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HISTÓRIA MEDIEVAL II

CURSOS DE GRADUAÇÃO – EAD


História Medieval II – Profa. Ms. Cláudia Regina Bovo e Profa. Dra. Renata Cardoso
Belleboni Rodrigues

Olá! Meu nome é Cláudia Regina Bovo. Sou graduada e mestre


em História pela FHDSS/Unesp-Franca. Atualmente, estou
vinculada ao doutorado em História pela Unicamp. Desde a
graduação, dedico-me ao estudo da Idade Média, trabalhando
com diversos tipos de documentação e privilegiando uma
abordagem político-cultural do período. Sou membro
pesquisador do LEME (Laboratório de Estudos Medievais USP/
Unicamp) e atuo como professora no ensino superior, tanto
em cursos presenciais quanto em cursos a distância.
e-mail: claudiabovo@hotmail.com

Olá! Sou Renata Cardoso Belleboni Rodrigues, graduada


em História (Licenciatura e Bacharelado) pela Unesp-Franca
(1993-1996), mestre em História Social do Trabalho pelo IFCH
– Unicamp (1998-2001) e doutora em História Cultural pelo
IFCH – Unicamp (2001-2005).
e-mail: re.medusa@gmail.com

Fazemos parte do Claretiano - Rede de Educação


Cláudia Regina Bovo
Renata Cardoso Belleboni Rodrigues

HISTÓRIA MEDIEVAL II

Batatais
Claretiano
2013
© Ação Educacional Claretiana, 2010 – Batatais (SP)
Versão: dez./2013

909.01 B781h

Bovo, Cláudia Regina


História medieval II / Cláudia Regina Bovo, Renata Cardoso Belleboni
Rodrigues – Batatais, SP : Claretiano, 2013.
218 p.

ISBN: 978-85-8377-054-1

1. Feudalismo – uma abordagem historiográfica. 2. Construção da


cristandade: a reforma da Igreja. 3. Expansão da cristandade: as cruzadas.
4. Renovação urbana e comercial. 5. “Renascimento do século 12”. 6. Fim
da Idade Média: crise ou transformação? I. Rodrigues, Renata Cardoso
Belleboni. II. História medieval II.

CDD 909.01

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Camila Maria Nardi Matos Felipe Aleixo
Carolina de Andrade Baviera Filipi Andrade de Deus Silveira
Cátia Aparecida Ribeiro Paulo Roberto F. M. Sposati Ortiz
Dandara Louise Vieira Matavelli Rodrigo Ferreira Daverni
Elaine Aparecida de Lima Moraes Sônia Galindo Melo
Josiane Marchiori Martins
Talita Cristina Bartolomeu
Lidiane Maria Magalini
Vanessa Vergani Machado
Luciana A. Mani Adami
Luciana dos Santos Sançana de Melo
Luis Henrique de Souza Projeto gráfico, diagramação e capa
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Rita Cristina Bartolomeu Joice Cristina Micai
Rosemeire Cristina Astolphi Buzzelli Lúcia Maria de Sousa Ferrão
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SUMÁRIO

CADERNO DE REFERÊNCIA DE CONTEÚDO


1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 9
2 ORIENTAÇÕES PARA ESTUDO........................................................................... 11
3 E-REFERÊNCIAS ................................................................................................. 34

Unidade 1 – FEUDALISMO:
UMA ABORDAGEM HISTORIOGRÁFICA
1 OBJETIVOS......................................................................................................... 37
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 37
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 37
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 39
5 CONTROVÉRSIAS EM TORNO DO “FEUDALISMO”.......................................... 40
6 ABORDAGENS JURÍDICO-POLÍTICA E ECONÔMICA SOBRE
O “FEUDALISMO”.............................................................................................. 42
7 DA SOCIEDADE FEUDAL AO SISTEMA FEUDAL............................................... 47
8 QUESTÕES AVALIATIVAS................................................................................... 58
9 CONSIDERAÇÕES............................................................................................... 59
10 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 59

Unidade 2 – CONSTRUÇÃO DA CRISTANDADE OCIDENTAL:


REFORMA DA IGREJA
1 OBJETIVOS......................................................................................................... 61
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 61
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 62
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 63
5 CLUNY E O MOVIMENTO DE REFORMA MONÁSTICA.................................... 64
6 MOVIMENTOS DA PAZ DE DEUS ..................................................................... 67
7 A REFORMA GREGORIANA E A CRESCENTE SACRALIZAÇÃO DA IGREJA...... 71
8 MOVIMENTOS CONTRÁRIOS À ORTODOXIA PAPAL....................................... 77
9 TEXTO COMPLEMENTAR................................................................................... 83
10 Q UESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 86
11 C ONSIDERAÇÕES............................................................................................... 87
12 E-REFERÊNCIAS ................................................................................................. 87
13 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 88

Unidade 3 – EXPANSÃO DA CRISTANDADE OCIDENTAL:


AS CRUZADAS
1 OBJETIVOS......................................................................................................... 89
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 89
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 90
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 91
5 ABORDAGENS HISTORIOGRÁFICAS SOBRE AS CRUZADAS............................ 92
6 A IDEOLOGIA DA GUERRA SANTA E A ORIGEM DAS CRUZADAS .................. 95
7 A PRIMEIRA CRUZADA E SUAS CONQUISTAS ................................................. 99
8 TEXTO COMPLEMENTAR................................................................................... 104
9 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 107
10 C ONSIDERAÇÕES .............................................................................................. 108
11 E-REFERÊNCIAS ................................................................................................. 108
12 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 109

Unidade 4 – RENOVAÇÃO URBANA


E COMERCIAL
1 OBJETIVOS......................................................................................................... 111
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 111
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 112
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 113
5 ABORDAGENS HISTORIOGRÁFICAS SOBRE O DESENVOLVIMENTO
URBANO E COMERCIAL DOS SÉCULOS FEUDAIS............................................ 114
6 ORIGENS E FORMAS DAS CIDADES MEDIEVAIS ............................................. 118
7 COMUNA: MOVIMENTO DE EMANCIPAÇÃO URBANA................................... 121
8 TEXTO COMPLEMENTAR................................................................................... 124
9 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 128
10 C ONSIDERAÇÕES .............................................................................................. 129
11 E-REFERÊNCIAS................................................................................................. 129
12 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 129

Unidade 5 – “RENASCIMENTO” CULTURAL DO SÉCULO 12


1 OBJETIVOS......................................................................................................... 131
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 131
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 132
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 134
5 PERSPECTIVAS HISTORIOGRÁFICAS PARA O “RENASCIMENTO
DO SÉCULO 12”.................................................................................................. 135
6 O MOVIMENTO CULTURAL DO SÉCULO 12..................................................... 139
7 CARACTERÍSTICAS DA PRODUÇÃO EM LÍNGUA LATINA
NO SÉCULO 12................................................................................................... 142
8 CARACTERÍSTICAS DA PRODUÇÃO EM LÍNGUA VERNÁCULA
NO SÉCULO 12 .................................................................................................. 147
9 ARQUITETURA ROMÂNICA E GÓTICA............................................................. 151
10 T EXTO COMPLEMENTAR................................................................................... 157
11 Q UESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 177
12 C ONSIDERAÇÕES............................................................................................... 178
13 E-REFERÊNCIAS................................................................................................. 178
14 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 179

Unidade 6 – FIM DA IDADE MÉDIA:


CRISE OU TRANSFORMAÇÃO?
1 OBJETIVOS......................................................................................................... 181
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 181
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 181
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 183
5 CRISE NO SÉCULO 14: A FOME......................................................................... 184
6 CRISE DO SÉCULO 14: A PESTE......................................................................... 187
7 GUERRA DOS CEM ANOS (1337-1453)............................................................. 192
8 RECONSTRUÇÃO POLÍTICA DA EUROPA NOS SÉCULOS 14 E 15.................... 197
9 TEXTO COMPLEMENTAR................................................................................... 200
10 Q UESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 215
11 C ONSIDERAÇÕES............................................................................................... 215
12 E- REFERÊNCIAS................................................................................................. 217
13 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 217
Claretiano - Centro Universitário
EAD
Caderno de
Referência de
Conteúdo

CRC

Ementa––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Feudalismo: uma abordagem historiográfica. Construção da cristandade ociden-
tal: a reforma da Igreja. Expansão da cristandade ocidental: as cruzadas. Reno-
vação urbana e comercial. "Renascimento do século 12". Fim da Idade Média:
crise ou transformação?
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

1. INTRODUÇÃO
Seja bem-vindo ao estudo de História Medieval II!
No Caderno de Referência de Conteúdo História Medieval I,
você acompanhou os principais temas referentes ao período his-
tórico que ficou conhecido como Alta Idade Média. Agora, estu-
daremos os temas e as problemáticas pertinentes ao período da
chamada Baixa Idade Média.
Quando falamos em Baixa Idade Média, estamos nos reme-
tendo ao período histórico que se estende do século 11 ao século
15, momento no qual as estruturas antigas perdem a força diante
10 © História Medieval II

da centralização do poder eclesiástico e da multiplicação dos po-


deres seculares.
Apesar de autores como Jacques Le Goff e Jêrome Baschet,
entre outros, entenderem que entre a Alta e a Baixa Idade Média
há um período intermediário, chamado por eles de Idade Média
Central (séculos 9 a 13), compreendemos que o pensamento e as
interpretações de mundo da Baixa Idade Média têm sua origem
nesse “período intermediário”, tornando-se ineficiente o estudo
isolado da chamada Idade Média Central.
Por isso, optamos por concentrar esses dois períodos em um
só, sob a alcunha de Baixa Idade Média.
Para que você possa entender melhor as mudanças ocorri-
das nesse período, priorizamos a formação de um quadro teórico
com base no sistema feudal e na centralidade exercida pela Igreja
dentro dele.
Nosso estudo dos temas pertinentes à segunda fase da Ida-
de Média será dividido em seis unidades. Na primeira unidade,
você conhecerá as discussões em torno do feudalismo e das teses
historiográficas que tentaram explicar sua emergência e funciona-
mento.
Na Unidade 2, dedicaremos especial atenção ao movimen-
to de reforma impulsionado pela Igreja Romana. Esse movimento,
com base na incorporação de referências reformadoras anterio-
res como o movimento monástico de Cluny e os concílios de paz,
tornou-se hegemônico no Ocidente.
Na terceira unidade, você acompanhará um dos elementos
mais debatidos da temática medieval: as cruzadas. Conhecerá o
processo de terceirização da guerra e a tentativa da Igreja Cristã de
se inserir nesse ambiente, disciplinando e propondo outra tônica
para os conflitos.
Na Unidade 4, serão apresentadas as transformações comer-
ciais e urbanas ocorridas na sociedade feudal. Passando à Unidade
© Caderno de Referência de Conteúdo 11

5, abordaremos o tema do “Renascimento” cultural. Estudaremos,


ainda, o processo de desenvolvimento do Humanismo medieval e
suas contribuições para a literatura latina e vernácula, a arquitetu-
ra e a filosofia.
Finalmente, na Unidade 6, teremos como tema a "crise" do
século 14 e os debates em torno do fim do período que se con-
vencionou chamar de Idade Média. Com isso, encerraremos por
ora nosso estudo desse período cercado de tanta controvérsia e,
muitas vezes, de tanto preconceito.
No entanto, com base em seu conhecimento prévio, bem
como apoiando-se no que vimos durante o curso e em nossas in-
dicações bibliográficas, você pode e deve expandir seus conheci-
mentos sobre esse tema. Lembre-se de que o aprendizado é um
processo contínuo e infindável que deve acompanhar toda a sua
vida.
Bons estudos!

