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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS MODERNAS

LENDO MULHERES NO CURSO DE LETRAS DA UFPR

Laura Carneiro dos Santos


Letícia Pilger da Silva
Maria Regina da Silva Arrais
Mateus Massaro Soares
Ranieri Emanuele Mastroberardino

CURITIBA – 2017
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO........................................................................................... 03
1.1 Justificativa................................................................................................... 03
1.2 Objetivos………………………………………………………………...... 05
1.2.1 Objetivo geral............................................................................................... 05
1.2.2 Objetivos específicos.................................................................................... 05
1.3 Asserções...................................................................................................... 06
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA………………………………………... 08
2.1 Pensando o cânone e as 09
mulheres.................................................................
3. METODOLOGIA........................................................................................ 12
3.1 Uma perspectiva etnográfica........................................................................ 12
3.2 Perfil dos participantes e instrumentos de pesquisa 12
.....................................
4. ANÁLISES E RESULTADOS DA 14
PESQUISA..........................................
4.1 O currículo e o 14
cânone..................................................................................
4.2 A prática docente.......................................................................................... 17
4.3 A voz do 26
aluno..............................................................................................
4.4 Vamos 31
ler……………………………………………………………..........
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................... 35
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................... 37
ANEXOS E 39
APÊNDICES............................................................................
3

1. INTRODUÇÃO

1.1 Justificativa

Cursar Letras significa ler muitos textos literários, sejam da literatura brasileira,
da literatura portuguesa, ou da literatura das diversas línguas. Nós, alunos de Letras,
lemos muito durante todo o curso, mas, ao que tudo indica, assim como os críticos
literários, nunca seremos capazes de responder apropriadamente a pergunta em termos
estruturais: “o que é Literatura?”. A resposta mais simplória seria: “a arte da palavra”,
ou, mais teoricamente, como aponta Jonathan Culler (1999), em seu livro Teoria
literária – uma introdução, literatura é “linguagem que coloca em primeiro plano a
própria linguagem” (op cit., 1999, p. 35), ou ficção, ou linguagem potencializada com
fins estéticos, ou como “construção intertextual ou auto-reflexiva” (op cit., 1999, p. 40).
Várias possibilidades, mas nenhuma certeza. Como ninguém parece capaz de responder
de forma satisfatória a essa pergunta, nós lemos os textos literários para experienciar a
literatura. E por experiência tomamos a definição de Jorge Larrosa:

a experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não o que
se passa, não o que acontece, ou o que toca. A cada dia se passam muitas
coisas, porém, ao mesmo tempo, quase nada nos acontece. Dir-se-ia que tudo
o que se passa está organizado para que nada nos aconteça. Walter Benjamin,
em um texto célebre, já observava a pobreza de experiências que caracteriza o
nosso mundo. Nunca se passaram tantas coisas, mas a experiência é cada vez
mais rara. (LARROSA, 2002, p. 21)

Desse modo, a Literatura é experiência de formação do ser humano pelo


reconhecimento, através do contato com diversas narrativas, de que a vida humana não
é uma mera sucessão de fatos, mas uma narrativa que, assim como as histórias que
ouve, conta e lê, tem um começo, um meio e um fim da “(...) identidade de uma pessoa,
a forma de uma vida humana concreta, o sentido de quem ela é e do que lhe passa”
(LARROSA apud VEIGA-NETO, 1996, p.147). Além de que a literatura e a leitura
“nos d[ão] palavras para definir de forma mais precisa as experiências da nossa
vida(...)” (MANGUEL, 2014). Assim, para a leitura constituir experiência, ela precisa
“passar” no leitor, ajudando-o a constituir sua subjetividade e sua visão de mundo.
Em seu texto Direito à Literatura, Antonio Candido (2011) defende que a
Literatura é um direito fundamental do ser humano, assim como a Educação e a Saúde,
porque ninguém consegue ficar vinte e quatro horas sem fabular e adentrar o mundo da
ficção, seja na imersão da telenovela, no inconsciente do sonho ou durante o desvario
4

amoroso. Ele define Literatura como o “sonho acordado das civilizações” (2011, p. 3),
que deveria ser lida porque permite ao ser humano experienciar o mundo a partir da
palavra, dar sentido ao que vive por meio das palavras, além de que ela é formadora de
subjetividade – por meio da (des)identificação com os “egos experimentais” (para
recuperar termo de Milan Kundera, 2009, p. 38) que são os personagens e os eus líricos
– e permite que se experiencie novos modos de existência (novamente recuperando
Milan Kundera, 2009). Dessa forma, pela potencialidade de significados e pelos ritmos
das palavras além de sua estruturação, a literatura possibilita que “formas amorfas”
sejam transformadas em “experiência organizada” e, assim, ajuda o leitor a organizar
sua própria vida e a condição humana, compreendendo que a vida, assim como as
narrativas literárias, não é uma mera sucessão de fatos, mas forma, ritmo, significado e
experiência.
E então caímos em outras perguntas: que textos literários experienciamos? Que
textos nos passam no decorrer do curso de Letras? Que textos nos ajudam a formar
nossa subjetividade e nosso repertório de futuros profissionais – professores e críticos –
da Literatura? Quem foram as pessoas que jogaram no texto as palavras que serão
potencializadas e passarão nosso corpo pela leitura? Barthes (2004) já apontou para a
morte do autor, mas nós continuamos nos questionando: quem escreve os textos que
lemos no curso de Letras? A resposta mais simplória para estas duas perguntas é:
escritores escrevem os textos. Num ciclo eterno, surge uma nova pergunta: quem são
esses escritores? Quem são os grandes escritores segundo a historiografia literária?
Enquanto estudantes que estão no final do curso de Letras, depois de quatro anos
experienciando a leitura de inúmeros textos, percebemos que a maioria dos autores são
homens. Tal fato é tão óbvio que o ato de pensar o escritor ou o autor teórico como
masculino, considerando o “não marcado” do português, é tão “naturalizado” que
muitas vezes o uso apenas do sobrenome em textos acadêmicos - a exemplificar por
(XAVIER, 1999) - para fazer referência, no corpo dos textos, fazem pensar em autores
homens, de modo a confirmar a hegemonia masculina da universidade enquanto
instituição.
A partir dessa percepção, e da reflexão e diálogo em diversos espaços do curso –
nos corredores ou na cantina, entre nós, como amigos; nas salas de aulas, com os
professores e turma; no espaço criado por alunas de Letras (inclusive uma das
integrantes do grupo que realiza a presente pesquisa é uma das criadoras da Semana da
Mulher do curso de Letras da UFPR), entre alunas, professoras e comunidade – surgiu a
reflexão que nos motivou a escolher este tema para investigação. Isto é, partindo de
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nossa experiência discente, decidimos abordar a presença-ausência da autoria feminina


no curso de Letras da UFPR, de modo a repensar o currículo do curso, problematizar o
cânone literário e buscar novas possibilidades do ensino – e da prática da leitura
literária no geral – pela representatividade e pela inclusão.
Considerando que a pesquisa de cunho etnográfico influencia o campo da
pesquisa, e considerando que nós fazemos parte do campo de pesquisa como estudantes,
pretendemos, com essa pesquisa, despertar (ou ampliar) e socializar a percepção dos
estudantes e dos professores de letras acerca da discrepância entre a quantidade de
textos lidos no curso de Letras de autoria masculina e feminina, considerando que, na
posição de “objetos de estudo” e componentes da geração de dados, docentes e
discentes terão que repensar (ou verbalizar e compartilhar suas reflexões) sobre a
presença de textos escritos por mulheres no curso de Letras da UFPR e, ampliando o
escopo, nos mais diversos contextos nos quais textos literários circulam na sociedade.
Isto é, queremos problematizar o currículo e, consequentemente, o sistema, para
continuarmos o processo de (re)construção de (um novo) cânone literário mais
inclusivo.
Propomos, como pergunta exploratória: será que, considerando a discrepância
do número de obras lidas de escritoras mulheres e de homens no curso de Letras da
UFPR, é percebido o silenciamento da leitura de mulheres pelos alunos?

1.2 OBJETIVOS

1.2.1 Objetivo Geral

Essa pesquisa tem por objetivo geral averiguar a presença da autoria feminina nas aulas
de uma disciplina de literatura do curso de Letras da UFPR – a ser “Literatura Brasileira
III” – e verificar a percepção dos discentes e o posicionamento dos professores (que
cursam/ministram essa disciplina nesse primeiro semestre de 2017) em relação à
ausência de mulheres no cânone literário, considerando a historiografia literária e o
currículo do curso.

1.2.2 Objetivos específicos

A partir do foco acima delimitado, tomamos como objetivos específicos:


1. Analisar a ficha 2/programa dos dois professores da disciplina selecionada para
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investigação (Literatura Brasileira III) e sua correspondência com a ementa da


disciplina e o currículo do curso.
2. Analisar a relação da ficha 2/programas propostos pelos professores com o
cânone literário através da contabilização do número de obras escritas por
mulheres e obras escritas por homens dentro dos programas da disciplina
selecionada.
3. Verificar qual a percepção das alunas e dos alunos acerca da ausência da autoria
feminina na Academia.
4. Analisar o caminho docente-discente na construção do conhecimento.
5. Analisar a importância da representatividade dentro da Academia.
6. Relacionar a presença da voz feminina dentro das obras lidas com os
sentimentos das discentes e docentes entrevistadas.

1.3 Asserções

1) A ausência da leitura de obras de escritoras mulheres é consequência da


ausência de pesquisa na historiografia literária sobre livros escritos por
mulheres, pois elas não são inseridas no cânone literário masculinizado;
2) O diálogo entre docentes e discentes dentro da sala de aula acerca da presença-
ausência da autoria feminina nos programas das disciplinas – e,
consequentemente, no cânone literário – possibilita a modificação do discurso
dominante do conhecimento literário.

Delimitados nossos objetivos e dadas nossas asserções, gostaríamos de


compartilhar com o nosso leitor, em nossa introdução, a estrutura do texto, a fim de que
se possa acompanhar o caminho da nossa escrita(-viagem) na análise dos dados.
No primeiro capítulo, intitulado Pensando o cânone e as mulheres, vamos tratar
das leituras teóricas – isto é, do embasamento teórico – que fundamentaram nossa
análise acerca da ausência da autoria feminina na historiografia literária brasileira. A
partir dessas leituras, lançamos um olhar focado sobre os dados objetivos, cuja
Metodologia será descrita no segundo capítulo, com título homônimo. Nesta seção,
trataremos dos nossos três instrumentos utilizados para a geração de dados.
No terceiro capítulo, intitulado Análises e resultados da pesquisa,
apresentaremos nossas leituras dos dados gerados durante a pesquisa. Dividimos esse
capítulo em três seções, de modo a dividir os três pontos que achamos ser os mais
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importantes da análise: (i) o currículo e o cânone; (ii) a prática docente e (iii) a voz do
aluno. Ainda neste capítulo, escrevemos a seção “Vamos ler” – inspirada nos anexos de
livros da L&PM, em que, não raro, nós nos pegamos lendo para ver quais daqueles
livros citados já lemos – que foi escrita pensando em você, leitor. Depois de passar por
nossa análise, repense seus conhecimentos conosco e conheça mais escritoras mulheres.
Vamos lê-las.
No quarto e último capítulo, intitulado Considerações finais, amarraremos todos
os dados de forma a realizar a triangulação dos dados gerados e ver como cada um dos
pontos acima citados estão intimamente relacionados. Por fim, a última seção traz as
referências utilizadas para a fundamentação teórica da análise, seguida dos anexos com
os instrumentos da pesquisa, para que o leitor possa, a partir da nossa análise, fazer sua
própria leitura dos dados e, quem sabe, pensar em realizar pesquisa semelhante em
outros contextos – pois, a nosso ver, esta pesquisa pode ser realizada nos outros níveis
de ensino que não o ensino superior, como ensino fundamental e médio.
Então comecemos esse texto, que, é importante ressaltar, foi escrito por cinco
cabeças, dez mãos e várias vozes. Agora, mais uma cabeça e mais duas mãos adentram
a escrita desse texto, a partir da leitura. Além disso, por trabalharmos nesta pesquisa
com o silenciamento de vozes dentro do ambiente acadêmico, decidimos não silenciar
as vozes que escrevem este texto, deixando-as marcadas em suas individualidades -
individualidade marcadas pela polifonia das discussões em grupo. Também gostaríamos
de apontar que, se você, nosso leitor, for professor da educação básica, pense em formas
de trazer para sua prática docente a autoria feminina e, consequentemente, a
representatividade e a agência para a autoria feminina.
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2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Em seu livro A identidade cultural na pós-modernidade, ao abordar a


constituição deslocada e fragmentada da identidade do sujeito pós-moderno, Stuart Hall
(2006) disserta sobre cinco descentramentos/rupturas no discurso do conhecimento, e
um deles é o Feminismo. Hall aborda o Feminismo tanto como crítica teórica quanto
como movimento social, de modo que abrange discussão na teoria e na prática. O autor
aponta que o Feminismo, enquanto descentramento do discurso referente ao ôntico,
ontológico e epistemológico, foi responsável pela constituição da política de identidade,
que concedeu uma “identidade” para cada movimento. Hall também afirma que o
slogan do Feminismo – “o pessoal é político” – questionou a distinção entre “dentro” e
“fora”, de modo que politizou a subjetividade, discutiu a constituição e as concepções
de identidade e o (da performatividade do) processo de identificação dentro dos
dualismos em que a sociedade patriarcal e colonial é organizada, como: homem vs.
mulher; público vs. privado; civilização vs. natureza; mente vs. corpo; consciente vs.
inconsciente, entre outros. O discurso feminista, segundo Luiza Lobo (1999), possibilita
a afirmação no plano do simbólico e a troca entre o sujeito e os valores e discursos do
mundo externo, isto é, a aquisição, o uso e a troca da linguagem em geral. O feminismo
questiona os pressupostos básicos dos sistemas dominantes do discurso do
conhecimento e aplica a teoria da desconstrução para desentranhar conceitos
polarizados na linguagem dominante (LOBO, 1999), como os anteriormente apontados
através da leitura de Hall.
Schmidt (2011) também aponta o feminismo, ao lado dos estudos pós-coloniais,
como um avanço que deslocou conceitos referenciais da cultura ocidental produzidos a
partir de pensamentos patriarcais na medida que o confrontaram com modelos de
pensamentos das margens das tradições. Similarmente à Hall, Schmidt afirma que o
debate sobre valoração surge no contexto teórico para colocar em questão conceitos do
campo social, de gênero, raça e classe social.
Foram discussões – teóricas e práticas – feministas que permitiram que nós,
inseridos numa sociedade patriarcal, mas também imersos em contextos em que o
sistema vigente é problematizado, pudéssemos questionar a condição da nossa
identidade de gênero e nossa identificação dentro da sociedade como um todo, e, de
forma contextualizada, dentro do curso de Letras, de forma a questionar a nossa
“identificação” e a representatividade das mulheres nos textos que lemos. Assim, para
embasar teoricamente nossa pesquisa, lemos textos referentes a pesquisas e autoras que
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questionassem a identidade e a (ausência de) representatividade da autoria feminina no


cânone literário brasileiro.

