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ISSN 2595-8372

Seminário Regional de Educação do Campo da Região Centro do Rio Grande do Sul

20 anos de Educação do Campo: educação


transformando a sociedade

III Seminário Regional de Educação do Campo da Região


Centro do Rio Grande do Sul

SIFEDOC

Marielen Priscila Kaufmann


Dreisse Gabbi Fantineli
Helena Maria Beling
Valquiria Conti
(0rganizadores)

30 a 31 de agosto de 2018
Local: Universidade Federal de Santa Maria - UFSM
Santa Maria/RS.

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ISSN 2595-8372
Seminário Regional de Educação do Campo da Região Centro do Rio Grande do Sul

Marielen Priscila Kaufmann


Dreisse Gabbi Fantineli
Helena Maria Beling
Valquiria Conti
(0rganizadores)

20 anos de Educação do Campo: educação


transformando a sociedade

III Seminário Regional de Educação do Campo da Região


Centro do Rio Grande do Sul

Santa Maria
2018

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DADOS CATALOGRÁFICOS

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III Seminário Regional de Educação do Campo da Região Centro do Rio


Grande do Sul – SIFEDOC

20 anos de Educação do Campo: educação transformando a sociedade

30 a 31 de agosto de 2018
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Santa Maria/RS.

COMISSÃO ORGANIZADORA

Coordenação Geral
Carmem Rejane Flores Wizniewsky
Janete Webler Cancelier

Comissão científica
Angelita Ziemmermann
Ana Carla Lenz
Anna Christine Ferreira Kist
Carmem Rejane Wizniewsky
Cezar De David
Daiane Loretto de Vargas
Dreisse Gabbi Fantineli
Edimar Rodrigo Rossetto
Hilário José Menezes
Helena Maria Beling
Ivanio Folmer
Janete Webler Cancelier
Janete Facco
Liziany Müller
Kelly Perlin Cassol
Leonice Aparecida de Fátima Alves Pereira Mourad
Marilse Beatriz Losekann
Marielen Priscila Kaufmann

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Marlova Giuliane Garcia


Mauricio Bandinelli
Miriele Fontoura

Comissão Organizadora
Angelita Ziemmermann
Ana Carla Lenz
Ana Clarice Soares Hanauer
Anna Christine Ferreira Kist
Ane Carine Meurer
Amanda Alves Mathias
Bruna Maltauro Tomazoni
Bruno Traesel Schreiner
Carmem Rejane Wizniewsky
Cezar De David
Daiane Loretto de Vargas
Denise Lenise Machado
Dreisse Gabbi Fantineli
Edimar Rodrigo Rossetto
Felipe Leindecker Monteblanco
Hilário José Menezes
Helena Maria Beling
Ivanio Folmer
Jacson Dreyer Schumacher
Janete Webler Cancelier
Janete Facco
João Pedro Capeleto Massia
Kauã Arruda Wioppiold
Kelly Perlin Cassol
Leonice Aparecida de Fátima Alves Pereira Mourad
Marilse Beatriz Losekann
Marielen Priscila Kaufmann
Marlova Giuliane Garcia
Mauricio Bandinelli
Miriele Fontoura
Valquiria Conti

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APRESENTAÇÃO

O III Seminário Regional de Educação do Campo da Região Centro do Rio Grande


Grande do Sul, cujo tema central foi 20 anos da educação do campo: educação
transformando a sociedade, realizado nos dias 30 e 31 de agosto de 2018, no campus da
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria/RS.
O III SIFEDOC é um evento de projeção nacional e internacional, que tem como foco
prioritário, mas não exclusivo, as discussões acerca da Educação do Campo, temática esta,
cujos desdobramentos dizem respeito a todos os envolvidos com a questão educacional do
campo.
A participação ocorreu na condição de ouvinte e/ou apresentação de trabalhos
acadêmicos, posters e relatos de experiências. Importante destacar que, as inscrições foram
gratuitas, mediante entrega de um Kg de alimento não perecível.

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SUMÁRIO
EIXO 1: O trabalho do camponês, reprodução social e produtiva dos camponeses e
comunidades tradicionais. ........................................................................................................ 12
A DEPENDÊNCIA DA CULTURA DO TABACO X A DIVERSIFICAÇÃO DA
PROPRIEDADE....................................................................................................................... 13
A IMPORTÂNCIA DA FESTA DO PINHÃO PARA A VALORIZAÇÃO DA CULTURA
NA COMUNIDADE SANTO ANTÔNIO, LINHA DOS POMERANOS, AGUDO/RS ....... 23
DESTINO DOS RESÍDUOS DOMÉSTICOS PRODUZIDOS PELAS FAMÍLIAS DE
ALUNOS DA ESCOLA ESTADUAL MEDIANEIRA, AJURICABA/RS ............................ 36
SABERES COTIDIANOS NA FEIRA DE ORGÂNICOS DE SANTIAGO ......................... 58
CONHECIMENTOS AGROEOCOLÓGICOS: SUSTENTABILIDADE E EMANCIPAÇÃO
SOCIAL NA REGIÃO CENTRAL/RS ................................................................................... 77
EIXO 2: A educação do campo e a educação dos camponeses ( educação escolar e não
escolar)...................................................................................................................................... 92
HISTÓRIAS DE VIDA, OLHARES SENSÍVEIS E DIÁLOGOS: a realidade da Educação do
Campo....................................................................................................................................... 93
INDÚSTRIA CULTURAL E AGRONEGÓCIO: aproximações possíveis .......................... 104
METODOLOGIAS PARA O PLANEJAMENTO DE PRÁTICAS SUSTENTÁVEIS EM
ESCOLAS: articulação da Educação Ambiental com a Educação do Campo ....................... 115
O CORRETO DESCARTE DO LIXO ELETRÔNICO EM UMA ESCOLA DO CAMPO DO
MUNICÍPIO DE ITAQUI ...................................................................................................... 127
O PAPEL DA ESCOLA DIANTE DA ESCOLHA DA POPULAÇÃO CAMPONESA:
PERMANECER OU SAIR DO CAMPO .............................................................................. 142
O PROCESSO DE FUNDAÇÃO ESCOLA FAMÍLIA AGRÍCOLA DE VALE DO SOL . 163
RECONHECIMENTO DA IMPORTÂNCIA DO MOVIMENTO DOS TRABALHADORES
RURAIS SEM TERRA-MST, NAS TRANSFORMAÇÕES DO/NO CONTEXTO DE UMA
ESCOLA DO CAMPO........................................................................................................... 178
BRINCAR: mediações docentes e suas singulariedades ........................................................ 191
MÉTODO PAULO FREIRE E PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA: uma análise da
metodologia de trabalho das Casas Familiares Rurais ........................................................... 201
A IMPORTÂNCIA E A VALORIZAÇÃO DAS BRINCADEIRAS NO ESPAÇO RURAL.
................................................................................................................................................ 215
EDUCAÇÃO DO CAMPO E COMUNICAÇÃO ASSERTIVA .......................................... 229

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GÊNERO E FEMINISMO NA ESCOLA FAMÍLIA AGRÍCOLA DE VALE DO SOL: A


UNIÃO DAS MONITORAS EM PROL DA EDUCAÇÃO IGUALITÁRIA EM UMA
ESCOLA DO CAMPO........................................................................................................... 240
O TRABALHO PEDAGÓGICO DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA ESCOLA DE
ASSENTAMENTO DO MST: UM ESTUDO DE CASO..................................................... 251
A EDUCAÇÃO DO CAMPO CONTEXTUALIZADA A PARTIR DA REALIDADE DO
MUNICÍPIO DE NOVA PALMA, RS, BRASIL .................................................................. 270
A ARTICULAÇÃO ENTRE AGROECOLOGIA E PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA NA
FORMAÇÂO DE JOVENS DO CAMPO ............................................................................. 282
DIA DE CAMPO: integrando saberes ................................................................................... 293
SEMEANDO CONHECIMENTO, COM MAIS IGUALDADE E NOVAS
OPORTUNIDADES ............................................................................................................... 305
INDICADORES EMANCIPATÓRIOS E (DES) COLONIAIS NA ESCOLA FAMÍLIA
AGRÍCOLA DE SANTA CRUZ DO SUL: REFLEXÕES A PARTIR DAS PRÁXIS DO-
DISCENTES ........................................................................................................................... 317
A GESTÃO DA EDUCAÇÃO DO CAMPO: UM NOVO OLHAR DOS SUJEITOS QUE LÁ
TRABALHAM E VIVEM ..................................................................................................... 333
QUEM SOU EU? SOU CORPO, ALIMENTO E SOLO: Uma Abordagem Temática
integrando conhecimentos na Pedagogia da Alternância ....................................................... 347
EDUCAÇÃO NO PROCESSO DE GESTÃO AMBIENTAL: o pescador artesanal como
sujeito da ação educativa na perspectiva da luta de classes ................................................... 362
RURALIDADES EDUCACIONAIS DE UMA ESCOLA PERTENCENTE A 8ª
COORDENADORIA DE EDUCAÇÃO ................................................................................ 377
HISTÓRIA DA PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA: um possível percurso discursivizado
pelas licenciaturas em educação do campo ............................................................................ 388
FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA EDUCAÇÃO INCLUSIVA NA EDUCAÇÃO
DO CAMPO EM DOM PEDRITO ........................................................................................ 402
POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFETIVAÇÃO DO ATENDIMENTO EDUCACIONAL
ESPECIALIZADO NAS ESCOLAS DO CAMPO DA REDE MUNICIPAL DE
DOMPEDRITO – RS ............................................................................................................. 419
A EDUCAÇÃO DO CAMPO NA ESCOLA URBANA: Um olhar sobre uma experiência
interdisciplinar ........................................................................................................................ 434
ESCOLAS DO CAMPO E COMUNIDADES: POSSIBILIDADES DE
FORTALECIMENTO DIANTE DO FECHAMENTO DAS ESCOLAS – O CASO DE
FREDERICO WESTPHALEN, IRAÍ E LIBERATO SALZANO ........................................ 446

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UMA EXPERIÊNCIA CARTOGRÁFICA NA ESCOLA RURAL DE SANTA FLORA –


SANTA MARIA, RS .............................................................................................................. 467
A PERCEPÇÃO DA COMUNIDADE EM RELAÇÃO À INCLUSÃO DOS ALUNOS COM
NECESSIDADES ESPECIAIS NO ENSINO REGULAR.................................................... 481
PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DOCENTE EM ESCOLAS DO CAMPO ........................... 499
O TRABALHO PEDAGÓGICO DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA ESCOLA DE
ASSENTAMENTO DO MST: um estudo de caso ................................................................ 509
EDUCAÇÃO DO CAMPO E AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS AGRÍCOLAS NA ESCOLA
SÃO PAULO NO MUNICIPIO DE ENTRE IJUIS- RS ....................................................... 529
A RELAÇÃO ENTRE A EDUCAÇÃO DO CAMPO E O ESTÁGIO INTERDISCIPLINAR
DE VIVÊNCIA SANTA MARIA: POR UMA EDUCAÇÃO LIBERTADORA ................. 552
AGROECOLOGIA E EDUCAÇÃO DO CAMPO: A CONSTRUÇÃO AGROECOLÓGICA
A PARTIR DAS VIVÊNCIAS NA ESCOLA FAMÍLIA AGRÍCOLA DE SANTA CRUZ
DO SUL – EFASC ................................................................................................................. 563
MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA: equidade de gênero por
meio da educação do campo ................................................................................................... 574
PROCESSOS FORMATIVOS DE PROFESSORAS DE ESCOLA RURAL DO CAMPO 584
DESAFIOS E ESTRATÉGIAS PARA A GESTÃO DA ESCOLA DO CAMPO ................ 595
PERFIL DOS ESTUDANTES DE AGRONOMIA NA REGIÃO DO ALTO URUGUAI .. 605
EDUCAÇÃO AMBIENTAL NAS ESCOLAS DO CAMPO: UMA PRÁTICA PARA ALÉM
DA SALA DE AULA ............................................................................................................ 618
UM ESTUDO SOBRE A ATUAL REALIDADE DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA
EDUCAÇÃO INFANTIL NA ESCOLA DO CAMPO. ........................................................ 636
EIXO 3: RELATOS DE EXPERIÊNCIAS ............................................................................ 655
ANÁLISE DESCRITIVA DE UMA PRÁTICA DOCENTE EM GRADUAÇÃO NO CURSO
DE AGRONOMIA DO INSTITUTO EDUCAR ................................................................... 656
OLHO D’ÀGUA: RECUPERAÇÃO E PRESERVAÇÃO DE NASCENTES ..................... 661
O FECHAMENTO DAS ESCOLAS DO CAMPO EM CONTRADIÇÃO AOS DIREITOS
DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE................................................................................ 665
AS CONSEQUÊNCIAS DA NÃO REGULAMENTAÇÃO DO ENSINO MÉDIO NA
ESCOLA NÃO URBANA RISOLETA QUADROS ............................................................ 668
APRENDENDO SOBRE A CULTURA LOCAL NA ESCOLA .......................................... 672
OS SABERES E OS FAZERES DE UMA FAMÍLIA DO IRAPUAZINHO, CACHOEIRA
DO SUL/RS: RELATO DE EXPERIÊNCIA E DE PERMANÊNCIA DA AGRICULTURA
FAMILIAR FRENTE AO AGRONEGÓCIO ........................................................................ 677

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HORTA EDUCATIVA - UM ESPAÇO PARA CONSTRUIR E RESSIGNIFICAR AS


APRENDIZAGENS NA ESCOLA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO BÁSICA EUCLIDES
ARANHA – BORORÉ/MAÇAMBARÁ ............................................................................... 682
APROVEITAMENTO DO SOLO PARA UMA ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL NA
ESCOLA RURAL .................................................................................................................. 686
RELATÓRIO III DE TERRITÓRIO E TERRITORIALIDADE .......................................... 691
SABERES E FAZERES NA ESCOLA DO CAMPO ........................................................... 696
OFICINA TEMÁTICA DE REUTILIZAÇÃO DE GARRAFAS PET NO INTERIOR DO
MUNICÍPIO DE JÓIA/RS ..................................................................................................... 701
PROJETO IDENTIDADE RURAL – À LUZ DA PEGAGOGIA DA ALTERNÂNCIA .... 707
PROJETO MORANGUINHO: PRESERVANDO O GOSTO PELA ALIMENTAÇÃO
SAUDÁVEL........................................................................................................................... 711
REFLEXÕES SOBRE A CARTA DA TERRA EM UMA ESCOLA DO CAMPO ............ 713
VIVÊNCIAS DE CICLISMO EM UMA ESCOLA DE CAMPO ATRAVÉS DE AULAS DE
EDUCAÇÃO FÍSICA ............................................................................................................ 716
VIVÊNCIAS DE OFICINAS DE SABÃO EM UMA ESCOLA DE CAMPO ATRAVÉS DE
AULAS DE TURNO INTEGRAL ......................................................................................... 722
RELATO DE TEMPO COMUNIDADE: Controle biológico de pragas como abordagem para
o ensino de microbiologia em escola do campo do município de Bossoroca, RS ................. 728
A ARTE COMO FORMA DE CONSCIENTIZAÇÃO E PRESERVAÇÃO DO MEIO
AMBIENTE ........................................................................................................................... 732
A POSSE DA TERRA: REFLETINDO SOBRE OS CONCEITOS DE PROPRIEDADE .. 734
PROMOVENDO A ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL EM UMA ESCOLA DO CAMPO DE
RESTINGA SÊCA-RS ........................................................................................................... 736
CARTOGRAFIAS DA EDUCAÇÃO BÁSICA: UM OLHAR SOBRE OS DIREITOS
HUMANOS A PARTIR DO ESTUDO DA ESCOLA DO CAMPO JOÃO VIANEY DO
MUNICIPIO DE IVORÁ ....................................................................................................... 739
A EDUCAÇÃO ALIMENTAR E NUTRICIONAL NA ESCOLA DO CAMPO: DA
CONSTATAÇÃO AO ESTÍMULO SIGNIFICATIVO ........................................................ 741
REFLEXÕES TEÓRICAS SOBRE A FORMAÇÃO DOS ASSENTAMENTOS RURAIS E
AS CONDIÇÕES DE VIDA .................................................................................................. 744
EDUCANDO PARA PRESERVAR: ANÁLISE SOBRE A IMPORTÂNCIA DA ÁGUA
CONSUMIDA NA ESCOLA DE ENSINO FUNDAMENTAL ALBERTO PASQUALINI,
EM AGUDO/RS ..................................................................................................................... 750

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AS POLÍTICAS PÚBLICAS E O PROGRAMA NACIONAL DO LIVRO DIDÁTICO –


PNLD NO CIEP DE DOMPEDRITO/RS .............................................................................. 755
ESCOLAS E A EDUCAÇÃO DO CAMPO EM SETE DE SETEMBRO – RS ................... 759
IDENTIDADE RURAL: VALORIZANDO A CULTURA E CONSTRUINDO
CONHECIMENTO ................................................................................................................ 761
FEIRA DA AGRICULTURA FAMILIAR: DIÁLOGO DE SABERES E SABORES ........ 763
DESAFIOS E PERSPECTIVAS DA EDUCAÇÃO DO CAMPO: O ENSINO DE CIÊNCIAS
NA ESCOLA PÓLO DE NOVO TESOURO, BAIÃO-PARÁ ............................................. 768
DIFERENTES OLHARES PARA A ESCOLA DO CAMPO: A EXPERIÊNCIA DE
FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORAS DO CAMPO NA REGIÃO DA
CAMPANHA GAÚCHA ....................................................................................................... 774
MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA: Agroecologia enquanto
resistência no fazer saúde do campo....................................................................................... 778
EDUCAÇÃO AMBIENTAL APLICADA AOS RESÍDUOS SÓLIDOS NA ESCOLA
MUNICIPAL DE ENSINO FUNDAMENTAL ROSA DA SILVA BRAGA, SEBERI/RS 780

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EIXO 1: O trabalho do camponês, reprodução social e produtiva dos camponeses e


comunidades tradicionais.

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A DEPENDÊNCIA DA CULTURA DO TABACO X A DIVERSIFICAÇÃO DA


PROPRIEDADE

Nalini Maiquiéli Castilhos Lampert 1


Márcio Mário Pretzel 2
Taciano Pellegrin 3

RESUMO
Esta pesquisa traz reflexões acerca da diversificação de uma propriedade rural em relação a uma
propriedade que investe na monocultura do tabaco. Ambas as propriedades estão localizadas na região
norte do município de Agudo, Rio Grande do Sul. Teve como objetivo geral investigar o que cada uma
produz para sua subsistência e o que/quanto compram, buscando identificar os benefícios que a
diversificação da produção agrícola traz para a família, tanto financeira como nutricional
influenciando diretamente na saúde do indivíduo. Para que a pesquisa pudesse ser efetivada optou-se
por coletar os dados através da observação direta nas propriedades bem como conversa informal com
os proprietários para entender as diferenças e as motivações que mantem esses aspectos. Os dados
encontrados apontam para uma liberdade financeira e qualidade nutricional maior de uma família que
investe na diversificação da propriedade em relação à família que se dedica ao cultivo do tabaco e fica
financeiramente dependente das fumageiras.

Palavras-chave: Monocultura, diversificação, economia, tabaco, alimentação.

1. INTRODUÇÃO

A desigualdade social no âmbito nacional é notória, assim como no país, estado, os


municípios também têm diversos problemas relacionados a esta questão. São problemas
sanitários, acesso à saúde, à educação condizente com a realidade de cada ator, desigualdade
monetária e problemas relacionados a nutrição. Busca-se entender durante este estudo, a
influência da monocultura para o aumento destas desigualdades e problemas relacionados a
saúde alimentar, nutricional e, dependência financeira à cultura do tabaco especificamente.
A fumicultura é uma atividade econômica que se desenvolveu inicialmente no
nordeste do País, e após, em outras regiões do território brasileiro. Ao longo do século XX,
consolidou-se nos estados do Sul (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná) abrangendo
um grande número de municípios devido sua importância econômica, gerando empregos em

1
Universidade Federal de Santa Maria - nalini_mc@yahoo.com.br
2
Universidade Federal de Santa Maria - marciopretzel@gmail.com
3
Universidade Federal de Santa Maria - tacianopellegrin@gmail.com

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áreas rurais e possibilitando alta rentabilidade em pequenos espaços de terra, em propriedades


familiares.
Quanto à origem do fumo, há diversas teorias e divergências, porém, precisa-se levar
em conta o que diz Etges (1991) baseado na obra A História do Fumo Brasileiro de Jean
Batisti Nardi (1985), quando afirma que:

O local provável para o surgimento do fumo tenha sido os vales orientais dos Andes
Bolivianos e dali tenha se difundido através do território brasileiro pelas migrações
indígenas, sobretudo Tupy-Guarani. Quando da chegada dos europeus, o fumo era
de uso comum nas tribos indígenas e cultivado em toda a costa brasileira. Depois da
chegada do navegador genovês a serviço da coroa espanhola, Cristovão Colombo, o
fumo passou a ser conhecido em vários lugares. (ETGES, 1991, p. 41)

A fumicultura é considerada uma atividade polêmica como podemos ver na citação de


Dutra e Hilsinger (2013)
Por ser uma atividade polemica, a fumicultura envolve uma série de elementos
conflitantes, entre os defensores da atividade estão as entidades de classe que
utilizam fundamentalmente dados econômicos, como número de famílias
envolvidas, geração de impostos, entre outros. De outro lado, estão os antibagistas,
vinculados em especial aos órgãos promotores da saúde pública. (DUTRA E
HILSINGER, 2013, p. 18)

Em Agudo, duas culturas são as predominantes para geração de renda às famílias, a do


arroz e a do fumo. O cultivo do tabaco se fortaleceu principalmente devido às facilidades
proporcionadas pelas empresas na aquisição do insumo, este que é pago com a safra e,
também, pela lucratividade em pequenos espaços de terra, já que, para o cultivo de soja, cana-
de-açúcar, entre outros, precisa-se ter uma área maior de terra para ser lucrativo.
Então, partindo da monocultura do tabaco, acredita-se que esta influencia diretamente
na questão monetária e qualidade alimentar e nutricional das famílias rurais do município de
Agudo. Buscou-se entender como a diversificação de uma propriedade dedicada inicialmente
ao cultivo do tabaco pode influenciar na qualidade de vida, renda, saúde de uma família rural
e em contraponto, entender o que leva uma família a dedicar-se exclusivamente a esta cultura
como principal renda.

O conceito de diversificação pode ser entendido em seu sentido estrito associado à


multifuncionalidade, com o exercício simultâneo de várias atividades
desempenhadas por uma única pessoa. Ela torna-se uma condição indispensável à
sobrevivência e à competitividade dos territórios rurais na medida em que garante à
biodiversidade, gerando renda através de novas oportunidades de negócio (IDRHA,
2006, n.p)

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Acredita-se que ao diversificar as culturas na propriedade, a família poderá obter


ganhos econômicos relacionados a aquisição de alimentos, venda do excedente e não
depender exclusivamente da renda proveniente do tabaco. Richetti (2006) destaca que a
diversificação pode ser tanto horizontal (com a produção de um maior número de culturas na
propriedade) como, também, vertical (com a realização de várias etapas de produção de um
mesmo produto).
Quando se trata de uma agricultura agroecológica, qualquer tipo de diversificação
pode possibilitar uma maior sustentação da produção, com a reintegração de uma gama maior
de produtos dentro da própria propriedade, tornando os indivíduos mais autônomos em
relação a renda familiar.
Durante a pesquisa, levou-se em consideração o histórico familiar, ou seja, desde
quando se dedicam ao cultivo do tabaco, se é passado de geração em geração, características
da propriedade. Qual a composição da renda da família e o possível aumento da renda ou
deixando de gastar ao diversificar sua produção.

[...] quando tratamos de aumento de rentabilidade e maior possibilidade de acúmulo


de riquezas, é fundamental que pensemos no longo prazo, nas diferentes realidades e
cenários econômicos, que têm possibilidade de ocorrer e estabelecer uma correta
estratégia de proteção contra os eventuais “sustos” que a economia volta e meia nos
apresenta. Por isso, o fundamental é balancear a busca de maior rentabilidade com
atividades menos rentáveis, porém mais seguras (ANTUNES; RIES, 2001, p.65).

Nesse sentido, o objetivo da pesquisa foi o de conhecer os impactos da monocultura do


fumo nos aspectos econômicos e sociais de duas famílias pesquisadas. Identificar os pontos
negativos da monocultura (plantio de tabaco) na renda das famílias da região norte do
Município de Agudo e os possíveis benefícios ao diversificar, qual a possível economia que as
famílias terão ao aderir a este modo de produção.
Conhecer os possíveis problemas gerados pela monocultura do fumo para as famílias
visitadas também foi outro aspecto importante que a pesquisa buscou entender e perceber
também os aspectos positivos da diversificação da produção no que se refere aos aspectos
econômicos e social.

REFERENCIAL TEÓRICO

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Quando a unidade familiar rural produz seus alimentos, ela deixa de gastar na compra
dos mesmos em supermercados. Woortmann (1978) afirma que,

(...) realizando seu consumo alimentar em boa medida pela produção própria, o
pequeno lavrador aumenta as possibilidades de realização, pela via do mercado, de
outras fontes de consumo, não menos importantes para sua reprodução como ser
social. (WOORTMANN, 1978, p.114).

Além da economia na compra dos alimentos que elas mesmas produzem as famílias
também não sofrem com a variação dos preços dos alimentos. Segundo Garcia Jr. (1989, p.
127), as unidades familiares, “(...) ao autoconsumir diretamente durante parte do ano, diminui
o tempo em que estão expostas à flutuação dos preços pagos ao consumidor, reduzindo os
momentos em que são apenas compradoras”.

Outro aspecto que incentivou algumas famílias a deixarem a monocultura é situação


de insegurança e a crise que se instaurou nos últimos anos no país. A diversificação da
propriedade é uma estratégia para aumentar a autonomia e diminuir a vulnerabilidade que
advém da mercantilização (ELLIS, 2000).

A produção e consumo de alimentos auxilia na estabilidade econômica e social das


famílias expostas as oscilações acerca do cultivo do fumo. De maneira semelhante, Buainain,
Romeiro e Guanzirolli (2021, p. 3) afirmam que a diversificação “é uma clara e consciente
estratégia de redução de riscos e incerteza, sem dúvida um trunfo de muitos sistemas de
produção explorados por agricultores familiares”. Com estas estratégias as famílias podem
garantir uma produção diversificada, para o consumo e auxílio na renda familiar.

Desta forma, gastando menos em compras de alimentos, famílias vêm investindo em


suas propriedades, com a produção de alimentos, beneficiamento e venda de acordo com as
necessidades da família.

Já os agricultores que se dedicam apenas a uma monocultura enfrentam outras


necessidades, segundo Cândido:

Surgem assim (...) necessidades novas, que contribuem para criar ou intensificar os
vínculos com a vida das cidades, destruindo sua autonomia e ligando-o estritamente

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ao ritmo da economia geral, isto é, da região, do estado e do país, em contraste com


a economia particular, centralizada pela vida de bairro e baseada na subsistência.
Doravante, ele compra cada vez mais, desde a roupa e os utensílios até alimentos e
bugigangas de vário tipo; em consequência, precisa vender cada vez mais.
(CÂNDIDO, 2001, p. 207)

Pode-se entender a partir da citação acima que quando não há uma busca de
autossuficiência econômica, alimentar e esta família depende exclusivamente de uma cultura
para renda, a busca e ligação com a vida na cidade aumenta, com a busca de alimentos,
utensílios, entre outros, e consequentemente esta facilidade em comprar os produtos prontos
influencia no êxodo rural e também, aos que ainda ficam no meio rural, precisam aumentar o
cultivo do fumo para obter mais renda e assim suprir suas necessidades de compra.

METODOLOGIA

Para que a pesquisa fosse efetivada buscou-se no estudo de caso (YIN, 2005)
embasamento metodológico, por entender que se trata de um caso com limites bem definidos
os quais, em outra região ou com sujeitos pesquisados diferentes não poderia ser aplicado os
mesmos métodos de coleta de dados, nesse sentido foi um estudo de caso descritivo, pois
possibilitou, aos investigadores, a descrição de fenômenos contemporâneos dentro de seu
contexto real. Para Yin (2005, p.32) “o estudo de caso é uma investigação empírica que
investiga um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto da vida real”. Com essa
estratégia de pesquisa, os dados foram analisados de forma qualitativa, uma vez que partiram
somente da observação direta feita nas propriedades e conversa informal com os proprietários
das mesmas.
Na figura (01) abaixo, está representado como ocorreu a coleta de evidências para dar
conta de responder o questionamento inicial feito pela pesquisa.

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Primeiro contato Apresentado os Definiu-se quem eram


formal com as objetivos da as pessoas chaves
famílias pesquisas. pesquisa. para conversar.

Validação dos Coleta das Definição dos critérios


dados com os evidências. para observação.
pesquisados.

Figura 01: Esquema do processo da coleta de dados


Fonte: adaptado de Freitas e Jabbour (2011)

Num primeiro momento identificou-se duas famílias, uma trabalhando com a


monocultura do tabaco e, outra com o sistema de diversificação de cultura, produzindo
alimentos para subsistência e venda do excedente.
As duas famílias são da região norte do município de Agudo, do estado do Rio Grande
do Sul, onde a cultura predominante é o tabaco. As famílias foram escolhidas pela forma
diferente que trabalham em suas propriedades e pelas dimensões de plantio das mesmas ser
equivalentes.
Os dados/evidências foram coletados através de observação direta durante visitação e
conversa com os membros das famílias. Perguntas chaves foram feitas para entender o
contexto familiar, cultura, história e o que leva a escolha acerca das atividades produtivas. A
partir das respostas feitas a pessoas chaves de cada família, ou seja, os responsáveis pela
propriedade e através da observação realizada pode-se chegar a algumas considerações dos
fatores essências para a definição de optar pela monocultura ou pela cultura diversificada
nessa região.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Após os dados levantados através da observação direta feita nas localidades, optou-se
em preservar a identidade das famílias envolvidas, então neste relato serão chamadas de
família 1 e família 2.

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As famílias residem em localidades vizinhas no município de Agudo, no estado do Rio


Grande do Sul, sendo uma delas na localidade de Cerro Seco, com relevo composto por
colinas e dedicam-se exclusivamente ao cultivo do tabaco para a renda familiar e a outra
família reside na localidade de Linha das Pedras com relevo semelhante ao do Cerro Seco e
produzem diversos alimentos, culturas e, inclusive a do tabaco para a renda familiar.
Referente às condições climáticas, o relevo de ambas propriedades é semelhante.
Através da observação direta feita nas duas propriedades constatou-se na fala da
família 1 que esta se dedica exclusivamente ao cultivo do tabaco para geração de renda e que
não veem de forma negativa ser dependente financeiramente ao cultivo de apenas uma
cultura. Consideram satisfatória a renda obtida com este, bem como pretendem aumentar a
área plantada. Nesse sentido, Shiva (2003) chama atenção para,
As monoculturas ocupam primeiro a mente e depois são transferidas para o solo. As
monoculturas mentais geram modelos de produção que destroem a diversidade e
legitimam a destruição como progresso, crescimento e melhoria. (...) A expansão das
monoculturas tem mais a ver com política e poder do que com sistemas de
enriquecimento e melhoria da produção biológica. Isso se aplica tanto à Revolução
Verde quanto à revolução genética ou às novas biotecnologias. (SHIVA 2003, p. 17)

Desta forma, no relato da família 1 pode-se observar que os mesmos não conseguem
ver outra possibilidade de renda rápida e tão lucrativa. O cultivo do tabaco nesta família vem
de geração em geração, os maquinários utilizados são adquiridos via financiamentos, os
insumos são fornecidos pelas empresas fumageiras e abatem o valor na hora da venda do
produto e ficam à mercê do valor aplicado pela mesma.
Além do tabaco, produzem alimentos para subsistência como mandioca, hortaliças,
feijão, milho para os animais, leite, porcos, galinhas e gado.
A família 2, é assistida pela EMATER de Agudo, é composta por seis integrantes,
quatro adultos e duas crianças. De acordo com os relatos, sempre produziram alimentos
diversos na propriedade e tinham o hábito de vender o excedente.
Porém, a renda principal provinha do tabaco. Atualmente trabalham com a redução do
plantio do tabaco e investem na produção diversificada de alimentos. Como pode ser
observado no relato de um dos integrantes da família: “assim não dependemos só do fumo, se
dá granizo como na safra passada, e estragou o fumo, a gente ainda tem como se defender
com estas outras coisas”, (família 2, Agudo).

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Percebe-se então que as colocações da família 2 vai ao encontro com o que Freitas
(2015) afirma:
Diversificar significa ter menor dependência de fatores externos, menor dependência
de recursos controlados por atores externos e utilizar ao máximo as atividades dentro
e fora da unidade produtiva, agrícolas ou não agrícolas, procurando, ao fim, a
melhoria dos meios de vida e consequentemente das condições de vida. A
diversificação torna-se um fator-chave no desenvolvimento, pois dá aos atores
sociais a possibilidade de ter maior autonomia e construir trajetórias de vida
consideradas significativas. (FREITAS, 2015, p. 112).

Do excedente produzido no ano de 2017 obtiveram um lucro aproximadamente de


R$35.477,00. Já do que deixaram de comprar, pois produzem seu alimento, economizaram
R$18, 073, 80. De acordo com a família possibilita que o tabaco seja vendido todo de uma
vez, com um preço mais atrativo, sem contar que não ficam tão dependentes da venda do
mesmo.
Entende-se assim, de acordo com (REDIN, 2012) que: “a diversificação para o
consumo fortalece o atendimento das necessidades familiares, contribuindo para que o
excedente possa ser redistribuído nas relações pessoais como produtos de troca ou de venda”.
Observando as duas famílias, na Família 1, há uma dependência e ligação com
instituições financeiras e fumageiras para aquisição de implementos agrícolas, compra de
mais terra para aumento da produção, ficando mais atrelados e comprometidos com a
produção em larga escala do fumo para suprir estas necessidades além, das necessidades
básicas como compra de alimentos, pois o que produzem não gera uma grande economia na
renda.
Além dos implementos, há também os pacotes da empresa fumageira, que para
determinada espécie de fumo ser cultivado precisam, usar determinados adubos, venenos,
sistema de irrigação nos canteiros, sistemas estes criados por estas empresas.
Ou seja, cada vez mais aumenta o custo da produção e o produtor não se da conta, o
que fica claro quando diz que “é o que dá mais lucro, não da pra plantar outra coisa pra dar
dinheiro porque tem muito cerro, pouca terra” (Família 1, Agudo) e pretende aumentar a área
plantada adquirindo a propriedade vizinha.
Na família 2, os dados evidenciaram uma satisfação e tranquilidade financeira e social,
pois, com a produção do alimento consumido e venda do excedente estão obtendo uma boa

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renda e com isso, reduzindo a produção do tabaco que é considerado “judiado, trabalhoso”
por eles, devido ao tempo que é necessário para o cultivo, colheita, beneficiamento.
A redução do plantio do fumo é considerável, de 60 mil pés de fumo, em dois anos,
reduziram para 47 mil e, para a próxima safra pretendem plantar de 30 a 32 mil pés de fumo.
De acordo com a família, a diversificação demanda tempo e a gama de produtos está
aumentando, os produtos disponíveis são: feijão, ovos, leite, frango, carne suína, carne
bonina, massa caseira, pão, bolacha caseira, mandioca, folhosas, peixe, frutas diversas,
cebola, batatinha, batata doce, mel, banha, açúcar mascavo, alho, tomate, queijo, torresmo,
manteiga, suco de laranja e melado.

CONCLUSÃO

A pesquisa evidenciou a importância da diversificação da propriedade rural,


permitindo uma autonomia da família, para que se sintam mais livres financeiramente e não
atrelados e dependentes a uma indústria, nesse caso a fumageira, situação esta, que se agrava
se ocorre um sinistro na cultura do tabaco, tornando a família ainda mais dependente desta.
Além disso, a diversificação da cultura melhora a qualidade de vida, alimentar e
nutricional proporcionando melhoria na saúde familiar.
Outro aspecto relevante observado, é que, apesar da dependência financeira do tabaco,
a família 1, não se sente incomodada e não vê essa dependência de forma negativa. Sentem-se
felizes e, focam no aumento da produção deste, bem como, a compra de mais terra para este
fim.
Com o findar da pesquisa, ficou evidente a necessidade de se pensar/incentivar a
diversificação de cultura, pois, a mesma fortalece a agricultura familiar, dando possibilidades
de permanência no campo, uma vez que, não estando atrelado a apenas uma fonte de renda ou
de cultivo, quando se entende que de uma pequena propriedade pode-se viver com dignidade
a relação com o campo torna-se mais fortalecida.
A pesquisa também fez refletir como os pequenos agricultores não vêem outra saída
quando estão imersos no pensamento de grandes indústrias que vendem a idéia da
lucratividade e de pseudos benefícios, ou seja, a lógica do capital.

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A IMPORTÂNCIA DA FESTA DO PINHÃO PARA A VALORIZAÇÃO DA


CULTURA NA COMUNIDADE SANTO ANTÔNIO, LINHA DOS POMERANOS,
AGUDO/RS

Ricardo Henrique Klüsener 4


Kátia Fernanda Barrim Paz 5
Natália Laura Prodorutti6

Resumo

Este projeto tem como objetivo conhecer a importância da Festa do Pinhão na localidade de Linha dos
Pomerânos interior do município de Agudo, que é realizada anualmente no mês de Agosto. Buscando
através da pesquisa realizada com moradores locais e idealizadores do evento o porquê de sua
realização e sua importância para os agricultores familiares e coletores de pinhão da comunidade. A
metodologia adotada foi entrevistas formais e informais com os organizadores e idealizadores do
evento, e com os coletores de pinhão locais. Os resultados obtidos através da análise das entrevistas
mostram uma profunda relação de identidade entre a comunidade e a arvore araucária, através das
histórias contadas e a temática da festa. O que motivou a criação do evento foi um antigo café colonial
que existia na região e que impulsionou o turismo local, bem como uma forma de arrecadação e
identidade turística local. Os coletores mostraram um profundo conhecimento sobre a produção e
coleta das pinhas, demonstrando que se trata de um produto muito importante para a alimentação e
economia local. Estes também observaram que a produção vem diminuindo, por diversos motivos
como questões climáticas, uso excessivo de agrotóxicos e diminuição dos exemplares de araucárias.
Conclui-se que a araucária, bem como a festa está intimamente relacionado com a cultura do território
estudado, e é aconselhado o replantio e a valorização da espécie e da cultura do pinhão.

Palavras-chave: Agricultura familiar; Gastronomia; Araucária.

Introdução

A vida comunitária e as teias de relações construídas no campo são a base para


formação da identidade dos territórios rurais. Estas relações culturais, dos povos com o meio
ambiente onde vivem, são fundamentais para a resiliência e permanência das famílias de
agricultores no meio rural, freando o êxodo para as cidades.
A relevância que as comunidades rurais tem para os atores sociais envolvidos tange
várias esferas, como sentimento de pertencimento, os mutirões, as trocas de serviço, as ajudas,

4
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), ricardohenriquek@gmail.com
5
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), katia.fb.paz@gmail.com
6
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), natyprodorutti@gmail.com

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o lazer e as festividades. Conforme (TARDIN, 2012, p. 181) complementa, “em suas relações
sociais acentuam valores humanos fundamentais, como a solidariedade e a fraternidade, que
se concentram em múltiplas práticas de ajuda mútua entre vizinhos, em situações de
catástrofes, perdas de safra, doenças e morte, mesmo na organização de festividades
comunitárias [...]”.
No município de Agudo, cidade localizada na região central do estado do Rio Grande
do Sul, especificamente na localidade de Linha dos Pomeranos, é realizada anualmente no
mês de agosto a Festa do Pinhão. Este evento, organizado pela comunidade Santo Antônio,
conta com uma gastronomia típica onde o pinhão, fruto da araucária, é o protagonista dos
pratos. Participam pessoas de toda a região, que além de degustar os pratos preparados com
pinhão, apreciar também apresentações artísticas locais e viver um momento de comunhão
comunitária.
Os pinhões são colhidos entre os meses de março e setembro por pessoas da
comunidade, e servem como alimentação e renda complementar para as famílias da região. O
excedente é vendido diretamente ao consumidor e abastece alguns mercados locais.
A Floresta Ombrófila Mista, também conhecida como Floresta de Araucária, faz parte
do bioma da Mata Atlântica (Decreto Lei 750/1993), considerado como detentor de altíssimos
níveis de diversidade, apesar de intensamente explorado (LIMA; CAPOBIANCO, 1997). A
araucária é uma espécie arbórea clímax que ocupa o dossel da floresta servindo de proteção e
sombreamento para as outras árvores dos estratos inferiores. A fauna se beneficia através das
suas sementes, os pinhões, que são consumidos e dispersados pela floresta.
A Araucária angustifólia é uma espécie que consta no livro vermelho da flora do brasil
de espécies em extinção do estado do Grande do Sul Rio (MARTINELLI; MORAES, 2013).
Este é um dos motivos da planta ser imune ao corte demonstrando sua importância de
preservação.
A preservação parte do reconhecimento do seu valor tanto como espécie como por
elemento gastronômico local. Portanto a festa se torna um ponto chave para a permanência da
pratica cultural dos coletores e da valorização desta árvore tão importante para a fauna e flora
local.
Neste contexto, esse trabalho objetiva analisar a importância da Festa do Pinhão, na
Comunidade Santo Antônio de Linha dos Pomeranos, município de Agudo. Onde buscamos

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identificar a origem da festas do pinhão na respectiva comunidade, descrever a cultura do


pinhão na comunidade; identificar como a produção do pinhão contribui para a conservação
ambiental e turismo e compreender como a coleta do pinhão influencia na cultura e economia
da comunidade.
A realização desta pesquisa se justifica por se tratar de um aspecto cultural do
território, e da vida das pessoas que habitam a região. Sua relevância aumenta pelo fato da
araucária ser uma planta em extinção e que possui funções ecossistêmicas fundamentais para
a floresta local, alimentando e abrigando diversas espécies da fauna.

Agricultura Familiar

Conforme a Lei 11.326, que estabelece as diretrizes para a formulação da Política


Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais, a agricultor familiar
e são práticas de atividades no meio rural, que sigam as seguintes diretrizes:
Não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais; utilize
predominantemente mão de obrada própria família nas atividades econômicas do seu
estabelecimento ou empreendimento; tenha renda familiar predominantemente
originada de atividades econômicas vinculadas ao próprio estabelecimento ou
empreendimento; tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades
econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo Poder
Executivo; dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família. (BRASIL,
2006, p. 1).

O município de Agudo, segundo o senso do IBGE de 2010, tem uma população de


16.711 habitantes, sendo que destes, 9.835 residem na zona rural e tem sua base de sustento
na agricultura familiar. O local de pesquisa dar-se-á na comunidade Santo Antônio, localizada
em Linha dos Pomeranos, região norte do município.
Nesta região predomina o cultivo do tabaco, porem a produção de alimentos para
autoconsumo permanece presente gerando inclusive renda extra. Nos últimos anos, percebe-se
uma modificação neste padrão, e algumas famílias estão ingressando no cultivo de
hortifrutigranjeiros em escala maior, para venda, diversificando para além do cultivo do
tabaco. Já outras famílias estão se dedicando ao plantio da soja, produção de maior escala
necessitando assim de mais investimentos, maior tecnologia e insumos externos.
Assim sendo, a agricultura familiar é característica nesta comunidade, tanto pela forma
de renda, como pela mão de obra familiar e estilo de produção e vivência, conforme

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Bittencourt e Bianchini (1996), em um estudo feito na região sul do Brasil adotam a seguinte
definição “Agricultor familiar é todo aquele (a) agricultor (a) que tem na agricultura sua
principal fonte de renda (+ 80%) e que a base da força de trabalho utilizada no
estabelecimento seja desenvolvida por membros da família. É permitido o emprego de
terceiros temporariamente, quando a atividade agrícola assim necessitar. Em caso de
contratação de força de trabalho permanente externo à família, a mão-de-obra familiar deve
ser igual ou superior a 75% do total utilizado no estabelecimento.”
Na percepção de Mazoyer e Roudart (2010), [...] as formas de agriculturas observáveis
variam conforme o lugar, a tal ponto que de uma região do mundo a outra, podemos
classificá-las em gêneros muito diferentes. Enfim, com o tempo, toda agricultura se
transforma. Em dada região do mundo podem suceder-se espécies de agricultura
completamente distintas, que constituem as etapas de uma “serie evolutiva” característica da
história dessa região (MAZOYER; ROUDART, 2010, p. 44).

Gastronomia
A gastronomia típica se torna um atrativo turístico a parte. Santos (2011), em sua
análise sobre a comida do Paraná, diz que “os pratos locais são muito úteis como atrativos
turísticos de uma identidade social, pois: dessa forma, os pratos regionais fazem parte de um
processo civilizatório, que, ao celebrar esta sociedade, se expressam como fatos sociais totais
e se somam às realidades locais, permitindo emergências de novas formas de sociabilidades
públicas e privadas. A partir daí se pode permitir uma viagem ecogastronômica [...].”
Analisando as influencias no território ele segue, “na lógica do território criado, a
identidade aí construída é estimulada e propagada como uma forma de valorizar e diferenciar
uma especificidade, uma tipicidade. Quanto mais típico este território ou esta rede, mais
benefícios turísticos aportam para as cidades.” Como é o caso do pinhão na região norte do
município de Agudo, que poderia ser agregado aos pontos turísticos da localidade valorizando
o trabalho dos coletores e cozinheiros. Destacando as características fitogeográficas locais,
onde a araucária predomina.

Araucária

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A área de ocorrência natural de A. angustifólia está localizada no sul do Brasil, grande


parte dos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Agrupamentos menores
eram encontrados nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo (BACKES, 1999).
A araucária possui características peculiares, conforme descrito por KOCH, Zig:
As folhas são duras e pontiagudas. Permanecem por vários anos na planta. A
tonalidade escura das folhas rendeu o apelido de “mata preta” dado às florestas. A
araucária é planta dióica. Ou seja, possui árvores masculinas e femininas. A
polinização ocorre entre os meses de agosto e outubro, quando o vento transporta o
pólen da flor masculina (mingote) até a flor feminina (pinha). A partir daí
desenvolvem-se as sementes, os pinhões, que maduros servem de alimento a animais e
ao homem. Uma planta vive em média entre 200 e 300 anos, sendo sua idade
calculada pelos anéis de crescimento que vão sendo formados no tronco. (KOCH,
2002, p.33).

As florestas de araucárias sofreram grande pressão nos períodos coloniais, quando sua
madeira foi exportada para a Europa e utilizada na construção civil no sul do Brasil pelos
povos imigrantes. Esta situação fez com que as espécies de araucárias se encontrem em risco
de extinção.

Metodologia

Esta pesquisa se caracteriza pela abordagem qualitativa, enquanto técnicas utiliza-se as


entrevistas com conversa informal e formal. Na primeira etapa da pesquisa, foram realizadas
quatro entrevistas com os idealizadores e organizadores do evento, das quais duas em caráter
informal e duas formal. Os locais das entrevistas foram respectivamente no escritório da
EMATER de Agudo e na propriedade de um dos entrevistados. As perguntas foram feitas de
forma oral e anotadas as respostas por um dos integrantes do grupo, posteriormente
registradas no diário de campo e utilizadas nas análises.
Na sequência ainda foram entrevistados dois produtores rurais, coletores de pinhão em
suas respectivas propriedades no município de Agudo. Foram feitas de forma oral, gravadas
com celular e anotadas por um dos integrantes do grupo. Com estas entrevistas objetivou-se
descobrir como ocorria a coleta e as espécies de araucária existentes na região. Os dados
coletados foram analisados e resultaram na discussão apresentados posteriormente.
Os entrevistados serão denominados como A, B, C, D, E e F, esse procedimento se
justifica pela necessidade de preservar a identidade dos informantes.

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Organizadores
Os idealizadores e organizadores entrevistados foram o casal A e B e a senhora C,
agricultores e membros da diretoria da comunidade Santo Antônio. Todos são agricultores
familiares e moradores de Linha dos Pomeranos, localidade de Agudo.
A primeira pergunta da entrevista foi sobre a origem da ideia da festa, os entrevistados
responderam “que a ideia veio a partir do café colonial da serra que era oferecido aos finais de
semana pelas agricultoras locais. Algumas pessoas começaram a perguntar sobre o café e a
possibilidade de continuar oferecendo, porém não houve interesse da comunidade local.” Em
conversa com a entrevistada D, extensionista social da EMATER de Agudo foi sugerido que a
comunidade de Linha dos Pomeranos criasse algum evento que valorizasse a localidade e
então surge a proposta da Festa do Pinhão. Outro ponto foi pela questão da região apresentar
condições próprias de clima típico da Serra Gaúcha com relevo e Pinheiros de grande porte,
como também a tradição de colher os frutos anualmente.
Quando perguntados sobre o intuito da festa, relataram que objetivo foi de valorizar e
divulgar a localidade como potencial turístico-gastronômico e também gerar fundos de
arrecadação para a comunidade. Sobre os critérios para definição dos pratos a comissão
organizadora consultou uma nutricionista do município de Passa Sete que já realiza a festa há
alguns anos. Após reunião definiram o cardápio com os pratos de maior aceitação do público
que foram os seguintes: entrevero de Pinhão, paçoca, salada de pinhão, galinha caipira com
pinhão, arroz de leite, doces e cucas a base de pinhão.
Perguntados sobre quantas famílias se envolveram direta e indiretamente com a festa,
disseram que a comissão organizadora contou com as três famílias acima mencionadas que
trabalharam diretamente e com o apoio da comunidade local dividiram as tarefas de
elaboração e organização do local para a festa.
Na questão dos fatores limitantes para participação do público em geral, contaram que
entre as dificuldades encontradas a principal foi a mão de obra que era limitada,
principalmente nos dias que antecederam a festa, pois no dia houve boa participação das
famílias da comunidade. A distância também pode ser considerada um fator limitante, pelo
fato de que algumas pessoas da cidade deixam de ir, alegando a distância e condições da
estrada. Chamou a atenção o fato de que a comunidade do entorno foi pouco participativa se

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comparada com pessoas que vieram de fora como no caso da cidade de Agudo e até mesmo
outros municípios vizinhos.
Perguntados se a expectativa foi alcançada, a avaliação pós festa desde a primeira até a
terceira edição, foi bem positiva apesar de não ter o apoio esperado da comunidade local, e o
que desanimou a comissão organizadora foi o prejuízo financeiro ocorrido na última edição
em 2017, onde o clima chuvoso foi o determinante para a baixa participação do público em
geral.
Questionados se existe relação entre o tema e a preservação da espécie, responderam
que a preservação da araucária só começou a fazer sentido para as famílias com a diminuição
tanto dos exemplares mais antigos, que eram vendidos a preço de “banana” como pela
diminuição da produção de pinhas que vem acontecendo nos últimos anos.
Para concluir, a entrevistada C disse que “Hoje as famílias veem a Araucária com
outros olhos e significado simbólico relembrando o passado das enormes árvores e não só
como uma tora que vai para a serraria. Esperamos que a nova geração preserve as que ficaram
em pé”.

Coletores de pinhão
Os coletores entrevistados foram E e F, ambos residentes em Linha dos Pomeranos,
localidade de Agudo. O entrevistado E é um agricultor familiar, tem setenta e cinco anos e
sucedeu a família na propriedade rural, é casado há trinta e sete anos e tem três filhos. Uma
filha mora na propriedade já partilhada e independente, com seu marido e filhos, os outros
dois filhos residem e trabalham na cidade. O entrevistado F nasceu e morou toda vida na
propriedade onde trabalha, é um agricultor e juntamente com a família, composta por sua
esposa e seus seis filhos, trabalhou no plantio do tabaco. Hoje sua principal renda vem da
aposentadoria e uma das filhas, com esposo e filha continua na fumicultura.
Quando perguntados sobre o tempo que realizam a coleta, ambos responderam que já
na infância acompanhavam a família no trabalho de coleta e desde a adolescência participam
subindo nos pinheiros para derrubar as pinhas, prática que o seu F realiza até hoje, aos
sessenta e cinco anos. Com a prática, foram ganhando velocidade na derrubada, já que haviam
pinheiros com duzentas a trezentas pinhas, chegando a render cinco sacos de semente por
araucária.

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Contam que na infância eram realizados mutirões para a debulha das pinhas e
separação das falhas, e ensacar para posterior comercialização. O pinhão era armazenado nos
galpões e revirados todos os dias para não esquentar e levavam sal para não “carunchar”. A
comercialização era feita em Porto Alegre, Cachoeira e Salto do Jacuí. Um pinheiro chegava a
encher uma carroça de pinhas. Hoje, estes pinheiros não chegam a dar dois sacos de pinha.
Para F, o exemplo de aperfeiçoamento na prática de subir nas araucárias foram observadas
nos vizinhos e incorporadas.
Quando perguntados em qual época do ano realizam as coletas responderam que a
coleta inicia no fim de março e vai até fim de julho, período que pode variar, dependendo da
espécie de araucária. Por exemplo, o pinhão vermelho amadurece primeiro, depois vem o
pinhão rajado, o pinhão branco e por último o pinhão macaco, que pode ir até o fim de
setembro, mas que podem ter pinhas mal formadas e pinhões não tão gostosos. A época da
maturação pode se alterar conforme as condições climáticas, bem como acontece com as
demais plantas. Em períodos mais quentes, a maturação tende a acontecer precocemente.
Sobre as espécies conhecidas relataram que conhecem os pinhões vermelhos, rajados, brancos
e pinhão macaco, conhecimento das espécies este, que foi herdado das gerações passadas.
Ao questionar sobre a diminuição da produção, o entrevistado E relatou que nos dois
primeiros anos de seu casamento, dos trinta e sete de casados que somam hoje, a produção só
diminuiu. Hoje a produção é de apenas vinte por cento, em relação àquela época, havendo
anos em que a produção supre apenas as necessidades de consumo da família, e que segundo
eles, vem em função da ausência do frio. Disse que “no passado aconteciam geadas
diariamente e a temperatura era tão baixa que essa camada de gelo chegava a durar semanas,
não derretia. Hoje, a ocorrência de geadas diminuiu muito e isso influenciou, não só a
produção do pinhão, mas em todas as outras plantas que dependem do frio, como a uva e o
kiwi.” Todas as plantas que perdem as folhas (caducifólias) e tem que ter período de
dormência, vem sofrendo com esta mudança.
O entrevistado E acreditam que a diminuição da produção das araucárias não tem
relação com o plantio de soja e milho transgênico, pois desde os dois primeiros anos da
família constituída e grandes colheitas de pinhão, a produção já vem diminuindo e os
monocultivos estão sendo implantados de dez a quinze anos pra cá. Segundo ele, a queda

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gradativa na produtividade já é registrada a mais de trinta anos e como o plantio dos


transgênicos iniciou depois, não haveria associação entre as duas coisas.
Já o entrevistado F observa a diminuição na produção, relatando que “em uma planta
específica, onde conseguia em torno de dois sacos de pinhão, neste ano não recolheu nem bem
um saco.” Conta que nos últimos cinco a seis anos a produção diminuiu drasticamente e
acredita que haja relação com o uso de agrotóxicos e transgênicos, nas culturas de soja e
milho da região. Conta que em algumas árvores do pinhão branco, as pinhas são tão falhadas
que não vale a pena derrubar.
Sobre a quantidade de araucárias, o entrevistado F tem em torno de 150 araucárias na
propriedade de 19 hectares. Enquanto na propriedade de E, estima-se que tenham em torno de
300 araucárias, em 69 hectares, muitas delas plantadas a trinta anos atrás e que hoje já estão
produzindo. Sendo conhecedor de toda a região, ele afirma que a quantidade de araucárias
diminuiu bastante, mas que hoje essa quantidade se mantem. Por outro lado, a mata de
araucária não aumenta e não se renova em virtude de os agricultores não plantarem e não
permitirem seu crescimento, devido a legislação ambiental que torna a planta imune ao corte.
Em sua propriedade, ele permite o crescimento das mesmas, porém nas vizinhas, quando há
uma planta nascendo ou mudas crescendo, as mesmas são arrancadas. Isso acontece porque os
produtores rurais consideram uma desvantagem ter as árvores em suas terras, uma vez que a
extração da madeira é proibida e a araucária ocupa uma grande proporção do solo, o que deixa
mais difícil o manejo das lavouras, tornando a terra fica improdutiva.
Questionados sobre o percentual de renda que a venda do pinhão representa nas
finanças da família, o entrevistado E contou que realizam a venda direta ao consumidor,
juntamente com a venda do caqui. Neste ano, o valor do quilo foi de seis reais e a renda que o
pinhão gera para a família é de aproximadamente mil e quinhentos a dois mil reais por ano. O
entrevistado F também faz a venda direta, juntamente com o comércio do feijão. Ele conta
que tem pinhão na propriedade e também compra de fora (Sobradinho) e vende para Cortado,
Paraíso e na cidade de Agudo. Sua renda é de cinco a oito mil reais anual. Ganha de três, a
três e cinquenta reais por quilo, pois no comercio vende-se a sete reais e cinquenta centavos o
quilo, vendendo em torno de dois mil kg por ano.
Outra pergunta foi em relação ao conhecimento dos entrevistados sobre a fenologia da
araucária, e responderam que pinha leva um ano e meio para se formar. Segundo o

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entrevistado E “no fim de setembro, quando começa a subir a seiva da araucária, forma-se a
pinha nova, do fim de setembro ao fim de outubro, toda pinha floresce, e a partir do fim de
março, essa pinha amadurece.”
Para eles fatores externos podem interferir na produção, como: uma tempestade de
granizo que pode derrubar as pinhas que estão em formação, ou torná-las defeituosas.
Invernos rigorosos aumentam a produção, já que a árvore se beneficia deste micro clima.
Invernos menos rigorosos, fazem com que o pinheiro carregue menos, pois há um período de
dormência, em que a planta necessita do frio, caso o contrário, ela aborta a flor. Comentaram
também que uma planta começa a produzir com doze a quinze anos e em terra fértil, até antes
desse tempo.
Observaram que além do pinhão, a araucária é uma madeira de excelente qualidade.
Quando há um “machucado” no tronco, a seiva engrossa e vira própolis, que é colhido pelas
abelhas e levado para as colmeias para tapar frestas e formar cera, formando posteriormente o
própolis. Esse própolis é um antibiótico natural e na região de pinhais é um dos própolis mais
fortes, aromáticos e de maior efeito, devido a qualidade da seiva da madeira, o que resulta um
própolis gostoso, forte e curativo, contra infecções e gripes. Desse própolis vai pode-se fazer a
propulina, que é muito consumida.
O pinhão é consumido por muitos animais da fauna nativa local como o tatu, a paca, a
cotia, os ratos e pássaros. A gralha azul, por exemplo, guarda a semente para comer depois e
“esquece” onde guardou, assim esses sementes germinam a nasce uma nova planta, segundo
ele “muitas das araucárias que a região tem hoje, estão lá graças ao trabalho deste pássaro”. A
reprodução da árvore se deve em partes a gralha e em partes pela própria planta, pois quando
a pinha cai e as sementes ficam na posição ideal para germinação. As famílias não conseguem
coletar todos os pinhões pelo fato da mata de araucárias ser muito densa e ampla.
As coletas são realizadas em toda a região, estima-se que da propriedade das famílias
entrevistadas até o limite com o município de Cerro Branco existam em torno de oito mil
araucárias adultas, conforme Figura 01. Os entrevistados observam que pessoas de vários
lugares vêm para coletar pinhão, pois há terras de herança sem moradores fixos, onde os
donos atualmente vivem em outras cidades. Os coletores vêm de Novo Cabrais, Cerro Branco,
Agudo, Sobradinho, Passa Sete, Lagoa Bonita e toda essa região do Centro Serra.

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Figura 01: Mata de araucárias na localidade de Linha dos Pomeranos, Agudo-RS


Fonte: Arquivo dos autores

Neste ano a maturação desigual é um fato, pois no mesmo pé observa-se pinhas


maduras e pinhas que ainda não amadureceram. Outra curiosidade inusitada é que nesse ano
um lado da planta tem pinhas normais e no outro lado as pinhas são falhadas, não tem
pinhões. Os coletores acreditam que isto se deve ao eclipse lunar. O sol forte também é uma
possibilidade, por queimar as pinhas em formação, além das chuvas escassas. O entrevistado
F diz que a má formação se deve ao uso intensivo de agrotóxicos, as pinhas florescem em
outubro, novembro e em pouco tempo em torno de 80% delas já estão escurecidas.

Lembranças e Memórias
A família dos pais do entrevistado E são proprietária das terras a gerações, ele recorda
que nas épocas da produção do pinhão, a família cercava uma área de aproximadamente trinta
hectares de mata e usavam para a engorda dos porcos e gado e porco.
Conta também de uma história de quando escalava uma araucária para coletar pinhão e
quebrou o galho onde havia feito o laço e caiu ficando pendurado nos galhos de baixo.
Também conta da situação dos coletores que precisaram de ajuda pra descer do pinheiro, pois
endureceram de frio ou de câimbra e de catadores que tomaram “pinhadas” na cabeça.
Outro fato interessante foi o caso de um homem que derrubou uma pinha em cima de
uma caixa de abelha e foi atacado, este teve que descer do pinheiro envolto na nuvem de
abelhas e foi socorrido quando chegou no chão.

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As lembranças dos momentos de comemoração da colheita quando as pessoas se


reuniam pra fazer fogo de chão com as grimpas e sapecar pinhão, que para eles, é a melhor
forma de preparo, pois resulta no melhor sabor da semente. O pinhão também pode ser
consumido assado na chapa ou cozido, em pratos especiais, como os servidos na Festa do
Pinhão.

Sucessão
A filha que está na propriedade do entrevistado E já trabalha na coleta. Acorda de
madrugada e já vai buscar as sementes. O filho dela, e neto do entrevistado, também já
participa da atividade. A coleta inicia dia 19 de março, dia de São José.
A neta tem interesse na coleta do pinhão, porém, para subir na árvore, ele acredita que
não haverá sucessão. Pessoas não conhecem a pinha, nem como acontece a coleta. Os
pinheiros mais antigos estão nas propriedades dos familiares do entrevistado E e chegam a ter
4,5 metros de diâmetro, os agricultores estimam que essas árvores tenham mais de 300 a 500
anos. Avaliada por uma engenheira ambiental, há uma árvore milenar na região. Cada ano de
vida aumenta 1 cm da espessura da árvore.

História local
A Serraria Scheidt (que dá nome a localidade próxima) foi responsável pelo corte e
beneficiamento da maior parte da mata de araucária da região, há aproximadamente 150 anos.
Serravam e levavam pra Santa Maria, Santa Cruz, Rio Pardo e Cruz Alta. Então a mata que se
tem hoje, é relativamente nova, resultado dos processos regenerativos naturais.

Conclusões

Analisando os dados coletados nas entrevistas chegou-se as seguintes conclusões. A


origem da festa vem de um movimento que surgiu dentro da comunidade Santo Antônio de
Linha dos Pomeranos, Agudo, como forma de resgate cultural de um antigo café colonial que
existia na região, valorizar o potencial turístico local, bem como uma forma de angariar
fundos que contemplasse as características locais. O pinhão foi escolhido como prato
principal pelas características ambientais e culturais que envolvem este alimento.

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Em relação ao resultado das entrevistas com os coletores observou-se que o pinhão,


sua coleta e a araucária fazer parte da identidade cultural do território estudado. Existe uma
sabedoria e conexão destes com espécie, onde foram relatados diversas histórias e contos. Os
motivos da redução na produção das araucárias são diversos, porém ficou claro que a
diminuição da oferta do pinhão também decorre dos pequenos percentuais de área de mata de
araucárias existentes no município. Considera-se relevante que ocorra um reflorestamento
especificamente com araucárias na busca de recompor a mata nativa original.

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DESTINO DOS RESÍDUOS DOMÉSTICOS PRODUZIDOS PELAS FAMÍLIAS DE


ALUNOS DA ESCOLA ESTADUAL MEDIANEIRA, AJURICABA/RS

Francieli Daliani Bandeira Bertollo 7


Angela Maria Maboni Sansonovicz8
Janete Webler Cancelier 9

Resumo

A busca por uma vida mais saudável pressupõe, entre outras condições, um local para as famílias do
meio rural viverem num ambiente sustentável com qualidade de vida. Assim, objetivo desse trabalho
foi identificar o destino dado aos resíduos domésticos nas propriedades rurais das famílias de alunos
da Escola Estadual de Ensino Fundamental Medianeira, Ajuricaba/RS. Também foi objetivo da
pesquisa coletar sugestões das famílias sobre o que a administração municipal pode fazer para
solucionar ou amenizar o problema do descarte incorreto de resíduos no espaço rural. Os resultados
obtidos demostram que todas as famílias participantes da pesquisa têm consciência das consequências
negativas do descarte incorreto dos resíduos domésticos ao meio ambiente e a saúde, porém, existe
uma contradição no que ocorre na prática. A administração pública e população rural devem procurar
unir esforços para diminuir os impactos causados pelo descarte incorreto dos resíduos domésticos.

Palavras-chave: Descarte de resíduos sólidos. Espaço rural. Educação ambiental.


Sustentabilidade.

Introdução

A destinação correta dos resíduos gerados pelos brasileiros é, sem dúvida, um grande
problema em todo o país, tanto nas grandes como nas pequenas cidades, porém, no meio rural
essa questão é agravada pela ineficiência de políticas púbicas em relação ao recolhimento dos
resíduos. Vale destacar que atualmente os hábitos de consumo da população rural se
assemelham aos da população urbana, assim os materiais descartados também são os mesmos.
Sem falar dos resíduos de produtos agrícolas e de uso veterinário, evidenciando a
problemática em questão.

7
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM):fdbandeira@yahoo.com.br.
8
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM): angela_mab_san@hotmail.com.
9
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM): janetewc@yahoo.com.br.

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Devido a ineficiência da coleta de resíduos no meio rural, é também difícil encontrar


dados da geração de resíduos nessas áreas, assim o que encontramos através de pesquisas são
apenas os dados de coletas urbanas. Segundo o Atlas de Saneamento publicado pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (2011), a maioria dos municípios brasileiros dispõem de
coleta de lixo, não definindo a origem desses resíduos, se de áreas urbanas ou do campo,
porém, chama a atenção para o destino, afirmando que 50,8% são depositados em espaços a
céu aberto, conhecidos popularmente como lixões.
Essa pesquisa teve como objetivo verificar qual o destino dos resíduos domésticos das
propriedades rurais das famílias dos alunos da Escola Estadual de Ensino Fundamental
Medianeira, Ajuricaba/RS. Buscou também coletar sugestões das famílias sobre o que a
administração municipal pode fazer para solucionar ou amenizar o descarte incorreto de
resíduos no espaço rural. Os resultados da pesquisa foram entregues para as autoridades
responsáveis pelo setor do meio ambiente no município, para que as pessoas responsáveis
pela elaboração das políticas públicas reflitam sobre a problemática.
No município de Ajuricaba a coleta regular de lixo urbano ocorre três dias na semana,
com destino ao Aterro Sanitário da SIMPEX, localizado em Palmeira das Missões/RS. Porém,
no espaço rural, a situação do descarte dos resíduos sólidos é agravada pela inexistência de
um programa de coleta eficiente, onde ocorre em pontos específicos com periodicidade
mensal.
O destino da crescente quantidade de resíduos sólidos, produzido pela sociedade de
consumo, é um problema a ser discutido não apenas pela administração pública, mas também
por toda a sociedade. A problemática do descarte de resíduos se agravou ainda mais com o
advento da cultura do descartável, nesse sentido o reaproveitamento e a reciclagem são
consideradas importantes soluções para a redução da produção de lixo, sendo necessário
mudar o pensamento de que tudo que descartamos é realmente lixo.
Antigamente o lixo descartado nas propriedades rurais era, em grande maioria,
orgânico, que se degradava com facilidade e não oferecia risco a saúde e ao meio ambiente. A
partir do advento da Revolução Industrial o avanço do processo de industrialização
ampliaram-se substancialmente a utilização de recursos naturais e consequentemente a
produção de resíduos sólidos como as embalagens e materiais, os quais pela sua composição
sintética não se degradam naturalmente. Nesse contexto, é necessário que a população tenha

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ciência da quantidade de resíduos gerados, assumindo responsabilidades perante a destinação


adequada dos mesmos.
A destinação correta dos resíduos sólidos trata-se de um grande desafio. Uma solução
é a coleta seletiva do lixo, que ainda é pouco expressiva no Brasil, segundo o IBGE, em 2008
representava 17,9%, principalmente nas Regiões Sul e Sudeste do país. E entre os que
realizam a coleta seletiva, apenas 38% compreendem todo o território do município (IBGE,
2011).
Grande parte dos resíduos descartados pela população poderia ser reaproveitado ou
destinado para instituições associadas, a empresas de reciclagem com valor de
comercialização maior. Ação essa, que colaboraria para a diminuição do grande volume de
resíduos produzidos, que em sua maioria acaba sendo destinado para aterros sanitários.
Percebe-se que essas ações pouco se manifestam não somente pela ausência de
conhecimentos ambientais por parte da população e sim também pela carência de políticas,
sejam elas a nível municipal, estadual ou federal, que auxiliem e estimulem através de
incentivos financeiros a concretização de iniciativas como cooperativas que poderiam
trabalhar com esses materiais, o que em última instância ainda possibilitaria recursos
financeiros as famílias envolvidas.
Ainda segundo o IBGE (2011) “a coleta seletiva contribui para diminuir a quantidade
de resíduos disposta em aterros sanitários e outros destinos, gera empregos, melhora a
condição de trabalho dos catadores de lixo, permite a reciclagem e, com isso, economiza
energia e recursos naturais”. Boa parte da população acredita que o trabalho de coleta e
separação dos resíduos descartados é sujo, porém se a separação dos resíduos for realizada de
maneira correta pela população e a coleta seletiva for efetivada, a reciclagem e o
reaproveitamento dos resíduos passam a ser tarefas mais limpas.
Mais do que discussões teóricas no ambiente escolar, é necessário desenvolver ações
que façam a administração pública e comunidade como um todo refletir sobre situações que
ocorrem no cotidiano, assim, a aplicação desse projeto irá colaborar para a reflexão sobre a
problemática do descarte incorreto dos resíduos sólidos no espaço rural e a conscientização
ambiental não só dentro da escola, mas extrapolando seus limites.
A pesquisa foi realizada na instituição de ensino Escola Estadual de Ensino
Fundamental Medianeira, que está localizada no interior do município de Ajuricaba/RS

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(figura 1), mais precisamente no Distrito Medianeira-Linha 26, distante aproximadamente 7


km do centro da cidade. Seu funcionamento ocorre nos turnos da manhã e da tarde, atendendo
99 alunos que compõem 9 turmas do 1º ano dos anos iniciais até o 9º ano dos anos finais.
Alguns desses alunos residem na vila em que a escola está localizada, porém outros deslocam-
se, com transporte escolar, de diferentes localidades do município. Por estar localizada na
área rural do município, a escola está sempre preocupada com as questões locais, assim, é
interesse da escola promover atividades que abordem essas questões.

Figura 1 – Mapa com a localização do município de Ajuricaba no Rio Grande do Sul.


Fonte: Wikipedia

Minayo (2001, p.17) entende por pesquisa “a atividade básica da ciência na sua
indagação e construção da realidade. É a pesquisa que alimenta a atividade de ensino e
atualiza frente à realidade do mundo”. Para ele a pesquisa engloba pensamento e ação, assim,
em primeiro lugar deverá abordar um problema da vida real. Para ele, a problemática deverá
estar relacionada “a interesses e circunstâncias socialmente condicionadas. São frutos de
determinada inserção no real, nele encontrando suas razões e seus objetivos” (MINAYO,
2001, p.17). Minayo (2001, p. 25) destaca ainda que a pesquisa “se realiza fundamentalmente

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por uma linguagem fundada em conceitos, preposições, métodos, e técnicas de linguagem que
se constroem com ritmo próprio e particular”.
Os sujeitos da pesquisa são as famílias de todos os alunos da escola, ou seja, fizeram
parte da pesquisa todas as famílias que têm seus filhos matriculados do 1º ao 9º ano do ensino
fundamental, porém, das 71 famílias, 65 responderam e entregaram o questionário. Para
identificar o destino dado aos resíduos sólidos domésticos nas propriedades rurais das famílias
de alunos da Escola Estadual de Ensino Fundamental Medianeira, foi elaborado um
questionário com perguntas objetivas relacionadas com a maneira que as famílias realizam o
descarte dos resíduos em suas propriedades. O questionário foi enviado para as famílias
através dos alunos, na sequência foram analisados e os dados organizados.
Quanto a natureza da pesquisa pode ser considerada um estudo de caso, pois tem por
objetivo de gerar conhecimentos para a solução de problemas relacionados ao descarte de
resíduos sólidos das famílias dos alunos. Quanto a forma de abordagem podemos dizer que a
pesquisa é quali-quantitativa, pois além de empregar a quantificação, na coleta de
informações através de questionário e no tratamento das informações por meio de técnicas
estatísticas, a pesquisa utilizou também a descrição para a análise de alguns dados não
quantificáveis.
A pesquisa é descritiva, pois tem o objetivo de levantar dados em relação ao destino
dos resíduos sólidos. Do ponto de vista dos procedimentos técnicos a pesquisa pode ser
considerada como de levantamento, já que visa conhecer o comportamento de algumas
pessoas em relação ao destino que dão a seus resíduos sólidos.
O questionário foi organizado com perguntas que colaboraram para que alguns dos
objetivos fossem alcançados, como qual é o destino dado aos resíduos produzidos nas suas
residências e sugestões que a administração do município pode fazer para solucionar ou
minimizar o problema do descarte incorreto dos resíduos sólidos domésticos no espaço rural.
Após a aplicação dos questionários, os dados foram organizados, interpretados e
avaliados, para a montagem de um relatório que foi entregue ao setor responsável pelo meio
ambiente no município de Ajuricaba/RS, na Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente.

A escola promotora da saúde

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Aspecto fundamental para efetivação da Atenção Básica é a promoção da saúde, que é


uma estratégia de articulação transversal que objetiva a melhoria na qualidade de vida e a
redução da vulnerabilidade e dos riscos à saúde, por meio da construção de políticas públicas
saudáveis, que levem a população a ter melhorias no modo de viver: condições de trabalho,
habitação, educação, lazer, cultura, acesso a bens e serviços essenciais. Uma estratégia
fundamental é a saúde da família, com isso terá que desenvolver atividades de acordo com o
planejamento e a programação realizada com base no diagnóstico situacional e tendo como
foco a família e a comunidade, entendida que começa na escola.
Conforme Philippi Jr. e Pelicioni (2005), a promoção da saúde começa na escola,
parte de uma visão integral e multidisciplinar do ser humano, considerando as pessoas no seu
contexto familiar, comunitário e social. Procurando desenvolver conhecimentos, habilidades e
agilidades para o cuidado com a saúde e a prevenção das condutas de riscos em todas as
oportunidades educativas; fomentando uma análise crítica e reflexiva sobre os valores,
atitudes, condições sociais e estilos de vida, onde busca fortalecer tudo aquilo que contribui
para a melhoria da saúde, da qualidade ambiental e do desenvolvimento humano. Facilitando
a participação de todos os membros da comunidade educativa na tomada de decisões,
colaborando na promoção de relações de igualdade entre as pessoas, na construção da
cidadania e democracia, sendo solidário, com trabalho em comunidade, respeitando os
direitos humanos.
É necessário compreender a variedade de fatores que podem afetar a saúde, o meio
ambiente e, essas consequências afetam a qualidade de vida das pessoas. Essas devem ser as
bases para que a educação e a promoção da saúde sejam visíveis na prática com os alunos. A
escola como promotora da saúde, levando à adoção de ações necessárias para a promoção da
saúde, no ambiente escolar, e ações de proteção, conservação e recuperação do meio
ambiente, da comunidade, da cidade em que está localizada.
O princípio da motivação das crianças e jovens pelos temas ambientais têm se
mostrado importante para que o conceito de escola saudável seja implementando, incluindo
num todo e não tratando só a saúde, mas como resultante de um meio ambiente saudável, nos
aspectos biofísico e social.
A escola saudável, se preocupa com a comunidade humana e com a saúde de todos os
seus membros: professores, alunos e trabalhadores em educação, incluindo todos os que se

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relacionam com a comunidade escolar, e com a qualidade do meio em que vivem. Todas as
escolas colaborando com a promoção da saúde e a proteção do meio ambiente, podem
contribuir para autonomia, participação, crítica e criatividade; para desenvolver as
potencialidades físicas, psíquicas, cognitivas e sociais.
Philippi (2005) deixa transparecer que essa ideia de uma escola promotora da saúde é
o reconhecimento implícito de que a educação em saúde e a educação ambiental não se fazem
somente pelo currículo explícito, parte desse programa escolar, mas com ações pedagógicas,
que previna e promova a saúde, e de conservação do meio ambiente, bem como a
comunidade, pelo apoio mútuo entre escola, famílias e comunidade com base no conceito de
educação. De acordo com o autor, a função da escola é oferecer conhecimentos e atitudes que
promovam o cuidado da própria saúde e ajudem a prevenir comportamentos de risco que
impeçam a degradação ambiental. Facilitando o trabalho de todo o conjunto de todos os
integrantes da comunidade educativa, com o mesmo objetivo de melhorar a saúde e a
qualidade de vida das gerações atuais e futuras. Essas mudanças vão acontecendo ao longo do
percurso, não é de um dia para outro, mas aos poucos se transformam em grandes mudanças.
Temos três tarefas importantes para seguir:

- Desenvolver um plano escolar de educação com inclusão, um currículo flexível,


observando a realidade dos alunos, capacitação dos docentes com conteúdos e
métodos da educação e da promoção da saúde e da educação ambiental e a criação e
a execução de políticas públicas adequadas;
- Estabelecer uma relação estreita com as famílias, consultando os pais sobre
assuntos de interesse relacionados com as áreas da saúde e meio ambiente, colocar
os objetivos da escola e envolver eles no processo de ensino e aprendizagem de seus
filhos;
- Integração da escola com a comunidade, chamar as pessoas dos serviços de saúde e
de meio ambiente local no planejamento e na execução de programas escolares,
desenvolvendo ações preventivas na escola, fazer um planejamento para pedir
recursos e envolver toda a comunidade escolar e os trabalhadores em educação.
(PHILIPPI JR.; PELICIONI, 2005).

O desafio da educação é propiciar bases para compreensão da realidade da vivência


dos educandos a fim de criar condições para a transformação e melhoria de suas vidas. A
escola é o lugar ideal para desenvolver programas de promoção e educação em saúde e de
educação ambiental, com grande repercussão, por exercer uma grande influência sobre as
crianças e adolescentes nas etapas formativas mais importantes de sua vida. Na educação

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infantil e séries iniciais as crianças adquirem as bases de seu comportamento e conhecimento,


o senso de responsabilidade e a capacidade de observar, pensar e agir.
Para Philippi Jr. e Pelicioni (2005), criar proposta das escolas saudáveis é formar
gerações de cidadãos éticos, com conhecimentos, habilidades e atitudes necessários para
promover e cuidar de sua saúde, de sua família e comunidade, criando ambientes de vida, de
estudo e de convivência saudáveis. Assim, a promoção da saúde no âmbito escolar é uma
prioridade, assegurando o direito a saúde, ao meio ambiente saudável e a educação na infância
é responsabilidade de todos, onde a sociedade é responsável, por meio da capacidade criadora
e produtiva dos jovens, um futuro social e humano sustentável.

A função da escola na sociedade contemporânea, além do desenvolvimento pessoal


dos alunos, é prepará-los para a vida em comum, ou seja, para a sua socialização e
trabalho, tornando-os aptos a compreender a dinâmica da sociedade e conseguir
desenvolver mecanismos efetivos de participação social (PHILIPPI JR.;
PELICIONI, 2005, p. 835).

Nesse contexto, de período de transição pelo qual a sociedade está passando com
relação a concepção de educação, a escola passa a assumir seu papel, em relação ao
conhecimento e a vida sociocultural. O professor deve assumir um posicionamento mais
dialógico com seus alunos, procurando diminuir a distância entre seu conhecimento e as
práticas pedagógicas que utiliza em sala de aula, passando a construir pontes entre a realidade
das práticas educativas e o que se pretende realizar, embora não podendo fugir dos conteúdos
(PHILIPPI JR.; PELICIONI, 2005).

Educação ambiental

O saber ambiental pode ser subentendido como a formação de um novo saber


de integração interdisciplinar do conhecimento, ele não se esgota na extensão dos paradigmas
da ecologia e nem tem limites a um determinado componente ecológico. O saber ambiental
vai além das “ciências ambientais”, que foi constituída pela antropologia ecológica, ecologia
urbana, saúde, psicologia, economia e engenharia ambiental, e vai além, abre um campo nos
valores éticos, nos conhecimentos práticos e no saber tradicional.

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Os processos ecológicos, econômicos, tecnológicos e culturais que confluem num


sistema socioambiental são conformados pelos interesses e racionalidades de atores
sociais e organizações institucionais diversos. O saber ambiental é constituído não
só pela confluência de disciplinas científicas estabelecidas, mas pela emergência de
um conjunto de saberes teóricos, técnicos e estratégicos, atravessados por estratégias
de poder no saber (LEFF, 2012, p. 147).

Para Leff (2012), o saber ambiental está em processo de gestação, tentando se


legitimar, teórico e prático, este saber passa pelo processo transdisciplinar, mudança de
paradigma; integrando fenômenos naturais e sociais articulando processos materiais com
especificidade ontológica e epistemológica. Trata-se de um processo teórico que se dá através
de movimentos sociais e mudanças institucionais que incidem na concretização do conceito
de ambiente, esse ambiente em que vivemos, na transformação das práticas pedagógicas onde
é assimilado o saber, e nas práticas de ensino onde trabalhamos. O saber ambiental emergente
propõe a reconstrução da subjetividade e dos sujeitos da história, diferença do ser e da
autoridade dos indivíduos, suas diversidades, suas memórias, novas formas de
posicionamento no mundo são geradas.
A partir deste contexto, a educação ambiental se coloca enquanto um processo de
reconhecimento de valores e clarificações de conceitos, do desenvolvimento das habilidades e
da modificação das atitudes em relação ao meio, para esse entendimento e para apreciar as
inter-relações entre os seres humanos, suas culturas e seus meios biofísicos. A educação
ambiental também se relaciona com a prática das tomadas de decisões e a ética que conduzem
para a melhora da qualidade de vida.
As ações de educação ambiental devem ocorrer de forma contínua, pela qual a
comunidade educativa tem a tomada de consciência de sua realidade global, do tipo de
relações que os homens estabelecem entre si e com a natureza, dos problemas derivados de
diversas relações e suas causas profundas. Mediante uma prática que vincula o educando com
a comunidade em geral, valores e atitudes que promovem um comportamento dirigido a
transformação superadora dessa realidade, tantos em seus aspectos naturais como sociais,
desenvolvendo no educando as habilidades e atitudes necessárias para a dita transformação.
Esse tipo de educação se desenvolve individualmente, com caráter social em sua relação com
a natureza e com os outros seres humanos, visando potencializar essa atividade humana com a
finalidade total de prática social e de ética ambiental.

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Porém, a educação ambiental passa por um processo de construção de um saber


interdisciplinar e de novos métodos holísticos para analisar os processos complexos
socioambientais que surgem da mudança global. Entretanto pela sua complexidade, estão
conseguindo conscientizar os cidadãos e a inserção de componentes para capacitar dentro da
área de projetos de gestão ambiental, oriundos por critérios de rentabilidade econômica. Mas
essa prática é ineficaz. Nesse momento a necessidade de criar novos rumos, com saberes,
através de novas estratégias, com conceitos que guiam para a construção de uma nova
racionalidade social, orientada por princípios de democracia, sustentabilidade ecológica,
diversidade cultural e equidade social. Isto posto renova, os princípios da educação ambiental
e coloca novos desafios futuros para transformar suas orientações, suas estratégias e seus
métodos, para construir uma nova ordem social.
A Lei 9.795/99, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras
providências, dispõe

Art. 1º. Entende-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o
indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades,
atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso
comum do povo, essencial á sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade.

A educação ambiental, tem como objetivo principal, proporcionar aos indivíduos a


possibilidade de adquirir conhecimentos, o sentido dos valores, o interesse ativo e as atitudes
necessárias para proteger e melhorar as relações da sociedade com o planeta Terra no
contexto das questões ambientais e a utilização dos recursos naturais. Tendo como princípios
básicos da educação ambiental, o enfoque humanista, holístico, democrático e participativo.
A aplicação do saber ambiental, para programas de gestão ambiental mostra a
necessidade de elaborar indicadores interprocessuais com capacidade de analisar, avaliar e
fazer um monitoramento dos sistemas e processos ambientais complicados, sobre qualidade
de vida, valorização econômica, cultural e social dos recursos; os impactos ambientais que
geram, mudança global, a condição do espaço demográfico da atualidade com grande
mudança do meio rural para urbano, no qual intervêm e causa diversas modificações a nível
de costume de materialidade e racionalidade. Levando a um diálogo dos níveis mais altos de

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abstração conceitual até os níveis do saber prático e do cotidiano vivenciados onde são
vivenciadas as estratégias e práticas.

Sustentabilidade

Desenvolvimento sustentável é definido como “o desenvolvimento que satisfaz as


necessidades das presentes gerações, sem comprometer a capacidade de as futuras gerações
satisfazerem suas próprias necessidades” (LEFF, 2012 p.143). Indicando as dimensões básicas
da sustentabilidade que são: econômica, social e ambiental. “Cerca de três quartos dos
recursos naturais do mundo são consumidos em cidades. A estimativa da ONU é que 70% da
população global estarão vivendo em áreas urbanas até 2050” (PANSERA-DE-ARAÚJO,
1998, p.243).
Compreende-se por “Recursos Naturais” o conjunto de elementos da natureza que
possuem utilidade para o ser humano, com a finalidade do desenvolvimento da civilização,
sobrevivência e também conforto. A utilização destes recursos devem ocorrer de forma
racional e sustentável, assegurando o equilíbrio ecológico, a igualdade social e o crescimento
econômico.
Desenvolvimento sustentável é a preservação de recursos ambientais e culturais para
as gerações futuras. O respeito á diversidade e a redução das desigualdades sociais.
Responsabilidade social empresarial (SER) partes interessadas ou públicos de interesse
(LEFF, 2012).
Segundo estudo das Nações Unidas, o crescimento econômico hoje é obtido por meio
do uso intenso de recursos naturais e tem contribuído para baixos índices de qualidade de vida
(PHILIPPI JR.; PELICIONI, 2005).
Neste sentido, Philippi Jr. e Pelicioni (2005) dizem que a educação terá que
desenvolver um processo estratégico com o propósito de formar os valores, as habilidades e as
capacidades para melhor orientar a mudança desse paradigma de ordem econômica, política e
cultural. Essas estratégias educacionais serão formadas para reavaliar e atualizar os programas
de educação ambiental, renovar os conteúdos com base nos avanços do saber e da democracia
ambiental. Educar para o desenvolvimento sustentável implica em criar novas orientações e
conteúdos, novas práticas pedagógicas, ensinar a pensar a realidade socioambiental como um

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processo de construção social, a partir da integração de processos não como fatos isolados,
mas como relações de produção de conhecimentos e os processos de circulação, expressão do
saber ambiental. Isto, posto, a necessidade de incorporar os valores ambientais e os novos
paradigmas do conhecimento na formação dos novos atores da educação ambiental e do
desenvolvimento sustentável. A educação ambiental com um novo sentido estratégico,
conduzindo um novo processo, para uma sociedade sustentável.
Esse processo trata-se de um fenômeno histórico, exigindo o compromisso do Estado e
da cidadania para construir projetos nacionais, regionais e locais, onde a definição da
educação seja através de um critério de sustentabilidade, correspondendo ao potencial
ecológico e aos valore culturais de cada região, para a população apropriar-se de seu ambiente
como uma fonte de riqueza econômica, para viver em harmonia com a natureza (PHILIPPI
Jr.; PELICIONI, 2005).
Especialistas acreditam que a mudança do cenário atual para aquele necessário a uma
economia mais sustentável depende, basicamente, de dois fatores fortemente ligados a
operação das empresas (LEFF, 2012).
O primeiro fator é a inovação tecnológica. Por meio da inovação, conseguiremos
encontrar recursos ou processos substitutos que permitam a utilização integral de matérias
primas e energia. Assim eliminaremos os desperdícios existentes na atualidade. Nesse campo,
as empresas têm o importante papel de buscar formas cada vez mais eficientes de atender as
necessidades humanas por meio de produtos ou serviços que utilizem a menor quantidade de
recursos em sua produção, uso e pós-consumo.
O segundo fator consiste na mudança de modelo de mercado e de consumo. Muitas
empresas têm desenvolvido e colocado em prática bons projetos de sustentabilidade relativos
a seu negócio, educando os consumidores para que eles busquem incluir essas questões em
sua decisão de compra. Outras empresas já exploram novos modelos de negócio, mudando
suas atividades de produtos para serviços. Esse processo é chamado desmaterialização da
economia. Há ainda as empresas que fazem essa mudança dando á população de baixa renda
acesso a produtos e serviços dos quais esse grupo não dispunha.

Gestão de Resíduos Sólidos e a problemática do descarte no espaço rural

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A Lei Estadual 9.921/1993 do estado do RS, institui a Política Estadual de Resíduos


Sólidos estabelece que os sistemas de gerenciamento dos resíduos sólidos terão como
instrumentos básicos os planos e projetos específicos de coleta, transporte, tratamento,
processamento e destinação final, tendo como meta a redução da quantidade de resíduos
gerados e o perfeito controle de possíveis efeitos ambientais.
Entende-se por gestão dos resíduos sólidos a maneira de conceber, implementar,
administrar os resíduos sólidos considerando uma ampla participação das áreas de governo
responsáveis no âmbito estadual e municipal. A questão determinante para o gerenciamento
dos resíduos de forma integrada é a compreensão de que todas as ações e operações
envolvidas no gerenciamento estão interligadas, influenciando umas às outras: coleta mal
planejada encarece o transporte mal dimensionado, além de gerar prejuízos e reclamações,
prejudica as formas de tratamento e de disposição final.
Essa visão sistêmica da limpeza urbana, que contribui significativamente para a
preservação da limpeza e qualidade de vida na cidade, não poderia ser apenas de domínio dos
gestores deste sistema, é necessário que toda a sociedade também internalize esse novo
conceito, esta visão integrada, pois afinal é ela também a grande parceira na preservação da
cidade limpa.
A sensibilização da sociedade é buscada através de campanhas de educação ambiental
que tem como foco principal despertar na comunidade o sentimento de participação no
sistema, tendo o indivíduo como parte integrante e atuante do todo.
Grande parte dos resíduos descartados pela população pode ser reaproveitado ou
destinado para instituições associadas a empresas de reciclagem com valor de comercialização
maior. Ação essa, que colaboraria para a diminuição do grande volume de resíduos
produzidos em nosso município, que em sua maioria acaba sendo destinado para o aterro
sanitário, por falta de conhecimento e consciência ambiental da população.
É responsabilidade de cada município a gestão de seus resíduos sólidos. Segundo o
informativo sobre a Política Nacional de Resíduos Sólidos (2016, p. 37), o custo para a
manutenção de um aterro sanitário de pequeno porte não é viável,

Quanto maior o Município, maior a viabilidade econômica do aterro sanitário


individual. Uma auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em
2011 constatou que a manutenção da operação dos aterros sanitários individuais para

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Municípios com população menor que 100 mil habitantes é inviável em razão da
ausência de recursos técnicos e financeiros.

Por se tratar de um município pequeno, com pouco mais de 7 mil habitantes, Ajuricaba
conta com coleta regular de lixo urbano, em três dias da semana, com destino ao Aterro
Sanitário da SIMPEX, localizado em Palmeira das Missões/RS. Segundo dados do Plano
Estadual de Resíduos Sólidos do Rio Grande do Sul (2014, p. 218) a região Noroeste do Rio
Grande do Sul possui o maior número de municípios com iniciativas de coleta seletiva no
estado, são 106 municípios, comprometidos com o recolhimento de forma separada dos
resíduos, porém o município em questão ainda não faz parte dessa estatística.
A situação do descarte dos resíduos sólidos no município é agravada ainda mais pela
inexistência de um programa de coleta eficiente na área rural do município, nem ao menos
existe uma preocupação com a conscientização dos moradores em relação a essa questão. Se
analisarmos o Plano Estadual de Resíduos Sólidos do Rio Grande do Sul (2014), podemos
observar que até mesmo ali é deixado de lado a questão dos resíduos sólidos domésticos na
área rural, isso se verifica quando apresenta as tipologias de resíduos sólidos contempladas no
plano e, para o meio rural é considera apenas os Resíduos Sólidos Agrossilvipastoris sendo
“os resíduos de origem animal e vegetal gerados nas atividades agropecuárias e silviculturais,
incluídos os resíduos relacionados à utilização de insumos nessas atividades” (2014, p.28).
Ainda segundo o Plano Estadual de Resíduos Sólidos do Rio Grande do Sul, a questão
ambiental na área rural é abordada nas escolas, principalmente na rede de educação pública
municipal, “por meio de programas de incentivo à reciclagem de embalagens de agrotóxicos,
tratamento e destino de resíduos animais, programas de conservação da água e de
reflorestamento” (2014, p. 113). E como metas para os próximos anos prevê, para a área rural,
programas destinados a “capacitar e desenvolver o processo de Educação Ambiental em
escolas da rede estadual do meio rural conforme suas especificidades” (2014, p. 392) e
“desenvolver e divulgar propostas adaptadas localmente para segregação de resíduos
recicláveis secos no meio rural e para sua destinação adequada, priorizando áreas com maior
concentração populacional” (2014, pág. 412).

Resultados e discussões

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Com o intuito de sistematizar dados para atingir aos objetivos, foram entregues
questionários para todas as 71 famílias que possuem alunos na Escola Estadual de Ensino
Fundamental Medianeira, totalizando os 99 alunos. Retornaram para a escola 65 questionários
respondidos, abrangendo 87 alunos que residem em localidades como Linha 25 (6 famílias),
Linha 26 (22 famílias) , Linha 27 (5 famílias), Linha 28 (6 famílias), Linha 29 (8 famílias),
Linha 30 (13 famílias), Linha 31 (3 famílias) e Linha 32 (1 família), em um dos questionários
não foi especificado a localidade em que a família reside.
Uma das questões da pesquisa estava relacionada com o entendimento do que é lixo
para a família, a maior parte dos envolvidos na pesquisa relataram que é tudo aquilo que não
se utilizar mais, o que não se aproveita e não serve mais para o consumo, “somente é lixo
aquilo que não tem mais uso para ninguém, por isso é importante separar o lixo”, “ é tudo o
que não pode ser reaproveitado”.
Sobre o destino dado ao resíduo produzido nas propriedades, 54% das famílias
armazenam para levar até o ponto de coleta de lixo na localidade onde moram, 34% queimam
seus resíduos, principalmente papéis e plásticos, 17% enterram seus descartes, principalmente
aqueles de difícil decomposição, 14% armazenam seus resíduos e levam para serem coletados
na cidade e 9% jogam em algum lugar na propriedade, o que está evidenciado na figura 2.
Algumas famílias relataram fazer a separação do lixo.

DESTINO DOS RESÍDUOS

54%

34%

17% 14%
9%

ARMAZENAM PARA QUEIMAM ENTERRAM LEVAM PARA JOGAM EM ALGUM


LEVAR ATÉ O SEREM LUGAR NA
PONTO DE COLETA COLETADOS NA PROPRIEDADE
MAIS PRÓXIMO DA CIDADE
PROPRIEDADE

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Figura 2 - Destino dos Resíduos.


Fonte: Autoras, pesquisa de campo, 2018.

A proximidade do ponto de coleta de resíduos do local onde as famílias residem


geralmente é distante, apenas 14 famílias possuem ponto de recolhimento a menos de 500m
de distância de suas casas, já as outras 51 famílias estão mais distantes dos pontos de coletas,
de 1 até 17 km. A distância predominante é em torno de 2 e 3 km.
Indagados sobre a periodicidade da coleta de resíduos, 66% das famílias responderam
não saber qual é a frequência do recolhimento, 17% afirmaram que a coleta ocorre uma vez
por mês, 12% afirmaram que ocorre a cada 15 dias, 3% afirmaram que ocorre a cada dois
meses e uma das famílias afirmou que a coleta acontece apenas uma vez no ano, como pode
ser observado a partir da figura 3. Em relação ao destino dado aos resíduos recolhidos no
município, 65% das famílias não sabe o destino e apenas 35% afirmam saber.

Figura 3 – Frequência do recolhimento dos resíduos.


Fonte: Autoras, pesquisa de campo, 2018.

Sobre a separação do lixo orgânico (resto de alimentos, frutas e vegetais) do lixo seco
(embalagens plásticas, metalizadas, papel, vidro), 86% das famílias declaram fazer a
separação, destinando a horta, pomar e lavoura, para virar adubo, utilizam também para a
alimentação de galinhas, suínos, cachorros e gatos. 12% das famílias destacam separar às
vezes e uma família não separa, e afirma que os resíduos orgânicos são descartados

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juntamente com o lixo seco, isso pode ser observado na figura 4. Poucas famílias destacaram
que adotam o processo de compostagem dos resíduos orgânicos.

Figura 4 – Separação dos resíduos orgânicos.


Fonte: Autoras, pesquisa de campo, 2018.

Em relação ao destino dado ao óleo de cozinha usado, 31% das famílias utiliza na
alimentação de animais, 25% faz sabão, 18% descarta no solo, 9% descarta na pia da cozinha,
9% armazena para posterior descarte em locais credenciados, 6% não utiliza óleo ou não
respondeu e apenas 2% utiliza na hora de ascender fogo, como pode ser observado na figura
5.

Figura 5 - Destino do óleo de cozinha usado.


Fonte: Autoras, pesquisa de campo, 2018.

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Sobre a reutilização de materiais que possivelmente seriam descartados 51% não


reutilizam e 49% das famílias reutilizam, o que pode ser observado na figura 6. Dessas que
reutilizam foram destacados materiais como garrafas pet, papéis, sacolas plásticas, potes de
plástico e de vidro, caixas e óleo de cozinha.

Figura 6 – Reutilização de materiais.


Fonte: Autoras, pesquisa de campo, 2018.

Sobre o consumo consciente, 78% das famílias disseram ter cuidado em usar produtos
naturais e/ou que não gerem lixo descartável, e apenas 22% afirmam que não estão
preocupadas com isso, como mostra a figura 7.

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Figura 7 – Consumo consciente.


Fonte: Autoras, pesquisa de campo, 2018.

Sobre se as famílias acreditam que a coleta e armazenamento corretos dos resíduos


podem fazer uma diferença muito grande para a saúde do meio ambiente, todas afirmaram que
sim, demonstrando que estão conscientes sobre os impactos negativos do descarte incorreto
dos resíduos. Destacam que se os resíduos fossem descartados de forma correta auxiliaria na
preservação dos solos, rios, nascentes, animais, que muitas vezes comem os resíduos, na
economia dos recursos naturais, na diminuição da proliferação de pragas e insetos,
colaborando com a saúde das pessoas, evitaria também catástrofes como enchentes e
garantiria um ambiente mais saudável para as futuras gerações. A consciência é visível na
resposta de um dos participantes da pesquisa, quando afirma acreditar que a coleta e
armazenamento corretos dos resíduos podem fazer uma diferença muito grande para a saúde
do meio ambiente, “porém, temos consciência de que somos falhos em relação ao destino
correto do lixo”.
As sugestões dadas pelas famílias sobre medidas que a administração do município
poderia tomar em busca de soluções para o problema do descarte incorreto dos resíduos no
espaço rural vão desde a implementação de lixeiras nas comunidades até ao aumento da
frequência do recolhimento de resíduos nas diferentes localidades. Algumas famílias
sugeriram a coleta nas propriedades, mas devido a distância e a grande extensão territorial no
interior, isso seria muito oneroso, necessitando uma contrapartida da população rural. Outros
sugerem o aumento e a melhoria de locais de coleta, e também melhorar a divulgação do
programa de coleta no interior, orientando a população de como proceder na separação e
armazenamento dos resíduos até a data da coleta. Uma sugestão seria a adoção de uma escala
de coleta para as comunidades.
Algumas famílias destacaram a preocupação com o descarte de resíduos específicos,
como fraldas, vidros e eletrônicos, “deveria ter mais lugares para a entrega de pilhas,
lâmpadas, baterias, aparelhos eletrônicos, pois muitas vezes não sabemos o que fazer com
esses lixos, principalmente aparelhos eletrônicos”.
Satisfeitas com a coleta, 6% das famílias entrevistadas, afirmaram que nada precisa ser
modificado pois a coleta funciona muito bem, algumas destacam ainda que o maior problema
é em relação as pessoas que não são conscientes sobre a importância da destinação correta dos

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resíduos, necessitando assim de um trabalho de conscientização da população rural. Uma das


famílias destacou que deveria ser trabalhado a ideia da coleta seletiva.
Após a entrega do relatório para a administração do município, com os dados obtidos
através da pesquisa, espera-se que a situação do descarte dos resíduos domésticos em todo o
espaço rural do município seja evidenciada, e assim, a administração pública reflita sobre a
elaboração de políticas públicas nessa área, tanto voltada a educação e conscientização
ambiental da população rural, quanto de ações práticas que minimizem o descarte incorreto
dos resíduos.

Conclusão

Pela análise dos resultados obtidos, percebe-se que todas as famílias participantes da
pesquisa têm consciência das consequências negativas do descarte incorreto dos resíduos
domésticos ao meio ambiente e a saúde. Porém, existe uma contradição no que ocorre na
prática, isso ficou visível quando se observou que grande parte das famílias queima ou enterra
os resíduos domésticos em suas propriedades, uma parcela significativa também descarta o
óleo de cozinha usado no solo, e mais da metade das famílias não reutiliza os resíduos
domésticos.
É importante destacar que muitas famílias adotam práticas conscientes como o
reaproveitamento do óleo de cozinha para fazer sabão e também a utilização de garrafas pet,
sacolas plásticas e potes. Outra atitude consciente é a utilização do resíduo orgânico para
alimentação de animais ou a compostagem para adubação de hortas, jardins e pomares.
Já existe a coleta de resíduos no espaço rural do município, porém, ficou evidente a
falta de conhecimento da população em relação a frequência em que a coleta ocorre,
evidenciando a necessidade de uma maior divulgação do programa de coleta, e também de um
trabalho de conscientização de como a população rural deve proceder no armazenamento dos
resíduos.
Assim, podemos constatar que ainda existe muito o que a população e a administração
municipal devam fazer, a questão ambiental deve ser vista com mais seriedade tanto pela
administração pública quanto pela população rural, que juntas devem procurar unir esforços
para diminuir os impactos causados pelo descarte incorreto dos resíduos domésticos.

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Sustentabilidade é o caminho do equilíbrio em que o social, o econômico e o


ambiental se somam para vivermos em uma sociedade melhor para todos. Para que algo seja
considerado “sustentável”, deve atender aos três pilares sendo economicamente viável,
socialmente justo, e ambientalmente adequado. Sustentabilidade tem muito a ver com o que
acontece no mundo de hoje e com o nosso dia a dia.

Referências Bibliográficas

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SABERES COTIDIANOS NA FEIRA DE ORGÂNICOS DE SANTIAGO

Bernardo Rodrigues da Silva10


Isabel Cristina Lourenço da Silva11
José Geraldo Wizniewsky12

Resumo

Os espaços de educação informal são tão importantes quanto os espaços de educação formal. Durante
a nossa vida, estamos sempre realizando atividades cotidianas que fazem parte das nossas experiências
pessoais e coletivas. Essas experiências cotidianas, segundo Certeau et. al (2012), quando repetidas
inúmeras vezes dão a base para o conhecimento cotidiano do saber-fazer. Ao acompanhar o cotidiano
de quatro famílias de agricultores orgânicos do município de Santiago percebemos que os agricultores
orgânicos estão em constante aprendizado. É a partir do reconhecimento do esforço e do trabalho de
cada agricultor e a partir do reconhecimento da importância de produzir e consumir alimentos
orgânicos, que os significados ali são construídos. Desta forma, imergindo na cultura desse grupo de
pessoas, este artigo busca, a partir das falas das agricultoras e dos agricultores, identificar os saberes
que circulam em torno do cotidiano da Feira de Orgânicos de Santiago. Assim o trabalho levantou
apontamentos à respeito da vida de quatro famílias que comercializam no espaço da feira abordada e
relacionou esses apontamentos com a construção dos saberes locais.

Palavras-chave: cultura, cotidiano, feira de orgânicos, saber-fazer.

Introdução

Com a intenção de identificar, a partir das falas dos agricultores, os saberes que
circulam em torno do cotidiano da Feira de Orgânicos de Santiago/RS, realizamos este estudo
para acompanhar os significados que se constroem nesse espaço. Assim foi necessário que
percebêssemos como esses agricultores se planejam e como eles se constroem em suas
vivências para chegar à feira, do plantar ao colher. Desta forma com o decorrer da pesquisa
nos deparamos com o fato de que a feira inicia no planejamento de quem planta, no preparo
da terra, no plantio, nos tratos culturais, durante a colheita e organização dos produtos até

10
Universidade Federal de Santa Maria, rodriguesdasilvabernardo@gmail.com;
11
Universidade Federal de Santa Maria, isabel.agroecologia@gmail.com;
12
Universidade Federal de Santa Maria, zecowiz@gmail.com.

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chegar à praça nos sábados de manhã. Assim a compreensão de alguns conceitos,


relacionados à cultura, foram facilitados pela observação da prática dessas famílias
agricultoras.
A cultura e a mente são os dois objetos mais importantes escolhidos para tentar
construir uma ciência dentro da antropologia e psicologia. A mente cria, busca, preserva e usa
sentido para construir o mundo, já a cultura é criada pela mente daqueles que estão imersos
nela (GUEERTZ, 2001).
Nosso cérebro encontra-se em nosso corpo e nossa mente encontra-se em nosso
mundo. Cérebro e cultura evoluíram reciprocamente, ou seja, os mundos físico, biológico e
social se entrelaçam, e, apesar de distintos, cérebro e cultura formam teias de significado entre
si. A cultura não é nada mais do que a interpretação de onde o homem está amarrado a essas
teias que ele próprio teceu. (GEERTZ, 1989; GUEERTZ, 2001)
Essas teias se entrelaçam entre os indivíduos que nela vivem, de modo que ao
compartilhar o ambiente também acabam por compartilhar experiências, normas e padrões
para construir sentido em seus mundos.
Neste ponto percebemos a importância de conhecer as sociedades a partir dos relatos
individuais. Cada mente/cérebro se desenvolvem de acordo com características únicas, cada
pessoa possui sua visão de mundo e se relaciona com os seus de acordo com suas experiências
individuais (GUEERTZ, 2001). O que faz com que não exista apenas uma cultura dentro de
uma determinada sociedade, mas várias culturas que dialogam entre si, formando uma teia de
relações.
Ao abordar estudos sobre cultura em sociedade rurais em seu estudo conhecido pela
publicação “Os parceiros do Rio Bonito”, Cândido (2001)13 aborda o conceito de cultura
rústica para ir além das questões de localização que a palavra “rural” nos remete. Desta forma,
o uso do termo “rústico” nos remete ao relacionamento dos indivíduos com o isolamento, nos
remete à relação que o indivíduo desenvolve com a “cultura urbana”, pois se entende que esta
influencia a existente no ambiente rural e vice-versa, exprimindo modo de ser e tipo de vida.
Este estudo quando traduzido para a atualidade nos mostra que o rural cada vez mais se
entrelaçou com o urbano.

13
O estudo foi realizado entre os anos de 1947 e 1954. A primeira edição do livro “Os parceiros do Rio Bonito”
foi publicada em 1964.

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Porém a cultura rústica abordada por Cândido não é mais a mesma, intensas
transformações ocorreram nos meios de comunicação e transporte no rural, o que fez com que
novas relações sociais fossem capazes de ressignificar elementos previamente estabelecidos.
Uma das relações que, atualmente, possibilita novas pontes entre rural e urbano são as
Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs). As TICs, como internet e telefones
celulares, são uma realidade no mundo contemporâneo e cada vez mais interferem nas
decisões e espaços de sociabilidade da vida rural (GUIMARÃES et al., 2015).
O estudo da cultura tem grande destaque na antropologia, nas palavras de Oliveira
(1996) “o olhar” é uma dos pilares fundamentais do trabalho do antropólogo, sendo os outros
dois “o ouvir” e “o escrever”. Para o autor, caso um desses três pilares não for devidamente
treinado, seu trabalho estará comprometido. O olhar nesse contexto deve ser domesticado para
estar sensível a coisas que antes da bagagem teórica da antropologia não eram perceptíveis,
dessa forma, o olhar passa a identificar fatores que antes pareciam invisibilizados pelo olhar
do senso comum do cotidiano.
Para Agnes Heller o estudo do cotidiano passa pelo estudo das ações da vida particular
das pessoas (1987, p. 19, tradução nossa):

Para reproduzir a sociedade é necessário que seres humanos particulares se


reproduzam a si mesmos como seres humanos particulares. A vida cotidiana é o
conjunto de atividades que caracterizam a reprodução dos seres humanos
particulares, os quais, por sua vez, criam a possibilidade da reprodução social.

Assim, a vida cotidiana no particular se reproduz em seu próprio mundo, diretamente,


e em conjunto com a sociedade, de modo indireto. Ou seja, existe um pequeno mundo
particular a cada pessoa onde as relações de vida ocorrem de forma direta, e um grande
mundo da sociedade, onde a vida particular é afetada de forma indireta (HELLER, 1987).
Desta forma, o homem particular, a qual Agnes Heller fala, não existe de isolado de outros em
sua vida cotidiana, sendo que suas ações afetam e são afetadas pelos outros que compartilham
seus espaços, e é a partir das relações entre estas pessoas que ocorrem as individualidades,
que por sua vez podem se rearranjar em formas coletivas da sociedade.
O cotidiano desta forma se apresenta no dia a dia, interagindo e fazendo parte do
trabalho, da moral, da religião, da política, da ciência, arte e filosofia. A partir dessas

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experiências emergem os saberes14 que decidem as escolhas de ações cotidianas (HELLER,


1987). De forma mais próxima, Certeau et al (2012) aborda a temática mostrando como ela
ocorre entre o morar e o cozinhar, abordando o cotidiano como tudo aquilo que é dado no dia
a dia, as situações que são encaradas, as pessoas com quem se encontra, os desafios que são
tomados, e quem cada um acaba sendo. Fazem parte do cotidiano as memórias olfativas do
almoço ao ser preparado, os gestos que são repetidos sob determinados contextos, os hábitos
de consumo adquiridos, os trajetos que viram parte do cotidiano, as obrigações morais para
consigo e o seu mundo, e o conforto dos espaços privados, onde a morada se apresenta como
lugar da vida.

Metodologia

Com a intenção de identificar, a partir das falas dos agricultores, os saberes que
circulam em torno do cotidiano da Feira de Orgânicos de Santiago/RS foi utilizada a
abordagem de estudo qualitativa, que se concentra em interpretar os significados que não são
visíveis no mundo, mas que podem ser expostos, interpretados e explicados pelos
pesquisadores (MINAYO, 2009).
Em conformidade com a abordagem de estudo qualitativa, foi empregado o estudo de
caso. Os estudos de caso exploram temas e fenômenos em seu contexto real tentando atribuir
relações causais indo além de apenas descrever as situações pesquisadas, possuem a
característica de não poderem realizar extrapolações empíricas e poderem realizar
extrapolações teóricas. A pesquisa utilizou como método um estudo de caso único, de apenas
um caso, combinado com múltiplas técnicas de coleta de dados (GRAY, 2012). No contexto
da pesquisa, a Feira de Orgânicos de Santiago foi considerada como um único caso. A
localização do município de Santiago, dentro do estado do Rio Grande do Sul, pode ser
visualizada conforme a figura 1.
Para constituir o corpus empírico da pesquisa, foi realizada amostragem por meio de
estudo de caso único de meio institucional com seleção das amostras seguindo critérios

14
O próprio livro de Michel Certeau, Luce Giard e Pierre Mayol (2012), “A Invenção do Cotidiano (2. Morar,
cozinhar)”, aborda vários saberes que se manifestam no cotidiano entre a compra do alimento e a hora da
alimentação, através do saber-fazer.

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intencionais (PIRES, 2010). Os critérios intencionais convergem em torno da Feira de


Orgânicos de Santiago, sendo eles: [1] a escolha pelo município de Santiago, em decorrência
da característica cultural dos moradores de consumir produtos nas feiras locais; [2] a
existência de uma feira apenas com produtos orgânicos e agricultores certificados; [3] a
possibilidade de estudar um grupo de pessoas que vivenciam práticas agrícolas influenciadas
por saberes cotidianos.
Ainda em relação ao corpus empírico da pesquisa é importante salientar que Feira de
Orgânicos de Santiago é formada por um grupo de seis famílias, sendo que, dentro deste
trabalho, foram realizadas entrevista com quatro famílias. De maneira a melhor identificá-las
no trabalho, estabeleceu-se que cada família entrevistada receberia nomes fictícios, sendo que
os entrevistados da família A ganharam nomes que começam com a letra A, o mesmo critério
foi utilizado para as famílias B, C e D.

Figura 1 – Localização do município de Santiago, em relação à Região Central do Estado do Rio Grande do Sul.

Fonte: Silva (2016, apud MIOLA, 2015).

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De acordo com o estudo de caso foram utilizadas diversas técnicas de coleta de dados,
dentre elas, podemos citar a entrevista e observação, como dados primários, e a pesquisa
bibliográfica, como dados secundários.
Primeiramente, os dados secundários foram coletados através da pesquisa
bibliográfica. Sendo que, segundo Gil (2002) a pesquisa bibliográfica é caracterizada por ser
desenvolvida com materiais já elaborados, sejam eles livros ou artigos.
Na sequência os dados primários foram coletados através de observação direta
intensiva, que, segundo Marconi e Lakatos (2003), é realizada através das técnicas de
observação e entrevista com os agricultores feirantes. A observação é uma técnica que
possibilita a coleta de dados a partir dos sentidos dos pesquisadores, nesta pesquisa foi
realizada a técnica de observação estruturada, não participante, individual, efetuada na vida
real (MARCONI e LAKATOS, 2003). A entrevista consistiu na técnica em que o pesquisador
tem a possibilidade de conversar diretamente com os sujeitos pesquisados a fim de obter
informações de determinado assunto ou tema, ainda segundo a classificação sugerida por
Marconi e Lakatos (2003), foram realizadas entrevistas não-estruturadas, focalizadas, onde
não há uma ordem de perguntas, mas sim um roteiro de tópicos relativos ao problema que se
deseja estudar.
Em relação aos aspectos éticos da pesquisa, cada entrevista foi assegurada pelo Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme a Resolução nº 466, de 12 de dezembro de
2012 e demais aspectos legais existentes (BRASIL, 2012).
Os dados coletados durante toda a trajetória da pesquisa, por fim, foram analisados e
interpretados por meio da metodologia de análise de conteúdo (GOMES, 2009). Onde, a
análise (ou explicação) pode ser considerada como a tentativa de evidenciar as relações que
ocorrem entre o fenômeno estudado e outros fatores, e a interpretação é encarada como o
esforço intelectual para atribuir significações à explicação aos resultados encontrados durante
a pesquisa (MARCONI; LAKATOS, 2003).
O cotidiano antes de chegar na feira

Antes da escolha do plantar, observamos que as quatro famílias possuem bem


delimitado em suas trajetórias o momento em que escolheram retornar ao campo e fazer dele
parte de suas vidas pessoais e profissionais. Este ato caminha junto com as observações de

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mundo de cada uma das agricultoras e de cada um dos agricultores, saber onde está incluído e
qual o seu propósito dentro deste local parece ser algo trabalhado em suas mentes. E, apesar
de nunca se estar pronto e acabado, um sentimento de que o mais difícil já passou parece
prevalecer durante suas falas e atitudes.
Seu Daniel nasceu na região da propriedade onde atualmente trabalha, lá passou sua
infância e parte da adolescência, com dezesseis anos foi para a cidade trabalhar numa oficina
mecânica onde trabalhou até os quarenta e seis anos. Mas a memória sempre permaneceu,
segundo ele, as lembranças ajudaram na hora de retornar e trabalhar em tempo integral na
parcela da propriedade que um dia foi dos seus pais:

Ah, já ajuda. Nas noção de como lidar na terra, até como pegar, como usar uma
ferramenta, né. Claro que pouco que se pegou, mas é como pegar uma enxada, como
lidar com o trator, como abrir um buraco pra segurar um palanque. Se o cara nunca
trabalhou nessa área fica mais difícil, né. Mas pra mim... Eu era acostumado quando
eu era novo.

Mesmo morando na cidade, uma vez que a propriedade era dos seus pais, seu Daniel
nunca deixou de frequentar a localidade, porém, seu local de trabalho era na cidade, e até que
retornasse para trabalhar no campo, seus momentos de estar na casa dos pais eram muito mais
momentos de descanso, do que de trabalho, propriamente dito. Junto aos pais morava o irmão,
então em meio a uma relação de parceria a memória podia ser exercitada nos fins de semana.

Daniel - É, mas o cara não esquecia, porque virava e mexia eu tava sempre aqui
fora15, na casa do meu irmão que fica aqui perto, tava sempre ajudando ele. Eu
nunca saí fora16 (totalmente), eu tinha um gadinho aqui, a gente vinha cuidar, vinha
os fim de semana.

O saber fazer, aprendido no cotidiano da infância e reforçado pela memória de Daniel


nada mais é do que um conjunto de gestos que tem um objetivo de utilidade e uma intenção

15
A expressão “aqui fora”, “pra fora”, nessa região do estado do Rio Grande do Sul está relacionada à parte do
município que é considerada “rural”. Por exemplo, quando se está em algum ponto do meio rural, se diz que está
“pra fora”. É como se a cidade, o urbano fosse “pra dentro”, e o campo, o rural fosse “pra fora”. Também é
importante salientar que a expressão “pra dentro” foi aqui utilizada para dar o exemplo, mas ela não existe no
vocabulário das pessoas dessa região.
16
Já nesse ponto Daniel relata que nunca saiu fora do cotidiano da propriedade. É interessante notar o jogo de
palavras que a palavra “fora” pode ganhar nessa mesma frase. Em um primeiro momento, o estar “pra fora”
remetia a estar fora da cidade. Já nesse segundo momento, a sentença “eu nunca saí fora” remete ao sentimento
de nunca ter saído fora da propriedade.

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operatória. Seu Daniel seguiu lembrando-se de como era trabalhar com agricultura e pecuária
durante a sua vida, mesmo após trabalhar tantos anos na cidade, pois em sua consciência,
aquilo tinha um significado que era importante ser lembrado, caso contrário seria esquecido.

O gesto se decompõe numa sequência ordenada de ações elementares, coordenadas


em sequência de duração variável, segundo a intensidade do esforço exigido,
organizada segundo um modelo aprendido de outra pessoa ou por imitação (alguém
me mostrou como fazer), reconstituída de memória (eu a vi fazer), ou estabelecida
por ensaios e erros a partir de ações vizinhas (acabei descobrindo como fazer). A
habilidade de adaptar o gesto às condições de que se conseguiu pôr em prática e em
evidência aquele saber-fazer exatamente como deve ser feito. Quer se trate de
domínio culinário ou de outro tipo de transformação material feita com uma
determinada intenção, o gesto é antes de tudo uma técnica do corpo (CERTEAU et.
al, 2012. p. 273).

A memória de Betânia também foi importante para a sua produção orgânica, uma vez
que passou a infância no ambiente rural, algumas lembranças de como sua mãe produzia
fizeram com que ela, naturalmente, reproduzisse algumas de suas técnicas e se encaminhasse
para uma produção livre de agrotóxicos e agroquímicos sintéticos. Uma passagem durante
nossa conversa merece destaque:

Betânia - E a minha mãe mesmo tinha uma horta muito bonita pra fora, e aí, tu
sabe... Ela nunca usou veneno e sempre usou esterco, né. Isso eu me lembro quando
eu tinha três, quatro anos, tem coisas que a gente não esquece, né. E eu me lembro
que ela juntava de carrinho de mãos os estercos, nem era carrinho de mão naquela
época, era de carreta, e amontoava tudo num canto assim. E aí ela adubava a horta
dela, e ela tinha verduras lindas, né. Então, por que não, né? Eu acho que isso aí
também a gente vem meio no sangue, né. Na... Sei lá...
Pesquisador - Pega a memória, né?
Betânia - Pega a memória. Não sei, todo mundo me pergunta assim: "Como é que tu
começou lá". Me pego pensando: "Pois é, como é que eu comecei?", né?! “Por que
eu não botei veneno?”; “Por que eu não usei adubo químico?”. Sei lá. Acho que
instintivamente, né. Que a gente vai fazendo as coisas.

Já a descoberta do agricultor como profissão na vida do Breno, filho de Betânia,


aconteceu só depois que ele foi morar na atual propriedade, foi no dia a dia que ele se
percebeu envolvido pelo que já planejava com sua família há tempos. Sua personalidade de
querer crescer junto com sua família, que vislumbrou, no atual lugar de atuação, o futuro que
sempre planejou. Aos poucos, Breno busca por questões profundas como “Quem eu sou?”. E
ao se afirmar agricultor, significa para si, todo um orgulho que é fruto do seu trabalho diário.

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Breno - Quando me perguntam eu podia dizer assim ó: “Ah, eu sou estudante de


administração.”; “Sou estudante de agronomia.”. E eu digo assim: “Ah, eu sou
agricultor!”. A maioria das pessoas tem vergonha de dizer: "Olha, eu sou
agricultor!". Entende? Eu sei que tem amigos meus, que os pais são plantador de
soja, ou eles são plantador. Aí eles dizem assim: "Ah, eu sou agricultor plantador de
soja!”; [ou], “Não, eu sou criador de gado!". Agora vê se um dos que produzem
hortaliças [dizem]: "É, eu sou produtor!". E mesmo assim tem uns que produzem
gado tem vergonha de dizer que são agricultores, ou que moram pra fora, ou coisa
assim. Como eu vou te dizer, é um preconceito muito grande.

O ser agricultor, para Breno, parece ter muito a ver com o entendimento do seu papel
no mundo, mais do que profissão, está implicado numa opção de vida. E aqui a palavra opção
ganha destaque, uma vez, que a opção demarca a trajetória das quatro famílias pesquisadas,
que vivenciaram outras possibilidades de trabalho e escolheram trabalhar no campo. Breno se
enxerga como agricultor e dá ênfase nisso, pois junto à sua mãe, trabalha muito para fazer
com que seu sonho desse certo. E ao dar exemplo de pessoas que conhece, e não dizem com a
mesma força dele que são agricultores, se depara talvez com uma realidade construída no
imaginário subjetivo das pessoas que moram na cidade, o imaginário de que apenas são bem
sucedidos na vida os produtores de soja e os criadores de gado.
O município, por estar localizado em área do Bioma Pampa, adquiriu uma “vocação”17
para a criação animal, como no restante da área de mesmo bioma, devido às pastagens nativas
características de sua vegetação. Além disso, a criação animal está relacionada à grandes
extensões de terra e riqueza, dando em si, um significado de riqueza financeira. Já, nos
últimos anos, com a expansão da soja no Bioma Pampa, a soja recebeu o mesmo significado
da criação animal em relação à situação econômica de quem produz. Os demais agricultores
de hortaliça, porém, apesar de serem bem valorizados culturalmente no município, não
apresentam a mesma imagem, em relação à sua situação financeira, quando comparados aos
produtores de soja e criadores de gado. Talvez isso justifique a resposta de Breno, uma vez
que ele se enxerga no mesmo patamar que os demais agricultores, nem acima, nem abaixo,
mas igualmente grande.
Outro exemplo a respeito disso, surgiu na sequência da entrevista, quando a Betânia
comentou sobre como essa mentalidade do que é ser agricultor ocorre em outras propriedades

17
Aqui a palavra vocação aparece entre aspas pois se trata de uma alegoria para ir direto ao ponto da explicação.
Sabe-se que as culturas, animais ou vegetais, tradicionalmente produzidas em cada região variam muito de
acordo com os processos de ocupação da terra e as características edafoclimáticas. O caso de Santiago não é
diferente.

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do município. No exemplo, ela contextualizou uma conversa que teve com outro agricultor do
município, também envolvido no universo da olericultura:

Betânia - Ele me disse assim: "Ah, eu disse pra minha filha, que ela não quis estudar
e vai ter que ser agricultor". Eu disse "Como assim, não quis estudar e vai ter que ser
agricultor? Hoje em dia o agricultor tem que no mínimo estudar, ter o conhecimento,
né. Uma base, né."

Com isso, Betânia, mostra o que ela entende por ser agricultora, e o que ela espera do
seu filho ao ser agricultor. Deixar de estudar não é uma opção em sua mentalidade. Sempre há
a busca pelo conhecimento durante o seu dia a dia, e apesar de nem sempre o estudo ocorrer
de forma formal, ele ocorre no cotidiano, pesquisando livros na internet, ligando para outros
agricultores que também plantam, conhecendo novas realidades. Tudo isso é necessário na
mentalidade da agricultora. E, uma vez que tem em sua personalidade um traço muito forte de
comunicação e cooperação, a agricultora tenta, a seu modo, mostrar a todos que é preciso
estudar muito para sempre melhorar e oferecer produtos de qualidade. Ela também deseja que
o Breno estude, mas que estude para melhorar e facilitar as suas vidas na hora de encontrar
informações sobre a produção orgânica.
A expectativa da Betânia, em relação ao seu filho se desdobra no desejo que ele
também tenha a mesma oportunidade que ela teve de optar ser agricultora. Querer que ele
estude e vivencie experiências e estudos, para assim seguir tendo a opção de trabalhar com o
que trabalham da melhor forma que achar possível. Isso é denotado em momentos em que ela
fala orgulhosamente de sua própria trajetória.

Betânia - Eu sou agricultora por opção, não por falta de opção, então quando tu sai
fora, trabalhando outras coisas, que tu faz outras coisas, eu acho que tu vem com
ideias diferentes, e como tu já viu empresas diferentes, e que tu trata a tua
propriedade como empresa, né. Então tu tem essa visão do empreendedorismo, que
tu tem uma empresa, que isso aqui é uma empresa, que tu que dar lucro, que tem que
gerar.
Pesquisador - Tu trabalhou em Porto Alegre, tu tem toda a visão de lá, que tu tá
trazendo pra cá...
Betânia - Exatamente. A parte de marketing, eu trabalhei muitos anos na área de
marketing, então isso aí te dá uma visão de propaganda muito grande, né. Te dá uma
visão de propaganda, que tu precisa expor o teu produto, que tu tem que embalar,
que tu tem que deixar ele apresentável, pra conquistar o teu cliente, né. E isso não é
qualquer pessoa que tem. Não é pra... É só pra aquela pessoa que realmente sabe o
que quer né? O que tá fazendo.

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Diversificação da produção e qualidade de vida

Diversificar a produção é uma estratégia para manter a segurança da estabilidade


financeira dentro da propriedade, da mesma forma que é sinônimo do aumento de carga de
trabalho. Como o cotidiano de cada uma das famílias acaba sendo muito diferente, onde
alguns apresentam dedicação exclusiva para produção, e outros se dividem entre outros
cotidianos. A escolha de diversificar ou não, acaba trazendo um significado diferente no modo
de pensar entre as famílias. Enquanto para uma família diversificar pode ser sinônimo de
maior estabilidade financeira, de maior resiliência na produção da propriedade, para outra
família pode remeter rapidamente ao aumento da mão de obra exigida pelo maior número de
atividades consequentes das atividades policulturais. Assim, não podemos associar sempre a
diversificação como algo positivo, pois é preciso lembrar que a diversidade de produção
aumenta a carga de trabalho da família. Afirmar que diversificar é sempre a solução para a
estabilidade é desconsiderar as outras atividades que as famílias podem ter em suas vidas
pessoais e profissionais, dentro ou fora da propriedade.
Daniel, por exemplo, tem investido a maior parte do seu tempo para trabalhar em sua
propriedade, assim, sua renda depende dos frutos gerados a partir dali. Assim, ao falar sobre
diversificação de produção, ele encara o trabalho como um investimento do seu tempo e
garantia de que alguma de suas produções vai lhe dar retorno, mesmo com intempéries.

Daniel - Aí é que entra, aquilo de novo, a questão de diversificar a tua produção, né.
Aí tu tem várias vértices, como se diz assim, pra não perder. Porque de todo o
trabalho, alguma coisa tu vai perder, um ano vai uma coisa, no outro não vai dar
outra. Então é relativo. Então não é eu só plantar isso e vou depender só disso. [...]
Então é outra fonte de renda. Ao invés de só aqui, eu vou ter uma outra [renda]. Por
isso que eu digo, a propriedade, se tu não diversificar é complicado sobreviver, né.
Agora se tu diversificar tu ganha dinheiro.

A perda de alguma produção é algo comum quando se trabalho na agricultura, pois


vários são os fatores que podem causar a perda da produção, seja uma geada, um temporal, o
excesso ou a falta de chuva, uma doença na planta ou inseto predador. Entender que nem
sempre é possível contornar estes riscos faz parte da experiência de ser agricultor.
Porém, quando não se tem um tempo integral para ser dedicado à produção,
diversificar pode ser sinônimo de excesso de carga de trabalho. Carla nos lembra disso, uma

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vez que boa parte de seu cotidiano é destinada às atividades da escola onde leciona. Por isto
mesmo, a estratégia de diversificar a produção é recente em sua família.

Carla- A gente tem essa questão de trabalhar em outros envolvimentos, então pra
nós tava tranquilo ter só o morango. Era aquela época e pronto. Embora ele envolva
e comece a envolver... A gente planta, por exemplo, em maio. Vai até dezembro, por
aí, né. Mas pra nós tava tranquilo, né. Digamos assim. [...] Só que a gente começou a
ver que a feira tava...
Cláudio - A feira necessitava de mais.
Carla - Então, a gente começou então... Então vamos tentar né, vamos expandir pra
outro... Pra não deixar esfriar. Então, em nome da associação a gente começou a
(diversificar).

Para a família de Carla e Claúdio, diversificar a produção tem muito mais uma relação
com a vontade de ver a feira crescer. E ao observar a demanda da feira, a diversificação de
produtos foi algo necessário à continuidade do espaço.
Mesmo mencionando que ultimamente a carga de trabalho tem sido um ponto
limitante ao aumento da sua produção, Carla também comenta da sua qualidade de vida com
certa frequência no seu cotidiano. Ao observarmos este ponto, resolvemos apontar este
questionamento no momento da entrevista.

Pesquisador - Em relação à qualidade de vida, o morar aqui?


Carla - Depois pergunta pro meu filho, então. (risos). Pergunta pra ele o que ele
acha até. Tô curiosa, até. Mas ele sempre diz: "Ah, coisa boa morar aqui fora". Esses
dias ele me dizendo assim, ele teve aula sábado, "Ai, mãe. Eu passei a manhã inteira
com a dor de barriga. Mas eu fui lá no pátio na hora do recreio, peguei uma folha de
árvore. Cheirei aquela folha... Ai, melhorei, mãe. Acho que era o que tava me
faltando". (risos). Mas ele sempre diz, "Como é bom morar pra fora. Tá aqui pra
fora". E, ele, ele vem e começa a pregar essas coisas de qualidade, sabe. Mas a tal de
internet que é um problema.

Ao associar a qualidade de vida diretamente com a resposta do filho, Carla demonstra


a importância do seu filho nas suas escolhas cotidianas. Assegurar sua educação vinculada ao
meio em que vive é algo que ocorre quase que naturalmente. Por ser agricultora e professora
de Geografia, o cuidado e a atenção com o meio ambiente e com as pessoas que habitam nele
perpassam pelos processos de educação do filho. Assim, percebe-se em sua fala o orgulho de
contar a história de que seu filho percebe que a vida dele tem qualidade ao morar onde mora.
E neste ponto finaliza com outra preocupação de um ponto que acha importante, mas no
momento encontra-se indisponível dentro da família, o acesso à internet.

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Ao antecipar as ambições do filho, o acesso à internet, aqui aparece como um dos


pontos inerentes à qualidade de vida no futuro da família, porém destaca-se que o sinal de
telefonias móveis se apresenta como um problema, que na visão da família já deveria ter sido
resolvido, dado o avanço da tecnologia. Assim, destaca-se que das quatro famílias em que se
vivenciaram as experiências aqui expostas, apenas a família B possui internet, sendo que o
uso desta se apresenta de forma essencial dentro dos canais de comercialização e sua
respectiva divulgação e propaganda. Nas famílias A e D a necessidade de internet não foi
mencionada, uma vez que o sinal de telefonias móveis se apresentou como um problema de
maior dimensão.
Ainda falando sobre a qualidade de vida, Daniel aponta isto ao responder o porquê de
ter trocado seu ofício de mecânico na cidade, por seu ofício de agricultor no campo.

Daniel - É!... Abandonei a oficina. E os cara perguntam: “Por quê?”. Qualidade de


vida... e... Eu em qualidade de vida eu incluo tudo, né? Saúde, não se incomodar, o
lado financeiro também. No começo é difícil, mas depois que tu tiver uma estrutura
mais ou menos montada, tu tira bem mais que na oficina.

Qualidade de vida, para Daniel representa as suas ambições ao trabalhar no campo,


dentre elas saúde (física e mental) e estabilidade financeira. Daniel encara o trabalho dentro
da propriedade como o seu trabalho de vida. Tornou-se claro no tempo em que se vivenciou
sua realidade, que trabalhar naquele local, é uma das coisas que lhe traz tranquilidade, o que,
conforme os relatos que contou do seu antigo trabalho como mecânico era algo que
praticamente inexistia.

Sábado de manhã: É Dia de Feira!

A partir desse ponto no texto começaremos a analisar sobre algumas problematizações


realizadas a partir do cotidiano da feira que acontece nos sábados de manhã.

O espaço físico da praça

Antes de abordar alguns pontos individuais e coletivos referentes à associação e


execução da feira, achamos importante abordar algumas observações em relação ao espaço da

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praça onde acontece a feira, numa tentativa de tentar retratar a história que vive ali
adormecida, história esta que convenientemente pode voltar a ser relembrada vez ou outra por
cidadãos do município. Um breve passeio pela Praça Moisés Viana apresenta, a quem
caminhe com o olhar mais atento, a imagem de várias gestões de poder público que atuaram
na cidade e que tentam deixar para a posteridade sua marca física, em forma de monumento,
placa ou calçada construída. É possível perceber informações, que tentam comunicar aos que
passam por ali, quem foram os responsáveis por tais obras públicas e o que eles queriam que
fosse lembrado. Naturalmente, muitas dessas histórias acabam passando despercebidas. O fato
é que a praça fala por si própria. E, através dela, outras histórias de pessoas que passaram pelo
poder público do município desejam perpetuar-se através do tempo.
Apesar de, no momento não ousarmos explanar uma análise e interpretação sobre o
poder que a praça exerce na memória e, consequentemente, na política de gestão pública da
cidade, assim como, na própria feira em si, destacamos que estes pontos foram observados
durante as vivências de campo, e, mesmo com as nossas dificuldades teóricas de entrelaçá-los
a esta pesquisa, simplesmente não mencioná-los seria uma atitude um tanto conformista.
Desta forma, para fomentar futuras discussões, deixamos abaixo uma citação do sociólogo e
historiador austríaco Michael Pollak (1992), que aborda algumas questões relacionadas à
construção da memória de um povo, e como os governantes, a partir dela, podem acabar se
organizando para beneficiar-se disto.

A memória é seletiva. Nem tudo fica gravado. Nem tudo fica registrado.
A memória é, em parte, herdada, não se refere apenas à vida física da pessoa. A
memória também sofre flutuações que são função do momento em que ela é
articulada, em que ela está sendo expressa. As preocupações do momento
constituem um elemento de estruturação da memória. Isso é verdade também em
relação à memória coletiva, ainda que esta seja bem mais organizada. Todos sabem
que até as datas oficiais são fortemente estruturadas do ponto de vista político.
Quando se procura enquadrar a memória nacional por meio de datas oficialmente
selecionadas para as festas nacionais, há muitas vezes problemas de luta política. A
memória organizadíssima, que é a memória nacional, constitui um objeto de disputa
importante, e são comuns os conflitos para determinar que datas e que
acontecimentos vão ser gravados na memória de um povo. (POLLAK, 1992. p. 203,
204)

De tal forma, a feira, que semanalmente faz parte da praça, também é, e possivelmente
será, símbolo de poder que poderá ser resgatado no futuro, em outros discursos de outros
sujeitos. Neste ponto, deixamos registradas nossas preocupações em redigir um texto que

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tente captar a memória da feira através da fala dos sujeitos que fazem dela possível de
acontecer durante todo o sábado, desde que foi aberta, os agricultores.

As mesas onde se comercializam os alimentos

Logo no nosso primeiro dia de campo, nos primeiros momentos de observação,


direcionamos nosso olhar às mesas de exposição dos produtos. As mesas, à primeira vista, nos
deram a impressão de que elas formavam um limite invisível entre agricultor e consumidor,
onde feirante apresentava seu espaço (na parte de trás da mesa) e tinha o controle sobre esse
espaço seguro para atender seus clientes, como se mesa e feirante fossem um só. Porém, com
alguns minutos de observação essa impressão de parede invisível, do agricultor versus
consumidor, em relação à mesa, se apresentou equivocada revelando outras relações. Assim,
logo percebemos que, ora o agricultor fazia o contorno na mesa, para tomar o lugar do
consumidor e junto a ele ajudar a apresentar e escolher os produtos, ora um consumidor
atravessava esse limite invisível e ficava posicionado no lugar outrora estabelecido como do
feirante.
As mesas que antes nos deram a impressão de que parecia um muro de proteção entre
agricultor e consumidor, passaram a ter nesse segundo momento de observação uma fluidez,
uma vez que percebemos que os agricultores sempre que achavam que era necessário
mudavam de lugar e atuavam no outro lado da mesa, para ter maior contato com o
consumidor e mostrar mais de perto um produto ou conversar sobre algum outro assunto que
ali surgia. O mesmo acontecia com alguns consumidores que estavam mais habituados a
frequentar a feira, passando “para o outro lado da mesa” nos momentos que assim julgavam
interessante para melhorar sua experiência de comprar na feira.
As mesas, apesar de estarem sob a responsabilidade de seus devidos agricultores, vez
ou outra passavam pela tutela do agricultor da mesa do lado. Esses momentos acontecem
sempre em que é necessário abandonar a mesa para realizar alguma atividade rápida nas
redondezas, seja ir até o carro, seja para ir a alguma loja e pagar uma conta. Nesses momentos
em que a mesa estava sob responsabilidade do agricultor da mesa vizinha, este se
responsabilizava por ajudar na venda, caso alguém aparecesse. Logicamente, esses momentos
só acontecem nos horários em que a feira está menos agitada, pelas últimas horas da manhã.

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As mesas nos parecem agora menos estáticas e mais fluidas. O senso do coletivo parece
prevalecer na ajuda mútua entre as famílias que ali trabalham juntas.

O processo democrático do dia-a-dia

A democracia na feira ocorre como um processo em construção contínua, sempre se


renovando e autoafirmando. Neste processo de democratização o grande problematizador é o
cotidiano. Um bom exemplo para ilustrar isso apareceu em uma das conversas informais
realizadas durante o processo de observação. A história nos foi contada como sendo um caso
hipotético dentro da feira, porém é possível que alguns pontos do causo tenham ocorrido
realmente. O importante aqui, portanto trata a natureza do exemplo de linha de raciocínio
exposto pelo agricultor. A seguir tenta-se retratar a história da maneira que nos foi contada:

A feira já tinha algumas normas quando um dos feirantes realizou a sua inserção na
feira. Assim, quando dispôs seus produtos na sua mesa pela primeira vez, com o
intuito de iniciar suas vendas e cativar clientes este feirante começou a anunciar
que na banca dele, seu produto era "mais docinho". Esse tipo de anuncio gerou um
pouco de desconforto naquele momento. (reconstrução da organização da história
ouvida com as palavras dos autores)

É claro que, se formos analisar pelo ângulo de quem já está a mais tempo na feira, isso
parece um ultraje, uma vez que todos ali também vendem alimentos orgânicos, e,
teoricamente, todos os produtos teriam esse atrativo do "mais docinho", sendo que seu
anúncio poderia significar que ela estaria tentando concorrer mostrando uma superioridade do
seu produto frente ao dos outros feirantes. Esta modalidade de anúncio é comum em outros
moldes de comércio que tem por base a competição. Porém, se formos analisar do lado do
novo feirante, este "ultraje" talvez não tenha acontecido de forma intencional, uma vez que as
lógicas de comercialização da feira são diferentes das lógicas de comercialização de um tipo
convencional de varejo de alimentos com livre concorrência, portanto, o ato de anunciar que o
produto era "mais docinho" não significava o mesmo para os dois feirantes, enquanto feirantes
estabelecidos estavam inseridos em uma lógica cooperativa, o feirante novo precisava se
adequar a nova realidade, já que ele só conhecia a lógica competitiva. Um segundo ponto, que
é possível que tenha acontecido, reside no fato de que o produto que era apresentado com esta
característica poderia ser o único naquele espaço e naquela manhã de feira, uma vez que é

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comum que isso aconteça, devido a diversidade de fatores que podem ocorrer durante a
produção.

A resolução aconteceu ao final da manhã de feira, quando ambos os envolvidos,


feirantes estabelecidos e feirante novo, discutiram a situação, mostrando ao novo
feirante, o porquê de sua atitude de marketing não condizer com as normas
construídas no espaço da feira. Após isso, o novo feirante teve a possibilidade de
ressignificar seu gesto e aprender como funciona o senso de equidade na feira. Aqui
ninguém precisa dizer que o produto é “mais docinho” que o do colega.
(reconstrução da organização da história ouvida com as palavras do autor)

Observou-se que esse tipo de ressignificação é um ato contínuo no espaço, uma vez
que sempre se tem algo a aprender no coletivo. Moacir Gadotti (2009) comenta sobre esse
processo pedagógico que acontece em ambientes que trabalham seguindo os princípios da
economia solidária, sendo que para ele não se concebe uma economia solidária sem uma
cultura solidária. Assim, através de relações de reciprocidade, de respeito e de entendimento
aos traços culturais próprios de cada indivíduo, a cultura solidária se apresenta com o desafio
de combinar essas diversidades.
Neste caso, podem-se ver como algumas diretrizes da economia solidária se
estabelecem entre os feirantes, onde há o surgimento do problema, seguido por sua discussão
e análise, desfechando em uma resolução construída entre seus pares. Isso tudo, para que, ao
final de cada sábado de feira, nenhum feirante saia prejudicado por causa de outro feirante,
mostrando na prática o significado da palavra cooperação. Aprende-se a cooperar no coletivo.

Considerações finais

Observar a cultura através do cotidiano faz parte dos processos de respeito aos saberes
locais. Assim, os saberes da feira são influenciados pelas práticas que acontecem antes do
momento de comercialização, ainda na propriedade.
Escolher ser agricultor implica em uma constante busca por aprendizagem e
conhecimento. Essa aprendizagem e conhecimento se constroem através dos diálogos entre
agricultores/feirantes e consumidores, no dia a dia da feira.

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A qualidade de vida acaba se apresentando como um fator importante na hora de


justificar a permanência no campo, mesmo assim, cabe salientar que o conceito de qualidade
de vida aparece de forma diferente em cada família estudada.
Não se pode dizer que diversificar a produção é solução para todas as propriedades,
uma vez que aumentar a diversidade implica em aumentar a carga de trabalho da família, o
que por muitas vezes, não é uma opção.
No cotidiano da feira podemos observar que em sua diversidade de relações, o
processo democrático de organização é fortemente influenciado.
Por fim, mas não menos importante, uma vez que a feira acontece no espaço público
da praça central do município, faz-se necessário entender que com o passar do tempo a feira
será parte da memória coletiva construída ao redor da praça. Assim, trabalhos como este,
possibilitam realizar o registro da fala das próprias agricultoras e agricultores na construção
dessa memória no município.

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CONHECIMENTOS AGROEOCOLÓGICOS: SUSTENTABILIDADE E


EMANCIPAÇÃO SOCIAL NA REGIÃO CENTRAL/RS

Maurício Machado Sena18


Bernardo Rodrigues da Silva19

Resumo
O presente trabalho investiga a construção da Agroecologia, como campo do conhecimento, através
das experiências dos agricultores diante dos princípios da Sustentabilidade como fomento para
Emancipação Social. A pesquisa se utiliza de documentos, entrevistas, fotografias e materiais
audiovisuais recolhidos e produzidos entre agosto de 2017 e janeiro de 2018. Fazem parte dessa
experiência três (04) famílias agricultoras participantes das ações do NEA-UFSM, sendo 3 em Santa
Maria e 1 em Santiago. Pensamos essas experiências a partir das Metodologias Participativas como
possibilidade de investigação e vivência, investigando as relações sociais estabelecidas nos
agroecossistemas e tencionando questões a respeito das práticas agroecológicas. Como considerações
finais presenciamos no diálogo um caminho adequado para esse intento identificando-o como
elemento fundamental nesse processo.

Palavras-chave: Agroecologia, Diálogo, Emancipação Social.

Introdução

O presente trabalho investiga a possibilidade da Agroecologia como fomento à


Emancipação Social. A partir das relações dessa ciência (CAPORAL; COSTABEBER, 2004),
por parte dos agricultores e dos acadêmicos, possibilitando a Emancipação Social (SANTOS,
2007) e democratização da sociedade, onde os saberes, valores e visões dos indivíduos são
admitidos de forma igualitária junto à construção do conhecimento. Assim, ao abordarmos a
Agroecologia, e seus diversos significados, se faz necessário discutirmos esses temas sob a
ótica do Desenvolvimento Sustentável (ESTEVA, In: SACHS et al., 2000) para além da
aparente ecologização da produção, acumulação de capital e tecnificação.
O presente trabalho consiste em um estudo de caso, realizado junto a quatro (04)
famílias agricultoras (3) em Santa Maria e (01) em Santiago, e se baseia na investigação
através de entrevistas que foram documentadas entre agosto de 2017 e janeiro de 2018. Nesse

18
UFSM, jornal.sena@gmail.com
19
UFSM, rodriguesdasilvabernardo@gmail.com

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sentido, pensamos essa multiplicidade de assuntos a partir das Metodologias Participativas


(CHAMBERS, 1992) como elementos fundamentais para a ciência agroecológica, como nova
forma de pensamento e de leitura de mundo.
Identificando a relação da escolha por técnicas de produção sustentável com a
perspectiva de mudança diante das dificuldades presentes no trabalho diário. Revelando um
profundo interesse nas atividades de capacitação, na aprendizagem e disseminação de
conhecimentos de base sustentável, bem como a realização de cursos sobre a Agroecologia.
Potencializando, dessa forma, a emancipação social (SANTOS, 2007) do sujeito frente
ao mundo, possibilitando uma democratização da sociedade e a possibilidade de resolver os
problemas modernos, diante da expectativa de uma sociedade melhor (SANTOS, 2007, p.17).
Em consonância, a Agroecologia (CAPORAL; COSTABEBER, 2004) é um campo do
conhecimento, que tem entre suas principais preocupações o desenvolvimento sustentável, as
transformações sociais no meio rural, a valorização do conhecimento dos agricultores, a
qualidade de vida e as relações estabelecidas entre as populações urbanas e rurais. Esse
desenvolvimento sustentável segundo a ONU, diante da Comissão Mundial sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento:

[..] é um processo de mudança no qual a exploração dos recursos, o direcionamento


dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e a mudança
institucional estão em harmonia e reforçam o atual e futuro potencial para satisfazer
as aspirações e necessidades humanas” (ONU, 1991, p. 30).

A respeito das famílias20 selecionadas apontamos, a família Da Silva, a família Silva, a


família Streck e a Família Vielmo.
Podemos afirmar que as famílias possuem uma série de semelhanças que as colocam
em evidência dentro de suas comunidades, como a participação junto aos grupos em feiras e
associações, as “porteiras abertas” para a realização de pesquisas, bem como um profundo
senso ético e crítico a respeito das relações que estabelecem em seu dia-a-dia. Além do fato de
que todas tiveram um contato com a vida “urbana” e resolveram realizar a mudança para o
meio rural, aliando-se à produção orgânica fundamentada nos princípios, práticas, técnicas e
valores da Agroecologia.

20
Mantemos o sobrenome real das famílias com o intuito de valorizar suas histórias pessoais, suas lutas,
contradições e em respeito aos preceitos das Metodologias Participativas.

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Sabendo que essas ações revelam e permeiam as relações de ordem sociológicas,


ambientais, econômicas, políticas, culturais e éticas. Notamos que a Agroecologia, em suas
diversas nuances significados e interpretações, sob a tutela e enfoque de suas teorias,
extrapola os temas comumentes promovidos pelo Desenvolvimento Sustentável. Dessa forma,
consideramos que a inserção dessas questões junto à academia, é de fundamental importância,
pois contribuem para a ampliação das perspectivas da interdisciplinaridade e da
complexidade, propostas para a Agroecologia. Apresentando ideias que dialoguem com a
realidade observada, para que sejam expostas de forma ampla e adequada, contemplando os
questionamentos e objetivos da pesquisa

Sustentabilidade e Desenvolvimento no Rural

Ao pensarmos sob o ponto de vista histórico, identificamos uma série de trabalhos que
influenciaram o debate global sobre a agroecologia, a sustentabilidade e nossa relação com o
meio-ambiente. Assim, apontamos o período do Pós-Guerra, como grande marco, quando,
nesse momento as nações começaram a se questionar a respeito da melhor utilização desse
“capital natural e humano” disposto pela agricultura e pelo ecossistema que, pela primeira
vez, se mostrava como um limitante.
Essa preocupação se intensificou na medida em que os países investiam grande parte
de seus recursos na modernização da agricultura, na ampliação de sua matriz industrial e na
busca por novos mercados diante do processo de descolonização. Essas ações foram tomadas
em âmbito global, por ambos os lados desse mundo polarizado por Estados Unidos e União
Soviética, na tentativa de restabelecer o dinamismo da economia intensificando a produção e
visando um aumento no consumo de bens, por parte de uma nova classe média.
Nessa época, a denominada “Revolução Verde”, que foi a manifestação do paradigma
tecnicista no meio rural, iniciou sua caminhada em ampliar a produção de grãos e
commodities agrícolas no intuito de abastecer a indústria e as grandes redes varejistas,
promovendo a concentração fundiária, aumentando o controle externo sobre os
agroecossistemas e por fim submetendo ou excluindo as diferentes formas de agriculturas.
Essa luta de forças, extremamente desproporcional, resultou em uma série de conflitos no
campo evidenciados principalmente pelo “Êxodo Rural”, pela concentração fundiária, pelo

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aumento dos problemas ambientais nos agroecossistemas e pela extinção de cultivos e de


modos de vida.
No entanto, outros fatores contribuíram para esse debate, onde podemos citar o
Movimento Ambientalista, a contra-cultura, o associativismo rural, a influência de grupos
religiosos e a articulação de Instituições de Ensino e cientistas que questionaram as tomadas
de decisão dos grupos hegemônicos. Assim, destacamos a ação do Clube de Roma que, em
1968, publicou o documento Os Limites do Crescimento (MEADOWS et al., 1972),
realizando também outras atividades que inspiraram a primeira Conferência das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em 1972, em Estocolmo, Suécia.
Além dessas iniciativas globais, tivemos no Brasil, uma série de movimentos que
tencionaram o debate a respeito da questão ambiental da produção agrícola, da utilização dos
agrotóxicos, entre outros assuntos. Sendo que localmente, destacamos a atuação da Prof. Ana
Maria Primavesi, de naturalidade austríaca, que nos anos 60 veio ao Brasil, lecionou junto à
UFSM e iniciou os trabalhos a respeito da importância da fertilidade para a preservação do
solo, uma das bases das técnicas para a pesquisa em Agroecologia.
Já ao final desse período histórico marcado por seus extremos, por suas guerras,
revoluções, regimes ditatoriais e por uma profunda bipolarização do mundo, temos com a
publicação de Nosso Futuro em Comum, da Comissão das Nações Unidas para o Meio
Ambiente, de 1987, ou simplesmente Comissão Brundtland, uma proposta para o
desenvolvimento sustentável, que apregoava um “desenvolvimento que satisfaz as
necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas
próprias necessidades” (ONU, 1987, p.5).
Essa perspectiva de sustentabilidade é abordada, por Gustavo Esteva, quando
argumenta que o termo “desenvolvimento” muitas vezes diz exatamente o oposto de seu
significado, sendo atrelado diretamente ao termo Subdesenvolvimento, baseado na visão
hegemônica de um Norte Rico e de um Sul Pobre, ou de uma área mais tecnificada, para outra
menos. Obviamente, essa concepção tem sido reformulada, onde o pensamento de um
desenvolvimento sustentável, participativo, horizontal e baseado, por exemplo, no
etnodesenvolvimento, no desenvolvimento regional ou no bem-viver, com as contribuições de
Fals-Borda, Stavenhagen, Nishikawa, Acosta, entre outros, são amplamente discutidas.
Dessa forma de acordo com Esteva (in: SACHS et al., 2000, p. 66):

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A palavra define uma percepção. Essa, por sua vez, torna-se um objeto, um fato.
Ninguém parece suspeitar que o conceito não se refere a um fenômeno real.
Ninguém parece compreender que “desenvolvimento” é um adjetivo comparativo
cuja base de apoio é a premissa, muito ocidental, mas inaceitável e não
demonstrável, da unidade, homogeneidade e linearidades da evolução do mundo.

