interno.
Ademais, se no âmbito da regulação do mercado de capitais a vedação
absoluta e apriorística do ágio interno carece de análise mais profunda, no campo
do Direito Tributário, existe ainda a necessidade de alteração legislativa para que
se possa legitimamente modificar o arcabouço normativo hoje em vigor.
Resta, contudo, a difícil tarefa de se conciliar os diversos conceitos e normas
aplicáveis ao ágio. A chave do problema está, portanto, em delimitar a adequada
dimensão e alcance dos pronunciamentos do CPC e dos atos normativos da
CVM que tratam da contabilização e registro do goodwill pago na aquisição
de empresas dentro do mesmo grupo. Se, de um lado, sob o ponto de vista da
O futuro do FCONT
Kieran Mcmanus
Sócio da PricewaterhouseCoopers.
Introdução
De acordo com o disposto nas Leis 11.638 e 11.941 as alterações nelas
introduzidas, que modifiquem o critério de reconhecimento de receitas, custos
e despesas computadas na escrituração contábil, para apuração da contabilidade,
inclusive o lucro líquido do exercício definido no art. 191 da Lei nº 6.404, não terão
efeitos para fins de apuração do lucro real e da base de cálculo da Contribuição Social
sobre o Lucro Líquido (CSLL) da pessoa jurídica sujeita ao Regime Transitório
de Tributação (RTT), devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos
e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007.
Esse novo regime fiscal, portanto, determina que ajustes tributários devem
ser efetuados com a finalidade de neutralizar os efeitos dos novos métodos e
critérios contábeis introduzidos pela legislação antes citada.
Para a efetivação de tais ajustes fiscais foi instituído o Controle Fiscal
Contábil de Transição-FCONT, que é uma escrituração das contas patrimoniais
e de resultado, em partidas dobradas, que considera os métodos e critérios
contábeis aplicados pela legislação tributária em 31 de dezembro de 2007
Histórico
As alterações legislativas que conduziram as mudanças dos métodos
e critérios contábeis adotados pela contabilidade brasileira, com vistas ao
alinhamento às práticas internacionais, tiveram por premissa a neutralidade
tributária. Ou seja, as novas práticas contábeis não poderiam resultar em
aumento ou diminuição da carga tributária. Para atendimento a essa orientação,
a Lei nº 11.941/2009 instituiu o chamado RTT.
Esse regime teve por objetivo garantir a referida neutralidade tributária
quando determinou que as alterações introduzidas pelas Leis nº 11.638/2007 e
nº 11.941/2009, bem como pelos pronunciamentos do CPC, que modifiquem o
critério de reconhecimento de receitas, custos e despesas registradas na escrituração
contábil, computadas na apuração do lucro líquido do exercício definido na
legislação societária, não produzirão efeitos para fins de apuração do lucro real e da
base de cálculo da CSLL, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos
e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007.
O RTT, opcional para os anos-calendário de 2008 e 2009, tornou-se
obrigatório para todas as pessoas jurídicas que apuram o imposto de renda com
base no lucro real, presumido ou arbitrado a partir do ano-calendário de 2010.
Ajustes RTT
R$
Lucro líquido (Lei nº 11638, Lei nº 11941 e CPCs) 900
(+) AVP 200
(+) depreciação – leasing 100
(-) subvenção para investimento (300)
(+) diferido 100
(-) contraprestação leasing (150)
Lucro líquido fiscal 850
Adições / Exclusões:
R$
Lucro líquido fiscal 850
(+) multa indedutível 120
(-) equivalência (200)
Lucro real 770
Os livros estatutários
Enquanto os conceitos contábeis do FCONT são estáveis às normas
contábeis aplicados para fins tributários, os livros societários seguem as
normas emitidas pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC). O
CPC definiu que vai emitir normas contábeis sempre consistentes com as
normas internacionais de contabilidade emitidas pela International Accounting
Standards Board (IASB). O IASB emite normas (IFRS/IAS) e suas respectivas
interpretações (IFRIC/SIC). O CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis
tem como objetivo o estudo, o preparo e a emissão de Pronunciamentos
Técnicos sobre procedimentos de Contabilidade e a divulgação de informações
dessa natureza, para permitir a emissão de normas pela entidade reguladora
brasileira, visando à centralização e uniformização do seu processo de produção,
levando sempre em conta a convergência da Contabilidade Brasileira aos
padrões e emitem suas interpretações das normas (ICPCs) e orientações sobre
tais normas (OCPCs). O órgão regulador específico (CFC – Conselho Federal
de Contabilidade) em muitos casos, pode ainda alterar as normas do CPC
por instruções específicas. Em sumário o processo de definição das praticas
contábeis é apresentado abaixo:
O desafio do FCONT
O desafio para as empresas brasileiras é de manter a escrituração de cada
transação nas duas contabilidades conforme as normas específicas. Enquanto
empresas já tinham os controles necessários para manter a contabilidade acolhida
pelo FCONT até 2007 a contabilidade societária tornou-se uma obrigação adicional.
Este desafio passa por várias áreas da empresa, como por exemplo:
a) Contábil: todas as transações devem ser registradas individualmente
conforme as normas contábeis do FCONT e da societária, sendo que
as diferenças entre as duas contabilidades devem ser reconciliadas;
b) Fiscal: para verificar se os parâmetros contábeis utilizados no FCONT
são adequados para fins fiscais e se as diferenças do FCONT e
societário se enquadram no RTT;
c) Sistemas: criação de processos e controles sobre os dois livros que
permitem lançamentos das transações individualmente nas duas
contabilidades e uma reconciliação dos respectivos saldos apurados
Portanto, além da alta administração, da área contábil e tributária,
incluindo assessores tributários, a área de sistemas, em geral, terá um grande
trabalho pela frente para manter controles adequados para permitir à área
contábil-financeira captar e controlar tais ajustes. Em muitos casos o nível
Alternativas futuras
O grande benefício de manter o FCONT é que as normas contábeis do
FCONT têm se mantido estáveis por muitos anos servindo como base para
apuração de imposto de renda e contribuição social. O lucro antes de imposto
do FCONT está sujeito às exclusões e inclusões específicas para apurar o
lucro tributável via um sistema semi-dependente na contabilidade FCONT e
garantindo a neutralidade dos ajustes trazidos pelos CPCs. Porém a manutenção
da contabilidade FCONT e societária traz um custo operacional relevante e
crescente. Portanto, é necessário considerar potenciais alternativas futuras para
reduzir este custo operacional para manter a neutralidade dos ajustes dos CPCs.
A alternativa obvia seria que a contabilidade societária servisse como
base para apurar imposto de renda e contribuição social sem a necessidade de
manter a escrituração independente do FCONT. Considerando o volume e
complexidade das normas do CPC cujo efeito varia por indústria e por empresa,
esta alternativa torna difícil o objetivo de manter a neutralidade. Ainda que o
sistema tributário conseguisse adaptar-se ao novo modelo, as novas alterações
nos CPCs vão requerer constante mudança no sistema de apuração dos tributos.
Outra alternativa seria eliminar ou limitar os efeitos dos CPCs para que a
contabilidade societária volte a estar alinhada com o FCONT. O IFRS aplicado
através dos CPCs traz grandes benefícios para as empresas na transparência
impostos precisam ser na maioria dos casos precisos, em uma única unidade
de moeda, e embora uma autoridade fiscal possa ser considerada como um
usuário, claramente não há um requisito para que as demonstrações financeiras
em IFRS sejam preparadas com essa precisão. Mesmo que as autoridades
aceitassem um aumento em seus limites existentes, não é simplesmente uma
questão de precisão numérica. As empresas também teriam que aceitar um
requisito de fornecer informações de suporte mais detalhadas, se solicitadas, se,
por exemplo, um item de despesa de particular relevância tributária não tivesse
sido identificado separadamente. Uma questão adicional é a de comparabilidade.
O nível de relevância para um subsidiária de uma multinacional de grande
porte é claramente diferente daquele para uma empresa de pequeno porte e
seria difícil para uma autoridade fiscal aplicar diferentes níveis a diferentes
contribuintes. Os registros contábeis também contêm várias estimativas, por
exemplo, provisões e pagamentos antecipados, que podem se tornar imprecisos.
Quando as transações subjacentes são concluídas, as estimativas são corrigidas
(geralmente no período seguinte) e com o tempo as estimativas para baixo e para
cima são corrigidas. Dependendo da relevância desses ajustes, essas diferenças
temporárias poderiam criar dificuldades com relação ao estabelecimento de
uma base de cálculo.
O princípio da ‘essência sobre a forma’ (parágrafo 35) também é
problemático. O exemplo mais claro disso é provavelmente um ativo em um
‘arrendamento financeiro’ onde, embora o ativo seja alugado, e não próprio,
ele é geralmente contabilizado como um ativo. Embora isso seja aplicado
a vários graus para fins de tributação, não há uma abordagem padrão; a
legislação tributária considera que o bem objeto de arrendamento é ativo da
arrendadora e trata como despesas dedutíveis, para fins de imposto de renda, as
contraprestações pagas por força de um contrato de arrendamento mercantil.
Criar uma base de cálculo comum inevitavelmente significa que as autoridades
fiscais teriam que mudar sua abordagem atual, mas se a abordagem da IFRS,
que dá maior ênfase a esse princípio, é o melhor método é questionável.
Em particular, quando houver dependência contábil ela poderia ter maiores
implicações para a lei contábil comercial (lei societária).
As definições de Ativo, Passivo e Patrimônio Líquido são relativamente
simples, visto que um nível razoável de divulgação do tratamento específico
é geralmente requerido. Por exemplo, transferências para reservas fiscais,
que devem ser registradas como movimentações das reservas e não como
despesas, são especificamente mencionadas como potencialmente relevantes
para os usuários e, portanto, requereriam divulgação. A IFRS individual sobre
tratamentos contábeis específicos geralmente também requer um alto nível de
divulgação quanto à política e metodologia adotada. Contudo, ganhos sobre
ativos não são considerados como diferentes de receita (parágrafo 75) e ganhos
não realizados são especificamente incluídos nessa definição (parágrafo 76).
A inclusão, e a tributação, desses ganhos (ou perdas) em lucros, ou seja, ‘a
abordagem de contabilização ao valor justo’ seria um desvio fundamental da
atual prática de tributação. Embora a prática de divulgação separada desses itens
seja reconhecida, se isso seria suficientemente detalhado para permitir alterações
apropriadas a serem feitas para chegar a uma base de cálculo é questionável.
Alguns países estão estudando a tributação desses ganhos, mas a tributação
de ganhos não realizados, e a concessão de isenção para perdas não realizadas
estão longe de ser a prática estabelecida.
quando são relevantes para fins fiscais, são estritamente nacionais, ou seja, não
há consolidação fronteiriça. Quando empresas nacionais têm atividades em
mais de um país, o direito a tributar a renda depende da legislação local, sujeito
a qualquer acordo bilateral de bi-tributação entre os respectivos estados. Não
há uma legislação específica da UE referente a acordos de bi-tributação entre
Estados-Membros, embora os princípios gerais derivados dos Tratados básicos
da UE se apliquem.
Adicionalmente, existe diversidade por parte das autoridades fiscais
se o patrimônio liquido sobre o qual se calculará o “thin-capitalization” é o
societário ou o fiscal. Maior tributação surge no uso do societário na limitação
de despesas de juros dedutíveis pelas regras de sub-capitalização onde o nível
de endividamento nos livros societários aumenta devido um instrumento
que foi tratado como patrimônio para fins fiscais e dívida no societário. A
mesma diversidade remanesce em relação ao cálculo dos métodos do preço de
transferência. A questão é: os custos e receitas nas operações de importação
/exportação devem ser apurados com base na escrituração societária ou dos
livros fiscais?
subsidiárias. Porém, a maioria dos grupos também escolheu utilizar a IFRS para
a apresentação das contas separadas da controladora, para fins de consistência
com as contas consolidadas. Contudo, há muita variação na abordagem adotada
para contas de empresas subsidiárias. Enquanto que alguns grupos decidiram
também utilizar a IFRS para todas as suas empresas subsidiárias, uma vez que
dados contábeis em IFRS têm que ser produzidos de qualquer forma para fins
de consolidação do grupo, outros adotaram a abordagem de que produzir contas
consolidadas em IFRS já é um grande esforço e eles terão que manter a forma
de cumprir requisitos estatutários locais nas contas de suas subsidiárias para
minimizar a mudança nas subsidiarias.
No Reino Unido, muitas subsidiárias anteciparam a implementação da
IFRS em suas contas estatutárias, com base em sua interpretação da respectiva
lei societária. Como os impostos de renda eram dependentes da contabilização
estatutária, a utilização de contas em IFRS poderia gerar implicações gerais.
Por exemplo, as empresas no Reino Unido que mudarem do UK GAAP para
IFRS podem ter três possíveis implicações para o cálculo de lucros para fins
fiscais e de contabilização:
1. Os lucros podem ser acelerados. Em certos casos, a IFRS requer
o reconhecimento mais rápido da receita do que o UK GAAP. De
acordo com o UK GAAP, certos tipos de recebimentos podem
ter sido postergados para fins de contabilização, enquanto a IFRS
pode requerer que elas sejam reconhecidas imediatamente, quando
do recebimento como receita.
2. Os lucros podem ser desacelerados. A IFRS pode requerer um
nível mais alto de provisão para certos tipos de riscos ou, de outro
modo, o diferir o reconhecimento da receita.
3. Pode haver pouca mudança.
O impacto da mudança pode variar de empresa para empresa. Para grandes
grupos, algumas subsidiárias do grupo sofreriam a aceleração da receita pela
utilização da IFRS, enquanto que para outras o efeito seria o oposto. Alguns
grupos, portanto, prepararam contas em UK GAAP para essas subsidiárias
quando a IFRS causava a aceleração na receita e mudaram para a IFRS quando
isso desacelerava a receita ou não causava mudança relevante. Obviamente, isso
não teria impacto nas contas do grupo, visto que seriam preparados a partir dos
pacotes de consolidação utilizando exclusivamente IFRS.
idéia parece muito atraente, mas há pouca pesquisa detalhada sobre o que isso
realmente significaria na prática.
Exemplos foram identificados dos possíveis problemas na utilização de
contas em IFRS como um ponto de partida para a base de cálculo consolidada.
Métodos contábeis alternativos são permitidos para valorização do estoque:
PEPS ou UEPS na IAS 2, para contratos: percentual de conclusão ou
recuperação de custo na IAS 11, para custos de empréstimo: despesa ou
capitalização na IAS 23, para imobilizado na IAS 16: custo ou reavaliação
regular e para intangíveis e propriedades para investimento: custo ou valor
justo na IAS 38 e 40. Contudo, quando da implementação da IFRS nas contas
estatutárias no Brasil, o CPC eliminou muitas opções a fim de assegurar uma
base de contabilização comparativa pelas empresas brasileiras. Outras questões,
porém, permanecem nos CPCs atualmente utilizados no Brasil:
A essência sobre a forma é aplicada para arrendamentos na IAS 17 e para
Instrumentos Financeiros na IAS 32. A depreciação do imobilizado deve ser
reconhecida ao longo da vida útil, mas isso considera valores residuais baseados
na IAS 16. O valor justo também é o princípio para instrumentos financeiros na
IAS 32, para ativos biológicos na IAS 41 e para calcular o impairment de ativos
na IAS 36. Na maioria dos casos, os requisitos de divulgação são tais que o efeito
sobre os lucros da contabilização como despesas em vez de capitalizar transações,
de reavaliar ativos e passivos, de aumentar a depreciação, de reconhecer lucros
e prejuízos, etc. pode ser estabelecido pelo usuário das contas. Porém, há uma
potencial tensão entre o relatório financeiro, onde altos lucros são compensados;
e a ‘contabilização’ fiscal onde baixos lucros são compensados através de um
menor encargo tributário. Fortalecer o elo nas contas consolidadas em IFRS
poderia levar a um relatório mais equilibrado, mas poderia levar a decisões
contábeis sendo baseadas mais nos princípios de diferimento e redução de
impostos do que nos princípios contábeis de ‘verdadeiro e justo’.
As Alterações da
Legislação Societária e
Implicações no Cálculo
dos Juros sobre o
Capital Próprio
Rodrigo Munhoz
1 De acordo com o Relatório da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados (http://
www.camara.gov.br/sileg/integras/373704.pdf), “a revisão ampla de nossa legislação societária,
iniciada pela Lei 10.303, de 31 de outubro de 2001, teve como linha mestra a preocupação com
o fortalecimento do mercado de capitais de nosso País, como instrumento viabilizador do auto-
financiamento das empresas. Este Projeto de Lei segue, exatamente, naquela direção. Nesse sentido,
com a adoção de normas contábeis compatíveis com os melhores padrões internacionais, buscou-se
conferir maior proteção aos acionistas minoritários, com vistas a atrair entrada de novos recursos e
permitir o desenvolvimento seguro do mercado de capitais.”
2 A Lei 11.638/2007 estabeleceu nova redação ao artigo 177 da Lei 6.404/1976. Determina o § 7º
que:
“§ 7o Os lançamentos de ajuste efetuados exclusivamente para harmonização de normas contábeis,
nos termos do § 2o deste artigo, e as demonstrações e apurações com eles elaboradas não poderão
ser base de incidência de impostos e contribuições nem ter quaisquer outros efeitos tributários”.
3 Inclusão do § 2º ao artigo 177 da Lei 6.404/1976.
5 “Art. 21. As opções de que tratam os arts. 15 e 20 desta Lei, referentes ao IRPJ, implicam a adoção
do RTT na apuração da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, da Contribuição para
o PIS/Pasep e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS”.
6 Artigo 15 da Lei 11.941/2009.
7 Instituído pelo Decreto 3.000, de 26 de março de 1999.
8 Alterada pela Instrução Normativa RFB 1.139/2011.
9 Veja-se a redação do citado dispositivo:
“Art. 3º A pessoa jurídica sujeita ao RTT, para reverter o efeito da utilização de métodos e critérios
contábeis diferentes daqueles previstos na legislação tributária, baseada nos critérios contábeis
vigentes em 31 de dezembro de 2007, nos termos do art. 2º, deverá:
I - utilizar os métodos e critérios da legislação societária para apurar, em sua escrituração contábil,
o resultado do período antes do Imposto sobre a Renda, deduzido das participações;
II - utilizar os métodos e critérios contábeis aplicáveis à legislação tributária, a que se refere o art.
2º, para apurar o resultado do período, para fins fiscais;
(no caso de endividamento com pessoa jurídica vinculada no exterior que não
tenha participação societária na pessoa jurídica residente no Brasil). O artigo
25 estabelece regras para a dedutibilidade de juros pagos ou creditados para
pessoa residente, domiciliada ou constituída no exterior, em país ou dependência
com tributação favorecida ou sob regime fiscal privilegiado. Esse artigo dispõe
que para serem dedutíveis, para fins de determinação do Lucro Real e da base
de cálculo da CSLL, as despesas com juros deve atender cumulativamente ao
requisito de que o valor total do somatório dos endividamentos com todas as
entidades situadas em país ou dependência com tributação favorecida ou sob
regime fiscal privilegiado não seja superior a 30% (trinta por cento) do valor
do Patrimônio Líquido da pessoa jurídica residente no Brasil.
