Вы находитесь на странице: 1из 78

Sumário

A Psicologia da Religião ........................................................................................... 01

Psicologia e religião ................................................................................................... 19

Religião e Psicologia: análise das interfaces Temáticas ............................ 34

Fé e Ideologia na Compreensão Psicológica da Pessoa .............................. 65

Religião, Enfrentamento e Cura: Perspectivas Psicológicas .................... 72


A psicologia da religião

- Numa visão holística (= da totalidade) ampla se diz


tudo a respeito de tudo. De fato, a mesma realidade pode ser
analisada por diferentes pontos de vista, inclusive pelas
várias ciências.
- Mesmo assim, nenhuma ciência está tão próxima da
Religião quanto a Psicologia. De fato, nada é mais humano
do que a vivência religiosa. A história da humanidade
confunde-se com a história das religiões, nas quais já o
homem primitivo ia buscar razões para a explicação de sua
vida. Não consta, na história da civilização, a existência de
um único povo que não tivesse sua religião. Existe, pois, no
ser humano um instinto de procura da divindade, assim
como uma obra de arte não assinada parece estar,
eternamente, à procura de seu realizador. Nós somos uma
obra de arte assinada, só que temos uma natural dificuldade
de identificar a assinatura do escultor.
Esse instinto de procura da divindade é como um elo
escondido na alma de todo ser humano, um traço que se
iniciou com a criação do primeiro homem, que, conservando
o calor do toque da mão de Deus, se perpetua como faísca na
alma de todo ser humano à procura de suas origens divinas.
A existência universal de religiões, no tempo e no
espaço, reflete uma necessidade básica, intrínseca do
homem, de responder e explicar anseios internos, complexos,
como ansiedade, medo e culpa diante do sentido do mundo,
da vida e do outro. Não são esses sentimentos, entretanto,
que criaram as religiões ou a idéia de Deus, presente na
estrutura mental e humana de toda pessoa que termina por
criar esses sentimentos, diante da impossibilidade do
homem ter acesso direto e claro à divindade.
Daí, talvez, uma explicação radical para a existência de
rituais religiosos de sacrifícios humanos, como dádiva
suprema do homem a Deus, como forma desesperada, ou até
ritualisticamente aprovada, de aplacar ou agradar a divindade
por não saber ou poder atingi-la.
O sacrifício humano é uma forma brutal de veneração e
de adoração; mas, segundo algumas culturas, talvez a única
capaz de devolver a Deus o dom da vida e de suplicar a ele a
continuação dessa mesma dádiva.
O homem é naturalmente religioso; traz nele a marca, o
selo da propriedade divina. No estágio atual da evolução do
cosmos, o homem é o mais belo exemplar da arte divina.
Os chamados grandes ateus da humanidade - Freud,
Marx, Nietzsche e Sartre entre outros - de tanto negá-lo ou
de tanto não prestar atenção a Ele, mas prestar extrema
atenção a si mesmos, terminaram por encontrar, em si
mesmos, rastros da criação divina.
É nesse contexto que se insere a Psicologia: psicologia,
etimologicamente “estudo da alma”, como a ciência do
invisível que habita o coração humano.
Como pode a Psicologia fingir que as angústias do
coração humano, ao procurar seu sentido último, sua
liberdade e seu destino, não lhe dizem respeito?
Psicologia é a ciência que estuda o fenômeno humano
na sua plena e dinâmica relação pessoa-mundo. A ela
interessa, por natureza, o pensar, o sentir, o fazer e a
linguagem humana. Como estudo da alma humana nas suas
mais complexas manifestações (ligações e coligações, sejam
de ordem física, biológica, emocional, social, espiritual,
psicológica, enfim) ela ultrapassa a questão do
comportamento, que, pretensamente, se pensa poder ser
medido, pesado e contado.
A psicologia, sobretudo aquela acadêmica, tem se
comportado como se a religião não existisse. Na verdade é
uma contradição que a Psicologia se apresente como atéia,
materialista, se seu objeto último de estudo é algo imaterial,
não ponderável, não universalizável, dado que é a ciência do
indivíduo nas suas manifestações psicoemocionais.
Na realidade, tem existido um grande mal-entendido
entre Religião e Psicologia. Uma, ciência de Deus; outra,
ciência do homem. Mas estes dois saberes não se opõem, se
partirmos dos fatos e não de idéias pré-concebidas.
Chega-se, então, à seguinte contradição. Por um lado,
não se aceita a idéia de Deus, pois Ele não pode ser
comprovado cientificamente; e, por outro, bilhões de
inteligências humanas convivem com a idéia de um Ser
Superior. E aí, uma certa Psicologia tem feito a pior coisa
que uma ciência pode fazer: faz de conta que Deus não é
objeto de suas preocupações epistemológicas (= da ciência
específica da psicologia).
Na realidade, Deus é um dado, um fato que estrutura e
dá identidade à humanidade, enquanto conjunto de pessoas
que se encontram em marcha numa contínua busca de
próprio sentido e significado.
Deus não é um dos problemas da humanidade; Ele é o
problema número um da humanidade; e é, ao mesmo tempo,
parte ou o número um de suas soluções.
Quando as pessoas dizem que acreditam em Deus
consideram-no como o ser perfeito (porque não deveria
faltar-lhe nenhuma das perfeições existentes no universo),
eterno (porque está além do tempo e do espaço), criador
(não podendo ser criado por outro

antes dele): Ele cria todas as coisas, nada podendo escapar à


sua ação criadora.
E, quando o homem não tem uma noção clara destas
três características divinas (perfeito, eterno, criador de
tudo), acaba “humanizando” Deus, até “matando Deus”: e a
relação com Ele se limita a atitudes de reparação e de
petição, raramente de adoração e de agradecimento.
Não interessa à Psicologia, nem à Religião analisar
Deus do ponto de vista teórico. Interessa, sim, estudar como
Deus é vivido, experienciado pela pessoa humana no seu
cotidiano.
A Psicologia, como ciência que estuda o
comportamento humano, não pode fazer de conta que Deus
não existe ou, se existe, que não cuida das pessoas.
90% dos brasileiros declaram acreditar em Deus. E, se
Deus pertence ao emocional, ao sentimento do povo
brasileiro, não há como a Psicologia fechar os olhos ante esta
evidência.
Essa visão religiosa do mundo, na qual Deus se insere,
nasce do fato que o ser humano procura a solução do
próprio mistério; experimenta uma sensação de plenitude
através da vivência do sagrado; e nasce também de uma
relação com o mundo humano e material, na procura de uma
harmonia interna que obedece a uma tendência natural para a
totalidade.

Assim, se olharmos Deus como Causa Primeira, Ele é o


princípio que torna o mundo possível; e se O olharmos como
um Bem, Ele é fonte e garantia de tudo que existe de bom e
maravilhoso no mundo e no homem.
Podemos ver a relação de Deus com o mundo de quatro
modos, que importam em quatro concepções de Deus:
1. Deus e o mundo:
Deus pode ser considerado como criador da ordem do
mundo (= um intelecto), ou como Natureza do mundo (que
seria seu prolongamento), ou como o “transcendente” que
criou o mundo mas é distinto dele.
2. Deus e o mundo moral:
Deus pode ser considerado como Garante da ordem
moral (se não existisse Deus, não haveria moral), ou a
Providência que guia o mundo e os homens, ou a Causa
Livre da ordem moral, que respeita a liberdade humana.
3. Deus e a divindade:
Podemos ter o monoteísmo, ou o politeísmo.
4. A revelação de Deus:
Podemos ter o “deísmo” (afirma que o homem pode
chegar sozinho até Deus), ou o “teísmo” (afirma que Deus
vai ao encontro do homem).
O homem é um ser bio-psico-sócio-espiritual. Essas
quatro dimensões básicas constituem sua estrutura
experimental (aspecto geobiológico), experiencial (aspecto
psicoemocional), existencial (aspecto socioambiental) e
transcendental (aspecto sacro-transcendental).
Não se pode pensar a pessoa humana excluindo
qualquer dessas dimensões. Do ponto de vista clínico, pode
se afirmar que diversas psicopatologias são facilmente
identificáveis como disfunções desses diversos sistemas.
Também no processo de desenvolvimento humano
pode-se encontrar essa mesma ordem.
1. Num primeiro momento (até os 7 anos), a criança tenta
localizar-se no mundo, construir sua geografia humana:
experiementa seu corpo, formando as primeiras sensações da
própria identidade corporal.
2. Num segundo momento (dos 7 aos 14 anos) a criança e o
pré-adolescente ingressam no campo psicoemocional.
3. Num terceiro momento (dos 14 aos 21 anos) o adolescente
passa a lidar no seu campo socioamabiental, no qual o
existencial surge com toda sua força, tentado fazê-lo
experienciar os valores que agora passam a ser
individualizados, personalizados.
4. Num quarto momento (após os 21 anos), se os três
primeiros campos se harmonizam, o adulto pode viver e
reconhecer o campo sacro-transcendental, no qual o
espiritual começa a apresentar-se de maneira adulta,
fechando uma caminhada de procura e abrindo-se para a
maturidade sem limites. Aqui a espiritualidade encontra seu
campo fecundo.
A Psicologia, ainda, não lida, adequadamemte, com
essas quatro dimensões humanas. Ancorou-se no psicológico
e no social, dá passos tímidos na direção do campo
geobiológico, e lida mal com o campo espiritual, no qual
toda a personalidade humana deverá desembocar. Quando as
outras três dimensões desembocam, longe de perder sua
identidade, plenificam-se, tornando-se o oceano humano que

junta beleza, mistério e savcralidade, como, de resto, é o que


significa o caminhar humano.
Sem espiritualidade, a estruturação da personalidade
fica como um prédio planejado para subir, mas que nunca
chegará ao fim, porque lhe faltam as conexões entre os
diversos andares. Espiritualidade não é apenas o ponto de
chegada, o último andar, mas é a argamassa que une todos os
andares: organiza e dá sentido à existência humana.
Uma psicologia, que lida mal com qualquer desses
campos, fica esquizofrenizada, como um corpo que, além de
lidar mal com os pés, desconhece as potencialidades da
cabeça.
A Psicologia precisa encarar de frente a relação legítima
“homem-religião-Deus”, pois é constitutivo da essência
humana o fato de que o homem é um ser-de-relação.
E a relação típica da religião é “crença na garantia
sobrenatural de salvação e técnicas destinadas a obter e
conservar essa garantia....É sobrenatural no sentido de situar-
se além dos limites abarcados pelos poderes do
homem...Crença é a atitude religiosa fundamental; técnicas
são os atos ou práticas de culto (oração, sacrifício, ritual...)”
(ABBAGNANO, N. Dicionário de filosofia. São Paulo:
Martins Fontes, 2000, p. 846-847)
A idéia de salvação é o elemento constitutivo do
conceito de religião: o homem está consciente da sua
limitação, da sua impotência para atingir o misterioso; e
Deus se torna a garantia da salvação.
“Sem dúvida, Deus é o „totalmente Outro‟; Ele é,
porém, o totalmente mesmo, o totalmente presente...o
mistério da evidência que está mais próximo a mim do que
meu próprio Eu” (BUBER, Martin. Eu e tu. São Paulo:
Centauro, 2003, p. 92).
De outro lado, é importante lembrar que a idéia de Deus
não é intuitiva. Primeiro, o homem depara-se com um sol
que nasce todos os dias, com uma lua que aparece e
desaparece, com o relâmpago que ilumina o céu, com
bilhões de pontinhos luminosos lá em cima, com a chuva
que, aparentemente, ninguém sabe de onde vem, com os
frutos que nascem de plantas que aparentemente não são a
sua causa, com a barriga da mulher que vai crescendo e,
depois, um dia, sai, de dentro dela, um novo ser, e, assim, ao
infinito, e é, daí que nasce o mistério, o imperscrutável. O
homem não consegue conviver com essa infinitude de
informações sem poder explicá-la; ele não agüenta toda essa
majestade que o cerca; daí ele encontra Alguém em quem
todas as explicações se encontram e que, pela sua grandeza e
majestade, torna-se, ele mesmo, misterioso. Eis o campo do
religioso, do espiritual, do sagrado.
A inteligência humana é feita para descobrir e lidar com
a verdade. Ela passa da complexidade de mil mistérios,
dentro da qual ela se sente impotente, para a síntese de um
único mistério: mistério que produz, ele mesmo, no homem,
o instinto do divino. O homem não inventa Deus, ele
descobre Deus.
Esses processo de busca de Deus consome a alma do
homem, mesmo daqueles que, por mil razões, dizem não crer
na sua existência. Não é o fato de alguém não crer em algo
que esse algo deixa de existir; como, também, não é o fato de
alguém crer ou explicitar algo que esse algo passa a existir.
A experiência religiosa está no cerne da experiência
humana, na sua alma: e a Psicologia torna-se o lugar desse
encontro homem-espiritual, homem-sagrado-mundo.
Mas também invoca Deus aquele que abomina este
nome e crê estar sem Deus, quando invoca com o impulso de
todo o seu ser o Tu de sua vida (BUBER, 2003, p. 88).
A Psicologia, em algumas escolas, tem vivido um longo
e calculado silêncio no que diz respeito à espiritualidade e à
religião. Esta atitude corresponde ao mecanismo de defesa
de racionalização: nego aquilo com que não posso lidar.
“Na medida em que o espírito voltado sobre si renuncia
a este sentido, ele é obrigado a colocar no homem aquilo que
não é o homem; ele é obrigado a reduzir o mundo e Deus a
um estado de alma. Esta é a ilusão psíquica do espírito”
(BUBER, 2003, p. 108).
É a própria impotência existencial do homem que o leva
a pensar e a sentir que ele não pode ser o todo poderoso, o
único, o que dá sentido às coisas, e essa percepção o levou a
se encontrar com Deus, como o absoluto real, o que dá
sentido a ele e a todas as coisas.
Tudo, no universo, o convida a perceber que ele é
apenas uma mínima parte desse concerto cósmico que o
rodeia e, ouvindo essa mágica música, entendeu que não era
ele o compositor. Foi, então, procurar, além, o compositor e
grande maestro que rege, com infinita maestria, a ópera da
universalidade.
Muitos psicólogos têm visto a religião como expressão
de uma vivência sem fundamento, mistura de fé e de magia,
algo substitutivo do esforço pessoal para a auto-realização,
compensação de fracassos, expressão de uma boa fé e
ingenuidade, ópio e ignorância.
Nós respondemos analisando, antes de tudo, o
significado do termo. “Religião” vem dos termos latinos
relegere (re-ler), ou religare (re-ligar).
O primeiro sentido aponta para a atitude de re-ler a
realidade, vivenciando o diálogo com o diferente, a
solidariedade como expressão máxima do humanismo, a
ecologia como vivência harmônica entre o homem e a
natureza ou ambiente. Dentro dessa visão, entramos
necessariamente no conceito de ética como expressão
profunda do respeito pelo Outro, entendido como Tudo que
nos cerca e dentro do qual somos, nos movemos e existimos.
Religião, nesse contexto, não inclui o conceito de Deus
num primeiro momento e se torna a expressão da vivência do
outro pela comunhão e reverência com o outro, seja ele o
homem, a mulher, as plantas, os animais e, por meio dessa
re-leitura, tudo se torna sagrado. Estabelece-se, assim, a
religião, como o lugar do diálogo, da solidariedade, da
ecologia.
“Quando afirmamos que certas coisas são sagradas
entendemos que elas têm um valor incomensurável com
relação a outros valores humanos” (DURKHEIM, E. O
suicídio. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 212).
Descobrir o sagrado das coisas é descobrir o caminho
da solidariedade entre os homens. Sagrado e ética tornam-se
a dupla que dá sentido à experiência humana. Não é possível
pensar uma moral social comunitária sem pensar o sagrado.
O sagrado é o constitutivo da moral.
Quando se vê o mundo com os olhos do sagrado,
descobre-se que tudo tem relação com tudo, que tudo
influencia tudo: existe um holismo (holos, em grego,
significa tudo) cósmico.
Evidentemente, antes de se deparar com o sagrado, o
homem vê o outro homem de carne e osso, ama e/ou odeia o
outro, percebe que ninguém é uma ilha, junta e desfaz grupos
pelos mais variados motivos, junta-se ou separa-se do outro,
tenta se aproximar dos que pensam e fazem como ele,
percebe que a coesão grupal é o mais curto caminho entre
dois pontos e, dessa multiplicidade de comportamentos, ele
começa a perceber que o mundo é dividido entre dois
grandes campos: o Sagrado e o Profano. Quando ele re-lê o
sagrado, descobre o profano; e, quando ele re-lê o profano,
descobre o sagrado. Ele vive de representações.
A religião é, essencialmente, a experiência do sagrado e
é por meio da religião, no sentido que estamos colocando de
re-leitura do homem-mundo, que o homem abandonou o
caos ou olha o caos como uma possibilidade de crescer e
encontrar o verdadeiro sentido das coisas.
É nesse contexto que a Psicologia encontra seu
verdadeiro campo de ação como ciência do comportamento
humano. É pelo pensar, do sentir, do fazer e da linguagem
que o homem se plenifica, isto é, que pode chegar ao
máximo de si mesmo; e é, também, pela perda da conexão
entre esses quatro sistemas que ele se perde de si mesmo e
do mundo.
O mundo das representações é, ao mesmo tempo, o
mundo do humano e da espiritualidade. É na junção desses
dois mundos que ele se descobre como ele mesmo, como
tendo um sentido único, último, não delegável. Se ele perde
essa conexão ou se ele se perde nessa conexão, ele se perde
de si mesmo. Sua identidade individual se faz por meio de
uma conexão do processo de socialização e de uma vivência
consciente da realidade, introjetada por suas representações.
Isso gera uma cosmovisão, um paradigma comportamental,
pelo qual a pessoa se localiza no mundo. E, dentro dessa
cosmovisão, o conceito de sagrado e de religião ocupa os
pilares constitutivos do edifício humano.
A grande função da Psicologia é penetrar no mundo da
sensibilidade humana, penetra no mistério de suas incertezas
e da sua angústia, companheira milenar da caminhada pela
busca do que signfica viver, ser homem, ou mulher.
De outro lado, na trilha de Santo Agostinho que entende
que religião vem de re-ligar, penetramos no mundo da
interdependência, em que nada é solitário, muito menos o
homem.
Assim, quando tentamos entender religião enquanto um
re-ler, entramos na busca de sua origem, da validade
intrínseca da religião; e, quando vemos a religião como re-
ligar, entramos no campo da função, da funcionalidade da
religião enquanto prática que garante a salvação do homem.
Atrás do batismo numa igreja cristã, do rolo da Torá
numa sinagoga dos judeus, ou de peregrinos reunidos diante
da Caaba em Meca o que há de comum?
Com certeza há a idéia do sagrado. Todos esses
momentos são gestos sagrados e é o sagrado que, separando-
se do profano, re-liga a criatura ao seu Criador, garantindo a
salvação sobrenatural.
“O sagrado é o inteiramente outro, ou seja, aquilo que é
totalmente diferente de tudo o mais e que, portanto não pode
ser descrito em termos comuns...É uma força que, por um
lado, engendra um sentimento de grande espanto, quase
temor, mas que, por outro lado, tem um poder de atração, ao
qual é difícil resistir” (HELLERN, V.; NOTAKGR, H.;
GAARDER, J. O livro das religiões. São Paulo: Companhia
das Letras, 2002, p. 18).
Quando falamos em religião, enquanto uma re-leitura
do mundo, Deus aparece a posteriori, depois das coisas,
depois do homem-mundo.
Quando, porém, falamos de religião enquanto uma re-
ligação homem-Deus, estamos falando de um Deus a priori,
como ponto de partida, do qual nascem as esperanças e para
o qual caminham todas as coisas, um Deus que prometeu ser
fiel aos que a ele fossem fiéis.
Nessa concepção, o homem tenta “comercializar‟ com
Deus seu processo de salvação pessoal. De algum modo, ele
não duvida que, se seus rituais forem feitos adequadamente,
o efeito, por uma questão lógica, se seguirá. Ele acredita, ou
espera, que Deus, embora livre absolutamente, lhe dará uma
mão, se ele, homem, fizer sua parte. Se ele não consegue,
tende a dizer que foi porque não fez o que devia, preferindo
culpar-se a culpar Deus de não ter querido ouvi-lo, atendê-lo.
Há muitos tipos de gestos ritualísticos pelos quais ele
espera agradar a Deus e receber as graças de que tanto
espera, sobretudo a salvação. Eis alguns: oferenda, sacrifício
de purificação, oração, ritos de passagem, jejum, sacrifício -
de expiação, serviço divino (Eucaristia, Santa Ceia),
serviço social (visita aos pobres, aos presos; esmolas)...
“De uma maneira mais didática essas práticas religiosas
podem ser vistas sob dois aspectos: garantia de salvação e
referência às relações humanas.
No primeiro aspecto, a religião oferece ao homem: 1. a
garantia de libertá-lo do mundo, considerado um mal; 2. a
certeza infalível que ela representa a verdade.
E, no segundo aspecto a religião oferece a garantia de
que, ao vivê-la, o homem pratica os verdadeiros valores
morais que regulam a ordem na vida social (Cf.
ABBAGNANO, 2000, p. 846-852).
Vamos continuar “fazendo pontes” entre Psicologia e
Religião.
Abbagnano (2000), define Psicologia como disciplina
que tem como objeto a alma, a consciência ou eventos
característicos da vida animal e humana, nas várias formas
de caracterização de tais eventos com o fim de determinar
sua natureza específica (p. 809).
Vejamos os elementos que compõem essa definição.
A Psicologia tem por objeto:
1. Estudar a alma;
2. Estudar a consciência;
3. Os eventos característicos da vida animal e humana;
4. As várias formas de caracterização de tais eventos;
5. Determinar sua natureza específica.

