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Realização
Sindicato dos Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental do Governo de
Minas Gerais (SINDESP-MG)
Produção e Organização
Andrey Morais Labanca
Leonardo Nunes de Souza
Lunna Rachel Gusmão Campos
Rafael Maia Nogueira
Fotografia
Leandro Nunes de Souza
Lunna Rachel Gusmão Campos
Apoio Técnico
Bruno Carlos da Silva Porto
Cleidiane Figueiredo da Silva
1 - Resumo
Durante a solenidade foi escolhido o gestor público Eduardo Aires Berbert Galvão do
SindGestor de Goiás para presidir a primeira diretoria da entidade.
Dia 04/05/2017
16:00 - 16:30
Credenciamento
Local: Auditório JK
16:30 - 19:30
ABERTURA - DISCURSO DOS MEMBROS DA MESA DIRETORA
1. Alvimar Tito - Presidente do SINDESP-MG
2. André Reis - Secretário Municipal de Planejamento e servidor de carreira de EPPGG
3. Eloísa Pereira - Secretária de Estado Adjunta da Secretaria de Cidades e de
Integração Regional
4. Gabriel Azevedo - Vereador da Câmara Municipal de Belo Horizonte e Ex-
Subecretário de Juventude
5. Helvécio Magalhães - Secretário de Estado de Planejamento e Gestão
6. Epaminondas Pires de Miranda – Secretário de Estado de Desenvolvimento e
Integração do Norte e Nordeste de Minas Gerais
Local: Auditório JK
19:30 - 20:00
ATO SOLENE
Assinatura do Estatuto da Federação Nacional de Carreiras de Gestão de Politicas
Públicas e filiação das entidades presentes.
Local: Auditório JK
20:00 - 00:00
Coquetel de abertura
Local: Auditório JK
Dia 05/05/2017
09:00 - 10:00
ABERTURA DOS TRABALHOS
1. César Cristiano de Lima - Secretário adjunto de Planejamento e Gestão
2. Onofre Alves Batista Júnior - Advogado-Geral do Estado
3. Roberto do Nascimento Rodrigues - Presidente da Fundação João Pinheiro
4. Leonardo Nunes de Souza - Diretor Jurídico SINDESP-MG
Local: Auditório FJP
10:00 - 12:30
TEMA A - POLÍTICAS SOCIAIS - 4 ARTIGOS
- Impactos das políticas de regularização fundiária urbana no Brasil. Autores: Rafael
Lara Mazoni Andrade, Claudio Burian Wanderley, Germana de Campos Gonçalves.
- Explorando resultados do projeto fortalecimento da agricultura familiar para o
abastecimento alimentar. Autores: Marina Coimbra Ferreira Batista e Fernanda
Peixoto Petrocchi da Costa.
- Regularização Fundiária em Minas Gerais: avanços recentes e a possibilidade de
atuação consorciada. Autores: Matheus Guimarães Novais, Breno Longobucco, Thaís
Cristina Lopes de Araújo Vilas Boas e Leonardo Luis Avendanha Gabrich Ferreira.
- Sistema previdenciário na Suécia: subsídios para um debate. Autores: Rafael Lara
Mazoni Andrade, Gutenberg Brandon Viana de Andrade e Pedro Henrique Bragança
dos Santos.
Local: Sala FJP A
10:00 - 12:30
TEMA B - EFICIÊNCIA NOS GASTOS PÚBLICOS
- Monitoramento: uma análise do ciclo do Plano Plurianual de Ação Governamental
2012-2015. Autores: Daniel Henrique da Cunha Campos, Carolina Fonseca Moreira e
Sarah Cristina de Sales Mourão.
Local: Sala FJP B
10:00 - 12:30
TEMA C - CONTROLE INTERNO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
- Desafios para a construção de uma cultura de monitoramento analítico em políticas
sociais. Autores: Vitor Sousa Gonçalves e Victor Antunes Leocádio.
- A organização do aparato de controle político-administrativo do Brasil e da Espanha:
diferenças e similaridades do controle interno. Autor: Bruno Massayuki Nakano.
Local: Sala FJP C
10:00 - 12:30
TEMA D - TEMAS TRANSVERSAIS
Coordenador: João Marcelo de Souza Gomes - Diretor da Associação dos Especialistas
em Políticas Públicas do Estado de São Paulo (AEPPSP)
- O dilema paulista: patrimonialismo versus profissionalização das carreiras de estado.
Autor: Associação dos Especialistas em Políticas Públicas do Estado de São Paulo
(AEPPSP)
- Juventudes e vulnerabilidade social nos territórios urbanos: uma análise das
juventudes em territórios urbanos vulneráveis da região metropolitana de belo
horizonte. Autores: Alexandre Mário de Freitas e Bruno Lazzarotti Diniz Costa.
- Aspectos comparativos da nova lei de finanças públicas. Autora: Leila de Castro
Bezerra de Andrade.
- O Processo de Recrutamento e Seleção para o Centro de Serviços Compartilhados do
Estado de Minas Gerais: estudo de caso. Autores: Julio Guimarães Barata e Amanda
Cristina Bento Braga.
Local: Sala FJP D
10:00 - 12:30
TEMA ESPECIAL - TECNOLOGIA E EFICIÊNCIA NOS GASTOS PÚBLICOS
- Como a ciência de análise de dados e a tecnologia podem otimizar os recursos
públicos.
Autor: Helberth Cavalcante
Sócio Diretor da BHS Kriptos
Especialista em soluções de análise de dado
Local: Sala FJP E
13:30 - 15:30
PALESTRA 1 - REFORMA DA PREVIDÊNCIA
1. Marcus Vinícius de Souza – Diretor de Previdência do IPSEMG
2. Milton Vasques Thibau de Almeida - Professor Associado de Direito do Trabalho e
Previdência Social da UFMG. Desembargador do Trabalho do TRT da 3ª Região.
3. Alex Canuto - Presidente da ANESP
4. Alvimar José Tito – Presidente SINDESP-MG
Local: Auditório FJP
15:30 - 16:00
COFFEE BREAK
16:00 - 17:30
PALESTRA 2 - DÍVIDA PÚBLICA E SUSTENTABILIDADE FISCAL
1. Paulo Kliass - Doutor em Economia pela Université de Paris e Especialista em
Políticas Públicas e Gestão Governamental
2. Eduardo Aires Berbert Galvão – Presidente SindGestor Goiás e FENAGESP
3. Bruno Alencar – EPPGG, ex-secretário-adjunto da Secretaria de Desenvolvimento
Regional
4. Rafael Maia Nogueira – Secretário-Geral SINDESP-MG
Local: Auditório FJP
17:30 - 18:00
ENCERRAMENTO
1. Fernanda Medeiros Azevedo Machado - Diretora da CODEMIG
2. Eduardo Aires Berbert Galvão – Presidente do SindGestor-GO e da FENAGESP
3. Alvimar José Tito - Presidente do SINDESP-MG
Local: Auditório FJP
4 – Fotos do Evento
5 – Trabalhos Aprovados para apresentação
Políticas Sociais
Temas transversais
Autoria: Rafael Lara Mazoni Andrade, Claudio Burian Wanderley, Germana de Campos
Gonçalves
ABSTRACT: Based on the analysis of a scenario of urban crisis and the imperative need for
action of the Brazilian State in this area, this paper seeks to present results of impact
evaluations of land regularization policies - public policies used to give land titles to squatters,
acquisition of land, as well as giving them better living conditions through better housing,
urbanization and environmental recovery. In order to strengthen the argument that land
tenure regularization policies can positively impact the enjoyment of rights and public
finances, thus impacting regional development, the work has undertaken a bibliographical
research in search of empirical research results related to land regularization. The results show
that these policies have a positive impact on social welfare indicators, being a key determinant
of economic development, impacting labor supply, work income, household investment of low
income families and the collection of municipalities, reducing their dependence on
intergovernmental transfers and enabling better responses to the specific problems of their
jurisdiction. Finally, solutions to the challenges of Brazilian cities are discussed, based on the
use of land regularization policies, within the framework of a responsible and capillary urban
policy.
KEY WORDS: urban planning; regional development; public policies impact evaluation.
1- INTRODUÇÃO
1.1- Objetivos
1.2- JUSTIFICATIVAS
À maneira ensinada por Laville e Dionne (1999), a justificativa para a realização deste
trabalho assenta-se em quatro aspectos: sua importância, sua relevância, sua contribuição e as
vantagens em fazê-lo. Em primeiro lugar, a importância do tema é crucial para ampliar o olhar
dos gestores sobre o atual da gestão pública – sobretudo a administração municipal – no
Brasil, de efervescência de movimentos buscando maior qualidade da resposta do Estado aos
problemas urbanos. Ainda, o crescimento e o desenvolvimento econômico tanto almejados
pelo Estado brasileiro demandam soluções eficientes para seus problemas estruturais, e a tese
aqui defendida é de que a regularização fundiária – no bojo de uma política urbana
responsável – seria, ao mesmo tempo, solução para esses dois problemas.
Quanto à sua relevância, pode-se afirmar que há uma lacuna na produção acadêmica.
A literatura menciona várias avaliações do impacto trazido pelas ações de regularização
fundiária. No entanto, nenhuma publicação discutia – em linhas gerais – os resultados desses
trabalhos.
Quanto à sua contribuição, atentando à lacuna na produção acadêmica, este trabalho
– especialmente no contexto em que serão feitas as revisões dos Planos Diretores dos
municípios brasileiros – busca ser um subsídio à tomada de decisões e um incentivo à
cooperação entre prefeituras e os outros níveis de governo. Por fim, sua vantagem relaciona-
se ao fato de ser realizada por um estudante que atua no âmbito do desenvolvimento local,
favorecendo a adoção de avanços e melhorias nas políticas relacionadas a esse tema.
2- REFERENCIAL TEÓRICO
Alguns autores afirmam que a crise seria um aspecto intrínseco às cidades, posto que
elas sejam “o lugar onde há mais mobilidade e mais encontros” (SANTOS, 2006, p. 159). Fato é
que as urbes surgem a partir de um processo de implosão-explosão, descrito por Lefebvre
(1986). O crescimento das aglomerações para cima – na verticalização – e para os lados – na
periferização – acarretaria a exacerbação de seus problemas e a deterioração das condições de
vida nas cidades.
No Brasil, as cidades já surgem como reflexo de conflitos. Como disse Faoro (2001), as
urbes surgiriam sob a égide do pelourinho – e o instrumento de tortura lembraria a todos que
havia um poder, e que ele estaria pronto a intervir em caso de recalcitrâncias.
Ao passo em que o Brasil tornou-se um país majoritariamente urbano, esses
problemas se amplificaram. Os grandes movimentos populacionais em direção aos centros
urbanos encontraram cidades incapazes de prover adequadas condições de vida (MARICATO,
2003). A análise de dados dos censos demográficos realizados pelo IBGE mostra que há um
crescimento explosivo da população urbana no Brasil. Houve momentos em que o crescimento
populacional chega à casa dos 412%, como em Belo Horizonte em seus anos iniciais, no
período posterior à Primeira Guerra Mundial, entre 1900 e 1920; e que passa dos 360% em
São Paulo, entre 1890 e 1900. Como padrão, observa-se forte incremento populacional nos
municípios analisados no ínterim 1920-2000, sobretudo a partir do término da Primeira Guerra
Mundial, entre 1940 e 1950.
Todavia, a população que evade os campos em direção aos centros urbanos depara-se
com cidades problemáticas. Assim, o crescimento desenfreado das cidades gerou vários
problemas que se fazem presentes nessa crise das cidades brasileiras. No Brasil, dentre vários
defeitos de seu processo de urbanização, podem-se citar a poluição ambiental, as carências
habitacionais, a precariedade dos assentamentos, a irregularidade fundiária, o trânsito caótico,
a violência e as carências na acessibilidade (MAZONI ANDRADE, 2016).
Se não fosse o bastante, as ações do Estado em suas políticas urbanas acabaram
agravando tais deficiências. As premissas de saneamento e embelezamento das cidades
acabaram resultando em segregação socioespacial, desigualdades e concentração da pobreza
nas periferias (MARICATO, 2013):
as deficiências e mesmo a omissão do poder público no enfrentamento da
problemática urbana no curso histórico da urbanização brasileira resultaram
num quadro socioespacial precário, caracterizado por desigualdades e
processos de exclusão, e pela magnitude do déficit habitacional e da
informalidade de ocupação, dentre outros aspectos (BRASIL; CARNEIRO,
2009, p. 13).
1
Conceito trazido pela Lei Federal 11.124/2005, considerado “como direito e vetor de inclusão social”.
por exemplo, o acesso às fontes de financiamento habitacional, pleno
exercício do direito sucessório, valorização da propriedade (D’OTTAVIANO;
SILVA, 2009, p. 210).
Toda essa problemática relativa às questões urbanas no Brasil gera fortes demandas
em relação ao setor público. Estes graves problemas que impactam fortemente o bem-estar
dos cidadãos impõem ao Estado brasileiro a necessidade de implantar políticas que os
resolvam.
Nesse sentido, o conceito de planejamento urbano pode ser descrito como “a
disciplina que lida com as escolhas políticas voltadas para uma mudança social construtiva em
ambiente urbano – dotado de especificidades e complexidades” (MAZONI ANDRADE, 2016, p.
74). O urbanista Flávio Villaça (2010, p. 179) caracteriza-o como a “ação planejada do Estado
sobre o espaço urbano”. Souza (2010, p. 73) o resume como “estratégias de desenvolvimento
urbano, alimentadas por pesquisa social básica, tanto teórica quanto empírica”. Para Deák
(2010, p. 13), esse planejamento seria o “conjunto das ações de ordenação espacial das
atividades urbanas que, não podendo ser realizadas ou sequer orientadas pelo mercado,
tinham de ser assumidas pelo Estado”.
Para buscar essa mudança social construtiva, o planejamento urbano dispõe de
institucionalidades específicas. No Brasil, a legislação urbanística – cujas peças principais são a
Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Cidade – prevê condições para o uso de vários
instrumentos. De modo genérico, esses instrumentos podem ser divididos entre os mais
tradicionais, como zoneamentos e índices urbanísticos, passando por incentivos na forma de
tributos – como o IPTU progressivo no tempo e o solo criado –, até instrumentos ditos mais
modernos, como operações urbanas consorciadas e regularização fundiária (MAZONI
ANDRADE, 2016).
A partir dessa constatação, nesta seção busca-se apresentar sumariamente o tema da
regularização fundiária. As próximas partes dessa seção versarão sobre a gênese e o conceito
da regularização fundiária, seus princípios, seus instrumentos e o envolvimento dos diferentes
entes.
A cartilha do Ministério das Cidades que trata sobre a Lei Federal nº 11.977/2009,
afirma que
Essa ideia defendida pelo Ministério das Cidades apresenta grande consonância às
ideais defendidas por Hernando De Soto (2001), Acemoglu e Robinson (2012), dentre outros. A
regularização fundiária teria o potencial de agir contra a dependência dos municípios sob a
óptica das finanças públicas. Isso ocorreria porque a segurança ao direito de propriedade –
fundamental para que haja investimento, produtividade e, por conseguinte, desenvolvimento
econômico – destravaria o capital morto, latente nos imóveis, transformando-o em capital
ativo para a produção.
Acemoglu e Robinson utilizam-se de vários exemplos na história do desenvolvimento
econômico para provar que “Os direitos de propriedade são cruciais, uma vez que somente
quem os tiver assegurados vai se dispor a investir e aumentar a produtividade” (ACEMOGLU;
ROBINSON, 2012, p. 59). Enfim, sua tese é de que faltam incentivos para investimentos, que
viria a partir da segurança da propriedade provida pelo Estado.
A opinião de Hernando De Soto, por sua vez, é de que
el capital muerto existe porque hemos olvidado […] que convertir un activo
físico em uno generador de capital, valerse de la casa para obtener dinero
en préstamo y financiar una empresa, por ejemplo, supone un proceso muy
complejo. Este processo no se diferencia mucho del que Albert Einstein nos
enseñó, mediante el cual un solo ladrillo puede liberar una inmensa
cantidad de energía mediante una explosión atómica. Por analogía, el capital
es el resultado de descubrir y desencadenar la energia potencial de los
millones de millones de ladrillos que los pobres han acumulado em sus
edificaciones (DE SOTO, 2001, p. 29).
Na mesma seara, Engerman e Sokoloff (2005, p. 21) afirmam que “Although the
prevalence of land ownership was markedly lower in the South [...] the overall picture is one of
a series of liberal land policies, leading up to the Homestead Act of 1862, providing broad
access to this fundamental type of economic opportunity”.
Além disso, estima-se que os municípios passariam a arrecadar mais impostos –
principalmente o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e o Imposto sobre a Transmissão
de bens inter vivos (ITBI), diretamente relacionados à propriedade de imóveis –, o que pode
trazer-lhes maior capacidade de investir ou gastar, independentemente das transferências de
outros entes e suas vinculações, que reduzem substancialmente o poder discricionário da
administração pública municipal (REZENDE; LEITE; SILVA, 2015).
Ainda, a regularização fundiária garante o direito à saúde, ao lazer, ao trabalho – e, por
conseguinte, à cidade. Isso pode ocorrer a partir da inclusão da área nas rotinas
administrativas ou a partir da mudança do status. Sobre o primeiro ponto, o Ministério das
Cidades afirma que, após a legalização, faz-se mister ao Poder Público prover serviços básicos
– água, esgoto, pavimentação, transporte, educação, dentre outros – sem que isso seja
meramente um “favor” ou moeda de troca de políticos (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2013).
Sobre o segundo ponto, Maricato diz que
A regularização jurídica completa a melhoria das condições sociais já que
confere mais estabilidade e segurança ao morador que pode até passar a
livrar-se de uma condição penosa de morador de favela, condição essa que
interfere nas chances de obtenção de emprego, crediário e até salários
(MARICATO, 2003, p. 163).
A despeito de todos esses impactos que podem ser trazidos pela regularização
fundiárias, poucos municípios no Brasil possuem legislação municipal concernente ao tema –
dados da pesquisa MUNIC, do IBGE, de 2015, mostram que apenas 26,14% dos municípios
brasileiros dispõem de norma sobre isso. A experiência na prática mostra que a razão para a
pequena aderência se respalda em dificuldades técnicas por trás do processo – os processos
de regularização fundiária demandam a atuação de uma equipe multidisciplinar bem
preparada e com experiência de campo.
É importante notar que cada ente possui sua própria política e sua própria legislação
para tratar sobre a regularização fundiária urbana. Todavia, um manual do Ministério das
Cidades (2009) apresenta um modelo de melhores práticas:
• caracterização do assentamento, a partir do levantamento de “aspectos físicos, urbanísticos,
dominiais e sociais do assentamento e da comunidade que ali vive” (MINISTÉRIO DAS CIDADES,
2009, p. 29), dando à sociedade participação efetiva, desde a mobilização até a informação
sobre o processo (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2009);
• entrega dos títulos, após a assinatura dos termos administrativos, que devem ser entregues
aos beneficiários para que eles providenciem o registro (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2009).
2
Como equipamentos existentes no entorno e no próprio assentamento (escolas, postos de saúde,
centros comunitários, hospitais, praças, parques e transporte público).
