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1. Introdução
A abertura comercial, iniciada no Brasil no início dos anos 1990, exigiu inúmeras
mudanças e adaptações das empresas brasileiras, para estarem aptas a participar do
mercado mundial, extremamente competitivo. Essas mudanças vão desde ajustes in-
ternos das empresas até alterações na forma de gestão das cadeias de produção.
Além disso, outra exigência vem sendo feita para garantir a permanência das indús-
trias brasileiras nos certames mundiais: a sustentação econômica. Ela depende de
uma série de fatores como, por exemplo, controle dos gastos e do déficit público e in-
o contrato de PPP é de concessão de longo prazo (15, 20, 30 anos, podendo até a
chegar a 35 anos), no qual o Estado transfere para um operador privado o direito
e a obrigação de fazer o investimento e depois operar aquilo, enquanto o gover-
no paga como se fosse um contrato de prestação de serviços, o que não deixa de
ser, só que combinado com obras.
De acordo com tudo que se observou até o momento, pode-se concluir que o
objetivo das PPPs é a realização de empreendimentos sociais ou estrategicamente
prioritários, tais como os de infra-estrutura, com retorno financeiro desconhecido ou
de baixa expectativa, em um contexto de restrição à realização de gastos públicos,
buscando, ainda, proporcionar certo crescimento sustentável à economia brasileira.
A intenção e o objetivo das PPPs têm sido considerados, nos meios político
e científico, positivos. O Brasil necessita de investimentos massivos e o Estado
não tem como realizá-los. A utilização das PPPs parece uma solução viável. Esse
tipo de contrato fornece a prestação do serviço por parte da iniciativa privada, as-
sim como procura garantir o recebimento pelo serviço prestado. Porém, muitos
pontos ainda geram dúvidas. A experiência externa não pode ser utilizada, ainda,
como referência para assegurar a eficiência das PPPs para o Brasil, principalmen-
te devido aos diferentes tipos de desenhos e correspondentes regulamentos, de
acordo com características específicas de cada país.
Delimitação de funções
cada contrato, o que expressamente permite delegar todas as funções, à exceção das
funções de regulação, jurisdicional e do exercício de poder de polícia (Nunes, 2004).
O grau de abrangência que o projeto de lei concede às PPPs abre a possibili-
dade para que sejam transferidas ao setor privado as principais decisões sobre os in-
vestimentos governamentais, principalmente na ausência de um sistema de
planejamento governamental capaz de sinalizar seus objetivos e as prioridades de
alocação de recursos no médio e longo prazos. Juruá (2004) ressalta a dificuldade
em acreditar que a parceria possa ser utilizada pelo governo para direcionar o inves-
timento privado. A tradição brasileira preconiza que o contrário é mais provável: as
decisões de investimento ficarão por conta dos investidores privados, que os selecio-
narão de acordo como seus critérios de poder de mercado e de maximização de lu-
cros.
Outra questão relevante, mais específica que a anterior, é a referente à defini-
ção do projeto de empreendimento, objeto do contrato. Observa-se, no projeto de lei,
a ausência de especificações e detalhamentos a esse respeito. As especificidades téc-
nicas do empreendimento devem ser declaradas pela administração pública para que,
então, a iniciativa privada desenvolva o projeto. Não há indicativos no projeto de lei
que determinem que os projetos devam seguir somente essas especificidades. A difi-
culdade surgirá na avaliação dos mesmos, uma vez que inúmeras empresas poderão
participar do certame apresentando projetos diferenciados, com especificidades nem
sempre demandadas ou desejadas. Torna-se tarefa complexa comparar projetos e
selecionar a empresa adequada, uma vez que as propostas sejam diferentes. A discri-
cionariedade do administrador público será fator decisivo.
Captação de recursos
A falta de especificação consistente sobre a quem caberá o investimento que não for
feito pelo Estado constitui outro desafio. Não fica claramente limitado ao sistema fi-
nanceiro privado a captação de recursos para o financiamento de PPPs. Diversos
projetos, anunciados pelo Ministério do Planejamento, quando da divulgação dos
contratos de PPPs, seriam financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) ou por fundos de desenvolvimento regionais — por-
tanto, por dinheiro público. Aumentando, assim, a importância dos provedores de
fontes para investimentos de longo prazo, como o próprio BNDES.