Para o autor a palavra Desenvolvimento, com toda sua carga e pompa, não tem mais
capacidade de confrontação frente aos problemas presentes na realidade. Tornando-se uma
simples muleta, da qual não necessitamos, uma vez que, “é possível andar com nossos
próprios pés, em nosso próprio caminho, para sonhar nossos próprios sonhos”. (p.81).
Nesse sentido, ao pensarmos o novo paradigma da Agroecologia, como uma ciência
viva, dinâmica e participativa, também pensamos esse novo desenvolvimento sustentável para
os agroecossistemas, a partir de uma progressão coevolutiva sustentada por um sistema social
desenvolvido de forma autóctone. Essa perspectiva coevolucionista admite que os sistemas
agrícolas são integrados e dinâmicos.
Esse dinamismo está retratado na inserção do fator humano, bem como em seus
anseios e pensamentos, legitimando os conhecimentos, a diversidade cultural, a capacidade de
experimentação e a criatividade dos agricultores. Dessa forma, para além da inserção de
tecnologias verdes, da substituição de insumos, das técnicas de agricultura de baixo carbono e
do “selo”, denotando a garantia de um produto orgânico e apontam para a proposta comercial
das agriculturas sustentáveis, necessitamos de uma nova racionalidade, como apontam
Caporal e Costabeber (2004).

Por isto mesmo, quando se fala de Agroecologia, está se tratando de uma orientação
cujas contribuições vão muito além de aspectos meramente tecnológicos ou
agronômicos da produção, incorporando dimensões mais amplas e complexas, que
incluem tanto variáveis econômicas, sociais e ambientais, como variáveis culturais,
políticas e éticas da sustentabilidade (CAPORAL; COSTABEBER, 2004, p. 13).

Essa nova proposta científica também se baseia no respeito ao conhecimento do


agricultor e busca uma maior participação, dos mesmos, nos processos de construção da
pesquisa, valorizando suas significações, estratégias e tecnologias. Considerando dessa forma,
que as estratégias de promoção da sustentabilidade devem ser baseadas nessas seis (06)
dimensões, a saber: ecológica, econômica, social, cultural, política e ética.

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Assim, a incorporação de temas no meio rural, que transcendem a produção agrícola,


traz novos questionamentos sobre as estratégias de fomento à agricultura familiar, revelando
de forma mais nítida o papel multifuncional do campo. Possibilitando uma pesquisa que além
da execução de atividades técnicas e de coleta de dados, precisa ser interpretada de forma
subjetiva, analisando as relações de poder decorrentes dessa ação, assim como afirma Miguel
Altieri, em seu livro Agroecologia: bases científicas para uma agricultura sustentável (2012):

Grandes reformas devem ser feitas nas políticas, nas instituições e nos programas de
pesquisa e desenvolvimento para assegurar que essas alternativas se disseminem de
forma massiva, equitativa e acessível, de modo que os benefícios por elas gerados
sejam direcionados para a conquista da segurança alimentar (ALTIERI, 2012, p.17).

Essa abertura não busca a redução, limitação ou censura frente à ciência, mas sim,
combater a subordinação da tecnologia aos interesses do sistema, que resulta na perpetuação
de necessidades fabricadas, no desperdício, na desigualdade e na exploração desordenada do
meio ambiente.
Essas relações se destacam ao afirmarmos a emergência da valorização dos
conhecimentos dos agricultores. Potencializando, dessa forma, a emancipação social
(SANTOS, 2007) do sujeito frente ao mundo, possibilitando uma democratização da
sociedade onde seus saberes, valores e visões são admitidos junto à construção do
conhecimento.

O problema é que a emancipação social é um conceito absolutamente central na


modernidade ocidental, sobretudo porque esta tem sido organizada por meio de uma
tensão entre regulação e emancipação social, entre ordem e progresso, entre uma
sociedade com muitos problemas e a possibilidade de resolvê-los em outra melhor,
que são as expectativas. Então, é uma sociedade que pela primeira vez cria essa
tensão entre experiências correntes do povo, que às vezes são ruins, infelizes,
desiguais, opressoras, e a expectativa de uma vida melhor, de uma sociedade melhor
(SANTOS, 2007, p.17).

Evidenciamos a necessidade da realização de pesquisas que se apoiem na


reformulação do pensamento, onde não mais a instituição/o extensionista são os detentores do
conhecimento científico, e o agricultor, é um objeto de estudo inerte. Assim, a partir do aporte
das redes temos uma nova forma de pensar as estruturas de produção de conhecimento
acadêmico, fomentando discussões sobre as relações de poder estabelecidas nessas trocas de
saberes e integrando a comunicação como potencializador dessa mudança.

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Metodologias Participativas e Ciência Agroecológica

Esse esforço de buscar novas formas de produzir conhecimento se mostra necessário,


uma vez que a pesquisa baseada em métodos cartesianos tradicionais não contempla as
possibilidades de interpretação dessas relações, ainda mais, ao levarmos em consideração os
agricultores e agroecossistemas, que são organismos vivos e dinâmicos. Nesse sentido,
pensamos que ao nos depararmos com uma multiplicidade de assuntos, perguntas e respostas
devemos nos valer das Metodologias Participativas como elementos fundamentais para a
ciência agroecológica.
Sobre essa necessidade Chambers (1992) ilustra a evolução percebida na ciência e na
sociologia agrária, como nova forma de pensamento e de leitura de mundo. Assim afirmamos
que as metodologias participativas vêm se desenvolvendo, junto aos processos de sociologia
rural, desde os anos 60, na tentativa de encontrarmos respostas mais amplas e aproximadas da
realidade: “Em função disso passou-se a buscar métodos mais eficazes de modo que as
pessoas de fora pudessem saber mais sobre as condições de vida e sobre os habitantes das
áreas rurais” (CHAMBERS, 1992, p. 15).
Nesse sentido, ao pensarmos no movimento de retroalimentação, presente na relação
da Agroecologia com os demais temas aqui abordados, percebemos que essas propostas
estabelecem que o agricultor familiar seja o primeiro e último elo dessa corrente no estudo do
rural e na possibilidade de desenvolvimento e transformação social. Nesse sentido revelamos
essas questões da pesquisa, para além das respostas pré-agendadas referente às atividades de
trabalho do dia-a-dia, do retorno econômico financeiro ou da visão dicotômica
preservacionista, que exclui o elemento ético. Assim como aponta, Rhoades e Booth (1982, p.

22) “La filosofía básica en la que se apoya este modelo es que la investigación y el desarrollo

agrícola deben comenzar y terminar en el campesino.”. No entanto como expõe Santos:

Experiências muito locais, não muito conhecidas nem legitimadas pelas ciências
sociais hegemônicas, são hostilizadas pelos meios de comunicação social, e por isso
têm permanecido invisíveis, "desacreditadas". A meu ver, o primeiro desafio é
enfrentar esse desperdício de experiências sociais que é o mundo; e temos algumas
teorias que nos dizem não haver alternativa, quando na realidade há muitas
alternativas (2007, p. 24).

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Da mesma forma, Guzmán (2001) afirma que para além da revisão transdisciplinar, a
Agroecologia se presta ao papel de questionar os fundamentos da ciência moderna.
Organizando seus conhecimentos, através do dualismo metodológico e epistemológico, com a
questão social, sendo de extrema importância, nessa análise, o respeito à multiplicidade dos
processos no agroecossistema. O autor também concorda que, para a Agroecologia, a palavra
método apresenta um caráter polissêmico:

Assim, definimos como método o conjunto de procedimentos que, articulando os


pressupostos teóricos com os mecanismos de produção e contrastação da
informação, constituem o suporte e orientação em que se apoia o pesquisador para
levar a cabo suas contribuições.Por outro lado, entendemos por técnicas o conjunto
de ferramentas, ou procedimentos concretos, através dos quais se leva a cabo a
coleta de dados, ou a produção dos dados, que nos permitem enfrentara análise.
(GUZMAN, 2001, p.19)

Bem como uma aproximação frente à Pesquisa-Ação como oportunidade de


transformação social. Relembrando, Guzman aponta que atualmente temos três (03)
perspectivas de pesquisa: Distributiva, Estrutural e Dialética, que são articuladas em torno da
Agroecologia como campos de análise, podendo cristalizar três níveis de investigação: o nível
tecnológico (ou empírico), o nível metodológico e o nível epistemológico. Nesse contexto,
nos valemos do terceiro nível, para aprofundarmos o debate a respeito da dialética e da sócio-
política, nas quais a Pesquisa-Ação participativa tenciona a relação sujeito-objeto, provocando
a possibilidade de uma mudança nas ações sociais dentro da atuação da ciência.
Assim, pesquisar em conjunto ao agricultor, de forma dialógica, para que o mesmo se
aproprie criticamente, quando são apresentados a conhecimentos, conceitos, técnicas e
histórias que lhes fazem sentido, uma vez que essa construção do conhecimento se reflete no
mundo do sujeito. Como explica Paulo Freire:

Ser dialógico é não invadir, é não manipular, é não sloganizar. Ser dialógico é
empenhar-se na transformação constante da realidade. Esta é a razão pela qual,
sendo o diálogo o conteúdo da forma de ser própria à existência humana, está
excluído de toda relação na qual alguns homens sejam transformados em “seres para
outro” por homens que são falsos “seres para si”. (FREIRE, 1977, p.28).

Dessa forma, dentro do contexto de investigação uma posição dialógica serviu como
guias para as entrevistas. O diálogo garantiu uma maior aproximação das problemáticas a

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respeito da Agroecologia como campo do conhecimento e a relação dos agricultores com os


princípios que a sustentam.

Sentimentos, Saberes e Princípios como Emancipação Social

Assim, ao falarmos sobre Oldemar e Dora Streck percebemos o empenho em manter


as tradições, fazeres e conhecimentos em suas práticas diárias sendo o trabalho e a hsit´ria de
vida, uma satisfação. Essa satisfação também se aproxima da noção de construção do
conhecimento, como uma sabedoria desfrutada junto ao meio rural, identificado pelos
agricultores por uma série de características únicas, até mesmo em sua produção caseira, na
mesa farta e na memória dos antepassados por esse “estilo de vida saudável”. Como afirma
Oldemar Streck: “Esse modelo de cultura, de vivência, de ter esses produtos, de fazer esses
produtos saudável sempre existiu... e nós se criemo com nossos antepassados comendo esse
tipo de coisa, mais saudável, mais limpa”. Essa noção de satisfação está intimamente ligada à
noção de conhecimento das famílias.
Seguindo, percebemos junto à família Da Silva uma relação interessante com a
construção do conhecimento, sob uma perspectiva mais prático e crítico da situação rural,
sendo que tanto João Antônio da Silva, e sua esposa Olga têm sua origem no meio rural,
retornando para o mesmo após trabalharem por muito tempo em profissões urbanas. Assim,
em uma primeira análise ambos têm uma concepção bastante técnica e prática das formas de
conhecimento.
Para os Da Silva a reaproximação, com o meio rural, iniciou com a mudança para
Santa Maria e a aquisição do agroecossistema. O Sr. João Antônio afirma que o primeiro
passo foi a realização de um curso em Citricultura, junto ao Colégio Politécnico, buscando a
reativação do pomar de laranjas. Ele aponta que esse primeiro contato, com a UFSM, foi
decisivo para a construção do conhecimento. No entanto ele também revela que herdou um
saber que veio de seus pais, principalmente sobre lidas, tempos de cultivares, observação da
natureza além de caldas e receitas caseiras.
João Antônio também considera que deveria existir um maior diálogo entre os
agricultores e as instituições de ensino, principalmente quanto aos estágios e vivências de
formação dos acadêmicos. E completa afirmando que “seria um casamento muito bom... se

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conseguisse uma relação, dos alunos da universidade, na propriedade coma gente, tanto pra
eles quanto pra gente seria positivo” (Entrevista João Antônio, 17min). E que hoje, tem uma
relação de confiança e amizade com os grupos que o receberam na UFSM, assim partimos de
um problema prático que se transmutou em uma relação interpessoal, invertendo a lógica de
extensionista/assistido.
Sobre o conhecimento também notamos que o jovem agricultor Roberto Vielmo está
motivado a se especializar na área técnica das ciências agrárias, uma vez que foi aprovado no
vestibular para o curso de Agronomia, no Campus Santiago da Universidade Regional
Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI). Ele aponta que grande parte de seu
conhecimento vem a partir das experiências e da “tentativa e erro”, e que mesmo com o apoio
da extensão rural eles precisam de uma maior responsividade para os problemas enfrentados
diariamente.
Como afirma Núbia Vielmo “na parte de verdura, se tu tem uma coisa é pra ontem,
não tem como tu olhar estudar o problema, e daqui uma semana eu te dou uma resposta, em
uma semana tu perde uma estufa” (entrevista Núbia e Roberto, 8min). E completa:
“Precisamos de um produtor que seja formado em agronomia. Porque ele vai ter a experiência
dele, lá na faculdade e vai ter a experiência na terra” (entrevista Núbia e Roberto, 12min)
A família Vielmo avalia que essa falta de informação qualificada é um problema
comum a todos os agricultores familiares em transição agroecológica, sendo que recentemente
tiveram um problema com uma cultura e receberam a visita de “três engenheiros agrônomos e
cada um deu uma solução diferente”.
Os Vielmo também acreditam que grande parte dos problemas podem ser resolvidos
com a melhoria de solos e manejos, avaliando que sua atual formação acadêmica não
contempla os conhecimentos necessários para a resolução dos problemas da horta, como
afirma Roberto “tem que ter um agricultor que entenda dos problemas” (entrevista Núbia e
Roberto, 10min).
Eles argumentam que mesmo recebendo assessoria técnica ainda falta esse “agricultor
agrônomo”, sendo que deveria existir alguma forma da Universidade auxiliar nessa
caminhada. Roberto finaliza afirmando que o conhecimento deve ser utilizado pra beneficiar o
grupo: “Não vai beneficiar só eu e mãe aqui, vai beneficiar o grupo dos orgânicos e os outros

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produtores, são cento e um produtores de hortaliças em Santiago”(entrevista Núbia e Roberto,


10min).
Também os Silva possuem um profundo interesse nas atividades de capacitação, bem
como na aprendizagem sobre a Agroecologia, como afirma Carmen Silva, ao sustentar que
esse conhecimento está em construção e que o estudo proporciona a ampliação da perspectiva,
principalmente ao inserir os fatores bióticos na produção. Nesse caso o conhecimento
acadêmico prévio foi um motivador pelo interesse na produção orgânica, sendo que um dos
primeiros contatos se deu através dos estudos da professora Ana Primavesi. Como afirma
Carmen:

(...) ele vem de um desejo de produzir alimentos, de uma forma de uma agricultura
sustentável. Em que tu pode produzir o teu alimento, cuidar do teu solo, e tratar de
uma forma natural sem o uso de agrotóxico, sem o uso de veneno, sem o uso de
qualquer químico (Entrevista Carmen, Maurício, Tais - 2min).

Entre os cursos realizados pela Família podemos citar: Poda, Hortas, Produção de
Morangos, Fruticultura, Biodinâmica, Avicultura Colonial e Boas Práticas, entre outros.
Como afirma Carmen, “a agroecologia desperta em ti essa visão mais sistêmica, de uma visão
de que tudo está relacionado, conectado” (Entrevista Carmen, Maurício, Tais -4min).
No mesmo sentido, Tais Silva afirma que ainda vê algumas dificuldades,
principalmente diante do desafio de transferir o conhecimento do curso para o
agroecossistema, considerando fundamental a ligação entre a teoria e a prática, e completa:

(...) mas é um aprendizado constante... é um laboratório, todo dia é um aprendizado


novo, uma dificuldade nova que se coloca, um obstáculo, e a gente tem que
procurando alternativas pra lidar com aquilo ali, mas é muito. Eu acho que cada dia
que passa, eu tô mais apaixonada pela Agroecologia (Entrevista Carmen, Maurício,
Tais - 5min).

Além disso, Maurício Silva finaliza afirmando que sempre quando conversa com seus
colegas agrônomos, considerando tanto os agroecológos quanto os que se dedicam a
agricultura convencional, percebe que a formação é muito tecnicista e pouco prática. Apesar
de considerar necessária essa base teórica, e a amplitude do curso de agronomia, acredita que
é necessário recuperar o conhecimento ancestral em que se baseia Agroecologia, pontuando:
“A gente não quer fazer uma agricultura orgânica de substituição, trocar o fungicida, por um

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produto que tenha um efeito parecido, a gente quer um produto saudável, por isso que a gente
busca conhecimento” (Entrevista Carmen, Maurício, Tais - 8min).
A partir dessas considerações, podemos inferir que, a Agroecologia, pensada como
uma área de conhecimento transdisciplinar, se apresenta como paradigma científico
alternativo frente à necessidade de estabelecermos uma relação ecológica com o meio
ambiente, que garanta retorno financeiro ao agricultor, que seja socialmente abrangente,
politicamente democrática, empática com as diferentes culturas e que se fundamente em
relações éticas. Ou seja, sustentável com os agroecossistemas e dialógica com as pessoas.

Considerações Finais

Nesse sentido seja a visão mais ligada às práticas ancestrais, da família Streck, da
importância do conhecimento técnico, na família Da Silva, da necessidade de capacitação do
saber, da Família Vielmo e da visão holística, da Família Silva Garcia, percebemos uma
profunda visão crítica das famílias a respeito do conhecimento apropriado.
Assim, reafirmamos que a contribuição dos agricultores é fundamental para a
construção do conhecimento agroecológico. Sendo que esse conhecimento só poderá ser
construído de maneira dialógica, onde as ações e sentimentos dos indivíduos sejam
consideradas. Pois, no processo de emancipação social, seja através do trabalho do agricultor
ou do pesquisador, seja o agricultor mais ou menos tecnificado, todos os conhecimentos
construídos dialogicamente podem contribuir para esse fim.
Tecemos essas considerações após uma profunda reflexão a respeito da realidade
observada junto aos agricultores familiares em transição agroecológica, bem como análise de
sua relação com seus agroecossistemas, refletindo sob a busca por emancipação social.
Levando em consideração o paradigma Agroecológico, como campo científico emergente que
se baseia na valorização e resgate do conhecimento dos agricultores, na transformação social
e na tomada de consciência dos saberes implicados em suas ações e de seu trabalho.

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EIXO 2: A educação do campo e a educação dos camponeses ( educação escolar e não


escolar).

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HISTÓRIAS DE VIDA, OLHARES SENSÍVEIS E DIÁLOGOS: a realidade da


Educação do Campo21

Géssica Pretzel22
Graziela Franceschet Farias23

Resumo
Inquietas com o grande número de escolas no campo cessadas e com a naturalização desses processos,
buscamos identificar as escolas em processo de cessação, cessadas e ativas na zona rural do município
de Ibarama-RS, conhecer as concepções da comunidade sobre as escolas fechadas ou com as
atividades suspensas, bem como, ressaltar a importância da Educação do e no Campo. Optamos pela
abordagem qualitativa para realizar o estudo de caso, realizamos a pesquisa de campo com visitas in
loco e entrevista semiestruturada. E recolheram-se juntamente com a SMECDT os documentos que
comprovam o fechamento, os quais justificam que as escolas foram cessadas pelo baixo número de
matrículas e pela nuclearização de algumas escolas, devido a oferta do transporte escolar. Como
resultados, consideramos que a Educação do Campo, tal como na concepção originária nos
movimentos sociais pode contribuir para que as escolas hoje consideradas no campo tornem-se do
campo.

Palavras – Chave: Comunidades; Educação no e do campo; Contextos escolares.

Notas introdutórias

Caminho por uma extensa estrada de terra. A chuva recente faz intensificar ainda mais as cores e o perfume das
flores, a fragrância das folhas úmidas dos frondosos eucaliptos e o aroma que se ergue do vapor da terra
molhada. Uma melodia se faz presente com o sonido dos animais e com a brisa que faz balançar as vegetações
presentes em ambos os lados da estrada. Esses múltiplos odores, sons e cores se misturam, oferecendo a todos
uma obra de arte viva. Nesta bela paisagem, percebo também algumas casas abandonadas... De longe é quase
impossível supor quem viveu nelas e o que aconteceu no seu interior... Mas de perto, elas me contam tanto...
Elas choram de saudades por vidas que se foram... Mas também se alegram ao pensar na possibilidade de terem
deixado marcas significativas em cada um que lá passou...

(CARDONETTI, Fragmento do parecer do TCC de Géssica, 2018).

O olhar sensível permite que identificamos realidades, muitas vezes despercebidas por
muitos seres humanos. As determinadas realidades que me refiro, são de comunidades do
campo, do direito à Educação do Campo em nosso país. Apesar dos grandes avanços neste
campo, há, ainda, muito a fazer. Muito a se construir.

21
Este artigo constitui-se em um recorte do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) intitulado “Quando se
mantém uma escola viva e aberta: protagonismos das comunidades do Interior de Ibarama/RS”.
22
Prof.ª Pedagoga – Egressa do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia/UFSM. gessyka88@hotmail.com
23
UFSM-profegraziela@gmail.com.

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Pouco se discute sobre a Educação do Campo, nos mais diversos contextos, até
mesmos em cursos da área de Educação. Durante a formação inicial da primeira autora, a
mesma sentiu a necessidade de pesquisar mais sobre a Educação do Campo, pois ao longo do
curso, pouco se aprofundou, algumas considerações foram feitas em relação à planejamentos
pedagógicos e práticas voltadas para o estudo do tema. Desta maneira, a mesma, buscou
inserir-se no do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) no
subprojeto PIBID - Interdisciplinar Educação do Campo, e conhecer um pouco do contexto no
qual está inserida a Escola Estadual de Ensino Fundamental Arroio Grande, localizada no
quarto distrito de Santa Maria. E entre meio aos projetos desenvolvidos, o reconhecimento das
realidades vivenciadas pelas crianças e adolescentes, a curiosidade sobre o tema Educação do
Campo, só progrediu. E as inquietações assim surgiram: Que educação é essa que se constrói
no meio rural? Existe educação diferenciada para os povos do campo? Educação no Campo
ou Educação do Campo? Essas e outras tantas indagações merecem ser discutidas e
analisadas.

EDUCAÇÃO DO CAMPO: DE QUAL EDUCAÇÃO FALAMOS?

Ao citar o povo do campo e a Educação que é destinada aos mesmos, podemos


retomar muitas lutas e batalhas, porém também muitas inquietações, as quais foram
percebidas por nós autoras ao longo da nossa história de vida, pelo olhar sensível e atento nos
longos trajetos e cansativas rotinas semanais nas quais não passavam despercebidas aos olhos,
as escolas do campo que estão com as “portas fechadas”.
Essa realidade, também é visível no interior do município de Ibarama/RS, que segundo
o Censo Demográfico (2010), constitui-se por 4.371 habitantes, dos quais: 3.318 residem na
zona rural e somente 1.053 residem na zona urbana. Tais números indicam que a base
econômica do município é sustentada pelo setor primário (preponderantemente a Agricultura),
predominando na geração de renda das famílias que ali residem
Memórias estas que se traduzem em relatos orais espontâneos e que se expressam na
fisionomia do olhar dos sujeitos autores, que narram: “[...] esta ou aquela determinada escola
foi importante na minha vida e, recentemente, foi fechada. Umas estão abandonadas, com as
portas abertas, vidros quebrados, provavelmente foram arrombados, outras foram restauradas

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e adotas como igrejas, algumas adaptadas para servirem como centro de eventos e assim as
antigas escolas localizadas na zona rural, só ficam na lembrança de quem um dia estudou em
uma delas, ou teve o sonho de poder estudar” (grifos da primeira autora, 2017).
Ao nos depararmos com sensíveis relatos esporádicos de sujeitos das comunidades do
interior do município de Ibarama/RS, acolhemos a Educação do Campo como cenário amplo
e denso de pesquisa e nos movimentamos nos sentidos das suas potencialidades, levando em
consideração o contexto do aluno, suas vivencias locais, individuais e coletivas. Por outro
lado, como objeto de análise deste artigo destacamos que as escolas no interior estão sendo
fechadas progressivamente e um pequeno número ainda mantém as atividades escolares.
Neste sentido, tomamos como opção a possibilidade de valorizar falas, sujeitos,
lugares e ações que se identificam e aproximam a pesquisa em destaque com a grande área
das Ciências Sociais e Humanas. Para constituirmos esse trabalho optamos por adotarmos a
abordagem de cunho qualitativo, pois a mesma contempla os objetivos definidos.
Consideramos ainda que a autora pertence ao contexto de estudo desde que nasceu e buscou
compreender a influência dos fenômenos humanos, sociais, assim como, outras fontes de
informações que poderiam contribuir para a organização e sistematização de um repertório
teórico, conforme aponta o fragmento abaixo,
[...] os estudos chamados de qualitativos que englobam um conjunto heterogêneo de
perspectivas, de métodos, de técnicas e de análises, compreendendo desde estudos
do tipo etnográfico, pesquisa participante, estudo de caso, pesquisa ação até análises
de discurso e de narrativas, estudos de memória, história de vida, história oral.
(ANDRÉ, 2001, p.54).

No caso deste estudo, optamos pelo método estudo de caso, uma vez que,
[...] o conhecimento gerado a partir do estudo de caso é diferente do conhecimento
gerado a partir de outras pesquisas porque é mais concreto, mais contextualizado,
mais voltado para interpretação do leitor e baseado em populações de referência
determinadas pelo leitor [...] (DEUS; CUNHA; MACIEL, 2010, p.03).

Dessa maneira um dinâmico e amplo leque de possibilidades se colocam à disposição


e revelam o que, em outras tantas vezes, nos passa despercebido.
Quanto ao campo de possibilidades da pesquisa, tendo em vista as diferentes variáveis
de interesse, se colocam a disposição uma série de fontes de evidências que exigiram a
triangulação de informações. Em relação a isso, Yin (2010, p. 124) fala que “A evidência do
estudo de caso pode vir de seis fontes: documentos, registros em arquivos, entrevistas,

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observação direta, observação participante e artefatos físicos [...]”. Essas fontes não
sobrepõem vantagens umas às outras, ao contrário, se complementam. Nesse estudo
desfrutamos de algumas dessas fontes como, por exemplo, a documentação disponibilizada
pela Secretaria Municipal de Educação, Cultura, desporto e Turismo (SMECDT), que
comprova o fechamento das escolas e traz os motivos para que isso tenha acontecido, pois
Yin (2010, p. 128) propõe que “[...] a informação documental é, provavelmente, relevante
para todos os tópicos de estudo de caso [...]”. Acreditamos que foi relevante realizar um
levantamento, estudo e revisão dos referenciais teóricos sobre o tema de pesquisa, para que
pudéssemos construir um embasamento e analisar as informações coletadas durante a
pesquisa. Fonseca (2002) afirma que,
A pesquisa bibliográfica é feita a partir do levantamento de referências teóricas já
analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrônicos, como livros, artigos
científicos, páginas de web sites. Qualquer trabalho científico inicia-se com uma
pesquisa bibliográfica, que permite ao pesquisador conhecer o que já se estudou
sobre o assunto. (FONSECA, 2002, p. 32).

A partir do estudo e aprofundamento dos referenciais teóricos sobre o tema,


percebemos que, conforme aponta o excerto abaixo que,
Devido ao seu valor global, os documentos desempenham um papel explícito em
qualquer coleta de dados na realização dos estudos de caso. As buscas sistemáticas
de documentos relevantes são importantes em qualquer plano de coleta de dados.
(YIN, 2010, p. 130).

Dessa maneira, consideramos os documentos oficiais disponibilizados pela Secretaria


Municipal de Educação, Cultura, Desporto e Turismo de Ibarama/RS fundamentais, pois
comprovam oficialmente os pedidos de cessação e/ou fechamento das escolas rurais.
Entendemos, sem sobressaltos, que o processo de construção da Educação do Campo e não
somente do tensionamento campo/rural é relevante para o aprofundamento/embasamento
sobre o tema. Sendo assim, realizou-se uma pesquisa de campo.
Outra fonte de análise constituiu-se na observação direta que, segundo Yin (2010),
auxilia o estudo de caso, proporcionando maior contato com o local do “caso”. Dessa
maneira, Yin (2010, p. 136) afirma que “A evidência observacional é frequentemente útil para
proporcionar informação adicional sobre o tópico sendo estudado”. Essa observação direta do
local pode se dar de várias formas, onde os registros também podem ser variáveis e, neste
caso especifico, os registros se deram através de fotografias. Yin (2010, p. 137) defende que

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“[...] as observações podem ser tão valiosas que você pode até mesmo considerar fotografar o
local do estudo de caso”, pois as fotografias desde muitos anos, são utilizadas para registrar
fatos, momentos importantes e dessa maneira elas possibilitam que outras pessoas possam
conhecer um pouco da realidade do local do estudo de caso.
Após a etapa de registro fotográfico, considerando-se as múltiplas fontes de
evidências, Yin (2010, p. 143) fala que “A vantagem mais importante apresentada pelo uso de
fontes múltiplas de evidência, no entanto, é o desenvolvimento de linhas de convergentes de
investigação, um processo de triangulação e corroboração”, partiu-se para a triangulação de
informações, considerando os documentos oficiais, as observações diretas e os registros
fotográficos.
Da triangulação destas fontes emergiram dois aspectos de destaque: o primeiro refere-
se à cessação/fechamento das escolas rurais/campo e, em segundo, a escola no campo e em
processo de organização pedagógica para tornar-se do campo. Consideramos que a partir da
triangulação de informações, foi possível construir um ensaio sobre o lócus da pesquisa, uma
“cartografia social” do município sobre a cessação das escolas do/no campo. Por fim, uma das
metas deste trabalho enfatiza a necessidade de reconhecimento e valorização das escolas “no”
e em processo “do” campo, valorizando a cultura e a identidade de um povo que mora e
produz vida nestes contextos.
Sabemos que a Educação, hoje, é um direito de todos os cidadãos, mas nem sempre foi
assim, principalmente para os povos do campo, que mesmo depois de muitas lutas ainda é
discriminado, em partes. Pois o meio urbano na maioria das vezes é sobreposto ao meio rural
e o transporte escolar possibilita que as crianças possam se deslocar do campo para cidade,
porém, diante a valorização da Educação do Campo, prevista em documentos oficias,
percebemos um grande avanço para os povos do campo, a valorização desta cultura a qual por
muito tempo passou despercebida. A Lei de Diretrizes e Bases n° 9394/96 reconhece também
a realidade dos povos do campo, pois no seu artigo 28 está explícito que

Na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino


promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida
rural e de cada região, especialmente: I conteúdos curriculares e metodologias
apropriadas às reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural; II
organização escolar própria, incluindo adequação do calendário escolar às fases do
ciclo agrícola e às condições climáticas; III adequação à natureza do trabalho na
zona rural. Parágrafo único. O fechamento de escolas do campo, indígenas e
quilombolas será precedido de manifestação do órgão normativo do respectivo

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sistema de ensino, que considerará a justificativa apresentada pela Secretaria de


Educação, a análise do diagnóstico do impacto da ação e a manifestação da
comunidade escolar. (Incluído pela Lei nº 12.960, de 2014). (BRASIL,1996).

Através desta Lei, além da valorização das peculiaridades da vida no campo, dá-se o
direito à criança a construir conhecimento no seu lugar de origem, o campo. Este que é tão
rico de conhecimento. Nesse sentido, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação possibilitou a
construção e definição de Diretrizes Operacionais para a Educação do Campo. As quais
trazem consigo várias preocupações
Dentre elas o reconhecimento e a valorização da diversidade dos povos do campo, a
formação diferenciada dos professores, a possibilidade de diferentes formas de
organização da escola, à adequação dos conteúdos as peculiariedades locais, o uso
de práticas pedagógicas contextualizadas, a gestão democrática, a consideração dos
tempos pedagógicos difenciados, a promoção, através da escola, do
desenvolvimento sustentável e do acesso aos bens econômicos, sociais e culturais.
(BRASIL, 2007, p. 17)

Mas além desta Lei, das Diretrizes Operacionais para a Educação do Campoexistem
outros tantos documentos, programas que mostram a grande trajetória percorrida pela
Educação do Campo, essa educação merece ser no e do campo pois,
[...] “no campo”, porque, o povo tem direito de ser educado preferentemente onde
vive, isto é, sem ter de submeter-se forçosamente a longos e cansativos transportes
para escolas situadas em realidades, mormente, urbanas; “do campo”, porque o povo
tem direito a uma educação pensada desde o seu lugar e com a sua participação,
vinculada a sua cultura e as suas necessidades humanas e sociais. (MUNARIM,
2011, p. 12).

Porém o que mais contradiz todas essas lutas pelo direito à Educação do Campo é o
fechamento de muitas escolas no meio rural.
Como autora deste trabalho, isso é algo inquietante na minha vida, desde minha
infância, onde a mim foi negado o direito de estudar na escola da localidade em qual morava,
pois ela foi desativada. Escolas no Campo desativadas, passaram a fazer parte da realidade de
muitos municípios e começaram a ser despercebidasaos olhos dos seres humanos. A realidade
que passei a perceber é parecida com a qual Peixer; Varela (2011) destacam,
Em um de nossos percursos nas comunidades rurais da região serrana, encontramos
vestígios de uma construção, próximo à Igreja. Ao indagarmos o que existia ali, nos
disseram: Era uma escola. Hoje, nada mais do que resquícios de escolas fechadas,
transformadas em casas de moradia. (PEIXER; VARELA, 2011, p. 48).

Inquietante realidade, a qual só fica na lembrança de quem um dia fez parte de uma
dessas determinadas escolas, ou teve o sonho de poder estudar em uma delas. Essa realidade

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encontrada em muitos municípios da região Centro Serra do estado do RS, é também a


realidade encontrada no município de Ibarama.
Segundo os documentos disponibilizados pela Secretaria Municipal de Educação,
Cultura, Desporto e Turismo de Ibarama/RS, desde 1993 até 2017, foram cessadas 18
(dezoito) escolas e 4 (quatro) encontram-se paralisadas, como podemos perceber no gráfico
abaixo.A redução de escolas multisseriadas no campo, é percebível. Mas o que se busca saber
quais os motivos para essa cessação de muitas escolas. Pois grande maioria das escolas
cessadas, estão abandonadas e o que encontramos hoje são resquícios da vida escolar. Outras
foram restauradas, e continuam sendo utilizadas pela comunidade, como centro de eventos,
igrejas, local de encontro de grupos de mulheres trabalhadoras rurais, etc.

Gráfico 1- Situação das Escolas Localizadas no Campo no Município de Ibarama.


Fonte: SMECDT (2017).
Org.: Autora (2017).

Como podemos perceber o número de escolas extintas (cessadas) é muito elevado em


relação as escolas que hoje ainda estão em funcionamento, ou seja, as escolas ativas.
De acordo com o trecho do Parecer n° 953/2013 abaixo destacado, o motivo pelo qual
a grande maioria das escolas cessaram, está diretamente ligado aos seguintes fatos: a) censo
demográfico; b) A diminuição de matrículas na escola; c) A nuclearização de escolas na rede

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municipal de ensino. Alega-se também que havia poucos alunos nessas escolas e que a
distância entre outras escolas era pouca e frisa-se a disponibilização de transporte escolar. Os
fatos afirmados, são também relatados pelas comunidades.
Em relação aos motivos citados, podemos destacar que a diminuição de matrículas se
deu, por diversos motivos, entre eles a diminuição da quantidade de filhos, ou seja,
diminuição da taxa de fecundidade. Já o transporte escolar, é de fundamental importância para
a locomoção das crianças até a escola, porém a disponibilização do mesmo também causou
uma distorções nos critérios e princípios da oferta transporte escolar, pois segundo BRASIL
(2007), essa oferta de transporte escolar, fez com que muitas escolas no meio rural fossem
desativadas. Dessa maneira se construíram escolas núcleos ou as crianças foram transferidas
para escolas próximas ao meio urbano ou no meio urbano, o que entendemos que se priorizou
algumas escolas em detrimento de outras. Neste mesmo sentido, Dal´ Ongaro; Shirmer;
Meurer (2016, p. 58) afirmam que “[...]É necessário desconstruir preconceitos há muito tempo
existentes e entranhados na sociedade, a fim de promover uma minimização das
desigualdades educacionais entre o campo e a cidade”.
Outras escolas, também foram fechadas pelo fato afirmado no Decreto n° 848/2000, de
03 de abril de 2000 “[...] que desativa a escola por se localizar em área abrangida pela
barragem Dona Francisca”, mas respectivamente 3 escolas foram cessadas por este motivo.
Dessa maneira, a realidade que encontramos hoje é definida da seguinte maneira de
acordo com a Colaboradora C3
Patrimônios construídos com o dinheiro público, sendo destruídas pelos cupins, pela
ação do tempo e do vento. [...]Em outra a degradação total, sem telhado, o assoalho
estragado, o mato tomando conta[...] Em todas achamos criadouros de
marimbondos. Em outra fizemos até reformas pra que ali morasse uma família.
(COLABORADORA C3, 2017).

Como citado pela Colaboradora C3, a natureza está interferindo nesses espaços e o que
um dia era considerado centro da comunidade, hoje é mais reconhecido por um lugar de total
abandona, em alguns casos. Como podemos perceber na Foto 01.

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Figura 01- E. M. E. F. Arnoldo Hamann (parte interna).


Fonte: Acervo pessoal da autora (2017).

Ao analisar esses contextos, lugares, espaços, percebemos que existem resquícios da


vida escolar e ao mesmo tempo nos fazem refletir sobre a Educação do Campo, pois as
escolas que encontramos hoje no campo, pouco se diferem das escolas no meio urbano,
mesmo se localizando no campo, muitas vezes não pertencem a ele.
Porém as escolas “com vida” no campo, são também a esperança para a construção de
Escola do e no Campo. De acordo com a SMECDT, no ano de 2017, 5 escolas estavam em
situação de ativas no município. Estas, em processo de tornarem-se também Escolas do
Campo, buscam estratégias de valorização do campo, a partir de projetos. Aproximando assim
as famílias, as crianças e o contexto escolar. Proporcionando, o resgate de conhecimentos e a
constante busca por construção de outros.

EDUCAÇÃO DO CAMPO EM CONSTANTE CONSTRUÇÃO

Como dito, a muito a se construir. A muito a se fazer. Comprovamos que 22 escolas


não estão ativas, o que encontramos foram prédios abandonados, ruínas e prédios restaurados
pelas próprias comunidades. O motivo mais evidente, o pouco número de alunos(as), ou seja,

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o baixo número de matrículas e a nuclearização de algumas escolas. As escolas na maioria das


vezes eram consideradas centro da comunidade, desde seu fechamento a interação entre a
comunidade também diminuiu. O ponto de esperança existente agora, são as escolas ainda
ativas, pois não podemos mais permitir que essas estejam no campo e não pertençam a ele. O
que almejamos é o destaque para uma antiga demanda social da qual Dal´ Ongaro; Shirmer;
Meurer (2016, p. 57) ressaltam como “[...]dessas novas demandas da sociedade, surge a
educação do campo que reconhece os saberes do plantar, do colher e da relação dos sujeitos
que ali vivem com a natureza[...]”.
Sabemos que a Educação do Campo é um direito humano. Mas como podemos
perceber ao longo da escrita, a realidade encontrada é muitas vezes desanimadora. Ao olhar
para várias escolas multisseriadas, abandonadas no campo, percebe-se a contradição entre a
oferta da Educação do Campo e a cessação de escolas. Buscamos dessa maneira mostrar que o
campo é lugar de muitas aprendizagens, muitos valores e diferentes culturas e que a Educação
do Campo Dal´ Ongaro; Shirmer; Meurer (2016, p. 58) afirmam que “[...]busca uma
contextualização dos conteúdos da sala de aula com a realidade vivenciada pelos educandos,
na tentativa de que estes valorizem o lugar onde vivem e tenham a oportunidade de escolher
se realmente querem continuar no campo [...]”.
As crianças e os adolescentes do campo, muitas vezes não valorizam o lugar onde
vivem pois, desde a infância são inseridas em um meio que não as pertencem. Nos diálogos
existentes a vida dos citadinos é sempre melhor e no currículo construído a partir dessa vida
que devem se basear todas as escolas. Concepção essa mal formulada, pois se precisamos
criar possibilidades para as crianças construírem conhecimentos, por que essas possibilidades
não podem ser criadas no campo?
Acredito que as escolas ativas no meio rural de Ibarama possam sim fazer a diferença
e respeitar as especificidades de cada criança, compreendendo as diferentes infâncias e os
diferentes tempos e espaços. Respeitando a cultural individual e coletiva, respeitando também
o povo do campo, os seus saberes, sabores, vivências [...]. Precisamos continuar lutando pela
Educação do Campo.

Referências Bibliográficas

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INDÚSTRIA CULTURAL E AGRONEGÓCIO: aproximações possíveis

Roberto Kittel Pohlmann24


Marlon Bianchini25

Mas apesar de tudo isso


Latifúndio é um inço
Que precisa acabar.
Romper as cercas da ignorância
Que produz a intolerância
Terra é de quem plantar
(Pedro Munhoz)

Resumo

Neste trabalho, propomos descrever os conceitos de Indústria Cultural e Agronegócio, bem como suas
possíveis aproximações e implicações no contexto da educação do campo. Os conceitos fazem parte de
um escopo diametralmente oposto ao seguido pela Escola Família Agrícola de Vale do Sol (EFASOL),
na qual atuamos como monitores. Tais reflexões são necessárias para explicitar as diferenças e
incompatibilidades entre Indústria Cultural e Agronegócio, de um lado, e Agroecologia, de outro.
Nosso propósito é demarcar os espaços sociais que cabe a cada polo. No entanto, neste primeiro passo
de nossas reflexões focamos nos dois primeiros conceitos.

Palavras-chave: Escola Família Agrícola de Vale do Sol; Indústria Cultural;Agronegócio.

Considerações Inicias

Neste texto, nos dedicamos a pensar sobre os conceitos de Indústria Cultural e de


Agronegócio em relação ao espaço social de atuação da escola em que atuamos. Escola essa
cuja proposta de trabalho centra-se na Agroecologia. Para tanto organizamos o texto em
quatro partes interligadas e de igual importância: Considerações Iniciais; Agronegócio e
Latifúndio; A Indústria Cultural como aliada do Agronegócio e Considerações Finais.
Iniciamos destacando que somos colegas na Escola Família Agrícola de Vale do Sol
(EFASOL), assim, dividimos tempos e espaços semanalmente. Dentre os vários afazeres que

24
Monitor de Linguagens na Escola Família Agrícola de Vale do Sol (EFASOL). pohlmannroberto@gmail.com
25
Monitor de Ciências Humanas e Sociais na Escola Família Agrícola de Vale do Sol (EFASOL).
marlonbiachini4@gmail.com

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nos cabem na instituição, sobressaem a discussão e lapidação de conceitos relacionados a


nossa prática social e escolar. Os mais recentes, e que nos pareceram próximos, são os
conceitos de Indústria Cultural e Agronegócio. Num primeiro momento, tais noções parecem
não ter qualquer semelhança, pois são de áreas diferentes; todavia, se vistos de maneira
complexa sua interligação explicita-se, uma vez que os atores envolvidos são os mesmos. É
dizer, os conceitos destacados se operacionalizam de forma semelhante, pois são ações
movidas pelo capitalismo.
Esse percurso de pensamento escrito somente foi possível quando nos debruçamos,
enquanto escola, a pensar o conceito de Agroecologia como opção educativa. Foi a partir
desse estudo que encontramos, escondidos sobre o véu de boas intenções, as aproximações
dos conceitos de Indústria Cultural e Agronegócio.
Nesse sentido, esse texto é, antes de tudo, um pensamento escrito a respeito de
Indústria Cultural e Agronegócio, com intuito de reconhecer suas semelhanças. Justifica-se,
pois nossa opção enquanto pessoas e enquanto instituição é pela Agroecologia e, para tanto,
entendemos ser importante estudar conceitos diferentes e opostos a nossa opção para
propormos ações cotidianas.
Convém compreender o lugar de que falamos, qual seja, a Escola Família Agrícola de
Vale do Sol. Essa escola que tomamos como espaço de discussão foi fundada em 2014 e
recebe estudantes de 16 municípios do Vale do Rio Pardo e região Centro Serra do Rio
Grande do Sul. Inspirada nas Maison Familiale, as Escolas Família Agrícola (EFAs) têm
origem em 1935, em Sérignac-Péboudou, na França, a partir do encontro entre o Padre Abbé
Granereaue um agricultor. Segundo Granereau, o estado

através de seus professores(as) do primário, salvo maravilhosas exceções, não sabia


mesmo o que dizer aos agricultores a não ser o seguinte: seu filho é inteligente; não
pode ser deixado na roça (...) é preciso encaminhá-lo nos estudos (...) vencerá na
vida melhor que seu pai (...) conseguirá uma boa posição social (GRANEREAU in
NOSELA, 1969, p.25).

As EFAs rapidamente se espalharam pelas comunidades interioranas da França e se


expandiram para outros países. Nessa mesma direção, em 1969 foram criadas as primeiras
EFAs no Brasil, especificamente nas cidades de Anchieta e Alfredo Chaves, no Espírito
Santo, por intermédio do MEPES (Movimento de Educação Promocional do Espírito Santo).

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Já no Rio Grande do Sul, temos EFAs em Santa Cruz do Sul (desde 2009), Caxias do Sul
(2013), Vale do Sol, (2014) e Canguçu (2016).
Sendo assim, a EFASOL é fruto do desejo de agricultores, organizados em associações
locais, de pensar o modo de vida camponês. Objetivamos o resgate da história e dos modos de
vida do campo e a construção de uma educação baseada na união entre o conhecimento
científico e o saber popular a partir do campo. Trata-se de uma instituição de caráter
comunitário, alicerçada em quatro pilares: Pedagogia da Alternância, Desenvolvimento do
Meio, Associação Local e Formação Integral.
Sobre esse último pilar é preciso se demorar, pois tem íntima relação com o tema
dessa escrita.Isso não quer dizer que demais pilares não tenham importância, mas quando se
fala em Formação Integral é preciso compreender que não somente o conhecimento científico
ou o saber camponês tem valor. É no encontro entre estes modos de pensar que se faz
acontecer a educação do campo, segundo nossa concepção. Dentre os pontos propostos pela
Formação Integral da EFASOL está a compreensão de que a Indústria Cultural e o
Agronegócio têm suas “garras” entranhadas nos afazeres diários dos agricultores e
agricultoras familiares e que a pseudo opção pelo manejo convencional não é de caráter
libertário, como pode parecer para muitos.

Agronegócio e Latifúndio

Para compreender o Agronegócio é preciso aprofundar o pensamento junto dos


camponeses acerca da concepção de sujeito do campo, haja vista que existem sujeitos que
desconhecem as questões camponesas; vivem no campo em separado do território ou apenas
percebendo este como lugar de extração, como um negócio. Esse fenômeno provém, em parte,
do avanço do agronegócio que transforma as propriedades camponesas em pequenos
latifúndios. Nesse caso, a premissa primeira, de sujeitos do campo como protagonistas das
questões camponesas, se anula, pois na proposta do agronegócio o sentido da vida dá lugar ao
lucro.
Os estudos em torno do agronegócio ou mesmo do latifúndio se cruzam a medida que
a ideia de exploração se torna mais clara. Desde a colonização do nosso território brasileiro,
com a extração do pau brasil e depois com os grandes ciclos de produção principalmente com

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a cana de açúcar e o café, a ideia de explorar os recursos naturais passou a ser cada vez mais
difundida.
Com o final da segunda guerra mundial e a evolução tecno-científica, passamos a nos
aliar a uma nova era exploratória. A Teoria da modernização surge como um modelo de
desenvolvimento, substituindo o tradicional pelo moderno. A partir desse contexto inicia-se a
chamada Revolução Verde, que promove a aplicação de tecnologias variadas e
novas(semelhantes às usadas na segunda guerra mundial) no campo, na agricultura. Com isso,
temos uma nova era em relação à produção agrícola, aplicada ao capitalismo.
Segundo Silva (1996), a modernização da agricultura é a substituição da agricultura
natural por uma agricultura que utiliza insumos artificiais produzidos industrialmente. Assim,
a modernização de forma geral é baseada no espírito iluminista, em que a razão domina a
natureza, sendo capaz de alterar a ordem natural e irracional dos acontecimentos. Passamos,
então, a abordar este processo como a implementação e aplicação das ciências sobre os meios
naturais.
A partir de 1950, a substituição da concepção de agricultura tradicional por agricultura
moderna passou a extrapolar as relações entre o campo e a cidade, aliando as máquinas, a
terra e a indústria ao consumidor. Em grande escala, houve uma tecnificação do campo,
baseada nas novas tecnologias capazes de iniciar uma nova forma de agricultura.
Tais tecnologias são, principalmente, máquinas e agrotóxicos que passam a ser
reutilizadas na agricultura, possibilitando formas diferentes de manejo. Com isso as grandes
produções começaram a se tornar ainda mais frequentes, proporcionando aos grandes
agricultores a obtenção de uma maior produção com menos mão de obra e em menos tempo, o
que gera mais lucro. Porém, isso torna o conceito mais amplo contemporaneamente e
extrapola a ideia meramente produtiva, que passa a se aliar as ideologias modernas
fundamentadas nesta nova forma de agricultura, chamada de agronegócio.
Cada vez mais, teóricos das mais diversas áreas passam a buscar substituir o termo
agricultura moderna, pois se deparavam com uma preocupação com um termo que integrasse
a agricultura e a indústria pelas suas diversas perspectivas. Segundo Heredia, Palmeira e Leite
(2010) o termo agronegócio passa a ser empregado como uma generalização em que o meio
agrícola perde espaço para indústria tendo como referência não o espaço da instituição
industrial, mas o conjunto de gerenciamento desta relação. Assim, o foco deixa de ser

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exclusivamente produtivo, passando a ser mais sistêmico e envolvendo diferentes espaços de


desenvolvimento da sociedade.
Atualmente, usa-se a terminologia agronegócio, que deriva do termo usado por John
Davis e Ray Goldberg:Agribusiness. O termo norte americano tem origem em 1950 com o
intuito de integrar as faces econômicas e agropecuárias situadas no setor industrial. Tratava-
se, inicialmente, de uma aliança ou de uma nova fase motivada pela modernização, mas logo
começa afazer do meio rural um consumidor dependente do espaço urbano. Segundo Silva
(1996),com esse processo acontece uma destruição da economia vinculada à agricultura
natural e uma reconstrução desta com base no modo capitalista de produção.
A partir de processos políticos, sociais e econômicos em torno do agronegócio, os
quais têm por consequência seu crescimento principalmente no final do século XX, todos
estes processos revelam-se muito mais amplos que a relação produtiva entre agricultura e
indústria.

a agricultura é transformada num ramo da indústria e a natureza é subordinada aos


interesses das empresas capitalistas. Nesse modelo, tanto as sementes quanto a vida
vegetal e animal, assim como o trabalho dos seres humanos, transformam-se em
mercadorias e em negócios (PALUDO in STRECK, ESTEBAN, 2013, p. 72)

Vale ressaltar que o agronegócio, além da terminologia que geralmente é associada ao


campo, envolve também um conjunto de ações que vão além das propriedades rurais.
Segundo Mendes, o agronegócio consiste na:

soma total das operações de produção e distribuição de suprimentos agrícolas, das


operações de produção nas unidades agrícolas do armazenamento, do processamento
e da distribuição dos produtos agrícolas e itens produzidos com base neles
(MENDES, 2017, p. 48).

Se o conceito de agronegócio é de base moderna, ele consequentemente se ancora no


capitalismo como preceito base de desenvolvimento. Desta forma, o surgimento desta “nova”
agricultura volta a estar embasada pela teoria de modernização do século XX, pois este
desenvolvimento acontece a partir de uma criação de dependências. Estas dependências são
fatores limitantes de produção, comercialização ou industrialização, criando uma ideia de
sistema de gestão, regulado por um mercado. Segundo Silva (1996), existe um lado escondido
nesta história que coloca o discurso de aumento de produtividade como dependente da

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indústria com fins agrícolas. Nesta lógica de forma cíclica, o agronegócio coloca o campo
sempre atrás da indústria, de quem adquire técnicas e tecnologias imbuídas pela ciência, que
por vez é gestada pelo capital.
Em meio a tudo isso, a dependência dos agricultores familiares é de um mercado de
mercado externo. O agronegócio se apropria de grandes produtores, verdadeiros
latifundiários, com grandes áreas de terras e com um grande poderio financeiro, capaz de
adquirir as melhores e mais qualificadas máquinas e equipamentos da modernidade. Ainda,
conseguem manter-se unidos politicamente para além da agricultura, tornando o agronegócio
com extensões nacionais e internacionais.
Estas relações não consideram o espaço onde se está inserido, por isso seus reflexos
são a poluição, a extração criminosa dos recursos naturais e as sequentes causas prejudiciais à
saúde e à natureza causadas pelos usos de agrotóxicos. O grande regulador do agronegócio é o
capital, capaz de trabalhar como um mecanismo de integração interna e externa aos meios
sociais, culturais e políticos, tratando tudo como um verdadeiro negócio.
Tais propostas imbuídas no agronegócio anulam a ideia de viver junto ao território.
Nesse sentido, as políticas de Educação do Campo têm a Agroecologia como um caminho de
pensamento, pois propõe uma opção de agricultura que leva em conta o meio onde vivemos,
buscando o menor impacto pelas ações agrícolas.

A Indústria Cultural como aliada do Agronegócio

O agronegócio se utiliza de ferramentas para manter-se, assim como a Indústria


Cultural o faz. Em outros termos, as indústrias se aliam as próprias indústrias. Não raro vimos
notícias de que alguma transnacional do ramo agrícola tem ações em outros ramos. O
agronegócio precisa manter e convencer a população de que suas ações não têm impacto
nocivo as pessoas. Para tanto, enraíza suas ações de modo a fazer o território onde atua
dependente das mesmas. Esse convencimento pode ser feito de diversas formas, porém a
estratégia que tem se mostrado mais eficaz é a utilização da Indústria Cultural.
Como basilar para este conceito, tomaremos o texto de Max Horkheimer e Theodor W.
Adorno, intitulado A Indústria Cultural - O Iluminismo como Mistificação das Massas. Os
autores em questão, fazem parte da chamada Escola de Frankfurt. Segundo a Dra. Palmira

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Petratti Teixeira, no texto de apresentação do livro destacado, Adorno, ao estudar a mídia


norte americana, “sustentava que o lazer não era mais simples diversão ou entretenimento.
Havia um imenso maquinismo denominado de ‘indústria cultural’, visando obter um
comportamento dócil e uma multidão domesticada, através da exploração sistemática de bens
culturais” (TEIXEIRA in ADORNO, 2002). Apesar, de Adorno ser de outro tempo
cronológico, as discussões continuam muito atuais e expansivas a outras mídias, como se
poderá notar nos próximos parágrafos.
O texto em questão destaca de imediato a semelhança entre as empresas de
comunicação (rádio, cinema e jornal) e suas sedes físicas. Acrescentamos a essa lista as redes
sociais e os aplicativos para smartphones, que configuram novas mídias. Vale destacar as
semelhanças em termos físicos e de organização das empresas do ramo da Indústria Cultural e
do Agronegócio, que pouco se diferem nos países que abrangem, seja ele de primeiro ou
terceiro mundo, ou ainda em cidades consideradas “promissoras” e aquelas que não são.
Trata-se de ilhas dentro de um território, que nos faz, inclusive, ter orgulho de sua presença.
Não raro percebemos pessoas entusiasmadas que seu município tem agora a sede de uma
transnacional. Afinal, isso representa o progresso, o milagre econômico, segundo as
propagandas.
Nas reuniões para estratégias de venda da Indústria Cultural, um dos primeiros pontos
a ser levantados é o público-alvo. Horkheiner e Adorno escrevem que a constituição do
público
que teoricamente e de fato favorece o sistema da indústria cultural, faz parte do
sistema e não o desculpa (...) Junta-se a isso o acordo, ou, ao menos, a determinação
comum aos chefes executivos de não produzir ou admitir nada que não se assemelhe
às suas tábuas da lei, ao seu conceito de consumidor, e, sobretudo, nada que se afaste
de seu auto-retrato (HORKHEINER; ADORNO, 2002, p.10).

A Indústria estuda seu público-alvo, estuda aqueles a quem vai vender seus produtos e
os classifica. Não há preocupação em promover o novo, o diferente, mas sim aquilo que tem
maior possibilidade de venda. A venda é baseada em clichês, em repetições e na insistência do
mesmo, como no caso da música, por exemplo.

A breve sucessão de intervalos que se mostrou eficaz em um sucesso musical, o


vexame temporário do herói, por ele esportivamente aceito, os saudáveis tapas que a
bela recebe da mão pesada do astro, sua rudeza com a herdeira viciada são, como
todos os pormenores e clichês, salpicados aqui e ali, sendo cada vez subordinados à

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finalidade que o esquema lhes atribui (...) Desde o começo é possível perceber como
terminará um filme, quem será recompensado, punido ou esquecido; para não falar
da música leve em que o ouvido acostumado consegue, desde os primeiros
acordes, adivinhar a continuação, e sentir-se feliz quando ela ocorre
(HORKHEINER; ADORNO, 2002, p.10, grifo nosso).

O grifo na citação acima dá conta das propagandas vigentes, que de forma incessante e
contínua estampam o sucesso. O novo jargão “o agro é pop, a indústria riqueza do Brasil”
(que logo será substituído por outro jargão), repetido diversas vezes durante o dia em diversas
mídias, nos dá conta de uma narrativa já conhecida (mesmo que nunca tivéssemos visto
antes). Sabemos o que esperar da trilha sonora, que impacta desde o começo, bem como dos
dados expressivos ali contidos. O destaque é o produto e não as pessoas que estão direta ou
indiretamente envolvidas em sua produção.
Segundo Horkheiner e Adorno, ao se referirem aos artistas, escreveram que estes
nunca foram
os que encarnaram o estilo no modo mais puro e perfeito, mas sim aqueles que
acolheram na própria obra o estilo como rigor, a caminho da expressão caótica do
sofrimento, o estilo como verdade negativa. No estilo das obras a expressão adquiria
a força sem a qual a existência resta inaudível (HORKHEINER; ADORNO, 2002,
p.21).

A partir dessa afirmação se coloca um paradigma a ser pensado, qual seja, aquele
artista que não se junta à indústria, isso é, que busca a diversidade, a sua arte, acaba por ser
excluído das audições, marginalizado do público. Tudo isso porque o público alvo “já sabe” o
que quer ouvir ou ler, dentro de cada estilo, pois é guiado em seus gostos e escolhas pela
Indústria Cultural. Ou seja, o consumidor dessa indústria é levado a fazer certas escolhas e a
adotar certo estilo. Neste ponto, nos perguntamos se a situação não é semelhante à do
agricultor que adota o manejo convencional acreditando que o faz por livre escolha.
Outro fato de destaque é que o que mantém a indústria cultural é a publicidade. Até
temos pequenas “rebeliões” culturais, mas o acesso ao smartphone e a propaganda na palma
da mão, em frente aos olhos, perto dos ouvidos, fazem a indústria manter-se. É dizer, “é
evidente que se poderia viver sem a indústria cultural, pois já é enorme a saciedade e a apatia
que ela gera entre os consumidores. Por si mesma ela pode bem pouco contra esse perigo. A
publicidade é seu elixir da vida” (HORKHEIMER; ADORNO, 2002, p.66). A publicidade
nos encanta pelo que há de vir e tende a reduzir a capacidade reflexiva, mascarando o
processo complexo por trás de cada tomada de decisão do consumidor.

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Nesse universo publicitário, há sempre uma promessa a ser cumprida, assim como nas
salas de cinema, quando “quem chega atrasado fica sem saber se assiste ao ‘em breve neste
cinema’ ou o filme propriamente dito” (HORKHEIMER; ADORNO, 2002, p.68).A
propaganda é capaz de endeusar qualquer produto ou levá-lo a catástrofe imediata.Essas
reflexões nos levam a atentar para a dualidade da propaganda, tanto no âmbito do agronegócio
(que prega que o agro é pop), quanto no âmbito da indústria cultural (ditando padrões
estéticos de consumo), pois não há ética alguma em suas manifestações, posto que a verdade é
de quem paga mais.

Considerações Finais

Aqui, alguém ainda pode fazer fortuna, desde que não olhe muito reto diante de si,
mas consista em pactuar. Aquele que resiste só pode sobreviver integrando-se. Uma
vez registrado em sua diferença pela indústria cultural, já faz parte desta, assim
como a reforma agrária do capitalismo. A revolta que rende homenagem à realidade
se torna a marca de fábrica de quem tem uma nova idéia para levar à indústria. A
esfera pública da sociedade atual não deixa passar qualquer acusação perceptível em
cujo tom os auditivamente sensíveis já não advirtam a autoridade sob cujo signo o
revolte com eles se reconcilia (HORKHEIMER; ADORNO, 2002, p.23).

As semelhanças entre os conceitos de Agronegócio e Indústria Cultural e suas


manifestações cotidianas são muitas, sobretudo por sua origem: o Iluminismo. A classe
burguesa, detentora do Agronegócio e da Indústria Cultural, foi a mesma que promoveu o
Iluminismo, reforçou sua importância e mantém até hoje seus princípios. Nesse percurso, o
capital determina, pelas mãos de poucos, o rumo “certo da humanidade”.
Neste sentido, o capital, que é cada vez mais cultural, implica justamente uma das
aproximações deste “certo comum”. O Agronegócio e a Indústria Cultural se aproximam a
partir de um pano de fundo neoliberal e iluminista. O Agronegócio impõe uma sistemática de
vida para aquelesse inserem nesse sistema de produção, a ponto de não conseguirem sair e
não pensarem nesta possibilidade. Não pensam justamente porque o Agronegócio integra-se
àIndústria Cultural em uma transposição de cotidiano social. Este cotidiano social é embasado
por uma hegemonia simbólica. É uma criação de uma vida “estética” em que a sociedade
sempre será consumista.

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Desta forma, a mercantilização da agricultura é reflexo de uma dominação e


hegemonia imposta junto a Indústria Cultural. A televisão, por exemplo, passa a reproduzir
uma ideia de felicidade, em que o campo tradicional (que se utiliza do manejo orgânico) não é
capaz de proporcionar. Cada vez mais, a propaganda transmite um ideal, e a sociedade
massivamente, dia e noite busca encontrar este ideal. A grande questão de tudo isto é que este
ideal é exclusivamente consumista, e quem se opõe a este sistema acaba virando minoria.
Vejamos:

Os meios de comunicação de massa vêm contribuindo enormemente com esse


modelo ao difundir não só um modo de vida, mas também todo o modo de produção
que lhe está associado. Afinal, a ideia de que a felicidade humana se obtém, como na
imagem de jovens na praia ou numa loja de uma grande cadeia de alimentos
consumindo refrigerantes e hambúrgueres globalizados, é a mesma que nos faz
aceitar a paisagem monótona de quilômetros e mais quilômetros quadrados de
monoculturas, de paisagens homogêneas que implicam uso maciço de pesticidas,
fungicidas e praguicidas (PORTO-GONÇALVES, 2006, p. 108).

Não se trata de uma mera aproximação, se trata de uma ideologia política social e
econômica que interfere no imaginário e no cotidiano das pessoas, impondo uma cultura
moderna, mas totalmente conservadora. É hegemônica, porque quem se atreve a ir contra,
diariamente é pisoteado com a construção de uma ideia de atraso. O “jeca”, “o agro é pop”,
são exemplos desta relação em que se você não segue a “onda”, é cômico e atrasado. Se
segue, nunca está satisfeito. Assim, a utilização do progresso iluminista trata de um
desenvolvimento continuo e ensurdecedor de alguns poucos. A grande maioria é apenas a
mais valia de todo esse processo, estando inserido em uma rotina de dependências e
reproduções.
Rotineiramente, reproduzimos, almejamos e novamente reproduzimos alguns destes
pequenos atos retratados neste artigo. Reproduzir, não necessariamente significa ser
latifundiário, ou mesmo assistir televisão. Reproduzir significa de forma mais simplista ainda,
agirmos dentro dos padrões, dentro das normas ou das “caixinhas”. Mas como se sai desse
rumo “certo” proposto pelos iluministas, já que nascemos num mundo que já está entranhado
as redes do Agronegócio e da Indústria Cultural, se mesmo a academia ainda sustenta, em
suas práticas diárias a publicidade e a produção exacerbada como basilares de qualidade.
Dentre as várias respostas possíveis, e que deve perpetuar em nossocorpo, está
justamente o questionamento. Do verbo questionar, nos cabe a missão de pensar sobre tudo

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aquilo que nos é imposto. Depois, vem as soluções, a busca por aquilo que consideramos o ser
em sua essência, e a essência de seu meio. A agroecologia e a poética como uma unidade
comum, como uma área de inclusão daquele pouco que se tem, e não mais daquele tudo que
se pode ter.
Torna-se urgente a união em comunidade e um movimento contra hegemônico, se
fortalecendo e opondo-se a imposição do capital em todas as esferas, econômicas, sociais e
culturais. É por tudo isso que buscamos incentivar as formações humanas e culturais, com
produção de alimento saudável, com acesso à cultura e educação. A luta, sigamos!

Que soem as próximas notas...

Referências Bibliográficas

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HEREDIA, B.; PALMEIRA, M,; LEITE. S. Sociedade e economia do agronegócio no Brasil.


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METODOLOGIAS PARA O PLANEJAMENTO DE PRÁTICAS SUSTENTÁVEIS


EM ESCOLAS: articulação da Educação Ambiental com a Educação do Campo

Diego Carneiro dos Santos26


Ana Carolina de Oliveira Salgueiro de Moura27

Resumo

Com o objetivo de contribuir para o estudo de ações que colaboram com a gestão sustentável do
campo no âmbito da atuação docente e do contexto escolar este trabalho apresenta metodologias para o
planejamento de práticas sustentáveis em escolas. A partir de articulações acerca das metodologias de
ensino com a educação ambiental e propostas vinculadas à gestão do ambiente apresenta-se um
exercício de desenvolvimento da Metodologia das Árvores para o contexto escolhido: uma escola do
campo do município de Dom Pedrito. Na seção Mapas Conceituais e o ensino de ciências é
compartilhado o mapa conceitual elaborado, a partir da temática das árvores, o qual traduz as relações
e desdobramentos possíveis de serem feitos ao relacionarmos o tema com conteúdos das ciências da
natureza. Por fim são tecidas considerações acerca das metodologias para o planejamento de práticas
sustentáveis em escolas de maneira a articular a educação ambiental com a educação do campo.

Palavras-chave: Educação Ambiental; Educação do Campo; Metodologias de Ensino.

Introdução

Este trabalho foi desenvolvido a partir do Componente de Prática Pedagógica em


Educação do Campo VI: Gestão de práticas sustentáveis no/do campo no curso de Educação
do Campo – Licenciatura, da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), Campus Dom
Pedrito. Dentre os objetivos do componente ressalta-se o propósito de “investigar e analisar o
contexto do desenvolvimento social, econômico, ambiental e cultural do campo de modo a
contribuir para o estudo das práticas que colaboram para a gestão sustentável do campo”
(UNIPAMPA, 2016, p.149). A partir desse objetivo, e ao se considerar a formação e atuação
de professores, o componente buscou desenvolver ações de aprendizagem vinculadas a
processos de ensino, possibilitando a elaboração de um Plano de Práticas Sustentáveis para

26
Universidade Federal do Pampa – UNIPAMPA. diego.tecagricola.dc@gmail.com
27
Universidade Federal do Pampa – UNIPAMPA. anamoura@unipampa.edu.br.

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um determinado contexto por meio da Metodologia das Árvores e dos mapas conceituais
(MOURA e CICUTO, 2018).
Para elaboração do Plano de Práticas Sustentáveis houve a necessidade de releitura de
ações anteriores que realizadas em uma escola do campo do município de Dom Pedrito, com
as temáticas: Território Territorialidade, Trabalho como Princípio educativo e Contexto
socioeconômico, sociopolítico e socioeducacional. Essa releitura teve como propósito
contribuir com a realização do estudo do meio e desta forma identificar as potencialidades e
conflitos no ambiente da escola. Com a intenção de organização deste planejamento também
foram feitas várias leituras e análises em sala de aula, buscando entendimento da importância
e do porquê de uma ação no ambiente da escola visando a gestão de práticas sustentáveis, por
meio da educação ambiental.
Nesse trabalho apresentamos primeiramente as articulações acerca das metodologias
de ensino com a educação ambiental e propostas vinculadas à gestão ado ambiente. Na seção
Metodologia das Árvores apresentamos um exercício de desenvolvimento da metodologia
para o contexto escolhido: uma escola do campo do município de Dom Pedrito. Tal exercício
foi elaborado sem a participação da comunidade, pois seu propósito foi de aprendizagem do
desenvolvimento da metodologia, e não a aplicação da mesma. Na seção Mapas Conceituais e
o ensino de ciências, apresentamos um mapa conceitual elaborado, a partir da temática das
árvores, que traduz as relações e desdobramentos possíveis de serem feitos ao relacionarmos
com conteúdos das ciências da natureza. Por fim, apresentamos algumas considerações acerca
das metodologias para o planejamento de práticas sustentáveis em escolas: articulação da
educação ambiental com a educação do campo.

Metodologias e Práticas Sustentáveis na Escola

O Professor não tem só a função de ensinar os componentes curriculares exigidos, mas


também é um referencial para quem vivencia a escola. Então este é o ambiente para que o
professor comece a desenvolver a capacidade de seu aluno fazendo com que este entenda e
identifique problemas relacionados ao ambiente, pense e desenvolva sensibilidade frente às
relações deste sujeito com a natureza. As relações culturais, sociais e naturais devem fazer
parte de um olhar perceptivo do ambiente e suas atitudes. A educação ambiental pode

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contribuir com estas percepções e com a mudança de comportamento para manutenção e


equilíbrio do meio ambiente onde estamos inseridos.
Analisando as atitudes atuais pode-se ver e sentir a necessidade da escola, através do
ser humano, o professor, trabalhar e desenvolver atividades de qualidade, onde a prioridade
seja a qualidade e preservação da vida. Não é só função do professor ter um olhar analítico
observador, mas sim motivador ao desenvolver atividades sustentáveis, onde a educação
ambiental entra como uma forte ferramenta para esta mudança.
Através das atividades de ensino, coordenadas pelos professores, os alunos terão a
possibilidades de aprender como podem ser feitas algumas intervenções, a fim de sanar
pequenos problemas de proteção e conservação do ecossistema. Aproveitando esta
oportunidade e utilizando a natureza ao redor da escola como sala de aula e laboratório de
boas práticas, fazendo com que os estudantes façam parte deste através de suas ações os
levando a reflexão da teia que envolve a cultura, sociedade, atitude e ambiente. Então através
da educação ambiental que crianças e jovens aprenderão a conviver e intervir no seu território
como cidadãos críticos, conscientes e preocupados com a manutenção o meio ambiente e com
a saúde.
Para Quintas (2007, p.135) a gestão ambiental é um: “[...] Processo de mediação de
interesses e conflitos (potenciais e explícitos) entre atores sociais que agem sobre os meios
físico-natural e construído, objetivando garantir o direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado”. Para que ocorra o equilíbrio do ambiente e uma gestão ambiental sustentável a
educação ambiental deve primar pela participação dos envolvidos proporcionando o diálogo e
o exercício da cidadania e democracia. Onde a intenção deve ser a de valorizar o campo
através da gestão ambiental. Para que isto ocorra devemos visualizar os caminhos que a
educação ambiental nos mostra, onde esta se tornará um processo educativo e formador de
sujeitos que possam através do olhar, identificar os conflitos e potencialidades do ambiente,
desta forma fazendo ações socioambientais com clareza. Pensando assim a educação
ambiental tem uma grande função que é a de formação e esclarecimento as questões de
valorização e importância do ecossistema.

A educação ambiental não é, [...] uma “forma” de educação (uma “educação


para...”) entre inúmeras outras; não é simplesmente uma “ferramenta” para a
resolução de problemas ou de gestão do meio ambiente. Trata-se de uma
dimensão essencial da educação fundamental que diz respeito a uma esfera

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de interações que está na base do desenvolvimento pessoal e social: a da


relação com o meio em que vivemos, com essa “casa de vida” compartilhada
(SAUVÉ, 2005, p. 317).

E frente a esta vivência no ambiente onde estamos inseridos podemos vislumbrar que a
educação do campo se liga a educação ambiental no cotidiano do campo valorizando a cultura
e as atividades do território e dando oportunidades às comunidades para o desenvolvimento de
atividades, ações que tenham participação e colaboração destes na construção e gestão de
projetos e práticas sustentáveis. Então através de metodologias e recursos da educação
ambiental que a educação do campo pode vincular suas atividades dentro e fora da sala de
aula com as ciências da natureza e demais disciplinas.
A Metodologia das Árvores, uma das propostas apresentadas nesse trabalho,
possibilita uma real intervenção, que a partir de uma forma simples de vislumbrar o problema,
encontra suas razões, percebe como resolvê-lo, e o que pode se conquistar de resultados de
uma forma responsável. A Metodologia das Árvores se difere pela forma simples de
visualização de um problema, assim como ordenar suas causas e soluções de uma forma clara
e lúdica, é um método que mostra a lógica: se a árvore não nos dá frutos é porque algo está
errado, e se ela passa a dar frutos é porque nossas ações foram satisfatórias nos levando a
resolução do problema (Figuras 1 e 2). Crivellaro; Neto Martinez e Rache (2001), autores e
proponentes dessa metodologia, a construíram afim de contribuir com a inserção da educação
ambiental na escola, por meio da formação de professores.
A partir da Metodologia das Árvores é já visualizada a situação problema e as
potencialidades do ambiente onde será aplicado o Plano de Práticas Sustentáveis. A partir da
elaboração do Plano, de maneira integrada foi elaborado e esquematizado em forma de mapa
conceitual quais os conceitos das ciências da natureza poderiam ser trabalhados com o tema
escolhido. Os mapas conceituais nos ajudam a organizar os temas de forma ordenada ligando
um conceito ao outro de forma que tenha uma continuidade de assuntos, é a forma mais
acertada de visualizar os conceitos, onde as ciências naturais se encaixam muito bem.
Então a intenção de usar o mapa conceitual, é de organizar os conhecimentos da
educação ambiental ligados à educação na escola do campo, visto que este é um recurso
didático que representa de forma sistêmica as adversidades ambientais e suas ligações com as
ciências da natureza. Assim Novak e Cañas (2010) falam que as ligações cruzadas nos mapas

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nos ajudam a entender como os conceitos representados no mapa devem relacionar-se uns
com os outros.
O mapa conceitual é uma estrutura de fundamental importância no ato de ajudar o
Plano a ser organizado, partir do tema gerador podemos visualizar as inúmeras ligações de
conceitos das ciências da natureza com o Plano, através do mapa fica simples e fácil ver e
organizar nossas ações, aulas e atividades de intervenção que estarão ligadas a
sustentabilidade.
A educação ambiental aborda muitos temas e atividades que podem sim ser
trabalhados em sala de aula e fora desta de maneira interdisciplinar garantindo à formação de
sujeitos. Então partir do entendimento do professor sobre a relação entre educação ambiental,
cotidiano da escola e as ciências da natureza, ele ou ela passa a construir as atividades que
poderão fazer a intervenção na realidade vivida no território da comunidade onde a escola esta
inserida.

O desenvolvimento da Metodologia das Árvores

Após o estudo e análise das potencialidades e conflitos do meio, foi elencado um


conflito principal, problema que com uma intervenção pudéssemos organizar um
planejamento relacionado com a sustentabilidade e conservação do meio ambiente, onde a
comunidade escolar tivesse plena participação em suas possíveis soluções.
A metodologia das árvores proporciona uma melhor organização do trabalho, uma
forma simples de contextualizar, localizar e enumerar os problemas, as ações e os resultados
que queremos obter. Através desta metodologia pode-se chegar a uma organização facilitada
na montagem de um planejamento de forma a usar a ideia lúdica da imagem das árvores, pois
a relação feita com uso das imagens facilita o entendimento. Foi de extrema importância,
além de interessante, o uso desta metodologia para a construção do nosso projeto após a
escolha da situação conflito. Na escola estudada a situação conflito escolhida foi o problema
com os resíduos sólidos.
Para dar inicio a metodologia das árvores deve-se começar pela árvore-conflito onde a
comunidade escolhe a situação problema e a coloca no caule da árvore, este conflito pode ser

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escolhido por sua urgência ou por ser um problema mais preocupante para a comunidade. A
partir daí se pensa em suas causas alocando estas na raiz da árvore-conflito. Em seguida se
analisa as consequências deste conflito alocando-os nos galhos da árvore. Toda esta
construção e reflexão são realizadas pelo grupo de trabalho, estas atividades de pensar e
conversar sobre o conflito suas causas e consequências fará com que o grupo veja de forma
sistemática as relações com a cultura, ética, política, sociedade e natureza.
Ao finalizar a árvore-conflito o grupo deverá pensar na constituição da árvore-solução
a qual estará ligada ao que está no caule da árvore-conflito, assim o caule da árvore-solução
deve ser o conflito solucionado, baseado no que se espera e objetiva como resultados
positivos para a solução do conflito. Nos galhos da árvore-solução estarão as intenções, os
fins, onde se quer chegar com a realização das ações. As raízes desta devem ser preenchidas
ao final após uma boa e grande reflexão do grupo, pois é nela que estarão organizadas as
atividades a serem realizadas com as comunidades envolvidas através da intervenção do
grupo de trabalho. A seguir estão apresentadas as árvores conflito e solução.

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Figura 1: Árvore-conflito.
Fonte: os autores.

A árvore-conflito nos aponta as causas da situação problema assim como os problemas


ocasionados pelo mesmo ao ambiente e aos que ali convivem. A contextualização desses
junto à imagem serve como um recurso para apontar os principais fatores que estão visíveis,
indicando os principais problemas a serem solucionados. Então no caule da árvore aponta-se o
problema elencado pela análise do ambiente da escola, na área rural de Dom Pedrito, onde é
de grande relevância e urgência de resolução, o problema de resíduos sólidos na escola, os
quais são descartados em um buraco no pátio da escola, sem nenhum tratamento,
contaminando o ambiente, solo e lençol freático e deixando este insalubre para os estudantes.

Figura 2: Árvore-Solução.
Fonte: os autores.

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A árvore-solução tem a intenção de enumerar as intervenções de forma organizada


dando uma ótima direção das atividades e caminhos a seguir. As raízes trazem cada uma das
atividades que devem ser executadas. O caule nos dá o que seria o ideal dos resultados a
serem alcançados e os galhos e frutos, nos mostram os resultados efetivos da intervenção.

Plano de Práticas Sustentáveis

Com a elaboração das árvores é possível elaborar um Plano de Práticas Sustentáveis o


qual organizará ações na comunidade envolvida. O plano tem a intenção de modificar a
realidade da escola estudada em relação ao descarte e reciclagem dos resíduos sólidos.
Através de ações que podem ser desenvolvidas na escola em seu dia-dia, em conjunto com
toda comunidade escolar partindo da direção desta escola e professores, com plena
participação dos funcionários e principalmente dos alunos.
Este plano parte do princípio da construção interdisciplinar entre as disciplinas da
escola para o desenvolvimento pleno de atividades que possam mudar os hábitos e também a
visão de um território saudável e harmônico. É a partir dos trabalhos com as ciências da
natureza nas disciplinas de química, física e biologia com auxílio das demais disciplinas como
artes, português, matemática, geografia e história que intencionamos o fortalecimento das
atividades. As ciências podem trabalhar a parte que trata da influência e os danos dos resíduos
sólidos na natureza com auxílio das disciplinas de artes e português para a construção de
materiais didáticos feitos pelos próprios alunos, cartazes, informativos, leitura e elaboração de
textos vinculados ao tema e à sustentabilidade. A importância da história para o entendimento
das mudanças na interação dos seres vivos com o ambiente e a geografia para entendermos os
diferentes relevos e danos causados a estes pelos maus-tratos sofridos pela natureza. No
quadro 1 apresentamos o plano elaborado.

Quadro1 – Plano de Práticas Sustentáveis – elaborado para a escola do campo de Dom Pedrito
Justificativa
No contexto mundial temos a percepção de que a grande quantidade de resíduos sólidos
produzido pelos seres humanos está ligada ao desenvolvimento dos países, quanto mais desenvolvido
mais resíduo este produz. O Brasil é o terceiro maior produtor de resíduos dando uma media de 1 kg
de lixo dia por habitante. Este fato pode ser constatado em grande parte das cidades do País. Mas neste
momento nos deparamos com esta situação nas áreas rurais. Assim ao realizarmos uma observação e
análise do território e da instalação da escola objeto de nosso estudo, é bem clara a necessidade de uma

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intervenção através de um projeto que exalte a importância da sustentabilidade da escola. Onde foi
constatado a dificuldade no controle de pragas (insetos e animais) devido a grande quantidade de
resíduos sólidos e mato dificultando acesso nas áreas infestadas. Há acúmulo de mato, restos de
construções antigas, vidros quebrados, materiais metálicos escolares (cadeiras e classes) descartados
no pátio. Ainda ocorre o depósito de outros resíduos orgânicos e inorgânicos em um buraco, os quais
são queimados quando constatado o acúmulo. Esta situação acaba ocasionando a contaminação do
lençol freático, do ambiente e de animais, além da fumaça que pode causar intoxicação. Isto causa uma
perda de potencial de produção da terra, e acarreta a desmotivação do quadro de funcionários da escola
para envolvimento com uma causa coletiva: cuidado com o pátio da escola. Sendo assim uma clara
justificativa para que sejam realizadas ações que busquem a sustentabilidade com uma gestão coletiva
na comunidade escolar.

Objetivo Geral
Organizar para que os resíduos da escola sejam descartados de forma adequada através da
reciclagem, coleta periódica pela prefeitura, uso do resíduo orgânico na produção de alimentos na
escola, ambiente escola valorizado em harmonia com a natureza, solo e água livre de contaminação.
Trabalhos e aulas ao ar Livre sem preocupação com a integridade dos alunos desenvolvendo a
interdisciplinaridade com a interação com o ambiente.

Objetivos Específicos
- Contribuir com o término dos problemas de saúde referente aos resíduos produzidos;
- Desenvolver a reciclagem e o reaproveitamento dos resíduos orgânicos, assim tornar cultural
para algumas famílias ;
- Exterminar pragas sem depredação a partir do trabalho de limpeza do pátio da escola;
- Instalar algumas lixeiras na escola e comunidade com ajuda e patrocínio das empresas
agropecuárias do território;
- Desenvolver aulas dinâmicas e interdisciplinares usando o ambiente com exemplo;
- Produzir alimentos saudáveis de forma agroecológica na comunidade escolar;
- Aumentar o interesse dos alunos em relação à manutenção e preservação do bioma;
- Motivar a comunidade em desenvolver as atividades e práticas conservacionistas;
- Regularizar do recolhimento dos resíduos sólidos pela Prefeitura.

Metodologia
Reunir a comunidade escolar (professores, funcionários, pais e alunos) para discussão e
formação de ações para resolução dos problemas. Em seguida fazer um diálogo com a Prefeitura e
Secretarias para regularizar o recolhimento dos resíduos sólidos produzidos na escola e retirada dos
entulhos do pátio assim como a destinação de uma equipe para manutenção do pasto alto junto ao
descarte.
Com auxílio dos professores desenvolver aulas ao ar livre para trabalhar temáticas vinculadas
à produção e destinação de resíduos com as ciências naturais e valorizar o ambiente escolar e o bioma.
Realizar junto a comunidade escolar algumas práticas de reciclagem, trabalhando a seleção e
destinação correta dos diferentes materiais descartados. Em algum momento com intenção didática os
professores desenvolverão com os alunos a confecção de uma composteira, para uso do resíduo
orgânico na produção de alimentos na escola.
Durante o ano letivo os professores farão uma divisão de tarefas entre as turmas de alunos para
a construção de horta, jardim e pomar com viés didático usando estas atividades para desenvolver os
conteúdos de forma interdisciplinar, junto aos demais professore das áreas de ciências da natureza,
Matemática, Português e Artes. O desenvolvimento das atividades não deve ter data de término, pois a
ideia é que se tornem atividades cotidianas da escola. Desta forma fazer com que os alunos e a
comunidades ao entorno da escola também desenvolvam em suas casas estas atividades.

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As reuniões com a comunidades escolar serão de suma importância para a criação de um


núcleo que pensará nas atividades didáticas e práticas, desta maneira poderá distribuí-las de acordo
com a faixa etária dos alunos, por exemplo, os alunos das séries iniciais podem ter atividades de
reciclagem, plantio e conservação do jardim da escola e os alunos das séries finais poderão além de
trabalhar a reciclagem desenvolver atividades de plantio e conservação da horta e do pomar da escola.
Será através e durante o desenvolvimento das aulas de ciências que o professor exaltará a importância
da reciclagem, visando o entendimento de que são necessárias estas praticas para que se obtenha um
bom resultado, como a educação ambiental, formas de criação de renda e uma vida saudável.
A organização da horta e do pomar será a prática que proporcionara aos alunos o entendimento
de como produzindo alimentos saudáveis sem uso de agrotóxicos, usando o viés e técnicas
agroecológicas fomentam saúde para comunidade, educação ambiental, cultural, e formas de criar uma
renda alternativa para as famílias, escola e comunidade.

Mapa conceitual sobre Resíduos Sólidos

Apresentamos o mapa conceitual elaborado, a partir da temática das árvores, que


traduz as relações e desdobramentos possíveis de serem feitos ao relacionarmos com
conteúdos das ciências da natureza.

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Figura 3: Mapa Conceitual.


Fonte: os autores.

Este mapa conceitual traz uma organização lógica a partir do tema reciclagem em
conexão com as ciências da natureza onde a proposta traz a interdisciplinaridade como
estratégia didática, a intenção deste é de forma simples a visualização de todos os conceitos
ligados ao tema, qualidade de vida, economia dos recursos naturais, aproveitamento dos
materiais reciclados, a conservação do meio e seus recursos naturais, saúde e outros. Desta
forma abordar as ciências naturais junto às atividades propostas. Trazendo o mesmo principio,
de relacionar toda comunidade escolar nas atividades com a intenção de organização do
trabalho do professor e facilitando o desenvolvimento e o raciocínio para a construção das
suas atividades e planos de aula para cada ano da escola.

Considerações finais

A educação ambiental pode ser uma das estratégias de mudança de contextos


ambientais e sustentáveis junto às escolas, pois possibilita processos formativos vinculados à
valorização e importância do ecossistema, e para isso precisa da integração e participação da
comunidade que faz parte do território. A Educação do Campo entra como construtora de
princípios de práticas sustentáveis e desenvolve projetos com os educandos que se encontram
em formação tanto teórica como cultural, pois as atitudes e princípios estão plenamente
ligados à consciência e conhecimento adquirido ao longo da vida.
A visão de educação ambiental após o desenvolvimento deste trabalho, descontrói o
pressuposto onde a escola simplesmente repassa o conhecimento e as técnicas para que se
possa mudar o contexto do ambiente no território ou comunidade. Assim é através da
organização principiada por esta e através da construção do coletivo, da motivação que
fortalece a participação de todos envolvidos, que podemos contribuir possibilitando que a
comunidade possa pensar e entender o entorno e suas relações com o meio, valorizando a
cultura e cada um dos envolvidos. Para que isto ocorra é imprescindível que a Educação do
Campo interaja frente à organização dos processos de gestão, fazendo uso de metodologias e
recursos de ensino.

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O CORRETO DESCARTE DO LIXO ELETRÔNICO EM UMA ESCOLA DO


CAMPO DO MUNICÍPIO DE ITAQUI

Régis dos Santos Martines28


Liliane dos Santos29
Pamela Barbosa Coffi30
Judite Massi31

Resumo

Este artigo objetiva-se pela necessidade de mudança de hábitos, visto que há necessidade de trazer
informação sobre o assunto sustentabilidade no ambiente escolar, considerando que os indivíduos do
campo também são consumidores de equipamentos eletrônicos, dessa forma tornando consumidores
conscientes. É preciso abordar o tema “Educação Ambiental” lembrando que a Educação Ambiental
está ligada ao indivíduo como ser social, sendo assim, é importante à percepção individual como
elemento da prática ou disseminação dos malefício do lixo eletrônico a saúde sob os olhares de cada
ator do espaço social. Para tanto, a pesquisa desenvolvida utilizou como instrumento de coleta de
dados bibliografias relacionadas com a temática. Os sujeitos da pesquisa foram 14 educandos e para
estes foi aplicado questionário buscando entender basicamente qual o entendimento destes em relação
a lixo eletrônico, poluição ambiental, logística reversa e sustentabilidade. Os dados preliminares
apontam que os educandos tem pouco conhecimento sobre assuntos como lixo eletrônico, logística
reversa, poluição ambiental. Também se verificou a ausência do senso de responsabilidade ambiental,
pois os mesmos não têm sentimento de pertencimento ao local onde vivem. Sendo assim, buscou-se
debater sobre educação ambiental a fim de criar um pensamento critico e reflexivo sobre esta temática.

Palavras-chave: Escola do Campo; Lixo Eletrônico; Poluição Ambiental.

Introdução

A população mundial vem crescendo de forma exponencial, o impacto das atividades


humanas seja no consumo de água, produção de alimento, vestuário, está poluindo e
degradando o meio ambiente. Segundo Alves (2011), “O sistema capitalista não consegue ser
simultaneamente inclusivo, justo e ambientalmente sustentável”. (ALVES, 2011). Sendo
assim, esses impactos das atividades do homem sobre a natureza é tão intenso que a natureza
já não possui capacidade de regeneração.

28
Universidade Federal de Santa Maria. regissmartines@gmail.com
29
Universidade Federal de Santa Maria. brag7sant3@gmail.com
30 Universidade Federal de Santa Maria. coffipamela@gmail.com
31 Universidade Federal de Santa Maria. juditemassi@hotmail.com

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Além disso, com este aumento populacional cresce também a produção de resíduos
como, por exemplo, o lixo eletrônico que é todo resíduo físico produzido pelo descarte de
equipamentos eletrônicos.
Nesse contexto, segundo ABINEE (2007):

Com o crescente avanço tecnológico existe uma diversidade de equipamentos


eletrônicos, quando estes equipamentos não tem mais uso ou se tornam obsoletos se
tornam lixo acarretando um enorme problema ambiental, estes aparelhos são
compostos quase que totalmente por circuitos eletrônicos como televisores,
celulares, computadores, mas também estão incluídos equipamentos
eletrodomésticos que possuem alguma parte eletro eletrônica, por exemplo:
geladeira, máquinas de lavar, batedeiras, (ABINNE, 2007)

Diante disso, verificamos que, grande parte do lixo eletrônico é formada por
computadores e outros produtos do setor de informática. De acordo com Conama (2007)
“Alguns destes materiais são prejudiciais para o meio ambiente e para e ser humano, caso a
água venha ser utilizada na irrigação, criação de gado ou abastecimento público, o homem
pode ser afetado”. (CONAMA, 2007)
Borges (2007) constata que, a obsolescência desses materiais aumenta
progressivamente e muitas vezes eles tornam-se ultrapassados antes mesmo de ser vendido
nas lojas, o que representa um grande problema para empresas, sociedade e meio ambiente
(BORGES, 2007). Sendo assim, a contaminação no homem pode ocorrer pelo contato direto
com elementos químicos, que entram na fabricação dos equipamentos, causando vários
problemas de saúde.
Sendo assim, para minimizar esses impactos negativos existem leis que obrigam os
fabricantes, importadores e demais empresas que comercializam aparelhos eletrônicos a
recolherem os equipamentos para áreas adequadas onde não causem perigo para o meio
ambiente. De acordo dom Leite (2003):

Quanto à lei federal n 12.305 de dois de agosto de 2010, que trata da política de
resíduos sólidos (incluídos nestas categorias equipamentos eletrônicos) em seu
artigo 33 estabelece que seja de responsabilidade do fabricante, importadores e
comerciantes, a estruturação e implantação de sistemas de logística reversa, apesar
disso, a grande maioria dos estados brasileiros carece de leis específicas para esta
questão. (LEITE, 2003)

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Portanto, para auxiliar a reduzir o impacto ambiental causado pelo lixo eletrônico,
existe a logística reversa, onde fabricantes e consumidores em conjunto cooperam para que
haja o descarte correto desses equipamentos obsoletos em locais próprios, procurando não
misturar com outros tipos de lixo, como lixo orgânico ou lixo de reciclagem normal (metais,
plásticos e papéis). Para Gonçalves (2009), “Esse fluxo inverso deve ser bem administrado
pela logística reversa, que deve planejar junto aos canais de distribuição o retorno desses
produtos para o setor produtivo de forma rápida e segura, levando em consideração as normas
e questões ecológicas”. (GONÇALVES, 2009)
Nesse sentido existem leis que obrigam os fabricantes a fazerem uso da logística
reversa, Gerbase e Oliveira ressaltam que, o processo de reciclagem do lixo de informática
inicia com a coleta e/ou recebimento do material obsoleto. Após, os equipamentos passam por
uma triagem que irá definir se o computador e/ou monitor está funcionando, aqueles em
condições de uso são encaminhados para projetos de inclusão digital de comunidades e
escolas.
Este trabalho teve como objetivo geral desenvolver conceitos sustentáveis para o
descarte correto do lixo eletrônico por meio de reflexões teóricas e práticas, para educandos
do nono ano do ensino fundamental de uma escola rural localizada no município de Itaqui/RS.
Para tanto, foi necessário identificar as bases conceituais a respeito do lixo eletrônico e seu
descarte correto, informar quanto à coleta do lixo eletrônico. Conscientizando os educandos
sobre a necessidade de preservar o meio em que vivem e os tornando multiplicadores destes
conhecimentos na comunidade onde residem.

Educação Ambiental

Com a crescente evolução e desenvolvimento tecnológico, as pessoas foram se


esquecendo de preservar o meio ambiente, favorecendo ao desequilíbrio da natureza,
acarretando assim inúmeras consequências desastrosas.
Dessa forma, se faz necessária a educação ambiental, segundo Kondrat e Maciel
(2013):

A educação ambiental sustenta uma recente discussão sobre as questões ambientais e


transformações de conhecimentos, valores e atitudes que devem ser seguidos diante

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da nova realidade a ser construída, constituindo uma importante dimensão que


necessita ser incluída no processo educacional. (KONDRAT; MACIEL, 2013,
P.826)

Sendo assim, os educadores no ambiente escolar devem trabalhar para formar cidadãos
sustentáveis e conscientes do seu papel na sociedade, para que novas gerações futuras
continuem a ter acesso aos recursos naturais. Em consoante a isso, Kondrat e Maciel (2013)
dizem:
A educação ambiental é um processo de educação que segue uma nova filosofia de
vida, uma nova cultura comportamental que busca um compromisso do homem com
o presente e o futuro do meio ambiente. A sua aplicação torna o processo educativo
mais orientado para a formação da cidadania. A educação para o desenvolvimento
sustentável, como também pode ser chamada, deve considerar as realidades
regionais e respeitar as diversidades culturais das populações. (KONDRAT;
MACIEL, 2013, P.828)

Portanto, a educação ambiental no processo educativo, transforma valores,


conhecimentos e atitudes, por consequência desenvolvendo uma nova sociedade com
cidadãos preocupados não só com desenvolvimento econômico, mas também com meio
ambiente, sendo um processo continuo a todos os níveis educacionais. A educação ambiental
está em constante crescimento, devendo ser desenvolvida como práticas cotidianas pelos
educadores, devendo ser disseminada por todos, formando cidadãos conscientes que possam
ser capazes de realizar mudanças do atual estado da natureza.
É importante ressaltar que a escola é um espaço social que tem a função de propagar e
disseminar a consciência ecológica, educadores são formadores de opiniões, portanto o
educador tem uma missão muito importante para mudar a realidade ambiental, modificado,
conscientizando, valorizando a terra em que produz sustento para muitas famílias do campo e
uma alimentação saudável. De acordo com Dias, Leal e Carpi júnior (2016):

Trabalhar com educação ambiental significa pensar num futuro melhor para nosso
mundo e para as pessoas que aqui vivem, colocando em prática uma ação
transformadora das nossas consciências e de nossa qualidade de vida (DIAS, LEAL;
CARPI JUNIOR, 2016, p. 11).

Sustentabilidade

Nesse contexto, a educação ambiental é forma de instigar e conduzir a


preservação ambiental e assim promover a sustentabilidade, voltada principalmente para

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escolas primárias, para que nas novas gerações tenham uma nova mentalidade de preservação
ambiental, depois fica fácil propagar a sustentabilidade. Para Piaget (1968), “As crianças
estão em fase de grande aprendizado, sendo capazes de assimilarem o aprendizado que será
base para a construção futura de seu desenvolvimento (PIAGET; INHELDER 1968)”.
Ademais, a sustentabilidade tem como objetivo preservar o meio ambiente
garantindo o desenvolvimento sem agredir a natureza, essa é a forma de proporcionar
qualidade de vida para as gerações futuras, garantido a manutenção dos recursos naturais
(lagos, rios, oceanos, matas e florestas). Com o avanço populacional e por consequência o
desenvolvimento econômico e como resultado o avanço tecnológico o consumo de
equipamentos eletrônicos aumenta, quando não usam mais estes equipamentos eletrônicos
eles viram lixo tornado um enorme problema ambiental. Sob o ponto de vista de Kondrat e
Maciel (2013), “O mundo precisa de educadores ambientais que tragam esperança,
conhecimento e sabedoria a uma população de cidadãos que devem ser responsáveis pela
formação e manutenção de uma sociedade sustentável.” (KONDRAT; MACIEL, 2013, p.828)
Nessa perspectiva existem muitas empresas preocupadas com meio ambiente que, vem
utilizando-se da sustentabilidade, ou seja, produzem seus produtos sem agredir o meio
ambiente, dessa forma a sustentabilidade é a forma de garantir a sobrevivências dos recursos
naturais do planeta e o crescimento sustentado é o aumento da economia sem danificar os
naturais do planeta. Roos e Becker (2012) ressaltam que:

O princípio da sustentabilidade, portanto surge com a globalização, em que a


sustentabilidade ambiental é a capacidade do sistema manter o seu estado constante
no tempo, a tal ponto de incorporar a problemática da relação homem x natureza. A
Educação Ambiental é a base cientifica para a sustentabilidade, sendo que a
sustentabilidade é um processo que deverá atingir a sociedade como um todo, sem
excluir nenhum elemento físico, mental ou espiritual desse processo de
transformação, pois é necessária essa integração para que, finalmente, ocorra o
desenvolvimento a partir da sustentabilidade. (ROOS; BECKER, 2012, p. 864)

Logística Reversa

O aumento populacional nas zonas urbanas e rurais traz consigo uma grande geração
de resíduos, muitas vezes o gerenciamento desse lixo é realizado de forma incorreta. A falta
da reutilização, reciclagem ou reaproveitamento é comum, e acabam indo parar em aterros e
lixões ou, pior, escapam para a natureza. Daí a importância de políticas públicas e

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empresariais de logística reversa. Resíduos dispostos inadequadamente atraem os mosquitos e


podem causar doenças, além da possibilidade de causarem contaminação do solo e de corpos
d'água, poluição atmosférica quando são queimados sendo assim os resíduos e rejeitos devem
ser destinados e dispostos corretamente para que não atinjam negativamente o meio ambiente
e, por consequência, a humanidade.
Razão pela qual foi instituída a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), Lei n°
12.305/10, que dispõe princípios, objetivos e instrumentos relacionados com o manejo de
resíduos sólidos, bem como as diretrizes relativas à gestão integrada e ao gerenciamento desse
material, entre outros aspectos. De acordo com a PNRS, a responsabilidade sobre o produto
cabe a comerciantes, fabricantes, importadores, distribuidores, cidadãos e titulares de serviços
de limpeza e manejo dos resíduos sólidos.
No decreto Nº 7.404/2010, foi ratificada a relevância da logística reversa e criado o
Comitê Orientador para a Implantação de Sistemas de Logística Reversa (Cori), que é
presidido pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), que diz que os resíduos eletrônicos
devem possuir um sistema de logística reversa responsabilizando os fabricantes,
importadores, distribuidores e comerciantes.
Para auxiliar na logística reversa, os responsáveis podem implantar um mecanismo de compra
dos produtos e embalagens usados, assim a população é incentivada a retornar o material.
Também podem criar postos de entrega e trabalhar em parceria com cooperativas para o
recolhimento do resíduo. O consumidor deve assumir um papel mais responsável no que se
refere à reutilização, reciclagem e redução de resíduos que poluem o meio ambiente.
Verifica-se que, lixo eletrônico é o descarte de qualquer equipamento eletrônico e
eletrodoméstico como computador, celular, tablets, micro-ondas, fogões e etc. Desta forma, o
lixo eletrônico também é conhecido pela sigla RAEE (Resíduos de Aparelhos Eletro e
Eletrônicos), que engloba os componentes que constituem os eletrônicos, como baterias e
pilhas e mais alguns produtos magnetizados. Para Oliveira e Gerbase (2012):
Os Resíduos de Equipamentos Elétricos e Eletrônicos (celulares, computadores e
afins) são compostos basicamente por materiais poliméricos e metálicos. Apresentam em sua
constituição metais pesados e outros componentes, como os retardadores de chama bromados,
que ao serem descartados no solo, em aterros ou lixões, podem causar danos graves ao meio
ambiente e à saúde das pessoas. Quando o lixo é depositado em aterros não controlados há a

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possibilidade de ocorrer à lixiviação destes metais para o solo e para as águas subterrâneas e
superficiais. A incineração destes materiais também não é aconselhada, pois leva à emissão de
poluentes no ar. Por exemplo, a queima de PVC libera toxinas como dioxinas e furanos, que
podem afetar o homem alterando suas funções hormonais ou, ainda, contaminando o leite
materno. (OLIVEIRA; GERBASE, 2012)
Nesse contexto, o consumo capitalista e a globalização inevitavelmente acarretam na
geração de novos aparelhos, dessa forma os aparelhos eletrônicos se tornam rapidamente
obsoletos, sendo descartados e trocados por novos aparelhos. Este ciclo está gerando um
grande impacto ambiental pelo descarte incorreto. Com isso, os componentes tóxicos
presentes nos equipamentos eletrônicos, acabam trazendo riscos para saúde dos seres
humanos, a contaminação se torna mais perigosa por estar exposta em lixões a céu aberto.
Para tanto a reciclagem é uma saída viável, segundo Gerbase e Oliveira, (2012):

A reciclagem é uma opção importante que vem sendo implementada e incentivada


por governos, instituições e ONGs. É a alternativa ecologicamente correta para o
tratamento da sucata eletrônica. Reciclar o resíduo eletrônico contribui para a
preservação do meio ambiente, além de reduzir a extração de recursos naturais não
renováveis como, por exemplo, o cobre, que pode ser recuperado no processo. No
entanto, principalmente em países subdesenvolvidos, a possibilidade de ganhar
dinheiro com a comercialização do material desmantelado instiga o interesse de
comunidades pobres de realizar o trabalho de desmanche do lixo eletrônico sem
cuidado e/ou proteção. (GERBASE; OLIVEIRA, 2012)

È importante ressaltar que, os danos causados pelos elementos químicos encontrados


no lixo eletrônico são diversos, o chumbo causa danos ao sistema nervoso e sanguíneo, são
encontrados no computador, celular, televisão, o mercúrio causa danos cerebrais e ao fígado.
Geralmente esses elementos são encontrados em computadores, monitores e televisores de
tela plana. Já c cádmio causa envenenamento, danos aos ossos, rins e pulmões, é encontrado
nos computadores, monitores de tubo antigos e baterias de laptops. Outro elemento comum
nesses equipamentos é o arsênico, que causa doenças de pele, prejudicando o sistema nervoso
podendo causar câncer no pulmão, esse elemento e geralmente encontrado nos celulares. Os
retardantes de chamas (BRT) causam desordens hormonais, nervosas ou até mesmo
reprodutivas, é encontrado em diversos componentes eletrônicos, para prevenir incêndios.
Outro elemento encontrado nestes equipamentos e o PVC, quando queimado e inalado pode
causar problemas respiratórios, comumente encontrado em fios, para isolar corrente.
O “Projeto Lixo Eletrônico” realizado numa escola rural da cidade de Itaqui/RS, e foi

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bem aceito pela equipe diretiva, educadores e educandos.


Durante o desenvolvimento do projeto ocorreram palestras que, tiveram como objetivo
estimular a consciência ambiental, mostrando as consequências que a degradação do meio
ambiente traz para nossa saúde. Por meio de vídeos, exposições e dinâmicas de grupo, os
educandos foram se familiarizando e assimilando o quanto é importante à preservação do
meio ambiente. As famílias dos educandos foram trazendo o lixo eletrônico de duas
residências para fazer o descarte correto, a coleta ocorreu em parceria com a Prefeitura
Municipal de Itaqui (Secretaria do Meio Ambiente) que, ficou com a responsabilidade de
coletar e dar destino final a lixo recolhido na escola.

Metodologia

Para desenvolvimento da pesquisa primeiramente foi feita uma revisão de literatura


pautada em leituras de leis ambientais e pesquisa na Plataforma Capes, Google Acadêmico
onde centralizou- se em palavras chave como meio ambiente, logística reversa e lixo
eletrônico com ênfase em temas relevantes como sustentabilidade e descarte correto do lixo
eletrônico no meio ambiente afim de que o conhecimento compartilhado traga uma reflexão
para todos os indivíduos, podendo assim ser disseminado com outras comunidades.
Os sujeitos da pesquisa foram 14 educandos, sendo 10 do sexo masculino e 4 do sexo
feminino com idades entre 14 e 16 anos. O Projeto Conscientização do Descarte Correto do
Lixo Eletrônico foi dividido em três etapas:
a) Organização
b) Desenvolvimento do projeto
c) Avaliação
Na primeira etapa de organização e planejamento, constitui-se o processo de pesquisar
em bibliografias conteúdos pertinentes para arquitetar as informações que farão parte dessa
construção do conhecimento em relação ao descarte correto do lixo eletrônico, poluição
ambiental e sustentabilidade.
A metodologia adotada pelo projeto será centrada na compreensão da realidade em
que se vive na capacidade de compreender e enfrentar os desafios do mundo atual, quer seja
em relação a problemas de saúde, à preservação do meio ambiente (GASPAR, 2001).

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Na segunda etapa ocorreu a realização do projeto em uma escola da zona rural da


cidade de Itaqui no ano de 2018, pelo período de dois meses. No primeiro dia da realização do
projeto foi aplicado um questionário fechado para aferir o conhecimento existente sobre temas
relacionados a lixo eletrônico, poluição ambiental e sustentabilidade.

Anexo I – Questionário

Modelo: Teste de conhecimento sobre o lixo eletrônico (marque V para verdadeiro e F para
falso):
( ) Para você o lixo eletrônico são aparelhos que não funcionam mais ou estão sem uso e
viram sucata.
( ) Lixo eletrônico contamina solo e água.
( ) O ar é contaminado por esse tipo de resíduo.
( ) É de responsabilidade só do estado o lixo eletrônico.
( ) Doação do aparelho velho é uma forma de preservação do meio ambiente.
( ) O Brasil não sofre ameaça do lixo eletrônico.
( ) Materiais retirados do aparelho velho podem ser reutilizados na fabricação de outro
aparelho.
( ) Trocar de aparelho eletrônico com muita rapidez aumenta a quantidade de lixo eletrônico.

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Imagem 1: Locomoção até a escola com a parceria com Prefeitura Municipal de Itaqui-RS.

Fonte: Projeto Lixo Eletrônico Itaqui – RS.

Imagem 2: Apresentação do Projeto para educandos

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Fonte: Projeto Lixo Eletrônico Itaqui – RS.


Nesta etapa também ocorreu à apresentação de página na rede social Facebook
denominada “Projeto Lixo Eletrônico”, contendo informações e curiosidades a respeito das
temáticas a serem abordadas.

Imagem 3: Página do Projeto no Facebook

Fonte: Projeto Lixo Eletrônico Itaqui – RS.

Foi disponibilizado um coletor na escola para descarte de lixo eletrônico da escola e da


comunidade local, onde a Prefeitura Municipal se responsabilizou pelo descarte correto do
material recolhido.
Ocorreram palestras e exposições mediadas pelos integrantes do grupo do projeto
sobre temas relevantes na área de educação ambiental, poluição ambiental, descarte correto do
lixo eletrônico, logística reversa, importância da sustentabilidade e conceitos sobre
agroecologia.
Na terceira etapa para finalização do projeto ocorreram dinâmicas para que os
educandos pudessem discutir sobre esses temas, a turma foi dividida em dois grupos e foi
solicitado para eles que escrevessem uma pequena percepção sobre sustentabilidade e
agroecologia.
Grupo A – Reflexão sobre Agroecologia e Sustentabilidade:

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“Agroecologia → tudo o que é natural exemplo (horta).”


“Sustentabilidade → O que mantém.”
Grupo A – Reflexão sobre Agroecologia e Sustentabilidade:
“Agroecologia é tudo aquilo que é usado sem agrotóxicos, agroecologia é o futuro da nação.”
“Sustentabilidade é tudo aquilo que é sustentável ao meio ambiente”.
“Nosso meio ambiente precisa de mais sustentabilidade, agroecologia e tudo aquilo que faça
bem para todos nós.”

Imagem 4: Atividade educativa “jogo dos balões – perguntas e respostas”.

Fonte: Projeto Lixo Eletrônico Itaqui – RS.

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Imagem 5: Educandos e integrante do projeto.

Fonte: Projeto Lixo Eletrônico Itaqui – RS.

Imagem 6: Material coletado pelos integrantes do projeto e educandos.

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Fonte: Projeto Lixo Eletrônico Itaqui – RS

Conclusão

Com esta pesquisa ficou evidente a necessidade de trabalhar temáticas relacionadas


com o meio ambiente e consequentemente com o correto descarte do lixo eletrônico. O
estimulo nas temáticas sobre educação ambiental, favoreceram o debate e o pensamento
crítico.
Ocorreu uma conscientização para que os educandos atuem como multiplicadores de
conhecimento na comunidade onde vivem.
Portanto, o projeto trouxe resultados positivos, beneficiando a escola e a comunidade
local, acredita-se que a semente foi plantada, sabe-se que se tem um longo trajeto para
percorrer, mas é dessa forma que pouco a pouco se vai modificando o pensamento em prol de
uma sociedade mais consciente em relação à preservação do meio ambiente.

Referências Bibliográficas

ABINEE. Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica. Ano 2007. Recuperado

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ROOS, A.; BECKER, E. L. S. EDUCAÇÃO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE.


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Brasil

ALVES, J. E. D. População e desenvolvimento (in) sustentável, 2013. Disponível em:


<https://www.ecodebate.com.br/2013/01/25/populacao-e-desenvolvimento-insustentavel-
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BORGES, A. (2004). Lixo eletrônico vira montanha de problemas. Computer world - Edição
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CONAMA. Conselho Nacional do Meio Ambiente. (1999). Resolução nº 257. Recuperado


em: 15 mar. 2018.

GASPAR, A. Museus e Centros de Ciências Conceituação e Proposta de um Referencial


Teórico. Tese de Doutorado. FE-USP, São Paulo, 1993.

GONÇALVES, A. M. P M. Logística Reversa Redução de Custos e Estratégias Competitivas.


2011. Disponível em: <http://www.administradores.com.br/informe-se/artigos/logistica-
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KONDRAT, Hebert. Instituto de Botânica de São Paulo,São Paulo, SP, Brasil. Educação
ambiental para a escola básica: contribuições para o desenvolvimento da cidadania e da
sustentabilidade. Maria Delourdes Maciel Universidade Cruzeiro do Sul,

LEITE, P. R. (2003). Logística reversa – meio ambiente e competitividade. Ed. Pearson


Education do Brasil Ltda.

PIAGET, J.; INHELDER, B. A psicologia da criança. Tradução de Octavio M. Cajado.


São Paulo: Difel, 1968. P.146.

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O PAPEL DA ESCOLA DIANTE DA ESCOLHA DA POPULAÇÃO CAMPONESA:


PERMANECER OU SAIR DO CAMPO

Mari Seloi Ferreira Batista De Oliveira32


José Guilherme Franco Gonzaga33

RESUMO
O presente trabalho trata de uma pesquisa a partir das concepções de estudantes da Escola Municipal
de Ensino Fundamental Aracy Vieira do Amaral, bem como de jovens/adultos, moradores do território
do educandário, situada no Sexto Distrito – Touro Passo do município de Rosário do Sul-RS. O
trabalho tem por objetivo refletir sobre o papel da escola na permanência ou saída do jovem/adulto do
campo. Sendo contextualizados os dados coletados a partir das observações diárias, conversas
informais e questionários, aplicados com alguns jovens/adultos que possuem ou possuíram vínculo
com o território investigado, levando em consideração o papel da escola quanto a interferir ou não
nesse processo. Para isso utilizamos como método de coleta de dados observação diária do cotidiano
escolar e comunidade, assim como aplicação de questionário com jovens/adultos com faixa etária
entre 13 e 45 anos, moradores e não moradores da localidade.

Palavras-chave: Permanecer no Campo. Sair do Campo. Papel de escola.

JUVENTUDE DO CAMPO: TERRITÓRIO DA PESQUISA

O presente trabalho trata de uma pesquisa sobre o sentido da Escola Municipal de


o
Ensino Fundamental Aracy Vieira do Amaral situada em Touro Passo, 6 Distrito do
município de Rosário do Sul – RS, para a população do território onde a escola está inserida.
Foram entrevistados estudantes e egressos que contemplam a idade entre 13 e 45 anos.Os
sujeitos com os quais buscamos dialogar nesta pesquisa são em sua maioria filhos de famílias
pertencentes à agricultura familiar e de famílias empregadas de fazendas e lavouras existentes
na região.
O Município de Rosário do Sul, segundo documento do Núcleo de Estudos Agrários
da UFRGS (MEDEIROS, 2012), em 2012 tinha um índice GINI de concentração fundiária
correspondente à 0,751. Considerando que o índice tem uma escala aonde o valor 0 (zero)

32
Mari Seloi Ferreira Batista de Oliveira: Acadêmica do 7º semestre da graduação Educação do Campo.
Universidade Federal do Pampa, Campus Dom Pedrito-RS. E-mail: msfoliveira81@gmail.com
33
José Guilherme Franco Gonzaga: Professor Adjunto – Universidade Federal do Pampa. E-mail:
joguigon@gmail.com

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corresponde à igualdade de distribuição de terras e o valor 1 (um) corresponde ao mais alto


grau de concentração, podemos concluir que o Rosário do Sul apresenta um grau de
concentração elevado. Essa informação, conforme veremos adiante, tem impacto no tema
estudado neste trabalho.
O território é constituído de pequenos e médios estabelecimentos de pecuaristas
familiares, distribuídos entre grandes propriedades. Talvez pela concentração fundiária
apresentada no parágrafo anterior, nessa localidade não visualiza-se união entre as famílias
para um trabalho coletivo, cada família trabalha individualmente, não funcionando nenhum
tipo de associação ou movimento social, tampouco alguma reunião de lazer, como jogo de
futebol, rodeio ou bailes. Observa-se que nesse espaço o vínculo com o território é mais com
lugar, onde pertencer àquele território é o discurso empregado nas falas dos moradores, não
ouve-se em nenhum momento posicionamentos que remeta à pertença a uma comunidade,
grupo ou associação. Quando perguntado de onde são, a referência é o lugar e não a
comunidade. Um bom exemplo disso é que ao ser perguntado responde-se “Sou do Touro
Passos”, ou “Sou do Caverá”, mas a mesma pergunta feita para alguém de um território
quilombola que fica na mesma região, a resposta seria “Sou da comunidade do Rincão da
Chirca”.
Neste trabalho, procurou-se perceber o sentido da escola e a possibilidade desta
contribuir com a permanência da população no campo e a implicação do trabalho escolar na
decisão sobre a permanência ou saída, visto a escola atender jovens moradores da região, que
tem o educandário como espaço para apropriação do conhecimento.
O objetivo principal é tentar compreender o que pensa a população que frequenta esta
escola, buscando com isso melhorar sua participação no processo de ensino aprendizagem e
atuação no seu ambiente de origem, visto que supõe-se viver em uma comunidade, mas como
já foi dito não há vínculos comunitários nesta localidade.

JUVENTUDE DO CAMPO: MÉTODOS E ABORDAGENS

Para elaborar o presente trabalho tomou-se por base a relação que a autora possui com
a escola e o território investigado, visto a mesma residir na localidade, onde, com observações
diárias da comunidade escolar e arredores foi possível coletar informações informalmente do

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ambiente, bem como do comportamento dos jovens estudantes do educandário e moradores


do território. Diante disso, TRIVIÑOS (1990), aponta que a pesquisa deve estar de acordo
com a realidade do pesquisador ou com a prática que realiza profissionalmente. Estar inserido
no ambiente de pesquisa, segundo o autor, é propício para compreender o contexto, isso
VERGARA (2004) também aborda, quando diz que é nesse processo que o pesquisador
interage com o meio investigado.
Com base na vivência da autora e a partir de conversas informais, como as citadas por
MIGNOLO (2003: 11-12), questionários e entrevistas outros sujeitos envolvidos na pesquisa
expuseram suas certezas, dúvidas e inquietações, no que se refere a permanecer ou sair do
campo e o sentido da escola para esta decisão. Também, no decorrer desse tempo, realizou-se
visitas a moradores do território da escola, sendo realizado diálogos com famílias que
possuem jovens que concluíram a educação básica e permaneceram no campo, assim como às
famílias, onde jovens migraram para a zona urbana em busca de estudo e trabalho, e também
com aqueles que pararam com os estudos para trabalhar em suas propriedades rurais, pois é
importante ouvir o jovem que fizeram e fazem parte da escola e comunidade do campo.
Autores, como ALVES, CASTRO, MARTINS E LIBÂNEO, assim como artigos que
abordam os temas presentes neste trabalho deram sustentação e foram tomados como
referência para sistematizar a questão de permanência ou saída de jovens do meio rural,
levando em consideração as dificuldades enfrentadas por alunos para a permanência na escola
e no campo, identificando o sentido da escola na permanência do jovem no campo.
Também foi aplicado um questionário com moradores da localidade, que possuem ou
possuíram vínculo com a escola do campo e continuaram morando no ambiente rural, bem
como, com aqueles que saíram do campo e migraram para cidade com a finalidade de estudar
e trabalhar. O questionário foi aplicado com jovens/adultos entre 13 e 45 anos e foi uma forma
de interação social com os sujeitos envolvidos, pois, com essa prática foi possível obter
informações acerca do posicionamento do entrevistado sobre o que é ou foi a escola no
processo de formação de cada um. Foram aplicados 18 questionários, sendo nove com pessoas
do sexo masculino e nove do sexo feminino, em comum a todos os entrevistados está o fato
de estudar ou terem estudado na escola referência desta pesquisa. Do total de entrevistados,
sete residem na cidade, sendo estes cinco mulheres e dois homens, os outros onze

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entrevistados têm residência permanente no campo, sendo sete homens e quatro mulheres, o
que faz pensar na porcentagem maior de homens a permanecer no campo.
Por meio deste questionário buscou-se informações para analisar questões como: o
sentido da escola para a vida do jovem e para a realidade afetiva e profissional; a contribuição
da escola para a permanência no território; temas considerados importantes de ser abordados
na escola do campo; se a escola frequentada pelos entrevistados aborda assuntos relacionados
com a vida no campo; o que é feito nos momentos de lazer e o que gostariam que tivesse no
território que proporcionasse entretenimento; em que a escola frequentada contribui
(contribuiu) profissionalmente na vida de cada um; se percebem relação dos conteúdos vistos
na escola com o cotidiano do campo; quais as perspectivas em relação ao futuro; preferência
em relação a escola/trabalho/campo/cidade; pontos positivos ao ter acesso a uma escola no
território; pontos positivos e negativos em ser jovem morador do campo; pretensões em
relação ao futuro; apoio da família. Essas foram algumas questões que deram suporte às
entrevistas e aos diálogos realizados com os envolvidos nessa pesquisa.
Buscou-se, por fim, com a sistematização desses dados entender o processo de
permanência ou saída dos jovens do campo, e isso foi possível para a autora, diante das
conversas e vivências na escola como estudante, em um primeiro momento, como vizinha,
amiga de algumas famílias de estudantes e por fim como estagiária neste educandário, pois,
ao estar em contato com o território pode-se, com a colaboração do professor orientador da
pesquisa, lançar um olhar imparcial para as questões que se apresentaram diante dos dados
coletados acerca do tema do trabalho.

JUVENTUDE DO CAMPO: NECESSIDADE DE ESCOLHAS

Tanto quanto a educação, habitar um determinado território é um direito do ser


humano, porém as condições para que os jovens permaneçam ou mantenham os laços com o
campo, muitas vezes é árduo, visto as dificuldades enfrentadas pelos mesmos em permanecer
em territórios, no qual não se garante acesso aos direitos básicos, como educação, saúde, lazer
e outros. Além da precariedade das vias de acesso, desvalorização social, desvalorização
econômica do trabalho realizado no campo, descaso do poder público para com as escolas que
comprometem a permanência do jovem na zona rural e consequentemente a sucessão familiar,

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agravando o êxodo rural e o esvaziamento do campo (PERIPOLLI, 2011; TOLEDO E TONI


2016).
Essa pesquisa buscou compreender o sentido da escola para os moradores da região do
Sexto Distrito, Touro Passo. A escola, que deu base para os levantamentos de campo, está
situada a 50 Km da sede do município, oferecendo aulas quatro vezes na semana em turno
integral. A maioria dos professores são oriundos da zona urbana, onde, é frequente, por
motivos de transporte, má conservação das estradas e condições climáticas não haver aula no
educandário por dias consecutivos, levando professores e alunos demonstrarem desanimo e
comprometimento no processo de ensino e aprendizagem. Com essa realidade, ao jovem
muitas vezes é negado o direito de estar na escola. A partir disso, pensa-se no sentido do
educandário no que se refere à valorização da própria escola, do território, do professor, do
aluno e consequentemente na permanência do jovem no campo, visto a realidade vivida, onde
é pertinente uma escola que ouça a comunidade a qual faz parte, dialogando que a educação
do campo, nesses territórios, é um direito e que os sujeitos tenham consciência disso.
Um direito ainda a ser conquistado, pois, conforme análise dos próprios alunos do
educandário, ao abordarem os problemas enfrentados pela escola para começar suas
atividades no ano letivo de 2017, destacam às mas condições das estradas e falta de
transporte, confirmando aí a negação ao direito de estar na escola por esses alunos. Percebe-se
que os mesmos, sem se dar conta, possuem análise crítica e política quanto aos impasses que
permeiam o andamento das aulas, pois os alunos estão inseridos a essa realidade.

“O atraso das aulas aconteceu devido as estradas estarem ruins e a prefeitura não
ter transporte para transportar os alunos para a escola”. (Conforme redação de
aluno do oitavo ano, 14 anos).
“Perder aula nunca é bom, ainda mais se forem muitos dias, ou um mês como foi
aqui. As férias aumentaram mas em compensação ficamos com muitas matérias
atrasadas, esse esforço dificulta o aprendizado dos alunos. Deviam investir mais em
transportes escolares e também nas estradas. Esse atraso só tem pontos negativos
para o ensino”. (Conforme redação de aluna do nono ano, 15 anos)

Diante do atraso do ano letivo e a necessidade prevista pelo poder público em conter
gastos, optou-se este ano, por haver aula quatro vezes na semana em turno integral, ou seja,
manhã e tarde, de segunda a quinta. No entanto, muitos alunos residem longe da escola e
necessitam madrugar para pegar o transporte escolar, retornando somente à tarde, diante disso,
conforme abordagem dos professores, os mesmos demonstram cansaço durante as aulas, pois

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alguns alunos retornam da escola para suas residências chegando em casa à tardinha e no dia
seguinte tem que madrugar novamente.
“Quando tem aula todo dia na minha escola é muito ruim, por que a gente cansa
muito, por exemplo, eu me levanto, para ir para escola e fico muito cansada por que
cansa muito ficar todo dia na escola, principalmente quando temos que levantar
cedo”. (Conforme redação de aluna do 8º ano, 13 anos)

O descrito nos leva pensar se ao jovem está dando-se a real atenção, se está pensando-
se nas reais necessidades desses sujeitos por parte da escola e poder público. Sendo assim, de
que maneira querer que o jovem veja pontos positivos no ambiente em que estão inseridos e
que sintam prazer em estar na escola. Ainda assim em situações aonde a escola sai de sua
rotina é possível perceber a alegria dos jovens em ali estar, durante festas, oficinas, gincanas,
fato que comprova-se em uma das redações em que uma jovem estudante da escola sugere
“Mas eles poderiam mudar. Ter mais passeios, talvez nós podíamos ter aulas ao ar livre. Eu
adoraria estudar artes, desenhar o que estar ao meu redor, descobrir coisas novas” (aluna de
6º ano, 11 anos). A redação desta estudante nos leva pensar como é importante uma escola
com ambiente democrático, onde as diferentes vozes sejam efetivamente ouvidas.

Por outro lado, alguns jovens, que residem neste território e frequentam esta escola,
apresentam dificuldades de aprendizagem, no entanto, no que se refere ao trabalho realizado
por suas famílias, os mesmos demonstram sabedoria ao falar sobre, percebe-se a participação
de alguns adolescentes no trabalho realizado nas propriedades. Tarefas como, ajudar na lida
de campo (manejo de gado e ovelha), na ordenha das vacas, na limpeza dos locais de trabalho,
no racionamento diário de animais, nos processos de plantação e colheita e de tosquia de
ovinos são atividades pertinentes a estes jovens. Visto que está se falando de agricultura e
pecuária familiar em pequenas e médias propriedades. Com isso, ao interagir com esses
adolescentes percebe-se que a maioria sente prazer com o que faz, sentem-se realizados ao
retornar da escola para casa, montar um cavalo, e ir para o campo ajudar na “lida”. Nesse
sentido, pergunta-se: o trabalho os realiza mais que a escola?

Com essa realidade é instigante entender o que leva o jovem permanecer no campo e
como a escola interfere nesse processo, quando percebe o interesse ou desinteresse do jovem
pelo que é oferecido na instituição de ensino. Entender como a escola dialoga com a realidade

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da juventude presente nesse educandário é necessário, para compreender o processo de


permanência ou não dos jovens no campo.

JUVENTUDE DO CAMPO: DIREITO À ESCOLA NO E DO CAMPO

O campo constitui um universo social que faz parte da sociedade em geral, porém
possui características que o diferencia, como a relação com a terra, o trabalho e modos de
viver. Ao problematizarmos a juventude que pertencente a este lugar, muitas vezes aparecem
dilemas, no que se refere a tomadas de decisões, em relação a possível saída ou permanência
do meio rural, onde as perspectivas, sobre as melhores condições intelectuais e profissionais
influenciam nessa decisão.

O fato de pertencer ao campo, de trabalhar em seus lugares de origem, de estar com


sua família, rebate com a busca por qualificação e oportunidades fora do meio rural, pois
ainda são remotas as oportunidades para qualificação profissional sem precisar sair do campo,
com isso, a escolaridade tem influência na mobilidade das populações do campo, como afirma
ALVES:

A persistência de baixos investimentos na escola primária (ensino regular) e os


baixos níveis de escolaridades da população rural acabam conduzindo os menos
letrados a transpor barreiras da mobilidade levando as famílias a migrar. A maior
escolaridade intensifica e antecipa o êxodo (ALVES, p.30, 2006).

No entanto, a LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação, afirma que pode-se ser
educado em família, no trabalho, na escola, no meio em que está inserido, com isso,
reconhece que espaços extraescolares são lugares de aprendizagem, porém conceitos teóricos,
baseados em estudos científicos exigem a busca pelos bancos tradicionais de ensino, levando
muitos jovens migrar para centros urbanos.

Para que não fosse necessária essa migração, outras metodologias deveriam ser
ajustadas ao ensino ofertado no campo, como a que sugere a LDB, Artigo 28, uma outra
forma de ensino no campo, onde a realidade do campo seja considerada. Como pode-se ver a
seguir:

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Art. 28 – Na oferta da Educação Básica para a população rural, os sistemas de


ensino promoverão as adaptações necessárias a sua adequação, às peculiaridades da
vida rural e de cada região, especialmente:
I – conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais
necessidades e interesses dos alunos da zona rural;
II – organização escolar própria, incluindo adequação do calendário escolar às fases
do ciclo agrícola e as condições climáticas;
III – adequação a natureza do trabalho na zona rural.

Acerca disso, deve-se considerar os conhecimentos existentes e adquiridos no meio


familiar, no trabalho e na convivência em sociedade no território de origem dos jovens é
pertinente, tendo a sala de aula como um lugar de socialização e sistematização dessas
experiências. Para isso as políticas públicas preveem a pedagogia de alternância como uma
forma de garantir o ensino às populações do campo, não sendo necessária a migração dessa
população para os centros urbanos. Pensar formas de garantir a vida no campo, com qualidade
e acesso ao que é de direito dos sujeitos que habitam esses territórios é necessário,
possibilitando ao jovem permanecer no campo com condições de evoluir economicamente,
culturalmente e intelectualmente. Evitando o êxodo forçado quando por vezes é visto jovens
migrando para cidade, por não ver seu ambiente de origem como um lugar que lhe permita
viver com dignidade.

Contudo, CASTRO (2012), aborda que os jovens que vivem no campo são rodeados
de diversidade sociais, culturais e econômicas. Entretanto, essas condições por si só não
definem a permanência dos mesmos nesses territórios que ao almejarem formação acadêmica,
melhores condições de trabalho, acesso à cultura, maiores rendas os jovens acabam por
considerar a migração do campo para a área urbana como uma das possibilidades de melhorar
as condições de vida.

Entre estas preocupações, surge com maior destaque a busca pela continuidade dos
estudos e a formação acadêmica. Para isso, pensar no currículo escolar vigente nas escolas do
campo é necessário, pois esse ambiente tem e sempre teve sua identidade, sua história, sua
cultura, o que torna o campo tão importante quanto a cidade. Os currículos de maneira geral
não são pensados para os sujeitos do campo, o que leva a escola ofertar ao aluno um ensino
voltado para realidades urbanas, sendo assim, a escola toma por base os currículos e o executa
ficando a critério do educador a educação contextualizada.

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Também é possível perceber, como nos diz ARROYO (2017), MARTINS (1995), que
a visão hegemônica enxerga o campo como lugar de atraso, representada na imagem de
personagens como Jeca Tatu, Mazzaropi, entre outros, como lugar sem cultura, de saberes
menos valorizados, onde poucas letras dão conta de atender esses sujeitos, onde apenas
noções básicas é necessário aos sujeitos desses espaços.

“A história do pensamento pedagógico desde a colonização e desde o trato dos


trabalhadores como escravos, não como humanos, foi marcada e continua marcada
por não pensar os trabalhadores, sobretudo do campo, como educáveis, mas apenas
como alfabetizáveis, como letráveis” ARROYO, 2017.

Com isso, influenciados por estas ideologias alheias, alguns jovens veem o campo
como lugar de atraso e a cidade como lugar de progresso, a partir do momento de que ao
jovem do campo é atribuído certo desmerecimento à sua cultura, levando-o a buscar por uma
nova identidade. No entanto, MARTINS (1995) aborda que as características tradicionais, de
um determinado lugar são essenciais, pois tais características viabiliza o lugar a adquirir
meios de produção, pois o campo possui extraordinárias variedades de características próprias
que o permite desenvolver-se.

ARROYO (2017) aponta que embora ainda exista comodismo e aceitação por parte
dos povos do campo ao que lhe é oferecido, as lutas pelos reconhecimentos dos direitos
desses povos já são frequentes, mesmo que o sistema, para sair da responsabilidade, remeta-a
aos próprios sujeitos do campo, quando atribui a defasagem do ensino do campo à distância,
às estradas mal conservadas e até mesmo à abnegação dos sujeitos pela educação. Essa
responsabilização não é mais aceita pelos movimentos sociais e os moradores do campo, que
exigem uma educação que lhes garanta o direito à educação que respeite suas identidades,
seus territórios, saberes e formas de viver.

Diante do descrito acima, pensar o sentido da escola é necessário, quando por vezes a
mesma tem sua prática pedagógica baseada na cópia e reprodução, deixando de contextualizar
o conteúdo com o contexto a que está inserida, assim tornando o território menos interessante
para o jovem (ARROYO, 2017). É preciso desvincular-se da ideia que o campo remete ao
arcaico e esse processo cabe a escola realizar, afim de permitir que o jovem, se resolver sair
do campo, que o faça consciente do valor do mesmo e do que ele pode oferecer (MARTINS,
1995).

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A questão de desigualdade social, também é um fato, onde a desvalorização do


trabalho é presente em alguns territórios, levando o jovem desiludir-se quando seu trabalho e
produção não são valorizados, talvez a isso, atribua-se a falta de políticas públicas voltadas
para o campo, especificamente para a agricultura familiar, e também a ideias de que, o
progresso econômico para o campo esteja relacionado com o agronegócio, indo contra as
possibilidades de progresso da agricultura familiar (CASTRO, 2012).

E quando acontece a desilusão por parte dos jovens, em relação à permanência no


campo, também pensa-se no perfil de escola que está inserida ao território, onde muitas vezes,
trata-se de uma escola com profissionais educadores oriundos da zona urbana, sendo que, para
trabalhar nestas escolas seria necessário levar em consideração a realidade de cada aluno,
fazendo-o pensar o quanto é importante a valorização do meio em que vivem, trazendo essa
realidade para sala de aula, aliando teoria e prática. No entanto, muitos educadores são
desmotivados com as condições econômicas que os professores são submetidos, com salários
que desmotivam o mesmo fazer um trabalho com práticas de ensino de qualidade, assim como
afirma LIBÂNEO:

[...] na prática, os governos têm sido incapazes de garantir a valorização salarial dos
professores levando a uma degradação social e econômica da profissão e a um
rebaixamento evidente da qualificação profissional dos professores em todo o país.
Em outros termos, ao mesmo tempo em que se fala da valorização da educação
escolar para a competitividade, para a cidadania, para o consumo, continuam
vigorando salários baixos e um reduzido empenho na melhoria da qualidade da
formação profissional dos professores. (LIBÂNEO, 2004.p.65).

Porém, acima de tudo, deveria estar o comprometimento com o próximo, no caso, com
o aluno, que está à mercê da possibilidade de aquisição do conhecimento transmitido pelo
educador, é também pelo trabalho docente que o jovem prepara-se para vida, a partir disso,
pensar o sentido da escola em prol da permanência do jovem no campo. Como também no
reconhecimento da luta em favor das populações camponesas, para isso, não necessariamente
o jovem tenha que permanecer morando no campo, mas que suas raízes sejam fortalecidas em
prol da defesa dos direitos e manutenção da identidade camponesa.

JUVENTUDE DO CAMPO: PERMANECER OU SAIR

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Nas últimas décadas a educação vem passando por mudanças, desde a educação
infantil, ensino fundamental até os cursos universitários. A ampliação e criação de programas,
o acesso a bolsas de permanência, têm possibilitado que, pessoas anteriormente excluídas dos
bancos escolares, possam ingressar no sistema de ensino. Entretanto, com a nova reforma
prevista e proposta pelo governo, que congela por vinte anos gastos com educação, o acesso
no que diz respeito à educação, e excepcionalmente quanto a educação rural, correm o risco
de ficarem comprometidas e regredir quanto sua estrutura ideológica e econômica. A
educação no meio rural, na sua história, foi questionada pelas falhas na sua estrutura, levando
o jovem rural pensar e preferir migrar para cidade e para escolas urbanas.

No entanto, segundo a perspectiva da educação do campo, que pensa o processo


educativo a partir de uma “educação básica que assumisse, de fato, a identidade do meio rural,
não só como forma cultural diferenciada, mas principalmente como ajuda efetiva no contexto
específico de um novo projeto de desenvolvimento do campo” (Conferência Nacional por
uma Educação do Campo: Texto base , Brasília 27 a 31 de julho de 1998) é dever da escola
do campo levar para seu aluno a conscientização da importância do meio que vive, ver o local
não apenas como um espaço agrícola e da pecuária, mas como um local para morar, desfrutar
de lazer e construir meios para sobrevivência digna e de qualidade.

A ausência de uma escola do campo, conforme proposta na conferência citada no


parágrafo anterior, vem contribuindo para que a zona rural esteja cada vez menos populosa,
pois o município com uma população total de 41.363 habitantes, conforme dados de 2007, o
6º Distrito - Touro Passo contava com uma população de 460 habitantes. Atualmente, segundo
informações ainda inconclusas do censo agropecuário de 2017, esse número reduziu. Tal
realidade é evidenciada pelo envelhecimento das pessoas que lá habitam, pela natalidade
diminuída e pelo crescente êxodo do jovem rural, com isso, tenta-se entender o perfil do
jovem que ainda mora nesses territórios, quais suas perspectivas em relação ao meio, a escola
e o futuro.

A escola, existente neste território, forma jovens no ensino fundamental, que ao


concluí-lo permanecem ou deixam o campo. Nota-se que a escola pouco interfere nessas
decisões, a instituição realiza seu trabalho e detêm-se em formar alunos no ensino
fundamental.

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As próprias políticas públicas restringem a este lugar a educação para as “zonas


rurais”, conforme documento citado por GERALDI que diz:

Para simplificar a questão, foram estabelecidos dois tipos ou níveis de


competências cognitivas: a primeira, denominada tipo 1, para as tarefas ou
ocupações mais simples e difundidas; a segunda, para as atividades ou
funções mais complexas (tipo 2). Em segundo lugar, deveríamos diferenciar
as competências necessárias na cidade e no campo. Para as funções
produtivas mais difundidas num processo global de modernização agrícola,
deveríamos considerar um patamar mínimo de competências cognitivas
equivalentes às quatro primeiras séries do 1o. Grau. Já nas cidades, as
funções no setor secundário e, fundamentalmente, no terciário, demandam
competências equiparáveis ao Primeiro Grau completo. Para o tipo 2,
deveríamos considerar o primeiro grau completo no meio rural e o segundo
grau completo no meio urbano. (Ibidem:9-10) (BRASIL, 1994 apud
GERALDI, 1999)

Pode-se observar que a proposição para o campo é no máximo o primeiro grau


completo, o que pode justificar a ausência de escolas de ensino médio no campo, confirmando
novamente as colocações de ARROYO (2017) quando diz que a visão hegemônica é pensar
que ao camponês poucas palavras bastam. No município de Rosário do Sul esta afirmação
pode ser confirmada, pois não há nenhuma escola de ensino médio nas áreas rurais do
município. Obrigando a quem deseja continuar os estudos a migrar para a área urbana ou se
submeter as condições precárias, e muitas vezes inviáveis, de transporte.

Percebe-se também, na escola investigada, a falta de interação entre a comunidade e


escola, que dá-se somente em reuniões para entrega de pareceres dos alunos, em
confraternizações do dia das mães e pais e datas comemorativas pertinentes ao educandário,
no entanto, em conversa informal com alguns pais integrantes do CPM (Círculo de Pais e
Mestres), os mesmos colocam que sempre são bem recepcionados pela direção, professores e
funcionários da escola, porém para assuntos burocráticos não são convocados, não participam
das decisões pertinentes ao funcionamento do educandário. De forma que a população de
Touro Passos não se sente parte da escola e não sente a escola como parte de seu território: a
escola não é dali, está ali!

Ao conviver com adolescentes, estudantes do educandário, percebe-se que alguns


veem os dias que ficam sem aula como ponto positivo e oportunidade para ajudar nas tarefas
cotidianas em suas propriedades. Percebe-se um certo desinteresse pela escola, onde a mesma
estando em atividade torna-se um atrapalho às tarefas que poderiam realizar se estivessem em

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casa, pois, estando em casa alguns adolescentes podem ajudar na “lida” cotidiana das
propriedades. Diante dessa percepção, é propício pensar que o jovem quando expõe-se dessa
maneira está transferindo um recado à escola, pois fica nítido que a mesma, talvez, não esteja
trabalhando de acordo com as necessidades e realidades dos alunos, diante das tarefas que os
mesmos realizam em suas residências, e isso é perceptível quando os adolescentes preferem o
trabalho familiar a ir para escola, é como se a escola não fizesse parte do território e do
cotidiano dos jovens.

Com isso, quando o jovem expõe que a escola atrapalha sua vida, o mesmo está
sugerindo que a escola deve mudar seu modo de trabalho. Que ele, “aluno”, está ali para
estudar, brincar, interagir, e a escola tem que adequar-se ao seu modo de vida, à sua realidade,
atender não só as necessidades futuras desses jovens, mas também as suas necessidades
imediatas, caso contrário, a mesma não será interessante para ele.

JUVENTUDE DO CAMPO: PERMANECER OU SAIR, ESCOLHA OU IMPOSIÇÃO?

Diante das conversas, citadas na metodologia, ao interagir com os adolescentes,


percebe-se que nem todos os jovens têm intenção de migrar para os centros urbanos. Fato que
comprova-se quando ouve-se: “Quero cuidar dos meus bichos, estou criando meus bichos.”,
abordagem de um adolescente, estudante da escola e residente no território com seus
familiares, ao falar da sua criação de bovinos e ovinos. Também é comum ouvir os
adolescentes atribuírem o fato de haver aula em turno integral como algo ruim, pois isso os
cansa e não permite que os mesmos envolvam-se com o trabalho ao chegar em casa, visto que
a maioria desses alunos residem distante da escola e por conta disso chegam viajar até duas
horas para chegar ao educandário.

Ao conversar com um pecuarista familiar, morador do território, o mesmo expõe que


concluiu a formação básica em uma escola urbana contra sua vontade, pois seus pais tinham
propriedade no campo e o mesmo não via vantagem alguma em ir para a cidade estudar, por
conta da escola situada no território, na época, trabalhar até o quinto ano. Ele queria
permanecer no campo e ajudar seu pai cuidar da propriedade, e assim o fez, concluiu o ensino
médio e retornou para o campo, onde reside, diferente de seus irmãos que continuaram com os

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estudos e concluíram a formação superior. Durante a conversa demonstrou preocupação com a


conservação da propriedade da família ao dizer que, se não tivesse contrariado a vontade de
sua mãe, que, queria vê-lo cursando um curso superior, quem estaria cuidando da propriedade
hoje, visto ser uma propriedade pequena e os mesmos não tendo como manter um funcionário
para cuidá-la. Apesar das dificuldades para manter-se no campo, não arrepende-se da escolha
que fez, pois sua renda depende das safras de comercialização de lã ovina, de terneiros e gado
de corte, sendo assim, sua renda não é fixa, nem mensal, o mesmo tem que trabalhar muito
para que seus animais produzam com qualidade afim de ter uma boa comercialização.

Por outro lado, há os que resolvem deixar o campo e migrar para os centros urbanos,
ora por vontade própria, ora por influência da família, que consideram a vida no campo árdua
e com retorno financeiro lento. Por conta disso resolvem deixar o ambiente rural em busca de
estudo e trabalho nos centros urbanos, e, em consequência, muitos rompem os laços com o
ambiente camponês. Fato que pôde-se concluir ao conversar informalmente com uma jovem,
filha de moradores da região, que viveu no campo até seus quatorze anos, e ao sair para
estudar, não mais retornou, a mesma quase nunca visita a localidade, pois hoje seu pai já é
falecido e sua mãe reside na cidade. Ao ser questionada, a ex-moradora, hoje com trinta e
quatro anos, diz não gostar do campo, pois o mesmo não a permite trabalhar e ganhar
dinheiro, não oferece conforto e tampouco lazer, enfim, não há o que fazer no campo, segundo
ela.

Esse posicionamento remete pensar que o território desta escola não oferece
oportunidades ao jovem, não há vida social, é visto apenas como lugar de trabalho por quem
ali reside, pois cada morador dessa localidade trabalha para sua sobrevivência, e se tiver
intenção de estudar e se divertir terão que dirigir-se à cidade.

Outra realidade são os adolescentes que resolvem parar de estudar para trabalhar em
suas propriedades familiares ou como empregados em fazendas e lavouras de propriedades
vizinhas de suas residências. Esses adolescentes, ao começarem a ter contato com o trabalho e
tendo algum retorno financeiro por conta disso, passam a ver o mundo do trabalho mais
interessante que a escola, que torna-se, na concepção do jovem, não atrativa e contribuinte
para sua vida e para o trabalho que realizam. Para esses adolescentes, trabalhar com o que
gostam, seja com pecuária, seja com agricultura os satisfazem, o que faz pensar que, se a

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escola que frequentam não trabalha os conteúdos curriculares de acordo com a realidade do
aluno e do território, a mesma torna-se desnecessária para o jovem que acaba evadindo da
mesma. Esses adolescentes começam faltar muitas aulas, esperam atingir a maioridade e
evadem de vez do ambiente escolar.

Contudo, o trabalho que exercem em seus cotidianos, também contribui para a vida
desses adolescentes, pois o conhecimento que adquirem através da prática diária do trabalho
os fazem profissionais em suas áreas e consequentemente os mantem no campo. Ao ouvi-los
falar sobre tal decisão é notável que fazem esta escolha, de parar de estudar para trabalhar,
porque gostam e identificam-se com ambiente rural e não veem a escola contribuindo para o
trabalho que realizam, segundo eles, gostam é da campanha (campo) e da lida (trabalho) do
campo, e não sentem vontade de deixar o espaço rural.

Também, nesses momentos de diálogos, obtidos na escola, entre os alunos, percebe-se


que, várias são as formas de pensar dos estudantes do campo, onde alguns tem a escola como
importante para seu desenvolvimento intelectual e pessoal, visto que ao estar no ambiente
escolar o jovem expõe suas vivencias e pretensões quanto a seus futuros, como o de migrar
para os centros urbanos em busca de estudo e trabalho ou de parar de estudar e trabalhar nas
propriedades junto às suas famílias ou até mesmo em fazendas e lavouras da região, como
empregados assalariados.

Durante as visitas aos moradores do território do entorno da escola, foi possível


constatar diversos os posicionamentos, pois algumas famílias, de pequenos produtores, veem
a escola e o aprendizado como um meio para o jovem viver outra realidade, diferente das
suas, que julgam ser uma realidade difícil, marcada pelo trabalho laborioso do dia a dia. Pois,
as famílias explanam que a realidade do pequeno produtor é trabalhar, produzir para obter o
sustento da família e garantir renda nas épocas de safra, visto que na região a população não
adere à produção para comercialização em feiras semanais e sim à criação de bovinos e
ovinos, onde são comercializados carne e lã em épocas determinadas, mais precisamente
anualmente, sendo assim, almejam para seus filhos outro modo de vida, onde possam estudar
e trabalhar com a certeza que ao findar o mês terão seus salários garantidos.

Também é pertinente abordar a realidade de quem trabalha nas fazendas e lavouras,


fato que comprova-se quando ouve-se o seguinte comentário: “estudar para ser alguém na

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vida”, abordagem de um pai de adolescente estudante da escola, que remete à realidade do


campo o sacrifício de sobreviver dignamente, diante da realidade de trabalho a qual se
submetem ao trabalhar como agregados em fazendas ou lavouras da região.

A partir dessas observações e diálogos, é importante pensar e entender o jovem


pertencente a esse território, suas inquietações, opiniões e relação que estabelece com a
escola, assim como, entender o sentido da escola para com esse aluno. Para isso, a aplicação
do questionário, presente nos apêndices deste trabalho foi excencial, sendo que, ao aceitar
participar da pesquisa os jovens entrevistados foram responsáveis sobre suas respostas. Com
essa prática foi possível compreender melhor as percepções dos moradores do território da
escola acerca da decisão entre permanecer e sair do campo, bem como, se a escola interfere
nessas resoluções.

JUVENTUDE DO CAMPO: ANÁLISE DOS DADOS

Um dos instrumentos utilizados para a realização desta pesquisa, foram entrevistas


realizadas por meio de questionários, dentre os quais questionou-se temas importantes a serem
tratados pela escola. Entre os temas considerados importantes de serem abordados na escola,
destacou-se os assuntos relacionados a realidade do campo, sendo que o trabalho realizado
nesse território foi o que teve maior escolha, pois segundo os entrevistados, aos alunos
moradores do campo é pertinente assuntos conforme suas vivências. No entanto, quando
questionados se percebem alguma relação dos conteúdos vistos na escola com suas realidades,
das dezoito entrevistas, dez responderam que não percebem essa relação em sala de aula,
apenas quando é ofertado na escola palestras, com palestrantes convidados a falar sobre
assuntos pertinentes ao campo. Porém, um entrevistado diz que mesmo a escola não
abordando frequentemente assuntos do campo, a mesma é muito importante, visto que, o
aluno ao ser alfabetizado poderá interpretar a indicação de um medicamento ou ler instruções
de algum equipamento.

Ao considerar as demais respostas do questionário vê-se que cada participante possui


suas inquietações ao falar sobre o assunto abordado. Os entrevistados que migraram para a
cidade, alegam que o fizeram por questões financeiras, por não ter oportunidade de estudo e

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trabalho no campo, ao contrário da zona urbana, que na concepção dos mesmos oferece mais
opções de emprego. No entanto, dos sete entrevistados que residem na cidade, apenas dois
concluíram o curso técnico, um em enfermagem, outro técnico agrícola, os demais concluíram
o ensino fundamental, na escola citada neste trabalho, e não conseguiram ir adiante nos
estudos, pois ao migrar para cidade deparam-se com despesas não tidas no campo, por conta
disso tiveram que trabalhar para manter-se. O que permite refletir sobre o pensamento ilusório
acerca da realidade urbana, quando nem tudo que parece é, e o acesso à educação, ao trabalho
valorizado nem sempre é ofertado a todos de forma igualitária. Essa realidade GONZAGA
(2006, pág. 59) ajuda compreender quando aborda em sua dissertação de mestrado, que a
cidade representa, para o camponês, o sonho daquilo que deseja – emprego, educação, saúde,
reconhecimento como cidadão, fim de jornadas extensas de trabalho, possibilidade de ganhar
e acumular dinheiro. Mas, a realidade não é bem essa, e na maioria das vezes a cidade se
apresenta como um pesadelo, uma ilusão, violência, falta de infra-estrutura, falta de acesso a
moradia, condições precárias de saúde, educação, transporte.

Os que permaneceram no campo dizem que fizeram essa opção por gostar do ambiente
rural apesar das dificuldades enfrentadas para a sobrevivência, como o retorno financeiro mais
lento. Os mesmos alegam que o campo oferece qualidade de vida, onde pode-se plantar,
colher e consumir alimentos mais saudáveis, ao contrário da cidade que na concepção dos
entrevistados tudo é a custa de dinheiro.

Ao analisar as respostas sobre o que se considera essencial na escola, destaca-se a


resposta de um jovem, morador do campo, que ao responder o questionário expressou a
importância da escola, pois “a pessoa analfabeta não terá como ler a bula de um
medicamento receitado, seja para uma pessoa ou para um animal”. Entretanto, este jovem,
com 26 anos, que cursou até o 6º ano do Ensino Fundamental, deixa claro que não pretende
voltar estudar e sua vontade é continuar morar no campo, o mesmo diz que ao decidir parar de
estudar, a escola que frequentava não o questionou em nenhum momento. Fato em comum em
todas as respostas, quando perguntados sobre o posicionamento da escola ao decidirem parar
com os estudos, todos responderam que não houve questionamento desta decisão por parte da
escola.

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Contudo, considerando a vivência da autora em observações do trabalho diário nesta


escola, participando de reuniões pedagógicas e rodas de conversas com professores e alunos
pode-se perceber que o posicionamento dos professores, a respeito da permanência ou não do
jovem no campo, varia de um para outro, pois alguns afirmam que sentem necessidade de
entender a realidade dos jovens com os quais trabalham, para assim adotar a metodologia
apropriada, metodologia essa, que poderá basear-se na realidade a qual os alunos estão
inseridos, onde possam contextualizar os conteúdos com as vivencias dos educandos, para que
os alunos consigam melhor compreender o que estão vendo em sala de aula, e que também
percebam o quanto a escola faz parte e contribui para seus cotidianos. Já para outros
educadores é indiferente estar em escola do campo ou escola urbana, a não ser pelo fato de as
escolas do campo possuir turmas com número reduzido de alunos, pois a metodologia adotada
é a mesma para as duas realidades, seja urbana ou rural. Conforme os professores, os
conteúdos são os mesmos, no campo ou na cidade, e segundo eles, quando esses alunos
concluírem o fundamental nessa escola irão para uma escola urbana, no entanto, não sendo
necessário trabalhar de forma diferente na escola do campo.

No entanto, considera-se as condições de trabalho as quais os professores são


submetidos, pois os mesmos enfrentam altas madrugadas para chegar ao educandário, tendo
alguns que sair de suas residências em torno de quatro e meia, cinco horas da manhã para
chegar à escola as oito horas, já pensando na viajem de retorno, com isso acarretando um
certo desanimo no trabalho docente. Ainda assim, diante do professor está o aluno, que
também viaja para chegar à escola e necessita de atenção do professor, tendo seu aprendizado
naquele momento a mercê do trabalho docente, e naquele momento é à esta instituição que
compete.

Para isso, pensar uma educação que contemple as necessidades do jovem do campo e
de quem está a trabalhar nesses contextos é necessário, considerando suas realidades, partido
de uma prática que efetivamente fortaleça a identidade do camponês e que o faça pensar que o
território ao qual pertencem é um espaço de vida, mesmo diante das dificuldades que
enfrentam cotidianamente para estar na escola e permanecer no território. Pensar a perspectiva
da Educação do Campo, que traga para a escola as especificidades do campo, com respeito a
quem está nesse ambiente.

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JUVENTUDE DO CAMPO: OUTROS SENTIDOS PARA A ESCOLA

A saída dos jovens do campo, seja pelas difíceis condições de vida nesses espaços, seja
para buscar por qualificação, representa uma questão social que necessita um olhar diferente
do poder público, pois, reduzidas são as ações para sanar as dificuldades que os jovens,
moradores do campo, enfrentam para qualificar-se profissionalmente, sendo essa problemática
um dos motivos da saída dos jovens do ambiente rural, sem contar nas possibilidades que os
jovens visualizam quanto ao retorno financeiro imediato, ou seja, mensal, fora do ambiente
rural.

Nesse sentido, é necessário pensar uma educação voltada para os jovens do campo que
atenda suas necessidades e que contribua para melhores condições de vida, permitindo, ao
jovem, autonomia frente as suas decisões. Para isso, à escola cabe contextualizar o ambiente
em que está inserida, assim como a realidade do aluno, pois o educando deve sentir que escola
faz parte de sua realidade, que a mesma é importante para suas tomadas de decisões.

Estratégias futuras, como cursos técnicos e universitários, através da pedagogia de


alternância, poderia contribuir para a formação dos jovens do campo, para que, ao se tornarem
independentes, os jovens possam escolher permanecer no campo, alicerçados por uma
formação, visto que nesse período da juventude, os jovens estão construindo e planejando o
futuro, mesmo sendo dependentes, normalmente subordinados aos pais. É perceptível que está
cada vez mais reduzida a renovação de lideranças camponesas, resultando no esvaziamento do
campo, e se a escola a que estão inseridos trabalha em uma perspectiva urbana mais reforça
essa realidade.