Caso a pessoa jurídica escriture despesas com juros com pessoas vinculadas
no exterior em valor superior aos limites estabelecidos, deverá efetuar a adição
no Lucro Real e na base de cálculo da CSLL. Veja-se, no caso de eventual
excesso, que o ajuste deverá ser objeto de adição ao Lucro Real, ou seja, não se
trata de ajuste de RTT ao lucro líquido.
Assim, em virtude de a lei tributária ter elegido institutos e conceitos
de direito societário e de contabilidade, as alterações dos métodos e critérios
contábeis produzem outros efeitos fiscais que não apenas os relacionados ao
reconhecimento de receitas, custos e despesas computadas na apuração do lucro
líquido conforme prevê o RTT.
Esse raciocínio indica que a neutralidade fiscal não é plena, ou seja, para
os casos em que a legislação fiscal estabelece limite de dedutibilidade com base
em institutos/conceitos de direito societário e de contabilidade esses poderão
produzir efeitos fiscais.
Corrobora o entendimento apresentado o fato de não existir uma
contabilidade tributária e sim um Controle Fiscal Contábil de transição, criado
III - determinar a diferença entre os valores apurados nos incisos I e II; e
IV - ajustar, exclusivamente no Livro de Apuração do Lucro Real (LALUR), o resultado do período,
apurado nos termos do inciso I, pela diferença apurada no inciso III.
§ 1º Para a realização do ajuste específico, de que trata o inciso IV do caput, deverá ser mantido
o controle definido nos arts. 7º a 9º.
§ 2º O ajuste específico no LALUR, referido no inciso IV, não dispensa a realização dos demais
ajustes de adição e exclusão, prescritos ou autorizados pela legislação tributária em vigor, para
apuração da base de cálculo do imposto. § 3º Os demais ajustes a que se refere o § 2º devem ser
realizados com base nos valores mantidos nos registros do controle previsto nos arts. 7º a 9º”.
17 Veja a transcrição:
“Art. 1º Ficam reduzidas a zero as alíquotas da Contribuição para o PIS/PASEP e da Contribuição
para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS incidentes sobre as receitas financeiras
auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de incidência não-cumulativa das referidas
contribuições.
Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica às receitas financeiras oriundas de juros sobre
capital próprio e as decorrentes de operações de hedge”.
18 Promulgado pelo Decreto nº 5.799, de 7 de Junho de 2006.
19 Promulgado pelo Decreto nº 6.000, de 26 de dezembro de 2006.
20 Veja-se julgados nesse sentido:
“DE LUCROS JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO, NATUREZA JURÍDICA DE DESPESA
FINANCEIRA. PAGAMENTO DESPROPORCIONAL À PARTICIPAÇÃO DO SÓCIO NO CAPITAL
SOCIAL IMPOSSIBILIDADE INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÕES SOBRE O EXCESSO.
A natureza jurídica dos Juros Sobre Capital Próprio é de despesa financeira para a empresa e de
receita para o sócio beneficiário.Os valores pagos ou creditados aos sócios a título de Juros Sobre
Capital Próprio, além do que lhes seria devido pela aplicação do percentual correspondente
a participação de cada um no capital social, devem sofrer a incidência de contribuição
previdenciária, por representar pró-labore indireto.
(...)
ACORDAM os membros do colegiado da segunda seção de julgamento, por unanimidade de
votos, negar provimento ao recurso.”
(Processo nº 10380 005041/2007-01, Recurso nº 158.977 Acórdão nº 2401-01. 504 - 4ª Câmara
/ 1ª Turma Ordinária Sessão de 1 de dezembro de 2010).
“Ementa: IRPJ – JUROS SOBRE O CAPITAL PRÓPRIO – Os juros sobre capital próprio investido pela
sociedade em outra empresa não têm natureza de lucro ou dividendo, mas de receita financeira.
Regime jurídico tributário diferenciado. Os juros recebidos em decorrência de aplicação capital
próprio em outra pessoa jurídica compõem a base de cálculo do IRPJ.” (Número do Recurso:
154.767, Processo: 11080.009776/2005-81, Sessão: 17/04/2008, Relator: João Carlos de Lima
Júnior, Acórdão 101-96692).No mesmo sentido são os Acórdãos 101-96.692, 101-96.785, 105-
16.570 e 103-23.0.07, dentre outros.
21 O artigo 30 DA IN 11/2006 determina que: “O valor dos juros pagos ou creditados pela pessoa
jurídica, a título de remuneração do capital próprio, poderá ser imputado ao valor dos dividendos
de que trata o art. 202 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, sem prejuízo da incidência
do imposto de renda na fonte.
Parágrafo único. Para efeito de dedutibilidade na determinação do lucro real, os juros pagos ou
creditados, ainda que imputados aos dividendos ou quando exercida a opção de que trata o § 1º
do artigo anterior, deverão ser registrados em contrapartida de despesas financeiras.”
4 – Do Cálculo do JCP
De acordo com o já transcrito artigo 9º da Lei nº 9.249/1995, os JCP
devem ser calculados com base nas contas do Patrimônio Líquido, sobre o qual
é aplicada a Taxa de Juros de Longo Prazo (“TJLP”).
O Patrimônio Líquido é instituto do direito societário, que corresponde à
diferença entre o valor dos ativos e passivos da pessoa jurídica e caracteriza-se por
ser o valor pertencente aos sócios ou acionistas da pessoa jurídica.22 O artigo 178
da Lei 6.404/1976, com a redação dada pela Lei nº 11.941 estabelece que o
Patrimônio Líquido é “dividido em capital social, reservas de capital, ajustes de
avaliação patrimonial, reservas de lucros, ações em tesouraria e prejuízos acumulados”.
Como o Patrimônio Líquido é figura societária e contábil, ele, que é a
base de cálculo dos JCP, deve ser apurado observando-se os métodos e critérios
contábeis vigentes na data da elaboração das demonstrações financeiras, de
modo que as alterações contábeis introduzidas pelas Leis 11.638/2007 e
11.941/2009 geram efeitos na sua determinação.
E não há na regulamentação do RTT qualquer exigência de que
este Patrimônio Líquido (Societário) seja sujeito a ajustes contábeis para
determinação de um Patrimônio Líquido Fiscal para fins de JCP, como existe
em relação ao lucro líquido para fins de apuração do Lucro Real.
É importante ressaltar que sempre que desejou ajustar o Patrimônio
Líquido para fins de cálculo do JCP, o legislador o fez expressamente. Veja-se
o § 8º, do artigo 9º:
“§ 8º Para os fins de cálculo da remuneração prevista neste artigo, não será
considerado o valor de reserva de reavaliação de bens ou direitos da pessoa
jurídica, exceto se esta for adicionada na determinação da base de cálculo
do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro líquido”.23 (p.seg.)
22 Neste sentido é “Manual de Contabilidade Societária”, Sérgio de Iudícius, Eliseu Martins, Ernesto
Rubens Gelbcke, Ariovaldo dos Santos, São Paulo, Atlas, 2010, pág. 342:
“No balanço patrimonial, a diferença entre o valor dos ativos e dos passivos representa o Patrimônio
Líquido, que é o valor contábil pertencente aos sócios”.
pelos valores expressamente previstos pela legislação fiscal, encontra-se o valor dos
JCP que poderão ser pagos ou creditados, desde que a pessoa jurídica:
a) Possua lucros computados antes da dedução dos juros, em montante
igual ou superior ao valor de duas vezes os JCP; ou
b) Possua lucros acumulados e reservas de lucros, também em
montante em montante igual ou superior ao valor de duas vezes os
JCP.
Ou seja, para o pagamento ou crédito deve-se observar se o montante
apurado está dentro de um dos seguintes limites de dedutibilidade: (a) 50%
(cinqüenta por cento) do lucro líquido do exercício antes do cômputo dos
JCP e da Provisão do IRPJ 50%; ou (b) 50% (cinqüenta por cento) dos Lucros
Acumulados e Reservas de Lucros, dos dois o maior27.
A determinação do limite de dedutibilidade com base no lucro líquido nos
remete a um novo questionamento. Deve este lucro líquido apurado pela nova
Contabilidade ser ajustado aos critérios vigentes em 31 de dezembro de 2007?
Os que defendem que sim dirão que a neutralidade fiscal determinada
pelo RTT prevê a apuração de um lucro líquido fiscal distinto do contábil. Mas
como já ressaltamos a apuração deste lucro líquido fiscal é o ponto de partida
para determinação do Lucro Real, mas não deve ser confundido com a própria
apuração do Lucro Real.
Adotando o RTT determinado pelo artigo 17 da Lei 11.941/2009, temos:
(1) Apuração do lucro líquido antes do IRPJ com adoção dos métodos
e critérios introduzidos pela Lei 11.638/2007 e 11.941/2009;
(2) Ajustes ao lucro líquido que revertam o efeito da utilização de
métodos e critérios contábeis diferentes daqueles da legislação
tributária, baseada nos critérios contábeis vigentes em 31 de
dezembro de 2007;
(3) Lucro Líquido Fiscal, resultado de (1) + (2);
27 Sobre o limite de dedutibilidade previsto em “b” (cinqüenta por cento dos Lucros Acumulados
e Reservas de Lucros), verifica-se que, com a edição da Lei 11.638/2007, a conta “Lucros
Acumulados” não deverá mais possuir saldo, devendo os saldos dos resultados das companhias
serem registrados (se positivos) na conta Reserva de Lucros; e, se negativos, na conta Prejuízos
Acumulados.
Dados da Contabilidade:
Dados Fiscais:
valores por sua própria causa ou deteriora ativos, regra geral não estará gerando
um prejuízo a terceiros. Ainda assim, podem ser qualificadas tais situações
como uma contingência, já que, uma vez mais por exemplo, se uma máquina
deixa de funcionar, ou um forno de uma indústria fica parado, a empresa arcará
com uma perda (dano emergente), além de poder ver-se impactada em seus
resultados futuros (lucros cessantes).
Todavia, quando a própria entidade, por imprudência, imperícia ou
negligencia gera, no curso de sua atividade, gera um prejuízo a terceiro, pessoa
física ou jurídica, ente público ou privado, a entidade correrá o risco de ser
demandada ou já se encontrará em uma situação de litígio formalizada. Em
ambas as situações estaremos frente a um passivo contingente, o qual demanda
uma análise, denominada de avaliação de contingências legais.
Inserida no contexto da evolução da apresentação das demonstrações
financeiras capitaneadas pelo Direito Societário, do Mercado de Capitais e Contábil
(princípios e normas)2, a avaliação de contingências legais, antes de ser um dever,
é objeto de regulação por parte de um arcabouço normativo e coerente no Brasil.
A ele, devem-lhe obediência não somente as empresas abertas, mas a
totalidade das sociedades comerciais, pelos efeitos em terceiros decorrentes de
eventuais danos empresariais (breach of rule).
2 Em seu artigo A Linguagem Contábil no Ordenamento Jurídico Tributário, Antonio Lopo Martinez
afirma que “esse conjunto de instrumentos jurídicos prescritivos que regulam a técnica contábil
pode, com finalidades didáticas, ser classificado como um ramo próprio do Direito, sendo definido
a priori pelo fato de tais instrumentos terem um objeto comum: a normatização da técnica
contábil. É possível dizer que o Direito Contábil, ‘segmento’ do Direito, tem como conteúdo a
ordem normativa que trata da linguagem contábil (conhecimento contábil) juridicizada. (...) O
Direito Contábil Positivo é, então, o conjunto de instrumentos jurídicos prescritivos que regulam
a técnica contábil, constituindo, para fins didáticos, ramo autônomo do Direito, em virtude da
unidade que se obtém da análise de um tema comum: a técnica contábil. Entre os aspectos aos
quais o Direito Contábil se reporta cabe destacar: i) a obrigatoriedade da escrituração contábil;
ii) a contabilidade como meio de prova; iii) a elucidação dos conceitos contábeis.” (MARTINEZ,
Antonio Lopo. A Linguagem Contábil no Ordenamento Jurídico Tributário. Disponível em: < http://
www.fucape.br/_admin/upload/prod_cientifica/CONGRESSO%20USP-LOPO.pdf >. Acessado em
28 mar. 2011.) É importante destacar também que, “considerando que se trata de um ramo do
direito não sujeito exclusivamente à legalidade, cabe às normas infralegais regulamentar o direito
contábil, o que tem sido feito pelas Resoluções do CFC e Instruções da CVM. Essa liberdade de
regulamentação, por outro lado, não é absoluta, devendo ser respeitados os dispositivos legais
que venham a limitar ou obrigar determinada opção de política contábil. Por fim, por estar, esta
sim, sujeita exclusivamente à legalidade, a repercussão tributária dessas mudanças deve estar
expressamente previstas em lei, sendo que, por ora, vige o Regime Tributário de Transição (RTT).”
(FERNANDES, Edison Carlos. Normas Contábeis e o direito internacional. Valor Econômico.
Disponível em: <http://www.valoronline.com.br/impresso/legislacao-tributos/106/127438/normas-
contabeis-e-o-direito-internacional>. Acessado em 28 mar. 2011.)
3 A elaboração anual do balanço patrimonial também se faz obrigatória para o empresário individual
e para qualquer outro tipo de sociedade empresária, incluindo as sociedades empresárias limitadas,
em virtude do que preceitua o artigo 1.179 do Código Civil, segundo o qual “o empresário e a
sociedade empresária são obrigados a seguir um sistema de contabilidade, mecanizado ou não,
com base na escrituração uniforme de seus livros, em correspondência com a documentação
respectiva, e a levantar anualmente o balanço patrimonial e o de resultado econômico.” Além
disso, por força do artigo 3º da Lei nº 11.638/2007, as sociedades de grande porte que não
se revistam da forma de sociedade por ações também estão sujeitas às disposições da Lei das
Sociedades Anônimas a respeito da escrituração e elaboração de demonstrações financeiras e
da obrigatoriedade de auditoria independente por auditor registrado na Comissão de Valores
Mobiliários (CVM). Para os fins do referido artigo, considera-se sociedade de grande porte a
sociedade, ou o conjunto de sociedades sob controle comum, que, no exercício social anterior,
possuir ativo total superior a R$ 240 milhões ou receita bruta anual superior a R$ 300 milhões.
4 Regulamento do Imposto de Renda, aprovado pelo Decreto nº 3.000/99: “Demonstrações
FINANCEIRAS. Art. 274. Ao fim de cada período de incidência do imposto, o contribuinte deverá
apurar o lucro líquido mediante a elaboração, com observância das disposições da lei comercial,
do balanço patrimonial, da demonstração do resultado do período de apuração e da demonstração
de lucros ou prejuízos acumulados (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 7º, § 4º, e Lei nº 7.450,
de 1985, art. 18). § 1º O lucro líquido do período deverá ser apurado com observância das
disposições da Lei nº 6.404, de 1976 (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 67, inciso XI, Lei nº
7.450, de 1985, art. 18, e Lei nº 9.249, de 1995, art. 5º). § 2º O balanço ou balancete deverá ser
transcrito no Diário ou no LALUR (Lei nº 8.383, de 1991, art. 51, e Lei nº 9.430, de 1996, arts.
1º e 2º, § 3º).”
5 CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas. 4ª ed. São Paulo: Saraiva:
2009. v. 3. p. 683.
6 Segundo Bulhões Pedreira, “considerado sob o aspecto da sua origem, o capital aplicado no ativo
que corresponde às obrigações do patrimônio pertence a terceiros, e somente a parte que excede
do valor total dessas obrigações é de propriedade do titular do patrimônio (v. n.º 82).
A medida do capital aplicado que pertence a terceiros é o passivo exigível – o conjunto dos
valores (negativos) das prestações das obrigações do patrimônio (v. n.º 84-B). O subconjunto do
capital aplicado que é de propriedade do titular do patrimônio é designado patrimônio líquido (v.
n.º 84-C).” (PEDREIRA, José Luiz Bulhões. Finanças e demonstrações financeiras da companhia:
conceitos e fundamentos. Rio de Janeiro: Forense, 1989. p. 367.)
7 Ibid. p. 377.
11 Ernest & Young e FIPECAFI. Manual de Normas Internacionais de Contabilidade: IFRS versus
Normas Brasileiras. 1ª ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. xiii.
12 Criado em 1973 como uma fundação independente, o International Accounting Standards Commitee
(IASC) tinha como objetivo estabelecer um novo padrão de normas contábeis internacionais,
chamadas de International Accounting Standards (IAS). Em abril de 2001, após um processo
de reestruturação, o IASC foi substituído pelo International Accounting Standards Board (IASB).
Apoiado tecnicamente pelo IFRS Advisory Council (Conselho Consultivo de IFRS) e pelo IFRS
Interpretations Committee (Comitê de Interpretações de Relatório Financeiro Internacional), o
IASB é supervisionado por uma junta de curadores formada por profissionais de diversos setores
e países, denominada IFRS Foundation Trustees, e presta contas ao Monitoring Board (Conselho
de Monitoramento), integrado por autoridades do mercado de valores mobiliários. Desde sua
criação, o IASB passou a emitir pronunciamentos contábeis conhecidos como International
Financial Reporting Standards (IFRS). Embora submetidos a processo de revisão, atualização
e reformulação pelo IASB, muitos dos IAS’s formulados pelo IASC ainda continuam vigentes e
convivem lado a lado com os IFRS publicados já nos tempos do IASB. É o caso, por exemplo,
do IAS 37, relativo a Provisões, Passivos Contingentes e Ativos Contingentes, o qual foi emitido
pelo IASC em setembro de 1998 e se encontra em vigor desde 1º de julho de 1999, sendo, no
entanto, objeto de processo de revisão desde 2005, como se verá no item III-4.3, infra.
13 Embora o parágrafo quinto do artigo 177 da Lei das Sociedades Anônimas não faça referência
direta e expressa às normas do IASB, o Brasil optou por alinhar suas normas contábeis com os
pronunciamentos deste órgão regulador internacional, em virtude não apenas de sua reconhecida
qualidade técnica, como também da relevância do papel desempenhado pelo IASB no processo
de convergência global das normas contábeis. À época de elaboração deste artigo, conforme
levantamento publicado em edição especial da Revista Capital Aberto, cerca de 120 países já
adotavam “integral ou parcialmente as normas editadas pelo IASB. Por exemplo, os países da
União Européia seguem as normas do IASB desde 2005, e a previsão é que Canadá, Índia, Coréia
e Argentina consigam implementá-las este ano (2011). No Japão, a adoção é voluntária desde
2010, mas se tornará obrigatória em 2016” (Guia de IFRS: perguntas e respostas. Revista Capital
Aberto. Edição Especial, ano 3, fev. 2011. p. 12).
