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Alimentação simbólica na cibercultura: uma análise das imagens do

Instagram com a hashtag #instafood1.


Karina Pereira Weber 2
Gabriela BirnfeldKurtz 3

Resumo: O objetivo do presente trabalho é buscar a compreensão da relação existente entre símbolo,
imaginário e cibercultura, de maneira a explorar as manifestações simbólicas na esfera da alimentação.
Além da refeição ser apontada como um fator de religação dos sujeitos, a valorização da estética, a
sacralização do alimento como um ritual foram, também, alguns apontamentos deste estudo. Por meio da
análise de fotografias tiradas por usuários do mundo inteiro no aplicativo para dispositivos móveis
Instagram, objetiva-se ver como as imagens categorizadas com a hashtag #instafood manifestam os
simbolismos da alimentação no contexto da cibercultura. Valendo-se dos conceitos de imaginário e
símbolo de Gilbert Durand, da cibercultura (Pierre Lévy) e da tecnologia do imaginário (Juremir
Machado da Silva), foi realizada uma leitura das imagens escolhidas, juntamente com uma análise
relacionada aos conceitos teóricos apresentados.

Palavras-chave: Mídia Digital; Imaginário; Símbolo; Alimentação; Comunicação

Introdução

O alimento faz parte de um dos rituais mais antigos. A alimentação é uma das
atividades essenciais do homem para se manter vivo. No entanto, alimentar-se é muito
mais do que apenas nutrir-se, conforme observa o especialista em nutrição Francesa
Fossas (2006). O autor explica que a alimentação depende de fatores como culturais,
econômicos, moda, gosto e simbolismos, sendo um processo que se modifica ao longo
do tempo e de acordo com os povos.
Jean-Pierre Poulain (2004) explica que a esfera alimentar se tronou globalizada
em mesmo nível que os demais setores industriais, o que acarretou em produtos
padronizados e na homogeneização da alimentação. Sabe-se que por muito tempo os
alimentos eram utilizados como meios de diferenciação social. A aristocracia francesa,
como apresentou Poulain (2004), caracterizava-se “pelo distanciamento em relação à
1
Trabalho apresentado no GT de História da Mídia Digital, integrante do 10º Encontro Nacional de História da
Mídia, 2015.
2
Mestre do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da PUCRS. E-mail: karinaweber.rs@gmail.com
3
Mestre do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da PUCRS. E-mail: gabriela@sidicom.com.br
1
necessidade, a nobreza afirma sua posição social através do consumo de produtos caros
e distantes (as especiarias, por exemplo) e assim procedendo opõe-se às práticas
alimentares populares mais submetidas à pressão do nicho ecológico” (2004, p. 35). O
alimento, então, permitia criar um distanciamento social.
No entanto, a industrialização e mundialização do setor alimentício para não
deixar se perder os alimentos locais e suas tradições, devido a uma homogeneização dos
pratos, trouxe à tona uma valorização dos alimentos naturais, das refeições caseiras.
Poulain expôs (2004), com base em Edgar Morin, que, como resposta à modernização e
industrialização do setor alimentício, tais mudanças fizeram florescer uma mentalidade
“neo-arcaica” dentro dessa esfera. Percebe-se, atualmente, uma negação ao mundo
“artificial”, e isto é visto também, como demonstrou Poulain, em relação aos alimentos,
abordados como elementos de culto muitas vezes.
Os alimentos se tornam mais do que apenas insumos voltados para a nutrição –
elementos constituintes da cultura, se tornam símbolos de regiões, sociedades, classes
sociais, grupos de pessoas. Junto a isso, conforme pondera Poulain (2004), há um
movimento de fetichização das imagens simbólicas e lendárias dos grandes banquetes,
da alta corte, que se converte em coletâneas de pratos sofisticados, uma redução de uma
variedade culinária outrora existente, o mesmo pode ser percebido no Instagram.
O objetivo do presente trabalho se concretiza a partir do conhecimento da esfera
do imaginário que viabiliza a constituição de imagens nas quais é possível observar as
manifestações simbólicas. Com base nisso, pretende-se, nesse artigo, analisar
fotografias tiradas por usuários do aplicativo Instagram com a hashtag #instafood para
compreender, a partir dessa “tecnologia do imaginário”, como estes símbolos que
transitam através das imagens permitem a religação entre os sujeitos envolvidos 4.