Todavia, se a escola trabalhar em uma perspectiva da educação do campo, poderia


contribuir para que o jovem refletisse sobre sua pertença ao campo, e desta forma, a escola
estaria contribuindo para o desenvolvimento do território, partindo do incentivo quanto a
organização e ao trabalho coletivo, entre os moradores e a escola. Diante disso, talvez o
processo de evasão rural fosse menor, pois os laços de amizade e parceria entre o jovem, a
escola e a sociedade local faria o jovem pensar em permanecer na localidade, pois, por ele,

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seria levado em consideração a satisfação de estar morando e convivendo junto a sua


comunidade.

Para tanto, à escola caberia organizar metodologias diferenciadas para trabalhar e


dialogar com seus alunos, através de alternativas de lazer, aprendizado e valorização do
território local, onde o trabalho realizado pelas famílias dos jovens fossem contextualizados
com os conteúdos escolares, construindo assim, uma visão diferente para o jovem em relação
à sua possível permanência ou saída do campo. Ao trabalhar dessa forma, os alunos poderiam
ser mais ouvidos pela escola, pois os mesmos sentem e almejam por uma escola que tenha
sentido para eles, que dialogue com suas realidades, conforme fala de dos próprios alunos,
demonstrado nas redações apresentadas neste trabalho, ao sugerir aulas diferenciadas,
melhorias da estradas, condições de transporte, pois ao não serem ouvidos pode nos levar a
pensar que são dificuldades de aprendizagem, quando pode ser a consequência da falta de
vinculo da escola com as vivencias cotidianas dos estudantes, para que a escola fizesse mais
sentido para aquele território.

Quanto a permanecer ou sair do campo, é um acontecimento, muitas vezes inevitável,


no entanto, à escola cabe conscientizar esse jovem, sobre sua participação e contribuição na
sociedade, que, estejam onde estiverem, poderão defender os direitos das populações
camponesas, através da manutenção de suas identidades e valores trazidos do campo e da
família. A responsabilidade do dilema do jovem entre ficar e sair do campo não pode ser
atribuída somente à escola, pois existe um conjunto de ações que envolve o sistema em geral,
quando este não fornece aos diversos povos o que lhes é de direito em seus ambientes de
origem.

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afirmam? 2017.

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O PROCESSO DE FUNDAÇÃO ESCOLA FAMÍLIA AGRÍCOLA DE VALE DO SOL

Ismael Gomes34
Regis Dattein Solano35

Resumo

O texto descreve o processo de fundação da Escola Família Agrícola de Vale do Sol – EFASOL. São
abordados os aspectos históricos que levaram a criação da referida escola no território do Vale do Rio
Pardo, interior do Rio Grande do Sul. Também são discutidos alguns dos conceitos que fundamentam
trabalho educativo desenvolvido nesta escola do campo que tem por base os preceitos da Pedagogia da
Alternância.

Palavras-chave: Educação do Campo; Pedagogia da Alternância; Escola Família Agrícola.

Introdução

Este artigo tem por finalidade apresentar uma história vivenciada e construída por
diversas mãos, ao longo de vários dias, meses e anos. A partir de um recorte do trabalho de
conclusão do Curso de Bacharel em Desenvolvimento Rural – PLAGEDER/UFRGS de Regis
Dattein Solano defendido em 2017 e com base em reflexões do fazer pedagógico cotidiano36,
buscamos no decorrer do texto apresentar o processo de fundação da Escola Família Agrícola
de Vale do Sol – EFASOL, localizada no Vale do Rio Pardo, região central do Rio Grande do
Sul. Pretende-se, sobretudo, registrar a história, mas para além disso,refletir alguns dos
conceitos que fundamentam o trabalho educativo desenvolvido nesta instituição de ensino.
Com a fundação da Escola Família Agrícola de Santa Cruz do Sul – EFASC37, em
2009, outras regiões do Rio Grande do Sul – RS passaram a aproximar-se da Pedagogia da
Alternância das EFAs, percebendo seus impactos e resultados. A partir de então,
gradativamente, iniciou-se um processo de expansão destas escolas pelo RS, estabelecendo

34
Escola Família Agrícola de Vale do Sol – EFASOL e Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC.
profismaelgomes@gmail.com
35
Escola Família Agrícola de Vale do Sol – EFASOL – regissolano157@gmail.com
36
Regis e Ismael são monitores/professores da área de ciências humanas e sociais da EFASOL e fazem parte da
coordenação da escola.
37
A EFASC foi a primeira EFA a surgir no RS e está localizada no mesmo território (Vale do Rio Pardo) da
EFASOL.

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este modo de organização social como alternativa possível às demandas da Educação do


Campo no Estado.

Contextualizando o território e alguns conceitos fundamentais

De acordo com a Fundação de Economia e Estatística (FEE, 2015), a região do Vale


do Rio Pardo é composta por 23 municípios38, com uma população total de 435.550
habitantes, em uma área de 13.171,7km². Dos 23 municípios do Vale do Rio Pardo, em
absolutamente todos, o cultivo do tabaco é existente em um modelo produtivo conhecido
como sistema integrado do tabaco.
Gomes (2014) destaca que a profunda integração da agricultura familiar com o setor
do tabaco se apresenta como um exemplo interessante a ser estudando, pois, o sistema
integrado do cultivo do tabaco na região vem sendo desenvolvido há quase um século. Nesse
sistema, as empresas do setor realizam contratos com os agricultores e fornecem aos
produtores o pacote tecnológico para a produção, como: sementes, adubos, assistência técnica
especializada e todo o atendimento necessário para desenvolver a atividade. O agricultor
adquire o pacote, realiza o plantio a partir de sua mão de obra e de sua família, disponibiliza a
infraestrutura e o solo o plantio e tem como garantia a compra da produção pela empresa.
Neste sistema produtivo, no entanto, o agricultor não possui autonomia sobre sua
produção, pois a produção tem mercado garantido, porém preço não. O agricultor não tem
autonomia de negociar preço sobre o seu produto, muito menos pelos insumos, infraestrutura,
máquinas e equipamentos necessários para a realização do plantio. Resumindo, o agricultor
“põe preço em nada”. Além disso, utiliza grandes pacotes tecnológicos para o cultivo trazendo
riscos econômicos, sociais e ambientais na utilização desses produtos.
A esse respeito, Redin (2010) traz que nesse sistema não existe nenhuma flexibilização
para uma ação independente do agricultor produtor de tabaco, seja nas práticas de cultivo,
padrões do armazenamento, condições da comercialização e preço pago pelo produto,

38
Arroio do Tigre, Boqueirão do Leão, Candelária, Encruzilhada do Sul, Estrela Velha, General Câmara,
Herveiras, Ibarama, Lagoa Bonita do Sul, Mato Leitão, Pantano Grande, Passa Sete, Passo do Sobrado, Rio
Pardo, Santa Cruz do Sul, Segredo, Sinimbu, Sobradinho, Tunas, Vale do Sol, Vale Verde, Venâncio Aires e
Vera Cruz.

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requisitos sobre a qualidade do produto final, entre outras questões. Todas as etapas do
processo, com raríssimas exceções são rigorosamente geridas pelas empresas.
Outra questão a ser levada em consideração, o outro “gargalo” na região é o da
diversificação da produção agrícola. Neste sentido, considerando o contexto social, político,
econômico e cultural estabelecido, um dos grandes desafios constitui na (des)construção,
junto aos agricultores, da consciência sobre o potencial produtivo de suas propriedades,
buscando o entendimento de que a lógica estabelecida nos modelos convencionais de cultivo
não é necessariamente a melhor opção.
É justamente neste desafio que a educação apresenta um importante potencial. A partir
de processos educativos realmente significativos e que considerem o contexto no qual estão
inseridos, é possível construir a consciência coletiva necessária para isso, sobretudo se
considerarmos que o trabalho educativo se estabelece principalmente junto a população jovem
que gradativamente tem “se afastado” do meio rural.
Matte e Machado (2016), em estudo sobre a temática da sucessão na agricultura
familiar no sul do Brasil colocam que:

De 1970 até 2010, segundo dados do Censo Populacional (IBGE, 2011), o número
de jovens com até 29 anos residindo no meio rural brasileiro reduziu 43,3% entre as
jovens mulheres e 46,3% entre os jovens homens. Consequentemente, houve um
acréscimo no número de idosos no meio rural brasileiro, com um aumento de
pessoas acima de 60 anos equivalente a mais de 51,9% (IBGE, 2011). Um estudo
recentemente divulgado pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e
Agricultura (FAO, 2016) aponta que houve uma melhora na qualidade do emprego
para os jovens de comunidades rurais da América Latina nas últimas décadas.
Porém, alguns desafios permanecem, como trabalhos precários, salários baixos e
carga horária excessiva. (MATTE e MACHADO, 2016, p. 2)

Segundo os mesmos autores, entre os principais fatores que influenciam os jovens a


não permanecerem no meio rural estão a dificuldade em obtenção de terra, baixa renda,
ausência de incentivo e estímulo dos pais, comparação entre os meios urbano e rural,
penosidade das atividades produtivas, impossibilidade de constituir novas famílias,
desigualdade de gênero, acesso ao estudo e expectativa profissional. Desse modo, o
afastamento dos filhos das atividades da propriedade, bem como das tomadas de decisões, tem
resultado em um processo de desvinculação dos jovens e consequente migração para os
centros urbanos.

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Para piorar as coisas, o modelo dominante de educação rural desenvolvido no Brasil


desconsidera o conhecimento e os saberes populares e coloca-se como ferramenta de difusão
do modo capitalista, sobretudo no que diz respeito à incorporação e submissão dos
trabalhadores/as do campo como força de trabalho assalariado no processo de industrialização
e urbanização da sociedade brasileira.
É preciso compreender que de modo geral, a educação sempre foi “negada” à boa
parte do povo brasileiro, especialmente aos povos periféricos como negros, indígenas,
quilombolas, pescadores, camponeses e agricultores familiares. Mais do que isso, na medida
em que coloca a cidade e o território urbano como sinônimo de desenvolvimento e sucesso,
esse modelo educativo excludente tem contribuído fortemente com um status de
desmerecimento da qualidade da vida no campo, ajudando a perpetuar o meio rural como o
lugar do atraso.
Grande parte dos agricultores não tem acesso à escola e, os que tem, cursam apenas os
primeiros anos do primário, sempre na perspectiva de que para pegar no cabo da enxada não é
preciso ir para a escola. A este respeito Reis (2004), em artigo sobre Educação do Campo e
Desenvolvimento Sustentável, traz à tona mais uma importante reflexão:

Basta uma rápida observação para detectar que, no oferecimento da educação para a
cidade, sempre se buscaram melhores condições de ensino e aprendizagem
(melhores instalações, melhores salários, mais recursos, etc.), enquanto que no
campo, muitas vezes, a escola funcionava e funciona em muitos casos na própria
casa dos professores, com condições mínimas de elementos que favoreçam a
aprendizagem (má acomodação, limitação de espaço, falta de livros e materiais
didáticos, livros didáticos voltados para a realidade urbana, etc.). (REIS, 2004, p. 30)

Além disso, muitas crianças e adolescentes deixam a escola para ajudar nas lavouras,
cuidar dos afazeres domésticos ou dos irmãos menores, enquanto os pais fazem o trabalho
braçal da lavoura. Assim, gradativamente os povos do campo têm sido afastados do direito a
educação de qualidade, mistificando o espaço urbano como território de pessoas cultas
(estudadas) e o campo como o lugar de gente sem estudo.
Nesta perspectiva, em contrapartida a esse modelo tradicional de educação rural, tem
estabelecido desde a década de 1960, um debate, pautado por movimentos sociais ligados ao
campo, sobre a necessidade de processos educativos com uma abordagem conceitual
alternativa. É partir deste debate, aliado a base acadêmica construída nas universidades
brasileiras, que tem se estruturado os fundamentos da Educação do Campo.

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Desta maneira, a abordagem teórico-conceitual da Educação do Campo tem se


constituído a partir da proposta de processos educativos que levam em consideração todas as
dimensões da formação humana. O campo tem sido compreendido como território, como
espaço de vida, de cultura, de contradições, de luta, de diferença.
Atualmente existem experiências brasileiras em Educação do Campo capazes de
reconhecer e valorizar os diferentes saberes dos agricultores/as, incluindo-os como sujeitos
legítimos nos processos educativos. Entre estas experiências, encontram-se Escolas Famílias
Agrícolas – EFAs que têm suas bases pedagógicas ancoradas na perspectiva da Pedagogia da
Alternância – PA.
Este sistema de ensino, se caracteriza por alternar a formação do estudante entre
momentos no ambiente escolar e momentos no ambiente familiar/comunitário. A proposta é
desenvolver um processo de ensino-aprendizagem contínuo em que o estudante percorre o
trajeto propriedade – escola – propriedade.
Na PA, o jovem constrói novos conhecimentos a partir da sua realidade. E para isso,
permanece por um período determinado de tempo39 na vivência das atividades da propriedade
agrícola de sua família (sessão familiar) e, posteriormente, um período nas dependências da
escola em regime de internato (sessão escolar).
A PA nasceu na França em 1935 e chegou ao Brasil em 1969 no estado do Espirito
Santo estabelecendo-se, mais tarde, por diversos estados do país. No Vale do Rio Pardo, no
ano de 2008, deu-se início ao processo de fundação da primeira EFA do Rio Grande do Sul,
que por consequência acaba reverberando para o surgimento de outras escolas no Estado, a
exemplo da Escola Família Agrícola de Vale do Sol – EFASOL, narrativa que será abordado
no tópico a seguir40.

A fundação da EFASOL: reverberando impactos educativos

39
O período de alternância varia conforme a realidade de cada comunidade/instituição de ensino que adota a PA
como princípio educativo. Nas Escola Família Agrícola do Rio Grande do Sul o período alternância é de uma
semana, ou seja, o jovem passa cinco dias (segunda a sexta-feira) na escola, depois vai para casa, permanecendo
pelos próximos nove dias consecutivos no convívio sócio-familiar, para então retornar ao ambiente escolar.
40
Considerando os limites deste artigo, não será possível aprofundar o contexto da PA e das EFAs no Brasil e no
RS. Para mais informações a respeito do tema indicamos COSTA (2012), VERGUTZ (2013) e POZZEBON
(2015).

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Em entrevista com professor Ireno Finkler41, pessoa que foi fundamental para a
criação da terceira EFA do RS, destacou-se que a justificativa de ter uma EFA em Vale do Sol
decorre do fato da economia do município ser essencialmente agrícola. No entanto, Ireno
também destaca que um dos fatores mais marcantes para a criação da EFASOL foi a
existência da Escola Família Agrícola de Santa Cruz do Sul – EFASC. O professor coloca que
o município foi parceiro da EFA de Santa Cruz desde sua fundação, com ajuda financeira e
transporte para os jovens estudarem na instituição. Com o tempo, as entidades locais, as
famílias e a comunidade em geral começaram a ver os diferenciais nesses jovens, suas
inserções na comunidade e as atividades que vinham desenvolvendo em suas propriedades.
A esse respeito, Pozzebon (2015) destaca que o diferencial formativo das EFAs
decorre do fato destas escolas trabalharem com uma educação contextualizada que tem como
princípio envolver não somente o jovem, mas também a família e a comunidade no processo
de formação considerando o território e as pessoas do convívio social do jovem como
conformadores. Ao desenvolver práticas pedagógicas envolvendo os jovens, as famílias e as
comunidades no processo de ensino-aprendizagem, as EFAs possibilitam que o jovem
compreenda o espaço onde ele vive, enquanto cidadão inserido dentro de um território.
Assim, a partir das repercussões causadas pela presença da EFASC no Vale do Rio
Pardo, mas sobretudo pela preocupação de diversas pessoas e instituições com o
desenvolvimento da região, em 2011 se iniciaram as primeiras articulações para o
estabelecimento de mais uma EFA no território.
Com o apoio e assessoria da Associação Gaúcha Pró-Escolas Família Agrícola –
AGEFA, foi criada uma Comissão Pró-EFA Vale do Sol (figura 1), formada por professores,
representantes de instituições públicas e privadas, pais de futuros estudantes e demais grupos
organizados, a fim de realizar um estudo sobre a viabilidade de uma EFA no município de
Vale do Sol.

Figura 1: Reuniões da comissão Pró-EFA Vale do Sol

41
Professor aposentado, residente em Vale do Sol que participou da comissão de emancipação do município e é
sócio fundador da Associação Escola Família Agrícola de Vale do Sol (AEFASOL).

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Fonte: Arquivos da Associação Gaúcha Pró-Escolas Famílias Agrícolas – AGEFA, 2011.

De acordo com matéria publicada no Jornal Folha do Vale do Sol, 05 de agosto de


2011 (figura 2), o município havia investido mais de R$1.500.000,00 na construção de um
prédio de grande porte na localidade de Formosa, que mesmo não finalizado teria capacidade
de abrigar 800 estudantes. Considerando este fato, a Secretaria Municipal de Educação,
resolveu transferir os estudantes da Escola Municipal de Ensino Fundamental São João
Batista (próxima ao referido prédio) para esse novo espaço. Ainda assim, teria muito espaço
vago a ser ocupado e os gestores municipais tinham como proposta, em médio prazo, abrir
uma escola técnica para os estudantes de Ensino Médio. Pensando nisso, foi proposto que as
duas escolas (EFASOL e EMEF São João Batista) ocupassem o mesmo prédio.

Figura 2:Reportagem sobre a criação de uma escola técnica em Vale do Sol

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Fonte: Arquivo Jornal Folha do Vale do Sol, 05 de agosto de 2011.

Analisando esse contexto, podemos perceber que os gestores municipais estavam


oferecendo grande apoio à criação da EFASOL, algo fundamental no processo. Mas
analisando com outro olhar, é possível destacar também que era necessário dar uma finalidade
ao prédio recém construído. De alguma forma, a obra estava repercutindo negativamente
junto a comunidade local, visto que toda a rede municipal compreendia na época pouco mais
de 1.000 crianças e adolescentes e a estrutura da nova escola, mesmo não finalizada, teria
capacidade para 800 estudantes.
Dando continuidade ao processo, houveram diversas reuniões da Comissão Pró-EFA
Vale do Sol, nas quais foram definidas as ações necessárias para a implantação da escola.
Dentre as demandas levantadas, identificou-se a necessidade de realizar de uma pesquisa de
interesse pela EFA que também tinha como objetivo divulgar a proposta e estimular a
reflexão sobre a implantação escola, realizando levantamento de demandas e possíveis
apoiadores e parceiros.

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De acordo as bases documentais arquivadas na AGEFA, a pesquisa teve como


público-alvo os estudantes das séries finais da rede municipal e estadual e as famílias de Vale
do Sol e parte de Sinimbu, Herveiras e Vera Cruz. Foi elaborado e aplicado um questionário
com ajuda de jovens estudantes da EFASC, professores, agentes comunitários de saúde e
orientadores agrícolas da Empresa Indústria de Tabacos e Agropecuária (INTAB Ltda.).
A pesquisa, realizada no mês de outubro de 2011, atingiu um grande número de
pessoas como pode ser observado na tabela 1.

Tabela 1: Pesquisa com os estudantes (422 jovens) da rede municipal e estadual


Enfoque Sim Não Não sabem/não
responderam
Pretendem permanecer na 48% 49% 3%
agricultura
Você gostaria de estudar 65% 32% 3%
numa EFA
Você apoiaria a criação de 97% 2% 1%
42
uma EFA
Fonte: Arquivos da Associação Gaúcha Pró-Escolas Famílias Agrícolas – AGEFA, 2011.

Interessante destacar que 97% dos estudantes das séries finais apoiaram a criação da
escola, pois vislumbravam a vinda de mais oportunidades para o jovem se interessar pelo
meio rural, entre outras justificativas que foram destacadas nas pesquisas.
Já as pesquisas realizadas com as famílias, num total de 491 famílias entrevistadas, os
principais pontos seguem destacados no quadro abaixo:

Tabela 2: Pesquisa 491famílias de Vale do Sol e parte de Herveiras, Sinimbu e Vera Cruz
Enfoque Sim Não Não sabem/não
responderam
Você incentivaria seu 78% 22% 0%
filho (a) a permanecer na
agricultura
Você apoiaria a criação de 97% 2% 1%
43
uma EFA
Fonte: Arquivos da Associação Gaúcha Pró-Escolas Famílias Agrícolas – AGEFA, 2011.

42
Além disso, segundo a pesquisa 60% dos estudantes acham muito importante a criação de uma EFA.
43
Neste caso, segundo a pesquisa 66% das famílias entrevistadas acham muito importante a criação de uma EFA.

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Além destas questões, também foi solicitado aos entrevistados para destacarem sobre
quais as maiores necessidades do meio rural atualmente, onde a permanência dos jovens no
meio rural, investimentos em Educação do Campo e a garantia de comercialização dos
produtos foram as mais levantadas.
Com a pesquisa realizada, no dia 10 de novembro de 2011, no Ginásio da comunidade
de Formosa, foi realizado um encontro para apresentação dos dados como pode ser observado
na figura 3.

Figura3: Reunião sobre a implementação de uma EFA em Vale do Sol

Fonte: Arquivos da Associação Gaúcha Pró-Escolas Famílias Agrícolas – AGEFA, 2011.

Esse processo foi fundamental para a implantação da EFASOL, pois uma Escola
Família Agrícola deve partir da base, do interesse da comunidade e região, pois uma EFA é de
todos, não de uma instituição, prefeitura, ou presidente de comunidade. Segundo Costa (2012)
nas EFAs:

Não há donos/proprietários e sim famílias/pessoas integradas pelo processo


formativo da Alternância, que devem definir os caminhos seguidos pela EFA, pois
“no caso dos CEFFA, essas pessoas – principalmente as famílias – que têm um
patrimônio próprio – social cultural etc. – se unem para obter uma finalidade
definida - a educação dos filhos, que lhes permita construir um futuro melhor. Eles
descobrem que sozinhos individualmente não podem, e que juntos, superando
dificuldades e obstáculos de todo tipo, conseguem atingir as metas pretendidas
(COSTA, 2012, p.126)

Após as atividades desenvolvidas pela comissão Pró-EFA Vale do Sol e com o aval
comunitário, o próximo passo foi a criação da Associação Local, que teria o papel de
organizar todo o processo administrativo de registro de curso, estruturação, implantação e

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posteriormente servir como mantenedora da futura EFA. Segundo García-Marirrodriga e


Puig-Calvó (2010, p. 65), “a Associação Local é constituída principalmente por famílias,
junto às outras pessoas que aderem a seus princípios, e que são os gestores do projeto, os
atores de seu próprio desenvolvimento”.
Assim, no dia 1º de maio de 2012 foi realizada a assembleia de fundação da
Associação Escola Família Agrícola de Vale do Sol – AEFASOL. Neste dia foi eleita a
primeira diretoria, que de segundo Finkler (2012), ficou composta pelos seguintes membros:
Presidente –Rosmar Kretzmann; Vice-presidente -Sandor Luís Rick; Secretário –Ireno
Finkler; Vice-secretário -Maiara Werner; Tesoureiro - Emerson Luís Rech; Vice-tesoureiro -
Vera Lúcia Brandt; Membros do Conselho Administrativo - Gerson Morsch, Isidoro
Landskren, Ubirajara de Almeida, Ricardo Kretzmann, Luis Rogério Boemeke e Clóvis Rech;
Membros do Conselho Fiscal: Joice Rejane Schwantz, Carlos Leandro Zahn e Néverton
Fischborn. Suplentes: Marceli Arend, Leoni Werner e Wilson Vitalles.
Ireno Finkler destaca que desde a data de fundação da AEFASOL até o início das
atividades com estudante passaram-se quase 2 anos. Inicialmente a escola iria se instalar no
prédio recém construído em Formosa, como já mencionado, porém devido à falta de
alojamentos, cozinha, refeitório e área experimental o projeto começou a enfrentar algumas
dificuldades. Segundo o professor tinha-se a ideia de comprar uma área de 14 hectares
próximo a EMEF São João Batista, tinha casa de moradia, espaço grande. “Fomos atrás de
parcerias nas empresas, não conseguimos dinheiro, fomos na prefeitura, também não tivemos
êxito. Então havia a 3º opção, que era a Brizoleta44. A Escola Estadual de Ensino
Fundamental José de Anchieta, na época tinha poucos estudantes, 28, mas que em 2014 teria
somente 18. Aí falamos com as famílias e esses estudantes foram pra São João Batista, pois é
pertinho, uns 200 metros e o prédio era novo. Assim foi possível que a EFASOL usasse o
espaço, então a José de Anchieta não fechou, mas reabriu comouma Escola do Campo de
Ensino Médio e Técnico”.
Por fim, definiu-se que na “Brizoleta” iriam funcionar os dormitórios, a área
experimental, o refeitório ea secretaria. Os demais espaços, necessários, como sala de aula,

44
Escola construída em 1962 na comunidade de Formosa, no governo do então Governador do Estado do RS,
Leonel Brizola.

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laboratórios, biblioteca, auditório e ginásio de esportes iriam funcionar na EMEF São João
Batista45.
Para a formação da primeira turma houve grande mobilização das rádios regionais,
jornais locais e regionais. E assim, em 10 de março de 2014 foram iniciadas as atividades
formativa com 24 jovens filhos e filhas de agricultores da região, sendo 16 oriundos de Vale
do Sol, 2 de Lagoa Bonita do Sul, 2 de Sinimbu, 1 de Tunas, 1 de Candelária e 1 de Cachoeira
do Sul. Para dar conta das questões pedagógicas e institucionais foram contratados 9
professores e monitores para dar seguimento às atividades necessárias. Na figura 4, uma
matéria publicada no jornal Gazeta do Sul sobre a inauguração da EFASOL.

Figura 4: Momento importante das EFAs no Brasil e no Rio Grande do Sul: Inauguração da
Escola Família Agrícola de Vale do Sol – EFASOL em Linha Formosa, Vale do Sol/RS

45
Mais tarde foi estabelecido um convênio com a Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC que atualmente
disponibiliza laboratórios especializados e todo o seu acervo bibliográfico para utilização dos estudantes e
monitores da EFASOL.

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Fonte: Jornal Gazeta do Sul, 11 de março de 2014.

Considerações Finais

A fundação de uma Escola Família Agrícola geralmente é um processo longo, árduo,


de persistência, luta e resistência e que costuma enfrentar inúmeros desafios. E com a
EFASOL não foi diferente. Ao todo foram 950 dias desde a primeira reunião em 02 de agosto
de 2011 até o início das atividades formativas com estudantes em 10 de março de 2014. Desde
então, a EFASOL tem atuado na região do Vale do Rio Pardo buscando contribuir com o

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desenvolvimento do território, promovendo uma agricultura autônoma e com impacto


reduzido no ambiente.
Em 2018, a Escola consta com 93 estudantes matriculados. Destes, 34 estão no
primeiro ano, 17 no segundo e 28 no terceiro ano do Ensino Médio e Técnico em Agricultura.
Além disso, já se formaram na escola duas turmas. Uma em 2016 com 21 jovens e outra em
2017 com 16 jovens. A maioria dos egressos encontra-se com os estágios curriculares
realizados. Todos os estudantes que passaram ou estão matriculados na escola possuem
vínculo com a agricultura, em sua maioria, como filhos e filhas de agricultores.
Cabe ressaltar que o período posterior a inauguração, foi e tem sido bastante
desafiador, assunto que trataremos em oportunidades futuras. O que permanece, como
reflexão final deste ensaio é que sem a atuação de diversas pessoas e instituições esta
experiência não seria possível.
Por fim, gostaríamos ainda de reforçar a necessidade de uma Educação do Campo que
seja dos agricultores para os agricultores, mediada por todo o contexto político, social,
cultural e econômico característico do mundo camponês. Precisamos de uma Educação do
Campo que promova a formação integral dos sujeitos do campo, de modo que os mesmos se
tornem promotores do desenvolvimento do meio onde estão inseridos. Além de desenvolver
as competências necessárias para a atuação na agricultura, a Escola do Campo precisa formar
cidadãos críticos, reflexivos, com responsabilidade social e ambiental. Que consigam
diagnosticar e buscar soluções frente aos desafios do cotidiano na agricultura, tornando-se
assim agentes de transformação das suas realidades, na vista de promoverem, eles mesmos e
de forma sustentável, desenvolvimento social, cultural, humano e econômico para suas
comunidades.

Referências Bibliográficas

COSTA, J. P. R. Escola Família Agrícola de Santa Cruz do Sul – EFASC: uma


contribuição ao desenvolvimento da região do Vale do Rio Pardo a partir da Pedagogia da
Alternância. 2012. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional) – Universidade de
Santa Cruz do Sul, Santa Cruz do Sul, 2012.

COSTA, J. P. R., ETGES, V. E., VERGUTZ, C. L. B., Educação do Campo e o


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Regional de Educação Básica – 27 à 30 de abril de 2016, Universidade de Santa Cruz do Sul –
UNISC. Santa Cruz do Sul, 2016.

FINKLER, I. Nossa Terra, Nossa História: Registro da Folha Vale do Sol. Editora Vale
solence, Vale do Sol, 2012

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Gazeta do Sul, Grupo de Comunicações, 2017.

GOMES, A. C., A operacionalização do Mercado Institucional de alimentos no contexto


do Vale do Rio Pardo: o caso da Cooperativa Leoboqueirense de Agricultores Familiares.
2014. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional) – Programa Pós-Graduação em
Desenvolvimento Regional, Universidade de Santa Cruz do Sul, Santa Cruz do Sul, 2014.

REDIN, E. A Fumicultura e Agricultura Familiar: O Caso de Jaguari/RS. Sociais e Humanas,


Santa Maria, v.23, nº.02, jul/dez 2010, p.99 – 116.

VERGUTZ, C. L. B. Aprendizagens na pedagogia da alternância da Escola Família


Agrícola de Santa Cruz do Sul. 2013. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade
de Santa Cruz do Sul, Santa Cruz do Sul, 2013.

VERGUTZ, C. L. B. O caminho da Aprendizagem na Pedagogia da Alternância e o


Sujeito Alternante. IX ANPED SUL – Seminário de Pesquisa em Educação da Região Sul,
2012. PPGEdu, Universidade de Santa Cruz do Sul, UNISC – CAPES, 2012.

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Agrícola de Santa Cruz do Sul no Vale do Rio Pardo, RS: Uma contribuição para o
Desenvolvimento Rural. 2015. Dissertação de Mestrado (Mestrado em Desenvolvimento
Rural) - Universidade do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.

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RECONHECIMENTO DA IMPORTÂNCIA DO MOVIMENTO DOS


TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA-MST, NAS TRANSFORMAÇÕES
DO/NO CONTEXTO DE UMA ESCOLA DO CAMPO

Jordaiane Chaves da Silva46


Fabiane Ferreira Soares47
Annie Mehes Brito48

Resumo

O Presente trabalho contempla experiências e pesquisas vivenciadas durante o Tempo Comunidade do


curso de Educação do Campo – Licenciatura da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA,
Campus Dom Pedrito), desenvolvido com o tema central “Território e Territorialidade”. Essa
investigação centrou-se na observação do território onde está inserida a Escola Estadual de Ensino
Médio 08 de Agosto, localizada no Projeto de Assentamento (PA) Fazenda São Francisco, Município
de Candiota-RS à 25 km da sede e suas particularidades, assim como, em algumas características
identitárias, em especial, a atuação do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra- MST e dos
guardiões de sementes, por meio da família Brito49. Possibilitando compreender a importância da luta
travada pela comunidade para criação, manutenção e transformação do contexto e do espaço escolar.

Palavras-chave: Educação; MST; Guardiões de sementes, Modelos de produção.

Introdução

O presente trabalho é um relato das experiências vivenciadas durante o Tempo


Comunidade (3º semestre), do curso de Educação do Campo – Licenciatura, da Universidade
Federal do Pampa (UNIPAMPA, Campus Dom Pedrito. Esse trabalho foi realizado no
Período de janeiro à julho de 2017, e contempla o Relatório do Projeto III “Território e
Territorialidade”, que foi desenvolvido a partir de análise do contexto onde está inserida a
Escola Estadual de Ensino Médio 08 de Agosto, localizada no Projeto de Assentamento (PA)
Fazenda São Francisco, Município de Candiota-RS à 25 km da sede.
A organização curricular do curso de Educação do Campo – Licenciatura ocorre por
meio da alternância, dividindo-se em tempo Universidade e Tempo Comunidade-,
possibilitando, neste segundo momento aprofundarmos nosso conhecimento, vinculando as
46
UNIPAMPA- Discente do Curso de Licenciatura em Educação do Campo- (jordaianechaves@gmail.com)
47
UNIPAMPA- Discente do Curso de Licenciatura em Educação do Campo- (nanyfsrodrigues@gmail.com)
48
UNIPAMPA- Docente do Curso de Licenciatura em Educação do Campo- (anniebrito@unipampa.edu.br)
49
Brito é um sobrenome fictício que utilizamos para preservar a identidade da família que contribuiu na
elaboração deste trabalho.

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aprendizagens construídas na Universidade com a realidade do campo. Essa configuração nos


permite fazer reflexões construtivas e contextualizadas da realidade nas dimensões territoriais,
políticas, econômicas, educacionais, culturais e sociais. Sendo essa uma etapa para
cumprimento da nossa formação como Educadoras do/no Campo.

Metododologia
Para realizar este estudo, optamos por observar o território no qual se localiza a Escola
Estadual de Ensino Médio 8 de Agosto50, também conhecida como região da Campanha ou
Regional Neuroni Machado51. Visto que, uma das autoras Jordaiane Chaves, foi aluna da
Escola, pertence à comunidade, participando ativamente de movimentos sociais que visam o
desenvolvimento da mesma.
Fomos também motivadas em realizar os estudos em dada comunidade, visto que, a
mesma dispõe de diversos campos de observação. Além da Escola 8 de Agosto, o território
conta com o Centro de Educação Popular e Pesquisa em Agroecologia- CEPPA Bionatur52,
resultantes da luta e persistência de guardiões das sementes crioulas, sendo os maiores
contribuintes para o desenvolvimento campesino da região. A visita a propriedade do casal
Brito, que desenvolvem um trabalho agroecológico em cerca de 50% de suas terras,
reafirmando assim a necessidade de aprofundar nossos estudos a respeito deste cenário
campesino.
A partir, de uma nova visão, como Acadêmicas e, pertencentes ao Campo, fica evidente
a importância da comunhão homem/natureza53, tendo também como propósito, colaborar para
uma visão geral e especifica dos autores e atores da realidade que impera nesse espaço
biogeográfico.

50
Situada no Assentamento Propriedade Agrária- (PA). Fazenda São Francisco/ Candiota- RS.
51
Esse nome foi escolhido devido à morte do companheiro, ocasionada durante a “Ocupação da Fazenda São
Pedro em Candiota- RS”, em prol da luta pela liberação de terras para os acampados, visto que o INCRA havia
os deixado ali, a mais de ano, sem nenhum aparato.
52
Sua representante comercial Cooperativa Agroecológica Nacional Terra e Vida Ltda.- CONATERRA
53
“A relação entre o homem e o meio ambiente provavelmente nunca esteve tão crítica. Vista como meio de se
obter lucros, a natureza tem sido apropriada pelo capital. No entanto, a visão de que a natureza deve ser
dominada, superada, conquistada, nos remete a épocas bem anteriores ao próprio capitalismo moderno. O
problema da sociedade atual é que as questões socioambientais revelam um modo de produzir cada vez mais
insustentável, que visa ao lucro sem medir conseqüências e é baseado na produção industrial ininterrupta e no
consumo de massa”. (ALBUQUERQUE, 2007, p. 8)

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Para a elaboração do presente trabalho utilizamos pesquisas documentais a partir do


Projeto Político Pedagógico-(PPP) da Escola Estadual de Ensino Médio oito de Agosto, Ata
de Constituição e Estatuto Social da Cooperativa Agroecológica Nacional Terra e Vida Ltda.-
COONATERRA, pesquisas bibliográficas, conversas informais, observação, artigos
disponíveis eletronicamente, observação direta do espaço geográfico.
Discussões

Analisando o desenvolvimento da agricultura e pecuária, foi possível realizar um


contraponto empírico entre os guardiões de sementes e os monocultores e a disparidade entre
ambos, pode-se perceber as diversas modificações do contexto por parte dos fenômenos
naturais e das ações humanas.
A Escola Estadual de Ensino Médio 8 de Agosto, situada no Assentamento PA Fazenda
São Francisco/ Candiota- RS, acima mencionada, afirma, conforme dados extraídos em seu
PPP, p. 04:
Este assentamento é resultado de um conflituoso processo de negociação entre o
Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra – MST, o Governo Federal e o
Instituto de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, órgão responsável pela
Política Agrária e Fundiária Rural no País.

Os sujeitos pertencentes a este contexto caracterizam-se na sua grande maioria por


comunidades oriundas de lutas sociais, sendo possuidores de conhecimentos e
particularidades que evidenciam as suas trajetórias.
Tendo em sua base teórica o enfoque principal na valorização dos sujeitos do campo,
levando em consideração toda sua bagagem e particularidade. Na perspectiva de formar
sujeitos que tenham vez e voz ativas na sociedade.
A história da trajetória de luta dos Movimentos e suas diferentes formas, conforme
fica evidenciado na citação de Miranda, Cardoso e Castilho (2009, p. 176-183):

[…] O movimento social refere-se então a perspectiva de mudança social, isto é, a


possibilidade de superação das condições de opressão e da construção de uma nova
forma de sociedade[…]
O estudo da história revela que os movimentos sociais e a participação popular
estiveram sempre presentes em todas as sociedades e devem ser entendidos como
fenômenos do processo de mudança. […]
As lutas sociais no Brasil redefinem-se, o movimento popular rural cresce e aparece,
ficando conhecido como: Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem – Terra (MST).
Esse movimento surgiu em Santa Catarina em 1979 e transformou-se no maior
movimento da década de 90, reivindicando a posse da terra e lutando pela reforma
agrária no país, sendo apoiado por parte da sociedade brasileira que vê na

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distribuição da terra a possibilidade de fixar o homem no campo diminuindo a


pobreza na cidade […].
A conquista dos direitos é resultado de lutas sociais empreendidas por movimentos
populares e organizações sociais que reivindicaram direitos e espaços de
participação social. O conflito social deixa de ser simplesmente reprimido e passa a
ser reconhecido.

Evidenciando assim, um processo de reconhecimento da importância do Movimento dos


Trabalhadores Rurais Sem Terra-MST, nas transformações realizadas nesse território,
inclusive na instalação da Escola 8 de Agosto.
A partir da leitura do PPP da Escola e vivência na comunidade pela acadêmica
Jordaiane, existe um retrocesso visível no que diz respeito ao diálogo entre Escola e
Comunidade oriundo de dificuldades da Instituição em formar um quadro pedagógico estável
e coeso, em virtude de a grande maioria do quadro docente não ser um sujeito inserido no
contexto da comunidade, gerando assim um distanciamento entre as partes, resultantes das
diferentes ideologias, culturas, vivências e valores.
Com iniciativas que visem o sujeito do campo e sua valorização como cidadão, mas
acima de tudo, tem em sua essência vital a necessidade e obrigação de construir e fomentar
nestes sujeitos a necessidade de preservação e conservação de nossos recursos naturais,
ampliando e explicitando que estes mesmos são finitos e que necessitamos preservá-los para
nossa própria sobrevivência.
Rompendo com a lógica de destruição do planeta criado pelo modelo de
desenvolvimento hegemônico, a Educação do Campo pretende contribuir para a
construção de um mundo sustentável, fundado em relações de solidariedade e justiça
social. Isto significa ter o Ser Humano como o centro da produção do campo, o que
só é possível a partir da diversificação de produtos, da utilização racional dos
recursos naturais, da Agroecologia, das sementes crioulas, da agricultura familiar e
da reforma agrária, possibilitando um modelo de desenvolvimento do campo que se
contrapõe ao hegemônico do capitalismo (PPP, p. 05).

Ressaltando a perspectiva de continuidade das características e espécies pertencentes à


localidade, preservação dos cursos de água, a agrobiodiversidade, das sementes crioulas, da
fauna e flora, pondo também, em evidencia o alarmante número de degradação e impactos
ocasionados pela ação humana, desde as últimas décadas, nas Áreas de Preservação
Permanente- APP.
A maneira como as monoculturas florestais estão sendo praticadas no município
bacia hidrográfica do arroio Candiota ameaça o equilíbrio ambiental da região, pois
afetam a biodiversidade natural dos Campos Sulinos. Em contra partida as áreas de
mata ciliar (Áreas de Preservação Permanente) regrediram de 362 ha em 1985 para
12.225 ha em 2009. (EGER, FORNECK, HASENACK, 2013. p. 7677).

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Diante do cenário atual do contexto rural, com suas diferentes e divergentes formas de
produção, de questões ideológicas e princípios e valores de suas redes e teias de produção,
onde, possuem em um mesmo contexto territorial, diversas formas distintas de produção;
princípios, preocupações e fundamentos opostos em um mesmo espaço, sejam por parte de
sujeitos das redes, ou de interesses financeiros de grandes investidores que se inserem naquele
contexto, enfim, são fatores que estão colocando em cheque os danos que esta transformação
da agricultura está acometendo o território. Uma vez que, esta inversão no modelo de
produção, está acarretando em uma série de efeitos negativos no contexto rural, tais como:
danos ambientais, homogeneização da população do campo, manutenção do empobrecimento
do campo, desaparecimento de espécies, expressivo êxodo rural, nova composição do
agronegócio, perda de nossa segurança e soberania alimentar.
Colocando em tela os processos e campos de relações nos quais se constituem os
objetivos, os quadros de referência e os próprios agentes do desenvolvimento. As
fronteiras que demarcam os limites entre o global e o local, o convencional e o
alternativo, o Estado e a sociedade civil, o econômico e o social, deixam de se
constituir como mapas seguros de navegação, tornando-se, elas próprias, objeto de
investigação. (SCHMITT, 2011, p. 88).

Atualmente, estamos diante de dois cenários, o da resistente e necessária agricultura


campesina, a qual possui a preocupação de manutenção e preservação dos recursos naturais, e
que acima de tudo, tem a terra e os diversos recursos, dos quais dependemos para nossa
sobrevivência, como recursos finitos e de suma importância para todas as cadeias, redes e
seres que vivem em nosso planeta; e em contraponto, esse sistema burguês, que somente visa
o lucro e satisfazer a ganância das empresas, com sua ambição e produção de monoculturas
em grande escala para exportação, sendo um modelo que se destina a economia política, pois
possui, em pano de fundo, todo um aparato político, tecnológico e financeiro do Estado para
sua produção e comercialização.
“O capital social difere dos outros tipos de capital humano até hoje conhecidos
porque é habitualmente criado e transmitido através de mecanismos culturais, como
a religião, a tradição ou o hábito historicamente transmitido” (FUKUYAMA, 1999,
p. 37, apud CUNHA, 2000, p.55).

Havendo a preocupação por parte de organizações camponesas e guardiões sobre


necessidade de haver discussões entre os conceitos de confiança e capital social e debates
entre desenvolvimento rural dentro das redes de comunidades, visando à agricultura familiar/
campesina – não distinguindo ou caracterizando aqui, suas organizações, e particularidades,

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mas frisando, a conscientização destas categorias sobre necessidade de preservação e


manutenção dos recursos naturais- com características, ideologias e praticas voltada para uma
forma de desenvolvimento. Uma vez que, segundo Almeida “a noção de desenvolvimento [...]
pretende evidenciar todas as dimensões - econômica social e cultural - da transformação
estrutural da sociedade”, evidenciado, em todos os aspectos e dimensões e levando em
consideração o desenvolvimento mais focado a um quadro territorial do que setorial.
Visando uma nova realidade para o espaço do meio rural, com iniciativas da Agricultura
Familiar, e Reforma Agrária, entre outras articulações em defesa dos recursos naturais que
visem o Desenvolvimento Rural, baseados na expansão da agricultura campesina e sua
introdução no mercado, em uma perspectiva de estimulo para agrupar conceitos e valores,
contudo preocupando-se com as capacidades dos recursos naturais existentes.
“A questão torna-se mais complexa, tendo em vista que nos processos de
desenvolvimento afloram interesses divergentes entre os diferentes atores
individuais e coletivos que atuam num determinado território, os quais têm diversas
e conflitantes percepções da realidade” (CUNHA, 2000, p. 58).

Existindo a necessidade de haver valores construídos e cultivados coletivamente, em


prol de um bem comum, onde normas e valores estejam de acordo com suas necessidades
específicas e valorizando o suor da comunidade em questão, tendo com elemento principal a
confiança, organização, relação cooperativa, cultura, recursos naturais, meio ambiente e redes
sociais entre seus membros na perspectiva do desenvolvimento rural, ressaltando ainda a
divergência de interesses e valores, individuais e coletivos por parte dos membros desta rede.
Segundo ABRAMOVAY (1998, p. 13. Apud CUNHA, 2000, p. 57) “O desenvolvimento
territorial apoia-se, antes de tudo, na formação de uma rede de atores trabalhando para a
valorização dos atributos de uma certa região”
Tal perspectiva de trabalho coletivo baseia-se, para promoção deste capital social, em
uma perspectiva de desenvolvimento territorial de um espaço geográfico, (comunidade,
região, país...) os quais variam, de acordo com heranças culturais, políticas e econômicas
relativas a uma determinada região, vista, no caso, como um território específico. Havendo a
necessidade de diferenciar desenvolvimento de progresso, pois segundo Almeida (2010, p.
35):

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[...] no progresso [...] a análise social coloca agora em evidência a co-existência


conflitual entre civilizações muito diferentes, onde a dominação é uma relação bem
mais frequente que a solidariedade, e onde muitas vezes essa relação é fonte de
opressão e miséria.

Colocando em evidencia que só o fato de haver recuperação do capital investido pelas


multinacionais ainda justifica a presença deste modelo de produção transgênico (soja, entre
outros produtos), nas lavouras dos agricultores e na mesa dos consumidores. Atualmente, nos
deparamos com uma realidade alarmante, mesmo a Lei de Biossegurança de 1995 – a qual é
vista por muitos cientistas como uma das mais completas do mundo, há índices assustadores
do uso indiscriminado de agrotóxicos nas diversas regiões brasileiras, os quais afetam
diretamente a população campesina, além da disseminação de monoculturas no espaço rural, o
que põe a vida dessas populações em risco contribuindo também para o êxodo rural de
milhares de agricultores.
Reportando-nos a trajetória de lutas por direitos ao acesso à terra e resistência dos
camponeses a esse modelo hegemônico imposto nesta sociedade capitalista, que fica explícito
na citação de Jesus e Torres, 2008, p.3, apud Meneses, 2009, p.72:

“Os movimentos em defesa da reforma agrária também se intensificam na década de


1980. A reforma agrária passa a ser uma bandeira de luta dos movimentos sociais do
campo, em especial do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra. O MST se
organiza enquanto movimento a partir da Pastoral da Terra, um braço da igreja
progressista, identificado com a teologia da libertação, que desde o Concílio
Vaticano II (1968) fazem a opção de atuar junto aos pobres e despossuídos do
planeta. Esse foi um período de enfrentamento dos trabalhadores rurais com o
latifúndio, resultando em ocupações de terra que foram ganhando contornos
diferenciados como estratégia de promoção da reforma agrária, ainda não exercitada.
A partir dessa década a resistência exercida pela população campesina tem
procurado mostrar à sociedade o aprofundamento da desigualdade social provocado
pelo desenvolvimento capitalista no campo.”

Podemos observar que o desenvolvimento da Reforma Agrária54 no município de


Candiota- RS evidencia dois modelos de produção no entorno da escola.
Conforme Heidrich (2000, apud ALVES 2007, p. 40):

a Campanha Gaúcha se caracteriza pela atividade pastoril, geralmente extensiva,


concentração fundiária e baixa densidade demográfica. O que revela a baixa

54
No caso brasileiro a Reforma Agraria se dá por meio de um decreto que transfere de forma compulsória a
propriedade das terras para o Estado, mediante indenização. Existe ainda a modalidade de compra negociada
com o fazendeiro (decreto nº433, de 24 de janeiro de 1992), em que se negociam valores de indenização sem que
haja necessidade de decreto desapropriatório […] Stedile in Dicionário da Educação do Campo p. 657.

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dinâmica socioeconômica e territorial, envolvendo poucos atores sociais na


organização do espaço agrário. Porém, com a implementação dos assentamentos
rurais houve alguma alteração nas questões produtivas, econômicas, sociais,
políticas, culturais e ambientais dessa região.

Pequenas, mas, significantes transformações refletem-se no contexto histórico do


município conforme citação de ALVES, 2007 p. 38.

No final da década de 1980, o processo de reforma agrária começa a se instaurar na


Campanha Gaúcha, de forma lenta e sem o planejamento desejado, fazendo com que
outros atores sociais se tornem presentes na organização agrária regional,
acrescentando outras formas e meios de produzir no campo, além de modificar
(muito pouco) a estrutura fundiária regional.

A grande transformação, em uma perspectiva agroecológica aconteceu com a


oficialização da Cooperativa Bionatur sementes que foi criada em 1997, sua rede é formada
por famílias do MST, sendo sua sede no município de CANDIOTA-RS. Atualmente, as
famílias trabalham com mais de 98 variedades em sua produção, abrangendo o mercado
nacional e internacional. Destacando-se como a única cooperativa de sementes da América
Latina, com tamanha diversidade de variedades produzidas agroecologicamente.

A Rede de Sementes Agrocológica Bionatur é uma cooperativa de agricultores e


agricultoras assentadas da Reforma Agrária, produtores de sementes de diversas
espécies de hortaliças, plantas ornamentais, forrageiras e grãos, em sistemas de
produção de base agroecológica. A opção pela agroecologia tornou a Bionatur
experiência pioneira no Brasil e na América Latina. Esta experiência iniciada por 12
famílias assentadas nos municípios de Candiota e Hulha Negra, no estado do Rio
Grande do Sul, hoje envolve mais de 180 famílias, nos estados do Rio Grande do Sul
e Minas Gerais (disponível em: https://www.bionatursementes.bio.br).

Tendo como respaldo de suas perspectivas a oficialização e fundação de sua linha de


produção Agroecológica, em 2005 com a Bionatur Sementes Agroecológicas.
A idéia de agricultura sustentável para Almeida (1998) é aquela que envolve todas
esferas da organização agrária, o autor analisa o desenvolvimento rural de forma
integrada e sistêmica “a possibilidade de nascimento de um novo modo de
desenvolvimento ou de organização social desenvolvimentista, modernizadora e
nacionalista que tenha uma base social, econômica, cultural e ambiental mais
sustentável. (ALVES, 2007 p. 46.)

Contraponto a este, com introdução na localidade, visando um progresso para a região,


instalam-se empresas capitalistas na localidade, as quais em primeiro momento pressupunham
que sua instalação geraria muitos empregos para a população e consequentemente maior
“desenvolvimento regional”, como fica explicito, na citação de Alves.

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“No fim da década de 1990 e início do século XXI, os projetos de florestamento na


região da Campanha Gaúcha começam a surgir, por meio de empresas como
Votorantin, Aracruz e Stora Enso, devido a algumas condições favoráveis, como a
falta de investimentos econômicos pela necessidade de geração de emprego na
região. Por isso estes empreendimentos são apoiados por lideranças governamentais
e políticas para que se instalem na região [...]” (ALVES, 2007, p. 39).

O que na prática não se fez valer, pois, os métodos produtivos- tanto ao se referir às
monoculturas de soja, quanto às extensas áreas de produção de madeira- geraram sérias
consequências negativas para a população local, tanto, em questões de saúde, de segurança,
prejudicando as produções agroecológicas existentes no entorno, quanto, toda a fauna e a flora
originárias daquela região explorada.
Produzir agroecologicamente ainda são valores cultivados pelo casal Brito,
pertencentes à Comunidade Santa Marta, município de Candiota – RS, localidade esta distante
aproximadamente 2 km da Escola 8 de Agosto.

“A agroecologia [...] Constitui, em resumo, um conjunto de


conhecimentos sistematizados, baseados em técnicas e saberes
tradicionais (dos povos originários e camponeses) “que incorporam
princípios ecológicos e valores culturais às praticas agrícolas que, com
o tempo, foram desecologizadas e desculturalizadas pela capitalização
e tecnificação da agricultura” (Leff, 2012, p 42 apud Guhur & Toná,
pág. 57).

O que os faz diferente dentro deste cenário é que produzem aproximadamente 90% do
que consomem, utilizando 50% de sua propriedade além de terem sua própria fonte de água
potável.
Há, no entanto, um contraponto de toda sua dedicação e resgate a agrobiodiversidade e
conservação das sementes originárias (matriz), - com toda sua vigorosidade de produção. Pois
há nesta mesma propriedade o arrendamento de aproximadamente 50% de suas terras. Sendo
produzido nas mesmas, soja transgênica- o que resulta em um impasse pelo fato de haver duas
formas de produção desenvolvida na mesma propriedade, sendo uma realizada de forma
tradicional neste cenário particular da família- onde de um lado observa-se, o pequeno
agricultor campones, ainda com condições rudimentares de produção- produção essa
extremamente diversificada, e de outro a produção de monocultura, tendo todo um aparato
tecnológico de produção disponível por esta cadeia de produção em massa- os famosos
“desertos verdes”, extremamente prejudiciais a todas as formas de vida.

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Conclusão

O que pode ser destacado é que, em um primeiro momento, a grande maioria da


comunidade sentia-se parte da constituição escolar, contribuindo na construção e manutenção
do espaço tanto físico, como na elaboração dos planos pedagógicos. Em suma, esses
princípios e valores que eram cultuados, foram se perdendo com o passar dos anos, hoje, seus
discentes, não se sentem responsáveis pela sua conservação; não se sentem filhos dessa luta e
causa; não sabem na essência o que passaram seus antepassados para que esse
desenvolvimento se concretizasse.
A Escola é um grande referencial na história de luta e resistência de uma classe
oprimida por normas e leis governamentais que dificultam seus acessos a direitos essenciais,
que teoricamente estão estipulados por leis (Lei de Terras - nº 4.504, de 30 de novembro de
1964.). Contudo, na prática não se fazem valer, visto que, para que os direitos adquiridos por
lei sejam concretizados de fato, houveram lutas, tanto da Escola como da comunidade
Embora, em outrora o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST)
representou de forma mais atuante o papel de autor social/coletivo, responsável pelas
conquistas da comunidade, atualmente reflete-se um processo de transição de valores e práxis.
Existem diferentes formas de agricultura familiar estabelecidas, onde, nem todas possuem
afinidades em todos os momentos, mas há, em seu capital social (rede de confiança) a
participação coletiva de todos os autores do processo de produção da propriedade.
A relação entre os conceitos de confiança e capital social e a concepção de
desenvolvimento territorial é imediata a partir da constatação de que os níveis de confiança e
capital social variam em termos espaciais, conforme a diversidade regional e territorial
existente.
Nesse caso, a questão torna-se mais complexa, tendo em vista que nos processos de
desenvolvimento afloram interesses divergentes entre os diferentes atores individuais e
coletivos que atuam num determinado território, os quais têm diversas e conflitantes
percepções da realidade.
A nova forma de produção, controlada desde a produção de sementes, passando pelos
agroquímicos, até a industrialização e comercialização, por algumas poucas multinacionais,

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está expulsando os produtores do tipo familiar de suas terras. Além do fato, de que as
empresas que detém o mercado comercial afirmam que, tanto o uso, quanto a ingestão de
alimentos produzidos com estas substâncias eram seguros a saúde, com uma realidade
alarmante nos dias atuais, pelos sérios riscos que refletem para saúde humana, biodiversidade,
fauna, flora, a eliminação de insetos e micro-organismos que pertencem ao equilíbrio
ecológico, o aumento da contaminação dos lençóis freáticos.
O atual sistema que nos é imposto, somente visa satisfazer a ganância da indústria
química e do sistema financeiro, não levando em consideração os riscos que provoca, tanto a
curto, quanto a longo prazo.
Tendo em vista que, o que antes se refletia natural, as redes de cooperação, entre outras,
hoje passa a ser raro. A falta de preocupação com a utilização do agrotóxico nas lavouras é
alarmante, nos envenenamos diariamente e pouco fazemos para tentar mudar esta realidade.
Acabamos nos tornando coniventes e passivos a este sistema que impera.
Infelizmente, atualmente a agricultura e o desenvolvimento rural vêm perdendo espaço
para a este modelo de produção mecanizado, manipulação biológica e química dos elementos
que afetam não somente a saúde do solo, como a saúde humana. A modificação do contexto
rural, influenciada por esses fatores é vista como “uma visão de evolução da população do
campo” - onde tal transformação da agricultura, seria, segundo o mercado comercial
(complexo industrial), o modelo de produção que facilitaria a vida do agricultor, supriria suas
necessidades e ainda lhe geraria um capital financeiro. Contrapondo-se a essa afirmação
inverídica, pode-se observar que, se trata de uma cadeia de interesses e alianças de setores
privados, que detém o capital financeiro, determinado pela indústria (mercado comercial),
impondo assim, o modelo de produção a ser desenvolvido.
Diante deste cenário campesino podemos perceber o quanto o agricultor familiar, com
uma identidade dos movimentos sociais, ainda desconhece o seu papel no contexto que se
insere. Sendo o mesmo oprimido, por um sistema hegemônico burguês.
Ressaltamos assim a necessidade de fomentação e incentivo à produção de forma
agroecológica e orgânica, considerando seus saberes tradicionais, garantindo assim, a
soberania alimentar, como uma forma de afirmação no/do campo
Nossa responsabilidade como futuras Educadoras do Campo, vai além de uma
graduação, mas, assumimos um compromisso de conhecermos e reconhecermos o contexto de

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nossos educandos, valorizando seus saberes, de lutarmos pela educação como um direito de
todos e por uma escola mais justa e humana.

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BRINCAR: mediações docentes e suas singulariedades

Letícia Silveira da Silveira55


Veronice Tavares Ferraz da Silva56

Resumo

Esse trabalho cujo titulo é Brincar: mediações docentes e suas singularidades. Possui o objetivo de
refletir sobre as mediações docentes no ambiente escolar, e também busca refletir sobre a importância
do brincar no desenvolvimento integral da criança. Dessa maneira o seguinte trabalho será organizado
inicialmente com uma reflexão sobre a mediação docente e o cotidiano escolar, logo iremos dissertar
sobre o brincar e suas singularidades. Também refletiremos sobre o conceito de infância e a influência
do professor sobre o brincar na sala de aula.

Palavras-chave: Brincar; Mediações docentes; Escola.

Introdução

Durante o desenvolvimento do curso de Licenciatura Plena em Pedagogia Diurno,


ofertado pela Universidade Federal de Santa Maria. Curso, esse que estamos em processo de
formação. Ocorreram inúmeras discussões e reflexões a respeito do brincar no
desenvolvimento infantil. Em referência a essa temática muito nos questionamos sobre como
o brincar é compreendido pela escola e desenvolvido pelo professor. Essa compreensão por
parte do professor traz consigo concepções e estereótipos da sua cultura e o seu entendimento
pelo brincar. E todas essas questões refletem no desenvolvimento da sua prática pedagógica.
Sabemos que, conforme a cultura e o cotidiano da criança. A mesma representa no seu
ato de brincar, nas brincadeiras e na relação com o outro as suas referências, indagações e
necessidades. Todas essas questões são estabelecidas pela cultura que a mesma esta imersa. E
a partir da cultura que a mesma esta inserida, surgi um território de brincar diferente de outros
contextos. Em todas as culturas, regiões e países a criança possui um território de brincar, mas
o mesmo é de acordo com o contexto e realidade daquela sociedade em si.

55
Universidade Federal de Santa Maria. E-mail: leticia.silveira23@hotmail.com
56
Universidade Federal de Santa Maria. E-mail: veroferaz@hotmail.com

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No decorrer deste trabalho iremos buscar compreender o porquê que o professor não
visualiza o brincar como um elemento de aprendizagem na escola. E queremos também
pensar nos diferentes territórios do brincar na escola.
Dessa maneira o seguinte trabalho será organizado inicialmente com uma reflexão
sobre a mediação docente e o cotidiano escolar, logo iremos dissertar sobre o brincar e suas
singularidades. Também refletiremos sobre o conceito de infância e a influência do professor
sobre o brincar na sala de aula.

Mediação docente e o cotidiano escolar

Pensa-se que para compreender o brincar como elemento de aprendizagem, o


professor deve possuir compreensão sobre a educação e o papel da mesma, mas seguindo um
viés diferente do pensamento tradicional. O docente deve se colocar no papel de mediador e
não de dono, e centro do processo de aprendizagem da criança.
Pensa-se que um contexto escolar de qualidade, é onde a escola e as pessoas que estão
inseridas na mesma acreditam na importância da participação da criança no processo de
ensino/aprendizagem. Participação essa efetiva no cotidiano, já que, as mesmas participam
criticamente dessa nova metodologia escolar. Que busca se atualizar, e sair do padrão de
educação tradicional, que é ultrapassada e visa a pedagogia da transmissão.
Acredita-se que na prática pedagógica deve-se buscar, seguir os princípios da
pedagogia da participação. Onde, os mesmos buscam compreender o professor como
mediador e o aluno como sujeito crítico e participativo na prática pedagógica.
Deve-se pensar, e buscar desenvolver uma nova metodologia que abranja as novas
realidades e contextos da escola atual. Já que as metodologias e estratégias que vemos no
cotidiano escolar são ações que se repetem desde o século XIX. A escola não compreende
que cada criança aprende de uma maneira, e que apenas uma estratégia e metodologia não é
suficiente para o desenvolvimento de todos. A educação tradicional também não possibilita
as crianças explorar espaços de aprendizados diferenciados, pois a mesma engessou a
organização pedagógica. E dessa forma, muitos pensam ainda que para uma criança aprender

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algo necessariamente é preciso um professor e um quadro. Só que sabe-se que a aprendizagem


pode ocorrer de diversas formas. E entre elas está o brincar. Dessa maneira Borba cita que:
Ao brincar, a criança não apenas expressa e comunica suas experiências, mas as
reelabora, se reconhecendo como sujeito pertencente a um grupo social e a um
contexto cultural, aprendendo sobre si mesma e sobre os homens e suas relações no
mundo, e também sobre os significados culturais do meio em que está inserida. O
brincar é, portanto, experiência de cultura, através da qual valores, habilidades,
conhecimentos e formas de participação social são constituídos e reinventados pela
ação coletiva das crianças. (BORBA, 2006, p,47.)

Dessa forma, através da brincadeira a criança também esta produzindo cultura, tendo
em vista que algumas brincadeiras perpassam de uma geração para outra, e com isso
compartilham suas culturas. Culturas essas que são produzidas pelas experiências,
experimentada durante as brincadeiras, trazendo assim a autonomia da criança durante essas
vivencias.
As crianças aprendem com a troca de experiência, e com a exploração de diversos
espaços. E com a mediação do professor os espaços se tornam espaços de novas
aprendizagens. Pois, o papel do professor é esse, o de mediar às situações e aprendizagens.
Sempre valorizando as crianças, e possibilitando a participação dos mesmos. Participação essa
que pode se dar através da escuta atenta do professor sobre seus alunos. Escuta essa, que vá
além de ouvir.
Mas infelizmente ainda nos dias de hoje dentro do ambiente escolar ainda é
“aplicada” uma metodologia, ultrapassada, não valorizando que ali existe crianças muitas
vezes iniciando sua trajetória escolar, e sendo oprimida e barrada, não tendo a liberdade de se
expressar, tendo que entrar em regras e moldes impostos por professores. Professores esses
que ignoram a individualidade de cada criança. Professores esses que tratam as crianças como
todas iguais, e não compreendem que cada criança aprende de uma forma e em tempos
diferentes. Visto, que a educação não é uma receita de bolo a qual colocamos todos os
ingredientes, e bolo sairá como o planejado. Quando falamos de educação não estamos
falando de dados concretos, pois ela não é padrão e nem molde. O processo de ensino e
aprendizagem é amplo e desenvolvido em todos os lugares, com isso a autora Telma Weisz
ressalta que:
O processo de aprendizagem não responde necessariamente ao processo de ensino,
como tantos imaginam. Ou seja, não existe um processo único de “ensino-
aprendizagem” como muitas vezes se diz, mas dois processos distintos o de
aprendizagem, desenvolvido pelo aluno, e o de ensino, pelo professor. (WEISZ,
2009, p. 65)

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A esse respeito, pensa-se que como a Telma menciona a aprendizagem não está
vinculada ao processo de ensino. Podemos ratificar que a criança está em processo de
aprendizagem no momento do brincar. Já que podemos constatar aprendizagem em todos os
lugares, não somente dentro da sala de aula. A aprendizagem também se dá na troca com os
outros, na exploração de outros recursos, e o professor tem o papel de mediador desse
processo, e não ficando no comodismo, de uma educação com certo “molde” de
aprendizagem e modelo de ensino. Precisamos ser inovadores, associando a realidade da
criança como um aliado da aprendizagem da mesma na escola.
O educador deve identificar a dificuldade de seu aluno e a partir disso procurar uma
maneira de ensina-lo, mostrando que é possível fazer com que o aluno consiga aprender a
partir do interesse e incentivo do professor, além de que isso enriquece a aprendizagem, e faz
com que ele sinta prazer em aprender. Como menciona Freire (1996, p.25), “Quem ensina,
aprende ao ensinar e quem aprende, ensina ao aprender” pois o professor aprende muito mais
do que ensina. E assim, pensa-se que não se pode pensar que o professor tem o papel de
ensinar, mas sim, que o mesmo é o mediador. Pois, ao mesmo tempo que ensina, ele aprende.
E no momento de aprender, ele ensina. Já que, à docência deve ser compreendida dessa
maneira. Acredita-se que para ambas as partes são necessárias para que o
ensino/aprendizagem ocorra de forma prazerosa para todos.

Brincar e as suas singularidades

A infância é um período da vida das crianças em que as brincadeiras possuem um


papel de extrema importância para o desenvolvimento integral das mesmas. Acredita-se que
por meio delas as crianças podem satisfazer seus interesses e desejos particulares, pois o
brincar assume um lugar muito significativo nas vidas das crianças, visto que, é por meio
delas que elas agregam valores importantes e contribuem para sua formação no mundo.
É por meio da realização da brincadeira que a criança desde muito cedo, pode aprender
a importância do trabalho em equipe, da organização, de ajudar o outro, de compartilhar seus
brinquedos/objetos. Valores estes que acompanharão para sua vida futura. O contexto social
onde a criança está inserida é importante para o “brincar” infantil, pois não pode ser separado

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das influências do mundo, em razão de que a criança é um ser social e aprende a brincar.
Como menciona Brougére:
A brincadeira é um processo de relações interindividuais, portanto de cultura. É
preciso partir dos elementos que ela vai encontrar em seu ambiente imediato, em
parte estruturado por seu meio, para se adaptar às suas capacidades. A brincadeira
pressupõe uma aprendizagem social. (BROUGÈRE, 2001, p. 97)

Nesse sentido pensa-se que no ato das brincadeiras sendo elas, já conhecidas ou novas
brincadeiras as crianças na interação do social estão vivenciando novas experiências e
soltando a imaginação. E assim se desenvolvendo. Visto que o brincar é necessário para o
desenvolvimento infantil, pois não é um ambiente para construir a aprendizagem.
Constata-se hoje, através dos documentos que norteiam a educação nacional, que a
Educação Infantil é de extrema importância para o desenvolvimento integral das crianças.
Mas nem sempre a Educação de crianças pequenas foi vista dessa maneira em nosso país.
Sabe-se da necessidade de uma Educação Infantil de qualidade. A mesma precisa de
propostas pedagógicas flexibilizadas e que possibilite enxergar a individualidade de cada
criança, que possui um processo de aprendizagem diferente da outra. E cada uma tem o seu
tempo e necessidade de aprendizagem. E o brincar vem de encontro com a prática
pedagógica para auxiliar essa aprendizagem para cada criança. Sabemos que o
desenvolvimento da criança tem uma grande influência da brincadeira, pois durante a mesma
ocorrem as mais diversas mudanças seja ela social e psiquico infantil, esse é o caminho mais
certo para esse desenvolvimento. As crianças também através da brincadeira podem avaliar
seus próprios comportamentos, suas habilidades e comparar a outras crianças.
Mas para todos esses atos do brincar, brincadeira, brinquedo e jogos a maior parte
deles são realizados no ambiente escolar, e todo esse olhar ao comportamento da criança sua
manifestação, deve ser dado ao professor. Onde o mesmo precisa ter um olhar muitas vezes
crítico sobre essas brincadeiras e com as crianças brincando o educador consegue ter um olhar
observador para identificar quais estratégias usar para auxiliar em suas aprendizagens. Mas
sabemos que ainda hoje em nossa sociedade sentimos falta de professores capacitados para
usar a brincadeira como fonte de aprendizagem, não tendo um olhar observador sobre a
brincadeira. Muitas vezes é o próprio educador quem determina com que e qual brinquedo a
criança vai brincar, e até o período de tempo, não tendo consciência que brincando a criança

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também está aprendendo. O papel do professor diante da brincadeira é explicar o brincar e


não dirigir as atividades, caso contrário perde a intenção do brincar.
Sabemos que nas práticas educacionais na maioria das vezes o educador não tem
tempo suficiente para desenvolver uma pratica voltado ao brincar, visto que o processo por
qual a criança precisa passar de escolarização é configurado de uma forma que o tempo para
brincar não existe. E as professoras lutam contra o tempo para vencer o currículo. E o
momento do brincar é fragmentado, pois as vezes o professor não compreende o brincar como
fonte de aprendizado.
Dessa maneira, pensa-se que a escola atual não pensa nas necessidades reais da
criança. Pois, não busca inovar e pensar na individualidade de cada criança. Sentados um atrás
do outro não é a melhor forma de desenvolver uma construção de conhecimento significante
para cada criança. Já que cada criança pensa e vê o mundo e suas necessidades de uma
maneira diferente do olhar do adúlto. Uma criança que vive em determinada região pensa e
vê o mundo de uma forma diferente de outra que vivencia outro espaço.
As estratégias, e metodologias utilizadas em determinado contexto não funcionam com
as demais realidades. Só que infelizmente, a educação tradicional não pensa nos diferentes
contextos e realidades. A mesma é engessada e desenvolvida em inúmeros contextos, sem
pensar na individualidade de cada tempo e espaço. A partir do momento em que pensarmos
cada espaço a partir da sua realidade iremos encontrar a melhor estratégia para
desenvolvermos e conhecermos melhor aquela criança que vivencia e possui uma cultura a
partir das interpretações que ela realiza da sociedade que ela participa. Friedmann, disserta
sobre essa questão.
Os pensadores e as pesquisas apontaram que as crianças têm linguagens e culturas
próprias, são atores sociais e tem voz, necessidades e interesses diversos, que variam
conforme o contexto no qual elas crescem e se desenvolvem. (FRIEDMANN, p.38)

A esse respeito, pensa-se que as crianças produzem cultura na interação e na


interpretação da realidade que a mesma esta imersa. Buscamos ratificar, que as crianças são
sujeitos críticos e ao brincar estão construindo conceitos necessários para os seus
desenvolvimentos. E a escola, ela pensa nesses diferentes contextos, tempos e espaços? A
escola pensa no contexto que a mesma está inserida?
Partindo dessas questões, vamos refletir sobre as escolas nas regiões rurais, já que
sabemos que muitas das escolas do e no campo não possuem uma metodologias e estratégias

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adequadas a realidade que a mesma esta inserida. Muitas vezes as escolas do e no campo
seguem a mesma perspectiva da escola da cidade. Não pensando e contextualizando a
realidade de seus educandos. E de acordo com o contexto que a criança esta inserida, é as
formas de brincar. Pois os brinquedos e brincadeiras são os mesmos. Mas as crianças
interpretam-nos de acordo com as suas realidades.

O conceito de infância e a influência do professor sobre o brincar na sala de aula

A infância é um período natural por qual todo o ser humano passa, em sua vida. Certo
é que todos os indivíduos nascem e passaram por essa fase, de ser criança até um determinado
tempo de vida, independente da condição de vida, já que essa fase é inegável. Porem, essa
visão nem sempre foi vista dessa maneira, na qual por diversos tempos, indagou em qual era o
tempo da criança e a infância da mesma. Esse pensamento que se tem da infância foi sendo
construído e a criança passou a ser vista como um ser em desenvolvimento, pensamentos e
características próprias, e não como um adulto em miniatura.
Em meados do século XII é que começaram a surgir grandes transformações e deram
a infância sentidos diferentes, para o imaginário do homem, em todos os pontos tanto social
como cultural entre outros. A criança era vista como substituível alguém produtivo para a
sociedade, e a partir de certa idade, já era colocada para o ser serviço, ajudando seus pais nas
tarefas.
As famílias sempre eram grandes com muitas pessoas, e isso fazia que com o tempo as
crianças fossem sendo substituídas, sem nenhum sentimento.
O autor Costa acreditava que a infância dos adultos acontecia, mas em idades mais
remotos, ou seja, ou tempos muito distante, havia preocupação com a educação da criança
com seu corpo com o momento de aprendizagem, visto que as aprendizagens ocorriam com
as famílias, seja elas pobres ou ricas todas ocorria a aprendizagem, e a cultura dessas infâncias
tem referencia o vinculo do mundo adulto. A esse respeito Corsaro cita que:
O termo interpretativa captura os aspectos inovadores de participação na sociedade,
indicando o fato de que as crianças criam e participam de suas culturas de pares
singulares por meio da apropriação de informações do mundo adulto de forma a
atender aos seus interesses próprios enquanto crianças. O termo reprodução significa
que as crianças não apenas internalizam a cultura, mas contribuem ativamente para a
produção e a mudança cultural. Significa também que as crianças e suas infâncias

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são afetadas pelas sociedades e culturas das quais são membros (CORSARO, 2009
p. 31).

Portando as culturas são produzidas pelas crianças, na sua vida cotidiana, nos seus
afazeres, sozinha ou na relação com outras crianças, e não somente na presença dos adultos,
mas em todo o momento. As crianças estão inseridas em varias culturas, e caracterizam essas
informações individualmente e em pequenas rodas de convívio. As crianças têm capacidade
para agir, e desde muito cedo já aprendem a partir do convivo social. Sabemos que o ambiente
escolar, é um dos ambientes em que as crianças constroem e interpretam suas culturas
diariamente. Mas como já citamos muitas vezes essas culturas são negadas, barradas e
interrompidas. Pois as escolas com sua estrutura não pensam e valorizam as culturas e as
construções pessoais das crianças.
Nesse sentido, podemos pensar nas escolas do e no campo. Que muitas vezes seguem
um Projeto Político Pedagógico que não valoriza a cultura rural.
Na época atual para que o brincar e a mediação na escola seja significativa para as
crianças, à responsabilidade é muito grande para o professor. Pois ter um currículo em que
seja flexível e que insira o brincar em suas aulas, diárias um ambiente em que seja agradável
para a aprendizagem, onde proporcione a criança alegria e prazer no ato do brincar e aprender.
O professor deve ser o mediador das aprendizagens, usando a metodologia, para que as
interações, com as brincadeiras percorram de forma diversa, proporcionando à autonomia as
crianças de escolher os objetos e materiais e com quem quer brincar. Com isso o professor
fazendo a mediação desse processo, possibilitando e proporcionando um espaço adequado
para essas aprendizagens.

Considerações Finais

Consideramos de extrema relevância pensar na infância da criança. E com isso,


proporcionarmos um ambiente de desenvolvimento. E uma das maneiras de proporcionar isso
no ambiente educacional é através do cotidiano escolar com o brincar. Mas para isso, o
mesmo deve ser compreendido e entendido pelos os educadores. Não somente pelos os
educadores, mas também pela gestão escolar. Já que sabemos que através do brincar a criança
se desenvolve cognitivamente, psicologicamente, sensório motor e também constroem e
compartilham suas culturas, e apropriando-se uma das outras.

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Ratificamos a necessidade de os professores possuírem esse saber a respeito do


brincar, para que os mesmos saiam do senso comum. E tenha as condições de argumentar e
defender que o brincar é importante para o desenvolvimento das crianças.
Dessa forma deve- se pensar como pode organizar um currículo, com metodologias
adequadas para escolas rurais, em que respeite as linguagens, o cotidiano da criança, a sua
forma de pensar, e agir. Pois pensar na criança, exige um olhar de tratamento de respeito a
infância das crianças compreendendo que a criança é um ser que pensa e com autonomia, que
expressa suas emoções ações e reações, fantasia e realidade.
Acredita-se que é interessante destacar que o pedagogo deve saber que todos os
momentos da rotina são momentos que a criança está construindo conhecimento. Então é
interessante destacar a ideia negativa de desenvolver a rotina de uma forma mecânica, pois
dessa forma o professor não estará proporcionando momentos de aprendizagens nos diferentes
instantes do dia. Na hora da troca de fralda, do almoço e do brincar todos esses momentos o
professor tem o papel de estar presente com um olhar atento, e conhecer sobre os processos de
aprendizagens das crianças em cada momento do dia.
Outro ponto que o pedagogo tem que ter conhecimento é que o brincar e o educar
podem caminhar lado a lado, pois ao brincar a criança está se desenvolvendo como já citado.
A mesma no momento da brincadeira está interagindo com diferentes crianças e dessa forma
ela está criando novas amizades, está aprendendo a desenvolver uma consciência a respeito do
seu corpo e movimento, a criança ao brincar explora os espaços de diferentes maneiras, ela
imagina e constrói situações para que ela e os amigos possam resolver. Devemos ter
conhecimento das brincadeiras para cada fase de construção da aprendizagem da criança e
pensar em proporcionar o brincar livre, e nesse brincar estar presente e não ausente, pois
nesses momentos o professor pode mediar de alguma maneira, mas para somar na brincadeira.

Referências Bibliográficas

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Paulo: Paz e Terra, 1996.

______. Pedagogia do oprimido. 17ª. Ed. Rio de Janeiro, Paz e terra. 1987.

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Paulo : Atica. 2009.

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MEIRELLES, Renata. Território do brincar. Diálogos com as escolas.

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do professor. CERP/SSE /M. G. Out. 1986.

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CARVALHO, A. M. A. Teoria e prática na pesquisa com crianças: diálogos com William
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(Org). Boletim Salto para o Futuro: O cotidiano na Educação Infantil n. 23, 2006: 46-54.
Disponivel em: https://goog.gl/TYbB5A Acesso em: 29 jul. 2018.

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MÉTODO PAULO FREIRE E PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA: uma análise da


metodologia de trabalho das Casas Familiares Rurais

Jandrei José Maciel57


Letícia Paludo Vargas58

Resumo

A Pedagogia da Alternância é um método de educação que proporciona um meio de aproximação do


ensino da realidade do educando, contribuindo na relação entre escola-família-comunidade, e é
utilizado pelas Casas Familiares Rurais (CFRs), onde se busca, através da relação escola-família-
comunidade apresentar um modelo de educação que se aproxime da realidade do educando, de sua
comunidade e das atividades desenvolvidas na propriedade. Dentro dessa perspectiva, o objetivo geral
dessa pesquisa é analisar e comparar a pedagogia freireana, baseada no Método Paulo Freire e a
Pedagogia da Alternância, procurando compreender como essa proposta de educação do campo se
diferencia da educação tradicional de educação e como pode contribuir para a formação do jovem do
campo, principalmente aqueles advindos da agricultura familiar. Entende-se que o principal desafio da
Pedagogia da Alternância, é construir uma verdadeira alternância, capaz de integrar o processo de
formação aos conteúdos e vivências dos jovens nos diferentes tempos e espaços, com uma
compreensão de mundo que fuja da lógica capitalista, que pense em projetos de vida que atendam aos
anseios e emergências das famílias dos próprios educandos.

Palavras-chave: Educação do campo; Jovens rurais; Pedagogia freireana.

Introdução

A Pedagogia da Alternância é um método de educação criado na França, no fim da


década de 1930, que proporciona um meio de aproximação do ensino da realidade do
educando, contribuindo na relação entre escola-família-comunidade. A Pedagogia da
Alternância é um dos métodos utilizados pelas Casas Familiares Rurais no Oeste Catarinense,
onde se busca, através da relação escola-família-comunidade apresentar um modelo de
educação que se aproxime da realidade do educando, de sua comunidade e das atividades
desenvolvidas na propriedade.
57
Mestrando em Educação pela Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó). Licenciado em
Filosofia pela Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). Professor do eixo das Ciências Humanas na Casa
Familiar Rural Ludovico de Marco - Secretaria do Estado e Educação (SED, SC). E-mail:
jandreimaciel@hotmail.com
58
Zootecnista (UFSM). Mestre e Doutora em Extensão Rural pelo Programa de Pós-Graduação em Extensão
Rural da Universidade Federal de Santa Maria (PPGExR - UFSM). Professora da Casa Familiar Rural Ludovico
de Marco - Secretaria do Estado e Educação (SED, SC). E-mail: letipvargas@gmail.com

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Dentro dessa perspectiva, o objetivo geral dessa pesquisa é analisar e comparar a


pedagogia freireana, baseada no Método Paulo Freire e a Pedagogia da Alternância
desenvolvida nas Casas Familiares Rurais (CFR) do Oeste catarinense, procurando
compreender como essa proposta de educação do campo se diferencia da educação tradicional
de educação e como pode contribuir para a formação do jovem do campo, principalmente
aqueles advindos da agricultura familiar.
Para alcançar o objetivo, serão elencados alguns elementos importantes dessa
pesquisa. Primeiramente, pretende-se conhecer a proposta freireana de educação, mais
especificamente compreender o “método Freireano” de educação, na qual Paulo Freire
apresenta uma educação que se constrói a partir da realidade do educando, das palavras
geradoras e que leva ao processo de educação comprometido com a superação da opressão.
Além disso, será apresentada a Pedagogia da Alternância, que pode ser entendida
como um método educacional que valoriza os saberes do educando, relaciona os saberes
teóricos com as práticas desenvolvidas pelo jovem educando, sua família e a propriedade, e
também aos saberes e costumes locais da comunidade onde está inserido. A Pedagogia da
Alternância é o método adotado pelas Casas Familiares Rurais em todo estado de Santa
Catarina. Como unidade de análise específica, o enfoque será na Casa Familiar Rural
Ludovico De Marco, localizada no Distrito de Caraíba, no município de Seara, SC. Um dos
principais componentes da pesquisa é entender a aproximação da Pedagogia da Alternância
com a proposta pensada por Freire, e como pode contribuir para a educação do jovem da
agricultura familiar possibilitando uma formação integral, que parta de sua realidade histórica.
O Método sugerido por Paulo Freire, baseado nos princípios de emancipação e
libertação dos indivíduos, através do diálogo, pode ser um instrumento de apoio aos
educadores e demais envolvidos com a prática educativa na educação do campo,
principalmente das Casas Familiares Rurais. Entende-se que a prática educacional trabalhada
nessas instituições pode se aproximar da proposta educacional de Freire e da proposta da
Pedagogia da Alternância, com os seguintes pressupostos: práticas educacionais libertadoras,
conscientizadoras, emancipadoras e críticas, partindo da realidade do educando.
Na maioria dos casos, especialmente quando se trata de jovens rurais, os conteúdos das
escola estão distantes da realidade do educando, pois são abordadas temáticas como o

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agronegócio, grandes potências agrícolas, latifúndios com monoculturas rentáveis e sem


preocupação ambiental, conservação da biodiversidade e cuidado com os indivíduos.

O Método Paulo Freire

O que hoje conhecemos como “Método Paulo Freire” surgiu com o trabalho realizado
por Freire na década de 1960, juntamente com o Movimento Cultura Popular do Recife
(MCP) em uma periferia de Recife. Incialmente uma experiência com cinco educandos, onde
apenas três prosseguiram. A mais notável experiência foi realizada em Angicos, Rio Grande
do Norte, onde foram educadas trezentas pessoas em quarenta e cinco dias (GADOTTI.
1985). Angicos não foi a primeira experiência de aplicação do método, mas foi a experiência
que mais teve olhares, pois tratava-se da terra natal do então presidente da república, João
Goulart. O objetivo era alfabetizar trabalhadores rurais, num período de quarenta horas. A
preparação dos professores se dava anteriormente ao trabalho, captando expressões
vocabulares próprias daquele povo e dos trabalhadores, para partir deste conhecimento em
busca da alfabetização que não se reduzia à escrita e leitura da palavra, mas a leitura do
mundo.
Os resultados obtidos foram mais de trezentos trabalhadores alfabetizados. Estes
números impressionaram profundamente a opinião pública. E coma intenção de expandir a
experiência, permitindo que novos “cidadãos” fossem alfabetizados e tivessem direito ao
voto, decidiu-se aplicar o método em todo o território nacional, contando com o apoio do
Governo Federal. Foi assim que, entre junho de 1963 e março de 1964, foram realizados
cursos de formação de coordenadores na maior parte das capitais dos estados brasileiros (no
estado da Guanabara se inscreveram mais de seis mil; igualmente criaram-se cursos nos
Estados do Rio Grande do Norte, São Paulo, Bahia, Sergipe e Rio Grande do Sul, que
agrupavam milhares de pessoas). O plano de ação de 1964 previa a instalação de vinte mil
círculos de cultura, capazes de formar, no mesmo ano, por volta de 2 milhões de alunos. Cada
círculo educava, em dois meses, trinta alunos (FREIRE, 1980).
O Método Paulo Freire, inicialmente criado para alfabetizar adultos, implica no
diálogo entre educador e educando, onde o educador desperta a curiosidade do educando e a
conscientização para inserir-se no mundo de forma crítica, para “ser mais”, dentro do contexto

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social em que convivem uma classe opressora e uma classe oprimida. A libertação do homem
enquanto ser oprimido se dá pela emancipação, conscientização e politização através da
educação.
Partindo da análise de pensadores freireanos, tais como Carlos Alberto Torres (1997),
Moacir Gadotti (1985) e da própria afirmação de Freire, pode-se dizer que o Método de Freire
se identifica como uma possibilidade de aprender a ler o mundo, a realidade e as palavras,
pautada no diálogo, na troca e construção de saberes, e não como uma fórmula de ensino, de
transmissão de conhecimento feita de um sujeito para outro.

As fases do método

O método perpassa algumas condições práticas que antecedem o ato educativo, antes
mesmo da “roda de conversa” do círculo de cultura. Freire propõe cinco fases, ou passos, para
a aplicação desta práxis educativa, que os educadores deveriam seguir, na experiência de
aplicação (principalmente de Angicos), descritos na obra: “Educação como Prática de
Liberdade” (1980), que parte desde a captação da realidade do educando, até o processo final
de ensino da leitura e escrita como um ato conscientizador e libertador. As fases do Método
de Freire, descritas em suas obras, se estendem desde a captação do universo vocabular,
conhecimento da comunidade do educando até a práxis no círculo de cultura e o ato de leitura
da própria realidade, para a transformação.
A primeira fase é o levantamento do universo vocabular dos grupos com quem se
trabalhará. É um processo onde se propõe captar através de um levantamento com entrevistas,
conversas informais com os moradores da comunidade, com os próprios educandos para
conhecer sua realidade, as palavras que tem mais sentido na sua realidade, na sua experiência
de vida. Não só se retêm as palavras mais carregadas de sentido existencial, também as
expressões típicas do povo: formas de falar particulares, palavras ligadas à experiência do
grupo, especialmente à experiência profissional. A entrevista, como destaca Freire (1980)
relata anseios, frustrações, descrenças, esperanças, mas também, ímpeto de participação,
como aspectos estéticos da linguagem do povo.

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A segunda fase é constituída pela escolha das palavras do universo vocabular, captadas
no primeiro contato com a realidade do educando. Esta seleção deve ser submetida aos
seguintes critérios: a) O da riqueza fonêmica; b) O das dificuldades fonéticas. As palavras
escolhidas devem responder às dificuldades fonéticas da língua e colocar-se na ordem de
dificuldade crescente; c) O do conteúdo prático da palavra, o que implica procurar o maior
compromisso possível da palavra numa realidade de fato, social, cultural, política.
A terceira fase caracteriza-se pela criação de situações existenciais típicas do grupo
com o qual se trabalha. Estas situações desempenham o papel de “desafios” apresentados aos
grupos. Trata-se de situações problemáticas, codificadas, que levam em si elementos para que
sejam descodificados pelos grupos com a colaboração do coordenador. Uma palavra geradora
pode englobar a situação completa ou referir-se somente a um dos elementos da situação.
Já a quarta fase é de elaboração de fichas indicadoras ou fichas-roteiro, que ajudam os
coordenadores do debate em seu trabalho. Tais fichas deverão simplesmente auxiliar, e não
serão uma prescrição rígida e imperativa. Ocorre a elaboração de fichas de cultura e a
apresentação de uma imagem como a divisão fonética. A imagem é projetada com situações
de vida do educando e da comunidade, problematizando a realidade do educando.
Por fim, a quinta fase é onde ocorre a leitura de fichas com a decomposição das
famílias fonêmicas correspondente aos vocábulos geradores. Uma vez elaborado o material,
em forma de dispositivos ou cartazes, constituídas as equipes de supervisores e de
coordenadores, devidamente treinados nos debates relativos às situações já elaboradas, e de
posse de suas fichas indicadoras, começa o trabalho efetivo de alfabetização. Esta fase
também está marcada por um forte compromisso de perceber na educação, na leitura da
palavra o compromisso com a realidade, com a conscientização e transformação da própria
realidade. É possível perceber como a educação está intimamente ligada a realidade do
educando, ao compromisso político da educação.
Cabe destacar que os passos indicados por Freire em seu método pedagógico, jamais
devem ser tomados como uma estrutura rígida a ser seguida e aplicada em nossas práticas
educacionais, e menos ainda, serem utilizados como um método a ser copiado e aplicado de
forma rígida e dogmática em nossos dias. O que Freire fez, na década de 1950 e 1960, foi
uma reorganização da práxis pedagógica, modificando o papel do educador e do educando,
colocando-os em uma condição e igualdade de dialógica. Freire transforma a maneira de

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concepção a educação, onde o professor detinha o controle e domínio do conteúdo e ao


educando bastava captar e ser preenchido com o conhecimento. Freire valoriza a história do
educando, a bagagem que ele traz para a aula, e ambos em um processo dialógico constroem
um novo conhecimento.

As Casas Familiares Rurais e a Pedagogia da Alternância

As Casas Familiares Rurais (CFR) representam uma proposta inovadora no ensino


para jovens do campo, representando uma forma de educação do campo, que surge no
sudoeste da França, por volta do ano de 1937. A agricultura francesa vivia uma grande crise e
a educação formal tinha sua proposta de ensino voltada para o meio urbano, fugindo da
realidade e dos interesses dos jovens do meio rural. Este tipo de educação era pouco atrativo
para os jovens agricultores, pois se quisessem seguir estudando, deveriam abandonar suas
propriedades, e mesmo que desejassem prosseguir na profissão, a educação urbana não os
preparava para isso.
A partir dessa constatação, pequenos agricultores, preocupados com a formação e o
futuro de seus filhos e de suas propriedades, em conjunto com líderes sindicais e lideranças da
igreja, propuseram um modelo de educação que atendesse aos desafios enfrentados por estes
agricultores, que estivesse de acordo com a sua realidade, possibilitando um aprendizado que
permitisse a continuidade de suas atividades no meio rural (GIMONET, 2007). Os
camponeses franceses temiam que, deixando seus filhos estudarem na cidade, renegariam suas
raízes e abandonariam o campo. Deste modo iniciaram um movimento junto aos sindicatos e à
Igreja buscando uma alternativa viável para o problema que estavam enfrentando.
A partir da iniciativa de três agricultores e do Padre Grannereau, do povoado de
SérignacPeboudou em Lot-et-Garone - um pequeno vilarejo da França - aconteceu a primeira
experiência em alternância onde os jovens ficavam reunidos uma semana em local apropriado
(casa paroquial) e três semanas na propriedade familiar (NASCIMENTO, 2009). Surgiu a
primeira CFR, com uma turma de apenas cinco alunos, com idade entre treze e quatorze anos,
onde o sistema de ensino era realizado de forma alternada, no qual os jovens passavam três
semanas em suas propriedades e uma semana em regime de internato, improvisado nas
dependências da igreja (NASCIMENTO, 2009).

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De acordo com Gimonet (2007, p. 41), o objetivo maior desta proposta era unir a
educação escolar com os conhecimentos da prática profissional do campo. Assim o ensino e a
formação não estavam separados da realidade e do momento vivido pelos jovens agricultores.
A pedagogia praticada baseia-se na Alternância, o que significa a “Alternância de tempo e de
local de formação, ou seja, de períodos em situação sócio profissional e em situação escolar”.
Mas a Alternância significa, sobretudo, “[...] uma outra maneira de aprender, de se formar,
associando teoria e prática, ação e reflexão, o empreender e o aprender dentro de um mesmo
processo” (GIMONET, 2007, p. 44).
Com o sucesso desta experiência, nasceria a estrutura pedagógica, atualmente
conhecida por “Pedagogia da Alternância”, que é o método de ensino utilizado pelas CFRs.
Os resultados obtidos a partir desta experiência foram excelentes. Depois da consolidação
deste modelo pedagógico no território francês, iniciou-se a internacionalização das Casas
Familiares ou das Maison Familiale Rurale (MFR), no final dos anos 1950. Após a experiência
francesa, outros países que se desafiaram a implantação deste modelo educacional – Itália e
Espanha (1966) e Portugal (1984) (ESTEVAM, 2003). Atualmente, a experiência que se
consolidou na França está presente nos cinco continentes, em mais de quarenta países,
somando em torno de mil escolas rurais por alternância (GIMONET, 2007).
No Brasil, a primeira CFR surgiu no Nordeste, mais precisamente no município de
Arapiraca, Alagoas, no ano de 1981. Após alguns problemas locais, o projeto acabou sendo
desativado, vindo a surgir, depois, no município de Riacho das Almas, Pernambuco, em 1984,
região do agreste nordestino em que os agricultores são castigados e levados à miséria pelos
longos meses de seca ocorridos durante o ano. Depois destas experiências, o projeto se
expandiu para outras regiões do País, migrando primeiramente para a região Sul (Paraná), no
ano de 1987. Ali foram iniciadas as discussões envolvendo os agricultores e autoridades
locais, possibilitando o início da implantação da primeira CFR, dois anos depois, no
município de Barracão, PR. No estado de Santa Catarina, a primeira CFR implantada foi no
ano de 1991, em Quilombo, Oeste Catarinense. Hoje, existem onze CFRs em funcionamento,
distribuídas por todo o território catarinense.
A Casa Familiar Rural Ludovico De Marco, objeto de estudo da presente pesquisa,
está localizada no Distrito de Caraíba, Seara, Santa Catarina, e teve seus estudos e discussões
iniciais no ano de 2000 e implantação no ano de 2002. Contava inicialmente com ensino

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fundamental, anos finais, e, ensino médio. No ano de 2006 passou a ser de formação técnica
de nível médio, formando os filhos e filhas de agricultores familiares do município de Seara e
arredores como Técnicos em Agricultura.
A coordenação das CFRs se dá através da Associação Regional das Casas Familiares
Rurais do Sul do Brasil (ARCAFAR/Sul). De acordo com a ARCAFAR/Sul (1998), uma CFR
pode ser definida como uma instituição educativa, dentro do meio rural, criada para formar
jovens filhos de agricultores que buscam uma educação personalizada e uma formação
integral, a partir de sua própria realidade. É uma escola-residência, na qual os filhos dos
agricultores têm acesso a formação do ensino médio ou técnico, com uma educação e
conteúdo que se adequam a sua realidade de vida, as suas práticas, não precisando deixar de
lado a propriedade e a família do meio rural. Além disso, as CFRs são administradas por uma
associação de pais e lideranças das comunidades envolvidas no projeto, constituindo-se numa
organização não governamental (ARCAFAR-SUL, 1998).
A Casa Familiar Rural Ludovico de Marco, conta atualmente com trinta e cinco
estudantes distribuídos em três turmas do ensino médio, com a formação do ensino médio
integrada ao curso Técnico em Agricultura. O método utilizado é o da Pedagogia da
Alternância, onde o jovem passa uma semana na instituição, no sistema de internato e uma
semana na propriedade. Os conteúdos e práticas desenvolvidas no processo educacional
sempre estão relacionados à sua realidade, propriedade rural e comunidade em que vive.
A Pedagogia da Alternância consiste numa metodologia que conjuga diferentes
experiências formativas distribuídas ao longo de tempos e espaços distintos, tendo como
finalidade uma formação profissional para o jovem rural, mantendo-o no meio rural. Para
Caldart (2012, p.147). “Mais que o direito da população ser educada no lugar onde vive, [a
Pedagogia da Alternância] defende o direito de uma educação pensada desde o seu lugar e
com sua participação, vinculada a sua cultura e as necessidades humanas e sociais”. Dentro
dessa perspectiva, Gimonet (2007, p.19) esclarece que a Pedagogia da Alternância deixa para
trás uma pedagogia plena para ingressar numa pedagogia no espaço e no tempo e diversificam
as instituições, bem como os atores implicados. O jovem em formação não é mais um aluno
na escola, mas um ator em um determinado contexto de vida território e a família é convidada
a participar ativamente de sua educação e formação.

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A prática da Pedagogia da Alternância propõe alguns instrumentos para facilitar o


processo de aprendizagem, de diálogo e ligação do ensino com o educando, como por
exemplo: Plano de Formação e Temas Geradores, Plano de Estudo, Colocação em Comum,
Atendimento Personalizado, Caderno de Alternância, Visita de Estudo e Avaliação.
A Pedagogia da Alternância procura relacionar o processo de educação com seu
público-alvo, conciliando o trabalho na propriedade rural, da família, com a educação,
valorizando o conhecimento do jovem numa interação entre a escola-família-comunidade,
utilizando a interdisciplinaridade e os Temas Geradores no processo de ensino-aprendizagem.
Respeitando dessa forma a história do educando, da família e da comunidade onde o mesmo
se insere.
A formação dos jovens nas CFRs possibilita uma educação em tempo integral,
conseguindo envolver as famílias na educação dos filhos, proporcionando diálogo entre os
diferentes sujeitos que participam do processo de formação dos jovens (professor/monitor,
aluno/jovem, família e a comunidade). Além disso, proporciona qualificações técnicas aos
jovens agricultores, com o intuito de fortalecer a agricultura familiar, permitindo estudar e
continuar nomeio rural, contribuindo com os trabalhos na propriedade de seus pais ou na sua
própria propriedade, podendo vir a desenvolver alternativas de permanência nesse meio.
O Plano de Estudo e os temas geradores trabalhados são pensados pela equipe técnica,
professores, jovens e comunidade, no início de cada ano letivo. Os professores e monitores
realizam um estudo, por meio de visita e conversa, da realidade agrícola dos jovens, junto
com as suas famílias e a comunidade. Todos sugerem assuntos que contemplem o meio em
que vive o jovem, para que, posteriormente, sejam elencados os temas que se tornarão a base
de estudo durante os três anos que o educando permanece na CFR.
As atividades desenvolvidas na CFR Ludovico de Marco são as seguintes: os
estudantes, ao chegarem na escola na segunda-feira, são acolhidos, e após a organização da
casa e dos materiais, se reúnem com os professores e monitores para a colocação em comum.
Neste momento de diálogo, destacam a sua vivência semanal na propriedade, experiências
profissionais, trabalhos desenvolvidos na propriedade, experiências comunitárias e eventos
que marcaram a semana, além de apresentarem assuntos, dúvidas e temas ligados à
alternância a ser estudada, possibilitando assim uma ligação dos conteúdos a serem estudados
com a sua realidade, com a sua comunidade e propriedade. Esta experiência permite desafiar

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os jovens, pais e professores na tarefa educacional, pois permite a ligação interdisciplinar


entre o ensino técnico e as disciplinas do ensino formal. Também desafia o jovem a buscar a
relação com assuntos de seu dia-a-dia, suas atividades, com sua propriedade e sua realidade
de vida.
Durante a semana na instituição, além das aulas, os estudantes se organizam nas
Atividades da Rotina Diária, ou seja, mantém os cuidados de limpeza com a instituição, com a
horta da escola e mantêm comportamento adequado com colegas, professores e monitores.
Também ocorrem atividades práticas relacionadas ao tema trabalhado na semana, com visitas
de estudo, experiências práticas, dias de campo, visitas às famílias da comunidade ou dos
próprios educandos, mantendo uma relação com a realidade local. Ao final de cada semana, o
educando leva para sua propriedade uma tarefa de pesquisa ou atividade prática relacionado
ao tema da alternância da semana seguinte.
A avaliação semanal é um instrumento também utilizado na Pedagogia da Alternância
pois, permite, aos educandos avaliar sua prática, relacionamento, aproveitamento na semana e
trabalho dos monitores. Nesse momento, o educando pode contribuir para o andamento das
atividades, com críticas e sugestões, possibilitando um planejamento e desenvolvimento de
práticas conjuntas entre educador, educandos e monitores.
Outra ferramenta que possibilita ao jovem educando perceber na educação uma
perspectiva de futuro e de mudança da realidade é o Projeto Profissional de Vida do Jovem
(PPVJ) ou Projeto de vida, comumente chamado. Trata-se de um uma atividade, que, em
conjunto com a família, o jovem deve desenvolver durante os três anos de formação,
orientado pelos monitores, alguma ampliação ou implantação de nova atividade produtiva que
permita a manutenção da propriedade e da qualidade de vida. Nesse momento, o educando
pode perceber uma mudança de perspectiva de vida e um incentivo para a permanência na
propriedade.
Caldart (2012) constata que a Pedagogia da Alternância pode ser pensada em dois
momentos: o tempo escola, ou momento de aprofundamento teórico e aulas práticas na CFR e
o tempo da comunidade, momento destinado à realização das atividades de pesquisa,
embasados na realidade da qual estão inseridos e ao mesmo tempo, o momento em que podem
colocar em prática a teoria adquirida na CFR. É neste momento, segundo a autora, que a
família tem um papel importante para a efetivação da Pedagogia da Alternância, e deve

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assumir a responsabilidade na educação dos filhos, e possibilitar a ligação entre escola e


família, e ou/ escola e propriedade e comunidade.

Considerações finais

A partir do que foi estudado, serão elencados alguns pontos de convergência entre o
pensamento freireano e a Pedagogia da Alternância e posteriormente apontados alguns
desafios a serem pensados e enfrentados pelos educadores século XXI.
A respeito da concepção de educação, tanto para Freire quanto para a proposta da
Pedagogia da Alternância, o conhecimento é um constructo, entre professor e estudante. Para
Freire, o educador não deve ser detentor do conhecimento e o jovem mero receptor, mas a
educação deve ser construída no diálogo entre ambos. Para a Pedagogia da Alternância o
conhecimento se dá na relação entre o conteúdo apresentado pelo professor, a experiência de
vida e práticas do jovem agricultor e seus anseios perante ao que se vai aprender para que
possa aplicar em sua realidade.
O papel do educador, nas duas propostas, é tido como mediador dos conteúdos, e não
perde sua importância na construção do conhecimento, pelo contrário, tem papel mediador
dos conteúdos apresentados pelos educandos e jovens com os conteúdos formais da educação,
que deve servir como auxílio em sua vida e experiências.
O estudante, na concepção freireana, apresenta um saber que se dá pela sua bagagem
histórica, sua vida, seu mundo, basta esse conhecimento ser aperfeiçoado. Para a Pedagogia
da Alternância, o jovem, é um ser histórico que possui experiência de vida, uma propriedade,
uma família e uma comunidade, experiência que deve ser utilizada no processo de construção
do conhecimento.
Em relação aos conteúdos, na proposta freiriana, são extraídos das vivências dos
educandos, a partir da investigação do universo verbal, onde os educadores extraem a
realidade dos educandos com palavras geradoras de relevância para o educando, e que
retornam ao educando problematizadas, fazendo-o questionar a própria realidade. Para a
Pedagogia da Alternância, o conteúdo é, de forma semelhante à de Freire, extraído da
realidade do educando, onde os próprios jovens e monitores discutem os conteúdos a serem

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trabalhados, partindo das necessidades das suas famílias. Também são definidos em forma de
temas geradores e norteiam o plano de estudos.
O método de ensino, na pedagogia freireana aparece como uma forma que nega o
ensino formal, como uma proposta inovadora, baseada no diálogo e na problematização para a
construção do conhecimento. Na Pedagogia da Alternância, percebemos que se trata de uma
proposta alternativa ao ensino formal, tradicional, pois considera o tempo Escola e o Tempo
Comunidade, valoriza a teoria, conteúdos aprendidos em sala como também leva em
consideração a prática desenvolvida pelos jovens. Freire pensa a educação como uma forma
de conscientização e transformação da realidade do educando, assim como ocorre na
Pedagogia da Alternância através do Projeto de vida, onde ocorre um incentivo para a
permanência na propriedade e uma possibilidade de transformação da realidade.
Como propostas a serem debatidas e retomadas pela educação do campo e pela
Pedagogia da Alternância nas Casas Familiares Rurais à luz das propostas de Freire, podemos
elencar três elementos para que a educação atenda aos anseios da realidade da agricultura
familiar, aos jovens do campo: o Primeiro desafio consiste em dar aos movimentos sociais (do
campo, de trabalhadores, de mulheres, de gênero) um papel de protagonistas na educação,
para que esteja cada dia mais próxima da realidade dos educandos.
Caldart (2012) expõe que a retomada do protagonismo dos movimentos sociais na
Educação do Campo é hoje um grande desafio, que passa por uma interpretação mais rigorosa
e pela difusão ampliada da compreensão desse momento da luta de classes, que inclui o
debate das contradições da fase atual do capitalismo e as consequências que traz para a
agricultura e para a vida dos camponeses, bem como para o conjunto da sociedade.
O mesmo desafio passa pela retomada ou pelo fortalecimento do vínculo orgânico da
educação do campo (enquanto crítica, enquanto práticas e enquanto disputa política) com as
lutas de resistência dos trabalhadores do campo e a construção de um projeto de agricultura
que tenha outra lógica que não seja a da agricultura com o objetivo do negócio, fazendo dos
alimentos e da terra um objeto a mais da especulação do capital financeiro, em detrimento das
pessoas. Outras temáticas que fazem parte dessa discussão atual e que devem ser retomadas
pela educação do campo diz respeito à questões como crise alimentar, crise energética e crise
financeira, soberania alimentar, reforma agrária, Agroecologia, biodiversidade, direito às
sementes e à água como patrimônio dos povos, cooperação agrícola, descriminalização dos

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movimentos sociais, direitos sociais dos camponeses e camponesas, crianças, jovens, adultos,
idosos e por que não, (acrescentamos) debate de gênero, bioética entre outros assuntos que
levam a perspectiva de totalidade do ser humano enquanto parte da natureza e não como
detentor e dominador dela, ou de outros seres humanos.
Por fim, entende-se que o principal desafio da Pedagogia da Alternância, é construir
uma verdadeira alternância, capaz de integrar o processo de formação aos conteúdos e
vivências dos jovens nos diferentes tempos e espaços, com uma compreensão de mundo que
fuja da lógica capitalista, que pense em projetos de vida que atendam aos anseios e
emergências das famílias dos próprios educandos. Cabe ainda como temática de debate, a
necessidade de divulgação das CFRs, para que mais jovens filhos e filhas de agricultores
tenham acesso à educação do campo, e que saibam que ela pode possibilitar um meio de
permanência na agricultura, com enfoque na sucessão familiar e na mudança da realidade,
sem precisar abandonar a vida no campo.

Referências

ASSOCIAÇÃO REGIONAL DAS CASAS FAMILIARES RURAIS DO SUL DO BRASIL


(ARCAFAR/SUL). Informações. Disponíveis em: <http://www.arcafarsul.org.br/pag
e/home>. Acesso em 20 jul 2017.

CALDART, R. S. Dicionário da educação do campo. São Paulo. Expressão,


2012.

FREIRE, P. Educação como Prática da Liberdade. 10 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1980.

GADOTTI, M. É possível aplicar o método Paulo Freire hoje? In: Educação e


compromisso. Campinas, Papirus. 1985.

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Petrópolis, RJ: Vozes; Paris: AIMFR Associação Internacional dos Movimentos de Formação
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2ª Ed. Florianópolis: Insular, 2003.

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TORRES, C. A. Pedagogia da luta: da pedagogia do oprimido à escola pública popular.


Trad. Luzia Araujo, Talia Bugel. Campinas, SP: Papirus, 1997.

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A IMPORTÂNCIA E A VALORIZAÇÃO DAS BRINCADEIRAS NO ESPAÇO


RURAL.

Angélica Tais Della Justina De Bacco 59

Resumo

A infância é uma fase de grande aprendizagem, interação e desenvolvimento, com isso o objetivo deste
trabalho é demonstrar que nas series iniciais a utilização de brincadeiras e atividades lúdicas ao ar
livre, podem influenciar na aprendizagem e na vida dessas crianças. Para isso foi utilizado oficinas na
elaboração de brincadeiras voltadas a educação do campo, também foi resgatado brincadeiras antigas
que utilizem o espaço amplo externo que a escola possui e não é utilizado. A pesquisa foi realizada
através da analise de documentos utilizando-se também dos métodos da pesquisa-ação, uma vez que a
pesquisadora propôs ações lúdicas para os participantes. Os resultados apontam para a valorização do
espaço rural dessa escola, através da valorização de brincadeiras antigas e ao ar livre, com suas
peculiaridades e especificidades, onde as crianças são valorizadas e ensinadas sobre perspectiva da
valorização do espaço do campo de uma maneira lúdica.

Palavras-chave: Brincadeiras; educação do campo; crianças.

Introdução

A educação do campo se apresenta como uma modalidade da educação que surge a


partir das reivindicações dos movimentos sociais na década de 1990 em contraposição à
educação rural, a qual era assistencialista e não correspondia às necessidades formativas dos
povos do campo. A legislação educacional trouxe avanços para essa discussão,
principalmente, a partir da década de 1990, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional de 1996 (DE LIMA; COSTA; PEREIRA, 2017).
A conquista do direito dos cidadãos de todas as idades que vivem e trabalham no
campo, percebendo que o campo é um território humano, vivo, onde os saberes e os fazeres
presentes no espaço-tempo histórico, social, cultural e desenvolvimento sustentável. As
instituições de educação para crianças, de modo geral, têm considerado a infância como um
dado universal e categoria natural. Tal contexto educacional pouco favorece a experiência das

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crianças com o conhecimento científico, tampouco com a cultura, seja esta entendida em sua
dimensão de produção nas relações sociais cotidianas, ou como produção historicamente
acumulada, presente na literatura, na música, na dança, no teatro, na brincadeira, enfim, na
produção artística, histórica e cultural (ORLANDI, 2009).
Com o intuito de compreender este tema, precisamos voltar ao tempo e conhecer a
essência da vida, a infância. É nesta perspectiva que se torna importante refletir sobre a
infância juntamente com as diferentes formas de brincar que estão em constante modificação,
transformando assim a sociedade e modificando a infância das crianças (BAHIA, 2009).

Sabemos que a cultura na qual a criança está inserida, demarca sua trajetória infantil,
pois, na atualidade, segundo Friedmann, (2012), as crianças vivem em universos
“multiculturais” recebendo a influência de diversas culturas, sendo a partir da família, através
de seus pais, da comunidade na qual estão inseridas e, ainda da escola e da cultura global
envolvendo as mídias e redes sociais. Nessa perspectiva, cria-se formas totalmente diferentes
de brincar em espaços distintos, como o campo e os grandes centros urbanos.
Diante disso, é importante realçar que as escolas do campo auxiliam na formação da
consciência infantil e, muitas vezes, podem transformar as crianças em futuros profissionais
do campo, através da utilização do ambiente e de práticas pedagógicas que vivem e revivem a
história da transformação do ambiente natural em cultura.
Para tanto, o presente artigo teve como objetivo geral valorizar os espaços externos de
uma escola do campo através de brincadeiras antigas ao ar livre. Para isso buscou-se resgatar
as brincadeiras antigas como intuito de valorizá-las, mostrando a importância destas
brincadeiras ao ar livre para o desenvolvimento das crianças.

As escolas do campo.

As escolas em um geral são lugares de aprendizagem, e é de fundamental importância


que os sujeitos sejam compreendidos desde a sua origem. No Brasil a partir da última década
vem sido discutida a diversidade sociocultural, onde esse reconhecimento se deu a partir das
lutas sociais e políticas de muitos movimentos sociais do campo e da sociedade. (PINTO &
GANDIN; 2003).

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A educação do campo não emerge no vazio, e nem é iniciativa das políticas públicas,
mas emerge de um movimento social, da mobilização dos trabalhadores do campo, da luta
social. É fruto da organização coletiva dos trabalhadores diante do desemprego, do trabalho
precário e da ausência de condições materiais de sobrevivência dessa população. (PINTO &
GANDIN; 2003).
Compreende-se que a organização da escola do campo também se articula à
consolidação de uma concepção de escola no e do campo, isto é, de uma educação que seja
pensada para a realidade dos povos do campo brasileiro. Assim, além do dever de garantir o
acesso ao processo de escolarização e aos conhecimentos historicamente produzidos pela
humanidade, a escola do campo mostra-se fundamental para a manutenção e para o avanço da
luta pela terra, para compreensão da identidade do sujeito coletivo do campo e para a
construção de um projeto de escola que se integre a um projeto de transformação social (DE
LIMA; COSTA; PEREIRA, 2017). Utilizando-se dos espaços e do ambiente do campo para a
compreensão e valorização, como local de vivencia, aprendizados e produção.

A importância do brincar

Brincar é definido em diferentes dicionários como: divertir-se, recrear-se, entreter-se,


distrair-se, folgar, também pode ser entreter-se com jogos infantis, ou seja, brincar é algo
presente e importante em nossas vidas desde a infância até na vida adulta.
Brincar é criar, imaginar, interagir com o outro. No ato da brincadeira a criança se
desenvolve e constrói sua coordenação motora, promovendo socialização e interação com as
outras crianças e com o mundo. O brincar é a primeira linguagem da criança, a partir das
atividades lúdicas é que ela irá se desenvolver provocando seu processo de socialização,
comunicação, construção de pensamentos. (PEREIRA et al. 2013)
O Brincar, é a criança estar em contato com o meio envolvente, criando, imaginando e
interagindo com o outro e com o mundo que a rodeia. É através de atividades lúdicas que ela
explora o seu mundo interior imitando aspectos da vida adulta para compreendê-la melhor; a
criança quando brinca investiga a vida. No brincar a criança prepara-se para vida adulta,
ensaia o que é ser mãe, pai, casar e trabalhar, fantasias que nem sempre correspondem ao que
de fato acontece. (MANDJAVO; 2015).

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Nessas brincadeiras, tão frequentes do espaço infantil, a criança também revive


situações que acontecem em sua família, e vai tentando representá-la. Uma criança ao fazer de
contas que é uma mãe mal como a sua, neste jogo ela tenta compreender o porquê da sua mãe
ser assim. E assim encontrará como respostas elementos da realidade, mas também construirá
fantasias que nem sempre correspondem ao que de fato acontece. (MANDJAVO; 2015).
O brincar é importante no desenvolvimento da criança porque ele é uma das formas
mais comuns do comportamento do ser humano, principalmente durante a infância.
Infelizmente, até há pouco tempo, o brincar era desvalorizado e menosprezado, dispensado de
valor a nível educativo. Com o evoluir dos tempos, atravessa-se uma mudança na forma como
se verifica o brincar, e a sua importância no processo de desenvolvimento de uma criança.
(MANDJAVO; 2015).
Quando a criança brinca não tem noção do quanto está aprendendo e interagindo com
a sociedade, por isso não há essa preocupação com os resultados que podem ser obtidos
através de suas brincadeiras, mesmo porque o que importa para elas é exatamente a realização
de suas vontades. (PEREIRAet al. 2013)
É brincando que a criança constitui seu eu, expressa seus desejos e suas vontades,
sendo assim, quanto maiores forem às oportunidades oferecidas a essas crianças para brincar,
mas fácil será seu desenvolvimento que contribuirá quando estiver na vida adulta. (PEREIRA
et al. 2013)

Teixeria (2012) acredita que as brincadeiras devem ser oferecidas dentro dos nossos
espaços escolares, sejam como forma de conquistar o aluno para o saber, seja como meio de
transmissão de conhecimentos, ou mesmo como espaço para que eles sejam capazes de criar
seu próprio mundo, o que não podemos é deixar que seja extinto, pois não quero ver crianças
sentadas em suas carteiras absorvendo conhecimentos e mais conhecimentos sem direito de
fazê-los através do que realmente são: crianças que brincam, que jogam que criam, que
imaginam e transformam o mundo.

A valorização das brincadeiras nos espaços rurais.


Através das brincadeiras as crianças constroem o seu mundo imaginário. Desta forma,
realçamos a importância da valorização das brincadeiras infantis em todas as áreas.

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Constituindo assim, a ideia que as “Brincadeiras de áreas rurais têm algumas características
particulares: acontecem em amplos espaços em contato direto com a natureza, fundindo-se
dos elementos do entorno que motivam esses repertórios lúdicos.” (FRIEDMANN, 2012).
Piaget, Vygostsky e Wallon, demostram a capacidade de construir através das trocas
estabelecidas entre o sujeito e o meio, e não são meras receptoras das informações a sua volta,
pois através do contato com o próprio corpo, com as coisas do seu ambiente, a interação com
outras crianças e adultos, desenvolve a sua capacidade afetiva, a sensibilidade a autoestima, o
raciocínio, o pensamento e a linguagem (COLL; SOLE; 1998).
São inúmeras as atividades que podem ser incluídas nas escolas do campo. Muitas
destas atividades misturam meninas e meninos, como a brincadeira do esconde-esconde,
menino pega menina, pega-pega entre várias outras que não possuem espaços delimitados.
Entretanto, há também as brincadeiras de bonecas e casinhas em meio ao ar livre, árvores e,
em meio a natureza que são brincadeiras destinadas principalmente as meninas, sendo que,
não há nenhum motivo que separa essas brincadeiras dos meninos. Além disso, os meninos
gostam mais de brincar com carrinhos, no qual constroem estradas em meio a terra, jogar
bola, entre outras atividades (FRIEDMANN, 2012).
As atividades lúdicas que ocorrem em zonas rurais, geralmente são brincadeiras que
envolvem brinquedos “criados e construídos com o que o próprio meio oferece: água, terra,
plantas, árvores, bichos”. (FRIEDMANN, 2012). Sendo que através desses elementos
naturais, as crianças conseguem construir um vasto conhecimento sobre a natureza e suas
representações, através de atividades lúdicas. Além disso, Friedmann (2012) nos coloca que
as crianças de idades distintas, misturam-se para brincar e desfrutar de todo o espaço
disponível.
Entende-se assim, que as crianças que vivem em áreas rurais possuem mais contato
com a natureza e todos os elementos que a constituem, agregando assim a essas crianças um
mundo natural e mágico, para desenvolver diversas brincadeiras e habilidades. Para que
possamos utilizar essa sistemática de ambiente e peculiaridades do campo, devemos ter em
nossas escolas rurais currículos voltados para as inúmeras atividades proporcionadas por esta
diferenciação em relação ao meio urbano.

METODOLOGIA

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A pesquisa científica tem o objetivo de conhecer um ou mais aspectos de determinado


assunto. Por esse motivo, a pesquisa deve ser organizada, metódica e analítica. O desfecho da
pesquisa científica tem a obrigação de contribuir para o avanço do conhecimento humano
(PRODANOV; FREITAS, 2013).
A presente pesquisa pode ser enquadrada em descritiva, pois a pesquisadora descreveu
e registrou os fatos analisados num primeiro momento sem a intervenção, pois primeiramente
foi analisado o espaço físico que a escola dispunha para brincadeiras bem como para a prática
da educação física. Além disso, a pesquisadora também baseou-se na pesquisa documental
tendo como referencial teórico Gil (2010), o qual salienta que a pesquisa documental institui
um dos delineamentos mais importantes. Este tipo de pesquisa acontece com o uso de fonte
documental como relatórios, boletins, atos jurídicos, etc. Se a consulta de material for interna
à organização denomina-se pesquisa documental.
Ainda para Prodanov e Freitas (2013), pode-se observar que a pesquisa documental se
dá quando podemos organizar informações que se encontram espalhadas, dando a estas uma
nova importância como fonte de pesquisa. Nesse sentido a pesquisadora analisou nos diários
de classe dos professores se os mesmos utilizavam dos espaços externos da escola para a
promoção de brincadeiras, após essa análise buscou-se embasamento nos métodos da
pesquisa-ação para propor atividades lúdicas para as crianças e professores, buscando a
valorização dos espaços e também o desenvolvimento sensório motor das crianças.
Ao todo participaram cinquenta e sete crianças do ensino fundamental anos iniciais e
cinco professores, ressalta-se que a escolha pela referida escola se deu pelas observações da
pesquisadora que frequentemente visualiza o amplo local externo da escola sem uso. Após a
realização das atividades que tiveram duração de 05 dias foi feita uma análise de como esses
dias foram importantes para o ensino- aprendizado através de relatos das crianças e
professores participantes.

Resultados e achados

Este trabalho se desenvolveu na Escola Municipal de Ensino Fundamental Princesa


Isabel, localizada na comunidade de Candeia Baixa interior do município de Santa Rosa
Estado do Rio Grande do Sul. Esta escola compreende os níveis de Ensino Fundamental Anos

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iniciais e anos finais. Esta atividade ocorreu com os alunos de 1ª ano ao 4ª ano do Ensino
Fundamental anos iniciais.
Foi realizado no local oficinas com brincadeiras antigas e atuais no ambiente externo
da escola, para a valorização desse local amplo que é muito pouco utilizado nesta escola pelas
crianças e pelos professores. As oficinas ocorreram do dia 28 do mês de maio, até dia 02 de
junho, compreendendo um total de cinco dias de muita aprendizagem, união,
companheirismo, diversão e descobertas.
O objetivo principal por escolher esta escola para a realização destas oficinas se deu
pela pesquisadora estar muito presente neste local, e ter percebido que as crianças não
utilizam os ambientes externos da escola para brincar, os quais são imensos e recheados de
possibilidades para serem explorados. Neste local tem gramados imensos para a realização de
jogos, brincadeiras e dinâmicas e perto da escola tem um caminho como se fosse uma trilha
que vai até um rio, que disponibiliza ações de trilhas e um profundo contato com a natureza.
A realização do objetivo proposto inicialmente teve grande aceitação pelos professores
e alunos dessa escola do campo, ambos participaram ativamente de todas as 34 (trinta e
quatro) atividades propostas, e se permitiram brincar e realizar descobertas e aprendizados de
uma maneira mais lúdica.
Ao final dos cincos dias de oficinas, todos demonstraram grande gratidão, e os
professores comentaram que descobriram inúmeras possibilidades de realização de atividades
diferentes com um cunho de aprendizado, e assim podendo aproveitar o imenso ambiente
externo disponível nesta escola e valorizar esse ambiente pouco utilizado, também
reconheceram o valor que esse ambiente tem no aprendizado dos alunos e como está escola
está repleta de ambientes prontos para serem utilizados e estudados.
Os alunos aproveitaram ao máximo as oficinas com as brincadeiras, se permitiram
independentemente da idade, conviveram com as diversas turmas em harmonia aproveitando
este momento único na escola. Exploraram a natureza durante a trilha, observando cada
detalhe do caminho, cada árvore, cada planta e cada rocha que encontravam, e ao chegar ao
final da trilha no rio, aprenderam sobre a importância dele para a vida de todos e
contemplaram mais está beleza da mãe natureza.
Realizar este projeto nesta escola foi muito importante e marcante, esta experiência
permitiu um maior contato com a realidade camponesa, com as brincadeiras antigas que

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foram resgatadas, com o espaço externo da escola e com a natureza. Foram cinco dias de
aprendizado através do lúdico, das brincadeiras, jogos e em contato direto com a natureza e
com tudo o que ela tem a oferecer.

Algumas brincadeiras antigas resgatadas e realizadas.

Amarelinha: Essa brincadeira tão tradicional entre as crianças brasileiras também é


chamada de maré, sapata, avião, academia, macaca etc. A amarelinha tradicional é desenhada
no chão com giz e tem o formato de uma cruz, com um semicírculo em uma das pontas, onde
está a palavra céu, lua ou cabeça. Depois vem a casa do inferno (ou pescoço) e a área de
descanso, chamada de braços (ou asas), onde é permitido equilibrar-se sobre os dois pés. Por
último, a área do corpo (ou quadrado).

Alerta: O jogador pega a bola, joga ela para cima e grita o nome de uma pessoa. A
pessoa que teve seu nome citado deve pegar a bola e gritar “Alerta! ”. Imediatamente, todos
devem ficar estátuas. O jogador dá 3 passos e, parado, deverá tentar acertar com a bola na
pessoa que tiver mais próxima. Se acertar, a pessoa atingida sai da brincadeira. Se errar, ele é
quem sai. É uma espécie de queimada parada.

Arranca-Rabo: O grupo é dividido em dois, os integrantes de um dos times penduram


um pedaço de fita na parte de trás da calça ou bermuda, eles serão fugitivos. Ao sinal do
mestre, os fugitivos correm tentando impedir que as crianças do time adversário peguem suas
fitas, quando todos os rabos forem arrancados, as equipes trocam os papéis, quem era pegador
vira fugitivo.

Arremesso de Bambolê: Tipo arremesso de argolas, mas com bambolê. Uma pessoa
será a vítima e ficará a 5 metros dos jogadores. Faz 1 ponto quem conseguir encaixar o
bambolê na pessoa primeiro. Ganha quem tiver mais pontos.

Bambá: Jogo próprio de campo, executado com quatro metades de caroços de


pêssegos, (ou algumas rodelas de casca de laranja). Sabugos inteiros e cortados servem de
parelheiros. Traçam na terra riscos em forma de escada com os primeiros elementos jogados

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sobre os riscos. Tiram os pontos conforme estes avançam os parelheiros. O parelheiro de


quem fizer mais pontos é ganhador.

Bate e corre: Os participantes formam uma roda e um jogador iniciará a brincadeira.


Ao sinal de início, o jogador separado põe-se a correr em volta da roda, devendo bater
inesperadamente no ombro de um colega. Este sai no seu encalço, enquanto o outro continua a
correr em torno da roda para tentar ocupar o lugar, agora vago no círculo, antes de ser
apanhado. Se conseguir, o corredor desafiado reinicia a brincadeira indo tocar outro. No caso
contrário, o alcançado vai para o centro da roda. Lá fica até outro cometer erro semelhante ao
seu, trocando de lugar com ele.

Bobinho: É uma brincadeira de bola. Os jogadores vão jogando a bola um para o


outro, e o objetivo do bobinho é roubar a bola. Se conseguir, quem chutou a bola pela última
vez será o novo bobinho. Pode ser brincado com os pés ou com as mãos.

Cama-de-gato: A cama-de-gato é uma brincadeira com barbante. Consiste em trançar


um cordão entre os dedos das duas mãos e ir alterando as figuras formadas. Provavelmente de
origem asiática, a brincadeira é praticada em diversas partes do mundo. Uma versão mais
moderna é trançar um elástico com as pernas.

Chefe Comanda: As crianças colocam-se em fileira; em posição oposta, fica o chefe


ou mestre. Inicia-se o diálogo entre o chefe e as crianças:

Chefe: Boca de forno.


Crianças: Forno.
Chefe: Tirar um bolo.
Crianças: Bolo.
Chefe: Fareis tudo o que o mestre mandar?
Crianças: Faremos todos.

Seguem-se as ordens do mestre. Geralmente, elas consistem em coisas simples como: andar x
passos, bater palmas, dar pulos, etc. A escolha do mestre ou chefe é feita através de sorteio.

Cobrinha: Dois participantes seguram nas extremidades da corda e começam a fazer


movimentos com ela. Enquanto isso, os demais participantes deverão ultrapassar a corda sem

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tocar nela. Se não conseguir, é eliminado. Quando todos já tiverem passado, deverão passar
para o outro lado. E por aí vai até chegarmos a um campeão.

Coelho sai da toca: O professor irá fazer círculos no chão da quadra que serão as
tocas dos coelhos, se tiver 24 alunos o professor irá desenhar 23 tocas e um aluno ficará sem
toca. Toda vez que o professor dizer coelhinho sai da toca, todos saem da toca e começam a
correr, quando o professor dizer coelhinho entra na toca, todos terão que achar uma toca e o
que ficar de fora sai da brincadeira.

Corrida dos Cadarços: Corrida de duplas, de ida e volta, onde os participantes


correm com os cadarços amarrados. Na ida, vai de frente, na volta, vem de costas. Não pode
virar. Se cair, levanta e continua. Ganha quem voltar primeiro.

Corrida ao Contrário: Os corredores dão 25 voltas em um cabo de vassoura e correm


de costas até a linha de chegada. Quem chegar primeiro, vence.
Corrida dos Sentados: Corrida de ida e volta onde os participantes correm sentados e
não podem usar as mãos para a nada. Na ida, vai de frente, na volta, vem de costas, ou seja,
não pode virar. Ganha quem voltar primeiro.
Dança da cadeira: Colocam-se cadeiras em círculo, cada participante senta-se, sendo
que uma criança é destacada para dirigir o jogo, este deve estar vendado. O dirigente da
brincadeira grita: já! Todos levantam e andam em roda das cadeiras. O dirigente retira uma
cadeira. À voz de já! todos procuram sentar. Quem ficar sem lugar comandará a nova volta.
Assim, as cadeiras vão sendo retiradas e o grupo vai diminuindo. Será o vencedor aquele que
conseguir sentar na cadeira no último comando. Variante: As cadeiras são dispostas em duas
fileiras (de costas uma para a outra). As crianças sentam nas cadeiras e uma fica responsável
por ligar e desligar o rádio e também por retirar as cadeiras. Quando o rádio for ligado às
crianças circulam pelas cadeiras quando o rádio é desligado as crianças sentam. A cada parada
vai sendo retirada uma cadeira. Quem fica sem cadeira cai fora, é considerado vencedor o
participante que conseguir sentar na cadeira, na última disputa.

Esconde-esconde: A criança tem de se esconder e não ser encontrada, a criança que


deverá procurar os demais elementos do grupo deve permanecer de olhos fechados e contar
até 10 para que todos tenham tempo de se esconder. Após a contagem, a criança sai em busca

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dos amiguinhos que estão escondidos. Para ganhar, a criança que está procurando deve
encontrar todos os escondidos e correr para a base.

Escravos de Jó: Cantiga aparecendo sob a forma de jogo ou passeio (ver esta última
modalidade na categoria correspondente). A música é a mesma. Crianças sentadas no chão em
círculo ou ao redor de uma mesa; um objeto (pedrinha, caixa de fósforos ou sementes). As
crianças vão entoando a cantiga, marcando os tempos fortes; passam o objeto de uma para
outra, no sentido dos ponteiros do relógio. Somente na parte onde dizem zique – zá o objeto é
passado na direção contrária, retornando-se, logo a seguir, à primeira direção contrária,
retornando-se, logo a seguir, à primeira direção. Quem erra cai fora. Os últimos dois serão os
vencedores. Música: Escravos de Jó Jogavam Caximbó. Tira, bota. Deixa o Zé Pereira Que se
vá. Guerreiros com guerreiros fazem zigue – zigue zá (repete-se a música até restarem só
dois).

Está quente, está frio: Um participante esconde um objeto, enquanto os outros


fecham os olhos. A voz de pronto, as crianças saem a procurar. O que escondeu o objeto vai
alertando, conforme a distância que estiverem do esconderijo: Está quente (quanto próximo),
está frio, (quando distanciado), está queimado (quando bem perto). Quem encontrar o objeto
será o encarregado de escondê-lo na repetição da brincadeira.

História da Serpente: Um participante será a serpente que procura pedaços do seu


rabo. Ele começa a cantar a música abaixo e chama os outros participantes para formar uma
fila atrás de si, formando o rabo da serpente. Aqueles que são chamados têm que passar por
baixo das pernas de quem já está na fila.

Pega-pega: Esta brincadeira envolve muita atividade física. Uma criança deve correr e
tocar outra. A criança tocada passa ter que fazer o mesmo.

Pular Corda: A corda é movimentada por duas pessoas e as outras pessoas pulam.
Quando apenas uma for pular, se ela errar, é substituída. Quando for várias pessoas, quem
enganchar na corda é eliminada. Há várias versões para essa brincadeira. Vale a pena
perguntar quem conhece alguma e executá-la. Pular corda é uma brincadeira que permite a
criação de diversas versões diferentes.

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Pular elástico: Para a realização da brincadeira é necessário um elástico de


aproximadamente 2 metros, com as pontas unidas. É disputado no mínimo por três crianças:
duas prendem o elástico, enquanto as demais, uma por vez, saltam o elástico, cumprindo a
seguinte sequência:

(a) A criança salta o elástico, que no início do jogo é preso na altura dos calcanhares das duas
crianças, sempre caindo (batendo) com os pés ao mesmo tempo e cumprindo a seguinte série
de saltos: – para dentro do elástico esticado; – em cima do elástico; – afastando um quarto de
voltas, cruzando o elástico na altura dos seus calcanhares e saltando para fora do elástico;

(b) Cavalgada: a mesma série acima, só que a batida dos pés sobre o elástico deve ser
alternada (primeiro um pé, e após um curto intervalo de tempo o outro);

(c) Num pé só: a mesma série, de olhos fechados.

(d) Ceguinho: a mesma série, de olhos fechados. Após essa sequência, o elástico passa da
altura dos calcanhares à dos joelhos e cintura, até chegar às axilas. Vencerá quem chegar a um
grau de maior dificuldade. As crianças que errarem substituirão aquelas que estiverem
mantendo o elástico esticado.

Importante salientar que todas as brincadeiras citadas acima dentre outras, não citadas
o que deixaria o artigo demasiadamente extenso, foram realizadas no espaço externo da
escola, com ampla participação dos sujeitos pesquisados, trazendo momentos de integração
das diversas turmas participantes e também dos professores envolvidos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base neste trabalho podemos observar a importância das escolas do campo, da
ludicidade, do brincar e principalmente das brincadeiras antigas resgatadas, e da importância
de se utilizar o ambiente externo da escola para o resgate dessas atividades que foram
propostas.
Com isso é interessante expressar com ênfase, que mediante os argumentos
supracitados é de grande importância o conhecimento técnico teórico do educador, para
analisar o ambiente trabalhado, mediante ele, pode-se observar oportunidades de melhorias,

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inovações e práticas pedagógicas, citadas apenas em campos teóricos. Corrobora tal afirmação
a análise encontrada, como o fato de, existir no ambiente escolar o sentimento bucólico, que
propicia ao aluno com atividades de lazer, educacional, e, em contato com a natureza, gerando
ao aluno o resgate da simplicidade, dinamicidade e perspicácia de atividades que influenciam
no seu aprendizado; tendo em vista que atualmente grande parte das crianças possuem um
contato extremamente tecnológico.
Em virtude do que foi mencionado concluem-se então que este trabalho conseguiu
atingir todos os objetivos desejados e propostos, e ainda foi possível se adquirir um maior
conhecimento sobre as escolas do campo, o lúdico, o brincar e sobre as brincadeiras antigas.

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EDUCAÇÃO DO CAMPO E COMUNICAÇÃO ASSERTIVA

Daiane Loreto de Vargas60


Aline Guterres Ferreira61
Resumo

Trataremos aqui sobre as temáticas educação do campo, pedagogia da alternância e comunicação


assertiva. A educação do campo possui na pedagogia da alternância uma importante metodologia,
afim de construir junto aos sujeitos rurais um processo de ensino-aprendizagem que compreenda e
respeite as suas diferentes realidades sociais. A comunicação assertiva vem contribuir com esse
processo, ao destacar a relevância do ato comunicativo junto aos sujeitos, o que deve ser falado? De
que forma? E para quem? O objetivo deste trabalho é discutir sobre a comunicação assertiva no
ambiente da educação do campo contemporânea, tendo como base os princípios de Paulo Freire.
Metodologicamente o trabalho constitui-se a partir de reflexões teóricas sobre as temáticas propostas.
Apontamos como considerações finais que, a educação passa, necessariamente, pela comunicação e a
comunicação deve ser assertiva.

Palavras-chave: Educação do Campo, Comunicação Assertiva; Pedagogia da Alternância.

Introdução

No capitalismo contemporâneo, produzir é cada vez mais "produzir inovação" a


qualquer custo, isto é, com boas condições de trabalho ou sem elas, com a intensidade do
trabalho pela mais-valia absoluta ou a inserção de tecnologias com mais-valia relativa. Em
decorrência dessa tendência à intelectualização, no pós-taylorismo, com a mudança da
organização há crescente incorporação da tecnologia em todos os setores da fábrica e nos
serviços, a demandar outras competências do trabalhador.
No âmbito das atuais e abrangentes transformações tecnológicas, os profissionais da
educação que não se preocuparem em se qualificar permanentemente, em se educar -
condição para ser educador -, estão correndo sérios riscos de serem candidatos ao processo de
desintermediação. Talvez nenhum outro setor de atuação seja tão dependente da presença de
pessoas quanto o dos profissionais da educação. No entanto, o que se reclama é se necessita

60
UFSM - E-mail: loretodevargas@gmail.com
61
UFRGS – E-mail: alinegufe@gmail.com

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não é uma presença definida como ocupação de espaço: é a qualidade dessa presença e dessa
ocupação que, seguramente, faz a diferença.
Conquanto não se possa afirmar categoricamente, tudo sugere que a qualidade das
relações, na escola, entre todos os agentes educacionais e os educandos, assim como o auto-
respeito dos profissionais da educação à sua profissão, irá garantir que a presença destes
continue imprescindível em uma época de tantas transformações. A presença do professor-
educador no ambiente escolar é fundamental porque a educação é um ato comunicativo e
como tal, necessita de uma mensagem que seja construída através da troca de saberes, fazeres,
vivências, culturas e histórias.
Nesse sentido, a educação do campo tem sido construída historicamente através de
lutas sociais e de processos pedagógicos, como a pedagogia da alternância, onde os
educadores possuem um papel fundamental. A sua relevância no ambiente contemporâneo,
onde a educação tem sido relegada a ambientes e ferramentas tecnológicas, também tem sido
pautada nas ações de assertividade no âmbito comunicativo dentro e fora do ambiente escolar.
A educação do campo historicamente, vem redescobrindo sistemas de educação e que
carregam consigo princípios de respeito a diversidade nos aspectos sociais, culturais,
políticos, ambientais, econômicos, de gênero, geração, de raça e etnias, bem como
desenvolvimento de espaços de investigação e articulação de experiências locais e que se
articulam com o mundo do trabalho. No cenário atual tem por base a contribuição de outras
ciências como a filosofia e a psicologia que contribuem com diversos estudos e pesquisas
sobre o processo de ensino e aprendizagem, alguns apontam a relevância do ato comunicativo
de forma assertiva com os sujeitos no âmbito escolar.
Objetivo deste trabalho é discutir sobre a comunicação assertiva no ambiente da
educação do campo contemporânea, tendo como base os princípios da educação e da
pedagogia da alternância de Paulo Freire. Metodologicamente o trabalho constitui-se a partir
de reflexões teóricas sobre as temáticas propostas. O texto está organizado, a partir desta
introdução, em duas seções: a) Educação do Campo e a Pedagogia da Alternância e b)
Comunicação Assertiva na Educação Contemporânea. Por fim, algumas considerações final.

Educação do Campo e a Pedagogia da Alternância

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O tema da educação do campo tem conquistado inserção nas agendas e debates


políticos, acadêmicos e da sociedade, fruto das demandas e da pressão dos movimentos e
organizações sociais, bem como um incentivo de políticas públicas as escolas do campo a
adotarem este novo referencial metodológico da educação do campo, numa perspectiva
pedagógica mais inovadora. Essa forma de educação traz uma nova identidade ao campo,
empoderando seus educandos e sua família em torno da luta de uma educação digna e
contextualizada e ao modelo de modernização agrícola implantado no país.

A educação do campo como proposta de inovação pedagógica está em debate em


detrimento a educação rural, imposta historicamente as populações do campo, onde seu
resultado foi o incentivo ao êxodo rural, a desvalorização do conhecimento do cotidiano
agrícola e os saberes da terra. Para isto, esta educação inovadora possui seu embasamento
teórico nos referenciais da Pedagogia da Alternância, o que permite ao educando,
compartilhar seu conhecimento originário do seu núcleo familiar com a escola e o
conhecimento construído na escola com seu núcleo familiar, não se distanciando da sua
comunidade de origem.

A educação do campo por muitos anos foi negligenciada a população do campo, e por
vezes, quando debatida na legislação, se limitava a formação de mão de obra para o processo
de industrialização que o país estava vivendo. Segundo Martins (2009), com a intensificação
das lutas pelos direitos sociais quando da abertura política do final dos anos 1970, os
Movimentos Sociais retomam a crítica da educação rural, como urbanizante e
descontextualizada das questões relativas ao campo e ao camponês.

Historicamente a educação ofertada no campo, pelas mais diversas instâncias


governamentais e políticas, para os estudantes filhos de agricultores, não se preocupa com o
desenvolvimento destes. Podemos comprovar isto, através das taxas de analfabetismo, onde
23,2% da população residente no campo com cerca de 15 anos é analfabeta, entre 9 e 16 anos
a adequação a idade/ anos de estudo é de 56% para os jovens do meio rural, índice 19%
inferior aos jovens urbanos. Outro dado que corrobora são os anos de escolaridade, que no
meio rural é cerca de 4,5 anos em média, enquanto no meio urbano de 7,8 anos (IBGE, 2010).

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Quando refletidas estas realidades ressalta-se que há uma dívida histórica em relação à
educação para a população rural, sendo que para reverter este contexto, a luta dos
trabalhadores e trabalhadoras rurais tem sido fundamental, contribuindo para a elaboração e
aprovação de normas legais no processo de construção de uma educação do campo como
Política Pública (PIRES, 2012). Assim sendo, busca-se uma escola que seja comprometida
com uma educação transformadora e que atenda aos interesses dos educandos onde estes se
tornem “sujeitos de sua própria educação” (FREIRE, 1999, p.28).

Anterior a Constituição Federal de 1988, segundo Henriques et al., (2007), a educação


para populações agrícolas havia apenas sido mencionada apenas para propor uma educação
instrumental, assistencialista ou de ordena. A partir da década de 1990 com objetivo de
pensar alternativas para suprir as necessidades da educação no meio rural, os movimentos
sociais começam a se organizar e intensificar suas lutas em prol da elaboração e
implementação das políticas educacionais voltadas para realidade do rural brasileiro
(HENRIQUES et al., 2007). Esta perspectiva de uma Educação do Campo apresenta uma
relação de proximidade e compartilhamento na concepção do processo educativo com os
referenciais da Educação Popular, a qual se fortalece na América Latina a partir da década de
1960 (GARCEZ, 2006).

Acondicionado a esta conjuntura de mobilização social, “a constituição de 1988


consolidou compromisso do Estado e da sociedade brasileira em promover a educação para
todos, garantindo o direito ao respeito e à adequação da educação às singularidades culturais e
regionais” (SANTOS E SILVA, 2008). Nesta nova compreensão de escola do campo deve-se
possibilitar aos educandos participar de seu desenvolvimento com acesso a decisões sobre a
construção do bem comum, assumindo um posicionamento frente a problemas sociais,
políticos, econômicos, culturais, religiosos e educacionais, adquirindo assim conhecimento
para a vida.

Após anos de luta e mobilizações populares dos movimentos sociais do campo a


Educação do Campo tornou-se parte da legislação brasileira e amparada por diversas Leis e
Diretrizes. Podemos destacar que no ano de 2002 foi aprovada a Resolução CNE/CEB Nº. 01
de 03 de abril que instituiu as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do
Campo, a serem observadas nas propostas das instituições que integram os diversos sistemas

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de ensino. Pode-se observar que partir de 2004, o Ministério da Educação propõe a construção
de uma política nacional de Educação do Campo, a partir do diálogo com as demais esferas da
gestão do Estado e com os movimentos e organizações sociais do campo brasileiro. Os eixos
orientadores dessa política em construção seriam: a diversidade étnico-cultural como valor; o
reconhecimento do direito à diferença e a promoção da cidadania (BRASIL, 2005).

De acordo com Freire (1992), a educação pode se tornar um agente importante nos
processos de libertação do indivíduo e da sociedade. E tornar popular a educação compreende
sua universalização e democratização em diferentes níveis tornando-a de fato acessível às
camadas populares pela via do conhecimento e da cidadania, frente às condições necessárias a
transformação social e a emancipação humana, finalidade da ação político-pedagógico. É uma
estratégia de construção da participação popular para o redirecionamento da vida social.

Segundo Arroyo (2001), a educação popular e o pensamento Freiriano tiveram origem


quando se percebeu que o camponês tem seu próprio conhecimento, seus mestres e sua
sabedoria, com grande valor. E neste contexto a educação rural é renomeada para educação do
campo como afirma Fernandes et al., (2004, p.25).

Decidimos utilizar a expressão campo e não mais a usual meio rural, com o
objetivo de incluir no processo (...) uma reflexão sobre o sentido atual do
trabalho camponês e das lutas sociais e culturais que hoje tentam garantir a
sobrevivência deste trabalho. Mas quando discutimos a educação do campo
estamos tratando da educação que se volta ao conjunto dos trabalhadores e
trabalhadoras, incluindo quilombolas, sejam as nações indígenas, sejam os
diversos tipos de assalariados.

No Brasil, pode-se afirmar que a Educação do Campo tem na Pedagogia da


Alternância sua gênese motivadora, a qual chega ao Brasil no final da década de sessenta. Tal
proposta surge inicialmente na França no ano de 1935 quando agricultores franceses não
satisfeitos com o sistema educacional reúnem-se para criar uma educação que atendesse suas
reais necessidades. Através da ação do Movimento de Educação Promocional do Espírito
Santo (MEPES), o qual fundou a então Escola Família Agrícola de Alfredo Chaves, Escola
Família Agrícola de Rio Novo do Sul e Escola Família Agrícola de Olivânia, essa última no
município de Anchieta, onde o objetivo inicial era atuar sobre os interesses do homem do
campo (PESSOTTI, 1978). Atualmente a Pedagogia da Alternância se difundiu no Brasil.

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A Pedagogia da Alternância possui um itinerário científico (ação – reflexão – ação),


como diz Paulo Freire na obra Pedagogia do Oprimido “A práxis, porém, é reflexão e ação
dos homens sobre o mundo para transformá-lo. Sem ela, é impossível a superação da
contradição opressor-oprimido” (FREIRE, 1987, p.38). Na prática essa pedagogia configura
uma dinâmica transformadora, capaz de mudar a realidade, estudando seus anseios, seus
limites e suas capacidades e é a partir da reflexão de suas ações que o educando constrói
novos espaços, valoriza sua cultura e fortalece novas ações mais sustentáveis e com
responsabilidades mediadas pela sociedade em que vive.
A Pedagogia da Alternância permite que o ensino de uma agricultura com base
ecológica seja mais eficiente e produtivo, pois permite que o educando observe sua realidade
e faça pesquisas participativas na sua comunidade, retorne a escola para refletir e analisar sua
realidade e volte para comunidade para experimentar e fazer novas interrogações e pesquisas.
Como destaca Pessotti

A alternância consiste em repartir o tempo de formação do jovem em


períodos de vivência na escola e na família. Esse ritmo alternado rege toda a
estrutura da escola e busca a conciliação entre a escola e a vida. Não
permitindo ao jovem desligar-se de sua família e, por conseguinte, do meio
rural (PESSOTTI, 1978, p. 37).

Esse novo sistema de ensino, que aproxima sociedade, pais, educadores e educandos,
permite uma conexão maior com a realidade no meio rural. Também traz para dentro da sala
de aula, os conhecimentos e saberes da população do campo, que antes eram menosprezados e
descriminados pela educação rural. Segundo Begnami (2003, p. 110), esta aproximação da
escola da realidade da família e da comunidade faz com que promova a integração entre
“educadores e educandos (as), escola e família, teoria e prática, estudo e trabalho, o pessoal e
o coletivo, os saberes experiências e os saberes científicos, os saberes pedagógicos com os
saberes disciplinares”.
No momento em que o sistema de ensino, a Pedagogia da Alternância, responsabiliza
pais, comunidades, educadores, gestores e educandos à educação de seus sujeitos, todos se
comprometem em construir conhecimentos a partir dos saberes da população do campo, da
sua prática e de seu cotidiano e também resgatando conhecimentos tradicionais e unindo a
estes os conhecimentos técnicos oriundos da academia e de pesquisas científicas.

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Comunicação Assertiva na Educação Contemporânea

A partir da análise da educação do campo e da pedagogia da alternância e com a


contribuição do estudo de ambas as temáticas, tomamos por base a relevância de colocar estes
temas, embasados especialmente na teoria de Paulo Freire, numa discussão da comunicação
assertiva no cenário contemporâneo. Pois, a educação é um ato comunicativo e precisa ser
assertivo.
Em 1971, Lazarus definiu assertividadecomo a capacidade para recusar e elaborar
pedidos, pedir favores, expressar sentimentos negativos e positivos e iniciar, continuar e
terminar uma conversa comum. Cinco anos mais tarde, Lange e Jakubwski consideraram a
assertividade como a defesa de direitos pessoais e a expressão de pensamentos, sentimentos e
crenças de forma direta, honesta e apropriada, de modo a respeitar os direitos das outras
pessoas (GRILO, 2012).
Mais tarde outros autores foram dando novas forma ao conceito, mas por certo, tem-se
que fato de ser assertivo no processo comunicativo parte de estudos da psicologia e que a
assertividade não faz parte da personalidade, ela é aprendida com o tempo. O ato de
comunicar-se e a forma como o mesmo ocorre tem muito do processo de vivência e das
crenças do sujeito que se comunica.
Trazendo este contexto para a educação do campo, essa é uma questão que já estava
sendo colocada por Paulo Freire, quando o mesmo destacava a necessidade de se comunicar
levando em consideração as diferentes realidades sociais dos indivíduos. Vejamos, para
Freire, o ato de educar está para a formação, para a promoção dos educandos, seu verdadeiro
sentido e significado. A concepção de educação em Freire está impregnada de esperança:

E a concepção de homem na perspectiva do devir, que está num constante


processo de constituir-se demanda uma educação que corresponda a essa
expectativa, isto é, uma Pedagogia da Esperança. E por ser a educação uma
prática construtora do humano, no homem e na mulher, educar para Freire é
humanizar e constitui-se numque-fazer social-político-antropológico-ético
(ECO E NOGARO, 2015, p.10).

Portanto, educamo-nos, obviamente, na relação, na interação, no convívio com outros


seres humanos. E é nesse processo que aprendemos a ser gente, porque convivemos com
gente. Educar, para Freire (1983), é “construir gente”, humanizar os humanos na luta em

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denunciar e superar os elementos desumanizadores. É nessa concepção educativa que a


comunicação, e sua forma de ser colocada ao educando, faz toda a diferença.
Mas nesse processo de aprender, a ser gente, o fato de obtermos um cenário social e
escolar dentro de um contexto comunicativo assertivo produz significados diferentes. Nas
escolas do campo, muitas vezes, não encontramos uma comunicação assertiva, isso ocorre
quando, por exemplo, professores urbanos e livros didáticos que falam do urbano e da
urbanidade num sentido positivo e colocam o rural como espaço do atraso. A falta de
assertividade no campo também ocorre quando os currículos das mesmas não são específicos
ao contexto rural, a educação rural é vista como inadequada e descompromissada com a luta
dos trabalhadores do campo por melhor condição de vida.
Essas circunstancias que demonstram uma comunicação não assertiva não são neutras.
Para Freire (2000, p.78), “Não há nem jamais houve prática educativa em espaço-tempo
nenhum de tal maneira neutra, comprometida apenas com ideias preponderantemente
abstratas e intocáveis”. Portanto, todo projeto pedagógico está imbuído de discurso político,
não há prática educativa neutra e se isso é rebeldia dos que são injustiçados pela força do
capital a outra também é, inclusive ao proclamar a ideia de que se está misturando educação
com política, pois não temos como separar trabalho e educação da vida dos sujeitos do campo,
e é neste momento que nos aproximamos da qualidade apresentada na formação superior em
alternância com os sujeitos do campo.
Portanto, a comunicação assertiva no ambiente escolar é uma pratica que exige
habilidades sociais, entendimento político e saber pedagógico. E ainda, quando praticada de
maneira séria e comprometida com a realidade social contribui significativamente para o
processo de aprendizagem do sujeito, assim como para potencializar suas habilidades.
Atualmente existem evidências de que os problemas de comunicação, com base na falta de
assertividade no ato comunicativo, têm provocado muitos problemas dentro do contexto
escolar.
O mundo e as relações, sejam no rural ou urbano, são pautadas pela comunicação e
esta deve ser utilizada para diminuir as distâncias entre os sujeitos, seja as distâncias físicas,
quando as sociais. Nesse sentido, o filósofo Mario Sérgio Cortella coloca que é o ato de tornar
algo comum a todos ou a alguém. Para tomar algo comum aquele que comunica deve ter o

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cuidado de conhecer com quem fala, para saber como deverá falar e o que deve falar, ou seja,
que forma comunicar, para que a mensagem seja inteligível.
Para o filosofo, o professor (comunicador) que assume uma postura assertiva ao
transmitir sua mensagem e ao se propor a construir conhecimento com aquele sujeito que está
a sua frente, deve pautar a comunicação em alguns princípios. Dentre estes princípios esta: ser
honesto, respeitar o saber do outro e se propor a ouvir. Esses são processos que ainda
precisam ser discutidos e aprimorados dentro do contexto educacional contemporâneo.