2.1 Pensando o cânone e as mulheres

Ao colocarmos em evidência a leitura de obras femininas na Academia,


estamos, intrinsecamente, discutindo o cânone literário. Ao discutir a constituição do
cânone no discurso acadêmico, Schmidt (2011) diz que:

(...) os cânones inscrevem um mesmo código escritural cuja função é projetar


uma representação idealizada da cultura, como se essa constituísse a expressão
de uma totalidade sem fraturas. A vigência de uma identidade histórica da
cultura e da literatura nacional como força unificadora e homogeneizante tem
consequências na prática do ensino de literatura brasileira, particularmente
quando o ensino converge para a leitura e a análise somente daqueles textos
autenticados pela evocação a uma tradição que os define como “verdadeira
literatura”. (SCHMIDT, 2011, p. 179)

Quando Schmidt discorre sobre uma identidade histórica e uma tradição


literária, faz-se necessário ampliar o escopo desses estudos a fim de melhor
compreender a constituição do cânone literário desde seus primórdios. Ao se pensar na
constituição geográfica do mundo tal qual conhecemos atualmente, precisamos retornar
ao período das expansões marítimas, isto é, ao início do século XV. O processo de
expansão e posterior colonização de áreas até então desconhecidas pelas civilizações
europeias, desde o momento em que se estabeleceu, propulsiona efeitos diversos que
vigoram intrinsecamente às relações humanas modernas. Esse cenário estrutura o que
Candau e Oliveira (2010) definem como colonialidade: “um padrão de poder (...) [que]
se relaciona à forma como o trabalho, o conhecimento, a autoridade e as relações
intersubjetivas se articulam entre si através do mercado capitalista mundial e da idéia de
raça.” (TORRES, 2007, apud CANDAU & OLIVEIRA, 2010, p.18).
Nesse sentido, os impactos do processo de colonização vêm sendo tão
expressivos que os Candau e Oliveira baseiam seus estudos num grupo de
pesquisadores que consideram que “a colonialidade é constitutiva da modernidade, e
não derivada” (MIGNOLO, 2005, p. 75, apud CANDAU & OLIVEIRA, 2010, p. 17). É
nessa perspectiva que Candau e Oliveira apontam para os estudos de Walsh (2007): “a
decolonialidade representa uma estratégia que vai além da transformação da
descolonização, ou seja, supõe também construção e criação. Sua meta é a reconstrução
radical do ser, do poder e do saber.” (2010, p. 24). Walsh (2007) também indica a
possibilidade de relação entre a denominada pedagogia decolonial e a área educativa,
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que viria a reforçar os estudos a respeito da interculturalidade.


A partir desse panorama como um todo, consideramos de fundamental
importância a incorporação da questão de gênero, visto que é inegável o papel influente
que a colonialidade exerce na própria constituição do pensamento moderno, isto é, mais
especificamente, do que se entende por identidade e tradição literária. Além disso, como
Avtar Brah (2006) aponta, classe, gênero e raça são conceitos identitários indissociáveis
cujas identidades são organizadas e definidas pela lógica do sistema colonial e,
considerando o contexto pós-colonial atual, da decolonialidade que permanece na
organização da sociedade e do conhecimento - sintomaticamente na tradição literárias.
Schmidt (2012) justamente questiona essa tradição literária e os valores que a
constituíram ao longo da história, valores esses construídos socialmente pelos discursos
etnocêntricos e patriarcais, e uma possível transformação nessa historiografia literária
por meio do resgate de obras escritas por mulheres. O olhar da autora se volta
especialmente para a produção nacional dessa literatura de autoria feminina e para a
necessidade de legitimá-la, pois, o discurso acerca da historiografia literária é “um
discurso implicado no estabelecimento de limites, interdições, silenciamentos, de um
lado, e na construção de vozes e subjetividades autorizadas ou legitimadas, de outro.”
(SCHMIDT, 2012, p. 65). Ela afirma que até mesmos os arranjos curriculares de cursos
de Letras expressam conhecimentos produzidos em uma herança de poder cultural,
institucional e patriarcal, por isso que a visibilidade de textos de autoria de mulheres é
considerada, por parte da cultura letrada conservadora, como “ameaça à sobrevivência
da literatura” (SCHMIDT, 2011, p. 185). Schmidt também defende que é preciso
quebrar a ideia de que as obras não canônicas, principalmente de sujeitos pertencentes
às minorias, parem de ser vistas apenas como documentos para análises sociológicas
(SCHMIDT, 2011).
Ainda de acordo com Schmidt, a (trans)valorização dessas obras posicionaria
essas autoras nos discursos sociais, históricos e culturais que permeiam a sociedade.
Esse movimento ocasionaria em uma nova visão da historiografia literária pautada em
uma criticidade que vai além dos aspectos formais e estéticos, pois, apreende valores
sociais, políticos e institucionais que estão historicamente em constantes mudanças.
Portanto, esse novo modelo de historiografia “colocaria em evidência os vetores
identitários que se entrecruzam na gênese e na função de textos literários como parte de
um sistema inserido no campo sócio – histórico – cultural.” (SCHMIDT, 2012, p.69),
pois “a autoria significa a inscrição de um sujeito no espaço social-histórico dos
discursos que circulam em uma dada sociedade” (SCHMIDT, 2011, p. 183).
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Considerando a posição de destaque ocupada pelo cânone nas discussões atuais


da crítica feminista, Elódia Xavier (1999) chama a atenção para a possibilidade de
revisão historiográfica do cânone a partir dessa crítica feminista. Para a autora, é preciso
questionar os valores estabelecidos, por uma sociedade patriarcal, e as relações de poder
excludentes – “extra-literários” –, que silenciaram obras de escritoras mulheres a
despeito de suas qualidades literárias. Desse modo, cabe à crítica feminista o resgate de
obras de autoria feminina ocultadas pela tradição crítica, mas “esse trabalho deve ser
mais crítico do que feminista, para que represente uma real contribuição para a
historiografia literária” (XAVIER, 1999, p. 21).
Assim como Antonio Candido (1976) apresentou a Literatura enquanto direito
inalienável do ser humano pela importância da efabulação, Schmidt (2011) defende que
a Literatura é importante por possibilitar dialogismo e formação intersubjetiva da
identidade através da linguagem e da alteridade, de modo que o ensino da literatura
possibilita “reinserir o sujeito no circuito do conhecimento/reconhecimento, cujo
potencial emancipatório declina um entendimento de sustentabilidade de vida (...)”
(SCHMIDT, 2011, p. 187), e esse sujeito pode ser a mulher.
12

3. METODOLOGIA

3.1 Uma perspectiva etnográfica

A etnografia se constitui como uma metodologia de pesquisa qualitativa, cuja


origem se encontra na antropologia cultural. Segundo Wielewicki (2001), uma
investigação de cunho etnográfico tem por objetivo uma tentativa de descrever,
interpretar e explicar a cultura de determinado grupo social, levando em consideração a
perspectiva êmica dos participantes – isto é, de dentro para fora –, sempre filtrada pela
ótica do pesquisador em uma construção de conhecimento holística. Nesse sentido,
nossa pesquisa é pautada na investigação etnográfica como discurso, o qual é
“verdadeiro em um contexto, mas que não deixa de ser uma versão construída do outro
mesclada com a visão de si mesmo (WIELEWICKI, 2001, p.32).
A pesquisa foi realizada com os discentes e docentes do Curso de Letras da
Universidade Federal do Paraná (UFPR). Duas turmas da disciplina de Literatura
Brasileira III (HL233) foram selecionadas para a investigação. A escolha da disciplina
reflete a percepção que os pesquisadores compartilham acerca da quantidade de obras
escritas por mulheres lidas nessas aulas, pois fomos alunos dessas disciplinas, e o fato
de uma professora e um professor ministrarem a matéria no mesmo período também
possibilitou a análise da percepção docente a partir da perspectiva de ambos os gêneros.

3.2 Perfil dos participantes e instrumentos de pesquisa

Ao total 25 estudantes participaram da pesquisa, dos quais 84% declararam


pertencer ao gênero feminino e 16% ao gênero masculino. Desse total de envolvidos, 10
são estudantes da Professora A1 e 15 são estudantes do Professor B. Quanto à idade, 11
participantes têm entre 17 e 20 anos, 7 entre 21 e 25 anos, 5 entre 26 e 29 anos, e 2
estudantes declararam ter 30 anos ou mais. A Professora A faz parte do quadro de
professores do Curso de Letras como professora substituta desde março de 2016, e essa
é a segunda vez que ela ministra Literatura Brasileira III – já tendo ministrado
Literatura Brasileira I, Literatura Brasileira II e Literatura Brasileira IV. Já o Professor
B está ministrando a disciplina pela terceira vez, e desde 2015 é professor adjunto da
universidade.
Como instrumentos para a geração de dados foram utilizados um questionário

1
Por questões éticas os nomes de todos os participantes dessa pesquisa foram ocultados.
13

online (APÊNDICE 1) , entrevistas (APÊNDICE 2) e a análise da ementa e dos planos


de ensino (ficha 2) (ANEXO 1 e 2), elaborados pelos professores da disciplina em
questão. A análise desses documentos buscou traçar um paralelo entre as diretrizes da
ementa e as escolhas bibliográficas encontradas nos programas, possibilitando o
levantamento de obras lidas dentro da disciplina escritas por mulheres e escritas por
homens.
Para ampliar a compreensão das seleções bibliográficas presentes nos planos de
ensino, realizamos uma entrevista individual com os docentes. Além disso, durante as
entrevistas, procuramos apreender a percepção que esses professores têm em relação ao
cânone e as obras de autoria feminina, as leituras literárias realizadas no âmbito
acadêmico e as possíveis mudanças nos estudos literários dentro do Curso de Letras.
Do mesmo modo, para obtermos a percepção dos alunos quanto à leitura de
obras escritas por mulheres na graduação, a provável discrepância dessas em relação a
obras escritas por homens, e os sentimentos dos estudantes mediante esses fatos,
produzimos um questionário online e o divulgamos no grupo do Facebook™ de Letras
UFPR, pedindo a participação dos estudantes que estão, efetivamente, cursando a
disciplina no primeiro semestre de 2017.
Cientes da impossibilidade de omitir as nossas vozes enquanto pesquisadores,
buscamos cruzar os dados gerados por meio dos instrumentos de pesquisa, da
documentação da disciplina e da bibliografia levantada, mas, especialmente, com a
nossa própria experiência enquanto estudantes do Curso de Letras. Desse modo, a
análise que segue reflete essa confluência de vozes construída por nós, pesquisadores e
alunos, e pelos discursos dos diversos sujeitos que participaram dessa pesquisa.
14

4. ANÁLISES E RESULTADOS DA PESQUISA

4.1 O Currículo e o Cânone

Agora é pertinente trazer à luz de nossas discussões a seguinte indagação: o


currículo acadêmico, o qual é composto pela ementa e ficha 2, e o cânone literário
fortalecem o silenciamento da literatura escrita por mulheres? Para adentrarmos nesta
temática, convém trazermos para a superfície do texto o real significado do termo
“currículo”, bem como os seus respectivos desdobramentos.
Thomas S. Popkewitz (2010), em seu texto História do currículo, regulação
social e poder, define este vocábulo, caro ao ensino, como sendo uma espécie de
organização particular do conhecimento. Em consonância com as percepções do
intelectual norte-americano, esta sistematização possui, como objetivo, regular e
disciplinar os estudantes para atuarem como membros de uma comunidade/sociedade.
Entretanto, engana-se, estimado leitor, quem pensa, ingenuamente, que o processo de
constituição do currículo reflita na liberdade de escolhas. Pelo contrário, uma vez que
esta estruturação de disciplinas engloba uma (de)limitação do saber. Para sermos menos
abstratos: o currículo, por intermédio de uma imposição, delimita e limita um espaço de
conhecimento. Isto posto, ao que tudo indica, o currículo é fundamentado por escolhas,
as quais impõem certas definições sobre o que deve ser conhecido, marginalizando, por
conseqüência, outros saberes. À vista disso, algumas informações são selecionadas em
detrimento de outras. De acordo com o nosso entendimento, esta seleta lista de
sabedoria não resulta apenas em informação, mas em regras, modelos, que guiam os
indivíduos na produção de seus respectivos conhecimentos sobre o mundo. Para
Popkewitz, “(...) o currículo é uma coleção de sistemas de pensamento que incorporam
regras e padrões através dos quais a razão e a individualidade são construídas (...)”
(POPKEWITZ, 2010, p. 194).
E, já que estamos discorrendo acerca de padrões e modelos, destaca-se, neste
instante da análise, que o currículo das disciplinas em questão é estruturado de uma
forma a tratar de um tipo de modelo muito significativo, emblemático, quando o assunto
é literatura. Trata-se do cânone literário. Para o leitor que não possui familiaridade com
o vocábulo “Cânone” e com a sua respectiva relação com a literatura, podemos afirmar,
em linhas gerais, que a palavra designa o conjunto de textos/livros considerados como
referência em um determinado período, estilo ou cultura. Em conformidade com a
historiografia literária nacional, o cânone é predominantemente masculino. Isto
15

significa que, por razões históricas, sociais, culturais e políticas, elegem-se, em sala de
aula, textos/livros escritos por homens em detrimento daqueles escritos por mulheres.
As produções de Antonio Candido e de Guimarães Rosa, por exemplo, são consideradas
“cânones”, no que diz respeito à literatura brasileira. Coincidência ou não, estes
exemplos são intrínsecos ao que “deve” ser abordado na disciplina de Literatura
Brasileira III. Afinal, espera-se que os alunos de Letras conheçam estes intelectuais para
que depois, quando tornarem-se professores, consigam ministrar aulas satisfatórias e
enriquecedoras sobre as obras destas personalidades inerentes à história literária deste
país. Todavia, algumas perguntas afloram de nossas reflexões. São elas: nós, futuros
docentes, devemos incorporar, no nosso aperfeiçoamento profissional, somente a escrita
masculina? Será que somente os textos de autoria masculina estão sendo estudados na
disciplina de Literatura Brasileira III? Doravante, estas indagações serão passíveis de
serem respondidas.
Com o intuito de averiguarmos a relação currículo-cânone masculino,
analisamos, com extremo zelo e dedicação, a ementa da disciplina, no site da
coordenação de Letras. Eis que nos deparamos com a sucinta descrição: “Ementa:
ficção contemporânea: vertentes e desdobramentos. Estudo de obras e autores
representativos”. O leitor que se debruça nestas páginas há de concordar conosco que a
ementa é, no mínimo, genérica. Quais obras? Quais autores representativos? Sim, leitor.
Estes também foram os nossos questionamentos, os quais, infelizmente, não obtiveram
respostas. Contudo, com o escopo de dar seguimento a nossa pesquisa, observamos a
ficha 2 dos professores supracitados na subdivisão anterior. Neste documento, destaca-
se que os programas da Professora A e do Professor B são pautados na ficção
contemporânea e em uma série de autores considerados representativos, dos quais
despontam tanto mulheres quanto homens. Em termos numéricos, percebe-se que, na
ficha 2 da docente A, temos 43 obras escritas por homens e apenas 8 escritas por
mulheres. Em relação ao B, temos 58 obras escritas por homens e 27 escritas por
mulheres. No que concerne a estas informações, ressalta-se, a título de sermos claros e
precisos, que foram contabilizadas as leituras complementares e obrigatórias, dentro do
programa da disciplina.
Embora as obras de autoria feminina sejam inferiores, numericamente, às obras
de autoria masculina, nota-se que o pensamento acerca da autoria feminina é
incorporado em sala de aula pelos docentes entrevistados. Diante disso, podemos
depreender que textos escritos por mulheres estão sendo estudados na disciplina de
Literatura Brasileira III. Claro que é em pequena quantidade, prezado leitor, porém, é
16

preciso enxergar o copo mais cheio do que vazio, uma vez que os dados evidenciam que
o cânone está se modificando, se adaptando, e isto, de acordo com o nosso prisma de
análise, é relevante. Relevante, pois os docentes entenderam que:

(...) o cânone se enriquece e se desvia a cada época, a partir de releituras


críticas e sedimentações temporais que ocorrem em função (...) de mudanças
de mentalidades (LOBO, 1999, p. 45).

