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CURSO DE PSICOLOGIA
PSICOPATOLOGIA
(SDE 0167)
TEXTOS DE APOIO

Professor ADELMO GOMES


adelmoprofessor20151@bol.com.br
1

CALENDÁRIO ACADÊMICO 2015.1 (6 º PERÍODO)


QUARTA-FEIRA SEXTA-FEIRA
11 13 Carnaval
FEV 18 Carnaval 20
25 27
04 06
11 13
MAR 18 20
25 27
01 03 Paixão
08 (AV 1) 10 (AV 1)
ABR 15 17
22 Descobrimento 24
29
06 01 Trabalhador
13 08
MAI 20 15
27 22
29
03 05
10 12
JUN 17 (AV 2) 19 (AV 2)
24 26
01 (AV 3) 03 (AV 3)
JUL 08 10 Fim

EMENTA DA DISCIPLINA
Unidade I - Introdução ao estudo da Psicopatologia e o diagnóstico em Psiquiatria
1.1 - Histórico e principais correntes em Psicopatologia;
1.2 - O normal e patológico em Psicopatologia;
1.3 - Conceituação de doença mental e transtorno psiquiátrico;
1.4 - Sistemas classificatórios: DSM IV e CID-10;
1.5 - Entrevista psiquiátrica e exame da doença mental; anamnese psiquiátrica; diagnóstico
pluridimensional.
Unidade II - Processos psíquicos e suas alterações
2.1 - Alterações da consciência (vigilância);
2.2 - Alterações da atenção;
2.3 - Alterações da orientação;
2.4 - Alterações nas vivências de tempo e espaço;
2.5 - Alterações da sensopercepção (alucinação);
2.6 - Alterações do pensamento;
2.7 - Alteração do juízo de realidade (delírio);
2.8 - Alterações da afetividade;
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
2

2.9 - Alterações da volição;


2.10 - Alterações do comportamento motor;
2.11 – Alterações da linguagem;
2.12 – Alterações da memória.
Unidade III - Transtornos de Ansiedade: A ansiedade normal e patológica
3.1 – Agorafobia;
3.2 - Transtorno do Pânico;
3.3 - Fobia Específica;
3.4 - Fobia Social;
3.5 - Transtorno de Ansiedade Generalizada;
3.6 - Transtorno de Estresse Pós-Traumático;
3.7 - Transtorno Obsessivo-Compulsivo;
Unidade IV - Transtornos Somatoformes;
4.1 - Transtorno de Somatização;
4.2 - Transtorno Conversivo;
4.3 - Transtorno de Dor Psicogênica;
4.4 - Transtorno Factício;
Unidade V - Transtornos de Personalidade e Transtornos de Ajustamento
5.1 - Transtornos de personalidade e psicopatias;
5.2 - Transtornos de ajustamento;
Unidade VI - Transtornos do Humor
6.1 – Distimia;
6.2 – Ciclotimia;
6.3 - Transtorno Bipolar;
6.4 - Transtorno Depressivo Maior;
Unidade VII - Transtornos Psicóticos
7.1 – Esquizofrenia;
7.2 - Outros transtornos psicóticos;
Unidade VIII - Transtornos relacionados ao uso de substâncias
8.1 - Conceitos gerais (uso social, abuso, dependência, síndrome de abstinência);
8.2 - Transtornos relacionados ao álcool;
8.2 - Transtornos relacionados à anfetamina e cocaína;
8.3 - Transtornos relacionados à cannabis e alucinógenos;
8.4 - Transtornos relacionados à cafeína e nicotina;
8.5 - Transtornos relacionados aos inalantes.
***

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


3

Considerações preliminares
A expressão psicopatologia origina-se de três afixos gregos: “pshiché” –
psiquismo, psiquê, psíquico; “pathos” – paixão, sofrimento e, “logos” –
discurso, conhecimento.
[...] A psicopatologia pode ser definida como o conjunto de conhecimentos
referentes ao adoecimento mental do ser humano. É um conhecimento que se
esforça por ser sistemático, elucidativo e desmistificante. Como conhecimento que visa ser
científico, não inclui critérios de valor, nem aceita dogmas ou verdades a priori. O psicopatólogo
não julga moralmente o seu objeto, busca apenas observar, identificar e compreender os diversos
elementos da doença mental.
A psicopatologia estuda especialmente os transtornos, não a sua causa ou tratamento. Procura,
portanto, estudar as manifestações clínicas das doenças mentais.
É um estudo descritivo dos transtornos, então não é explicativo.

Nesse sentido, a psicopatologia possui uma natureza semiológica, ou seja, a de um estudo dos
sinais e sintomas dos transtornos mentais (ou patognomonia).

O que são doenças mentais?


Transtornos caracterizados por [signos] psicológicos, comportamentos anormais,
funcionamento prejudicado ou qualquer combinação destes. Tais transtornos podem
causar sofrimento clinicamente significativo e prejuízo em uma variedade de esferas
de funcionamento e podem ser devidos a fatores orgânicos, sociais, genéticos,
químicos ou psicológicos. (adaptado APA, 2010, p. 984-5)
As doenças mentais podem ter uma base orgânica (genética/neurológica/cerebral)
conhecida (por exemplo, as demências nas doenças de Alzheimer e de Parkinson), presumida (por
exemplo, a Esquizofrenia1 e o Transtorno Afetivo Bipolar) ou desconhecida/inexistente (por
exemplo, nas neuroses). No entanto, no estudo das causas das doenças mentais a influência do
ambiente (relações familiares, traumas emocionais, condições socioeconômicas e culturais etc.)
deverá sempre ser levada em consideração, sob pena de se cair num discurso organicista de cunho
determinista.
Ou seja, ao se avaliar uma doença, a partir de uma perspectiva multidimensional, três fatores
precisam ser considerados. São eles: (1) as possíveis predisposições genéticas (temperamento,
doenças genéticas etc.), (2) as influências ambientais (relações de afeto, educação, socialização,
eventos ocorridos etc.) e, (3) as estruturas psicológicas constituídos e desenvolvidas (caráter,
inteligência, psicopatologias etc.).

1
Vide artigo sobre as causas genéticas da Esquizofrenia – pág. 195.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
4

Sinais e sintomas
Os sinais e os sintomas2 representam os signos da psicopatologia [...]. Os
sintomas são subjetivos (vivências, sensações e impressões) e aparecem
nas queixas do paciente. Dor, o sentimento de tristeza e a escuta
alucinatória, por exemplo, são sintomas. Já os sinais são objetivos, ou seja
são verificáveis pela observação direta. Eles podem ser detectados por outra
pessoa, às vezes pelo próprio paciente. [...] uma fácies de tristeza e o solilóquio (falar sozinho) são
sinais. (CHENIAUX, 2013, p. 4). Síndrome é um agrupamento de sintomas e sinais que ocorrem
juntos e que constituem uma condição reconhecível com etiologias e mecanismos diversos.3

Sintomas positivos e negativos


Sintomas Positivos – [...] estão relacionados diretamente ao surto psicótico4. Entende-se por surto
psicótico um estado mental agudo caracterizado por grave desorganização psíquica e fenômenos
delirantes e/ou alucinatórios, com perda do juízo crítico da realidade. A capacidade de perder a
noção do que é real e do que é fantasia, criação da mente da própria pessoa, é um aspecto muito
presente nos quadros agudos da esquizofrenia. [...]
Sintomas Negativos – [...] estão mais relacionados à fase crônica da esquizofrenia. Embora
possam ocorrer na fase aguda, eles se estendem por mais tempo e predominam a longo prazo. Esses
sintomas são chamados também de deficitários, como referência à deficiência de algumas funções
mentais, como a vontade e a afetividade.
(http://entendendoaesquizofrenia.com.br/website/?page_id=144)

Transfundos das Vivências Psicopatológicas e Sintomas Emergentes5


Desenvolvendo o modelo sugerido por autores como Jaspers, Schineider e Weitbrecht, propõe-se
aqui situar as vivências psicopatológicas em duas perspectivas fundamentais: têm-se de um lado, os
transfundos das vivências psicopatológicas, espécie de palco, de contexto mais geral, em que
emergem os sintomas. De outro, reconhecem-se os sintomas específicos vivenciados, denominados
sintomas emergentes6. Eles são, portanto, vivências pontuais, que ocorrem sempre sobre
determinado transfundo. Esse transfundo, por sua vez, influencia basicamente o sentido, a direção, a
qualidade específica do sintoma emergente. Há uma relação dialética entre o sintoma emergente e
o transfundo, entre a figura e o fundo, a parte e o todo, o pontual e o contextual.
Nesse modelo, discriminam-se dois tipos básicos de transfundo: os estáveis e duradouros e os
mutáveis e momentâneos:
1. Os transfundos estáveis, pouco mutáveis, são a personalidade e a inteligência. Qualquer
vivência ganha conotação diferente a partir da personalidade específica do indivíduo.
Pacientes passivos, dependentes, astênicos e ‘largados’ tendem a vivenciar os sintomas de
modo também passivo; já indivíduos explosivos, hipersensíveis e muito reativos a diferentes
2
Do grego símptoma, significando acontecimento, o que ocorre.
3
Lowenkron, T. 2007.
Com relação aos signos psicopatológicos (sinais e sintomas), caberia a menção dos conceitos de simulação (forjar,
teatralizar, fingir algum sinal ou sintoma psicopatológico) e de dissimulação (encobrir, disfarçar, esconder algum sinal
ou sintoma psicopatológico).
4
Vide item na página 8 desta apostila.
5
Adaptado de DALGALARRONDO, 2008, p. 293-9. (Negritos e acréscimos foram feitos pelo professor da matéria)
6
Observe que no caso das psicoses, os sintomas emergentes são classificados como positivos e negativos, conforme
visto anteriormente.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
5

estímulos tendem a responder aos sintomas de forma mais viva e ampla, e assim por diante.
A inteligência determina essencialmente os contornos, a diferenciação, a profundidade e a
riqueza de todos os sintomas. Pacientes muito inteligentes produzem, por exemplo, delírios
ricos e complexos, interpretam constantemente as suas vivências e desenvolvem as
dimensões conceituais das vivências de forma mais acabada. Sujeitos com inteligência
reduzida criam quadros psicopatológicos indiscriminados, sem detalhes, superficiais e
pueris.
2. Os transfundos mutáveis e momentâneos também atuam decisivamente na determinação
da qualidade e no sentido do conjunto das vivências psicopatológicas. O nível de
consciência estabelece a clareza e a precisão dos sintomas. Sob o estado de turvação, uma
alucinação auditiva ou visual, uma recordação, um sentimento específico são
experimentados em uma atmosfera mais onírica e confusa. O humor e o estado afetivo-
volitivo momentâneo influem decisivamente não apenas no desencadeamento de sintomas
(os chamados sintomas catatímicos7), mas também no colorido específico de sintomas não
diretamente deriváveis do estado afetivo. Uma ideia prevalente, em um contexto ansioso
intenso, pode ganhar dimensões muito próprias. Em um estado depressivo, qualquer
dificuldade cognitiva passa a ter uma importância enorme para o paciente.

Sintomas emergentes são todas aquelas vivências psicopatológicas mais destacadas,


individualizáveis, que o paciente experimenta. Incluem as esferas que não fazem parte dos
transfundos, como uma alucinação (sensopercepção), um sentimento (afetividade), um delírio
(juízo), uma paramnésia (memória), uma alteração do pensamento ou da linguagem, etc.8

7
Catatimia - 1. Entidade psiquiátrica que se manifesta paroxisticamente como crises passageiras, ditas catatímicas, e
que se caracteriza por intensa alteração do humor, seja no sentido da depressão, da expansão ou da passividade, não
levando, contudo, à melancolia, à mania ou à esquizofrenia. 2. Influência que exerce o estado afetivo sobre as demais
funções psíquicas. (Aurélio)
8
DALGALARRONDO, p., 2008, p. 293-4)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
6

Transfundos e Sintomas Emergentes

Componentes do surgimento, da constituição e da manifestação dos sintomas e transtornos

Evolução Temporal dos Transtornos Mentais

CURSOS CRÔNICOS DOS TRANSTORNOS MENTAIS9

DESENVOLVIMENTO
PROCESSO
(ou, EVOLUÇÃO)

- Personalidade pré-mórbida;
Crises (ou, Ataques)
- Sinais prodrômicos;
- Remissão;
Episódios
- Recuperação;
Fenômenos Agudos ou - Recaída ou Recidiva;
Reação Vivencial Anormal
Subagudos - Recorrência.

Fase

Surto

9
Adaptado de DALGALARRONDO, 2008, p. 296-9. (Negritos e acréscimos foram feitos pelo professor da matéria)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
7

Processo
Processo refere-se a uma transformação lenta e insidiosa da personalidade, decorrente de alterações
psicologicamente incompreensíveis, de natureza endógena. O processo irreversível, supostamente
de natureza corporal (neurobiológica), rompe a continuidade do sentido normal do desenvolvimento
biográfico de uma pessoa. Utiliza-se o termo processo, por exemplo, para caracterizar a natureza de
uma esquizofrenia de evolução insidiosa [doentia, maléfica], que lenta e radicalmente transforma a
personalidade do sujeito acometido.

Desenvolvimento (ou, Evolução)


Desenvolvimento refere-se à evolução psicologicamente compreensível de uma personalidade. Essa
evolução pode ser normal, configurando os distintos traços de caráter do individuo, ou anormal,
deter minando os transtornos da personalidade e as neuroses. Nesse caso, há uma conexão de
sentido, uma trajetória compreensível ao longo da vida do sujeito. Fala-se, então, em
‘desenvolvimento paranoide’, ‘desenvolvimento histriônico’, ‘desenvolvimento hipocondríaco’, etc.

Crise (ou, Ataque)


A crise, ou ataque, caracteriza-se, em geral, por surgimento e término abruptos, durando
segundos ou minutos, raramente horas. Utilizam-se os termos crise ou ataque para fenômenos
como: crises epilépticas, crises ou ataques de pânico, crises histéricas, crises de agitação
psicomotora, etc.

Episódio
O episódio tem geralmente a duração de dias até semanas. Tanto o termo crise como o termo
episodio nada especificam sobre a natureza do fenômeno mórbido. Os termos episodio e crise são
denominações referentes apenas ao aspecto temporal do fenômeno. Na pratica, é comum utilizar-
se o termo episodio de forma inespecífica, quando não há condições de precisar a natureza do
fenômeno mórbido. Assim, pode-se falar em episodio maniatimorfo, episodio paranoide, episodio
depressivo, etc.

Personalidade pré-mórbida e sinais pré-mórbidos


A personalidade pré-mórbida e os sinais pré-mórbidos são aqueles elementos identificados em
períodos da vida do paciente claramente anteriores ao surgimento da doença propriamente
dita, em geral na infância. Já pertencendo ao início do transtorno, fala-se em sinais e sintomas
prodrômicos10, que representam de fato a fase precoce, inicial do adoecimento.
A literatura psiquiátrica, principalmente a de língua inglesa, utiliza os seguintes termos em relação
ao curso dos episódios de transtornos mentais:

Remissão (remission). É o retorno ao estado normal tão logo acaba o episódio agudo. Fala-se em
remissão espontânea quando o paciente se recupera sem o auxílio de intervenção terapêutica.

Recuperação (recovery). É o retorno e a manutenção do estado normal, já tendo passado um bom
período de tempo (geralmente se considera um ano) sem que o paciente apresente recaída do
quadro.
10
Pródromo - Fenômeno clínico que revela o início de uma doença; propatia.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
8

Recaída ou recidiva (relapse). É o retorno dos sintomas logo após haver ocorrido uma melhora
parcial do quadro clínico [...] (não tendo passado um ano do episódio agudo).

Recorrência (recurrence). É o surgimento de um novo episódio, tendo o indivíduo estado


assintomático por um bom período (pelo menos por cerca de um ano). Pode-se dizer que a
recorrência é um novo episódio da doença.

Reação Vivencial Anormal


A reação vivencial anormal caracteriza-se por ser um fenômeno psicologicamente compreensível,
desencadeado por eventos vitais significativos para o individuo que os experimenta. É designada
reação anormal pela intensidade muito marcante e duração prolongada dos sintomas. Ocorre
geralmente em personalidades vulneráveis, predispostas a reagir de forma anormal a certas
ocorrências da vida. Após a morte de uma pessoa próxima, da perda do emprego ou do divórcio, o
individuo reage, por exemplo, apresentando um conjunto de sintomas depressivos ou ansiosos,
sintomas fóbicos ou mesmo paranóides. A reação vivencial pode durar semanas ou meses,
eventualmente alguns anos. Passada a reação vivencial, o individuo retorna ao que era antes, sua
personalidade não sofre ruptura; pode empobrecer-se ou enriquecer-se, mas não se modifica
radicalmente.

Fase
Já a fase refere-se particularmente aos períodos de depressão e de mania dos transtornos
afetivos. Passada a fase, o individuo retorna ao que era antes dela, sem alterações duradouras na
personalidade, ou seja, não há sequelas na personalidade. A fase é, em sua gênese, incompreensível
psicologicamente, tendo um caráter endógeno. Uma fase pode durar semanas ou meses, menos
frequentemente, anos, havendo sempre (ou quase sempre) restitutio ad integrum11. Fala-se, então,
em fase depressiva, fase maníaca e período interfásico assintomático.

Surto
O surto, segundo a noção da patologia geral (mas assumida pela psicopatologia), é uma ocorrência
aguda, que se instala de forma repentina, fazendo eclodir uma doença de base endógena, não
compreensível psicologicamente. O característico do surto é que ele produz sequelas irreversíveis,
danos à personalidade e/ou à esfera cognitiva do individuo. Assim como, após o primeiro surto de
esclerose múltipla, o paciente ‘sai’ com alguma sequela sensitiva ou motora, após o primeiro surto
de esquizofrenia (com alucinações, delírios, percepção delirante, etc.), que pode durar de 3 a 4
meses, por exemplo, o individuo ‘sai diferente’, seu contato com os amigos torna-se mais
distanciado, o afeto modula menos, e ele tem dificuldades na vida social, as quais não consegue
explicar ou entender. É o ‘déficit pós-esquizofrênico’, devido àquilo que Bleuler afirmava: ‘A
esquizofrenia, de modo geral, não permite restitutio ad integrum’. Tem-se, portanto, como
possibilidades, um surto esquizofrênico agudo, um surto hebefrênico, um surto catatônico, etc.
Após vários anos de doença, nos quais vários surtos foram se sucedendo (ou um processo insidioso
foi se implantando de forma lenta), em geral o paciente encontra-se no chamado estado residual da

11
Restitutio ad integrum - Regresso ou retorno completo à normalidade ou à integridade.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
9

doença, apresentando apenas sinais e sintomas que são sequelas desta, sintomas
predominantemente negativos.
Dessa forma, é incorreto falar em surto maníaco [pois o surto, no exemplo dado, é bipolar], fase
esquizofrênica [pois fase refere-se a períodos dos transtornos afetivos, conforme visto
anteriormente, e não à doença], crise maníaca [pois a crise, ou ataque, refere-se ao que foi visto
anteriormente]; tal uso revela o desconhecimento da terminologia e dos conceitos psicopatológicos
básicos.

Forma e conteúdo dos signos psicopatológicos


Em geral, quando se estudam os sintomas psicopatológicos, dois aspectos básicos costumam ser
enfocados: a forma dos sintomas, isto é, sua estrutura básica, relativamente semelhante nos
diversos pacientes (alucinação, delírio, ideia obsessiva, labilidade afetiva etc.), e seu conteúdo, ou
seja, aquilo que preenche a alteração estrutural (conteúdo de culpa, religioso, de perseguição, etc.).
Este último é geralmente mais pessoal, dependendo da história de vida do paciente, de seu universo
cultural e da personalidade prévia do adoecimento.
De um modo geral, os conteúdos dos sintomas estão relacionados aos temas centrais da existência
humana, tais como sobrevivência e segurança, sexualidade, temores básicos (morte, doença,
miséria, etc.), religiosidade, entre outros. Esses temas representam uma espécie de substrato, que
entra como ingrediente fundamental na constituição da experiência psicopatológica.
(DALGALARRONDO, 2008, p. 28)

Sistemas classificatórios: DSM 5 e CID-1012


São dois os principais sistemas classificatórios:
1º) A Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, da
Organização Mundial da Saúde (OMS), atualmente em sua 10ª revisão –
CID – 10 e,
2ª) A Diagnostic and Statiscal Manual of Mental Disorders, da American
Psychiatric Association atualmente em sua 5ª edição – DSM – V.

12
Toda classificação não é o resultado de um trabalho exclusivamente científico ou apenas um instrumento político; ela
é o conjunto, de modo geral, desses fatores. Cabe aos que produzem as classificações e aos que se utilizam delas que
estejam cientes desses propósitos, de suas finalidades e de seus limites. (Lowenkron, T. 2007)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
10

Classificação Geral das Doenças Mentais

Conceituação
a. Oligofrenias (ou, Retardos Mentais)
Oligofrenia é sinônimo de Deficiência ou Retardo Mental. A característica essencial do Retardo
Mental é um funcionamento intelectual significativamente inferior à média, acompanhado de
limitações significativas no funcionamento adaptativo em pelo menos duas das seguintes áreas de
habilidades: comunicação, autocuidados, vida doméstica, habilidades sociais/interpessoais, uso de
recursos comunitários, autossuficiência, habilidades acadêmicas, trabalho, lazer, saúde e segurança.
O início deve ocorrer antes dos 18 anos. O Retardo Mental possui muitas causas diferentes que
afetam o funcionamento do sistema nervoso central.
O funcionamento intelectual geral é definido pelo quociente de inteligência (QI ou equivalente)
obtido mediante avaliação com um ou mais testes de inteligência padronizados de administração
individual (por ex., Escalas Wechsler de Inteligência para Crianças — Revisada, Stanford-Binet,
Bateria Kaufman de Avaliação para Crianças). Um funcionamento intelectual significativamente
abaixo da média é definido como um QI de cerca de 70 ou menos (aproximadamente 2 desvios-
padrão abaixo da média).
Cabe notar que existe um erro de medição de aproximadamente 5 pontos na avaliação do QI,
embora este possa variar de instrumento para instrumento (por ex., um QI de 70 na escala Wechsler
é considerado como representando uma faixa de 65-75). Portanto, é possível diagnosticar o Retardo
Mental em indivíduos com QIs entre 70 e 75, que exibem déficits significativos no comportamento
adaptativo. Inversamente, o Retardo Mental não deve ser diagnosticado em um indivíduo com um
QI inferior a 70, se não existirem déficits ou prejuízos significativos no funcionamento adaptativo.
(http://www.psiqweb.med.br)

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


11

b. Demências
A demência não é apenas um tipo de doença, ela é considerada uma síndrome, ou
seja, é um grupo de sinais físicos e sintomas que a pessoa apresenta, estando
presente em várias doenças diferentes. Assim, como uma síndrome a Demência
apresenta três características principais.
Prejuízo da memória. Os problemas de memória podem ser desde um simples
esquecimento leve até um prejuízo severo a ponto de não se recordar da própria
identidade.
Problemas de comportamento. Normalmente se caracteriza por agitação, insônia, choro fácil,
comportamentos inadequados, perda da inibição social normal, alterações de personalidade.
Perda das habilidades. São as habilidades adquiridas durante a vida, tais como, organizar os
compromissos, dirigir, vestir a roupa, cuidar da vida financeira, cozinhar, etc.
Os sintomas iniciais de Demência variam, mas a perda de memória em curto prazo costuma ser a
característica principal ou única a ser trazida à atenção do médico na primeira consulta. Ainda
assim, nem todos os problemas cognitivos nos idosos são devidos a Demência. Perguntas
cuidadosas aos pacientes e aos familiares podem ajudar a determinar a natureza do
comprometimento cognitivo e a estreitar o diagnóstico.
Os sintomas mais comuns que aparecem nas Demências são:
1- déficit de memória;
2- dificuldades de executar tarefas domésticas;
3- problema com o vocabulário;
4- desorientação no tempo e espaço;
5- incapacidade de julgar situações;
6- problemas com o raciocínio abstrato;
7- colocar objetos em lugares equivocados;
8- alterações de humor de comportamento;
9- alterações de personalidade;
10- perda da iniciativa – passividade.
Existem muitas doenças ou alterações orgânicas capazes de levar a um quadro demencial. Muitas
dessas causas relacionadas à Demência são reversíveis, principalmente o uso prolongado de alguns
medicamentos, como por exemplo, drogas usadas para hipertensão arterial, diuréticos, alguns
hipnóticos. A depressão também pode esta associada à Demência. Muitas vezes, diferenciar a
Demência da depressão é uma tarefa difícil e que apresenta muitos obstáculos. Outras doenças
relacionadas com a Demência são:
doenças vasculares do sistema nervoso central – SNC,
doenças infecciosas,
hipotireoidismo,
deficiência de vitamina B12,
Síndrome de Wernic-Korsacoff,
sífilis e HIV no SNC,
doenças degenerativas do SNC (doenças inflamatórias, atrofias etc.)
(adaptado de http://www.psiqweb.med.br/)

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


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c. Psicoses
Psicoses são distúrbios psiquiátricos graves onde o paciente perde contato
com a realidade, emite juízos falsos (delírios), podendo também apresentar
alucinações (ter percepções irreais quanto a audição, visão, tato), distúrbios
de conduta levando à impossibilidade de convívio social, além de outras
formas bizarras de comportamento.
O termo Psicose (e sintomas psicóticos) é empregado para se referir à perda do juízo da realidade e
um comprometimento do funcionamento mental, social e pessoal, normalmente levando a um
prejuízo no desempenho das tarefas e papéis habituais.
As Psicoses podem ter várias origens: por lesões cerebrais, tumores cerebrais, esquizofrenia,
tóxicos, álcool, infecções, traumas emocionais etc. Algumas Psicose são incuráveis, outras
apresentam cura completa. Quase sempre requer tratamento à base de psicotrópicos. Nem sempre é
necessária a internação. Nas psicoses agudas, as psicoterapias são pouco indicadas.
[No DSM-5, os Transtornos Psicóticos incluem: Transtorno Psicótico Breve, Transtorno
Esquizofreniforme, Esquizofrenia, Transtorno Esquizoafetivo, Transtorno Psicótico Induzido por
Substância/Medicamento, Transtorno Psicótico Devido a Outra Condição Médica, Catatonia13
Associada a Outro Transtorno Mental, Transtorno Catatônico Devido a Outra Condição Médica,
Catatonia Não Especificada, Outro Transtorno do Espectro da Esquizofrenia e Outro Transtorno
Psicótico Especificado, Transtorno do Espectro da Esquizofrenia e Outro Transtorno Psicótico Não
Especificado.]
Na CID.10 os Transtornos Psicóticos são classificados como (F20-F29) esquizofrenia, transtornos
esquizotípicos e transtornos delirantes. Este agrupamento reúne a esquizofrenia, a categoria mais
importante deste grupo de transtornos, o transtorno esquizotípico e os transtornos delirantes
persistentes e um grupo maior de transtornos psicóticos agudos e transitórios. Os transtornos
esquizoafetivos foram mantidos nesta seção, ainda que sua natureza permaneça controversa.”
(http://www.psiqweb.med.br/)
A perspectiva psicanalítica em relação às psicoses propõe existir um terrível conflito entre o ego
e o mundo externo. Incapaz de mediar satisfatoriamente tais circunstâncias o ego criaria uma nova
realidade, uma realidade delirante e alucinadamente de acordo com os impulsos do Id.
“O efeito patogênico depende do ego, numa tensão conflitual desse tipo, permanecer fiel à sua
dependência do mundo externo e tentar silenciar o id, ou se ele se deixar derrotar pelo id e,
portanto, ser arrancado da realidade.” Inicialmente, Freud propõe que na neurose existe uma luta
vitoriosa contra a perda da realidade, enquanto na psicose a perda é irremediável. Posteriormente,
através da observação clínica, ele conclui no texto “A Perda da Realidade na Neurose e na Psicose”
que tanto na neurose quanto na psicose existe uma perturbação da relação do sujeito com a
realidade. “Na neurose, um fragmento da realidade é evitado por uma espécie de fuga, ao passo que
na psicose ele é remodelado... a neurose não repudia a realidade, apenas a ignora: a psicose a
repudia e tenta substituí-la”. (Freud, 1924, pág. 231) [...]
Para Freud, o ponto central de sua observação é que em ambas as estruturas o mais importante não

13
Catatonia - Fenômeno esquizofrênico caracterizado por perda da iniciativa motora e certo grau de tensão muscular,
atitude fixa, fenômenos cinéticos e automáticos paradoxais, e, às vezes, estupor, mutismo e negativismo.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
13

é a questão relativa à perda da realidade, mas sim os substitutos encontrados. Na neurose, o


substituto encontrado ocorre via mundo da fantasia; já na psicose, os substitutos são delírio e
alucinação.14

d. Neuroses
[...] A neurose é uma reação exagerada do sistema emocional em relação a uma
experiência vivida (Reação Vivencial). Neurose é uma maneira da pessoa SER e
de reagir à vida. Quando se diz que a pessoa É neurótica e não ESTÁ neurótica,
está se tentando dizer que a neurose é uma maneira da pessoa ser, associada a
traços de sua personalidade. Essa maneira de ser neurótica significa que a pessoa
reage à vida através de reações vivenciais não normais; seja no sentido dessas
reações serem desproporcionais, seja pelo fato de serem muito duradouras, seja
pelo fato delas existirem mesmo sem que exista uma causa vivencial aparente.
Essa maneira exagerada de reagir leva a pessoa neurótica a adotar uma serie de comportamentos
compatíveis com o que está sentindo. Cada tipo de transtorno neurótico tem seus sintomas, suas
atitudes e sentimentos; o quadro das neuroses é muito variável.
Na realidade os quadros neuróticos estão descritos em várias seções, tais como Ansiedades e
Fobias, Depressão, Estresse, Histeria e afins, Obsessões e Compulsões e outros.
O neurótico tem plena consciência do seu problema e muitas vezes, sente-se impotente para
modificá-lo. [...]
(adaptado de http://www.psiqweb.med.br/)
Sob o ponto de vista psicanalítico, as neuroses corresponderiam, então, “numa divisão entre o
afeto e a ideia. O afeto permanece na esfera psíquica, enquanto a ideia passa a ser enfraquecida e
permanece na [recalcada no inconsciente], separada de qualquer associação. Para Freud, o afeto
apresenta um destino diferenciado.15
‘Mas seu afeto, tornado livre, liga-se a outras ideias que não lhe sejam incompatíveis; e, graças a
essa ‘falsa conexão’, tais ideias desenvolvem-se como obsessivas. Essa é, em poucas palavras, a
teoria psicológica das obsessões e fobias...’ (Freud,1894, pág. 64)
Nesse texto encontra-se a afirmativa de que a histeria, as fobias e obsessões acham-se diretamente
relacionadas a ideias sexuais reprimidas.
No artigo “hereditariedade e a etiologia das Neuroses”, de 1896, Freud reafirma que a origem das
neuroses está vinculada à vida sexual:
‘Baseado em uma laboriosa observação dos fatos, devo sustentar que essa última suposição
concorda e muito com a realidade, pois cada uma das neuroses maiores que enumerei têm como sua
causa imediata um distúrbio particular da economia do sistema nervoso, e que essas modificações
patológicas funcionais têm como fonte comum a vida sexual do sujeito, sejam apoiadas em uma
perturbação de sua vida sexual contemporânea ou em fatos importantes do passado.’ (Freud,1896,
pág. 171/172)16

14
Adaptado de OLIVEIRA, M.S.B., O conceito das estruturas clínicas neurose e psicose para a psicanálise. [s.d.],
p. 120.
15
Estas ideias correspondem ao que se conceitua em psicanálise de “Solução de Compromisso” nas neuroses.
16
OLIVEIRA, M.S.B., O conceito das estruturas clínicas neurose e psicose para a psicanálise. [s.d.], p. 120. As
chaves são do professor.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
14

e. Transtornos de personalidade
Pessoas explosivas, teatrais, sistemáticas, meticulosas, obsessivas, cismadas,
muito emotivas e outros tipos difíceis de conviver sugerem, intuitivamente
para todos nós, tratar-se de uma maneira de SER assim e não de ESTAR
assim. Ao longo da vida essas pessoas podem melhorar, através de muito
empenho e vontade de morrer melhor do que nasceram. Outras estacionam,
petrificadas para sempre, sofrendo e fazendo sofrer.
Henri Ey considera algumas pessoas portadoras de um Ego Patológico, caracterizando não apenas
uma maneira de ESTAR no mundo, mas sobretudo, uma maneira de SER no mundo. Karl Jaspers
afirma serem anormais as personalidades que fazem sofrer, tanto a pessoa quanto quem a rodeia.
Para Jaspers, as personalidades anormais representam variações não-normais da natureza humana,
as quais podem perfeitamente ser entendidas como Transtornos de Personalidade (TP).
Diz a CID.10 que os transtornos de personalidade são estados e tipos de comportamentos
característicos que expressam maneiras da pessoa viver e de estabelecer relações consigo
mesma e com os outros. São distúrbios da constituição e das tendências comportamentais –
continua dizendo a CID.10 – não diretamente relacionados a alguma doença, lesão, afecção
cerebral ou a outro transtorno psiquiátrico. Isso tudo quer dizer que a pessoa simplesmente é
desse jeito e será sempre assim.17
Habitualmente os transtornos da personalidade se acompanham de sofrimento e de
comprometimento no desempenho global da pessoa. Aparecem precocemente durante o
desenvolvimento individual sob a influência de múltiplos fatores, sejam constitucionais, sociais ou
existenciais.18 Depois de solidificado este conjunto de traços pessoais, tal como uma
personalidade normal, persistirá indefinidamente.
Entretanto, dependendo da cognição, juízo crítico, conhecimento e disposição ao entendimento, tais
estados supostamente pétreos podem seguir por caminhos mais favoráveis e de menor sofrimento,
tanto para a pessoa deles portadora, quanto dos demais à sua volta. Sabendo lidar com essa questão
a pessoa poderá se adaptar perfeitamente a sua maneira de ser, poderá disciplinar pulsões, esquemas
de pensamentos, impulsos específicos desses transtornos, e tal manejo poderá ser de tal forma
eficiente que a qualidade da vida emocional será muito melhorada.
De fato, o que denomina, classifica ou dá o nome ao transtorno da personalidade é a
predominância de determinados traços, os quais todos nós os temos em dose diminuta. Todos
temos algo de histéricos, uma pitada de paranoia, traços de ansiedade, e assim por diante.
Entretanto, no transtorno da personalidade tais traços são predominantes e dominam tiranamente a
maneira de ração dessas pessoas de forma a causar sofrimento (na pessoa e/ou naqueles próximos) e
comprometer o desempenho.
[...] A Organização Mundial de Saúde (OMS) trata do assunto sob o titulo de Transtornos da
Personalidade e de Comportamento, especificando-os nos códigos F60 até F69 na CID-10. A OMS
descreve tais transtornos da seguinte maneira:
‘Estes tipos de condição abrangem padrões de comportamento permanentes e profundamente
arraigados no ser que se manifestam como respostas inflexíveis a uma ampla série de situações

17
Este trecho nos sugere uma causa genética/orgânica para os diversos Transtornos de Personalidade.
18
Observe que neste trecho, diferentemente dos demais, cogitam-se causas sociais e existenciais para os TP. Isto nos
sugere uma possível falta de consenso entre os autores psiquiátricos. Note-se, no entanto, que a tendência predominante
em psiquiatria, em relação às causas dos TP, é a de atribuir às causas genéticas/orgânicas.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
15

pessoais e sociais. Elas representam desvios extremos ou significativos do modo como o


indivíduo médio, em uma dada cultura, percebe, pensa, sente e, particularmente, se relaciona
com os outros’.
Quando a OMS diz ‘...permanentes e profundamente arraigados no ser...’ ela quer dizer que se trata
de uma característica definitiva. Uma pessoa obsessiva, meticulosa, perfeccionista e rígida com
problemas de adaptação, por exemplo, pode mudar sua maneira de ser para melhor refazendo
algumas crenças pessoais e atitudes comportamentais no sentido de construir melhor relação
consigo mesma, com os outros e com a vida, embora continue sendo menos obsessiva, menos
meticulosa, menos perfeccionista e menos rígida. Acontecendo assim a pessoa deixará de ter um
transtorno de personalidade para ter apenas traços obsessivos, traços perfeccionistas e assim por
diante.
As características de personalidade por si só não caracterizam um Transtorno de
Personalidade, elas são os traços, ou seja, padrões duradouros de percepção, relação e
pensamento acerca do ambiente e de si mesmo, e são exibidos numa ampla faixa de contextos
sociais e pessoais importantes. É somente quando as características de personalidade são
inflexíveis e desadaptadas, causando um comprometimento significativo no desempenho da
pessoa é que elas podem constituir-se em Transtornos da Personalidade.
Os Transtornos de Personalidade, ainda segundo a CID-10, são condições do desenvolvimento da
personalidade que aparecem na infância ou adolescência e continuam pela vida adulta. Esta
condição constitucional e biológica de desenvolvimento diferencia o Transtorno da Alteração
da Personalidade. A Alteração da Personalidade ocorre durante a vida em consequência de
algum outro transtorno emocional, dependência química, traumatismo craniano, tumores,
infecções cerebrais, etc.
Enfatizando, os Transtornos de Personalidades são perturbações graves da constituição do
caráter e das tendências comportamentais [atitudes], portanto, não são adquiridas no meio tal
como as Alterações da Personalidade19. A CID-10 apresenta entre os títulos F60 e F69 uma
grande variedade de subtipos de Transtornos de Personalidade. [...]
A Associação Norte-americana de Psiquiatria, através de seus critérios de classificação e
diagnóstico de transtornos mentais, o DSM-5, fala sobre os Transtornos da Personalidade da
seguinte forma:
Os traços de personalidade constituem transtornos da personalidade somente quando são inflexíveis
e mal-adaptativos e causam prejuízo funcional ou sofrimento subjetivo significativos. O aspecto
essencial de um transtorno da personalidade é um padrão persistente de experiência interna e
comportamento que se desvia acentuadamente das expectativas da cultura do indivíduo e que se
manifesta em pelo menos duas das seguintes áreas: cognição, afetividade, funcionamento
interpessoal ou controle de impulsos (Critério A). Esse padrão persistente é inflexível e abrange
uma ampla faixa de situações pessoais e sociais (Critério B), provocando sofrimento clinicamente
significativo e prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da
vida do indivíduo (Critério C). O padrão é estável e de longa duração, e seu surgimento ocorre pelo
menos a partir da adolescência ou do início da fase adulta (Critério D). O padrão não é mais bem
explicado como uma manifestação ou consequência de outro transtorno mental (Critério E) e não é
atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex., droga de abuso, medicamento,

19
Este trecho nos sugere uma possível origem genética para tais transtornos. Tal posição da psiquiatria não é a
definitiva nas ciências que estudam a mente humana (por exemplo, a própria psicologia).
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
16

exposição a uma toxina) ou a outra condição médica (p. ex., traumatismo craniencefálico) (Critério
F).
E qual seria a diferença entre o Transtorno da Personalidade e a Doença Mental franca? As
doenças mentais ocorrem e se desenvolvem a partir de um momento definido da vida, tal como são
as crises, reações, processos, episódios e surtos20, enquanto os Transtornos da Personalidade, por
sua vez, são maneiras problemáticas de ser, constantes e perenes. As doenças mentais surgem e os
Transtornos da Personalidade são.21
Na Esquizofrenia, por exemplo, assim como nos Transtornos do Humor e outros, a partir de um
determinado momento na vida a personalidade, que já era chamada pré-mórbida, envereda por uma
trajetória que se afasta mais e mais do normal resultando em um episódio agudo. Nos Transtornos
da Personalidade o rumo da personalidade está e sempre esteve algo distante do normal, embora não
tenha obrigatoriamente que piorar cada vez mais, como nos outros processos psicopatológicos.
Os Transtornos de Personalidade afetam todas as áreas da personalidade, o modo como o indivíduo
vê o mundo, a maneira como expressa as emoções, o comportamento social. Caracteriza um estilo
pessoal de vida mal adaptado, inflexível e prejudicial a si próprio e/ou aos que com ele convivem.
Essas características, no entanto, apesar de necessárias não são suficientes para identificação dos
Transtornos de Personalidade, pelo fato de serem muito vagas. A maneira mais clara como a
classificação deste problema vem sendo tratada é através da subdivisão em tipos de transtornos de
personalidade, com critérios de diagnóstico próprios e bem definidos, tanto pela CID.10, quanto
pelo DSM-5.
Convencionalmente os transtornos da personalidade foram divididos em três grupos:
1º. Grupo – Aqui estão as pessoas caracterizadas essencialmente por pensamentos estranhos,
comportamentos excêntricos e mórbida tendência ao isolamento. Estão classificadas aqui as
personalidades paranoides e esquizoides, as primeiras possuidoras de rígido padrão de suspeitas e
desconfianças infundadas, as segundas são emocionalmente distantes e com dificuldade em
estabelecer relações sociais.
2º Grupo – Os transtornos deste grupo têm em comum um comportamento com tendência à
dramaticidade, apelação e emoções que se expressam intensamente. Os indivíduos histriônicos
representam esse grupo, sendo muito excitáveis, demonstrativos, justificativos e egocêntricos.
Também está aqui a chamada Personalidade Antissocial, que manifesta expressiva incapacidade
geral de adaptação aos padrões sociais estabelecidos e para relações afetivas estáveis.
3º. Grupo – Estão neste grupo as personalidades com marcantes traços de dificuldade no controle
dos impulsos; transtorno explosivo ou impulsivo da personalidade, transtorno ansioso ou evitativo
da personalidade, transtorno anancástico ou obsessivo-compulsivo da personalidade.22

20
Assim definidas, o conceito de Doença Mental assemelha-se ao de Alteração da Personalidade, anteriormente
estabelecido.
21
Este parágrafo nos sugere, portanto, que os TP não deveriam ser classificados, stricto-sensu, como “doenças
mentais”.
22
Adaptado de www.psiqweb.com.br.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
17

Introdução ao estudo da Psicopatologia e o diagnóstico em Psiquiatria


Histórico e principais correntes em Psicopatologia

CORRENTE DA PSICOPATOLOGIA23

DESCRITIVA – “interessa-se DINÂMICA – “interessa-se pelo conteúdo da


fundamentalmente pela forma das alterações vivência, os movimentos internos de afetos,
psíquicas, a estrutura dos sintomas, aquilo que desejos e temores do indivíduo, sua
caracteriza a vivência patológica como sintoma experiência particular, pessoal, não
mais ou menos típico.” necessariamente classificável em sintomas
Possui, portanto, características diagnósticas previamente descritos.
e objetivas. Possui, portanto, características pessoais e
subjetivas.

MÉDICO-NATURALISTA – “Trabalha com EXISTENCIAL – “O doente é visto


uma noção de homem centrada no corpo, no principalmente como “existência singular”,
ser biológico como espécie natural e universal. como ser lançado a um mundo que é apenas
Assim, o adoecimento mental é visto como um natural e biológico na sua dimensão elementar,
mau funcionamento do cérebro, uma mas que é fundamentalmente histórico e
desregulação, uma disfunção de alguma parte humano. O ser é construído por meio da
do “aparelho biológico”. experiência particular de cada sujeito, na sua
relação com outros sujeitos, na abertura para a
construção de cada destino pessoal. A doença
mental, nessa perspectiva, não é vista tanto
como disfunção biológica ou psicológica, mas,
sobretudo, como um modo particular de
existência, uma forma trágica de ser no mundo,
de construir um destino, um modo
particularmente doloroso de ser com os
outros.”

COMPORTAMENTAL-COGNITIVISTA – PSICANALÍTICA – “o homem é visto como


“o homem é visto como um conjunto de ser “determinado”, dominado por forças,
comportamentos observáveis, verificáveis, que desejos e conflitos inconscientes. A psicanálise
são regulados por estímulos específicos e dá grande importância aos afetos, que, segundo
gerais, e por certas leis e determinantes do ela, dominam o psiquismo; o homem racional,
aprendizado. Associada a essa visão, a autocontrolado, senhor de si e de seus desejos,
perspectiva cognitivista centra atenção sobre é, para ela, uma enorme ilusão. Na visão
as representações cognitivas conscientes de psicanalítica, [as] síndromes mentais são
cada indivíduo. As representações conscientes consideradas formas de expressão de conflitos,
seriam vistas como essenciais ao predominantemente inconscientes, de desejos
funcionamento mental, normal e patológico. que não podem ser realizados, de temores aos
Os sintomas resultam de comportamentos e quais o indivíduo não tem acesso. O sintoma é
representações cognitivas disfuncionais, encarado, nesse caso, como uma “formação de
aprendidas e reforçadas pela experiência compromisso”, um certo arranjo entre o desejo
sociofamiliar.” inconsciente, as normas e as permissões
culturais e as possibilidades reais de satisfação
desse desejo. A resultante desse emaranhado

23
Quadro montado a partir de DALGALARRONDO, 2008, p. 35-8)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
18

de forças, dessa “trama conflitiva”


inconsciente, é o que se identifica como
sintoma psicopatológico.”

CATEGORIAL – “As entidades DIMENSIONAL – “Haveria, então,


24
nosológicas ou transtornos mentais dimensões como, por exemplo, o espectro
específicos podem ser compreendidos como esquizofrênico, que incluiria desde formais
entidades completamente individualizadas, muito graves, tipo ‘demência precoce’ (com
com contornos e fronteiras bem demarcados. grave deterioração da personalidade,
As categorias diagnósticas seriam “espécies embotamento afetivo, muitos sintomas
únicas”, tal qual espécies biológicas, cuja residuais), formas menos deteriorantes de
identificação precisa constituiria uma das esquizofrenia, formas com sintomas afetivos,
tarefas da psicopatologia. Assim, entre a chegando até um outro polo, de transtornos
esquizofrenia e os transtornos afetivos afetivos, incluindo formas com sintomas
bipolares e os delirantes, haveria, por exemplo, psicóticos até formas puras de depressão25 e
uma fronteira nítida, configurando-os como mania26 (hipótese esta que se relaciona à antiga
entidades ou categorias diagnósticas diferentes noção de psicose27 unitária).
e discerníveis na sua natureza básica.” [é o Algumas polaridades dimensionais em
modelo adotado pelo CID-10 e pelo DSM-5]. psicopatologia seriam, por exemplo:
Esquizofrenia deficitária / Esquizofrenia
benigna / Psicoses esquizoafetivas /
Transtornos afetivos com sintomas psicóticos /
Transtornos afetivos menores
Ou
Depressões graves (estupor28, psicótica) /
Depressão bipolar / Depressões moderadas /
Distimia / Personalidade depressiva /
Depressão subclínica.”

24
Nosologia – é o estudo das doenças.
25
Distimia – [...] em psicopatologia geral, é o termo que designa a alteração básica do humor, tanto no sentido da
inibição como no sentido da exaltação. Não se deve confundir o sintoma distímico com o transtorno depressivo
persistente (no DSM-5 também chamado de distimia), que, segundo as classificações da CID-10 e do DSM-5, é um
transtorno depressivo leve e crônico. (DALGALARRONDO, 2008, p. 164). Como transtorno, a distimia caracteriza-se
por ser um rebaixamento crônico do humor, persistindo ao menos por vários anos, mas cuja gravidade não é suficiente
ou na qual os episódios individuais são muito curtos para responder aos critérios de transtorno depressivo recorrente
grave, moderado ou leve.
26
Mania sem sintomas psicóticos - Presença de uma elevação do humor fora de proporção com a situação do sujeito,
podendo variar de uma jovialidade descuidada a uma agitação praticamente incontrolável. Esta elação se acompanha de
um aumento da energia, levando à hiperatividade, um desejo de falar e uma redução da necessidade de sono. A atenção
não pode ser mantida, e existe frequentemente uma grande distração. O sujeito apresenta frequentemente um aumento
do autoestima com ideias de grandeza e superestimativa de suas capacidades. A perda das inibições sociais pode levar a
condutas imprudentes, irrazoáveis, inapropriadas ou deslocadas. (CID 10)
Mania com sintomas psicóticos - Presença, além do quadro clínico descrito [anteriormente] de ideias delirantes (em
geral de grandeza) ou de alucinações (em geral do tipo de voz que fala diretamente ao sujeito) ou de agitação, de
atividade motora excessiva e de fuga de ideias de uma gravidade tal que o sujeito se torna incompreensível ou
inacessível a toda comunicação normal. (CID 10)
27
‘ [...] Uma psicose corresponde a uma perturbação primária da relação libidinal com a realidade. A oposição neurose-
psicose põe em jogo a posição intermediária do ego entre o id e a realidade. Enquanto na neurose o ego obedece as
exigências da realidade (e do superego), recalcando as reivindicações pulsionais, na psicose começar por se gerar uma
ruptura entre o ego e a realidade, que deixa o ego sob o domínio do id.” (CASTRO, 2006, p. 75)
28
Estupor – “estado mental no qual um indivíduo fica total ou quase totalmente insensível e imóvel e experimenta
desorientação”. (APA, 2010, p. 391)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
19

BIOLÓGICA – “enfatiza os aspectos SOCIOCULTURAL – “visa estudar os


cerebrais, neuroquímicos ou neurofisiológicos transtornos mentais como comportamentos
das doenças e dos sintomas mentais. A base de desviantes que surgem a partir de certos fatores
todo transtorno mental são alterações de socioculturais, como discriminação, pobreza,
mecanismos neurais e de determinadas áreas e migração, estresse ocupacional,
circuitos cerebrais. [...] ‘doenças mentais são desmoralização sócio familiar etc. Os sintomas
(de fato) doenças cerebrais. Griesinger, 1845.” e os transtornos devem ser estudados, segundo
essa visão, no seu contexto eminentemente
sociocultural, simbólico e histórico. É nesse
contexto de normas, valores e símbolos
culturalmente construídos que os sintomas
recebem seu significado, e, portanto, poderiam
ser precisamente estudados e tratados. Mais
que isso, a cultura, em tal perspectiva, é
elemento fundamental na própria determinação
do que é normal ou patológico, na constituição
dos transtornos e nos repertórios terapêuticos
disponíveis em cada sociedade.”29

OPERACIONAL-PRAGMÁTICA – “as FUNDAMENTAL – “o projeto de


definições básicas de transtornos mentais e psicopatologia fundamental, proposto pelo
sintomas são formuladas e tomadas de modo psicanalista francês Pierre Fedida, visa centrar
arbitrário, em função de sua utilidade a atenção da pesquisa psicopatológica sobre os
pragmática, clínica ou orientada à pesquisa. fundamentos de cada conceito psicopatológico.
Não são questionados a natureza da doença ou Além disso, tal psicopatologia dá ênfase à
do sintoma e tampouco os fundamentos noção de doença mental como pathos, que
filosóficos ou antropológicos de determinada significa sofrimento, paixão e passividade. O
definição. Trata-se do modelo adotado pelas pathos, diz Berlin (1977), é um sofrimento-
modernas classificações de transtornos paixão que, ao ser narrado a um interlocutor,
mentais; o DSM-5, norte-americano, e a CID- em certas condições, pode ser transformado em
10, da OMS.” experiência e enriquecimento.”

29
Assim colocada, esta corrente assemelha-se à corrente Existencial, anteriormente estudada.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
20

O normal e patológico em Psicopatologia


"Normalidade é a habilidade para se adaptar ao mundo exterior com satisfação e para dominar a
tarefa de aculturação". K. Meninge
Há vários critérios de normalidade e anormalidade em medicina e psicopatologia. A adoção de um
ou outro depende, entre outras coisas, de opções filosóficas, ideológicas e pragmáticas do
profissional [...]. Os principais critérios de normalidade utilizados em psicopatologia são:
1. Normalidade como ausência de doença
O primeiro critério que geralmente se utiliza é o de saúde como “ausência de sintomas, de
sinais ou de doenças”. Segundo expressiva formação de René Lerdice (1936): “a saúde é a
vida no silêncio dos órgãos”. Normal, do ponto de vista psicopatológico, seria então,
aquele indivíduo que simplesmente não é portador de um transtorno mental definido.
Tal critério é bastante falho e precário, pois, além de redundante, baseia-se em uma
“definição negativa”, ou seja, define-se a normalidade não por aquilo que ela supostamente
é, mas sim, por aquilo que ela não é, pelo que lhe falta [...].
2. Normalidade ideal
A normalidade aqui é tomada como uma certa “utopia”. Estabelece-se arbitrariamente uma
norma ideal, o que é supostamente “sadio”, mas “evoluído”. Tal norma é, de fato,
socialmente construída e referendada. Depende, portanto, de critérios socioculturais e
ideológicos arbitrários, e, às vezes, dogmáticos e doutrinários. Exemplos de tais conceitos de
normalidade são aqueles com base na adaptação do indivíduo às normas morais e políticas
de terminada sociedade (como no caso do macarthismo30 nos EUA e do pseudodiagnóstico
de dissidentes políticos como doentes mentais da antiga União Soviética).
“[...] chamamos de mentalmente insanas as pessoas cujas condutas pessoais violam certas
normas éticas, políticas e sociais. Isso explica porque muitas figuras históricas, de Jesus a
Castro, e de Jó a Hitler, têm sido diagnosticadas como sofrendo desta ou daquela doença
psiquiátrica.” (SZASZ, 1980, p. 29)
3. Normalidade estatística
A normalidade estatística identifica norma e frequência. Trata-se de
um conceito de normalidade que se aplica especialmente a fenômenos
quantitativos, com determinada distribuição estatística na população
geral (como peso, altura, tensão arterial, horas de sono, quantidade de
sintomas ansiosos, etc.). O normal passa a ser aquilo que se observa com maior
frequência. Os indivíduos que se situam estatisticamente fora (ou no extremo) de uma curva
de distribuição normal passam, por exemplo, a ser considerados anormais ou doentes. É um
critério muitas vezes falho em saúde geral e mental, pois nem tudo o que é frequente é
necessariamente “saudável”, e nem tudo que é raro ou infrequente é patológico.
Tomem-se como exemplo fenômenos como as cáries dentárias, a presbiopia31, os sintomas
ansiosos e depressivos leves, o uso pesado do álcool, fenômenos estes que podem ser muito

30
Macarthismo (em inglês McCarthyism) é o termo que descreve um período de intensa patrulha anticomunista,
perseguição política e desrespeito aos direitos civis nos Estados Unidos que durou do fim da década de 1940 até meados
da década de 1950. Foi uma época em que o medo do Comunismo e da sua influência em instituições americanas
tornou-se exacerbado, juntamente ao medo de ações de espionagem promovidas pela OTAN. (Wikipedia)
31
Presbiopia - Distúrbio visual que se observa na velhice, e em que se perde, por baixa de elasticidade e por
diminuição da capacidade de acomodação do cristalino, o poder de distinguir, com nitidez, objetos próximos.
(AURÉLIO)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
21

frequentes, mas que evidentemente não podem, a priori, ser considerados normais ou
saudáveis.
4. Normalidade como bem-estar
A Organização Mundial de Saúde (WHO, 1946) definiu, em 1946, a saúde como o completo
bem-estar físico, mental e social, e não simplesmente como ausência de doença. É um
conceito criticável por ser muito vasto e impreciso, pois bem-estar é algo difícil de se definir
objetivamente. Além disso, esse completo bem-estar físico, mental e social é tão utópico que
poucas pessoas se encaixariam na categoria “saudáveis”.
5. Normalidade funcional
Tal conceito baseia-se em aspectos funcionais e não necessariamente quantitativos. O
fenômeno é considerado patológico a partir do momento em que é disfuncional, produz
sofrimento para o próprio indivíduo ou para o seu grupo social.
6. Normalidade como processo
Neste caso, mais que uma visão estática, consideram-se os aspectos dinâmicos do
desenvolvimento psicossocial, das desestruturações e das reestruturações ao longo do tempo,
de crises, de mudanças próprias a certos períodos etários. Esse conceito é particularmente
útil em psiquiatria infantil, de adolescentes e geriátrica.
7. Normalidade subjetiva
Aqui é dada maior ênfase à percepção subjetiva do próprio indivíduo em relação a seu
estado de saúde, as suas vivências subjetivas. O ponto falho desse critério é que muitas
pessoas que se sentem bem, “muito saudáveis e felizes”, como no caso de sujeitos em fase
maníaca, apresentam, de fato, um transtorno mental grave.
8. Normalidade como liberdade
Alguns autores de orientação fenomenológica e existencial propõem conceituar a doença
mental como perda da liberdade existencial (p.ex., Henry Ey). Dessa forma, a saúde mental
se vincularia às possibilidades de transitar com graus distintos de liberdade sobre o mundo e
sobre o próprio destino. A doença mental é constrangimento do ser, é fechamento,
fossilização das possibilidades existenciais. [...]
9. Normalidade operacional
Trata-se de um critério assumidamente arbitrário, com finalidades pragmáticas explícitas.
Define-se, a priori, o que é normal e o que é patológico e busca-se trabalhar
operacionalmente com esses conceitos, aceitando as consequências de tal definição prévia.
Portanto, de modo geral, pode-se concluir que os critérios de normalidade e de doença em
psicopatologia variam consideravelmente em função dos fenômenos específicos com os quais se
trabalha e, também, de acordo com as opções filosóficas do profissional. Além disso, em alguns
casos, pode-se utilizar a associação de vários critérios de normalidade ou doença, de acordo com o
objetivo que se tem em mente. De toda forma, essa é uma área da psicopatologia que existe postura
permanentemente crítica e reflexiva dos profissionais. (DALGALARRONDO, 2008, p. 31-4)

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


22

Entrevista psiquiátrica e exame da doença mental; anamnese psiquiátrica; diagnóstico


pluridimensional
Principais conceitos:
Anamnese – (do grego anámnesis – ana = novo; mnesis = memória - rememoração; recordação).
Termo originalmente proposto por Platão para significar a
possibilidade de reconhecimento, de recordação da verdade, conhecida
pela alma quando da sua existência no mundo espiritual e esquecida
quando da sua encarnação material terrena. “[...] em psiquiatria, o
relato pessoal do paciente, de sua história desenvolvimental, familiar e
médica anterior ao início de um transtorno psicológico ou internação. [sugerido por Aldolf Meyer,
psiquiatra norte-americano nascido na Suíça (1866-1950), como um auxílio para o diagnóstico e a
exploração de possíveis causas do transtorno do paciente.]” (APA, 2010, p. 74)
Diagnóstico – (do grego diagnostikós – “movimento através do conhecimento”; distinguir;
reconhecer) – “processo de identificar e determinar a natureza de uma doença ou distúrbio por seus
sinais e sintomas, mediante o uso de técnicas de avaliação. [...]” (APA, 2010, p. 283)

A entrevista psiquiátrica32
A entrevista psiquiátrica possui três objetivos básicos: a formulação de um diagnóstico, a
formulação de um prognóstico33 e o planejamento terapêutico. [...] No início é essencial que o
médico se apresente, explique o objetivo da entrevista e, se possível, obtenha o consentimento do
paciente. Se não há plena consciência de morbidade por parte do paciente, é fundamental que se
entrevistem os familiares – ou outras pessoas que possam prestar informações – de preferência com
a concordância (e a presença) do paciente.
A arte de entrevistar só pode ser adquirida mediante o treinamento com um supervisor e com a
prática. Aulas e manuais, contudo, também trazem algum auxílio. Ensina-se ao aluno como
trabalhar com as evidências apuradas, embora seja difícil mostrar como obtê-las. De qualquer
modo, há algumas regras básicas que devem ser seguidas:
- No começo, deve-se deixar o paciente falar livremente, e só depois perguntar de modo mais
específico temas ou pontos duvidosos.
- É preciso saber quando e como interromper o paciente: sem cortar o fluxo da comunicação, mas
sem deixar que a minuciosidade ou a prolixidade (alterações da forma do pensamento) prejudiquem
a obtenção da história clínica. Sempre controlar e dirigir a entrevista.
- Não formular as perguntas de maneira monótona ou mecânica. O diálogo deve ser tão informal
quanto possível.
- Evitar perguntas muito sugestivas, fechadas, que podem ser respondidas com um simples sim ou
não: é melhor perguntar ‘Como você está se sentido?’ do que ‘Você está ansioso?’
- Não aceitar jargões fornecidos pelos pacientes, como ‘nervoso’, ‘deprimido’, ‘tenho pânico’: pedir
para que ele explique o que quer dizer com essas palavras.
- Certificar-se de que o paciente compreende as perguntas: utilizar linguagem acessível, sem termos
médicos.

32
CHENIAUX, 2013, p. 5-13 – com adaptações.
33
Prognóstico - Juízo médico, baseado no diagnóstico e nas possibilidades terapêuticas, acerca da duração, evolução e
termo de uma doença. (AURÉLIO)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
23

Estrutura e conteúdo da anamnese [ou, avaliação] psiquiátrica


Os dois componentes da avalição psiquiátrica são: a anamnese e o exame psíquico. [...] A
anamnese psiquiátrica segue, em linhas gerais, o roteiro da anamnese em medicina. É preciso ter em
mente um roteiro de anamnese, mas este não pode perturbar a espontaneidade da entrevista.
A redação final de uma observação psiquiátrica precisa ser completa, sem ser sobrecarregada ou
repetitiva, mas nunca será totalmente completa e precisa. Dois examinadores jamais farão a mesma
anamnese do mesmo paciente. [...]

Itens da avaliação psiquiátrica


A redação da avaliação psiquiátrica – incluindo a anamnese e o exame psíquico – pode ser dividida
nos seguintes itens:
1) Identificação – A identificação é composta pelos seguintes itens: nome, data de nascimento,
sexo, estado civil, naturalidade, nível de instrução, profissão, etnia, religião, residência,
procedência, filiação.
A identificação pode ser de grande auxílio para a formulação do diagnóstico. Por exemplo, o
alcoolismo é mais comum em homens; esquizofrênicos em geral não são casados; pacientes
com retardo mental costumam apresentar um baixo nível educacional; etc.
Na apresentação pública de casos – como em sessões clínicas -, o nome pode ser
representado pelas iniciais, mas é preferível, para preservar o sigilo, usar um pseudônimo.
2) Queixa principal (QP)
A QP, que constitui o foco da história da doença atual, deve ser sucinta. Convém relacionar
no máximo três queixas, de preferência apenas uma.
A QP é redigida com as palavras do paciente (entre aspas, ou usando sic34), devendo ser
registrada mesmo que absurda. Caso o paciente não formule nenhuma queixa, isso também
tem que ser apontado.
3) Motivo do atendimento – O item motivo do atendimento só é necessário quando não há
consciência de morbidade por parte do paciente. O seu conteúdo é fornecido por outra
pessoa: um familiar, vizinho, bombeiro, policial, outro profissional de saúde, etc. São
reproduzidas literalmente as palavras do informante.
4) História da doença atual – (HDA)
A HDA consta de um relato sobre a época e modo de início da doença, a presença de fatores
desencadeantes, tratamentos efetuados e o modo de evolução, o impacto sobre a vida do
paciente, intercorrência de outros sintomas e as queixas atuais.
Ela é narrada pelo paciente, ou por informantes – no caso de pacientes psicóticos -, ou por
ambos. Faz-se necessário identificar sempre, para cada informação, qual foi a fonte. Na
redação da HDA, evitam-se termos técnicos: são utilizadas as palavras do paciente ou do
informante. Os quadros clínicos são descritos, porém não nomeados. A redação deve seguir
uma ordem cronológica, mesmo que a narrativa, por parte do paciente ou dos informantes,
não tenha sido assim.
São ainda incluídas na HDA informações (sobre alterações psíquicas e físicas) pesquisadas
ativamente pelo entrevistador, mesmo que não tenham sido trazidas espontaneamente pelo
paciente ou informante. Fazem parte também da HDA os negativos pertinentes, ou seja,

34
sic - Palavra que se pospõe a uma citação, ou que nesta se intercala, entre parênteses ou entre colchetes, para indicar
que o texto original é bem assim, por errado ou estranho que pareça. (AURÉLIO)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
24

certos sintomas cuja ausência pode ser significativa para a identificação da doença ou da
fase evolutiva em que esta se encontra. Episódios psiquiátricos anteriores devem ser
relatados também aqui, já que estes devem estar relacionados ao atual, visto que os
transtornos mentais são, em geral, crônicos.
Em casos de transtorno de personalidade ou de retardo mental, será impossível separar HDA
e história pessoal, que podem ser fundidas.
5) História patológica pregressa (HPP)
A HPP refere-se a estados mórbidos passados, em geral não psiquiátricos, que não
mostrem possuir relação direta ou indireta de causa e efeito com a moléstia atual. Se existir
essa relação, eles são incluídos na HDA. São investigados principalmente as seguintes
ocorrências: enurese [incontinência urinária], sonilóquio, pesadelos frequentes, terror
noturno, sonambulismo, asma, tartamudez [dificuldades para falar, gagueira], fobia escolar,
na infância; convulsões35 ou desmaios; doenças venéreas; outras doenças infecciosas,
tóxicas ou degenerativas; traumatismos cranianos; alergia; intervenções cirúrgicas; hábitos
tóxicos (álcool, tabaco, drogas ilícitas); uso de medicamentos. Faz parte também da HPP a
revisão de sistemas, isto é, o questionamento junto ao paciente relativo a cada aparelho de
seu organismo (cardiovascular, respiratório, etc.).
Na redação da HPP incluem-se todas as doenças importantes relatadas. Não se devem listar
doenças ausentes, já que é impossível citar todas as que existem, a não ser que tal ausência
seja significativa para a formulação do diagnóstico.
6) História fisiológica
São investigados os seguintes elementos relativos à história fisiológica: gestação (da mãe),
nascimento, aleitamento, desenvolvimento psicomotor (andar, falar, controle esfincteriano),
menarca [primeira menstruação], catamênios [menstruação], atividade sexual, gestações,
partos, abortamentos, menopausa, padrões de sono e de alimentação.
7) História pessoal (Fatores Predisponentes)
Pode-se optar por fundir a HPP, a história fisiológica, a história pessoal e a história social,
sob a denominação de história pessoal. Caso se mantenha a história pessoal como um item
mais restrito, pesquisam-se as seguintes informações:
- Infância: personalidade, socialização, jogos e brincadeiras, aproveitamento escolar,
ansiedade de separação.
- Adolescência: desempenho escolar, uso de álcool e drogas, delinquência, relacionamentos
interpessoais.
- Sexualidade: iniciação, preferência, orientação, número de parceiros, frequência.
- Vida profissional: vocações; estabilidade no emprego; relacionamento com chefes,
subordinados e colegas; desempenho.
- Personalidade pré-mórbida: relacionamentos sociais, interesses, hábitos de lazer e
culturais, padrão de humor, agressividade, introversão/extroversão, egoísmo, altruísmo,
independência/dependência, atividade/passividade, valore, adaptação ao ambiente.

35
As convulsões generalizadas podem ser: De ausência: geralmente ocorrem em crianças. Como o nome implica, a
pessoa fica ausente do mundo consciente por um breve período. Clônicas: causam convulsões ou movimentos
involuntários em ambos os lados do corpo. Mioclônicas: envolvem o movimento involuntário da parte superior do
corpo e dos membros. Tônicas: resultam na contração súbita dos músculos. Essas convulsões são mais comuns durante
o sono. Atônicas: envolvem a perda do controle muscular, fazendo a pessoa desmaiar ou cair. Tônico-clônicas:
envolvem uma combinação dos sintomas das convulsões tônicas e clônicas.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
25

8) História social
Fazem parte da história social informações relativas à moradia – condições sanitárias,
pessoas com quem convive, número de cômodos, privacidade, características sócio-
demográficas da região; situação socioeconômica; características socioculturais; atividade
ocupacional atual; situação previdenciária; vínculo com o sistema de saúde; atividades
religiosas e políticas; antecedentes criminais.
9) História familiar (Fator Predisponente)
A história familiar abrange dados relacionados a: doenças psiquiátricas e não psiquiátricas;
ter sido a gravidez desejada ou não pelos pais do paciente, separação dos pais, quem criou o
paciente; ordem de nascimento entre os irmãos, diferença de idade; características de
personalidade dos familiares, o relacionamento entre estes e destes com o paciente; atitude
da família diante da doença do paciente; relacionamento com o cônjuge e filhos.

O exame psíquico
O exame psíquico também é chamado de exame do estado mental, exame mental, exame
psicopatológico, exame psiquiátrico. Ele começa no primeiro contato com o paciente, antes de se
obterem os dados de identificação. O psiquiatra experiente será capaz de realizar a maior parte do
exame do estado mental ao mesmo tempo em que completa a tomada da história. [...]
No exame psíquico, são descritas apenas as alterações presenciadas durante a entrevista. Portanto,
na redação do exame psíquico, expressões como no momento ou durante a entrevista são
redundantes. De um momento para outro, a sintomatologia psiquiátrica pode mudar – como podem
mudar a frequência cardíaca, a pressão arterial, etc. -, constituindo assim um outro exame psíquico.
Nos casos em que a sintomatologia é intermitente, o que não é raro com alucinações e com
alterações do nível de consciência, um exame psíquico isolado pode ser pouco revelador. Uma
possível solução seria tornar o exame psíquico mais amplo, compreendendo mais de uma
observação, com intervalos de horas ou dias entre uma e outra.
Na redação, é conveniente a descrição das condições nas quais se realizou ou exame: se no
domicílio do paciente, em consultório ou ambulatório, em quarto de hospital, ou numa enfermaria;
se havia mais alguém presente.
Há uma influência mútua entre as funções mentais. Na verdade, qualquer subdivisão das funções
mentais é artificial, e as diversas funções psíquicas são avaliadas de forma praticamente simultânea.
As funções psíquicas podem alterar-se quantitativa ou qualitativamente.
Além do registro das alterações psicopatológicas, faz parte do exame psíquico a descrição das
funções mentais preservadas. Não devem ser consideradas as possíveis causas dos fenômenos: são
apontadas todas as alterações presentes, mesmo que, por exemplo, se acredite que elas sejam
devidas à medicação em uso. Para a avaliação de algumas funções, como memória, orientação,
inteligência, etc., são necessárias perguntas mais específicas ou mesmo testes. A redação do exame
psíquico deve restringir-se a uma descrição dos fenômenos observados, sem o uso de termos
técnicos.

Súmula psicopatológica
Os itens que compõem a súmula psicopatológica são: (1) aparência; (2) atitude; (3) consciência; (4)
atenção; (5) sensopercepção; (6) memória; (7) fala e linguagem; (8) pensamento; (9) inteligência;

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


26

(10) imaginação; (11) conação36; (12) psicomotricidade; (13) pragmatismo37; (14) humor e
afetividade; (15) orientação38; (16) consciência do eu; (17) prospecção39; (18) consciência de
morbidade.
Esses mesmos elementos são examinados no exame psíquico. A súmula psicopatológica e o exame
psíquico possuem o mesmo conteúdo, sendo a súmula um resumo do exame psíquico: a partir de
um exame psíquico bem feito, qualquer outra pessoa terá que formular a mesma súmula
psicopatológica. Além disso, na súmula torna-se explícita a subdivisão das funções mentais e são
utilizados termos técnicos.
Não há uma uniformidade quanto a uma configuração ideal da súmula, nem quanto ao número ou
ordem de apresentação dos itens. [...]