Considerações Finais

Os grandes desafios da educação do campo, estão em superar as relações clássicas de


formação e organizar sistemas formais e informais de educação que possam sustentar o
desenvolvimento humano do campo, enfim, em todos os níveis de ensino e que possam
superar indicadores técnicos, sociais, muitas vezes criados para compor vastos relatórios que
acabam por suportar apenas discursos políticos. Pensar a educação como princípio
pedagógico estratégico para o desenvolvimento sustentável, é pensar a partir da ideia de que o
território pode e deve ser reinventado, através das suas potencialidades e especificidades.
O ensino para os educandos oriundos do campo, baseado em grades curriculares,
disciplinas isoladas e na transmissão de conhecimento, sem levar em consideração a realidade
dos sujeitos, das suas famílias, ao invés de promover o desenvolvimento do meio, acaba por
distanciar da sua realidade, incentivando a busca de oportunidades fora das suas origens e não
proporcionando a sucessão de costumes, valores e do espaço sociocultural necessário para o
desenvolvimento como processo de liberdade, de surgimento de novas, modernas e
tecnológicas propostas de educação do campo, mas que considerem a vida do campo.
Para apoiar a educação do campo e as metodologias da pedagogia da alternância, a
construção da comunicação assertiva vem de encontro aos preceitos de Paulo Freire. Para o
educador a educação é uma prática libertadora, mas para tal concepção ser colocada em
prática o ato comunicativo entre os sujeitos (professor e aluno) deve ser assertivo. A
comunicação precisa ter reciprocidade se a educação é dialógica,a educação é comunicativa a
comunicação dá voz ao ato de educar, por isso é importante saber: eu como educador e
comunicador, que tipo de comunicação estou utilizando.

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GÊNERO E FEMINISMO NA ESCOLA FAMÍLIA AGRÍCOLA DE VALE DO SOL:


A UNIÃO DAS MONITORAS EM PROL DA EDUCAÇÃO IGUALITÁRIA EM UMA
ESCOLA DO CAMPO

Cláudia Magalia da Rosa Gonçalves62


Monique Aline Arabites de Oliveira63
Maria Luiza Tomaz64
Liziany Müller Medeiros4

Resumo
Quebrando paradigmas, algumas meninas (e suas famílias) que optam pelo ensino oferecido pela Escola Família
Agrícola de Vale do Sol (EFASOL), sofrem, diariamente, diferentes preconceitos provindos do machismo visto
no campo. Sensibilizados por essa realidade, a EFASOL busca trabalhar questões de gênero para
empoderamento das jovens, dentro e fora da escola. As atividades, apoiadas e auxiliadas pelos
monitores(as)/educadores(as), mas articuladas pelas monitoras da escola, extrapolam a sala de aula e procuram,
nas ferramentas pedagógicas da Pedagogia da Alternância (PA), como a tutoria, reforçar o empoderamento
feminino. Conclui-se que é imprescindível começar fazer um trabalho reverso ao que está imposto pela
hegemonia patriarcal. É na conversa, na insistência, no trabalho diário e contínuo que será possível alcançar o
maior objetivo: a igualdade entre todos e todas.

Palavras-chave: Empoderamento; Educação; Gênero.

Introdução

Segundo a Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário


(2018), mais de 14 milhões de mulheres estão no campo, nas lavouras, comunidades
quilombolas e indígenas e nas reservas extrativistas, sendo as protagonistas da Agricultura
Familiar no Brasil. Essas mulheres são responsáveis por 45% dos produtos que são plantados
e colhidos no país. Contudo, as mulheres do campo ainda são alvos de preconceitos e
machismos provenientes de uma cultura patriarcal acirrada, que coloca essas mulheres num
lugar de extrema submissão, e isso faz com que elas aceitem situações de violência, e, muitas
vezes, não reconheçam, sintam vergonha ou tenham dificuldade em admitir que estão em uma
posição de vulnerabilidade.

62
Escola Família Agrícola de Vale do Sol;Universidade Federal de Santa Maria; clau.agroindustria@gmail.com
63
Escola Família Agrícola de Vale do Sol; Unisc;moniquearabites@gmail.com
64
Escola Família Agrícola de Vale do Sol; Unisc; marialuizatomaz45@gmail.com
5
Universidade Federal de Santa Maria; UFSM; lizianym@hotmail.com

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A educação para os sujeitos do campo não pode ser desenvolvida a partir de um


projeto pensado para a escola urbana e deslocado das necessidades e da realidade do campo.
A Educação do Campo consiste em uma modalidade de educação e ensino prevista na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) n.º 9394/96(BRASIL, 1996). O artigo 28
desta lei, afirma que na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de
ensino promoverão as adaptações necessárias às suas peculiaridades, especialmente no que se
refere aos conteúdos curriculares e metodologias apropriadas, à organização escolar própria, à
adequação à natureza do trabalho na zona rural.
Dentre as várias maneiras de se promover as adaptações curriculares necessárias à
adequação e às peculiaridades da vida rural destaca-se a Pedagogia da Alternância, praticada
no Brasil pelos Centros Familiares de Formação por Alternância (Ceffas). Um Ceffa pode ser
definido como uma instituição educativa do campo, criada para formar jovens filhos de
agricultores que buscam a formação integral a partir da sua própria realidade (ESTEVAM,
2012).
É uma casa-escola, na qual os jovens estudam, alternando o tempo e o espaço, os
conteúdos de formação geral e profissional, sem abandonar suas atividades na propriedade. É
administrada por uma Associação de Pais e lideranças da comunidade envolvida no projeto,
utilizando como método de ensino a Pedagogia da Alternância, em que o jovem passa uma
semana no Ceffa em regime de internato e uma semana no seu meio sócio familiar
(ESTEVAM, 2012).
No Brasil, Estevam (2012) revela que o movimento da PA apresenta-se dividido em
dois modelos: o das Escolas Família Agrícola (EFAs)e o das Casas Familiares Rurais (CFRs),
sendo que, o que diferencia estas são a forma como chegaram ao Brasil, se são oriundos da
experiência francesa (CFRs) ou da italiana (EFA).Silva (2003) discorre que, no Brasil, as
EFAs e as CFRs, apesar de possuírem características diferenciadas, tem em comum como
princípio norteador de seus projetos a PA.
A Escola Família Agrícola de Vale do Sol (EFASOL) é resultado de uma mobilização
de agricultores familiares, lideranças comunitárias, pessoas e entidades comprometidas e
preocupadas com o desenvolvimento regional e a existência de melhores oportunidades para
os jovens filhos e filhas de agricultores familiares.A idéia surgiu no ano de 2012, quando
preocupados com o intenso êxodo rural, especialmente de jovens em busca de melhores

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condições de estudo e trabalho, algumas lideranças comunitárias conheceram a experiência da


Escola Família Agrícola de Santa Cruz do Sul (EFASC), vinculada à Associação Gaúcha Pró-
Escolas Famílias Agrícolas - AGEFA.

Iniciaram-se então articulações, e com assessoria da AGEFA, foram realizados


diversos encontros comunitários no município de Vale do Sol. Estes encontros tinham como
objetivo divulgar a proposta, bem como a aplicação de uma pesquisa para identificação do
perfil e interesse das famílias e possíveis educandos. Como houve ótima receptividade da
comunidade, bem como, um amplo apoio de agentes públicos e privados, decidiu-se dar o
primeiro passo concreto para a existência da escola, que foi a criação da sua mantenedora, a
Associação da Escola Família Agrícola de Vale do Sol.

Atualmente, a EFASOL conta com 79 educandos oriundos de regiões rurais de 16


municípios pertencentes ao Vale do Rio Pardo, no Estado do Rio Grande do Sul, Brasil.
Desses jovens, 24 são mulheres e 55 são homens, apresentando, inclusive nesses números,
uma desigualdade de gênero provinda do senso comum muito instituído no meio rural de que
“ensino técnico não é lugar para mulher”.

Neste contexto, o presente trabalho objetivo relatar a experiência das


monitoras/educadoras da EFASOL, enquanto educadoras de uma escola do campo,que
trabalha a partir da Pedagogia da Alternância (PA).

A pedagogia de alternância é, conforme Caldart (2008), um instrumento pedagógico que


articula o tempo e o espaço de formação, para facilitar o intercâmbio entre o meio de
vivência, promovendo a autonomia dos jovens, através do princípio de ação-experiência,
reflexão-teoria e ação-experimentação. Para Gimonet (2007), a Pedagogia da Alternância dos
Centros de Formação por Alternância representa um caminhar permanente entre a vida e
aescola, saindo da experiência de saberes mais teóricos para voltar novamente à experiência, e
assim sucessivamente.

Conforme BRASIL (2006), a alternância deve supor estreita conexão entre os dois
momentos de atividades em todos os níveis – individuais, relacionais, didáticos e
institucionais. Ressalta-se que não há primazia de um componente sobre o outro, a ligação
permanente entre eles é dinâmica, e se efetua em um movimento contínuo de ir e retornar,

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embora seja a forma mais complexa da alternância, seu dinamismo permite constante
evolução.
Na EFASOL a PA desenvolve-se pensando na realidade das famílias que vivem do/no
campo, estruturada de maneira em que os educandos fiquemuma semana na escola,
convivendo com colegas, monitores/educadores,aprendendo e ensinando em todas as esferas,
desde o convívio um com outros, até os conteúdos curriculares, contextualizados seguindo o
dia-a-dia da juventude do campo, e outra semana na propriedade, onde pais e mães dedicam-
se a serem os educadores de seus filhos e filhas.
A EFASOL abrange educandos que vivem na área rural de 16 municípios diferentes
pertencentes à região do Vale do Rio Pardo. Considerando a realidade dessa região e, a partir
das ferramentas pedagógicas da PA, como a tutoria, as monitoras/educadoras da escola
diagnosticaram nos quatro anos de existência da escola, uma urgência no que tange o trabalho
formativo sobre questões de gênero. Dessa maneira, as educadoras criaram um grupo de
trabalho e estão realizando formações, seminários e eventos destinados à discussão de gênero
na escola, além de utilizarem das ferramentas pedagógicas da PA para conversarem assuntos
relacionados ao feminismo e gênero com cada educanda, esclarecendo dúvidas e trabalhando
intensamente a importância da igualdade e da equidade todos os dias.

“Lugar de mulher é onde ela quiser”

Quebrando paradigmas, algumas meninas (e suas famílias) que optam pelo ensino
oferecido pela EFASOL, sofrem, diariamente, diferentes preconceitos provindos do
machismo visto no campo. O machismo, que reflete até no ensino, que, muitas vezes, é mais
limitado para mulheres nas áreas rurais, pois muitas não vêem necessidade de dar
continuidade a sua instrução, pois se casam cedo e dedicam suas vidas a cuidar dos filhos e do
marido. Além disso, agressões às meninas e mulheres, sejam elas físicas, sexuais,
psicológicas, verbais, dentre muitas outras, dentro e fora de casa, são normalizadas no
contexto rural. Soma-se a isso, o descrédito ao trabalho realizado por mulheres, que
desencoraja as jovens a buscarem ensino técnico e/ou superior, ou mesmo, saírem de
situações de risco.

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Conforme Costa et al. (2015), a mulher do campo é vista sob a ótica da relação de
serviço, subordinação e obediência, considerada responsável pela reprodução biológica,
cuidadora do lar e dos afazeres domésticos, sem direito de expressar e relatar seus sentimentos
e, com pouca ou nenhuma legitimidade para "desconformidades".O masculino é ritualizado
como o lugar da ação, da decisão,da chefia da rede de relações familiares e da
paternidadecomo sinônimo de provimento material, em consequência, o masculino é
investido, significativamente, com a posição social(naturalizada) de agente de poder da
violência, havendo, historicamente,uma relação direta entre as concepções vigentes de
masculinidade e o exercício do domínio de pessoas, de guerrase de conquistas (LAMOGLIA
e MINAYO, 2009; COSTA et al. 2015).
Sensibilizados com essa realidade, a EFASOL busca trabalhar questões de gênero para
empoderamento das jovens, dentro e fora da escola. As atividades, apoiadas e auxiliadas pelos
monitores(as)/educadores(as), mas articuladas pelas monitoras/educadoras da escola,
extrapolam a sala de aula e procuram, nas ferramentas pedagógicas da Pedagogia da
Alternância, como a tutoria, reforçar o empoderamento feminino. Aliado a isso, são realizados
seminários e eventos que discutem o lugar da mulher dentro da sociedade por diferentes
prismas que consideram desde a importância da independência das mulheres e da instrução da
juventude rural, até questões como maternidade, raça, homossexualidade, etc.
A prática pedagógica proporcionada pela Pedagogia da Alternância é norteada pela
vivência em semi-internato, onde os jovens ficam uma semana na escola e outra na
propriedade, aprendendo com suas mães e seus pais sobre agricultura familiar. Quando
regressam à escola, eles apresentam os estudos realizados em casa, e todas as aulas são
compreendidas e contextualizadas tendo em vista as experiências no contexto familiar.
Além da alternância, outros instrumentos pedagógicos da PA são: o plano de estudos,
que é o relatório sobre o que foi pesquisado na propriedade, entregue a cada sessão escolar; o
caderno de acompanhamento, que é o local de comunicação entre monitores/educadores e
família; e a tutoria, realizada por um monitor/educador que tem como responsabilidade
acompanhar alguns educandos mais individualmente, realizando desde correções do plano de
estudos, até conversas orientadoras sobre o cotidiano.
Destaca-se que são nas tutorias que as monitoras/educadoras possuem uma afetividade
maior com cada jovem. Nesses momentos, conversas são realizadas e são compartilhadas a

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realidade de cada educanda (Figura 1). Também, na tutoria que as monitoras/educadoras,


tendo em vista o trabalho sobre equidade entre gêneros, encontraram uma maneira de auxiliar,
além dos conteúdos curriculares. Tornou-se uma maneira de promover o empoderamento das
jovens, através de mediações que abordam o amor próprio, a autoestima e a autoconfiança
extremamente necessária para as mulheres do campo, pois elas, além de cuidar da casa, das
filhas(os) e laborar tanto quanto o homem na agricultura (apesar, de muitas vezes, os
educandos (as)relatarem que a mãe “ajuda” o pai), não são vistas, são invisíveis.
As mulheres são consideradas trabalhadoras ativas dos processos produtivos, além do
trabalho na roça,cultivam toda a alimentação que vai para a mesa da família, nãosão as
mulheres que se ocultam, são as relações desiguais que lhes atribuem hierarquias
(LORENZONI, 2007; COSTA et al. 2015). Com isso, o trabalho delas na esfera produtiva
permanece, praticamente, invisível, porque é praticado no interior do estabelecimento, sendo
os homens praticamente os únicos responsáveis pelos contatos com o exterior -
bancos,sindicatos, cooperativas, entre outros (LORENZONI, 2007).

Figura 1. Monitora/educadora no momento de Tutoria com uma


educanda.
Fonte: Arquivo das autoras.

Nos momentos de tutoria, ocorre a aproximação e se constroem laços afetivos com as


educandas, pois o diálogo e o compartilhamento de angústias, dúvidas e medos com as
monitoras/educadoras, permitem um conhecimento maior sobre a realidade de cada educanda,

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sendo dessa maneira, possível trabalhar o empoderamento de cada jovem. São nesses
momentos, que elas são encorajadas a enfrentar a difícil realidade em que estão inseridas, e,
onde é possível oferecer apoio para que elas consigam se sentir protagonistas de suas vidas.
De maneira interdisciplinar, a EFASOL também trabalha a questão de gênero dentro
das áreas pertencentes ao seu currículo. A escola possui três grandes áreas que buscam
realizar atividades sempre em conjunto, sendo elas: Ciências Agrárias (Química, Física,
Biologia, Agronomia e Ciência dos Alimentos); Linguagens (Literatura, Língua Portuguesa,
Língua Estrangeira, Teatro, Música, Artes Visuais e Educação Física); e Ciências Humanas
(Filosofia, Direito e Cidadania, Sociologia, História, Geografia, Matemática e Gestão da
Propriedade).

Resultados e Discussões

A partir do trabalho que vem sendo desenvolvido pelas monitoras/educadoras, percebe-


se que as educandas da EFASOL estão mais empoderadas diante de suas realidades. Muitas
jovens engajaram-se em movimentos feministas, como o movimento de mulheres camponesas
do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e vem realizando atividades de
empoderamento com outras mulheres que vivem em suas comunidades, assim, extrapolando
os limites da escola e auxiliando outras agricultoras a se enxergarem como protagonistas de
suas próprias histórias (Figura 2). Outras jovens vêm enfrentando suas realidades e ousando
sair de rotinas de risco vivenciadas dentro de suas próprias casas, encontrando no grupo de
mulheres da EFASOL um lugar de apoio, companheirismo e ativismo.

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Figura 2. Atividades de empoderamento com outras mulheres que vivem em suas


comunidades.
Fonte: Arquivo das autoras.

Além do trabalho nas áreas, também se realizam com frequência eventos que
permitem o diálogo sobre gênero e abrem possibilidades para debates (Figura 3). No dia 08 de
março de 2018, foi realizado um Seminário sobre questões de gênero que fomentou reflexões
acerca do ser mulher na sociedade atual. As conversas tiveram início na parte da manhã com a
discussão sobre o conceito de gênero, realizado pela Dra. Mariana Jantsch de Souza.
Também, houve uma roda de conversa que uniu educandas, monitoras/educadoras e mulheres
que são referência em suas áreas de atuação, dentre elas estavam a artista plástica e designer
Carla Vieira, a musicista Deline Rossi e as professoras Kellen Santos, Graça Vieira e Mariana
Jantsch de Souza. O debate teve como objetivo refletir sobre as dificuldades em ser mulher na
contemporaneidade e os caminhos possíveis para diminuir as desigualdades entre gêneros
ainda existentes no nosso contexto social.

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Figura 3. Atividades de empoderamento com as educandas e


monitoras/educadorasna EFASOL.
Fonte: Arquivo das autoras.

A atuação da mulher no campo é imprescindível para que todo o sistema de produção


aconteça. A mulher é responsável pela organização da casa, da família, muitas vezes pelo
trabalho agrícola. Sua participação é de extrema importância para realizações das ações e
atividades. Porém, considerando as mães e filhas que optaram pelos estudos na EFASOL,
muitas não percebem a importância que possuem enquanto agentes de transformação do
contexto onde vivem:

Não é comum as mulheres demonstrarem ter consciência da repressão de gênero a


que estão submetidas. Veem a organização da esfera doméstica como algo
naturalizado, ainda que se queixem do excesso de trabalho. E aquelas que participam
mais da vida pública não compreendem o processo que possibilitou a chegada delas
ao nível em que se encontram e acreditam que a decisão de participar ou não dos
espaços públicos esteja atrelada a opção pessoal e não às limitações de gênero
(GARCIA apud SILVA, 2009).

Os monitores(as)/educadores(as) da EFASOL desejam desconstruiro contexto de


machismo no campo, pois, é notório que o trabalho dentro das ferramentas pedagógicas da
PA, reforçado por diálogos problematizadores proporcionados continuamente no âmbito da

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escola, favorecem não apenas as jovens educandas, mas também suas mães, que se sentem
mais empoderadas, inclusive, em participar da associação da escola. O intuito é que, no
futuro, essas meninas possam perceber a importância que possuem, e o papel de agentes
transformadoras que podem ter tanto na escola, quanto em suas comunidades e famílias.
Ações como essa, permitem modificar a realidade em que as educandas estão inseridas.
Infelizmente, o machismo está enraizado na conduta da sociedade como um todo e é
extremamente difícil se desprender de certos hábitos que estão profundamente enraizados,
principalmente no contexto do campo. Contudo, é imprescindível o início de um trabalho
reverso ao que está imposto pela hegemonia patriarcal. É na conversa, na insistência, no
trabalho diário e contínuo que conseguiremos alcançar nosso maior objetivo: a igualdade
entre todos e todas nós.

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O TRABALHO PEDAGÓGICO DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA ESCOLA DE


ASSENTAMENTO DO MST: UM ESTUDO DE CASO

Carine Marques Charão65


Gislei José Scapin66
Maristela da Silva Souza67

Resumo

Neste artigo objetivamos compreender como se constitui o trabalho pedagógico da Educação Física,
no que se refere a teoria pedagógica, na Escola Estadual de Ensino Fundamental Roseli Correa da
Silva (RCS). O contexto da pesquisa se desenvolve no assentamento Nova Santiago. Trata-se de uma
pesquisa do tipo estudo de caso, que se utiliza do materialismo histórico e dialético como
fundamentação teórica. Após o percurso investigativo, confirmamos a hipótese levantada no estudo,
que o MST e, consequentemente, a escola do assentamento e o trabalho pedagógico da EF, através da
teoria pedagógica, vem afastando-se dos princípios que inicialmente/historicamente nortearam a
educação do campo e inspiraram as primeiras lutas na conquista da terra.

Palavras-chave: Trabalho Pedagógico; Movimento Social; Educação Física; MST.

Introdução

O objetivo deste artigo é compreender como se constitui o trabalho pedagógico da


Educação Física no que se refere a teoria pedagógica, na Escola Estadual de Ensino
Fundamental Roseli Correa da Silva, localizada no assentamento Nova Santiago.
Nossa hipótese se baseia no pensamento de Kopnin (1978) denominando-a não como
um enunciado isolado, mas como uma fração do pensamento em que a ideia não se encontra
suficientemente desenvolvida, mas que, no processo de elaboração do conhecimento,
converte-se em teoria. Sendo assim, levanta-se como hipótese nesse estudo, que o MST e
consequentemente a escola do assentamento e o trabalho pedagógico da EF, através da teoria
pedagógica, vem afastando-se dos princípios que inicialmente nortearam a educação do
campo e inspiraram as primeiras lutas na conquista da terra.

65
Centro de Educação Física e Desportos – UFSM; carinemarxcharao@gmail.com
66
Centro de Educação Física e Desportos – UFSM; gjscapin@gmail.com
67
Centro de Educação Física e Desportos – UFSM; Maristeladasilvasouza@yahoo.com

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Analisamos este processo a partir da teoria pedagógica, entendendo teoria enquanto


“uma forma de pensamento que tem suas peculiaridades e ocupa um certo lugar no
movimento do conhecimento” (Kopnin, 1978, 237). Neste movimento, a Teoria Pedagógica
formula princípios norteadores que tratam o trabalho pedagógico (Freitas, 1995). A teoria
pedagógica, portanto, realiza a mediação entre a Teoria Educacional, que relaciona Educação
e Sociedade em seu desenvolvimento, e Organização do Trabalho Pedagógico, que segundo
Freitas (1995), se insere na Teoria Pedagógica e se materializa em dois níveis no interior da
escola: 1) Trabalho pedagógico, que costuma se desenvolver em sala de aula; 2) Projeto
político pedagógico da escola.
Portanto, por meio da Teoria pedagógica, objetivou-se melhor conhecer o trabalho
pedagógico do professor, a constituição da escola do MST e sua relação com a sociedade, em
especial através do professor de Educação Física. Entendemos que o contexto singular do
trabalho da Educação Física, vai ao encontro da escola e de seu processo de constituição, que
não só concebemos ser fruto de uma lógica social, mas de uma história em particular, nesse
caso a da escola RCS, e que ainda desconhecíamos.

Metodologia

A pesquisa do tipo estudo de caso utilizou-se do materialismo histórico e dialético


como fundamentação teórica, e com o objeto nos utilizamos das categorias de conteúdo que
conforme Kuenzer (1998) são aplicáveis ao particular, específicas em cada pesquisa,
coerentes com seus objetivos. As categorias de conteúdo neste estudo, a priori estabelecidas,
se constituem em: Trabalho, MST, Educação do Campo, Trabalho Pedagógico da Educação
Física e Teoria Pedagógica. Através destas categorias, temos a possibilidade de estabelecer,
dialeticamente, a relação entre o universal (projeto histórico), o particular (escola RCS) e o
singular (trabalho pedagógico do professor de EF).
As entrevistas foram realizadas nos meses de fevereiro e março de dois mil e dezesseis
nas cidades de Santiago e Capão do Cipó, onde o (a) pesquisador(a) permaneceu por quatro
dias consecutivos. No total do grupo, foram realizadas vinte e sete entrevistas, tendo como
critérios o pertencimento a gestão democrática da escola, ou seja, conselho escolar, CPM

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(Círculo de Pais e Mestres) e liderança de turmas. Participaram da entrevista nove educadoras,


duas funcionárias, onze alunos e cinco responsáveis pelos alunos (pais, avós e parentes
próximos).

Análises teóricas
Teoria Pedagógica: mediação entre teoria educacional e trabalho pedagógico

[...] embora tenhamos avançado significativamente, e com muita qualidade, na


compreensão das dimensões pedagógicas das relações sociais e produtivas,
contribuindo para a construção de uma nova teoria sobre a educação nesta etapa de
reestruturação do capitalismo, há que indagar até que ponto ainda o mundo do
trabalho tem sido seguido pelo necessário retorno à escola (KUENZER, 1998, p.
71).

A teoria educacional trata dos aspectos mais gerais, relacionando sociedade e


educação, para isso deixa claros seus objetivos, o seu projeto histórico, o tipo de homem e
mulher que deseja formar.

Segundo Freitas (1987), “Um projeto histórico enuncia o tipo de sociedade ou


organização social na qual pretendemos transformar a atual sociedade e os meios
que deveremos colocar em prática para sua consecução. Implica uma ‘cosmovisão’,
mas é mais que isso. É concreto, está amarrado a condições existentes e, a partir
delas, postula meios e fins” (TITTON, 2006, p. 72).

Tanto a teoria educacional quanto a teoria pedagógica expressam uma concepção de


mundo e apontam para um projeto histórico. Tal projeto

[...] deve ser considerado em todos os momentos da análise, pois a superação do


atual projeto societário só pode ser possível se reconhecidas as contradições deste
mesmo projeto, identificando nestas as possibilidades de ação para sua superação
(TITTON, 2006, p. 72)

Todo trabalho pedagógico tem uma teoria que o fundamenta, o fato do professor
desconhecer, ou até mesmo utilizar-se de várias teorias pedagógicas de forma acrítica, não
extingue a existência da teoria68. É por influenciar o trabalho do professor na escola, que uma

68
Fala proferida por Newton Duarte no vídeo disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=uCHSUjiQjPQ>. Acessado: em 22/09/2015.

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teoria pedagógica é importante, pois esta pratica social não esta separada da luta ideológica.
Se não temos tais aportes, cairemos em incoerências e contradições.
A partir da década de noventa, acompanhando os ditames da “terceira via,” os
trabalhadores passam a ser formados pela influencia de outra lógica, explicitada em
documentos relacionados a educação, e aos órgão que se relacionam ao BM, como: “a ênfase
no saber fazer e saber ser, no aprender a aprender, no desenvolvimento de habilidades e
competências” (GARCIA, 2015, p. 110).
No que se refere à educação dentro do MST69 surgiu em virtude da própria
necessidade constatada na prática social, nos primeiros acampamentos. Ao mesmo tempo em
que o movimento se organizava, procurava pensar os processos educativos. “Intimamente
ligado ao processo de ocupação da terra está a história da educação no MST, conforme
relatado por Caldart [...]” TITTON (2006, p. 47). Portanto, é desta prática social que surge
também a teoria pedagógica que hoje é chamada Pedagogia do Movimento Sem Terra,
sistematizada pela intelectual orgânica do Movimento, Roseli Caldart.
D’Agostini (2009) e Titton (2006) ao analisarem a teoria educacional, que direciona a
teoria pedagógica e a organização do trabalho pedagógico no interior das escolas do MST,
constatam que as produções teóricas na educação dentro do Movimento que inicialmente
eram mais coletivas, passaram a ser, a partir da década de noventa, mais individuais e que
existem tendências pós-modernas70 na produção de conhecimento.
Segundo Garcia (2009, p. 116) existem dois momentos “bem demarcados na história
da produção teórica da Pedagogia do Movimento, assim como a existência de uma transição
69
“No caso do MST e das suas escolas, há duas décadas aproximadamente, identifica-se a preocupação com a
formação humana e educação dos sem-terra, que se constata pela organização e construção da Teoria Pedagógica
do Movimento. Por esse motivo, diversas lutas em defesa pela garantia de escolas e a organização de inúmeros
cursos de formação de professores, congressos, encontros nacionais e estaduais vêm ocorrendo sistematicamente.
Trata-se de uma preocupação orientada para a educação da classe trabalhadora do campo e, ao mesmo tempo, da
intenção de vir a ser uma formação humana orientada para o confronto com o modo de produção capitalista. E,
por esse aspecto e pelas dimensões sociais que podem ser alcançadas, talvez se possa dizer que pelas ações e
lutas do MST tenha-se ali uma retomada ontológica do ser social” (GARCIA, 2009, p. 40).
70
“Caldart (2004, p. 28) em sua produção assume a possibilidade de estarmos na pós-modernidade. Percebemos
também que, diferentemente dos cadernos de Educação do MST, nesta obra há um distanciamento com as
categorias marxistas trabalho, classe, luta de classes e revolução, e há um privilégio das categorias cultura,
identidade e subjetividade. A autora não nega nem essas categorias e nem o trabalho como princípio educativo,
mas atribui maior ênfase à cultura e aos processos culturais para a formação do sujeito social e sua identidade”
(D AGOSTINI, 2009, p. 135).

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entre um e outro com a tese de doutorado de Caldart (1999)”. Mesmo que embora a autora
reconheça, fundamentada em Kopinin que toda teoria necessita de um amadurecimento71 e de
estar sendo constantemente revisitada, revisada e construída.
Há que se destacar, também, os princípios pedagógicos e filosóficos ressaltados pelo
Movimento, no Caderno Pedagógico nº. 08 (MST, 1996). Nos princípios filosóficos estão: A
educação para a transformação social; Educação para o trabalho e a cooperação; Educação
voltada para as várias dimensões da pessoa humana; Educação com/para valores humanistas e
socialistas e Educação como um processo permanente de formação/transformação.
Quanto aos princípios pedagógicos temos: Relação entre teoria e prática; Combinação
metodológica entre processos de ensino e de capacitação; A realidade como base da produção
de conhecimento; Conteúdos formativos socialmente úteis; Educação para o trabalho e pelo
trabalho; Vinculo orgânico entre processos educativos e processos políticos; Vínculo orgânico
entre educação e cultura; Gestão democrática; Auto-organização dos/das educadores; Atitudes
e habilidades de pesquisa; Combinação entre processos pedagógicos coletivos e individuais.

Trabalho pedagógico da Educação Física e Educação do campo

O trabalho pedagógico do qual estamos tratando, não está desvinculado do trabalho


como categoria fundante do ser humano. Entretanto, esse é um tipo de trabalho que está
ligado, sobretudo a educação. É um tipo de trabalho não material, onde o produto não se
separa do ato de produção, conforme Saviani (1984, p. 1) o “ato de produção e ato de
consumo se imbricam”. Paro (2002, p. 33) também afirma que “no processo de trabalho
pedagógico, o produto não se separa da produção”.
A forma predominante de educação, em nossa sociedade é a escolar, de tal maneira
que se confunde educação como sinônimo de escola, mesmo que saibamos que a educação é
muito mais ampla. O trabalho pedagógico em questão aqui é o que se desenvolve nessa

71
“Para esse autor, o conhecimento, ao se converter em teoria, deve atingir em seu desenvolvimento certo grau
de maturidade, ou seja, enquanto o conhecimento se restringir apenas à seleção e descrição dos fatos da
realidade, relativos a um ou outro objeto ou fenômeno(s), esse conhecimento está tratando apenas de um enfoque
da teoria, “uma preparação para a sua criação e não a própria teoria” (KOPNIN, 1978, p. 237)” (GARCIA,
2009, p. 118).

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instituição, e este não fica alheio ao processo de produção ora vigente, o do sistema
capitalista.
Podemos afirmar que no interior da escola, o trabalho pedagógico do professor EF,
tem características próprias, exige espaços diferenciados das demais disciplinas (nem sempre
existentes nas escolas, em sua maioria, projetadas apenas como salas de aulas), material
pedagógico específico, e que, portanto sua atuação é diferente das demais disciplinas.

O professorado de Educação Física realiza um trabalho nas escolas, ao mesmo


tempo, comum a dos outros professores, em função da consonância com os
propósitos da instituição escolar; e singular, em função da especificidade dos
conhecimentos e das práticas da área. Tal especificidade pode ser facilmente
visualizada na natureza dos espaços que os professores de Educação Física utilizam
para sua intervenção, na peculiaridade dos materiais e recursos que esses fazem uso,
no trato pedagógico com as manifestações da cultura corporal e com o movimento, e
mesmo, nas relações que esses docentes estabelecem com outros professores e com
o alunado (WITTIZORECKI, 2001, p.27).

Sobre as condições de trabalho do professor de EF, nas escolas pesquisadas por Frizzo
(2012, p. 102) foi encontrada uma precária infraestrutura para aulas de EF, carência de
materiais didáticos, crescente intensificação do trabalho do professor decorrente das
condições de remuneração e trabalho, não existência de incentivo para a formação continuada
e o limitado acesso ao conhecimento por parte do alunado.
Se tais características das condições de trabalho da EF são encontradas por Frizzo nas
escolas urbanas, pesquisadas em sua tese, o que podemos dizer a respeito de tais
características nas escolas do/no campo, tendo em vista que a precarização do trabalho em
educação, nesta realidade, é muito maior72 e aumenta na mesma proporção em que a lógica do
capitalismo avança e combina elementos como agronegócio, latifúndio e monocultura.
Sabemos que as escolas do campo têm particularidades quanto ao tamanho, número de
professores, número de alunos e funcionários, sendo na maior parte das vezes, menores do
que as escolas localizadas no meio urbano. Essas características influenciam a organização do
trabalho pedagógico e fazem com que o Estado venha considerando como “gasto” manter
aberta a escola do campo e a mão de obra de trabalhadores lotados ali, explorando ainda mais

72
“Os professores da área rural enfrentam as consequências da sobrecarga de trabalho, da alta rotatividade e das
dificuldades de acesso e locomoção. Além disso, recebem salários inferiores aos da zona urbana e estão entre os
que tem menor nível de escolaridade” (TRANZILO, 2008, p. 67).

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o trabalho dos educadores, que muitas vezes atendem turmas multiseriadas, ou mesmo
ministrando disciplinas para as quais não possuem formação, a fim de preencher totalmente
sua carga horária semanal.
Outra situação recorrente é a de que caso o professor não preencha na mesma escola a
totalidade de suas horas, o mesmo se sujeitará a atender mais de uma escola, tendo poucas
horas em cada uma delas. O fato de ter menor número de alunos e turmas faz com que na
maioria das escolas do campo, a carga horária seja tão pequena que não se consiga deslocar
um professor de Educação Física para ministrar a disciplina, e nesse caso, outro professor
com formação pedagógica diferente irá assumir essa responsabilidade.
Citamos como exemplo dessa realidade, as duas escolas de assentamento, localizadas
na abrangência da oitava coordenadoria regional de educação, a Escola Estadual de Ensino
Fundamental Santa Júlia no assentamento Santa Júlia e a Escola Estadual de Ensino
Fundamental 15 de Março, no assentamento Nova Ramada. Ambas não possuem professores
de Educação Física. A própria escola RCS, estudada nesta pesquisa, foi fundada em 1988,
mas contou com a primeira professora de Educação Física somente no ano de 2005. Segundo
Avila (2004, p.7)

Neste sentido, entendemos que pensar a formação continuada das professoras do


MST é fundamental para que a Educação Física nesta realidade comece a se
consolidar, a partir de uma perspectiva crítica articulada com os demais saberes.
Assim, este momento apresentado no trabalho reflete o início de um processo que
precisa ser contínuo e permanente. Provocando um movimento duplo: que a
Educação Física seja repensada pela escola e por ela mesma, a partir desta prática
social - a escola do campo inserida num movimento social organizado.

Ao mesmo tempo, sabemos que a relevância da Educação Física na escola relaciona-se


com a proposta pedagógica da instituição, enquanto entendimento da teoria educacional, que
se materializa na medida em que a gestão democrática, através de um coletivo de educadores,
organiza o trabalho pedagógico, sendo que esta importância também está relacionada com
realidade social em que a escola está inserida.

O contexto da pesquisa: com a palavra... os sujeitos

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Para a análise das entrevistas utilizaremos as categorias de conteúdo estabelecidas


neste estudo, subdivididas em dois grupos a fim de aglutinar as respostas encontradas nas
falas dos sujeitos.
Nas questões relativas ao MST, a relação das educadoras com o Movimento se dá
prioritariamente pela escola, tendo todo o grupo afirmado que essa relação existe e pode ser
melhorada. A escola também participa do encontro Sem Terrinha que é uma atividade do
Movimento, realizada anualmente no mês de outubro, próximo ao dia em que se comemora o
dia da criança.
Educadora 2, quando perguntada sobre sua relação com o MST:

Ah, só de palestras, grupos, formação em Veranópolis, em Porto Alegre,


Uruguaiana, Santana, foram os que teve nesse último governo, quase todos eu fui!
(Educadora 2)

Tem, não diretamente, mas tem. É uma escola de assentamento, ela conta a história
dos assentados, então, indiretamente ela tem esse comprometimento com o
movimento, embora não tenha uma participação ativa. Há pessoas que estão fazendo
pós-graduação lá dentro do movimento e que vão pegar informação na escola,
entrevistas, então ela tem sim uma participação. A escola participa também do
movimento Sem Terrinha, sempre tem professor junto, há muitos anos. (Educadora
1)

Em relação a Educação do Campo, todos os educadores afirmaram que a escola


trabalha voltada a essas questões, tendo demonstrado que a RCS é uma escola diferente
quando comparada a outras que já tiveram a experiência de trabalhar. Essas características
podem ser encontradas na disciplina de técnicas agrícolas, na bandeira da escola, no objetivo
e filosofia da mesma, entre outros exemplos citados.

Sim, a formação continuada, assim na verdade a gente promove lá na Escola, né? faz
reuniões de planejamento, mais por esse lado assim de organização do trabalho
pedagógico, porque o Estado em si, né? ultimamente ele não tem fornecido uma
formação pedagógica, a não ser no governo passado que foi feito, né? em Educação
do Campo, ai sim teve várias formações mais voltadas pra Educação do Campo, pra
Pedagogia do Campo, ai eles tavam querendo implantar a questão do ciclo ai teve
muitas formações, né? (Educadora, 3)

Como o grupo é composto na sua totalidade de mulheres algumas demonstraram-se


sobrecarregadas em relação as tarefas domesticas, filhos, lar, família, além da carga horária de

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trabalho na escola, ou em duas, ou até em três como é o caso de uma professora que desloca-
se por três escolas em dois municípios diferentes. Nem todas as professoras são nomeadas
como a maior parte do grupo, além da existência de cinco contratos.

É que às vezes, como diz o outro, a gente não é só profe, né? às vezes é mãe, às
vezes tu pensa em fazer, mas em função da família da gente, a gente tem que dar
uma estagnada porque às vezes tu quer, mas disse aí desculpe cheguei atrasada, eu,
eu, sabia que eu tinha que chegar as nove, mas é que não deu, mas aí em outro
momento a gente tenta, e faz parte da vida da gente isso. E eu, às vezes eu me sinto
chateada porque parece que eu não to conseguindo dá conta de tudo o que eu tenho
que fazer, mas tudo se organiza no seu devido tempo, então eu digo assim, eu vou
tentar cumprir, mas as vezes eu não consigo ir além do jeito que eu queria, porque
eu não tive aquele tempo. (Educadora 7)

No grupo de alunos, o trabalho a que se referiram os sujeitos é o trabalho campesino,


lavoura, no trato com animais, serviços domésticos dentro do lar, ao redor da moradia,
apiário, hortaliças. Nesse sentido, percebemos mais os meninos ligados a atividades fora de
casa, e as meninas dentro casa.

As vezes eu ajudo a mãe na horta, busca a vaca, mas mais eu ajudo em casa.
(Estudante 24)
Olha lá, geralmente eu ajudo, nós somos agricultores, vaca de leite, e eu ajudo, a
tirar leite, tratar as galinhas, servicinho assim, nada muito ruim assim... (Estudante
26)

Em relação ao MST, o sentimento dominante nas falas, é de que as mobilizações já


foram maiores, do que atualmente, por aqueles que são alunos da EJA. As mulheres se
referem a participações recentes no Movimento quando essas tem ligação à temática das
mulheres e nos alunos que ainda são crianças/jovens, seus conhecimentos dependem da sua
condição, no sentido de que alguns participaram do acampamento e outros já nasceram no
assentamento.

Não, é que eu não sou muito, faz o primeiro ano que arrecem que eu sou líder, e eu
não to muito aproximado do MST. (Estudante 26)

Mas olha, é que tá assim com o pessoal não tá mais pegando junto como antes, né?
se fosse, né? todo mundo, pega mais junto, pra ir numa mobilização, vão sempre os
mesmos quase. (Estudante 17)

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Com relação a educação do campo, os alunos demonstraram que entendem a


importância e a relevância da escola do assentamento, dando mais exemplos do seu cotidiano,
das relações de amizades, da convivência, que criam na escola. Alguns alunos que tiveram
experiência de estudar em escolas urbanas em outras localidades deram outros exemplos.

É legal, todo mundo conversa, não é igual nas outras escolas mais grande que, mal e
mal se fala... Lá nas outras escolas, eram, as vezes tinha pouco aluno na sala de aula,
as vezes tinha muito, daí a professora ficava chamando a gente, só que confundindo
o nome né... aqui já não, elas pelo menos decoram o nome da gente... (Estudante 27)

No que se refere aos pais dos alunos todos mencionaram que o trabalho no
lote/assentamento e por consequência a sua entrada e permanência no Movimento são as
alternativas para as condições que apresentavam, como família com pouca terra, desemprego
na cidade, sendo que lutar por melhores condições de vida foi o fator determinante.

Mas devido que nóis, nóis era, família pobre, o pai tinha nóis, e era em cinco irmão
homem, três mulher e o pai tinha nove hectare de terra. (Responsável 13)

Em relação ao MST, embora as opiniões se dividam, e todos tenham afirmado que de


alguma forma ainda participam das ações do Movimento, houve um relato de um responsável
que fora bem crítico...

Nós temo meio desligado, porque nesse período, antigamente quando vim morar
aqui, você falava em MST, arrumava vinte homem num piscar de olho, e com tudo o
que aconteceu no Movimento e na Política e tá acontecendo, e vamos dizer assim a
palavra, meio que desmanchou o MST aqui.(Responsável 14)

Mesmo assim, outros fatos foram citados como o envelhecimento no campo, alguns
companheiros que já se foram (faleceram), a juventude que sai para estudar e não retorna.
Mas mesmo nessa avaliação, sempre há reunião do Movimento no assentamento, talvez não
sejam mais intensas como foram em outros momentos históricos.
Com relação à escola do assentamento e a educação do campo, este grupo de pais foi
selecionado por fazer parte da gestão da escola através de conselho escolar e circulo de pais e
mestres, então quanto à participação na escola e conhecimento dos avanços e dificuldades
estão bem cientes.

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Ah, mas a escola é muito boa, muito boa, porque veja bem, quantas pessoas idosas
que tão aí estudando e antigamente era só na roça, na roça vendo o sol nascer, o sol
entrar. Tão aposentado e tão estudando, aí mesmo tem, tem uns senhores de cabeça
branca, bigode branco, tão estudando... (Responsável 14)

Sobre a educação do campo as falas dizem de uma escola que tem relevância no
assentamento, de pessoas que já saíram da RCS com o ensino fundamental completo e
continuaram seus estudos, em escolas do MST ou não, e como a EJA tem sido importante na
formação humana. Um dos assentados usou uma expressão para reforçar o significado...

É a escola é tudo numa comunidade, ainda mais no assentamento, né? se não fosse à
escola, é como dizem, se não tivesse a escola, é o filho nascer sem pai. (Responsável
13).

No que tange o trabalho pedagógico desenvolvido na RCS, mesmo demonstrando


dificuldades e desejando que ele pudesse ser mais organizado e coletivo, o grupo de
professores ainda que em falas individuais, foi bastante unido quanto a esse esforço que todos
têm no sentido de que o trabalho seja mais coletivo.
As dificuldades ressaltadas pelos professores para que consigam organizar o trabalho
coletivamente convergem com de qualquer escola. Entretanto, os professores destacam que o
fato do grupo de professores ser pequeno, facilita as reuniões e o trabalho pedagógico.

... como somos uma escola mais pequena a gente consegue chegar mais no aluno, e
lá como é muito grande é muito aluno, eu percebo..., algumas coisas se dispersa, e
que, eu acho que a gente consegue mais tanto relação com o aluno, como relação
com o colega. (Educadora 7)

Foram citados ainda como entraves ao trabalho pedagógico as políticas publicas mal
formuladas e de governos, ou seja, que mudam a cada governo, a multiseriação/enturmação
nas escolas do campo, problemas com relação a transporte escolar como no caso do ensino
médio, salários baixos e sem reajustes, impossibilidade de fazer cursos, adquirir livros.
Sobre a questão da Educação Física a professora da disciplina demostrou que não vê
diferença no papel dessa disciplina em relação às outras matérias ensinadas na escola, e que
com isso, consegue que seu trabalho pedagógico também seja relevante.

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Eu tenho uma visão, assim da Educação Física assim ó que eu não consigo separar,
sabe, não consigo separar o papel da Educação Física da escola. Pra mim a
Educação Física é um componente curricular. Ela, o que ela tem além das outras é
que tu consegue além de preparar, de transmitir, de ajudar que eles construam
conhecimento, o cognitivo, tu tem uma preparação física também, né? não pode
dissociar porque envolve o físico deles, mas é os mesmos objetivos dos outros
conteúdos, tu tem, das outras disciplinas, tu tem o que ensinar, como ensinar, tu tem
como fazer eles pensarem, refletirem sobre aquilo que eles tão fazendo, qualquer
movimento, qualquer jogo, qualquer esporte, na ginástica tu tem como questionar, tu
tem como fazer com que eles cresçam em cima da tua disciplina. Acho que pra mim
escola é isso, é o ensinar, sobre alguma coisa, tu consegue, a Educação Física não
tem como separar o papel da Educação Física, acho que ela tem o mesmo papel das
outras disciplinas, ensinar. (Educadora 4)

A professora de Educação Física, em sua fala, deixa explicito que segue em sua
atuação como professora, aquilo que recebeu como formação universitária cursada na Unijuí,
amparada pela visão que construiu na graduação.

O meu planejamento se dá da seguinte forma: quando eu começo eu tenho uma


concepção assim, eu fui formada, eu fui formada na UNIJUÌ, né? Eu tenho uma
concepção bem de cultura corporal de movimento. Tá então eu procuro trabalhar os
5 eixos que estão aí dentro, né?: os esportes, a dança, a ginástica, as lutas, dentro das
minhas limitações, dentro das limitações que me são dadas também, né? Em termos
de espaço físico, do ambiente, da época do ano, porque tu sabe que a gente tem o
ginásio, mas os dias que a gente ta aqui mesmo a gente não tem outro espaço, então
acaba sendo o que: uma ginástica dentro da sala e o xadrez que é o que eu gosto de
trabalhar, também porque a gente sempre acaba mais trabalhando o que a gente
gosta, que é a realidade eu, a gente, não pode negar. (Educadora 4)

Houve outro momento, antes da entrevista, em que questionamos a professora de


Educação Física pelo fato de termos ouvido dos pais e alunos algumas respostas que sempre
apareciam dando ênfase à importância da Educação Física relacionada a saúde. Apenas uma
mãe ressaltou a importância de aprender a dividir, jogar, agir coletivamente. Outros
entrevistados, pela questão da amizade. Sobre isso a professora de Educação Física, admitiu
ser mais uma possibilidade de resposta apreendida no sendo comum do que em suas aulas...

Eu acho que é talvez, seja mesmo, do senso comum e, porque assim ó: eu,
particularmente, eu não trabalho com aula teórica, as minhas aulas, em nem uma das
escolas, eu trabalho com aula teórica, é meu isso assim ó, eu acho que tudo que eu
posso ensinar eu posso ensinar na prática, sabe, assim ó: se eu to ensinando regras eu
não preciso que eles copiem regra, sabe, se eu to ensinando que eles precisam
ocupar o espaço da quadra, né? que eu posso fazer um jogo adaptado, 2 contra 2, eu

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paro naquele instante e ensino, então eu não preciso montar, joguinho, regrinha e
dar, é uma coisa minha, não tenho nada contra quem faça, porque eu acho que pra
eles, eles tão, assim, Educação Física tem essa relevância e essa diferença nesse
sentido: é o sair da sala de aula, né? eles esperam muito aquela aula eles vão sair da
sala de aula. Então quando menos eles escreverem, quanto menos eu prender eles na
escrita, mais eles vão aprender, até porque eles vão aprender, porque eles gostam
daquilo, eles vão aprender praticando. Então essa talvez, essa coisa da saúde, pode
ser até de ouvir falar mesmo em função de prevenção, né? de profilaxia mesmo de
alguma doença, né? da própria adolescência que eles se preocupam muito em
engordar, né? as meninas mesmo de ter que praticar alguma coisa em função de
perder peso, da perda de peso, alguma coisa nesse sentido, mas não é uma coisa que
eu fique em cima. (Educadora 4)

Os entraves que surgem em nosso ponto de vista é que realmente a escola tem se
esforçado para manter contato com o MST através da Cooptec, que é a cooperativa que presta
assessoria aos assentamentos, do encontro Sem Terrinha, das reuniões com lideranças do
MST da comunidade, e das regionais do Movimento, trabalhando temas na escola ligados a
vida campesina, buscando através da EJA, mais formação humana aos jovens e adultos, mas
de fato as próprias educadoras reconhecem que poderia haver laços mais estreitos nessa
relação com o MST.
Quanto a teoria pedagógica o grupo tem recebido mais formações na temática da
educação do campo. Individualmente, alguns educadores dizem se utilizar de vários meios e
fontes, e outros ainda citaram autores como Paulo Freire, Moacir Gadoti e o Dicionário da
Educação do Campo.
Na disciplina específica de Educação Física a professora citou autores atuais na área
pedagógica, porém sem ligação com os Movimentos Sociais e educação do campo. Mesmo
assim, fica muito claro na fala da referida professora, que ela segue no campo da Educação
Física a linha teórica que lhe foi passada na sua formação inicial.

Com certeza, com certeza, o professor Fernando, professor Fernando González e a


professora Maria Simone assim são meus eixos norteadores assim, são o meu norte
sempre foram desde o tempo de acadêmica, eu tenho os livros deles até hoje, os que
chegaram pra nós os últimos foram deles então, todos reformulados, é um material
riquíssimo e com certeza é na linha dele, tem o Alex Fraga, né? que também trabalha
com Fernando González que eu gosto muito, enfim, tem outros, tem. Eu gosto de
vários outros que seguem a mesma linha, que na verdade o Kunz mesmo que era da
UNIJUÍ, então são na verdade a minha linha é de UNIJUÍ mesmo, sabe? Os meus
professores são dali e eu aprendi assim, eu não aprendi de outra forma. O Walter
Bracht que era muito usado, por eles, né? na literatura deles, e é essa acho que, essa
é a metodologia que eu uso. (Educadora 4)

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Mesmo assim as respostas são muito difusas e não explicita um projeto histórico que
possa nortear a teoria educacional e por consequência a teoria pedagógica, alguns professores
tiveram a ética e a sinceridade de reconhecer que não seguem mais nenhuma teoria
pedagógica.

– Que eu tenha um embasamento? Hoje eu te digo que não... revistas direcionadas a


língua portuguesa... (Educadora 9)

A Educação Física não ficou para trás em termos de não ver a relação do MST com a
sua disciplina... Quando perguntada, a professora respondeu:

Tu acha que existe alguma relação entre o MST, a Educação Física e a proposta
pedagógica da Escola? Tu vê essa relação entre a tua disciplina, o Movimento e a
Escola?
Entrevistada: Não... não..
Fora esse evento que vocês foram...
Entrevistada: Não, não vejo.... Vejo lideranças assim ó, de vez em quando aqui, que
são daqui do Assentamento, quem vem pra conversar e vou ser bem sincera,o que eu
conheço, sobre o Assentamento daqui, são quando chega perto do aniversário da
Escola, né? que tem eventos e que são convidadas pessoas que ajudaram a fundar,
vieram acho que nos últimos anos, muito interessante, muito interessante mesmo,
fizeram toda uma retrospectiva, com fotos, com vídeos, sabe? com entrevistas de
pessoas, material riquíssimo que tem aqui na escola que... de repente os próprios
filhos não conheciam antes, sabe, eles contaram e... (Educadora 4)

Nesse sentido, percebe-se que a história dos sujeitos assentados e dos estudantes da
RCS esta permeada na luta pela terra. Negar tal luta enquanto relação teoria-prática pelo
trabalho pedagógico, por meio da EF ou dos demais conhecimentos que compõem os
conteúdos clássicos a serem socializados, é negar a função social da escola pública e,
portanto, oferecer uma educação que não eleva a consciência da classe trabalhadora
campesina.
Acreditamos que em vários momentos, que se destacaram nas falas, não tornou
possível afirmar que não exista relação da escola com o assentamento e vice-versa, entretanto
é necessário aprofundar essa relação enquanto instrumentos de luta de classe da escola pública
e do MST. É preciso além de estar numa escola do campo, ser uma escola do campo, pois
uma escola que não instrumentaliza seus próprios sujeitos, e não problematiza a sua realidade
e sua história, não pode transformar a pratica social.

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Para a EF não há nada mais desafiador do que reconhecer o povo do campo como
detentor de conhecimentos, e não de uma vida do “atraso”, que precisa ser colonizada ou
atualizada pelo modo de vida urbano. Neste processo a EF, enquanto área de conhecimento
que trata da dimensão da Cultura Corporal, deve se inserir nessa luta, contribuindo com a sua
especificidade na luta maior.

Considerações Finais

O objeto do estudo foi o trabalho pedagógico e a teoria pedagógica desenvolvida


dentro da escola RCS. Para isso, o estudo utilizou-se de entrevistas com os sujeitos que
compõem a escola, educadores, pais, estudantes, funcionários, a fim de compreender melhor o
trabalho pedagógico desenvolvido.
Neste sentido, após o percurso investigativo, confirmamos a hipótese levantada no
estudo, que o MST e consequentemente a escola do assentamento e o trabalho pedagógico da
EF, através da teoria pedagógica, vem afastando-se dos princípios que inicialmente nortearam
a educação do campo, e inspiraram as primeiras lutas na conquista da terra.
Salientamos que em uma pesquisa, tipo estudo de caso, o resultado encontrado não
pode gerar generalizações. Confirmamos a referida hipótese quando nas análises teóricas
percebemos elementos como: dependência do Estado, a precarização do trabalho do professor
do assentamento por falta de formação, dependência do Estado na contratação e vínculo de
seus professores.

Porém, sua proposta educacional, que pretende ser uma educação de classe, com fins
de emancipação humana, vem sendo desenvolvida na sociedade capitalista e,
portanto, incorpora as contradições gerais entre trabalho e capital. Por sua vez, essas
contradições expressam-se no trabalho pedagógico, principalmente através da cisão
entre teoria e prática. (D’AGOSTINI, 2009)

As pedagogias dominantes expressam-se pelo lema aprender a aprender, pela


desvalorização da teoria cientifica, onde os relatos de experiência imediata valem mais, no
saber-fazer, e isso repercute na formação de professores aligeirada dos fundamentos teóricos,
epistemológicos que dão sustentação ao trabalho pedagógico. Temos o exemplo direto das

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licenciaturas em educação do campo, quase todas na modalidade educação à distância e


muitas vezes, em menor tempo.
Frigotto, nos declara que a década de 2000-2010 diferencia-se da de 1990 em vários
aspectos quando analisa o que denomina “continuidade no essencial da política
macroeconômica” (2011, p. 240). O autor faz referência a este período partindo do
pressuposto de que o Estado contava com um novo fundamento denominado de liberalismo
conservador. O papel deste pressupõe reduzir a sociedade a um conjunto de consumidores,
onde o indivíduo não é mais considerável à sociedade, e sim, ao mercado. “A educação não
mais é direito social e subjetivo, mas um serviço mercantil” (FRIGOTTO, 2011, p. 240).
Outro aspecto que Frigotto (2011) comenta e que caracteriza este período corresponde
ao trato com os movimentos sociais, como também a realização de políticas compensatórias.
Nas palavras do autor:
a relação distinta com os movimentos sociais, não mais demonizados nem
tomados como caso de polícia; e ampliação intensa de políticas e programas
direcionados à grande massa não organizada que vivia abaixo da linha da
pobreza ou num nível elementar de sobrevivência e consumo. (FRIGOTTO,
2011, p. 240)

Percebemos, através das entrevistas, que a teoria que embasa o trabalho pedagógico da
disciplina em EF foi a recebida pela professora na formação inicial. Uma teoria pedagógica
revolucionária hoje, para o processo de ensino-aprendizagem, deve, essencialmente, basear-se
nos princípios, leis e categorias da dialética materialista. Os tempos ditos pós-modernos,
necessitam serem contrapostos e superados, pois com as suas teses “sedutoras” e
“envolventes”, através da pedagogia do apreender a apreender, do fim do trabalho, da
conciliação de classe, etc. nos fragmentam e pragmatizam com o fim de que não sejam
visualizados os determinantes da essência dos fenômenos. Nesta esteira, os movimentos
sociais, afastam-se de suas bandeiras de luta e aproximam-se de um processo
contrarrevolucionário (Fernandes, 2002).
No que se referem à EF, os princípios norteadores da teoria revolucionária encontram-
se nos pressupostos da proposta Crítico-Superadora, juntamente com os princípios
revolucionários da pedagogia Histórico-Crítica que lhe acompanham.
Desta forma, não estamos querendo responsabilizar os professores, pois os mesmos
também apontam a falta de formação continuada, o que mesmo tendo garantias na lei,

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acontece somente pela organização interna da escola, e mesmo que os professores manifestem
o desejo de estudar, não lhes é dado incentivo para que essa instrumentalização ocorra.
Chamamos a atenção para a importância da teoria do materialismo histórico, como
fundamentação para a teoria pedagógica, que embasa também a Educação Física. Já que como
bem afirmou a professora entrevistada neste estudo, este componente curricular trata
pedagogicamente de um conhecimento específico e não tem motivos para ser secundarizada
ou receber um trato diferente em relação aos demais componentes curriculares presentes no
chão da escola.
Este trabalho é apenas um ponto de partida. Por ora, há uma predominância de estudos
que remetem-se à realidade urbana. Buscamos também, com base na concepção do
Materialismo-Histórico e Dialético, estabelecer a necessidade de construção de conhecimento
comprometido com a transformação da realidade atual, mas, principalmente, tornar público o
conhecimento que está sendo elaborado no interior de uma escola do campo constituída por
sujeitos sociais e históricos que traçaram uma luta pelos dignos direitos de existência.

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A EDUCAÇÃO DO CAMPO CONTEXTUALIZADA A PARTIR DA REALIDADE DO


MUNICÍPIO DE NOVA PALMA, RS, BRASIL

Vanessa Manfio73
Mara Alini Meier74

Resumo

A educação do campo é uma ferramenta para promover o sujeito, enquanto ator de sua aprendizagem,
oferecendo subsídios também para a permanência do mesmo no seu espaço de vivência. É uma
educação de valorização do homem que habita o campo. Isto se faz com uma leitura educacional
diferente da escola tradicional, pois atende os interesses do aluno e está pautada no ensino e no
desenvolvimento social. Porém, atualmente estas escolas estão sendo destituídas em virtude da
transferência dos alunos do rural para as cidades, distanciando o sujeito do espaço. Nesse contexto,
este artigo busca discutir a educação do campo, retratando a realidade do município de Nova Palma -
RS, a fim de contribuir com esta temática e com a conscientização da relevância da educação plena do
sujeito.

Palavras-chave: Educação do Campo; Nova Palma - RS; Valorização da educação do sujeito.

Introdução

O Brasil vem se tornando um país cada vez mais urbano nas últimas décadas, porém
ainda existem diversas áreas rurais e algumas distantes dos centros urbanos. Nestas áreas
existe a necessidade de se manter uma escola próxima ao espaço de vida do aluno,
contemplando sua essência de trabalho, vida e moradia.
Observa-se que o aluno, principalmente de séries iniciais, necessita entrar em contato
com o lugar, com a realidade para assimilar conceitos e entender o espaço. Dessa forma, é
importante que a escola esteja presente no espaço de vivência da criança, aprofundando
pontos da sua experiência.
Mas será que as escolas do campo estão sendo preservadas? E como estão se
mantendo? Os municípios pequenos e agrícolas como Nova Palma ainda estão conservando as
escolas rurais? E de que forma isso está sendo feito? Estas são discussões que se almejam

73
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, nessamanfio@gmail.com
74
Universidade Federal de Santa Maria, mara.alini@gmail.com

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abordar neste artigo, enfocando a realidade do município de Nova Palma, localizado na região
central do Rio Grande do Sul (Figura 1), na Quarta Colônia de Imigração Italiana, onde as
características italianas e as atividades agrícolas são fortemente reconhecidas no espaço-
sociedade. É um município com população estimada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (2017) com 6605 habitantes, sendo considerado em termos de número de
habitantes um município pequeno.

Figura 1- Mapa de Localização de Nova Palma


Fonte: IBGE (2008); Org.: MANFIO, V. (2010)

Para tentar responder estas questões e o objetivo central do trabalho, que é a discussão
da escola do campo no espaço de Nova Palma, suas características e dilemas, foi utilizado o
método empírico. Para Prodanov e Freitas (2013), o método empírico busca analisar

271
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fenômenos e relações casuais, sendo a realidade mensurável através da capacidade de


observação e percepção dos fatos.
Além disso, como técnicas metodológicas foram feitas a revisão de literatura, a coleta
de dados, mediante uso de entrevistas (na prefeitura, escolas locais e população residente no
campo) e a análise da realidade local, com leitura da paisagem e do contexto social que
resultaram no suporte para construção do artigo. Quanto às entrevistas, o entrevistado A
refere-se à entrevista na Prefeitura, o entrevistado B à escola e o entrevistado C à comunidade.
Este artigo encontra-se estruturado em uma abordagem teórica sobre o tema da
educação do campo e uma análise da realidade do município de Nova Palma quanto à
educação no meio rural.

Educação do Campo: uma discussão relevante e necessária

A educação do campo é uma forma de promover o ensino, associando o aluno ao


campo e ao trabalho rural. Segundo Rodrigues (2017), a educação do campo tem uma estreita
ligação com o trabalho e a cultura da localidade. Contudo, é uma atividade pedagógica
voltada para atender o fundamento coletivo para o trabalho do campo (RODRIGUES, 2017).
Assim, “pensar uma educação do campo, significa ouvir e atender a cultura, a
dinâmica social e educativa dos diferentes grupos que formam o povo campesino”
(BERNARDI; PELINSON; SANTI; 2014, p. 121). Nesse sentido, a educação do campo não é
apenas o aprendizado mecânico do conhecimento, mas o entendimento da realidade, do social
e do trabalho. É uma forma de manter o sujeito ativo no seu espaço. Nessa perspectiva:

A escola do campo deve ser pensada para que seja viva, e interaja com o lugar e seus
sujeitos. Para que a escola do campo seja viva, ela deve ser construída por sua
comunidade, pensada para ajudar no processo de desenvolvimento social, para
manter a cultura, a raiz e a história daquele lugar. Essa escola deve formar sujeitos
participantes e capazes de construir seu próprio caminho, buscando seus direitos e
lutando para serem cidadãos do campo (WIZNIEWSKY, 2010, p. 33).

Complementa Suess, Carvalho Sobrinho e Bezerra (2014, p.1),

A educação no/do campo surge como expectativa de uma proposta educativa que
esteja emaranhada na cultura, tempos e ritmos dos sujeitos do campo em prol de
uma sociedade justa que possa ser construída por todos e não imposta por poucos,
uma sociedade na qual cidadãos tenham voz e respeito mútuos.

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A educação do campo é um meio de luta, resistência e de complemento ao rural. Para


Martins (2009), um dos elementos mais importantes da escola do campo é o envolvimento
com a comunidade. A escola passa a se envolver com a vida em comunidade, suas
necessidades e perspectivas para sonhar e trabalhar a construção do local (MARTINS, 2009).
Estas escolas do campo apresentam uma estrutura pedagógica, muitas vezes,
diferenciada das escolas citadinas, com a presença de turmas de alunos multiseriados, com
turnos integrais, com técnicas de manejo do campo, ou seja, hortas comunitárias e atividades
coletivas de jardinagem. Estas atividades são fundamentais para a construção do
conhecimento do campo.
No avanço das discussões da escola do campo em nível de lei,

A promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil em 1988 e a


sanção da Lei de diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei 9.394/1996,
também foram importantes e deram subsídios para a construção das Diretrizes
Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo. [...]. A instituição das
Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo pautou-se na
legislação educacional atuante e visou atender parte das reivindicações dos
movimentos sociais e daqueles que lutam por uma educação do campo como
fundamentais em sua diversidade, para a constituição da identidade da população
rural e de sua inserção cidadã na definição dos rumos da sociedade brasileira,
reconhecendo, assim, a identidade própria do camponês e o seu valor para a nação
brasileira (SUESS; CARVALHO SOBRINHO; BEZERRA, 2014, p. 5).

Nesta linha de análise, Machado (2017) menciona que, após a década de 1980, as
escolas rurais foram alteradas quanto à nomenclatura e as concepções de educação do campo.
A substituição da expressão “rural” por “campo” pretendia incluir no processo educativo
outra reflexão que está vinculada ao trabalho camponês e as lutas sociais e culturais que
buscam permitir a sua sobrevivência por meio do trabalho, assim como a sua permanência e a
conquista de um lugar (FERNANDES; CERIOL; CALDART, 2004 apud SUESS;
CARVALHO SOBRINHO; BEZERRA, 2014).
No entanto, atualmente o capital não tem o intuito de manter as escolas, pois
representa gastos em infraestruturas, professores e equipamentos. Assim, os governantes
acabam optando pelo fechamento das escolas rurais e a realocação dos alunos no espaço
urbano, em escolas maiores que atendem diferentes alunos. Isto representa o fim de uma
pedagogia do sujeito e a valorização da comunidade rural. Como Benjamin e Caldart (2000, p.

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37) colocam “somente as escolas construídas política e pedagogicamente pelos sujeitos do


campo, conseguem ter o jeito do campo”.
E ainda, Wizniewsky (2010, p. 35) frisa que "a nucleação das escolas busca
racionalizar os custos dos alunos das escolas rurais, sem respeitar, na maior parte das vezes, a
liberdade de decidir sobre onde esses estudantes pretendem completar seus estudos". Nesse
sentido, poda-se o direito de escolha e a estruturação de um ensino específico voltado para o
público do campo.
Além da ameaça constante de fechamento, as escolas do campo, que ainda persistem,
são atravessadas por diversas dificuldades que impedem que elas alcancem seus objetivos. Por
vezes:

a escola do campo é o espaço onde são produzidas e reproduzidas dinâmicas, que,


em grande medida se distanciam da realidade dos sujeitos que vivem nesse lócus. O
desencontro entre a escola e os anseios da comunidade é resultado de ações e
políticas públicas, que, historicamente, promoveram a valorização de ambiências
mais ligadas ao urbano, relegando o campo e seus sujeitos a um plano secundário,
considerado por muitos como marginal (WIZNIEWSKY, 2010, p. 27)

Nesse contexto, Wizniewsky (2010) destaca a necessidade de qualificação dos


profissionais da educação que atuam nas escolas do campo, a fim de que favoreça um ensino
que contribua para a compreensão da realidade em que os discentes encontram-se inseridos.
Dessa forma, a estruturação do Projeto Político Pedagógico deve contribuir para que os alunos
alcancem a sua emancipação, mediante a ampliação do seu olhar sobre o local, mas também
sobre o mundo. Além disso, a escola do campo deve ser construída coletivamente, com a
participação efetiva de todos os atores envolvidos (WIZNIEWSKY, 2010). Isso porque "a
escola no meio rural é muito mais que um espaço de escolarização, é, em muitos casos, a
referência para a comunidade" (WIZNIEWSKY, 2010, p. 33). E ainda, "se valoriza a escola
como centro de socialização da população do campo, cujos saberes são aí resgatados,
registrados e conservados como patrimônio da coletividade que os produziram" (DE DAVID,
2010, p. 48).
Diante do que foi apresentado, a escola do campo deve desenvolver um trabalho
específico e de qualidade para a formação dos cidadãos do campo. Assim, não é possível
aceitar o seu fim, mas sim a sua permanência cada vez mais qualificada para que contemple as
singularidades e atenda as necessidades da população do campo.

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A educação do campo no município de Nova Palma – RS

A colonização italiana em Nova Palma repercutiu na configuração do espaço e nas


dinâmicas sociais, econômicas e culturais do município. Foi à cultura italiana que desbravou
estas terras e criou condições de trabalho e vida.
Além disso, em Nova Palma, o rural influencia no modo de vida da cidade e as
relações entre rural e urbano são fortemente visíveis (MANFIO, 2011). Portanto, a
colonização e a importância do rural permitiram a configuração no espaço municipal que é
composto por várias localidades rurais e a área urbana da cidade (Figura 2).

Figura 2 - Mapa de localização das localidades rurais de Nova Palma – RS


Fonte: http://www.3c.arq.br/016_np/; adaptado por: MANFIO, V. (2018)

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Em cada uma dessas áreas rurais existia, até por volta da década de 1950, uma escola,
uma capela e um centro comunitário, que os moradores utilizavam respectivamente para
educação dos filhos, para os cultos, para os momentos de lazer e encontro comunitário.
Conforme entrevistas, as escolas eram frequentadas pelos filhos dos moradores destas
localidades, caracterizadas por uma turma integrada com vários alunos de escolaridade
diferente e um (a) único (a) professor (a), geralmente atendendo o ensino fundamental (Figura
3).

Figura 3 - Linha Três, Nova Palma - RS


Fonte: foto tirada em 17-6-2018 por Vanessa Manfio.

Os alunos, neste tempo, ajudavam os pais na lida do campo e da casa e ainda


estudavam nas escolas próximas das residências e participavam de atividades comunitárias no
contexto escolar. A escola também era um ponto de encontro entre vários amigos, irmãos e
conhecidos, que frequentavam as mesmas turmas, onde o convívio do aluno podia ser ainda
mais intenso e rico de experiências.
Estas escolas promoviam a educação do campo com os alunos sem romper com a sua
realidade e espaço de vivência. Elas marcaram a educação dos moradores do campo e de seus

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filhos, além de caracterizar-se como espaço de integração na comunidade, onde eram


desenvolvidas outras atividades, como festas.
Atualmente, a maioria destas escolas foi desativada, pelo pouco número de alunos que
frequentavam cada escola e pelos custos de manutenção destas para o poder local. Convém
destacar que antigamente as famílias dos imigrantes italianos eram numerosas e atualmente os
seus descendentes tem um número reduzido de filhos, diminuindo consideravelmente o
número de alunos, o que dificulta a manutenção de uma escola em cada comunidade.
Estas escolas desativadas ainda estão presentes na paisagem rural e, portanto são peças
de uma história materializada no espaço-tempo. A maioria em boas condições estruturais,
sendo utilizadas ainda pela comunidade para festa, para o encontro comunitário e para o
ensino da catequese (instrução religiosa católica).
Em Nova Palma, algumas escolas de áreas centrais permanecem ativas no campo,
como as escolas: Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom Érico Ferrari (Linha Base),
Escola Estadual de Educação Fundamental Padre João Zanela (Vila Cruz), Escola Estadual de
Ensino Fundamental Ana Lobler (Caemborá), entre outras (Entrevistado A).
Porém, estas escolas ativas no campo de Nova Palma tiveram que reorganizar suas
atividades e dinâmicas para não serem fechadas pelo poder público. A Escola Estadual de
Educação Fundamental Padre João Zanela mantém os alunos do ensino fundamental com
atividades nos dois turnos escolares, manhã e tarde, ou seja, os educandos participam de um
sistema integrado de atividades pedagógicas (Entrevistado B). Dessa forma, a escola tem
evitado a falta de atividades e alunos.
A escola, às vezes, nem está preparada para atender os alunos em turno integral,
deixando as crianças sem trabalho ou atividade didática por um tempo dentro da escola,
desmotivando os alunos (Entrevistado C). Na verdade lhes faltam infraestrutura e professores,
capacitação para a atuação em turno integral. Mas como o turno integral passa a ser uma
opção de manter a escola viva, as atividades escolares vão acontecendo do jeito que dá. Os
pais, então, às vezes preocupados, com isto, e acabam pensando em mandar os filhos para
cidade, por meio turno (Entrevistado C). O que de fato representa um fracasso para educação
escolar e para as escolas do campo.
No entanto, as escolas do campo de Nova Palma não têm garantia de permanecer
ativas por muito tempo, já que para o poder local e estadual, os custos com transporte escolar

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são menores que manter as escolas em funcionamento. Ainda, mais que o transporte já existe
para buscar os alunos de ensino médio no espaço rural. Segundo, Vela, Lago e Spanevello
(2004, p.6), “a grande maioria dos jovens estuda na cidade, pois o município possui apenas
uma escola pública com o ensino médio completo, localizada na sua sede”. Com isso, aos
poucos, as escolas do campo vão desaparecendo.
E com o desaparecimento destas escolas, os alunos que desejam seguir no campo
tendem a abandonar as escolas citadinas, enquanto os educandos, que desejam ser
profissionais da cidade, como: dentista, médico, professor, cientista, entre outras, acabam
migrando para cidade e não retornando ao campo.
Observa-se também que muitas áreas do campo são afastadas da cidade e até mesmo
de áreas de comunidades rurais que ainda tem escolas do campo, por isto, alguns alunos
acabam indo moraram com familiares na cidade, retirando do convívio familiar crianças e
jovens.
Mesmo representando um gasto financeiro, as escolas do campo são muito
importantes, pois trabalham com a realidade dos alunos e estão próximas as residências
destes. Nesse segmento, elas acabam reforçando o vínculo escolar com o lugar, aproximando
também os pais e a comunidade escolar.
Pensar nas escolas do campo como uma forma de sucesso da educação é essencial,
ainda mais quando estas desenvolvem atividades de preservação e valorização do sujeito do
campo, instigando-o a permanecer no espaço rural.
Sabe-se das dificuldades de manutenção das escolas, mas em um município agrícola
como Nova Palma, o contexto escolar e o meio rural precisam estar articulados. Isso irá
favorecer com que os jovens permaneçam desenvolvimento as atividades que seus pais
realizavam. Soma-se a isso, o entendimento da geografia e das demais disciplinas como uma
forma de ampliar os olhares para o lugar vivido e o desenvolvimento local.

Considerações finais

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As escolas do campo tiveram e ainda tem um papel relevante para a sociedade rural,
aproximando crianças e jovens do ensino, sem romper com as tradições locais. Elas foram o
lugar de formação de sujeitos engajados com sua família e espaço.
No entanto, nos últimos anos, estas escolas estão passando por um processo de crise,
pois para o capital é mais fácil deslocar os alunos para à cidade que manter abertas várias
escolas nas comunidades rurais. Isto acaba desmistificando a visão do mundo do aluno,
principalmente da criança que acaba sendo transportada para outro espaço, onde, muitas
vezes, elas demoram a se inserir. Além disso, as escolas da cidade não estão preparadas para
manter as raízes dos alunos com o trabalho do campo.
Assiste-se hoje, um suicídio das escolas do campo e de tudo que ela representa para as
comunidades locais, pois algumas delas era o ponto de encontro e de diálogo entre família,
alunos e professores, ou seja, ela é o ambiente de formação de um cidadão empenhado em
desenvolver o campo com suas habilidades e conhecimentos.
Em Nova Palma, esta realidade foi constatada nas escolas do campo, no entanto a
maioria destas foi desativada, levando os alunos a se deslocaram e se inserirem em uma nova
cultura, a cultura citadina. As poucas escolas que ainda funcionam no campo foram
rearticuladas para funcionarem em tempo integral para evitar o fechamento, retirando a
criança do convívio das atividades de casa no turno inverso da escola. Ademais, elas nem
sempre estão preparadas para esta educação integral, deixando os alunos, muitas vezes,
ociosos na escola.
Mesmo com as mudanças das escolas do campo de Nova Palma, não se tem a previsão
de sobrevivência destas por muito tempo. Isto certamente implicará num afastamento dos
alunos das escolas e/ou do campo. Os alunos motivados a seguir carreira profissional na
cidade mudaram para a cidade, enquanto os alunos que desejam permanecer no campo se
afastaram das escolas.
Por isso, é necessário pensar numa educação voltada para a realidade e o interesse do
aluno. Uma escola não apenas com espaço para educação, mas para socialização do aluno e
para o engajamento do mesmo com o seu espaço local, criando um sujeito ativo com sua
comunidade. Caso contrário, a agricultura familiar e o homem do campo deixarão de existir,
criando um homem cada vez mais capitalista e burguês citadino.

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A ARTICULAÇÃO ENTRE AGROECOLOGIA E PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA


NA FORMAÇÂO DE JOVENS DO CAMPO

Evandro da Rosa Silveira75


Diego Henrique Limberger76
Liziany Müller de Medeiros77

Resumo

A presente pesquisa tem por objetivo descrever a importância da articulação entre a Agroecologia e
Pedagogia da Alternância na formação de jovens do campo através do processo formativo realizado
pela EFASC. A pesquisa foi realizada com jovens recém-formados, educandos e educandas com faixa
etária aproximada entre 17 e 19 anos, de municípios da abrangência da EFASC no Vale do Rio Pardo
RS, Brasil. Os dados foram levantados através de um questionário semiestruturado, com perguntas que
se referem, desde o ingresso do jovem, perpassando pelas principais mudanças e interferências
ocorridas durante a formação. Como resultados, destaca-se a maioria das práticas agroecológicas
realizadas que contribuem para produção de alimentos, resgate cultural e de espécies crioulas.
Conclui-se é necessária a articulação entre agroecologia e pedagogia da alternância para formação dos
jovens, tendo grande contribuição para possibilidade de permanência, continuidade e de
desenvolvimento do campo.

Palavras-chave: Juventude, Agroecologia, Pedagogia da Alternância.

Introdução

Esse artigo visa dissertar e analisar a importância do processo de ensino aprendizagem


desenvolvido pela EFASC- Escola Família Agrícola de Santa Cruz do Sul, com jovens do
campo filhos e filhas de agricultores familiares da região do vale do Rio Pardo e a articulação
entre Agroecologia e Pedagogia da alternância no desenvolvimento da região.

A Pedagogia da Alternância propicia que a aprendizagem dos educandos ocorra em


diferentes espaços, alternando entre o meio escolar e o meio sócio familiar. Já que, durante

75
Tecnólogo em Horticultura, Pós-Graduado em Docência no Ensino Técnico; Professor/Monitor na Escola
Família Agrícola de Santa Cruz do Sul; Acadêmico do curso de Licenciatura em Educação do Campo-UFSM e
Pós-Graduando em Educação do Campo e Desenvolvimento Regional-UNISC. Email:evandro.efasc@gmail.com
76
Tecnólogo em Horticultura; Professor/Monitor na Escola Família Agrícola de Santa Cruz do Sul; Acadêmico
do curso de Licenciatura em Educação do Campo-UFSM e Pós-Graduando em Educação do Campo e
Desenvolvimento Regional-UNISC email: limbergerdiego@gmail.com
77
Profª. Drª Coordenadora de Tutoria do Curso de Licenciatura em Educação do Campo. Email:
lizianym@hotmail.com

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um determinado tempo o estudante permanece na escola e, outro em sua realidade, com o


intuito de apreender sem se desvincular do local onde vive, conhecendo, valorizando,
intervindo. Está embasada em instrumentos pedagógicos, os quais servem de instrumentos de
pesquisa e ligação entre escola e comunidade.

A Agroecologia auxilia a pedagogia da alternância na construção de novos


conhecimentos, como um enfoque dialógico, científico, prático e cultural, que valoriza o saber
local, trabalhando a autonomia dos agricultores, preservando e conservando os recursos
naturais da sociobiodiversidade. A união entre Agroecologia e pedagogia da alternância ajuda
na construção de uma educação Libertadora, que valoriza o saber local e também o científico,
o campo e a produção de alimentos; que respeita as questões geracionais, de gêneros e
principalmente preserva os recursos naturais.

Revisão bibliográfica

A EFASC possui um processo educativo diferenciado, que relaciona a realidade dos


educandos e sua rotina diária do campo com o cotidiano da sala de aula, trabalhando com
conteúdo e métodos embasados na realidade do estudante e fundamentados na Pedagogia da
Alternância, que possibilita o jovem manter o vínculo com a família e com a comunidade,
pois permanece uma semana na escola em regime de internato e outra semana junto à família
aplicando na propriedade o conhecimento construído (COSTA, 2012).

Como matriz transversal ao processo de ensino aprendizagem realizado pela EFASC


destaca-se a agroecologia, através de uma formação integral que envolve diversas áreas do
conhecimento.

A Agroecologia nasce num ambiente de busca e construção de novos conhecimentos,


como um novo enfoque científico, capaz de dar suporte a uma transição a estilos de
agriculturas sustentáveis e, portanto, contribuir para o estabelecimento de processos de
desenvolvimento rural sustentável (CAPORAL e COSTABEBER, 2003).

Para Altieri (2012), a Agroecologia consiste em uma abordagem holística


transdisciplinar que integra os princípios agronômicos, ecológicos e socioeconômicos

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avaliando e discutindo o efeito das tecnologias sobre os sistemas agrícolas e a sociedade como
um todo. Uma abordagem agroecológica incentiva os pesquisadores a penetrar no
conhecimento e nas técnicas dos agricultores, objetivando alimentar sistemas agrícolas
complexos, nos quais as interações ecológicas e os sinergismos entre os componentes
biológicos criem, eles próprios, a fertilidade do solo, a produtividade e a proteção das culturas
(ALTIERI, 2012)

A agroecologia é um dos princípios da EFASC, pois está diretamente relacionada com


a construção de uma sociedade mais justa, de uma forma de pensar a agricultura com menos
danos ao meio ambiente, que valorize o homem e a mulher do campo.

A formação técnica de jovens do campo através da pedagogia da alternância, além de


ser uma alternativa para uma educação contextualizada e voltada a realidade, ela deve estar
fundamentada na agroecologia, juntas constituem uma educação emancipadora analisando e
buscando soluções para os problemas socioambientais. E que a mediação em sala de aula cabe
ao professor além de questionar buscar junto aos jovens possíveis soluções para os problemas
ambientais (CALVALCANTE, 2009).

Para Calvalcante (2009) a busca pela produção a partir do paradigma agroecológico,


onde a visão da agricultura ultrapassa a simples concepção de produção e adere a concepção
de relacionamento com a terra, com as pessoas que vivem nela, evidenciando um potencial
ambientalizador.

A proposta de uma educação contextualizada está diretamente relacionada à


possibilidade de se construírem práticas pedagógicas que caminhem de acordo com os
interesses dos sujeitos da educação. Respeitar o modo de vida dos formandos e fortalecer o
papel das comunidades na definição e no funcionamento do tipo de escola que eles almejam é
uma das prioridades da Escola Família Agrícola (VERGUTZ, 2013). Tais características
acordam com as ideias de Freire (1996), o qual afirma ser a educação escolar uma questão
cultural, uma atividade e um instrumento de cultura capazes de contribuir para a
democratização fundamental da sociedade e para enriquecer os constituintes dela.

Para Vergutz (2013) a aprendizagem na pedagogia da Alternância busca a substituição


da linearidade por uma circularidade, não fechada e plana, mas em espiral. Ou seja, um

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movimento em espiral do saber, que possibilita rever, repensar uma situação já vista, já
conhecida, mas com um olhar diferente.

A articulação dos tempos e espaços de formação ocorre através dos instrumentos


pedagógico. A organização pedagógica deve garantir ação-reflexão-ação, que acontece
através dos instrumentos pedagógicos e também pela estrutura circular que a alternância
proporciona.

Conforme Vergutz e Cavalcante (2012) a proposta educacional da Pedagogia da


Alternância desde a sua origem está diretamente ligada a realidade tendo vinculação entre os
saberes institucionais e científicos e os saberes populares e/ou de senso comum. Este processo
educacional parte da concepção de que a aprendizagem transforma já que é o próprio processo
de viver, é o apropriasse de si mesmo.

Segundo Calvalcante (2009) as ações desempenhadas pela pedagogia da alternância,


como o viver e conviver no local com responsabilidades e pertencimento; o Diálogo de
saberes entre saberes populares e científicos traz um amadurecimento dos sujeitos quanto aos
desafios; A ação em redes nacionais, locais e regionais é um parâmetro instigante.

A pedagogia da alternância através da sua organização alternada possibilita aos


sujeitos refletirem sobre as ações, implicando numa atitude transformadora e consciente do
mundo que os rodeia (VERGUTZ 2013, p. 93).

Segundo Vergutz (2013) o aprender acontece no movimento da ação e da reflexão, que


faz interagir diferentes saberes e experiências através do distanciamento e consequentemente
aproximação dos objetos proporcionando o conhecer crítico e a conscientização. Não é apenas
a alternância de tempos e espaço que possibilita uma aprendizagem significativa, a
organização metodológica é fundamental para que de fato possa ocorrer a associação entre
ação e reflexão.

A organização metodológica da alternância está orientada em instrumentos


pedagógicos, os quais possibilita uma formação integral e contextualizada. Está fundamentada
também na cooperação e na partilha do poder educativo (VERGUTZ 2013).

Os instrumentos pedagógicos além de assumirem a característica de registros das


alternâncias se estruturam potencializado a pesquisa, a interrogação, o diálogo, a

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experimentação, a troca, a expressão, a sistematização através de relações com o viver, com o


trabalho, com o distanciamento e com respeito aos diferentes saberes e relações existentes na
humanidade.

De maneira geral, os instrumentos pedagógicos da alternância potencializam uma


aprendizagem contextualizada com o jovem do campo da região do Vale do Rio Pardo,
problematizando e encontrando soluções através do conhecer sistêmico (VERGUTZ 2013).

Metodologia

A pesquisa teve abordagem qualitativa, do tipo estudo de caso, e foi realizada na


EFASC, com 5 jovens recém-formados, que estão em processo de estágio curricular
obrigatório para obtenção do diploma em técnico em agricultura. Trata-se de educandos e
educandas com faixa etária aproximada entre 17 e 19 anos. Devido a abrangência regional da
EFASC de 10 municípios do Vale do Rio Pardo, optou-se por um recorte na escolha de jovens
com condições de relevo, solo e topografia diferentes, tamanho de propriedade agrícola e
atividade principal de renda. Também é importante salientar a escolha referente as questões de
gênero, pois dos entrevistados 40% são do gênero feminino e 60 % masculinos.

A cada dois meses esses jovens se reúnem na EFASC para realizar a socialização da
prática de estágio. Aproveitou-se um desses encontros para realização da pesquisa. As
pesquisas foram realizadas através de um questionário semiestruturado, com perguntas que se
referem, desde o ingresso do jovem na EFASC, principais mudanças e interferências ocorridas
durante a formação, a influência das ações na construção do conhecimento e a compreensão
da agroecologia.

Após realização das pesquisas foi realizada a sistematização dos resultados, analisando
cada questão individualmente, referente as respostas dos educandos. Estas respostas foram
registradas/tabuladas seguindo a numeração 01 a 05 a fim de facilitar a análise, assim como, a
preservação dos/as entrevistados/as.

Seguimos as compreensões de Lakatos e Marconi (2003, p. 195) que entende a


entrevista como um encontro entre duas pessoas ou mais, a fim de que uma delas obtenha

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informações a respeito de determinado assunto, mediante uma conversação de natureza


profissional. É um procedimento utilizado na investigação social, para a coleta de dados ou
para ajudar no diagnóstico ou no tratamento de um problema social. Quanto ao conteúdo,
Selltiz apud Lakatos e Marconi (2003, p. 195) apresenta os objetivos: Averiguação de “fatos”.
Descobrir se as pessoas que estão de posse de certas informações são capazes de compreendê-
las. Determinação das opiniões sobre os “fatos”. Conhecer o que as pessoas pensam ou
acreditam que os fatos sejam. A entrevista com um questionário padronizado para todos teve
como objetivo obter um padrão das informações para facilitar a sistematização e uso das
informações de melhor forma para geração de gráficos e tabelas de informações
principalmente (LAKATOS E MARCONI, 2003, p. 196) caracteriza como entrevista
padronizada aquela em que o entrevistador segue um roteiro previamente estabelecido; as
perguntas feitas ao indivíduo são predeterminadas.

Como o processo de aprendizagem via Pedagogia da Alternância, seus movimentos,


seus instrumentos pedagógicos e a construção do conhecimento agroecológico a partir das
práticas, debates e ações na sessão escolar e familiar vivência ao decorrer do processo de 60
alternâncias. E esse artigo tem como base a opinião de educandos e educandas em período de
estágio e com distanciamento do processo formal da alternância, mas plenamente vinculados
em seus espaços de estágio.

Resultados e discussão

No que se refere a resultados, a primeira pergunta realizada foi sobre a relação com a
agricultura antes de ingressar na EFASC, 20% contribuíam plenamente nas atividades, porém
com pouco envolvimento e reflexão. Já 60% tinha pouca relação com a agricultura, apenas
ajudando a família quando solicitado, com pouca curiosidade e reflexão do porque estava
realizando as atividades. E os 20 % restantes não possuíam nenhuma relação com a
agricultura e pouca compreensão, pois os pais empregados rurais.

Relacionado as principais mudanças após o ingresso na EFASC, foi dividido em dois


subitens: propriedade e percepção de vida. Em 80% dos entrevistados aconteceu como

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principal mudança o aumento da produção de alimentos para a autossuficiência alimentar da


família, sendo essa produção agroecológica, com a aplicação de práticas e técnicas estudadas
durante o processo de formação e com o resgate cultural de variedades de sementes crioulas e
de saberes culturais. Destaca-se nessa questão que na maioria das propriedades o processo de
produção está de responsabilidade dos pais, sendo a mudança e aplicação de um novo sistema
de produção algo que gera bastante resistência por parte das famílias. Uma das entrevistadas
enfatiza muito a importância da mãe, “pois ela apoia e contribui com essa ideia, colocando-a
em prática na produção de alimentos para o consumo de nossa família” (ESTUDANTE
ESTAGIÁRIA 03, 2018). Outro aspecto relacionado foi a redução do uso de adubos sintéticos
e agrotóxicos nas principais culturas agrícolas.

A percepção de vida foi citada por 100% dos entrevistados, ou seja, a mudança na
percepção do campo como um local de vida, sendo possível permanecer com qualidade de
vida. O conhecer a comunidade melhor aparece com frequência para a maioria dos
entrevistados, pois relataram que antes não conheciam todas as potencialidades e
oportunidades que lá se encontra, seja relacionado aos aspectos sociais, culturais, de
biodiversidade, solos e relevos.

Todos os entrevistados destacaram o quanto mudou a sua relação com a família, o


contato com a agricultura e a comunidade, a partir do debate, aulas e instrumentos
pedagógicos que os instigaram a conhecer primeiramente a si mesmo, por segundo sua família
e, em sequência, seu meio profissional e comunitário. Essa mudança também se deve as suas
experimentações agrícolas, produzindo alimentos limpos e vislumbrando possibilidades de
também permanecer na propriedade com qualidade de vida.

As principais práticas agroecológicas realizadas citadas por 100% dos entrevistados


foram principalmente voltadas a recuperação e produção de sementes crioulas, realização de
caldas e extrato de plantas para o controle de insetos pragas, de iscas naturais para a mosca da
fruta, composto orgânico, vermicomposto e biofertilizantes para o processo de nutrição das
plantas, práticas de recuperação do solo e conservação do solo. No entanto, 60% ainda
citaram a recuperação de receitas de preparo e processamento de alimentos com as pessoas
mais antigas da comunidade e avós.

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A sessão escolar tem por função contribuir na reflexão da realidade dos/as


educandos/as e a partir deste constituir uma nova ação em seu meio. Partindo desta
compreensão é só no espaço escolar que acontece a construção do conhecimento técnico e
agroecológico nos educandos, mas também no momento em que estão em sua sessão familiar,
dialogando com seus familiares e agricultores/as, ou seja, os educandos passam a ser
responsáveis na produção de saberes, a partir de sua prática e observação no momento que
constituí uma área de experimentos e produção de alimentos, de uma elaboração de composto,
biofertilizante, cultivos, manejos e outros saberes inerentes a produção de cada cultura
agrícola. Na escola se compreende, se visualiza, mas nós compreendemos que as propriedades
e locais não são igualitárias as condições da escola, por isso, esses saberes agroecológicos são
mais enriquecedores e de cada educando que pensa seu espaço e agroecossistema a local,
além das relações humanas que se fortalecem.

Para que ocorra a autonomia e apropriação por parte dos educandos na aprendizagem
via pedagogia da alternância o professor tem o papel de mediador do processo de
aprendizagem, e através da busca na realidade possibilita aos educandos uma aprendizagem
crítica para sua atuação como sujeito na sociedade, conhecendo e conseguindo incrementar e
melhorar a realidade onde vive.

Dos entrevistados 100% não tinha noção do que era a agroecologia antes do ingresso
na EFASC, como pode ser observado na resposta de uma estudante entrevistada:

“Na verdade, antes do ingresso na EFASC eu nem sabia que existia agroecologia,
como estamos submersos a produção convencional, por vezes nem temos contato
com outras formas de se produzir, de fazer agricultura” ”. (ESTUDANTE
ESTAGIÁRIA 03, 2018).

A compreensão da agroecologia por todos entrevistados ficou evidente após o ingresso


na EFASC, como pode ser destacada na resposta a seguir:

“Agora, após a minha formação na EFASC, percebo que agroecologia é muito mais
que apenas produzir agroecologicamente, é produzir um alimento saudável, é
refletir//agir de forma mais justa e igualitária, em todos os espaços. Isso quer dizer
que, é não visibilizar a mulher agricultora, é não vender tão mais caro o alimento
por ser agroecológico. A agroecologia ultrapassa os limites de produção agrícola, é
pensar diferente e acima disso, viver de outra maneira, pensando nas relações
sociais que movem as práticas produtivas, buscando um mundo socialmente justo e
igualitário par todas e todos. Agroecologia é luta, é fazê-la diariamente”.
(ESTUDANTE ESTAGIÁRIA 03, 2018).

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O movimento da alternância possibilita a junção entre prática teorizada e teoria


aplicada, fazendo com que o estudante aprenda aspectos relacionados a realidade. A
construção do conceito de agroecologia pelos jovens vai ocorrendo através do processo de
formação, tanto pelas pesquisas realizadas na realidade, quanto pela reflexão na sessão escolar
das diversas áreas do conhecimento. Tudo inicia da tomada de consciência de conhecer a si
mesmo e a realidade a qual os educandos estão inseridos, para posteriormente questionar e
buscar a transformação dessa realidade.

Considerações Finais

Conclui-se que a formação desenvolvida pela EFASC é voltada para jovens do campo
filhos de agricultores e educandos do ensino médio e técnico em agricultura, que moram no
meio rural e através da pedagogia da alternância e seus instrumentos pedagógicos e uma
prática docente problematizadora e reflexiva permite que os educandos consigam desenvolver
o processo de observação, reflexão e ação. O conhecimento construído com esses educandos
segundo Paulo Freire é chamado de práxis, a ação construtora e renovadora consorciando
prática com teoria. “A teoria sem a prática vira 'verbalismo', assim como a prática sem
teoria, vira ativismo. No entanto, quando se une a prática com a teoria tem-se a práxis, a
ação criadora e modificadora da realidade.

E, após viverem as sessões escolares e familiares, passado o processo de formação


formal, os/as educandos e educandas além de estudar, conhecer e desenvolver o local onde
vivem, podem optar pela permanência no campo. Não sendo a única opção, pois muitos
acabam permanecendo no campo e estudando, o que é essencial e acaba com o mito de que
para trabalhar no campo não é necessário estudar. Isso tudo é resultado de uma educação
libertadora, com o ensino voltado para a realidade.

Muitos avanços vêm sendo realizados, principalmente em relação ao processo de


formação dos jovens, produção de alimentos para autoconsumo, resgate de saberes culturais e
de espécies e compreensão da agroecologia. No entanto, alguns desafios são necessários de
superar para que os jovens consigam implementar ainda mais práticas agroecológicas como

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por exemplo, a pouca abertura e resistência do processo de mudança por algumas famílias, a
dependência financeira de uma única matriz comercial das propriedades que dificulta
vislumbrar outras possibilidades. Muitos desses desafios acabam dificultando a permanência
de alguns jovens nas propriedades.

Para conseguir avançar ainda mais podemos concluir que está cada vez mais evidente
e necessária a articulação entre agroecologia e pedagogia da alternância na formação de
jovens do campo filhos e filhas de agricultores, tendo grande contribuição para a continuidade
e desenvolvimento do campo, através de uma agricultura mais limpa, justa e igualitária com
qualidade de vida e o essencial de tudo, com pessoas no campo

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DIA DE CAMPO: integrando saberes

Magna Leila Wachholz78


Loraine Rodrigues Jardim 79
Eliane Rosa Ramires 80

Resumo

O presente artigo visa relatar e investigar o papel do dia de campo como mecanismo facilitador no
processo de ensino aprendizagem sobre a cultura do arroz. Optou-se por trabalhar com o sétimo ano do
ensino fundamental da Escola Municipal de Ensino Fundamental Ernesto José Anonni, localizada no
meio rural do município de São Gabriel/RS. Essa pesquisa baseou-se no processo investigativo e de
troca de saberes entre os sujeitos envolvidos na investigação. Os resultados mostram que o dia a
campo favorece o processo de ensino aprendizagem, pois ocorreu a ampliação do conhecimento e o
olhar crítico dos alunos.

Palavras-chave: Dia de Campo; Escola do Campo; EMEF Ernesto José Annoni; São
Gabriel/RS.

1. Introdução

A escola é um espaço importante para a formação de indivíduos responsáveis e


capazes de colaborar e decidir sobre questões sociais, restabelecendo suas relações com o
meio onde vive. As Escolas do Campo em particular, afirma Caldart (2012, p.258),
conseguem aproximar a escola a sua comunidade, bem como a valorizar os aspectos
históricos e socioculturais dos sujeitos.
As Escolas do Campo necessitam pensar sua proposta pedagógica, no caminho de
valorização da cultura local e adaptações curriculares, seguindo as definições das Diretrizes
Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo, de 2002, que seu Artigo 5°
menciona
As propostas pedagógicas das escolas do campo, respeitadas as diferenças e o direito
à igualdade e cumprindo imediata e plenamente o estabelecido nos artigos 23, 26 e
28 da Lei 9.394, de 1996, contemplarão a diversidade do campo em todos os seus

78
E-mail: magnawachholz@gmail.com. EMEF Ernesto José Annoni. São Gabriel - RS.
79
E-mail: lorodrigues2@gmail.com. EMEF Ernesto José Annoni. São Gabriel - RS.
80
E-mail: elianerramires@hotmail.com. EMEF Ernesto José Annoni. São Gabriel - RS.

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aspectos: sociais, culturais, políticos, econômicos, de gênero, geração e etnia.


(BRASIL, 2002).

Percebe-se a preocupação com a Educação do Campo, que compreende a Educação


Básica que, devido as suas particularidades, que se organiza de forma adaptada, respeitando a
diversidade do campo. Por isso, as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação
Básica, de 2010, define em seu Artigo 35,
Art. 35. Na modalidade de Educação Básica do Campo, a educação para a
população rural está prevista com adequações necessárias às peculiaridades da vida
no campo e de cada região, definindo-se orientações para três aspectos essenciais à
organização da ação pedagógica:
(...)
III – adequação à natureza do trabalho na zona rural. (BRASIL, 2010, pg.73).

No entanto, em virtude das dificuldades encaradas no âmbito escolar muitos discentes


acabam desmotivados no ambiental educacional. Diante disso, cabe ao profissional da
educação transformar essa realidade que tanto dificulta o processo de ensino e aprendizagem
por meio de alternativas, ou seja, estratégias didáticas atraentes para o alunado.
Com isso, destacam-se os dias de campo como importantes recursos didáticos,
facilitando o processo da aprendizagem, tendo em vista as necessidades por busca de
estratégias didáticas que facilitem a relação entre professores e alunos, pois o trabalho fora da
sala de aula tende a auxiliar a construção do conhecimento. De acordo com Lima e Assis
(2005, p. 112), “o trabalho de campo se configura como uma solução para o aluno
compreender o lugar e o mundo, articulando a teoria à prática, através da observação e da
análise do espaço vivido e idealizado”.

1. Localização da Escola Ernesto José Annoni

O município de São Gabriel situa-se no estado do Rio Grande do Sul, uma área
territorial de 5.020 km², localizado na Microrregião da Campanha Central, pertencente a
Mesorregião Sudoeste Rio-Grandense. Possui uma população total de 60.425 habitantes, dos
quais cerca de 53.775 na zona urbana e em torno de 6.650 vivem no meio rural (IBGE/2010).
Considerando o contexto educacional, o município possui instituições de ensino
municipais, estaduais e federais. Considerando a rede municipal, temos a totalidade de 37

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escolas, sendo 29 localizadas na zona urbana e 8 na zona rural. Na figura 1 estão localizadas
algumas das escolas da zona rural, denominadas Escolas Polos.

Figura 1 – Mapa das Escolas Polos - São Gabriel/RS


Fonte: Dissertação Mestrado Eduardo Pastorio/RS (2015)

Dentre as escolas localizadas na zona rural, temos a Escola Municipal de Ensino


Fundamental Ernesto José Annoni na localidade de Cerrito, distrito de Catuçaba, a uma
distância de 62 km do centro da cidade. A escola Annoni possui turmas desde a educação
infantil (pré-escola) até o 9° ano do ensino fundamental, com um total de 113 alunos, 14
professores (uma responsável pelo Atendimento Educacional Especializado-AEE) e 5
funcionários, além da equipe diretiva. O calendário letivo é adaptado e suas atividades
acontecem de forma integral com alternância de dias entre as turmas do currículo e da área,
cumprindo no final oitocentas horas previstas em lei.

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Sua estrutura física compreende cinco salas de aula, biblioteca e sala de informática,
refeitório, cozinha, dois banheiros para os alunos (masculino e feminino), banheiros para os
professores e funcionários, sala dos professores, secretaria, supervisão, direção, sala de
depósito na parte externa e almoxarifado, sala de atendimento educacional especializado,
saguão (espaço de realização das festividades da escola), quadra de esportes, praça para os
alunos, horta escolar e espaço amplo na parte externa da escola (área livre).
A Figura 02 e 03 ilustram os aspectos frontais e laterais do prédio da Escola Municipal
de Ensino Fundamental Ernesto José Annoni.

Figura 02 e 03- Vista lateral e frontal da escola.


Fonte: Arquivo da EMEF Ernesto José Annoni.

3.Conteúdo e contexto: Dia de Campo

Muitos são os estudos referentes a importância do dia de campo para a construção do


conhecimento e desenvolvimento dos educandos. Por isso, Carbonell (2002) destaca que os
espaços fora da sala de aula despertam a mente e a capacidade de aprender, pois se
caracterizam como ambientes instigantes que, se bem aproveitados, se classificam como um
relevante panorama para a aprendizagem.
Com isso, entende-se que o dia de campo consiste no contato direto com o ambiente
de estudo fora da rotina em sala de aula, permitindo que o professor faça uso de um
importante instrumento pedagógico na relação ensino-aprendizagem.
Diante dessa abordagem, entende-se que para a concretização dos objetivos, o dia de
campo não pode apenas configurar-se como uma viagem ou passeio por falta de organização e

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planejamento. Entretanto, se bem planejado e vinculado com as propostas curriculares, essa


prática pode ocorrer no pátio da escola, na casa do aluno, no entorno da escola e com isso
qualquer escola pode desenvolver esse método com os alunos, estimulando e possibilitando
assim ao educando uma maneira de construir conhecimento crítico.
Com a busca por alternativas que visem facilitar e dinamizar a aprendizagem busca-se
uma relação entre conteúdos vistos com a situação vivenciada no dia de campo, tendo assim,
uma maior sensibilização ao mundo natural e cultural, além de propiciar o enriquecimento da
personalidade do aluno e aquisição de conhecimento de conteúdo relacionado com a visita.
Discentes de escolas do campo, por vivenciarem no seu cotidiano as experiências
rurais, devem ser ainda mais incentivados na participação de dias de campo, pois de acordo
com Mortimer (2000) apud Coutinho et al (2017) as ideias prévias dos estudantes
desempenham um papel fundamental no processo de aprendizagem, já que essa só é possível
a partir do que o aluno já conhece, e nesse contexto é o próprio campo.
Planejar o que se pretende obter com essa metodologia é fundamental, caso contrário
se transformará num momento de turismo. Nessa perspectiva, o planejamento começou
através de uma sondagem com os alunos do sétimo ano, os quais relataram que queriam
conhecer uma fazenda que realizasse a produção do arroz.
Os alunos participaram ativamente da organização do dia de campo, avaliando as
possibilidades desde qual fazenda visitar até mesmo na dinâmica de deslocamento e
alimentação.

3.1 O Dia de Campo

O dia de campo ocorreu em 26 de março de 2016. Os alunos foram recepcionados na


fazenda Mozzaquatro, de propriedade de pais de alunos da escola Annoni, localizada a 10 km
da escola.
O trabalho foi dividido em paradas. A saída da escola ocorreu às 9 horas da manhã e a
primeira parada foi a sede da Fazenda Mozzaquatro, onde fomos recepcionados pelos
proprietários. Após a recepção, os alunos foram levados para conhecer as dependências da
moega, onde é descarregado o arroz após a colheita, conduzido por esteiras de transporte até
as peneiras e seguindo o fluxo em direção aos silos de armazenamento, em que permanecem

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esperando os caminhões de transporte após as negociações. Nesta visitação foram abordados


temas como estações de cultivo, logística de insumos, cultivo, armazenamento e
beneficiamento de grãos, equipamentos de proteção individuais (EPIs), aquisição e
manutenção de maquinários agrícolas. Foi demonstrado o procedimento de análise da
umidade do grão, que deve passar pelo processo de secagem para estar com a umidade
adequada para armazenamento.
Os alunos foram conduzidos também por uma visitação às áreas em torno dos silos de
armazenamento e da sede da fazenda, onde foram descritos e discutidos assuntos como
descarte de resíduos, aplicação de adubos químicos, hortas caseiras, plantas medicinais, entre
outros.
O aluno, filho dos proprietários da fazenda, apresentou aos colegas o experimento que
estava realizando em uma pequena área de campo cedida pelo pai, onde cultivou quatro
fileiras de arroz, aplicando diferentes insumos para comparação de desenvolvimento das
plantas, sendo eles: o mesmo adubo que a família utilizava nas lavouras, ureia, fungicida a
base de óleo natural e apenas água. No experimento apresentado, como mostra figura 04 e 05
o aluno utilizou diferentes concentrações e janelas de aplicação, descrevendo as
características de desenvolvimento da cultura, bem como as necessidades de alterações nas
formas de cultivo ao verificar que algumas folhas estavam apresentando manchas
características de excesso de adubo na área foliar.

Figura 04 e 05- Explicação sobre o experimento.


Fonte: Arquivo da EMEF Ernesto José Annoni.

A segunda parada foi o almoço, constituído por um belo e saboroso churrasco


acompanhado de um bufe de saladas, com direito a sobremesa e muito mais.

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Posterior ao pequeno descanso de início da tarde, os alunos foram convidados a


visitarem uma das lavouras de arroz da Fazenda Mozzaquatro, onde puderam acompanhar o
processo da colheita, conhecer as dinâmicas de irrigação utilizadas na propriedade e de
fertilização do solo com a utilização da palha que sobra após a colheita, conforme figura 06 e
07.

Figura 06 e 07- Alunos e professores acompanhando o processo da colheita.


Fonte: Arquivo da EMEF Ernesto José Annoni.

Como última parada, os alunos retornaram a sede da Fazenda Mozzaquatro para


degustar um delicioso lanche antes de retornarem à escola.

3.2 Análise da vivência

Nesse dia de campo realizado na Fazenda Mozzaquatro, observou-se os passos da


cultura arrozeira, desde a preparação do solo até a colheita, armazenamento e venda do
produto. Os dados foram obtidos através de questionamentos, observações e conversa com os
funcionários, proprietários e outros alunos que também vivenciam essas práticas nos seus
cotidianos. Como alguns professores não conheciam moega por dentro, os próprios alunos
explicaram algumas dinâmicas de funcionamentos. A historicidade de um povo, de uma
cultura, são bases para a transformação de uma nação, por isso, em uma prática como esse dia
de campo vivencia-se muito mais do que apenas uma rotina agrícola, mas sim a importância
da atividade rural.
A agricultura é a atividade que melhor representa o desenvolvimento humano sobre a
terra. Foi fundamental para a sobrevivência do homem pré-histórico e continua sendo
indispensável ao homem moderno. Desde o estabelecimento das famílias em aldeias, ainda

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em eras remotas, o processo agrícola tomou conta do dia - a dia e implicou a divisão de
trabalho dentro da família. Com isso, alimentar a todos os seres humanos sem destruir o
planeta é o maior desafio da agricultura para este novo século.
As atividades realizadas no campo merecem bem mais respeito e atenção do que
tradicionalmente vem sendo - lhes reservadas. São, e continuarão sendo, importantes fontes de
empregos, geração de renda e riqueza para o país e o mundo.
O dia de campo realizado na Fazenda Mozzaquatro consistiu em interpretar dados
coletados a partir de conversas, isto é, analisando o discurso, analisando fatos da memória das
pessoas. No diálogo, os educandos podem ver reconhecidos os seus saberes, a sua cultura e a
história, muitas vezes silenciada. Na sala de aula, a interlocução desses saberes com o
conhecimento legitimado pela ciência há de abrir caminhos para a consciência crítica.
(SANTIAGO, 2012). As trocas de informações, tecnologias e experiências são fundamentais
em quaisquer níveis do conhecimento e no campo não poderia ser diferente. Dessa forma, a
turma do sétimo ano efetuou essas trocas de conhecimento entre os envolvidos.
O dia de campo é um método grupal e complexo que permite a reunião de um grupo
de pessoas de realidades distintas, desde alunos que residem em ambiente rural, professores
que residem em ambiente urbano, visitantes, funcionários e proprietários. A opção por este
método deve ser feita quando se deseja mostrar a várias pessoas em um único dia, uma ou
mais práticas e ou tecnologias referentes a um tema, em determinada unidade familiar, onde
estão sendo obtidos bons resultados e que merecem ser reconhecidos, possibilitando aos
participantes a observação, discussão e análise das questões tecnológicas, econômicas, sociais
e ambientais passíveis de implementação (FRANÇA, 1993).
O planejamento do dia de campo foi encarado com muita seriedade, pois foi dele que
dependeu todo o sucesso do evento, e para tal, foi imprescindível realizar reuniões objetivas
com todos os membros envolvidos. Na elaboração do planejamento, a equipe de coordenação
da Escola, organizou reuniões envolvendo todos os alunos nas decisões quanto ao tema, à
época da realização, os conteúdos técnicos a serem priorizados, à definição dos instrutores, o
local do evento e à divulgação entre o público interessado.
Após a definição do tema, da data e local para a realização do evento, o próximo passo
foi a elaboração do plano de ação do dia de campo. O plano de ação é o planejamento de
todas as ações necessárias para atingir o resultado desejado. Este plano contou com uma

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cronologia clara e objetiva das etapas que foram desenvolvidas, observando-se as ações
preparatórias, de execução e acertos finais, contendo as responsabilidades dos envolvidos e
prazos definidos em reunião com todo o grupo envolvido.
As saídas de campo facilitam a interação dos alunos com o meio ambiente em
situações reais aguçando a busca pelo saber, além de estreitar as relações entre
aluno/professor (VIVEIRO; DINIZ, 2009). As atividades de campo são fundamentais na
construção do conhecimento científico, mesmo que ocorra de a experiência nem dar muito
certo naquele momento, pois quando o resultado é diferente do esperado, professor e alunos
tem diante de si uma riquíssima oportunidade de procurarem juntos as causas da diferença. Da
mesma forma, os alunos podem trocar ideias e informações analisando diferentes resultados
que obtiveram. Romanatto & Viveiro (2015, pág.8) descrevem que “a primeira característica
da atividade cientifica é que mobilizamos conhecimentos quando nos admiramos ou
surpreendemos com um fato, fenômeno ou evento da realidade”.
Como critério a ser usado na escolha de temas para serem trabalhados junto com os
alunos temos o contexto social e da vivência de alunos e professores que muito facilita o
diálogo e coloca nas mãos do professor um instrumento flexível e de fácil adaptação ao
interesse às características da classe. Muito importante ainda, é oferecer ferramentas que a
criança possa desenvolver a capacidade de pesquisar sozinha, pois essa é uma habilidade que
lhe será útil por toda vida. O espaço no qual se vive “pode ser o ponto de partida para estudos
que permitam ao aluno compreender como o local, o regional e o global estão relacionados,
considerando as diversas variáveis que podem explicar os fenômenos” (CRUZ; LOPES 2009,
p. 3).
Nas atividades de campo no estudo de Ciências ou em qualquer outra disciplina a
criança desenvolve a observação direta ou indireta. A proposta do dia de campo é transcender
os limites físicos da sala de aula explorando a sensibilidade do contato direto dos alunos aos
aspectos naturais do nosso ambiente. Infelizmente a maioria das escolas brasileiras esbarra em
problemas como falta de recursos financeiros, burocracia da escola, receios dos pais em
relação a passeios e excursões, exigindo ainda mais criatividade e empenho do professor para
que o ensino não sofra prejuízos. O campo traz muitas informações, desde que bem orientado
para que o objetivo não se perca.

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4. Considerações finais

Discentes de escolas do campo, que vivenciam esse contexto de produção nos seus
ambientes familiares, sejam como famílias proprietárias ou como funcionários, apresentam
dificuldade em verificar a inserção de conceitos estudados em sala de aula com suas práticas
diárias. O encontro de professores, direção da escola, alunos e familiares, em um ambiente
familiar aos alunos, compartilhando saberes, possibilita a concretização da ideal teoria/prática.
Em momentos como esse os alunos concretizam o fato de já possuírem muitos
saberem que se integram com as teorias abordadas em sala de aula, com isso, vão além das
paredes da sala de aula, possibilitando a integração dos conceitos com a rotina do campo,
valorizando assim a realidade e as experiências dos alunos. O dia de campo para alunos de
escolas do campo são fundamentais para a implementação da proposta pedagógica destas
escolas, contemplando verdadeiramente a diversidade do campo em todos os seus aspectos:
sociais, culturais, políticos. O contato com os trabalhadores rurais mostra como saberes
populares estão impregnados de saberes científicos, desde conceitos físicos da mecânica na
utilização do maquinário na lavoura à utilização de proporções, cálculos de áreas e estimativa
na produção do arroz.

Investigar o trabalhador em sua prática rotineira é mais que apenas um dia de campo, é
pertencer a um ambiente onde as disciplinas, mais do que estarem presentes na sua realidade,
são a própria realidade, sendo utilizadas o tempo todo, desde o levantar ao deitar. Conversar,
investigar, conhecer outra rotina, embora trabalhosa no início, e às vezes até problemática,
nos faz perceber e compreender o que é cultura, o que é história, o que é individualidade e ao
mesmo tempo generalização, nos faz entender cada gesto, cada ato, cada conquista e ver que
cada um tem seu próprio modo de ver a realidade e que devem ser respeitados por isso.
O arroz além de importante para a dieta do ser humano pode ser uma inesgotável fonte
de assuntos cotidianos que podem ser trabalhados com a parte teórica e prática. Por outro
lado, como a disciplina não pode estar desligada da realidade, a ação pedagógica nos mostra
como podemos fazer essa ligação e a vantagem de usá-la, uma vez que, quando conseguimos
trabalhar conceitos de uma forma que faça sentido para o educando, então conseguimos fazer
educação.

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Um dos aspectos presentes na transferência de tecnologias para produtores rurais é a


comunicação (FREIRE, 1991). Dentre as barreiras da comunicação e da informação
classificadas por WERSIG (1976) apud FREIRE (1991), a que teve relevância na elaboração
do dia de campo foi a barreira terminológica, descrita da seguinte maneira: não
necessariamente usuários e agentes da informação precisam usar o mesmo código de
linguagem no processo de conhecimento, no setor produtivo a terminologia usada pode
impedir a compreensão final da mensagem.
Os agentes da informação nesse caso são oriundos de uma vivência diferente dos
usuários finais. Como os agentes da informação estão inseridos no meio em que vivem, é
comum o uso de uma linguagem mais popular, que na maioria das vezes não faz parte da
realidade do ouvinte. Para ser mais eficiente na comunicação optou-se por, além de adotar
linguagem mais simplificada, um aluno fazer parte da apresentação, sendo que o mesmo, por
ter contato frequente com os agentes da informação e com os usuários finais, poderia
esclarecer melhor a informação, atuando como um mediador da comunicação entre as partes.
Acredita-se que esta iniciativa tornou mais efetiva a comunicação e deu maior
confiabilidade à informação frente aos participantes do dia de campo e com isso, o dia de
campo apresenta grande potencial como ferramenta na difusão do conhecimento e de
tecnologias para a agricultura familiar e comunidade escolar.

5. Referências bibliográficas

BRASIL. Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo.


Resolução CNE/CEB nº 1 de 03 de abril de 2002. Ministério da Educação. Secretaria de
Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD). Brasília: MEC, 2002.

BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. Resolução


CNE/CEB n° 4 de 13 de julho de 2010. Ministérios da Educação. Brasília: MEC, 2010.

CALDART, R. S. (org.). Dicionário da Educação do Campo. Rio de Janeiro – São Paulo:


Expressão Popular, 2012.

CARBONELL, J. A aventura de inovar: a mudança na escola. Porto Alegre: Artmed, 2002


(Coleção Inovação Pedagógica)

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COUTINHO, F.A.; GOULART, M.I.; PEREIRA, A.F. Aprendendo a ser afetado:


contribuições para a educação infantil. Educação em Revista, n. 33. Belo Horizonte, 2017.

CRUZ, Suzana de Fátima Camargo Ferreira da; LOPES, Mario Cezar. Velhas metodologias,
novos olhares: o caso do estudo do meio. 2009. Disponível em: Acesso em: 26 junho de
2018

FRANÇA, A. P. de. Metodologia de extensão rural: dia de campo. Recife: Emater -


PE/DECOM, 1993.

FREIRE, I. M. Barreiras na comunicação da Informação tecnológica. Ciência da


Informação, v.20, n.1, p. 51 - 54, 1991.

BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Site:


http://www.ibge.gov.br/ acesso em 27 de julho de 2018.

LIMA, V. B; ASSIS, L. F. DE. Mapeando alguns roteiros de trabalho de campo em


Sobral (CE): uma contribuição ao ensino de Geografia. Revista da Casa de Geografia de
Sobral. Sobral, v. 6/7, n. 1, 2004/2005.

PASTORIO, E. Nucleação das Escolas do Campo: o caso do município de São Gabriel/RS.


Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Geografia. Santa Maria: UFSM,
2015

PEREIRA, L. M. Os Kaiowá em Mato Grosso do Sul. Dourados-MS: Editora UFGD, 2016.


Referências seguindo as normas da ABNT, em Times New Roman tamanho 12, espaçamento
entre linhas 1.0. Sem recuo. Espaçamento depois do parágrafo.

ROMANATTO, M.C.; VIVEIRO, A.A. Aprofundamento cientifica: um direito de


aprendizagem. In.: Pacto nacional pela alfabetização na idade certa- ciências da natureza no
ciclo da alfabetização. Caderno 08. Ministério da educação, secretaria de educação básica,
diretoria de apoio à gestão educacional. Brasília: MEC, SEB, 2015

SANTIAGO, A.R.F. Pedagogia crítica e educação emancipatória na escola pública: um


diálogo entre Paulo Freire e Boaventura Santos. IX ANPED SUL. 2012. Disponível em
http://www.ucs.br/etc/conferencias/index.php/ anpedsul/9anpedsul/paper/viewFile/. 225/217.
Acesso em 28 de julho de 2018.

VIVEIRO, A.A.; DINIZ, R.E.da S. Atividades de campo no ensino das ciências e na


educação ambiental: refletindo sobre as potencialidades desta estratégia na prática escolar.
Ciência em Tela. v.2, n.1, 2009.

WERSIG, G. Information Science: the study of postmodern Knowledge usage. Information


Processing & Management, v.29, n.2, p. 229 - 239, 1993

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SEMEANDO CONHECIMENTO, COM MAIS IGUALDADE E NOVAS


OPORTUNIDADES

Angela Marmitt81
Franciele Marques Nunes82
Joana Vitoria Machado83
Solange Casagrande4

Resumo
Esta pesquisa apresenta uma reflexão acerca das dificuldades dos estudantes da comunidade
Quilombola de Cambará inserido no município de Cachoeira do Sul, para a realização das atividades
escolares que necessitam de meios de pesquisa. Tem como objetivos oportunizar o acesso à materiais
necessários para os alunos e a comunidade, através da implantação de uma biblioteca comunitária na
localidade, com o intuito de contribuir e auxiliar na realização de trabalhos e pesquisas, além de
incentivar a leitura e diminuir as disparidades educacionais e desigualdades sociais. Os livros podem
ser utilizados enquanto uma ferramenta que oportunize o despertar do conhecimento. Enquanto
técnicas de pesquisa utilizou-se de referências bibliográficas e pesquisa de campo através da aplicação
de questionário com perguntas abertas e fechadas, de forma a extrair dados e informações diretamente
da realidade do objeto de estudo, e a partir destes dados se compreenda a importância da criação da
biblioteca na comunidade.

Palavras-chave: Educação; Quilombo; Biblioteca.

Introdução

A leitura sempre foi o caminho necessário para entender o mundo, sem deixar de
respeitar as diferenças culturais, sociais e políticas do indivíduo. A formação de cidadãos, não
se limita a conceitos preestabelecidos que torna inviável o ato de pensar. É necessário
perceber esta nova realidade e criar estratégias que valorizem a leitura de escrita e de mundo.
A leitura é a base do conhecimento, é a porta de entrada para uma boa formação profissional e
intelectual.

Assim, a biblioteca comunitária surge como um espaço destinado ao envolvimento e à


inserção do público local, promovendo o acesso à informação, leitura e cultura, com a

81
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM- angelamarmitt79@gmail.com
82
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM- nunesniko488@gmail.com
83
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM- joanavitoriamachado@hotmail.com
4
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM- solcasagrande@gmail.com

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finalidade de promover a inclusão social, a redução da desigualdade e suprir injustiças


(MACHADO, 2009; BLANK, SARMENTO, 2010). Podemos perceber que quanto mais
participativa, maior é a possibilidade da biblioteca transformar-se num ponto estratégico para
integração social, respeitando a diversidade e contribuindo para uma formação emancipatória,
que trará melhores níveis de escolaridade com mais igualdade garantindo melhores
oportunidades.

O projeto Semeando conhecimento tem o intuito de organizar uma mini biblioteca


comunitária na comunidade quilombola de Cambará, localizada no limite dos municípios de
Cachoeira do Sul e Caçapava do Sul, oportunizando neste contexto, o desenvolvimento social
e local para essa população que gradativamente vem lutando para sair da condição de
excluídos. Apesar das dificuldades, como as limitações para o deslocamento e financeiras, a
comunidade anseia por conhecimento e desenvolvimento social. Desta forma, busca-se
promover o acesso livre ao conhecimento e incentivo à leitura através da disponibilização de
um acervo diversificado, que possibilitará a realização de atividades escolares e culturais para
a comunidade.

A mini biblioteca proporcionará melhores condições de estudo aos estudantes da


comunidade quilombola Cambará, uma vez que, oportuniza o acesso a materiais que auxiliam
na realização de suas pesquisas e trabalhos escolares, de forma a amenizar as dificuldades
enfrentadas pelos alunos e contribuir para a diminuição da disparidade na aprendizagem.

Ainda, poderá ser utilizada como um espaço de convivência social, um ambiente que
estimule o prazer pela leitura, que promova o (re)conhecimento da cultura local reforçando a
valorização bem como o incentivo ao desenvolvimento da região, de forma a sensibilizá-los
que o projeto servirá não só como instrumento de estudo para os alunos, através de livros
obtidos por doações, entre literatura infantil, literatura para jovens e adultos, livros didáticos,
de pesquisa e técnicos, que abrangem diversas áreas de informação do conhecimento, mas
também capaz de se tornar um ponto de referência, podendo-se realizar também oficinas de
dança, teatro e contos de histórias.

Portanto, se faz necessário incentivar à educação e promoção à cidadania, desta


maneira, a leitura representa um grande passo para aquisição do conhecimento, contribui para

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o funcionamento e desenvolvimento do pensamento crítico, levando o leitor a questionar e


avaliar o texto lido, dentro de um referencial próprio de seus conhecimentos, conceitos e
valores, para Perrotti (1990, p. 70) “o objetivo principal da biblioteca deve de ser o de
incentivar a leitura recreativa, propiciar condições para o desenvolvimento para o hábito de
leitura e oferecer atrativos para incentivar o uso do livro e da biblioteca”. A criação de um
projeto de incentivo a leitura através de uma biblioteca é de extrema importância.

A Biblioteca Comunitária como principal agente de transformação social

A biblioteca comunitária surge onde o investimento e iniciativas governamentais são


ausentes, onde o acesso à informação e a educação é precário, tanto em áreas urbanas e
especialmente nas áreas rurais. Como o próprio nome sugere, é uma biblioteca para
comunidade em seu entorno, feita em parceria com a comunidade, que através de suas
lideranças estão sempre em busca de incentivos e promoção social. Surgindo em espaços
alternativos, o que move a construção é o desejo de disseminar conhecimento contribuindo
para diminuir as disparidades educacionais daqueles que estão à margem do saber.

Para MACHADO (2010, p. 98) “o motivo principal para a criação desses espaços é a
dificuldade de acesso ao livro e à leitura, ou seja, a carência de espaços públicos para esse fim
– bibliotecas públicas e escolares.”

Considerando que a educação é um dos direitos humanos básicos para a formação dos
sujeitos propõe-se que os quilombolas busquem conquistar não só o direito ao acesso, mas
principalmente as condições de permanência e assim poder atuar na construção de uma
escolarização que contemple sua identidade, sua cultura, e seus valores.

Pode-se facilmente reconhecer a biblioteca como importante meio para manutenção da


cultura, não simplesmente sendo um depósito de livros, mas como organismo atuante para
práticas culturais, contribuindo para a formação de indivíduos com pensamento crítico e
reflexivo. Pois, não é aceitável que o conhecimento fique somente registrado, este precisa ser
disseminado para o maior número de usuários possível.

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Neste sentido, a biblioteca comunitária mesmo com pouco apoio e sem uma estrutura
adequada consegue desempenhar a ideia de ampliar conhecimento, que é seu principal
objetivo. Sendo que, sua vantagem é o fato de estar mais próxima e aberta para população,
(MILANESI, 2002: 91). Vínculo esse que é percebido mais claramente em uma comunidade
que se disponibiliza em instituir seu próprio acervo, partindo de uma iniciativa individual ou
em parceria, e assim se propaga entre os demais membros da comunidade. Sob o mesmo
ponto de vista, MACHADO também destaca que,

[é] interessante perceber que a biblioteca comunitária surge como um poder


subversivo de um coletivo, uma forma de resistência contra-hegemônica, de quase
enfrentamento social, numa nova realidade, que escapa das medidas e das categorias
descritivas existentes, passando praticamente despercebida pela academia. De forma
empírica e criativa, elas trabalham no empoderamento da comunidade, criando
mecanismos para colaborar no desenvolvimento social, potencializando os talentos
dos indivíduos e das comunidades, constituindo-se em espaços públicos voltados à
emancipação, onde a prática cidadã pode aflorar de forma inovadora, criativa e
propositiva. (MACHADO, 2010, p.51)

Com base nestes pressupostos, segundo (LAKATOS, 2007), o acesso à informação e à


leitura é condição básica para o exercício da cidadania e para uma participação ativa da
sociedade além de se constituir em condição fundamental para o desenvolvimento de práticas
sociais, culturais e políticas que determinam a nossa existência no mundo e as nossas atuações
profissionais.

Nesse contexto, a biblioteca comunitária é inserida na localidade como alternativa de


resposta às necessidades informacionais imediatas das pessoas que ali convivem, buscando
materiais que contribuem para a educação básica em todos os níveis. Deve ser mantida pela
própria comunidade e/ou com parcerias, através de iniciativas de captação de recursos,
fomentando as estratégias de ações culturais, que por sua vez atraíam as pessoas à
participação das atividades promovidas pela unidade de informação.

METODOLOGIA

A construção desta pesquisa efetivou-se a partir de uma primeira visita à comunidade,


onde nos apresentamos como graduandas do curso de Licenciatura em Educação do Campo

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da Universidade Federal de Santa Maria/ RS e que estávamos buscando um espaço para


realizar um projeto que este seria construído em conjunto com povos tradicionais, referente a
melhorias e desenvolvimento em relação à educação. Através de uma conversa informal com
moradores, buscamos saber se estes possuíam interesse em participar. O projeto com a idéia
da mini biblioteca foi muito bem recebido. Sequencialmente, conversamos com alguns
moradores, entre eles a presidente da comunidade com diálogos informais, onde procuramos
captar detalhes que não ficam evidentes nas demais técnicas utilizadas e, desta forma
possibilitar a compreensão da realidade em que estão inseridos os sujeitos pesquisados.

Posteriormente foram realizadas mais três visitas a comunidade; para aplicação de


questionários, realização de uma reunião com as famílias da comunidade, em especial as que
continham filhos estudantes, e para concluir a criação do acervo dentro da comunidade,
organizado num espaço definido em conjunto com os moradores destinado a biblioteca.

A abordagem da pesquisa é pesquisa-ação, pois procura diagnosticar um problema


específico, com o intuito de atingir uma relevância na prática dos resultados, de natureza
aplicada, abordagem qualitativa, uma vez que se propôs a conhecer dificuldades, obstáculos,
possibilidades e perspectivas na constituição e no processo de desenvolvimento de ações
coletivas voltadas para práticas de leitura, e quantitativa, na forma de coleta dos dados via
questionário quanto a análise dos resultados e sua apresentação.

Construiu-se um roteiro para a aplicação do questionário assistido, constituído de doze


questões abertas e fechadas, com caráter quantitativo, direcionadas a responder aos objetivos
da pesquisa, ou seja, sobre os principais problemas e as dificuldades que eles enfrentam
referente a educação. No total foram aplicados 13 questionários junto às famílias da
comunidade, os dados coletados foram analisados e tabulados.

Pretendeu-se neste estudo uma análise dialética das dificuldades e possibilidades em


que se encontram, não somente em seus aspectos sociais, objetivos, concretos e materiais, mas
também em suas determinações mais subjetivas e individuais, através da pesquisa de campo.
Seus resultados serão apresentados de forma descritiva, tabulados e por meio de fotografias.

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RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com base na pesquisa realizada percebe-se que a dificuldade de acesso e a falta de


meios para acompanhar as atividades propostas pela escola, influenciam diretamente no
desenvolvimento e engajamento do estudante, que acaba desmotivado em dar continuidade
nos estudos. Sendo assim, fica claro que embora o acesso à escola seja facilitado, são
necessárias iniciativas que dêem suporte para estes estudantes, auxiliando a alterar este
quadro, impulsionando-os na busca por uma educação plena e transformadora.

A partir dos dados coletados e analisados dos questionários, somados ao que fora
debatido com as famílias constatou-se vários fatores contribuintes para a desigualdade no
desempenho escolar, entre os quais se destaca a dificuldade para realização das atividades
escolares que necessitam de pesquisa. Fenômeno este causado principalmente pela dificuldade
de acesso à internet e bibliotecas. Devido a comunidade situar-se distante da escola e da
cidade, além de os alunos não disporem de condições financeiras, o que torna inviável irem à
escola e ou cidade onde teriam condições de acesso à internet e utilização do acervo da
biblioteca, para realização das atividades.

As pessoas da comunidade possuem uma grande dificuldade em continuar estudando,


assim os níveis de escolaridade não ultrapassam o ensino médio, chamando atenção o grande
percentual nos níveis incompletos de ensino, a inexistência do ensino superior, além do alto
índice de repetência, como pode ser observado a partir da Figura 1.

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Figura 1 - Nível de escolaridade da comunidade quilombola de Cambará.

Fonte: Autoras (2018).

Figura 2 - Índice de repetência da comunidade quilombola de Cambará

Índice de Reprovação

%
Total de alunos Não Repetentes

Entrevistados Repetentes

13 6 7 53,85

Fonte: Autoras (2018)

De acordo com os resultados das figuras 1 e 2, fica visível que há deficiência tanto
nos níveis de ensino, como de aprendizagem, consequência de uma soma de fatores, desde
a situação de exclusão enfrentada pelos alunos, a falta de políticas públicas que atenda as

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necessidades destes sujeitos, que tenham objetivo de oferecer uma concepção de educação
emancipatória, de transformação social, além da falta de iniciativas e meios que
promovam o acesso dos alunos a espaços para desenvolver sua autonomia,o gosto pelo
aprender, o interesse pela leitura.

Todos estes fatores são causas para a desmotivação, para a falta de perspectiva,
resultantes nos baixos índices de aprendizagem, ocasionando altos índices de repetência e
por consequência a evasão escolar.

Embasados pelos resultados obtidos e apontados, chega-se ao senso comum, da


necessidade de haver a criação de um acervo dentro da comunidade, construído num
espaço de fácil acesso aos moradores e que este seja destinado a biblioteca comunitária.
Assim, esta ação contribuirá de forma positiva, criando melhores condições de estudo e
pesquisa. Suprindo em sua maioria a falta de informação, de incentivo e iniciativas,
alcançando desta forma a possibilidade de acesso a uma formação mais emancipatória,
que lhes trará melhorias em sua escolaridade com mais igualdade e lhes garantirá
melhores oportunidades.

Mediante o exposto, Paulo Freire afirma que,

Educação não transforma o mundo. Educação muda pessoas. Pessoas


transformam o mundo. Quando o homem compreende a sua realidade, pode
levantar hipóteses sobre o desafio dessa realidade e procurar soluções. Assim
pode transformá -la [...] (Paulo Freire)

De acordo com o pensamento do pedagogo, a educação é fundamental para a


formação plena do indivíduo, e através desta plenitude nos tornarmos capazes de refletir,
criticar e atuar no contexto geral da sociedade, faz com que deixemos de ser massa de
manobra e passamos a ser autores de nossa própria história.

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Fotografia 1- Visita inicial á comunidade quilombola de Cambará

Fonte: Autoras (2018)

Fotografia 2 - Aplicação de Questionário

Fonte: Autoras (2018)

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Fotografia 3 - Integração e realização do Projeto com a Comunidade Quilombola

Fonte: Autoras (2018)

Fotografia 4- Entrega dos livros a comunidade Quilombola

Fonte: Autoras (2018)

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CONCLUSÕES

A criação de uma biblioteca comunitária com livros e demais materiais constituem-


se em uma ação positiva e ativa de ensinar. A proposta se concretiza em sua amplitude
quando os leitores utilizam a biblioteca para seus trabalhos e pesquisas. Desta forma, a
mesma passa a oferecer oportunidade para os sujeitos, auxiliando-os no sentido de se
desenvolverem.

Conclui-se então que o estudo atingiu seus objetivos, uma vez que conseguira
oferecer materiais abrangentes à vários assuntos, capazes de favorecer a comunidade, no
sentido de suprir em parte a carência existente. Objetiva-se, que a mini biblioteca continue
e que venha até mesmo expandir, de forma a manter um acervo cada vez mais organizado
e diversificado reforçando entre os moradores a importância da disponibilidade da
biblioteca para o uso constante da comunidade. Possibilitando a utilização do espaço por
todos e para todos, somente assim a mini biblioteca desempenhará o seu papel para
comunidade, conforme fora idealizado.

Neste propósito, embora seja uma pequena iniciativa, almeja-se que a mini
biblioteca tenha capacidade de desenvolver cada vez mais atividades que estimulem a
curiosidade dos sujeitos, desenvolvendo o hábito de ler, e assim possibilitar abrir um novo
horizonte e despertar a comunidade para a possibilidade de acesso a uma formação mais
emancipatória, garantindo melhores oportunidades a estas pessoas desfavorecidas,
trazendo-lhes maior autonomia no exercício da cidadania, Inserindo-os num ambiente
social, como leitores críticos com a capacidade de argumentar e refletir sobre sua
realidade

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANTUNES, W. A; ANTUNES, M. C; CAVALCANTE, G . A. Curso de capacitação para


dinamização e uso da biblioteca pública: manual. São Paulo: Global,2000.

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EFETIVADO. cartilha, [S.l.], p.01-28, jan. 2006. Disponível em:
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PERROTI, Edmir. Confinamento cultural, infância e leitura. São Paulo: Summus Editorial,
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Para Comunidades Periféricas Da Ilha De São Luís, Maranhão, Trabalho de Graduação
do curso de Biblioteconomia 2012,10f. Universidade Federal do Maranhão, 2012.

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INDICADORES EMANCIPATÓRIOS E (DES) COLONIAIS NA ESCOLA FAMÍLIA


AGRÍCOLA DE SANTA CRUZ DO SUL: REFLEXÕES A PARTIR DAS PRÁXIS DO-
DISCENTES

Aline Mesquita Corrêa84

Resumo

O presente trabalho problematiza como as práxis docentes e discentes, do-discentes, tramadas na


educação do campo, na Escola Família Agrícola de Santa Cruz do Sul -EFASC-, constituem
indicadores emancipatórios e (des) coloniais na busca pelo ser mais e pela humanização enquanto
tarefas permanentes. Os caminhos teóricos e metodológicos entrelaçam a pesquisa de cunho
qualitativo com elementos de participação e o aporte teórico em Freire (1984), Quijano (2005),
Nosella (2007), Caldart (2012) e Streck; Adams (2014). Discorre-se que a recuperação e valorização
dos saberes populares, a perspectiva agroecológica, o enfrentamento ao patriarcado, a busca pelo
conhecimento transformado/transformador são importantes indicadores emancipatórios e
(des)coloniais que as referências pedagógicas e epistemológicas da EFASC articulam nas práxis da
educação do campo com vistas à dignidade humana e a emancipação.

Palavras-chave: Indiciadores emancipatórios; Indicadores (des) coloniais; Escola Família


Agrícola de Santa Cruz do Sul; Educação do Campo.

Introdução

Iniciamos a andarilharem contextualizando que a educação do campo como fruto das


lutas sociais por uma educação articulada com a realidade desse espaço e com os sujeitos-
mulheres, homens, jovens, idosos/as e crianças- que produzem suas vidas na relação com e no
campo é um fenômeno ainda recente no Brasil. Oriunda das resistências e práxis dos
movimentos e organizações político-sociais dos trabalhadores e trabalhadoras do campo, essa
educação processualmente vem tramando-se nos diálogos políticos/pedagógicos e
epistemológicos possibilitando-nos desvelar que a luta pela terra, pelo alimento e pela
articulação trabalho e educação é o começo de um embate de outras lutas que apontam
horizontes emancipatórios e possibilidades de transformar a realidade pretensamente
opressora e colonialista (QUIJANO, 2005; CALDART, 2012).

84
Doutoranda em Educação pela Universidade de Santa Cruz do Sul-UNISC; Bolsista Prosuc Capes.
alinemesquitta@yahoo.com.br

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Assim, a Educação do Campo, originalmente vinculada aos movimentos sociais do


campo, foi tomada como base para os trabalhadores e trabalhadoras sem-terra, para a
agricultura familiar e outros movimentos vinculados à terra e à natureza. A base empírica e
reflexiva articula a Educação do Campo a uma Pedagogia do MST, por seu envolvimento
genuíno com a proposta de educação para a terra ou a Pedagogia do Movimento (CALDART,
2012). Além disso, como se apresenta na atualidade tem sua herança na Pedagogia do
Oprimido (FREIRE, 1984), na Pedagogia Socialista (PISTRAK, 1981) e na compreensão
histórico-dialética de educação integral do homem e da mulher como princípio de
emancipação humana. Nesta trama, além da expressa luta de classes, está implicada a
recuperação dos saberes populares e a experiência dos povos do campo como referência
epistemológica, no processo educativo e na constituição do campo como campo
epistemológico. Contudo, essa conquista do campesinato não é fruto do acaso o que desvela
uma história de descaso e recusa de direitos, de dizerem a palavra, aos homens e mulheres do
campo, pois durante décadas os povos do campo não tiveram acesso à educação
contextualizada com suas lutas, histórias e realidade (FREIRE, 1984).
Em contraponto a realidade fatalista, a extensão do agronegócio e o descaso com a
educação e saúde dos povos do campo, na Região do Vale do Rio Pardo, no ano de 2009, foi
instituída uma escola do campo, a Escola Família Agrícola de Santa Cruz do Sul (EFASC),
com intuito de tramar um processo educativo que possibilitasse às mulheres e aos homens
pensarem estratégias libertadoras de vida do e no campo. Um dos princípios dessa escola é o
protagonismo da mulher e do homem do campo. Para tanto, se embasa numa proposta
educativa chamada Pedagogia da Alternância na qual estudo (teoria) e trabalho (prática em
casa e na comunidade) (NOSELLA, 2007) compõem uma práxis voltada para técnicas de
cultivo e plantio que diversifiquem a agricultura com base em princípios agroecológicos, bem
como para outras articulações de trabalho e educação que não se restringem somente à ordem
técnica como o artesanato, a culinária e a música (VERGUTZ, 2013). Com isso, podemos
compreender a unidade dialética entre trabalho e educação.
Esta escola articula a educação do campo, a agroecologia e a pedagogia da
alternância na trama de uma educação como possibilidade emancipatória, humanizadora e
dialógica, se propondo ao enfrentamento e a superação da produção do conhecimento
hegemônico e práticas de agricultura hegemônica. Para tanto, em favor da partilha de saberes

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entre mães, pais, estudantes e educadoras/es, se constitui a luta por uma agricultura mais justa
e humanizadora, bem como por uma educação crítica e transformadora a partir da do-
discência85. Além disso, toma como referência pedagógica a pedagogia própria da camponesa
e do camponês que é fruto dos seus saberes populares e de suas experiências. Nesta trama, o
campo como campo epistemológico de produção do conhecimento propicia as relações entre o
conhecimento científico e o saber popular (FREIRE, 2005).
Deste modo, observamos que a pedagogia da alternância que se constitui na Escola
Família Agrícola (EFA) investigada pode ser compreendida como (des) colonial sendo
protagonizada pelas agricultoras e agricultores com seus saberes populares e experiências.
Numa perspectiva colonialista há um padrão universal que classifica o conhecimento como
válido e não válido. O válido está para a razão indolente, enquanto que o não válido está para
os considerados inferiores perante o europeu colonizador, os não humanos, portanto a
desumanização das classes populares frente a racionalidade dominante. Ao resistir às heranças
colonialistas impregnadas na educação, considerando alternativas pedagógicas e
epistemológicas, a mulher e homem do campo, na busca pelo ser mais como caminho para
emancipação humana, tramam práxis educativas libertadoras.
Assim, durante as aproximações realizadas com a EFASC no decorrer de pesquisas
que se se estendem desde 2014 até o presente momento, através do grupo e projeto de
pesquisa (Des)colonialidade do ser/poder/saber na Pedagogia da Alternância: sistematização
de uma experiência86 foi possível compreender que as lutas pela humanização não somente
constituem-se em práxis que apontam indicadores emancipatórios (STRECK;ADAMS, 2014)
mas também em práxis que apontam indicadores (des)coloniais no enfrentamento e nas
estratégias de superação das heranças colonialistas que se expressam no trabalho, na
educação, na reprodução da vida e nas relações entre mulheres e homens, trabalhadoras e
trabalhadores, do campo (QUIJANO,2005).

85
Na do-discência, os sujeitos aprendem e ensinam a partir dos diferentes papéis que assumem no processo
educativo. A família com o saber da experiência feita; o papel do educando e da educanda em uma relação de
aprendizagem com suas famílias e educadores/as e, do mesmo modo, de ensino conforme se dá o encontro do
saber popular com o científico; e os educadores e educadoras, enquanto escola problematizam o encontro de
conhecimentos. Assim, por meio dessa partilha as práxis educativas são ressignificadas, na vida de cada um dos
sujeitos envolvidos, construindo a importância do saber transformador.
86
Projeto coordenado pela professora Dr.ª Cheron Zanini Moretti, na Universidade de Santa Cruz do Sul-
UNISC.

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Deste modo, a seguir no próximo item intitulado Indicadores Emancipatórios e


(des)coloniais a partir das práxis do-discentes nos propomos apresentar, bem como discutir, a
concretude das práxis que têm por objetivo produzirem desde já e a muitas mãos
(BRANDÃO, 2006) uma realidade em que a ainda não é a (BLOCH, 2005-2006), mas está
sendo (FREIRE, 1995).

Indicadores emancipatórios e (des)coloniais a partir das práxis do-discentes

Neste segundo momento de nossa escrita continuando nossa andarilhagem,


consideramos que, primeiramente para discutirmos acerca dos indicadores emancipatórios e
(des) coloniais, é importante discorreremos brevemente sobre o conceito de emancipação e de
colonialidade. Para tanto iniciamos pelo conceito de emancipação o que em nossa perspectiva
requer também que o compreendamos a partir de nossa realidade, América Latina, o que em
suma significa libertação Freire (1984). Ou seja, a libertação das condições que colocam a
mulher e o homem no posto de ser menos.
Para Freire (1984) e Adorno (1995), a emancipação humana, num sentido pleno, não é
possível em nosso tempo presente. Segundo Wood (2003), todas as lutas sociais devem
carregar em si também uma luta anticapitalista porque é este sistema, capitalista, que
inviabiliza a emancipação em sua plenitude, bem como a humanização e a libertação plenas.
Assim é também na EFASC, pois a emancipação das agricultoras e dos agricultores será
parcial na ausência de uma luta contra o sistema que as/os oprime, bem como no processo de
enfrentamento das contradições e criação de alternativas pedagógicas, epistemológicas e de
existência material, pois

[...] a Educação do Campo projeta futuro quando recupera o vínculo essencial entre
formação humana e produção material da existência, quando concebe a
intencionalidade educativa na direção de novos padrões de relações sociais, pelos
vínculos com novas formas de produção, com o trabalho associado livre, com outros
valores e compromissos políticos, com lutas sociais que enfrentam as contradições
envolvidas nesses processos. (CALDART, 2010, 263).

Em síntese, compreende-se também que é dever de toda escola, sobretudo a que se


propõe a uma educação libertadora, o enfrentamento das contradições concebendo-as como

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partes envolvidas no processo educativo e nas práxis do-discentes, no sentido que as


contradições se constituem como caminhos para as possibilidades emancipatórias e próprias
destas práxis que se articulam nos diferentes saberes e conhecimentos.
Contudo, cotidianamente pode-se identificar sinais emancipatórios que ressignificam a
nossa “esperança utópica concreta” de um mundo melhor para que a mulher e o homem
possam ser/estar humanizados e emancipados. Neste sentido, articula-se também a
possibilidade de que os povos do campo, a partir de suas lutas, possam superar a terra como
um negócio e fazer desta um local onde se pisa, se trabalha e do qual se vive enquanto matriz
pedagógica e, também, política da vida.
Nas reflexões de Adorno (1995), a educação para a emancipação deve ser
primeiramente crítica. “A educação tem sentido unicamente como educação dirigida a uma
autorreflexão crítica”. (ADORNO, 1995, p. 121). Ou seja, tanto a educação do campo nas
diferentes formas de se organizar quanto a educação regular, ambas precisam ser voltadas
para uma reflexão crítica sobre a realidade. A crítica no sentido também de uma não
acomodação que vai “esculpindo” a emancipação, porque desestabiliza o ser humano
aproximando-o do desejo de luta e transformação, assim como também da utopia concreta, da
realização possível de uma outra sociedade.
No pensamento de Freire (1995), a emancipação, para além de uma proposta
filosófica, social ou crítica, se torna essencialmente uma tarefa educacional, direcionada
especificamente para a práxis pedagógica. É através da educação que as pessoas se libertam e
se constituem como sujeitos de luta-resistência, mas a educação sozinha não liberta, do
mesmo modo que mulheres e homens também não se libertam e nem se emancipam sozinhos.
Segundo Freire (1984), a educação para o nosso contexto precisa ser partilhada entre pessoas
“ensopadas” da práxis como compromisso com a sociedade transformada para ser então
celeiro da humanidade.
A respeito de colonialidade e (des) colonialidade, Aníbal Quijano (2005) discorre que
a colonialidade se instaura em uma sociedade através de diferentes mecanismos a começar
pela superioridade de raça até o eurocentrismo como lógica única e aceitável de ordenamento
da subjetividade / intersubjetividade, implicando no processo de produção do conhecimento.
O colonialismo traz historicamente não somente a imposição de padrões e valores culturais,
como também um padrão epistemológico. Já a (des) colonialidade do conhecimento vai se

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efetivando a partir das rupturas, estabelecidas através das lutas sociais emancipatórias, com o
padrão segregador do conhecimento. Assim, ainda conforme Lander (2005) a colonialidade
oprime e a (des) colonialidade liberta e a libertação é uma premissa importante na educação
do campo.
Para Quijano (2002), a colonialidade cria um padrão de poder mundial com suas
articulações de colonialidade do ser, do saber e do poder através de quatro aspectos: 1-a
colonialidade do poder através da ideia de raças inferiores e superiores; 2- o capitalismo como
padrão universal de exploração social; 3- o Estado como forma hegemônica e central de
controle; 4- o eurocentrismo como forma hegemônica de controle da subjetividade e da
intersubjetividade, em especial no modo de produzir conhecimento (QUIJANO, 2002).
Em diálogo com Boaventura de Souza Santos (2002), a desumanização “ganha força”
pela racionalidade ocidental que, nutrida da razão indolente, atua produzindo cinco lógicas de
não existência: do saber, do tempo, da classificação social, da dominação e por fim da
produção/trabalho, fazendo assim com que as experiências alternativas, ou seja (des)
coloniais, sejam desperdiçadas. Portanto, se a compreensão de mundo excede a razão
ocidental, isto implica pensarmos que existem outras possibilidades de existência, outros
tempos/ espaços e outros sujeitos que tensionam por uma compreensão de mundo a partir de
si mesmos/as.
É também importante e necessário refletirmos sobre os conflitos que se constituem no
confronto violento entre o que detém o poder colonialista e o ocultado que detém a alternativa
solidária, considerada improdutiva pela razão indolente. Nesse sentido, já sinalizamos que o
improdutivo ou o não civilizado são também modos da razão indolente, no domínio da razão
metonímica, se utilizar destas dicotomias em favor de sua própria manutenção já que para
existir tem como necessidade a desqualificação do outro. Ou seja

o Norte não é inteligível fora da relação com o Sul, tal como o conhecimento
tradicional não é inteligível sem a relação com o conhecimento científico ou a
mulher sem o homem. Assim, não é admissível que qualquer das partes tenha vida
própria para além da que lhe é conferida pela relação dicotómica e muito menos que
possa, além de parte, ser outra totalidade. Por isso, a compreensão do mundo que a
razão metonímica promove não é apenas parcial, é internamente muito seletiva. A
modernidade ocidental, dominada pela razão metonímica, não só tem uma
compreensão limitada do mundo, como tem uma compreensão limitada de si própria
(SANTOS, 2002, p. 242).

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Ou seja, fora das lógicas de não existência que são o espelho da visão de mundo
indolente aquilo que é considerado como inválido, não existente, incivilizado e sem cultura é,
na verdade, “um gigantesco desperdício da experiência (SANTOS, 2002, p. 239) produzida
pelas outras e outros cujas experiências não são visíveis e nem ganham credibilidade se não
houver um deslocamento sociológico e de razão, que Santos descreve como razão
cosmopolita, pois a ciência social tal como está, segundo o autor, “no fim de contas (...) é
responsável por esconder ou desacreditar as alternativas” (Ibiden, p.238).
Ou seja, a razão indolente se constitui na perspectiva de um conhecimento hegemônico
e desenvolve-se num contexto de ascensão do capital e do colonialismo, o que nos possibilita
compreendermos o motivo pelo qual as suas lógicas vinculam-se à fragmentação e
invisibilização de todas as outras formas de existências que não são coadunadas àquilo que é
legitimado e existente em sua lógica operante. Neste sentido, tramar alternativas de
resistências a essa racionalidade é também tramar alternativas de enfrentamento à soberania
do capital, do colonialismo e do imperialismo.
Ainda, se a razão indolente foi alavancada pelas relações capitalistas, pela valorização
do trabalho na perspectiva do capital, bem como das relações de trabalho na lógica
produtivista, o que está fora dessa lógica, segundo Santos (2002), é considerado improdutivo.
Para Quijano (2002), isso se deve a instauração do padrão mundial de poder que
impregna a mais profunda e eficaz forma de dominação social, material e intersubjetiva,
levando a dominação política e histórica através de seu elemento fundante que é a
classificação social através do mecanismo de raças, pois

o controle do trabalho no novo padrão de poder mundial constituiu-se, assim,


articulando todas as formas históricas de controle do trabalho em torno da relação
capital-trabalho assalariado, e desse modo sob o domínio desta. Mas tal articulação
foi constitutivamente colonial, pois se baseou, primeiro, na adscrição de todas as
formas de trabalho não remunerado às raças colonizadas, originalmente índios,
negros e de modo mais complexo, os mestiços, na América e mais tarde às demais
raças colonizadas no resto do mundo, oliváceos e amarelos. E, segundo, na adscrição
do trabalho pago, assalariado, à raça colonizadora, os brancos. Essa colonialidade do
controle do trabalho determinou a distribuição geográfica de cada uma das formas
integradas no capitalismo mundial. Em outras palavras, determinou a geografia
social do capitalismo: o capital, na relação social de controle do trabalho assalariado,
era o eixo em torno do qual se articulavam todas as demais formas de controle do
trabalho, de seus recursos e de seus produtos. Isso o tornava dominante sobre todas
elas e dava caráter capitalista ao conjunto de tal estrutura de controle do trabalho.
Mas ao mesmo tempo, essa relação social específica foi geograficamente
concentrada na Europa, sobretudo, e socialmente entre os europeus em todo o

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mundo do capitalismo. E nessa medida e dessa maneira, a Europa e o europeu se


constituíram no centro do mundo capitalista. (QUIJANO, 2005, p. 120).

