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A LÍNGUA DE PAU

A língua de pau
Por Vladimir Volkoff

Pode-se dizer que a língua de pau é a obra-prima da desinformação, pois


é impossível falá-la sem nos tornarmos, pelo efeito de vampirismo,
desinformado e desinformante ao mesmo tempo.
La Harpe (1) falava de “língua inversa”. Françoise Thom fez uma análise
pertinente da “língua de pau” (2) do comunismo.
Pode-se dizer que a língua de pau é a obra-prima da desinformação, pois
é impossível falá-la sem nos tornarmos, pelo efeito de vampirismo de que
já falamos, desinformado e desinformante ao mesmo tempo: “Tal como a
Igreja viva criada pelos bolcheviques serve para destruir a religião, as
falsas eleições para demover as veleidades democráticas, a falsa
legalidade para impedir o nascimento de um verdadeiro Direito, a falsa
língua bloqueia a comunicação, congela a formação de uma sociedade civil
que ameaçaria o poder comunista, esconde o pensamento e entrava o
desenvolvimento do indivíduo no seio do homo sovieticus. Entre todos os
fantasmas criados pela ideologia, a língua fantasma representa o maior
perigo”, escreve Françoise Thom.
Com efeito, o comunismo não se contentou em exigir que se agisse e se
pensasse como era preciso: quis que se falasse como era preciso, sabendo
perfeitamente que o pensamento sem palavras é impotente e que um
determinado vocabulário condena não só à mentira expressa como ao
raciocínio defeituoso.
A língua de pau suprime, tanto quanto possível, as orações subordinadas
circunstanciais, substituindo-as por substantivos precedidos de uma
proposição: “Por decisão e orientação de situações políticas anteriores”
(Barbusse), “Pelo desenvolvimento de uma grande atividade de massas”
(Humanité). Prefere os conjuntos verbos-substantivos aos verbos
correspondentes: “encontrar a sua expressão, encontrar o seu reflexo,
tomar a decisão, dar a sua ajuda” em vez de “exprimir-se, refletir, decidir,
ajudar”. Faz desaparecer o “eu” em favor do “nós” que é fácil opor a
“eles”. Este ponto é interessante, pois o leitor ou o ouvinte não ousa
identificar-se com o “eu”, sendo englobado no “nós” pela rejeição do
“eles” (os outros).
Prefere as formas passivas e impessoais: “Fez-se um bom avanço
construtivo, o laço mútuo foi reforçado, foram expressos votos, foi dada
uma atenção particularmente profunda”: o rosto humano apaga-se cada
vez mais.
Os comparativos permitem sublinhar o aspecto inacabado do mundo: “A
política do poder dos monopólios só poder gerar contradições mais
profundas, mais vastas, e esta vertente da análise da doutrina marxista-

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leninista ocupa um lugar cada vez mais importante, a ligação entre o