No tocante a essa mudança de mentalidade, autoras como Elvira Vigna e


Carolina Maria de Jesus, pertencentes às fichas 2 da disciplina, ilustram uma possível
reestruturação/reconfiguração do cânone e da própria historiografia literária, na
tentativa de deixá-los mais inclusivos e menos hegemônicos. Destarte, conseguimos
entrever que as fichas 2, bem como a ementa, são delimitadas pelo cânone masculino,
mas não são limitadas por este, dado que a inserção da escrita feminina na disciplina é
presente e, ao mesmo tempo, significativa. Portanto, os docentes, aparentemente, têm a
liberdade para incluir “(...) narrativas que foram suprimidas e jogadas às margens da
nação e, consequentemente, excluídas do campo da investigação histórica e literária”
(SCHMIDT, 2012, p. 64), compreendendo que a voz feminina, na arte da docência e na
vida acadêmica dos estudantes, possibilita inúmeros aprendizados e ensinamentos.
17

4.2 A Prática Docente

Durante a realização das entrevistas com os dois professores e de sua posterior


análise em grupo, elencamos três pontos coincidentes nas falas dos dois professores que
conversavam com nossas asserções para tomarmos como foco em nossa análise dos
dados gerados por esse instrumento, a ser: a percepção docente acerca da ausência de
textos de autoria feminina no currículo de literatura do curso de Letras da UFPR; a
importância da voz do aluno na prática docente, e a perspectiva de mudança do cânone
literário e na representatividade da autoria feminina no contexto acadêmico através da
prática e pesquisa dos docentes e discentes.
Primeiramente, questionamos os professores quanto à montagem da ficha
2/plano de estudo, e ambos fizeram menção à ementa da disciplina, já tratada na seção
anterior, que consiste basicamente, para recuperar as palavras do Professor B, de “prosa
brasileira contemporânea”. Na percepção da Professora A, a ementa é “bem ampla”; e
para o Professor B, é “bem simples” e “tem um padrão”, de modo que os professores
parecem ter liberdade para escolher os textos com que trabalharão na disciplina.
A Professora A relatou que pensa nos autores que poderiam entrar no programa
pela ementa e planeja aula a aula de maneira metódica. O Professor B relata que, por ter
entrado recentemente, procurou professores que já haviam ministrado a disciplina para
ter como base experiências anteriores e escolher os textos; ele também conta que há
autores dos quais não se pode deixar de ler e falar na disciplina devido à sua
importância na literatura brasileira, como Guimarães Rosa e Clarice Lispector. O
Professor B complementou relatando que, a partir disso, ele escolhe os textos pela sua
“relevância na tradição literária, mas também de acordo com a relevância, digamos,
política desses autores e textos”, além de tentar recuperar, em seu programa, autores
pouco lidos, conhecidos e trabalhados, como Antônio Fraga e João Antônio.
Quanto à proporção desigual de textos de autoria feminina e masculina nos seus
programas, a Professora A disse que “esse fato está relacionado com o cânone”, e o
Professor B disse: “eu sabia que, do plano de vista teórico, do sistema acadêmico,
literário e intelectual, ele [o cânone] é machista e patriarcal”, concluindo que “o
problema (es)tá na base do sistema”. A partir disso, percebemos que ambos os
professores têm a percepção de que seus planos de aula e suas escolhas de textos são
guiados não apenas por suas escolhas pessoais, mas pelo currículo, e este, enquanto
(de)limitador dos conteúdos trabalhados, embasado no cânone literário. E, como disse
Schmidt acerca do discurso acadêmico da Literatura:
18

discursos produzidos e reproduzidos em certos contextos institucionais nos


quais os estudos de literatura nacional, a despeito dos desenvolvimentos
teóricos contemporâneos e da abertura interdisciplinar, ainda estão, sob muitos
aspectos, voltados à preservação e à continuidade de pressupostos avaliativos e
interpretativos gerados pela hegemonia de saberes constituídos na perspectiva
da literatura canônica ou da alta literatura. (SCHMIDT, 2011, p. 179)

Isto é, a universidade enquanto local de pesquisa acadêmica (re)afirma a


ideologia hegemônica, o discurso colonial e patriarcal no qual homens brancos,
heterossexuais e cisgêneros continuam a comandar a produção do conhecimento, fato
que aparece na fala do Professor B quando ele fala do “fundamento patriarcal do
sistema intelectual e literário”. E o cânone literário, segundo a Professora A, “não cai do
céu pronto, ele é construído”, ou seja, o discurso hegemônico, aqui representado pelo
cânone literário, não é natural, mas construído, de forma que funciona de modo a
manter uma hierarquia entre os locais da enunciação e favorece a negação do sujeito no
espaço sócio-histórico nos discursos da sociedade. Como afirma Schmidt (2012):

(...) a busca de inserção da autoria feminina na narrativa histórica de


construção da literatura brasileira do século XIX tem levantado uma série de
questões de fundo sobre a constituição do nosso passado literário e sobre como
esse passado, seus valores e regimes de representação, são reproduzidos no
rastro de heranças do poder patriarcal que se desdobra em poder cultural,
institucional, teórico e interpretativo. Não se trata simplesmente da exclusão
de uma ou outra obra pelo fato de levar a assinatura de uma mulher, mas sim
da negação a todas as escritoras do período, de acesso ao poder simbólico
investido no estatuto da autoria. (SCHMIDT, 2012, p.64)

Ao ser questionada quanto à relevância da literatura escrita por mulheres em sua


formação como leitora e como professora, levando em considerando a sua identidade de
gênero, a Professora A relata que entrou no curso de Letras com pretensões literárias, e:

a gente acaba buscando modelos quando entra na universidade. Eu quando eu


entrei em Letras queria escrever, e o cânone é predominantemente masculino.
Quando você se depara com uma obra de autoria feminina que é bacana, isso
de alguma forma acaba sendo uma referência. (Professora A)

Esse trecho revela a importância do trabalho com a identidade e a identificação


do Feminismo (LOBO, 1999). A leitura de escritoras mulheres em um curso
predominantemente feminino é questão de representatividade, de agência e de direito ao
locus da representação e da enunciação (SCHMIDT, 2011) de modo que a mulher
ocupa posição de sujeito histórico cuja produção literária e cuja subjetividade têm voz e
vez.
Pensando na pretensão literária da Professora A, e ampliando esta situação
pessoal para a produção contemporânea de escritoras mulheres, questionamos o
19

Professor B se a “crítica contemporânea” continua tratando a literatura escrita por


mulheres como meramente confessional e como “derramamento confessional”, como
fez muitas vezes com Clarice Lispector e com Charlotte Perkins Gilman. Na perspectiva
dele, a crítica mudou, mas não totalmente. Ele aponta que há um fenômeno na área de
Literatura acerca da representatividade: há grande presença de professoras mulheres nos
cursos de Literatura (além de que a maioria dos estudantes são mulheres), mas os
críticos renomados continuam sendo homens – se não no número, no destaque –, o que
revela, nas palavras dele, o fato de que “o sistema se reproduz sempre de alguma
maneira”. Ele exemplifica com a crítica de Claudio Daniel, da revista Zunái, sobre a
poesia da poeta contemporânea Angélica Freitas, que é “basicamente uma reprodução
desse discurso antigo da razão versus emoção; só que sob nova roupagem, sob novos
aparatos críticos (...) então, mudou, mas ao mesmo tempo continua a acontecer, eu
acho. No geral, o sistema continua sendo reproduzido” (Professor B).
Após conversarmos sobre a elaboração da ficha 2 e do compartilhamento de uma
breve análise dos programas – que será abordada mais à frente –, questionada se poderia
ter mais textos de autoria feminina no programa da disciplina, a Professora A recupera a
sua experiência enquanto aluna de graduação em Letras na UFPR:

Poderia sim. Mas a forma como o nosso curso está estruturado dificulta um
pouco, porque não é só uma questão da ementa – que é bem ampla – mas é
uma questão de costume mesmo. Por exemplo, eu estudei aqui, o meu curso
foi muito canônico, e pra eu dar uma disciplina inovando é difícil, você acaba
imitando aquilo que você aprendeu. (...) A questão é um pouco do nosso
curso, ele é muito tradicional (Professora A, grifo nosso)

Podemos depreender da fala da Professora A que a estruturação do curso –


“muito canônico” e “muito tradicional” – (de)limita a escolha do professor, e faz com
que a prática docente seja perpassada pelas vozes ouvidas na prática discente, de modo
que o programa da disciplina não ecoe apenas a noção de currículo e de cânone, mas de
prática docente embasada numa metodologia de reprodução, e na ideia de polifonia e
exotopia (BAKHTIN, 1997). O discurso do professor, na forma de enunciados, é
perpassado por inúmeros enunciados ditos antes por ele mesmo e por outros
(professores, críticos, escritores de ficção), isto é, por inúmeras vozes. No entanto,
como a própria Professora A apontou ao dizer “Poderia sim.”, nossos enunciados
podem ecoar enunciados que ainda não foram ditos – podem trazer/trazem diferença e
mudança.
Indagado acerca de nossa educação ser focada na metodologia da repetição –
como argumento de autoridade, a exemplificar pela leitura da própria crítica literária – e
20

da possibilidade de mudança do cânone, o Professor B falou que a tradição literária já


está mudando. Segundo ele, a mudança na tradição, com o enfoque não na questão de
gênero, acontece desde o trabalho dos irmãos Campos, por meio da reforma da tradição
– com a recuperação do (sequestrado) Barroco brasileiro por Haroldo de Campos – , do
resgate de autores – a exemplificar por Sousândrade –, e, mais recentemente, pela
reivindicação de uma tradição pela literatura marginal – não apenas Ferréz, mas
também Antônio Fraga e João Antônio, além de “ressignificar Lima Barreto”. Ele
também disse que, por meio destes movimentos, a própria ideia de cânone é colocada
em questão, de modo que a tradição literária possa ser ressignificada e, com isso,
possibilite novas formas de pensar e organizar o cânone:

E também não é só o cânone que muda, eu acho que é algo que pode ser
mais… ahn… potente do que isso, com todo esse movimento e também… o
ligado ao gênero… é o próprio modo de pensar e organizar uma tradição
em uma linhagem, né? Ou seja, a própria ideia de cânone eu acho que é o
que se coloca em questão. Que eu acho que é mais interessante. A própria
ideia, e essa é uma autocrítica que eu faço, ahn... eu ainda sou preso a um
cânone quando eu monto os programas. Eu tenho que dar Guimarães, eu tenho
que dar Clarice, né? Porque é a expectativa dos alunos, é a expectativa da
universidade, ahn… mas em certo sentido, eu ainda to preso a uma ideia de
cânone. Por que que eu não dou… sei lá, poderia dar uma disciplina de
Brasileira III só de autoras mulheres de prosa contemporânea. Por que que eu
não dou? É, mas a questão é de…. E isso é algo que é estrutural porque passa
pela própria expectativa dos alunos: “Tem que formar um professor que
saiba dar aula sobre Guimarães Rosa…”. Mas como é que a gente muda?
Se não começar a gente não muda, né? (Professor B, grifo nosso)

Considerando o final do trecho acima, podemos relacionar o que a Professora A


chamou de “uma questão de costume” com o que o Professor B fala sobre questão
“estrutural”, isto é, expectativa da universidade, e também a expectativa dos próprios
alunos acerca das leituras que serão realizadas na disciplina. Aqui, também
depreendemos a função social do ensino-aprendizagem da disciplina, que é a formação
de futuros professores que trabalharão com Literatura em sua prática docente, seja ela
no ensino básico ou no ensino superior. Dessa forma, como o Professor B disse, suas
escolhas são (de)limitadas pelo cânone, pelo currículo e também pela função social da
disciplina e da graduação – formar professores capazes de (...) –, e também pelo
interesse dos alunos.
Um dado importante é que os alunos não apareceram na voz dos professores
apenas como um eco da Professora A enquanto aluna na graduação, e da questão da
expectativa discente. A voz dos alunos se mostrou essencial para a prática docente dos
professores, através de questionamentos que possibilita(ra)m reflexão, pesquisa e
mudança.
21

Após analisarmos os planos de ensino da disciplina, questionamos os


professores acerca do número de textos de autoria feminina. Ambos reconheceram que,
em um primeiro momento, os cronogramas de suas disciplinas apresentavam um
número ínfimo de textos de autoria feminina. Uma autora trabalhada pelos professores
foi Clarice Lispector, autora que, segundo a Professora A, “é canônica”, e, para o
Professor B, alguém que não se pode deixar de trabalhar na disciplina, o que acabou por
silenciar a voz de escritoras mulheres dentro do curso de Letras.
A Professora A ministrou, nesses dois anos como docente na universidade,
Literatura Brasileira I, II, III e IV. Analisando a ficha 2, na Literatura Brasileira I não
houve nenhuma escritora mulher; na II, duas escritoras; na IV, duas escritoras cujos
textos foram discutidos em sala e seis na lista de autores para seminários (com vinte e
um homens)2, e na III, a disciplina aqui analisada, três mulheres. Nas palavras dela, esse
fato se deve ao já citado cânone literário. Ela ainda exemplificou tal fato com um relato:

(...) Por exemplo, a primeira vez que eu lecionei Brasileira I foi no primeiro
semestre do ano passado e uma aluna me perguntou por que não tinha
nenhuma escritora mulher, se elas não escreviam nessa época. Eu expliquei
que as mulheres sempre escreveram, talvez, em menor quantidade do que os
homens, principalmente pelo difícil acesso delas à educação, pois a
alfabetização feminina não ocorreu do mesmo modo que a dos homens. Por
isso, as mulheres acabavam escrevendo menos e ficaram fora do cânone. Mas
é possível encontrar pesquisas de produção escrita por mulheres no período
colonial, mas são pesquisas recentes, que, de fato, são pouco divulgadas.
Depois que essa aluna me questionou eu pensei: não têm escritoras
mulheres nesta ficha, mas poderia ter, por que não? Eu poderia procurar
alguns nomes e trabalhar (...) . (Professora A, grifo nosso)

A Professora A repensou seu programa durante a prática docente através do


diálogo com umA alunA – a identificação de gênero da estudante é um dado
importante, porque, na posição de discente mulher, ela estava questionando a voz de seu
gênero dentro da instituição acadêmica da qual participa. Podemos especular3 se o
gênero da professora foi um fator determinante da pergunta da aluna, seja pelo lugar de
fala, seja pela ausência da autoria feminina na aula de uma docente mulher.
A resposta da professora tratou da posição desvalorizada da mulher na sociedade
e, consequentemente, nas práticas sociais escritas, sendo a Literatura uma delas. Ela
aponta, contudo, que as mulheres sempre escreveram, mas ficaram fora do cânone
devido ao seu silenciamento. Apesar de não mencionar diretamente, a professora alude
a “pesquisas recentes, que, de fato, são pouco divulgadas”.