14 Vide o preâmbulo da Resolução do Conselho Federal de Contabilidade nº 1.055, de 7 de outubro
de 2005, a qual será analisada com mais detalhes a seguir e que muito bem sintetiza as vantagens
decorrentes do alinhamento das normas contábeis brasileiras com as internacionais.
internacionais.
Nesse sentido, por meio da Resolução nº 1.055, de 07 de outubro de 2005, o
Conselho Federal de Contabilidade (CFC) criou o Comitê de Pronunciamentos
Contábeis (CPC), composto, além do próprio CFC, pela Bolsa de Valores de São
Paulo (BOVESPA), IBRACON, APIMEC, ABRASCA e FIPECAFI.
Como muito bem sintetizado no preâmbulo da Resolução do CFC, o
processo de emissão de normas contábeis desperta o interesse e conta com a
participação não apenas dos preparadores e dos examinadores das demonstrações
financeiras – contadores e auditores independentes, respectivamente –,
mas também dos usuários dessas informações, tais como profissionais de
investimentos e órgãos reguladores. Além disso, a Resolução também destaca
a tendência, constatada na maior parte dos países, de adoção de uma entidade
única de emissão e divulgação de regras contábeis, gozando essa entidade da
contribuição de todas as categorias de interessados nas informações contábeis.
A instituição do CPC veio suprir uma lacuna verificada até então na
realidade contábil brasileira, favorecendo a inserção efetiva do país no cenário
internacional de aprimoramento e modernização das práticas contábeis. Com
o escopo de estudar, preparar e emitir pronunciamentos técnicos contábeis,
obedecendo sempre aos padrões internacionais fixados pelo IASB15, o CPC se
apresentou como a entidade centralizadora e uniformizadora do processo de
produção de normas contábeis que faltava até aquela época ao país.
Cumpre observar, porém, que o CPC, na qualidade de entidade de
direito privado, não se reveste de força normativa para tornar suas normas
obrigatórias. Ao contrário, as regras do CPC devem ser formalmente adotadas
por cada órgão regulador para que se tornem aplicáveis e exigíveis às entidades
e profissionais sob sua respectiva esfera de regulação. Enquanto não forem
aprovados e referendados pelos citados órgãos reguladores, os pronunciamentos
técnicos do CPC têm seu alcance limitado aos seus próprios integrantes e não
passam de meras orientações e referências para as demais entidades, da mesma
15 O artigo 12F do Regimento Interno do CPC torna evidente ter a associação como um de seus
propósitos a emissão de pronunciamentos técnicos em conformidade especificamente com
as normas internacionais do IASB. Nos termos desse artigo, “com o objetivo de que todos os
documentos emitidos pelo CPC estejam convergentes às normas internacionais de contabilidade
emitidas pelo International Accounting Standards Board (IASB), o CPC dará conhecimento
público da inclusão de aprimoramentos e de correções em documentos já editados, por meio do
documento intitulado ‘Revisão CPC No ‘X’’.” (grifo nosso)
16 Resolução CFC nº 1.055/2005. “Art. 3º. O Comitê de Pronunciamentos Contábeis – (CPC) tem por
objetivo o estudo, o preparo e a emissão de Pronunciamentos Técnicos sobre procedimentos de
Contabilidade e a divulgação de informações dessa natureza, para permitir a emissão de normas
pela entidade reguladora brasileira, visando à centralização e uniformização do seu processo
de produção, levando sempre em conta a convergência da Contabilidade Brasileira aos padrões
internacionais.” (grifo nosso)
17 Entendia-se por obrigação não formalizada aquela que se originasse de práticas no passado, de
declarações feitas ou de políticas divulgadas, pelas quais uma entidade criasse uma expectativa
válida em terceiros, assumindo um compromisso perante estes. Por sua vez, a obrigação legal
seria aquela que derivasse de um contrato, da lei ou de outro instrumento fundamentado em lei.
Em matéria tributária, porém, a Interpretação Técnica IBRACON nº 02, de 30 de novembro de
2006, adotou apenas a lei como referência para a definição da obrigação legal, tendo em vista
o disposto nos artigos 5º, II, e 150, I, da Constituição Federal, segundo os quais “ninguém será
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, sendo vedado “exigir
ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”.
18 Entretanto, cumpre esclarecer que, em suas disposições transitórias, a NPC restringiu o ajuste de
provisões a valor presente, de modo que tal ajuste ocorresse, na prática, somente quando alguma
norma específica o exigisse ou após a edição de norma que desse “legitimidade à aplicação desse
conceito nas práticas contábeis adotadas no Brasil” (item 78 da NPC).
norma contábil incluíam: (i) a venda ou extinção de uma linha de negócios; (ii) o fechamento de
fábricas ou locais de negócios de um país ou região; e (iii) mudanças na estrutura da administração,
dentre outros.
23 Ibid. p. 322.
24 A discussão do exemplo 4 (a) ganhou contornos práticos por ocasião do julgamento pelo Supremo
Tribunal Federal de quatro recursos individuais relativos à constitucionalidade do parágrafo 1º do
artigo 3º da Lei nº 9.718/98, em sessão plenária de 09 de novembro de 2005. O artigo 3º, parágrafo
1º, da Lei nº 9.718/98 havia definido como receita bruta a totalidade das receitas auferidas pela
pessoa jurídica, para fins de cálculo da contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e da
Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS). Na medida em que a legislação
anterior previa a incidência da COFINS e da contribuição ao PIS sobre o faturamento bruto das
pessoas jurídicas, verificou-se um alargamento da base de cálculo das referidas contribuições sociais.
A questão foi tratada pelo Comunicado Técnico do IBRACON nº 02, de 23 de janeiro de 2006, e
pelo já mencionado Ofício-Circular CVM/SNC/SEP nº 02/2007. Posteriormente, em 13 de julho de
2009, o IBRACON editou o Comunicado Técnico nº 05/2009, a fim de refletir o desenvolvimento
do tratamento do assunto.
o exigisse.
A Lei nº 11.638/2007 tornou obrigatória no Brasil a prática contábil do
ajuste a valor presente, por meio da alteração do artigo 184, inciso III, da Lei
das Sociedades Anônimas. Todavia, a regulamentação detalhada do assunto só
foi editada em dezembro de 2008, quando da aprovação do Pronunciamento
Técnico CPC 12, referente a Ajuste a Valor Presente. Somente a partir de
então se tornou possível a plena aplicação do IAS 37 no que tange a ajuste de
provisões a valor presente.
4.2.2. O atual Pronunciamento Técnico CPC 25. Durante Reunião
Extraordinária realizada em 26 de junho de 2009, o CPC aprovou o
Pronunciamento Técnico CPC 25, referente a Provisões, Passivos Contingentes
e Ativos Contingentes.
Elaborado a partir do IAS 37 sobre o mesmo tema, o Pronunciamento
Técnico CPC 25 teve sua minuta submetida a audiência pública conjunta com
a CVM até 15 de junho do mesmo ano. A maior parte das sugestões recebidas
durante o período da audiência pública tratou de questões relacionadas à forma
da minuta, e não ao seu conteúdo, tendo-se acatado a maioria das sugestões feitas
com o objetivo de melhorar a redação ou o entendimento da norma.
No entanto, segundo o relatório da auditoria divulgado pela Coordenadoria
Técnica do CPC, algumas sugestões de conteúdo não foram aceitas pelo
Comitê, com destaque para as que propunham que todas as execuções fiscais e
débitos inscritos em dívida ativa fossem tratados como passivo da entidade. Ao
justificar a não-aceitação dessas propostas, o Comitê esclareceu que as normas
do IASB, e, assim, o Pronunciamento Técnico CPC 25, fundamentam-se em
princípios que estabelecem as circunstâncias nas quais se devem provisionar
os passivos de uma entidade ou divulgá-los em nota explicativa. Por isso, o
Comitê entendia não ser adequado fixar regras de provisionamento com base
apenas no estágio das disputas judiciais ou administrativas.
A posição do Comitê pode ser mais bem compreendida a partir da
colocação de que “a contabilidade, na visão do IASB, é principles-based (baseada
em princípios), opondo-se à abordagem rules-based (baseada em regras).
Enquanto a primeira prega uma contabilidade amparada por princípios e
conceitos com amplo espaço para julgamento de valor, a segunda preocupa-se
em desenvolver regras detalhadas que, ao contrário, reduzam a margem para
discricionariedade. (...) Sistemas jurídicos common law (direito consuetudinário),
27 Respectivamente, Pronunciamentos Técnicos CPC 38, 17, 32, 06, 33, 11 e 15.
28 Conforme item 9 da NPC, que, conforme mencionado no tópico 2.1.1 deste trabalho, estabelecia
quatro categorias nas quais os passivos e os ativos poderiam ser classificados: praticamente certo,
provável, possível e remoto.
29 Vide Ofício-Circular CVM/SNC/SEP nº 02, de 1º de julho de 2010, que divulgou trabalho produzido
pelo CPC com o objetivo de assinalar aspectos importantes dos pronunciamentos, orientações e
interpretações editados pela referida entidade até 31 de dezembro de 2009, de forma a destacar os
itens que poderiam impactar de maneira mais significativa as demonstrações contábeis das pessoas
jurídicas para os exercícios findos a partir de 31 de dezembro de 2010.
30 Os US GAAP (Generally Accepted Accounting Principles in the United States) podem ser
entendidos como Princípios Contábeis Geralmente Aceitos nos Estados Unidos e correspondem
ao conjunto de normas norte-americanas que regem a elaboração, apresentação e divulgação
de demonstrações financeiras. Atualmente, o Financial Accounting Standards Board (FASB) é a
autoridade mais alta nos Estados Unidos a estabelecer princípios contábeis aplicáveis a companhias
públicas e privadas. No âmbito estadual, os GAAP são geralmente estabelecidos por Gorvenmental
Accounting Standards Board (GASB). Em 2002, o IASB e o FASB firmaram um memorando de
entendimentos conhecido Norwalk Agreement, que estabeleceu o compromisso de ambas as
entidades de promover a convergência e harmonização de suas normas contábeis.
Com esse objetivo, em 30 de junho de 2005, foi emitida uma Minuta para
Exposição (Exposure Draft – ED) contendo uma série de propostas de mudanças
significativas na prática prevista pelo IAS 37. A referida ED propunha, em
primeiro lugar, a eliminação das expressões “provisões” e “passivos contingentes”,
passando-se a adotar a designação geral de “passivos não financeiros”. Mais
do que uma simples mudança terminológica, essa alteração representaria uma
nova abordagem ao tema, “com base no argumento de que os passivos surgem
apenas de obrigações incondicionais (ou não contingentes) e, portanto, algo
que seja um passivo (uma obrigação incondicional) não pode ser contingente
ou condicional”31.
Na ED de 2005, também se propôs a eliminação da probabilidade como
um dos critérios para o reconhecimento de uma provisão. Além disso, em termos
de mensuração, havia a intenção de substituir a noção de “melhor estimativa”
pelo valor razoável que a entidade pagaria para liquidar ou transferir a obrigação
para terceiros na data do balanço, valor esse que seria calculado com base no
fluxo de caixa esperado, considerando-se todos os possíveis desfechos, e não
apenas o mínimo, o máximo ou o mais provável. De acordo com a proposta do
IASB, as regras de mensuração do IAS 37 davam margem a diferentes formas
de interpretação e seriam inadequadas no contexto das demais propostas da
ED de 2005.
Após receber e analisar os comentários recebidos à Minuta de
Exposição de 2005, o IASB revisou e reformulou alguns dos aspectos da
ED com base nas respostas examinadas, chegando a conclusões a respeito
da maioria dos pontos de sua proposta, referentes ao reconhecimento de
passivos e a custos de reestruturação.
Nesse sentido, o Board decidiu que o novo IFRS não incluiria a
probabilidade de saída de recursos como critério para o reconhecimento de
passivos. As incertezas relativas ao valor e ao momento dos desembolsos
33 Tradução livre de informações obtidas na própria página eletrônica da IFRS Foundation (<http://
www.ifrs.org/Current+Projects/IASB+Projects/Liabilities/Meeting+Summaries/IASB+Sept+10.htm>).
Acesso em 20 mar. 2011.
34 Conforme artigo 335 do Regulamento do Imposto sobre a Renda aprovado pelo Decreto 3.000/99
que dispõe só serem dedutíveis a provisões expressamente autorizdas pela legislação do IR e
consolidadas no Regulamento.
35 Sobre a questão vide o artigo A dedutibilidade dos depósitos judiciais na base do Imposto de
Renda da pessoa jurídica e da Contribuição Social sobre o lucro – – derrogação do art. 8º da
Lei nº 8.541/92 em face da Lei nº 9.703/98,de Marcos André Vinhas Catão, publicado na Revista
Dialética de Direito Tributário, nº 63, São Paulo: Dialética, 2000.
36 Ver Recurso Especial nº 1168038/SP: “TRIBUTÁRIO – PROCESSO CIVIL – IMPOSTO SOBRE A
RENDA – REGIME DE TRIBUTAÇÃO – DESPESAS DEDUTÍVEIS – REGIME DE CAIXA – DEPÓSITOS
JUDICIAIS – INGRESSOS TRIBUTÁRIOS – IMPOSSIBILIDADE DE DEDUÇÃO ANTES DO
TRÂNSITO EM JULGADO DA DEMANDA – VIOLAÇÃO A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS –
ART. 110 DO CTN – MATÉRIA CONSTITUCIONAL – INCOMPETÊNCIA DO STJ – PRECEDENTES
– RECURSO SUBMETIDO AO REGIME DO ART. 543-C DO CPC E DA RESOLUÇÃO N. 8/STJ.
1. Falece competência ao Superior Tribunal de Justiça para conhecer de supostas violações a
enunciados normativos constitucionais. Precedentes.
2. O art. 110 do CTN estabelece restrições ao exercício da competência tributária pelo legislador
do Ente Federativo, matéria nitidamente constitucional, razão pela qual a competência para o
exame de sua violação compete ao Supremo Tribunal Federal. Precedentes.
3. Compete ao legislador fixar o regime fiscal dos tributos, inexistindo direito adquirido ao
contribuinte de gozar de determinado regime fiscal.
4. A fixação do regime de competência para a quantificação da base de cálculo do tributo e do
regime de caixa para a dedução das despesas fiscais não implica em majoração do tributo devido,
inexistindo violação ao conceito de renda fixado na legislação federal.
5. Os depósitos judiciais utilizados para suspender a exigibilidade do crédito tributário consistem
em ingressos tributários, sujeitos à sorte da demanda judicial, e não em receitas tributárias, de
modo que não são dedutíveis da base de cálculo do IRPJ até o trânsito em julgado da demanda.
6. Recurso especial conhecido em parte e não provido.” (STJ, REsp nº 1168038/SP, Rel. Ministra
Eliana Calmon, Brasília, 09.06.2010)
V – Conclusão
O tratamento das contingências legais no Brasil vem sendo objeto
de uma constante regulação, imposta indiscriminadamente a todas as
sociedades comerciais.
Tal evolução impõe um regime jurídico próprio composto de várias
matizes: societária, contábil e fiscal, consolidando-se como um dos mais
importantes elementos de eficiência da administração.
Mais do que uma faculdade ou dever funcional dos administradores, a
avaliação de contingências decorre de um arcabouço normativo estruturado e
sistêmico, e configura-se, assim, em uma obrigação legal.
Em tempos de elevação do princípio de transparência que rege a premência
de uma melhor governança corporativa pelas sociedades comerciais brasileiras,
a observância dessa normatização assume feição cada vez mais relevante no
contexto de nosso ordenamento.
Bibliografia
CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas. 4ª ed. São Paulo: Saraiva:
2009. 885 p. (v. 3).
CATÃO, Marcos André Vinhas. A dedutibilidade dos depósitos judiciais na base do Imposto
de Renda da pessoa jurídica e da Contribuição Social sobre o lucro – derrogação do art. 8º
da Lei nº 8.541/92 em face da Lei nº 9.703/98, Revista Dialética de Direito Tributário, nº
63, São Paulo: Dialética, 2000.
EIZIRIK, Nelson. Os Impactos das Novas Regras Contábeis da Lei nº 11.638/2007. Disponível
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IUDÍCIBUS, Sérgio de; MARION, José Carlos. Curso de contabilidade para não contadores. 3ª
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Sites consultados
Comissão de Valores Mobiliários – CVM. <www.cvm.gov.br>
Comitê de Pronunciamentos Contábeis – CPC. <www.cpc.org.br>
IFRS Foundation. <www.ifrs.org>
Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC. <www.ibgc.org.br>
Instituto dos Auditores Independentes do Brasil – IBRACON. <www.ibracon.com.br>
O Regime Tributário
de Transição e a
Escrituração para Fins
Fiscais
Introdução
A partir do processo de alinhamento das normas contábeis brasileiras às
normas internacionais, cujo marco legal é a Lei 11.638, de 2007, através de
modificações dos dispositivos da Lei das Sociedades por Ações (Lei 6.404, de
1976) que tratam das demonstrações financeiras, é certo que muitos aspectos
polêmicos surgiram, sobretudo na seara tributária, muito dos quais ainda
carentes de melhor encaminhamento.
Neste sentido, em que pese a Lei 11.941, de 2009, fruto da conversão, com
alterações, da MP 449, de 2008, ter criado o Regime Tributário de Transição
(RTT), com aplicação a partir do ano-calendário 2008 com vistas a propiciar
a neutralidade para fins tributários, ainda se discute o alcance deste regime.
Abrangendo também as bases de cálculo da CSLL e da contribuição ao PIS
e da Cofins, o postulado do Regime Tributário de Transição1 é que as alterações
introduzidas pela Lei 11.638/2007 e pelos arts. 37 e 38 da Lei 11.941/2009,
que modifiquem o critério de reconhecimento de receitas, custos e despesas
computadas na escrituração contábil, para apuração do lucro líquido do
exercício, não terão efeitos para fins de apuração do lucro real2 da pessoa jurídica
sujeita ao RTT, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e
critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007.
Assim, o propósito deste estudo é analisar se a aplicação do RTT, nos
termos de sua definição legal, ensejaria a obrigatoriedade da manutenção, por
parte das empresas, de uma escrituração específica para fins tributários, baseada
nos métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007, como
condição sine qua non para o pleno atendimento aos ditames do referido regime,
1 “Art. 16. As alterações introduzidas pela Lei 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos arts.
37 e 38 desta Lei que modifiquem o critério de reconhecimento de receitas, custos e despesas
computadas na apuração do lucro líquido do exercício definido no art. 191 da Lei nº 6.404, de
15 de dezembro de 1976, não terão efeitos para fins de apuração do lucro real da pessoa jurídica
sujeita ao RTT, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios contábeis
vigentes em 31 de dezembro de 2007.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo às normas expedidas pela Comissão de
Valores Mobiliários, com base na competência conferida pelo § 3o do art. 177 da Lei no 6.404, de
15 de dezembro de 1976, e pelos demais órgãos reguladores que visem a alinhar a legislação
específica com os padrões internacionais de contabilidade. “
2 De acordo com o § 3º do art. 15 da Lei 11.941/2009, o RTT é obrigatório a partir do ano-calendário
de 2010, inclusive para a apuração do imposto sobre a renda com base no lucro presumido ou
arbitrado, da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, da Contribuição para o PIS/PASEP
e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS.