Identifica-se uma questão relevante e que, em um futuro próximo, pode vir a re-
presentar fonte de descontentamento. Se uma empresa capta recursos do BNDES para
um contrato de PPP, esses recursos estariam submetidos a juros muito abaixo dos pra-
ticados no mercado financeiro. Essa empresa basear-se-ia no baixo custo do capital na
“cobrança” do serviço do Estado? Ou, no caso de haver “pedágios”, cobrados da soci-
edade, estariam esses pedágios vinculados aos juros baixos de um empréstimo feito
por uma empresa privada, obtendo recursos de um agente público? Neste caso, contes-
ta-se se a presença de um intermediário privado em transação que envolva dinheiro pú-
blico em obras públicas é saudável tanto para o Estado quanto para a sociedade.
A Lei de Responsabilidade Fiscal não permite o endividamento, a longo pra-
zo, do agente público. Dessa forma, fica criado o obstáculo legal que impede que o
BNDES financie obras públicas, diretamente com agências públicas. Considerado
isso, ressalta-se a relevância que o BNDES passa a ter nos contratos de PPP. O que
deve ser observado e cuidado é o fato de a iniciativa privada, a partir da obtenção do
financiamento do BNDES, não repassar um custo muito elevado para o Estado e
para a sociedade.
Fundos
A Lei de Responsabilidade Fiscal tem sido considerada, pela maior parte dos autores,
um dos mecanismos mais salutares já surgidos no ordenamento jurídico, em favor da
moralidade público-administrativa, na medida em que garante o equilíbrio das contas
públicas, ao mesmo tempo em que impede exageros no endividamento do Estado a
longo prazo.
Os arts. 15 e 16 da LRF dizem que toda despesa que não vier acompanhada de
estimativas do seu impacto orçamentário-financeiro no respectivo exercício em que
entre em vigor e nos dois subseqüentes, assim como aquelas que não vierem com a de-
claração do ordenador da despesa de que o aumento tem respaldo e adequação orça-
mentária e financeira com a Lei Orçamentária Anual, com o Plano Plurianual e com a
Lei de Diretrizes Orçamentárias será considerada irregular e lesiva ao patrimônio pú-
blico.
Quando o governo adota um contrato de PPP não faz um investimento inici-
al, que passa para o setor privado. Nos anos em que a obra é implantada, não há pa-
gamento. Durante esse período, a iniciativa privada efetua o investimento relativo ao
5. Experiência internacional
A Inglaterra, uma das pioneiras nos contratos entre a administração pública e a inici-
ativa privada, tem sua experiência baseada em projetos desenvolvidos sob o instru-
mento denominado private finance initiative (PFI). Esse tipo de arranjo possui
algumas diferenças significativas, se comparado com o projeto de lei das PPPs, apre-
sentado para o Brasil. Nessa modalidade de associação, o setor público mantém a
responsabilidade pela provisão de parte dos serviços, ou seja, o investimento inicial
é de responsabilidade tanto da iniciativa privada, quanto da administração pública.
Segundo estimativas do International Financial Services (2003), cerca de 70%
do valor total dos contratos de PFI é de responsabilidade do governo central da In-
glaterra. O fluxo atual de investimentos nessa modalidade é de aproximadamente
US$ 6 bilhões por ano. A participação do setor privado no financiamento de proje-
tos de serviços públicos corresponde a cerca de 15% do investimento total.
Este arranjo de parceria foi introduzido na Inglaterra em 1992, com objetivo de
aumentar os investimentos em áreas sociais. Inicialmente esse objetivo se viu frustra-
do por fatores como a falta de coordenação, priorização insuficiente e legislação inade-
quada. Passado o período inicial, tradicionalmente marcado pela instabilidade por
tratar-se de uma forma de contrato nova e sem jurisdição válida, os contratos de PFI
passaram a obter maior credibilidade e êxito, porém não estando isentos de dificulda-
des.
Um fator de extrema relevância no modelo inglês foi a necessidade de regula-
ção (avaliação e auditoria) desses contratos, que passaram a ser regularmente avalia-
dos e auditados pelo National Audit Office, instituição independente do governo
ligada ao Parlamento (CNI, 2004). Medidas como essa vieram no sentido de tornar o
contrato mais seguro e transparente, tanto para a administração pública quanto para a
iniciativa privada, além de proporcionar mais segurança para a sociedade.
Kerr (1998) aponta alguns desdobramentos da implantação dos contratos de
PFI na Inglaterra:
um relatório que concluiu que os projetos executados sob a forma de PFI permiti-
ram, em média, uma economia de 17% em relação às formas convencionais de ofer-
ta de serviços públicos; 75% dos projetos foram concluídos dentro do prazo e 80%
dentro do orçamento previsto (International Financial Services, 2003).
