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1 Conteúdo de 12º ano: Fernando Pessoa – Heterónimos/ Preparação para a 2ª ficha de avaliação de Português.

Poesia dos heterónimos


1. Fernando Pessoa: a criação dos heterónimos.
Fernando Pessoa, após a morte do irmão, mostra-se reservado e solitário, o que o leva à
criação de diversos amigos imaginários “exatamente humanos”. O primeiro surge aos seis anos,
é francês e chama-se Chevalier de Pas; em 1899, cria o heterónimo Alexander Search, que escreve
poemas em inglês; a partir daí são algumas dezenas os nomes inventados. Mas é entre 1912 e
1914 que se formam os mais conhecidos, a que chamou Ricardo Reis, Alberto Caeiro e Álvaro de
Campos. No dia 8 de março de 1914 é o “dia triunfal” da sua vida, pois surge o “mestre” Alberto
Caeiro a escrever os poemas do “Guardador de Rebanhos”. E, nesse mesmo ano, ganham
contornos definidos os discípulos Álvaro de Campos e Ricardo Reis.

Fernando Pessoa, ao sentir-se variamente outro, cria amigos que exprimem estados de alma
e consciência distintos dos seus e, por vezes, opostos. O “Eu” do artista despersonaliza-se,
desdobra a própria individualidade, torna-se essência de outros e de si, para melhor exprimir a
apreensão da Vida, do Ser e do Mundo.

O fenómeno da heteronímia, como afirma numa carta a Adolfo Casais Monteiro, vem da
necessidade de descobrir a sua consciência e a sua personalidade. Nessa carta de 1935, diz ele:
“hoje já não tenho personalidade: quanto em mim haja de humano eu o dividi entre os autores
vários de cuja obra tenho sido o executor.”

O que é um heterónimo? A heteronímia pessoana.

O heterónimo distingue-se do pseudónimo pelo facto de não ser apenas o nome pelo qual um
autor assina a sua obra mas por ter, por trás dele, uma personalidade fictícia e, eventualmente,
uma biografia.
Pessoa aponta, como explicação para a génese dos heterónimos, o facto de:
 Ter um “profundo traço de histeria”;
 Desde criança se rodear à volta de um “mundo fictício”;
 Ter uma tendência “orgânica para a despersonalização e para a simulação”.

Alberto Caeiro Álvaro de Campos Ricardo Reis


Poeta primitivo e vê o mundo Sensacionista (em excesso) e Poeta clássico cujas odes
com os olhos da alma futurista, antes de enveredar representam admiráveis
(sensacionismo puro). por uma poesia do sínteses filosóficas.
quotidiano mesclada de um
desgosto pré-existencialista
pelo ser e pelo mundo.

Alberto Caeiro

Alberto Caeiro é um simples “guardador de rebanhos” que vê de forma objetiva e natural a


realidade com a qual contacta a todo o momento.

Poeta do olhar, vê as coisas como elas são e considera que “pensar é estar doente dos olhos”.
Recusa o pensamento metafísico, afirmando que “pensar é não compreender”. O pensamento
apenas falsifica o que os sentidos captam. É um sensacionista, que vive aderindo

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espontaneamente às coisas, tais como são, e procura gozá-las com despreocupada e alegre
sensualidade.

Mestre de Pessoa e de outros heterónimos, Caeiro dá especial importância ao ato de ver, num
discurso em verso livre, em estilo coloquial e espontâneo. Passeando e observando o mundo,
personifica o sonho da reconciliação com o universo, com a harmonia pagã e primitiva da
Natureza.

Alberto Caeiro propõe-se não passar do realismo sensorial, defendendo que “a sensação é a
única realidade para nós”. Considera que é preciso aprender a não pensar.

1. A poesia das sensações.


Para Caeiro só lhe interessa vivenciar o mundo que capta pelas sensações. Este recusa o
pensamento metafísico – “pensar não é compreender”, insistindo na “aprendizagem de
desaprender”, ou seja, aprender a não pensar, para se libertar de todos os modelos e poder ver
a realidade concreta. O pensamento gera a infelicidade: “pensar incomoda como andar à chuva/
quando o vento cresce e parece que chove mais”. Para o poeta, ver é conhecer e compreender o
mundo. Ele constrói, assim, uma poesia das sensações, boas por serem naturais.