2. ORIENTAÇÕES PARA ESTUDO

Abordagem Geral
Neste tópico, apresentamos uma visão geral do que será es-
tudado neste Caderno de Referência de Conteúdo. Aqui, você en-
trará em contato com os assuntos principais deste conteúdo de
forma breve e geral e terá a oportunidade de aprofundar essas
questões no estudo de cada unidade. Desse modo, essa Aborda-
gem Geral visa fornecer-lhe o conhecimento básico necessário a
partir do qual você possa construir um referencial teórico com
base sólida – científica e cultural – para que, no futuro exercício
de sua profissão, você a exerça com competência cognitiva, éti-
ca e responsabilidade social. Vamos começar nossa aventura pela
apresentação das ideias e dos princípios básicos que fundamen-
tam este Caderno de Referência de Conteúdo.

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12 © História Medieval II

Com este roteiro, será possível que você inicie seus estudos
tendo um panorama geral do que será discutido no decorrer de
seus estudos. Apresentaremos a seguir um panorama do período
que os historiadores denominaram Baixa Idade Média, compreen-
dido entre os séculos 11 e 15.
Este roteiro contribuirá para a construção de seu conheci-
mento, apresentando as principais temáticas que serão estudadas
durante o curso. Contudo, seu objetivo é, sobretudo, enfatizar que
não devemos assimilar tais conteúdos sem antes analisá-los, le-
vantar questionamentos, criar hipóteses e fazer um exercício de
reflexão.
Propomos que você tenha sempre duas coisas em mente:
em primeiro lugar, tudo o que lhe será apresentado é resultado de
uma construção historiográfica. Portanto, são interpretações que
revelam a linha teórica e metodológica dos estudiosos.
Em segundo, é necessário verificar sempre a argumentação
dos autores estudados, justamente porque estaremos diante de
interpretações. Desse modo, a construção de seu conhecimento
será consequência de um esforço crítico e não apenas da apropria-
ção de conceitos prontos.
Antes de iniciarmos as considerações a respeito de alguns
dos temas mais discutidos pelos estudiosos acerca do período me-
dieval, pedimos sua atenção para as imagens que apresentaremos
a seguir.
A Figura 1 é a representação de uma típica cena medieval.
São nobres passeando em torno do castelo. Essa imagem é uma
miniatura medieval pertencente ao Livro de Horas do Duque de
Berry, que se encontra hoje em Paris, na Biblioteca Nacional.
© Caderno de Referência de Conteúdo 13

Figura 1 Livro de Horas: Agosto.

A Figura 2 retrata a “Peste Negra”, que assolou parte da Eu-


ropa no século 15. Estima-se que essa peste tenha atingido aproxi-
madamente 70 milhões de pessoas. Esta representação se encon-
tra na Bíblia de Toggenburg, de 1411.

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14 © História Medieval II

Figura 2 Bíblia de Toggenburg: Peste Negra.

Já a Figura 3 faz referência às cruzadas. Aqui vemos Pedro,


o Eremita, mostrando o caminho de Jerusalém aos cruzados, em
uma iluminura de 1270.

Figura 3 Pedro, o Eremita.

A escolha dessas três representações não foi fortuita. Ela se


baseou no resultado de uma pesquisa informal, que apresentou a
alunos de Ensino Médio a seguinte pergunta: "Quando falamos em
Idade Média, o que vem à mente de vocês?" A resposta não sur-
preendeu. A grande maioria respondeu bem rapidamente: “feu-
dalismo”.
© Caderno de Referência de Conteúdo 15

Dentre outros poucos temas citados, a Peste Negra e as cru-


zadas também foram lembradas. Percebemos, então, que em mui-
tas escolas a apresentação dos conteúdos enfatiza essas temáticas.
No entanto, o tema “Idade Média”, ou, em nosso caso específico,
a “Baixa Idade Média”, não compreende apenas esses conteúdos.
Temos muito mais a aprender e a desmistificar.
Um grande desafio é contrariar o senso comum, que divulga
conhecimentos relativos a esse período como verdades absolutas
– quando estes não o são.
Vamos observar um exemplo do que estamos dizendo: é
muito comum ouvir de alunos e do público em geral que a Igreja
foi a grande “vilã” da Idade Média. Mas a função dessa institui-
ção foi apenas caçar as bruxas e os hereges? Queimar todos na
fogueira? Promover guerras em nome de Cristo? Desse modo, não
estaríamos divulgando uma falsa ideia do papel da Igreja nesse
período da História?
Outro problema facilmente encontrado no meio escolar é a
utilização do termo “feudalismo” como sinônimo de Idade Média.
Quem assim ministra o conhecimento não leva em conta que a
Idade Média é um período muito maior do que aquele em que
podemos detectar o que foi denominado de feudalismo.
Ainda em relação à utilização de conceitos, o próprio feu-
dalismo é abordado de diferentes formas por medievalistas e au-
tores de livros didáticos. Podemos encontrar os seguintes sinô-
nimos: “sociedade feudal”, “sistema feudal”, “regime feudal” ou
mesmo “feudalidade”. Qual seria a denominação correta? Todos
eles abrangem a totalidade dos elementos que configuram o feu-
dalismo?
Como você pode observar, em apenas algumas linhas levan-
tamos uma série de problemas que atingem a mediação do conhe-
cimento histórico relativo ao período da Baixa Idade Média. Tais
problemas exigem nossa reflexão.

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16 © História Medieval II

Para tanto, voltaremos nossos olhares para o debate histo-


riográfico e documental dos variados fatos que esse tempo histó-
rico compreende. Assim, estaremos nos munindo contra a simples
divulgação do senso comum e de interpretações que negligenciam
as diferentes fontes a que temos acesso.
Feita essa reflexão, podemos dar início às considerações
acerca de algumas temáticas relativas à Baixa Idade Média que
merecem destaque. Abordemos primeiramente o conceito de feu-
dalismo. Ganshof (apud BONNASSIE, 1985, p. 10) assim o definiu:
[...] conjunto de instituições que criam e regulam determinadas
obrigações de obediência e de serviço da parte de um homem livre,
denominado senhor e obrigações de proteção e sustento da parte
do senhor para com o vassalo; a obrigação de sustento traduz-se
geralmente na concessão pelo senhor ao vassalo de um bem cha-
mado feudo.

A conceituação feita por esse autor encaixa-se na tradição


jurídico-política, ou seja, aborda apenas a relação de obrigações
entre senhores e vassalos. Será que essa definição é adequada e
abrange toda a complexidade e todas as particularidades do fun-
cionamento do feudalismo? Não teriam ficado de fora a dinâmica
das relações sociais e até mesmo a dinâmica econômica desse sis-
tema?
Teríamos que conceber o feudalismo em sua integralidade,
encarando-o como fenômeno estruturante de um modo de vida
que integrava diversos campos, como o social, o político, o econô-
mico e o cultural.
Dois autores que contribuíram para essa visão mais abran-
gente sobre o feudalismo foram os historiadores Marc Bloch e
Alain Guerreau. O primeiro, em sua obra A Sociedade Feudal, ana-
lisou e explicou a organização da estrutura social com suas diver-
sas ligações políticas, econômicas e culturais.
Já Guerreau concebia o feudalismo como sistema. Isso que
lhe permitiu adentrar o “emaranhado organizado” da sociedade
dos séculos 11 a 13, abordando inclusive suas contradições inter-
nas e as pressões vindas do exterior.
© Caderno de Referência de Conteúdo 17

Para esse autor (1980, p. 217), o sistema feudal estava dis-


posto em quatro eixos relacionados entre si. São eles: a relação de
dominium, o parentesco artificial, o ecossistema feudal e a Igreja
– eixo articulador dos três anteriores. A partir desse quadro, ele
afirma:
[...] é ridículo e absurdo imaginar as relações feudais como a sim-
ples relação entre honestos camponeses vergando-se sob o jugo e
senhores cúpidos e ociosos que extraíam a renda a golpes de coa-
ção extra-econômica. Que tal mito tenha um forte valor ideológico,
não se discordará; mas há que desembaraçar-se dele claramente,
se se pretende fazer trabalho científico.

A Igreja, que Guerreau definiu como o elemento articulador,


teria tido como um de seus papéis primordiais a determinação dos
referenciais simbólicos e materiais do sistema feudal. O autor des-
taca o controle exercido por essa instituição sobre os vários tem-
pos: o tempo do ano (organizando o calendário), o tempo do tra-
balho (regido pelo emprego dos sinos), o tempo das festividades.
Guerreau, também, aponta o controle das dioceses e pa-
róquias sobre os laços de parentesco, impondo o modelo de ma-
trimônio e definindo o incesto. Analisa a autoridade que a Igreja
exercia, por exemplo, sobre o sistema de ensino e sobre as cren-
ças, que lhe permitia manipular o sistema feudal a seu favor.
À primeira vista, esses apontamentos podem dar a entender
que a Igreja mereceu a fama de “vilã” da Idade Média. Porém, pen-
semos um pouco a respeito: ela agiu sozinha? O poder político não
estava ao seu lado? Esse poder foi conquistado rapidamente e sem
nenhuma contestação? A que contexto histórico nos referimos?
“Vilã” ou “mocinha”, perseguidora ou divulgadora da doutri-
na cristã... seja qual for o adjetivo utilizado para nos referirmos à
Igreja, ele nunca abrangerá toda a complexidade dessa instituição.
Tomemos como pontos de partida a possibilidade de se en-
tender o feudalismo de diferentes formas e o fato de que a Igreja
influía na organização da sociedade.

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18 © História Medieval II

É possível continuar a divulgar a ideia de que a sociedade


feudal era estática, simplesmente marcada pela organização esta-
mental e submetida a um sistema de exploração do trabalho cam-
pesino? Essa organização "estamental" (ou seja, em "estamentos"
ou camadas sociais estáticas) imobilizava todas as relações sociais?
Reflita: não haveria algum dinamismo nas relações sociais,
nas relações de produção e mesmo na própria organização institu-
cional eclesiástica?
Mas como ocorreu esse desenvolvimento da instituição
eclesiástica? Quais teriam sido as múltiplas formas que ela adqui-
riu durante o período feudal e que lhe permitiram exercer tanta
autoridade e poder no decorrer da Baixa Idade Média?
Para começarmos a compreender esse processo histórico,
outra importante temática deve ser abordada: o movimento de
Reforma, que partiu dos ambientes monásticos, estendeu-se aos
ambientes episcopais, até reconhecer em Roma (a Santa Sé) seu
domínio primordial.
Dois autores podem nos esclarecer melhor essa questão: Mi-
chel Balard e Elisabeth Mornet. Ambos apontam as tendências re-
formadoras da Abadia de Cluny e da Ordem Cluniacense, pautadas
nas prescrições de São Bento, como ponto inicial do processo de
reforma e fortalecimento da Igreja Romana no Ocidente medieval.
Essa ordem privilegiava a prece e a celebração do ofício divi-
no e vigiava de perto todas as práticas e costumes, como o recolhi-
mento, o trabalho intelectual e os trabalhos manuais dos monges.
Foi entre 954 e 1109 que Cluny se transformou em uma potência
espiritual e temporal, passando a ter grande influência sobre a
aristocracia laica e sobre os poderes régios. Tal influência inspirou,
direta ou indiretamente, os movimentos de outros monastérios e
da própria Sé Romana rumo à liberdade da Igreja (ou libertas ec-
clesia).
© Caderno de Referência de Conteúdo 19

A reforma a que nos referimos também ficou conhecida como


Reforma Gregoriana. Além dos elementos citados anteriormente,
nesse período vemos a forte afirmação do poder papal frente à in-
fluência e ao controle do imperador germânico. O estudioso Giles
Constable, em suas análises sobre a Reforma, buscou reconhecer
as singularidades do período, dividindo-o em dois momentos:
• 1º momento – séculos 11 e 12: os objetivos eram o retor-
no às origens da prática espiritual dos tempos de Cristo e
seus apóstolos (voltar os olhos para o passado) e a restau-
ração da hierarquia eclesiástica, suprimindo a interven-
ção laica nos assuntos da Igreja.
• 2º momento – do século 12 à primeira metade do sécu-
lo 13: momento em que a liberdade administrativa já era
desfrutada, permitindo que se voltasse o olhar para o fu-
turo, em defesa da centralidade pontifícia. Na condição
de representante terrestre de Cristo, o papa se constitui-
ria na fonte de poder da Igreja, disciplinando não só o am-
biente clerical, mas a toda sociedade.
Será que essa ortodoxia papal não sofreu resistência? Po-
deríamos afirmar que havia um poder ilimitado sendo lançado na
sociedade?
Mais uma vez nossa resposta é não. Resistências e contesta-
ções também marcaram essa época. Houve uma proliferação de
movimentos laicos dispostos a uma vida em comunidade e a uma
pobreza voluntária voltada para um espiritualismo exacerbado.
Tais movimentos tinham a pretensão de assumir funções restritas
ao clero.
Essa situação gerou desconforto para a Igreja. Tratava-se de
uma nova batalha a ser travada e vencida: a ortodoxia versus a he-
resia. Para ilustrar nossa explicação, observe as Figura 4 e 5:

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20 © História Medieval II

Figura 4 A Trindade.

