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GOULART

CAPA; SÔNTE MARIA

I
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F'ICHA CATALOGRAFICA
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CIP-Brasil' Catalogação-na-fonte
de Livros' RJ'
sindicaio N;;d;' aot Bãitor"s

Leitman, SPencer Lewis' Guerra-dos luTltpot'


L557r Raízes socioeconômicas da
aãiii'iãii"ão Érasil no século XIX / spen-
'. ")iiíiüLeitman;
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Ji Saritillinhares Barsted'
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í"*i;''Edições leTe'

roots of the ragamuÊ


Tradução dc: Socio-economic
'i"t"
fin war
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- Universidade do Texas
Bibliografia /
A meu sogro
1835-
. l. Brasil - História - Brasil Farrapos'
Guerra dos
História - Guer'
- ARNDD WITTE
1845 - Aspectos I' Título
ra dos Farrapos,""onáãi"o"2'
rg3i-lE+S -Aspectos sociais

cDD - 981.04

79-002r
õou - 981"1835-1845"
Abreviações usadas nas notas

AALRGS Arquivo da Assembléia Legislativa do Rio Grande do


Sul, Porto Alegre.
AFRC Coleção de Alfredo Ferreira Rodrigues, Arquivo His-
tórico do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. ÍNptce
AHI Arquivo Histórico do Ministério de Relações Exterio-
res, Itamaratí. 9
PREFÁCIO
1s
AHRGS Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, Porto Ale- INTRODUÇÃO ..
gre. I A GUERRA DOS FARRAPOS 25

AIHGB Arquivo do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro' [Í.: A TRAMA INTERNACIONAL E A


POLÍTICA DA PROVÍNCIA
Rio de Janeiro.
III. O DECLÍNIO DA AGRICULTURA
AMIP Arquivo do Museu Imperial de Petrópolis. E A ASCENDÊNCIA DA PECUÁRIA . ......,.,79
Arquivo Público do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. IV. AS TERRAS DA FRONTEIRA ...."... 103
APRGS
D
_ A IRRITAÇÃo ceuseDA PELo coN-
AN Arquivo Nacional FISCO MONETÁRIO E FISCAL ....... .123

BN Biblioteca Nacional VIJ. O GADO E OS CAUDILHOS


NA REVOLUÇÃO ...149
HGR Alfredo Varela, História da grande revolução: O cyclo *Epílogo """""167
.farroupilha no Brasil. 6 vols. (Porto Alegre, 1933). niUtiogratia " " '177
PMPA Arquivo da Prefeitura Municipal de Porto Alegre.
RC Alfredo Varela, Revoluções cisplatinas: - A república
Rio-grandense. 2 vols. (Porto, l9l5)
RGS Rio Grande do Sul
RIHGB Revista do Instituto Histórico e GeográJico Brasileiro.
RIHGRGS Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Gran'
de do Sul.
VC Coleção Alfredo Varela, Arquivo Histórico do Rio
Grande do Sul.
INTRODUÇÃO

Urnu das razões da rivalidade luso-espanhola nas planícies me'


ridionais era a vasta área de terras devolutas, ou zona tampão, com-
preendendo os territórios entre as fronteiras espanholas e portugue-
'sas. ' Com a exceção de algumas tribos indígenas dispersas, era esta
região temperada praticamente despovoada nos séculos XYI e XVII.
Dúrante oiéculo XVIII, estas planícies férteis foram ferozmente dis-
putadas. Os exploradores portugueses e espanhóis traçaram primeira-
mente a costa das Terras Contbstáveis e os sistemas fluviais que desa-
guavam no Atlântico, de São Paulo, ao norte, atê ao estuário do Pra-
ia, ao sul. Exércitos disputaram esta região no século XVIII, enquan-
to a população dispersa se rnisturava ç os idiomas português e espa-

l. lll:
Para debates geo-históricos, ver: Alfredo Y arcla, Riogrande do Sul, descipeã9
sica, históricie econômica (Petotas, 1897); Balduino Rambo, A fisionomia do Rio
Grande do.Sul, ensaío de monogralia natural (Porto Alegre, 1942); Aurclio Porto,
Historia das missões oientais ilo uruguai 2 vols. (Porto Alegre, 1954); Dauril Al-
den, Royal Govemmen, in Colonial Brazil with Special Reference to the Administra-
,t
tion oÍ the Marquis of Lavadio, Vicetoy, 1769'1779 (Berkeley, 1968).
l5
I

I
nhol se corrompiam mutuamente. No século XIX, as guerras e os tra- gindo 1.200 ms. nos Aparados de Bom Jesus. No início do segunclo
tados consolidaram as fronteiras políticas. Hoje, esta região abrange quartel do século XIX, os irnigrantes alemães comeÇaram a cultivar
os estados brasileiros do Paraná, Santa catarina, Rio Grande do sul pequenos lotes familiares nas áreas ao norte e a oeste de Porto Alegre,
e o Uruguai. no Guaíba.2 Mais tarde, ainda no mesmo seculo, pioneiros italianos
os primeiros esforços para povoar perrnanentemente a periferia se estabeleceram nas florestas de pinheiros, nos vales das montanhas de
das Terras contestáveis rorarrr feitos nos primeiros vinte e cinco anos Cima da Serra.' No tempo da Guerra dos Farrapos, a Serra era a
do século xvlll, pelos jesuítas espanhóis que fundaram missões nas zona rnenos populosa, com poucos estancieiros ou fazendeiros. Era
margens dos rios Paraná e Paraguai. No início, grandes bandos de in- comurn encontrar grandes fazendas de gado na região do oeste. Flo-
cursores paulistas, caçadores de escravos, ou bandeirantes, empurra- restas e pastagens cobriam a zona de Cruz Alta, área importante pela
ram os jesuítas em direção ao sul, para o centro do Rio Grande do criação de burros, que se transformava em zona de vegetação árida.
sul. outras incursões compeliram os jesuítas a atravessar o rio uru- no lado ocidental.
guai, em busca das missões estabelecidas no paraná. o gado domesti- A menor região fisiográfica no Rio Grande do Sul é a depressão
cado que abandonaram se tornava selvagem e se reproduzia rapida- central. Historicamente, no entanto, concentrava a maior população
mente nas pastagens. rural peqmanente. Do Vale do Jacuí, na depressão central, os colonos
A presença destes novos e grandes rebanhos selvagens fez com se espalharam em todas as direções. O Jacuí, com seus inúmeros tri-
que os jesuítas voltassem pelo rio, e estimulou o interesse luso- butários, e o lbicuí, fbrmam como que uma estrada que vai de leste ao
brasileiro eú são Paulo e na Laguna. No século xvlll, os paulistas oeste, aberta nas duas extremidades. No linal do seculo XVlll, cam-
estabeleceram fazendas de gado ao longo do vale do alto são Francis- poneses açorianos cultivavam pequenos e medianos campos de ce-
co, para abastecer as plantações costeiras e as novas áreas de minera- reais nas zonas do nordeste. Com o passar dos anos, eles e outros
ção dç ouro em Minas Gerais. Porém esta fente de abastecimento não avançaram para o sul e o oeste, para se dedicarem à criação de gado,
era suficiente. A extensão das regiões das minas de ouro gerou uma mais fácil e mais lucrativa. A vegetação do Jacuí, zona marginal, está
nova demanda, que impeliu os paulistas em direção às terras pastoris incorporada entre as colinas rochosas e secas da Serra do Sudoeste,
do Rio Grande do Sul. Esta região tornou-se, portanto, uma grande ao sul, e a Serra Geral, em forma de cone, ao norte. Próximo à Serra
estância, ou fazenda de gado. Geral..as pastagens vão diminuindo cada vez mais, até se transforma-
Tanto os espanhóis como os portugueses, tentaram conquistar rem ell apenas campos cercados pela Íloresta e por uma vegetação
mais terra, mais gado, e a lealdade das tribos indígenas, numa luta densa. Na maior parte a terra e plana, com pouco escoamento das á-
que seus descendentes continuaram no século XIX. As melhores ter- guas. No lado meridional do Jacuí, as pastagens são mais secas e o
ras das Missões, com boas pastagens e terreno menos acidentado, es- terreno mais acidentado, à medida que se aproxima da Serra do Su-
tavam localizadas na zc,na do oeste, perto das reduções de São Borja e doeste, serra esta que loi uma lortaleza dos Farrapos. Cai quase em partes
São Luiz, fortalezas jesuítas. com a conquista portuguesa das Mis- iguais de cada lado do Rio Camaquã. Ocupando 15 por cento da provín-
sões em 1801, os criadores de gado se estabeleceram nestas missões, cia. o sudoeste lorma um triângulo isósceles; o vértice é a Lagoa dos Bar-
agora desertas. Mas as melhores terras da província para a criação de ros, e os ângulos da base, Serrito e São Gabriel.
gado ficavam na Campanha, as pastagens do sudoeste, pendendo
para o vale do Uruguai e a bacia do Prata.
Ao norte e a leste das Missões fica a zona de Cima da Serra, que Sobre a colonização alçmã, ver: Aurélio Porto, O trabalho alemrio no Rio Grandt'dt,
§u/ (Porto Alegre, 1934) e Jean Roche, Lo Colonisation Allemande et le Rio Grande
se estende entre os vales dos rios Uruguai e pelotas, ao norte, e, ate do Sz/ (Paris, 1959).
Cruz Alta, a oeste. Ao sul, o desfiladeiro leste-oeste da depressão cen- Stuart Clark Rothwell, The Old Italian Colonial Zone of Rio Crande do Sul, Brazil
tral forma a fronteira. Do oeste para o leste a altitude aumenta, atin- (Porto Alegre, 1959)p. 36.
l6 l1
A ocupação portuguesa no século XVIII do Jacuí fortaleceu seu tos. Porém, uma vez ultrapassada a perigosa barra do Rio Grande, a
domínio no Rio Grande do Sul, forçando os espanhóis a se reorgani- paisagem se tornava cada vez mais verde. Um cinturão verde ao redor
zarem e se reagruparem nas margens ocidentais dos rios Uruguar e das colinas, logo atrás das margens da lagoa, convencia o viajante que
uma perspectiva mais alviçareira o esperava, recompensando sua pa-
Quaraí. Com a tomada das Missões, os portugueses flanquearam os
espanhóis. A chave era o controle do Jaçuí, pois as pequenas cidades ciência.
ribeirinhas de Cachoeira, Rio Pardo, Triunfo, Santo Amaro e Santa A vila do Rio Grande, ou O Sul, como seus habitantes gostavam
Maria, serviam de centros distribuidores de gado e de trigo das áreas de chamá-la, devido à sua posição ao sul do Norte, resplandecia con-
em desenvolvimento, ligando-as diretamente com Porto Alegre e Pe- tra a areia branca. Durante todo o dia, os escravos varriam a areia
lotas, compreendidas no sistema da Laguna. Antes do início da Guer- para fora das casas e tiravam agua dos poÇos, sem parar, como se fos-
ra dos Farrapos, em 1835, a indústria da charqueada, isto é, os esta- sem fornrigas. "Ali, o homem pôde mais que a natureza, onde achou
belecimentos de salga de carne tinham começado a operar no interior, impotência e miseria, elç l'ez nascer prosperidade...". o A algumas lé-
oferecendo, porém, pouca competição aos arrogantes centros de guas da barra, os capitalistas da cidade e homens de projeção cons-
charqueada de Pelotas. Das margens do Guaíba ate a fronteira do truiram casas suntuosas, rivalizando com as melhores de outras cida-
Rio Pardo, e da extremidade sudoeste da Serra do Sudoeste, onde se des brasileiras. Mas o vento, o sol e a areia nas ruas tornavam a vida
encontra com a Campanha na cidade ribeirinha de Serrito, barcos desagradável, mesmo para os porcos e as galinhas. Um teatro, duas
earregados com toneladas de carne salgada e couros, transferiam sua tipograÍias, três sociedades patrióticas e uma igreja bem construida,
carga para intermediários na região de Laguna. foram as tentativas feitas pelo Rio Grande para imitar o Rio de Janei-
As primeiras impressões do Rio Grande do Sul variam conforme ro. 5 Os homens de dinheiro e suas familias visitavam a capital do im-
o ponto de ingresso do visitante. Chegando por via rnarítima, o via- pério, reabastecendo guarda-roupas e atualizando suas mentes.
jante encontra primeiro o Litoral, uma zona arenosa ao longo do Porto Alegre era climaticamente mais agradável do que sua rival
Atlântico, que contém as duas maiores lagoas brasileiras - Mirim e comercial. Construída numa península que avançava pelo extremo
Patos - se estendendo por 620 kms. da barra do Chui, ao sul, ate a loz norte da Lagoa dos Patos, onde quatro nos se juntavam para formar
do Mampituba, ao norte. Dunas de areia movediça, às vezes com o Guaíba, era.extremamente bem situada para o comércio. O Jacuí
mais de vinte metros de altura, pontilham a ârea. As duas característi- era o seu hinterland. Do alto das colinas, o palácio do governador, a
cas mais importantes do litoral sào as lagoas alongadas, paralelas ao igreja, a prefeitura e a esplêndida residência do visconde de São Leo-
Atlântico, e a ausênci4 de portos. Os traiçoeiros bancos arenosos im- poldo, vislumbravam aos seus pés as docas. Quando foi adequadamente
pedem o desembarque desde Torres até aos portos de Rio Grande e lortiÍrcada e defendida, a cidade desafiava todas as formas de ataque, com
Norte, na extremidade sul da Lagoa dos Patos. Os naufrágios eram a exceção de assedio. Ruas bastante largas cortavam a colina de Santa
frequentes, devido aos fortes ventos que sopravam geralmente do sul Anna. A rua da Praia, na base da colina, separava as docas das casas
e do leste, e à imprevisibilidade dos bancos de areia que enervavam os que pontilhavam a encosta. Negros carregando pesados fardos, co-
comandantes dos navios quando estes entravam na lagoa. Os comer- merciantes gesticulando em frente de suas lojas, e grupos de marinhei-
ciantes clamavam por melhorias do porto e do canal e se desespera- ros empertigados, davam idéia das brilhantes possibilidades de co-
vam com a perda de comercio da província. mercio da cidade e da provincia. Ao redor da cidade, nas colinas e na
A maior parte dos imigrantes e dos viajantes entrava na provín-
cia pela barra do Rio Grande, a única saída para o Atlântico. O pano-
rama das monótonas dunas com nuvens de areia rodopiando por ci- -{. Nicofau Dreys, Nolr'r'rc de.çcritiva da província do Rio-Crande de S. Pedro do.§u/ (Rio
ma, desanimava o imigrante. Uma grande faixa branca e estéril se es- Grande, 1921), p. lO4.
tendia sob a forma de bancos de areia movediça, até a Lagoa dos Pa- 5. O Noticiador, 8 de outubro de 1832, np 78, p. 319.
l8 l9
pequena Braça que ficava logo atrás, crescia uma grande variedade de necessidades econômicas, mas o faziam para aumentar a produção,
àruorer frutíferas tropicais e da zona temperada. Nas matas das inú- promover seu prestígio e preparar o futuro da familia. Neste movi-
meras ilhas do Guaíba, os habitantes pescavam e apanhavam lenha mento em direção ao sul, evitavam antagonismos sociopolíticos em á'
paÍa a cidade. A turbulência simbolizava progresso material, porém reas já ocupadas por outros clãs aristocrático§ de pecuaristas, e vi'
não escondia a pouca distância que existia entre a vida da cidade e a viam em paz com seus competidores em Montevidêu e Buenos Aires,
vida da fronteira. Homens cultos, que liam literatura e tratados eco- Como a era da administração científica do solo e da melhoria do gado
nômicos europeus, não hesitavam em cavalgar junto com a milícia e das pastagens ainda estava muito longe, os rio-grandenses ambiçio-
gaúcha e destruir grande parte daquilo que tinham criado. sos olhavam com cobiça para as terras de melhor pastagem da Banda
A população de Porto Alegre, de 12.000 a 15.000 habitantes em Oriental, em vez de pensarem como poderiam melhorar as que já pos-
1830, sustentava cinco igrejas, uma alfândega solidamente construí- suiam.
da, dois quartéis, um hospital, um asilo de pobres e umâ cadeia nova'
Havia planos para a construção de um teatro na praça do lado oposto As Guerras Cisplatinas (l8ll-1828) forneceram oportunidades
à prefeitura, lugar este pouco recomendado, porque' quando chovia, para uma rápida ocupação desta região. Primeiramente, como estas
u iu, r" transformava em uma sêrie de cachoeiras. As igrejas eram de terras estavam ainda despovoadas, os chefes luso-brasileiros aprova-
construção e aparência simples e eram pouco frequentadas, a não ser vam e encorajavam uma ocupação imediata para substanciar maiores
pelas mulheres devotas e crianças. As procissões religiosas eram o di- reivindicações territoriais. Segundo, a presençâ de grandes manadas
vertimento principal, e toda a população saía às ruas pâra ver passa- de gado selvagem permitia aos novos proprietários adquirir capital
rem os santos ricamente enfeitados' Nas sacadas das janelas, no per- imediato. Terceiro, organizando estâncias, a populaçâo errante' da
curso da procissão, tapeçarias de seda com franjas douradas flutua- fronteira podia ser controlada. A maior parte dos estancieiros a ad- f
-
vam com a brisa. u quirir terras na fronteira, era composta de oÍjciais da milícia, que ti- i
Em lS22,aproximadamente cem anos depois da colonização ini- nham recursos próprios e laços de família com os estancieiros de La- !
cial no Rio Grande do Sul, o litoral continha 22 por cento de toda a guna. Por exemplo, Bento Gonçalves da Silva, futuro líder dos Farra-l
população total da província, calculada em 120.000, e as regiôes de pos, administrou terras na Banda Oriental, sob a égide econômica de
Cima da Serra e Missões, l8 por cento. Sessenta por cento dos habi- seu pai, que residia no vale de Camaquã. 8
tantes do Rio Grande do Sul estavam concentrados na depressão cen- A posição de oficial da milícia era estratégica para um futuro I
tral e nas terras de gado da Serra do Sudoeste e da Campanha- A "coronel". O primeiro emprego de Bento Manuel Ribeiro no Rio {'
Campanha abrange uma área de 50.000 kms. quadrados, aproxima- Grande do Sul foi o de peão. Porém, durante as décadas do conflito, \
damente 18 por cento da área total da província.' fez carreira rapidamente na milicia, e no final das Guerras Cisplati- \
nas, recebeu uma grande extensão de terras para pecuária, como re- )
Na primeira parte do século XIX, os prôsperos criadores de gado compensâ por seus serviços. n Ainda mais típica, talvez, foi a carreira-
e seus filhos iam acompanhando a fronteira à proporção que esta ia se de estancieiro de Francisco Telles de Souza, que se estabeleceu na
expandindo. Não eram forçados a procurar novas áreas premidps por margem esquerda do Arroio Lageado, no distrito de Alegrete, em

8. O que parece ser verdade sobre a fronteira paulista parece ter semelhança com o
ó. Arsêne Isabelle, Viagem ao Rio da Prata e ao Rio Crande do Sul, Trad. de Teodemi-
movimento no Rio Crande do Sul, Warren Dean, The Indusírialization of São Pau'
ro Tostes (Rio de Janeiro, 1949), pp. 2'75-278. lo 1880-1945 (Austin, 1969), p. 39; Herbert Canabarro Reichart, Bento Gonçalves:
'7'16.65G; R'aphael Copstein, "Terra dos farra-
7. Jozé Pedro Cezar, Mapa, 1829, AN. Estudo biográfico (Porto Alegre, 1932), pp.23-26.
pos", Correio do Povo,20 de setembro de 1969, suplemento, p. 4. 9. Othelo Rosa, Vultos da epopéia farroupilha (Porto Alegre, 1935), pp. 95-96.
20 2t

1l

I
1823. De seu superior militar, o jovem alferes, recebeu o tradicional Havia um grande número de escravos em qua§e todas as estân-
donativo de terra, uma sesmarla, de três leguas quadradas. Suas tertas cias. Nas zonas do Chui e São Miguel, dentro dos limites do Uruguai,
aunrentaram e por ocasião de sua morte, em 1861, era um homem ri- trinta e cinco estancieiros brasileiros possuiam mais dc duzentos es-
co. Durantc a Revolução Farroupilha, deu a seu filho uma fazenda na cravos empregados num extensivo sistema de trabalho, embora hou-
qual pastavam 4.000 rezes em 1 845, "t demonstrando assim suas habi- vesse também peões e gaúchos assalariados. Muitos esÇravos trada-
tiAnaLr empresariais. O testamento do velho Telles de Souza era pare-'i lhavam como empregados domésticos. Outros cuidavam do milho,
cido com o de qualquer chefe famoso da fronteira " do trigo, da mandioca, dofeiião e de outros alimentos de subsistência.
Os estancieiros geralmente construiam suas casas no topo das co- Muitas vezes, os peões das estâncias eram escravos que exerciam to-
xilhas, ou série de colinas cobertas de pasto, para poder defendê-las das as funções próprias dos gaúchos. Duarte da Ponte Ribeiro, fun-
melhor. As primeiras casas eram feitas de taipa , com o teto de palha. cionirrio do Ministerio rle Relações Exteriores, afirma que as estâncias
As únicas aberturas eram uma porta na frente e um portão atrás, por brasileiras no Uruguai eram mais prósperas dô que suas congêneres
onde os cavalos podiam penetrar no pátio interno, para proteção. uruguaias porque empregavam mão-de-obra de escravos.'r
Nos cantos das casas havia fendas suficientemente largas para dar
passagem aos canos das espingardas. As vezes construiam até mesmo Os chefes republicanos dos Farrapos, saídos da classe de estan-
pequenas torres. Para sua própria proteção e para a proteção de seus cieiros da fronteira, queriam reforÇar as instituições da tradicional so-
animais, o estancieiro procurava se estabelecer em uma área cercada ciedade rio-grandense. Seu republicanismo não pode ser confundido
por "limites naturais, como morros íngremes' matos impenetráveis, e com radicalismo. A autonomia só seria aplicada à elite existente,
rnelhor que tudo, rios profundos pois dali não pode sair o gado vaga- como ficou evidenciado na Constituição que propuseram. Os eleitos
de algumas reformas mais liberais que tinham sido propostas e esta-
bundo, e mais resguarda esta fazenda das depredações dos ladrões' e
vam sendo votadas no Rio de Janeiro em 1830, os amedrontavamloOs
mesmo de viajantes"' "
Dependendo da qualidade da pastagem e da quantidade de água chefes Farrapos não eram revolucionários .sociais empenhados em
reestruturar as relações de classes. Na melhor das hipóteses, eram o
cada légua quadrada podia sustentar aproximadamente de 1.500 a
2.000 cabeças. As estâncias brasileiras na Banda Oriental tinham qua- froduto do tempo, incapazes de ultrapassar as atitudes sociais tradi-
se o dobro da capacidade da maioria de suas congêneres no Rio cionais. Qualquer colapso nas relações tradicionais entre senhor e es-
Grande do Sul. Na região de Jaguarão, no Departamento Oriental de cravo, estancieiro e gaúcho, poderia desorganizar o sistema político e
Serro Largo, a maioria das fazendas era de I 1/2 leguas quadradas. social vigente. O estancieiro que possuia peões negros poderia con-
Como no Rio Grande do Sul, os estancieiros possuiam mais de uma cordar com a recente abolição do tráfico de escravos, mas não permi-
fazenda, e não necessariamente na mesma zona. A maior estância tiria a emancipação. Foi precisamente esta maneira de ser que levou a
brasileira na Banda Oriental, no linal da Guerra dos Farrapos, abran- elite das fronteiras a manter uma estrutura social bastante estratifica-
gia sessenta léguas quadradas. '' da durante a Guerra dos Farrapos, mesmo quando enfrentava a der-
rota.

10. Leandro Telles, "As origens do Alegrete", Correio do Povo,24 de maio de 1970, p.
3.
ll. Dreys, Notícia, p. 133.
12. Rclatório da reportição do.s negócios esírangeitos apresentado_à assembléia geral le' :)
gislariva na terieira sessão da oitava legislatura pelo respectivó ministro e secretário t:. tbid. Dtarte da Ponte Ribeiro, As reloções do Brasil com as repúblicas do Rio da
ile L:.tratlo, Paulino Soares de.Soaza (Rio de Janeiro, l85l). Anexo A, negócios do Prata (Rio de Janeiro, 1936), p. 41.
Prata. 14. O Continentino,3 de janeiro, 1833, n. I, pp. 5-6.