2
Para as disciplinas de Literatura Brasileira II e IV, não analisamos as fichas 2, mas sabemos dos
conteúdos aplicados por termos sidos alunas da Professora A nestas disciplinas. O leitor pode ter contato
com o programa via link do site no anexo 1.
3
Podemos apenas especular, já que a identidade da aluna não nos foi revelada.
22

Nos programas dos três anos consecutivos que o Professor B ministrou a


disciplina Literatura Brasileira III, nos anos 2015, 2016 e 2017, observamos um
aumento gradativo na quantidade de textos de autoria feminina. Em 2015, havia Clarice
e Verônica Stigger; em 2016, essas duas mais Adalgisa Nery e Pagu 4. Em 2017 entrou
Carolina Maria de Jesus, que ocupa não apenas o espaço da autoria feminina, mas
também da autoria socioeconomicamente marginal. Antes mesmo de apontarmos esta
mudança, quando falava sobre a forma como planeja o programa da disciplina, o
Professor B já expressou que, sendo a terceira vez que ministra essa disciplina,

ao longo dos anos eu fui ajustando na medida em que fui percebendo certa[s
coisas] (...) na prática, no meu primeiro programa eu tinha pouquíssimas
autoras mulheres (...) quando eu fui reformular pro segundo ano, eu já tinha
percebido isso, ahn… e… eu decidi mudar e tentar melhorar um pouco isso, e
agora no terceiro ano eu tentei ainda mais”. (Professor B, grifo nosso)

Pelo relato dele, por meio da escolha pelas palavras “ajustando” e “percebido”,
podemos ver que ele (re)pensou sua prática docente e reformulou o programa das
disciplinas ao longo dos anos de forma “consciente”. Ao caracterizar esta percepção
como “consciente”, ele retoma seu percurso acadêmico e de pesquisa, recuperando o
movimento estudantil e leituras teóricas como Derrida e sua ideia de falogocentrismo.
Contudo, ele aponta que “a questão é… quando eu fui dar aula mesmo que eu... eu
tomei um susto com o meu… meu próprio programa” (grifo nosso). Ao falar do susto,
ele conta que:

Mas não só com isso, também com perguntas feitas por alunas sobre
romances masculinos, por exemplo…. Mais de uma aluna perguntou… ahn...
sobre a posição das personagens femininas, por exemplo, no “Lavoura
Arcaica”, que as mulheres não falam, né? Ahn… sintomaticamente foram
mulheres que fizeram essas perguntas, né (risos). Então, é, digamos, que,
em certos sentidos, esse tipo de coisa reverbera, né, então não… não é
simplesmente uma questão teórica... da falta de mulheres no programa foi algo
que se deu num… num impacto da docência, né, das relações. Tomei um
susto comigo mesmo né na verdade (risos). (Professor B, grifo nosso)

Assim como a Professora A, o Professor B aponta que teve essa percepção não
apenas por questões teóricas – pois a teoria, como já apontado por ele, tem um
fundamento patriarcal, de modo que trabalha a favor da permanência do cânone já
estabelecido e da ideologia hegemônica –, mas pela prática docente, nas relações dentro
da sala de aula. Além disso, ele salienta que “sintomaticamente” foram alunAs
mulheres que questionaram a posição de personagens mulheres dentro dos textos, isto é,

4
Fizemos análise dos programas da presença da autoria feminina nos anos anteriores via memória porque
fomos alunos do professor B.
23

a identificação de gênero fez com que as alunas refletissem sobre a condição de seu
gênero dentro da ficção.
A partir da voz do Outro, os professores refletiram sobre seus programas e sobre
sua prática docente e, como resposta, o Professor B reformulou seu programa, e sinaliza
que continua a modificar, inclusive apontou que esse ano ele percebeu não um
problema relacionado ao gênero, mas quanto à falta de textos de escritores negros. A
Professora A contou que depois do questionamento da aluna: “eu pesquisei”, o que
mostra a dupla função do professor (não apenas do professor universitário, mas
principalmente) como docente e como pesquisador. Segundo Rita Teresinha Schmidt,
precisa-se quebrar a oposição entre educador e pesquisador e tentar cumprir a função
social do professor de ser um “agente de formação, produção e transformação” (2011,
p. 180) que esteja “comprometido com um saber/fazer pautado na concepção do
conhecimento como processo de intervenção nas práticas discursivas, culturais e
políticas que constituem a realidade e da educação como uma prática da liberdade”
(SCHMIDT, 2011, p. 181).
Segundo as pesquisas da Professora A, muitas mulheres que escreveram nos
séculos XVII e XVIII estão no contexto educacional, isto é, mulheres que escrevem
sobre pedagogia, e inclusive têm escola em casa. Ela ainda fala: “E isso foi bem
pioneiro aqui no Brasil, e é bem interessante pensar que isso foi feito por mulheres”. O
relato da pesquisa da Professora A responde à série de perguntas que Schmidt (2011)
aponta como importantes para o comprometimento com a construção do conhecimento
e a formação em estudos literários, a serem:

o que sabemos? Como sabemos o que sabemos? Que recursos o discurso


mobiliza para dizer o que diz? Quem representa o que para quem? Por quais
razões? Para alcançar quais efeitos? A que interesses servem? Que
conhecimentos determinadas representações produzem? O que é silenciado em
determinadas representações? Tais perguntas não surgem às margens do
pensamento teórico contemporâneo, pelo contrário, emergem em decorrência
de seus avanços. (SCHMIDT, 2011, p. 181).

Além disso, considerando a presença e a importância da voz do aluno


perpassando o discurso e a prática docente dos professores, e do caráter docência-
pesquisa, podemos falar que há construção do conhecimento em conjunto, e um
rompimento com a visão bancária da educação na qual o professor “transmite” os
conhecimentos para os alunos. Aqui, o professor também aprende com o aluno, de
modo que ambos têm voz e compartilham seu conhecimento, um dando acabamento
exotópico ao outro (BAKHTIN, 1997) – já que o discente aprende com o docente e o
24

docente aprende com o discente (FREIRE, 1996).


Perguntamos para ambos os professores se eles acham que os alunos têm a
percepção de que o cânone literário é predominantemente masculino, e a Professora A
apontou que “é um movimento mais recente”, pois ela não tinha essa percepção muito
clara em sua época de graduação. Contudo, ela relatou que no semestre passado, quando
ofereceu a disciplina Literatura Brasileira IV - poesia contemporânea -, muitos alunos
pediram para fazer os seminários sobre poemas de poetas mulheres.
O Professor B, também comparando a atual geração de estudantes na graduação
em Letras com a sua geração, diz que “o discurso de gênero é muito mais forte” hoje e,
consequentemente, a percepção da discrepância do número de obras de autoria feminina
e masculina estudadas na Academia. Contudo, ele chama atenção ao fato de que, às
vezes, de tão óbvio não é evidenciado, de modo que só a percepção não basta. É
necessário que a percepção leve a uma indagação, a um questionamento.
Acreditamos que essa indagação já está acontecendo nesta nova geração fruto de
discussões teóricas e dentro dos movimentos sociais acerca do papel da mulher na
sociedade e no espaço literário. E os próprios professores apontam a concretização
dessa mudança quando relatam questionamento de alunas acerca da posição da mulher
enquanto autoras e enquanto personagens de ficção. A realização de pesquisas de
resgate de autoras (o livro Literatura e Feminismo, organizado por Christina Ramalho,
1999, é um exemplo, além das pesquisas de Elódia Xavier, Angélica Soares, Helena
Parente Cunha e Rita Therezinha Schmidt), a criação de eventos como a Semana da
Mulher do curso de Letras da UFPR, e a própria realização deste estudo etnográfico são
tentativas de desnaturalizar/desconstruir o discurso hegemônico e repensar o cânone e,
como disse Elódia Xavier:

A tradição canônica não pode e não deve, pura e simplesmente, ser abolida;
mas a flexibilização do cânone, reconhecendo a contribuição das diferenças,
pode e deve permitir a valorização de obras até então invisíveis. Porque, além
do cânone, há muito mais do que supõe o nosso relativo conhecimento...
(XAVIER, 1999, p. 21)

Decidimos finalizar essa seção com uma reflexão do Professor B acerca da


autoria feminina como “meio” de trazer a diferença para o cânone e não como “fim”,
apontando uma estratégia para transgredir o sistema – numa continuidade do caráter de
ruptura do discurso do conhecimento de que falou Stuart Hall sobre o Feminismo –,
mesmo que de forma lenta e gradual. Enquanto objeto de pesquisa, o trecho seguinte
ilustra não apenas a importância da perspectiva êmica em nosso estudo, mas também
uma sinalização de uma possibilidade de mudança que, como apontado anteriormente,
25

já está acontecendo na prática docente, discente e também na prática da pesquisa:

(...) como eu disse, é um problema... estrutural, né, um trabalho… um


trabalho de formiguinha , né… não sei se… e a maior questão não é nem
tanto… ahn, eu acho… quer dizer… isso das escritoras mulheres, é mais um
meio do que um fim em si mesmo, né. É um meio de tentar… quebrar, ou
mesmo que minar, como o cupim, devagarzinho, né… o sistema, né? Então...
eu acho que é mais isso que está em jogo. (Professor B, grifo nosso)
26

4.3 A Voz do Aluno

Neste terceiro momento de análise, após termo-nos voltado para o currículo da


disciplina Literatura Brasileira III e seus atuais docentes, temos a vez do aluno e
trabalhamos, portanto, com a voz do aluno. Considerando um de nossos objetivos de
pesquisa – verificar qual a percepção dos discentes da disciplina em relação à ausência
de mulheres no cânone literário –, criamos o questionário online baseados em nossa
própria experiência enquanto estudantes de Letras e de maneira que verificássemos a
opinião dos alunos e alunas sobre a disciplina analisada, sobre o próprio curso de Letras
e sobre a experiência enquanto leitores de literatura.
Primeiramente, os alunos responderam no questionário se tinham a experiência
de leitura de obras escritas por mulheres enquanto estudantes de Letras. Dos 25
respondentes, apenas um respondeu que não, resultando em 4%. Os demais 96%
responderam que sim, tinham essa experiência. É interessante notar que a resposta
negativa proveio de uma respondente mulher, aluna da Professora A, que
posteriormente também afirmou não perceber um esforço da professora para que mais
mulheres fossem lidas dentro da disciplina. A mesma respondente, porém, afirmou em
outra pergunta nunca ter pensando a respeito das diferenças entre a presença da autoria
feminina e da autoria masculina canônicas.
Em seguida, pedimos aos respondentes que afirmaram que haviam lido obras
escritas por mulheres na questão anterior que dissessem em que contextos essas leituras
ocorreram. Algumas das respostas, que eram de cunho dissertativo, envolveram citações
das disciplinas em que o contato ocorreu, em sua maioria disciplinas de literatura, e
também mencionaram quem foram os docentes que trouxeram essas leituras. Além
destas, uma resposta teve a citação de disciplinas de Linguística e de Tradução; um
respondente afirmou ter lido escritoras teóricas em diversas matérias; outra aluna disse
ter lido mulheres em uma disciplina de Educação. Estas respostas nos chamam a
atenção por irem além de nosso esperado. Enquanto pesquisadores, focamo-nos em
mulheres escritoras de literatura, e é interessante notar que alguns respondentes não
(de)limitaram-se apenas a esse campo de conhecimento. Outra respondente afirmou ter
lido mulheres em grupos de discussão, outro campo de atuação que não foi incluído em
nossas reflexões – devido ao recorte da pesquisa - mas que também nos chamou a
atenção, já que podemos entender que fora das (de)limitações das disciplinas, existem
outros espaços dentro da academia onde mulheres podem ser lidas.
27

Demais respostas que nos chamaram a atenção incluem a resposta de uma aluna
que afirmou ter lido essas obras em “Raras disciplinas. Apenas em Brasileira II e agora
em Brasileira III e disciplinas do Espanhol” e a resposta de uma aluna que afirmou ter
lido-as “Em todas as disciplinas, incluindo poesia, prosa e teoria”. Vale notar que essas
alunas são discentes de Letras há mais de dois anos, a primeira integrante está no curso
desde 2015 e a segunda desde 2014, o que torna mais claro para nós a importância do
papel do professor na decisão de seu programa de disciplina. As duas alunas, a
princípio, deveriam ter experiências similares dentro de seus estudos, mas a diferença
de respostas nos leva a crer que as experiências diferentes provém de diferentes atitudes
dos professores em relação ao cânone, seja ele literário ou teórico.
Pensando ainda sobre o papel do professor, perguntamos, na quarta questão, se
os respondentes percebiam algum esforço dos docentes de Literatura Brasileira III para
que obras escritas por mulheres fossem lidas. Como o leitor notou na seção anterior,
ambos os professores afirmavam ter esse esforço, portanto, essa pergunta promovia o
caráter perceptivo dos alunos que queríamos pesquisar. Dentre os respondentes, vinte e
três (92%) responderam que sim, percebiam esse esforço; dois alunos (8%) afirmaram
que não.
As respostas positivas afirmam a perspectiva que assumimos anteriormente, de
estarmos pesquisando a prática docente de dois professores conscientes da discrepância
entre as obras lidas escritas por homens e as escritas por mulheres. São as respostas
negativas, portanto, que são mais notáveis para nós: as duas respostas vêm de alunas,
uma aluna da Professora A e outra aluna do Professor B. A aluna da Professora A,
supracitada, afirmou nunca ter pensando a respeito da discrepância no cânone, mas a
aluna do Professor B afirma que isso a faz sentir incomodada. Como as perguntas aqui
eram objetivas, não saberemos dizer exatamente o porquê destas alunas não terem
percebido um esforço por parte de seus professores; podemos apenas pensar em
hipóteses: será que as alunas não percebem um esforço por acreditarem que as
disciplinas seriam normalmente guiadas assim, ou será que o esforço não foi impactante
a ponto de ser notado?
Posteriormente, questionamos os alunos em relação à existência de uma
disparidade entre a quantidade de obras estudadas de autoria feminina e a de autoria
masculina dentro do curso de Letras da UFPR. Constituindo um cenário em que todas
as respostas obtidas (100%) apontaram para a existência dessa desproporção, os
resultados nos surpreenderam na medida em que evidenciam o quão ciente está o corpo
discente dessas turmas de modo geral, a respeito dessa dessemelhança no curso de
28