Diagnóstico psiquiátrico
[...] As doenças são apenas conceitos, abstrações criadas pelo homem, que podem ser a qualquer
momento modificadas ou descartadas. Constituem condições relacionadas a desconforto, dor,
incapacitação ou morte, mas que só vão ser consideradas doenças em função de muitos fatores
(sociais, econômicos, biológicos, etc.).
São levantadas algumas objeções à formulação de diagnósticos. Uma delas está relacionada à ideia
de que cada pessoa é uma realidade única e inclassificável: ‘não existem doenças, mas doentes.’
Afirma-se ainda que o diagnóstico é estigmatizante, e que ele apenas serviria para rotular as pessoas
diferentes, permitindo e legitimando o poder médico, o controle social sobre o indivíduo
desadaptado ou questionador.
Mas, entre diagnosticar e reduzir a pessoa que recebeu o diagnóstico a um rótulo, há uma grande
diferença. Embora possua algumas desvantagens e possa ser usado indevidamente, o diagnóstico

36
Conação – “[...] conjunto de atividades psíquicas direcionadas para a ação. Incluem-se as funções conativas os
impulsos e a vontade.” (CHENIAUX, 2013, p.117)
37
Pragmatismo – “[...] capacidade de colocar em prática, de realizar de forma eficaz, aquilo que se deseja ou que foi
planejado. Portanto, ele não pode ser avaliado se a conação está diminuída: se o paciente nada quer, o distúrbio não está
na transposição do querer para a realização. De certa forma, o pragmatismo serve como uma medida do grau de eficácia
das funções psíquicas em seu conjunto (Motta, 1995). O pragmatismo só pode se alterar quantitativamente, e para
menos: hipopragmatismo e apragmatismo. O exame do pragmatismo implica, em primeiro lugar, identificar os
interesses e objetivos do paciente, e, em segundo, avaliar a adequação do comportamento quanto à realização de tais
objetivos. Todos os transtornos mentais levam a acerto grau de hipopragmatismo, uns mais, outros menos. O maníaco,
apesar da hiperbullia (intensificação da vontade), está hipopragmático: seus objetivos mudam constantemente e ele não
consegue terminar nada que inicia.” (CHENIAUX, 2013, p.130)
38
Orientação – “é a capacidade de se situar em relação a si mesmo e ao ambiente. Não é propriamente uma função
psíquica; consiste, de fato, no resultado dos rendimentos e da integração de diversas funções psíquicas – como a
percepção, a atenção, a memória, o pensamento, a inteligência e o afeto. A orientação resulta especialmente da
apercepção (ou apreensão, compreensão intelectual). A apercepção representa a capacidade de relacionar entre si as
percepções para alcançar a significação do contexto. Por exemplo, na tela do televisor vemos um extenso gramado com
algumas marcações brancas e duas traves, além de um bola e homens uniformizados correndo, e, através da apercepção,
concluímos que se trata de uma partida de futebol.” (CHENIAUX, 2013, p.152)
39
Prospecção – “[...] consiste no planejamento que o indivíduo faz quanto à própria vida, e reflete a expectativa que ele
tem em relação ao futuro. O exame da prospecção se faz perguntando-se diretamente ao paciente o que ele planeja
fazer, por exemplo, quando tiver alta hospitalar – se estiver internado -, ou mesmo num futuro mais distante. Os planos
para o futuro podem estar ausentes ou presentes. Se estão presentes, podem ser adequados e exequíveis, ou então
inadequados e inexequíveis – incompatíveis com a realidade do paciente. Pacientes delirantes costumam formular
planos absurdos e inexequíveis: por exemplo, eliminar todas as doenças do mundo. Os deprimidos em geral são
pessimistas, e nada esperam do futuro. Os maníacos, ao contrário, são muito otimistas, e muitas vezes formulam planos
cuja execução está além de suas possibilidades. Em alguns indivíduos com demência ou retardo mental, em função do
prejuízo intelectivo, noções abstratas como a de tempo podem estar ausentes, e a vida psíquica se limita à realidade
imediata, sendo impossível a prospecção.” (CHENIAUX, 2013, p.168)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
27

representa uma necessidade prática na medicina e na ciência. As finalidades principais do


diagnóstico são: comunicação – permitir uma linguagem comum – e previsão (‘diagnóstico e
prognóstico’). Além disso, o diagnóstico favorece a investigação científica e fundamenta as
medidas terapêuticas e preventivas.” (CHENIAUX, 2013, p. 5-11)

A entrevista com o paciente40


"Harry Stack Sullivan (1983) afirmava que o domínio da técnica de realizar entrevistas é o que
qualifica especificamente o profissional habilidoso. Nesse sentido, por exemplo, ele define o
psiquiatra (poderia ser um psicólogo clínico ou enfermeiro em saúde mental) como “um perito do
campo das relações interpessoais”, ou seja, um expert em realizar entrevistas que sejam realmente
úteis, pelas informações que fornecem e pelos efeitos terapêuticos que exercem sobre os pacientes.
Assim, a técnica e a habilidade em realizar entrevistas são atributos fundamentais e insubstituíveis
do profissional de saúde em geral e de saúde mental em particular. Tal habilidade é, em parte,
aprendida e, em outra, intuitiva, patrimônio da personalidade do profissional, de sua sensibilidade
nas relações pessoais. É a respeito dos aspectos passíveis de serem desenvolvidos, aprendidos,
corrigidos e aprofundados que trata este capítulo. [...]
De início, pode-se afirmar que a habilidade do entrevistador se revela pelas perguntas que formula,
por aquelas que evita formular e pela decisão de quando e como falar ou apenas calar. Também é
atributo essencial do entrevistador a capacidade de estabelecer uma relação ao mesmo tempo
empática [rapport] e tecnicamente útil do ponto de vista humano.
É fundamental que o profissional possa estar em condições de acolher o paciente em seu
sofrimento, de ouvi-lo realmente, escutando-o em suas dificuldades e idiossincrasias. Além de
paciência e respeito, o profissional necessita de certa têmpera e habilidade para estabelecer limites
aos pacientes invasivos ou agressivos, e, assim, proteger-se e assegurar o contexto da entrevista. Às
vezes, uma entrevista bem-conduzida é aquela na qual o profissional fala muito pouco e ouve
pacientemente o enfermo. Outras vezes, o paciente e a situação “exigem” que o entrevistador seja
mais ativo, mais participante, falando mais, fazendo muitas perguntas, intervindo mais
frequentemente. Isso varia muito em função:
1. Do paciente, da sua personalidade, do seu estado mental e emocional no momento, das suas
capacidades cognitivas, etc. Às vezes, o entrevistador precisa ouvir muito, pois o paciente “precisa
muito falar, precisa desabafar”; outras vezes, o entrevistador deve falar mais para que o paciente
não se sinta muito tenso ou retraído.
2. Do contexto institucional da entrevista (caso a entrevista se realize em pronto-socorro,
enfermaria, ambulatório, centro de saúde, CAPS, consultório, etc.).
3. Dos objetivos da entrevista (diagnóstico clínico; estabelecimento de vínculo terapêutico inicial
[rapport]; entrevista para psicoterapia, tratamento farmacológico, orientação familiar, conjugal,
pesquisa, finalidades forenses, trabalhistas, etc.).
4. E, finalmente, mas não menos importante, da personalidade do entrevistador. Alguns
profissionais são ótimos entrevistadores, falam muito pouco durante a entrevista, sendo discretos e
introvertidos; outros só conseguem trabalhar bem e realizar boas entrevistas sendo espontaneamente
falantes e extrovertidos.
Deve-se ressaltar que, de modo geral, algumas atitudes são, na maior parte das vezes, inadequadas e
improdutivas, devendo o profissional, sempre que possível, evitar:
40
DALGALARRONDO, P., 2008, p. 66-84. As chaves e destaques são do professor da matéria.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
28

1. Posturas rígidas, estereotipadas, fórmulas que o profissional acha que funcionaram bem com
alguns pacientes e, portanto, devem funcionar com todos. Assim, ele deve buscar uma atitude
flexível, que seja adequada à personalidade do doente, aos sintomas que apresenta no momento, à
sua bagagem cultural, aos seus valores e à sua linguagem.
2. Atitude excessivamente neutra ou fria, que, muito frequentemente em nossa cultura, transmite ao
paciente sensação de distância e desprezo.
3. Reações exageradamente emotivas ou artificialmente calorosas, que produzem, na maioria das
vezes, uma falsa intimidade. Uma atitude receptiva e calorosa, mas discreta, de respeito e
consideração pelo paciente, é o ideal para a primeira entrevista. Criar um clima de confiança
para que a história do doente surja em sua plenitude tem grande utilidade tanto diagnóstica como
terapêutica.
4. Comentários valorativos ou emitir julgamentos sobre o que o paciente relata ou apresenta.
5. Reações emocionais intensas de pena ou compaixão. O paciente desesperadamente transtornado,
aos prantos, em uma situação existencial dramática, beneficia-se mais de um profissional que
acolhe tal sofrimento de forma empática, mas discreta, que de um profissional que se desespera
junto com ele.
6. Responder com hostilidade ou agressão às investidas hostis ou agressivas de alguns pacientes. O
profissional deve se esforçar por demonstrar serenidade e firmeza diante de um doente agressivo ou
muito hostil. Também deve ficar claro que, na entrevista, há limites. O profissional procura
responder, ao paciente que eleva a voz e se exalta, sempre em voz mais baixa que ele. Em algumas
situações, apesar de não revidar às agressões, o profissional deve mostrar ao paciente que ele está
sendo inadequadamente hostil e que não aceita agressão física ou verbal exagerada. Querelas e
discussões acirradas costumam ser inúteis no contato com os pacientes.
7. Entrevistas excessivamente prolixas, nas quais o paciente fala, fala, fala, mas, no fundo, não diz
nada de substancial sobre seu sofrimento. Fala, às vezes, para se esconder, para dissuadir a si
mesmo e ao entrevistador. Nesse sentido, o profissional deve ter a habilidade de conduzir a
entrevista para termos e pontos mais significativos, interrompendo a fala do paciente quando julgar
necessário.
8. Fazer muitas anotações durante a entrevista, pois, em alguns casos, isso pode transmitir ao
paciente que as anotações são mais importantes que a própria entrevista (o profissional precisa
observar se o paciente se sente incomodado enquanto anota).
Uma dificuldade comum nas entrevistas realizadas em serviços públicos é a falta de tempo dos
profissionais, excesso de trabalho, estresse e condições físicas (arquitetônicas) de atendimento
precárias. Assim, muitas vezes o profissional de saúde está impaciente para ouvir pessoas com
queixas pouco precisas (os “poliqueixosos”), rejeita aqueles doentes que informam de forma vaga
ou que estão muito desorganizados psiquicamente. Entretanto, no atendimento em saúde, a
paciência do entrevistador é fundamental. Às vezes, o profissional dispõe de não mais que 5 ou 10
minutos (p. ex., no pronto-socorro ou em um ambulatório repleto de pacientes à espera), mas, se
nesse pouco tempo, puder ouvir e examinar o doente com paciência e respeito, criando uma
atmosfera de confiança e empatia, mesmo com as restrições de tempo, isso poderá propiciar o início
de um trabalho de boa qualidade. Muitas vezes, não é a quantidade de tempo com o paciente que
mais conta, mas a qualidade da atenção que o profissional consegue lhe oferecer.
Assim, o profissional, ao entrar em contato com cada novo paciente, deve preparar seu espírito para
encarar o desafio de conhecer essa pessoa, formular um diagnóstico, entender, quando possível,
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
29

algo do que realmente se passa em seu interior. Aqui, a paciência é um dos elementos mais
fundamentais. Não é possível saber quantas entrevistas e quanto tempo serão necessários para
conhecer adequadamente o paciente. A experiência e a atitude do profissional, curiosa, atenta e
receptiva, determinam o quão profundo e abrangente será o conhecimento extraído das entrevistas.
A(s) primeira(s) entrevista(s)
A entrevista inicial é considerada um momento crucial no diagnóstico e no tratamento em saúde
mental. Esse primeiro contato, sendo bem-conduzido, deve produzir no paciente uma sensação de
confiança e de esperança em relação ao alívio do sofrimento. Entrevistas iniciais desencontradas,
desastrosas, nas quais o profissional é, involuntariamente ou não, negligente ou hostil com o
paciente, em geral são seguidas de abandono do tratamento.
Logo no início, o olhar e, com ele, toda a comunicação não-verbal, já tem sua importância: é o
centro da comunicação, que inclui toda a carga emocional do ver e ser visto, do gesto, da postura,
das vestimentas, do modo de sorrir ou expressar sofrimento. Mayer-Gross, Slater e Roth (1976)
assinalam, nesse sentido, que: ‘A primeira impressão tem o seu valor próprio e dificilmente poderá
ser recapturada em ocasiões posteriores...’.
E prosseguem:

[...] com maior frequência, essa impressão é correta, mesmo que desapareça aos poucos ou passe a ser considerada
como enganosa, quando a atenção estiver voltada para os detalhes, as ideias e as informações fornecidas pelo paciente.

Em um trabalho clássico sobre o diagnóstico em psiquiatria, Sandifer, Hordern e Grenn (1970)


observaram por meio de pesquisas empíricas que, em profissionais com alguma experiência clínica,
a entrevista em psiquiatria não funciona como uma “máquina de somar simples”, na qual o passar
do tempo vai acrescentando informações, em progressão linear. De fato, esses pesquisadores
verificaram que os primeiros três minutos da entrevista são extremamente significativos, sendo
muitas vezes úteis tanto para a identificação do perfil dominante de sintomas do paciente como para
a formulação da hipótese diagnóstica final.
A primeira impressão que o paciente produz no entrevistador é, na verdade, o produto de uma
mescla de muitos fatores, como a experiência clínica do profissional, a transferência que o paciente
estabelece com ele, aspectos contratransferenciais do entrevistador e valores pessoais e preconceitos
inevitáveis que o profissional, querendo ou não, carrega consigo. Além disso, há grande dose de
intuição que, lapidada pelo estudo e amadurecida pela prática clínica, pode se tornar instrumento
valioso de conhecimento e ação.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


30

Aspecto global do paciente


Um fator importante nas fases iniciais da avaliação do paciente é notar e descrever o aspecto global
do paciente, expresso pelo corpo e pela postura corporal, pela indumentária (roupas, sapatos, etc.),
pelos acessórios (colares, brincos, piercing, etc.), por detalhes como maquiagem, perfumes, odores,
marcas corporais (tatuagens, queimaduras, etc.), porte e atitudes psicológicas específicas e globais
do paciente. A aparência do paciente, suas vestes, seu olhar, sua postura, revela muito de seu
estado mental interior e é recurso fundamental para o diagnóstico. Nesse sentido, o Quadro 8.2,
organizado a partir dos trabalhos de Betta (1972) e de Cheniaux (2005), visa resumir os principais
padrões observados no consultório.
Além disso, para descrever a aparência do paciente, convém relatar o que se observou de forma
detalhada, objetiva e precisa, mas sem precipitações ou inferências indevidas. O Quadro 8.3
apresenta os termos descritivos relativos à aparência física do paciente (Carlat, 2007).

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


31

(continua)

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


32

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


33

Apresentação
Logo no início da entrevista, é conveniente que o profissional se apresente, dizendo seu nome, se
necessário, sua profissão e especialidade e, se for o caso, a razão da entrevista. A confidencialidade,
a privacidade e o sigilo poderão ser explicitamente garantidos caso se note o paciente tímido ou
desconfiado ou se o contexto da entre- vista assim o exigir. Para isso, em alguns casos, é importante
que o profissional garanta explicitamente o que segue:
1. A entrevista e o tratamento ocorrerão com sigilo e discrição. O profissional esclarece ao paciente
(e aos familiares, quando necessário) que aquilo que for relatado durante as entrevistas não será
revelado a ninguém. Caso isso se faça necessário por exigência do próprio tratamento
(encaminhamento a um outro profissional, carta à alguma instituição, informação à família para
proteger o paciente, etc.), só será feito após consulta e anuência do entrevistado. O sigilo poderá ser
rompido no caso de ideias, planos ou atos seriamente auto ou heterodestrutivos.
2. Em qualquer caso, é preciso ressaltar a necessidade de colaboração mútua entre o profissional e o
paciente. Ambos devem trabalhar ativamente para que o processo terapêutico tenha bons resultados.
Na primeira entrevista, o profissional deve inicialmente colher os dados sociodemográficos básicos,
como nome, idade, data de nascimento, naturalidade e procedência, estado civil, com quem reside,
profissão, atividade profissional, religião, etc. Após colher tais informações, que de fato situam
quem é o paciente que chega ao serviço de saúde, deve-se solicitar que o paciente relate a queixa

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


34

básica, o sofrimento, a dificuldade ou o conflito que o traz à consulta. Esse primeiro relato deve
ocorrer de forma predominantemente livre, para que o paciente expresse de forma espontânea seus
sintomas e sinais. O profissional ouve o relato e observa, além do conteúdo daquilo que o
paciente conta, como esse relato é feito, o “estilo” do paciente, sua aparência e suas atitudes
básicas. O profissional deve, nesse momento, muito mais ouvir que falar. Suas intervenções
objetivam facilitar o prosseguimento da fala do paciente. O psiquiatra espanhol Vallejo Nágera
(1944) aconselhava ao jovem profissional:

El explorador hablará poco y dejará que hable mucho el enfermo; la regla más importante del interrogatorio es que el
alienista hable muy poco, para que sea locuaz el alienado.

Cabe lembrar, entretanto, que, embora a atitude básica do entrevistador na fase inicial da avaliação
seja de escuta, isso não significa colocar-se em posição totalmente passiva. Bem ao contrário, pois,
como enfatizado por Sullivan (1983), os dados essenciais da clínica psicopatológica emergem
basicamente de uma observação participativa, da interação intensa entre paciente e
profissional. Nesse sentido, Sullivan (1983) afirmava que

[...] o entrevistador desempenha um papel muito ativo na introdução de interrogações, não para mostrar que é
inteligente ou cético, mas literalmente para ter certeza que ele sabe o que está sendo dito. [...] Quase toda vez que se
pergunta, ‘Bem, você quer dizer assim e assado?’, o paciente é um pouco mais claro sobre o que ele quer dizer...

O entrevistador deve lembrar que, nas fases mais iniciais da entrevista, o paciente pode estar muito
ansioso e usar manobras e mecanismos defensivos como riso, silêncio, perguntas inadequadas,
comentários circunstanciais sobre o profissional, etc. Por exemplo: “O senhor é jovem, não?”; ou
‘A senhora é casada, tem filhos?”; ou, ainda, “Por que será que todo psiquiatra é tão sério (ou tem
barba, etc.)...?’. São estratégias involuntárias ou propositais que podem estar sendo utilizadas
para que o paciente evite falar de si, de seu sofrimento, de suas dificuldades. O profissional
deve lidar com tais manobras, lembrando polidamente ao paciente que a entrevista tem por
finalidade identificar seu problema para, assim, poder melhor ajudá-lo. Ele também deve deixar
claro para o paciente que a pessoa do entrevistador não é o tema da entrevista.
Nos primeiros encontros, o entrevistador deve evitar pausas e silêncios prolongados, que possam
aumentar muito o nível de ansiedade do paciente e deixar a entrevista muito tensa e improdutiva.
Alguns procedimentos podem facilitar a entrevista no momento em que o entrevistador lida com o
silêncio do paciente:
1. O entrevistador deve fazer perguntas e colocações breves que assinalem a sua presença efetiva e
mostrem ao paciente que ele está atento e tranquilo para ouvi-lo.
2. O entrevistador deve evitar perguntas muito direcionadas, fechadas, que possam ser respondidas
com um sim ou um não categóricos; também deve evitar perguntas muito longas e complexas,
difíceis de serem compreendidas pelo paciente.
3. É sempre melhor intervenções do tipo ‘Como foi isso?’, ‘Explique melhor’, ‘Conte um pouco
mais sobre isso’, que questões como ‘Por quê?’ ou ‘Qual a causa?’. Estas últimas estimulam o
paciente a fechar e encerrar a sua fala.
4. O entrevistador deve buscar para cada paciente em particular o tipo de intervenção que facilite a
continuidade de sua fala.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


35

Mesmo realizando entrevistas abertas, nos primeiros encontros, o profissional deve ter a estrutura
da entrevista em sua mente, permitindo ao mesmo tempo que o paciente conte sua própria versão.
Falar de forma livre permite que o entrevistador avalie melhor a personalidade e, por vezes, alguns
conflitos do paciente. A fala livre também tem frequentemente uma dimensão catártica, de
‘desabafo’, que pode ser muito útil e servir de alívio para o paciente.
À medida que o relato feito pelo doente progride, tal relato vai sendo ‘encaixado’ em determinada
estrutura de história, que está na mente do entrevistador. Surgirão lacunas nessa história, que
saltarão à mente deste. Após a fase de exposição livre, ele fará as perguntas que faltam para
completar e esclarecer os pontos importantes da história e da anamnese de modo geral.
A duração e o número de entrevistas iniciais, com fins diagnósticos e de planejamento terapêutico
não são fixos, dependendo do contexto institucional onde se dá a prática profissional, da
complexidade e da gravidade do caso e da habilidade do entrevistador.

Transferência e contratransferência
O conceito de transferência, introduzido por Freud, é um elemento
fundamental que o profissional deve conhecer para realizar as
entrevistas de forma mais habilidosa, entendendo e tratando seus
pacientes de modo menos ingênuo, mais profundo e sensível.
A transferência compreende atitudes e sentimentos cuja origem são
basicamente inconscientes para o paciente. Inclui tanto sentimentos
positivos (como confiança, amor e carinho) quanto negativos (como
raiva, hostilidade, inveja, etc.). Esses sentimentos são uma repetição inconsciente do passado; o
analista (ou médico, profissional de saúde, professor, etc.) passa a ocupar, no presente, o lugar que o
pai ou a mãe ocupavam no passado. O paciente não se dá conta, dizia Freud [1926] (1986), da
natureza de tais sentimentos, e os considera como novas experiências reais, em vez de identificar o
que eles realmente são, ou seja, reflexos, repetições de sentimentos do passado. O próprio Freud
assim descreveu a transferência:

Eles desenvolvem com seu médico relações emocionais, tanto de caráter afetuoso como hostil, que não se baseiam na
situação real, sendo antes derivadas de suas relações com os pais (o complexo de Édipo). A transferência é a prova de
que os adultos não superaram sua dependência infantil.

Assim, para Dewald (1981), a transferência é

uma forma de deslocamento que dirige para um objeto presente todos aqueles impulsos, defesas, atitudes, sentimentos
e respostas que experimentou e desenvolveu no relacionamento com os primeiros objetos de sua vida.

Segundo Jung (1999), a transferência não é mais que o processo comum de projeção: o paciente
tende a projetar inconscientemente no médico os afetos básicos que nutria (e nutre) pelas figuras
significativas de sua vida. Trata-se, então, de um fenômeno geral, não apenas exclusivo da relação
analítica. Para Jung, pode-se observar a transferência sempre que uma relação íntima entre duas
pessoas se estabelece. O paciente projeta inconscientemente, no profissional de saúde, os
sentimentos primordiais que nutria por seus pais na infância. Sente o seu médico atual como o pai
poderoso e onipotente (ou cruel e autoritário) da infância, ou a enfermeira como a mãe carinhosa e
preocupada (ou omissa e negligente) de seus primeiros anos.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
36

A contratransferência é, em certo sentido, a transferência que o profissional estabelece com seus
pacientes. Da mesma forma que o paciente, o profissional de saúde projeta inconscientemente, no
paciente, sentimentos que nutria no passado por pessoas significativas de sua vida. Sem saber por
que, este ou aquele paciente desperta no profissional sentimentos de raiva, medo, piedade, carinho,
repulsa, etc. Ao identificar tais reações contratransferenciais e conscientizar-se que estas têm a ver
com seus próprios conflitos, o profissional poderá lidar de forma mais racional e objetiva com o que
está ocorrendo na relação profissional.
[...]

Entrevista e dados fornecidos por um “informante


[...] muitas vezes faz-se necessária a informação de familiares, amigos, conhecidos e outros. Os
dados fornecidos pelo ‘informante’ também padecem de certo subjetivismo, que o entrevistador
deve levar em conta. A mãe, o pai ou o cônjuge do(a) paciente, por exemplo, têm a sua visão do
caso, e não ‘a visão’ (correta e absoluta) do caso. De qualquer forma, muitas vezes as informações
fornecidas pelos acompanhantes podem revelar dados mais confiáveis, claros e significativos.
Pacientes com quadro demencial, déficit cognitivo, em estado psicótico grave e em mutismo
geralmente não conseguem informar dados sobre sua história, sendo, nesses casos, fundamental a
contribuição do acompanhante.

Sobre a confiabilidade dos dados obtidos: simulação e dissimulação


O profissional com alguma experiência em psicopatologia aprende prontamente que os dados
obtidos em uma entrevista podem estar subestimados ou superestimados. Não é raro o paciente
esconder deliberadamente um sintoma que vem apresentando, às vezes, de forma intensa; ou relatar
um sintoma ou vivência que de fato não apresenta. O profissional deve exercer toda a sua
habilidade para buscar diferenciar as informações verdadeiras, confiáveis e consistentes das falsas e
inconsistentes.
Denomina-se dissimulação o ato de esconder ou negar voluntariamente a presença de sinais e
sintomas psicopatológicos. Ao ser questionado sobre se tem algum temor, se tem cismas ou acredita
que alguém quer prejudicá-lo, o paciente, mesmo tendo ideação paranóide ou delírio persecutório,
nega terminantemente experimentar tais vivências. Em geral, tal negativa ocorre por medo de ser
internado, de receber medicamentos ou de ser rotulado como louco. O paciente nega alucinações
auditivas, mas cochicha frequentemente com um ser imaginário que está ao seu lado, ou seja, apesar
de dissimular as alucinações para o profissional, revela indícios de sua presença por meio de
comportamento que é incapaz de dissimular.
Já a simulação é a tentativa do paciente de criar, apresentar, como o faria um ator, voluntariamente,
um sintoma, sinal ou vivência que de fato não tem (Turner, 1997). O paciente diz ouvir vozes, estar
profundamente deprimido ou ter fortes dores nas costas, tudo isso no sentido de obter algo.
Geralmente, o paciente que simula sintomas está buscando obter algum ganho com isso: dispensa
do trabalho, aposentadoria, internação para não ser encontrado por traficantes de drogas, etc. Deve-
se ressaltar que a simulação é, por definição, um ato voluntário e consciente, não se incluindo
aqui os sintomas psicogênicos (como paralisia histérica) sem base orgânica, mas com suas raízes
em processos e conflitos inconscientes.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


37

Crítica do paciente e insight em relação a sintomas e transtornos


Em psicopatologia, um aspecto característico da clínica é que parte dos pacientes, apesar de
apresentar sintomas graves que comprometem profundamente suas vidas, não os reconhece como
tal (Lewis, 1934- 2004). Foi proposto que o insight não é um fenômeno categorial e
unidimensional, mas inclui vários níveis de intensidade e distintas dimensões (Dantas; Banzato,
2004). Por exemplo, David (1990) propôs ser o insight composto por três componentes:
1. consciência da doença;
2. modo de nomear ou renomear os sintomas;
3. adesão a tratamentos propostos.
Em particular, pacientes graves, como psicóticos (Dantas; Banzato, 2007), bipolares em quadro
maníaco, alguns dependentes químicos, com retardo mental, síndromes autísticas ou demências,
apresentam graves prejuízos quanto ao insight (Antoine et al., 2004).
Perspectiva transversal versus longitudinal
A avaliação psiquiátrica possui uma dimensão longitudinal (histórica, temporal) e outra
transversal (momentânea, atual) da vida do paciente. Ao se colher a dimensão longitudinal, deve-
se buscar descrever relações temporais de forma clara e compreensível e observar como o paciente
relata, sente e reage aos eventos passados.
Sem a dimensão longitudinal, a transversal fica obscura e incompleta, sendo difícil a sua devida
apreciação. Assim, as relações temporais ficam perdidas.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


38

Relato do caso por escrito


Ao final da entrevista, forma-se o esboço do caso na mente do entrevistador. O estado mental foi
observado durante toda a coleta dos dados, surgindo, dessa forma, a síntese do estado mental do
paciente para o profissional. O relato do caso por escrito deve conter, de preferência, as próprias
palavras que o paciente e os informantes usaram ao descrever os sintomas mais relevantes. O uso de
termos técnicos deve ser sóbrio e proporcional ao grau de conhecimento que o profissional obteve
do caso. Já a caligrafia deve ser legível, e o estilo, claro, preciso, com frases e parágrafos curtos.
Deve-se evitar terminologia por demais tecnicista que geralmente revela a insegurança do
profissional, que busca compensar, na linguagem rebuscada, os vácuos de sua ignorância sobre o
caso, ou que quer demonstrar de modo exibicionista sua erudição e seu saber médico. Além disso, o
profissional deve evitar a interpretação precoce dos dados, seja ela psicológica, psicanalítica,
sociológica ou biológica. Uma interpretação precoce, feita muitas vezes de modo apressado e
excessivo pelo profissional que quer logo ver um sentido em tudo, pode impedir que se enxergue o
paciente que está à sua frente.
É preciso lembrar que, apesar de serem descritos fenômenos irracionais em uma história
psicopatológica, muitas vezes de forma desorganizada e caótica, o relato deve ser organizado e
coerente, facilitando o estabelecimento de hipóteses diagnósticas e o planejamento terapêutico
adequado. O paciente tem o direito de ser confuso, contraditório, ilógico; já o profissional, ao
relatar o caso, não.
Além do aspecto médico essencial, que é o diagnóstico clínico, a entrevista e o seu relato devem
fornecer uma compreensão suficientemente ampla da personalidade do paciente, da dinâmica de sua
família e de seu meio sociocultural imediato.
O relato escrito de um caso tem, além de valor médico, importante valor legal. É um documento
que, sendo bem redigido, poderá ser decisivo em questões legais futuras, impensáveis no momento
em que a avaliação está sendo feita.
No momento em que o entrevistador redige os dados que coletou, deve lembrar que a história
clínica deve ser redigida com uma linguagem simples, precisa e compreensível. O relato deve ser
pormenorizado, mas não prolixo, detalhado naquilo que é essencial ao caso e conciso naquilo que é
secundário.
Não será enfocada aqui a entrevista de crianças e adolescentes. Um bom protocolo de avaliação
psicopatológica desses grupos etários é o sugerido pela American Academy of Child and
Adolescent Psychiatry (1997). Também são recomendados os trabalhos de Shaffer, Lucas e Richters
(1999), o livro de Michael Rutter e Eric Taylor (2002), assim como a obra acessível e didática de
Robert Goodman e Stephen Scott (2004).

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


39

DISSOCIAÇÃO DA REALIDADE

PSICOSES
ESQUIZOFRENIA MELANCOLIA
TRANSTORNO BIPOLAR
DO HUMOR

___________________________________________________________________________________________________

TRANSTORNOS INTERMEDIÁRIOS

BORDERLINES SOCIOPATIAS

NEUROSES
OBSESSIVA TRANSFERÊNCIA HIPOCONDRÍACA
FÓBICA
ANSIEDADE
HISTÉRICA
DEPRESSIVA

NORMAIS
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)

(ORIENTAÇÃO A PARTIR DOS JUÍZOS DE REALIDADE)


40

Processos psíquicos e suas alterações

ALTERAÇÕES DA CONSCIÊNCIA (VIGILÂNCIA)41

Consciência psicológica – [...] soma total das experiências conscientes de um


indivíduo em determinado momento. Nesse sentido, a consciência é o que se
designa campo da consciência. É a dimensão subjetiva da atividade psíquica do
sujeito que se volta para a realidade. Na relação do Eu com o meio ambiente a
consciência é a capacidade de o indivíduo entrar em contato com a realidade,
perceber e conhecer os seus objetos. (DALGALARRONDO, 2008, p. 88)

Segundo Jaspers, consciência é ‘o todo momentâneo da vida psíquica.’ Em outras palavras,


constitui uma síntese ou integração de todos os processos mentais em determinado momento.
As características da consciência psicológica são as seguintes:
- trata-se de uma vivência interna e atual;
- está relacionada à distinção eu/não eu;
- é o conhecimento (o dar-se conta) que o indivíduo tem de suas vivências internas, de seu corpo e
do mundo externo – podendo ser didaticamente dividida em consciência do eu [autopsíquica] e
consciência dos objetos [alopsíquica];
- segundo a fenomenologia, possui intencionalidade (‘toda consciência é sempre consciência de
algo’ [Husserl], é doadora de significado às coisas.
- é reflexiva, ou seja, o indivíduo tem consciência de que tem consciência, e assim pode refletir
sobre os seus conteúdos psíquicos. (CHENIAUX, 2013, p. 20-1)

Alterações quantitativas patológicas da consciência

Rebaixamento do nível de consciência


A expressão rebaixamento do nível de consciência refere-se a um nível de consciência entre a
lucidez e o coma. Constitui uma perda da clareza da consciência: a percepção do mundo externo
torna-se vaga e imprecisa (aumenta o limiar para a captação de estímulos externos), havendo ainda
uma dificuldade para a introspecção, para a apreensão do próprio eu.
O rebaixamento do nível de consciência está relacionado a um comprometimento difuso,
generalizado, do funcionamento cerebral. Sempre possui uma etiologia orgânica. Ocorre um déficit
cognitivo global. Estão especialmente afetadas as funções de atenção, orientação alopsíquica,
pensamento, inteligência, sensopercepção, memória, afeto e psicomotricidade. [...]

Obnubilação42 simples e oniróide

“O doente revela-se indiferente, apático, sem iniciativa e sem espontaneidade.” (PAIM, 1993,
p.201)

41
Tópico construído a partir de recortes e adaptações de: CHENIAUX, 2013, p. 20-32; DALGALARRONDO, 2008, p.
88-101; PAIM, 1993, p. 193-218.
42
Obnubilação vem do latim, ob + nubilare, que significa ‘por uma nuvem na frente’, ‘enevoar’. Em psicopatologia, o
turvamento da consciência.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
41

A obnubilação simples caracteriza-se pela ausência de sintomas psicóticos. O paciente apresenta,


além de intensa sonolência, hipoprosexia (diminuição global da atenção), desorientação no tempo e
no espaço, pensamento empobrecido e alentecido (às vezes, mutismo), dificuldades de compreensão
e de raciocínio, hipoestesia (alteração quantitativa da sensopercepção), hipomnesia de fixação e de
evocação (distúrbio da memória), apatia e inibição psicomotora (às vezes, estupor).

A obnubilação oniróide43 caracteriza-se pela presença de sintomas psicóticos, especialmente


ilusões e pseudoalucinações44 visuais (menos frequentemente, de outras modalidades sensoriais)
[...], além de ideias deliróides (muitas vezes, persecutórias). Há ainda dificuldade de concentração
(com exacerbação da atenção espontânea), desorientação têmporo-espacial, desagregação do
pensamento, dificuldade de compreensão e de raciocínio, amnésia de fixação e de evocação,
exaltação afetiva (muitas vezes, ansiedade), perplexidade e agitação psicomotora. Esse quadro
corresponde à amência [ou, confusão mental], termo introduzido por Meynert em l890.
O delirium tremens45, um quadro grave de abstinência alcóolica, costuma cursar com obnubilação
oniróide. O indivíduo encontra-se agitado e assustado, sem saber onde está e não conseguindo

43
Oniroide – do grego oneiros, que significa ‘sonhos’.
44
Pseudoalucinação – “percepção falsa que, ao contrário das alucinações, se reconhece como irreal. Kandinsky, que a
descreveu pela primeira vez em 1885, a denomina como a percepção que prescinde de ‘corporeidade’ que aparece no
‘espaço’ subjetivo interno’ e, no entanto, ‘se apresenta com toda a adequação perceptiva dos elementos sensíveis’.
(DORSCH, 2001, p. 711) “Resultam de atividade muito intensa da imaginação, em virtude da qual a imagem adquire o
aspecto de percepção real. É comum, normalmente, depois de uma viagem a bordo, nos sentirmos, em terra, como se
estivessemos navegando. Observa-se, por exemplo, como sintoma patológico, no delírio espírita episódico.”
(http://www.psiquiatriageral.com.br/psicopatologia/01percepcao.htm)
45
Delirium – “Síndrome cerebral orgânica sem etiologia específica caracterizada pela presença simultânea de
perturbações da consciência e da atenção, da percepção, do pensamento, da memória, do comportamento psicomotor,
das emoções e do ritmo vigília-sono. A duração é variável e a gravidade varia de formas leves a formas muito graves.
(CID -10)
A característica essencial de um delirium consiste de uma perturbação da consciência acompanhada por uma alteração
na cognição que não pode ser melhor explicada por uma Demência preexistente ou em evolução. A perturbação
desenvolve-se em um curto período de tempo, geralmente de horas a dias, tendendo a flutuar no decorrer do dia.
Existem evidências, a partir da anamnese, exame físico ou testes laboratoriais, de que o delirium é uma consequência
fisiológica direta de uma condição médica geral, Intoxicação ou Abstinência de Substância, uso de um medicamento ou
exposição a uma toxina, ou uma combinação desses fatores.
A perturbação na consciência manifesta-se por uma redução da clareza da consciência em relação ao ambiente. A
capacidade para focalizar, manter ou deslocar a atenção está prejudicada. As perguntas precisam ser repetidas porque a
atenção do indivíduo se dispersa, ou o indivíduo pode perseverar na resposta a uma pergunta anterior, ao invés de
deslocar adequadamente o foco de sua atenção.
A pessoa se distrai facilmente com estímulos irrelevantes. Em vista desses problemas, pode ser difícil (ou impossível)
engajá-la em uma conversação.
Há uma alteração concomitante na cognição (que pode incluir comprometimento da memória, desorientação ou
perturbação da linguagem) ou desenvolvimento de uma perturbação da percepção.
O comprometimento da memória é evidente, acomete com maior frequência a memória recente e pode ser testado
pedindo-se que a pessoa memorize vários objetos sem relação entre si ou uma frase curta e os repita após alguns
minutos de distração. A desorientação é habitualmente manifestada por desorientação temporal (por ex., pensa ser de
manhã no meio da noite) ou espacial (por ex., pensa estar em casa, não em um hospital). No delirium leve, a
desorientação temporal pode ser o primeiro sintoma a aparecer.
A desorientação autopsíquica é menos comum. A perturbação na linguagem pode se evidenciar como disnomia (isto é,
prejuízo na capacidade de nomear objetos) ou disgrafia (isto é, prejuízo na capacidade de escrever). Em alguns casos, o
discurso é dispersivo e irrelevante; em outros, compulsivo e incoerente, com mudanças imprevisíveis de assunto.
O profissional pode ter dificuldade para avaliar alterações na função cognitiva, pois o indivíduo pode mostrar-se
desatento e incoerente. Sob essas circunstâncias, é útil rever cuidadosamente a sua história e obter informações a partir
de outros informantes, particularmente membros da família.
As perturbações na cognição podem incluir interpretações errôneas, ilusões ou alucinações. O bater de uma porta, por
exemplo, pode ser interpretado pela pessoa como um tiro (interpretação incorreta); as dobras nas roupas de cama podem
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
42

identificar corretamente as pessoas ao seu redor. Com grande frequência, ele vê ou sente sobre sua
pele pequenos animais repugnantes – como baratas, aranhas, lagartixas ou ratos -, os quais não estão
realmente presentes.

Coma
O termo coma vem do grego e significa sono profundo. O quadro caracteriza-se
por abolição da consciência. Nesse estado, o indivíduo não pode ser despertado
nem por estímulos dolorosos muito intensos. Ocorre perda total da motricidade
voluntária e da sensibilidade. Embora a vida somática prossiga, não há sinal de
atividade psíquica.”46

Sopor
Segundo o dicionário Aurélio, sopor significa “modorra, sonolência; sono pesado.
Estado comatoso, letargia.” Em psicopatologia, refere-se a um estado de marcante
turvação da consciência no qual o paciente pode ser apenas despertado por estímulos

enérgicos, sobretudo de natureza dolorosa.


Embora o indivíduo ainda possa apresentar
reações de defesa ele é incapaz de qualquer
ação espontânea. O paciente sempre se
mostra evidentemente sonolento. A
psicomotricidade encontra-se mais inibida
do que nos estados de obnubilação. O
traçado eletroencefalográfico acha-se
globalmente lentificado, podendo surgir as
ondas mais lentas, do tipo delta e teta.47

parecer-lhe objetos animados (ilusão); ou o indivíduo pode "ver" um grupo de pessoas pairando sobre a cama, quando
na verdade não há ninguém ali (alucinação).
Embora as interpretações sensoriais incorretas sejam habitualmente do tipo visual, elas podem afetar também outras
modalidades sensoriais. As percepções errôneas variam de simples e uniformes até altamente complexas. O indivíduo
pode ter uma convicção delirante do caráter de realidade das alucinações e apresentar respostas emocionais e
comportamentais congruentes com seu conteúdo.
A perturbação desenvolve-se em um curto período de tempo e tende a apresentar flutuações no decorrer do dia. Durante
a ronda hospitalar matinal, por exemplo, a pessoa pode mostrar-se coerente e cooperativa, mas à noite pode insistir em
arrancar o equipamento intravenoso e voltar à casa dos pais já falecidos. (DSM-IV) A abstinência e várias outras
condições médicas não relacionadas ao alcoolismo podem causar esse problema. Como dentro do estado de delirium da
abstinência alcoólica são comuns os tremores intensos ou mesmo convulsão, o nome ficou como Delirium Tremens.
Um traço comum no delírio tremens, mas nem sempre presente são as alucinações táteis e visuais em que o paciente
"vê" insetos ou animais asquerosos próximos ou pelo seu corpo [Síndrome de Ekbom, Delírio Parasitário ou Delírio
Dermatozóico, é uma condição na qual o paciente apresenta a crença inabalável de que está infestado por parasitas,
sejam sobre sua pele, ou mesmo percorrendo o interior do seu corpo]. Esse tipo de alucinação pode levar o paciente a
um estado de agitação violenta para tentar livrar-se dos animais que o atacam. Pode ocorrer também uma forma de
alucinação induzida, por exemplo, o entrevistador pergunta ao paciente se está vendo as formigas andando em cima da
mesa sem que nada exista e o paciente passa a ver os insetos sugeridos. O Delirim Tremens é uma condição
potencialmente fatal, principalmente nos dias quentes e nos pacientes debilitados. A fatalidade quando ocorre é devida
ao desequilíbrio hidro-eletrolítico do corpo.”( http://www.psicosite.com.br)
46
Adaptado de CHENIAUX, 2013, p. 22-3.
47
Adapatado de DALGALARRONDO, 2008, p.96.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
43

Estados crepusculares48 ou estreitamento da consciência


Outra alteração da qualidade da consciência é o Estado Crepuscular ou, conforme preferem alguns o
Estreitamento da Consciência. Neste estado o paciente parece estar totalmente voltado para dentro.
Perambula como que ausente psiquicamente, automático e sem objetivos claramente definidos. O
pensamento pode ser comparado a uma vivência onírica, pouco clara e da qual as lembranças são
embasadas e turvas, não raras vezes nada é lembrado depois de passado o episódio do Estado
Crepuscular.
Pode manifestar-se um pavor irracional ou uma agressividade extremada durante a crise. Entre as
patologias que comumente proporcionam o Estado Crepuscular a Epilepsia tem lugar destacado mas
não monopoliza todos os pacientes que apresentam este quadro. Situações psicotiformes reativas 49 e
vivências muito traumáticas podem "empurrar" o paciente para este estado de afastamento
momentâneo de uma realidade sofrível.
Portanto, o Estado Crepuscular é um estreitamento transitório da consciência, com a
conservação de uma atividade mais ou menos coordenada, mais ou menos automática.
Normalmente há falsa aparência de que o paciente está compreendendo a situação. Em geral, a
percepção do mundo exterior é imperfeita ou de todo inexistente.
Em alguns casos de Estado Crepuscular, é possível observar a presença de alucinações e ideias
deliróides, mas isso não é a regra. A conduta do enfermo durante o episódio, à primeira vista, pode
parecer ordenada mas, na realidade, a maioria de suas atitudes é automática.
Durante o Estado Crepuscular o paciente pode estar dominado por impulsos e, uma vez conservada
sua capacidade de decisão e de ação, pode praticar atos incompreensíveis, agressivos, impulsivos e
violentos contra pessoas. Essa espécie de automatismo resulta que o doente pode executar uma série
de atos coordenados e com certa finalidade, embora inconscientes, tais como andar sem destino,
enfrentar situações complexas como o sistema de transportes de uma grande cidade e até mesmo
adquirir passagens e realizar viagens de longo percurso.
Os Estados Crepusculares costumam desaparecer rapidamente, mas, em alguns casos, podem durar
muitos dias. Apresentam-se e terminam de modo súbito, acompanhando-se de amnésia em relação
às vivências acessuais [por acessos].” (http://www.psiqweb.med.br). Os estados crepusculares
podem ocorrer associados com despertar do sono [consciência hipnopômpica50], à epilepsia, ao
sonambulismo, terror noturno, quadros alucinatórios, intoxicação alcoólica e delirium.

48
De crepúsculo, “luminosidade, de intensidade crescente ao amanhecer (crepúsculo matutino) e decrescente ao
anoitecer (crepúsculo vespertino), proveniente da iluminação das camadas superiores da atmosfera pelo Sol, quando,
embora escondido, está próximo do horizonte: Figura: Decadência, declínio; ocaso. (AURÉLIO)
49
Ou seja, formas psicóticas reativas à determinados eventos. P.ex., uma grave depressão, produzida pela morte de ente
querido, com manifestações delirantes.
50
Convém diferenciar duas condições da consciência relacionadas ao sono/vigília: 1ª. a hipnagógica. Ou seja, a
condição de sonolência, precedente ao sono e, 2ª. hipnopômpica. Ou seja, a condição anterior à vigília, logo após o
sono.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
44

Onirismo
“Estado semelhante a sonho em uma condição de vigília.” (APA, 2010,
p. 664)
O termo Onirismo é empregado para designar os estados de sonho
patológico. O Onirismo se caracteriza pela predominância das
representações imaginárias, resultando em perturbações sensoriais e
sensitivas. Nesta situação, muitas imagens aparecem como nitidamente
alucinatórias e tais representações compõem o fenômeno intelectual
inicial, daí adquirem a forma de percepção, colocando em atividade os
centros sensoriais das zonas sensitivas e sensoriais terminais.
Henri Ey comenta esse tema e diz que as lembranças e as imagens que participam da composição
fantástica do Onirismo são, elas próprias, dotadas de forte coeficiente de realidade, de tal sorte que
o conjunto adquire um perfeito caráter de nitidez e de realidade cênica. Será exatamente essa
realidade cênica que constitui o material imaginário do qual, pelo menos em certos momentos, o
paciente toma consciência.
Muitos autores estudaram esses casos de perturbações do sonhar, relatados como sonhos intensos e
vivenciados por uma consciência em Estado Crepuscular, o que determina uma profunda alteração
do imaginário e do próprio ato de sonhar. A descrição desses casos de Onirismo mostra a existência
de uma obnubilação da consciência durante um Estado Crepuscular, onde as cenas oníricas
desenroladas durante este Estado Crepuscular pudessem ser relembradas ao retornar o paciente às
condições de normalidade. (http://www.psiqweb.med.br)

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


45

Alterações da consciência do eu51 52


[...] As alterações da consciência do eu normalmente estão relacionadas ao fato do indivíduo sentir-
se possuído por entidades sobrenaturais, especialmente espíritos e demônios. No grupo das
Alterações da Consciência do Eu incluem-se os seguintes transtornos:

Estado de Êxtase
Estado mental transitório, no qual o indivíduo perde todo contato com o mundo
sensível e experimenta um profundo sentimento de beatitude ou de graça, por
encontrar-se absorvido na contemplação mística e/ou espiritual. Algumas
pessoas com prática em meditação podem experimentar estados de êxtases de
duração muito variável. Portanto, para se atingir voluntariamente o estado de
êxtase, é necessário um treinamento especial ou preparação através de
exercícios espirituais.
Também alguns estados psicopatológicos, como por exemplo na histeria, em
alguns casos de esquizofrenia ou em crises de mania podemos observar Estados de Êxtase. Nesses
casos a consciência fica polarizada ao objeto da meditação e a pessoa abstêm-se voluntariamente de
contatar o restante da realidade, tal como ocorreria numa auto-hipnose.53

Transitivismo
Transitivismo é o fenômeno onde o enfermo sente-se transformado em
outra pessoa, como se fosse uma despersonalização54. Em
psicopatologia, o transitivismo consiste no desaparecimento da relação
entre o corpo e os objetos do meio exterior, como uma impossibilidade
de estabelecer a distinção entre aquilo que é próprio do indivíduo e
aquilo que pertence ao meio exterior, havendo um apagamento dos
limites entre a pessoa e o exterior.
Apesar do fenômeno poder aparecer sob a influência de severa angústia55, na maioria das vezes
prenuncia o desenvolvimento de uma psicose ou, quando não, ocorre na vigência de uma lesão dos

51
Tópico construído a partir de recortes e adaptações de: CHENIAUX, 2013, p. 159-67; DALGALARRONDO, 2008,
p. 245-56; PAIM, 1993, p. 193-218.
52
“[...] De maneira muito geral, ele [o Ego/Eu] define a pessoa enquanto unidade distinta. Deve-se assinalar uma
ambiguidade fundamental: o ego/eu se baseia numa experiência subjetiva (consciência de si), que garante sua unidade, e
ao mesmo tempo é o agente que governa as relações da pessoa com o mundo. [...] [Em psicanálise] O ego/eu aparece,
com efeito, como uma instância dentro da personalidade, cujas principais funções são a adaptação ao real e a
manutenção da coerência interna. O ego/eu é, ao mesmo tempo, uma instância integrada onde se forjam as
representações conscientes, especialmente a representação de si, e a agência defensiva que, para corresponder às duas
exigências do princípio da realidade e da coerência interna, deve, diante de qualquer sinal de ameaça em relação a esses
dois princípios (proveniente das representações internas ou das percepções), instalar mecanismos de recalque. O ego/eu
é, portanto, ao mesmo tempo, a sede da consciência e o agente de operações conscientes e inconscientes. (DORON;
PAROT, 2006, p. 270)
53
O Estado do Êxtase é também considerado uma alteração do humor.
54
Vide página 52.
55
Cabe aqui fazer algumas diferenciações importantes: “O termo angústia relaciona-se diretamente à sensação de
aperto no peito e na garganta, de compressão, sufocamento. Assemelha-se muito à ansiedade, mas tem conotação mais
corporal e mais relacionada ao passado. Do ponto de vista existencial, a angústia tem significado mais marcante, é algo
que define a condição humana, é um tipo de vivência mais ‘pesada’, mais fundamental que a experiência da ansiedade.
Ansiedade, por seu turno, é definida como estado de humor desconfortável, apreensão negativa em relação ao futuro,
inquietação interna desagradável. Inclui manifestações somáticas e fisiológicas (dispneia, taquicardia, vasoconstrição ou
dilatação, tensão muscular, parestesias (sensações anormais - formigamento, picada, queimadura - não causadas por
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
46

hemisférios cerebrais ou alguma outra da maturação neurológica. Por falta dessa maturação o
fenômeno pode ser observado como manifestação patológica em crianças entre 4 e 8 anos de idade.
No curso da esquizofrenia o Transitivismo, se apresenta como sintoma de primeira ordem, quando
então o enfermo situa em seu corpo um objeto exterior; seus órgãos se transformaram ou se
comunicam uns com os outros, sem consideração as realidades anatômicas. Nessa situação as ações
parecem comandadas de fora e acompanhadas da sensação de influência.

Possessão
O fenômeno da possessão tem caráter universal e a psicopatologia tenta
explicá-lo em termos de sugestão ou autossugestão ou como resultado
de desdobramentos do eu. Evidentemente a crença cultural em espíritos
desempenha papel importante no aparecimento dessas possessões.
Oesterreich acha que através da provocação da possessão, o ser humano
primitivo procurou voluntariamente a presença consciente do metafísico
e o desejo da presença divina, ambos oferecendo forte incentivo para
continuar a cultivar estados de possessão.
Também os desejos de comunicação com ancestrais e outros parentes mortos desempenham
importante papel na possessão do moderno espiritismo. Em seu estudo, Oesterreich procurou
destacar as relações da possessão com as condições socioculturais existentes entre os povos onde o
fenômeno é observado e, pode-se dizer que, na sociedade humana, a possessão começa a
desaparecer assim que a crença nos espíritos vai perdendo influência. A partir do momento em que
não se leva a sério a possibilidade da possessão, começa a faltar a necessária autossugestão.
Na clínica psiquiátrica a possessão é sempre acompanhada do sentimento de desdobramento da
personalidade e se manifesta em sua forma típica no delírio de possessão demoníaca ou no
Transtorno de Possessão. Há também um evidente aspecto de contaminação (normalmente entre
pacientes histéricos) desses fenômenos de possessão, onde ocorrem "epidemias" de possuídos.

Licantropia
Podem ser observados também os casos de delírio de possessão por
animais, dos quais os mais célebres são as possessões por lobos,
neste caso chamado de Licantropia (Lobisomem). A Licantropia foi
uma das manifestações muito comuns na Idade Média. Os pacientes
com este quadro se achavam transformados em lobo, ou tinham uma
serpente dentro do corpo, ou outros animais.
Na manifestação completa de Licantropia o paciente se torna "corpo
e alma" do animal. Com frequência, a possessão é vivida não como a inclusão de um corpo em
outro corpo, mas como a animação do corpo por um espírito do animal.

Convicção de inexistência
Trata-se de uma convicção de inexistência do próprio corpo ou de certos órgãos, ou de que o
enfermo não se encontra vivo e sim morto. O paciente apresenta uma forma de anulação da própria
corporalidade ou existência.” (http://www.psiqweb.med.br)

estímulo exterior ao corpo), tremores, sudorese, tonturas, etc.) e manifestações psíquicas (inquietação interna,
apreensão, desconforto mental, etc.). [...] (DALGALARRONDO, 2008, p. 166)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
47

ALTERAÇÕES DA ATENÇÃO56

Atenção (ou, direção da consciência) – estado de consciência em que os sentidos estão


seletivamente focados em aspectos do ambiente e o sistema nervoso central
está em estado de prontidão para responder a estímulos. Uma vez que os
seres humanos não possuem uma capacidade infinita de prestar atenção a
todas as coisas – focalizam certos aspectos às custas de outros -, grande parte
da pesquisa nesse campo investiga os fatores que influenciam a atenção e
procura compreender os mecanismos neurais envolvidos no processamento seletivo da informação.
Por exemplo, a experiência passada afeta a experiência perceptiva (percebemos coisas que têm
significado para nós) e algumas atividades (p.ex., leitura) requerem participação consciente (i.e.,
atenção intencional). Entretanto, a atenção também pode ser capturada (i.e., dirigida
involuntariamente) por qualidades de estímulos do ambiente, tais como intensidade, movimento,
repetição, contraste e novidade. (APA, 2010, p. 107)

Em função da atividade predominante, distinguem-se várias formas de atenção: sensorial, motora e


intelectual.
A atenção sensorial está relacionada aos nossos cinco sentidos (visão, audição, olfato, tato e
paladar). Por exemplo, ao provarmos uma bebida, concentramos nossa percepção (atenção) no
paladar a fim de discernirmos o gosto da bebida.
“Na atenção motora, a consciência está concentrada na execução de uma atividade: o exemplo
típico é encontrado na aprendizagem de exercícios físicos e, mais comumente, na formação
intencional dos hábitos. O papel da atenção, nesse caso, consiste em limitar o campo aos seus
movimentos voluntários, à exclusão dos elementos automáticos e a reduzir os elementos intelectuais
do próprio movimento. (PAIM, 1993, p. 164)
Atenção intelectual – “Representa o ato de reflexão, quando necessitamos resolver qualquer
problema em que se encontre implicado o raciocínio. [...]” (PAIM, 1993, p. 164)

Distração – Chama-se distração a dois estados diferentes. Em primeiro lugar é uma incapacidade
quase completa de fixar a atenção. Bleuler cita como exemplo a falta de
tenacidade e a supervigilância observada no escolar, que desvia a todo
instante a atenção de seus deveres para os mais simples ruídos do meio
exterior. No segundo caso, trata-se de uma concentração muito forte em
determinado assunto, que impede a apreensão de tudo aquilo que não se
refere ao motivo particular de atenção: é a distração do sábio, do
estudioso que se acha interessado vivamente por uma ideia ou por uma
pesquisa científica. Os efeitos, nos dois casos, são idênticos, pois a consciência não focaliza,
suficientemente, as impressões que a atingem. [...] (PAIM, 1993, p. 170)

Alguns autores referem-se a distraibilidade, um estado patológico que se exprime por instabilidade
marcante e mobilidade acentuada da atenção voluntária, com dificuldade ou incapacidade para

56
Tópico construído a partir de recortes e adaptações de: CHENIAUX, 2013, p. 33-40; DALGALARRONDO, 2008, p.
102-08; PAIM, 1993, p. 161-72.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
48

fixar-se ou deter-se em qualquer coisa que implique esforço produtivo. A atenção do indivíduo é
muito facilmente desviada de um objeto para outro.

Hiperprosexia – refere-se ao aumento quantitativo da atenção. Refere-se a uma superatividade da


atenção espontânea. Caracteriza-se, essencialmente, por uma extrema habilidade de atenção, o que
leva o indivíduo a atender, simultaneamente, às mais variadas impressões sensoriais, sem que fixe a
atenção sobre um objeto determinado. [...]
Nas síndromes maníacas, os enfermos são levados a prestar atenção forçada aos deferentes
estímulos sensoriais. [...] (PAIM, 1993, p. 171)

Hipoprosexia – Consiste no enfraquecimento acentuada da atenção em todos os seus aspectos. É


observada nos estados infecciosos acompanhados de obnubilação da consciência, na embriaguez
alcoólica aguda, em casos de transtornos mentais tóxicos, na amência e em certas reações vivenciais
anormais. Os estados depressivos sempre se acompanham de diminuição da capacidade de
concentrar a atenção, particularmente nos quadros de depressão ansiosa, que podem chegar, em
casos de estupor melancólicos, a um diminuição acentuada da capacidade de concentrar a atenção.
(PAIM, 1993, p. 171)

Aprosexia – É a falta absoluta de atenção, dependendo esse tipo de transtorno de acentuada


deficiência intelectual ou de inibição cortical. Esse estado difere da insuficiente capacidade de
concentração de origem afetiva e das manifestações de negativismos esquizofrênico. O sintoma foi
descrito por Chavigny como sequela da confusão mental de guerra. Observa-se a aprosexia na
amência, no estupor e nos estados demenciais. (PAIM, 1993, p. 172)

No transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) o paciente “apresenta atenção ou vigilância excessiva


e desregulada. O paciente demonstra alterações no controle executivo (funções frontais), na
memória de trabalho (intimamente relacionada à atenção e na seleção de respostas.
Na esquizofrenia, o déficit de atenção é central. A filtragem de informação irrelevante geralmente
consiste em uma dificuldade importante dos sujeitos acometidos. Pacientes esquizofrênicos
costumam ter dificuldades em anular adequadamente estímulos sensoriais irrelevantes enquanto
realizam determinada tarefa; são muito suscetíveis de distrair-se com estímulos visuais e auditivos
externos.[...]

No transtorno do déficit de atenção/hiperatividade57 (TDAH) - A característica essencial do


transtorno de déficit de atenção/hiperatividade é um padrão
persistente de desatenção e/ou hiperatividade-impulsividade que
interfere no funcionamento ou no desenvolvimento. A desatenção
manifesta-se comportamentalmente no TDAH como divagação em
tarefas, falta de persistência, dificuldade de manter o foco e
desorganização – e não constitui consequência de desafio ou falta de

57
TDAH - O Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é um transtorno neurobiológico, de causas
genéticas, que aparece na infância e frequentemente acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Ele se caracteriza por
sintomas de desatenção, inquietude (hiperatividade) e impulsividade. Ele é chamado às vezes de DDA (Distúrbio do
Déficit de Atenção). (http://www.tdah.org.br)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
49

compreensão. A hiperatividade refere-se a atividade motora excessiva (como uma criança que corre
por tudo) quando não apropriado ou remexer, batucar ou conversar em excesso. Nos adultos, a
hiperatividade pode se manifestar como inquietude extrema ou esgotamento dos outros com sua
atividade. A impulsividade refere-se a ações precipitadas que ocorrem no momento sem
premeditação e com elevado potencial para dano à pessoa (p. ex., atravessar uma rua sem olhar). A
impulsividade pode ser reflexo de um desejo de recompensas imediatas ou de incapacidade de
postergar a gratificação [baixo limiar de frustração]. Comportamentos impulsivos podem se
manifestar com intromissão social (p. ex., interromper os outros em excesso) e/ou tomada de
decisões importantes sem considerações acerca das consequências no longo prazo (p. ex., assumir
um emprego sem informações adequadas).
O TDAH começa na infância. A exigência de que vários sintomas estejam presentes antes dos 12
anos de idade exprime a importância de uma apresentação clínica substancial durante a infância. Ao
mesmo tempo, uma idade de início mais precoce não é especificada devido a dificuldades para se
estabelecer retrospectivamente um início na infância. As lembranças dos adultos sobre sintomas na
infância tendem a não ser confiáveis, sendo benéfico obter informações complementares.
Manifestações do transtorno devem estar presentes em mais de um ambiente (p. ex., em casa e na
escola, no trabalho). A confirmação de sintomas substanciais em vários ambientes não costuma ser
feita com precisão sem uma consulta a informantes que tenham visto o indivíduo em tais ambientes.
É comum os sintomas variarem conforme o contexto em um determinado ambiente. Sinais do
transtorno podem ser mínimos ou ausentes quando o indivíduo está recebendo recompensas
frequentes por comportamento apropriado, está sob supervisão, está em uma situação nova, está
envolvido em atividades especialmente interessantes, recebe estímulos externos consistentes (p. ex.,
através de telas eletrônicas) ou está interagindo em situações individualizadas (p. ex., em um
consultório).
Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico
Atrasos leves no desenvolvimento linguístico, motor ou social não são específicos do TDAH,
embora costumem ser comórbidos. As características associadas podem incluir baixa tolerância a
frustração, irritabilidade ou labilidade do humor. Mesmo na ausência de um transtorno específico da
aprendizagem, o desempenho acadêmico ou profissional costuma estar prejudicado.
Comportamento desatento está associado a vários processos cognitivos subjacentes, e indivíduos
com TDAH podem exibir problemas cognitivos em testes de atenção, função executiva ou
memória, embora esses testes não sejam suficientemente sensíveis ou específicos para servir como
índices diagnósticos. No início da vida adulta, o TDAH está associado a risco aumentado de
tentativa de suicídio, principalmente quando em comorbidade com transtornos do humor, da
conduta ou por uso de substância.
Não há marcador biológico que seja diagnóstico de TDAH. Como grupo, na comparação com pares,
crianças com TDAH apresentam eletrencefalogramas com aumento de ondas lentas, volume
encefálico total reduzido na ressonância magnética e, possivelmente, atraso na maturação cortical
no sentido póstero-anterior, embora esses achados não sejam diagnósticos. Nos raros casos em que
há uma causa genética conhecida (p. ex., síndrome do X-frágil, síndrome da deleção 22q11), a
apresentação do TDAH ainda deve ser diagnosticada. (DSM-5)

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


50

ALTERAÇÕES DA ORIENTAÇÃO58

Denomina-se orientação o complexo de funções psíquicas em virtude das


quais temos consciência, em cada momento de nossa vida, da situação
real em que nos encontramos.
A orientação se encontra intimamente ligada às noções de espaço e de
tempo.

Tipos de orientação
A orientação divide-se em autopsíquica e alopsíquica, classificação essa proposta por Wernicke. A
orientação autopsíquica refere-se à própria pessoa, e consiste num dos elementos da consciência do
eu. A orientação alopsíquica refere-se ao mundo externo e poder ser subdividida em: orientação
temporal (‘saber o dia da semana, o dia do mês, o mês e o ano em que se está. [...]’), orientação
espacial (‘significa exatamente onde se está – por exemplo, se estiver internado, saber que se está
num hospital, e o nome deste -, incluindo a rua, o bairro, a cidade etc.’), orientação quanto às
outras pessoas (‘estar orientado quanto as outras pessoas significa poder reconhece-las, identifica-
las corretamente’) e orientação situacional (‘significa saber a razão pela qual se está em
determinado lugar e que tipo de relação se tem com as pessoas ali presentes. Por exemplo, o
indivíduo saber que está num hospital como paciente, e que está sendo examinado por um médico.
A orientação situacional está estreitamente relacionada com as outras formas de orientação
alopsíquica e também com a orientação autopsíquica.’) (CHENIAUX, 2013, p. 152-3)

Examinar a orientação, tanto a auto quanto a alopsíquica, estamos avaliando as noções do paciente
sobre si mesmo, sobre seu estado atual e sobre suas relações com o restante do ambiente. Tendo em
vista a complexidade funcional da orientação, os quadros onde esta se encontra alterada não devem
ser considerados como sintomas autônomos, senão como consequência de vários fatores
psicopatológicos.
Na desorientação autopsíquica total, o indivíduo não sabe quem é. Normalmente esse
desconhecimento da própria identidade se verifica nas amnésias totais traumáticas, nos estados de
acentuada obnubilação da consciência ou na evolução extremas dos processos demenciais. Bem
mais frequente é a chamada falsa orientação autopsíquica. É a que acomete os enfermos delirantes,
quando se auto atribuem uma nova identidade ou quando assimilam a personalidade de figuras
fantasiosas de seus delírios.
Nos esquizofrênicos pode ocorrer ainda uma dupla orientação, isto é, uma orientação verdadeira ao
lado de uma falsa. É o caso, por exemplo, do paciente que responde encontrar-se numa igreja,
escola ou prisão, porque se delira acreditando incumbido de alta missão moral ou educativa, ou
porque se supõe prisioneiro, sequestrado, vítima da polícia, de associações secretas, de organizações
políticas internacionais mas, ao mesmo tempo ou logo a seguir, mostra saber que se acha no
hospital e que está diante do médico.
Os distúrbios da orientação podem manifestar-se de modo global ou atingir, preferentemente,
apenas uma das facetas da orientação. É, por exemplo, o que acontece no delirium tremens, onde se
observa conservada a orientação autopsíquica, junto com a mais completa desorientação alopsíquica

58
Tópico construído a partir de recortes e adaptações de: CHENIAUX, 2013, p.152-58; DALGALARRONDO, 2008, p.
109-13; PAIM, 1993, p. 181-92.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
51

(no tempo, no espaço e nas relações do enfermo com o ambiente). Em geral, nos doentes mentais,
verifica-se que, em primeiro lugar, há perda da orientação no tempo, depois no espaço e, por último,
em relação à própria pessoa.
Também pode ocorrer desorientação temporo-espacial completa diante de extremo desinteresse,
como acontece em esquizofrênicos, ou dependente de insuficiente apreensão e fixação de estímulos
sensoriais por desatenção e desinteresse nos depressivos mais graves (estupor depressivo). Pode
ainda ocorrer ofuscação geral da consciência, logo, desorientação global, nos estados crepusculares
epilépticos e histéricos, ou nas síndromes confusionais das psicoses tóxicas e infecciosas agudas.
Examinar a orientação, embora seja relativamente simples e acessível, pode ser considerada como a
investigação da essência estrutural da consciência. Portanto, para bem avaliar suas perturbações,
não basta nos limitarmos às perguntinhas costumeiras da rotina hospitalar mas sim, nos dedicarmos
à uma entrevista mais completa, demorada e minuciosa.

Desorientação Apática
[...] a Desorientação Apática depende de alterações da percepção, ou seja, de alterações decorrentes
da vida instintivo-afetiva. Embora o paciente esteja lúcido e perceba com clareza sensorial o que se
passa no ambiente à sua volta, existe enorme falta de interesse, expressiva inibição psíquica e
insuficiente energia psíquica para a elaboração da representação e do raciocínio. O paciente percebe
todas as particularidades do ambiente mas não tem capacidade para integrar essas informação e
formar um juízo sobre a própria situação. A Desorientação Apática ocorre nos estados de profunda
e grave depressão.

Desorientação Amnéstica
As perturbações da memória, que se acompanham de deficiência ou incapacidade de fixação
resultam numa desorientação no tempo e no espaço denominada de Desorientação Amnéstica.
Caracteriza-se pela incapacidade que o enfermo demonstra para fixar os acontecimentos e,
consequentemente, para orientar-se no tempo, no espaço e em suas relações com as pessoas do
ambiente.

Desorientação Amencial e Desorientação Delirante


Tanto os casos de obnubilação da consciência quanto os estados delirantes se acompanham de
dificuldades da compreensão e, por consequência, de alterações da síntese perceptiva. As
alucinações e a impressão das percepções, observadas nesses casos, influem também no
aparecimento da Desorientação Amencial. Fala-se em Desorientação Amencial para aquela que se
observa no delirium tremens e nas psicoses orgânicas, onde se verificam alucinações e transtornos
da compreensão que dificultam a orientação.

Nas psicoses esquizofrênicas falamos em Desorientação Delirante, onde, apesar da completa


lucidez da consciência, observa-se um tipo de desorientação resultado da adulteração da situação no
tempo e no espaço. Nesses casos, é muito frequente observar também uma dupla orientação, a
delirante ao lado da orientação normal, como dissemos acima. De sorte que os pacientes possam
estar orientados no tempo e no espaço mas, por outro lado, podem acreditar que se encontram numa
prisão ou no inferno.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


52

Desdobramento da Personalidade
Hoje em dia os casos de Desdobramento da Personalidade são considerados como dependentes de
autossugestão, tratando-se em geral de pessoas histriônicas (histéricas), mas, de qualquer forma, há
uma evidente desorientação autopsíquica onde o paciente, desdobrando-se em outra personalidade,
perde a orientação da original.

Despersonalização
O fenômeno conhecido como Despersonalização pode ser observado
em alguns casos de reações afetivas muito intensas, em casos de
acessos febris toxi-infecciosos e em certas intoxicações exógenas.
Trata-se de um estado mental particular, de natureza paroxística, de
rápida ou longa duração, caracterizado por um inexplicável
sentimento de estranheza. Essa sensação de estranheza é
inicialmente relacionada com o meio exterior e se estende,
progressivamente, até a própria personalidade.
Nessa situação o paciente assiste inerte ao desenrolar de sua vida psíquica, como se aquilo não
estivesse relacionado com sua pessoa. Concomitantemente ele conserva um incrível estado de
apatia. (adaptado de www.psiqweb.med.br)

“Experiências de irrealidade, distanciamento ou de ser um observador externo dos próprios


pensamentos, sentimentos, sensações, corpo ou ações (p. ex., alterações da percepção, senso
distorcido do tempo, sensação de irrealidade ou senso de si mesmo irreal ou ausente, anestesia
emocional e/ou física).” (DSM-5)

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


53

ALTERAÇÕES NAS VIVÊNCIAS DE TEMPO E ESPAÇO59


De modo geral, a passagem do tempo é percebido como lenta e vagarosa nos estados depressivos, e
rápida e acelerada nos estados maníacos. O ritmo psíquico também é oposto nesses dois transtornos:
na mania, há o taquipsiquismo geral, com aceleração de todas as funções psíquicas (pensamento,
psicomotricidade, linguagem, etc.), e, na depressão, ocorre o bradipsiquismo, com lentificação de
todas as atividades mentais.

Ilusão sobre a duração do tempo


Trata-se de deformação acentuada da percepção da duração temporal. Ocorre, sobretudo, nas
intoxicações por alucinógenos ou psicoestimulantes (cocaína, anfetamina, etc.), nas fases agudas
e iniciais das psicoses e em situações emocionais especiais e intensas. Ocorre também quando são
recebidas, por exemplo, muitas informações novas; o tempo pode parecer transcorrer de modo
extremamente veloz ou comprimido, ou de forma muito lenta e dilatada.

Atomização do tempo
Vivemos no tempo presente, em um agora que vincula intimamente aos acontecimentos passados e
às possibilidades do porvir. A alteração ou a falta dessa experiência subjetiva natural de fluir
temporal, decorrente da perda ou do enfraquecimento de ambas as margens do tempo (passado e
futuro), produz uma redução quase puntiforme ou atomizada do tempo, fazendo-o parecer uma
sucessão de pontos presentes que não se articulam entre si. O indivíduo não consegue inserir-se
naturalmente na continuidade do devir, adere a momentos quase descontínuos. Esse fenômeno
ocorre nos estados de exaltação e agitação maníaca, geralmente acompanhados da chamada fuga
de ideias e de distraibilidade intensa.

Inibição da sensação de fluir do tempo (inibição do devir subjetivo)


A experiência normal do tempo implica a ampliação de um agora que se estende ao passado e se
dirige ao porvir. Implica também um movimento mental que integra o fluir dos acontecimentos
objetivos e externos à dimensão temporal subjetiva, ou seja, ao devir da vida subjetiva. A
anormalidade da sensação do fluir do tempo corresponde à falta da sensação do avançar subjetivo
do tempo, na qual o sujeito perde o sincronismo entre o passar do tempo objetivo, cronológico, e o
fluir de seu tempo interno. Isso ocorre em síndromes depressivas graves. Certos pacientes
depressivos expressam a sua vivência do tempo dizendo que o tempo encolheu, que não passa,
deixou de fluir, ou que está passando muito mais devagar que o normal.
Alguns pacientes esquizofrênicos experimentam certa passividade em relação ao fluir do tempo;
sentem que a sua percepção do tempo é controlada por uma instância exterior ao seu Eu. Outros
pacientes esquizofrênicos, geralmente mais graves, sofrem verdadeira desintegração da sensação do
tempo e do espaço.
Pacientes muito ansiosos descrevem uma pressão do tempo, como se o tempo de que dispõem fosse
sempre insuficiente; ‘sinto que nunca vou dar conta de fazer o que devo fazer em determinado
período’. Pacientes obsessivo-compulsivos graves ocasionalmente experimentam uma lentificação
enorme de todas as atividades, sobretudo quando devem completar alguma tarefa.

59
Tópico construído a partir de recortes e adaptações de: CHENIAUX, 2013, p. 152-58; DALGALARRONDO, 2008,
p. 114-18; PAIM, 1993, p. 181-92.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
54

Anormalidades da vivência do espaço


No estado de êxtase, há perda das fronteiras entre o eu e o mundo exterior. Nesse caso (que
também pode ser classificado como transtorno da consciência do eu), o sujeito sente como se
estivesse fundido ao mundo exterior [...].
A vivência do espaço no indivíduo em estado maníaco é a de um espaço extremamente dilatado e
amplo, que invade o das outras pessoas. O maníaco desconhece as fronteiras espaciais e vive como
se todo o espaço exterior fosse seu. Esse espaço não oferece resistências ao seu eu.
Nos quadros depressivos, o espaço exterior pode ser vivenciado como muito encolhido, contraído,
escuro e pouco penetrável pelo indivíduo e pelos outros.
O indivíduo com quadro paranoide vivencia o seu espaço interior como invadido por aspectos
ameaçadores, perigosos e hostis do mundo. O espaço exterior é, em princípio, invasivo, fonte de
perigos e ameaça. No caso do indivíduo com agorafobia, o espaço exterior é percebido como
sufocante, pesado, perigoso e potencialmente aniquilador.60

60
DALGALARRONDO, 2008, p. 114-7)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
55

ALTERAÇÕES DA SENSOPERCEPÇÃO (ALUCINAÇÃO)61

Conceitos básicos

Sensação
Define-se sensação como o fenômeno elementar gerado por estímulos físicos,
químicos ou biológicos variados, originados fora ou dentro do organismo, que
produzem alterações nos órgãos receptores, estimulando-os. Os estímulos
sensoriais fornecem a alimentação sensorial aos sistemas de informação do
organismo. As diferentes formas de sensação são geradas por estímulos sensoriais
específicos, como visuais, táteis, auditivos, olfativos, gustativos,
proprioceptivos e cinestésicos63.
62

Percepção
Por percepção, entende-se a tomada de consciência, pelo indivíduo, do estímulo
sensorial. Arbitrariamente, então, se atribui à sensação a dimensão neuronal, ainda
não plenamente consciente, no processo de sensopercepção. Já a percepção diz
respeito à dimensão propriamente neuropsicológica e psicológica do processo, à
transformação de estímulos puramente sensoriais em fenômenos perceptivos
conscientes. Piéron (1996) define percepção como a tomada de conhecimento
sensorial de objetos ou de fatos exteriores mais ou menos complexos.

A sensação é considerada, portanto, um fenômeno passivo; estímulos físicos (luz, som, pressão) ou
químicos atuam sobre sistemas de recepção do organismo. Já a percepção seria fenômeno ativo; o
sistema nervoso e a mente do sujeito constroem um percepto (ou seja, um conteúdo significativo)
por meio da síntese dos estímulos sensoriais, estímulos esses confrontados com experiências

61
Tópico construído a partir de recortes e adaptações de: CHENIAUX, 2013, p. 41-53; DALGALARRONDO, 2008, p.
119-36; PAIM, 1993, p. 25-70.
62
Proprioceptivos ou Cenestésicos - estímulos originados no interior do próprio organismo. Segundo o dicionário
Aurélio, as cenestesias corresponderiam a “sensação que o indivíduo experimenta, conscientemente, de sua existência;
sensação que tem o indivíduo de que todas as suas funções orgânicas estão normais.”
63
Cinestésicos - Sentido pelo qual se percebem os movimentos musculares, o peso e a posição dos membros.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
56

passadas registradas na memória e com o contexto sociocultural em que vive o sujeito e que atribui
significado às experiências. Tal percepto, ou seja, a percepção final, é, dessa forma, apreendido pelo
sujeito consciente.
Analise o quadro abaixo:

Imagem (ou imagem perceptiva real)


O elemento básico do processo de sensopercepção é a imagem perceptiva real, ou simplesmente
imagem. A imagem se caracteriza pelas seguintes qualidade:

- Nitidez (a imagem é nítida, seus contorno são precisos);


- Corporeidade (a imagem é viva, corpórea, tem luz, brilho e cores vivas);
- Estabilidade (a imagem percebida é estável, não muda de um momento para outro);
- Extrojeção (a imagem, provinda do espaço exterior, também é percebida nesse espaço);
- Ininfluenciabilidade voluntária (o indivíduo não consegue alterar voluntariamente a imagem
percebida)
- Completitude (a imagem apresenta desenho completo e determinado, com todos os detalhes
diante do observador).

A imaginação é uma atividade psíquica, geralmente voluntária, que consiste na evocação de


imagens percebidas no passado (imagem mnêmica) ou na criação de novas imagens (imagem
criada). A imaginação, ou processo de produção de imagens, geralmente ocorre na ausência de
estímulos sensoriais.

A fantasia, ou fantasma, é uma produção imaginativa, produto minimamente organizado da


imaginação. No sentido psicanalítico, a fantasia pode ser consciente ou inconsciente. Ela se origina
de desejos, temores e conflitos tanto conscientes como inconscientes. A produção de fantasias é
muito frequente e intensa em crianças. Às vezes, é dominante em certos tipos de personalidades,
como nas personalidades histéricas. A produção de fantasias tem uma importante função
psicológica: ajudar o indivíduo a lidar com frustrações, com o desconhecido e, de modo geral, com
os seus conflitos. Muitas pessoas encontram grande prazer em suas atividades fantasmáticas, e os
profissionais da criatividade (artistas, inventores, poetas, etc.) dependem basicamente de sua
capacidade de produzir, desenvolver e elaborar fantasias. [...]

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


57

Representação é a reapresentação de uma imagem na consciência, sem a presença real, externa,


do objeto que, em um primeiro momento, gerou uma imagem sensorial. (“A representação é a
reprodução na consciência de percepções passadas.64)
A imagem representativa ou mnêmica (representação) se caracteriza por:
- Pouca nitidez (os contornos, geralmente, são borrados);
- Pouca corporeidade (a representação não tem a vida de uma imagem real);
- Instabilidade (a representação aparece e desaparece facilmente do campo da consciência);
- Introjeção (a representação é percebida no espaço interno);
- Incompletude (a representação demonstra um desenho indeterminado, apresentando-se
geralmente incompleta e apenas com alguns detalhes).

Existem alguns subtipos de imagem representativa:


- Imagem eidética (eidetismo). É a evocação de uma imagem guardada na memória, ou seja, de
uma representação, de forma muito precisa, com características semelhantes à percepção. A
imagem eidética é experimentada por alguns indivíduos que, por uma capacidade excepcional,
conseguem ver um objeto com muita nitidez e clareza (uma cadeira, a face de uma pessoa, etc.). A
evocação de uma imagem eidética é voluntária e não representa necessariamente sintoma de
transtorno mental.

- Pareidolias. São as imagens visualizadas voluntariamente a partir de


estímulos imprecisos do ambiente. Ao olhar uma nuvem e poder ver
nela um gato ou um elefante, a criança está experimentando o que se
denomina pareidolia. Da mesma forma,
ocorre pareidolia ao se olhar uma folha
com manchas imprecisas e, por meio de
esforço voluntário, visualizar nessas
manchas determinados objetos65. Ambas as formas de percepção
artificialmente modificadas devem ser classificadas como pareidolias.

[...]

É preciso distinguir o fenômeno imagem do fenômeno representação. Ao contrário da imagem


perceptiva real, a imagem representativa ou mnêmica (representação) se caracteriza por ser
apenas uma revivescência de uma imagem sensorial determinada, sem que esteja presente o objeto
original que a produziu.
[...]