22 23
l

A GUERRA DOS FARRAPOS

A *uio, parte da população riograndense olhou com simpatia


quando os chefes do novo regime tomaram o poder no dia 20 de se-
tembro de 1835, afastando o Governador e o Comandante de Armas
da Província. os Farrapos, que controlavam as posições estratêgicas
da Guarda Nacional, empenharam-se imediatamente em construir
uma base popular paÍa a rebelião, a qual os levaria a uma segunda se-
dição em dias vindouros, sedição esta que visava mais a separação e o
republicanismo do que simplesmente a substituição dos representan-
tei do governo central. Emissários do novo governo Farrapo se espa-
lharam pelas trilhas do gado, assegurando ao povo que não eram re-
volucionários. Experientes em assuntos de técnica conspiracional, os
Farrapos sabiam que se resistissem durante um certo tempo, o gover-
no responderia com uma ação repressiva. Esta, por sua vez, le-
""ntrul
varia a um conflito militar e criaria uma base sólida para o passo mais
arrojado da separação completa. No começo, o Rio de Janeiro rela-
xou as tensões, mas depois, respondeu militarmente. Em novembro
25
de 1836, os Irarrapos organizaram uma nação independente, com Grande. Em 1835, loi designado Comandante Supremo da Guarda
uma estrutura legal e militar que resistia ao governo central. De 1836 Nacional da Província.'
a ltt40, se niantiveram firmes, e às vezes tomaram a iniciativa' Em A Ciuarda Nacional, cujos chefes eram unidos por laços de famí-
1840, depois de cinco anos de luta, os recursos materiais e espirituais lia, era a espinha dorsal das forças revolucionárias. Bento Gonçalves
para a lutit conreçararrl a se esgotar. Nos últimos anos da guerra, o§ convocou a Guarda Nacional para executar o plano de ataque, um
combates se desenrolaram na Campanha. Todas as cidades e todas as movimento geral e simultâneo em toda a província.'2 Elementos da
vilas foram retomadas pelos Legalistas. A amargura das derrotas, da Guarda sob o comando de José Gomes de vasconcellos Jardim e do
Íonte e do fim de um sonho e a divisão dentro das próprias fileiras dos corpulento Onofre Pires da Silveira Canto, chegaram aos arredores
Ijarrapos, possibilitaratl aos generais do governo imperial açhar uma de Porto Alegre no dia 20 de setembro de 1835.
soluçito prlra por lim à guerra em 1845. coube ao Brigadeiro Gaspar Francisco Menna Barreto a defesa
Bento GonÇalves da Silva era o líder do partido Farroupilha e da cidade, o qual mandou um pequeno grupo fazer um reconheci-
principal conspirador da ala separatista-republicana. Nascido em Ca- mento. Cientes de sua aproximaçãO, os Farrapos desmantelaram-no
numa tocaia bern planejada. os que conseguiram escapar para Porto
maquã, região da Lagoa dos Patos, su1 carrgira se a-ssemelhava à de
tantos outros caudilhos platinos, com mánobras brilhantes, trarcões Alegre, chegaram tão apavorados que contaminaram os outros com
seu medo. o nome de Bento Gonçalves como chefe dos Farrapos, re-
ambiguas e guerras periódicas. Seu pai era um estancieiro rico, e uma
duziu os 200 defensores de Porto Alegre de met.ade. o Governador
intporuante ligura da política loçal. o jovem Bento, que recebeu uma
educaÇão limitada, demonstrou competêncta quando trabalhou na es-
Antonio Rodrigues Fernandes Braga chamou os cidadãos às armas.
Depois de uma rápida contagem do número dos leais defensores, to-
tância de seu irmão mais velho, antes de se estabelecer na sua própria.
Giuseppe Garibaldi, algum tempo depois, descreveu os dotes de cava-
mou uma esÇuna que estava ancorada no rio Guaíba. Antes de zar-
par, deu ordens a Menna Barreto para capitular, evitando assim um
leiro de Bento Gonçalves como sendo somente inferiores aos de Jose t'
Farrapo, um cen- desnecesshrio derramamento de sangue
Antonio Sousa Netto, outro caudiiho da fronteira e
Depois de um artifício legal, o Farrapo Marciano Ribeiro substi-
tauro das colinas verdejantes.
tuiu Braga no posto de governador. Porém a vitória na província ain-
A primeira experiência militar de Bento foi nas Campanhas Cis- da não Ãtruu-"onrolidada, pois os legalistas ainda dominavam a ci-
platinai, em 1811, quando tinha 23 anos. A maior parte dos jovens dade estratégica de Rio Pardo e a maior parte das comarcas do Rio
iio-grandenses do seu nível social e econômico, entrava para a milí- Grande e piratini. No entanto, Piratini rendeu-se e, logo após, Rio
cia, ou para os lamosos Dragões do Rio Pardo. Bento, porém, não Pardo, Çom um minimo de resistência. Depois disto, os Farroupilhas
entrou. Para melhorar Sua situação econômica, Bento Gonçalves de- se dirigiram para o Rio Grande, onde Braga tinha se entrincheirado.
sertou em l8l I na campanha de Dom Diogo na Guerra Cisplatina, e
se dirigiu para a fronteira, para o distrito de Serro Largo, na Banda
Ôriental, servindo por algum tempo com o herói da Independência l. Herbert Canabarro Rerchardt, Bento Gonçalves, esludo biográfico (Porto Alegre,
uruguaia, José Gervasio Artigas. Quando deixou a milícia uruguaia, 1932) pp. l7-27; Alfredo Ferreira Rodrigues, "Bento Gonçalves da Silva", l/rza-
permaneceu em Serro Largo, comprou estâncias, dirigiu um armazém nak Liierario e EstatísÍico da Protíncia do Rio Grande do Sul (1892), p.21; "Necro-
logia de Bento GonÇalves da silva" (MS), vC, LXI; Lindolfo.collor, Garibaldi e a
e taverna, e fez um bom casamento. Nas campanhas Cisplatinas se- gu-erra do,r Íàrralos, 2s ed. (Porto Alegre , 1958). p 46-
guintes, foi comandante da milícia brasileira, major das forças de 2 RC, I, 518.
guerrilha, e coronel do exército regular. Depois da guerra contra as 3 Ihid, 518-53O; Aurélio Porto, "Notas", Puhlicações do Arquivo Nacional XXIX
Érovíncias Unidas, 1825-1828, recebeu o comando do 4c Corpo de (Rio de Janeiro, 1938), pp. 322-123; Antonio Rodrigues Fernandes Braga a Joa-
quim Vieira da Silva e Souza. Rio Grande, setembro 29. 1835. VC. 168'
cavalaria do exercito, comandando a fronteira estratégica do Rio
27
26
Braga procurou negociar, sem instruções do governo central' Foram tomadas rapidamente outras medidas importantes à pro-
com um caudilho da Banda Oriental que controlava o Serro Largo, e moÇão do esforço de guerra, com o objetivo da tomada do porto do
que jii tinha se olerecido para ajudar as forças legalistas de João da Rio Grande. O entendimento de Bento Gonçalves com Manuel Ori-
Silva Ta'yares. Comandante da F-ronteira do Rio Grande. Na frontei- be, Presidente do Uruguai, permitiu a Marciano Ribeiro movimentar
ra. Sebastião Barretó Pereira Pinto recebeu também autorização cle as forças da fronteirapara a região da Laguna' A 2l deoutubro, Ben-
Braga para aceitar ajuda uruguaia. Braga tentou reunir a Guarda Na- to entrou na cidade do Rio Grande, completando assim o primeiro
cional na cidade e seus arredores, mas encontrou oposição. Para con- estágio da Revolução. u

seguir a adesão de outrcs, enviou um oficial com fundos do erário da Embora existisse, havia pouca evidência de um plano secreto
província para contratar soldados na área de Pelotas. Algumas esca- para levar as operações militares de setembro até a proclamação da
rantuÇas incitaram as esperanÇas dos Legalistas. Porem a noticia de república. Desembaraçar o governo da província de seus principais
que as tropas dos Farrapr:s estavam se aproximando de Pelotas, a chefes era a meta declarada. Uma vez no poder, os líderes revolucio-
uma pequena distância dos Legalistas "em seu último relúgio de lega- nários seguiram as fórmulas políticas estabelecidas, negando as acu-
lidade", de novo lorçcu Braga e se refugiar numa canhoneira no por- sações separatistas e republicanas. Esta tática facilitou o problema do
to. De lá, escreveu a Sebastiào Barreto, o ex-Comandante de Armas, estabelecimento da legitimidade política e não perturbou a harmonia
que os rebeldes tinham como objetivo "mudar a forma de governo da social. N uma série de proclamações, Bento GonÇalves acalmou os re-
província e colocar Lavalleja (um caudilho da Banda Oriental) à testa sidentes portugueses, que temiam a perda de seus direitos e proprie-
dos negócios deste estado". Braga se transferiu para um brigue, che- dades.'
sando ao Rio de Janeiro no dia 28 de outubro de 1835.0 Neste ínterim, no Rio de Janeiro, Diogo Feijó, Regente do Bra-
E,mbora a opinião de Braga fosse incorreta llo que se referia a sil, que era padre e governava com pulso de ferro, nomeou José de
Lavalleja, pois a revolução estava inteiramente nas mãos dos rio- Araújo Ribeiro, um rio-grandense, parente de Bento Manuel, para o
grandenses, ele tinha razão quanto às intenÇões da ala separatista do cargo de novo Governador. Na opinião de Feijó, "Braga e Barreto
partido Farroupilha, de estabelecer um governo republicano. Em agiram miseravelmente... deixando a província ao livre arbítrio de
porto Alegre, o novo governo de Marciano Ribeiro começou imedia- Bento Gonçalves". O governo central já tinha se desgastado "conce-
tamente a fortiflcar suas posições militares; o cunhado de Bento Gon- dendo recursos para pôr f,im à rebelião no Pará". Sem um grande
çalves recebeu o comando da polícia, a Guarda Nacional permaneceu apoio popular Feijo admitiu para o seu amigo, o Visconde de Barba-
de prontidão, os dissidentes conhecidos foram afastados e a defesa do cena, que seria muito difícil para o Brasil conquistar o Rio Grande... 8

porto foi considerada prioritária. Para manter o apoio do imprevisí-


vel Bento Manuel Ribeiro, Marciano Ribeiro nomeou-o Comandantç Porto Alegre,23 de
setembro, 1835: ident a Francisco Xavier do Amaral sarmento,
de Armas. Bento Manuel era muito conceituado entre os habitantes setembro, 1835'. itlem a idem,PorÍo Alegre, l2 de outubro,
,l834,
AHRGS' Cx' 86'
da zona da fronteira de Alegrete. Não era um chefe impetuoso, mas n. 159; Olyntho Sanmartin, Bento Manoe! Riheiro, ensaio histórico (Porto Alegre,
um chefe admirado em toda a província por seu estilo frio e calculis- 1935), pp. t22-123.

ta.'Seu apoio foi crucial quando os Farroupilhas decidiram depor o 6. Marciano Ribeiro a Bento Gonçahes, Porto Alegre, 3 de novembro, 1835,
AHRGS,Cx.86,n. l5glAssisBrasil,,4 guerrado'sfarrapos,ahiçtóriadarepública
governo da província. riograndense (Rio de Janeiro, lgla) pp. 132-133; RC' ll' 556'
4. Walter Spalding, A epopéiaJarroupilha, pequena história da grande revoluç-ão' acom- 7. ManiÍ'esto do coronel Bento Gonçalves da silva, justificando a arrancada de 20 de
panhada tte faria aoriir-nnçào ii aporá, ials-tsls (Rio de Janeiro' l9^63)-pp'
103- setenlbro de I 815, Porto Alegre, 25 de setembro, I 835; manifestos do coronel Ben-
104; Braga a Sebastião íarreto Peieira Pinto' Rio ôrande' 16 de outubro'
1835' to Gonçalves da Silva, Rio órande,2l de outubro, 1835, em Spalding, A epopéia'
AHRGS, Cx. 36, n. tsl; iaii úanuel Oribe, Rio Grande' 22 de outubro'
1835' pp.282-293.
"
AHRGS, Cx.86, n. l5d; o Sere D'Ábrit,ll de novembro' 1835' n' 293'
p' l' 8. RC, II, 612; Diogo Feijó a Barbacena,.Rio de Janeiro, l0 de dezembro, 1835' em
5. Marciano Pereira Ribeiro a Manuel Antunes da Porciúncula, Porto Alegre, 23 Eugento Egas, Diogo Ántonio ['eijó,2 vols. (São Paulo, l9l2)' II' 201'
de

28 29
Braga procurou negociar' sem instruções do governo central' Foram tomadas rapidamente outras medidas importantes à pro-
comum-caq<lilhodaBandaOrientalquecontrolavaoSerroLargo,e moção do esforço de guerra, com o objetivo da tomada do porto do
que jir tinúa se oferecido para ajudar as forças legalistas de João da Rio Grande. O entendimento de Bento Gonçalves com Manuel Ori-
§iluu Turur"s, Comandanie cja Fronteira do Rio Grande. Na frontei- be, Presidente do Uruguai, permitiu a Marciano Ribeiro movimentar
ra, Sebastião Barretó Pereira Pinto recebeu também autorização de as forças da fronteira para a região da Laguna- A 2l de outubro, Ben-
Braga para aceitar ajuda uruguaia. Braga tentou reunir a Guarda Na- to entrou na cidade do Rio Grande, completando assim o primeiro
cional na cidade e seus arredores, maS encontrou oposição. Para con- estágio da Revolução.
u

seguir a adesão de outros, enviou um oficial com fundos do erário da Embora existisse, havia pouca evidência de um plano secreto
província para contratar soldados na área de Pelotas. Algumas esca- para levar as operações militares de setembro até a proclamação da
iun.,rçu, incitaram âs e§peranças dos Legalistas' Porém a notícia de república. DesembaraÇar o governo da província de seus principais
que as tropas dos Farrapos estavam se aproximando de Pelotas' a chefes era a meta declarada. uma vez no poder, os líderes revolucio-
uma pequena distância dos Legalistas "em seu último refúgio de lega- nários seguiram as fórmulas políticas estabelecidas, negando as acu-
lidadl", de novo forçou Braga e se refugiar numa canhoneira no por- sações separatistas e republicanas. Esta tática facilitou o problema do
to. De 1á, escreveu a Sebastião Barreto, o ex-Comandante de Armas' estabelecimento da legitimidade política e não perturbou a harmonia
que os rebeldes tinham como objetivo "mudar a forma de governo da social. Numa série de proclamações, Bento Gonçalves acalmou os re-
província e coloçar Lavalleja (um caudilho da Banda oriental) à testa sidentes portugueses, que temiam a perda de seus direitos e proprie-
àos negócios deste estado'i' Braga se transferiu para um brigue' che- dades. '
o
gando ao Rio de Janeiro no dia 28 de outubro de 1835' Neste ínterim, no Rio de Janeiro, Diogo Feijó, Regente do Bra-
Embora a opinião de Braga fosse incorreta no que se referia a sil, que era padre e governava com pulso de ferro, nomeou José de
Lavalleja, pois a revolução e§tava inteiramente nas mãos dos rio- Araújo Ribeiro, um rio-grandense, parente de Bento Manuel, para o
grrnd"nr"s, elç tinha razão quanto às intenÇões da ala separatista do cargo de novo Governador. Na opinião de Feijó, "Braga e Barreto
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-Porto Farroupilha, de estabelecer um governo republicano. Em agiram miseravelmente... deixando a província ao livre arbítrio de
Alegre, o novo governo de Marciano Ribeiro comeÇou imedia- Bento Gonçalves". O governo central já tinha se desgastado "conce-
tamente a fortifioar suas posiçiies militares; o cunhado de Bento Gon- dendo recursos para pôr fim à rebelião no Pará". Sem um grande
permaneceu
çalves recebeu o comando da polícia, a Guarda Nacional apoio popular Feijó admitiu para o seu amigo, o Visconde de Barba-
I
àe prontidão, os dissidentes conhecidos foram afastados e a defesa do cena, que seria muito difícil para o Brasil conquistar o Rio Crande..'
poito foi considerada prioritária. Para manter o apoio do imprevisí-
vel Bento Manuel Ribeiro, Marciano Ribeiro nomeou-o Comandante
setembro,1835:idemaljranciscoXavierdoAmaralSarmento,PortoAlegre,23de
de Armas. Bento Manuel era muito conceituado entre os habitantes setembro; 1835; idem a iclem, Potto Alegre, t2 de outubro, 1834' AHRGS' Cx' 86'
da zona da fronteira de Alegrete. Não era um chefe impetuoso, mas n. 159; Oiyntho Sanmartin, Bento Maioel Ribeiro, ensaio histórico (Porto Alegre,
um chefe admirado em toda a província por seu estilo frio e calculis- l93s), pp. 122-123.
" Marciano Ribeiro a Bento Gonçalves, Porto Alegre,3 de novembro,
1835,
6.
ta.5 Seu apoio foi crucial quando os Farroupilhas decidiram depor o Áúnci, c-- 86, n. l59l Assis Brasil, Á guerra dos farralos,l história da república
governo da província. riograndense (Rio de Janeiro, 1934) pp' 132-133;' RC' II' 556'
Manifesto do coronel Bento Gonçalves da Silva, justificando a arrancada
de 20 de
4. Walter Spalding, A epopéia farroupilha, pequena histôia da grande revolução' acom' 7.
ip;;;, (Rio de Janeiro' 1963) pp' 103- setembrodel835,PortoAlegre,25desetembro,ls35;manifestosdocoronelBen-
panhada de farta aoruríu-nlü,i; t8i5-1845
104; Braga a Sebastiao Sar'reto Peieira Pinto, Rio brande' l6 'te outubro' 1835' to GonÇalves da §ilua, Rio õrande,2l deoutubro' 1835' em Spalding' A epopéia'
-ottt'tt,otlu", Rio Grande' 22 de n'outubro'
1835'
AHRGS, Cx. 36, n. fi;;à;;;-rüun'"r 293' p' l'
pp. 282-293.
AHRGS, Cx. 86, n' líd;'õ
'ü;.;i"r; iã" ll de novembro' 1835' A. RC, II, 6l2; Diogo Feijó a Barbacena,.Rio de Janeiro' l0 de dezembro'
1835' em

5. pereira Ribeiià ã úunu"t Antunes da porciúncula, Porto Alegre, 23 de Eugenio Egas, diogo Àntonib Feijó,2-vols' (São Paulo, l9l2)' IL 20l'
29
28
As notícias de Montevidéu que chegavam ao Rio de Janeiro crevendo o perigo próximo: "têm aparecido pessoas que maquinam
eram inquietadoras. o governo uruguaio "parece acreditar que o Rio pôr em execução um plano de sua separaçãodo Império, com o inten-
Grande do sul tende a separar-se do Império e que este é o espírito da to de formarem dela uma república..."
lacção que presentemente domina 1a rebàliao1',. i M"rrno com'poderes
Com Bento Manuel a seu lado, Araújo Ribeiro tomou posse ile-
quase ditatoriais a seü dispor, Feijó pouco poda fazer. Araújo Ribei-
galmente da província em nome do governo c"bntral, na prefeitura do
ro chegou ao Rio Grande nos primeiros dias de dezembro com docu-
Rio G rande. 'a Os Farrapos radicais, sob as ordens de Bento Gonçal-
mentos proclamando a anistia. No início tomou uma posição conci- ves, regozijaram-se com gsta manobra. O novo representante do go-
liadora. Os Moderados que apoiaram o movimento de 20 de se- verno central tinha violado a lei, e os Farrapos podiam, portanto,
tembrq, acolheram bem o escolhido do Regente, mas os exaltados co- opor-se legalmente a ele. Não tendo feito o juramento naAssembléia
meÇaram a tramar contra ele, planejando destituí-lo do governo. ,o
da Províncian ele "breve pagarâ por sua lqlcura, assim como todos os
A questão do estabelecimento da sede do novó governo em porto mais que obedecem suas ordens ilegais". ,, O moderado Marciano Ri-
Alegre mergulhou o estado numa guerra civil não ãeclarada, com os beiro convidou Araújo Ribeiro a ir a Porto ,Alegre, afirmando que se
Farrapos de um lado e os Imperialistas de outro. A Assembléia da não viesse, os "revoltosos" continuariam a controlar a situação. ,u Os
Província, convocada, com membros dos dois partidos, reuniu-se em radicais de Porto Alegre continuaram a escrever aos líderes do inte-
sessões extraordinárias para discutir o assunto. Um deputado da As-
rior que haviam apoiado a deposição de Braga, mas ainda não ha-
sembléia da Província considerou a votação sem significado. Antes da
viam se decidido quanto a Araújo Ribeiro. Os Farrapos enviaram
votação, o enigmático Bento Manuel, que também era deputado, cha-
cartas negando a separação e o estabelecimento de uma república.
mou o outro para a casa onde estava hospedado, fingindo doença, de Negando a posse a Araújo Ribeiro na Assembléia da província con-
modo que não pudesse tomar parte na sessão e mostrar sua posição
trolada pelos Farrapos, os conspiradores,em Porto Alegre ..queriam
vacilante. o comandante de Armas estava firmemente convencido
envolver a província numa nova sedição" '7 uma atitude regressiva,
que a Assembléia não daria posse ao escolhido pelo governo central.
atitude esta que faria o povo em geral receber bem a independência e
Bento Manuel arrancou suas ataduras diante dele, revelando sua de-
a república.
cepção. Os dois h.omens, sozinhos no quarto, rodeados de vidros de Do dia 30 de dezembro em diante, Bento Manuel, secretamente
remédios, lalaram abertamente. Aqueles que estavam a favor dos ra- de acordo com Araújo Ribeiro, começou a angariar apoio. Outras
dicais e desejavum a separaçâo, tencionavam estar presentes à votação pessoas influentes que tinham apoiado o movimento de 20 de se-
do dia seguinte. As galerias armadas decidiriam a questão. ', No dia tembro aderiram, especialmente Santos Loureiro e Manuel Luis Osó-
seguinte, os agitadores politicos angariavam apoio em prol de uma re-
rio. Os Farroupilhas consideraram a adesâo de Bento Manuel, que
pública e da separação. '2 A Assembléia impediu a posse de Araújo
Ribeiro. Para ele, o caminho a seguir estava agora claro. para conse-
guir apoio, Araújo Ribeiro escreyeu aos legalistas em potencial, des- I3. José de Araújo Ribeiro a José Vasco Madruga, Brigue Barca (Rio Grande), 3 de ja-
neiro, 183ó, VC, XLV.
14. "Notas de José de Paiva Calvert". (MS.), VC. LXI.
I5. Onofre Pires da Silveira Canto de Joaquim Rodrigues Saraiva, Campo em Marcha,
9. Almeida Vasconcellos a Manuel Alves Branco, Montevidéu, 19 de novembro, AFRC, Documentos, 1823-1837.
r835, AHr, 221/2/e.
16. Marciano Ribeiro a Araújo Ribeiro, Porto Alegre, l5 de janeiro, 1836 em Walter
t0. RC, II,6l2-613; "Memó.:ia sobre a revolução de lS35" Francisco de Sá Brito, Ale-
Spalding, Farroupilhas e carumurus; a brasilidade dos farrapos, história, documentos
grete, em Publicações do Arquivo Nacional XXXI (Rio de Janeiro, 1935), p. 251.
e biblíograJia sobre o movimento reivindicador de 1835-1845 (Porto Alegre, 1944),
I l. Ibid. pp. 252-253. pp. 27-28.
t2. José Domingos de Almeida a Bernardina Barcellos de Almeida, porto Alegre, l5 c 17. Sebastião Ribeiro de Almeida a M.tria Mancio da Conceição, Vacachy, 4 de feve-
20 de dezembro, 1835, VC, XXV. reiro, 1836, AFRÇ, Arquivo de Sebastião Ribeiro.
30
3l
veio a público mais tarde, um ato de traição. O indigno Bento Manuel
desejava a glôria de destruir seu rival, Bento Gonçalves. Depois de ter O Farrapo Afonso José dã Almeida Côrte Real derrotou Bento
conquistado o apoio de seu amigo e parente, Araújo Ribeiro resolveu Manuel na Batalha de Capané; a revolução atingira sua segunda fase.
esmagar a revolução. Como Araújo Ribeiro se cercava de conservado- Reorganizando suas tropas, o experimentado Bento Manuel vingou-
res portugueses e brasilelros (retrógrados) em pelotas, Rio Grande e se decisivamente no combate de Passo do Rosário. As forças qué
Norte, suspeitava-se em Porto Alegre que sua administração seria avanÇavam tomaram parte em diversas pequenas batalftas, sem ne-
como a precedente (Braga), que perseguira os Livres. ,8 nhuma vitória importante, até que João Man-uel de.Lima e Silva es-
Araújo Ribeiro não informou o governo do Rio de Janeiro de magou a resistência Legalista em Pelotas, no dia 7 de abril de 1836..
suas verdadeiras intenções. Mas o governo central suspeitou, com ra- Preso em Porto Alegre, o comandante Legalista derrotado subornou'
zão, que seu precário estado de saúde e o clamor da prefeitura do Rio os carcereiros e fez acordos secretos com elementos conservadores.
Grande para que ele tomasse posse "não foram as únicas razões que o Na manhã do dia l5 de junho, os prisioneiros armados retomaram a
influenciaram" a evitar uma viagem à capital de província. paia cidade de Porto Alegre para os Legalistas. A notícia do desastre che-
se
defender, o governo ordenou sua ida a Porto Alegre. ,, pouco tempo gou a Bento Gonçalves quando este procurava inutilmente encurralar
depois, o governo percebeu que uma ação militar seria o único cami- Bento Manuel, último obstáculo importante ao controle Farrapo. 2r
nho a seguir. Era difícil encontrar soldados nas'ouÍras províncias, .
Pouco depois Bento Gonçalves tentou de novo 3.retomada de
mas os ministros do Gabinete prometeram ajuda naval suficiente. Al- Porto Alegre, sem sucesso. Levantando o cerco, planejou outrâs ope-
gumas tropas estavam a caminho, vindas de São paulo. 20 Em janeiro raÇões., procurando reunir-se a outras forças Farroupilhas. Bento
de 1836, o governo central já tinha determinado as condições parâ a Manuel perseguiu o general Farrapo até a ilha de Fanfa, no rio Jacui.
I

anistia, pedindo a Araújo Ribeiro que "concedesse tempo suficiente" Em contato com forças navais legalistas, Bento Manuel fechou todos
aos participantes da revolução de setembro que ainda se opunham às os caminhos de retirada a Bento Gonçalves. A Batalha de Fanfa (3-4
ordens e decisões do Rio de Janeiro para que depusessem suas ar- de outubro, 1836) foi uma tremenda derrota para os Farrapos. A
mas. 2' m.aior parte dos chefes Farrapos, Bento Gonçalves, Onofre Pires e
Os Farrapos resistiram até os meados de fevereiro, quando co- Tito Livio Zambeccari, renderam-se a Bento Manuel e foram envia-
meÇaram as lutas armadas. "Uma nuvem negra cobre agora o hori- dos às prisões no norte. Mas em vez de aproveiiarem a oportunidade
zonte da província" disse um riograndense. ,, Araújo Ribeiro abrira para declarar a anistia e tratar das feridas da guerra, as forças impe-
as cômportas das paixxões do provincialismo no Rio Grande. Deci- riais desencadearam uma onda de vingança e perseguição contra os
diu agir em todos os lugares onde pudesse conseguir apoio. remanescentes das forÇas derrotadas. Isto fez com que aumentasse ra-
pidamente o número das tropas dos Farrapos. Um general Farrapo
escreveu tempos depois: "não houve mais fé no governo central". 24
18. Joaquim Gomes de Araújo a José e Francisco de Macedo, Bagé,"9 de fevereiro, No dia I I de setembro de 1836, um pouco menos de um mes an-
I836, VC, XXXV; Brasil, ,4 Guerra,pp. 158-159; José Pinheiro de Ulhôà Cintra,
"Revolução de 1835", Correio do Povo,28 dejunho, 1898, vol. lV, n. 143. p. l. tes da batalha de Fanfa, os Farrapos obtiveram uma impressionante
19. Antonio Paulino Limpo de Abreu a Araújo Ribeiro, Rio de Janeiro" I de fevereiro, vitória no oeste, a de Seival. Ainda em campo, o general Farrapo An-
1836, AHRGS, Avisos da Justiça, tonio de Sousa Netto proclamou a república. No dia seguinte, a pre-
20. idem a idem, Rio de Janeiro, 22 de fevereiro, 28, 28 (reservado), AHRCS, Avisos
da Justiça.
21. idem a idem, Rio de Janeiro, 3 I de janeiro; I 836 (reservado), Porto Alegre, I 2 de.la- 23. Spalding, A epopéia, pp. 109-110.
neiro, 1836, VC, XXVI. 24. "Notas de (José Gomes) Portinho", VC, 205. Comentários marginais do general
22. Josê Domingos de Almeida a Bernadina Barcellos de Almeida, porto Alegre, l2 de Farrapo sobre o trabalho de Tristâo de Alencar Araripe, "Guerra pivil no Rio
janeiro, 1836, VC, XXVI. Grande do Sul: Memória acompanhada de documentos", RIHB, XLVI (1880),
xLv (r882), XLvl (1883), XLVil (1884).
32
33
i

