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RESENHAS BOOK REVIEWS 3067

níveis de gestão do SUS. Em comum, prevê-se para O QUE É DEFICIÊNCIA. Diniz D. São Paulo: Edi-
todos os gestores responsabilidades, como: elaborar tora Brasiliense; 2007. 96 pp. (Coleção Primeiros
normas técnicas para inserção da PNPIC na rede de Passos, 324).
saúde; definir recursos orçamentários e financeiros pa- ISBN: 978-85-11-00107-5
ra a implementação da PNPIC; promover articulação
intersetorial para a efetivação da Política; implementar Deficiência, saúde pública e justiça social
a educação permanente em consonância com a reali-
dade loco regional; estabelecer instrumentos e indica- Durante um longo período, deficiência foi sinônimo
dores para o acompanhamento e avaliação da Política; de desvantagem natural. Os saberes biomédicos domi-
acompanhar e coordenar a assistência farmacêutica naram o campo dos estudos sobre deficiência. A obra
com plantas medicinais, fitoterápicos e medicamentos O Que É Deficiência, da antropóloga Debora Diniz,
homeopáticos; exercer vigilância sanitária e incentivar publicada na Coleção Primeiros Passos, é uma provo-
estudos de farmacovigilância e farmacoepidemiologia; cação à compreensão biomédica da deficiência como
apresentar e aprovar proposta de inclusão da PNPIC desvantagem biológica. A vida de Jorge Luiz Borges,
nos Conselhos de Saúde. escritor argentino cego, é o tropo inicial da obra que
assume a assertiva de que “...ser cego é apenas uma das
As implicações da proposta muitas formas corporais de estar no mundo...” (pp. 7-8).
Essa redescrição da deficiência em termos sociológi-
Este livro tem um caráter formativo fundamental, pois, cos revela que a lesão é algo recorrente no ciclo da vida
além de aprofundar conhecimentos específicos sobre humana, especialmente em razão do envelhecimento
Homeopatia, Medicina Tradicional Chinesa-Acupun- populacional. Com isso, a pesquisadora mostra que a
tura, Fitoterapia e Crenoterapia, conduz o leitor pelo deficiência é um conceito complexo que, além de reco-
processo de construção social de uma política de saúde nhecer o corpo com lesão, denuncia a estrutura social
no Brasil. Por um lado, apresenta o histórico dos atos que aparta do convívio social a pessoa deficiente. A
formais relativos às práticas complementares, por ou- narrativa é um convite à reflexão; uma provocação ao
tro, deixa ver o processo de passagem de movimento autismo social e governamental frente à emergência da
social à política nacional. Assim, mostra: como os gru- diversidade de estilos de vida.
pos de trabalho foram organizados; como as diferentes O livro é dividido em cinco partes que abordam os
propostas foram sendo formatadas, com o fim de com- seguintes assuntos: o modelo social da deficiência; a
por um único documento; como ocorreu a aprovação revisão do modelo médico; e a deficiência, feminismo e
parcial, com recomendações de alterações e inclusão cuidado. Um aspecto preliminar na narrativa é a oposi-
do Termalismo Social/Crenoterapia, em dezembro de ção à idéia de deficiência como anormalidade. Segun-
2005, até alcançar a aprovação final e a publicação da do a autora, a deficiência não é uma variação do nor-
Portaria Ministerial nº. 971, em 3 de maio de 2006. mal da espécie humana, pois anormalidade é um julga-
Ao leitor, ao findar o livro, cabe o exercício crí- mento estético e, portanto, um valor moral sobre estilo
tico, uma vez que não se trata de uma obra analítica. de vida. Essa foi uma crítica central para a construção
Do nosso ponto de vista, as implicações da proposta da primeira geração do modelo social da deficiência.
são de ordem nacional e internacional. Internamente, É que a anormalidade era um argumento recorrente
trata-se de mais um exercício de democracia, suporte para explicar o encarceramento de pessoas com lesões
à pluralidade e respeito ao usuário, na medida em que físicas e mentais severas. Antes do modelo social, es-
veicula informações claras, precisas e atuais, referentes sas pessoas sobreviviam isoladas em instituições que,
aos tipos de terapias e racionalidade disponíveis para o a pretexto de tratá-las para devolvê-las à família ou à
cuidado. Internacionalmente, a PNPIC-SUS traz impli- sociedade em condições de normalidade, impunham-
cações que reforçam a visão de que o sistema público lhes um regime de alienação moral baseado no auto-
de saúde brasileiro, modelo mundial em relação a vá- ritarismo e na crueldade. O objetivo do modelo social,
rias ações, segue competente na defesa da construção um marco teórico nos estudos sobre deficiência, era ir
de um “paradigma prudente para uma vida decente”. além da medicalização das lesões.
A desconstrução da imagem do deficiente como
Nelson Filice de Barros uma pessoa anormal lastreou a tese da Liga dos Lesa-
Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campi-
nas, Campinas, Brasil.
dos Físicos contra a Segregação (UPIAS), a primeira
nelfel@uol.com.br organização formada e gerenciada por deficientes na
história da civilização. A UPIAS defendia que a exclu-
Pâmela Siegel são social que vitimava os deficientes não decorria de
Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campi-
nas, Campinas, Brasil.
suas limitações corporais, como entendia a medicina.
Segundo a UPIAS, a deficiência decorria do desamparo
Carmen De Simoni institucionalizado de organizações sociais e políticas
Ministério da Saúde, Brasília, Brasil. pouco sensíveis à diversidade corporal. Sem dúvida,
essa foi uma estratégia decisiva, porque, ao tempo
1. World Health Organization. Traditional medicine em que aproximava os deficientes de outras minorias,
strategy 2002-2005. Geneva: World Health Orga- como as mulheres e os negros, também legitimava a
nization; 2002. reivindicação de que a deficiência deveria ser, por is-
2. Luz MT. Racionalidades médicas e terapêuticas to mesmo, matéria de ações políticas afirmativas e de
alternativas. Rio de Janeiro: Instituto de Medicina intervenção do Estado. Mesmo sendo inicialmente um
Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro; movimento social enviesado pelo maior destaque à de-
1996. (Série Estudos em Saúde Coletiva, 62). ficiência física, a UPIAS conseguiu demonstrar que, in-
dependentemente da forma de deficiência, ela sempre
implicava uma experiência de opressão.

Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 23(12):3066-3069, dez, 2007


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A inovação do modelo social de deficiência estava tamento da questão política da deficiência. As novas
na concepção de que a experiência da opressão não é críticas minaram a força da ICIDH. A ICIDH parecia
uma conseqüência natural de um corpo com lesões. uma expansão da CID, um aspecto negativo do docu-
Seria, na verdade, uma imposição social. O problema mento, porque aproximava a deficiência das doenças,
é que, como demonstra a autora, diferentemente das o que afastava o debate do campo sociológico. Com is-
discussões sobre desigualdade de gênero, nas quais há so, os críticos mostraram que a ICIDH implicava uma
consenso político de que a biologia não determina a maneira camuflada de retomar a medicalização sobre
desvantagem social, no campo da deficiência este seria o corpo com lesões. No mais, a ICIDH carecia de repre-
um argumento inócuo: a rejeição à lesão é algo tão di- sentatividade porque havia sido feita por pessoas sem
fundido nas sociedades industrializadas que a separa- experiência pessoal na deficiência, além de lastrear-
ção entre a natureza e a sociedade não seria facilmente se em concepções de normalidade para a pessoa hu-
digerida nas negociações políticas em prol dos direitos mana. A revisão da ICIDH ocorreu na década de 1990
dos deficientes. Com base nisso, houve a primeira relei- e, desta vez, contou com intensa participação de diver-
tura do modelo social tal como ele foi concebido. A crí- sas entidades acadêmicas e de movimentos sociais de
tica buscava trazer o corpo para o centro dos debates deficientes.
sobre justiça para os deficientes. Como espaço de ex- A revisão teve por desfecho a publicação da Classi-
pressão da desigualdade, o corpo não devia ser ignora- ficação Internacional de Funcionalidade, Deficiência e
do, inclusive porque nem todos os ajustes arquitetôni- Saúde (CIF), em 2001. Com ela, a deficiência deixou de
cos possíveis garantirão a plena liberdade de ir, de vir e ser mera conseqüência de doenças para se tornar uma
de agir das pessoas deficientes, cujas demandas variam questão pertencente aos domínios da saúde, traduzin-
de acordo a multiplicidade e a gravidade de suas lesões, do-se numa tentativa de integrar os modelos médico e
motoras e/ou cognitivas. social de deficiência. A publicação da CIF foi um marco
Mas o enfoque no corpo não significou um atraso nos estudos que, porém, ainda sofreram críticas. Outra
nos estudos sobre deficiência. Muito pelo contrário. O crítica importante adveio da perspectiva feminista, que
corpo é um aspecto central no debate sobre deficiên- deu origem à segunda geração de teóricos do modelo
cia, especialmente porque pessoas produtivas podem, social de deficiência. A revisão do modelo social da de-
após longos anos de trabalho mecânico, experimentar ficiência à luz do feminismo desestabilizou a falsa su-
a deficiência. Ou seja, a deficiência não é apenas fruto posição de que os deficientes, sem exceção, retiradas as
do acaso da natureza. Não deve ser vista como proble- barreiras físicas, precisem de auxílio ou apoio de tercei-
ma individual, fruto de tragédia pessoal ou de uma li- ros para conduzir os rumos da própria vida. O que as
mitação corporal. Uma prova disso são os idosos, que teóricas feministas queriam era mostrar que o cuidado
experimentam a deficiência pelo desgaste gradual do também é uma demanda de justiça social dos deficien-
corpo. Nesse ponto, Diniz mostra o quanto a inclusão tes. Era preciso assimilar a idéia de que a independên-
dos idosos no universo da deficiência representou uma cia não deve ser um valor central do modelo social, ou
guinada argumentativa ao debate. A visão da deficiên- seja, as relações de dependência são inevitáveis à vida
cia como um problema social, sem negligenciamento social; são inescapáveis à história de vida de todas as
da representatividade do corpo, repercutiria de modo pessoas.
positivo na implementação de políticas de saúde públi- A crítica feminista causou uma revolução nos es-
ca e direitos humanos, com prioridade às medidas de tudos sobre o tema da deficiência. Como esclarece a
reparação de desigualdade, e não às medidas sanitárias autora, a perspectiva feminista tinha por principal de-
de reabilitação. Uma conquista paradigmática. safio demonstrar a possibilidade de haver um projeto
Um capítulo fundamental para a compreensão de justiça que considerasse o cuidado em situações de
da evolução dos estudos sobre o tema é o que aborda extrema desigualdade de poder, sem que isso implicas-
a revisão do modelo médico, em que Diniz analisa a se devolver os deficientes ao espaço de subalternidade
importância e a tensão decorrente da publicação, em e de exclusão social. Mas a crítica feminista, segundo
1980, pela Organização Mundial da Saúde (OMS), de Diniz, não era somente uma proposta de mudança de
um catálogo oficial de lesões e deficiências semelhante paradigma. Havia uma estratégia perspicaz por detrás
à Classificação Internacional de Doenças (CID): a Clas- dela: numa sociedade pouco sensível aos interesses dos
sificação Internacional de Lesão, Deficiência e Handicap deficientes, seria mais fácil garantir o cuidado que mo-
(ICIDH), cujo caráter teleológico era, para além da uni- dificar a ordem social e política que os oprimia. Nesse
ficação da terminologia sobre a linguagem biomédica ponto, aos olhos dos primeiros teóricos do modelo so-
sobre lesões e deficiências, principalmente propiciar cial, a crítica feminista implicava, inicialmente, uma
uma padronização para fins comparativos e de políti- ameaça política. Com o passar do tempo, não houve
cas de saúde. O novo vocabulário proposto pela OMS outra saída senão reconhecer que, além da perspectiva
representou, no entanto, retrocesso ao debate sobre dos deficientes, era preciso levar em consideração tam-
deficiência, porque resgatou conceitos perniciosos, bém o ponto de vista das cuidadoras dos deficientes.
como o de anormalidade, ao debate. O impacto de um Nisso, a crítica feminista outra vez surpreendeu,
vocabulário elaborado pela OMS, cuja força política porque viabilizou o reconhecimento de outra autori-
no cenário internacional é indiscutível, pôs em risco dade sobre a deficiência que não apenas o deficiente
as conquistas feitas pelos teóricos do modelo social da algo inquietante para a primeira geração de teóricos do
deficiência. modelo social porque abalou o argumento de autorida-
No entanto, a publicação da ICIDH teve uma in- de de que era preciso ser deficiente para escrever sobre
fluência positiva para o debate, porque foi o ponta-pé deficiência. A figura da cuidadora foi colocada no cen-
inicial para uma grande fase de crescimento intelectual tro do debate sobre justiça e deficiência, denunciando
para o modelo social, que, numa tentativa consertada o viés de gênero no liberalismo político e servindo, so-
de impedir o revigoramento do modelo médico, procu- bretudo, como alerta para o fato de que há desigualda-
rou demonstrar a fragilidade da ICIDH para o enfren- des de poder no campo da deficiência que jamais serão