Trata-se, pois, de Psicologia enquanto estudo da


totalidade do ser humano, sem dicotomizar, sem atomizar as
experiências humanas e espirituais, que são o cotidiano de
todas as pessoas.
E uma psicologia que estuda o ser, como uma totalidade
dinâmica, eternamente em processo, não se amedronta diante
da idéia de Deus, do sagrado, da espiritualidade, da religião,
até porque são esses processos que constituem a identidade
individual e social do homem e da comunidade.
Se as religiões pertencem, milenarmente, ao
inconsciente coletivo da humanidade, se muitos povos
construíram sua identidade a partir de suas crenças
religiosas, se a experiência humana de angústia, medo,
temor, assombro, assombro, bem como a vivência do sentido
do destino, da inevitabilidade da morte e a incerteza do além
sempre fizeram com que o homem, por meio de cultos e
rituais, aplacasse e agradasse a divindade, por que a
psicologia pode ou precisa passar ao largo da idéia de Deus
e, conseqüentemente, de religião como se nada disso tivesse
a ver com o homem?

Encontramos, em ABBAGNANO (2000, p. 209) a


indicação de seis correntes fundamentais da Psicologia:
a) Psicologia Racional: estuda a alma de forma racional, a
partir de princípios filosóficos e não de forma empírica, a
partir dos fatos. Foi usada por Christian Wolff (1679-1754).
b) Psicologia Psicofísica: é o psicológico atingindo o físico.
Por exemplo, um trauma, uma tensão, atingem o físico
(como cegueira, paralisia, perda de fala); ou as respostas
galvânicas da pele (arrepio) provocam um mal-estar
psicológico. Foi proposta por Fechner (1860).
c) Behaviorismo (= comportamentismo), do termo inglês
“behavior”(EUA), ou “behaviour”(Inglaterra). Em 1913,
John B. Watson colocou o comportamento no lugar dos
processos mentais como objeto da psicologia e descartou o
método introspectivo. Para ele, a consciência não podia ser
objeto da psicologia. O método devia ser a observação.
Também pôs de lado conceitos como inclinações,
forças, tendências, propósitos etc. O comportamento era
considerado como o conjunto de reações musculares e
glandulares de um organismo: a soma total de respostas a
estímulos internos e externos (condições ambientais). Cf.
Skinner.
d) Gestaltismo (de “Gestalt” = estrutura, forma). O objetivo
desta psicoterapia é o aqui e o agora em contraste com
abordagens voltadas ao passado da pessoa. Foi proposta por
Frederick Perls.
e) Psicologia do Profundo, ou psicanálise. Busca as
motivações que não afloram ao nível da consciência do
homem que age, mas que, nem por isso, deixam de influir
em seu comportamento: são as forças inconscientes que
determinam o comportamento humano. Cf. Freud.
f) Psicologia Funcional: é o estudo dos fenômenos psíquicos
como processos adaptivos, de ajustamento. Esta escola
surgiu com William James, que se propôs estudar as funções
mentais que visam o ajustamento do organismo ao ambiente.

Jorge Ponciano Ribeiro comenta, a esse respeito, o


seguinte:
“Pronto, agora sim. O homem pode ser, exaustivamente
compreendido ou entendido: está todo dividido, um pedaço
para cada teoria. E, no leilão acadêmico, quem der mais,
leva” (p. 33).
Esta crítica se baseia na convicção de que estas disputas
não consideram o homem em si, mas as várias teorias entre
elas, que são abstratas. Além disso, Ribeiro acredita que não
é a Psicologia, como ciência, que lida mal com a idéia de
religião, mas apenas alguns psicólogos, devido à influência
de Freud e de outros autores.
Na realidade, Deus mora, silenciosamente, em cada
uma de suas criaturas. No entanto, é na religião, ou em
práticas religiosas que as pessoas o procuram de uma
maneira mais formal, embora muitos também, convivam
com Ele valendo-se de experiências absolutamente pessoais.

Qualquer que seja a opção religiosa pessoal do


psicólogo, este precisa aprender a conviver com um Deus
que mora na humanidade ou no cosmos e que se expressa,
freqüentemente, nos homens, inclusive nos “clientes do
psicólogo” por meio de gestos que incluem fé, amor,
esperança e também, muitas vezes, medo, temor e angústia.
Naturalmente esta “empatia” fica mais fácil quando o
psicólogo é religioso.
Quanto mais olharmos para o outro com seus próprios
olhos, mais entraremos na esfera do sagrado, do espiritual
que habita nele e no mundo.
Assim se expressa o filósofo contemporâneo Martin
BUBER:
“São três as esferas nas quais o mundo da relação se
constrói:
A primeira é a vida com a natureza em que a relação
permanece no limiar da linguagem.
A segunda é a vida com os homens na qual a relação
toam forma de linguagem.
A terceira é a vida com os seres espirituais em que a
relação, embora sem linguagem, gera a linguagem.
Em cada uma dessas esferas, em cada ato de relação,
vislumbramos a orla do Tu eterno; em cada uma percebemos
um sopro dele; em cada Tu nós nos dirigimos ao Tu eterno,
segundo o modo específico de cada esfera. Todas as esferas
são incluídas nele, mas ele não está incluído em nenhuma.
Por meio delas, irradia-se uma presença única” (2003, p.
148).

Estamos falando de Deus; da solidariedade, do diálogo,


da ecologia humana. Não estamos falando de um Deus que
as religiões ensinam ou impõem; estamos falando com Ele e
não dele. Esse é o Deus da Psicologia, um Deus que está
muito além das disputas acadêmicas . Ele não invade
ninguém: apenas espera ser encontrado. Também se não for
encontrado, Ele continua onde está. Só tem medo dele
aqueles que falam dele; os que falam com Ele acabam se
tornando bons, cordiais e fiéis amigos.
Psicologia e Religião: uma longa caminhada, um
diálogo mediado pela relação homem-Deus.

Psicologia e Religião: nenhuma das duas tem que


provar nada a outra. Se cada uma ficar profundamente na sua
dimensão, terminarão por se encontrar, uma a outra, porque
onde está a verdade, tudo está incluído.

Bibliografia

1) Texto básico
RIBEIRO, Jorge Ponciano. Religião e Psicologia. In:
HOLANDA, Adriano (Org.). Psicologia, religiosidade e
fenomenologia. Campinas: Alínea, 2004. p. 11-36.
Jorge Ponciano Ribeiro é Doutor em Psicologia pela
Universidade Pontifícia Salesiana de Roma (1975); pós-
doutor na Sussex University, Inglaterra (1990), Professor
titular de Psicologia Clínica da Universidade de Brasília.
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

Religião e Psicologia: análise das interfaces temáticas


Martha Caroline Henning* [martha mfa.unc.br]

Carmen L. O. O. Moré** [cmore mbox1.ufsc.br]

Resumo
O presente artigo tem como objetivo analisar as interfaces temáticas entre Psicologia e
Religião nas publicações da Revista de Estudos da Religião - REVER. Para tanto, num
primeiro momento analisaram-se 127 artigos, decorrentes da busca inicial através da
palavra-chave “Psicologia”. Tendo como referência a metodologia qualitativa e análises de
conteúdo, os artigos foram lidos e examinados, eliminando-se aqueles que não exploravam
de forma direta ou indireta a temática da religião relacionada à Psicologia. Desta forma,
restaram 27 publicações, as quais foram nucleadas em unidades temáticas de análise que
resultaram nas seguintes ênfases encontradas: a) traços culturais ligados a religiosidade; b)
a religião e a identidade pessoal, o comportamento, sexualidade, saúde e relacionamentos
interpessoais dos adeptos; c) características psicológicas e comportamentais de grupos
religiosos; d) a influência da religiosidade na Psicologia Clínica.

Palavras-chave: Psicologia, Religião, Cultura, Saúde.

Abstract
This article systematizes and discusses articles on the issues Psychology and Religion
published in the Revista de Estudos da Religião – REVER. According to a content analysis of
127 essays initially taken into account 27 were finally considered relevant. In a second step,
the latter were sub-organized in the following categories: a) cultural traits related to
religiousness; b) religion in reference to personal identity, sexuality, health and inter-relations
of adherents; c) psychological characteristics and behavior of religious groups; d) the impact
of religiousness upon clinical psychology.

Keywords: Psychology, Religion, Culture, Health.


* Psicóloga. Terapeuta Relacional Sistêmica. Professora de Psicologia da Universidade do Contestado –
Campus Mafra – SC. Mestre em Psicologia pela UFSC.

** Psicóloga. Mestre e Doutora em Psicologia Clínica pela PUC-SP. Professora de Psicologia da UFSC.

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 84
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

Introdução
A espiritualidade acompanha o Homem ao longo da História. Enquanto um componente da
vida humana, sua influência não se restringe ao âmbito sociocultural, aparecendo também
na constituição da subjetividade do indivíduo, expressa em crenças, valores, emoções e
comportamentos a ela relacionados. Desta forma, se faz presente nos atendimentos clínicos
de Psicologia, trazida como parte da constituição psicológica dos clientes que procuram
auxílio profissional para seus problemas.

Entretanto, a religião, como campo de convergência desta expressão ao longo dos tempos,
foi colocada em tela na época moderna, principalmente pela dificuldade metodológica da
prova da existência em termos concretos da fé, frente a uma cultura de conhecimentos em
que as relações precisavam ser quantificadas. A própria Psicologia sofreu efeitos deste
paradigma científico, apesar de se constituir como uma ciência humana, o que gerou uma
tensão frente à possibilidade de se adotar a Religião como campo ou elemento de estudo.

Gradativamente, as Ciências Humanas voltaram a ser vistas como ciências do espírito, nas
quais sua meta passou a ser a compreensão e comunicação, não a previsão e o controle
(FIGUEIREDO 1991). Com isso, a religiosidade pôde tornar-se efetivamente um objeto de
estudo da Psicologia, e a religião pôde estabelecer uma relação com a mesma, sem
sobreposições entre essas diferentes áreas da existência humana. Neste caminho, a
religiosidade apareceu nos estudos de diferentes pesquisadores da Psicologia, trazendo
publicações que apontam a associação da mesma com aspectos que facilitam e/ou
dificultam os processos de promoção de saúde mental.