l
feitura de Serrito aderiu, o mesmo acontecendo com outros Conse- l)cpois da Revolução de 7 de abril de 1831, que forçou D. Pedro I a
lhos Municipais na Campanha.
ttO ato final desta cena desenrolou--se rrbdicar o trono em lavor de seu filho menor e nomear um Regente
em novombro de 1836, sem os conspiradores chel-es, que tinham sid<l llarir governar em seu lugar, os moderados no poder reduziram ao
presos em Iranfa. Alguns dos conspiradores originais, ainda resistin- rníninro as Íorças armadas. O corpo de oÍ'iciais era composto na maio-
do. tiveram consciência da necessidade urgente de legitimar suas posi- ria de portugueses, cujo pensamento militar não se adaptava ao tipo
possuia uma poderosa mari-
ções, e entrar em acordo com os remanescentes oficiais Farrapos
ain- c1e
-{uerra das Américas. Porem o Brasil
nha. O governo central se confundiu organizando a guerra em diver-
da em campo. João Manuel de Lima e Silva imediatamente começou
t" sas Í'rentcs. Os suprimcntos erant antiquadtls e escassos. Para superar
a reorglrnizar as unidades rebeldes dispersas'
estes problernits, em 1836, os Ministrtls lirranl buscitr nit Eiuropa em-
Nos dias 5 e 6 de novembro. reunidos nas salas do Conselho de
préstinros, tropas e arnlas modernas para cnl'rcntltr os rebeldcs. l-oi
Prratini, os rebeldes elegeram o prisioneiro Bento Gonçalves Presi-
dilícil encontrar mercenários europeus. Alenr do n.rais, mr.ritos brasi-
dente da República, em substituição ao velho José Gomes de Vascon-
leiros não aprovavant a idéia de impor a ordem através de nào-
cellos Jardim, e organizaram um gabinete composto de seis ministe-
brasileiros. A experiência prévia brasileira com tropas alemãs amoti-
rios, encabeçados por algumas das figuras mais ilustres da guerra,
nadas na guerra contra as Províncias Unidas, ainda era uma lembran-
como sejam, Mattos, Domingos José de Almetda e Jose Pinheiro de
ça muito recente e desagradável. Portanto, os agentes do Imperio na
tJlhôa C-'intra. Alem destes ministérios, com sua pequen.l corte de ins-
Europa se concentraram em obter emprestimos e o último tipo cle ar-
petores e oficiais de tecrutamento, a recem-criada máquina política I
Ilras.:t
irrclrria também um partido revolucionário. A nação funcionava senl I
Mais perigosas para o governo central eram as relaçÕes tlrl'tltrnlá-
o bcnelício de uma constituiÇão. 2' Em parte os Legalistas tinham ra-
ticas com os paises do Prata, que apoiavam a revolução republicana e
zão quando chamavam o governo Farrapo um estado militar ambu-
i separatista dos rio-grandenses. A política platina, depois que o Presi-
lante. Sua capital l'oi duas vezes sediada em Piratini, em Caçapava e I
dente uruguaio Manuel Oribe entrou em acordo com o ditador da Ar-
Alegrete, e Í'inalr11cntc, n() carro bitgagciro do (lencral [)avi Car.rahar-
I gentina, Juan Manuei Rosas, girava em torno de dois caudilhos, Ro-
ro. Entbrtnr nruntivossctt.t ultta ('tlnstituintc e unla Assembleia Legis- ü
I sas e l-ructuoso Rivera, líder dos Unitários da Banda Oricntal. Quem
lativa c tivesscnt csbttçadtl urrta Corlstituição. as exigências da guerra
quer que dominasse a Banda Oriental "protegia abcrtantonto tls Re-
tinham prioridadc.
beldes, usando-os para ameaçar o govcrntl do lnlpcritl, olbrecendo
Porlanto, esta era a situação explosiva com a qual se defrontava
(ao Rio de Janeiro) uma mediação olcnsiva Pitrll tcrlninltr lt rcvolta,
o governo central. Trnha de planejar um curso de aÇão para com a
em troca de concessões ultrljantcs.t" At) termino da guerra, o Brasil
província desgarrada. E,nquanto cuidava de outras áreas descontentes
linalmente adrritiu qur: a espcrança «le estabelecer acordos diplomáti-
no Irnperio, o Gabinete tinha de recrutar e equipar forças de terra e
cos era ilus(rria. Mais seguro era confiar na ÍorÇa das armas e no po-
mar para reprimir os F-arrapos.
der do ouro, do que depender do apoio estrangeiro do Prata para aju-
O governo central estava mal equipado quando os ritl-
grandenses declararam sua independência. Não havia nem mesmo ar-
mas suficiente para treinar os recrutas que eram forçados a se engajar. 2{J. Prado Maia, A Marinha de guerra do Brasil na colônia e no império; tentativa de re'
con.ttituiç'ão histórica (Rio de Janeiro, l9ó5), pp. 132-135, 185-187; Barbacena a
Limpo de Abreu, Londres, 25 de junho, 1836 (secreto), AHl,29912la; Francisco
Gé Acaiaba de Montezuma a José Saturnino da Costa Pereira, Rio de Janeiro, 30
25. Spalding, Á epopéia, p. ll3; Fernando Luiz Osório, A guerra dos farrapo's, (l>ctrl<'t
de maio e 9 de junho, 1837, AN, IG 1321.
Alegre, 1935), pp. 62-63-
26. RC, II, 9I4.
29. Duarte da Ponte Ribeiro, As relações do Brasil com a.s repúblicas do Rio da Praro de
1829 a 1843 (Rio de Janeiro, 1936), p. 7.
27. tbid. 917.
35
34
rir

lr
t,

Os cavalos eram a chave da vitória. Os conflitos militares na


il
daf a destruir os Farrapos. Durante os dez anos de guerra os rebeldes
Banda Oriental reduziam o fornecimento de cavalos necessários para
tiveram problemas semelhantes com suprimentos. Porém os Farrapos
as manobras na Campanha e na zona da fronteira. Farrapos, Impe-
recebiam canhões, munição e tropas de seus vizinhos platinos. As
rialistas e uruguaios, todos competiam na disputa dos cavalos, os
transações, enfretanto, eram efetuadas numa base estritamente co-
quais, à medida que a guerra se arrastava, iam se tornando mais im-
mercial. O apoio diplomático prometido, mesmo quando reforçado
portantes do que os homens que os montavam. Cada cavaleiro neces-
por tratados, nunca se materializava.
sitava de três a cinco animais. A um certo ponto da guerra, um depu-
O governo central tinha também dificuldades para manter a leal-
tado paulista deu ênfase à importância de manadas de cavalos em seu
dade dos brasileiros residentes na Banda Oriental e para adquirir mi-
discurso na Câmara: "os rebeldes têm 12.000 cavalos, e 12.000 cava-
lhares de cavalos para suas tropas. Os Farroupilhas tinham tambóm o
los são quase 12.000 homens... quem tiver a maior manada de cavalos
mesmo problema, mas levavam vantagem, pois estavam mais perto
ganhará a guerraoo t' A luta poderia continuar para sempre se os rebel-
da fonte de abastecimento de cavalos no Uruguai, Corrientes e Entre
des tivessem apenas 2.500 gaúchos. Era inútil fechar uma das zonas
Rios, e podiam exercer pressão sobre o.s residentes brasileiros.
da fronteira, porque os rebeldes podiam adquirir novos cavalos no
O governo central autorizou o seu Chargé d'Affaires no Uruguai Uruguai e reapareÇer em outra área. Na verdade, os cavalos e potros
a unga.iar o apoio dos imigrantes e dos residentes brasileiros. Ele ti: capturados aos Legalistas, iam para a remonta dos Farrapos. Quando
nha amplos fundos para engajar tropas, mas seu problema imecliato não havia dinheiro para comprar novos Õavalos, os Farrapos pediam
era achar homens para dirigir a luta. A estratêgia a longo prazo do aos estrangeiros simpatizantes, dando em garantia seu próprio gado
Brasil era envolver os rio-grandenses numa guerra em duas frentes. ou a receita do posto de fiscalização mais próximo. Se o dono do ca-
Apertando os Farrapos na Campanha, reduziriam a pressão ao redor valo resistia, a tropa levava os cavalos "emprestados", devolvendo-os
da região da Laguna. As complicações, porém, comeÇaram a aparecer quando já estavam esqueléticos. "
desde cedo. Os oflciais do exército brasileiro no Uruguai, procurados Era mais difícil para os Legalistas reunir uma grande manada de
pelo Chargé d'Á.ffaires, eram homens de idéias independentes, rela- cavalos. Por mais de dez anos, os Farrapos controlaram a Campanha
cionados com os caudilhos uruguaios. O governo central receava que e eram os "senhores" dos distritos de Alegrete e Missões, onde havia
desertassem e se bandeassem para os rebeldes ou para os chefes locais ainda uma grande quantidade de cavalos. 3' Os generais imperiais tra-
uruguaios, que estavam sempre em luta na Banda Oriental. As vezes ziam seus próprios animais porém cstes eram insuficientes, e como
os uruguaios proibiam os Legalistas de reunir grande número de tro- não podiam contar com novo fornecimento, seus planos para incur-
pas no lado uruguaio, mas permitiam que pequenos grupos se juntas- sões no interior do estado ficavam prejudicados. O melhor meio de
sem às forças imperiais lutando no Uruguai. Não obstante os perigos
inerentes e a falta de cooperação por parte dos comandantes e oficiais
uruguaios, o governo imperial não diminuiu os preparativos para a
guerra no Uruguai até 1840. Depois disso, o Rio de J'aneiro contou documentos inéditos,..2 vols. (Porto, 1929), I139; Antonio Elisiário de Miranda e
r" Brito a Rego Barros, Porto Alegre, 23 de abril, 1838, AHRGS, Cx. 7, n. 52; idem a
com os rio-grandenses leais e tropas de outras províncias. idem, Rio Grande, 2 de outubro, 1838, AHRGS, Cx. 7, n. 52.
31. Jornal do Commércio,27 de julho, 1841, n. 147.
32. Yarela, Política, I, 195; Domingos José de Almeida a José Mariano de Matos, Ca-
leira, 26 de junho, l84l , VC, XXVIII; Luiz José Ribeiro Barreto a Manuel Lucas
I
30. lbid., pp. l3-14; Almeida \asconcellos a Antonio Peregrino Maciel Monteiro, de Oliveira, Piratini, l0 de junho, 1843; VC, XXI; Matos a lgnacio Jozé de Oliveira
Montevidéu, 8 de novembro, 1837 (reservado);,Maciel Monteiro a Sebastiâo do Guimaraens, Alegrete, 25 de agosto, 1839 (circular), VC, XXI.
Rego Barros, Rio.deJaneiro,20dedezembro,1837(reservado)'AN' IC l32l;Joa- 33. Saturnino de Sousa e Oliveira a José Clemente Pereira, Porto Alegre, 28 de maio,
quim Rodrigues Barbosa a Almeida Vasconcellos, Fazenda em Lamarejo, 2t'i de' 1841, AHRGS, Cx. 8, n. 34.
outubro, 1837, AN, IG 1321; Alfredo Yarela, Política brasíleira inlerna e extema,
I 37
36
obter montaria, scgund<) um governador da provincia, "era tomá-la niirios viranr-se cercados de homens violentos e ambiciosos. Tambem
clo inirrrigo" ". Mrs oratn poucas as grandes batalhas, e de 1836 a lti40 enr 18J7, as tropas sazonadas dos Farrapos conquistaram uma notá-
os liarrapos dominaram. Logo que assumiu o comando em 1842, o vel vitória em CaÇapava, e assim começou o segundo assédio da capi-
cnlio Barão de Caxias, figura militar lamosa do Brasil, compreendeu tal. Os canhões de pequeno porte dos rebeldes bombardearam a cida-
a rrecessidade de obter cavalos dos paí'ses platinos, demonstrando as- de. Os Legalistas, de dentro do complexo emaranhado de trincheiras
sim sua grande percepção da natureza da guerra. t' e parapeitos que circundava o centro da cidade, respondiam da mes-
E,mbora não fosse o mais famoso, o melhor estrategista dos dois ma maneira. O bombardeio fez poucas vítimas, mas o moral das for-
lados era Bento Manuel. Os dois lados o corteiavam. Uniu-se aos ças do Império baixou. "' Em contraste, o otimismo dos Farrapos au-
Ijarrapos em setembro de 1835, mas trocou de aliança com a chegada nrentou.
do novo governador Araújo Ribeiro, enviado pelo governo central.
Para assegurar a liberdade de alguns líderes importantes dos l-ar-
EIc ni'io aprovavil a leição que a Revoluçzlo estava tomando, e nem a
rupos detidos em fortalezas no litoral brasileiro, a máquina invisível
po§içao proeminente de Bento Gonçalves. N o início de 1836, este che-
da maçonaria no Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Bahia, Íbi acio-
le da fronteira deixou o campo revolucionário, recusando-se a seguir nada. Enviaram dinheiro para o norte, a fim de ajudar a manter os
Bento Gonçalves, "que à custa do inocente sangue de seus patrícios se l]arrapos aprisionados e de subornar os juízes e guardas. Às vezes, ri-
quer tornar um segundo Artigas". "'Mas os Farrapos contaritm muis
cos simpatizantes do Rio de Janeiro ds ajudavam, como o rio-
uma vez com seus serviços quando o governo central nomeou para grandense Irineu Evangelista de Souza, futuro visconde de Mauá.
(iovernador um inimigo de sua làmília, Anthero Jose l-erreira Brito,
Muitas vezes rebeldes humildes eram anistiados, sob a condição de
destituindo Araújo Ribeiro. Conforme ele mesmo disse, o caudilho de
não voltarem ao sul enquanto durasse a revolução. r" Mas os prisio-
Alegrete "preferiu a ditadura de Bento GonÇalves ao despotismo de
neiros como Onofre Pires, Bento Gonçalves, Pedro Boticário e Zam-
Arrthcro Elrito". " beccari eram de outra categoria. Era portanto necessário um esquema
No clia 25 rle Inarçtl dc ltll7. llcnttl Manuel capturou Ar-rthero mais complexo para libertá-los. A primeira parte do plantl de l'uga
Brito cnr Itapcr'í, nrutlltntlo ttssittt tt lc'içirtl cllr 8,tlcrrll. lncltpaz de redi- teve sucesso. Onolre Pires e Côrte Real fugiram da velha l-rtrtaleza de
nrir-se da hunrilhaçiro stllricla, o I{io dc.l lttlciro rrrlrl pôdc itvltltar ll Santa Cruz para um barco que os esperava na Bahia dc (ir-ranahara,
perda do Governador da provínciit, rcuttsrtnclo ptlr tltltis tlc rttll ltno a mas Zambeccari não foi porque não sabia nadar. Irnquanto isso, na
discutir a troca de prisioneiros. " [)ept>is dc vittiriils c()ll1() cssll, os Fortaleza de Laje, Bento Gonçalves c l)edro Boticiiritt aguardavam.
Farrapros passaram a contar com mais adesôcs, e os lídcrcs rcvolttcitr- Bento já tinha serrado as gntclcs, nlts l)oclro lloticlirio, ntuito corpu-
lento, não podia passur pcllr.juncllr cstrcita. Bcrrto decidiu licar con.r
seu arnigo. l;oi cntio trirnslcridrl para o Forte do Mar, em Salvador, c
1.1 (
lenrcnte Pereira a saturnino de Sousa e olivcira. Rio de Janeiro, l7 tlc lcvercir," Pedro Botichrio para o ReciÍ'e.
AHRGS, Avisos da Guerra.
1842,
15. Caxias a Clemente Peretra, Porto Alegre. l2 de novembro e 22 de dezenrhro. IliJl.
AlÍR(;S, ( r.8, n.55.
.16. Ben(o Manuel Rtbeiro a Manuel Cavalheiro de oliveira, campo, -10 rlc Drrrçrt. 19. Augusto'l'asso I-ragoso, A rewlução larroupilha, lÍ135-1845, ilarratit'a sintátitu tla.ç
llJ,l6 e nr Moyse s vellinh ct, ('opitonia tl'l:l-Rci, a.tp('cto.\ poltimito.s do.f t'nttttçtirt ri,t op(rilça)e.\ ntilitare.t (Rio de Janeiro, 1939), pp. 96-98.
,qrundcn:c (l)orto AIcgre, 1964). p. 201'{' n. 2tl9. -10. .lolio Manuel de 1-inra e Silva a Domingos José dc Almcida. Montevidcu, 25 dc lc-
.17. Varelu. l,0lítitu.l. l0l. A curta de [Jento Manuel é muito parecida com a t]tlc leee- yereir<.t, 1817, V(. XVII; José Carlos Pinto a Alrneida. Montevrdéu, 25 de ltverci-
beu dc ( avalheiro, Rio (irande,4 de março, l8--]7, AI RC,,Arquivo de llcnto Ml- ro, 1u37, VC, XVII: Adolfo Cesar do Amaral a Jozé Pedrozo de Albuquerque,
nuel. (Rio de Janeiro), 7 e l0 de setembro, 183u, VC, XXXV: Relação das pessoas que
-lE. Osório. Á guerra, p. 7l. n- 3. ainda existem presas nesta corte, VC, LV.
Iu 39
Na Bahia, Bento (ionçalves aguardava uma outra ocasião para
fugir. Na manhâ do dia l0 de sete.bro de 1837 tornou seu banho de par, enfrentou uma comissão de inquerito para explicar a derrota
mar habitual. A uma pequena distância, um barco <Je pescu o espera- mais importante dos Legalistas ate aquela data. " O controle do Jacuí
va. Para surpresa dos guardas, Bento Gonçalves de repente se ciirigiu deu aos Farrapos o domínio indisputável da Campanha e reabriu os
para o barco e para a liberdade. com a ajuda dos republicanos e ma- caminhos para a Laguna.
çons, Bento Gonçalves viajou por terra e por mar para a área dilace- Depois destes revés dos Legalistas, os rebeldes reslabeleceram o
rada pela guerra no sul, onde assumiu a presidência da República do cerco de Porto Alegre, o terceiro, no dia 15 de junho. As forças impe-
Rio Grande do Sul. '' riais recuaram para as suas antigas posições, na margem direita do rio
Bento Gonçalves juntou-se às forças dos Farrapos em Viamão, e, São Gonçalo. A lim de dar mais conÍlança e levantar o ânimo dos
em 1838, Iiderou 1.500 homens, no segundo assédio de porto Alegre. destacamentos sob o comando de Elz-eário, o governo central carre-
Como em I837, a situação favoreceu os rebeldes. embora lossem su_ gou os navios de guerra com tropas inexperientes e sem entusiasmo.
perados em número, na proporção de dois para um. L,m Bagc, pirati- Mais de 2.000 homens chegaram em 1838, perfazendo um total de
ni e outros pontos da Campanha, os Liarrapos tinham outros 1.500 aproximadamente 6.500. Nos primeiros dias de 1839. Elzeário fez
soldados. uma nova ofensiva, usando este reforço para tentar levantar o cerco,
A única área controlada pelos Legalistas era o Litoral e partes da seguindo quase que as mesmas diretrizes usadas um ano, íintes, e que
Serra, sem -grande importância. L,lzeário de Brito, o novo Governa- terminou no desastre de Rio Pardo. Mais uma vezfez contato com o
dor Irnperial e comandante, decidiu tomar a o|ensiva antes que os si- inimigo. Porém, desta vez, recuou para o abrigo da capital. No cam-
tiantes rcunissem mais forças para um outro grande ataque à capital. po, corria o risco de ser esmagado entre duas tropas Farrapos que se
Ponrposamente chamou a operação um passeio militar. Flanqueados, deslocavam com extrema facilidade. O cerco recomeÇou, e com mais
os rebeldes levantaram o assedio e se dirigiram para o norte, para as eficiência do que antes. A bateria de ltapuã, situada nafoz do Guaí-
montanhas da Serru. S(r pararan'r quando alcançaram Lages, na fron- ba, estava nas mãos dos Farrapos, ameaçando seriamente as comuni-
teira corr Santa ('utarirrlr. Lii incorponrnrnr o território à República caÇões navais com o Rio Grande. al
do Rio Grande tlo Sul. I)ois r,cscs dcprlis. lrlzcnrio conqr.ristou a im- Os Farrapos estavam gastando toda sua força tentando esmagar
portante cidade ribeirinha dc Rio l)lrdo. voltou tJcpois a l)orto AIe- Porto Alegre. Mas a geografia da península protegia as tropas impe-
gre e às suas obrigações, deixando porónr unra lilrtc guarrriçl-to corn- riais, enquanto que a esquadra garantia as linhas de comunicação e de
posta de clois batalhões de inlantaria, dois reginrcntos dc cavularia c abastecimento com o Rio Grande. O alto comando liarrapo foi o pri-
oito canhões, sob o comando de Sebastião Barreto. meiro a perceber a necessidade de uma mudança de estratégia, porque
se o governo imperial bloqueasse Montevidéu, a República do Rio
Os revolucionários se agruparam sob o comando dos che les Nct-
Crande do Sul Ílcaria sufocada. Além disso, os rio-grandenses sabiam
to, Bento Manuel, Canabarro e João Antonio da Silveira. e no tlil -10 que não poderiam contar sempre com a amizade dos governos do
de abril de 1838 obtiveram a mais impressionante vitória clcsta gucr-
Uruguai. Rivera e Manuel Oribe, brigando entre si, estavam em con-
ru. Nur.r.rl bal.alha senr tréguas, que fez 370 vítimas imperiuis, tonril-
tato tanto com os imperialistas quanto com os Farrapos, o que au-
rum Ritr Pardo. Muniçoes e cavalos. presas essas muitos vuliosrrs. clri-
mentava a apreensão destes.
ram nas mãos dos insurgentes. Sebastião Barreto, que conseguiu csca-

'11. walter spalding. Forrap,'; hi.ttório em «tnro' da ravoluqão.fàrroupilhu,2t etl. (l).r- 42. Anthero Jose Ferreira de Brito ao Ministro da Guerra, porto Alegre, 6 de abril,
to Alegre, 1957), pp. l14-140. I838, AHRGS, Cx.7, n.5l; Frago.so, Á revolução, pp. 105-llg.
40 43. Fragoso, A revolução, ll9-124.
4t
A guerra arrastou-se durante três anos e meio. O Rio de Janerro
já estava ficando irnpaciente e irritado, à medida qr"re via uma serie de gio na Barra do Camacho, perto de Laguna. A 22 de julho de 1839, as
governadorcs sc sucederem, sem ganhar terreno, quer político, quer tropas de Canabarro entraranl na cidade de Laguna. U ma semana de-
pois, o Conselho da cidade se reuniu em sessão extraordiniiria e pro-
territorial. Os ljarrapos estavam Ílrmes na Campanha, c o governo
clamou a independência da província. L,m novembro, os Farrapos de-
central receava que o tempo estivesse trabalhando a tavor deles. Os
signaram uma delegação para discutir as bases de uma confederaçào
rebeldes estimulavam a consciência republicana com uma série de vi-
com a República Juliana, antiga província de Santa Catarina. Cana-
tórias militares e uma imprensa revolucionária sob a direção de car-
barro consolidou a vitória com os l-anceiros Negros de Joaquint Tei-
bonhrios italianos. Mesmo que não conseguissem retomar a capital,
xeira Nunes, que Í'orçaram o resto das tropas intpcrilis a se retirarem
havia grande possibilidade de lazerem urla aliança olensiva com o
nrais para o norte. r'' Os rio-grandenses sc rcgozi.jarutnr.0 governo im-
Uruguai e ce rtas províncias argentinas do litoral. Continuavam, por
perial teve que agir rápida e vigorosamente para cxpulsar os invasores
tanto, a luta. na esperanÇu que o apoio patriótico no Rio de Janeiro c
antes que as legiões de Canabarro e a esquadra de Garibaldi tontas-
em outras províncías estivesse em declínio. Eram também promisso-
senr a ilha estratégica de Santa Catarina.
ras as notícias de outras rebeliões regionais em progresso ou para ir-
romper. Numa decisão, tão militar quanto política, o alto comando No Rio de Janeiro, o governo começou a avaliar o golpe ousado
republicano decidiu demonstrar sua Íorça às outras províncias. gue os l-arrapos tinham dado. Certo de que os É.arrapos tinham se es-
Davi Canabarro, um dos mais bem sucedidos generais I-arrapos palhado dentais. decidiu agir antes que os rebeldes pudessenr consoli-
no campo de batalha, levaria a guerra para o norte, ate Santa Catari- dar sua vttória. A esquadra imperial encurralou Garibaldi na Laguna.
na. O governo Farrapo escolheu o porto de Laguna, na costa de San- O novo sovernador de Santa Catarina eçnpregou suas melhores tro-
ta Catarina, como primeiro objetrvo paÍa a expedição de Canabarro. pas na deÍ'esa do porto: - tÍeze navios e 2.000 homens. Canabarro e
A esquadra rebelde, sob o comando do revolucionário italiano Giu- Garibaldi concluiram que seria muito difícil resistir e recuaram poÍ
seppe Garibaldi, transporttria por terra. até ao Atlântico, as recém- terra, ocupando Lages por algum tempo. Mas aí também, as tbrças
construídlrs c()rvetils da rcpúrhlicu. Quurrdo Canaburro chegasse à La- Legalistas os empurraram para o sul. ,, Giuseppe Garibaldi ganhou
guna, encontraria (iurihaldi cspcrrrndo pura dur-lhc apoio pelo latlo lanra e se casou em Santa Catarina. Os Farrapos tinham subcstintado
a reação do governo imperial e superestimado o prrtp(rsito rcvrllr.rcio-
marítimo. "
nário do povo de Santa Catarina. Quando u paz voltou à Surrta Clata-
Garibaldi mandara construir duas grandes carroças pirra trans-
rina, o governo central mostrou-se mais durrl. () Rio dc Jarrciro esta-
portar as duas corvetas. Duzentos bois puxaram os barcos ao longct
va surpreso com sua pr(rpria el'iciôncilr. ()s gcncruis in'rporiais criaram
das cinqüenta e quatro milhas, até as costas de Trarnandaí. O povo sc
alma nova e pusentnt os Iiarroupilhlrs rra del'ensiva durante todo o
divertiu vendo o curioso espetáculo dos barcos da csquadra republi-
resto da gucrra.
cana "navegando pelos campos". o5 Os ventos fortes e o mar bravio
destruíram uma daschalupas, mas a outra, a Seival, ericontrou rel'ú- E,mbora sobrepujados em número e material, os Farrapos resisti-
ram por mais cinco anos. No quinto ano de guerra, as negociações de
paz resultavam em nada de concreto e eram pouco promissorus ,"
44. Sobre a maior aventura de Garibaldi no Novo Mundo, ver Collor, Garibaldi, pp.
I I l-133; Salvatore Candido, Giuseppe Garibaldi, corsaro ríograndense. lll37-lll-lll
(Roma, 1964); Sobre as atividades da marinha imperial ver Lucas Alexandrc Boi- 16. C<'sllor, Gnrihaldi, pp. 163-198.
leux, Á marinha imperial na revolução Jàrroupilha (Rio de Janeiro, 1935); Maia, ,4
marinha de guerra, pp. 182-204.
47. Fragoso, Á retoluçõo, pp. 142-156.
1{t. Relatório das tentativas de negociaçôes paia a paz feitas de anó a ano, ver E. F.
45. Giuseppe Garibaldi, The Life of General Garibaldi, trad. de Theodore Dwight (No-
Souza Docca, o scntido brasileiro da revoluçãoJàrroupilha (porto Alegre, 1936) pp.
va lorque, 1859), p. 51.
6t-94.
42
43
Para os rebeldes, somente os toques de clarim e as batalhas poriam tais manobras eram necessárias. 52 Nos dois anos que se seguiram os
fim ao conflito. O Rio de Janeiro estava irritado com o aumento das Farroupilhas entravam no Uruguai e voltavam ao Rio Grande do
despesas e com o domínio dos Farrapos na Campanha. No interior Sul, evitando a perseguição de Caxias. O barão podia se movimentar
do estado, os rebeldes elegeram os delegados para uma Convenção livremente para ocupar território rebelde, mas não podia garantir es-
Constitucional. Dois anos mais tarde, em 1843, instalaram uma As- sas áreas indefinidamente. Atacando de surpresa, muitas vezes os
sembléia Constituinte e começaram a esboçar uma constituição. Po- Farrapos salvaram a reputação da República e reativaram as esperan-
rém a Assembléia estava dividida por lutas internas, com duas facções Ças, como aconteceu com a vitória de São Gabriel, em 1843. 53
do partido, espalhando intrigas. Uma queria continuar a guerra, en- Mesmo depois dessa vitória, a maior parte dos chefes Farrapos
quanto que a outra estava pronta a assinar a paz. As disputas e a poli ainda estavam em dúvida quanto à sua posição. A Constituinte e a
ticagem enfraqueceram a frente revolucionária. ne O Barão de Caxias, Assembléia Legislativa dos Farrapos convocaram novâs eleições para
que em novembro de 1842 assumira o comando de todas as tropas a Presidência da Repúbliça. Bento Gonçalves recebeu a maioria dos
imperiais em opdração no sul, jogou as duas facções do partido que votos dos eleitores da cidade fronteiriça de Alegrete. A Vice-
compunham a República do Rio Grande do Sul, uma contra a outra. Presidência Íicou com seu inimigo, Antonio Paulo da Fontoura, dire-
O Barão já tinha restabelecido a ordem no Maranhão e esmaga-. tor do jornal Farrapo Estrela do Sul. Fontoura criticou publicamente
do a revolta liberal em Minas Gerais e São Paulo. Hábil conhecedor as diretrizes que Bento Gonçalves estava dando à guerra, e quando
de homens e da política, Caxias esforçou-se por conquistar Bento foi assassinado, a ala minoritária dos Farrapos espalhou o boato de
Manuel, que, em 1839, de novo havia deixado as fileiras dos Farra- que Bento Gonçalves era o responsável. Numa tentativa de abrandar
pos, depois de uma disputa com Bento Gonçalves. Caxias confiava as tensões e incentivar a união, Bento Gonçalves demitiu-se da Presi-
em Bento Manuel e explicou ao Ministro da Guerra sua decisão de dência, sendo substituído pelo venerando José Gomes de Vasconcelos
colocá-lo no comando de um importante destacamento de cavalaria, Jardim. Bento perdeü também o comando do exército, que passou
para Davi Canabarro. Embora fosse um bravo e firme soldado, Bento
dizendo que os benefícios ultrapassariam até mesmo suas próprias
restrições. Bento Manuel "me será muito útil, fornecendo-me o que Gonçalves agora'tornara-se suscetível às críticas. Num duelo às mar-
gens do Sarandí, matou seu velho amigo e parente Onofre Pires. Divi-
estou precisando... conhecimento prático do terreno; e com suas rela-
didos internamente, os Farrapos estavam com seus dias contados. 5a
ções na Campanha, espero obter mais cavaleiros e cavalos".'u Com
7.000 homens à sua disposição, número este que atingiria mais de Nos mais altos círculos do governo republicano do Rio Granàe
I 1.000, Caxias dividiu seu exército em três divisões, para maior mobi- do Sul grassava a discórdia política, e os dois lados começaram a se
lidade. 5r Estava pronto a levar a batalha ao reduto Farroupilha. empenhar em pôr fim à guerra. Caxias estâva a par de tudo que'se
Porto Alegre e Rio Grande estavam bem providas de tropas e passava no campo dos F'arrapos, e, através de intrigas, conseguiu ga-
mu.rrições. Em 1843, a esquadra naval imperialista do Jacuí controla- nhar terreno, solapando a liderança dos Farrapos. Apesar disso, a
guerra continuava. O ânimo do general legalista aumentou, ao tomar
va a linha de Cachoeira a Rio Pardo e a Porto Alegre. Caxias, adap-
tando-se à situação, subdividiu suas tropas em divisões menores. Para
pegar "estes pássaros (os Farrapos) que voam por cima dos campos",
52. Carvalho, ('axia,r, pp. 132-133.
53. Ver Ordens do dia de Caxias na Guerra dos farrapos, ordens do dra do general barão
de Caxias (Rio de Janeiro, 1943).
49. varela, Política, ll, 177-184, 322. 54. Spalding, A epopéia, pp. 148-149; Manuel Gonçalves da Silva a Domingos José de
50. Affonso de Carvalho, taxias,2r ed. (Rio de Janeiro, l94O), p. 130. Almeida. 2 de fevereiro, 1837, VC, XLY; Luiz Jozê Ribeiro Barreto a Joào Antonio
51. HGR, V[,22.21. da Silveira, Alegrete, l0 de dezembro, 1842, \t, XLV.