Imaginário e símbolo

Para a compreensão do valor simbólico dos alimentos, compreendemos a partir


de Juremir Machado da Silva (2006, p. 9) que: “O imaginário é uma rede etérea e

4
O presente artigo foi produzido para um capítulo do e-book do grupo de pesquisa GIM (Grupo Imagem e
Imaginários) da PUCRS, o material se encontra no prelo.
2
movediça de valores e de sensações partilhadas concreta ou virtualmente”. É no plano
do imaginário que os processos comunicacionais ocorrem. Neste sentido, escolhe-se um
olhar voltado a esta atmosfera que que envolve a sociedade, criando uma harmonia entre
os valores, agrupando a partir dessa nebulosa, a sociedade como um todo, o que
viabiliza uma comunicação pluridimensional, como ocorre na cibercultura.
Segundo Gilbert Durand (2001), o imaginário, ou Museu Imaginário, é o lugar
“de todas as imagens passadas, possíveis, produzidas e a serem produzidas” (2001, p.
6). Nele circulam todas as imagens que atuam como dinamizadoras da vida. Segundo o
autor, o museu imaginário impõe-se como uma educação estética, a qual diz respeito
aos simbolismos que tocam as pessoas e permitem uma ordem através dos sentidos
(2012, p. 430). Nesse sentido que Silva (2006) afirma que “O imaginário é uma
distorção involuntária do vivido que se cristaliza como marca individual ou grupal” (p.
12).
A utilização e circulação de símbolos se dá no ambiente social como essas
marcas individuais e coletivas de valores e sentidos, que viabilizam a comunicação
entre os sujeitos. No caso do aplicativo Instagram, a marca é o uso da hashtag
#instafood, que parte de uma representação individual, mas torna-se coletiva no
momento em que diversas pessoas aderem e têm acesso a imagem compartilhada.
Ademais, criam-se novos valores entorno do alimento, num ato simbólico de valoração
do momento de uma refeição, o qual é partilhado entre os sujeitos que estão conectados
por meio do aplicativo.
O símbolo é uma manifestação do imaginário. Ele é uma das formas de
consciência que viabilizam representar o mundo. Durand (1988) elucidou que o símbolo
é uma das maneiras de consciência de representação do mundo, quando a imagem de
algo não pode ser vista concretamente. Nesses casos, o objeto sofre uma
“re(a)presentação” (1988, p. 11-12), materializando-se em imagem. Assim, os símbolos
são construções culturais nunca decifráveis diretamente, mas compreendidos em sua
totalidade, por um sentido que o une a um contexto sócio-histórico. Logo, a partir da
circulação da mesma em diversas culturas é possível buscar o entendimento de seus
valores, suas verdades, seus desejos, seus mistérios.

3
Historicamente, o alimento tornou-se um símbolo da comunhão, da
solidariedade, da fraternidade e da fartura por estar presente nas celebrações, ceias e
festividades. Michel Maffesoli (2010, p. 135) aborda a questão da religação dos sujeitos
a partir de um dos aspectos da socialidade, a religiosidade. O autor pondera que, para
isso, é preciso utilizar esse termo no seu sentido mais primordial: o da religação
(religare). Religação essa que descreve “a ligação orgânica dentro da qual interagem a
natureza, a sociedade, os grupos e a massa” (2010, p. 135). Apoia-se no autor para
demonstrar que as tecnologias estão na sociedade contemporânea a serviço dos valores
arcaicos, sendo um local possível de colocar em prática a religação entre os sujeitos.
Os símbolos, conforme Durand (2012), constituem valores diversos e opostos,
os quais são chamados pelo autor de dominantes. Durandexemplifica ao falar, por
exemplo, da árvore que pode ao mesmo tempo ser símbolo do ciclo sazonal e da
ascensão vertical. Ao falar do símbolo alimento, podem surgir infinitas representações
de valores em uma análise, coletivos e individuais, como exibicionismo, preocupações
estéticas, principalmente quando as representações de alimentos analisados são
manifestadas de diversas regiões geográficas, recorrentes das mais variadas culturas, o
que pode, portanto, implicar em valores simbólicos múltiplos. No entanto, tal colocação
não se trata de uma certeza, uma vez que, como veremos adiante, no cenário global, os
valores se mesclam, ou seja, os valores e símbolos ultrapassam as fronteiras na
cibercultura.
O imaginário, constituído de imagens que fazem “agir” e “reagir”, animando os
corpos de uma sociedade, não é estático, é uma “narrativa inacabada” (SILVA, 2006, p.
8), sempre em mutação. A partir dessas imagens é que se constitui o imaginário, que é
uma linguagem que extravasa o indivíduo, atingindo a atmosfera social e cultural,
materializando-se, dentre outras formas, pelos símbolos. Símbolos esses que têm como
uma de suas funções a religação dos sujeitos, como ocorre com os alimentos e todos os
rituais e simbolismos que o envolvem. Na atualidade esses símbolos se manifestam das
mais diversas maneiras, e com a internet ligam os sujeitos em uma escala global, como
será tratado no próximo item.