Para o caso da Inglaterra, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) identi-
ficou alguns fatores críticos para o sucesso das PFIs, que determinaram o êxito des-
se arranjo, mesmo com dificuldades iniciais, e que podem ser apropriados para os
diversos arranjos de PPPs, pois constituem pré-requisitos para o êxito de qualquer
contrato dessa natureza, independentemente do contexto socioeconômico. De acor-
do com a CNI, os fatores são: compromisso político, legislação adequada, expertise,
priorização dos projetos e a existência de um fluxo regular e previsível de provisão
dos serviços e pagamentos.
A experiência inglesa evidencia, ainda, que o marco das PFIs precisa ser con-
tinuamente desenvolvido e aperfeiçoado. Um exemplo é o mecanismo de solução de
conflitos (arbitragem) que, mesmo preestabelecido, prova-se, freqüentemente, insu-
ficiente diante dos conflitos reais.
No Canadá, uma versão alternativa para o contrato entre o setor público e a ini-
ciativa privada é a chamada contribuição de melhoria (benefit sharing). Este contrato
constitui um mecanismo em que o setor privado complementa o investimento tradicio-
nal do Estado. Dessa forma, a iniciativa privada ajuda a financiar a obra. A receita cor-
rente é utilizada para pagar parte do investimento, geralmente a que cabe ao ente
privado. A área beneficiada sofre encargos tributários aplicados, fazendo com que a
população pague a outra parte do investimento realizado.
As principais dificuldades que surgem deste modelo são a questão do valor do
empreendimento, que pode ser determinado pelas empresas, e que não necessaria-
mente reflete o valor real da obra, além da complexidade na verificação e monitora-
mento das zonas de influência nas áreas envolvidas, para a tributação.
Portugal iniciou a utilização das PPPs no início dos anos 1990, para superar
as deficiências de sua malha rodoviária. Segundo Rubio (2003), as PPPs foram forte-
mente utilizadas na construção de estradas. Nesse país, em diversas rodovias, lan-
çou-se mão do modelo que não cobrava dos usuários pelos serviços prestados pela
iniciativa privada, cabendo diretamente ao Estado o pagamento ao ente privado. Nas
estradas onde se fazia uso de pedágios, mas o volume de tráfego não conferia retor-
no suficiente aos projetos, a viabilidade da rodovia também era garantida pelo Esta-
do. Contudo, a falta de coordenação do setor público e a subestimativa dos custos
futuros resultaram em impactos fiscais imprevistos e revisão das condições em que
os serviços eram oferecidos à população (como cobrança de pedágio não prevista).
A experiência de Portugal constitui um exemplo interessante dos erros em que se
pode incorrer.
6. Conclusão
A avaliação da experiência internacional das PPPs deve ser feita com algumas ressal-
vas, pois, em primeiro lugar, nas economias onde o uso do instrumento é mais antigo,
sam de previsões. Por outro lado, o projeto de lei, que institui e regula as PPPs, mostra-
se incipiente em diversos pontos, como apresentado neste artigo, contrariando (ou des-
validando) leis já instituídas, tais como as leis de Responsabilidade Fiscal, de Licita-
ções e Contratos e de Concessões.
A elaboração criteriosa dos contratos é fator-chave para o êxito da parceria. A
coordenação dos compromissos financeiros assumidos pelo ente público como contra-
partida dos investimentos privados, assim como a prevalência de controle por parte da
administração pública sobre os agentes privados, de forma a evitar “abusos”, é tam-
bém fator relevante.
Deve-se ainda ter, de maneira bastante clara, qual a real justificativa para esse
contrato de parceria, se a escassez de recursos e impossibilidade de endividamento
por parte do Estado ou a melhor capacidade de gerenciamento da iniciativa privada.
Tudo o que já foi apresentado aponta para o fato de que as parcerias não po-
dem se dar de maneira apressada e sem critérios bem definidos, sob pena de, por um
lado, comprometer a credibilidade do instrumento e pôr em risco o interesse coleti-
vo e, por outro, gerar contingências fiscais que se refletirão em aumento da dívida
pública, aumento da taxa de juros e piora do ambiente macroeconômico para o in-
vestimento privado. Todas as dificuldades que surgiram e surgem dessa forma de
contrato são relevantes para a construção de um modelo intrinsecamente brasileiro
de contrato de parceria entre o público e o privado, que venha na direção das deman-
das do país e, principalmente, ao encontro com as especificidades brasileiras, tanto
legais quanto de contexto.
Este novo modelo, que poderá surgir a partir de superações de algumas das
questões aqui abordadas, e que se aprimora a partir de discussões acerca do tema,
pode vir a ser uma efetiva contribuição para o crescimento do Brasil, contrariando o
atual modelo de parceria público-privada proposto no país, que pode estar oferecen-
do soluções mágicas e oportunas para problemas de primeira ordem, como os de in-
fra-estrutura.
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