Considerando a importância da produção científica para a evolução do conhecimento em


Psicologia, ascende a relevância de revisar as publicações de revistas especializadas sobre
o tema da religião, buscando a relação existente entre ambas trazida por pesquisadores da
área. Neste sentido, quando se trata de tais publicações no Brasil, a Revista de Estudos da
Religião – REVER emergiu como um referencial de qualidade importante no cenário das
publicações científicas do contexto brasileiro.

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 85
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

Assim, este artigo teve como objetivo estabelecer uma relação entre Psicologia e Religião
nas publicações da Revista de Estudos da Religião - REVER, visando identificar as
interfaces temáticas, com o intuito de analisar o aporte desses campos de conhecimento
para a Psicologia enquanto ciência e profissão. Com isso em vista, foi pesquisado o site
oficial da revista na Internet de novembro de 2007 até março de 2008, no qual se lançou
Psicologia como palavra chave para busca de artigos que cruzassem os temas. Na
investigação foram encontrados 127 artigos, os quais foram lidos e examinados, eliminando
aqueles que surgiram apenas por citarem a palavra Psicologia, sem, contudo, explorar esta
temática ou assuntos relacionados a ela. Desta forma, restaram 27 artigos que exploram
questões relacionadas direta ou indiretamente com a Psicologia, até a data em questão.

Assim, procedeu-se a análise dos mesmos, buscando tanto as regularidades temáticas


como seus aspectos diferenciais, a partir dos quais se configurou um conjunto de núcleos
temáticos os quais se constituíram em parâmetros de referência para análises da temática
proposta.

Os núcleos temáticos e suas configurações


Partindo da ideia de que pessoas religiosas compreendem os eventos da vida dentro da
estrutura de sua crença, considera-se a religiosidade1 como um aspecto importante da
experiência humana, pois os ensinamentos e atividades religiosas fazem parte da cultura e
do sistema de valores e são base de julgamentos, escolhas e comportamentos, sendo um
fenômeno social e cultural (MAHFOUD 2001; STADTLER 2002; VALLE 2002; BAIRRÃO
2004; BRUSGAGIN 2004; DALGALARRONDO, SOLDERA, CORRÊA-FILHO & SILVA 2004;
EPELBOIM 2006; HEFNER 2007; PAIVA 2007; PERES, SIMÃO & NASELLO 2007).

Além de fazer parte da cultura, a religião é constituída por mitos, rituais e comportamento
moral que interpretam o processo cultural, definindo significados de comunidade e
influenciando sobre que pode e não pode ser feito, ou o certo e o errado. Assim, move-se
entre o que é novo e a sabedoria herdada do passado, sendo desafiada a equilibrar ambas
as esferas, como um fator de preservação da cultura (HEFNER 2007). Em concordância

1 A religiosidade pode ser considerada como crenças associadas a uma seita ou religião específica,
caracterizada pela prática de rituais religiosos públicos que são compartilhados com pessoas que possuem
as mesmas ideias a este respeito (SOCCI, 2006).

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 86
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

com isto, uma das temáticas que se configurou a partir da seleção de artigos para a
construção deste estudo, foi a de traços culturais ligados à religiosidade.

Por sua vez, nesse percurso cultural, surge diante do indivíduo um sistema de experiências
acumuladas e saberes cristalizados sob a forma de sistemas religiosos, os quais são
apresentados na configuração de respostas prontas que podem ser assimiladas ou não
(AMATUZZI 1999). Vergote (2001) defende a ideia de que o psicólogo estude as pessoas
considerando-as em seu contexto cultural-religioso, tal como fazem os antropólogos. A
observação psicológica constituir-se-ia então, em escutar as expressões religiosas e
observar os comportamentos que a cultura designa como religiosos para interpretá-los em
sua relação, sem ajuizamentos a cerca da verdade de tais convicções. Tendo em vista a
influência da religiosidade no comportamento das pessoas, dada sua infiltração em questões
socioculturais, desenhou-se os valores e normas religiosas e o comportamento das pessoas
enquanto unidade temática de análise.

Entretanto, a influência da religião não se restringe ao âmbito sociocultural e


comportamental, aparecendo também na constituição do indivíduo (SENGL 2000). Desta
forma, o religioso adquire uma função re-ordenadora da percepção de si (auto-imagem e
senso de identidade) e do mundo (sentido e opções de vida). A atitude religiosa não é
apenas um sentimento de autopercepção ou uma valorização do objeto religioso, ela envolve
a ação de afirmação ou de negação em relação a questões extremamente concretas que
chega a modificar a personalidade do sujeito, sendo dela inseparável (VALLE 2002). Assim,
as outras unidades temáticas configuradas foram tanto valores e normas religiosas e a
identidade pessoal do fiel, quanto as características psicológicas e comportamentais de
grupos religiosos.

Independentemente do credo, a experiência religiosa marcante possui consequências na


forma como a pessoa vive, sendo constantemente associada ao maior desapego das coisas,
à aquisição de um senso maior de fraternidade com empenho na solução dos problemas
humanos, além de um sentimento de alegria mais profundo (AMATUZZI 1999). Ao
estudarem a experiência religiosa aliada ao crescimento pessoal de católicos, Baungart &
Amatuzzi (2007) afirmam que a experiência religiosa dos participantes contribuiu para uma

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 87
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

mudança subjetiva com consequente modificação de comportamentos, tais como: maior


tolerância nos relacionamentos interpessoais, inserção em grupos sociais,
autoconhecimento e empatia. Essas mudanças observadas no contato com esse estudo
levaram a considerar outro núcleo temático, que se refere aos valores e normas religiosas e
os relacionamentos interpessoais.

Além disso, outro gênero de pesquisa que tem sido publicada atualmente no Brasil trata de
relacionar consequências da aderência a religiões específicas em aspectos psicológicos
ligados à sexualidade dos fiéis. Existem estudiosos que retratam o prejuízo à saúde vindo da
culpa alimentada pela religiosidade quanto à sexualidade (VERGOTE 2001). Carvalho
(1999), por sua vez, desenvolveu um estudo buscando investigar a influência religiosa no
comportamento afetivossexual de adolescentes, no qual constatou que os jovens sem
afiliação religiosa se envolvem mais nos relacionamentos do tipo namoro, relação sexual e
carícias avançadas; os religiosos, por sua vez, alegaram que demoram mais para envolver-
se nesse tipo de relacionamento por atribuírem uma alta significação a isso. Com tais
constatações, desenhou-se uma nova temática intitulada valores e normas religiosas e a
sexualidade dos fiéis.

A presença do religioso no modo de construir e vivenciar o sofrimento mental igualmente tem


sido estudada e descrita. A busca por significação e alívio do sofrimento parece ser algo
marcadamente recorrente na experiência religiosa (KOENIG, LARSON & LARSON 2001;
PANZINI & BANDEIRA 2005; 2007; DALGALARRONDO 2007; FLECK & SKEVINGTON
2007). Pacientes, profissionais da saúde e pessoas da comunidade em geral afirmam que a
religião, a espiritualidade e crenças pessoais formam um dos principais aspectos de sua
qualidade de vida (FLECK & SKEVINGTON 2007). Neste sentido, Moreira-Almeida, Lotufo-
Neto & Koenig (2006) desenvolveram uma pesquisa em que toda a evidência científica
disponível sobre a relação entre religião e saúde mental foi revisada utilizando-se de várias
bases de dados científicos. Foi percebido que a maioria dos estudos de reconhecida
qualidade científica detectou que maiores níveis de envolvimento religioso estão associados
positivamente aos indicadores de bem estar psicológico e a menos depressão, pensamentos
e comportamentos suicidas, uso/abuso de álcool/drogas. Encontraram ainda evidências de
que o impacto positivo do envolvimento religioso na saúde mental é mais intenso entre

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 88
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

pessoas sob estresse, como idosos e indivíduos com deficiências e doenças clínicas. Nesse
contexto, a unidade temática relacionada a valores e normas religiosas e a saúde dos fiéis
foi a que melhor congregou dados dos estudos.

A despeito da influência da religião na saúde, nas ideias, valores e comportamento das


pessoas, alguns psicoterapeutas veem o tema da religiosidade familiar como irrelevante, ou
até superficial. Para eles, este seria um assunto que os clientes deveriam abordar apenas no
espaço religioso. Contudo, o cliente é um ser total, que ao falar de seus problemas traz suas
crenças, inclusive as religiosas (GIOVANETTI 1999; BRUSGAGIN 2004). Sob este ponto de
vista, percebe-se a necessidade dos terapeutas estarem mais atentos ao papel das crenças
e das práticas religiosas na vida dos seus clientes e na terapia (GIOVANETTI 1999; LIMA
2001; ANGERAMI-CAMON 2002; BRUSGAGIN 2004; BAUNGARTE & AMATUZZI, 2007;
PANZINI & BANDEIRA 2007; PERES et alii 2007). Assim, pode-se entender como a
Psicologia deve contextualizar aspectos significativos da realidade e da vida das pessoas, tal
como a religião. Peres et alii (2007) observaram, através de uma revisão de literatura, que
vários estudos internacionais contemplaram o tema da espiritualidade/religiosidade e
psicoterapia, demonstrando pertinência dessa interconexão com bons resultados
terapêuticos. Defendendo um ponto de vista semelhante, Williams & Sternthal (2007)
explicam, também através de uma revisão de pesquisas publicadas na área, que os
pacientes australianos desejam que suas clínicas incorporem aspectos referentes à
espiritualidade nos tratamentos. Partindo destes dados desenhou-se a o núcleo temático
que versa sobre a influencia da religiosidade na Psicologia Clínica.

Analise da temática psicologia e religião


Considera-se que pensar nas interfaces temáticas destes dois campos de conhecimento
significa trazer à tona reflexões que contribuam para o enriquecimento dos mesmos e, por
consequência, às praticas decorrentes. Os núcleos temáticos evidenciam regularidades de
temas presente nos artigos analisados e buscaram uma organização dos dados que
favorecessem o entendimento da discussão dos mesmos. No entanto, acredita-se que a real
compreensão e sentido dos mesmos se dá no conjunto deles, ou seja, cada ênfase temática
trazida pelos núcleos se relaciona e auxilia na contextualização da outro e vice-versa. É sob
essa perspectiva que se analisaram e discutiram os mesmos à luz do objetivo proposto.

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 89
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

Traços culturais ligados a religiosidade


Observou-se que nove dos 27 artigos que cruzam os temas Psicologia e Religião versavam
sobre traços culturais ligados a religiosidade. São eles: ALBUQUERQUE 2001; BURITI
2001; VALLE 2002; GROISMAN 2004; RIBEIRO 2004; BIDEGAIN 2005; KOCHMANN 2005;
KIMBANDA 2006 e HEFNER 2007.

Tendo como parâmetro a afirmação de Hefner (2007) de que a religião faz parte da cultura e
a reflete, acredita-se que a relação entre religião e política se torna também indissociável,
uma vez que a referência aos preceitos religiosos serve para avançar no contexto das
preocupações morais, sociais ou políticas amplas. Pode-se fazer uma analogia ainda com
aspectos culturais, uma vez que os processos de construção ou aprofundamento da
democratização que disseminaram a forma liberal de pensar, provocando um incremento da
lógica pluralista, produziram um efeito no campo da religiosidade e cultura que permite tanto
a diversidade religiosa, quanto a vivência individual da espiritualidade 2. Um efeito
contraditório disso é o aprofundamento da experiência religiosa como algo pessoal,
individual e íntimo, paralelamente com uma globalização do religioso (BURITI 2001). Assim,
diante da diversidade de culturas e credos torna-se difícil determinar um único programa de
ética que se aplique a toda instância particular (HEFNER 2007).

Em consenso com essas ideias, Bidegain (2005) explica que a regulação das relações de
pares e as regras de conduta sexual atreladas ao universo religioso (vindas, sobretudo do
Cristianismo) asseguram que se mantenham os costumes e a ordem social e política. Para a
autora, a reprodução da espécie e a formação de lares para educar os filhos foi um meio de
socialização da moral e da política.

Entretanto, Ribeiro (2004) constatou em seu estudo que existe hoje uma generalizada
redução na prática ritual, na crença e na pertença religiosas dos jovens, em que cada nova
geração começa sua religiosidade num nível de prática inferior à da precedente. Uma das
razões consideradas pelo autor para esse fenômeno é o distanciamento entre o

2 A espiritualidade refere-se a atividades solitárias como crenças pessoais, preces e leituras religiosas. Assim,
o termo espiritualidade está mais ligado a vivências intrínsecas ao indivíduo, enquanto que o termo
religiosidade expressa vivências mais extrínsecas a ele (SOCCI, 2006). Neste sentido, é comum que a
espiritualidade coexista com a religiosidade, embora às vezes isso não aconteça necessariamente.

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 90
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

ensinamento moral das igrejas e a cultura dos jovens (sobre questões familiares e da vida
privada, como a sexual, por exemplo).

Relacionando culturas de etnias específicas e religiosidade, houve quatro publicações


(ALBUQUERQUE, 2001; VALLE, 2002; GROISMAN, 2004; KIMBANDA, 2006). Estudando a
religião oriental praticada por brasileiros, Albuquerque (2001) observou a função de
preservação do patrimônio étnico e cultural, explicando que pode ser notada a tentativa de
resgate de traços culturais pré-modernos através da orientalização. Assim, os praticantes de
religiões orientais no Brasil buscam comportamentos ligados à vida comunitária, à
rusticidade, à aliança com a natureza, ao contato direto com o sagrado, ao artesanato e à
simplicidade. Quanto a isso, Valle (2002) esclarece que a conversão de brasileiros a uma
religião oriental supõe desconstruções e reconstruções mais drásticas do que as que
acontecem quando ele se converte a uma religião ocidental, pois a pessoa, além de mudar
sua religião, muda também questões relativas à cultura de origem.

A pesquisa de Kimbanda (2006) versa sobre o costume africano (bem como de países
árabes ou islamizados) da infibulação 3 da mulher na cultura bantu regulando a relação
conjugal através deste ritual arraigado em práticas religiosas. Apesar do mesmo se colocar
como um problema para a sua saúde física e psicológica, ele reveste-se de significados de
morte e renascimento na puberdade, com a nova personalidade que incorpora a idade
adulta. Assim, a consciência/experiência que a mulher africana possui de ser pessoa
responsável, é obtida por meio da iniciação, o que mostra a importância psicológica disso.

Já a pesquisa de Groisman (2004) estudou a transposição simbólica do Santo Daime do


Brasil para a Holanda. Percebeu-se um estilo de conduta comportamental que o Santo
Daime como sistema religioso preconiza, com rigidez nas formas, sustentada por uma
ideologia de salvação. Assim, o que inspirou a transposição (rito, práticas sociais e
ideocosmologia) foi o contexto ideológico, caracterizado por seu caráter de constante
experimentação dos sistemas presentes e busca de inovação dos mecanismos de
articulações social.

3 Trata-se da remoção parcial/ total do clitóris da mulher.

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 91
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

Também versando sobre culturas de etnias específicas e religiosidade, Kochmann (2005),


por sua vez, afirma que os movimentos religiosos liberais judaicos, acompanhando as
mudanças do papel da mulher na sociedade em geral, permitem a participação igualitária da
mulher judia em todos os níveis, inclusive a ordenação de mulheres rabinas, apesar de nem
todas as correntes religiosas judaicas estarem prontas para isso.