A diferença entre a experiência vívida da sensopercepção e as experiências da imaginação e da


representação é bem descrita pelo criador da psicologia empírica, o filósofo inglês David Hume
(1711- 1776):
Todos admitirão sem hesitar que existe uma considerável diferença entre as percepções da mente
quando o homem sente a dor de um calor excessivo ou o prazer de um ar moderadamente tépido e

64
PAIM, 1993, p. 25.
65
O conhecido teste de personalidade Rorschach utiliza tais manchas.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
58

quando relembra mais tarde essa sensação ou a antecipa pela imaginação. Essas faculdades
podem remedar ou copiar as percepções dos sentidos, mas jamais atingirão a forma e a vivacidade
do sentimento original. O máximo que podemos dizer delas, mesmo quando operam com todo o seu
vigor, é que representam o seu objeto de maneira tão viva que quase se poderia dizer que os vemos
ou sentimos. [...] O mais vivo pensamento é ainda inferior à mais embotada das sensações (1973,
p. 134)

Alterações da sensopercepção

Alterações quantitativas da sensopercepção


Nas alterações quantitativas, as imagens perceptivas têm intensidade anormal, para mais ou para
menos, configurando hiperestesias, hiperpatias, hipoestesias, anestesias e analgesias.
Eventualmente, esses termos são empregados em neurologia com um sentido um pouco diverso do
utilizado em psicopatologia.
A hiperestesia, no sentido psicopatológico, é a condição na qual as percepções encontram-se
anormalmente aumentadas em sua intensidade ou duração. Os sons são ouvidos de forma muito
amplificada; um ruído parece um estrondo; as imagens visuais e as cores tornam-se mais vivas e
intensas. A hiperestesia ocorre nas intoxicações por alucinógenos, como o LSD 66(eventualmente
também após a ingestão de substâncias como cocaína, maconha, harmina e harmalina, estas duas
últimas contidas na beberagem [ou, chá] de uso ritual nas religiões Santo Daime e União do
Vegetal), em algumas formas de epilepsia, na enxaqueca, no
hipertireoidismo, na esquizofrenia aguda e em certos quadros
maníacos. Denomina-se hiperpatia, no sentido neurológico,
quando uma sensação desagradável (geralmente de queimação
dolorosa) é produzida por um leve estímulo da pele. A hiperpatia
ocorre tipicamente nas síndromes talâmicas.
Já a hipoestesia, no sentido psicopatológico, é observada em
alguns pacientes depressivos, nos quais o mundo circundante é
percebido como mais escuro; as cores tornam-se mais pálidas e
sem brilho; os alimentos não têm mais sabor; e os odores perdem a
sua intensidade. As hipoestesias táteis, com sentido neurológico, são alterações localizadas em
territórios cutâneos de inervação anatomicamente determinada, compondo as chamadas síndromes
sensitivas de interesse à neurologia clínica. As mais comuns são decorrentes de lesões da medula,

66
O LSD, acrônimo de dietilamida do ácido lisérgico, produz grandes alterações no cérebro, atuando diretamente sobre
o sistema nervoso e provocando fenômenos psíquicos, como alucinações, delírios e ilusões. É uma substância sintética,
produzida em laboratório, que adquiriu popularidade na década de 60, quando não era vista como algo prejudicial à
saúde. Pode ser consumida por via oral, injeção ou inalação, e se apresenta em forma de barras, cápsulas, tiras de
gelatina e líquida; seus efeitos duram de oito a doze horas. Os efeitos físicos dessa droga são: dilatação das pupilas,
sudorese, aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial, aumento da temperatura, náuseas, vômitos. Os sintomas
psíquicos são alucinações auditivas e visuais, sensibilidade sensorial, confusão, pensamento desordenado, perda do
controle emocional, euforia alternada com angústia, dificuldade de concentração. É importante destacar que os efeitos
do LSD dependem do ambiente, da qualidade da droga e da personalidade da pessoa. O LSD é mais usado por
adolescentes e jovens, que querem experimentar visões e sensações novas e coloridas, pois as formas, cheiros, cores e
situações se modificam, levando a pessoa a criar ilusões e delírios, como por exemplo, paredes que escorregam, mania
de grandeza e perseguição. Pode ocorrer também um “flashback”, fenômeno no qual são sentidos os efeitos da droga
após um período de semanas ou meses sem usá-la. O LSD é conhecido também com outros nomes como doce, ácido,
gota, papel e microponto. (http://www.brasilescola.com/drogas/lsd.htm)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
59

das raízes medulares dos nervos (hipoestesia em faixa) e dos neurônios periféricos (hipoestesia ‘em
bota’ e ‘em luva’ das clássicas polineuropatias).
Por sua vez, as anestesias táteis implicam a perda da sensação tátil em determinada área da pele.
Usa-se, com frequência, o termo anestesia para indicar também analgesias (perda das sensações
dolorosas) de áreas da pele e partes do corpo. Anestesias, hipoestesias e analgesias em áreas que
não correspondem a territórios de nervos anatomicamente definidos, em geral são de causas
psicogenéticas. Tais alterações ocorrem mais em pacientes com transtornos histéricos, em sujeitos
com alto grau de sugestionabilidade e em alguns quadros depressivos e psicóticos graves. [...]

Alterações qualitativas da sensopercepção


As alterações qualitativas da sensopercepção são as mais importantes em psicopatologia.
Compreendem as ilusões, as alucinações, a alucinose e a pseudoalucinação.

O fenômeno descrito como ilusão se caracteriza pela percepção


deformada, alterada de um objeto real e presente. Na ilusão, há sempre um
objeto externo real, gerador do processo de sensopercepção, mas tal
percepção é deformada, adulterada, por fatores psicológicos diversos.
A ilusão é a percepção deformada de um objeto real e presente.
As ilusões ocorrem basicamente em três condições:

1. Estados de rebaixamento do nível de consciência. Por turvação da consciência, a


percepção torna-se imprecisa, fazendo com que os estímulos sejam percebidos de forma
deformada.
2. Estados de fadiga grave ou inatenção marcante. Podem ocorrer ilusões transitórias e sem
muita importância clínica.
3. Alguns estados afetivos. Por sua acentuada intensidade, o afeto deforma o processo de
sensopercepção, gerando as chamadas ilusões catatímicas.

Agnosias associativas e seus diversos tipos


As agnosias associativas caracterizam um prejuízo, uma deterioração, na capacidade de reconhecer
as características dos objetos por meio dos sentidos: tato, gosto, olfato, visão e audição. Ou seja,
refere-se ao déficit de formação do percepto. Na agnosia visual o paciente não é capaz de
identificar objetos, formas, cor e espaço. Enxerga-os, pode descrevê-los, mas não sabe o que
realmente são. Na agnosia tátil o paciente é incapaz de reconhecer objetos mediante o sentido do
tato, apesar da sensibilidade se encontrar conservada no fundamental. Na agnosia auditiva o
enfermo ouve sons e ruídos, porém não o pode identificar; não compreende. Por exemplo: não pode
reconhecer um relógio pelo tique-taque ou um chaveiro pelo tilintar das chaves. Nas agnosias
olfativa e gustativa ocorrem, respectivamente, a incapacidade de discernir odores e gostos, sem
que os respectivos órgãos sensoriais estejam prejudicados. “Esta está normalmente associada a
danos cerebrais ou doenças neurológicas, particularmente a lesões do lobo temporal e do lobo
parcial, onde se armazena a memória e a importância dos objetos conhecidos. Muitas vezes, a
agnosia aparece subitamente depois de um traumatismo craniano. Pode, no entanto, ser também

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


60

resultado de uma vida com muito stress onde a saúde em si é deixada em segundo plano em relação
às atividades do dia-a-dia.”67

Tipos de ilusão
As ilusões mais comuns são as visuais, nas quais o paciente geralmente vê pessoas, monstros,
animais, entre outras coisas, a partir de estímulos visuais como móveis, roupas, objetos ou figuras
penduradas nas paredes. Também não são raras as ilusões auditivas, nas quais, a partir de estímulos
sonoros inespecíficos, o paciente ouve seu nome, palavras significativas ou chamamentos.

As alucinações
Define-se alucinação como a percepção de um objeto, sem que este esteja presente, sem o estímulo
sensorial respectivo. [...]
A alucinação é a percepção clara e definida de um objeto (voz, ruído,
imagem) sem a presença do objeto estimulante real.
Embora as alucinações sejam mais comuns em indivíduos com
transtornos mentais graves, podem ocorrer em pessoas que não os
apresentam. Um estudo de Tien (1991) revelou que alucinações de
qualquer tipo ocorrem na população normal com incidência anual de 4 a 5%, sendo as visuais mais
comuns que as auditivas. Dessa forma, indivíduos sem transtornos mentais podem ter visões ou
ouvir vozes [odores], sobretudo a de parentes próximos já mortos, devido ao desejo intenso de
reencontrá-los. [...]

Tipos de alucinações

- Auditiva;
- Visuais (Liliputianas, Autoscópica; Extracampinas);
- Táteis e de contato;
- Olfativas;
ALUCINAÇÕES
- Gustativas;
- Cinestésicas;
- Cenestésicas (ou, Proprioceptivas);
- Psíquicas;

Alucinações auditivas são as mais frequentes e as mais importantes. Apresentam-se sob a forma
elementar: ruídos, zumbidos, murmúrios, estalidos; e sob a forma complexa: como ‘vozes’ que
censuram e ameaçam, como melodias, toques de campainha. O enfermo pode ouvir uma única voz,
que repete uma palavra ou diz frases completas, ou muitas vozes que mantêm entre si uma
conversação. Em alguns casos, são quase imperceptíveis, como sussurradas. As vozes podem ser
masculinas, femininas ou de crianças. A direção de onde provêm é variável; podem vir de longe ou
de perto, do teto, do quarto ao lado ou da rua. Alucinações liliputianas foram descritas por Bierre
de Boismont e Ziehen. Trata-se de um tipo especial de alucinação visual no qual, ao lado da
percepção normal dos objetos e pessoas que o rodeiam, o enfermo divisa uma série de personagens

67
http://doencasneurologicas.blogs.sapo.pt
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
61

minúsculos, isolados ou acompanhados de pequenos animais em movimento. Alucinações


autoscópica, é uma variedade visual em que o enfermo percebe a sua imagem corporal como se
estivesse diante de si próprio. Alucinações extracampinas – Bleuler descreveu[...] os casos em que
as visões se localizam fora do campo sensorial correspondente. O paciente ‘vê’ pessoas que estão
atrás de sua cabeça. Alucinações táteis e de contato – As primeiras são encontradas nas
perturbações mentais tóxicas. Os enfermos sentem sobre a pele pequenos animais. Encontram-se
com mais frequência nos transtornos psicóticos tóxicos, especialmente no delirium tremens e no
cocainismo. [...] As alucinações de contato estão, em sua maioria, localizadas nas zonas erógenas e
aparecem com mais frequência no sexo feminino. As enfermas se queixam de serem vítimas da
prática de relações sexuais, de defloramento, de masturbação. Nas alucinações olfativas o enfermo
é perseguido por sensações repugnantes de mau odor: de cadáver, de carne deteriorada, de pano
queimado, de lixo, de mofo e de cheiro pútrido de fezes. Em alguns casos, ao doente parece que o
mau odor provém dele próprio. Nos casos em que os pacientes se julgam influenciados por gases
tóxicos, trata-se de interpretações delirantes de percepções normais. As alucinações gustativas
consistem, segundo informações dos enfermos, em que o alimento tem um sabor estranho, metálico,
um sabor de droga que não pode ser identificado. Queixam-se os doentes de sentir um gosto
desagradável na boca, que permanece durante todo o dia. A sitiofobia (medo patológico de se
alimentar) pode resultar de alucinações do paladar, quando o enfermo ‘percebe’ gosto de veneno na
comida. Nas alucinações cinestésicas alguns enfermos têm a impressão de que o seu corpo realiza,
espontaneamente, determinados movimentos. Outros admitem que os seus músculos se contraem,
que um dos braços se levanta ou um das pernas se encolhe, sem que, na realidade, se observe
qualquer movimento na parte indicada. Nas alucinações cenestésicas muitos enfermos fazem
referência a sensações estranhas em outros órgãos: algo pressiona os olhos, na parte interna, de
modo que, ao olharem-se no espelho, percebem atemorizados que os olhos estão projetados para
fora das órbitas; outros referem-se a sensações estranhas no cérebro, como se ali tive colocado uma
pedra de gelo. Sentem, em alguns momentos, ‘as veias correrem dentro do corpo’; ‘uma bala girar
em espiral dentro do crânio, subindo da base para a parte superior’. Sensações relativas à cabeça são
referidas como se algo pressionasse o cérebro, que aumenta de forma desmedida a ponto de
espedaçar-se o crânio. Especialmente, no início da enfermidade, os pacientes se queixam de dores
internas, que o ‘o couro cabeludo está tão sensível que o menor toque no cabelo produz dores
lancinantes’; têm sensações de frio ou de calor intenso; sentem dentro do corpo como se tivessem
colocado ali óleo fervendo; seus olhos e seus cabelos expelem chamas. Insuflam ar em seus
pulmões, o que produz uma sensação desagradável de sufocação e de morte iminente. Nas
alucinações psíquicas as imagens alucinatórias não têm um verdadeiro caráter sensorial, objetivo.
Os enfermos fazem referência a ‘palavras sem som’, dizem, por exemplo, que falam com indivíduos
estranhos por ‘direta comunicação do pensamento’, por uma espécie de ‘linguagem dos espíritos’,
feita de ‘vozes sem ruído’, de ‘palavras secretas e interiores que não soam’.”68

Alucinose – “A alucinação denominada alucinose é o fenômeno pelo qual o paciente percebe tal
alucinação como estranha a sua pessoa. [...] o característico das alucinoses é serem adequada e
imediatamente criticadas pelo sujeito, reconhecendo o seu caráter patológico. [...]
Na alucinose, embora o doente veja a imagem ou ouça a voz ou o ruído, fala a crença que
comumente o alucinado tem em sua alucinação. O indivíduo permanece consciente de que aquilo é
68
Adaptado de PAIM, 1993, p.41-60)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
62

um fenômeno estranho, patológico, não tem nada a ver com a sua pessoa, estabelecendo
distanciamento entre si e o sintoma. Diz-se que a alucionose é um fenômeno periférico ao Eu,
enquanto a alucinação é central ao Eu.
A alucinose ocorre com maior frequência em
quadros psico-orgâncos; por isso, foram também
denominadas alucinações neurológicas.
A alucinose em sua modalidade visual ocorre com
maior frequência em pacientes com intoxicações
por substâncias alucinógenas, com LSD,
psilobicina, mescalina, anticolinérgicos, ayahuasca,
etc. Pode ocorrer devido a tumores do pendúnculo
cerebral, sendo então denominada alucinose
penduncular de Lhermitte, [...].”69

Pseudoalucinações
As pseudo-alucinações são produtos patológicos da atividade representativa. [...] Constituem-se de
imagens dotadas de clareza sensorial, as quais, ao contrário das alucinações verdadeiras, são
percebidas numa espécie de espaço subjetivo. Distinguem-se das alucinações pelo fato de que as
imagens visuais e as vozes serem localizadas no interior da cabeça ou na parte interna do corpo.
Kandinski empregou a expressão pseudo-alucinações para designar os casos em que as imagens
percebidas careciam de objetividade. Nas alucinações verdadeiras, as imagens visuais e auditivas
são projetadas para o exterior, para o espaço objetivo. A nitidez sensorial e a impressão de realidade
são de tal ordem que dão ao enfermo uma irresistível força de convicção. Nas pseudo-alucinações,
ao contrário, o paciente não desconhece o caráter falso dos fenômenos. (PAIM, 1993, p. 59-60)

69
DALGALARRONDO, 2008, p. 129-30)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
63

ALTERAÇÕES DO PENSAMENTO70

O que é o pensamento?

A palavra pensar vem do verbo latino pendere, que significa ficar


em suspenso, examinar, pesar, ponderar.

Comportamento cognitivo no qual ideias, imagens, representações


mentais ou outros elementos hipotéticos da reflexão são
experimentados ou manipulados. Nesse sentido pensamento inclui
imaginação, lembrança, solução de problema, devaneio, livre associação, formação de conceito e
muitos outros processos. Pode-se dizer que o pensamento tem duas características definidoras: (a)
Ele é velado, ou seja, não é diretamente observável, mas deve ser deduzido a partir de
comportamentos ou autorrelatos; (b) ele é simbólico, ou seja, parece envolver operações sobre
símbolos ou representações mentais, cuja natureza permanece obscura e controversa.71

O que caracteriza o pensamento normal é ser regido pela lógica formal e orientar-se segundo a
realidade e os princípios de racionalidade da cultura na qual o indivíduo se insere.

Atividades fundamentais do pensamento


As atividades fundamentais do pensamento são: a elaboração de conceitos, a formação de juízos e
o raciocínio.
Um conceito identifica os atributos ou qualidades mais gerais e essenciais de um objeto ou
fenômeno. É expresso por uma palavra. Está relacionado a abstração e generalização. Por exemplo:
céu e azul são conceitos.
O juízo estabelece uma relação entre dois ou mais conceitos. Consiste no ato da consciência de
afirmar ou negar algum atributo ou qualidade a um objeto ou fenômeno. É composto por um sujeito,
um verbo de ligação e um predicado. Por exemplo: ‘O céu é azul.’
Raciocínio representa uma operação mental que relaciona juízos, levando à formação de novos
juízos (ou conclusões). Por exemplo: ‘Todo homem é mortal’; ‘Sócrates é um homem’, portanto,
‘Sócrates é mortal’ [neste caso, um raciocínio dedutivo]. Um raciocínio pode ser indutivo (do
particular para o geral)72, dedutivo (do geral para o particular) ou analógico (de um particular para
outro particular)73. [...]

Aspectos do pensamento
Curso, forma e conteúdo constituem os aspectos do pensamento. O curso refere-se à velocidade e
ritmo do pensamento, à quantidade de ideias ao longo do tempo. A forma, por sua vez, está

70
O texto de todo esse tópico foi extraído e adaptado de: CHENIAUX, 2013, p. 82-106; PAIM, 1993, p. 87-114;
DALGALARRONDO, 2008, p. 193-231.
71
APA, 2010, p. 692
72
Exemplo de raciocínio indutivo: Um cientista observa a cor de milhares de cisnes. Verificar que todos os cisnes
observados por ele são brancos (regularidade na cor dos cisnes). Formula, então, a partir desses dados empíricos uma
teoria a respeito da cor dos cisnes: “Todos os cisnes são brancos” (generalização).
73
Exemplo de raciocínio analógico: “A árvore é um ser vivo. Tem metabolismo e reproduz-se. O ser humano também.
Nisto, são semelhantes. Ora, se são semelhantes nestas coisas e a árvore cresce podemos concluir que o ser humano
também cresce.”
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
64

relacionada à estrutura do pensamento, à relação entre as ideias. Já o conteúdo diz respeito à


temática do pensamento, às qualidades ou características das ideias.

Alterações do pensamento
[...]
Aqui é proposta a seguinte classificação das alterações do pensamento:
- Quantitativas – curso (aceleração, alentecimento, interrupção);
- Qualitativas – forma (fuga de ideias, desagregação, prolixidade, minuciosidade, perseveração) e,
conteúdo (concretismo; ideias delirantes, deliroides e sobrevaloradas).
Analise o esquema a seguir:

O Exame do pensamento
A fala do paciente é o único meio de acesso ao seu pensamento. Não é possível, portanto, avaliar o
pensamento de um paciente em mutismo.
Quando se quer examinar a forma do pensamento, deve-se deixar o paciente falar livremente
durante algum tempo, evitando interrompê-lo.

ALTERAÇÕES QUANTITATIVAS (CURSO DO PENSAMENTO)

Aceleração do curso
Na aceleração do curso do pensamento (ou taquipsiquismo), o paciente fala mais rápido; há uma
maior produtividade ideativa e uma maior velocidade no processo associativo. Isso ocorre na mania,
na intoxicação por cocaína ou anfetamina e nos estados de ansiedade ou agitação psicomotora.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


65

Alentecimento do curso (ou inibição)


No alentecimento do curso do pensamento (ou retardo, ou inibição do pensamento, ou
bradipsiquismo), o paciente fala mais devagar; há uma redução no número de ideias e
representações, e inibição do processo associativo. Esse fenômeno – [...] – é tipicamente observado
na depressão, ocorrendo também na demência e no estupor (abolição da psicomotricidade) do
delirium ou da esquizofrenia catatônica.

Interrupção do curso (ou, bloqueio; ou, interceptação do pensamento; ou roubo do


pensamento)
A interrupção do curso (ou bloqueio do pensamento) foi descrita por Bleuler, sendo considerada
uma alteração quase exclusiva da esquizofrenia. Kraepelin empregava o termo interceptação para
esse mesmo fenômeno.
Abruptamente, e sem qualquer motivo aparente, o paciente interrompe a sua fala, deixando de
completar uma ideia. Algumas vezes a interrupção se dá no meio de uma frase, ou mesmo de uma
palavra. Após um intervalo, que varia entre alguns poucos minutos e várias horas, o paciente pode
completar o pensamento interrompido ou, o que é mais frequente, inicia um outro ciclo de
pensamento, inteiramente diverso do anterior. A vivência do paciente é a de que o fluxo do seu
pensamento cessou ou rompeu-se, resultando num branco, num vazio, em sua mente. Tal
experiência é muitas vezes atribuída pelo paciente a um roubo do seu pensamento. [...]

ALTERAÇÕES QUALITATIVAS (FORMA DO PENSAMENTO)

Fuga de ideias
A fuga de ideias – [...] – caracteriza-se pela variação rápida e incessante de tema, com preservação
da coerência do relato e da lógica na associação de ideias. A tendência dominante do pensamento
está enfraquecida e, consequentemente, há um progressivo afastamento da ideia-alvo.
Alternativamente, pode-se considerar que diversas ideias-alvo se sucedem em um pequeno espaço
de tempo. O pensamento é facilmente desviado por estímulos externos; e as associações muitas
vezes se dão por assonância (rimas) ou aliteração (repetição de consoantes) das palavras.
A fuga de ideias está quase sempre associada a logorreia e aceleração do curso do pensamento.
Trata-se de uma manifestação típica da síndrome maníaca primária, sendo ainda observada na
intoxicação por cocaína ou anfetamina, na embriaguez alcoólica, na sífilis cerebral etc.
Exemplo: ‘Você foi o médico do meu marido. Ele voou pela janela. Minha irmã também se matou.
Também pulou pela janela. Ela se tratava com o doutor Pitta. Ele devia se chamar doutor ‘Apita’.
Aí ele apitava, e todos os doentes pulavam pela janela.’

Desagregação do pensamento (ou confusional, ou ainda dissociado)


A desagregação do pensamento caracteriza-se por uma perda do sentido lógico na associação de
ideias. Há a formação de associações novas, que são incompreensíveis, irracionais e extravagantes.
Como consequência, altera-se a sintaxe74 do discurso, que se torna incoerente, fragmentado e,
muitas vezes, ininteligível. A desagregação do pensamento ocorre na esquizofrenia, no delirium, na
demência avançada e, ocasionalmente, em casos de extrema agitação maníaca.

74
Sintaxe - Parte da gramática que estuda a disposição das palavras na frase e a das frases no discurso, bem como a
relação lógica das frases entre si; construção gramatical (Aurélio).
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
66

Pensamento desagregado, pensamento dissociado, pensamento incoerente, pensamento confuso,


pensamento descarrilado, pensamento disparatado, pensamento vago ou afrouxamento dos enlaces
associativos possuem significado basicamente semelhantes, embora alguns autores, de maneira não
uniforme, tentem estabelecer diferenças quantitativas ou qualitativas entres eles. Os termos
desagregado (Bleuler), dissociado (Bleuler), descarrilado (Carl Scheider) e disparatado (Carl
Scheider) são mais usados na esquizofrenia; já termos incoerente e confuso são empregados mais
frequentemente nos quadros de delirium.
[...]
Alguns autores propõem um subtipo que seria o pensamento confusional – ‘devido à turvação da
consciência, [verifica-se] um pensamento incoerente, de curso tortuoso, que impede que o indivíduo
apreenda de forma clara e precisa os estímulos ambientais e possa, assim, processar seu raciocínio
adequadamente. Há marcante dificuldade em estabelecer vínculos entre conceitos e juízos devido às
alterações de consciência, de atenção e de memória imediata, impedindo a formação adequada do
raciocínio e lançando o indivíduo em estado de perplexidade e impotência. Ocorre principalmente
nas síndromes confusionais agudas.

Prolixidade
A prolixidade, que foi descrita por Lipmann e Edel, caracteriza-se por um
discurso repleto de detalhes irrelevantes, o que o torna tedioso; a ideia-alvo
jamais e alcançada ou só o é tardiamente. Decorre de uma incapacidade de
síntese, de distinguir o essencial do acessório.
É encontrada basicamente nos quadros em que há comprometimento intelectivo,
como retardo mental e na demência. Também é observada no transtorno de
personalidade associado à epilepsia do lobo temporal e na esquizofrenia.
Alguns autores preferem utilizar os termos circunstancialidade e tangencialidade para designar
esse tipo de pensamento. O que diferencia um do outro é que, só no caso da circunstancialidade, a
ideia-alvo seria atingida.
Um paciente prolixo apresenta dificuldades em responder de forma direta e objetiva uma pergunta.
Se questionado sobre, por exemplo, onde mora, ele, em vez de fornecer de imediato o seu endereço,
vai dar um monte de informações desnecessárias. Pode comentar que reside num local muito bonito,
que lá faz muito calor, citar todas as linhas de ônibus que circulam por lá etc. Quando pressionado a
ir direto ao ponto, muitas vezes vai dizer algo como ‘calma, que eu chego lá!’.

Minuciosidade
A minuciosidade caracteriza-se por um discurso com um número
excessivo de detalhes relevantes. Estes são introduzidos para enriquecer a
comunicação e, ansiosamente, para evitar quaisquer possíveis omissões. É
encontrada no transtorno obsessivo-compulsivo e no transtorno de
personalidade obsessiva (anancástica). Perguntado pelo médico sobre
como tem passado, um paciente minucioso vai fazer um relatório pormenorizado de tudo o que
sentia a cada dia desde a última consulta, descrevendo as características e a cronologia completa dos
sintomas.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


67

Perseveração
A perseveração, descrita por Pick, caracteriza-se por uma recorrência excessiva e inadequada no
discurso do mesmo tema, ou uma dificuldade em abandonar determinado tema. Consiste numa
perda da flexibilidade do pensamento. Há a fixação persistente de uma única ideia-alvo e um
empobrecimento dos processos associativos.
A perseveração ocorre na demência, retardo mental, delirium, epilepsia, esquizofrenia. Muitas
vezes, num transtorno psicótico, um delírio (alteração do conteúdo do pensamento) assume tal
importância na vida do paciente que, em seu discurso, a temática se torna perseverante (alteração da
forma do pensamento).
As ideias obsessivas (ou obsessões) podem ser consideradas uma forma especial de perseveração do
pensamento. Elas possuem as seguintes características:
- São ideias tidas pelos próprios pacientes como absurdas, irracionais, sem sentido, repulsivas,
desagradáveis ou ansiogênicas;
- que o indivíduo reconhece como próprias;
- que são repetitivas ou persistentes;
- que se impõem à sua consciência contra a sua vontade;
- e que levam a violenta luta interna, isto é, o indivíduo se esforça para afastá-la de sua mente ou
realiza cerimoniais preventivos ou expiatórios.
São exemplos de conteúdos de ideias obsessivas: dúvidas torturantes, [...], tentações censuráveis,
presságios quanto a tragédias ou morte relacionadas a familiares ou a si próprio. [...]
As ideias obsessivas, [...], são encontradas principalmente no transtorno obsessivo-compulsivo, mas
também na depressão e na esquizofrenia.

Pensamento mágico
É o tipo de pensamento que fere frontalmente os princípios da lógica formal, bem como os
indicativos e imperativos da realidade. O pensamento mágico segue os desígnios dos desejos, das
fantasias e dos temores, conscientes e inconscientes, do sujeito, adequando a realidade ao
pensamento, e não o contrário.

Pensamento dereístico
O pensamento dito dereístico, algo semelhante ao pensamento mágico, é um tipo de pensamento
que se opõe marcadamente ao pensamento realista, o qual se submete à lógica e à realidade. Aqui, o
pensamento só obedece à lógica e à realidade naquilo que interessa ao desejo do indivíduo,
distorcendo a realidade para que esta se adapte aos seus anseios. No pensamento dereístico, o
pensar volta-se muito mais ao mundo interno do sujeito, suas fantasias e seus sonhos, manifestando-
se como um devaneio, no qual tudo é possível e favorável ao indivíduo. [...]
Na língua inglesa, utiliza-se o termo wishful thinking (tomar o desejo pela realidade) para indicar a
identificação errônea dos próprios desejos com a realidade, o conjunto de crenças adotadas pelo
indivíduo, crenças estas baseadas mais nos desejos que em fatos, ou seja, um aspecto do
pensamento dereístico. Pode ocorrer nos transtornos de personalidade (esquizotípica, histriônica,
borderline, narcisista, etc.), na esquizofrenia, na histeria e, eventualmente, em crianças e
adolescentes (e mesmo em adultos) normais.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


68

Pensamento vago
As relações conceituais, a formação dos juízos e a concatenação destes em raciocínios são
caracterizadas pela imprecisão. O paciente expõe um pensamento muito ambíguo, podendo mesmo
parecer obscuro. Não há propriamente o empobrecimento do pensamento, mas, antes, a marcante
falta de clareza e precisão do raciocínio. O pensamento vago pode ser um sinal inicial de
esquizofrenia ou ocorrer em quadros demenciais iniciais, transtornos de personalidade (p.ex.,
esquizotípica) e neuroses75 graves.

Pensamento obsessivo
Aqui, predominam ideias ou representações que, apesar de terem conteúdo absurdo
ou repulsivo para o indivíduo, se impõem à consciência de modo persistente e
incontrolável. Isso determina uma luta constante entre as ideias obsessivas, que
voltam de forma recorrente à consciência, e o indivíduo, que se esforça por bani-las
de sua consciência, gerando um estado de angústia constante. Com certa frequência, em pacientes
gravemente obsessivos, aspectos do pensamento mágico também estão presentes (p.ex., ‘Se eu tocar
na roupa de uma prostituta ficarei contaminado’, ou ‘Se eu repetir a palavra santo cinquenta vezes
impedirei que meu pai morra’).

Afrouxamento das associações


Neste caso, embora ainda haja concatenação lógica entre as ideias, nota-se já o afrouxamento dos
enlaces associativos [...]. As associações parecem mais livres, não tão bem articuladas. Manifesta-se
nas fases iniciais da esquizofrenia e em transtornos da personalidade (sobretudo no da
personalidade esquizotípica).

Descarrilhamento do pensamento
O pensamento passa a extraviar-se de seu curso normal, toma atalhos colaterais, desvios,
pensamentos supérfluos, retornando aqui e acolá ao seu curso original. Geralmente está associado a
marcante distraibilidade. Se o descarrilhamento for muito acentuado, e os desvios, muito frequentes
e longos, pode-se não mais captar a sequência lógica do pensamento. O descarrilhamento é
observado na esquizofrenia e, eventualmente, nos transtornos maníacos.

ALTERAÇÕES QUALITATIVAS (CONTEÚDO DO PENSAMENTO)

Concretismo (ou deficitário, ou oligofrênico)


O concretismo (ou pensamento empobrecido) caracteriza-se por um discurso pobre em conceitos
abstratos, em metáforas e analogias. Há uma intensa adesão ao nível sensorial e imediato da
experiência. Ocorre na demência, no delirium, no retardo mental e na esquizofrenia.
Uma forma especial de concretismo seria a reificação (res = coisa), que consiste na utilização de
expressões e símbolos, não com algo representativo, mas com coisa substantiva, concreta. Um
esquizofrênico, por exemplo, que diz que roubaram seu pensamento o está vivenciando como um
objeto físico.

75
Uma neurose, em sentido amplo, caracteriza uma afecção psicogênica cujos sinais e sintomas são, segundo a teoria
psicanalítica, uma expressão simbólica de conflitos psíquicos, normalmente inconscientes, que têm suas raízes na
história infantil do indivíduo e constituem compromissos entre o desejo e as defesas.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
69

Pensamento demencial
Trata-se também de pensamento pobre, porém tal empobrecimento é desigual, ao contrário do que
ocorre no pensamento deficitário, no qual o empobrecimento é mais homogêneo. Em certos pontos,
o pensamento demencial pode revelar elaborações mais ou menos sofisticadas, embora de forma
geral seja imperfeito, irregular, sem unidade ou congruência. Em relação aos conceitos abstratos e
aos raciocínios diferenciados e complicados, podem-se observar seus resquícios no pensamento
demencial, embora, com o progredir da síndrome demencial, vá predominando mais e mais o
pensamento pobre, concreto e desorganizado. É frequente o fato de o indivíduo dementado, nas
fases iniciais, tentar dissimular suas dificuldades cognitivas. Ao se deparar com a dificuldade em
encontrar as palavras (aspecto característico no início das demências), procura termos mais
genéricos, evita os adjetivos e os substantivos específicos. Por exemplo, ‘Não consigo encontrar
aquela coisa, o meu... (batom), aquilo para pintar a boca...’; ‘Vou pedir ao...àquele homem (o
guarda), que me ajude a atravessar... aqui (a rua).

Ideias delirantes
A palavra delirar é derivada do latim delirare (de = fora; liros = sulcos),
que significa literalmente lavrar fora do sulco. Apofania é a apresentação
do delírio.
De acordo com Karl Jaspers (1987), ideias delirantes (ou delírios) são
juízos patologicamente falsos, que possuem as seguintes características
externas: acompanham-se de uma convicção extraordinária, não são
susceptíveis à influência e possuem um conteúdo impossível.
Os delírios, constituindo uma alteração do conteúdo do pensamento, são, por conseguinte,
detectados no discurso do paciente. Todavia, com frequência o paciente irá dissimular sua atividade
delirante ou não terá interesse ou possibilidade (nos casos de estupor, por exemplo) de verbaliza-la.
Nessa situação, torna-se fundamental a avaliação da atitude (desconfiança, medo, arrogância, etc.).
O delírio constitui uma alteração relacionada à formação de juízos. Através dos juízos,
discernimos a verdade do erro. Através do juízo de realidade, distinguimos o que é real do que é
fruto de nossa imaginação. [...]
O delírio caracteriza-se por uma certeza subjetiva absoluta, por uma firmeza irremovível da
convicção, por uma impossibilidade de modificação diante do desmentir dos fatos ou da refutação
rigorosa: é incorrigível. [...]
A impossibilidade do conteúdo é um critério bastante criticado, pois considera-se que a maior parte
dos delírios tem um conteúdo possível, embora improvável; e, em alguns casos, o conteúdo do
delírio é, por mero acaso, verdadeiro.
O juízo falso é impossível e irracional quando está relacionado a um erro lógico, quando o
raciocínio subverte os princípios lógicos: tornar existente o que não existe e não pode existir. Por
exemplo: acreditar estar na Terra e na Lua ao mesmo tempo. Trata-se de uma impossibilidade
lógica.
O juízo falso é impossível e racional quando está relacionado a um erro gnosiológico76 – tornar
existente o que não existe mas pode vir a existir – e, no raciocínio, os princípios lógicos são
preservados. Por exemplo: antes de 1969, afirmar ter estado na Lua. Trata-se de uma
impossibilidade real.
76
Gnosiologia – teoria do conhecimento.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
70

O juízo falso é possível e improvável quando está relacionado a um erro gnosiológico mas também
a uma possibilidade real, embora pequena, de ser verdadeiro (Chalub, 1977). Um exemplo de um
delírio com essas características é o seguinte: Senhora de mais de 50 anos morava sozinha desde sua
separação conjugal. Havia alguns anos que ela não tinha mais contato com o ex-marido, que estava
agora casado com uma mulher bem mais jovem que ela. A paciente, quando chegava em casa do
trabalho, notava que alguns objetos estavam fora de lugar. Ela acreditava que, quando saía de casa,
o ex-marido entrava em seu apartamento (sem ser visto por ela) e tirava de lugar tais objetos, para
que ela pensasse que estava perdendo a memória e ficando ‘maluca’. Segundo ela, o porteiro estava
envolvido nesse plano, pois ele avisava a seu ex-marido quando ela saía, assim como um chaveiro,
que tinha feito uma cópia da chave de seu apartamento para o invasor. Também faziam parte da
trama o síndico do edifício e diversas outras pessoas, todos judeus. O objetivo deles era fazer com
que ela ficasse nervosa e desesperada, e, assim, vendesse seu apartamento por um baixo preço para
um dos conspiradores, que então teria um grande lucro financeiro. Nenhuma das ideias formuladas
pela paciente era absurda, todavia as chances de todas elas terem sido verdadeiras eram, na prática,
desprezíveis. [...]
O delírio constitui uma vivência individual, idiossincrática77. Com isso, distingue-se das crenças
culturalmente compartilhadas, como os dogmas religiosos, os quais podem possuir as mesmas
características apontadas por Jaspers em relação ao delírio.
Todo delírio é de certa forma autorreferente, no sentido de que o seu conteúdo está direta ou
indiretamente relacionado ao enfermo. O delírio se transforma no eixo em torno do qual passa a
girar a vida do indivíduo.
Em função de sua convicção extraordinária, o delirante não sente a necessidade de comprovar
objetivamente a veracidade de seu juízo e pode não achar importante convencer as outras pessoas
de que está certo.
Muitas vezes há uma discrepância entre o delírio e a conduta do paciente: ou este não muda em
nada seu comportamento, ou age de forma diferente do que se esperaria de alguém que realmente
estivesse na sua situação.
Delírios são experimentados subjetivamente com características mais de saber do que acreditar
(Sedler, 1995), o que também os distingue das crenças religiosas.

Delírio primário
O delírio primário é a ideia delirante autêntica. Ele é autóctone, isto é, não deriva de nenhuma outra
manifestação psíquica. É incompreensível: não pode ser seguido psicologicamente até a sua origem,
é algo de ‘último e derradeiro’ (Jaspers). Está relacionado a uma profunda transformação da
personalidade, sendo expressão de um processo: o surgimento de algo novo, duradouro e
irreversível na vida mental. Classicamente, seria exclusivo da esquizofrenia.
K. Jaspers incluiu sob a denominação de vivências delirantes primárias as percepções delirantes, as
representações delirantes e as cognições delirantes. K. Schneider criou o conceito de ocorrências
delirantes, que englobaria as representações delirantes e cognições delirantes [ou, delírio intuitivo].
A percepção delirante consiste na atribuição de um significado novo, anormal, a uma percepção
normal de um objeto real. Essa significação se dá de forma simultânea ao ato perceptivo. O
significado é para o observador algo ilógico, absurdo e incompreensível, ou seja, parece não haver

77
Idiossincrasia - 1. Disposição do temperamento do indivíduo, que o faz reagir de maneira muito pessoal à ação dos
agentes externos. 2. Maneira de ver, sentir, reagir, própria de cada pessoa.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
71

qualquer relação entre o que foi percebido e a conclusão a que se chegou. Para o doente, o
significado é em geral autorreferente; tem o caráter de um aviso, mensagem ou revelação; é algo
especial, de grande importância, que é sentido como imposto. Um exemplo seria o seguinte: o
indivíduo vê um cachorro urinando na rua e sabe que o mundo vai acabar. A percepção delirante é
um dos sintomas de primeira ordem de Kurt Schneider para o diagnóstico da esquizofrenia. [...]
Na representação delirante, um significado anormal é dado a uma recordação normal. Por exemplo:
‘Eu podia muito bem ser filho do Rei Luis’ – uma recordação clara, de como o imperador, ao passar
a cavalo, na parada, vista há alguns anos, olhou justamente para ele, o confirma’ (Jasper, 1987).
A cognição delirante [ou, delírio intuitivo] consiste em uma convicção patológica intuitiva, uma
certeza súbita, uma revelação imediata, que prescinde por completo de conexões significativas com
quaisquer dados perceptivos ou representativos. Por exemplo, o indivíduo de repente sabe que é
Jesus Cristo, mas isso não está relacionado com nada que ele tenha visto, ouvido ou se lembrado. A
cognição delirante ocorre mais em quadros psicóticos mais agudos do que crônicos. Ao contrário da
percepção delirante e da representação delirante, constituídas por 2 membros – a percepção ou
recordação normal + a significação anormal –, a cognição delirante possui um único membro
(Schneider, 1978).

Delírio secundário (ou, ideia deliroide)


O delírio secundário também é chamado de ideia deliroide. Ele se origina de forma compreensível
psicologicamente de outras manifestações psíquicas patológicas, tais como alterações do humor, da
sensopercepção e da consciência.
São exemplos de delírios secundários: as ideias de culpa na depressão – a tristeza vital é
considerada primária -, as ideias de grandeza na mania, as ideias de influência relacionadas a
alucinações cenestésicas, as ideias de perseguição no delirium tremens, etc. [...]

Ideia sobrevalorada
Na definição de Nobre de Melo (1981), a ideia sobrevalorada (ou supervalorada, ou prevalente, ou
sobrevalente) é uma ideia errônea por superestimação afetiva. O erro decorre do fato de a ideia estar
relacionada a uma carga afetiva muito intensa, que influencia o julgamento da realidade (influência
catatímica) tornando-o pouco racional. Essa ideia ganha preponderância em relação às demais e
orienta unilateralmente a conduta do indivíduo.
Na ideia sobrevalorada, o erro é compreensível psicologicamente em função da vivência emocional
ou de traços de personalidade do indivíduo. A convicção é menor do que no delírio: a ideia é mais
influenciável.
A ideia sobrevalorada pode ocorrer em pessoas normais. Por exemplo, convicções apaixonadas em
relação a questões científicas, filosóficas, políticas e religiosas, assim como as ideias dos
enamorados sobre o objeto do seu amor. Ocorre ainda em alguns transtornos mentais, como na
hipocondria (a ideia de sofrer de uma doença), no transtorno dismórfico corporal (ter um defeito na
aparência), na anorexia nervosa (precisar emagrecer), no transtorno obsessivo-compulsivo (ter que
limpar, contar, verificar ou tocar) e no transtorno de personalidade paranoide (estar sendo enganado
ou prejudicado).

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


72

Os temas dos delírios


- Delírio de perseguição (ou persecutório) – O doente acredita que o estão vigiando, querem
prejudica-lo ou mesmo mata-lo.
- Delírio de prejuízo – Seria uma forma atenuada de delírio persecutório: o indivíduo pensa que as
outras pessoas são hostis em relação a ele, zombam dele ou o menosprezam.
- Delírio de reivindicação (ou querelante) – Seria um subtipo de delírio persecutório. O indivíduo
se julga vítima de terríveis injustiças ou discriminações, e, em função disso, envolve-se em disputas
legais e querelas.
- Delírio de influência ou controle (também chamado de Vivências de Influência) – Seria um
outro tipo de delírio persecutório. O paciente acredita que alguém ou alguma força externa controla
(literalmente) sua mente ou seu corpo. Pode, por exemplo, dizer que um pensamento que apareceu
em sua mente não é seu, que foi colocado lá por outra pessoa; ou então afirmar que está se sentido
fraco porque um ímã está sugando suas energias.
- Delírio de grandeza (de enormidade) – O doente acredita ser muito rico e poderoso, ou possuir
habilidades e talentos especiais. Tal conteúdo de delírio é típico da mania.
- Delírio de ciúmes e delírios de infidelidade – O indivíduo acredita que seu cônjuge ou amante
está sendo infiel a ele. Esse quadro está especialmente associado ao alcoolismo crônico e ao
transtorno delirante, sendo mais comum no sexo masculino.
- Delírio erotomaníaco (ou erótico)78 – O indivíduo crê ser amado, a distância, por uma outra
pessoa. Essa outra pessoa é tipicamente mais velha e possui uma situação socioeconômica mais
elevada que a do paciente. Muitas vezes trata-se de uma pessoa famosa. O indivíduo pode atribuir a

78
O delírio erotomaníaco é típico da chamada Síndrome de Clèrambault, que se caracteriza na convicção delirante,
por parte do paciente, de que alguém de posição social mais elevada o ama. Nas descrições clássicas, o surgimento dos
delírios é abrupto, o que nem sempre é observado na prática clínica.
De Clèrambault descreveu a erotomania como uma síndrome de emoções patológicas que segue uma evolução
ordenada, passando pelos estágios de esperança, despeito e rancor. Essa evolução foi considerada por ele como
invariável, sendo a fase de rancor a mais importante delas e, na verdade, o que mais bem caracteriza toda a síndrome, ao
invés do estágio de amor.
Então o portador da erotomania acredita que o seu objeto de amor declarou-se para ele, de alguma maneira: por sinais ,
telepaticamente, ou frases ditas ao público mas que o portador acredita ter sido direcionadas a ele.
Depois disto, o portador que inicialmente poderia não corresponder ao amor que acredita ter sido declarado
primeiramente pelo outro, passa interessar-se e corresponder e tentar demonstrar este amor, seduzindo seu objeto
amado, declarando-se, etc.. O paciente pode desejar ter relações sexuais com o objeto de seu amor delirante, pode tentar
seduzi-lo para esse fim ou passar a acreditar, inclusive, que está gestando um filho dele. Os homens tendem mais à
perseguição de seus objetos que as mulheres.
Embora atos físicos ou sexuais sejam incomuns, esses pacientes podem trazer significativo impacto psicológico e social
à vida de suas vítimas, em consequência de perseguições por períodos prolongados, que variam de chamadas telefônicas
a declarações de amor em ambientes públicos e movimentados.
Diante da percepção do envolvimento do ser amado com terceiros surge o despeito e diante de sua rejeição, o rancor.
Quando o paciente erotomaníaco alcança o estágio de rancor, depois de repetidas rejeições que sofre, não raro exerce
retaliações contra seu objeto de amor ou contra terceiros.
O típico portador da erotomania pode ser homem ou mulher, leva uma vida reservada, socialmente inexpressiva; poucos
são casados, muitos são privados de contato sexual por anos, a maioria ocupa cargos subalternos, e alguns são muito
pouco atraentes. Esse comportamento pode resultar de traços de personalidade hipersensível, desconfiança acentuada ou
assumida superioridade em relação às outras pessoas. Por outro lado, os objetos de amor delirante, na realidade ou em
fantasia, são sempre superiores em inteligência, posição social, aparência física, autoridade ou uma combinação destes
atributos. Quase sempre, o paciente sente-se como que livrado de sua solidão pelo amor que o objeto supostamente lhe
dedica. Esta síndrome pode apresentar-se em diversos transtornos mentais: transtorno delirante persistente,
esquizofrenias, transtorno afetivo bipolar. (http://dicionariodesindromes.blogspot.com.br/2006/10/sndrome-de-
clrambault.html)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
73

não aproximação por parte da outra pessoa à malevolência de terceiros. O delírio erotomaníaco é
mais comum no sexo feminino e pode ocorrer no transtorno delirante.
- Delírio de referência (de alusão ou de auto-referência) – O doente atribui a fatos fortuitos ou
acidentes do cotidiano uma relação direta com a sua pessoa. Por exemplo: ele vê dois
desconhecidos conversando, e, mesmo sem nada ouvir, sabe que estão falando sobre ele. Ou então:
ele acredita que o enredo da novela da TV foi baseado na sua vida.
- Delírio de relação – O indivíduo delirante constrói conexões significativas (delirantes) entre os
fatos normalmente percebidos. Essas conexões novas surgem geralmente sem motivação
compreensível. Por exemplo, o paciente agora sabe que tudo faz sentido, os fatos se relacionam (as
chuvas do verão passado, o inverno atual mais frio, etc.), indicando “que realmente a guerra dos
seres alienígenas irá começar”. Tal tipo de delírio também apresenta colorido persecutório.
(DALGALARRONDO, 2008, p. 219)
- Delírio de ruína (ou niilista) – É comum na depressão. Para o paciente, sua vida está repleta de
desgraça, sofrimento, fracassos e perdas: tornou-se financeiramente miserável, seus familiares o
abandonaram, etc. Os delírios somáticos (ruína da saúde física), de culpa (ruína moral) e de negação
(ruína total) poderiam ser considerados subtipos do delírio de ruína.79
- Delírio somático (ou hipocondríaco) – o paciente acredita estar sofrendo de uma doença muito
grave e incurável, como AIDS, câncer, tumor cerebral, etc., ou ter o corpo terrivelmente deformado.
- Delírio de infestação (Síndrome de Ekbom) – O indivíduo acredita que seu corpo
(principalmente sua pele e/ou cabelos) está infestado por pequenos (mas macroscópicos)
organismos. Relata, no mais das vezes, que há ‘bichinhos’ sob a pele’, insetos nos cabelos,
vermezinhos, aranhas, etc. Acompanhando o delírio, podem ocorrer alucinações táteis
(correspondentes aos ‘pequenos insetos’). Esse tipo de delírio ocorre em pacientes esquizofrênicos,
deprimidos, no delirium tremens, em intoxicações por cocaína ou alucinógenos e em indivíduos
obcecados pela higiene corporal. (DALGALARRONDO, 2008, p. 223)
- Delírio de culpa (ou autoacusação) – Característico da depressão. O paciente acredita que
cometeu pecados terríveis, ou mesmo crimes, em seu passado, e que merece ser punido. Ele
supervaloriza pequenas falhas que cometeu, ou pensa ter influenciado o acontecimento de grandes
catástrofes.
- Delírio de negação de órgãos – O indivíduo experimenta profunda alterações corporais. Relata
que seu corpo está destruído ou morto, que não tem mais um ou vários órgãos, como o coração, o
fígado ou o cérebro, suas veias ‘estão secas’, não tem mais nem uma gota de sangue, seu corpo
secou ou apodreceu, seus braços e pernas estão se ‘esfarelando’. Denomina-se síndrome ou delírio
de Cottard quando o delírio de negação de órgãos vem acompanhado de delírio de imortalidade e
de enormidade (‘Não vou morrer nunca mais, vou sofrer para o resto da eternidade’) e, mais
raramente, de delírio de enormidade (o paciente vivencia o corpo se expandido, tomando conta de
todo o quarto, crescendo até proporções gigantescas). [...] O delírio de negação de órgãos e a
síndrome de Cottard são típicos das depressões graves com marcante componente ansioso. Podem
ocorrer também em quadros psico-orgânicos crônicos e na esquizofrenia. (DALGALARRONDO,
2008, p. 221-2)

79
Alguns autores fazem menção a uma variação relativa a este delírio: a chamada Síndrome de Cotard também
chamada de delírio de Cotard, síndrome do cadáver ambulante1, delírio niilista ou delírio de negação. É uma síndrome
rara de fundo psicológico onde a pessoa acredita estar morta, não reagindo a estímulos exteriores nem a outras pessoas.
Também pode acreditar que está com seus órgãos internos podres ou apodrecendo. (adaptado de Wikipédia)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
74

- Delírio místico ou religioso – Envolve temas religiosos, espíritos, etc. O indivíduo diz que é Jesus
Cristo, que pode fazer milagres, que Deus lhe deu uma missão, ou que vai fundar uma nova
religião. No delírio de possessão, que pode ser aqui incluído, o doente julga que um espírito entrou
em seu corpo e assumiu o controle de sus atos.
- Delírio de reforma (ou salvacionismo) – Ocorre entre indivíduos que se sentem destinados a
salvar, reformar, revolucionar ou redimir o mundo ou a sociedade. Tal plano revolucionário ou
salvacionista está muitas vezes fundamentado em dogma ou sistema religioso ou político,
desenvolvido pelo próprio delírio. Esses delirantes têm convicção plena de que seu sistema religioso
ou político é absolutamente o único capaz de salvar de fato a humanidade. (DALGALARRONDO,
2008, p. 223)
- Delírio fantástico (ou mitomaníaco) – Envolve temas extraordinários, ou de extrema
grandiosidade. Por exemplo: uma paciente que afirma ter parido todas as pessoas que existem no
mundo.
- Delírio de identificação – O paciente julga que uma pessoa familiar foi substituída por uma sósia.
Este é fisicamente idêntico à primeira, mas psicologicamente distinto.
- Delírio de conteúdo depressivo – são aqueles que têm temática de colorido marcadamente triste,
como ruína ou miséria, culpa ou auto-acusação, doenças e mesmo o desaparecimento de partes do
corpo (negação dos órgãos). São tipos de delírios intimamente associados a estados depressivos
profundos. Esses delírios são o inverso dos delírios de grandeza ou daqueles em que o sujeito
acredita ser alguém muito especial (verificados em certos quadros de mania). Além disso, diz-se
que, nos transtornos de humor que cursam com ideias delirantes, o delírio é congruente com o
humor quando, em episódios de depressão psicótica, se observam delírios de ruína, culpa, negação
dos órgãos ou hipocondríacos (e, no caso da mania, delírios de grandeza). Quando os conteúdos dos
delírios não estão coerentes com a alteração do humor, diz-se que eles são “incongruentes com o
humor” ou humor-incongruentes (delírio persecutório em quadro depressivo, sem a ideia de
‘merecer’ ser perseguido, ou delírio de controle80 em quadro de mania). Os principais delírios de
conteúdo depressivo são os de ruína, de culpa e de auto-acusação, de negação de órgãos e
hipocondríacos.” (DALGALARRONDO, 2008, p. 221)
- Delírio de invenção ou descoberta – Aqui o indivíduo, mesmo completamente leigo na ciência
ou na área tecnológica em questão, revela ter descoberto a cura de uma doença grave (de AIDS, do
câncer, etc.), ou ter desenvolvido um aparelho moderno fantástico; enfim, descobertas ou invenções
que irão mudar o mundo. Verifica-se principalmente nos transtornos delirantes (antiga paranoia), na
esquizofrenia e na mania. (DALGALARRONDO, 2008, p. 222-3)

80
O delírio de controle é típico na Síndrome de Kandinsky-Clèrambault. Nesta síndrome seu portador acredita que
sua mente esta sendo controlada por alguém ou por forças externas. O portador crê, portanto, que seu pensamento, suas
sensações e seus comportamentos estão sendo controlados por outra pessoa, gerando o que se chama em psicopatologia
"automatismos".
Assim, segundo o primeiro psiquiatra a descrever o fenômeno, Dr. Kandinsky na Rússia, poderia haver automatismos
cognitivos, sensitivos e motores, combinados com delírios de influência física ou mental, tais como roubo ou inserção
do pensamento.
Mais adiante, Dr. Clèrambault na França, dividiu os automatismos de modo semelhante em três tipos:
1.Tipo associativo: inclui afrouxamento de associações, bloqueio do pensamento, fuga de ideias, delírios de influência,
publicação do pensamento etc.
2.Tipo sensitivo: delírios de influência física com sensações desagradáveis vindas de órgãos internos, provocadas por
terceiros.
3.Tipo motor: envolve o delírio de que outra pessoa é responsável por movimentos e ações.
Esta síndrome é frequentmente observada no contexto das Esquizofrenias.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
75

- Delírio hipocondríaco - O paciente crê com convicção extrema que tem uma doença grave,
incurável e que irá morrer brevemente.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


76

ALTERAÇÕES DA AFETIVIDADE81

Afetividade – Definições:
[...] grau de resposta da pessoa ou sua suscetibilidade a prazer, dor e
outros estímulos emocionais. [...] (APA, 2010, p. 40)
[...] refere-se a um tom emocional momentâneo que acompanha o que
dizemos ou fazemos. (BARLOW, 2010, p. 62)
[...] termo introduzido por Bleuler para designar o conjunto dos processos
emocionais da vida dos sentimentos, da vida emotiva. Em sentido amplo,
designa o conjunto dos sentimentos de uma pessoa. (DORCSH, 2001, p.
19)
Chama-se afetividade a capacidade de experimentar sentimentos e emoções. A afetividade
compreende o estado de ânimo ou humor, os sentimentos, as emoções e as paixões. (PAIM, 1993, p.
219)

[...] Afeto vem do latim afficere, que significa influenciar, afetar. Esse termo pode ser usado para
designar genericamente os elementos da afetividade, incluindo emoções, sentimentos e humor; mas,
outras vezes, é empregado como sinônimo de emoção.
O termo emoção corresponde ao francês emouvoir, que significa comover, emocionar; e está ligado
a uma ideia de movimento. Emoção em geral representa um estado afetivo súbito, de curta duração
e grande intensidade, que se acompanha de alterações corporais, relacionadas a uma hiperatividade
autonômica.
Sentimento deriva-se do latim sentire, que significa sensação, perceber através dos sentidos, dar-se
conta. Esse termo em geral se refere a um estado afetivo menos intenso e mais prolongado que as
emoções, e sem as alterações fisiológicas encontradas nestas. Talvez se possa dizer que os
sentimentos resultem de um processamento cognitivo maior do que haveria nas emoções.
As paixões têm a intensidade das emoções, porém uma duração maior. Elas monopolizam e
direcionam os pensamentos e ações do indivíduo.
O humor (ou estado de ânimo, ou tônus afetivo) representa um somatório ou síntese dos afetos
presentes na consciência em um dado momento. Constitui o estado afetivo basal e fundamental, que
se caracteriza por ser difuso, isto é, não relacionado a um objeto específico, e por ser em geral
persistente e não reativo. O humor oscila entre os polos da alegria, da tristeza e da
irritabilidade, assim como entre a calma e a ansiedade. [...]

Não é necessário que o paciente nos conte como está se sentido para podermos avaliar a sua
afetividade: o afeto é expresso através da mímica, do olhar, dos gestos da postura e do tom de voz.
A afetividade é avaliada empaticamente. É como se o observador dissesse para si mesmo, por
exemplo: ‘Se eu estivesse me sentido como aquele indivíduo aparenta estar – pela sua expressão
facial, gestos, etc. -, eu me sentiria muito alegre, portanto, ele está alegre.

81
O texto deste item foi retirado e adaptado, principalmente, de: CHENIAUX,2013, p. 139-151; DALGALARRONDO,
2008, p. 155-173 e, PAIM, 1993, p. 219-236
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
77

Alterações do humor
Analise o esquema a seguir:

Hipertimia – [...] ou estado de ânimo morbidamente elevado, distinguem-se a euforia e a exaltação


afetiva patológica.
A euforia simples se traduz por um estado de completa satisfação e felicidade. Verificam-se
elevação do estado de ânimo, aceleração do curso do pensamento, loquacidade, vivacidade da
mímica facial, aumento da gesticulação, riso fácil e logorreia. A euforia simples é observada nos
indivíduos predispostos constitucionalmente e, em sua forma pura, na fase maníaca, nos estados
hipomaníacos, na embriaguez alcoólica, na demência senil. Na epilepsia, podem-se verificar estados
de euforia simples, [...].
Na exaltação patológica há não só a euforia, mas, também, aumento da convicção do próprio valor
e das aspirações. (‘[...] há, além da alegria patológica, a expansão do eu, uma sensação subjetiva de
grandeza e de poder. O Eu vai além dos seus limites, ganhando o mundo’). Vai acompanhada de
aceleração do curso do pensamento, que pode chegar à fuga de ideias, desviabilidade da atenção e
certa facilidade para passar rapidamente do pensamento à ação. A instabilidade afetiva desses
enfermos se traduz pela extrema facilidade com que eles passam da euforia à tristeza ou à cólera. O
estado de ânimo é o da distimia expansiva. Nos estados de exaltação patológica os enfermos dão a
impressão de mais jovens, há aumento do turgor vitalis82, manifestações de apetite voraz e de
excitação sexual, insônia, grande facilidade dos movimentos expressivos e tendência irresistível à
ação.

Hipotimia ou, depressão/ tristeza patológica; ou distimia hipotímica – Verifica-se o aumento da


reatividade para os sentimentos desagradáveis, podendo variar desde o simples mal-estar até o
estupor melancólico. Caracteriza-se, essencialmente, por uma tristeza profunda e imotivada, que se
acompanha de lentidão e inibição de todos os processos psíquicos. Em suas formas leves, a
depressão se revela por um sentimento de mal-estar, de abatimento, de tristeza, de inutilidade e de

82
Turgor vitalis – expressão latina que significa força, pressão de vida ou vital; disposição; estado de espírito.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
78

incapacidade para realizar qualquer atividade. Nas formas mais graves, os doentes apresentam um
estado de profundo abatimento: fisionomia triste, traços contraídos, [...]. Os enfermos estão
dominados por um profundo sentimento de tristeza imotivada. No doente deprimido, as percepções
são acompanhadas de uma tonalidade afetiva desagradável: tudo lhe parece sombrio. Os doentes
perdem completamente o interesse pela vida. Nada lhes interessa do presente nem do futuro e, do
passado, são rememorados apenas os acontecimentos desagradáveis. As percepções são lentas,
monótonas, descoloridas. Ao enfermo parece que os alimentos perderam o sabor habitual. Nos
estados depressivos, as ilusões são mais frequentes do que as alucinações. As ideias deliroides são
comuns, expressando geralmente ideias de culpabilidade, de indignidade e de autoacusação. O
pensamento é lento e o próprio ato-de-pensar é acompanhado de um sentimento desagradável. O
conteúdo do pensamento exprime motivações dolorosas. O doente não pode livrar-se de suas ideias
tristes.
O quadro clínico da depressão patológica é caracterizado pela inibição, refletida na lentidão e
pobreza de movimentos, na mímica apagada, na linguagem lenta, monótona, algumas vezes
expressa numa voz sussurrada. Em alguns casos, a inibição motora acompanha-se de um estado de
tensão da musculatura voluntária, quadro clínico esse denominado pelos antigos autores de ‘estado
atônito’.
Os sintomas somáticos são evidentes. As alterações vasomotoras se revelam pelas mãos frias e
cianosadas, pela cianose dos lábios e pela hipotermia. São frequentes espasmos vasculares, com
elevação da pressão arterial, palidez da face e diminuição do turgor vitalis. Os doentes dão a
impressão de mais velhos. As perturbações digestivas são constantes: língua saburrosa (mucosa),
inapetência, prisão de ventre. As perturbações circulatórias ocasionam um sentimento subjetivo de
opressão na região cardíaca, determinando a chamada angústia precordial83.

Disforia – [...] diz respeito à distimia acompanhada de uma tonalidade afetiva desagradável, mal-
humorada. Quando se fala em depressão disfórica ou mania disfórica, está sendo designado um
quadro de depressão ou de mania acompanhado de forte componente de irritação, amargura,
desgosto ou agressividade.

Puerilidade – É uma alteração do humor que se


caracteriza pelo aspecto infantil, simplório,
regredido. O indivíduo ri ou chora por motivos
banais; sua vida afetiva é superficial, sem afetos
profundos, consistentes e duradouros. Verifica-se
especialmente na esquizofrenia hebefrênica, em
indivíduos com déficit intelectual, em alguns
quadros histéricos e em personalidades imaturas de
modo geral. Assemelhando-se à puerilidade, a
moria é uma forma de alegria muito pueril,
ingênua, boba, que ocorre principalmente em
pacientes com lesões extensas dos lobos frontais, em deficientes mentais e em indivíduos com
quadros demenciais acentuados. Nesses casos os enfermos fazem bufonarias, caretas, não

83
Precordial - Relativo ou pertencente à região que fica adiante do coração, ou nela situado. (Aurélio)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
79

permanecem quietos um só instante; o humor é extremamente instável; tornam-se cada vez mais
exuberantes, loquazes, riem às gargalhadas.

Êxtase – [...] há uma experiência de beatitude, uma sensação de dissolução do Eu no todo, de


compartilhamento íntimo do estado afetivo interior com o mundo exterior, muitas vezes com
colorido hipertímico e expansivo. Está frequentemente associado a experiências circunscritas a um
contexto religioso ou místico, não sendo aqui considerado como fenômeno psicopatológico, mas
cultural. Entretanto, o êxtase também pode estar presente em condições psicopatológicas, como no
transe histérico, na esquizofrenia ou na mania.

Irritabilidade patológica – [...] há a hiper-reatividade desagradável, hostil e, eventualmente,


agressiva a estímulos (mesmo leves) do meio exterior. Qualquer estímulo é sentido como
perturbador, e o indivíduo reage prontamente de forma disfórica. Qualquer ruído (de crianças, da
televisão, de carros, etc.), a presença de muitas pessoas no local, qualquer crítica à pessoa doente,
enfim, tudo é vivenciado com muita irritação. A irritabilidade é sintoma bastante frequente e
inespecífico, indicando, não raramente, quadro de natureza orgânica. Também ocorre a
irritabilidade patológica nas síndromes depressivas, nos quadros maníacos, nos transtornos ansiosos
e na esquizofrenia. O clínico sempre deve procurar diferenciar a irritabilidade primária, oriunda
diretamente de um transtorno do humor psico-orgânico, de uma irritabilidade secundária, associada
a vivências psicóticas (delírios persecutórios, alucinações ameaçadoras, etc.) ou neuróticas
(conflitos inconscientes, insegurança, dificuldade em tomar decisões existenciais importantes, etc.).

Paratimia – A paratimia caracteriza-se por uma inadequação do afeto: uma incongruência entre o
afeto expresso e a situação vivenciadas, ou entre o afeto expresso e aquilo que o indivíduo
verbaliza. Por exemplo: o paciente, rindo, conta que foi torturado na noite anterior; ou então o
doente afirma estar alegre, mas sua mímica é de tristeza.
A paratimia reflete uma desarmonia entre a afetividade e o pensamento. Ocorre na esquizofrenia.

Ambitimia – A ambitimia também chamada de ambivalência afetiva, segundo a denominação de


Bleuler, [...] Representa a presença de sentimentos opostos ou contraditórios que simultâneos e que
se referem ao mesmo objeto, pessoa ou situação. Por exemplo: ao mesmo tempo amar e odiar a
mesma pessoa.

Neotimia – [...] consiste em uma vivência inteiramente nova, extravagante e inusitada. São afetos
qualitativamente diferentes de todos os que o paciente havia experimentado em sua vida. Podem ter
esse caráter de neotimia alguns sentimentos místicos, de êxtase, de elação, de desolação e de terror.
A neotimia é observada na esquizofrenia – especialmente no trema84 -, na intoxicação por
alucinógenos e em algumas auras85 epiléticas.

84
Trema – [...] estado de tensão peculiar em que o ator fica antes de entrar em cena e que o professor experimenta antes
de iniciar a aula. Poderá ser de maior ou menor intensidade. Esta é uma palavra tirada do argot, da gíria do teatro.
85
Aura - Fenômeno ou sensação especial que, nos indivíduos epilépticos, surge imediatamente antes do início do
ataque. “O paciente sente pronunciado cheiro de terra molhada e experimenta várias outras sensações peculiares.
Involuntariamente, emite um urro animalesco, conhecido como “grito do leão” ou “grito do pavão”. Seguem-se
normalmente, a queda ao chão e o início das convulsões. Durante as crises o paciente pode ser tomado de grande
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
80

Outras alterações da afetividade

Labilidade afetiva – São estados nos quais ocorrem mudanças súbitas e imotivadas de humor,
sentimentos ou emoções. O indivíduo oscila de forma abrupta, rápida e inesperada de um estado
afeito para outro. O paciente está falando de algo ameno e começa a chorar convulsivamente,
passando, logo a seguir, a sorrir de forma tranquila. Pode ocorrer em quadros de depressão ou
mania, estados graves de ansiedade e esquizofrenia.

Incontinência afetiva – Na incontinência afetiva, o indivíduo não consegue conter de forma


alguma suas reações afetivas. A resposta afetiva ocorre geralmente em consequência a estímulos
apropriados, mas é sempre muito desproporcional. Pode ocorrer em quadros de depressão ou mania,
estados graves de ansiedade e esquizofrenia.

Fobias – São medos determinados psicopatologicamente, desproporcionais e incompatíveis com as


possibilidades de perigo real oferecidas pelos desencadeantes, chamados de objetos ou situações
fobígenas86.

Pânico – É uma reação de medo intenso, de pavor, relacionado geralmente ao perigo imaginário de
morte iminente, descontrole ou desintegração. O pânico se manifesta quase sempre como crises de
pânico. Estas são crises agudas e intensas de ansiedade, acompanhadas por medo intenso de morrer
ou de perder o controle e de acentuada descarga autonômica (taquicardia, sudorese, etc.). As crises
caracterizam-se pelo início abrupto de uma sensação de grande perigo e desejo de fugir ou escapar
da situação. [...]

Tenacidade afetiva – [...] consiste na persistência anormal de certos estados afetivos, como
ressentimento, o ódio e o rancor. Em virtude dessa fixação prolongada de sentimentos
desagradáveis, o enfermo está sempre de mau humor e encara todos os acontecimentos da vida
através de um prima pessimista. [...] A tenacidade afetiva é própria dos epilépticos, conforme
assinalou Kleis, a perseveração dos epilépticos é um fenômeno geral, semelhante à sonolência ou ao
estupor, e abrange também os processos afetivos. Daí a persistência anormal dos sentimentos
observada nesses enfermos.

Sugestibilidade patológica – É uma alteração de ordem tanto afetiva quanto volitiva. Trata-se de
uma predisposição psíquica especial, que determina uma receptividade e uma submissão muito
fáceis às influências estranhas exercidas sobre o indivíduo. No terreno puramente psíquico,
encontra-se a sugestibilidade nos histéricos, razão pela qual se tornam esses enfermos muito
favoráveis à produção de estados hipnóticos, de sintomas somáticos e até mesmo de sintomas
psicóticos – as chamadas perturbações mentais induzidas ou por contágio mental. [...]
A sugestibilidade é também muito comum nos deficientes mentais e nos estados demenciais, nos
quais é uma consequência da insuficiência intelectual. Na demência senil a sugestibilidade adquire
grande significação do ponto de vista médico-legal (Justiça), em virtude de estarem esses enfermos

agressividade. Fora do surto a consciência e a vontade são restabelecidas plena ou parcialmente” (FUHRER, R.E.,
2000, p. 58)
86
Vide descrição clínica e relação das principais fobias na página 113 desta apostila.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
81

sujeitos a explorações prejudiciais a seus interesses pessoais, extorsão de dinheiro, captação de


herança.
A sugestibilidade pode também ser observada nos estados de excitação maníaca e nos alcoolistas.
No delirium de abstinência alcoólica, por exemplo, podem-se sugerir facilmente várias coisas ao
enfermo, inclusive alucinações.
Na catatonia, a sugestibilidade é predominantemente motora. [...]

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


82

ALTERAÇÕES DA VOLIÇÃO87 88

Principais conceitos:

Impulso (em inglês, drive - tendência – “necessidade repentina e inegável de agir imediatamente,
muitas vezes resultando em ação sem deliberação para um propósito que não pode ser lembrado.
Também denominado impulsão.” (APA, 2010, p.503) Comportamento súbito, brusco, inesperado e
irracional, muitas vezes perigoso, vivenciado pelo sujeito como uma necessidade imperiosa. Sua
carga afetiva é geralmente intensa, mas de diversas naturezas, por exemplo, sexual ou destrutiva;
[...] (DORON; PAROT, 2008, p. 416). A impulsividade compõe o temperamento89 de um
indivíduo.
O conceito de impulso corresponde à tradução do termo psicanalítico pulsão (em alemão, trieb –
impulso, ímpeto, força impelente, força que coloca em movimento) cujo melhor sentido, em
psicanálise, seria o de uma pressão interna, totalmente inconsciente, “[...] algo incômodo, que
incita, algo intrinsecamente incessante e impelente que não é eliminado, pode apenas ficar em
estado de impedimento, bloqueado, latente. [...] [...] “Trieb é a força responsável pelas
necessidades, vontades, impulsos e desejos, assumindo a forma de impulso fisiológico, pensamento
etc..” (FREUD, 2004, p. 48) “Processo dinâmico que consiste numa pressão ou força (carga
energética, fator de motricidade) que faz tender o organismo para um alvo. Segundo Freud, uma
pulsão tem a sua fonte numa excitação corporal (estado de tensão); o seu alvo é suprimir o estado de
tensão que reina na fonte pulsional; é no objeto ou graças a ele que a pulsão pode atingir o seu
alvo.” (LAPLANCHE; PONTALIS, 1986, p. 506). Em psicanálise são distinguidos vários tipos de
pulsão (p.ex., pulsões sexuais, pulsões agressivas etc).

Vontade – A vontade constitui um processo psíquico de escolha de uma entre várias possibilidades
de ação, uma atividade consciente de direcionamento da ação. Trata-se de uma elaboração cognitiva
realizada a partir dos impulsos, sendo influenciada por fatores intelectivos e socioculturais.

Desejo – [...] é um querer, um anseio, um apetite, de natureza consciente ou inconsciente, que visa
sempre algo, que busca sempre a sua satisfação. Os desejos se diferenciam das necessidades, pois
estas são fixas e inatas, independentes da cultura e da história individual, enquanto aqueles são
móveis, moldados e transformados social e historicamente.
‘[...] Foi no contexto da psicologia do sonho que S. Freud elaborou sua teoria do desejo. As
condições de possibilidade da formação do desejo são dispostas no decorrer da experiência de
satisfação [prazer]. Esta ocorre quando a excitação proveniente de uma necessidade interior é

87
A expressão volição caracteriza o “ato pelo qual a vontade se determina.” (Aurélio). Entre os autores de
psicopatologia há termos distintos sobre esse mesmo tema. Por exemplo, vontade (“sentimento que incita alguém a
atingir o fim proposto por esta faculdade; aspiração; anseio; desejo” – Aurélio), conação (“tendência consciente para
atuar” – Aurélio), atividade voluntária etc.
88
Este item foi construído a partir de adaptações dos seguintes autores: CHENIAUX, 2013, p. 117-29;
DALGALARRONDO, 2008. p. 174-84.
89
Temperamento (do latim temperare que significa “equilíbrio”) – corresponde aos aspectos (traços) geralmente
inconscientes da personalidade relacionados às reações emocionais bem como de sua rapidez e intensidade. O
temperamento poderá ser alterado, até certos limites, por influências médicas (medicações, tratamentos etc) bem como
no decurso da aprendizagem e das experiências de vida. A impulsividade, a sensibilidade, a intempestividade etc. são
características de temperamento.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
83

amainada pela obtenção do objeto específico. S. Freud traz o exemplo de um bebê faminto que
recebe seu alimento: um elemento essencial dessa experiência é o aparecimento de certa percepção
(o alimento, no exemplo escolhido), cuja imagem mnésica ficará associada com o traço mnésico da
excitação da necessidade. Desde o momento em que a necessidade se apresentar novamente, haverá,
graças à relação estabelecida, desencadeamento de uma impulsão psíquica, que de novo investirá a
imagem mnésica dessa percepção na memória e provocará de novo a percepção, ou seja,
reconstituirá a situação de primeira satisfação. Essa moção [movimento] chama-se desejo; o
reaparecimento da percepção é realizada pelo desejo. O desejo inconsciente e, portanto, definido
como visando primitivamente a uma repetição alucinatória de uma percepção anteriormente
associada à satisfação, o que explica sua propensão a manifestar-se no sonho ou na fantasia.’
(DORON; PAROT, 2006, p. 227 – as chaves são do professor)

Inclinação – [...] é a tendência a desejar, buscar, gostar, etc., intimamente relacionada à


personalidade do indivíduo, duradoura e estável, que inclui tanto aspectos afetivos como volitivos.
Trata-se de algo constitutivo do indivíduo e é, em certa proporção, de natureza genética.

Instinto – [...] é definido como um modo relativamente organizado, fixo e complexo de resposta
comportamental de determinada espécie, que, por meio dela, pode sobreviver melhor em seu
ambiente natural. Geralmente envolve um conjunto de respostas e comportamentos herdados que,
apenas com modificações superficiais, serve sempre à adaptação do organismo (p.ex., as reações e
os comportamentos associados à fome, os instintos de sobrevivência, etc.). Há uma expressão
proveniente da etologia, que é a pesquisa científica em relação aos hábitos dos animais e da sua
acomodação às condições do ambiente, ‘padrão fixo de ação’, que para em alguns casos, assemelha-
se ao de instinto. Sua definição é a de um ‘comportamento caracterizado como específico de uma
espécie, altamente estereotipado, completado uma vez que iniciado, resistente à modificação e
frequentemente desencadeado por um estímulo específico.’ (DAVIDOFF, 2001, p.767)

Processo volitivo
O processo volitivo divide-se em quatro etapas: (1) intenção ou propósito; (2) deliberação (ou
análise); (3) decisão; e, (4) execução.
A fase de intenção ou propósito, na qual se esboçam as tendências básicas do indivíduo, suas
inclinações e interesses. Nesse momento, impulsos, desejos e temores inconscientes exercem
influência decisiva sobre o ato volitivo, muitas vezes imperceptíveis para o próprio indivíduo.
A fase de deliberação, que diz respeito à ponderação consciente, levando-se em conta tanto os
motivos como os móveis implicados no ato volitivo. O indivíduo faz uma análise básica do que
seria positivo ou negativo, favorável ou desfavorável, benéfico ou maléfico em sua decisão. É um
momento de apreciação, consideração dos vários aspectos e das implicações de determinada
decisão.
A fase de decisão propriamente dita é o momento culminante do processo volitivo, instante que
demarca o começo da ação, no qual os móveis e os motivos vencidos dão lugar aos vencedores.
A fase de execução constitui a etapa final do processo volitivo, na qual os atos psicomotores
simples e complexos decorrentes da decisão são postos em funcionamento, a fim de realizar e
consumar aquilo que mentalmente foi decidido e aprovado pelo indivíduo.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


84

O ato de vontade pautado por essas quatro fases, em que ponderação, análise e reflexão precedem a
execução motora, é denominado ação vonluntária.