Letras. Ainda, a partir da comparação com algumas das respostas dos docentes nas
entrevistas, é possível encarar essa unanimidade como uma indicação, de fato, de que
“o discurso de gênero é muito mais forte” hoje, nas gerações mais recentes, assim como
afirmou o Professor B.
Todavia, ao analisarmos a quarta pergunta do questionário - referente a como o
respondente se sente no caso de acreditar que essa discrepância genérica citada na
pergunta anterior de fato existe -, também podemos notar a percepção sem indagação
da qual o Professor B igualmente discorreu em sua entrevista, embora em proporções
bem pequenas, visto que apenas duas respondentes afirmaram nunca terem se
questionado quanto a disparidade aqui discutida. Considerando que os 25 respondentes
puderam assinalar quantas opções lhes fossem convenientes, obtivemos 16 afirmações
de que o indivíduo se sente incomodado, 10 de que se sente triste e 5 de que se sente
bravo.
Dentro desse quadro, o que mais se destoou foram dois respondentes que
selecionaram a opção “Outro”, discorrendo subjetivamente como se sentem nesse
panorama. Vale lembrar que ambos são do gênero masculino, mas enquanto um estuda
com o Professor B e declarou ter entre 17 e 20 anos, o outro é da turma da Professora A
e declarou ter idade entre 26 e 29 anos. Ambos atentaram pro fato de “que vivemos em
uma sociedade construída historicamente com bases no patriarcado”, assim como
afirmou o respondente mais velho, e que “durante [a] maior parte da história literária
sequer existia a possibilidade de mulheres escreverem”, assim como discorreu o mais
novo. Dessa forma, os dois respondentes aqui citados expressaram que compreendem
que o cânone seja constituído majoritariamente por autores do gênero masculino, não se
surpreendendo com a diferença expressiva entre o número de autores homens estudados
e o de mulheres. Porém, enquanto o mais jovem manifestou que desconhece uma
possibilidade de “fugir dessa desproporção” nos estudos literários, o mais velho
defendeu a ideia de que só o fato de estar consciente a respeito da divergência desse
cenário já constitui uma alternativa para direcionar esforços “para uma subversão desse
cânone, incluindo mais escritoras”.
Essas respostas contribuíram muito para nossas reflexões, permitindo-nos
levantar algumas outras hipóteses, tais como: os homens nessa pesquisa se sentiram
mais confortáveis para expressar sua opinião e/ou o que sentem? Ou, até mesmo, os
seus próprios sentimentos aparentam ser mais sólidos, definidos, (de)limitados?
A quinta pergunta de nosso questionário pedia respostas subjetivas de nossos
respondentes, solicitando comentários ou relatos de experiências que eles quisessem
29

compartilhar. Dos 25 respondentes, apenas 11 responderam este campo, sendo 2 do


gênero masculino e as demais do gênero feminino.
Retomando nossa discussão sobre o papel do professor enquanto “agente de
formação”, vale mencionar que diversas respostas se referiram ao posicionamento e às
atitudes dos docentes dentro desse contexto de presença/ausência de autoras femininas
dentre as obras e escritores estudados, seja na disciplina de Literatura Brasileira III
especificamente, seja no curso de Letras como um todo. Nesse sentido, as afirmações de
alguns dos respondentes corroboraram com as argumentações dos professores nas
entrevistas supracitadas, como uma aluna da Professora A, por exemplo, a qual
comentou que sua docente trouxe propositalmente mais mulheres para a disciplina. Esse
tópico a respeito do esforço dos docentes mostrou-se recorrente em três outras
respostas, nas quais os estudantes explicaram que ambos os professores A e B se
mostraram preocupados com a questão e estruturaram bons programas para a disciplina
aqui analisada. Ademais, eles afirmaram que esses professores não só incorporaram
escritoras reconhecidas pelo cânone como também autoras marginalizadas e pouco
conhecidas. Os mesmos respondentes ainda discorreram sobre o corpo docente do curso
no geral, argumentando que

(...) os professores têm se esforçado para tocar no assunto, (...) Mesmo em


matérias que não foram estudadas obras de mulheres, houve um esforço para
se comentar a respeito, com a indicação de artigos que tratam o tema (como
em Literatura Brasileira I, com Maria Isabel Bordini). (Estudante do Professor
B, do gênero masculino)

Apesar de enfatizar que acredita na possibilidade de haver um contato com


autoras mulheres cada vez maior, a única discente do gênero feminino - dentre os três
mencionados acima - expressou que essa possibilidade depende completamente do
esforço dos professores: “(...) Creio que é muito possível que a gente possa ter contato
cada vez mais com escritoras, só basta os profs (sic) se esforçarem para isso.”.
Outra discente, do Professor B, expressou sua opinião a respeito do trabalho dos
docentes em cima desse problema e mostrou-se ciente das dificuldades que eles
enfrentam quando estruturam suas disciplinas:

Acredito que os docentes tratem da questão abordando pontos de vista lúcidos,


como a estrutura machista presente na sociedade e que influencia,
infelizmente, o meio literário. Também acredito que é importante não perder
de vista questões cronológicas ao pensar sobre o tema, pois há momentos da
historiografia literária em que a voz das mulheres foi amplamente silenciada,
portanto, não se tem notícia das suas produções. (Estudante do Professor B, do
gênero feminino)
30

Essa resposta, portanto, parece-nos especialmente relevante para nossa pesquisa:


a estudante mostra-se não somente ciente do esforço de seus professores em trazer
mulheres para a Academia, como também do silenciamento histórico que as mulheres
escritoras enfrentaram. Com um cruzamento de dados, notamos que essa aluna é a que
afirmou ter lido mulheres “em todas as disciplinas” dentro da faculdade. A partir disso,
abrimos aqui mais uma hipótese: será que esta estudante possui esta percepção sobre o
curso de Letras por ter tido mais oportunidades de leitura de mulheres enquanto
discente?
Por outro lado, alguns dos comentários referentes a essa pergunta expressaram o
descontentamento dos respondentes. Uma estudante do Professor B explicou que sente
uma desvalorização, desconsideração e não-reconhecimento de obras escritas por
mulheres por parte da maioria dos docentes da instituição. Além disso, outra aluna
dessa mesma turma afirmou que percebe uma escassez de textos produzidos por
mulheres em outras disciplinas, como nas da área de clássicas e de literatura
portuguesa: “Não existem é mera desculpa, porque há sim textos, ainda que menos
conhecidos, por e sobre mulheres” (destaque no original).
Uma outra resposta trouxe, também com indignação, um fator importante para
nossa pesquisa, noticiando que, no próprio vestibular da UFPR, apenas três mulheres
diferentes apareceram na lista das obras de literatura indicadas para as questões de
Literatura Brasileira, sendo elas Ana Miranda, Clarice Lispector e Cecília Meireles.
Este fator nos ajuda a pensar, primeiramente, que estamos sempre frente a um cânone
engessado em escritores homens. Segundo, que se nós, enquanto estudantes de Letras,
enfrentamos obstáculos para ler obras escritas por mulheres, é uma pena notar que os
vestibulandos também passam por esse desafio. Com a falta de mulheres na lista do
vestibular (a lista para o concurso presente, de 2017/2018, possui uma mulher - Ana
Miranda - e oito homens como indicação), entendemos que, por conta da Academia, os
alunos, quaisquer sejam seus cursos desejados, não são incentivados a lerem mulheres a
não ser que por contra própria. Se este fato já é triste dentro do nosso curso, a mesma
perspectiva dentro do vestibular, que é realizado pelos milhares de jovens da nossa
sociedade, nos faz questionar por quanto tempo o silenciamento da voz da mulher ainda
permanecerá fora da Academia.
Por fim, dois comentários chamaram-nos a atenção de forma especial. O
primeiro constitui a expressão de uma aluna a respeito do impacto que a presença de
mulheres nos estudos literários causa não só no aspecto individual, como discente, mas
também no coletivo, como estudantes do gênero feminino: “Quando obras escritas por
31

mulheres são estudadas, me sinto, muitas vezes, representada, além de perceber que as
mulheres da sala de aula participam mais da discussão a respeito da obra.” (Discente do
professor B). Ela atenta, portanto, aos benefícios que uma inclusão traz ao contexto
acadêmico de sala de aula. E é justamente esse movimento e processo de incorporação
do feminino, de uma busca por uma contemplação genérica equilibrada nos estudos
literários que é clamado pelo segundo (e último) comentário - o qual nos parece, caro
leitor, um conveniente final para nossa análise: “Se ninguém começar a estudar
escritoras mulheres, então escritoras mulheres não serão conhecidas. É priciso (sic) uma
mobilização para se repensar a literatura e os cânones literários.” (Discente do Professor
B, do gênero masculino).

4.3 Vamos Ler

As últimas duas perguntas do questionário online pediam que os respondentes


citassem quais foram as escritoras mulheres cujas obras eles haviam lido tanto dentro
quanto fora do curso de Letras da UFPR. Na primeira pergunta, sobre as escritoras lidas
dentro do curso, encontramos um total de 36 autoras sendo mencionadas, incluindo
aquelas esperadas por estarem previstas na disciplina de Literatura Brasileira III -
Adalgisa Nery, Clarice Lispector, Carolina Maria de Jesus, Pagu e Verônica Stigger.
Como o curso de Letras da UFPR comporta habilitações em mais de 10 línguas,
encontramos na lista escritoras que não são brasileiras, mas americanas, inglesas,
irlandesas, indianas, alemãs, austríacas, espanholas, paraguaias, gregas. Além disso,
temos a presença da intelectual francesa Simone de Beauvoir, filósofa, romancista e
feminista. Embora não saibamos em qual contexto ocorreu esta leitura dentro de Letras,
podemos supor que foi apresentada por um docente intencionalmente, como um
processo de intervenção.
Na segunda pergunta, sobre escritoras lidas fora do curso de Letras, vemos o
número da lista quase dobrar, subindo para 68. Vemos repetidas as autoras mais
canônicas da primeira lista - Cecília Meireles, Clarice Lispector, Emily Dickinson,
Virginia Woolf, mas são as escritoras fora do cânone que nos chamam a atenção. Na
segunda lista, temos a presença de escritoras daquilo que é considerado literatura global
- Agatha Christie, Anne Rice, Emily Bronte, Jane Austen, J.K. Rowling, Stephenie
Meyer, Suzanne Collins; escritoras brasileiras contemporâneas - Alice Sant’Anna,
Bruna Beber, Carol Bensimon, Clara Averbuck, Julia Dantas; escritoras muito
reconhecidas por seus trabalhos com literatura infanto-juvenil - Ana Maria Machado,
32

Marina Colasanti; escritoras de histórias em quadrinhos - Marjane Satrapi. Estas, entre


muitas outras, revelam que os alunos do curso de Letras não se sentem (de)limitados
pelo cânone quando fazem suas escolhas para leituras pessoais, lendo não somente
mulheres, mas mulheres das diversas áreas da literatura. Isso pode ser tanto a causa
quanto a consequência do pensamento apontado pelo Professor B em entrevista, de que
a nova geração de alunos já possui um forte discurso de gênero, o que também podemos
constatar pela presença de escritoras feministas como Beauvoir e Chimamanda Ngozi
Adichie na lista.
Nesta seção, portanto, apresentaremos quais foram as autoras citadas pelos
respondentes do questionário nas duas perguntas tanto como apoio para nossa análise
quanto como um convite para você, caro leitor, para que questione se você já leu estas
escritoras, dentro ou fora de um curso de Letras, mas também para que agora,
repensando seus conhecimentos sobre escritoras mulheres, procure conhecer suas obras
também.

Escritoras lidas dentro do curso de Letras da UFPR

● Adalgisa Nery
● Ana Cristina Cesar
● Ana Martins Marques
● Ana María Matute
● Angélica Freitas
● Anne Enright
● Arundhati Roy
● Carolina Maria de Jesus
● Cecília Meireles
● Charlotte Perkins Gilman
● Clarice Lispector
● Eiléan Ní Chuilleanáin
● Elvira Vigna
● Emily Dickinson
● Flora Süssekind
● Herta Müller
● Hilda Doolittle
● Hilda Hilst
● Hildegard von Bingen
● Ingeborg Bachmann
● Isabel Allende
● Josefina Plá
● Katherine Mansfield
● Margaret Atwood
● Márcia Cançado
● Patricia Galvão (Pagu)
● Rosalía Castro
33

● Safo
● Simone de Beauvoir
● Sor Juana
● Susan Sontag
● Sylvia Plath
● Teresa D'Ávila
● Veronica Stigger
● Virginia Woolf

Escritoras lidas fora do curso de Letras da UFPR

● Adriana Falcão
● Adélia Prado
● Agatha Christie
● Alice Munro
● Alice Sant'anna
● Ana Cristina César
● Ana Maria Machado
● Ana Miranda
● Angélica Freitas
● Anne Rice
● Azar Nafisi
● Bruna Beber
● Camille Paglia
● Carol Bensimon
● Carola Saavedra
● Carson McCullers
● Cecília Meireles
● Chimamanda Ngozi Adichie
● Clara Averbuck
● Clarice Lispector
● Cora Coralina
● Deborah Ellis
● Eleanor Catton
● Elena Ferrante
● Ellen White
● Emily Brontë
● Emily Dickinson
● Futhi Nitshingila
● Harper Lee
● Hilda Hilst
● Inês Pedrosa
● Isabel Allende
● J.K. Rowling
● Jane Austen
● Jhumpa Lahiri
● Jill Eisenstadt
● Josefina Plá
● Julia Dantas
34

● Letícia Wierzchowski
● Lilia Moritz Schwarcz
● Lionel Shriver
● Louisa May Alcott
● Lygia Fagundes Telles
● Margaret Atwood
● Marguerite Duras
● Maria Luisa Bombal
● Maria Valéria Resende
● Marina Colasanti
● Marion Zimmer Bradley
● Marjori Satrapi
● Martha Medeiros
● Mary Shelley
● Maya Angelou
● Miranda July
● Mariama Bâ
● Patti Smith
● Paulina Chiziane
● Rachel de Queiroz
● Simone de Beauvoir
● Stella Carr
● Stephenie Meyer
● Suzanne Collins
● Sylvia Plath
● Teresa de La Parra
● Vanessa Barbara
● Virginia Woolf
● Zélia Gattai
35

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em nossas considerações finais, faremos uma breve triangulação da análise do


dados gerais, a serem:

Currículo e cânone

A prática A voz do
docente aluno

de modo que a triangulação, isto é, o cruzamento dos dados, é um cruzamento de três


aspectos: a relação intrínseca entre currículo, prática docente e voz do aluno, pois um
elemento depende do outro para existir. Como se pode observar no decorrer do texto, a
geração de dados em um instrumento dependeu da consciência êmica - dos próprios
participantes da pesquisa - da existência dos outros dois aspectos da pesquisa, de forma
que se pesquisou a relação entre os três elementos. Cada capítulo tratou do vértice de
uma análise triangulada, que convergiu em um foco que foi a perspectiva êmica de cada
instrumento. Isso pode ser exemplificado pelo questionário dos discentes, pois os alunos
tiveram que pensar em sua vida acadêmica, na prática dos professores e também no
currículo. Sendo assim, para pensarmos mudanças no currículo, é preciso que haja
mudanças concomitantemente na prática docente e discente.
Ao término deste trabalho, depreende-se que os professores da disciplina em
questão não se limitam a seguir os pressupostos da ementa. Esta constatação, a nosso
ver, retrata que os docentes, mediante as suas respectivas reflexões no processo de
ensino-aprendizagem, buscam adotar procedimentos que reestruturam o cânone literário
masculino, deixando-o mais inclusivo. Conforme analisamos na nossa pesquisa, a
tentativa de reestruturação também provém da voz dos alunos, uma vez que os discentes
se posicionaram, com ímpeto e veemência, diante da marginalização da literatura escrita
por mulheres, promovendo modificações para o conteúdo abordado em sala de aula -
como também foi relatado pela Professora A. No que tange a esta reconfiguração, nota-
se, em um primeiro momento, que o conhecimento oriundo da escrita de autoria
feminina é incorporado na relação docente-discente. Este fato ilustra, de acordo com o
nosso entendimento, um esforço de inserção das mulheres no âmbito do saber. Inserção
36

que condiz com a possibilidade de vislumbrá-las não como um ser à parte, desenraizado
do cenário cultural, mas como um ser sócio-histórico e intelectual. Relembrando o
parecer do Professor B, esta inserção é gradativa, é “um trabalho de formiguinha”, isto
é: deve ocorrer paulatinamente em nossa prática como docente, discente e de leitor da
palavra “mundo” e da palavra “literária”, entrevendo, por conseqüência, a autoria
feminina como um meio, um caminho para deixar o ensino de literatura mais plural e
menos segregador. Formiguemos, pois.
Embora tenhamos conseguido obter êxito na presente pesquisa, muito ainda
deve ser feito, uma vez que, na nossa concepção, o cerne vital deste trabalho é
impossível de ser exaurido nestas páginas. Seríamos levianos, negligentes, ao apontar
que esta temática é passível de ser esgotada, visto que o nosso estudo é um preâmbulo
para estudos vindouros. Um preâmbulo que não se distingue por ser um conhecimento
catedrático, o qual não se pode questionar. Pelo contrário, é apenas um saber que
necessita, urgentemente, de um diálogo com outros saberes, oriundos de outras leituras,
de outras análises, as quais contribuem ou podem contribuir para um aprofundamento
deste tema delicado que, infelizmente, é caro à Universidade Federal do Paraná. Isto
posto, o que desejamos, a partir de agora, é abrir a seara para pesquisas futuras, dado
que a grandeza e a riqueza de um determinado assunto somente serão realçadas quando
múltiplas interpretações e compreensões emergem em primeiro plano.
Indubitavelmente, o que nós nos propusemos a analisar merece ser ampliado, revisitado
e renovado, a partir dos questionamentos que são desencadeados. Que este trabalho
formigue.
37

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BARTHES, Roland. “A morte do autor”. In: O Rumor da Língua. São Paulo: Martins
Fontes, 2004.

BRAH, Avtar. “Diferença, diversidade, diferenciação”. In cadernos pagu. v.26. jan/jun,


2006, p. 229-376.

CANDAU, Vera M. F; OLIVEIRA, Luiz F. de; Pedagogia Decolonial e Educação


Antirracista e Intercultural no Brasil. Educação em Revista, Belo Horizonte, v. 26, n.
01, p. 15-40, abr. 2010.

CANDIDO, A. O Direito à Literatura. In: Vários Escritos. 5 ed. Rio de Janeiro: Ouro
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CULLER, Jonathan. Teoria literária: uma introdução. São Paulo: Beca produções Ltda,
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HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade.Rio de Janeiro: DP&A, 2006.

KUNDERA, Milan. A arte do romance. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

LARROSA, J. Notas sobre experiências e o saber de experiência. Revista Brasileira de


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Alberto Manguel sobre e-books. Entrevista por Galileu – 07 de novembro de 2014.
Disponível em: http://revistagalileu.globo.com/Sociedade/noticia/2014/11/nos-
38

confundimos-tecnologia-com-o-uso-que-fazemos-dela-diz-alberto-manguel-sobre-e-
books.html

POPKEWITZ, Thomas S. “História do Currículo, Regulação Social e Poder”. In:


SILVA, Tomaz T.S. (org.) O sujeito da Educação: estudos foucaultianos. Petrópolis,
Rio de Janeiro: Vozes, 2010, p. 173-210.

SCHMIDT, Rita Therezinha. Cânone, valor e a história da literatura: pensando a autoria


feminina como sítio de resistência e intervenção. El Hilo de la Fábula, v. 10, 2012, pp.
59-74.

______. Para quê literatura? Reflexões sobre conhecimento, reconhecimento e


educação. revista de letras, 2011, pp. 173-189.

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In: COSTA, M. V. (Org.). Caminhos investigativos: novos olhares na pesquisa em
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WIELEWICKI, Vera H. G. “A pesquisa etnográfica como construção discursiva”. In


Acta Scientiarum, Maringá, 23(1), 2001, pp. 27-32.

XAVIER, Elódia. “Para além do cânone”. In RAMALHO, Christina (org.). Literatura e


feminismo: propostas teóricas e reflexões críticas. Rio de Janeiro: Elo, 1999, pp. 15-23.
39

ANEXOS E APÊNDICES

APÊNDICE 1 - QUESTIONÁRIO ONLINE (ALUNOS)

Ano de ingresso no curso de Letras: 2012; 2013; 2014; 2015; 2016.

Idade: Entre 17 e 20 anos; Entre 21 e 25 anos; Entre 26 e 29 anos; Entre 30 e 50 anos;


Mais de 50 anos.
40

Gênero: Feminino; Masculino; Outro.

Docente: Professora A (vermelho); Professor B (azul).

1. Dentro do curso de Letras, você tem a experiência de leitura de obras escritas


por mulheres? Sim; Não.
41

Caso tenha respondido SIM na questão anterior, em que contextos ocorreu essa
leitura?___________________________________________________________
42

2. Dentro da disciplina de Literatura Brasileira III, você percebe algum esforço


dos professores para que obras escritas por mulheres sejam lidas?

Sim; Não.

3. Você acha que há uma diferença dentro do curso de Letras na quantidade de


obras estudadas que foram escritas por homens e nas escritas por mulheres?

Sim; Não.
43

4. Se existe uma diferença na quantidade de obras estudadas que são escritas por
mulheres para obras que são escritas por homens, como você se sente?

Não vejo diferença; Não sinto nada relevante; Nunca pensei a respeito; Me sinto
incomodada ou incomodado; Me sinto triste; Me sinto brava ou bravo; Outros.

Respostas Outros:
44

5. Você gostaria de acrescentar algum comentário ou relato? (questão aberta)


45

6. Que escritoras você já leu dentro do curso de Letras? (questão aberta)


46

7. Fora do curso de Letras, que escritoras você já leu? (questão aberta)

APÊNDICE 2 - ENTREVISTA COM OS PROFESSORES


47

ENTREVISTA - PROFESSORA A

1. Como é feito o processo de organização da Ficha 2 de uma disciplina?


Primeiro eu elaboro o programa aula a aula, eu sou meio metódica, eu gosto de saber
o que eu vou fazer em cada aula. Então, eu penso nos autores que poderiam entrar no
programa a partir da ementa, e eu organizo a ficha 2.

2. Analisando a ficha 2 das disciplinas que você ministrou (lit bras I, II e III),
vimos que na I não houve nenhuma mulher; na II 1 escritora (Pagu); na III 3
mulheres; na IV 2 escritoras lidas nas aulas e 6 na lista de seminários (de 21
homens). Como você encara esse fato? Essa ausência total na primeira disciplina,
referente aos séculos XVI ao XIX, e 3 na disciplina concernente à literatura
moderno-contemporânea?
Esse fato está relacionado com o cânone. Por exemplo, a primeira vez que eu lecionei
Brasileira I foi no primeiro semestre do ano passado e uma aluna me perguntou por
que não tinha nenhuma escritora mulher, se elas não escreviam nessa época. Eu
expliquei que as mulheres sempre escreveram, talvez, em menor quantidade do que os
homens, principalmente pelo difícil acesso delas à educação, pois a alfabetização
feminina não ocorreu do mesmo modo que a dos homens. Por isso, as mulheres
acabavam escrevendo menos e ficaram fora do cânone. Mas é possível encontrar
pesquisas de produção escrita por mulheres no período colonial, mas são pesquisas
recentes, que de fato, são pouco divulgadas.
Depois que essa aluna me questionou eu pensei: não têm escritoras mulheres nesta
ficha, mas poderia ter, por que não? Eu poderia procurar alguns nomes e trabalhar. A
questão é um pouco do nosso curso, ele é muito tradicional.

3. O fato de estudarmos pouco a literatura escrita por mulheres, pode-se


relacionar com a maneira como elas escreviam ou com a posição social que elas
ocupavam ao longo da história brasileira?
Foi isso, as poucas mulheres que escreveram não conseguiram atingir o público. E,
pelo pouco que eu pesquisei, muitas mulheres que escrevem a partir do século XVII e
XVIII, escrevem em um contexto educacional, são mulheres que escrevem sobre
pedagogia, às vezes elas têm uma escola em casa. E isso foi bem pioneiro aqui no
Brasil, e é bem interessante pensar que isso foi feito por mulheres.
48

4. Acha que poderia ter mais escritoras mulheres na Literatura Brasileira III? Se
sim, por que não tem?
Poderia sim. Mas a forma como o nosso curso está estruturado dificulta um pouco,
porque não é só uma questão da ementa – que é bem ampla – mas é uma questão de
costume mesmo. Por exemplo, eu estudei aqui, o meu curso foi muito canônico, e pra
eu dar uma disciplina inovando é difícil, você acaba imitando aquilo que você
aprendeu.

5. Como a nossa educação é focada na metodologia da repetição crítica (como


argumento de autoridade), você acha que essa lista de obras canônicas que
devem ser trabalhadas mudará quando e como?
Eu acredito que pode mudar sim, há certa liberdade nas ementas para colocar diversos
autores. Mesmo na Brasileira I, não há nada na ementa que me obrigue a trabalhar
Tomás Antônio Gonzaga e não outra autora que produziu no mesmo período que ele.
Eu poderia ter mudado.

6. Pensando no futuro: existe alguma perspectiva de inserção das mulheres no


cânone literário?
Sim, é uma questão de fazer o que eu não fiz na Brasileira I (risos), de estudar uma
autora que é mais “marginal”, despertar o interesse nos alunos sobre ela para que haja
pesquisa. Porque o cânone não cai do céu pronto, ele é construído. Na Brasileira IV
ficou mais aberto os seminários e surgiu interesse dos alunos por algumas autoras
contemporâneas.

7. Na sua formação discente, na graduação e pós-graduação, você leu mulheres


nas disciplinas obrigatórias? Lembra a quantidade aproximada? Quais eram as
escritoras lidas por você na sua formação acadêmica ou na sua formação como
leitora? Elas pertencem ao cânone?
Na Brasileira I e II não. Na III eu li Clarice - mas ela é canônica - e na IV algumas
poetas (Hilda Hilst, Adélia Prado, talvez). Mas eu li algumas coisas fora das
disciplinas. Recentemente, eu li Elvira Vigna e Maria Valéria Rezende, a Pagu eu li
no meu projeto de doutorado.

8. A literatura escrita por mulheres teve alguma relevância na sua formação


como leitora e como professora?
49

Teve relevância sim, a gente acaba buscando modelos quando entra na universidade.
Eu quando eu entrei em Letras queria escrever, e o cânone é predominantemente
masculino. Quando você se depara com uma obra de autoria feminina que é bacana,
isso de alguma forma acaba sendo uma referência.

9. Você acha que os alunos têm essa percepção de que o cânone é


predominantemente masculino?
É um movimento mais recente, até mesmo porque quando eu entrei na universidade
eu não tinha essa percepção tão clara.

10. Como em uma conversa sobre literatura é sempre legal dar indicações, qual
escritora mulher, que faça parte do cânone ou não, que seja lida ou não nas
disciplinas, você indicaria para os alunos lerem e fazerem pesquisas?
Eu indicaria 3 da literatura contemporânea que eu li recentemente. A Elvira Vigna,
Maria Valéria Rezende que é uma autora peculiar, é uma freira, faz trabalhos sociais,
e a Vanessa Bárbara, escritora bem jovem, recomendo o livro “Operação
Impensável”.
50

ENTREVISTA - PROFESSOR B

1. Como é feito o processo de organização da Ficha 2 de uma disciplina?


(gostaríamos de saber brevemente como você planeja o programa das disciplinas)
Tem a ementa... geral da disciplina que ta na grade curricular, né... então tem mais ou
menos... a ementa é bem simples. Tem um padrão, é… prosa brasileira
contemporânea… a gente coloca o marco mais ou menos dos 40 e dos 50 em diante.
Ahn… no meu caso, como eu entrei recentemente, eu procurei outros professores que
tinham dado recentemente essa disciplina e a partir disso eu organizei… organizei a
minha. Então, autores dos quais a gente não pode deixar de falar, né, especificamente
Guimarães e Clarice. Ahn… e a partir disso eu fui selecionando outros autores e
textos… ahn, de acordo tanto com a relevância na tradição literária, mas também de
acordo com a relevância… digamos política desses autores e textos. E também optei…
eu tento optar por trazer autores que são pouco lidos, e conhecidos e trabalhados, como
Antônio Fraga e José Fraga. E aí tem… é a terceira vez que dou essa disciplina,
Brasileira III, e aí ao longo dos anos eu fui ajustando na medida em que fui percebendo
certas… tudo bem, eu sabia que... do plano de vista teórico que... do sistema acadêmico,
literário e intelectual, ele é machista e patriarcal... ahn… mas na prática... no meu
primeiro programa eu tinha pouquíssimas autoras mulheres e aí… e isso me deu um…
quando eu fui reformular pro segundo ano, eu já tinha percebido isso, ahn… e… eu
decidi mudar e tentar melhorar um pouco isso, e agora no terceiro ano eu tentei ainda
mais. É claro que não resolve, né, porque o problema ta na base do sistema… ahn…
existem muitas mulheres que não escreveram, né... que não chegaram nem a escrever…
então... por causa do... desse fundamento patriarcal do sistema intelectual e literário.

