Três homens importantíssimos da História da Igreja, Ambrósio, Jerônimo e Crisóstomo. Atanásio
morreu em 373, final do quarto século. Quando ele morreu os 3 Capadócios estavam na faixa dos 40 anos. O Ambrósio, Jerônimo e Crisóstomo estavam na faixa dos 30 anos. Havia um jovem no Norte da África, com 19 anos, que é o grande gigante Agostinho. Dá para sentir o peso do quarto século para a História da Igreja, para a teologia. Ambrósio (339-397) Quando se fala em Ambrósio se pensa em um homem da Igreja, um líder eclesiástico, um líder da Igreja, o pastor, o pregador, e um criador de estilos de adoração. Um homem também da liturgia. Nasceu em Roma, de uma família aristocrática, e era político. Começou cedo na vida política. Foi governador do Norte da Itália. Era considerado bom governador, muito competente. Era cristão, mas não dos mais dedicados. O foco dele era a vida política, a vida como governador lá no Norte da Itália. Bispo de Milão O problema é que a Igreja em Milão, onde era a sede do governo, vivia um período de grande turbulência por causa da briga de arianos com ortodoxos. Cada um puxando para o seu lado. É aquela época depois do Concílio de Nicéia em que o Atanásio esta brigando pela verdade. No meio dessa confusão tinha que se escolher um novo Bispo, e no dia da escolha do novo Bispo o governador Ambrósio estava no meio da multidão, do povo que iria escolher o novo Bispo. Os dois lados brigando, não se entendiam, e de repente no meio da multidão, uma criança começa a gritar: “Ambrósio para Bispo!”. Nem ele nem alguém jamais tinham imaginado essa possibilidade, ele era o governador, mas ela soou interessante para muita gente. De repente todos estavam gritando a mesma coisa. Ele ficou numa situação que não poderia recusar, foi aclamação do povo. Só havia um detalhe, ele ainda não tinha sido batizado. Em 8 dias ele foi batizado, ordenado presbítero e ordenado Bispo. Com certeza é um recorde na História da Igreja. Ele deixou de ser governador. Ambrósio administrou muito bem os problemas que havia na Igreja e, começou a defender a independência da Igreja em relação ao estado. Isso era um problema nessa época por causa do Teodósio. Teodósio era terrível, ele interferia em tudo. Tornado o cristianismo a religião oficial passou a achar que era o dono da Igreja, dando ordem para todos. O Estado interferindo na Igreja acaba tirando a pureza dela. Ambrósio foi o que mais resistiu, foi uma grande contribuição, pois ele trouxe equilíbrio. Brigou com Teodósio várias vezes, apesar de ele ser o Imperador. Era um homem muito corajoso. Uma vez Ambrósio não deixou Teodósio entrar na Igreja em Milão, porque Teodósio tinha massacrado umas pessoas lá em Tessalônica, e disse “Você com essas mãos sujas de sangue não vem para cá”. Pregador Era também um excelente pregador. Pregador fantástico, um homem de retórica fora de série, extremamente eloqüente. Agostinho foi para Milão só para vê-lo. De todos os Pais da Igreja que vimos até agora, ninguém chegou nem perto da Doutrina da Graça, e Ambrósio chegou muito perto de entender a Doutrina da Graça. Por exemplo, uma oração que Ambrósio fez: “Oh! Deus, que olhaste para nós quando estávamos caídos na morte,e resolveste nos resgatar pelo advento do teu Filho Unigênito”. Já a idéia de morte espiritual, tudo coisas que haviam se perdido. Agostinho vai construir em cima disso. Quando pensamos em Agostinho devemos pensar em Ambrósio também. Esses dois homens têm uma ligação que Deus queria que eles tivessem. Vamos ver depois. Lutou contra o Neopaganismo, porque principalmente nos níveis mais elevados da sociedade romana, o paganismo estava voltando, muita gente