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resolvidas por ajustes arquitetônicos. A crítica feminis- tico para leitores leigos, não omitiu dados nem concei-
ta teve o papel fundamental de desvelar outros prota- tos relevantes para a compreensão fidedigna do tema.
gonistas do universo da deficiência, que vivenciam a Para além da importância acadêmica da obra, o livro
experiência da deficiência pelo cuidado aos filhos, so- representa uma chamada de justiça social, pois nun-
brinhos, pais, parentes e pessoas com quem não têm ca, na história da civilização humana, tantas foram as
vínculo familiar, como é o caso de enfermeiros. Com a demandas de respeito aos direitos humanos, que pas-
crítica feminista, o debate sobre a deficiência passou a saram a ser, por esta razão, o vértice das ações gover-
considerar que a absoluta independência é uma ban- namentais dos países democráticos. Os desafios sobre
deira perversa que certamente implicará desamparo o tema ainda são muitos, mas o entendimento de que
aos deficientes. a deficiência é uma expressão da diversidade de estilos
A deficiência é um tema extremamente delicado. de vida é um avanço sem precedentes para a concreti-
O livro de Diniz propicia a compreensão de que a de- zação de um projeto de justiça social urgente: a inte-
ficiência resulta de um relacionamento complexo en- gração dos deficientes.
tre as condições de saúde de um indivíduo e os fatores
pessoais e externos, sendo um conceito guarda-chuva Arryanne Queiroz
Departamento de Polícia Federal, Ministério da Justiça,
que associa a concepção médica de lesão aos aspec-
Brasília, Brasil.
tos negativos da interação entre o sujeito e o contexto ANIS: Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero,
social. Um aspecto que merece destaque no livro é a Brasília, Brasil.
profundidade da abordagem, que, apesar de ter sido arryanne.avq@dpf.gov.br
publicada numa coleção editorial com um perfil didá-

Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 23(12):3066-3069, dez, 2007

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