Pôde-se perceber então, que no que diz respeito a traços culturais ligados a religiosidade,
existem práticas e significados que só podem ser compreendidos em relação à cultura na
qual estão inseridos, tal o caso do costume africano da infibulação descrito no estudo de
Kimbanda (2006). Viu-se ainda, que pode acontecer de as pessoas já partirem em busca de
determinadas religiões para que com elas mergulhem em universos culturais que lhe sejam
afins (conforme mostrou as publicações de ALBUQUERQUE 2001; VALLE 2002;
GROISMAN 2004). Neste percurso, percebeu-se que a referência aos preceitos religiosos
liga-se a preocupações morais que alcançam inclusive questões políticas, como é o caso
das regras de conduta atreladas ao universo religioso que tentam manter os costumes e a
ordem social da cultura na qual estão inseridos. Também se constatou que, na contramão
desses fatos, os adolescentes acabam iniciando sua religiosidade num nível de prática
inferior à da geração precedente, justamente por estarem inseridos em uma cultura jovem
que não encontra ajuste com seus hábitos e exercícios, o que traz preocupações a grupos
religiosos que acabam tentando modernizar algumas de suas práticas em vista desta
evolução cultural.

Assim sendo, sem fugir de uma possível concordância com as demais divulgações sobre o
assunto aqui tratado, Hefner (2007) conclui que a influência cultural exercida pela religião
nas crenças e valores dos indivíduos vai do ritual à prática. Desta forma, os mitos descrevem
como as coisas devem ser; já os rituais são conjunto de ações simbólicas que fazem certa
mediação entre o mito e a prática; e a prática, por sua vez, é a transformação das ações
simbólicas em comportamentos fora dos locais sagrados. Coaduna-se com o autor acima
mencionado, no sentido de que a religião é incorporada nos sistemas de valores culturais e
passa a influenciar decididamente as ideias e comportamentos daqueles que a praticam,
conforme se explicitou em cada uma das publicações, de um modo ou de outro.

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 92
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

Valores e normas religiosas e o comportamento das pessoas


Nesta categoria, foram nucleados os dados de sete artigos, que versavam sobre valores e
normas religiosas e o comportamento das pessoas. São eles: HARVEY 2002; VALLE 2002;
GROISMAN 2004; RIBEIRO 2004; BIDEGAIN 2005; GOMES 2006; HEFNER 2007.

A maioria dos artigos em questão (cinco de sete) considera primeiramente a influência da


religião na cultura e nas tradições do meio no qual o fiel se encontra para, a partir disso,
passar a influenciar seu comportamento, modificando-o (VALLE 2002; GROISMAN 2004;
BIDEGAIN 2005; GOMES 2006; HEFNER 2007). Neste sentido, o comportamento sexual
surge como alvo de estudos da influência religiosa (BIDEGAIN 2005; GOMES 2006), assim
como a prática do exorcismo (GOMES 2006), o rigor de atitudes vinculadas ao universo
religioso na busca de salvação (GROISMAN 2004) e a religiosidade conseguindo (HARVEY
2002; VALLE 2002; HEFNER 2007) ou deixando de conseguir (RIBEIRO 2004) influenciar
propositalmente o comportamento dos fiéis de maneira geral. Entretanto, com a liberdade de
adesão religiosa, pode-se perceber subjetivamente em alguns estudos, que ao mesmo
tempo em que a religião encoraja determinados comportamentos, os fiéis podem também se
identificar com tais preceitos mostrando, muitas vezes, um ajuste de ideias entre religião e
indivíduo (HARVEY 2002; VALLE 2002; RIBEIRO 2004).

A tentativa de regulação e a influência no comportamento afetivossexual das pessoas (em


especial das mulheres) pode ser percebida no artigo de Bidegain (2005), que mostra como
as normas de conduta sexual atreladas ao universo religioso asseguram que se mantenham
os costumes e a ordem social, política e econômica. Sobre isso, Gomes (2006), ao estudar
as representações sociais a respeito do comportamento sexual de protestantes, percebeu
que as crenças e ideias religiosas são fatores determinantes para sua prática sexual. Além
disso, a crença do corpo como habitação do demônio libera a consciência de suas
responsabilidades e subordina ao exercício do exorcismo como um comportamento religioso.

Percebeu-se ainda, um estilo de conduta comportamental rígida preconizada pelo Santo


Daime enquanto sistema religioso, sendo sustentada por uma ideologia de salvação
(GROISMAN 2004). Já Hefner (2007) enfoca questões relativas à doença, tratamento e
prevenção, assegurando também, que as interpretações teológicas interferem nos

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 93
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

comportamentos de seus adeptos, uma vez que estes, motivados por preceitos religiosos,
aderem a práticas que visam cuidados especiais com a saúde.

O estudo de Valle (2002) sobre conversão a religiões orientais chama a atenção para
pesquisadores interessados neste assunto, no sentido que não se pode deixar de considerar
as consequências da troca de religião e as mudanças de comportamento derivadas desta
adesão, bem como às buscas da pessoa, além de atentar-se aos aspectos conscientes e
inconscientes do psiquismo de cada convertido, levantando as características (inclusive
psicoafetivas) do grupo ao qual a pessoa se afilia e observando as circunstâncias sociais
(macro e micro).

Estudando o Satanismo, Harvey (2002) observou que esta religião tem por intenção reforçar
o interesse racional no self do indivíduo. Para eles, Satã é uma imagem útil que encoraja o
individualismo e hedonismo objetivados como comportamentos ideais, no que se refere à
oposição e não-conformidade. Assim, o autor mostra a influência deste movimento religioso
na conduta de seus adeptos, encorajando-os a ceder honestamente aos seus desejos.

O estudo de Ribeiro (2004), por sua vez, mostra o efeito contrário: como a religião deixa de
lograr seu intento de influenciar o comportamento dos jovens justamente por seus preceitos
morais estarem na maior parte das vezes distantes da realidade cultural atual.

Conclui-se então, a partir das ênfases temáticas encontradas nos artigos que versavam
sobre valores e normas religiosas influenciando o comportamento das pessoas, que não se
pode fugir deste fato. Mesmo quanto ao estudo de Ribeiro (2004), pois há que se considerar
o distanciamento dos jovens do universo religioso, já como um comportamento motivado
pelas regras religiosas que por eles são consideradas muito rígidas ou ausentes de seus
contextos. Constatou-se ainda que as crenças religiosas são fatores determinantes para a
prática sexual, na qual a ideologia da salvação acaba por sustentar ou motivar estas e outras
condutas rigorosas.

Neste contexto, cada grupo religioso com suas pregações específicas acaba por adquirir
características comportamentais que lhe são peculiares, evidenciando a conformidade de
ideias existentes entre o indivíduo e o grupo de sua afiliação. Surge então a necessidade de

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 94
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

discutir a categoria referente aos valores e normas religiosas influenciando a identidade das
pessoas.

Valores e normas religiosas e a identidade pessoal do fiel


Oito dos 27 artigos analisados apontam valores e normas religiosas e a identidade pessoal
do fiel: ALBUQUERQUE & SOUZA (2002); HARVEY (2002); STADTLER (2002); VALLE
(2002); RODRIGUES (2003); BESSA (2006); KIMBANDA (2006); MASSIH (2006).

Para Valle (2002), a questão religiosa adquire uma função reordenadora da percepção de si
(autoimagem, senso de identidade) e do mundo (sentido e opções de vida). Conceitos
relacionados a sentimento de pertença, grupos de referência, identidade e personalidade
religiosa, socialização religiosa e até mesmo crise religiosa (dentre outros) só podem ser
entendidos se postos em uma perspectiva psicossocial mais integrada, que considere
simultaneamente o social e o psicológico. Indo ao encontro dessas ideias, Stadtler (2002)
afirma que o ponto inicial das alterações cognitivas é ser convencido por um novo sistema
de ideias que, além de promover uma identidade forte, é mais poderoso para explicar as
adversidades da vida cotidiana. Essas alterações têm origem nas mensagens religiosas
poderosas cuja assimilação desobstrui a cognição na direção do sistema ideativo do grupo.

Neste sentido, a identidade católica refere-se com frequência a ideias de respeito, amor ao
próximo e libertação humana. Os fiéis também se identificam afetivamente com a religião,
que lhes proporciona fortes experiências emocionais, convívio social, sentido existencial,
encontro consigo e com Deus, paz e equilíbrio para a vida cotidiana (RODRIGUES 2003).

Já no caso do Satanismo, este é assim denominado porque Satã é uma imagem útil para
encorajar o individualismo, sendo que os que assim se assumem gostam de passar uma
atmosfera assustadora. Assim, por trás desta máscara de maldade, os fiéis são encorajados
a ceder aos seus anseios, assumindo uma personalidade hedonista. Além disso, é para
parecer mais interessantemente sinistras que algumas pessoas começaram a usar o rótulo
de “satanista” (HARVEY, 2002).

Bessa (2006) percebeu que a negação e a hipervalorização do corpo são duas


possibilidades de expressão do feminino nos contextos neopentecostais em que está

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 95
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

presente o movimento de batalha espiritual. Assim, o feminino fica preso na identidade


masoquista (negação da sexualidade e postura submissa) ou histérica (onde a rebelião é
condenada e vira objeto de exorcismo).

A Perfeita Liberdade (PL), por sua vez, oferece uma alternativa à identidade feminina
moderna, pois as mulheres encontram possibilidades de reformulação de seus papéis
através de um modelo mais tradicional (ALBUQUERQUE & SOUZA 2002).

Existem também ritos de iniciação influenciando a identidade de fiéis, como é o caso da


cultura bantu, que pratica rituais revestidos de significados de morte e renascimento para
uma nova personalidade a ser incorporada na idade adulta. A autoconsciência que a
africana possui, de ser madura e responsável, é obtida por meio destas iniciações
(KIMBANDA 2006).

Ainda no que tange à influência religiosa para a identidade pessoal do fiel, ao estudar o
comportamento homossexual pedófilo de um padre católico, Massih (2006) ressalta a
importância de analisar a constituição da sexualidade do sujeito e a relação da mesma com
a sua religiosidade, levando mais em conta a singularidade das pessoas do que teorias
gerais do desenvolvimento.

Com tudo isso em vista, percebe-se que os processos de aquisição de crenças religiosas
interferem tanto na autoimagem do fiel quanto na percepção que ele tem do mundo e dos
eventos que o envolvem, influenciando, portanto, sua personalidade. Em virtude desta
influência, e diante das restrições sexuais impostas por algumas doutrinas às mulheres em
especial (a exemplo das neopentecostais, conforme BESSA 2006), surge a identificação
masoquista para aquelas que negam sua sexualidade, ou as saídas histéricas para as que a
supervalorizam. Por outro lado, oferecendo uma alternativa mais tradicional para a
identidade feminina moderna, viu-se que religiões como a PL conseguem adeptos
justamente por apresentar um modelo diferenciado de feminilidade para suas identidades.

Defendeu-se ainda a ideia de que o sentido existencial e as experiências emocionais e


sociais aliadas ao universo religioso proporcionam uma identificação afetiva com a religião
(RODRIGUES, 2003). Em contrapartida, há quem escolha religiões que defendem o

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 96
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

hedonismo e encorajam o individualismo, mostrando que de fato a identidade dos adeptos


tanto é influenciada pela escolha da filiação religiosa, quanto a influencia, já que alguns dos
fiéis escolhem denominar-se satanistas na intenção de passar uma aparência mais sinistra
nos relacionamentos sociais, por exemplo. Desta forma, a influência da religiosidade na
identidade das pessoas chega ao extremo de oferecer rituais de passagem para uma nova
identidade, como mostrou uma das publicações em questão (KIMBANDA 2006).

Uma vez que os valores e normas religiosas acabam por influenciar a identidade de seus
adeptos, considerou-se então a possibilidade de também os grupos religiosos congregarem
características psicológicas e comportamentais do grupo como um todo, conforme pôde ser
observado na unidade de análise que segue abaixo, emersa dos dados encontrados.

Características psicológicas e comportamentais de grupos religiosos


Uma vez que está clara a influência religiosa na identidade pessoal do fiel, foi constatado
que, dos 27 artigos que versam sobre Religião e Psicologia, cinco tratam de apontar
características psicológicas e comportamentais de grupos religiosos específicos: no Seicho-
no-ie e na Perfect Liberty (PAIVA 2002), no Judaísmo (KOCHMANN 2005), no Catolicismo
(MORANO 2006; VALLE 2006) e até mesmo de pessoas que se declaram sem religião
(RODRIGUES 2007).

Na discussão de características psicológicas envolvidas na adesão às novas religiões


japonesas (Seicho-no-ie e Perfect Liberty), Paiva (2002), valendo-se dos conceitos
lacanianos de imaginário e simbólico, discrimina a natureza dessa adesão. Explica a
existência de dois grupos: o Grupo Imaginário, que mantém a articulação simbólica de
origem (católica), acrescentando-lhe elementos do imaginário (Seicho-no-ie ou Perfect
Liberty); e o Grupo Simbólico, que inaugura uma articulação simbólica nova (Seicho-no-ie ou
Perfect Liberty), retendo apenas imaginariamente elementos do Catolicismo. Nas
entrevistas, observou-se que os adeptos da Seicho-no-ie tendem a manter o simbólico
católico e os adeptos da PL a assumir o simbólico da Perfect Liberty. A razão dessa
diferença reside no caráter doutrinal das duas novas religiões: a Seicho-no-ie refere-se
explicitamente a Cristo, a sua missão e às escrituras cristãs; a Perfect Liberty não tem
nenhuma palavra acerca de Cristo ou das escrituras bíblicas. Por isso, o contato de católicos

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 97
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

com a Seicho-no-ie permite a manutenção da referência simbólica católica modificada. Ao


contrário, o contato com a Perfect Liberty leva à adoção de uma referência simbólica sem
lugar para o simbólico cristão.

Para Kochmann (2005), o lugar da mulher dentro do Judaísmo deve ser analisado à luz do
contexto histórico em que se desenvolveu, pois ele variou segundo a conjuntura histórica,
social, política e religiosa. Como hoje se tornou desagradável para a mulher judia ouvir as
bençãos matinais em que os homens agradecem por não terem nascido mulher, muitos
livros de orações substituíram os agradecimentos por não ser mulher, por agradecimentos
por ter sido feito à imagem e semelhança de Deus. Além disso, como citado anteriormente,
muitas judias reclamaram o direito de estudar a fim de se formar rabinas, o que foi acatado
pelos movimentos mais liberais, retratando mudanças tanto nas características psicológicas
quanto nas comportamentais dos adeptos dessas correntes.

Quanto ao Catolicismo, Morano (2006) transcorre sobre as dificuldades ligadas ao celibato


pela impossibilidade de contrair matrimônio e pelas histórias fantásticas que a mídia tem
contado sobre infidelidade e abuso. Apesar disso, o autor traz a sublimação como o
mecanismo de defesa através do qual se torna possível uma vida plena no celibato, a
despeito da necessidade de manter-se a virgindade/castidade.

Valle (2006), por sua vez, discorre sobre os posicionamentos da Igreja Católica ante a
homossexualidade e o auxílio que julga necessário por parte da Psicologia. Explica que o
problema da homossexualidade entre seminaristas, religiosos (as) e sacerdotes não pode
ser ocultado. Compreender melhor o fenômeno homossexual em todas as suas dimensões
pede um trabalho mais consciencioso nos relacionamentos e procedimentos formativos dos
mesmos. Para isso, segundo o autor, os psicólogos e formadores de seminaristas não
deveriam esperar passivamente que as instruções cheguem de cima indicando qual a prática
a ser seguida.

Pesquisando as características dos que se dizem sem religião, Rodrigues (2007) constatou
que apenas parte dos entrevistados é de ateus ou descrentes; outra parte é de pessoas de
fé e com espiritualidade, porém apenas desvinculadas de instituições religiosas. Criticando
algumas delas, os sujeitos da pesquisa apresentavam um profundo descontentamento com

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 98
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

o sistema vigente, com seus líderes religiosos e suas normas, mostrando que os dogmas já
não são mais tão facilmente absorvidos, nem as regras acatadas. Dentre as críticas
presentes em ambos os grupos de entrevistados estão o excesso de normas, manipulação,
fanatismo, intolerância, hipocrisia, falsidade, incoerência.