Figura 5 Hereges sendo imolados.

• Ortodoxia Doutrinal: conjunto de verdades recebidas que


formam um “todo” indissociável, a fé, que tem o meio
eclesiástico como seu propagador.

• Heresia: tudo aquilo que se desliga de um elemento da fé,


dissolvendo o todo. Era representada, por exemplo, pelos
cátaros e pelos valdenses (respectivamente, seguidores
das seitas heréticas albigensianismo e valdismo).
A reação da Igreja contra os grupos heréticos tomou diver-
sas direções: combate pela palavra, excomunhão, morte pelo fogo,
confisco de bens e mesmo as cruzadas. No entanto, uma frase
muito utilizada atualmente explica outra postura da Igreja: "Quan-
do não se pode com o inimigo, una-se a ele." Foi assim que as
© Caderno de Referência de Conteúdo 21

ordens mendicantes foram reconhecidas no século 13. Entre elas,


destacam-se as ordens Dominicana e Franciscana.
As informações apresentadas até aqui nos permitem afirmar
que, durante a Baixa Idade Média, os elementos constituintes da
sociedade, fossem eles políticos, religiosos ou mesmo econômi-
cos, estavam intimamente ligados. Desse modo, é impossível diri-
girmos nossos olhares para essa época pensando em apenas um
desses setores.
Além disso, não basta contemplarmos todo o contexto his-
tórico. É preciso dirigir as perguntas mais adequadamente, inter-
pretar as fontes de modo diverso e abrir nosso campo crítico para
variadas reflexões.
Outras temáticas poderiam ser abordadas aqui, como o de-
senvolvimento urbano e a expansão do comércio. Novas proble-
matizações poderiam ser propostas. Mas cremos que já há um
bom material para reflexão.
Discutiremos agora um pouco sobre as cruzadas, a arte e a
educação na Baixa Idade Média. Lembremo-nos de que a ideia de
que esse período é marcado pela estagnação total é, no mínimo,
falsa.
Para além de todas as interferências, conflitos e alianças
ocorridos durante o movimento de formação da cristandade Oci-
dental, ainda podemos citar uma nova empreitada da Igreja: sua
intervenção nos assuntos referentes à guerra travada em busca
dos lugares tidos como santos pelo Cristianismo.
Estamos falando das cruzadas. Esse tema, também muito
explorado pela historiografia e pelos livros didáticos, recebeu di-
ferentes interpretações.
Alguns estudiosos defendem a tese de que o termo “cruza-
da” teria surgido apenas depois de 1250. Nos séculos 11 e 12, es-
ses eventos teriam sido designados como “viagens a Jerusalém",
peregrinações ou expedições. Nesse processo, o papel fundamen-
tal da Igreja era o de assegurar a Paz de Deus.

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22 © História Medieval II

A noção de peregrinação estava fortemente relacionada à


ideia de sofrimento físico, à busca pelo estado de graça em terri-
tório sagrado. Portanto, tratava-se de uma forma de penitência e
exercício individual de purificação. Vejamos como ocorreu a con-
vocação daquela que seria a primeira cruzada, decidida pelo Con-
cílio de Clermont, em 1095:
Considerando as exigências do tempo presente, eu, Urbano, tendo,
pela misericórdia de Deus a tiara pontifical, pontífice de toda a ter-
ra, venho até vós, servidores de Deus, como mensageiro para des-
vendar-vos o mandato divino [...] é urgente levar com diligência aos
nossos irmãos do Oriente a ajuda prometida e tão necessária no
momento presente. Os turcos e os árabes atacaram e avançaram...
e penetram mais a cada dia nos países dos cristãos; eles os vence-
ram sete vezes em batalha, matando e fazendo grande número de
cativos, destruindo as igrejas e devastando o reino... Por isso eu vos
apregôo e exorto, tanto aos pobres como aos ricos – e não eu, mas
o Senhor vos apregoa e exorta – que como arautos de Cristo vos
apresseis a expulsar esta vil ralé das regiões habitadas por nossos
irmãos, levando uma ajuda oportuna aos adoradores de Cristo. Eu
falo aos que estão aqui presentes e o proclamo aos ausentes, mas
é Cristo quem convoca [...] (CHARTRES apud PEDRERO-SÁNCHEZ,
2000, p. 83).

Note como as palavras são usadas em nome de Deus. Ele é


quem convoca pela boca de seu maior representante na Terra. A
cruzada é justificada como meio de salvação dos territórios cris-
tãos e dos próprios cristãos. Portanto, nossa atenção deve se vol-
tar para o valor da palavra (divina ou não) naquele contexto.
Há inúmeras abordagens possíveis. Poderíamos propor a
análise da visão dos turcos e árabes sobre aqueles conflitos. Ou,
ainda, de modo mais amplo, procurar entender as relações sociais
ou os conflitos gerados pelo encontro de culturas. Uma análise
comparativa contribuiria muito para a construção de nosso conhe-
cimento.
Mas retornemos à convocação. Em 1096, com ampla reper-
cussão e sob o comando de Pedro, o Eremita, um grande número
de homens e mulheres (cerca de 150.000) rumou para a Europa
central, na cruzada que ficou conhecida como Cruzada Popular. No
© Caderno de Referência de Conteúdo 23

entanto, sem uma estrutura militar adequada e sem estarem habi-


tuados à guerra, esses peregrinos foram massacrados pelo exérci-
to turco no final de setembro do mesmo ano.
Mas o que realmente era considerado como uma cruzada?
Alguns estudiosos defendem que havia quatro elementos defini-
dores de uma cruzada:
1) Deveria ser convocada ou legitimada pelo papado.
2) Deveria ter o objetivo de liberar os lugares considerados
santos pelo Cristianismo em Jerusalém.
3) Deveria oferecer a indulgência como contrapartida à
participação de seus convocados.
4) Deveria ostentar a cruz como seu símbolo maior.
As cruzadas resultaram na dominação dos cristãos sobre o
Mediterrâneo, favorecendo as trocas entre o Oriente e o Ocidente;
permitiram que a Igreja latina se estabelecesse em terreno orien-
tal; fizeram florescer o movimento de traduções dos textos árabes
de medicina, de filosofia e as obras de Aristóteles; valorizaram os
servidores das armas.
Com todas essas consequências, as cruzadas transforma-
ram-se em um negócio político, que gerou o aumento do poder
e ganhos materiais para algumas famílias aristocráticas e para os
eclesiásticos mais próximos.
Como podemos verificar, as cruzadas vão muito além do
que é divulgado pelo senso comum. Ou seja, essas peregrinações
não tiveram apenas a carnificina como decorrência; não ocorreu
uma utilização fortuita da figura de Cristo. Em contrapartida, não
podemos negar as mortes e as atrocidades. E como poderemos
entender esse contexto tão rico em pormenores e tão complexo?
Mais uma vez, ponderando sobre as fontes e buscando uma aná-
lise crítica.
Passemos, então, a outra temática. O movimento cultural do
século 12, que teve duas características determinantes: a emer-
gência de um sistema ideológico próprio da aristocracia laica e o
desenvolvimento de uma nova visão de História.

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24 © História Medieval II

Esse novo sistema ideológico laico pode ser sentido, essen-


cialmente, no meio cavaleiresco. Ou seja, os integrantes da cava-
laria eram privilegiados em relação a outros grupos sociais. Essa
superioridade cavaleiresca foi divulgada pela produção literária
em língua vulgar.
O segundo elemento desse movimento cultural foi o desen-
volvimento de uma nova visão de História. Já podemos vê-lo esbo-
çado no momento em que se inicia uma tomada de consciência da
ideia de progresso. A História humana já não seria pensada como
reflexo da decadência; seria encarada como uma conquista em di-
reção à perfeição.
Houve uma retomada das referências da gramática e da lógi-
ca antiga, uma reestruturação dos ambientes de ensino, do direito
canônico e da organização religiosa, além de incentivos à arte e à
arquitetura.
Se analisarmos a reforma nos ambientes de ensino, o que
veremos é uma mudança em dois focos:
• o ensino, antes destinado aos monges ou à aristocracia
clerical, passa a contemplar também a aristocracia laica;
• o local de instalação das escolas não estaria mais restrito
aos monastérios. Elas passariam a ser construídas nas ci-
dades, com maior independência intelectual (apesar da
tutela episcopal).
Outras inovações referentes à educação podem ser citadas:
o uso mais contínuo de escolas privadas abertas por mestres inde-
pendentes, de preceptoria individual nas casas aristocráticas e de
escolas capitulares ligadas a cônegos regulares.
Em outros termos, passamos a ver a ampliação do acesso da
aristocracia laica a uma determinada educação sem a necessidade
de que fossem criados vínculos muito estreitos com o meio ecle-
siástico. Porém, até aquele momento, ainda era a Igreja a grande
detentora do saber. Portanto, algumas questões permanecem e
exigem nossa análise:
© Caderno de Referência de Conteúdo 25

a) Com um número maior de leigos sendo instruídos, ten-


do acesso a diferentes obras e autores, como ficaria a
manutenção do poder?
b) Perdendo parte do poder de instrução, a Igreja teve seu
poder de dominação reduzido?
c) Com a instrução, não teria renascido o desejo de se co-
nhecer mais, para além do que se permitia saber nas es-
colas dos mosteiros ou naquelas ligadas à Igreja?
Em relação às mudanças no cenário cultural, ainda veremos
um pouco dos gêneros literários divulgados no século 12, dentre
os quais destacamos:
• Romances
• Canções de gesta
• Lais
Os romances eram inspirados em lendas greco-romanas,
mas com um apelo moral próprio do século 12. Dentre eles, desta-
camos: Roman de Thèbes (~1150-1180), Roman de Enéas (~1160),
ambos de autoria anônima, e Roman de Troie (~1154-1160), de
Benoît de Sainte-Maure.
As canções de gesta (ou canções de "feitos") apropriavam-
-se da matéria épica dos temas de histórias lendárias da Alta Idade
Média, como o ciclo de Guilherme de Orange, o ciclo de Carlos
Magno e o ciclo que desenvolve temas de revolta de um lorde con-
tra seu senhor.
Os lais (partes de músicas ou poemas cantados, com cur-
ta duração), cujos temas eram as lendas, tinham suas narrativas
pautadas nas aventuras de um herói colocado em contato com o
sobrenatural ou com uma prova de coragem excepcional.
Como exemplo concreto da produção cultural daquele sé-
culo, citamos os romances arturianos. Vejamos, nas Figuras 6 e7,
duas apropriações artísticas desse personagem tão famoso:

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26 © História Medieval II

Figura 6 Artur, Guinevere. Figura 7 Artur.

