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A negação do reconhecimento oficial do Islão como uma das confissões religiosas instauradas em
Angola pode criar a ideia de que o Estado angolano é adepto da islamofobia.
Na realidade, a relação entre o poder e a religião, em Angola, desde a independência, foi sempre
marcada pela intolerância política, a ambivalência e a co-optação, tanto de forma combinada como
alternada.
“ No seu projecto totalitário, o governo angolano tinha que encontrar uma via para enquadrar as
Igrejas de tal modo dentro do sistema que se eliminava, pela sua inserção, o perigo que elas
representavam por serem as únicas organizações de massa fora da iniciativa e do controlo directo
do Estado” .
Schubert nota que “ tem havido continuidade no propósito da política religiosa das autoridades”
com o objectivo claro de controlar as Igrejas, o que continua a verificar-se na actualidade.
A violência e a co-optação, por si só, não explicam o domínio do MPLA, no poder desde 1975,
sobre as igrejas. A ambivalência sim.
O académico Homi Bhabha argumenta que a ambivalência é uma das estratégias mais eficazes,
quer ao nível de discurso quer do ponto de vista físico, de poder discriminatório. Legitima os
estereótipos “ como forma de conhecimento e identificação que vacila entre o que sempre foi
estabelecido, conhecido, e algo que deve ser repetido com ansiedade” .
• É essa ambivalência que tem permitido, ao poder, o seu domínio político sobre as
lideranças religiosas, através da oferenda de privilégios aos aliados e da exclusão dos que
lhe são hostis. Por sua vez, os representantes das igrejas também são proactivos na
manutenção da ambivalência no relacionamento entre o Estado e as igrejas, em
conformidade com interesses individuais e colectivos do dia.
Historial
1975
“ Todos os que seguem o camarada presidente Dr. Neto, bem como os que seguem o presidente
Holden Roberto e o Dr. Savimbi, sendo vós os chefes do povo angolano, vão cumprindo as leis de
poderem matar e todos quantos seguem o Simão Toco não podem nem poderão segurar em armas
para matarem os seus irmãos nem tão pouco contribuírem dinheiro para a compra de armas. Mas
sim poderão contribuir em comida para a alimentação do povo (…).”
A Igreja Tocoísta passou a ser perseguida, considerada subversiva e conotada com a FNLA, porque
os seus fiéis provinham sobretudo do Norte de Angola, na altura região de influência do primeiro
movimento de libertação do país. A outra igreja profética, de raiz africana, a Igreja Kimbanguista,
também sofreu perseguições, sobretudo na mesma área geográfica (Uíge, Zaire e Cabinda). Os
seus fiéis eram essencialmente da mesma região e muitas vezes confundidos com os Tocoístas. À
semelhança da Igreja Tocoísta, também era considerada apoiante da FNLA e acreditava-se que
tinha ligações ao regime de Mobutu, no então Zaire, sendo ademais entendida como agente do
imperialismo.
1976
“ A Igreja Católica fazia diariamente anúncios pela sua emissora de rádio no sentido de que as
Testemunhas de Jeová eram subversivas” , sublinha a narrativa de Carlos Cadi:
• A Igreja Metodista demarcou, logo em Novembro do mesmo ano, aquele que viria a ser o
modelo de relacionamento entre a igreja e o Estado, privilegiado pelo MPLA. O bispo
Emílio de Carvalho defendeu, nessa altura, “ o serviço cristão para a edificação de uma
sociedade socialista” e prestou, sem equívocos, a sua lealdade ao projecto totalitário da
época. E assim a sua ala escapou às perseguições políticas.
1978
Por sua vez, em sua defesa na altura, os bispos católicos recordaram que, logo após a
independência, “ a Rádio Ecclésia fora obrigada pelo governo a estar ligada à Rádio Nacional,
devendo transmitir a maioria dos seus programas, mesmo os de propaganda ateia” .
1980
1987
• Um dos casos mais marcantes da violência política do governo contra as igrejas teve lugar
a 15 de Fevereiro, quando forças militares e de segurança executaram 35 fiéis na Terra
Nova, segundo informação prestada ao Maka Angola por uma alta entidade desta igreja.
1990
1991
1992
• O presidente José Eduardo dos Santos abandonou o ateísmo, casou pela Igreja Católica e
baptizou os seus filhos.
2003
Em reacção, a Rádio Ecclésia emitiu um comunicado que, de certo modo, resume também a
ambivalência de vários dirigentes que professam crenças religiosas:
“ Ao insurgir-se contra a linha editorial da Rádio Ecclesia e ao chamar terrorista a esta estação,
implicitamente está a chamar terrorista à Igreja Católica de Angola, da qual sua Excelência é
membro, essa Igreja que durante os anos deu mostras de idoneidade, apesar de todos os
constrangimentos.