progresso econômico e o progresso sociopolítico e espiritual torna-se cada
vez mais forte”, cita Françoise Thom. Também se gosta de falar em
amadurecimento, apodrecimento, germes, rebentos, sementes, humo, já
e ainda não, etapas, patamar, estados, saltos gigantescos, florescimento,
aceleração, consolidação, multiplicação, desenvolvimento, reforço,
aprofundamento, aumento, envio, enriquecimento, alargamento,
ultrapassagem e desdobramento.
Os utensílios linguísticos que significam obrigação são utilizados a cada
passo: dever, ser preciso, ter que, ser convidado a, necessariamente,
fatalmente, obrigatoriamente, sem falta.
“A imaginação bélica estende-se aos domínios tradicionalmente mais
bucólicos, quer se trate de ordenhar vacas ou colher maçãs só se ouve
falar de frentes, batalhas, ataques, resistência, assaltos (...). Aliás esta
predileção encontra-se (...) no vocabulário da língua nazi, onde as
palavras Kampf, kamferisch, marschierens (3) são constantes”.
A função do epíteto de pau consiste em direcionar o substantivo de pau
em estrita orientação desinformativa: “forças progressistas, abundância
kolkhoziana, legalidade revolucionária”. Os adjetivos descoloridos servem
para dar aos substantivos um sinal positivo ou negativo embora elevado,
grande e próximo se tornem sinônimos simpáticos, ao passo que baixo,
estrito, longínquo são entendidos como sinônimos antipáticos.
Os verbos servem frequentemente para descrever a participação do
comunismo na História: “ajudar, desempenhar um papel, orientar,
facilitar, criar condições para, travar, aperfeiçoar, acelerar, estimular,
desenvolver, reforçar, defender, dirigir a energia das massas”.
Por muito abstrata que seja, a língua de pau recorre, por vezes, a
metáforas estereotipadas: “Os comunistas são a carne da carne, o sangue
do sangue da classe operária. Lenine é a encarnação ideal do
revolucionário. A estrutura econômica deve encarnar os ideais da nova
sociedade”.
Ao mesmo tempo, a língua russa era sistematicamente empobrecida. O
dicionário fundamental de Dahl contém 22000 palavras os escritores
soviéticos utilizavam 1500.
O estilo de pau recorre frequentemente à alegoria, à prosopopéia, à
metonímia (4), mas nunca de forma inocente. Se quer designar-se a
URSS, diz-se “O partido e o governo” se querem referir-se aos Estados
Unidos, diz-se “Wall Street” ou “o Pentágono”. A metalepse permite supor
demonstrado o que não está, tipo a “justeza das teses leninistas”, que não
admitem ser postas em questão.
A língua de pau é sobretudo maniqueísta: forma e conteúdo, abstrato e
concreto, objetivo e subjetivo, todo e parte, natureza e aparência opõem-
se sem gradações – “as mandíbulas da ideologia”, afirma justamente
Françoise Thom – e o conjunto das suas categorias permite raciocinar-se
sem nunca se correr o risco da originalidade.
A língua de pau assume a confissão de Goebbels: “Não falamos para dizer
alguma coisa, mas para obter um determinado efeito”. Ser codificada é
uma vantagem da língua de pau. “Certos sons, como ‘revisionista’ e
‘inimigo do povo’ dão o sinal à matilha outros como ‘erro’ e ‘falta de
vigilância’ servem de aviso ou de ameaça podem igualmente, todos eles,
reforçar a submissão”.
“A função da língua de pau é dupla”, indica Françoise Thom:
- por um lado, amplifica o poder ideológico. Declarar, por exemplo, “é
preciso demonstrar vigilância reforçada”, significa imaginar inimigos
infiltrados, admitir-se o descrédito próprio e denuncia a intenção de
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“lançar a humilhação sobre outro”. Linguisticamente muito econômico,


deve-se reconhecer
- por outro lado, permite participar momentaneamente do poder e
mostrar que se é digno dele, na medida em que “se usa
irrepreensivelmente a língua de pau, isto é, na medida em que se
proclama a fidelidade à ideologia”.
A língua de pau era a única admitida nos círculos dirigentes e não
autorizava qualquer divergência em nível individual. Quem entra no seu
jogo alinha igualmente no jogo da ideologia dominante e, por
conseqüência, no dos homens da situação.
A propósito, seria interessante estudar em pormenor o modo como Boris
Ieltsine, educado no serralho e grande utilizador da língua de pau, só
muito dificilmente dela se libertou, apesar de há muito ter renunciado à
ideologia comunista. Na realidade, só se libertou nas suas recordações ou
nas conversas privadas: publicamente, só sabe exprimir-se com grilhetas
lingüísticas nos pés.
“O discurso de pau”, prossegue Françoise Thom, “é de sentido único: não
admite réplica. A única resposta possível a um discurso de pau é outro
discurso de pau a rigor, podemos defender-nos em língua de pau (...) mas
em caso algum exprimirmo-nos através dela”.
Ao eliminar o eu, a língua de pau visa eliminar o homem como sujeito.
Proíbe a memória: “Mal de quem mostre divergências ou contradições
com a linha (do partido) para viver tranquilo é preciso saber esquecer”.
A língua de pau é o caso extremo da logomaquia (que analisaremos mais
à frente, dedicado aos acessórios verbais da desinformação). A língua de
pau é a logomaquia transformada em língua.
Verdadeiramente notável é a análise de uma língua de pau imaginária, a
Newspeak (Novalíngua), feita por George Orwell no seu memorável 1984.
Recorde-se que na Oceânia reinava o tirano Big Brother, apoiando-se
numa doutrina totalitária, o Ingsoc (“socialismo inglês”). A Newspeak, que
o partido no poder impõe cada vez mais rigidamente à população, faz com
que “um pensamento herético, ou seja, um pensamento divergente dos
princípios do Ingsoc, se torna literalmente inconcebível”, assim que a
Oldspeak, a língua atual, seja esquecida. Este resultado era alcançado,
“parcialmente, com a invenção de novas palavras, mas sobretudo através
da eliminação de palavras indesejáveis e despindo as restantes de
qualquer significação heterodoxa e, tanto quanto possível, de significado
secundário, seja ele qual for”. Acresce que, “além da supressão das
palavras claramente heréticas, a redução do vocabulário era um objetivo,
pelo que não se deixava sobreviver uma palavra que não fosse
necessária”. “Cada redução era um ganho, pois menos escolha havia e
menor era a tentação de pensar”.
Acabam as exceções gramaticais: tudo se conjuga e declina da mesma
forma. (Dir-se-ia estar na França sob a ameaça uma nova reforma
ortográfica.) O vocabulário especializa-se de tal modo que um técnico não
compreende outro. Encoraja-se a criação de palavras a partir de sílabas
truncadas cujo sentido é esquecido (à maneira de Gestapo para Gheime
Staats Polizei, ou de Komintern em vez de Kommunistitcheskiy
Internatsional). “A intenção era tornar o discurso, sobretudo o que
tratasse um assunto não ideologicamente neutro, tão independente
quanto possível da consciência. As necessidades da vida quotidiana
impunham, por vezes, que se refletisse antes de falar, mas quando um
membro do Partido formulasse um juízo político ou ético, ele deveria
poder emitir as opiniões corretas com o automatismo idêntico ao de uma
metralhadora disparando as suas balas”.
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Grandes autores, como Shakespeare, Milton ou Dickens, são traduzidos