Para além da superioridade e inferioridade racial e da relação capital-trabalho, em que


todas as formas de trabalho passaram a ser compreendidas sob a lógica de exploração do
capital, Quijano (2005) nos alerta também para a questão do colonialismo do ser em sua
integralidade objetiva e subjetiva a partir de uma única história aceita, uma única cultura
“correta” e um único modo de existência possível, ou seja,

A incorporação de tão diversas e heterogêneas histórias culturais a um único mundo


dominado pela Europa, significou para esse mundo uma configuração cultural,
intelectual, em suma intersubjetiva, equivalente à articulação de todas as formas de
controle do trabalho em torno do capital, para estabelecer o capitalismo mundial.
Com efeito, todas as experiências, histórias, recursos e produtos culturais
terminaram também articulados numa só ordem cultural global em torno da
hegemonia europeia ou ocidental. Em outras palavras, como parte do novo padrão
de poder mundial, a Europa também concentrou sob sua hegemonia o controle de
todas as formas de controle da subjetividade, da cultura, e em especial do
conhecimento, da produção do conhecimento. (QUIJANO, 2005, p. 121).

A partir destas problematizações entendemos que a Educação do Campo que se trama


na Escola Família Agrícola de Santa Cruz do Sul (EFASC) em articulação com a Educação
Popular, com a Pedagogia Freiriana e com a agroecologia vem produzindo práxis do-discentes
que, no seio dos limites/contradições e possibilidades, constitui importantes estratégias e
experiências que vão na contramão da colonialidade, configurando-se em esperanças
(des)coloniais e possibilidades emancipatórias para estas mulheres e homens do campo.
A agroecologia, neste aspecto, cumpre um papel social e político muito importante de
colocar as mulheres como sujeitos políticos, de direitos e em relação com os saberes e
conhecimentos produzidos na/com a terra. Ou seja, a agroecologia apresenta aspectos
importantes para romper com a lógica capital/trabalho, mas também de enfrentamento e
superação das heranças do patriarcado, da divisão sexual do trabalho e da invisibilidade das
mulheres no cerne da agricultura familiar, pois

[...] pensando na Agroecologia como projeto, há um grande desafio que temos pela
frente e que para vencermos esse período em que passamos, é preciso sair das
pequenas experiências de Agroecologia e passarmos a dialogar com a sociedade
sobre o papel político e de enfrentamento ao Capital, que de fato, a Agroecologia se
propõe a discutir. A sociedade precisa entender que o avanço do Agronegócio com

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os transgênicos e avanço nos território, é uma violência principalmente sobre as


mulheres. (PIOVIZANI, 2017, s/p).

Ou seja, a articulação da EFASC com a agroecologia apresenta importantes


indicadores emancipatórios e (des)coloniais na compreensão de que a perspectiva
agroecológica não se concilia com o agronegócio, com os alimentos transgênicos, com os
venenos e tampouco com a violência doméstica e a discriminação contra as mulheres. As
estudantes mulheres ao compreenderem que a colonialidade atribui a agricultura ao homem,
tensionam por voz e presença neste espaço que, numa história vista de baixo, também
pertence às mulheres na condição de trabalhadoras do campo e não como meras “ajudantes”,
como podemos entender a partir das seguintes falas:

a) [...] saio cedo de casa e volto tarde, antes de sair eu ainda ajudo já tiro o leite
para levar para a cidade e agora o meu marido teve que aprender a fazer o
meu serviço, o que eu fazia antes, aprender a assumir a casa. Vai ter que fazer
comida, lavar roupa, vai sim 87 (Agricultora, 2018).
b) [...] mesmo com pouco estudo, pois cursei só até a sexta série, eu entrei no
sindicato, aprendi a digitar oficio, mexer no computador, fazer atestado de
renda e hoje penso em continuar estudando, fazer um curso de computador88.
(Agricultora, 2018).
c) [...] o lugar da mulher é onde ela quiser, que essa escolha é dela89.
(Agricultora, 2018).

Assim, podemos destacar a importância da consciência de si e para si destas mulheres


do campo que juntas tensionam as lógicas coloniais e dominantes que tentar lhes retirar a
autenticidade de serem mais e buscarem a libertação, ao passo que historicamente coube as
mulheres o papel de defesa da biodiversidade, das águas e das matas e das formas de
existências que se contrapõem a lógica do capital. (PIOVIZANI, 2017).
Freire (1984) defendeu a ideia de uma educação libertadora que dialogue de forma
crítica com as diferentes culturas e as culturas entre si, para que assim se constitua a
igualdade. Igualdade porque, segundo o autor, a emancipação é uma vocação de todas/os. A
mulher e o homem do campo ou da cidade têm o direito à emancipação. Por isso, para Freire
(1984) esta é um ato político.

87
Anotações do Diário de Campo- Debate: Saberes populares, mulheres e agroecologia, na EFA, 08/03/2018.
88
Anotações do Diário de Campo- Debate: Saberes populares, mulheres e agroecologia, na EFA, 08/03/2018.
89
Anotações do Diário de Campo- Debate: Saberes populares, mulheres e agroecologia, na EFA,08/03/2018.

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Assim, no cotidiano da observação participante que tem se realizado no decorrer da


pesquisa, colocações como: - É importante articularmos trabalho e educação juntos; - Fui
conversar com a nona; - Busca do conhecimento com o vô e a vó; - O meu vô e a minha vó
nunca precisaram tomar remédio, sempre se cuidaram a base de chás90- observamos
elementos que contribuem para a quebra da colonialidade e da opressão, indicando caminhos
para (des) colonizar e possibilidades para se emancipar em nosso tempo, uma vez que
retomando Wood (2003), na atualidade toda luta por humanização e emancipação deve
necessariamente ser uma luta que vá na contramão do capitalismo, uma vez que este é
também um elemento chave para colonialidade se perpetuar e expandir sua lógica.
Deste modo, na importância de valorizarmos e visibilizarmos as experiências que as
mulheres e os homens assumem é “somente exercitando a emancipação, tendo experiências
emancipatórias que se torna possível construir a emancipação.” (SANTOS, 2007, p. 114). O
campesinato que consciente de sua condição e em diálogo com sua matriz pedagógica, a terra,
na luta por uma agricultura mais justa, incorpora também a luta por uma educação desde o
Sul91 e pela existência, no sentido de superarem a lógica de não existência e de coisificação
(FREIRE, 1995. Santos, 2002) precisar ser visto e compreendido na sua luta ontológica e
histórica por um outro mundo possível.
Neste sentido, a seguir partilhamos um quadro de sistematização dos indicadores
emancipatórios em articulação com os indicadores (des)coloniais que até o momento vêm
sendo compreendidos a partir das práxis do-discentes que se constituem na EFASC, por
mulheres e homens que acreditam na transformação e lutam cotidianamente para saírem da
condição de coisas e tornarem-se humanizados:
Pensar o desenvolvimento do campo a partir de um projeto contra hegemônico
Sustentabilidade
Valorização dos saberes populares
Quebra do monopólio da palavra
A escola que caminha com a vida
O oprimido liberta a si mesmo e ao opressor

90
Anotações do Diário de Campo, Santa Cruz do Sul, 2015.
91
Metáfora utilizada para se referir às experiências, as epistemologias, os saberes, os conhecimentos e as práxis
que se tramam em contraposição ao lógica dominante do eurocentrismo e dos padrões mundiais que apontam um
único modo de ser/estar no mundo.

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Transformações dos modos de cultivo - diversificação da agricultura


Comprometimento da educação com o sujeito
Comprometimento do sujeito com a transformação
Temas geradores
Possibilidades de economia solidaria em direção à quebra do padrão
capital/trabalho/salário
A agroecologia como um princípio de libertação das mulheres, da biodiversidade, das
matas, das águas e dos homens
Tensionamentos acerca da agricultura técnica
Referências pedagógicas e epistemológicas que entrelaçam a pedagogia da alternância à
educação popular, bem como à formação omnilateral defendida por Marx (2003)
Visibilidade da mulher do campo
Maior presença das mulheres nos debates ocorrem na EFASC
Atividades voltadas para a agroecologia e para as mulheres
Feira agroecológica com alimentos, artesanatos e alimentos preparados como bolachas,
geleias e entre outros
Relação entre a escola e a família como possibilidade de transformação da propriedade
Fonte: Quadro elaborado pela autora a partir dos registros de pesquisa anotados em Diário de Campo.

A partir das questões trazidas no quadro podemos observar que os indicadores


emancipatórios e (des) coloniais podem ser compreendidos através do trabalho, da educação,
pelas relações humanas e pela agricultura orgânica e agroecológica conforme será explanado
a seguir:
a) Pelo trabalho porque este possui uma dimensão humanizadora quando se constitui como
princípio educativo. Ao resgatar este princípio se atrela, junto com ele, a possibilidade de
superação do trabalho sob a ótica colonialista do sistema capitalista que seria a subordinação
do agronegócio à agroecologia e não o contrário como tem acontecido. Segundo Bensaid et.
Al (2000), o trabalho carrega uma contradição porque ele é “a alienação e a possibilidade de
emancipação, de humanização” (p. 99). Nesse sentido, ao mesmo tempo em que o trabalho é
próprio da mulher e do homem, quando realizado separando produto e produtora/produtor, é
alienado. Até que a emancipação que em nossa compreensão é utopia concreta, se torne
realidade e que para isto o sistema capitalista chegue ao fim, a emancipação permanece como
uma possibilidade também concreta na EFASC.

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b) Pela educação, que sendo libertadora, caminha ao lado das mulheres e dos homens na luta
pela transformação tendo como premissa as nossas iguais sabedorias e ignorâncias. As práxis
do-discentes se apresentam como necessidade de uma educação para emancipação e condição
de existência da EFASC porque sem as relações com a família e a comunidade, não há
educação progressista. O movimento da Educação do Campo, segundo Caldart (2012),
compreende que a escola do e no campo deve ser uma aliada dos sujeitos políticos e sociais
em luta para que possam continuar existindo, enquanto camponesas e camponeses, para
garantir reprodução material de suas vidas a partir do trabalho na terra.
c) Pelas relações humanas porque é preciso aprender a conviver, respeitar-se e unir-se
porque o que fortalece o ser humano é o fato de que ele é um ser de relações (FREIRE, 1991),
superando a colonialidade do poder (QUIJANO, 2005). Numa EFA a relação escola-família-
comunidade, no sentido político e comprometido com a educação que reivindicam, fortalece a
constituição das visões sociais de mundo que apontam a humanização e a emancipação, bem
como a (des) colonialidade, como possibilidades concretas e verificáveis nas experiencias
(LÖWY, 1996).
d) Pela agricultura orgânica e agroecológica porque nesta se inscreve a possibilidade de
uma vida sustentável que é marcada pelo reconhecimento de que a natureza é uma parceira e
não um mero recurso de exploração e envenenamento massivo através de uma de nossas
necessidades existenciais que é o alimento. A agroecologia, segundo Gliessman (2000) pode
ser compreendida um conjunto de conhecimentos sistematizados com as “práticas e saberes
tradicionais utilizados como princípios ecológicos e saberes culturais aplicados à produção
agrícola como forma de resgatar a desecologização e a desculturação” (p.98). Na EFASC,
observamos também o quanto a agroecologia vem fortalecendo as agricultoras no
enfretamento das relações patriarcais ainda muito presentes na agricultura e no confronto com
os limites impostos pelo machismo que tende a invisibilizar o trabalho destas mulheres no
campo. Podemos articular esta reflexão com Santos (2002) quando o autor discute que no
campo das ecologias que se constituem em contraposição às lógicas de inviabilizar as muitas
outras formas de existir, na ecologia de produtividade são apresentadas alternativas que
confrontam esse modelo hegemônico que se manifesta na agricultura, no campesinato, da
produção do conhecimento, nas políticas e na valorização e reconhecimento das mulheres.

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No decorrer da pesquisa, estes indicadores emancipatórios e (des) coloniais (STRECK;


ADAMS, 2014) podem ser modificados devido à dialética aberta entre o ser e o estar no
mundo na busca por justiça, igualdade, humanização e ser mais, bem como na (re)construção
epistemológica permanente da EFASC para tramar, junto aos sujeitos que a constituem, as
possibilidades emancipatórias e a resistência ao colonialismo constituindo indiciadores para
(des) colonizar.

Algumas considerações
A colonialidade naturaliza que o conhecimento do camponês e da camponesa está do
lado do falso pensar, é “inválido”. E, durante décadas o campesinato, infelizmente,
compreendeu erroneamente que seu pensar era inválido e que o fato de não “terem estudo” e
nem viverem na cidade, os fazia menos. Atualmente em detrimento dos movimentos sociais
protagonizados pelas próprias camponesas e camponeses, mulheres e homens do campo
processualmente vêm se conscientizando da importância de suas existências, de suas lutas e
do campo epistemológico que dispõe para tramarem uma educação humana, digna e justa que
considere as pessoas, o meio em que vivem e as visões sociais de mundo para qual caminham
em busca de seu ser mais.
A reivindicação pelo (re) conhecimento de seus saberes e o modo singular como
produzem suas experiências convidam a pensar outras relações de poder e saber, ou seja,
outros modos de produção da vida e da existência humana que não são mitos nem magia, mas
oriundos da realidade. Assim afirmando-se como povos sábios “estão em disputa contra o
conhecimento hegemônico e, também, por outro padrão de poder-saber”. (Arroyo, 2012, p.
257). Neste caminho as histórias de vida, os sonhos e as esperanças são tomadas como
essência dos processos educativos que se colocam no desafio de tramar uma educação no
campo e dos/com povos do campo.
Os indicadores emancipatórios e (des) coloniais se tramam na luta cotidiana por uma
educação do campo que se volte para a realidade na qual a mesma se constrói, partindo desta
realidade para transcende-la e transformá-la. Tais indicadores, porém, não retiram as
contradições de ordens micro e macrossociais que colocam a EFASC em luta permanente
junto àquelas e àqueles que buscam um lugar no cosmos livres da condição de oprimidas e
oprimidos.

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A GESTÃO DA EDUCAÇÃO DO CAMPO: UM NOVO OLHAR DOS SUJEITOS


QUE LÁ TRABALHAM E VIVEM

Andrio Sander Rodrigues Viana1


Natauan Bianchin de Lima2
Loana Martins de Jesus3
Alice Ferreira Schmitt 4

RESUMO

O presente artigo trata de uma reflexão a respeito da Gestão da Educação do Campo,


desenvolvida a partir de observações e vivências especificamente em escolas do campo. Nas
pesquisas realizadas, foi possível compreender que uma longa história de lutas foi
empreendida com o objetivo de contribuir com a qualificação do processo educacional dos
sujeitos que vivem e trabalham no campo. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, que
permitiu conhecer a história da educação dos povos do campo a qual serviu de referencial
para instrumentalizar os novos profissionais que atuam e atuarão nas instituições formais e
não-formais do campo qualificando a educação básica e superior das populações do campo.
Essa investigação, serviu para reconhecer que a Educação do Campo necessita ser assumida a
partir de uma metodologia diferenciada e que realmente prepare o educando para a vida,
considerando os diferentes fatores existentes no campo. Os estudos desenvolvidos têm
contribuído de forma significativa para nos constituirmos profissionais da educação mais
preparados e comprometidos com a educação do campo. Conhecer a história e os
fundamentos da Educação do Campo e seu impacto sociocultural na comunidade, sem dúvida
estão colaborando para construir projetos e programas na perspectiva de delinear um novo
cenário, oportunizado pela implementação gradativa da educação do campo, como política
pública cara e urgente no Brasil.

Palavras-chave: Gestão da Educação do Campo. Desafios. Perspectivas.

_______________________________

1
E. M. E. B. Euclides Aranha – andriosv@hotmail.com
2
E. M. E. B. Euclides Aranha – natauanlima@hotmail.com
3
E. M. E. B. Euclides Aranha – loanajesus@hotmail.com
4
IFFar – alicefschmitt@hotmail.com

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INTRODUÇÃO

Esse artigo nasceu de estudos e aprofundamentos realizados a partir de observações


em escolas do campo e suas dinâmicas de ensino\aprendizagem, diante das pesquisas e
debates nessa área de conhecimento, foi possível conhecer os referenciais históricos e
políticos da Educação do Campo.

Nesse sentido, o propósito deste trabalho é construir uma análise e uma reflexão sobre
o processo educacional brasileiro, especialmente com foco voltado para à educação do campo
e sua gestão. É necessário destacar que esse estudo, busca analisar o sistema educacional
brasileiro que contemplou à educação nos espaços urbanos, privilegiando de algum modo à
educação urbana em relação à da educação rural.

Nesse contexto, constatou-se que uma longa trajetória de lutas pela Educação do
Campo foi empreendida nas últimas décadas envolvendo, governantes e os sujeitos do campo,
que por direito exigiram que esse processo educacional fosse ofertado e assumido por
profissionais da educação mais qualificados, comprometidos com um modelo de ensino e
aprendizagem que tenha pressupostos e metodologias adequadas a uma verdadeira educação
do campo.

2.1 EDUCAÇÃO DO CAMPO, UM POUCO DE HISTÓRIA

A incerteza do real. [...] A realidade não é facilmente legível. [...]importa ser realista
no sentido complexo: compreender a incerteza do real, saber que há algo possível
ainda invisível no real. (MORIN, 2000, p.85).

A Constituição Federal do Brasil, ao fazer referência aos direitos sociais dos


brasileiros, apresenta: “Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o
trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à
maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.”
(BRASIL, 1988).

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A carta magna do Brasil dá a conhecer à educação como um direito de todos os


cidadãos brasileiros, garantindo o acesso aos níveis de escolaridade, formação profissional e
formação para vivenciar a verdadeira cidadania. Assim, o estado, assumia sua
responsabilidade com a educação de todos. No entanto,

Os dados oficiais disponibilizados pelas instituições federais de pesquisa – IBGE,


INEP e IPEA, entre outras – demonstram uma diferença acentuada entre os
indicadores educacionais relativos às populações que vivem no campo e as que
vivem nas cidades, com clara desvantagem para as primeiras. Isto indica que, no
decorrer da história, as políticas públicas para essas populações não foram
suficientes para garantir uma equidade educacional entre campo e cidade. (BRASIL,
2007, p.09).

Essa constatação revela que historicamente as pessoas que vivem no campo têm
direito a uma educação que envolva a formação integral dos indivíduos, porém, ao longo de
décadas o acesso das populações do campo à educação foi uma questão tratada de forma
diferenciada pelos governantes.

É oportuno também destacar que em 1932, foi promulgado o Manifesto dos Pioneiros
da Educação Nova, cuja finalidade era traçar um diagnóstico e indicar os rumos das políticas
públicas de educação com a preocupação de construir uma escola democrática, que ofertasse
as mesmas oportunidades para todos.

Nos anos 1960, estudos apontam que o governo intensificou planejamento e ações
voltadas à educação rural considerando o fluxo migratório do campo para a cidade, apenas
para atender às demandas da elite brasileira, que neste momento estava temerosa diante do
crescimento do número de favelados nas periferias das grandes cidades.

Nesse contexto foi aprovada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,


precisamente em 1961. Entre tantos pressupostos defendidos rezava pela exigência de que os
poderes públicos instituiriam e apoiariam serviços e entidades que trabalhassem a favor da
manutenção de instituições na zona rural que oportunizassem a formação do homem ao meio,
motivando e incentivando a vocação profissional. Nesse período de forte ordenamento social,
inúmeros técnicos para atividades agropecuárias foram formados.

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Também nessa época iniciou um movimento de educação popular, com o objetivo de


ampliar e fomentar a participação política das camadas populares, contemplando também as
do campo, no intuito de criar estratégicas pedagógicas mais integradas com a cultura e com as
exigências nacionais.

No entanto, em 1964, com a implantação do governo militar, as organizações


comprometidas com a mobilização política da sociedade civil como os Centros de Cultura
Popular (CCP), criados pela União Nacional dos estudantes em 1961 e o Movimento Eclesial
de Base (MEB), órgão da Confederação Geral dos Bispos do Brasil – sofreram um pesado
processo de repressão política e policial. Houve assim, uma significativa desarticulação,
reprimindo os movimentos de educação popular. (BRASIL, 2007).

Em meados da década de 1980, é instalado um decurso de resistência à ditadura


militar, em que um coletivo de instituições e organizações, particularmente às ligadas à
educação popular, incluíram a educação do campo, nos grandes eixos temáticos fundamentais
para integrar o processo de redemocratização do país. Toda a proposta girava em torno da
seguinte premissa: era imprescindível construir um sistema de educação mais articulado com
as especificidades culturais do país, respeitando os direitos sociais presentes na constituição e
atendendo as reais necessidades dos povos camponeses.

Essa circunstância político em que vivia o país, impeliu que organizações comunitárias
vinculadas aos povos do campo, profissionais da educação aliados à resistência à ditadura
militar, sindicatos e associações que defendiam as questões educacionais, setores da igreja
católica que se identificavam com a teologia da libertação, entre outros, empreenderam uma
forte mobilização, de forma coletiva, com os sindicatos de trabalhadores rurais, buscando
concretizar um sistema de educação público para o campo. É importante destacar, que nesse
momento histórico, as inúmeras atividades educativas do “Movimento Nacional dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Comissão Pastoral da Terra (CPT), da Confederação
Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) e do Movimento Eclesial de Base
(MEB)”, foram marcantes. (BRASIL, 2007, p.12).

Toda essa mobilização de entidades e sujeitos comprometidos com a educação dos


povos do campo, resultou na consolidação da Constituição de 1988 que estabeleceu a

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responsabilidade do Estado e da sociedade brasileira em potencializar a educação para todos,


assegurando o direito ao respeito e à adequação da educação às especificidades dos povos do
campo. (BRASIL, 2007).

Em 1996, é lançada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n°


9.394/96) que definiu uma base comum a todas as regiões do país, a ser complementada pelos
sistemas federal, estaduais e municipais de ensino e, assim, flexibilizou que o processo
educacional e o próprio calendário escolar poderiam ser organizados, de forma a atender as
especificidades da vida do campo, bem como de qualquer região.

Na década de 1990 muito movimentos sociais foram empreendidos para fortalecer e


qualificar a educação do campo, entre eles: a Conferência Nacional por uma educação básica
do campo (1998), os Encontros dos Fóruns Estaduais de Educação do Campo; (1999, 2000,
2001, 2002), e a II Conferência Nacional realizada em Julho de 2004, entre outros. Foi um
período de intensa articulação nacional por uma educação do campo.

Todos os esforços foram relevantes pois resultou na criação da Secretaria de Educação


Continuada, Alfabetização e Diversidade, pelo Ministério da educação, em 2004, que
contribui na elaboração das Diretrizes Operacionais da Educação do Campo, na perspectiva
de traçar princípios a serem adotados pelas escolas do campo.

Nesses aportes legais, a concepção de educação do campo está assim definida:

Art. 1º A Educação do Campo compreende a Educação Básica em suas etapas de


Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e Educação Profissional
Técnica de nível médio integrada com o Ensino Médio e destina-se ao atendimento
às populações rurais em suas mais variadas formas de produção da vida –
agricultores familiares, extrativistas, pescadores artesanais, ribeirinhos, assentados e
acampados da Reforma Agrária, quilombolas, caiçaras, indígenas e outros.
(BRASIL, 2008, p.53).

Nesse conceito está expressa toda a complexidade em reconhecer as inúmeras


especificidades da educação do campo, em sua totalidade, em atendimento aos preceitos
legais de garantir o direito à todos a educação.

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Paralelo a todo esse movimento, também houve a preocupação com a implantação dos
Cursos de Licenciatura em Educação do Campo, mais precisamente a partir da década de
1990, pelo Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), com o
objetivo de formar profissionais preparados para atuar na educação do campo qualificando a
educação básica e superior das populações do campo.

2.2 EDUCAÇÃO DO CAMPO: ALGUMAS REFLEXÕES

Ao pesquisar a respeito do cenário educacional ao longo da história da educação do


campo no Brasil, constatou-se que as metodologias de ensino utilizadas em geral pelos
educadores, estavam muito centradas em abordagens conteudistas que direta e indiretamente
desestimulavam a qualificação do homem e da mulher do campo, incentivando o êxodo rural
e o não reconhecimento das peculiaridades da realidade do campo como objeto epistêmico.

Nessa direção, estudos atuais apontam que é urgente retomar a educação a partir da
consideração dos sujeitos coletivos e não mais só do entendimento que o ensino deve primar
pela edificação do sujeito singular que exalta o projeto pessoal e não a noção de coletividade.

Escrivão Filho (2012) ao teorizar sobre a importância da Educação do Campo,


argumenta que precisa “ser entendida e praticada como um direito fundamental da pessoa
humana ou como um direito humano fundamental”. Para o escritor, os avanços desta
modalidade de educação resultaram da pressão dos movimentos sociais, justifica que sua
efetivação nunca será algo que parte do estado instituído, mas da exigência da população.

A concepção de Educação do Campo nasce a partir da ação dos sujeitos coletivos,


organizados em movimentos sociais do campo e que apresenta com o propósito de resistir às
intensas transformações ocorridas no campo, em função da expansão do capitalismo e da
modernização da agricultura. Nessa perspectiva, a educação do campo é concebida como ação
política que visa o acolhimento e entendimento dos povos do campo e a convicção que esses
têm o direito de serem educados nos lugares onde vivem e que são sujeitos históricos que,
com sua participação, demandam e propõem um projeto de educação vinculado à sua cultura e
às necessidades humanas e sociais.

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Sendo assim, Haddad e Arroyo, (2012) acenam que a Educação do Campo precisa ser
concebida como um direito humano fundamental, como garantia das diferenças e da
diversidade de saberes e fazeres.

Nessa mesma compreensão, vale ressaltar que Caldart (2004) esclarece que mais que o
direito da população ser educada no lugar onde vive, precisa ser respeitado o direito à uma
educação pensada desde o seu lugar e com sua participação, vinculada a sua cultura e às suas
necessidades humanas e sociais. Ou seja, o processo de valorização de sua cultura incentiva
os sujeitos do campo a pensar e agir por si próprios, assumindo sua condição de sujeitos.

Entende-se por Educação do Campo uma formação que contextualiza a realidade da


comunidade onde o aluno está inserido considerando suas raízes, sua cultura e o modo de
produção além da realidade urbana que ele poderá ter condições de analisar. Que possam
ampliar suas visões sobre o mundo e do mundo para que possa ser uma pessoa capaz de
promover o seu próprio desenvolvimento e transformar o meio ao qual está inserido.

É oportuno enfatizar a seguinte declaração:

Temos uma preocupação prioritária com a escolarização da população do campo.


Mas, para nós, a educação compreende todos os processos sociais de formação das
pessoas como sujeitos do seu próprio destino nesse sentido, educação tem relação
com cultura, com valores, com jeito de produzir, com formação para o trabalho e
para a participação social. (KOLLING, CERIOLI e CALDART, 2002, p. 19).

Há um chamamento por parte dos autores de que é preciso rever nossas concepções de
educação, e da própria educação do campo. É fundamental o reconhecimento da realidade
rural como objeto de desafio epistemológico para a educação formal, o que implica pensar a
formação diferenciada para docentes que irão trabalhar nela, novas metodologias e novas
abordagens de conteúdos, bem como uma revisão sobre o que se aprende, o que se ensina e
como se ensina. Esse movimento parece ser imprescindível, para que novas luzes sejam
lançadas às escolas do campo, traduzindo-se em prenúncio de um novo tempo.

Na verdade, as mudanças no sistema educativo se fazem necessárias enfrentando


algumas questões próprias: do que somos, do porquê somos desse ou daquele modo, de como
ensinamos, o que é ensinar e como deve ser a educação. Esses questionamentos e reflexões,

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podem promover uma oxigenação ao nosso modelo formal de ensino, que não significa uma
mudança pela mudança, mas ressignificar o que fazemos em função do que somos. Acredita-
se que é assumindo novas posturas frente ao nosso fazer pedagógico que podemos contribuir
mais efetivamente com as transformações da escola, com a educação formal e não formal,
com a sociedade como um todo. São esforços, rumo à direção pretendida que não é um
modelo idealista apenas, mas um modo de entender e fazer a educação do campo como
estratégia ética, política e pedagógica para a transformação social.

A Educação do Campo precisa ser assumida a partir de uma metodologia diferenciada


e que realmente prepare o educando para a vida levando em conta os diferentes fatores
existentes no campo.

É indiscutível que o processo educacional voltado à realidade, é essencial, para que


assim eles também possam acreditar em seu valor humano, suas capacidades e riquezas
humanas advindas da diversidade, apostando em suas potencialidades de autodeterminação e
assim ressignificarem seu papel social como sujeitos ativos valorizados em seu cultural e
ambiental, fazendo também da ação educativa uma ação política para a transformação integral
da vida de quem vive e trabalha no campo.

2.4 A URGÊNCIA DE UMA EDUCAÇÃO DO CAMPO

Partindo da realidade dos municípios, baseada na agricultura familiar, precisamos


refletir sobre a necessidade de um olhar mais cuidadoso sobre a educação de quem vive e
trabalha no campo. Se por um lado as políticas públicas como a da merenda escolar
estimulam a produção de alimentos saudáveis, gera renda para as famílias e acesso aos
alimentos de qualidade, precisamos aprimorar e ampliar a gestão da Educação do Campo
como modo de assegurar vida plena, cidadania e acesso ao saber àquelas pessoas que aí
vivem.
Não entendemos que o acesso à Educação do Campo seja um favor do estado, ou
como algo que necessariamente vai acontecer de modo automático, assim como a luta e as
conquistas pela Educação do Campo derivam da iniciativa dos movimentos sociais, conforme
nos alerta, Escrivão Filho (2012, p. 215)

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Segundo o filósofo Enrique Dussel: (2007), os direitos humanos refletem as


conquistas históricas da consciência política de um povo. De fato, assim como a
resistência indígena, quilombola e camponesa no passado, as ocupações de terras
indicam que hoje a consciência política dos movimentos sociais de sem-terra,
indígenas e quilombolas estão à frente do próprio Estado – na verdade, à frente da
consciência política dos agentes que historicamente ocupam o Estado brasileiro.
Todos os direitos humanos reconhecidos pelos Estados resultaram da luta,
manifestação e pressão populares (ver Comparato, 2003; Lyra Filho, 1995).

Precisamos manter um olhar atento à realidade e as demandas das pessoas que


constituem a realidade do campo. E não apenas devemos reconhecer isso, porque o acesso à
educação de qualidade a quem vive no campo não é uma realidade ainda, e não pode ser vista
como concessão de privilégio, mas acesso ao que é de direito, com toda a legitimidade
conforme nos alerta Sérgio Haddad (2012, p. 217).

Conceber a educação como direito humano significa incluí-la entre os direitos


necessários à realização da dignidade humana plena. Assim, dizer que algo é um
direito humano é dizer que ele deve ser garantido a todos os seres humanos,
independentemente de qualquer condição pessoal. Esse é o caso da educação,
reconhecida como direito de todos após diversas lutas sociais, posto que por muito
tempo foi tratada como privilégio de poucos. Por meio da educação, são acessados
os bens culturais, assim como normas, comportamentos e habilidades construídos e
consolidados ao longo da história da humanidade. Tal direito está ligado a
características muito caras à espécie humana: a vocação de produzir conhecimentos,
de pensar sobre sua própria prática, de utilizar os bens naturais para seus fins e de se
organizar socialmente.

Não concebemos o aceso à Educação do Campo como um privilégio, mas como


direito humano irrevogável, pois não podemos esmorecer nesse momento histórico, onde as
pessoas estão começando a ter acesso ao entendimento de seus direitos, e consequentemente
facilita a compreensão e prática de seus deveres como cidadãos livres e dignos.
A educação de qualidade entendida não apenas como a efetivação da escola, mas
espaços também não formais que permitam o desenvolvimento pleno das pessoas que vivem e
trabalham no campo. No entendimento de Haddad, In Caldart, 2012, p. 217:

A educação é um elemento fundamental para a realização dessas características. Não


apenas a educação escolar, mas a educação no seu sentido amplo, a educação
pensada como uma ação humana geral, o que implica a educação escolar, mas não se
basta nela, porque o processo educativo começa com o nascimento e termina apenas
no momento da morte. A educação pode ocorrer no âmbito familiar, na comunidade,
no trabalho, junto com amigos, nas igrejas etc. Os processos educativos permeiam a
vida das pessoas. Os sistemas escolares são parte desse processo e, neles, algumas
aprendizagens básicas são desenvolvidas.

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Não podemos punir as pessoas que vivem no campo, e que no caso supracitado,
possuem um papel fundamental na sociedade, a viverem alheias ao processo cultural e
científico do mundo, a ficarem isoladas nos meios e acessos às informações suficientes e
necessárias para uma vida digna e plena.
O acesso à Educação do Campo é uma urgência para a realidade de nosso município.
Não apenas para evitar o êxodo rural, por causa da produção de alimentos, mas porque é
direito fundamental das pessoas terem acesso à educação no meio em que vivem. Sem ter que
abrir mão de seus valores, referências, convivência comunitária e familiar. Pretendemos aos
poucos constituirmos em nosso município núcleos de estudo, cursos de formação em parceria
com o Instituto Federal Farroupilha e outras Instituições, momentos de reflexão, eventos e
atividades técnico-científicas que possam viabilizar a Educação do Campo como estratégia de
promoção do respeito às diferenças, de pluralidade de ideias e concepções de educação,
conforme sugere Arroyo (2012, p. 231):

O projeto de campo e de Educação do Campo traz a marca histórica da participação


da diversidade de coletivos e de movimentos, diversidade que o enriquece e lhe
confere maior radicalidade político-pedagógica. Como explorar essa riqueza
político-pedagógica no projeto educativo do campo, nos currículos de formação e de
educação básica, na pedagogia dos movimentos? Um dos caminhos é aprofundar a
contribuição dos coletivos diversos na conformação dos princípios-matrizes
formadores da Educação do Campo destacados nas análises.

O projeto de Educação do Campo tanto em âmbito federal, estadual e municipal, está


por ser construído, tendo em vista que não temos uma política pública voltada para esse
segmento. A Educação do Campo como já dito é uma conquista dos movimentos sociais que
precisa ser assumida como convicção do estado, com formação específica, custeio, concursos,
enfim com ações que possam dar garantia plena de acesso à educação de qualidade aos que
vivem no campo.
De nossa parte pretendemos fomentar reflexões como estas, propor novos caminhos a
partir de novas concepções de aprendizagem e abordagens do ensino. Não queremos apenas
uma modalidade de ensino para o campo, queremos constituir centros de referências de
pesquisa e ações voltadas à realidade do campo. Para que não apenas estimulemos as pessoas
a viverem e trabalharem no campo, e sim que lá possam ter chances de participar mais

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efetivamente da constituição do seu ser cidadão, no sentido amplo e estrito, participando


ativamente da construção das decisões que lhe dizem respeito.
Na condição de pesquisadores em Educação do Campo queremos levar adiante um
projeto maior, conforme alerta Arroyo, 2012, in Caldart, p. 236

Esse pode ser um campo de pesquisas, análises e interações entre os diversos


movimentos, sobretudo nos cursos de Pedagogia da Terra e de Formação de
Professores, assim como nos projetos e encontros de pesquisa sobre Educação do
Campo. Outro caminho será introduzir, nos currículos de formação de educadores,
dirigentes e militantes, a história da construção dos diferentes em desiguais ou a
história da construção racista ou sexista dos padrões de poder, de conhecimento, de
dominação e opressão, de trabalho e de apropriação-expropriação da terra e da
produção tão determinantes e persistentes em nossa história. A especificidade de
nossa formação social e política na história da dominação e da opressão do trabalho
e da terra merece destaque nos currículos de formação e de educação básica.

Assumimos aqui o desafio de pensar conceitualmente as nuances e implicações de um


projeto maior de Educação do Campo, voltada a nossa realidade. Não queremos apenas a
implantação de políticas públicas ligadas à Educação do Campo, sim num primeiro momento,
mas gradativamente buscaremos ampliar essa realidade, constituindo grupos de reflexão,
estudo e formação permanente para dar conta de todas as demandas atinentes ao processo
complexo que é levar educação de qualidade, em todos os sentidos, para quem vive e trabalha
no campo.

3.METODOLOGIA

Esse estudo foi desenvolvido e apoiado em observações e pesquisa bibliográfica, com


referenciais teóricos, que discutem o tema. A pesquisa bibliográfica, “é fundamentada nos
conhecimentos de biblioteconomia, documentação e bibliografia: sua finalidade é colocar o
pesquisador em contato com o que já se produziu e registrou a respeito do seu tema de
pesquisa” (PÁDUA, 2000, p.52).

Nesse contexto, a pesquisa bibliográfica desenvolvida teve como fonte de estudo e


análise, materiais disponíveis, constituídos especialmente de livros e artigos científicos e
aportes legais. São referenciais teóricos, que nos dias atuais, orientam educadores e educandos
a respeito do trabalho com pesquisa.

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Ao buscar compreender a pesquisa bibliográfica, vimos que:

A pesquisa bibliográfica significa o levantamento da bibliografia referente ao


assunto que se deseja estudar. A pesquisa bibliográfica apresenta quatro etapas:
identificação, localização, compilação e fichamento (MEDEIROS, 2008, p.36).

Ao explicitar essas importantes etapas da pesquisa, o autor argumenta que a


identificação é o recolhimento e o levantamento bibliográfico realizado, tendo em vista o
tema a ser pesquisado. Já, a localização, é a fase posterior ao levantamento bibliográfico,
significa situar e limitar as obras específicas, tendo em vista obter as informações necessárias.
A compilação pressupõe o período da obtenção e agrupamento do material desejado.
Enquanto que o fichamento é a transcrição dos dados em fichas, para numa fase subsequente
fazer consulta e referência. Por isso, chama a atenção que essas anotações precisam ser
completas, redigidas com clareza e fiel a obra original.

4.CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os estudos desenvolvidos contribuíram de forma significativa para nos constituirmos


profissionais da educação mais preparados e comprometidos com a educação do campo.
Conhecer a história e os fundamentos da Educação do Campo e seu impacto sociocultural na
comunidade, sem dúvida estão colaborando para construir projetos e programas na
perspectiva de delinear um novo cenário, oportunizado pela implementação gradativa da
educação do campo, como política pública cara e urgente no Brasil.

Esse trabalho procurou contribuir com o debate da educação do campo, colocando em


pauta as intervenções do Estado e as ações da sociedade civil para operacionalizar uma
educação do campo com mais qualidade.

Há um reconhecimento de que todos os projetos e ações desenvolvidos pelo Ministério


da Educação (MEC) visando implementar uma Política Nacional de Educação do Campo, são
fundamentais para consolidar todo o sistema educacional do Brasil. Portanto constata-se que a
agricultura familiar é de extrema importância para o resgate e valorização das singularidades
indetitárias promovendo a permanência do homem no campo, contribuindo para

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intensificação da economia local e os anseios da comunidade através das diversas atividades


campesinas decorrentes das variedades dos produtos cultivados oportunizando bem-estar
social e econômico através da geração de renda.

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Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão – Brasília: SECADI, 2012.
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BRASIL. Cadernos da SECAD 2. Educação do Campo: diferenças mudando paradigmas.


Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade. Ministério da Educação. –
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Popular, 2004.

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Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Expressão Popular, 2012.

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Caldart, Isabel Brasil Pereira, Paulo Alentejano e Gaudêncio Frigotto. – Rio de Janeiro, São
Paulo: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Expressão Popular, 2012.

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Isabel Brasil Pereira, Paulo Alentejano e Gaudêncio Frigotto. – Rio de Janeiro, São Paulo:
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LAMARCHE, Eughes. A agricultura familiar: comparação internacional. Campinas:


Unicamp, 1997. 2.ed.

MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. Tradução de Catarina


Eleonora F. da Silva e Jeanne Sawaya; revisão técnica de Edgard de Assis Carvalho. – 2. ed. –
São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2000.

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QUEM SOU EU? SOU CORPO, ALIMENTO E SOLO: Uma Abordagem Temática
integrando conhecimentos na Pedagogia da Alternância

Ângelo Quoos92
Claudia Magalia da Rosa Gonçalves93
Tania Renata Prochnow94

Resumo

O presente trabalho apresenta os resultados de uma abordagem temática, a partir do tema “Quem sou
eu?”, integrando conhecimentos básicos ao Ensino Médio, na área das Ciências da Natureza, com
conhecimentos exigidos ao Curso Técnico em Agricultura. Além disso, nortearam este estudo, os
princípios da Pedagogia da Alternância e da Educação do Campo. A investigação foi realizada com
uma turma de estudantes da Escola Família Agrícola de Vale do Sol e seus resultados basearam-se na
análise das sínteses produzidas pelos(as) jovens após a intervenção. A partir do estudo, percebeu-se
que os/as estudantes conseguiram relacionar os diferentes saberes, demonstrando que a concepção
curricular da escola está indo ao encontro das orientações nacionais e dos princípios da Alternância.

Palavras-chave: Pedagogia da Alternância; Currículo; Educação do Campo.

Introdução

Com base nas reflexões de Marx, Gramsci apud Drabach (2016) concebe-se a escola e
a educação como as instâncias adequadas para promoverem reformas intelectuais e morais
necessárias à construção de uma sociedade mais igualitária. Gramsci se propõe a pensar a
escola, a educação e a sociedade dentro do contexto histórico em que estão situadas. Fazendo
isso, ele constrói o conceito de hegemonia como um processo que se desenvolve dentro da
realidade histórica. A hegemonia consiste na maneira como a classe dominante na sociedade
constrói e mantém a dominação política e cultural que alcançou sobre as demais classes
sociais, agindo de modo a criar o consenso social ou coagindo através da força quando a
criação ou manutenção do consenso não é possível. A dominação que a classe burguesa visa

92
Universidade Luterana do Brasil e Escola Família Agrícola de Vale do Sol, angquoos@hotmail.com.
93
Universidade Federal de Santa Maria e Escola Família Agrícola de Vale do Sol,
clau.agroindustria@gmail.com.
94
Universidade Luterana do Brasil, taniapro@gmail.com.

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alcançar é ideológica, ou seja, sobre as ideias e valores morais difundidos entre as classes
subalternas.
A Educação do Campo nasceu como crítica à realidade da educação brasileira,
particularmente à situação educacional do povo brasileiro que trabalha e vive no campo. Os
protagonistas do processo de criação da Educação do Campo são os movimentos sociais,
fundamentalmente pela práxis pedagógica destes, continua e pode revigorar a tradição de uma
educação emancipatória, retomando as questões antigas e formulando novas interrogações à
política educacional e à teoria pedagógica (CALDART, 2009).
Segundo Caldart et. al (2012), o conceito em construção da Educação do Campo, sem
se descolar do movimento específico da realidade que a produziu, já pode configurar-se como
uma categoria de análise da situação ou de práticas e políticas de educação dos trabalhadores
do campo, mesmo as que se desenvolvem em outros lugares e com outras denominações.A
escola passa a ser vista como fator de mudança social, e como fator de desenvolvimento. No
entanto, sua expansão é mantida em atraso em relação ao desenvolvimento, e só ocorre
mediante a pressão da demanda social e efetiva na cidade e no campo (SILVA, 2004).
Os Centros Educativos Familiares de Formação por Alternância (CEFFA) são
exemplos de instituições que trabalham com a Educação do Campo. Estes são mantidos e
gestados por movimentos sociais e se propõem a difundir uma educação contra-hegemônica.
Para tanto, rompem as barreiras do ensino e dos currículos tradicionais e desenvolvem o seu
próprio sistema de ensino: a Pedagogia da Alternância.
A Escola Família Agrícola de Vale do Sol (EFASOL) é um CEFFA que oferece o
Ensino Médio e Técnico em Agricultura para jovens do campo. Sendo assim, por ser um
CEFFA, a mesma compartilha dos princípios da Pedagogia da Alternância e da Educação do
Campo. Contudo, ao propor uma educação profissionalizante integral, a EFASOL também
precisa considerar as orientações nacionais no que tange a construção do currículo. Por
considerar que o conhecimento não é fragmentado, o currículo da EFASOL é organizado em
áreas do conhecimento, sendo uma delas as Ciências Agrárias, área que compreende os
conhecimentos sobre agricultura e processamento de alimentos, além das Ciências da
Natureza: Química, Física e Biologia. Ao que tudo indica, o trabalho pedagógico nesta
perspectiva torna-se um desafio aos/às educadores(as), que precisam trabalhar de forma

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interdisciplinar, partindo da realidade do(a) jovem e sem esquecer os conhecimentos exigidos


em nível nacional para esta modalidade de ensino.
Partindo dessa problemática, o presente estudo objetivou avaliar se os/as estudantes de
uma turma de primeiro ano da EFASOL conseguiram relacionar conhecimentos tidos como
essenciais para o Ensino Médio e para o Curso Técnico em Agricultura, os quais foram
trabalhados a partir de um tema gerador nas aulas de Ciências Agrárias. Dessa forma,
considera-se que tal avaliação seja capaz de apontar se a concepção curricular deste
educandário está ao encontro dos princípios da Pedagogia da Alternância, bem como, das
orientações nacionais sobre o currículo.
Nos parágrafos a seguir, são apresentados os referenciais que guiam a prática
pedagógica na EFASOL, a descrição da investigação realizada, bem como, considerações
sobre os resultados do estudo.

Orientações gerais para a construção do currículo

Apoiando-se nas ideias de D’Ambrósio (l997), pode-se afirmar que o currículo é a


estratégia para a ação educativa, contendo os conteúdos, os métodos e os objetivos da ação.
Em uma escola, o currículo se materializa através do Projeto Político Pedagógico, Planos de
Trabalho, Planos de Aula, entre outros documentos que norteiam a prática pedagógica.
No que tange a educação brasileira, os educadores devem elaborar os currículos a
partir da realidade do público ao qual este se destina. Todavia, existem alguns conhecimentos
tidos como básicos e que devem permear todas as escolas em território nacional. Estes
conhecimentos compõem a Base Nacional Comum Curricular, a qual é mencionada,
inclusive, na Constituição de 1988 (BRASIL, 1988).
O Ensino Médio é a última etapa da Educação Básica e possui como objetivos gerais a
consolidação e aprofundamento dos conhecimentos construídos durante o Ensino
Fundamental, visando a preparação para o prosseguimento dos estudos; a preparação para o
mundo do trabalho e exercício da cidadania; o aprimoramento do(a) estudante como humano,
levando em conta a dimensão ética, o pensamento crítico e autonomia; e a compreensão dos
fundamentos científicos e tecnológicos relacionados aos processos produtivos, no ensino de
cada disciplina (BRASIL, 1996).

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A Lei que estabelece as Diretrizes e Bases para a educação nacional (LDB), além de
fixar objetivos ao Ensino Médio, também trata que os currículos dessa etapa serão construídos
a partir de uma Base Nacional Comum (BRASIL, 1996). Essa base é expressa, de maneira
geral, através das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica, as quais se
constituem como orientações gerais sobre cada etapa e modalidade da Educação Básica, sem
aprofundamentos em conhecimentos específicos a serem trabalhados, mas com considerações
sobre cada etapa e modalidade (BRASIL, 2013).
Com a finalidade de orientar os educadores durante o processo de reforma curricular,
bem como, servir de apoio na escolha de novas abordagens e metodologias, foram criados
também os Parâmetros Curriculares Nacionais, os quais trazem competências e habilidades
sugeridas a cada área do conhecimento, dentre aquelas abrangidas pela Educação Básica.
Esses Parâmetros colocam, por exemplo, dentro das disciplinas de Química e Biologia, a
necessidade do estudante conseguir reconhecer e utilizar, tanto na escrita quanto na fala,
códigos e conceitos próprios da linguagem científica (BRASIL, 2000).
Tendo como referências os documentos anteriormente citados, percebe-se que tais
orientações indicam a construção de um currículo disciplinar. No entanto, as Diretrizes
Curriculares Nacionais sugerem que tais disciplinas relacionem-se através de temáticas
comuns, numa proposta de interdisciplinaridade.

A interdisciplinaridade pressupõe a transferência de métodos de uma disciplina para


outra. Ultrapassa-as, mas sua finalidade inscreve-se no estudo disciplinar. Pela
abordagem interdisciplinar ocorre a transversalidade do conhecimento constitutivo
de diferentes disciplinas, por meio da ação didático-pedagógica mediada pela
pedagogia dos projetos temáticos (BRASIL, 2013, p. 28).

Sendo assim, as Diretrizes sugerem que se mantenham as disciplinas com seus


objetivos específicos, mas que as mesmas estabeleçam diálogos entre si através de temas
transversais.
Além dessas orientações gerais ao Ensino Médio, as Diretrizes Curriculares Nacionais
da Educação Básica (2013) também trazem orientações para as modalidades de ensino que
podem estar relacionadas a esta etapa, como por exemplo, a Educação do Campo e a
Educação Profissional Técnica de Nível Médio.
As Escolas do Campo são entendidas como instituições de ensino inseridas em
espaços não urbanos de floresta, pecuária, das minas, da agricultura, pesqueiros, caiçaras,

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ribeirinhos e/ou extrativistas (BRASIL, 2013). A necessidade de um olhar diferenciado para o


currículo destas escolas já é colocada na LDB, ao afirmar que as metodologias e conteúdos
devem ser adequados às necessidades e interesses dessa população; além de que os
calendários escolares devem ser adaptados conforme as fases do ciclo agrícola e as condições
climáticas; e que as mesmas precisam se adequar à natureza do trabalho na zona rural
(BRASIL, 1996).
Quanto à Educação Profissional Técnica de Nível Médio, as Diretrizes Curriculares
Nacionais da Educação Básica esclarecem que se trata de uma educação voltada ao mundo do
trabalho, objetivando formar cidadãos (ãs) trabalhadores (as) numa perspectiva integral. Ou
seja, não é uma educação pensada para formar apenas mão de obra. Não se distancia o pensar
do fazer (BRASIL, 2013). Para o planejamento do currículo nessa modalidade de ensino,
devem-se considerar as orientações do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos, o qual traça
um perfil profissional do(a) egresso(a) de cada curso. Ao se tratar do Curso Técnico em
Agricultura, por exemplo, o Catálogo define o seguinte perfil:

Planeja, organiza, dirige e controla a produção vegetal sustentável. Propaga espécies


vegetais. Elabora, executa e monitora projetos agrícolas. Maneja o solo e a água
mediante práticas conservacionistas. Projeta e implanta sistemas de irrigação e
drenagem. Promove o manejo integrado de pragas, doenças e plantas espontâneas.
Planeja e faz a gestão e o controle da produção. Supervisiona a colheita e a pós-
colheita das principais culturas. Identifica e aplica técnicas mercadológicas para
distribuição e comercialização de produtos. Elabora laudos, perícias, pareceres e
relatórios. Administra a propriedade agrícola. Opera máquinas e implementos
agrícolas (BRASIL, 2016, p. 226).

A partir de uma análise dos documentos oficiais relacionados à educação nacional,


percebe-se que a autonomia das escolas frente à construção do currículo é limitada. Sendo
assim, os/as educadores(as) precisam conseguir integrar as orientações nacionais com as
realidades dos(as) seus/suas estudantes. No caso da Escola Família Agrícola de Vale do Sol,
tem-se uma Escola do Campo que oferece Ensino Médio e o Curso Técnico em Agricultura.
Ou seja, além das necessidades específicas da região onde a mesma está inserida,
fundamentam a construção do currículo dessa escola as Diretrizes Curriculares Nacionais para
o Ensino Médio, para a Educação Profissional Técnica e para a Educação do Campo. Aliado a
isso, a escola em questão adota a Alternância como sistema de ensino, o que coloca aos/às
educadores(as) mais alguns aspectos a seres considerados durante a elaboração do currículo.

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O currículo na Pedagogia da Alternância

A Escola Família Agrícola de Vale do Sol é um Centro Educativo Familiar de


Formação por Alternância. Estas instituições de ensino iniciaram na França, em 1935, com o
objetivo de oferecer aos/às jovens do campo uma formação relacionada à sua realidade,
alternando períodos de tempo e espaço entre a escola e o ambiente socioprofissional e
familiar, de modo que o/a jovem não perdesse o vínculo com a propriedade rural. Esse
movimento foi protagonizado por agricultores(as) e, posteriormente, se espalhou pelo mundo,
chegando ao Brasil na década de 1960 (GARCÍA-MARIRRODRIGA; PUIG-CALVÓ, 2010;
ZAMBERLAN, 2003).
Em sua expansão pelo mundo, os CEFFA foram adquirindo características distintas, de
acordo como o meio onde se inseriram. Porém, são tidos como invariáveis desse movimento,
quatro pilares. Dois deles constituem as finalidades de um CEFFA, que são a formação
integral do(a) estudante, o que significa formação para o trabalho, para a cidadania, mas
também formação humana, ética e cultural; e o desenvolvimento do meio onde o CEFFA se
localiza. Para alcançar tais finalidades os CEFFA apoiam-se em outros dois pilares. Um deles
é a Associação Local, caracterizada por um grupo de pessoas da comunidade responsáveis
pela gestão do processo. O outro pilar é o sistema de ensino utilizado pelo CEFFA: a
Pedagogia da Alternância (GARCÍA-MARIRRODRIGA; PUIG-CALVÓ, 2010).
A Pedagogia da Alternância é um sistema de ensino, segundo Gimonet (2007), num
ritmo de três tempos. Isso porque o/a alternante (o/a estudante que é um(a) ator/atriz da sua
formação) passa um período de tempo (nove dias, no caso da EFASOL) no ambiente familiar
observando a sua realidade. Posteriormente, ele(a) vai para o CEFFA refletir sobre suas
observações e, assim, construir novos conhecimentos a partir das mesmas. Como terceira
etapa, o/a jovem volta para a propriedade da família para aplicar o que aprendeu. Essa
sequência de etapas se repete durante todo o ano letivo.
Para que essa articulação de tempo e espaços ocorra da melhor forma possível, a
Alternância dispõe de uma série de instrumentos pedagógicos. Um deles é o Plano de Estudo,
que se caracteriza como uma pesquisa que orienta a observação por parte do(a) jovem da sua
realidade. Outro instrumento é a Colocação em Comum, momento no qual cada alternante
expõe suas observações aos/às colegas e educadores(as), numa troca de conhecimentos. As

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aulas, na Pedagogia da Alternância,constituem apenas uma parte do processo pedagógico, e


têm como função organizar aquilo que o/a estudante já conhece, construir novos
conhecimentos a partir da realidade e desenvolver o raciocínio e a reflexão (GIMONET,
2007; DE BURGHGRAV, 2011).
A EFASOL iniciou suas atividades em 2014, portanto, ainda está num processo de
construção de identidade e, portanto, de currículo. Quando se fala em currículo na Pedagogia
da Alternância, deve-se partir dos pilares do CEFFA, mas também existem alguns princípios
que norteiam essa pedagogia. O primeiro deles é a primazia da experiência sobre o programa,
ou seja, a experiência do/a jovem, o que ele(a)trás de casa, é o que dá o ponto de partida para
a aprendizagem, e não uma listagem de conteúdos a ser seguida. Outro princípio é a
articulação entre tempos e espaços da formação, ou seja, o currículo deve ser organizado de
tal forma que as sessões familiares e escolares95 estejam sincronizadas. Outro princípio é a
formação profissional e geral associadas, sendo assim, os conteúdos profissionais e práticos
são vistos como mobilizadores para o estudo de conteúdos mais teóricos e abstratos
(GIMONET, 2007).
Nos CEFFA o currículo também é materializado através do Plano de Formação. Este
se caracteriza como um quadro que estabelece relações entre tempos e espaços de formação,
além de colocar uma sequência de temas a serem estudados, pois a observação da realidade
do(a) jovem se dá de forma organizada, a partir de temas geradores (VERGÜNTZ, 2013).
Estes temas geradores são definidos a partir do conhecimento da realidade do(a) jovem, num
processo parecido como o que Freire (1987) chamou de investigação temática.Ou seja, no
início do ano letivo, os/as educadores(as), juntamente com a comunidade escolar, elencam
uma sequência de temas relacionados à realidade dos(as) jovens para serem aprofundados em
cada semana.
A partir do que o/a estudante trás de sua realidade através do Plano de Estudo, cabe
aos/àseducadores(as), nas aulas, aprofundarem esses conhecimentos, problematizarem a
realidade do(a) jovem, relacionar os saberes populares aos científicos e conduzir os/as
estudantes a conhecimentos mais gerais e abstratos.

95
Sessão escolar: Período em que o/a jovem permanece nas dependências do CEFFA, em regime de internato.
Sessão familiar: Período em que o/a alternante está em seu ambiente familiar e profissional.

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Sendo assim, segundo os princípios da Alternância, é a realidade do(a) jovem que


orienta a construção do currículo. Todavia, ao objetivar uma formação integral, é
imprescindível que esse(a) estudante tenha condições para prosseguir nos seus estudos. Logo,
as orientações nacionais devem ser levadas em conta.

Metodologia

Atualmente a EFASOL tem 79 estudantes de 16 diferentes municípios da região do


Vale do Rio Pardo e Centro Serra. A EFASOL trabalha a partir da Pedagogia da Alternância,
que foi desenvolvida pensando na realidade das famílias que vivem do/no campo. De maneira
interdisciplinar, a EFASOL desenvolve diversas temáticas relacionadas ao cotidiano dos/das
estudantes, valorizando os saberes empíricos trazidos das gerações anteriores. É na escola que
estes saberes se encontram com o saber cientifico, e com isso podem-se criar teses. O
currículo da escola é organizado em três grandes áreas que buscam realizar atividades sempre
em conjuntas, sendo elas: Ciências Agrárias (Química, Física, Biologia, Agronomia e Ciência
dos Alimentos); Linguagens (Literatura, Língua Portuguesa, Língua Estrangeira, Teatro,
Música, Artes Visuais e Educação Física); e Ciências Humanas (Filosofia, Sociologia, Direito
e Cidadania, Sociologia, História, Geografia, Matemática e Gestão da Propriedade).
A turma de primeiro ano do Ensino Médio e Técnico em Agricultura, tem como
temática de estudos, no primeiro bloco da formação do ano, um olhar para si próprios, pois se
entende que, para traçarem um projeto de vida, é fundamental que estes(as) jovens conheçam
a si mesmos. Portanto, o primeiro Plano de Estudo do primeiro ano parte da temática “Quem
sou eu?”. Neste Plano de Estudos os/as estudantes buscam informações a respeito de si
próprios com suas famílias, desde informações a respeito do nascimento até lembranças da
primeira infância. Após realizada a pesquisa durante a sessão familiar, os/as estudantes fazem
a Colocação em Comum, que é o momento de socialização das pesquisas realizadas junto com
os/as colegas e educadores(as). Neste momento, os/as educadores(as) realizam anotações a
respeito daquilo que vem de resultados das pesquisas realizadas.
Após a Colocação em Comum sobre o tema “Quem sou eu?”da turma de primeiro ano
de 2018, os/as educadores(as) da área de Ciências Agrárias reuniram-se para discutir como o
tema seria abordado, levando em consideração os conteúdos presentes no Plano de Formação.
Cabe ressaltar que fazem parte deste grupo de educadores(as) uma licenciada em Biologia,

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um licenciado em Química, uma tecnóloga em Agroindústria e um bacharel em Agronomia.


Para que os/as estudantes conseguissem compreender realmente quem são, julgou-se
necessário trabalhar a composição do corpo humano relacionando com a composição dos
alimentos e do solo. Para isso, as aulas da semana (as quais totalizam 14 horas divididas em
três turnos e meio) forma organizadas da seguinte forma:

I. Primeiro momento: Os/As estudantes participaram de uma aula que tinha como
temática a composição do solo. Durante a aula o educador instigou os/as estudantes a
refletirem de como o solo é originado, também sobre a importância com o cuidado do
mesmo,bem como, os nutrientes essenciais às plantas. Sendo enfatizado que solos
pobres em nutrientes geram alimentos da mesma forma, pobres.
II. Segundo momento: Nesta aula os/as estudantes tiveram como tema principal a
composição dos alimentos, buscando compreender o que é alimento. Inicialmente
buscaram-se com os/as estudantes os seus conceitos empíricos a respeito do assunto,
posteriormente explicou-se o que é nutriente e nutrição, destacando as principais
fontes dos mesmos para uma boa alimentação e consequentemente uma boa saúde.
Destacou-se que os alimentos possuem os mesmos nutrientes presentes no solo, e que
os mesmos só estarão presentes no alimento se estiverem presentes no solo que os
produziu.
III. Terceiro momento: Nesta aula buscou-se que os estudantes compreendessem qual é a
composição do corpo humano. Para isso, iniciou-se a conceituação do corpo humano
como um organismo vivo, composto por sistemas de órgãos, onde cada órgão é
formado por tecidos, os quais se constituem como conjuntos de células, formadas por
organelas. Salientou-se que cada organela é composta por substâncias na forma de
moléculas ou íons, os quais se originam de átomos que se diferenciam por suas
partículas subatômicas, dando origem a elementos químicos. Todos estes conceitos
foram esmiuçados com os/as jovens através de exemplos. Também foram enfatizados
que os grupos de substâncias presentes no corpo, bem como, os elementos químicos
que as compõem.
IV. Quarto momento: Ao final da semana, objetivou-se observar se os/as estudantes
conseguiram relacionar os conteúdos trabalhados durante a semana. A partir da
pergunta “O que sou eu?”sugeriu-se que os/as estudantes, através de grupos, pudessem

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apresentar algo físico, como cartaz, desenho, objetos, etc., que respondesse essa
pergunta a partir dos suas compreensões do conteúdo trabalhado. Após isso, solicitou-
se que cada estudante respondesse a mesma questão individualmente, para que se
observasse a relaçãodos conteúdos entre si.
Dessa forma, esse conjunto de aulas tinha como principal objetivo que os/as estudantes
conseguissem aprofundar os conhecimentos sobre o seu corpo e que identificassem que os
elementos químicos que os/as constituem são provenientes do solo e adquiridos através do
alimento. Com isso, também se abordaram uma série de conceitos básicos para o
prosseguimento nos conteúdos de Química, Física, Biologia, Agricultura e Ciência dos
Alimentos.
Para avaliar se os/as estudantes conseguiram relacionar tais conceitos de modo a
responder a pergunta geradora, fez-se Análise de Conteúdo, segundo Bardin (2004), das
respostas dadas pelos treze jovens que compõe a turma no quarto momento da intervenção.
A Análise de Conteúdo é a análise de dados quantitativos, possuindo legitimidade,
rigor científico e profundidade na pesquisa realizada (BARDIN, 2004). O objetivo da análise
feita foi identificar quais dos conceitos trabalhados em aula os estudantes usaram para
responder ao questionamento. Para tanto, inicialmente, faz-se uma leitura geral do material a
ser analisado, que constitui o “corpus” da pesquisa. A partir dessa leitura, optou-se por
codificar o material através de palavras. A partir dessa codificação, criaram-se as categorias
que são apresentadas a seguir, juntamente com a interpretação da análise.

Apresentação e discussão dos resultados

A Análise das respostas dos/as estudantes permitiu categorizar os conceitos utilizados


pelos(as) mesmos(as) para responder à pergunta “O que sou eu?” em cinco grandes grupos,
conforme a Tabela 1. Tais categorias foram subdivididas em subcategorias primárias e
secundárias, conforme o significado dos conceitos que abrangem. Tais conceitos constituem
as unidades de contexto da Análise e, na Tabela 1, também são expostas as frequências com
que cada unidade é citada nas respostas, bem como, os percentuais que essas frequências
representam dentro de cada categoria.

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Os conceitos que mais apareceram nas respostas eram relacionados à composição do


corpo humano, os quais foram abordados no terceiro momento da intervenção. Neste grupo de
conceitos, destacaram-se aqueles relacionados às estruturas microscópicas do corpo humano,
sendo o termo “átomo” o mais frequente do grupo. Dentre as estruturas macroscópicas
citadas, a mais frequente foi “tecido”.
Apesar dos(as) jovens referenciarem com maior frequência estruturas do corpo
humano em suas respostas, os mesmos citaram muitos termos relacionados à alimentação,
como pode ser visto na Tabela 1, bem como, termos relacionados ao solo e à planta, conceitos
estes abordados no primeiro e no segundo momento da intervenção. Esse fato demonstra que
os/as jovens compreenderam a relação entre composição do corpo, alimento e solo.
Outra categoria criada durante a Análise foi a “Nutrição”, que abrangeu termos
relacionado aos nutrientes necessários ao corpo humano, os quais foram citados nos três
primeiros momentos da intervenção. Nesta categoria, destacou-se o termo “nutriente”, mas
também apareceram os termos “macro nutriente”, “micronutriente”, “água”, “vitaminas”,
“proteínas”, “aminoácidos”, dentre outros.
Os/As jovens também relacionaram a composição do corpo humano com alguns
micro-organismos, dando origem à quinta categoria. Entretanto, os termos relacionados a essa
categoria foram percebidos com menor ênfase. Acredita-se que essa associação foi feita muito
em função da aula sobre solos, onde se frisou que tais micro-organismos também compõem o
solo.

Tabela 1: Categorização a partir da Análise de Conteúdo das respostas dos(as) estudantes.


SUBCATEGORIA SUBCATEGORIA
CATEGORIA FREQUÊNCIA %
PRIMÁRIA SECUNDÁRIA
Sistema 7 8,97
Estruturas Órgão 10 12,82
macroscópicas Tecido 12 15,38
Organismo 7 8,97
Íon 1 1,28
Composição Célula 9 11,54
do corpo Elemento químico 3 3,85
Estruturas DNA 1 1,28
microscópicas Substância 8 10,26
Organela 3 3,85
Molécula 6 7,69
Átomo 11 14,10

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Alimento 44 97,78
Alimentação
Produto alimentício 1 2,22
Solo 28 65,11
Agricultura Planta 10 23,25
Cultivo 5 11,63
Nutrientes 15 38,46
Gerais Macro e
5 12,82
Micronutrientes
Vitaminas 7 17,95
Nutrição Proteínas 3 7,69
Água 3 7,69
Tipos de Nutrientes
Fibras 1 2,56
Aminoácidos 1 2,56
Minerais 4 10,26
Bactérias 3 42,86
Seres Vivos Fungos 2 28,57
Micro-organismos 2 28,57
Fonte: Elaborada pelos(as) autores(as).

A partir dessa análise, percebe-se que os/as estudantes citaram os conceitos abordados
nos três momentos da intervenção para responder à pergunta geradora. Através da leitura das
respostas, também é possível perceber que tais conceitos são colocados de forma articulada,
demonstrando que os/as mesmos(as) conseguiram estabelecer relações entre estes
conhecimentos, mesmo tendo sido trabalhados em momentos distintos. Essa relação fica claro
na resposta de uma das estudantes:

A partir do que estudamos, vimos que somos formados por átomos que quando se
juntam formam-se as moléculas. Depois disso se formam as células, que constituem
os tecidos para a formação dos órgãos que fazem parte dos diferentes sistemas que
compõe o nosso organismo chamado corpo. Os nutrientes necessários para que
possa ter um bom funcionamento em nosso corpo vêm dos alimentos que ingerimos,
se consumirmos comidas saudáveis, nosso corpo irá funcionar bem, porém se for
ingerido em maior quantidade os produtos alimentícios, que não contém um grande
valor nutricional, não é possível ter um bom funcionamento. Para ter os alimentos
saudáveis é necessário cuidar do solo, pois é ele quem transmite os nutrientes
necessários para uma boa alimentação. Para ser mais especifico, somos o solo que
cuidamos, somos o alimento que ingerimos e somos o ser humano que é
completamente dependente dessas coisas (ESTUDANTE DA EFASOL)[grifo do(as)
autor(as)].

Destaca-se também a frequência com que os/as estudantes utilizaram os termos que se
referem às estruturas microscópicas, cujo ensino é dificultoso por se tornar abstrato. Ao
referenciar estruturas macro e microscópicas para descreverem o que são, os/as estudantes

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utilizaram conceitos próprios da linguagem científica, o que é orientada nos Parâmetros


Curriculares Nacionais (BRASIL, 2000).
Os conceitos de solo, alimento, nutriente, a composição do solo e do alimento, são
conhecimentos essenciais ao/à Técnico(a)em Agricultura, que, segundo o Catálogo Nacional
de Cursos Técnicos, precisa conhecer técnicas de manejo do solo e fazer a gestão da colheita e
pós-colheita. Visto as orientações das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Profissional Técnica de Nível Médio, além dos(as) técnicos(as) conhecerem os procedimentos
necessários à sua atuação, precisam entender tais procedimentos, e aí que entra o estudo das
ciências que fundamentam os processos produtivos (BRASIL, 2013; BRASIL, 2016).
A partir da integração destes conhecimentos, trabalhou-se com uma temática da
realidade dos(as) estudante(s), fazendo-os(as) se reconhecerem enquanto organismos vivos
dependente do solo e do alimento. Dessa forma, utilizou-se a temática do Plano de Estudo
como questão norteadora para o aprofundamento dos conhecimentos, conforme os princípios
da Pedagogia da Alternância.

Considerações Finais

A abordagem interdisciplinar dos conhecimentos relacionados ao solo, alimentação e


composição do corpo humano a partir do tema “Quem sou eu?” permitiu aos/às estudantes
terem uma visão holística destes assuntos.
Sendo assim, apesar das dificuldades em se pensar um currículo com tantas
especificidades, conclui-se que tal intervenção permitiu a integração de conhecimentos
básicos para o Ensino Médio e para o Curso Técnico em Agricultura, além de considerar os
princípios da Educação do Campo e da Pedagogia da Alternância.

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EDUCAÇÃO NO PROCESSO DE GESTÃO AMBIENTAL: o pescador artesanal como


sujeito da ação educativa na perspectiva da luta de classes

Ederson Pinto da Silva96


Lucia de Fátima Socoowski de Anello 97
Ana Paula Grellert98

Resumo

O presente trabalho situa-se no campo da educação no processo de gestão ambiental pública e tem a
intenção de apresentar contribuições iniciais no que se refere ao entendimento da realidade dos
pescadores artesanais como sujeitos da ação educativa em processos pedagógicos comprometidos com
a transformação da realidade social. Ancorado no materialismo histórico, enfatiza o papel da educação
ambiental no processo de gestão ambiental pública, destacando aspectos teóricos e metodológicos que
podem subsidiar e direcionar as diferentes ações junto aos pescadores artesanais, seja no âmbito da
gestão pública, da pesquisa ou do processo educativo junto a estes sujeitos.

Palavras-chave: Educação; Gestão Pública; Pesca Artesanal.

Introdução

Quintas (2006) afirma que é da interação entre seres humanos e natureza que emerge o
que se conhece por meio ambiente. Contudo, na medida em que o ser humano é ao mesmo
tempo um ser natural e um ser social, as diferentes formas de organização social
historicamente construídas acabam influenciando a forma de interação dos seres humanos
com a natureza, o que, por sua vez, vai influenciar nas relações estabelecidas entre os seres
humanos.

No processo de transformação do meio ambiente, de sua construção e reconstrução


pela ação coletiva dos seres humanos– são criados e recriados modos de
relacionamento da sociedade com o meio natural (ser humano-natureza) e no seio da
própria sociedade (ser humano - ser humano). Ao se relacionar com a natureza e
com outros homens e mulheres, o ser humano produz cultura evidenciada por suas
manifestações, ou seja, cria bens materiais, valores, modos de fazer, de pensar, de
perceber o mundo, de interagir com a própria natureza e com os outros seres

96
Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental – PPGEA/FURG
ederson.tga@gmail.com.
97
Profª Drª no Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental – PPGEA/FURG
luciaanello@hotmail.com.
98
Pedagoga na Pró-reitoria de Assuntos Estudantis/FURG. Mestre em Educação. ana.grellert@furg.br .

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humanos, que constituem o patrimônio cultural construído pela humanidade ao


longo de sua história (QUINTAS, 2006, p. 21, grifo do autor).

Assim, à medida que a sociedade passa a se organizar sob o modelo de produção


capitalista, segundo afirma Sabbatella (2010), as relações entre os seres humanos e desses
com a natureza se alteram de forma que o trabalho assume um duplo caráter: um caráter
concreto de produção de valores de uso e um caráter abstrato de produção de mais valia. O
primeiro corresponde à relação metabólica homem-natureza. Já o segundo corresponde a uma
relação social imaterial entre capital e trabalho. A necessidade de produção de mais valia,
além de aumentar a necessidade de trabalho humano, por consequência, aumenta a utilização
dos bens naturais e a geração de resíduos que são devolvidos ao meio ambiente. Para
Sabbatella (2010) a propriedade privada acaba por estabelecer a reificação do objeto natural e
sua alienação da natureza, o que se constitui em elementos chave para o esgotamento dos bens
naturais e para a contaminação do meio ambiente.

[...] en el régimen capitalista, la forma predominante en la cual el hombre se vincula


a la naturaleza es la apropiación privada y la mercantilización. La producción está
dirigida a la obtención de plusvalía relativa a través del aumento de la productividad;
y el mercado está signado por la competencia entre capitales individuales. Con esas
características, la reproducción en escala ampliada del capital estimula la
centralización no solo de los médios de producción. Para una perspectiva ecológica,
cabe enfatizar una restricción cada vez más pronunciada en el acceso y control de
los bienes naturales, que no es más que la riqueza natural de medios de vida y
objetos/medios de trabajo (SABBATELLA, 2010, p. 73).

Se de um lado as relações sociais de produção baseadas na exploração do trabalho pelo


capital levam a desigualdades sociais, do ponto de vista ambiental a soma das relações sociais
de produção com as relações sociedade-natureza leva às desigualdades ambientais. Por
desigualdades ambientais pode-se compreender “a exposição desproporcional dos
socialmente mais desprovidos aos riscos das redes técnico-produtivas da riqueza ou sua
despossessão ambiental pela concentração dos benefícios do desenvolvimento em poucas
mãos” (ACSELRAD, 2010, p. 109). Neste sentido, Sabbatella (2010) afirma que as
desigualdades ambientais podem se manifestar de duas formas: a) a desigualdade no acesso e
controle dos bens naturais – entendidas como assimetrias para acessar e aproveitar e utilizar
bens naturais essenciais à vida como água, terra, energia, pesca e medicamentos tradicionais

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naturais, etc; b) a desigualdade de acesso a um ambiente sadio – relacionada com a proteção


ao meio ambiente e com as assimetrias de poder na distribuição dos impactos ambientais
decorrentes de atividades produtivas, tais como contaminação do ar, da água, dos alimentos
provocadas por indústrias, transporte, disposição de resíduos e por grandes obras.

É neste contexto que se insere a gestão ambiental pública como “processo de


mediação de interesses e conflitos (potenciais ou explícitos) entre atores sociais que agem
sobre os meios físico-natural e construído” (QUINTAS, 2006, p.30). Ao discorrer sobre a
gestão ambiental pública, Anello (2009) diz que nesta

o governo estabelece as regras para o uso e o acesso aos recursos ambientais


(Licenciamento Ambiental, Zoneamento Ecológico Econômico, Planos de Manejo,
Plano Diretor ou Código de Posturas e Obras do Município); ou seja, o Estado tem a
função de garantir o interesse de todos e o bem comum em uma visão republicana,
ou garante as condições para que a disputa pelo acesso ao recurso aconteça dentro de
regras pré estabelecidas, ou ainda garante à burguesia a organização racional e
eficiente da exploração dos bens ambientais. (ANELLO, 2009, p. 83)

Como ao tomar as decisões no campo ambiental o Estado “está de fato definindo


quem ficará, na sociedade e no país, com os custos e quem ficará com os benefícios advindos
da ação antrópica sobre o meio físico-natural ou construído” (QUINTAS, 2006, p.31) e,
sendo o Estado pautado prioritariamente pelos interesses da burguesia, as arenas de discussão
da gestão ambiental pública passam a assumir relevante importância na luta por justiça
ambiental. Conforme Acselrad (2010) o que está em jogo no centro do embate acerca da
questão ambiental é o modo como se organizam e distribuem no território as diferentes
formas de apropriação dos recursos ambientais e como a existência de determinadas formas
pode afetar as demais. Neste sentido, ao afirmar que a noção de “justiça ambiental” expressa
um movimento de ressignificação da questão ambiental, resultando de uma apropriação
singular da temática do meio ambiente por dinâmicas sociopolíticas tradicionalmente
envolvidas com a construção da justiça social, este autor destaca que tal processo de
ressignificação está associado a uma reconstituição das arenas onde se dão os embates sociais
pela construção dos futuros possíveis.

É na disputa realizada no âmbito destas arenas ambientais que a educação ambiental


pode exercer o importante papel de contribuir para a democratização destes espaços e,

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consequentemente, para que os grupos sociais mais frágeis possam se inserir de forma mais
efetiva na gestão ambiental pública, disputando assim futuros que lhes sejam mais favoráveis.
Neste sentido, é fundamental que o educador ambiental comprometido com esta visão de
mundo esteja também comprometido em conhecer o educando sujeito da sua ação educativa,
bem como a realidade em que este educando está inserido.

No que se refere à questão dos pescadores artesanais, é importante destacar que


quando se fala em pesca é preciso se ter presente que esse termo bastante genérico e que o
mesmo envolve uma complexa rede de diversidades, as quais se relacionam em um
movimento que, na maioria das vezes, é conflituoso. Sem o devido esforço para se
compreender as diferentes categorias e suas particularidades, não raras vezes fala-se em
pescadores, como se não houvessem tais diferenças.

Assim, o presente trabalho busca trazer uma contribuição inicial para aqueles que se
posicionem ao na perspectiva da luta de classes no debate teórico da educação no processo de
gestão ambiental e que queiram discutir as questões ambientais que compõem a realidade da
pesca artesanal.

A educação no processo de gestão ambiental

Entretanto, enquanto processo educativo, conforme demonstra Layrargues (2006) a


educação ambiental não está descolada das concepções político-ideológicas que disputam
hegemonia no debate sobre o modelo de sociedade. O autor afirma que para a mudança
ambiental, sobretudo em sociedades desiguais, é necessário que a educação ambiental tenha
relação não apenas com a mudança cultural, mas também com as mudanças sociais. Assim
têm-se a educação ambiental como instrumento em disputa que pode servir tanto para a
manutenção como para a transformação das relações de sociais.

Uma concepção de educação ambiental em que o processo educativo assume apenas o


caráter de “repasse” de informações, com vistas a tornar o indivíduo ecologicamente correto,
buscando promover uma mudança dos seus valores culturais, éticos e morais em relação à
natureza, “como se bastasse ao humano apenas reaprender a ler o livro da Natureza para

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tornar sustentável o desenvolvimento” (LAYRARGUES, 2006, p. 83), não passa de uma


concepção de educação que serve à manutenção das relações sociais estabelecidas. Esta
concepção de educação ambiental, que foca no indivíduo sem colocá-lo de forma crítica em
um sistema de relações que pertence a uma totalidade, estaria sim mais alinhada com o que
Freire (1977) chama de uma falsa educação que, na verdade, é domesticação.

Layrargues (2006) afirma que para a mudança ambiental, sobretudo em sociedades


desiguais, é necessário que a educação ambiental tenha relação não apenas com a mudança
cultural, mas também com as mudanças sociais. Neste sentido, destaca alguns autores que têm
firmado posição em um campo político-ideológico contra-hegemônico e que têm construído
algumas concepções de educação ambiental que se articulam com os as forças sociais
progressistas e que é comprometido com a mudança social, para o qual não basta, conforme
afirma Layrargues (2006), discutir as relações sociedade-natureza sem que se busque
mudanças nas relações internas da sociedade. Neste sentido, inserem-se algumas concepções
de educação ambiental que se articulam com os as forças sociais progressistas e que são
comprometidas com a mudança social. Dialogando com a teoria crítica, são concebidas sobre
grande influência da pedagogia de Paulo Freire que encara a educação como “prática da
liberdade” e como ação transformadora, onde

A tomada de consciência não se dá nos homens isolados, mas enquanto travam entre
si e no mundo relações de transformação, assim também somente aí pode a
conscientização instaurar-se[...]. Este esforço da tomada de consciência em superar-
se a alcançar o nível da conscientização, que exige sempre a inserção crítica de
alguém na realidade que se lhe começa a desvelar, não pode ser, repitamos, de
caráter individual, mas sim social. [...]a conscientização, que não pode dar-se a não
ser na práxis concreta, nunca numa práxis que se reduzisse à mera atividade da
consciência, jamais é neutra. Como neutra jamais pode ser a educação. Quem fala
em neutralidade são precisamente os que temem perder o direito de usar a
ineutralidade em seu favor. (FREIRE, 1977, P. 77)

É neste contexto que se insere a educação no processo de gestão ambiental discutida


em Quintas (2004), que reconhecendo a assimetria nas arenas políticas que tratam da gestão
ambiental, atua no sentido de fortalecer os grupos sociais mais fragilizados para que os
mesmos possam se inserir em melhores condições na disputa travada no âmbito destas arenas.
Neste sentido o autor afirma que:

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Por ser produzida no espaço tensionado, constituído a partir do processo decisório


sobre a destinação dos recursos ambientais na sociedade, a Educação no Processo de
Gestão Ambiental exige profissionais especialmente habilitados, que dominem
conhecimentos e metodologias específicas para o desenvolvimento de processos de
ensino-aprendizagem com jovens e adultos em contextos sociais diferenciados.
Exige, também, compromissos com aqueles segmentos da sociedade brasileira, que
na disputa pelo controle dos bens naturais do país, historicamente são sempre
excluídos dos processos decisórios e ficam com o maior ônus. Cabe esclarecer que,
ao se falar em Educação no Processo de Gestão Ambiental, não está se falando de
uma nova Educação Ambiental. Está se falando sim, em uma outra concepção de
educação que toma o espaço da gestão ambiental como elemento estruturante na
organização do processo de ensino-aprendizagem, construído com os sujeitos nele
envolvidos, para que haja de fato controle social sobre decisões, que via de regra,
afetam o destino de muitos, senão de todos, destas e de futuras gerações.
(QUINTAS, 2004, p. 115-116)

Desta forma, ao mesmo tempo em que se reconhece a gestão ambiental pública como
um espaço tensionado e assimétrico, atribui-se à educação ambiental um importante papel
para que os grupos sociais historicamente alijados dos processos decisórios acerca da questão
ambiental possam se inserir de forma protagonista nas arenas que tratam da gestão ambiental
pública. Entretanto, é preciso que as práticas educativas sejam desenvolvidas no sentido de
dar e fortalecer a voz daqueles que historicamente ficaram apenas com o ônus do modelo
hegemônico adotado pela sociedade capitalista no uso dos bens naturais.

O pescador artesanal na luta de classes

A pesca é uma atividade que vive da exploração da natureza e, por isso, “há uma
correlação importante entre a vida social e a reprodução natural [...] há uma correlação
entre a vida social e a reprodução dos estoques de pescado” (DIEGUES, 1983, p. 95). Desta
forma, a reprodução social das comunidades de pequenos pescadores é influenciada de forma
considerável pela reprodução natural dos cardumes, a qual é imprevisível e foge ao controle
do homem. De forma semelhante a pesca empresarial capitalista, ainda que tenha a
possibilidade de explorar diversos ecossistemas ao mesmo tempo, não está livre da limitação
de predação imposta pela capacidade de reprodução dos estoques. Este seria, segundo afirma
Diegues, “um aspecto importante na análise da atividade pesqueira, esquecido muitas vezes
por aqueles que analisam a pesca como idêntica aos outros setores da divisão social de
produção” (DIEGUES, 1983, p. 95). Dito de outra forma, ao contrário de outros setores, a
pesca reproduz-se condicionada pelas leis naturais de reprodução dos cardumes.

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Dada a dificuldade de consenso em termos de categorização, no âmbito deste trabalho


optou-se por situar a pesca artesanal de acordo com a caracterização apresentada por Diegues
(1973; 1983; 1988). Neste sentido, Diegues (1973), para estratificar a pesca existente no
litoral do estado de São Paulo afirma que “a categorização de indivíduos numa atividade
econômica é uma função, em 1º lugar da especificidade do setor, de seu dinamismo e das
condições em que é realizado e, em 2º lugar, da estrutura social em que a atividade se insere”
(DIEGUES, 1973, p. 110). Assim, para estratificar os pescadores da região estudada utilizou
os critérios de i) relações de trabalho existentes na unidade produtiva; ii) destino da produção;
iii) tecnologia utilizada; iv) ambiente ecológico a ser explorado, e v) tradição de pesca. Com
esta análise, descreve o pescador artesanal como

[...] aquele que na captura e desembarque de toda a classe de espécies aquáticas,


trabalha sozinho e/ou utiliza mão-de-obra familiar ou não assalariada, explorando
ambientes ecológicos limitados através de técnicas de reduzido rendimento relativo
e que destina sua produção, total ou parcial, para o mercado [...] Ele é um
profissional quando faz da pesca seu único meio de vida ou quando e da atividade
pesqueira que retira seus rendimentos. (DIEGUES, 1973, p.111)

Com base nesta conceituação inicial, Diegues (1983; 1988) aprofunda sua análise
utilizando uma metodologia que parte das relações sociais de produção existentes em
determinada realidade para categorizar as formas de organização da produção pesqueira. Em
um primeiro esforço de aprofundamento Diegues (1983), mantendo a área de estudo no litoral
do estado de São Paulo e partindo da análise das relações entre os agentes da produção
pesqueira, apresenta algumas formas e subformas em que esta se expressa.

[...] percebe-se que os agentes da produção pescadores/não-pescadores se


relacionam entre si e com as condições objetivas da produção, segundo certas
formas ou modelos que ganham uma existência histórica. Ainda que em dados
momentos históricos uma dessas formas seja a dominante, a mais dinâmica, elas
coexistem e se articulam. Tendo-se em vista as diversas combinações dos fatores
produtivos em relações sociais de produção, constatamos que elas assumem formas
possíveis e algumas subformas: a) a produção pesqueira de autossubsistência ou
primitiva; b) a produção pesqueira realizada dentro dos moldes da pequena produção
mercantil; c) a produção pesqueira capitalista. No interior da pequena produção
mercantil identificamos ainda duas subformas: a) a pequena produção familiar dos
pescadores-lavradores, e b) a pequena produção dos pescadores artesanais. No
interior da produção pesqueira capitalista encontramos duas subformas: a produção
dos armadores de pesca e a produção das empresas de pesca. (DIEGUES, 1983, p.
148)

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Ao discutir estas formas e subformas de organização social da produção pesqueira, o


autor apresenta algumas características que as distinguem entre si. Estas formas e subformas
vão novamente ser abordadas por Diegues (1988) em um esforço que buscou “coordenar sob
o ponto de vista teórico” (DIEGUES, 1988, p. 8) a análise das formas da produção pesqueira,
apresentando uma tipologia passível de ser utilizada em outras regiões do Brasil.

Nesta versão mais acabada da tipologia construída por Diegues (1988), as formas de
organização da pesca são estruturadas agora em três categorias, a saber: 1) Pesca de
subsistência; 2) Pesca realizada dentro dos moldes da pequena produção mercantil; 3) Pesca
empresarial-capitalista. A pesca artesanal está situada em uma subdivisão da pesca realizada
dentro dos moldes da pequena produção mercantil a qual Diegues define suas principais
características.

A principal característica dessa forma de organização é a produção do valor de troca


em maior ou menor intensidade; isto é, o produto final, o pescado, é realizado tendo-
se em vista a sua venda. Isto pressupõe uma certa divisão social do trabalho já com
produtores mais ou menos especializados que não necessariamente participam da
captura. É o caso, por exemplo, do artesão "fazedor de canoas". Os produtores
diretos, nesse caso, são independentes: proprietários dos meios de produção,
incluindo-se aí o "savoir-faire" tradicional empregado na localização dos cardumes.
O trabalho tem em geral características familiares (nuclear ou extensa), a tecnologia
empregada se caracteriza pelo relativamente baixo poder de predação e o nicho
ecológico é restrito. O processo produtivo gira em torno de instrumentos de
produção (redes, espinhéis, canoas, etc.) apropriados familiar ou individualmente. A
unidade de produção e em geral o grupo familiar ou a vizinhança, sendo a
apropriação do produto regido pelo sistema de partilha ou quinhão (partes do
produto são distribuídas aos produtores diretos). Em suma, o princípio que norteia
essa forma de organização de produção é o da mercadoria, que se converte em
dinheiro através da circulação mercadoria-dinheiro, que é utilizada para a aquisição
de novas mercadorias (M-D-M) (DIEGUES, 1988, p. 8-9)

No que se refere à pesca artesanal, Diegues apresenta algumas características que, sem
afastá-la da pequena produção mercantil, são particulares desta forma de organização. Tais
características são apresentadas em seis pontos.

Em primeiro lugar, o grupo doméstico, ainda que importante na atividade


pesqueira, não mais constitui a base das unidades de produção e cooperação. À
medida que a pesca deixa de ser uma atividade complementar para tornar-se a
principal fonte de produção de bens destinados a venda, à medida que surge um

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excedente, utilizado na compra de embarcações motorizadas, que exigem uma outra


"tripulação", a mão-de-obra mais apropriada nem sempre é a familiar. De acordo
com as novas bases de partilha da produção introduzidas, nem sempre é interessante
utilizar um parente como "camarada". Em segundo lugar, a atividade pesqueira
passa a ser a principal fonte de renda, propiciando, em determinadas situações, uma
maior produção de excedente, em cuja distribuição entre os pescadores passam a ser
introduzidos padrões menos igualitários. O "dono da embarcação motorizada", por
exemplo, passa a exigir um “quinhão maior”, alegando custos maiores na
manutenção da embarcação, pagamento de financiamentos feitos etc. Rompe-se,
então, um certo igualitarismo existente na subforma de produção anteriormente
descrita. Com isto, torna-se mais nítida a diferença entre os proprietários dos meios
de produção e os "camaradas". [...] Em terceiro lugar, esse novo tipo de pesca,
explorando ambientes marinhos e costeiros mais amplos, exige conhecimentos mais
específicos [...] Em quarto lugar, a propriedade dos meios e instrumentos de
trabalho na pesca passa a ser um elemento fundamental em toda a organização
produtiva, ao passo que a "propriedade familiar" deixa de ser tão importante. Em
quinto lugar, há um avanço tecnológico importante como a introdução da
embarcação motorizada, das redes de náilon, de novos processos de conservação e
transporte do pescado etc. Em sexto lugar, organiza-se todo um processo de
comercialização do pescado em que progressivamente os "atravessadores"
individuais vão perdendo gradativamente o terreno para as “firmas” de compra e
financiamento da produção. (DIEGUES, 1988, p. 11-13, grifos nosso)

Devido a estas características particulares, Diegues mantém a pesca artesanal dentro


dos moldes da pequena produção mercantil, porém estando esta subforma em um estágio um
pouco mais avançado no que se refere ao desenvolvimento das forças produtivas, passa a
classifica-la como pequena produção mercantil pesqueira ampliada. Assim, “é somente nesse
estágio que surge o "pescador” como tal, que passa a viver exclusiva ou quase
exclusivamente da sua "profissão"” (DIEGUES, 1988, p. 13). Ao passo que faz da pesca a sua
profissão, o seu principal meio de vida,

[...] o pescador "artesanal" passa a se reproduzir e reproduzir suas condições de


existência na pesca, voltada fundamentalmente para o comércio. O mercado é o
objetivo de sua atividade [...]. No entanto, o excedente reduzido e irregular, a baixa
capacidade de acumulação, a dependência total vis-à-vis do intermediário, a
propriedade dos meios de produção, o domínio de um saber pescar baseado na
experiência (e que constitui sua profissão) são elementos que caracterizam ainda “a
pequena pesca mercantil”(DIEGUES, 1988, p. 13-14).

E é justamente quando o pescador artesanal se torna um profissional, quando o


mercado passa a ser o objetivo de sua atividade, que parece estar o momento em que, na luta
de classes travada na sociedade burguesa, o pescador artesanal é incorporado à classe

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trabalhadora. Ainda que esteja organizada em um sistema de produção mercantil, ou seja, que
não tenha chegado a uma organização plena do processo de produção capitalista, a pesca
artesanal faz parte de um todo que é regido pelo modelo de produção capitalista. Desta forma
esta “incorporação” pode perfeitamente ser observada através análise da relação que o
pescador estabelece com a mercadoria que produz, relação esta que é condicionada pela total
dependência que o mesmo tem do intermediário, tanto para o seu financiamento, como para
poder comercializar a mercadoria produzida por meio do seu trabalho.

A relação de dependência do pescador artesanal tem do intermediário, seja ele o


atravessador local ou a empresa capitalista, faz com que o pescado capturado pelo trabalho do
pescador não seja seu, mas sim de um terceiro que não participa do processo produtivo e que
tem o poder não só de adquirir com exclusividade a mercadoria, como também lhe atribuir o
valor que lhe convir. Assim, o pescado passa a ser propriedade do capitalista, restando ao
pescador o papel de empregar seu trabalho para capturá-lo e entregar ao intermediário. Cria-se
então uma relação de estranhamento entre o pescador artesanal/trabalhador e a mercadoria
que produzida por meio do seu trabalho na natureza.

No modelo capitalista “o trabalhador se torna mais pobre quanto mais riqueza


produz, quanto mais sua produção aumenta em poder e extensão. O trabalhador se torna
uma mercadoria tão mais barata quanto mais mercadorias cria” (MARX, 2004, p. 80). Esta
relação não é diferente na pesca artesanal. Como dito em Diegues (1983), a pesca é uma
atividade de caça em larga escala e a produção social é condicionada pela produção natural
dos estoques. Assim, pela “lei” imposta pelos intermediários, quanto mais o pescador
artesanal captura, mais valor produz, porém, menor é o valor que recebe por unidade (kg)
entregue ao intermediário. Desta forma, quanto mais riqueza produz, menor é o valor relativo
recebido pelo seu trabalho.

Assim que produz o pescado por meio do seu trabalho, que o põe em sua embarcação,
o pescador artesanal se depara com algo que, além de não lhe pertencer, passa-lhe a ser hostil.
Esta mesma “hostilidade” é identificada por Marx quando analisa a relação do trabalhador
com o produto do seu trabalho na sociedade capitalista.

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Na determinação de que o trabalhador se relaciona com o produto de seu trabalho


como [com] um objeto estranho estão todas estas consequências. [...] A
exteriorização (Entäusserung) do trabalhador em seu produto tem o significado não
somente de que seu trabalho se torna um objeto, uma existência externa (äussen),
mas, bem além disso, [que se torna uma existência] que existe fora dele (ausser ihn),
independente dele e estranha a ele, tornando-se uma potência (Macht) autônoma
diante dele, que a vida que ele concedeu ao objeto se lhe defronta hostil e estranha.
(MARX, 2004, p. 81)

Ora, que outra relação que não de estranhamento existe entre o pescador artesanal e
pescado capturado que necessita ser rapidamente entregue ao capitalista ao preço que melhor
lhe convir? Que outra relação que não de estranhamento existe entre o pescador artesanal e o
pescado que ele captura e que não pode consumir após este ser transformado em mercadoria?
Ao se tornar independente do pescador artesanal, o pescado mercadoria lhe empurra para a
condição de trabalhador que lhe produz mas não tem domínio sobre ele. O pescador artesanal
passa à condição de trabalhador que produz em um processo de trabalho estranhado, onde o
seu trabalho está a serviço de um não trabalhador. Desta forma, ainda que possua a
propriedade dos meios de produção, que se reproduza socialmente baseado na
tradicionalidade, etc., no todo da luta de classes existente na sociedade capitalista, o pescador
artesanal não pode ocupar outra posição que não a de classe trabalhadora.

Contudo, além deste posicionamento da pesca artesanal como classe trabalhadora nas
relações sociais da produção pesqueira, no que se refere à luta de classes, um outro aspecto
fundamental deve de ser considerado. Trata-se da relação do pescador artesanal com a
natureza e da forma como seu meio de vida é afetado quando a natureza é apropriada para
atender aos interesses das classes dominantes.

Como já demonstrado, a relação homem-natureza está no centro do pensamento de


Marx e exerce papel fundamental na história da luta de classes. Retomando os Debates sobre
a Lei referente ao furto de madeira, é possível notar que, ainda de forma embrionária, Marx já
apresentava este olhar. Nestes artigos, ao se referir ao feudalismo afirmou que,

O feudalismo, no sentido mais amplo, é o reino animal do espírito, [...] onde a


humanidade é posta em gavetas no sentido próprio do termo [...] no feudalismo,
uma raça se alimenta da outra até chegar lá embaixo, na raça que como um pólipo
grudado na gleba nada possui além de muitos braços para colher os frutos para as
raças superiores, ao passo que ela própria se alimenta do pó, pois, enquanto no reino

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animal da natureza os zangões são mortos pelas abelhas operárias, no reino animal
do espírito, as abelhas operárias são mortas pelos zangões, e isso se dá por meio do
trabalho (MARX, 2017, p. 85).

No artigo seguinte, Marx traz uma importante reflexão sobre como, a partir da
apropriação privada da natureza ocorrida no início do sistema capitalista, passou a assumir
importante papel na relação das classes sociais com a natureza. Assim, ao discutir como os
despossuídos ignoravam as regras da propriedade privada e confrontavam os interesses
burgueses para satisfazerem suas necessidades fundamentais de existência, Marx disse

Descobriremos que os costumes que são costumes de toda a classe pobre sabem
captar a propriedade com instinto certeiro por seu lado indeciso; descobriremos que
essa classe não só sente o impulso de satisfazer uma necessidade natural, mas na
mesma medida sente a necessidade de satisfazer um direito legal. A madeira seca no
chão nos serve de exemplo. Sua ligação orgânica com a árvore, via é tão pequena
quanto a pele descascada com a cobra. A própria natureza representada nos gravetos
e galhos secos, quebrados, separados da vida orgânica, em contraste com as árvores
e os troncos firmemente enraizados, cheios de seiva, assimilando ar, luz, água e terra
na forma que lhes é própria e em sua vida individual, como que o antagonismo de
pobreza e riqueza. É uma representação física de pobreza e riqueza. A pobreza
humana sente essa afinidade e deriva desse sentimento de afinidade seu direito de
propriedade, se modo que, deixando a riqueza orgânico-física para o proprietário
premeditado, ela reivindica a pobreza física para a necessidade e sua contingência
[...] No ato de coletar, a classe elementar da sociedade humana confronta-se com os
produtos da potência elementar da natureza, ordenando-os. É o que ocorre com os
produtos florestais, que constituem um acidente totalmente contingente da posse e
que por sua insignificância não podem ser objeto da atividade do proprietário
propriamente dito; é o que ocorre com os direitos da respiga, com os da segunda
colheita e com outros direitos consuetudinários desse tipo (MARX, 2017, p. 89-90).

Como visto, a forma de apropriação e uso da natureza tem sido um dos elementos
centrais na luta de classes ao longo da história. No modelo capitalista, a apropriação privada
da natureza para atender aos interesses da classe dominante, não só configura a disputa direta
pelo acesso direto ao bem natural (lenha, terra, água, alimentos, etc.), como também assume a
dimensão das disputas pelo uso do território. Assim, atuando em ambientes ecológicos
limitados e dependendo da integridade destes ambientes para a reprodução natural dos
cardumes, a pesca artesanal passa a enfrentar um outro embate com a classe dominante. Desta
vez pelo direito de acesso a um ambiente ecológico que garanta sua produção e reprodução
social.

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Em uma situação paradoxal, ao mesmo tempo em que se verifica que por meio das
relações sociais da produção pesqueira, o pescador artesanal é explorado e posicionado na
luta de classes, também é possível observar que é por meio do trabalho na natureza que ele se
efetiva, não só como trabalhador, mas também como o ser, como o profissional que vive da
pesca artesanal. Para ser pescador artesanal ele necessita do ambiente ecológico em condições
mínimas que garanta a reprodução dos estoques e, consequentemente, a sua produção e
reprodução enquanto trabalhador. Contudo, à medida que as classes dominantes vão se
apropriando da natureza para atender seus interesses, vão gerando impactos no meio ambiente
e comprometendo a sobrevivência das demais classes. Os impactos que as atividades a serviço
da acumulação capitalista podem causar ao ambiente são telegraficamente descritos por Marx
e Engels quando os mesmos afirmam que

A “essência” do peixe é o seu “ser”, a água – para tomar apenas uma de suas
proposições. A “essência” do peixe de rio é a água de um rio. Mas esta última deixa
de ser a “essência” do peixe quando deixa de ser um meio de existência adequado ao
peixe, tão logo o rio seja usado para servir à indústria, tão logo seja poluído por
corantes e outros detritos e seja navegado por navios a vapor, ou tão logo suas águas
sejam desviadas para canais onde simples drenagens podem privar o peixe de seu
meio de existência (MARX; ENGELS, 2007 p. 46-47)

Obviamente que Marx e Engels não estavam escrevendo sobre a atividade pesqueira,
mas o exemplo utilizado por eles mostra que já naquela época os impactos ambientais
decorrentes do modelo de produção adotado poderiam determinar a “inexistência” dos peixes.
Ora, se a pesca artesanal ocorre em território limitado; se a existência do pescador artesanal é
condicionada pela existência do peixe; se os impactos ambientais decorrentes da exploração
da natureza para atender aos interesses da classe dominante pode inviabilizar a existência do
peixe, reside ai outro elemento da luta de classes que posiciona o pescador artesanal junto à
classe trabalhadora: a luta pela preservação do ambiente onde vive e, consequentemente, pela
sua sobrevivência ante os interesses das classes dominantes.

Considerações finais

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O presente trabalho buscou contribuir para o debate teórico que envolve os processos
educativos desenvolvidos com comunidades de pescadores artesanais e que estejam
comprometidos com uma visão de mundo que desenvolve suas análises na perspectiva da luta
de classes. Ainda que deva ser reconhecido seu caráter inconcluso, tal abordagem mostra-se
importante para evidenciar as particularidades que devem ser observadas quando do
planejamento, por pesquisadores ou educadores do campo popular, de ações investigativas e
educativas em educação ambiental, junto às comunidades de pescadores artesanais..

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RURALIDADES EDUCACIONAIS DE UMA ESCOLA PERTENCENTE A 8ª


COORDENADORIA DE EDUCAÇÃO

Felipe Costa da Silva- UFSM99


Juliana da Rosa Ribas- UFSM100
Marijane Rechia- UFSM101

Resumo

Este trabalho é um recorte reflexivo do projeto “Cartografias da educação básica em escolas rurais:
perspectivas para a formação e atuação de professores da região central do Rio Grande do Sul”, com o objetivo
de cartografar a realidade da educação básica rural através do reconhecimento e da valorização das ruralidades
de uma escola do campo. A pesquisa está pautada em uma metodologia quali-quantitativa, com o uso de
instrumentos de coleta através de observação in loco e questionário. A pesquisa contou com o apoio financeiro
do CNPq, onde nos oportunizou perceber que existe uma valorização pela comunidade do campo, e uma busca
por uma educação de qualidade, onde mesmo com todas as dificuldades ainda conseguem serem persistentes e
lutando por melhoria nas condições das escolas do campo.

Palavras-chave: Ruralidades; Formação; Professores .

Introdução

Este trabalho está vinculado ao Projeto, Cartografias da Educação Básica em Escolas Rurais:
Perspectivas para a formação e atuação de professores da região Central do Rio Grande do
Sul, objetiva cartografar a realidade da educação básica rural e analisar as informações
coletadas na pesquisa para identificar e construir o perfil profissional dos professores da
educação básica rural. A metodologia do trabalho tem como opção uma abordagem quali-
quantitativa, os instrumentos e técnicas de coleta de informações se deram através do
preenchimento de um questionário e da observação in loco, possibilitando conhecer

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Universidade Federal de Santa Maria/RS felipecostadasilva.96@gmail.com
100
Universidade Federal de Santa Maria/RS julianaribped@yahoo.com.br
101
Universidade Federal de Santa Maria/RS mjrechia@gmail.com
Financiamento- CNPQ

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efetivamente a escola, provocando reflexão sobre a realidade da educação do campo e o


sentimento de pertencimento da professora em relação ao espaço onde trabalham.

Os professores participantes da pesquisa acreditam em uma escola democrática e


promotora dos direitos humanos e são apoiados por toda a comunidade. Os pais são de
extrema importância para a escola, são participativos e mesmo com todas as dificuldades
enfrentadas não desanimam, estão sempre prontos para ajudar no que for preciso, por
valorizarem o espaço educativo e por acreditarem que aquele contexto pode transformar a
vida dos filhos. Possuem a compreensão da importância daquele contexto educativo em suas
vidas, expressam um olhar de valorização e pertencimento.

O sentimento de pertencimento está estabelecido, existe resiliência naquele ambiente,


pois mesmo com todas as dificuldades que a escola enfrenta a comunidade escolar não
desanima. Isto nos levou a perceber a preocupação existente de ensinar os seres humanos a
sempre buscar o melhor a cada dia e a cada problema para que possamos enfrentar e vencer,
pois a educação é uma expressão libertadora que movimenta o mundo. O desenvolvimento
desta pesquisa possibilita aos participantes constituir novas experiências e perspectivas
relativas à importância e à valorização da educação do campo.

Educação Básica Rural e o pertencimento dos professores na luta pela Educação Pública
e de Qualidade.

A Educação Básica rural passou a assumir um papel fundamental para a formação e


desenvolvimento das pessoas e da sociedade de um modo geral, neste contexto podemos
perceber que ao desenvolver o Projeto “Cartografias da Educação básica rural: perspectiva
educacional na região central do Rio Grande do Sul” conhecemos a realidade de 30 escolas do
campo, onde os professores nos relataram os seus anseios e enfrentamentos que as
comunidades estavam presenciando. Então, foi direcionado nestas visitas o uso da tecnologia
da informação a partir do questionário o online, como um método de coleta de informações
para professores e alunos, já que nestas comunidades o uso da tecnologia proporcionou uma
nova dimensão e uma autonomia relacionado a questão pedagógica e saberes docentes.

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O desenvolvimento do projeto tem a concepção de aprofundar a realidade das escolas


do campo a qual devemos progredir juntamente para que possamos observar as perspectivas
que as escolas se inserem e os contextos que os alunos estão colocados. Também podemos
reconhecer que os alunos possuem esforço, pois no andamento da pesquisa coletamos que os
alunos de algumas realidades passam algum tipo de dificuldade para chegarem a escola, neste
contexto as escolas querem ter visibilidade do trabalho que é realizado dentro destas
instituições de ensino.

A pesquisa tende a mostrar e dar visibilidade e dar voz para que essas escolas se
mostrem e concretizem seus projetos com muita satisfação e êxito, o trabalho destes
professores é enriquecedor na perspectiva que realmente lutam por uma educação de
qualidade.

A reflexão dos professores nos emocionaram pelo seguinte fato que eles encontram
muita dificuldade nas ações que envolvem a escola, mas mesmo assim esses professores tem
garra para que a educação no campo não termine e sim que sempre se fortaleça, pois esses
professores tem o entusiasmo que seus alunos possam olhar o mundo de uma forma diferente,
os professores pensam e tentam transmitir para seus alunos que o ensino público e de
qualidade é um direito deles, e que a educação é um fator importante que muda a vida das
pessoas, a cultura influência bastante na formação do ser humano e deste modo os professores
tem o papel importantíssimo de evidenciar que a cultura que os alunos se inserem é de grande
qualidade e não devem ter vergonha e sem sair do campo, mas sim criar possibilidades para
que esses alunos pensem no contexto que eles se inserem e também todas as questões ligadas
ao campo e a escola.

Ouvindo as narrativas dos professores percebemos que a ação pedagógica implica no


comprometimento dos alunos com a problemática de suas situações existenciais a partir da
realidade na qual se encontram inseridos, neste caso o sentimento de pertencimento ao meio
rural, valorizando-o, cuidando-o, dentro de uma ótica de sustentabilidade e cidadania
planetária, pois o local e o global se conectam continuadamente.

O homem assumirá a posição de sujeito de sua própria educação e, para que isso
ocorra, deverá estar comprometido com o processo de conscientização do cuidado de si, da

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natureza, dos outros, neste caso o cuidado com o ar, a água, os alimentos orgânicos
produzidos na horta escolar implicando numa qualidade de vida.

Acompanhamos a gestão democrática dos professores que se baseiam-se na


afetividade e amorosidade que eles tem com seus alunos e com luta pela educação, mesmo
enfrentando vários problemas no contexto escolar, sua determinação e luta pela qualidade da
educação nas escolas é o que faz a diferença no aprendizado dos alunos, a sua ressignificação,
reflexão e atuação como parte pertencente a comunidade aumenta seu comprometimento e
preocupação com o futuro das crianças e dos adolescentes para que essas tenham o direito de
continuar seus estudos dentro do seu espaço rural sem precisar sair da sua comunidade.

A realidade das escolas do campo nos mostrou a luta dos docentes pelo não
fechamento das escolas rurais multisseriadas e do campo, com a preocupação de sempre
poder desenvolver as atividades com êxito, para que seus alunos possam crescer e conquistar
seu espaço na sociedade, fixando sua residência no campo e atuando na agricultura familiar.

Este projeto de pesquisa tem como foco a educação básica em escolas rurais da região
central do Estado do RS buscando cartografar a realidade educacional de comunidades rurais
por meio das informações coletadas relacionando-as com os Bancos de Dados do MEC, do
INEP, do IBGE, do IDEB, do Censo Escolar para o Estado do Rio Grande do Sul objetivando
traçar o perfil dos professores rurais e de potenciais leitores literários, através de um
levantamento quanti-qualitativo das perspectivas educacionais para o ensino nos municípios
da região central do RS.
O trabalho permitirá ainda com base no Banco de Dados do Ministério da Educação
(MEC), do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP),
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), do Desenvolvimento da Educação
Brasileira (IDEB) e do Censo Escolar realizaremos um levantamento das escolas municipais e
estaduais rurais que atendem a região central do Estado do Rio Grande do Sul.
O processo de investigação a ser realizado permitirá traçar o perfil dos professores,
significações construídas sobre a trajetória docente, metodologias adotadas, saberes docentes
e concepções sobre o processo de construção da cultura escrita.
As evidências das pesquisas que temos realizado culminam em um fato comprovado
pelos dados do Censo Escolar (2011), divulgados pelo INEP, que apontam para a realidade

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escolar brasileira. Hoje cerca de 25% dos professores que atuam nas escolas de educação
básica não possuem diploma de ensino superior, ou seja, um contingente de mais de 530 mil
professores que não tiveram acesso à educação superior. Esses dados estão sendo atualizados
conforme o censo de 2014 e farão parte desta pesquisa.
O panorama geral de matriculados nos anos iniciais e finais da educação básica em
escolas rurais, Censo (2014), atinge um número considerável, porém sabemos que poderia ser
maior caso as escolas rurais tivessem as condições necessárias para permanência dos
estudantes.
Sobre a formação de professores que atuam em escolas do campo e que possuem
classes multisseriadas, segundo RIBAS( 2016, p.81):
Muitos dos professores que atuam em escolas multisseriadas não foram concursados,
mas convidados pelo poder instituído para lecionar. Sendo que, a partir de 1930,
segundo estudos de Vicentini e Lugli (2009), começa-se a instaurar, no Brasil, o
processo de seleção de professores. É importante ressaltar que muitas famílias
desconhecem que o Rio Grande do Sul tem o maior número de professores com
graduação que atuam em escolas multisseriadas. Segundo dados do Inep (2012),
cerca de 75,88 % possuem o Ensino Superior. (RIBAS, 2016, p.81).

Ainda, segundo a autora, ter uma graduação ainda não é o suficiente, pois:

Ter Ensino Superior para atuar em meio às turmas multisseriadas não é o suficiente,
pois, segundo Santos e Moura (2010), os cursos de formação de professores acabam
deixando de lado a multisseriação, o que faz com que as turmas multisseriadas sejam
alvos do silenciamentos, de apagamento, uma vez que esse silenciamento e
abandono por parte das políticas públicas contribuiu para que se construísse um
olhar preconceituoso sobre as turmas multisseriadas, com o qual passaram a serem
vistas como responsáveis pela má qualidade do ensino nas escolas do campo.
(RIBAS, 2016, p.82).

Entendemos que existe uma visão errônea que gira em torno do ensino em escolas do
campo com turmas multisseriadas, pois se alega que o ensino é sinônimo de fracasso e atraso,
mas é importante ressaltar que não é o fato de serem escolas do campo com turmas
multisseriadas que as faz de inferior qualidade, mas o fato de que se adotam para essas turmas
modelos transplantados de currículo urbano dentro do rural e que também não existe uma
formação especifica para se atuar com as turmas multisseriadas.

Produziu-se um trabalho significativo no campo da educação rural, porque


pesquisamos as tendências e perspectivas que abrangem a educação do campo. E também
realizamos um levantamento acerca da bibliografia específica sobre a educação do e no

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campo, sobre as ruralidades, valorizando o meio rural. Representamos o Gepfica frente às


escolas participantes da pesquisa, construímos diários de campo que nos possibilitaram
escrever sobre a atual situação das escolas de ensino rural da região central do Rio Grande do
Sul.

Com este projeto buscou-se conhecer e analisar a realidade da Educação Básica Rural,
por meio das visitas a campo realizada nas escolas estaduais com abrangência a esta
coordenadoria, com isso foi realizado o levantamento de informações e indagações através de
um questionário semi-estruturado, após o estudo aprofundado sobre estas informações obtidas
foi traçado o perfil dos professores desta modalidade de ensino. As escolas que foram
visitadas foram as seguintes :

ESCOLA CIDADE

E.E.E.M Ijucapirama Jaguari

E.E.E.F São Pedro de Alcântara Cacequi

E.E.E.F 15 de Março Júlio de Castilhos

E.E.E.F Ana Lobler Nova Palma

E.E.E.F Arroio Grande Santa Maria

E.E.E.M João Aguiar São Francisco de Assis

E.E.E Princesa Isabel Santa Maria

E.E.E.F Joaquim José da silva Júlio de Castilhos


Xavier

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E.E.E.F José Elidoro Neves Vila Nova do Sul

E.E.E.F Augusto Steinhauzen Toropi

E.E.E.M Reinoldo Block São Sepé

E.E.E.F Carlos Gomes Júlio de Castilhos

E.E.E.F Dário Vitorino Chagas Cacequi

E.E.E.F Roque Gonzales São Francisco de Assis

E.E.E.F Dom Érico Ferrari Nova Palma

E.E.E.F Rafael Iop São João do Polêsine

E.E.E.F João Vianey Ivorá

E.E.E.F Almiro Beltrame Santa Maria

E.E.E.F Indígena Yvyra Já Santa Maria


Tenonde Vera Miri
E.E.E.F Santa Júlia Júlio de Castilhos
E.E.E.F Luis Xavier Mata
E.E.E.F São João Batista Formigueiro
E.E.E.F Nossa Senhora Aparecida Júlio de Castilhos
E.E.E.M João Octávio Nogueira São Francisco de Assis
Leiria
E.E.E.F São Domingos Sávio Faxinal do Soturno
E.E.E.F João Zanella Nova Palma
E.E.E.M Itaara Itaara

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E.E.E.F Boca do Monte Santa Maria


E.E.E.F Santo Isidoro Júlio de Castilhos

E.E.E.F Ironita Witt Marques Jaguari

O CAMPO ESTÁ VIVO: REFLEXÕES SOBRE A VALORIZAÇÃO DA


IDENTIDADE DOS SUJEITOS.

A escola Santa Júlia, localizada no município de Júlio de Castilhos. Chegamos à


escola por volta das 09h20min, pois primeiro deixamos nossas colegas em outra escola.
É escola totalmente diferenciada, não por se tratar de um assentamento, pois isso já era
de nosso conhecimento, mas pelas condições das salas de aula, um pouco diferente das outras
escolas estaduais rurais da 8ª CRE.
Através das falas relatadas pelos professores que atuam na escola, é possível perceber
a satisfação, vontade e alegria com que estão trabalhando. Estão focadas, ensinando com
muita responsabilidade e comprometimento para garantir a aprendizagem aos alunos.
Elas não deixam que as dificuldades apresentadas pela estrutura física, superem as
qualidades didáticas que elas têm para oferecer às crianças. Ao entrar na sala de aula foi
possível comprovar, além dos diversos trabalhos expostos e a organização do material
educativo, um ambiente harmônico e muita esperança por um ensino melhor.
Elas fazem todos os serviços da escola, desde a limpeza até a merenda das crianças.
Segundo seus relatos isso só as aproxima dos alunos e as motiva para continuar lutando pela
qualidade da educação e pela valorização da escola do campo.
Há duas classes multisseriadas: 1º, 2º e 3º anos e 5º e 6º. Não há, neste ano, alunos
matriculados no 4º ano.
Neste mesmo dia de nossa visita, estava sendo comemorada a semana farroupilha. Era
sexta feira e o dia do gaúcho seria no domingo. As crianças estavam usando vestimentas
gauchescas e seus pais estavam reunidos na cozinha, preparando um carreteiro para o almoço.

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De acordo com o relato das professoras, os pais são atenciosos e bem participativos na vida
escolar dos seus filhos.
Os pais possuem um histórico bem simples; são pessoas humildes, do campo. A
maioria deles reside no assentamento. São presentes e cobram os direitos dos seus filhos.
Há na escola um projeto de construção de uma estufa para o cultivo de plantas. Ainda
não há uma estrutura mas já escolheram o local onde iniciarão uma horta ainda durante este
ano.
É gratificante ver tamanha valorização que a comunidade ressalta para a educação
púbica de qualidade, e mesmo com todas as dificuldades ainda conseguem ser persistentes e
esperançosos na busca de melhores condições para as escolas estaduais rurais.
Entende-se conforme Ribas e Antunes (2014 p. 100) '' Que a educação do campo é
construída a partir das demandas, da luta e das experiências dos sujeitos que vivem no
campo.'' Ela questiona a ausência de políticas educacionais para os povos do campo, o modelo
de uma educação empobrecida, inferiorizada, destituída dos saberes do trabalho, da cultura, e
do contexto do campo. Assume a identidade dos povos do campo, as suas lutas, e se vincula
ao debate do campo e do modelo de desenvolvimento, da luta pela terra, pelo trabalho, por
políticas agrícolas e pela Reforma Agrária.

Dessa forma, ao estar pensando em uma Educação do Campo dentro de uma política
educacional, é preciso que se reconheça a identidade da escola do campo. Segundo as
Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (2002), esta
identidade é definida a partir dos sujeitos do campo, do modo como estes organizam seu
cotidiano, dos saberes e da cultura que produzem enquanto transformam a terra e o próprio
contexto onde estão inseridos, bem como dos conhecimentos e da cultura historicamente
acumulados, produzidos na relação dialética entre o campo e a cidade, no modo de trabalho e
organização da sociedade.

Corrobora-se Ribas e Antunes (2014 p. 100), '' quando falam que para a escola do
campo possa ter sua identidade reconhecida e assumida no trabalho pedagógico escolar.''
Coloca-se como fundamental reestruturar os currículos e a formação de professores, onde se
leve em conta o entorno e o contexto em que esses sujeitos estão inseridos. Entende-se, que
pelo fato de a Educação do Campo, nascer através das lutas dos camponeses, os traz como

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sujeitos de políticas e não meros consumidores de ações educativas,de modo que suas
experiências, seu contexto, sua cultura, seus conhecimentos e suas identidades possam ser
referências para a formulação de políticas públicas, que venham valorizar e respeitar esses
sujeitos dentro de suas especificidades, singularidades e particularidades.

Considerações Finais

Todos os fatos relacionados sobre a escola divulgada neste artigo, fazem com que
tenhamos esperança sobre a qualidade da educação nas escolas estaduais rurais, pois mesmo
diante de tantas dificuldades é possível observar que ainda existem profissionais focados no
trabalho com seus alunos e lutam para manter as escolas rurais do/no campo funcionando nas
localidades em que atuam.
Devido a isso o grupo GEPFICA, através do projeto de pesquisa “Cartografias da
educação básica em escolas rurais: perspectivas para a formação e atuação de professores
da região central do Rio Grande do Sul”, tem se dedicado desde 2007 a pesquisas sobre a
educação do campo, pois acredita que através da persistência e luta pela educação
conseguiremos contribuir com a visibilidade diante dos governantes para que no futuro sejam
criadas políticas públicas que atendam esses contextos educacionais.
Das 30(trinta) escolas estaduais rurais da 8ª CRE visitadas, destacamos esta, pois
mesmo cada uma tendo suas particularidades, nesta escola, encontramos a motivação dos
professores que mesmo tendo que desempenhar todas as tarefas diárias, encontram alegria e
se mantêm comprometidos com a sua atuação como professor, assim como a participação dos
país e alunos.
A diretora através de uma gestão participativa e democrática consegue manter a união
e a perseverança de toda a comunidade reunindo toda comunidade escolar. Essas ações
tornam a escola uma aliada na manutenção do amor pela terra e a permanência das famílias
nas localidades rurais.
Sendo assim, continuaremos divulgando as escolas visitadas, cada uma com suas
características, sendo que todas com a mesma finalidade de manter suas escolas em

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funcionamento e em dar uma educação pública e de qualidade aos seus alunos, sempre
buscando o respeito pela sua identidade cultural e histórica do sujeito do campo.

Referências Bibliográficas

DIRETRIZES OPERACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA nas Escolas do Campo. In:


KOLLING, E. J.; CERIOLI, P. R.; CALDART, R. S. (Org.). Educação do Campo: identidade
e políticas públicas. Brasília: Resolução CNE/CEB, n. 1, 3 abr. 2002. n. 4. (Coleção Por uma
Educação do Campo).
RIBAS, J. da R. O fazer-se professor em turmas multisseriadas na região de santa maria/rs:
desenvolvimento profissional e saberes experenciais. 2016. (Dissertação de
Mestrado).Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria- 2016
RIBAS, J. da R; ANTUNES. H.S. OLHARES PARA A EDUCAÇÃO DO CAMPO: EM
BUSCA DA CONSTRUÇÃO DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO. 2014. In:
http://dx.doi.org/10.5902/2176217114603
SANTOS, F. J. dos; MOURA, T. V. Políticas educacionais, modernização pedagógica e
racionalização do trabalho docente: problematizando as representações negativas sobre as
classes multisseriadas. In: ROCHA, M. I. A.; HAGE, S. M. (Orgs.). Escola de Direito:
reinventando a escola multisseriada. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2010.
VICENTINI, P. P.; LUGLI, R. G. História da profissão docente no Brasil: representações em
disputa. São Paulo: Cortez, 2009.
PEREIRA, L. M. Os Kaiowá em Mato Grosso do Sul. Dourados-MS: Editora UFGD, 2016.

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HISTÓRIA DA PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA: um possível percurso


discursivizado pelas licenciaturas em educação do campo

Lucas Martins Flores102

Resumo

Neste texto, proponho reflexões sobre uma história da Pedagogia da Alternância como vem sendo
discursivizada pelos Projetos Pedagógicos dos Cursos de Licenciatura em Educação do Campo
(LEDOC) do Rio Grande do Sul. Para tanto, utilizo-me dos aparatos teóricos-metodológicos da
Análise de Discurso de linha francesa e da História das Ideias Linguísticas que permitem interpretar o
funcionamento do discurso atravessado pela história e interpelado pela ideologia. Nesse percurso,
observo que as LEDOC nomeiam a alternância de duas diferentes formas – pedagogia da alternância
e/ou regime de alternância, - mas que, inicialmente, produzem efeitos de sentidos no mesmo e não na
diferença. É o mesmo e o diferente das palavras “pedagogia” e “regime” que significam pela história e
pela língua em uma relação entre o já-dito, o que se está dizendo ou o que há de se dizer.

Palavras-chave: História; Discurso; Pedagogia da Alternância; Educação do Campo.

Definindo caminhos...

Para situar o propósito deste trabalho, trago à baila o texto Expansão das licenciaturas
em Educação do Campo: desafios e potencialidades (2015), produzido pela Professora
Mônica Castagna Molina, da Universidade de Brasília, em que a autora apresenta, a partir do
Observatório da Educação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), a
pesquisa intitulada “Políticas da Expansão da Educação Superior no Brasil”, cujo período de
execução é de 2013 a 2017. Nesse texto, além de apresentar um panorama geral sobre a
Educação de Ensino Superior no país, ela discorre sobre o histórico de criação da Licenciatura
em Educação do Campo, sobre os princípios que orientam a matriz político-pedagógica deste
curso, sobre os desafios e potencialidades que podem vir a serem objetos de estudos e de
acompanhamento.
De acordo com Molina, de 2008 em diante, 42 cursos de Licenciatura em Educação do
Campo foram implantados no Brasil por Universidades Federais e Institutos Federais de

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Professor do Instituto Federal Farroupilha Campus Jaguari e Doutorando em Letras pela Universidade
Federal de Santa Maria, lucasmflores@gmail.com

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Educação, Ciência e Tecnologia. No Rio Grande do Sul, cinco instituições ofertaram essa
Licenciatura: Universidade Federal da Fronteira Sul (Campus Erechim e Laranjeiras do Sul),
Universidade Federal do Pampa, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Universidade
Federal do Rio Grande e Instituto Federal Farroupilha103.
Nesse ponto, é que inicio um percurso de constituição da compreensão do que me
interessa refletir neste texto, a Pedagogia da Alternância, “metodologia104” adotada nesses
cursos, por isso, a partir desse levantamento como apresentado por Molina é que faço
recortes, para traçar algumas reflexões sobre como a Pedagogia da Alternância é apresentada
pelos Projetos Pedagógicos dos Cursos ofertados no Rio Grande do Sul.
Em um processo que me encontro no presente momento, de constituição de um
arquivo que me servirá para futuras reflexões em um trabalho de tese de doutoramento em
Letras sobre a temática da Educação do Campo e Pedagogia da Alternância, importa-me
definir arquivo como “campo de documentos pertinentes e disponíveis sobre uma questão”
(PÊCHEUX, [1975] 1994, p. 57), para então, fazer recortes desse arquivo para poder
reconhecer as evidências práticas que organizam essas leituras e, nas palavras de Pêcheux
(1994) “mergulhar a leitura literal (enquanto apreensão do documento) numa leitura
interpretativa”, constituindo assim, um trabalho de relação do arquivo com ele mesmo, em
uma série de conjunturas, ao mesmo tempo em que se dá um trabalho da memória, da história
e da língua.
Interessante observar que essa “escolha” (primeiro recorte) de trabalhar com os
Projetos Políticos Pedagógicos do Curso de Licenciatura em Educação do Campo das
instituições do Rio Grande do Sul, já é um recorte realizado para a constituição desse arquivo.
Na posição que assumo – de alguém que tenta transitar na Análise de Discurso de perspectiva
pecheuxtiana – isso se justifica, porque o que me interessa não é a abrangência de leitura
sobre o arquivo, nem a quantidade de fontes consultadas, mas o tratamento que esse arquivo e
essas fontes merecem.
Orlandi (1984, p. 14) afirma que “recorte é uma unidade discursiva”. E por unidade
discursiva, “entendemos fragmentos correlacionados de linguagem-e-situação”. “Assim, um

103
Estes dados referem-se ao segundo semestre de 2016, período em que tal trabalho começou a ser
desenvolvido.
104
A Pedagogia da Alternância é tratada pelos Marcos Normativos da Educação do Campo (2012) como uma
“metodologia pedagógica”, normatizada por meio do Parecer nº 01/2006 (BRASIL, 2012, p. 41).

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recorte é um fragmento da situação discursiva”. Desse modo, um segundo recorte que faço
para apresentar tal trabalho, está direcionado ao que me proponho a ler nestes Projetos
Políticos Pedagógicos, que se trata sobre a proposta de funcionamento do Curso de
Licenciatura em Educação do Campo: a Pedagogia da Alternância. Esses recortes que ora
realizo se dão pelo fato de meu interesse em descrever o funcionamento do discurso sobre a
Pedagogia da Alternância nesses documentos, compreendendo que o lugar em que situo tal
reflexão não se baseia em uma descrição do texto, mas sim, uma teorização sobre o discurso,
observando o seu funcionamento a partir de um quadro epistemológico em que se unem o
histórico, o linguístico, atravessado por uma teoria psicanalítica em que enquadra a noção de
sujeito.
Nesse sentido, constituo o corpus deste trabalho (terceiro recorte), pelos recortes
discursivos (RD), compreendendo: a) os critérios vinculados à questão de pesquisa; b) que
essas materialidades discursivas pertencem a espaços e tempos discursivos distintos; c) que
esses recortes projetam gestos de interpretação que permitem a compreensão de sentidos além
de uma memória institucionalizada, mas especialmente, efeitos de sentido nesse espaço tempo
e d) que esses recortes – regularidades entre os PPCs – compreendem uma totalidade ilusória
dos sentidos sobre a Pedagogia da Alternância.
Assim, o objetivo deste trabalho é, através de nosso gesto interpretativo, refletir sobre
como os Projetos Pedagógicos dos Cursos de Licenciatura em Educação do Campo do Rio
Grande do Sul apresentam e descrevem a Pedagogia da Alternância? A partir dessa reflexão,
projeto delinear o horizonte de retrospecção da Pedagogia da Alternância, com base em
Sylvain Auroux (2008), traçando um percurso histórico de como ela foi implantada no Brasil
e refletir sobre a produção do conhecimento proposta pela alternância de espaços e tempos.

Caminhando pela Licenciatura em Educação do Campo...

A Licenciatura em Educação do Campo é um “novo” curso de graduação, que vem


sendo implantada desde 2007 pelas universidades, com o apoio do Ministério de Educação.
“O curso propõe-se atender a uma nova demanda, as populações do campo, que
historicamente lutam por uma educação diferenciada de qualidade, que respeite as

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especificidades da vida neste contexto”, afirma o PPC da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul.
De acordo com Caldart (2011, p. 96), o curso nasceu das proposições da II
Conferência Nacional por uma Educação do Campo, realizada em 2004. Por meio de uma
comissão instituída pelo Grupo Permanente de Trabalho de Educação do Campo da Secretaria
de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad) e com representante do Iterra,
a proposta específica começou a ser construída no MEC, em 2005, mas, a autora afirma que
foi em novembro de 2006, que o MEC decidiu convidar universidades para a realização de
projetos-piloto do curso.
Caldart (2011, p. 96) menciona que quatro projetos-piloto foram desenvolvidos: o
primeiro, uma parceria entre Iterra e UnB, com aprovação da criação institucional do curso
realizada em julho de 2007, com o vestibular e início da primeira etapa ainda em setembro de
2007. Ela explica que essa turma aconteceu em Veranópolis, RS, na sede do Iterra, com uma
organização curricular de etapas constituídas pela alternância entre Tempo Escola e Tempo
Comunidade. Os outros projetos-piloto são da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG), Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Universidade Federal de Sergipe (UFS)
(CALDART, 2011).
A partir do início das turmas dos projetos-pilotos, o MEC criou um programa
específico de apoio à implantação de cursos de Licenciatura em Educação do Campo (o
Procampo), lançando anualmente editais de convocação às Instituições de Ensino Superior
públicas para que apresentem projetos de criação da nova Licenciatura, dentro dos mesmos
parâmetros da proposição inicial. Isso é exposto no PPC da Licenciatura em Educação do
Campo de todas as instituições analisados, como por exemplo, o Instituto Federal Farroupilha
Campus Jaguari que afirma: “a proposta está em consonância com o Edital de Chamada
Pública Nº 02, de 31 de agosto de 2012, chamada pública para seleção de Instituições
Federais de Educação Superior – IFES, objetivando a criação de cursos de Licenciatura em
Educação do Campo”.
Nesse edital (2012), é claramente exposto como devem ser apresentados os projetos de
cursos para serem aprovados pelo edital, no que diz respeito ao seu funcionamento:

3.5 – Os projetos apresentados deverão:

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c) apresentar organização curricular por etapas equivalentes e semestres regulares


cumpridas em Regime de Alternância entre Tempo-Escola e Tempo-Comunidade.
Entende-se por Tempo-Escola os períodos intensivos de formação presencial no
campus universitário e, por Tempo-Comunidade, os períodos intensivos de formação
presencial nas comunidades camponesas, com a realização de práticas pedagógicas
orientadas (BRASIL105, 2012, p. 2).

Nesse momento, em que descrevo o processo de constituição das Licenciaturas em


Educação do Campo, a partir de um edital do MEC, tentando lançar-me a um gesto
interpretativo sob os PPCs dos Cursos ofertados por esse edital no RS, chama-me atenção o
modo como a UFRG “responde às orientações básicas propostas pelo Edital” (PPC UFRGS,
p. 8):

c) organizar metodologicamente o currículo por alternância entre Tempo/Espaço e


Universidade e Tempo/Espaço Comunidade, de modo a permitir o necessário
diálogo entre saberes teóricos-tecnológicos e saberes tradicionais culturais oriundos
das experiências de vida no campo (PPC UFRGS, p. 9).

Nessa “resposta às orientações”, assim posta no projeto do curso, o currículo organiza-


se nomeando diferentemente do Edital. As orientações do edital trazem a nomeação “regime
de alternância”. No entanto, nessa “resposta”, há um apagamento da nomeação “regime”.
Nesse processo discursivo, os sentidos podem ser um, mas também podem ser outros. A não
presença da nomeação “regime” ou “alternância”, como se apresenta no decorrer do PPC da
UFRGS, provoca efeitos de sentidos que merecem ser compreendidos. Que memórias
discursivas entram nesse jogo de palavras que significam igualmente, mas de modo diferente?

Caminhando pela pedagogia da alternância...

Considerando que “existem muitas formas de aplicar e, portanto, de compreender a


Alternância” (CALVÓ e GIMONET, 2013 p. 42) na Pedagogia da Alternância ou no Regime
de Alternância, nesta seção apresento um caminho histórico sobre a Pedagogia da
Alternância, levando em consideração também como ela é apresentada nos Projetos de Cursos
de Licenciatura em Educação do Campo no Rio Grande do Sul. Não me é tarefa fácil refletir
sobre o funcionamento da alternância, tendo em vista que preciso distanciar-me de minha

105
Edital organizado pela Secretaria de Educação Superior (SESU), Secretaria de Educação Profissional e
Tecnológica (SETEC) e Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI).

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prática cotidiana no Curso de Licenciatura em Educação do Campo do Instituto Federal


Farroupilha Campus Jaguari.
A distância é grande entre a ideia ou o conceito e a prática de alternância, e aqueles
que percorrem logo o percebem (Gimonet, 2007, p. 19). Nas Maisons Familiales Rurales
(MFR) na França, elaborou-se “uma metodologia progressiva” no tempo e ajustada em função
dos contextos, da evolução das formações, dos públicos recrutados, até mesmo das exigências
administrativas. E de lá para cá, conhecimentos teóricos práticos foram sendo constituídos e
transformados. Como se vê, o público da Pedagogia da Alternância em suas origens eram
públicos específicos, o que vemos hoje, é essa prática sendo aplicada em cursos de formação
de professores do/no/para o campo em Universidades e Institutos Federais brasileiros.
Desse modo, Auroux (2008) explica que o ato de saber (a produção do conhecimento)
“não é ele mesmo algo sem relação à temporalidade”, ou seja, é necessário tempo para saber
sobre um conhecimento instantâneo. É a partir de um horizonte de retrospecção, isto é,
conjunto de conhecimentos antecedentes que fazem com que se represente a Pedagogia da
Alternância hoje, talvez, diferentemente, do modo como era em outros lugares e momentos.
Isso não significa afirmar que uma ou outra está certa ou errada. “É necessário tempo para
saber” (Auroux, 2008, p. 141).
Da mesma maneira que o horizonte de retrospecção constitui saberes anteriores,
segundo Auroux, o horizonte de projeção antecipa, idealiza, imagina, uma projeção do que
está por vir. Na França, quando da criação das MFR, criaram-se alguns traços fundamentais
de uma identidade comum, mas evidentemente que previa parâmetros constantes e evolutivos
(Gimonet, 2007, p. 14). O que se tem hoje, em termos da legislação da Pedagogia da
Alternância é a última Nota Técnica Nº 3/2016 da SECADI que afirma que:

As Licenciaturas devem integrar programas institucionais de ensino, pesquisa e


extensão, sendo ofertados na modalidade presencial, com a garantia da infraestrutura
adequada e desenvolvimento pelo Regime de Alternância, com vivências dos tempos
educativos – Tempo Escola (TE) e Tempo Comunidade (TC) (BRASIL, 2016).

Essa produção do conhecimento sobre a Pedagogia da Alternância vai além de onde


dizem nascer seus marcos iniciais, nesse percurso é que me interessa também compreender
como se dá esse funcionamento do processo discursivo que vem da “pedagogia da
alternância” para “regime de alternância”, como mencionado na última nota técnica em que,

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em nenhum momento, nomeia-se “pedagogia”, mas sim “regime”. Isso justifica meu interesse
em refletir sobre essa memória da/ na atualidade nesse processo discursivo. No Edital (2012),
como apresentado anteriormente, utiliza-se “regime”, na literatura e nos PPCs dos Cursos,
utiliza-se “pedagogia”, na última nota técnica (2016), “regime”. Entre “regime” e
“pedagogia”, os sentidos não estão somente nas palavras, mas também na relação com a
exterioridade, nas condições em que elas são produzidas. “Regime” e “pedagogia” significam
pela história e pela língua.
Sobre esses marcos iniciais da Pedagogia da Alternância, Calvó e Gimonet (2013)
observam que a Pedagogia da Alternância “não é monopólio” no que diz respeito a sua
criação, porque já tem séculos. Eles destacam nesse processo, os Compagnos du devoir ou
aprendizes-companheiros e seu Tour de France, construindo castelos, palácios e catedrais; os
monges e a construção de monastérios na idade média que já aplicavam uma forma de
alternância trabalho-escola; os irmãos das escolas cristãs e suas escolas dominicais.
O livro Educação do Campo: origens da Pedagogia da Alternância no Brasil de Paolo
Nosella (2012) conta as origens da Pedagogia da alternância no Brasil, e é uma obra de caráter
documentativo, de acordo com o autor, em que se publica a dissertação de mestrado,
defendida na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, em março de 1977, cujo título é:
Uma nova educação para o meio rural: sistematização e problematização da experiência
educacional das escolas da família agrícola do Movimento de Educação Promocional do
Espírito Santo. O autor não é apenas um historiador observador das origens dessa experiência
pedagógica, sobretudo, participou diretamente, desde 1968, do trabalho de criação das
primeiras Escolas da Família Agrícola (EFAS) da Pedagogia da Alternância no Brasil
(NOSELLA, 2012, p. 18).
Nosella para introduzir sobre a vida do Padre Granereau, afirma que “A história de
uma ideia é também é história de um homem e, de certa forma, é também a história da época e
dos problemas vividos por ele” (2012, p. 45). O Padre Granereau, nascido em 1885, na
França, desde a sua juventude, o padre preocupou-se com o desinteresse, por parte do Estado
e da Igreja, frente ao problema do homem do campo. Na época, acreditava-se que para os
filhos de agricultores se tornarem sábios e instruídos, deveriam necessariamente mudar para
os grandes centros urbanos, observa Nosella. Dessa necessidade de traçar um novo olhar para
os homens do campo, para a escola rural, surgiu a Pedagogia da Alternância. Vê-se

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claramente o funcionamento da ideologia sendo posta em evidência: dois “aparelhos


ideológicos”106: a) de estado e b) religioso funcionando sob um sujeito padre. Que
movimentos escolares da época na França proporcionaram esse processo de valorização ao
que está na cidade e ao que está no campo de forma diferenciada? Que políticas aí estão em
jogo? Qual a relação da igreja nesse processo? O que ela pregava? E seria o que a igreja
pregava a mesma posição do padre?107
A Europa, nesse período pós-primeira guerra mundial, vivia uma efervescência de
pensamentos liberais, socialistas, nacionalistas, e social cristão, corroboram Andrade e
Andrade (2012, p. 63). De acordo com os autores,

Em 1891, o papa Leão XIII (1878-1903), sensibilizada pela “condição dos


operários” lança a encíclica Rerum Novarum. Com esse documento a Igreja Católica
Apostólica Romana – ICAR assume a questão social. Nesse momento, a questão
agrária e a situação dos camponeses não constitui a preocupação principal da Igreja.
Pouco depois, o papa Pio XI (1922-1939), com a encíclica social Quadragesimo
anno, contribui para o surgimento da Ação Católica Geral e na sequência com a
Ação Católica Especializada. Esse é um período que a ação da Igreja vai de encontro
à situação dos camponeses. A Ação Católica Especializada no Brasil vai ser
fundamental na formação de lideranças e organização dos camponeses no período
entre 1950 a 1970, principalmente a Juventude Agrária Católica – JAC (ANDRADE
e ANDRADE, 2012, p. 63).

Como se percebe as primeiras MFR teve grande contribuição dos setores progressistas
da Igreja Católica e no Brasil não foi diferente. Em 1968, uma organização filantrópica e sem
fins lucrativos de inspiração cristã constitui o Movimento de Educação Promocional do
Espírito Santa (MEPES) liderado pelo padre jesuíta Humberto Pietrogrande, sacerdote de
Anchieta – ES, afirmam Andrade e Andrade (2012, p. 64), de acordo com Nosella. Esse
movimento de criação dessa fundação pode ser visualizado no fragmento abaixo em que
Nosella (2012, p. 64) apresenta um fragmento dos Cadernos (1970), demonstrando os
envolvidos: estado e igreja:

No dia 25 de abril de 1968, na Câmara Municipal de Anchieta, uma Assembleia de


agricultores dos municípios assinava a ata constitutiva do Movimento de Educação
Promocional do Espírito Santo (MEPES), que tinha como finalidade a promoção de
pessoa humana, através de uma ação comunitária que desenvolva a mais ampla

106
ALTHUSSER, Louis. Ideologia e Aparelhos Ideológicos de Estado. Martins Pontes.
107
Tais questionamentos referem-se a estudos possíveis a serem realizados futuramente, uma vez que não há
espaço para seu desenvolvimento neste texto no momento.

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atividade inerente ao interesse da agricultura e principalmente no que tange à


elevação cultural, social e econômica dos agricultores. Na Junta Diretora do MEPES
se encontram os representantes da Companhia de Jesus, dos Vigários dos Prefeitos,
da Associação dos Amigos Italianos e da ACARES (Associação de Crédito e
Assistência Rural do Espírito Santo) (NOSELLA, 2012, p. 64).

Além do MEPES, fundado em 1968, de acordo com Araújo (2005, p. 90), fundou-se
também a Associação dos Amigos do Estado Brasileiro do Espírito Santo – AES,
Organização não governamental, criada na Itália, para ajudar no processo de implantação,
assinatura de convênios e arrecadação de recursos para a manutenção das escolas que, além de
dar esse suporte, viabilizou intercâmbios entre brasileiros e italianos. Vale ressaltar que esse
processo de implantação dessas escolas no Brasil se deu no auge da ditadura militar no Brasil,
que de acordo com Araújo (2005)

[...] período em que o campo sofreu um processo de tal abandono por parte dos
poderes públicos, excluindo a agricultura familiar. As políticas públicas para o
campo, naquela época, estavam centradas na grande produção agropecuária, no
modelo de agricultura patronal, voltado para as monoculturas e o mercado externo,
associado à sofisticação tecnológica, conhecida como modernização conservadora
(ARAÚJO, 2005, p. 91).

Traçado esse percurso do processo histórico de implantação das primeiras atividades


com a proposta pedagógica da alternância em escolas familiares rurais, passamos a caminhar
pela Pedagogia da Alternância como posta pelos Cursos de Licenciatura em Educação do
Campo.

Caminhando pelos projetos de cursos...

Em A Historicidade das Ciências, Sylvain Auroux (2008), traça um percurso


filosófico para explicitar que a produção de saber como conhecimento, faz-se necessário
distinguir saberes tácitos dos saberes que configuram formas de representação.
O filósofo francês observa que

a relação do ser humano com seu ambiente (sobrevivência, produção de bens,


organização) passa necessariamente pela colocação em funcionamento de elementos
cuja construção e conservação dependem de externalidades e/ou são externalidades;
tanto quanto estes elementos referem-se à representação, trata-se do que se chama
“conhecimento” ou “saber” (AUROUX, 2008, p. 125).

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Nesse sentido, os saberes tácitos constituem nossas práticas cotidianas, de acordo com
Auroux (2008, p. 125), “não há saber sem transmissão” e o saber tácito pode ser ocultado,
mas “transmissível”. Essa transmissão se dá pelas técnicas. “Assim, as técnicas têm sido
primeiro conhecimentos não representados, transmitidos por aprendizagens e imitação”. São
esses saberes tácitos que a Pedagogia da Alternância enfatiza como um processo de
inicialização da produção do conhecimento dentro do curso, a partir de seu funcionamento em
dois tempos: tempo escola, ou “tempo universidade” (como chamado pelo PPC do UFRGs) e
tempo comunidade. A seguir, trago um recorte discursivo de um PPC, que demonstra essa
valorização, enquanto necessidade de “esforço na apropriação” dos docentes de que seja desse
modo e não de outro, dos tempos e espaços no processo formativo da proposta da alternância
no Curso:

Esta opção, para além de metodológica, se traduz em uma opção política, exigindo
por parte dos professores do curso um esforço na apropriação, problematização e
proposição do próprio método. Desse modo, serão delineados momentos específicos
para planejamento, elaboração e organização dos chamados Tempos Educativos:
Tempo Escola (TE) e Tempo Comunidade (TC) que fundamentam a Metodologia da
Alternância (UFFS, p. 41).

O PPC apresenta como uma “opção” a escolha pela Alternância, no entanto, como
visualizamos anteriormente, isso foi politicamente definido pelo edital, como se explica
adiante no próprio excerto “opção política”, isso demonstra o funcionamento da interpelação
pelo estado na manutenção de uma proposta de ensino. Além disso, esse recorte discursivo
apresenta a Pedagogia da Alternância como uma metodologia, definindo os espaços de
“tempo” e “espaço” ocupados que permitem um diálogo entre os saberes “técnico-
tecnológicos” e os saberes “das experiências de vida”. Importa-me aqui refletir brevemente
sobre essa “representação” dos saberes enquanto discursivização produzida por sujeitos em
diferentes espaços: a) de um lado, o sujeito que produz conhecimento científico, o da
academia e b) de outro, um sujeito do campo, no campo (rural) que discursiva saberes para os
seus, através da transmissão de aprendizagens e imitação. Encontra-se aí, talvez, a
preocupação como apontada no PPC da UFFS (RD2), de que exige “por parte dos
professores” “um esforço na apropriação, problematização e proposição do próprio método”.

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Essas preocupações apontam para o que Auroux (1998, p. 126) corrobora, [...] “sabe-
se que se sabe aquilo que se sabe. Evidente, às vezes não é absurdo dizer que se sabia, mas
que não sabia o que se sabia”, demonstrando que nesse jogo de representações, o sujeito
precisa ser encarado não como um sujeito biológico, objetivo, que sabe tudo, que sempre quer
ter todas as respostas e que quando não as tem, representa tê-las, mas um sujeito que
representa (no inconsciente) e é representado (no real) a todo momento, um sujeito sócio
histórico que interpela e é interpelado pela língua e pela ideologia em seus processos
discursivos nos seus diferentes tempos e espaços, que falha, que se contradiz. É nesse sentido,
que concordo com Petri (2004, p. 25), quando afirma que a representação está sempre sujeita
à opacidade da linguagem e dos sentidos.
No recorte do PPC que trago abaixo, demonstra-se como se dá o funcionamento
prático das organizações dos tempos escola e comunidade no Curso de Dom Pedrito. Ao
contrário das outras organizações, o PPC da Licenciatura em Educação do Campo de Dom
Pedrito/RS utiliza-se unicamente da nomeação “regime” como se percebe no recorte abaixo:

A Organização curricular em regime de alternância, com base no Parecer CNE/CEB


n. 1/2006 – prevê dias letivos organizados em tempo escola e tempo comunidade,
com etapas presenciais (equivalentes a semestres de cursos regulares) e etapas
vivenciadas no próprio ambiente social e cultural dos estudantes. Sendo assim, neste
projeto o TE, desenvolvido nos meses de fevereiro e julho, será realizado
presencialmente na universidade, configura-se como um momento no qual os
educandos possuem aulas teóricas e práticas com o grupo de docentes efetivos do
curso e colaboradores, participam também de atividades culturais, e exercitam a
capacidade de auto-organização: momentos de organização do ambiente, trabalho
em grupo, resolução de exercícios, leituras, ou seja, cada acadêmico, de acordo com
as suas necessidades organiza o seu tempo individual de acordo com a avaliação das
suas prioridades e de acordo com o seu planejamento individual e coletivo. No TC
os educandos realizam atividades em suas comunidades de origem, sejam elas
escolas, acampamentos, assentamentos de reforma agrária, propriedades rurais.
Entre algumas das atividades previstas para o TC estão: pesquisa sobre a realidade,
registro destas experiências, implementação de ações pedagógicas, vivências que
possibilitem a partilha de conhecimentos, desenvolvimento de projetos de
aprendizagem. Todas as atividades são orientadas no TE, e acompanhadas pelos
professores mediadores nos meses de julho a dezembro e nos meses de março a
junho (Unipampa, 2013, p. 29).

Nesse movimento de sentidos, entre o mesmo e o diferente, entre a “pedagogia” e o


“regime” da alternância, entre os saberes da Universidade e os saberes do campo se
constituem discursos que assumem diferentes posições que se assumem como as mesmas, em
um caminho que perpassa o científico e o popular, inconscientemente atravessado

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ideologicamente por relação de forças. É nesse percurso entre os tempos e espaços pré-
definidos da escola e da comunidade que a produção do conhecimento da Educação do
Campo vem se constituindo, enquanto proposta educacional para aqueles localizados no
campo.

Considerações Finais

Neste texto, discorro sobre o processo formativo de uma proposta pedagógica que
nasceu nos anos 1960 com influência da igreja e que vem desde lá, através de uma luta dos
movimentos sociais em prol de uma educação diferenciada àqueles que vivem no e do campo,
buscando espaço em meio à produção do conhecimento acadêmico de universidades e
institutos federais brasileiros.
Para tanto, utilizo-me de Projetos Pedagógicos de Cursos de Licenciatura em
Educação do Campo ofertados via Edital proposto pelo MEC em 2012, para descrever uma
relação entre é o que demandado politicamente por um edital e o que é apresentado pelas
instituições ofertantes, no que diz respeito à proposta de funcionamento dos cursos.
Essa proposta, ora nomeada como Pedagogia da Alternância, ora como Regime de
Alternância, como construída e apresentada nos Projetos Pedagógicos dos Cursos de
Licenciatura em Educação do Campo do RS não atribui diferenças de sentidos entre a
“pedagogia” e o “regime”, pois eles centram suas explicações no funcionamento das práticas
do curso, em seus diferentes tempos, o da escola e o da comunidade, a fim de atender a um
Edital e poder ofertar o curso nessas instituições.
No entanto, uma vez que caminhamos teoricamente alicerçados por uma teoria
discursiva de interpretação que busca compreender a língua fazendo sentido, enquanto
trabalho simbólico-social, constitutivo do sujeito e respectivamente de sua história, é
importante descrever o funcionamento dos discursos que institucionalizam saberes sobre essa
proposta nos cursos, às vezes, nomeando “regime”, outras “pedagogia”, interpelados
ideologicamente em uma memória de saberes que entra em funcionamento,
inconscientemente, para “optar” dizer de um modo que não de outro.
Essas filiações de sentidos, entre o “regime” e a “pedagogia”, remetem a memórias e a
circunstâncias que mostram que os sentidos não estão somente nas palavras, mas em uma

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relação com as condições em que elas são produzidas, com uma relação com a exterioridade e
com a historicidade que nelas se constitui.

Referências Bibliográficas

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em Educação do Campo. Dom Pedrito, RS, 2013.

UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL. Projeto Pedagógico do Curso


Interdisciplinar em Educação do Campo. Erechim, RS, 2013.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL. Projeto Pedagógico do Curso


de Graduação Licenciatura em Educação do Campo. Porto Alegre, RS, 2013.

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FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA EDUCAÇÃO INCLUSIVA NA EDUCAÇÃO


DO CAMPO EM DOM PEDRITO

Maria Helena Mena Dutra108


Suzana Cavalheiro de Jesus109

Resumo

A presente pesquisa foi desenvolvida a partir do Trabalho de Conclusão de Curso 1 no eixo “Inclusão,
Acessibilidade e Tecnologia” do sétimo semestre, do Curso Educação do Campo-Licenciatura da
UNIPAMPA – Campus Dom Pedrito. Com base na disseminação da ideia de que os “professores não
estão preparados para a inclusão”, tão propagada na fala cotidiana de diversos docentes, o objetivo foi
analisar a existência ou ausência de compromisso das políticas públicas de formação continuada,
voltadas para a Educação inclusiva, nas escolas do campo. Este trabalho traz dados de uma entrevista
realizada com a secretária de educação municipal, que faz parte do grupo de professores do campo na
cidade de Dom Pedrito- RS, supervisora geral de educação, em um segundo momento educadora
especial em uma escola do campo e responsável pelo CAP e uma educadora do campo.

Palavras-chave: Educação Inclusiva; Educação do Campo; Formação Continuada.

INTRODUÇÃO

Nos dias atuais, os estudos em relação a inclusão de indivíduos com necessidades


especiais nas escolas vêm aumentando, despertando o interesse das comunidades que
entendem ser de grande importância garantir estudo e desenvolvimento para todos, garantindo
uma educação de acordo com as especificidades de cada sujeito.
As Políticas Públicas passam a manifestar-se neste contexto educacional para
assegurar educação de qualidade aos sujeitos em questão. “A Constituição Federal [...]. No
seu artigo 206, inciso I, estabelece a “igualdade de condições de acesso e permanência na
escola” como um dos princípios para o ensino e garante como dever do Estado, a oferta do
atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino (art. 208)
”. Entende-se com isso, que as escolas devem se preocupar em estar preparadas não somente
na estrutura física para atender os alunos com necessidades especiais de aprendizado, mas
com a mesma preocupação no preparo dos profissionais para desenvolver a troca de ensino e
aprendizagem na escola.
Em seu site oficial, o Ministério da Educação afirma que,

108 Universidade Federal do Pampa mhelenamdutra@gmail.com


109 Universidade Federal do Pampa suzanacavalheiro@yahoo.com.br

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Em 2003, é implementado pelo MEC o Programa Educação Inclusiva: direito à


diversidade, com vistas a apoiar a transformação dos sistemas de ensino em sistemas
educacionais inclusivos, promovendo um amplo processo de formação de gestores e
educadores nos municípios brasileiros para a garantia do direito de acesso de todos à
escolarização, à oferta do atendimento educacional especializado e à garantia da
acessibilidade.

Com base neste programa e o entendimento de que a educação especializada é um


direito de todos, será feita a pesquisa para averiguar qual a formação ou preparo dos
professores das escolas do campo na cidade de Dom Pedrito-RS.
A pesquisa parte do problema do despreparo dos professores para o processo de ensino
e aprendizagem de alunos com necessidades educacionais especiais nas escolas do campo,
deixando estes alunos à margem da educação, longe das escolas por não se sentirem capazes
de aprender assim como os professores de ensinar. Desta forma a inclusão caminha a passos
de formiga pela questão de nem todos perceberem sua parte nessa luta. Professores, pais,
alunos, todos têm uma parcela de ações para que as engrenagens funcionem de forma
organizada e eficaz. O objetivo principal foi conhecer que ações, voltadas para a educação
inclusiva, são desenvolvidas no âmbito da formação continuada de professores que atuam na
educação do campo na rede pública de Dom Pedrito.