Observe que estamos diante de apropriações da figura do


rei Artur e não de imagens de iluminuras, quadros, tapeçarias ou
outras fontes reconhecidamente históricas. O que vemos é a per-
manência de elementos da lenda do século 12 mesclados a ele-
mentos do imaginário contemporâneo.
Também devemos atentar para o fato de que um atributo
ficou registrado e perpetuado: a espada. Ela é símbolo da autori-
dade e da supremacia do poder, símbolo da proteção, da guarda,
da defesa e do ataque, da luta e da vitória sobre os inimigos. Sim-
boliza a força que pode atuar tanto no plano físico quanto no plano
astral. Seja qual for o contexto em que o rei Artur estiver inserido
(ao lado de uma linda donzela, com trajes reais ou como um garo-
to pobre curvado perante a arma), o atributo que o faz conhecido
desde o período medieval está presente.
Eis uma forma de aprofundar nossos conhecimentos: não só
conhecer os gêneros literários, mas entender as simbologias em
torno dos personagens, as permanências pictóricas, as apropria-
ções das imagens... Enfim, é preciso ter em mente que o estudo
da História nos permite a interdisciplinaridade... quanto mais re-
lacionamos, mais aprendemos... quanto mais aprendemos, mais
cultura geral preservamos.
Há ainda um último assunto a ser abordado. O que as fontes
nos revelam sobre os séculos 14 e 15? Quase sempre, revelam um
período “depressivo” e de diminuição da produtividade. Os histo-
riadores destacam três fatores principais como justificativas para
tal cenário: a fome, a peste e a guerra.
© Caderno de Referência de Conteúdo 27

Sobre a Grande Peste, o historiador George Duby (1992, p.


256) afirma:
Se tivéssemos de guardar na memória apenas uma data durante o
longo período que examino, seria o ano de 1348. É neste ano que
a Peste Negra invade a França, e dali para a frente nada mais seria
como antes. É este o acontecimento decisivo. Ele assinala na reali-
dade o fim de uma época da história, aquela que por simples hábito
continuamos a chamar de Idade Média.

Note que o autor estabelece a peste como um marco... A


História da França se dividiria em “antes e depois” desse flagelo.
O autor está indiretamente nos propondo que examinemos varia-
dos aspectos da sociedade com base em tal acontecimento. O que
ocorreu no campo da Economia? Qual era o cenário social e que
forma tomou? Como a Igreja atuava e como passou a atuar frente
a um “castigo divino”? O que a fontes da época têm a nos dizer?
Há uma consequência da peste no campo artístico-literário
interessante de ser observada: a manifestação de um tipo de arte
chamada de "dança macabra". Nela, homens e mulheres de todas
as condições sociais eram arrastados por esqueletos em uma dan-
ça infernal. Com isso, os humanos eram lembrados de sua condi-
ção mortal. Vejamos dois exemplos de representações figuradas
da peste, observando as Figuras 8 e 9:

Figura 8 Dança macabra. Gravura de 1493.

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28 © História Medieval II

Datando de 1435, Danse Macabre foi destruída nos bombar-


deios aliados na Segunda Guerra, mas partes dela estão guardadas
na Igreja de São Nicolau, em Talim, na Estônia.
A mais antiga representação artística da peste é o cemitério
pintado na Igreja dos Santos Inocentes, em Paris, obra de 1424.

Figura 9 Igreja dos Santos Inocentes

Após observar as duas figuras, é possível adentrar diferentes


temáticas e abrir nosso leque de conhecimento. Para além da Pes-
te Negra, podemos voltar nossa atenção:
1) para a morte;
2) para a representação figurada da morte;
3) para as condições de vida das diferentes "classes so-
ciais";
4) para a questão do debate entre Antropocentrismo e Te-
ocentrismo.
Bem, como pode perceber, a partir dos temas usualmente
abordados para o período denominado Baixa idade Média, pode-
mos ampliar nossas discussões a partir de questões diferenciadas,
manuseando as fontes de modo diverso, levantando problemas a
partir de inter-relações temáticas. Não temos de assumir as inter-
pretações como se fossem nossas. Antes, devemos questionar o
que nos é apresentado, criar critérios para a aceitação ou a nega-
ção das teorias vigentes. Construir o conhecimento não é tarefa
fácil, mas sem dúvida é um exercício inspirador.
Inspire-se...
Bom desempenho nos estudos!
© Caderno de Referência de Conteúdo 29

Glossário de conceitos
O Glossário de Conceitos permite a você uma consulta rá-
pida e precisa das definições conceituais, possibilitando-lhe um
bom domínio dos termos técnico-científicos utilizados na área de
conhecimento dos temas tratados no Caderno de Referência de
Conteúdo História Medieval II. Veja, a seguir, a definição dos prin-
cipais conceitos:
1) Adubamento: do francês medieval adoubement. É uma
das denominações para a ordenação de um cavaleiro.
2) Anátema: excomunhão, maldição, reprovação.
3) Conjuratio: termo que denomina as relações entre ha-
bitantes das comunas urbanas na Baixa Idade Média.
Representava o juramento de lealdade, fidelidade e con-
fiança recíprocas entre iguais.
4) Cânones: regras, normas.
5) Consuetudinário: conjunto de normas não escritas con-
sagrado pelo uso e costumes tradicionais.
6) Contraforte: pilar que reforça uma parede para susten-
tar uma abóboda ou um terraço.
7) Êmulo: imitador; aquele que disputa, compete, rivaliza
com outrem.
8) Escolas catedralísticas: escolas fundadas por bispos.
9) Exações: cobranças rigorosas de impostos ou dívidas.
10) Investidura: é o ato de "investir" (nesta acepção, "em-
possar") uma pessoa na posse de algum cargo ou digni-
dade (benefício).
11) Priorado: mosteiro dirigido por um prior.
12) Ortodoxia: doutrina religiosa considerada verdadeira.
13) Simonia: abuso do tráfico de dignidades eclesiásticas.

Esquema dos Conceitos-chave


Para que você tenha uma visão geral dos conceitos mais im-
portantes deste estudo, apresentamos, a seguir (Figura 10), um Es-
quema dos Conceitos-chave do Caderno de Referência de Conteú-

Claretiano - Centro Universitário


30 © História Medieval II

do. O mais aconselhável é que você mesmo faça o seu esquema de


conceitos-chave ou até mesmo o seu mapa mental. Esse exercício
é uma forma de você construir o seu conhecimento, ressignifican-
do as informações a partir de suas próprias percepções.
É importante ressaltar que o propósito desse Esquema dos
Conceitos-chave é representar, de maneira gráfica, as relações entre
os conceitos por meio de palavras-chave, partindo dos mais com-
plexos para os mais simples. Esse recurso pode auxiliar você na or-
denação e na sequenciação hierarquizada dos conteúdos de ensino.
Com base na teoria de aprendizagem significativa, entende-se
que, por meio da organização das ideias e dos princípios em esque-
mas e mapas mentais, o indivíduo pode construir o seu conhecimen-
to de maneira mais produtiva e obter, assim, ganhos pedagógicos
significativos no seu processo de ensino e aprendizagem.
Aplicado a diversas áreas do ensino e da aprendizagem esco-
lar (tais como planejamentos de currículo, sistemas e pesquisas em
Educação), o Esquema dos Conceitos-chave baseia-se, ainda, na ideia
fundamental da Psicologia Cognitiva de Ausubel, que estabelece que
a aprendizagem ocorre pela assimilação de novos conceitos e de pro-
posições na estrutura cognitiva do aluno. Assim, novas ideias e infor-
mações são aprendidas, uma vez que existem pontos de ancoragem.
Tem-se de destacar que "aprendizagem" não significa, ape-
nas, realizar acréscimos na estrutura cognitiva do aluno; é preci-
so, sobretudo, estabelecer modificações para que ela se configure
como uma aprendizagem significativa. Para isso, é importante con-
siderar as entradas de conhecimento e organizar bem os materiais
de aprendizagem. Além disso, as novas ideias e os novos concei-
tos devem ser potencialmente significativos para o aluno, uma vez
que, ao fixar esses conceitos nas suas já existentes estruturas cog-
nitivas, outros serão também relembrados.
Nessa perspectiva, partindo-se do pressuposto de que é você
o principal agente da construção do próprio conhecimento, por
meio de sua predisposição afetiva e de suas motivações internas
© Caderno de Referência de Conteúdo 31

e externas, o Esquema dos Conceitos-chave tem por objetivo tor-


nar significativa a sua aprendizagem, transformando o seu conhe-
cimento sistematizado em conteúdo curricular, ou seja, estabele-
cendo uma relação entre aquilo que você acabou de conhecer com
o que já fazia parte do seu conhecimento de mundo (adaptado do

site disponível
 em: <http://penta2.ufrgs.br/edutools/mapascon-
ceituais/utilizamapasconceituais.html>.
 Acesso em: 11 mar. 2011).

 



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Figura 10 Esquema dos Conceitos-chave do Caderno de Referência de Conteúdo História


Medieval II. Esquema dos Conceitos-chave da disciplina História Medieval II.
Figura 10

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32 © História Medieval II

Como você pode observar, esse Esquema dá a você, como


dissemos anteriormente, uma visão geral dos conceitos mais im-
portantes deste estudo. Ao segui-lo, você poderá transitar entre
um e outro conceito e descobrir o caminho para construir o seu
processo de ensino-aprendizagem. Por exemplo: para que se com-
preenda a formação dos burgos e a expansão urbana, é necessário
que se compreenda antes o conceito de feudalismo e a crise que
esse sistema atravessou durante a Baixa Idade Média.
O Esquema dos Conceitos-chave é mais um dos recursos de
aprendizagem que vem se somar àqueles disponíveis no ambiente
virtual, por meio de suas ferramentas interativas, bem como àqueles
relacionados às atividades didático-pedagógicas realizadas presen-
cialmente no polo. Lembre-se de que você, aluno EaD, deve valer-se
da sua autonomia na construção de seu próprio conhecimento.

Questões Autoavaliativas
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões
autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados, as quais podem ser
de múltipla escolha, abertas objetivas ou abertas dissertativas.
Responder, discutir e comentar essas questões, bem como
relacioná-las com a prática do ensino de História pode ser uma for-
ma de você avaliar o seu conhecimento. Assim, mediante a reso-
lução de questões pertinentes ao assunto tratado, você estará se
preparando para a avaliação final, que será dissertativa. Além disso,
essa é uma maneira privilegiada de você testar seus conhecimentos
e adquirir uma formação sólida para a sua prática profissional.

As questões de múltipla escolha são as que têm como resposta


apenas uma alternativa correta. Por sua vez, entendem-se por ques-
tões abertas objetivas as que se referem aos conteúdos matemá-
ticos ou àqueles que exigem uma resposta determinada, inalterada.
Já as questões abertas dissertativas obtêm por resposta uma in-
terpretação pessoal sobre o tema tratado; por isso, normalmente, não
há nada relacionado a elas no item Gabarito. Você pode comentar
suas respostas com o seu tutor ou com seus colegas de turma.
© Caderno de Referência de Conteúdo 33

Bibliografia Básica
É fundamental que você use a Bibliografia Básica em seus
estudos, mas não se prenda só a ela. Consulte, também, as biblio-
grafias complementares.

Figuras (ilustrações, quadros...)


Neste material instrucional, as ilustrações fazem parte in-
tegrante dos conteúdos, ou seja, elas não são meramente ilus-
trativas, pois esquematizam e resumem conteúdos explicitados
no texto. Não deixe de observar a relação dessas figuras com os
conteúdos do Caderno de Referência de Conteúdo, pois relacionar
aquilo que está no campo visual com o conceitual faz parte de uma
boa formação intelectual.