44r 45
lir

conhecimento dos problemas dos rebeldeso ou sejam, dificuldades de 25 por cento para a carne salgada vinda do Prata. Os tratados de Ca.
fornecimento, de comunicações, deserções, e a briga entre os altos es- xias com os chefes rebeldes foram feitos em separado, pois era "im-
calões. possível juntar todos os chefes rebeldes para um só acordo racional".
Mais uma vez Caxias reorganizou seu exército, dividindo suas O governo central deu 300 contos a Caxias para aplainar os "obstácu-
tropas em duas colunas. Sob seu comando, a oeste, ficou uma, com_ los econômicos" em suas negociações individuais com os caudilhos.
posta de 4.500 homens, enquanto que Bento Manuel manobrava.a ou_ Tudo foi feito dentro do maior sigilo, para não comprometer o Rio de
tra, entre a fronteira uruguaia e o rio santa Maria, resultando assim Janeiro no futuro. 56

uma divisão da campanha em duas partes de leste e oeste. Bento Ma- Em 1844, devido ao inverno muito severo e às constantes perse-
nuel comandou uma série de ofensivas contra canabarro. guiçi'es dos regimentos de cavalaria do Império, Canabarro teve que
oi dois gene-
rais_brincavam de gato e rato. As forças de Canabarro se reí'ugiar frequentemente no Uruguai. Muitos desertaram, e os fra-
se refugiaram
na Banda oriental e mais tarde reapareceram na linha de batalha cos morreram devido às chuvas frias de agosto de I 844. Em 1843, Ca-
no Rio Grande do sul, Do fin4l de 1842 até meados de 1g44, caxias e nâbarro decidiu preparar o palco para o ato final. Secretamente con-
Bento Manuel pressionaram os remanescentes dos Farrapos na cam- cordou com Caxias a levar avante uma última grande batalha, que
panha, especialmente as tropas de Canabarro. Manobrarum em gran_ destruiria a resistência dos Farrapos. Os Farrapos tiveram alguma
des círculos pelas coxilhas da campanha. Muitas vezes a vangriarda satisfação na derrota: por quase dez anos tinham resistido com suces-
das forças imperiais fazia contato com a retaguarda dos Fairapos, so ao poder do Império no sul do Brasil. O caminho para apaz estava
mas os rebeldes nunca aceitavam o combate. porém, onde os legalis- aberto.
tas estavam mais fracos, os Farrapos atacavam em marchas relâmpa- Depois de Porongos, as negociações para apazentÍaÍam na fase
go, e faziam provisões militares. o Império tinha seis mil homens em final. Alguns dias antes da batalha que destruiu a vontade dos Farra-
armas nas campanha.55 Mas os Farrapos tinham bastante cavalos e pos de continuar a luta, os generais Farrapos, reunidos em conselho,
alguns intermediários importantes na Banda oriental, e pareciam im- e em contato com Caxias, mandaram uma missão depaz ao Rio de
batíveis neste tipo de guerrilha. caxias teria que r.corr".ã diplomacia Janeiro. A cena na capital do Brasil foi constrangedora. Os Ministros,
e a acgrdos secretos com alguns Farrapos, além de sua açãà militar, com uma mistura de desprezo e admiração, sentaram-se com os gaú-
para pacificar a província. chos semi-selvagens. Quando solicitado.a beijar a mão do jovem Im-
Falharam todas as propostas feitas ao governo Farrapo para ter_ perador Pedro, Antonio Vicente da Fontoura recusou-se. As discus-
minar a guerra. Desde o princípio, o governo imperial màndou dele- sões foram calorosas, mas os delegados dos Farrapos sairam orgulho-
gações ao sul e se utilizou de representantes locais. como todos os sos de seu desempenho. No dia lc de Março de 1845, em Ponche Ver-
guerreiros, os Farrapos queriam a paz com honra, recusando-se aca- de, no Rio Grande do Sul, Canabarro e Caxias proclamaram a paz.
pitular antes de discutir os termos. Na verdade, estavam resistindo Entre as principais cláusulas do Tratado dePaz, estava incluído que o
pâra conseguir concessões, quase sempre de caráter pessoal, como governo imperial pagaria as dívidas da República, os oficiais dos Far-
anistia, ouro e dispensa de serviço na Guarda Nacional, de modo que rapos assumiriam os mesmos postos no exército brasileiro e os Farra-
pudessem cuidar de seus interesses pecuários. o governo central já ti- pos escolheriam seu próprio governador.57
nha cedido a uma das nrincipais exigências econômicas dos Farrápos,
quando, em princípios de 1840, decretou uma taxa de importaçãà de
55 Carvalho, c'arias, pp. 134-136; Rinaldo pereira da câmara, o marechar Câmara, 56. Jerônimo Francisco coelho a caxias, Rio de Janeiro, 30 de outubro e 30 de ou-
sua vida militar,2 vors. (porto Alegre, 1964-1940) r, 20-23; tubro, 1844 (leservado); 22 de novembro, rg44 (reservado); lg de dezembro, lg44
caxias a Jeronimo Fran- (reservado); AHRGS, Avisos de Gúerra.
cisco C_oelho, e. G, Capela.deSanta Ana do Uruguai, 7 à"rnu.ço,
te+i iÃ-dgri^
do harão de Ca.uias, IB42-1845 (Rio de Janeiro,*1950), p. 120. 57. Spalding, A epopéio, pp. 156-162.
46 47
Corn a gr,nde vitririu tle (.xius c a paciÍicaçào da província do
Rio (irunclc clo srl. ()s crros, a pcrcla cre h.nrcrs, c os onos de Í'rusra-
çlio Íirftrrrr cstltrec:irlos. s ua nragnarrirrridacle: perrrtil iLr rrgs [. arrirpss
nilo scrcrrr tlcslrcreditados, c lirlneceu unl hr:rtii panr toclo o urasil.
llento (iorrçulves tanrbér.n recebeu muitas atenções p()r seu clcscnrpe-
rrh. corrr. (ieneral e Presidente da República do Rio Grancle do sul.
P.rém Benro Gonçalves não agira sozinho. outros homens Íbram le-
vados à luta, por razões diversas, numa das rebeliões mais cluras cia
[tr
hisltiria do Brasil.

A TRAMA INTERNACION{AL E A
POLÍTICA DA PROVÍXCIA

A, da Guerra dos Farrapos, embora fossem primordial-


"ouro,
mente determinadas por circunstâncias internas rcsultantes de uma
sociedade rural baseada numa economia de monocultura, aconteci-
mentos externos, tais como o sucesso das revoluções republicanas dos
países do Prata, e a ntanutenção das rolações políticoeconômicas com
os czrudilhos platinos, ujudaram a despertar a consciência política.
Havia esperanÇa no Rio Grande do Sul, nos primeiros anos da déca-
da de 1830, de que as novas idéias liberais dos círculos governamen-
tais do Rio de Janeiro resolveriam muitos problemas poríticos e eco-
nômicos rio-grandenses, mas o Rio de Janeiro usou a nova ideologia
para reforçar sua posição tradicional. o governo central demonstrou
assim não compreender o relacionamento especial do Rio Grande do
Sul com as nações do Prata, nem suas necessidades no Brasil.
Uma coligação de federalistas, separatistas e republicanos desen-
cadeou a revolução de 7 de abril de l83l contra o autocrata pedro I,
48
49
çlro lrrrroupilha quanto a de Artigas foram marcadas por um regiona-
prias associaÇões como naÇão independente da Bacia do Prata, abri- lisrrro irnti-monárquico, retôrico e agressivo. Além do mais, a popula-
iia muitas possibilidacles o ft.rrtalecirnento das já
d-e novas alianças e
çrio rural gaúcha no Rio Grande do Sul, imitava os gaúchos de Santa
existentes. Por exenrplo, as duas províncias irmãs de Buenos Aires,
I:c, Buenos Aires. Corrientes e outras partes da baçia platina onde
Entré Rios c Corrientcs, juntarnente Çom o Uruguai e o Rio Grande
reinuva a pecuária. ' As ocupações nômades dos gaúchos, os inúme-
do Sul poderiarn e nfrentar resolutamente o crescente poder econômi-
ros conllitos Ca fronteira, e os limites incertos aproximavam homens,
co e'políticr_r de Juan Manuel Rosas, governador de Buenos Aires.
costumes e ideias. Lutando uns contra os outros, ou lado a lado, em
Outras conrbinações poderiam ser feitas. Unido em confederação
sucessivas campanhas cispiatinas, os çaudilhos rio-grandenses e os
com o Uruguai, c- Rio Grande do Sul poderia assegurar a indepen-
gaúchos e seus congêneres uruguaios se reencontraram durante a ocu-
«lênçia tie Montevideu, do Paraguai e da Argentina, a qual ainda con- pação luso-brasileira da Banda Oriental de 1820 a 1828.'
siderava estas duas naÇões como parte de urn país maior no mesmo Em 1822 e 1823, quando Montevidéu viu que o Brasil estava livre
esquema político do Vice-Reinado do Rio da Prata. Os veteranos da da tuiela portuguesa, começou a infiltração dos da Banda Oriental
luta pelii independência no uruguai e no Paraguai tinham consciência nos círculos rio-grandenses. Esforçaram-se juntamente com coman-
do que significava ser uruguaio ou paraguaio e se opunham aos desíg- dantes brasileiros liberais, através de clubes jacobinos, "para afastar
nios de expansão da Argentina. Por outro lado, um Rio Grande do os brasileiros do território Oriental" e "destruir o império".'Embora
Sul independente seria vantajoso para Buenos Aires, porqu'r serviria a simpatia pela causa oriental crescgsse rapidamente no Rio Grande
como um tantpão adicional contra os desígnios imperalistas do Bra- do Sul, a opinião da maioria na província ainda era favorável à ocu-
sil. Visto sob qualquer ângulo, um Rio Grande do Sul inclependente pação brasileira. No entanto o nacionalismo uruguaio ajudou a nutrir
significaria um Brasil mais fraco. o provincialismo rio-grandense. Alcançar a independência e a imple-
As tentativas de revolucionar o Rio Grande do Sul têm suas raí- nrentaÇão de um governo republicano, o primeiro objetivo mais defi-
zes entre os revolucionários de Buenos Aires, em 1810. Os introduto- nido do que o segundo, levou muitos rio-grancienses a se aliarem aos
res do mtrvimctrto da independência, a Jwúa de Mayo, contavam, entre orientais. Os rebeldes cisplatinos atacaram com surpreendente rapi-
seus membros, com IVtanuel Belgrano, que se encálrregou de apresen- dez o exército brasileiro de ocupação, e invadiram rapidamente o in-
tar a causa republicana aos oficiais portugueses sinrpatizantes. F-oram terior uruguaio em 1825. Com seus aliados argentinos, penetraram no
muitos os luso-brasileiros que, nas guerras de Artigas, abandonaram território brasileiro. 'n A propaganda uruguaia e argentina e as intri-
t
as fileiras do rei português. Talvez, nesta ocasião, tenham tomado gas no início da década de 1820, em parte explicam o sucesso de La-
conhecimento do projeto artiguista para o estabelecimento de uma fe- valleja.
deração platina, que incluiria o Rio Grande do Sul, Uruguai, Entre
Rios e Corrientes. O objetivo seria contrabalançar o crescente poder Quando eram aliados, lutando pela independência uruguaia, de
1825 a 1828, Lavalleja e Rivera mantinham uma correspondência ati-
político e econômico de Buenos Aires. Quando se referiam à popula-
va com os principais coronéis rio-grandenses, tentando aliciá-los, ou
ção gaúcha platina, Artigas e outros usavam a palavra Americanct.ç.
E,xatamente vinte anos depois, os Farrapos se rlenominaram america-
u
nos, e se referiam continuamente à causa americana' Tanto a revolu- 7 Germán O. E. Tjarks, "Momentos criticos en la busqueada del ser nacional en el
Rio de la Plata, l8l0-188O", Jarhbuch für Geschichte von Staat, Wittschaft und Ge-
sellschalt Lateinamerikas, 6 (1969), p. 2al.
5. cermán o. E. Tjarks, "Dorrego y la guerra con el Brasil", Boletin de la Átadenriu 8 "Notas de José de Paiva Calvet", VC, LXl.
Nacional de Hisroria, XXXVI (19ó5), p.465; D. Diogo de Souza ao Conde [-inhr- 9 Yarela, Duas grandes intrigas, ll, 15.
res, Q. G. em santa Teresa, 28 de setembro de l8l l, em Revisto do Archivo Prihlito l0 Para um interessante relatório brasileiro sobre a guerra, ver Luiz Manoel de Lima e
do Rio Grande do Sul, ll (1923), pp. 70-73; HGR' ll' 23. Sllva, Guerra com as províncias do Rio da Prata (Rio de Janeiro, 1956).
6. O Povo, le de dezembro, 1838, Vol. l, ns 27, pp. 108-109.
53
52
ao menos, neutralizá-los. rr As intrigas estrangeiras para conseguir in-
brlsile iros da corte eram sujeitos a insultos. Os oficiais rio-grandenses
Í-luenciar os liberais e republicarros rio-grandenses, puseram em movi-
slrírirrn da guerra, não como inimigos ferrenhos dos uruguaios, mas
mento diversos projetos scparatistas. O núrnero de unidades socioe- conro respcitltve is cornandantes da cavalaria. Os rio-grandenses per-
conônricas parcialrncntc autônomas no Rio Grande do Sul, tais como
r.leranr grandes manadas de gado para os invasores, compreendendo,
Alegrclc c irs suh-rcgiõcs dc Bage, aumentou e complicou ainda mais a
no entanto, que os hispano-americanos estavam pagando na mesma
tcia de intrigas entre as regiões da província e entidades políticas moeda pelo sucesso luso-brasileiro de l8l6 a 1820. Embora os rio-
maiores. Os caudilhos uruguaios éoinpetiam entre si pela oportunida- grandenses se beneliciassem grandemente com as reservas de gado
de de inÍluenciar a política dos caudilhos rio-grandenses da fronteira.
cisplatino, e política olicial portugussa favorecia os uruguaios. O
Antonio Manuel Correa da Câmara, um dos representantes bra-
çxçrcito português tinha se apoderado de mais de um milhão de cabe-
sileiros no Prata, avisou o governo de Pedro I dos planos secretos
ças cle gado das estâncias espanholas, gado esse que era mantido em
para o lederalismo platino e da participaÇão notória dos maçons re-
currais, para abastecer os estabelecimentos de charque de Montevi-
publicanos rio-grandenses, os quais encorajavam as deserções do
dóu. '' Nas fases finais da guerra de 1825-1828, a cena se modiÍrcou
exercito imperial no sul. '' Logo no início do conflito, Fructuoso Ri-
um pouco. A política econômica luso-brasileira anterior, as perdas de
vera aconselhou o caudilho de Alegrete, Bento Manuel, a se compro-
gado atuais, e as derrotas militares psicologicanrente debilitantes, le-
meter com a luta pela liberação da Banda Oriental. A aliança com os
varam os líderes rio-grandenses a reconsiderar sua lealdade. Conti-
uruguaios traria benelícios recíprocos. Consciente dos interesses pe- nuâram a negociar com o eloquente Rivera, porem não se comprome-
cuários de Bento Manuel, Rivera lembrou ao rio-grandense que as tiam completamente com seus planos sqraratistas.
manadas nas províncias argentinas de Santa Fé, Entre Rios e Cor-
Cientes da simpatia e do auxílio que poderiam esperar do Rio
rientes eram escassas, e que estes governos estavam prontos a lutar
Grande do Sul, os uruguaios e argentinos tentaram esquemas mais
contra os brasileiros pelo gado. rr Naquele tempo, os caudilhos orien-
ambiciosos para revolucionar a província meridional brasileira. O go-
tais tinham muito mais sensibilidade para as necessidades e temores verno argentino manobrou acordos com as tropas estrangeiras a ser-
dos pecuaristas do outro latlo da lronteira do que os líderes brasiler-
viço do Brasil, abriu uma segunda frente na zona vulnerável das Mis-
ros do Rio de Janciro.
sões do Rio Grande do Sul, e tentou consolidar conspirações revolu-
Durante a guerra de 1825-lti28, Bento (ionçalves, Bento Ma- cionárias republicanas, nun"r esforÇo coordenado para derrubar a últi-
nuel, Pedro de Abreu e Sebastião Barreto, ganharam Íàma como ma monarquia no Novo Mundo.'t
competentes oliciais da milicia e do exército, e. por conseguinte. mui-
Fazia parte dos planos revolucionários de Lavelleja iniciar uma
tos partidários entre os gaúchos brasileiros. Por suas laÇanhas guerrilha no Rio Grande do Sul. Queria assim demonstrar aos rio-
militares, receberam elogios dos rio-§randenses pela lealdade e cora- grandenses que era suÍlcientemente poderoso para protegê-los, caso
genl na defesa da província, enquanto que os generais portugueses e
decidissem se rebelar. Depois da triste derrota do exército brasileiro
enr Ituzaing ó, a 20 de levereiro de 1827, Lavalleja, Bento Gonçalves e
ll. Felipe Cabellero a Manuel Lavalleja, Durazno, 28 de setembro, 18251 l]ructuoso Jose Antonio de Caldas, o padre brasileiro ievolucionário que servia
Rivera a Juan Antonio Lavalleja, Durazno, l9 de dezembro, 1825; Rivera a Sebas- no exército argentino, urdiram um plano pataa separação da provín-
tião Barreto e Pedro de Abreu. Costa del Rio Negro,22 de outubro, 1825; Rivcra a cia, e Cepois, para o desmembramento de outras províncias brasilei-
Lavallejrr, 2u de outubro, 1825, enr Correspondencia mílilar del aio lll25,2 v<tls.
( Montevidéu, 1932- l915).

I 2. Antonio Manuel Correa da Câmara ao Marquês de Queluz, São Luis, 27 dc julho.


llJ27, em Anai.ç do ltantaratí,6 vols. (Rio de Janeiro, 1936-1962), III, 145-150.
lJ. Fructuoso Rivera a Bento Manuel Ribeiro, junho de 1825 (cópia) AFRC, Arquivo 14. RC, 1,169-172.
Bento Manuel. 15. Para um relatório detalhado, ver Tjarks, "Dorrego"
54 55
ras' o
compricado prano <1e,taquc para
tomar porto Aregre por meio
de uma man'bra er, íi>rrrr. ,r" pirçu-,, .r", pero exército ar- cilris para julgar os rebeldes e desertores,
genli'o-üruguai., ,p,iirtJ, "^".utrda
.',,,irpir,,,t,,r",
p,r,.
e corocou a província sob lei
rio-granclenses e prisio- ntrrrcial.r"
neiros lihcrtircr.s drr çlrcrciu'roc,rr,
íi,rcasrcu crcvido a uma ramentáver O representante do Brasil no prata, Antonio
dcrr,tir rrriritar ltlgo n, início. 'o,.,n.,r,nos Manucl da Câmara,
três homens renovariam Lr m rio-grandense de
sua uriurrça revoruciclnária ern rg2g respeitável Íamília, observava atentamente
e de novo em 1g32. Em lg2g, rrtividades dos agentes anti_brasileiros" as
vera encarregou-se de estaberçcer Ri- Seus a"rpu"fro, ãrrurr, u
Llm congresso revorucionário
de rio_ guerra de lg25-rg2g, reratavam constantemente
grandenses nas fuIisr as intrigas envorven-
d.o os-coroneis rio_grandenses influentes.
u n, a p ro v í n c i, i, d.;§:";:: 1ffi:;:;: HTJ.fiTit': Muito p."o",ipuao,'àorn ,
: situaçâo Antonio Manuer, avisru ao
platincl. ''
Todos estes planos tir"rrrr.". Ministro de Éeraçoes r^1".ro."r,
.evido ao mau"t,'Jjj'"T:
entrosa- do l'uturo do I{io Grande dcr Sul no prata. grrir._-i;'r""ri"
menro, à ftrlta de disciplina das ,r, O"r_
tropas .ãri" ã" ;;##_ rle I828, ,ão havia descansc. E,m sua
ça nelas, e ao tratado de paz p..l;;;;;-de
"ri.rng"i.u,
1g28. "o.r"rpunOe,i";;;;;;J;*r"._
rri. Antonio Munuer procurou expor os acordos reitos
grandenses e uruguaios, acoídbs entre rio-
A Paz preliminar entre o Brasil e a Argentina, qrà solapavam a posição polí_
feita a ped.ido dos lica e milita_r do Império no sui. "rr",
ingleses' cujos interesses comerciais
estavam sendo prejudiiados, não Coro," aproximasse o fim de sua
pôs fim ao empenho.ur.ugy-a1o carreira diplomiitica, disse: 'Já vejo ari, uma
em separar o Rio Grande do Sul república. Tarvezera es-
resto do Brasil. Depois do pere para batizar-se, em presença de
de lg2g, o U.rgroi tornou_se um boas testemunhas e padri_
independente' mas permaneceu país tampão nhos'" t'' Alénr do mais, acrescentou, não
como zona cre contenda'"ri."ri"i.". era segredo que os governos
Sua i n dependência foi o pon ro .rl_i;"rt; platinos tinham tido a intençào de sublevar
;;;;;'l;ü,"r,.liir,u.,_ o Ri-o c.ura" á"trr, a*_
ca dos uruguaios para conseguir de o início de seus próprios movimentos
autonomia local, de independência.
cruciante da nacionaridade pratinu
nao-iorr" resolvida " or"rra,
"_tr*senão depois A partir de lg2g, houve, dentro da política
de algum tempo. euanto ao Brasil, guaia' uma cisão enrre as forças revolucionária Uru_
como ficou provado na subse_ o" r-úri";u e Rivera.
qüente história da província do
Rio b.onJ" do sur, a paz preriminar uruguaios disputaram, primeiro, o os dois heróis
somcntc deteve temporariamente controle Ou uArinirtr"ríà a"
os clcmentos separatistas no sul. província, e depois, a presicrência do
John ponso,by. Minisrro brirânico futuÀ governo constitucionar. 2r
T'anto para Fructuoso Rivera, eleito
portante na assinatura do tratado ;;"-;;r"n,penhou um papel im_
em 1830, como para seu famoso riràI,
primeiio president" áo úrrguui
depazno pràta e- tszs,'JJ"]aro,, seus vizinhos brasileiros, ao
que "Ri-yglq manipulava a verha
trama de norte, eram de sumo interesse. Arnbos
.F-ng.it" E acrescentou .? rn"úrl".,.separar o Rio Grande do tinham aaotado a verha tese de
José Artigas, de um país mesop.tar"io,'i"o"rarista.
dos habitantes das cida_
des de porto Alegre e do 1..irio c.rráL zões para essa preocupação. prinreirrn]"nt", Havia duas ra_
contra o Imperador". ,, O governo ";;;;" pronta para se sublevar
brasileirr bilidades de pocler c influência pr.o
aumentariam suas possi_
de i n s u rreiçâ. q, a", em I 829, estabelecer? ;ffltt"T'J, rre, à" suas presentes esferas de
", ;LT::il::
19. RC, t,237-239.
16. "Pequena biografia de Bento 20. An{Qnio Manuel Correl_dasâmaraao,Marquês
Gonçalves,,, AHI,257/2/3. de eueluz, São Luis, 5 de junho,
1 7. Porto, H istório
1827] em Anais do ltamarurt, ltt,
das mi.rsões, ll, lll
-§l;aiU".to puto* eque, Lt l0g-109.
de misiones (Buenos Aires, iói;;,;. El generat Rive ra,
general Riveft, la 2l' sobre a situação política complexa no
Uruguai, ver Juan E. piver Devoto,
... :ofpyo
18. John Ponsonbv
3ó."'urrrcque' _

de los partidos v de tas illa,s,yolitica; Histórto


a Georg^e Gordon, nio jun"iro, e;'e'l'i;grày (n,lont"uiaeo. 1956); pivel
de Herrera. La misiónVonronbu."2';;iA" 6 de janeiro, 1g29, em Alberto voto, Hisrória de la Republica Oriental
a",t'üíí*y (Monrevideo, t945); pablo De-
iür"ilyidéu. r930), l, 343_344. o""'.0o. Hisrària a" u Ãritiir"óifá,rt
56 ,'Ji!;' det L/ruguav (Monrevideo