Alterações da vontade

Hipobulia/abulia – significam, respectivamente, diminuição e abolição da atividade conativa. A


hipobulia e a abulia caracterizam-se por uma sensação de indisposição, fraqueza, desânimo ou falta
de energia; perda da iniciativa, da espontaneidade e do interesse pelo mundo externo; indecisão;
dificuldade de transformar as decisões em ações; e inibição da psicomotricidade.
Ocorrem na depressão, na esquizofrenia, no delirium sem psicose, em alguns casos de demência ou
retardo mental e no uso crônico de neurolépticos90.

Enfraquecimento de impulsos específicos

Distúrbios como a diminuição ou perda do apetite (anorexia), da sede e da libido, além de insônia,
representam um enfraquecimento dos impulsos, um debilitamento das tendências naturais à
satisfação das necessidades corporais.
A anorexia é observada na depressão, na anorexia nervosa, em alguns quadros de ansiedade e em
diversas condições médicas gerais. A anorexia deve ser distinguida da sitiofobia91, na qual a recusa
alimentar se deve a manifestações fóbicas ou delirantes, não havendo uma real redução do apetite.
A insônia pode ser classificada em: inicial, quando há dificuldade para adormecer; intermediária,
caracterizada por diversos despertares noturnos; e terminal, quando o paciente acorda muito cedo e
não consegue voltar a dormir. A insônia aparece na depressão (podendo ser inicial ou terminal), nas
síndromes de ansiedade (em geral, inicial ou intermediária), na mania, nos quadros de agitação
psicomotora, nas intoxicações por psicoestimulantes (anfetamina, cocaína, cafeína, etc) e em
quadros de abstinência a algumas drogas psicoativas (opiáceos, benzodiazepínicos, álcool, etc).
A perda da libido é observada na depressão e no uso de substâncias antiandrogênicas92, de
neurolépticos e de alguns antidepressivos (especialmente os tricíclicos e os serotoninérgicos93).

90
Neurolépticos - Os antipsicóticos ou neurolépticos são medicamentos inibidores das funções psicomotoras, a qual
pode encontrar-se aumentada em estados, por exemplo, de excitação e de agitação. Paralelamente eles atenuam também
os sintomas neuro-psíquicos considerados psicóticos, tais como os delírios e as alucinações. São substâncias químicas
sintéticas, capazes de atuar seletivamente nas células nervosas que regulam os processos psíquicos no ser humano e a
conduta em animais. (http://www.psiqweb.med.br)
91
Sitiofobia - Medo de se alimentar.
92
Antiandrogênicas são drogas que inibem o hormônio testosterona. Geralmente são utilizadas no tratamento de
doenças da próstata.
93
Serotonina - A serotonina é um neurotransmissor que atua no cérebro regulando o humor, sono, apetite, ritmo
cardíaco, temperatura corporal, sensibilidade a dor, movimentos e as funções intelectuais.
Quando ela se encontra numa baixa concentração, pode levar ao mau humor, dificuldade para dormir e vontade de
comer o tempo todo, por exemplo. Uma das formas de aumentar a concentração de serotonina na corrente sanguínea é
consumindo alimentos ricos em triptofano, outra forma é praticando exercícios físicos com regularidade.
(http://www.tuasaude.com)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
85

Intensificação de impulsos específicos

A bulimia (ou sitiomania, ou sitiofilia) consiste num


aumento patológico do apetite. Pode ocorrer em distúrbios
hipotalâmicos, na síndrome de abstinência relacionada à
anfetamina, em alguns casos de depressão, no transtorno
disfórico pré-menstrual e em quadros de ansiedade. Está
relacionada à hiperfagia94 – ingestão excessiva de alimentos –
e à obesidade.
A sede excessiva é denominada potomania; a ingestão
exagerada de água, polidipsia. Esta é observada no diabetes
melito, no diabetes insípidus95 e na síndrome de ansiedade.
Hipersonia (ou letargia) significa sono em excesso. Ela é observada em alguns deprimidos; pode
ser um efeito colateral de medicamentos como benzodiazepínicos, antipsicóticos e antidepressivos;
e ocorre de forma paroxística na narcolepsia96.
O desejo sexual patologicamente aumentado no homem é chamado de satiríase e, na mulher,
ninformania. O aumento da libido é uma alteração típica da mania.

Hiperbulia – [...] caracteriza-se por um sentimento subjetivo de força, de energia, de disposição;


observa-se um aumento da iniciativa, da espontaneidade e do interesse em relação ao mundo
externo; costuma haver desinibição e aumento da psicomotricidade. Ocorre principalmente na
síndrome maníaca.

Atos impulsivos – [...] caracterizam-se por serem súbitos, incoercíveis e incontroláveis. São atos
desprovidos de finalidade consciente. Pulam-se as etapas de deliberação e decisão do processo
volitivo, indo-se direto da intenção para a ação. Presumivelmente, os atos impulsivos ocorrem em
função de um aumento da intensidade dos impulsos ou de um enfraquecimento dos mecanismos de
inibição e refreamento.
Os atos impulsivos tornam-se patológicos quando são empaticamente incompreensíveis para o
observador. Alguns comportamentos heteroagressivos, autoagressivos e suicidas, a frangofilia, a
piromania, a dromomania, a dipsomania e os ataques de hiperingestão alimentar (da bulimia
nervosa) podem ter as características de um ato impulsivo.
Os comportamentos heteroagressivos impulsivos ocorrem de forma não premeditada, sendo
muitas vezes imotivados. Podem algumas vezes resultar em homicídio.
A frangofilia representa uma forma especial de comportamento agressivo. Nesse caso, a ação é a
de destruir objetos – deixa-los em frangalhos -, como roupas, móveis, colchões, etc.
A piromania constitui uma propensão a atear fogo, provocar incêndio. Muitas vezes trata-se de
uma reação agressiva a uma contrariedade.

94
Sobre hiperfagia, vide página 193.
95
A diabetes insipidus (DI) é uma doença caracterizada pela sede pronunciada e pela excreção de grandes quantidades
de urina muito diluída. Esta diluição não diminui quando a ingestão de líquidos é reduzida. Isto denota a incapacidade
renal de concentrar a urina. A DI é ocasionada pela deficiência do hormônio antidiurético (vasopressina) ou pela
insensibilidade dos rins a este hormônio.
96
Narcolepsia - Manifestação caracterizada pela necessidade mórbida de dormir, ou por ataques repentinos de sono,
que ocorrem com intervalos; sono paroxístico; hipnolepsia.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
86

Os impulsos heteroagressivos, a frangofilia e a piromania são observados nos transtornos de


personalidade antissocial, borderline97 e explosiva, assim como na mania, na esquizofrenia, no
retardo mental, na demência e no estado crepuscular epiléptico.
A dromomania (poriomania, automatismo ambulatório ou fuga) consiste numa necessidade de
afastar-se, de mudar de lugar, que se manifesta como uma deambulação sem finalidade ou como
uma corrida súbita e imotivada. A fuga proporciona alívio para um estado de disforia relacionado a
circunstância do ambiente. Ocorre nos estados crepusculares histérico e epiléptico, na esquizofrenia,
na demência e no retardo mental.
A dipsomania representa uma tendência periódica para a ingestão de grande quantidade de álcool,
afetando pessoas que estão, em geral, abstêmias. Após o início da ingestão alcoólica, o indivíduo
perde inteiramente o controle sobre esta, e a bebe até cair inconsciente.
Na bulimia nervosa, ocorrem ataques de hiperingestão alimentar, que se caracterizam pelo
comportamento de comer rapidamente uma grande quantidade de alimentos e, principalmente, pela
sensação de perda de controle sobre a ingestão.

Atos compulsivos (ou compulsões)


As compulsões, [...], são atos que o indivíduo se sente compelido a realizar. Todavia, ao contrário
do que ocorre nos atos impulsivos, a execução não se dá de imediato, e sim somente após alguma
deliberação consciente, havendo, com frequência, luta ou resistência contra a sua execução.
Também diferentemente dos atos impulsivos, os atos compulsivos nem sempre levam a uma
sensação de prazer; muitas vezes produzem apenas certo alívio, em geral temporário, para uma
vivência disfórica.
No transtorno obsessivo-compulsivo, as compulsões podem ser secundárias a ideias obsessivas,
uma forma de combater essas ideias, de reduzir a ansiedade provocada por elas; ou, então,
consistem em comportamentos repetitivos que requerem um padrão rígido de realização, e que
muitas vezes assumem a forma de verdadeiros rituais. Por exemplo: vem à mente do paciente a
ideia de que seu pai vai morrer, e ele se vê impelido a bater com a colher na xícara de café cinco
vezes para evitar que tal tragédia ocorra; lavar as mãos dezenas de vezes ao dia em função do medo
de contaminação por germes; conferir se desligou o gás inúmeras vezes ao sair de casa. [...] O
paciente com transtorno obsessivo-compulsivo reconhece o caráter absurdo de suas compulsões e
tenta resistir a elas. Compulsões são comuns também na depressão e na síndrome de Tourette98.

97
Sobre o tipo borderline vide página 142.
98
Síndrome de Tourette (Transtorno de Tourette ou Doença de Gilles de La Tourette) é um distúrbio
neuropsiquiátrico caracterizado por tiques múltiplos, motores ou vocais, que persistem por mais de um ano e geralmente
se instalam na infância.
Na verdade, alguns destes movimentos, sua intensidade, podem ser controlados parcialmente, à custa de muita tensão.
Assim, na presença de pessoas desconhecidas ou com quem não se tem intimidade, a pessoa com a síndrome certamente
se esforçará para conter ao máximo os tiques.
Classificação dos Tiques:
•Simples
1.Motores: Piscar os olhos, repuxar a cabeça, encolher os ombros, fazer caretas, trincar os dentes, mover os dedos das
mãos, etc.
2.Vocais: “coçar” a garganta (Pigarrear, limpar a garganta), grunhidos, uivos, zumbidos, latidos, estalidos com a língua,
fungar, gritar, assobiar...
•Complexos. Os tiques complexos geralmente são precedidos por algum pensamento que direta ou indiretamente os
desencadeia, como obsessões, gerando ansiedade.
1.Motores: Pular, tocar pessoas ou coisas, cheirar, retorcer-se e, embora muito raramente, atos de autoagressão, tais
como machucar-se ou morder a si próprio...
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
87

Possuem igualmente um caráter compulsivo o padrão de uso de drogas psicoativas na dependência


química (toxicofilia), o comportamento alimentar na obesidade hiperfágica comum (em que não há
ataques de hiperingestão), o jogo patológico, a cleptomania e certos padrões de comportamentos
relativos ao comprar e ao envolvimento amoroso.
O comportamento de um indivíduo em relação à comida, ao jogo e ao objeto sexual pode possuir
os mesmos aspectos observados nos quadros de dependência química em relação à droga: avidez
(ânsia por comida, pelo jogo ou pelo parceiro sexual), pensamentos recorrentes (quanto aos
mesmos), negação da dependência, sintomas de abstinência e a ocorrência de prejuízos
psicossociais significativos.
Na cleptomania, o indivíduo, mais frequentemente uma mulher, vê-se impelido a furtar
determinado objeto, do qual na verdade não necessita e cujo valor financeiro é irrelevante. O ato de
roubar é precedido de ansiedade e acompanha-se de um alívio dessa ansiedade, além de certa
excitação e prazer. A compulsão por comprar (ou oniomania, prodigalidade99) tem
características semelhantes.

Comportamentos desviantes em relação aos impulsos

Os comportamentos de automutilação e suicida podem ser considerados desvios dos impulsos de


autopreservação. Formas leves e moderadas de automutilação ocorrem mais em pacientes com
retardo mental ou transtorno de personalidade borderline. Já formas mais graves são mais comuns
na esquizofrenia. O suicídio é um risco importante especialmente na depressão, no alcoolismo e na
esquizofrenia, embora nem sempre esteja relacionado a uma doença mental.
A alotriofagia representa um desvio dos impulsos de nutrição, uma perversão do apetite, como se
chamava antigamente. Consiste na ingestão de coisas estranhas ou inadequadas. Por exemplo:
comer animais repugnantes (lagartixa, barata, minhoca), excrementos (coprofagia), substâncias
nocivas e objetos perigosos (tinta, botões, alfinetes, sabão, etc). [...] Ocorre mais frequentemente no
retardo mental e na demência, e, ainda, na esquizofrenia residual e na mania. Comum também é a
tricotilomania, impulso a arrancar os cabelos podendo ser seguido da tricofagia, comê-los.
A malácia caracteriza uma tendência do indivíduo a comer coisas extravagantes, como comer terra,
cinza, madeira, papel, sabão, parafina, animais pequenos repugnantes como lagartixas, baratas,
minhocas, vermes e outros pequenos animais vivos, substâncias orgânicas em decomposição,
excrementos (croprofagias) etc. Essa alteração é comum nos casos de deficiência mental grave e
nos dementes senis.
As parafilias100 (ou Transtornos da Preferência Sexual) constituem um desvio do
comportamento sexual. Consistem na preferência por objetos ou situações sexuais não usuais, que

2.Vocais: Frases fora de contexto, frases ou sons ouvidos recentemente que têm que ser repetidos (ecolalia), e mais
raramente obscenidades.
Apesar de não haver cura, há tratamento e a indicação para fazê-lo depende muito do quão incomodado o "Touréttico"
se sente. Sim, porque muitas vezes os tiques incomodam mais quem os observa, do que quem os têm.
99
A prodigalidade também pode ser entendida não só pelo impulso descontrolado (patológico, portanto) à compra,
como também o impulso descontrolado ao desperdício, às doações e à dilapidação do patrimônio pessoal ou familiar
(comum por exemplo, em alguns casos da demência, da compulsão ao jogo, da dependência química etc.). É comum,
nessas circunstâncias, que tais pessoas, por iniciativa de suas próprias famílias, sejam interditadas civilmente na Justiça.
100
Alguns autores preferem a denominação ‘atos impulsivos e compulsivos de natureza sexual; outros as chamam de
perversões sexuais. “Uma perversão representa um desvio em relação ao ato sexual ‘normal’, definido este como coito
que visa a obtenção do orgasmo pela penetração genital, com uma pessoa do sexo oposto. Diz-se que existe perversão
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
88

se tornam uma condição necessária para a excitação sexual e o orgasmo. Na quase totalidade das
vezes, as parafilias acometem pessoas do sexo masculino. No fetichismo, o interesse sexual se
concentra sobre partes não genitais do corpo feminino (pés, cabelos, nuca, etc) ou peças do
vestuário (sapatos, roupas íntimas, meias, etc.). No fetichismo transvéstico o indivíduo veste-se
com roupas do sexo oposto a fim de excitar-se sexualmente. No exibicionismo, o comportamento
consiste na exposição dos órgãos genitais, geralmente contra a vontade da pessoa que observa. Na
escopofilia (ou voyeurismo), o prazer provém basicamente da observação de uma pessoa que está
tento uma relação sexual ou que está nua ou tirando a roupa. No sadomasoquismo, o prazer está
vinculado à dor, humilhação, ou dominação e submissão. Na coprofilia, a excitação depende do uso
de excrementos no ato sexual. Na pedofilia o desejo sexual é por crianças ou púberes do sexo
oposto. Na pederastia o desejo sexual é por crianças ou púberes do mesmo sexo. Na gerontofilia o
desejo sexual é por idosos. Na zoofilia é por animais e na necrofilia os objetos sexuais são
cadáveres. Na compulsão à masturbação há uma intensa necessidade de realizar atividades
masturbatórias repetitivas, até mesmo praticada com desprazer. Na compulsão a utilizar
clisteres101 o paciente introduz objetos, como lâmpadas, podes vidro, garrafas, etc., no ânus ou na
vagina. No frotteurismo o indivíduo toca ou esfrega-se em uma pessoa sem o seu consentimento.

Ambitendência
A ambitendência também é denominada ambivalência volitiva. Consiste numa incapacidade para
decidir, em função da presença na consciência de tendências volitivas opostas. Por exemplo, querer
ficar perto de alguém e, ao mesmo tempo, não querer, e temer tal aproximação. A ambitendência
pode ocorrer na esquizofrenia.
Um fenômeno dessa natureza ocorre nos pacientes obsessivos. Nestes há um excesso de
deliberação, ou seja, todas as alternativas possíveis de conduta são minuciosa e repetidamente
examinadas, o que impede que se chegue à etapa de decisão do processo volitivo.

Negativismo
O negativismo, [...], consiste numa resistência não deliberada, imotivada e incompreensível às
solicitações externas. No negativismo passivo, o paciente simplesmente não faz o que lhe é pedido;
no ativo, ele faz o oposto ao solicitado. Podem ser manifestações de negativismo passivo o
mutismo (a recusa a falar) e a sitiofobia (recusa de alimentos). [...] O negativismo é observado em
quadros catatônicos, como na esquizofrenia e na depressão.
É uma ‘tendência permanente e instintiva a reagir contra toda solicitação do mundo exterior,
quaisquer que seja a sua natureza.’ (Kahlbaum). Essa tendência a resistir às influências externas,
chamada pelos antigos autores loucura de oposição, manifesta-se não só em relação às ordens
transmitidas ao paciente como ainda aos movimentos que se procura imprimir aos seus membros.
Se o médico manda o enfermo levantar-se, deitar-se, vestir-se ou andar, ele não obedece ou faz
exatamente o contrário daquilo que se lhe ordena.
O negativismo também é classificado como uma alteração do comportamento motor ou da
psicomotricidade (vide página 96).

quando o orgasmo é obtido através de objeto sexuais ou por outras zonas corporais, e quando o orgasmo é subordinado
de forma imperiosa a certas condições extrínsecas. De forma geral, tem-se por perversão o conjunto de comportamento
psicossexual que acompanha tais atipias na obtenção do prazer sexual.” (adaptado de CASTRO, 2006, 76)
101
Clister - Injeção, no reto, de água, de líquido medicamentoso ou de substância para contraste radiológico.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
89

Reação do último momento


[...] consiste no desaparecimento súbito de uma conduta negativista justamente no momento em que
o examinador desiste do seu empenho de fazer com que o paciente atenda à sua solicitação. Por
exemplo, o indivíduo se recusa a responder a qualquer pergunta por mais de uma hora, e permanece
o tempo todo em silêncio, sem sequer olhar para o examinador. Mas, quando este vai se retirar, o
doente começa a cooperar. Todavia, a falta de cooperação em geral se reinicia logo em seguida.

Sugestionabilidade volitiva ou patológica


[...] é um sintoma oposto ao negativismo. Consiste numa tendência exagerada a atender às
solicitações vindas do exterior. Ocorre nos transtornos dissociativos e conversivos
(autossugestão); e nos estados hipnóticos e no transtorno psicótico compartilhado
(heterossugestão). Num transtorno dissociativo, por exemplo, o paciente se convence de que
perdeu a memória. Num transtorno conversivo, ele pode passar a acreditar, por si próprio, que está
paralítico ou cego. Já no transtorno psicótico compartilhado, um indivíduo primariamente delirante,
que sofre, por exemplo, de esquizofrenia, ‘contagia’ um segundo indivíduo, mais crédulo e ingênuo,
com sua ideação patológica. Os fenômenos em eco – ecopraxia, ecomimia e ecolalia102 –
representam casos mais graves de sugestionabilidade e ocorrem na síndrome catatônica.

Obediência automática
A obediência automática representa um exemplo de sugestionabilidade patológica. Caracteriza-se
pelo cumprimento passivo e imediato, sem qualquer reflexão ou elaboração, de quaisquer ordens ou
solicitações, mesmo que a ação realizada seja perigosa ou danosa para o próprio paciente. Se se
disser para o indivíduo pular do vigésimo andar, ele o fará ‘sem pestanejar’. O obediência
automática ocorre na síndrome catatônica.

Poriomania – É o impulso e o comportamento de andar a esmo, viajar, ‘desaparecer de casa’,


‘ganhar o mundo’, como se diz na linguagem popular. Ocorre em pacientes esquizofrênicos (às
vezes, por imaginar que está sendo perseguido e precisar ‘sumir do mapa’), em pessoas com quadro
psico-orgânicos e nos deficientes mentais, etc.

Jogo patológico
É a compulsão por jogos de azar, fazer apostas, especular com dinheiro, apesar de prejuízos
financeiros e sociais percebidos pelo sujeito.

Compulsão por internet e vídeos-games


Recentemente um número crescente de pessoas passou a apresentar dependência grave pela internet
(jogos, salas de bate-papo, sites eróticos e de compra, [sms] etc.). Parecem ser jovens com baixa
autoestima, tímidos e com baixa proatividade.

O exame da conação

102
Ecopraxia – consiste na repetição automática e despropositada das ações motoras executadas por outra pessoa, que
está diante do paciente. São imitados gestos, posturas, a fala (ecolalia) ou as expressões fisionômicas (ecomimia).
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
90

A exploração da conação dá-se, basicamente, pela observação do comportamento do paciente:


observa-se se ele demonstra iniciativa, espontaneidade e interesse, e ainda a capacidade de tomar
decisões.
Em geral, o grau de cooperação do paciente numa simples entrevista já fornece elementos para a
identificação de alterações, como negativismo e sugestionabilidade patológica.
Para a detecção de obediência automática, são dada, sem prévias explicações, ordens simples que
pareceriam às pessoas em geral estranhas ou inadequadas para a situação de um exame médico:
‘Levante os braço...Abaixe os braços...Sente-se... fique de pé... Dê três pulinhos...Dê três voltas em
torno da cadeira...’
As variações quantitativas da linguagem e da psicomotricidade costumam estar correlacionadas
diretamente com a conação. A hiperbulia quase sempre se acompanha de logorreia e de agitação
psicomotora; e a hipobulia, de oligolalia103 ou mutismo e de inibição psicomotora.

103
Oligolalia ou laconismo – refere-se a uma expressão verbal diminuída, mas não abolida. Consiste no oposto da
logorreia. É observada nas mesmas situações em que o mutismo pode ocorrer.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
91

ALTERAÇÕES DO COMPORTAMENTO MOTOR (ou, PSICOMOTRICIDADE)104

A motilidade
Nem todos os movimentos corporais se encontram no âmbito da psicologia e da psicopatologia, mas
somente as ações psicomotoras. Aqueles movimentos corporais involuntários e independentes do
psiquismo interessam apenas à neurologia.
As ações psicomotoras possuem um conteúdo psicológico, são uma expressão do psiquismo. São
voluntárias, isto é, conscientes quanto à motivação e finalidade. Representam a quarta etapa do
processo volitivo: a execução.
A motilidade consiste na via final de todo evento psíquico e é a única forma de acesso que temos ao
psiquismo de uma outra pessoa.
Na psicomotricidade está incluída a fala, mas esta faz jus a um capítulo à parte. Os movimentos
expressivos da mímica – embora estejam diretamente relacionados ao psiquismo, particularmente à
afetividade – não são estudados aqui, por não serem, segundo Jaspers, voluntários nem intencionais.

Apraxia – [...] consiste na dificuldade ou impossibilidade de realizar atos motores intencionais,


voluntários, na ausência de paresia105 ou paralisia, de déficit sensorial e de incoordenação motora. A
apraxia representa a perda do movimento aprendido.
As apraxias estão relacionadas a lesões corticais, geralmente no hemisfério dominante, envolvendo
doenças vasculares cerebrais, processos demenciais e neoplasia106.
[As formas da apraxia são: a ideomotora, a ideativa, a construcional, a de vestimenta e a da
marcha.] A apraxia ideomotora é a perda da capacidade de realizar movimentos simples em
resposta à solicitação do examinador: por exemplo, bater num prego com um martelo; fazer um
aceno significando adeus; escovar os dentes; etc. O paciente pode conseguir executar o mesmo ato
de forma espontânea. A apraxia ideativa, por sua vez, é a perda da capacidade de realizar
movimentos sequenciais: por exemplo, dobrar uma carta, coloca-la em um envelope, lacrar o
envelope e, em seguida, colocar um selo. Os pacientes conseguem executar individualmente os
movimentos que integram a sequência. A apraxia construcional é a incapacidade de construir
figuras geométricas, montar quebra-cabeças ou desenhar um cubo ou outras formas geométricas. A
apraxia de vestimenta é a perda da capacidade para vestir-se, mantendo-se as capacidades motoras
simples e a cognição global. Tanto a apraxia construcional como a de vestimenta resultam
geralmente de lesões do hemisfério direito. A apraxia da marcha é a incapacidade de iniciar o
movimento espontaneamente e organizar a atividade gestual da marcha, ocorrendo com frequência
a marcha em pequenos passos (petit pas). A apraxia da marcha resulta de lesões dos lobos frontais e
subcorticais e de alterações associadas à hidrocefalia de pressão normal.
Para avaliar a presença de apraxia ideomotora, podem ser dadas ao paciente ordens como as
seguintes: ‘Mostre-me como você faz um aceno de adeus’; ‘Mostre-me como você cortaria com
uma tesoura; ‘Mostre-me como você escovaria seus dentes com uma escova’. Deve-se frisar para o

104
Este tópico foi elaborado a partir de recortes e adaptações dos seguintes autores: CHENIAUX, 2013, p.131-38;
DALGALARRONDO, 2008, p. 184-92; PAIM, 1993, p. 237-48.
105
Paresia - Diminuição da força em um ou mais grupos musculares. É um grau menor de paralisia.
106
Neoplasia - Termo que denomina um conjunto de doenças caracterizadas pelo crescimento anormal e em certas
situações pela invasão de órgãos à distância (ver metástases). As neoplasias mais frequentes são as de mama, cólon,
pele e pulmões.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
92

paciente, por exemplo, que ele não deve fazer o movimento como se seus dedos fossem a escova de
dentes, e sim como se ele estivesse segurando uma escova.
Para avaliar a presença de apraxia ideativa, podem ser dadas as seguintes ordens, que se referem a
tarefas sequenciais: ‘Eu vou lhe dar um pedaço de papel. Quando eu fizer isso, pegue o papel com a
sua mão direita, dobre-o ao meio, com ambas as mãos, e coloque-o no chão’.

Hipocinesia (ou lentificação psicomotora)


A hipocinesia (ou inibição psicomotora) caracteriza-se pela diminuição acentuada e generalizada
dos movimentos voluntários. Os movimentos tornam-se lentos e são realizados com grande
dificuldade. Em geral, há inibição do pensamento e da fala, empobrecimento da mímica
(hipomimia), e diminuição da vontade (hipobulia). [Tal quadro reflete a lentificação de toda a
atividade psíquica (bradipsiquismo).]

Acinesia (ou estupor)


Na acinesia há abolição dos movimentos voluntários. O paciente pode ficar por longo período
restrito ao leito, sem qualquer reação ao ambiente, apresentando mutismo, abolição da expressão
facial (amimia), recusa de alimentos (sitiofobia) e incontinência urinária e fecal (gatismo), além de
abulia (normalmente o nível de consciência está aparentemente preservado e de capacidade
sensório-motora para reagir ao ambiente).
Tanto o estupor quanto a hipocinesia podem ocorrer na esquizofrenia catatônica, na depressão
grave, nos quadros de delirium não psicóticos, em estados dissociativos histéricos, no
parkinsonismo, na encefalite letárgica e, mais raramente, em estados demenciais avançados, no
retardo mental e em ataques de pânico (reações de congelamento).
Quando o estupor se acompanha de rigidez muscular,
com redução da mobilidade passiva e manutenção da
postura corporal, trata-se de catalepsia, que também é
uma forma de estereotipia. Nesse caso, o paciente pode
assumir espontaneamente posições bastante incômodas
por um tempo prolongado: por exemplo, manter os braços
elevados; ficar deitado com as pernas para o ar; ou ainda
permanecer com a cabeça inclinada para a frente, como se
estivesse apoiada em um travesseiro imaginário
(travesseiro psíquico).
Na flexibilidade cerácea, o indivíduo, ou uma parte de seu corpo (braço, perna, cabeça), é colocado
pelo examinador em determinada posição (mesmo posições muito desconfortáveis), e assim
permanece, como se fosse um homem de cera, moldável por uma outra pessoa. A catalepsia e a
flexibilidade cerácea são sintomas frequentes na esquizofrenia catatônica. As paralisias da
conversão histérica constituem um estado de acinesia localizada, restrita a um ou mais membros.
Uma variação interessante desse tipo é a cataplexia que é a perda abrupta do tônus muscular,
geralmente acompanhada de queda ao chão. Está presente na narcolepsia (crises recorrentes de sono
tipo REM107 no indivíduo desperto).

107
Sono REM (Rapid Eye Moviment). É a fase do sono em que sonhamos.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
93

Hipercinesia (ou exaltação psicomotora, ou agitação psicomotora)


A hipercinesia caracteriza-se por um aumento patológico da atividade motora voluntária. Essa
exaltação da psicomotricidade pode se dar em três níveis de gravidade: inquietação, agitação e
furor (do menos para o mais intenso).
Comumente a hipercinesia acompanha-se de logorreia (fala excessiva) e de heteroagressividade.
Trata-se de uma alteração psicopatológica bastante comum e inespecífica, podendo ser observada
na esquizofrenia catatônica, na mania, na depressão ansiosa, em quadros de delirium com sintomas
psicóticos, em estados crepusculares histéricos e epilépticos, em síndromes de ansiedade, em
síndromes delirantes, em alguns pacientes com retardo mental ou demência e no transtorno de
déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), quadros psico-orgânicos agudos (por intoxicação com
substâncias, síndromes de abstinência, traumas cranioencefálicos, encefalites metabólicas, etc).

Estereotipias motoras
São repetições automáticas e uniformes de determinado ato motor complexo, indicando geralmente
marcante perda do controle voluntário sobre a esfera motora. O paciente repete o mesmo gesto com
as mãos (gestos esses desprovidos de finalidade e sentido, inclusive para o próprio doente) dezenas
ou centenas de vezes em um mesmo dia. As estereotipias podem ser movimentos (desde simples
movimentos de dedos até marchas), de posição (estereotipia acinética ou catalepsia – a manutenção
de uma postura corporal, geralmente extravagante, durante longo tempo), de lugar (a busca
reiterada, sem razão plausível, de um mesmo local) ou de palavras e frases (chamada de
verbigeração). Observam-se as estereotipias motoras na esquizofrenia, sobretudo nas formas
crônicas e catatônicas, assim como na deficiência mental.

Ecopraxia
Consiste na repetição automática e despropositada das ações motoras executadas por outra pessoa,
que está diante do paciente. São imitados gestos, a postura, a fala (ecolalia) ou a expressão
fisionômica (ecomimia).
A ecopraxia está relacionada à sugestionabilidade patológica. Pode ser observada principalmente na
síndrome catatônica e, ainda, no retardo mental, no delirium e em processos demenciais.

Maneirismo
São movimentos expressivos – isto é, movimentos que servem a um propósito de comunicação, tais
como gestos, mímicas, vocalizações – que se tornam exagerados quanto à sua amplitude, tornam-se
afetados, rebuscados, estilizados ou desarmônicos, perdem sua graça natural e parecerem
extravagantes ao observador.
Observavam-se maneirismos na esquizofrenia catatônica ou hebefrênica, no retardo mental, na
histeria, em doenças cerebrais orgânicas e no homossexualismo.
O comportamento de um paciente que, toda vez em que vê seu médico, ajoelha-se e beija as mãos
deste pode ser considerado amaneirado. Um outro exemplo de maneirismo é o de um aperto de mão
que dura mais de um minuto, com movimentos excessivamente vigoroso. O paciente pega a colher
de modo muito próprio e realiza gestos bizarros para levar a comida à boca. Ao falar com o
enfermeiro, gesticula, faz caretas, encolhe os ombros de modo peculiar, faz rodopios com as mãos e
movimenta a cabeça de forma afetada.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


94

Tiques
Os tiques são movimentos de defesa ou movimentos de expressão que acabaram
por degenerar em atos automáticos. São semiconscientes e só em determinado grau
dependem da vontade. São atos coordenados, repetitivos, resultantes de contrações
súbitas, breves e intermitentes, envolvendo geralmente um grupo de músculos que
atua em suas relações sinérgicas normais. Acentuam-se muito com a ansiedade. Os
tiques geralmente são reflexos condicionados, os quais surgiram associados a
determinados estímulos emocionais ou físicos, mantendo-se de forma estereotipada, como um
movimento involuntário. Podem ocorrer no indivíduo sem qualquer outra alteração mental e entre
crianças ansiosas, submetidas a estresse. Tiques múltiplos, motores e/ou vocais, podem indicar a
presença do Transtorno de Tourette. Os tiques ocorrem com mais frequência em crianças que
adultos.

Interceptação cinética
Consiste numa interrupção brusca e incompreensível de uma ação motora já iniciada, que para no
meio. O paciente muitas vezes atribui a impossibilidade de completar o movimento a uma
influência externa.
A interceptação cinética é algo equivalente ao roubo do pensamento (alteração da consciência do
eu), podendo também ocorrer na esquizofrenia catatônica.

Perseveração motora
Representa uma repetição sem sentido de uma ação motora de início executada adequadamente. Por
exemplo: solicita-se ao paciente que coloque a língua para fora, o que ele faz, e, em seguida, que ele
a coloque para dentro, o que ele também faz; todavia, o paciente agora passar a realizar
repetidamente os mesmos movimentos com a língua sem que haja uma nova solicitação por parte
do examinador.

Conversão
Na conversão há o surgimento abrupto de sintomas físicos (paralisias, anestesias, parestesias108,
cegueira, etc), de origem psicogênica. A conversão motora (paralisias, contraturas conversivas,
ataxias109 psicogênicas, etc.) ocorre geralmente em situação estressante, de ameaça ou conflito
intrapsíquico ou interpessoal significativos para o indivíduo. Por exemplo, após discussão violenta
com o marido, a esposa passa a apresentar-se paraplégica, não conseguindo mais andar, ou o
marido, após ser descoberta a sua infidelidade conjugal, passa abruptamente a apresentar
hemiplegia110 psicogênica.

Alterações da marcha
A marcha do paciente histérico é descrita como irregular, mutável, bizarra, podendo ter elementos
de ataxia, espasticidade111 e outras alterações, mas raramente revela um padrão preciso e estável de

108
Parestesia - Sensação de formigamento ou de ardência na pele, não-causadas por estímulo exterior ao corpo.
109
Ataxia - Perda da faculdade de coordenar os movimentos voluntários.
110
Hemiplegia - Paralisia da metade do corpo. Compromete a metade da face, braço e pernas do mesmo lado.
Relaciona-se a infartos, hemorragias ou tumores do sistema nervoso central.
111
Espasticidade - é a rigidez muscular que dificulta ou impossibilita o movimento, em especial dos braços e das
pernas.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
95

determinada marcha neurológica. Há muitos movimentos supérfluos e balancear exagerado de um


lado para outro, arremessos das pernas e tremores das extremidades. Tem-se a impressão de que o
paciente está prestes a cair, mas raramente ele cai, a não ser na presença de outros. Quando cai, em
geral não se machuca gravemente. O exame neurológico para tônus, força muscular, coordenação
motora e reflexos (estes principalmente) pode estar normal.
Alguns pacientes histéricos apresentam a camptocormia, que é o caminhar com o tronco fletido
para a frente. Na hemiplegia histérica, o paciente em geral arrasta o pé ‘paralisado’ sobre o solo,
diferentemente da marcha ceifante do hemiplégico orgânico (que tem de fato uma paralisia
espástica).
Os termos astasia e abasia foram muito utilizados no passado, no contexto da histeria. A abasia é a
impossibilidade ou dificuldade para a marcha; e a astasia, a impossibilidade de ficar de pé quando
não há razão orgânica para isso (utiliza-se atualmente também o termo disbasia histérica).
Apresenta, então, astasia-abasia aquele paciente, em geral com histeria, que revela total ou parcial
incapacidade de levantar-se e andar, apesar de não apresentar qualquer paralisia ou ataxia de origem
orgânica.
A marcha de alguns pacientes esquizofrênicos é marcadamente bizarra, com maneirismos e
estereotipias motoras variadas. Quando estão usando neurolépticos tradicionais, alguns pacientes
psicóticos apresentam distonias de tronco ou membros, revelando marcha bizarra pelo componente
distônico de sua postura. Alguns pacientes gravemente deprimidos apresentam marcha lentificada e
difícil.
O padrão de marcha do paciente psiquiátrico deve ser comparado, a título de diagnóstico
diferencial, com os principais padrões de marchas alteradas das doenças neurológicas.

Hiperventilação psicogênica
Nesse tipo a respiração se acelera, fica quase imperceptível e é marcada por suspiros não
obstrutivos. Ocorre associada à ansiedade ou à situação estressante. Observa-se esse problema em
portadores de transtornos de pânico, em pacientes histéricos e, de modo geral, em indivíduos muito
ansiosos. [...]

Apragmatismo (ou hipopragmatismo)


Caracteriza a dificuldade ou incapacidade de realizar condutas volitivas e psicomotoras
minimamente complexas, como cuidar da higiene pessoal, limpar o quarto, participar de trabalhos
domésticos, envolver-se em qualquer tipo de atividade produtiva para si ou para seu meio. O
apragmatismo resulta de alteração básica das esferas volitivas e afetivas (está geralmente associada
à hipobulia, apatia e desorganização psíquica geral), não havendo incapacidade neuropsicológica de
realizar os atos motores complexos. Não deve, portanto, ser confundido com a apraxia (perda da
atividade gestual complexa por lesão neuronal). O hipopragmatismo é uma alteração frequente em
pacientes psicóticos crônicos, representando um desafio à reabilitação. No caso de alguns pacientes
esquizofrênicos crônicos e graves, já ao cumprimenta-los, nota-se que seu aperto de mão é
‘sintomático’, pois não apertam propriamente a mão do outro, tocam-na apenas com a ponta dos
dedos (mão ateleiótica, de atelès, no grego; sem fim, inacabado, imperfeito).

Negativismo (vide página 88)

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


96

ALTERAÇÕES DA LINGUAGEM112

A linguagem, particularmente na sua forma verbal, é uma atividade


especificamente humana, talvez a mais característica de nossas atividades
mentais. É o principal instrumento de comunicação dos seres humanos. Além
disso, é fundamental na elaboração e na expressão do pensamento. Alterações da
linguagem, embora de definição e delimitação difíceis, sempre foram de grande
interesse para a psicopatologia. [...]
Especificamente em relação à língua, é preciso diferenciar ainda três elementos essenciais de
qualquer língua ou idioma: o fonético, que se refere aos sons, aos elementos materiais da fala; o
semântico, relacionado à significação dos vocábulos utilizados em determinada língua, e o
sintático, que diz respeito à relação e à articulação lógica das diversas palavras.
Além disso, é possível descrever as seguintes funções da linguagem:
1. A função comunicativa, que garante a socialização do indivíduo.
2. A linguagem como suporte do pensamento, particularmente de sua forma evoluída, como
pensamento lógico e abstrato.
3. A linguagem como instrumento de expressão dos estados emocionais, das vivências
internas, subjetivas.
4. A linguagem como afirmação do eu e de instituição das oposições eu/mundo, eu/tu,
eu/outros.
5. A linguagem na sua dimensão artística e/ou lúdica, como elaboração e expressão do belo,
do dramático, do sublime ou do terrível, isto é, a linguagem como poesia, como literatura.
[...]
A linguagem é ainda um sistema de signos arbitrários, o signo linguístico, as palavras. Esses signos
ganham seus significados específicos por meio de um sistema de convenções historicamente dado.
A linguagem é, portanto, uma criação social de cada um e de todos os grupos humanos.

Linguagem e pensamento estão intimamente relacionados, não podendo ser facilmente separados,
mas são dois fenômenos distintos. Podem ocorrer perturbações de pensamento não associadas a
perturbações da fala, e vice-versa. Podem existir pensamentos sem linguagem, como nos devaneios;
assim como palavras não associadas a pensamentos, como frases sem sentido usadas puramente
para a interação social – por exemplo, ‘olá!’, ‘tudo bem?’
O estudo da linguagem tem como objeto as palavras, enquanto o estudo do pensamento se refere às
ideias. A linguagem molda o pensamento e é fundamental para a sua elaboração e expressão. Só
com a aquisição da linguagem, e a consequente utilização de conceitos, é que se desenvolve na
criança o pensamento abstrato.
Além do componente cognitivo, a linguagem possui ainda um componente afetivo, que a prosódia.
Esta é constituída pela musicalidade, entonação e inflexões da fala, além da gesticulação.

Não faz parte da psicopatologia o estudo dos distúrbios restritos ao aparelho fonador, isto é, as
perturbações no processo mecânico da fala. Estas não interferem na compreensão da linguagem e,
principalmente, podem ocorrer na ausência de um transtorno mental. Assim, não estudaremos as

112
Este tópico foi elaborado a partir de recortes e adaptações dos seguintes autores: CHENIAUX, 2013, p.72-81;
DALGALARRONDO, 2008, p. 232-44; PAIM, 1993, p. 259-74.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
97

disartrias (dificuldade mais ou menos geral na articulação da palavras, prejudicando especialmente


a pronúncia de consoantes), as dislalias (deformação, omissão ou substituição restrita a
determinadas consoantes), as disfemias (como a tartamudez ou gagueira) e as disfonias
(perturbação da voz, atingindo principalmente as vogais).
Por outro lado, a distinção entre distúrbios orgânicos e distúrbios psíquicos (ou funcionais) da fala,
encontrada em diversos textos de psicopatologia, é bastante criticável, por basear-se na presunção
da existência de uma separação mente-corpo.

O exame da linguagem
A expressão oral e a compreensão auditivo-verbal são avaliadas de forma informal durante toda a
entrevista. Todavia, alguns testes podem ser necessários, [...].
- A compreensão pode ser avaliada através de ordens transmitidas oralmente ao paciente, como
‘Toque sua orelha direita com sua mão esquerda.’; perguntas simples, como ‘Os bairros são maiores
do que as cidades?’; ou ordens por escrito, como ‘Feche os olhos’.
- Capacidade de nomeação: mostra-se ao paciente uma caneta e um relógio, por exemplo, e pede-
se que diga como se chamam esses objetos. Ou então pede-se que ele, em um minuto, cite todos os
nomes de animais que puder.
- Capacidade de repetição: pede-se ao paciente que repita frases como ‘Nem aqui, nem ali, nem
lá.’, ou “Sem quês, nem mas, nem porquês.’
- Expressão: solicita-se ao paciente que escreva uma frase (com sujeito, verbo e objeto).

Afasias e disfasias
Os termos afasia e disfasias são, com frequência,
usados de forma intercambiáveis, todavia, mais
precisamente, o primeiro se refere a uma perda, e o
segundo, a um prejuízo ou dificuldade quanto à
linguagem.
As afasias são distúrbios adquiridos da capacidade
linguística – na compreensão ou expressão -, sem que
haja um déficit auditivo ou incapacidade motora do
órgão fonador. Estão relacionadas a lesões corticais –
causadas principalmente por distúrbios vasculares,
tumores e processos degenerativos, como a doença de
Alzheimer.
As afasias podem ser classificadas como: motora
(expressiva, ou de Broca), sensorial (receptiva, ou de
Wernicke), de condução, global, transcortical e anômica (semântica, amnéstica).

Afasia motora
Constitui uma apraxia verbal. Os pacientes conseguem utilizar os músculos fonadores para outros
fins que não a fala.
Trata-se de uma forma de afasia não fluente. O discurso, emitido com grande dificuldade,
caracteriza-se por frases curtas ou simplesmente fragmentos de palavras, e pela perda da estrutura
gramatical (agramatismo: ausência de artigos, preposições, conjunções, advérbios de lugar e
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
98

verbos auxiliares). Além disso, os pacientes cometem erros parafásicos 113 literais, e há perda da
prosódia. A compreensão da linguagem, assim com a capacidade de nomeação, está preservada,
mas a capacidade de repetição (do que o examinador fala) está comprometida.
A afasia motora está relacionada a lesões na região posteroinferior do lobo frontal esquerdo (área de
Broca).

Afasia sensorial
Corresponde a uma agnosia verbal. Há perda da capacidade de compreender a linguagem, e a
audição, por definição, não está prejudicada. É uma afasia fluente, mas o paciente tem dificuldades
em compreender a própria fala. As palavras são pronunciadas de forma defeituosa – há parafasias
literais e semânticas – e a sintaxe pode estar bastante alterada (paragramatismo). As capacidades
de repetição e de nomeação também estão comprometidas.
Na afasia sensorial, há lesão na região posterosuperior do lobo temporal esquerdo (área de
Wernicke).

Afasia da condução
Nessa forma de afasia há fluência, a compreensão é normal, mas a capacidade de repetição e a de
nomeação estão comprometidas. Esse tipo de afasia está relacionado a lesões no fascículo arqueado,
que conecta a área de Wernick com a de Broca.

Afasia global
Esta afasia está relacionada a lesões das áreas de Broca e de Wernick – a expressão, a compreensão
e a repetição estão comprometidas.

Afasia transcortical
A principal característica dessa afasia é a preservação da capacidade de repetição. Trata-se de uma
afasia não fluente, podendo estar a capacidade de compreensão comprometida ou não.

Afasia anômica
Nesse tipo de afasia há dificuldade de nomear objetos. A expressão, a compreensão e a repetição
são normais.

Agrafia
Caracteriza-se pela incapacidade isolada para escrever. Pode também estar associada às afasias.

Alexia
Nesse tipo, perde-se a capacidade para a leitura. Pode ocorrer isoladamente ou associada às afasias
e às agrafias.

Aprosódia (hipoprosódia)
Na aprosódia ou na hipoprosódia há, respectivamente, perda ou diminuição da modulação afetiva da
fala, que se torna monocórdica, monótona. Pode haver também perda (ou diminuição) da

113
Vide parafasias – pág. 101 desta apostila.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
99

capacidade de compreender a prosódia da fala das outras pessoas. Esse distúrbio relaciona-se a
lesões no hemisfério direito.

Hiperprosódia
Caracteriza-se por uma acentuação da inflexão verbal; uma fala enfática, loquaz. Ocorre na mania.

Mutismo
Significa ausência da fala. Pode expressar negativismo (silencia deliberado) ou inibição psíquica
(no estupor esquizofrênico, depressivo, histérico ou do delirium).

Logorreia (ou verborreia, ou verborragia)


Refere-se a uma expressão verbal aumentada. O paciente fala o tempo todo e é difícil interrompê-lo.
Ela é observada tipicamente nos estados maníacos.

Oligolalia (ou laconismo)


Refere-se a uma expressão verbal diminuída, mas não abolida. Consiste no oposto da logorreia. É
observada nas mesmas situações em que o mutismo pode ocorrer.

Hiperfonia
Representa uma elevação do volume da voz, isto é, falar excessivamente alto.

Hipofonia
Representa uma redução do volume da voz, isto é, falar excessivamente baixo, o que às vezes torna
impossível entender o que se está dizendo.

Taquilalia (ou taquifasia) e bradilalia (ou bradifasia)


Referem-se respectivamente, a um aumento e a uma diminuição da velocidade da expressão verbal.
Correspondem às alterações do curso do pensamento.

Latência da resposta
Refere-se ao tempo que o paciente demora para responder às perguntas do examinador, podendo
estar aumentada ou diminuída. O aumento pode expressar uma inibição psíquica (como na
depressão), negativismo ou suspicácia (suspeita). A diminuição pode estar relacionada a uma
síndrome maníaca ou a ansiedade.

Ecolalia
Consiste na repetição, como um eco, da últimas ou últimas palavras faladas pelo entrevistador (ou
outra pessoa do ambiente), dirigidas ou não ao paciente. Corresponde, na linguagem, ao que são a
ecomimia e a ecopraxia na psicomotricidade. Ocorre na síndrome catatônica, no autismo114 e na
demência. Por exemplo, o examinador pergunta ‘qual é o seu nome?’, e o paciente responde ‘qual é
o seu nome?’

114
Vide página 202.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
100

Palilalia
Consiste na repetição involuntária da última ou últimas palavras que o próprio paciente falou.
Ocorre na demência. Por exemplo, o examinador pergunta ‘qual o seu nome?’, e o paciente
responde ‘eu me chamo João...João’.

Logoclonia
Este tipo é semelhante à palilalia, só que a repetição é apenas das últimas silabas. É encontrada
tipicamente na demência. Por exemplo, o examinador pergunta ‘qual é o seu nome?’, e o paciente
responde ‘eu me chamo João...ão’.

Estereotipia verbal (ou Verbigeração)


Consiste numa repetição monótona, inadequada e sem sentido comunicativo de palavras ou frases.
Ocorre na síndrome catatônica e na demência.
Um paciente ficava o dia inteiro gritando ‘É uma coisa! É uma coisa!’. Não pronunciava
praticamente nenhuma outra palavra.

Mussitação
Nesse tipo o paciente fala com uma voz sussurrada, em volume muito baixo e tom monótono, quase
sem mover os lábios; fala para si próprio, e de forma incompreensível. Esse distúrbio ocorre na
esquizofrenia.

Neologismos
Consiste em palavras novas, criadas pelos pacientes, ou palavras já existentes às quais é atribuído
um novo significado. Podem ser resultado de uma fusão de conceitos, ou consistir numa tentativa de
expressar vivências extraordinárias que o vocabulário comum não conseguiria expressar. São
encontrados principalmente na esquizofrenia. [...]
Paim (1998) refere-se a um paciente cujo discurso era repleto de neologismos:
‘Não é solteiro nem casado, é ‘sindorá’; seu pai não está vivo, é ‘simprizatos’; e sua mãe chama-se
Maria do ‘Silenciale’. [...]

Jargonofasia (ou salada de palavras, ou esquizofasia, ou confusão de linguagem)


Representa uma completa desorganização da linguagem, cuja sintaxe se torna inteiramente
incoerente. Palavras reconhecíveis, em geral articuladas corretamente, são emitidas numa ordem
caótica e ilógica, podendo ainda ser misturadas com neologismos, o que torna o discurso sem
qualquer sentido, ininteligível. Ocorre na esquizofrenia e na afasia sensorial. O discurso de um
paciente, recolhido por Pio Abreu (1997), exemplifica a jargonofasia:
‘Alviela de seporte antantá da cédula de emigração delitianos de poupador de alter cor de várias
entidades oficiais tite as insígnias desmercocoloie de bat anglo bater dulpagi de armas glomirais
de briquet dos regimentos de Lisboa.’

Parafasias
Referem-se à deformação ou troca de palavras, podendo ser literais ou verbais. A parafasia literal
(ou fonêmica) caracteriza-se pela substituição de uma palavra por outra de som semelhante, como
faca por vaca, cadeira por cameila. Ocorre nas afasias motora e sensorial. A parafasia verbal (ou
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
101

semântica), por sua vez, é caracterizada pela substituição de uma palavra por outra semanticamente
relacionada, como faca por garfo. Ocorre na afasia sensorial.

Solilóquio
Refere-se ao comportamento de falar sozinho. É uma manifestação indicativa de alucinação
auditiva, mas pode ocorrer também em pessoas normais.

Coprolalia
Neste tipo o discurso é caracterizado pela presença de palavras obscenas, vulgares ou relativas a
excrementos. Quando se constitui num tique verbal, é uma manifestação típica da síndrome de
Tourette.

Glossolalia
O indivíduo expressa-se como se falando em outra língua. Ele produz sons ininteligíveis, mantendo
os aspectos prosódicos da fala normal.

Maneirismos
Nesse tipo a fala torna-se pouco natural, afetada, seja quanto à escolha das palavras (rebuscamento,
uso de palavras difíceis, formalismo exagerado, assim como o uso excessivo de diminutivos, gírias
ou jargões), à pronúncia, ao sotaque ou à inflexão verbal (disprosódia ou paraprosódia115).
Quando um indivíduo refere-se a si mesmo na terceira pessoa, isso representa um maneirismo. Com
frequência o ex-jogador de futebol Pelé conta episódios de sua carreira sem usar o pronome eu,
preferindo usar a expressão o Pelé. [...]

Pedolalia
O paciente fala com uma voz infantilizada.

Pararrespostas
São respostas totalmente disparatadas em relação às perguntas. Por exemplo: ‘Qual o seu nome?’ –
Resposta: ‘Acho que vai chover’. São encontradas na esquizofrenia e na demência.

Respostas aproximadas
[...] O paciente, embora compreenda perfeitamente a pergunta e conheça a resposta correta,
deliberadamente dá uma resposta errada, mas que está relacionada à pergunta. Por exemplo:
‘Quantas patas tem um cachorro?’ – Resposta: ‘Cinco’; ou então: ‘Quantos são 3 X 3’? – Resposta:
‘Dez’.
Respostas aproximadas ocorrem num quadro de pseudodemência (dissociativa) conhecido como
síndrome de Ganser [...].

115
Disprosódia ou paraprosódia - Distúrbio da fala em que há maior demora na silabação das palavras, e anomalia em
sua entonação, ritmo e altura.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
102

ALTERAÇÕES DA MEMÓRIA116

A memória é a capacidade de registrar, manter e evocar as experiências e os


fatos já ocorridos. A capacidade de memorizar relaciona-se intimamente
com o nível de consciência, com a atenção e com o interesse afetivo.
Tudo o que uma pessoa aprende [e conhece – cognição] em sua vida
depende intimamente da capacidade de memorização.

O processo de memorização possui três etapas principais: fixação (ou engramação), conservação
(ou retenção) e evocação.
Do ponto de vista psicológico, a engramação depende de:
- Nível de consciência e estado geral do organismo (o indivíduo deve estar desperto, não muito
cansado, bem-nutrido, calmo, etc);
- Atenção global e capacidade de manutenção de atenção concentrada sobre o conteúdo a ser fixado
(capacidade do indivíduo concentrar-se);
- Sensopercepção preservada;
- Interesse e colorido emocional relacionado ao conteúdo mnêmico a ser fixado, assim como do
empenho do indivíduo em aprender (vontade e afetividade);
- Conhecimento anterior (elementos já conhecidos ajudam a adquirir elementos novos);
- Capacidade de compreensão do conteúdo fixado;
- Organização temporal das repetições (distribuição harmônica e ritmada no tempo auxilia na
fixação de novos elementos);
- Canais sensoperceptivos envolvidos na percepção, já que, quanto maior o número de canais
sensoriais, mais eficaz a fixação (p.ex., o método audiovisual de ensino de línguas).

A conservação dos elementos mnêmicos depende de:


- Repetição (pois, de modo geral, quanto mais se repete um conteúdo, mais facilmente este se
conserva);
- Associação com outros elementos (cadeia de elementos mnêmicos);

A evocação é a capacidade de recuperar e atualizar os dados fixados. Esquecimento, por sua vez, é
a denominação que se dá à impossibilidade de evocar e recordar. O reconhecimento é a capacidade
de identificar o conteúdo mnêmico como lembrança e diferenciá-la da imaginação e de
representações atuais.
Em relação ao processo temporal de aquisição e evocação de elementos mnêmicos, a
neuropsicologia moderna divide a memória em três fases ou tipos [...]:
1. Memória imediata ou de curtíssimo prazo (de poucos segundos até 1 a 3 minutos)
Este tipo de memória confunde-se com a atenção e com a memória de trabalho117, pois é a
capacidade de reter o material (palavras, números, imagens, etc) imediatamente após ser percebida.

116
Este item foi redigido a partir de recortes de CHENIAUX, 2013, p.54-71; DALGALARRONDO, 2008, p. 137-54;
PAIM, 1993, p. 141-60.
117
Memória de trabalho – [...] é, na verdade, a combinação de habilidades de atenção (capacidade de prestar atenção e
de concentração) e da memória imediata. São exemplos de memória de trabalho ouvir um número telefônico, retê-lo na
mente, para, em seguida, discar, assim como, quando ao dirigir em uma cidade desconhecida, perguntar sobre um
endereço, receber a informação e a sugestão do trajeto e, mentalmente, executar o itinerário de forma progressiva. [...]
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
103

A memória imediata tem capacidade limitada e depende


da concentração, da fatigabilidade e de certo treino. As
memórias imediatas e de trabalho dependem sobretudo
da integridade das áreas pré-frontais.
2. Memória recente ou de curto prazo (de poucos
minutos até 3 a 6 horas)
Refere-se à capacidade de reter a informação por curto
período. Também é um tipo de memória de capacidade
limitada. A memória recente depende de estruturas
cerebrais das partes mediais dos lobos temporais, como a
região CA1 do hipocampo, do córtex entorrinal, assim
como do córtex parietal posterior. [...]
3. Memória remota ou de longo prazo (de meses até
muitos anos)
É a capacidade de evocação de informações e acontecimentos ocorridos no passado, geralmente
após muito tempo do evento (pode durar por toda a vida). É um tipo de memória de capacidade bem
mais ampla que a imediata e a recente. Acredita-se que a memória remota relaciona-se tanto ao
hipocampo (no processo de transferência de memórias recentes para remotas) como as amplas e
difusas áreas corticais, principalmente frontais, incluindo todos os outros lobos cerebrais, sobretudo
em suas áreas corticais de associação.
O termo priming diz respeito a um fenômeno normal e importante do processo de recordação e
evocação. Fragmentos de um conteúdo mnêmico amplo são evocados e, a partir deles, todo o resto é
gradativamente recuperado. Assim, um músico toca ou ouve os primeiros dois ou três acordes de
uma canção aparentemente esquecida, e, de forma gradativa, a canção toda (e sua sequência de
acordes e melodias) começa a surgir para o sujeito. O priming pode ser traduzido como dicas
evocadoras de lembranças mais amplas. Ele sugere que a lembrança de alguns fragmentos da
memória e conjuntos mnêmicos maiores seriam armazenados de forma parcialmente independentes.
O priming é um fenômeno predominantemente neocortical, participando dele as áreas pré-frontais e
corticais associativas temporoparietooccipitais.
O esquecimento (o oposto da evocação) se dá por três vias:
1. O esquecimento normal, fisiológico: ou por desinteresse do indivíduo ou por desuso.
2. O esquecimento por repressão: quando se trata de conteúdo desagradável ou pouco importante para
o indivíduo, podendo, no entanto, o sujeito, por esforço próprio, voltar a recordar certos conteúdos
reprimidos (que ficam estocados nos pré-consciente).
3. Esquecimento por recalque: certos conteúdos mnêmicos, devido ao fato de serem emocionalmente
insuportáveis, são banidos da consciência, podendo ser recuperados apenas em circunstâncias
especiais (ficam estocados no inconsciente).

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


104

ALTERAÇÕES PATOLÓGICAS DA MEMÓRIA

Hipermnésias
As representações (elementos mnêmicos) afluem rapidamente, em tropel, ganhando em número,
perdendo, porém, em clareza e precisão. [...] A hipermnésia traduz mais a aceleração geral do ritmo
psíquico que um alteração propriamente da memória.

Amnésia (ou hipomnésia)


Denomina-se amnésia, de forma genérica, a perda da memória, seja a da capacidade de fixar ou a da
capacidade de manter e evocar antigos conteúdos mnêmicos. Diferenciam-se os seguintes tipos de
amnésias:
1. Amnésia psicogênica. Nesse tipo há perda de elementos mnêmicos focais, os quais têm valor
psicológico específico (simbólico e afetivo). O indivíduo esquece, por exemplo, um evento
de sua vida (que teve um significado especial para ele), mas consegue lembrar de tudo que
ocorreu ao seu ‘redor’. Tal amnésia pode ser superada por um estado hipnótico (na hipnose,
o indivíduo consegue lembrar do que, estado de consciência, não recorda).
2. Amnésia orgânica. Trata-se de amnésia menos seletiva (em relação ao conteúdo do material
esquecido) que a psicogênica. Em geral, perde-se primeiramente a capacidade de fixação
(memórias imediatas e recentes); em estados avançados da doença, o indivíduo começa a
perder conteúdos antigos. [...]

Amnésia anterógrada e retrógrada


Na amnésia anterógrada, o indivíduo não consegue mais fixar elementos mnêmicos a partir do
evento que lhe causou o dano cerebral. Por exemplo, o indivíduo não lembra do que ocorreu nas
semanas (ou meses) depois de um trauma cranioencefálico. Esse tipo de amnésia é um distúrbio-
chave e bastante frequente na maior parte dos distúrbios neurocognitivos. Já na amnésia
retrógrada, o indivíduo perde a memória para fatos ocorridos antes do início da doença (ou
trauma). Sua ocorrência sem amnésia anterógrada pode ser observada em quadros dissociativos
(psicogênicos), como a amnésia dissociativa e a fuga dissociativa. [...]
De um modo geral, é comum, após trauma cranioencefálico, a ocorrência de amnésias
retroanterógradas (ou total), ou seja, déficits de fixação para o que ocorreu dias, semanas ou
meses antes e depois do evento. A amnésia pode ainda ser transitória (ou breve) e lacunar
(relacionada a determinados períodos de tempo). Os casos mais típicos e mais de amnésia
transitória observa-se na convalescença de enfermidades infecciosas graves (por exemplo,
meningites) e de amnésia lacunar nos casos de traumatismos cranioencefálicos.

Alomnésia (ou ilusão mnêmica ou ilusão de memória)


É uma alteração análoga à que ocorre na sensopercepção. Aqui as recordações de um evento real
são deturpadas, distorcidas pelo indivíduo de forma involuntária.
Ocorre no delirium, na demência, no transtorno amnéstico e nos estados crepusculares, associada a
alterações quantitativas da memória; na mania e na melancolia118, por influência do afeto

118
A melancolia representa uma das formas da psicose. “A depressão melancólica é um diagnóstico psiquiátrico de
história de vida, geralmente com episódios recorrentes. Melancolia é uma síndrome com longa duração e características
específicas de psicopatologia, insuficientemente diferenciada de depressão maior por um especificador no DSM-5 e
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
105

dominante; e, ainda, na esquizofrenia e no transtorno delirante, com expressão do conteúdo dos


delírios.

Paramnésia (ou alucinação de memória)


Trata-se de recordação de algo que de fato não ocorreu, de uma falsa lembrança, embora para o
paciente ela seja verdadeira.
Pode ocorrer na esquizofrenia, em virtude da atividade delirante.

A fabulação (ou confabulação) seria um tipo especial de paramnésia. Fabulação é um termo em


geral utilizado para designar as alucinações de memória que ocorrem em quadros amnésticos de
origem orgânica, como no transtorno amnéstico, na demência e no delirium.

Déjà vu e Jamais vu
No déjà vu (já visto), o indivíduo tem uma sensação de familiaridade diante de uma situação (ou
objeto) inteiramente nova, como se ele já a houvesse vivenciado anteriormente. É muito comum,
quando vamos a um lugar pela primeira vez, a sensação de que estivemos lá. No jamais vu (nunca
visto) ocorre o oposto: há uma ausência da sensação de familiaridade diante de uma situação já
vivenciada um ou mais vezes no passado. Um exemplo seria o de não ser capaz de reconhecer a
mãe, o pai ou um amigo íntimo. [...] O dèjá vu e o jamais vu podem ocorrer na epilepsia do lobo
temporal, na esquizofrenia, em síndromes de ansiedade em pessoas normais.

Criptomnésia
Termo criado por Freud. Consiste numa falha relativa ao reconhecimento como pretérito.
Recordações voltam à mente do indivíduo, mas não são reconhecidas como tais, parecendo a ele
ideias novas, criações originais suas. É o mecanismo dos casos de plágio involuntário. O próprio
Freud reconheceu que havia, inconscientemente, tomado para si a autoria de uma hipótese
psicanalítica, relativa à bissexualidade humana, que seu então amigo Fliess lhe comunicara algum
tempo antes.

Ecmnésia
[...] representa também um distúrbio quanto ao reconhecimento como pretérito. Trata-se de uma
presentificação do passado: a recordação é tão intensa, quase alucinatória, que o paciente se
comporta como se o evento pretérito estivesse ocorrendo naquele momento, como se ele estivesse
vivendo em uma época anterior de sua vida.
Ocorre em estados crepusculares histéricos e epilépticos, em estados de obnubilação oniróide (como
no delirium ocupacional), na intoxicação por alucinógenos e na demência.
Um exemplo de ecmnésia, de natureza dissociativa, foi o de uma senhora de mais de 60 anos que,
após a morte súbita do marido, passou a agir como criança, brincava o dia inteiro e ficava
chamando pelos pais, falecidos havia muito tempo.

parcialmente descrito nos critérios da Classificação Internacional de Doenças-10ª Edição. Dentro da classificação atual,
é frequentemente vista em pacientes gravemente doentes com depressão e transtorno bipolar. No entanto, a melancolia
possui uma homogeneidade psicopatológica e biológica distinta na experiência clínica e nos marcadores de testes
laboratoriais, e é diferencialmente sensível às intervenções terapêuticas específicas.” (adaptado de JURUENA, et al.,
Rev. Bras. Psiq., vol. 33, mai/2011.)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
106

Transtornos de Ansiedade: A ansiedade normal e patológica

Ansiedade normal
A ansiedade é uma reação em geral normal do ser humano. É um sentimento que acompanha
mudanças na vida da pessoa; separação da criança dos pais ao ir para escola, rompimento de
relacionamentos, espectativa para fazer provas ou testes, e assim por diante.
A ansiedade é um sintoma primariamente psíquico, ou seja, a pessoa se sente ansiosa e conta isso
aos outros, por exemplo, mas há uma série de sinais que acompanham a sensação mental que
incluem: tontura, diarréia, pressão alta, palpitação, tremor, sudorese excessiva, etc. As reações
variam de indivíduo a outro.
Assim ela se divide em dois aspectos:
1) sua percepção de alterações fisiológicas (como sudorese e palpitação)
2) a consciência de estar nervoso ou amedrontado.
A ansiedade tem como função adaptativa básica o alerta a perigos internos (dor) ou externos
(ameaça de lesão corporal). Desta maneira, pode vir acompanhada de medo (medo de morrer frente
à um assalto), e visa a preparar o indivíduo para reações imediatas ou evitar tais ameaças, ou pelo
menos atenuar os seus danos.
“Estresse” geralmente depende do estímulo e do indivíduo que recebe o estímulo. Assim, um
desbalanço entre o interno (capacidade de a pessoa manter-se calma, estruturação psicológica, e
assim por diante) e o externo (sobrecarga emocional e/ou física) gera o estresse.

Ansiedade patológica
A ansiedade passa a ser patológica na medida em que ela aparece sem que haja um estímulo, ou
seja, na medida em que a pessoa fique ansiosa sem ter um motivo aparente. Palpitações, sudorese,
“aperto no peito” surgem com uma frequência razoável sem que haja uma causa imediata que possa
ser identificada por ele.
Outro critério que geralmente é usado é quando a reação ansiosa é desproporcional ao estímulo.
Reações muito drásticas a estímulos que normalmente teriam de desencadear respostas menores por
parte do indivíduo.
As causas são as mais variadas; as teorias psicológicas falam e repressão de desejos (Freud), de
condicionamento de respostas ansiosas (teorias comportamentais) e de vazios existenciais (teorias
existenciais).
As teorias biológicas falam em hiper-excitação do sistema nervoso autônomo (aquele que é
responsável por respostas como taquicardia, dor de cabeça e aceleração da respiração, por exemplo)
e desequilíbrio de hormônios como a serotonina e a noradrenalina, além de fatores genéticos que
contribuem para isso.
(http://www.psiq.med.br/index.php?opcao=ver_tema&id_tema=19&id_cat=3)

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


107

Transtornos de Ansiedade
Agorafobia
CID-10 DSM-5
Grupo relativamente bem definido de fobias A característica essencial da agorafobia é o
relativas ao medo de deixar seu domicílio, medo ou ansiedade acentuado ou intenso
medo de lojas, de multidões e de locais desencadeado pela exposição real ou prevista a
públicos, ou medo de viajar sozinho em trem, diversas situações [...]. O diagnóstico requer que
ônibus ou avião. A presença de um transtorno os sintomas ocorram em pelo menos duas das
de pânico é frequente no curso dos episódios cinco situações seguintes:
atuais ou anteriores de agorafobia. Entre as 1) uso de transporte público, como automóveis,
características associadas, acham-se ônibus, trens, navios ou aviões;
frequentemente sintomas depressivos ou 2) permanecer em espaços abertos, como áreas
obsessivos, assim como fobias sociais. de estacionamento, mercados ou pontes;
3) permanecer em locais fechados, como lojas,
As condutas de evitação comumente são teatros ou cinemas;
proeminentes na sintomatologia e certos 4) permanecer em uma fila ou ficar em meio a
agorafóbicos manifestam pouca ansiedade uma multidão; ou
dado que chegam a evitar as situações 5) sair de casa sozinho.
geradoras de fobia. Os exemplos de cada situação não são
exaustivos; outras situações podem ser temidas.
Quando experimentam medo e ansiedade
acionada por essas situações, os indivíduos
geralmente experimentam pensamentos de que
algo terrível possa acontecer [...]. Acreditam
com frequência que escapar dessas situações
poderia ser difícil (p. ex., “não consigo sair
daqui”) ou que o auxílio pode não estar
disponível (p. ex., “não há ninguém para me
ajudar”) quando ocorrem sintomas do tipo
pânico ou outros sintomas incapacitantes ou
constrangedores. “Sintomas do tipo pânico” se
referem a algum dos 13 sintomas inclusos nos
critérios para ataque de pânico, como tontura,
desmaio e medo de morrer. “Outros sintomas
incapacitantes ou constrangedores” incluem
sintomas como vomitar e sintomas inflamatórios
intestinais, bem como, em adultos mais velhos,
medo de cair ou, em crianças, uma sensação de
desorientação e de estar perdido.
A quantidade de medo experimentada pode
variar com a proximidade da situação temida e
pode ocorrer em antecipação ou na presença real
da situação agorafóbica. Além disso, o medo ou
ansiedade pode assumir a forma de um ataque
de pânico com sintomas completos ou sintomas
limitados (i.e., um ataque de pânico esperado).
O medo ou ansiedade é evocado quase todas as
vezes em que o indivíduo entra em contato com
a situação temida [...]. Assim, alguém que fica
ansioso apenas ocasionalmente em uma situação

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


108

agorafóbica (p. ex., fica ansioso quando


permanece em uma fila ou em apenas uma a
cada cinco ocasiões) não seria diagnosticado
com agorafobia. O indivíduo evita ativamente a
situação, ou, se não consegue ou decide não
evitá-la, a situação evoca medo ou ansiedade
intenso [...]. Esquiva ativa significa que o
indivíduo está, no momento, comportando-se de
formas intencionalmente concebidas para
prevenir ou minimizar o contato com situações
agorafóbicas. A esquiva pode ser
comportamental (p. ex., mudar as rotinas
diárias, escolher um emprego próximo para
evitar o uso de transporte público, organizar a
entrega de alimentos para evitar ter de entrar em
lojas e supermercados), bem como cognitiva por
natureza (p. ex., usando a distração para passar
por situações agorafóbicas). Pode tornar-se tão
grave a ponto de a pessoa ficar completamente
confinada à sua casa. Com frequência, um
indivíduo é mais capaz de enfrentar uma
situação temida quando acompanhado por
alguém como um parceiro, amigo ou
profissional da saúde.
O medo, ansiedade ou esquiva deve ser
desproporcional ao perigo real apresentado
pelas situações agorafóbicas e ao contexto
sociocultural [...]. A diferenciação de medos
agorafóbicos clinicamente significativos de
medos razoáveis (p. ex., sair de casa durante
uma forte tempestade) ou de situações que são
consideradas perigosas (p. ex., caminhar em
uma área de estacionamento ou usar o transporte
público em uma área de alta criminalidade) é
importante por inúmeras razões. Primeiramente,
o que constitui esquiva pode ser difícil de julgar
entre as culturas e nos contextos socioculturais
(p. ex., é culturalmente apropriado que as
mulheres muçulmanas ortodoxas em certas
partes do mundo evitem sair de casa sozinhas, e
assim essa esquiva não seria considerada
indicativa de agorafobia). Segundo, adultos
mais velhos provavelmente superestimam a
relação entre seus medos e as restrições
relacionadas à idade e, de modo semelhante,
podem não julgar seus medos como
desproporcionais ao risco real. Terceiro, os
indivíduos com agorafobia têm probabilidade de
superestimar o perigo em relação aos sintomas
do tipo pânico ou outros sintomas corporais. A
agorafobia deve ser diagnosticada somente se
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
109

persiste o medo, ansiedade ou esquiva [...] e se


ele causa sofrimento clinicamente significativo
ou prejuízo no funcionamento social,
profissional ou em outras áreas importantes da
vida do indivíduo [...]. A duração de “mais de
seis meses” significa excluir os indivíduos com
problemas transitórios de curta duração. No
entanto, o critério de duração deve ser usado
como um guia geral, com a possibilidade de
algum grau de flexibilidade.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Nas suas formas mais graves, a agorafobia pode
levar os indivíduos a ficar completamente
restritos à sua casa, incapazes de sair e
dependentes de outra pessoa para serviços ou
assistência até mesmo às suas necessidades
básicas. A desmoralização e os sintomas
depressivos, bem como o abuso de álcool e
medicamentos sedativos como estratégias
inadequadas de automedicação, são comuns.

Transtorno do pânico (ou Ansiedade Paroxística Episódica)


CID-10 DSM-5
A característica essencial deste transtorno são Transtorno de pânico se refere a ataques de
os ataques recorrentes de uma ansiedade grave pânico inesperados recorrentes [...]. Um ataque
(ataques de pânico), que não ocorrem de pânico é um surto abrupto de medo ou
exclusivamente numa situação ou em desconforto intenso que alcança um pico em
circunstâncias determinadas mas de fato são minutos e durante o qual ocorrem quatro ou
imprevisíveis. mais de uma lista de 13 sintomas físicos e
Como em outros transtornos ansiosos, os cognitivos. O termo recorrente significa
sintomas essenciais comportam a ocorrência literalmente mais de um ataque de pânico
brutal de palpitação e dores torácicas, inesperado. O termo inesperado se refere a um
sensações de asfixia, tonturas e sentimentos de ataque de pânico para o qual não existe um
irrealidade (despersonalização ou indício ou desencadeante óbvio no momento da
119
desrealização ). Existe, além disso, ocorrência – ou seja, o ataque parece vir do
frequentemente um medo secundário de nada, como quando o indivíduo está relaxando
morrer, de perder o autocontrole ou de ficar ou emergindo do sono (ataque de pânico
louco. noturno). Em contraste, os ataques de pânico
Não se deve fazer um diagnóstico principal de esperados são ataques para os quais existe um
transtorno de pânico quando o sujeito indício ou desencadeante óbvio, como uma
apresenta um transtorno depressivo no situação em que os ataques de pânico ocorrem
momento da ocorrência de um ataque de geralmente. A determinação de os ataques de
pânico, uma vez que os ataques de pânico são pânico serem esperados ou inesperados é feita
provavelmente secundários à depressão neste pelo clínico, que faz esse julgamento com base
caso. na combinação de um questionamento
cuidadoso quanto à sequência dos eventos que

119
Desrealização: Experiências de irrealidade ou distanciamento em relação ao ambiente ao redor (p. ex., indivíduos ou
objetos são vivenciados como irreais, oníricos, nebulosos, inertes ou visualmente distorcidos). DSM-5

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


110

precederam ou conduziram ao ataque e do


próprio julgamento do indivíduo do quanto o
ataque lhe pareceu ocorrer sem razão aparente.
As interpretações culturais podem influenciar a
designação do ataque de pânico como esperado
ou inesperado [...]. Nos Estados Unidos e na
Europa, aproximadamente metade dos
indivíduos com transtorno de pânico tem
ataques de pânico esperados tanto quanto
ataques inesperados. Assim, a presença de
ataques de pânico esperados não exclui o
diagnóstico de transtorno de pânico. [...]
A frequência e a gravidade dos ataques de
pânico variam de forma considerável. Em
termos de frequência, pode haver ataques
moderadamente frequentes (p. ex., um por
semana) durante meses, pequenos surtos de
ataques mais frequentes (p. ex., todos os dias)
separadas por semanas, meses sem ataques ou
ataques menos frequentes (p. ex., dois por mês)
durante muitos anos. As pessoas que têm
ataques de pânico infrequentes se parecem com
as pessoas com ataques de pânico mais
frequentes em termos de sintomas do ataque,
características demográficas, comorbidade com
outros transtornos, história familiar e dados
biológicos. Em termos de gravidade, os
indivíduos com transtorno de pânico podem ter
ataques com sintomas completos (quatro ou
mais sintomas) ou com sintomas limitados
(menos de quatro sintomas), e o número e o tipo
de sintomas do ataque de pânico frequentemente
diferem de um ataque de pânico para o seguinte.
No entanto, é necessário mais de um ataque de
pânico completo inesperado para o diagnóstico
de transtorno de pânico.
As preocupações acerca dos ataques de pânico
ou de suas consequências geralmente rela-
cionam-se a preocupações físicas, como a
preocupação de que os ataques de pânico
reflitam a presença de doenças ameaçadoras à
vida (p. ex., doença cardíaca, transtorno
convulsivo); preocupações pessoais, como
constrangimento ou medo de ser julgado
negativamente pelos outros devido aos sintomas
visíveis de pânico; e preocupações acerca do
funcionamento mental, como" "“enlouquecer”
ou perder o controle [...]. As mudanças
desadaptativas no comportamento representam
as tentativas de minimizar ou evitar os ataques
de pânico ou suas consequências. Os exemplos
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
111

incluem a esquiva de esforço físico,


reorganização da vida diária para garantir que
haja ajuda disponível no caso de um ataque de
pânico, restrição das atividades diárias habituais
e esquiva de situações agorafóbicas, como sair
de casa, usar transporte público ou fazer
compras. Se a agorafobia está presente, um
diagnóstico adicional de agorafobia é
estabelecido.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Um tipo de ataque de pânico inesperado é o
ataque de pânico noturno (i.e., acordar do sono
em um estado de pânico, que difere de entrar em
pânico depois de completamente acordado). Nos
Estados Unidos, foi estimado que esse tipo de
ataque de pânico ocorre pelo menos uma vez em
aproximadamente um quarto a um terço dos
indivíduos com transtorno de pânico, dos quais
a maioria também tem ataques de pânico
durante o dia. Além da preocupação acerca dos
ataques e de suas consequências, muitos
indivíduos com o transtorno relatam
sentimentos constantes ou intermitentes de
ansiedade que são mais amplamente
relacionados a preocupações com a saúde em
geral e com a saúde mental em específico. Por
exemplo, indivíduos com transtorno de pânico
com frequência preveem um resultado
catastrófico a partir de um sintoma físico leve
ou efeito colateral de medicamento (p. ex.,
pensar que pode ter um infarto agudo do
miocárdio ou que uma dor de cabeça significa a
presença de um tumor cerebral). Essas pessoas
em geral são relativamente intolerantes aos
efeitos colaterais de medicamentos. Além disso,
pode haver preocupações acerca da capacidade
de concluir as tarefas ou suportar os estressores
diários; pode haver uso excessivo de drogas (p.
ex., álcool, medicamentos de prescrição ou
drogas ilícitas) ou comportamentos extremos
que visam controlar os ataques de pânico (p. ex.,
restrições severas na ingestão de alimentos ou
evitação de alimentos ou medicamentos
específicos devido a preocupa- ções acerca dos
sintomas físicos que provocam ataques de
pânico).