Quando a regularização é feita em áreas privadas, o legítimo proprietário pode dispor
do seu imóvel utilizando estes instrumentos: Concessão de Direito Real de Uso, passível de
utilização entre particulares ou no caso de terrenos pertencentes a sociedades de economia
mista, como o caso das COHABs; alienação; doação; dação, principalmente nos casos de
dívidas fiscais para com municípios; e direito de superfície. Nos casos em que a transferência é
operada a despeito do proprietário – quando ele abandona o imóvel e a área é ocupada por
terceiros –, pode-se usar a usucapião, reconhecida em juízo. A usucapião especial urbana,
conforme instituem a Constituição de 1988 e o Estatuto da Cidade, pode ocorrer através de
usucapião individual, quando o requerente é um só, e quando o terreno puder ser
individualizado, com limites, dimensões e confrontantes definidos; usucapião plúrima, quando
o requerente é um grupo e o terreno pode ser individualizado – o que “simplifica sua
tramitação, gerando economia processual e agilizando o processo de regularização”
(MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2009, p. 109); e a usucapião coletiva, usada quando o requerente é
um grupo e a área não pode ser individualizada, dada a situação de composse. Nesse último
caso, a sentença deve instituir um condomínio indivisível formado pelos ocupantes.
Seguindo o exemplo das proposições elencadas por Lefebvre (1999), Corrêa (2002),
Caldeira (2000), Maricato (1999; 2013), Jesus et al. (2010) e Brasil e Carneiro (2010), o
mainstream dos estudos acerca de política e planejamento urbanos e regularização fundiária
enfoca as assimetrias de acesso à terra urbanizada e à moradia – mormente pela população de
baixa renda.
Sabe-se de partida que as políticas urbanas têm impacto positivo sobre a
produtividade (GALLUP; GAVITIA; LORA, 2007). A explicação por trás disso seria a facilidade
trazida por investimentos públicos em infraestrutura urbana sobre a movimentação de
mercadorias, bens e pessoas.
Para além desses trabalhos já citados, vários estudos empíricos reforçam algumas das
teorias consoantes às desigualdades de acesso à terra e as políticas relacionadas à
regularização fundiária. Andrade e Pero (2011), mostram impacto positivo de um programa de
regularização fundiária sobre indicadores de bem-estar social. Para isso, foi utilizado o método
de propensity score matching para o estudo do caso do Programa de Regularização Fundiária
implementado pela Prefeitura do Rio de Janeiro na comunidade da Quinta do Caju. Para as
autoras, o programa avaliado tem impacto positivo e estatisticamente significativo na renda
domiciliar per capita dos domicílios beneficiados pelo programa. Esses achados refletem a
afirmação de que direitos de propriedade bem definidos, atribuídos e garantidos se refletem
em menores custos de transação e, consequentemente, maior será o valor do ativo e da renda
dos proprietários destes ativos. Além disso, a partir da segurança dos direitos de propriedade,
os moradores de comunidades de baixa renda são incluídos na cidade formal e passam a ter
mais acesso a diversos mercados.
Em artigo publicado pelo World Bank, Moura, Bueno e Leoni (2009) mostram que a
segurança dos direitos de propriedade é uma chave determinante do desenvolvimento
econômico. A partir do uso de técnicas econométricas com famílias escolhidas de maneira
randômica em dois bairros distintos – um que recebeu um programa de regularização
fundiária e outro, vizinho a este, que não o recebeu –, os autores estimam que a posse do
título reduz a participação de crianças na força de trabalho.
Por seu turno Dantas (2013) mostra, em sua dissertação de mestrado, que a
regularidade fundiária urbana possui impacto positivo sobre a oferta de trabalho, o
rendimento do trabalho e o investimento domiciliar das famílias beneficiárias de baixa renda.
Para poder afirmar esse impacto, tal qual Andrade e Pero (2011) fizeram, esse autor utiliza-se
do método de propensity score matching.
Em consonância àquilo que propõem Ávila e Ferreira (2016), a segurança da posse e o
reconhecimento de uma moradia pela administração local são instrumentos de inclusão e de
cidadania – nos termos descritos por Marshall (1967) e, depois, Carvalho (2011): a conjugação
de direitos civis, ligados à ideia de liberdade; direitos políticos, atinentes à participação no
governo, por exemplo, a partir do voto; e diretos sociais, ligados à participação na riqueza e na
provisão de serviços.
Outros achados de extrema relevância são as obras de Acemoglu e Robinson e De
Soto. Acemoglu e Robinson (2012) destacam a segurança ao direito de propriedade como
ponto central para estimular a atividade econômica e o crescimento econômico – posto que
aqueles que não possuam tal segurança não estariam dispostos a investir e aumentar a
produtividade. Ainda, seguindo as ideias desses autores, instituições econômicas inclusivas
requerem a garantia ao direito de propriedade e oportunidades econômicas para toda a
sociedade. Por seu turno, De Soto (2001) afirma são necessários mecanismos para destravar o
capital morto acumulado em imóveis, transformando o seu potencial econômico em capital
ativo para a produção:
Un paseo por las calles del Oriente Medio, de la antigua Unión Soviética o de
América Latina le mostrará muchas cosas: casas en las que vive la gente;
parcelas de tierra em labranza, siembra o cosecha; mercaderías que se
compran y se venden. En los países en desarrollo y en los que salen del
comunismo los activos sirven sobre todo para estos propósitos físicos
inmediatos. En cambio, en Occidente, esos mismos activos llevan además
una vida paralela, como capital externo al mundo físico. Pueden ser usados
para aumentar la producción, atendiendo a los intereses de otras partes
como “garantía” de una hipoteca, por ejemplo, o asegurando el suministro
de otras formas de crédito, así como de servicios públicos (DE SOTO, 2001,
p. 29 – grifo nosso).
Isto ocorreria porque os proprietários poderiam utilizar tais imóveis como garantias de
empréstimos; que é a única garantia possível para as parcelas mais pobres da população, e em
cuja ausência os agentes seriam excluídos do mercado financeiro. Ou seja, a regularização
fundiária serviria como instrumento de combate à exclusão financeira das parcelas mais
pobres da população.
Ao utilizar o método de propensity score matching3 para testar esses efeitos da
regularização fundiária sobre as receitas municipais, utilizando-se dados de 2001 a 2011,
Mazoni Andrade (2016) aferiu que a arrecadação de IPTU é impactada em R$ 7,01 per capita.
Ou seja, municípios que fizeram ações de regularização fundiária no período pesquisado
arrecadaram pouco mais de R$ 7 por habitante a mais que os demais municípios com
características iguais – levando em consideração uma série de variáveis disponíveis em bases
de dados de pesquisas municipais, como a MUNIC, do IBGE. Por sua vez, a arrecadação de ISS é
impactada em R$ 20,42 per capita; e a arrecadação de ITBI, a despeito de não ser um resultado
estatisticamente significativo aumenta R$ 2,68 per capita (MAZONI ANDRADE, 2016).
3
Esse método seleciona, dentre os mais de 5.550 municípios brasileiros, aqueles que têm características
econômicas e demográficas semelhantes, ao ponto de sua única diferença ser o fato de ter recebido
ações de regularização fundiária ou não.
As dificuldades são amplificadas no caso de municípios pertencentes a regiões
metropolitanas: as dinâmicas econômicas e demográficas próprias desses espaços dificultam
ainda mais as tomadas de decisão. Por exemplo, esses municípios geralmente têm
movimentos populacionais pendulares – quando um indivíduo reside em um e trabalha ou
estuda em outro –, o que os pressiona a prover serviços a um número maior de pessoas.
A despeito de todas essas dificuldades, Belo Horizonte, capital do estado de Minas
Gerais, tem conseguido atingir resultados dignos de nota na seara das políticas de
regularização fundiária. Como nas demais cidades de grande porte no Brasil, a formação do
espaço urbano belo-horizontino se deu num processo desordenado de urbanização. O
resultado desse processo está presente nos morros da capital: dados do Censo de 2010, do
IBGE, mostram que Belo Horizonte possuía à época 169 vilas e aglomerados. Nessas áreas
desprovidas de vários serviços e equipamentos públicos moravam quase 13% da população da
cidade. Estima-se que boa parte dessa população habite domicílios irregulares do ponto de
vista fundiário.
Em meio a tantos desafios, de Belo Horizonte veio um dos primeiros programas de
regularização fundiária do Brasil. Na contramão da política nacional, em 1983, o programa Pró-
Favela trouxe como principal avanço a luta pela permanência da população nos seus
assentamentos originais. À época, o que acontecia por todo o país era a retirada dessa
população, que era então alocada em novos assentamentos em áreas mais distantes dos
centros urbanos e menos providas de equipamentos e serviços públicos – e essa inadequação
justifica o insucesso dessas políticas:
O PRÓ-FAVELA (Programa Municipal de Regularização de Favelas) foi criado
pela Prefeitura em 1983, e é considerado pioneiro em todo o Brasil por ter
sido a primeira ação pública que reconhecia a especificidade da favela e o
direito de seus habitantes à moradia e aos bens e serviços básicos. [...] Entre
1986 e 1992, o PRÓ-FAVELA havia atuado em 17 favelas, abrangendo um
universo de 62.000 pessoas (URBEL, 1991). Desde então, este tem sido o
paradigma exportado para as outras grandes cidades do Brasil como modelo
ideal de regularização de favelas (TONUCCI FILHO; ÁVILA, 2008, p. 14).
Mesmo sem contar com significativo apoio de outros níveis de governo, especialistas
afirmam que a Prefeitura de Belo Horizonte vem alcançando efetividade em seus programas
de urbanização de favelas, atendimento à população em áreas de risco e construção
habitacional (CARDOSO, 2006). Por exemplo, o Programa Municipal de Regularização de
Favelas se tornou parte integrante da política de habitação no município, já trabalhando desde
a década passada com o conceito de regularização fundiária plena – que vai além do sentido
jurídico e da entrega dos títulos de posse, mas lança um olhar sobre variáveis ambientais e
urbanísticas, promovendo sua adequação para, enfim, o consequente alcance do direito à
cidade.
Há ainda que se destacarem dois pontos fortes da política de regularização fundiária
em Belo Horizonte. O primeiro é o grande esforço em busca da autogestão da construção
habitacional nesses programas: as próprias famílias beneficiadas fazem mutirões
administrados por elas mesmas (CARDOSO, 2006). Ainda, diferentemente do que acontece no
Direito Urbanístico brasileiro – no qual prevalece o descolamento entre a lei, seus
instrumentos e a prática –, o case de Belo Horizonte revela uma forte integração entre a
política urbana e os seus instrumentos normativos (CARDOSO, 2006).
Tais avanços são inegáveis. Contudo, ainda há muito a se evoluir. A legislação
urbanística vem evoluindo ao longo dos últimos anos – incluindo a promulgação de uma lei a
tratar especificamente sobre regularização fundiária urbana –, e volumosos recursos vêm
sendo reservados para essas políticas (por exemplo, vindos do governo federal). Para que
esses avanços não fiquem no passado, é necessário repensar a aplicação dos instrumentos de
política urbana. As gestões públicas municipais carecem de maior qualificação e inteligência
aplicada ao planejamento para o alcance de resultados ainda melhores (MAZONI ANDRADE,
2016).
5- CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa que gerou este trabalho propôs-se a uma discussão dos impactos das
politicas de regularização fundiária no Brasil. Para tanto, partindo das premissas da
importância do tema – dada a crescente e efervescente busca por melhores respostas do
Estado brasileira frente aos desafios da gestão pública –, sua relevância – posta a lacuna
explicitada na produção acadêmica –, sua contribuição e suas vantagens, este trabalho buscou
descrever a problemática relacionada à regularização fundiária no Brasil, destacando o
impacto que essas políticas públicas possuem sobre a garantia de direitos e as finanças
públicas municipais.
Para tanto, propôs-se uma breve pesquisa bibliográfica sobre temas relacionados à
política urbana e ao planejamento urbano, revelando a problemática das cidades brasileiras e
a imperiosa necessidade de ação do poder público para saná-la. A partir disso, apresenta-se a
regularização fundiária como uma proposta de solução desses problemas.
Para robustecer o argumento apresentado, de que políticas de regularização fundiária
podem impactar positivamente a fruição de direitos e as finanças públicas, impactando assim o
desenvolvimento regional, o trabalho buscou resultados de pesquisas empíricas relacionadas à
regularização fundiária.
Utilizando-se métodos quantitativos, Andrade e Pero (2011), mostram impacto
positivo de um programa de regularização fundiária sobre indicadores de bem-estar social. Por
seu turno, Moura, Bueno e Leoni (2009) mostram que a segurança dos direitos de propriedade
é uma chave determinante do desenvolvimento econômico. Nesse mesmo sentido, Dantas
(2013) mostra que a regularidade fundiária urbana possui impacto positivo sobre a oferta de
trabalho, o rendimento do trabalho e o investimento domiciliar das famílias beneficiárias de
baixa renda. Por fim, com base na obra de Acemoglu e Robinson (2012) e De Soto (2001),
Mazoni Andrade (2016) mostra a regularização fundiária pode impactar significativamente a
arrecadação dos municípios, reduzindo sua dependência de transferências
intergovernamentais e possibilitando melhores respostas aos problemas específicos de sua
jurisdição.
Por fim, a partir de discussões encontradas na literatura, o trabalho apresenta
sucintamente o caso da regularização fundiária no município de Belo Horizonte, apontando
para o seu sucesso e suas especificidades, no que diz respeito à luta pela permanência da
população nos seus assentamentos originais e a aplicação do conceito de regularização
fundiária plena – que vai além do sentido jurídico e da entrega dos títulos de posse, mas lança
um olhar sobre variáveis ambientais e urbanísticas, promovendo sua adequação para, enfim, o
consequente alcance do direito à cidade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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brasileiros de pequeno porte: autonomia ou dependência? In: DERZI, M. A. M.; BATISTA
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Vol. 1. Belo Horizonte: Arraes Editores, 2015. Vol. 1, p. 199-222. (Coleção Estado federal e
tributação. 4 volumes)
RESUMO
Esse artigo faz a avaliação de resultados do Projeto Fortalecimento da Agricultura Familiar para
o Abastecimento Alimentar, dentro do Programa Estruturador Cultivar, Nutrir e Educar -
PECNE, executado pelo governo de Minas Gerais de 2012 a 2014. A metodologia empregada é
quantitativa, utilizando-se testes de hipóteses para analisar se o Projeto atingiu seu objetivo,
sendo este: elevar o percentual de aquisição de gêneros alimentícios da Agricultura Familiar
por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE.
1. INTRODUÇÃO
5. CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
ABRAMOVAY, Ricardo. De volta para o futuro: mudanças recentes na agricultura familiar. Anais
do 1º Seminário Nacional do Programa de Pesquisa em Agricultura Familiar da EMBRAPA,
Petrolina, 1995. Disponível em: <http://uenf.br/pos-graduacao/politicas-
sociais/files/2015/06/MIGUEL-RAUL-MAZISSA-ZINGA.pdf>. Acesso em 25 mai. 2015.
a.1) Teste f
α = 0,05, sendo:
H1 a hipótese alternativa;
α o nível de significância1.
Resultados:
F crítico: 1,6928
F teste: 1,1427
Como F crítico ≥ F teste, não se rejeita a hipótese nula, ou seja, as variâncias das duas
populações são iguais. Isso significa que o Teste t será válido.
Considerando um nível de significância de 95% (ou seja, α = 0,05), será efetuado o teste t para
duas amostras de municípios no ano de 2013. A amostra 1 contém municípios que
participaram do projeto no referido ano, e a amostra 2 contém municípios que não fizeram
parte do projeto em 2013. Com base nos dados da aquisição de produtos da agricultura
familiar frente ao PNAE, iremos testar se a variação entre as médias é significativa.
H0: μx = μy
H1: μx ≠ μy
α = 0,05, sendo:
H1 a hipótese alternativa;
α o nível de significância.
Resultados:
T crítico: 1,99
T teste: 12,05
Como T crítico ≤ T teste, rejeita-se a hipótese nula. Desse modo, conclui-se que há uma
diferença significativa entre as médias de aquisições do grupo de municípios que receberam o
projeto e do grupo que não foi beneficiado. O projeto mostrou-se, então, como fator que
contribui efetivamente para o aumento da aquisição de produtos da agricultura familiar em
2013.
α = 0,05, sendo:
H1 a hipótese alternativa;
α o nível de significância.
Resultados:
T crítico: 2,04
T teste: 163,48
Como T crítico ≤ T teste, rejeita-se a hipótese nula. Desse modo, temos que a diferença de
aquisição da agricultura familiar no PNAE entre os anos de 2011 e 2013 foi significativa, o que
comprova que o PECNE teve papel significativo no aumento das médias de aquisição entre
esses anos.
α = 0,05, sendo:
H1 a hipótese alternativa;
α o nível de significância.
Resultados:
T crítico: 2,042
T teste: - 0,0432
Como T crítico ≥ T teste, deixa-se de rejeitar a hipótese nula. Então, pode-se concluir que a
diferença das médias de aquisição da agricultura familiar entre 2011 e 2014 não foram
significativas, o que representa poucos efeitos do PECNE nesse ano de intervenção.
H1 a hipótese alternativa;
α o nível de significância.
Resultados:
T crítico: 2,04
T teste: 406,06
Como T crítico ≤ T teste, rejeita-se a hipótese nula (H0). Então, temos que as médias entre
2011 e 2014 de aquisições da agricultura familiar no PNAE para municípios atendidos pelo
PECNE em 2013 são significativamente diferentes, o que aponta para uma relevância do
programa no sentido de aumentar a venda da agricultura familiar para o PNAE.
i Agricultura patronal é outro termo existente para designar a agricultura não familiar.
iii O IMA foi incluído nessa atividade pelo fato de esse órgão ser responsável pela regularização
das agroindústrias familiares que processem produtos de origem animal
1. INTRODUÇÃO
O Instituto de Terras – ITER era o órgão que detinha a competência para promover a
regularização fundiária no Estado, tanto urbana quanto rural, de 2001 até setembro de 2011,
quando então foi deflagrada a “Operação Grilo” da Polícia Federal, que investigou
irregularidades em grilagem de terras por agentes públicos estaduais (NEIVA, 2014). Tal
episódio levou à interrupção de todas as ações de regularização fundiária, suspeitas ou não,
conduzidas pelo Estado, incluindo o cancelamento dos títulos até então emitidos e ainda não
registrados.
A crise no Instituto culminou em sua extinção na reforma administrativa de 2013,
transferindo as competências de regularização fundiária para a então Secretaria de Estado de
Desenvolvimento Regional, Política Urbana e Gestão Metropolitana – SEDRU e a Secretaria de
Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento – SEAPA, cada qual, respectivamente,
devendo atuar em imóveis urbanos e rurais (MINAS GERAIS, 2013). Todavia, a despeito das
competências institucionais remanescerem, a SEDRU nunca chegou a executar políticas
relevantes nesse aspecto.
A interrupção dessas ações contribuiu para a geração de um passivo de imóveis com
irregularidade fundiária em Minas Gerais que veio a atingir patamares insustentáveis,
sobretudo no que se refere às áreas institucionais instaladas em terras devolutas. Até 2015,
existiam cerca de 2.800 processos paralisados na SEDRU, herdados do ITER. Em avaliação
recente realizada pela Superintendência de Infraestrutura, da SECIR, constatou-se que grande
parte da instrução desses expedientes é inconsistente, em especial documentos e declarações
vencidos e levantamentos planialtimétricos imprecisos.