4
Cibercultura e Imaginário
A sociedade passa por um momento em que identidade e globalização são
tendências presentes, mas em conflito entre si. Manuel Castells (2001, p. 17) escreve
que o novo capitalismo e as inovações na tecnologia da informação originaram uma
configuração social diferente: a sociedade em rede. Esta ocorre no mundo todo e se
caracteriza por uma cultura de “virtualidade real construída a partir de um sistema de
mídia onipresente, interligado e altamente diversificado” (CASTELLS, 2001, p17).
Logo, tudo está ligado entre si, em escala mundial, e arquivos e produções são
compartilhados em um volume sem precedentes. A cibercultura (LÉVY, 1999) é
constituída pelo ciberespaço, um ambiente mutante, constituído pela interconexão da
rede mundial de computadores e das memórias dos mesmos. Ainda segundo o autor, o
fato de este espaço estar se modificando constantemente deve-se ao fato de lidarmos
com o digital, que é “fluido [...], desprovido de qualquer essência estável” (LÉVY,
1999, p. 27).
Neste contexto, há, então, as tecnologias do imaginário, conceito de Silva
(2006), que são, segundo o autor “dispositivos (elementos de interferência na
consciência e nos territórios afetivos aquém e além dela) de produção de mitos, de
visões de mundo e de estilos de vida” (SILVA, 2006, p.22), e operam principalmente na
esfera do que é visual, fomentando a atividade do imaginário. Estas tecnologias podem
ser também, então, as ferramentas existentes na internet, como os sites de redes sociais,
blogs, chats, entre outros, capazes de agrupar imagens e imaginários do mundo no
ciberespaço. Baseando-se no conceito de “laço social” proposto por Maffesoli, Silva
(2006) disserta que as tecnologias do imaginário têm o poder de estabelecer uma ligação
entre os sujeitos – o “laço social”. E, para o autor, “não há laço social sem imaginário”
(SILVA, 2006, p. 21).
No objeto de pesquisa em questão, encontramos uma tecnologia do imaginário,
a plataforma Instagram, que é um dispositivo para captação e edição de fotografias
(conforme será explicado com mais detalhes no próximo item). Ao mesmo tempo, o uso
que as pessoas fazem desta ferramenta determinam a atividade do imaginário
tecnológico, que não é desencadeado apenas pelo uso técnico, mas também por questões

5
intrínsecas ao ser humano, como a imaginação e a consciência. O Instagram também
atua como um local de manifestação do que PiérreLévy define como inteligência
coletiva (1996), que é distribuída por toda a parte, e ocorre em tempo real, onde cada
indivíduo possui uma competência - e mobiliza-a no ciberespaço, originando em
coletivos inteligentes. No caso do Instagram, ele é uma rede social e também um grande
museu, baseando-se na teoria de Durand, um repositório de imagens criadas por esses
coletivos. A disseminação das hashtags (também detalhadas no próximo item),
constituem uma forma de criar grandes bibliotecas de imagens catalogadas de acordo
com assuntos - que são pré-definidos pelos usuários, e não pelo aplicativo.
Nos tempos das imagens técnicas, também expressas na cibercultura, Durand
(2012, p. 439) entende que a necessidade de expressão da subjetividade e o culto pelo
mítico são inerentes ao homem, justamente por ser um ser simbólico. Neste caso, com
as tecnologias disponíveis para a manifestação da subjetividade e da pessoalidade, estas
características se tornam cada vez mais visíveis, e os cultos e ritos podem ser
verificados nos mais variados dispositivos, como no Instagram.