A partir dos artigos que versavam sobre características psicológicas e comportamentais de


grupos religiosos, constatou-se que enquanto a religião influencia a identidade de seus fieis,
é comum que os grupos religiosos acabem por adquirir características que lhe são
peculiares, como é o caso do descontentamento com o sistema, com líderes religiosos e
suas normas apresentado pelo que se dizem sem religião. Da mesma forma, surgem como
vivências destacadas tanto o homossexualismo quanto as dificuldades vindas da
impossibilidade de casar-se para os grupos de celibatários católicos; ou, ainda, a evolução
conquistada pelas adeptas quanto ao reconhecimento da mulher no Judaísmo, por exemplo.

Ao mesmo tempo em que a religião influencia a identidade dos seus fiéis e constrói com isso
características grupais que se tornam típicas daquele sistema, incentiva comportamentos
que acabam por influenciar os relacionamentos interpessoais de seus adeptos, como pode
ser observado na próxima categoria de análise emersa das publicações estudadas.

Valores e normas religiosas e os relacionamentos interpessoais


Dentre as publicações desta revista que deliberam sobre Psicologia e Religião, quatro
trataram de valores e normas religiosas e os relacionamentos interpessoais. São elas:
STADTLER (2002); VALLE (2002); BIDEGAIN (2005); BAUNGART & AMATUZZI (2007).

Stadtler (2003) constatou que a conversão ao Pentecostalismo provoca alterações na


socialização dos fiéis, influenciando a formação de vínculos, o sentimento de pertinência, a
execução de papéis, e até mesmo a percepção do mundo. Assim, ao ir transformando o
modo de pensar dos fiéis, acaba gerando mudanças nas formas de interação de seus
seguidores com o mundo ao redor.

Em consenso com os resultados encontrados por Stadtler (2003), Baungart & Amatuzzi
(2007) constataram que a experiência religiosa dos participantes de sua pesquisa contribuiu
para uma mudança subjetiva com consequente modificação de comportamentos,

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 99
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

provocando crescimento pessoal através da maior tolerância nos relacionamentos


interpessoais, da inserção em grupos sociais, do autoconhecimento e desenvolvimento da
empatia.

Para Valle (2002), o universo religioso exerce uma função de inserção e/ou reinserção do
indivíduo em um grupo, um meio sociocultural motivador e dotado de sentido. O
estabelecimento da monogamia cristã, por exemplo, implicou na consolidação do processo
de aculturação (família como pedra angular da sociedade), bem como na adoção de padrões
ocidentais de organização social, elemento crucial das relações sociais (BIDEGAIN, 2005).

Assim, percebe-se que enquanto Bidegain (2005) e Valle (2002) consideram a influência
religiosa nos relacionamentos de uma forma mais ampla e indireta (através da cultura cristã
ocidental), Stadtler (2003), Baungart & Amatuzzi (2007) o fazem considerando esta
influência de uma maneira mais focada e direta, em que os próprios ditames religiosos são
incorporados nos sistemas de valores pessoais e a partir daí influenciam relacionamentos e
comportamentos interpessoais.

Desta forma, pôde-se vislumbrar o alcance da influência que valores e normas religiosas têm
sobre os relacionamentos interpessoais. Percebeu-se que com a internalização de dogmas
que pregam o amor ao próximo aumentam a empatia e a tolerância nos relacionamentos, ao
mesmo tempo em que participar de grupos religiosos insere a pessoa em um contexto de
socialização com outros que possuem ideias afins.

Valores e normas religiosas e a sexualidade dos fiéis


Encontraram-se dez trabalhos que versam sobre valores e normas religiosas e a sexualidade
dos fiéis. São eles: ALBUQUERQUE & SOUZA (2002); RODRIGUES (2003); BIDEGAIN
(2005); PIMENTEL (2005); BESSA (2006); GOMES (2006); KIMBANDA (2006); MASSIH
(2006); MORANO (2006) E VALLE (2006).

Vergote (2001) já havia apontado para a utilização da culpa pela sexualidade como
argumento para o posicionamento de profissionais que defendem a ideia de que a religião é
nociva à saúde mental (VERGOTE 2001). Neste sentido, apenas um estudo publicado pela
REVER aponta exclusivamente os prejuízos trazidos pela religiosidade à saúde e à

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 100
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

sexualidade (BIDEGAIN 2005). Em contrapartida, também apenas um estudo frisa apenas


os benefícios da religiosidade para o funcionamento sexual e da saúde pessoal
(ALBUQUERQUE & SOUZA, 2002).

Enquanto Bidegain (2005) enfatiza o prejuízo à sexualidade devido à repressão, falando da


religião cristã como forma de controle social, político e econômico (e caracterizando-os
quase como uma imposição ou, se não isso, um automatismo), Albuquerque & Souza (2002)
enfatizam benefícios à sexualidade falando da religião PL como uma alternativa aos papéis
femininos modernos através de um modelo mais tradicional (caracterizando-o mais como
uma escolha ou possibilidade). Para Bidegain (2005), através da repressão à sexualidade
feminina e do casamento monogâmico e heterossexual promovidos pelo Cristianismo, a
formação de lares para educar os filhos foi um meio de socialização da moral e da política,
e, portanto, um núcleo fundamental das relações de poder. Já Albuquerque & Souza (2002)
acreditam que os processos de racionalização da modernidade têm sido insuficientes para
fornecer realização de metas sociais, abrindo espaço para religiões que, como a PL,
oferecem alternativas aos papéis femininos modernos.

Por outro lado, oito publicações efetuaram o discurso antagônico, apontando tanto os
benefícios quanto os malefícios da religiosidade à saúde e sexualidade (RODRIGUES 2003;
PIMENTEL 2005; BESSA 2006; GOMES 2006; KIMBANDA 2006; MASSIH 2006; MORANO
2006; VALLE 2006).

A história da moral cristã mostra especial dificuldade em situar o lugar ético e antropológico
do prazer sexual. As formas de enxergar a sexualidade negam qualquer espaço e valor à
sexualidade. Todavia, compreender melhor questões como, por exemplo, o fenômeno
homossexual, pede um trabalho mais consciencioso nos relacionamentos, podendo-se agir
com respeito, sem ferir o que igreja pede (VALLE 2006).

Além disso, foi percebido que algumas mulheres apresentam uma lacuna entre a orientação
da igreja sobre sexualidade e suas condutas sexuais efetivas. Essas orientações foram
questionadas pelas seguidoras e adaptadas às suas realidades, apesar de terem sido
mantidas orientações católicas a cerca de outros valores morais e éticos (a fortificação
espiritual, o acolhimento social e a comunhão, que lhes trazem sentido de vida). Entretanto,

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 101
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

para chegarem nesse estado, passaram por um processo conflitante a fim de ampliar a
consciência, integrando a sexualidade de forma saudável, sem perderem a identidade
religiosa (RODRIGUES 2003).

Já no que diz respeito à repressão da sexualidade feminina feita pela Igreja Universal do
Reino de Deus (IURD), esta mostra que a submissão à vontade masculina é a regra geral
para as mulheres, sendo comum que elas sejam vistas como "porta de entrada do mal”.
Além disso, por acreditarem na ação do demônio, podem alienar-se pela projeção da culpa
em algo externo; por outro lado, observando as fiéis, fica claro o fato de que por mais que
isso retire da pessoa a culpa sobre seus atos, não tira a responsabilidade que ela tem de
libertar-se. Assim, o exorcismo traz a chance de encontrar alívio para os conteúdos
opressores através da projeção na figura do demônio e da catarse proporcionada pelo ritual
(PIMENTEL, 2005).

Em concordância com estas ideias, Bessa (2006) explica que o movimento da batalha
espiritual na IURD repreende não apenas a sensualidade da mulher, como também
comportamentos ligados à feminilidade (não somente por suscitar o desejo, mas por levar o
homem à tentação). Entretanto, ao demonizarem a histérica, as líderes dos movimentos de
batalha espiritual tornam-se semelhantes a ela (talvez sublimando esses traços numa
possibilidade de externá-los não como sexualmente sedutoras, mas como religiosamente
sedutoras), pois assim elas impõem seus desejos, demandam atenção e exigem uma escuta
a seus argumentos, o que possibilita sua sexualidade e expressão.

Indo também ao encontro desta forma de avaliar a postura dos grupos protestantes, pois
Gomes (2006) defende o pensamento de que as crenças religiosas determinam as ideias
sobre o corpo humano e a prática sexual. Assim, o conceito do corpo como habitação do
demônio é comum, o que libera a consciência de responsabilidades éticas e morais,
subordinando o fiel ao exorcista. Porém, o autor esclarece que existem diversos tipos de
vivência religiosa, algumas patológicas e outras formadoras de personalidades sadias.

Morano (2006), como visto anteriormente, transcorre sobre as dificuldades ligadas ao


celibato pela proibição da prática sexual concomitante com a divulgação de histórias de
abuso. O autor traz a sublimação como o mecanismo de defesa através do qual se torna

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 102
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

possível uma vida plena no celibato, a despeito da necessidade de manter-se a


virgindade/castidade. Entretanto, fala também da existência de celibatários que caem no que
ele chama de enfermidade do idealismo, criando discursos sobre virgindade e celibato que
deixam ver um fundo mórbido e obscuro, fazendo pensar mais em uma sexualidade negada
e corrompida do que em sublimação propriamente dita.

No caso de pedofilia de um padre católico analisado no artigo de Massih (2006), fala-se do


contato do sujeito com ambientes religiosos (seminários) onde lhe ensinaram a lidar com o
problema através de penitências e de rituais de autoflagelação. Desta maneira, ao sentir que
tudo isso era insuficiente para abrandar a força de suas pulsões, desenvolveu
comportamento defensivo com rituais obsessivos. Apesar disso, a formação religiosa que
recebeu lhe foi útil para instituir um modo reparador que ativou seu potencial, fazendo-o
desenvolver modos humanitários de relação, o que vem ao encontro do pensamento de que,
se por um lado a religião pode dificultar a promoção de saúde no quesito sexualidade, por
outro lado ela pode facilitar.

Já a infibulação da mulher na cultura bantu é um costume africano, bem como de países


árabes ou islamizados que se acha arraigado em práticas religiosas, evidencia uma visão da
sexualidade feminina num lugar de características machistas, regulando, assim, a relação
conjugal homem/mulher. Neste sentido, a adulta que não é iniciada torna-se um indivíduo
não apreciado que permanece excluído da sociedade, o que deixa claro que, se por um lado
a prática causa um prejuízo para a sexualidade, por outro traz benefícios sociais
(KIMBANDA, 2006).

Assim, foi possível observar com estas publicações que a maior parte dos estudiosos aborda
tanto os prejuízos, quanto os benefícios das normas impostas à sexualidade de pessoas
religiosas. Da mesma forma, pelo menos a metade deles trata destas questões enfatizando
o alcance disso para o gênero feminino (ALBUQUERQUE & SOUZA 2002; RODRIGUES
2003; PIMENTEL 2005; BESSA 2006; KIMBANDA 2006), embora nenhum tenha justificado
ou transcorrido sobre uma possível influência concomitante da cultura paternalista/machista,
além da religiosa.

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 103
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

Como os valores e normas religiosas influenciam comportamentos e práticas, alcançando a


identidade e sexualidade de seus adeptos, nota-se também a importância de evidenciar
publicações que discorrem igualmente sobre o alcance dos mesmos na saúde dos fiéis.

Valores e normas religiosas e a saúde dos fiéis


A REVER publicou cinco artigos sobre valores e normas religiosas e a saúde dos fiéis:
PIMENTEL (2005); GOMES, 2006; KIMBANDA (2006); SILVA (2006) E HEFNER (2007), a
maioria destes já mencionado anteriormente em virtude de tratar de mais de um assunto ao
mesmo tempo, tais são os exemplos de Pimentel (2005), Gomes (2006) e Kimbanda (2006),
que falam também de sexualidade; ou ainda de Hefner (2007), que fala de traços culturais
ligados a religiosidade e influência religiosa no comportamento dos adeptos.

Como a religião faz parte da cultura, as interpretações teológicas sobre doença interferem
nos comportamentos e concepções de tratamento e prevenção, sendo que às vezes entram
em contradição com a imagem de um Deus bom. Embora as enfermidades sejam
ocorrências naturais, pergunta-se como o mal e o sofrimento estão relacionados com Deus,
que é bondoso e o único criador, na visão cristã ocidental? Na melhor das hipóteses, o saber
cristão afirma que o mal é consequência de outras intenções divinas, enquanto a cura possui
um caráter sacramental, no qual se exercita a intenção de Deus de que o ser humano seja
completo (HEFNER, 2007).

Silva (2006) afirma que estudos históricos sobre as contribuições para as Ciências Humanas
da antiga Companhia de Jesus (1540-1775) no que diz respeito a opiniões e práticas
psicológicas têm mostrado sua influência na cultura ocidental. A maioria deles analisa as
discussões teóricas e as aplicações práticas da Psicologia, demonstrando que na primeira
modernidade já havia a preocupação com questões de saúde mental e satisfação do
trabalhador por parte de religiosos.

Existem também práticas religiosas que influenciam a saúde de maneira mais direta, tal é o
caso da infibulação, e dos rituais de exorcismo analisados em algumas produções da revista.
Já foi mencionado que embora cresça a consciência de que a infibulação da mulher se põe
como um problema para a sua saúde física e psicológica na cultura bantu, essa prática
garante a inclusão social das mesmas, caracterizando que existem tanto prejuízos quanto

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 104
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

benefícios à saúde psíquica das fiéis desta religião (KIMBANDA 2006). Já no sentido da
promoção de saúde, o exorcismo praticado na IURD traz a chance de encontrar alívio para
os conteúdos opressores através da projeção na figura do demônio e da catarse
proporcionada pelo ritual (PIMENTEL 2005).

Pode-se perceber então, que existem três possibilidades de concepção da religiosidade,


uma benéfica e duas prejudiciais à saúde: das prejudiciais, uma é legalista, essencialmente
proibitiva e correspondente a uma estrutura (neurótica) de personalidade perfeccionista
ligada ao rigor do superego bíblico; outra de dependência, correspondente a uma estrutura
de personalidade (neurótica) de medo da liberdade e de conflitos com tendências
compulsivas. Por fim, existe uma terceira possibilidade: a religião do espírito, em que a
crença religiosa, longe de ser sufocante ou dissociadora, unifica as tendências, os
sentimentos, as ideias e centraliza a atitude do indivíduo no amor pelo próximo; esta é,
portanto, benéfica (GOMES 2006).

Desta forma, é possível observar que as publicações da REVER que abordam a temática da
influência dos valores e normas religiosas na saúde dos fiéis versam tanto sobre o auxílio
nos processos de promoção de saúde (PIMENTEL 2005; GOMES 2006; KIMBANDA 2006;
SILVA 2006), quanto sobre casos em que o impedem ou dificultam (GOMES 2006;
KIMBANDA 2006). Além disso, houve um artigo que versou sobre as interpretações
religiosas para os processos de saúde e doença (HEFNER 2007).

A influência da religiosidade na Psicologia Clínica


Embora tenham sido encontrados apenas cinco artigos publicados (SILVA 2001; VALLE
2001; STADTLER 2002; CAMBUY, AMATUZZI & ANTUNES 2006; PAIVA 2007) na REVER
sobre a influência da religiosidade na Psicologia Clínica, existem outros autores que
defendem a necessidade de maior investimento da comunidade científica visando uma
melhor compreensão da associação entre a religiosidade e a saúde mental (tais como
RAZALI ET ALII 1998; CAMBUY ET ALII 2006; MOREIRA-ALMEIDA ET ALII 2006; PANZINI
& BANDEIRA 2007; PERES ET ALII, 2007; WILLIAMS & STERNTHAL 2007). Além disso,
devido à relação direta existente entre ambas e o conhecimento sobre o potencial de

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 105
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

influência benéfica da religiosidade na saúde, os mesmos consideram a possibilidade de


aplicação de tais informações na prática clínica da Psicologia.