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


112

Fobia específica
CID-10 DSM-5
Fobias limitadas a situações altamente Uma característica essencial desse transtorno é
específicas tais como a proximidade de que o medo ou ansiedade está circunscrito à
determinados animais [cinofobia], locais presença de uma situação ou objeto particular
elevados [acrofobia], trovões [brontofobia], [...], que pode ser denominado estímulo fóbico.
escuridão [nictofobia], viagens de avião As categorias das situações ou objetos temidos
[Ptesiofobia], espaços fechados [claustrofobia], são apresentadas como especificadores. Muitos
utilização de banheiros públicos indivíduos temem objetos ou situações de mais
[molismofobia], ingestão de determinados de uma categoria, ou estímulo fóbico. Para o
alimentos [sitiofobia], cuidados odontológicos, diagnóstico de fobia específica, a resposta deve
visão de sangue [hemo/hemafobia ou ser diferente dos medos normais transitórios que
hematofobia] ou ferimentos. Ainda que a comumente ocorrem na população. Para
situação desencadeante seja inofensiva, o satisfazer os critérios para um diagnóstico, o
contato com ela pode desencadear um estado medo ou ansiedade deve ser intenso ou grave
de pânico como na agorafobia ou fobia social. (i.e., “acentuado”) [...]. O grau do medo
experimentado pode variar com a proximidade
do objeto ou situação temida e pode ocorrer
com a antecipação da presença ou na presença
real do objeto ou situação. Além disso, o medo
ou ansiedade pode assumir a forma de um
ataque de pânico com sintomas completos ou
limitados (i.e., ataque de pânico esperado).
Outra característica das fobias específicas é que
o medo ou ansiedade é evocado quase todas as
vezes que o indivíduo entra em contato com o
estímulo fóbico [...]. Assim, um indivíduo que
fica ansioso apenas ocasionalmente ao ser
confrontado com a situação ou objeto (p. ex.,
fica ansioso apenas em um de cada cinco voos
que faz) não seria diagnosticado com fobia
específica. Entretanto, o grau de medo ou
ansiedade expresso pode variar (desde a
ansiedade antecipatória até um ataque de pânico
completo) nas diferentes ocasiões de encontro
com o objeto ou situação fóbica devido a vários
fatores contextuais, como a presença de outra
pessoa, a duração da exposição, e a outros
elementos ameaçadores, como turbulência em
um voo para indivíduos que têm medo de voar.
O medo e a ansiedade são com frequência
expressos de formas diferentes entre crianças e
adultos. Além disso, o medo ou ansiedade
ocorre tão logo o objeto ou situação fóbica é
encontrado (i.e., imediatamente, em vez de ser
retardado).
O indivíduo evita ativamente a situação, ou, se
não consegue ou decide não evitá-la, a situação
ou objeto evoca temor ou ansiedade intensos
[...]. Esquiva ativa significa que o indivíduo

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


113

intencionalmente se comporta de formas


destinadas a prevenir ou minimizar o contato
com objetos ou situações fóbicas (p. ex., pega
túneis em vez de pontes em sua ida diária para o
trabalho devido ao medo de alturas; evita entrar
em um quarto escuro pelo medo de aranhas;
evita aceitar um trabalho em um local em que
um estímulo fóbico é mais comum). Os
comportamentos de esquiva são com frequência
óbvios (p. ex., um indivíduo que tem medo de
sangue recusando-se a ir ao médico), mas às
vezes são menos óbvios (p. ex., um indivíduo
que tem medo de cobras recusando-se a olhar
para figuras que se assemelham ao contorno ou
à forma de cobras). Muitas pessoas com fobias
específicas sofreram durante muitos anos e
alteraram suas circunstâncias de vida com o
objetivo de evitar o objeto ou situação fóbica o
máximo possível (p. ex., uma pessoa
diagnosticada com fobia específica, animal, que
se muda a fim de residir em uma área
desprovida do animal temido em particular).
Consequentemente, elas não mais experimentam
medo ou ansiedade em sua vida diária. Em tais
circunstâncias, os comportamentos de esquiva
ou a recusa persistente de se engajar em
atividades que envolveriam exposição ao objeto
ou situação fóbica (p. ex., recusa repetida em
aceitar ofertas para viagens a trabalho devido ao
medo de voar) podem ser úteis para a
confirmação do diagnóstico na ausência de
ansiedade ou pânico explícito.
O medo ou ansiedade é desproporcional em
relação ao perigo real apresentado pelo objeto
ou situação ou mais intenso do que é
considerado necessário [...]. Embora os
indivíduos com fobia específica com frequência
reconheçam que suas reações são
desproporcionais, tendem a superestimar o
perigo nas situações temidas, e assim o
julgamento do caráter desproporcional é feito
pelo clínico. O contexto sociocultural do
indivíduo também deve ser levado em conta.
Por exemplo, o medo do escuro pode ser
razoável em um contexto de violência constante,
e o medo de insetos pode ser mais
desproporcional em contextos onde insetos são
consumidos na dieta. O medo, a ansiedade ou a
esquiva é persistente, geralmente durando mais
de seis meses [...], o que ajuda a distinguir o
transtorno de medos transitórios que são
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
114

comuns na população, em particular entre


crianças. No entanto, o critério de duração deve
ser usado como um guia geral, com a
possibilidade de algum grau de flexibilidade. A
fobia específica deve causar sofrimento
clinicamente significativo ou prejuízo no
funcionamento social, profissional ou em outras
áreas importantes da vida do indivíduo para que
o transtorno seja diagnosticado [...].
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Os indivíduos com fobia específica geralmente
experimentam aumento na excitabilidade
autonômica pela antecipação ou durante a
exposição a um objeto ou situação fóbica.
Entretanto, a resposta fisiológica à situação ou
ao objeto temidos varia. Enquanto os indivíduos
com fobias específicas situacionais, de ambiente
natural e de animais têm probabilidade de
apresentar excitabilidade aumentada do sistema
nervoso simpático, aqueles com fobia específica
a sangue-injeção-ferimentos frequentemente
demonstram uma resposta de desmaio ou quase
desmaio vasovagal120 que é marcada por breve
aceleração inicial do ritmo cardíaco e elevação
da pressão arterial seguida por desaceleração do
ritmo cardíaco e queda na pressão arterial. Os
modelos atuais dos sistemas neurais para fobia
específica enfatizam a amígdala e estruturas
relacionadas, assim como em outros transtornos
de ansiedade.

120
Vasovagal - Relativo aos vasos e ao nervo vago; síndrome caracterizada por mal-estar epigástrico e cardíaco,
sensação de constrição respiratória, até falsa angina de peito, palidez, extremidades frias, cefaléia, durante minutos.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
115

RELAÇÃO DAS PRINCIPAIS FORMAS DE FOBIAS

Ablutofobia — medo de tomar banho; Corofobia — medo de dançar;


Acarofobia — medo de ter a pele infestada por pequenos Coitofobia — medo ou aversão à sexo;
organismos (ácaros); Coniofobia — medo de poeira (amatofobia);
Acrofobia — medo de altura; Cromofobia ou cromatofobia — medo de cores;
Acusticofobia — medo relacionado aos ruídos de alta Cronofobia — medo do tempo;
intensidade; Cronomentrofobia — medo de relógios;
Aerodromofobia — medo de viagens aéreas; Claustrofobia — medo de espaços confinados ou lugares
Agliofobia — medo de sentir dor, sinônimo de algofobia; fechados ou seja, o oposto da agorafobia;
Afefobia — medo de ser tocado; Cleitrofobia ou cleisiofobia — medo de ficar trancado em
Agrafobia — medo de abuso sexual; lugares fechados;
Agrizoofobia — medo de animais selvagens; Cleptofobia — medo de ser roubado;
Agirofobia — medo de ruas ou cruzamento de ruas; Climacofobia — medo de degraus (subir ou cair de degraus);
Aicmofobia — medo de agulhas de injeção ou objetos Clinofobia — medo de ir para cama;
pontudos; Colpofobia — medo de órgãos genitais;
Ailurofobia — medo de gatos. Idem galeofobia ou gatofobia; Coimetrofobia — medo de cemitérios;
Aletrorofobia — medo de galinhas (ornitofobia); Contreltofobia — medo de abuso sexual;
Algofobia — medo de dor. Idem agliofobia; Coprofobia — medo de fezes;
Amaxofobia — medo mórbido de se encontrar ou viajar Coulrofobia — medo de palhaços;
dentro de qualquer veículo de transporte; Criofobia — medo de frio intenso, gelo ou congelamento;
Ambulofobia — medo de andar; Demonofobia — medo de demônios;
Amnesifobia — medo de perder a memória; Demofobia ou enoclofobia — medo de multidão
Androfobia — medo de homens; (agorafobia);
Antofobia — medo de flores; Dendrofobia — medo de árvores;
Antropofobia — medo de pessoas ou da sociedade; Dermatosiofobia, dermatofobia ou dermatopatofobia —
Anuptafobia — medo de ficar solteiro (a); medo de doenças de pele;
Apifobia — medo de abelhas; Dipsofobia — medo de beber;
Aracnefobia ou Aracnofobia — medo de aranhas; Disabiliofobia — medo de se vestir na frente de alguém;
Astenofobia — medo de desmaiar ou ter fraqueza; Dismorfofobia — medo de deformidade;
Astrofobia ou astrapofobia — medo de trovões e relâmpagos; Distiquifobia — medo de acidentes;
Ataxofobia — medo de desordem; Dorafobia — medo de pele de animais;
Autofobia — medo de si mesmo ou de ficar sozinho Dromofobia — medo de cruzar ruas.
(Monofobia, Isolofobia); Eisoptrofobia — medo de espelhos ou de se ver no espelho;
Bacilofobia ou Bacteriofobia — medo de bactérias Electrofobia — medo de eletricidade;
(Microbiofobia); Eleuterofobia — medo da liberdade;
Basofobia ou basifobia — medo de andar ou cair (inabilidade Elurofobia — medo de gatos (ailurofobia);
de ficar em pé); Emetofobia — medo de vomitar;
Batofobia — medo de profundidade; Enosiofobia ou enissofobia — medo de ter cometido um
Botanofobia — medo de plantas; pecado ou crítica imperdoável;
Batracofobia — medo de anfíbios (como sapos, salamandras, Entomofobia — medo de insetos;
rãs etc.); Epistaxiofobia — medo de sangrar do nariz;
Belonofobia — medo de alfinetes e agulhas (aiquimofobia); Epistemofobia — medo do conhecimento;
Brontofobia — medo de trovões e relâmpagos; Equinofobia — medo de cavalos;
Biofobia — medo da vida. Eremofobia — medo de ficar só;
Cacorrafiofobia — medo de fracasso ou falhar; Ergofobia — medo do trabalho;
Caetofobia — medo de pêlos; Eretofobia — medo mórbido de sentir dor durante relações
Cainofobia ou cainotofobia — medo de novidades; sexuais;
Catagelofobia — medo do ridículo (estar ou ser); Esciofobia ou esciafobia — medo de sombras
Catoptrofobia — medo de espelhos; Escolecifobia — medo de vermes;
Catsaridafobia — medo de baratas; Escopofobia ou escoptofobia — medo de estar sendo olhado;
Cimofobia — medo de ondas ou de movimentos parecidos Escotofobia — medo de escuro;
com ondas; Escotomafobia — medo de cegueira;
Cinetofobia ou cinesofobia — medo de movimento; Esfecsofobia — medo de marimbondos;
Cinofobia — medo de cães; Espectrofobia — medo de fantasmas ou espectros;
Cipridofobia, ciprifobia, ciprianofobia, ou ciprinofobia — Estasibasifobia ou estasifobia — medo de ficar de pé ou
medo de prostitutas ou doença venéreas; andar (ambulofobia);
Ceraunofobia — medo de trovão; Estenofobia — medo de lugares ou coisas estreitas;

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


116

Fagofobia — medo de engolir ou de comer; Hormefobia — medo de ficar abalado ou chocado;


Falacrofobia — medo de tornar-se careca; Homiclofobia — medo de neblina;
Farmacofobia — medo de tomar remédios; Hominofobia — medo de homens, mesmo que androfobia;
Febrifobia, fibrifobia ou fibriofobia — medo de febre; Hoplofobia — medo de armas de fogo;
Fengofobia — medo da luz do dia ou nascer do sol; Homofobia — etimologicamente medo do semelhante, uso
Felinofobia — medo de gatos (ailurofobia, elurofobia, comum: medo da homossexualidade;
galeofobia, gatofobia); Humilhofobia — medo de ser humilhado.
Filemafobia ou filematofobia — medo de beijar; Iatrofobia — medo de ir ao médico;
Filofobia — medo de apaixonar-se; Ictiofobia — medo de peixe;
Filosofobia — medo de filosofia; Ideofobia — medo de ideias;
Fobia social — medo de estar sendo avaliado negativamente Ilingofobia — medo de vertigem ou sentir vertigem quando
(socialmente); olha para baixo;
Fonofobia — medo de barulhos ou vozes ou da própria voz Iofobia — medo de veneno;
de telefone; Insetofobia — medo de insetos;
Fotoaugliafobia — medo de luzes muito brilhantes; Isolofobia — medo da solidão, de estar sozinho, o medo de
Fotofobia — medo de luz; ficar isolado (Autofobia, Monofobia);
Fronemofobia — medo de pensar; Isopterofobia — medo de cupins.
Flatusfobia — medo de liberar flatos a valer. Katsaridafobia ou Catsaridafobia — medo de baratas.
Galeofobia ou gatofobia — medo de gatos, mesmo que Lachanophobia ou lachanofobia — medo de vegetais;
Ailurofobia; Lactofobia — medo de leite;
Gamofobia — medo de casar; Laliofobia ou lalofobia — medo de falar;
Gefirofobia, gefidrofobia ou gefisrofobia — medo de cruzar Lesbofobia — medo de mulheres lésbicas;
pontes; Leprofobia ou leprafobia — medo de lepra;
Geliofobia — medo de rir; Ligirofobia — medo de barulhos;
Geniofobia — medo de manter a cabeça erguida; Ligofobia — medo de escuridão;
Gerascofobia — medo de envelhecer; Lilapsofobia — medo de furacões;
Gerontofobia — medo de pessoas idosas; Limnofobia — medo de lagos;
Geumafobia ou geumofobia — medo de sabores; Lissofobia — medo de ficar louco;
Ghostfobia — Medo de fantasmas; Locquiofobia — medo de nascimento (criança);
Gimnofobia — medo de nudez; Logizomecanofobia — medo de computadores;
Ginofobia, ginefobia ou ginecofobia — medo de mulheres; Logofobia — medo de palavras;
Glossofobia — medo de falar ou tentar falar em publico; Luefobia — medo de sífilis (lues).
Gnosiofobia — medo do conhecimento. Mageirocofobia — medo de cozinhar;
Hagiofobia — medo de santos ou coisas santas; Maieusiofobia — medo da infância;
Hamartofobia — medo de pecar; Malaxofobia — medo de amar (sarmassofobia);
Hafefobia ou haptefobia — medo de ser tocado ou de tocar Maniafobia — medo de insanidade;
em alguém ou em alguma coisa; Mastigofobia — medo de punição;
Harpaxofobia — medo de ser roubado; Mecanofobia — medo de máquinas;
Hedonofobia — medo de sentir prazer; Megalofobia — medo de coisas grandes;
Heliofobia — medo do sol; Melanofobia — medo de cor preta;
Hemofobia, hemafobia ou hematofobia — medo de sangue; Melissofobia — medo de abelhas;
Heresifobia ou hereiofobia — medo de desafiar a doutrina Melofobia — medo ou ódio de música;
oficial (governo); Meningitofobia — medo de doença nervosa;
Herpetofobia — medo de répteis ou coisa que arrastam; Merintofobia — medo de ficar amarrado;
Heterofobia — etimologicamente medo do sexo oposto, uso Metalofobia — medo de metal;
comum: medo da heterossexualidade; Metatesiofobia — medo de mudar;
Hidrofobia — medo de água; Metifobia — medo de álcool;
Hidrofobofobia — medo de contrair hidrofobia; Metrofobia — medo ou ódio de poesia;
Hielofobia ou hialofobia — medo de vidro; Microbiofobia — medo de micróbios (bacilofobia);
Hierofobia — medo de padres ou coisas sacras; Mictofobia — medo de escuridão;
Higrofobia — medo de líquidos ou umidade; Mirmecofobia — medo de formigas;
Hilefobia — medo de materialismo ou de epilepsia; Misofobia — medo de germes, contaminação ou sujeira;
Hilofobia — medo de florestas; Mitofobia — medo de mitos, histórias ou declarações falsas;
Hipengiofobia ou hipegiafobia — medo de responsabilidade; Molismofobia ou molisomofobia — medo de sujeira ou
Hipnofobia — medo de dormir ou ser hipnotizado; contaminação;
Hipofobia — medo de casas; Monofobia — medo de solidão ou ficar só (Autofobia,
Hipsifobia — medo de altura; Isolofobia);
Hobofobia — medo de bêbados ou mendigos; Monopatofobia — medo de doença incurável;
Hodofobia — medo de atravessar estradas; Motefobia — medo de borboleta e mariposa;

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


117

Motorfobia — medo de automóveis; Sexofobia — medo do sexo oposto (heterofobia);


Musofobia ou murofobia — medo de ratos. Siderodromofobia — medo de trem ou viagem de trem;
Narigofobia — medo de narizes; Siderofobia — medo de estrelas;
Nebulafobia — medo de neblina (homiclofobia); Sinistrofobia — medo de coisas do lado esquerdo, mão
Necrofobia — medo de morte ou coisas mortas; esquerda;
Nelofobia — medo de vidro; Sitofobia ou Sitiofobia — medo de comida ou comer
Neofarmafobia — medo de medicamentos novos; (cibofobia);
Neofobia — medo de qualquer coisa nova; Socerafobia — medo de padrasto ou madrasta;
Nefofobia — medo de nevoeiros; Sociofobia — medo da sociedade ou de pessoas em geral;
Nictofobia — medo da escuridão ou da noite; Somnifobia — medo de dormir;
Noctifobia — medo da noite; Simmetrofobia — medo de simetria;
Nictohilofobia — medo de florestas escuras ou a noite; Singenesofobia — medo de parentes;
Ninfofobia — medo do sexo; Sifilofobia — medo de sífilis;
Nosocomefobia — medo de hospital; Sofofobia — medo de aprender;
Nosofobia ou nosemafobia — medo de ficar doente; Soteriofobia — medo de dependência dos outros;
Nostofobia — medo de voltar para casa; Surifobia — medo de camundongo (rato);
Nudofobia — medo de nudez. Simbolofobia — medo de símbolos.
Obesofobia — medo de ganhar peso (pocrescofobia); Tacofobia ou Tachofobia — medo de velocidade;
Oclofobia — medo de multidão; Taeniofobia ou Teniofobia — medo de solitária (tênia);
Ocofobia — medo de veículos; Tafofobia ou tafefobia — medo de ser enterrado vivo;
Odinofobia ou odinefobia — medo da dor (algofobia); Talassofobia — medo do mar;
Odontofobia — medo de dentista ou cirurgia odontológica; Tanatofobia ou tantofobia — medo da morte ou de morrer;
Oenofobia — medo de vinhos; Tapinofobia - medo de ser contagioso;
Ofidiofobia — medo de cobras; Taurofobia — medo de touro;
Oftalmofobia — medo de estar sendo vigiado; Teatrofobia — medo de teatro;
Olfactofobia — medo de cheiros; Tecnofobia — medo de tecnologia;
Ombrofobia — medo de chuva ou de estar chovendo; Telefonofobia — medo de telefone;
Ometafobia ou omatofobia — medo de olhos; Teleofobia — medo de definir planos ou de cerimônias
Oneirofobia — medo de sonhos; religiosas;
Onomatofobia — medo de ouvir certas palavras ou nomes; Teofobia — medo de Deus ou de religião;
Ornitofobia — medo de passaros; Teologicofobia — medo de teologia;
Pantofobia — medo de tudo ou de todas as fobias; Teratofobia — medo de crianças ou pessoas deformadas;
Pedofobia — medo das crianças; Termofobia — medo de calor;
Penterofobia — medo da sogra; Testofobia — medo de fazer provas (escolares);
Pirofobia — medo do fogo; Tiranofobia — medo de tiranos;
Ptesiofobia — medo de viajar de avião. Tocofobia — medo de gravidez;
Quemofobia — medo de substâncias químicas ou de Tomofobia — medo de cirurgia;
trabalhar com elas; Tonitrofobia — medo de trovão;
Quenofobia — medo de espaços vazios; Topofobia — medo de certos lugares ou situações, que dão
Quifofobia — medo de parar; medo ou pavor;
Quimofobia — medo de ondas; Toxifobia, toxofobia ou toxicofobia — medo de se
Quionofobia — medo de neve; envenenar;
Quinofobia — medo de raiva (doença); Traumatofobia — medo de traumas (físicos);
Quiraptofobia — medo de ser tocada(o); Transfobia — medo de transexuais;
Quilofobia — medo de esquilos ou qualquer um roedor. Tripanofobia — medo de injeções;
Rabdofobia — medo de ser severamente punido; Tropofobia — medo de mudar ou fazer mudanças.
Radiofobia — medo de radiação, Raio—X; Unatractifobia — medo de pessoas feias;
Ripofobia — medo de defecar; Uranofobia — medo do céu;
Ritifobia — medo de ficar enrugado; Urifobia — aversão e medo mórbido irracional,
Rupofobia — medo de sujeira. desproporcional persistente e repugnante a fenômenos
Sarmassofobia — medo de seduzir e de participar de jogos de paranormais;
sedução; Urofobia — medo de urina ou do ato de urinar;
Satanofobia — medo de satã (demônio); Uiofobia — medo dos próprios filhos; medo da prole.
Selafobia — medo de flashes (luzes); Vacinofobia — medo de vacinação;
Selachofobia — medo de tubarões; Verbofobia — medo de palavras;
Selenofobia — medo da lua; Verminofobia — medo de vermes;
Seplofobia — medo de material radiativo; Virginitifobia — medo de estupro;
Sesquipedalofobia — medo de palavras grandes; Vitricofobia — medo do padrasto.
Sexoafobia — medo de fazer sexo; Xenofobia — medo de estrangeiros ou estranhos;

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


118

Xerofobia — medo de secura, aridez; Zelofobia — medo irracional do ciúme;


Xilofobia — medo de objetos de madeira ou de floresta. Zoofobia — medo de animais.

Transtorno de Ansiedade Social (Fobia Social)


CID-10 DSM-5
Medo de ser exposto à observação atenta de A característica essencial do transtorno de
outrem e que leva a evitar situações sociais. As ansiedade social é um medo ou ansiedade
fobias sociais graves se acompanham acentuados ou intensos de situações sociais nas
habitualmente de uma perda da autoestima e de quais o indivíduo pode ser avaliado pelos
um medo de ser criticado. outros. Em crianças, o medo ou ansiedade deve
As fobias sociais podem se manifestar por ocorrer em contextos com os pares, e não
rubor, tremor das mãos, náuseas ou desejo apenas durante interações com adultos [...].
urgente de urinar, sendo que o paciente por Quando exposto a essas situações sociais, o
vezes está convencido que uma ou outra destas indivíduo tem medo de ser avaliado
manifestações secundárias constitui seu negativamente. Ele tem a preocupação de que
problema primário. Os sintomas podem evoluir será julgado como ansioso, débil, maluco,
para um ataque de pânico. estúpido, enfadonho, amedrontado, sujo ou
desagradável. O indivíduo teme agir ou aparecer
de certa forma ou demonstrar sintomas de
ansiedade, tais como ruborizar, tremer,
transpirar, tropeçar nas palavras, que serão
avaliados negativamente pelos demais [...].
Alguns têm medo de ofender os outros ou de ser
rejeitados como consequência. O medo de
ofender os outros – por exemplo, por meio de
um olhar ou demonstrando sintomas de
ansiedade – pode ser o medo predominante em
pessoas de culturas com forte orientação
coletivista. Um indivíduo com medo de tremer
as mãos pode evitar beber, comer, escrever ou
apontar em público; um com medo de transpirar
pode evitar apertar mãos ou comer alimentos
picantes; e um com medo de ruborizar pode
evitar desempenho em público, luzes brilhantes
ou discussão sobre tópicos íntimos. Alguns têm
medo e evitam urinar em banheiros públicos
quando outras pessoas estão presentes (i.e.,
parurese, ou “síndrome da bexiga tímida”)121.
As situações sociais quase sempre provocam
medo ou ansiedade [...]. Assim, um indivíduo
121
Parurese, também chamada de bexiga tímida, é um transtorno psicológico em que o parurético não consegue urinar
na presença real ou imaginária de outras pessoas. Afeta mais os homens, porém as mulheres podem ser afetadas
também.
A Parurese varia de pessoa para pessoa, mas há certas coisas em comum. Ocorre principalmente em banheiros públicos,
mas pode ocorrer na casa de amigos ou familiares ou mesmo na própria casa quando há alguém perto do banheiro
enquanto o parurético está lá. Há várias intensidades, desde leve, quando consegue urinar em banheiros públicos com
certas condições, à grave quando a pessoa só pode urinar quando estiver sozinha em casa.
Uma pessoa que de vez em quando tem que esperar dois ou três segundos para conseguir urinar não tem Parurese. A
Parurese é uma condição ao longo da vida caracterizada pela hesitação excessiva ou uma incapacidade de urinar. A
maioria dos paruréticos exigem certo conforto pessoal para conseguir urinar. Em uma situação particular, onde há
ruídos, odores, falta de privacidade visual, muitas pessoas no banheiro ou pressa para urinar, a Parurese entra em ação,
pois geralmente o parurético imagina que há alguém esperando, ouvindo enquanto urina ou zombando dele. (Wikipedia)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
119

que fica ansioso apenas ocasionalmente em


situação(ões) social(is) não seria diagnosticado
com transtorno de ansiedade social. Entretanto,
o grau e o tipo de medo e ansiedade podem
variar (p. ex., ansiedade antecipatória, ataque de
pânico) em diferentes ocasiões. A ansiedade
antecipatória" "pode ocorrer às vezes muito
antes das próximas situações (p. ex., preocupar-
se todos os dias durante semanas antes de
participar de um evento social, repetir
antecipadamente um discurso por dias). Em
crianças, o medo ou ansiedade pode ser
expresso por choro, ataques de raiva,
imobilização, comportamento de agarrar-se ou
encolher-se em situações sociais. Os indivíduos
com frequência evitarão as situações sociais
temidas ou então as suportarão com intenso
medo ou ansiedade. A esquiva pode ser
abrangente (p. ex., não ir a festas, recusar a
escola) ou sutil (p. ex., preparando
excessivamente o texto de um discurso,
desviando a atenção para os outros, limitando o
contato visual).
O medo ou ansiedade é julgado desproporcional
ao risco real de ser avaliado negativamente ou
às consequências dessa avaliação negativa. Às
vezes, a ansiedade pode não ser julgada
excessiva porque está relacionada a um perigo
real (p. ex., ser alvo de bullying ou atormentado
pelos outros). No entanto, os indivíduos com
transtorno de ansiedade social com
frequência superestimam as consequências
negativas das situações sociais, e, assim, o
julgamento quanto a ser desproporcional é
feito pelo clínico. O contexto sociocultural do
indivíduo precisa ser levado em conta quando
está sendo feito esse julgamento. Por exemplo,
em certas culturas, o comportamento que de
outra forma parece socialmente ansioso pode ser
considerado apropriado em situações sociais (p.
ex., pode ser visto como um sinal de respeito).
A duração do transtorno é geralmente de pelo
menos seis meses [...]. Esse limiar de duração
ajuda a diferenciar o transtorno dos medos
sociais transitórios comuns, particularmente
entre crianças e na comunidade. Contudo, o
critério de duração deve ser usado como um
guia geral, com a possibilidade de algum grau
de flexibilidade. O medo, a ansiedade e a
esquiva devem interferir significativamente na
rotina normal do indivíduo, no funcionamento
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
120

profissional ou acadêmico ou em atividades


sociais ou relacionamentos ou deve causar
sofrimento clinicamente significativo ou
prejuízo no funcionamento social, profissional
ou em outras áreas importantes de sua vida [...].
Por exemplo, alguém que tem medo de falar em
público não receberia um diagnóstico de
transtorno de ansiedade social se essa atividade
não é rotineiramente encontrada no trabalho ou
nas tarefas de classe e se o indivíduo não tem
um sofrimento significativo a respeito disso.
Entretanto, se evita ou ignora o trabalho ou
educação que realmente deseja ter devido aos
sintomas de ansiedade social, [o critério] é
satisfeito.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Os indivíduos com transtorno de ansiedade
social podem ser inadequadamente assertivos ou
muito submissos ou, com menos frequência,
muito controladores da conversa. Podem
mostrar uma postura corporal excessivamente
rígida ou contato visual inadequado ou falar
com voz extremamente suave. Podem ser
tímidos ou retraídos e ser menos abertos em
conversas e revelar pouco a seu respeito. Podem
procurar emprego em atividades que não
exigem contato social, embora esse não seja o
caso para indivíduos com transtorno de
ansiedade social somente desempenho. Podem
sair da casa dos pais mais tarde. Os homens
podem retardar o casamento e a paternidade,
enquanto as mulheres que gostariam de
trabalhar fora de casa podem viver uma vida
inteira como donas de casa. A automedicação
com substâncias é comum (p. ex., beber antes de
ir a uma festa). A ansiedade social entre adultos
mais velhos também pode incluir a exacerbação
de sintomas de doenças médicas, como tremor
aumentado ou taquicardia. O rubor é a resposta
física característica do transtorno de ansiedade
social.

Transtorno de ansiedade generalizada


CID-10 DSM-5
Ansiedade generalizada e persistente que não As características essenciais do transtorno de
ocorre exclusivamente, nem mesmo de modo ansiedade generalizada são ansiedade e
preferencial, numa situação determinada (a preocupação excessivas (expectativa
ansiedade é ‘flutuante’). Os sintomas apreensiva) acerca de diversos eventos ou
essenciais são variáveis, mas compreendem atividades. A intensidade, duração ou frequência
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
121

nervosismo persistente, tremores, tensão da ansiedade e preocupação é desproporcional à


muscular, transpiração, sensação de vazio na probabilidade real ou ao impacto do evento
cabeça, palpitações, tonturas e desconforto antecipado. O indivíduo tem dificuldade de
epigástrico. Medos de que o paciente ou um de controlar a preocupação e de evitar que
seus próximos irá brevemente ficar doente ou pensamentos preocupantes interfiram na atenção
sofrer um acidente são frequentemente às tarefas em questão. Os adultos com
expressos. transtorno de ansiedade generalizada
frequentemente se preocupam com
circunstâncias diárias da rotina de vida, como
possíveis responsabilidades no trabalho, saúde e
finanças, a saúde dos membros da família,
desgraças com seus filhos ou questões menores
(p. ex., realizar as tarefas domésticas ou se
atrasar para compromissos). As crianças com o
transtorno tendem a se preocupar
excessivamente com sua competência ou a
qualidade de seu desempenho. Durante o curso
do transtorno, o foco da preocupação pode
mudar de uma preocupação para outra.
Várias características distinguem o transtorno de
ansiedade generalizada da ansiedade não
patológica. Primeiro, as preocupações
associadas ao transtorno de ansiedade
generalizada são excessivas e geralmente
interferem de forma significativa no
funcionamento psicossocial, enquanto as
preocupações da vida diária não são excessivas
e são percebidas como mais manejáveis,
podendo ser adiadas quando surgem questões
mais prementes. Segundo, as preocupações
associadas ao transtorno de ansiedade
generalizada são mais disseminadas, intensas e
angustiantes; têm maior duração; e
frequentemente ocorrem sem precipitantes.
Quanto maior a variação das circunstâncias de
vida sobre as quais a pessoa se preocupa (p. ex.,
finanças, segurança dos filhos, desempenho no
trabalho), mais provavelmente seus sintomas
satisfazem os critérios para transtorno de
ansiedade generalizada. Terceiro, as
preocupações diárias são muito menos
prováveis de ser acompanhadas por sintomas
físicos (p. ex., inquietação ou sensação de estar
com os nervos à flor da pele). Os indivíduos
com transtorno de ansiedade generalizada
relatam sofrimento subjetivo devido à
preocupação constante e prejuízo relacionado ao
funcionamento social, profissional ou em outras
áreas importantes de sua vida.
A ansiedade e a preocupação são acompanhadas
por pelo menos três dos seguintes sintomas
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
122

adicionais: inquietação ou sensação de estar


com os nervos à flor da pele, fatigabilidade,
dificuldade de concentrar-se ou sensações de
“branco” na mente, irritabilidade, tensão
muscular, perturbação do sono, embora apenas
um sintoma adicional seja exigido para crianças.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Pode haver tremores, contrações, abalos e dores
musculares, nervosismo ou irritabilidade
associados a tensão muscular. Muitos
indivíduos com transtorno de ansiedade
generalizada também experimentam sintomas
somáticos (p. ex., sudorese, náusea, diarreia) e
uma resposta de sobres- salto exagerada.
Sintomas de excitabilidade autonômica
aumentada (p. ex., batimentos cardíacos
acelerados, falta de ar, tonturas) são menos
proeminentes no transtorno de ansiedade
generali- zada do que em outros transtornos de
ansiedade, tais como o transtorno de pânico.
Outras con- dições que podem estar associadas
ao estresse (p. ex., síndrome do intestino
irritável, cefaleia) frequentemente acompanham
o transtorno.

Transtornos relacionados a traumas e a estressores


Transtorno de Estresse Pós-traumático
CID-10 DSM-5
Este transtorno constitui uma resposta Obs.: No DSM-5 esse transtorno não é mais
retardada ou protraída a uma situação ou classificado como Transtorno de Ansiedade e
evento estressante (de curta ou longa duração), sim como um Transtornos Relacionados a
de natureza excepcionalmente ameaçadora ou Trauma e a Estressores.
catastrófica, e que provocaria sintomas
evidentes de perturbação na maioria dos A característica essencial do transtorno de
indivíduos. Fatores predisponentes, tais como estresse pós-traumático é o desenvolvimento de
certos traços de personalidade (por exemplo sintomas característicos após a exposição a um
compulsiva, astênica) ou antecedentes do tipo ou mais eventos traumáticos. [...] A
neurótico, podem diminuir o limiar para a apresentação clínica do TEPT varia. Em alguns
ocorrência da síndrome ou agravar sua indivíduos, sintomas de revivência do medo,
evolução; tais fatores, contudo, não são emocionais e comportamentais podem
necessários ou suficientes para explicar a predominar. Em outros, estados de humor
ocorrência da síndrome. Os sintomas típicos anedônicos ou disfóricos e cognições negativas
incluem a revivescência repetida do evento podem ser mais perturbadores. Em alguns
traumático sob a forma de lembranças outros, a excitação e sintomas reativos
invasivas ("flashbacks"), de sonhos ou de externalizantes são proeminentes, enquanto em
pesadelos; ocorrem num contexto durável de outros, sintomas dissociativos predominam. Por
"anestesia psíquica" e de embotamento fim, algumas pessoas exibem combinações
emocional, de retraimento com relação aos desses padrões de sintomas.
outros, insensibilidade ao ambiente, anedonia, Os eventos traumáticos [...] sofridos diretamente
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
123

e de evitação de atividades ou de situações que incluem, mas não se limitam a, exposição a


possam despertar a lembrança do traumatismo. guerra como combatente ou civil, ameaça ou
Os sintomas precedentes se acompanham ocorrência real de agressão física (ataque físico,
habitualmente de uma hiperatividade assalto, furto, abuso físico infantil), ameaça ou
neurovegetativa, com hipervigilância, estado ocorrência real de violência sexual (p. ex.,
de alerta e insônia, associadas frequentemente penetração sexual forçada, penetração sexual
a uma ansiedade, depressão ou ideação suicida. facilitada por álcool/droga, contato sexual
O período que separa a ocorrência do abusivo, abuso sexual sem contato, tráfico
traumatismo do transtorno pode variar de sexual), sequestro, ser mantido refém, ataque
algumas semanas a alguns meses. A evolução é terrorista, tortura, encarceramento como
flutuante, mas se faz para a cura na maioria dos prisioneiro de guerra, desastres naturais ou
casos. Em uma pequena proporção de casos, o perpetrados pelo homem e acidentes
transtorno pode apresentar uma evolução automobilísticos graves. Para crianças, eventos
crônica durante numerosos anos e levar a uma sexualmente violentos podem incluir
alteração duradoura da personalidade. experiências sexuais inapropriadas em termos
do estágio de desenvolvimento sem violência
física ou lesão. Uma doença potencialmente
fatal ou uma condição clínica debilitante não
são consideradas necessariamente eventos
traumáticos. Incidentes médicos que se
qualificam como eventos traumáticos incluem
eventos súbitos e catastróficos (p. ex., despertar
durante uma cirurgia, choque anafilático122).
Eventos testemunhados incluem, mas não se
limitam a, observação de ameça de lesão ou
lesão real grave, morte natural, abuso físico ou
sexual de outra pessoa em virtude de agressão
violenta, violência doméstica, acidente, guerra
ou desastre ou catástrofe médica envolvendo um
filho (p. ex., uma hemorragia potencialmente
fatal). A exposição indireta por ter
conhecimento do evento está limitada a
experiências que afetam parentes ou amigos
próximos e experiências violentas ou acidentais
(p. ex., morte por causas naturais não se
qualifica). Esses eventos incluem ataque pessoal
violento, suicídio, acidente grave e lesão grave.
O transtorno pode ser especialmente grave ou
duradouro quando o estressor é interpessoal e
intencional (p. ex., tortura, violência sexual).
O evento traumático pode ser revivenciado de
diversas maneiras. É comum que a pessoa tenha
lembranças recorrentes, involuntárias e
intrusivas do evento [...]. As lembranças
intrusivas no TEPT são distintas das ruminações
depressivas no sentido de que só se aplicam a

122
O choque anafilático, ou anafilaxia, é uma reação alérgica, de hipersensibilidade imediata e severa, que afeta o
corpo todo. A sua manifestação mais grave é quando provoca inchaço e obstrução de vias aéreas superiores e/ou
hipotensão, que pode ser fatal.
A falta de ar pode ser fatal, a menos que o indivíduo receba o tratamento de emergência prontamente.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
124

recordações angustiantes involuntárias e


intrusivas. A ênfase é nas lembranças
recorrentes do evento, as quais normalmente
incluem componentes comportamentais
sensoriais, emocionais ou fisiológicos. Um
sintoma comum de revivência são sonhos
angustiantes que repetem o evento em si ou são
representativos ou relacionados tematicamente
às ameaças principais envolvidas no evento
traumático [...]. A pessoa pode sofrer estados
dissociativos que duram desde alguns segundos
até várias horas ou até mesmo dias, durante os
quais aspectos do evento são revividos e a
pessoa se comporta como se o evento estivesse
ocorrendo naquele momento [...]. Esses eventos
ocorrem em um continuum desde intrusões
visuais ou sensoriais breves de parte do evento
traumático sem perda de senso de realidade até
a perda total de percepção do ambiente ao redor.
Esses episódios, conhecidos como flashbacks,
são geralmente breves, mas "podem estar
associados a sofrimento prolongado e excitação
elevada. No caso de crianças pequenas, a
reencenação de eventos relacionados ao trauma
pode aparecer na brincadeira ou em estados
dissociativos. Frequentemente ocorre
sofrimento psicológico intenso [...] ou
reatividade fisiológica [...] quando o indivíduo é
exposto a eventos precipitadores que se
assemelham a ou simbolizam algum aspecto do
evento traumático (p. ex., dias ventosos depois
de um furacão; ver alguém parecido com o
criminoso). O fator desencadeante pode ser uma
sensação física (p. ex., tontura para
sobreviventes de traumatismo craniano;
frequência cardíaca acelerada para uma criança
previamente traumatizada), particularmente para
indivíduos com quadros altamente somáticos.
Estímulos associados ao trauma são evitados de
maneira persistente (p. ex., sempre ou quase
sempre). O indivíduo costuma fazer esforços
deliberados para evitar pensamentos,
lembranças, sentimentos ou diálogos a respeito
do evento traumático (p. ex., utilizando técnicas
de distração para evitar recordações internas)
[...] e para evitar atividades, objetos, situações
ou pessoas que desencadeiem lembranças do
evento [...].
Alterações negativas em cognições ou no humor
associadas ao evento surgem ou pioram depois
da exposição a ele. Essas alterações negativas
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
125

podem assumir várias formas, incluindo


incapacidade de recordar algum aspecto
importante do evento traumático; esse tipo de
amnésia deve-se essencialmente a amnésia
dissociativa, e não a lesão craniana, álcool ou
drogas [...]. Outra forma são expectativas
negativas exageradas e persistentes (i.e., sempre
ou quase sempre) a respeito de aspectos
importantes da vida que se aplicam à vítima, a
outras pessoas ou ao futuro (p. ex., “Sempre tive
pouco discernimento”; “Não se pode confiar em
figuras de autoridade”) que podem se manifestar
como uma mudança negativa na identidade
percebida desde o trauma (p. ex., “Nunca mais
poderei confiar em alguém”; [...]). Indivíduos
com TEPT podem ter cognições errôneas
persistentes a respeito das causas do evento
traumático que as levam a se culpar ou a culpar
os outros (p. ex., “É culpa minha ter sido
abusada pelo meu tio”) [...]. Um estado de
humor negativo persistente (p. ex., medo,
horror, raiva, culpa, ver- gonha) surge ou piora
depois da exposição ao evento [...]. O indivíduo
pode apresentar interesse ou participação
notadamente menor em atividades que antes
eram prazerosas [...], sentindo-se alheio ou
isolado de outras pessoas [...], ou incapacidade
persistente de sentir emoções positivas
(especialmente felicidade, alegria, satisfação ou
emoções associadas a intimidade, ternura e
sexualidade) [...].
Indivíduos com TEPT podem irritar-se
facilmente e até mesmo adotar um
comportamento físico e/ou verbal agressivo com
pouca ou nenhuma provocação (p. ex., gritar
com os outros, envolver-se em brigas, destruir
objetos) [...]. Eles podem também adotar um
comportamento imprudente ou autodestrutivo,
como direção perigosa, uso excessivo de álcool
ou drogas, ou um comportamento automutilante
ou suicida [...]. O TEPT é com frequência
caracterizado por hipersensibilidade a ameaças
potenciais, incluindo as relacionadas à
experiência traumática (p. ex., depois de um
acidente automobilístico, ficar especialmente
sensível à ameaça potencial representada por
carros ou caminhões) e as não relacionadas ao
evento traumático (p. ex., medo de sofrer infarto
agudo do miocárdio) [...]. Indivíduos com TEPT
podem mostrar-se bastante reativos a estímulos
inesperados, exibindo uma resposta de
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
126

sobressalto intensa ou tensão/nervosismo a


ruídos elevados ou movimentos inesperados (p.
ex., pulando de susto em resposta ao toque de
um telefone) [...]. Dificuldades de con-
centração, incluindo dificuldade para lembrar de
eventos diários (p. ex., esquecer o número do
próprio telefone) ou participar de tarefas que
exigem concentração (p. ex., acompanhar uma
conversa por um determinado período), são
comumente relatadas [...]. Problemas para
iniciar e manter o sono são comuns e podem
estar associados a pesadelos e preocupações
com a segurança ou a hiperexcitação
generalizada, que interfere no sono adequado
[...]. Alguns indivíduos também sofrem
sintomas dissociativos persistentes de
distanciamento do próprio corpo
(despersonalização) ou do mundo ao redor
(desrealização); isso se reflete no especificador
“com sintomas dissociativos”.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
A regressão do desenvolvimento, como a perda
da fala em crianças pequenas, pode ocorrer.
Pseudoalucinações auditivas, como ter a
experiência sensorial de escutar seus próprios
pensamentos ditos em uma voz ou em vozes
diferentes, bem como ideias paranoides, podem
estar presentes. Depois de eventos traumáticos
graves, prolongados e repetidos (p. ex., abuso
infantil, tortura), o indivíduo pode apresentar
também dificuldades na regulagem de emoções
ou para manter rela- cionamentos interpessoais
estáveis, ou ainda sintomas dissociativos.
Quando o evento traumático produz morte
violenta, sintomas de luto complicado e TEPT
podem estar presentes.

Transtornos de ajustamento (ou de adaptação)


CID-10 DSM-5
Esta categoria difere das outras na medida que A presença de sintomas emocionais ou
sua definição não repousa exclusivamente comportamentais em resposta a um estressor
sobre a sintomatologia e a evolução, mas identificável é o aspecto essencial dos
igualmente sobre a existência de um ou outro transtornos de adaptação [...]. O estressor pode
dos dois fatores causais seguintes: um ser um único evento (p. ex., o término de um
acontecimento particularmente estressante relacionamento afetivo), ou pode haver
desencadeia uma reação de "stress" aguda, ou múltiplos estressores (p. ex., dificuldades
uma alteração particularmente marcante na profissionais acentuadas e problemas
vida do sujeito, que comporta consequências conjugais). Os estressores podem ser recorrentes
desagradáveis e duradouras e levam a um (p. ex., associados a crises profissionais cíclicas,
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
127

transtorno de adaptação. Embora fatores de relacionamentos sexuais insatisfatórios) ou


"stress" psicossociais ("life events") contínuos (p. ex., uma doença dolorosa
relativamente pouco graves possam precipitar a persistente com incapacidade crescente, morar
ocorrência de um grande número de em área de alta criminalidade) e podem afetar
transtornos classificados em outra parte neste um único indivíduo ou uma família inteira, um
capítulo ou influenciar-lhes o quadro clínico, grupo maior ou uma comunidade (p. ex., um
nem sempre é possível atribuir-lhes um papel desastre natural). Alguns estressores podem
etiológico, quanto mais que é necessário levar acompanhar eventos específicos do
em consideração fatores de vulnerabilidade, desenvolvimento (p. ex., ir para a escola, deixar
frequentemente idiossincráticos, próprios de a casa dos pais, voltar para a casa dos pais,
cada indivíduo; em outros termos, estes fatores casar-se, tornar-se pai/mãe, fracassar em metas
não são nem necessários nem suficientes para profissionais, aposentadoria).
explicar a ocorrência e a natureza do transtorno Transtornos de adaptação podem ser
observado. Em contraste, para os transtornos diagnosticados após a morte de um ente querido
reunidos aqui sob F43, admite-se que sua quando a intensidade, a qualidade e a
ocorrência é sempre a consequência direta de persistência das reações de luto excedem o que
um "stress" agudo importante ou de um se esperaria normalmente, quando normas
traumatismo persistente. O acontecimento culturais, religiosas e apropriadas à idade são
estressante ou as circunstâncias penosas consideradas. Um conjunto mais específico de
persistentes constituem o fator causal primário sintomas relacionados ao luto foi designado
e essencial, na ausência do qual o transtorno como transtorno do luto complexo persistente.
não teria ocorrido. Os transtornos reunidos Os transtornos de adaptação estão associados a
neste capítulo podem assim ser considerados um risco maior de tentativas e consumação de
como respostas inadaptadas a um "stress" suicídio.
grave ou persistente, na medida em que eles
interferem com mecanismos adaptativos
eficazes e entravam assim o funcionamento
social.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


128

Outros Transtornos Específicos


Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC)
CID-10 DSM-5
Transtorno caracterizado essencialmente por O sintoma característico do TOC é a presença
ideias obsessivas ou por comportamentos de obsessões e compulsões (Critério A).
compulsivos recorrentes. As ideias obsessivas Obsessões são pensamentos repetitivos e
são pensamentos, representações ou impulsos, persistentes (p. ex., de contaminação), imagens
que se intrometem na consciência do sujeito de (p. ex., de cenas violentas ou horrorizantes) ou
modo repetitivo e estereotipado. Em regra impulsos (p. ex., apunhalar alguém). É
geral, elas perturbam muito o sujeito, o qual importante observar que as obsessões não são
tenta, frequentemente resistir-lhes, mas sem prazerosas ou experimentadas como voluntárias:
sucesso. são intrusivas e indesejadas e causam acentuado
O sujeito reconhece, entretanto, que se trata de sofrimento ou ansiedade na maioria das pessoas.
seus próprios pensamentos, mas estranhos à O indivíduo tenta ignorá-las ou suprimi-las (p.
sua vontade e em geral desprazeirosos. Os ex., evitando os desencadeantes ou usando a
comportamentos e os rituais compulsivos são supressão do pensamento) ou neutralizá-las com
atividades estereotipadas repetitivas. O sujeito outro pensamento ou ação (p. ex., executando
não tira prazer direto algum da realização uma compulsão). Compulsões (ou rituais) são
destes atos os quais, por outro lado, não levam comportamentos repetitivos (p. ex., lavar,
à realização de tarefas úteis por si mesmas. verificar) ou atos mentais (p. ex., contar, repetir
O comportamento compulsivo tem por palavras em silêncio) que o indivíduo se sente
finalidade prevenir algum evento compelido a executar em resposta a uma
objetivamente improvável, frequentemente obsessão ou de acordo com regras que devem
implicando dano ao sujeito ou causado por ele, ser aplicadas rigidamente. A maioria das
que ele(a) teme que possa ocorrer. O sujeito pessoas com TOC tem obsessões [pensamentos]
reconhece habitualmente o absurdo e a e compulsões [comportamentos]. As
inutilidade de seu comportamento e faz compulsões são geralmente executadas em
esforços repetidos para resistir-lhes. resposta a uma obsessão (p. ex., pensamentos
O transtorno se acompanha quase sempre de de contaminação levando a rituais de lavagem
ansiedade. Esta ansiedade se agrava quando o ou pensamentos de que alguma coisa está
sujeito tenta resistir à sua atividade incorreta levando à repetição de rituais até
compulsiva. parecer “direita” [just right)]. O objetivo é
reduzir o sofrimento desencadeado pelas
obsessões ou evitar um evento temido (p. ex.,
ficar doente). Contudo, essas compulsões não
estão conectadas de forma realista ao evento
temido (p. ex., organizar itens simetricamente
para evitar danos a uma pessoa amada) ou são
claramente excessivas (p. ex., tomar banho
durante horas todos os dias). As compulsões não
são executadas por prazer, embora alguns
indivíduos experimentem alívio da ansiedade ou
sofrimento.
O Critério B enfatiza que as obsessões e
compulsões devem tomar tempo (p. ex., mais de
uma hora por dia) ou causar sofrimento ou
prejuízo clinicamente significativos para
justificar um diagnóstico de TOC. Esse critério
ajuda a distinguir o transtorno dos
pensamentos intrusivos ocasionais ou

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


129

comportamentos repetitivos que são comuns


na população em geral (p. ex., verificar duas
vezes se a porta está trancada). A frequência e a
gravidade das obsessões e compulsões variam
entre os indivíduos com TOC (p. ex., alguns têm
sintomas leves a moderados, passando 1 a 3
horas por dia com obsessões ou executando
compulsões, enquanto outros têm pensamentos
intrusivos ou compulsões quase constantes que
podem ser incapacitantes).
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
O conteúdo específico das obsessões e
compulsões varia entre os indivíduos.
Entretanto, certos temas, ou dimensões, são
comuns, incluindo os de limpeza (obsessões por
contaminação e compulsões por limpeza);
simetria (obsessões por simetria e compulsões
por repetição, organização e contagem);
pensamentos proibidos ou tabus (p. ex.,
obsessões agressivas, sexuais ou religiosas e
compulsões relacionadas); e danos (p. ex., medo
de causar danos a si mesmo ou a outros e
compulsões de verificação). Algumas pessoas
também têm dificuldades em descartar e
acumulam objetos como uma consequência de
obsessões e compulsões típicas, como o medo
de causar danos a outras pessoas. Esses temas
ocorrem em diferentes culturas, são
relativamente consistentes ao longo do tempo
em adultos com o transtorno e podem estar
associados a diferentes substratos neurais. É
importante observar que os indivíduos com
frequência têm sintomas em mais de uma
dimensão.
As pessoas com TOC experimentam uma gama
de respostas afetivas quando confrontadas com
situações que desencadeiam obsessões e
compulsões. Por exemplo, muitos indivíduos
experimentam ansiedade acentuada que pode
incluir ataques de pânico recorrentes. Outros
relatam fortes sentimentos de nojo. Enquanto
executam as compulsões, algumas pessoas
relatam uma angustiante sensação de
“incompletude” ou inquietação até que as coisas
pareçam ou soem “direitas” (just right).
É comum que indivíduos com o transtorno
evitem pessoas, lugares e coisas que
desencadeiam obsessões e compulsões. Por
exemplo, indivíduos com preocupações com
contaminação podem evitar situações públicas
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
130

(p. ex., restaurantes, banheiros públicos) para


reduzir a exposição aos contaminantes temidos;
pessoas com pensamentos intrusivos sobre
causar danos podem evitar as interações
sociais.123

Outros tipos de Transtornos


Transtorno Dismórfico Corporal
CID-10 DSM-5
A CID-10 não descreve isoladamente o TDC, Os indivíduos com transtorno dismórfico
colocando-a no item que fala sobre Transtorno corporal (anteriormente conhecido como
Hipocondríaco (F45.22). dismorfofobia) são preocupados com um ou
“A característica essencial deste transtorno é mais defeitos ou falhas percebidas em sua
uma preocupação persistente com a presença aparência física, que acreditam parecer feia, sem
eventual de um ou de vários transtornos atrativos, anormal ou deformada [...]. As falhas
somáticos graves e progressivos. Os pacientes percebidas não são observáveis ou parecem
manifestam queixas somáticas persistentes ou apenas leves para outros indivíduos. As
uma preocupação duradoura com a sua preocupações variam desde parecer “sem
aparência física. Sensações e sinais físicos atrativos” ou “não adequado” até parecer
normais ou triviais são frequentemente “hediondo” ou “como um monstro”. Podem
interpretados pelo sujeito como anormais ou focar em uma ou mais áreas do corpo, mais
perturbadores. A atenção do sujeito se comumente a pele (p. ex., percepção de acne,
concentra em geral em um ou dois órgãos ou cicatrizes, rugas, palidez), os pelos (p. ex.,
sistemas. Existem frequentemente depressão e cabelo “escasso” ou pelo corporal ou facial
ansiedade importantes, e que podem justificar “excessivo”) ou o nariz (p. ex., o tamanho ou
um diagnóstico suplementar. formato). No entanto, qualquer área do corpo
Dismorfofobia (corporal) (não-delirante) pode ser foco de preocupação (p. ex., olhos,
Hipocondria dentes, peso, estômago, mamas, pernas,
Neurose hipocondríaca tamanho ou formato do rosto, lábios, queixo,
Nosofobia sobrancelhas, genitais). Algumas pessoas são
Exclui: preocupadas com a percepção de assimetria de
dismorfofobia delirante (F22.8) áreas corporais. As preocupações são intrusivas,
idéias delirantes persistentes sobre o indesejadas, tomam tempo (ocorrendo, em
funcionamento ou a forma do corpo (F22.-) média, de 3 a 8 horas por dia) e geralmente são
difíceis de resistir ou controlar.
Os comportamentos repetitivos ou atos mentais
excessivos (p. ex., comparações) são executados
em resposta à preocupação [...]. O indivíduo se
sente compelido a executar esses
comportamentos, os quais não são prazerosos e
podem aumentar a ansiedade e a disforia. Eles
geralmente tomam tempo e são difíceis de
resistir ou controlar. Os comportamentos
comuns são comparar a própria aparência com a
de outros indivíduos; verificar repetidamente os
defeitos percebidos em espelhos ou em outras
superfícies refletoras ou examiná-los
diretamente; arrumar-se de maneira excessiva

123
As chaves e os destaques são do professor da matéria.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
131

(p. ex., penteando, barbeando, depilando ou


arrancando os pelos); camuflar (p. ex.,
aplicando maquiagem repetidamente ou
cobrindo as áreas em questão com coisas como
chapéu, roupas, maquiagem ou cabelo);
procurar tranquilização acerca do aspecto das
falhas percebidas; tocar as áreas em questão
para verificá-las; fazer exercícios ou
levantamento de peso em excesso; e procurar
procedimentos estéticos. Alguns indivíduos se
bronzeiam de forma excessiva (p. ex., para
escurecer a pele “pálida” ou diminuir a acne
percebida), mudam constantemente de roupa (p.
ex., para camuflar os defeitos percebidos) ou
compram de maneira compulsiva (p. ex.,
produtos de beleza). Arrancar a pele
compulsivamente com a intenção de melhorar
os defeitos percebidos é comum e pode causar
lesões cutâneas, infecções ou ruptura de vasos
sanguíneos. A preocupação deve causar
sofrimento clinicamente significativo ou
prejuízo no funcionamento social, profissional
ou em outras áreas importantes da vida do
indivíduo [...]; geralmente ambos estão
presentes. O transtorno dismórfico corporal
deve ser diferenciado de um transtorno
alimentar.
A dismorfia muscular [vigorexia], uma forma
de transtorno dismórfico corporal que ocorre
quase exclusivamente no sexo masculino,
consiste na preocupação com a ideia de que o
próprio corpo é muito pequeno ou
insuficientemente magro ou musculoso. Os
indivíduos com essa forma de transtorno, na
verdade, têm uma aparência corporal normal ou
são ainda mais musculosos. Eles também podem
ser preocupados com outras áreas do corpo,
como a pele ou o cabelo. A maioria (mas não
todos) faz dieta, exercícios e/ou levanta pesos
excessivamente, às vezes causando danos ao
corpo. Alguns usam esteroides anabolizantes
perigosos e outras substâncias para tentar deixar
seu corpo maior e mais musculoso. O transtorno
dismórfico corporal por procuração é uma
forma de transtorno dismórfico corporal em que
os indivíduos são preocupados com defeitos que
eles percebem na aparência de outra pessoa.
O insight relativo às crenças do transtorno
dismórfico corporal pode variar de bom até
ausente/delirante (i.e., crenças delirantes que
consistem na completa convicção de que a visão
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
132

que o indivíduo tem da sua aparência é precisa e


não distorcida). Em média, o insight é pobre;
um terço ou mais dos indivíduos atualmente tem
crenças delirantes de transtorno dismórfico
corporal. Aqueles com transtorno dismórfico
corporal delirante tendem a ter maior morbidade
em algumas áreas (suicidalidade), mas isso
parece ser justificado por sua tendência a ter
sintomas mais graves. [...]
Muitos indivíduos com transtorno dismórfico
corporal têm ideias ou delírios de referência,
acreditando que outras pessoas prestam especial
atenção neles ou caçoam deles devido a sua
aparência. O transtorno dismórfico corporal está
associado a altos níveis de ansiedade, ansiedade
social, esquiva social, humor deprimido,
neuroticismo e perfeccionismo, bem como a
baixa extroversão e baixa autoestima. Muitos
indivíduos têm vergonha da sua aparência e do
foco excessivo em seu visual e têm relutância
em revelar suas preocupações aos outros. A
maioria dessas pessoas faz tratamento estético
para tentar melhorar seus defeitos percebidos.
Tratamento dermatológico e cirurgia são mais
comuns, mas qualquer tipo de tratamento (p.
ex., dentário, eletrólise) pode ser feito. Às
vezes, os indivíduos podem realizar cirurgia em
si mesmos. O transtorno dismórfico corporal
parece ter uma resposta pobre a tais tratamentos
e por vezes piora. Algumas pessoas tomam
providências legais ou são violentas com o
clínico porque estão insatisfeitas com o
resultado estético.
O transtorno dismórfico corporal foi associado a
disfunção executiva e anormalidades no
processamento visual, com uma propensão a
analisar e codificar detalhes em vez de aspectos
holísticos ou configuracionais dos estímulos
visuais. Os indivíduos com esse transtorno
tendem a interpretar de forma negativa e
ameaçadora expressões faciais ou cenários
ambíguos.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Muitos indivíduos com transtorno dismórfico
corporal têm ideias ou delírios de referência,
acreditando que outras pessoas prestam especial
atenção neles ou caçoam deles devido a sua
aparência. O transtorno dismórfico corporal está
associado a altos níveis de ansiedade, ansiedade
social, esquiva social, humor deprimido,
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
133

neuroticismo e perfeccionismo, bem como a


baixa extroversão e baixa autoestima. Muitos
indivíduos têm vergonha da sua aparência e do
foco excessivo em seu visual e têm relutância
em revelar suas preocupações aos outros. A
maioria dessas pessoas faz tratamento estético
para tentar melhorar seus defeitos percebidos.
Tratamento dermatológico e cirurgia são mais
comuns, mas qualquer tipo de tratamento (p.
ex., dentário, eletrólise) pode ser feito. Às
vezes, os indivíduos podem realizar cirurgia em
si mesmos. O transtorno dismórfico corporal
parece ter uma resposta pobre a tais tratamentos
e por vezes piora. Algumas pessoas tomam
providências legais ou são violentas com o
clínico porque estão insatisfeitas com o
resultado estético.
O transtorno dismórfico corporal foi associado a
disfunção executiva e anormalidades no
processamento visual, com uma propensão a
analisar e codificar detalhes em vez de aspectos
holísticos ou configuracionais dos estímulos
visuais. Os indivíduos com esse transtorno
tendem a interpretar de forma negativa e
ameaçadora expressões faciais ou cenários
ambíguos.

Transtornos Somatoformes ou de Sintomas Somáticos


Transtorno de somatização
CID-10 DSM-5
Transtorno caracterizado essencialmente pela Indivíduos com transtorno de sintomas
presença de sintomas físicos, múltiplos, somáticos geralmente apresentam sintomas
recorrentes e variáveis no tempo, persistindo somáticos múltiplos e atuais que provocam
ao menos por dois anos. A maioria dos sofrimento ou resultam em perturbação
pacientes teve uma longa e complicada história significativa da vida diária (Critério A), embora
de contato tanto com a assistência médica às vezes apenas um sintoma grave, mais
primária quanto especializada durante as quais comumente dor, esteja presente. Os sintomas
muitas investigações negativas ou cirurgias podem ser específicos (p. ex., dor localizada) ou
exploratórias sem resultado podem ter sido relativamente inespecíficos (p. ex., fadiga). Por
realizadas. vezes representam sensações ou desconfortos
Os sintomas podem estar referidos a qualquer corporais normais que geralmente não
parte ou sistema do corpo. O curso da doença é significam doença grave. Sintomas somáticos
crônico e flutuante, e frequentemente se sem uma explicação médica evidente não são
associa a uma alteração do comportamento suficientes para fazer esse diagnóstico. O
social, interpessoal e familiar. Quando o sofrimento do indivíduo é autêntico, seja ou não
transtorno tem uma duração mais breve (menos explicado em termos médicos.
de dois anos) ou quando ele se caracteriza por Os sintomas podem ou não estar associados a
sintomas menos evidentes, deve-se fazer o uma outra condição médica. Os diagnósticos de
diagnóstico de transtorno somatoforme transtorno de sintomas somáticos e uma doença
indiferenciado (F45.1). médica concomitante não são mutuamente
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
134

excludentes e com frequência ocorrem em


conjunto. Por exemplo, um indivíduo pode
tornar-se gravemente incapacitado por sintomas
do transtorno de sintomas somáticos depois de
um infarto do miocárdio sem complicações
mesmo se o infarto em si não resultar em
nenhuma incapacidade. Se outra condição
médica ou o alto risco de desenvolver uma
estiver presente (p. ex., forte história familiar),
os pensamentos, sentimentos e comportamentos
associados a essa condição são excessivos
(Critério B).
Indivíduos com transtorno de sintomas
somáticos tendem a manifestar níveis muito
elevados de preocupação a respeito de doenças
(Critério B). Eles avaliam seus sintomas
corporais como indevidamente ameaçadores,
nocivos ou problemáticos e com frequência
pensam o pior a respeito da própria saúde.
Mesmo quando há evidência do contrário,
alguns pacientes ainda temem a gravidade
médica de seus sintomas. No transtorno de
sintomas somáticos grave, as preocupações
acerca da saúde podem assumir um papel
central na vida do indivíduo, tornando-se um
traço da sua identidade e dominando as relações
interpessoais.
Os indivíduos geralmente sentem angústia, a
qual é sobretudo focada em sintomas somáticos
e em seu significado. Quando questionados
diretamente a respeito de seu sofrimento, alguns
o descrevem como associado a outros aspectos
de suas vidas, enquanto outros negam qualquer
fonte de sofrimento que não os sintomas
somáticos. A qualidade de vida relacionada à
saúde é com frequência prejudicada, tanto física
quanto mentalmente. No transtorno de sintomas
somáticos grave, o prejuízo é marcante e,
quando persistente, pode levar à invalidez.
Há, com frequência, alto nível de utilização de
serviços médicos, o que raramente alivia as
preocupações do indivíduo. Consequentemente,
o paciente pode acabar buscando múltiplos
médicos para os mesmos sintomas. Esses
indivíduos muitas vezes parecem não responder
a intervenções médicas, e novas intervenções
podem apenas exacerbar os sintomas presentes.
Algumas pessoas com o transtorno parecem
incomumente sensíveis aos efeitos colaterais de
medicamentos; outras sentem que a avaliação e
o tratamento médico foram inadequados.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
135

Características Associadas que Apoiam o


Diagnóstico
Aspectos cognitivos incluem atenção focada em
sintomas somáticos, atribuição de sensações
corporais normais a doenças físicas
(possivelmente com interpretações
catastróficas), preocupação a respeito de
doenças e medo de que qualquer atividade física
possa prejudicar o corpo. Os aspectos
comportamentais associados relevantes podem
incluir verificações repetidas do corpo à procura
de anormalidades, busca reiterada de ajuda e de
garantias médicas e evitação de atividades
físicas. Esses aspectos comportamentais são
mais proeminentes no transtorno de sintomas
somáticos grave persistente e geralmente estão
associados a pedidos frequentes de ajuda
médica para tratar diferentes sintomas
somáticos, o que pode levar a consultas médicas
nas quais os indivíduos estão tão concentrados
em suas preocupações acerca do(s) sintoma(s)
somático(s) que não é possível redirecioná-los
para outros assuntos. Qualquer garantia recebida
do médico no sentido de que os sintomas não
são indicativos de doença física grave tende a
ser fugaz e/ou é sentida pelos indivíduos como
se o médico não estivesse levando a sério seus
sintomas. Como o foco em sintomas somáticos
é um aspecto essencial do transtorno, indivíduos
com transtorno de sintomas somáticos
apresentam-se normalmente a serviços de saúde
geral em vez de a serviços de saúde mental. A
sugestão de encaminhamento a um especialista
em saúde mental pode ser recebida com
surpresa ou até mesmo recusa franca por
indivíduos com o transtorno.
Visto que o transtorno de sintomas somáticos
está associado a transtornos depressivos,
existe um risco maior de suicídio. Não se sabe
se o transtorno de sintomas somáticos está
associado ao risco de suicídio
independentemente da sua associação com
transtornos depressivos.124

124
As chaves e os destaques são do professor da matéria.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
136

Transtorno Dissociativo ou Conversivo (Transtornos de Sintomas Neurológicos Funcionais)


CID-10 DSM-5
Os transtornos dissociativos ou de conversão Muitos clínicos usam termos alternativos como
se caracterizam por uma perda parcial ou “funcional” (referindo-se ao funcionamento
completa das funções normais de integração anormal do sistema nervoso central) ou
das lembranças, da consciência, da identidade “psicogênico” (referindo-se a uma etiologia
e das sensações imediatas, e do controle dos presumida) para descrever os sintomas do
movimentos corporais. transtorno conversivo (transtorno de sintomas
Os diferentes tipos de transtornos dissociativos neurológicos funcionais). Nele, pode haver um
tendem a desaparecer após algumas semanas ou mais sintomas de diversos tipos. Sintomas
ou meses, em particular quando sua ocorrência motores incluem fraqueza ou paralisia;
se associou a um acontecimento traumático. A movimentos anormais, como tremor ou
evolução pode igualmente se fazer para movimentos distônicos; anormalidades da
transtornos mais crônicos, em particular marcha; e postura anormal de membro.
paralisias e anestesias, quando a ocorrência do Sintomas sensoriais incluem sensação cutânea,
transtorno está ligada a problemas ou visão ou audição alteradas, reduzidas ou
dificuldades interpessoais insolúveis. No ausentes. Episódios de tremores generalizados
passado, estes transtornos eram classificados de membros com aparente prejuízo ou perda de
entre diversos tipos de "histeria de conversão". consciência podem assemelhar-se a convulsões
Admite-se que sejam psicogênicos, dado que epiléticas (também denominadas convulsões
ocorrem em relação temporal estreita com psicogênicas ou não epiléticas). Pode haver
eventos traumáticos, problemas insolúveis e episódios de ausência de resposta semelhantes a
insuportáveis, ou relações interpessoais difíceis síncope ou coma. Outros sintomas incluem
(autodefesa a um trauma). Os sintomas volume da fala reduzido ou ausente
traduzem frequentemente a ideia que o sujeito (disfonia/afonia), articulação alterada (disartria),
se faz de uma doença física. uma sensação de “bola” ou caroço na garganta
O exame médico e os exames complementares (globus) e diplopia.
não permitem colocar em evidência um Embora o diagnóstico exija que o sintoma não
transtorno físico (em particular neurológico) seja explicado por doença neurológica, ele não
conhecido. Por outro lado, dispõe-se de deverá ser feito simplesmente porque os
argumentos para pensar que a perda de uma resultados das investigações foram normais ou
função é, neste transtorno, a expressão de um porque o sintoma é “bizarro”. É preciso haver
conflito ou de uma necessidade psíquica. achados clínicos que demonstrem claramente
Os sintomas podem ocorrer em relação incompatibilidade com doença neurológica. A
temporal estreita com um "stress" psicológico inconsistência interna no exame é uma maneira
e ocorrer frequentemente de modo brusco. O de demonstrar incompatibilidade (i.e.,
transtorno concerne unicamente quer a uma demonstrando que os sinais físicos provocados
perturbação das funções físicas que estão por meio de um método de exame deixam de ser
normalmente sob o controle da vontade, quer a positivos quando testados de uma maneira
uma perda das sensações. diferente). Exemplos de tais achados de exame
Os transtornos que implicam manifestações incluem:
dolorosas ou outras sensações físicas • Sinal de Hoover, no qual a fraqueza da
complexas que fazem intervir o sistema extensão do quadril retorna à força normal com
nervoso autônomo, são classificados entre os flexão do quadril contralateral contra
transtornos somatoformes. Há sempre a resistência.
possibilidade de ocorrência numa data ulterior • Fraqueza acentuada da flexão plantar do
de um transtorno físico ou psiquiátrico grave. tornozelo quando testada no leito em um
Inclui-se nessa classificação: indivíduo capaz de caminhar na ponta dos pés.
histeria • Achados positivos no teste diagnóstico do
histeria de conversão tremor. Nesse teste, um tremor unilateral pode

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


137

reação histérica ser identificado como funcional se mudar


psicose histérica quando o indivíduo estiver distraído dele. Isso
pode ser observado pedindo-se para o paciente
Acréscimos: imitar o examinador fazendo um movimento
1)“Os doentes obtêm um ganho primário ao rítmico com a mão não afetada: ocorre mudança
manterem os conflitos internos fora da sua no tremor de tal forma que ele imita ou
consciência e o ganho secundário pelo fato de, “embarca” no ritmo da mão não afetada, ou o
ao se encontrarem doentes, conseguirem obter tremor funcional é suprimido, ou não mais
dispensas de obrigações e de situações sociais, assume um movimento rítmico simples.
ao mesmo tempo que obtêm o apoio de outras • Em ataques que se assemelham a epilepsia ou
pessoas.” (Kaplan & Sadock, 2007) síncope (ataques não epiléticos “psicogênicos”),
a presença de olhos fechados com resistência à
2) Tipos de transtornos dissociativos: abertura ou um eletrencefalograma simultâneo
a. amnésia dissociativa – amnésia de eventos normal (embora isso por si só não exclua todas
traumáticos; as formas de epilepsia ou síncope125).
b. fuga dissociativa – “o indivíduo • Para sintomas visuais, um campo visual
repentinamente perde todas suas recordações, tubular (i.e., visão em túnel).
inclusive de sua própria identidade. É importante observar que o diagnóstico de
Inesperadamente essa pessoa muda-se de transtorno conversivo deverá se basear no
localidade, de cidade ou de estado, assumindo quadro clínico geral, e não em um único achado
uma outra identidade, função e vida por vários clínico.
dias. Durante esse período não se lembra de Características Associadas que Apoiam o
nada de sua vida passada nem tem consciência Diagnóstico
de que se esqueceu de algo. Durante esse Uma série de aspectos associados pode
período seu comportamento é compatível com respaldar o diagnóstico de transtorno
as normas sociais de maneira que ninguém conversivo. Pode haver história de múltiplos
percebe algo errado naquela pessoa, exceto por sintomas somáticos semelhantes. A
ser um forasteiro. Vive de forma simples, um manifestação inicial pode estar associada a
pouco recluso, com modéstia. Subitamente estresse ou trauma, tanto de natureza
recobra toda a memória, excetuando-se o psicológica como física. A relevância etiológica
período enquanto viveu a fuga dissociativa. potencial desse estresse ou trauma pode ser
Com o restabelecimento da memória a pessoa sugerida por uma relação temporal próxima.
recobra sua vida anterior. Raramente esse Entretanto, ainda que a avaliação quanto à
episódio dura meses: comumente dura dias ou presença de estresse ou trauma seja importante,
horas.” (www.psicosite.com.br) o diagnóstico poderá ser feito mesmo se
c. estupor dissociativo – diminuição nenhum destes for encontrado.
importante ou ausência de movimentos O transtorno conversivo está, muitas vezes,
voluntários e da reatividade normal a estímulos associado a sintomas dissociativos, tais como
externos (luz, som, tato etc); despersonalização, desrealização e amnésia
d. transe ou possessão – outra identidade dissociativa, particularmente no início do
atribuída a entidades espirituais; quadro sintomático ou durante os ataques.
e. de movimentos – perda da capacidade de O diagnóstico de transtorno conversivo não
mover uma parte ou a totalidade do membro ou requer o julgamento de que os sintomas não
dos membros (afonia, disfonia psicogênicas; sejam intencionalmente produzidos (i.e., não
torcicolo histérico); simulados), já que a ausência definitiva de
f. convulsões – semelhantes àquelas presentes simulação pode não ser discernível de forma
nas crises epilépticas, porém, normalmente confiável. O fenômeno la belle indifférence

125
Síncope - Perda transitória da consciência com recuperação posterior completa. É produzida por irrigação cerebral
insuficiente podendo ter causas variadas. Quando se associa a uma arritmia cardíaca grave, pode significar um
importante risco de vida para o indivíduo. (Dicionário de Termos Médicos)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
138

sem mordedura da língua, ferimentos de queda, (i.e., ausência de preocupação acerca da


incontinência urinária etc. Além disso, a natureza ou das implicações do sintoma)126 tem
consciência está preservada ou substituída por sido associado ao transtorno conversivo, porém
um estado de estupor ou transe. não é específico dele nem deverá ser utilizado
g. anestesias ou perda sensorial – cegueira, para fazer o diagnóstico. Da mesma maneira, o
surdez etc. psicogênica. A perda da conceito de ganho secundário (i.e., quando os
sensibilidade pode ser acompanhada de indivíduos obtêm benefícios externos como
parestesias (formigamentos ou ardências na dinheiro ou isenção de responsabilidades)
pela não causadas por estímulos externos). também não é específico do transtorno
conversivo, e, particularmente na presença de
evidência concreta de simulação, os
diagnósticos que deverão ser considerados
incluem transtorno factício ou simulação [...].