Instagram
A rede social Instagram, criada em 6 de outubro de 2006 e possui cerca de 150
milhões de usuários (OUR..., 2014) 5. Lançado incialmente apenas para iPhone e outros
dispositivos da Apple, mas, devido ao seu imenso sucesso logo no começo de sua
existência - em dezembro do mesmo ano, a rede social já contava com 1 milhão de
usuários (OUR..., 2014) -, passou a ser compatível com dispositivos Android, sendo
comprado pelo Facebook em abril de 2012.
O Instagram surgiu com o objetivo de trazer de volta o estilo fotográfico das
câmeras Polaroid, que se tornaram populares por revelarem as fotos no momento em
que elas eram tiradas (PIZA, 2012). Assim, a ideia do aplicativo consiste em uma rede
social baseada em localização geográfica que oferece aos usuários uma maneira de
tirarem fotos a partir de seus dispositivos móveis e manipularem-nas instantaneamente,
por meio de filtros predefinidos, ajustes de cor, luz, nitidez e molduras. Logo, o motivo

5
Dados do site Instagram, de 6 de setembro de 2013.
6
da escolha desta rede social e não de outras, centra-se na ideia de que somente é
possível publicar imagens que representem um momento da vida do usuário, sempre
interpretado por ele por meio da escolha do ponto de vista pelo qual a fotografia é tirada
e das opções de tratar a imagem.
O principal mecanismo utilizado pelo Instagram é o uso de hashtags (#), que
funcionam como uma maneira de categorizar as fotos por assunto, muito semelhante à
ideia de postagens em blogs, por exemplo. O usuário pode tirar a foto e atribuir uma ou
mais categorias, sempre adicionando o sustenido a frente da palavra. Ele também pode
escrever sobre a foto, contextualizando o momento para seus seguidores. Para este
artigo, optou-se pela análise das imagens agrupadas pela hashtag #instafood. Esta
relaciona-se à fotos ligadas a refeições e alimentos dos usuários. Pesquisando dentro do
aplicativo Instagram por esta tag, foi possível encontrar 26.026.857 publicações, e este
número cresce exponencialmente a cada dia. De acordo com o site Hashtagig
(ANALYTICS…, 2014), apenas no dia 08 de julho de 2014 6 foram publicadas mais de
28 mil fotos relacionadas à #instafood.
Além disso, outras hashtags também ligadas à comida são utilizadas, como
#food, #yummy, #meal, etc. Contudo, o motivo da escolha da hashtag#instafood se dá
por ela possui além de uma grande representatividade numérica, o nome do aplicativo
abreviado, que dá a ideia de algo criado específico para essa rede social (outros
exemplos: #instacat, #instagood, etc.). As hashtags que apresentam uma abordagem
mais geral, como #food, por exemplo, podem ser vistas e utilizadas em muitos blogs e
outros sites que operam com o mesmo sistema, mas a #instafood apenas faz sentido se
utilizada dentro do aplicativo Instagram. O uso desse recurso, além de contextualizar a
fotografia, também faz com que ela apareça nos motores de busca do aplicativo, dando
mais visibilidade à criação do indivíduo.