3 Lei 11.941, de 2009; “Art. 3º Aplicam-se às sociedades de grande porte, ainda que não constituídas
sob a forma de sociedades por ações, as disposições da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976,
sobre escrituração e elaboração de demonstrações financeiras e a obrigatoriedade de auditoria
independente por auditor registrado na Comissão de Valores Mobiliários.
Parágrafo único. Considera-se de grande porte, para os fins exclusivos desta Lei, a sociedade ou
conjunto de sociedades sob controle comum que tiver, no exercício social anterior, ativo total
superior a R$ 240.000.000,00 (duzentos e quarenta milhões de reais) ou receita bruta anual
superior a R$ 300.000.000,00 (trezentos milhões de reais).”
4 Art. 6º - caput.
Além disso, a Lei 11.638 havia inserido o § 7º8 ao art. 177 da lei societária,
determinando a neutralidade, para fins tributários, dos ajustes relacionados à
harmonização das práticas contábeis.
A respeito das mudanças na forma de escrituração mercantil promovidas
pela Lei 11.638, assim se posicionou o Manual de Contabilidade das Sociedades
por Ações9:
“Esse novo § 2º reforça o seguimento de regras contábeis de natureza
fiscal ou de outra origem, que não produzam demonstrações contábeis
adequadas, só pode ser feito de duas formas: a citada no item I, que
é como já hoje se faz; efetuam-se os registros normalmente nos
livros diário e razão, conforme as boas normas e práticas contábeis,
ajustando-se no LALUR – Livro de Apuração do Lucro Real – o
que for necessário por força das disposições tributárias. Mas sabemos
das enormes dificuldades para essa aplicação de forma mais completa,
principalmente pelo fato de o próprio fisco limitar o uso desse livro
a partir de regras específicas que impôs.
Só que agora temos a alternativa nova, criada sob o item II, que é essa
do “LALUC”: efetuam-se os registros no diário e razão, conforme
critérios aceitos pela legislação fiscal, levantam-se o balanço e a
demonstração do resultado a serem enviados à Receita Federal, mas
essas peças contábeis são de uso exclusivo para relacionamento com
o governo, jamais para publicação, entrega aos bancos, cálculo de
dividendo mínimo obrigatório ou outros etc. O que se tem que fazer
é, após levantadas essas demonstrações só para fins fiscais, efetuar os
devidos ajustes contábeis para a obtenção das demonstrações contábeis
societárias. Isso precisará ser feito mediante uso de livros auxiliares
ou em registros nos próprios diário e razão, conforme normatização
ainda a ser efetuada. Se vierem a ser utilizados livros auxiliares, eles
precisarão ser revestidos das mesmíssimas formalidades legais que os
diário e razão costumeiramente utilizados.”
11 “O Direito Contábil: da Lei 11.638/07 à Lei 11.941/09 – Vol. II”, ROCHA, Coordenador Sergio
Andre: Quartier Latin.
12 “Aspectos Tributários da Nova Lei Contábil: Lei 11.638/07”; Coordenadores Edison Carlos
Fernandes e Marcelo Magalhães Peixoto; São Paulo: MP Editora, 2010.
13 Exposição de Motivos 161/08: “56.9. Revoga-se o § 7º do art. 177 da Lei nº 6.404, de 1976, tendo
em vista que os efeitos deste dispositivo já estão plenamente garantidos pelo RTT, à medida que o
conjunto de modificações propostas na escrituração de livros auxiliares e do Livro de Apuração
do Lucro Real dispensa totalmente os sujeitos passivos de realizar lançamentos na sua escrita
mercantil, unicamente com o propósito de atender à legislação tributária.....(omissis)...”
14 Sabe-se que o RTT deve ser mantido para os próximos anos-calendário, até porque não há
mecanismos menos complexos que permitam a neutralidade dos novos métodos e critérios
contábeis para fins tributários. Não é outra a razão do porque de vários outros países que
experimentam a convergência ao IFRS terem optado pela manutenção de uma escrituração para
fins fiscais, ainda que com variantes em função das peculiaridades locais.
15 Art. 16. As alterações introduzidas pela Lei 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos arts.
37 e 38 desta Lei que modifiquem o critério de reconhecimento de receitas, custos e despesas
computadas na apuração do lucro líquido do exercício definido no art. 191 da Lei no 6.404, de
15 de dezembro de 1976, não terão efeitos para fins de apuração do lucro real da pessoa jurídica
sujeita ao RTT, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios contábeis
vigentes em 31 de dezembro de 2007.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo às normas expedidas pela Comissão
de Valores Mobiliários, com base na competência conferida pelo § 3o do art. 177 da Lei no 6.404,
de 15 de dezembro de 1976, e pelos demais órgãos reguladores que visem a alinhar a legislação
específica com os padrões internacionais de contabilidade.
16 De acordo com o § 3o do art. 15 da Lei 11.941/09, o RTT é obrigatório a partir do ano-calendário
de 2010, inclusive para a apuração do imposto sobre a renda com base no lucro presumido ou
arbitrado, da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, da Contribuição para o PIS/PASEP
e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS.
2.2.2. Ágio
Ao se supor que a equivalência patrimonial pode ter saldo distinto para
fins fiscais, a figura do ágio passa pelo mesmo dilema, dado ser determinado
pela diferença entre o preço pago na aquisição de investimento relevante e o
valor da equivalência patrimonial de abertura.
Além disso, há discussões acerca da possibilidade de se manter, para fins
fiscais, fundamento econômico distinto para o ágio, em relação ao adotado na
escrituração comercial, em virtude da aplicação do Pronunciamento Técnico
do CPC 1517. Não pretendemos nos aprofundar neste tema, dado que vários
colegas já se debruçaram sobre o mesmo.
2.2.3. Eventos Especiais
A legislação que trata do RTT nada menciona acerca do tratamento a
ser dado aos saldos do FCONT nos casos de eventos especiais (fusão, cisão
parcial ou total e incorporação).
Em que pese às empresas ainda ser possível optar por realizar tais operações
a valor contábil ou de mercado18, discute-se qual seria, no plano fiscal, o valor
contábil a informar tais transações a partir da adoção dos novos métodos e
critérios contábeis, os quais claramente abandonam o custo histórico, até então
adotado, como base de valor contábil.
Assim sendo, caso não haja sucessão nos saldos controlados no FCONT
das empresas sucedidas, na hipótese de que estes sejam distintos dos valores
da escrituração comercial, tornar-se-á impraticável às empresas sucessoras
manter o adequado tratamento para fins de depreciação, alienação e baixas
futuras, por exemplo.
Por outro lado, considerar qualquer ganho ou perda de capital nas empresas
sucedidas, ainda que os saldos da escrituração comercial passem a constituir custo de
aquisição nas sucessoras, nos parece infringir o fundamento do RTT, dado que esta
não era a premissa para as operações a valor contábil (do balanço fiscal – FCONT)
que, como dissemos, ainda constitui prerrogativa para as empresas.
17 O Pronunciamento Técnico do CPC 15 tem como objetivo definir o tratamento contábil aplicável
ao reconhecimento, à mensuração e às divulgações decorrentes de operações de “combinação
(ou concentração) de negócios”.
18 Lei nº 9.249, de 1995, art. 21.
para fins de apuração do lucro real da pessoa jurídica sujeita ao Regime Tributário de Transição
(RTT), devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios contábeis vigentes
em 31 de dezembro de 2007.
Dispositivos legais: Lei nº 6.404, de 1976, art. 183, § 3º, II; Lei nº 11.638, de 2007, art. 1º; Lei nº
11.941, de 2009, arts. 15, 17 e 37; Decreto nº 3.000, de 1999 (RIR/1999), arts. 305, 307, 309,
310 e 312; IN RFB nº 949, de 2009.
SOLUÇÃO DE CONSULTA No 11 de 2 de maio de 2011 (5ª Região Fiscal).
ASSUNTO: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica - IRPJ EMENTA: “REGIME TRIBUTÁRIO
DE TRANSIÇÃO - RTT. DEPRECIAÇÃO. CRITÉRIOS DE CONTABILIZAÇÃO. PROCEDIMENTOS
DE REVERSÃO DOS EFEITOS. A pessoa jurídica sujeita ao Regime Tributário de Transição - RTT
deve adotar o procedimento previsto no artigo 17 da Lei nº 11.941, de 2009, no tocante ao registro
contábil da depreciação e à reversão dos efeitos da utilização de métodos e critérios contábeis
diferentes dos prescritos na legislação tributária. (Dispositivos Legais: Lei nº 6.404, de 1976, art.
183, § 3º, II; Lei nº 11.941, de 2009, art. 17; Decreto nº 3.000, de 1999 (RIR/1999), art. 305 e
seguintes.”
20 Instrução Normativa SRF 213, de 2002: Art. 6º As demonstrações financeiras das filiais, sucursais,
controladas ou coligadas, no exterior, serão elaboradas segundo as normas da legislação comercial
do país de seu domicílio.
21 Arts. 24 e 25.
22 Arts. 18 a 24-A da Lei 9.430, de 1996; Instrução Normativa SRF 243, de 2002.
23 “Art. 201. A companhia somente pode pagar dividendos à conta de lucro líquido do exercício,
de lucros acumulados e de reserva de lucros; e à conta de reserva de capital, no caso das ações
preferenciais de que trata o § 5º do artigo 17.
§ 1º A distribuição de dividendos com inobservância do disposto neste artigo implica
responsabilidade solidária dos administradores e fiscais, que deverão repor à caixa social a
importância distribuída, sem prejuízo da ação penal que no caso couber.
§ 2º Os acionistas não são obrigados a restituir os dividendos que em boa-fé tenham recebido.
Presume-se a má-fé quando os dividendos forem distribuídos sem o levantamento do balanço ou
em desacordo com os resultados deste.”
24 Lei 9.249, de 1995, art. 10.
25 Deliberação CVM 207, de 1996.
26 Art. 6º É vedado, para fins de gozo da isenção prevista no art. 38 do Decreto-Lei nº 1.598, de 1977,
o registro, no controle a que se referem os arts. 7º a 9º, de reserva de capital, para as operações
referidas nos arts. 4º e 5º.
3. Conclusão
A análise dos dispositivos legais que trataram de definir o RTT e seu alcance,
ao mencionarem que as alterações introduzidas pela Lei 11.638/2007 e pelos
arts. 37 e 38 da Lei 11.941/2009, que modifiquem o critério de reconhecimento
de receitas, custos e despesas computadas na apuração do lucro líquido do
exercício definido no art. 191 da Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976, não
terão efeitos para fins de apuração do lucro real da pessoa jurídica sujeita ao
RTT, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios
contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007, não são incisivos o bastante
para determinarem a existência de um balanço para fins tributários.
Sem embargo do fato de que a contabilização de receitas, custos e
despesas não pode ser vista dissociada das respectivas contrapartidas em contas
patrimoniais, a referência a uma escrituração para fins fiscais está contida apenas
na Instrução Normativa RFB 949/2009, quando da definição do FCONT, ou
seja, assenta-se em norma infralegal27.
Este controle para fins fiscais alinha-se à nova redação dada ao § 2º do art.
177 da Lei 6.404, de 1976, promovida pela Lei 11.941, de 2009, no sentido de
que dispositivos da lei tributária, ou de legislação especial sobre atividade que
constitui seu objeto que prescrevam, conduzam ou incentivem a utilização de
métodos ou critérios contábeis diferentes ou determinem registros, lançamentos
ou ajustes ou a elaboração de outras demonstrações financeiras que não as da
escrituração mercantil, devem ser observados exclusivamente em livros ou
registros auxiliares.
De salientar que, na redação anterior dada a esse dispositivo pela Lei
11.638, de 2007, previa-se, ainda que optativamente, a figura formal de uma
escrituração para fins tributários, sem prejuízo da escrituração comercial.
Assim, nos parece que não há, no atual arcabouço legal, dispositivo que
imponha expressamente a apuração de um balanço para fins tributários, sobre
o qual diversos ajustes na apuração do lucro real seriam calculados, a exemplo
dos casos citados neste estudo.
27 Cabe mencionar que, dentre as inovações do programa gerador da DIPJ 2011, aprovado pela IN
RFB 1.149, de 2011, estão novas fichas nas quais são transcritas as contas patrimoniais (Ativo/
Passivo) do balanço para fins fiscais, tal qual apurado através do FCONT, bem como a respectiva
Demonstração de Lucros ou Prejuízos Acumulados (Fichas 36E, 37E e 38A).
Contabilização de
Investimento em
Sociedades Objeto
de Acordo entre
Acionista Controlador e
Minoritário Relevante
Nelson Eizirik
I – Introdução
A partir da edição da Lei nº 11.638/2007, iniciou-se oficialmente o processo
de convergência das normas contábeis brasileiras para aquelas editadas, em âmbito
internacional, pelo International Accounting Standards Board – IASB.
O § 5º do artigo 177 da Lei das S.A., acrescentado pela referida Lei
nº 11.638/2007, estabeleceu que as normas expedidas pela Comissão de Valores
Mobiliários – CVM para regular as demonstrações financeiras das companhias
abertas devem ser “elaboradas em consonância com os padrões internacionais de
contabilidade adotados nos principais mercados de valores mobiliários”.
Adicionalmente, a Lei nº 11.638/2007 também introduziu o artigo 10-A à Lei
nº 6.385/1976, o qual permitiu que a CVM, o Banco Central do Brasil e demais
órgãos e agências reguladoras celebrassem “convênio com entidade que tenha por
objeto o estudo e a divulgação de princípios, normas e padrões de contabilidade e de
auditoria, podendo, no exercício de suas atribuições regulamentares, adotar, no todo
ou em parte, os Pronunciamentos e demais orientações técnicas emitidas”.
Com isto, foram criadas as condições legais para que a CVM incorporasse
ao nosso ordenamento jurídico-contábil os Pronunciamentos Técnicos
aprovados pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis – CPC, os quais, por
sua vez, são elaborados com base nas normas internacionais conhecidas como
International Financial Reporting Standards – IFRS, editadas pelo IASB.
Em cumprimento à nova legislação, a CVM aprovou, por meio de
Deliberações de seu Colegiado, diversos Pronunciamentos e Interpretações
do CPC, os quais, segundo manifestado pelo próprio CPC, permitem que
“as demonstrações contábeis elaboradas sob seus critérios possam ser tomadas como
estando totalmente de acordo com as normas do IASB” (CPC nº 43 aprovado pela
Deliberação CVM nº 610/2009).
Alguns destes Pronunciamentos tratam do registro contábil das
participações em outras sociedades por parte das companhias que detenham
tais participações, estabelecendo três diferentes métodos de contabilização
– equivalência patrimonial, consolidação parcial e consolidação total –, cuja
aplicação varia em função de a sociedade investida caracterizar-se como
coligada, controlada em conjunto ou controlada da companhia investidora.
O objetivo do presente Artigo consiste em analisar qual dos referidos
métodos deve ser utilizado no registro contábil de investimento em companhias
1 NELSON EIZIRIK. Oferta Pública de Aquisição de Controle de Companhia Aberta. In: Fusões
e Aquisições: aspectos jurídicos e econômicos. Organizador: Jairo Saddi. São Paulo: IOB,
2002, p. 236.
2 ALFREDO LAMY FILHO e JOSÉ LUIZ BULHÕES PEDREIRA. A Lei das S.A.: (pressupostos,
elaboração, aplicação). 2ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1996. Vol. 2, p. 195.
4 Na data de elaboração do presente Artigo, estava em curso audiência pública, promovida pela
CVM, sobre proposta de revisão dos pronunciamentos CPC 15, 18, 19 e 36. Tais propostas de
revisão, contudo, não alteram os fundamentos e as conclusões do presente Artigo.
8 Segundo consta expressamente do CPC19, “as atividades para as quais não existe acordo contratual
estabelecendo o controle conjunto não se configuram como empreendimento controlado em
conjunto para fins de aplicação do presente Pronunciamento”.
Por outro lado, se o operador tiver poderes para ditar as políticas financeiras
e operacionais da atividade econômica, entende-se que ele controla efetivamente
o empreendimento e, desta forma, este não se caracterizará como uma joint
venture sujeita à aplicação do CPC 19.
Os casos em que fique configurado o controle de determinado investimento
por um único empreendedor são regulados pelo CPC 36, o qual determina a
consolidação integral do investimento nas demonstrações contábeis do referido
empreendedor.
O CPC 36 disciplina as demonstrações consolidadas, devendo ser aplicado,
segundo seus próprios termos, “na elaboração e apresentação de demonstrações
contábeis consolidadas de grupo econômico de entidades sob o controle de controladora”.
Para fins de aplicação do CPC 36, “controle” é definido como “o poder de
governar as políticas financeiras e operacionais da entidade de forma a obter benefício
das suas atividades”.
Ou seja, deve ser adotada a consolidação integral quando um investidor
possui poderes para definir, com exclusividade, as políticas financeiras e
operacionais de determinado empreendimento.
De acordo com o CPC 36, presume-se a aplicação do método de
consolidação ali previsto nos casos em que o investidor possui, direta ou
indiretamente, mais da metade do capital com direito a voto da sociedade. Tal
presunção somente pode ser afastada em “circunstâncias excepcionais”, isto é,
em hipóteses em que fique “claramente demonstrado” que a propriedade de tal
parcela do capital votante não permite a seu titular ditar as políticas financeiras
e operacionais da entidade controlada.
Por fim, o Pronunciamento CPC 15 estabelece as regras a serem adotadas
na contabilização dos efeitos das denominadas “combinações de negócio”, isto é,
“operação ou outro evento por meio do qual o adquirente obtém o controle de um ou
mais negócios, independentemente da forma jurídica da operação”.
Tal Pronunciamento deve ser interpretado em conjunto com o CPC 36,
na medida em que ele trata das hipóteses em que, por meio de determinada
operação de “combinação de negócios”, uma entidade adquire o controle de outra
e, consequentemente, deve adotar o procedimento de consolidação integral.
Da análise conjunta dos Pronunciamentos acima mencionados, pode-se aferir
que a contabilização de investimentos em outras sociedades nas demonstrações
consolidadas de determinada companhia deve observar as seguintes regras:
V – Conclusão
Tendo em vista o acima exposto, passamos a analisar qual a forma de
contabilização de investimento aplicável às companhias em que o acionista
majoritário e um minoritário relevante ou estratégico tenham celebrado acordo de
acionistas, assegurando a tal minoritário determinados direitos especiais, tais como
(i) eleger alguns membros do Conselho de Administração ou da Diretoria, e (ii)
impedir que determinadas deliberações da Assembleia Geral e do Conselho de
Administração sejam aprovadas sem o seu prévio consentimento (direito de veto).