Dicas (motivacionais)
O estudo deste Caderno de Referência de Conteúdo
convida você a olhar, de forma mais apurada, a Educação como
processo de emancipação do ser humano. É importante que você
se atente às explicações teóricas, práticas e científicas que estão
presentes nos meios de comunicação, bem como partilhe suas
descobertas com seus colegas, pois, ao compartilhar com outras
pessoas aquilo que você observa, permite-se descobrir algo que
ainda não se conhece, aprendendo a ver e a notar o que não havia
sido percebido antes. Observar é, portanto, uma capacidade que
nos impele à maturidade.
Você, como aluno dos cursos de Graduação na modalidade
EaD, necessita de uma formação conceitual sólida e consistente.
Para isso, você contará com a ajuda do tutor a distância, do tutor
presencial e, sobretudo, da interação com seus colegas. Sugeri-
mos, pois, que organize bem o seu tempo e realize as atividades
nas datas estipuladas.
É importante, ainda, que você anote as suas reflexões em
seu caderno ou no Bloco de Anotações, pois, no futuro, elas pode-

Claretiano - Centro Universitário


34 © História Medieval II

rão ser utilizadas na elaboração de sua monografia ou de produ-


ções científicas.
Leia os livros da bibliografia indicada, para que você amplie
seus horizontes teóricos. Coteje-os com o material didático, discuta
a unidade com seus colegas e com o tutor e assista às videoaulas.
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões
autoavaliativas, que são importantes para a sua análise sobre os
conteúdos desenvolvidos e para saber se estes foram significativos
para sua formação. Indague, reflita, conteste e construa resenhas,
pois esses procedimentos serão importantes para o seu amadure-
cimento intelectual.
Lembre-se de que o segredo do sucesso em um curso na
modalidade a distância é participar, ou seja, interagir, procurando
sempre cooperar e colaborar com seus colegas e tutores.
Caso precise de auxílio sobre algum assunto relacionado a
este Caderno de Referência de Conteúdo, entre em contato com
seu tutor. Ele estará pronto para ajudar você.

3. E-REFERÊNCIAS
Figura 1 Livro de horas: agosto. Disponível em:<http://www.cliohistoria.110mb.com/
imagens/horas_arquivos/august.jpg>. Acesso em: 28 fev. 2011.
Figura 2 Bíblia de Toggenburg: peste negra. Disponível em: <http://www.dsc.ufcg.edu.
br/~pet/jornal/maio2009/materias/o_mundo.html>. Acesso em: 30 ago. 2010.
Figura 3 Pedro, o Eremita. Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/
commons/6/61/Roman_du_Chevalier_du_Cygne_f176v_Pierre_l’Ermite.jpg>. Acesso
em: 30 ago. 2010.
Figura 4 A Trindade. Disponível em: <http://www.santarita-oar.org.br/imagens/
agostinho/vitral12.gif>. Acesso em: 28 fev. 2011.
Figura 5 Hereges sendo imolados. Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/
wikipedia/commons/0/09/Templars_Burning.jpg>. Acesso em: 30 ago. 2010.
Figura 6 Artur, Guinevere. Disponível em: <http://www.mingaudigital.com.br/
BancoDeImagens/ArthurGuinervere.gif>. Acesso em: 28 fev. 2011.
Figura 7 Artur. Disponível em <http://teatromosca.com.sapo.pt/images/arturmenos.
jpg>. Acesso em: 30 ago. 2010.
© Caderno de Referência de Conteúdo 35

Figura 8 Dança macabra. Gravura de 1493. Disponível em: <http://www.renaissance-in-


art.org/Dance-of-Death-1493.jpg>. Acesso em: 28 fev. 2011.
Figura 9 Igreja dos Santos Inocentes. Disponível em:<www.uniblog.com.br/img/posts/
imagem26/262262.jpg>. Acesso em: 30 ago. 2010.

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EAD
Feudalismo:
Uma Abordagem
Historiográfica
1
1. OBJETIVOS
• Conhecer e identificar diferentes abordagens historiográ-
ficas sobre o feudalismo.
• Identificar os conceitos fundamentais da organização feudal.

2. CONTEÚDOS
• Tradição político-jurídica do feudalismo.
• Tradição econômica do feudalismo.
• Sociedade feudal.
• Sistema feudal.

3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE


Antes de iniciar o estudo desta unidade, é importante que
você leia as orientações a seguir:
38 © História Medieval II

1) O termo “feudalismo” aparece pela primeira vez no sé-


culo 16. Para aprofundamento desse tema, sugerimos a
consulta à obra a seguir:
• ALMEIDA, Néri de Barros. Feudalismo: conceito e ori-
gem. In: Revista Estudos de História. Franca, v.9, n. 1,
p. 11-30, 2002.
2) Em alguns casos, optamos por colocar o termo “feuda-
lismo” entre aspas para indicar a não aceitação passiva
da abordagem historiográfica que o construiu como um
conceito definitivo. O uso do termo como título desta
unidade deve-se mais à sua popularidade do que pro-
priamente à defesa da abordagem historiográfica que o
constituiu.
3) Alain Guerreau faz questão de lembrar-nos da ausên-
cia do conceito de “camponês” na Europa feudal. Se-
gundo ele, “entre as numerosas palavras que serviam
para designar aqueles que temos a tendência para con-
siderar em bloco como camponeses, há que distinguir
dois grupos: as que designam um estatuto, como servi,
mancipia, colliberti, liberti; e as que designam uma resi-
dência, como agricolae, rustici, villani, pagenses, vicini,
manentes, mansionarii, ou uma nova residência, como
coloni, hospites. Todos sabem que a característica mais
importante dos servos era precisamente estarem ligados
a uma terra, e vê-se, portanto, que de fato o essencial
destes termos não designa nada mais que uma residên-
cia” (1980, p. 222).
Para aprofundar os estudos sobre Guerreau e seu tema
de análise, indicamos a obra:
• GUERREAU, Alain. O feudalismo: um horizonte teóri-
co. Lisboa: Ed. 70, 1980.
4) François-Louis Ganshof foi um historiador belga que es-
tudou primeiramente o período carolíngio, na obra Les
Destinées de l’Empire en occident de 395 a 888, de 1928,
e, posteriormente, o feudalismo, em Qu’est-ce que la
féodalité?, de 1944.
© U1 - Feudalismo: Uma Abordagem Historiográfica 39

5) É essencial que um historiador conheça a tradição his-


toriográfica que o precede. A consulta à bibliografia do
curso o ajudará nessa aproximação. Um autor cujo tra-
balho é importante para as análises desenvolvidas nesta
unidade é o medievalista Robert Boutruche. Caso queira
se aprofundar nas ideias desse autor, sugerimos a leitura
da obra:
• BOUTRUCHE, Robert. Seigneurie et féodalité. 2 v. Pa-
ris: Aubier, 1968.
6) O termo “exogamia”, que aparecerá nesta unidade, diz
respeito à prática da busca de vínculos matrimoniais
fora do círculo de parentesco consanguíneo. No caso da
Idade Média, a proibição dos matrimônios que envolves-
sem consanguinidade se estendeu progressivamente até
o 7º grau de parentesco, por conta da iniciativa eclesiás-
tica. Mas o acompanhamento dessa norma por parte da
Igreja só se tornou recorrente com o fortalecimento da
própria instituição eclesiástica durante o período feudal.

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Vamos iniciar nossos estudos do Caderno de Referência de
Conteúdo História Medieval II com um dos temas mais estudados
e divulgados sobre a Idade Média: o feudalismo.
Quando se fala em feudalismo, quais são as características
que você concebe como integrantes desta organização social tipi-
camente medieval?
Alguns termos e expressões sobre esse tema são frequente-
mente lembrados pelos estudantes, como por exemplo: “senhor
feudal’, “servo”, “vassalo” e “feudo”.
Você se lembra de quando estudou o feudalismo como um
modo de produção presente em toda a Idade Média? Essa foi uma
das abordagens popularizadas ao longo dos séculos 19 e 20 que

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40 © História Medieval II

ainda estão presentes nos materiais didáticos dos ensinos funda-


mental e médio.
Muitos equívocos conceituais que ainda pairam sobre a Ida-
de Média nasceram do estudo do feudalismo. E um dos equívocos
mais recorrentes é tomar-se o período medieval como sinônimo
de feudalismo.
Partindo dessas questões, nosso objetivo nesta unidade é
apresentar as principais teses historiográficas construídas sobre
o feudalismo. Serão abordados os questionamentos que cercam
essas teorias e lhes impõem limites, além, é claro, de buscar esta-
belecer um quadro conceitual que corresponda à “realidade” his-
tórica referente ao tema em questão.

5. CONTROVÉRSIAS EM TORNO DO “FEUDALISMO”


O estudo do feudalismo foi marcado por controvérsias e
divergências, especialmente em relação ao debate em torno de
sua duração e localização temporal e das regiões em que ocorreu.
Além disso, persistem inúmeros debates a respeito da nomencla-
tura usada para designar o que se convencionou chamar de “feu-
dalismo”.
Há uma multiplicidade de nomenclaturas utilizadas no estu-
do do feudalismo. Além deste termo, utiliza-se, por exemplo, “so-
ciedade feudal”, “sistema feudal”, “regime feudal”, “feudalismo” e
“feudalidade”.
Mas isso não significa que essas denominações sejam sinôni-
mos. Ao contrário, são concepções particulares de uma experiên-
cia de pesquisa e de um tratamento documental singular. Foi com
base nessa diversidade terminológica que novas conceituações se-
guiram questionando e apontando insuficiências em antigas teses
historiográficas.
© U1 - Feudalismo: Uma Abordagem Historiográfica 41

O debate em torno do “feudalismo” foi tão intenso que auto-


res como Alain Guerreau dedicaram algumas obras para avaliar e
questionar a teoria formulada sobre o tema. Como o próprio autor
afirma, o "feudalismo" parece mais próximo de um modelo teórico
do que de uma realidade histórica verificável pela análise docu-
mental.
A duração temporal do chamado "feudalismo" também é
envolta por sérias divergências.
Como veremos adiante, alguns autores defendem que o
"feudalismo" começa na transição do século 9º para o século 10,
persistindo até o século 13. Outros defendem que tenha ocorrido
somente entre os séculos 11 e 13. E ainda há aqueles que defen-
dem que esse sistema esteve presente durante toda a Idade Média
(do século 5º ao século 15).
Como afirma Almeida (2002, p. 14), o feudalismo:
[...] aparece indicando a síntese de todos os elementos caracterís-
ticos de um período cronológico numa síntese ao mesmo tempo
conciliadora e diluidora, na qual o conceito é esvaziado de sua es-
pecificidade e o próprio fenômeno que se designa é obscurecido,
perdendo-se a força de sua relevância.

Confundido com um período cronológico, "feudalismo" tor-


nou-se uma expressão usada para descrever uma época. Transfor-
mou-se na descrição geral de uma descentralização política que
teria predominado durante toda a Idade Média. Sua dinâmica so-
cial e seus mecanismos de funcionamento foram deixados de lado
a favor de descrições absolutas de um modo de vida estático.
Dessa maneira, vemos que o debate em torno da "localiza-
ção" temporal do "feudalismo" esteve intimamente ligado às dis-
cussões sobre os espaços de ocorrência desse fenômeno.
Há estudos sobre o “feudalismo” que teriam ocorrido na
Gália, na Grã-Bretanha, na Península Itálica, na Península Ibérica,
entre outros lugares. Por isso, optamos por limitar nosso estudo

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42 © História Medieval II

do "feudalismo" à região galo-germânica, localizada entre os rios


Loire e Reno, a fim de evitar comparações equivocadas e anacro-
nismos.