achava que o cristianismo tinha enfraquecido Roma e, que bom mesmo era na época dos deuses. Lutou também contra o Arianismo que voltava toda hora pelo norte, pelos bárbaros. Foi um defensor da ortodoxia. Liturgista Organizou de uma maneira especial o culto, deu uma forma ao culto, com uma seqüência litúrgica. Foi também um grande compositor de hinos, deu muita ênfase à música. Agostinho escreve o seguinte: “Como eu chorei com os cantos dos hinos da Igreja”, nas suas visitas a Igreja de Milão. Hoje em dia tem vários hinos que são cantados com letras do Ambrósio, não aqui no Brasil, mas nos Estados Unidos. Hinos de antigamente com muita teologia, pois Ambrósio sempre achava que os hinos se prestavam tanto para a adoração como para o ensino. As pessoas cantavam e aprendiam com a letra. Ele como pastor que era se preocupava muito com isso. Foi ele que ajudou Agostinho a chegar à fé. Jerônimo (347-420) Nasceu na Itália, também de família rica, não é uma pessoa que gosta de pessoas, é um intelectual, um acadêmico, um teólogo. Esses indivíduos também têm um lugar na Igreja, também contribuem para a Igreja. Algum motivo Deus tem para levantar esse tipo de pessoa. Teólogo acadêmico Ele tinha uma biblioteca impressionante, uma das maiores bibliotecas individuais do seu tempo. Comprava e colecionava tudo tipo de livro que podia. Adorava ler o Cícero (escreve filosofia grega). Tem uma história interessante nesse sentido, porque apesar do Clemente e do Orígenes terem falado que não havia qualquer problema em ler essas filosofias gregas, que até era bom, Jerônimo se sentia culpado quando lia Cícero, por ser um escrito pagão. Uma noite ele teve um sonho em que ele foi colocado diante de Jesus Cristo, e Jesus disse: “Você não é cristão porque você lê Cícero”. Esse sonho o marcou profundamente. Dali para frente toda vez que ele tinha vontade de ler o Cícero, ele lia e depois lia a Bíblia um monte para compensar. Ele queria muito deixar de ler o Cícero, ele era viciado em ler Cícero. Ele nunca conseguiu parar de ler, e um dia alguém disse para ele assim: “Você esta lendo o Cícero? Mas e o teu sonho?”. E ele responde: “Você sabe, não podemos dar importância demais para sonhos!”. Então ele acabou cedendo. A maior obra de Jerônimo, com certeza, tradução da Bíblia para o latim, a Vulgata latina. Trabalhou 22 anos nela. Ele sabia fluentemente o latim, o grego e o hebraico, que não era comum nessa época. Com isso ele foi capaz de traduzir diretamente do hebraico para o latim, o velho testamento. Nessa tradução ele incluiu só os trinta e nove livros canônicos, não incluiu os outros por não considerá-los canônicos. Mesmo a Vulgata Latina sendo a Bíblia oficial da Igreja Católica Romana, não tem esses outros livros traduzidos. A Vulgata depois, na História da Igreja, acabou sendo a prisão da Palavra, porque o Catolicismo Romano aprisionou a Palavra no latim. Para ele o latim é a língua divina. Até pouco tempo as missas eram em latim. Jerônimo não foi culpado por isso, pois quando ele fez essa tradução estava traduzindo para a língua do povo e nisso ele é um protestante, não um Católico Romano, porque ele esta pondo a Bíblia na mão do povo. Os apócrifos foram incluídos na Bíblia Católica Romana, no Concílio de Trento, em mil quinhentos e quarenta e cinco, mas já existiam desde a época de Jerônimo, são livros antigos. Na época de Jerônimo o Cânon ainda não estava estabelecido com clareza, ainda havia discussões a respeito dele. Então Jerônimo tem a visão dele a respeito do Cânon, e eram os trinta e nove. O Novo Testamento não precisava de tradução, pois já era em língua que as pessoas usavam, foi escrito em grego. Nessa