À época, já se verificava por meio de pesquisas nessa temática a dimensão da
insegurança dominial de imóveis próprios. Dados da Pesquisa de Amostragem de Domicílios
mostram que 665.015 domicílios em Minas Gerais contam com alguma inconformidade
dominial, dentre os quais a grande maioria consiste na tipologia “casa” (92,5%).
Um dos avanços demandados pela nova gestão, como mostra Leite (2015), é a
possibilidade de que as ações do Estado no tocante à regularização fundiária não se limitem à
titulação somente, podendo abarcar, além da necessária segurança jurídica referente à posse
do imóvel, um conjunto de medidas que ofereçam aos beneficiários as mínimas condições de
urbanidade. Trata-se de garantir às famílias beneficiadas não apenas o acesso ao título, mas,
de forma mais ampla, o direito à cidade. Tais ponderações sugerem uma vontade política de
que as estratégias de regularização fundiária sejam planejadas e executadas à luz do conceito
de “regularização fundiária plena” (BRASIL, 2012), que envolve não só a titulação, mas também
melhorias urbanísticas destinadas a promover qualidade de vida urbana.
A SECIR realizou diagnósticos fundiários e contratou serviços de georreferenciamento
no Norte de Minas, onde já iniciou, em parceria com os municípios, a instrução de processos
de titulação de áreas irregulares. Também foram selecionados 473 imóveis do passivo deixado
pelo ITER, ocupados por órgãos da administração municipal ou estadual, em diversos
municípios mineiros, para conclusão e regularização dominial.
Em paralelo, também atua em outras frentes, como a capacitação municipal e criação
de ferramentas de gestão que possibilitem os administradores municipais a tomarem
iniciativas independentes, como a habilitação de empresas através do Sistema de Registro de
Preços –SRP – para execução de serviços de levantamento planialtimétrico georreferenciado,
fundamental para conclusão da primeira etapa do processo de regularização.
O SRP permite maior eficiência administrativa e maior economia de escala uma vez
que diversos municípios podem participar da mesma Ata de Registro de Preços, a um custo
menor do que aquele usualmente praticado em licitações isoladas com quantitativos
reduzidos. Além disso, a solicitação de serviço ocorre somente a partir da concretização da
necessidade do poder público, ou seja, quando identificadas as áreas irregulares nos diversos
municípios participantes. A adesão de municípios à ata e a contratação das plantas cadastrais
permite a tomada de ações tanto independentes quanto colaborativas. No que se refere à
primeira hipótese, já foram efetuados contatos com municípios que estudam levar à cabo, por
conta própria, ações de regularização fundiária.
No que se refere ao estudo e desenvolvimento de políticas futuras no âmbito da
regularização fundiária, a SECIR avalia formas inovadoras para aumentar a efetividade de suas
ações, como o fomento à colaboração entre cooperativas habitacionais, associações de
moradores, fundações, organizações sociais, organizações da sociedade civil de interesse
público ou outras associações civis que tenham por finalidade atividades nas áreas de
desenvolvimento urbano ou regularização fundiária urbana.
Outra possibilidade de inovação seria fomentar a atuação dos consórcios públicos na
política de regularização, de modo a garantir ganhos de escala e maior eficiência nessas ações.
Essa alternativa permite ao Estado capilarizar as ações de regularização fundiária sem
comprometer a capacidade de trabalho da SECIR, que naturalmente possui limitações em
termos de quantidade de técnicos. A Secretaria estuda desenhos e estruturas de experiências
análogas em outros estados da federação para assessorar os municípios mineiros futuramente
nessa questão. Na seção seguinte serão apresentadas as principais considerações e conclusões
acerca do novo modelo proposto.
Uma forma de manter unidade na execução das ações sem afastar o conhecimento
dos técnicos municipais já envolvidos nos processos de regularização fundiária anteriormente
à opção pela atuação consorciada se dá por meio da cessão destes servidores ao consórcio,
nos termos do art. 23 do Decreto Federal nº 6.017/07.
Os benefícios esperados com o modelo proposto perpassam pelas vantagens inerentes
ao consorciamento, dentre os quais se destacam os ganhos de escala oriundos da
centralização das atividades em uma unidade, permitindo a redução de custos e maiores
agilidade e capacidade de oferta de serviço. O modelo propicia a formação de um corpo
técnico com maior expertise na área de desenvolvimento urbano e regularização fundiária,
cujos custos serão repartidos entre os municípios, que poderão, inclusive, realizar a cessão de
servidores para a entidade. Este capital humano poderá ser capacitado para atender às
demandas regionais de serviços de levantamento planialtimétrico e elaboração de projetos de
regularização fundiária, dispensando a necessidade de contratação. Tem-se ainda a
possibilidade de aquisição compartilhada de equipamentos a serem utilizados nas atividades, o
que também enseja a redução de custos.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
As competências estatais a serem executadas por meio de políticas públicas são muitas
e, a cada ciclo, algumas são priorizadas em detrimento de outras. A política de regularização
fundiária em Minas Gerais foi desempenhada aquém da necessidade social que se
apresentava. Somam-se a isso fatores externos ao governo, que podem ser perenes, como a
natureza especulativa do mercado imobiliário, ou pontuais, como a intervenção sofrida em
2011, que paralisou os trabalhos da pauta, contribuindo para o acúmulo do passivo de
processos a serem analisados pelas equipes técnicas do Estado.
Recentemente, teve início um novo ciclo, onde a temática da regularização fundiária
ganhou fôlego novo para recuperar o tempo de paralisia e retomar com novos processos de
trabalho, novos atores e novos rumos.
Os processos de trabalho estão sendo ampliados, indo além da mera titulação, e
integrados, a exemplo das contratações via Sistema de Registro de Preços, capazes de gerar
eficiência administrativa para o Estado e para os municípios, que podem participar da mesma
Ata de Registro de Preços.
A possibilidade do envolvimento de novos atores no processo de regularização
fundiária surge como alternativa alinhada a uma estratégia adotada por diversos governos no
país. Os consórcios públicos apresentam-se, assim, como uma alternativa efetiva na solução de
problemas congruentes entre as municipalidades, pautada na redução de custos e ganhos em
resultados.
No âmbito da administração estadual, a formatação de parcerias com consórcios
também traz vantagens, uma vez que se atinge um universo consideravelmente superior de
municípios e cidadãos beneficiados quando se opta pelo investimento de esforços técnicos e
financeiros na implementação de políticas públicas via consórcios públicos.
Destacam-se, ainda, os benefícios alcançados frente ao público alvo das ações de
regularização fundiária, uma vez que se espera alcançar maior agilidade na entrega de títulos,
garantindo o direito social à moradia e a segurança jurídica dos beneficiados.
Por fim, para iniciar a formatação de parcerias entre Estado e consórcios com esta
finalidade, verifica-se a necessidade de priorização de regiões de maior vulnerabilidade, como
o norte do Estado, que apresenta grande quantidade de terras devolutas e, por consequência,
maior demanda por ações de regularização fundiária. Prima-se, assim, pela prestação efetiva
do serviço público ao cidadão que mais precisa.
NOTAS
1 Áreas devolutas podem ser definidas como aquelas que não possuem registro ou
transcrições cartorárias, ou seja, não foram incorporadas ao patrimônio público ou particular
por título legítimo. Essas áreas, por direito, podem pertencer à União ou aos Estados. As
pertencentes à União são aquelas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e
construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental. Todas as
outras são de domínio estadual.
4 No caso dos consórcios públicos que atuam na área de saúde, não se recomenda a
incorporação de outras finalidades, tendo em vista que os recursos oriundos do Sistema Único
de Saúde – SUS devem ser aplicados exclusivamente nesta finalidade. A atuação em áreas
distintas à saúde poderia ocasionar confusão na aplicação dos recursos do SUS.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei n. 11.977, de 7 de julho de 2009. Dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida
– PMCMV e a regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas; altera o
Decreto-Lei n 3.365, de 21 de junho de 1941, as Leis n 4.380, de 21 de agosto de 1964, 6.015,
de 31 de dezembro de 1973, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 10.257, de 10 de julho de 2001, e
a Medida Provisória n 2.197-43, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências. Brasília,
2009. Disponível em:
<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l11977.htm>. Acesso em: 12
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Belo Horizonte, 2015.
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em: <http://fernandopimentel.com.br/noticias/pimentel-reafirma-compromisso-de-implantar-
o-vila-viva-em-todo-o-estado/>. Acesso em: 17 out. 2016.
RESUMO: Este trabalho busca fazer uma análise do funcionamento do sistema previdenciário
da Suécia, a fim de permitir debates acerca das propostas de reforma no caso brasileiro. Para
atingir tal objetivo, feita uma pesquisa acerca da dinâmica socioeconômica em que esse país
está inserido, bem como uma extensa revisão bibliográfica acerca da trajetória recente das
políticas sociais nos países nórdicos e acerca dos diferentes modelos de welfare states. O
sistema previdenciário sueco está inserido num contexto sui generis, no cerne de um país
nórdico com grande influência de ideais da socialdemocracia – sobretudo a universalidade de
direitos. No entanto, devido a mudanças nas relações de mercado e até mesmo à própria crise
do welfare state, o sistema previdenciário sueco precisou se reinventar. Com a crescente taxa
de desemprego da década de 1990, houve o estrangulamento do sistema em questão. Há de
se salientar também o envelhecimento populacional e o acirramento da competição
internacional. O Estado então passou a diminuir o seu papel como provedor de renda para os
idosos (população que cresceu muito devido o envelhecimento). Foram tomadas medidas,
então, que visaram à diminuição do déficit público, sem a diminuição drástica dos direitos
sociais, mas sob efeito da preocupação com o desenvolvimento sustentável, que também
passa pela desconcentração de renda e com o menor impacto ambiental possível. Essas e as
demais especificidades aqui demostradas revelam que a previdência sueca reproduz o sistema
socioeconômico em que está inserido – reprodução essa que ainda sofre influencia
internacional, mas não é totalmente dependente dela.
1. INTRODUÇÃO
2. CARACTERIZAÇÃO DA SUÉCIA
Não é possível compreender o fenômeno do welfare state sueco sem compreender
suas vertentes histórica e geográfica. Ainda, a caracterização do sistema previdenciário sueco
depende do entendimento de sua economia e das implicações do desenvolvimento dessa
economia sobre o seu estado de bem-estar social (STEPHENS, 1995; ABRAHAMSON, 2012).
Fisicamente, a Suécia se caracteriza por ter a terceira maior área da União Europeia –
são 450.295 km2 – na península escandinava, extremo norte do continente europeu, fazendo
fronteira com Noruega a Oeste e Finlândia a Leste. Boa parte dessa área está sobre uma
geologia uniforme e senil. Seu clima é temperado, com área de clima polar. Há grande
amplitude térmica anual e índice pluviométrico entre 700 e 1.000 mm por ano. Sobre esse
território espalham-se pouco menos de 9,5 milhões de habitantes – o que significa uma baixa
densidade demográfica.
Considera-se um diferencial dos países nórdicos em geral, e especialmente da Suécia, a
relativa homogeneidade da população em termos de etnia e religião. Fugindo de qualquer
determinismo geográfico, parece que as características do meio físico transbordam para a
cultura daquele povo:
Durante muitos anos, a versão luterana do cristianismo teve um status
hegemônico em todos os países nórdicos [...] talvez a explicação mais
importante das similaridades entre os Estados nórdicos e, em particular,
do(s) tipo(s) nórdico(s) de bem-estar que eles defendem (CHRISTIANSEN &
MARKKOLA, 2006, p. 10, apud ABRAHAMSON, 2012).
Outro fator de diferenciação é sua longa tradição de democracia e respeito por direitos
humanos e pelo estado de direito. Sua cultura política se baseia num grau de participação
popular bem alto. Além disso, há um certo consenso em torno da busca por soluções pacificas
para conflitos de ordem social e política (ABRAHAMSON, 2012).
Outra descrição desse povo diz haver uma explicação para o desenvolvimento de
programas sociais de caráter universal na:
combinação de estruturas sociais relativamente igualitárias; populações
pequenas e relativamente homogêneas em termos de etnia, religião e
língua; e uma longa tradição histórica de responsabilidade pública/comunal
para assuntos de bem-estar social (KUHNLE & HORT, 2004, p. 13, apud
ABRAHAMSON, 2012).
A Suécia, que possui uma das maiores rendas per capita do mundo, tem uma
economia de mercado bem desenvolvida e baseada em serviços, indústria pesada e comércio
internacional – o que talvez se justifique pelo reduzido tamanho de sua economia, que impôs à
Suécia uma dependência da existência de um setor externo competitivo. O capital humano
sueco é forte, e vem crescendo – o que é importante para a competitividade internacional do
país (STEPHENS, 1995). 4% do PIB sueco são investidos em ciência e tecnologia, o que se
reflete no padrão sueco de inovação, patentes, publicações e desenvolvimento técnico.
Talvez a característica mais distintiva da Suécia seja o caráter de seus negócios.
Enquanto a Suécia compartilha com Finlândia e Noruega um alto grau de concentração da
economia no setor secundário, com particular ênfase em exportações de produtos que não
são da agricultura, a Suécia difere deles na sua indústria, dominada por um pequeno número
de indústrias oligopolísticas de propriedade privada, internacionalizadas e internacionalmente
competitivas. A despeito de ter entrado mais tardiamente no rol das nações industrializadas, a
Suécia conseguiu transitar do status de exportadora de matéria prima para o exportadora de
bens de capital mais rapidamente que os demais países nórdicos(STEPHENS, 1995;
ABRAHAMSON, 2012).
Por fim, outra característica distintiva da economia sueca é o alto grau de
intervencionismo estatal. Como mostra a tabela abaixo, o welfare state sueco é conhecido por
suas políticas de gasto público com emprego, treinamento e subsídios, se destacando inclusive
quando comparado com os demais estados de bem-estar social dos países nórdicos
(STEPHENS, 1995). O país possui ainda, no cerne de suas preocupações com um
desenvolvimento igualitário, “considerável controle político sobre processos externos e
domésticos a fim de evitar um crescimento da exportação que torne a sociedade mais
oligárquica” (SENGHAAS apud ABRAHAMSON, 2012).
3. A SUÉCIA E OS MODELOS DE WELFARE STATE
Em meio às ciências sociais, é bem comum a tipificação dos welfare states em modelos
distintos, visto que dentre estes pode-se distinguir características que os diferenciam. Segundo
a tipologia cunhada por Titmuss em 1971, a qual, diga-se de passagem, era diferente da visão
reducionista de convergência dos modelos, amplamente divulgada à época, os Estados de
Bem-Estar Social poderiam ser caracterizados em “3 tipos puros”. São eles os Estados de Bem-
Estar Residual, Produtividade e Desempenho Industrial; e Redistributivo. O primeiro tipo se
refere aos países em que o Estado tem um papel marginal na provisão de políticas públicas
diretamente às famílias. O seu maior exemplo são os EUA, onde cabe ao mercado, estimulado
por políticas fiscais governamentais, prover o acesso a esses serviços de que a sociedade
necessita. Da política fiscal preconizada pelo governo, tem-se a necessidade do pleno emprego
para que a população em geral, atinja, via mercado, o acesso a políticas de previdência social,
educação, saúde, etc. Outra característica advinda deste tipo é a política social focalizada, isto
é, principalmente os mais pobres recebem ajuda do governo, no entanto, não para sempre,
somente até este conseguir sair da situação em que se encontra e retornar ao mercado de
trabalho. Nas palavras de Carlos Aurélio de Faria:
O Estado é encarregado de proporcionar um nível mínimo de proteção
social a uma pequena parcela da população, qual seja, aos muito pobres. Os
mecanismos de redistribuição implementados administram um fluxo
relativamente pequeno de recursos da coletividade para a assistência social
pública, e a concessão de benefícios depende da comprovação de carência.
Porém, a assistência pública só é fornecida àqueles que se disponham a
“ajudar a si mesmos”. (FARIA, 1998, p. 54)
O segundo tipo é o chamado Modelo de Produtividade e Desempenho Industrial, onde
apesar do mercado ter um papel predominante, os mecanismos do Estado de provisão das
políticas sociais são complementares àquelas. No entanto, para se ter o acesso às políticas de
proteção social, necessita-se cumprir alguns requisitos baseados no mérito, produtividade e
desempenho no serviço. Neste sentido, como escreve Esping–Andersen em sua tipologia de
welfare state, este modelo, chamado por ele de Conservador ou corporativista, tende a
reforçar muito o bias de classe, isto é, os direitos sociais estão condicionados fortemente ao
emprego do cidadão (ESPING-ANDERSEN, 1991; FARIA, 1998).
O último tipo, chamado de Estado Redistributivo por Titmuss ou Social Democrata por
Esping–Andersen preconiza uma ação estatal mais efetiva na provisão das políticas sociais às
famílias, isto é, elas têm por característica o universalismo delas, procurando, segundo Esping–
Andersen, a desmercadorização dos indivíduos. Neste sentido, é característico deste welfare a
sua equidade e sua não focalização, isto é, diferentemente da concepção meritocrática e
estratificante do regime conservador, e diverso ainda do caráter focalizador do regime liberal
ou residual, as políticas sociais no modelo social democrata seriam a todos ofertados pelo
Estado. Porém, para que o Estado sustente o alto gasto público em políticas sociais, tem-se a
necessidade de uma tributação altamente progressiva em torno dos cidadãos, o que só seria
possível com um país no pleno emprego, fator que induz até mesmo o caráter de equidade das
políticas sociais.
A Suécia é um bom exemplo de Estado Redistributivo ou Social-Democrata. A partir
dessa contextualização do Estado sueco, pode-se compreender melhor a evolução de suas
políticas sociais, bem como seu sistema previdenciário – objetos de estudo das posteriores
seções deste trabalho.
Já na década de 1960, outras questões também passaram a fazer parte das políticas
sociais nesses países, como desenvolvimento sustentável, proteção ambiental, energias
sustentáveis e alimentação saudável (ABRAHAMSON, 2012).
A partir da década de 1970, os estados de bem estar social passaram por crises
(DRAIBE, 198; ESPING-ANDERSEN, 1995). As políticas sociais providas pelo Estado passaram
por várias reformas, aumentando o papel do mercado e diminuindo o papel estatal. A crise
fiscal levou a necessidade de diminuição dos gastos públicos, reformas previdenciárias,
administrativas. Contudo, os efeitos das medidas defendidas pelos neoliberais não tiveram um
efeito muito forte nos países nórdicos, isso porque a população rechaçava quaisquer
mudanças muito significativas. Assim, houve países como Inglaterra que migraram
drasticamente do modelo em que a presença do Estado como provedor era muito forte para o
modelo residual. Mas tal mudança drástica não ocorreu nos países aqui analisados. Assim, as
políticas sociais estatais continuaram com grande importante e representatividade neles.
Contudo, com mudanças incrementais de retração, pois essas foram necessárias para a
manutenção do sistema socialdemocrata de bem estar social, com o aumento da
mercadorização das políticas sociais. (ABRAHAMSON, 2012).