A felicidade do “guardador de rebanhos” reduz-se ao saber a verdade do pensamento feito em


sensações. E alguma tristeza que aparece resulta do excesso de sensações, por gozar “tanto” “um
dia de calor”.

Caeiro põe em causa o significado das coisas ou o que pode ser marca desse significado. Para
ele, as coisas não têm sentido.

O mundo de Caeiro é aquele que se percebe pelos sentidos. O mundo existe, basta senti-lo,
basta experimentá-lo através dos sentidos, nomeadamente através da visão. Ver é compreender.
Tentar compreender pelo pensamento, é não saber ver. Alberto Caeiro vê com os olhos e não com
a mente.

2. A poesia da Natureza.
Alberto Caeiro sente-se feliz pois sempre conseguiu realizar-se, vendo claramente.

Poeta do real objetivo, Caeiro passeia e observa o Mundo, personifica o sonho da reconciliação
com o universo, com a harmonia pagã e primitiva da Natureza. Viver, para ele, implica a adesão
espontânea às coisas e ao Mundo.

Em Caeiro há a inocência que lhe permite saber ver sem criar abstrações ou formular conceitos.
Vê a Natureza na sua constante renovação e crê na “eterna novidade das coisas”. Interessa-lhe o
presente, o concreto, o imediato, uma vez que é aí que as coisas se apresentam como são.

Pela crença na Natureza, o Mestre revela-se um poeta pagão, que saber ver o mundo dos
sentidos, ou melhor, sabe ver o mundo sensível em que revela o divino e não precisa de pensar.

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3. “Mestre” dos outros.


Caeiro procura captar apenas o que as sensações lhe oferecem na realidade imediata. E a sua
linguagem torna-se quase infantil, sem os mecanismos da subordinação ou da pronominalização.

Mas Caeiro é também uma metáfora, construindo uma doutrina orientada para a
objetividade, para a contemplação dos objetivos originais, para o conhecimento intuito da
Natureza. Para si o tempo surge eterno, uno, feito de instantes de presente.

Ao anular o pensamento metafísico e ao voltar-se apenas para a visão total perante o mundo,
elimina a dor de pensar que afeta Pessoa. Para o ortónimo, para Álvaro de Campos e para Ricardo
Reis, Caeiro representa um regresso às origens, à sinceridade plena.

Enquanto Caeiro aceita, tacitamente, a realidade, o ortónimo dececiona-se e experimenta o


desespero. Já Álvaro de Campos, homem da cidade, que procura aplicar a lição sensacionista ao
mundo da máquina, não consegue acompanhar a pressa mecanicista e a desordem das sensações
e sente uma espécie de desumanização e frustração. Ricardo Reis, que adquiriu a lição de
paganismo espontâneo de Caeiro, cultiva um neoclassicismo neopagão, recorrendo à mitologia
greco-latina, e considera a brevidade da vida, pois sabe que o tempo passa e tudo é efémero;
Caeiro vê o mundo sem necessidade de explicações e confessa que existir é um facto maravilhoso.
Caeiro aceita a vida sem pensar; Reis talvez a aceite, apesar de pensar. Reis chega a ser o contrário
do mestre, pois procura vivenciar poeticamente um sensacionismo de carácter reflexivo, com a
emoção controlada pela razão.

Caeiro procura ser a voz da Terra, com a sua simplicidade e naturalidade. Sem preocupações
de ordem metafísica e social, desnuda as coisas de sentidos filosóficos, vendo-as tal como são.