época não é que tenha sido feita a primeira tradução para o Latim, mas essa foi a melhor. Já havia outras traduções, só que com pouca qualidade, e traduções que vinham da Septuaginta, não diretamente do hebraico para o latim, direto do original. Latim passou a ser a língua oficial do Ocidente, e tudo que era escrito e traduzido precisa ser também em Latim para que todos tivessem acesso. Comentarista Escreveu muitos comentários da Bíblia. Agostinho escreveu uma carta para o Jerônimo dizendo assim: “Eu te agradeço pelos teus escritos, porque Deus deu alguém como tu para ti mesmo, para mim e para toda a Igreja”, apesar de os dois terem brigas seríssimas. Jerônimo era um sujeito absolutamente intratável, ninguém suportava o Jerônimo, ele ofendia-se com qualquer coisa, podia facilmente humilhar as pessoas que não concordavam com ele, ou que ele considerasse pouco inteligente. Uma pessoa desagradável realmente. Mas ele é respeitado tanto no Ocidente como no Oriente. No Oriente porque ele se estabeleceu mais tarde em Belém, ele foi Monge lá. Monge Foi um monge diferente dos Beneditinos, pois esses suavam a camisa de verdade, tinham que ter uma disciplina tremenda e, Jerônimo era um monge que queria sossego. Ele foi para Belém se isolar porque queria escrever, fazer o trabalho dele, nada desse negócio de ter muito horário como os Beneditinos e ficar trabalhando no pesado. Como monge ele começou a escrever cada vez mais sobre o celibato, sendo importante sobre a influência sobre o Catolicismo Romano quanto ao caráter superior do celibato em relação ao casamento. Nessa época havia um crescente interesse sobre o celibato e a virgindade dentro da Igreja. Jerônimo influenciou muito isso. Com ele isso ficou ainda mais forte. O David B. Calhoun diz que se Jerônimo fosse dar notas ele daria para o celibato um 10, para viuvez um 6 e, para o casamento um 3. Jerônimo escreveu um livro sobre a Perpétua Virgindade da Bem Aventurada Maria, escrevendo nesse livro um texto assim: “O acento esta macio, o chão esta varrido, as flores estão nos vasos, o jantar esta pronto. Diga-me onde, em meio a tudo isso, há espaço para pensar em Deus?”. Ele estava colocando os cuidados desse mundo, os cuidados típicos de uma família, como um empecilho para a vida com Deus, a comunhão com Deus. Isso ficou sem resposta, ela viria, mas só no tempo da Reforma, com Lutero e Calvino, e com o irmão Lourenço. Crisóstomo – Boca de ouro – (345-407) É importante principalmente no Oriente, nasceu em Antioquia e foi Bispo de Constantinopla, cidade mais importante nessa época. Crisóstomo, na verdade é um apelido, o nome dele é João. Recebeu esse apelido por ser maravilhoso pregador, fantástico. Foi convertido pela influência de Basílio. Sua mãe Antusa. Sua mãe era cristã e viúva, fazendo um trabalho excelente criando esse rapaz nos caminhos da fé. Libânios era o maior retórico, pago para falar, do seu tempo, queria por toda lei pegar o jovem para si, para trabalhar com ele, por causa da grande capacidade de oratória que Crisóstomo tinha. Sua mãe é que impediu que ele levasse o seu dom para longe do Senhor, segurou ele para que ele trabalhasse para a Igreja. Foi Libânios que disse aquela famosa frase – “Que mulheres esses cristãos têm”. Na História da Igreja vemos que aquele ditado é verdadeiro – “Por trás de um grande homem há uma grande mulher”. A não ser no caso de Jerônimo, que atrás dele não tem alguém por que ninguém consegue ficar com ele. Pregador em Antioquia e Constantinopla João Crisóstomo tornou-se um grande pregador e, dos grandes. Tinha uma linguagem vívida e ilustrações marcantes e aplicações realmente perscrutadoras. De