57
aÇrio. Scgundo, o ticsenvolvirncnt«r tle urrra política econômica mars de reconcluistar a Cisplatina sem perturbar as delicadas relações di-
coorde rrlrtlrr e rrrlris lirrle rrcstirs rircrrs dc pecuriria, os coloctrria em me- plonxiticls c()nr os urgcrrtinos. o Rio dc Janeirr-r aceitou e não impediu
lhor 1.rosiçio prrrrr dcsul'iitr Ilucnos Aircs. Ile ntrr (irtnçrrlves de a.judar Lavalleja. C'omo recontpensa por seu pa-
l.rrvlrllc.ilr csl)croLr () nronrcnt() oportuno c: r'riro IanÇclu irrrediata- triotisnro, Caldas qucria apenas o perdão por sua ajucla aos argenl,i-
nrcntc unr violertto ataquc ao governo de Rivera. Pelo contrário, íbi nos lro conllil.o de 182-!- 1828. t'
ir()s p()ucL)s rt; unindo particiários no Uruguai e rcavivou scus contatos O padre nordestino estava movimeirtando habilnrente as peças
c()Ín o líiier da lronteira rio-grandense, Bento Gonçalves. Com isso, do grande jogo. O Rio de Janeiro apoiou o esqLlema. que não apre-
garantiu uma base dc influência fora do alcance de Rivera. Um ano senlavlr Írrandes riscos, scln pcrceber que () vcrdudeiro objetivo era fa-
depois cla posse deste, Lavalleja, através de imprensa de Montevidéu, cilitar a conspiração de Cultlas, t-uvtllc.ja e (ionrrçves para separar
lrtacou-o. pressionando assirn suas reivindiciições. Dois anos depois. sttu pror'íncia nteridional. Portaltto, durante nltis dc unt ano, até o
niro hesitou enr lançar nrão de rneios rnilitarcs. Sua primeira tentativa dil enr que procurou unta aproximação conr Rivenr, cm ll.l32, o Rio
de co"n.rpetir com Rivera em nível nacional. I'racassor.r, Í'orçando-o a de Janciro estava contribuindo, sem perceber. para sua própria frag-
nrr.rdar sua base de operações Ila!:a Jaguarào.:: Estilva, então, no exí- mentaçào.
lio. Enr 1832, a Corte teve esperanÇa que as dif'erenças podessem ser
Os intcresses e(:onômicos e po[ítir;os de I]ento Gonçalves, asstm superadas. Reconh*cendo clue estavam em situaçiro dilícil, a mais de
c()Ír'r() slm irrtuição, levaranr-r'ro a adcrir a Juan Antonio Lavalleja. Em nril clLrilôi'netros do cenário da ação ntilitar cls líderes agiarn com cau-
I ti-ll. na Íl"onLeira. os dois ceutlilhos concordlrriim ern expulsar Rive- tela. ('omcçirnrm a suspeitar cada dia mais das atividades indepen-
nr c scpirrar a província do Rio Grancle tio Sul do Impório. .luntamen- dc'ntes di: Bento (ionçalves. ao mesmo tempo que iam recebendo des-
tc c()nr L aldas, arquitetarain urn simples porenl brilhante plano de pechos perturbadores de Montevideu. Manuel de Almeida Vascon-
rrçr.-ro. l)uru gurrhrrr u sil'r.rpatia e o apoio do Imperio e dos interesses ccllos. t'r {'har.gé d',4[/itire.r br-asileiro, lez lembrar ao Ministro das Re-
purticrrllrre:s nir pr()\,íncilr, l.rrvlrllcjlr lrlcglrria quc suari nranobras rnili- laçt-res Hrtcriores e ao governador do Rio Grande do Sul, a drÍjculda-
tirres c polítielr lot-;rlcr:rrn rrceess;i rilrs plrrlr derruhltr I;ructrrosrl Rive- dc crn ctlnÍ.ecicrur o LJruguui ao Brasil. E acrescentttrr quc Lavallcja
rrr, c lrssiru porlcl Lrrtil'ieirr-(l.c r]()vu rr ( ispllrlirtlt lro Inrpcrio. Bento prorlovia a idóirr du lcderação, somente conto unt rneio dc obter
(iortçlrlvcs tlctr 1'rrotcçit) c lrnrirs tror; Iionletts cic l-uvlrllcjtr, c permitiu apoitt para scus prtippis interesses. No entanto. a Rcgênciu aindu he-
tltre elrutlilhos hrlsilciros Íorlgi<1os ngissenr dcntro cio IJruguai, sob sjtal'a errr retirirr r) rip()io rio-grandense ir cuusu clc I.irvullcja, perce-
sLirrs ordcr.ts. Alent do rlais, constanteme nle in lormava ls intenções bendo que havru rnuito n'tlris cnr -jogo. As lrurnobrus dc Rivera perto
tic [.rrvalie.ju de associar o Uruguai ao Brasil. enquânto encobria os da fronteiru rio-gr"lrndcnsc crlun rrrlris lnrclrçirdoras do que os boatos
vertlade iros progressos n-rilitares dos orientais. t' sobre [-ai'irlle-jir.''
.lri pcrtLrrbudu corr a separaçiro do Uruguai do Brasil, a Corte Íl- Riveru via.javu rcpetidiltnente para a Í'ronteii-a, ostensivamente
car.'li airtda rrtais dcsassossegada com âs notícias da separação do Rio para c\tcrminur qts saqucadores rio-grandenses que atormentavam os
Grande do Sul. A perda de território pesava tanto quanto a perda de
dignidacie" Quando o astuto padre Caldas propôs o planr irresistível
l4 João da Cunha L.obo Barreto. "Apontamentos sobre a revoluqão do Rio Granrlc
até ir deplcrrável atirquc do Rio Pardo".em Puhlituqõe.s tlo.lrquito Nutional XXXI
(Rio dc Janeiro, l9l-5), pp. )13-211: Varela, /)aa.i grunde.s iritrigc.r, ll, -101.l.
ll RC. I.257-158. t5 .losó.loaquint tJe Alencastro a [-rancisco (]arneiro de Campos; Montcvideo. I,r (l(
l.l Bento (ionçalves a Schrr:tiÀtr [Jarreto. I I dejunho. ]tt32: Sebastiâo I]arrcto li l\1a- nraio. ll(J l. AÍ11,27o124. Santiago vasquez a Almeirla vasconccllos. Montcvitlc.,
nuel Antonio (ialvi-ro, Porto Alogre. 2l de-tulho. 1832. AN, tJ I1346; Barrcto a Bra. 2l de setenrbro. IlJl2. e Almeida Vasconcellos a Galviio. Monlevitleo.2g clc sc
ga. Bagó, 4 de seternbro, l8-14, AN, IG l2'73. temhro. 11332 (reservadol, em .4nai.s do Itamaratí. L

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estancieiros uruguaios. A medida que avírnçava. os rumores reais ou sas se deterioravam, devido a seu apoio aos exiladosunitários argenti-
imaginários sobre suas intcnçõrcs se rnultiplicavam. Embora para os nos, suas atividades no Rio Grande do Sul se ampliavam. Consoli-
círculos ol'iciais a cvidência fosse airrda vaga e insuliciente, havia dando seu próprio poder pela adesão a Lavalleja, Bento Gonçalves
medo na província de que Rivera usando o "prctexto dc provocação aumentou a confusão, espalhando boatos sobre as tentativas organi-
por parte dos ladrões desta província, fizesse represálias çm nosso ter- zaf,as por Rivera "com o fim de envolvê-la (a província) no sistema
ritório". '" O governo central apoiou as tentativas feitas pela adminis- republicano, revoltar a escravatura e fazeÍ uni-la àquele Estado". 3r '-
traÇão da província de fechar a fronteira, mesmo antes de receber as Um dos governadores estava ansioso para que Rivera não contraísse
notícias mais perturbadoras, procedentes de Montevideu, de que ho- dívidas no Rio Grande do Sul, o que teria o efeito de prender os cre-
rnens influentes de ambos os ladós da fronteira estavani "procurando dores ao futuro politico da Banda oriental. r3 Em 1832, Lavalleja ain-
separar aquela província do resto do Império". " da era a melhor opção para o governo central. ra Neste mesmo ano,
As propostas de confederação feitas por R.ivera encontraram eco l loi ele derrotado no Uruguai, refugiando-se de novo no Rio Grancle
no Rio Grande do Sul. Nas cidades, os extremistas estavam dispostos do Sul. A corte então procurou ent[ar em acordo com o lider vitorio-
a apoiar qualquer um que quisesse ajudá-los a chegar ao republicanis- so do Uruguai. Fructuoso Rivera.
mo. " Porém os Farroupilhas da fronteira em geral não gostavam de Para Bento Gonçalves, a pequena guerra civil que Lavalleja esta-
Rivera devido à sua amtiguidade, enquanto qúe Lavalleja era sólido ,'va fazendo contra Rivera,.o* bur"t dentro do Brasil, era uma boa
em relação à questão da proteção aos estancieiros rio-grandenses que , oportunidade para aumentar sua própria força. Como Comandante
tinham propriedades na Banda Oriental. " Desde 1829 Rivera envia- de Fronteira do Rio Grande do Sul, herói da última guerra, e um im-
va agentes ao Rio Grande do Sul, tentando aliciar os empregados da portante estancieiro com um grande sóquito de partidários na frontei-
classe menos favorecida da província. rn Os temores dos governadores ra, exercia na verdade um grande poder militar. Aos poucos construiu
aumentaram ou diminuiam, dependendo das condições políticas de uma máquina política e foi reconhecido como o porta-voz dos farrou-
seus vizinhos platinos. '' À medida que as relações de Rivera com Ro- pilha"s. Na fronteira, Bento Gonçalves organizou lojas maçônicas,
aprendendo rapidamente todos os meandros da organização, e usan-
do o serviço postal maçônico como uma alternativa para sua corres-
pondência secreta. Alguns anos depois, um de seus filhos achou que
26. Caetano Maria Lopes da Gama ao Marquês de Caravelas, Porto Alegre, l8 de
março, 1830, AN, tJJ945l; Conde do Rio Pardo a Lopes Gama,8 de março, 1830, Sucre, o codi-nome maçônico de seu pai, era prova suficiente de sua
AHRGS, Avisos da Guerra. intenção de estabelecer uma república antes do dia2O de setembro de
27. Carneiro Campos a Feijó e Manuel da Fonseca Lima e Silva, Rio de Janeiro, l3 de r 1835. r5
janeiro, 1832, AHI, 30O13116; Almeida Vasconcellos a Carneiro Campos, Monte-
video, 25 de outubro. 1831, em Ánai,ç do ltamaratí, ll. As sociedades mitçônicas prolil'eravarn em todo o Rio Grande do
28. Alberto Jose Senteno a Galvão, Triumpho, l2 de dezembro, l83l; Custodio da Sil- Sul. Quase todos os homens inÍluentes e literatos da província eram
va Barreto a Senteno, Faxinal, ll de dezembro, l83l;Calvão'a Feijó, Porto Ale-
gre,24 de dezembro, 1831, AN, IJ1846.
29. C. Catalá a Gabriel A. Pereira, Buenos Aires,27 de fevereiro, 1832, em Gabriel A.
Pereira, Correspondência confidencial y politica del sr. d. Gabriel A. Pereira desde el'
afro l82t hasta t860,6 vols. (Montevideo, 1894-1901),1,46-47; Salvador Mandia a 32. Varela, Duas grandes intrigas, II, 358.
,l96- l8 de novembro' 1831, AN' ICI32I;
Gabriel Pereira, Salto, 29 de dezembro, 1833, em Pereira, Correspondêncra, I, 33. Galvão a Carneiro Campos, Porto Alegre,
197; Alencastro a Carneiro Campos, Montevideo, 25 de outubro, 1831, em Anais RC, r, 329.
do ltamaratí, l. 34. Galvâo a Atmeida Vasconcellos, Porto Alegre, ll de agosto, 1832, AHI'
30. Rc. l,268, nc 2. 270 124 I to.
31. GalvãoaJoséLinoCoutinho,PortoAlegre,20desetembro, lS3l,BN,Documen- 35. Varela, Duas grandes intriga-r,ll, 361;Joaquim Gonçalves da silva a Alfredo Fer-
tos relativos à república riograndense, 1831-1850, 7, 5, 9, 8. reira Rodrigues, Pedreira, 20 dejunho, 1897, AFRC, Correspondência.
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maçons. A sociedade servia como instituiÇão política para os impa- Sebastião Barreto tentava sabotar os esquemas separatistas de
cientes e frustados e tanrbénr corno ponto de encontro para a troça de []ento Gonçalves, mas, devido ao seu envolvimento passado, agia
ideias e pequenas anrenidades. A principul l-oja da província, a Socie- c()m cautela, para não se comprometer. Sentia um grande desprezo
dade C'ontine ntin(), l'uncionava nl rua clo Roslirio, ern Porto Alegre. por Bento Gonçalves, seu rival pelo.domínio nos acordos militares
Para o lranscuntc, nada mais cra d() quc uma sociedade litcrária. A clos rio-grandenses. De certo modo, o seu apoio a Rivera e o compro-
I-o.ja crt ussociada ii (irande Oriente de Lavradio, e uÍna das sessenta misso incondicional de Bento Gonçalves com Lavalleja, reanimou no
_çxistcntes no Brasil na década de 1830. 'u Rio Grande do Sul, a separaÇão federalista-unitária platina. a,
Antes de 1832, a Loja "parece ter servido de terreno comum a re-
Depois da completa cisão entre os conservadores e os farroupi-
trógrados e liberais, identicamente votados à aspiração separatis- Ihas, os rio-grandenses tiveram a impressiro de que não poderia haver
ta". " Foi aí que Sebastião Barreto concordou com o plano de La- paz. Até 1835 os governadores lutaranr contra pequenos distúrbros de
valleja de unir a Cisplatina ao Imperio. r8 E,m l83l-1832, o Çonserva-
rua, contra comícios de radicais, enquanto recebiam notícias pertur-
dor Sebastião Barreto defendeu os me mbros republicanos extremistas
badcras sobre a trama separatista e os planos revolucionários para
da Sociedade perante o Governador, depois que autoridades locais
depor o governo. No entanto, diante da violência dos acontecimentos
descobriram um esconderijo de armas, relacionando-as com uma tra-
em outras partes do imperio antes da Guerra dos Farrapos, tais como
ma de Rivera para separar a província. Ao tomar conhecimento das
em Minas Gerais, Maranhão, Pará, Mato Grosso é os conflitos de rua
manobras de Rivera para libertar escravos e prisioneiros e redistribuir
no Rio de Janeiro, que às vezes pareciam verdadeíras batalhas, o Rio
a terra, ameaçando assim a ordem social estabelecida, Sebastião Bar-
Grande do Sul dava a impressão de ser uma província modelo. Ate
reto assclciou-se aos Farroupilhas. Havia um interligamento de inte-
mesmo as manifestações explosivas na lronteira podiam ser óontrola-
resses econômicos entre os estancieiros da fronteira. Todos concorda-
das, visto serem pouco lrequentes as nctícias de violência interna em
vam quanto à expansão para els terras mais férteis da Banda Oriental,
grande escala.
nras i\s vczes discordavanr quilnto ao car-rdilho uruguaio qr-re f acilita-
Depois de 1835 essa suposiÇão de passividade da política rio-
ria estc nrovilrrcntrl. ()ulrnrlo, crn ll{-12, lr invusi-ro clc Luvlrllc-ja l'racas- grandense se desÍ-ez rapidamente. De fato, nunca foi verdadeira. A ala
srlLr, Schltsliirtl llltlrcttl c ()utr()s ctrnscrvlrrltlres.scprtnrtistls sc rctiril-
do partido farroupilha sob Bento Gonçalves "estava somente altuar-
nun drr Lo-jrr c rrpoirrrlrrtt tl l)rcsirlcrttc rrrugturio. " A rrrctlitl;r tlrre Rive-
clando a oportunidade" para se rebelar. ''Seus Jtlanrls separatistlrs di-
ra consolidavit seu controle e os libcrais no Rio dc Janciro sc mostra-
vergianr das ambições revolucionltrias de outros I;urrapos, nruitos
vanr nrais nroderados. Sebastião Barreto tornou-se urn dclensor do
dos quais eram simplesnrente Íêderalistas-rcpuhlicunos. " As dissen-
.\tatus cluo, e o militar essencialmente responsável pela del'esa da
província contra os Farroupilhas-Lavallejistas. Então "se declarou ções políticas dentro do partido estavullt tlirc{amcntc r':lacionadas à
r" economia estagnudrt da pr<lr'írrciu. l)c uru lado cstavar.n aqueles que
inimigo implacável de Lavalleja e seus amigos".
continuavitnr a lutirr p()r unla rcpública brasilcirl unide, porem lbde-
rativa. e que se agarravam à ideia da integração eco,rômica do Brzr-

16. Alfredo Ferreira Rodrigues, "Notas para a história da imprensa no Rio Crande do
Sol" Álmanak Litterario e Estatístico da Província do Rio Grande r/o Sa/ (1900), pp. .+i.Tjarks. "Nuevos aportes", pp. 2.46-247.
236-237' Jornal do Cornmercio. l5 de outubro, 1834. Vol. Viii, nç -lll, p. l.
1). Joaquim Gonçalves da Silva a Alfredo Ferreira Rodrigues. Pedreira, 29 de se-
Varela, /)ra.r grande.s intrigas, ll, 331. tcrnhro, l tt96. AFRC, Corrcspondência.
l8 Lobo Barreto, "Apontamentos", p. 275. JI Marciuno Ribeiro a Bento (ionçalves. Porto Alegre, 29 de dezenrbro. ltt-.]2. em An-
19. Varefa, I)ua,r grandas intrigas,II, 294; l-obo Barreto, "Apontantcntos" p. 27-5 ttrniol)iaz. llirtririuytlítiruyntilitardela.srepuhlicosdel Plutude.rdeel aíiotlctU2ll
40. Yarela, Dua.t grande.s intrigd.ç,II, 16l; Lobo Barreto "Apontamentos" p. 275. ln:ta el de l8ó6, l2 vcls. (Montevideo. 1877-ltiTtt). Il, l-ll-ll.{.
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sil." Eram os herdeiros da revolução liberal de 1831, que, segundo
eles, iinhá.sô rJcsvirtua<jo. I)rlrérr.t a lircçiro mais importante era a de rcvolrrcioniirios não incitavam seus peões, escravos, dependentes e os
rlrvcrsos vagabundos da Campanha a se rebelarem contra o sistema
7t unr pequcno núlrncr() de corrspiratJores scparatisÍ,as republicanos, tal-
vez não ntitir; rluc sctc, cu.ja I'ilosol'ia ds autonnnria çconômica se espa- sot'irrl vigcnte. Era umf dilema terrível. Temiam uma ruptura incon-
lhou pr>r lrlrllr u província, c-lyjo plano era a independência. " Sem lroliivcl, mas, por outro lado, estavam cientes da necessidade de for-
ne[l nlesln() o conhecimento dos outros membros da mesma socieda- nxrr uma consciência política na Campanha,paÍa poder levar avante
de secreta, estes homens, incluindo Bento Gonçalves, João Manuel de trrrra revolução vitoriosa. Sabendo que não podiam se expor política e
l.inra e Silva e José Mariano Mattos, tramavam a revolução, embora stlcialmente a uma rçbelião geral, se concentraram, como os outros,
os boatos e conversas indiscretas sobre eles. ate mesmo o lato de se- enr lrtlrqLres xenóÍbbos aos portugueses e nos habituais apelos regiona-
rern chamados.conspiradores, 16 deixassem dúvidas quanto a seus mé- listlrs. l-ogo que conreÇou a revolução, a rctórica mudou drasticamente,
todos tle sigilo político. Ou talvez isso lbsse feito intencionalmente. lnus mesmo assim nada mais era do que expressões militantes para o
como parte de um maior esforço de propaganda para ganhar apoio, csclarecimento das idéias. As questões sociais eram tratadas respeito-
introduzir um elemento de medo, e dar uma confiança ilusória aos samente, e geralmente incorporadas às amplas declarações filosóÍl-
funcionários do governo, fazendo-os acreditar que o partido estava cas, incompreensíveis para o gaúcho comum do exercito farrapo. Ou
dividido no tocante a questões cruciais. Por esta razã,o, Bento Gon- cntão eram apelos aos valores morais: honra, justiça e lealdade. As
vésperas da Guerra dos Farrapos, o caixeiro-viajante francês Arsene"
çalves esperava a hora de agir.
As vezes, as reações públicas destes revolucionários às pressões Isahelle discerniu o espírito regionalista do rio-grandense, sua det-esa
da administração da província eram extraordinariamente passivas. A dos valores gaúchos e sua avidez em incriminar o Rio de Janeiro. " -
cisão no partido farroupilha impedia reações mais fortes. Além do Um grupo de homens resolutos, colocados estrategicamente, po-
mais, de ltJl2 a lti34, os conspiradores confiavam, em parte, numa vi- deria derruLrar o governo de província facilmente. Os cavalarianos se-
tória dc Lavalleja, que, conÍbrme combinado, viria em seu auxílio. riam decisivos para fazer do Rio Grande do Sul um pais independente
na lutit inevitável contra o governo central. Mas, no primeiro estágio
Mas havia outrus ruzircs plra t:sta passivitJade. l)rimciro, os revolu-
da revolução, isto é, a tomada de Porto Alegre e a remoÇão dos altos
cionários não qucrilrrn dcscncltdoar Lulul rcvolução social quando
chogasse a hora de sc rcbclar. Segundo. cnrbora alguns dos homens de
I'uncionários administrativos, não eram necessários. Para isto, os líde-
Bento (ionçalvez ocupassem posições-chavcs na Guarda Nacional e res larrapos preferiram usar a Guarda Nacional. A organização de
no exército, não controlavam os postos mais importantes. uma nova instituição hberal da Guarda, em ltl3l, para scus próprios
O agente revolucionário tinha de conseguir apoio na Campanha, llns, loi uma tarefa longa e diiícil, responsiivel cm parto pelo aspecto
aparenlemente tranquilo rJa pr«lvíncia.
entre a elite dos estancieiros, para reforçar o movimento geral. N o en-
tanto, os estancieiros da fronteira, inclusive Bento Gonçalves, não ti- i'- [Jma das preocupaçitcs da nova lideranÇa no Rio de Janeiro de-
, pois tla revoluçito clc 7 dc abril de 1831,l'oi a necessidade de reduzir i.l
nham intenção de libertar a população gaúcha, formadq por escravos
e por um grande número de libertos, armados esem propriedade, ex-
, podcr dos oligarclts dcl interior. Para isto, o governo procurou centra-
perientes em banditismo e guerra. No período de 1828 a 1835, estes lizar as Íbrças da polícia rural e vigiar atentamente a Guarda Nacio-
nul. " Esta prometeu não somente restringir as tropas pessoais dos
líderes do interior, ntas se ofereceu para contrabalançar este exercito

44 lhid, p. 278; Arsêne lsabelle, l/iagem ao Rio do Prata e ao Rio Grantle tlo Sa/, Trad.
por Teodorimo Tostes (Rio de Janeiro, 1949), pp. 36,278.
.17. lsabelle, Viagetn. pp. 298-299.
45. Francisco Bertolini, Livio Zambeccari; cenni biograJici (Bolonha, 1885) p. 16.
46. Sebastião Barreto a Braga, Bagé,4 de setembro, 1834, AN, lcl213. 48. Thomas W. Palrner, "A momentous Decade in Brazilian Adminislrative Historv.
l83l-11J40", Hi.rpanic American Hisrorical Revrew (May 1950), pp.209-210.
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I
imprevisível. cujo cstuclo nlaior íjra conrposto pelos odiados oliciais I)o 1'ronttr de r.ista drts rio-gnrndenscs, tanto das ciclaclcs cttnttt
l)ortuguesr:s.'" Os rlcputrrdos libcruis no Rio dc.laneiro niro conÍ'ia- ,lrrs t'st;lrrcilrs. cu-jo traLrllho neccssituva uma atL:nÇalo coticlianu. cnr
valri n() cxórcilo, r;uc hti llio ;rouco tcrnpo uintla depcndia rJc Pedro I lr irle rrte Linr clesc()rttentar-nento gcral c()nt u (iuarda Nucittnul. Ntt li-
c, portlrrrto, poderilr scr ur;lrdo por clc c scLls partidlirios para uma re- rlrl tlu (iuerra dos Iilrrapos. pedirarl iscnçi-ro do serviço na (il,urdlr
trlllrarlrr rlc podcr. A esscs homens também causava rcpugnância a l);rrll de','otar toclo rt seu tempo a tareÍh de reÍ'azer t: cutdar de suas ntu-
ideirr de cxpant!ir as tropas da linha de Íiente usando o odioso metodo nirtllrs. Porent no pe ríorio cie 18ll l 1u35. nas cidades da la-euna. ape-
de rccrutunrento oompulsório. Estavam seguindo os passcs dos bur- srrr rius reclunraçõcs locltis. ri (iuirrtlrr preenchia sLras fileiras. I lnt clos
gucscs liherais Í'ranceses, que tanio temiam o absolutisn'ro da Coroa govcnlldtlrcs express()u srut proíLrntllr cxrtspe rirçl'io clizcndo rl Llc "lt
(lulurl() o absolutisnto das massas. No ambient.e urbancl do Rio dc Ja- ()rgilnilirÇat() estltiit enr opttsiçlt«) lt()s c()s(unres dcste p()\/()". '"( lr-llr-
nciro c sob a égide do Ministro da JustiÇa l-eijo, a Guaida Nacional rilitls quc c()ntribuent pura o bcrn rilr sociedlrtlc rlevcrilrr.n:icr tlispensu-
atuou bem, subjugando as tropas amotinadas e acalntando os espíri- rir;s do serviço nrilitar". dizia urn cditorial clc llt-12. "scrriço essc rlLlc
tos lacilmente inflamados depois dos dias inebriante.y de abril. .'' tl.:rcrirr l-iultr reçerr ltdr) pltrlt os plrrlrsilus srlciais. tluc illtdlr L()trtrr-
- A Regên,:ia enfraqueceu muito a estrutura do exercito no Sul. buen.r". .\s acusaçr)es I'eitas contra a (iuarda erarn tamhc!rit p()r cirLt-
exército esse do qual iria neçessitar rnais tarde. Sentindo-se abando- srr d,.r nivclanlenlo clas classes. O liberalismo tinha ido longe dcnrurs
r.tados. a estratégia dos oliciais do exórcito se desenvolveu ent torno de n() l{i() de Junciro. Atônitos dirrnle clu novlr rculiduclc social irtrplícitlr
unra anrpla aceitação local do pensamento do exército e de sua intpor- rtrr buse delnocrliticu estahelecicla pitril a prornoÇão de ol'iciais cio sc-
iância corrro uma instituiçâo tradicional. O exercito. cont toda razào. gtl ndo cscalão. urn editor nmniÍestou clarantentc suas ()hjeÇ(les: "Sou
considerava a Guarda Nacional como ri.,zal. pois, em vez de acabar Linr liberal. ó r'erdade. mas não um nivelador". '"
conr os clistúr'bios políticos. arrefeceu o espíritc. militar. destruindo a  Íirrnraçiro das unidades da Guarda despcrtor-r ressentrn-ento e
(,rdcnr c ubolinclo ils tr()pus de segundu linha (milícia). '' stispeitas nr) ilrterior cla província, r'rndc os cludilhos intpenrvlrnr. [.Lr-
A tteccssititttlc crlrtstlutlc tlc rniurtcr lrs del'csirs tlu ll-onteirtr tlirtri- Irrrir r]r c()ntnr lt erecuçlio dli lei, lrtnLvós da insLrbrnissio. Os chclcs rll
ttttitt *t ritttto rilt ineorportçrro tlir rrrilír'ilr nlr lirrnlrçlio tllr (iulrrrllr. lL lrontcinr. cr)nr scus perlucnos crórcitos dc depentlcntes. peõcs e !.rrú-
r;ttltl cnt rlrqltnizlttllr nir blrse tlc rrrrrnicípitl, " () g()'vcrn() rclrrtlrva crtr ehos. e cont!-ole da milícia. ternianr â usLlrpuÇaro rle scrrs por-lcres trutli-
cnrpreglrr nas inúnrcras erricrgônciirs as rrrridlrtlcs trcin:rtlls l\s pressas cionais c delendiam zelosamente seus posl()s, rccc()s()s rlc os pcrtlcr
da (iuarda Nacionai e, porlanto, usou ulla tropa ilu rrrilícilr. Sc hou- nas eleiçt)es populares er;giclas pcla ( iLlirrrlir.
vessc Llrrra batalha con'i as tropas de Rivera, cttnli.trnte o Nl inisilo da (]uandrt se dcrilnt contlr tllr rrrr;rrlrtirri'rlr (luc cslilvll rcscrr. litltr à
(iucrra lerrbrou na Cântara dos l)eputados, a Guardu "scril vílintit (itrarcllr, os nrlrf istnttlrls orqrrrtizrrnrrri rrrtrtllrrlcs rlc lrcrlrdrl corrr os oii-
rlu st'tt prttrirltisrrttr". ciuis clu Inilíei.r tltte tlcscirrvrnr pos(os rrir (irlrrdlr. () cicsccnte conl'littr
tlentro tlo llirr ( irrrntle tlr; Sul para o controlc político acclerou us uti-