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O sistema previdenciário sueco está inserido num contexto sui generis, no cerne de um
país nórdico com grande influência de ideais da socialdemocracia – sobretudo a universalidade
de direitos. No entanto, devido a mudanças nas relações de mercado e até mesmo à própria
crise do welfare state, o sistema previdenciário sueco precisou se reinventar. Com a crescente
taxa de desemprego da década de 1990, houve o estrangulamento do sistema em questão. Há
de se salientar também o envelhecimento populacional e o acirramento da competição
internacional. O Estado então passou a diminuir o seu papel como provedor de renda para os
idosos (população que cresceu muito devido o envelhecimento). Foram tomadas medidas,
então, que visaram à diminuição do déficit público, sem a diminuição drástica dos direitos
sociais.
Há de se levar em conta as especificidades de cada país ao se analisar toda a sua
estrutura de políticas sociais. Suas características culturais, históricas, políticas e geográficas
são elementos essenciais para se fazer tal análise. A dinâmica internacional também é
importante, pois os fenômenos da economia globalizada, da alta velocidade e amplo acesso a
informação e a crescente necessidade de maior competitividade fazem com que os países se
adaptem exatamente para não se tornarem isolados dos demais, perdendo recursos e
oportunidades.
A Suécia é um dos países com indicadores sociais mais avançados do mundo, com
baixo Coeficiente de Gini, o que demostra que há baixa desigualdade de renda. Também é
indicado como um dos países mais democráticos, com um governo que tem alta participação
popular. A preocupação com o desenvolvimento sustentável é outra caraterística desse país,
sustentabilidade essa que também passa pela desconcentração de renda e com o menor
impacto ambiental possível. Essas e as demais especificidades aqui demostradas revelam que a
previdência sueca reproduz o sistema socioeconômico em que está inserido – reprodução essa
que ainda sofre influencia internacional, mas não é totalmente dependente dela.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Set. 1991.
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Rio de Janeiro: Zanar, 1967. pp. 57-114
STEPHENS, J. D. The Scandinavian Welfare States: achievenments, crisis and prospects. UNRISD
Discussion Papers. 1995.
ARTIGO – Eficiência nos gastos públicos
1. INTRODUÇÃO
O Ciclo PDCA, que também atende pelos nomes de Ciclo de Shewhart, Ciclo da
Qualidade ou Ciclo de Deming, é uma metodologia que auxilia no diagnóstico, análise e
prognóstico de problemas organizacionais, sendo útil para a solução de problemas (PACHECO
et al, 2013, p. 3).
Campos (1996, p. 262, apud Andrade, 2003, p. 10) define que: “PDCA é um método de
gerenciamento de processos ou de sistemas. É o caminho para se atingir as metas atribuídas
aos produtos dos sistemas empresariais.” Para Andrade (2003, p.4) “O método PDCA reúne os
conceitos básicos da administração, na forma de um ciclo, apresentado de uma forma simples
e clara de ser entendida e aplicada por qualquer organização”. Esse método “É utilizado pelas
organizações para gerenciar os seus processos internos de forma a garantir o alcance de metas
estabelecidas, tomando as informações como fator de direcionamento das decisões.”
(MARIANI, PIZZINATTO, FARAH, 2005, p. 3). O Ciclo PDCA é composto pelas etapas Plan
(planejar), Do (executar), Check (verificar) e Act (atuar).
Em Minas Gerais, o ciclo de gestão do PPAG foi pensado tomando como referência o
ciclo PDCA. Seu ciclo apresenta cinco etapas: planejamento, execução, monitoramento,
avaliação e revisão. A etapa adicional em relação ao ciclo PDCA resulta do desmembramento
da etapa “check” em “monitorar” e “avaliar” (VASCONCELOS, 2012), pois, em se tratando de
políticas públicas, o monitoramento é essencial para o controle, acompanhamento e
intervenções nos programas de governo. Já a avaliação verificará os resultados do programa
no final do exercício, mostrando-os à sociedade bem como suas respectivas análises.
Na fase de “planejamento”, o PPAG é elaborado. Nessa etapa, são instituídos e
detalhados todos os programas e ações da administração pública estadual para um período de
quatro anos, de forma regionalizada. As atividades de planejamento são realizadas durante os
meses de julho a setembro e culminam com o envio do projeto de lei do PPAG à Assembleia
Legislativa até o dia 30 de setembro. É nesta fase que os indicadores de programa são criados.
A existência de indicadores não é obrigatória, mas a sua criação é recomendada por se tratar
de uma importante ferramenta de mensuração de desempenho frente às metas estabelecidas.
A etapa de “execução” ocorre após a aprovação dos projetos de lei do PPA e da LOA
pela Assembleia Legislativa. A LOA confere operacionalidade ao PPAG e por meio dela são
especificados os recursos e as despesas que serão realizados para cada conjunto de programas
e ações do PPAG (UFV, 2013). Sendo assim, os dois instrumentos são colocados em prática
com o início do exercício financeiro do ano posterior à sua elaboração.
O monitoramento se inicia concomitantemente à fase de execução. Ele tem caráter
técnico, sendo o acompanhamento da execução do plano. Visa identificar riscos, contingências
e oportunidades que possam afetar o andamento e execução das metas traçadas. Para Bozzi
(2001, apud GAMBI, 2010) o monitoramento é uma medição do desempenho ligada à criação
de um sistema de indicadores e ferramentas, em uma dimensão mais técnica. Essa etapa é
realizada com o objetivo de:
[...] tornar mensuráveis os objetivos dos programas por meio de indicadores
de desempenho, relacionando as ações e os recursos necessários para o seu
atingimento, bem como comparando, por meio da coleta sistemática de
dados, os resultados obtidos com as metas propostas, de forma que
assegure ao gestor as informações sobre os progressos obtidos e os
problemas encontrados (SERPA, 2011, p. 48).
4. INDICADORES
Neste tópico do trabalho serão abordados o conceito, as características e a utilidade
dos indicadores, bem como apresentado os indicadores do PPAG, que serão alvo de posterior
análise de dados.
Os indicadores constituem uma relação de grandezas relevantes para a compreensão
da situação do programa e são geralmente exteriorizados na forma de quocientes. São
utilizados para diversos fins, dentre eles: demonstrar a relevância e o impacto de políticas,
planos e programas; estabelecer o marco zero da situação atual; localizar oportunidades e
problemas; estudar comportamentos e inter-relações; monitorar processos para garantir a
eficácia das metas e a utilização dos recursos; avaliar os resultados alcançados e a efetividade
dos trabalhos; alertar para a necessidade de redirecionamentos; comunicar resultados.
(MINAS GERAIS, Manual de Monitoramento do SIGPlan, 2017).
Nesse sentido, o PPAG possui quatro tipos de indicadores que auxiliam na mensuração
da qualidade do plano, a saber: os indicadores de programas, as taxas de execução física e
orçamentária das ações e o índice de eficiência destas. Todos eles são orientados para aferir o
desempenho dos programas e ações governamentais, a fim de orientar os gestores na tomada
de decisões.
A apuração dos indicadores de programa acontece na etapa de avaliação do PPAG,
sendo de responsabilidade dos órgãos e entidades estaduais o lançamento das apurações no
sistema. Destaca-se que caso o órgão ou entidade não tenha possibilidade de apurar o
indicador naquele momento, por motivos diversos, tais como: periodicidade superior a um
ano, dados disponibilizados pela fonte após o período de apuração, é possível atribuir ao
indicador o status de “em apuração”.
Além disso, é possível que o órgão ou entidade, no decorrer da execução do plano,
constatem a inviabilidade de apuração de determinado indicador. Diante dessa situação, o
status conferido ao indicador é o “em revisão”, indicando que o mesmo será reestruturado ou
excluído do plano nas próximas revisões. Ressalta-se, por fim, que os status “em apuração” e
“em revisão” são exceções. A regra é que uma vez criado, os órgãos e entidades tenham
condições técnicas e operacionais de apura o indicador no tempo necessário.
Por sua vez a mensuração do desempenho da ação, envolve três indicadores e
acontece durante o monitoramento. Os dois primeiros, denominados Desempenho Físico e
Desempenho Orçamentário, conforme estabelecido no Manual de Monitoramento do SIGPlan
– 2017, analisam a execução até o período monitorado, permitindo aferir o desempenho físico
e orçamentário da ação em confronto com a meta estabelecida no PPAG. O terceiro indicador
é denominado Índice de Eficiência. De acordo com o Manual de Monitoramento do SIGPlan, o
indicador:
[...] mede a correlação entre o desempenho físico e orçamentário até o
período monitorado, oferecendo uma comparação entre o custo unitário
direto médio planejado e executado. Nesse sentido, esse índice não informa
se o custo planejado ou executado é alto ou baixo, mas apenas se o custo
apurado no momento da execução foi maior ou menor que o custo
programado. A faixa de 0,7 a 1,3 é considerada um intervalo razoável de
variação, fora do qual há uma distorção desproporcional entre as taxas de
execução física e orçamentária (MINAS GERAIS, Manual de Monitoramento
do SIGPlan, 2017, p.42).
O quadro 1 mostra uma visão geral dos indicadores dentro do planejamento mineiro.
Percebe-se, que, ao longo dos anos, a média de programas com pelo menos um indicador é de
149,25. Como a média de programas ao longo dos anos é de 233,75, durante o quadriênio
63,81% dos programas cadastrados tiveram pelos menos um indicador cadastrado. Ademais,
como pode haver mais de um indicador por programa, existem anos (2012 e 2013) em que o
número de indicadores ultrapassa o número de programas.
Além disso, outra análise que se depreende do quadro 1 pode ser melhor vista no
gráfico 1. Percebe-se que, ao longo dos anos, o percentual de programas com pelo menos um
indicador decresceu. Todavia, mesmo com um quantitativo menor constatou-se que durante
os anos, o percentual de indicadores apurados aumentou, enquanto os percentuais de
indicadores “Em Apuração” ou “Em revisão” diminuíram, conforme demonstrado no quadro 2.
A variação constatada é positiva, uma vez que um indicador em revisão ou em apuração não
pode fornecer informações úteis para a revisão do programa no ano seguinte, não
contribuindo com aperfeiçoamento do plano.
Nota-se que 67,24% dos indicadores tiveram a sua polaridade confirmada durante o
ciclo de gestão do PPAG 2012 – 2015. Sendo que em 34 deles a variação do valor apurado, nos
quatro anos, foi do tipo maior melhor, enquanto em cinco a variação foi menor melhor. Por
outro lado, 16 indicadores do tipo maior melhor tiveram uma variação negativa, ou seja,
durante os quatro anos de vigência do Plano o valor apurado em determinado ano foi menor
do que o apurado no ano anterior, contrariando a tendência esperado de incremento. Já em
relação à tendência de redução dos indicadores do tipo menor melhor, três deles não tiveram
a polaridade confirmada.
O resultado acima revela que aqueles programas em que os indicadores não tiveram a
sua tendência confirmada, possíveis falhas no planejamento ou na execução de suas metas
prejudicaram a geração da mudança de realidade esperada a partir da criação do programa.
Para tanto, analisaremos no próximo tópico o desempenho das ações que se mantiveram
vigentes durante os quatro anos do plano, a fim de identificar o padrão de execução física e
orçamentária dessas ações.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O artigo teve como objetivo analisar o desenvolvimento dos indicadores e mecanismos
de controle do monitoramento previstos no SIGPLAN para verificar se os resultados se
mostraram efetivos para melhorar o planejamento ao longo dos anos. Assim, por meio dos
indicadores, o planejamento físico e orçamentário pode ser visualizado por critérios objetivos
que permitem sua avaliação.
Foi realizada uma análise bibliográfica do histórico do planejamento brasileiro e
mineiro, demonstrando as etapas e evoluções que resultaram na promulgação da Constituição
da República Federativa do Brasil de 1988 e na implementação do Plano Plurianual. Após isso,
os estados instituíram seus próprios planos e, Minas Gerais, instituiu o Plano Plurianual de
Ação Governamental para coordenar suas ações do decorrer dos seus quatro anos de vigência.
Com institucionalização do PPAG, bem como de sua ferramenta de gestão, o SIGPlan,
pôde-se analisar as ações e programas que compõem este plano. Assim, depreendese da
referida análise que, as ações que passaram por um processo mais longo de monitoramento
conseguiram, de fato, um percentual “Satisfatório” maior do aquele observado no plano como
um todo.
Em relação aos indicadores de programas, percebe-se que, apesar da quantidade de
indicadores por programas ter diminuído ao longo dos anos, o percentual de indicadores que
foram apurados aumentou, além de ter diminuído o número de indicadores “em revisão” e
“em apuração”. Essas constatações são consideráveis, uma vez que vez que um indicador em
revisão ou em apuração não contribui com aperfeiçoamento do plano. Percebe-se, portanto,
uma evolução no que se trata da utilização dos indicadores como forma de mensuração de
resultados de ações e programas, e melhoria destes por parte dos gestores ao longo dos anos.
Por fim, observa-se que apesar das ações constantes em todos os anos analisados
seguirem a mesma tendência dos resultados obtidos com todas ações do PPAG, as primeiras
tiveram um melhor resultado, considerando o desempenho satisfatório físico e orçamentário.
Assim, o monitoramento e os indicadores presentes nos programas e nas ações auxiliam na
melhoria desta etapa do ciclo, uma vez que as ações melhoraram seu desempenho e,
principalmente, diminuíram a quantidade de indicadores que não auxiliavam neste processo.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Politécnica da Universidade de São Paulo para obtenção do título de mestre em engenharia.
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SCOFIELD, Patrícia. Minas Gerais fecha 2014 com saldo negativo, revela Fazenda. 2015.
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SERPA, Selma Maria Hayakawa Cunha. Levantamento do Tribunal de Contas da União sobre
sistemas de monitoramento e avaliação da administração direta do poder executivo. Revista
Brasileira de Monitoramento e Avaliação, Brasília, nº. 2, p. 46-75, jul./dez. 2011.
1. INTRODUÇÃO
2. DO CONTROLE INTERNO
Nesse contexto, o controle interno governamental desempenha, entre outros, a
função de ajudar a modernizar o aparato burocrático, promovendo sua probidade, legalidade
e transparência. Como atua fortemente em funções que impactam diretamente na qualidade
da gestão e na democratização das relações do Estado com a sociedade (OLIVIERI, 2010), sua
atuação, portanto, tem potencial de gerar impacto muito positivo sobre a qualidade das
políticas públicas.
Assim, a compreensão da estrutura e atuação dos órgãos de controle interno é aspecto
fundamental para analisar a capacidade das próprias Administrações de melhorarem seu
desempenho e, consequentemente, a qualidade dos serviços públicos.
Favorecido pelo conceito de modernização da administração pública para melhorar a
eficiência, importantes medidas foram empreendidas nesse sentido, principalmente no que diz
respeito ao monitoramento das políticas públicas. É função do controle interno – auditando,
fiscalizando, orientando e normatizando – democratizar o poder público fazendo prestar
contas à população e responsabilizando possíveis desvios de condutas. Sendo assim, os
organismos de controle interno devem auxiliar na condução de uma melhor administração do
Estado (SPECK & FERREIRA, 2012).
Enquanto órgãos responsáveis pelas auditorias das contas públicas e avaliação da
gestão governamental, estes atuam por meio das fiscalizações da atuação estatal e de
orientações aos gestores. Por isso esses mecanismos de controle interno são importantes para
a promoção da responsabilidade governamental. Mesmo com estruturas e realidades
completamente diversas, Brasil e Espanha possuem atualmente organismos específicos de
controle da gestão pública nacional. Por isso, o presente trabalho buscou estudar e
compreender a atuação destes instrumentos de defesa do Estado para saber se estruturas
diversas atingem os mesmos objetivos do controle interno governamental.
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Joaquim Filipe. Da Nova Gestão Pública à Nova Governação Pública: pressões
emergentes da fragmentação das estruturas da Administração Pública. In: H. Silvestre & J. F.
Araújo (Coord.). Coletânea em Administração Pública. Lisboa, Portugal: Escolar Editora, pp. 25-
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FARIA, José Henrique de; & MENEGHETTI, Francis Kanashiro. Burocracia como organização,
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OLIVIERI, Cecília. A lógica política do controle interno: o monitoramento das políticas públicas
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SPECK, Bruno; & FERREIRA, Valeriano M. (Coord.). Sistemas de Integridade nos Estados
Brasileiros. São Paulo: Instituto ETHOS de Empresas e Responsabilidade Social, 2012.
ARTIGO – Controle Interno na Administração Pública
1. INTRODUÇÃO
4. SISTEMAS DE MONITORAMENTO
Os sistemas de monitoramento são também um elemento crucial para a estruturação
do monitoramento analítico em uma política, já que a forma com que as informações estão
dispostas e os indicadores que são disponibilizados aos usuários podem desestimular a equipe
para o esforço de interpretação dessas informações. Logo, é imprescindível que os indicadores
estejam dispostos na forma de um painel, com interface simples e amigável, que permita aos
técnicos e gestores acessar os dados referentes à política, contribuindo para uma atitude mais
analítica sobre ela (JANUZZI, 2011).
Ainda segundo Januzzi (2001), é importante que os sistemas de monitoramento
disponham de indicadores relevantes e periodicamente atualizados para que se possa
acompanhar o andamento do programa ou política. A utilização de indicadores sociais ocorre
com a finalidade de enriquecer a interpretação empírica da realidade social e potencializar a
análise, formulação e interpretação das políticas. Apesar de um grande esforço de atualização
tecnológica para armazenamento, tratamento e consulta de indicadores, não se tem dedicado
com o mesmo afinco no aprimoramento analítico no uso desses indicadores para o processo
de formulação e avaliação das políticas sociais. Por conseguinte, impera-se a crença de que o
mero emprego dessas tecnologias, por si só, garantirá uma melhor gestão dos recursos e
programas sociais.
Segundo Mora (2000) a construção de indicadores e a fixação de metas para a
avaliação de desempenho não é um exercício fechado, mas sim um processo flexível e
dinâmico em que, a partir dos aprendizados adquiridos, com o tempo pode sofrer alterações.
Além disso, deve se adaptar às mudanças institucionais, à disponibilidade de informações e ao
cenário no qual a política ou programa está inserido.
A configuração de um painel analítico de uma política ou programa deve se apoiar em
um bom conjunto de indicadores, que “(...) deve ser suficiente para prover indicações da
“situação geral” do programa em seus componentes-chave, mas nem tão amplo que traga
ambiguidade, redundância e perda de objetividade no que é fundamental analisar” (JANUZZI,
2011, p.17).
É preciso ter atenção para que cada tipo de usuário receba informações adequadas ao
que necessita – aos usuários gestores de nível operacional devem estar disponíveis
informações que possibilitem o acompanhamento dos processos e atividades sob sua
responsabilidade e aos gestores mais estratégicos, indicadores que permitam acompanhar os
macroprocessos chave para o modelo lógico do programa ou política.
Januzzi ainda cita uma série de propriedades a que um indicador deve atender, tais
como:
ter um grau de cobertura populacional adequado aos propósitos a que se
presta; ser sensível a políticas públicas implementadas; ser específico a
efeitos de programas setoriais; ser inteligível para os agentes e públicos-alvo
das políticas; ser atualizável periodicamente, a custos razoáveis; ser
amplamente desagregável em termos geográficos, sociodemográficos e
socioeconômicos; gozar de certa historicidade para possibilitar comparações
no tempo (JANUZZI, 2001, p.56-57).