Transtorno de dor psicogênica (ou, Dor Somatoforme)


CID-10 DSM-5
A queixa predominante é uma dor persistente, Vide Transtorno de Sintomas Somáticos, logo
intensa e angustiante, dor esta não explicável a seguir.
inteiramente por um processo fisiológico ou
um transtorno físico, e ocorrendo num
contexto de conflitos emocionais e de
problemas psicossociais suficientemente
importantes para permitir a conclusão de que
os mesmos sejam a causa essencial do
transtorno. O resultado é em geral uma maior
atenção em suporte e assistência quer pessoal,
quer médica. Uma dor considerada como
psicogênica mas ocorrendo no curso de um
transtorno depressivo ou de uma esquizofrenia
não deve ser aqui classificada.

Transtorno Factício (Relacionado aos Transtornos de Sintomas Somáticos)


CID-10 DSM-5
Simulação repetida e coerente de sintomas, às A característica essencial do transtorno factício
vezes com automutilações com o intuito de é a falsificação de sinais e sintomas médicos ou
provocar sinais ou sintomas. A motivação é psicológicos em si mesmo ou em outro
obscura e possivelmente de origem interna e associado a fraude identificada. Indivíduos com
visa adotar um papel ou um status de doente, e transtorno factício também podem buscar
frequentemente se associa a grandes tratamento para si mesmos ou para outro depois
transtornos da personalidade e das relações. da indução de lesão ou doença. O diagnóstico
requer a demonstração de que o indivíduo está
agindo de maneira subreptícia [fraudulenta] para
falsear, simular ou causar sinais ou sintomas de
doença ou lesão na ausência de recompensas
externas óbvias. Os métodos de falsificação de
doença podem incluir exagero, fabricação,

126
La belle indifférence – Um exemplo é a pessoa que acaba de ficar cega (cegueira histérica), paralítica ou muda, e
reage a essa grave incapacidade com aparente naturalidade”. Tais quadros são indicativos de conversão ou histeria.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
139

simulação e indução. Se uma condição médica


preexistente estiver presente, o comportamento
fraudulento ou a indução de lesão fraudulenta
associada à fraude faz outras pessoas verem
esses indivíduos (ou outros) como mais doentes
ou comprometidos, o que pode levar a
intervenções médicas excessivas. Indivíduos
com transtorno factício poderiam, por exemplo,
relatar sentimentos de depressão e ideias
suicidas como consequência da morte de um
cônjuge a despeito de essa morte não ser
verdadeira ou de o indivíduo não ter um
cônjuge; relatar falsamente episódios de
sintomas neurológicos (p. ex., convulsões,
tonturas ou desmaios); manipular um exame
laboratorial (p. ex., acrescentando sangue à
urina) para indicar falsamente uma
anormalidade; falsificar prontuários médicos
para indicar uma doença; ingerir uma substância
(p. ex., insulina ou varfarina) para induzir um
resultado laboratorial anormal ou uma doença;
ou se automutilar ou induzir doença em si
mesmos ou em outra pessoa (p. ex., injetando
material fecal para produzir um abscesso ou
induzir sepse [putrefação]).
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Indivíduos com transtorno factício autoimposto
ou transtorno factício imposto a outro correm o
risco de sofrer grande sofrimento psicológico ou
prejuízo funcional ao causar danos a si mesmos
e a outros. Familiares, amigos e profissionais da
saúde também são muitas vezes afetados
adversamente por esse comportamento.
Transtornos factícios têm semelhanças com
transtornos por uso de substância, transtornos
alimentares, transtornos do controle de
impulsos, transtorno pedofílico e alguns outros
transtornos relacionados tanto à persistência do
comportamento quanto aos esforços
intencionais de ocultar o comportamento
perturbado por meio de fraude. Enquanto alguns
aspectos dos transtornos factícios
representariam comportamento criminoso (p.
ex., transtorno factício imposto a outro, no qual
as ações do pai ou da mãe representam abuso e
maus-tratos a um filho), esse comportamento
criminoso e a doença mental não são
mutuamente excludentes. O diagnóstico de
transtorno factício enfatiza mais a identificação
objetiva da falsificação de sinais e sintomas de
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
140

doença do que uma inferência acerca da


intenção ou da possível motivação subjacente.
Ademais, esses comportamentos, incluindo a
indução de lesão ou doença, estão associados a
fraude.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


141

Transtornos de Personalidade e Transtornos de Ajustamento


Transtornos de personalidade borderline (fronteiriço)
CID-10 DSM-5
Transtorno de personalidade caracterizado por A característica essencial do transtorno da
tendência nítida a agir de modo imprevisível personalidade borderline é um padrão difuso de
sem consideração pelas consequências; humor instabilidade das relações interpessoais, da
imprevisível e caprichoso; tendência a acessos autoimagem e de afetos e de impulsividade
de cólera e uma incapacidade de controlar os acentuada que surge no começo da vida adulta e
comportamentos impulsivos; tendência a está presente em vários contextos.
adotar um comportamento briguento e a entrar Indivíduos com o transtorno da personalidade
em conflito com os outros, particularmente borderline tentam de tudo para evitar abandono
quando os atos impulsivos são contrariados ou real ou imaginado [...]. A percepção de uma
censurados. separação ou rejeição iminente ou a perda de
Dois tipos podem ser distintos: o tipo estrutura externa podem levar a mudanças
impulsivo, caracterizado principalmente por profundas na autoimagem, no afeto, na cognição
uma instabilidade emocional e falta de controle e no comportamento. Esses indivíduos são
dos impulsos; e o tipo borderline, caracterizado muito sensíveis às circunstâncias ambientais.
além disto por perturbações da autoimagem, do Vivenciam medos intensos de abandono e
estabelecimento de projetos e das preferências experimentam raiva inadequada mesmo diante
pessoais, por uma sensação crônica de de uma separação de curto prazo realística ou
vacuidade, por relações interpessoais intensas e quando ocorrem mudanças inevitáveis de planos
instáveis e por uma tendência a adotar um (p. ex., desespero repentino em reação ao aviso
comportamento autodestrutivo, do clínico de que a consulta acabou; pânico ou
compreendendo tentativas de suicídio e gestos fúria quando alguém importante para eles se
suicidas. atrasa alguns minutos ou precisa cancelar um
compromisso). Esses indivíduos podem achar
que esse “abandono” implica que eles são
“maus”. Tais medos de abandono têm relação
com intolerância a ficar só e necessidade de ter
outras pessoas ao redor. Os esforços
desesperados para evitar o abandono podem
incluir ações impulsivas como automutilação ou
comportamentos suicidas, [...].
As pessoas com transtorno da personalidade
borderline apresentam um padrão de
relacionamentos instável e intenso [...]. Podem
idealizar cuidadores ou companheiros potenciais
em um primeiro ou segundo encontro, exigir
ficar muito tempo juntos e partilhar os detalhes
pessoais mais íntimos logo no início de um
relacionamento. Entretanto, podem mudar
rapidamente da idealização à desvalorização,
sentindo que a outra pessoa não se importa o
suficiente, não dá o suficiente e não está
“presente” o suficiente. Esses indivíduos podem
empatizar e cuidar de outros, mas somente com
a expectativa de que o outro estará presente
quando chamado, em uma espécie de troca para
atender às suas próprias necessidades. Estão
propensos a mudanças dramáticas e repentinas

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


142

na sua forma de enxergar os outros, que podem


ser vistos alternadamente como apoiadores
benevolentes ou como punidores cruéis. Tais
mudanças, em geral, refletem desilusão com um
cuidador cujas qualidades de dedicação haviam
sido idealizadas ou cuja rejeição ou abandono
era esperado.
Pode ocorrer uma perturbação da identidade,
caracterizada por instabilidade acentuada e
persistente da imagem ou da percepção de si
mesmo [...]. Há mudanças súbitas e dramáticas
na autoimagem, caracterizadas por metas,
valores e aspirações vocacionais inconstantes.
Podem ocorrer mudanças súbitas em opiniões e
planos sobre carreira profissional, identidade
sexual, valores e tipos de amigos. Esses
indivíduos podem repentinamente mudar de um
papel de suplicantes necessitados de ajuda para
o papel de vingadores justos de maus-tratos
passados. Embora costumem ter uma
autoimagem baseada em serem maus,
indivíduos com esse transtorno podem por vezes
apresentar sentimentos de que eles mesmos não
existem. Tais experiências ocorrem geralmente
em situações nas quais o indivíduo sente falta de
relações significativas, de cuidado e de apoio.
Podem demonstrar um desempenho pior em
situações não estruturadas de trabalho ou
estudo.
Indivíduos com transtorno da personalidade
borderline mostram impulsividade em pelo
menos duas áreas potencialmente
autodestrutivas [...]. Podem apostar, gastar
dinheiro de forma irresponsável [prodigalidade],
comer compulsivamente, abusar de substâncias,
envolver-se em sexo desprotegido ou dirigir de
forma imprudente. Apresentam recorrência de
comportamento, gestos ou ameaças suicidas ou
de comportamento de automutilação [...].
Suicídio ocorre em 8 a 10% de tais indivíduos,
sendo que atos de automutilação (p. ex., cortes
ou queimaduras) e ameaças e tentativas de
suicídio são muito comuns. A ideação suicida
recorrente é com frequência a razão pela qual
essas pessoas buscam ajuda. Esses atos
autodestrutivos são geralmente precipitados por
ameaças de separação ou rejeição ou por
expectativas de que o indivíduo assuma maiores
responsabilidades. A automutilação pode
ocorrer durante experiências dissociativas e com
frequência traz alívio por reafirmar a capacidade
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
143

do indivíduo de sentir ou por expiar a sensação


de ser uma má pessoa.
Indivíduos com o transtorno podem demonstrar
instabilidade afetiva devido a acentuada
reatividade do humor (p. ex., disforia episódica,
irritabilidade ou ansiedade intensa com duração
geralmente de poucas horas e apenas raramente
com duração de mais do que alguns dias) [...]. O
humor disfórico basal dos que têm esse
transtorno é amiúde interrompido por períodos
de raiva, pânico ou desespero e é raramente
aliviado por períodos de bem-estar ou
satisfação. Esses episódios podem refletir a
extrema reatividade do indivíduo a estresses
interpessoais. Indivíduos com o transtorno
podem ser perturbados por sentimentos crônicos
de vazio [...]. Facilmente entediados, podem
estar constantemente buscando algo para fazer.
Com frequência expressam raiva inadequada e
intensa ou têm dificuldades em controlá-la [...].
Podem demonstrar sarcasmo extremo, amargura
persistente ou ter explosões verbais. A raiva é
geralmente provocada quando um cuidador ou
companheiro é visto como negligente, contido,
despreocupado ou como alguém que abandona.
Tais expressões de raiva costumam ser seguidas
de vergonha e culpa, contribuindo para o
sentimento de ter sido mau. Durante períodos de
estresse extremo, podem ocorrer ideação
paranoide ou sintomas dissociativos transitórios
(p. ex., despersonalização) [...], embora sejam,
em geral, de gravidade ou duração insuficiente
para levar a um diagnóstico adicional. Esses
episódios ocorrem mais frequentemente em
resposta a um abandono real ou imaginado. Os
sintomas tendem a ser passageiros, durando de
minutos a horas.
O retorno real ou percebido da dedicação do
cuidador pode resultar em remissão dos
sintomas.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Indivíduos com transtorno da personalidade
borderline podem ter um padrão de sabotagem
pessoal no momento em que uma meta está para
ser atingida (p. ex., abandono da escola logo
antes da formatura; regressão grave após
conversa sobre os bons rumos da terapia;
destruição de um relacionamento bom
exatamente quando está claro que ele pode
durar). Alguns indivíduos desenvolvem
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
144

sintomas semelhantes à psicose (p. ex.,


alucinações, distorções da imagem corporal,
ideias de referência, fenômenos hipnagógicos)
em momentos de estresse. Indivíduos com esse
transtorno podem se sentir mais protegidos
junto a objetos transicionais (i.e., animal de
estimação ou objeto inanimado) do que em
relacionamentos interpessoais. Pode ocorrer
morte prematura por suicídio em indivíduos
com o transtorno, especialmente naqueles em
que há ocorrência simultânea de transtornos
depressivos ou transtornos por uso de
substância. Deficiências físicas podem resultar
de comportamentos de abuso autoinfligidos ou
de tentativas fracassadas de suicídio. Perdas de
emprego recorrentes, interrupção da educação e
separação ou divórcio são comuns. Abuso físico
e sexual, negligência, conflito hostil e perda
parental prematura são mais comuns em
histórias de infância daqueles com o transtorno
da personalidade borderline. Transtornos
comuns de se observar concomitantemente
incluem transtornos depressivo e bipolar,
transtornos por uso de substância, transtornos
alimentares (sobretudo bulimia nervosa),
transtorno de estresse pós-traumático e
transtorno de déficit de atenção/hiperatividade.
O transtorno da personalidade borderline
também ocorre frequentemente com outros
transtornos da personalidade.

Transtorno de personalidade paranoide (ou paranoica)


CID-10 DSM-5
Transtorno da personalidade caracterizado por A característica essencial do transtorno da
uma sensibilidade excessiva face às personalidade paranoide é um padrão de
contrariedades, recusa de perdoar os insultos, desconfiança e suspeita difusa dos outros a
caráter desconfiado, tendência a distorcer os ponto de suas motivações serem interpretadas
fatos interpretando as ações imparciais ou como malévolas. Esse padrão começa no início
amigáveis dos outros como hostis ou de da vida adulta e está presente em contextos
desprezo; suspeitas recidivantes [recorrentes], variados.
injustificadas, a respeito da fidelidade sexual Indivíduos com esse transtorno creem que
do esposo ou do parceiro sexual; e um outras pessoas irão explorá-los, causar-lhes
sentimento combativo e obstinado de seus dano ou enganá-los, mesmo sem evidências que
próprios direitos. apoiem essa expectativa [...]. Suspeitam, com
Pode existir uma superavaliação de sua base em pouca ou nenhuma evidência, de que
autoimportância, havendo frequentemente outros estão tramando contra eles e podem
autoreferência excessiva. atacá-los de repente, a qualquer momento e sem
razão. Costumam achar que foram profunda e
irreversivelmente maltratados por outra pessoa
ou pessoas, mesmo na ausência de evidências
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
145

objetivas para tal. São preocupados com dúvidas


injustificadas acerca da lealdade ou confiança
de seus amigos e sócios, cujas ações são
examinadas minuciosamente em busca de
evidências de intenções hostis [...]. Qualquer
desvio percebido da confiança ou lealdade serve
de apoio a seus pressupostos subjacentes. Ficam
tão surpresos quando um amigo ou sócio
demonstra lealdade que não conseguem confiar
ou crer nisso. Quando envolvidos em
problemas, esperam que amigos e sócios os
ataquem ou ignorem.
Indivíduos com transtorno da personalidade
paranoide relutam em confiar ou tornar-se
íntimos de outros, pois temem que as
informações que compartilham venham a ser
usadas contra eles [...]. Podem recusar
responder a perguntas pessoais dizendo que tais
informações “não são da conta de ninguém”.
Percebem significados ocultos desabonadores e
ameaçadores em comentários ou eventos
benignos [...]. Por exemplo, um indivíduo com
esse transtorno pode interpretar mal um erro
honesto de um funcionário de uma loja como
uma tentativa deliberada de dar troco a menos
ou entender um comentário bem-humorado
casual de um colega de trabalho como um
ataque sério ao seu caráter. Elogios costumam
ser mal interpretados (p. ex., um elogio por uma
nova aquisição é mal interpretado como uma
crítica de egoísmo; um elogio relativo a um
feito é mal interpretado como uma tentativa de
coerção a desempenho melhor). Podem entender
uma oferta de ajuda como uma crítica por não
estarem tendo desempenho suficientemente bom
por conta própria.
Indivíduos com esse transtorno guardam
rancores persistentemente e não se dispõem a
perdoar insultos, injúrias ou menosprezo dos
quais pensam ter sido alvo [...]. Um leve
desrespeito desperta grande hostilidade, sendo
que os sentimentos hostis persistem por um bom
tempo. Como são constantemente
hipervigilantes em relação às intenções
prejudiciais de outros, sentem, com frequência,
que seu caráter ou reputação foram atacados e
que foram de alguma forma desrespeitados. São
rápidos no contra-ataque e reagem com raiva
aos insultos percebidos [...]. Indivíduos com
esse transtorno podem ser patologicamente
ciumentos, muitas vezes suspeitando de que o
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
146

cônjuge ou parceiro sexual é infiel sem qualquer


justificativa adequada [...]. Podem reunir
“evidências” triviais e circunstanciais que
apoiem suas crenças de ciúme. Desejam manter
controle total das relações íntimas para evitar
serem traídos e podem constantemente
questionar e desafiar o paradeiro, as ações, as
intenções e a fidelidade do cônjuge ou parceiro.
O transtorno da personalidade paranoide não
deve ser diagnosticado se o padrão de com-
portamento ocorre exclusivamente durante o
curso de esquizofrenia, transtorno bipolar ou de-
pressivo com sintomas psicóticos ou outro
transtorno psicótico ou se é atribuível aos
efeitos fisiológicos de uma condição
neurológica (p. ex., epilepsia do lobo temporal)
ou a outra condição médica [...].
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Indivíduos com transtorno da personalidade
paranoide são geralmente de difícil convivência
e apresentam frequentes problemas nos
relacionamentos íntimos. Sua desconfiança e
hostilidade excessivas podem se expressar sob a
forma de argumentações ostensivas, queixas
recorrentes ou, ainda, indiferença calma e
aparentemente hostil. Como são hipervigilantes
em relação a ameaças potenciais, podem agir de
maneira discreta, secreta ou indireta e parecer
“frios” e sem sentimentos afetivos. Ainda que
possam parecer objetivos, racionais e não
emotivos, frequentemente demonstram
labilidade afetiva, com predomínio de
expressões hostis, inflexíveis e sarcásticas. Sua
natureza combativa e desconfiada pode
provocar uma resposta hostil em outras pessoas,
a qual, então, serve para confirmar suas
expectativas originais.
Visto que indivíduos com o transtorno carecem
de confiança nos outros, apresentam
necessidade excessiva de autossuficiência e
forte senso de autonomia. Precisam, ainda, de
elevado grau de controle sobre as pessoas ao seu
redor. Frequentemente são rígidos, críticos em
relação aos outros e incapazes de trabalhar em
conjunto, embora eles mesmos tenham grande
dificuldade de aceitar críticas. Podem culpar os
outros por suas próprias deficiências. Devido à
rapidez no contra-ataque em resposta às
ameaças que percebem ao seu redor, podem ser
beligerantes e frequentemente se envolver em
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
147

disputas judiciais. Indivíduos com esse


transtorno buscam confirmar suas ideias
negativas preconcebidas em relação às pessoas e
às situações com as quais se deparam,
atribuindo motivações malévolas aos outros, as
quais são projeções dos próprios medos. Podem
apresentar fantasias irreais e pouco disfarçadas
de grandeza, estão frequentemente ligados a
questões de poder e posição e tendem a
desenvolver estereótipos negativos dos outros,
em especial aqueles de grupos populacionais
diferentes do seu. Atraídos por formulações
simplistas do mundo, costumam se precaver de
situações ambíguas. Podem ser vistos como
“fanáticos” e formar “cultos” ou grupos muito
unidos com outros indivíduos que compartilham
seus sistemas paranoides de crença.
Especialmente em resposta ao estresse,
indivíduos com esse transtorno podem
apresentar episódios psicóticos breves (durando
de minutos a horas). Em certos casos, o
transtorno da personalidade paranoide pode
surgir como o antecedente pré-mórbido de
transtorno delirante ou esquizofrenia. Indivíduos
com transtorno da personalidade paranoide
podem desenvolver transtorno depressivo maior
e podem estar sob risco aumentado de
agorafobia e transtorno obsessivo-compulsivo.
Transtornos por uso de álcool e outras
substâncias ocorrem com frequência. Os
transtornos da personalidade concomitantes
mais comuns parecem ser: esquizotípica, esqui-
zoide, narcisista, evitativa e borderline.

Transtorno de personalidade esquizoide


CID-10 DSM-5
Transtorno da personalidade caracterizado por A característica essencial do transtorno da
um retraimento dos contatos sociais, afetivos personalidade esquizoide é um padrão difuso de
ou outros, preferência pela fantasia, atividades distanciamento das relações sociais e uma faixa
solitárias e a reserva introspectiva, e uma restrita de expressão de emoções em contextos
incapacidade de expressar seus sentimentos e a interpessoais. Esse padrão surge no começo da
experimentar prazer. vida adulta e está presente em vários contextos.
Indivíduos com transtorno da personalidade
esquizoide demonstram não ter desejo de
intimidade, parecem indiferentes a
oportunidades de desenvolver relações próximas
e não parecem encontrar muita satisfação em
fazer parte de uma família ou de outro grupo
social [...]. Preferem ficar sozinhos em vez de
com outras pessoas. Com frequência parecem
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
148

ser socialmente isolados ou “solitários” e quase


sempre optam por atividades ou passatempos
solitários que não incluem interação com outros
[...]. Preferem tarefas mecânicas ou abstratas,
como jogos matemáticos ou de computador.
Podem ter muito pouco interesse em ter
experiências sexuais com outra pessoa [...] e
têm prazer em poucas atividades, quando não
em nenhuma [...]. Há geralmente uma sensação
reduzida de prazer decorrente de experiências
sensoriais, corporais ou interpessoais, como
caminhar na praia ao fim do dia ou fazer sexo.
Esses indivíduos não têm amigos próximos ou
confidentes, exceto um possível parente de
primeiro grau [...].
Indivíduos com transtorno da personalidade
esquizoide costumam ser indiferentes à apro
vação ou à crítica dos outros e não parecem se
incomodar com o que os demais podem pensar
deles [...]. Podem passar ao largo das sutilezas
normais das interações sociais e frequentemente
não reagem de forma adequada a gentilezas
sociais, de modo que parecem socialmente
inaptos ou superficiais e absorvidos em si
mesmos. Habitualmente, mostram um exterior
“insípido”, sem reatividade emocional visível, e
apenas raramente respondem de forma recíproca
a gestos ou expressões faciais, como sorrisos ou
acenos [...]. Alegam que raramente vivenciam
emoções fortes, como raiva e alegria.
Costumam mostrar um afeto constrito e
parecem frios e distantes. No entanto, naquelas
circunstâncias particularmente incomuns em
que esses indivíduos ficam pelo menos
temporariamente confortáveis em revelar a si
mesmos, podem admitir ter sentimentos de dor,
sobretudo relacionados às interações sociais.
O transtorno da personalidade esquizoide não
deve ser diagnosticado se o padrão de
comportamento ocorre exclusivamente durante
o curso de esquizofrenia, transtorno bipolar ou
depressivo com sintomas psicóticos, outro
transtorno psicótico ou transtorno do espectro
autista ou se é atribuível aos efeitos fisiológicos
de uma condição médica neurológica (p. ex.,
epilepsia do lobo temporal) ou a outra condição
médica.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Indivíduos com transtorno da personalidade
esquizoide podem ter uma dificuldade particular
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
149

para expressar raiva, mesmo em resposta a


provocação direta, o que contribui para a
impressão de que carecem de emoção. Suas
vidas parecem por vezes sem rumo, e eles
podem aparentar estar “à deriva” em relação a
seus objetivos. Tais indivíduos frequentemente
reagem de forma passiva a circunstâncias
adversas e apresentam dificuldade em reagir
adequadamente a acontecimentos importantes
da vida. Devido à falta de habilidades sociais e à
ausência de desejo de experiências sexuais,
indivíduos com esse transtorno têm poucos
amigos, raramente namoram e costumam não
casar. O funcionamento profissional pode estar
prejudicado, em especial quando há necessidade
de envolvimento interpessoal; podem,
entretanto, ser bem-sucedidos quando trabalham
em condições de isolamento social.
Particularmente em resposta a estresse,
indivíduos com esse transtorno podem ter vários
episódios psicóticos muito breves (com duração
de minutos a horas). Em alguns casos, o
transtorno da personalidade esquizoide pode
surgir como o antecedente pré-mórbido de
transtorno delirante ou esquizofrenia. Indivíduos
com esse transtorno podem, às vezes, desenvol-
ver transtorno depressivo maior. O transtorno da
personalidade esquizoide com frequência ocorre
concomitantemente com os transtornos da
personalidade esquizotípica, paranoide e
evitativa.

Transtorno de personalidade esquizotípica


CID-10 DSM-5
Transtorno caracterizado por um A característica essencial do transtorno da
comportamento excêntrico e por anomalias do personalidade esquizotípica é um padrão difuso
pensamento e do afeto que se assemelham de déficits sociais e interpessoais marcado por
àquelas da esquizofrenia, mas não há em desconforto agudo e capacidade reduzida para
nenhum momento da evolução qualquer relacionamentos íntimos, bem como por
anomalia esquizofrênica manifesta ou distorções cognitivas ou perceptivas e
característica. A sintomatologia pode comportamento excêntrico. Esse padrão surge
comportar um afeto frio ou inapropriado, no começo da vida adulta e está presente em
anedonia; um comportamento estranho ou vários contextos.
excêntrico; uma tendência ao retraimento Indivíduos com transtorno da personalidade
social; ideias paranoides ou bizarras sem que esquizotípica com frequência apresentam ideias
se apresentem ideias delirantes autênticas; de referência (i.e., interpretações incorretas de
ruminações obsessivas; transtornos do curso do incidentes casuais e eventos externos como
pensamento e perturbações das percepções; tendo um sentido particular e incomum
períodos transitórios ocasionais quase especificamente para a pessoa) [...]. Estas
psicóticos com ilusões intensas, alucinações devem ser distinguidas de delírios de referência,
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
150

auditivas ou outras e ideias pseudodelirantes, nos quais as crenças são mantidas com
ocorrendo em geral sem fator desencadeante convicção delirante. Esses indivíduos podem ser
exterior. O início do transtorno é difícil de supersticiosos ou preocupados com fenômenos
determinar, e sua evolução corresponde em paranormais que fogem das normas de sua
geral àquela de um transtorno da subcultura [...]. Podem achar que têm poderes
personalidade. especiais para sentir os eventos antes que
ocorram ou para ler os pensamentos alheios.
Podem acreditar que exercem controle mágico
sobre os outros, o qual pode ser implementado
diretamente (p. ex., a crença de que o fato de o
cônjuge estar levando o cachorro para passear é
consequência direta de, uma hora antes, ter
pensado que isso devia ser feito) ou
indiretamente, por meio de obediência a rituais
mágicos (p. ex., passar três vezes por
determinado objeto para evitar uma
consequência danosa). Alterações perceptivas
podem estar presentes (p. ex., sentir que outra
pessoa está presente ou ouvir uma voz
(Salvador Dali – 1904-1989) murmurando seu nome) [...]. Seu discurso pode
incluir fraseados e construções incomuns ou
idiossincrásicas e costuma ser desconexo,
digressivo ou vago, embora sem apresentar um
real descarrilhamento ou incoerência [...].
Respostas podem ser excessivamente concretas
ou abstratas, e palavras e conceitos são, por
vezes, aplicados de maneiras pouco habituais (p.
ex., o indivíduo pode afirmar que não estava
“conversável” no trabalho).
Indivíduos com esse transtorno são
frequentemente desconfiados e podem
apresentar ideias paranoides (p. ex., crer que os
colegas de trabalho estão planejando minar sua
reputação com o chefe) [...]. Em geral, são
incapazes de lidar com os afetos e as minúcias
interpessoais que são necessários para
relacionamentos bem-sucedidos; assim, com
frequência parecem interagir com os outros de
forma inadequada, formal ou constrita [...].
Esses indivíduos são geralmente considerados
esquisitos ou excêntricos em virtude de
maneirismos incomuns, isto é, sua forma
desleixada de vestir-se que não “combina” bem
e sua falta de atenção às convenções sociais
habituais (p. ex., o indivíduo pode evitar contato
visual, usar roupas manchadas ou que não
servem bem e ser incapaz de participar das
provocações e brincadeiras que ocorrem entre
colegas de trabalho) [...].
Indivíduos com transtorno da personalidade
esquizotípica vivenciam os relacionamentos
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
151

interpessoais como problemáticos e sentem


desconforto em se relacionar com outras
pessoas. Embora possam manifestar infelicidade
acerca da falta de relacionamentos, seu
comportamento sugere um desejo reduzido de
contatos íntimos. Assim, costumam ter poucos
ou nenhum amigo próximo ou confidente que
não seja parente de primeiro grau [...]. São
ansiosos em situações sociais, especialmente
aquelas que envolvem pessoas desconhecidas
[...]. Irão interagir com outras pessoas quando
tiverem de fazer isso, mas preferem não
estabelecer interações, pois sentem que são
diferentes e que não se enturmam. Sua
ansiedade social não diminui facilmente, mesmo
quando passam mais tempo no local ou
conhecem melhor as outras pessoas, visto que a
ansiedade tende a estar associada à desconfiança
quanto às motivações dos outros.
Por exemplo, em um jantar, a pessoa com o
transtorno da personalidade esquizotípica não
ficará mais relaxada com o passar das horas;
pelo contrário: ficará mais tensa e desconfiada.
Transtorno da personalidade esquizotípica não
deve ser diagnosticado se o padrão de compor-
tamento ocorre exclusivamente durante o curso
de esquizofrenia, transtorno bipolar ou
depressivo com sintomas psicóticos, outro
transtorno psicótico ou transtorno do espectro
autista [...].
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Indivíduos com transtorno da personalidade
esquizotípica costumam buscar tratamento mais
para os sintomas associados de ansiedade ou
depressão do que para as características do
transtorno da personalidade em si.
Particularmente em resposta a estresse,
indivíduos com o transtorno podem apresentar
episódios psicóticos transitórios (com duração
de minutos a horas), embora eles geralmente
tenham duração insuficiente para indicar um
diagnóstico adicional, como transtorno psicótico
breve ou transtorno esquizofreniforme. Em
alguns casos, podem surgir sintomas psicóticos
clinicamente significativos que atendam aos
critérios de transtorno psicótico breve,
transtorno esquizofreniforme, transtorno
delirante ou esquizofrenia. Mais de metade dos
indivíduos com o transtorno da personalidade
esquizotípica pode ter história de pelo menos
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
152

um episódio depressivo maior. De 30 a 50% dos


indivíduos diagnosticados com esse transtorno
têm um diagnóstico simultâneo de transtorno
depressivo maior quando avaliados em um
contexto clínico. Existe considerável
concomitância de transtornos da personalidade
esquizoide, paranoide, evitativa e borderline.

Transtorno de personalidade obsessiva-compulsiva (ou anancástica)


CID-10 DSM-5
Transtorno da personalidade caracterizado por A característica essencial do transtorno da
um sentimento de dúvida, perfeccionismo, personalidade obsessivo-compulsiva é uma
escrupulosidade, verificações, e preocupação preocupação com ordem, perfeccionismo e
com pormenores, obstinação, prudência e controle mental e interpessoal à custa de
rigidez excessivas. flexibilidade, abertura e eficiência. Esse padrão
O transtorno pode se acompanhar de surge no início da vida adulta e está presente em
pensamentos ou de impulsos repetitivos e vários contextos.
intrusivos não atingindo a gravidade de um Indivíduos com transtorno da personalidade
transtorno obsessivo-compulsivo. obsessivo-compulsiva tentam manter uma
sensação de controle por meio de atenção
cuidadosa a regras, pequenos detalhes,
procedimentos, listas, cronogramas ou forma a
ponto de o objetivo principal da atividade ser
perdido [...]. São excessivamente cuidadosos e
propensos à repetição, prestando extraordinária
atenção aos detalhes e conferindo repetidas
vezes na busca por possíveis erros. Esquecem o
fato de que outras pessoas podem se incomodar
muito com os atrasos e as inconveniências que
resultam desse comportamento. Por exemplo,
quando esses indivíduos esquecem onde
colocaram uma lista de coisas a fazer, gastam
tempo demais procurando a lista em vez de
gastar alguns instantes refazendo-a de memória
e passando à execução das tarefas. O tempo é
mal alocado, e as tarefas mais importantes são
deixadas por último. O perfeccionismo e os
padrões elevados de desempenho autoimpostos
causam disfunção e sofrimento significativo a
esses indivíduos. Podem ficar de tal forma
envolvidos em tornar cada detalhe de um
projeto absolutamente perfeito que este jamais é
concluído [...]. Por exemplo, a conclusão de um
relatório escrito é retardada por várias reescritas
que tomam tempo, para tudo ficar aquém da
“perfeição”. Prazos não são atendidos, e
aspectos da vida do indivíduo que não são o
foco atual da atividade podem desorganizar-se.
Indivíduos com esse transtorno demonstram
dedicação excessiva ao trabalho e à
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
153

produtividade, a ponto de excluir atividades de


lazer e amizades [...]. Esse comportamento não
é explicado por necessidade financeira. Com
frequência sentem que não têm tempo para tirar
uma tarde ou um fim de semana de folga para
viajar ou apenas relaxar. Podem ficar
postergando atividades agradáveis, como as
férias, de modo que elas podem jamais ocorrer.
Quando realmente dedicam algum tempo para
lazer ou férias, sentem-se bastante
desconfortáveis, a não ser que tenham consigo
algum tipo de trabalho de modo a não
“desperdiçarem tempo”. Pode haver muita
concentração em tarefas domiciliares (p. ex.,
limpeza excessiva e repetida a ponto de “poder
comer direto do chão”). Quando ficam algum
tempo com os amigos, é provável que seja em
algum tipo de atividade formalmente organizada
(p. ex., esportes). Passatempos e atividades de
recreação são levadas como tarefas sérias que
exigem organização criteriosa e trabalho duro
para serem dominadas. A ênfase recai sobre o
desempenho perfeito. Esses indivíduos
transformam o jogo e brincadeiras em tarefas
estruturadas (p. ex., corrigindo um bebê que não
põe os círculos em um cilindro de madeira na
ordem correta; dizendo a uma criança para
andar de triciclo em linha reta; transformando
um esporte qualquer em uma “lição” severa).
Indivíduos com transtorno da personalidade
obsessivo-compulsiva podem ser
excessivamente conscienciosos [cuidadosos],
escrupulosos e inflexíveis acerca de assuntos de
moralidade, ética ou valores. Podem obrigar-se
e obrigar os outros a seguir princípios morais
rígidos e padrões muito austeros de
desempenho. Podem, ainda, ser críticos
impiedosos em relação aos próprios erros.
Indivíduos com esse transtorno respeitam
autoridade e regras com extrema consideração e
insistem em obedecer às regras de forma
bastante literal e inflexível. Por exemplo, o
indivíduo não irá emprestar uma moeda a um
amigo que precisa dela para um telefonema
porque ele mesmo não é “do tipo que pede
emprestado ou empresta” ou porque seria ruim
para o caráter da pessoa. Essas características
não devem ser explicadas por identificação
cultural ou religiosa do indivíduo. Indivíduos
com esse transtorno podem ser incapazes de
descartar objetos usados ou sem valor, mesmo
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
154

na ausência de valor sentimental [...].


Frequentemente admitem ser acumuladores.
Consideram o descarte de objetos um
desperdício, pois “nunca se sabe quando poderá
precisar de alguma coisa” e ficam incomodados
se alguém tenta se livrar de coisas que eles
guardaram. Seus cônjuges ou parceiros podem
se queixar da quantidade de espaço ocupado por
peças e revistas antigas, aparelhos estragados e
assim por diante. Essas pessoas relutam em
delegar tarefas ou em trabalhar em conjunto
[...]. De maneira teimosa e injustificada,
insistem que tudo precisa ser feito a seu modo e
que as pessoas têm de se conformar com sua
maneira de fazer as coisas. Com frequência dão
instruções bastante detalhadas sobre como tudo
deve ser feito (p. ex., só há uma forma de cortar
a grama, lavar os pratos, construir uma casa
para o cachorro) e ficam surpresos e irritados
quando outros sugerem alternativas criativas.
Em outras ocasiões, podem rejeitar ofertas de
ajuda mesmo quando atrasados no cronograma,
pois consideram que ninguém pode fazer as
coisas tão bem quanto eles mesmos.
Indivíduos com esse transtorno podem ser
miseráveis e mesquinhos e manter um padrão de
vida bastante inferior ao que podem sustentar,
acreditando que os gastos devem ser
rigidamente controlados para garantir sustento
em catástrofes futuras [...]. O transtorno da
personadidade obsessivo-compulsiva
caracteriza-se por rigidez e teimosia [...].
Indivíduos com o transtorno estão tão
preocupados em realizar as tarefas da única
maneira “certa” que enfrentam dificuldades para
concordar com as ideias de qualquer outra
pessoa. Planejam o futuro nos mínimos detalhes
e não se dispõem a avaliar possíveis mudanças.
Completamente envolvidos pela própria
perspectiva, têm dificuldade de reconhecer os
pontos de vista dos outros. Amigos e colegas
podem se frustrar por essa rigidez constante.
Mesmo quando reconhecem que ceder pode ser
interessante para eles mesmos, podem de forma
teimosa recusar-se a isso alegando ser este “o
princípio da coisa.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Quando regras e procedimentos estabelecidos
não ditam a resposta correta, tomar uma decisão
pode se tornar um processo demorado e
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
155

desgastante. Indivíduos com transtorno da


personalidade obsessivo-compulsiva podem ter
tanta dificuldade para decidir as tarefas às quais
dar prioridade ou qual a melhor maneira de
fazer alguma tarefa específica que podem
jamais começar o que quer que seja. Têm
propensão ao aborrecimento ou à raiva em
situações nas quais não conseguem manter
controle do seu ambiente físico ou interpessoal,
embora a raiva não costume ser manifestada de
forma direta. Por exemplo, o indivíduo pode
ficar irritado diante de um serviço insatisfatório
em um restaurante, mas, em vez de queixar-se
ao gerente, fica ruminando sobre quanto dar de
gorjeta. Em outras ocasiões, a raiva pode ser
expressa por meio de indignação em relação a
um assunto aparentemente insignificante.
Indivíduos com esse transtorno podem dar
atenção especial a seu estado relativo nas
relações de domínio-submissão e podem exibir
deferência excessiva a uma autoridade que
respeitam e resistência excessiva a uma que não
respeitam.
Indivíduos com esse transtorno geralmente
manifestam afeto de forma altamente controlada
ou artificial e podem sentir grande desconforto
na presença de outros que se expressam com
emoção. As relações cotidianas são sérias e
formais, e eles podem parecer sisudos em
situações em que outros sorririam e ficariam
alegres (p. ex., saudar um namorado no
aeroporto). Eles se contêm cuidadosamente até
estarem certos de que o que dirão será perfeito.
Podem se preocupar com a lógica e com o
intelecto e ser intolerantes ao comportamento
afetivo dos outros. Com frequência apresentam
dificuldades de expressar sentimentos amorosos
e raramente fazem elogios. Indivíduos com esse
transtorno podem ter dificuldades e sofrimento
no trabalho, sobretudo quando confrontados
com novas situações que exijam flexibilidade e
transigência.
Indivíduos com transtornos de ansiedade,
inclusive transtorno de ansiedade generalizada,
transtorno de ansiedade social (fobia social) e
fobias específicas, bem como transtorno
obsessivo-compulsivo (TOC), têm
probabilidade aumentada de apresentar uma
perturbação da personalidade que atenda aos
critérios do transtorno da personalidade
obsessivo-compulsiva. Mesmo assim, parece
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
156

que a maioria das pessoas com TOC não


apresenta um padrão de comportamento que
atenda aos critérios para esse transtorno da
personalidade. Muitas das características do
transtorno da personalidade obsessivo-
compulsiva sobrepõem-se às características de
personalidade “tipo A” (p. ex., preocupação
com o trabalho, competitividade, urgência
temporal), e estas podem estar presentes em
pessoas com risco de infarto do miocárdio. Pode
haver associação entre transtorno da
personalidade obsessivo-compulsiva e
transtornos bipolar e depressivo e transtornos
alimentares.

Transtorno de personalidade histriônica


CID-10 DSM-5
Transtorno da personalidade caracterizado por A característica essencial do transtorno da
uma afetividade superficial e lábil, personalidade histriônica é a emocionalidade
dramatização, teatralidade, expressão excessiva e difusa e o comportamento de busca
exagerada das emoções, sugestibilidade, de atenção. Esse padrão surge no início da vida
egocentrismo, autocomplacência, falta de adulta e está presente em vários contextos.
consideração para com o outro, desejo Indivíduos com o transtorno da personalidade
permanente de ser apreciado e de constituir-se histriônica sentem-se desconfortáveis ou não
no objeto de atenção e tendência a se sentir valorizados quando não estão no centro das
facilmente ferido. atenções [...]. Normalmente cheios de vida e
dramáticos, tendem a atrair atenção para si
mesmos e podem inicialmente fazer novas
amizades por seu entusiasmo, abertura aparente
ou sedução. Essas qualidades se extinguem,
todavia, à medida que esses indivíduos
demandam continuadamente ser o centro das
atenções. Eles comandam o papel de “vida da
festa”. Caso não sejam o centro das atenções,
podem fazer algo dramático (p. ex., inventar
histórias, criar uma cena) para atrair o foco da
atenção para si. Tal necessidade é com
frequência aparente em seu comportamento com
um clínico (p. ex., elogiar, levar presentes, dar
descrições dramáticas de sintomas físicos e
psicológicos que são substituídos por novos
sintomas a cada consulta).
A aparência e o comportamento de indivíduos
com esse transtorno são, em geral, sexualmente
provocativos ou sedutores de forma inadequada
[...]. Esse comportamento é voltado não
somente às pessoas por quem o indivíduo tem
interesse romântico ou sexual, mas ocorre
também em uma grande variedade de
relacionamentos sociais, ocupacionais e
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
157

profissionais, além do que seria apropriado ao


contexto social. A expressão emocional pode ser
superficial e rapidamente cambiante [...]. Os
indivíduos com o transtorno usam
reiteradamente a aparência física para atrair as
atenções para si [...]. São excessivamente
preocupados em impressionar os outros por
meio de sua aparência e dedicam muito tempo,
energia e dinheiro a roupas e embelezamento.
Podem buscar elogios acerca da aparência e
também ficar chateados de forma fácil e
excessiva em virtude de algum comentário
crítico sobre como estão ou por uma fotografia
que porventura considerem não lisonjeira.
Esses indivíduos têm um estilo de discurso
excessivamente impressionista e carente de
detalhes [...]. Opiniões fortes são expressas de
forma dramática, mas as razões subjacentes
costumam ser vagas e difusas, sem fatos e
detalhes de apoio. Por exemplo, um indivíduo
com transtorno da personalidade histriônica
pode comentar que determinada pessoa é um ser
humano maravilhoso, ainda que não consiga
oferecer qualquer exemplo específico de boas
qualidades que apoiem sua opinião. Indivíduos
com esse transtorno são caracterizados pela
autodramatização, pela teatralidade e pela
expressão exagerada das emoções [...]. Podem
envergonhar amigos e conhecidos pela exibição
pública excessiva de emoções (p. ex., abraçar
conhecidos casuais com entusiasmo demasiado,
chorar de forma inconsolável em ocasiões
sentimentais de importância menor, ter ataques
de raiva repentinos). Suas emoções, no entanto,
frequentemente parecem ser ligadas ou
desligadas com muita rapidez para serem
sentidas em profundidade, o que pode levar os
outros a acusá-los de dissimular esses
sentimentos.
Indivíduos com transtorno da personalidade
histriônica são altamente sugestionáveis [...].
Suas opiniões e sentimentos são facilmente
influenciados pelos outros ou por modismos
presentes. Podem confiar em demasia, em
especial em figuras fortes de autoridade que
veem como capazes de solucionar de forma
mágica seus problemas. Têm tendência a dar
palpites e a adotar convicções rapidamente.
Costumam considerar as relações pessoais como
mais íntimas do que realmente são, descrevendo
quase todos os conhecidos como “meu
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
158

queridíssimo amigo” ou fazendo referência a


médicos que encontraram uma ou duas vezes
em circunstâncias profissionais por seus
primeiros nomes. [...]
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Indivíduos com transtorno da personalidade
histriônica podem ter dificuldades em alcançar
intimidade emocional em relacionamentos
românticos ou sexuais. Sem se dar conta disso,
costumam desempenhar um papel (p. ex.,
“vítima” ou “princesa”) em suas relações com
os outros. Podem buscar controlar seu parceiro
por meio de manipulação emocional ou sedução
em um nível, ao mesmo tempo que mostram
dependência acentuada deles em outro nível.
Indivíduos com esse transtorno geralmente têm
relacionamentos difíceis com amigos do mesmo
sexo, pois seu estilo interpessoal sexualmente
provocativo pode parecer uma ameaça aos
relacionamentos afetivos destes. Esses
indivíduos podem também afastar os amigos
com exigências de atenção constante. Com
frequência ficam deprimidos e aborrecidos
quando não são o centro das atenções. Podem
buscar obstinadamente novidades, estímulos e
excitação e ter tendência a entediar-se com a
rotina. Não costumam tolerar ou se sentem
frustrados por situações envolvendo atraso de
gratificação, sendo suas ações costumeiramente
voltadas à obtenção de satisfação imediata.
Embora com frequência comecem um trabalho
ou projeto com muito entusiasmo, seu interesse
pode se dissipar rapidamente. Relacionamentos
de longa data podem ser negligenciados para dar
espaço à excitação de novos relacionamentos.
O risco real de suicídio não é conhecido, mas a
experiência clínica sugere que esses indivíduos
estão sob risco aumentado de gestos e ameaças
suicidas que realizam com o intuito de obter
atenção e coagir os demais a oferecer melhores
cuidados. O transtorno da personalidade
histriônica tem sido associado a taxas mais altas
de transtorno de sintomas somáticos, transtorno
conversivo (transtorno de sintomas neurológicos
funcionais) e transtorno depressivo maior. Com
frequência, os transtornos da personalidade
borderline, narcisista, antissocial e dependente
ocorrem de forma concomitante.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


159

Transtorno de personalidade narcisista


CID-10 DSM-5
Não consta o tópico. A característica essencial do transtorno da
personalidade narcisista é um padrão difuso de
grandiosidade, necessidade de admiração e falta
de empatia que surge no início da vida adulta e
está presente em vários contextos.
Indivíduos com o transtorno têm um sentimento
grandioso da própria importância [...].
Superestimam de forma rotineira suas
capacidades e exageram suas conquistas, com
frequência parecendo pretensiosos e arrogantes.
Podem tranquilamente partir do pressuposto de
que os outros atribuem o mesmo valor aos seus
esforços e podem surpreender-se quando o
elogio que esperam e o sentimento que sentem
merecer não ocorrem. Comumente implícita nos
juízos inflados das próprias conquistas está uma
subestimação (desvalorização) das contribuições
dos outros. Indivíduos com transtorno da
personalidade narcisista estão frequentemente
preocupados com fantasias de sucesso ilimitado,
poder, brilho, beleza ou amor ideal [...]. Podem
ruminar acerca de admiração e privilégios “há
muito devidos” e comparar-se favoravelmente a
pessoas famosas ou privilegiadas.
As pessoas com esse transtorno creem ser
superiores, especiais ou únicas e esperam que os
outros as reconheçam como tal [...]. Podem
sentir que são somente compreendidas por
outras pessoas especiais ou de condição elevada,
e apenas com elas devem se associar, podendo
atribuir qualidades como “únicas”, “perfeitas” e
“dotadas” àquelas com quem se associam.
Indivíduos com esse transtorno acreditam que
suas necessidades são especiais e estão além do
conhecimento das pessoas comuns. Sua própria
autoestima é realçada (i.e., “espelhada”) pelo
valor idealizado que conferem àqueles com
quem se associam. Tendem a insistir em ser
atendidos apenas por pessoas “top” (médico,
advogado, cabeleireiro, instrutor) ou em ser
afiliados às “melhores” instituições, embora
possam desvalorizar as credenciais daqueles que
os desapontam.
Indivíduos com esse transtorno geralmente
exigem admiração excessiva [...]. Sua
autoestima é quase invariavelmente muito
frágil. Podem estar preocupados com o quão
bem estão se saindo e o quão favoravelmente os

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


160

outros os consideram. Isso costuma assumir a


forma de uma necessidade constante de atenção
e admiração. Podem esperar que sua chegada
seja saudada com grandes comemorações e
ficam atônitos quando os outros não cobiçam
seus pertences. Podem constantemente buscar
elogios, em geral com muita sedução. Fica
evidente nesses indivíduos uma sensação de
possuir direitos por meio das expectativas
irracionais de tratamento especialmente
favorável que apresentam [...]. Esperam ser
servidos e ficam atônitos ou furiosos quando
isso não acontece. Por exemplo, podem supor
que não precisam aguardar em filas e que suas
prioridades são tão importantes que os outros
farão uma deferência a eles, irritando-se depois
quando estes não os auxiliam “em seu trabalho
tão importante”. Essa sensação de possuir
direitos, combinada com falta de sensibilidade
aos desejos e necessidades dos outros, pode
resultar na exploração consciente ou
involuntária de outras pessoas [...]. Esperam
receber qualquer coisa que desejarem ou sintam
necessitar, independentemente do que isso possa
significar para os outros. Por exemplo, esses
indivíduos podem esperar uma grande
dedicação dos outros e podem explorá-los
abusivamente sem dar importância ao impacto
que esse fato pode ter em suas vidas. Tendem a
formar relações de amizade ou romance
somente se a outra pessoa parece possibilitar o
avanço de seus propósitos ou, então,
incrementar sua autoestima. Costumam usurpar
privilégios especiais e recursos extraordinários
que creem merecer por serem tão especiais.
Indivíduos com o transtorno geralmente
apresentam falta de empatia e dificuldade de
reconhecer os desejos, as experiências
subjetivas e os sentimentos das outras pessoas
[...].
Podem pressupor que os outros estão totalmente
preocupados com seu bem-estar. Tendem a
discutir suas próprias preocupações de forma
detalhada e prolongada, ao mesmo tempo que
falham em reconhecer que os demais também
têm sentimentos e necessidades. Com
frequência são desdenhosos e impacientes com
outros que falam sobre seus próprios problemas
e preocupações. Podem não enxergar o quanto
ferem os demais com seus comentários (p. ex.,
dizer exageradamente a um ex-companheiro
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
161

“Agora estou em um relacionamento para toda a


vida!”; alardear a saúde diante de alguém
doente). Quando reconhecidos, as necessidades,
os desejos ou os sentimentos das outras pessoas
são provavelmente encarados de forma
depreciativa como sinais de fraqueza ou
vulnerabilidade. Aqueles que se relacionam com
indivíduos com transtorno da personalidade
narcisista costumam encontrar frieza emocional
e falta de interesse recíproco.
Esses indivíduos tendem a invejar os outros ou a
acreditar que estes os invejam [...]. Podem ver
com má vontade o sucesso ou os pertences das
outras pessoas, sentindo que eles é que são os
reais merecedores de tais conquistas, admiração
ou privilégios. Podem desvalorizar
grosseiramente as contribuições dos outros,
sobretudo quando essas pessoas receberam
reconhecimento ou elogio pelo que realizaram.
Comportamentos arrogantes e insolentes
caracterizam esses indivíduos; com frequência
exibem esnobismo, desdém ou atitudes
condescendentes [...]. Por exemplo, um
indivíduo com esse transtorno pode se queixar
da “grosseria” ou “estupidez” de um garçom
desajeitado ou concluir uma avaliação médica
com uma apreciação condescendente do
médico.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
A vulnerabilidade na autoestima torna os
indivíduos com transtorno da personalidade
narcisista muito sensíveis a “feridas” resultantes
de crítica ou derrota. Embora possam não
evidenciar isso de forma direta, a crítica pode
assustá-los, deixando neles sentimentos de
humilhação, degradação, vácuo e vazio. Podem
reagir com desdém, fúria ou contra-ataque
desafiador. Tais vivências geralmente levam a
retraimento social ou a uma aparência de
humildade que pode mascarar e proteger a
grandiosidade. Relações interpessoais
costumam ser afetadas devido a problemas
resultantes da crença no merecimento de
privilégios, da necessidade de admiração e da
relativa desconsideração das sensibilidades dos
outros. Embora ambição e confiança
desmedidas possam levar a grandes conquistas,
o desempenho pode ser comprometido pela
intolerância a críticas ou derrotas. O
desempenho no trabalho às vezes pode ser
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
162

muito baixo, refletindo falta de disposição de se


arriscar em situações competitivas ou em outras
em que há possibilidade de derrota. Sentimentos
persistentes de vergonha ou humilhação e a
autocrítica acompanhante podem estar
associados a retraimento social, humor
deprimido e transtorno depressivo persistente
(distimia) ou transtorno depressivo maior. Por
sua vez, períodos sustentados de grandiosidade
podem estar associados a humor hipomaníaco.
O transtorno da personalidade narcisista está
ainda associado a anorexia nervosa e transtornos
por uso de substância (especialmente
relacionados a cocaína). Transtornos da
personalidade histriônica, borderline, antissocial
e paranoide podem estar associados ao
transtorno da personalidade narcisista.

Transtorno de personalidade dependente


CID-10 DSM-5
Transtorno da personalidade caracterizado por: A característica essencial do transtorno da
tendência sistemática a deixar a outrem a personalidade dependente é uma necessidade
tomada de decisões, importantes ou menores; difusa e excessiva de ser cuidado que leva a
medo de ser abandonado; percepção de si comportamento de submissão e apego e a
como fraco e incompetente; submissão passiva temores de separação. Esse padrão surge no
à vontade do outro (por exemplo de pessoas início da vida adulta e está presente em vários
mais idosas) e uma dificuldade de fazer face às contextos. Os comportamentos de dependência
exigências da vida cotidiana; falta de energia e submissão formam-se com o intuito de
que se traduz por alteração das funções conseguir cuidado e derivam de uma
intelectuais ou perturbação das emoções; autopercepção de não ser capaz de funcionar
tendência frequente a transferir a adequadamente sem a ajuda de outros.
responsabilidade para outros. Indivíduos com o transtorno da personalidade
dependente apresentam grande dificuldade em
tomar decisões cotidianas (p. ex., a cor de
camisa a vestir ou levar ou não o guarda-chuva)
sem uma quantidade excessiva de conselhos e
reasseguramentos oferecidos por outros [...].
Esses indivíduos tendem a ser passivos e a
permitir que outros (frequentemente apenas uma
pessoa) tomem a iniciativa e assumam a
responsabilidade pela maior parte das principais
áreas de suas vidas [...]. Adultos com o
transtorno costumam depender de pai ou mãe ou
cônjuge para decidir onde morar, o tipo de
trabalho a realizar e os vizinhos com quem fazer
amizade. Adolescentes com o transtorno podem
permitir que seus pais decidam o que devem
vestir, com quem fazer amizade, como usar o
tempo livre e a escola ou universidade para
onde ir. Essa necessidade de que outras pessoas
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
163

assumam a responsabilidade vai além das


solicitações de auxílio adequadas à idade ou à
situação (p. ex., as necessidades específicas de
crianças, idosos e pessoas deficientes). O
transtorno da personalidade dependente pode
ocorrer em um indivíduo que tenha uma
condição ou incapacidade médica grave, mas
nesses casos a dificuldade em assumir
responsabilidade precisa ir além daquilo que
estaria normalmente associado a essa condição
ou incapacidade.
Como existe o receio de perder apoio ou
aprovação, indivíduos com o transtorno da
personalidade dependente frequentemente
apresentam dificuldade em expressar
discordância de outras pessoas, em especial
daquelas de quem são dependentes [...]. Eles se
sentem tão incapazes de funcionar por conta
própria que podem vir a concordar com coisas
que consideram erradas apenas para não arriscar
perder a ajuda daqueles que procuram para
orientação. Não se enfurecem justificadamente
com outros de cujo apoio e cuidados
necessitam, por medo de se afastar deles. Se as
preocupações do indivíduo relativas às
consequências de expressar discordância forem
realistas (p. ex., medos reais de punição de um
cônjuge abusivo), o comportamento não deve
ser considerado evidência de transtorno da
personalidade dependente.
Indivíduos com esse transtorno apresentam
dificuldades para iniciar projetos ou fazer coisas
de forma independente [...]. Carecem de
autoconfiança e acham que precisam de ajuda
para iniciar e finalizar tarefas. Podem vir a
aguardar os outros para começar algo, pois
pensam que, em regra, os outros podem fazer
esse algo melhor. Esses indivíduos têm
convicção de serem incapazes de funcionar
independentemente e apresentam-se como
incapazes e como se necessitassem de
assistência constante. Entretanto, é provável que
funcionem adequadamente caso tenham certeza
de que outra pessoa estará supervisionando e
aprovando seu trabalho. Pode haver receio de se
tornar ou parecer mais competente, pois podem
acreditar que isso levará ao abandono. Visto que
contam com os outros para lidar com seus
problemas, com frequência não aprendem as
habilidades para uma vida independente,
perpetuando, assim, a dependência.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
164

Indivíduos com transtorno da personalidade


dependente podem ir a extremos para conseguir
cuidado e apoio de outros, a ponto até de
voluntariar-se para tarefas desagradáveis caso
esse comportamento possa proporcionar a
atenção de que precisam [...]. Estão dispostos a
se submeter ao que os outros desejam, mesmo
que as demandas não sejam razoáveis. Sua
necessidade de manter um vínculo importante
resultará frequentemente em relacionamentos
desequilibrados ou distorcidos. Essas pessoas
podem fazer sacrifícios extraordinários ou
tolerar abuso verbal, físico ou sexual. (Deve-se
observar que esse comportamento deve ser
considerado evidência de transtorno da
personalidade dependente apenas quando puder
ser claramente estabelecido que existem outras
opções para o indivíduo.) Pessoas com esse
transtorno sentem-se desconfortáveis ou
desamparadas quando sós devido aos temores
exagerados de não serem capazes de cuidar de si
mesmas [...]. Vão se “grudar” a outros apenas
para evitar a solidão, mesmo sem ter interesse
ou envolvimento com o que está acontecendo.
Ao término de um relacionamento íntimo (p.
ex., rompimento com companheiro afetivo,
morte de cuidador), indivíduos com transtorno
da personalidade dependente podem buscar
urgentemente outro relacionamento para obter
os cuidados e o apoio de que necessitam [...].
Sua crença de que são incapazes de funcionar na
ausência de um relacionamento íntimo motiva-
os a tornarem-se rápida e indiscriminadamente
apegados a outra pessoa. Com frequência
preocupam-se com medos de serem
abandonados à própria sorte [...]. Veem-se como
tão completamente dependentes dos conselhos e
da ajuda de uma outra pessoa significativa que
se preocupam com a possibilidade de serem
abandonados por essa pessoa mesmo quando
não há justificativa para esses temores. Para que
sejam considerados evidência desse critério, os
medos devem ser excessivos e irreais. Por
exemplo, um idoso com câncer que se muda
para a casa do filho para ser cuidado está
demonstrando comportamento dependente
adequado, consideradas suas circunstâncias de
vida.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Indivíduos com transtorno da personalidade
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
165

dependente com frequência são caracterizados


por pessimismo e autoquestionamentos, tendem
a subestimar suas capacidades e seus aspectos
positivos e podem constantemente referir a si
mesmos como “estúpidos”. Encaram críticas e
desaprovação como prova de sua desvalia e
perdem a fé em si mesmos. Podem buscar
superproteção e dominação por parte dos outros.
O funcionamento profissional pode ser
prejudicado diante da necessidade de iniciativas
independentes. Podem evitar cargos de
responsabilidade e ficar ansiosos diante de
decisões. As relações sociais tendem a ser
limitadas àquelas poucas pessoas de quem o
indivíduo é dependente. Pode haver risco
aumentado de transtornos depressivos, de
ansiedade e de adaptação. O transtorno da
personalidade dependente costuma ser
concomitante com outros transtornos da
personalidade, especialmente borderline,
evitativa e histriônica. Doença física crônica ou
transtorno de ansiedade de separação na
infância ou adolescência podem predispor o
indivíduo ao desenvolvimento desse transtorno.

Transtorno de personalidade dissocial (ou antissocial ou psicopatia ou sociopatia)


CID-10 DSM-5
Transtorno de personalidade caracterizado por A característica essencial do transtorno da
um desprezo das obrigações sociais, falta de personalidade antissocial é um padrão difuso de
empatia para com os outros. Há um desvio indiferença e violação dos direitos dos outros, o
considerável entre o comportamento e as qual surge na infância ou no início da
normas sociais estabelecidas. adolescência e continua na vida adulta. Esse
O comportamento não é facilmente modificado padrão também já foi referido como psicopatia,
pelas experiências adversas, inclusive pelas sociopatia ou transtorno da personalidade
punições. Existe uma baixa tolerância à dissocial. Visto que falsidade e manipulação são
frustração e um baixo limiar de descarga da aspectos centrais do transtorno da personalidade
agressividade, inclusive da violência. antissocial, pode ser especialmente útil integrar
Existe uma tendência a culpar os outros ou a informações adquiridas por meio de avaliações
fornecer racionalizações plausíveis para clínicas sistemáticas e informações coletadas de
explicar um comportamento que leva o sujeito outras fontes colaterais.
a entrar em conflito com a sociedade. Para que esse diagnóstico seja firmado, o
indivíduo deve ter no mínimo 18 anos de idade
[...] e deve ter apresentado alguns sintomas de
transtorno da conduta antes dos 15 anos [...]. O
transtorno da conduta envolve um padrão
repetitivo e persistente de comportamento no
qual os direitos básicos dos outros ou as
principais normas ou regras sociais apropriadas
à idade são violados. Os comportamentos
específicos característicos do transtorno da
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
166

conduta encaixam-se em uma de quatro


categorias: agressão a pessoas e animais,
destruição de propriedade, fraude ou roubo ou
grave violação a regras.
O padrão de comportamento antissocial
continua até a vida adulta. Indivíduos com
transtorno da personalidade antissocial não têm
êxito em ajustar-se às normas sociais referentes
a comportamento legal [...]. Podem repetidas
vezes realizar atos que são motivos de detenção
(estando já presos ou não), como destruir
propriedade alheia, assediar outras pessoas,
roubar ou ter ocupações ilegais. Pessoas com
esse transtorno desrespeitam os desejos, direitos
ou sentimentos dos outros. Com frequência,
enganam e manipulam para obter ganho ou
prazer pessoal (p. ex., conseguir dinheiro, sexo
ou poder) [...]. Podem mentir reiteradamente,
usar nomes falsos, trapacear ou fazer maldades.
Um padrão de impulsividade pode ser
manifestado por fracasso em fazer planos para o
futuro [...]. As decisões são tomadas no calor do
momento, sem análise e sem consideração em
relação às consequências a si ou aos outros; isso
pode levar a mudanças repentinas de emprego,
moradia ou relacionamentos. Indivíduos com o
transtorno tendem a ser irritáveis e agressivos e
podem envolver-se repetidamente em lutas
corporais ou cometer atos de agressão física
(inclusive espancamento de cônjuge ou filho)
[...] (Atos agressivos necessários para defesa
própria ou de outra pessoa não são considerados
evidência para esse item). Essas pessoas ainda
demonstram descaso pela própria segurança ou
pela de outros [...]. Isso pode ser visto no
comportamento na direção (i.e., velocidade
excessiva recorrente, direção sob intoxicação,
múltiplos acidentes). Podem se envolver em
comportamento sexual ou uso de substância
com alto risco de consequências nocivas. Podem
negligenciar ou falhar em cuidar de uma criança
a ponto de colocá-la em perigo.
Indivíduos com o transtorno da personalidade
antissocial também tendem a ser reiterada e
extremamente irresponsáveis [...].
Comportamento laboral irresponsável pode ser
indicado por períodos significativos de
desemprego, a despeito de haver oportunidades
de trabalho disponíveis, ou por abandono de
vários empregos sem um plano realista de
obtenção de outro. Pode também haver um
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
167

padrão de repetidas ausências ao trabalho que


não são explicadas por doença própria ou de
familiar. Irresponsabilidade financeira é
indicada por atos como inadimplência, fracasso
em sustentar regularmente os filhos ou outros
dependentes [também apresentam o padrão
pródigo – qual seja, dilapidam seus patrimônios
e o dos seus familiares em gastanças].
Indivíduos com o transtorno demonstram pouco
remorso pelas consequências de seus atos.
Podem ser indiferentes a ter ferido, maltratado
ou roubado alguém, racionalizando de modo
superficial essas situações (p. ex., “a vida é
injusta”, “perdedores merecem perder”). Esses
indivíduos podem culpar as vítimas por serem
tolas, desamparadas ou merecedoras de seu
destino (p. ex., “ele já esperava por isso de
qualquer forma”); podem minimizar as
consequências danosas de seus atos ou ainda
simplesmente demonstrar total indiferença. Em
geral, fracassam em compensar ou fazer
reparações em razão do seu comportamento.
Podem achar que todo mundo deve “ajudar o
número um” e que se deve fazer qualquer coisa
para evitar ser incomodado.
O comportamento antissocial não deve ocorrer
exclusivamente durante o curso de esquizofrenia
ou transtorno bipolar [...].
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Indivíduos com transtorno da personalidade
antissocial frequentemente carecem de empatia
e tendem a ser insensíveis, cínicos e
desdenhosos em relação aos sentimentos,
direitos e sofrimentos dos outros. Podem ter
autoconceito inflado e arrogante (p. ex., sentem
que o trabalho comum cotidiano está abaixo
deles ou carecem de uma preocupação real a
respeito dos seus problemas do momento ou a
respeito de seu futuro) e podem ser
excessivamente opiniáticos [teimoso],
autoconfiantes ou convencidos. Podem exibir
um charme desinibido e superficial e podem ser
muito volúveis e verbalmente fluentes (p. ex.,
usar termos técnicos ou jargão que podem
impressionar uma pessoa que desconhece o
assunto). Falta de empatia, autoapreciação
inflada e charme superficial são aspectos que
têm sido comumente incluídos em concepções
tradicionais da psicopatia e que podem ser
particularmente característicos do transtorno e
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
168

mais preditivos de recidiva em prisões ou


ambientes forenses, onde atos criminosos,
delinquentes ou agressivos tendem a ser
inespecíficos. Esses indivíduos podem, ainda,
ser irresponsáveis e exploradores nos seus
relacionamentos sexuais. Podem ter história de
vários parceiros sexuais e jamais ter mantido um
relacionamento monogâmico. Como pais,
podem ser irresponsáveis, conforme
evidenciado por desnutrição de um filho, doença
de um filho resultante de falta de higiene
mínima, dependência de vizinhos ou outros
familiares para abrigo ou alimento de um filho,
fracasso em encontrar um cuidador para um
filho pequeno quando está fora de casa ou,
ainda, desperdício recorrente do dinheiro
necessário para a manutenção doméstica. Esses
indivíduos podem ser dispensados do exército
de forma desonrosa, fracassar em prover o
próprio sustento, empobrecer ou até ficar sem
teto ou, ainda, passar muitos anos em institutos
penais. São mais propensos a morrer
prematuramente de formas violentas (p. ex.,
suicídio, acidentes, homicídios) do que a
população em geral.
Indivíduos com transtorno da personalidade
antissocial podem também apresentar disforia,
incluindo queixas de tensão, incapacidade de
tolerar a monotonia e humor deprimido. Podem
ter transtornos de ansiedade, transtornos
depressivos, transtornos por uso de substância,
transtorno de sintomas somáticos, transtorno do
jogo e outros transtornos do controle de
impulsos associados. Também apresentam com
frequência aspectos de personalidade que
atendem a critérios de outros transtornos da
personalidade, em particular borderline,
histriônica e narcisista. A probabilidade de
desenvolvimento de transtorno da personalidade
antissocial na idade adulta aumenta se o
transtorno da conduta do indivíduo teve início
na infância (antes dos 10 anos) e se houve
também déficit de atenção/hiperatividade
associado. Abuso ou negligência infantil,
paternidade/maternidade instável ou errática ou
disciplina parental inconsistente podem
aumentar a probabilidade de o transtorno da
conduta evoluir para transtorno da
personalidade antissocial.127

127
As chaves foram acrescentadas pelo professor da matéria.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
169

Transtorno Dissociativo de Identidade (anteriormente Transtorno de Personalidade Múltipla)


CID-10 DSM-5
Este transtorno está citado na rubrica Outros A característica definidora do transtorno
transtornos dissociativos. dissociativo de identidade é a presença de dois
ou mais estados de personalidade distintos ou
uma experiência de possessão [...]. Entretanto, a
manifestação ou dissimulação desses estados de
personalidade variam em função da motivação
psicológica, do nível de estresse, de conflitos e
dinâmicas internas e da resiliência emocional.
Períodos longos de perturbação da identidade
podem ocorrer quando pressões psicossociais
são graves e/ou prolongadas. Em muitos casos
de transtorno dissociativo de identidade na
forma de possessão, e em uma pequena
proporção de formas que não envolvem
possessão, as manifestações de identidades
alternativas são bastante claras. A maioria dos
indivíduos com transtorno dissociativo de
identidade que não envolve possessão não exibe
abertamente a descontinuidade da identidade
por períodos prolongados; apenas uma minoria
se apresenta ao atendimento clínico com
alternância observável de identidades. Quando
estados de personalidade alternados não são
observados diretamente, o transtorno pode ser
identificado por dois conjuntos de sintomas:
1) alterações ou descontinuidades repentinas no
senso de si mesmo e de domínio das próprias
ações (Critério A) e 2) amnésias dissociativas
recorrentes (Critério B).
Sintomas do Critério A estão relacionados a
descontinuidades que podem afetar qualquer
aspecto do funcionamento de um indivíduo.
Indivíduos com transtorno dissociativo de
identidade podem relatar o sentimento de terem-
se tornado subitamente observadores
despersonalizados de suas “próprias” falas e
ações, e podem sentir-se incapazes de reverter
essa situação. Essas pessoas também podem
relatar a escuta de vozes (p. ex., a voz de uma
criança; a voz de uma entidade espiritual). Em
alguns casos, as vozes são vivenciadas como
fluxos de pensamentos múltiplos,
desconcertantes e independentes, os quais o
indivíduo não consegue controlar. Emoções
fortes, impulsos e até mesmo a fala ou outras
ações podem emergir repentinamente, sem um
sentido de domínio ou controle pessoal. Essas
emoções e impulsos costumam ser descritos

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


170

como ego-distônicos e enigmáticos. Atitudes,


opiniões e preferências pessoais (p. ex., acerca
de alimentos, atividades, roupas) podem mudar
subitamente repetidas vezes. Os indivíduos
podem relatar que sentem seus corpos diferentes
(p. ex., como uma criança pequena, como o
gênero oposto, grandes e musculosos).
Alterações no senso de si mesmo e de perda de
domínio das próprias ações podem ser
acompanhadas por um sentimento de que tais
atitudes, emoções e comportamentos – até
mesmo o próprio corpo – ‘não são meus’ e/ou
‘não estão sob meu controle’. Embora a maioria
dos sintomas do Critério A seja subjetiva,
muitas dessas descontinuidades repentinas na
fala, no afeto e no comportamento podem ser
observadas pela família, por amigos ou pelo
clínico. Convulsões não epiléticas e outros
sintomas conversivos são proeminentes em
algumas apresentações do transtorno
dissociativo de identidade, especialmente em
contextos não ocidentais.
A amnésia dissociativa de indivíduos com
transtorno dissociativo de identidade manifesta-
se de três formas principais: como 1) lacunas na
memória remota de eventos da vida pessoal (p.
ex., períodos da infância ou adolescência;
alguns eventos de vida importantes, como a
morte de avô/avó, o próprio casamento, dar à
luz um filho); 2) lapsos na memória
normalmente confiável (p. ex., do que aconteceu
hoje, de habilidades bem aprendidas, como as
ocupacionais, usar um computador, ler, dirigir);
e 3) descoberta de evidências de ações e tarefas
cotidianas que eles não lembram terem feito (p.
ex., encontrar objetos inexplicáveis em suas
sacolas de compras ou entre seus pertences;
encontrar escritos ou desenhos
incompreensíveis que eles devem ter criado;
descobrir ferimentos; ‘voltar a si’ no meio de
algo que estava fazendo). Fugas dissociativas,
nas quais a pessoa descobre a viagem
dissociada, são comuns. Dessa forma,
indivíduos com transtorno dissociativo de
identidade podem relatar que se encontraram de
repente na praia, no trabalho, em uma boate ou
em algum lugar em casa (p. ex., no armário, na
cama ou no sofá, em um canto) sem lembrar
como aí chegaram. A amnésia em indivíduos
com transtorno dissociativo de identidade não se
limita a eventos estressantes ou traumáticos;
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
171

essas pessoas com frequência também não


conseguem recordar os eventos cotidianos.
Indivíduos com transtorno dissociativo de
identidade variam em termos da consciência e
da atitude que têm em relação às suas amnésias.
É comum que minimizem seus sintomas
amnésicos. Alguns de seus comportamentos
amnésicos podem se tornar perceptíveis aos
outros – não recordar algo que testemunharam
que foi feito ou dito, não lembrar o próprio
nome ou não reconhecer o cônjuge, os filhos ou
os amigos próximos.
A forma de possessão do transtorno dissociativo
de identidade manifesta-se, em geral, como
comportamentos que surgem como se um
‘espírito’, um ser sobrenatural ou uma entidade
externa tivesse assumido o controle, de tal
forma que o indivíduo começa a falar e agir de
maneira claramente diferente. Por exemplo, o
comportamento de uma pessoa pode fazer
parecer que sua identidade foi substituída pelo
‘fantasma’ de uma menina que cometeu suicídio
na mesma comunidade anos atrás, falando e
agindo como se ela ainda estivesse viva. Ou a
pessoa pode ser ‘possuída’ por um demônio ou
divindade, resultando em uma alteração
profunda, e exigindo que a própria pessoa ou
um familiar seu seja punido por uma ação do
passado, o que é seguido por períodos mais sutis
de alteração da identidade. Entretanto, a maioria
dos estados de possessão no mundo inteiro é
normal, geralmente parte de práticas espirituais
e não satisfaz os critérios de transtorno
dissociativo de identidade. As identidades que
surgem durante o transtorno na forma de
possessão apresentam-se de maneira recorrente,
são indesejadas e involuntárias, causam
sofrimento ou prejuízo clinicamente
significativos (Critério C) e não são parte
normal de uma prática cultural ou religiosa
amplamente aceita (Critério D).
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Indivíduos com transtorno dissociativo de
identidade apresentam-se geralmente com
depressão, ansiedade, abuso de substância,
automutilação, convulsões não epiléticas ou
outros sintomas como comorbidade. Com
frequência ocultam, ou não têm consciência
completa de, perturbações na consciência,
amnésia e outros sintomas dissociativos. Muitos
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
172

com o transtorno relatam flash-backs


dissociativos durante os quais revivem
sensorialmente um evento pregresso como se
ele estivesse ocorrendo no presente, em geral
com mudança de identidade, perda parcial ou
completa de contato com a realidade presente
durante o flashback e amnésia subsequente em
relação ao conteúdo do flashback. Indivíduos
com transtorno dissociativo de identidade
comumente relatam múltiplos tipos de maus-
tratos sofridos durante a infância ou a idade
adulta. Também podem ser descritas formas que
não envolvem maus-tratos, mas que reúnem
eventos precoces opressivos na vida, como
múltiplos procedimentos médicos prolongados e
dolorosos. Automutilação e comportamento
suicida são frequentes. Em testes padronizados,
esses indivíduos apresentam níveis maiores de
suscetibilidade à hipnose e de capacidade
dissociativa comparados a outros grupos
clínicos e controles sadios. Algumas pessoas
sofrem fenômenos ou episódios psicóticos
transitórios. Várias regiões do cérebro foram
implicadas na fisiopatologia do transtorno disso-
ciativo de identidade, incluindo o córtex
orbitofrontal, o hipocampo, o giro para-
hipocampal e a amígdala.