A propósito, vale ressaltar que, de acordo com o CPC 36, presume-se que
a companhia deve efetuar a consolidação integral do investimento em qualquer
sociedade na qual detenha mais da metade das ações com direito a voto.
Conforme referido, o CPC 36 expressamente esclarece que tal presunção
somente pode ser afastada em “circunstâncias excepcionais”, nas quais fique
“claramente demonstrado” que o detentor de mais de 50% (cinquenta por cento) do
capital votante não tem poderes para ditar as políticas financeiras e operacionais
da sociedade investida.
Assim, deve-se partir da premissa de que o acionista majoritário, titular de
mais de 50% (cinquenta por cento) do capital votante da companhia investida,
tem o direito de contabilizar seu investimento de acordo com o método da
consolidação integral.
A legitimidade da consolidação integral do investimento nas demonstrações
contábeis do acionista majoritário é ainda reforçada nos casos em que o acordo de
acionistas não afeta o seu direito de eleger a maioria absoluta dos membros do
Conselho de Administração e da Diretoria da companhia investida.
Por outro lado, poder-se-ia eventualmente argumentar que o acordo
de acionistas, ao atribuir ao minoritário estratégico direito de veto sobre
determinadas matérias expressamente previstas, impediria o acionista
majoritário de “governar as políticas financeiras e operacionais” da companhia
investida e, consequentemente, de contabilizar seu investimento pelo método
da consolidação integral.
A propósito, vale ressaltar que o direito de veto previsto em acordo de
acionistas não assegura ao seu titular o exercício de qualquer das prerrogativas
que, conforme exige o artigo 116 da Lei das S.A., permitem identificar a
figura do acionista controlador, isto é, o poder de eleger os administradores e
de comandar, efetivamente, as atividades sociais.
útil dos ativos, seria uma imposição nova, ou se tal procedimento já seria de
observância obrigatória para as empresas, que haviam optado por adotar as
taxas sugeridas pelo fisco por razões puramente práticas.
A resposta a essa questão tem implicação prática relevante. Afinal, o RTT,
que garante neutralidade fiscal para os ajustes decorrentes da introdução de
novos parâmetros contábeis, somente pode ser aplicado em relação aos novos
procedimentos contábeis, ou seja, às inovações trazidas pela Lei nº 11.638.
Assim, caso se conclua que as alterações nas taxas de depreciação correspondem
a uma “correção” de procedimento contábil, e não à observância de uma regra
nova, a conseqüência é que a utilização de tais taxas não terá sua neutralidade
fiscal assegurada pelo RTT, podendo, conforme o caso, afetar positiva ou
negativamente o lucro tributável das empresas.
O presente trabalho pretende examinar e responder a questão acima suscitada,
tendo em conta as disposições da Lei nº 11.638 e da Lei nº 11.941/2009. As
conclusões serão válidas tanto em relação ao imposto de renda da pessoa jurídica
(IRPJ), quanto em relação à contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL) e
às contribuições sociais (Contribuição ao Programa de Integração Social – PIS
e Contribuição ao Financiamento da Seguridade Social – COFINS), dada a
extensão de tratamento conferida pela legislação no âmbito do RTT.
2 Art. 309. A quota de depreciação registrável na escrituração como custo ou despesa operacional
será determinada mediante a aplicação da taxa anual de depreciação sobre o custo de aquisição
dos bens depreciáveis. (...)
3 Art. 310. A taxa anual de depreciação será fixada em função do prazo durante o qual se possa
esperar utilização econômica do bem pelo contribuinte, na produção de seus rendimentos.
4 § 1º A Secretaria da Receita Federal publicará periodicamente o prazo de vida útil admissível, em
condições normais ou médias, para cada espécie de bem, ficando assegurado ao contribuinte o
direito de computar a quota efetivamente adequada às condições de depreciação de seus bens,
desde que faça a prova dessa adequação, quando adotar taxa diferente.
5 A título de exemplo, no caso específico das concessionárias de energia elétrica, a RFB, por meio
do Parecer Normativo CST nº 153/75, reconheceu que as regras de depreciação das empresas
concessionárias de energia elétrica são definidas pela legislação específica do setor, aplicando-se as
taxas normais previstas na legislação fiscal somente no caso de bens não relacionados com a concessão.
maneira geral, tais prazos são aceitos pela RFB, tendo em vista que os órgãos
reguladores têm presumivelmente maior capacidade técnica para estabelecer
as regras aplicáveis ao setor regulado.
Até o advento dos novos parâmetros contábeis brasileiros, o que se
verificava, na prática, era a utilização, para fins contábeis, da mesma taxa
de depreciação prevista pela legislação fiscal. Esse procedimento, que vinha
sendo adotado pela maioria das empresas no Brasil, tinha um benefício claro:
não havia qualquer discrepância entre as despesas de depreciação registradas
na contabilidade e o valor considerado como despesa dedutível para fins de
apuração dos tributos sobre a renda (IRPJ e CSLL)6.
Os novos parâmetros contábeis introduzidos a partir da Lei nº 11.638
mudaram essa realidade, sendo obrigatório para as empresas brasileiras adotar
uma taxa de depreciação contábil que reflita, efetivamente, a vida útil econômica
dos bens, independentemente do que dispõe a legislação fiscal.
6 Essa afirmação é válida em condições normais de depreciação, já que existem exceções aplicáveis
no caso de depreciação acelerada ou incentivada.
7 De acordo com a Resolução CFC nº 1.159/2009, as definições da Lei nº. 11.638/2007 e da MP
nº. 449/08 (posteriormente Lei nº. 11.941/2009) devem ser observadas: (i) por todas as empresas
obrigadas a obedecer à Lei das S/A, compreendendo não só as sociedades por ações, mas também
as demais empresas, inclusive as constituídas sob a forma de limitadas, independentemente da
sistemática de tributação por elas adotada; (ii) as empresas de grande porte, de acordo com a
definição da Lei nº. 11.638/2007 (parágrafo único do art. 3º), devem, adicionalmente, observar as
regras da CVM; (iii) devem também ser observadas as determinações previstas nas Normas Brasileiras
de Contabilidade (NBCs) emitidas pelo CFC e os CPCs; e (iv) as demais entidades, sem finalidades
lucrativas, devem observar a legislação aplicável e as Normas Brasileiras de Contabilidade (NBCs)
específicas. O IRFS completo (Full IFRS), de acordo com a Resolução CFC nº 1.159/2009, as
definições da Lei nº. 11.638/07 e da MP nº. 449/2008 (posteriormente Lei nº. 11.941/2009) devem
ser observadas: (i) por todas as empresas obrigadas a obedecer à Lei das S/A, compreendendo
não só as sociedades por ações com capital registrado, mas também as empresas de grande porte,
inclusive as constituídas sob a forma de limitadas, independentemente da sistemática de tributação
por elas adotada; (ii) as empresas de grande porte, de acordo com a definição da Lei nº. 11.638/2007
(parágrafo único do art. 3º), devem, adicionalmente, observar as regras da CVM; e (iii) devem
também ser observadas as determinações previstas nas Normas Brasileiras de Contabilidade (NBCs)
emitidas pelo CFC e os CPCs. O IFRS para Pequenas e Médias Empresas (IFRS PME), de acordo
com a Resolução CFC 1255/2009, deve ser aplicado às empresas que: (a) não têm obrigação
pública de prestação de contas; e (b) elaboram demonstrações contábeis para fins gerais para
usuários externos. Exemplos de usuários externos incluem proprietários que não estão envolvidos
na administração do negócio, credores existentes e potenciais, e agências de avaliação de crédito.
8 Visando atribuir força normativa aos CPCs, são tais pronunciamentos aprovados como norma
própria por órgãos como o Conselho Federal de Contabilidade (CFC), a Comissão de Valores
Mobiliários (CVM), a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), Banco Central do Brasil
(BACEN) e agências reguladoras, sendo submetidos a audiências públicas.
9 IUDÍCIBUS, Sérgio de, MARTINS, Eliseu, GELBCKE, Ernesto Rubens, Manual de contabilidade
das sociedades por ações: (aplicável às demais sociedades), 2ª edição, São Paulo, Atlas, 2009,
Suplemento, p. 26.
10 Segundo o CPC 27, vida útil é: (a) o período de tempo durante o qual a entidade espera utilizar
um ativo; ou (b) o número de unidades de produção ou de unidades semelhantes que a entidade
espera obter pela utilização do ativo.
11 Segundo o CPC 27, valor residual de um ativo é o valor estimado que uma entidade obteria com
a venda do ativo, após deduzir as despesas estimadas de venda, caso o ativo já tivesse a idade e
a condição esperadas para o fim de sua vida útil.
12 A RFB publicou diretrizes para a adoção do referido regime por meio da Instrução Normativa nº
949/2009, a qual regulou a aplicação do RTT e instituiu o Controle Fiscal Contábil de Transição
(FCONT) como forma de escrituração obrigatória das pessoas jurídicas optantes pelo RTT para as
contas patrimoniais e de resultado, em observância aos métodos e critérios contábeis aplicados
pela legislação tributária (ou sejam, aqueles vigentes em 31 de dezembro de 2007).
imposição nova, introduzida pela Lei nº 11.638 ou, por outro lado, se tal
procedimento já seria de observância obrigatória para as empresas.
Nos itens a seguir serão discutidas duas possíveis interpretações para
a matéria e suas consequências fiscais, relacionando, de forma detalhada,
o posicionamento da RFB sobre a matéria, nos termos do aludido Parecer
Normativo nº 1/2011.
II.3.1. Primeira interpretação possível: ausência de
critério contábil novo
por questões práticas, a utilização dos prazos divulgados pela RFB, em condições
normais e médias, e sem prejuízo de o contribuinte adotar taxa diversa, em face
das condições reais de depreciação de seus bens, e desde que o faça com base em
documentação que comprove a adequação da taxa utilizada.
Assim, seguindo a mesma linha de raciocínio, não teria havido mudanças
concretas nas regras que tratam da determinação de taxas de depreciação para fins
contábeis e para fins fiscais. As alterações no prazo de vida útil de ativos eventualmente
adotados por empresas brasileiras em face dos novos parâmetros contábeis não seriam,
portanto, conseqüência de uma nova regra contábil introduzida pela Lei nº 11.638/07,
mas tão somente a “correção” de uma prática anterior que consistia em adotar, na
contabilidade, o prazo de vida útil sugerido pela RFB.
Como conseqüência desse entendimento, não existiria uma permissão
legal para se efetuar ajustes, no âmbito do RTT, para refletir alterações nas taxas
de depreciação de bens da empresa que tenham sido modificadas para fins de
adequação aos novos parâmetros contábeis brasileiros. Isso porque os referidos
ajustes são permitidos apenas para os casos em que a nova legislação tenha
acarretado mudança de critério contábil que afete a base de apuração dos tributos
sobre a renda (além das contribuições para o PIS/COFINS)13.
Pelo que se verifica do Parecer Normativo nº 1/2011, a RFB não é partidária
dessa linha de interpretação, concluindo que os novos parâmetros contábeis
efetivamente alteraram a sistemática de depreciação dos ativos. É do que se trata
a seguir, ao se analisar a segunda linha de interpretação possível.
II.3.2. Segunda interpretação possível: artigo 17 da Lei nº 11.941
Outra interpretação possível parte do pressuposto que a ausência de
uma previsão expressa na legislação societária anterior, quanto ao critério de
determinação das taxas de depreciação, possibilitava a adoção das taxas fiscais
de forma subsidiária, tendo tornado-se prática contábil no Brasil.
13 Assim, caso as empresas pretendessem adotar, para fins contábeis, uma nova taxa de depreciação,
que fosse diversa daquela prevista pela legislação fiscal e da que vinha sendo adotada até da Lei nº
11.638/07, com objetivo de “corrigir” uma prática anterior, deveriam comprovar a adequação da nova
taxa, em observância à legislação fiscal, podendo solicitar, em caso de dúvida, a elaboração de laudo
de avaliação por parte de entidade oficial especializada (artigo 310 (...) §2º No caso de dúvida, o
contribuinte ou a autoridade lançadora do imposto poderá pedir perícia do Instituto Nacional de
Tecnologia, ou de outra entidade oficial de pesquisa científica ou tecnológica, prevalecendo os
prazos de vida útil recomendados por essas instituições, enquanto os mesmos não forem alterados
por decisão administrativa superior ou por sentença judicial, baseadas, igualmente, em laudo
técnico idôneo (Lei nº 4.506, de 1964, art. 57, § 4º).
14 IUDÍCIBUS, Sérgio de, MARTINS, Eliseu, GELBCKE, Ernesto Rubens, SANTOS, Ariovaldo dos,
Manual de contabilidade societária, São Paulo, Atlas, 2010, p. 248.
Vale dizer que esse entendimento pode ser aplicado ainda que se entenda
não ter havido a introdução de um critério contábil novo para o cálculo das taxas
de depreciação. Afinal, o citado artigo 17 não exige a efetiva mudança de critério
contábil para assegurar a neutralidade fiscal de alterações contábeis realizadas para
atender os novos parâmetros contábeis brasileiros, mas tão somente a existência
de regras tributárias que “conduzam” ou “incentivem” práticas contábeis diversas
daquelas previstas na atual legislação societária e contábil.
Antes do advento do Parecer Normativo nº 1/2011, a própria RFB já
havia publicado algumas manifestações favoráveis à possibilidade de se realizar
ajustes de RTT em relação à alteração nas taxas de depreciação decorrente dos
novos parâmetros contábeis. As referidas manifestações foram exaradas por duas
divisões da RFB (5ª Região Fiscal e 10ª Região Fiscal) e são transcritas a seguir:
Processo de Consulta nº 11/2011 (Superintendência Regional da
Receita Federal / 5ª Região Fiscal)
Assunto: Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL.
Ementa: REGIME TRIBUTÁRIO DE TRANSIÇÃO – RTT.
DEPRECIAÇÃO. CRITÉRIOS DE CONTABILIZAÇÃO.
PROCEDIMENTOS DE REVERSÃO DOS EFEITOS. A pessoa
jurídica sujeita ao Regime Tributário de Transição – RTT deve adotar
o procedimento previsto no artigo 17 da Lei nº 11.941, de 2009, no
tocante ao registro contábil da depreciação e à reversão dos efeitos da
utilização de métodos e critérios contábeis diferentes dos prescritos
na legislação tributária.
DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei Nº 6.404, de 1976, art. 183, §
3º, II, Lei nº 11.941, de 2009, art. 17, Decreto nº 3.000, de 1999
(RIR/1999), art. 305 e seguintes.
Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ.
Ementa: REGIME TRIBUTÁRIO DE TRANSIÇÃO – RTT.
DEPRECIAÇÃO. CRITÉRIOS DE CONTABILIZAÇÃO.
PROCEDIMENTOS DE REVERSÃO DOS EFEITOS. A pessoa
jurídica sujeita ao Regime Tributário de Transição – RTT deve adotar
o procedimento previsto no artigo 17 da Lei nº 11.941, de 2009, no
tocante ao registro contábil da depreciação e à reversão dos efeitos da
utilização de métodos e critérios contábeis diferentes dos prescritos
na legislação tributária.
III. Conclusões
Em síntese, é possível resumir da seguinte forma a análise dos impactos
fiscais de eventuais alterações nas taxas de depreciação adotadas por empresas
brasileiras em face dos novos parâmetros contábeis brasileiros:
(i) a primeira posição possível é no sentido de que não houve mudança
na legislação brasileira no que diz respeito à determinação do
prazo de vida útil dos ativos; assim, as alterações nas taxas de
depreciação realizadas a partir da vigência da Lei nº 11.638/2007
representariam mera “correção” de uma prática anterior que
consistia em adotar, na contabilidade, o prazo de vida útil sugerido
pela RFB, por razões de praticidade;
(ii) no caso de adoção da posição acima explicitada, a empresa deveria
estabelecer a taxa de depreciação que corresponda ao prazo
durante o qual espera utilizar economicamente os ativos e não
poderá adotar, para fins fiscais, taxa diversa daquela adotada na
contabilidade, uma vez que não existiria autorização legal para
este tipo de ajuste no âmbito do RTT (nesse caso, a utilização de
taxa diversa daquela prevista pela legislação fiscal dependeria de
comprovação por meio de laudo técnico);
(iii) a segunda posição possível, já validada pela RFB por meio do Parecer
Normativo nº 1/2011, é no sentido de que houve, de fato, uma
mudança de critério contábil, sendo tal posição amparada pelos
artigos 16 e 17 da Lei nº 11.941; o citado artigo 17 esclarece,
de maneira específica, que, na existência de regras tributárias
que “conduzam” ou “incentivem” a adoção de práticas contábeis
diversas dos novos parâmetros contábeis, deverá o contribuinte
optante pelo RTT ajustar o lucro tributável via FCONT, de forma
a assegurar a manutenção das práticas contábeis vigentes em 31
de dezembro de 2007 na escrituração fiscal; e
(iv) a situação prevista pelo referido artigo 17 é precisamente o
caso das depreciações, já que a adoção das taxas sugeridas
pela RFB, se não era obrigatória para fins contábeis, ao menos
incentivava o procedimento que vinha sendo adotado até agora
no Brasil, no sentido de seguir, na escrituração contábil, as
mesmas taxas de depreciação previstas na legislação fiscal;
assim, mesmo que se entenda não ter havido mudança de
critério contábil, não há como negar a influência da legislação
tributária na contabilidade, fato este que, a teor do artigo 17,
atrai a aplicação do RTT para corrigir eventuais discrepâncias
entre os prazos de vida útil definidos como base nos novos
parâmetros contábeis e aqueles sugeridos pela RFB.
As novas regras
contábeis trazidas pela
Lei nº 11.638/2007 e o
arrendamento mercantil
1 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Teoria das Obrigações Contratuais e
Extracontratuais, 3º Vol. 20ª ed. São Paulo. Saraiva, 2004, p. 670-671.
2 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. Volume 3. 12ª ed. São Paulo. Saraiva, 2011,
p. 165-166.
3 Contrato de Leasing, vol. 250. Revista Forense, p. 771.
4 RIZZARDO, Arnaldo. Leasing – Arrendamento mercantil no direito brasileiro. 5º ed. São Paulo.
Revista dos Tribunais. 2009, p. 18.
5 Op cit., p. 139.
6 Op cit., p. 54-58.
4. As modalidades de Leasing.
A Resolução 2.309/96, em seu art. 1º, § único, previu expressamente a
modalidade de leasing operacional, distinguindo-o do financeiro:
“Art. 1º As operações de arrendamento mercantil com o tratamento
tributário previsto na Lei nº 6.099, de 12 de setembro de 1974, alterada
pela Lei nº 7.132, de 26 de outubro de 1983, somente podem ser
realizadas por pessoas jurídicas que tenham como objeto principal de
sua atividade a prática de operações de arrendamento mercantil, pelos
bancos múltiplos com carteira de arrendamento mercantil e pelas
instituições financeiras que, nos termos do artigo 13 deste Regulamento,
10 Imposto de Renda das Empresas – Interpretação e Prática. 34ª ed. São Paulo: IR Publicações Ltda,
2009, p. 317-318.
ou operacional o leasing (art. 10, supra), desde que também observadas as demais
disposições da resolução, a par das previsões da Lei nº 6.099/74.