Metodologia
Para analisar as imagens referentes à hashtag #instafood, assume-se esta
posição: as pessoas fotografam suas refeições e, valendo-se do uso desta tecnologia,

6
Dia escolhido aleatoriamente, de forma a mostrar um recorte do cotidiano dos usuários.
7
publicam-nas na rede, onde uma série de interações entre usuários ocorre. O objetivo
deste estudo é partir das imagens fotografadas, e a técnica de pesquisa utilizada neste
trabalho é a de pesquisa documental. De acordo com Lüdke e André (1986), essa forma
de análise busca detectar informações em documentos a partir de hipóteses ou objetivos
que são de interesse do pesquisador. Para a pesquisa documental, podem ser
considerados: relatórios, registros governamentais, estatísticas oficiais, conteúdo de
mídia de massa, discursos, romances, fotografias, desenhos, peças, mapas, documentos
pessoais, diários, entre outros materiais (MAY, 2004). Dessa maneira, a compreensão
dos problemas de pesquisa se darão através da leitura das imagens postadas no
Instagram.
Por meio da pesquisa da hashtag #instafood no aplicativo Instagram, como
citado anteriormente, foi possível encontrar mais de 27 milhões de publicações entre os
usuários 7. Pensando na quantidade de postagens, que aumenta exponencialmente a cada
minuto - conforme citado anteriormente com as métricas do site Hashtagig -, busca-se
coletar as imagens por meio do recurso de printscreen de forma a ilustrar como os
usuários se comportam, de maneira que optou-se por analisar as 10 imagens mais
recentes no mundo dentro desta hashtag na ocasião da coleta das imagens (08 de julho
de 2014, às 19 horas de 50 minutos). O motivo de delimitar o número de fotografias a
10 se justifica pelo limite de extensão do presente trabalho. A ocasião da coleta das
imagens foi escolhida de maneira aleatória, sem escolher alguma data especial, de forma
a retratar o cotidiano dos usuários. Também por isso que optou-se por escolher as
imagens mais recentes daquele horário igualmente aleatório, de forma a diminuir a
intervenção na escolha das imagens. Além disso, foram coletadas as descrições das
imagens. Foram descartadas as imagens que possuíam a hashtag #instafood, mas não
eram diretamente relacionadas a refeições, como selfies e fotos de paisagens, por
exemplo. Isso porque, muitas vezes, os usuários associam suas fotos a hashtagsdiversas
para aumentar o potencial de disseminação das mesmas, ainda que não sejam
diretamente relacionadas ao tema. Para manter o anonimato das pessoas que fizeram as
postagens, ocultou-se os nomes dos usuários e rostos dos mesmos. Para aumentar a

7
Números coletados no dia 14 de agosto de 2014.
8
compreensão do contexto onde estas imagens estão, utilizou-se também o que cada
usuário escreveu como descrição da foto: o que foi dito sobre ela e as outras hashtags
que foram inseridas juntamente com a #instafood.

Análise
As dez imagens coletadas (que se encontram separadas, na sessão de anexos)
demonstram a variedade e amplitude das situações envolvendo alimentos que são
compartilhadas. Dentre as fotografias, vê-se algumas contendo refeições coletivas,
como espécies de banquetes, também pode-se perceber a presença de imagens de doces
e sobremesas e de pessoas em estabelecimentos alimentícios, conforme as imagens em
anexo. A análise será dividida em categorias, que são: estética dos alimentos,
alimentação como ritual, alimentação e modismos, deslocalização e relocalização dos
alimentos, alimentação e corpo. Dessa forma, busca-se contemplar o objetivo de
compreender como se dá essa religação dos sujeitos por meio da tecnologia do
imaginário.

Estética dos alimentos


Considerando que o aplicativo Instagram possibilita a aplicação de filtros sobre
as imagens, distorcendo as cores, nota-se que, das dez fotos selecionadas, todas optaram
por manter a colorização mais realista dos alimentos, conservando suas aparências e, de
certa maneira, respeitando a integridade do alimento. Opção que pode estar associada a
um respeito pelo que está sendo ingerido, valorização deste como tal em sua essência,
numa espécie de reforço do símbolo do alimento, de um momento sagrado que deve ser
respeitado para que se tenha sempre o que comer. Assim, a partir da fotografia, do
registro desse ritual quase como culto por meio da criação de uma hashtagespecífica
para tratar do assunto, do compartilhamento de diversas imagens sobre o tema, da
preocupação com a fidedignidade, demonstram uma valorização e manutenção do
símbolo.
Além disso, ao observar traços em comum nas fotos, o que se pode constatar é
que todos buscam retratar o alimento de forma bela e utilizam os filtros do Instagram