19 Nelson \\'erneck Sodré. Hí.çrriria Militar do Bra.v/ (Rio de Janeiro. 1965) p. I 17.
50 Sttusa.,tcrfri. np. 1.1.1 1.15.
ll .\antirtt'ilu lu Liltt,rtludt,20 dc rnarço. l8-r5, n.r 494, pp. i-2.
5l (;ill\i()it()i.lttíucstie I)rtzticl)irltilti, I)()rtcirils, Iahirn.llerval..lagurriioc(;rlltrrs- 5"1 (ilrlrirr a []rito. I)r)rto.,\legre.6 de ltovcntbro. lE-l:. /\HR(;S. ( x. ó. n! 10.

rú, l)orttr Àlcgrc. 25 dc ltgosto, lli-12. 1;1;u;,o l\ ( irrnara Municiplildc I)elrrtlrs. l,or 55 O \rttítiudor. l-1 d,.: ltvereiro. l8.ll. rq 15. pp. 57-58.
to.\le.!trc. l5 tie auostrr. llil2. r\tlR(iS. (1x.60, nr l5-5. -56 .\rtttint,llu du l-ilttrdttdt. ll de ouluhro. lE-ll, n,: _149. pp. l-2.
5l Rtlttórirt du rcptrtiçtio do.s nesticio.s da guerru upre.sentado t) atsenbliiu gtrrtl lt.qt.r- 57 O ('rtntirtentino. l9 de oulubro. ll(ll, nq II2. p.4zl5; (ialvito a Bri1o. porto Alcgre. 7
lotiva tn.ses.stio ortliniiriu tle l,\34 pelo respecl!tD nrinistério c::etretário tlt,rtiatlo .lri- de dczcnrbro. 18.12. AIIR"GS. Cr. 6, np 50 ident a ident. Porto Alesre. 6 de no-
tent.José Ferreira de Brito. Rio de Janeiro,6 de maio. 18.14. vemhro. lli-r2. At.lRGS. Cr. 6. ns 50.
66 67
llrrrs :rl'i rnrlvirnt que o governo central tinha "reformado o Pacto Fun-
Cireito, usando seus po-
[vi«Jades rle organizaçiril.'* [Jrn astutoluiz de rlrrrrrcrrLrrl. dugclo a() pov11 a esperança de que suas dificuldades serianl
) ,1"r"* ruríciic.ri e rrrcsiclirrtltl a.jtrntir t1e clualil-iclçiro' poderia lacilnren- ,rrrlrtlirs. isto nito acontecera. "' [)epois da abdicação de Pedro
/ t. anlu.",. ltcl1hr.s dc sttlt l'1nrí1i1, tnctlbr6s dc scu plrrtido e chelcs 1-16rén'r
l. rts liberais do Rio de Janeiro decretaram relorma atrás de relilrma,
clue I'icou clartl clue no-
] que apoiassc, n() corp() dc olicilris. '" 4 rnodida se ln conseguir resolver as necessidades sociais. O Ato Adicional
tiror"l
l institucionais estavam reduzindo os poderes locais' a
r1i-urlurças irs esperanÇas de muitos liberais, que acreditavam em relorma pacíl-i-
i .ui
I «;uiuda çrqsceu en1. inrportância' ca. Agera era mais Íáçil acreditar que só uma revolução seria cap4z de
oAtoAdicionaldelS34,emseuesquemageral,descentralizava trazer uma descentralizaÇão real. Os rio-grandenses viam tambem
ntuii.s poderes do governo central, mas, como um estadista contem- qLle os conservadores e libcrais moderados no Rio de Janeiro estavam
porâne,t disse: "centralizava, entretarlto, o que era apenas munici- do mesmo lado. e receavam o retorno dtl absolutisnto. "t Hra necessll-
pa1".,,,, os Iiberais lutaram durante as décadas de ltt20 e 1830 contra rio, portanto, àtacar o Ato Adicional dc modo a comhater os honlens
as forças conservadoras para obter autonomia. No entanto, embora que o promulgaram e dele abusavamt Com o beneplhcito do Ato Adi-
fossem hábeis críticos da centralização, eram incapazes de organizar
e cional, a Assembleia da Província decretou novos impostos, provo-
construir. ", os liberais de l83l se apressaram em apresentar uma sé- cando o descontentamento dos rio-grandenses, já sobrecarregados
riedeatosecódigosimportantesparaaproteçãodasliberdadescivis. conr as taxas provenientes de uma burocracia irresponsável'
do
Porém era mais lácil entrar em acordo quanto aos direitos pessoais os larroupilhas que faziam parte da Assembléia conscienciosa-
que achar uma solução para a centralização adtninistrativa. Â nova nrente corttribuírarll na irnpllrltação de novas taxas na província' as
as As-
emenda da Constituição muito centralizada de 1824, que gerou quais, sabiam eles, seriam imputadas ao governo central. Estes novos
semblóias das Províncias, teve uma acolhida duvidosa na província' tributos entravam em vigor imediatamente. A medida que o dono de
l-inalmente, pelo menos no Rio Grande do Sul, foram os conser- um botequim cobrava mais por uma bebida e os estancieiros paga-
vadores quc aprovaram o Ato Adicional, e não os liberais, que
duran- vam imposto territorial, os farroupilhas iam acrescentando às suas
te anos clantuvum pela clescentralizaçlto. Os conservadtlres acharam
o hostes mais um gaúcho e mais um estanÇieiro desgostoso. As munici-
Atrt muito promissor, pois a lci rcstrirrgiria tls cslirrços dos "homens palidades no interior iam acumulando as críticas, não tanto iis As-
, atrevidos" (caudilhos), decididos a "estabclccor Llll.l ()utro governo sembléia.s, mas aos administradores da província. "' O Ato Adicional
(república)". u' Desempenhando um novo papel' os antigos propo--. era uma arma perigosa nas mãos do governador de província e dos
nentes atacaram o governo cen'rral, acusando-o de |ogro. Os Í-arroupi- militares que o rodeavam, pois usilvam-no para juslificar seu poder
execessivo, sob o pretexto de quc lbra dclegado pelos representantes
do povo.
A forte reaçiro dos rio-grandenses ao liberalismo do Rio de Ja-
58.BragaaBentoGonçalves,PortoAlegre,l4d'ejulho,1834 idemaTheodorioJosé neiro começara antes, sob a direção e influência de propagandistas lo-
,iu §ituu, Porto Alegie, l9 de julho, 1834, AHRGS' Cx' ll' ns l56l Alliedo
Irerroira
..Anton"io vicente da Fontoura" Almanak Litterario e llstotístio da
Rodrigues,
ProvínciadoRioGrandedoSul(1900)'p'6.,oNoticiador,3deabril,l832,nc24' pp'
l0 de novembro' 1834' nç 74' 7-4'
pp. 97-99; O Echrt Porlo Álegren'se 63. Varela, Duas grandes intigas, Il, 385-388; O Recopilador Liberal' 2 de setembÍo'
59.ONoticiador,20deagosto,l832'l],,í]lJr2ó5el3desetembro,l832,n.]71'pp. 1815. nq 301. pp. l-3.
293-294. 64: Varela, l)uasgrandesintrigas,ll,453 OConÍinentisía,7deagostol835,ns7,pp.2-
vols (2r ed')
60. Paulino José soares de Sousa, Ettsoirt trtbrt'o direito administralivo,2 l.
(Rio de Janeiro, 1960), I' viii. fói, Manuel Gonçalves Meirelles a Joaquim Manoel de Azevedo, Serrito,30 de agosto,
l9l6)' p' ,, tg:S, AHRCS, Cx. 50, maÇo 2e; José Joaquim da Silva Maya a Azevedo, Piratini,
61. Basilio de Magalhães, A"circular" de Theophilo ottoni (Rio de Janeiro,
95. 3l de agosto, l8l5; AHRGS. Cx., 53, maQo 2e.
62. Correio oJicial, T de janeiro, 1835, ns 6, pp' 3-4'
68
cais e estrangeiros. Jornais das cidades de porto Alegre e Rio Grande,
rlc tlrrrs dúzias de italianos que combatiam pelos farrapos ou os aju-
com artigos altamente inflamados, se espalharam pelos quatro cantos
tl;rvrrrrr. lrntre os mais influentes, antes e durante a Guerra dos Farra-
da província. De 1829 até a tomada da capital pelos farrapos em
l)()s. cslava o Conde Tito Livio Zambeccari. Em Porto Alegre, este ex-
1835, Porto Alegre tinha mais de vinte jornais, o que, afinal de contas,
pct'icnte aristocrata revolucionário q.ue gostavra de ciências naturais,
era uma número bem im;ronente para uma cidade de 12.000 habitan-
l()n)()u-sc unt dos principais colaboradores de O Continente e O Re-
tes, em sua maioria analfabetos. o6 os rio-grandenses que se interessa-
ptthlicanct. Entrou também para o grupo sejeto de conspiradores da
vam pelos desenvolvimentos políticos platinos reconheciam que as
Lo.la de Porto Alegre. Zambeccari trabalhou alem disso com um ou-
Guerras da Independência foram os acontecimentos mais importan-
tro revolucionár'io estrangeiro, Manuel Ruedas, de Montevidéu, no
tes de sua própria história. Na realidade, o fato mais importante na
jrrrnal O Recopilador l-iheral. ''"
política,rio-grandense. Rodrigo de souza da silva pontes, uma figura
Ruedas era um dos principuis "doutrinários" que negociavam
polêmica, que era conservador-separatista na década de 1g30, e que
cont pólvora e balas. Era uma dos mais íntimos associados de La-
mais tarde, sob o regime imperial, ocupou posições influentes conhe-
valleja a espalhar propaganda revolucionária na província. '-" Como
cia bem a literatura revolucionária. Em 1944, escreveu que..as obras
Lavalleja, tinha um relacionamento muito instável com Rosas, da Ar-
mais ímpias e mais demagógicas do século dezoito corriam pela
gentina, procurava maior apoio no Rio Grande do Sul. Em Porto
Província do Rio Grande do Sul traduzidas em espanhol". o, Conhe_
Alegre, a mulher de l-avalleja sçrvia de ligação entre seus partidários
cia bem os radicais rio-grandenses, como por exemplo, pedro José de
e os amigos no Brasil. ''
Almeida.
Pessoas recem-chegadas ao Rio Grande do Sul de outras provín-.
Conhecido como Pedro Boticário ou Vacabrava, Almeida era
cias, talvez devido a convicções profundamente enraízadas, contri-
um juiz de direito muito popular em porto Alegre, e editor do jornal
buiam para lomentar este sentimento revclucionário no Sul. Enirc
republicano radical ldade do Páu, o qual esbravejava contra as insti-
elas estavam os oficiais militares José Mariano de Mattos. João Ma-
iuições monárquicas e contra os portugueses em cargos públicos.
nuel de Lima e Silva, e Reis Alpoim. No Rio de Janeiro estes três mili-
Anos depois, durante a Guerra dos Farrapos, preso em pernambuco,
tares tiveranr participação ativa na revolução de 7 de abril de 1831.
"eu envoquei os nomes sagrados - I'átria - Liberdade e meus nrales
- ('onsiderados radicais demais pelo governo de moderados, foram
se me figuraram menores". ut
transÍ'eridos para o Sul, em caráter de meia-aposentadoria. Fieis à fi-
Havia uma intçressante coleção de aventureiros revolucionários
losol-ia revolucionária, João Manuel e José Mariano comeÇaram a
ajudando a edrtar outros jornais republicanos radicais. A revolução
pre-qar a política revolucionária nos quarteis e l'oranr admitidos no pe-
se faria.sem a ajuda deles, mas não resta dúvida que lhe davam um
queno grupo de conspiradorcs, que mitis turcle acolhcu Zambeccari. '2
certo colorido. Giuseppe Garibaldi, o mais famoso de todos, serviu
Alónt da inl'lL,ôncir incrcntc u sclr posto, Jose Mariano e João
como corsário farrapo e estrategista naval, vagando pela província
Manuel possuiurn unra grando tccnica revolucionária. Joào Manuel
depois do início da Guerra dos Farrapos. Era apenas um entre mais
enr nruito inrportante para os revolucionários, pois era membro de
uma das I'anrílias mais lamosas do Brasil; seu irmão era um dos R.e-

66. Edgar Luiz schneider, "Imprensa sul-riograndense nos séculos xrx exX', p-unda-
mentos da Curtura Rio-Grandense,
euintã série (r962), pp. al-lz; Éo.io;.xotas,', 69 R( , l, -]06--l0qi Porro, "Notas", p. 357.
pp. 320-322.
70 Sclenrbrintr l:. I)credu. lil ,qcttrral Rir.era,:u prinrcra pre:itlúntiu,l830-1815, (Mon-
67. Silva Pontes, "l\Íemória", pp. lgl-1g2.
tevrdeo, 1925), p. I 17.
68. Pedro José de Almeida- a i'Domingos José de Almeida?), pernambuco, I0 de
feve- 1t Varcla, I)ira.r (ironde.ç lntrigo.r, 11,438.
rçiro, 1838, VC, XXXV.
72 R(, I, -t 12.
70
7l
gentes. '.?S-ã_o Manuel e José Mariano disputavam com a conservado- srrhrrclinação e intrigas contra seu senhor, o Imperador. ,, Depois da\,
ra Sociedade Militar, recentemente formada, a lealdade política'dos irl ;rbrlic.ção, os liberais do governo central continuaram u reduzir o /'
slgldados rasos. [Jnr dos principais organizadores da Sociedade Mili- tc:rrciirltjas forças armadas no Brasil, por outras razões. puou /i
Xl-,
tar era Sebastião Barreto. Dentro de pouco tempo esta sociedade se "r"r,
cxúrcito menor significava um governo mais estável. Mas os governa- j
orgulhava de possuir como sócios oitenta oliciais, e era do conheci- j tlores rio-grandenses argumentavam veementementecontra a redução
nrento geral ser ela filiada à sociedade reacionária do Rio de Janeiro.
J

rl. número de brasileiros em serviço, o que deixaria a provincia ex-;


Sem consultar os caudilhos da fronteira, José Mariano e João Manuel posta às incursões armadas do uruguai. o efetivo militar na década
il
imediatarnente se opuseram a que fosse oÍicialmente estabelecida na tlc ltl30, no Rio Grande do Sul, ficou reduzido a unr terÇo d.o nor- Ii
1

província. 'o Os jornais locais abriram uma acirrada campanha contra rrrirl. 't o recrutamento dos rio-grandenses era muito difícil, pois, se- 1
a presença da Sociedade Militar, trazendo os farroupilhas para a rua. gundo palavras de um governador, "eles eram iguais aos árabes... e
Os farrapos federalistas no litoral, estavam quase prontos a declarar a rrada lhes era mais .penoso do que serem soldados da infantaria". ,n O
federação neste momento, mas se abstiveram, pois sabiam que neces- recrutamento exarcebava os ânimos, e os que eram convocados mu-
sitavam do apoio militar dos estancieiros da fronteira. Daí em diante, davam-se para outros lugares onde o risco era menor; da fronteira do
Bento Gonçalves teve maior ascendência sobre seus partidários, Rio Grande para a Banda Oriental. 80

transferindo as preparações da separação para a fronteira. Ern Porto


Alegre, o governador não tardou em reconhecer Mattos como "líder Os militares no Rio Grande do Sul enfrentaram o primeira difi-
de todos os turbulentos da cidade". " A Sociedade Militar, no entan- culdade em 1832, quando a luta pelo poder na Banda Oriental amea-
to, era poderosa demais para os farroupilhas ativistas. O pequeno çava se estender pela província. Encravado entre o Estado Oriental,
exército no sul continuou fiel ao governo da província, rêiis'tindo às Corrientes, Entres Rios e Paraguai, com poucos obstáculos naturais
iéntatiras dos larrapos para subvertê-lo de dentro para [ora. Porém, para ajudar sua defesa, com a exceção do rio Uruguai e os arroios
quando a revolta eclodiu, em 1835, o exército estava fraco demais Chuí, Jaguarão e Quaraí, o Rio Grande do Sul era vulnerável. Na
para detê-la. fronteira, a situação continuava critica, e os três pelotões de cavala-
A Regência deu o toque llnal nos planos de Pedro I para reduzir ria, com um total de 376 homens incluindo os oficiais, não seriam ca-
a força das tropas no Rio Grande do Sul. "' Antes da abdicação,.já es- pazes de resistir a um ataque inimigo. I' O número de tropas na
tavam elaborados estes planos, devido a razões de segurança interna e província diminuia à proporção que o governo, de acordo com a lei,
a motivos financeiros. Foi dispensada atenção especial às tropas es- assinava os documentos necessários para aqueles que tinham comple-
trangeiras, principalmente às divisões alemãs, conhecidas por sua in- tado o serviÇo militar. 8'z Os Ministros da Guerra e os governadores

77- conde do Rio Pardo a Lopes Gama, Rio de Janeiro, 24 de janeiro. l g3 I (reserva-
dol: idem a José carlos Pereira de Almeida Torres, Rio de Janeiro. l2 de fevereiro,
73. Othelo Rosa, Vultos da epopéia farroupilha, escôrços biographicos (porto Ategre, 1831, AHRGS, Avisos da Guerra; Marquês de Caravelas a Lopes Gama, Rio de
1935), pp.85-91. Janeiro, l2 de janeiro, 1831, AHRGS, Avisos do Império.
74. Coruja Filho (Sebastião Leão), Datas riograndenses (Porto Alegre, 1962) pp. 339- 78. Lopes Gama ao Conde do Rio Pardo, porto Alegre, 2 de janeiro, 1930, AN,
340; RC, I, 372; Galvâo a Aureliano de Sousa Oliveira Coutinho, porto AÍcgre, l5 IGI170.
de outubro, 1833, AN, IJJ945l. 79. rbid.
75. O Recopilador Liberal,3l de maio, 1834, nc 185, pp. 2-4; RC, I,373-378; José Ma- 80. Mariani a Brito, Porto Alegre, 3 de janeiro, 1g34, AHRGS, Cx. 6, nc 50.
riani a Coutinho, Porto Alegre,5 de novembro, 1833, AN, IJlg47. 81. Francisco Antonio Olinto Carvalho, porto Alegrc, 6 de dezembro, lg3à,
76' J. B. Magalhães, A evolução militar do Brusil, anotações para a história, (Rio de Ja- AALRGS, Propostas.
neiro, 1958); pp. 282-283. 82. Galvão a Brito, Porto Alegre, 23 de novembro, LB32,AHRGS, Cx. 6, ne 50; Brito a
72
73
rio-grandenses esperavarr uma lei de recrutamento da câmara dos
;rgora dispersar qualquer dúvida que houvesse a este respeito. Contra-
Deputados, que nunca Íoi assinada.', listava chegando o dia, queixa- (l rilndo as expectativas dos farroupilhas, Braga cumpriu à risca as or-
va-se arrargamente () c'ornantlantc cls Ârnras seblrstião Barreto, enr
tk:ns do governo central. Seu irmão, Pedro Rodrigues Chaves, líder
que "a província e a í'ronteinr l'icarilrn scnt defesa". ',
irrlluente entre as forças conservadoras da província, tornou-se seu
í Por razões políticas, a lacção mais bem equipada clo exército es-
crlnselheiro particular. Braga começou sistematicamente a perseguir
tava aquartelada em Porlo Alegre. As atividades revolucionárias se
os Farroupilhas e os partidários de Lavalleja. Ruedas e Caldas foram
ldesenv'olveram livremente nos lugares onde o exercito era mais fraco. oxpulsos da provincia, e os farrapos dâ Polícia de Porto Alegre come-
I Em certas áreas o exército levava alguma vantagem sobre a Guarda
Çaram a sentir a força do governador. Bento Manuel e Bento Gonçal-
Nacional e as tropas independentes dos estancieiros, devicro ao rato
ves perderam seus postos de ComandâniêÀ ãà rrôntê,iià. Atoiilóãdos
de ser mais bem equipado e devido ao entrosamento entre o comand<t
momentaneamente, os Farroupilhas, sentindo a traição de Braga, en-
e o controle. Mas o governo central detinha o embarque de nclvas ar-
traram em ação com mais vigor. Para neuÍralizar a Guarda Nacional,
mas, por temer o estabelecimento dos militares, mesmo quando o go_
Braga procurou organizar uma gu4rda pretoriana, embora sem suces-.'
verno, embora financeiramente apertado, já as possuía. ,t
so. Os assassinatos políticos se multiplicavam e Bento Gonçalves ga-
No final de 1834 e princípios de 1835, quando o governo da rantia aos outros que não entraria em entendimentos com o governo
província mobilizou apoio para desbaratar o grosso das forças oposi-
de província. 8'
cionistas, os parâmetros de ação militar loram limitados dcvido ao
baixo nivel das tropas..$elatóú-o-q..yindos do interior e mesmo de al- Bento Gonçalves não demorou muito a entrar em ação. eual-
gurrs povoados menores n.a vizinhança da laguna, relatavam o apoio quer que fosse sua posição ideológica - federalista ou separatista - os
dudtr Pçl;s (iLrlrrdu Nlrcionrrle pelos ju.ízes de puz ao purtido flrroupi- Farroupilhas estavam suficientemente comprometidos a derrubar o
lha. As autoridades da província tinhâm agora que confiar na learda- governo da província. Escaramuças almadas em Rio Pardo provoca-
de do exórcito. "As pcssoas cortlltlrs c qLre dese'janr vcr c()nsolidadas ram na capital o receio de que estivessem preparando uma batalha
as c()usa§ do Ilrasil, olhartt o cxórcito conrt) clcntcntrt dlr or«lcrrr", afir- maior. Gritos de "morte aos galegos (portugueses) e morte aos traido-
rnavíl o porta-v0z do govcrno. o -jornal lrcr..lsi.lvir a rccónr-instalada As- res" precediam o fechar de portas e janelas na cidade ribçirinha de
semblcilr "dc procLtrar destruir dc todo u inÍluôrrciu clcsta ilr-rstre classe Rio Pardo, onde existia uma débil trégua armada. Um magistrado
já cornbalida pelos atos insensatos'da Câmara dos l)eputados do Rro prudente, compreendendo a delicadeza da situação, requisitou tropas
de Janeiro". "' de linha, e as autoridades locais começaram a fazer investigações que
O novo governador, Antonio liernandes Braga, apoiou-se n«.1 excitaram ainda mais os Farroupilhas. *' As rivalidades entre as famí-
exercito. na Sociedade Militar e na comunidade porluguesa. No lias do Rio Pardo e da província, exacerbavam as tensões. Os Farrou-
princípio, tendo sido amigo íntimo de Bento Gonçal'es, pr()curirvir pilhas procuraram fazer o juiz compreender os perigos que corria se
continuasse com o processo. Nos distúrbios de Rio Pardo estavam
implicados José Mariano, Alpoim, e a importante família Amaral, as-

(ialvão, Rio de Janeiro, 5 de janeiro, 1833; Brito a Mariani, Rio rlc J.ncir.. li de
novenrhro, l8li, AHRGS. nvisos da Guerra.
ií1. []rancisco trr: Lirnu e silva a (l.rlviio, Rio de Janeiro,26 de março, lu.l.l, AilR(;s, 87. BragaaJoãoPaulodossantosBarreto,portoAlegre,14deabril,lg35;idemaJosé
Avisos da (ir,rerra. Fêlix Pereira Pinto Borges, Porto Alegre, 19 de maio, 1835, AHRGS, Cx.7, ne 5l;
ti4. Sebastião llarreto a Brito, Bagé, -J de novembro, 1814, AN. l(;127.1. Brito a Braga, Rio do Janeiro, l l de setembro, 1814, AHRÇS, Avisos da duu..u;
85. Brito a Braga. Rio de Janeiro.22 de março, 1u34, AHRCS. Avisos <ia (iucrra. RC, I, 447; Brito a Braga, Rio de Janeiro, 22 de novembro, tg34, AHRGS, Avisos
da Guerra.
86. (orreio O./Jicial, l8 de julho. t835, ns 6t, p. 4.
88. RC, r,460-46t.
74
75
nuel Macedo Brum da Silveira. Decidiram proclamar um país inde-
sim como os maÇons membros da Sociedade Defensora da Indepen- pendente e concordaram na data da tomada de Pôito Àlegre. "
dência e da Liberdade. Os Farroupilhas acharam necessário fazer uma
outra visita ao juiz, desta vez para matá-lo. Foi dificil encontrar um Com o fito de destituir Braga, Bento Gonçalves viajou pela
substituto, "porque, se um juiz for morto na sala, um outro o será na província, procurando a adesão dos que não estavam comprometi-.
cama".8' Tentando estabelecer um exemplo e demonstrar apoio da dos. No dia l0 de setembro., Marciano Ribeiro e José de Magalhães/
província, o governador empenhou todos os esforços para continuar Calvet, juntamente com Bento Gonçalves, vi§itaram a casa do respei- )
com os julgamentos. Para retardar e pôr ltm a seu prosseguimento, os tado juiz Francisco de Sá Brito. Depois dos cumprimentos, Bento re- , i:
Farrapos roubaram os documentos legais da mala do correio. 'n velou seus planos para a destituição de Braga e de Sebastião Barreto,
-
mas nada disse sobre a independência' A revolução, acrescentou' se-
. Por um momento acreditou-se que as explosões de violência em ria-fáiil, mas não seria levada avante sem antes ser ouvida a opinião
Rio Pardo e nos outros lugares se dissolveriam. Mas os braguistas se de outros. Calvet e Ribeiro ficaram calados, esperando que Brito se
enganaram quanto às paixões e táticas dos Farroupilhas. Com sua manifestasse. Finalmente este se pronunciou contra a revolta. Mar-
volta à fronteira, Bento Golçalves manteve o controle e preparou-se ciano Ribeiro e Calvet concordaram com o raciocínio de Brito, dei-
para a revolução. Braga cometeu o erro cras§o de acusar publicamen-i xando Bento GonÇalves em minoria. Controlando sua raiva, este dis-
ie Bento GonÇalves na Assemblêia da Província de traidor, afirman-
L

se: "Bem, senhores, não se farâ a revolução, mas não ltcarei na


do que Bento Gonçalves e outros tinham dado uma proteção escan- província..." e'Dez dias depois desta encenação, Bento Gonçalves en-
dalosa e Lavalleja, e estavam planejando separar a província e confe-,
trou em Porto Alegre à testa das tropas dos Farrapos. Tinha começa-
derá-la com o uruguai. e' Este ataque somente serviu para apressar al
do a Guerra dos Farrapos.
eclosão da revolta.