Sabe-se que as religiões (das mais primitivas às mais sofisticadas) surgiram na medida em
que os mecanismos neuropsicológicos humanos se apuraram e assumiram as
características do sentir, do agir e do pensar propriamente humanos. São características que
se vinculavam ao senso de si e dos outros em um mundo e natureza percebidos como
necessários e de alguma forma relacionados com forças ou entidades transcendentes. Essa
evolução da religião durou milhares e milhares de anos. Nas formas históricas de religião
tudo se desenrola com muita clareza. Elas se vestem de vários conceitos e rituais, mas
indicam e visam estados e percepções bem semelhantes. Entretanto, a experiência religiosa
subjacente a todas estas religiões tem pontos evidentes de contato no tocante às suas
experiências, práticas, rituais e crenças essenciais. Assim, postulando a existência de uma
mente mística (aspecto biológico relacionado à religiosidade), após meticulosa descrição do
funcionamento do cérebro e da mente, considera-se o fato das funções exercidas pelos
mesmos levarem, por si mesmas, a experiências de tipo místico. Desta forma, procura-se
ainda demonstrar que no ser humano existem condições intrínsecas para gerar estados
místicos e para proporcionar tais vivências (VALLE 2001).

Assim, analisando a existência de uma inteligência existencial/espiritual, Silva (2001), por


sua vez, pondera sobre os estudos de dois cientistas (Robert Emmons e Howard Gardner)
que discorrem sobre assunto. Para Emmons, existem cinco habilidades que caracterizariam
a inteligência espiritual: a capacidade de transcendência; a habilidade de entrar em estados
espiritualmente iluminados de consciência; a capacidade de investir em atividades, eventos
e relacionamentos carregados com senso do sagrado; a habilidade de utilizar recursos
espirituais para resolver problemas na vida e a capacidade de ser virtuoso e de se comportar
efetivamente como tal. Já Howard Gardner pensa que não se pode considerar a
espiritualidade uma inteligência perfeitamente delineada, pois isso seria prematuro, uma vez
que, na opinião do autor, não há embasamento suficiente para tal.

Indo ao encontro dessas ideias, compreende-se que a religião é um fenômeno social e


cultural, o qual inclui primeiramente concepções, atribuições e histórias relacionadas com

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 106
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

Deus ou deuses; em segundo lugar, sentimentos, afetos e emoções também relacionadas


com essas entidades; e depois então, ações, práticas e ritos relativos a essas concepções e
emoções. Assim, Paiva (2007) afirma que a Psicologia Evolucionista baseia-se na
pressuposição de que a cognição se desenvolveu como os demais órgãos do corpo por via
da seleção natural, resolvendo problemas cruciais de sobrevivência e reprodução. Sob essa
ótica, procura-se entender tanto os processos cognitivos quanto a consciência religiosa e as
ideias relativas a Deus enquanto funções de sobrevivência.

Apesar disso, Stadtler (2002) afirma que os psicólogos foram quase que proibidos de
abordar os clientes pela via da religiosidade apresentada pelos mesmos. Para a autora, esse
tipo de posicionamento positivista tem causado muitas incompreensões e problemas
profissionais devido às pressuposições assumidas sobre a vida mental dos clientes, ao
adotar-se o mesmo tratamento para situações que na verdade são bem diferentes: crença
religiosa/doença mental, racionalidade/loucura, misticismo/alucinação. Entretanto, dada a
influência da religiosidade na cultura e nos valores pessoais, o fenômeno religioso se faz
presente nos atendimentos psicológicos, existindo observações clínicas e pesquisas que
mostram tanto aspectos saudáveis, quanto psicopatológicos aliados à experiência religiosa
(CAMBUY et alii 2006).

Desta forma, para Cambuy, et al (2006) mostram que existe a necessidade de facilitar a
emergência da experiência religiosa dos clientes no setting terapêutico, atravessando a
linguagem dogmática e ajudando-os a chegarem ao âmago do vivido, desenvolvendo
atitudes profissionais e referenciais teóricos para abordar esta temática na Psicologia
Clínica. Assim, os autores propõem que seja tarefa do psicólogo, com suas atitudes e
técnicas e dentro de seu referencial teórico, permitir esta re-ligação do Homem consigo
mesmo, entendendo que o sagrado é uma dimensão subjacente ao humano. Para isso, o
profissional deverá ser capaz de facilitar a emergência da experiência religiosa em sua
pureza e originalidade próprias.

Com isso, constataram-se temáticas ligadas à influência da religiosidade na Psicologia


Clínica que ponderam sobre um aspecto biológico relacionado ao tema (VALLE 2001; SILVA
2001; PAIVA 2007), o que corrobora para a relevância de considerar o fenômeno na prática

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 107
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

clínica da Psicologia, buscando tanto compreender o cliente em sua complexidade quanto


desenvolver atitudes profissionais e referenciais teóricos para abordar esta questão.

Conclusão
Partindo da ideia de que a religiosidade das pessoas é um aspecto importante a ser
estudado pela Psicologia, dada sua influência em questões de identidade pessoal e grupal,
comportamento, sexualidade e saúde, percebe-se que hoje há o reconhecimento de estudos
que retratam esta realidade. Fugindo de posturas excessivamente positivistas, e sem deixar
o rigor científico de lado, foram encontrados 27 estudos dentre as publicações da REVER
que retratam ligações (diretas ou indiretas) entre Psicologia e religião.

Tanto se pode afirmar que as religiões estão inseridas na cultura, quanto que elas contêm
traços culturais em sua constituição. Assim, foi possível observar que os costumes
religiosos, além de influenciarem a cultura das pessoas, são eles próprios influenciados pela
conjuntura histórica, social e política do momento.

Partindo da informação de que o indivíduo constrói o autoconceito no social e continua


fundindo parte do seu eu com os grupos aos quais se agrega ao longo da vida, identificando-
se com noções, valores e práticas para poder pertencer aos mesmos, percebeu-se nos
estudos encontrados a influência da religiosidade na identidade pessoal e grupal de seus
seguidores. Pôde-se constatar que, ao ser convencido por um sistema de ideias de um
dogma religioso, o fiel integra valores e práticas como parte de seu cotidiano, tornando isso
tudo como que componentes de sua identidade pessoal. Ao mesmo tempo, os grupos
religiosos adquirem uma identidade própria, assumindo traços que os caracterizam como
únicos e os diferenciam das demais correntes religiosas existentes.

Por outro lado, foi verificado que em diversas religiões há pontos evidentes de relação no
tocante às suas experiências, práticas, rituais e crenças. Assim, a pré-existência de funções
da religião na psique passou a ser considerada em concordância com os estudos sobre
aspectos biológicos relacionados à religiosidade.

Sobre a influência de valores e normas religiosas no comportamento das pessoas, a maioria


dos artigos encontrados considera primeiramente a influência da religião nas tradições da

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 108
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

cultura da qual a pessoa faz parte, para a partir disso passar a influenciar seu
comportamento, edificando ou modificando-o. Os comportamentos influenciados por
doutrinas religiosas que foram tratados nas publicações envolvem práticas sexuais, rituais,
rigidez de atitudes na busca de salvação e comportamentos sociais sustentados por
ideologias religiosas. Como existem evidências de que a religião envolve crenças, valores e
práticas, é possível concluir que o comportamento de um fiel está sob influência de sua
religião tanto quanto de sua cultura ou família. Lança-se, assim, uma hipótese de que essa
influência seja maior na medida em que se aumente a adesão da pessoa àquela religião.

Uma vez que o comportamento está vinculado à religião, esta influência alcança também os
relacionamentos sociais. Isso acontece em meio a vários sistemas, considerando-se desde
macroalcances (sociedade), até microabrangências (dogmas específicos). Em um sentido
mais abrangente, foi possível observar com esta pesquisa que os relacionamentos são
influenciados através do alcance que valores religiosos têm na cultura de forma geral, como
é o caso da tradição cristã em incentivar os relacionamentos familiares como centro da
organização social. Num sentido mais privativo, pôde-se perceber que dogmas específicos
podem influenciar a socialização, a formação de vínculos e o desempenho de papéis com
base em normas, crenças e valores peculiares àquele grupo em questão. Assim, a influência
da religião na sociedade e desta nos relacionamentos interpessoais existe de maneira mais
indireta, enquanto que dogmas religiosos específicos influenciam a forma de seus adeptos
se relacionarem de maneira mais direta.

No que diz respeito à sexualidade, apesar das muitas condenações/restrições que algumas
religiões fazem a respeito, a maior parte das pesquisas analisadas retrata tanto os prejuízos
quanto os benefícios da religiosidade. Dentre os prejuízos mais comuns estão a culpa e a
repressão. Já quanto aos benefícios, encontram-se os sociais (aceitação do grupo com a
acedência a estes valores), projeção da culpa na influência demoníaca, sublimação da
energia sexual no celibato e alternativas mais tradicionais aos papéis da modernidade.

Neste sentido, a religião também é uma influência potencialmente benéfica para a saúde
física e mental das pessoas, muito embora existam ainda práticas questionáveis a este
respeito, tal é o caso da infibulação exercitada pela cultura bantu. Observou-se nas

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 109
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

publicações que nos ambientes religiosos existem preocupações com a saúde física e
mental; neles, a cura possui um caráter sagrado. Além disso, foi constatado que tanto
algumas práticas ritualísticas quanto o acolhimento do grupo religioso provocam alívio para
os conteúdos opressores, centralizando as atitudes da pessoa na empatia pelos
semelhantes.

Levando tudo isso em consideração, conclui-se que realmente a religiosidade das pessoas
se torna presente no contexto psicoterapêutico, uma vez que é fonte de comportamentos e
de valores internalizados como parte do self. Ignorar isto, como se fazia outrora,
corresponderia a ignorar parte da vida do indivíduo. Desta forma, em concordância com a
opinião expressa em um dos artigos encontrados sobre a influência da religiosidade na
Psicologia Clínica (CAMBUY et alii 2006), pensa-se que os profissionais devem possibilitar a
emergência da religiosidade/espiritualidade de seus clientes no setting terapêutico,
considerando a temática como parte de sua realidade e, por meio do discurso religioso (mas
sem ater-se a ele), ajudá-los a chegar ao cerne da questão. Isto pode ser considerado como
uma forma de se utilizar a religiosidade a serviço da psicoterapia, partindo da ideia de que
ambas são potencialmente capazes de promover saúde e bem estar, desde que sabiamente
utilizadas, e sem sobreposição de saberes.

Bibliografia
ALBUQUERQUE, L.M.B. 2001 “Oriente: fonte de uma geografia imaginária”. Revista de
Estudos da Religião, São Paulo, Nº 3: 114-125.
ALBUQUERQUE, L.M.B. & SOUZA, B.M. 2002 “Doutrina e Ética da Perfect Liberty no
Resgate de Papéis Femininos Tradicionais”. Revista de Estudos da Religião, São
Paulo, Nº 4: 34-46.
AMATUZZI, M.M. 1999 “Desenvolvimento psicológico e desenvolvimento religioso”. In:
MASSINI, M.; MAHFAUND, M. (org.). Diante do mistério: psicologia e senso religioso.
São Paulo: Edições Loyola, 123-140.
ANGERAMI-CAMON, V.A. 2002 “O papel da espiritualidade na prática clínica”. In:
ANGERAMI-CAMON, V.A. (org Novos rumos na psicologia da saúde. São Paulo:
Pioneira Thomson Learning, 1-46.

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 110
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

BAIRRÃO, J.F.M.H. 2004 “Sublimidade do mal e sublimação da crueldade: criança, sagrado


e rua”. Psicologia Reflexão e Crítica, Porto Alegre, V. 17, Nº 1: 61-73.
BAUNGART, T.A.A.; AMATUZZI, M.M. 2007 “Experiência Religiosa e Crescimento Pessoal:
Uma Compreensão Fenomenológica”. Revista de Estudos da Religião, São Paulo, Nº
4: 95-111.
BESSA, A.B. 2006 “A batalha espiritual e o erotismo”. Revista de Estudos da Religião, São
Paulo, Nº 1: 39-49.
BIDEGAIN, A.M. 2005 “Sexualidad, Estado, Sociedad y Religión: Los controles de la
sexualidad y la imposición del matrimonio monogámico en el mundo colonial
hispanoamericano”. Revista de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 3: 40-62.
BRUSGAGIN, C. 2004 “Família e Religião”. In: CERVENY, C.M.O. (org). Família e… São
Paulo: Casa do Psicólogo, 1-29.
BURITY, J.A. 2001 “Religião e Política na Fronteira:
desinstitucionalização e deslocamento numa relação historicamente polêmica”. Revista
de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 4: 27-45.
CAMBUY, A.; AMATUZZI, M.M.; ANTUNES, A. 2006 “Psicologia clínica e Experiência
Religiosa”. Revista de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 3: 77-93.
CARVALHO, A.M. 1999 “Sexualidade e religiosidade entre os adolescentes: um estudo
comparativo”. In: MASSINI, M. & MAHFOUND, M. (org.). Diante do mistério: psicologia
e senso religioso. São Paulo: Edições Loyola. 99-122.
DALGALARRONDO, P; SOLDERA, M.A; CORREA-FILHO, H.R.; SILVA, C.A.M. 2004
“Religião e uso de drogas por adolescentes”. Revista Brasileira de Psiquiatria, São
Paulo, V. 26, Nº 2: 82-90.
DALGALARRONDO, P. 2007 “Estudos sobre religião e saúde mental realizados no Brasil:
histórico e perspectivas atuais”. Revista de Psiquiatria Clínica, São Paulo, V. 34: 25–33.
EPELBOIM, S. 2006 “Identidade judaica: considerações psicológicas acerca da dimensão
religiosa”. Estudos de Psicologia, Campinas, V. 23, Nº 1: 47-54.
FIGUEIREDO, L.C.M. 1991 Matrizes do pensamento psicológico. Petrópolis: Vozes.
FLECK, M.P. & SKEVINGTON, S. 2007 “Explicando o significado do WHOQOL-SRPB”.
Revista de Psiquiatria Clínica, São Paulo, V. 34: 146–149.

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 111
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

GIOVANETTI, J.P. 1999 “O sagrado e a experiência religiosa na psicoterapia”. In: MASSINI,


M. & MAHFOUND, M. (org.). Diante do mistério: psicologia e senso religioso. São
Paulo: Edições Loyola, 87-96.
GOMES, A.M.A. 2006 “As Representações Sociais do Corpo e da Sexualidade no
Protestantismo Brasileiro”. Revista de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 1: 1-38.
GROISMAN, A. 2004 “Missão e projeto: motivos e contingências nas trajetórias dos
agrupamentos do Santo Daime na Holanda”. Revista de Estudos da Religião, São
Paulo, Nº 1: 01-18.
HARVEY, G. 2002 “Satanismo: realidades e acusações”. Revista de Estudos da Religião,
São Paulo, Nº 3: 1-18. Tradução por Leda Maria Perillo Seixas.
HEFNER, P. 2007 “A Religião no contexto da cultura, teologia e ética global”. Revista de
Estudos da Religião, São Paulo, Nº 2: 68-82.
KOENIG, H.G; LARSON, D.B. & LARSON, S.S. 2001 “Religion and coping with serious
medical illness”. The Annals of Pharmacotherapy. V. 35, Nº 3: 352-359.
KIMBANDA, R.W. 2006 “Excisão como Iniciação Sexual e Religiosa em Mulheres Negro-
Bantu”. Revista de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 1: 116-129.
KOCHMANN, S. 2005 “O Lugar da Mulher no Judaísmo”. Revista de Estudos da Religião,
São Paulo, Nº 2: 35-45.
LIMA, M.V.O. 2001 “Terapia cognitiva comportamental e religiosidade”. In: WIELENSKA,
R.C. (org.). Sobre comportamento e cognição – questionando e ampliando a teoria e as
intervenções clínicas e em outros contextos. Vol. 06. Santo André: ESET, 222-227.
MASSIH, E. 2006 “Obsessão, Culpa e Espiritualidade em um Religioso com Comportamento
Pedofílico”. Revista de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 1: 87-115.
MORANO, C.D. 2006 “Sexualidade e Celibato: Considerações Psicanalíticas”. Revista de
Estudos da Religião, São Paulo, Nº 1: 50-86.
MOREIRA-ALMEIDA, A; LOTUFO-NETO, F; KOENIG, H.G. 2006 “Religiousness and mental
health: a review”. Revista Brasileira de Psiquiatria, São Paulo, Vol. 28, Nº 3: 242-250.
PAIVA, J.G. 2002 “Imaginário e Simbólico: aspectos psicológicos na adesão à Seicho-no-iê e
à PL-Instituição Religiosa Perfeita Liberdade”. Revista de Estudos da Religião, São
Paulo, Nº 2: 74-84.