4. Linguagem, estilo e estrutura da poesia de Alberto Caeiro.

Alberto Caeiro.
 O poeta da Natureza; “Eu não tenho filosofia: tenho sentidos…/Se falo na
 Relação de harmonia com a Natureza que Natureza não é porque saiba o que ela é/ Mas
assume valor essencial. porque a amo, e amo-a por isso.”
 O desejo de se transformar numa coisa “Quem me dera que a minha vida fosse um carro
vulgar natural; de bois/ Que vem a chiar, manhãzinha cedo, pela
 A ruralidade e a simplicidade; estrada.”
 Buscar na simplicidade a capacidade de
ser feliz.
 A recusa do pensamento (O pensamento “Compreendi que as coisas são reais e todas
tornas as coisas uniformes. diferentes umas das outras;/ Compreendi isto com
os olhos, nunca com o pensamento./ Compreender
isto com o pensamento seria achá-las todas
iguais.”
“O mundo não se fez para pensarmos nele/ (Pensar
é estar doente dos olhos)/ Mas para olharmos para
ele e estarmos de acordo…”
“Pensar incomoda como andar à chuva/ Quando o
vento cresce e parece que chove mais.”
 A apologia dos sentidos. “Penso com os olhos e com os ouvidos/ E com as
mãos e os pés/ E com o nariz e a boca.”
 A apologia da visão como sentido “Nunca tive um desejo que não pudesse realizar,
preferencial. porque nunca ceguei. Mesmo ouvir nunca foi para
mim senão um acompanhamento de ver.”

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 Não passa além do realismo sensorial. “Eu nunca passo para além da realidade imediata./
Para além da realidade imediata não há nada.”
 A eterna novidade das coisas. “Sinto-me nascido a cada momento/ Para a eterna
novidade do mundo…”

- Predomínio de construções sintáticas coordenadas e subordinadas adverbiais (comparativas,


causais e temporais);
- Predomínio do presente do indicativo;
- Verso livre e, normalmente, longo;
- Irregularidade estrófica, rítmica e métrica;
- Ausência de rima (versos soltos);
- Recursos expressivos predominantes: comparação, metáfora, anáfora, repetição.

Ricardo Reis

Ricardo Reis é o poeta clássico, da serenidade epicurista, que aceita, com calma e lucidez,
a relatividade e a fugacidade de todas as coisas.

Este discípulo de Caeiro aceita a antiga crença nos deuses, enquanto disciplinadora das
nossas emoções e sentimentos, mas defende, a busca de uma felicidade relativa alcançada pela
indiferença à perturbação.

A filosofia de vida de Ricardo Reis é a de um epicurismo triste, pois defende o prazer do


momento, o carpe-diem, como caminho da felicidade, mas sem ceder aos impulsos dos instintos.

Considera que nunca se consegue a verdadeira calma e tranquilidade, ou seja, a ataraxia


(a tranquilidade sem qualquer perturbação). Sente que tem de viver em conformidade com as leis
do destino, indiferente à dor e ao desprazer, numa verdadeira ilusão da felicidade.

Ricardo Reis recorre à ode e a uma ordenação estética marcadamente clássica. A sua
poesia intelectual faz a apologia da indiferença do homem diante do arbítrio e do poder dos
deuses. Em Ricardo Reis há a apatia face ao mistério da vida mas também se encontra o mundo
de angústias que afeta Pessoa.

Há, no seu pensamento, uma tensão, uma atitude de luta contra tudo o que lhe tire o
desassossego.

Para Reis é necessário saber apreciar, muito consciente e tranquilamente, o prazer das
coisas. É preciso viver a vida em conformidade com as leis do destino, indiferente à dor e ao
desprazer: “Segue o teu destino,/ Rega as tuas plantas/ Ama as tuas rosas. /O resto é a sombra/ De
árvores alheias.”

1. O Neopaganismo.
Reis cultiva a mitologia greco-latina e a crença nos deuses antigos.

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Reis afirma uma crença nos deuses e nas presenças quase divinas que habitam todas as
coisas.

Reis aceita o destino com naturalidade, considerando que os deuses estão acima do homem
por uma questão de grau, mas que acima dos deuses, se encontra o Fado, a que tudo se submete.

Os deuses são, assim, uma metáfora do Mundo.