6. ABORDAGENS JURÍDICO-POLÍTICA E ECONÔMICA


SOBRE O “FEUDALISMO”
Uma das abordagens mais fecundas e questionadas do
“feudalismo” nasceu em meio aos debates sobre a História do
Direito e constitui-se em uma das bases da tradição dos estudos
jurídico-políticos do período medieval. Essa tradição de estudos
teve em François-Louis Ganshof um dos seus principais expoentes.
Em seu livro Qu'est-ce que la féodalité?, de 1944, cuja edição
para o português recebeu o título Que é o feudalismo?, Ganshof
(apud BONNASSIE, 1985, p. 10-11) definiu feudalismo como:
[...] conjunto de instituições que criam e regulam determinadas
obrigações de obediência e de serviço da parte de um homem livre,
denominado senhor e obrigações de proteção e sustento da parte
do senhor para com o vassalo; a obrigação de sustento traduz-se
geralmente na concessão pelo senhor ao vassalo de um bem cha-
mado feudo.

Ou seja, o feudalismo seria uma relação jurídica estabelecida


no laço contratual entre "senhor" e "vassalo". Tal laço demandava
a concessão de bens fundiários por parte do “senhor” em troca da
fidelidade e dos serviços militares oferecidos pelo "vassalo".
Essa relação jurídica apenas se estabeleceria entre dois ho-
mens que desfrutassem da condição de homem “livre”, pois so-
mente eles poderiam estabelecer um laço de homem para homem
por meio dos ritos de fidelidade e homenagem.
A partir de um conjunto normativo, o vínculo feudo-vassáli-
co era construído sobre a premissa da reciprocidade. Entretanto,
ele somente podia funcionar se o "senhor" fosse mais poderoso
que seu "vassalo", obrigando-o a se submeter sem que pudessem
negociar de igual para igual (GANSHOF, 1959, p. 25).
© U1 - Feudalismo: Uma Abordagem Historiográfica 43

A perspectiva jurídica foi mantida nos trabalhos de Robert


Boutruche. Esse medievalista abordou o "regime feudal", que,
segundo ele, definia-se pela presença do contrato vassálico e do
feudo – entendido como porção de direitos sobre uma terra. Essa
visão também sobreviveu em Jacques Le Goff, que a atualizou em
seu manual A civilização do Ocidente medieval, de 1964.
Segundo Le Goff, o feudalismo apresentou características di-
ferentes em cada região europeia. Vem daí a opção por estudar a
região do Mâcon (sul da Borgonha/França), que se formou como
organização político-jurídica entre os séculos 10º e 14. Le Goff
(2005, p. 84) define o feudalismo como:
[...] conjunto de laços pessoais que unem numa hierarquia os mem-
bros das camadas dominantes da sociedade. Tais laços apóiam-se
numa base real: o benefício que o senhor concede a seu vassalo em
troca de um certo número de serviços e de um juramento de fide-
lidade. Em sentido estrito, o feudalismo é a homenagem e o feudo.

Mesmo identificando que o feudo é "mais um termo dos ju-


ristas e historiadores modernos do que um vocábulo da época"
(2005, p. 85), Le Goff reafirma a existência dos feudos na condição
de porção de terra fundamental para a manutenção dos contratos
de vassalagem.
Estamos, então, diante de uma questão fundamental. O feu-
do correspondia à porção de terras, à parte material de um ter-
ritório circunscrito, ou aos direitos jurídicos exercidos sobre essa
porção de terra? Assim, o conceito de feudo se transformaria em
uma das concepções mais combatidas e contraditoriamente utili-
zadas pelas diferentes teses sobre o “feudalismo”.

Críticas à concepção de "feudalismo"


Diante da perspectiva jurídica vista anteriormente, inúme-
ras críticas apareceram para questionar a concepção de feudalis-
mo visto como um conjunto normativo baseado em um contrato
feudo-vassálico.

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44 © História Medieval II

Entre elas, destaca-se a crítica de Alain Guerreau, que apon-


tou o abuso cronológico da concepção jurídica dos feudos. Segun-
do Guerreau (1980, p. 93), "a concepção de direito dos feudos só
aparece no século 13 de maneira transitória e fluida no movimen-
to de constituição dos principados e das monarquias".
Já a crítica de Bournazel e Poly (1998) destacou o excessivo
apelo ao aspecto jurídico, que não respeita a forma de organiza-
ção dos elementos institucionais da sociedade medieval. Segundo
esses autores, ao determinar o funcionamento do feudalismo na
relação sociedade e sistema jurídico, Ganshof e os seguidores da
tradição jurídico-política distanciam seu modelo teórico da práti-
ca, dificultando a observação da dinâmica das relações sociais.
No mesmo sentido, a crítica dos historiadores marxistas pri-
mou por apontar insuficiências na visão que concebia o feudalis-
mo somente como uma relação entre senhores e deixava de fora a
relação entre senhores e camponeses.
Segundo a corrente marxista, as concepções de feudalismo
defendidas pela tradição jurídica limitavam o caráter social e, so-
bretudo, econômico do fenômeno, basicamente por não conside-
rarem o papel social dos camponeses e as inúmeras formas de ex-
ploração de seu trabalho.
Entretanto, na defesa do estudo da categoria servil/cam-
ponesa, os historiadores marxistas difundiram uma concepção
do modo-de-produção feudal. Consequentemente, acompanha-
ram essa visão todas as implicações conceituais de se pensar um
modo de vida dando centralidade exclusiva à questão econômica.
Na maioria dos modelos marxistas de feudalismo, a centralidade
dada à relação entre senhor e servo (muitas vezes confundido com
o camponês) ignora as relações internas à aristocracia.
Guy Blois, por exemplo, fundamenta o feudalismo "no pri-
mado da pequena exploração camponesa e no confisco de uma
parte variável dos rendimentos desta exploração por intermédio
da caução senhorial" (BLOIS apud ALMEIDA, 2002, p. 18).
© U1 - Feudalismo: Uma Abordagem Historiográfica 45

Outros autores, como Udaltzova e Gutnova, ou ainda Bonas-


sie, apesar de modificarem o modelo apresentado por Blois, per-
manecem definindo a relação entre senhor e camponês a partir da
compreensão contemporânea das dicotomias explorador/explora-
do e dominante/dominado. Observe a definição de Pierre Bonnas-
sie (1985, p. 89) no Dicionário da Idade Média:
Confisco freqüentemente brutal dos rendimentos (do subproduto)
do trabalho campesino, garantindo sua redistribuição no seio da
classe dominante por meio de um sistema mais ou menos comple-
xo de redes de dependência (vassalidade).

Em relação às ideias de Bonassie sobre o feudalismo, Almei-


da (2002, p. 18) esclarece:
Bonnassie inverte a fórmula político-jurídica, estabelecendo a fun-
ção econômica como determinante para o desenvolvimento das
estruturas feudais. Sua definição valoriza primeiramente a relação
entre senhores e camponeses, em segundo lugar, aponta seus ob-
jetivos econômicos e em terceiro, indica as relações entre aristocra-
tas, como meio de viabilizar este fim.

Conceitualmente, não encontramos em Bonnassie uma de-


finição de feudalismo que se distancie da concepção moderna
das relações de apropriação e expropriação do trabalho. O pobre
camponês tem seus rendimentos brutalmente confiscados e não
recebe nada em troca, além de mais trabalho, enquanto a "classe
dominante" distribui em seu meio os lucros advindos do trabalho
do camponês.
Além disso, o resultado da posição de Bonnassie acaba carac-
terizando o feudalismo "pelo domínio e pelo senhorio, o que não
dá conta da especificidade histórica do sistema e de seus meios de
difusão e reprodução" (ALMEIDA, 2002, p. 18).
Domínio e senhorio, assim como feudo, tornam-se concei-
tos confusos, muitas vezes tomados como sinônimos. O funciona-
mento e a distribuição da produção material no feudalismo, assim
como a dinâmica das relações de poder presentes na organização
desses ambientes rurais, permanecem sem explicação.

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46 © História Medieval II

Outro historiador oriundo da tradição marxista que acaba


passando pelo tema do feudalismo é Perry Anderson. O autor, que
até pouco tempo figurava como referência em materiais didáticos
brasileiros, apresenta uma síntese mais cuidadosa sobre o tema,
mas nem por isso menos controversa.
Em sua obra Passagens da Antiguidade ao feudalismo (a pri-
meira edição inglesa dessa obra é de 1974; em língua portuguesa,
a primeira edição data de 1982), Anderson defende que a longa
simbiose entre as formações sociais romana e germânica mitigou
as divergências entre ambas. Dessa coalizão surgiria o feudalismo,
como o modo de produção de uma nova sociedade (medieval).
Mas esse quadro começa a ser formado apenas a partir do
século 9º, quando o feudo, entendido como "concessão delega-
da, investida de poderes jurídicos e políticos em troca de serviço
militar" (ANDERSON, 1982, p. 134), generaliza-se. Essa generali-
zação teria sido efeito do enfraquecimento do poder imperial e
das invasões do século 9º. Conjuntamente, ocorre a expansão das
imunidades senhoriais aos territórios enfeudados. Por fim, dá-se
a generalização da servidão com o processo de encastelamento
ocorrido no início do século 11.
Antes de prosseguirmos, é necessária uma análise um pouco
mais profunda do termo “encastelamento”, fundamental para o
estudo do “feudalismo”.
Robert Fossier foi o primeiro autor a definir por encellule-
ment (enclausuramento) o enquadramento dos homens em um
sistema comunitário de exploração coletiva do solo. Tal enquadra-
mento, paroquial ou senhorial, tinha como principais consequên-
cias a fixação espacial dos homens, o enquadramento dos desloca-
mentos e a intensificação dos privilégios senhoriais. Segundo esse
autor (1982, p. 122):
Esta fixação espacial é prioritariamente social, e não carcerária
(malgrado o uso do termo enclausuramento). Trata-se de uma fixa-
ção simbólica, assegurada pela atração do sagrado, pela concessão
© U1 - Feudalismo: Uma Abordagem Historiográfica 47

de direitos próprios a determinado lugar e pela hereditariedade


das terras, que induzem esquematicamente à vinculação paroquial
e ao “bairrismo”.

O encastelamento é uma forma possível do encellulement,


já que concentra efetivamente em torno do castelo o habitat cam-
ponês (bem como o aristocrático). Entre as muralhas, abrigavam-
-se colheitas e a sede do poder de comandar outros homens, de
obrigá-los a servir e de assegurar entre eles, e sobre eles, a polícia
e a justiça.
Voltemos, então, à análise das ideias de Perry Anderson.
Os limites do modelo teórico de Anderson residem na manei-
ra como ele restitui as relações feudo-vassálicas à centralidade de
sua definição de feudalismo. O feudalismo só poderia efetivar-se
com a união entre vassalagem e benefício (elemento condicional
de troca) e a generalização dessa prática entre os remanescentes
da aristocracia carolíngia após o século 9º.
Novamente, o feudo e os laços vassálicos figuram como as
únicas instituições feudais, como se todas as concessões de bens
feitas entre os séculos 9º e 13 tivessem se concretizado na forma
de feudo, e a vassalagem fosse o único laço existente entre os aris-
tocratas.
Como vimos, muitas controvérsias foram geradas na tentati-
va de explicar o "feudalismo" como um modelo teórico presente
na sociedade medieval. Agora, você terá a oportunidade de co-
nhecer algumas teses que organizaram de maneira mais eficaz as
categorias determinantes para o surgimento, o desenvolvimento e
o fim do chamado “feudalismo”.

7. DA SOCIEDADE FEUDAL AO SISTEMA FEUDAL


Para a compreensão do "feudalismo" como realidade histó-
rica de uma sociedade complexa e real, é importante procurarmos
uma visão que conceba esse sistema em sua totalidade, como fe-
nômeno estruturante de um modo de vida.