em Newspeak e, concluída a tradução, os originais são destruídos. Golpe
de gênio. Eis um dos principais objetivos da desinformação: substituir-se
à verdadeira informação. É por isso que as fontes de informação que se
apresentam como “objetivas” ou “moderadas” são as mais perigosas, pois
tende-se a não recorrer a outras.
A língua de pau não é monopólio dos comunistas e similares. Todos os
especialistas têm a sua língua, incompreensível para os outros, e em
relação à qual nutrem um particular afeto e sentem-se comodamente
instalados: as gentes da lei, os médicos, os padres, os filósofos, os
militares franceses com as suas inúmeras siglas a partir de iniciais, os
russos, com os seus vocábulos feitos de pedaços de palavras (por
exemplo, komdiv para comandante de divisão). A diferença é que o calão
especializado significa qualquer coisa, pelo menos para os iniciados, não
sendo, portanto, desinformante para quem o compreende e para quem
não o entende.
Pelo contrário, a língua de pau nada significa. Para quem compreende a
sua codificação, ela anuncia para quem a tenta levar à letra, ela mistifica.
“É evidente”, escreve Orwell, “que quem é capaz de utilizar estas
expressões se esqueceu que as palavras têm um significado”. Deste
modo, dizendo uma coisa a uns e outra coisa a outros, a língua de pau
constitui um grande êxito da desinformação. Não se disse que François
Mitterrand nunca foi socialista, mas aprendeu a falar como um socialista?
Koestler não se enganou, de fato, sobre a importância da língua de pau.
Em Os Tempos Heróicos, parodia a trucagem marxista do vocabulário
através de algumas definições ao sabor do gosto da época. Assim,
“democracia” deve definir-se como “a expressão unânime da vontade
unânime do povo unânime” “verdade”, como “livre relação dialética entre
as palavras e os fatos” “tomada da Bastilha”, como “ato de banditismo
anarcofascista” e “História”, como “o passado flexível e fluido determinado
pela necessidade do presente”.

Notas do tradutor:

(1) Amargo e cáustico crítico literário e dramaturgo francês, Jean-François de La Harpe


(1739-1803) foi editor do Mercure de France e chegou à Academia. O seu Curso de
Literatura tem 16 volumes. Apesar de adepto da revolução foi preso em 1794 e, chocado
com o que viu, tornou-se um feroz reacionário, atacando os antigos companheiros.

(2) O autor utiliza a expressão langue de bois, que – segundo o Larousse – é uma forma
rígida de expressão, nomeadamente no domínio da política, através da multiplicação de
estereótipos e de fórmulas congeladas.

(3) Batalha, campanha, marchar. Obs.: Trata-se de tradução portuguesa, cedida pela
Editorial Notícias. No Brasil, “Mein Kampf”, de Adolf Hitler, foi traduzida por “Minha Luta”,
não “Minha Batalha”.

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(4) Alegoria: expressão de uma idéia sob forma figurada Prosopopéia: figura de retórica em
que se atribui o dom da palavra a seres inanimados, a irracionais ou mesmo a mortos
Metonímia: alteração do sentido natural dos termos pelo emprego da causa em vez do
efeito, do todo pela parte etc..

O texto “A língua de pau” foi extraído do Cap. 6º, “A Desinformação Organiza-se”, do livro
“Pequena História da Desinformação – do Cavalo de Tróia à Internet” (pg. 66 a 71), de
Vladimir Volkoff, Editora Vila do Príncipe Ltda., Curitiba, 2004. (
viladoprincipe@onda.com.br)

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