Como é muito difícil que um indicador apresente todas essas características, o analista
deve avaliar os trade-offs das diferentes possibilidades que podem ser obtidas, de forma a
selecionar os melhores indicadores para uma determinada situação. Além disso, a avaliação de
políticas públicas requer indicadores de diferentes naturezas. Portanto, é imprescindível que
se diferencie os indicadores quanto à natureza do ente indicado, tais como insumo, processo,
produtos, resultados e possíveis impactos (JANUZZI, 2011).
Os indicadores de insumo refletem a disponibilidade dos insumos básicos para a
execução da política, que podem envolver recursos humanos, financeiros, ou equipamentos.
Os indicadores de processo se prestam a indicar como esses recursos foram utilizados, ou seja,
os esforços empreendidos para a obtenção dos resultados propostos. Já os indicadores de
produto, objetivam apreender os resultados obtidos com os processos executados, isto é, o
alcance de metas físicas. Indo além da entrega de produtos, os indicadores de resultado se
propõem a mensurar os benefícios para o público-alvo, decorrentes das ações da política.
Enquanto, os indicadores de impacto voltam-se para os efeitos provocados por essa política
para a sociedade (BRASIL, 2014).
A partir da especificação de um marco conceitual, isto é, o arcabouço
teórico/normativo que norteará a implementação/condução de uma política pública, é
importante o enquadramento desse marco a partir de uma lógica de encadeamento, de forma
que cada parte desse processo se relacione com as demais.
Assim sendo, é importante observar esses aspectos para a definição de uma cadeia de
objetivos, que possibilite antever a lógica e a consistência interna das propostas, alternativas e
estratégias de intervenção.
Dada essa relação de interdependência e causalidade entre as fases desse ciclo, é
possível estabelecer análises comparativas e de correlação entre cada uma das partes por
meio dos indicadores envolvidos em cada uma delas.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
É notável no Brasil uma grande carência de uma cultura avaliativa nas instituições que
lidam com as políticas sociais. Nas organizações em que os processos de M&A são mais
desenvolvidos no país, há o predomínio de uma concepção gerencial, enquanto a noção de
monitoramento analítico é bastante incipiente.
Faz-se necessário, então, que se avance na estruturação de uma cultura de
monitoramento analítico dentro das burocracias que conduzem as políticas públicas no país.
Para atingir tal objetivo, é importante se atentar às estratégias propostas por Mokate como
propulsoras desse processo de transformação, quais sejam: a especificação de um marco
conceitual, ajustes dos indicadores a esse marco, superação da lacuna entre o quantitativo e o
qualitativo, e a gestão efetiva dos fluxos de informação.
Retomando as duas primeiras recomendações de Mokate, é imprescindível que exista
um marco teórico bem definido para orientar a condução da política e que os indicadores
monitorados guardem correspondência com esse marco. No entanto é relevante destacar que,
em grande parte das vezes, essa correspondência não existe e que há uma enorme carência de
indicadores de resultado no contexto brasileiro.
Além disso, há um predomínio de indicadores de insumo, processo e, sobretudo, de
produto, o que evidencia uma excessiva preocupação com entregas e com o desempenho, mas
não necessariamente há um enfoque para resultados. Quando existem indicadores de
impacto, muitas vezes, tenta-se correlacionar esses indicadores com os de produto, no
entanto, essa ligação tende a ser falha, pois existe uma enorme distância entre uma coisa e
outra e vários outros fatores que devem ser levados em consideração.
Tratando-se da superação da lacuna entre o quantitativo e o qualitativo, quando se
restringe-se à abordagens quantitativas, é comum que se produza resultados ambíguos ou de
difícil interpretação. Dessa maneira, é interessante que se combine abordagens quanti e quali
de modo a se obter respostas mais assertivas em relação ao que se busca com as práticas
avaliativas.
Já com relação a gestão efetiva dos fluxos de informação, é fundamental a constituição
de fluxos que favoreçam e criem incentivos para o exercício analítico sobre as informações que
são monitoradas. Uma interessante alternativa é a inclusão de um importante ator dentro dos
fluxos informacionais, a sociedade civil. Para além de oportunizar o efetivo controle social da
política que está sendo monitorada, a publicização das informações geradas e a abertura de
espaços de diálogo com a população, atende às tendências contemporâneas para a gestão
pública, como o accountability e a participação social, até porque uma das principais funções
dos processos avaliativos se refere a sua aplicação como um recurso democrático.
Por fim, é relevante relembrar que a estruturação dessa lógica de resultados não se
deve restringir ao que o CLAD (2010) considera como “gerencialismo equivocado”, ou seja,
para além da melhoria no desempenho, é necessário que o trabalho seja norteado em função
dos resultados que se almejam alcançar. Só assim, será possível ultrapassar a lógica de
monitoramento gerencial dominante e avançar na construção de uma cultura de
monitoramento analítico.
NOTAS
1 [...] la proposición de metas no es meramente una tarea gerencial, sino que debe estar ligada
a objetivos políticos más amplios CLAD (2010, p. 12).
2 La libertad y la flexibilidad para tomar decisiones es fundamental, tanto para enfrentar los
riesgos como para aprovechar las oportunidades del entorno (MORA, 2000, p.6).
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PORTER, S., GOLDMAN, I. ‘A Growing Demand for Monitoring and Evaluation in Africa’, African
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ARTIGO – Temas transversais
RESUMO: Este artigo tem como objetivo analisar como estão distribuídos os fatores e
características que contribuem para a vulnerabilidade dos jovens dos centros urbanos, em
especial das juventudes em territórios urbanos vulneráveis da Região Metropolitana de Belo
Horizonte. Para alcançar este objetivo foi analisado o conceito de juventudes, vulnerabilidade
social e territorialidade de forma a compreender as conexões entre essas temáticas. Para
comprovar a tese de que as vulnerabilidades sociais são concentradas e sobrepostas em
territórios específicos da cidade, foi analisada a distribuição de jovens vítimas de homicídios
em Belo Horizonte e a distribuição de vulnerabilidades sociais relacionadas às temáticas de
trabalho, saúde, educação e pobreza na Região Metropolitana de Belo Horizonte. O resultado
demonstrou que os 34 territórios com maior vulnerabilidade social em Belo Horizonte,
detentores de 8,56% da quantidade de jovens da cidade, concentram 17,25% do número de
homicídios consumados contra jovens de 14 a 29 anos de idade e que 85,1% das Unidades de
Desenvolvimento Humano possuem ao menos 9 das 11 das variáveis investigadas em situação
pior do que a média da Região Metropolitana, comprovando assim a tese enunciada.
Reconhecida essa realidade, o artigo parte para sua fase final em que discute as possíveis
estratégias e enfoques que as políticas públicas de/para/com juventudes e políticas territoriais
utilizam para superação de situações de exclusão social.
1. INTRODUÇÃO
Segundo Waiselfisz (2014), Brasil é um “país sem disputas territoriais, movimentos
emancipatórios, guerras civis, enfrentamentos religiosos, raciais ou étnicos, conflitos de
fronteira ou atos terroristas”. E é neste país que tivemos, entre 2008 e 2011, um total de
206.005 vítimas de homicídio. Número superior às 169.575 vítimas dos 12 maiores conflitos
armados do mundo entre 2004 e 2007 e muito próximo aos 208.349 mortos nos 62 conflitos
armados deste período. Para além do elevado número absoluto de homicídios, o Brasil fica na
7º colocação mundial na lista de países com as maiores taxas de homicídios de jovens entre 15
e 29 anos de idade (WAISELFISZ, 2014).
A proporção de homicídios na juventude brasileira tem um grande peso na vida dos
jovens. A Pesquisa Nacional sobre Perfil e Opinião dos Jovens Brasileiros – 2013, realizada pela
Secretaria Nacional de Juventude, demonstra que 51% dos jovens já perderam alguma pessoa
próxima por morte violenta e pouco mais de 20% dos jovens tiveram uma pessoa próxima
vítima de homicídio. Segundo a pesquisa (SNJ, 2013, p.25), as vítimas, no geral, “são amigos,
irmãos, primos ou tio desses jovens, ou seja, companheiros de geração”, pessoas que
desempenham um papel central na formação dos jovens enquanto indivíduo e que, ao
morrerem vítimas de homicídio geram uma experiência de alta dramaticidade para os jovens.
O impacto da violência na vida dos jovens é tão grande que nesta pesquisa a violência
foi citada por 43% dos jovens como sendo considerado o problema que mais preocupa os
jovens e corrobora “a constatação do quanto essa experiência se configura como constitutiva
dessa geração” (SNJ, 2013, p. 27).
Os dados apresentados demonstram que há um grupo historicamente excluído da
população que são as principais vítimas de homicídio no Brasil, fazendo com que as vítimas
tenham cor, idade, gênero e endereço, sendo elas “jovens negros do sexo masculino,
moradores das periferias e áreas metropolitanas dos centros urbanos” (WAISELFISZ, 2014, p.
9). São em sua maioria jovens que foram excluídos dos recursos materiais ou simbólicos, do
acesso à estrutura de oportunidades sociais, econômicas, culturais, resultando em
“debilidades ou desvantagens para o desempenho e mobilidades social dos atores” (VIGNOLI;
FILGUEIRA apud ABRAMOVAY, 2002, p. 13). Os homicídios estão intrinsecamente ligados à
vulnerabilidade social e aos espaços de sociabilidade dos quais o jovem utiliza para se
constituir enquanto sujeito. É no território em que o jovem vive, se relaciona, estuda, trabalha,
que os fatores materiais e simbólicos se tornam potencializadores das vantagens e
desvantagens.
Investigar a relação entre juventudes, vulnerabilidade social e territorialidade é
essencial para estruturarmos estratégias e enfoques para as políticas públicas de/para/com as
juventudes. E é com o objetivo de contribuir para o aprofundamento do debate sobre
juventudes, vulnerabilidade social e territorialidade e prospectar possíveis saídas para essa
realidade de exclusão social que este trabalho se propõe a realizar uma análise das juventudes
em territórios urbanos vulneráveis da Região Metropolitana de Belo Horizonte e responder a
seguinte pergunta: Como estão distribuídos os fatores e características que contribuem para a
vulnerabilidade dos jovens dos centros urbanos, em especial das juventudes em territórios
urbanos vulneráveis da Região Metropolitana de Belo Horizonte?
Para tanto precisaremos compreender o significado do que é ser jovem e do termo
“juventudes”; conceituar vulnerabilidade e territorialidade; investigar o impacto das
vulnerabilidades e da territorialidade na constituição do jovem enquanto sujeito; averiguar a
relação entre a vulnerabilidade social e a violência; analisar como as vulnerabilidades estão
distribuídas na Região Metropolitana de Belo Horizonte e como a violência está distribuída em
Belo Horizonte; e explorar possíveis estratégias e enfoques que as políticas públicas
de/para/com juventudes e políticas territoriais utilizam para superação de situações de
exclusão social.
2. DESENVOLVIMENTO TEÓRICO
O conceito de juventude é definido por Dayrell (2003, p. 42) como “um momento
determinado da vida, cunhado por um processo extremamente influenciado pelo meio social
no qual o jovem se desenvolve e pela qualidade das trocas que esse meio proporciona”. Falar
sobre a juventude significa, portanto, compreender toda a realidade social, econômica e
cultural que influenciam nessa etapa da vida do indivíduo e reconhecer que “a idade é
também um fenômeno social, e não apenas biológico” (RODRIGUES, 2009, p. 41).
A juventude possui um caráter de formação para o indivíduo que faz com que essa
etapa transitória seja singular na vida humana. É durante esse período em que o indivíduo
estabelece sua identidade pessoal e um conjunto de crenças e padrões morais em que irá
basear suas ações. Essa etapa constitutiva do sujeito é impactada pelas mais diversas
formas de vulnerabilidade, exclusão social e isolamento, de forma a influir na construção e
definição do papel social a ser desempenhado pelo jovem. E é esse caráter formativo que dá
um sentido especial à heterogeneidade da juventude.
Definir juventude não é algo simples porque estamos falando de um fenômeno social
influenciado por fatores econômicos, históricos, sociais e culturais. Enquanto ser social, o
homem se constitui na relação com o outro, dentro de um meio social em que ele está
inserido. O ser humano é, portanto uma, construção em que faz parte de determinado grupo e
contexto social, sendo igual a muitos que compartilham da mesma realidade e singular
enquanto indivíduo. Nesta perspectiva, o jovem se constitui enquanto sujeito a partir das
potencialidades que o meio lhe apresenta, como apresentado por Dayrell (2003, p.43),
“podemos concluir que o pleno desenvolvimento ou não das potencialidades que caracterizam
o ser humano vai depender da qualidade das relações sociais desse meio no qual se insere”.
Pobreza e desigualdade fazem parte de um cenário de desumanização, em que o
jovem é “proibido de ser” e é “privado de desenvolver suas potencialidades”, fazendo com que
os jovens em situação de risco social vivenciam uma complexa dialética entre potencialidade e
vulnerabilidade. E é vivenciando e interpretando as relações e contradições de nossa
sociedade que os jovens vulneráveis constroem uma cultura própria e, “nos limites dos
recursos a que têm acesso, eles vivenciam processos riquíssimos de socialização, mesmo que
não sejam os tradicionais, elaboram valores, representações, identidades, constituem-se como
sujeitos, tão humanos quanto outros jovens ‘bem socializados’ com trajetórias de vida mais
‘normais’”. A diversidade de lugares, meios e contextos no qual o jovem se constitui enquanto
sujeito faz com que existam múltiplas formas de se vivenciar a juventude, e é reconhecendo
essa realidade que o termo “juventudes” foi cunhado (DAYRELL, 2001, p. 229).
3. JUVENTUDE E VULNERABILIDADE
Para discutirmos juventude e vulnerabilidade, partiremos da definição do termo
vulnerabilidade social, que é concebida como “o resultado negativo da relação entre a
disponibilidade dos recursos materiais ou simbólicos dos atores, sejam eles indivíduos ou
grupos, e o acesso à estrutura de oportunidades sociais, econômicas, culturais que provêm do
Estado, do mercado e da sociedade. Esse resultado se traduz em debilidades ou
desvantagens para o desempenho e mobilidades social dos atores” (VIGNOLI; FILGUEIRA
apud ABRAMOVAY, 2002, p. 13).
Nesse sentido, a vulnerabilidade social diz tanto sobre discrepâncias objetivas como o
acesso à estrutura de oportunidades sociais, econômicas, culturais e a recursos materiais,
quanto sobre questões subjetivas como a diferença de recursos simbólicos entre os atores.
São fatores diferentes que dialogam entre si, tornando cada um potencializador do outro e
tendo como resultado final a exclusão social.
Dos mais diversos tipos de necessidades do indivíduo, tem um tipo que se relaciona
mais especificamente com a juventude, que é a necessidade formativa (específica do período
de formação do sujeito). Caso a necessidade formativa não seja suprimida ela pode provocar
um falimento no percurso de construção do indivíduo com consequências graves de “reações
marginalizantes, de agressividade, de fuga da realidade, de aceitação da condição
marginalizante” (CALIMAN, 2008, p. 94).
Estar em uma situação de marginalidade significa estar excluído dos espaços de poder
e do acesso aos recursos que o sistema possui. A marginalização, por outro lado, é “um
processo no qual indivíduos e grupos são expulsos e se encontram isolados no sentido
negativo dentro do sistema social ao qual pertencem e do qual continuam a depender”. O
objeto da marginalidade é “a exclusão dos direitos, das decisões, dos recursos e dos
privilégios” (CALIMAN, 2008, p. 112). A pobreza e a vulnerabilidade têm como características a
privação da renda; privações múltiplas; a multidimensionalidade e sobreposição de fatores de
exclusão social; o impacto nas relações sociais e trajetória dos indivíduos; e a redução da
autonomia, capacidades, ativos a resiliência dos indivíduos (BRONZO, 2005, p. 203).
A marginalização do jovem tem impacto estruturante, de forma que “a estrutura social
de subdesenvolvimento determina as condições de vida de setores absolutamente
majoritários da população latino-americana e impede a constituição da juventude no seu
sentido social” (RODRIGUEZ apud CALIMAN, 2008, p. 126).
4. TERRITORIALIDADE
A definição de território e territorialidade apresenta concepções heterogêneas. Seu
sentido pode ser delimitado de forma mais restrita como um “recorte no espaço”,
homólogo à regionalização (LEMOS apud BRASIL, 2004, p. 48) ou, de forma mais ampla, a
partir de dimensões mais relacionais e sociológicas.
É neste caminho que Lefebvre conceitua o espaço social como “produto, condição e
meio de reprodução das relações sociais” (Lefebvre apud Brasil, 2004, p. 49), neste sentido, o
espaço é envolvido por diversas dimensões como “as práticas espaciais materiais inscritas no
cotidiano vivido e as práticas espaciais simbólicas referidas às representações”. Conceito
próximo a este é trazido por Boaventura de Sousa Santos, que define o espaço da comunidade
como “constituído pelas relações sociais desenvolvidas em torno da produção e reprodução
dos territórios físicos e simbólicos, de identidade e identificações com referências as origens e
destinos comuns” (SANTOS apud BRASIL, 2004, p. 49).
Neste sentido, o espaço público tem sua importância intensificada na vida do jovem e
as relações que ultrapassam o âmbito familiar e seu respectivo controle constituem processos
de estruturação de sua identidade. É nos espaços em que o jovem está fora do controle
exercido pela sua família que ele cria amizades e “elos” entre grupos específicos. (JAYME,
ANDRADE E ALMEIDA, apud RODRIGUES, 2009, p. 55).
Segundo Saravi (2004, p.34), “assim como o espaço público é fator decisivo na
formação de identidades dos jovens, ele é também ‘potencializador’ de processos de
acumulação de vantagens ou de desvantagens” neste sentido, parte das vulnerabilidades
também é “fruto de relações sociais e de processos de segregação e marginalização
socioespacial” (BRONZO, 2010, p.126), tendo o território como influência direta para
“qualidade das trocas” e pela qualidade dos espaços de sociabilidade disponíveis (DAYRELL,
2003, p. 49).
O reconhecimento do território enquanto “potencializador” das vantagens e
desvantagens é reforçado por evidências empíricas. Bronzo (2015) explica o conceito.
“Em determinados territórios ou áreas espaciais, existem condições de
privações que se sobrepõem com um acúmulo de riscos e vulnerabilidades
que limitam as chances de superação da pobreza e impõem
constrangimentos não desprezíveis para a população que ali reside ou
trabalha” (BRONZO, 2015, p. 416).
É a partir dessa infraestrutura social, dessa relação entre o material e o simbólico, que
os territórios se tornam potencializadores de vantagens e desvantagens e constroem
diferentes “lealdades, códigos compartilhados, pertencimentos”. É a partir destes pedaços que
o jovem estrutura sua identidade pessoal e um conjunto de crenças e padrões morais em que
este irá basear suas ações. O espaço estrutura relações, sociabilidades, oportunidades e
vulnerabilidades.
Ou seja, o fenômeno da vulnerabilidade e, portanto, seu enfrentamento, não podem
ser compreendidos adequadamente de um ponto de vista estritamente individual, mas como
resultado e expressão de um conjunto de relações sociais e materiais que se articulam em
espaços determinados.
5. METODOLOGIA
O objetivo da pesquisa quantitativa é buscar a resposta para duas perguntas
essenciais: As vulnerabilidades sociais e os homicídios estão concentrados em territórios
específicos da cidade? Se sim, esses territórios estão suscetíveis a uma sobreposição de
vulnerabilidades?