2. O Epicurismo e o Estoicismo.
Ricardo Reis propõe uma filosofia moral de acordo com os princípios do Epicurismo e uma
filosofia estoica:

 “carpe diem” (aproveitar o dia), ou seja, “aproveitai a vida em cada dia”, como
caminho da felicidade;
 buscar a felicidade com tranquilidade (ataraxia);
 não ceder ao impulso dos instintos (Estoicismo);
 procurar a calma ou, pelo menos, a sua ilusão;
 seguir o ideal ético da apatia que permite a ausência da paixão e a liberdade (sobre
esta apenas o Fado).

Não devemos nem podemos opor-nos ao destino, devemos antes aceitá-lo com
naturalidade.

O núcleo da sabedoria epicurista consiste no aceitar o destino inelutável, desfrutando dos


prazeres e sofrendo a inevitável dor. Cabe ao homem viver a vida com a lucidez “dos grandes
indiferentes”.

Fernando Pessoa afirma que a obra de Ricardo Reis apresenta um epicurismo triste, pois
na vida, apesar do prazer e da felicidade que se deve buscar, nunca se encontra a calma e a
tranquilidade.

O Epicurismo defende o prazer como caminho da felicidade. Mas para que a satisfação dos
desejos seja estável, sem desprazer ou dor, é necessário um estado de ataraxia, ou seja, de
tranquilidade e sem qualquer perturbação.

Ricardo Reis é um poeta disciplinado, que procura o prazer nos limites do ser humano
face ao destino e à brevidade da vida.

A apatia em Reis, ou a indiferença cética, é um ato de lucidez de quem sabe que tudo
tem o seu fim e de que tudo já está, fatalmente, traçado. Este considera a inconsciência ou a
distração como a melhor forma de gozar o pouco que nos é dado. O sentimento de passagem do
tempo leva-o a considerar o instante como a duração calculada da vivência, mas que flui
continuamente.

Há, na sua poesia, uma consciência da fugacidade da vida e de tudo o que “neste mundo
choramos”.

3. Classicismo (intelectual e erudito).

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A precisão verbal e o recurso à mitologia associados aos princípios da moral e da estética


epicurista e estoicas ou à tranquila resignação ao destino são marcas do classicismo erudito de
Reis. Faz dos gregos o modelo da sabedoria, pois souberam aceitar o destino e fruir o bem da vida.
Poeta clássico, Ricardo Reis privilegia a ode, o epigrama e a elegia. A sintaxe clássica latina,
frequentemente com a inversão da ordem lógica, favorece o ritmo das suas ideias. Assim, Reis é
clássico no estilo, no rigor e no estoicismo, na adoção do paganismo, na crença “real e verdadeira
nos deuses da Grécia antiga”.
Ricardo Reis, como os gregos da Antiguidade e o poeta latina Horácio, dá-nos uma filosofia
assente na reflexão sobre a efemeridade e o destino que é imposto aos homens e aos deuses. Para
conseguir superar a angústia causada pelo Fado, procura viver de acordo com a lição de sabedoria
dos antigos que conquistaram uma liberdade, aprendendo a ataraxia como caminho para a
felicidade.
Reis constrói uma filosofia da contemplação e placidez, que lhe permite ver o fluir do tempo,
o liberta de comprometimentos excessivos e lhe permite ter a sensação de ser dono do seu
próprio destino.
Advogando o carpe diem, o prazer natural, mas controlado, sem paixões violentas, tem plenas
consciência da brevidade de tudo, da passagem do tempo, da fragilidade da nossa condição e da
inevitabilidade da morte. Por isso, considera importante saber viver os pequenos prazeres de uma
forma despegada, com equilíbrio e serenidade. Aceitar o Mundo, a vida e aquilo que somos é para
Reis o único caminho da felicidade.