Nas hipóteses de recuperação ou devolução do bem, a arrendadora pode
mantê-lo, por no máximo dois anos, no seu ativo imobilizado antes de aliená-
lo, segundo o art. 14, supra.
A Portaria 564/78, item 9, a seu turno, dispõe que a diferença entre o valor
da venda e o VRG, seja no exercício da opção de compra, seja na venda a
terceiro com apropriação pela arrendadora, se positiva, deve ser computada
como resultado do exercício, e se negativa, pode ser utilizada para amortização
no restante de 70% do prazo de vida útil normal do bem. Portanto, a Portaria
564/78, ao regular o art. 14 da Lei 6.099/74, não permite a dedutibilidade da
perda decorrente da venda do bem objeto do arrendamento mercantil no período
de apuração referente à venda, mas a permite de forma diferida.
Em caso do exercício da opção de compra pela arrendatária, segundo o
art. 15, caput, da Lei nº 6.099/74, o bem integrará o ativo da adquirente pelo
seu custo de aquisição, que é o valor pago pela arrendatária pelo exercício
da opção de compra. (art. 15, § único). Segundo o PN SRF 8/92, o custo
de aquisição representado pelo valor residual do bem pago pela arrendatária
poderá ser depreciado no prazo para a depreciação de bens adquiridos usados,
o maior dentre os seguintes: metade do prazo de vida útil admissível par o bem
adquirido novo ou o restante do prazo de vida útil do bem, considerando este
em relação à primeira instalação ou utilização (art. 311 do RIR/99).
Os gastos efetuados pela arrendatária com manutenção do bem são dedutíveis
como despesa se não propiciarem aumento de vida útil superior a um ano, caso
contrário deverão ser ativados e amortizados. As benfeitorias feitas pela arrendatária,
caso não haja previsão de indenização pela arrendadora, são amortizáveis pelo
prazo do contrato, observados os art. 324, § 3º e o art. 325, “d”, do RIR/99,
que não se restringe aos casos de locação e arrendamento puros, mas também
abarca benfeitorias em bens de terceiros, como é o caso em apreço, malgrado
posicionamento em contrário do Fisco, que as reputa amortizáveis pelo prazo de
vida útil restante do bem, ao argumento de que o arrendamento mercantil não se
confunde com o arrendamento comum. Quanto aos prêmios de seguro, devem
ser apropridados como despesa ou custo durante o prazo de vigência do seguro.
venda a prazo, por força do art. 11, § 1º da lei. Confiram-se o artigo 2º da lei
e o art. 27 da resolução em comento:
“Art 2º Não terá o tratamento previsto nesta Lei o arrendamento
de bens contratado entre pessoas jurídicas direta ou indiretamente
coligadas ou interdependentes, assim como o contratado com o
próprio fabricante.
§ 1º O Conselho Monetário Nacional especificará em regulamento
os casos de coligação e interdependência”
“Art. 27. Para os fins do artigo 2º, § 1º, da Lei n. 6.099, de 12 de
setembro de 1974, e deste Regulamento, considera-se coligada ou
interdependente a pessoa:
I – em que a entidade arrendadora participe, direta ou indiretamente,
com 10% (dez por cento) ou mais do capital;
II – em que administradores da entidade arrendadora, seus cônjuges e
respectivos parentes até o 2º (segundo) grau participem, em conjunto
ou isoladamente, com 10% (dez por cento) ou mais do capital, direta
ou indiretamente;
III – em que acionistas com 10% (dez por cento) ou mais do capital
da entidade arrendadora participem com 10% (dez por cento) ou mais
do capital, direta ou indiretamente;
IV – que participar com 10% (dez por cento) ou mais do capital da
entidade arrendadora, direta ou indiretamente;
V – cujos administradores, seus cônjuges e respectivos parentes até
o segundo grau participem, em conjunto ou isoladamente, com 10%
(dez por cento) ou mais do capital da entidade arrendadora, direta ou
indiretamente;
VI – cujos sócios, quotistas ou acionistas com 10% (dez por cento) ou
mais do capital participem também do capital da entidade arrendadora
com 10% (dez por cento) ou mais de seu capital, direta ou indiretamente;
VII – cujos administradores, no todo ou em parte, sejam os mesmos
da entidade arrendadora.”
No caso de subarrendamento, verifica-se uma hipótese de coligação ou
interdependência a afastar o enquadramento da operação como arrendamento
mercantil. O art. 17 da Resolução nº 2.309/96 proíbe que haja coligação
8. Conclusão.
Face ao exposto, os valores pagos a título de contraprestação por força
de contrato de leasing não passam a ter natureza de aquisição/imobilização
e não perdem a natureza de despesa/custo, para fins tributários, em
virtude da mudança da forma de contabilização de tal contrato. Embora o
arrendamento mercantil permita a aquisição do bem arrendado, é instituto
distinto da compra e venda e do financiamento e recebe tratamento
tributário que também o distingue daquelas figuras.
É certo que a Lei 11.638/2007 traz um novo paradigma contábil, mas
também nos parece nítida a sua intenção de não se imiscuírem o objeto da
contabilidade e os fenômenos de natureza jurídico tributária, evitando que
se repitam impropriedades muitas vezes já incorridas pela legislação, que,
para regular relações e produzir efeitos no âmbito tributário, se reportava
a institutos e regras da contabilidade, acabando por deformá-los, a suscitar
ajustes e orientações por parte das entidades responsáveis pela normatização e
fiscalização das práticas contábeis.
Assim, conclui-se que a Lei 11.638/2007 não pretende alterar a natureza
jurídica do leasing e tampouco disciplinar o seu tratamento tributário, mas
simplesmente fixar um novo critério de contabilização do substrato econômico
que tal contrato carreia. Do ponto de vista jurídico, a propriedade do bem
Tributação do
Reembolso de Despesas
e do Compartilhamento
de Custos e o CPC 30
1. Introdução
Aspecto controvertido e que gera bastante preocupação nas relações entre
empresas é o tratamento fiscal aplicável aos reembolsos de despesas e às situações
em que há o compartilhamento de custos entre empresas de um mesmo grupo
econômico ou independentes.
O pagamento por uma empresa a outra de valores a título de reembolsos
gera discussões quanto à sua natureza, se contraprestação por um serviço
prestado e, portanto, receita tributável, ou mera recomposição patrimonial, ou
seja, entrada financeira que não representa acréscimo patrimonial.
Além disso, também são objeto de discussão questões relacionadas à
dedutibilidade das despesas ou a apropriação dos custos pelas empresas envolvidas.
O propósito deste estudo é o exame dos aspectos relacionados ao reembolso
de despesas e ao compartilhamento de custos, analisando-se a legislação
aplicável bem como as decisões administrativas e judiciais sobre a matéria.
Tendo em vista as novas regras contábeis introduzidas no ordenamento
jurídico brasileiro a partir da publicação das Leis nºs 11.638/2007 e 11.941/2008,
analisaremos a definição de receita contida Pronunciamento Contábil CPC
30 a fim de verificarmos como o tratamento contábil aplicável aos reembolsos
de despesas pode se correlaciona com a análise fiscal do tema.
Como os reembolsos de despesas normalmente se dão em conexão com
a prestação de serviços, nossas considerações serão focadas nessa espécie
de relação empresarial.
1 Cf. BARRETO, Aires F. ISS na Constituição e na Lei. São Paulo: Dialética, 2003. p. 300. Nesse
mesmo sentido: SARDINI, Gian Paolo Peliciari. A base de cálculo do ISS na prestação de serviços
de intermediação de mão-de-obra. Revista Tributária e de Finanças Públicas, São Paulo, n. 44,
mai.-jun. 2002, p. 111. Em sentido contrário: ROSSI, Carlos Alberto del Papa. ISS – Base de
Cálculo. Revista Tributária e de Finanças Públicas, São Paulo, n. 47, nov.-dez. 2002, p. 110 e
111. Sobre o conceito de receita, ver: MINATEL, José Antonio. Conteúdo do Conceito de Receita
e Regime Jurídico para sua Tributação. São Paulo: MP Editora, 2005. p. 124; SOARES DE MELO,
José Eduardo. ISS: Aspectos Teóricos e Práticos. São Paulo: Dialética, 2003. pp. 121-128.
2 Como exemplo, podemos mencionar o estudo de Eduardo Domingos Botallo, que citando Geraldo
Ataliba, analisou os tipos de ingresso financeiro enquadráveis como receita para fins tributários:
“O conceito de receita refere-se a uma espécie de entrada. Entrada é todo o dinheiro que ingressa
nos cofres de determinada entidade. Nem toda entrada é receita. Receita é a entrada que passa a
pertencer a entidade. Assim, só se considera receita o ingresso de dinheiro que venha a integrar o
patrimônio da entidade que recebe”. Esse mesmo autor conclui o seguinte: “Das lições oferecidas
por estes Mestres, ressalta, como elemento comum, a compreensão de que os contribuintes citados
têm o direito de não considerar, como receitas próprias, valores que apenas transitam por seus
livros fiscais, sem representar, entretanto, acréscimo patrimonial. Tal é o caso, v. g., dos montantes
a ele repassados para a satisfação de despesas incorridas por conta e ordem de terceiros, ou para
pagamento, aos efetivos prestadores de serviços por eles apenas intermediados. Na verdade,
valores com essas características não remuneram serviços próprios dos contribuintes e, assim, não
exprimem parcelas de sua capacidade contributiva. Não compõem, em consequência, o ‘preço
do serviço’, a ‘receita’ ou o ‘faturamento’, na acepção jurídico tributária dessas expressões. Estas
importâncias, em última análise, são expressivas do que Bernardo Ribeiro de Moraes denomina
‘atividades marginais’ do prestador de serviços, que, ‘não representando fruto do serviço prestado,
não interessam ao ISS. Não representam ‘preço de serviço’.” (BOTALLO, Eduardo Domingos. Base
Imponível do ISS e das Contribuições para o PIS e a COFINS. Revista de Estudos Tributários, São
Paulo, n. 10, nov.-dez. 1999, p. 21).
3 Em suas palavras: “Vejamos, juridicamente, o marco divisório entre as ‘despesas’ que integram a
base de cálculo do ISS e aqueloutras que não podem compô-la. Tenha-se em conta que despesas
são inconfundíveis com valores pertencentes a terceiros. Despesas são gastos do prestador do
serviço, a serem subtraídos da sua respectiva receita, para efeito de apuração do resultado – e,
nesse caso, sim, o seu reembolso configurará, também, receita, afetando o resultado econômico
de atividade, vale dizer, afetando, positivamente, o patrimônio da empresa. A contraposição a ser
feita é de despesas versus receitas e não de despesas versus ingressos financeiros. Despesas são
apenas os desembolsos realizados em favor de quem as faz. São gastos com a própria atividade,
realizados para que esta possa desenvolver-se e propiciar os proveitos (receitas) à vista dos quais
se a explora. Só podem compor a base de cálculo do ISS as verdadeiras despesas, reembolsáveis
ou não. Veras despesas, obviamente, não podem ser deduzidas, pena de o preço do serviço
deixar de ser a receita bruta a ele correspondente” (BARRETO, Aires F, ISS na Constituição e na
Lei, 2003, p. 337).
4 REsp nº 113.820-5.
5 Grande parte dos acórdãos mais recentemente proferidos pelo CARF são no sentido de que os
valores recebidos a título de reembolso de despesas não seriam receitas tributáveis, especialmente
se respaldados por contratos (em caso de rateio de custos, estipulando os critérios de rateio
adotados). Como exemplo, podemos mencionar os seguintes: acórdão nº 107-09.588, 101-96.074
e 101-96.357.
que acabam optando por tributar valores recebidos a título de reembolso por
receio de terem seus procedimentos questionados.
Para ilustrar, podemos mencionar a solução de consulta nº 38/20117, a
qual distinguiu o tratamento tributário aplicável (i) ao reembolso de despesas
resultantes de atividades desenvolvidas por controladora em favor das demais
empresas do grupo, (ii) das despesas contratadas pela controladora junto a
terceiros também em favor das demais empresas do grupo.
Em relação aos valores recebidos por controladora em decorrência de
atividades por ela desenvolvidas em favor das demais empresas do grupo, o
entendimento adotado foi no sentido de que tais valores seriam enquadrados como
receita tributável da controladora. Ao passo que, no caso de despesas contratadas
pela controladora junto a terceiros, os valores recebidos a título de reembolso
foram enquadrados como redução da despesa operacional da controladora.
Quanto ao tratamento tributário aplicável aos reembolsos decorrentes
de atividades desenvolvidas pela controladora, não ficou claro qual o critério
adotado pelas autoridades fiscais para enquadrar tais valores como receita.
Embora não se tenha acesso ao teor do questionamento formulado
pelo contribuinte, usualmente o reembolso de despesas à controladora
resultante de atividades-meio por ela desenvolvidas, dá-se no contexto de
um compartilhamento de estrutura material e de pessoal entre empresas do
mesmo grupo, tão somente para o atendimento de necessidades operacionais
das empresas envolvidas, não alcançando, em conseqüência disso, qualquer
prestação de serviço que possa gerar o ingresso de receita passível de tributação.
8 Não localizamos disposição semelhante em outros municípios, como, por exemplo, o de São
Paulo, no entanto, isso não significa que as autoridades fiscais não exijam a inclusão de valores
recebidos à título de reembolsos na base de cálculo do ISS.
9 § 1º do artigo 10 do Regulamento de ISS do Município do Rio de Janeiro.
10 Ao analisar a questão do reembolso de despesas entre empresas do mesmo Grupo Econômico, o
Conselho de Contribuinte do Município do Rio de Janeiro, assim decidiu: “ISS – PRESTAÇÃO DE
SERVIÇOS A EMPRESAS INTEGRANTES DO GRUPO DE SOCIEDADES – INCIDÊNCIA DO ISS Os
serviços prestados a empresas pertencentes ao mesmo grupo de sociedades são tributáveis pelo
ISS, uma vez que essas sociedades possuem personalidade e patrimônio próprios, caracterizando
a prestação do serviço a terceiros. Recurso voluntário improvido. Decisão por maioria.” (Data de
decisão: 14.02.2008).
despesa não deverá ser considerado como uma receita da empresa brasileira.
Por outro lado, caso tal contas a receber seja decorrente de serviços prestados
para a empresa não residente, o pagamento da despesa seria o equivalente ao
pagamento por serviços prestados, ou seja, receita tributável.
Por fim, na hipótese de o pagamento ser posteriormente reembolsado
à empresa não residente, a empresa brasileira poderá perfeitamente se
apropriar do custo ou despesa no Brasil, sendo certo que a remessa do
reembolso ao não residente não deve se submeter a qualquer tributação,
sendo mera recomposição patrimonial deste.
Sobre essa questão a Superintendência Regional da Receita Federal
da 8ª Região manifestou-se recentemente no sentido de que a remessa
desse tipo de reembolso não se submeteria à tributação por não se tratar
de prestação de serviços11:
Processo de Consulta nº 65/2010
Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – CIDE
O fato gerador da Cide é o pagamento, crédito, entrega, emprego ou
remessa de royalties de qualquer natureza, bem como a remuneração
pela contraprestação de serviços técnicos e de assistência administrativa
e semelhantes prestados por residentes ou domiciliados no exterior.
Não constitui, portanto, fato gerador da referida contribuição, os
valores remetidos pela Filial (localizada no Brasil) à Matriz (com
sede no exterior) à título de reembolso pela compra de bens (veículo
automotivo), adquiridos no Brasil.
Dispositivos Legais: Art. 2º da Lei nº 10.168, de 29.12.2000
(alterado pelo art. 6º da Lei nº 10.332, de 19.12.2001); e art. 10
do Decreto nº 4.195, de 11.04.2002.
Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins.
O fato gerador da Cofins (Importação) é a entrada no território
nacional de bens estrangeiros ou o pagamento, o crédito, a entrega,
o emprego ou a remessa de valores a residentes ou domiciliados
no exterior como contraprestação por serviços executados no País;
12 GALHARDO, Luciana Rosanova. Rateio de Despesas no Direito Tributário. São Paulo: Quartier
Latin, 2004. pp. 177-178.
13 Na mesma linha de entendimento, ver os Processos de Consulta nº 53/2002 e nº 250/2001.
despesas – disciplina tributária. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 107, ago.
2004, pp. 78-83; LONGO, José Henrique. Natureza jurídica do ressarcimento de despesas. Revista
Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 77, fev. 2002, pp. 68-73; MARTINS, Natanael. O
Contrato de Rateio de Despesas e suas Implicações Tributárias. In: SCHOUERI, Luís Eduardo
(Coord.). Direito Tributário: Homenagem a Alcides Jorge Costa. São Paulo: Quartier Latin, 2003. v.
II. pp. 737-748; GERMANO, Livia de Carli. Regime Tributário dos Contratos de Compartilhamento
de Custos e Despesas. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito Internacional Aplicado. São
Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 791-831.
15 MARTINS, Natanael, O Contrato de Rateio de Despesas e suas Implicações Tributárias, 2003,
p. 739. No mesmo sentido: BRANCO, Vinicius, Convênios de rateio de despesas – disciplina
tributária, 2004, p. 82.
16 No mesmo sentido: LONGO, José Henrique, Natureza jurídica do ressarcimento de despesas, 2002,
p. 71; SOARES DE MELO, José Eduardo, ISS: Aspectos Teóricos e Práticos, 2003, pp. 135 e 136.
17 BRANCO, Vinicius, Convênios de rateio de despesas – disciplina tributária, 2004, p. 79.
18 Sobre a questão dos critérios de rateio, vale a pena transcrever a seguinte passagem de Vinicius
Branco: “Quanto aos critérios, o do espaço físico efetivamente ocupado por cada empresa
conveniada é usualmente adotado como forma de rateio no caso de imóveis. De se notar que
mesmo no caso de imóveis não locados, mas de propriedade de uma das empresas conveniadas,
as despesas com depreciação, conservação, condomínio, impostos, água e energia elétrica podem
e devem ser objeto de rateio em função do espaço utilizado.
No caso de máquinas e equipamentos, o critério normalmente adotado é o de efetiva utilização
do bem, ou do tempo disponibilizado a cada um dos usuários. Entendemos que a constituição
de condomínio de bens, nesse caso, é perfeitamente dispensável, sobretudo na hipótese de as
usuárias do bem comum integrarem um mesmo grupo econômico.
No caso de recursos humanos, o método mais eficiente de rateio consiste na apuração do tempo
consumido nos respectivos trabalhos por cada profissional. Outros métodos podem ser empregados
para esse efeito, como por exemplo o número de lançamentos feitos pela contabilidade, o número
de compras feitas pela área de compras, o volume de dados processados pela área de sistemas
ou o valor dos investimentos administrados por um único gestor” (BRANCO, Vinicius, Convênios
de rateio de despesas – disciplina tributária, 2004, p. 80).