METODOLOGIA

Este trabalho trata-se de uma pesquisa desenvolvida a partir de entrevista


semiestruturada com a secretaria de educação municipal, optei pela elaboração de uma
entrevista/questionário com o propósito de analisar as necessidades e peculiaridades dos
docentes, na avaliação de um caso concreto buscando subsídios nas políticas públicas. O
sujeito que fará parte desta pesquisa será o gestor da Secretaria Municipal de Educação do
município de Dom Pedrito que faz parte do grupo de docentes das escolas do município.
A ideia foi analisar os conteúdos coletados para entender o que acontece em termos de
formação para preparar os docentes para a realidade da inclusão: palestras, oficinas, cursos
mensais, enfim. Que tipo de estudo é ofertado e de que forma o docente interage com os
conhecimentos adquiridos? A partir do que lhe é proposto, consegue organizar o ensino
aprendizagem ou as abordagens não são suficientes?

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A partir da entrevista realizada com a Secretária de Educação e conversa estabelecida


com a mesma, em conjunto com a Supervisora Geral, professora orientadora deste trabalho e
colega do curso de Educação do Campo percebe-se que a comunicação entre gestão e
professores possui diversas lacunas, pois o município oferece cursos, mas a gestão das escolas
acaba por não repassar as informações aos professores ou repassando de forma não atrativa,
não existindo o estímulo de participação. Analisarei estes dados com maior afinco no capítulo
final.
A partir dos dados coletados na secretaria, percebi que as estratégias de formação
estavam ligadas ao trabalho docente e às iniciativas dos professores. Assim, direcionei
atenção às narrativas de uma colega de curso e professora do campo que já teve estudantes
incluídos em sua sala de aula. Esta havia participado de um projeto fotográfico que
desenvolvi, o qual acabou sendo também fonte de pesquisa para este artigo, com vista a
articular, na interpretação dos dados, imagem e texto.
Diferente do texto, a imagem permite interpretações relacionadas com experiências
vividas de cada ser que a contempla, e a união entre imagem e texto estabelece uma
comunicação completa e rica em conhecimentos e saberes. A arte atrai os olhos curiosos do
indivíduo e utilizá-la em benefício da educação é transformar um sistema antes bancário e
monótono em interessante, envolvente e revolucionário de ideias. Segundo Novaes (2008), a
imagem contribui por estar ligada a realidade e por outro ponto de vista é possível obter
leituras totalmente diferentes e profundas dramatizando contextos diversos variando de cada
receptor.
Percebe-se neste momento que no início da pesquisa estaria se configurando estudo de
caso, mas este limitou e travou o trabalho pela ausência de formação continuada voltada para
inclusão, então essa configuração da metodologia teve o papel de trazer a possibilidade das
narrativas da minha colega e professora do campo porque logo no início a metodologia
aplicada já não deu as devidas condições para seguir o trabalho. Desta forma, surgindo a
necessidade de transformá-la em uma pesquisa narrativa onde busquei entender como o
professor sem formação consegue incluir os alunos. Fica explícito no discorrer do trabalho
que o ponto de partida foi investigar a formação continuada centrada em cursos e palestras e
no desenvolver da pesquisa foi adentrando na ideia da formação continuada da ação e reflexão
docente.

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2 HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA E EDUCAÇÃO ESPECIAL

Educação Inclusiva muitas vezes é confundida com Educação Especial, mas ela
engloba muitas outras questões além das deficiências, segundo Ferreira (2005), ela diz
respeito a todas as pessoas que por motivos sociais, econômicos, culturais são discriminadas
pela sociedade e acabam por ficar sem condições de ter uma educação de qualidade. Diz
respeito as barreiras que devem ser identificadas a fim de combatê-las como: maus tratos,
prostituição, doenças terminais; assim como grupos sociais como MST, Quilombolas e tantos
outros que por questões políticas vivem à margem da sociedade. Todos estes são beneficiados
com e Educação Inclusiva que tem por objetivo a igualdade social.
A Educação Especial entende-se estar incluída na Educação Inclusiva, desta forma na
LDB (Lei de Diretrizes e Bases), capítulo V; PÁG: 39 é assegurado o direito de todo o
cidadão ser assistido conforme suas especificidades educacionais a fim de garantir a
aprendizagem nas escolas regulares, então independente do aluno ter transtornos globais do
desenvolvimento, superdotação ou altas habilidades é previsto em lei que o atendimento
educacional e serviços especializados garantam um trabalho adequado para auxiliar o
desenvolvimento e aprendizagem deste aluno. O sistema de ensino deve se adequar através de
currículo, técnicas e recursos assim como os professores têm o dever ético de buscar
formações, leituras, debates para desenvolver um trabalho apropriado.
Este capítulo específico para educação especial representa um avanço, trazendo o
atendimento como um dever do Estado, dando ênfase à responsabilidade das escolas de
elaborar currículos e métodos para as diversidades especiais. Contempla a terminalidade
específica para esses alunos, estes que não conseguem cumprir no mesmo tempo regular, ou
seja, no mesmo tempo da maioria dos alunos ditos “normais”, a escola tem por obrigação
prover uma terminalidade e a preocupação de profissionalizar inserindo no mercado de
trabalho.

2. 1 EDUCAÇÃO DO CAMPO E FORMAÇÃO CONTINUADA

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Segundo COSTA (2016), a LDB, artigo 28, propõe adaptações curriculares e


metodologias perante a diversidade das comunidades do campo, assim como calendário
próprio com base nas fases agrícolas e variações climáticas
Conforme o PPC (Projeto Político Pedagógico) do Curso de Educação do Campo-
Licenciatura da UNIPAMPA – campus Dom Pedrito, pág 19, a Educação do Campo é uma
modalidade que vem crescendo à medida que pecebe-se a importância de ampliar o
conhecimento das famílias do campo em relação ao meio em que vivem assegurando uma
base cultural sólida respeitando o conhecimento prévio e a partir dele incorporar o
conhecimento científico, nesse compartilhar de saberes surge um novo educador para garantir
o direito do sujeito do campo em se manter no campo se assim for sua vontade, a formação de
sujeitos críticos e o reconhecimento do meio. Trata-se de uma luta a favor da igualdade social
de comunidades de pequenos agricultores como quilombolas, ribeirinhas, MSTs, etc.
Entende-se por formação continuada todo e qualquer curso de extensão que a
secretaria de educação ofereça aos professores assim como cursos, oficinas, tertúlias
oferecidas pelas APAEs e outras entidades ligadas a educação especial. Uma das questões é se
o convite à participação chega até os professores e se os mesmos demonstram interesse nessas
ações. A formação continuada é de grande valia para cidades como a pesquisada, cujo curso
específico de Educação Especial não é fornecido na região tendo o professor, interessado que
se deslocar cerca de 400 km aproximadamente se houver interesse em cursar a licenciatura.
Caiado diz:
A formação docente agrega particularidades sobre a atuação e profissionalização do
professor. Sobre a atividade docente com o público da Educação Especial na
Educação Básica e Superior, algumas questões nos inquietam: se a proposta de
Educação Inclusiva, a qual envolve a Educação Especial, é para todos, por que a
formação se dá apenas para os professores de Sala de Recursos Multifuncional
(SRM), já que os alunos frequentam mais a sala de aula comum? O interesse não
deveria ser de toda a escola? Os professores de sala de aula comum não são
professores de alunos público–alvo da Educação Especial? (2017, p.73).

Essas inquietações norteiam a pesquisa de forma a identificar o entendimento dos


professores das salas regulares a respeito da sua formação, buscando saber se concordam que
a formação especial deve ser apenas para profissionais dos AEEs pois essa é a realidade na
educação.

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Da mesma forma, a referente pesquisa visa analisar o que defende a secretaria de


educação a respeito da formação continuada para professores de salas regulares, observando
se a educação especial está agregada no processo formativo.
Com a realidade atual entende-se que Padilha está certa quando afirma que o
sofrimento do professor diante das dificuldades dos alunos diz respeito a visão que a
sociedade tem sobre a obrigação do docente ensinar mesmo que não estando preparado para
as especificidades de cada aluno.
As dificuldades dos docentes em sala de aula são variadas pois não possuem o preparo
necessário para trabalhar com alunos com necessidades especiais de aprendizagem
dependendo exclusivamente dos AEEs (Atendimento Educacional Especializado). Como
agravante, a cidade onde acontece a pesquisa (Dom Pedrito-RS) possui aproximadamente 20
escolas incluindo rede municipal/estadual, e apenas seis (6) disponibilizam uma sala para
atendimento especializado. As outras escolas receberam o material necessário para equipar as
salas, mas devido ao fato de não ser prioridade dessas escolas, os materiais estão guardados.
Diagnóstico traçado por Castro (2002) numa pesquisa realizada na rede municipal de
educação de Santa Maria/RS, que analisou representações e sentimentos de
professores da rede regular de ensino diante da inclusão de alunos com necessidades
especiais em "suas" salas de aula. Castro mostrou que os professores, de modo geral,
não se sentem capacitados para receber um aluno com deficiência, apesar de
acreditarem nos méritos da inclusão. É o que se pode depreender das seguintes falas,
proferidas por diferentes professores: Eles [alunos especiais incluídos] exigem uma
atenção que não temos condição de dar.[...] Não temos condição de oferecer o que
eles realmente necessitam, pois não somos educadoras especiais, apesar de termos
boa vontade.[...] Não temos preparo suficiente para fazer um trabalho com muitos
resultados positivos.[...] Há muito despreparo nas classes regulares e nos cursos de
formação do magistério.[...] Eu acho ruim [a inclusão], pois os professores precisam
de conhecimento para trabalhar com esses alunos.[...] Desde que não atrase muito o
ritmo do grupo em geral pode acontecer.[...] É um direito assegurado a todos. E é
possível a inclusão se o sistema educacional estiver preparado a aceitar e tiver
conhecimento específico para lidar com as diferenças (PLETSCH, 2009).

Logo, entende-se que é importante o professor lembrar que o processo de


aprendizagem é individual e que a diversidade em sala de aula é interessante nessa construção
de conhecimento que acontece entre aluno e professor. Todos são capazes de aprender, cada
um no seu tempo, mas para isso é necessário que o docente participe de cursos de formação
para se preparar no que diz respeito à adaptação de aulas para os alunos incluídos que receber
assim como é importante priorizar as salas de AEE para utilização do material de apoio.
Acredito que desta forma aconteça uma pressão na gestão municipal para abertura de
concurso público para garantir profissionais qualificados na área.

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A Declaração de Salamanca fala com a mesma ênfase na importância da formação de


professores para a inclusão:

C. RECRUTAMENTO E TREINAMENTO DE EDUCADORES • 38. Preparação


apropriada de todos os educadores constitui-se um fator chave na promoção de
progresso no sentido do estabelecimento de escolas inclusivas. As seguintes ações
poderiam ser tomadas. Além disso, a importância do recrutamento de professores
que possam servir como modelo para crianças portadoras de deficiências torna-se
cada vez mais reconhecida. • 39. Treinamento pré-profissional deveria fornecer a
todos os estudantes de pedagogia de ensino primário ou secundário, orientação
positiva frente à deficiência, desta forma desenvolvendo um entendimento daquilo
que pode ser alcançado nas escolas através dos serviços de apoio disponíveis na
localidade. O conhecimento e habilidades requeridas dizem respeito principalmente
à boa prática de ensino e incluem a avaliação de necessidades especiais, adaptação
do conteúdo curricular, utilização de tecnologia de assistência, individualização de
procedimentos de ensino no sentido de abarcar uma variedade maior de habilidades,
etc. Nas escolas práticas de treinamento de professores, atenção especial deveria ser
dada à preparação de todos os professores para que exercitem sua autonomia e
apliquem suas habilidades na adaptação do currículo e da instrução no sentido de
atender as necessidades especiais dos alunos, bem como no sentido de colaborar
com os especialistas e cooperar com os pais.

Inspirada em uma aula ministrada pela minha orientadora Suzana Cavalheiro de Jesus
onde ofertou um material que aborda de forma breve a história da inclusão, surgiu a
necessidade de investigar historicamente a Educação Inclusiva. Segundo Miranda (2003), na
antiguidade começam a surgir divisões políticas e econômicas gerando a desigualdade,
algumas comunidades sacrificavam ou abandonavam às margens de rios as pessoas com
deficiência enquanto outras acreditavam que essas pessoas eram uma ação divina. Na Grécia,
as crianças eram abandonadas em depósitos chamados ‘Apothetai’. Já na Idade Média, com o
surgimento do Cristianismo, cultuava-se o sentimento de pena, ou ainda, essas pessoas eram
vistas como forma de divertimento para a nobreza. Na Idade Moderna, a deficiência passa a
ser objeto de estudo para a ciência.
Na sociedade capitalista contemporânea, as pessoas com deficiência são vistas como
alguém incapaz de produzir ou competir no mercado. A atuação de movimentos sociais e a
produção de Políticas de Educação Inclusiva surgem para mudar essa visão rotulada de
incapacidade social
Conforme Silva, as pessoas com deficiência são excluídas e marginalizadas desde o
início dos tempos sendo rotuladas como incapazes de decidir pelo próprio destino, não
merecendo respeito e dignidade. Com as ações dos movimentos sociais a inclusão passa a ser
discutida com mais visibilidade produzindo políticas públicas que começam a assegurar

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direitos para os sujeitos com deficiência igualando em mercado de trabalho, educação,


posição familiar, etc.
Entende-se que as necessidades especiais existem pelo fato da sociedade ditar o que é
normal, ou seja, definir o conceito de “capaz”, dessa maneira, as pessoas que não aprenderem
a ler no dito “tempo certo”, por exemplo, são consideradas deficientes ou anormais. Mas
afinal o que é ser normal?
Essa discussão vem de muito tempo. Conforme Miranda (2003), no Brasil pode-se
falar de uma iniciativa importante na época do império que foi a criação de um instituto para
cegos e outro para surdos, desde então a trajetória da legislação tem sido lenta, e estas
crianças que tem deficiências diversas são os excluídos. O documento de Salamanca que
reuniu na Espanha representantes de 88 países para discutir a educação especial do ponto de
vista da inclusão mantendo a responsabilidade de incluir essas crianças com deficiência na
sociedade.
Para os efeitos da Convenção da Guatemala, entende-se por:
1.Deficiência O termo "deficiência" significa uma restrição física, mental ou
sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer
uma ou mais atividades essenciais da vida diária, causada ou agravada pelo ambiente
econômico e social. 2. Discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência a)
o termo "discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência" significa toda
diferenciação, exclusão ou restrição baseada em deficiência, antecedente de
deficiência, consequência de deficiência anterior ou percepção de deficiência
presente ou passada, que tenha o efeito ou propósito de impedir ou anular o
reconhecimento, gozo ou exercício por parte das pessoas portadoras de deficiência
de seus direitos humanos e suas liberdades fundamentais. (CONVENÇÃO
INTERAMERICANA PARA A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE
DISCRIMINAÇÃO CONTRA AS PESSOAS PORTADORAS DE DEFICIÊNCIA
- Aprovado pelo Conselho Permanente na sessão realizada em 26 de maio de 1999)

Conforme o Portal do MEC, A Educação Especial tem por objetivo garantir o


fortalecimento do direito humano, do potencial e autoestima de pessoas com deficiência. A
partir destas considerações entende-se que a institucionalização da educação especial no
Brasil deve ser analisada e articulada de forma política e econômica de maneira a firmar o
compromisso de respeito a todo o cidadão.
Em 2003, é implementado pelo MEC o Programa Educação Inclusiva: direito à
diversidade, com o intuito de garantir a oferta educacional inclusiva nos sistemas
educacionais com o acesso a todos os que precisam de educadores e gestores formados de
maneira especializada nos municípios brasileiros.

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É importante observar que a lei ainda não se faz valer nos dias atuais, pois a maioria
dos professores que realizam atividades com pessoas incluídas vivem a angústia de conviver
com as dificuldades dos alunos que necessitam de um ensino aprendizagem diferenciado, isso
acontece pelo fato do professor ser visto como alguém com o dever de ensinar de todo o jeito
e de qualquer forma independente de estar preparado para determinada situação. Sabemos que
esta situação não é pontual da Educação do Campo, e sim de toda a rede de ensino.

3. O LUGAR DA FORMAÇÃO DOCENTE EM EDUCAÇÃO INCLUSIVA NA REDE


MUNICIPAL DE ENSINO DE DOM PEDRITO

Em nosso diálogo a secretária de educação compartilha conosco as informações que


ela recebe de que professores da rede estadual quando recebem um aluno com necessidades
especiais de aprendizagem aconselham os responsáveis a matricular na rede municipal
alegando os professores terem mais preparo para trabalhar com aquela criança. Sabe-se que na
rede municipal tem uma escola em especial que chama a atenção da comunidade pedritense
pela dedicação no trabalho com crianças com necessidades especiais de aprendizagem e nesse
momento eu me pergunto porque os demais professores não buscam ter o mesmo cuidado e
zelo nas demais escolas? O fato é que nenhum professor nasce preparado para dialogar com as
diferenças, o que acontece é que a minoria busca trilhar pelo caminho do estudo e da pesquisa
para aumentar seus conhecimentos em áreas diversas e a maioria opta por ficar nesse jogo de
empurra baseado em lamentações que não levam a nada.
As formações ofertadas pela secretaria são baseadas nos pedidos que acontecem em
reuniões com os professores na tentativa de sanar dúvidas e auxiliar no dia a dia escolar.
Percebe-se que os professores entendem por formação continuada apenas os cursos ofertados
pela secretaria de educação excluindo as ofertas de entidades. A gestão (S.M) deveria se
responsabilizar por convocar os professores para formações voltadas a inclusão, mas o que
acontece é que nem supervisão existe, com uma supervisão pedagógica adequada, ou seja,
com o perfil adotado entre as décadas de 1980 e 1990 que caracteriza o cargo de supervisor
como o de pesquisador voltado a compreender as relações que acontecem em sala de aula e na
comunidade, pois o processo de ensino aprendizagem passa a ser visto como uma via de mão
dupla onde todos ensinam e aprendem, segundo Oliveira (2012). Logo, com a inexistência da

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supervisão os professores acabam por procurar essas formações quando surge um caso
específico a ser tratado. Quando a secretaria oferta cursos em outras áreas o chamamento
acontece mais não é atendido e isso acaba em frustração pois os diretores das escolas são os
primeiros a não demonstrar interesse e muitas vezes não liberam os professores para tais
formações, ou seja, eles, os diretores, devem ter maior compromisso pedagógico.
Outra visão que percebo é o fato dos professores terem como objetivo nessas
formações os certificados e em segundo plano o aprendizado, sendo assim, muitas palestras,
oficinas, etc; oferecidas por entidades passam a não despertar o interesse por nem sempre
oferecer o documento. Existe um curso federal ofertado para os professores de rede pública-
PACTO (Programa Mais Alfabetização) -com duração de três anos, oferta o estudo de
práticas pedagógicas para o ensino fundamental e o valor de duzentos reais de incentivo, mas
no momento o valor não é mais ofertado e os professores não demonstram mais interesse pelo
curso que era dividido em dois dias por semana: um dia era para os professores de escolas
urbanas e o outro dia para professores de escolas do campo. Lamentavelmente não estamos
falando de um curso voltado para a inclusão, nesta reflexão surge a pergunta: Os professores
não estão preparados porque não tem suporte de formação ou porque estão acomodados e
acabam não se interessando?

Conversando com a responsável pelo NAPI (Núcleo de Apoio Psicopedagógico e


Inclusivo) antigo CAP (Centro de Apoio Pedagógico), fica claro a falta de esclarecimento
tanto dos educadores que estão na linha de frente dando aula, assim como da gestão das
escolas porque a questão é o interesse de cada um que trabalha na área de educação em buscar
conhecimento adicional sobre as especificidades dos alunos, estou falando de diferentes
crenças, diferentes povos, diferentes dificuldades de aprendizagem.
Os professores tendem a manter uma visão homogênea caso contrário serão obrigados
a planejar para uma turma diversa, não conseguem incluir e tratam os alunos com
necessidades especiais como intrusos pois costumam usar a frase “Tenho um número de
alunos e outro número de incluídos”, ou seja, não reconhecem como alunos que tem os
mesmos direitos à educação de qualidade.
Lembrando que incluir não é abordar o conhecimento da mesma maneira para todos
que estão em sala de aula e sim se dedicar a levar este conhecimento de forma diversa para
que todos os alunos consigam ter a aprendizagem necessária. Não adianta exemplificar uma

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aula com realidades fora do contexto cultural dos alunos que tem experiências diversas e nem
fora do alcance dos alunos que tem dificuldades especiais de aprendizagens, não será
significativo o aprendizado e acaba por acontecer as frases decoradas nas respostas para
garantir nota sem aprendizado.
A escola do campo sofre neste cotidiano de olhar hegemônico onde a preferência é
garantir que o sujeito apenas aprenda a ler e escrever, no máximo aulas mais técnicas voltadas
para um trabalho específico. Se quiser mais, este aluno não terá o direito a escolha de ficar na
sua terra para estudar e terá que abrir mão do seu lar para buscar conhecimento. É absurda e
injusta a realidade imposta pela sociedade que prefere ainda pensar que se nada der certo, vira
professor. Ser professor é bem mais do que escrever uma matéria no quadro, ser professor é
ajudar cada indivíduo no desenvolvimento da sua formação garantindo que ele tenha coragem
de ser curioso e não aceite uma resposta sem pesquisar outras possibilidades, ser professor é
ajudar os alunos a olhar adiante dos fatos para depois concluir conforme experiências vividas,
é politizar os alunos e desenvolver a vontade de levar todo o conhecimento compartilhado
para as famílias e comunidades.
Percebe-se que o papel da gestão é relevante nesse contexto inclusivo a fim de
organizar e fazer valer os direitos de cada sujeito envolvido, a falta de suporte governamental
não garante as escolhas pedagógicas das escolas, além disso quando há a preocupação para
esta área é fixada a atenção para infraestrutura esquecendo que calendário, currículo e
metodologia são tão ou mais importantes, aumentando a lupa a gestão escolar muitas vezes
peca na organização do PPC (Projeto Político Pedagógico) que deveria ser feito coletivamente
é visto como algo estritamente burocrático e acaba por não atender a diversidade das salas de
aula.
Obviamente, o problema central é a falta de incentivo econômico porque a educação
tem uma demanda alta de recursos, tanto na infraestrutura quanto na qualificação dos
educadores. Concordo com COSTA (2016), quando diz que o processo educacional deve ser
observado e avaliado periodicamente a fim de sanar problemas obtendo resultados positivos.

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Foto: Mª Helena M. Dutra

3.1. O cotidiano que ensina

As imagens ofertadas neste trabalho mostram uma professora e seus alunos, mas não é
apenas isso, por trás desta leitura existe uma interpretação mais complexa e cheia de
significados como experiências diversas na luta pela inclusão dos alunos no contexto
educacional. Em diálogo com a professora da fotografia descubro histórias distintas de
inclusão sem respaldo formativo como foi discorrido ao longo das minhas escritas neste
trabalho.
Por vários anos minha entrevistada teve alunos incluídos com necessidades especiais
de aprendizagem, como primeira história foi escolhida a de um aluno com Síndrome de
Willians, este aluno veio com a mãe de Caxias do Sul-RS onde ficava do início ao fim da aula
no mesmo lugar sem desenvolver as atividades, não se comunicava com ninguém e aqui
passou a desenvolver as atividades propostas pela professora que se preocupou em posicioná-
lo em uma classe perto de sua mesa para dar o atendimento devido, desta forma ele aprendeu
a ler e fazer cálculos mas não escrevia, a escrita era por uma espécie de códigos, círculos e
traços que ele identificava. Para ficar claro, cito o exemplo de que se ele desenhasse dois
círculos para demonstrar o nome dele, seguiria fazendo sempre da mesma forma, então
percebe-se que ele tem um sistema simbólico eficiente para entender seus apontamentos.
Quando pergunto de que forma acontecia a adaptação do planejamento para incluir este aluno

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a professora conta que tudo o que passava no quadro para a maioria dos alunos era escrito de
forma pontilhada para o aluno incluído, essa era a forma dele ter a matéria no caderno para
estudar e gostava de traçar as linhas pontilhadas com canetinha. Uma curiosidade nesse caso é
que o aluno lê com domínio mas pulava algumas palavras. Havia dias que o aluno não se
interessava pela aula e pedia a professora para assistir filme, a professora proporcionava esses
momentos emprestando celular para que ele realizasse o desejo, tinha o perfil de pessoa muito
tranquila e amorosa, algumas vezes ria exageradamente por motivo desconhecido. Ele ficou
por dois anos no quarto ano e na sequência avançou para o quinto ano no turno da manhã.

Foto: Mª Helena M. Dutra

Teve uma aluna que não conseguiu avançar na aprendizagem, por motivo desconhecido
já que não tinha laudo da especificidade da mesma, somente aprendeu a escrever a letra “B”.
Outra experiência relatada pela professora foi com um aluno com Síndrome de Down,
este aluno lê e escreve, mas somente quando estava com vontade, não copiava o texto
completo e tinha muita vergonha de ler para os colegas. Quando pergunto sobre o suporte
pedagógico, lembrando que a escola tem o AEE, a professora diz não acreditar no trabalho
desenvolvido na sala de atendimento, ressalta que os alunos ficam jogando vídeo game, o

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atendimento acontece uma vez por semana e a professora responsável pelo atendimento
especializado atende também na APAE. Existe um lamento na fala da professora que diz não
existir interesse na educadora especial em contribuir com ideias diferentes para ajudar na
inclusão dos alunos assim como a gestão também não faz sua parte. A realidade de sala de
aula é tão complexa com planos de aula desenvolvidos para a maioria, não ter ajuda para
desenvolver aulas diferenciadas para atender a inclusão torna-se quase impossível. Percebe-se
que o problema geral na inclusão é a falta de gestão para organizar currículo, método,
infraestrutura, documentação e financeiro para fazer valer as leis que garantem os direitos de
todo o indivíduo independente de etnia, crença, cultura, necessidades especiais de
aprendizagem, sexualidade, etc. Cargos políticos, secretaria de educação, diretoria de escola e
professores em sala de aula devem trabalhar de forma organizada e unida estudando cada caso
e propondo melhorias educacionais. Mas não é o que acontece e acaba os professores vivendo
na maioria dos dias experiências frustrantes na tentativa de incluir alunos sem formação ou
ajuda especializada. Materiais especiais sem uso, falta de profissionais qualificados e
inexistência de concursos públicos para esta área dificulta o processo de ensino aprendizagem
de muitos alunos.
Em 2007, é lançado o Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE, reafirmado
pela Agenda Social, tendo como eixos a formação de professores para a educação
especial, a implantação de salas de recursos multifuncionais, a acessibilidade
arquitetônica dos prédios escolares, acesso e a permanência das pessoas com
deficiência na educação superior e o monitoramento do acesso à escola dos
favorecidos pelo Beneficio de Prestação Continuada – BPC. (MEC/SECADI)

Apesar dos programas serem criados, se não houver gestão para garantir acesso da
comunidade a esses programas de nada adianta. Em Dom Pedrito a realidade é que apenas
seis escolas estão com o AEE funcionando, não existe formação continuada para os
professores voltada para a inclusão e as escolas estão fechando por falta de incentivo à
inclusão como transporte, ensino fundamental e médio completa, material adequado.
Os professores passam a ser inclusivos tentando desenvolver técnicas próprias e para
eficácia do estudo é necessário primeiramente analisar as especificidades dos alunos. Como
exemplo, posso citar uma sala de sétimo ano onde três alunos apresentam síndromes distintas
e cada um deles está numa fase diferente de desenvolvimento motor e raciocínio: o professor
de geografia poderá iniciar sua aula levando cartaz ou desenhando no quadro o mapa de
algum continente instigando a curiosidade de todos enquanto fala sobre o assunto, ainda

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mostrar no globo o continente onde os alunos estão e a distância do continente que será
estudado, esta primeira fase todos os alunos, independente da dificuldade, conseguirá
acompanhar.
No segundo momento da aula será proposto um estudo dirigido a maioria dos alunos e
aos três que estão em fases diferentes de aprendizagem, para quem está com o nível de
aprendizagem na coordenação motora serão ofertados desenhos do continente para colorir,
para quem está no nível de alfabetização desenvolver escrita dos nomes dos países do
continente e nível de segundo ano trabalhará rios, acidentes geográficos, etc. Com isso ele
estará dando uma aula para todos os alunos, caracterizando a inclusão e acontecerá a
aprendizagem significativa independente das dificuldades.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quando pensamos, minha orientadora e eu, na pesquisa acreditamos na oportunidade


de compartilhar informações e experiências significativas sobre diferentes modos de formação
continuada para a inclusão, mas essa formação não existe nas escolas do campo da nossa
cidade então trabalhei com o pouco de informação que obtivemos em conversas com a
secretária de educação, supervisora geral e educadora especial e optamos por incluir a
discussão de quais as adaptações utilizadas por uma professora do campo para contornar esses
conflitos em sala de aula.
Conforme Costa (2016) é necessária a reflexão do professor neste contexto de
formação pela busca de conhecimento a fim de burlar a realidade de um sistema que não
funciona e realizar a inclusão dos alunos que são diversos. As escolas do campo ainda não
atendem a inclusão conforme as políticas públicas devido a três fatos: o primeiro diz respeito
às estradas que pelo péssimo estado de conservação inúmeras vezes alunos e professores
ficam sem acesso às escolas; o segundo diz respeito ao espaço físico das escolas já que a
maioria necessita de muitos reparos, salas sem condições de receber alunos cadeirantes, etc; e
o terceiro diz respeito aos professores que estão recém começando a perceber a importância
de se preparar para lidar com as diferenças sociais, políticas, religiosas, culturais e de
necessidades especiais de aprendizagem.

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Como podemos perceber, infelizmente não há ações formativas voltadas para a


educação inclusiva para os professores do campo na rede pública de Dom Pedrito, estes
profissionais precisam desenvolver suas próprias adaptações para ministrar as aulas de forma
a incluir todos os alunos, deste modo percebemos que a formação não se resume a cursos
específicos, o cotidiano também é formativo. Sendo assim, não há possibilidade de análise das
formações, pois a única que foi citada é o PACTO, que se trata de um programa federal de
práticas pedagógicas para ensino fundamental.
Entendo que a Educação Inclusiva está diretamente ligada a Educação do Campo
porque os povos do campo ainda são excluídos da sociedade não tendo direito a completar
seus estudos na sua comunidade, sem acesso a materiais adaptados a vivência no campo, sem
estradas transitáveis nem transporte adequado. Mas este trabalho tem como uma das
finalidades acreditar na possibilidade da igualdade dos sujeitos, do fim das classes.
Obviamente que esses resultados não serão vistos por nós, nem por nossos filhos, mas a
questão é lutar pelo futuro das próximas gerações, trabalhar para que as comunidades passem
a respeitar o meio, a diversidade cultural e principalmente o ser humano independente da
religião, cor da pele ou necessidade especial porque as diferenças nos tornam iguais, somos
todos iguais, pois cada um é único. Como dizia Martin Luther King Jr.: “Eu tenho um sonho”
.um sonho de que as pessoas sejam aceitas com suas diferenças, sonho de que a educação
chegue a cada criança, a cada lar porque acredito que a educação liberta, só a educação salva!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Convenção da Organização dos Estados Americanos. DECRETO Nº 3.956, DE 8 DE


OUTUBRO DE 2001

COSTA, Margarete Terezinha de Andrade. Formação Docente para a Diversidade. 2016

LEINEKER, Mariulce da Silva; RODRIGUES, Roseli Viola. Inclusão em Contexto de


Exclusão: Um Estudo nas Escolas Itinerantes dos Acampamentos do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra/ Escola Base- Colégio Estadual Iraci Salete Strozak.

MEC, SECADI. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação


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OLIVEIRA, Eloiza da Silva Gomes; GRISPUN, Mírian Paura Sabrosa Zippin. Princípios e
Métodos de Supervisão e Orientação Educacional. 2012

PADILHA, Adriana Cunha. Professores de Educação Especial na Educação do Campo:


Condições de Trabalho na Carreira Docente. 2012

PLETSCH, Márcia Denise. A Formação de Professores para a Educação Inclusiva:


Legislação, Diretrizes Políticas e Resultados de Pesquisa. 2009

SILVA, Elenilda Sinésio Alexandre. Educação Inclusiva: Exclusão e Marginalização no


Âmbito Escolar.

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POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFETIVAÇÃO DO ATENDIMENTO


EDUCACIONAL ESPECIALIZADO NAS ESCOLAS DO CAMPO DA REDE
MUNICIPAL DE DOMPEDRITO – RS
Leila Eliza Rodrigues Padilha110
Suzana Cavalheiro de Jesus111

Resumo

A presente pesquisa teve como objetivo investigar quais políticas e para o Atendimento Educacional
Especializado são efetivadas nas Escolas do Campo do município de Dom Pedrito – RS.
Metodologicamente, definiu-se como uma pesquisa de abordagem qualitativa exploratória cujo dados
foram analisados através de uma perspectiva interpretativa,utilizando a técnica Hermenêutica por ser o
ramo da filosofia que estuda a teoria da interpretação, instrumentado por uma entrevista
semiestruturada com a secretária municipal de educação e uma visita ao Centro de Apoio Pedagógico
(CAP) de Dom Pedrito. Os resultados demonstraram que as políticas públicas do AEE, de modo
específico a estruturação das salas de recursos multifuncionais, não estão sendo garantidas em escolas
do campo, tendo apenas previsões para a implementação deste atendimento em uma escola da zona
rural.Conclui-se que para que esse trabalho seja consolidado e a legalidade de inclusão cumprida, faz-
se necessário mobilizar as famílias e a comunidade escolar nas articulações por ações públicas que
garantam a efetivação de políticas educacionais para estudantes com necessidades educacionais
especiais, na educação do campo.

Palavras-chave: Educação Especial no Campo, educação inclusiva, Políticas Públicas para o


AEE, Educação do Campo.

INTRODUÇÃO

Esta pesquisa tem como objeto de estudo as políticas públicas no âmbito do


atendimento educacional especializado nas escolas do campo da rede municipal de ensino de
Dom Pedrito – Rio Grande do Sul. Propõe-se aprofundar questionamentos sobre inquietações
emergentes a partir de estudos no Tempo Universidade do sétimo semestre do Curso de
Educação do Campo – Licenciatura. Na oportunidade, dentro do eixo de estudos “Inclusão,
Acessibilidade e Tecnologias”, através do componente curricular Fundamentos da Educação
Especial para a Educação do Campo, ministrada pela professora Suzana Cavalheiro de Jesus,
adentramos em discussões sobre educação inclusiva.

1
Universidade Federal do Pampa leilarodrigues.padilha@gmail.com
111
Universidade Federal do Pampa suzanacavalheiro@yahoo.com.br

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Para melhor entender este universo, realizou-se uma visita a Escola Municipal de
Ensino Fundamental Duque de Caxias, com sala de Atendimento Educacional Especializado
(AEE), situada na zona urbana do município, com 11 alunos incluídos, tendo uma estrutura
pedagógica que atende de fato às especificidades que os alunos possuem. Também visitou-se
uma Instituição Filantrópica, voltada ao atendimento de pessoas com necessidades
educacionais específicas, a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais 1 de Dom Pedrito
– APAE.Na ocasião das visitas, percebeu-se alunos do campo inseridos nas escolas da cidade,
o que remeteu a caminhos para este estudo sobre transversalidade da Educação Especial na
Educação do Campo.A partir destas experiências surgiu o questionamento que norteia esta
pesquisa: Quais as políticas públicas da rede municipal de Educação de Dom Pedrito, que
buscam efetivar o atendimento educacional especializado nas Escolas do Campo?

PERCURSOS METODOLÓGICOS

Para embasar esta pesquisa optou-se por utilizar uma abordagem qualitativa, baseada,
inicialmente em uma entrevista semiestruturada com a Secretária de Educação do município
de Dom Pedrito, Melize Quadros Xavier, em exercício no período de 2016 a 2018. A partir
dos dados encontrados fez-se necessário um aprofundamento, sendo realizada uma visita ao
Centro de Apoio Psicopedagógico do Município (CAPI), para uma conversa com uma
educadora lá atuante, com vistas a compreender a relação entre atendimento de apoio
pedagógico e AEE, enquanto ação pública para a educação inclusiva. Os procedimentos
partem da análise interpretativa de dados coletados.
Nesta perspectiva, a presente pesquisa, buscou esclarecer “como” a secretaria
municipal de educação de Dom Pedrito tem incentivado o Atendimento Educacional
Especializado nas escolas do campo, por meio de políticas públicas específicas.
Nesta perspectiva, dirige-se a temas contemporâneos, que a depender da finalidade
(exploratória ou descritiva), articula diferentes variáveis para a compreensão de uma dada
realidade.
Pesquisando as salas de recursos, em entrevista com a gestão não tinha dados na
Secretaria de Educação de estudantes do campo que tivessem atendimento de AEE na rede,
foi tentado implementar uma sala mas não tinha espaço físico, e não tinha profissional com

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formação na área. Por conta disso não tem AEE no Campo, e não teria estudantes do campo
atendidos na zona urbana. Dando continuidade a entrevista fui conduzida ao CAP, também
como uma referência de educação inclusiva, mesmo sendo um lugar de atendimento
psicopedagógico que atende as dificuldades de aprendizagem, e não faz parte da educação
especial.
Em conversa com a educadora do CAP, algumas informações se confirmam: Que
existem alunos oriundos do campo sendo atendidos nos espaços urbanos do AEE. As
narrativas desencontradas remetem uma análise interpretativa dos dados coletados, seguida da
técnica da Hermenêutica (ramo da filosofia que estuda a teoria da interpretação, arte de
interpretar o sentido da fala do autor) muito utilizada na Antropologia por estudar o
comportamento humano.

O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO ENQUANTO


POLÍTICAPÚBLICA NA EDUCAÇÃO DO CAMPO

Para tratar sobre o AEE, torna-se necessária a definição do conceito de Política


Pública, entendida como a

[...] Totalidade de ações, metas e planos que os governos (nacionais, estaduais ou


municipais) traçam para alcançar o bem-estar da sociedade e o interesse público. É
certo que as ações que os dirigentes públicos selecionam são aquelas que eles
entendem serem as demandas ou expectativas da sociedade (CALDAS, 2008,p. 5).

Com um olhar mais direcionado às políticas públicas para efetivação de Atendimento


Educacional Especializado, identificamos a estruturação das salas de recursos multifuncionais
nas escolas de educação básica, como a política de maior impacto na área. Através da
implementação das salas e oferta de cursos de aperfeiçoamento a docentes que atuem nas
mesmas, os sistemas de ensino puderam garantir a matrícula dos estudantes com necessidades
educacionais especiais nas classes comuns do ensino regular, ficando o atendimento de
educação especial, realizado no contra-turno ou no horário mais adequado, conforme
organização da escola.
O Ministério de Educação e Cultura (MEC) define o público-alvo da Educação
Especial como os alunos com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas

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habilidades/superdotação. Assim, em casos que abrangem transtornos funcionais específicos,


de forma que a educação especial articula-se ao ensino comum, subsidiando os atendimentos
às necessidades educacionais especiais desses alunos. (BRASIL, 2008).
Com vistas a amenizar essas barreiras, o Atendimento Educacional Especializado –
AEE – é uma política pública inserida no contexto escolar a fim de dar suporte às pessoas
com Necessidades Educacionais Especiais (NEE). Desse modo, a Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008) destaca que em princípio,
foram criadas instituições, escolas e classes específicas para os alunos que necessitarem desse
atendimento, de modo que não haviam políticas públicas de acesso universal à Educação e
não consideravam as especificidades de aprendizagem dos alunos.
Através de uma série de articulações, apenas a partir da Constituição Federal de 1988
que teve início a implementação do AEE atrelado à rede regular de ensino, sendo
posteriormente reforçado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, através da Lei 8.069/90,
artigo 55, a Declaração Mundial de Educação para Todos (1990) e pela Declaração de
Salamanca (1994). No ano de 1994, a Política Nacional de Educação Especial passa a orientar
a ‘integração instrucional’ para alunos que possuíssem condições de acompanhar o ritmo das
atividades curriculares do ensino regular. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
9.394/96 (LDB), também assegura o direito de todos os indivíduos ao ensino regular. Por fim,
o Decreto 3.956/2001, defende que as pessoas com NEE têm os “mesmos direitos humanos e
liberdades fundamentais que as demais pessoas” (BRASIL, 2008).
A Declaração de Salamanca (1994), documento resultante da Conferência Mundial de
Educação Especial, realizada em Salamanca, Espanha, reuniu 88 governos e 25 organizações
internacionais e teve como foco a urgência do providenciamento de educação para os
indivíduos que apresentam necessidades educacionais especiais, no Sistema regular de ensino.
Entre as proclamações anunciadas estão o direito fundamental de todos os indivíduos à
educação e que sistemas e programas educacionais deveriam ser designados e implementados,
considerando a diversidade das características e necessidades individuais.
A LDB 9.394/96, embasa-se nestes documentos, assegurando o direito de todos à
educação. Em seu artigo 4º, parágrafo III garante o atendimento educacional especializado aos
educandos com necessidades educacionais especiais na rede regular de ensino, pontuando em
seu Artigo 59, a adequada formação, em nível médio e superior, tanto para atuação no AEE,

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quanto para atuação nas classes comuns.


As determinações da Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência (1999), promulgada no
Brasil através do Decreto 3.956/2001, destacam a necessidade de tomar medidas de diversas
naturezas, inclusive educacional, a fim de eliminar a discriminação, promovendo a integração
das pessoas com deficiência ao contexto social.
As Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, Resolução
02/2001, no artigo 2º, ressaltam que os sistemas de ensino devem organizar-se para assegurar
uma educação de qualidade para todos, cabendo às escolas também o papel do atendimento
aos alunos com NEE. As APAES, criadas na década de 1950 e cujo nome inclui a
terminologia utilizada na época (excepcionais 2 ), participam nos debates pela inclusão,
entendendo que as pessoas devem estar em todos os espaços, pela garantia dos direitos da
inclusão. Em Dom Pedrito, a instituição funciona desde 1974, oferecendo atendimento nas
áreas de estimulação precoce e pré-escola, alfabetização e oficinas de informática,
pedagógicas, de dança e arte, banda e música, teatro, culinária, esporte, equoterapia e
recreação.
Outra Política de Atendimento a alunos com NEE, referência em educação inclusiva, é
o Centro de Atendimento Psicopedagógico – CAP – que, em escolas da rede estadual do Rio
Grande do Sul, subsidia as salas de recursos, transcrevendo materiais didático-pedagógicos
para o sistema Braille e adaptando conteúdos para o formato MEC Daisy, possibilitando aos
estudantes cegos e de baixa visão o acesso ao conhecimento, com materiais específicos de
acessibilidade. Na rede municipal de ensino de Dom Pedrito, o CAP oferece atendimento a
alunos com Dislexia e Transtornos do Déficit de Atenção e Hiperatividade.
Nota-se que a educação inclusiva, ao operacionalizar a educação especial, atua de
forma transversal em todos os níveis e modalidades de ensino e, portanto, deveria estar
presente também nas escolas do campo. Estudos que trabalham com esta problemática, estão
reunidos no livro Educação Especial no Campo, organizado por Kátia Regina Moreno Caiado
(2017) – uma das poucas publicações na área. O propósito da obra é contribuir com elementos
para enfrentar o debate sobre a educação especial. Lopes e Oliveira (2012), refletem sobre o
tema por meio de uma pesquisa qualitativa, instrumentada por análise documental e
entrevistas, visando abordar as questões referentes à acessibilidade e inclusão de crianças com

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NEE na Escola do Campo. Os resultados reafirmam dificuldades para a efetivação das


políticas públicas de inclusão, em especial em Escolas do Campo nas escolas do campo. Os
artigos que integram o livro apresenta diversas perspectivas sobre a temática, incluindo
olhares sobre a Educação de Jovens e Adultos, formação docente, trabalho pedagógico e os
desafios e perspectivas do AEE no campo. Na apresentação do livro, a autora destaca que
foram encontrados dados que instigaram o início de pesquisas que abordassem essa interface
entre educação especial e do campo.

2 Pessoas com deficiência intelectual ou superdotação.

Lopes e Oliveira (2012), refletem sobre o tema por meio de uma pesquisa qualitativa,
instrumentada por análise documental e entrevistas, visando abordar as questões referentes à
acessibilidade e inclusão de crianças com NEE em uma Escola do Campo de Caruaru,
Pernambuco. Os resultados reafirmam dificuldades para a efetivação das políticas públicas de
inclusão, em especial em Escolas do Campo.
Em sua monografia, apresentada à Universidade Federal do Pampa, Santos (2018),
investigou a garantia do direito à educação aos alunos com NEE nas escolas do campo. Neste
sentido, realizaram-se questionários e entrevistas com professores do AEE, apontando que, na
rede municipal de ensino de Dom Pedrito, há três alunos com NEE que residem no campo e
deslocam-se até escolas da zona urbana para estudar, uma vez que as escolas do campo não
possuem estrutura e condições para recebê-los, concluindo-se que o direito à inclusão não
vem sendo garantido para estes alunos.
No trecho acima, fica claro que cabe às Escolas organizarem-se com o intuito de
proporcionar a estes estudantes um ensino de qualidade com todas as condições necessárias
neste processo. Com isso, procuram garantir acesso aos espaços a comunicação e recursos
facilitadores na construção da aprendizagem e atender as necessidades do aluno com NEE.
A área de Educação Inclusiva vêm despertando interesse nos meios acadêmicos,
assim, Dutra (2018) e Veber (2018) são autoras de trabalhos de conclusão de curso, na
Licenciatura em Educação do Campo, com previsão de publicação sobre a temática, sendo
que a primeira apresenta o trabalho final, com um panorama sobre a formação continuada de
professores do campo na perspectiva da inclusão. Já a segunda apresenta um pré-projeto que

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irá analisar as experiências da Educação Inclusiva dos alunos do campo da rede municipal de
ensino de Dom Pedrito.

3. O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO NAS ESCOLAS


DO CAMPO DE DOM PEDRITO

As respostas da Secretária de Educação do município de Dom Pedrito – RS, em uma


entrevista semi estruturada, de cunho qualitativo exploratório, analisada através de uma
perspectiva interpretativa, a partir da técnica Hermenêutica, (a arte de interpretar o sentido da
palavra do autor), por tratar da interpretação de duas vertentes: da realidade (sobre o
encontrado nas entrevistas realizadas) e da teoria (respaldo teórico).
Ao investigar as salas de recursos na rede municipal de ensino de Dom Pedrito-RS,
Conforme a secretária, há 379 alunos do campo matriculados na rede municipal de ensino,
sendo que, 289 alunos freqüentam escolas do campo e 90 alunos freqüentam escolas na zona
urbana. Entretanto, deste universo, não haveria alunos com necessidades educacionais
especiais, provenientes do campo, matriculados em escolas do campo ou urbanas.

Gráfico 1 – Alunos matriculados em escolas municipais

Fonte: Autora (2018)

Entretanto, os dados obtidos por Santos (2018), demonstram que há três alunos

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provenientes da zona rural matriculados em escolas urbanas, como demonstra a Tabela 2.

Tabela 2 - Estudantes com Necessidades Educacionais Especiais do campo matriculados em


escolas municipais

Estudante Escola Escolaridade Residente Idade Diagnóstico

A 1 4° ano Lagoa do Forno 12 Deficiênciaintele


ctual

B 2 8° ano Rincão do Ponche 20 Paralisia Cerebral


Verde

C 2 8° ano Estrada do passo do 18 Deficiênciaauditi


Amor va

Fonte: Santos (2018)

Tais dados são corroborados por uma professora de Educação Especial, em uma
conversa informal, que realiza atendimentos no AEE e CAP do município, e afirma que há
alunos com NEE oriundos do campo matriculados em escolas da zona urbana.
O aparente desencontro de informações mostra diferentes formas de olhar para a
operacionalização das salas de recursos: a secretaria vendo a partir da localização das salas de
recursos, materiais e profissionais capacitados, centradas em escolas Urbanas; e a docente do
AEE vendo a partir do cotidiano do aluno, que lhe é mais próximo. Duas formas distintas de
implementação de uma Política que se cruzam, o que remete pensar que o campo enquanto
área não está sendo contemplado, pois o aluno que dá subsídio a isso, não está sendo visto em
seu contexto histórico.
Quando da entrevista com a secretária de educação, questionou-se sobre a oferta de
formação docente em educação inclusiva na Rede Municipal de Ensino de Dom Pedrito.
Haviam dois possíveis resultados: de que houvesse e de que não houvesse formação
continuada de professores oferecida pela Secretaria Municipal de Educação.
As respostas da secretária foram no sentido de que há oferta de formação (palestras,
oficinas, entre outras) porém, há fatores que interferem: (a) falta de divulgação dentro das
escolas; (b) indisponibilidade por parte dos professores; (c) preparação da escola.
O primeiro fator, conforme destacado pela secretária, deve-se à pouca articulação entre

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equipe diretiva e o corpo docente das escolas, uma vez que os convites para formação são
feitos, porém não há formas efetivas de divulgação interna ou não há liberação de horários
para que os docentes participem das atividades.
Em relação ao segundo fator, a secretária ressalta a importância da participação dos
professores e da equipe diretiva. A chamada para a formação é feita e deixo os professores
muito à vontade para participar, mas acabo me frustrando com o público que participa [...].
O gestor tem que ter mais compromisso com a parte pedagógica, e também participar desses
encontros. Esta indisponibilidade pode ser justificada em função de alguns fatores, como o
professor trabalhar em mais de uma escola e não dispor de tempo hábil para as formações.
Além disso, a secretária não especifica a oferta de formação voltada para a Educação
Especial, mas ressalta suas vivências enquanto docente. Dentro de uma escola eu tive vários
tipos de alunos inclusos, como esquizofrenia, autismo, lesão cerebral, surdo. Eu nunca fui
preparada para trabalhar, eu chegava na escola e já me diziam “olha, tu tem um aluno
assim” e a partir daquele momento eu tinha que correr atrás. Ou corria, ou corria, não tinha
outra opção.
Conforme conversa informal com uma professora da Educação Especial, a
participação nas atividades de formação ocorrem apenas quando há convocatória, sendo que a
participação não é efetiva quando há somente convites da Secretaria da Educação. Ressalta
ainda a necessidade de interesse do professor, que deve buscar sair da sua zona de conforto
para proporcionar o melhor desenvolvimento possível para os alunos com NEE.
Nesse sentido, a LDB assegura que as instituições de ensino devem contar com
“professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento
especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses
educandos nas classes comuns” (BRASIL, 2017).
Assegura-se ainda que cursos de formação inicial de professores “do Magistério às
Licenciaturas, devem dar-lhes a consciência e a preparação necessárias para que recebam, em
suas salas de aula, alunos com e sem necessidades educacionais especiais” (BRASIL, 2004, p.
20).
Em relação a terceiro fator, que diz respeito à preparação da escola para receber alunos
com NEE, a secretária destaca a importância da infraestrutura escolar. Os pais dizem que as
escolas do município estão mais preparadas. Preparadas todas estão ou não estão, a situação

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é a mesma tanto para o estado quanto para o município. [...] Isso é o que as escolas
justificam para mandar os alunos para o município.
Este fator converge para a importância do AEE, principalmente no campo, em função
do transtorno do deslocamento para que tenha esse atendimento. Caiado (2017), ao falar sobre
a formação de professores para o atendimento no AEE, em escolas urbanas, do campo e de
comunidades quilombolas, afirma que pessoas com NEE provenientes de regiões com
particularidades necessitam de acesso à Educação e à atendimentos especializados de saúde,
destacando que estes sujeitos devem sair do anonimato.
Também a secretária de educação do município de Dom Pedrito pontuou, durante
entrevista que as famílias que vivem no campo e que possuem um membro com NEE, tendem
a procurar atendimento de saúde e também atendimento pedagógico, na cidade. Quanto à
participação da família, de modo geral, as respostas da secretária de educação ressaltam que o
comportamento varia de família para família, mas que quando há um período de não
aceitação, muitas vezes justificam-se dizendo que os alunos não têm em casa as dificuldades
e/ou comportamentos relatados pela escola.
A família com a intenção de proteção, às vezes não leva para a escola e algumas vezes
não permite que seja trabalhado como deveria. Quando se nota a resistência da família, ela é
chamada para conversar [...]. A secretária afirma que se a família, mesmo após essa conversa,
continua em situação de não aceitação, é pedido um laudo médico, para que se comprove a
necessidade de atendimento especializado. Estes comportamentos de resistência e
ocultamento da situação podem ser originados a partir das mudanças provocadas pela
presença, no núcleo familiar, de uma criança com necessidades especiais, caracterizando-se
como uma “fuga do ideal” (FIAMENGHI E MESSA, 2007).
Fiamenghi e Messa (2007) afirmam que também as famílias devem receber
atendimentos, no sentido de aprender a lidar com a criança com deficiência, destacando
estudos que ressaltam reações positivas – maturidade e independência – por parte de irmãos
de crianças com NEE. Para além do trabalho realizado com a família, torna-se necessário o
desenvolvimento da comunidade, através do qual as pessoas com deficiência poderão
integrar-se à sociedade, devendo ser implementada por meio de esforços entre pessoas com
deficiências, famílias, comunidades e serviços de educação, saúde e bem-estar
(DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994).

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Caiado (2017) ressalta a importância da família no desenvolvimento de uma pessoa


com deficiência, na perspectiva de que a parceria escola e família conflui na plena realização
dos objetivos. Analisando a procura por atendimento educacional especializado, por parte das
famílias com PNEE, a secretária de educação de Dom Pedrito destaca que surgem situações
de familiares que, ao procurar em escolas do estado, são orientados a procurar escolas
municipais para matricularem seus filhos, justificando que as escolas municipais estariam
melhor preparadas – em termos de infraestrutura e capacitação dos profissionais.
A gente se preocupa muito com as pessoas que chegam até nós, que nem nossas são,
mas nós temos, por exemplo, pais que chegam até nós dizendo assim “A, fui numa escola do
estado que mandaram eu procurar uma escola do município”. Daí eu questiono “Qual o
motivo? Qual a razão?”. Eles dizem “as escolas do município estão mais preparadas”.
Nesse sentido, a secretária ressalta que conhece, por sua prática docente, as duas
realidades – estado e município – e considera ambas aptas a receber alunos com NEE.
A LDB 9.394/96 afirma o dever constitucional do país em relação à oferta da educação
especial, a qual tem seu início na faixa etária de zero a seis anos, durante a educação infantil.
Desse modo, entende-se a necessidade de escolas da rede municipal e estadual de ensino
estarem preparadas para receber alunos com NEE.
Além disso, ressalta-se que o AEE, por ser o ambiente escolar mais adequado para
garantir o contato dos alunos com seus pares de mesma faixa etária, deve estar presente em
todas as escolas, uma vez que promove a estimulação de todo o tipo de interação que possa
beneficiar seu desenvolvimento cognitivo, motor e afetivo (BRASIL, 2004).
Palma e Carneiro (2017) afirmam que recentemente a Educação Especial e Educação
do Campo tiveram seus direitos garantidos por meio de uma trajetória de lutas para conquistá-
los. Entretanto, entende-se que a continuidade dessas lutas é fundamental para que sejam
atendidas as demandas do campo, numa perspectiva de educação inclusiva.
Em Dom Pedrito, segundo conversa informal com uma professora da Educação
Inclusiva, houve avanços a partir da criação do CAP, em 2002, que atendia todos os alunos
com NEE. A partir da implementação de uma sala-pólo de AEE, inserida em uma escola da
zona urbana, foi possível ter a abrangência da demanda, de forma que foram solicitadas nove
salas, sendo que oito atenderam a zona urbana e uma a zona rural do município.
Estas salas foram cadastradas e receberam materiais para sua implementação,

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entretanto, apenas seis encontram-se em funcionamento. Entre os fatores que impedem a


efetivação de atendimentos nas demais escolas, entre elas a única escola do campo a receber
AEE, estão a falta de espaço físico para o AEE e realização de um concurso para os
profissionais da área.
A secretária ressalta que um dos fatores que influenciam as famílias a optar por mudar
para a cidade é, por exemplo, um aluno que precise de medicações injetáveis, que só podem
ser aplicadas em um hospital, ou um aluno que convulsione, tornando-se inviável para a
família permanecer no campo. Às vezes os alunos vêm do campo, não por uma questão
escolar, mas por uma questão de medicação.
Ainda sob o viés do atendimento médico, ressalta-se a necessidade de apresentação de
laudo à escola, para que o aluno possa ser encaminhado ao AEE. Destaca-se também a
importância deste laudo para a compreensão, por parte da família, de que o aluno precisa
receber esse atendimento especial na escola.
A Declaração de Salamanca (1994, n.p.) assegura que “medidas Legislativas paralelas
e complementares deveriam ser adotadas nos campos da saúde, bem-estar social, treinamento
vocacional e trabalho no sentido de promover apoio e gerar total eficácia à legislação
educacional”. Na mesma linha, até os três anos de idade, o AEE se expressa através de
serviços de intervenção precoce que visam otimizar o processo de aprendizagem, respaldado
em serviços de saúde e assistência social (BRASIL, 2008).
Caiado (2017) destaca as dificuldades que as famílias que moram no campo enfrentam
para levar os alunos com NEE aos atendimentos de saúde – psicólogo, fonoaudiólogo,
terapeuta ocupacional – uma vez que o transporte é um fator dificultador.
Além disso, torna-se importante, além do atendimento da pessoa com NEE, também
um acompanhamento da família, que é o primeiro espaço de inclusão da criança. Neste
sentido, Fiamenghi e Messa (2007, p. 239) ao citar Casarin (1999) destacam que a família
passa por um uma espécie luto, ao receber o diagnóstico, uma vez que houve a perda do ideal
do filho perfeito, sadio. Além disso, as expectativas, valores e objetivos da família sofrem
alterações, em função da nova realidade.
No município de Dom Pedrito, uma professora que trabalha em salas de AEE, afirma
que há entraves burocráticos que dificultam o atendimento adequado dos alunos com NEE,
uma vez que antes do laudo, trabalha-se apenas com hipóteses sobre a necessidade de cada

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um. Além disso, a morosidade do laudo acaba por comprometer o aprendizado dos alunos, o
trabalho correto do professor e o direcionamento de atividades individuais.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na atualidade as discussões em torno do termo “inclusão” vem ganhando espaço em


todas as esferas, perpassando as sociais chegando até a Educação. Desta forma, estudos em
torno dessa temática são de suma importância para que alternativas de inserção dos indivíduos
com NEE seja efetivada dentro do contexto da sala de aula. Estas alternativas devem propiciar
ao estudante as mesmas oportunidades e oferta no processo de ensino e aprendizagem, desde
que sejam levadas em consideração suas especificidades e características.
Observam-se duas linhas distintas de pensamento quando aborda a trajetória das
pessoas que vivem no campo e pessoas com NEE, quando se trata de direitos negados e
desigualdade social. A maioria das pessoas que vivem no campo (trabalhadores e filhos de
trabalhadores) e a maioria das pessoas com deficiência são alvos das barreiras, vivenciando
uma constante luta pela garantia de direitos negados. Percebe-se que, há um discurso sobre
certa incapacidade do aluno com NEE que é naturalizado pela sociedade e que ignora suas
potencialidades no processo ensino aprendizagem, criando barreiras que impossibilitam mais
do que as reais limitações. Os fatos ficam mais visíveis no que diz respeito às escolas do
campo com a ausência de políticas públicas seja em educação, transporte, moradia, saúde e
trabalho e revelam a vulnerabilidade que esse público enfrenta para garantir uma efetiva
participação social. Ocupar espaços é preciso para sentir-se parte do meio.
Logo, o AEE implantado nas instituições de ensino ou centros especializados contribui
com orientações significativas quanto à aplicabilidade e funcionalidade dos recursos
disponibilizados, além de otimizar o processo de desenvolvimento e aprendizagem que
conversam com os serviços de saúde e assistência social. Porém, não substitui a escolarização
nas classes comuns, mas são parceiras, para que a formação dos alunos aconteça com
autonomia tanto nas dependências da escola, como fora dela.
Ressalta-se que a implementação deste atendimento não ocorre apenas com base na
estrutura física, o docente deve estar qualificado e atualizado em recursos didáticos e
metodologias que atendam as especificidades dos estudantes considerados como público alvo

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da Educação Inclusiva.
Torna-se importante salientar a obrigatoriedade da oferta do AEE pelas redes de
ensino, uma prática legal de ensino que tem como característica um trabalho simultâneo ao
ensino de sala de aula, preferencialmente na escola que o aluno freqüenta ou em centros
especializados que realizam o atendimento educacional. Ao longo da pesquisa, a articulação
entre instâncias político-administrativas e docentes de AEE tornou-se ainda mais evidente
para a educação do campo. Uma vez que a secretaria não tinha dados sobre estudantes do
campo que são atendidos na cidade, vislumbramos que a gestão preocupa-se com a
organização das salas e não tanto com a realidade sociocultural de seus alunos, a qual acaba
sendo uma tarefa mais a cargo das docentes de AEE.
Para que esse trabalho seja de fato consolidado e a legalidade de inclusão cumpridas se
faz necessário mobilizar as famílias, e a comunidade escolar nas articulações por políticas
públicas educacionais que contemplem as necessidades dos alunos. No caso dos estudantes do
campo, há de se pensar ainda um AEE do campo, para o campo.

Referências Bibliográficas

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A EDUCAÇÃO DO CAMPO NA ESCOLA URBANA: Um olhar sobre uma experiência


interdisciplinar

Tamine Santos Sául112


Marcela da Silva Sokolovicz 113
Miriam Gaier da Costa 114

Resumo

O presente trabalho tem como objetivo relatar uma experiência ocorrida na Escola Marista Santa
Marta, na cidade de Santa Maria, região centro oeste do estado do Rio Grande do Sul, durante o
segundo trimestre do ano de 2018. O mesmo se refere a uma estruturação curricular baseada na
metodologia das Sequências Didáticas, a partir da Abordagem Temática, construída de forma
interdisciplinar, e que, envolveu componentes curriculares da área das Ciências da Natureza (Biologia,
Física e Química), da área das Ciências Humanas (Filosofia, História e Protagonismo Social) e das
Linguagens (Língua Portuguesa), a partir do tema: “Sol, ondas e vida (s)”. A implementação está
ocorrendo em duas turmas de nonos anos, na escola em questão, envolvendo em torno de 72
estudantes, durante o período de um trimestre. A presente experiência demonstrou a relevância em
trabalhar com essa perspectiva de reestruturação curricular a partir de uma problemática atual e
importante para toda a sociedade, a partir da educação.

Palavras-chave: Educação do Campo; Interdisciplinaridade; Abordagem Temática.

Introdução

A Educação do Campo mais que uma modalidade de educação é um projeto de luta


dos povos do campo pelo direito mínimo de igualdade. A mesma existe com o objetivo de
superar o capitalismo em luta por uma formação humana e de qualidade. No Brasil, iniciou
por volta de 1980, quando a sociedade, após o Regime Militar, participou “[...] da organização
de espaços públicos e de lutas democráticas em prol de vários direitos [...]” (OLIVEIRA,
CAMPOS, 2012, p. 237).
Existem três grandes questões que fundamentam a Educação do Campo: a Reforma
Agrária, a Agroecologia e a Soberania Alimentar, as quais devem ser pensadas como eixos,

112
Escola Marista Santa Marta, taminesk8mlks@hotmail.com
113
Escola Marista Santa Marta, marcela.silva@maristas.org.br
114
Escola Marista Santa Marta, miriamgaier.biologia@gmail.com

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para que articulações pedagógicas possam estar auxiliando na compreensão da realidade,


associando teoria e prática (MOLINA, 2011). É apenas nas escolas do campo o lugar onde
devemos discutir essas questões? Ou toda a sociedade precisa de alimento de qualidade?
Pensando nessas perguntas, a Matriz Curricular da Educação Básica do Brasil Marista
(2016, p. 13), ao tratar sobre “A transversalidade orienta para a necessidade de se instituir, na
prática educativa, uma analogia entre aprender conhecimentos teoricamente sistematizados
(aprender sobre a realidade) e as questões da vida real (aprender na realidade e da realidade)”.
Ou seja, os assuntos trabalhados em sala de aula precisam fazer parte da vida do discente.
Nesse sentido, a Sequência Didática (SD) é uma metodologia a partir de situações
didáticas, que tem duração, em média, de um trimestre, e que pode ser aliada a práticas
interdisciplinares (ALVES et al, 2015). Dessa forma, o objetivo deste trabalho foi construir
uma Sequência Didática com o Tema: “Sol, ondas e vida (s)”, onde foi criada a seguinte
situação-problema: “Com o que você se alimenta? Quais as implicações dos “venenos” na sua
saúde? Como os animais são tratados até chegar à sua mesa?”.
Segundo Delizoicov, Angotti e Pernambuco (2011, p. 189) o ensino a partir de temas
rompe com o paradigma tradicional de currículo (Abordagem Conceitual), oportunizando a
partir da Abordagem Temática, uma “[...] perspectiva curricular cuja lógica de organização é
estruturada com base em temas, com os quais são selecionados os conteúdos de ensino das
disciplinas.”.
Como mencionado anteriormente, além de trabalhar com a Sequência Didática, dentro
da área de conhecimento das Ciências da Natureza, no Ensino Fundamental, onde a disciplina
é as Ciências Naturais e, portanto, não existem diferentes professores para os Componentes
Curriculares de Biologia, Física e Química, partiu-se para a construção de uma situação-
problema e de um contexto que, para serem respondidos, precisaram também dos
conhecimentos dos Componentes Curriculares de Filosofia e História, principalmente,
apoiados ainda em Língua Portuguesa e Protagonismo Social. Assim:

A exigência interdisciplinar impõe a cada especialista que transcenda sua própria


especialidade, tomando consciência de seus próprios limites para acolher as
contribuições das outras disciplinas. Uma epistemologia da complementariedade, ou
melhor, da convergência, deve, pois, substituir a da dissociação (JAPIASSU, 1976,
p. 26).

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Com a Abordagem Temática pautada na interdisciplinaridade foi realizada a


estruturação curricular, com base no tema: “Sol, ondas e vida (s)”. O mesmo está sendo
implementado, com duração de um trimestre, nos Componentes Curriculares de Ciências
Naturais, Filosofia e História, nos quais os conceitos científicos, presentes nos Conteúdos
Nucleares da Matriz Curricular da Educação Básica do Brasil Marista (2016), foram
subordinados ao tema.
A partir da seleção dos conceitos científicos e de estratégias metodológicas para a
compreensão do tema, durante os diálogos, sinalizou-se uma ideia inicial: trabalhar com
aspectos da Educação do Campo, mesmo sendo em uma escola urbana. Sentiu-se essa
necessidade pelo fato de ser uma problemática atual e que provoca consequências para toda a
população. Assim, pensou-se em: como as lutas sociais dos povos do campo podem ser
trabalhadas em escolas que não são as do campo?
O objetivo do presente trabalho é a partir do referencial da Abordagem Temática e da
Educação do Campo, demonstrar a importância de falar sobre esta última, em diversos
contextos, a partir de temas e da interdisciplinaridade, objetivando a transformação da
sociedade por meio da educação.

Referencial teórico

A história do Brasil é uma história de lutas, dos povos oprimidos que após a Ditadura
Militar começaram a buscar por uma educação de qualidade, por igualdade para todos os
cidadãos. É uma história da luta de classes, movida pelos Movimentos Sociais, que
reivindicam até hoje pela Reforma Agrária, até então, inexistente em nosso país, ou seja, “[...]
no Brasil nunca houve um processo de Reforma Agrária. Por isso, a concentração da
propriedade da terra aumenta a cada ano, como resultado da lógica de acumulação do capital.”
(STEDILE, 2012, p. 663).
Nesse sentido, a “Reforma Agrária é um programa de governo que busca democratizar
a propriedade da terra na sociedade e garantir o seu acesso, distribuindo-a a todos que a
quiserem fazer produzir e dela usufruir.” (STEDILE, 2012, p. 657). Porém, na sociedade
capitalista que vivemos, ainda há muito a evoluir nesse sentido, para que a população e os
governantes, de maneira geral, e não só os povos do campo e os Movimentos Sociais se

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preocupem em enxergar a Reforma Agrária como uma necessidade da população como um


todo, entendendo a questão da terra como direito de todos que dela possam produzir
respeitando a natureza e toda a biodiversidade existente.
Nesse sentido, pensando na Reforma Agrária como uma necessidade, segundo Stedile
(2012, p. 664 e 665), a mesma “Compreende a necessidade de adoção de novas técnicas
agrícolas, baseadas na agroecologia, que consigam aumentar a produtividade das áreas e do
trabalho em equilíbrio com a natureza e sem uso de venenos agrícolas.”.
Assim, é preciso entender alguns conceitos básicos que envolvem a mudança do
conceito de segurança alimentar para soberania alimentar. A segurança alimentar se resume
em política pública que garanta a alimentação de toda a população, enquanto que a soberania
é algo mais complexo, ou seja, “[...] é o conjunto de políticas públicas e sociais que deve ser
adotado por todas as nações, em seus povoados, municípios, regiões e países, a fim de se
garantir que sejam produzidos os alimentos necessários para a sobrevivência da população de
cada local.” (STEDILE e CARVALHO, 2012, p. 715).
Ainda, é preciso refletir sobre o que de fato é um alimento e o que se entende sobre
respeito à natureza e a biodiversidade existente nela. De um lado há a indústria alimentar que
historicamente defende o argumento de que algumas espécies de animais servem apenas para
exploração e consumo humano, em contrapartida, admite que se tratem outras espécies como
dignas de cuidado, carinho e afeto. Por outro lado, há argumentos que se contrapõe ao
especismo, termo que designa “[...] preconceito ou atitude de favorecimento dos interesses
dos membros de uma espécie em detrimento dos interesses dos membros de outras espécies"
(SINGER, 2010, p.23). Assim, tendo em vista o objetivo do trabalho, se fazem importantes a
compreensão e reflexão sobre os argumentos que defendem e refutam e utilização de animais
como comida, instigando nos estudantes o desejo de saber e transformar a realidade onde
vivem.
Para compreender questões como essas, a área de Ciências da Natureza, sentiu a
necessidade de envolver todos os Componentes Curriculares da área: a Biologia, a Física e a
Química, a partir de uma reestruturação curricular baseada no referencial da Abordagem
Temática, com viés interdisciplinar. Para isso, sentiu-se a necessidade de incluir também,
outros Componentes Curriculares para compreensão do tema, a contar: Filosofia e História
(área das Ciências Humanas) e, também, outros componentes em ações mais pontuais (Língua

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Portuguesa e Protagonismo Social). Dessa forma, na próxima seção estão descritos os


encaminhamentos metodológicos desse trabalho.

Encaminhamentos metodológicos

O presente trabalho realizou-se na Escola Marista Santa Marta, na cidade de Santa


Maria, região centro oeste do estado do Rio Grande do Sul. Após reuniões de estudos e
planejamentos orientados pela coordenação pedagógica, a área de Ciências da Natureza
precisou pensar nas Sequências Didáticas (metodologia utilizada pela escola em questão) de
6º a 9º anos, durante o segundo trimestre do ano que decorre.
O foco desta análise é a SD do 9º ano, que está sendo aplicada em duas turmas com
cerca de 36 discentes cada, com o tema: “Sol, ondas e vida (s)”. Ao selecionar os conteúdos
necessários para a compreensão do tema e para responder a situação problema: “Com o que
você se alimenta? Quais as implicações dos “venenos” na sua saúde? Como os animais são
tratados até chegar à sua mesa?”, percebeu-se a necessidade do conhecimento de outros
especialistas, a contar das disciplinas de Filosofia, História, Língua Portuguesa e
Protagonismo Social, como já mencionado.
Assim, houve diálogos e chegou-se a conclusão do que cada um poderia contribuir e
de que forma. Os conteúdos nucleares de cada Componente Curricular da Matriz Curricular
da Educação Básica do Brasil Marista (2016) envolvidos para a compreensão do tema foram
desmembrados em conteúdos específicos.
Nas Ciências Naturais foram selecionados os seguintes conteúdos específicos:
Movimento Ondulatório (Ondas, Classificação); Som; Espectro eletromagnético, luz, arco
íris, fotossíntese, combustão, respiração e nutrição, aquecimento global e efeito estufa;
Ecologia (conceitos básicos); Cadeias e teias alimentares; Energia e Termodinâmica;
Interações dos seres vivos; Impactos sobre os ecossistemas urbanos e rurais, alimentação e
fluxo de energia. Em Filosofia, a partir do estudo da Lógica Informal, foram desenvolvidos os
conceitos de inferência e argumentação. E, a partir de temas e problemas éticos, trabalhou-se
com aspectos da ética no que se refere aos direitos dos animais, isto é, foi pensado por que os
animais são utilizados como coisas tendo em vista que aqueles que são abatidos para o
consumo alimentar humano são sencientes, ou seja, são capazes de ter sensações como a dor,

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por exemplo. Já, em História, será trabalhada a questão agrária a partir das constituições,
fazendo um contraponto entre as leis, os Movimentos Sociais e o latifúndio.
Ainda, as aulas da Sequência Didática foram estruturadas a partir da dinâmica dos
Três Momentos Pedagógicos (3MP), de Delizoicov, Angotti e Pernambuco (2011), a contar a
Problematização Inicial (PI), Organização do Conhecimento (OC) e Aplicação do
Conhecimento (AC). Sendo que a PI ocorreu com base na situação problema (“Tema,
Problema e Questões orientadoras”). A OC com base na “Contextualização e Aplicação de
conceitos/Atividades” e a AC na “Sistematização e Argumentação/Produto Final”, tudo isso
com base na SD, com um cronograma de final de maio a início de setembro de 2018.
Na próxima seção, a organização e o cronograma desta SD serão melhores explicados.

Desenvolvimento

Com base na Sequência Didática, estruturada a partir da Abordagem Temática, com o


tema: “Sol, ondas e vida (s)” e no problema “Com o que você se alimenta? Quais as
implicações dos “venenos” na sua saúde? Como os animais são tratados até chegar à sua
mesa?”, os mesmos foram apresentados aos discentes e problematizados (PI) a partir das
experiências do Disco de Newton e a observação em prismas, bem como com as seguintes
questões: “Como a luz do sol chega até nós? Porque o céu é azul? As folhas são mesmo
verdes? Como se forma o arco íris? Que cor é o sol? Que roupa costuma secar mais rápido no
varal: branca ou preta? Por quê? Já pensou de onde vem e o que é o seu alimento? O que seria
fluxo de energia? Como ocorre o processo de transformação da energia ao longo das cadeias
alimentares? O que pode caracterizar a má origem de sua alimentação?”.
Na sequência, com o auxílio do data show, já na OC, essas problematizações foram
retomadas a partir de imagens (como, por exemplo, a demonstrada abaixo) e esquemas
construídos em slides e entregues em material de apoio (adaptado de LOPES, 2015), sobre os
conteúdos específicos de Ciências Naturais, citados anteriormente. Foi trabalhado também,
nesse segundo Momento Pedagógico, o documentário: “O veneno está na mesa II” (2014),
com o qual, puderam-se desenvolver discussões sobre o problema real e atual que é a
utilização de agrotóxicos, bem como relacionar os conteúdos de Biologia, Física, Química,
Filosofia e História.

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Legenda: O agronegócio é “pop”, é “tudo”, é tóxico, é cancerígeno, é assassino (PEREIRA,


2018).

Ainda na OC, foi realizada a leitura do livro: “Primavera Silenciosa” (CARSON,


1969) - atividade interdisciplinar com as duas professoras de Língua Portuguesa das turmas -
em grupos, nos quais cada grupo ficou responsável pela leitura de uma parte do texto para
posterior apresentação das principais ideias aos colegas. Após esse momento de discussão e
troca no grande grupo, os estudantes serão orientados pelas professoras na produção de
resenhas críticas/contos sobre a obra.
Também, durante esse período em que os estudantes estavam lendo a obra, já
mencionada, à distância, foi lançado em aula o Produto Final da SD, a simulação de uma
assembleia na câmara de vereadores da cidade de Jaguari (interior do estado). Os estudantes
nessa atividade foram problematizados a partir da reportagem: “No centro do RS, uso de
defensivos agrícolas reduz em 30% o número de produtores de uva em Jaguari”, bem como
pesquisar sobre a lei Nº 3.163, DE 11/07/2017 e olhar o Dicionário da Educação do Campo
(indicados nas referências das orientações do trabalho entregues aos estudantes).
As turmas foram divididas em grupos, são eles: A) pequenos agricultores que plantam
para consumo próprio e para vender na feira de orgânicos do município; B) produtores de uva;

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C) latifundiários que plantam soja, fumo, etc; D) EMATER; E) agrônomos que defendem o
agronegócio; F) agrônomos que defendem a agroecologia; G) pessoas do assentamento do
Movimento Sem Terra (MST); H) grupo representando a comunidade de maneira geral que
precisam do alimento do mercado e da feira; I) representação de alunos da escola de educação
do campo (interior) e J) vereadores. Após a divisão dos grupos, os mesmos tiveram
3horas/aula para realizarem pesquisas no laboratório de informática sobre o assunto destinado
a cada grupo, bem como as referências indicadas.
É importante ressaltar que essa atividade foi iniciada para que os estudantes possam ir
se organizando, refletindo e amadurecendo ideias, bem como possam ter mais argumentos e
subsídios a partir dos demais conteúdos e atividades de todas as disciplinas envolvidas, para
que possam compreender melhor o tema. Assim, cada grupo, independente de sua opinião,
está estudando o segmento da sociedade que representa, de acordo com seu grupo, buscando
argumentos para defender ou não a proibição do uso de agrotóxicos em larga escala
(pulverização com aviões) no município, em questão. Dessa forma, após pesquisa e
organização dos grupos, ocorrerá a simulação de uma assembleia da câmara de vereadores da
cidade para decidir se a prefeitura proibirá ou não o uso dos mesmos (AC).
Na continuidade do trabalho, será lida e discutida a reportagem: “Como podemos usar
o animal como uma coisa, se ele não é uma coisa, se há provas em contrário?”, bem como os
conteúdos específicos da disciplina de História (nível de Brasil) e Filosofia (Inferência e
argumentação), pois as mesmas poderão subsidiar o entendimento dos estudantes sobre a
história dos alimentos, da Reforma Agrária que até hoje não ocorreu em nosso país e entender
melhor os segmentos que os mesmos irão representar, bem como auxiliará na tomada de
decisão consciente e coletiva, para que os estudantes compreendam melhor, inclusive, o
conceito de cidadania e sua participação política na sociedade em que vivemos.
A atividade também contará com a participação das turmas de 8º ano da escola (outra
professora de Ciências Naturais), as quais estarão trabalhando com o sistema
digestório/alimentação e assistirão a discussão da obra: “Primavera Silenciosa” e apresentarão
um júri simulado sobre agrotóxicos, com base no documentário “O veneno está na mesa II”,
já citado, para os 9ºs anos.
Já na AC, em turno oposto, foi produzido com os estudantes, sabão caseiro com o
objetivo de reutilizar óleo de cozinha arrecadado em uma campanha realizada pelos próprios

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discentes no mês que antecedeu a produção - projeto construído pelos estudantes. Esse
trabalho foi importante, pois oportunizou que as questões ambientais fossem trabalhadas. Essa
atividade foi interdisciplinar com o Componente Curricular de Protagonismo Social, que
trabalha com as questões da miniempresa do 9º ano para arrecadar verbas para a viagem do
final do ano, na qual o sabão foi todo comercializado na Festa Julina da escola, exigindo dos
estudantes uma nova produção para reutilizar o restante do óleo arrecadado e também, para
comercializar no próximo evento: Dia da Integração – organizado pela escola para toda a
comunidade.
É significativo destacar que as avaliações, em grande maioria, também serão
interdisciplinares e estão ocorrendo ao longo do trimestre conforme o comprometimento dos
estudantes em cada aula, ou seja, prezou-se pela coerência entre a SD proposta e o modo de
avaliação.

Resultados e discussão
O trabalho interdisciplinar é sempre muito motivador, pois ao nos desacomodarmos
das nossas fronteiras disciplinares, a partir do trabalho coletivo e do diálogo, nos dispomos a
aprender e ensinar aprendendo, através de problemáticas contextualizadas com a vida dos
discentes. Embora, o trabalho em questão não tenha sido uma Abordagem Temática Freireana
(FREIRE, 2014), em que o tema parta de um estudo da realidade, mas sim uma Abordagem
Temática em que o tema foi escolhido pelo coletivo de professores, por se tratar de uma
temática atual e que faz parte da vida diária dos estudantes, obteve envolvimento e
participação dos mesmos durante as aulas.
Aliás, embora a experiência aqui relatada, ainda não tenha sido finalizada, os
resultados se apresentam quase que diariamente, pois como mencionado os estudantes se
envolvem e o perfil das turmas de maneira geral, é bem politizado, ou seja, os discentes
gostam de pesquisar e buscar informações sobre a problemática atual dos agrotóxicos, por
exemplo.
Também, embora a utilização dos 3MP possa ocorrer como estruturantes de currículo
(MUENCHEN, 2010 e PANIZ, 2017), o que não foi o caso, mas sim como dinâmica de sala
de aula, permitiu que a partir das problematizações, houvesse discussões, participação nas
aulas, talvez pelo fato do tema estar relacionado a problemática atual no cenário político do

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Brasil, com projetos do governo para liberação de agrotóxicos e proibição da venda de


orgânicos. Foi muito interessante ver a indignação dos estudantes, ao trazerem para discussão
essas reportagens atuais defendendo o uso de agrotóxicos, bem como durante os momentos de
pesquisas no laboratório quando encontravam “pontos positivos” do uso dos “venenos”, onde
eles chamavam para perguntar se aquele site era falso ou não confiável, o que oportunizou
ampliar a visão crítica deles.
Ainda, uma fala de um estudante na aula de Ciências Naturais, impactou muito, pois
ele questionou: “Sora! Por que a senhora ensinou sobre agrotóxicos pra nós?! Agora toda vez
que eu for comer vou saber que tem veneno!”. Essa fala demonstra o quanto o conhecimento é
necessário para o nosso dia-a-dia.

Considerações

Pensando na questão levantada no início do trabalho: “como as lutas sociais dos povos
do campo podem ser trabalhadas em escolas que não são as do campo?”, consideramos que a
mesma foi respondida, mesmo sem o Produto Final da Sequência Didática ter sido finalizado,
mas o envolvimento e a forma como os estudantes receberam as propostas e vem se
envolvendo nas aulas proporciona um significado bem positivo no nosso trabalho com essa
reestruturação curricular a partir da Abordagem Temática que envolve as situações da
Educação do Campo, com o objetivo de transformar a sociedade a partir da educação.
Assim, é importante considerar que a interdisciplinaridade é fator indispensável
quando tratamos de temas como os presentes na Educação do Campo, pois os mesmos não
podem ser entendidos/resolvidos apenas com as disciplinas existentes mantendo, inclusive,
suas fronteiras. Disciplinas como, por exemplo, a Agroecologia, seriam interessantes de
estarem presentes em nossos currículos.

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STEDILE, J. P.; CARVALHO, H. M. de.; Soberania Alimentar. In: CALDART, R. C. (Org.)


Dicionário da Educação do Campo. Rio de Janeiro, São Paulo: Escola Politécnica de Saúde
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Marista: área de ciências da natureza e suas tecnologias. União Marista do Brasil – Curitiba:
PUCPRess, 2016.

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ESCOLAS DO CAMPO E COMUNIDADES: POSSIBILIDADES DE


FORTALECIMENTO DIANTE DO FECHAMENTO DAS ESCOLAS – O CASO DE
FREDERICO WESTPHALEN, IRAÍ E LIBERATO SALZANO

Vanessa Dal Canton115


Carine Busatto 116
Adivane Bresolin117

Resumo

Esta pesquisa objetiva conhecer quais ações estão presentes ou podem ser fomentadas na comunidade
escolar para o fortalecimento das escolas do campo diante da ameaça de fechamento. O estudo baseia-
se numa pesquisa qualitativa de cunho bibliográfico e descritivo com coleta de dados através de
entrevistas e questionários aplicados a professores, alunos e comunidades nas quais estão inseridas
escolas do campo dos municípios de Frederico Westphalen, Iraí e Liberato Salzano. Em face disso,
afirma-se que há o reconhecimento da comunidade local pela importância de uma escola do campo
permanecer aberta, o que contribui para o desenvolvimento e manutenção das comunidades
fortalecendo os vínculos com o campo, principalmente às crianças e jovens em idade escolar. Observa-
se ainda que as escolas do campo colaboram na formação de sujeitos ativos que reconhecem o papel
do campo num cenário global e que, as comunidades estão dispostas a unir cada vez mais esforços
para lutar em favor do fortalecimento da educação do campo vindo a evitar o fechamento de escolas.

Palavras-chave: educação do campo; jovens; formação; comunidade; desenvolvimento.

1 Introdução

A temática do fechamento das escolas do campo apresenta-se atualmente como grande


inquietação dos profissionais, pais, alunos e municípios onde estão inseridas. Tendo em vista,
a observação de alguns casos da região em que projetos relacionados ao campo e a
comunidade local tiveram força para sensibilizar lideranças e evitar o fechamento de escolas,
é que este trabalho busca responder ao problema de pesquisa de quais ações estão presentes
ou podem ser fomentadas na comunidade escolar para o fortalecimento das escolas do campo

115
UFSM - Universidade Federal de Santa Maria. UAB Polo de Apoio Presencial de Seberi. E-mail:
vanessadalcanton@hotmail.com .
116
UFSM - Universidade Federal de Santa Maria. UAB Polo de Apoio Presencial de Seberi. E-mail:
carine_busatto@hotmail.com.
117
UFSM - Universidade Federal de Santa Maria. UAB Polo de Apoio Presencial de Seberi. E-mail:
adivane.uabseberi@gmail.com.

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diante da ameaça do fechamento.


Sabe-se que a população do campo vem diminuindo nos últimos anos, devido a
mudanças no cenário rural, famílias menores principalmente e políticas públicas muitas vezes
em desacordo com a realidade. Este cenário impulsiona muitas famílias rurais ao êxodo
fazendo com que as mesmas se desloquem para cidades em busca de emprego, nas quais,
muitas vezes se frustram com a situação que não é como a esperada.
As escolas do campo são ameaçadas pelos governantes para que aconteça o seu
fechamento, seguem argumentos de corte de gastos e a diminuição do número de alunos.
Observa-se também a falta de preparo dos profissionais, falta de uma formação adequada à
realidade do campo, o que faz com que ocorra a ausência de práticas voltadas ao campo, o que
muito colabora no fechamento das mesmas que ficam a mercê de políticas que na maioria das
vezes, não levam em consideração as pessoas.
As escolas do campo se inserem num projeto maior de formação de pessoas que
precisam levar em consideração sua história de luta e seu compromisso diante de uma
conjuntura forte e agressiva. Assim, explicam as autoras:

À escola do campo se coloca o desafio de conceber e desenvolver uma formação


contra hegemônica, ou seja, de formular e executar um projeto de educação
integrado a um projeto político de transformação social liderado pela classe
trabalhadora, o que exige a formação integral dos trabalhadores do campo, para
promover simultaneamente a transformação do mundo e a autotransformação
humana (MOLINA e SÀ, 2012, p. 325).

Os projetos do campo devem ser desafiadores e transformados pela própria classe


trabalhadora, os mesmos têm o direito de uma educação digna, de qualidade a ser oferecida
com oportunidades para que haja a formação e transformação humana. Pensando em educação
do campo acredita-se que é necessário um repensar tanto dos governantes quanto do fazer
pedagógico e a união entre os sujeitos envolvidos. Assim, segundo Caldart (2012, p. 262):

A escola tem sido objeto central das lutas e reflexões pedagógicas da educação do
campo pelo que representa no desafio de formação dos trabalhadores, como
mediação fundamental, hoje, na apropriação e produção do conhecimento que lhes é
necessário, mas também pelas relações sociais perversas que sua ausência no campo
reflete e sua conquista confronta.

A escola do campo é a base central para o fortalecimento dos trabalhadores em seus

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territórios, por isso deve ter ações que contemplem suas necessidades com vistas à
permanência e o envolvimento em atividades voltadas para a cultura local. Assim será
fomentada a permanência no campo, quando as atividades forem trabalhadas a partir da
realidade dos sujeitos envolvidos. Está é a visão que devem ter as escolas do campo, como
complementa Caldart (2011) ao afirmar que a escola do campo é o espaço onde os sujeitos do
campo podem colaborar no processo de humanização a partir de suas lutas, trabalho, saberes e
cultura.
Neste sentido, reitera-se que a escola do campo não é uma escola diferente, mas
compreende um conjunto de ideias, intenções, objetivos e expectativas de trabalhadores do
campo devendo ser pensado, planejado e objetivado o envolvimento dos sujeitos para que de
fato ocorra a colaboração para a permanência das pessoas no campo. Levar em consideração o
conhecimento que os mesmos têm da realidade faz com que mais facilmente consigam
descobrir soluções/alternativas para seus anseios proporcionando oportunidade de aprender e
se reconstruir.
O fechamento de escolas do campo colabora para a tessitura da conjuntura atual
agressiva de ter um campo com cada vez menos gente. Verifica-se ainda uma longa
caminhada por maior valorização e reconhecimento da educação do campo. Sabe-se que é um
processo lento, mas não basta estar garantida em diretrizes e leis, é preciso que haja uma
interação maior entre escola e comunidades, entre o conhecimento escolar, os saberes e
fazeres do campo, para que os sujeitos se sintam realmente no e do campo.

2 Princípios básicos da Educação do Campo

2.1. A importância da luta por uma educação de qualidade

Os movimentos sociais incorporam as angústias de um grupo ou comunidade que


perpassam por tensões e contradições de aceitação pelo seu modo de vida em um determinado
local da sociedade. Surgem os mesmos, pois, são forçados a seguirem valores e ações que não
condizem com a realidade social deste grupo. Para chegar até a modalidade de Educação do
campo não foi diferente, muitas movimentações sociais foram realizadas em busca de tornar
importante esse modo de vida e essa modalidade de ensino. Por se sentirem assim, é que os
movimentos sociais agrários buscaram através de suas incansáveis lutas por direitos e
interesses específicos, através das pressões políticas ao poder publico em beneficio do grupo

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geral.
Os movimentos sociais vinham com um grande objetivo, que era criar uma política
que favorecia e defendia a identidade desse grupo para garantir uma Educação que seja no
Campo e do Campo. Pois, eram convictos que, No Campo, teriam suas escolas no lugar onde
viviam, e Do Campo, teria uma metodologia pensada e planejada para essa realidade. Como
exemplifica Caldart (2002, p. 26) “No, o povo tem direito a ser educado no lugar onde vive.
Do, o povo tem direito a uma educação pensada desde seu lugar e com a sua participação,
vinculada à sua cultura e às suas necessidades humanas e sociais”.
É neste sentido que a educação do campo continua sendo um desafio para o Brasil,
pois existe uma diferença social e política da educação rural. O movimento de busca por uma
educação adequada à realidade dos sujeitos do campo iniciou-se basicamente pela luta ao
acesso a terras, já que no Brasil, a disparidade em quantidade de área de terras é enormemente
assustadora. A questão educacional vem em seguida para reforçar esse movimento, criar mais
sustentação e resistência para manter essa estratégia do modo de vida.
A educação do campo trabalha através do diálogo, está vinculada aos valores da
participação e democracia. São ações exercidas pelo povo e para todos. A educação do campo
é vinculada a uma forma de vida específica que foi conquistada através de muitas lutas e
mobilizações sociais, o que se difere da educação rural. “O destinatário da educação rural é a
população agrícola constituída por todas aquelas pessoas para as quais a agricultura representa
o principal meio de sustento” (PETTY et al 1981, apud RIBEIRO, 2012, p. 295).
A educação rural diz respeito, conforme os autores, a indivíduos que residem e
trabalham no campo, que se sustentam através do seu serviço que tem origem da agricultura.
Para esses indivíduos quando existe uma escola na comunidade na qual são inseridos, é
desenvolvida uma modalidade de ensino da mesma metodologia e linha de pensamento que os
estudantes que residem na zona urbana. Não se tem um foco de adaptar os conteúdos e
atividades para a vivência das pessoas e das atividades que delas desenvolvem.
Muitos acabam desistindo de buscar novos conhecimentos para aperfeiçoar o trabalho
no campo, e muitas famílias perdem a determinação e o desejo de continuar na luta pelo
desenvolvimento da família. Acaba-se que muitas desistem, vendem suas propriedades e vão à
busca de um salário mensal na cidade para manter-se. Ou acabam por se tornarem
propriedades esquecidas e desleixadas sem um retorno social e financeiro como poderiam

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retribuir, haja vista, a educação não tem ligação com a realidade a fim de estimular a
melhoria, o entendimento, o conhecimento científico e o querer por continuar na lida com as
atividades da propriedade familiar.
Salienta-se que a educação do campo é uma modalidade de educação pensada, criada e
planejada pelos indivíduos do campo para o educando que vive no campo. Certamente com
um propósito único e direcionado para essa clientela, que apresenta constantes situações de
dificuldades no modo de vida e de produção em geral.

A Educação do Campo envolve diversos níveis e modalidades de ensino, possui


legislação própria e está vinculada a um projeto de desenvolvimento sustentável,
articulado com outras instituições ligadas ao meio rural. O objetivo é qualificar os
espaços escolares e garantir o acesso à educação, contribuindo para a permanência
dos jovens no meio rural. (SEDUC, 2018).

Conforme a Secretaria da Educação o objetivo da educação do campo é de qualificar


os meios escolares para a permanência dos jovens no espaço onde vive garantindo assim a
manutenção do modo de vida, a cultura com a continuidade dessa classe tão importante de
fundamental importância para o país. É de extrema importância para os meios social, cultural
e econômico, a permanência e funcionamento dos movimentos e grupos do meio rural.

2.2 A importância de uma formação adequada à realidade do campo

Um dos grandes problemas enfrentados na educação do campo é a falta de preparação


dos profissionais para trabalhar com tal realidade. Não é possível estabelecer relação entre
educação e trabalho quando não se consegue adentrar na realidade daqueles com que trabalha,
ou seja, no contexto real de vida dos alunos. Preocupado com esta dificuldade, Pinto (1981
apud RIBEIRO, 2012, p. 296) “refere-se aos professores justificando que eles não recebem
uma formação adequada para lidar com a realidade do campesinato, por isso seu desinteresse
em estabelecer relações com as comunidades, quando encaminhados a trabalhar nas áreas
rurais.”
De fato, a formação dos profissionais deveria estar na base de um plano ou projeto da
educação do campo. Se não existe formação adequada, também não pode haver interrogações
sobre um trabalho educativo que não vá ao encontro de práticas em favor do campo. Esta é
uma afirmação que permeia o subconsciente da maioria das pessoas. No entanto, tem-se

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conhecimento de bons exemplos de escolas do campo que conseguem fazer a diferença


mesmo enfrentando uma série de dificuldades. Exemplos estes que têm conseguido força
suficiente para evitar o fechamento de escolas.

O campo precisa de professores que sonhem os mesmos sonhos que os campesinos


sonham. Que sintam as mesmas angústias e, principalmente, que estejam dispostos a
lutar por estes sonhos e pelas resoluções de seus problemas e, infelizmente, essa
ainda não é a realidade hoje vislumbrada pela educação campesina. (PORTAL DA
EDUCAÇÃO, 2012).

Os professores são profissionais essenciais na execução de uma proposta educativa de


acordo com a realidade do campo. É necessário que entendam o cotidiano da vida dos seus
alunos, estimulem e sonhem junto com as possíveis melhorias da comunidade. São
responsáveis também por colaborar através das suas práticas diárias na permanência destes
jovens no campo. Isto acontece por meio do conhecimento de suas lutas, história, cultura e
papel num cenário global, no qual todas as pessoas dependem da agricultura familiar para se
alimentar cotidianamente.
Complementar a essa ideia, Caldart (2001, p. 141) faz refletir o papel dos professores
de escolas do campo, dizendo que:

Toda vez que a escola desconhece ou desrespeita a história de seus alunos, toda vez
que se desvincula da realidade dos que deveriam ser sujeitos, não os reconhecendo
como tal, ela escolhe ajudar a desenraizar e a fixar seus educandos num presente
sem laços. E se isto acontecer com um grupo social desenraizado ou com raízes
muito frágeis, isto quer dizer que estas pessoas estarão perdendo mais uma de suas
chances (e quem garante que não a última?) de serem despertadas para a própria
necessidade de voltar a ter raiz, a ter projeto. Do ponto de vista do ser humano isto é
muito grave, é violentamente desumanizador.

Reitera-se a fundamental contribuição da escola comprometida e responsável na


formação de sujeitos do campo. As palavras de Caldart (2001) fazem pensar e reafirmar o
sentido de lutar juntos pelo respeito às raízes dos educandos do campo. Contudo deve-se
enaltecer que não é somente a formação dos professores que levará as escolas do campo ao
âmago do desenvolvimento. O que contribuirá é um conjunto de ações que envolvem:
políticas públicas, infra-estrutura, construção de um projeto político pedagógico, uma
proposta que dialoga com a necessidade da comunidade, acesso a escola e estruturação ampla

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da comunidade e do governo, entre outros fatores. Com todos os pontos ressaltados pode-se
sim haver uma grande transformação na educação do campo.

2.3 A realidade da ameaça e do fechamento das escolas do campo

O histórico da educação do campo no Brasil, segundo os censos escolares e o


levantamento de dados estatísticos educacionais em âmbito nacional realizado anualmente
coordenado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
(INEP), demonstram que sempre foi deixada em segundo plano, talvez por uma questão social
e cultural. Aparentemente, as escolas urbanas são mais bem vistas têm mais condições
favoráveis a sua viabilidade do que as rurais. Estas por sua vez acabam ficando a mercê de
políticas que garantem a continuidade de suas atividades ou o cancelamento
As Diretrizes Complementares da Educação Básica do Campo afirmam o
oferecimento das condições para a viabilidade de quaisquer atividades com respeito às
diversidades dos sujeitos do campo. As diretrizes asseguram ainda que as escolas do campo
devem oferecer todo acervo pedagógico e de infra-estrutura, o qual seria nada mais que um
direito de qualquer aluno usufruir. O grande ponto é que não é assim na realidade, como
mencionado nas entrevistas das escolas pesquisadas, sofrem para manter as estruturas físicas
básicas, pois, são poucos os recursos devido ao baixo número de alunos e o repasse vem
através da quantidade de matrículas.
O campo vai além de um grupo ou comunidade de pessoas com um espaço geográfico
e cultural diferenciado, da produção agrícola, do trabalho manual ligado ao meio, ou de um
contexto social mais humilde, ele traz consigo uma valorização para com a instituição escolar.
A escola é parte essencial para a comunidade manter-se viva. Sabe-se que é através da
educação que tanto meio rural quanto meio urbano buscam seus direitos, sendo algo de valor
inigualável deve-se obter a sua devida importância, e levar em conta a realidade das
necessidades de tais sujeitos.
Os movimentos sociais, comunidade e a própria academia buscam lutar por uma
educação de qualidade, na qual seja levado em consideração que no meio rural também se
encontra uma cultura significativa, uma história de vida, um povo com costumes, hábitos
diferentes, com um conhecimento empírico baseado em suas vivências. Tem por objetivo

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salientar a extrema necessidade de ter uma escola que vivencia os costumes e valores da
comunidade, além dessa instituição levar em conta as peculiaridades dos alunos. Sendo assim
a educação rural é fundamental para o desenvolvimento da comunidade.
Nos últimos anos as escolas do campo estão sendo ameaçadas pelos governantes, sabe-
se que cada vez mais diminui a população do campo o que vem acarretando, ou seja,
dificultando o andamento das atividades nas mesmas, pois faz com que as turmas fiquem cada
vez menores. Muitas vezes ficam poucos alunos o que não é viável para o governo manter
todas as turmas em funcionamento. Porém, sabe-se que os alunos têm o direito de receber
uma educação de qualidade sem deixar de lado as peculiaridades de sua região.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9.394/96) garante em seu
Artigo 28 a oferta de um sistema de ensino diferenciado para o campo que promova as
adaptações necessárias a sua adequação, levando em consideração às peculiaridades do
campo. Neste sentido, os conteúdos e metodologias são organizados de acordo com a
realidade levando em consideração o ciclo agrícola e as condições climáticas de cada região.
Observa-se nos municípios das escolas entrevistadas que comunidades que não
possuem escolas em funcionamento são comunidades com menos moradores e com
participação reduzida em qualquer que for o evento. Pode-se dizer então que uma escola
fechada contribui para o enfraquecimento da comunidade na qual está inserida. São notáveis
as diferenças de comunidades que possuem escola funcionando são mais ativas, mais
participativas e organizadas. Parece que existe um ânimo diferente, algo que move as pessoas
a se empenharem por uma mesma causa. Este é um bom motivo pela luta de permanência das
escolas do campo.
As escolas podem colaborar para a permanência dos jovens no campo, utilizando-se
de ferramentas que venham contribuir, incentivar, fortalecer o gosto pelas atividades
agrícolas, que dêem embasamento para o cultivo de alimentos, a geração de empregos, renda
e qualidade de vida no campo.
Com relação ao papel das comunidades no enfrentamento da ameaça de fechamento
das escolas do campo, pode ser citada a lei 12.960/2014 que altera o artigo 28 da LDB
9394/96 quando afirma que:

Parágrafo único: O fechamento de escolas do campo, indígenas e quilombolas será


precedido de manifestação do órgão normativo do respectivo sistema de ensino, que

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considerará a justificativa apresentada pela Secretaria de Educação, a análise do


diagnóstico do impacto da ação e a manifestação da comunidade escolar. (LEI Nº
12.960/2014).

É nesta óptica que a comunidade se faz muito importante na luta contra este ato dos
governantes, se a mesma for unida e atuar com o objetivo de fazer com que a comunidade
escolar continue a funcionar, através de manifestações é possível reverter estas situações. Se a
lei deixa claro que as escolas juntamente com suas comunidades podem reivindicar
adaptações e melhoras para incentivar o aluno a permanecer no campo, acredita-se que as
escolas serão fechadas se a comunidade escolar não estiver preparada para lutar pelo direito
de permanência no campo.

3 Metodologia

O presente estudo é oriundo de um projeto desenvolvido na disciplina de Seminário


Integrador II no curso de Licenciatura em Educação do Campo e busca conhecer as ações
desenvolvidas nas escolas de campo e o fortalecimento junto com a comunidade local, na
busca por estratégias de fortalecimento diante da ameaça de fechamento. A pesquisa foi
realizada em três municípios, nos quais as alunas pesquisadoras estão inseridas
profissionalmente e/ou pessoalmente, sendo: Iraí, Frederico Westphalen e Liberato Salzano.
As três primeiras escolas visitadas aceitaram participar da pesquisa e serão
referenciadas no decorrer do texto como: Escola 1, Escola 2 e Escola 3, sendo
respectivamente dos municípios de: Iraí, Frederico Westphalen e Liberato Salzano. O que se
dispôs a estudar refere-se a uma temática bastante complexa e atual que envolve diferentes
atores. Para tanto, o universo da pesquisa compreendeu o corpo docente, o corpo discente e a
comunidade onde a escola está inserida mediante Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido.
Assim, as entrevistas e questionários foram feitos conforme a seguinte organização e
objetivos:
a) Corpo docente: entrevista com o (a) diretor (a); entrevista com o (a) coordenador (a)
pedagógico (a) e entrevista com um professor (a). Teve como objetivo saber que alternativas o
corpo docente pensa ser importante para o não fechamento das escolas do campo. A escolha

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do professor (a) foi por convite.


b) Corpo discente: entrevista com um aluno de cada ano (5º, 6º, 7º, 8º e 9º). Com a
aprovação da direção das escolas, os alunos foram convidados a se reunir em sala separada
dos demais para responder ao questionário. A pesquisa com o corpo discente buscou saber
sobre a representatividade da escola para suas vidas e formação.
c) Comunidade: a entrevista foi realizada com cinco membros da comunidade, sendo
estes: um membro do Círculo de Pais e Mestres, o presidente da comunidade, dois pais e/ou
mães de alunos da respectiva escola e um membro da comunidade que não tenha filho
estudando na escola. Na oportunidade das entrevistas, na falta do presidente da comunidade,
por exemplo, buscou-se conversar com outra pessoa que fosse membro do Conselho desta
mesma. O objetivo da entrevista era ter a opinião destas pessoas quanto à representatividade
da escola para o desenvolvimento e/ou manutenção da comunidade.
Para compor o quadro teórico da pesquisa utilizou-se de um estudo bibliográfico
acerca das concepções básicas da Educação do Campo, com o objetivo de contextualizar e
compreender e balizar a realidade a ser estudada. Num segundo momento do trabalho foi
realizada a coleta, análise e interpretação dos dados que expressaram a realidade pesquisada,
no intuito de conhecer o desenho da educação do campo nos municípios de Frederico
Westphalen, Iraí e Liberato Salzano. Para a coleta de dados foram utilizadas entrevistas e
questionários, complementados pelo método da observação, haja vista, objetivou-se um
trabalho descritivo levando em conta o processo e não somente o resultado, com a finalidade
de apresentar um significado que seja útil do nível pessoal ao social.
A pesquisa de cunho qualitativo buscou responder à inquietação inicial deste projeto
trazendo para dentro do processo os atores que fazem parte dele e assim, buscar possibilidades
juntos, pois, a resposta deve vir do interior sendo trabalhada de forma horizontal. Teve-se
como preocupação inicial levar à comunidade a discussão sobre a importância de se
permanecerem abertas as escolas do campo, já que elas se incluem num projeto maior que
configura a manutenção das comunidades e da vida no meio rural. Além disso, as entrevistas e
questionários responderam de forma positiva, na sua grande maioria, alternativas de
fortalecimento das escolas do campo.

4 Resultados e discussão

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4.1 No universo da pesquisa: os docentes das escolas do campo

A primeira pergunta do questionário aplicado aos profissionais da educação das


escolas do campo buscou conhecer as atividades que as mesmas promovem que seguem na
direção do intuito da permanência dos jovens no campo. Sendo assim, duas escolas – Escolas
1 e 3 – desenvolvem ações que envolvem o preparo do solo, o plantio e os cuidados
necessários até a colheita, resultando em: horta, pomar, jardinagem, estufa, produção de
mandioca, amendoim, batata-doce e morango, principalmente. Conforme relato da Escola 3,
os alunos vivenciam na prática a importância da agricultura familiar para a sustentabilidade.
Destaca-se a relevância destes cultivos em espaço escolar, pois, além de contribuírem
para a valorização do campo e a produção de alimentos feita pelos agricultores familiares em
sua maioria, estes produtos colhidos servem em primeiro lugar para abastecer e enriquecer a
merenda escolar. Para exemplificar esta questão, chama-se atenção à resposta da
coordenadora pedagógica da Escola 1: “Sim. Desenvolvemos projetos permanentes de jardim,
horta e estufa. Os produtos cultivados são utilizados na merenda escolar. Como o terreno da
escola é muito extenso, cultivamos batata-doce, milho, amendoim, feijão e mandioca, além de
árvores frutíferas.”
A Escola 2 afirma que quando possível desenvolve ações voltadas à permanência do
jovem no campo. Aborda como exemplos, a participação em Feiras, Dias de Campo e outras
atividades em parceria com a Emater/RS ASCAR. Com relação à aproximação com esta
entidade de extensão rural, as outras duas escolas também afirmam sua contribuição, mas é
enfatizada pela Escola 3 que afirma ter a presença dos extensionistas durante todas as ações
principais que dizem respeito à agricultura.
As Escolas 1 e 3 já sofreram ameaças de fechamento. Os principais motivos são: o
baixo número de alunos e corte de gastos. Conforme relato dos profissionais da Escola 3, no
início deste ano a mesma foi informada pela SEDUC – Secretaria de Estado de Educação e
Qualidade de Ensino - que funcionaria em apenas um turno, porém, com a mobilização e o
apoio da comunidade, foi revertida esta situação. Os docentes reiteram que o que teve grande
influência para o não fechamento foram as ações desenvolvidas através do projeto voltadas a

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atividades do campo e isto levou a um comprometimento ainda maior da equipe escolar com a
comunidade em geral.
É possível perceber a influência de projetos como os citados acima e a presença da
comunidade no momento de tomar a decisão de fechar uma escola do campo. Assim, o
exemplo da Escola 1 demonstra a força do povo unido por uma mesma causa já que a escola
foi ameaçada de fechamento em duas ocasiões, conforme explica:

[...] Na primeira, o principal motivo foi o baixo número de alunos (fechamento total)
e na segunda, neste ano (2018) foi fechado um turno, alegando que o número de
salas é suficiente para o atual número de alunos. Situação esta que foi revertida pela
comunidade escolar, juntamente com a 20ª CRE e Prefeito Municipal. (Professor 1,
2018).

A manifestação da comunidade, conforme a Lei 12.960/2014 que altera o artigo 28 da


LDB 9.394/96 se faz importante instrumento de análise antes que seja tomada a decisão de
fechar uma escola do campo. Nesse sentido, reconhecendo as fragilidades de cada Escola
visitada, mas também, percebendo a luta por continuarem sua jornada apoiadas pela
comunidade, os docentes enalteceram as alternativas que pensam ser importantes para o
fortalecimento das instituições que viriam ao encontro do não fechamento. Para tanto, dentre
as alternativas mais citadas, o desenvolvimento de projetos e/ou práticas voltadas à realidade
do campo é a que mais se destaca seguida de uma formação adequada aos profissionais e o
aumento do número de alunos.
Correlacionada ao baixo número de alunos, realidade enfrentada pela maioria das
escolas do campo, está a dificuldade financeira e a falta de recursos humanos, o que por vezes
acarreta na sobrecarga de trabalho como relata a Coordenadora Pedagógica da Escola 1: “Por
ser uma escola com um número baixo de alunos, dispusemos de poucos recursos humanos,
uma vez que são vários projetos desenvolvidos, sobrecarregando alunos, professores,
funcionários e, principalmente, direção”. Sobre a dificuldade financeira, a Diretora da mesma
escola complementa: “[...] O que mantém financeiramente nossa escola é a Nota Fiscal
Gaúcha que desenvolvemos um grande trabalho e a produção de alimentos na própria escola,
também tenho que ressaltar a contribuição dos pais”.

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Abaixo relacionado apresenta-se uma tabela com todas as alternativas que os docentes
afirmam ser importantes para o fortalecimento das escolas do campo e as dificuldades que
estas enfrentam. Em negrito, as respostas que apareceram com mais frequência.

Figura 1 - Alternativas de fortalecimento e dificuldades das escolas do campo


relatadas por docentes:

Fonte: Elaborada pelas autoras.

As escolas que relataram terem sofrido ameaça de fechamento, enfatizaram o baixo


número de alunos como principal motivo para esta atitude de governantes. De fato, isto é uma
dificuldade real das escolas, haja vista, o campo possui menos gente e as famílias têm menos
filhos. Reunir alunos de duas escolas do campo é uma alternativa apresentada por uma
moradora da Comunidade 1. No município existem duas escolas próximas, porém, uma
estadual (Escola 1 que participou da pesquisa) e outra municipal. A sugestão dela é que os
alunos da municipal (são em menor quantidade) viessem estudar na estadual. Esta é uma

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possibilidade já enunciada pela Administração Municipal aos docentes da escola, porém, estes
rejeitaram de imediato até o presente momento.
Conforme docentes da Escola 2, outra dificuldade que enfrentam é a desmotivação e
desinteresse dos alunos. Segundo eles, a maioria dos pais delega suas funções para a escola,
não cumprindo seu papel primordial em casa. A escola responsabilizada por este e outros
tantos compromissos, não consegue dar conta, fazendo aquilo que pode com o que tem
convivendo ainda com a desvalorização profissional.
No que tange a participação da comunidade na vida escolar, a Escola 1 enfatiza sua
realidade como bastante positiva, relatando a participação ativa dos pais quando convidados a
virem à Escola e fazem muitas doações de alimentos, principalmente. Avaliam como
excelente e de suma importância o envolvimento das famílias na vida escolar. A Escola 2
entende que a comunidade poderia participar mais e a Escola 3, comenta que ainda algumas
famílias não se envolvem na vida escolar, outras têm resistência em participar, mas quando
solicitadas, a maioria participa.
Em face do exposto, salienta-se que o espaço rural apresenta-se como um espaço de
possibilidades. Sobre isto, Arroyo et al (2004, p.15) diz que:

Esta visão do campo como um espaço que tem suas particularidades e que é ao
mesmo tempo um campo de possibilidades da relação dos seres humanos com a
produção das condições de sua existência social, confere à educação do campo o
papel de fomentar reflexões sobre um novo projeto de desenvolvimento e o papel do
campo neste projeto. Também o papel de fortalecer a identidade e a autonomia das
populações do campo e ajudar o povo brasileiro a compreender que não há uma
hierarquia, mas uma complementaridade: cidade não vive sem campo que não vive
sem cidade.

A educação do campo precisa ser pensada a partir das singularidades de cada espaço
valorizando os saberes populares e a cultura dos seus sujeitos. Assim, é que a proposta
pedagógica de cada escola precisa ser configurada como práticas educativas em favor dos
sujeitos do campo a partir das suas realidades diversas, pois, torna-os atores e autores do
próprio processo educativo relacionando seus conhecimentos empíricos com saberes
científicos que impulsionam a transformação do espaço onde vivem e produzem.

4.2 No universo da pesquisa: os discentes das escolas do campo

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A entrevista com discentes buscou conhecer a representatividade da escola para suas


vidas e formação. Para elucidar as respostas dos alunos, apresenta-se abaixo a figura que
aborda a partir de palavras-chave o que mais ficou saliente nas respostas de acordo com as
respectivas interrogações:

Figura 2 - Entrevista com corpo discente das escolas do campo:

Fonte: Elaborado pelas autoras.

Com vistas a exemplificar ainda mais o contexto da escola na primeira questão,


destaca-se a resposta do Aluno do 6º ano da Escola 1 ao justificar o que mais gosta na sua
escola:

É o espaço físico que é amplo e tem o campo, a estufa, a quadra, a merenda boa e
nutritiva, o parquinho, pela escola ter menos quantidade de alunos as aulas são mais
proveitosas e com isso há uma melhor aprendizagem e tornam os alunos unidos e
participativos e nós respeitamos os professores.

Na resposta do aluno é possível ver o desenho da sua escola e a impressão que ele tem
da mesma. Assim, outras respostas apontam para a tranquilidade do lugar, as atividades
práticas de produção de alimentos e a satisfação em comer estes alimentos na merenda. Para

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tanto, destaca-se a representatividade das escolas para os alunos, independente da idade


escolar. A escola constitui-se como um lugar de importância infinita, pois, é comparada a uma
segunda casa, uma segunda família, devidas amizades cultivadas e aprendizados vivenciados.
Quanto mais próxima a realidade das famílias (de vida e de produção) estiver do contexto
escolar, maior a valorização e o reconhecimento dos alunos para com o espaço onde vivem.
Assim, a resposta do aluno do 6º ano da Escola 1 salienta esta importante aproximação
de contextos e aprendizados quando afirma que a escola colabora para a sua permanência no
campo: “Sim, pois aqui nós criamos um vínculo com o local e se nós mudarmos de escola, por
exemplo, for para a cidade, nós perdemos o vínculo com o campo e passaremos a não
valorizar mais a zona rural”. Outro aluno do 8º ano da Escola 3 complementa:

A escola colabora com nossa permanência no campo porque é ali que aprendemos
como devemos trabalhar para poder em casa praticar, onde aumenta o amor pela
terra, é na escola que aprendo que devo comer alimentos saudáveis e sem agrotóxico
através de palestras e de práticas.

Sob esta óptica, pode se afirmar que as escolas do campo representam aos alunos um
espaço de construção de conhecimentos validados na realidade de suas famílias, um lugar
bom de estudar onde muitas amizades são cultivadas e diversas experiências são vivenciadas
cotidianamente. Nas respostas, ficou claro que os alunos têm consciência sobre a importância
da escola e o que ela representa em suas vidas e formações. Ainda, apresentam possibilidades
de luta contra o fechamento das escolas. Possivelmente, estas alternativas já foram
experimentadas em face de ameaça de fechamento das duas escolas no início deste ano.
É nesta direção que se desenvolve um processo educativo que tem como princípio
balizador o trabalho. Trabalho este que leva em conta a realidade dos educandos e volta-se
para ela de maneira ressignificada, revisitada, agora com uma bagagem de conhecimentos
ampliada. Além disso, “‘educar é humanizar’, é cultivar os aprendizados de ser humano”.
(CALDART, 2003, p. 52). As pessoas aprendem umas com as outras, aprendem fazendo,
lutando, produzindo e reproduzindo cultura, afirma a autora.

4.3 No universo da pesquisa: as comunidades das escolas do campo

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Em conversa com membros das comunidades, envolvendo pais/mães de alunos,


membro do Círculo de Pais e Mestres e presidente da comunidade, buscou-se compreender
qual a representatividade da escola para o desenvolvimento e/ou manutenção da comunidade.
De maneira geral, pode ser afirmada a grande importância de uma escola para a comunidade.
Os entrevistados reconhecem que na relação de troca que há entre uma e outra, acontece a
valorização e reconhecimento das pessoas e do lugar onde vivem. A escola representa vida
ativa das pessoas que a constituem e estas por sua vez, envolvem-se com as causas da escola
de maneira comprometida e atuante.
Na figura abaixo, é possível visualizar as principais respostas que foram obtidas na
aplicação dos questionários.

Figura 3 – Entrevista com as comunidades das escolas do campo:

Fonte: Elaborado pelas autoras.

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Nas três escolas, há a ocorrência de respostas que afirmam a participação da


comunidade em eventos organizados pela escola. Na Escola 1, por exemplo, acontece o
envolvimento de uma para com a outra, ou seja, quando acontecem eventos na comunidade, a
escola colabora nos trabalhos, assim, a escola pode também contar com a ajuda dos membros
da comunidade em suas programações. “Na escola a gente se sente em casa”, afirma um
membro do Conselho da comunidade da Escola 1.
Vale ressaltar as colocações do presidente do Conselho Escolar e de um membro da
comunidade da Escola 1 quando afirma que essa aproximação que existe entre comunidade e
escola depende muito das pessoas que fazem a gestão de cada um dos locais. “O gestor
carrega os demais para o mesmo rumo” – afirmam. O exemplo disso é a premiação que a
escola ganhou com o trabalho feito acerca da Nota Fiscal Gaúcha e a colaboração da
comunidade com a merenda escolar. Outra iniciativa é a oferta de cursos ministrados pela
Emater/RS ASCAR dentro da escola, oportunizando a participação não só de alunos, mas
também da comunidade.

A escola contribui para o desenvolvimento ou a manutenção da comunidade, pois


acredito que seja um local de muito aprendizado e isso colabora para podermos
manter as pessoas na comunidade, pois se não tivermos a escola em nosso meio, os
alunos vão se deslocar para a cidade, onde muitos pais mudam para lá e as
comunidades acabam diminuindo e muitas vezes acabando [...]. (PAI/MÃE DE
ALUNO DA ESCOLA 3, 2018).

“Poderia haver mais incentivo por parte do governo às escolas do campo, assim os
jovens se motivariam a ficar no campo ao invés de ir até a cidade para estudar”, sugere um
pai/mãe de aluno da Escola 1. Uma proposta educativa para o campo precisa se preocupar
com o desenvolvimento deste espaço como um todo não o visualizando como um mero
instrumento de reprodução do sistema capitalista vigente. Assim, a educação do campo
configura-se como importante instrumento, mas não o único, para desenvolver este espaço em
seus aspectos sociais, econômicos e ambientais.

5 Conclusão

O estudo que se apresenta buscou conhecer quais ações estão presentes ou podem ser
fomentadas na comunidade escolar para o fortalecimento das escolas do campo diante da

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ameaça de fechamento. O universo da pesquisa compreendeu escolas do campo de: Frederico


Westphalen, Iraí e Liberato Salzano e seus atores, sendo eles: o corpo docente, o corpo
discente e a comunidade local.
Assim, diante das realidades pesquisadas, de modo geral, pode se afirmar que não é
possível visualizar uma proposta de educação do campo que não esteja ligada a um projeto
popular de educação e desenvolvimento para o país, ampliando assim, o leque de debates
acerca dos problemas existentes no meio rural. É preciso políticas setoriais de combate à
exclusão social, ao êxodo rural, ao analfabetismo funcional, à agricultura familiar, à formação
do professor, para que a luta por uma educação do campo não caia em medidas meramente
paliativas (NASCIMENTO, 2004).
Desse modo, a educação do campo se diferencia da educação rural, haja vista, a
educação do campo se preocupa com a formação humana do educando, se envolve na vida
cotidiana da comunidade com o intuito de apoiar com ações voltadas à sustentabilidade das
famílias que se encontram no campo e para o bem comum de todos. Já na educação rural, a
escola está localizada no meio rural, mas não são desenvolvidas atividades relacionadas a este
espaço, ou seja, o espaço, o lugar de onde vêm os alunos. Pode-se resumir dizendo que o
pensar pedagógico não é voltado para a realidade dos sujeitos que ali se encontram.
As diferenças teóricas entre educação do campo e educação rural se fazem presente na
realidade pesquisada. Das três escolas visitadas, uma delas, não desenvolve ações voltadas ao
campo, afirma apenas desenvolver quando possível por meio de visitas a Feiras, Dia de
Campo, isto é, a escola demonstra responder aos convites que recebe e afirma estas serem as
ações voltadas a sua realidade. A resposta de seus alunos quando questionados sobre a
colaboração da escola para sua permanência no campo comprova a ausência de práticas nesta
direção.
Por outro lado, destacam-se as práticas que fortalecem as escolas do campo e já
demonstrou sua força aliada a presença da comunidade no enfrentamento de ameaças de
fechamento. Os projetos que envolvem os alunos em ações com horta, pomar, estufa,
jardinagem entre outros cultivos, demonstraram ser instrumentos colaboradores no
fortalecimento de vínculo com a terra, com a origem, com o lugar, enfim, pode-se resumir em
vínculo de pertencimento. As respostas quanto à representatividade da escola aos alunos pode
comprovar esta afirmação. Mesmo pequenos, reconhecem a escola como “segunda casa” e já

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apresentam alternativas de luta contra o fechamento. Isto significa preocupar-se com uma
instituição que é importante na vida deles.
A comunidade por sua vez reconhece e enaltece o valor de uma escola no e do campo.
As pessoas se mostram mais ativas, organizadas, comprometidas, preocupadas com uma causa
maior, ou seja, com a formação e permanência dos jovens no campo. Talvez, ainda seja
necessário, buscar mais pessoas para a luta, não só da comunidade, mas também lideranças
e/ou representantes de entidades que possam colaborar com projetos que venham ao encontro
do fortalecimento de práticas educativas que somem num plano de permanência das escolas
do campo.
Diante disso, tem-se o reconhecimento do papel fundamental dos profissionais da
educação que promovem todas estas ações. Mesmo com dificuldades de falta de recursos
humanos e financeiros, com lacunas na formação, as escolas conseguem fazer a diferença e
integrar a comunidade escolar em suas ações. Sabe-se que o educador do campo precisa cada
vez mais se comprometer com a educação e com os sujeitos que ali se encontram conhecer as
peculiaridades culturais, sociais, econômicas e políticas do campo.
A educação do campo é fruto de muitas lutas, principalmente dos movimentos sociais,
para tanto não pode cair no esquecimento de governos e lideranças, pois ela está inserida num
projeto maior que engloba o desenvolvimento das pessoas e do lugar onde vivem e produzem.
Cada vez mais, se faz necessária a articulação entre escola e comunidade local, entre os
conhecimentos científicos e saberes/fazeres do campo.
Práticas de fortalecimento são importantes pontos de apoio da escola do campo.
Inicialmente, a legislação específica assegura direitos, assim, a escola precisa fazer sua parte
ou continuar fazendo, com ações voltadas ao campo com a integração cada vez maior da
comunidade. Tais práticas de fortalecimento só serão desveladas dentro do próprio processo e
movimento feito pelos próprios atores sociais. Por isso, a importância de olhar para si e para
os arredores contrastando tal realidade com um projeto global.

6 Referências Bibliográficas

ARROYO, Miguel Gonzalez; CALDART, Roseli Salete; MOLINA, Mônica Castagna.


(Org.). Por uma educação do campo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.

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Educação. Brasília, 1996.

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CALDART, Roseli Salete. Movimento Sem Terra: lições de Pedagogia. Revista Currículo
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NASCIMENTO, Claudemiro Godoy do. A Educação Camponesa como espaço de


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FE/Unicamp, 2004.

PORTAL DA EDUCAÇÃO. Metade dos professores que lecionam na zona rural não tem
formação adequada. Disponível em: http://www.todospelaeducacao.org.br/reportagens-
tpe/22215/metade-dos-professores-que-lecionam-na-zona-rural-nao-tem-formacao-adequada.
Acesso em: 25 de junho de 2018.

RIBEIRO, Marlene. Educação Rural. In: Caldart, R. S.; Pereira, I. B.; Alentejano, P.; Frigotto,
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SECRETARIA DA EDUCAÇÃO. Escolas do Campo. Disponível em:


http://www.educacao.rs.gov.br/escolas-do-campo. Acesso em 20 de março de 2018.

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UMA EXPERIÊNCIA CARTOGRÁFICA NA ESCOLA RURAL DE SANTA FLORA –


SANTA MARIA, RS

Zuleika Maria da Silva Ries118


Cesar De David119

Resumo

Esse trabalho tem como objetivo expor a importância da alfabetização cartográfica em escolas rurais,
bem como os benefícios que ela traz para o desenvolvimento cognitivo da aluno. Busca-se também,
estabelecer o papel do professor de Geografia no ensino da cartografia a fim de que os alunos tenham
maior domínio dos conteúdos geográficos, bem como, de desenvolvimento em outras frentes, como
um maior desenvolvimento na sociedade em que convivem. Paralelamente, apresenta-se um histórico
das escolas rurais, e a importância do Movimento Sem Terra – MST – na estruturação e propagação
deste conceito de escola e de ensino. Por fim, aponta-se a necessidade de se trabalhar e desenvolver
com prioridade a Geografia a partir da alfabetização cartográfica para o desenvolvimento pleno dos
educandos.

Palavras-chave: Alfabetização Cartográfica. Geografia. Cartografia. Educação Rural. MST.

Introdução

Na atualidade, vive-se um caos no âmbito educacional, tanto na esfera federal,


estadual e municipal. Na primeira tem-se os cortes de gastos abruptos, congelamento de
investimos e a mais recente “ideia” do ministro da Educação, abolir o ensino noturno. Na
esfera regional o parcelamento dos salários dos professores tem afetado o ensino
consideravelmente devido as frequentes paralisações e também greves.
As escolas têm pouco investimento, uma vez que grande parcela dos professores
apenas utiliza-se do quadro negro para desenvolvimento das aulas o que, hoje, não mais é
suficiente para prender a atenção dos alunos, muitos desses, oriundos de uma realidade
digital, o que exige do professor atenção maior ao mundo do aluno.
Nesse sentido, deve-se pensar a escola como expressão de relações e formas de
socialização que contemplem diversidades de estilos e desigualdades de condições de vida

118
Universidade Federal de Santa Maria - RS, zuleikaries@outlook.com
119
Universidade Federal de Santa Maria - RS, cdedavid2009@gmail.com

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humana presente na contemporaneidade, sobretudo no Brasil, e desta forma potencializar


ações que possam vir a contemplar a formação cidadã destes alunos.
Com o mundo em constante mudança, seria estranho que a educação também não
progredisse, caracteriza-se este fato de educação contemporânea e para tanto escolheu-se
relacioná-los ao ensino de Geografia, que atende o contexto sociopolítico e a realidade social,
física e espacial do momento e perpassa por todos os períodos da história mundial, além de
ser espelhada na qualidade de vida da população/povo/etnia que usufrui do espaço
sociopolítico e sócio cultural. Esta busca de relação e elo do ensino de Geografia justifica-se
com necessidade e importância ao momento atual tanto em políticas governamentais, como
necessidade de vida humana, e remete a um problema de pesquisa no viés de significação
profissional: como reunir estes dois elos – aluno e professor – na busca da significação e da
construção de cidadania a partir do letramento cartográfico? E tem como objetivo, investigar
possibilidades de dinamização do letramento, com contribuições expressivas da geografia em
atividades metodológicas diferenciadas reunindo práticas pedagógicas que contemplam as
necessidades sócias espaciais de escolas rurais.
Neste sentido, tem-se em vista incentivar o interesse, o sentimento de pertencimento, a
compreensão e a valorização do seu espaço, o espaço vivido por esses alunos, e também visa
possibilitar a aquisição das habilidades e/ou competências à leitura e escrita como motivos
relacionados aos conceitos produzidos em geografia a partir da leitura do cotidiano e também
do meio vivido.
Então nesta pesquisa-ação que será realizada na Escola Municipal de Ensino
Fundamental Santa Flora, localizada no distrito de Santa Flora, pertencente ao munícipio de
Santa Maria, RS, dar-se-á ênfase às atividades que atraiam a atenção dos sujeitos envolvidos
numa perspectiva de repensar o espaço vivido frente aos problemas sócios culturais de hoje e
do futuro visando o equilíbrio da vida em sociedade como um todo, pois, ao mesmo tempo em
que a pesquisadora propõe atividades de letramento, o faz com construção de sentido e
valorização de seu espaço em questão. Isso implica em adotar uma postura que proporcione o
aluno a refletir sobre sua prática, a se colocar problemas e buscar nos estudos elementos que o
auxiliem a encontrar caminhos para a seu desenvolvimento enquanto sujeito ocupante do
espaço vivido.

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Pretende-se demonstrar a importância da interação do professor com o aluno e sua


comunidade, o espaço vivido por este, por isso conforme a realidade da comunidade
desenvolver um projeto que contemple as necessidades da mesma torna-se um desafio para o
educador. Do mesmo modo que tecer relações da disciplina de geografia focada no letramento
também é desafiador e necessário, pois, com isto, amplia-se a capacidade dos alunos de
compreenderem o mundo e a escola dentro de um espaço aberto e vivo de culturas.
A problemática central deste trabalho consiste em saber como alunos e professores
pensam o lugar a partir do ensino da cartografia, apontando para uma perspectiva de ensino de
geografia que considere esse lugar de vivência dos sujeitos.
Apresenta-se como objetivo geral: Compreender a importância do letramento
geográfico, com contribuições expressivas da Geografia, a partir de atividades metodológicas
didáticas, reunindo práticas pedagógicas que contemplem as necessidades sócio espaciais.
No que tange aos objetivos específicos, pretende-se com estes averiguar a importância
do estudo do espaço no qual o aluno está inserido; ampliar o conhecimento geográfico dos
alunos com o uso da cartografia como ferramenta de ensino e, ampliar a espacialidade dos
alunos a partir do seu local de vivência.
Este trabalho caracteriza-se como uma pesquisa de campo, a qual procede à
observação de fatos e fenômenos exatamente como ocorrem no real, à coleta de dados
referentes aos mesmos e, finalmente, à análise e interpretação desses dados, com base numa
fundamentação teórica consistente, compreender e explicar o problema pesquisado. Assim, é
possível verificar que o trabalho de campo como um estreitamento entre a teoria e a prática
contribui em uma atividade de grande importância para a compreensão e leitura do espaço
(TOMITA, 1999).
A pesquisa de campo é uma fase que é realizada após o estudo bibliográfico, para que
o pesquisador tenha um bom conhecimento sobre o assunto, pois é nesta etapa que ele vai
definir os objetivos da pesquisa, as hipóteses, definir qual é o meio de coleta de dados,
tamanho da amostra e como os dados serão tabulados e analisados.

Referencial Teórico

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O ensino de Geografia pode contribuir enormemente para resgatar a análise e a


reflexão do rural como lugar onde se desenrolam as atividades socioeconômicas e as
manifestações culturais de seus habitantes, Libâneo (2005) salienta que as práticas educativas
não se restringem à escola ou à família. Elas ocorrem em todos os contextos e âmbitos da
existência individual e social humana, de modo institucionalizado ou não.
Vale ressaltar que nas palavras de Fantin, Tauschek e Neves (2010, p. 138):
A necessidade de uma mobilização para o conhecimento vem da exigência de se
estabelecer um vínculo entre os sujeitos da aprendizagem e o objeto de estudo. Ou
seja, é necessário que o aluno tenha uma ligação direta com o que ele possa
aprender. É preciso que o objeto seja significativo para o sujeito. Não basta
apresentá-lo ao aluno como necessário só porque faz parte do conteúdo
programático a ser estudado [...] superfície terrestre, em parceria e/ou posição à
natureza, materializando tempos históricos sobrepostos.

Assim, a Geografia contribui para esta formação, proporcionando ao aluno o


desenvolvimento de uma consciência crítica a respeito dos acontecimentos mundiais, fazendo
com que eles percebam a sua relação com a configuração do espaço geográfico, reconhecendo
as contradições e os conflitos econômicos, sociais e culturais, o que permite comparar e
avaliar qualidade de vida, hábitos, formas de utilização e/ou exploração de recursos e pessoas,
em busca do respeito às diferenças e de uma organização social mais equânime. Para, a partir
desta perspectiva, poder tornar o aluno sujeito do processo ensino-aprendizagem. Incentiva-se
o aluno a compreender as mais variadas escalas: local, regional, nacional e global. A
autonomia que a identidade do cidadão confere é necessária para expressar sua
responsabilidade com o seu “lugar-mundo”, através de sua identidade territorial.
Nesse sentido, Fantin, Tauschek e Neves (2010, p. 22) afirmam:

É impossível pensar a geografia apenas como a ciência da localização e da descrição


dos fenômenos. Muito mais que isso, ela investiga a ação humana (em suas relações
complexas) modelando a superfície terrestre, em parceria e/ou posição à natureza,
materializando tempos históricos sobrepostos.

A Geografia encontra-se inserida na quarta parte dos PCNs (Parâmetros Curriculares


Nacionais), respectivamente alocado na parte de Ciências Humanas e suas Tecnologias
(Geografia, História, Sociologia e Filosofia). Analisando-se o documento, na área de Ciências
Humanas, especificamente ao que se refere à disciplina Geográfica, o mesmo frisa o discurso

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sobre a importância de conseguir uma interdisciplinaridade entre os conteúdos ensinados.


Porém, Pereira, Ferreira e Santos (2014, p. 55) revelam que:

Os conteúdos propostos pelo documento são extensos, considerando a carga horária


destinada à geografia, fazendo com que eles sejam abordados de forma bastante
superficial, deixando de cumprir o papel principal da geografia, que é o de formar
cidadãos dotados de conhecimento e de uma consciência crítica.

Hoje, os PCNs encontram-se, de certa forma, desatualizados, por isso, faz-se uso da
Base Nacional Curricular Comum (BNCC) a mesma vem dividida em competências para as
séries iniciais e finais e cada um dos módulos apresenta unidade temática, objetos de
conhecimento e habilidades (BRASIL, 2016).
Na BNCC do ensino fundamental – séries iniciais – área de interesse neste trabalho -,
na parte inicial do capítulo de Geografia encontra-se a seguinte definição:

Para fazer a leitura do mundo em que vivem, com base nas aprendizagens em
Geografia, os alunos precisam ser estimulados a pensar espacialmente,
desenvolvendo o raciocínio geográfico. O pensamento espacial está associado ao
desenvolvimento intelectual que integra conhecimentos não somente da Geografia,
mas também de outras áreas (como Matemática, Ciência, Arte e Literatura)
(BRASIL, 2016, p. 6).

A educação do campo é concebida a partir do campo como espaço de vida e


resistência, onde camponeses lutam por acesso e permanência na terra e para edificar e
garantir um modus vivendi que respeite as diferenças quanto à relação com a natureza, o
trabalho, a cultura e as relações sociais.
Diante disto, não se pode negar muito menos negligenciar as Escolas Itinerantes e
também as escolas de assentamento, elas servem de embasamento para a funcionalidade das
escolas rurais, pois elas, a grosso modo, são um teste do ensinar de forma diferenciada. A
Itinerante é uma experiência de escola do campo que surge anos antes do Movimento “Por
Uma Educação do Campo”. A princípio, era denominada pelos Sem-Terra de “Escola do
Acampamento”, e a partir de sua legalização, como política estadual em 1996, passa a ser
Escola Itinerante.
Assim sendo, a educação a partir do mundo rural, deve levar em conta “o contexto do
campo em termos de sua cultura específica quanto à maneira de ver e de se relacionar com o

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tempo, o espaço, o meio ambiente e quanto ao modo de viver, de organizar família e trabalho”
(KOLLING, NERY, MOLINA, 1999, p. 14).
Diante dessa realidade, Caldart (2003) expõe sobre a necessidade de se estabelecer
uma educação que seja no e do campo. “No: o povo tem direito a ser educado no lugar onde
vive; Do: o povo tem direito a uma educação pensada desde o seu lugar, e com a sua
participação, vinculada a sua cultura e às necessidades humanas e sociais” (CALDART, 2003,
p. 26. Grifos no original).
Vale frisar que as escolas rurais, aos moldes que existem hoje, surgiram com as
escolas itinerantes do movimento MST. A ideia de lutar pela escola e por Reforma Agrária, ao
mesmo tempo, nasceu porque as famílias perceberam a necessidade e decidiram não esperar o
assentamento para ter acesso a ela (CAMINI, 2010).
Referente ao ensino, “na história da educação rural no município de Santa Maria, se
tem registro que por volta de 1930 foram criados os primeiros grupos escolares das sedes
distritais, sendo que, quem ministrava as aulas era pessoas leigas, sem habilitação específica,
o que contribuiu para alicerçar fragilmente a educação rural” (SANTOS, WIZNIEWSKY,
ROSSO, 2017, p. 6).
A Rede Municipal de Ensino do Município de Santa Maria, no final da década de
1980, em nível estadual possuía a maior rede de escolas rurais. Além das sete escolas
estaduais localizadas nas sedes distritais, encontravam-se em funcionamento na zona rural de
Santa Maria 126 escolas da rede municipal de ensino, sendo quatro destas escolas
pertencentes ao Programa Estadual de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino Municipal, ou
seja, escolas estaduais municipalizadas. Entretanto no ano de 1989 havia somente seis escolas
estaduais e duas escolas municipais no hoje munícipio de Itaara e no Distrito de Santa Flora,
com funcionamento do 1º grau completo, as outras 124 atendiam de 1º a 4º série, ou no
máximo até a 5º série (SANTOS, 1993).
Moura (2009, p. 75) descreve que:

No ano de 1990, a Secretaria de Município da Educação (SMED) implanta o Projeto


Piloto “Nuclearização de Escolas da Zona Rural”, no distrito de Dilermando de
Aguiar (1997 se torna município), na localidade de São José da Porteirinha, na
Escola Municipal Valentim Bastianello.

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Esta nuclearização consistia e consiste até hoje, ainda na escrita de Moura (2009, p.
75) que:

Ser uma escola centro, com condições de atender e receber através de transporte
escolar alunos oriundos de outras escolas rurais multisseriadas desativadas, de modo
integral em dias alternados da seguinte forma: 1º a 4º série (terças, quintas nos
turnos manhã e tarde e sábados pela manhã) de 5º a 8º série120 (segundas, quartas e
sextas, nos turnos manhã e tarde) ficando assim um dia em casa para auxiliar nas
lidas campeiras.

Propõem-se a partir de Tomita (1999) que o ensino de Geografia proceda enriquecido


de um bom embasamento teórico, partindo do conhecido para o desconhecido, do concreto
para o abstrato, do próximo para o mais distante, sendo assim, o ponto de partida é a realidade
do nosso aluno, seu espaço de vivência. A proposta do trabalho de campo tem como ponto de
partida o conhecimento prévio, alimentado pela teoria e reforçado com a observação direta da
realidade.
Assim, este trabalho através do letramento geográfico poderá trazer benefícios em
duas frentes igualmente significativas: a partir de vivências e valorização de sua comunidade,
além de novas posturas frente aos desafios da vida e a construção do sentido do letramento.
Além de também significar o diferencial e a importância deste no que tange à escola do
campo, inserindo a cartografia como instrumento de construção de saber aprofundado nestas
escolas.
O letramento significa a prática relacionada ao uso da escrita enquanto, a alfabetização
é tida como aquisição de leitura e escrita com ênfase na decodificação de textos escritos, o
surgimento do letramento pode ser interpretado como decorrência da necessidade de
configurar e nomear comportamentos e práticas sociais na área da leitura e da escrita que
ultrapassem o domínio do sistema alfabético e ortográfico.
A cartografia apresenta um sistema de conceitos próprios, cuja aprendizagem requer a
alfabetização, e é neste ponto que a cartografia e a alfabetização cartográfica se intercruzam,
pois, a primeira compete, conforme relata Rios e Mendes (2009, p. 1):

120
No ano corrente da referência citada o 9º ano ainda não havia sido implementado, nem em escolas rurais
como em urbanas.

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A Ciência que trata dos estudos e operações tanto científicas, técnicas e artísticas de
qualquer tipo ou forma de representação da superfície terrestre, seja por meios de
mapas, cartas, maquetes etc. Seus produtos são resultado das observações diretas
e/ou de explorações de documentações, tendo em vista à elaboração de produtos
cartográficos de acordo com determinados sistemas de projeção e de uma
determinada escala.

Enquanto a alfabetização se encarrega do “processo de domínio e aprendizagem de


uma linguagem constituída de símbolos e significados; uma linguagem gráfica (códigos e
símbolos definidos – convenções cartográficas)” (RIOS, MENDES, 2009, p. 1).
Essa alfabetização tem como objetivo, segundo Simielli, “Desenvolver as capacidades
de leitura e de comunicação oral e escrita por fotos, desenhos, plantas, maquetes mapas e
assim permitir ao aluno a percepção e o domínio do espaço” (SIMIELLI, 2000, p. 98).
Na Geografia, ensinar a ler significa criar condições para que a aluno leia o espaço
vivido. Ensinar a ler o mundo é um processo que se inicia quando a aluno reconhece os
lugares, conseguindo identificar as paisagens. Portanto, observar, registrar e analisar são
processos que estão relacionados com o significado de ler e de entender, desde os lugares de
vivência até aqueles que são concebidos por ela (CASTELLAR, VILHENA, 2012). A partir
de então se constrói a definição da cartografia como conhecimento que necessita relacionar o
espaço numa totalidade para que o mesmo se possa fazer entender.

Materiais e Métodos

Para atender aos objetivos propostos neste estudo, fez-se a opção pela abordagem
qualitativa, que é, em si mesma, um campo de investigação. A pesquisa qualitativa é uma
atividade situada que localiza o observador no mundo. É um conjunto de práticas materiais e
interpretativas que dão visibilidade ao mundo (DENZIN; LINCOLN, 2006). Destaca-se que
“essas práticas transformam o mundo em uma série de representações, incluindo as notas de
campo, as entrevistas, as conversas, as fotografias, as gravações e os lembretes” (DENZIN;
LINCOLN, 2006, p. 17).
A pesquisa qualitativa abrange o estudo do uso e a coleta de uma variedade de
materiais empíricos, como “o estudo de caso; experiência pessoal; introspecção; história de

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vida; artefatos; textos e produções culturais que descrevem momentos e significados


rotineiros e problemáticos na vida dos indivíduos” (DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 17). Por
conseguinte, quem pesquisa nessa área apropria-se de uma grande variedade de práticas
interpretativas interligadas, no intuito de conseguir compreender bem o tema que está ao seu
alcance.
A partir das considerações de Denzin e Lincoln (2006), percebe-se, contudo, que cada
prática garante uma visibilidade diferente ao mundo. Geralmente, há um compromisso no
sentido do emprego de mais de uma prática interpretativa em qualquer estudo.
Os estudos dos conceitos geográficos e sua apreensão pelo sujeito não deve-se prender
a uma visão espiritista, que só é possível trabalhar a geografia partindo do próximo (casa-
escola) para o distante (país, planeta). Deve-se pensar que a aluno faz parte deste mundo, ou
seja, ele- o mundo, ou lugares longínquos do mundo – pode não ser abstrato, mas fazer parte
da história familiar e cultural da aluno. É preciso, também acreditar no potencial da
imaginação, presente no chamado conhecimento espontâneos da aluno, ser a preocupação
exagerada de que os conteúdos devam ser “concretizados” para que sejam compreendidos.
Nesse sentido, pensou-se em desafiá-los com uma atividade pratica bastante familiar
de seu cotidiano. Como recurso apenas seu material do dia a dia e uma folha de oficio.
Atividade 1 – Percurso da casa do aluno até a escola
Essa atividade consistiu em solicitar aos alunos que desenhassem o trajeto de suas
casas até a escola.

Resultados

Com a aplicação dessa atividade, com os alunos 4° ano do ensino fundamental, pode-
se observar que os mesmos encontram-se em diferentes níveis de localização espacial, devido
as representações observadas nos desenhos.
Outra constatação feita a partir do estudo dos mapas desenhados pelos alunos é de que
os mesmos representam os elementos que são importantes sobre o ponto de vista deles e se
solicitados uma explanação sobre seus desenhos, será constatado o pontos mais importantes
da realidade deles mesmos.

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Assim, pode-se fazer uma relação e análise do espaço, a partir do ponto de vista
psicológico e epistemológico. Piaget apresenta o desenvolvimento mental da noção de espaço
do aluno como uma construção, na qual há uma interação entre a percepção e a representação
espacial, porém, esse desenvolvimento está atrelado com o desenvolvimento mental do
mesmo como um todo (GUERRERO, 2012).
Enfatiza-se que o mapa (B) possui uma ampliação do espaço em referência ao
primeiro (A), porém fica claro que o aluno representa com escrita apenas aquilo que lhe é
mais marcante durante o caminho, ou seja, até mesmo os lugares com o qual vai com mais
frequência; o aluno do terceiro mapa (C) possui uma visão espacial mais ampla, bem mais
desenvolvida e isto também está presente em outros mapas, feitos por eles.
O que pode-se induzir é que estes alunos encontram-se em níveis distintos de
desenvolvimento espacial e de desenvolvimento mental, e em momento algum isto exclui os
seus conhecimentos e é neste viés que a cartografia entra, ela é responsável por abarcar toda a
aprendizagem externa do aluno e complementá-la em sala de aula.

Figura A Figura B Figura C

Org: Ries, Z, 2017.


Segundo Almeida e Juliasz (2014) são por intermédio de atividades cotidianas que os
alunos descobrem as relações dos objetos entre si. Elas constroem conhecimento direto ou
sensível dos objetos e do espaço associada à ação sobre os elemento, a denominação das
localizações, posições e deslocamentos no espaço é outra fonte de conhecimento espacial, um

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conhecimento indireto. Por meio da integração dessas duas fontes de conhecimento há a


representação do espaço.

Conclusões

Conforme a atividade aplicada, é possível conhecer a maneira como os sujeitos


aprendem, é fundamental para saber como deve-se ensinar. Porque um bom professor
somente se fará compreender pelos alunos quando estes forem envolvidos e desafiados.
Para que possamos oportunizar aos alunos uma construção mais sólida dos
conhecimentos em Geografia, é necessário que busca-se atividades e práticas lúdicas e
concretas, assim encontra-se modos de como os sujeitos aprendem. Nesse sentido, que a
alfabetização cartográfica faz-se necessária, pois além de lúdica ela apresenta o conteúdo e
auxilia o aluno em uma melhor concepção e construção do seu conhecimento dentro do seu
universo de vivência diário, não um ensino engessado em citadino, no caso deste trabalho.
Ao realizar as atividades de cartografia com os alunos da Escola Municipal de Santa
Flora foi possível observar em duas das atividades uma certa dificuldade de espacialização e
localização no espaço.
Considera-se que a coordenação é o ponto de construção da espacialidade do aluno,
seja essa a coordenação mais simples e mais primitiva, pois a mesma refere-se a tudo sobre o
ponto de vista próprio, o qual deforma o espaço em função de uma única perspectiva possível:
a do sujeito (PAGANELLI, 2001).
O procedimento para trabalhar a cartografia, ou suas noções básicas nas séries iniciais,
enfatiza o trabalho dos alunos nesse processo, no qual o mesmo realmente participa, assim
compreendendo a representação do espaço. Desmitifica-se assim a cartografia-desenho e
passa-se a considerar a linguagem gráfica como meio de transmissão de informação
(SIMIELLI, 2011).
Nesse enfoque Almeida (2011, p. 122) deixa claro que:

O mapa considerado meio de comunicação está inserido em um processo


cartográfico que está começa com a realidade (o espaço geográfico) e passa por
várias etapas: transformação (de tri para bidimensional, de superfície esférica para
plana através de projeções), redução (escala) e generalização, codificação

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(linguagem gráfica e cartográfica), construção e reprodução. Como resultado, chega-


se ao mapa que vai ser utilizado por um usuário, que passa pelas fases de percepção,
leitura, análise e interpretação da representação gráfica.

Diante do exposto, percebeu-se durante a aplicação das atividades que os alunos foram
afetados em alguma parte de sua construção espacial, tendo isto ocorrido antes mesmo da
chegada à escola visto que, as primeiras construções cognitivas/espaciais se dão no contato
com a família, desde ao abrir os olhos até o apalpar de objetos, estas atividades são o que
proporcionam o conhecer de mundo ao recém-nascido, na sequência com os primeiros passos
e antes da chegada à escola o convívio com o mundo externo – brincadeiras, conversas, etc. -,
como também pode ter ocorrido no convívio escolar, sendo, talvez, negligenciado o
conhecimento de mundo que este aluno trazia, a sua bagagem cultural e seu conhecimento
empírico.
Reforça-se a urgência e a necessidade dos professores da área de Geografia buscarem
metodologias que os levem a compreenderem melhor o espaço no qual estão inseridos, a fim
de transformar conteúdos em conhecimento, tornando-se mais críticos e conhecedores da
realidade que os cercam.

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A PERCEPÇÃO DA COMUNIDADE EM RELAÇÃO À INCLUSÃO DOS ALUNOS


COM NECESSIDADES ESPECIAIS NO ENSINO REGULAR

Celina Santos dos Santos 121


Annie Mehes Maldonado Brito122

INTRODUÇÃO

O presente trabalho traz a descrição sobre inclusão de alunos com necessidades


educacionais especiais no cotidiano da escola. O ambiente de pesquisa ocorreu nas Escolas
Municipais de Ensino Fundamental Alda Seabra e Duque de Caxias. A primeira localiza-se na
Rua Osvaldo Aranha, nº 2048, no município de Dom Pedrito e foi fundada no ano 1971. Já a
segunda Escola, Duque de Caxias, está localizada na Rua Alberto Dutra Fernandes, nº.400 a
qual também recebe alunos/as com necessidades educacionais especiais.
Sou funcionária há 12 anos da primeira escola e vivencio a tentativa do processo de
inclusão de vários alunos/as no contexto escolar. Sendo que este foi um dos motivos centrais
na busca em desenvolver uma pesquisa neste tema. Partindo disto, buscou-se descrever a
percepção de duas comunidades escolares no que se refere à inclusão de alunos com
necessidades educacionais especiais.
Partindo de minha vivência dentro da presente escola passei a me questionar sobre os
desafios da educação inclusiva e discutir as possibilidades inclusivas, além de questionar
como funciona a inclusão nas referidas escolas. Para tanto, o principal recurso utilizado para
coletar dados foi entrevista realizada com vários atores destas escolas, em especial
professores/as, com o objetivo de descrever a percepção sobre a inclusão.
No cenário da inclusão várias Leis e Decretos podem ser citados, tais como a
Declaração de Salamanca, dispondo sobre polícias e práticas na área das necessidades
educacionais especiais. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº. 9.394/96,
a qual expressa em seu conteúdo alguns avanços como a oferta da educação especial na faixa

121
Celina Santos dos Santos. Acadêmica do curso de graduação Educação do Campo na Universidade Federal
do Pampa-UNIPAMPA. E-mail: celinasantosdp@hotmail.com
122
Annie Mehes Maldonado Brito. Professora Adjunta da Universidade Federal do Pampa-UNIPAMPA. E-mail:
mehesm@yahoo.com.br.

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etária de zero a seis anos; a ideia de melhoria da qualidade dos serviços educacionais para os
alunos e a necessidade de o professor estar preparado e com recursos adequados de forma a
compreender e atender à diversidade dos alunos. E Leis mais atuais como a Política Nacional
de Educação Especial, de 2008 – abordando as diretrizes que fundamentam políticas públicas
destinadas à inclusão escolar.

METODOLOGIA

Para o desenvolvimento da presente pesquisa os dados foram coletados a partir de


entrevista e observação, apoiando-se no método qualitativo, nas duas escolas mencionadas. A
E.M.E.F. Alda Seabra atende alunos desde a pré-escola até o 9º ano e a E.M.E.F. Duque de
Caxias, da pré-escola até o 5ºano. As questões que compreenderam a entrevista foram:
• Descreva quais são as percepções no que se refere à inclusão de alunos com
necessidades educacionais especiais no ensino regular.
• Quais as práticas e possíveis estratégias utilizadas pelo docente para que a
inclusão seja efetiva, promovendo uma reflexão sobre suas práticas em relação à proposta
inclusiva?