9
para auxiliar nessa intenção, de maneira que, esteticamente, elas parecem muito
semelhantes. A inteligência coletiva de Lévy aponta para a tendência de que,
competências separadas no contexto da cibercultura criam coletivos inteligentes.
Segundo essa linha de raciocínio, os usuários, ao observarem outros aplicarem técnicas
de ângulos e uso das ferramentas do Instagram, replicaram e também adicionaram novas
formas de retratar o alimento, criando um verdadeiro museu de imagens que são ao
mesmo tempo semelhantes e com marca da individualidade de cada usuário.
O usuário, então, ao tirar a foto de sua refeição, tem como objetivo capturar o
perene - por isso, deseja manter não apenas na lembrança, mas como em um registro
para si mesmo e para o grupo de amigos que possui na rede (no caso do Instagram). No
anexo 2, pode-se ver uma típica refeição japonesa, o obentô. Na postagem, o usuário
(que escreve em japonês), comenta sobre a beleza do prato e escreve que tem até pena
de comer - um dos prováveis motivos pelo qual a pessoa optou por fazer o registro.
Além disso, todas imagens de pratos figuram refeições antes de serem ingeridas, algo
que reforça a vontade de compartilhar o prato em si, e não somente o ato de comer –
mas também de exibir uma qualidade estética às pessoas. Esse comportamento é
intencional, pois no aplicativo é possível “curtir” as fotos dos usuários, culturalmente e
até mesmo antropologicamente, o que é belo é mais aceito e, nesse caso, mais “curtido”,
reforçando a influência do indivíduo dentro dessa rede por meio da aceitação dos outros
usuários.

Alimentação como ritual


De acordo com Corbeau (1997), os rituais de alimentação se renovam. O autor
defende que os consumidores são plurais, pois se encontram envolvidos em situações
diferentes de acordo com a natureza do alimento e seu aspecto – e também de acordo
com o imaginário que se associa a ele, gerando novas maneiras de se portar e de se
direcionar ao alimento. Ainda, outros fatores que influenciam no modelo dos rituais que
envolvem o alimento são o momento do aparecimento do mesmo em nossas sociedades,
sua raridade, de onde ele vem e em que local ele é ingerido. Esses fatores confirmam,
por fim, as transformações das formas e dos rituais alimentares durante o ato do

10
consumo. O indivíduo na esfera da alimentação, conforme Corbeau (1997) explica, é
plural, pois tem a capacidade de atualização dos comportamentos diferentes em sua
lógica e sua significação.
O alimento vai ser então o elemento de compensação saboreado entre amigos,
como a foto onde há uma sobremesa e três colheres em volta do prato (Anexo 4). Vai
ser um alimento de socialidade, de comunhão que reúne pessoas - como demonstrado no
anexo 10, onde há três pessoas sentadas à mesa, em uma cena de confraternização.
Também pode ser visto pelo próprio fato dessas imagens serem divulgadas e
compartilhadas entre amigos, dentro do próprio aplicativo. No anexo 8, as imagens da
pipoca que foram feitas pelo pai à filha (conforme escrito na postagem da mesma),
demonstram afeto e cuidado por meio da comida como um símbolo acolhedor, já que é
nutriente e energia, ou seja, é uma demonstração de fornecer vitalidade e alegria.
O alimento doce é representado como apropriado para o momento de
descontração, de amizade, de prazer, excedendo às funcionalidades, dando espaço ao
lúdico no ato de comer. Sendo a alimentação, nesses casos, um recurso de divertimento,
de consolo. A comida simboliza a cura para um dia ruim, de um momento não muito
agradável e, pela maioria dos exemplos, representado pela figura do alimento doce
(Anexos 4 e 8). Isso aparece claramente no anexo 4, onde a pessoa escreve que algo se
quebrou ou rompeu e ela ganhou um presente (o contexto não fica totalmente claro). De
acordo com os exemplos, a própria demonstração de religação nessa categoria é de
ritualizar o ato de comer, seja sozinho ou entre pessoas queridas.