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 112
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

PAIVA, J.G. 2007 “Psicologia Cognitiva e Religião”. Revista de Estudos da Religião, São
Paulo, Nº 1: 183-191.
PANZINI, G.R. & BANDEIRA, D.R. 2005 “Escala de coping religioso - espiritual (Escala
CRE): elaboração e validação de construto”. Psicologia em Estudo, Maringá, V. 10, Nº
3: 507–516.
___________________________ 2007 “Coping (enfrentamento) religioso/espiritual”. Revista
de Psiquiatria Clínica, São Paulo, V. 34: 126-135.
PERES, J.F.P; SIMÃO, M.J.P. & NASELLO, A.G. 2007 “Espiritualidade, religiosidade e
psicoterapia”. Revista de Psiquiatria Clínica, São Paulo, V. 34, Nº 1: 136-145.
PIMENTEL, F.S. 2005 “Psiquê nos Domínios do Demônio – um olhar sobre a relação entre
exorcismo e cura em um grupo de mulheres fiéis da Igreja Universal do Reino de
Deus”. Revista de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 2: 22-34.
RAZALI, SM; HASANAH, CI; AMINAH, K. 1998 “Religious–sociocultural psychotherapy in
patients with anxiety and depression”. Aust N Z J Psychiatry, V. 32: 867-872.
RIBEIRO, J.C. 2004 “Os universitários e a transcendência – visão geral, visão local”. Revista
de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 2: 79-119.
RODRIGUES, A.; ASSMAR, E.M.L.; JABLONSKI, B. 1999 Psicologia Social. Petrópolis:
Vozes.
RODRIGUES, C.S.L. 2003 “Católicas e Femininas: identidade religiosa e sexualidade de
mulheres católicas modernas”. Revista de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 2: 36-55.
RODRIGUES, D.S. 2007 “Religiosos sem igreja: um mergulho na categoria censitária dos
sem religião”. Revista de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 4: 31-56.
SENGL, C.S. 2000 “Religião e Autoconhecimento”. Florianópolis. Dissertação (Mestrado em
Psicologia). Universidade Federal de Santa Catarina,
SILVA, L.M.K. 2001 “Existe uma inteligência existencial/espiritual? O debate entre H.
Gardner e R. A . Emmons”. Revista de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 3: 47-64.
SILVA, P.J.C. 2006 “Psicologia organizacional e exercício do desejo na Antiga Companhia
de Jesus”. Revista de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 4: 79-95.
SOCCI, V. 2006 “Religiosidade e o Adulto Idoso”. In: WITTER, G.P. (org). Envelhecimento:
referenciais teóricos e pesquisas. Campinas: Editora Alínea, 87-102.

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 113
Revista de Estudos da Religião dezembro / 2009 / pp. 84-114
ISSN 1677-1222

STADTLER, H. 2002 “Conversão ao pentecostalismo e alterações cognitivas e de


identidade”. Revista de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 2: 112-135.
VALLE, E. 2001 “Neurociências e religião: interfaces”. Revista de Estudos da Religião, São
Paulo, Nº 3: 1-46.
_________ 2002 “Conversão: da noção teórica ao instrumento de pesquisa”. Revista de
Estudos da Religião, São Paulo, Nº 2: 51-76.
_________ 2006 “A igreja católica ante a homossexualidade: ênfases e deslocamentos de
posições”. Revista de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 1: 153-185.
VERGOTE, A. 2001 “Reflexões”. In: PAIVA, G.J. (org.). Entre necessidade e desejo:
diálogos da psicologia com a religião. São Paulo: Loyola, 9-24.
WILLIAMS, D. R. & STERNTHAL, M. J. 2007 “Spirituality, religion and health: evidence and
research directions”. Austrália: MJA Vol. 186, Nº 10.

www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf 114
Religião, enfrentamento e cura: perspectivas psicológicas

Religion, coping, and cure: psychological perspectives

Geraldo José de PAIVA1

Resumo
Discute-se, a partir da etimologia da palavra, mas do ponto de vista da Psicologia, o conceito de cura como cuidado e como
recuperação da doença, relacionando-o em particular com o enfrentamento religioso, forma específica de cuidado consigo e
com outrem. Distinguem-se várias possíveis relações entre cura e religião, que determinam o sentido da pergunta de Pargament
acerca da singular eficácia do enfrentamento religioso na cura da doença. Defende-se que a Psicologia, como ciência empírica,
não é competente para se pronunciar quanto à eficácia do religioso no enfrentamento, embora o possa fazer quanto à eficácia
do sagrado. Reconhecem-se, daí, competências diversas ao psicólogo, ao teólogo e ao agente pastoral.
Unitermos: cura; enfrentamento religioso; psicologia da religião.

Abstract
The concept of cure, as care and as recovery from illness, is discussed according to its etymology from a psychological perspective especially
in relation to religious coping, which is a particular manner of care. Several possible relations between cure and religion are distinguished and
frame out the meaning of Pargament´s question about the unique efficacy of religious coping in the cure process. It is argued that psychology,
as an empirical science, is unable to assess the religious coping efficacy, although it may do about the sacred efficacy. Diverse competences
are, therefore, acknowledged to psychologists, theologians and pastoral agents.
Uniterms: cure; religious coping; psychology of religion.

Um antigo provérbio latino dizia medicus curat, significam cuidar de alguma coisa ou estar dela
Deus sanat, isto é, o médico cura, Deus sara. Se o médico descuidado.
cura, ainda haverá lugar para Deus sarar? Sem dúvida, no caso da saúde e da doença o
RELIGIÃO, CURA E PSICOLOGIA

Uma reflexão psicológica acerca das relações verbo curar/cuidar é muito apropriado. Cuidar da saúde,
entre religião, enfrentamento e cura poderia começar por exemplo, sugere atenção com a saúde antes da
pela etimologia da palavra cura. Curar, em latim, significa instalação da doença. Cuidar da doença, ou do doente,
literalmente “cuidar”. Muitos termos do português significa ter cuidado para a saúde não se deteriorar ou o
conservaram esse sentido literal: curador, curatela, doente não piorar.
curioso. Outros termos há, como procurar, descurar, Como o resultado do cuidado é muitas vezes o
segurar (de se-curus, sem cuidado), que literalmente retrocesso da doença e a melhora do organismo, curar,
▼▼▼▼▼

1
Universidade de São Paulo, Instituto de Psicologia, Departamento de Psicologia Social e do Trabalho. Av. Prof. Mello Moraes, 1721, 05508-020, São Paulo,
SP, Brasil. E-mail: <gjdpaiva@usp.br>. 99

Estudos de Psicologia I Campinas I 24(1) I 99-104 I janeiro - março 2007


curar-se, passou, por metonímia, a significar sarar. “Eu outras mais. Para a Psicologia da religião, no caso do
me curei” atualmente não quer dizer “eu me cuidei”, mas cristianismo, a motivação é impregnada pelo valor da
“eu sarei”. Quando se diz que o médico cura, geralmente caridade e da fraternidade.
se entende que ele consegue fazer a pessoa sarar. O Não há dúvida de que na história do cristianis-
remédio cura porque contribui para que o organismo mo, ontem e hoje, o cuidado pelos enfermos é uma das
reaja e se recupere. Aplica-se um curativo não simples- manifestações mais patentes de sua presença no
mente porque se cuida de uma ferida, mas porque se mundo. Se, muito em função do desconhecimento geral
aplica um elemento ativo que contribui para a reação no campo da saúde, esse cuidado foi, no passado, mais
restauradora do organismo. A cura, então, pode ser remediativo do que preventivo, hoje, em razão dos
entendida como cuidado e como resultado desse novos conhecimentos e de novas sensibilidades, a
cuidado, a recuperação da saúde. psicologia em geral e a psicologia da religião apontarão
O conhecimento moderno aí está para esclarecer novos ou renovados elementos motivacionais, como
que a saúde se recupera com os cuidados higiênicos, responsabilidade social, senso de justiça, direitos da
alimentares e outros que se prestam ao enfermo, e que pessoa, respeito ecológico, elementos que adquirem
a doença é impedida com os cuidados que se prestam uma dimensão religiosa caso incluam uma intenciona-
à saúde. Nesse sentido, tanto a remediação como a lidade religiosa. É, com efeito, a relação com o objeto
prevenção são formas de cuidar ou de curar. religioso que torna religiosa uma variável, e não sua
Há um estudo notável do sociólogo da religião categorização em alguma classe especial de compor-
Rodney Stark, “O crescimento do cristianismo” (The rise tamentos.
of Christianity) (Stark, 1997), com o subtítulo “como o
obscuro e marginal movimento de Jesus tornou-se, Saúde/doença, religião e cura
dentro de poucos séculos, a força religiosa dominante
no mundo ocidental”. Segundo Stark, uma poderosa Há numerosos estudos a respeito da correlação
razão da mortalidade dos pagãos, da sobrevivência dos entre religião e saúde, religião e doença, religião e cura
cristãos e da conversão dos pagãos ao cristianismo foi (Paiva, 1998a). Além da tradicional relação geral entre
a maneira de os cristãos e os pagãos, respectivamente, religião e saúde (Amundsen, 1987; Sullivan, 1987), alguns
cuidarem ou deixarem de cuidar de seus doentes por autores chegam a se perguntar pela existência de um
ocasião das grandes epidemias que assolaram o império fator religioso na saúde e na doença (Levin & Schiller,
romano nos primeiros séculos da era cristã. A caridade, 1987; Piedmont, 1999, para uma discussão não da
ou seja, o amor ao próximo induziu os cristãos, diferen- religiosidade mas da espiritualidade). Outros estudiosos
temente dos pagãos, a providenciar para os irmãos de estão interessados com a relação, do tipo que for, entre
fé cuidados elementares, como “simples provisão de religião e saúde/doença mental (Pargament, 1997, 2001),
comida e água que permitem aos temporariamente paralelamente àqueles que se interessam pela relação
enfraquecidos lutar por si mesmos pela recuperação entre religião e saúde/doença física (Argyle, 1993; Argyle
em vez de perecer miseravelmente” (McNeill, 1976, & Beit-Hallahmi, 1975; McIntosh & Spilka, 1990). Há,
citado em Stark, 1997, p.88). Esse cuidado, segundo Stark, contudo, os que acautelam para a falta de uma
não só preservou proporcionalmente muito mais vidas metodologia realmente epidemiológica, isto é, ampla
de cristãos do que de pagãos como encaminhou o suficiente para abarcar longitudinal e transversalmente
conversões de pagãos ao cristianismo. os entrelaçamentos de religião e doença, capaz de
Como cuidado, a cura pode suscitar a indagação estabelecer a relação ou a ausência de relação entre
do porquê e pode ser encarada pela Psicologia como saúde/doença e religião (Stenger, 2002; Weaver, 2002).
G.J. PAIVA

um comportamento motivado. A variável motivadora Em evidente conexão com essas discussões,


ora é a pressão grupal para a coesão e a sobrevivência coloca-se a questão da cura pela religião. Note-se que
do pequeno grupo, ora o altruísmo que leva alguém a essa questão não é apenas psicológica e médica, mas
se sacrificar pelo bem do outro, ora um senso de dívida também teológica. Há religiões essencialmente de cura,
100 e retribuição, como o gerado pelas relações parentais e como a religião délfica. Há outras, como o budismo,

Estudos de Psicologia I Campinas I 24(1) I 99-104 I janeiro -.março 2007


em que a cura é desnecessária. E outras, como o cris- Um bom resumo da situação atual é oferecido
tianismo, consideram a cura às vezes fim em si mesma, por Ellison (1998), coordenador do Simpósio Religião,
embora parcial, e às vezes sinal de outra realidade final. Saúde e Bem-Estar, no Journal for the Scientific Study of
A psicologia da religião tem de haver-se com Religion. Ellison registra que “embora os achados
essas várias modalidades religiosas: ela não tem uma empíricos não sejam inequívocos, as resenhas sistemá-
palavra única para a relação entre religião e cura porque ticas [dos estudos] têm registrado consistentemente que
o comportamento religioso é variado em sua signi- vários aspectos do envolvimento religioso estão ligados
ficação. Em outras palavras, como as formas religiosas a resultados desejáveis da saúde mental” e que “várias
são históricas, a psicologia só se aplicará com compe- investigações recentes, ... usando rigorosos métodos
tência a uma modalidade religiosa se apreender seu analíticos, também registram efeitos salutares de
sentido. Numa cultura, por exemplo, em que saúde e diversos indicadores de envolvimento religioso numa
doença são consideradas holisticamente extensões da ampla gama de resultados de saúde física e mental”
relação com a divindade, como na antigüidade organi- (1998, p.692).
zada ao redor da religião (Vergote, 2001), a cura só pode A explicação desses achados pode ser buscada,
ser religiosa, pela definição dos termos. do ponto de vista psicológico, na eficácia da religião
Numa cultura moderna, em que se reconhece a em promover comportamentos saudáveis e restringir
autonomia dos diversos segmentos da vida individual comportamentos nocivos; na influência da religião nos
e social, a saúde e a doença não têm de passar pela estilos de vida pessoal; na integração e apoio, favorecidos
definição religiosa ou, se o fazem, é num sentido bas- pelos atos religiosos sociais; na intensificação dos
tante peculiar. Se tomarmos o caso do cristianismo, sentimentos de auto-estima e de auto-eficácia providos
encontraremos entendimentos diversos dessa relação pela religião; no enfrentamento das situações estressan-
na antigüidade e na modernidade. O interessante é que tes num quadro de referência religioso e, possivelmente,
subsistem em geral nas pessoas dimensões antigas e nas alterações das conexões psiconeuroimunológicas
modernas, de modo que idealmente às vezes nos ou neuroendócrinas que afetam os sistemas fisiológicos
comportamos como pré-modernos, vendo por (Cohen & Herbert, 1996; Ellison, 1998; Kiecolt-Glaser,
exemplo na saúde a bênção de Deus e na doença sua McGuire, Robles & Glaser, 2002).
punição, e às vezes como modernos, vendo na saúde o
resultado de feliz disposição genética, de recursos A discussão psicológica da cura pelo
econômicos e de conhecimento para cuidar da higiene enfrentamento religioso
e da alimentação.
E é também interessante que antigüidade e Um dos enfrentamentos possíveis da situação
modernidade ainda hoje se encontram no campo das das doenças física e mental, ao lado do profano, ou
próprias religiões. As religiões assentadas na comunhão secular, é o enfrentamento religioso (Pargament, 1997),
com a natureza e com as forças cósmicas e semelhantes que utiliza recursos da ordem religiosa para entender a
tendem a uma visão pré-moderna, que não circuns- doença e lidar com ela. Freqüentemente as urgências
creve limites às várias áreas da existência. Nessas pessoais ou situacionais são enfrentadas pelas pessoas,
RELIGIÃO, CURA E PSICOLOGIA

religiões, a análise psicológica do comportamento ao menos em parte, com o recurso religioso de orações,
religioso ligado à saúde não se poderá basear no promessas, peregrinações, exercícios ascéticos e ações
pressuposto “moderno” que distingue o aspecto reli- rituais, conforme as várias religiões, inclusive cristãs. No
gioso do aspecto da saúde. No âmbito da cultura cristã cristianismo, em particular, uma das manifestações mais
contemporânea, o caráter moderno revela-se nos indicativas da presença do reino de Deus foram as curas
estudos predominantemente correlativos entre religião, físicas e algumas curas que hoje chamaríamos de
doença e saúde. Nexos causais tendem a reduzir a psíquicas ou de psicossomáticas, curas essas muitas
distinção entre os vários segmentos da experiência vezes solicitadas pelo doente ou por outras pessoas. É
humana, ao passo que nexos correlacionais mantêm, notável que essas curas geralmente não terminavam
em princípio, essa distinção. no bem-estar físico ou psicológico, mas apontavam para 101