2. Analisando a ficha 2 dos três anos que você ministrou a disciplina Literatura
Brasileira III na UFPR, 2015, 2016 e agora, 2017, vimos que houve um aumento do
número de escritoras mulheres no programa da disciplina. Em 2015, nós vimos
Clarice e Verônica Stigger; em 2016, essas duas mais Adalgisa Nery e Pagu. Em
2017 entrou Carolina Maria de Jesus. Como você encara esse fato? Foi algo
consciente? Partiu de alguma situação acadêmico-cotidiana ou de pesquisa?
(formulamos essa pergunta pensando que três integrantes do grupo fizeram a
disciplina contigo em dois anos diferentes, e levando em conta que uma aluna
comentou no survey - outro instrumento de pesquisa, com os alunos - que voce
chegou a comentar, em 2016, a inserção de mais mulheres e se desculpar por ter
colocado em 2015 poucas mulheres).
51

É… consciente foi, mas… ahn… claro que isso nasce de uma percepção difusa, que é
tênua, há muito tempo, desde o movimento estudantil, e das leituras teóricas e tal, de
Derrida e da ideia do falogocentrismo… mas a… a questão é… quando eu fui dar aula
mesmo que eu... eu tomei um susto com o meu… meu próprio programa. Mas não só
com isso, também com… com perguntas feitas... por alunas... sobre romances...
masculinos, por exemplo…. Mais de uma aluna perguntou… ahn... sobre a posição das
personagens femininas, por exemplo, no “Lavoura Arcaica”, que as mulheres não
falam, né? Ahn… sintomaticamente foram mulheres que fizeram essas perguntas, né
(risos). Então, é… digamos que isso tem um... um, em certos sentidos, esse tipo de… de
coisa reverbera, né, então não… não é simplesmente um... uma questão teórica... da
falta de... mulheres no programa foi algo que se deu num… num impacto da docência,
né, das relações.
Tomei um susto comigo mesmo né na verdade (risos)...
Não, e... ainda tem mais porque… daí esse ano eu me toquei, né… claro que eu já sabia,
mas foi um choque de novo porque tem... poucos negros, né?

3. Enquanto professor homem, qual a sua posição acerca da leitura de obras


escritas por escritoras mulheres na academia? Você acha que os homens, dentro de
sua posição dominante, devem trabalhar a favor do silenciamento das mulheres na
literatura ou devem inseri-las nesse contexto de ensino-aprendizagem?
Não, trabalhar a favor não… (risos) ah, ta é uma per, ta… É pra ter duas respostas
possíveis. Não, tem que trabalhar... pela a inserção, né, contra o silenciamento… Não,
é… tem que inserir, a questão é que… como eu disse, é um problema... estrutural, né,
um trabalho… um trabalho de formiguinha, né… não sei se… e a maior questão não é
nem tanto… ahn, eu acho… quer dizer… isso das escritoras mulheres, é mais um meio
do que um fim em si mesmo, né. É um meio de tentar… quebrar, ou mesmo que minar,
como o cupim devagarzinho, né… o sistema, né? Então... eu acho que é mais isso que ta
em jogo assim, né?

4. A crítica muitas vezes tratou a literatura escrita por mulheres como meramente
confessional e como “derramamento sentimental”, como aconteceu com Clarice
Lispector e de certa forma com Charlotte Perkins Gilman. Esse tratamento
reafirma o dualismo (queremos dizer: o julgamento hierárquico da dualidade)
homem vs. mulher e razão vs. emoção. Você acha que atualmente a crítica parou
de olhar dessa forma para os textos escritos por mulheres? Se sim, conseguiria
52

apontar um momento em que isso aconteceu?


Sim e não. De um modo geral, sim. Até porque tem… tem um fenômeno que é… que é
um pouco… ahn… (inaudível) na área de literatura… dos professores de literatura, que
há uma grande presença de mulher, né… embora os grandes críticos renomados sejam
sempre homens, né… o sistema se reproduz sempre de alguma maneira, né? Se não é no
número é no destaque, né… Ahn… Então acho que isso ajudou um pouco a quebrar
esse quadro… ahn... agora há ainda críticos, ahn… como é o nome dele?... ah, tem um
crítico… acho que da Zunái, da revista Zunái… Cláudio… não lembro. Mas se você
olhar o que ele fala da Angélica Freitas, é… é basicamente uma reprodução desse
discurso antigo de razão versus emoção e…. Só que sob nova roupagem, sob novos
aparatos críticos, mas… ahn… então… mudou mas ao mesmo tempo… continua… a
acontecer, eu acho. O sistema continua… No geral, o sistema… continua sendo
reproduzido, assim.

5. Você acha que os alunos têm essa percepção de que o cânone é


predominantemente masculino?
Olha, eu diria que eu acho que não. Eu não sei, porque a geração de vocês é muito
diferente da minha, então acho que... o discurso de gênero é muito mais forte... a
percepção disso é muito mais forte. Agora é algo que… ahn… de tão óbvio, eu acho
que às vezes não é evidenciado. Então a percepção em si… pode ser que tenha a
percepção, mas a questão é... se essa percepção leva a uma indagação do… do motivo,
né… um questionamento.

6. Como a nossa educação é focada na metodologia da repetição crítica (como


argumento de autoridade), você acha que essa lista de obras canônicas que devem
ser trabalhadas mudará? Se sim, quando e como?
Ah, acho que já ta mudando, né? Já ta mudando e… eu acho que a… assim, de outro
enfoque que não... a questão de gênero… desde o trabalho dos irmãos Campos, de
reformular a tradição e de pensar, de resgatar autores e… mais recentemente…
passando pelo lado da questão étnica e social, toda a reivindicação de uma tradição pela
literatura marginal… ahn... e isso não significa apenas ler Ferréz e tal, mas ler junto
Fraga, ler junto João Antônio, ler junto Lima Barreto, ressignificar o Lima Barreto
nisso, né? E também não é só o cânone que muda, eu acho que é algo que pode ser
mais… ahn… potente do que isso, com todo esse movimento e também… o ligado ao
gênero… é o próprio modo de pensar e organizar uma tradição em uma linhagem, né?
53

Ou seja, a própria ideia de cânone eu acho que é o que se coloca em questão. Que eu
acho que é mais interessante. A própria ideia, e essa é uma autocrítica que eu faço,
ahn... eu ainda sou preso a um cânone quando eu monto os programas. Eu tenho que dar
Guimarães, eu tenho que dar Clarice, né? Porque é a expectativa dos alunos, é a
expectativa da universidade, ahn… mas em certo sentido, eu ainda to preso a uma ideia
de cânone. Por que que eu não dou… sei lá, poderia dar uma disciplina de Brasileira III
só de autoras mulheres de prosa contemporânea. Por que que eu não dou?
É, mas a questão é de…. E isso é algo que é estrutural porque passa pela própria
expectativa dos alunos: “Tem que formar um professor que saiba dar aula sobre
Guimarães Rosa…”. Mas como é que a gente muda? Se não começar a gente não muda,
né?

7. Na sua formação discente, na graduação (pensando no curso de Direito mesmo)


e pós-graduação, você leu mulheres nas disciplinas obrigatórias? Lembra a
quantidade aproximada? Quais eram as escritoras lidas por você na sua formação
acadêmica? Elas pertencem ao cânone?
Bem, no Direito… tinha… eu tive bastante professora mulher… ahn… no Direito já…
eu acho que é algo anômalo da… No departamento que eu estudava, no curso que eu
estudava na UFSC, tinha muitas mulheres… eu tive... a minha orientadora de TCC foi
uma mulher… ahn, mas além disso a gente lia… claro que em menor proporção, mas a
gente lia… o que eles chamam de direito de doutrinadores, que são os comentaristas de
leis, a gente lia mulheres. Ahn… E na pós-graduação, eu li bastante… tanto escritoras
de literatura mulheres, quanto críticas… porque aí de novo o ambiente de Letras é um
ambiente que, lá na UFSC, é predominantemente feminino, né, de quantidade… aqui
é… se pegar Letras, Linguística e Literatura é mais ou menos parelho, né? Em
Literatura eu já acho que tem mais homens do que… né?
Os estudos de gênero são muito fortes na UFSC. Em várias áreas de humanas tem um
crongresso famoso que é o “Fazendo Gênero” que... tem todo...

8. A literatura escrita por mulheres teve alguma relevância na sua formação como
leitor e como professor?
Meu grande norte literário é Clarice, né? (risos)

9. Como em uma conversa sobre literatura é sempre legal dar indicações, qual
escritora mulher - de literatura ou teórica - , que faça parte do cânone ou não, que
54

seja lida ou não nas disciplinas, você indicaria para os alunos lerem e fazerem
pesquisas acadêmicas?
A Clarice, claro, mas também a... Verônica Stigger. Ou Angélica Freitas.
55

ANEXO 1 - Programa Professora A

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ


SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE LITERATURA E LINGUÍSTICA
Literatura Brasileira III (HL233) | Turma C e D | 2017/1
Professora: Maria Isabel Bordini (bordini.literaturaufpr@gmail.com)
EMENTA: Ficção contemporânea: vertentes e desdobramentos. Estudo de obras e autores
representativos.
AVALIAÇÃO: Duas provas escritas.
HORÁRIO DE ATENDIMENTO: terça-feira, das 20h30 às 22h, e sexta-feira, das 10h30 às
12h ou em outro horário a ser combinado em sala ou por email.

A maioria dos textos está disponível ao final da página, outros encontram-se na Copiadora
Reitoria, pasta em nome de Maria Isabel Bordini, 1º sem 2017, Literatura Brasileira III.

CRONOGRAMA (sujeito a alterações):


MARÇO
7 – Apresentação
10 – Antonio Candido. “A nova narrativa”. Em: A educação pela noite e outros ensaios. São
Paulo: Ática, 1989, pp. 199-215.
Leitura complementar: ARAÚJO, Homero Vizeu. Comentários sobre “A nova
narrativa”, de Antonio Candido: romance e conto nos anos 60 e 70.
Terceira Margem, Rio de Janeiro, n. 21, p. 207-219, agosto/dezembro 2009.

14 – Lúcio Cardoso. “Junto ao mar (A ilha)”, “O afogado”, “A escada”, “O viúvo” e


“Colchão velho”. Em: Contos da ilha e do continente. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2012.
Leitura complementar: CARDOSO, Lúcio. Diário de Terror (esboços para uma teoria
da danação) (1952). Sopro, 47.
http://culturaebarbarie.org/sopro/arquivo/diariodeterror.html

17 – Guimarães Rosa. “A hora e vez de Augusto Matraga” e “Carta de João Guimarães Rosa
a João Condé, revelando segredos de Sagarana”. Em: Sagarana. Ed.
comemorativa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006 [1946].
Leitura complementar: RÓNAI, Paulo. A arte de contar em Sagarana. Em: Sagarana.
Ed. comemorativa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006; PASTA JÚNIOR, José
Antonio. O romance de Rosa: temas do Grande Sertão e do Brasil. Novos estudos
CEBRAP, n. 5, nov. 1999, pp. 61-70.

21 – Guimarães Rosa. “As margens da alegria” e “Os cimos”. Em: Primeiras Estórias. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 2005 [1962].
Leitura complementar: IANNI, Octavio. “Histórias do Brasil Moderno”. Em: A ideia
de Brasil moderno. São Paulo: Editora Brasiliense, 1992, pp. 34-48.

24 – Guimarães Rosa. “Famigerado” e “A terceira margem do rio”. (Primeiras Estórias).


Leitura complementar: BUENO, Luís. Segundas estórias: uma outra leitura de
“Famigerado”. O eixo e a roda, Belo Horizonte, v. 23, n. 1, 2014, pp. 147-164;
WISNIK, José Miguel. O Famigerado. Scripta, Belo Horizonte, v. 5, n. 10, 1º sem.
2002, p. 177-198,

28 – Guimarães Rosa. “Nada e a nossa condição” e “A benfazeja”. (Primeiras Estórias).


Leitura complementar: RÓNAI, Paulo. “Os vastos espaços”. Em: GUIMARÃES
ROSA, João. Primeiras estórias. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005, pp. 29-47.

31 – Guimarães Rosa. “Campo Geral.” Em: Corpo de baile. vol. 1. São Paulo: Nova
56

Fronteira, 2006 [1956].

ABRIL
04 – Guimarães Rosa. “Campo Geral.”
07 – Murilo Rubião. “O ex-pirotécnico Zacarias”, “O ex-mágico da Taberna Minhota”, “O
edifício” e “Os três nomes de Godofredo”. Em: Obra completa. São Paulo:
Companhia das Letras, 2010
11 – Clarice Lispector. “A imitação da rosa” e “O búfalo”. Em: Laços de família. Rio de
Janeiro: Francisco Alves, 1983 [1960].
14 – FERIADO
18 – Clarice Lispector. “O ovo e a galinha” e “A legião estrangeira”. Em: Felicidade
clandestina. Rio de Janeiro: Rocco, 1998 [1971]
21 – FERIADO
25 – Clarice Lispector. A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1999 [1977].
Leitura complementar: SANTIAGO, Silviano. “A aula inaugural de Clarice
Lispector”. Em: O cosmopolitismo do pobre. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.
28 – Clarice Lispector. A hora da estrela.

MAIO
02 – PROVA 1
05 – Flora Süssekind. “Retratos e egos”. Em: Literatura e vida literária; polêmicas, diários e
retratos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985.
Leitura complementar: ARRIGUCCI JR., Davi. “Jornal, realismo, alegoria. (O
romance brasileiro recente). Entrevista. Remate e males, v.1, Unicamp, 1980.
09 – SEMANA DE LETRAS
12 – SEMANA DE LETRAS
16 – Antonio Callado. Bar Don Juan. [1971]
Leitura complementar: GINZBURG, Jaime. “Literatura Brasileira: Autoritarismo,
Violência, Melancolia.” Em: Crítica em tempos de violência. São Paulo: Edusp, 2012,
pp. 173-187.
19 – João Antonio. “Paulinho Perna-torta”. Em: Leão de chácara. [1975]
23 – Rubem Fonseca. “O cobrador”. Em: O cobrador. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1979.
26 – João Cezar de Castro Rocha. "Dialética da marginalidade".
● Entrevista: João Cezar de Castro Rocha - A Marginalidade Cultural (Jogo de
Ideias, 2007)
30 – Caio Fernando Abreu. “Os sobreviventes”, “Sargento Garcia” e “Aqueles dois”. Em
Morangos mofados. [1982]
Leitura complementar: GINZBURG, Jaime. “Exílio, Memória e História.” Em:
Crítica em tempos de violência. São Paulo: Edusp, 2012, pp. 403-
415.
JUNHO
02 --- Valêncio Xavier. O mez da grippe. [1981]
Leitura complementar: SCHNAIDERMAN, Boris. "O mez da grippe - um coro a muitas
vozes".
06 – Hilda Hilst. O caderno Rosa de Lori Lamby. São Paulo: Massao Ohno, 1990.
● Entrevista: Hilda Hilst TV Cultura
09 – Karl Erik Schollhammer. “Breve mapeamento das últimas gerações”. Em: Ficção
brasileira contemporânea. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2009, pp. 21
a 53.
13 – Luiz Ruffato. Eles eram muitos cavalos. São Paulo: Record, 2007 [2001].
16 – Silviano Santiago. “Uma literatura anfíbia”. + Luiz Ruffato. Discurso para a abertura
da Feira de Frankfurt 2013.
20 – Elvira Vigna. Nada a dizer. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
23 – Em aberto
27 – PROVA 2
30 - Encerramento
57