Alimentação e modismos
Pode ser observado que as fotos tiradas pelos usuários buscam apresentar a
qualidade da comida. Todos os pratos estão apresentáveis, com boa aparência e comidas
mais sofisticadas (como o sushi, o brownie, wraps, croissant). Existe uma necessidade
de mostrar a sofisticação dos pratos, o que entende-se relacionado a uma questão de
status e de demonstrar um poder aquisitivo que viabiliza determinados tipos de
refeições. Pratos mais elaborados, em ambientes (como nos anexos 3 e 10) agradáveis e
comerciais. As fotos mais caseiras, que seriam as que mostram a pipoca e o pote de

11
Nutella, ainda representam outros valores. O pote de Nutella por ser de preço elevado,
trata-se de algo que não é acessível a todos e, por isso, pode-se pensar a necessidade de
compartilhar tal imagem, pois ele desperta desejo. A comida, nos grandes banquetes
ainda da Idade Média, já era um elemento de diferenciação social, utilizada para medir
status. Nessas imagens, pode-se notar que ainda determinados pratos representam essas
diferenças e valores econômicos culturais.
Os modismos são visíveis nos pratos mencionados anteriormente devido aos
fatores mencionados por Poulain de mundialização dos alimentos, que induzem ao
exotismo e fetichização dos mesmos – que aumenta o desejo e a vontade de exibir
alimentos que estão na moda. Das 10 imagens, 4 são de origem oriental (Anexos 1, 2, 5
e 6) e 2 são de origem francesa (Anexos 4 e 7). Os alimentos orientais simbolizam o
exótico por conta da distância cultural em relação ao ocidente, e se proliferaram em
diversas culturas por conta da mundialização, tornando-se uma moda e, assim, sendo
relevantes para o compartilhamento no Instagram. Já a culinária francesa denota o
sentido de status social, por ter uma tradição de ser constituída de pratos finos e de alto
custo. A moda remete ao sentido de pertencimento a um grupo, devido a identificações
possíveis, indicando as tendências de consumo, inclusive na alimentação.

Deslocalização e relocalização dos alimentos


As dez imagens são de localidades diferentes, e representam não só a cultura do
local onde as pessoas vivem por meio da culinária que registram, como também a
exportação de pratos de um país para o outro. Na sociedade em rede de Castells, há a
predominância do traço da globalização: a internet possibilitou que as pessoas se
ligassem não mais exclusivamente pelos traços geográficos, mas também por gostos. O
anexo 1 é de um prato do restaurante japonês SquidInk, localizado na cidade de
Phoenix, nos Estados Unidos 8. Já o anexo 2, que também trata de um prato da mesma
nacionalidade, foi tirada no Japão. Um prato típico de Singapura aparece no anexo 6,
mas a usuária é dos Estados Unidos.

8
Disponível em: <http://squidinksushi.com/squid_phoenix.htm> Acesso em 21 jul. 2014.
12
Logo, pode-se notar que há a integração da cultura oriental à ocidental, algo
apontado por Durand como traço dos tempos atuais - onde as imagens dos dois
hemisférios se encontram, o que gera um novo reequilíbrio e promovem, conforme
citado pelo autor, um intenso ativismo cultural. Assim, as fotos tiradas por usuários de
origem americana, árabe, hispânica, oriental e europeia (conforme detectado na análise
das postagens e perfis dos usuários), têm o traço da mistura e da diversidade na culinária
- algo que tomou grande dimensão por conta das redes e da internet. As tecnologias do
imaginário, em sua configuração de redes, permitem aos usuários se religarem além de
fronteiras locais, e muito além dos alimentos que são tradicionais de suas regiões,
bastando possuir, nesse caso, um aplicativo em comum – o Instagram, conexão com a
internet e a vontade de compartilhar os momentos de refeição.