Transtornos do Humor (ou Depressivos, ou ainda, relacionados ao Bipolarismo)


Distimia (ou Transtrono Depressivo Persistente)
CID-10 DSM-5
Rebaixamento crônico do humor, persistindo A característica essencial do transtorno
ao menos por vários anos, mas cuja gravidade depressivo persistente (distimia) é um humor
não é suficiente ou na qual os episódios depressivo que ocorre na maior parte do dia, na
individuais são muito curtos para responder maioria dos dias, por pelo menos dois anos, ou
aos critérios de transtorno depressivo por pelo menos um ano para crianças e
recorrente grave, moderado ou leve. adolescentes (Critério A). Esse transtorno
representa uma consolidação do transtorno
depressivo maior crônico e do transtorno
distímico definidos no DSM-4. Depressão maior
pode preceder o transtorno depressivo
persistente, e episódios depressivos maiores
podem ocorrer durante o transtorno depressivo
persistente. Os indivíduos cujos sintomas
satisfazem os critérios para transtorno
depressivo maior por dois anos devem receber
diagnóstico de transtorno depressivo persistente,
além de transtorno depressivo maior.
Os indivíduos com transtorno depressivo
persistente descrevem seu humor como triste ou
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
173

“na fossa”. Durante os períodos de humor


deprimido, pelo menos dois dos seis sintomas
do Critério B estão presentes. Como esses
sintomas tornaram-se uma parte tão presente na
experiência cotidiana do indivíduo, em
particular no caso de início precoce (p. ex.,
“Sempre fui desse jeito”), eles podem não ser
relatados, a menos que diretamente investigados
pelo entrevistador. Durante o período de dois
anos (um ano para crianças ou adolescentes),
qualquer intervalo livre de sinto- mas dura não
mais do que dois meses (Critério C).

Ciclotimia (ou transtorno ciclotímico)


CID-10 DSM-5
Instabilidade persistente do humor que O transtorno ciclotímico tem como
comporta numerosos períodos de depressão ou característica essencial a cronicidade e a
de leve elação nenhum deles suficientemente oscilação do humor, envolvendo vários períodos
grave ou prolongado para responder aos de sintomas hipomaníacos e períodos de
critérios de um transtorno afetivo bipolar ou de sintomas depressivos distintos entre si (Critério
um transtorno depressivo recorrente. A). Os sintomas [a princípio] hipomaníacos têm
O transtorno se encontra frequentemente em número, gravidade, abrangência ou duração
familiares de pacientes que apresentam um insuficientes para preencher a todos os critérios
transtorno afetivo bipolar. Algumas pessoas de um episódio hipomaníaco; e os sintomas
ciclotímicas apresentarão elas próprias depressivos têm número, gravidade,
ulteriormente um transtorno afetivo bipolar. abrangência ou duração insuficientes para
preencher a todos os critérios de um episódio
depressivo maior. Durante o período inicial de
dois anos (um ano para crianças e adolescentes),
os sintomas precisam ser persistentes (presentes
na maioria dos dias), e qualquer intervalo sem
sintomas não pode durar mais do que dois
meses (Critério B). O diagnóstico de transtorno
ciclotímico é feito somente quando os critérios
para episódio depressivo maior, maníaco ou
hipomaníaco nunca foram satisfeitos (Critério
C).
Se um indivíduo com transtorno ciclotímico
subsequente (i.e., após os primeiros dois anos
em adultos e um ano em crianças e
adolescentes) apresenta um episódio depressivo
maior, maníaco ou hipomaníaco, o diagnóstico
muda para transtorno depressivo maior,
transtorno bipolar tipo I, outro transtorno
bipolar e transtorno relacionado especificado ou
transtorno bipolar e transtorno relacionado não
especificado (subclassificado como episódio
hipomaníaco sem episódio depressivo maior
anterior), respectivamente, e o diagnóstico de
transtorno ciclotímico é abandonado.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
174

O diagnóstico de transtorno ciclotímico não é


feito se o padrão de mudanças do humor é mais
bem explicado por transtorno esquizoafetivo,
esquizofrenia, transtorno esquizofreniforme,
transtorno delirante, outro transtorno do
espectro da esquizofrenia e outro transtorno
psicótico especificado ou transtorno do espectro
da esquizofrenia e outro transtorno psicótico
não especificado (Critério D), caso em que os
sintomas de humor são considerados
características associadas ao transtorno
psicótico. A perturbação do humor também não
deve ser atribuível aos efeitos fisiológicos de
uma substância (p. ex., droga de abuso,
medicamento) ou a outra condição médica (p.
ex., hipertireoidismo) (Critério E). Embora
alguns indivíduos possam funcionar particular-
mente bem durante certos períodos de
hipomania, ao longo do curso prolongado do
transtorno deve ocorrer sofrimento ou prejuízo
clinicamente significativo no funcionamento
social, profissional ou em outras áreas
importantes da vida do indivíduo em
consequência da perturbação do humor (Critério
F). O prejuízo pode se desenvolver em
decorrência de períodos prolongados de
mudanças cíclicas do humor, frequentemente
imprevisíveis (p. ex., o indivíduo pode ser visto
como temperamental, mal-humorado,
imprevisível, incoerente ou não confiável).

Transtorno Bipolar
CID-10 DSM-5
Transtorno caracterizado por dois ou mais Tipo I (Episódio Maníaco)
episódios nos quais o humor e o nível de Para diagnosticar transtorno bipolar tipo I, é
atividade do sujeito estão profundamente necessário o preenchimento dos critérios a
perturbados, sendo que este distúrbio consiste seguir para um episódio maníaco. O episódio
em algumas ocasiões de uma elevação do maníaco pode ter sido antecedido ou seguido
humor e aumento da energia e da atividade por episódios hipomaníacos ou depressivos
(hipomania ou mania) e em outras, de um maiores.
rebaixamento do humor e de redução da
energia e da atividade (depressão). Episódio Maníaco
[...] A. Um período distinto de humor anormal e
Inclui: persistentemente elevado, expansivo ou irritável
doença maníaco-depressiva e aumento anormal e persistente da atividade
psicose maníaco-depressiva dirigida a objetivos ou da energia, com duração
reação maníaco-depressiva mínima de uma semana e presente na maior
Exclui: ciclotimia parte do dia, quase todos os dias (ou qualquer
duração, se a hospitalização se fizer necessária).
B. Durante o período de perturbação do humor e
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
175

Transtorno afetivo bipolar, episódio atual aumento da energia ou atividade, três (ou mais)
hipomaníaco dos seguintes sintomas (quatro se o humor é
Episódio atual correspondente à descrição de apenas irritável) estão presentes em grau
uma hipomania tendo ocorrido, no passado, ao significativo e representam uma mudança
menos um outro episódio afetivo notável do comportamento habitual:
(hipomaníaco, maníaco, depressivo ou misto). 1. Autoestima inflada ou grandiosidade.
2. Redução da necessidade de sono (p. ex.,
Transtorno afetivo bipolar, episódio atual sente-se descansado com apenas três horas de
maníaco sem sintomas psicóticos sono).
Episódio atual maníaco correspondente à 3. Mais loquaz que o habitual ou pressão para
descrição de um episódio maníaco sem continuar falando.
sintomas psicóticos, tendo ocorrido, no 4. Fuga de ideias ou experiência subjetiva de
passado, ao menos um outro episódio afetivo que os pensamentos estão acelerados.
(hipomaníaco, maníaco, depressivo ou misto). 5. Distratibilidade (i.e., a atenção é desviada
muito facilmente por estímulos externos
Transtorno afetivo bipolar, episódio atual insignificantes ou irrelevantes), conforme
maníaco com sintomas psicóticos relatado ou observado.
Episódio atual correspondente à descrição de 6. Aumento da atividade dirigida a objetivos
um episódio maníaco com sintomas psicóticos, (seja socialmente, no trabalho ou escola, seja
tendo ocorrido, no passado, ao menos um outro sexualmente) ou agitação psicomotora (i.e.,
episódio afetivo (hipomaníaco, maníaco, atividade sem propósito não dirigida a
depressivo ou misto). objetivos).
7. Envolvimento excessivo em atividades com
Transtorno afetivo bipolar, episódio atual elevado potencial para consequências dolorosas
depressivo leve ou moderado (p. ex., envolvimento em surtos desenfreados de
Episódio atual correspondente à descrição de compras, indiscrições sexuais ou investimentos
um episódio depressivo leve ou moderado128, financeiros insensatos).
tendo ocorrido, no passado, ao menos um C. A perturbação do humor é suficientemente
episódio afetivo hipomaníaco, maníaco ou grave a ponto de causar prejuízo acentuado
misto bem comprovado. no funcionamento social ou profissional ou para
necessitar de hospitalização a fim de prevenir
Transtorno afetivo bipolar, episódio atual dano a si mesmo ou a outras pessoas, ou
depressivo grave sem sintomas psicóticos existem características psicóticas.
Episódio atual correspondente à descrição de D. O episódio não é atribuível aos efeitos
um episódio depressivo grave sem sintomas fisiológicos de uma substância (p. ex., droga de
psicóticos129, tendo ocorrido, no passado, ao abuso, medicamento, outro tratamento) ou a
menos um episódio afetivo hipomaníaco, outra condição médica.
maníaco ou misto bem documentado. Nota: Um episódio maníaco completo que surge
durante tratamento antidepressivo (p. ex.,
Transtorno afetivo bipolar, episódio atual medicamento, eletroconvulsoterapia), mas que
depressivo grave com sintomas psicóticos persiste em um nível de sinais e sintomas além
Episódio atual correspondente à descrição de do efeito fisiológico desse tratamento, é

128
Leve - Geralmente estão presentes ao menos dois ou três dos sintomas citados anteriormente. O paciente usualmente
sofre com a presença destes sintomas mas provavelmente será capaz de desempenhar a maior parte das atividades.
Moderado - Geralmente estão presentes quatro ou mais dos sintomas citados anteriormente e o paciente aparentemente
tem muita dificuldade para continuar a desempenhar as atividades de rotina. (CID 10).
129
Grave ou Severo - Episódio depressivo onde vários dos sintomas são marcantes e angustiantes, tipicamente a perda
da autoestima e ideias de desvalia ou culpa. As ideias e os atos suicidas são comuns e observa-se em geral uma série de
sintomas "somáticos". (CID 10)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
176

um episódio depressivo grave com sintomas evidência suficiente para um episódio maníaco
psicóticos130, tendo ocorrido, no passado, ao e, portanto, para um diagnóstico de transtorno
menos um episódio afetivo hipomaníaco, bipolar tipo I.
maníaco ou misto bem comprovado.
Episódio Hipomaníaco
Transtorno afetivo bipolar, episódio atual A. Um período distinto de humor anormal e
misto persistentemente elevado, expansivo ou irritável
Ocorrência, no passado, de ao menos um e aumento anormal e persistente da atividade ou
episódio afetivo maníaco, hipomaníaco ou energia, com duração de pelo menos quatro dias
misto bem documentado, e episódio atual consecutivos e presente na maior parte do dia,
caracterizado pela presença simultânea de quase todos os dias.
sintomas maníacos e depressivos ou por uma B. Durante o período de perturbação do humor e
alternância rápida de sintomas maníacos e aumento da energia e atividade, três (ou mais)
depressivos. dos seguintes sintomas (quatro se o humor é
Exclui: episódio afetivo misto isolado apenas irritável) persistem, representam uma
mudança notável em relação ao comportamento
Transtorno afetivo bipolar, atualmente em habitual e estão presentes em grau significativo:
remissão (Vide os itens de 1 a 7 do Episódio Maníaco)
Ocorrência, no passado, de ao menos um C. O episódio está associado a uma mudança
episódio afetivo maníaco, hipomaníaco ou clara no funcionamento que não é característica
misto muito bem comprovado, e de ao menos do indivíduo quando assintomático.
um outro episódio afetivo (hipomaníaco, D. A perturbação no humor e a mudança no
maníaco, depressivo ou misto) mas sem funcionamento são observáveis por outras
nenhuma perturbação significativa do humor, pessoas.
nem atualmente nem no curso dos últimos E. O episódio não é suficientemente grave a
meses. As remissões sob tratamento profilático ponto de causar prejuízo acentuado no
devem ser classificadas aqui. funcionamento social ou profissional ou para
necessitar de hospitalização. Existindo
características psicóticas, por definição, o
episódio é maníaco.
F. O episódio não é atribuível aos efeitos
fisiológicos de uma substância (p. ex., droga de
abuso, medicamento ou outro tratamento).
Nota: Um episódio hipomaníaco completo que
surge durante tratamento antidepressivo (p. ex.,
medicamento, eletroconvulsoterapia), mas que
persiste em um nível de sinais e sintomas além
do efeito fisiológico desse tratamento, é
evidência suficiente para um diagnóstico de
episódio hipomaníaco. Recomenda-se, porém,
cautela para que 1 ou 2 sintomas
(principalmente aumento da irritabilidade,
nervosismo ou agitação após uso de
antidepressivo) não sejam considerados
suficientes para o diagnóstico de episódio
hipomaníaco nem necessariamente indicativos

130
Episódio depressivo correspondente á descrição de um episódio depressivo grave mas acompanhado de alucinações,
ideias delirantes, de uma lentidão psicomotora ou de estupor de uma gravidade tal que todas as atividades sociais
normais tornam-se impossíveis; pode existir o risco de morrer por suicídio, de desidratação ou de desnutrição. As
alucinações e os delírios podem não corresponder ao caráter dominante do distúrbio afetivo.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
177

de uma diátese bipolar.

Episódio Depressivo Maior


A. Cinco (ou mais) dos seguintes sintomas
estiveram presentes durante o mesmo período
de duas semanas e representam uma mudança
em relação ao funcionamento anterior; pelo
menos um dos sintomas é (1) humor deprimido
ou (2) perda de interesse ou prazer. Nota: Não
incluir sintomas que sejam claramente
atribuíveis a outra condição médica.
1. Humor deprimido na maior parte do dia,
quase todos os dias, conforme indicado por
relato subjetivo (p. ex., sente-se triste, vazio ou
sem esperança) ou por observação feita por
outra pessoa (p. ex., parece choroso). (Nota: Em
crianças e adolescentes, pode ser humor
irritável.)
2. Acentuada diminuição de interesse ou prazer
em todas, ou quase todas, as atividades na maior
parte do dia, quase todos os dias (conforme
indicado por relato subjetivo ou observação
feita por outra pessoa).
3. Perda ou ganho significativo de peso sem
estar fazendo dieta (p.ex., mudança de mais de
5% do peso corporal em um mês) ou redução ou
aumento no apetite quase todos os dias. (Nota:
Em crianças, considerar o insucesso em obter o
ganho de peso esperado.)
4.Insônia ou hipersonia quase diária.
5. Agitação ou retardo psicomotor quase todos
os dias (observável por outras pessoas; não
meramente sensações subjetivas de inquietação
ou de estar mais lento).
6. Fadiga ou perda de energia quase todos os
dias.
7. Sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva
ou inapropriada (que podem ser delirantes)
quase todos os dias (não meramente
autorrecriminação ou culpa por estar doente).
8. Capacidade diminuída para pensar ou se
concentrar, ou indecisão quase todos os dias
(por relato subjetivo ou observação feita por
outra pessoa).
9. Pensamentos recorrentes de morte (não
somente medo de morrer), ideação suicida
recorrente sem um plano específico, tentativa de
suicídio ou plano específico para cometer
suicídio.
B. Os sintomas causam sofrimento clinicamente
significativo ou prejuízo no funcionamento
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
178

social, profissional ou em outras áreas


importantes da vida do indivíduo.
C. O episódio não é atribuível aos efeitos
fisiológicos de uma substância ou a outra
condição médica.
Nota: Os Critérios A-C representam um
episódio depressivo maior. Esse tipo de episódio
é comum no transtorno bipolar tipo I, embora
não seja necessário para o diagnóstico desse
transtorno.
Nota: Respostas a uma perda significativa (p.
ex., luto, ruína financeira, perdas por desastre
natural, doença médica grave ou incapacidade)
podem incluir sentimentos de tristeza intensos,
ruminação acerca da perda, insônia, falta de
apetite e perda de peso observados no Critério
A, que podem se assemelhar a um episódio
depressivo. Embora tais sintomas possam ser
entendidos ou considerados apropriados à perda,
a presença de um episódio depressivo maior,
além da resposta normal a uma perda
significativa, deve ser também cuidadosamente
considerada. Essa decisão exige inevitavelmente
exercício do juízo clínico, baseado na história
do indivíduo e nas normas culturais para a
expressão de sofrimento no contexto de uma
perda.

Características Associadas que Apoiam o


Diagnóstico
Durante um episódio maníaco, é comum os
indivíduos não perceberem que estão doentes ou
necessitando de tratamento, resistindo, com
veemência, às tentativas de tratamento. Podem
mudar a forma de se vestir, a maquiagem ou a
aparência pessoal para um estilo com maior
apelo sexual ou extravagante. Alguns percebem
maior acurácia olfativa, auditiva ou visual.
Jogos de azar e comportamentos antissociais
podem acompanhar o episódio maníaco. Há
pessoas que podem se tornar hostis e
fisicamente ameaçadoras a outras e, quando
delirantes, podem agredir fisicamente ou
suicidar-se. As consequências catastróficas de
um episódio maníaco (p. ex., hospitalização
involuntária, dificuldades com a justiça,
dificuldades financeiras graves) costumam
resultar do juízo crítico prejudicado, da perda de
insight e da hiperatividade.
O humor pode mudar rapidamente para raiva ou
depressão. Podem ocorrer sintomas depressivos
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
179

durante um episódio maníaco e, quando


presentes, durar momentos, horas ou, mais
raramente, dias [...].

Tipo II (Episódio Hipomaníaco)


A. Foram atendidos os critérios para pelo menos
um episódio hipomaníaco (Critérios A-F em
“Episódio Hipomaníaco” descritos
anteriormente).
B. Jamais houve um episódio maníaco.
C. A ocorrência do(s) episódio(s)
hipomaníaco(s) e depressivo(s) maior(es) não é
mais bem explicada por transtorno
esquizoafetivo, esquizofrenia, transtorno
esquizofreniforme, transtorno de- lirante, outro
transtorno do espectro da esquizofrenia e outro
transtorno psicótico especificado ou transtorno
do espectro da esquizofrenia e outro transtorno
psicótico não especificado.
D. Os sintomas de depressão ou a
imprevisibilidade causada por alternância
frequente entre pe- ríodos de depressão e
hipomania causam sofrimento clinicamente
significativo ou prejuízo no funcionamento
social, profissional ou em outra área importante
da vida do indivíduo.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Uma característica comum do transtorno bipolar
tipo II é a impulsividade, que pode contribuir
com tentativas de suicídio e transtornos por uso
de substância. A impulsividade pode também se
originar de um transtorno da personalidade
comórbido, transtorno por uso de substância,
transtorno de ansiedade, outro transtorno mental
ou uma condição médica. Pode haver níveis
aumentados de criatividade em alguns
indivíduos com transtorno bipolar. A relação
pode ser, no entanto, não linear; isto é, grandes
realizações criativas na vida têm sido associadas
a formas mais leves de transtorno bipolar, e
criatividade superior foi identificada em
familiares não afetados. A satisfação que o
indivíduo tem com a criatividade aumentada
durante episódios hipomaníacos pode contribuir
para ambivalência quanto a buscar tratamento
ou prejudicar a adesão a ele.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


180

Transtorno Depressivo Maior


CID-10 DSM-5
Transtorno depressivo recorrente, episódio Vide item anterior.
atual grave sem sintomas psicóticos
Transtorno caracterizado pela ocorrência
repetida de episódios depressivos, sendo o
episódio atual grave, sem sintomas psicóticos,
[...] na ausência de qualquer antecedente de
mania.
Depressão:
endógena
maior recorrente
sem sintomas psicóticos
vital recorrente

Transtorno depressivo recorrente, episódio


atual grave com sintomas psicóticos
Transtorno caracterizado pela ocorrência
repetida de episódios depressivos, sendo o
episódio atual grave, com sintomas psicóticos,
[...] na ausência de qualquer antecedente de
mania.
Depressão endógena com sintomas psicóticos
Episódio recorrente grave (de):
depressão:
maior com sintomas psicóticos
psicótica
psicose depressiva:
psicogênica
reativa

Psicose maníaco-depressiva, forma depressiva,


com sintomas psicóticos.

Transtornos Alimentares
Pica
CID-10 DSM-5
(Pica do lactente ou da criança) A característica essencial da pica é a ingestão de
Transtorno caracterizado pelo consumo uma ou mais substâncias não nutritivas, não
duradouro de substâncias não-nutritivas (por alimentares, de forma persistente durante um
exemplo, terra, lascas de pintura etc). Pode período mínimo de um mês (Critério A), grave o
constituir um comportamento psicopatológico suficiente para merecer atenção clínica. As
relativamente isolado ou fazer parte de um substâncias típicas ingeridas tendem a variar
transtorno psicuquiátrico mais global (tal como com a idade e a disponibilidade e podem incluir
o autismo). Um diagnóstico de pica deve ficar papel, sabão, tecido, cabelo, fios, terra, giz,
reservado às manifestações isoladas. Este talco, tinta, cola, metal, pedras, carvão vegetal
comportamento se observa sobretudo em ou mineral, cinzas, detergente ou gelo. O termo
crianças que apresentam retardo mental; na não alimentar está incluso porque o diagnóstico
presença de um retardo mental, este último de pica não se aplica à ingestão de produtos
deve constituir o diagnóstico principal. alimentares com conteúdo nutricional mínimo.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
181

Geralmente não há aversão a alimentos em


geral. É preciso que a ingestão de substâncias
não nutritivas, não alimentares, seja
inapropriada ao estágio de desenvolvimento
(Critério B) e não parte de uma prática
culturalmente aceita (Critério C). Sugere-se uma
idade mínima de 2 anos para o diagnóstico de
pica, de modo a excluir a exploração de objetos
com a boca que acabam por ser ingeridos,
normal no desenvolvimento das crianças
pequenas. A ingestão de substâncias não
nutritivas, não alimentares, pode ser um aspecto
associado a outros transtornos mentais (p. ex.,
deficiência intelectual [transtorno do
desenvolvimento intelectual], transtorno do
espectro autista, esquizofrenia). Se o
comportamento alimentar ocorrer
exclusivamente no contexto de outro transtorno
mental, então um diagnóstico distinto de pica
deverá ser feito apenas se o comportamento
alimentar for grave o suficiente a ponto de
demandar atenção clínica adicional (Critério D).
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Embora deficiências de vitaminas e minerais (p.
ex., zinco, ferro) tenham sido descritas em
alguns casos, frequentemente nenhuma outra
anormalidade biológica é encontrada. Em
algumas ocasiões, a pica chega à atenção clínica
somente acompanhando complicações médicas
gerais (p. ex., problemas intestinais mecânicos;
obstrução intestinal, como a que resulta de um
bezoar; perfuração intestinal; infecções como
toxoplasmose e toxocaríase em decorrência da
ingestão de fezes ou sujeira; intoxicação, como
pela ingestão de tinta à base de chumbo).

Anorexia Nervosa
CID-10 DSM-5
Anorexia nervosa é um transtorno A anorexia nervosa tem três características
caracterizado por perda de peso intencional, essenciais: restrição persistente da ingesta
induzida e mantida pelo paciente. O transtorno calórica; medo intenso de ganhar peso ou de
ocorre comumente numa mulher adolescente engordar ou comportamento persistente que
ou jovem, mas pode igualmente ocorrer num interfere no ganho de peso; e perturbação na
homem adolescente ou jovem, como numa percepção do próprio peso ou da própria forma.
criança próxima à puberdade ou numa mulher O indivíduo mantém um peso corporal abaixo
de mais idade até na menopausa. daquele minimamente normal para idade,
A doença está associada a uma psicopatologia gênero, trajetória do desenvolvimento e saúde
específica, compreendendo um medo de física (Critério A). O peso corporal dessas
engordar e de ter uma silhueta arredondada, pessoas com frequência satisfaz esse critério
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
182

intrusão persistente de uma idéia depois de uma perda ponderal significativa,


supervalorizada. porém, entre crianças e adolescentes, pode
Os pacientes se impõem a si mesmos um baixo haver insucesso em obter o ganho de peso
peso. Existe comumente desnutrição de grau esperado ou em manter uma trajetória de
variável que se acompanha de modificações desenvolvimento normal (i.e., enquanto cresce
endócrinas e metabólicas secundárias e de em altura) em vez de perda de peso.
perturbações das funções fisiológicas. Os O Critério A requer que o peso do indivíduo
sintomas compreendem uma restrição das esteja significativamente baixo (i.e., inferior à
escolhas alimentares, a prática excessiva de faixa mínima normal ou, no caso de crianças e
exercícios físicos, vômitos provocados e a adolescentes, inferior à faixa mínima esperada).
utilização de laxantes, anorexígeros e de [...]
diuréticos. Indivíduos com esse transtorno exibem
geralmente medo intenso de ganhar peso ou de
Anorexia Nervosa Atípica engordar (Critério B). Esse medo intenso de
Transtornos que apresentam algumas das engordar não costuma ser aliviado pela perda de
características da anorexia nervosa mas cujo peso. Na verdade, a preocupação acerca do peso
quadro clínico global não justifica tal pode aumentar até mesmo se o peso dimimuir.
diagnóstico. Por exemplo, um dos sintomas- Indivíduos mais jovens com anorexia nervosa,
chave, tal como um temor acentuado de ser bem como alguns adultos, podem não
gordo ou a amenorréia, pode estar ausente na reconhecer ou perceber medo de ganhar peso.
presença de uma acentuada perda de peso e de Na ausência de outra explicação para o peso
um comportamento para emagrecer. significativamente baixo, podem ser usados,
Este diagnóstico não deve ser feito na presença para estabelecer o Critério B, a inferência do
de transtornos físicos conhecidos associados à clínico a partir da história fornecida por
perda de peso. informantes, dados de observação, achados
físicos e laboratoriais ou curso longitudinal
indicando seja um medo de ganhar peso, seja
comportamentos persistentes relacionados que
impeçam o ganho de peso.
A vivência e a significância do peso e da forma
corporal são distorcidas nesses indivíduos [tipo
de dismorfia] (Critério C). Algumas pessoas
sentem-se completamente acima do peso.
Outras percebem que estão magras, mas ainda
assim se preocupam com determinadas partes
do corpo, em particular que o abdome, os
glúteos e o quadril estão “gordos demais”. Elas
podem empregar uma variedade de técnicas
para avaliar o tamanho ou o peso de seus
corpos, incluindo pesagens frequentes, medição
obsessiva de partes do corpo e uso persistente
de um espelho para checar áreas percebidas de
“gordura”. A estima de indivíduos com anorexia
nervosa é altamente dependente de suas
percepções da forma e do peso corporal. A
perda de peso é, com frequência, vista como
uma conquista marcante e um sinal de
autodisciplina extraordinária, enquanto o ganho
ponderal é percebido como falha de
autocontrole inaceitável. Embora alguns
indivíduos com esse transtorno talvez
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
183

reconheçam que estão magros, frequentemente


não assumem as graves implicações médicas de
seu estado de desnutrição.
Geralmente, o indivíduo é levado à atenção
profissional por familiares depois de perda de
peso marcante (ou insucesso em obter o ganho
de peso esperado) ter ocorrido. Se buscam ajuda
por si mesmos, costuma ser devido à angústia
causada por sequelas somáticas e psicológicas
da inanição. É raro uma pessoa com anorexia
nervosa queixar-se da perda de peso por si só.
Na verdade, indivíduos com anorexia nervosa
com frequência carecem de insight ou negam o
problema. É, portanto, importante obter
informações de familiares ou de outras fontes
para avaliar a história da perda de peso e outros
aspectos da doença.

Características Associadas que Apoiam o


Diagnóstico
A semi-inanição da anorexia nervosa e os
comportamentos purgativos às vezes associados
a ela podem resultar em condições médicas
importantes e potencialmente fatais. O
comprometimento nutricional associado a esse
transtorno afeta a maioria dos sistemas
corporais e pode produzir uma variedade de
perturbações. Perturbações fisiológicas,
incluindo amenorreia [ausência de período
menstrual] e anormalidades nos sinais vitais, são
comuns. Enquanto grande parte das
perturbações fisiológicas associadas à
desnutrição é reversível com reabilitação
nutricional, algumas, incluindo a perda de
densidade óssea mineral, com frequência não
são completamente reversíveis.
Comportamentos como vômitos autoinduzidos e
uso indevido de laxantes, diuréticos e enemas
[introdução de substâncias líquidas ou
semilíquidas através do esfíncter anal, com o
objetivo de induzir a defecação ou administrar
medicamentos] podem causar uma série de
distúrbios que levam a achados laboratoriais
anormais; entretanto, alguns indivíduos com
anorexia nervosa não exibem tais
anormalidades.
Quando gravemente abaixo do peso, indivíduos
com anorexia nervosa apresentam sinais e
sintomas depressivos, como humor deprimido,
isolamento social, irritabilidade, insônia e
diminuição da libido. Na medida em que alguns
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
184

desses aspectos também são observados em


indivíduos sem anorexia nervosa, mas
significativamente subnutridos, muitos dos
aspectos depressivos podem ser secundários às
sequelas fisiológicas da semi-inanição, embora
também possam ser graves o suficiente para
justificar um diagnóstico adicional de transtorno
depressivo.
Características obsessivo-compulsivas,
relacionadas ou não à alimentação, são com
frequência proeminentes. A maioria dos
indivíduos com anorexia nervosa é centrada na
preocupação com os alimentos. Alguns
colecionam receitas e estocam comida.
Observações de comportamentos associados a
outras formas de inanição sugerem que
obsessões e compulsões relacionadas à
alimentação podem ser exacerbadas por
subnutrição. Quando indivíduos com anorexia
nervosa exibem obsessões e compulsões não
relacionadas a alimentos, forma corporal ou
peso, um diagnóstico adicional de transtorno
obsessivo-compulsivo (TOC) pode ser
justificável.
Outros aspectos por vezes associados à anorexia
nervosa incluem angústia de alimentar-se
publicamente, sentimentos de fracasso, forte
desejo por controlar o próprio ambiente,
pensamentos inflexíveis, espontaneidade social
limitada e expressão emocional excessivamente
contida. Comparados a indivíduos com anorexia
nervosa do tipo restritiva, os que têm anorexia
nervosa do tipo compulsão alimentar purgativa
apresentam taxas maiores de impulsividade e
tendem a abusar mais de álcool e outras drogas.
Um subgrupo de indivíduos com anorexia
nervosa exibe níveis excessivos de atividade
física. Aumentos na atividade física com
frequência precedem a manifestação inicial do
transtorno, e, durante o curso da doença, a
atividade física mais intensa acelera a perda de
peso. Durante o tratamento, talvez seja difícil
controlar o excesso de atividade física,
prejudicando, assim, a recuperação do peso.
Indivíduos com anorexia nervosa podem fazer
uso indevido de medicamentos, como, por
exemplo, manipular a dosagem para conseguir
perder peso ou evitar ganhá-lo. Aqueles com
diabetes melito podem omitir ou reduzir as
doses de insulina a fim de minimizar o
metabolismo de carboidratos.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
185

Bulimia Nervosa
CID-10 DSM-5
A bulimia é uma síndrome caracterizada por Existem três aspectos essenciais na bulimia
acessos repetidos de hiperfagia e uma nervosa: episódios recorrentes de compulsão
preocupação excessiva com relação ao controle alimentar (Critério A), comportamentos
do peso corporal conduzindo a uma alternância compensatórios inapropriados recorrentes para
de hiperfagia e vômitos ou uso de purgativos. impedir o ganho de peso (Critério B) e
Este transtorno partilha diversas características autoavaliação indevidamente influenciada pela
psicológicas com a anorexia nervosa, dentre as forma e pelo peso corporais (Critério D). Para se
quais uma preocupação exagerada com a forma qualificar ao diagnóstico, a compulsão alimentar
e peso corporais. Os vômitos repetidos podem e os comportamentos compensatórios
provocar perturbações eletrolíticas e inapropriados devem ocorrer, em média, no
complicações somáticas. mínimo uma vez por semana por três meses
Nos antecedentes encontra-se freqüentemente, (Critério C).
mas nem sempre, um episódio de anorexia Um “episódio de compulsão alimentar” é
nervosa ocorrido de alguns meses a vários anos definido como a ingestão, em um período de
antes. tempo determinado, de uma quantidade de
alimento definitivamente maior do que a
Bulimia Nervosa Atípica maioria dos indivíduos comeria em um mesmo
Transtornos que apresentam algumas período de tempo em circunstâncias
características da bulimia nervosa mas cujo semelhantes (Critério A1). O contexto no qual a
quadro clínico global não justifica tal ingestão ocorre pode afetar a estimativa do
diagnóstico. Por exemplo, pode haver acessos clínico quanto à ingestão ser ou não excessiva.
repetidos de hiperfagia e de uso exagerado de Por exemplo, uma quantidade de alimento que
laxativos sem uma alteração significativa de seria considerada excessiva para uma refeição
peso ou então a preocupação típica e exagerada típica poderia ser considerada normal durante
com a forma e peso corporais pode estar uma refeição comemorativa ou nas festas de fim
ausente. de ano. Um “período de tempo determinado”
refere-se a um período limitado, normalmente
menos de duas horas. Um único episódio de
compulsão alimentar não precisa se restringir a
um contexto. Por exemplo, um indivíduo pode
iniciar um comportamento de compulsão
alimentar no restaurante e depois continuar a
comer ao voltar para casa. Lanches contínuos de
pequenas quantidades de alimento ao longo do
dia não seriam considerados compulsão
alimentar.
Uma ocorrência de consumo excessivo de
alimento deve ser acompanhada por uma
sensação de falta de controle (Critério A2) para
ser considerada um episódio de compulsão
alimentar. Um indicador de perda de controle é
a incapacidade de abster-se de comer ou de
parar de comer depois de começar. Alguns
indivíduos descrevem uma qualidade
dissociativa durante, ou em seguida a, episódios
de compulsão alimentar. O prejuízo no controle
associado à compulsão alimentar pode não ser
absoluto; por exemplo, um indivíduo pode

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


186

continuar a comer de forma compulsiva


enquanto o telefone está tocando, mas vai parar
se um amigo ou o cônjuge entrar
inesperadamente no recinto. Alguns relatam que
seus episódios de compulsão alimentar não são
predominantemente caracterizados por um
sentimento agudo de perda de controle, e sim
por um padrão mais generalizado de ingestão
descontrolada. Se relatarem que desistiram de
tentar controlar a ingestão, a perda de controle
deverá ser considerada presente. A compulsão
alimentar também pode ser planejada, em
alguns casos.
O tipo de alimento consumido durante episódios
de compulsão alimentar varia tanto entre
diferentes pessoas quanto em um mesmo
indivíduo. A compulsão alimentar parece ser
caracterizada mais por uma anormalidade na
quantidade de alimento consumida do que por
uma fissura por um nutriente específico.
Entretanto, durante episódios de compulsão
alimentar, os indivíduos tendem a consumir
alimentos que evitariam em outras
circunstâncias.
Indivíduos com bulimia nervosa em geral
sentem vergonha de seus problemas alimentares
e tentam esconder os sintomas. A compulsão
alimentar normalmente ocorre em segredo ou da
maneira mais discreta possível. Com frequência
continua até que o indivíduo esteja
desconfortável ou até mesmo dolorosamente
cheio. O antecedente mais comum da
compulsão alimentar é o afeto negativo. Outros
gatilhos incluem fatores de estresse
interpessoais; restrições dietéticas; sentimentos
negativos relacionados ao peso corporal, à
forma do corpo e a alimentos; e tédio. A
compulsão alimentar pode minimizar ou aliviar
fatores que precipitam o episódio a curto prazo,
mas a autoavaliação negativa e a disforia com
frequência são as consequências tardias.
Outro aspecto essencial da bulimia nervosa é o
uso recorrente de comportamentos
compensatórios inapropriados para impedir o
ganho de peso, conhecidos coletivamente como
comportamentos purgativos, ou purgação
(Critério B). Muitos indivíduos com bulimia
nervosa empregam vários métodos para
compensar a compulsão alimentar. Vomitar é o
comportamento compensatório inapropriado
mais comum. Os efeitos imediatos dos vômitos
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
187

incluem alívio do desconforto físico e redução


do medo de ganhar peso. Em alguns casos,
vomitar torna-se um objetivo em si, e o
indivíduo comerá excessiva e compulsivamente
a fim de vomitar, ou vomitará depois de ingerir
uma pequena quantidade de alimento.
Indivíduos com bulimia nervosa podem usar
uma variedade de métodos para induzir o
vômito, incluindo o uso dos dedos ou
instrumentos para estimular o reflexo do
vômito. Geralmente se tornam peritos em
induzir vômitos e acabam conseguindo vomitar
quando querem. Raramente, consomem xarope
de ipeca para induzir o vômito. Outros
comportamentos purgativos incluem o uso
indevido de laxantes e diuréticos. Uma série de
outros métodos compensatórios também pode
ser usada em casos raros. Indivíduos com
bulimia nervosa podem usar indevidamente
enemas após episódios de compulsão alimentar,
mas raramente este se trata do único mecanismo
compensatório empregado. As pessoas com esse
transtorno podem tomar hormônio da tireoide
em uma tentativa de evitar o ganho de peso.
Aquelas com diabetes melito e bulimia nervosa
podem omitir ou diminuir doses de insulina a
fim de reduzir a metabolização do alimento
consumido durante episódios de compulsão
alimentar. Indivíduos com o transtorno, ainda,
podem jejuar por um dia ou mais ou se exercitar
excessivamente na tentativa de impedir o ganho
de peso. O exercício pode ser considerado
excessivo quando interfere de maneira
significativa em atividades importantes, quando
ocorre em horas inapropriadas ou em contextos
inapropriados ou quando o indivíduo continua a
se exercitar a despeito de uma lesão ou outras
complicações médicas.
Indivíduos com bulimia nervosa enfatizam de
forma excessiva a forma ou o peso do corpo em
sua autoavaliação, e esses fatores são
extremamente importantes para determinar sua
autoestima (Critério D). Eles podem lembrar
muito os portadores de anorexia nervosa pelo
medo de ganhar peso, pelo desejo de perder
peso e pelo nível de insatisfação com o próprio
corpo. Entretanto, um diagnóstico de bulimia
nervosa não deve ser dado quando a perturbação
só ocorrer durante episódios de anorexia
nervosa (Critério E).

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


188

Características Associadas que Apoiam o


Diagnóstico
Indivíduos com bulimia nervosa estão
geralmente dentro da faixa normal de peso ou
com sobre-peso (IMC > 18,5 kg/m2 e < 30 em
adultos). O transtorno ocorre, mas é incomum,
entre indiví- duos obesos. Entre os episódios de
compulsão alimentar, indivíduos com bulimia
nervosa costumam restringir seu consumo
calórico total e optam, de preferência, por
alimentos hipocalóricos (“dietéticos”), ao
mesmo tempo que evitam alimentos que
percebem como engordantes ou com potencial
para desencadear compulsão alimentar.
Irregularidade menstrual ou amenorreia ocorrem
com frequência em mulheres com bulimia
nervosa; não está claro se tais perturbações
estão relacionadas a oscilações no peso, a
deficiências nutricionais ou a sofrimento
emocional. Os distúrbios hidreletrolíticos
decorrentes do comportamento purgativo são
por vezes graves o suficiente para constituirem
problemas clinicamente sérios. Complicações
raras, porém fatais, incluem lacerações
esofágicas, ruptura gástrica e arritmias
cardíacas. Miopatias esqueléticas e cardíacas
graves foram relatadas em indivíduos depois do
uso repetido de xarope de ipeca para induzir o
vômito. Indivíduos que abusam cronicamente de
laxantes podem tornar-se dependentes do seu
uso para estimular movimentos intestinais.
Sintomas gastrintestinais costumam estar
associados a bulimia nervosa, e prolapso retal já
foi relatado entre indivíduos com esse
transtorno.

Transtorno de Compulsão Alimentar (ou, Hiperfagia)


CID-10 DSM-5
Hiperfagia Associada A Outros Distúrbios A característica essencial do transtorno de
Psicológicos compulsão alimentar são episódios recorrentes
de compulsão alimentar que devem ocorrer, em
Hiperfagia devida a eventos estressantes, tais média, ao menos uma vez por semana durante
como lutos, acidentes, partos etc. três meses (Critério D). Um “episódio de
Hiperfagia psicogênica. compulsão alimentar” é definido como a
ingestão, em um período determinado, de uma
quantidade de alimento definitivamente maior
do que a maioria das pessoas consumiria em um
mesmo período sob circunstâncias semelhantes
(Critério A1). O contexto em que a ingestão
ocorre pode afetar a estimativa do clínico
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
189

quanto à ingestão ser ou não excessiva. Por


exemplo, uma quantidade de alimento que seria
considerada excessiva para uma refeição típica
seria considerada normal durante uma refeição
comemorativa ou nas festas de fim de ano. Um
“período de tempo determinado” refere-se a um
período delimitado, geralmente inferior a duas
horas. Não é necessário que um episódio de
compulsão alimentar limite-se a um único
contexto. Por exemplo, um indivíduo pode
começar a comer compulsivamente em um
restaurante e depois continuar a comer quando
volta para casa. Lanches contínuos em pequenas
quantidades de alimento ao longo do dia não
seriam considerados compulsão alimentar.
Uma ocorrência de consumo excessivo de
alimento deve ser acompanhada por uma
sensação de falta de controle (Critério A2) para
ser considerada um episódio de compulsão
alimentar. Um indicador da perda de controle é
a incapacidade de evitar comer ou de parar de
comer depois de começar. Alguns indivíduos
descrevem uma qualidade dissociativa durante,
ou depois de, episódios de compulsão alimentar.
O prejuízo no controle associado à compulsão
alimentar pode não ser absoluto; por exemplo,
um indivíduo pode continuar a comer
compulsivamente enquanto o telefone está
tocando, mas vai parar se um conhecido ou o
cônjuge entrar no recinto. Alguns indivíduos
relatam que seus episódios de compulsão
alimentar não são mais caracterizados por um
sentimento agudo de perda de controle, e sim
por um padrão mais generalizado de ingestão
descontrolada. Se relatarem que desistiram dos
esforços para controlar a ingestão, a perda de
controle ainda assim pode ser considerada
presente. A compulsão alimentar também pode
ser planejada, em alguns casos.
O tipo de alimento consumido durante episódios
de compulsão alimentar varia tanto entre
diferentes pessoas quanto em um mesmo
indivíduo. A compulsão alimentar parece ser
caracterizada mais por uma anormalidade na
quantidade de alimento consumida do que pela
fissura por um nutriente específico.
É preciso que a compulsão alimentar seja
caracterizada por sofrimento marcante (Critério
C) e pelo menos três dos seguintes aspectos:
comer muito mais rapidamente do que o normal;
comer até se sentir desconfortavelmente cheio;
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
190

ingerir grandes quantidades de alimento sem


estar com sensação física de fome; comer
sozinho por vergonha do quanto se come; e
sentir-se desgostoso de si mesmo, deprimido ou
muito culpado em seguida (Critério B).
Indivíduos com transtorno de compulsão
alimentar geralmente sentem vergonha de seus
problemas alimentares e tentam ocultar os
sintomas. A compulsão alimentar ocorre em
segredo ou o mais discretamente possível. O
antecedente mais comum da compulsão
alimentar é o afeto negativo. Outros gatilhos
incluem estressores interpessoais; restrições
dietéticas; sentimentos negativos relacionados
ao peso corporal, à forma do corpo e ao
alimento; e tédio. A compulsão alimentar pode
minimimizar ou aliviar fatores que precipitaram
o episódio a curto prazo, porém a autoavaliação
negativa e a disforia com frequência são as
consequências tardias.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
O transtorno de compulsão alimentar ocorre em
indivíduos de peso normal ou com sobrepeso e
obesos. O transtorno é consistentemente
associado ao sobrepeso e à obesidade em
indivíduos que buscam tratamento. Contudo, é
distinto da obesidade. A maioria dos indivíduos
obesos não se envolve em compulsão alimentar
recorrente. Além disso, comparados a
indivíduos obesos de peso equivalente sem
transtorno de compulsão alimentar, aqueles com
o transtorno consomem mais calorias em
estudos laboratoriais do comportamento
alimentar e têm mais prejuízo funcional,
qualidade de vida inferior, mais sofrimento
subjetivo e maior comorbidade psiquiátrica.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


191

Transtornos Psicóticos
Esquizofrenia (Dados epidemiológicos mostram que cerca de 1% da população mundial sofre de
Esquizofrenia)
CID-10 DSM-5
Os transtornos esquizofrênicos se caracterizam Os sintomas característicos da esquizofrenia
em geral por distorções fundamentais e envolvem uma gama de disfunções cognitivas,
características do pensamento e da percepção, comportamentais e emocionais, mas nenhum
e por afetos inapropriados ou embotados. sintoma é patognomônico do transtorno. O
Usualmente mantém-se clara a consciência e a diagnóstico envolve o reconhecimento de um
capacidade intelectual, embora certos déficits conjunto de sinais e sintomas associados a um
cognitivos possam evoluir no curso do tempo. funcionamento profissional ou social
Os fenômenos psicopatológicos mais prejudicado. Indivíduos com o transtorno
importantes incluem o eco do pensamento apresentarão variações substanciais na maior
[ouvir o próprio pensamento após ter sido parte das características, uma vez que a
pensado (sonorização) de forma repetida], a esquizofrenia é uma síndrome clínica
imposição ou o roubo do pensamento, a heterogênea.
divulgação do pensamento [o paciente tem a Critérios Diagnósticos
nítida sensação de que as pessoas ouvem o que A. Dois (ou mais) dos itens a seguir, cada um
pensa no momento mesmo em que está presente por uma quantidade significativa de
pensando], a percepção delirante, ideias tempo durante um período de um mês (ou
delirantes de controle, de influência ou de menos, se tratados com sucesso). Pelo menos
passividade, vozes alucinatórias que comentam um deles deve ser (1), (2) ou (3):
ou discutem com o paciente na terceira pessoa, 1. Delírios.
transtornos do pensamento e sintomas 2. Alucinações.
negativos. 3.Discurso desorganizado.
A evolução dos transtornos esquizofrênicos 4.Comportamento grosseiramente
pode ser contínua, episódica com ocorrência de desorganizado ou catatônico.
um déficit progressivo ou estável, ou 5.Sintomas negativos (i.e., expressão emocional
comportar um ou vários episódios seguidos de diminuída ou avolia).
uma remissão completa ou incompleta. Não se B. Por período significativo de tempo desde o
deve fazer um diagnóstico de esquizofrenia aparecimento da perturbação, o nível de
quando o quadro clínico comporta sintomas funcionamento em uma ou mais áreas
depressivos ou maníacos no primeiro plano, importantes do funcionamento, como trabalho,
a menos que se possa estabelecer sem relações interpessoais ou autocuidado, está
equívoco que a ocorrência dos sintomas acentuadamente abaixo do nível alcançado antes
esquizofrênicos fosse anterior à dos do início (ou, quando o início se dá na infância
transtornos afetivos. Além disto, não se deve ou na adolescência, incapacidade de atingir o
fazer um diagnóstico de esquizofrenia nível esperado de funcionamento interpessoal,
quando existe uma doença cerebral acadêmico ou profissional).
manifesta, intoxicação por droga ou C. Sinais contínuos de perturbação persistem
abstinência de droga. [...] durante, pelo menos, seis meses. Esse período
de seis meses deve incluir no mínimo um mês
Esquizofrenia paranoide (ou, parafrênica) de sintomas (ou menos, se tratados com
A esquizofrenia paranoide se caracteriza sucesso) que precisam satisfazer ao Critério A
essencialmente pela presença de ideias (i.e., sintomas da fase ativa) e pode incluir
delirantes relativamente estáveis, períodos de sintomas prodrômicos ou residuais.
frequentemente de perseguição, em geral Durante esses períodos prodrômicos ou
acompanhadas de alucinações, particularmente residuais, os sinais da perturbação podem ser
auditivas e de perturbações das percepções. As manifestados apenas por sintomas negativos ou
perturbações do afeto, da vontade, da por dois ou mais sintomas listados no Critério A
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
192

linguagem e os sintomas catatônicos, estão presentes em uma forma atenuada (p. ex.,
ausentes, ou são relativamente discretos. crenças esquisitas, experiências perceptivas
incomuns).
Esquizofrenia hebefrênica D. Transtorno esquizoafetivo e transtorno
Forma de esquizofrenia caracterizada pela depressivo ou transtorno bipolar com
presença proeminente de uma perturbação dos características psicóticas são descartados porque
afetos; as ideias delirantes e as alucinações são 1) não ocorreram episódios depressivos maiores
fugazes e fragmentárias, o comportamento é ou maníacos concomitantemente com os
irresponsável e imprevisível; existem sintomas da fase ativa, ou 2) se episódios de
frequentemente maneirismos. O afeto é humor ocorreram durante os sintomas da fase
superficial e inapropriado. O pensamento é ativa, sua duração total foi breve em relação aos
desorganizado e o discurso incoerente. Há uma períodos ativo e residual da doença.
tendência ao isolamento social. Geralmente o E. A perturbação não pode ser atribuída aos
prognóstico é desfavorável devido ao rápido efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex.,
desenvolvimento de sintomas "negativos", droga de abuso, medicamento) ou a outra
particularmente um embotamento do afeto e condição médica.
perda da volição. A hebefrenia deveria F. Se há história de transtorno do espectro
normalmente ser somente diagnosticada em autista ou de um transtorno da comunicação
adolescentes e em adultos jovens. iniciado na infância, o diagnóstico adicional de
esquizofrenia é realizado somente se delírios ou
Esquizofrenia catatônica alucinações proeminentes, além dos demais
A esquizofrenia catatônica é dominada por sintomas exigidos de esquizofrenia, estão
distúrbios psicomotores proeminentes que também presentes por pelo menos um mês (ou
podem alternar entre extremos tais como menos, se tratados com sucesso).
hipercinesia e estupor, ou entre a obediência [...]
automática e o negativismo. Atitudes e Características Associadas que Apoiam o
posturas a que os pacientes foram compelidos Diagnóstico
a tomar podem ser mantidas por longos Indivíduos com esquizofrenia podem exibir
períodos. Um padrão marcante da afecção pode afeto inadequado (p. ex., rir na ausência de um
ser constituído por episódios de excitação estímulo apropriado); humor disfórico que pode
violenta. O fenômeno catatônico pode estar assumir a forma de depressão, ansiedade ou
combinado com um estado oniróide com raiva; padrão de sono perturbado (p. ex., sono
alucinações cênicas vívidas. durante o dia e atividade durante a noite); e falta
de interesse em alimentar-se ou recusa da
Esquizofrenia indiferenciada ou atípica comida. Despersonalização, desrealização e
Afecções psicóticas que preenchem os critérios preocupações somáticas podem ocorrer e por
diagnósticos gerais para a esquizofrenia mas vezes atingem proporções delirantes. Ansiedade
que não correspondem a nenhum dos subtipos e fobias são comuns. Déficits cognitivos na
incluídos [...], ou que exibam padrões de mais esquizofrenia são comuns e fortemente
de um deles sem uma clara predominância de associados a prejuízos profissionais e
um conjunto particular de características funcionais. Esses déficits podem incluir
diagnósticas. diminuições na memória declarativa, na
memória de trabalho, na função da linguagem e
Depressão pós-esquizofrênica em outras funções executivas, bem como
Episódio depressivo eventualmente prolongado velocidade de processamento mais lenta.
que ocorre ao fim de uma afecção Anormalidades no processamento sensorial e na
esquizofrênica. Ao menos alguns sintomas capacidade inibitória, bem como redução na
esquizofrênicos "positivos" ou "negativos" atenção, são também encontradas. Alguns
devem ainda estar presentes mas não dominam indivíduos com esquizofrenia mostram déficits
mais o quadro clínico. Este tipo de estado na cognição social, incluindo déficits na
depressivo se acompanha de um maior risco de capacidade de inferir as intenções dos outros
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
193

suicídio. Se o paciente não apresenta mais (teoria da mente), podendo atender a eventos ou
nenhum sintoma esquizofrênico, deve-se fazer estímulos irrelevantes e depois interpretá-los
um diagnóstico de episódio depressivo. Se os como significativos, talvez levando à geração de
sintomas esquizofrênicos ainda são aparentes e delírios explanatórios. Esses prejuízos
proeminentes, deve-se manter o diagnóstico da costumam persistir durante a remissão dos
forma clínica apropriada da esquizofrenia. sintomas.
Alguns indivíduos com psicose podem carecer
Esquizofrenia residual de insight ou consciência de seu transtorno (i.e.,
Estádio crônico da evolução de uma doença anosognosia). Essa falta de insight inclui não
esquizofrênica, com uma progressão nítida de perceber os sintomas de esquizofrenia, podendo
um estádio precoce para um estádio tardio, o estar presente em todo o curso da doença. Não
qual se caracteriza pela presença persistente de perceber a doença costuma ser um sintoma da
sintomas "negativos" embora não própria esquizofrenia em vez de uma estratégia
forçosamente irreversíveis, tais como lentidão de enfrentamento. É comparável à falta de
psicomotora; hipoatividade; embotamento percepção de déficits neurológicos após dano
afetivo; passividade e falta de iniciativa; cerebral, chamada de anosognosia. Esse sintoma
pobreza da quantidade e do conteúdo do é o mais comum preditor de não adesão ao
discurso; pouca comunicação não-verbal tratamento e prevê elevadas taxas de recaída,
(expressão facial, contato ocular, modulação da aumento no número de tratamentos
voz e gestos), falta de cuidados pessoais e involuntários, funcionamento psicossocial mais
desempenho social medíocre. pobre, agressão e um curso mais pobre da
doença.
Esquizofrenia simples Hostilidade e agressão podem estar associadas a
Transtorno caracterizado pela ocorrência esquizofrenia, embora agressão espontânea ou
insidiosa e progressiva de excentricidade de aleatória não seja comum. A agressão é mais
comportamento, incapacidade de responder às frequente em indivíduos do sexo masculino
exigências da sociedade, e um declínio global mais jovens e em pessoas com história anterior
do desempenho. Os padrões negativos de violência, não adesão ao tratamento, abuso
característicos da esquizofrenia residual (por de substância e impulsividade. Deve-se observar
exemplo: embotamento do afeto e perda da que a grande maioria das pessoas com
volição) se desenvolvem sem serem precedidos esquizofrenia não é agressiva, sendo, com mais
por quaisquer sintomas psicóticos manifestos. frequência, mais vitimizada que aquelas na
população em geral.
Atualmente não há exames laboratoriais,
radiológicos ou testes psicométricos para o
transtorno. As diferenças são claras em
múltiplas regiões do cérebro entre grupos de
pessoas saudáveis e pessoas com esquizofrenia,
incluindo evidências de estudos por
neuroimagem, neuropatologia e neurofisiologia.
Diferenças ficam também evidentes na
arquitetura celular, na conectividade da
substância branca e no volume da substância
cinzenta em uma variedade de regiões, como os
córtices pré-frontal e temporal. É observada
redução no volume cerebral total, bem como
aumento da redução de volume com o
envelhecimento. Reduções do volume cerebral
com o envelhecimento são mais pronunciadas
em pessoas com esquizofrenia do que em
indivíduos saudáveis. Por fim, pessoas com a
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
194

doença parecem diferir daquelas sem o


transtorno em índices eletrofisiológicos e de
eye-tracking131.
Sinais neurológicos leves em indivíduos com
esquizofrenia incluem prejuízos na coordenação
motora, na integração sensorial e no
sequenciamento motor de movimentos
complexos, confusão esquerda-direita e
desinibição de movimentos associados. Além
disso, podem ocorrer anomalias físicas leves da
face e dos membros.

131
Eye-tracking – “Rastreamento ocular.” Refere-se ao processo pelo qual os olhos seguem um objeto em movimento,
sem rotação da cabeça.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
195

Genética álcool e drogas,


Cientistas identificam genes da esquizofrenia. tratados com terapia,
Descoberta dos genes mais atuantes no suplementos
distúrbio mental pode levar a melhores nutricionais (como
diagnósticos e tratamento da doença. cápsulas de óleo de
"Pesquisadores descobriram que neurônios peixe com ômega-3) e, inclusive, com ingestão
fabricados com células da pele de paciente com precoce de medicamentos antipsicotrópicos para
esquizofrenia eram incapazes de processar o evitar o desenvolvimento completo da doença",
oxigênio corretamente" Pesquisadores diz Niculescu.
identificaram centenas de genes capazes de Combinações - De acordo com o pesquisador,
mostrar quem corre mais riscos de desenvolver a após identificar os genes relacionados com a
doença (Thinkstock). esquizofrenia, a equipe testou suas descobertas em
Cientistas anunciaram nesta terça-feira ter outros pacientes fora do grupo de estudos para
identificado os genes mais atuantes na mostrar que os resultados seriam reproduzíveis e
esquizofrenia. Em um estudo que envolveu teriam habilidade previsível. Estudos genéticos
informação genética de milhares de pacientes com sobre psiquiatria costumam gerar uma excitação
o distúrbio mental e de um grupo de controle inicial. "Mas depois não são reproduzidos em
saudável, os pesquisadores identificaram centenas populações independentes, que são a prova mais
de genes capazes de mostrar quem corre mais importante de que uma descoberta é sólida e real".
riscos de desenvolver a doença. A descoberta foi A equipe também usou dados cerebrais de
divulgada no periódico Molecular Psychiatry, camundongos que tomaram medicamentos que
publicação da revista científica Nature. imitavam a esquizofrenia. "Alguns genes e
Saiba mais mecanismos biológicos que identificamos podem
“Quebramos o código genético da esquizofrenia, ser usados para o desenvolvimento de um novo
identificando muitos dos genes envolvidos e como remédio", disse Niculescu. Eles também podem
eles funcionam juntos para provocar a doença", ser usados para redirecionar drogas normalmente
diz Alexander Niculescu, coordenador do estudo, usadas para tratar outros distúrbios.
da Escola de Medicina da Universidade de "O ambiente também desempenha um papel. Os
Indiana, em Indianápolis. "Entendendo melhor a genes que identificamos atuam na conectividade
base genética e biológica da doença, podemos cerebral, portanto podem ocasionar mais
desenvolver testes e tratamentos melhores." Esses criatividade em alguns indivíduos ou a doença em
testes poderiam ser usados para determinar se outros, variando de acordo com o excesso destas
crianças em famílias com casos de esquizofrenia mutações genéticas na combinação errada e um
correriam riscos de desenvolver a doença. ambiente estressante", diz.
"Se forem determinados como em risco elevado, (http://veja.abril.com.br/noticia/saude/cientistas-
essas crianças seriam acompanhadas mais de perto identificam-genes-da-esquizofrenia)
pelos médicos, aconselhadas a evitar estresse,

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


196

Outros transtornos psicóticos


Transtorno Esquizoafetivo
CID-10 DSM-5
Trata-se de transtornos episódicos nos quais O diagnóstico de transtorno esquizoafetivo
tanto os sintomas afetivos quanto os baseia-se em uma avaliação de um período
esquizofrênicos são proeminentes de tal modo ininterrupto da doença durante o qual o
que o episódio da doença não justifica um indivíduo continua a exibir sintomas ativos ou
diagnóstico quer de esquizofrenia quer de residuais da doença psicótica. Embora não
episódio depressivo ou maníaco. Outras necessariamente, o diagnóstico costuma ser
afecções em que os sintomas afetivos estão feito durante o período da doença psicótica. Em
superpostos a doença esquizofrênica pré- algum momento durante o período, deve ser
existente ou coexistem ou alternam com satisfeito o Critério A para esquizofrenia. O
transtornos delirantes persistentes de outros Critério B (disfunção social) e o F (exclusão de
tipos, são classificados em F20-F29. Os transtorno do espectro do autismo e de outro
sintomas psicóticos que não correspondem ao transtorno da comunicação com início na
caráter dominante do transtorno afetivo, não infância) para esquizofrenia não precisam ser
justificam um diagnóstico de transtorno satisfeitos. Além de satisfazer o Critério A para
esquizoafetivo. esquizofrenia, há um episódio depressivo maior
ou maníaco (Critério A para transtorno
Transtorno esquizoafetivo do tipo maníaco esquizoafetivo). Uma vez que é comum a perda
Transtorno em que tanto sintomas de interesse ou prazer na esquizofrenia, para que
esquizofrênicos quanto maníacos são seja satisfeito o Critério A para transtorno
proeminentes de tal modo que o episódio da esquizoafetivo, o episódio depressivo maior
doença não justifica um diagnóstico quer de deve incluir humor deprimido generalizado (i.e.,
esquizofrenia quer de episódio maníaco. Esta a presença de interesse ou prazer
categoria deveria ser usada tanto para um único acentuadamente diminuídos não é suficiente).
episódio, quer para classificar um transtorno Episódios de depressão ou mania estão
recorrente no qual a maioria dos episódios são presentes na maior parte da duração total da
esquizoafetivos do tipo maníaco. doença (i.e., após atendido o Critério A)
(Critério C para transtorno esquizoafetivo). Para
Transtorno esquizoafetivo do tipo separar o transtorno esquizoafetivo de um
depressivo transtorno depressivo ou transtorno bipolar com
Transtorno em que os sintomas características psicóticas, devem estar presentes
esquizofrênicos e os sintomas depressivos são delírios ou alucinações durante pelo menos duas
proeminentes de tal modo que o episódio da semanas na ausência de um episódio de humor
doença não justifica o diagnóstico nem de (depressivo ou maníaco) em algum momento ao
esquizofrenia nem de um episódio depressivo. longo da duração da doença na vida (Critério B
Esta categoria deve ser utilizada para para transtorno esquizoafetivo). Os sintomas
classificar quer um episódio isolado, quer um não devem ser atribuídos aos efeitos de uma
transtorno recorrente no qual a maioria dos substância ou a outra condição médica (Critério
episódios são esquizoafetivos do tipo D para transtorno esquizoafetivo).
depressivo. O Critério C para transtorno esquizoafetivo
especifica que os sintomas de humor que
satisfazem os critérios para episódio depressivo
maior ou maníaco devem estar presentes
durante a maior parte da duração total das fases
ativa e residual da doença. O Critério C exige a
avaliação dos sintomas de humor durante todo o
curso de uma doença psicótica, o que difere do
critério no DSM-4, que exigia apenas uma

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


197

avaliação do período atual da doença. Se os


sintomas de humor estão presentes durante
apenas um período relativamente curto, o
diagnóstico é esquizofrenia, e não transtorno
esquizoafetivo. Ao decidir se a apresentação do
indivíduo satisfaz o Critério C, o clínico deve
revisar a duração total da doença psicótica (i.e.,
sintomas ativos e residuais) e determinar
quando sintomas de humor significativos (não
tratados ou precisando de tratamento com
antidepressivo e/ou medicamento estabilizador
do humor) acompanharam os sintomas
psicóticos. Essa determinação demanda
informações suficientes da história e juízo
clínico. Por exemplo, um indivíduo com história
de quatro anos de sintomas ativos e residuais de
esquizofrenia desenvolve episódios depressivos
e maníacos que, no conjunto, não ocupam mais
de um ano na história de quatro anos da doença
psicótica. Essa apresentação não satisfaz o
Critério C.
Além das cinco áreas de domínio dos sintomas
identificadas nos critérios diagnósticos, é
fundamental a avaliação dos sintomas dos
domínios cognição, depressão e mania para que
sejam feitas distinções importantes entre os
vários transtornos do espectro da esquizofrenia
e outros transtornos psicóticos.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
O funcionamento profissional costuma estar
prejudicado, mas não se trata de um critério de-
finidor (diferentemente do que ocorre na
esquizofrenia). Contato social restrito e
dificuldades com o autocuidado estão
associados ao transtorno esquizoafetivo, mas os
sintomas negativos podem ser menos graves e
menos persistentes do que os encontrados na
esquizofrenia. Anosognosia (i.e., insight
prejudicado) também é comum no transtorno
esquizoafetivo, mas os déficits no insight podem
ser menos graves e generalizados do que os da
esquizofrenia. Indivíduos com transtorno
esquizoafetivo podem ter risco aumentado de
desenvolvimento posterior de episódios de
transtorno depressivo maior ou transtorno
bipolar se os sintomas de humor continuarem
após a remissão dos sintomas que satisfazem o
Critério A para esquizofrenia. Pode haver
transtornos associados ao álcool ou relacionados
a outras substâncias.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
198

Não há testes ou medidas biológicas capazes de


auxiliar no diagnóstico de transtorno esqui-
zoafetivo. Não está claro se esse transtorno
difere da esquizofrenia no que se refere a
características associadas como anormalidades
cerebrais estruturais ou funcionais, déficits
cognitivos ou fatores de risco genéticos.

Transtorno delirante
CID-10 DSM-5
Transtorno caracterizado pela ocorrência de A característica essencial do transtorno delirante
uma ideia delirante única ou de um conjunto de é a presença de um ou mais delírios que
ideias delirantes aparentadas, em geral persistem por pelo menos um mês (Critério A).
persistentes e que por vezes permanecem Não é feito o diagnóstico de transtorno delirante
durante o resto da vida. O conteúdo da ideia ou se o indivíduo alguma vez teve apresentação de
das ideias delirantes é muito variável. A sintomas que satisfaçam o Critério A para
presença de alucinações auditivas (vozes) esquizofrenia (Critério B). Independentemente
manifestas e persistentes, de sintomas do impacto direto dos delírios, prejuízos no
esquizofrênicos tais como ideias delirantes de funcionamento psicossocial podem estar mais
influência e um embotamento nítido dos circunscritos que os encontrados em outros
afetos, e a evidência clara de uma afecção transtornos psicóticos como a esquizofrenia, e o
cerebral, são incompatíveis com o diagnóstico. comportamento não é claramente bizarro ou
Entretanto, a presença de alucinações auditivas esquisito (Critério C). Se ocorrerem episódios
ocorrendo de modo irregular ou transitório, de humor concomitantemente com os delírios,
particularmente em pessoas de idade avançada, sua duração total é breve em relação à duração
não elimina este diagnóstico, sob condição de total dos períodos delirantes (Critério D). Os
que não se trate de alucinações tipicamente delírios não podem ser atribuídos aos efeitos
esquizofrênicas e de que elas não dominem o fisiológicos de uma substância (p. ex., cocaína)
quadro clínico. ou a outra condição médica (p. ex., doença de
Alzheimer), não sendo mais bem explicados por
outro transtorno mental, como transtorno
dismórfico corporal ou transtorno obsessivo-
compulsivo (Critério E).
Além das cinco áreas de domínios de sintomas
identificadas nos critérios diagnósticos, é
fundamental a avaliação dos sintomas dos
domínios cognição, depressão e mania para que
sejam feitas distinções importantes entre os
vários transtornos do espectro da esquizofrenia
e outros transtornos psicóticos.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Problemas sociais, conjugais ou profissionais
podem ser consequências de crenças ou
transtorno delirante. Indivíduos com transtorno
delirante podem ser capazes de descrever, de
forma factual, que outras pessoas veem suas
crenças como irracionais; são incapazes, no
entanto, de aceitar isso (i.e., pode existir
“insight dos fatos”, mas não um insight
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
199

verdadeiro). Muitos indivíduos desenvolvem


humor irritável ou disfórico, que costuma ser
compreendido como uma reação às suas crenças
delirantes. Raiva e comportamento violento
podem ocorrer com os tipos persecutório,
ciumento e erotomaníaco. A pessoa pode se
envolver em comportamento litigioso ou
antagonista (p. ex., envio de centenas de cartas
de protesto ao governo). Podem ocorrer
dificuldades legais especialmente nos tipos
ciumento e erotomaníaco.