As observações e as entrevistas foram realizadas durante visitas, tendo como público


alvo a comunidade escolar e as professoras da sala do Atendimento Educacional
Especializado (AEE). Sendo que totalizou 12 participantes, com 07 da E.M.E.F. Alda Seabra
e 05 da E.M.E.F. Duque de Caxias. O período de coleta de dados compreendeu os meses
setembro e outubro de 2017.
Referente às Escolas quanto ao quesito caracterização, a E.M.E.F. Alda Seabra tem
como diretora a professora Greice Deiques Barbosa, sendo que a instituição possui um prédio
central com 17 salas; 5 banheiros de alunos e 1 banheiro para professores, 01 refeitório com
cozinha, 01 banheiro com acessibilidade, 01 biblioteca com espaço para audiovisual; 01
laboratório de informática desabilitado; 01 secretaria, 01 sala para direção e vice direção, 01
sala para os professores, 01 sala de recursos para AEE, com 02 professores, 01 sala para o
Serviço de Orientação Educacional (SOE), possui pátio coberto e murado, também faz parte
de suas instalações uma quadra de esportes. Trabalha com um quadro de educadores

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compostos por: 40 professores, 8 funcionários, 4 vigias, 2 secretários, e um total de 450


alunos, destes, 220 alunos no turno da manhã (7h:45min às 11h:45min) e 230 alunos no turno
da tarde (13;00h às 17;00h), oferecendo Educação Infantil e Ensino Fundamental Completo.
Já a E.M.E.F. Duque de Caxias tem como diretora a professora Berenice Quincozes
Jardim, sendo que a ferida escola possui 05 salas de aula, 01 sala para direção, 01 cozinha, 01
refeitório, 02 sala de Educação Infantil,02 atendentes ,02 serventes,01 cozinheira,01 vigia. O
quadro é composto por 07 professores em sala de aula, 02 secretários e um total de 85 alunos,
destes 40 são alunos no turno da manhã (07h:45min às 11h:45min) e 45 alunos no turno da
tarde (13h:00 às 17h)
Para a análise de dados foi utilizado a ferramenta Tagul, o qual permite criar nuvem de
palavras e organizá-las como preferir, sendo construída a partir de uma forma (estrela, nuvem,
etc). Esta ferramenta tem ainda algumas funcionalidades que permitem personalizar a nossa
nuvem de palavras, como fontes, cores e uma interface que nos permite ver como será o
resultado final.

EDUCAÇÃO ESPECIAL

Segundo a Declaração de Salamanca (1994), a Educação Especial é o ramo da


Educação, que se ocupa do atendimento e da educação de pessoas com deficiência, ou seja, de
pessoas com necessidades educativas especiais.
O conceito de educação inclusiva surgiu a partir de 1994, com a Declaração de
Salamanca. A ideia é que as crianças com necessidades educativas especiais sejam incluídas
em escolas de ensino regular. O objetivo da inclusão demonstra uma evolução da cultura
ocidental, defendendo que nenhuma criança deve ser separada das outras por apresentar
alguma espécie de deficiência e respeitar suas especificidades.
Com a Declaração de Salamanca surgiu o termo necessidades educativas especiais,
que veio substituir o termo “criança especial”, termo anteriormente utilizado para designar
uma criança com deficiência. Porém, este novo termo não se refere apenas ás pessoas com
deficiência, este engloba todas e quaisquer necessidades consideradas “diferentes” e que
necessitem de algum tipo de abordagem específica por parte de instituições.

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Ainda na Declaração de Salamanca (1994), “pode-se conceituar educação inclusiva


sendo uma ação educacional humanística, democrática, amorosa mas não piedosa, que
percebe o sujeito em sua singularidade e que tem como objetivos o crescimento, a satisfação
pessoal e a inserção social de todos.” Sendo que a mesma estabelece as seguintes
determinações a este respeito:

Todas as crianças, de ambos os sexos, têm direito fundamental à educação e a elas


deve ser dada a oportunidade de obter e manter um nível aceitável de conhecimento:
Toda criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de
aprendizagem que lhe são próprios;
Os sistemas educativos devem ser projetados e os programas educacionais aplicados
de modo que tenham em vista a gama dessas diferentes características e necessidades;
As pessoas com necessidades especiais educacionais devem ter acesso às escolas
comuns que deverão integrá-las numa pedagogia centrada na criança, capaz de atender a essas
necessidades;
As escolas comuns, com orientação integradora, representam o meio mais eficaz de
combater atitudes discriminatórias, de criar comunidades acolhedoras e dar educação para
todos;
Melhorar a eficiência e, certamente, a relação custo-benefício de todo o sistema
educativo. (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994, p. 10)
Em um processo de renovação e de busca incessante da democracia, a educação
inclusiva só será alcançada quando todas as pessoas indiscriminadamente tiverem acesso à
informação, ao conhecimento e aos meios necessários de sua plena cidadania.
Sendo assim, a inclusão é um processo que visa apoiar a Educação para Todos e para
cada criança no Mundo. Essa ideia implica encarar a escola como um espaço onde todos os
educandos têm lugar para aprender e construir o conhecimento e desenvolver-se enquanto
pessoa (Ainscow & Ferreira, 2003, apud Rodrigues, 2003).
Neste contexto da inclusão educacional de crianças com necessidades especiais é
fundamental que a criança seja vista como criança, não lhe negando sua diferença ou
característica orgânica. Do mesmo modo, nunca se deve supervalorizar esse fator e resumir

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uma ação a uma única característica, principalmente aquele que deprecia uma pessoa ao
diferenciá-la diante das demais.
Segundo Mantoan (2005, p. 26), “na escola inclusiva professores e alunos aprendem
uma lição que a vida dificilmente ensina: respeitar as diferenças, esse é o primeiro passo para
construir uma sociedade mais justa”. A mesma autora, que é uma ferrenha defensora da
educação inclusiva no nosso país, acrescenta que tolerância, respeito e solidariedade são
atitudes importantes na busca de uma sociedade mais justa, em que todas as pessoas realmente
serão iguais perante a lei e terão acesso aos direitos sociais.
Contudo, para uma inclusão bem sucedida tanto depende do desejo do professor, dos
pais e do aluno querer fazer ou não está mudança. Isto é poder das politicas públicas poderá
contribuir para criar espaços, assegurar direitos e deveres, promover projetos mais eficientes,
mas não da garantia nenhuma sobre uma verdadeira inclusão entre pessoas se de fato não nos
envolvermos. Envolver leva a responsabilidade e compromisso, é caminhar a passos curtos.
Aonde não exista afeto de fato não há relação humana possível e, portanto não haverá
inclusão.
Hoje observo nos docentes das escolas do ensino regular o medo da mudança e o da
diferença, provocando assim certo afastamento e consequentemente o preconceito. Muitos
docentes desconhecem quem é esse sujeito, suas possibilidades, seus desejos, suas
dificuldades e limitações. Conforme palavras de Jesus (2005, p. 11):
Acredito que a falta de informação deve ser o grande problema que justifica a não
inclusão bem maior de crianças com deficiência no ensino regular brasileiro. Esta falta de
informação, aliada ao preconceito, ao medo, falta de elaboração de metas governamentais
para qualificar o ensino; tudo isso provoca a segregação de crianças, que vão perdendo
oportunidades de desenvolverem seu potencial e de exercerem cidadania. O ministério da
Educação ainda não é capaz de garantir a educação a todas as crianças portadoras de
deficiências. Outro fator é que, não adianta só as crianças matricular-se nas escolas regulares,
o ensino brasileiro não está preparado para recebê-las com uma formação com qualidade e
onde a diversidade esteja presente de forma natural.
Ainda dentro dessa perspectiva da inclusão de pessoas com necessidades educacionais
especiais no ensino regular, podemos entender que o processo de inclusão educacional como
um conjunto de atitudes, tanto nas escolas públicas ou privadas no sentido de também incluir

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não só os alunos específicos, mas todos aqueles que detenham alguma dificuldade. Sendo
assim:
A inclusão causa uma mudança de perspectiva educacional, pois não se limita a ajudar
somente os alunos que apresentam dificuldades na escola, mas apoia a todos: professores,
alunos, pessoal administrativo, para que obtenham sucesso na corrente educativa geral
(MANTOAN; MARQUES, 1997, p.145).
Sendo assim, o processo de inclusão escolar dos alunos com necessidades
educacionais especiais só acontecerá quando todos indistintamente fizerem parte do contexto
escolar, ou seja, estabelecendo um envolvimento que vai desde professores, vigias,
funcionários da escola.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei nº 9.394/96, no artigo
59, preconiza que os sistemas de ensino devem assegurar aos estudantes currículo, métodos,
recursos e organização específicos para atender às suas necessidades; assegura a
terminalidade específica àqueles que não atingiram o nível exigido para a conclusão do ensino
fundamental, em virtude de suas deficiências; e assegura a aceleração de estudos aos
superdotados para conclusão do programa escolar.
Também define, dentre as normas para a organização da educação básica, a
“possibilidade de avanço nos cursos e nas séries mediante verificação do aprendizado” (art.
24, inciso V).
Logo após a contribuição de LDB, também é possível acompanharmos novos decretos
para que a ideia de inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais possa se
consolidar então em:
Em 2004 O Ministério Público Federal publica o documento “O Acesso de Estudantes
com Deficiência às Escolas e Classes Comuns da Rede Regular”, com o objetivo de
disseminar os conceitos e diretrizes mundiais para a inclusão, reafirmando o direito e os
benefícios da escolarização de estudantes com e sem deficiência nas turmas comuns do ensino
regular Impulsionando a inclusão educacional e social.
O Decreto nº 5.296/04 regulamentou as Leis nº 10.048/00 e nº 10.098/00,
estabelecendo normas e critérios para a promoção da acessibilidade às pessoas com
deficiência ou com mobilidade reduzida. Posteriormente, o Decreto n° 6571, incorporado pelo
Decreto n° 7611/2011, institui a política pública de financiamento no âmbito do Fundo de

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Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da


Educação - FUNDEB, estabelecendo o duplo cômputo das matriculas dos estudantes com
deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação.
Visando ao desenvolvimento inclusivo dos sistemas públicos de ensino, o decreto de
2008 também define o atendimento educacional especializado complementar ou suplementará
escolarização e os demais serviços da educação especial, além de outras medidas de apoio à
inclusão escolar podemos ressaltar a
Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva de 2008
que refere-se ao movimento mundial pela educação inclusiva, sendo esta uma ação política,
social, cultural e pedagógica em defesa do direito de todos de todos os alunos estudar em
juntos ,sem haver nenhum tipo de discriminação. Para tanto a educação inclusiva se constitui
em um modelo educacional fundamentado na concepção dos direitos, que cita igualdade e
diferenças como valores inseparáveis. Reconhecendo as dificuldades enfrentados pelo sistema
de ensino, ficando evidente o confronto entre as práticas discriminatórias e a criação
alternativas para superá-las.
A educação inclusiva passa ser o ponto central nas discussões na sociedade atual e do
papel da escola para superar a exclusão. Por tanto a partir dos referenciais de estruturação dos
sistemas educacionais inclusivos, a organização das escolas e classes especiais passa a ser
repensada divergindo uma mudança estrutural e cultural da escola para que todos os alunos,
sejam atendidos cada um dentre as suas especificidades.

O SURGIMENTO DO CONCEITO DE INCLUSÃO

O movimento de inclusão surgiu no Brasil no final da década de 80, mas foi nos anos
90 que alavancou, começando a discussão em torno do novo modelo de atendimento escolar
denominado inclusão escolar, enquanto em outros países já existia desde a década de 50. Se
analisarmos a história da Educação Especial nos países da Europa e na América do Norte,
podemos identificar quatro estágios de desenvolvimento do atendimento às pessoas que
apresentam necessidades educacionais especiais.

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O primeiro estágio as pessoas com necessidades especiais ou deficientes, como eram


chamados, eram abandonados, perseguidos mortos e a sociedade ainda corroborava com essas
ações como sendo normais.
Em meados do século XIX, se encontra o segundo estágio, a fase de
institucionalização, em que os indivíduos que apresentavam deficiência eram segregados e
protegidos em instituições residenciais.
Ao final do século XIX e meados do século XX era marcado pelo desenvolvimento de
escolas e /ou classes especiais em escolas públicas, tendo em vista uma educação a parte para
pessoas deficientes.
Na década de 70 chegava o final do quarto estágio, em que se observa um movimento
de integração social dos indivíduos que apresentavam deficiência, cujo objetivo era integrá-
los em ambientes escolares o mais próximo possível daqueles oferecidos à “pessoa normal”.
Podemos dizer que a fase de integração fundamentava-se no fato de que a criança deveria ser
educada até o limite de sua capacidade. Portanto inclusão surge visando garantir que todos
frequentem a sala de aula do ensino regular da escola comum, independentemente do tipo de
deficiência.
Quando nos referimos em escola inclusiva, sabemos que está se preocupa em
modificar atitudes discriminatórias, criar comunidades acolhedoras e desenvolver uma
sociedade inclusiva. A Declaração de 1994 reflete a consolidação de anseios de grupos
organizados, com renovado poder de pressão sobre os órgãos governamentais e
fortalecimento de convicção da importância e urgência de transformações sociais
educacionais compatíveis com imprescindível respeito à diversidade do ser humano. Para
Mazzotta (2008, p. 6):
A política educacional há de ser aquela que implanta e implementa condições reais de
acesso, permanência e sucesso na escola praticando a inclusão com responsabilidade a fim de
incluir todos em escolas de qualidade, contando com os recursos correspondentes às suas
necessidades escolares.
Tanto o aluno com necessidades educacionais especiais como a escola e a sociedade
precisam se adaptar a essa nova concepção; respeitando a diversidade. Reconhecemos que
para a inclusão se concretizar, é necessária uma mobilização em vários âmbitos, como o
político, o social e o institucional.

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Segundo Carvalho (2004, p. 6), “A inclusão de alunos com necessidades educacionais


especiais: refere-se não só à socialização, mas também ao processo de apropriação de
conhecimentos”.
Dessa forma, sucesso ou não da inclusão depende, em grande medida, das atitudes e
crenças do professor. As crenças exprimem percepções e pensamentos que funcionam como
filtros na interpretação da realidade, podendo influenciar o comportamento do professor em
relação a esse aluno.
Ainda ressaltamos a importância das relações sociais para o desenvolvimento da
criança com deficiência em seu processo de escolarização, pois entende-se que esta é a base
para a aprendizagem.
Assim dentre as instituições que alavancam as relações sociais dos alunos/as com
necessidades educacionais especiais podemos citar a Associação de Pais e Amigos dos
Excepcionais (APAE). Pois sendo, assim, todos os anos, a Federação Nacional das Apaes
(Fenapaes), por meio da “Semana Nacional da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla”
abre debates e coloca a sociedade em reflexão no dever da igualdade para inclusão.
A Apae nasceu em 1954, no Rio de Janeiro. Caracteriza-se por ser uma organização
social, cujo objetivo principal é promover a atenção integral à pessoa com deficiência,
prioritariamente aquela com deficiência intelectual e múltipla. A Rede Apae destaca-se por
seu pioneirismo e capilaridade, estando presente, atualmente, em mais de 2 mil municípios em
todo o território nacional.
Visando ao desenvolvimento inclusivo dos sistemas públicos de ensino, o decreto de
2008 também define o atendimento educacional especializado complementar ou suplementará
escolarização e os demais serviços da educação especial, além de outras medidas de apoio à
inclusão escolar.
Dentre a inclusão ainda podemos citar a Deficiência Intelectual e Múltiplas
Deficiências, que são Pessoas com deficiência intelectual ou cognitiva que costumam
apresentar dificuldades para resolver problemas, compreender ideias abstratas, estabelecer
relações sociais, compreender e obedecer a regras, e realizar atividades cotidianas. Portanto
crianças com atraso cognitivo podem precisar de mais tempo para realizar e desenvolver suas
habilidades como: aprender a falar, caminhar e aprender competências necessárias para cuidar
de si. Deste modo, é natural que a criança enfrente dificuldades de aprendizagem, no entanto,

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aprenderão com mais lentidão, é possível também que algumas não consigam desenvolver
certas habilidades. De acordo Mariana Almeida,apud, Ellen Joyse Vasconcelos, Gileade
Souza Santos ,Patrícia Rejane Almeida Santos:
Deficiência intelectual ou atraso mental trata-se de quando indivíduo apresenta
limitações no seu funcionamento mental e no desempenho de tarefas como cuidado pessoal,
comunicação e de relacionamento social. Tais limitações provocam atrasos na aprendizagem e
consequentemente no desenvolvimento do indivíduo.(ALMEIDA,2007,p:04)
Podemos dizer que capacidade de argumentação desses alunos também pode ser
afetada e precisa ser devidamente estimulada para facilitar o processo de inclusão e fazer com
que a pessoa adquira independência em suas relações com o mundo. A mesma autora
acrescenta que pessoas portadoras de deficiência múltipla são aquelas afetadas em duas ou
mais áreas, caracterizando uma associação entre diferentes deficiências, com possibilidades
bastante amplas de combinações, ou seja, seriam as pessoas que têm deficiência mental e
física.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Após a realização das entrevistas e utilizando a ferramenta Tagul, juntamente com


anotações referentes às observações, o seguinte resultado foi gerado a partir da figura abaixo,
com destaque para várias palavras e termos que são discutidos.
A palavra de maior destaque na análise foi aluno/a, demonstrando o protagonismo do
mesmo no cenário da inclusão. As participantes mencionam a preocupação, as limitações, as
dificuldades sempre tendo como centralidade os alunos/as que passam por este processo
inclusivo. Alunos estes que até um tempo atrás eram escondidos, ficavam no anonimato da
sociedade e muitos deles ditos doentes. Conforme excerto da entrevista, “hoje podemos dizer
que são alunos/as que demonstram grande potencial, cada um com suas especificidades,
procurando vencer a cada dia os objetivos propostos dentre a uma educação inclusiva’.
Para tanto se salientou nesta análise palavras que fazem menção às questões
cognitivas, na qual é mencionada a aprendizagem e com menor expressão o conhecimento. Os
participantes afirmam que o educando com necessidades educacionais especiais requer um
olhar diferenciado, devido ao grau de necessidade que o mesmo apresenta e ainda ressaltando

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a importância da participação da família, a garantia de acessibilidade e equipamentos


adequados que possam contribuir para o seu aprendizado.
As participantes acrescentam que alguns dos educandos desenvolvem suas
aprendizagens com limitações, mas produzem questionamentos e conseguem realizar as
atividades propostas, contudo “podemos observar que alguns dos educandos demonstram
capacidade além do esperado, ficando claro o seu desenvolvimento.” Uma das professoras
acrescenta que “os alunos necessitam de um tratamento diferenciado e individualizado, pois
eles aprendem a sua maneira e a seu tempo.” Esse aspecto também é salientado na pesquisa de
Balbino et al. (2015), em que as professoras apontam que precisam conter a ansiedade em
relação ao resultado da aprendizagem, atendo-se nas especificidades de cada aluno e
consequentemente lembrando que a aprendizagem ocorre de modo diferenciado também em
relação ao tempo.
Uma reflexão vinculada à temática inclusão foi mencionada acima pelas participantes
da pesquisa ao se referirem a aprendizagem e a ênfase dada a mesma. Antunes (1998) com
sua obra inteligências múltiplas incita a pensar que tipo de aprendizagem o professor espera
em relação ao seu aluno com necessidades educacionais especiais? Este questionamento
conduz à reflexão de que existem diferentes tipos de inteligências, para Gardner (1995)
seriam oito tipos, a espacial, a lógico-matemática, a corporal ou cinestésica, a linguística, a
naturalista, a sonora ou musical, a intrapessoal e a interpessoal. Baseado na perspectiva das
inteligências múltiplas caberá ao professor a estimulação das mesmas, além disso, ter em
conta que nem todas as pessoas têm os mesmos interesses, bem como não aprendem do
mesmo modo. Por fim, é importante proporcionar ao aluno/a um ambiente de aprendizado
mais amplo e variado, que não se fixe com exclusividade nas inteligências linguísticas e
lógico-matemáticas.
Considerando as duas pesquisas feitas em escolas distintas, fica claro a importância do
olhar do professor frente os mais diversos educandos que apresentam necessidades
educacionais especiais, dentre os quais temos educandos com Síndrome de Tourette,
Síndrome Asperger, Síndrome de Down, Autismo e ainda os com necessidades intelectuais.
Independentemente das necessidades que o educando apresenta, tenhamos que objetivar a
ações que envolva a escola frente à inclusão, não somente com os educandos com
necessidades educacionais especiais, mas que envolva também a comunidade escolar.

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Em outro momento, pode-se observar que a palavra potencial/potencialidade é


mencionada nas entrevistas. No que se refere à potencialidade os participantes alegam que é
necessário planejamento diferenciado, pois assim, o professor poderá identificar o potencial
desses educandos, deste modo, valorizando-os e tornando-os parte do grande grupo.
O termo relação, a partir das entrevistas associado à socialização também é
mencionado, sendo que se salienta a importância do convívio desses educandos com os outros
da rede regular, pois os mesmos terão oportunidade de além de se socializar, também
aprender, para que o aprendizado seja recíproco.
Para Vygotsky (2001, p.109), "a aprendizagem da criança começa muito antes da
aprendizagem escolar". Assim, o meio no qual a criança está inserida vai abrir as
possibilidades para seu aprendizado, a partir do conhecimento prévio adquirido pela sua
história. Assim afirma o teórico que a criança ao chegar à escola traz consigo experiências
significativas, ressaltando que a escola tem papel fundamental no processo de
desenvolvimento da aprendizagem.
Ainda durante a entrevista ficou claro a importância da inclusão dos educandos com
necessidades especiais, pois se pode perceber o quanto é importante conviver e aceitar que os
seres humanos são essencialmente diferentes e que isso não sirva para estabelecer quem é
melhor ou pior.
No decorrer da pesquisa na Escola Municipal de Ensino Fundamental Duque de
Caxias, tal como identificado na escola Alda Seabra, as questões cognitivas também foram
mencionadas. Ressaltou-se a importância da inclusão desses alunos, juntamente com outros e
que possam desenvolver uma aprendizagem relevante. Para tanto, o desafio está em conseguir
essa aprendizagem dentre as limitações de cada aluno. Mantoan (2005) acrescenta que a
proposta de educação inclusiva é um dos passos para construirmos uma sociedade mais
igualitária.
Diversas palavras que se referem aos valores foram mencionadas, tais como: respeito e
união. As professoras ressaltam que “a inclusão de alunos especiais proporciona o
crescimento pessoal e o respeito à diferença”. Ainda dentro da discussão foi ressaltado o
comprometimento tanto da parte da escola, quanto o da família para que o processo de
inclusão aconteça de forma efetiva. Em todos os relatos foram evidenciados a preocupação

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com esse aluno/a, pois cada um deles possui suas especificidades e a inclusão é um desafio a
ser enfrentado.
Conforme a autora Carvalho (2004) a letra das leis, os textos teóricos e os discursos
que proferimos asseguram os direitos, mas o que os garante são as efetivas ações, na medida
em que se concretizam os dispositivos legais e todas as deliberações contidas nos textos de
políticas públicas. Contudo é preciso mais que oferecer, é necessário, fornecer possíveis
estratégias, soluções no que se refere à inclusão para que os direitos sejam de fato
consolidados.
Ainda ampliando a discussão vamos dialogar sobre as possíveis práticas e estratégias
para que haja uma inclusão efetiva. Para tanto as participantes ressaltam o quanto se torna
difícil de trabalhar com alunos com necessidades especiais e que para além disso, muitas
vezes se sentem excluídas. Afirmam ainda que tentam buscar soluções através de recursos
pedagógicos para atender de maneira adequada, a inclusão, ou seja, “incluir é colocar o
aluno/a na sala e fazer com que ele participe de todas as atividades, realizando-as de acordo
com suas limitações”. Deste modo, é preciso oferecer meios e possibilidades para que o
aluno/a tenha a possibilidade de realizar a sua atividade.
As professoras ressaltam a importância que “trabalhar com alunos especiais exige
planejamento constante, o que não o diferencia de outros alunos”, procurando atividades que
atendam a necessidade de cada aluno, fazendo com que haja troca de experiências e
informações entre a professora do AEE, buscando atender as peculiaridades de cada aluno. E
ainda é ressaltado pelos professores do AEE “que os professores são despreparados e que
acabam transferindo as suas responsabilidades para os professores da sala de atendimento
educacional especializado”.
No entanto é necessário rever e avaliar as propostas do processo de ensino
aprendizagem, se existe condições físicas no ambiente no qual o procedimento de ensino será
aplicado e se são compatíveis co com as necessidades de cada aluno.
As participantes afirmam que é necessário objetivar as ações que sejam organizadas de
acordo com a necessidade de cada aluno, onde se destaca a importância da interação, da rotina
pré-estabelecida como: jogos com formas, cores, letras e números, explorando imagens para
ampliar o vocabulário.

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Também desenvolver trabalhos que envolvam o auxílio dos colegas utilizando


materiais adequados para seus níveis de desenvolvimento. “Portanto são oferecidos trabalhos
individuais ou em pequenos grupos com materiais e jogos diversificados, brincadeiras,
música, atividades online e programas do MEC sendo este,ações, ou seja Programas
disponibilizados às escolas públicas de ensino regular, conjunto de equipamentos de
informática, mobiliários, materiais pedagógicos e de acessibilidade para a organização do
espaço de atendimento educacional especializado. Cabe ao sistema de ensino, a seguinte
contrapartida: disponibilização de espaço físico para implantação dos equipamentos,
mobiliários e materiais didáticos e pedagógicos de acessibilidade, bem como, do professor
para atuar no AEE.
Como foi citado acima atividades online, nos remete ao avanço da tecnologia, pois a
mesma contribui cada vez mais para a inclusão dos alunos/as com necessidade educacionais
especiais. Existem softwares, equipamentos de comunicação alternativa e diversos outros
itens ampliam a habilidade funcional. Sabemos que se não fosse a tecnologia, muitos alunos
que conhecemos não estariam estudando. Portanto, “não basta incluir, tem que ter acesso a
tecnologias e possibilidade de permanência para esses alunos/as com necessidades
educacionais especiais”, e que o mesmo possa fazer parte do contexto em que está inserido.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Sabemos que a inclusão dos educandos com necessidades educacionais especiais nas
escolas no ensino regular traz a necessidade de atuação de docentes especializados, mas o que
encontramos nas escolas são docentes conformados com que é oferecido pelo sistema pois,
alegam que antes eles não tinham quem os ajudasse com esses educandos. em sala de aula
,mesmo sabendo da real situação que o sistema impõe esses docentes não procuram exigir o
que é de direito e exposto na Lei de Diretrizes e Bases 9394/96 Art.59
Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com deficiência, transtornos globais
do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação: (Redação dada pela Lei nº 12.796,
de 2013)
I – currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para
atender às suas necessidades;

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II – terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para
a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para
concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados;
III – professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para
atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a
integração desses educandos nas classes comuns;
Ainda Cabe aos sistemas de ensino, ao organizar a educação especial na perspectiva da
educação inclusiva, disponibilizar as funções de instrutor, tradutor/intérprete de Libras e guia
intérprete, bem como de monitor ou cuidador aos alunos com necessidade de apoio nas
atividades de higiene, alimentação, locomoção, entre outras que exijam auxílio constante no
cotidiano escolar.
Para atuar na educação especial, o professor deve ter como base da sua formação
,inicial e continuada, conhecimentos gerais para o exercício da docência ,conhecimentos
específicos da área e recursos, nos centros de atendimento educacional especializado,
Portanto, hoje o que encontramos são atendentes fazendo o papel destes docente
especializado nas instituições de ensino regular ,ainda é ofertado a Sala de Atendimento
Educacional Especializado(AEE),onde os alunos/as são atendidos uma vez por semana, num
período de 00:45 min durante mesmo turno de aula ,mesmo sabendo que esses aluno/as
deveriam ser atendidos no período inverso as aulas.
Vale ressaltar que os profissionais da Sala de Atendimento Educacional Especializado
(AEE) sentem a falta de comprometimento por parte de alguns colegas, sendo que quando
ocorre situação adversa, cabe ao a este resolver problemas que deveriam ser solucionadas no
coletivo.
Contudo acredito que o sistema educacional e seus profissionais devem ter
conhecimento das características do processo inclusivo, suas possibilidades e suas
dificuldades. Entretanto é muito importante também que haja trocas de experiências entre os
professores das escolas que estejam engajadas no processo inclusivo, bem como a formação
de grupos de estudos para obter uma visão mais ampla de todo o processo e de suas
estratégias educacionais adequadas a cada realidade.
Uma escola inclusiva exige preparo e envolvimento de seus profissionais, ou seja, com
capacidade de adaptação do currículo às necessidades específicas dos alunos e mais recursos

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educacionais e o mais importante o aluno com necessidade educacionais especiais deverá


estar incluído no PPP da escola. Nós não podemos criar currículos e programas educacionais
que somente privilegiam uma parcela da sociedade, seja em termos econômicos ou em termos
de habilidades físicas e cognitivas, mas sim, de criar currículos e programas que
proporcionem uma educação de qualidade para todos.
A inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais é o tema, que além de
despertar interesse da sociedade, traz consigo questões relativas à implantação e a
implementação da proposta de uma Educação Inclusiva, onde é ressaltado qual é o papel da
escola neste processo.
Para finalizar, no que diz respeito às limitações desta pesquisa consta a necessidade de
realizar um desdobramento das necessidades educacionais especiais citadas acima e ainda
complementar com observações em sala de aula, constatando que desta que forma
enriqueceria o presente trabalho com maior volume de material para análise.

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PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DOCENTE EM ESCOLAS DO CAMPO

Mariane Bolzan – UFSM – marianebolzan@yahoo.com.br


Gracieli Conrad Benz – UFSM - graciconradbenz@gmail.com
Helenise Sangoi Antunes – UFSM – professora@helenise.com.br

Resumo
Este trabalho surge do interesse em pesquisar como se dá a formação inicial de uma professora
alfabetizadora que atuou em escolas rurais de Restinga Seca, interior do estado do Rio Grande do Sul,
bem como, quais são as suas concepções em relação à modalidade de Educação do Campo. Buscamos
compreender como os processos formativos de professores implicou na docência e na vida pessoal da
entrevistada, o que de certa forma a remete a suas histórias de vida, assim como quais as concepções e
os conhecimentos que ela possui em relação à Educação do Campo e de que maneira estas estão
implicadas em suas práticas educativas da sala de aula. A pesquisa é de cunho qualitativo, conforme
estudos de Bogdan; Biklen (1994), sendo que a coleta de informações foi realizada através de
encontros com as colaboradoras da pesquisa. Os instrumentos de coleta de informações utilizados
foram a entrevista semiestruturada e os relatos autobiográficos orais e escritos, sendo todos gravados,
transcritos e organizados, conforme as categorias de análise: processos formativos e lembranças
escolares, concepções acerca da modalidade de Educação do Campo. Desse modo, os referenciais
teóricos que orientaram a escrita deste trabalho são Antunes (2007), Nóvoa (1988), Caldart (2000),
Arroyo (2000), Tardif (2010) entre outros que contribuem para os estudos sobre formação de
professores, educação do campo, histórias de vida. Com este estudo, evidenciamos que, durante a
formação inicial, pouco se contempla sobre os contextos das escolas rurais, o que confirma a
contemporaneidade da temática, a fragilidade das políticas públicas e a necessidade de pesquisas que
contemplem tais especificidades rurais. Neste sentido, há a necessidade latente de buscar-se a
valorização dos profissionais que atuam nas escolas do interior, por meio de políticas públicas de
qualidade e que privilegiem tais lugares, suas especificidades e necessidades, assim como, a inserção
das temáticas referentes à educação nas escolas rurais no currículo dos cursos de formação inicial de
professores.

Palavras-chave: Formação de professores; História de vida; Educação do campo.

Para introduzir

Este trabalho está vinculado ao Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Formação Inicial,
Continuada e Alfabetização/GEPFICA, da Universidade Federal de Santa Maria/UFSM. Tem-
se como referência princípios da abordagem qualitativa, com base em estudos teóricos
realizados por Bogdan e Biklen (1994). Segundo os mesmos, a pesquisa qualitativa tem o
ambiente natural como sua fonte direta de dados e o pesquisador como seu principal
instrumento, supondo um contato direto e prolongado do mesmo com o ambiente e a situação

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que está sendo investigada, normalmente por meio de um trabalho de campo (BOGDAN;
BIKLEN, 1994). Ainda no que tange à técnica qualitativa, Arostégui (2006, p. 515) afirma
que “[...] são aquelas que trabalham com dados não expressos de forma numérica, quer dizer,
com conceitos agrupáveis em classes, mas não suscetíveis de adquirir valores mensuráveis
numericamente [...]”. Essa medida numérica é um dos pontos que difere a técnica qualitativa
da quantitativa.
O presente estudo é um estudo de caso fazendo referências às histórias de vida da
colaboradora da pesquisa, portanto, conforme Bogdan; Biklen (1994), elas são uma maneira
de o pesquisador “abarcar” toda a vida do entrevistado ou então alguns momentos específicos
da vida dele. Além disso, o estudo de caso, conforme Lüdke e André (1986, p. 46)

[...]é o estudo de um caso simples e específico ou complexo e abstrato e deve ser


sempre bem delimitado. Pode ser semelhante a outros, mas é também distinto, pois
tem um interesse próprio, único, particular e representa um potencial na educação.
Destacam em seus estudos as características de casos naturalísticos, ricos em dados
descritivos, com um plano aberto e flexível quefocaliza a realidade de modo
complexo e contextualizado.

Com a metodologia definida, um grande avanço foi conquistado, pois, conforme


Antunes (2001, p. 49), “[...] a metodologia, portanto, vai além de definir os métodos a serem
utilizados pelo pesquisador. Ela se torna um ponto estrutural no trabalho de investigação
cientifica, porque aponta condições para o pesquisador guiar-se durante a sua investigação
[...]”. Foi a partir desta metodologia que o estudo foi norteado durante todo o processo, desde
a coleta das informações, até a análise dos resultados.
Os instrumentos que fizeram parte da coleta de informações foram as entrevistas
semiestruturadas orais e os relatos autobiográficos orais e escritos. A
entrevistasemiestruturada não é tão rígida com a estruturada, nem tão livre e aberta com a
não-estruturada (PARDAL; CORREIA, 1995).
A partir do surgimento do intuito desta pesquisa muitas coisas, sentimentos e emoções
passaram em nossa mente, e entre elas, muitas dúvidas. Foi um grande processo até a
definição da colaboradora da pesquisa, sendo que acabamos optando por fazer com uma
professora aposentada que trabalhou durante anos em escolas rurais do município de Restinga
Seca/RS e que muito tem a contribuir com este estudo.

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A colaboradora Neida Terezinha Mainardi é professora aposentada. Neida possui 59


anos de idade e mora no interior da cidade de Restinga Seca, na comunidade de São Miguel
Novo. No momento está aposentada, mas trabalhou em várias escolas do município por um
período de 25 anos, 1 mês e 08 dias, entre elas na escola Joaquim Nabuco, Castro Alves, Sete
de Setembro e Dezidério Fuzer. Nesta última escola aposentou-se como diretora. Sua
formação é o Magistério (2º grau) e, segundo ela, gostaria de ter cursado uma faculdade, mas
não teve a oportunidade. Neida é casada e possui dois filhos e atualmente dedica seu tempo
aos afazeres da casa e a comunidade, onde é presidente do grupo da terceira idade.
Ao resgatar as suas histórias de vida, a memória terá um importante papel nessa
pesquisa com a professora Neida, já que, segundo Nóvoa (1988, p. 116), “[...] as histórias de
vida e o método (auto)biográfico integram-se no movimento actual que procura repensar as
questões da formação, acentuando a idéia que ‘ninguém forma ninguém’ e que ‘a formação é
inevitavelmente um trabalho de reflexão sobre os percursos da vida’ [...]”. Ainda conforme
Nóvoa (2004), “mais do que o passado as histórias de vida pensam o futuro”.
São importantes as pesquisas com histórias de vida ou (auto) biografia, pois
proporcionam ao pesquisador e aos sujeitos envolvidos, perceber a necessidade de uma
reflexão acerca da trajetória como formador, percebendo aquilo que de fato teve relevância
em sua história de vida tanto profissional como pessoal.
Como a pesquisa foi realizada com uma professora aposentada, que trabalhou durante
toda sua carreira do magistério em escolas rurais do município de Restinga Seca, penso que a
história de vida do professor aposentado acaba se decifrando na história e na experiência de
vida do pesquisador. Souza (2006) trata sobre história de vida e formação como arte de contar
e trocar experiências. Essa partilha entre entrevistado e pesquisador é algo muito rico, já que
são trocas e um aprende com o outro, com o relato do outro. Desse modo, Souza (2006, p. 25)
confirma que
As histórias de vida são, atualmente, utilizadas em diferentes áreas das ciências
humanas e de formação, através da adequação de seus princípios epistemológicos e
metodológicos a outra lógica da formação do adulto, a partir dos saberes tácitos e
experienciais e da revelação das aprendizagens construídas ao longo da vida como
uma metacognição ou metareflexão do conhecimento de si.

Maués (2003, p. 3) considera que a “[...] reconstrução de histórias pessoais, analisando


aspectos educacionais, crenças, valores e normas, pode contribuir para melhorar

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qualitativamente a prática docente individual e, em consequência, a prática docente no sentido


mais amplo [...]”. Nesse mesmo sentido, Chizzotti diz é que

[...] a história de vida ou relatos podem ter a forma obrigatória onde o autor relata
suas percepções pessoais, os sentimentos íntimos que marcaram a sua experiência,
ou os acontecimentos vividos no contexto de sua trajetória de vida. Pode ser um
discurso livre de percepções subjetivas ou recorrer a fontes documentais, as
afirmações e relatos pessoais (CHIZZOTTI, 1996, p. 47)

As memórias estão presentes nas lembranças dos professores, que fazem reflexões,
comparações, apontam situações semelhantes à realidade presente, realizam inferências do
passado com a atualidade.
Considerando como formação inicial não somente o curso de Graduação, mas também
as memórias e lembranças do tempo de estudante é que este trabalho surgiu, pois acreditamos
que é através da memória que os professores conseguem reviver fatos ocorridos em um
passado não tão distante, que em muitos casos, ainda se faz presente, já que alguns
educadores baseiam-se em seus professores para exercer práticas educativas hoje em sala de
aula. Ainda no que refere à memória, Antunes (2007, p. 162) afirma que “[...] a memória
docente constitui-se numa forma de conhecer e auxiliar no processo de formação inicial e
continuada dos professores [...]”. Entendemos, dessa forma, que as lembranças e as memórias
do tempo de escola, sejam dos colegas, das professoras e até mesmo da escola em si,
influenciam no processo de tornar-se professora.
Nesse sentido, dialogo com Nóvoa (2000), pois cada professora ao aguçar sua
memória faz reflexões que fazem parte de seu processo de formação enquanto profissional
docente, além de fazer reflexões a respeito do eu pessoal de cada uma delas. Ainda sobre a
memória, Antunes (2004) afirma que “a prática docente está também relacionada às
experiências de vida, aos processos de formação e à memória docente, evidenciando-se a
partir daí uma relação entre o saber e o contexto em que esse saber é elaborado”.
Na maioria das vezes, a prática dessas professoras é reflexo da memória que elas têm
da sua infância e do seu processo de alfabetização, lembrando da primeira professora, como
foi alfabetizada e como era a sua relação com essa professora, das suas trajetórias pessoais,
que se acredita estar diretamente ligada às suas trajetórias profissionais.

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Algumas contribuições vindas de uma professora

O processo formativo dessa educadora perpassa certamente não somente pela


formação inicial da mesma e sim é mais complexo e abrangente do que isso. A formação dela
se constitui também por seu processo de alfabetização, desde os tempos em que era estudante
e até agora quando assume o papel de professora. Todas essas lembranças certamente
contribuíram ou não para tornar-se professora.
As lembranças e as memórias da professora entrevistada são aspectos que merecem ser
destacados e analisados. A professora aposentada Neida ressalta que

Minha primeira professora se chamava Eva e fui alfabetizada na Escola Eugenio


Dotto, era uma escola com poucos alunos, onde a professora atendia todas as séries,
fazia merenda e os próprios alunos lavavam a louça e faziam limpeza do pátio e das
salas de aula. (Relato da colaboradora Neida Mainardi, 2011).

Através deste excerto da entrevista semiestruturada da colaboradora Neida, percebemos


que ainda estão muito vivas suas lembranças de escola e da primeira professora, que
geralmente nos marca muito. Em seu relato, Neida mostrou-se emocionada ao relembrar esses
acontecimentos em sua vida escolar e ressalta que existe muita diferença de hoje em dia, pois
todas as escolas possuem vários funcionários, um ou mais para cada setor. Sobre essas
lembranças, Neida relembrava cada detalhe como se estivesse revivendo os momentos de sua
vida, que tanto lhe fizeram bem.
Sobre a prática profissional, a colaboradora Neida começou seu trabalho cedo

[...] aos 18 anos e comecei em uma escola onde eu atendia duas séries ao mesmo
tempo.Sem experiência e sozinha, nada foi fácil. A Secretária de Educação passava
os conteúdos e durante o ano deviam ser desenvolvidos, pois no final do ano as
provas eram iguais para todo o município. Então era sempre aquela angustia, ficava
me questionando quanto a desempenho de minha função. (Relato da colaboradora
Neida Mainardi, 2011)

Neida, a professora aposentada que trabalhou durante muitos anos, não conseguia
participar de cursos de formação continuada, pois “naquela época era muito difícil para
alguém trabalhar e ao mesmo tempo frequentar algum curso para se atualizar.” (Relato da

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colaboradora Neida Mainardi, 2011). No entanto, dá para perceber que atualmente ainda há
problemas quanto à disponibilidade de tempo para participar da capacitação de professores.
Pensamos ainda que tanto a escola urbana quanto a rural deveriam ter os mesmos
investimentos no que refere à educação, já que quando se fala em educação não importa os
espaços onde se encontram os sujeitos aprendentes. A educação de qualidade deve estar
presente em todas as instituições de ensino e cabe ao governo providenciar estratégias e se
mobilizar para que essas ações de fato aconteçam. Por isso, a importância de formação
continuada a estas professoras.
Questionando sobre como era o processo de alfabetização, a colaboradora relatou que
No processo de alfabetização com meus alunos eram usados diferentes métodos,
porém na maioria das vezes eu trabalhei com alunos já alfabetizados, na 3ª e 4ª
séries. (Relato da colaboradora Neida Mainardi, 2011)
O método que eu usava era sempre material concreto que era de fácil acesso na zona
rural, como sementes, tampas e pedras. (Relato da colaboradora Neida Mainardi,
2011)

A maneira como essa professora exerce suas práticas profissionais está


intimamente relacionando às suas vivências, sejam boas ou ruins. De acordo com Nóvoa
(1992, p. 17)

A maneira como cada um de nós ensina está directamente depende daquilo que
somos como pessoa quando exercemos o ensino. [...] E as opções que cada um de
nós tem de fazer como professor, as quais cruzam a nossa maneira de ser com a
nossa maneira de ensinar e desvendam na nossa maneira de ensinar a nossa maneira
de ser. É impossível separar o eu profissional do eu pessoal.

Nesse mesmo sentido, acabamos por não nos desapegar de nossas vivências, pois o que
passou está diretamente dentro de nós ainda vivo, basta apenas atos que façam com que nossa
memória seja aguçada. Assim, para Fontana (2005, p. 182),

No tempo, vivemos e somos nossas relações sociais, produzimo-nos em nossa


história. Falas, desejos, movimentos, formas perdidas na memória. No tempo nos
constituímos, relembramos, repetimo-nos e nos transformamos, capitulamos e
resistimos, mediados pelo outro, mediados pela prática e significados de nossa
cultura. No tempo, vivemos o sofrimento e a desestabilização, as perdas, a alegria e
a desilusão. Nesse moto continuo, nesse jogo inquieto, está em constituição nosso
“ser profissional”.

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A entrevistada acredita que a formação inicial de professores alfabetizadores deveria


contemplar aspectos que lhe pudessem subsidiar durante sua prática pedagógica em sala de
aula, tanto para profissionais que lecionam em escolas do campo ou urbanas. A alfabetização
constitui-se em um processo que precisa partir da realidade do aluno, para que esse se sinta
instigado a procurar novas possibilidades de aprendizagem. A sala de aula deve se tornar um
lugar em que ocorra a sistematização das aprendizagens dos alunos, em que eles possam
trazer suas vivências, seja da família, da sociedade, ou seja, do lugar em que estão inseridos.
Portanto, faz-se necessário e importante conhecer essa realidade que está tão próxima
a nós e ao mesmo tempo tão distante, ficando muitas vezes mascarada, sendo que a maioria
das pessoas está acostumada aos moldes urbanos que acabam se tornando padrões de
referência, como se fossem modelo a ser seguido. Conforme Molina (2009),

Entre tantas concepções distintas sobre o próprio conceito Educação do Campo que
hoje perpassa os diferentes sujeitos e organizações que lutam por ela, um consenso
se faz presente: a indagável necessidade da formação de educadores capazes de
compreender e trabalhar processos educativos a partir das especificidades dos
modos de produção e reprodução da vida no campo (MOLINA, 2009, p. 185)

A entrevistada foi questionada quanto ao conhecimento em relação à Educação do


Campo. Buscamos compreender quais são as suas concepções acerca desta modalidade de
ensino. A colaboradora Neida afirma que acredita “ser uma maneira para atrair as crianças da
zona rural com atividades diferenciadas a eles”. (Relato da colaboradora Neida Mainardi,
2011).
Os alunos do interior são mais simples, mais afetuosos, segundo a professora Neida,
“[...] sinto saudades das crianças vindo me abraçar felizes, aquilo me dava ânimo, as crianças
da zona rural eram e são maravilhosas.” (Relato da colaborada Neida Mainardi, 2011)
Pensando no melhor preparo dos profissionais da educação que atenderão a esta
modalidade de ensino, já existe o curso de Licenciatura em Educação do Campo pela
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Além disso, pela Universidade Federal de
Pelotas também abriu recentemente essa Graduação. Esse curso surgiu pela necessidade de o
educador de escola do campo ter uma formação mais ampla, mais totalizante, já que nessa
realidade esse profissional precisa dar conta de uma série de dimensões educativas presentes.
(ROCHA, 2009). Esse curso vem para subsidiar a formação inicial de professores que atuarão

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em escolas do campo, com um olhar mais direcionado a essa realidade que merece atenção
especial. Rocha e Martins (2009) afirmam que o

“[...] compromisso acadêmico e político com o processo de construção de uma


sociedade mais justa, fraterna e sustentável. Enfim, são muitos os motivos pelos quais
podemos elencar o desenvolvimento da Universidade em um projeto de formação de
professores para atuação nas escolas do campo. Estar junto, ser aliada, ser
companheira, colaborar, mas, fundamentalmente, ocupar seu papel como sujeito nessa
construção”.

Assim, quanto mais preparados os profissionais da educação estiverem, melhor


atenderão ao alunado de escolas rurais, afim de que possa ser construída de fato uma
verdadeira Educação do Campo.

Algumas considerações

Retomando o objetivo geral desta pesquisa, que era o de conhecer os processos


formativos de uma professora alfabetizadora que trabalhou em escolas rurais do município de
Restinga Seca, percebo a importância de fazer a pesquisa não para identificar os problemas do
contexto rural, mas sim para tentar contribuir de forma significativa para que as eventuais
melhorias possam acontecer com a mediação de nossas ações de pesquisa. Esperamos ter
contribuído para que eventuais estudos possam ser feitos e também fica o desejo de que esses
profissionais da zona rural sejam mais valorizados em seu exercício docente, mostrando que
têm força de vontade e que vão atrás do que desejam.
Constatamos, durante as entrevistas, que a professora alfabetizadora da escola rural
emocionava-se ao relembrar fatos que mereciam ser destacados em sua memória, assim como
recordava momentos que não foram tão significativos assim, mas que de certa forma
contribuiu no processo de tornar-se professora. Assim, tivemos que respeitar esse momento e
demonstrar a elas o quanto as suas lembranças são significativas.
Precisa-se ainda desmistificar a velha impressão que se tem das escolas do campo
como não sendo portadoras de futuro, como se tivessem atraso em relação às demais. Com
este trabalho, buscou-se mostrar como as histórias de vida da professora alfabetizadora estão
relacionadas com a sua escolha profissional.

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É preciso ainda desmistificar a velha impressão que se tem das escolas do campo
como não sendo portadoras de futuro, como se tivessem atraso em relação às demais. Com
este trabalho, busco também a necessidade latente da construção de uma Educação do Campo,
que não depende somente dos professores e sim do poder público e outras instâncias.

Referências

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as lembranças escolares das alfabetizadoras. In: Revista Centro de Educação. Dossiê:
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O TRABALHO PEDAGÓGICO DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA ESCOLA DE


ASSENTAMENTO DO MST: um estudo de caso

Carine Marques Charão123


Gislei José Scapin124
Maristela da Silva Souza125

Resumo

Neste artigo objetivamos compreender como se constitui o trabalho pedagógico da Educação Física,
no que se refere a teoria pedagógica, na Escola Estadual de Ensino Fundamental Roseli Correa da
Silva (RCS). O contexto da pesquisa se desenvolve no assentamento Nova Santiago. Trata-se de uma
pesquisa do tipo estudo de caso, que se utiliza do materialismo histórico e dialético como
fundamentação teórica. Após o percurso investigativo, confirmamos a hipótese levantada no estudo,
que o MST e, consequentemente, a escola do assentamento e o trabalho pedagógico da EF, através da
teoria pedagógica, vem afastando-se dos princípios que inicialmente/historicamente nortearam a
educação do campo e inspiraram as primeiras lutas na conquista da terra.

Palavras-chave: Trabalho Pedagógico; Movimento Social; Educação Física; MST.

Introdução

O objetivo deste artigo é compreender como se constitui o trabalho pedagógico da


Educação Física no que se refere a teoria pedagógica, na Escola Estadual de Ensino
Fundamental Roseli Correa da Silva, localizada no assentamento Nova Santiago.
Nossa hipótese se baseia no pensamento de Kopnin (1978) denominando-a não como
um enunciado isolado, mas como uma fração do pensamento em que a ideia não se encontra
suficientemente desenvolvida, mas que, no processo de elaboração do conhecimento,
converte-se em teoria. Sendo assim, levanta-se como hipótese nesse estudo, que o MST e
consequentemente a escola do assentamento e o trabalho pedagógico da EF, através da teoria

123
Centro de Educação Física e Desportos – UFSM; carinemarxcharao@gmail.com
124
Centro de Educação Física e Desportos – UFSM; gjscapin@gmail.com
125
Centro de Educação Física e Desportos – UFSM; Maristeladasilvasouza@yahoo.com

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pedagógica, vem afastando-se dos princípios que inicialmente nortearam a educação do


campo e inspiraram as primeiras lutas na conquista da terra.
Analisamos este processo a partir da teoria pedagógica, entendendo teoria enquanto
“uma forma de pensamento que tem suas peculiaridades e ocupa um certo lugar no
movimento do conhecimento” (Kopnin, 1978, 237). Neste movimento, a Teoria Pedagógica
formula princípios norteadores que tratam o trabalho pedagógico (Freitas, 1995). A teoria
pedagógica, portanto, realiza a mediação entre a Teoria Educacional, que relaciona Educação
e Sociedade em seu desenvolvimento, e Organização do Trabalho Pedagógico, que segundo
Freitas (1995), se insere na Teoria Pedagógica e se materializa em dois níveis no interior da
escola: 1) Trabalho pedagógico, que costuma se desenvolver em sala de aula; 2) Projeto
político pedagógico da escola.
Portanto, por meio da Teoria pedagógica, objetivou-se melhor conhecer o trabalho
pedagógico do professor, a constituição da escola do MST e sua relação com a sociedade, em
especial através do professor de Educação Física. Entendemos que o contexto singular do
trabalho da Educação Física, vai ao encontro da escola e de seu processo de constituição, que
não só concebemos ser fruto de uma lógica social, mas de uma história em particular, nesse
caso a da escola RCS, e que ainda desconhecíamos.

Metodologia

A pesquisa do tipo estudo de caso utilizou-se do materialismo histórico e dialético


como fundamentação teórica, e com o objeto nos utilizamos das categorias de conteúdo que
conforme Kuenzer (1998) são aplicáveis ao particular, específicas em cada pesquisa,
coerentes com seus objetivos. As categorias de conteúdo neste estudo, a priori estabelecidas,
se constituem em: Trabalho, MST, Educação do Campo, Trabalho Pedagógico da Educação
Física e Teoria Pedagógica. Através destas categorias, temos a possibilidade de estabelecer,
dialeticamente, a relação entre o universal (projeto histórico), o particular (escola RCS) e o
singular (trabalho pedagógico do professor de EF).
As entrevistas foram realizadas nos meses de fevereiro e março de dois mil e dezesseis
nas cidades de Santiago e Capão do Cipó, onde o (a) pesquisador(a) permaneceu por quatro

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dias consecutivos. No total do grupo, foram realizadas vinte e sete entrevistas, tendo como
critérios o pertencimento a gestão democrática da escola, ou seja, conselho escolar, CPM
(Círculo de Pais e Mestres) e liderança de turmas. Participaram da entrevista nove educadoras,
duas funcionárias, onze alunos e cinco responsáveis pelos alunos (pais, avós e parentes
próximos).

Análises teóricas
Teoria Pedagógica: mediação entre teoria educacional e trabalho pedagógico

[...] embora tenhamos avançado significativamente, e com muita qualidade, na


compreensão das dimensões pedagógicas das relações sociais e produtivas,
contribuindo para a construção de uma nova teoria sobre a educação nesta etapa de
reestruturação do capitalismo, há que indagar até que ponto ainda o mundo do
trabalho tem sido seguido pelo necessário retorno à escola (KUENZER, 1998, p.
71).

A teoria educacional trata dos aspectos mais gerais, relacionando sociedade e


educação, para isso deixa claros seus objetivos, o seu projeto histórico, o tipo de homem e
mulher que deseja formar.

Segundo Freitas (1987), “Um projeto histórico enuncia o tipo de sociedade ou


organização social na qual pretendemos transformar a atual sociedade e os meios
que deveremos colocar em prática para sua consecução. Implica uma ‘cosmovisão’,
mas é mais que isso. É concreto, está amarrado a condições existentes e, a partir
delas, postula meios e fins” (TITTON, 2006, p. 72).

Tanto a teoria educacional quanto a teoria pedagógica expressam uma concepção de


mundo e apontam para um projeto histórico. Tal projeto

[...] deve ser considerado em todos os momentos da análise, pois a superação do


atual projeto societário só pode ser possível se reconhecidas as contradições deste
mesmo projeto, identificando nestas as possibilidades de ação para sua superação
(TITTON, 2006, p. 72)

Todo trabalho pedagógico tem uma teoria que o fundamenta, o fato do professor
desconhecer, ou até mesmo utilizar-se de várias teorias pedagógicas de forma acrítica, não

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extingue a existência da teoria126. É por influenciar o trabalho do professor na escola, que uma
teoria pedagógica é importante, pois esta pratica social não esta separada da luta ideológica.
Se não temos tais aportes, cairemos em incoerências e contradições.
A partir da década de noventa, acompanhando os ditames da “terceira via,” os
trabalhadores passam a ser formados pela influencia de outra lógica, explicitada em
documentos relacionados a educação, e aos órgão que se relacionam ao BM, como: “a ênfase
no saber fazer e saber ser, no aprender a aprender, no desenvolvimento de habilidades e
competências” (GARCIA, 2015, p. 110).
No que se refere à educação dentro do MST127 surgiu em virtude da própria
necessidade constatada na prática social, nos primeiros acampamentos. Ao mesmo tempo em
que o movimento se organizava, procurava pensar os processos educativos. “Intimamente
ligado ao processo de ocupação da terra está a história da educação no MST, conforme
relatado por Caldart [...]” TITTON (2006, p. 47). Portanto, é desta prática social que surge
também a teoria pedagógica que hoje é chamada Pedagogia do Movimento Sem Terra,
sistematizada pela intelectual orgânica do Movimento, Roseli Caldart.
D’Agostini (2009) e Titton (2006) ao analisarem a teoria educacional, que direciona a
teoria pedagógica e a organização do trabalho pedagógico no interior das escolas do MST,
constatam que as produções teóricas na educação dentro do Movimento que inicialmente
eram mais coletivas, passaram a ser, a partir da década de noventa, mais individuais e que
existem tendências pós-modernas128 na produção de conhecimento.

126
Fala proferida por Newton Duarte no vídeo disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=uCHSUjiQjPQ>. Acessado: em 22/09/2015.
127
“No caso do MST e das suas escolas, há duas décadas aproximadamente, identifica-se a preocupação com a
formação humana e educação dos sem-terra, que se constata pela organização e construção da Teoria Pedagógica
do Movimento. Por esse motivo, diversas lutas em defesa pela garantia de escolas e a organização de inúmeros
cursos de formação de professores, congressos, encontros nacionais e estaduais vêm ocorrendo sistematicamente.
Trata-se de uma preocupação orientada para a educação da classe trabalhadora do campo e, ao mesmo tempo, da
intenção de vir a ser uma formação humana orientada para o confronto com o modo de produção capitalista. E,
por esse aspecto e pelas dimensões sociais que podem ser alcançadas, talvez se possa dizer que pelas ações e
lutas do MST tenha-se ali uma retomada ontológica do ser social” (GARCIA, 2009, p. 40).
128
“Caldart (2004, p. 28) em sua produção assume a possibilidade de estarmos na pós-modernidade. Percebemos
também que, diferentemente dos cadernos de Educação do MST, nesta obra há um distanciamento com as
categorias marxistas trabalho, classe, luta de classes e revolução, e há um privilégio das categorias cultura,
identidade e subjetividade. A autora não nega nem essas categorias e nem o trabalho como princípio educativo,
mas atribui maior ênfase à cultura e aos processos culturais para a formação do sujeito social e sua identidade”
(D AGOSTINI, 2009, p. 135).

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Segundo Garcia (2009, p. 116) existem dois momentos “bem demarcados na história
da produção teórica da Pedagogia do Movimento, assim como a existência de uma transição
entre um e outro com a tese de doutorado de Caldart (1999)”. Mesmo que embora a autora
reconheça, fundamentada em Kopinin que toda teoria necessita de um amadurecimento129 e de
estar sendo constantemente revisitada, revisada e construída.
Há que se destacar, também, os princípios pedagógicos e filosóficos ressaltados pelo
Movimento, no Caderno Pedagógico nº. 08 (MST, 1996). Nos princípios filosóficos estão: A
educação para a transformação social; Educação para o trabalho e a cooperação; Educação
voltada para as várias dimensões da pessoa humana; Educação com/para valores humanistas e
socialistas e Educação como um processo permanente de formação/transformação.
Quanto aos princípios pedagógicos temos: Relação entre teoria e prática; Combinação
metodológica entre processos de ensino e de capacitação; A realidade como base da produção
de conhecimento; Conteúdos formativos socialmente úteis; Educação para o trabalho e pelo
trabalho; Vinculo orgânico entre processos educativos e processos políticos; Vínculo orgânico
entre educação e cultura; Gestão democrática; Auto-organização dos/das educadores; Atitudes
e habilidades de pesquisa; Combinação entre processos pedagógicos coletivos e individuais.

Trabalho pedagógico da Educação Física e Educação do campo

O trabalho pedagógico do qual estamos tratando, não está desvinculado do trabalho


como categoria fundante do ser humano. Entretanto, esse é um tipo de trabalho que está
ligado, sobretudo a educação. É um tipo de trabalho não material, onde o produto não se
separa do ato de produção, conforme Saviani (1984, p. 1) o “ato de produção e ato de
consumo se imbricam”. Paro (2002, p. 33) também afirma que “no processo de trabalho
pedagógico, o produto não se separa da produção”.
A forma predominante de educação, em nossa sociedade é a escolar, de tal maneira
que se confunde educação como sinônimo de escola, mesmo que saibamos que a educação é

129
“Para esse autor, o conhecimento, ao se converter em teoria, deve atingir em seu desenvolvimento certo grau
de maturidade, ou seja, enquanto o conhecimento se restringir apenas à seleção e descrição dos fatos da
realidade, relativos a um ou outro objeto ou fenômeno(s), esse conhecimento está tratando apenas de um enfoque
da teoria, “uma preparação para a sua criação e não a própria teoria” (KOPNIN, 1978, p. 237)” (GARCIA,
2009, p. 118).

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muito mais ampla. O trabalho pedagógico em questão aqui é o que se desenvolve nessa
instituição, e este não fica alheio ao processo de produção ora vigente, o do sistema
capitalista.
Podemos afirmar que no interior da escola, o trabalho pedagógico do professor EF,
tem características próprias, exige espaços diferenciados das demais disciplinas (nem sempre
existentes nas escolas, em sua maioria, projetadas apenas como salas de aulas), material
pedagógico específico, e que, portanto sua atuação é diferente das demais disciplinas.

O professorado de Educação Física realiza um trabalho nas escolas, ao mesmo


tempo, comum a dos outros professores, em função da consonância com os
propósitos da instituição escolar; e singular, em função da especificidade dos
conhecimentos e das práticas da área. Tal especificidade pode ser facilmente
visualizada na natureza dos espaços que os professores de Educação Física utilizam
para sua intervenção, na peculiaridade dos materiais e recursos que esses fazem uso,
no trato pedagógico com as manifestações da cultura corporal e com o movimento, e
mesmo, nas relações que esses docentes estabelecem com outros professores e com
o alunado (WITTIZORECKI, 2001, p.27).

Sobre as condições de trabalho do professor de EF, nas escolas pesquisadas por Frizzo
(2012, p. 102) foi encontrada uma precária infraestrutura para aulas de EF, carência de
materiais didáticos, crescente intensificação do trabalho do professor decorrente das
condições de remuneração e trabalho, não existência de incentivo para a formação continuada
e o limitado acesso ao conhecimento por parte do alunado.
Se tais características das condições de trabalho da EF são encontradas por Frizzo nas
escolas urbanas, pesquisadas em sua tese, o que podemos dizer a respeito de tais
características nas escolas do/no campo, tendo em vista que a precarização do trabalho em
educação, nesta realidade, é muito maior130 e aumenta na mesma proporção em que a lógica
do capitalismo avança e combina elementos como agronegócio, latifúndio e monocultura.
Sabemos que as escolas do campo têm particularidades quanto ao tamanho, número de
professores, número de alunos e funcionários, sendo na maior parte das vezes, menores do
que as escolas localizadas no meio urbano. Essas características influenciam a organização do
trabalho pedagógico e fazem com que o Estado venha considerando como “gasto” manter

130
“Os professores da área rural enfrentam as consequências da sobrecarga de trabalho, da alta rotatividade e das
dificuldades de acesso e locomoção. Além disso, recebem salários inferiores aos da zona urbana e estão entre os
que tem menor nível de escolaridade” (TRANZILO, 2008, p. 67).

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aberta a escola do campo e a mão de obra de trabalhadores lotados ali, explorando ainda mais
o trabalho dos educadores, que muitas vezes atendem turmas multiseriadas, ou mesmo
ministrando disciplinas para as quais não possuem formação, a fim de preencher totalmente
sua carga horária semanal.
Outra situação recorrente é a de que caso o professor não preencha na mesma escola a
totalidade de suas horas, o mesmo se sujeitará a atender mais de uma escola, tendo poucas
horas em cada uma delas. O fato de ter menor número de alunos e turmas faz com que na
maioria das escolas do campo, a carga horária seja tão pequena que não se consiga deslocar
um professor de Educação Física para ministrar a disciplina, e nesse caso, outro professor
com formação pedagógica diferente irá assumir essa responsabilidade.
Citamos como exemplo dessa realidade, as duas escolas de assentamento, localizadas
na abrangência da oitava coordenadoria regional de educação, a Escola Estadual de Ensino
Fundamental Santa Júlia no assentamento Santa Júlia e a Escola Estadual de Ensino
Fundamental 15 de Março, no assentamento Nova Ramada. Ambas não possuem professores
de Educação Física. A própria escola RCS, estudada nesta pesquisa, foi fundada em 1988,
mas contou com a primeira professora de Educação Física somente no ano de 2005. Segundo
Avila (2004, p.7)

Neste sentido, entendemos que pensar a formação continuada das professoras do


MST é fundamental para que a Educação Física nesta realidade comece a se
consolidar, a partir de uma perspectiva crítica articulada com os demais saberes.
Assim, este momento apresentado no trabalho reflete o início de um processo que
precisa ser contínuo e permanente. Provocando um movimento duplo: que a
Educação Física seja repensada pela escola e por ela mesma, a partir desta prática
social - a escola do campo inserida num movimento social organizado.

Ao mesmo tempo, sabemos que a relevância da Educação Física na escola relaciona-se


com a proposta pedagógica da instituição, enquanto entendimento da teoria educacional, que
se materializa na medida em que a gestão democrática, através de um coletivo de educadores,
organiza o trabalho pedagógico, sendo que esta importância também está relacionada com
realidade social em que a escola está inserida.

O contexto da pesquisa: com a palavra... os sujeitos

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Para a análise das entrevistas utilizaremos as categorias de conteúdo estabelecidas


neste estudo, subdivididas em dois grupos a fim de aglutinar as respostas encontradas nas
falas dos sujeitos.
Nas questões relativas ao MST, a relação das educadoras com o Movimento se dá
prioritariamente pela escola, tendo todo o grupo afirmado que essa relação existe e pode ser
melhorada. A escola também participa do encontro Sem Terrinha que é uma atividade do
Movimento, realizada anualmente no mês de outubro, próximo ao dia em que se comemora o
dia da criança.
Educadora 2, quando perguntada sobre sua relação com o MST:

Ah, só de palestras, grupos, formação em Veranópolis, em Porto Alegre,


Uruguaiana, Santana, foram os que teve nesse último governo, quase todos eu fui!
(Educadora 2)

Tem, não diretamente, mas tem. É uma escola de assentamento, ela conta a história
dos assentados, então, indiretamente ela tem esse comprometimento com o
movimento, embora não tenha uma participação ativa. Há pessoas que estão fazendo
pós-graduação lá dentro do movimento e que vão pegar informação na escola,
entrevistas, então ela tem sim uma participação. A escola participa também do
movimento Sem Terrinha, sempre tem professor junto, há muitos anos. (Educadora
1)

Em relação a Educação do Campo, todos os educadores afirmaram que a escola


trabalha voltada a essas questões, tendo demonstrado que a RCS é uma escola diferente
quando comparada a outras que já tiveram a experiência de trabalhar. Essas características
podem ser encontradas na disciplina de técnicas agrícolas, na bandeira da escola, no objetivo
e filosofia da mesma, entre outros exemplos citados.

Sim, a formação continuada, assim na verdade a gente promove lá na Escola, né? faz
reuniões de planejamento, mais por esse lado assim de organização do trabalho
pedagógico, porque o Estado em si, né? ultimamente ele não tem fornecido uma
formação pedagógica, a não ser no governo passado que foi feito, né? em Educação
do Campo, ai sim teve várias formações mais voltadas pra Educação do Campo, pra
Pedagogia do Campo, ai eles tavam querendo implantar a questão do ciclo ai teve
muitas formações, né? (Educadora, 3)

Como o grupo é composto na sua totalidade de mulheres algumas demonstraram-se


sobrecarregadas em relação as tarefas domesticas, filhos, lar, família, além da carga horária de

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trabalho na escola, ou em duas, ou até em três como é o caso de uma professora que desloca-
se por três escolas em dois municípios diferentes. Nem todas as professoras são nomeadas
como a maior parte do grupo, além da existência de cinco contratos.

É que às vezes, como diz o outro, a gente não é só profe, né? às vezes é mãe, às
vezes tu pensa em fazer, mas em função da família da gente, a gente tem que dar
uma estagnada porque às vezes tu quer, mas disse aí desculpe cheguei atrasada, eu,
eu, sabia que eu tinha que chegar as nove, mas é que não deu, mas aí em outro
momento a gente tenta, e faz parte da vida da gente isso. E eu, às vezes eu me sinto
chateada porque parece que eu não to conseguindo dá conta de tudo o que eu tenho
que fazer, mas tudo se organiza no seu devido tempo, então eu digo assim, eu vou
tentar cumprir, mas as vezes eu não consigo ir além do jeito que eu queria, porque
eu não tive aquele tempo. (Educadora 7)

No grupo de alunos, o trabalho a que se referiram os sujeitos é o trabalho campesino,


lavoura, no trato com animais, serviços domésticos dentro do lar, ao redor da moradia,
apiário, hortaliças. Nesse sentido, percebemos mais os meninos ligados a atividades fora de
casa, e as meninas dentro casa.

As vezes eu ajudo a mãe na horta, busca a vaca, mas mais eu ajudo em casa.
(Estudante 24)
Olha lá, geralmente eu ajudo, nós somos agricultores, vaca de leite, e eu ajudo, a
tirar leite, tratar as galinhas, servicinho assim, nada muito ruim assim... (Estudante
26)

Em relação ao MST, o sentimento dominante nas falas, é de que as mobilizações já


foram maiores, do que atualmente, por aqueles que são alunos da EJA. As mulheres se
referem a participações recentes no Movimento quando essas tem ligação à temática das
mulheres e nos alunos que ainda são crianças/jovens, seus conhecimentos dependem da sua
condição, no sentido de que alguns participaram do acampamento e outros já nasceram no
assentamento.

Não, é que eu não sou muito, faz o primeiro ano que arrecem que eu sou líder, e eu
não to muito aproximado do MST. (Estudante 26)

Mas olha, é que tá assim com o pessoal não tá mais pegando junto como antes, né?
se fosse, né? todo mundo, pega mais junto, pra ir numa mobilização, vão sempre os
mesmos quase. (Estudante 17)

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Com relação a educação do campo, os alunos demonstraram que entendem a


importância e a relevância da escola do assentamento, dando mais exemplos do seu cotidiano,
das relações de amizades, da convivência, que criam na escola. Alguns alunos que tiveram
experiência de estudar em escolas urbanas em outras localidades deram outros exemplos.

É legal, todo mundo conversa, não é igual nas outras escolas mais grande que, mal e
mal se fala... Lá nas outras escolas, eram, as vezes tinha pouco aluno na sala de aula,
as vezes tinha muito, daí a professora ficava chamando a gente, só que confundindo
o nome né... aqui já não, elas pelo menos decoram o nome da gente... (Estudante 27)

No que se refere aos pais dos alunos todos mencionaram que o trabalho no
lote/assentamento e por consequência a sua entrada e permanência no Movimento são as
alternativas para as condições que apresentavam, como família com pouca terra, desemprego
na cidade, sendo que lutar por melhores condições de vida foi o fator determinante.

Mas devido que nóis, nóis era, família pobre, o pai tinha nóis, e era em cinco irmão
homem, três mulher e o pai tinha nove hectare de terra. (Responsável 13)

Em relação ao MST, embora as opiniões se dividam, e todos tenham afirmado que de


alguma forma ainda participam das ações do Movimento, houve um relato de um responsável
que fora bem crítico...

Nós temo meio desligado, porque nesse período, antigamente quando vim morar
aqui, você falava em MST, arrumava vinte homem num piscar de olho, e com tudo o
que aconteceu no Movimento e na Política e tá acontecendo, e vamos dizer assim a
palavra, meio que desmanchou o MST aqui.(Responsável 14)

Mesmo assim, outros fatos foram citados como o envelhecimento no campo, alguns
companheiros que já se foram (faleceram), a juventude que sai para estudar e não retorna.
Mas mesmo nessa avaliação, sempre há reunião do Movimento no assentamento, talvez não
sejam mais intensas como foram em outros momentos históricos.
Com relação à escola do assentamento e a educação do campo, este grupo de pais foi
selecionado por fazer parte da gestão da escola através de conselho escolar e circulo de pais e
mestres, então quanto à participação na escola e conhecimento dos avanços e dificuldades
estão bem cientes.

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Ah, mas a escola é muito boa, muito boa, porque veja bem, quantas pessoas idosas
que tão aí estudando e antigamente era só na roça, na roça vendo o sol nascer, o sol
entrar. Tão aposentado e tão estudando, aí mesmo tem, tem uns senhores de cabeça
branca, bigode branco, tão estudando... (Responsável 14)

Sobre a educação do campo as falas dizem de uma escola que tem relevância no
assentamento, de pessoas que já saíram da RCS com o ensino fundamental completo e
continuaram seus estudos, em escolas do MST ou não, e como a EJA tem sido importante na
formação humana. Um dos assentados usou uma expressão para reforçar o significado...

É a escola é tudo numa comunidade, ainda mais no assentamento, né? se não fosse à
escola, é como dizem, se não tivesse a escola, é o filho nascer sem pai. (Responsável
13).

No que tange o trabalho pedagógico desenvolvido na RCS, mesmo demonstrando


dificuldades e desejando que ele pudesse ser mais organizado e coletivo, o grupo de
professores ainda que em falas individuais, foi bastante unido quanto a esse esforço que todos
têm no sentido de que o trabalho seja mais coletivo.
As dificuldades ressaltadas pelos professores para que consigam organizar o trabalho
coletivamente convergem com de qualquer escola. Entretanto, os professores destacam que o
fato do grupo de professores ser pequeno, facilita as reuniões e o trabalho pedagógico.

... como somos uma escola mais pequena a gente consegue chegar mais no aluno, e
lá como é muito grande é muito aluno, eu percebo..., algumas coisas se dispersa, e
que, eu acho que a gente consegue mais tanto relação com o aluno, como relação
com o colega. (Educadora 7)

Foram citados ainda como entraves ao trabalho pedagógico as políticas publicas mal
formuladas e de governos, ou seja, que mudam a cada governo, a multiseriação/enturmação
nas escolas do campo, problemas com relação a transporte escolar como no caso do ensino
médio, salários baixos e sem reajustes, impossibilidade de fazer cursos, adquirir livros.
Sobre a questão da Educação Física a professora da disciplina demostrou que não vê
diferença no papel dessa disciplina em relação às outras matérias ensinadas na escola, e que
com isso, consegue que seu trabalho pedagógico também seja relevante.

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Eu tenho uma visão, assim da Educação Física assim ó que eu não consigo separar,
sabe, não consigo separar o papel da Educação Física da escola. Pra mim a
Educação Física é um componente curricular. Ela, o que ela tem além das outras é
que tu consegue além de preparar, de transmitir, de ajudar que eles construam
conhecimento, o cognitivo, tu tem uma preparação física também, né? não pode
dissociar porque envolve o físico deles, mas é os mesmos objetivos dos outros
conteúdos, tu tem, das outras disciplinas, tu tem o que ensinar, como ensinar, tu tem
como fazer eles pensarem, refletirem sobre aquilo que eles tão fazendo, qualquer
movimento, qualquer jogo, qualquer esporte, na ginástica tu tem como questionar, tu
tem como fazer com que eles cresçam em cima da tua disciplina. Acho que pra mim
escola é isso, é o ensinar, sobre alguma coisa, tu consegue, a Educação Física não
tem como separar o papel da Educação Física, acho que ela tem o mesmo papel das
outras disciplinas, ensinar. (Educadora 4)

A professora de Educação Física, em sua fala, deixa explicito que segue em sua
atuação como professora, aquilo que recebeu como formação universitária cursada na Unijuí,
amparada pela visão que construiu na graduação.

O meu planejamento se dá da seguinte forma: quando eu começo eu tenho uma


concepção assim, eu fui formada, eu fui formada na UNIJUÌ, né? Eu tenho uma
concepção bem de cultura corporal de movimento. Tá então eu procuro trabalhar os
5 eixos que estão aí dentro, né?: os esportes, a dança, a ginástica, as lutas, dentro das
minhas limitações, dentro das limitações que me são dadas também, né? Em termos
de espaço físico, do ambiente, da época do ano, porque tu sabe que a gente tem o
ginásio, mas os dias que a gente ta aqui mesmo a gente não tem outro espaço, então
acaba sendo o que: uma ginástica dentro da sala e o xadrez que é o que eu gosto de
trabalhar, também porque a gente sempre acaba mais trabalhando o que a gente
gosta, que é a realidade eu, a gente, não pode negar. (Educadora 4)

Houve outro momento, antes da entrevista, em que questionamos a professora de


Educação Física pelo fato de termos ouvido dos pais e alunos algumas respostas que sempre
apareciam dando ênfase à importância da Educação Física relacionada a saúde. Apenas uma
mãe ressaltou a importância de aprender a dividir, jogar, agir coletivamente. Outros
entrevistados, pela questão da amizade. Sobre isso a professora de Educação Física, admitiu
ser mais uma possibilidade de resposta apreendida no sendo comum do que em suas aulas...

Eu acho que é talvez, seja mesmo, do senso comum e, porque assim ó: eu,
particularmente, eu não trabalho com aula teórica, as minhas aulas, em nem uma das
escolas, eu trabalho com aula teórica, é meu isso assim ó, eu acho que tudo que eu
posso ensinar eu posso ensinar na prática, sabe, assim ó: se eu to ensinando regras eu

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não preciso que eles copiem regra, sabe, se eu to ensinando que eles precisam
ocupar o espaço da quadra, né? que eu posso fazer um jogo adaptado, 2 contra 2, eu
paro naquele instante e ensino, então eu não preciso montar, joguinho, regrinha e
dar, é uma coisa minha, não tenho nada contra quem faça, porque eu acho que pra
eles, eles tão, assim, Educação Física tem essa relevância e essa diferença nesse
sentido: é o sair da sala de aula, né? eles esperam muito aquela aula eles vão sair da
sala de aula. Então quando menos eles escreverem, quanto menos eu prender eles na
escrita, mais eles vão aprender, até porque eles vão aprender, porque eles gostam
daquilo, eles vão aprender praticando. Então essa talvez, essa coisa da saúde, pode
ser até de ouvir falar mesmo em função de prevenção, né? de profilaxia mesmo de
alguma doença, né? da própria adolescência que eles se preocupam muito em
engordar, né? as meninas mesmo de ter que praticar alguma coisa em função de
perder peso, da perda de peso, alguma coisa nesse sentido, mas não é uma coisa que
eu fique em cima. (Educadora 4)

Os entraves que surgem em nosso ponto de vista é que realmente a escola tem se
esforçado para manter contato com o MST através da Cooptec, que é a cooperativa que presta
assessoria aos assentamentos, do encontro Sem Terrinha, das reuniões com lideranças do
MST da comunidade, e das regionais do Movimento, trabalhando temas na escola ligados a
vida campesina, buscando através da EJA, mais formação humana aos jovens e adultos, mas
de fato as próprias educadoras reconhecem que poderia haver laços mais estreitos nessa
relação com o MST.
Quanto a teoria pedagógica o grupo tem recebido mais formações na temática da
educação do campo. Individualmente, alguns educadores dizem se utilizar de vários meios e
fontes, e outros ainda citaram autores como Paulo Freire, Moacir Gadoti e o Dicionário da
Educação do Campo.
Na disciplina específica de Educação Física a professora citou autores atuais na área
pedagógica, porém sem ligação com os Movimentos Sociais e educação do campo. Mesmo
assim, fica muito claro na fala da referida professora, que ela segue no campo da Educação
Física a linha teórica que lhe foi passada na sua formação inicial.

Com certeza, com certeza, o professor Fernando, professor Fernando González e a


professora Maria Simone assim são meus eixos norteadores assim, são o meu norte
sempre foram desde o tempo de acadêmica, eu tenho os livros deles até hoje, os que
chegaram pra nós os últimos foram deles então, todos reformulados, é um material
riquíssimo e com certeza é na linha dele, tem o Alex Fraga, né? que também trabalha
com Fernando González que eu gosto muito, enfim, tem outros, tem. Eu gosto de
vários outros que seguem a mesma linha, que na verdade o Kunz mesmo que era da
UNIJUÍ, então são na verdade a minha linha é de UNIJUÍ mesmo, sabe? Os meus

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professores são dali e eu aprendi assim, eu não aprendi de outra forma. O Walter
Bracht que era muito usado, por eles, né? na literatura deles, e é essa acho que, essa
é a metodologia que eu uso. (Educadora 4)

Mesmo assim as respostas são muito difusas e não explicita um projeto histórico que
possa nortear a teoria educacional e por consequência a teoria pedagógica, alguns professores
tiveram a ética e a sinceridade de reconhecer que não seguem mais nenhuma teoria
pedagógica.

– Que eu tenha um embasamento? Hoje eu te digo que não... revistas direcionadas a


língua portuguesa... (Educadora 9)

A Educação Física não ficou para trás em termos de não ver a relação do MST com a
sua disciplina... Quando perguntada, a professora respondeu:

Tu acha que existe alguma relação entre o MST, a Educação Física e a proposta
pedagógica da Escola? Tu vê essa relação entre a tua disciplina, o Movimento e a
Escola?
Entrevistada: Não... não..
Fora esse evento que vocês foram...
Entrevistada: Não, não vejo.... Vejo lideranças assim ó, de vez em quando aqui, que
são daqui do Assentamento, quem vem pra conversar e vou ser bem sincera,o que eu
conheço, sobre o Assentamento daqui, são quando chega perto do aniversário da
Escola, né? que tem eventos e que são convidadas pessoas que ajudaram a fundar,
vieram acho que nos últimos anos, muito interessante, muito interessante mesmo,
fizeram toda uma retrospectiva, com fotos, com vídeos, sabe? com entrevistas de
pessoas, material riquíssimo que tem aqui na escola que... de repente os próprios
filhos não conheciam antes, sabe, eles contaram e... (Educadora 4)

Nesse sentido, percebe-se que a história dos sujeitos assentados e dos estudantes da
RCS esta permeada na luta pela terra. Negar tal luta enquanto relação teoria-prática pelo
trabalho pedagógico, por meio da EF ou dos demais conhecimentos que compõem os
conteúdos clássicos a serem socializados, é negar a função social da escola pública e,
portanto, oferecer uma educação que não eleva a consciência da classe trabalhadora
campesina.
Acreditamos que em vários momentos, que se destacaram nas falas, não tornou
possível afirmar que não exista relação da escola com o assentamento e vice-versa, entretanto
é necessário aprofundar essa relação enquanto instrumentos de luta de classe da escola pública

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e do MST. É preciso além de estar numa escola do campo, ser uma escola do campo, pois
uma escola que não instrumentaliza seus próprios sujeitos, e não problematiza a sua realidade
e sua história, não pode transformar a pratica social.
Para a EF não há nada mais desafiador do que reconhecer o povo do campo como
detentor de conhecimentos, e não de uma vida do “atraso”, que precisa ser colonizada ou
atualizada pelo modo de vida urbano. Neste processo a EF, enquanto área de conhecimento
que trata da dimensão da Cultura Corporal, deve se inserir nessa luta, contribuindo com a sua
especificidade na luta maior.

Considerações Finais

O objeto do estudo foi o trabalho pedagógico e a teoria pedagógica desenvolvida


dentro da escola RCS. Para isso, o estudo utilizou-se de entrevistas com os sujeitos que
compõem a escola, educadores, pais, estudantes, funcionários, a fim de compreender melhor o
trabalho pedagógico desenvolvido.
Neste sentido, após o percurso investigativo, confirmamos a hipótese levantada no
estudo, que o MST e consequentemente a escola do assentamento e o trabalho pedagógico da
EF, através da teoria pedagógica, vem afastando-se dos princípios que inicialmente nortearam
a educação do campo, e inspiraram as primeiras lutas na conquista da terra.
Salientamos que em uma pesquisa, tipo estudo de caso, o resultado encontrado não
pode gerar generalizações. Confirmamos a referida hipótese quando nas análises teóricas
percebemos elementos como: dependência do Estado, a precarização do trabalho do professor
do assentamento por falta de formação, dependência do Estado na contratação e vínculo de
seus professores.

Porém, sua proposta educacional, que pretende ser uma educação de classe, com fins
de emancipação humana, vem sendo desenvolvida na sociedade capitalista e,
portanto, incorpora as contradições gerais entre trabalho e capital. Por sua vez, essas
contradições expressam-se no trabalho pedagógico, principalmente através da cisão
entre teoria e prática. (D’AGOSTINI, 2009)

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As pedagogias dominantes expressam-se pelo lema aprender a aprender, pela


desvalorização da teoria cientifica, onde os relatos de experiência imediata valem mais, no
saber-fazer, e isso repercute na formação de professores aligeirada dos fundamentos teóricos,
epistemológicos que dão sustentação ao trabalho pedagógico. Temos o exemplo direto das
licenciaturas em educação do campo, quase todas na modalidade educação à distância e
muitas vezes, em menor tempo.
Frigotto, nos declara que a década de 2000-2010 diferencia-se da de 1990 em vários
aspectos quando analisa o que denomina “continuidade no essencial da política
macroeconômica” (2011, p. 240). O autor faz referência a este período partindo do
pressuposto de que o Estado contava com um novo fundamento denominado de liberalismo
conservador. O papel deste pressupõe reduzir a sociedade a um conjunto de consumidores,
onde o indivíduo não é mais considerável à sociedade, e sim, ao mercado. “A educação não
mais é direito social e subjetivo, mas um serviço mercantil” (FRIGOTTO, 2011, p. 240).
Outro aspecto que Frigotto (2011) comenta e que caracteriza este período corresponde
ao trato com os movimentos sociais, como também a realização de políticas compensatórias.
Nas palavras do autor:
a relação distinta com os movimentos sociais, não mais demonizados nem
tomados como caso de polícia; e ampliação intensa de políticas e programas
direcionados à grande massa não organizada que vivia abaixo da linha da
pobreza ou num nível elementar de sobrevivência e consumo. (FRIGOTTO,
2011, p. 240)

Percebemos, através das entrevistas, que a teoria que embasa o trabalho pedagógico da
disciplina em EF foi a recebida pela professora na formação inicial. Uma teoria pedagógica
revolucionária hoje, para o processo de ensino-aprendizagem, deve, essencialmente, basear-se
nos princípios, leis e categorias da dialética materialista. Os tempos ditos pós-modernos,
necessitam serem contrapostos e superados, pois com as suas teses “sedutoras” e
“envolventes”, através da pedagogia do apreender a apreender, do fim do trabalho, da
conciliação de classe, etc. nos fragmentam e pragmatizam com o fim de que não sejam
visualizados os determinantes da essência dos fenômenos. Nesta esteira, os movimentos
sociais, afastam-se de suas bandeiras de luta e aproximam-se de um processo
contrarrevolucionário (Fernandes, 2002).

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No que se referem à EF, os princípios norteadores da teoria revolucionária encontram-


se nos pressupostos da proposta Crítico-Superadora, juntamente com os princípios
revolucionários da pedagogia Histórico-Crítica que lhe acompanham.
Desta forma, não estamos querendo responsabilizar os professores, pois os mesmos
também apontam a falta de formação continuada, o que mesmo tendo garantias na lei,
acontece somente pela organização interna da escola, e mesmo que os professores manifestem
o desejo de estudar, não lhes é dado incentivo para que essa instrumentalização ocorra.
Chamamos a atenção para a importância da teoria do materialismo histórico, como
fundamentação para a teoria pedagógica, que embasa também a Educação Física. Já que como
bem afirmou a professora entrevistada neste estudo, este componente curricular trata
pedagogicamente de um conhecimento específico e não tem motivos para ser secundarizada
ou receber um trato diferente em relação aos demais componentes curriculares presentes no
chão da escola.
Este trabalho é apenas um ponto de partida. Por ora, há uma predominância de estudos
que remetem-se à realidade urbana. Buscamos também, com base na concepção do
Materialismo-Histórico e Dialético, estabelecer a necessidade de construção de conhecimento
comprometido com a transformação da realidade atual, mas, principalmente, tornar público o
conhecimento que está sendo elaborado no interior de uma escola do campo constituída por
sujeitos sociais e históricos que traçaram uma luta pelos dignos direitos de existência.

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EDUCAÇÃO DO CAMPO E AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS AGRÍCOLAS NA


ESCOLA SÃO PAULO NO MUNICIPIO DE ENTRE IJUIS- RS

Cátia dos Santos131


Marielen Priscila Kaufmann132
Carima Atiyel133

Resumo

A presente pesquisa pretende identificar, analisar e investigar práticas pedagógicas agrícolas da Escola
do Campo São Paulo, localizada na zona rural do município de Entre Ijuís, RS. O trabalho se delineou
através da observação do contexto escolar com auxílio de registros de imagem fotográfica e de
entrevistas com a gestora da escola e com a professora da turma especifica em que o estudo foi
realizado. O objetivo geral consistiu em conhecer, descrever e analisar as práticas pedagógicas
agrícolas da escola, voltadas à Educação do Campo e suas contribuições ao desenvolvimento rural
local. Os resultados mostram que, a partir dessas práticas trabalhadas com os educandos se percebem
pontos positivos no desenvolvimento rural devido aos educandos conseguirem aprimorar e ampliar
conhecimentos através da troca de saberes. Isso é transformador no contexto local e em suas vivências
familiares, bem como na conquista da cidadania pelas pessoas do campo. Assim a Educação do
Campo cumpre a legislação vigente, com a valorização da população rural e a contribuição no
processo de formação de uma nova geração de agricultores com condições de assumir liderança em
suas comunidades quando forem adultos.

Palavras-chave: Educação do Campo. Práticas pedagógicas agrícolas. Escola.

Introdução

O presente trabalho tem como tema a Educação do Campo na perspectiva das práticas
pedagógicas agrícolas. A pesquisa realizada para este trabalho buscou investigar, analisar e
discutir como uma escola do campo do município de Entre-Ijuís, RS trabalha com as práticas
pedagógicas agrícolas. Além disso, buscou avaliar as contribuições dessas práticas ao
desenvolvimento rural local.

Acredita-se que a Educação do Campo pode através das práticas pedagógicas


promover um processo de aprendizagem que se adapte ao desenvolvimento rural com um
nível de formação com mais conhecimento para os educandos do campo.
131
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS. Email:Katia79@outlook.com.br
132
Universidade Federal de Santa Maria, UFSM E-mail: marielenpk.@yahoo.com.br
133
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS. E-mail.Carimaatiyel13@gmail.com

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Os dados do Censo Escolar de 2015 no Rio Grande do Sul apontam que das 2,5 mil
escolas da rede estadual 657 são identificadas como Escolas do Campo e/ou Rurais. Entre
elas, estão 90 escolas indígenas e 35 escolas presentes em assentamentos do projeto de
reforma agrária.

A Educação do Campo no Brasil tem uma história de luta e legitimação de direitos do


povo brasileiro que vive e trabalha no mundo rural, que luta pelo direito a terra, ao trabalho e
à educação (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA, 2015). Pensando em uma
educação comprometida e construída com as pessoas do campo justificamos a relevância
social da pesquisa centrada em compreender e discutir como a educação do campo é vista
enquanto uma ação estratégica à emancipação da população rural, colaborando na formação
das crianças, jovens e adultos e contribuindo ao desenvolvimento rural local.

Com a crescente necessidade da permanência de pessoas/trabalhadores no campo, a


Educação do Campo vem se destacando dentro das comunidades rurais e, neste sentido, nos
interessa estudar com mais profundidade uma escola do campo e as práticas pedagógicas
propostas, já que a escola pode ser esse espaço de transformação para o agricultor familiar.

O objetivo focal à realização do trabalho foi o de explorar e analisar as práticas


pedagógicas agrícolas e suas contribuições à formação dos educandos para o desenvolvimento
rural local em Entre-Ijuís, RS.

O município de Entre-Ijuís está situado ao Noroeste do estado do Rio Grande do Sul,


distante 435 km da capital Porto Alegre, com uma população total estimada de 9.008
habitantes (IBGE, 2016). Os municípios vizinhos que fazem limite com Entre-Ijuís são Santo
Ângelo, São Miguel das Missões, Catuípe, Coronel Barros, Eugênio de Castro e Vitória das
Missões.

O objetivo deste trabalho foi desdobrado nas seguintes questões de pesquisa: Como os
educadores e educandos da escola do campo em estudo elaboram e desenvolvem as práticas
pedagógicas agrícolas? Como as famílias fomentam e compartilham dos conhecimentos dos
filhos adquiridos mediante práticas pedagógicas agrícolas? Quais as contribuições dessas
práticas no dia-a-dia do educando e no contexto familiar?

Pensamos que tais práticas correspondem à realidade histórica, cultural e pedagógica,


pois elas são práticas diferenciadas daquelas das escolas urbanas, Percebe-se que essas são
voltadas para as especificidades rurais e o método construtivista é um aliado nos trabalhos
desenvolvidos na escola do campo, pois “a partir deste contexto busca-se a superação, para
constituir as experiências de educação popular, como o movimento de cultura popular ligado
às formulações de Paulo Freire” (PALUDO, 2008, p.6) .

Além dessa introdução o trabalho apresenta uma revisão de literatura sobre a temática
proposta e a explanação dos principais conceitos utilizados, os objetivos à realização da

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pesquisa, o detalhamento dos procedimentos metodológicos e os principais resultados obtidos


com o desenvolvimento da pesquisa, bem como, algumas considerais finais e reflexões
realizadas ao término do trabalho.

Educação do Campo

Para melhor compreender a temática da Educação do Campo e das práticas


pedagógicas agrícolas buscou-se aporte teórico na literatura da área. Deu-se ênfase às diversas
referências de autores significativos nas discussões sobre o tema do trabalho, a fim de
apresentar e discutir algumas teorizações.

A conceituação de educação do campo é compreendida neste trabalho amparando-se


em definições de autores como Kolling, Nery e Molina (1999) que compreendem que:

A “educação do campo” é uma expressão utilizada para definir uma proposta de


educação concebida pelos protagonistas que vivem no e do campo, que atende às
suas ansiedades, valoriza e ressignifica suas culturas, saberes, valores, gestos,
símbolos etc. Ao mesmo tempo em que colabora na reflexão sobre o sentido atual
do trabalho agrícola e das lutas sociais e culturais dos grupos que hoje tentam
garantir a sobrevivência desse trabalho (KOLLING; NERY; MOLINA, 1999, p.37).

No Brasil a Educação do Campo ganha novo olhar a partir da Constituição Federal


de 1988. Após longo período de relegada atenção por partes de gestores e governantes a
Constituição Federal passa a dar relevância às pessoas e aos trabalhadores do campo que
passam a ter uma série de direitos legítimos previstos em lei.
Atualmente a Educação do Campo, no Brasil, envolve diversos níveis e modalidades
de ensino, possui legislação própria e está vinculada a um projeto de desenvolvimento
sustentável que se articula com outras organizações ligadas ao meio rural. Baseia seu objetivo
na qualificação dos espaços escolares e em garantir o acesso à educação contribuindo à
permanência dos jovens no meio rural.
A Educação do Campo destina-se à ampliação e qualificação da oferta de educação
básica e superior às populações do meio rural sendo desenvolvida pela união em regime de
colaboração entre os estados, o Distrito Federal e os municípios, de acordo com as diretrizes e
metas estabelecidas no Plano Nacional de Educação (PNE). Conforme a Lei de Diretrizes e
Bases em seu artigo 23:

[...] flexibiliza a organização curricular ao dispor que esta pode ocorrer em séries
anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos,
grupos não seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou
por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de

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aprendizagem assim o recomendar. Ou, quando afirma em seu Parágrafo 2º: O


calendário escolar deverá adequar-se às peculiaridades locais, inclusive climáticas e
econômicas, a critério do respectivo sistema de ensino, sem com isso reduzir o
número de horas letivas previsto nesta lei (LDB,1996).

O Art. 28 da LDB, por sua vez, enfatiza sobre as adaptações necessárias ao


atendimento da população rural ao dispor:

Art. 28 – Na oferta de educação básica para população rural, os sistemas de ensino


promoverão as adaptações necessárias a sua adequação às peculiaridades da vida
rural e de cada região, especialmente: I – conteúdos curriculares e metodologias
apropriadas às peculiaridades da vida rural e de cada região; II – organização
escolar própria, incluindo adequação do calendário escolar e as fases do ciclo
agrícola e às condições climáticas; III – adequação à natureza do trabalho na zona
rural (LDB, 1996).

Mas, ainda há muitos desafios para a Educação do Campo que precisam ser
superados. Por isso, os professores têm um papel importante no resgate da diversidade do
campo, para o reconhecimento da cultura do agricultor, dos significados de viver no campo
com dignidade e, ainda, de instrumentalizar seus alunos para que possam compreender e
contribuir com o lugar a partir de suas realidades.
Nesse contexto, a Educação do Campo é construída por e para os diferentes sujeitos,
práticas sociais, territórios e culturas que compõem a diversidade do campo. Caldart (2007)
diz que:

Educação do Campo e a reflexão sobre suas práticas, entre elas a da escola, trata-se
de um campo que se abre à produção do conhecimento em diferentes áreas, e
particularmente na área da pedagogia, ou do como conduzir processos educativos,
assumindo o movimento permanente, e às vezes contraditório, entre o particular e o
universal na construção de uma análise da realidade que nos permita trabalhar para e
desde novas relações sociais. Mas a sabedoria camponesa nos ensina que esta luta
urgente é uma luta de resistência e persistência. É preciso trabalhar agora pensando
já na próxima safra, preservando com cuidado as sementes e prestando atenção no
tempo certo de seu plantio. Por isso os movimentos sociais que foram sujeitos da
experiência expressa nestes textos trabalham com formação e particularmente com
formação de educadores. Porque acreditam que esta sementeira vai “garantir a
próxima planta” (CALDART, 2007, p.10).

A Educação do Campo se apresenta como forma de ampliação das possibilidades


para os educandos e familiares criarem e transformarem as condições de existência no campo.
Conforme Kolling et. al. (1999) argumenta:

A partir do movimento "Por uma Educação do Campo". Considerando que os


movimentos sociais foram os precursores da luta pela educação do campo, houve
por parte destes, a abrangência da luta por uma educação pública que contemplasse
as necessidades específicas do homem do campo. As discussões que envolvem as

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questões educacionais do campo tomaram corpo no Brasil a partir do movimento


"Por uma Educação do Campo", na década de 1990. Um dos princípios deste
movimento é de que
"não basta ter escolas no campo, é preciso ter escolas do campo" (KOLLING et al.,
1999, p. 29).

Segundo o autor, há a necessidade de as escolas do campo formularem suas próprias


práticas, projetos, ações educativas que auxiliem na formação das pessoas do campo.
Percebe-se que o mais importante na formação do agricultor familiar é a valorização
da luta comprometida com a luta social, fazendo com que os agricultores tenham consciência
de que a participação deles é fundamental às lutas e mudanças que desejam modificar o
mundo e a sociedade aonde vivem.
Caldart (2005, p. 27) explicita a utilização de dois termos fundamentais à essa
compreensão: “No: o povo tem direito a ser educado no lugar onde vive. Do: o povo tem
direito a uma educação pensada desde o seu lugar e com sua participação, vinculada à sua
cultura e às suas necessidades humanas e sociais”.
A mesma autora destaca, ainda, as aulas, as oficinas, o trabalho e a produção; a
gestão coletiva; as atividades artísticas e lúdicas; a participação em ações fora da escola e a
sistematização das práticas como um direito do sujeito do campo (CARDART, 2005).
Conforme a definição da identidade da escola do campo se faz necessário que a
escola saiba interpretar a realidade, a fim de criar novos modelos de agricultura; produzir com
economia e com novas tecnologias, para garantir a qualidade de vida dessas pessoas e
iniciativas de desenvolvimento no meio rural. Nesse sentido, Stuart Hall (2006) pondera:

A identidade, nessa concepção sociológica, preenche o espaço entre o ‘interior’ e o


‘exterior – entre o mundo pessoal e o mundo público. O fato de que projetamos a
“nós próprios” nessas identidades culturais, ao mesmo tempo que internalizamos
seus significados e valores, tomando-os “parte de nós”, constitui para alinhar nossos
sentimentos subjetivos com os lugares objetivos que ocupamos no mundo social e
cultural. A identidade então costura (ou, para usar uma metáfora médica, “sutura”) o
sujeito à estrutura.
Estabiliza tanto os sujeitos quanto os mundos culturais que eles habitam, tornando
ambos reciprocamente mais unificados e previsíveis (HALL, 2006, p.11-12).

A Educação do Campo faz parte de uma ação educacional mais ampla, que assume a
função de uma “ferramenta”, uma estratégia educacional necessária aos processos de
organização de uma nova sociedade que avance na construção da identidade do educando do
campo, com capacidade de produzir aprendizagens, teorias e práticas que auxiliem na
construção de novos sujeitos.
Conforme os princípios da Educação do Campo é necessário que se pense em
práticas educacionais, inclusive as que se referem ao conhecimento lógico/matemático, por
exemplo, que deverá partir de uma outra lógica: “quer seja a lógica da terra, a lógica do
campo e, sobretudo, a dos sujeitos que ali vivem, constroem e defendem seu modus vivendi”
(ROCHA; MARTINS, 2009, p. 1).

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Nesse sentido, o autor supracitado cita a educação matemática como um exemplo,


em que esta é praticada em sala de aula não desvinculada dos próprios modos de pensar
matematicamente o mundo vivenciado pelo agricultor em suas práticas sociais. Isso significa
que devem incorporar às práticas pedagógicas atividades que estejam articuladas com as
formas de vida, com a cultura dos sujeitos que compõem a comunidade em que a escola está
inserida. Somente assim, nossa escola será pensada “no” e “do” campo, pois:

Não basta que a escola ali esteja, mas é necessário que ela dialogue plenamente com
a realidade do meio onde se encontra. Isso significa dizer que é uma escola inserida
verdadeiramente na realidade desses sujeitos, pronta a acolher e procurar atender às
demandas específicas desses homens e mulheres e seus filhos, população que
trabalha com a terra e detém conhecimentos específicos e realidades profundamente
diferentes daquela dos sujeitos inseridos no meio urbano (FARIA, 2009, p. 93).

Também importante é que a sociedade entenda que uma escola do campo não é uma
escola diferente, mas sim a escola que reconhece e fortalece os povos do campo como sujeitos
sociais que fazem parte dos processos de desenvolvimento histórico, cultural, social,
econômico e político da sociedade. “Porque não há escolas do campo sem a formação dos
sujeitos sociais do campo, que admitem e lutam por esta identidade e por um projeto de
futuro” (CALDART, 2003, p. 66).
Pode–se afirmar que a educação do campo é de fundamental importância para o
desenvolvimento rural, uma vez que possibilita um maior envolvimento sociocultural, Jesus
(2004), neste sentido, afirma que:

O problema da Educação do Campo consiste, não só na deficiência de um projeto


educativo de acordo com a realidade, mas em algo ainda maior: um projeto de
integração que venha possibilitar aos agricultores do campo, alternativas para o
crescer e desenvolver de maneira sustentável, uma vez que, até então, os vários
investimentos, projetos, problemas e recursos destinados à educação tem a
finalidades, de servir ao processo de produção e reprodução de relações econômicas
e sociais que contribuíram de maneira acentuada para a falência da educação no
campo (JESUS, 2004, p.35).

A Educação do Campo deve se dar em consonância com a cultura dos agricultores


familiares, para formar uma ligação entre os elementos que permeiam a problemática e o
desenvolvimento da região. Assim, faz-se importante destacar a compreensão adotada nesse
trabalho para pensar e definir o desenvolvimento rural conforme segue.

Paulo Freire e as Práticas Pedagógicas Construtivistas

A Educação do Campo possui um vínculo que integra partes e, nesse âmbito, ganham
destaque as práticas pedagógicas construtivistas. Portanto, a Educação do Campo se define

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como uma identidade construtiva, com um projeto educativo que se constrói com e
especificamente às comunidades rurais.
O construtivismo freireano vai além da pesquisa, propõe a ação transformadora
através do conhecimento, é construção de forma integradora e interativa. Não é algo pronto a
ser apenas apropriado ou socializado, conhecer é descobrir e construir a partir da realidade.
Dentro do construtivismo é preciso reinventar o conhecimento, onde a escola entra como
aliada para instigar o aluno a construir a partir das práticas pedagógicas (INSTITUTO
PAULO FREIRE, 2015).
O autor Paulo Freire também foi um dos idealizadores do construtivismo crítico.
Desde suas primeiras experiências no nordeste brasileiro, no início dos anos 60, ela buscava
fundamentar o ensino-aprendizagem em ambientes interativos.
A escola não distribui poder, mas constrói saber que é poder. Não se muda a história
sem conhecimentos, mas temos que educar o conhecimento para que possam através dele
melhorar e compreender a sua história.
Neste contexto as práticas pedagógicas agrícolas, por exemplo, fazem o pensar ser
instigante permitindo aos alunos do campo se colocarem como sujeitos históricos, de modo a
conhecerem a si mesmos, sua história e os contextos em que se inserem. Aprende-se a partir
dos conhecimentos existentes na realidade através da análise, reflexão-ação, construção. Neste
sentido é interessante destacar que na “verdadeira aprendizagem, os educandos vão se
transformando em reais sujeitos da construção e da reconstrução do saber ensinado, ao lado
do educador igualmente sujeito do processo” (FREIRE, 1996, p. 26).
Dessa forma, as práticas pedagógicas aplicadas às escolas do campo vão compondo
formas de apropriação, organização e distribuição dos conhecimentos para a comunidade
escolar e vão constituindo a própria caminhada dos grupos. A opção teórico-metodológica
construtivista e transformadora envolve, em suas discussões as questões epistemológicas de
concepção de pessoa, de sociedade e de educação (ANTONIO; LUCINI, 2007, p. 188).
As décadas de 1960 e 1970 são marcadas pela continuação do desenvolvimento de
programas para a educação no meio rural, dentre os quais aqueles que se apoiavam na
utilização da pedagogia pensada por Paulo Freire. Esses programas contribuíram para dar um
ponto final à oposição cidadecampo, principal alvo do ruralismo pedagógico na luta
ideológica, por estabelecerem um vínculo entre desenvolvimento e educação (CALAZANS,
1993, p. 33-34). Nesse sentido, Santos et al. (2010) salienta:

A Educação do Campo compreende o trabalho como produção da vida, base


necessária para pensar a relação sociedade-natureza. É nesta totalidade que a relação
educação e trabalho ganha significado e se diferencia da perspectiva do capital. O
trabalho não é entendido como ocupação ou emprego, como mercadoria que se
denomina força de trabalho. Ele é compreendido como uma relação social que
define o modo humano de existência, que, além de responder pela reprodução física
de cada um, envolve as dimensões da cultura, lazer, sociais, artísticas. Em síntese, o
trabalho é compreendido como fator de humanização permanente, e é este o sentido
que a Educação do Campo busca resgatar (SANTOS et al., 2010, p.52).

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Quando se trata de educação do campo busca-se um contexto para pensar as


possibilidades de conhecer e vivenciar uma diversidade educacional, para que a educação
possa ser vista em espaços diversos e de forma variada dentro das culturas.
Conforme Arroyo e Fernandes (1999, p. 72), “o movimento social no campo
representa uma nova consciência do direito à terra, ao trabalho, à justiça, à igualdade, ao
conhecimento, à cultura, à saúde e à educação”, no contexto das práticas pedagógicas, essas
assumem sua importância por meio de seus significados e relações com a realidade rural do
educando agricultor.
Segundo a proposta de Paulo Freire (1996), os saberes dos educandos devem ser
respeitados a partir de um diálogo verdadeiro, feito de forma comunicativa, com os
conhecimentos trazidos pelos educadores. Isso porque “uma das tarefas mais importantes da
prática educativo-crítica é propiciar as condições em que os educandos, em suas relações uns
com os outros, e todos com o professor ou a professora, ensaiem a experiência profunda de
assumirem-se” (FREIRE, 1996, p. 41).
Para Freire (1987) uma das principais características da educação libertadora é o fato
das pessoas poderem se tornar sujeitos ativos de sua própria ação tornando-se agentes de
constante transformação da realidade. Conforme Freire (1996):

[...] a prática educativa tem de ser, em si, um testemunho rigoroso de decência e de


pureza. Uma crítica permanente aos desvios fáceis com que somos tentados, às
vezes ou quase sempre, a deixar as dificuldades que os caminhos verdadeiros podem
nos colocar. Mulheres e homens, seres histórico-sociais, nos tornamos capazes de
comparar, de valorar, de intervir, de escolher, de decidir, de romper, por tudo isso,
nós fizemos seres éticos. Só somos porque estamos sendo. Estamos sendo é a
condição entre nós, para ser. Não é possível pensar os seres humanos, longe, sequer
da ética, quanto mais fora dela. Estar longe, ou pior, fora da ética, entre nós,
mulheres e homens, é uma transgressão. É por isso que transformar a experiência
educativa em puro treinamento técnico é amesquinhar o que há de haver
fundamentalmente humano no exercício educativo: o seu caráter formador. Se se
respeita a natureza do ser humano, o ensino dos conteúdos não pode dar-se alheio à
formação moral do educando. Educar é substantivamente formar (FREIRE, 1996, p.
33).

Entende-se que Paulo Freire propõe uma pedagogia dialógica e construtivista. Freire
acreditava que a pedagogia e a prática pedagógica em si podem ser revolucionárias resgatando
o sentido dos fatos e dos fenômenos analisando-os criticamente elaborando novos significados
mediante a discussão e o diálogo, a fim de alcançar as transformações das realidades
pretendidas.
Assim sendo, para elaborar as identidades das escolas do campo se faz necessário
que a própria escola e cada escola façam a interpretação de suas realidades e analisem os
problemas locais, as redes, a fim de elaborar projetos e modelos de agricultura que permitam

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produzir com economia e novas tecnologias, a fim de ampliar a qualidade de vida dos
agricultores e o desenvolvimento de iniciativas de desenvolvimento no meio rural.
A Educação do Campo precisa ser compreendida como um valor com grande
potencial para o desenvolvimento rural e à formação do agricultor familiar, pois dá elementos
aos agricultores e subsídios para que os agricultores lutem pelos seus direitos o direito a terra,
o direito à saúde, o direito à produção alimentar e, principalmente, à educação. A Educação
do Campo deve ser orientada pelos educadores por meio de ações que venham a propiciar a
formação do agricultor familiar e dos grupos sociais capazes de identificar, problematizar e
agir em relação à cultura do campo.
A Educação do Campo não forma em conteúdos programáticos alinhados ao
currículo, mas se abre para que os conteúdos oriundos dos contextos, a fim de analisar os
problemas locais e elaborar projetos e lutas sociais.

Procedimentos Metodológicos

A presente pesquisa foi realizada a partir do desenvolvimento de um Estudo de Caso


junto à Escola Municipal São Paulo, buscando assim conhecer a realidade dessa escola e
responder aos objetivos da pesquisa.
O Estudo de Caso é caracterizado pelo estudo profundo e exaustivo de um ou de
poucos objetos, de maneira a permitir seu conhecimento amplo e detalhado, e “[...] esse
delineamento fundamenta-se na ideia de que a análise de uma unidade de determinado
universo possibilita a compreensão da generalidade deste ou, pelo menos, o estabelecimento
de bases para uma investigação posterior”. (GIL, 2005, p. 589).
A Escola Municipal São Paulo está localizada na esquina gaúcha no interior do
município de Entre-Ijuís próxima a BR 285, zona rural onde predomina a pequena
propriedade rural. As famílias dos educandos são compostas por pais, mães e filhos, exceto
alguns alunos que vivem no abrigo Martinho Lutero em Entre-Ijuís/RS, onde as famílias são
compostas por pais e irmãos sociais que dividem o mesmo espaço.
No geral as famílias vivem em pequenas propriedades localizadas próximas a escola
São Paulo e extraem suas subsistências na agricultura familiar com base na soja, milho,
atividade de produção de leite e derivados, além de outros gêneros alimentícios.
A escola conta com 95 alunos, 15 professores e 03 funcionários. Conforme o Projeto
Político Pedagógico (PPP), a escola se fundamenta em uma metodologia participativa e
cooperativa com responsabilidade assumida de maneira coletiva focada na pedagogia
histórico-critica a qual se enfatiza a aprendizagem significativa, o interesse pelas múltiplas
dimensões do saber, a importância da aprendizagem para a vida e sua possível aplicabilidade
para os problemas sociais.
A escola busca uma maior sintonização do conteúdo trabalhado em sala de aula com
a realidade rural, a fim de que os alunos percebam que o estudo de questões ligadas à vida
rural esteja embasado em reflexões capazes de provocar mudanças na forma de organização

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da pequena propriedade rural. Ao mesmo tempo a vida no campo precisa ser apresentada
como viável do ponto de vista da sustentabilidade e da realização profissional, conforme
descrito no Projeto Político Pedagógico da Escola São Paulo.

O Município de Entre-Ijuís: aspectos históricos, demográficos e econômicos

Esta seção do trabalho visa apresentar e discutir os dados da pesquisa reunidos em


campo analíticos. Primeiramente se apresentam alguns aspectos históricos, demográficos e
econômicos do município onde a pesquisa foi realizada.
O município de Entre-Ijuís localiza-se na região noroeste gaúcho a 435 km de Porto
Alegre (Figura 1). O município é predominantemente agrícola, sendo composto por vários
povos alemães, poloneses, índios e outras etnias. O clima da região é subtropical
(IBGE,2010). Na figura a seguir pode-se observar a localização do município em relação ao
Estado do Rio Grande do Sul.

Figura1: Mapa de localização do município de Entre-Ijuís, RS

Fonte: http://images.google.com.br/

Conforme o IBGE a história do município em estudo começa durante a expansão das


Reduções Jesuíticas, dirigiram-se índios e padres para esta região em busca de locais
adequados para a fundação de novas reduções, e em 1697, fundam a sexta Redução
Missioneira São João Batista que surge do desmembramento populacional da Redução de São
Miguel, em São João, hoje município de Entre-Ijuís. No ano 1824,o governo do estado
mandou para São João Batista (Entre Ijuis) diversas famílias de imigrantes alemães que
haviam chegado ao Rio Grande do Sul.

A Escola Municipal de Ensino Fundamental São Paulo

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A educação municipal de Entre-Ijuís conta com cinco escolas, sendo quatro escolas
de Ensino Fundamental localizadas na zona rural e uma escola de educação infantil localizada
na sede do município. A escola do campo em estudo foi inaugurada na década de 1940, na
comunidade rural de Esquina Gaúcha, localizada no interior do município de Entre-Ijuís, na
região noroeste do estado do Rio Grande do Sul. Essa escola foi denominada Escola
Municipal de Ensino Fundamental São Paulo e permanece com essa nomenclatura até os dias
atuais. Na imagem 1, a seguir, apresenta-se a fachada da escola (Figura 2).

Figura 2: Escola Municipal São Paulo, Entre-Ijuís, RS.

Fonte: Registro da autora, 2017.

A Escola São Paulo surgiu devido à necessidade que as famílias luteranas


apresentavam para com a educação de seus filhos, frente a isso compraram uma casa de
madeira e transformaram em escola. A primeira aula foi ministrada pela professora Ella
Gueths, no dia 1º de maio de 1940. (Fonte: PPP, Ano não identificado).
A escola era mantida pela comunidade e no momento em que um pastor luterano se
estabeleceu na comunidade rural este passou a ministrar as aulas de 1ª a 4ª séries. Em 1971 a
escola São Paulo foi municipalizada e passou a ser mantida pela prefeitura de Santo
Ângelo/RS, pois até então Entre-Ijuís era uma comunidade rural pertencente a Santo Ângelo e
distante 8,3 quilômetros da sede do município. (Fonte: PPP, Ano não identificado.)
Somente em 1989 com a emancipação do município de Entre-Ijuís a escola passou a
ser mantida pela prefeitura do agora novo município. A escola passou por uma grande
transformação que se iniciou desde as edificações refeitas até a modalidade de ensino adotada,
as aulas passaram a ser ofertadas desde a educação infantil até o nono ano do ensino
fundamental. (Fonte: PPP, Ano não identificado)
Os profissionais da escola, juntamente com os educandos desenvolvem práticas
pedagógicas agrícolas através do cultivo de hortas para a produção de hortaliças que são

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utilizadas na alimentação escolar, desenvolvimento de jardins para enfeitar a escola a partir


dos saberes dos educandos provindos do campo, a adubação do solo, estudos das épocas para
o plantio, classificação das melhores sementes a serem plantadas, entre outras práticas que
serão abordadas mais detalhadamente mais adiante.
No âmbito dessa discussão é pertinente ainda destacar o papel das políticas públicas
para a construção do processo educativo no campo. Nesse sentido, o Programa Nacional de
Educação na Reforma Agrária (PRONERA) que tem como objetivo o fortalecimento da
educação dos agricultores e é estimulado para propor o desenvolvimento para metodologias
voltadas às especificidades do campo.

Práticas Pedagógicas Agrícolas de Educação do Campo

A fim de conhecer as práticas pedagógicas agrícolas realizadas na Escola Municipal


de Ensino Fundamental São Paulo compareceu-se à escola e solicitou-se à direção permissão
para fazer a pesquisa, o que se fez após a autorização da mesma.
Ao dar início às observações constatou-se que a Educação do Campo no contexto da
instituição está sempre em movimento e é baseada na LDB referindo-se ao trabalho coletivo e
social para que o educando tenha aproximação com o seu contexto vivido. Neste sentido,
amparam-se na definição do Ministério da Educação que compreende que a Educação do
Campo é traduzida como uma “concepção político pedagógica, voltada para dinamizar a
ligação dos seres humanos com a produção das condições de existência social, na relação com
a terra e o meio ambiente, incorporando os povos e o espaço da floresta, da pecuária, das
minas, da agricultura, os pesqueiros, caiçaras, ribeirinhos, quilombolas, indígenas e
extrativistas” (CNE-MEC, 2002).
Portanto, oferecer uma educação escolar especifica associada à diversidade do
conhecimento e da cultura do campo visa desenvolver ações coletivas com a comunidade
numa perspectiva de qualificar o processo de ensino e aprendizagem das práticas pedagógicas
agrícolas. Conforme a pesquisa realizada percebe-se a percepção da educadora entrevistada
com relação à Educação do Campo onde a mesma destaca:

Desta forma busco trabalhar sempre respeitando os interesses dos educandos por
determinado conteúdo. As atividades neste contexto priorizo as preferências,
trabalho práticas pedagógicas agrícolas de acordo com a realidade que se encontra a
nossa escola do campo. A construção democrática também faz parte da elaboração
das práticas com a colaboração de todos, com o objetivo de formar uma educação do
campo crítica e transformadora, preparando e capacitando o aluno para o trabalho e
vida social dentro da comunidade que este está inserido. (FALA DA PROFESSORA
ENTREVISTADA).

Neste sentido, a Educação do Campo vem sendo um elemento que auxilia e contribui
à emancipação do educando dentro da sociedade onde vive e por isso esse educando adquire
um novo e importante papel a desempenhar para construir uma visão interdisciplinar do todo
e de si mesmo. Segundo Lück (2010) diz:

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[...] existe uma clara percepção, por parte de lideranças políticas brasileiras, de
representantes dos mais diversos segmentos que compõem a nossa sociedade, de
comunidades e família, de que a melhoria da qualidade de vida, o desenvolvimento
das comunidades e a transformação do Brasil em uma nação desenvolvida, com uma
população proativa, saudável, competente, cidadã e realizada, somente se dará caso
consigamos promover, [...] um salto de qualidade em nossa educação. (LÜCK, 2010
p. 21).

Portanto, o desenvolvimento de práticas pedagógicas agrícolas mostra um leque de


contribuições no processo educativo, fazendo com que o aluno tenha um melhor desempenho
no aprendizado e com isso vá se tornando um agente transformador da sociedade.
As práticas pedagógicas vão sendo aprimoradas e adaptadas na realidade escolar a
partir de situações de aprendizagem com o propósito de desencadear nos alunos um processo
cognitivo que envolva os conteúdos escolhidos e aprendizagens que façam sentido em relação
à realidade na qual se encontram. Levar em conta estes elementos torna-se fundamental para
uma Educação do Campo com qualidade.
Os alunos da escola São Paulo, em especial a turma em estudo, afirma gostar das
técnicas agrícolas que são desenvolvidas nas aulas. Geralmente as técnicas agrícolas se
iniciam na sala de aula, com a parte didática e, posteriormente, seguem a sequência das
atividades no pomar, horta e jardim da escola, onde são desenvolvidas de maneira mais
dinâmica. Nessas práticas todos participam e interagem mostrando sempre interesse e gosto
pelas mesmas.
Segundo a autora Luckesi (2002) “a aprendizagem ativa é aquela construída pelo
educando a partir da assimilação ativa dos conteúdos socioculturais. Isso significa que o
educando assimila esses conteúdos, tornando-os seus, por meio da atividade de internalização
de experiências vividas” (2002, p. 132).
Observou-se durante a realização da pesquisa um grande envolvimento e interação
entre os educandos e a educadora. As aulas práticas exigem que os alunos, literalmente,
coloquem a mão na terra quando trabalham fora da sala de aula e isso faz com que a diversão
seja um ingrediente da aprendizagem que vai além dos livros didáticos. Trata-se do momento
da transposição didática do que foi aprendido em sala de aula à dimensão da prática, ainda
com fruição. Assim a escola do campo vai construindo a formação de seus alunos para que
consigam crescer e se desenvolver em múltiplas dimensões de suas vidas.
Aprender com a diversidade, respeitar diferentes tempos e desenvolver atividades,
com uma visão inter, multi e transdisciplinar requer uma prática pedagógica diferenciada
(CONGRESSO INTERNACIONAL SOBRE AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO, 2003).
As práticas pedagógicas e agrícolas desenvolvidas na escola São Paulo caracterizam-
se como um importante componente da prática social, a qual corresponde a uma relação entre
o conhecimento inicial dos educandos com os conhecimentos práticos desenvolvidos voltados
para o cotidiano das comunidades do campo. Tem como ponto de partida inicial o
planejamento da professora que se desenvolve primeiramente por observação das crianças em

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suas conversas informais dentro ou fora da sala de aula, onde a mesma capta o interesse dos
alunos por algum assunto do dia-a-dia do educando e, posteriormente, começa o
desenvolvimento do plano de estudo.
O planejamento é orientado pelas necessidades dos alunos e sua comunidade. Essa
lógica busca superar “a oposição entre campo e cidade e a visão predominante de que o
moderno e mais avançado é sempre o urbano, e que o progresso de um país se mede pela
diminuição da sua população rural. (CONFERÊNCIA NACIONAL POR UMA EDUCAÇÃO
DO CAMPO, II CNEC, 2004, p. 3).
Neste sentido, a prática pedagógica aplicada na escola em estudo está em
consonância com os autores:

Ao decidir pela seleção, forma de organização e distribuição dos conhecimentos, as


comunidades definem sua própria caminhada de opção teórico-metodológica
transformadora, envolvendo suas discussões nas opções de concepção de homem, de
sociedade e de educação. (ANTONIO; LUCINI, 2007, p. 188).

A professora afirma que utiliza uma diversidade metodológica em suas práticas


pedagógicas onde destaca, prioritariamente, a presença de aulas expositivas, trabalhos em
grupo, pesquisas, leituras compartilhadas, desenhos e ilustrações e a participação ativa dos
educandos com intervenção da professora.
As aulas expositivas ocorrem da seguinte forma, primeiro a apresentação do
conteúdo elaborado no planejamento fazendo-se uso de recursos visuais como quadro negro e
giz. O segundo momento é representado pelo diálogo entre professora e alunos. Os trabalhos
em grupo, segundo as informações da professora são realizados em equipes e dependendo do
contexto podem ser elaborados na escola ou em casa com a participação dos familiares.
A professora faz uso das rodas de conversa, os conhecidos “círculos hermenêuticos”
que também eram usados por Paulo Freire, onde todos e todas podem falar e devem ouvir em
“pé de igualdade”. A contação de histórias também é uma prática utilizada e se caracteriza
pela formação em círculos de educandos, cujo objetivo baseia-se na discussão coletiva de
temas provenientes das realidades vivenciadas pelos alunos.
As práticas agrícolas desenvolvidas na escola são uma alternativa de unir a teoria e a
prática fazendo despertar o interesse dos alunos pela agricultura.
A escola do campo vai além de um local de produção do conhecimento, pois se
torna um espaço de convívio social onde acontecem reuniões, festas, atividades comunitárias,
entre outros. Assim se reforçam as relações sociais na comunidade e escola potencializando a
construção de uma identidade cultural, além da elaboração de novos conhecimentos.
Neste sentido, a finalidade da Educação do Campo na escola em estudo é, portanto,
oferecer uma educação escolar especifica associada à produção de novos conhecimentos e
desenvolver ações coletivas através da socialização com a comunidade escolar e local numa
perspectiva de qualificar o processo de ensino e aprendizagem de acordo com a realidade.
Constatou-se que os conhecimentos socializados na escola são transportados para a
vida familiar dos educandos, por meio de estratégias e interação entre família e escola. Essas

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práticas pedagógicas geram um mecanismo capaz de influenciar mudanças no


desenvolvimento do educando com relação à comunidade onde ele vive, porque ele é
estimulado durante o desenvolvimento das práticas a adquirir conhecimento e, posteriormente
partilhar esses conhecimentos. Isso produz uma enorme rede de possibilidades de interação na
comunidade onde vive e desenvolve um conjunto de competências afetivo-cognitivas.
Fernandes (2004), diz que a Educação do Campo é um conceito cunhado com a
preocupação de se delimitar um território teórico e defender o direito que uma população tem
de pensar o mundo a partir do local, da terra em que pisa que vive e produz como agricultor
familiar, no terreno de sua realidade concreta.

As Relações entre a escola e as famílias

A família e a escola passam juntas por alguns caminhos, por isso, quanto maior o
fortalecimento dessa relação família e escola, melhor será o desempenho escolar dos
educandos. Segundo Fernandes, “a família também é responsável pela aprendizagem da
criança, já que os pais são os primeiros ensinantes e as atitudes destes frente às emergências
de autoria, se repetidas constantemente, irão determinar a modalidade de aprendizagem dos
filhos”. (FERNANDES, 2001, p. 42).
Nesse sentido é importante destacar que a escola São Paulo tem um vínculo estreito
com as famílias de seus educandos. As famílias participam junto a seus filhos nas práticas
pedagógicas desenvolvidas na escola e isso facilita a aprendizagem e a interação entre família
e escola contribuindo ao desenvolvimento social do educando, pois a partir das trocas de
saberes se constroem aprendizagens significativas e compartilhadas.
Observou-se durante as atividades que os alunos aprendem técnicas como, por
exemplo, cuidados com o solo, cultivos de chás, educação alimentar e nutricional e culinária.
Eles levam esses conhecimentos para suas famílias e no convívio familiar esses
conhecimentos são compartilhados e aplicados para melhorar a qualidade de vida das pessoas.
Em depoimento a professora relata que “os familiares contribuem de forma
significativa com a escola no desenvolvimento das práticas pedagógicas, sendo que quando é
necessário o auxílio dos pais para ajudar no processo do desenvolvimento das atividades a
escola faz um comunicado e quem estiver disponível vai até a escola fazer sua contribuição
seja na limpeza da horta, do pátio ou para qualquer outra tarefa que são realizadas em parceria
com os educandos”.
Desta forma, entende-se que a participação das famílias no contexto escolar
influencia a elaboração das aprendizagens da criança facilitando a interação e a socialização
de práticas com quem sabe e faz. É importante ressaltar, ainda, a importância de ouvir, trocar
e aprender com quem carrega um saber-fazer a ser ensinado. Os saberes situados dos
familiares são contextualizados nas práticas pedagógicas e servem de estímulo às
aprendizagens.

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Destaca-se a parceria entre as famílias e a escola visto que, apesar de cada uma
apresentar valores e objetivos diferentes, no que se refere aos educandos e práticas
pedagógicas uma necessita da outra. As interações acontecem sempre durante as reuniões no
decorrer das práticas pedagógicas, nas festas comunitárias, ou seja, existe um enorme leque
que possibilita essas interações entre família e escola.

A escola deve utilizar todas as oportunidades de contato com os pais, para passar
informações relevantes sobre seus objetivos, recursos, problemas e também sobre as
questões pedagógicas. Só assim, a família irá se sentir comprometido com a
melhoria da qualidade escolar e com o desenvolvimento de seu filho como ser
humano. (PARO, 1997, p. 30).

A escola São Paulo utiliza todas as oportunidades de contato com os pais para passar
informações relevantes sobre seus objetivos e questões pedagógicas. Com isso as famílias
sentem-se comprometidas com a melhoria da qualidade escolar e com o desenvolvimento de
seus filhos como seres humanos no contexto da Educação do Campo.
Embora haja interação entre a escola, pais e alunos, ainda assim, presenciou-se a
angústia no enfrentamento de barreiras e desafios presenciados cotidianamente pelos
membros da comunidade escolar. Esta temática será abordada na próxima seção deste
trabalho.

Desafios da Comunidade Escolar em Relação à Educação do Campo

Durante a pesquisa buscou-se investigar os desafios, angústias e percepções das


entrevistadas na escola em estudo. As educadoras estão sempre buscando alternativas para
minimizar os desafios que são encontrados no dia-a-dia dentro da escola.
Segundo a professora entrevistada, existe preocupação com o planejamento de suas
atividades a partir da diversidade de sujeitos que compõem a sua turma multisseriada do
campo.
O planejamento é imprescindível para a atuação nesse meio sendo extremamente
fundamental para a aprendizagem dos alunos, ou seja, é a maneira de planejar e elaborar
conteúdos e práticas para que o aluno consiga desenvolver suas aprendizagens. A entrevistada
coloca “faço tudo da melhor maneira possível para que o aluno supra suas necessidades de
aprender”. Para Libâneo (1994 p. 221)

o planejamento pode ser definido como: [...] um meio para se programar as ações
docentes, mas é também um momento de pesquisa e reflexão [...] há três
modalidades de planejamento, articuladas entre si: o plano da escola, o plano de
ensino e o plano de aulas [...] o planejamento é um processo de racionalização,
organização e coordenação da ação docente, articulando a atividade escolar e a
problemática do contexto social [...] é uma atividade de reflexão acerca das nossas
opções e ações.

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Enfim, verificou-se nas entrevistas que tanto para a professora quanto para a diretora
existem angústias e preocupação com a educação com qualidade para os sujeitos do campo,
onde se destacam a ausência de políticas públicas para atender as necessidades e anseios das
escolas do campo em estudo. A diretora entrevistada descreve:
Devemos ter um olhar especial para cada realidade, sem perder de vista que apesar
da diversidade há direitos que são comuns: aproximação do ensino com a realidade das
crianças, valorização dos saberes do campo, uso dos espaços alternativos de ensino, como
plantações locais, aprofundamentos dos conhecimentos, abertura da escola para a participação
ativa da comunidade. Neste momento pensar a Educação do Campo é o ponto de partida para
implementações de ações que renovem ao avanço das transformações da realidade do campo.
Observou-se que a turma multisseriada é outro desafio que a escola tem, mas
percebeu-se ao longo da pesquisa que a professora tem muito profissionalismo e perfil
didático para trabalhar com a turma. Os obstáculos vão sendo superados há cada dia, porque o
trabalho desenvolvido por esta educadora se destaca quando a mesma procura conhecer a
realidade de cada aluno.
Segundo destaca Caldart (2003, p. 7) conhecer a realidade significa entender o
conhecimento como compreensão da realidade para transformá-la; compreensão da condição
humana para torná-la mais plena.
A escola do campo em estudo se aproxima da realidade dos sujeitos que vivem no
campo e visa se tornar um local de produção e reprodução de dinâmicas diferenciadas capazes
de atender as necessidades locais. No entanto, observa–se que no decorrer do dia-a-dia da
professora, a mesma consegue fazer aplicação das práticas pedagógicas agrícolas e estabelece
um vínculo entre os alunos e suas realidades. Por meio destes instrumentos acontece um
crescimento dos alunos em todos os sentidos, oralidade, expressão, coordenação e
conhecimento. Conforme a professora destaca:

As salas multisseriadas nas escolas do campo dão certo, para isso basta o professor
não olhar para os desafios negativos, e sim ter um olhar para as possibilidades que
esses desafios podem trazer, desenvolver um projeto numa turma multisseriada, e
ver os resultados positivos que podem e dão certo é muito emocionante para o
professor (FALA DA PROFESSORA ENTREVISTADA).

Através da pesquisa é possível destacar a compreensão das entrevistadas onde


mostram muita dedicação e amor com a profissão. E é esse amor que ultrapassa os limites que
faz com que elas consigam superar os desafios da Educação do Campo. Segundo a professora
a escola em estudo “é um espaço de produção e reprodução social, sendo este um espaço que
vai além da construção de saberes, um lugar de interação social”.

Considerações Finais

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O objetivo para a realização do trabalho de conclusão de curso foi o de explorar e


analisar as práticas pedagógicas agrícolas e suas contribuições à formação dos educandos para
o desenvolvimento rural local em Entre-Ijuís, RS.
Nesse trabalho foi abordado o processo de explorar, analisar e investigar as práticas
pedagógicas agrícolas da escola em estudo e averiguar como estas práticas contribuem nas
relações entre a família dos educandos e sua comunidade.
Na relação família-escola foi possível observar a interação entre os diversos
segmentos no contexto da aprendizagem dos alunos. As práticas pedagógicas agrícolas
demonstram o quanto os alunos conseguem evoluir em habilidades e competências afetivas e
cognitivas ao praticar os conteúdos que estudam e pesquisam no plano teórico.
A interação das famílias com a escola do campo é fundamental ao envolvimento e
comprometimento dos pais com a comunidade escolar. As práticas pedagógicas agrícolas
ganharam destaque na análise, pois através delas fica evidente que a escola consegue ampliar
a qualidade de um ensino significativo e contextualizado aplicando conteúdos pertinentes e
consonantes à proposta de Educação do Campo. Constatou-se que as práticas têm sido
trabalhadas continuamente de acordo com a realidade, vivências e saberes dos educandos e
suas famílias no cotidiano.
Os resultados mostram que, a partir dessas práticas trabalhadas na escola os
educandos adquirem conhecimentos e isso contribui de forma positiva ao desenvolvimento
rural local e familiar, pois os educandos conseguem aprimorar e ampliar conhecimentos
através da troca de saberes. Isso é transformador ao contexto local e para suas vivências
familiares.
Diante dos dados coletados ao longo da pesquisa e apresentados, discutidos nesse
trabalho é importante ressaltar que a metodologia adotada para as práticas pedagógicas
agrícolas permite que os educandos tenham uma participação ativa desde a construção dos
temas até a organização das atividades dinâmicas. Percebeu-se que os educandos se
identificam com o local onde estão estudando. A escola São Paulo oferece uma formação que
vincula os alunos com suas raízes culturais e relações sociais.
O universo de criatividade que existe no meio rural na região noroeste onde a escola
está inserida tem contribuído de forma significativa e isso tem conseguido resultados
positivos deixando de existir apenas na teoria. A prática pedagógica agrícola é uma realidade
nos projetos executados trazendo mudanças às aprendizagens dos alunos.
A escola São Paulo assume um papel muito importante na região, pois está
contribuindo para o processo de formação de uma nova geração de agricultores com
condições de assumir liderança em suas comunidades quando forem adultos e sucederem seus
pais em suas propriedades se assim o desejarem futuramente.

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A RELAÇÃO ENTRE A EDUCAÇÃO DO CAMPO E O ESTÁGIO


INTERDISCIPLINAR DE VIVÊNCIA SANTA MARIA: POR UMA EDUCAÇÃO
LIBERTADORA

Kauã Arruda Wioppiold134


Bruno Traesel Schreiner 135

Resumo

O Estágio Interdisciplinar de Vivência – EIV, consiste em um projeto de extensão vinculado a


Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), realizado por estudantes de diferentes cursos, em
conjunto com o Movimento dos Trabalhadores sem Terra, tendo como principal objetivo a troca de
saberes teóricos e práticos sobre a questão agrária e o espaço rural brasileiro. O estágio surge a partir
da necessidade de discussões da Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil e do movimento
estudantil em geral, em buscar um novo modelo de ensino, baseado em um ensino crítico, dialético e
popular. O presente trabalho, é motivado através de discussões geradas no 15º EIV Santa Maria,
ocorrido em fevereiro de 2018 no município de Jóia - Rio Grande do Sul. Busca-se a realização de
uma análise da importância da inserção da educação do campo nas discussões do estágio.

Palavras-chave: Estágio Interdisciplinar; Educação do Campo; Reforma Agrária.

Introdução

O Estágio Interdisciplinar de Vivência (EIV) é um projeto de extensão da


Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), organizado por estudantes em conjunto com o
Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, ocorrendo em áreas de reforma agrária,
possibilitando ao estudante/a urbano/a um estudo crítico e reflexivo com foco na questão
agrária do país. De acordo com Mengel et al. (2007), o estágio surge como uma ferramenta
para criticar o modelo agrário e de ensino do país. A primeira experiência surgiu em
Dourados-MS, resultado das discussões internas da Federação dos Estudantes de Agronomia
do Brasil – FEAB. Nesta primeira edição, apenas estudantes de agronomia participavam do
estágio.

134
UFSM, kaua1003@gmail.com.
135
UFSM, bruno10ts@hotmail.com.

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No ano de 1998, após aprofundadas discussões e com o objetivo de expandir o


estágio, o EIV tem sua primeira edição em Santa Maria, sendo um dos primeiros no Brasil
com o caráter interdisciplinar, de participação de estudantes de diversos cursos, mas
especialmente os das ciências agrárias. O estágio busca trazer principalmente um novo
modelo de ensino, sendo este crítico, dialético e popular.
A partir disso, o EIV, conforme Da Ros (2005), surge como uma alternativa à
formação convencional das universidades brasileiras. O método do estágio é baseado no
Método Pedagógico Josué de Castro, do Instituto de Educação Josué de Castro (IEJC), o
mesmo utilizado pelo MST em suas escolas de formação, tendo como princípios que buscam
a formação de um sujeito crítico a partir da interdisciplinaridade, tornando os estagiários
partes do processo educativo, conforme Freire (2014, p. 116) “não se faz de A para B, nem de
B para A, mas se faz de A com B”. Sendo assim, o objetivo é associar a prática e a teoria para
a transformação social, através da dialética, do trabalho e da coletividade.
Um diferencial inicial da realização do 15º EIV foi, que este, teria a realização das
etapas de formação e socialização do estágio ocorrendo em uma escola do campo, a Escola
Joceli Côrrea, do assentamento Rondinha. Outro fato importante, foi o expressivo número de
inscritos oriundos de cursos de licenciatura, a CPP chegou à conclusão e decisão de inserir o
tema educação do campo como uma das temática principais a serem abordadas no estágio,
buscando discussões e reflexões acerca do assunto.
O tema do 15º EIV teve inspiração em música sobre a educação do campo, sendo um
trecho da música “Passos do Saber” da cantora Marcinha. Assim, o tema do estágio foi: “Cada
passo que andar, história vai nos dar, novo tempo para colher, aprender e ensinar”,
demonstrando a abordagem do estágio por uma ampla discussão sobre a educação do campo.
Chega-se então no tema e o objetivo principal deste trabalho, consistindo em analisar
como a educação do campo e o EIV estão relacionados, na busca de uma educação que
fomente a transformação social, possibilitando, a consciência de classes e a aproximação de
estudantes universitários e movimentos sociais, como determinantes na busca por um novo
tipo de sociedade, mais igualitária e popular.

As relações entre o EIV e a educação do campo

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Os princípios do EIV estão intrinsicamente ligados a educação do campo, visto que


ambos consistem em uma análise crítica acerca do modo de produção e a divisão do trabalho
em nossa sociedade, pois surgem a partir da lógica que de acordo com Marx e Engels (2011),
“a divisão do trabalho numa nação obriga em primeiro lugar à separação entre o trabalho
industrial e comercial e o trabalho agrícola; e, como consequência, a separação entre a cidade
e o campo e à oposição dos seus interesses”. Através disso, portanto, surgem tanto a educação
do campo como o EIV, como ferramentas de formar cidadãos críticos que fomentem
alternativas frente a lógica perversa presente em nossa sociedade.
Neste sentido, devemos analisar a educação do campo como trata Caldart (2002 p. 13):

Quando dizemos Por Uma Educação do Campo estamos afirmando a necessidade de


duas lutas combinadas: pela ampliação do direita à educação e à escolarização no
campo; e pela construção de uma escola que esteja no campo, mas que também seja
do campo: uma escola política e pedagogicamente vinculada à história, à cultura e às
causas sociais e humanas dos sujeitos do campo, e não um mero apêndice da escola
pensada na cidade; uma escola enraizada também na práxis, da educação popular e
pedagogia do oprimido (CALDART, 2002 p. 13).

O EIV surge também com a mesma lógica, pois como salienta Da Ros (2005) ele
proporciona a formação de profissionais com um maior comprometimento com estas
realidades.
O estágio é dividido em três partes: a primeira consiste em reunir os estudantes de
diversos cursos em uma área cedida pelo MST (Figura 01), onde acontecem as formações em
tempo integral acerca de diversos temas que abrangem universidade, juventude, questão
agrária e diversos outros (Figura 02). Um segundo momento, acontece com o período de
vivências, nela os estagiários são direcionados a diversos assentamentos com o objetivo de
perceber o contexto, as contradições e o modo de produzir nas áreas de reforma agrária. Após
o período de vivências, os estudantes voltam ao local de formação onde podem compartilhar
suas experiências e de forma conjunta realizar sínteses sobre a questão agrária no Rio Grande
do Sul e sua relação com a extensão, universidade e sociedade.

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Figura 01: Salão de eventos no Assentamento Rondinha, em Jóia – RS.


Fonte: Autor.

Figura 02: Espaço de discussão na Escola Joceli Corrêa, do assentamento Rondinha, em Jóia – RS.
Fonte: Autor.

A partir destas análises, deve se levar em conta outro fator determinante na concepção do
EIV e da educação do campo, pois ambos se preocupam em estar conjuntamente com os

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movimentos sociais do campo, sendo o principal hoje em nosso país o Movimento dos
Trabalhadores sem Terra, este determinante para o acontecimento de ambos em nosso país.
Através disso, a educação deve ter o propósito de acordo com Leher (2005, p. 30) “O seu
propósito é de formar crianças e jovens verdadeiramente livres, capazes de protagonizar o
porvir histórico dos povos”. Assim, portanto tanto a educação do campo como o EIV têm
propostas de formar jovens que protagonizem as lutas dos movimentos sociais, pois,
conforme Freire (2014), os jovens não se formam através do silêncio, mas sim da palavra, da
ação reflexão e do trabalho.
Para a formação de crianças e jovens, devemos ir contra os retrocessos atuais do nosso
país, visto que a principal bandeira levantada hoje, é a do apartidarismo, em que a educação,
movimentos sociais e política, não devem estar interligadas. Porém, devemos ir na contramão
desta afirmação, pois só existe estágio de vivência e uma educação do campo, porque ambos
só existem através dos movimentos sociais ou estudantis que estão inseridos em um contexto
de um sistema de classe. Como salienta Frigotto (2017), a população e principalmente os
educadores tem um lado, e este deve ser em prol da classe trabalhadora e dos oprimidos.
Assim chegamos a seguinte conclusão de que a educação e a sociedade não são neutras pois:

Como a educação está imersa nas contradições da sociedade de classe, a sociedade


realmente existente, a difusão de que a educação é neutra é apenas uma “triste
imperfeição” da história, pois a luta de classes é um instrumento, até o presente,
necessário para o desenvolvimento social. A expressa, por conseguinte, a força
relativa das classes dominantes que têm logrado impor o seu modo de pensar a
Educação (LEHER, 2005 p. 25).

O Método Pedagógico Josué de Castro se mostra como a principal ferramenta de levar os


princípios da educação do campo na metodologia do estágio de vivência, visto que o método
possui matrizes que fomentam a formação humanística e dialética, principalmente com os
princípios da pedagogia do oprimido, onde conforme Freire (2014) mostra a importância
destes sujeitos historicamente oprimidos como sujeitos plenos de uma nova sociedade, na
construção de um projeto popular.
Além de uma educação popular, o método possui diversos princípios fundamentais para a
construção de uma sociedade justa e igualitária, como a coletividade, além do estudo através
do tempo trabalho e da dialética expostos por Marx e Engels. Tornando a partir do processo
dialético a transformação da sociedade para o novo.

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Através do método, portanto, que se faz com que pessoas que não tiveram um contato
próximo ao campo, ou que vieram do campo, mas tiveram uma educação da cidade, possam
no estágio de vivência, estimular a capacidade de compreender as desigualdades presentes na
nossa sociedade, através de várias ferramentas que possibilitam isso, como podemos notar
com Vygostski (1991), em que é descrito que cada atividade depende do material com o qual
opera, sendo a consciência fruto de vários conjuntos de hábitos específicos, portanto só se
chega a um desenvolvimento da consciência no momento que haja elementos relacionados
entre função e atividade
Com todos estes fatores, que o EIV, traz a estudantes universitários essa capacidade de
compreender a totalidade da sociedade em que estamos inseridos, tentando possibilitar o que
Fidel (2015) diz ser a capacidade de jovens de meditar de uma maneira profunda e chegarem
a conclusões de que querem a transformação da sociedade, para uma sociedade mais justa e
igualitária, ou melhor dizendo, uma sociedade sem classes.
A educação do campo, também traz esta importância de lutar por uma nova sociedade,
a partir do momento em que podemos observar de que ela está presente desde o surgimento
deste movimento:

E tratou-se primeiro de uma crítica prática: lutas sociais pelo direito à educação,
configuradas desde a realidade da luta pela terra, pelo trabalho, pela igualdade
social, por condições de uma vida digna de seres humanos no lugar em que ela
aconteça. É fundamental considerar para compreensão da constituição histórica da
Educação do campo o seu vínculo de origem com as lutas por educação nas áreas de
reforma agrária e como, especialmente neste vínculo, a Educação do campo não
nasceu como uma crítica apenas de denúncia: já surgiu como contraponto de
práticas, construção de alternativas, de políticas, ou seja, como crítica projetiva de
transformações (CALDART, 2009 p. 39).

Com a importância destes aspectos que: “muitos desses movimentos, como o MST,
estão tomando em suas mãos a educação e a formação de seus dirigentes, critérios
pedagógicos próprios” (LEHER, 2005 p. 29). Através destes critérios pedagógicos próprios, o
EIV usa essa base para formar também a criticidade dentro das universidades, como um
contraponto à lógica da educação vigente que não vê a educação como um processo de formar
cidadãos que irão atuar na sociedade, mas sim para a manutenção da lógica do capital,
conforme Mézaros (2005).

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Estas transformações da consciência humana através destas práticas pedagógicas, só


se dão através de uma parte importante neste processo, a interdisciplinaridade, esta que já está
presente no nome, Estágio Interdisciplinar de Vivência, demarcando já a sua importância no
processo de aprendizagem, conforme Severino (2008 p. 41).

Rompidas as fronteiras entre as disciplinas, mediações do saber, na teoria e na


pesquisa, impõe-se considerar que a interdisciplinaridade é condição também da
prática social. Com efeito, toda ação social, atravessada pela análise científica e pela
reflexão filosófica, é uma práxis, e, portanto, coloca tanto as exigências de eficácia
do agir quanto as de elucidação do pensar (SEVERINO, 2008, P. 41).

A interdisciplinaridade, entretanto, trata como uma importante ferramenta, não


apenas para o estágio de vivência, mas também para a formação de uma escola do campo,
tornando mais um fator que liga as diversas camadas da educação, principalmente a do
campo, onde é necessário que se entenda a complexidade e a totalidade da sociedade atual.

Portanto, a interdisciplinaridade na escola do campo vem complementar as


disciplinas, criando no conceito de conhecimento uma visão de totalidade, onde os
alunos possam perceber que o mundo onde estão inseridos é composto de vários
fatores, que a soma de todos, juntamente com suas práticas e vivências, formam uma
complexidade (BUENO e RIBEIRO, 2015, p. 125).

Todos os fatores que relacionam o estágio de vivência e educação do campo,


propiciam a educandos/as tanto do ensino superior quanto do básico, que possam voltar para a
sua realidade e conseguir exercer sua profissão e suas atividades voltadas a sociedade.
Tornando o EIV, portanto, não apenas um formador para a luta da reforma agrária, mas
também possibilita formar um/a educador/a do campo.

A extensão e o EIV como a possibilidade da formação de um/a educador/a do campo

Desde a revolução verde, nota-se um alto nível de deslocamento de pessoas do


campo para a cidade, diminuindo tanto quantitativa (em dados demográficos), como de
expressão econômica, Prado Junior (1979), coloca que devemos notar a dificuldade de colocar
em prática a educação do campo, visto que, cada vez mais se perde investimentos e
oportunidades na vida do campo.

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Esta caracterização torna o campo pouco atrativo, principalmente no que salienta


Colognese e Kummer (2013, p. 213): “a escolarização, portanto influi nas perspectivas de
reprodução da atividade agrícola, uma vez que aproxima os jovens rurais a um universo
particularmente voltado ao meio urbano”. Isso causa cada vez mais impacto na sociedade,
diminuindo a população rural e, portanto, aumentando a concentração fundiária.
A partir destas percepções que devemos analisar o papel da extensão universitária em
difundir a necessidade da reforma agrária e a educação do campo dentro da universidade,
possibilitando que a universidade tenha um papel fundamental na sociedade, conforme aponta
Castro (2004). Nos últimos anos a universidade vem possibilitando o aumento de estudantes
oriundos da classe trabalhadora, tendo, portanto, um novo perfil de estudantes, por isso a
extensão universitária vem com um papel importante na transformação social, como salienta
Castro (2004).
O papel da extensão, através do EIV, é fazer com que estudantes universitários com
raízes no campo, possam compreender a educação do campo e com isso, tornar-se um agente
de transformação da sociedade. Porém, podemos observar a importância de que esta
consciência não fique apenas aos educadores, mas também em outros campos da ciência,
principalmente pela interdisciplinaridade, pois a concepção e a luta por reforma agrária não
deve ficar restrito, mas deve ter uma unidade pedagógica na qual são educadores, não
somente os professores que porventura atuam num centro de educação básica, mas também os
pesquisadores, os agrônomos, engenheiros florestais, geógrafos e demais profissões.” Freire
(1985)
Portanto o EIV é um fator determinante para que, através da extensão, estudantes
universitários possam ver que é possível um novo tipo de educação e uma educação do campo
em conjunto com os movimentos sociais.

Considerações Finais

Através das análises aqui feitas, podemos compreender que o processo de


consciência, portanto, se dá por dois fatores, sendo eles o processo educativo e de extensão
protagonizado por estudantes em conjunto de movimentos sociais, o que vai ao encontro de

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Molina e Freitas (2011), um dos princípios da educação do campo é contribuir para a


promoção do desenvolvimento das comunidades camponesas, através da atuação das
instituições educativas.
Com isso surgem as perspectivas, sobre a condicionante do estágio de vivência surgir
a partir da lógica de libertação da classe oprimida, levando as suas práticas educacionais na
universidade, os desafios de uma educação popular e do campo, além da luta da reforma
agrária como principal condicionante para a igualdade de classes.
O estágio tem significativa importância na manutenção da esperança para a classe
trabalhadora e que ela não cruze os braços para as lutas, conforme Freire (1979, p.44):
“fazendo estas reflexões, o que pretendemos é defender o caráter eminentemente pedagógico
da revolução.” Assim contribuindo ao lado dos movimentos sociais na luta por uma educação
libertadora, sendo ela revolucionária e contra hegemônico.
O XV EIV, portanto, teve um importante papel, a parir da extensão universitária, levar
estudantes da classe trabalhadora, oriundos do campo e da cidade à terem debates acerca da
reforma agrária e educação do campo. Licenciados tendo a possibilidade de um novo tipo de
educação, a do campo, além de unir as questões de reforma agrária e de emancipação da
juventude do nosso país, possibilitando que tenhamos jovens dispostos a estarem
protagonizando as lutas da reforma agrária e da educação do campo. Os resultados ainda serão
visíveis, já que, os estudantes retornam com uma nova perspectiva de sociedade, para sua
realidade, alterando assim, a sua forma de atuação na universidade, sociedade e futura
profissão.

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AGROECOLOGIA E EDUCAÇÃO DO CAMPO: A CONSTRUÇÃO


AGROECOLÓGICA A PARTIR DAS VIVÊNCIAS NA ESCOLA FAMÍLIA
AGRÍCOLA DE SANTA CRUZ DO SUL – EFASC

Alexandro Fabris do Nascimento136


Diego Henrique Limberger137

Resumo

Este trabalho aborda a experiência desenvolvida pela EFASC, nas vivências acerca da Agroecologia, a
partir de experiências práticas vivenciadas, vinculadas a formação dos estudantes da escola. Observa-
se nas últimas décadas uma grande mudança no cenário da agricultura brasileira, sendo esta tendo
mudanças profundas na sua realização, quando comparado ao que os antepassados vinham
desenvolvendo, causando vários impactos a sociedade. Com isso, o trabalho apresenta a experiência
desenvolvida pela Área de Produção Agropecuária da escola, nas vivências agroecológicas e na
construção de possibilidades para transição agroecológica, numa perspectiva da educação do campo.
Percebe-se que a partir da experiência desenvolvida, possibilitou novas aprendizagens, e a construção
de uma consciência agroecológica em diferentes níveis, tanto para monitores e monitoras, quanto para
os estudantes.

Palavras-chave: Agroecologia; vivências agroecológicas; Educação do Campo.

Introdução

A partir da década de 1960 e 1970 muitas mudanças foram realizadas na agricultura


brasileira, mudando rapidamente o modo de prática da mesma, caracterizando a chamada
Revolução Verde. Muitas mudanças ocorreram na maneira de produção e vida das pessoas,
deixaram de ser utilizados práticas ancestrais e adaptadas localmente.

Esse novo modo de produção trouxe um pacote tecnológico que era composto pelos
adubos sintéticos, utilizados para nutrir as plantas, agrotóxicos para secar as plantas
espontâneas e controle de pragas e doenças, e por fim, a motomecanização com grande aporte
136
Licenciado em Ciências Biológicas pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC. Pós Graduando em
Educação Ambiental e Sustentabilidade pela Faculdade Dom Alberto. Atua como professor de Ciências
Biológicas na Escola Família Agrícola de Santa Cruz do Sul – EFASC. Email: fabrisrincaorio@gmail.com
137
Tecnólogo em Horticultura pela Universidade Estadual do Rio Grande do Sul – UERGS. Pós Graduando em
Educação do Campo e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC. Graduando
em Educação do Campo pela Universidade Federal de Santa Maria – UFSM. Atua como professor na Escola
Família Agrícola de Santa Cruz do Sul – EFASC. Email: limbergerdiego@gmail.com

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de implementos e máquinas para preparo do solo, manejo e colheita. Toda essa tecnologia
mudou a prática da agricultura no cenário brasileiro, pois com a presença de tanta tecnologia a
disposição, foi possível ampliar os campos de produção de algumas culturas agrícolas, assim
reduzindo a diversidade da produção que existia.

Tal processo agrícola que vem sendo desenvolvido no Brasil, traz muitos malefícios
aos sistemas de produção, pois o deixam totalmente desiquilibrados seus recursos como, solo,
água e patrimônio genético (GLIESSMAN, 2009). Dessa forma, a agricultura torna-se
dependente de insumos externos, e não utilizando mais os recursos existentes localmente,
sendo necessária a busca de fontes externas.