19 Nessa linha, destaca Elidie Bifano: “No que tange à incidência de tributos, relativamente
aos rateios de custos, alguns especiais aspectos devem ser destacados: (i) impossibilidade
de rateio de custos relacionados à atividade-fim de uma entidade, admitindo-se, apenas, o
compartilhamento de atividades designadas como meio, posto que atividade-fim, objeto da
empresa, somente se presta à comercialização, em troca de preço e não ao reembolso em troca
de transferência sem lucro; (ii) razoabilidade do critério de rateio, adotando-se premissas que
guardem relação direta com as necessidades dos envolvidos, não se permitindo o compartilhamento
de custos não necessários à atividade desenvolvida; e (iii) existência de contrato formal de rateio de
custos, com a descrição de todos os itens rateados, bem como dos critérios adotados para esses rateios”
(BIFANO, Elidie Palma. Apuração de Preços de Transferência em Intangíveis, Contratos de Prestação
de Serviços Intragrupo e Cost Sharing Agreements. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (Coord.). Tributos
e Preços de Transferência. São Paulo: Dialética, 2010. v. III. p. 45).
de rateio de custos ter sido celebrado entre empresas não relacionadas. Assim,
eventuais reembolsos de despesas pagos por uma empresa à outra não deverão ser
considerados receita tributável, sendo que o custo ou despesa deverá ser apropriado
pela empresa que efetivamente tenha suportado seu encargo econômico.
A não tributação de tais reembolsos pela empresa que recebe os valores
já foi reconhecida pelo CARF, como se infere da ementa abaixo transcrita:
PIS-FATURAMENTO – BASE DE CÁLCULO – Despesas de
publicidade e promoção de vendas pagas por distribuidores de bebidas
sob a forma de rateio – Ainda que estabelecidas em percentual sobre o
valor do preço de venda – não se configuram como receitas objeto de
atividade social da indústria-coordenadora de esforço publicitário, vez que
representam as distribuidoras dos produtos (bebidas). Recurso provido.
(Data da Sessão: 10.12.1991)
É muito comum que empresa não residente contrate serviços que revertam
em benefício de outras empresas do mesmo grupo econômico como, por
exemplo, pesquisas técnico-científicas, cobrando destas um reembolso dos
valores gastos em proporção ao seu benefício. Esse é o caso dos contratos de
contribuição de custos, examinados por Alberto Xavier.22
Nesses casos parece-nos que a solução é aquela que apresentamos no
item 3.2 acima, com a tributação da remessa feita pela empresa brasileira à sua
controladora (ou outra empresa do grupo no exterior) como se estive sendo
feita diretamente em favor do prestador do serviço.
Assim, se na hipótese de a remessa ser feita diretamente ao prestador
do serviço seria a mesma tributada no Brasil, deve ser este o tratamento a ser
conferido à operação.
A questão a ser discutida nesse caso ficaria por conta da demonstração
da razoabilidade da contribuição da empresa brasileira para a pesquisa (em
condições de não favorecimento) e a conseqüente dedutibilidade das despesas
correspondentes.
Ao analisar a questão, Alberto Xavier fundamenta suas considerações em
relatório da OCDE, afirmando que os contratos de contribuição de custos “devem
incluir como participantes apenas as empresas que esperam obter benefícios mútuos,
21 Para uma análise das diversas formas de operações intragrupo ver: TÔRRES, Heleno. Direito
Tributário Internacional: Planejamento Tributário e Operações Transnacionais. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2001. pp. 260-261.
22 XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.
p. 413. Sobre o tema ver: OECD. Transfer Pricing Guidelines for Multinational Enterprises and Tax
Administrations. Paris: OECD, 2010. pp. 205-233.
direta ou indiretamente, das atividades objeto do CCA e não apenas para executar
uma parcela dessa atividade; o acordo deve especificar a natureza e a extensão da
vantagem (beneficial interest) de cada participante nos resultados da atividade;
nenhum pagamento adicional às contribuições deverá ser feito para a vantagem
obtida através do CCA; as quotas de contribuições deverão ser determinadas
por métodos que reflitam a partilha dos lucros esperados; o acordo deve prever
pagamentos compensatórios, de modo a refletir alterações nas expectativas de lucros;
o acordo deve contemplar ajustes a serem feitos em razão da entrada ou retirada
de partes de CCA ou da terminação deste”.23
Vemos, portanto, que a razoabilidade da contribuição de cada empresa para o
projeto depende de critérios como, por exemplo, os mencionados acima, de forma
que tais contratos de contribuição de custos devem evidenciar de forma bastante
clara e objetiva os benefícios a serem gozados pela empresa brasileira em decorrência
de pacto dessa natureza para que se possa considerar a despesa correspondente
como dedutível.
24 Segundo Alberto Xavier, “considera-se que são ônus exclusivo da Sociedade-Mãe aqueles que o
Relatório de 1984 designa como ‘despesas do acionista’ e que se referem às despesas incorridas
para gerir e proteger os seus próprios investimentos, como é o caso dos encargos contraídos com
vista à preparação da assembléia dos acionistas, à consolidação dos resultados dos membros
do grupo, ou a título de despesas de administração, com vista ao fornecimento de meios de
financiamento necessários à expansão deste” (XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional
do Brasil, 2004, p. 407). Sobre o tema, ver: OECD. Transfer Pricing Guidelines for Multinational
Enterprises and Tax Administrations. Paris: OECD, 2010. p. 207-208).
29 FONSECA, Alessandro Amadeu da, A tributação da Renda e sua Correlação com os Principios
Contábeis Geralmente Aceitos. Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e Distanciamentos).
1º Volume. Dialética. 2010. p. 13.
30 Nesse sentido, é o entendimento manifestado por Fernando Próspero Neto e Fernando Caio Galdi,
in Manual de Normas Internacionais de Contabilidade – Ernst & Young e Fipecafi, 2ª Edição, p.
176 e por Ricardo Mariz Oliveira, in Fundamentos do Imposto de Renda, São Paulo: Editora
Quartier Latin., 2008, p. 92.
6. Conclusão
De uma maneira geral, a grande conclusão a que se pode chegar neste
trabalho é que somente as receitas auferidas são passíveis de tributação, sendo
que reembolsos de valores originariamente pagos por conta e ordem de terceiros
não se qualificam como receitas. Por outro lado, a dedutibilidade de uma despesa
deve ocorrer na empresa que efetivamente a suportou, e deve seguir as regras
previstas no artigo 299 do Regulamento do Imposto de Renda.
1. Delimitação do Tema
1 O comunicado 14.259, do Banco Central do Brasil, por exemplo, já havia estabelecido a adoção
dos padrões internacionais como meta para as instituições por ele reguladas. O mesmo já havia
ocorrido com a CVM, por meio da IN 457/2007.
2 Elidie Palma Bifano destaca que, muito embora a Lei 11.638/2007 não faça referência expressa
ao IFRS, estas se tornaram o padrão internacional em razão do Memorandum of Understanding,
publicado em 10/2002 e conhecido como Norwalk Agreement, firmado entre entidades de
contadores dos EUA e da Europa. BIFANO, Elidie Palma. Aspectos Contábeis da Lei 11.638/2007:
Reflexos Legais. In: ROCHA, Sérgio André. Direito Tributário, Societário e a Reforma da Lei das
S/A. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 49.
3 BIFANO, Elidie Palma. O Direito Contábil: Da Lei nº 11.638/07 à Lei nº 11.941/09. In: ROCHA,
Sérgio André. Direito Tributário, Societário e a Reforma da Lei das S/A. Vol. II. São Paulo: Quartier
Latin, 2010, p. 172
4 A incorporação de conceitos contábeis pelo direito não passou despercebida por Luis Eduardo
Schoueri e Vinicius Feliciano Tersi, que observaram a apropriação do conceito de lucro
contábil pelas normas tributárias antes do avento da Lei 6.404/76. SCHOUERI, Luis Eduardo
renda e receita, dentre outros5, pois como alertam Alexsandro Broedel Lopes
e Roberto Quiroga Mosquera o fenômeno social um só6.
Sob a ótica da Contabilidade, a adoção das normas internacionais é vista
como um avanço, uma vez que a contabilização com base na essência econômica
da operação representaria, de forma mais fiel, a realidade. Trata-se, como visto,
de uma mudança de paradigma.
Da perspectiva do Direito, ainda que se admita que a evolução da
realidade deva ser considerada, até mesmo para que seja cumprida a função
de regulação das condutas intersubjetivas, não podem ser desconsiderados os
princípios constitucionais que norteiam o Sistema Tributário Nacional, tais
como a Segurança Jurídica, a estrita legalidade, enfim os valores e princípios
que buscam estabilizar as relações sociais em tal domínio.
Não há dúvida de que, sendo relevante a interação entre Direito e
Contabilidade7, as alterações legislativas promovidas pelas Leis 11.638/2007
e 11.941/2009, no âmbito societário e da contabilidade, certamente geram
incertezas quanto aos possíveis impactos tributários, mas é preciso investigar
em que medida essa interação é juridicamente aceitável8. Isso porque a referida
interdisciplinaridade, por mais intensa que seja, “não pode e não deve macular a
rigidez do conhecimento científico”. Afinal, “cada ciência guarda seu conteúdo, sua
lógica e seus métodos de estudo. Na mesma linha, cada ciência tem seu destinatário
final, o que pressupõe atenção redobrada na análise da integração dos conhecimentos
adquiridos em cada área de atuação.” 9
16 Para ALIOMAR BALEEIRO, em sua obra Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar, o art.
109 do CTN fornece a diretriz para extremar-se a fronteira entre o Direito Privado e o Tributário,
resguardando-se a autonomia deste. (BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder
de Tributar. Editora Forense, 7ª ed. revista e atualizada, Rio de Janeiro, 2006).
17 Bem por isso, o STF declarou inconstitucionais, dentre outras, a lei ordinária que fazia incidir
contribuição sobre a folha de salários nos pagamentos feitos a avulsos, autônomos e administradores,
por ofensa à redação original do art. 195, I, da Constituição (Lei nº 7.787/89, art. 3º, I – STF, Pleno, RE
nº 166.772/RS, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, DJ 16.12.1994), bem como a lei que alargava a base
de cálculo do PIS e da COFINS antes da EC nº 20/98, indo além do faturamento autorizado na
redação originária do mesmo dispositivo constitucional (art. 3º, § 1º, da Lei nº 9.718/98 – STF,
Pleno, RE nº 346.084/PR, Rel. para o acórdão Min. MARCO AURÉLIO, DJ 01.09.2006).
18 SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de Legislação Tributária, 4ª ed. São Paulo: Resenha
Tributária, 1962, pp. 63-64, apud VELLOSO, op. cit., p. 57.
19 FALCÃO, Amílcar Araújo. Fato Gerador da Obrigação Tributária, 1ª ed. Rio de Janeiro: Edições
Financeiras, 1964, pp. 34-35.
20 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Teoria Geral do Tributo, da Interpretação e da Exoneração
Tributária. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Dialética, 2003, p. 141.
21 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lejus, 2002,
p. 83.
22 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Interpretação no Direito Tributário Brasileiro. In. NASCIMENTO,
Carlos Valder do. (org.). São Paulo: RT, 1989, p. 79.
23 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário brasileiro. 11ª edição, atualizada por Misabel Abreu
Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
24 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário, 23ª ed. São Paulo:
Malheiros, 2007, pp. 494-496.
25 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, pp. 218-219.
26 VELLOSO, Andrei Pitten. Conceitos e Competências Tributárias. São Paulo: Dialética, 2005, pp.
129-130.
27 TÔRRES, Heleno Taveira. Direito Tributário e Direito Privado. Autonomia privada, simulação e
elusão tributária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 16.
em que medida, se for o caso, o conceito utilizado pela norma tributária foi
alterado. E essa interpretação pode ser aplicada diretamente ao caso que se
pretende analisar no presente trabalho. Não se pode concordar que exista,
a priori, um conceito jurídico de ágio, diverso do contábil, muito embora
a definição trazida pela legislação indique que, no que toca a questão da
dedutibilidade, o legislador tributário tenha pretendido imprimir contornos
próprios à questão. A nosso ver, a presente questão amolda-se ao item três da
classificação empreendida por Heleno Tôrres, ou seja, uma transformação do
conceito, pelo direito tributário, sem que este perca a identidade prevista no
âmbito do direito societário ou da contabilidade.
Como será visto adiante, a despeito de tratar-se o ágio de um conceito
contábil, foi positivado pela legislação tributária, que expressamente o definiu
e empregou contornos próprios.
decorre diretamente da Lei 11.638/2007) pode ter reflexos tributários sem que
a lei tributária seja alterada?
Pensamos que, no caso específico do ágio, a resposta seja negativa.
É preciso que seja fixado, até como forma de se respeitar a segurança
jurídica, que um conceito definido e não simplesmente incorporado pelo
direito tributário, seja mantido imutável até que sobrevenha veículo normativo
competente para realizar a correspondente alteração. A partir de agora, não se
discute a abrangência da autonomia do direito tributário, mas sim os efeitos
da incorporação ou construção de conceitos de direito tributário no tempo.
É de se admitir que a norma tributária, quando define ou dá novos contornos
a institutos de outros ramos do Direito ou até mesmo de outras ciências, leve
em consideração princípios que são mais caros ao Direito Tributário e valores
existentes no momento da incorporação. Quando o legislador houve por bem,
através da Lei 9.532/97, atribuir efeitos tributários ao ágio decorrente de aquisição
de participações societárias avaliadas pelo método da equivalência patrimonial
(MEP), levou em consideração, por subsunção, o conceito contábil de ágio em
vigor naquele momento, definido pela norma tributária por meio do Decreto-
Lei 1.598/77. Eventual alteração contábil posterior, se não refletida no Direito
Tributário, não pode gerar efeitos tributários.
E não se pode deixar de ressaltar que no momento em que houve a definição
do conceito de ágio pelo legislador tributário, este deixou de ser um instituto
contábil e passou a ser um instituto jurídico, e que assim deve ser interpretado.
Como bem sustenta Paulo de Barros Carvalho29:
Existe interpretação econômica do fato? Sim, para os economistas. Existirá
interpretação contábil do fato? Certamente, para o contabilista. No entanto,
uma vez assumido o caráter jurídico, o fato será, única e exclusivamente,
fato jurídico; e claro, fato de natureza jurídica, não econômica ou contábil,
entre outras matérias. Como já anotado, o direito não pede emprestado
conceitos de fatos para outras disciplinas. Ele mesmo constrói sua realidade,
seu objeto, suas categorias e unidades de significação. O paradoxo inevitável,
e que causa perplexidade no trabalho hermenêutico, justifica a circunstância
29 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2010. 22ª edição,
p. 307.
36 Apesar de dizer respeito ao custo de aquisição do investimento, a Lei 6.404/76 nada dispõe acerca
da amortização do ágio.
37 PEDREIRA, José Luiz Bulhões. Finanças e Demonstrações Financeiras da Companhia. Ed: Forense:
Rio de Janeiro, 1989.
38 Aprovado pela Deliberação CVM 580/09 e pela Resolução CFC 1.175/2009.
39 “3. A entidade deve determinar se uma operação ou outro evento é uma combinação de negócios
pela aplicação da definição utilizada neste Pronunciamento, a qual exige que os ativos adquiridos e
os passivos assumidos constituam um negócio. Se os ativos adquiridos não constituem um negócio, a
entidade deve contabilizar a operação ou evento como aquisição de ativos. Os itens B5 a B12 fornecem
orientações sobre a identificação de uma combinação de negócios e uma definição de negócio.”
O CPC 15 define ágio como a diferença positiva entre o valor pago pela
aquisição de controle da adquirida e o valor líquido, na data de aquisição,
dos ativos identificáveis adquiridos e dos passivos assumidos, com base em
seu valor justo41.
A definição acima citada denota uma importante modificação também
na apuração do valor do ágio. Este deixa de ser (i) a diferença positiva entre o
valor pago pela participação societária adquirida e o valor de patrimônio líquido
da investida e passa a ser (ii) a diferença positiva entre o preço de aquisição e
o valor líquido dos ativos e passivos da investida trazidos a valor justo.
A mudança está no conceito de valor contabilizado, uma vez que os ativos
e passivos deverão estar registrados com base em seu valor justo. Em termos
práticos, há modificação na base de cálculo do ágio, uma vez que poderá haver,
com base na diferença entre custo histórico e valor justo, uma diminuição do
sobrepreço pago (parcela do valor seria alocada aos ativos que o justificariam
e aos bens antes não contabilizados).
Destaque-se que tal diferença (valor do patrimônio líquido da investida com
base em seus livros e com base no valor justo dos ativos e passivos) tende a se agravar
em razão da atual permissão de que se possa reconhecer a existência e o valor de
ativos e passivos antes não contabilizados, como é o caso da marca (intangível).
Com isso, o ágio pago em razão da rentabilidade futura pode ter sua
base de apuração sensivelmente diminuída, uma vez que a alocação da mais
valia dos ativos, incluindo os intangíveis não contabilizados, deve ser feita
antes. Caso ainda exista alguma diferença, esta poderá ser contabilizada como
rentabilidade futura, o que será considerado um ativo intangível, não sujeito à
amortização, mas a testes periódicos de recuperabilidade, ou impairment tests42.
Essa, portanto, é mais uma modificação importante que merece destaque: o
ágio contábil apurado segundo os novos critérios, não poderá ser amortizado.
Diante do acima exposto, verifica-se que o CPC 15 alterou de forma
radical o regime de reconhecimento do ágio, criando nova definição, que se
afasta daquela prevista no Decreto-Lei 1.598/77.
40 Existem outros requisitos igualmente relevantes para que a operação seja regulada pelo CPC 15.
No entanto, por não interferirem nas conclusões desse trabalho, deixa-se de transcrevê-los, muito
embora seja recomendada a leitura de seu inteiro teor.
41 “19. Em cada combinação de negócios, o adquirente deve mensurar qualquer participação de
não controladores na adquirida pelo valor justo dessa participação ou pela parte que lhes cabe
no valor justo dos ativos identificáveis líquidos da adquirida.”
42 A respeito do teste de impairment, vide o CPC 01.
43 O método do fluxo de caixa descontado consiste, em linhas gerais, em estimar o valor presente
líquido dos benefícios futuros, por meio da aplicação de uma taxa de desconto adequada.
44 Luciana Galhardo e Jorge Lopes Júnior destacaram o fato de que a IN/CVM 247/96 já dispunha
acerca da obrigatoriedade de consideração dos ativos e passivos pelo seu valor de mercado, o que
seria uma evidência de que as normas fiscais e tributárias são independentes. “Ao mesmo tempo
mesmo tempo em que a CVM já estabelecia, há mais de dez anos, que nas companhias abertas
e outras que observassem suas normas, o ágio por rentabilidade futura deveria ser contabilmente
apurado de forma a considerar o valor de mercado dos ativos e passivos da sociedade investida,
para fins fiscais, a legislação tributária permanecia determinando que essa mesma forma de ágio
deveria ser apurada em relação ao valor patrimonial dos ativos e passivos da sociedade investida”.