JULHO
04 – Exame Final

BIBLIOGRAFIA (* as obras marcadas com asterisco fazem parte do acervo da


biblioteca UFPR *)
* BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. 2. ed. rev. São Paulo: Cultrix,
1995.
* _____. Org. O conto brasileiro contemporâneo. São Paulo: Cultrix, 1977.
* CANDIDO, Antonio. A nova narrativa. In. A educação pela noite. São Paulo: Ática, 1987.
* _____. “Literatura e subdesenvolvimento”. Em: A educação pela noite. Rio de Janeiro:
Ouro sobre Azul, 2006.
CHAGAS, Pedro Ramos Dolabela. “Sobre a origem histórica da diversidade do romance
brasileiro contemporâneo. Uma leitura do Quarup como ‘romance de arquivo’”. Brasiliana,
3, 1 (2014). [no site]
* COUTINHO, Afrânio & COUTINHO, Eduardo. A literatura no Brasil. Rio de Janeiro: José
Olympio; Niterói: UFF, 1986. Vol 5.
* HOHLFELDT, Antonio C. Conto brasileiro contemporâneo. 2. ed. rev. Porto Alegre:
Mercado Aberto, 1988.
* LIMA, Luiz Costa. “A Mística ao revés de Clarice Lispector”. Em: Por Que Literatura.
Petrópolis, Vozes, 1969.
* PELLEGRINI, Tânia. A imagem e a letra. São Paulo: FAPESP, 1999.
* PROENÇA FILHO, Domício. Pós-modernismo e literatura. São Paulo: Ática, 1988.
* _____. , Org. O livro do Seminário de literatura brasileira. São Paulo: L.R., 1983.
* SANTIAGO, Silviano. “Repressão e censura no campo das artes na década de 70”. Em:
Vale quanto pesa. Rio de janeiro: Paz e Terra, 1982.
SCHOLLHAMMER, Karl Erik. Ficção brasileira contemporânea. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2011.
RONCARI, Luiz. O Brasil de Rosa: o amor e o poder. São Paulo: Editora da Unesp, 2004.
* SUSSEKIND, Flora. Literatura e vida literária; polêmicas, diários e retratos. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar, 1985.
*_____. Tal Brasil, qual romance? Rio de Janeiro: Achiamé, 1984.
Fonte: https://sites.google.com/site/belbordini/lb3 Acesso em: 30 mai. 2017.
58

ANEXO 2 - Programa Professor B

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ


SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE LINGUÍSTICA E LITERATURA
Literatura Brasileira III (HL233) | 2017/1
Professor: Alexandre Nodari (alexandre.nodari@gmail.com)
Turma A (matutino): Terça, 10:30-12:30 e Sexta, 07:45-9:30 – Sala 410 do D. Pedro II
Turma B (noturno): Terça, 18:45-20:30 e Sexta, 20:30-22:30 – Sala 1111 do D. Pedro I
Avaliação: a avaliação será realizada por meio de duas provas escritas (2/5 e 13/6). Será
aprovado o aluno que obtiver média 7 nessas provas, ou média 5, como resultado do exame
final.
Horário de atendimento: a ser combinado em sala ou por email
Cronograma com as leituras obrigatórias: (sujeito a alterações que serão comunicadas em
sala e no site; todos os textos estão ou estarão disponíveis no site)
● 21/2 – Apresentação do programa
● 24/2 - Não haverá aula
● 28/2 - Feriado: carnaval
● 3/3 – Antônio Fraga: Desabrigo. (Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura,
1995 [1942]).

● Leitura complementar sugerida:


● Maria Célia Barbosa Reis da Silva: "As vozes que ecoam em Desabrigo, de Antônio
Fraga" (Em: Modos da margem - figurações da marginalidade na literatura brasileira.
RJ: Aeroplano, 2015).
● 7/3 – Patrícia Galvão: trechos de Paixão Pagu (Rio de Janeiro: Agir, 2005); e de
Parque industrial e A famosa revista.

● Leitura complementar sugerida:


● Kenneth D. Jackson: “Patrícia Galvão e o realismo-social brasileiro dos anos 1930”
● Patrícia Galvão e Geraldo Ferraz: A famosa revista.
● 10/3 - MANHÃ: Adalgisa Nery: Capítulos I, II e XIII de A imaginária (Rio de
Janeiro: José Olympio, 2015 [1959]) + Osman Lins: “O outro gesto” (prefácio); “Os
gestos”; “Tempo”; “O Navio”; “O Vitral” (Em: Os gestos. 2. ed. São Paulo:
Melhoramentos, 1975 [1957]).

● Leitura complementar sugerida:
● Ana Luiza Andrade: Crítica e criação: síntese do trajeto ficcional de Osman Lins.

● NOITE: Adalgisa Nery: Capítulos I, II e XIII de A imaginária (Rio de Janeiro: José


Olympio, 2015 [1959]) + Antônio Fraga: Desabrigo. (Rio de Janeiro: Secretaria
Municipal de Cultura, 1995 [1942]).

● Leitura complementar sugerida:


● Maria Célia Barbosa Reis da Silva: "As vozes que ecoam em Desabrigo, de Antônio
Fraga" (Em: Modos da margem - figurações da marginalidade na literatura brasileira.
RJ: Aeroplano, 2015).
● 14/3 – Murilo Rubião: “O pirotécnico Zacarias”; “O ex-mágico da Taberna Minhota”;
“A cidade”; “Teleco, o coelhinho”; “A diáspora” (Em: Obra completa. São Paulo:
Companhia das Letras, 2010). José J. Veiga: "A usina atrás do morro"; Os cavalinhos
de platiplanto"; "Era só brincadeira" (Em: Os cavalinhos de platiplanto. São Paulo:
Companhia das Letras, 2015).
● Leitura complementar sugerida:
● José Paulo Paes: "Um sequestro do divino (sobre os contos de Murilo Rubião)"
● Site: http://murilorubiao.com.br/criticas.aspx
● Prefácio de Silviano Santiago a Os cavalinhos de platiplanto
59

● 17/3 – Guimarães Rosa: “O espelho”; “A terceira margem do Rio” (Em: Primeiras


estórias. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001 [1962].)

● Leituras complementares sugeridas:


● Machado de Assis: “O espelho” (Publicado na Gazetas de Notícias em 1882; depois no
volume Papéis avulsos)
● Paulo Rónai:. “Os vastos espaços”. Prefácio às Primeiras estórias. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 2001.
● Eduardo Sterzi: "Desleitura: aletria. "A terceira margem do rio" e a dialética da
tradição". Letras de hoje, v. 34 (4), 199:29-46.
● Walnice Nogueira Galvão: "Do lado de cá". Em: Mitológica rosiana. São Paulo: Ática,
1978.

● 21/3 – NÃO HAVERÁ AULA: GREVE DE ÔNIBUS

● 24/3 – Guimarães Rosa: “O espelho”; + os quatro prefácios de Tutameia: terceiras


estórias (6. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985 [1969]): 1) Aletria e
hermenêutica; 2 e 3) Hipotrélico e Nós, os temulentos; 4) Sobre a escova e a dúvida

● Leitura complementar sugerida:


● SILVA, David Lopes da. Tutaméia: prefácio. Dissertação de mestrado (UFSC):
Florianópolis, 2001.

● 28/3 - Guimarães Rosa: os quatro prefácios de Tutameia: terceiras estórias (6. ed. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 1985 [1969]): 1) Aletria e hermenêutica; 2 e 3) Hipotrélico
e Nós, os temulentos; 4) Sobre a escova e a dúvida

● 31/3 - Guimarães Rosa: Meu tio o Iauaretê” (Em: Estas estórias. Rio de Janeiro, José
Olympio, 1969).

● Leituras complementares sugeridas:


● FINAZZI-AGRÒ, Ettore. “Nada, nosso parente: uma leitura de ‘Meu tio o iauaretê’”.
Remate de Males, v.14, 1994. p. 129-139.
● CERNICCHIARO, Ana Carolina. “Antropofagia e perspectivismo: a diferonça canibal
em ‘Meu tio o Iauaretê’” .
● CAMPOS, Haroldo de. “A linguagem do Iauaretê”. Em: Metalinguagem e outras
metas. São Paulo: Perspectiva, 1992.

● 4/4 – Guimarães Rosa: Grande sertão: veredas.


● 7/4 – Guimarães Rosa: Grande sertão: veredas. (Para o turno da noite, NÃO
HAVERÁ AULA)
● 11/4 – Guimarães Rosa: Grande sertão: veredas.
Leituras complementares sugeridas:
João Camillo Penna: "Jagunços, topologia, tipologia (Euclides e Rosa)". (Em: Modos da
margem - figurações da marginalidade na literatura brasileira. RJ: Aeroplano, 2015).
CANDIDO, Antonio. “O homem dos avessos”. Em: Tese e antítese.
ARRIGUCCI Jr., Davi. O mundo misturado: romance e experiência em Guimarães Rosa.
Novos estudos, 40, 1994.
CANDIDO, Antonio. “Jagunços mineiros de Cláudio a Guimarães Rosa”. Em: Vários
escritos. São Paulo: Duas Cidades, 1995.
FINAZZI-AGRÒ, Ettore. Aporia e passagem. Scripta, 5 (10), 2002.
Jerusa Pires Ferreira: Um longe perto: Os segredos do sertão da terra.
BOLLE, Willi. grandesertão.br
João Adolfo Hansen: Grande sertão: veredas e o ponto de vista avaliativo do autor.
José Antonio Pasta Júnior: O romance de Rosa.
60

● 14/4 - Feriado
● 18/4 – Guimarães Rosa: Grande sertão: veredas.
● 21/4 - Feriado

● 25/4 - Guimarães Rosa: Grande sertão: veredas.


● 28/4 - NÃO HAVERÁ AULA - GREVE GERAL
● 2/5 - PROVA 1
● 5/5 - Paulo Leminski: Descartes com lentes

● Leitura complementar sugerida:
● Haroldo de Campos: Uma leminskíada barrocodélica
● Pedro Mandagará: "História da edição do Catatau, de Paulo Leminski"

● 9/5 - SEMANA DE LETRAS


● 12/5 – SEMANA DE LETRAS

● 16/5 - Clarice Lispector: “Mineirinho” (Em: Onde estivestes de noite. Rio de Janeiro:
Rocco, 2009) + "O ovo e a galinha" (Felicidade clandestina)

● Leitura complementar sugerida:


● Clarice Lispector: A bela e a fera ou a ferida grande demais
● Fábio Lucas: Clarice Lispector e o Impasse da Narrativa Contemporânea

● 19/5 - Clarice Lispector: Mineirinho + O ovo e a galinha

● 23/5 - A paixão segundo G.H. (recomenda-se que os alunos consigam um exemplar


impresso - acessível facilmente nas bibliotecas -, já que a versão usada para
digitalização tem a impressão falha)

● Leituras complementares sugeridas:


● Clarice Lispector: Brasília
● LIMA, Luiz Costa. “A Mística ao revés de Clarice Lispector”. Em: Por Que Literatura.
Petrópolis, Vozes, 1969.
● Benedito Nunes: “Introdução à edição crítica de A paixão segundo G.H.”.
● ROSA, Victor da. O retrato segundo G.H.
● Alexandre Nodari: "A vida oblíqua": o hetairismo ontológico segundo G.H>
● Emerson Marçal: O livro se me olha: Notas sobre A paixão segundo G.H., de Clarice
Lispector

● 26/5: A paixão segundo G.H. (recomenda-se que os alunos consigam um exemplar


impresso - acessível facilmente nas bibliotecas -, já que a versão usada para
digitalização tem a impressão falha)

● 30/5 - Clarice Lispector: A hora da estrela (edição comemorativa com manuscritos e


aparato crítico (ensaios, prefácio, etc.)

● Leitura complementar sugerida:


● Lúcia Sá: "De cachorros vivos e nordestinas mortas: A hora da estrela e o mal-estar das
elites"
● Regina Dalcastagnè: Contas a prestar: o intelectual e a massa em A hora da estrela, de
Clarice Lispector
● Berta Waldman: Armadilha para o Real: (Uma Leitura de A Hora da Estrela, de Clarice
Lispector)

● 2/6 – Rubem Fonseca: contos "Feliz ano novo"; "Passeio noturno (parte I)"; "Passeio
noturno (parte II)"; "O Campeonato"; "Intestino grosso" (todos do livro Feliz ano novo,
disponível aqui) + Veronica Stigger: Os anões. São Paulo: Cosac Naify, 2010
61

Leitura complementar sugerida:


Célia Pedrosa: O discurso hiperrealista (Rubem Fonseca e André Gide)
Veronica Stigger: Pré-histórias, 2 (censuradas & extemporâneas)
CERA, Flávia. O estranho porvir de Veronica Stigger.
___. Do espetáculo sem desculpas. Sopro, 31 (2010).
Nodari, Alexandre. Genealogia bastarda de Veronica Stigger.
Victor da Rosa: Literatura anã
João Camillo Penna: "Veronica Stigger ou a arte de dessentir"
○ 6/6-
○ MANHÃ: Bernardo Kucinski: K. - Relato de uma busca. (São Paulo: Cosac
Naify, 2014): Formato PDF | Formato EBUP

○ Leitura complementar sugerida:
○ Alexandre Nodari: Do que não cessa de se escrever.;
■ NOITE:
○ Carolina Maria de Jesus: Quarto de despejo
● 9/6: MANHÃ: Carolina Maria de Jesus: Quarto de despejo

● NOITE: Bernardo Kucinski: K. - Relato de uma busca. (São Paulo: Cosac Naify,
2014): Formato PDF | Formato EBUP

● Leitura complementar sugerida:


● Alexandre Nodari: Do que não cessa de se escrever.;

● 13/6 - Prova 2
● 16/6 - Não haverá aula
● 20/6 - Não haverá aula
● 23/6 - Entrega das provas e divulgação das notas finais
● Pros interessados, haverá aula sobre Lavoura arcaica, de Raduan Nassar
● 4/7 - Exame final no horário e local de aula

Bibliografia crítica e teórica


AGAMBEN, Giorgio. “O autor como gesto”. Em: Profanações. Trad. Selvino J. Assmann.
São Paulo: Boitempo, 2007.
ANTELO, Raúl. Transgressão e modernidade. Ponta Grossa: Editora da UEPG, 2001.
___. Objecto textual. São Paulo: Memorial da América Latina,1997.
BARTHES, Roland. “A morte do autor” e “Da obra ao texto”. Em: O rumor da língua. Trad.
Mário Laranjeiras. São Paulo: 1988.
BLANCHOT, Maurice. O espaço literário. Trad. Alvaro Cabral. Rio de Janeiro, Rocco,
1987.
BOLLE, Willi. “grandesertão.br ou: A invenção do Brasil”. Em: MADEIRA, Angélica;
VELOSO, Mariza (orgs.). Descobertas do Brasil. Brasília: EdUnB, 2001.
CAMPOS, Haroldo de. “A linguagem do Iauaretê”. Em: Metalinguagem e outras metas. São
Paulo: Perspectiva, 1992.
CANDIDO, Antonio. “Literatura e subdesenvolvimento”. Em: A educação pela noite. Rio de
Janeiro: Ouro sobre Azul, 2006. Link para versão com comentários e hipertextos de Célia
Pedrosa.
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