Para analisar a distribuição territorial, a sobreposição das vulnerabilidades sociais e a
vitimização de jovens foram coletados dados secundários do Atlas do Desenvolvimento
Humano do Brasil e será apresentado e analisado o mapa da concentração de homicídios de
jovens entre 14 e 29 anos na cidade de Belo Horizonte durante o período entre 2012 e 2015.
A investigação sobre a concentração de vulnerabilidades sociais teve como enfoque a
Região Metropolitana de Belo Horizonte. Foram investigados dados relativos às Unidades de
Desenvolvimento Humano (UDH). Para a verificação, foram analisados 10% das UDHs mais
vulneráveis. O indicador base para a análise foi “% de pessoas de 15 a 24 anos que não
estudam, não trabalham e são vulneráveis, na população dessa faixa (2010)”. Este vetor foi
adotado para balizar a escolha dos territórios pelo fato de que, para um jovem não estudar e
nem trabalhar, ele deve estar sujeito a uma série de vulnerabilidades que os outros dados
estão menos sujeitos a variação. Para a análise, além do indicador base, foram escolhidos
outros 10 indicadores relacionados à questão do trabalho, saúde, educação e pobreza.
A partir da análise destes territórios foram extraídas duas tabelas. A Tabela 1 analisa a
proporção dos territórios analisados que está abaixo da média dos índices da RMBH nos
demais indicadores e a Tabela 2, que analisa a proporção dos territórios analisados que está
entre os 10% mais vulneráveis de cada um dos indicadores.
6. ANÁLISE DE RESULTADOS
MAPA 1
O Centro Integrado de Informações de Defesa Social (CINDS), ao realizar uma análise
dos 34 territórios com maior vulnerabilidade social em Belo Horizonte escolhidos a partir de
uma análise multicritério elaborada por eles, demonstraram que esses territórios¹, detentores
de 8,56% da quantidade de jovens da cidade, concentram 17,25% do número de homicídios
consumados contra jovens de 14 a 29 anos de idade.
A relação entre violência e vulnerabilidade social é muito bem tratada por Daniel
Cerqueira e Danilo Santa Cruz Coelho na Nota Técnica do IPEA “Redução da Idade de
Imputabilidade Penal, Educação e Criminalidade”. É durante este estudo que eles demonstram
que a probabilidade de um homem com menos de 7 anos de estudo ser vítima de homicídio é
15,7 vezes maior do que entre homens com mais anos de estudo. Para a análise, os autores
fizeram uma estimativa de qual seria a quantidade de homicídios caso todos os indivíduos de
15 anos ou mais tivessem ensino médio. O resultado é que o número de vidas poupadas seria
de 22.442, uma queda de 43,3% no número de homicídios no país. Constatou-se que, “para
cada 1% a mais de jovens entre 15 e 17 anos nas escolas, há uma diminuição de 2% na taxa de
homicídio do município” e “se estimou ainda que o aumento de 1% na taxa de desemprego
dos homens jovens (15 a 29 anos) contribui para o aumento da taxa de homicídio no município
em questão de 2,5%” (CERQUEIRA, COELHO; 2015).
Há uma grande desigualdade territorial na RMBH, enquanto que na média
metropolitana a taxa de jovens de 15 a 24 anos sem estudar e nem trabalhar é de 6,4%, esse
valor vai de 18,8% a 13,87% nas UDHs mais vulneráveis da RMBH; uma diferença de pelo
menos 216,7%.
Como apontado na Tabela 1, essa desigualdade também se reflete em todos os outros
indicadores, das 11 variáveis apresentadas, 85,1% das UDH‟s possuem ao menos 9 das 11
variáveis em situação pior do que a média da Região Metropolitana. Não bastasse a
concentração de vulnerabilidades sociais em territórios específicos, esse dado demonstra que
são múltiplas as vulnerabilidades às quais os jovens estão sujeitos e que há uma alta
sobreposição de vulnerabilidades nesses territórios.
A gravidade da sobreposição de vulnerabilidades sociais se agrava quando analisamos
a quantidade de indicadores das UDHs da RMBH dentro dos territórios mais vulneráveis de
cada um dos indicadores analisados. Como demonstrado na Tabela 2, das 11 vulnerabilidades
analisadas, 86,5% dos territórios analisados pertencem à lista dos territórios mais vulneráveis
de 3 ou mais indicadores. Não bastasse os territórios possuírem uma realidade inferior à média
da RMBH, eles ainda estão dentro da lista dos territórios com os piores indicadores.
7. SUPERANDO BARREIRAS
Reconhecer essa realidade é fundamental para a construção de políticas públicas que
possam romper esse ciclo de exclusão social. E a relação entre juventudes, vulnerabilidade e
territorialidade dão pistas para possíveis caminhos que as políticas públicas de/para/com a
juventude poderiam percorrer e que foram muito bem estruturadas no livro “Políticas Públicas
de/para/com Juventudes” publicado em 2004 pela UNESCO e que serão apresentadas a seguir.
Os principais enfoques estratégicos que governos e entidades utilizam para a construção de
ações, projetos e programas se baseiam em 4 eixos centrais: “grupo de risco”; sujeitos de
direito; atores estratégicos no desenvolvimento; a construção do capital social e o seu
empoderamento.
Não obstante a contribuição dada pela publicação acima e reconhecendo a
importância da dimensão territorial no desenho de estratégias de superação da
vulnerabilidade social, é importante aprofundarmos um pouco mais na temática da
territorialidade, por isso, além das formas mencionadas de superação da vulnerabilidade
juvenil, incluiremos as proposições da Carla Bronzo (2010) construídas em seu artigo
“Intersetorialidade, autonomia e território em programas municipais de enfrentamento da
pobreza: experiências de Belo Horizonte e São Paulo” sobre territorialidade e que serão
baseadas em três eixos centrais: a centralidade do território para as políticas sociais; a noção
de infra-estrutura social; formas flexíveis de provisão dos serviços. É importante observar que
não se buscará eleger o melhor enfoque, mas compreendê-los para que possam ser utilizados
de forma combinada para a construção de políticas públicas.
Enfoques Estratégicos:
1. Jovens como “grupo de risco”: O reconhecimento dos jovens como “grupo de risco”
parte da “existência de amplos setores juvenis excluídos, vivendo em condições
extremamente precárias e enfrentando limitações” (UNESCO, 2004, p. 140). Os
dados relacionados à educação, ao trabalho e à violência reafirmam a compreensão
de que “esses atores sofrem um risco de exclusão social sem precedentes devido a
um conjunto de desequilíbrios provenientes do mercado, Estado e sociedade que
tendem a concentrar a pobreza entre os membros desse grupo e distanciá-los do
‘curso central’ do sistema social” (UNESCO, 2004, p. 140).
Eixos territoriais:
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como podemos observar pela teoria e análise realizada, os 34 territórios com maior
vulnerabilidade social em Belo Horizonte, detentores de 8,56% da quantidade de jovens da
cidade, concentraram 17,25% do número de homicídios consumados contra jovens de 14 a 29
anos de idade e 85,1% das Unidades de Desenvolvimento Humano possuem ao menos 9 das
11 das variáveis investigadas em situação pior do que a média da Região Metropolitana,
comprovando assim a tese enunciada de que “em determinados territórios ou áreas espaciais,
existem condições de privações que se sobrepõem com um acúmulo de riscos e
vulnerabilidades que limitam as chances de superação da pobreza e impõem
constrangimentos não desprezíveis para a população que ali reside ou trabalha” (BRONZO,
2015, p. 350). Ao reconhecermos o mosaico de oportunidades e desvantagens que a RMBH
apresenta, fica claro que territórios específicos da região apresentam cenários de
desumanização, em que o jovem é “proibido de ser” e é “privado de desenvolver suas
potencialidades” (DAYRELL, 2003, p. 43). Neste sentido, os jovens possuem fortes
constrangimentos e barreiras para seu desenvolvimento enquanto sujeito social.
As múltiplas e sobrepostas privações às quais os jovens de territórios vulneráveis estão
sujeitos impactam não só na redução da qualidade de vida, mas também na qualidade dos
espaços de socialização, integração e construção de capital social. Estes processos de
orientação e socialização dos jovens influenciam na participação ou não em atividades
criminosas de forma que os jovens em territórios vulneráveis possuem menores custos de
oportunidade para aderirem a essas atividades. As autoras Richard e Mumford, utilizadas pela
Carla Bronzo (2005, p. 183), caminham nessa direção ao colocar que a redução da capacidade
da infraestrutura social “aumentam atos de vandalismo, crimes e comportamentos
antissociais” e gera uma maior probabilidade do jovem ser vítima de homicídio.
Reconhecer a relação entre juventudes, vulnerabilidade social e territorialidade é
fundamental para que o Estado e a sociedade possam construir estratégias e enfoques para a
superação da exclusão social e possam enfrentar o extermínio que a juventude, em especial a
juventude negra, pobre e periférica, enfrenta no seu dia a dia.
NOTA
REFERÊNCIAS
ABRAMOVAY, Miriam. Juventude, violência e vulnerabilidade social na América Latina:
desafios para políticas públicas / Miriam Abramovay. – Brasília: UNESCO, BID, 2002. 192 p.
BRASIL, Flávia de Paula Duque. Território e territorialidades nas políticas sociais. In: COSTA,
Bruno; BRONZO, Carla. Gestão Social: o que há de novo? Fundação João Pinheiro, 2004.
BRASIL. Secretaria Nacional de Juventude. Agenda juventude Brasil: pesquisa nacional sobre o
perfil e opinião dos jovens brasileiros. Brasília: SNJ, 2014
CALIMAN, Geraldo. Paradigmas da exclusão social. – Brasília: Editora Universa, UNESCO, 2008.
368 p.
DAYRELL, Juarez. O jovem como sujeito social. Revista brasileira de educação n24: set/dez
2003, p. 40- 52
DAYRELL, Juarez. A música entra em cena: o rap e o funk na socialização da juventude em belo
horizonte. Faculdade de Educação da USP, 2001.
RODRIGUES, Hila. Políticas para a juventude e gestão local no Brasil: agenda, desenho e
implementação. 2009.
RESUMO: Este artigo tem o propósito de analisar alguns aspectos da denominada “Nova Lei de
Finanças Públicas”, Projeto de Lei Complementar (PLC), que tramita atualmente no Congresso
Nacional. Objetivo desse estudo é analisar a forma e o conteúdo do PLC em comparação com
atos normativos nacionais e internacionais. Em termos metodológicos, o estudo constituiu
uma pesquisa exploratória, comparativa e qualitativa. Os resultados da análise demonstram
que a “Nova Lei” poderá promover uma reforma efetiva, no Brasil, se enfatizar as
características do modelo de orçamento-programa, que ainda não foi plenamente
implementado no país.
1. INTRODUÇÃO
Este artigo tem o propósito de analisar alguns aspectos da denominada “Nova Lei de
Finanças Públicas”, Lei Complementar (LC) que, conforme o parágrafo 9º do artigo 165 da
Constituição Federal (CF) de 1988, deverá dispor, entre outros temas, sobre o exercício
financeiro, a organização e a vigência do plano plurianual (PPA), da lei de diretrizes
orçamentárias (LDO) e da lei orçamentária anual (LOA) e estabelecer normas de gestão
financeira e patrimonial, bem como normatizar as condições para a instituição e o
funcionamento de fundos públicos.
Esse estudo justifica-se por se tratar de um tema de alta relevância para efeitos das
reformas governamentais a serem conduzidas em matéria de gestão orçamentária e financeira
no Brasil. Além disso, trata-se de um assunto que vem sendo objeto de diversos projetos de lei
(PLs) discutidos e apreciados no âmbito do Congresso Nacional (CN), de modo que é válido, no
plano acadêmico, verificar a evolução temporal desses PLs e seus respectivos conteúdos.
Convém, ainda, examinar esse novo marco regulatório em comparação à vigente Lei
nº 4.320, de 17 de março de 1964, e a Lei nº 101, de 4 de maio de 2000 (a chamada Lei de
Responsabilidade Fiscal/LRF), bem como no que concerne às inciativas adotadas em países
desenvolvidos como Japão e Nova Zelândia. Nesse sentido, também é válido estudar as
diferenças e as similaridades da “Nova Lei” em relação às normas brasileiras e de outros países
em matéria de orçamentação e finanças públicas.
A proposição da “Nova Lei de Finanças Públicas” remonta à segunda metade da
década de 1990, quando teve início a tramitação do Projeto de Lei Complementar (PLC) nº
135, de 10 de dezembro de 1996, que visou instituir normas de direito financeiro para
elaboração, execução e controle dos planos, diretrizes, orçamentos e balanços da União, dos
estados, do distrito federal e dos municípios (BRASIL, 1996). Com o advento da LRF, esse PLC
tornou-se obsoleto (BRASIL, 2009), de acordo com publicação da Secretaria do Orçamento
Federal (SOF), órgão do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (MPDG).
Por meio do PLC nº 135/1996, de iniciativa do Poder Executivo Federal, esperava-se
introduzir no ordenamento jurídico atual uma norma que pudesse substituir a Lei nº
4.320/1964, publicada na década de 1960, considerada defasada para os parâmetros
tecnológicos, financeiros e administrativos do final do século XX e do início do século XXI.
No ano de 2009, teve início a tramitação do PLC nº 229, de 28 de maio de 2009, que
objetiva, além de regulamentar o referido dispositivo constitucional, instituir normas gerais
sobre plano, orçamento, controle e contabilidade pública, voltadas para a responsabilidade no
processo orçamentário e na gestão financeira e patrimonial. O PLC nº 229/2009, também,
deveria alterar alguns dispositivos da LRF e revogar a Lei nº 4.320/1964.
2. METODOLOGIA
O método de pesquisa adotado neste estudo, no que concerne aos meios técnicos de
investigação, foi o comparativo, ou seja, procedeu-se a investigação dos aspectos do PLC nº
295/2016 com vistas a ressaltar as diferenças e as similaridades desse ato normativo em
relação às leis de finanças públicas japonesa e neozelandesa. Sendo assim, objetivou-se
melhor conhecer as potencialidades e as deficiências desse PLC. Conforme Antonio Carlos Gil
(2009), o método comparativo concebido como aquele que:
O método comparativo procede pela investigação de indivíduos, classes,
fenômenos ou fatos, com vistas a ressaltar as diferenças e similaridades
entre eles. Sua ampla utilização nas ciências sociais deve-se ao fato de
possibilitar o estudo comparativo de grandes grupamentos sociais,
separados pelo espaço e pelo tempo. Assim é que podem ser realizados
estudos comparando diferentes culturas ou sistemas políticos. Podem
também ser efetivadas pesquisas envolvendo padrões de comportamento
familiar ou religioso de épocas diferentes (GIL, 2008, p.16-17)
O núcleo inovador ao qual Core se refere consiste no fato de a Lei nº 4.320, de 1964,
ter introduzido, no país, um modelo de orçamento funcional ou de orçamento de
desempenho, em que “a receita e a despesa são estruturadas de forma que evidencie a
política econômico- financeira do governo e as ações passam a ser explicitadas segundo um
programa de trabalho, contendo as funções, atividades e projetos” (CORE, 2001). Apesar da
incompatibilidade parcial entre a Lei nº 4.320/1964 e a ordem constitucional de 1967, o
governo brasileiro, em um contexto de reforma administrativa, editou o Decreto-Lei nº 200, de
25 de fevereiro de 1967, que institui o método do orçamento-programa, caracterizado por
ações voltadas a solucionar problemas sociais e pela integração entre as funções de orçamento
e de planejamento.
A Constituição Federal de 1988 também recepcionou, não de forma integral, aspectos
da Lei nº 4.320/1964 e da perspectiva programática do Decreto-Lei nº 200/1967. Entre as
inovações jurídicas trazidas pela Constituição vigente em matéria de orçamento público,
mencionam-se: a obrigatoriedade do planejamento de médio prazo (PPA), a criação da LDO
como instrumento de vinculação entre o plano de desenvolvimento e o orçamento anual e a
divisão da LOA nos orçamentos fiscal, da seguridade social e de investimentos das empresas.
Conforme Oswaldo Maldonado Sanches, apesar das modificações introduzidas, apresenta
algumas inconsistências que podem ser equacionadas pela “Nova Lei de Finanças Públicas”:
Do ponto de vista das normas de organizações e execução dos orçamentos,
a serem equacionados por intermédio da lei complementar referenciada na
Constituição, a questão mais urgente é a do orçamento de investimentos
das empresas sob o controle do setor público, devido à absoluta
inadequação das normas da Lei nº 4.320/1964 para disciplinar a sua
elaboração e, sobretudo, sua execução. Contudo, o principal problema com
que todos defrontam hoje, seja no Legislativo, seja no Executivo, é o do
caráter recente das modificações introduzidas pela Constituição, cuja não
regulamentação amplifica o espaço para divergências, gera incertezas nos
planos técnico, legal e político e retarda a articulação do instrumental
metodológico apropriado (SANCHES, Oswaldo Maldonado, p.190, 2007)
Da
III Do Processo I, II, III, III Elaboração S/Nº Da III
Orçamentári IV e V da Lei do Receita
o Orçamento Pública
- -
- - - XI Disposições S/Nº
Finais
Fonte: Elaborado pela autora a partir da análise do PLC nº 295/2016, a Lei nº 4.320/1964 e
Lei nº 101/2000
A primeira Lei de Finanças Públicas japonesa (Public Finance Law) foi aprovada em
1947, em um contexto que teve início logo após o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-
1945). O princípio legal de equilíbrio orçamentário (equivalência entre receitas e despesas)
constituiu o fundamento dessa norma, embora houvesse alguma flexibilidade para que o setor
público contratasse operações de crédito (endividamento público) a fim de reconstruir a
infraestrutura do país, que havia sido devastada durante o conflito internacional. Contudo,
para Massato Miayazi (2006), o aumento das despesas nipônicas, na prática, ocorreu apenas
no fim da década de 1950, pois, até então, o principal objetivo da política econômica do Japão
era a redução do déficit fiscal.
No exercício financeiro de 1965, apesar de ter havido uma compatibilidade entre as
receitas previstas e as despesas fixadas, o governo japonês percebeu que seria, nos próximos
anos fiscais, cada vez mais difícil obter fontes de financiamento para o aumento dos gastos
públicos. Dessa forma, nesse mesmo ano, foi editada uma lei especial que previa formas
excepcionais de financiamento para atender a eventuais desequilíbrios nas contas
governamentais. Com o advento da crise econômica de 1973, o Japão passou a experimentar
um período de recessão que acarretou uma redução na arrecadação de receitas do país. Em
1975, uma nova lei especial era aprovada para sustentar o aumento das despesas, ou seja, o
endividamento que era uma exceção converteu-se em regra. Entre 1976 e 1978, observa-se
um incremento significativo da dívida pública japonesa.
Nos anos de 1980 e 1990, o Japão experimentou duas reformas fiscais, sendo a
reforma da década de 1980 mais exitosa do que a da década seguinte. Apesar de ter falhado
na introdução de um imposto sobre consumo em 1979, o governo adotou uma série medidas
voltadas à diminuição dos gastos públicos, iniciativas que tiveram amplo apoio popular
(MIAYAZI, 2006, p.126). Essas medidas, que incluíam a imposição de limites às despesas
governamentais e o aumento da arrecadação de tributos, propiciaram a retração dos gastos e
o aumento das receitas.