GALHARDO, Luciana Rosanova e LOPES JÚNIOR, Jorge Ney de Figueirêdo. As novas normas
contábeis e a amortização fiscal do ágio. In: LOPES, Alexsandro Broedel Lopes e MOSQUERA,
Roberto Quiroga. Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e distanciamentos). São Paulo:
Dialética, 2010, pp. 228-229.
As colocações são absolutamente pertinentes e efetivamente denotam a separação ente o ágio
contábil e o ágio fiscal, o que não foi modificado pela Lei 11.638/2007.
45 DONIAK JR. Jimir. Análise da Amortização de Ágio Frente às Leis nºs 11.638/07 e 11.941/09.
In: ROCHA, Sérgio André. Direito Tributário, Societário e a Reforma da Lei das S/A. São Paulo:
Quartier Latin, 2010, p. 305.
46 “Ante o exposto, em que pese a legislação societária não mais se basear no patrimônio líquido da
investida para o cômputo do valor do ágio e não mais possibilitar a amortização do montante escriturado
como ágio, julgamos que nada se alterou até o presente momento para fins fiscais.” SANTOS, João
Victor Guedes. Direito Tributário e Justaposição: a Contabilidade Societária e os Limites à Neutralidade
Fiscal. In: LOPES, Alexsandro Broedel Lopes e MOSQUERA, Roberto Quiroga. Controvérsias Jurídico-
Contábeis (Aproximações e distanciamentos). São Paulo: Dialética, 2010, p. 214.
47 UTUMI, Ana Cláudia Akie. O Ágio nas operações de fusões e aquisições em face das novas regras
contábeis. In: LOPES, Alexsandro Broedel Lopes e MOSQUERA, Roberto Quiroga. Controvérsias
Jurídico-Contábeis (Aproximações e distanciamentos). São Paulo: Dialética, 2010, p. 112.
48 UTUMI, Ana Cláudia Akie. O Ágio nas operações de fusões e aquisições em face das novas regras
contábeis. In: LOPES, Alexsandro Broedel Lopes e MOSQUERA, Roberto Quiroga. Controvérsias
51 O caso em questão se amolda ao que Sampaio Dória denominava “Elisão Fiscal Incentivada”.
52 “Por outro lado, a dedutibilidade fiscal de ágio é um favor concedido pelo Estado, que pode ser
entendido como uma tentativa de incentivo a operações de fusões e aquisições, por exemplo. De forma
geral, abstraídas as muitas peculiaridades eventualmente existentes em cada situação, o aumento de
preço que pode ser indiretamente permitido pela perspectiva de dedutibilidade fiscal do ágio pelo
comprador será por ele deduzido de forma diferida, mas será tributado de forma imediata em forma de
ganho de capital no vendedor. Trata-se, na realidade, de uma opção legislativa, que pode ser exercida
pelo Estado conforme sua conveniência e nos limites da Constituição Federal, independentemente
de qualquer conclusão técnico-contábil sobre o mesmo tema”. GALHARDO, Luciana Rosanova e
LOPES JÚNIOR, Jorge Ney de Figueirêdo. As novas normas contábeis e a amortização fiscal do ágio. In:
LOPES, Alexsandro Broedel Lopes e MOSQUERA, Roberto Quiroga. Controvérsias Jurídico-Contábeis
(Aproximações e distanciamentos). São Paulo: Dialética, 2010, p. 239.
53 “Na verdade, em função do princípio constitucional da legalidade, as normas introduzidas pela
Lei nº 11.638/2007 jamais poderiam alterar a legislação tributária, pois, admitir tal possibilidade
7. Conclusões
Como visto ao longo do presente trabalho, uma correta análise da relação
existente entre o Direito e a Contabilidade jamais poderá deixar de considerar as
enormes barreiras conceituais existentes entre as duas ciências. Os objetivos, funções
e princípios são diversos, de modo que uma análise mais apressada do fenômeno
de interação pode levar a conclusões equivocadas.
A Contabilidade tem por objetivo a qualificação, a mensuração e a
exteriorização dos eventos econômicos ocorridos ao longo da vida de uma entidade.
E tais objetivos podem se distanciar da norma jurídica tributária, o que traz como
consequência a possibilidade de que alguns institutos gerem repercussões diferentes
a depender do enfoque (contábil ou jurídico) atribuído.
Tais questões, por si só, devem fazer com que se analise com muita ponderação os
limites da influência da alteração das normas contábeis sobre o Direito Tributário. De
um lado, os institutos jurídicos positivados pela legislação, de outro, o primado da ciência
contábil: a informação. É o princípio da prevalência da essência sobre a forma, muitas
vezes incompatível com o ordenamento jurídico.
Nesse contexto, pode-se afirmar que a razão de existir da Lei 11.638/2007 é a
melhoria da qualidade da informação contábil, focada na convergência com as normas
internacionais de contabilidade (IFRS). O objetivo está na qualidade da informação,
sempre tendo como referência a essência econômica da operação e não um arcabouço
normativo previamente estabelecido. A análise do antecedente histórico não permite
qualquer conclusão acerca da existência de preocupação com os aspectos tributários,
que deveriam ser absolutamente neutros. Eventual efeito fiscal dependerá de previsão
expressa da lei tributária.
Ainda que a norma tributária tome como referência conceitos de outros ramos
do Direito, ou até mesmo de outras ciências, é possível que o instituto referenciado
seja definido pelo próprio direito tributário e não apenas incorporado com as
mesmas definições atribuídas em seu ramo de origem. É o que se passa com o ágio
gerado em operações de fusão e aquisição.
equivaleria a permitir que as regras contábeis definissem tributos, em claro desrespeito ao referido
primado”. MARTINS, Natanael. A Realização da Renda como Pressuposto de sua Tributação.
Análise sobre a Perspectiva da Nova Contabilidade e do RTT In: LOPES, Alexsandro Broedel
Lopes e MOSQUERA, Roberto Quiroga. Controvérsias Jurídico-Contábeis (Aproximações e
distanciamentos). São Paulo: Dialética, 2010, p. 351.
É preciso que seja realçado, até como forma de se respeitar a segurança jurídica,
que um conceito definido, e não simplesmente incorporado pelo direito tributário,
seja mantido imutável até que sobrevenha veículo normativo competente para
realizar a correspondente alteração.
Assim, devem ser consideradas neutras, para fins tributários, as recentes
alterações oriundas da Contabilidade. O RTT, criado pelo artigo 16 da Lei
11.941/2009, não parece deixar margem para dúvidas, pois congelou os
possíveis efeitos tributários decorrentes da edição da Lei 11.638/2007,
enfatizando que a apuração dos tributos deve levar em conta os critérios
contábeis vigentes em 31.12.2007.
Não fosse a edição da Lei 11.941/2009, ainda assim nos parece que a
resposta não deveria ser alterada. A neutralidade tributária, então prevista na Lei
11.638/2007, seria a garantia da inexistência de efeitos tributários.
É que permanece em vigor um conceito tributário de ágio, definido pelo
Decreto-Lei 1.598/77 e ainda não revogado, expressa ou tacitamente. Esse conceito
foi incorporado formalmente pela Lei 9.532/97, que cuida da amortização fiscal
do ágio e que também permanece em vigor.
Do ponto de vista tributário, então, o valor do ágio continua sendo representado
pela diferença entre o custo de aquisição da participação societária e o valor de patrimônio
líquido dessa participação registrado na contabilidade da investida.
Sobre os fundamentos econômicos do ágio, estes não estão dispostos
na legislação de forma hierarquizada. Desde que seja possível ao contribuinte
comprovar a justificativa indicada, tal não poderá ser objeto de questionamento pelo
Fisco. A investidora é livre para fundamentar o ágio sob quaisquer das justificativas
previstas na legislação.
Do exposto, somos da opinião de que ao menos enquanto não revogado o
RTT, as alterações promovidas pela legislação societária sobre o conceito contábil
de ágio e seu respectivo regime não podem gerar quaisquer efeitos tributários, seja
em relação à dedutibilidade, seja em relação ao valor apurado.
Notas sobre o
Modelo Único de
Reconhecimento de
Receita proposto pelo
IASB
1. Introdução
1 MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. Rio de Janeiro: Forense, 1996. p.1.
Ainda, reconhecer ou não uma receita, sobretudo no Brasil, pode e/ou deve
ensejar efeitos distintos no balanço patrimonial do ano corrente, assim como
aumento de produtividade de um bem específico, ou, ainda, a necessidade de
reposição de estoque ou a contratação de novos recursos para a execução de
um determinado serviço.
É nessa conjuntura que chamamos a atenção dos especialistas e convidamo-
nos a refletir sobre o assunto, ainda que de forma objetiva, buscando colaborar
com esse interessante processo de transição.
6 ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. O Direito Contábil e a Disciplina Jurídica das Demonstrações
Financeiras. São Paulo: Prognose Editora, 2010. p. 285.
7 IUDÍCIBUS, Sérgio de. Teoria da Contabilidade. 7ª. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p.164.
8 BULGARELLI, Waldirio. Contratos Mercantis. 9ª. ed. São Paulo: Atlas, 1997. p. 202.
9 BULGARELLI, Waldirio. Contratos Mercantis. 9ª. ed. São Paulo: Atlas, 1997. p. 203.
10 ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. O Direito Contábil e a Disciplina Jurídica das Demonstrações
Financeiras. São Paulo: Prognose Editora, 2010. p. 297.
Há serviços que também podem representar apenas uma única ação, que
não se perdura no tempo, como, por exemplo, os serviços bancários, os serviços
de coleta de resíduos, dentre outros. Neste caso, a distinção é irrelevante e não
tem qualquer conseqüência prática, contábil, distinta da venda de mercadorias
para efeito de reconhecimento de receitas. Entretanto, o propósito aqui é
demonstrar que esses tipos específicos devem ser vistos como exceções.
Regra geral, o serviço, por si só, envolve múltiplas atividades e pressupõe
que o fator tempo entre o início e conclusão dessas atividades esteja presente
de forma efetiva. Outro fator relevante está associado à proporção entre os
serviços prestados e as despesas incorridas, com os quais se busca uma estimativa
confiável para o reconhecimento de receita contábil. Nesse sentido, o CPC
30 (itens 20 a 28) reserva uma parte específica para as diversas modalidades,
contribuindo de maneira efetiva, embora um pouco confusa e parcialmente
desatualizada, senão vejamos:
Quando o desfecho de transação que envolva a prestação de serviços
puder ser confiavelmente estimado, a receita associada à transação
deve ser reconhecida tomando por base a proporção dos serviços
prestados até a data do balanço. O desfecho de uma transação pode
ser confiavelmente estimado quando todas as seguintes condições
forem satisfeitas:
· o valor da receita puder ser confiavelmente mensurado;
· for provável que os benefícios econômicos associados à transação
fluirão para a entidade;
· a proporção dos serviços executados até a data do balanço puder
ser confiavelmente mensurada; e
· as despesas incorridas com a transação assim como as despesas
para concluí-la possam ser confiavelmente mensuradas.
O reconhecimento da receita com referência à proporção dos serviços
executados relativos a uma transação é usualmente denominado
método da percentagem completada. Por esse método, a receita
é reconhecida nos períodos contábeis em que os serviços forem
prestados. O reconhecimento da receita nessa base proporciona
informação útil sobre a extensão da atividade e o desempenho dos
serviços prestados durante o período. O Pronunciamento Técnico
CPC 17 – Contratos de Construção também exige o reconhecimento
Vale lembrar que esse caráter subjetivo pode muitas vezes distorcer os
resultados financeiros apresentados aos acionistas. É evidente que a
norma aqui necessita ser revista. Para piorar, o CPC 17 que trata de
contratos de construção apresenta esse mesmo modelo desatualizado,
ao nosso ver, de orientação. Vejamos suas principais características
relacionadas, novamente ao reconhecimento de receita:
Quando a conclusão de um contrato de construção puder ser
confiavelmente estimada, a receita e as despesas associadas ao contrato
de construção devem ser reconhecidas tomando como base a proporção
do trabalho executado até a data do balanço. Uma perda esperada no
contrato de construção deve ser reconhecida imediatamente como
uma despesa. Servem como exemplo de tais casos contratos:
· que não forem forçados a serem completados, isto é, sua validade
está seriamente em dúvida;
· cuja conclusão esteja sujeita ao desfecho de litígio ou de
legislação pendente;
· relacionados com propriedades que tenham a possibilidade de
ser condenadas ou expropriadas;
· em que o contratante não esteja em condições financeiras de
cumprir com as suas obrigações;
· em que o contratado é incapaz de completar o contrato ou de
cumprir com as suas obrigações segundo o contrato.
No caso de um contrato de preço fixo, a conclusão da construção
pode ser confiavelmente estimada quando estiverem satisfeitas
todas as condições seguintes:
· a receita do contrato pode ser mensurada confiavelmente;
· é provável que os benefícios econômicos associados ao contrato
fluirão para a empresa;
· as despesas para concluir o contrato, tanto quanto a proporção
executada até a data do balanço podem ser confiavelmente
mensuradas; e
· as custos atribuíveis ao contrato podem ser claramente
identificadas e confiavelmente mensuradas de forma que as
despesas efetivamente incorridas possam ser comparadas com
estimativas anteriores.
11 NOCERA, Rosaldo de Jesus. Teoria e Prática de Planejamento e Controle de Obras. Santo André:
Ed. do Autor, 2009. p. 135.
sobretudo porque seria bastante fácil a prática de atos prejudiciais aos interesses das
comunidades, como por exemplo a margem exorbitante de lucros, que redundaria no
empobrecimento dos que necessitassem das mercadorias.
Mesmo através de constantes intervenções do Estado, a dificuldade maior,
nos dias de hoje, é saber se aquele preço firmado, de fato, vale para o respectivo
serviço, ou produto. Por essa razão é que as relações comerciais têm como ponto
principal a definição do preço.
2.4.1. Preço pré-determinado
Embora não haja divergência em relação ao conceito de “preço pré-
determinado”, atualmente tivemos uma evolução nesse conceito, principalmente
em razão de mudanças no regime de tributação da Contribuição ao PIS e da
Cofins. Segue, nesse sentido, breve resumo:
· Com o advento da Lei nº 10.833/2003, os contratos firmados
anteriormente a 31/10/2003, com prazos superiores a 1 (um)
ano, de construção por empreitada ou de fornecimento, a preço
predeterminado, de bens ou serviços permaneceram sujeitos ao
regime cumulativo dessas contribuições, tributados a 0,65% e 3%,
respectivamente;
· Em 10.11.200413, foi publicada a Instrução Normativa nº 468,
que trouxe esclarecimentos sobre a aplicação da legislação,
principalmente no tocante ao “conceito de preço pré-determinado”
para os ca-sos em que tais contratos permaneciam sob esse regime
cumulativo;
· De acordo com o disposto na referida instrução normativa14, o caráter
pré-determinado do preço estipulado em contrato, permanece
apenas até o primeiro reajuste do valor verificado após 31.10.03.
· Esta regra aplica-se, ainda, caso a cláusula de reajuste vise preservar
o “equilíbrio econômico-financeiro” dos valores a serem recebidos
pelo contratado.
· IFRS – Normas muito antigas com pouco guidance o que faz de difícil
aplicação para transações mais complexas
· US GAAP – Muita regulamentação específica para as mais diversas
indústrias, o que resulta em inconsistências contábeis.
Segundo o mesmo documento, a norma visa melhorar o reporte financeiro
por meio de um modelo único baseado em princípios claros, servindo como uma robusta
estrutura conceitual sobre receita. Esta também almeja aprimorar a comparabilidade
entre as empresas e os mercados. O princípio fundamental do reconhecimento de receita
é que as entidades devem reconhecer a receita na transferência dos bens e serviços aos
clientes por um montante que reflita a contrapartida recebida, ou que era para ser
recebida, em troca dos bens e serviços fornecidos.
Em comparação com o modelo atual, o novo modelo deverá oferecer
resultados distintos, principalmente para as empresas que apurem o resultado
utilizando do percentual de conclusão da obra.
A diretriz proposta sugere uma divisão em cinco etapas para se cumprir
o princípio fundamental do reconhecimento de receita.
· Identificação do contrato com o cliente
· Identificação das performance obligations
· Determinação do preço da transação
· Alocação do preço da transação as performance obligations
· Reconhecimento da receita quando a performance obligation é satisfeita
que os contratos cujo escopo demande uma série de atos e providências por parte
do prestador e cuja consecução se prolongue no tempo, já vêm sendo firmados
com preços definidos a cada etapa do projeto, antes mesmo do surgimento
desse modelo. Não há duvidas de que cada vez mais, o contrato (documento
que faz lei entre as partes), é que irá balizar o critério jurídico aplicável ao
reconhecimento de receitas.
Somos da opinião de que esse modelo poderá inclusive proteger as partes
do contrato, principalmente se houver rescisão antes da conclusão do projeto.
Uma das maiores discussões atualmente, além do método de reconhecimento
de receita, é a precificação parcial nesses casos.
Por fim, podemos afirmar que os tributos aqui destacados continuarão
seguindo o curso do reconhecimento contábil de receita, e qualquer variação
ou impacto estaria vinculado à antecipação ou atraso nesse reconhecimento.
4. Exemplos Ilustrativos
4.1. Exemplo 1: Descontos com base em cumprimento de
Metas
Imaginemos agora uma Sociedade que tenha por atividade a
comercialização e distribuição de produtos e serviços de sistemas informatizados
de reservas de passagens aéreas, marítimas e terrestres, bem como a instalação
e manutenção de terminais e aparatos de comunicação, para o funcionamento
de sistemas informatizados de reservas de passagens da própria clientela.
Como parte de seu negócio, a empresa concede a clientes, descontos no
preço do aluguel do Equipamento e no licenciamento do uso de determinados
produtos. Todavia a concessão desses descontos está vinculada ao cumprimento
de metas por parte dos clientes, conforme contrato firmado entre as partes.
Assim, para que o cliente possa usufruir desses benefícios, deve alcançar um
patamar de reservas mensais através do sistema da empresa. Seguem dois
exemplos de contratos:
· Desconto Proporcional à Produção Média Mensal – nessa situação
o desconto concedido é diretamente proporcional ao cumprimento
da meta média mensal estabelecida em cláusula contratual. Caso
o usuário cumpra 100% da meta média mensal, terá 100% de
desconto no preço do aluguel do Equipamento e no licenciamento
18 ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. O Direito Contábil e a Disciplina Jurídica das Demonstrações
Financeiras. São Paulo: Prognose Editora, 2010. p. 308.
20 O valor pelo qual os créditos de prêmio podem ser vendidos separadamente. Se o valor justo não
for diretamente observável, ele deve ser estimado.