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48 © História Medieval II

Por isso mesmo, é importante pensar o "feudalismo" não


apenas como expressão das relações político-jurídicas ou mesmo
econômicas de uma dada experiência social, mas apreender a am-
plitude de sua significação como fenômeno que integrava os diver-
sos campos da vida humana: o social, o político, o econômico e o
cultural.
Nesse sentido, dois historiadores construíram uma nova vi-
são de "feudalismo", a fim de dar conta de sua integralidade em
termos de experiência histórica de um dado período.

Marc Bloch
O primeiro desses historiadores foi Marc Bloch, que, numa
obra extensa sobre a organização feudal (A sociedade feudal, de
1939), desenvolveu o conceito de "sociedade feudal". Seu objetivo
era analisar e explicar a organização da estrutura social daquele
período, com suas diversas ligações políticas, econômicas e cultu-
rais.
Bloch dividiu a época feudal em dois momentos, chamados
por ele de Primeira Idade Feudal e Segunda Idade Feudal.
A seguir, são apresentadas as principais características da
Primeira Idade Feudal, vigente entre o século 10 e a primeira me-
tade do século 11:
1) Declínio demográfico.
2) Distribuição demográfica desigual.
3) Nomadismo moderado da aristocracia para promover o
controle de seus territórios.
4) Irregularidade do comércio.
5) Processo de encastelamento, que promoveu a fixação ao
solo dos grupos sociais subalternos.
Já na Segunda Idade Feudal, que vigorou aproximadamente
entre 1050 e 1250 (séculos 11 ao 13), a organização ganhou novas
conotações, que em muitos sentidos se opõem às características
da Primeira Idade Feudal. Observemos suas características:
© U1 - Feudalismo: Uma Abordagem Historiográfica 49

1) Crescimento demográfico significativo em boa parte do


território galo-germânico, a ponto de incentivar o esta-
belecimento de novos aldeamentos rurais e também o
fortalecimento de ambientes urbanos.
2) Comércio interno e externo.
3) Circulação monetária.
4) Surgimento de novas atividades ligadas aos ambientes
urbanos.
5) Valorização social de novas categorias sociais (cortesão,
mercador).
Mesmo traçando um quadro detalhado da organização so-
cial feudal, Bloch teve sua tese revista e atualizada por inúmeros
historiadores. Para Almeida (2002, p. 22):
[...] a perspectiva da sociedade feudal de Marc Bloch é uma exce-
ção nas teses historiográficas sobre o tema, especialmente por ter
conseguido conciliar, já na década de 30, a tradicional visão políti-
co-jurídica à amplitude social vinda da concepção marxista, alcan-
çando assim o encontro entre ambas perspectivas.

Críticas à obra de Marc Bloch


De Bournazel e Poly (1998) vieram as críticas à valorização
excessiva que Bloch deu à descentralização da autoridade pública
na sociedade feudal. Essa valorização do processo de descentrali-
zação é recorrente na obra de Bloch.
Logo no início de seu texto, ele identifica o Império Carolín-
gio como o último poder capaz de atuar publicamente: "o desmo-
ronamento do império carolíngio tinha acabado de arruinar o úl-
timo poder suficientemente inteligente para se preocupar com os
trabalhos públicos, suficientemente poderoso para fazer executar
pelo menos alguns deles" (BLOCH, 1982, p. 85).
Em outra passagem, já no final de sua obra, Bloch (1982, p.
491) deixa claro que “do mesmo modo, com algum atraso e muitas
diferenças, a evolução em direcção ao desmembramento dos po-
deres públicos em pequenos grupos de comando pessoal prevale-
cia na Alemanha como na França".

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50 © História Medieval II

Outro autor que também não ignorou os exageros e as la-


cunas da tese de Bloch foi Guerreau (1980). Ele criticou a obra A
Sociedade Feudal, afirmando que esta limitava sua análise à com-
preensão da aristocracia e de seu exercício do poder pessoal, dei-
xando de lado uma análise econômica dessa organização social.
A visão marxista adotada por Bloch e ressaltada por Almeida
diz respeito ao exercício do poder de explorar e expropriar o cam-
ponês, e não aos aspectos técnicos da produção agrícola e de sua
distribuição na sociedade. É em relação a esse ponto que Guer-
reau critica Bloch: a falta de dados sobre a produção econômica e
a distribuição de riquezas no sistema feudal.

Alain Guerreau
O segundo historiador que construiu uma nova visão sobre o
"feudalismo" foi Alain Guerreau. A partir da crítica à boa parte dos
conceitos elaborados sobre o tema, especificamente às conceitua-
ções produzidas entre o início do século 19 e os anos 1980, ele
propôs um novo esquema racional para o "feudalismo", dando-lhe
o nome de “sistema feudal”.
De acordo com Almeida (2002, p. 19), a especificidade da
proposta de Guerreau "deriva de sua forma peculiar de relação
com a herança marxista, de seu respeito ao sentido histórico da
terminologia empregada na documentação e, sobretudo, do lugar
que reconhece à Igreja".
Alain Guerreau soube dar significado e vida ao "feudalismo"
quando propôs pensá-lo em termos de sistema. Essa certamente
foi uma de suas grandes inovações, uma vez que a interpretação
sistêmica permitiu que ele adentrasse o emaranhado organizado
da sociedade que viveu entre os séculos 11 e 13, sem excluir suas
contradições internas e suas pressões externas.
© U1 - Feudalismo: Uma Abordagem Historiográfica 51

Quatro eixos de sustentação do sistema feudal


Para Guerreau, o sistema feudal, no limiar das observações,
está disposto em quatro eixos imbricados entre si. São eles:
1) Relação de dominium.
2) Parentesco artificial.
3) Ecossistema feudal.
4) Igreja (eixo articulador dos três anteriores).

Relação de dominium
O primeiro eixo é a relação de dominium, resultante da revi-
são feita por Guerreau da antiga dicotomia senhores/camponeses
presente em boa parte da historiografia acerca do “feudalismo”.
De acordo com o autor (1980, p. 217):
É ridículo e absurdo imaginar as relações feudais como a simples
relação entre honestos camponeses vergando-se sob o jugo e se-
nhores cúpidos e ociosos que extraíam a renda a golpes de coação
extra-econômica. Que tal mito tenha um forte valor ideológico, não
se discordará; mas há que desembaraçar-se dele claramente, se se
pretende fazer trabalho científico.

Mas, então, em que consiste essa relação de dominium?


Guerreau inicia sua exposição pela busca do significado do
termo dominium e chega à conclusão de que na Idade Média exis-
tia apenas um sentido para o termo: relação de poder que englo-
ba simultaneamente o controle sobre a terra e o domínio político,
ideológico, econômico e jurídico sobre os homens (GUERREAU,
1980).
A relação de dominium caracterizava-se por uma situação de
dependência hierarquizada, na qual o senhor (dominus), ao con-
trolar um dado território, submetia todos os homens (fossem tra-
balhadores da terra ou de outra condição social) que residissem
nele. Portanto, essa relação não trazia em si um sentido econômi-
co de exploração do trabalho ou de apreensão dos lucros.

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52 © História Medieval II

Guerreau faz questão de afirmar que na documentação feu-


dal não há um estatuto definido nem para o senhor nem para o
camponês. Os termos latinos presentes na documentação, como
dominus, potens e homo, têm seu sentido fixado pelo vocabulá-
rio eclesiástico e dizem mais sobre um movimento hierárquico. O
critério de organização de tal hierarquia refere-se à fixação do ho-
mem ao solo, e não a um estatuto de subordinação econômica.
Para Guerreau, pensar a relação de dominium como a sim-
ples oposição entre senhores e servos é ignorar toda uma relação
social multifuncional, que não diz respeito exclusivamente à pro-
dução. Nesse sentido, ele deixa claro que "a análise das relações
de produção feudais deve ser primeiramente uma análise da liga-
ção dos homens ao solo” (1980, p. 223). É essa ligação que articula
o poder, a dependência pessoal e a dependência material caracte-
rísticos desse período.

Relações de parentesco artificial


O segundo eixo que dá vida ao sistema feudal diz respeito às
relações de parentesco artificial, que, segundo Guerreau (1980,
p. 225, grifo nosso), referem-se às relações de solidariedade, fide-
lidade e proteção contraídas entre os membros dos grupos aristo-
cráticos.
Os traços principais do sistema de parentesco da Europa feudal res-
saltam de maneira evidente de uma comparação com o que existia
antes (mundo romano), ao lado (mundo árabe), e depois (Código
Civil). Distingo quatro aspectos principais: casamento indissolúvel,
casamento único, exogamia extremamente desenvolvida e sur-
preendente indistinção da terminologia.

Os vínculos entre iguais eram estabelecidos por meio de ca-


samentos, apadrinhamentos, pela cerimônia de homenagem e de
adubamento (cerimonial no qual um homem era armado “cavalei-
ro”) que ajudavam a aproximar e multiplicar laços de solidarieda-
de, muito além das perspectivas sanguíneas.
© U1 - Feudalismo: Uma Abordagem Historiográfica 53

Reflita: que interesses havia por trás dessa estrutura de pa-


rentesco?
A estrutura de parentesco servia, antes de tudo, para garan-
tir a reprodução biológica da aristocracia, a ajuda militar e o auxílio
material – com o intercâmbio de bens e posses territoriais.
No entanto, essa estrutura estava diretamente vinculada à
estrutura eclesiástica, ou, como prefere Guerreau, “subordinada”
a ela.
Com o movimento de reforma eclesiástica iniciado na se-
gunda metade do século 11, tema que estudaremos com maior
profundidade na Unidade 2, a Igreja passou a determinar regras
que condicionavam o estabelecimento dos vínculos artificiais de
parentesco.
Isso se devia ao fato de que a Igreja também formava um
enorme sistema de parentesco “espiritual”, baseado na reformula-
ção da geração carnal. A “negatividade” advinda da relação sexual
dava lugar à positividade do laço espiritual – fruto do nascimento
virginal do Cristo.
Nesse caso, o batismo se inseria em uma nova socialização,
pensada com base na geração divina, que confere ao cristão uma
identidade espiritual, unindo-o primeiramente a Deus e depois a
todos os outros cristãos.
Outro aspecto presente nessa socialização que visava engen-
drar espiritualmente o homem é o papel preponderante do con-
trole social e do ritual da filiação, que passavam pelas mãos dos
clérigos. Os clérigos eram os intermediários capazes de engendrar
espiritualmente o cristão por meio do batismo ou, mais tardia-
mente, por meio do casamento e do adubamento.
Por meio da disseminação do batismo, da exigência da exo-
gamia e da indissolubilidade do casamento, ou mesmo da entrada
nos ritos de homenagem e adubamento, a Igreja interferia e con-
trolava uma das formas de reprodução do poder laico, asseguran-
do, assim, seu poder e sua hegemonia.

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54 © História Medieval II

Além disso, a proibição do casamento com não cristãos e clé-


rigos criou uma fronteira para o mundo exterior e uma barreira
espiritual interna na sociedade feudal. Segundo Guerreau (1980,
p. 232):
Este rápido sobrevôo do parentesco artificial deve, evidentemen-
te, encerrar-se e culminar pela observação da própria Igreja. Pater,
frater, filius são os termos chaves de um grupo em que, no caso
mais favorável, a relação real é o avunculato (relação tio-sobrinho).
Os mosteiros eram certamente a forma mais notável a este respei-
to, pois não apenas as relações internas eram pensadas em termos
de paternidade-fraternidade, mas também as relações entre mos-
teiros criados eram concebidas em termos de mães-filhas. A Igreja
forma, assim, um enorme sistema de parentesco sem casamento
nem procriação e que, no entanto, se reproduz muito bem, melhor
mesmo que a maioria dos outros grupos sociais.