A reforma da década de 1990 teve como marco de referência o Fiscal Structural
Reform Act de 1997, que se submeteu a três modificações, em 1998, a fim de superar os
efeitos da recessão que afetou a economia japonesa no final do século XX. Em resumo, as
modificações propostas foram as seguintes: suspensão das medidas de redução do déficit
público para atender a situações de calamidade pública (como desastres naturais), autorização
de redução do déficit fiscal para menos de 3% do PIB foi estendida de 2003 para 2005 e a
concessão para o aumento para mais 2% dos gastos com seguridade social no exercício
financeiro de 1999. Para Miayazi, fatores-chave como liderança política, condições econômicas
e o balanceamento entre receitas e despesas públicas explicam o êxito e o malogro das
reformas em cada período (MIAYAZI, 2006, p.133).
Na década de 2000, emergiu, no Japão, um movimento social a favor de uma nova
reforma fiscal. Nesse período, menciona-se a iniciativa do Research Institute of Economy,
Trade and Industry (RIETI), uma organização não governamental, de realizar o Simpósio
“Reforma Fiscal do Japão: Reformulando a Estrutura do Estado”, que ocorreu entre os dias 11
e 12 de março de 2004. As propostas discutidas no referido evento incluíram temas como: a
integração e a coordenação dos sistemas tributário e previdenciário, a introdução de um
sistema de orçamento plurianual, a alocação de recursos orçamentários em políticas públicas
multissetoriais, o estabelecimento de uma cultura de responsabilidade fiscal nos governos
locais e o compartilhamento de valores favoráveis à estabilidade fiscal no longo prazo (RIETI,
2004).
A estrutura da Public Finance Law (PFL) assemelha-se mais a forma de organização do
PLC nº 295/2016 (e da Lei nº 4.320/1964) do que da Lei nº 101/2000, embora há nela a
previsão de funcionamento de um órgão (Fiscal Council System) cujas atribuições se
aproximam do Conselho de Gestão Fiscal da LRF. A PFL é formada por três capítulos (Normas
Gerais sobre Finanças Públicas, Regras Contábeis e Orçamento) e apresenta 48 artigos e 13
emendas. No Japão, uma monarquia parlamentarista, elaboração e a apresentação do
orçamento público competem ao Gabinete do Primeiro Ministro. Assim como no Brasil, a
proposta orçamentária deve ser apreciada pelo Poder Legislativo, denominado Dieta Nacional
no caso japonês.
Ao longo da década de 1970 e no início da década de 1980, predominaram, na Nova
Zelândia, políticas fiscais keynesianas, caracterizadas pelo estímulo da demanda agregada e
pelo aumento progressivo dos investimentos públicos. Um ponto de inflexão dessas políticas
consiste na publicação do Fiscal Reponsability Act (FRA) de 1994, ato normativo que decorreu
de um conjunto de reformas gerenciais (New Public Management) do setor público ocorridas
nesse país na década de 1980. A FRA exerceu ampla influência na concepção da LRF brasileira.
O Public Finance Act (PFA) da Nova Zelândia foi instituído em 1989. De acordo com
essa norma, a alocação dos recursos públicos constitui uma atribuição do Poder Legislativo
(Parlamento), cabendo ao Pode Executivo a implementação da gestão financeira. Em 2004, foi
publicado o Public Finance Bill (PFB), que alterou e assimilou aspectos importantes do PFA.
Entre os aspectos alterados e assimilados, deve-se citar o controle exercido pelo Parlamento
sobre a previsão e a execução orçamentária, o emprego do princípio de competência em vez
do de caixa no registro contábil, a exigência de realização de auditorias independentes e de
elaboração de relatórios com planejamento fiscal de longo prazo.
O processo orçamentário da Nova Zelândia insere-se no modelo anglo-saxônico do
direito costumeiro, caracterizado por normas não escritas, e, dessa forma, não tem como base
uma lei orçamentária, mas vários atos normativos e resoluções emitidas pelo Parlamento. O
ciclo orçamentário é formado de cinco etapas: preparação e apresentação da estimativa de
receita e dos limites de despesa pelo Poder Executivo, tramitação legislativa no Parlamento,
execução orçamentária, contabilidade e relatórios de auditoria externas.
6. CONCLUSÕES
Brasil, Japão e Nova Zelândia, apresar de serem caracterizados por padrões de
culturais e níveis de desenvolvimento socioeconômico distintos, apresentam normas legais,
em matéria orçamentário-financeiro, que, em virtude de alguns aspectos, são passíveis de
comparação. No quadro 3 é possível visualizar as diferenças entre o PLC brasileiro e as leis
japonesa e neozelandesa.
Quadro 3 – Comparação entre PLC nº 295/2016, Public Finance Law e o Public Finance Bill
PLC nº 295/2016 Public Finance Law (1949) Public Finance Bill (2004)
País Brasil País Japão País Nova Zelândia
Principais Planejamento Principai Planejamento Principai Processo
aspectos s s Orçamentário
Processo aspectos Processo aspectos Responsabilidade
Orçamentário Orçamentário Fiscal
Contabilidade Contabilidade Controles
Externo, Interno
e Social
Funcionamento Funcionamento Operações de
de Fundos de Fundos Crédito
(endividamento)
Fonte: Elaborado pela autora por meio da análise dos conteúdos do PLC nº 295/2016, da
Public Finance Law e do Public Finance Bill
Com base no quadro 3, infere-se que a “Nova Lei de Finanças Públicas” assemelha-se
mais da Lei japonesa do que do ato normativo neozelandês. Uma razão que explica esse fato
decorre do componente “fiscalista” (responsabilidade ou ajuste fiscal) que está mais presente
no PFB do Japão do que no PFA da Nova Zelândia. Na verdade, essa também é a circunstância
que explica por que a “Nova Lei” se propõe a extinguir a Lei nº 4.320/1964, mas não a LRF.
Apesar de o PLC nº 295 compartilhar mais similaridades com a Lei japonesa, as
potencialidades (fortalecimento do PPA como instrumento de desenvolvimento
socioeconômico, por exemplo) da “Nova Lei” poderão ser mais aproveitadas se o Brasil, em
matéria de política macroeconômica, não seguir a mesma estratégia, caracterizada pelo
incremento dos gastos públicos, adotada pelo governo do Japão para promover a recuperação
econômica da década de 1990 (PESSOA, 2004). Vale ressaltar que essa estratégia gerou
estagnação e aumento do endividamento público.
Em um momento em que o Brasil atravessa um período de grave recessão, a reforma
das finanças públicas pode ser uma medida favorável para a retomada do crescimento
econômico. Nesse sentido, a cultura da austeridade fiscal trazida pela LRF ao não deve ser
apenas mantida, mas combinada com iniciativas que assegurem mais qualidade ao gasto
público e um modelo de planejamento centrado em resolução de problemas públicos. Os
eventuais benefícios acarretados pela reforma tenderão a ser mais significativos se
enfatizarem o paradigma de orçamento-programa, que ainda carece de plena efetivação no
contexto brasileiro.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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MIYAZAKI, M. Framework for Fiscal Consolidation: Successes and Failures in Japan. Oecd
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PESSOA, M. F. Fiscal policy in Brazil and Japan what can be learned. Tokio, 2004. Disponível
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RIETI. Fiscal Reform of Japan: Redesigning the Frame of the State Five proposals for
complementary institutional reform: From a “compartmentalized” to a “cross- sectional”
system. Japan, 2004. Disponível em:
<http://www.rieti.go.jp/en/events/04031101/pressrelease.pdf>. Acesso em: 26 fev. 2017.
TOLLINI, Helio Martins. A nova lei complementar de finanças públicas. 2017. Palestra realizada
na Escola Nacional de Administração Pública em 06 mar. 2017.
ARTIGO – Temas transversais
1. INTRODUÇÃO
Este artigo tem o propósito de analisar alguns aspectos da denominada “Nova Lei de
Finanças Públicas”, Lei Complementar (LC) que, conforme o parágrafo 9º do artigo 165 da
Constituição Federal (CF) de 1988, deverá dispor, entre outros temas, sobre o exercício
financeiro, a organização e a vigência do plano plurianual (PPA), da lei de diretrizes
orçamentárias (LDO) e da lei orçamentária anual (LOA) e estabelecer normas de gestão
financeira e patrimonial, bem como normatizar as condições para a instituição e o
funcionamento de fundos públicos.
Cargos comissionados são necessários para que governos eleitos democraticamente
possam colocar a administração pública no rumo do plano de governo escolhido pela
população nas urnas. O equilíbrio entre tamanho da administração (atribuições, orçamento e
pessoal) e o número de cargos comissionados ocupados por pessoas da confiança do Governo
que não prestaram concurso público é delicado. A Constituição Federal de 1988 previu apenas
três exceções para ingresso no serviço público sem concurso público:
Artigo 37, inciso V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por
funcionários ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem
preenchidos por funcionários de carreira nos casos, condições e percentuais
mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção,
chefia e assessoramento;
Cargos em comissão que se desviam das atribuições de direção, chefia e
assessoramento são, portanto, inconstitucionais. E há um motivo para isso: atribuições de
natureza administrativa, técnica ou científica devem ser exercidas exclusivamente por
servidores públicos submetidos a concurso público de ingresso, uma vez que são funções de
Estado e devem ser impessoais, além de transcender o tempo de mandato dos governos
eleitos.
Neste breve estudo pretendemos avaliar em termos quantitativos de que modo os
cargos de livre provimento do Governo do Estado de São Paulo atendem às exigências e
restrições constitucionais de direção, chefia e assessoramento, bem como as condições para o
desenvolvimento de carreiras típicas de Estado, as quais têm como sua natureza o exercício de
funções administrativas, técnicas ou científicas nesta estrutura político-administrativa.
4. ANTECEDENTES
Em 2008, uma missão do Fundo Monetário Internacional (FMI) visitou São Paulo a
convite da Secretaria da Fazenda (SEFAZ) para realizar uma avaliação sobre o grau de
transparência das atuais práticas de gestão fiscal e fazer recomendações no sentido de
aproximar-se das boas práticas internacionais. No documento ‘Transparência das Ações e das
Contas Públicas’, de 2008, há uma série exaustiva de análises críticas e recomendações do FMI
para o Governo do Estado de São Paulo, dentre as quais destaca-se a seguinte em relação aos
seus cargos comissionados:
As práticas de gestão dos servidores públicos devem ser aprimoradas.
Indicação para cargos em comissão. Apesar de muitos empregos públicos
serem competitivos, o número de cargos comissionados de livre indicação
representa um quantitativo expressivo (cerca de 24 mil cargos), apesar de
que muitos só podem ser ocupados pelos próprios servidores de carreira*.
Recomendação: As autoridades devem examinar a conveniência de reduzir o
número de cargos comissionados de livre indicação.
* (Nota de rodapé nº 12 do documento): Do total de 539.251 cargos do
Estado (excluindo a polícia militar), 4,4 por cento podem ser nomeados
livremente pelo governador. Todas as demais funções de confiança são
exercidas exclusivamente por funcionários concursados e da respectiva
carreira. São normalmente as funções de chefia e assistência, por exemplo,
das carreiras típicas, como fiscal de impostos. Dados do quadro de pessoal
estão disponíveis no site www.recursoshumanos.sp.gov.br. [FMI, 2008, p.
17-18]
Não se diferencia neste documento elaborado pelo FMI quantos daqueles 24 mil
cargos comissionados eram, em 2008, ocupados por funcionários de carreira (comissionados
com vínculo) e quantos eram ocupados por comissionados sem vínculo.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) realiza anualmente, desde 2012,
o ‘Estudo do Perfil dos Municípios e Estados Brasileiros’, dentro do qual está a ‘Pesquisa de
Informações Básicas Estaduais’, o Estadic. Em 2014 tornou-se de conhecimento público a
contradição entre os números de cargos comissionados informados pelo Governo do Estado
de São Paulo, conforme pode-se verificar em reportagem dos jornais da época, como esta, d’O
Globo: ‘Número de servidores comissionados cresce 3,5%, diz IBGE’. O jornal publicou o
seguinte:
Somente comissionados são os que têm como vínculo somente o cargo que
ocupam.
Desde a missão realizada pelo FMI em 2008 até os dias atuais, o Governo do Estado de
São Paulo pouco avançou na transparência ativa sobre seus recursos humanos. Em
contrapartida, a adoção de uma rotina técnica de consolidação e publicação dos dados
referentes aos cargos e empregos públicos enquanto política de Estado de transparência ativa
existe no Governo Federal desde os tempos do então Ministério da Administração Federal e
Reforma do Estado (MARE), dirigido à época pelo então Ministro Luiz Carlos Bresser- Pereira. O
Boletim Estatístico de Pessoal4 é publicado mensalmente de forma contínua e ininterrupta
desde maio de 1996 pelo Governo Federal. No Governo do Estado de São Paulo, por seu
turno, a despeito de ser a segunda maior Unidade Federativa do Brasil em população,
funcionários e orçamento públicos, não existe tal transparência.
Assim sendo, ao analisar-se os conjuntos de dados oficiais do Governo do Estado de
São Paulo chega-se aos seguintes números consolidados5: ao todo são 27.204 funcionários
comissionados, dos quais 10.777 sem vínculo com o Estado (comissionados puros) e 16.427
com vínculo (concursados). Possui, também, 174.470 funcionários contratados em regime
temporário (85% dos quais na Secretaria da Educação) e 323.486 funcionários efetivos
ocupando cargos permanentes (56% dos quais pertencentes ao quadro permanente da
Secretaria da Educação).
Não estão disponíveis nos conjuntos de dados oficiais utilizados nesta pesquisa e,
portanto, não foram aqui contabilizados, os números referentes ao efetivo da Polícia Militar.
Todos os números dizem respeito a funcionários ativos, ou seja, não estão contabilizados
aposentados nem pensionistas.
Tabela 3 - Distribuição dos Cargos Públicos por Natureza Jurídica dos Órgãos.
Fonte: Governo do Estado de São Paulo (elaboração própria).
Tabela 4 - Média Salarial dos Cargos Públicos por Natureza Jurídica dos Órgãos.
Fonte: Governo do Estado de São Paulo (elaboração própria).
6. COMISSIONADOS DA ADMINISTRAÇÃO INDIRETA
COMISSIONADOS
PERMANENTES
Administração Indireta sem com TOTAL % comiss.
total puros
vínculo vínculo
AGEM - AGÊNCIA
METROPOLITANA DA BAIXADA 20 - 20 - 20 100,0
SANTISTA
COMPANHIA PAULISTA DE
21 - 21 - 21 100,0
EVENTOS E TURISMO
CPP - COMPANHIA PAULISTA DE
14 - 14 - 14 100,0
PARCERIAS
ARTESP - AGÊNCIA REGULADORA
50 - 50 - 50 100,0
DE TRANSPORTES
SP-PREVCOM - FUNDAÇÃO DE
PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR DO 70 - 70 - 70 100,0
ESTADO DE SÃO PAULO
JUCESP - JUNTA COMERCIAL DO
179 - 179 - 179 100,0
ESTADO DE SÃO PAULO
IPESP - INSTITUTO DE
PAGAMENTOS ESPECIAIS DE SÃO 30 - 30 - 30 100,0
PAULO
COMPANHIA PAULISTA DE
10 - 10 - 10 100,0
SECURITIZAÇÃO
AGEMCAMP - AGÊNCIA
13 - 13 - 13 100,0
METROPOLITANA DE CAMPINAS
FUNDAÇÃO PARQUE ZOOLÓGICO
5 282 287 67 354 81,1
DE SÃO PAULO
DER - DEPARTAMENTO DE
259 1.526 1.785 1.279 3.064 58,3
ESTRADAS DE RODAGEM
DAESP - DEPARTAMENTO
AEROVIÁRIO DO ESTADO DE SÃO 58 34 92 76 168 54,8
PAULO
SUTACO-SUP. TRAB. ARTESANAL
11 2 13 11 24 54,2
COMUNIDADES
FUNDAÇÃO MEMORIAL DA
31 - 31 33 64 48,4
AMÉRICA LATINA
DAEE - DEPARTAMENTO DE ÁGUAS
6 621 627 713 1.340 46,8
E ENERGIA ELÉTRICA
FAPESP - FUNDAÇÃO DE AMPARO
À PESQUISA DO ESTADO DE SÃO 49 85 134 158 292 45,9
PAULO
EMPLASA - EMPRESA PAULISTA DE
PLANEJAMENTO METROPOLITANO 40 34 74 99 173 42,8
SA
ARSESP - AGÊNCIA REGULADORA
59 - 59 83 142 41,5
DE SANEAMENTO E ENERGIA
UNIVESP - FUNDAÇÃO
UNIVERSIDADE VIRTUAL DO 13 - 13 24 37 35,1
ESTADO DE SÃO PAULO
DERSA - DESENVOLVIMENTO
177 - 177 339 516 34,3
RODOVIÁRIO S.A.
FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO
23 8 31 60 91 34,1
PAULO
[...] [...] [...] [...] [...] [...] [...]
TOTAL 5.730 9.964 15.694 96.456 112.150 14,0
Tabela 5 - Quantidade e proporção de empregados comissionados (com e sem vínculo) e permanentes
nos órgãos da Administração Indireta. Apresentados apenas os órgãos com proporção de comissionados
igual ou superior a 30% do total de empregados do órgão.
Fonte: Governo do Estado de São Paulo (elaboração própria).
Para facilitar o entendimento dessa questão no Estado de São Paulo foram adicionadas
abaixo informações sobre a recente ação do Ministério Público Estadual de São Paulo (MPE-
SP) [CONJUR, 2016] contra órgão da Prefeitura Municipal de São Paulo, mais precisamente,
contra a Empresa de Tecnologia da Informação e Comunicação do Município de São Paulo
(PRODAM), na qual o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) decidiu (cf. Acórdão do TJ- SP,
voto nº 11.340) que a contratação para a ocupação de cargos públicos deve ser realizada por
meio de concurso público e declarou nulas as contratações sem concurso, com a dispensa do
pessoal admitido em tais condições. Ipsis literis, o MPE-SP pediu ao TJ-SP:
Caso o mesmo entendimento fosse replicado aos órgãos do Governo do Estado de São
Paulo, aproximadamente 2.595 “empregos em comissão sem vínculo” correriam o risco de ser
instantaneamente considerados ilegais: 641 em fundações e 1.954 em empresas públicas e
sociedades de economia mista.
A soma dos números das células que compõem os referidos eixos é apresentada na
parte externa da tabela. Cada célula desta tabela quadridimensional corresponde a uma
posição em cada uma das quatro dimensões. Assim, por exemplo, sabe-se que nas Secretarias
do Estado de São Paulo existem 242 funcionários contabilizados como ‘comissionados sem
vínculo’ que são, simultaneamente:
Não permanente: não ocupam qualquer cargo permanente;
Comissionado: foram nomeados para ocupar cargo em comissão;
Designado: foram designados para exercer as atribuições de cargo em
comissão;
Não temporário: não foram contratados em regime temporário.