Com o recesso da Assemblêia da Província em junho de 1835, Estava claro que os conspiradores não tinham apenas destituídoi
Bento Gonçalves começou a agir rapidamente. No dia l5 de agosto, o governáOorl tinham também assumidtj o poder politico e militar na
encontrou-se em Pedras Brancas, a pouca distância de Porto Alegre, província. Parecia, de fato, que todos no Rio Grande do Sul estavam,
com Zambeccari, José Gomes de Vasconcellos Jardim, José Carlos u pu, do esquema geral da piojetada revolução. O governo central ti-J
Pinto, Francisco Modesto Franco, Francisco Ferreira Leitão e Ma- nha cometido dois erros graves, Em primeiro lugar, mudou da políti-;

;l*'J'f, Hl;ã,:Xfl :lJffi J?:itH:#,l?iJ1.':.::Til:-li


Aandó tropas à província para fortalecer o governador. Segunclo, não\
89. Descrípção da morte do juiz da villa do Rio Pardo, Casimiro de Vasconcellos C'irne na teve perspicácia para ver a importância do gado e das terras uruguaiasl
noute de 24 de abril de 1835, Porto Alegre, 1834, (sic. 1835) em AFRC' Documen- para os rio-grandenses. Quando esta questão vital veio à tona, os Far- \
tos, 1823-1837; Correiô Official, 16 de maio, 1835, np 43 p' l.
90* Braga ao Promotor Público de Porto Alegre, Porto Alegre, l3 de julho. 1835, em
rapos recusaram a açeitar a subordinação ao governo central' O que o \
Correio Official,25 de julho, i835, ns 63, p. l. Rio de Janeiro não conseguira conciliar, a força o decidiria. J
9t. "Relatório de Antonio Rodrigues Braga à assembléia legislativaprovincial no acto
da primeira legislatura" (183s) em Jean Roche L'administration de la province du
Rii Grande do-Sul de 1829 a 1847 (Porto Alegre' l96l), pp. 107-108; Padre Antonio
da Costa Guimarães a Domingos José de Almeida, Jaguarão,20 de agosto' 1835,
VC, XLC.
92. Luigi Nascimbene, "Tentativo d'independenza dello stato del Rio Grande do Sud 9J. Francisco de Sá Brito, "Memória sobre a revoluÇão de 20 de setembro de 1835",
dalúmpero de Brasile offia reflesioni copy storiche per la linea divisoria oriental- em Publicações do Arquivo Nacional XXXI (Rio de Janeiro, 1935)' pp. 238-239'
brasiliana" (MS, 1860) no arquivo de Abeillard Barreto, Rio de Janeiro'
71
76
par dos preços, da taxa de câmbio, dos créditos e do efeito que a polí-
tica exercia sobre suas situações econômicas. Mandavam os filhos es-
tudar direito nas cidades grandes, prevendo corretamente que as ba-
talhas se desenrolariam tanto nos tribunais como nas fazendas.
Os estancieiros da Campanha tornaram-se os porta-vozes das rei-
vindicações políticas e econômicas da província1 gm termos políticos,
as forÇas de oposição eram centristas e separatistas. No Rio Grande
IV
do Sul, os conservadores, que mais tarde, durante a guerra, iriam ade-
rir ao Rio de Janeiro, eram muitas vezes separatistas. Como disse um
conservador-separatista: "o provincialismo mais elevado é a posição
política dominante dos rio-grandenses, qualquer que seja o partido
que eles abracem". " O desenvolvimento da pecuária e o declínio de
outras ocupaÇões reforçaram esse regionalismo, que se manifestou
mais fortemente na Campanha.
AS TERRAS DA FRONTEIRA

om a independência do Uruguai, em 1828, o Brasil perdeu


uma importante parte de seu território e a influência direta, por al-
gum tempo, nos negócios do Prata. A paz que seguiu foi onerosa e
amarga. O Brasil se enredou num emaranhado de questões diplo-
máticas com a Argentina e o Uruguai, culminando, trinta anos de-
pois, com a maior guerra do continente. Esses anos turbulentos foram
parte do legado de 1828. Internamente os líderes brasileiros enfrenta-
vam o descontentamento dos rio-grandenses, que tinham sofrido um
tremendo revés emocional e material.
Duas questões na fronteira, cujas raízes remontavam às conse-
qüências da Paz de 1828, contribuíram para o desenvolvimento do re-
gionalismo no "Continente", como os rio-grandenses às vezes chama-
vam sua província. Sê fosse haver uma regularização da fronteira en-
72. Rodrigo de Souza da Silva Pontes, "Memoria histórica sobre as causas e os aconte- tre o Brasil e o Uruguai, os rio-grandenses achavam que deveriam to-
cimentos que mais immediatamente precederam a sediÇão de 20 de selembro de
1815, na cidade de Porto Alegre, capital da província do Rro Grande do Sul", enr
mar parte na decisão e, naturalmente, ocupar mais terras. Queriam
Publit'açõe.r do Arquivo Nacional XXXI (Rio de Janeiro, 1935), p. 178. voltar a se estabelecer em terras que agora eram uruguaias ou que
t02 103
ainda estavam sob disputa, e tinham a impressão que o governo cen- Brasil tratasse da questão diretamente, sem a Argentina. Montevidéu
tral estava procurando todos os meios para restringí-los, sem levar em e Rio de Janeiro poderiam convocar uma convenção solene, pois a
consideração seus interesses pecuários. De fato, o governo revelou
Argentina estava sempre às voltas com guerras civis, não podendo
que estava pronto a dificultar esta penetração econômica rio- dar atenção às estipulações do Tratado de 1828. O Brasil, porém, não
grandense no Uruguai. Além disso, a atitude dura do governo central
queria ofender os argentinos e fez ver ao Uruguai que não poderia
para com os habitantes da fronteira que davam proteção aos uru-
tratar diretamente desse assunto. 2 Uma atitude mais firme da parte
guaios opositores de Fructuoso Rivera, despertou a ira da província.
do Brasil mostrando à Argentina a possibilidade de tais negociaçôes,
A perseguição movida contra esses amigos uruguaios dividiu a teria talvez trazido o Ministro Plenipotenciário argentino ao Rio de
província em dois campos políticos opostos. Para muitos rio-
Janeiro.
grandenses o Rio de Janeiro estava obstruindo os negócios na frontei-
O Uruguai enviou diversas missões ao Rio de Janeiro, solicitan-
ra.
do o restabelecimento dos limites de 1777 .3 O Brasil, no entanto' pre-
feriu a fronteira mais favorável, estabelecida em 1821, com a aprova-
A Convenção para a Paz Preliminar de 1828, que estabeleceu o
Uruguai como um país tampão independente entre o Brasil e a Ar,. ção do Cabildo de Montevidéu, previamente subjugado; designou,
porém, um coronel do Corpo de Engenharia para levar avante um es-
gentina, não definiu as fronteiras entre o Uruguai e o Rio Grandç do
tudo mais exato da fronteira. a
Sul. O Uruguai queria uma solução imediata que lhe daria mais for-
Ças para continuar a enfrentar a Argentina. o governo brasileiro esta-
O acordo feito em 1828 entre Rivera e Sebastião Barreto, Mare-
ria disposto a concordar, apesar de sua relutância em fortalecer a so- chal de Campo brasileiro, ainda complicou mais os debates. Este
berania da nova nação. os caudilhos rio-grandenses da fronteira que acordo estabelecera, embora sem a sanção oficial, os limites do Uru-
desejavam ter a posse de zonas contiguas para aumentar seu poder, guai no rio Quaraí. Rivera, que acabara de saquear as Missões na fase
preferiam retardar essa solução até que tivesse tido uma oportunida- final da guerra Çontra as Províncias Unidas, concordara em abando-
de de estabelecer uma reivindicação brasileira para essa área. O go- nar Entre Rios zona da fronteira do Rio Grande do Sul compreendi-
verno central precisava do consentimento dos caudilhos para poder da entre os rios Ibicuí e Arapey. ' Os rio-grandenses de Alegrete fica-
agir, porém não reconhecia totalmente essa ambição territorial e a ram satisfeitos com esse acordo que lhes garantia as zonas pastoris do
importância dada à movimentação do gado. Além do mais, conforme Entre Rios.
os termos da Paz Preliminar, a Argentina, e não o Uruguai, seria a Embora a independência uruguaia em 1828 reprimisse momenta-
outra parte contratante de qualquer acordo relacionado com a fron- riamente a penetração rio-grandense na Banda Oriental, as lutas sub-
teira. Buenos Aires, porém, procurava obstruir o processo. sequentes entre Federalistas e Unitários pelo controle do governo
O Brasil procurou a Argentina a fim de discutir os limites do compeliram os rio-grandenses a tomar partido, de modo a favorecer
Uruguai, mas a cada tentativa, em agosto, outubro e dezembro de
1832 e em novembro de 1835, o governo argentino se desculpava, ale-
gando outros problemas urgentes. ' uma fronteira instável entre seus 2. Francisco Carneiro de Campos a Joaquim Soares, Rio de Janeiro, 30 de maio,
dois rivais lhe daria uma vantagem militar. O Uruguai propôs que o 183r, AHI, 27012A1t0.
3. Teixeira Soares, Diplomacia do Império no Rio da Prata (F.io de Janeiro, 1955)' p.
75.
4. Miguel Calmon du Pin e Almeida ao Conde do Rio Pardo, Rio de Janeiro' 6 de
abril, 1830, AN IGl32l.
l. Duarte da Ponte Ribeiro, As relações do Brasil com as repúblicas do Rio da prata de 5. E. F. Sousa Doca, Limites entre o Brasil e o Uruguai (Rio de Janeiro, 1939)' pp.
1829 a 1843 (Rio de Janeiro, 1936), pp. I4, 2l; ponte Ribeiro, Rio de Janeiro, ju- orientais do Uruguai,2 vols. (Porto
2}l-2ll Aurélio Porto, História das missões
nho de 1844, AHI 270/215. Alegre, 1954), II, 396-398.
104 105
seus interesse§ pecuários. Incentivando t,
revoluções no uruguai, geral-
menté aumentavam o fluxo de gado para Depois da independêgc-la _q-r-Bglqia o governo proibiu os rio_
as províncias meridionais
brasileiras, permitindo u-u o"ufuçâo mais granãêriie§'de.lévar o gado parã ôí[áis"r espanhóis vizinhos, provo-
racit oo ruJã uiuLr"io au
fronteira' u Depois da paz de r gig, os rio-grandenses cando a ira dos estancieiros ultrajádos e tiazendo petições puru u
procuraram res-
tabelecer suas posições econômicas e continua.u- mesa do governador, AIém disto, os rio-grand"nr", ,ão tinham per_
u .ã-pru,
dar terras no uruguai e a fazer alianças políticas
e militares "-u*"n-
com os
missão de engordar ou criar gado nas excelentes colinas do uruguai.
uruguaios. Estavam, porém, encontrand; Contudo, diante das pressões locais, o governador apoiou o,
barreiras io. ,"u
de Rivera. ";;rã;
própriogoverno e pelo governo uruguaio cieiros que escreveram à corte dizendo que a continuãção desse "rtur_
M-esmo alrim, o em-
estancieiro da fronteira, usando u pít" bargo ao gado destinado ao mercado "atacava a liberdade do comér-
mais maleáv"f iu pãprf"çao,
o gaúcho cÍuzava bravamente a fionteira. ciot'. "'
Um dos problemas mais urgentes dos caudilhos
rio_grandenses o fato do governo subestimar o senso de independência dos es-
era o "restaberecimento das estâncias arruinadas,, tancieiros, mesmo conhecendo as notórias intrigas durante a guerra
no Rio õruro" ao
Sul e no novo país, o Depois da paz,começou quase imedia- de 1825-1828, foi fatal para a paz interna. um dos grandes proú"-u.
.Ur.uguai-
tamente a entrar capital na Campanha. ,^Assim, pÉ.ror".àno, com que se defrontaram os generais do exército regular braiileiro du-
olhando com otimismo para as condições
na Banda"ÀOriental, muitos" rante o conflito, foram os apelos sedutores feitos aos coronéis rio-
'rio-grandenses começaram a voltar às suas velhas terras. João da Sil- grandenses pelo exército dos orientais. Em suas "Memórias" o vis-
va Tavares, juiz de direito no distrito
gado, animais (cavalos e_burros) e alguns
;;;i".;;ã#;#; ,r, conde de são Leopoldo conta que o Ministro das Relações Exteriores
escravos... que tinha numa e o Imperador se deram conta da necessidade de terminar a guerra
estância nessa província (Uruguai)" ,tonfianao "para se atalharem os planos subversivos e as maquinações paia agi-
nu ,ou por,iio^" nu,
':
riquezas que tinha em outros lugares, silva Tavar", .ffiáiirou u tar o país e sobretudo o Rio Grande.,',,Os generais, temendo uma
' mesma estância
no início da décúa aá rg:0. um outro líder duplicidade de lealdade, combateram as promessas dos orientais,
influente e amigo intimo de Bento Gonçalves, militar
AIbano d.oliveira, soli_ concedendo favores especiais aos influentes oficiais de cavalaria. Du-
citou ao imperador, em r.g29, dispensa por rante os períodos calmos, Bento Gonçalves, por exemplo, recebeu
um ano do serviço militar
para reorganizar ou vender suas duas fázendas permissão para ir cuidar da segurança de seu gado. ,2 Terminada a
na Banda oiieniar. o
Comandante de Armas português aconselhou guerra' foi forçado a negar que suas manobras militares tivessem fa-
o go""rruáo.'r'rru.
sua influência e indeferir o pedido, baseando vorecido seus interesses pessoais. como prova, declarou ..é haver eu
tramas da guerra rio-grandense. Albano,
,r, oliniao ._ ."1"n,.,
disse o^coÀarã"riã, ,,r" perdido perto de 15.000 rezes de minhas fazendas da província cis-
tornara mais súdito daquele governo, do que platina quando estava com força na fronteira, e podia salvá-las, se me
do [mpério,,. e
propusesse a fazê-lo-" r3 Mas os que conheciam Bento Gonçalves ti-
6' Thomas Antonio de viranova portugal ao nham suas dúvidas. Diziam que era verdade que "teve estâncias no
Marquês de Aregretq, parácio da Real
Fazenda de Sanra Cruz..30.de rurço] isl8.
ÀHfri;s, eriro-, ã.;'ê"""rr", iárr"_
ao conde de Lases;po;toÀr"e*, io a"irrr,o,lãzi,
!;:#;ry*"1 eüi.tilcr.
7' Maciel a Gustavo Henrique Brown, Aregre, r l de outubro, l g27; Macier ao 10. Caetano Maria Lopes da Gama ao Marquês de Caravellas, porto Alegre,
2 de ja_
visconde de Laguna, porto Alegre, 7_porto
a" á"*riü.L, 1827, AHRGS, cx. 47, nç 90; neiro, 1830, AN. IJJ945l.
Maciel a Joaquim d'oliveira, pJ.to er"gÃ,1i'à-"
i"uio, 1829, AHRGS, cx. 39, no ll. RC, I, 124.
12. Julian Laguna a Martin Rodrigues, salto, 14 de dezembro, r g25, em
8. Jornal do Commercio,4 de janeiro, 1g37, Vol. Corresponden-
XI, nc 3, p.2. cia militar del arto r825,-2 vors. (Montevideo, 1932-1935),il; rlma trrt"^iíir'o*-
, lar,. contribuição para a história da guerra ente o Brcisir á'Bunor,lr*i§ã"
}t,l[tr:Iii,I".oj,ffi:"?nyu",",, e. G. em porto Aregre, 12 de jurho, r82e, 1946), p. 278.
i;"rr.,
106 13. O Amigo do Homem e da pátia,20 de julho, 1g30, nc l3g. pp. l-2.

107
estado Oriental, no Departamento de Serro Largp... mas não sofreu
e-le,nenhum prejuí2o." Bento Gonçalves tinha uÀ3 fazenda em socie- inimigo. Bento Gonçalves, aliado e protetor de Lavalleja, defendeu os
dade com Albano d'Oliveira e outra com Boayçntura Rodrigu ezBar_ direitos dos rio-grandenses no Uruguai de voltar às suas propriedades
los_. vendeu a primeira a Hyporito reriãndez-Êassos ou vendê-las. r' Rivera continuou a retirar o gado, expropriar terras
.9e-f êà õu irmão perto da fronteira e distribuí-las entre os uruguaios.
IvÍanóel Gonçalves da silva, e-a segunda a seu sócio Barcellos. ,.
A medida que a causa de Lavalleja ganhava ímpeto no bastião de
oslideres políticos uruguaios compreenderam imediatamente Bento Gonçalves, o Jaguarão, crescia o contrabando através da fron-
que não podiam impedir os rio-grandenses de retornarem e se instala-
teira. Os rebeldes orientais, opositores de Rivera, trocavam gado rou-
rem dentro de suas fronteiras. euando havia desordens civis os brasi-
bado por armas, munições e homens. As ordens que chegavam de
leiros acorriam em número sempre crescente para as zonas pastoris
e Porto Alegre proibindo a exportação de armas e o tráhco ilegal de
pouco populosas do uruguai setentrional. os caudilhos uruguaios
ti- gado pelo Jaguarão, não conseguiam deter este comércio. rB Serrito,
nham, portanto, grande interesse em manter acordos ã, fideres grande centro de contrabando, cresceu de importância à medida que
"o-
rio-grandenses da fronteira, cuja ajuda lhes seria muito útil em çaso Lavalleja e Bento Gonçalves reafirmavam sua aliança. Os roubos de
de futuros tumultos. Muitos uruguaios eram mais do que complacen-
gado nesta zona aumentavam ainda mais o fluxo. Em 1832, mais de
tes. Por sua vez, muitos rio-grandenses tinham pur"ni"."o p*
30.000 cabeças foram contrabandeadas pela fronteira de Serrito, mui-
mento com os uruguaios; estes reataram relações econômicás com "uru-
os tas delas por intermédio de Bento Gonçalves. Os exilados uruguaios
rio-grandenses, colocafldo anúncios nosjornais locais para vender
ou achavam sempre muitos rio-grandenses prontos a segui-los em suas
arrendar os melhores pastos de inverno. continuavam assim os
brasi- incursões no Uruguai. Lavalleja prometeu que todos os brasileiros
leiros a possuir terras na Banda oriental, muitas vezes em sociedade
que o ajudassem em seu empreendimento e que possuíssem terras na
com os uruguaios.t5
Banda Oriental receberiam imediatamente após a guerra título de
Fructuoso Rivera, o esperto presidente uruguaio, estava aumen- posse; e os que não possuíssem, seriam recompensados por seus servi-
tando o controle em 1832, mas não estava em posição de impedir a
ços com terras pastoris, de acordo com seu posto." ', Lavalleja pro-
penetração rio-grandense, embora pudesse usá_la para seus pióprios
metia facilmente o que não tinha.
Íins políticos. um de seus agentes no Rio Grande do sul tinhà
autorl-
zação para "poder ele passar escritura afiançando com os terrenos,' No dia 29 de setembro de 1832, Lavalleja e seu exército recente-
em troca de gado rio-grandense, que era facilmente conveúido mente derrotado entraram em território brasileiro. Seu velho amigo e
em di-
nheiro. 16 Fructuoso estava cor.rseguindo assim apoio uo torgo aliado, Bento GonÇalves, Comandante da Fronteira do Rio Grande
Ju
fronteira para contrabalançar a influência que seu rival, Juan Ánto- do Sul, acolheu a tropa de 500 homens cansados. ,n O governador do
nio Lavalleja, gozava entre os brasileiros desta zona. No final de
1832, Rivera começou a confiscar e a vender gado e terras
de Lavalle-
ja. correu a notícia que estava também conliscando gado
o dos resi- 17. O Noticiador, 19 de novembro, 1832, nç 90, p. 369; Bento Gonçalves a Rivera,
dentes brasileiros na Banda oriental que eram simpatizantes Campo, 30 de setembro, 1832, e Rivera a Bento Gonçalves, Jaguarão, 30 de se-
de seu
tembro, 1832, em Noticiador, l5 de outubro, 1832, nc 80, pp. 329-330.
18. Galvão a Thomas Rodrigues Pereira, Porto Alegre, 13 de outubro e 15 de de-
zembro, 1832, AHRGS, Cx. 60, nc 155.
14. Pequena biográfia de Bento Gonçalves da 19. José Joaquim Leite de Castro a Joaquim Manoel deAzevedo, Bagé,26 de abril,
Silva, AHl,25j/2.
15. ONoticiador,2gdemarço, lg32,nç22,p.92;ONoticiador, 1832, AHRGS, Cx.45, maço 29a; João Ignácio d'Oliveira a Joaquim José dc
p. I t6. 13deabril, 1g32,np24, Araújo, Serrito, 20 de outubro, 1832, AHRGS, Cx. 45 maço 29a.; Lavallcja a José
l6' Manoel Joaquim de Armeida a Estanisrau José Freitas,
Antoriio Martins, Cuareim,20 de abril, 1834, em Jornal do Commercio,26 de julho,
Alegrete, 22 de aúrr, 1E32, 1E34, Vol. YIII, nç 164, p. l.
AHRGS, Cx. 45, março 29a.
20. O Continente,T dejaneiro, 1833, nç 2,pp.7-8; Rivera a Julian de Gregório Espino-
108
109
Rio'Grande do sul, Manuel Antonio Galvão, a 9 de outubro de 1g32, como um aliado melhor do que o imprevisível Rivera. Depois do re-
seguindo as instruções do Conserho Geral, corpo consultivo do go- vés, desfez seu compromisso sob a alegação de não-interferência,
verno da província, deu ordens a Bento Gonçalves para conduzir La- substituindo-o por uma política de estrita neutralidade . 2n Com a saí-
valleja e seus oficiais à capital e desarmá-los. ,, Bento cumpriu a pri- da de Lavalleja da província e o desbaratamento de suas tropas, o go-
meira parte, mas permitiu que os orientais levassem ,uu, ur-u, verno estava cumprindo seus compromissos internacionais. Também
valos. Em Porto Alegre Galvão apresentou duas alternativas ao " "u- estava se sentindo mais seguro, pois Lavalleja tinha ligações com os
cau-
dilho uruguaio. Era óbvio que ele não poderia continuar na provín- argentinos, o que por si só já levantava as suspeitas brasileirasãe uma
cia; iria ou para uma outra provincia brasileira ou para Buenos Aires. possível influência argentina no Rio Grande do Sul. Tanto Rivera
Lavalleja escolheu Buenos Aires. sua decisão final de ir por via marí- Çomo o governo central brasileiro, temerosos de um eixo Lavalleja-
tima agradou ao governador, que tinha demorado em àar consenti- Rosas-Gonçalves, estavam tomando as mesmas precauções. O Rio de
mento para que seguisse por terra. Mas antes de partir, Lavalleja, Janeiro seguia com atenção os novos preparativos de Lavalleja em
Bento Gonçalves e o padre caldas entraram em contato com sçus Buenos Aires, mandando seu Chargé d'Affiires no Prata "observar e
amigos na fronteira e em porto Aregre e reafirmaram seus propósitos investigar, usando todos os meios a seu dispor". "
de revolucionar o Rio Grande do sul. segundo Garvão, Os homens de Lavalleja agiram com tanta eficiência que tiveram
us ôoruicçõe,
de Lavalleja não tinha mudado, tinhamie fortalecido: ..ele desejava boa acolhida na fronteira. Bento Gonçalves continuou a fingir anuên-
vingança". " cia a todos os pedidos e ordens da capital, recebendo elogios do go-
Por algum tempo, de l83l até a derrota de Lavalleja em 1g32, vernador. Enquanto os refugiados estivessem concentrados na fron-
o
Rio de Janeiro tinha dado hospitalidade ao general exiládo e sua teira, Lavalleja teria um trampolim para o Uruguai. Apesar dos rela-
tro-
Pâ, "o que é característico da generosidade da nação brasileira,'. tôrios de Bento Gonçalves, a Regência sabia que os orientais ainda
Mas
diante desse revés, o governador recebeu instruções para tomar estavam muito fortes. Em caso de uma outra grande tentativa militar
todas
as precauções para que o asilo dado aos refugiadoi nâo da parte de Lavalleja, o governador da provincia tinha autorização
servisse ou
parecesse servir de apoio às futuras tentativas de para usar todos os meios a seu dispor para defender a fronteira, che-
Lavalleja. Tendo
em vista informações secretas e a ida de Lavaileja para Bue-nos gando mesmo a incluir a milícia e os civis nas tropas de linha.'?6
Aires,
o Ministro da Guerra, que tambérn era rio-grandense, mandou novas Já sobrecarregada com inúmeros problemas a Regência não po-
ord-ens para dispersar os refugiados que ainda estivessem dia arcar com uma guerra com o Uruguai, que levaria à perda da
na frontei-
Fa. " província do Rio Grande do Sul. Impedindo as incursões dos orien-
tais baseados no Rio Grande do Sul, o governo afastaria a oportuni-
ficando. Antes da aventura de lg3i, o governo dade de uma invasão uruguaia. Rivera, tal como anteriormente La-
"oníid"ruu.i""urr":, valleja e Artigas, tinha um interesse especial no Rio Grande do Sul. "
O Rio de Janeiro, portahto, não queria dar ao presidente uruguaio
um pretexto para o ataque.
sa, Yaguaron Chico, 3 de outubro, 1932, em ..Correspondencia
del general Fruc-
tuoso Rivera con Jurian de Gregório Espinosa", Reiista Históri.olxxiv
(0"-
zembro, 1964)
21. Sessão do Conselho Administrativo, porto Alegre, g de outubro,
1g32, AN,
IGI 170. 24. Brito a Galvão, Rio de Janeiro, 3 de novembro, 1832, AHRGS, Avisos da Guerra.
22. Galvão a Brito, Porto Alegre, l3 de outubro e 3 de novembro, 1g32, 25. Brito a Silva Lisboa, Rio de Janeiro, 22 de janeiro, 1833, AHI, 2991213.
AN, IGI lZ0.
23' Nicolas Pereira de camposyergueiro a Galvão, Rio de Janciro, 26. Brito a Galvão,23 e25 de janeiro, 1833, AHRGS, Avisos da Guerra.
3 de novembro,
1832, AN, IJJ925; candido FerÃira a pedro de Araújo 27. Galvão a Campos, Porto Alegre, lç de agosto, 1832, em Silva Lisboa a Brito, Rio
t-ima, s;enos Â."r,'ia a"
outubro, 1932, AHt, 2OS/2/ tS. de Janeiro, 26 de setembro, 1832, AN, IGl32l.
ll0 lll
Diante das notícias de traição e da correspondência diplomática Lavalleja nos negócios da fronteira. " Por isso os nacionalistas libe-
agressiva do governo uruguaio sobre a proteção e apoio dados por rais resignadamente declararam sua política ultrapassada. Desde o
Bento Gonçalves às atividades hostis ao Uruguai, a Regência viu-se princípio o governo deveria ter negado asilo a esses "orientais indig-
forçada a reavaliar sua posição. 2* sempre cauteloso ao tratar com os nos de confiança" e seus aliados brasileiros, que criminalmente inter-
caudilhos rio-grãndenses, o governo reformulou sua velha estratógia. leriam na política interna do Uruguai. 33
Lavalleja, juntamente Çom os rio-grandenses, estaua planejando um Em abril de 1833, os oficiais de Lavalleja baseados no Rio Gran-
g.lpe mais ambicioso para o qual necessitava de uma avaliação mais de do Sul fizeram uma incursão na Cisplatina, capturando, por algum
cuidadosa da importância e influência de Bento Gonçalves. O gover- tempo a ciciade de Melo. Muitos brasileiros faziam parte das forças
no continuou a cortejar as boas graças de Bento Gonçalves, mas mo- de ataque, inclusive elementos do regimento de milícia de Bento Gon-
dificou sua posição liberal quanto aos direitos internacionais. se os çalves. " Mas o General Rivera, já em campo, forçou os rebeldes a re-
refugiados abusassem da hospitalidade brasileira a Regência teria troceder através da fronteira. Não houve uma grande ofensiva e Rive-
todo o direito de negar-lhes proteção. o governador decidiu por con- ra ficou mais firmemente entrincheirado do que nunca. Depois dessa
ta própria transferí-los para Torres, cidade na costa do Atlântico, a vitória, Rivera generosamente traçou um acordo na fronteira com o
fim de invalidar essa mudança de política. 2, Como no passado, os re- Comandante de Armas da província, Sebastião Barreto. As novas
fugiados permaneceram onde estavam. disposições de como os refugiados seriam tratados satisfizeram Rive-
Em fevereiro de 1833, sem informações precisas, o governo aler- ra. " As relações melhoraram, em grande parte devido à palavra de
tou o governador para o tratamento a ser dispensado a Bento Gon_ Sebastião Barreto. O governador garantiu ao Rio de Janeiro que o
çalves. 3u O Rio de Janeiro estava num dilema. Tudo indicava que os
Brasil nada tinha a temer do presidente da República do Uruguai.
brasileiros estavam ajudando Lavalleja. r Havia muita preocupação Quanto a Bento GonÇalves, disse ele, medidas severas para reprimir
com o excesso de autoridade na.fronteira, impelindo o Brasil para seu apoio aos rebeldes não eram mais tão importantes como no pas-
uma guerra. As acusações públicas contra os líderes da fronteira cor- sado, visto que a resistência ao regime de Rivera estava em declínio.
riam o risco de aliená-los seriamente. Era mais do que evidente que o Um processo contrâ ele serviria somente para excitar o ressentimento
governo central tinha e sempre teve pouco controle sobre eles. Final- de seus partidários. O poder de Bento Gonçalves originava-se não so-
mente, os ministros chegaram à conclusão que era melhor continuar mente de sua influência sobre a parte setentrional da fronteira como
em boa paz com Bento Gonçalves. porém, à medida que as notícias "também do prestígio adquirido nas guerras passadas". A província,
da província e a correspondência apreendida ia cheganào a seus gabi- escrevia o governador, "ao contrário de tantas outras no Império, es-
netes, ficaram visivelmente perturbados com o grau de infiltraçáo de tâ em paz". No entanto, advertiu, havia "muitos elementos contra
ela". 16 Bento Manuel, que ajudara Lavalleja no passado, agora coo-
perava com Rivera. O presidente uruguaio acreditava que "não havia