4. As características da poesia de Ricardo Reis.


Ricardo Reis.
 A fugacidade da vida e a iminência da “Tão cedo passa tudo quanto passa!/Morre tão
morte; jovem ante os deuses quanto/ Morre! Tudo é tão
 A necessidade de aproveitar os pouco!/Nada se sabe, tudo se imagina./ Circunda-
momentos bons de cada dia (“carpe te de rosas, ama, bebe/E cala. O mais é nada.”
diem”).
 Saborear o encanto de cada dia. “Cada dia sem gozo não foi teu/Foi só durares nele.
Quanto vivas/Sem que o gozes, não vives.”
 A busca da tranquilidade absoluta; “Aprendamos na história/Dos calmos jogadores de
 Não ceder ao impulso dos instintos xadrez/Como passar a vida.”
(estoicismo).

 O domínio dos deuses; “Só esta liberdade nos concedem/Os deuses:


 Procurar a calma ou, pelo menos, a sua submetermo-nos/Ao seu domínio por vontade
ilusão. nossa./Mais vale assim fazermos/Porque só na
ilusão da liberdade/A liberdade existe.”
 Os mortais devem elevar-se à categoria “Da nossa semelhança com os deuses/Por nosso
dos deuses e: bem tiremos/Julgarmo-nos deidades exilados
- Portar-se altivamente; […]/Altivamente donos de nós-mesmos/ Usemos a
- Aprender a gerir o seu próprio destino; existência/ […]/ Acima de nós-mesmos
- Tornar-se donos de si próprio. construamos/Um fado voluntário.”
 O epicurismo ou a arte de atravessar a “Logo que a vida me não canse, deixo/Que a vida
existência sem preocupações. por mim passe/Logo que eu fique o mesmo.”
 O presente como tempo de realização. “O prazer do momento anteponhamos/ À absurda
cura do futuro”
“Amanhã não existe. Meu somente/ É o momento”

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Este é o dia,/Esta é a hora, este o momento, isto/É


quem somos, e é tudo.”
 Poeta moralista, transmite conselhos “Para ser grande, sê inteiro: nada/Teu exagera ou
sobre a forma de encarar a vida. exclui./Sê todo em cada coisa. Põe quanto és/No
mínimo que fazes.”

- Preferência pela composição poética em ode;

- Regularidade estrófica, rítmica e métrica (versos predominantemente decassilábicos e


hexassilábicos);

- Ausência de rima (versos soltos);

- Predomínio de construções sintáticas subordinadas e com influência da sintaxe latina (inversão


da ordem frásica padrão);

- Privilégio do presente do indicativo e uso frequente da primeira pessoa do plural; utilização do


gerúndio com valor aspetual imperfetivo.

- Recursos expressivos predominantes: anástrofe, metáfora, aliteração, apóstrofe.

Álvaro de Campos

Álvaro de Campos é o mais moderno dos heterónimos. Fernando Pessoa descreve-o como
engenheiro naval.
Para Campos, a sensação é tudo. O Sensacionismo torna a sensação a realidade da vida e
base da arte. O “eu” do poeta tenta integrar e unificar tudo o que tem ou teve existência ou
possibilidade de existir. Campos é quem melhor procura a totalização das sensações.
Revela, tal como Pessoa, a mesma inadaptação à existência e a mesma demissão da
personalidade íntegra.
Em Campos, há a vontade de ultrapassar os limites das próprias sensações, numa vertigem
insaciável, que o leva a querer “ser toda a gente e toda a parte”. Numa atitude unanimista, procura
unir em si toda a complexidade das sensações.
Mas, passada a fase eufórica, o desassossego de Campos leva-o a revelar uma face
disfórica, a ponto de desejar a própria destruição.
Depois de exaltar a beleza da força e da máquina, a poesia de Campos revela um
pessimismo agónico, a dissolução do “eu”, a angústia existencial e uma nostalgia da infância
irremediavelmente perdida.
A obra de Álvaro de Campos passa por três fases: a decadentista – que exprime o tédio,
o cansaço e a necessidade de novas sensações; a futurista e sensacionista – que se caracteriza
pela exaltação da energia, de “todas as dinâmicas” e da velocidade até situações de paroxismo e
a intimista ou da abulia – que, perante a incapacidade das realizações, traz de volta o abatimento.