todos os homens que nos vimos até agora ele é o mais agradável e fácil de ler. Ele pregava seqüencialmente nos livros da Bíblia, como as Igrejas Reformadas fazem. O Charles Spurgeon admirava profundamente o Crisóstomo pela sua pregação, mas por outro lado, ficava decepcionado por encontrar tão pouco da graça nos seus ensinos. Era comum nessa época a Doutrina da Graça de Deus estar ofuscada e apagada, há só indícios e nada mais. Exegeta O maior exegeta (sabe explicar o sentido da Palavra) do seu tempo. Ele explica a Palavra com perfeição. Calvino achava que Crisóstomo era o supremo exegeta das Escrituras. Calvino admirava muito Agostinho, e o cita mais do que ninguém, mais do que todos os outros juntos, mas se decepcionava profundamente com a exegese de Agostinho que era realmente um desastre. E por que ele errava na exegese? Porque ele era adepto da escola de Alexandria de interpretação da Bíblia. A escola de Alexandria sempre interpreta a Bíblia de maneira alegórica, existe o sentido literal, mas eles o consideram inferior, não tão importante, o mais importante é o sentido escondido, místico das Escrituras. A outra escola era a de Antioquia que considerava sempre o sentido literal de interpretação das Escrituras. Crisóstomo é da escola de Antioquia. Nós com certeza nos sentiríamos muito mais confortáveis em Antioquia do que Alexandria. O que deixa todos impressionados é o seguinte – como é que pode o melhor exegese não ser o melhor teólogo? Esse é um enigma que o próprio Calvino se questionava. O maior teólogo é Agostinho. Imagino que ali Deus queria mostrar que nenhum homem se basta a si mesmo, a Igreja precisa sempre de todos, e que ninguém é perfeito. Pastor Foi um grande pastor. Ele ainda não era pastor, nem presbítero e já escreveu um livro sobre o Ser Presbítero, um belo livro. David B. Calhoun dia que é um livro útil ainda hoje. Crisóstomo escreve que um pastor deve ter grande discrição e zelo. Deve ser uma pessoa discreta e extremamente zelosa. Ele também disse: “O ofício do pastor é duplo: Povo e Pregação”. Deve dar ênfase idêntica a essas duas coisas, cuidar das pessoas e cuidar da pregação.
Interpretação Alegórica – Escola de Alexandria
Orígenes dizia que a interpretação da Bíblia era em três níveis, que corresponde as três partes do ser humano. Tirou tudo isso da filosofia grega. 1) Carne – a interpretação literal e óbvia corresponde à carne ou ao corpo humano, que é visível e evidente a todos que o vêem. Esse tipo de interpretação é para os indoutos. 2) Alma – aqueles que já fizeram algum progresso na vida cristã começam a discernir sentidos mais além do óbvio. 3) Espírito – a interpretação alegórica, própria dos que são espirituais. Alguns exemplos de interpretação alegórica Rebeca vem tirar água do poço e encontra os servos de Abraão (Gn 24.15-17) - significa que diariamente devemos vir aos poços da Escritura para ali nos encontrarmos com Cristo. Faraó mandando matar os meninos e preservando as meninas hebréias (Ex 1.15-16) - os meninos significam o espírito intelectual e sentidos racionais enquanto que as meninas significam paixões carnais. O sentido verdadeiro (alegórico) da passagem sobre o divórcio (Mt 19.9) é a separação da alma do seu anjo da guarda. Vejam que é desastroso esse tipo de interpretação e são encontrados materiais ruins, do próprio Agostinho, nessa linha. É importante chamar a atenção sobre isso, porque mostra que não basta ter a Bíblia, ela precisa ser interpretada e, dependendo por onde seguir, o caminho que tomar, vai errar tudo, com a Bíblia na mão. Por isso é que a gente precisa ser auxiliado pelos nossos irmãos, pela Igreja, para não errar tudo.