Transtornos psicóticos agudos e transitórios (ou, Breve)


CID-10 DSM-5
Grupo heterogêneo de transtornos A característica essencial do transtorno
caracterizados pela ocorrência aguda de psicótico breve consiste em uma perturbação
sintomas psicóticos tais como ideias delirantes, que envolve o aparecimento repentino de pelo
alucinações, perturbações das percepções e por menos um dos seguintes sintomas psicóticos
uma desorganização maciça do comportamento positivos: delírios, alucinações, discurso
normal. O termo "agudo" é aqui utilizado para desorganizado (p. ex., descarrilamento ou
caracterizar o desenvolvimento crescente de incoerência frequente) ou comportamento
um quadro clínico manifestamente patológico psicomotor grosseiramente anormal, incluindo
em duas semanas no máximo. Para estes catatonia (Critério A). Início súbito é definido
transtornos não há evidência de uma etiologia como uma mudança de um estado não psicótico
orgânica. Acompanham-se frequentemente de para um estado claramente psicótico em duas
uma perplexidade e de uma confusão, mas as semanas, geralmente sem um pródromo. Um
perturbações de orientação no tempo e no episódio da perturbação tem duração mínima de
espaço e quanto à pessoa não são um dia, ainda que inferior a um mês, e a pessoa
suficientemente constantes ou graves para eventualmente tem um retorno completo ao
responder aos critérios de um delirium de nível de funcionamento pré-mórbido (Critério
origem orgânica (F05.-). Em geral estes B). A perturbação não é mais bem explicada por
transtornos se curam completamente em menos transtorno depressivo ou transtorno bipolar com
de poucos meses, frequentemente em algumas características psicóticas, por transtorno
semanas ou mesmo dias. Quando o transtorno esquizoafetivo ou por esquizofrenia, nem
persiste o diagnóstico deve ser modificado. O atribuível aos efeitos fisiológicos de uma
transtorno pode estar associado a um "stress" substância (p. ex., um alucinógeno) ou a outra
agudo (os acontecimentos geralmente condição médica (p. ex., hematoma subdural)
geradores de "stress" precedem de uma a duas (Critério C).
semanas o aparecimento do transtorno). Além das cinco áreas de domínio dos sintomas
identificadas nos critérios diagnósticos, a
avaliação dos sintomas dos domínios cognição,
depressão e mania é fundamental para que
sejam feitas distinções importantes entre os
vários transtornos do espectro da esquizofrenia
e outros transtornos psicóticos.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Pessoas com transtorno psicótico breve
costumam vivenciar turbulência emocional ou
grande confusão. Podem apresentar mudanças
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
200

rápidas de um afeto intenso a outro. Ainda que a


perturbação seja breve, o nível de prejuízo pode
ser grave, podendo haver necessidade de
supervisão para garantir o atendimento às
necessidades nutricionais e higiênicas e para
que a pessoa fique protegida das consequências
de julgamento insatisfatório, prejuízo cognitivo
ou atos baseados em delírios. Parece haver risco
aumentado de comportamento suicida,
particularmente durante o episódio agudo.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


201

Transtorno do Neurodesenvolvimento (DSM–5) ou Transtorno Global do Desenvolvimento


(CID-10)
Autismo
CID-10 DSM-5
Autismo Infantil As características essenciais do transtorno do
Transtorno global do desenvolvimento espectro autista são prejuízo persistente na
caracterizado por comunicação social recíproca e na interação
a) um desenvolvimento anormal ou alterado, social (Critério A) e padrões restritos e
manifestado antes da idade de três anos, e repetitivos de comportamento, interesses ou
b) apresentando uma perturbação característica atividades (Critério B). Esses sintomas estão
do funcionamento em cada um dos três presentes desde o início da infância e limitam
domínios seguintes: interações sociais, ou prejudicam o funcionamento diário (Critérios
comunicação, comportamento focalizado e C e D). O estágio em que o prejuízo funcional
repetitivo. fica evidente irá variar de acordo com
Além disso, o transtorno se acompanha características do indivíduo e seu ambiente.
comumente de numerosas outras manifestações Características diagnósticas nucleares estão
inespecíficas, por exemplo fobias, perturbações evidentes no período do desenvolvimento, mas
de sono ou da alimentação, crises de birra ou intervenções, compensações e apoio atual
agressividade (auto-agressividade). podem mascarar as dificuldades, pelo menos em
Inclui: alguns contextos. Manifestações do transtorno
Autismo infantil também variam muito dependendo da gravidade
Psicose infantil da condição autista, do nível de
Síndrome de Kanner desenvolvimento e da idade cronológica; daí o
Transtorno autístico uso do termo espectro. O transtorno do espectro
Exclui: autista engloba transtornos antes chamados de
psicopatia autista (F84.5) autismo infantil precoce, autismo infantil,
autismo de Kanner, autismo de alto
Autismo Atípico funcionamento, autismo atípico, transtorno
Transtorno global do desenvolvimento, global do desenvolvimento sem outra
ocorrendo após a idade de três anos ou que não especificação, transtorno desintegrativo da
responde a todos os três grupos de critérios infância e transtorno de Asperger.
diagnósticos do autismo infantil. Os prejuízos na comunicação e na interação
Esta categoria deve ser utilizada para social especificados no Critério A são
classificar um desenvolvimento anormal ou pervasivos [gerais, espalhados, difusos] e
alterado, aparecendo após a idade de três anos, sustentados. Os diagnósticos são mais válidos e
e não apresentando manifestações patológicas confiáveis quando baseados em múltiplas fontes
suficientes em um ou dois dos três domínios de informação, incluindo observações do
psicopatológicos (interações sociais recíprocas, clínico, história do cuidador e, quando possível,
comunicação, comportamentos limitados, autorrelato. Déficits verbais e não verbais na
estereotipados ou repetitivos) implicados no comunicação social têm manifestações variadas,
autismo infantil; existem sempre anomalias dependendo da idade, do nível intelectual e da
características em um ou em vários destes capacidade linguística do indivíduo, bem como
domínios. de outros fatores, como história de tratamento e
O autismo atípico ocorre habitualmente em apoio atual. Muitos indivíduos têm déficits de
crianças que apresentam um retardo mental linguagem, as quais variam de ausência total da
profundo ou um transtorno específico grave do fala, passando por atrasos na linguagem, com-
desenvolvimento de linguagem do tipo preensão reduzida da fala, fala em eco até
receptivo. linguagem explicitamente literal ou afetada.
Inclui: Mesmo quando habilidades linguísticas formais
Psicose infantil atípica (p. ex., vocabulário, gramática) estão intactas, o
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
202

Retardo mental com características autísticas uso da linguagem para comunicação social
Usar código adicional (F70-F79), se recíproca está prejudicado no transtorno do
necessário, para identificar o retardo mental. espectro autista.
Déficits na reciprocidade socioemocional (i.e.,
capacidade de envolvimento com outros e
compartilhamento de ideias e sentimentos) estão
claramente evidentes em crianças pequenas com
o transtorno, que podem apresentar pequena ou
nenhuma capacidade de iniciar interações
sociais e de compartilhar emoções, além de
imitação reduzida ou ausente do comportamento
de outros. Havendo linguagem, costuma ser
unilateral, sem reciprocidade social, usada mais
para solicitar ou rotular do que para comentar,
compartilhar sentimentos ou conversar. Nos
adultos sem deficiência intelectual ou atrasos de
linguagem, os déficits na reciprocidade
socioemocional podem aparecer mais em
dificuldades de processamento e resposta a
pistas sociais complexas (p. ex., quando e como
entrar em uma conversa, o que não dizer).
Adultos que desenvolveram estratégias
compensatórias para alguns desafios sociais
ainda enfrentam dificuldades em situações
novas ou sem apoio, sofrendo com o esforço e a
ansiedade para, de forma consciente, calcular o
que é socialmente intuitivo para a maioria dos
indivíduos.
Déficits em comportamentos de comunicação
não verbal usados para interações sociais são
expressos por uso reduzido, ausente ou atípico
de contato visual (relativo a normas culturais),
gestos, expressões faciais, orientação corporal
ou entonação da fala. Um aspecto precoce do
transtorno do espectro autista é a atenção
compartilhada prejudicada, conforme
manifestado por falta do gesto de apontar,
mostrar ou trazer objetos para compartilhar o
interesse com outros ou dificuldade para seguir
o gesto de apontar ou o olhar indicador de
outras pessoas. Os indivíduos podem aprender
alguns poucos gestos funcionais, mas seu
repertório é menor do que o de outros e
costumam fracassar no uso de gestos
expressivos com espontaneidade na
comunicação. Entre adultos com linguagem
fluente, a dificuldade para coordenar a
comunicação não verbal com a fala pode passar
a impressão de “linguagem corporal” estranha,
rígida ou exagerada durante as interações. O
prejuízo pode ser relativamente sutil em áreas
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
203

individuais (p. ex., alguém pode ter contato


visual relativamente bom ao falar), mas
perceptível na integração insatisfatória entre
contato visual, gestos, postura corporal,
prosódia e expressão facial para a comunicação
social.
Déficits para desenvolver, manter e
compreender as relações devem ser julgados em
relação aos padrões relativos a idade, gênero e
cultura. Pode haver interesse social ausente,
reduzido ou atípico, manifestado por rejeição de
outros, passividade ou abordagens inadequadas
que pareçam agressivas ou disruptivas. Essas
dificuldades são particularmente evidentes em
crianças pequenas, em quem costuma existir
uma falta de jogo social e imaginação
compartilhados (p. ex., brincar de fingir de
forma flexível e adequada à idade) e,
posteriormente, insistência em brincar seguindo
regras muito fixas. Indivíduos mais velhos
podem relutar para entender qual o
comportamento considerado apropriado em uma
situação e não em outra (p. ex., comportamento
casual durante uma entrevista de emprego) ou as
diversas formas de uso da linguagem para a
comunicação (p. ex., ironia, mentirinhas). Pode
existir aparente preferência por atividades
solitárias ou por interações com pessoas muito
mais jovens ou mais velhas. Com frequência, há
desejo de estabelecer amizades sem uma ideia
completa ou realista do que isso significa (p.
ex., amizades unilaterais ou baseadas
unicamente em interesses especiais
compartilhados). Também é importante
considerar o relacionamento com irmãos,
colegas de trabalho e cuidadores (em termos de
reciprocidade).
O transtorno do espectro autista também é
definido por padrões restritos e repetitivos de
comportamento, interesses ou atividades
(conforme especificado no Critério B) que
mostram uma gama de manifestações de acordo
com a idade e a capacidade, intervenções e
apoios atuais. Comportamentos estereotipados
ou repetitivos incluem estereotipias motoras
simples (p. ex., abanar as mãos, estalar os
dedos), uso repetitivo de objetos (p. ex., girar
moedas, enfileirar objetos) e fala repetitiva (p.
ex., ecolalia, repetição atrasada ou imediata de
palavras ouvidas, uso de “tu” ao referir-se a si
mesmo, uso estereotipado de palavras, frases ou
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
204

padrões de prosódia). Adesão excessiva a


rotinas e padrões restritos de comportamento
podem ser manifestados por resistência a
mudanças (p. ex., sofrimento relativo a
mudanças aparentemente pequenas, como
embalagem de um alimento favorito; insistência
em aderir a regras; rigidez de pensamento) ou
por padrões ritualizados de comportamento
verbal ou não verbal (p. ex., perguntas
repetitivas, percorrer um perímetro). Interesses
altamente limitados e fixos, no transtorno do
espectro autista, tendem a ser anormais em
intensidade ou foco (p. ex., criança pequena
muito apegada a uma panela; criança
preocupada com aspiradores de pó; adulto que
gasta horas escrevendo tabelas com horário).
Alguns encantamentos e rotinas podem estar
relacionados a uma aparente hiper ou
hiporreatividade a estímulos sensoriais,
manifestada por meio de respostas extremadas a
sons e texturas específicos, cheirar ou tocar
objetos de forma excessiva, encantamento por
luzes ou objetos giratórios e, algumas vezes,
aparente indiferença a dor, calor ou frio.
Reações extremas ou rituais envolvendo gosto,
cheiro, textura ou aparência da comida ou
excesso de restrições alimentares são comuns,
podendo constituir a forma de apresentação do
transtorno do espectro autista.
Muitos adultos com transtorno do espectro
autista sem deficiência intelectual ou linguística
aprendem a suprimir comportamentos
repetitivos em público. Interesses especiais
podem constituir fonte de prazer e motivação,
propiciando vias de educação e emprego mais
tarde na vida. Os critérios diagnósticos podem
ser satisfeitos quando padrões limitados e
repetitivos de comportamento, interesses ou
atividades estiverem claramente presentes na
infância ou em algum momento do passado
mesmo que os sintomas não estejam mais
presentes.
O Critério D exige que as características devam
ocasionar prejuízo clinicamente significativo no
funcionamento social, profissional ou em outras
áreas importantes da vida do indivíduo no
presente. O Critério E especifica que os déficits
de comunicação social, ainda que algumas vezes
acompanhados por deficiência intelectual
(transtorno do desenvolvimento intelectual), não
estão alinhados com o nível de desenvolvimento
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
205

individual e que os prejuízos excedem as


dificulda- des esperadas com base no nível do
desenvolvimento.
Instrumentos padronizados de diagnóstico do
comportamento, com boas propriedades
psicométricas, incluindo entrevistas com
cuidadores, questionários e medidas de
observação clínica, estão disponíveis e podem
aumentar a confiabilidade do diagnóstico ao
longo do tempo e entre clínicos.
Características Associadas que Apoiam o
Diagnóstico
Muitos indivíduos com transtorno do espectro
autista também apresentam comprometimento
inte- lectual e/ou da linguagem (p. ex., atraso na
fala, compreensão da linguagem aquém da
produção). Mesmo aqueles com inteligência
média ou alta apresentam um perfil irregular de
capacidades. A discrepância entre habilidades
funcionais adaptativas e intelectuais costuma ser
grande. Déficits motores estão frequentemente
presentes, incluindo marcha atípica, falta de
coordenação e outros sinais motores anormais
(p. ex., caminhar na ponta dos pés). Pode
ocorrer autolesão (p. ex., ba- ter a cabeça,
morder o punho), e comportamentos
disruptivos/desafiadores são mais comuns em
crianças e adolescentes com transtorno do
espectro autista do que em outros transtornos,
incluindo deficiência intelectual. Adolescentes e
adultos com transtorno do espectro autista são
propensos a ansiedade e depressão. Alguns
indivíduos desenvolvem comportamento motor
semelhante à catatonia (lentificação e
“congelamento” em meio a ação), embora isso
tipicamente não costume alcançar a magnitude
de um episódio catatônico. É possível, porém,
que indivíduos com transtor- no do espectro
autista apresentem deterioração acentuada em
sintomas motores e um episódio catatônico
completo com sintomas como mutismo,
posturas atípicas, trejeitos faciais e flexibilidade
cérea. O período de risco de catatonia
comórbida parece ser maior nos anos de
adolescência.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


206

Outras Síndromes Psiquiátricas132

a) Síndrome do Esgotamento ou Estafa Profissional ou Burnout


Está síndrome é recente, foi descrita em 1974 pelo psicólogo H.J. Freudenberger.
É um sofrimento decorrente do trabalho e cujos sintomas também se manifestam mais durante as
atividades laborativas.
Caracteriza-se por exaustão emocional, baixa realização pessoal no trabalho e "desumanização"
passando a tratar pessoas como objetos. Outras características comuns são:
•predominância de sintomas relacionados a exaustão mental e emocional, fadiga e depressão;
•ênfase nos sintomas comportamentais e mentais e não nos sintomas físicos;
•sintomas do burnout são relacionados ao trabalho;
•os sintomas manifestam-se em pessoas "normais" que não sofriam de distúrbios psicopatológicos
antes do surgimento da síndrome;
•diminuição da efetividade e desempenho no trabalho ocorre por causa de atitudes e
comportamentos negativos.
As profissões mais vulneráveis ao burnout são são geralmente as que envolvem serviços, tratamento
ou educação.
Para prevenir a Estafa é preciso evitar excesso de trabalho e valorizar momentos de lazer.
É preciso fazer uma distinção entre se o excesso de trabalho gerou sintomas depressivos ou se a
depressão tem provocado maior dedicação ao trabalho, como ocorre principalmente com alguns
homens.

b) Síndrome de Capgras
Também conhecida como Delírio de Capgras, Ilusão de Capgras e Paranóia de Capgras, foi descrita
pela primeira vez em 1923 no boletim da Sociedade Clínica de Medicina Mental, na França, por
Jean Marie Joseph Capgras e Jean Reboul-Lachaux, no artigo entitulado “L`illusion des sosies dans
um délire systématisé chronique” (A ilusão dos sósias num delírio sistematizado crônico) e daí em
diante a síndrome passou a ser reconhecida com o nome do primeiro autor (Capgras).
Caracteriza-se pelo paciente acreditar que um familiar próximo torna-se um impostor, um duplo, a
despeito do reconhecimento de sua familiaridade na aparência e na conduta. Em decorrência da
ideação delirante, esse “impostor” ou “duplo” possui um caráter persecutório.
Tais pacientes podem continuar convivendo com o “impostor” ou “duplo”, apesar de “secretamente
saberem” que ele, ou ela, não é a pessoa que se diz ser.
Ocorre em ambos os sexos, apesar de inicialmente ter sido descrito apenas em mulheres.
O fenômeno de Capgras acompanha a doença de base do paciente, sendo geralmente de origem
funcional e menos frequentemente de causas orgânicas.
Entre as causas funcionais a mais frequente ainda é a Esquizofrenia, em especial o subtipo
paranóide. Mas, os transtornos de humor também ocupam lugar de destaque nas doenças de base
para ocorrência da Síndrome de Capgras.
Na verdade o percentual em que o Delírio de Capgras ocorre entre psicoses orgânicas é maior que
entre transtornos de humor. E os quadros orgânicos podem ser bastante variáveis: traumatismo
craniano, deficiência de ácido fólico, alcoolismo, má nutrição, etc., sem que que haja nenhum
marcador bioquímico específico.
132
Os relatos dessas síndromes foi adaptado de< http://dicionariodesindromes.blogspot.com.br/>.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
207

Existem ainda muitas explicações psicodinâmicas aplicáveis, dado o fato de que somente ocorre o
fenômeno com familiares. Mas, há uma tendência dos artigos mais recentes sobre o tema a tentar
encontrar razões biológicas para a ocorrência do fenômeno.

c) Síndrome de Diógenes
A Síndrome de Diógenes (SD) é uma alteração comportamental que geralmente ocorre entre
pessoas idosas, caracterizada pelo isolamento social, pela autonegligência (descuido com o
autocuidado, com a higiene pessoal e do lar), pelo comportamento paranoico e pelo colecionismo.
Em 1975 esta Síndrome foi descrita e nomeada, uma certa injustiça ao filósofo grego Diógenes de
Sínope, também chamado Diógenes "o Cínico" (kynikos, kynon = cachorro). Diógenes acreditava
que a virtude não deveria ser uma teoria mas uma ação prática, resultado da própria vivência, assim
optou por viver na miséria, habitando um grande barril como lar e carregando à luz do dia uma
lanterna acesa em busca de um homem honesto; acreditava que faria bem ao ser humano aprender
com o cão:
"afinal o cão é capaz de realizar suas funções corporais naturais em
público sem constrangimento, um cachorro comerá qualquer coisa, e
não fará estardalhaço sobre que lugar dormir. Cachorros vivem o
presente sem ansiedade, e não possuem as pretensões da filosofia
abstrata. Somando-se ainda a estas virtudes, cachorros aprendem
instintivamente quem é amigo e quem é inimigo. Diferente dos
humanos que enganam e são enganados uns pelos outros, cães
reagem com honestidade frente à verdade."
Paradoxalmente, o Cinismo anárquico de Diógenes nada tem em comum com o emprego atual da
palavra, assim como a vida despojada de bens de Diógenes nada se assemelha à Síndrome que leva
seu nome.
Na Síndrome de Diógenes o colecionismo é a tônica, em detrimento do autocuidado. É possível
observar desde casos de pessoas que colecionam todo tipo de objetos: recolhendo lixo e todo tipo de
objetos inúteis (syllogomania), até animais: já presenciamos um caso de uma senhora que chegou
mesmo a recolher, para desespero dos vizinhos, um jumento!

d) Síndrome de Estocolmo
Trata-se da dependência afetiva que o agredido (sequestrado, refém) passa a sofrer do seu agressor.
Este fenômeno foi descrito pelo psiquiatra e criminologista Nils Bejerot à propósito do assalto a um
banco ocorrido de 23 a 28 de agosto de 1973, em Estocolmo (Suécia), quando os reféns ficaram
"amigos" dos criminosos, chegando a colocar-se contra a polícia.

e) Síndrome de Fregoli
A síndrome caracteriza-se como uma condição na qual a pessoa acredita que um ou mais pessoas
que lhe são familiares (conhecidas), usualmente perseguidores, repetidamente modificam sua
aparência e passam a ocupar outros postos, por exemplo: de médico, carteiro, vendedor, etc.
Portanto, para o portador da síndrome justificando como é possível ao seu perseguidor estar nos
diversos ambientes dele, disfarçado.
É claramente uma ideia delirante de perseguição. Portanto espera-se encontrá-la em pessoas que
estejam psicóticas: transtorno delirante persistente e principalmente esquizofrenias.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
208

A síndrome recebeu este nome em homenagem ao ator italiano Leopoldo Fregoli, (1867-1936)
capaz de em suas apresentações encenar desde um monólogo até uma ópera, sendo ele o único ator
e cantor do espetáculo. Deu origem ao transformismo no teatro, tamanha a sua habilidade para
interpretar diversos personagens como ator e cantor.
É importante estabelecer um diagnóstico diferencial entre a Síndrome de Fregoli e a
Intermetamorfose. Enquanto na primeira as pessoas modificariam apenas sua aparência física, seria
um disfarce externo, na Intermetamorfose a transformação seria completa, isto é, também interna,
transformando a personalidade também.
Vejamos então exemplos concretos dos dois tipos de delírios:
1. Síndrome de Fregoli: se o perseguidor for um parente, um tio, o tio disfarça-se como irmão do
portador de Fregoli, mas as características de personalidade continuam sendo do tio. Inclusive o
portador do delírio de Fregoli saberá distinguir entre os trejeitos do irmão e como ele estaria se
portando agora para justificar seu delírio.
2. Já na Intermetamorfose o paciente acredita que o perseguidor passou também por uma
metamorfose interna, transformando-se completamente na outra pessoa: sendo o tio o perseguidor
ele teria se transformado fisicamente e psiquicamente no irmão do paciente, passando a ficar
absolutamente idêntico, em personalidade e trejeitos ao irmão. Mas de algum modo, o delirante diz
que aquele não é originalmente seu irmão, mas sim o seu perseguidor transformado a fim de fazer-
lhe algum mal.
Tanto a Síndrome de Fregoli quanto a Intermetamorfose, a Síndrome de Capgras, a Síndrome de
Cotard e até a Síndrome de Clèrambault fazem parte das Síndromes de Má-Identificação (delusional
misidentification syndrome).

f) Síndrome de Koro
A Síndrome de Koro também chamada de Síndrome de Redução Genital, Síndrome de Jinjin Bemar
e Síndrome de Suk Yeong (China, Índia, Sudeste asiático).
Caracteriza-se pelo medo agudo, ou ansiedade intensa diante da retração normal do pênis (no caso
dos homens), da vulva ou dos mamilos (em mulheres). A reação de angústia severa diante da
retração normal dos órgãos sexuais advém da crença de que esta retração prosseguirá até que
desapareça e provoque a morte do indivíduo, assim por exemplo, em homens, gênero em que é mais
comum, os portadores desta síndrome creêm seu pênis continuará retraindo incessantemente, até
penetrar de volta à cavidade abdominal, quando isto lhe provocará o óbito.
A palavra Koro, proveniente da língua malaia, significa cabeça de tartaruga, uma clara referência à
retração que esta é capaz de fazer em direção ao casco, desaparecendo por completo, à semelhança
do que os pacientes acometidos pela síndrome crêem que aconteça com a sua genitália.
Fatores predisponentes:
•exposição ao frio,
•coito excessivo,
•conflitos interpessoais,
•pressões sócio-culturais.
O Surgimento da síndrome é súbito.
Na tentativa de "tratar-se", as pessoas acometidas pela doença tentam explorar a própria genitália
(podendo levar a acidentes), ou solicitam a familiares que o façam, colocam talas para evitar a
retração dos genitais, usam remédios fitoterápicos, massagens ou felação.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
209

É possível ainda, distinguir entre a síndrome de Koro Primária e a Secundária:


•Primária: até a década de 70 somente era diagnosticada entre pessoas do sudeste asiático. Desde a
facilidade de migração entre os povos, a globalização que atinge também as culturas, é possível
diagnosticar esta síndrome também em outras regiões do mundo, mas no Koro Primário estará
culturalmente sempre relacionado. Por ser um fenômeno cultural, há diversos artigos publicados de
"epidemias" desta síndrome em alguns países, com cerca de 200 casos ocorrendo ao mesmo tempo,
nestes casos, histeria em massa.
•Secundária: relaciona-se a outras doenças pré-existentes como transtornos mentais (de ansiedade,
depressão, psicóticos, intoxicações), doenças urológicas, tumores cerebrais, epilepsias. A literatura
médica aponta cada vez mais casos em pessoas de culturas distintas do sudeste asiático.

g) Síndrome de Lima
Trata-se de um conjunto de sintomas desenvolvidos por sequestradores em sua atividade criminosa,
nas relações de proximidade e compreensão das necessidades das vítimas, resultando em afeto.
Ganhou este nome por tal fato ter sido registrado em 1996, em Lima (Peru), em ataque a embaixada
japonesa.

h) Síndrome de Münchausen
O nome deriva do Barão de Münchausen, o alemão Karl Friederich Hieronymus (1720-1797), que
após ter lutado em guerra contra os turcos (1740-1741) voltou relatando suas histórias. Entretanto, o
Barão tinha o hábito de modificá-las, mentindo e criando histórias grandiosas e fantasiosas, como
por exemplo:
•saíra de um poço muito profundo puxando os próprios cabelos;
•ficara com seu cavalo sobre a torre de uma igreja e de lá, escalando uma corda, chegara à lua;
•vencera todo um exército fantasiado de galinha;
•cavalgara numa bala de canhão etc .
Quanto à síndrome, é uma condição na qual conscientemente o indivíduo simula doenças, chegando
inclusive a agredir-se fisicamente para isto. Geralmente são pessoas inteligentes, conhecedoras das
práticas médicas que ao simularem ou provocarem um problema de saúde alcançam seu objetivo:
submeter-se a tratamentos médicos, internações e numerosos exames. É importante notar que nesta
doença apesar da simulação ser consciente as motivações para tanto são inconscientes.
Uma variação desta síndrome é a conhecida por Síndrome de Münchausen por Procuração.
Nestes casos ocorre o mesmo que na Síndrome de Münchausen por iniciativa de um adulto a
respeito da saúde de um menor, isto é, o portador da síndrome (geralmente um dos genitores) altera
a história médica ou adultera exames de uma criança para provocar mais cuidados médicos sobre
ela.

i) Síndrome de Oslo
A Síndrome de Oslo é uma reação psicológica de pessoas ou de grupos vítimas de maus tratos e/ou
ameaças a sua integridade física e mental.
Nesta síndrome a pessoa ou o grupo vitimizado passa a acreditar-se responsável pelos maus tratos
que recebe, às vezes até merecedora dos "castigos" que lhe são impostos. A vítima passa a achar
que merece ser agredida.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


210

Trata-se geralmente de uma defesa: diante de uma situação de agressão ou de ameaça severa, sobre
a qual o indivíduo sente-se absolutamente impotente, como mecanismo de defesa, o sujeito passa a
fantasiar que tem o controle da situação e a depender das suas reações, dos seus gestos, do seu
comportamento poderá controlar o agressor, isto é, assim a vítima acredita que se mudar o seu
agressor também mudará.
Nestes casos, subliminarmente, inconscientemente, a vítima considera pior do que a própria ameaça
à integridade física a sensação de impotência diante da iminência de agressão.
Da mesma maneira que ocorre com pessoas individualmente, pode ser um mecanismo de defesa
grupal, podendo ser a reação de um grupo ou de uma comunidade.
Exemplos: mulheres que sofrem violência doméstica, crianças abusadas fisicamente... .

j) Síndrome de Stendhal
A Síndrome de Stendhal caracteriza-se pelo surgimento súbito de diversos sintomas simultâneos
(vivências estranhas, por vezes acompanhadas de sintomas físicos, sensação de profunda emoção,
seguida de um leve entorpecimento, desorientação temporo-espacial momentânea, sudorese profusa
e desrealização) mediante a exposição do indivíduo à contemplação de uma ou mais obras de arte.

k) Síndrome do Duplo Subjetivo


Descrita em 1978 por Christodoulou, como uma variante da Síndrome de Capgras.
No caso da síndrome do Duplo Subjetivo a pessoa acredita que há um duplo de si mesma, um sósia,
que ela mesma pode tê-lo visto (autoscópico) ou não. Portanto, outra pessoa fora transformada em
seu sósia.
Esta síndrome costuma relacionar-se tanto a Esquizofrenias quanto a transtornos mentais orgânicos.

l) Síndrome de Ganser: Apesar de já ter sido classificada entre os transtornos factícios, atualmente
pertence aos quadros histéricos dissociativos.
A pessoa provoca um quadro psiquiátrico repentino e intenso, com exuberância de sintomas, a
ponto de parecer insana: pararrespostas, sonambulismo, dissociação. Contudo, aspectos
psicopatológicos conflitantes fazem o diagnóstico diferencial com as psicoses verdadeiras.
Foi inicialmente descrita entre presidiários sendo por isto também chamada de "Psicose da prisão".

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


211

Transtornos relacionados ao uso de substâncias

Álcool
“O álcool compartilha características dos sedativos, hipnóticos e ansiolíticos. (DSM-4)

“O etanol (ou o “espírito do vinho”, do latim


spiritus vini), cuja fórmula química é C2H5OH,
é um líquido incolor encontrado em todas as
bebidas alcoólicas. Nem todas as pessoas estão
igualmente propensas a se tornar dependentes do
álcool. Para que a dependência alcoólica ocorra,
é fundamental que haja vulnerabilidade e
suscetibilidade à dependência, fomentadas por
condições biológicas, psicológicas, sociais e
ambientais. Do ponto de vista médico, é
relevante o fato de que as enzimas que
metabolizam o álcool no organismo diferem de
indivíduo para indivíduo, o que se chama vulnerabilidade biológica. [...]
O etanol é uma molécula simples que se move facilmente através das membranas celulares,
equilibrando-se rapidamente entre o sangue e os tecidos. O nível do álcool no sangue é expresso em
miligramas ou gramas de etanol por decilitro (p.ex., 100 mg/dL ou 0,10 g/dL); um nível de 0,02 a
0,03, por exemplo, é o resultado da ingestão de uma a duas doses de bebidas alcoólicas. O
organismo, subsequentemente, metaboliza e excreta aproximadamente uma dose por hora. Além do
etanol, são encontrados, nas bebidas alcoólicas, outros produtos de sua maturação ou fermentação,
como metanol, butanol, aldeídos, ésteres, histaminas, fenóis, ferro, chumbo e cobalto, que são, em
grande parte, responsáveis pela diferenciação de sabor entre os tipos de bebidas.
Como consequência de sua alta solubilidade em água, o etanol cai rapidamente na corrente
sanguínea, de onde é distribuído para a maioria dos órgãos e sistemas. É absorvido pelas
membranas mucosas da boca e do esôfago (em pequenas quantidades), do estômago e do intestino
grosso (em quantidades moderadas) e pela porção proximal do intestino delgado, local principal de
sua absorção e também onde as vitaminas B são essencialmente absorvidas. A taxa de absorção é
aumentada quando o esvaziamento gástrico está acelerado, como na ausência de proteínas, gorduras
ou carboidratos, que interferem na absorção, além de outros produtos oriundos da fermentação do
álcool, na diluição de uma porcentagem moderada de etanol (máximo de 20% do volume) e na
presença de gás carbônico (p.ex., champanhe). [...]
Apesar do álcool fornecer calorias (uma dose de bebida alcoólica contém 70 a 100 kcal), estas são
desprovidas de nutrientes, como minerais, proteínas e vitaminas. O álcool pode, também, interferir
na absorção de vitaminas no intestino delgado e diminuir seu armazenamento no fígado com efeitos
no folato (ácido fólico), na piridoxina (B6), na tiamina (B1), no ácido nicotínico (niacina, B3) e
na vitamina A. Alguns indivíduos metabolizam o álcool melhor que outros. Além disso, é possível
que ocorra algum tipo de alteração no sistema biológico devido ao consumo frequente e abusivo do
álcool ou ao esgotamento do organismo, fazendo com que uma pessoa que, até então, tolerava bem
o álcool passe a reagir ao consumo de forma patológica. É importante considerar, também, a
quantidade de bebida consumida diariamente por um período prolongado, sendo que a fronteira de
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
212

risco para os homens é aproximadamente 60 g de álcool puro/dia e para as mulheres, de 40 g/dia.


Isso significa que uma margem segura deve estar abaixo desses limiares. Todavia, a dependência
física, com suas consequências devastadoras, aparece relativamente tarde, geralmente após 4 a 6
anos de consumo regular para o adolescente e após 6 a 8 anos para o adulto.”

O uso de baixo risco do álcool


Há um padrão de consumo que pode ser considerado de baixo risco, pouco tóxico e, eventualmente,
até benéfico à saúde em algumas situações. É o caso do adulto sem nenhuma doença, que bebe até
duas doses de vinho por dia, ou dois copos de cerveja, ou uma dose de destilado. Na gravidez,
porém, uma dose diária de álcool é suficiente para intoxicar o feto.
Nunca se pode perder a vista, porém, que o álcool é uma substância tóxica, qualquer que seja a dose
e que, quanto maior for o volume ingerido, mais tóxico ele é. Se a pessoa beber três, quatro doses
de vinho num dia, estará expondo seu organismo a um nível de toxicidade que mudará seu padrão
de sono e aumentará o risco de hipertensão, por exemplo. Número maior de doses diárias
provavelmente vai provocar dependência e outros problemas como doença cardiovascular,
acidentes pessoais, etc. (Dr. Ronaldo Laranjeira – Médico Psiquiatra especialista em Alcoolismo)

Uso abusivo do álcool


A pessoa que abusa de álcool não é necessariamente alcoólatra, ou seja, dependente e faz uso
continuado. O critério de abuso existe para caracterizar as pessoas que eventualmente, mas
recorrentemente têm problemas por causa dos exagerados consumos de álcool em curtos períodos
de tempo. Critérios: para se fazer esse diagnóstico é preciso que o paciente esteja tendo problemas
com álcool durante pelo menos 12 meses e ter pelo menos uma das seguintes situações:
a) prejuízos significativos no trabalho, escola ou família como faltas ou negligências nos cuidados
com os filhos.
b) exposição a situações potencialmente perigosas como dirigir ou manipular máquinas perigosas
embriagado.
c) problemas legais como desacato a autoridades ou superiores.
d) persistência no uso de álcool apesar do apelo das pessoas próximas em que se interrompa o uso.

Dependência ao álcool
Para se fazer o diagnóstico de dependência alcoólica é necessário que o usuário venha tendo
problemas decorrentes do uso de álcool durante 12 meses seguidos e preencher pelo menos 3 dos
seguintes critérios:
a) apresentar tolerância ao álcool -- marcante aumento da quantidade ingerida para produção do
mesmo efeito obtido no início ou marcante diminuição dos sintomas de embriaguez ou outros
resultantes do consumo de álcool apesar da continua ingestão de álcool.
b) sinais de abstinência -- após a interrupção do consumo de álcool a pessoa passa a apresentar os
seguintes sinais: sudorese excessiva, aceleração do pulso (acima de 100), tremores nas mãos,
insônia, náuseas e vômitos, agitação psicomotora, ansiedade, convulsões, alucinações táteis. A
reversão desses sinais com a reintrodução do álcool comprova a abstinência. Apesar do álcool
"tratar" a abstinência o tratamento de fato é feito com diazepam ou clordiazepóxido dentre outras
medicações.
c) o dependente de álcool geralmente bebe mais do que planejava beber.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
213

d) persistente desejo de voltar a beber ou incapacidade de interromper o uso.


e) emprego de muito tempo para obtenção de bebida ou recuperando-se do efeito.
f) persistência na bebida apesar dos problemas e prejuízos gerados como perda do emprego e das
relações familiares.

Síndrome de Wernicke Korsakoff


“[...] é uma complicação potencialmente fatal associada à deficiência de vitamina B1 ou tiamina.
Foi descrita como duas entidades distintas – encefalopatia de Wernicke e psicose de Korsakoff.
A síndrome é composta por uma tríade de anormalidades clínicas descritas por Wernicke –
oftalmoplegia [paralisia dos músculos dos olhos], ataxia e confusão mental. Esses seriam os pilares
no diagnóstico da síndrome; porém, a presença de todos esses sintomas não é necessária para o
diagnóstico de SWK, sendo mais rotineiramente encontrados sinais isolados (de oftalmoplegia e/ou
desorientação e/ou estupor e/ou coma). Os movimentos oculares podem consistir em nistagmo
[oscilações rítmicas, repetidas e involuntárias de um ou ambos os olhos conjugadamente, nos
sentidos horizontal (de um lado para o outro), vertical (de cima para baixo) ou rotatório
(movimentos circulares) que podem dificultar muito a focalização das imagens] 133 ou paralisia do
músculo reto lateral e do olhar conjugado. Em casos avançados, pode-se encontrar oftalmoplegia
completa. A confusão mental é caracterizada por diminuição do estado de alerta e atenção e
alteração senso-perceptual e da memória. Quadros de confabulação são comuns nesse grupo de
pacientes. Algumas vezes há progressão para coma. [...]”

Síndrome de Marchiava Bignami (ou “degeneração primária do corpo caloso”)


A Síndrome de Marchiava Bignami é uma doença mais comumente definida pelos aspectos
patológicos que pelos clínicos. A principal alteração é encontrada na porção medial do corpo caloso
onde, ao exame de olho nu, vê-se uma diminuição da densidade do tecido, com leve depressão
avermelhada ou amarelada, dependendo do tempo da lesão. Do ponto de vista microscópico,
observam-se, claramente, zonas de desmielinização com abundância de macrófagos 134, embora não
haja alterações inflamatórias. Menos consistentes, lesões de natureza similar são encontradas na
porção central das comissuras anterior e posterior e ponte.
É uma doença rara, que afeta pessoas mais idosas e, com poucas exceções, todos os pacientes
acometidos são dependentes de álcool. Alguns apresentam, no estágio terminal, quadros de estupor
e coma, e outros, sintomas compatíveis com quadro de
intoxicação crônica e síndrome de abstinência. Em
alguns casos, descreveram-se quadros de demência
progressiva, com sintomas como disartria, movimentos
vagarosos e instáveis, incontinência esfincteriana
transitória, hemiparesia135 e afasia. O diagnóstico
dessa patologia raramente é feito durante a vida mas,
via de regra, na necropsia, por meio de exame
anatomopatológico. A ocorrência, em paciente

133
http://www.hospitaldeolhos.com.br/noticia/1255
134
Os macrófagos são considerados fagócitos profissionais, isto é, células cuja função primária é a de fagocitar
partículas, sejam elas restos celulares, partículas inertes ou microorganismos.
135
Hemiparesia - Hemiparesia é a paralisia parcial de um lado do corpo.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
214

dependente de álcool, de sintomas semelhantes à síndrome do lobo frontal, à doença de Alzheimer


ou, ainda, de sintomas semelhantes a quadros de tumor na região frontal, mas que remitam
espontaneamente, sugere síndrome de Marchiava Bignami, e exames de imagem auxiliarão no
diagnóstico. A etiologia e a patologia desse quadro não foram bem esclarecidas até o momento.

Síndrome Alcoólica Fetal136

É uma síndrome que reúne vários sinais e sintomas, desde o nascimento, em pessoas filhas de mães
que consumiram bebidas alcoólicas durante a gestação.
A Síndrome Álcoólica Fetal (SAF) é a maior causa de retardo mental do ocidente e caracteriza-se
por déficit de crescimento, dismorfismo facial e evidências de anormalidades no SNC.
Os critérios mínimos para o diagnóstico da SAF são:
1.retardo do crescimento pré ou pós-natal;
2.envolvimento do sistema nervoso, atraso do desenvolvimento neuropsicomotor, alterações do QI e
do comportamento;
3.dismorfismo facial. Pelo menos dois dos seguintes sinais:
•microcefalia,
•microftalmia e/ou fissura palpebral pequena
•filtro nasal hipoplásico137 com lábio superior fino,
•hipoplasia maxilar

Abstinência ao álcool (DSM-5)


Critérios Diagnósticos
A. Cessação (ou redução) do uso pesado e prolongado de álcool.
B. Dois (ou mais) dos seguintes sintomas, desenvolvidos no período de algumas horas a alguns
dias após a cessação (ou redução) do uso de álcool descrita no Critério A:
1. Hiperatividade autonômica (p. ex., sudorese ou frequência cardíaca maior que 100 bpm).
2. Tremor aumentado nas mãos.

136
http://dicionariodesindromes.blogspot.com.br/2008/10/sindrome-alcoolica-fetal.html
137
Hipoplásico – hipoplasia - É um termo utilizado para designar a diminuição da atividade que leva à formação dos
tecidos orgânicos. Com isto ocorre o hipodesenvolvimento de órgãos ou de tecidos, já que as células que os compõem
estão presentes em menor número.
O órgão afetado se torna mais leve do que o normal, porém os padrões de sua arquitetura não sofrem modificações. São
várias as causas que podem levar a esta condição, sendo que a mesma pode afetar uma série de órgãos diferentes.
(http://www.saudemedicina.com/hipoplasia/)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
215

3. Insônia.
4. Náusea ou vômitos.
5. Alucinações ou ilusões visuais, táteis ou auditivas transitórias.
6. Agitaçãopsicomotora.
7. Ansiedade.
8. Convulsões tônico-clônicas138 generalizadas.
C. Os sinais ou sintomas do Critério B causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no
funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
D. Os sinais ou sintomas não são atribuíveis a outra condição médica nem são mais bem explicados
por outro transtorno mental, incluindo intoxicação por ou abstinência de outra substância.
[...] Os sintomas podem ser aliviados por meio da administração de álcool ou benzodiazepínicos (p.
ex., diazepam). Os sintomas de abstinência geralmente começam quando as concentrações
sanguíneas de álcool declinam abruptamente (i.e., em 4 a 12 horas) depois que o uso de álcool foi
interrompido ou reduzido. Refletindo o metabolismo relativamente rápido do álcool, a intensidade
dos sintomas costuma atingir o auge durante o segundo dia de abstinência, e os sintomas tendem a
melhorar acentuadamente no quarto ou quinto dia. Após abstinência aguda, entretanto, os sintomas
de ansiedade, insônia e disfunção autonômica podem persistir durante um período de até 3 a 6
meses em níveis menores de intensidade.
Menos de 10% dos indivíduos que desenvolvem abstinência de álcool chegam a desenvolver
sintomas drásticos (p. ex., hiperatividade autonômica grave, tremor, delirium por abstinência de
álcool). Convulsões tônico-clônicas ocorrem em menos de 3% das pessoas.
Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico
Embora confusão mental e alterações na consciência não sejam critérios para abstinência de álcool,
delirium por abstinência de álcool (ver “Delirium” no capítulo “Transtornos Neurocognitivos”)
pode ocorrer no caso de abstinência. Assim como é válido para qualquer estado de confusão e
agitação independentemente da causa, além de perturbação da consciência e da cognição, o delirium
por abstinência pode envolver alucinações visuais, táteis ou (raramente) auditivas (delirium
tremens). Quando se desenvolve delirium por abstinência, provavelmente há uma condição médica
clinica- mente relevante (p. ex., insuficiência hepática, pneumonia, sangramento gastrintestinal,
sequelas de traumatismo craniano, hipoglicemia e desequilíbrio eletrolítico ou estado pós-
operatório).

138
Convulsões Tônicas - resultam na contração súbita dos músculos. Essas convulsões são mais comuns durante o
sono. Convulsões Clônicas - causam convulsões ou movimentos involuntários em ambos os lados do corpo.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
216

Transtornos relacionados à anfetamina e cocaína

Anfetaminas – grupo de substâncias [...] que estimulam a formação


reticular139 no cérebro e provocam uma liberação da norepinefrina
armazenada. O efeito é um estado prolongado de estimulação e alívio
dos sintomas de fadiga. [...] A tolerância se desenvolve
progressivamente com o uso prolongado até o indivíduo atingir um
ponto de exaustão e dormir continuamente por alguns dias. O abuso de
anfetaminas pode resultar em dependência e um estado de psicose bem
definido. Embora largamente utilizada no passado para perda de peso,
alívio da depressão e outras indicações, o uso moderno das anfetaminas é mais circunscrito devido
aos seus efeitos adversos. Atualmente, elas são utilizadas principalmente em preparações de ação
breve e longa para controlar sintomas do transtorno do déficit de atenção/hiperatividade, e para
tratar certos casos de depressão grave ou narcolepsia – mas ainda são usadas pelo exército no
tratamento da fadiga. [...] (APA, 2010, p. 76)

Cocaína – “A cocaína compartilha características das anfetaminas ou simpaticomiméticos140 de


ação similar.” (DSM-4) “A cocaína é um alcaloide (produto extraído das folhas de uma planta
chamada Erythroxilon coca encontrada principalmente em países da América do Sul e Central).
Também é conhecida como coca, pó dourado, neve ou "senhora". A droga age bloqueando a
recaptação dos neurotransmissores dopamina, serotonina e norepinefrina. As propriedades
psicoativas da planta da coca foram reconhecidas pelos incas peruanos antes de 4.000 a.C. e na
década de 1880 foram investigados os possíveis usos terapêuticos da cocaína. Sigmund Freud
observou que a droga funcionava como anestésico tópico”. (APA, 2010, p. 184)

“Os Transtornos Relacionados a Substâncias incluem desde transtornos relacionados ao consumo


de uma droga de abuso (inclusive álcool), aos efeitos colaterais de um medicamento e à exposição a
toxinas. Neste manual (CID 10), o termo substância pode referir-se a uma droga de abuso, um
medicamento ou uma toxina. As substâncias discutidas nesta seção são agrupadas em 11 classes:
álcool
anfetamina ou simpaticomiméticos de ação similar
cafeína
139
Formação reticular - parte do tronco cerebral (ou tronco encefálico) que está envolvida em ações como os ciclos de
sono, o despertar e a filtragem de estímulos sensoriais, para distinguir os estímulos relevantes dos estímulos
irrelevantes. A sua principal função é ativar o córtex cerebral.
140
SNP Autônomo Simpático e SNP Autônomo Parassimpático - O SNP autônomo (SNPA) é dividido em dois
ramos: simpático e parassimpático, que se distinguem tanto pela estrutura quanto pela função. Enquanto os gânglios da
via simpática localizam-se ao lado da medula espinal, distantes do órgão efetuador, os gânglios das vias parassimpáticas
estão longe do sistema nervoso central e próximos ou mesmo dentro do órgão efetuador.
As fibras nervosas simpáticas e parassimpáticas inervam os mesmos órgãos, mas trabalham em oposição. Enquanto um
dos ramos estimula determinado órgão, o outro o inibe. Essa ação antagônica mantém o funcionamento equilibrado dos
órgãos internos.
O SNPA simpático, de modo geral, estimula ações que mobilizam energia, permitindo ao organismo responder a
situações de estresse. Por exemplo, o SNPA simpático é responsável pela aceleração dos batimentos cardíacos, pelo
aumento da pressão sanguínea, pelo aumento da concentração de açúcar no sangue e pela ativação do metabolismo
geral do corpo.
Já o SNPA parassimpático estimula principalmente atividades relaxantes, como a redução do ritmo cardíaco e da
pressão sanguínea, entre outras. (http://www.webciencia.com/11_29snp.htm)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
217

canabinóides
cocaína
alucinógenos
inalantes
nicotina
opióides
fenciclidina (PCP) ou arilciclo-hexilaminas de ação similar e sedativos
hipnóticos ou ansiolíticos
[...]
Muitos medicamentos vendidos com ou sem prescrição médica também podem causar Transtornos
Relacionados a Substâncias. Os sintomas com frequência estão relacionados à dosagem do
medicamento e habitualmente desaparecem com a redução da dosagem ou suspensão do
medicamento. Entretanto, às vezes pode haver uma reação idiossincrática a uma única dose.
Os medicamentos capazes de causar Transtornos Relacionados a Substâncias incluem (mas não se
limitam a) anestésicos e analgésicos, agentes anticolinérgicos141, anticonvulsivantes, anti-
histamínicos, medicamentos anti-hipertensivos e cardiovasculares, antimicrobianos,
antiparkinsonianos, agentes quimioterápicos, corticosteroides, medicamentos gastrintestinais,
relaxantes musculares, anti-inflamatórios não-esteroides, outros medicamentos vendidos sem
prescrição, antidepressivos[...].
A exposição a uma ampla faixa de outras substâncias químicas também pode levar ao
desenvolvimento de um Transtorno Relacionado a Substância. As substâncias tóxicas capazes de
causar Transtornos Relacionados a Substâncias incluem (mas não se limitam a) metais pesados (por
ex., chumbo ou alumínio), raticidas contendo estricnina, pesticidas contendo inibidores da
acetilcolinesterase, gases nervosos, etileno glicol (anticongelante), monóxido e dióxido de carbono.
As substâncias voláteis (por ex., combustíveis, tintas) são classificadas como "inalantes" (ver p.
157), quando usadas com fins de intoxicação e são consideradas "toxinas", se a exposição é
acidental ou faz parte de um envenenamento intencional. Prejuízos na cognição ou no humor são os

141
Anticolinérgicos - diz-se das substâncias antagonistas da ação de fibras nervosas parassimpáticas que liberam
acetilcolina. Ou seja, que inibem a produção da acetilcolina. [...] Estes medicamentos tem utilidade terapêutica no
tratamento da Síndrome de Parkinson e como antiespasmódico. Foram usados durante a Segunda Guerra Mundial por
organismos militares, que viram neles um "soro da verdade", pois na aplicação parenteral levam a um estado torporoso,
com especial tendência à sugestibilidade, liberando barreiras conscientes de defesa. [...] Absorvido em quantidades
maiores do que a dose terapêutica, o produto provoca alterações mentais como alucinações e delírios, com duração de
48 horas. Consumido junto com outras drogas, como inalantes e maconha, o efeito pode durar mais tempo ainda,
iniciando pela sensação de "barato" na cabeça ou no corpo todo, seguida de alterações na percepção de cores/sons,
terminando com sensações de estranheza, medo, confusão mental, ideias de perseguição, dificuldades de memória -
síndrome que adota a forma de um surto psicótico agudo. O potencial de dependência parece elevado, com alta
toxicidade, evoluindo para alterações crônicas. Os delírios e alucinações dependem bastante da personalidade da pessoa
e de sua condição. As drogas anticolinérgicas são capazes de produzir muitos efeitos periféricos. Assim, as pupilas
ficam muito dilatadas, a boca seca e o coração dispara. Os intestinos ficam paralisados - tanto que são usados
medicamentosamente como antidiarréicos - e a bexiga fica "preguiçosa" ou há retenção de urina. Os anticolinérgicos
podem produzir, em doses altas, grande elevação da temperatura - que chega, às vezes, até a 40-41 graus. Nestes casos,
não muito comuns, a pessoa apresenta-se com a pele muito seca e quente com vermelhidão principalmente no rosto e
pescoço. Esta temperatura elevada pode provocar convulsões. São, por isto, bastante perigosas. Existem pessoas que,
também, descrevem ter "engolido a língua" e quase se sufocarem por causa disto. Ainda, em casos de dosagem elevada,
o número de batimentos do coração sobe exageradamente, podendo chegar acima de 150 batimentos por minutos. Estas
drogas não desenvolvem tolerância no organismo e não há descrição de síndrome de abstinência após a parada de um
uso contínuo. (http://www.imesc.sp.gov.br)
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
218

sintomas mais comuns associados com substâncias tóxicas, embora ansiedade, alucinações, delírios
ou convulsões também possam ocorrer.
Os sintomas em geral desaparecem quando o indivíduo deixa de expor-se à substância, mas sua
resolução pode levar de semanas a meses e exigir tratamento.

Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína - intoxicação aguda


Estado consequente ao uso de uma substância psicoativa e compreendendo perturbações da
consciência, das faculdades cognitivas, da percepção, do afeto ou do comportamento, ou de outras
funções e respostas psicofisiológicas. As perturbações estão na relação direta dos efeitos
farmacológicos agudos da substância consumida, e desaparecem com o tempo, com cura completa,
salvo nos casos onde surgiram lesões orgânicas ou outras complicações. Entre as complicações,
podem-se citar: traumatismo, aspiração de vômito, delirium, coma, convulsões e outras
complicações médicas. A natureza destas complicações depende da categoria farmacológica da
substância consumida assim como de seu modo de administração.
[...]
As complicações podem ser físicas (por exemplo, hepatite consequente a injeções de droga pela
própria pessoa) ou psíquicas (por exemplo, episódios depressivos secundários a grande consumo de
álcool).

Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína - síndrome de dependência


Conjunto de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos que se desenvolvem após
repetido consumo de uma substância psicoativa, tipicamente associado ao desejo poderoso de tomar
a droga [“fissura”], à dificuldade de controlar o consumo, à utilização persistente apesar das suas
consequências nefastas, a uma maior prioridade dada ao uso da droga em detrimento de outras
atividades e obrigações, a um aumento da tolerância pela droga e por vezes, a um estado de
abstinência física.
A síndrome de dependência pode dizer respeito a uma substância psicoativa específica (por
exemplo, o fumo, o álcool ou o diazepam), a uma categoria de substâncias psicoativas (por
exemplo, substâncias opiáceas) ou a um conjunto mais vasto de substâncias farmacologicamente
diferentes.

Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína - síndrome [estado] de


abstinência
A característica essencial da Abstinência de Cocaína é a presença de uma síndrome característica de
abstinência, que se desenvolve dentro de algumas horas a alguns dias após a cessação (ou redução)
do uso pesado e prolongado de cocaína [...]. A síndrome de abstinência caracteriza-se pelo
desenvolvimento de um humor disfórico acompanhado por duas ou mais das seguintes alterações
fisiológicas: fadiga, sonhos vívidos e desagradáveis, insônia ou hipersonia, maior apetite e retardo
ou agitação psicomotora. Anedonia e premência pela droga também podem estar presentes, mas não
fazem parte dos critérios de diagnóstico. Esses sintomas causam um sofrimento clinicamente
significativo ou prejuízo no funcionamento social, ocupacional ou em outras áreas importantes da
vida do indivíduo [...]. Os sintomas não devem ser decorrência de uma condição médica geral e nem
ser melhor explicados por outro transtorno mental [...].

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


219

Os sintomas agudos de abstinência frequentemente são vistos após períodos de uso repetitivo de
altas doses e caracterizam-se por sensações intensas e desagradáveis de lassidão [cansaço, fadiga] e
depressão, geralmente exigindo vários dias de repouso e recuperação. Sintomas depressivos com
ideação ou comportamento suicida podem ocorrer e geralmente são os problemas mais sérios vistos
durante a "aterrissagem" ou outras formas de Abstinência de Cocaína. Uma parcela considerável
dos indivíduos com Dependência de Cocaína apresenta poucos ou nenhum sintoma de abstinência
evidente ao cessar o uso da substância.

Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína - síndrome de abstinência


com delirium
Estado no qual a síndrome de abstinência tal como definida [tópico acima] se complica com a
ocorrência de delirium, segundo os critérios [deste manual]. Este estado pode igualmente comportar
convulsões. Quando fatores orgânicos também estão considerados na sua etiologia, a afecção deve
ser classificada [como Outro delirium – ou seja, delirium de etiologia mista].

Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína - transtorno psicótico


Conjunto de fenômenos psicóticos que ocorrem durante ou imediatamente após o consumo de uma
substância psicoativa, mas que não podem ser explicados inteiramente com base numa intoxicação
aguda e que não participam também do quadro de uma síndrome de abstinência. O estado se
caracteriza pela presença de alucinações (tipicamente auditivas, mas frequentemente
polissensoriais), de distorção das percepções, de ideias delirantes (frequentemente do tipo paranoide
ou persecutório), de perturbações psicomotoras (agitação ou estupor) e de afetos anormais, podendo
ir de um medo intenso ao êxtase. O sensório não está habitualmente comprometido, mas pode
existir um certo grau de obnubilação da consciência embora possa estar presente a confusão mas
esta não é grave.

Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína - síndrome amnésica


Síndrome dominada pela presença de transtornos crônicos importantes da memória (fatos recentes e
antigos). A memória imediata está habitualmente preservada e a memória dos fatos recentes está
tipicamente mais perturbada que a memória remota. Habitualmente existem perturbações
manifestas da orientação temporal e da cronologia dos acontecimentos, assim como ocorrem
dificuldades de aprender informações novas. A síndrome pode apresentar confabulação intensa, mas
esta pode não estar presente em todos os casos. As outras funções cognitivas estão em geral
relativamente bem preservadas e os déficits amnésicos são desproporcionais a outros distúrbios.

Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso da cocaína - transtorno psicótico


residual ou de instalação tardia
Transtorno no qual as modificações, induzidas pelo álcool ou por substâncias psicoativas, da
cognição, do afeto, da personalidade, ou do comportamento persistem além do período durante o
qual podem ser considerados como um efeito direto da substância. A ocorrência da perturbação
deve estar diretamente ligada ao consumo de uma substância psicoativa. Os casos nos quais as
primeiras manifestações ocorrem nitidamente mais tarde que o (s) episódio(s) de utilização da droga
só deverão ser codificados neste caractere onde existam evidências que permitam atribuir sem
equívoco as manifestações ao efeito residual da substância. Os "flashbacks" podem ser
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
220

diferenciados de um estado psicótico, em parte porque são episódicos e frequentemente de muito


curta duração, e em parte porque eles reproduzem experiências anteriores ligadas ao álcool ou às
substâncias psicoativas.142

142
Texto adaptado da CID-10.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
221

Transtornos relacionados à cannabis e alucinógenos


Maconha - São as flores e folhas secas da planta CANNABIS SATIVA,
também conhecida como Cânhamo verdadeiro. Os cigarros são chamados
de: erva, pacau, baseado, charão, fininho ou finório. Contém várias
substâncias que têm efeitos cerebrais, a mais conhecida sendo o delta-9-
tetrahidrocanabinol (D -9-THC,THC). Também contém substâncias que não
agem no cérebro, como o alcatrão. Outras preparações da CANNABIS são
o haxixe, ganja e charas. Os efeitos variam se a droga é fumada ou tomada,
e dependem da quantidade usada. Com doses baixas há euforia (sensação de bem-estar) e risos,
quando em grupo, ou há relaxamento e sonolência, se está sozinho. A memória fica prejudicada e a
pessoa não consegue executar tarefas múltiplas. Há aceleração do tempo subjetivo, fazendo minutos
parecerem horas, e confusão entre passado, presente e futuro. Os sentidos ficam aguçados, mas o
indivíduo tem menor equilíbrio e força muscular. Os olhos ficam vermelhos (congestão da
conjuntiva), a boca seca, e aumenta a vontade de comer doces. O pulso fica acelerado, e a pressão
pode diminuir quando a pessoa fica em pé, causando tontura. Com doses mais altas iniciam os
delírios (desorientação, confusão, raciocínio incoerente, medo, ilusões), alucinações (perceber algo
quando não há estímulo) e despersonalização (sente que não é mais ele mesmo), que podem atingir
um nível de psicose tóxica. Nestes estágios de intoxicação a pessoa pode sentir-se muito mal,
mostrar-se agitada e confusa, caracterizando a má viagem.
Sem referir os problemas de comportamento já citados, é conhecido que:
•fumar maconha traz os mesmos problemas que fumar cigarro de tabaco: bronquite, asma, faringite,
enfisema e câncer;
•há maior risco de sofrer acidentes de trânsito;
•diminui a imunidade, aumentando a chance de ocorrerem infecções;
•se for usada durante a gravidez, existe a possibilidade de prejudicar o feto.
A dependência pode ocorrer por uso repetido, durante bastante tempo. Pode haver tolerância
(precisa usar maior quantidade de droga para sentir os mesmos efeitos de antes), de forma que a
pessoa passa a fazer uso diário da droga, no entanto, a suspensão abrupta do uso não produz
sintomas físicos. O dependente se afasta da família, do trabalho e do lazer, para ficar usando a
droga. Alguns podem perder o interesse por cuidar de sua saúde ou higiene.143
Pesquisas recentes demonstram que pessoas geneticamente predispostas à esquizofrenia, e que
utilizam a maconha cronicamente, correm um risco muito maior de desenvolverem esse tipo de
psicose. (vide: Genetic predisposition to schizophrenia associated with increased use of cannabis.
http://www.nature.com/mp/journal/vaop/ncurrent/full/mp201451a.html)

Canabidiol
Sem efeito psicoativo, o canabidiol (CDB) é uma substância
canabinoide existente na folha da Cannabis Sativa, a planta da
maconha. De acordo com pesquisadores, não causa efeitos
psicoativos ou dependência.
O elemento possui estrutura química com grande potencial terapêutico neurológico, ou seja, pode
ter ação ansiolítica, que diminui a ansiedade, antipsicótica, neuroprotetora, anti-inflamatória,
antiepilética e agir nos distúrbios do sono.
143
http://psicoativas.ufcspa.edu.br/maconha.html
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
222

Pesquisadores defenderam a reclassificação do canabidiol por parte da Anvisa. Segundo eles, o uso
medicinal da substância tem efeitos positivos relevantes em pacientes com autismo, esclerose
múltipla, dores neuropáticas, câncer, epilepsia, mal de Parkinson e não causa efeitos psicoativos ou
dependência.144

Abstinência à Cannabis (DSM-5)


Critérios diangósticos
A. Cessação do uso pesado e prolongado de Cannabis (i.e., normalmente uso diário ou quase diário
durante um período mínimo de alguns meses).
B. Três (ou mais) dos seguintes sinais e sintomas, desenvolvidos no prazo de aproximadamente uma
semana após o Critério A:
1. Irritabilidade, raiva ou agressividade.
2. Nervosismo ou ansiedade.
3. Dificuldade em dormir (insônia, sonhos perturbadores).
4. Apetite reduzido ou perda de peso.
5. Inquietação.
6. Humor deprimido.
7. Pelo menos um dos seguintes sintomas físicos causa desconforto significativo: dor abdominal,
tremor, sudorese, febre, calafrios ou cefaleia.
C. Os sinais ou sintomas do Critério B causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no
funcionamento social, profissional, ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
D. Os sinais ou sintomas não são atribuíveis a outra condição médica nem são mais bem explicados
por outro transtorno mental, incluindo intoxicação por ou abstinência de outra substância.

A característica essencial da abstinência de Cannabis é a presença de uma síndrome de abstinência


típica que se desenvolve após a cessação ou redução substancial do uso pesado e prolongado da
substância. Além dos sintomas do Critério B, podem-se também observar os seguintes no período
pós-abstinência: fadiga, bocejos, dificuldade de concentração, períodos de rebote de aumento no
apetite e hipersonia que se seguem a períodos iniciais de perda de apetite e insônia. Para o
diagnóstico, os sintomas de abstinência devem causar sofrimento clinicamente significativo ou
prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo
(Critério C). Muitos usuários de Cannabis relatam fumá-la ou consumir outras substâncias para
aliviar os sintomas de abstinência, e muitos relatam que os sintomas de abstinência tornam difícil o
abandono do hábito e contribuem para a recaída. Os sintomas em geral não são suficientemente
graves a ponto de exigir atenção médica, mas estratégias medicamentosas ou comportamentais
podem ajudar a aliviar os sintomas e melhorar o prognóstico dos indivíduos que estão tentando
abandonar o hábito.
A abstinência de Cannabis é habitualmente observada em pessoas que buscam tratamento para uso
da substância e também em usuários crônicos de Cannabis que não buscam tratamento. Entre os
indivíduos que a consomem regularmente durante um período de suas vidas, até um terço relata ter
sofrido abstinência. Entre adultos e adolescentes sob tratamento ou usuários crônicos, 50 a 95%
relatam abstinência de Cannabis. Esses achados indicam que a abstinência da substância ocorre em
um substancial subgrupo de usuários regulares de Cannabis que tentam abandonar o hábito.
144
Fonte: http://www.ebc.com.br/noticias/saude/2015/01/entenda-o-que-e-o-canabidiol
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
223

Alucinógenos
São substâncias capazes de produzirem um efeito sensorial (visual, auditivo,
olfativo, gustativo ou tátil) na ausência de um estímulo real. Por produzirem
alterações na percepção, cognição e humor os alucinógenos são chamados de
drogas psicodélicas (do grego, significando “que manifesta a mente”). Os
alucinógenos são um grupo de compostos heterogêneos, muitos dos quais de
ocorrência natural; outros são produzidos sinteticamente. Muitos alucinógenos são estruturalmente
semelhantes a um dos diversos neurotransmissores, o que pode ser usado como forma de
categorização. Por exemplo, alucinógenos semelhantes à serotonina incluem as indolalquilaminas,
exemplificadas pela dietilamida do ácido lisérgico (LSD), [...]; alucinógenos semelhantes às
catecolaminas incluem as feniletilaminas e seus derivados, tais como a mescalina, [...].
Ambas as classes em geral produzem alucinações visuais por sua atividade em subtipos de
receptores de serotonina. [...] (APA, 2010, p. 55)

Os transtornos psíquicos ocasionados pelo uso da maconha e de alucinógenos foram descritos no


item anterior.

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


224

Transtornos relacionados à cafeína, nicotina e inalantes


Cafeína – “A cafeína também chamada metil-xantina, derivada
das xantinas, está presente em plantas amplamente distribuídas
nas várias regiões geográficas. Ela é encontrada nos grãos de
café, folhas de chá e de mate, nas sementes de cacau e em várias
partes do guaraná. Devido ao consumo generalizado dessa
substância, conclui-se que ela é a droga mais utilizada no mundo.
Um copo de café contém aproximadamente 85mg de cafeína.
A cafeína possui efeitos terapêuticos importantes como dilatação
dos brônquios, estimulação do coração e aumento da excreção
urinária. No cérebro, ela alivia dores de cabeça. Ela possui também efeitos prejudiciais, provoca
aumento da secreção gástrica, agravando sintomas de gastrite e úlcera.
A droga também possui efeitos psicoestimulantes. Em doses moderadas (85 a 250mg), os usuários
relatam uma sensação de bem estar, melhora de atenção e pensamento. Porém em doses elevadas
(acima de 250mg), surgem efeitos de nervosismo, inquietação, insônia e tremores. Doses muito
altas podem produzir convulsões, delírios e aumento da frequência cardíaca.
A cafeína é metabolizada pelo fígado e eliminada pela urina.
O uso crônico dessa substância (350mg ao dia) provoca dependência física e tolerância à droga. Na
retirada da droga pode aparecer uma síndrome de abstinência caracterizada por dores de cabeça,
nervosismo, irritação, ansiedade e insônia.” (http://www.unifesp.br/dpsicobio/drogas/cafe.htm)
“A cafeína também pode causar dependência física. Muitas pessoas que param de consumi-la
podem sentir os sintomas desagradáveis devido ao seu consumo, tais como: fortes dores de cabeça,
náuseas e problemas estomacais.
Entretanto, ser dependente de cafeína não significa necessariamente um dano à saúde, pois muitas
pessoas vivem uma vida perfeitamente saudável com pequenas doses diárias desta substância.
Porém, quando seu consumo é elevado, ela pode aumentar seriamente o nível de estresse diário.
De forma geral, reduzir a ingestão de cafeína é uma atitude bastante benéfica quando estamos
atravessando um período estressante, pois, como já vimos acima, ela atua como estimulante, e isso,
inevitavelmente, eleva o nível de estresse, que por sua vez, é o desencadeador de uma série de
doenças.” (http://www.todabiologia.com/saude/cafeina.htm)

Abstinência à cafeína (DSM-5)


A característica essencial da abstinência de cafeína é a presença de uma síndrome de abstinência
típica que se desenvolve após a interrupção (ou redução substancial) abrupta da ingestão diária
prolongada de cafeína. A síndrome de abstinência de cafeína é indicada por três ou mais dos
seguintes: cefaleia; fadiga ou sonolência acentuadas; humor disfórico, humor deprimido ou
irritabilidade; dificuldade de concentração; e sintomas gripais (náusea, vômitos, dor/rigidez
muscular). A síndrome de abstinência causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no
funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Os
sintomas não devem estar associados aos efeitos fisiológicos de outra condição médica nem são
mais bem explicados por outro transtorno mental.
A cefaleia é a característica típica da abstinência de cafeína e pode ser difusa, de desenvolvimento
gradual, latejante e sensível ao movimento. Contudo, outros sintomas de abstinência de cafeína
podem ocorrer na ausência de cefaleia. A cafeína é a substância comportamentalmente ativa mais
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
225

amplamente usada no mundo e está presente em diversos tipos de bebidas (p. ex., café, chá, mate,
refrigerantes, refrescos, bebidas energéticas), alimentos, complementos energéticos, medicamentos
e suplementos alimentares. Como sua ingestão costuma estar integrada a hábitos sociais e a rituais
diários (p. ex., pausa para o cafezinho, chá da tarde), alguns consumidores podem não estar cientes
de sua dependência física da substância, e, por isso, os sintomas de abstinência podem ser
inesperados e atribuídos erroneamente a outras causas (p. ex., gripe, enxaqueca). Além disso, os
sintomas de abstinência de cafeína podem ocorrer quando o indivíduo precisa abster-se de
alimentos e bebidas antes de procedimentos médicos ou quando perde uma dose habitual da
substância devido a uma mudança na rotina (p. ex., durante viagens, fins de semana).
A probabilidade e a gravidade da abstinência de cafeína geralmente aumentam como resultado da
dose diária regular da substância. Contudo, há grande variação de uma pessoa para outra e em um
mesmo indivíduo em diferentes episódios quanto a incidência, gravidade e duração dos sintomas de
abstinência. Os sintomas de abstinência podem ocorrer após a interrupção abrupta de doses crônicas
relativamente baixas da substância (i.e., 100 mg).
Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico
Demonstrou-se que a abstinência de cafeína está associada a comprometimento do desempenho
comportamental e cognitivo (p. ex., atenção sustentada). Estudos eletrencefalográficos
demonstraram que os sintomas de abstinência estão significativamente associados a aumentos na
atividade teta e diminuições na atividade beta-2. Redução na motivação para trabalhar e diminuição
na sociabilidade também foram relatadas durante a abstinência de cafeína. Documentou-se, ainda,
aumento do uso de analgésicos durante a abstinência da substância.

Nicotina - O tabaco é uma planta cujo nome científico é Nicotiana tabacum, da qual é extraída uma
substância de efeito estimulante chamada nicotina. Além desta, o tabaco possui mais de 4.700
substâncias tóxicas, dentre elas o monóxido de carbono, amônia, cetonas, formaldeído e partículas
de nicotina e alcatrão.
O tabaco começou a ser utilizado aproximadamente no
ano 1000 a.C., nas sociedades indígenas da América
Central, em rituais mágico-religiosos, com o objetivo de
purificar, contemplar, proteger e fortalecer os ímpetos
guerreiros. A planta chegou ao Brasil provavelmente pela
migração de tribos tupis-guaranis. Hoje, apesar dos males
que o hábito de fumar provoca, a nicotina é uma das
drogas mais consumidas no mundo.
Quando o fumante dá uma tragada, a nicotina é absorvida pelos pulmões, chegando ao cérebro
aproximadamente em nove segundos. Os principais efeitos da nicotina no sistema nervoso central
consistem em: elevação leve no humor (estimulação) e diminuição do apetite.
A nicotina produz um pequeno aumento na frequência dos batimentos cardíacos, na pressão arterial,
no ritmo respiratório e na atividade motora. Quando uma pessoa fuma um cigarro, a nicotina é
imediatamente distribuída pelos tecidos. No sistema digestivo, provoca diminuição da contração do
estômago, dificultando a digestão.
O uso intenso e constante de cigarros aumenta a probabilidade de ocorrência de algumas doenças,
como: pneumonia, câncer (pulmão, laringe, faringe, esôfago, boca, estômago), infarto de miocárdio,
bronquite crônica, enfisema pulmonar, derrame cerebral e úlcera digestiva.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
226

A nicotina é um psicotrópico que gera dependência, por isso, o tabagismo é classificado pelo
Código Internacional de Doenças (CID-10) como um transtorno mental e de comportamento pelo
uso da substância.
No sistema digestivo, provoca diminuição da contração do estômago, dificultando a digestão. Além
disso, estimula no aparelho gastrointestinal a produção de ácido clorídrico, o que pode causar úlcera
gástrica.
Essa droga, no organismo, aumenta a liberação de catecolaminas, as quais são responsáveis pela
vasoconstricção, hipertensão arterial e aumento da frequência cardíaca.
A nicotina juntamente com o monóxido de carbono, provoca diversas doenças cardiovasculares,
como: infarto, acidente vascular cerebral e morte-súbita. Também desencadeia a liberação de
substâncias quimiotaxias145 no pulmão, o que estimula um processo de destruição da elastina
(proteína responsável pela expansão e contração do pulmão), provocando o enfisema pulmonar.

Abstinência ao tabaco (DSM-5)


Os sintomas de abstinência prejudicam a capacidade de interromper o uso de tabaco. Os sintomas
após a abstinência de tabaco devem-se, em grande parte, à privação de nicotina. Os sintomas são
muito mais intensos entre indivíduos que fumam cigarros ou formas não fumáveis de tabaco do que
entre aqueles que usam medicamentos com nicotina. A diferença na intensidade dos sintomas
provavelmente se deve ao início mais rápido e aos níveis mais altos de nicotina com o fumo de
cigarros. A abstinência de tabaco é comum entre usuários diários da substância que interrompem ou
reduzem o hábito, mas também pode ocorrer entre usuários não diários. Em geral, a frequência
cardíaca se reduz em 5 a 12 batimentos por minuto nos primeiros dias após a interrupção do
tabagismo, e o peso aumenta em média 2 a 3 quilos ao longo do primeiro ano após a interrupção do
tabagismo. A abstinência de tabaco pode produzir alterações no humor e prejuízo do funcionamento
clinicamente significativos.
Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico
A fissura por consumir alimentos doces ou açucarados e o comprometimento do desempenho em
tarefas que exigem alerta estão associados à abstinência de tabaco. A abstinência pode aumentar
constipação [resfriados com secreção], tosse, tontura, sonhos/pesadelos, náusea e dor de garganta. O
tabagismo aumenta o metabolismo de vários medicamentos usados para tratar transtornos mentais;
portanto, sua interrupção pode aumentar os níveis sanguíneos desses medicamentos, o que pode
produzir resultados clinicamente significativos. Esse efeito parece ser devido não à nicotina, e sim a
outros compostos presentes no tabaco.

145
Quimiotaxia - Reação de movimento orientado e obrigatório de organismos móveis, desencadeada e mantida por
uma substância química, que se efetua na sua direção (quimiotaxia positiva) ou em direção oposta (quimiotaxia
negativa).
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
227

146
(http://www.obid.senad.gov.br/portais/OBID/conteudo/index.php?id_conteudo=11287&rastro=I
NFORMA%C3%87%C3%95ES+SOBRE+DROGAS/Tipos+de+drogas/Tabaco)

146
A doença de Buerger (tromboangeíte obliterante) é a obstrução das artérias e das veias de pequeno e de médio
calibre, por uma inflamação causada pelo hábito de fumar.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
228

Inalantes e solventes - A palavra solvente significa substância capaz de dissolver coisas, e inalante
é toda substância que pode ser inalada, isto é, introduzida no
organismo através da aspiração pelo nariz ou pela boca.
Em geral, todo solvente é uma substância altamente volátil, ou
seja, evapora-se naturalmente, por esse motivo pode ser facilmente
inalado. Outra característica dos solventes ou inalantes é que
muitos deles (mas não todos) são inflamáveis.
Um número enorme de produtos comerciais, como esmaltes, colas,
tintas, tíneres, propelentes, gasolina, removedores, vernizes etc.,
contém esses solventes. Eles podem ser aspirados de forma involuntária (por exemplo,
trabalhadores de indústrias de sapatos
ou de oficinas de pintura, o dia inteiro
expostos ao ar contaminado por essas
substâncias) ou voluntariamente (por
exemplo, crianças em situação de rua
que cheiram cola de sapateiro, o
menino que cheira em casa acetona ou
esmalte, ou o estudante que cheira o
corretivo Carbex etc.).
Todos esses solventes ou inalantes são
substâncias pertencentes a um grupo
químico chamado de hidrocarbonetos,
como o tolueno, xilol, n-hexano,
acetato de etila, tricloroetileno etc [...].
Um produto muito conhecido no Brasil
é o “cheirinho” ou “loló”, também
conhecido como “cheirinho da loló”. Trata-se de um preparado clandestino à base de clorofórmio e
éter147, utilizado somente para fins de abuso.
Mas já se sabe que, quando esses “fabricantes” não encontram uma daquelas duas substâncias, eles
misturam qualquer outra coisa em substituição. Assim, em relação ao “cheirinho da loló” não se
conhece bem sua composição, o que complica quando se tem casos de intoxicação aguda por essa
mistura.
É importante chamar a atenção para o lança-perfume. Esse nome designa inicialmente aquele
líquido que vem em tubos e que se usa no carnaval. À base de cloreto de etila ou cloretila, é
proibida sua fabricação no Brasil e só aparece nas ocasiões de carnaval, contrabandeada de outros
países sul-americanos. Mas cada vez mais o nome lança-perfume é também utilizado para designar
o “cheirinho da loló”.
Os solventes começam a ser utilizados como droga de abuso por volta de 1960 nos Estados Unidos.
No Brasil, o uso de solventes aparece no período de 1965-1970.
O clorofórmio e o éter chegaram a servir como drogas de abuso em outros tempos e depois seu uso
foi praticamente abandonado. No Brasil, o hábito voltou com os lança-perfumes trazidos da
Argentina. O clorofórmio é conhecido desde 1847 como anestésico, mas foi abandonado porque

147
O éter e o clorofórmio são anestésicos de uso medicinal.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
229

surgiram anestésicos mais eficientes e seguros. Assim também ocorreu com o éter. Há referências
ao abuso do éter como substituto do álcool durante a Segunda Guerra Mundial na Alemanha.
Por volta de 1960, os lança-perfumes, que eram feitos de Cloreto de Etila, começaram a ser
aspirados para dar sensação de torpor, tontura e euforia. O Quelene, anestésico local, formava par
com o lança-perfume e era empregado fora das épocas de carnaval, quando a disponibilidade dos
lança-perfumes era menor. Por volta de 1965, o governo brasileiro proibiu a fabricação dos lança-
perfumes e do Quelene. Contudo, começou a surgir referências ao retorno do uso de lança-
perfumes, só que como um produto à base de clorofórmio e éter.
Assim como ocorre com o álcool, os solventes são substâncias que têm efeito bifásico, ou seja,
causam uma excitação inicial, seguida por depressão do funcionamento cerebral, que dependerá da
dose inalada.
Após a inalação, os solventes alcançam os alvéolos e capilares pulmonares e são distribuídos pelas
membranas lipídicas do organismo. O pico plasmático é atingido entre 15 a 30 minutos. O
metabolismo é variável: nitratos e hidrocarbonetos aromáticos são metabolizados pelo sistema
hepático microssomal. Alguns solventes possuem metabólitos ativos mais potentes que a substância
inicial. A eliminação pode ser renal ou pulmonar.
Praticamente todos os inalantes, com exceção dos nitritos, produzem efeitos prazerosos e
depressores do Sistema nervoso central. O Tolueno, substância encontrada em produtos como
tintas, colas e removedores, parece agir ativando o sistema dopaminérgico. Este sistema neural se
relaciona à dependência. É responsável pela sensação de prazer associada ao consumo da droga,
bem como a outros comportamentos naturalmente gratificantes como comer, fazer sexo e saciar a
sede.
Por outro lado, os Nitritos, conhecidos também como “poppers” e atualmente fabricados com a
finalidade de limpeza de roupas e utensílios e desodorização de ambientes, produz o efeito de
dilatação e relaxamento dos vasos sanguíneos e são utilizados como droga de abuso para melhor o
desempenho sexual.
O início dos efeitos, após a aspiração, é bastante rápido – de segundos a minutos no máximo – e em
15 a 40 minutos já desaparecem. Assim, o usuário repete as aspirações várias vezes para que as
sensações durem mais tempo.
Os efeitos dos solventes vão desde uma estimulação inicial até depressão, podendo também surgir
processos alucinatórios. Vários autores dizem que os efeitos dos solventes (quaisquer que sejam)
lembram os do álcool, entretanto, este não produz alucinações, fato bem descrito para os solventes.
Entre os efeitos, o predominante é a depressão, principalmente a do funcionamento cerebral. De
acordo com o aparecimento desses efeitos, após inalação de solventes, foram divididos em quatro
fases:
Primeira fase: a chamada fase de excitação, que é a desejada, pois a pessoa fica eufórica,
aparentemente excitada, sentindo tonturas e tendo perturbações auditivas e visuais. Mas podem
também aparecer náuseas, espirros, tosse, muita salivação e as faces podem ficar avermelhadas.
Segunda fase: a depressão do cérebro começa a predominar, ficando a pessoa confusa,
desorientada, com a voz meio pastosa, visão embaçada, perda do autocontrole, dor de cabeça,
palidez; ela começa a ver ou a ouvir coisas.
Terceira fase: a depressão aprofunda-se com redução acentuada do estado de alerta, incoordenação
ocular (a pessoa não consegue mais fixar os olhos nos objetos), incoordenação motora com marcha
vacilante, fala “enrolada”, reflexos deprimidos, podendo ocorrer processos alucinatórios evidentes.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
230

Quarta fase: depressão tardia, que pode chegar à inconsciência, queda da pressão, sonhos
estranhos, podendo ainda a pessoa apresentar surtos de convulsões (“ataques”). Essa fase ocorre
com frequência entre aqueles “cheiradores” que usam saco plástico e, após certo tempo, já não
conseguem afastá-lo do nariz e, assim, a intoxicação torna-se muito perigosa, podendo mesmo levar
ao coma e à morte.
Finalmente, sabe-se que a aspiração repetida, crônica, dos solventes pode levar à destruição de
neurônios (células cerebrais), causando lesões irreversíveis no cérebro. Além disso, pessoas que
usam solventes cronicamente apresentam-se apáticas, têm dificuldade de concentração e déficit de
memória.
Os solventes praticamente não agridem outros órgãos, a não ser o cérebro. Entretanto, existe um
fenômeno produzido pelos solventes que pode ser muito perigoso. Estes tornam o coração humano
mais sensível a uma substância que o nosso corpo fabrica, a adrenalina, que faz o número de
batimentos cardíacos aumentar.
A adrenalina é liberada toda vez que temos de exercer um esforço extra, como, correr, praticar
certos esportes etc. Assim, se uma pessoa inala um solvente e logo depois faz esforço físico, seu
coração pode sofrer, pois ele está muito sensível à adrenalina liberada por causa do esforço. A
literatura médica já cita vários casos de morte por arritmia cardíaca (batidas irregulares do coração),
principalmente de adolescentes.
Os solventes quando inalados cronicamente podem levar a lesões da medula óssea, dos rins, do
fígado e dos nervos periféricos que controlam os músculos. Por exemplo, verificou-se, em outros
países, que em fábricas de sapatos ou oficinas de pintura, os operários, com o tempo, acabavam por
apresentar doenças renais e hepáticas. Em decorrência disso, nesses países passou a vigorar uma
rigorosa legislação sobre as condições de ventilação dessas fábricas, e o Brasil também tem leis a
respeito.
Em alguns casos, principalmente quando existe no solvente uma impureza, o benzeno, mesmo em
pequenas quantidades, pode levar à diminuição de produção de glóbulos brancos e vermelhos pelo
organismo.
Um dos solventes mais utilizados nas nossas colas é o n-hexano. Essa substância é muito tóxica
para os nervos periféricos, produzindo degeneração progressiva, a ponto de causar transtornos no
andar (as pessoas acabam andando com dificuldade, o chamado “andar de pato”), podendo até
chegar à paralisia. Há casos de usuários crônicos que, após alguns anos, só podiam se locomover
em cadeira de rodas.
Outras razões associadas a mortes provocadas por inalantes são: sufocamento – acidentes com o uso
de saco plástico, pois no momento da inalação a pessoa coloca o saco plástico na cabeça e pode se
sufocar; quedas – os solventes provocam vertigens e tonturas, podendo levar a quedas e
atropelamentos, devido à incoordenação motora e ao prejuízo de reflexos.
A dependência entre aqueles que abusam cronicamente de solventes é comum, sendo os
componentes psíquicos da dependência os mais evidentes, tais como desejo de usar a substância,
perda de outros interesses que não seja o solvente.
A síndrome de abstinência, embora de pouca intensidade, está presente na interrupção abrupta do
uso dessas drogas, sendo comum ansiedade, agitação, tremores, cãibras nas pernas e insônia.
Pode surgir tolerância à substância, embora não tão dramática em relação a outras drogas (como as
anfetaminas, que os dependentes passam a tomar doses 50-70 vezes maiores que as iniciais).
Dependendo da pessoa e do solvente, a tolerância instala-se ao fim de um a dois meses.
“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)
231

O consumo de solventes durante a gestação aumenta os riscos de prematuridade, morte pré-natal,


anormalidades no crescimento e quadros semelhantes à síndrome alcoólica fetal (microcefalia,
malformações faciais, cardiovasculares, ósseas e renais). Não há informações definitivas a respeito
do potencial carcinogênico dos solventes sobre os seres humanos.
(http://www.obid.senad.gov.br/portais/OBID/conteudo/index.php?id_conteudo=11289&rastro=INF
ORMA%C3%87%C3%95ES+SOBRE+DROGAS/Tipos+de+drogas/Solventes+ou+Inalantes)

“[...] e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. (Jesus Cristo)


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Bibliografia utilizada e indicada


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