COMISSIONADOS
PERMANENTES
Administração Direta sem com TOTAL % comiss.
total puros
vínculo vínculo
ENERGIA E MINERACAO 30 4 34 1 35 97,1
TURISMO 33 19 52 19 71 73,2
DIREITOS DA PESSOA COM
36 7 43 17 60 71,7
DEFICIENCIA
SANEAMENTO E RECURSOS
52 20 72 38 110 65,5
HIDRICOS
CULTURA 93 44 137 83 220 62,3
DESENVOLVIMENTO SOCIAL 197 89 286 226 512 55,9
HABITACAO 34 19 53 44 97 54,6
EMPREGO E RELACOES DO 96 44 140 122 262 53,4
TRABALHO
JUSTICA E DEFESA DA CIDADANIA 80 20 100 100 200 50,0
CASA CIVIL 21 5 26 34 60 43,3
SECRETARIA DE GOVERNO 341 152 493 739 1.232 40,0
LOGISTICA E TRANSPORTES 27 5 32 51 83 38,6
GESTAO PUBLICA* 26 39 65 122 187 34,8
ADMINISTRACAO PENITENCIARIA 489 887 1.376 3.003 4.379 31,4
ESPORTE, LAZER E JUVENTUDE 62 75 137 352 489 28,0
PROCURADORIA GERAL DO ESTADO 53 396 449 1.212 1.661 27,0
TRANSPORTES METROPOLITANOS 35 19 54 226 280 19,3
FAZENDA 532 636 1.168 5.536 6.704 17,4
SAUDE 1.809 1.613 3.422 24.701 28.123 12,2
DESENVOLVIMENTO ECONOMICO,
33 25 58 421 479 12,1
C&T
SEGURANCA PUBLICA 58 187 245 1.832 2.077 11,8
AGRICULTURA E ABASTECIMENTO 194 295 489 3.762 4.251 11,5
MEIO AMBIENTE 66 96 162 1.301 1.463 11,1
PLANEJAMENTO E GESTAO 92 37 129 2.536 2.665 4,8
EDUCACAO 594 1.613 2.207 180.633 182.840 1,2
TOTAL 5.083 6.346 11.429 227.111 238.540 4,8
Tabela 7 - Quantidade e proporção de servidores comissionados (com e sem vínculo) e
permanentes nos órgãos da Administração Direta. (*) A Secretaria de Gestão Pública foi
extinta e toda sua estrutura e cargos foram distribuídos para as atuais Secretarias de
Planejamento e Gestão e Secretaria de Governo; apesar disso, permanece enquanto órgão
vigente no Portal da Transparência do governo paulista.
Fonte: Governo do Estado de São Paulo (elaboração própria).
Existem duas situações previstas na legislação estadual paulista nas quais, ao invés de
nomear alguém para ocupar um cargo comissionado de livre nomeação e exoneração, o
responsável por um órgão ou departamento pode simplesmente designar alguém para
responder temporariamente pelo expediente de uma unidade administrativa. O primeiro caso
ocorre em decorrência de reforma administrativa para exercer função de comando de unidade
que ainda não tenha o cargo correspondente. O segundo caso ocorre quando há necessidade
de substituição no impedimento legal ou temporário do titular do cargo de comando de
unidade administrativa.
Nos dois casos descritos acima ou o cargo não existe (reforma administrativa), ou o
cargo existe e está ocupado, mas seu titular está temporariamente impedido de exercer suas
atribuições e precisa ser substituído durante o interstício de seu impedimento. Alguns órgãos
do Governo do Estado de São Paulo aparentemente utilizam a forma jurídica da designação
como manobra para não contabilizar cargos comissionados, uma vez que para o mundo
jurídico a nomeação é uma forma de provimento (ocupação) de cargo público, enquanto a
designação é mera forma de desempenho temporário de servidor para cargos ou funções de
comando.
Deste modo, no presente estudo constatou-se que no Governo do Estado de São Paulo
existem mais designações do que nomeações para cargos de comando (direção e chefia): ao
todo, a Administração Direta possui 4.868 designados e 6.561 nomeados em cargos
comissionados (comando e assessoramento). Por não existir transparência sobre os
quantitativos de designações para cada tipo (reforma administrativa em que o cargo ainda não
existe, substituição temporária do titular, ou para “responder pelo expediente de cargo vago”),
o comando constitucional que exige transparência ativa do quantitativo de cargos
comissionados preenchidos de todos os órgãos estaduais é driblado por alguns:
COMISSIONADOS
Administração Direta comando assessoramento %
total designados
(nomeados) (nomeados) designados
ADMINISTRACAO PENITENCIARIA 1.376 942 148 286 68,5%
SEGURANCA PUBLICA 245 138 42 65 56,3%
SAUDE 3.422 1.832 1.113 477 53,5%
MEIO AMBIENTE 162 84 33 45 51,9%
ESPORTE, LAZER E JUVENTUDE 137 70 23 44 51,1%
PROCURADORIA GERAL DO
449 220 107 122 49,0%
ESTADO
EDUCACAO 2.207 1.045 557 605 47,3%
AGRICULTURA E ABASTECIMENTO 489 222 83 184 45,4%
DESENVOLVIMENTO ECONOMICO,
58 21 19 18 36,2%
C&T
EMPREGO E RELACOES DO
140 36 50 54 25,7%
TRABALHO
TRANSPORTES METROPOLITANOS 54 11 13 30 20,4%
TURISMO 52 8 19 25 15,4%
CASA CIVIL 26 4 9 13 15,4%
CULTURA 137 16 34 87 11,7%
SECRETARIA DE GOVERNO 493 57 96 340 11,6%
FAZENDA 1.168 123 157 888 10,5%
JUSTICA E DEFESA DA CIDADANIA 100 9 35 56 9,0%
SANEAMENTO E RECURSOS
72 6 21 45 8,3%
HIDRICOS
PLANEJAMENTO E GESTAO 129 9 34 86 7,0%
HABITACAO 53 3 17 33 5,7%
DESENVOLVIMENTO SOCIAL 286 10 169 107 3,5%
LOGISTICA E TRANSPORTES 32 1 15 16 3,1%
GESTAO PUBLICA* 65 1 11 53 1,5%
ENERGIA E MINERACAO 34 - 11 23 0,0%
DIREITOS DA PESSOA COM
43 - 15 28 0,0%
DEFICIENCIA
TOTAL 11.429 4.868 2.831 3.730 42,6%
Tabela 8 - Quantidade e proporção de servidores comissionados (designados, nomeados em
cargos de comando e nomeados em cargos de assessoramento) nos órgãos da
Administração Direta. (*) A Secretaria de Gestão Pública foi extinta e toda sua estrutura e
cargos foram distribuídos para as atuais Secretarias de Planejamento e Gestão e Secretaria
de Governo; apesar disso, permanece enquanto órgão vigente no Portal da Transparência
do governo paulista.
Fonte: Governo do Estado de São Paulo (elaboração própria).
Administração PERMANENTES %
Unidade COMISSIONADOS TOTAL
Direta puros comiss.
Unidade Central de
Secretaria de 34 9 43 79,1%
Recursos Humanos (UCRH)
Planejamento
Coordenadoria de
e Gestão 40 55 95 42,1%
Orçamento (CO)
Secretaria de Corregedoria Geral da
22 37 59 37,3%
Governo Administração (CGA)
Secretaria da Departamento de Controle e
46 147 193 23,8%
Fazenda Avaliação (DCA)
TOTAL 142 248 390 36,4%
Tabela 9 - Quantidade e proporção de servidores comissionados e permanentes puros
em quatro unidades tipicamente burocráticas da Administração Direta.
Fonte: Governo do Estado de São Paulo (elaboração própria).
Cientes das dificuldades para modernizar seu aparato estatal, setores do Governo do
Estado de São Paulo construíram no intervalo entre 2004 e 2008 alguns estudos,
entendimentos e decisões que levaram à criação de duas carreiras típicas de Estado projetadas
para fortalecer seu núcleo estratégico e dinamizar seu Ciclo de Planejamento e Gestão: as
carreiras de Especialista em Políticas Públicas (EPP) e de Analista em Planejamento, Orçamento
e Finanças Públicas (APOFP). Na mensagem do Governador à Assembleia Legislativa do Estado
de São Paulo (ALESP) que acompanhou, em 2007, o projeto de lei de criação dessas carreiras,
estavam postos os nobres valores que orientaram o Governo naquela ocasião:
Contudo, quase uma década após sua criação, constata-se que as carreiras de Estado
do Ciclo de Planejamento e Gestão ainda enfrentam grande dificuldade de institucionalização
na estrutura estatal paulista. No caso da carreira de Especialista em Políticas Públicas, por
exemplo, que tem dentre suas vocações a assunção de posições no núcleo estratégico do
Estado, observa-se que dos 500 cargos criados pela lei da carreira (Lei Complementar
1.034/2008), apenas 76 encontram-se efetivamente ocupados atualmente, ou seja, apenas
15% do total do quadro. Além disso, não há previsão de realização de novos concursos para a
carreira, apesar de ter havido apenas um único concurso até o presente, em 2010, com 150
vagas. Dentre os cargos de Analista em Planejamento, Orçamento e Finanças Públicas, por sua
vez, dos 800 cargos criados, somente 390 estão ocupados (48%).
Concomitantemente, a análise dos dados apresentados demonstra que o Governo do
Estado de São Paulo não apenas não revisou o aparato baseado na utilização excessiva de
cargos comissionados, como o ampliou. De fato, os 24.000 cargos comissionados citados de
maneira vaga no relatório do FMI em 2008 foram ampliados para 27.204 no cruzamento de
dados mais recente.
9. CONCLUSÃO
NOTAS
REFERÊNCIAS
CONJUR. TJ-SP manda empresa de economia mista dispensar servidores sem concurso.
Consultor Jurídico. 2016. Disponível em:
<http://www.conjur.com.br/2016-ago-20/empresa-economia-mista-dispensar-servidores-
concurso>
FMI. Transparência das Ações e das Contas Públicas. Fundo Monetário Internacional /
Departamento de Finanças Públicas; Secretaria da Fazenda, 2008. Disponível em:
<http://aeppsp.org.br/attachments/article/145/transparencia_das_acoes_e_contas_publicas.
pdf>
GLOBO. Número de servidores comissionados cresce 3,5%, diz IBGE. 2014. Disponível em:
<http://oglobo.globo.com/brasil/numero-de-servidores-comissionados-cresce-35-diz-ibge-
11861487>
IBGE. Estudo do Perfil dos Municípios e Estados Brasileiros - Estadic. Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística, 2014. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/estadic/estadic2014/>
RESUMO: Este artigo é derivado de relatório de pesquisa que analisou uma política pública do
Estado de Minas Gerais de meados de 2010: a criação de uma organização e a busca por
profissionais para atuar nela, dentro do próprio governo. Os trade-offs típicos da definição do
método de seleção de pessoal têm análise dificultada devido a aspectos institucionais rígidos e
ao grande número de candidatos sem a quantidade proporcional na equipe designada a
escolhê-los. Executou-se pesquisa exploratória, qualitativa, utilizando-se elementos
documentais e bibliográficos e entrevistas, não estruturada com um dos membros da equipe
do projeto, e semiestruturadas com os gestores de núcleo, com a finalidade de obter o ponto
de vista da execução do planejamento de pessoal. O diagnóstico mostrou que os
procedimentos adotados dão margem a críticas. De caráter descritivo, este artigo se propõe a
ampliar o debate doutrinário de Recrutamento e Seleção de pessoal para o ambiente
tipicamente público.
Figura 1 – Transição de uma organização com multiplicidade de áreas de apoio para uma com
CSC centralizado
4. DISCUSSÃO
Embora tenha havido o esforço para se fazer um robusto trabalho de definição de
papeis e competências necessárias, aliado a um mapeamento do pessoal que estava espalhado
nos órgãos (que, futuramente, comporiam o CSC), a decisão final ficou a cargo do órgão, que
mandou quem lhe era conveniente, incluindo pessoas que a equipe do projeto nem conhecia,
como recentes concursados ou que não haviam preenchido o Censo de Atividades. Os
principais motivos foram: (1) eram poucas pessoas para analisar cerca de seis mil candidatos
dentro do (2) cronograma apertado estipulado e (3) não havia capital político (talvez tenha
faltado marketing) para que a equipe da SEPLAG atuasse de forma tão incisiva no quadro de
pessoal das outras secretarias, sendo esse último motivo o mais forte deles. Por causa disso,
não há erro em dizer que a seleção não observou a aplicação de técnicas padronizadas, uma
vez que a equipe do projeto foi, no final das contas, mera influenciadora dessas decisões.
A junção de pessoas com os mais variados salários, conforme exposto, não se
questiona, por não ser um problema enfrentado ou causado pelo CSC: ele apenas tornou claro
um problema de cargos e salários do Estado. Outro ponto a ser observado é a natureza
transacional dos processos congregados por um Centro de Serviços Compartilhados, de modo
que grande parte do trabalho deve ser operacional. Dada a não análise de perfil de todos os
servidores, pessoas com perfis inadequados para este trabalho foram absorvidas, o que deverá
ser observado em momentos futuros.
Ainda sobre a escolha das equipes, critica-se veementemente a ausência da
participação dos “candidatos” no próprio processo de seleção, demonstrando total
desrespeito para com sua condição de indivíduo pensador, um retrocesso taylorista. O
conceito do trabalho progrediu muito ao longo do tempo, deixando de lado a concepção
penosa e subssocial, sendo hoje em dia um valor importante e necessário ao desenvolvimento
do indivíduo, num contexto que extrapola o ambiente típico do trabalho (AMORIM, 2009;
MORIN, 2001; DUTRA, 2009). Quanto mais significativamente as políticas influenciarem a vida
dos indivíduos, mais elas devem adotar caráter participativo, de modo que os próprios
indivíduos possam opinar e, no mais das vezes, alterar a organização do trabalho.
O mesmo não se viu no processo de seleção dos gestores de Núcleo e de alguns
coordenadores, os quais não apenas foram convidados, com poder de escolher ir ou não,
como, em alguns casos, participaram do próprio processo de planejamento. É notável o êxito
logrado pela equipe do projeto nestas escolhas e, veja-se, foi exatamente esse o grupo
escolhido com o uso de maior quantidade de técnicas de seleção e das que tinham maior
correlação com resultados.
A seleção dos coordenadores foi um meio termo. Não foram aplicadas técnicas
devidamente assistidas para sua seleção, mas as entrevistas deixaram transparecer a
satisfação na maioria das escolhas. As escolhas tidas posteriormente como insatisfatórias
também guardam relação com a não padronização de procedimentos. Para métodos
aleatórios, resultados aleatórios.
Como ponto positivo, evidencia-se o esforço da equipe do projeto em escolher o
pessoal mais adequado às vagas, com um desenho minucioso de processos, ensaios sobre
aptidões comportamentais, mitigação de impactos com a política salarial, com treinamentos
introdutórios, com uma recepção amistosa dos selecionados, dentre outros, mas grande parte
desse esforço foi simplesmente desperdiçada pela falta de poder político na decisão,
exatamente o momento mais crucial de todo o processo.
Apesar das críticas estarem no sentido da não padronização dos procedimentos de
seleção, nem mesmo a doutrina defende seu êxito. As técnicas são aplicadas por indivíduos
para entender indivíduos, sendo que ambos têm informações limitadas sobre a realidade e,
portanto, erros são esperados. Elas servem para guiar selecionadores e minorar erros. Seus
resultados dizem respeito às percepções dos gestores com o desempenho dos indivíduos
selecionados, de modo que seu simples seguimento não é sinônimo de êxito, trazendo uma
ótica de correlação positiva. Posto isso, toma ainda mais força a defesa da utilização das
técnicas que a Administração de Recursos Humanos vem desenvolvendo.
O ambiente político típico do setor público também deve ter atenção mais que
especial, uma vez que as técnicas derivadas do setor privado consideram uma lógica política
totalmente diversa, fazendo com que a simples importação diminua o impacto e as chances de
sucesso.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho buscou mostrar a implicação da estrutura organizacional pública em um
projeto de planejamento de pessoal que envolve mais de um órgão: a transversalidade da
matriz de responsabilidades. No final, o nível de sucesso alcançado dependeu menos das
metodologias escolhidas, e mais das relações de poder entre os atores. Defendemos que,
antes de se debruçar sobre a operacionalização do projeto, deve-se entender se existe (e
garantir haja) uma estrutura institucional que suportará o processo.
Também buscamos chamar atenção para a falta de bibliografia que aborde o processo
de Recrutamento e Seleção para, especificamente, a criação de organizações. Para sua
operacionalização, hoje, é necessário se fazer uma série de analogias e abstrações a partir da
doutrina de R&S existente e de áreas outras como Gestão de Projetos, Marketing e
Planejamento Estratégico. Isso se agrava quando se fala em setor público, que
tradicionalmente tem bibliografia menos robusta que o setor privado.
Espera-se que os apontamentos aqui feitos sirvam na consecução de quaisquer outros
projetos públicos deste teor, não apenas de Centros de Serviços Compartilhados.
NOTAS
1 Conforme apontado por Martins e Amaral (2008) 25 a 30% dos custos da produção de
uma empresa são imputados às áreas de apoio. A própria criação de um CSC já traz um
corte de gastos, porque percebe-se a não necessidade de toda a mão de obra que antes, em
unidades fragmentadas, era utilizada.
2 Não foi encontrada bibliografia totalmente aderente ao objeto de estudo, pois todas
tratam de organizações “em andamento” e defendem o Planejamento de Pessoal (ou a
terminologia própria de cada autor) como atividade perene, que prevê a vacância e já tem
todos os planos de ação para serem executados quando ela ocorre. Também não foi
possível recorrer plenamente à Gestão de Projetos, uma vez que não se trata do projeto (ou
da política pública), mas do processo que este projeto gerará.
3 O índice de validade apresentado pelo autor para as entrevistas estruturadas pode chegar
a 0,60 ou mais, numa escala de 0,0 a 1,0 de polaridade maior melhor. Os testes de
habilidade partem de 0,40, podendo chegar a 0,80. Apesar do alto coeficiente de correlação,
o autor aponta que, ao mesmo tempo que carecem comprovações empíricas sobre a
validade das entrevistas, elas são o método mais popular, sendo pois mais “uma arte que
uma ciência”
7 Apesar de terem sido próximas, não se pode afirmar que essas três metodologias foram
seguidas de forma absoluta (por exemplo, para todos os seis gestores de núcleo,
exatamente um mesmo conjunto de técnicas). Essa junção em três grupos foi feita para fins
didáticos.
REFERÊNCIAS
AMORIM, Ivam Gerage. Cidadania e direito ao trabalho. Revista Internacional de Direito e
Cidadania, n. 4, p. 79-96, junho/2009. Disponível em:
<http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/32789-40560-1-PB.pdf>. Acesso
em: 04/03/2017.
DUTRA, Joel Souza. Gestão de Pessoas: Modelo, Processos, Tendências e Perspectivas. 1. ed.-
8. reimp. São Paulo: Atlas, 2009.
LACOMBE, Beatriz Maria Braga. TONELLI, Maria José. O Discurso e a Prática: o que nos Dizem
os Especialistas e o que nos Mostram as Práticas das Empresas sobre os Modelos de Gestão de
Recursos Humanos. RAC, v. 5, n. 2, Maio/Ago. 2001: 157-174.
VILHENA, Renata Maria Paes de; BRITO, Adriane Ricieri; VALLE, Afonso Celso Corrêa de Araújo.
Implantação de um Centro de Serviços Compartilhados (CSC) no Governo do Estado de Minas
Gerais: pioneirismo, desafios, modernizações e inovações. 2014.