Estudos de Psicologia I Campinas I 24(1) I 99-104 I janeiro - março 2007


um tipo de bem-estar religioso, concretamente a com conceitos, modelos e métodos próprios. No caso
libertação do pecado e a união com Deus. do enfrentamento, a psicologia tem buscado interagir
com disciplinas biológicas, como a fisiologia e a
A pergunta “Será possível à Psicologia estabe-
psiconeuroimunologia, e com disciplinas sociais, como
lecer a existência e a eficácia do enfrentamento reli-
a antropologia.
gioso?” tem como ponto de partida o reconhecimento,
por parte de Kenneth Pargament (Pargament, 1996), do Quando se depara com o comportamento
extraordinário poder da religião, que o levou a indagar religioso utilizado em situações de urgência pessoal e
“se a religião não acrescenta ao enfrentamento algo social, a Psicologia, em virtude de seus próprios
além do que é fornecido pelo mundo secular” princípios, está autorizada a emitir um juízo acerca do
(Pargament, 1996, p.231). Ele cita, com efeito, alguns comportamento, da motivação e da eficácia desse
estudos que demonstram efeitos singulares do comportamento. Se, como ciência empírica moderna,
enfrentamento religioso. Um exemplo é o seu estudo a Psicologia se abstém de incluir qualquer transcen-
realizado em 1990, que evidenciou a diferença, pequena dência em seus pressupostos epistemológicos e
mas estatisticamente significante, no comportamento metodológicos, penso que lhe escapa pronunciar-se
de esquiva segundo a utilização do enfrentamento acerca do propriamente religioso do comportamento.
profano ou do enfrentamento religioso (Pargament et Desse ponto de vista, não penso que lhe seja possível
al., 1990). responder à pergunta de Pargament relativa a uma
eficácia distinta da eficácia secular alcançada pelo
Nesse estudo, o enfrentamento secular levou a
enfrentamento religioso. Em outras palavras, parece-
uma esquiva que apenas desviou a atenção de pensa-
-me uma pergunta mal situada. Não se negam os
mentos penosos, ao passo que o enfrentamento religioso
resultados das pesquisas que apontam uma eficácia
conferiu sentido, estabilidade e conforto. Pargament se
diferente e superior do enfrentamento religioso
pergunta em que consiste a singularidade do enfrenta-
(Pargament, 1990), mas nega-se a possibilidade de a
mento religioso e responde com duas ordens de
Psicologia alcançá-lo em sua qualidade religiosa. A
argumento. No artigo de 1990 apela para a versatilidade
Psicologia deverá contentar-se, como ciência secular,
das religiões que as faz “adaptar-se às mudanças do
com uma avaliação secular do enfrentamento religioso.
tempo, das circunstâncias e das necessidades” exata-
Segundo Aletti (2004), não se trata de perguntar se Deus
mente graças a seu “caráter abstrato, simbólico e
ajuda, mas se crer em Deus ajuda. Esclareça-se que o
misterioso” (Pargament, 1990, p.205). O caráter protéico
crer a que Aletti se refere não é o crer religioso, mas o
e não trivial da religião tornaria possível recorrer a ela
crer psíquico.
em qualquer situação. Em texto posterior, de 1996, apela
ao que denomina “a característica mais singular” das Penso que o problema de Pargament surgiu,
religiões, isto é, o sagrado. Do sagrado detalha alguns quase inevitavelmente, da população estudada, a saber:
componentes: “ligação com os antepassados, mistério, norte-americanos ligados à cultura moderna do
sofrimento, esperança, finitude, entrega, propósito cristianismo. Em parte reagindo à delimitação dessa
divino, redenção” (Pargament, 1996, p.232), e propõe que cultura e em parte suspeitando de um enquadramento
o sagrado, em virtude de não se subordinar a nenhuma mais amplo possível para sua questão, Pargament se
finalidade psicológica ou social, confere à pessoa refere ao conceito de sagrado como capaz de explicar a
religiosa um entendimento e uma capacidade de reação singularidade do enfrentamento religioso (Pargament,
peculiares frente aos acontecimentos que fogem a seu 1990, 1996). Seria o sagrado que faria a procura religiosa
controle. da significância, isto é, do sentido e da relevância,
G.J. PAIVA

Como ciência moderna, a Psicologia tem peculiar e potencialmente tão poderosa? Se a pessoa,
estabelecido como seu objeto os fenômenos que em outras palavras, consegue dar ao evento que a aflige
ocorrem na faixa da realidade humana situada entre o uma significação e uma importância garantidas pelo
puramente lógico e o puramente biológico, ou seja, o sagrado, ela certamente haure um sentido novo e uma
102 psíquico, e tem avançado no entendimento desse objeto força sobre-humana.

Estudos de Psicologia I Campinas I 24(1) I 99-104 I janeiro -.março 2007


Em parte podemos reconhecer tal explicação Essas realidades são percebidas como inerentes
como boa. Pargament (1996), entretanto, parece atribuir ao mundo e reveladoras de um mistério (Vergote, 1997).
ao sagrado características de ordens diversas: fim em si Em comparação, por meio do diferencial semântico
mesmo, ligação com os antepassados, mistério, espe- com o Deus cristão, o sagrado é percebido na dimensão
rança, finitude, entrega, propósito divino, redenção. de profundidade, ao passo que Deus é percebido tanto
Algumas dessas características são propriamente na dimensão de profundidade como na de altura.
sagradas, outras são religiosas, de fato cristãs. A ligação Associações com profundidade são, por exemplo, “tocar
com os antepassados, o mistério que envolve o sofri- no que temos de mais pessoal, íntimo, secreto; revelar
mento e a finitude e um fim não subordinado a finali- ao homem seu valor único; invadir todo o ser; ser
dades psicológicas ou sociais são qualificações do encontrado quando o homem entra em si; fazer aceder
sagrado que se pode descrever como o domínio à autenticidade, fonte e origem; dar seriedade e peso às
transicional entre o mundo profano e o Deus da religião coisas; enraizar-se nas forças vitais; mistério”. Associações
(Vergote, 1974, 1997). Mas propósito divino, redenção e, com altura são, entre outras, ligações positivas com
nesse contexto, esperança parecem claramente “força, excesso, potência, soberania, majestade,
qualificações religiosas, que apontam para o Deus dominação, sublimidade, fascínio, glória, admiração”
cristão. Enquanto, pois, Pargament situa-se no terreno (Vergote, 1997).
do sagrado, acredito que ele permaneça no território Percebe-se, pois, o sagrado como realidade
do empírico, do natural, embora de grande profun- essencialmente humana mas aberta, o que lhe dá o
didade, que a Psicologia como ciência pode alcançar caráter de “domínio transicional” (Vergote, 1974) para o
(Vergote, 1997). religioso, percebido como transcendente à realidade
Certamente, as pessoas cujo enfrentamento humana. Com base nesse entendimento, foi possível
“religioso” tem a natureza de um enfrentamento “sagra- atribuir ao sagrado de Pargament não só grande profun-
do” mobilizam cognições, motivações, pulsões que didade psicológica e transicionalidade para o religioso
dispõem uma nova configuração da existência e podem como o status de objeto da ciência psicológica. Esse
atingir, mediante o sistema imunológico, a faixa do mesmo entendimento, todavia, levou a manter fora
biológico no homem. Penso que as religiões naturais e, do alcance da Psicologia certas características por
até certo ponto, as religiões da palavra embutidas num Pargament atribuídas ao sagrado, que se revelaram
sistema de pré-modernidade ensejam o recurso ao características propriamente religiosas. A questão da
sagrado e podem, por isso, ser objeto de um juízo eficácia do enfrentamento religioso da doença é
psicológico, inclusive quanto a sua eficácia singular. O deslindada segundo essas orientações conceituais.
enfrentamento propriamente religioso, ao contrário, Tanto teórica como profissionalmente a não
penso que escape do alcance do olhar psicológico. O distinção entre religioso, sagrado e profano tem
juízo da eficácia desse enfrentamento será da alçada de conduzido a mal-entendidos. Tem-se colocado a religião
quem administra a realidade religiosa como tal. sob a Psicologia ou a Psicologia sob a religião, de
Subjacente a essa discussão está, naturalmente, alguma forma à revelia da consciência moderna. Há
a conceituação de sagrado, profano e religioso (Paiva, religiosos que enxergam o pecado na raiz de toda
RELIGIÃO, CURA E PSICOLOGIA

1998b; Paiva et al., 2004). Sagrado não apenas se doença e, como religiosos, habilitam-se a atender
contrapõe a profano, desde a definição de Durkheim dinâmicas psicológicas. Há psicólogos que não
(Durkheim, 1960/1912; Eliade, s/d), mas também a reconhecem autonomia à religião, e identificam o
religioso. Pode-se dizer, em substância, que o sagrado, religioso com o psíquico, freqüentemente patológico.
como substantivo, designa “realidades que representam E felizmente há os que fazem as distinções, adquirem as
valores essenciais e ideais, das quais o homem se vê respectivas competências ou respeitam em outrem a
beneficiário e garante”. Essas realidades “comportam o competência que não possuem, na Psicologia ou na
interdito de transgressão, porque sua violação destruiria religião. Dessa última forma, será possível aos religiosos
o próprio sentido de existência solidário desses valores” continuar usando os recursos do enfrentamento
(Vergote, 1974, p.475). religioso, aos religiosos e aos não religiosos usar os 103

Estudos de Psicologia I Campinas I 24(1) I 99-104 I janeiro - março 2007


recursos do enfrentamento sagrado, aos teólogos e Paiva, G. J., Garcia, A., Gonçalves, A. K., Scala, C. T., Faria, D. G.
R., Gómez, M. L. T., Jordão, J. P., Barbosa, R. C., & Franca, S.
pastores discriminar a adequação do comportamento M. S. (2004). Experiência religiosa e experiência estética
religioso e aos psicólogos ajuizar da adequação psíquica em artistas plásticos: perspectivas da psicologia da
religião. Psicologia: Reflexão e Crítica, 17 (2), 223-232.
do comportamento, religioso ou não.
Pargament, K. I. (1990). God help me: toward a theoretical
Para concluir, penso que a questão da eficácia framework of coping for the psychology of religion. In
singular do enfrentamento religioso como tal não pode D. McIntosh, B. Spilka, D. Moberg & M. Lynn (Orgs.),
Research in the social scientific study of religion (Vol.2,
ser avaliada pelo psicólogo, embora o psicólogo possa
pp.195-224). London: The JAI Press.
avaliar a eficácia do sagrado, inclusive do sagrado que
Pargament, K. I. (1996). Religious methods of coping:
possibilita no homem a inserção do religioso. resources for the conservation and transformation of
significance. In E. P. Schafranske (Org.), Religion and the
clinical practice of psychology (pp.215-239). Washington,
DC: APA Books.
Referências
Pargament, K. I. (1997). The Psychology of religion and coping.
Theory, research, practice. New York: The Guilford Press.
Aletti, M. (2004). A representação de Deus como objeto
transicional ilusório. Perspectivas e problemas de um Pargament, K. I., Ensing, D. S., Falgout, K., Olsen, H., Reilly, B.,
novo modelo. In G. J. Paiva & W. Zangari (Orgs.), A van Haitsma, K., & Warren, R. (1990). Gold help me: (I)
representação na religião: perspectivas psicológicas Religious coping efforts as predictors of the outcomes
(pp.19-50). São Paulo: Loyola. to significant negative life events. American Journal of
Community Psychology, 18 (6), 793-824.
Amundsen, D. W. (1987). Medicine and religion in western
traditions. In M. Eliade (Org.), The Encyclopedia of Religion Pargament, K. (2001). Research suggests correlation between
(Vol.9, pp.319-324). New York: MacMillan. religion and well-being. Research News & Opportunities in
Science and Theology, 1 (11/12), 37.
Argyle, M. (1993). The social psychology of everyday life. London:
Routledge. Piedmont, R. L. (1999). Does spirituality represent the sixth
factor of personality? Spiritual transcendence and the
Argyle, M., & Beit-Hallahmi, B. (1975). The social psychology
five-factor model. Journal of Personality, 67 (6), 985-1013.
of religion. London: Routledge & Kegan Paul.
Stark, R. (1997). The rise of Christianity. How the obscure,
Cohen, S., & Herbert, T.B. (1996). Health Psychology:
marginal Jesus Movement became the dominant
Psychological factors and physical disease from the
religious force in Western world in a few centuries. San
perspective of human Psychoneuroimmunology. Annual
Francisco: HarperCollins.
Review of Psychology, 47, 113-142.
Stenger, V. J. (2002). Victor J. Stenger on the epidemiology
Durkheim, E. (1960). Les formes élémentaires de la vie religieuse.
of religion. Research News & Opportunities in Science and
Paris: PUF. (Originalmente publicado em 1912).
Theology, 2 (5), 26.
Eliade, M. (s/d). O Sagrado e o profano. A essência das religiões.
Sullivan, L. E. (1987). Diseases and cures. In M. Eliade (Org.),
Lisboa: Livros do Brasil.
The Encyclopedia of Religion (Vol.4, pp.366-371). New
Ellison, C. G. (1998). Introduction to Symposium on Religion, York: MacMillan.
Health and Well-Being. Journal for the Scientific Study of
Vergote, A. (1974). Equivoques et articulation du sacré
Religion, 27 (4), 692-694.
(pp.471-492). Rome: Istituto di Studi Filosofici.
Kiecolt-Glaser, J. K., McGuire, L., Robles, T. F., & Glaser, R.
Vergote, A. (1997). Religion, belief and unbelief. A psychologcial
(2002). Emotions, morbidity, and mortality: new
study. Amsterdam: Rodopi.
perspectives from psychoneuroimmunology. Annual
Review Psychology, 53, 83-107 Vergote, A. (2001). Necessidade e desejo da religião na
ótica da psicologia. In G. J. Paiva (Org.), Entre necessidade
Levin, J. S., & Schiller, P. L. (1987). Is there a religious factor
e desejo. Diálogos da psicologia com a religião (pp.9-24).
in health? Journal of Religion and Health, 26 (1), 9-36.
São Paulo: Loyola.
McIntosh, D., & Spilka, B. (1990). Religion and physical
Weawer, A. J. (2002). Research on Religion and Health: a
health. The role of personal faith and control beliefs. In
D. Moberg & M. Lynn (Orgs.), Research in the social scientific second opinion. Research News & Opportunities in Science
study of religion, (Vol.2, pp167-194). London: JAI Press. and Theology, 2 (5), 33.

Paiva, G. J. (1998a). AIDS, Psicologia e religião: o estado da


G.J. PAIVA

questão na literatura psicológica. Psicologia: Teoria e


Pesquisa, 14 (1), 27-34.
Recebido em: 6/1/2006
Paiva, G. J. (1998b). Estudos psicológicos da experiência Versão final reapresentada em: 9/5/2006
religiosa. Temas em Psicologia, 6 (2), 153-160. Aprovado em: 24/7/2006

104

Estudos de Psicologia I Campinas I 24(1) I 99-104 I janeiro -.março 2007

Вам также может понравиться