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1- A vanguarda e o Sensacionismo.
Álvaro de Campos é o poeta vanguardista, canta o mundo contemporâneo, celebra o triunfo
da máquina e da civilização moderna, da força mecânica e da velocidade. Exalta o progresso
técnico. A “Ode Triunfal” ou a “Ode Marítima” são bem o exemplo desta intensidade e totalização
das sensações.
A sua procura da chave do ser e da inteligência do mundo torna-se desesperante.
Na “Ode Triunfal” e na “Ode Marítima”, Álvaro de Campos dá-nos a sensação de uma
frustração radical – é na máquina, irracional e exterior, que se projetam os sonhos e os desejos do
poeta: “Ah poder exprimir-me todo como um motor se exprime!/ Ser completo como uma
máquina!”
Futurista, canta a civilização industrial e introduz na linguagem poética e terminologia desse
mundo mecânico citadino e cosmopolita, contemporâneo das máquinas e da luz elétrica.
O Futurismo caracteriza-se pela exaltação da energia, da velocidade e da força.

2- Sensacionismo.
Esta fase da obra de Campos, designada por futurista, também conhecida por mecanista ou
whitmaniana, é marcada pela inspiração em Walt Whitman, no espírito nietzschino e no
Futurismo de Marinetti através do Sensacionismo. Está marcada pela intelectualização das
sensações ou pela sua desordem, pela integração na civilização da máquina, pela pressa
mecanicista e pela inquietude.
Campos mostra-se impaciente, sente a pressão da realidade que lhe faz vibrar todo o corpo.
O Sensacionismo de Campos começa com a premissa de que a única realidade é a sensação.
Mas a nova tecnologia na fábrica e nas ruas da metrópole moderna provoca-lhe a vontade de
ultrapassar os limites das sensações, numa vertigem insaciável.
O Sensacionismo, inspirado por Walt Whitman, apresenta-se como uma procura de
totalização de todas as possibilidades dadas pelas sensações ou perceções de toda a humanidade.
Campos busca exprimir a energia ou a força que se manifesta na vida. Daí o surgimento de
versos livres, vigorosos, submetidos à expressão da sensibilidade, dos impulsos, das emoções.

3- A abulia e o tédio.
Após a exaltação heroica e a obsessão dos “maquinismos em fúria”, cai no desânimo e na
frustração. Face à incapacidade das realizações, sente-se abatido. É a fase do intimismo ou
independente, marcada pela abulia e pelo tédio.
Nesta fase intimista, Campos sente-se vazio, um marginal, um incompreendido. Sofre fechado
em si mesmo, angustiado e cansado, como nos diz no poema “O que há em mim é sobretudo
cansaço”.
O abatimento que provoca em Campos este “supremíssimo cansaço” lembra o
Decadentismo, mas esta decadência não possui o mesmo sentido literário e histórico pós-
simbolista, antes traduz a reflexão intimista e angustiada de quem apenas sente o vazio depois
da caminhada heroica. O próprio Campos afirma: “Fui em tempos poeta decadente; hoje creio
que estou decadente, e já o não sou”.

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Na fase decadentista, no “Opiário”, motivado por uma viagem de Campos ao Oriente, a


nostalgia e a expressão do tédio, do cansaço e da saturação da civilização provocam a necessidade
de novas sensações.
Este Decadentismo traduz a falta de um sentido para a vida e a necessidade de fuga à
monotonia. Aqui há profundo vazio existencial, que se revela na descrença e na inquietação, na
desesperança e no aniquilamento.
Álvaro de Campos, depois de tentar viver as sensações excessivas e de todas as maneiras,
revela uma atitude depressiva, de abatimento.
Procurando transmitir o espírito do mundo moderno, da energia e da velocidade, evocando
as sensações da vida urbana e industrial, assume, na terceira fase, um niilismo, que se revela numa
angústia existencial e sensacionista, num vazio completo, que se estilhaça, que se fragmenta em
mil pedaços de novas sensações confusas, num cansaço psíquico que não consegue definir.

4- As características da poesia de Álvaro de Campos.