2&. Ánais da câtnara. lp de iunho, 1833 (sessão secreta), correspondência de santiago


Vasquez a Silva Lisboa, Montevideo, 30 de dezembro, tA32.
29. silva Lisboaa Brito, RiodeJaneiro,30dejaneiro, 1833,AN, IGl32l;Britoasilva
Lisboa, Rio de Janeiro, 8 de fevereiro, 1833, AHI, 2gg/2/3. 32. Almeida Vasconcellos a Silva Lisboa, Montevideo, 14 de fevereiro, 1833, AHI,
22214/2.
30. Vergueiro a Galvão, Rio de Janeiro, 20 de fevereiro, 1g33, AN, IJJ925.
31. José Antonio caldas a Lavalleja, Jaguarão,4 de janeiro, 1g33,
33. Brito a Silva Lisboa, Rio de Janeiro, ll de março, 1833, AHI, 29912/1.
"- Almeida AHI,
concelos a silva Lisboa, Montevideo, l4 de fevêreiro, 1g33, (reservado),
vas- 34. Sebastião Barreto a Brito, Bagé, 5 de setcmbro, 1E34, (relatório), AN, lGl273.
2221a/2; Candido Ferreira a Silva Lisboa, Buenos Aires, 2 de màrço, 1833(em có- 35. Ibid.
digo); idem a idem,Buenos Aires,28 de março, 1g33, AHI, 2OSi2l15. 36. Galvão a Carneiro Leão, Porto Alegrc, 13 de abril, 1833, AN, IJl847.
tt2 n3
nada a temer dessa família (Ribeiro)". " O Rio de Janeiro se conteve e vam os postos militares uruguaios. " A difícil coexistência entre os
não reavivou a questão da invasão do território do Império pelas for- brasileiros e Rivera ameaçava se desintegrar. À medida que os orien-
rt
ças riveristas. Desse modo, a Regência contribuiu para relaxar as tais invadiam a fronteira, a paciência de Rivera se esgotava. Bento
tensões. Gonçalves requisitou armas e equipamentos da capital para defendel
Durante quase um ano a questão dos refugiados, embora não es- a província contra.um possível ataque de Rivera, n' assim como para
quecida, chamou pouca atenção. Bento Gonçalves foi e voltou do Rio seu próprio uso no futuro. A situação, diziam as autoridades da fron-
de Janeiro, onde convincentemente cxpressou sua lealdade. De tem- teira, estava se tornando perigosa, com a proximidade das tropas uru-
pos em tempos, ele e Lavalleja entravam em contato. Apesar dos ar- gui.ias. De um lado parecia que Bento Gonçalves estava tentanto le-
gentinos não terem cumprido suas promessas e do apoio limitado dos var as duas nações à guerra, mas havia'também a possibilidade de que
rio-grandenses, Lavalleja entrou no Uruguai ainda uma vez em 1834, estivesse construindo seu próprio exército. Já controlava unidades da
com o intento de destituir Rivera. Na batalha de Yaraó, a l5 de maio Guarda Nacional em quase toda a província.43
de 1834, essa figura da independência uruguaia que tinha sido tão po- O governo central começou a agir energicamente. O Ministro da
pular, sofreu uma tremenda derrota. 3e Guerra deu ordens para repelir qualquer tentativa de invasão por par-
Desordenadamente, Lavalleja e alguns soldados cruzaram a te de Rivera, ao mesÍno tempo que recusava asilo a Lavalleja. O Co-
fronteira. Bento Manuel desfraldou a bandeira brasileira e, contra as mandante de Armas permaneceria na fronteira com tropas suftcien-
ordens de Sebastião Barreto, permitiu que os refugiados conservas- tes. oo Os brasileiros que tinham tomado parte nas incursões seriam
sem suas armas e seguissem em direção ao sul para as terras de Bento punidos conforme a lei e as autoridades da fronteira que negligencias-
Gonçalves, em vez do interior da. p.rovíncia. O governo brasileiro sem seus deveres estariam sujeitas às medidas disciplinares.
a5
Braga, o
acreditava que Lavalleja tivera o apoio de Rosas e de outros caudi- governador da província, inspecionou a fronteira, procurando dissol-
lhos argentinos nessa desastrada revolução. Feliz com a vitória, Rive- ver os grupos leais a Bento Gonçalves e fez lembrar ao governo uru-
ra recebeu garantias de que seus amigos no Rio Grande do Sul come- guaio a gravidade da situação. a6 Instalado do outro lado da fronteira
çariam em breve a limpar a irea. ao com 2.000 homens, Rivera achou essas medidas do governo fracas de-
Entretanto, Lavalleja, teimosamente otimista, juntamente com mais para conter os refugiados e ameaçou resolver o problema pela
Bento Gonçalves, continuou a invadir a Cisplatina. Ao longo de toda força. A notícia de que Rivera tencionava invadir o Brasil causou sen-
a fronteira do Jaguarão os brasileiros e refugiados uruguaios ataca- sação no Rio de Janeiro. O Ministério tentou acalmar o povo envian-
do aos jornais notícias selecionadas. Os nacionalistas estavam pron-

37. Rivera a Gabriel Pereira, Durazno, 5 dejulho, 1833, em Pereira, Correspondência,


r- 287-288. 4t. Joaquim José Rodrigues Tôrres a Bernardo Pereira Vasconcellos, Rio de Janeiro, 5
38. Silva Lisboa a Almeida Vasconcellos, Rio de Janeiro, 2 de setembro, 1833, AHI, de abril, 1839, em Braga a Brito, Porto Alegre, 23 de junho, 1834, AN' IJ1847.
23314110. 42. Brito a Braga, Rio de Janeiro, 9 de julho, 1834, AHRGS, Avisos da Guerra.
39. Candido Ferreira a Silva Lisboa, Buenos Aires, 30 de maio, 1833, AHI, 2O5/2llS. 43. Joaquim Vieira da Cunha a Braga, Jaguarão, 1l dejunho, 1834, AN, IJl847; José
40. Candido Ferreira a Silva Lisboa, Bucnos Aires, 20 de março e l7 de abril, 1834, Catr,lâ a Gabriel Pereira, Sandu, 28 dejunho, 1834, em Pereira, Correspondência,
AHl,205/2115; Lavalleja a Bento Manuel, Costa del Guaray, 26 de março, 1834, III, 183-184.
em Mariani a Brito, Porto Alegre, l5 de abril, 1834, AN, IGI lZ0; Bento Manuel a 44. Brito a Braga, Rio de Janeiro, g de julho, 1834, AHRGS, Avisos da Guerra.
Rivera, Alegrete, 5 de abril, 1834, eà Almeida Vasconcellos a Coutinho, Montevi- 45. Coutinho a Almeida Vasconcellos, Rio de Janeiro, l0 de julho' 1834' AHI,
deo, 20 de abril, 1834, AHl,22ll2/9; Almeida Vasconcellos a Coutinho, Montevi- ?3llalrc;Coutinho a Braga, ll de julho,2l (reservado), AHl,3l0l2l12;317 llll.
dén,24 de março, 1834, em Coutinho a Brito, Rio de Janeiro, 16 de abril, 1834, 46. Joaquim Vieira da Cunha a Braga, Jaguarão, 12 de agosto, 1834, em Jornal do
AN. IGI32I. Commercio, 17 de outubro, Vol. Vlll, rtc 227 p. l.
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tos para mandar a frota bloquear Montevidéu, e pediram um imedia-
to aumento dos contingentes de mar e tcrra. a? deria "levar a província aos horrores de uma guerra civil,'. Em 1g33,
Nos últimos dias de setembro de 1834, Rivera abandonou a o governador solicitou eneçgicamente ao governo. imperial que consi-
ameaça de guerra quando derrotou'Lavalleja em Tres Cruces e con- derasse seriamente a "questão da fronteira da Banda oriental", devi-
cluiu um acordo definitivo com Sebastião Barreto para evitar a guer- do ao interesse dos rio-grandenses pelas terras uruguaias. Rivera "se
ra. A milícia uruguaia que tinha sido chamada para uma emergência, opunha firmemente à incorporação federal" do Uruguai à Argentina
foi dissolvida e Rivera se preparou para voltar à capital. aB Levando o e sinceramente desejava a proteção do Brasil. Suas relações pouco
Brasil à beira de uma guerra, Éivera fortaleceu a posição das autori- amistosas com a Argentina deixavam-no em desvantagem nos deba-
dades de província e estimulou a Regência a tomar uma decisão con- tes sobre os limites. No Rio Grande do sul alguns elementos clama-
tra os refugiados uruguaios e sua própria populaçâo desleal da fron- vam por uma intervenção armada na Cisplatina. 5, Lavalleja e Rivera
teira. Foram dadas ordens para perseguir os refugiados, embora mui- tinham conseguido levar o conflito entre Federalistas e unitários até
tos continuassem à solta. o' ao Brasil.
Dessa vez, quando as autoridades da fronteira desafiaram a lei Nestes dias tensos, o boato de que Rivera tencionava estabelecer
que tinham jurado cumprir, o governo da provincia abriu uín proces- os limites do Uruguai no rio Piratini aumentou o medo dos rio-
so. 5o Sebastião Barreto transferiu Bento Manuel e suspendeu Bento grandenses.'2 A guerra surgia como uma possibilidade, quando, de
Gonçalves dos respectivos comandos da fronteira. Embora Lavalleja te mpos em tempos, Rivera e suas tropas se aproximavam da fronteira
continuasse a crvzar a fronteira, seus partidários desapareceram no do Rio Grande do Sul, no início da década de 1830. Em 1834, numa
interior. Sua única estratégia possível era uma campanha de guerri- manobra que enfureceu Bento Manuel e os residentes de Alegrete, Ri-
lhas, mas atê para isto lhe faltavam soldados e suprimentos. vera distribuiu terras entre o Arapey e o Quarai a 600 militares uru-
Os governadores do Rio Grande do Sul tinham gasto muito tem- guaios recentemente desligados da tropa. 53 Ele estava finalmente pla-
po com esta intrincada operaçâo de controle às atividades de Lavalle- nejando negociar independentemente com o Brasil. Essas terras eram
ja. Não somente vagabundos e malfeitores rio-grandenses, mas tam- utilizadas pelos residentes de Alegrete paÍa a engorda de seu gado.
bém membros importantes da população da fronteira estavam to- Quando Bento Manuel estava rio comando da fronteira, em 1821, os
mando partido na política interna uruguaia, ameaçando as relações limites seguiam os termos da Convenção feita entre o Brasil e o Cabil-
diplomáticas entre o Brasil e o Uruguai. Segundo as palavras de um do de Montevidéu. Mas. quando Rivera fundou uma colônia de
governador, qualquer mudança de posiç'ão no Rio Grande do Sul po- índios em Bella Union, depois do episódio das Missões, era perigoso
mandar o gado para pastar lá. Bento Manuel tinha recebido ordens
depois de 1828 para ecupar as terras ao longo do Arapey, mas ordens
subseqüentes o impediram de continuar ocupando essas terras. io Os
47. Coutinho a Almeida Vasconcellos, Rio de Janeiro, li de setembro, 1934, AHI,
??1l4ll0; idem a idem,23 de setembro e 29, 1834, e ll deoutubro, 1834, AHI,
22114110. Brito ao Governador da paraíba do Norte, Rio de Janeiro, 2 de ou-
tubro, 1834, AN, IGl358.
48. Rivera a sebastião Barreto, Çuaró, 8 de outubro, 1834, em BaÍreto a Brito, Bagé, 51. Galvão a Nicolau Pereira de Campos Vergueiro, porto Alegre, l7 de junho, 1g33,
20 de outubro, 1834, AN, lGl273. AHr,3N12lt4.
49. Brito a Braga, Rio de Janeirá, 2l de novembro, I g34, AHRGS, Avisos da Guerra; 52. O Noticiodor, l0 de maio, 1834, nr 231, pp. 949-951.
Braga a João da Silva Tavares, Pelotas, 23 e24 de novembro, 1g34, AHRGS, Cx. 53. Braga a Bento Manuel Ribeiro, Porto Alegre, l4 dejulho, 1g34, AHRCS, Cx
34, nc 157. ns 156.
50. Braga ao Promotor da villa Jaguarão, Porto Alegre, 25 de abril, 1g35, em correio 54. Bento Manuel Ribeiro à Prefeitura de Alegrete, l0 de março, 1g35, em Almeida
Official,2 de maio, t835, nç 39, p. 2. Vasconcellos a lgnácio Borges, Montevidéu, 29 de março, lg36 (cópia), AHI
ll6 221 l2/e.
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rio-grandenses vinham deixando aos poucos suas fazendas em Entre à solicitação de mais informaÇões ou documentos sobre as terras em
Rios, recuando para a margem direita do Quaraí. Entretanto, em disputa Í-eita à Preleitura de Alegrete e que seriam enviadas ao Char-
1834, a destruiçãt) da colônia índia por Rivera abriu de novo as terras gé d'A//àire.ç brasileiro em Montevidéu, aÍirmando que desconhecia
à ocupação dos orientais e rio-grandenses. Quer tenha ocorrido se- qualquer documento classificando estas terras como neutras. O go-
gundo um plano ou não, os indios conservaram as terras nominal- verno imperial continuou a instar com a Argentina para nomear um
mente dentro da órbita do governo uruguaio. A ocupação uruguaia plenipotenciário para vir ao Rio de Janeiro. Em Buenos Aires, o
causou divergência interna dentro das províncias brasileiras. Mas esta ('hargé d'A.//'aire.s brasileiro alirmou claramente que o Brasil não ti-
pequena pressão exercida contra o flanco meridional fraco do impé- nha intenções de anexar o território uruguaio e que uma concordân-
rio, produziu uma coesão entre os uruguaios e despertou seu naciona- cia pronta com o Tratado de l82tt contribuiria para a independência
lismo. Não consideravam noutras as terras, já que não haviam nenhu- do Uruguai. :8 Buenos Aires continuou a responder com subterfúgios,
ma convenção ou tratado designando-as como tal. esperando o dia em que a Cisplatina pertenceria às Províncias Unidas
Bento Manuel, o principal caudilho de Alegrete, imediatamente . da Argentina, pois que, se atendesse às reivindicações de Rivera, re-
informou o governo da província sobre os planos de redistribuição de tardaria esta incorporação tão desejada. Os rio-grandenses não gosta-
terras de Rivera. Os veteranos das guerras Cisplatinas que tinham re- ram desta demora e tinham medo de que a diplomacia do governo
cebido terras em Alegrete e nas suas vizinhanças, eram destemidos e central acabasse passando por cima de seus interesses.
queriam ação. Além do mais, julgavam-se alvo das injustiças da fron,
teira e achavam que enquanto os uruguaios permaneÇessem aí, o futu- A dúvida sobre as terras limítrofes com azona de Bento Manuel
acentuou-se com o relatório de Sebastião Barreto sobre os limites me-
ro das terras estaria em perigo. Os alegretenses atravessaram o rio
ridionais do Brasil em lti35. O governo tinha pedido sua opinião, pois
para se estabelecer nas terras sob disputa. As autoridades locais que
eÍa na ocasião o Comandante de Armas da província e tinha feito o
tinham ordens para impedir este movimento nada fizeram, e lembra-
acordo com Rivera em 1828. A julgar pelos relatórios da província
ram aos funcionários da capital da província que a Constituição de
que chegaram à Corte, Sebastião Barreto era o rio-grandense mais
I 824 havia sancionado o direito do cidadão de deixar a nação levando
chegado politicamente a Rivera. Antonio Fernandes Braga, governa-
seus bens.55
Aureliano de Sousa e Oliveira, Ministro das Relações Exteriores,
dor da província e também conservador como Sebastião Barreto,
instruiu o C'hargé d'AJJ'aires brasileiro em Montevidéu para protestar concordou com a avaliação que este fizera das fronteiras que seriam
melhores para o continente, e que estranhamente circundavam as ter-
contra a distribuição de terras "que não pertencem à República (do
ras pastoris do próprio Sebastião Barreto em Taquarembó. O Co-
Uruguai)..." 56 Enquanto isto, o Brasil continuava a juntar a docu-
mandante de Armas estava mais do que disposto , para a segurança da
mentação sobre a questão da fronteira, apesar das nuvens ameaÇado-
província, a retirar as reivindicaÇões do Brasil à região de Arapey-
ras de revolta, acreditando que estava próximo o momento das dis-
cussões com os recalcitrantes argentinos. s, Bento Manuel respondeu Quarai, em troca de uma extensão do Brasil pela região norte-centro
do Uruguai. Estrategicamente era melhor situada para a defesa e para
o comércio, tendo uma população brasileira já bem definida. Taqua-
rembó seria uma peça importante nas futuras negociações. 5e
55. Braga a Jozé Antonio Martins, porto Alegre, 24 de julho, 1835, AHRGS, Cx. g6,
nç 158.
56. Aureliano de sousa e oliveira coutinho a Almeida Vasconcellos, Rio de Janeiro,
58. Antonio Candido Ferreira a Oliveira Coutinho, Buenos Aires, l7 de novembro,
l0 de setembro, 1834, AHI, 233l4lll.
1834, A HI, 20512115; idem a Antonio Manuel de Yrigoyen, Buenos Aires l7 de no-
57. Bento da silva Lisboa a Antero José Ferreira de Brito, Rio de Janeiro, l5 de ou. vembro, 1834, AHI, 2O5l2l15.
tubro, 1834, AHl, 299 I 4/ tl.
59. Sebastião Barreto a Braga, Q. G. em Taquarembó, 30 de abril, 1835, em Almeida
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u9
Por intermédio de Sebastião Barreto o Uruguai pediu para ter re- são ideal exigiria uma permuta de terras entre o lbicuí e o Arapey por
presentação nas discussões que levariam à assinatura de uma pazper- terras entre as duas principais coxilhas e o Jaguarão, quejá estavam
manente para a guerra de 1825-1828. Rivera qüeria que seu enviado em mãos de brasileiros. As de Arapey serviam de reduto para foragi-
tomasse parte ativa na luta pelos direitos uruguaios contra uma Ar- dos. Toda a Lagoa Mirim e partes do Serro Largo, assim também
gentina hostil. Em troca acenava com a possibilidade de um acordo como o que hoje são as províncias uruguaias de Rocha, Lavalleja e
mais favorável com o Brasil sobre a questão da fronteira. Conforme Treinta y Tres, seriam brasileiras. Justificou estes limites tendo em
seu ponto de vista, o acordo deveria ser separado do tratado definiti- vista a riqueza e comércio destas terras. 63 Em seu relatório procurou
vo de paz. Como nação livre e independente o Uruguai poderia resol- reduzir a influência de seu principal rival na fronteira, Bento Manuel,
ver seus próprios limites sem a Argentina, uma vez que esta questão cujas propriedades ficavam na região que Bento GonÇalves acredita-
nâo afetava diretamente Buenos Aires. 6o Confiando em suas próprias va seria absorvida, caso os debates sobre os limites fossem levados
informações e nas informações obtidas de Rivera, Sebastião Barreto avante. Os caudilhos, embora sem conhecer a posição oficial uns dos
ligou Bento Gonçalves e o partido Farroupilha a Juan Manuel Rosas, outros em assuntos da fronteira, sabiam exatamente os interesses que
o caudilho mais poderoso da Argentina. Além disso, amenizou o pe- estavam em jogo, mas nenhum deles recebeu confirmação do destino
dido de Rivera para a participação nas discussões, com a elaboração que teriam suas próprias sub-regiões. Embora o governo central reco-
de um suposto pacto Lavalleja-Gonçalves, que indicava traição. Os nhecesse sua semi-independência, sabiam que a tolerância tradicional
Farroupilhas, escreveu ele, mandaram um emissário secreto a Buenos não duraria para sempre.
Aires para negociar com Rosas o seu auxílio aos planos para uma re- Apesar da ausência de um acordo político entre elos, suas posi-
belião que levaria Lavalleja ao governo do Uruguai e proclamaria o ções econômicas eram semelhantes. Para os rio-grandenses "o territó-
Rio Grande do Sul um país independente. Uma vez terminadas estas rio da Banda Oriental é muito fertil, e (os rio-grandenses) em São Pe-
operações, ambos formariam uma federação com a Argentina. 6rAs- dro continuam encantados" com ele. uo
sim, em 1835, Rivera estava se tornando o aliado extra oficial do Bra- Os fracassos de Lavalleja não desencorajaram Bento Gonçalves.
sil, interna e externamente. Com a onda de vingança que surgiu por toda a província contra as
Cerca de um ano antes, em 1833-1834, o governo central chama- perseguições do governo central aos orientais e brasileiros, Bento
ra Bento Gonçalves ao Rio de Janeiro para explicar suas atitudes in- Gonçalves defendeu seus próprios interesses quando descreveu a ação
dependentes ao longo da fronteira. Durante sua conversa com as au- do governo como intervenção na política local rio-grandense. Ga-
toridades, que tentavam conquistar sua lealdade fazendo-lhe certas nhou também muita experiência ajudando Lavalleja e fez contatos
concessões, 6' deu sua opinião sobre os limites meridionais do Brasil. valiosos para o futuro. Para Lavalleja o fim como força real estava
Conforme ele, a linha de l8l9 só era vantajosa por permitir a expan- próximo, e Bento Gonçalves percebeu então que o Rio Grande do Sul
são da fronteira brasileira através de uma parte das Missões, e a divi- teria que lutar sozinho para alcançar sua independência.

Vasconcellos a lgnácio Borges, Montevideo,2g de março, 1836, AHI,22ll2l9;


Braga a Manuel Alves Branco, Porto Alegre, 2 de junho, 1835, AHI' 3Ú/4122.
60. Sebastião Barreto a Braga, Taquarembó, 30 de abril, 1835, em Almeida Vascon-
cellos a lgnácio Borges, Montevideo, 29 de março, 1836, AHI, 221 1219.
6t. Ibid.
63. Bento Gonçalves, Rio de Janeiro, 18 de fevereiro, 1834, AHl,299l2l3.
62. BritoaMariani,RiodeJaneiro,4, 17,2l,24,26,e27defevereiro, l834,AHRGS,
Avisos da Guerra. 64. Jacinto Roque de Sena Pereira, Buenos Aires,3 de maio, 1833, AHI, 27O/2a/2.
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