Alimentação e corpo
Ainda, percebe-se que, em relação aos doces, há uma preocupação direta com os
reflexos desses alimentos no organismo humano. Em três, das quatro fotos de doce
(Anexos 7, 8 e 9), foram adicionadas à hashtag #instafood as hashtags: #gorda4ever,
#dieta, #pochecalorie ou, ainda, no próprio texto da descrição mencionando os ganhos
calóricos com a refeição doce. Isso demonstra a preocupação com o corpo, com a
associação direta de alimentos doces como responsáveis por prejudicar as características
imaginárias ideais de corpo, referentes ao modelo construído para a época atual - onde
há a cultura da magreza, da silhueta perfeita e também da alimentação saudável. Nesse
sentido, as postagens com essas marcações confirmam e reafirmam os valores
instituídos, cultivando a pregnância dos mesmos no espaço sociocultural. O alimento
mais prazeroso é aquele que, em mesmo nível, exige um sacrifício: o de engordar. Isso
gera um paradoxo entre o prazer de comer e o cuidado de manter uma boa saúde, vista
que os usuários tem consciência de que estão ingerindo alimentos calóricos e nem
sempre saudáveis, mas o fazem mesmo assim. A preocupação com a saúde e o bem
estar manifesta-se ao redor do mundo e, demonstrar essa consciência torna comum o ato
de comer doces ou alimentos não muito saudáveis, gerando uma espécie de conforto
coletivo.

13
Considerações finais
Conforme foi observado a partir das categorias, há muitos fatores que podem
religar os sujeitos a partir das imagens que, por sua vez, constituem símbolos. Também
é possível notar que esses fatos não ocorrem isoladamente – ainda que as fotografias
sejam dotadas de simbolismo, elas sozinhas não atingiriam o potencial apresentado aqui
se não fosse pelas tecnologias do imaginário. Nesse sentido, a socialidade da qual fala
Maffesoli é vista tanto nas imagens quanto no ambiente tecnológico propiciado pelo
aplicativo. Como forma de religação, a tecnologia atua como um amplo espaço que
comporta as diversidades culturais, de gosto, influencia na atualização da moda,
informando os usuários do que há e é ingerido pelo mundo.
No caso do Instagram, as pessoas compartilham momentos que se constituem de
sentimentos e pulsões que não podem ser representados diretamente no mundo e, por
isso, precisam ser re(a)presentados na forma de símbolos, conforme observado por
Durand. Assim, as imagens analisadas simbolizam, muitas vezes, sentimentos de afeto,
amor, ansiedade pela busca do corpo perfeito e vigilância em cima do próprio corpo e
dos hábitos alimentares, demonstração de status, entre muitas outras representações – e
são produções dos usuários, que têm um imaginário baseado em sua cultura.
A imagem faz agir e reagir, conforme demonstrado por Silva (2006), algo que
está sempre em mutação. Por meio das fotografias do Instagram, foi possível buscar a
compreensão desses fatores de religação dos sujeitos através de imagens simbólicas.
Outro ponto a se observar é que essas imagens compartilhadas têm a capacidade de
atualizar o imaginário, como Silva descreve, essa rede etérea e movediça de valores e
sensações e marcam, então, os costumes culturais e alimentícios de uma geração.
Assim, as tecnologias do imaginário estão na nossa sociedade a serviço dos valores
arcaicos, e a cibercultura se torna um ambiente repleto de possibilidades para se colocar
em prática a religação dos sujeitos.

Referências
ANALYTICS for #instafood - Instagram. Hashtagig. 2014. Disponível em:
<http://www.hashtagig.com/analytics/instafood>; Acesso em 10 jul. 2014.
14
CASTELLS, Manuel. O poder da identidade. v.2, 3. Ed. São Paulo: Paz e Terra, 2001.

CORBEAU, Jean-Pierre. Pour une représentationsociologique du mangeur.In:


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2014

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Anexos

Anexo 1 – Foto de prato oriental

Fonte: Instagram. 2014.

Anexo 2 – Foto de prato oriental 2

16
Fonte: Instagram. 2014.

Anexo 3 – Foto de usuária com um banner de fast-food

Fonte: Instagram. 2014.

Anexo 4 – Foto de petitgateau com amigos

17
Fonte: Instagram. 2014.

Anexo 5 – Foto de prato com wraps

Fonte: Instagram. 2014.

Anexo 6 – Foto de prato oriental 3

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Fonte: Instagram. 2014.

Anexo 7 – Foto de croissant

Fonte: Instagram. 2014.

Anexo 8 – Foto de prato de pipocas

Fonte: Instagram. 2014.

19
Anexo 9 – Foto de pote de Nutella

Fonte: Instagram. 2014.

Anexo 10 – Foto de pessoas em um restaurante

Fonte: Instagram. 2014.

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