Ecossistema feudal
O terceiro eixo no qual, segundo Guerreau, se sustentava o
sistema feudal era o chamado ecossistema feudal. Ele determina-
va e articulava as coações materiais do sistema feudal. Vejamos o
que isso significa.
É nesse eixo que Guerreau procura estabelecer as relações
de produção, escoamento e troca dos bens produzidos especial-
mente pela agricultura. Ele vê essas relações como um grande
ecossistema.
A primeira consideração importante feita por Guerreau:
deve ser tomado o senhorio, e não a pequena célula de produção
camponesa, como a base fundiária do sistema. O autor conside-
ra que o senhorio estava ligado ao poder específico de uma base
material bastante móvel e ampla, enquanto a pequena exploração
camponesa era muito restrita.
O termo “senhorio” dizia respeito ao território sobre o qual
o senhor exercia seus direitos de mando, mas também a esse pró-
prio poder de mando. Ou seja, era uma estrutura material e, ao
mesmo tempo, o exercício do poder de controle, punição e gestão
dessa estrutura.
© U1 - Feudalismo: Uma Abordagem Historiográfica 55

Definido por um centro, normalmente uma aldeia ou um


castelo, o senhorio compreendia ainda uma rede de lotes de ter-
ras e as vias de acesso entre esses diversos lotes e o centro social.
Guerreau (1980, p. 235) afirma:
Estou tentado a considerar que a célula base não era, no sistema
feudal, a exploração familiar, mas o grande domínio ou o senhorio,
dentro dos quais o papel e o tamanho das grandes e das pequenas
explorações eram importantes, mas eram-no essencialmente em
função das condições gerais nas quais se encontrava o senhorio,
isto é, essencialmente condições nas quais esse grande domínio es-
tava integrado num sistema muito mais vasto.

Dessa maneira, o castelo e/ou a aldeia eram o coração prá-


tico e simbólico do poder da aristocracia senhorial em um dado
território, e sua estrutura era constantemente ameaçada pela imi-
nência da guerra.
A guerra, ou mesmo a sua ameaça, desempenhava um papel
importante na reorganização das relações de poder de um terri-
tório. Quando estavam diante de uma ameaça, os senhores rivais
buscavam estabelecer acordos para evitar a efetivação da guerra.
Esses acordos incluíam desde a submissão de um senhor a
outro, o pagamento de tributos de um ao outro, até a oferta dos
filhos para casamento com o rival ou com um de seus descenden-
tes, a fim de selar a paz por meio da união matrimonial.
Quando a guerra existia de fato, ela renovava toda a dinâmi-
ca feudal, já que influía na posse de bens móveis e imóveis e torna-
va efetivos os laços hierárquicos, tanto entre a aristocracia, quanto
entre os homens submetidos às relações de dominium.
Essa lógica de atualização das relações sócio-econômico-po-
líticas, alicerçada na guerra, já existia antes do sistema feudal e se
manteve mesmo depois de seu fim.
A grande diferença entre as guerras que ocorreram na Alta e
na Baixa Idade Média está no fato de que, na Baixa Idade Média,
ela reatualizava as relações fixadas em um território, o que não
ocorria antes do século 11 – e não ocorreu após o século 13.

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As expedições militares começam a se alterar a partir do mo-


mento em que sofrem, tanto em termos ideológicos quanto em
termos normativos, a intervenção das instituições monárquicas e
da Igreja, que, com a proposta das cruzadas, incentiva a prática da
guerra fora dos espaços cristãos.

Igreja
O quarto eixo de sustentação do sistema feudal diz respeito
à dominação da Igreja, que, segundo Guerreau (1980, p. 237), foi
"a única instituição mais ou menos coextensiva ao feudalismo da
Europa Ocidental; nenhuma dominação foi tão geral e contínua".
Como elemento articulador de todo o sistema feudal, a Igreja
foi a principal “força motora do sistema feudal”. Seu papel central
em todas as relações retratadas até aqui (relação de dominium,
relação de parentesco artificial/espiritual e relações de produção)
demonstra sua função fundamental na determinação dos referen-
ciais simbólicos e materiais do sistema feudal.
Preocupado em apontar os diversos controles exercidos pelo
clero na sociedade feudal, Guerreau destaca que a Igreja, ao vul-
garizar o vocabulário utilizado nas missas (vocabulário litúrgico),
utilizando-o para dar significado às relações feudais, tornou inevi-
tável a identificação de todas as relações do sistema feudal com os
referenciais sagrados professados na missa.
Inicialmente, o autor faz menção às posses materiais da Igre-
ja. Entre um quinto e um terço das terras estavam sob controle
da Igreja durante os séculos 11, 12 e 13. "Esta riqueza fantástica
mantinha-se em boa parte graças à própria estrutura do clero: re-
crutamento relativamente fácil e nenhum problema com heran-
ças" (GUERREAU, 1980, p. 246).
O controle exercido em diversos âmbitos da sociedade da-
quele período transferiu à Igreja o domínio e os mecanismos para
manipular o sistema feudal a seu favor. Vejamos as formas em que
notadamente se manifestava esse controle:
© U1 - Feudalismo: Uma Abordagem Historiográfica 57

1) Controle sobre os vários tempos:


a) o tempo do ano (calendário);
b) o tempo do trabalho (emprego dos sinos);
c) o tempo das festividades;
d) o tempo histórico.

2) Poder de delimitar os espaços da cristandade, da dioce-


se e da paróquia.

3) Controle sobre os laços de parentesco:


a) interferência no modelo de matrimônio;
b) definição do incesto;
c) divulgação do modelo de parentesco espiritual.

4) Controle sobre o sistema de ensino.

5) Controle sobre as crenças.

6) Controle sobre a moral.


Todavia, seu poder não adveio do acaso. A Igreja assumiu-
-se como única intermediária capaz de estabelecer a relação en-
tre Deus e os homens, traduzindo os princípios fixos de justiça e
força decorrentes da lei divina. Nesse momento, ela se apropriou
do sistema de representações, orientando a crença, a moral e as
próprias relações sociais para que se mantivessem sob sua tutela.
Ainda segundo Guerreau (1980, p. 256):
A Igreja dominou incontestavelmente todos os aspectos do sistema
feudal europeu. Controlando o ensino e o parentesco, ela contro-
lava a sua reprodução. Assegurando, por si só até o século 13, e
em seguida parcialmente, os fundamentos essenciais da relação de
dominium, ela controlava, por isso mesmo, as relações de produ-
ção. Ela tirava essa força e essa possibilidade de controle da sua
organização, ao mesmo tempo estreitamente ligada à aristocracia
pela sua reprodução biológica e rigorosamente separada de toda a
sociedade laica pelo celibato de todos os seus membros: esta sepa-
ração concretizava socialmente a oposição sagrado/profano, sacra-
lizava mais e protegia os clérigos, se não os seus bens; concretizava
igualmente o parentesco espiritual em estado puro e reforçava,
assim, o poder dos clérigos em manipular os diversos aspectos do
parentesco natural e espiritual.

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58 © História Medieval II

8. QUESTÕES AVALIATIVAS
Sugerimos que você procure responder, discutir e comentar
as questões a seguir que tratam da temática desenvolvida nesta
unidade. São questões de caráter geral e específico que lhe aju-
darão a formular uma análise crítica sobre as interpretações do
Medievo.
A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para
você testar o seu desempenho. Se você encontrar dificuldades em
responder a essas questões, procure revisar os conteúdos estuda-
dos para sanar as suas dúvidas. Esse é o momento ideal para que
você faça uma revisão desta unidade. Lembre-se de que, na Edu-
cação a Distância, a construção do conhecimento ocorre de forma
cooperativa e colaborativa; compartilhe, portanto, as suas desco-
bertas com os seus colegas.
Confira, a seguir, as questões propostas para verificar o seu
desempenho no estudo desta unidade:

1) No estudo das humanidades, assim como na área da Ciência em geral, os


conceitos e visões sobre determinado tema evoluem por meio de debates,
controvérsias e divergências, o que é próprio da dialética acadêmica. É pre-
ciso abandonar as certezas para que haja a produção do conhecimento. Re-
flita sobre isso e elabore um texto argumentativo que contemple esse tema.
2) No estudo avançado de História, percebemos que por trás de cada termo há
uma corrente de pensamento, uma concepção de História, uma linha histo-
riográfica. Questionar esses termos é uma das principais ferramentas para
o estudo crítico da História. Qual era sua visão sobre o estudo da História
antes de iniciar este curso? E agora, qual é sua visão?

3) Em História, com frequência analisamos não apenas a situação dos homens,


mas também sua tipologia. Por exemplo, a relação entre dominus (senhor)
e o homo (servo) apresentava parâmetros diferentes daqueles presentes na
relação entre dois domini (senhores). Considerando os conteúdos estuda-
dos, apresente um exemplo dessa diferença.

4) Qual é o papel das necessidades e das relações econômicas na História da


humanidade?

5) Reflita, com base no que estudamos e em seu conhecimento de mundo, e


responda: qual é a ligação entre a posse de terra e o poder social?
© U1 - Feudalismo: Uma Abordagem Historiográfica 59

6) Quais são as principais controvérsias presentes no estudo do feudalismo?

7) Diferencie a abordagem teórica político-jurídica da abordagem econômica


de feudalismo.

8) Qual é a relevância de se pensar o feudalismo como um sistema?

9) Qual era o papel das relações de dominium e de parentesco no sistema feu-


dal?

9. CONSIDERAÇÕES
Nesta unidade, você conheceu algumas das principais teo-
rias sobre o “feudalismo”. De uma maneira ou de outra, cada uma
delas nos ajuda a pensar a sociedade feudal não mais como uma
sociedade estática, marcada pela organização estamental e sub-
metida a um sistema de exploração do trabalho campesino, e nos
aproxima de seu dinamismo.
Esse dinamismo foi muito bem representado pelo modelo
de Guerreau, que estabelece categorias para o estudo do sistema
feudal fundamentadas simultaneamente nas relações sociais, nas
relações de produção e na organização institucional eclesiástica.
Na próxima unidade, veremos o desenvolvimento da insti-
tuição eclesiástica e as múltiplas formas que ela adquiriu durante
o período feudal, que lhe possibilitaram exercer um lugar central
na sociedade da Baixa Idade Média e ser protagonista das relações
de poder e autoridade.

10. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ALMEIDA, N. de B. Feudalismo: conceito e origem. In: Revista Estudos de História. Franca,
v. 9, n. 1, 2002.
ANDERSON, P. Passagens da antiguidade ao feudalismo. São Paulo: Brasiliense, 1982.
BLOCH, M. A sociedade feudal. São Paulo: Martins Fontes, 1982.
BONNASSIE, P. Dicionário da idade média. Lisboa: Dom Quixote, 1985.
BOURNAZEL, E.; POLY, J. (Dir.). Les Féodalités. Histoire générale des systémes politiques.
Paris: PUF, 1998.

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FOSSIER, R. Enfance de l’Europe (Xe-XIIe siècles). Aspects économiques et sociaux. Paris:


PUF, 1982.
GANSHOF, F. Que é o feudalismo? Lisboa: Europa América, 1959.
GUERREAU, A. O feudalismo. Um horizonte teórico. Lisboa: Edições 70, 1980.
______. Feudalismo. In: LE GOFF, J.; SCHMITT, J-C. Dicionário do Ocidente medieval.
Bauru: Edusc, 2002, v. 1.
LE GOFF, J. A civilização do ocidente medieval. Bauru: Edusc, 2005.
MORSEL, J. Les Logiques communautaires entre logiques spatiales et logiques
catégorielles. In: ATELIER LE MOYEN AGE VU D’AILLEURS II: historiographie et recherches
actuelles. São Paulo: USP, out. 2003.

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