Álvaro de Campos.
 1ª Fase: “É antes do Ópio que a minh’alma é doente.
- Decadentista – exprime o tédio, o enfado, a Sentir a vida convalesce e estiola
náusea, o cansaço e a necessidade de novas E eu vou buscar ao Ópio que consola um Oriente
sensações. ao oriente do Oriente.
 A atmosfera de uma vida passiva […]
dependente de estupefacientes; A vida a bordo é uma coisa triste,
 O ópio como refúgio; Embora a gente se divirta às vezes.
 O sentimento de “fumar a vida”; Fá-lo com alemães, suecos e ingleses
 A inatividade meditando nos seus E a minha mágoa de viver persiste.
sonhos “de febre”;
 A falta de objetivos na vida; Eu acho que não vale a pena ter
 A busca de novas sensações; Ido ao Oriente e visto a Índia e a China.
 A monotonia em oposição ao A terra é semelhante e pequenina
divertimento; E há só uma maneira de viver.
 A resignação sem energia nem
alegria; Por isso eu tomo Ópio. É um remédio.
Sou um convalescente do Momento.
 A frustração;
Moro no rés do chão do pensamento
 O apelo a Deus para que termine
E ver passar a Vida faz-me tédio”
com tudo.
[…]”
- (Ex: “Opiário.”)

 2ª fase: “À dolorosa luz das grandes lâmpadas elétricas da


- Futurista e Sensacionista – caracteriza-se fábrica
pela exaltação da energia, de “todas as Tenho febre e escrevo.
dinâmicas”, da velocidade e da força. Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza
 A celebração do triunfo da disto,
máquina e da civilização Para a beleza disto totalmente desconhecida dos
moderna; antigos.
 A beleza da força e da máquina
por oposição à beleza Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno!
tradicionalmente conseguida; Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!
 A sensação como realidade da Em fúria fora e dentro de mim,
vida e base de toda a arte; Por todos os meus nervos dissecados fora,
 O excesso violento de Por todas as papilas fora de tudo com que eu
sensações. sinto!
- (Ex: “Ode Triunfal.”) Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,
De vos ouvir demasiadamente de perto,

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E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um


excesso
De expressão de todas as minhas sensações,
Com um excesso contemporâneo de vós, ó
máquinas!”
 3ª fase:
- Intimista – perante a incapacidade das
realizações, traz de volta o abatimento, a “O que há em mim é sobretudo cansaço Não disto
abulia, que provoca “Um supremíssimo nem daquilo,
cansaço/ Íssimo, íssimo, íssimo/ Cansaço…” Nem sequer de tudo ou de nada:
 A frustração, o fracasso; Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
 A perceção de malogro da Cansaço.”
existência;
 O distanciamento cada vez
maior da realidade; “Esta velha angústia,
 A dor de pensar, a sensação de Esta angústia que trago há séculos em mim,
vazio; Transbordou da vasilha,
 A desesperança e a falta de Em lágrimas, em grandes imaginações,
energia interior; Em sonhos em estilo de pesadelo sem terror,
 A tentativa vã de comunicação Em grandes emoções súbitas sem sentido
do eu com o real; nenhum.”
 O sentimento de estranheza e
da inutilidade de tudo;
- (Ex: “Esta velha angústia.”)

- A forma espelha o conteúdo da mensagem poética;

- Verso livre e, normalmente, longo;

- Irregularidade estrófica, rítmica e métrica;

- Ausência de rima (versos soltos);

- Linguagem simples, objetiva, prosaica, onomatopeias, neologismos, empréstimos, topónimos e


antropónimos;

- Inclusão de vários registos de língua (do literário ao calão);

- Vocabulário concreto (sobretudo do campo lexical da Mecânica e da Indústria);

- Construções sintáticas nominais, gerundivas, infinitivas e, por vezes, presença de frases atípicas,
experimentais;

- Privilégio do presente do indicativo;

- Recursos expressivos predominantes: aliteração, anáfora, apóstrofe, enumeração, gradação e


metáfora;

- Nas composições intimistas, o fôlego modernista e épico decai num estilo abúlico, deprimido,
aproximando-se do registo poético do ortónimo.

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