Com a chegada desse novo modo de produção, a agricultura passou a se especificar,


perdendo sua diversidade de produção que constituía a base alimentar dos povos. O impacto
disso, é a perda da produção de subsistência, assim grande parte dos agricultores deixam de
produzir, e dedicando-se a sua principal cultura produzida como fonte de renda única, e
destinando valores a partir desta para aquisição de seus mantimentos.

Nesse cenário surgem os monocultivos, que passam a dominar os campos brasileiros,


causando vários impactos aos recursos naturais. O uso incialmente de fertilizantes altamente
solúveis provoca mudanças, principalmente nos mananciais hídricos, com a presença de
nutrientes como nitrogênio e fósforo (COSTA, 2017, pág. 25).

Aliado a essa afirmação, destaca-se o uso de agrotóxicos nos campos de produção


brasileiros, sendo atualmente o campeão mundial no uso desses produtos, permitindo na
maioria das vezes alguns produtos que já estão proibidos em outros países (CARNEIRO,
2015, pág. 612).

Algumas culturas como, por exemplo, o pimentão que foram observados 91% das
amostras contaminadas, segundo dossiê da ABRASCO138. Assim muitos outros alimentos que
são consumidos pelos brasileiros estão contaminados com resíduos de agrotóxicos, e podem
causar algum dano a saúde da população, como ressalta a pesquisa.

138
Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO.

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Esses processos de produção da moderna agricultura levam ao desiquilíbrio dos


cultivos cultivados de forma individualizada, pois as plantas nesses sistemas não desenvolvem
seus mecanismos de defesa necessários, dando origem as pragas e doenças (ALTIERI, 1998).

A mudança na forma de produção, reforça a busca de contrapor esse modelo


produtivo, e muitos movimentos primeiramente na Europa, e após no Brasil, fazem um olhar
crítica ao sistema de produção proposto pela Revolução Verde (COSTA, 2017, pág. 57).

Também nesse período muitas pesquisas são lançadas acerca da problemática da


agricultura moderna como, a obra “Primavera Silenciosa” de Rachel Cardson, a qual denuncia
o uso indiscriminado de agrotóxicos (COSTA, 2017, pág. 57). No Brasil podemos mencionar
as contribuições de Lutzemberger na reflexão sobre as formas e os insumos utilizados para
produção, no “Manifesto Ecológico Brasileiro” (COSTA, 2017, pág. 59).

A Agroecologia busca desenvolver um novo pensamento sobre a sociedade e aos


modos de vida das pessoas, e sobre tudo pensar o modo de produção. Por isso, nas últimas
décadas muitos agricultores buscaram e buscam realizar a transição do modelo convencional
de produção, para um modelo menos agressivo ao meio ambiente.

Junto ao cenário em que vinham sendo discutidas várias possibilidades de mudança na


forma de produção da agricultura, vem muito forte o debate ao acesso a educação do campo,
buscando políticas públicas voltadas a população do campo (CALDART, 2012, pág. 259).
Por isso, a educação do campo contextualizada pode contribuir muito a construção de novos
caminhos para o campo brasileiro, refletindo sobre as principais problemáticas pertinentes a
esse espaço de vida.

Aliado a essa questão é necessário a transição do modelo econômico instalado no


campo brasileiro, a partir do rearranjo da agricultura e propondo novas possibilidades,
segundo destaca o mesmo autor.

Nesse contexto, situada no Vale do Rio Pardo no município de Santa Cruz do Sul,
surge a partir de 2009 a primeira Escola Família Agrícola do sul do Brasil, a EFASC139. A
EFASC no decorrer de seus 09 anos de caminhada vem construindo uma caminhada, que alia

139
Escola Família Agrícola de Santa Cruz do Sul – EFASC.

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Pedagogia da Alternância, Educação do Campo, e Agroecologia. E a construção desse olhar


agroecológico no campo produtivo também vem sendo desenvolvido e construído, a partir de
experiências na escola, e no contexto local dos estudantes.

Assim, a construção da consciência agroecológica dos processos de produção,


possuem uma diversidade imensa, bem como tempos de compreensão diferentes para cada
indivíduo. Dessa forma, esse trabalho busca descrever como esse olhar permeia o caminhar da
EFASC, junto a Área de Produção Agropecuária e as vivências dos estudantes.

Metodologia
O trabalho será organizado a partir do relato da experiência do trabalho desenvolvido
pela Área de Produção Agropecuária da EFASC, e sua contribuição na construção da
formação dos estudantes a partir dos princípios da Agroecologia.

Durante sete anos foram manejados uma área de produção de alimentos


agroecológicos junto a escola, com objetivo pedagógico de aprendizagem no campo da
agricultura, bem como produção de hortaliças para alimento na própria escola. A condução
desse espaço caminha junto com a reflexões que os monitores e monitoras fazem, construindo
novas aprendizagens. A reflexão sobre a mudança nos pensamentos durante esse período foi
visível, tendo uma diferença significativa nas abordagens anteriores, para as realizadas
atualmente na compreensão agroecológica.

O processo de transição agroecológica requer envolvimento dos atores para com o


processo, pois necessita-se de um profundo conhecimento observador dos fatores que ocorrem
no local, e pensando a transição do modelo convencional para estilos de agricultura com base
agroecológica, sobre tudo da mudança na forma em que o homem ao fazer agricultura veja-a
(CAPORAL e COSTABEBER, 2002, pág. 02).

A partir da abordagem dentro da perspectiva da transição agroecológica, muitos


conhecimentos foram sendo construídos, e muitas formas de manejo, por exemplo, foram
tendo compreensões diferentes. Essas percepções foram sendo tomadas sua consciência a
partir da relação entre prática e teoria, dessa forma mudando as abordagens dos conteúdos e
suas contribuições para construção da Agroecologia.

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Resultados e Discussão

A Agroecologia vem sendo abordada como uma proposta de novo paradigma, pois é
caracterizada por ser uma área multidisciplinar, onde que várias disciplinas podem interagir e
auxiliar na sua construção, de forma holística (CAPORAL E COSTABEBER, 2006).

A EFASC atua com a metodologia da Pedagogia da Alternância, sendo que os


estudantes realizam durante a estadia familiar o plano de estudos140, o qual possibilita na
sessão escolar serem planejadas as aulas pelas monitoras e monitores, para que possam
contribuir na reflexão da realidade dos mesmos.

A reflexão da realidade permeia as aulas junto aos assuntos, pois muito das pesquisas é
aliado aos conteúdos de agricultura e biologia, discutindo a atual situação em que se encontra
a prática da mesma.

Na região do Vale do Rio Pardo, caracteriza-se por pequenas propriedades familiares,


cuja a principal produção de rentabilidade econômica é o tabaco na maioria das propriedades,
aliado a uma produção de subsistência.

Junto a essa produção podemos observar que o uso do solo, por exemplo, é de forma
na maioria das vezes realizado seu manejo inadequadamente, ocasionando diversas perdas
como, fertilidade, porção biológica e encontra-se compactado pelo uso de motomecanização
em condições não favoráveis.

Nesse sentido também vale destacar o uso de vários insumos no cultivo das plantas,
tanto para nutrição, quanto para controle de pragas e doenças. Esse uso vem sendo cada vez
maior nas últimas décadas, resultando na perda do equilíbrio biológico dos solos, onde não há
reciclagem dos nutrientes.

Essa prática desenvolvida leva ao empobrecimento do solo, e cada vez mais são
necessárias aplicações de agrotóxicos para controle de doenças e pragas, bem como
fertilizantes para nutrição das plantas, já que os mesmos acabam lixiviando para as camadas
mais profundas do solo, não sendo aproveitados pelas raízes das plantas.

140
Instrumento pedagógico da Pedagogia da Alternância, realizado no período em que os estudantes estão na
sessão familiar, sendo abordados pesquisas com diversas temáticas.

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A presença de erosão também é visível pelo não uso de práticas conservacionistas de


solo, tais como, cobertura de solo, curvas de nível, cordões de retenção, e outros. Nesse
sentido as partículas de solo acabam sendo levadas pelas fortes chuvas que ocorrem durante o
ano, causando o assoreamento dos rios, como afirma o autor:

A relação causa-efeito entre agricultura convencional e erosão


do solo é direta e não ambígua. Preparo intensivo de solo,
combinado com monocultivos e rotações curtas, deixa-o
exposto aos efeitos erosivos do vento e da chuva. O solo
perdido através desse processo é rico em matéria orgânica, seu
componente mais valioso. De forma similar, a irrigação é causa
direta de muita erosão de solo agrícola pela água
(GLIESSMAN, 2005, p. 42).

Essa realidade pode ser encontrada em muitos locais da região, e na maioria das vezes
acaba por despercebida pelo agricultores e agriculturas. Essa situação causa uma perca imensa
de produtividade das lavouras, pois grande parte dos nutrientes são perdidos junto ao solo.

Nessa perspectiva, busca-se a partir dos trabalhos desenvolvidos pela Área de


Produção Agropecuária da EFASC, refletir junto com os estudantes sobre esse contexto de
degradação dos recursos naturais, pensando possibilidades e alternativas frente ao modelo
produtivo instalado. Por isso, muitas abordagens são realizadas com objetivo de refletir sobre
essas situações como, por exemplo, quando surge uma praga ou uma doença nos cultivos, o
que vem em mente é utilizar algum tipo de produto para combater aquela situação. Muitos
produtos como repelentes a base de plantas são desenvolvidos, como forma de controle de
alguns tipos de insetos, por exemplo, como é o caso da presença de pulgões em hortaliças, os
quais prejudicam seu desenvolvimento, pois os mesmos sugam a seiva das plantas. Essas
seriam algumas possibilidades, mas percebe-se que na maioria é utilizado produtos químicos
para seu controle.

As plantas desiquilibradas e com a utilização de agrotóxicos podem aumentar o


desenvolvimento de pragas, pois em pesquisas realizadas observou-se que quando aplicados
agrotóxicos sobre culturas, as taxas de reprodução de insetos aumentavam (CHABOUSSOU,
2006, pág. 36). Frente a isso como proceder? São desenvolvidas diversas experiências no
trabalho docente da Área de Produção Agropecuária, de em um primeiro momento refletir
sobre essas situações, e após pensar alternativas para o não uso de agrotóxicos.

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Com isso, são desenvolvidas diversas receitas de produtos agroecológicos a partir de


plantas existentes localmente como, calda de arruda e uva do Japão para repelir formigas,
extratos de cinamomo para controle de pulgões, extratos de cebola para controle de moscas,
entre tantas outras alternativas que são possíveis desenvolver.

Até então era percebido e buscado desenvolver produtos caseiros a base de plantas
para combatê-los. Com o decorrer dos experimentos desenvolvidos durantes os sete anos de
manejo da área experimental, observou-se que não bastava apenas utilizar essas receitas, era
necessário um trabalho mais amplo, buscando o equilíbrio ecológico do solo. Desenvolveu-se
então todo um trabalho de melhoria das condições químicas, físicas e biológicas do solo, com
práticas agroecológicas (incorporação de composto orgânico, uso de biofertilizantes e
microrganismos eficientes, consórcio de hortaliças, mínimo de revolvimento do solo, quebra
ventos e outros.).

A partir daí começou os cultivos após algum tempo, não apresentar tantos problemas
quanto a sua sanidade, assim não necessitando utilizar mais os repelentes desenvolvidos, pois
havia um mínimo de equilíbrio presente no local. Esse fator pode ser observado pelas
pesquisas de Ana Primavesi em seu livro “Manual do Solo Vivo”, onde aborda o equilíbrio do
solo e como consequência o equilíbrio das plantas, pois solo doente é igual a planta doente, e
por consequência o homem também adoece (PRIMAVESI, 2009).

Dentro da produção orgânica e agroecológica são utilizados vários tipos de produtos


141
para fertilizar as plantações como, o composto orgânico e biofertilizantes142. Durante
alguns experimentos desenvolvidos na área experimental da EFASC, puderam ser observados
que quando utilizados em conjunto esses dois meios para nutrição das plantas, os resultados
em termos de produtividade foram bem satisfatórios. Já quando utilizados individualizados
nos cultivos de hortaliças não foram eficientes, ficando as plantas desnutridas e não
desenvolvendo.

141
Material estabilizado que passou por processo de compostagem, e pode ser utilizado para adubação das
plantas.
142
Adubo líquido que passou por fermentação, e pode ser utilizado para nutrição das plantas.

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As culturas em geral necessitam de uma dose mínima de adubação para seu


desenvolvimento, conforme já observado pela lei do mínimo de Liebig143. O composto
orgânico e os biofertilizantes, quando quantificados não apresentam uma dosagem de
nutrientes suficientes para adubação das plantas, ficando muito a baixo da necessidade, assim
sua aplicação por hectare acaba sendo em quantidades na maioria das vezes inviáveis para
utilização. Assim esses produtos orgânicos que são utilizados para nutrição de plantas
possuem poucas quantidades de nutrientes em sua composição, especialmente os
biofertilizantes. A partir dessa afirmação como então que as hortaliças cultivadas têm pleno
desenvolvimento, e atingem produtividades mais elevadas do que cultivos convencionais.
Segundo Primavesi (2002) os solos tropicais não possuem altas taxas de fertilidade quando
comparados a solos temperados, por exemplo, mas sim possuem um mecanismo de ciclagem
muito mais eficiente dos nutrientes, ficando mais disponíveis para as plantas, sendo realizados
esses processos pelos microrganismos.

Fazendo essa relação entre a prática e a teoria, percebesse que o biofertilizante quando
utilizado no solo não é ele diretamente que faz as plantas crescerem, mas serve de ativação da
porção biológica do solo, e essa porção biológica através dos microrganismos faz a ciclagem
dos nutrientes deixando-os disponíveis para as plantas.

Nas hortaliças folhosas observa-se principalmente no período de inverno quando a


presença de umidade é maior, o desenvolvimento de doenças bacterianas e fúngicas, assim
danificando as folhas das mesmas e não podendo serem utilizadas para consumo. A presença
desses patógenos foi observada em muitos casos em cultivos solteiros144 e com pouca
vegetação espontânea145 presente. Quando se cultivou as mesmas espécies de hortaliças em
consórcio com outras espécies, e fez-se o manejo seletivo das plantas espontâneas, pode ser
percebido que a incidência de patógenos nessas culturas reduziu significativamente. Isso
ocorre pelo aumento da biodiversidade de outros microrganismos benéficos no local, os quais
são responsáveis pelo equilíbrio no ambiente.

143
Realizou experimentos com vegetais e desenvolvendo o uso de minerais na agricultura (Sebastião Pinheiro).
144
Cultiva-se apenas uma única espécie no canteiro ou lavoura.
145
Plantas que se desenvolvem de forma espontânea entre meio aos cultivos.

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Essas são algumas das experiências desenvolvidas na área experimental da EFASC,


que permeiam as abordagens frente a Agroecologia e interagem com vários conteúdos
abordados como, biologia do solo, fertilidade do solo, equilíbrio ecossistêmico, entre tantas
outras.

No decorrer dessa experiência percebe-se que no início tinha-se a pretensão de buscar


respostas/receitas para controle de diversos desiquilíbrios vistos, como resposta a curto prazo
para os problemas. Essas receitas eram utilizadas e tempo depois percebia-se que o problema
que era para ela eliminar estava presente novamente, e uma dose mais concentrada deveria ser
aplicada para minimizar tal problema.

Pensando nesse sentido, parece que tais práticas não possuem importância ou não
surtem efeito sobre os cultivos. O tempo possibilitou observar que o manejo deve ser
sistêmico, pensar todos os espaços de forma inter-relacionados e sempre manejando de forma
a contribuir com o solo e a vegetação presente. Quando observados áreas com um pouco mais
de equilíbrio os problemas com insetos e doenças são pouco visíveis, pois o próprio sistema
ecológico combate o que pode vir a prejudicar. De acordo com Primavesi (2002) plantas bem
nutridas não são atacadas por doenças e pragas, mas sim protegidas por elas, como é o caso da
associação das raízes de plantas com fungos, os quais utilizam energia liberada pelas raízes
(carboidratos) e em contrapartida protegem a mesma planta de outros microrganismos com a
liberação de antibióticos.

Dessa forma, a abordagem com os estudantes teve nesse período todo diferentes níveis
de consciência agroecológica, desde uma percepção inicial onde que a utilização de receitas
se faz necessário como início na mudança do pensamento de condução dos manejos, bem
como as construções da perspectiva de visão de inter-relacionada, não observando as espécies
de forma individual, mas sim o conjunto que compõe os ecossistemas locais.

Essas vivências de construção dos sistemas produtivos agroecológicos foram


acompanhadas pelas várias turmas que passaram, e tiveram olhares distintos da condução dos
espaços, e da reflexão da Agroecologia, pois inicialmente partia-se de uma visão de
agricultura orgânica, a qual possui apenas a troca dos insumos, não possuindo grandes
mudanças, até a construção de um olhar e uma abordagem agroecológica que leva em conta

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para além da produção orgânica, mas sim das próprias relações entre as pessoas e das
construções do saberes a partir de diferentes saberes dos estudantes a partir de suas pesquisas,
e dos monitores e monitoras na reflexão entre teoria e prática.

As experiências desenvolvidas na EFASC sempre eram construídas a partir da


necessidade e das demandas provindas dos estudantes, a partir de suas pesquisas, onde
levantavam várias questões pertinentes ao modo de produção existente, e como poderia ser
possível a produção sem o uso de pacotes tecnológicos.

Muitas das reflexões construídas podem ser observadas no PPJ146 ao final de suas
formações, onde sempre pensam a produção a partir dos recursos existentes na propriedade,
buscando reduzir ao mínimo a aquisição de insumos externos.

Nesse sentido, a experiência que vem sendo desenvolvida pela Área de Produção
Agropecuária da EFASC traz uma série de pontos importantes a serem pensados sobre a
forma de abordar a Agroecologia, e como ela pode estar associada aos conteúdos da formação
técnica em agricultura dos estudantes e numa perspectiva da educação do campo. Mas
também é uma experiência que vem sendo construída dia a dia, desde a implantação de novos
experimentos a partir de uma vivencia anterior refletida, e da construção coletiva dos saberes
entre estudantes, monitores e monitoras, e aliado aos conhecimentos científicos, pois como
diz um grande pensador: “Não há saber maior nem saber menor, há saberes diferentes”
(FREIRE, 1987). E esses saberes foram sendo construídos a partir da realidade dos estudantes
refletindo de forma conjunta, em pró de uma nova possibilidade produtiva, que valorize o
homem e a mulher, e que respeite a natureza.

Referências Bibliográficas

ALTIERI, Miguel. Agroecologia: bases cientificas para uma agricultura sustentável. Rio de
Janeiro: AS-PTA, 2002.

146
Projeto Profissional do Jovem.

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CALDART, Roseli Salete (org.). Dicionário da Educação do Campo. / Organizado por Roseli
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São Paulo: Escola politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Expressão Popular, 2012.
CAPORAL, Francisco Roberto; COSTABEBER, José Antonio. Agroecologia. Enfoque
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2006.

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agrotóxicos na saúde / Organização de Fernando Ferreira Carneiro, Lia Giraldo da Silva
Augusto, Raquel Maria Rigotto, Karen Friedrich e Andre Campos Búrigo. Rio de Janeiro:
EPSJV; São Paulo: Expressão Popular, 2015.
CHABOUSSOU. Francis. Plantas doentes pelo uso de agrotóxicos: novas bases de uma
prevensão contra doenças e parasitas: a teoria da trofobiose / Francis Chaboussou; tradução de
Maria José Guazzelli – 1° ed. – São Paulo: Expressão Popular, 2006.
COSTA, Manoel Baltasar Baptista da. Agroecologia no Brasil: história, princípios e práticas. /
Manoel Baltasar Baptista da Costa. 1 ed. São Paulo: Expressão Popular, 2017.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido, 17° ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra. 1987.
GLIESMANN, Stephen R. Agroecologia: processos ecológicos em agricultura sustentável /
Stephen R. Gliessman. – 3° ed. – Porto Alegre: Editora UFRGS, 2005.
GLIESSMAN, Stephen R. Agroecologia: Processos Ecológicos em Agricultura Sustentável.
4° ed. Porto Alegre: UFRGS, 2009.
PINHEIRO, Sebastião. Cartilha da Saúde do Solo (cromatografia de Pfeiffer). Salles Editora.
PRIMAVESI, Ana. Cartilha do solo como reconhecer e sanar seus problemas. 1° ed. São
Paulo, 2009.
PRIMAVESI, Ana. Manejo ecológico do solo: a agricultura em regiões tropicais / Ana
Primavesi – São Paulo: Nobel, 2002.

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MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA: equidade de gênero


por meio da educação do campo

LENZ, Ana Carla147


MACHADO, Denise Lenis148

Resumo

Qual é o papel da mulher no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST? Para chegar à
resposta o presente trabalho buscou entrevistar mulheres assentadas, e verificar se elas por meio da
educação voltada para o campo trabalham as questões de gênero em seus lares, assim como no próprio
movimento. A pesquisa se caracteriza como qualitativa, a qual utilizou levantamento bibliográfico,
levantamento em campo e analise e interpretação dos dados apurados.

Palavras-chave: Agricultura familiar, Trabalho na lavoura, Mulher do campo.

Introdução

As mulheres do campo produzem no setor agrícola, no setor da pecuária, da pesca, no


social, no cultural, pode-se dizer que são as protagonistas do desenvolvimento rural, contudo,
ainda sofrem com o preconceito, com a desigualdade de gênero e com tantos outros
problemas que herdaram de uma sociedade culturalmente patriarcal. Acredita-se que se faz
necessário desmistificar alguns dos elementos colocados ao longo dos anos sobre a mulher
rural, como: falta de força física; incapacidade de gerenciamento; serviço doméstico como
função feminina, cuidado da casa e dos filhos; sem contribuição na renda, vista como auxiliar
do trabalho masculino; dentre outros.
Assim, a presente pesquisa buscou responder a seguinte pergunta: qual é o papel da
mulher no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST? Pois, a mulher do campo
vive dupla/tripla jornada de trabalho, o que não deve ser diferente para as integrantes do MST,
então para resolver a problemática tem como objetivo geral: compreender como as mulheres
do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra atuam na comunidade a qual estão

147
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa Maria/RS.
anacarlalenz@gmail.com.
148
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa Maria/RS.
denisegeomachado@gmail.com.

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inseridas. E como objetivos específicos: a) Identificar as atividades desenvolvidas e


desempenhadas pelas mulheres do MST; b) Verificar se à educação das novas gerações visa a
equidade de gênero no movimento; c) Analisar o papel da mulher no movimento na
contemporaneidade.
Para o desenvolvimento desta pesquisa utilizou-se a aplicação da abordagem
qualitativa. Uma vez que a seleção deste método se justifica em vista dos objetivos traçados
neste estudo, haja vista que se busca compreender o papel da mulher no espaço/tempo na
agricultura familiar dos Assentamentos da Reforma Agrária Lanceiros Negros e Integração
Gaúcha em Eldorado do Sul/RS e Assentamento Capela em Nova Santa Rita/RS. Neste
sentido, este trabalho, configura-se como um estudo de caso de caráter exploratório, descritivo
e reflexivo, considerando que esse tipo de estudo auxilia na compreensão dos fenômenos
sociais, possibilita ao pesquisador a observação, o diálogo, o aprofundamento e a construção
de uma explicação da realidade investigada.
A primeira etapa da pesquisa foi destinada a uma revisão da matriz teórica, das quais
deram subsídios aos eixos investigativos e suas consequentes problematizações. A segunda
etapa da pesquisa buscou realizar uma ampla consulta, visando identificar, verificar e analisar
o papel da mulher no espaço/tempo na agricultura familiar dos Assentamentos da Reforma
Agrária Lanceiros Negros, Integração Gaúcha e Capela. Para a recolha dos dados foram
utilizadas entrevistas semiestruturadas, a fim de se identificar as características do trabalho
feminino nos assentamentos, sua influência e impactos nos saberes/fazeres do campo, da
cultura e do processo de ensino/aprendizagem das novas gerações. Estas entrevistas seguiram
a técnica conhecida como snowball (bola de neve), uma vez que essa técnica implica na
entrevista direcionada a informantes qualificados que indicam novos informantes a serem
entrevistados, assim no total foram dez entrevistados, e desses cinco selecionados para a
transcrição no presente texto. Essa etapa fez uso de: a) gravador de voz, com autorização para
tal procedimento; b) observações com apontamentos em um diário de campo; c) fotografias,
com uso de máquina fotográfica para a realização dos devidos registros das ações empíricas.
A terceira etapa foi destinada para a apreciação dos dados e informações apurados nas
demais etapas. Além de ser destinada para a redação do texto final do artigo.

Trabalho e gênero: uma construção de emancipação feminina no campo

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Pode-se dizer que a agricultura é uma das atividades mais importantes desenvolvida
pelos seres humanos ao longo da sua evolução. Com o seu surgimento a humanidade
estabeleceu um modelo de vida voltado para a estabilidade territorial, construindo sistemas
locais próprios, ou seja, espaços com elementos dotados de identidade.
Nesse processo, os grupos sociais definiram comportamentos coletivos por meio de
relações endógenas e exógenas nas ações para o desenvolvimento local. Assim o homem
obteve um papel de destaque em relação a mulher, mesmo que ela desenvolvia/desenvolve
atividades relevantes para a manutenção do bem estar da vida social da comunidade, na
maioria das vezes, é vista apenas como “dona de casa”. E sua colaboração no lavrado,
independente do grau de interferência, era/é tido meramente como auxiliar a da figura
masculina. (MARION; BONA, 2016, p.01-11 ).
A mulher na agricultura era/é tida como inferior ao homem, assim como em muitas
áreas da sociedade, sendo desvalorizada como trabalhadora ocupando o posto de ajudante do
trabalho desenvolvido na propriedade agrícola. Entende-se, que a mulher não é capaz de
exercer certas atividades ditas como masculinas, em virtude do esforço físico, o qual é tido
como favorável aos homens. Característica masculina que desqualifica a mulher para o
trabalho “pesado” na agricultura. O que não condiz com a realidade da mulher do campo, pois
não há tarefa que elas não executam na propriedade.(NOBRE, 1998, p. 01-10).
Considerado gratuito e de “ajuda”, o trabalho exercido pela trabalhadora rural não é
vinculado com a renda familiar, pois, não sendo reconhecido, ao contrário do desempenhado
pelo trabalhador rural, sugere que este trabalho não seja capaz de gerar valor econômico e
social, o que acaba dificultando o acesso às políticas públicas e reafirmando a tradicional
divisão sexual do trabalho (MELO,2002, p.01-14). Assim, nesse contexto, a divisão se
configura da seguinte forma: ao homem pertence a capacidade do trabalho na produção
agrícola, a posse da terra, a fonte de renda; a mulher compete o auxílio na lavoura, a educação
dos filhos e afazeres domésticos.
É muito mais fácil ver uma mulher “carpindo” com a enxada do que dirigindo o trator
para a realização do trabalho agrícola. Esse entre outros fatores, acaba por acarretar na própria
desvalorização do trabalho da mulher, que consequentemente acaba por acreditar que não é

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capaz de desempenhar certas atividades e de perceber sua importância para o


desenvolvimento da agricultura, destaca Nobre (1998, p.01-10).
De acordo com a autora supracitada:

Ainda hoje a divisão sexual do trabalho parte do princípio de que os homens são
responsáveis pelo trabalho produtivo (a agricultura, a pecuária, enfim tudo o que se
associa ao mercado) e as mulheres, pelo trabalho reprodutivo (o trabalho doméstico,
o cuidado da horta e dos pequenos animais, tudo o que é feito para uso e consumo
próprio, sem contar a reprodução da própria família pelo nascimento e cuidado dos
herdeiros). (NOBRE, 1998, p.01-10).

Percebe-se, neste sentido, que as mulheres acabam por cumprir funções que tendem a
explorá-las, pois nesta divisão do trabalho a figura masculina não se vincula com o trabalho
realizado nas dependências da casa, não existe o “dono de casa”. Não há a cooperação e a
contribuição masculina quando se trata dos afazeres domésticos e educação dos filhos, estas
atividades se estabelecem como obrigações femininas. Desta forma, a mulher participa tanto
da reprodução e da vida doméstica, como da produção, relacionada ao mercado, se tornando
visível a exploração sofrida por elas.

É importante salientar que o trabalho da mulher do campo vai muito além da lida
diária na lavoura, ela realiza dupla/tripla jornada de trabalho, pois, não dedica-se somente a
labuta no cultivo da roça, mas também, aos afazeres domésticos, aos filhos e, muitas vezes, a
educação formal dos mesmos. Também pode-se citar outras tarefas como: o cuidado com o
quintal, cultivo da horta, a criação de animais, a atividades que ajudam na complementação da
renda como a confecção de produtos artesanais (compotas, cucas, dentre outros). O que
evidencia a capacidade feminina de realizar diversas tarefas essenciais para o
desenvolvimento da agricultura familiar, não sendo vista somente como simplesmente uma
ajudante, mas como protagonista desta história.

Outra participação importante da mulher é a sua inserção nos movimentos de lutas no


campo pelos direitos dos camponeses como: acesso e uso da terra; inserção nos programas de
políticas públicas voltadas a agricultura familiar; acesso à educação das novas gerações do
campo; equidade de gênero, dentre outros. Movimentos que historicamente eram destinados

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aos homens, as mulheres foram buscando espaço e fortemente permanecendo nele, em um


mundo culturalmente machista e patriarcal, visando sua liberdade e emancipação.

A luta diária protagonizada pelas mulheres fez com que elas pudessem se inserir na
sociedade de forma mais significativa e atuante, o que possibilitou ser protagonista de sua
própria vida enxergando novas possibilidades para o seu próprio desenvolvimento tanto no
meio social, como também, de sua família e comunidade. Dessa forma, a invisibilidade
imposta culturalmente sobre elas aos poucos perde espaço e gradativamente passam a operar
de forma mais significativa, ganhando voz e sendo ouvidas, circulando nos mais diversos
setores das esferas política, econômica e da sociedade.

Nos movimentos sociais que ocorrem no campo a mulher exerce funções


fundamentais, não somente voltadas à reprodução da vida doméstica e produção econômica.
Elas participam efetivamente das reuniões e tomadas de decisões, se articulam quanto mulher
e cidadã, tornam-se líderes de cooperativas, trabalhando conjuntamente com o grupo em prol
do reconhecimento do movimento e para o desenvolvimento da agricultura familiar.

Contudo, há necessidade, dentro do próprio movimento da luta pela terra, a busca pelo
respeito e pela equidade de gênero nas relações estabelecidas diariamente entre seus
membros. Em virtude do descrito conclui-se que, em seu processo organizativo, “o
movimento social de luta pela terra dinamiza experiências sócio-político-educativas que
contribuem para a transformação das relações e identidades de gênero e para o
desenvolvimento do capital social e político da mulher camponesa”. (SCHWENDLER, 2015,
p. 87-109).

Apesar de todos os desafios e adversidades impostos, as trabalhadoras tendem a


permanecer na luta, desafiando um sistema hegemonicamente patriarcal e capitalista, que
acabam por explorá-las e reprimi-las, seguindo determinadas e confiantes em seus ideais.
Surpreendem pelo seu conhecimento e capacidade dentro do movimento, por sua ousadia em
suas falas e palavras de ordem e principalmente pela busca incessante por sua liberdade e
emancipação. Proporcionando uma mudança, apesar de difícil e lenta, necessária para a
transformação das relações existentes dentro do âmbito dos movimentos ao qual pertencem,
contribuindo para construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

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Assentamento um território de emancipação por meio da educação

A questão agrária no Brasil é historicamente conservadora, com predomínio de


latifúndios, favorecida pela Lei de Terras consolidada em 1850, que estabelecia a propriedade
da terra aos detentores de capital. Sua compra só poderia ser realizada por aqueles que
possuíssem recurso para tal aquisição. Pobres e escravos não faziam parte deste seleto grupo.
Sendo um dos países com a pior distribuição de terras do mundo, surgem no Brasil
movimentos que lutam pelo direito e distribuição da terra.

Desta forma, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, também conhecido
como Movimento dos Sem Terra ou MST, nasce a partir da necessidade e articulação das
lutas pela terra. Lutas que foram retomadas a partir do final da década de 70, especialmente na
região Centro-Sul do país, expandindo-se pelo território brasileiro. Surgem os assentamentos,
visando o direito de cultivar a terra e produzir alimentos que garantam a vida para diversas
famílias, com geração de empregos e desenvolvimento econômico e social.

Entende-se que a educação é um ato de construção coletiva, o qual visa a liberdade e


emancipação por meio do trabalho, sendo o mesmo o elemento que produz e modifica o
território. Salienta-se, também, que o espaço escolar e o espaço social são caracterizados por
serem elementos significativos de trocas, no qual ocorrem as experiências e o aprendizado,
visando suprir as necessidades individuais e coletivas.

“A organização familiar pertence ao espaço social, e por esse motivo, a mesma, deve
ter consciência política, buscando ensinar as novas gerações que elas pertencem a um
território e que tem obrigações para com ele”, observa a depoente A. ( Diário de Campo,
2018). Um espaço produzido pela história da comunidade, que é entendido como lugar de
proteção, segurança e oportunidades, para todos os que o habitam, homens e mulheres,
crianças e adultos, jovens e idosos dos assentamentos do Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terras - MST.

No contra turno das aulas regulares do ensino formal as crianças e jovens trabalham
com os seus pais nos lotes. “Os nossos filhos, tanto meninos como meninas, ajudam nos
serviços domésticos da casa, nas hortas, nas padarias e nas feiras, sem distinção de gênero,
todos são iguais”, acrescenta a depoente B. “Porém, a juventude busca a dinâmica de
trabalho das feiras, pois as atividades são voltadas para o imaginário da vida social urbana

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“fácil””, esse fenômeno se explica pelos relatos do depoente B que destaca, “aqui no
assentamento tem famílias que não se preocupam em passar o verdadeiro valor da terra,
ensinam a seus filhos/filhas somente o caráter exploratório da terra, e os jovens entendem
que a terra só como sinônimo de lucro”. (Diário de Campo, 2018).

No assentamento Integração Gaúcha encontra-se a melhor creche do município de


Eldorado do Sul, e uma das melhores escolas de ensino fundamental, também, segundo o
depoente C. Destaca, ainda que os jovens, sem distinção de gênero, praticam a alternância,
onde posteriormente ao término da graduação, voltam para aprenderem com a experimentação
concreta o trabalho na cooperativa, a COOTAP, que na atualidade exporta o arroz orgânico
para quatro países, um da América Latina, e três da Europa.

“O assentamento possui 30 anos, no início não foi fácil, fomos despejados no terreno,
e por cinco anos não conseguimos ter produção, pois não sabíamos trabalhar aquele tipo de
solo, pois éramos todos vindos de solo argiloso, terra vermelha, então, plantamos culturas
para o tipo de solo que conhecemos e varias vezes perdemos tudo. Não tínhamos orientação
nem uma, mas queríamos produzir. A situação começou a mudar com o projeto da Fundação
Gaia que tinha o incentivo de uma Ong da Alemanha, começamos a produção agroecológica,
aprendemos a fazer as composteiras, arborizar o local e a estudar a questões de educação
ambiental. Todos trabalhamos juntos, homens, mulheres e as crianças, que hoje temos
tanto”, conta a depoente C. ( Diário de Campo, 2018).

De acordo com a depoente C, “desde o início no assentamento Integração Gaúcho,


mulheres são lideranças junto com os homens, mas hoje o papel da mulher é bem mais
massivo nas lideranças, a gente prepara as filhas e filhos para ocupar espaço na sociedade,
para não se acomodar e não se deixar se fazer inferior. Na minha família homens e mulheres
são iguais, a educação se diferença de gênero deve começar dentro da casa da gente. Meus
filhos trabalham nas cooperativas, na lavoura, na casa, fazem cursos e dentro de casa, tanto
o menino quanto a menina”. (Diário de Campo, 2018).

“No tempo de comunidade, ou seja de alternância dos seus cursos normais, os jovens
dentro do movimento participam do processo de produção por meio da sua família, através
das organizações e instâncias internas do movimento, nos níveis de cooperação que a família
participa, pode ser na produção leiteira, arroz, horta, cooperativa de pão, dentre outras.

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Assim, como muitos são inseridos nos processos de organização”, observa, ainda, o depoente
D. (Diário de Campo, 2018).

O assentamento Lanceiros Negros possui sete famílias apenas, motivo pelo qual as
crianças precisam frequentar a escola fora do assentamento. Ocorreu certa rejeição da
sociedade no começo, contudo logo foi superada. O depoente D lembra que “os comerciantes
queriam comprar o arroz do movimento sem a bandeira do mesmo, no início cedemos, mas
depois “trancamos o pé”, e falamos que o arroz só sairá do assentamento com a nossa
bandeira, eles não reclamaram e compram até hoje o nosso produto. Nesse contexto,
ensinamos às nossas crianças a não se deixarem menosprezar, que devem ser fortes e se
impor perante as injustiças, também não temos diferenças de gênero, tanto meninas, quanto
meninos são educados para serem forte e se fazerem ouvir na sociedade” (Diário de Campo,
2018).

“O assentamento de Ivoti tem 20 anos e possui 360 famílias, eu fui assentada com 9
anos, desde o início trabalhei junto com a minha família no lote. No começo minha mãe
cuidava do lote e meu pai trabalhava fora. Na minha família a mulher sempre foi muito
importante e, sempre fez tripla jornada. Hoje eu tenho a minha família, meu marido cuida do
lote, da casa e dos filhos e eu trabalho na cooperativa. Meus filhos ajudam na horta, porém o
meu guri gosta mais do trabalho de fora, do que de dentro de casa, mas todos colaboram com
tudo”, conta a depoente E. (Diário de Campo, 2018).

Quanto ao papel da mulher a depoente E acrescenta ainda, “eu acho que na


agricultura a mulher sempre teve um papel importante, um papel primário, no assentamento
as cooperativa são tocadas por mulheres, elas estão em todos os setores, principalmente no
setor administrativo”. (Diário de Campo, 2018).

Considerações finais

A trabalhadora rural exerce um papel fundamental no desenvolvimento da agricultura,


não somente como auxiliar do trabalho masculino, desempenha inúmeras atividades
resultando em jornadas exaustivas, dentre elas estão: os afazeres domésticos; a criação e

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educação dos filhos; a “ajuda” na lavoura, que constantemente não é valorizada como
produtora de renda, dentre outras. Contudo, a submissão ao marido, o qual, muitas vezes,
inferioriza o seu trabalho e sua capacidade, tornando-a uma simples mão de obra barata,
contexto não observado pela presente pesquisa nos assentamentos da reforma agrária
estudados.

Mães, companheiras,”donas de casa”, educadoras, trabalhadoras, cidadãs e mulheres,


diversos papéis que são atrelados ao gênero feminino. A elas compete diariamente a busca
incessante pelo seu espaço, para poder circular em todos os setores da sociedade sem medo de
ser oprimida, para a sua voz ser ouvida e reconhecida, para se fortalecer na luta, por saber
que carrega dentro de si seus desejos e o mundo a ser descoberto essa é a postura observada
na atuação das mulheres a comunidade dos assentamentos a qual estão inseridas. Elas não
desanimam facilmente, mesmo com lágrimas nos olhos e com as mãos calejadas da labuta
diária, buscam a todo custo a possibilidade da equidade com os homens no movimento, e
mesmo sabendo das dificuldades vão às ruas estufam os pulmões de ar gritam e reivindicam
por seu direitos.

Voz e espaço que deve ser dado para trabalhadora rural, não somente no espaço
familiar, mas nos programas de auxílio à agricultura, ao direito à terra, ao reconhecimento de
seu trabalho. Reforçando que a presença das mulheres é uma fato que deve ser valorizado,
pois mesmo que estejam, ainda, na invisibilidade, não se pode negar seu papel fundamental
para agricultura, pois estão ocupando terras, plantando, colhendo, cultivando, cuidando da
casa, assim como do marido, dos filhos são algumas da atividades realizadas pelas mulheres
do MST identificadas pela presente pesquisa, além disso, também estão na luta pelo desejo e
o direito de usufruir de uma terra livre.

As atividades desempenhadas pelas trabalhadoras do campo não se qualificam como


uma contribuição, mas como parte primordial para sua emancipação, participando das
decisões, não somente aquelas direcionadas para o âmbito familiar, mas aquelas que geram
articulação dentro dos movimentos. A mulher passou a atuar de forma significativa, saindo
das sombras de seu pai, irmão ou companheiro e caminhando lado a lado pela busca da terra,
por educação de qualidade proporcionando a construção da criticidade, por seu direito à
saúde, as políticas públicas, aos programas de auxílio para o desenvolvimento da agricultura

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familiar e pelos seus direitos como mulher promovendo a equidade de gênero por meio da
educação formal e não formal nos assentamentos.

De acordo com o que foi apresentado conclui-se que cabe à sociedade o


reconhecimento do papel desempenhado pela mulher, sendo ela antes de mais nada cidadã,
que almeja igualdade econômica, cultural e social. Mulheres que são mães, companheiras,
trabalhadoras, que merecem respeito e espaço para ter sua autonomia. A partir da própria
percepção de sua importância para a sociedade as mulheres se fortalecem e seguem lutando
pelo reconhecimento de seus direitos tanto no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra, como em outras esferas sociais.

Referências Bibliográficas

MARION, A. A.; BONA, A. N. A importância da mulher na agricultura familiar.


Disponível em: http://www.infocos.org.br/publicacresol/upload/trabalhosfinal/227.pdf Acesso
em: 30 jun.2018

MELO, Lígia Albuquerque de. Injustiças de Gênero: o trabalho da mulher na agricultura


familiar. In: XIII Encontro da Associação Brasileira de Estudos Populacionais. Disponível
em: http://www.spm.gov.br/arquivos-
diversos/.arquivos/integra_estudo_trabalho_mulher_agricola Acesso em: 30 jun. 2018

NOBRE, Miriam. Relações de gênero e agricultura familiar. In: NOBRE, Miriam; et al.
(Orgs.). Gênero e Agricultura Familiar. SOF, São Paulo, 1998.

SCHWENDLER,Sônia Fátima. O processo pedagógico da luta de gênero na luta pela terra: o


desafio de transformar práticas e relações sociais. Educar em Revista, Curitiba, Brasil, n. 55,
p. 87-109, jan./mar. 2015. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/er/n55/0101-4358-er-55-
00087.pdf Acesso em: 02 jul. 2018

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PROCESSOS FORMATIVOS DE PROFESSORAS DE ESCOLA RURAL DO


CAMPO

Juliana da Rosa Ribas/UFSM149


Mariane Bolzan/UFSM150
Gracieli Benz/UFSM151

Resumo

O artigo constitui-se no recorte dos resultados de uma pesquisa envolvendo a história de vida de três
professoras que atuam em escola rural do campo, com o objetivo de buscar uma aproximação com a
história de vida dessas professoras e estar compreendendo o ser professor. A pesquisa está ancorada
em uma metodologia qualitativa, com base nos estudos de Bogdan; Biklen(1994), com ênfase nas
narrativas (auto)biográficas. Tiveram como aporte teórico os estudos de Abrahão (2006), Antunes
(2011), Antunes; Ribas (2015), Josso( 2004), Nóvoa (1992,1995,2004), Souza (2006); Tardif (2002).
A pesquisa oportunizou compreender que por meio da história de vida e a própria trajetória, esta se
apresenta como um importante instrumento na formação de professores, pelo fato de que ao
rememorar fatos e acontecimentos, esses podem ser refletidos com base em teorias permearam uma
reflexão sobre a própria prática e no ser professore em meio aos desafios na escola rural do campo.

Palavras-chave: formação de professores; escola rural do campo; história de vida.

Introdução

Este artigo constitui-se na análise de resultados feito a partir da história de vida de três
professoras que atuam em escolas rural do campo, localizadas no interior do município de
Santa Maria/RS e Restinga Seca/RS. Em decorrência das várias discussões e projetos
desenvolvidos pelo Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Formação Inicial, Continuada e
Alfabetização (GEPFICA) envolvendo a formação de professores que atuam em escolas rural
do campo, é que este estudo foi elaborado com objetivo de buscar uma aproximação com a
história de vida de ambas professoras com o intuito de perceber, através da memória, ao
escolha profissional, os processos formativos e o pertencimento, e assim estar compreendendo
o desvelamento do ser professor.

149
Universidade Federal de Santa Maria/RS. julianaribped@yahoo.com.br
150
Universidade Federal de Santa Maria/RS. marianebolzan@yahoo.com.br
151
Universidade Federal de Santa Maria/RS graciellibenz@hotmail.com

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Esta pesquisa fundamentou-se nos estudos de Abrahão (2006), Antunes (2011),


Antunes; Ribas (2015), Josso( 2004), Nóvoa (1992,1995,2004), Souza (2006); Tardif (2002),
entre outros que contribuíram para as reflexões propostas nesta pesquisa.
Este estudo é de abordagem qualitativa baseada nos estudos realizados por Bogdan;
Biklen (1994) e foi realizado por meio de entrevistas narrativas (auto) biográficas, com três
professoras que atuam em escolas rurais do campo.

Narrativas de vida como recurso metodologico

Entende-se, que ao estar trabalhando com a metodologia História de Vida por meio das
narrativas (auto) biográficas, você se depara com um universo sensível, que permite
aproximações, (re)-significações, interpretações. Para Souza (2006), ao desenvolver uma
pesquisa por meio da história de vida as relações entre a história de vida do professor e a
história de vida do pesquisador confrontam-se, negam-se, confirmam-se, convergem-se, é
apenas uma troca de experiência que dará vida e credibilidade à pesquisa educacional.
Para Abrahão (2006), a narrativa em pesquisa (auto) biográfica representa um
momento entre o colaborador e o pesquisador com maior proximidade, uma vez que quando o
colaborador da pesquisa conta sua vida ele não está relatando para um gravador, mas está re-
elaborando, re-significando sua história através da interação entre ambos. Entende-se que
trabalhar com narrativa de vida, as pessoas ao estarem rememorando, conseguem dar outro
significado, um novo sentido para a sua vida.
Desse modo, entende-se que as pesquisas envolvendo a história de vida tem dado várias
possibilidades de pesquisas no campo da formação inicial e continuada de professores.
Abrahão (2006, p.163) relata que a história das pessoas é algo tão rico e ao mesmo tempo
tão pouco valorizado, que, quando menos damos conta verificamos que a vida não é um
acaso. Somos produto de uma história. Ainda conforme Abrahão (2006, p.164) as narrativas
formam um rico material de trabalho, condicionadas pelos marcos sociais. Pois se entende que
o professor ao ter a oportunidade de resgatar momentos importantes de sua vida, de sua
trajetória quanto professor, pode redescobrir novos significados para o passado, trazendo-os
para o presente e ressignificando-os.
Ao desenvolver essa pesquisa buscou-se manter um olhar atento e cuidadoso para as

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colaboradoras, atentando a atenção a cada fala, gesto, a cada silêncio, a cada olhar, onde por
meio das narrativas (auto) biográficas docentes dessas três professoras, foi oportunizado dar
voz a elas com o intuito para que compreendessem os sentidos que atribuem a profissão e ao
serem professoras em meio as escolas rural do campo.
Ainda conforme Nóvoa (2004, p. 27), “mais do que o passado as histórias de vida
pensam o futuro”. Antunes (2011) corrobora com a ideia quando afirma a necessidade de
haver certo rigor metodológico que seja adequado quando se deseja conhecer a história de
vida de um ser humano, neste caso, uma professora, já que, segundo Nóvoa (1992), torna-se
necessário compreender que o eu profissional não se desarticula do eu pessoal, pois as
práticas pedagógicas são reflexos das lembranças de sua formação. Isso percebe-se
claramente nos relatos das colaboradoras da pesquisa, onde a sua essência é sempre
preservada, pois ninguém consegue ser professor sem antes ser pessoa, e o que somos não
conseguimos deixar mascarado.
Nessa perspectiva, entende-se que, na história de vida de um professor, marcada
fortemente pela subjetividade, o coletivo faz-se presente de certa forma. Mesmo o professor
sendo uma pessoa, com características próprias e individuais, as suas relações sociais
transformam a sua história na história dos outros e a história dos outros dentro da sua própria
história, em forma de troca.

Trajetórias de vida e formação de professoras de escola rural do campo

Os motivos que levam o professor a exercer a docência em meio as escolas rural do


campo, tem nos questionado devido aos desafios que isso implica. E por isso o professor se
sente pertencente a este contexto sócio-cultural. Além disso, Nóvoa, (1995.p.16), nos instiga a
refletir:

Como é que cada um se tornou no professor que é hoje? E porque? De que forma a
ação pedagógica é influenciada pelas características pessoais e pelo percurso de vida
profissional de cada professor? As respostas levarnos-iam longe demais. Mas talvez
valha a pena mencionar brevemente os três AAA que sustentam o processo
identitário dos professores: A de Adesão, A de Ação e A de Autoconsciência.

Entende-se que ao falar na trajetória formativa de um professor é preciso olhar para seu

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processo identitário, assim compreender o processo identitário das colaboradoras por meio de
suas narrativas (auto) biográficas, se fez importante:

Quando eu era pequena, não pensava em ser professora. Queria cuidar de animais,
ou seja, queria ser veterinária. Mas meu pai me “obrigou” a fazer magistério.
Confesso que no início foi angustiante, mas quando comecei a ter acesso a prática,
ali direto com as crianças, alguma coisa começou a mudar meu modo de me ver
como professora, coisa que até então, não me via. Como nós morávamos “pra fora”,
meus pais tinham certeza que eu seria professora. Talvez porque não deixariam eu
sair para estudar e curso de Pedagogia tinha na minha cidade. Eles sempre me
apoiaram e torceram por mim. ( Entrevista Narrativa, Professora S).

Eu nunca pensei em ser professora, nunca tive esse sonho quando criança.
Eu tinha colegas que sempre sonhavam em ser professoras. Eu não sabia o que eu
queria. Terminei o ensino médio e fiquei um ano parada e fui trabalhar de balconista
em uma padaria. Eles sempre me incentivaram e eu fui fazer o magistério em Júlio
de Castilhos, três anos e meio, três anos de aula e meio de estágio. No estágio eu
senti dificuldade , e até maio não conseguia dominar a turma, e eles diziam que o dia
que viesse as profes avaliar eles iam incomodar, não vamos te deixar dar aula.
Porque era uma troca de estagiarias e a professora da turma nunca me auxiliou, ela
não ficava na escola, ela ia para a casa dela. Eu não tinha nem noção de quem eram
os meus alunos, não conhecia a família, a realidade deles. Depois que eu comecei a
conhecer eles tudo melhorou e em julho no final do estágio eles não queriam que eu
saísse. Foi uma experiência muito boa, eu percebi o quão importante é a gente
conhecer nossos alunos, como é as famílias deles, como eles vivem para depois tu
saber o que tu vai trabalhar com eles na sala de aula. Eles queriam que eu ficasse
como profe eu consegui conquistar eles, mas não foi fácil. ( Entrevista Narrativa,
Professora E).

Dessa forma, conforme Moita (2000), ao compreender como cada pessoa se formou se
encontra as relações que se estabelecem com as pluralidades que atravessam a vida. Pois
conforme as narrativas das professoras abaixo, ninguém se forma no vazio, a formação
acontece por meio da troca, da experiência, das interações de uns com os outros.

Terminei o magistério e fiquei seis anos, arrumei outro emprego em uma loja de
roupas e depois para a padaria trabalhar mais um pouco e em 2000 eu passei no
concurso do estado em segundo lugar. Eu tinha 29 anos. No inicio da profissão a
gente sofre muito, são muitos desafios, dá um desespero, mas com os tropeços a
gente vai aprendendo, a gente aprende muito com os outros , com a troca de
experiência , a gente aprende com o passar do tempo e com os erros. (Entrevista
Narrativa, Professora E)

Fui aprovada no concurso para o magistério em 2001. Em 2002 fui nomeada para
dar aula numa turma de 1º ano, em São João do Polêsine. Ótima escola. No início
me apavorei, pois nunca tinha tido qualquer experiência com alfabetização.
Confesso que achei que não teria condições para trabalhar com alunos tão
dependentes. Mas a cada aula, novas ideias íam surgindo e a energia que eles
sugavam de mim, ao mesmo tempo me impulsionava para o próximo dia. Quando

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comecei a presenciar os “estalos” na leitura, achei a coisa mais fantástica que já


tinha visto. Lembro como se fosse hoje, tinha uma aluna chamada Tatieli que não
tinha jeito de fazer ler. Já tinha tentado de tudo. E como num passe de mágica, ela
saiu da aula num dia sem saber ler e voltou no outro, lendo tudo. Fiquei encantada.
(Entrevista Narrativa, Professora S.).

Percebe-se através das narrativas das professoras, que o caminho da docência é cheio de
desafios, incertezas, medos, mas vejo esses desafios como uma locomotiva, que no decorrer
do andarilhar por entre esses percursos formativos, elas vão se constituindo, esse ser professor
vai ganhando corpo e forma, força e vitalidade, e vai descobrindo que em meio a tantos
percalços a docência encanta e nos constrói por meio de todas as experiências que demarcam
a minha, a sua, a nossa história de vida.
Corrobora-se com Nóvoa (1995), ao falar que a reflexão sobre nossa história de vida
educativa, como espaço de construção de conhecimentos pela via da pesquisa, serve para
provocar a preocupação com uma atuação eficaz através do desenvolvimento de um trabalho
pedagógico que esteja comprometido com a formação de profissionais mais críticos e
reflexivos para intervir no meio em que se inserem.
Sobre as memórias de sua formação inicial, a professora F. conta que após concluir os
estudos no Ensino Fundamental, fez o Magistério na Escola Olavo Bilac, onde no final de
1996 concluiu o curso. Ela conta com carinho e emoção todos os passos de sua formação
inicial, desde a entrada nos cursos até a conclusão dos mesmos e apesar das dificuldades
manteve-se forte na conquista do seu objetivo. Segundo ela, “o início de 1996, fiz concurso
para lecionar no município de Restinga Sêca e para ingressar na UFSM. Passei nos dois e
então começaram os desafios. Estudar e trabalhar, choque de horários, distancia entre o local
do trabalho e o local do estudo”. (Professora F. Entrevista Narrativa).
O resgate dessas memórias propicia um contexto de produção que instiga cada futuro
professor em formação a viver e reviver seu percurso. Ao estar revivendo a trajetória escolar e
refletir sobre a escolha de sua profissão consolidam-se numa experiência importante para
ressignificar experiências escolares e refletir sobre as aprendizagens e suas condições de
produção frente a prática pedagógica.. Assim, conforme relato da professora ela tornou-se
mais forte perante as adversidades que surgiram em seu caminho pois tinha um único
propósito: o de tornar-se professora.

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O desejo por ser professora deu-se desde muito pequena, pois “brincava de dar aula
nos galpões, onde fazíamos sala de aula e usávamos carvão para escrever. As paredes eram
quadros e ensinávamos os vizinhos e amigos com quem brincávamos”. (Entrevista Narrativa
Professora F). Novamente, percebe-se o encantamento que ela já tinha pela docência, pois
mesmo com tanta simplicidade, sua vontade foi maior e venceu todos os desafios que
surgiram ao longo do seu percurso de vida.
Percebe-se que ser professor hoje requer muito mais do que ser um profissional
respaldado no conhecimento do conteúdo e da prática docente. O gosto e o desejo por ensinar
e a descoberta por isso acontece logo que desperta para sua autoformação. Ser professor é
antes de tudo, uma opção nem sempre fundada em aspectos objetivos. As questões subjetivas
que permeiam as escolhas nem sempre estão presentes em nossas justificativas conscientes.
Para Josso, “[...] o que faz a experiência formadora é uma aprendizagem que articula,
hierarquicamente, saber-fazer e conhecimentos, funcionalidades e significação, técnicas e
valores num espaço-tempo que oferece a cada um a oportunidade de uma presença de si e
para a situação pela mobilização de uma pluralidade de registros [...]” (2004, p. 28)
Ainda conforme Pimenta (1999, p. 29-30) “formação é, na verdade, auto formação e
pensar a formação do professor‟ inclui um projeto único, desde a formação inicial até a
continuada”. Acredita-se que para que haja uma transformação nas ações educacionais
voltadas para o meio rural faz-se necessário formar profissionais com uma visão ampla do
fenômeno educativo, que favoreça a percepção das relações de poder e dos jogos de interesses
presentes na sociedade capitalista, que produz as desigualdades para a manutenção dos seus
privilégios. Para tanto, é imprescindível o engajamento político desses profissionais na luta
cotidiana por uma educação que respeite a singularidade do povo brasileiro, em especial, os
costumes e a cultura da população do campo, auxiliando-os no processo de afirmação de sua
identidade e desenvolvimento de suas potencialidades.
O período de formação inicial na vida de um profissional se constitui como um
período de grandes descobertas, desafios, aprendizagens e também emoções, onde diversos
sentimentos vem a tona. Segundo Josso (2004, p. 379)

Torna-se possível desvendar modelos e princípios que estruturam discursos


pedagógicos que compõem o agir e o pensar de professoras/es em formação. Isto
porque o ato de lembrar – narrar possibilita ao autor reconstruir experiências,

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refletindo sobre dispositivos formativos e cria espaço para uma compreensão da sua
própria prática.

A experiência é algo em que podemos dizer aos outro o que fizemos, e tudo aquilo que
aprendemos. Sobre o conceito de experiência, Larrosa (2002) revela que a experiência seria
aquilo que nos passa. Não o que passa, senão o que nos passa. Um saber finito ligado ao
amadurecimento de um indivíduo particular, saber que revela o homem singular e sua própria
finitude; um saber particular subjetivo, relativo, pessoal. Ninguém pode evitar a experiência.
Ninguém pode aprender da experiência de outrem a menos que essa seja de algum modo
vivida; um saber que não se pode separar do indivíduo concreto no qual se encarna.
Uma identidade profissional se constrói a partir da significação social da profissão, da
revisão constante dos significados sociais da profissão e da revisão das tradições. Ela se
constrói também através do significado que cada professor, enquanto ator ou autor, confere à
atividade docente no seu cotidiano a partir de seus valores, de seu modo de situar-se no
mundo, de sua história de vida, de suas representações, de seus saberes, de suas angústias e
anseios, do sentido que tem em sua vida o ser professor (PIMENTA, 1999).
No ano de 2014, a professora F fez curso de especialização em Alfabetização e sempre
procura fazer cursos e formações “para buscar novas técnicas que facilitem o processo de
aprendizagem dos alunos”. (Professora F, Entrevista Narrativa). A professora F já passou por
todas as turmas dos anos iniciais, porém desde 2006 está trabalhando apenas com turmas de
1° ano, pelas “quais tenho um carinho muito grande”. (Entrevista Narrativa, Professora F).
As professoras Soraia e Eliane, ambas participam de cursos de formação oferecidos
pela Secretaria de Educação, mas como atuam em turmas multisseriadas, contexto diferente
da Professora F, revelam que “nunca tivemos formação especifica para atuar em turmas
multisseriadas, aprendemos na troca com outros professores, através de nossa experiência”
(Entrevista Narrativa, Professoras S e E).
Percebe-se que embora não exista formação para atuar em meio ao contexto das
escolas rural do campo, essas três professoras se constroem professoras por meio da
experiência formadora, no dia-a-dia, durante suas praticas pedagógicas.
Josso (2004) caracteriza a “experiência formadora” como um conceito em construção,
porque consiste na narração dos “processos de formação, de conhecimento e de aprendizagem
do ponto de vista dos adultos aprendentes a partir das suas experiências formadoras” (p. 34),
porque nasce da capacidade, do investimento do ator falar e escrever sobre si, sobre sua

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história, estabelecendo sentido ao que foi e é vivido através dos significados particulares e
coletivos.
Apoia-se em SCHÖN (1992), quando este afirma que a prática docente deve envolver
o conhecimento na ação, a reflexão na ação e a reflexão sobre a ação, o que conduz o
professor a repensar sua memória docente, seus percursos de formação e a sua trajetória nos
ciclo de vida pessoal e profissional, para que chegue à compreensão de que está produzindo
sua vida e sua profissão.
Os saberes docentes podem emergir do fazer do dia-a-dia na sala de aula, da
experiência que é adquiridas ao longo da trajetória enquanto professoras. De acordo com
Tardif (2002, p. 58), estes são: [...] os saberes mobilizados e empregados na prática cotidiana,
saberes esses que dela provêm, de uma maneira ou de outra, e servem para resolver os
problemas dos professores em exercício, dando sentido às situações de trabalho que lhes são
próprias.
Sobre o inicio de seus processos formativos, professora F afirma que “desde a 8° série
começou a fazer cursos voltados a Educação, tamanho era o gosto que tinha”. Os seus
primeiros alunos conforme ela fala eram “muito simples e carentes, mas muito empenhados e
amáveis”(Professora F, entrevista narrativa).
Sobre os desafios da atualidade para lecionar, a professora afirma que:

A cada ano novos desafios surgem e este ano novamente estou com duas turmas
juntas, o que requer mais empenho ainda, devido a grande diversidade. Continuamos
na busca pelo melhor, diante tamanho descaso pela educação. (Professora F,
entrevista narrativa)

A fala da professora F, de trabalhar com duas turmas juntas, ou seja, dentro de um


contexto multisseriado, se assemelham aos desafios do trabalho docente enfrentados pelas
professoras E e S. Para a professora S, o desafio em trabalhar com turmas multisseriadas está
“em como planejar e dar os conteúdos”, na fala da professora E “ no início você fica perdida,
não sabe como vai trabalhar, trabalhava individualizado, cada coisa para cada série”. “ Com o
tempo você percebe que consegue trabalhar integrado, e contemplar a tamanha diversidade
das turmas multisseriadas, mas isso eu aprendi tudo por meio da experiência, como o passar
dos anos da minha prática”( Entrevista Narrativa, Professoras S e E).

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Para Antunes; Ribas (2015), o trabalho em meio às turmas multisseriadas é um grande


desafio, e algo imprescindível é formação para se atuar nesse contexto. Para as referidas
autoras, essa formação é vista como uma importante ferramenta na construção da educação
seja no sentido de manter o que está posto como pronto e acabado ou no sentido de romper e
contribuir com uma educação voltada para a emancipação crítica dos sujeitos.
Sobre o sentimento de desencanto da profissão, HUBERMAN (1992) contribui para
buscar entender as razões que fazem com que muitos professores, ainda jovens, revelem seu
desencanto com a profissão e busquem abandoná-la; por que distintos professores com o
mesmo tempo de profissão têm atitudes e posicionamentos tão diferentes, enquanto uns
revelam-se entusiastas e envolvidos com seu trabalho, outros revelam desconforto e amargor.
As explicações do autor parecem interessantes para o estabelecimento de algumas relações
entre significações sociais imaginárias instituídas e/ou instituintes, na medida em que a
construção de novos significados tem a ver com o conjunto de experiências que os indivíduos
vieram acumulando ao longo de seu ciclo de vida e de profissão.
Os relatos das professoras possibilitaram entender não apenas como deve ser a
formação do(a) professor(a), mas, principalmente o que esse profissional pensa sobre si
mesmo e somente compreendo-o profundamente é que as propostas educacionais poderão
obter êxito. Quando se dá a chance ao professor de contar suas angústias e suas crenças é que
se pode melhor averiguar a dinâmica o movimento da educação formal.
Esses excertos atrelados às falas de estudiosos da área, nos fazem perceber que as
memórias da prática docente das professoras F, S e E, apontam para a idéia de encantamento
com a profissão desempenhada por elas, mesmo com os desafios e pelo descaso da educação
brasileira, onde a experiência formadora é a mola propulsora para o andarilhar da profissão.
As professoras buscam aliar a teoria com a prática, para dessa forma, desempenhar um papel
de autonomia em sala de aula, buscando metodologias diferenciadas que possam atender as
demandas que tem em sala, visto que encontram diversas realidades em um único espaço e é
preciso estar preparado para atendê-los.

Algumas Considerações

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Percebe-se que as pesquisas que se utilizam da história de vida além de trazer


retornos, é de grande relevância no que se refere ao trabalho com professores. Entende-se, que
ao estar optando por trabalhar com as memórias das professoras, há aproximação, de uma
forma mais aberta que propicia um compartilhar de experiências. Isso certamente enriquece
pesquisador e colaborador.
Acredita-se que a reflexão pode ajudar na transformação que se almeja e que se é
capaz de fazer, pois, entende-se que uma prática reflexiva proporciona aos educadores o seu
desenvolvimento tanto pessoal como profissional, tornando-os profissionais mais
responsáveis e sujeitos de sua identidade e profissionais da educação.
Desse modo, compreender a história de vida e a própria trajetória apresenta-se como
um importante instrumento na formação de professores, pelo fato de que ao rememorar fatos e
acontecimentos, esses podem ser refletidos com base em teorias que enfocam como, por
exemplo, o papel do professor. Isto poderá desencadear escolhas quanto a atuação futura do
professor, o que de fato, aconteceu com a colaboradora da pesquisa. A professora vivenciou
certas situações em sua escolarização e poderá buscar meios de não reproduzi-las, ou
preservá-las em situações da prática pedagógica.
Considera-se que na formação do professor existem momentos que podem aliar
saberes da experiência, que permitam a construção de novos significados ao fazer
profissional, isto é, que permita a formação de um professor consciente e responsável diante
dos desafios atuais.
A pesquisa nos remete a pensar na importância de conhecer e refletir sobre as
memórias e histórias das professoras, pois cada um de nós constrói e significa a própria vida e
trabalho de modo subjetivo e distinto. E isso pode ser refletido na maneira como lidamos com
nossa profissão, como tratamos nossa área de conhecimento e estudos, nossos alunos.

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DESAFIOS E ESTRATÉGIAS PARA A GESTÃO DA ESCOLA DO CAMPO

Elaine Libardi Andreatta152


Cauana Peyrot Conceição153
Pedro Valdir da Conceição154

Resumo

O presente artigo aborda questões referentes aos desafios e estratégias da gestão escolar nas
escolas do campo, discutindo a efetivação de um processo de gestão democrática e os
elementos necessários a serem considerados em tal processo, visando à constituição da
democratização desta escola. Para tanto, discutem-se os princípios que regem a escola do
campo relacionando-os à postura do gestor nesse espaço, através de suas estratégias criadas
por inúmeros desafios para a efetivação do papel social no espaço que ocupa. Conclui-se,
dentre outros fatores, que o trabalho coletivo nas escolas do campo é possível, fundamental e
os resultados são exitosos quando todos participam das decisões e aprendem a exercer a
democracia dentro e fora da escola.

Palavras-chave:escola do campo; gestão escolar; educação; estratégias.

Introdução

É no âmbito da gestão que algumas estratégias começam a tomar corpo elaborando


suas propostas ou ainda, captando a iniciativa da equipe gestora, às quais serão assumidas
pelo todo da escola, em busca de bons resultados. Assim, a gestão escolar ainda é um campo
de estudo e de discussão, pois absorve a dinamicidade do mundo contemporâneo e nele, ainda
está presente a escola do campo que ora se apresenta e precisa ter novas posturas diante dos
novos desafios.
Nesse sentido também entendemos que o mundo educacional se abre para a discussão
de gestão, uma vez que essa palavra não substitui administração pois, no ensino público, a
ideia de gestão educacional desenvolve-se associada a outras ideias fundamentais em

152
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)- elainelibardiandreatta@hotmail.com
153
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)- cauanapc@hotmail.com
154
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)- dile.joia@hotmail.com
.

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educação, ou seja, à sua dimensão política e social, de educação para transformação,


participação e cidadania.
Muitos estudos apontam para a discussão da gestão escolar como forma de resolver
diversos problemas da educação. No entanto, sabemos que a educação, de forma geral, apesar
de perpassar por dificuldades de gestão, enfrenta diferentes desafios no processo de ensino-
aprendizagem dos educandos. Em vista disto, faz-se necessário a reconstrução e qualificação
do currículo das escolas do campo, a partir das realidades locais e regionais, construindo
novos tempos e espaços do processo educativo, com a participação dos sujeitos sociais do
campo, dialogando com as populações ali inseridas.
Assim, esse estudo trata de discutir como a escola do campo organiza-se e quais os
princípios que devem ser considerados para a gestão nesse espaço, além de discutir
possibilidades de trabalho e consolidação de uma gestão democrática e participativa.

POR UMA GESTÃO DEMOCRÁTICA NA ESCOLA DO CAMPO

No contexto de uma sociedade que se democratiza e se transforma diante das novas


demandas que surgem, promover a gestão democrática das escolas requer o reconhecimento
que se deu pelos grupos que compõe o coletivo dessa escola. Então podemos afirmar que a
Educação do Campo, é um movimento da sociedade pela educação pública. Isso, além de
reforçar o caráter democrático da conquista, reafirma uma concepção de educação, que pode
ser sintetizada por Roseli Caldart: “A Educação do Campo não cabe em uma escola, mas a
luta pela escola tem sido um de seus traços principais (...)” (CALDART, 2004, p.156).
A gestão democrática está relacionada à participação de educandos, educadores e
comunidades de onde os educandos são oriundos, considerando que muitas escolas do campo
atendem a um coletivo de comunidades. A participação e as práticas realizadas a partir delas
se farão inerentes às características dos sujeitos sociais e indica pressupostos de gestão
democrática na construção do espaço institucional da educação do campo. Por isso,
a construção da escola democrática constitui, assim, um projeto que não é sequer
pensável sem a participação ativa de professores e de alunos, mas cuja realização
pressupõe a participação democrática de outro setores e o exercício da cidadania
crítica de outros atores, não sendo, portanto, obra que possa ser edificada sem ser em
co-construção. (LIMA, 2002, p. 42)

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Assim, a identidade da escola do campo é definida a partir de sujeitos sociais a quem


se destina: agricultores familiares, assalariados, assentados, reassentados, ribeirinhos,
indígenas, remanescentes de quilombos, enfim, todos os povos do campo brasileiro. Essa
concepção está expressa no parecer das Diretrizes e tem sua identidade definida no artigo 2º,
parágrafo único das Diretrizes Operacionais para Educação Básica nas Escolas do Campo, ao
afirmar que:

A identidade da escola do campo é definida pela sua vinculação as questões


inerentes a sua realidade, ancorando-se na temporalidade e saberes próprios dos
estudantes, na memória coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciências e
tecnologia disponível na sociedade e nos movimentos sociais em defesa de projetos
que associem as soluções exigidas por essas questões à qualidade social da vida
coletiva do país. (MEC, 2004, p. 41).

A identidade da Educação do Campo definida pelos seus sujeitos sociais deve estar
vinculada a uma cultura que se dá por meio de relações mediadas pela produção social e
cultural da existência humana.
Em vista isso, a Escola Estadual de Ensino fundamental Dr Edmar Kruel, situada no
município de Jóia RS, possui em sua base curricular, dos anos finais do ensino fundamental, a
disciplina de agroecologia. Esta tem como objetivo geral possibilitar ao educando a
compreensão das modificações dos meios de produção e dos recursos naturais juntamente
com a leitura crítica do meio onde ele está inserido, contribuindo para sua formação como ser
social e participante ativo, proporcionando-lhes maior autonomia e melhor qualificação e
incentivando a sua permanência no campo, possibilitando assim, a sucessão rural.
Dessa forma, em aulas semanais, de turno inverso, os alunos trabalham conhecimentos
teóricos e práticos, tendo como foco principal a Gestão da UPF (Unidade de Produção
Familiar), além de temas voltados a Segurança Alimentar e Nutricional, com o fluxograma
alimentar da propriedade agrícola da família e foco para o manejo do solo, de resíduos
sólidos e água, pomar, plantas bioativas ( medicinais, condimentares e aromáticas),
agroflorestal, sementes crioulas, melhoramentos dos arredores da propriedade e ajardinamento
além de horta agroecológica, inter-relacionando esses temas às áreas do conhecimento,
propiciando assim o trabalho interdisciplinar e efetivando essas práticas junto às famílias.
Dessa forma, faz-se necessário, a compreensão e leitura da realidade micro, de âmbito
local e macro abrangendo um espaço mais amplo, articulada a compreensão da gestão social,
ambiental, econômica de políticas públicas e de segurança alimentar. A escola tem como foco

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a caminhada transversal, na qual os educandos e educadores com apoio técnico da


EMATER/Ascar (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural e Associação de Crédito
e Assistência Rural) analisam a gestão dos recursos naturais, gestão econômica e
planejamento analisando os fatores que interferem e os fatores que interagem no resultado
econômico anual da propriedade rural, gestão de mercado, gestão do trabalho e gestão dos
recursos humanos analisando as atividades que geram renda e as que agregam renda na
unidade de produção familiar que cada educando pertence.
Os educandos com educadores, equipe gestora e equipe da EMATER,também
planejam o Encontro de Segurança Alimentar, o qual ocorre anualmente, em comemoração ao
Dia Mundial da Alimentação. Realizam-se no decorrer do ano letivo, visitas técnicas às
propriedades de agricultores do município e região e viagem de estudos que visam analisar e
compreender a viabilidade da pequena propriedade onde se prioriza a diversificação de
culturas, a agroindústria familiar e a produção para o auto sustento. Ao final do ano letivo os
educandos apresentam para toda a comunidade escolar e local, um trabalho de conclusão de
curso, onde explanam sobre temas estudados no decorrer do ano, além de elaborarem o seu
projeto de vida e junto com a família pontuarem as fortalezas e oportunidades bem como
fraquezas e ameaças percebidas na unidade produtiva familiar.
Dessa forma, percebe-se que as famílias passam a dialogar com os jovens e com a
escola e a mudar algumas práticas recorrentes, começam a valorizar e colocar em prática o
aprendizado que seus filhos levam da escola para a propriedade, qualificando assim as
atividades ali desenvolvidas agregando conhecimentos potencializadores que possibilitem
novos modelos de agricultura com uso de tecnologia, aumento da produçãoe preservação do
meio ambiente. Constata- se também as relações de trabalho e de vida a partir de estratégias
solidárias, que garantam a melhoria da qualidade de vida dos que vivem e sobrevivem no e do
campo.
Nos últimos tempos, a denominação “do campo” vem se expandindo para demarcar o
papel dos sujeitos e a importância da educação na sua formação e no seu desenvolvimento.
Ela carrega consigo um conjunto de conhecimentos e práticas que instigam as políticas
públicas a compreenderem o campo como um espaço emancipatório, como um território
fecundo de construção da democracia e da solidariedade, ao transformar-se no lugar não

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apenas das lutas pelo direito a terra, mas também pelo direito à educação, à saúde, à
organização da produção, pela soberania alimentar, pela preservação das águas, entre outros.
Essas lutas acabaram por colocar em pauta novas políticas culturais, econômicas e
ambientais e, sobretudo, políticas educacionais para o país. Em vista disso, foi construído
coletivamente umCaderno de subsídios onde constam as referências para uma Política
Nacional de Educação do Campo O princípio pedagógico que se refere ao papel da escola
enquanto formadora de sujeitos articulada a um projeto de emancipação humana,
compreendeque os sujeitos possuem sua história, sonham, têm raças e etnias diferenciadas.
Conforme o caderno de subsídios- Referências para uma Política Nacional de Educação do
Campo.

A formação humana é todo o processo educativo que possibilita ao sujeito


constituir-se enquanto ser social responsável e livre, capaz de refletir sobre
sua atividade, capaz de ver e corrigir os erros , capaz de cooperar e de
relacionar-se eticamente porque não desaparece nas suas relações com o
outro. (MEC, 2004 p.37).

O princípio que se refere à valorização dos diferentes saberes no processo


educativo se faz presente através da pesquisa epistemológica e valoriza os
conhecimentos que os pais, a comunidade e os alunos possuem, e resgata-os na sala de
aula num diálogo permanente com os saberes produzidos nas diferentes áreas do
conhecimento.
Podemos dizer que alguns dos elementos que perpassam pelo currículo da escola
são: a terra, o meio ambiente e sua relação com o cosmo, a democracia, a resistência e a
renovação das lutas e dos espaços físicos, assim como as questões sociais, políticas,
culturais, econômicas, científicas e tecnológicas, e estas, transformam-se em projetos a
serem trabalhados em sala de aula.
No que se refere aos espaços e tempos de formação dos sujeitos da aprendizagem,
o princípio aponta para o fato de que educação do campo ocorre tanto em espaços
escolares como fora deles. A sala de aula é um espaço específico de sistematização,
análise e de síntese das aprendizagens constituindo-se assim, num local de encontro das
diferenças, pois são nelas que se produzem novas formas de ver, estar e se relacionar
com o mundo. Baseados nisso é que o princípio do lugar da escola vinculado à realidade
dos sujeitos fica clara, pois a educação do campo significa pensar em uma escola

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sustentada no enriquecimento das experiências, mas em nome de uma reconstrução dos


modos de vida, pautada na ética da valorização humana e no respeito às diferenças. Uma
escola que proporcione aos seus alunos condições de optarem, como cidadãos e cidadãs,
sobre o lugar onde desejam viver. Isso significa, em última análise, inverter a lógica de
que apenas se estuda para sair do campo.
Em vista disso, a escola em foco, representa o compromisso em retomar o respeito
à identidade, de valorizar a cultura da população do campo e do saber popular articulado
ao saber científico, a fim de promover o vínculo mais profundo entre a pesquisa e a
produção do conhecimento, com o processo de construção de um projeto alternativo de
desenvolvimento do campo e da cidade, que viabilize a produção ecológica de alimentos
de forma articulada com as demandas da agricultura familiar, conforme a Política
Estadual de Educação do Campo do Estado do Rio Grande do Sul.
A discussão acerca da gestão da educação do campo apresenta-se, no contexto
estadual, a partir de várias concepções, além de cenários complexos, articulados aos diferentes
sistemas de ensino. Nesse sentido, o entendimento de tais concepções e cenários faz-se
importante para que sejam estabelecidas proposições de ações, programas e estratégias de
gestão a fim de oferecer um ensino de qualidade aos educandos.

O campo é lugar de vida, onde as pessoas podem morar, trabalhar, estudar


com dignidade de quem tem o seu lugar, sua identidade cultural. O campo não
é só lugar da produção agropecuária e agroindustrial, do latifúndio e da
grilagem de terras. O campo é espaço e território dos camponeses e dos
quilombolas. É no campo que estão as florestas, onde vivem as diversas
nações indígenas. Por tudo isso, o campo é lugar de vida e sobretudo de
educação. (FERNANDES, CERIOLI e CALDART, 2004, p.23).

Assim, à medida que a escola inclui a comunidade em seu processo de gestão, é capaz
de tornar-se centro ativo dessa, à qual passará a confiar na ação educativa, vendo a escola
como o lugar em que poderá discutir seus problemas, buscar apoio e oportunidade para sua
solução. É por isso que uma gestão democrática e participativa implica em tomada de
decisões estratégicas, buscando um sistema de gestão de qualidade.
Neste contexto, podemos afirmar que as escolas do campo do Estado do Rio Grande
do Sul vêm, gradativamente, traçando metas para qualificar o ensino e a aprendizagem dos
educandos, além de promover a inclusão social e o desenvolvimento social, econômico e
cultural das comunidades ali inseridas, pois o campo “é mais que um perímetro não-urbano, é

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um campo de possibilidades que dinamizam a ligação dos seres com a própria produção das
condições de existência social e com as realizações da sociedade humana” (Resolução
CNE/CEB 1/2002). Portanto, é lugar de vida, de trabalho, de lazer, de produção econômica,
cultural e de conhecimentos.
A educação do campo proposta por essa instituição de ensino, pensada desde sua
particularidade, articulada ao universal, passa a construir um novo paradigma que tem seu
início voltado para a construção de um projeto de educação, articulado com o projeto de
desenvolvimento do campo. Projeto este, construído com e não para os sujeitos do campo,
educação comprometida como formação humana que tem o campo como espaço de trabalho,
de produção de saberes, de cultura e de vida.
Neste sentido, Paulo Freire corrobora para a nossa discussão afirmando que “Então o
camponês descobre que, tendo sido capaz de transformar a terra, ele é capaz também de
transformar a cultura, renasce não mais como objeto dela, mas também como sujeito da
história”.
Assim, entender quais são os desafios para a gestão democrática no espaço das escolas
do campo, bem como propor uma gestão estratégica que confira legitimidade ao gestor no
exercício de sua função é fundamental para alcançar uma educação de qualidade e, ao mesmo
tempo, transformadora. Tal legitimidade poderia ser alcançada pela oportunidade de tomada
de decisões que é apresentada ao gestor. Para Kazmier, (1975 apud GONÇALVES E
CARMO, 2001, p. 39),

(...) a habilidade em tomar decisões é a chave para o planejamento bem sucedido


em todos os níveis da gestão. Isto envolve mais que uma simples seleção de planos
de ação que assume pelo menos três fases: diagnóstico; descobertas de alternativas e
análises.

Não só a tomada de decisões, mas também a liderança é fundamental para o sucesso


da gestão da escola do campo e de qualquer instituição de ensino. Nesse conceito, também se
transpõe o paradigma de liderança autocrática para o de liderança democrática. Gonçalves e
Carmo (2001, p. 42) contribuem significativamente na construção desse conceito, dizendo que
o líder não tem a intenção de educar e instruir cada subordinado isoladamente. Ele ultrapassa
a visão de tratamento de empregado e carrega a ambição de estimular e orientar cada pessoa a
fim de que possa desenvolver-se potencialmente como profissional e sentir-se membro
importante do grupo. Os autores também afirmam que “liderança em seu sentido democrático,

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deve ser um elo que faz com que um grupo de trabalho não seja apenas uma coleção de
indivíduos.” (GONÇALVEZ E CARMO, 2001, p. 42).
Nesse sentido, o gestor democrático acaba estabelecendo situações que são favoráveis
a cada sujeito do grupo, buscando o desenvolvimento profissional de cada um para alcançar o
objetivo maior, o sucesso da instituição escolar. Tal gestor, ao ocupar o espaço da escola do
campo, deve assumir, o papel de agregador, o que o leva a pensar na escola como espaço de
prática social, por isso, conforme afirma Dourado,

A gestão educacional tem natureza e características próprias, ou seja, tem escopo


mais amplo do que a mera aplicação dos métodos, técnicas e princípios da
administração empresarial, devido à sua especificidade e aos fins a serem
alcançados. Ou seja, a escola, entendida como instituição social, tem sua lógica
organizativa e suas finalidades demarcadas pelos fins político-pedagógicos que
extrapolam o horizonte custo-benefício stricto sensu. Isto tem impacto direto no que
se entende por planejamento e desenvolvimento da educação e da escola e, nessa
perspectiva, implica aprofundamento sobre a natureza das instituições educativas e
suas finalidades, bem como as prioridades institucionais, os processos de
participação e decisão, em âmbito nacional, nos sistemas de ensino e nas escolas.
(DOURADO, 2007, p. 924)

Assim, importa entender que os rumos do ensino da escola do campo conduzem o


sistema escolar para o exercício de uma função de democratizar para ensinar e promover
transformações sociais. Ou ainda, a de conjugar gestão democrática com gestão estratégica,
buscando a qualidade de ensino nas esferas democráticas como um mecanismo para o sucesso
não só do educando, mas da comunidade em que esse sujeito está inserido. Por isso, caminha
nesse sentido o grande desafio do gestor escolar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escola do campo que tentamos conceber aqui se concretizará em sua plenitude se


gestores, educadores, educandos e toda a comunidade inserida nesse espaço e também os
órgãos públicos, entenderem seus princípios a fim de traçarem estratégias. Nos contextos
educacionais, torna-se necessário estabelecer uma prática de reflexão contínua diante dessa
temática, uma vez que o mundo está em constante transformação e que as ações que antes se
estabeleciam não mais dão conta do novo universo que vai sendo traçado rapidamente diante
de nossos olhos.

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Entendemos que a escola do campo tem o compromisso de contribuir para a formação


do novo homem e da nova mulher capazes de lutar pela transformação social, que significa a
apropriação do conhecimento historicamente produzido e acumulado, construir novas relações
que implica em colocar os sujeitos e o conhecimento em movimento, afirmar valores e ter
uma ampla e comprometida visão de mundo.
No que se refere ao conhecimento, é preciso compreendê-lo na perspectiva histórica,
ou seja, a serviço da emancipação humana e, que para a Educação do Campo significa colocar
em diálogo o conhecimento científico com os conhecimentos populares, e ainda, assumir que
todo sujeito é sujeito de conhecimento, ou seja, todo conhecimento científico é constituído de
certo senso comum, bem como, todo senso comum, traz indicação do conhecimento
científico.
Por isso é que uma gestão democrática e participativa parece ser fundamental em um
espaço em que a escola é elemento agregador para outros acontecimentos. A educação é uma
construção coletiva e o que se estabelecer como meta dentro do espaço escolar passa a ser
relevante no ambiente do educando e na relação com seus familiares. Gerir a escola do campo
significa, pois, adentrar um universo que mescla uma vida contemporânea, o conhecimento
científico com o conhecimento popular e a inserção de novas tecnologias. Tal desafio só pode
ser vencido com decisões coletivas para reafirmar a palavra democracia, uma vez que
caminhar de mãos dadas no processo educacional traduz mais do que aprender e ensinar
coletivamente, traduz um ponto de partida para a transformação da sociedade.

REFERÊNCIAS

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perspectivas. InRevista Educ. Soc., Campinas, vol. 28, n. 100 - Especial, p. 921-946, out.
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PERFIL DOS ESTUDANTES DE AGRONOMIA NA REGIÃO DO ALTO URUGUAI

Edson Luiz Tonello Junior155


Izabele Brandão Kruel156

Resumo

O presente estudo tem como objetivo analisar o perfil dos acadêmicos do curso de Agronomia da
Faculdade IDEAU, campus Getúlio Vargas, onde o torna de caráter justificativo, pois o mesmo tem
como suma importância pesquisar o perfil dos acadêmicos, uma vez que poderá auxiliar na discussão e
reflexão sobre o tema e buscar alternativas para a melhoria de qualidade dos serviços prestados. A
pesquisa tornou-se de forma explanatória de caráter quantitativo, onde participaram do questionário
204 acadêmicos. A coleta de dados se deu na terceira semana do mês de junho de 2018. A maioria dos
acadêmicos inseridos no curso de graduação são oriundos de escolas públicas de rede municipal onde
residiam na cidade e interior, tendo um vínculo e sua influência com o mesmo na escolha do curso,
preparando-o assim para suprir suas expectativas e para o mercado de trabalho, sendo que depois de
formados tem como objetivo ingressarem definitivamente em uma pós-graduação.

Palavras-chave: perfil dos acadêmicos, formação profissional, pós-graduação.

Introdução

Todo e qualquer processo educacional torna-se adequado quando as características dos


alunos tornam-se consideradas, sendo assim, todos os processos tem como papel fundamental
o auxílio e elaboração de metodologias a serem empregadas no ensino-aprendizagem
(PAIVA, 2008). Diante desta afirmação, todos os processos educativos passam de um estado
de falta de conhecimento para um estado capaz de transformar o conhecimento em realidade.
O desenvolvimento de um país está diretamente relacionado ao processo de educação
de seu povo, sendo assim, a educação é vista como um dos principais mecanismos para
remover pessoas permanentemente da pobreza e qualificar os mesmos, possibilitando assim o
acesso ao mercado de trabalho, promovendo um crescimento de forma sustentada a longo
prazo (CASTELAR, 2009).

155
Discente do curso de Agronomia – Faculdades IDEAU – Getúlio Vargas/RS. E-mail:
edsonluiztonellojunior@hotmail.com
156
Engenheira Agrônoma, Docente do curso de Agronomia – Faculdades IDEAU – Getúlio Vargas/RS. E-mail:
izabellekruel@gmail.com

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Ao ingressar em uma Universidade, o aluno acaba se deparando com ambiente novo e


mudanças, sendo provável que desconheça grande parte das questões históricas e técnicas
relacionadas a identidade da instituição (ALMEIDA, 2012). Esse desconhecimento faz com
que o universo que os espera seja acolhedor ou que atinja seu objetivo enquanto curso
escolhido. A universidade pode ser um ambiente prazeroso com crescimento pessoal e
profissional para o acadêmico, bem como poderá se caracterizar como um ambiente gerador
de frustração, angústia e de dificuldades caso o curso não seja realmente o desejado ou se não
houver adaptação do ingressante (ALBUQUERQUE, 2008).
O curso de agronomia, é uma opção entre uma ampla variedades existentes em um
sistema educacional. O processo de formação de um profissional da Engenharia Agronômica,
leva muito além de apenas teorias, contextualizando muito mais a prática e execução de
técnicas, as quais tornam-se essenciais para suprir as dúvidas, tendo assim como objetivo
produzir conhecimentos direcionados a melhorar o desempenho da área de atuação
(BORGES, 2000).
Quando remete-se a escolha profissional, a mesma, vem sendo tratada e discutida de
acordo com uma gama de pensamentos e opiniões diversas, dentre as quais, a ideia de que a
adolescência é o período no qual a escolha do profissional deve ser realizada de maneira única
e definitiva, visto que, com caracteres de desconfiança o jovem que não consegue fazê-la ou
que se mostra indefinido (LIMA, 2006). ZAVAREZE (2008) entende que a escolha deve ser
feita de acordo com o processo de construção da identidade pessoal e do projeto de vida de
cada indivíduo apresenta.
Estudar o perfil dos estudantes, poderá auxiliar na discussão e reflexão sobre temas e
buscar alternativas para a melhoria da qualidade dos serviços prestados por esses futuros
profissionais.
Ao identificar o perfil e as razões as quais levam os ingressantes a escolherem o curso
de Agronomia como sua opção profissional, levará ao conhecimento, tanto das universidades
como aos conselhos de classe informações referentes ao fruto do trabalho dos profissionais já
em exercício. Além disso, analisando especificamente para a Instituição de ensino Superior
onde a pesquisa será realizada, permitirá a identificação das peculiaridades de diversas
turmas, o que facilitará uma melhor orientação ao corpo docente no processo de tomada de

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decisão para elaboração de planos de ensino e comportamentos didáticos em sala de aula


(PEREIRA & BAZZO, 2009).
Sendo assim, o presente trabalho tem por objetivo a realização de um estudo de
verificação do perfil dos estudantes de Agronomia na região do Alto Uruguai no Instituto de
Desenvolvimento Educacional do Alto Uruguai – Faculdades IDEAU, campus Getúlio
Vargas.

Material e Métodos

O estudo foi desenvolvido no Instituto de Desenvolvimento Educacional do Alto


Uruguai (IDEAU), campus Getúlio Vargas – RS. A metodologia foi constituída com base em
técnicas de coleta de dados, atrás de uma pesquisa aleatória e explanatório com caráter
quantitativo, tendo como público alvo, os estudantes no curso de Agronomia. Os
questionários foram entregues para 267 alunos, todos cursavam disciplinas do curso, tendo os
mesmo integrantes do primeiro ao nono semestre do curso.

A aplicação dos questionários, pode ser classificado como pesquisa de campo, pois é
utilizada para conseguir informações sobre um problema, e em seguida buscar sua resolução
(MARCONI & LAKATOS, 2011).
A construção do questionário foi baseada em instrumentos, para traçar o perfil dos
estudantes, sendo divididos em: a) Dados pessoais, b) local onde reside, c) renda familiar, d)
escola a qual estudou, e) se possui ou não algum profissional formado na área de Engenharia
Agrícola ou Agronômica na família, f) grau de escolaridade dos pais, g) se o curso o qual
cursa, foi sua primeira opção, h) qual o objetivo de cursar Engenharia Agrícola, i) se a base da
família vem da agricultura, j) pretensão em continuar os estudos, k) se pretende trabalhar fora
do estado. A aplicação do mesmo se obteve na terceira semana do mês de junho de 2018.
Através do levantamento e análise dos dados, construiu-se o perfil dos acadêmicos
baseado nos aspectos relacionados aos seus interesses pessoais, que podem ser utilizados
como referência no conhecimento de fatores que contribuam para o encaminhamento de
futuros trabalhos, planejados estrategicamente, a cada demanda na análise dos questionários,
que possivelmente venham a ser desenvolvidos durante o curso. As questões buscaram

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abranger desde afinidades e motivações da escolha do curso, expectativas de aprendizagem,


até perspectivas quanto ao mercado de trabalho após a vida acadêmica.
Os dados coletados foram interpretados através das frequências absoluta e percentual
relacionadas a cada item proposto e apresentadas em forma de tabelas e figuras.

Resultados e discussão

Após a apuração dos resultados do questionário foi possível definir os resultados e


fazer uma avaliação para cada item da pesquisa.

Figura 1: Cidades ondem residem os acadêmicos no curso de Agronomia da Faculdade IDEAU de Getúlio
Vargas/RS.
Fonte: TONELLO JUNIOR, E. L., São José do Ouro, 2018.

Como demonstrado na figura 1, grande parte dos universitários da Faculdade IDEAU,


direcionado ao curso de agronomia são provenientes de municípios vizinhos, sendo os
mesmos contabilizados em 38 municípios. Quando relacionado a quilometragem para chegar

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até a universidade (Figura 2), demonstra que 76% dos acadêmicos realizam um trajeto diário
de menos de 100 km/dia, e 24% realizam um trajeto de mais de 100 km/dia.

80% 76%

70%
60%
50%
40%
30% 24%
20%
10%
0%
Mais de 100 Km/dia Menos de 100 km/dia
Figura 2: Quilometragem de viagem por dia realizada pelos universitários da Faculdade IDEAU do curso
de Agronomia de Getúlio Vargas.
Fonte: TONELLO JUNIOR, E. L., São José do Ouro, 2018

A escolha do curso, muitas das vezes, tem relação direta ao meio em que vivem e da
sua profissão antes de frequentarem o ensino superior, ou seja, muitos dos acadêmicos
consideram abertamente a escolha do curso com a realidade em que muitos já estão inseridos,
havendo alguma afinidade anteriormente (BOMTEMPO et al., 2012). Quando submetidos ao
meio em que vivem, 44% dos entrevistados residem na zona rural, e 56% na zona urbana
(Figura 3).

Figura 3: Meio em que os acadêmicos de Agronomia residem.


Fonte: TONELLO JUNIOR, E. L., São José do Ouro, 2018

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Um dos motivos do aluno em cursar Agronomia, está amplamente correlacionado ao


meio de produção, sendo o mesmo relacionado a possuir ou não área de plantio própria ou
arrendada, sendo possível evidenciar na figura 4, que 76% dos mesmos, possuem área própria
de plantio e 24% apresentam área arrendada.

24%
Área propria
Área arrendada
76%

Figura 4: Área de plantio própria e arrendada utilizada para a subsistência dos mesmos.
Fonte: TONELLO JUNIOR, E. L., São José do Ouro, 2018

Quando relacionado a remuneração salarial dos mesmos, observa-se que 40% dos
entrevistados possuem uma renda mensal de 1 a 3 salários mínimos, 32% possuem de 4 a 6
salários mínimos, 14% apresentam renda mensal de 7 a 9 salários mínimos e 14% dos
acadêmicos entrevistados apresentam uma rende mensal maior do que 9 salários mínimos
conforme demostrados na figura 5.

45%
40%
40%

35% 32%
30%

25%

20%
14% 14%
15%

10%

5%

0%
1 A 3 SALÁRIOS 4 A 6 SALÁRIOS 7 A 9 SALÁRIOS > DE 9 SALÁRIOS

Figura 5: Renda mensal dos acadêmicos de agronomia.

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Fonte: TONELLO JUNIOR, E. L., São José do Ouro, 2018

Sabe-se que a educação a campo tem grande influência tem grande influência sobre os
acadêmicos, antes de ingressarem no ensino superior, visando essa política de qualidade,
optou-se por questionar se as escolas onde estudarão antes eram públicas ou privadas, se
residiam na cidade ou interior e se agora, como acadêmico o mesmo mora sozinho, com os
pais ou com outras pessoas (Tabela 1). Com o intuito de deliberar sobre, foi observado que
quando remetido a escolas públicas e privadas, acabou apresentando que 94% dos jovens
acadêmicos estudaram em escolas públicas, 6% dos acadêmicos estudaram em escolas
particulares. Quando questionados se a escola a qual estudaram residia no meio urbano ou
rural, os resultados aparecem nitidamente justificados, sendo 78% em meio urbano e 22% no
meio rural.
Apresentando essa correlação, hoje os mesmos acadêmicos, quando submetidos ao
questionário se residem sozinhos, com os pais ou com outras pessoas, ainda apresentam em
maior quantidade residindo com os pais, apresentando 68%. Residindo sozinho apresentou
15% e com outras pessoas apresentou 17%.

Tabela 1: Escolas a qual os acadêmicos estudaram e sua influência na atualidade.


Estudou em:
Escola publica 94%
Escola particular 6%
Escola a qual estudou residia em:
Zona Urbana 78%
Zona Rural 22%
Reside atualmente:
Sozinho 15%
Pais 68%
Outros 17%
Fonte: TONELLO JUNIOR, E. L., São José do Ouro, 2018

A escolha de um curso superior parece estar associada as preferências, ao gosto e a


“vocação” individual. Mesmo quando a escolha não foi correta ou o curso superior não é da

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área profissional de preferência, é possível descrever esse processo de decisão como uma
percepção de escolha que não foi ao encontro da vontade do aluno (BRAGA & PEIXOTO,
2006).
A tabela 2 demonstra que 80% dos acadêmicos escolheram o curso de Agronomia
como sua primeira opção, sendo que 20% optaram por outro curso por não terem passado no
vestibular em seu curso preferencial, ou, muitas vezes, optaram pelo curso de agronomia por
não terem condições financeiras de cursar outro curso e que o curso preferencial ficaria
localizado distante de sua cidade de origem, preferindo cursar sua segunda opção e morar com
os pais, como citado na tabela 1 onde 68% dos jovens residem com os pais.
Além disso, a influência em realizar o curso, seria de na família já haver algum
profissional da área já formado, aumentando as chances do acadêmico na área, sendo assim,
apresentou 24% dos acadêmicos já possuem alguém na família formado na área, e 76% não
possuem (Tabela 2).

Tabela 2: Escolha do ensino superior e sua influência profissional.


Agronomia foi sua 1º opção?
Sim 80%
Não 20%
Possui algum profissional na área formado?
Sim 24%
Não 76%
Fonte: TONELLO JUNIOR, E. L., São José do Ouro, 2018.

A escolaridade dos pais acarreta diretamente na carreira dos filhos. De forma que a
escolaridade dos pais é decisiva para garantir o diploma dos filhos, sendo assim, na medida
em que cresce a escolaridade dos pais, aumenta a chance dos brasileiros alcançar um nível
educacional mais elevado.
Quando comparados esses dados com a pesquisa estudada os resultados são amplos e
justificados, pois mais de 50% da população consultada os pais não completaram seus
estudos, ou seja, incompleto; cerca de 15% possui 1º grau completo, 16% dos pais dos

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acadêmicos possuem o 2º grau completo, apenas 8% possui um curso de ensino superior e 5%


buscou alguma especialização na área de formação (Figura 6).
O levantamento aponta que os filhos possuem um nível educacional diferente do
paterno. No geral, o nível educacional dos filhos aumentou em relação ao dos pais, uma vez
que os governos tem investidos em programas educacionais para fazer com que o acesso ao
ensino chegue as populações que antes não teriam acesso.

5%
8%
Incompleto
1º Grau
16%
56% 2º Grau
Graduação
15%
Pós-Graduação

Figura 6: Escolaridade dos pais dos acadêmicos.


Fonte: TONELLO JUNIOR, E. L., São José do Ouro, 2018

Sendo assim, o sucesso da escolha, tanto quanto o apoio familiar, e o vínculo do


acadêmico com o curso, tem grande influência sobre o seu sucesso depois da conclusão do
ensino superior. Com isso, após o termino do ensino superior, vários dos jovens recém
formados, se deparam com situações inusitadas do mercado de trabalho, tornando-os a pensar
em qual dos ramos seguir. Muitas, se não sempre, os jovens tendem a tocar a propriedade dos
pais, porém, com a mudança do mercado de trabalho e o incentivo que o jovem ganhou para
conseguir uma especialização, sendo a mesma correlacionada com a demanda de profissionais
formados especializados na área, acabou aumentando os resultados (Figura7).

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60%

50%

40%

30%
56%

20% 44%

10%

0%
PROPRIEDADE PRÓPRIA COMÉRCIO

Figura 7: Pretensão dos acadêmicos após a conclusão do ensino superior.


Fonte: TONELLO JUNIOR, E. L., São José do Ouro, 2018

Como demonstra a figura anterior, a maioria dos jovens recém formados, tem uma
pretensão maior em trabalhar no comercio (56%), do que trabalhar em sua propriedade (44%).
Quando submetidos se a base para o sustento dos estudos, seja ele, graduação, pós-graduação
e outras qualificações profissionais, se destina da agricultura, os resultados demonstram uma
maior porcentagem, apresentando 72%, a base para o sustento das famílias, vem do meio
rural, e apenas 28%, não se destina do mesmo (Figura 8).

80%
70%
60%
50%
40%
72%
30%
20%
28%
10%
0%
SIM NÃO

Figura 8: Base do sustento familiar vem da agricultura brasileira.


Fonte: TONELLO JUNIOR, E. L., São José do Ouro, 2018

Levando em consideração a base familiar, e os objetivos de continuar os estudos, ou


trabalhar fora do estado, os jovens, com a demanda de profissionais formados e qualificados

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sendo exigente ao mercado de trabalhos, a grande maioria busca qualificação sendo


demonstrado na Figura 9, de forma que ainda assim, a grande maioria pensa em trabalhar fora
do estado (figura 10).
80%

70%
60%

50%

40%
74%
30%

20%
26%
10%

0%
SIM NÃO

Figura 9: Pretensão em realizar cursos de Pós-Graduação.


Fonte: TONELLO JUNIOR, E. L., São José do Ouro, 2018

70%

60%

50%

40%

30% 62%

20% 38%

10%

0%
SIM NÃO

Figura 10: Pretensão em trabalhar fora do estado.


Fonte: TONELLO JUNIOR, E. L., São José do Ouro, 2018

Após a formação no curso superior, 74% buscam realizar uma pós-graduação na área,
desta forma com o mundo globalizado e pelas rápidas transformações o mercado de trabalho

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procura profissionais qualificados, para tanto é importante a continuação da busca pelo


conhecimento através da realização de uma pós-graduação.
Contudo, cerca de 62% dos acadêmicos entrevistados, buscam trabalhar fora do
estado, tanto quanto pela remuneração salarial adequado ao cargo de ocupação e pela
experiência a ser alcançada, uma vez que oportunidades surgem e a busca pelo sucesso nunca
para.

Conclusão

O perfil dos acadêmicos no curso de Agronomia da Faculdade IDEAU de Getúlio


Vargas, destacou-se pela busca da satisfação pelo curso, tanto quanto a mobilidade ao qual
encontra-se.

Os acadêmicos que ingressaram no curso buscam uma formação acadêmica como


forma de agregar conhecimento a sua ampla experiência profissional, uma vez que já
trabalham na área e pretendem continuar em suas propriedades próprias.

A alta demanda de profissionais formados no mercado, buscando qualificação


profissional, demonstrando que cerca de 74% buscam continuar seus estudos, uma vez que o
mundo está em mudanças, e novas áreas sendo expandidas e estudadas, buscando acima de
tudo a satisfação e preparação para o mercado de trabalho, seja ele no estado ou fora dele.

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EDUCAÇÃO AMBIENTAL NAS ESCOLAS DO CAMPO: UMA PRÁTICA PARA


ALÉM DA SALA DE AULA

Cauana Peyrot Conceição157


Pedro Valdir da Conceição158

Resumo

O presente artigo refere-se ao projeto de pesquisa-ação realizado na turma de quinto (5º ano) da EMEF
Conquista Dezesseis de Outubro, Jóia-RS com objetivos de investigar e construir um novo saber
ambiental, devido à preocupação com a velocidade que o meio ambiente vem sendo degradado. Com
isso, trabalhamos com a reutilização de materiais orgânicos, considerados “lixo”, construindo uma
compostagem para produção de adubo com a finalidade de usar na horta escolar. A questão ambiental
não um problema isolado, mas um problema social. Desse modo, adotamos tarefas teóricas e práticas
com os alunos. Teóricas de questionamento e conscientização e prática na execução da construção da
composteira.

Palavras-chave: Meio ambiente; reutilização; cultura ambiental; Educação do Campo;


Escolas do Campo.

INTRODUÇÃO

O presente artigo foi desenvolvido a partir da proposição da disciplina, Seminário


Integrador II, do curso de Licenciatura em Educação do Campo da UFSM. Foi desenvolvido
em uma escola municipal de ensino fundamental localizada em um assentamento de
trabalhadores sem-terra-MST (Assentamento Ceres), no município de Joia (RS). Teve como
foco a educação ambiental através do reaproveitamento de resíduos orgânicos descartado na
cozinha escolar. O objetivo principal é a ênfase na educação ambiental, levando a
conscientização sobre as práticas corretas de cuidados ambientais como uma questão também
social e econômica.
Acreditamos que a escola sempre foi e será o melhor lugar para formação do ser
humano. Nesse sentido, entendemos esse espaço como privilegiado, de valorização,
reconstrução e formação de novos saberes. Visando aproveitar melhor a oportunidade de
trabalhar as questões ambientais, nos propomos a desenvolver o projeto de educação

157
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)- cauanapc@hotmail.com
158
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)- dile.joia@hotmail.com.

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“Educação Ambiental: um estudo para além da sala de aula” com a turma do 5º ano da
escola.
Numa sociedade ao qual visa atender aos interesses de um sistema econômico
capitalista, embasado na obtenção do lucro a qualquer custo, a problemática ambiental foi
ignorado por muito tempo. No entanto, discussões existentes sobre, nos últimos anos, têm
envolvido as diversas áreas do conhecimento em debates, buscando a melhor maneira de
abordar o tema. Estamos a cada dia percebendo práticas, as quais consideramos inadequadas
em relação aos cuidados com o meio ambiente.
Nesse sentido nos apropriamos da “pesquisa-ação” em virtude de constatar que seria a
mais adequada no sentido de aliar teoria e prática na aplicação da proposta pedagógica,
possibilitando incluir os materiais impressos e audiovisuais para o desenvolvimento teórico e
nos apropriarmos da prática na construção da composteira, contando com o envolvimento dos
alunos.

CONCEITO DE EDUCAÇÃO DO CAMPO

O campo é um local de trabalho, de vida, de cultura, de produção de conhecimentos,


de subsistência. A educação do campo surge nesse âmbito em meio aos movimentos sociais
no final do século XX, visando uma melhor qualidade de vida aos sujeitos e a valorização dos
mesmos no espaço social onde vive. Educação do Campo, Segundo Fernandes, Cerioli e
Caldart (2004, p. 25).

A utilização da expressão campo tem o intuito de propiciar uma reflexão sobre o


sentido do atual trabalho camponês e das lutas sociais e culturais dos grupos que
hoje tentam garantir a sobrevivência deste trabalho. No final dos anos de 1990, a
proposta educativa construída pelo Movimento Sem Terra (MST) passa a ser
discutida no âmbito das reflexões sobre a Educação do Campo com o propósito de
conceber uma educação básica do campo, voltada aos interesses e ao
desenvolvimento sociocultural e econômico dos povos que habitam e trabalham no
campo, atendendo às suas diferenças históricas e culturais.

A educação do Campo se articula a um projeto político sustentável de


desenvolvimento local a partir dos interesses e necessidades dos povos que vivem no local. O
que caracteriza os povos do campo é a sua relação com a natureza, com a maneira de lidar
com a terra, fazendo-a produtiva, dos valores, do culto as festas e a valorização da

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comunidade local, bem como a celebração pela colheita, fruto do suar de seu trabalho e a
relação com a terra.

[...] o homem não só se adapta ao mundo, como também o transforma. Essa


transformação ocorre em dois níveis: em primeiro lugar no nível da interação do
homem com a natureza e como ser da natureza, modificando o ambiente natural com
o uso de ferramentas. Ocorre também no nível da consciência, da interação
comunicativa entre os indivíduos e sua organização social (SCHELLING, 1991,
p.32).

E nessa interação do homem como sujeito social o ambiente onde vive com a sua
cultura que o mesmo se modifica, se adapta ao ambiente, bem como se transforma como
sujeito do campo. A educação do campo é o contraponto a educação rural que via o campo
como local de atraso, de pouco desenvolvimento. A educação do campo valoriza essa prática
como capaz de ajudar no desenvolvimento do sujeito, na sua formação trabalhando e
transformando-se como sujeito social de valor enfrentando o sistema capitalista que o esmaga,
que os suga.

MARCO HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO DO CAMPO NO BRASIL

No Brasil, mais precisamente, em meados dos anos 80 que a “Educação do Campo” se


consolida. Essas práticas surgem a partir dos movimentos sociais, em especial do MST159nos
assentamentos da Reforma Agrária com a construção de escolas. Nesse momento, o
movimento entendia que só a terra não seria suficiente para contemplar as demandas.
Precisava ter escolas com educação baseada na realidade do povo assentado e acampado da
época. Nesse sentido, “Escolas Itinerantes” davam conta da demanda, com professores do
próprio acampamento. Conforme Dal Ri e Vieitez (2004, p. 44). “Nesse campo de
preocupações inserem-se os esforços pedagógicos do Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST) surgem formulações tais como, a educação para a cidadania, a formação de
consciência crítica, o cultivo dos valores humanistas e várias outras”.
Na história da “educação do campo” dentro dos assentamentos sempre se pensou
numa proposta voltada para a formação de sujeito crítico em condições de intervir na

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

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realidade e contribuir com a sociedade. É na escola que a educação se completa e desenvolve-


se. Quanto a educar na realidade Freire (2011) diz:

Por que não discutir com os alunos a realidade concreta a que se deva associar a
disciplina cujo conteúdo se ensina, a realidade agressiva em que a violência é a
constante e a convivência das pessoas é muito maior com a morte do que com a
vida? Por que não estabelecer uma necessária “intimidade” entre os saberes
curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles têm como
indivíduos? Por que não discutir as implicações políticas e ideológicas de tal descaso
dos dominantes pelas áreas pobres da cidade? A ética de classe embutida neste
descaso? Porque, dirá um educador reacionariamente pragmático, a escola não tem
nada que ver com isso. A escola não é partido. Ela tem que ensinar os conteúdos,
transferí-los aos alunos. Aprendidos, estes operam por si mesmos. (Freire, 2011, p
15).

Em contra ponto as práticas utópicas e pela garantia de uma educação destinada as


Escolas do Campo, surgem às políticas para “Educação do Campo” que ainda se apresentam
algumas dificuldades de implementação das práticas pedagógicas para promoção do ser
humano. Nesse cenário destaca-se o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, ao qual
luta não só por terra, mas por escolas, por dignidade e pela valorização do sujeito no campo.
Mesmo que o cenário atual, socioeconômico não mostre boas perspectivas de futuro é a
cultura que nos liga a terra, as lutas pelos direitos humanos e sociais.

No ano de 1990 a lei 9.394/96 (Lei de diretrizes para a educação - LDB) reconheceu a
diversidade sociocultural e o direito à igualdade e as diferenças. Essa lei estabelece que os
sistemas de ensino devam promover adequações do ensino as peculiaridades da vida rural e de
cada região, (adequando o calendário escolar as fases agrícolas e as condições climáticas).

A partir de 1970 houve um aumento considerável do êxodo rural, o que prejudicou


ainda mais a evolução da educação na região rural. Conforme Nascimento 2003.
A educação foi vista como um processo desnecessário para aqueles/as que estavam
emergidos num mundo onde ler, escrever, pensar e refletir não tinha nenhuma
utilidade e serventia. Assim, trabalhar na roça, criar cultura a partir do manejo com a
terra, estar inteiramente ligado ao ecossistema do mundo campesino, era condição
sine qua non para não se ter acessibilidade ao mundo do conhecimento.
(NASCIMENTO, 2003, p.02).

O autor se posicionava criticamente sobre as políticas educacionais. Para ele estas e os


projetos pedagógicos não reconheciam o povo do campo como sujeitos da política.
Toda vez que houve alguma sinalização de política educacional ou de projeto
pedagógico específico isto foi feito para o meio rural e muito poucas vezes com os

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sujeitos do campo. Além, de não reconhecer o povo do campo como sujeito da


política e da pedagogia, sucessivos governos tentaram sujeita-lo a um tipo de
educação domesticadora e atrelada a modelos econômicos perversos. (CALDART,
2002, p. 28).

Diferentemente da forma abordada por Caldart (2002), em 2001 foram aprovadas pelo
Conselho Nacional de Educação as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica das
Escolas do Campo, que segundo (BRASIL, 2007, p.17) foi muito importante para a educação
do campo:
Um importante marco para a educação do campo porque contemplam e refletem um
conjunto de preocupações conceituais e estruturais presentes historicamente nas
reivindicações dos movimentos sociais. Dentre elas o reconhecimento e valorização
da diversidade dos povos do campo, a formação diferenciada de professores, a
possibilidade de diferentes formas de organização da escola, a adequação dos
conteúdos às peculiaridades locais, o uso de práticas pedagógicas contextualizadas, a
gestão democrática, a consideração dos tempos pedagógicos diferenciados, a
promoção, através da escola, do desenvolvimento sustentável e do acesso aos bens
econômicos, sociais e culturais.

A classificação das escolas do campo (BRASIL, 2007, p.14) partem da definição que
considera a localização da escola no município e foco de produção econômica social e
cultural:
Nesse contexto, as escolas do campo são aquelas que têm sua sede no espaço
geográfico classificado pelo IBGE como rural, assim como as identificadas com o
campo, mesmo tendo sua sede em áreas consideradas urbanas. Essas últimas são
assim consideradas porque atendem a populações de municípios cuja produção
econômica, social e cultural está majoritariamente vinculada ao campo.

EDUCAÇÃO AMBIENTAL NAS ESCOLAS DO CAMPO

A educação ambiental no âmbito escolar, surge por força de legislação com objetivo
de assumir o papel de transversalidade da educação. Nesse sentido, a educação ambiental não
nasce fora de um contesto social e político onde os educandos vivem e produzem cultura
juntamente com a sua família, tendo o meio ambiente lugar de vida, de transformações
naturais e de produção de cultura.
[...] enquanto saber que, por força das políticas públicas implementadas no Brasil
precisa ser trabalhada na escola enquanto tema transversal, entendida a partir desta
compreensão, ganha contornos políticos e assume papel transformador, uma vez que
compreender a Natureza como totalidade na qual o próprio ser social está inscrito, é
compreender que as relações materiais de produção da vida social desenvolvem-se
como relações materiais de produção da própria natureza, ou seja, que há uma
relação dialética entre o desenvolvimento das relação de produção humanas e o
desenvolvimento da natureza não-humana. (BIGLIARDI& CRUZ, 2012, p.324)

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Na relação do ser humano com a natureza gera resíduos, aos quais provocam grandes
desastres ecológicos, sociais e ambientais, além do grande desconforto para população,
quando não é dado atenção necessária para o destino correto. Com isso acaba gerando “lixo”,
deixando de ser resíduos, pois, acreditamos que resíduos são reaproveitáveis, diferente de
“lixos” ao qual consideramos o descarte de materiais inadequados em locais impróprios ao
qual apenas irá gerar problemas socioambientais.

Toda a atividade humana ou animal gera resíduos, e estes podem ser aproveitados
para a manutenção da vida. A geração desses resíduos passa a ser problema quando
for em quantidade e qualidade tal que impeça o desenvolvimento harmônico dos
seres vivos em dado ecossistema e já vem preocupando os homens há milhares de
anos, em função das epidemias de doenças surgidas pela contaminação de águas.
(ADEDE Y CASTRO, 2003, p.94)

A concepção de meio ambiente se fundamenta no conhecimento e na consciência, na


atividade política e no desenvolvimento de uma nova economia, registrando-se na evolução
do tempo.

[...] “a problemática ambiental abriu um processo de transformação do


conhecimento, expondo a necessidade de gerar um método para pensar de forma
integrada e multivalente os problemas globais e complexos, assim como a
articulação de processos de diferente ordem de materialidade”. (LEFF, 2005, p.56).

Segundo Pelicioni (2005, p. 596, 597):


A educação ambiental, então, além de ser um processo de mudança e de formação
de valores, bem como de preparo de exercício da cidadania, constitui-se em um
conjunto de ideias contrárias às ideias prevalentes no sistema social atual, contrárias
às ideias de egoísmo e de individualismo, a favor da transformação social com ética
e com democracia. É uma luta a favor, portanto, de novas ideias e de valores éticos,
em que deve prevalecer a melhoria da qualidade de vida para todos.

Para Barbieri (2011) os objetivos da educação ambiental, de acordo com a Carta de


Belgrado, são:
1.Conscientização: contribuir para que indivíduos e grupos adquiram consciência e
sensibilidade em relação ao meio 51 ambiente como um todo e quanto aos
problemas relacionados com ele. 2. Conhecimento: propiciar uma compreensão
básica sobre o meio ambiente, principalmente quanto às influências do ser humano e
de suas atividades. 3. Atitudes: propiciar a aquisição de valores e motivação para
induzir uma participação ativa na proteção ao meio ambiente e na resolução dos
problemas ambientais. 4. Habilidades: proporcionar condições para que os

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indivíduos e grupos sociais adquiram as habilidades necessárias a essa participação


ativa. 5. Capacidade de avaliação: estimular a avaliação das providências
efetivamente tomadas em relação ao meio ambiente e aos programas de educação
ambiental. 6. Participação: contribuir para que os indivíduos e grupos desenvolvam
o senso de responsabilidade e de urgência com relação às questões ambientais
(BARBIERI, 2011, p.55-56).

A educação ambiental tem como principal objetivo a produção de um novo saber sobre
o meio ambiente, no qual a natureza seja valorizada e preservada, construindo uma nova
cultura, a partir da forma que as pessoas se utilizem apenas do necessário de recursos naturais
para subsistência, por meio da sustentabilidade, mantendo um equilíbrio ambiental.
Nos deparamos com inúmeros problemas que surgem ao longo dos anos, e assim,
percebe-se a necessidade de construir um novo saber ambiental o qual tenha como princípio a
valorização do meio, tendo consciência da sua importância, para a vida humana, para a vida
animal, vegetal e para todos as espécies de vida, seja animal ou vegetal.
A relação que o homem exerce com o meio ambiente é de posse, ou seja, o ser humano
se considera dono dos recursos naturais, tendo consigo o poder de manipulação de recursos.
Através dessa atitude está conseguindo destruir a natureza, criando um desequilíbrio. O
homem transforma e altera os organismos da natureza, degradando-os.
Compreende-se que o crescimento populacional é um fator determinante na grande
produção de resíduos, ou seja, os centros urbanos estão cada vez maiores, com inúmeras
pessoas aglomeradas em lugares inapropriados, produzindo muitos danos ambientais, tanto
com a produção de resíduos, a forma desorganizada da construção das moradias, enfim. ..
Vale apena destacar que nas áreas de apropriação rural também ocorre a produção de
resíduos, não na mesma dimensão, mas existem outras formas de poluição tais como: o uso de
agrotóxicos ou venenos, derrubadas de matas, assoreamento de rios, lagos, vertentes, caça de
animais em extinção, entre outros fatores.
A tomada de consciência produzida juntamente aos alunos, relativas à preservação,
conservação e valorização dos recursos naturais, terão como ponto principal a construção dos
mesmos princípios de família, sendo uma das atividades, o compartilhamento do
conhecimento para os pais e demais familiares, proporcionando uma interação entre todos.
Nesse sentido BEL, 2003 expõe o seguinte:
As mudanças devem ocorrer em nossos movimentos em relação a nós mesmos, aos
outros e ao mundo. Cada gesto nosso tem repercussões sobre todo o planeta. Cada
gesto nosso precisa ser consciente. Ele reflete nossa maneira de pensar e, então, é o

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que precisa ser modificado. O quadro que temos hoje é resultado de milênios de
histórias. As mudanças serão, portanto, pequenas e gradativas. (BEI, 2010, p.12).

Nesse sentido, a escola deve propor atitudes favoráveis à preservação do meio


ambiente, buscando a construção de uma nova visão de educação, ou seja, uma educação
sócio ambiental, que interaja com as demais áreas do conhecimento, potencializando a
conscientização de que o meio ambiente é primordial para todas as formas de vida no planeta
terra.
Acreditamos que a consciência ambiental, é gerada na família e na escola, adquirindo
princípios que lhes acompanharão para a vida toda. Quanto a esse tema, se faz necessário
orientar os filhos e/ou educandos/as da melhor forma possível. Na escola é possível direcionar
atividades variadas, proporcionando o despertar para diversos conhecimentos, onde possibilite
a reflexão sobre a vida e a ação do ser humano na sociedade. BRASIL 2001.

A complexidade da natureza exige uma abordagem sistêmica para seu estudo, isto é,
um trabalho de síntese, com os diversos componentes vistos como um todo partes de
um sistema maior, bem como em suas correlações e interações com os demais
componentes e seus aspectos. Fazendo-se uma analogia entre um sistema natural em
estudo e uma rede de pesca, da mesma forma que para conhecer a rede não basta
observar os seus nós, para se conhecer um sistema não basta observar suas partes,
mas é preciso enxergar como elas se interligam e se modificam, em sua própria
estrutura e sentido de ser, por causa dessas interações. (BRASIL 2001, p.22)

“A Educação Ambiental é condição indispensável para modificar o quadro crescente


de degradação socioambiental”. (ALVES; SILVA; VASCONCELOS, 2007, p.112). A
educação que promove a sustentabilidade é uma educação transformadora, reflexiva e crítica e
não apenas uma educação transmissora de conhecimentos. Jacobi (2003) destaca que a
Educação Ambiental tem como compromisso a função política orientada para a transformação
social, onde associa a natureza, o homem e o universo nos inúmeros campos de
conhecimento, promovendo uma educação para a cidadania fundamentada na educação
participativa.
Nessa mesma linha de reflexão Lima (2002, p.136) ressalta que, “a ausência de
participação na educação reforça o seu caráter autoritário assim como anula as possibilidades
de crescimento, autonomia e emancipação do educando.”
Lima (2002) considera que a Educação Ambiental foi criada socialmente para
minimizar os resultados da crise ambiental e para promover a sustentabilidade e ainda

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compartilha com os autores acima a ideia de que a Educação Ambiental é política e


transformadora da realidade socioambiental ou não tem razão de existir, conforme segue:
Se esse reconhecimento da natureza política da EA não é capaz de ultrapassar o
nível da retórica, se o medo da mudança for maior que o desafio de inovar, então
podemos apagar as luzes e procurar desafios mais sérios com que nos ocupar, posto
que se a EA não tem compromisso com a transformação social e individual, ela
converte-se em mero artifício para justificar, legitimar e conservar a exploração e
degradação- do homem e da natureza- praticadas pelo sistema capitalista (LIMA,
2002, p.132).

Os estudos referentes ao funcionamento do meio ambiental são bastante complexos,


mas com dedicação e união de todos é possível compreender a dimensão da importância de
aprender a lidar de forma correta com a natureza. A partir do momento que se percebe que
tudo está interligado ao meio natural, se torna possível desenvolver uma nova fórmula de
usufruir da natureza, cuidando, protegendo e se comprometendo com o meio ambiente de
forma responsável.
Diante dessa dimensão percebe-se que muitos são os desafios, e muitas as questões de
educação ambiental que devem ser compreendidas e refletidas, a Comissão Mundial sobre o
Meio Ambiente e Desenvolvimento (1988: 46), vem definir como "aquele que atende às
necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem
a suas próprias necessidades".
Neste sentido nos remetemos a compreender melhor a da qualidade de vida, Dias
(2003), nos ajuda a pensar de que nada adianta sermos desenvolvidos economicamente, sem o
desenvolvimento social, e ainda não basta. É necessário termos desenvolvimento econômico,
social e ainda no viés ambiental, sustentável e ecologicamente equilibrado.
Este teve como objetivo principal desenvolver atividades práticas, no intuito de
reciclar resíduos orgânicos até então considerados “lixos”, culminando com a construção de
uma composteira para produção de adubo orgânico. Para Alves e Pereira (2015), a escola tem
o papel de formar cidadãos críticos, conscientes e reflexivos, capazes de interferir na
sociedade para uma melhora ambiental.
Freire (1996) considera a questão de educação ambiental, a pobreza, a politica e a
dimensão d aética como a necessidade de aproveitar as experiências dos alunos, para abordar
problemáticas de nível ambiental. Nessa direção a escola do campo, deve ser agenciadora de
transformações sociais, pautadas em uma pedagogia libertadora, com abordagens adequadas
ao local.

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A ESCOLA MUNICIPAL DE ENSINO FUNDAMENTAL CONQUISTA DEZESSEIS


DE OUTUBRO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO DO CAMPO

No ano de 1995 um grupo de agricultores Sem Terra querendo oferecer condições


mais dignas as suas famílias resolve acampar num acampamento do MST, cujo sua formação
inicial foi na cidade de Palmeira das Missões. Por se localizar nesse cidade foi nomeado como
Palmeirão. Passado algum tempo, muitos de seus integrantes foram sendo assentados em
áreas de terras, e o mesmo foi enfraquecendo. Então resolve se juntar na cidade de Júlio de
Castilhos com o acampamento que lá existia e, que também já havia enfraquecido por muitas
famílias já terem sido assentadas.
Alguns tempos de espera a área de terra do Assentamento ceres ao qual vinha em
negociação com o INCRA- Instituto de Colonização e Reforma Agrária, área pertencente a
Varig acaba de ser comprada pelo órgão. Então o acampamento se organiza para realizar o
sorteio da área. No momento inicial foram 114 famílias beneficiadas, essas vindas de várias
cidades do estado.
Das famílias contempladas, 4 foram de funcionários que trabalhavam na empresa no
momento da efetivação da compra. No ano de 1996, no mês de dezembro, muitas das famílias
sorteadas chegaram à área para cuidar da mesma. No início de 1997 dá-se o processo de
medidas de perímetro da área e divisão dos lotes de terras por empresa contratada para isso.
Ainda no primeiro semestre inicia a organização das famílias nos lotes com a construção de
galpões/moradias e manejo de solo para plantio de subsistência
Para legalização da reserva, a qual consta com uma área aproximadamente de 326
hectares de mata nativa, o INCRA realizou a readequação dos lotes. Foi usado da negociação
do INCRA com as famílias, visto que, dos 46 lotes vistoriados, 38 destes ocupavam parte da
mata nativa com uma média de 5 ha. Assim, os lotes foram reformulados com de área e
compensação em outro local. A readequação numa área de aproximadamente 200 hectares
que pertencia a uma antiga cooperativa dos assentados e também com a extinção de alguns
lotes, reconduzindo as famílias para essa área.

A regularização do assentamento atende ao Código Florestal Brasileiro, que


determina que pelo menos 20% da sua área deve ser de reserva legal, necessária ao

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uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos


ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora
nativas. (INCRA, 2008, p.1)

Figura 1- Mapa do Assentamento Ceres- Fonte: INCRA – RS. Relatório Ambiental do Projeto
Assentamento Ceres. Porto Alegre, INCRA, 2007.

METODOLOGIA DA PESQUISA

A característica desse trabalho é a pesquisa de ação, devido ao fato que envolve um


plano de ação, como assim é definida.
Pesquisa-ação é uma forma de investigação baseada em uma autorreflexão coletiva
empreendida pelos participantes de um grupo social de maneira a melhorar a
racionalidade e a justiça de suas próprias práticas sociais e educacionais, como
também o seu entendimento dessas práticas e de situações onde essas práticas
acontecem. A abordagem é de uma pesquisa-ação apenas quando ela é colaborativa
(...) KEMMIS e MC TAGGART (1988 apud Elia e Sampaio, 2001, p.248).

Neste sentido, a metodologia de pesquisa está baseada em objetivos e num processo de


aprendizagem, troca de conhecimentos, de acompanhamento de análise, de observação, de
reflexão e de mudança.

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A pesquisa-ação educacional é pensada em uma estratégia para o desenvolvimento de


saberes, sobretudo de professores e pesquisadores envolvidos de alguma maneira com a
temática. Tem-se como objetivo que a pesquisa possa modificar, qualificar e aprimorar a sua
forma de ensino.

Figura 2- fonte: Tripp (2005).

A Pesquisa ação remete-nos a um diagnostico inicial, planejamento, a uma ação


programada e após implantasse e avaliam-se as possíveis mudanças. Considera-se que a
avaliação é essencial a prática, para repensá-la, sobretudo aquelas que propõem impactos e
promovem a reflexão dos sujeitos da pesquisa.

As atividades com os alunos foram ministradas de duas maneiras: uma teórica através
de materiais impressos e uso de equipamentos audiovisuais, a outra, a prática da construção
de uma composteira para reaproveitar os resíduos orgânicos retirados da cozinha escolar com
a finalidade de transformar em adubo orgânico para uso na horta, pomar e jardim escolar.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

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Através do trabalho desenvolvido no citado projeto, procuramos destacar a


importância da separação dos resíduos, levando a conscientização de que a natureza é muito
rica e capaz de transformar aquilo que considerávamos “lixo” em um adubo orgânico muito
rico em nutrientes para uso em plantas. Para desenvolvimento do projeto com os
educandos/as, conforme o planejado usamos de duas aulas de 4 horas cada. Sendo a primeira
parte teórica e de observações na escola e, a segunda totalmente prática de construção da
compostagem.
Na primeira aula, a teórica nos dedicamos sensibilizar os educandos numa postura
crítica diante de situações concretas observadas com relação à problemática do “lixo” nos
entornos e dentro do ambiente escolar, bem como o destino que os mesmos recebem.
Nessa aula, dividimos em vários momentos, sendo o primeiro de reconhecimento do
ambiente. Nesse momento, os educandos foram convidados a andar pelas dependências
internas e externas da escola para verificar como está sendo tratado o tema na escola. Após, os
alunos assistiram vídeo lixo nosso de cada dia, disponível endereço eletrônico:
https://www.youtube.com/watch?v=fR_JTGiAuiA “o lixo nosso de cada dia” para
começarmos a reflexão sobre o assunto levando em conta a realidade onde vivem.
A seguir, fomos à cozinha da escola olhar a lixeira para ver o que era descartado e se
poderíamos usar do reaproveitamento na composteira buscando o despertar para uma nova
consciência de preservação, de redução e de reaproveitamento de materiais recicláveis, antes
considerados “lixo”. A natureza clama pelo desenvolvimento de atitudes de ecológicas.
Com isso, ainda debatemos sobre o exagero de lixo que produzimos todos os dias,
para onde vão? Não poderíamos reutilizar diminuindo os impactos ambientais, e, ainda
gerando renda para família? Com isso, acreditamos elevar a consciência socioambiental dos
educandos dessa turma esperando que eles levem para vida como aprendizagem o que viram e
debatemos nessa aula.
Na segunda aula, retomamos o que foi trabalhado na aula anterior, visando o trabalho
prático da construção de uma composteira com aproximadamente 1m x 1m por mais ou
menos uns cm de altura para produção de adubo orgânico para uso da escola.
O interessante foi que ao construir a composteira nos demos conta de que estávamos
reciclando matéria orgânica, por que não reciclar pedaços de zincos e de madeiras para

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construção da mesma. Com isso reaproveitamos os materiais citados, o que acreditamos


sermos coerentes com a proposta de atividade desenvolvida no projeto.
Bom destacar que nesse dia havia sido solicitado que os educandos trouxessem restos
de cascas e outaras matérias orgânicas para nos usar na composteira. Teve uma educanda que
trouxe uma sacolinha com esterco de galinha par misturar. Uma iniciativa muito linda dessa
aluna o que nos leva a pensar que o trabalho da aula anterior já estava surtindo efeito ao
despertara a consciência para o reaproveitamento.
A seguir foi à vez dos educandos/as rastelarem o pátio para juntar as folhas de uva de
inverno. Foi um momento muito lindo. Nesse momento cada educando teve seu envolvimento
fosse para rastelar, para juntar as folhas ou para levar até a cisterna. Na prática, colocamos
uma camada de folha. Logo após, uma camada de matéria orgânica, seja cascas, restos de
frutas, aboboras apodrecidas e esterco de galinha.
Como resultado desse processo, lançamos junto aos educandos e professora da
turma, o desafio de dar segmento às atividades realizando as observações como a medida de
temperatura ambiente, o processo de formação do adubo orgânico. O mais importante disso,
não é o resultado da transformação da matéria orgânica, mas a formação da consciência
socioambiental nos educandos, estendendo para sua família, através do reaproveitamento.
Esperamos com isso, obter matéria orgânica para adubar a horta escolar ao qual fornecerá
alimentação saudável, incrementando a merenda escolar.
Da mesma maneira, esperamos obter as condições necessárias para produção de
alimentos saudáveis e reaproveitamento da matéria orgânica, esperamos ter alguns jogos
pedagógico construídos com materiais reciclados que irão contribuir no processo de ensino
aprendizagem dos alunos da escola além de retirar da natureza certa quantidade de “lixos” que
no final do projeto espera-se não ser mais considerados.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS

Portanto, o trabalho realizado foi bastante gratificante para nós educandos em


formação. A inserção na turma para realização do projeto nos remeteu a pensar muito sobre o
planejar e o fazer numa perspectiva metodológica da pesquisa ação. Sentimos motivados por

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estar realizando o que gostamos, ajudar na formação dos educandos através de uma proposta
educativa consciente.
Concluímos o mesmo, com a certeza de termos alcançado os objetivos propostos. A
ideia é de que essa prática prossiga e se multiplique na escola com reflexo na comunidade.
Desse modo, acreditamos na educação e que os aprendizados podem refletir na prática
socioambiental reciclando experiências, preservando o meio, gerando produção de qualidade
da horta para mesa, amenizando os problemas ambientais.
Compreendemos que a educação ambiental é adequada para produção de dinâmicas
sociais, capazes de promover mudanças individuais e coletivas, no sentido de uma abordagem
crítica para a busca da resolução dos problemas (Loureiro, 2004; Sauvé, 2005). Percebemos o
quão importante que as crianças despertem para o conhecimento e a preservação do meio
ambiente, pois essas serão multiplicadoras de ideias.
Assim, a partir de (Caldart, 2005) que a Educação do Campo está alicerçada e
vinculada com sujeitos sociais, e que além de tudo é atravessada pela formação humana. Aqui
a educação do campo vem dialogar com a realidade dos camponeses, do trabalho do campo e
na construção de uma educação para o povo do campo.

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UM ESTUDO SOBRE A ATUAL REALIDADE DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES


NA EDUCAÇÃO INFANTIL NA ESCOLA DO CAMPO.

Heliene Pimentel de Sousa-UFOPA(helieneufpa@hotmail.com)


Drª Solange Helena Ximenes Rocha-UFOPA (solange.ximenes@gmail.com)

Resumo

A educação brasileira passa por diversos problemas, entre eles podemos destacar a formação docente,
em especial dos que atuam na educação infantil na zona rural. Diante disso, este trabalho objetivou
analisar como se dá a formação de professores para atuar na educação infantil na escola do campo em
Santarém-Pará. Os específicos foram: verificar a qualificação do professor de educação infantil da
escola do campo; conhecer de que maneira está acontecendo a formação continuada; entender como o
professor aprende a docência para atuar na educação infantil no campo. A pesquisa foi de campo, de
natureza qualitativa com quatro professores da educação infantil que trabalham nas escolas de Santa
Maria na Comunidade de Patos, Frei Rogério na comunidade de Garrafão e Jarbas G. Passarinho no
Tabocal e a coordenadora da educação infantil. Como ferramentas investigativas foram utilizadas
entrevistas semi-estruturadas que, depois de gravadas foram transcritas na íntegra e analisadas. Os
resultados mostram que os professores tem a formação mínima exigida na LDB, porém a formação de
professores não está acontecendo, os professores não tem acesso a formação continuada, devido a
distância e as dificuldades de acesso a comunicação, são precárias as condições de trabalho, não existe
um planejamento em conjunto que possa auxiliar as professoras em suas práticas docente, as
professoras estão aprendendo a ser professoras no dia a dia,buscando conhecimentos com as mais
experientes.

Palavras-chave: Formação de Professores. Educação no Campo Educação Infantil

Introdução

Este artigo é resultado de pesquisas realizadas em escolas do campo no município de


Santarém – Pará que objetivou pesquisar como se da a formação de professores para atuar na
educação infantil na escola do campo. O aporte teórico que utilizou-se foi Mizukami (2002),
Arenhart (2004), Ximenes – Rocha (2009), Casali (2005), Campos (2002) entre outros.
O trabalho está dividido em três momentos, no primeiro faz um levantamento teórico
da educação infantil no campo, formação dos profissionais da educação infantil e
aprendizagem da docência. No segundo momento destaca-se os resultados da pesquisa

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realizada, destacando a formação dos professores e no terceiro momento reporta-se a uma


analise critica da realizada da educação nas escolas do campo em Santarém - Pará.

A educação infantil na escola do campo

O atendimento de crianças em creches e pré-escolas na conjuntura brasileira, ainda


sofre com vários problemas, mas quando mapeamos a educação infantil nas escolas do campo
verifica-se, através dos dados estatísticos existentes sobre crianças de até três anos de idade no
norte do país que não frequentam creches e pré-escolas, demonstram o quanto se precisa
avançar em pesquisas, investigações e em políticas públicas para corrigir as distorções nas
localidades que ficam distantes dos centros urbanos.

A educação na região Norte avançou nos últimos quinze anos. A amazônia no


entanto, ainda enfrenta problemas, como a persistência de altas taxas de evasão
escolar e a elevada distorção idade - série. Entre as populações rurais, negras e
indígenas, as disparidades são ainda maiores. Esses entraves, somados à falta de
políticas públicas nas localidades mais distantes dos centros urbanos, se refletem
diretamente na frequência de meninos e meninas à escola desde os primeiros anos de
vida. O norte é onde, segundo a Pnad (IBGE/2007), há menos criança de até 3 anos
de idade em creches: 7,5%, sendo que a média nacional é de 17,5%. (UNICEF,2009,
página 81)

A discussão em torno da educação infantil na escola do campo desvela a necessidade


do desenvolvimento de ações que podem ser implementadas para o avanço de questões como
a infraestrutura de creches e pré-escolas, a formação de professores e o diagnóstico da
realidade das crianças da primeira etapa da educação básica do campo em nosso país.
A falta de dados sobre a problemática da educação infantil na escola do campo afeta
na construção de políticas sociais para as crianças e as famílias que vivem longe dos centros
urbanos e que necessitam da educação básica, dando início na construção de ensino-
aprendizagem das mesmas.

A origem da educação infantil é uma questão que envolve as creches urbanas e tem
sido uma luta histórica da área, pois, apesar de a Constituição de 1988 apontar o
atendimento em instituições de educação infantil como um direito das crianças, uma
opção da família e um dever do estado, tal direito ainda não passa de uma realidade
somente no papel. Historicamente e ainda hoje, mesmo com o movimento de luta
pelos direitos das crianças, há muito para se lutar – politicamente e
pedagogicamente – para que esse atendimento de fato seja oferecido a

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todos as crianças, dos diferentes contextos e realidades socioculturais.


(ARENHART, p. 177-178, 2004)

Como reflete Deise Arenhart, Mestre em educação pela UFSC, o atendimento de


crianças pequenas precisa ser pensada em uma perspectiva que oriente o acolhimento das
mesmas nos seus diferentes contextos e realidades vividos por eles em todas as regiões do
país.
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) traz
um panorama refletindo acerca da educação nas escolas do campo problematizando sobre a
realidade que as mesmas encontram para desenvolver o ensino e aprendizagem de meninos e
meninas que moram distantes dos centros urbanos.

A transformação da educação no campo requer mais do que a melhoria física das


escolas ou a qualificação dos professores, ela implica, necessariamente, um currículo
escolar baseado na vida e valores de sua população, a fim de que o aprendizado
também possa ser um instrumento para o desenvolvimento do meio rural. (INEP, p.
3, 2007)

Como posto no panorama do INEP, além das melhorias que precisam ser pautadas em
políticas públicas para o desenvolvimento do meio rural através da educação da população
camponesa é necessário estabelecer a construção de um currículo que atenda as necessidades
vivenciadas pelos mesmos.

Quando se coloca o problema da educação do campo, grande parte de nossos


governantes, Secretarias de Educação e intelectuais que se dizem pensantes da
educação, partem do princípio que os grandes desafios estão na falta de estrutura, de
professores preparados, de transporte escolar adequado, de material didático-
pedagógico. O grande desafio, na verdade, é uma mudança do modelo de educação
presente no campo. A escola que temos no campo não prepara as crianças nem para
o mundo urbano e nem para o mundo do campo. (CASALI, p.4, 2005)

Desse modo Casali (2005), também compartilha da ideia que a transformação da


educação do campo deve ir além de simples melhorias estruturais, de materiais pedagógicos e
transporte escolar, ela deve ir em busca de uma identidade construída nos valores e
necessidades da população inserida naquela região ou comunidade.

A formação de Profissionais da Educação Infantil.

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Podemos perceber uma falta de compromisso com a educação por parte dos gestores
públicos e principalmente quando falamos em educação infantil parece que nessa fase
qualquer pessoa pode lecionar como se não fosse algo sério, porém essa problemática não é
apenas uma realidade dos tempos modernos, pois no tempo do império esse fato já ocorria
também.

A docência leiga foi institucionalizada pelo Estado Brasileiro desde o tempo do


império. Os padres jesuítas assumiram, além da função de catequizar os índios, a
função de fornecer-lhes uma instrução que pudesse favorecer os objetivos da
congregação, que eram expandir e consolidar o cristianismo na colônia conquistando
almas para Deus e ampliar o número de súditos para a Coroa Portuguesa
arregimentando os índios como força de trabalho. Com a expulsão dos Jesuítas pelo
Marquês de Pombal em 1759, o Estado se tornou responsável pela educação dos
habitantes do país. Isso, porém, não representou um avanço, ao contrário, é
entendido como um retrocesso uma vez que não havia um plano de ação para
atender à demanda deixada pelos padres da companhia de Jesus. Havia de encontrar
professores preparados para tal função além de o tipo de escola existente causar
grande aversão nas crianças (COLARES, 2003). A ausência de professores
qualificados para a docência possibilitou a contratação de leigos, vocábulo que na
época limitava-se à interpretação de professores não ligados a Ordens religiosas.
(XIMENES-ROCHA, 2009, p. 145).

Ainda segundo a autora, durante o período do Império houve a preocupação com a


formação dos professores para o ensino primário embora pouco tenha sido feito de modo
concreto, para enfrentar essa problemática. A partir de 1920 as modificações na configuração
da economia brasileira, demandadas pelo processo de industrialização e urbanização,
aumentam a demanda pela escolarização. Essa problemática foi amenizada com aprovação da
primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 4.024/61 que em seu artigo 53
dizia que a formação de professores para a docência na escola primária deveria obedecer aos
seguintes princípios:

a) em escola normal de grau ginasial no mínimo de quatro séries anuais onde além
das disciplinas obrigatórias do curso secundário ginasial será ministrada preparação
pedagógica;
b) em escola normal de grau colegial, de três séries anuais, no mínimo, em
prosseguimento ao [...] grau ginasial.

Quanto à formação de professores para atuar na escola do campo, de acordo com a Lei
citada no artigo 57 determina com informações não muito claras que:

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Art. 57. A formação de professores, orientadores e supervisores para as escolas


rurais primárias poderá ser feita em estabelecimentos que lhes prescrevem a
integração no meio.

Na Constituição Federal de 1998 e na LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação


Nacional de 1996 vem dar um novo rumo para as creches e pré-escolas, antes dessa
legalidade, as creches em sua maioria estavam na responsabilidade de órgãos não
educacionais, especialmente na área de bem estar social, já as pré-escolas mesmo fazendo
parte dos sistemas de ensino precisavam de uma legalização mais clara, pois a LDB 5.692 de
1971 apenas dizia que os sistemas de ensino deveriam “zelar” pelas crianças menores de sete
anos, idade em que se inicia o período de escolaridade obrigatória.

As reformas educacionais da década de 90, no Brasil, entre outras importantes


mudanças, trouxeram as instituições de educação infantil, que atendem as crianças
de 0 e 6 anos de idade, para o âmbito de ação da educação, enquanto campo legal,
burocrático, institucional e ideológico. Essa mudança, ainda em processo, recuperou
antigos conflitos e contradições, os quais historicamente sempre permearam o
atendimento a essa faixa de idade, fazendo-os reaparecer sob novas formas e novos
discursos (CAMPOS, 2002, p. XII ).

Tais mudanças ocorridas na oferta à educação da criança, se deram em meio aos


debates nacionais em consonância com os movimentos sociais no final do período militar,
essas mobilizações vinham de vários grupos sociais, que de acordo com Campos (2002, p.
XIII).

Essas mobilizações partiam de vários grupos sociais, dentre os quais grupos de


mulheres que lutavam por creches nos bairros, feministas, sindicalistas, grupos que
organizavam creches e “escolinhas” comunitárias, grupos de defesa de crianças e
adolescentes em situação de risco, sendo muitos desses movimentos ligados a Igreja
Católica. O debate incorporou associações profissionais e acadêmicas, criando-se
um consenso sobre a necessidade de definir claramente a natureza educacional do
trabalho realizado em todas as modalidades de atendimento coletivo de crianças na
faixa etária de 0 a 6 anos de idade.

Campos (2002) enfatiza, que importantes inflexões ocorreram ao longo desse debate: a
ênfase no direito das mulheres ao atendimento de seus filhos durante o período de trabalho foi
substituída, o que permitia que a qualidade desse atendimento passasse também a ser
questionada. Por sua vez, os diagnósticos disponíveis sobre as instituições existentes levaram
a uma aposta de que a área de educação estaria mais bem preparada para garantir uma
melhoria na qualidade do atendimento às crianças.

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As exigências de formação incorporadas à LDB são coerentes com essa opção, ao


definir como meta a formação em nível superior e, como exigência mínima, a formação em
nível médio, na modalidade normal, que é o mesmo tipo de qualificação requerida para os
professores das quatros primeiras séries do ensino fundamental

● A Experiência como docente, cada vez maior, e que é partilhada com a maioria da
população, uma experiência que supõe socialização (conhecimento comum) do
ensino a partir das concepções e crenças [...] .
● A socialização (conhecimento) profissional mediante a formação inicial
específica.
● A vivência profissional imediatamente posterior no campo da prática educacional
que leva à consolidação de um determinado conhecimento profissional (assumindo-
se esquemas, pautas e rotinas da profissão). Trata-se do chamado período de
iniciação à docência.
● A formação permanente, que tem como uma de suas funções questionar ou
legitimar o conhecimento profissional posto em prática. A formação permanente tem
o papel de descobrir a teoria para ordená-la, fundamentá-la, revisá-la e combatê-la,
se for preciso. Seu objetivo é remover o sentido pedagógico comum, a fim de
recompor o equilíbrio entre os esquemas práticos e os esquemas teóricos que
sustentam a prática educativa (MIZUKAMI apud Imbernón, 2002, p. 15).

A formação inicial sozinha não é suficiente, se faz necessário um conjunto de fatores


como mostra na citação acima, entre esses fatores podemos destacar a formação continuada
como uma das partes desse processo de formação de professores onde Mizukami explica:

A idéia de processo – e, portanto continuum – obriga a considerar a necessidade de


estabelecimento de um fio condutor que vá produzindo os sentidos e explicando os
significados ao longo de toda a vida do professor, garantindo ao mesmo tempo, os
anexos entre formação inicial, a continuada e as experiências vividas (MIZUKAMI
et al, 2002, p. 16).

Aprendizagem da docência

Diversos estudos e pesquisas têm sido realizados tanto no Brasil quanto em outros
países sobre a temática aprendizagem do professor. Ximenes - Rocha (2009, p. 56) afirma que
“estes estudos e pesquisas têm dado visibilidade para a questão da formação de professores”.
Segundo Mizukami et al (2002, p. 47).

Aprender a ensinar e a se tornar professor são [...] processos e não eventos


(Knolwels et al., 1994, p. 286), processos estes – pautados em diversas experiências

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e modos de conhecimentos – que são iniciados antes da preparação formal, que


prosseguem ao longo desta e que permeiam toda a prática profissional vivenciada.

A formação de professores é compreendida como um processo contínuo que não se dá


somente nos cursos de formação, mas é um processo que se desenvolve por toda a vida.
Aprender a ser professor não é um processo que se conclua ao final de longos anos de estudos
e segundo Zeichner (1993) aprender a ensinar é um processo que continua ao longo da
carreira docente e que, não obstante a qualidade do que fizermos nos nossos programas de
formação de professores, na melhor das hipóteses só poderemos preparar os professores para
começar a ensinar.

Aprender a ser professor, nesse contexto, não é, portanto tarefa que se conclua após
estudos de um aparato de conteúdo e técnica de transmissão deles. É uma
aprendizagem que deve se dar por meio de situações práticas que sejam
efetivamente problemáticas, o que exige o desenvolvimento de uma prática reflexiva
competente. Exige ainda que, além de conhecimentos, sejam trabalhadas atitudes, as
quais são consideradas tão importantes quanto os conhecimentos. (MIZUKAMI et
al, 2002, p.12).

Segundo Ximenes-Rocha (2009) as recentes pesquisas têm demonstrado que a


aprendizagem da docência é um processo complexo, porque relaciona diferentes
conhecimentos e as mais diversificadas experiências, e que demanda tempo, porque se
prolonga por toda a vida.

Aprender a ser um bom professor não depende apenas de programas de formação


inicial, por isso entende-se que os futuros professores necessitam ser capacitados para
aprender durante toda a vida.
Aprender a ensinar é um processo complexo que envolve fatores afetivos,
cognitivos, éticos, de desempenho, entre outros (Cole & Knowles, 1993). Para
Calderheald (1996), não se dispõe, até o momento, de um referencial teórico
coerente e abrangente, de uma teoria geral de conhecimento sobre aprendizagem
profissional que possa iluminar processos de desenvolvimento profissional de
professores de modo a informar o desenho de cursos de formação básica e
programas de formação continuada. (MIZUKAMI et al, 2002, p. 48).

Segundo o autor Marcelo Garcia apud Ximenes-Rocha (2009) explica que “uma
característica da aprendizagem ao longo da vida é que todos podem aprender, onde
aprendizagem não precisa limitar-se as instituições formais e tradicionais de formação”. Esse
autor destaca que não se deve considerar apenas como aprendizagem de valor somente aquela

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adquirida em instituições formais, mas têm que se levar em consideração também as


aprendizagens informais e não formais, pois possuem sua devida importância.

Acredita-se que o conhecimento é construído, segundo Mizukami et al (2002), “a


partir de hipóteses que se estruturam e se desestruturam. O conhecimento docente também se
constrói: com a quebra das certezas presentes na prática pedagógica cotidiana de cada um de
nós”. A construção contínua do saber não pode acontecer de maneira isolada, deve ocorrer em
conjunto com pessoas que estão em processo de desenvolvimento profissiona160.

Consideramos que o conhecimento, as crenças e as metas dos professores são


elementos fundamentais na determinação do que fazem em sala de aula e de por que
fazem; que aprender a ensinar é desenvolvimental e requer tempo e recursos para os
professores modifiquem suas práticas; que as mudanças que os professores precisam
realizar de forma a contemplar novas exigências sociais e de políticas públicas vão
além do aprender novas técnicas, implicando revisões conceituais do processo
educacional e instrucional e da própria prática (MIZUKAMI et al, 2002, p. 44).

Os docentes são pessoas adultas, Marcelo Garcia (apud Ximenes-Rocha 2009) faz uma
exposição com relação aprendizagem do adulto, elaborada Knowels (1984), no qual foram
destacados cinco princípios:
1. O autoconceito do adulto, como pessoa madura, evolui de uma situação de
dependência para a autonomia; 2. O adulto acumula uma ampla variedade de
experiências que podem ser um recurso muito rico para a aprendizagem; 3. A
disposição de um adulto para aprender está intimamente relacionada com a evolução
das tarefas que representam o seu papel social; 4. Produz-se uma mudança em
função do tempo à medida que os adultos evoluem de aplicações futuras do
conhecimento para aplicações imediatas. Assim, um adulto está mais interessado na
aprendizagem a partir de problemas do que na aprendizagem de conteúdos; 5. Os
adultos são motivados para aprender por factores internos em vez de factores
externos.

Esses cinco princípios segundo o autor, podem contribuir para a compreensão do


processo de aprendizagem da docência, Marcelo Gargia diz que eles foram minuciosamente
analisados.

160
O conceito de desenvolvimento profissional é recente nos debates sobre a formação de docentes dos diversos
níveis de ensino. A sua importância resulta da constatação que uma sociedade em constante mudança impõe à
escola responsabilidades cada vez mais rigorosa. Os conhecimentos e competências adquiridos pelos professores
antes e durante a formação inicial tornam-se manifestamente insuficientes para o exercício das suas funções ao
longo de toda a sua carreira.

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Os professores necessitam de conhecimentos básicos de como a criança aprende e se


desenvolve em seus aspectos físicos, psíquicos e cognitivos, precisam ter conhecimento dos
conteúdos específicos que devem ser repassados, entender como se dá o processo de avaliação
e assim agir de maneira produtiva dentro da sala de aula diante das crianças.

Caracterização das Comunidades

A escola Santa Maria fica localizada na comunidade de Patos Santarém – Curuá-Una


KM 98 nas proximidades da Serra Grande do Ituquí, considerada um anexo da escola Polo
Santo Antônio, a escola possui 2 salas de aula, sendo que funcionam 4 turmas, uma no
refeitório da escola que corresponde ao Pré I, e outra funciona em 1 barracão coberto de telha
amianto sem piso, e 2 em sala normais, tem 1 diretoria que é dividida com a secretaria.

A comunidade não possui energia elétrica e nem motor de luz, por conta disso as aulas
iniciam bem cedo com horário reduzido, pois, na escola existem turmas do EJA sendo que
eles têm aula até o horário em que a luz solar permita que eles enxerguem (essas informações
estão de acordo com relato de professores e moradores). Não há centro de saúde e o acesso a
escola é bem precário, pois, não há transporte coletivo que chegue até a comunidade. O
ônibus que faz linha para essa região deixa os comunitários, professores e visitantes a uma
distância de até trinta minutos. A estrada não é asfaltada, e durante o inverno a situação piora.
Os professores relatam que tem de andar por dentro de poças de lama para chegarem até outra
comunidade onde é em média uns 45 minutos a distância de uma escola para outra.

Escola Frei Rogério é a única da comunidade de Garrafão, fica localizada na


comunidade próxima a Mojuí dos Campos, Santarém Curuá - Una – KM 26, tem 1 posto de
saúde, conta com iluminação pública, porém nos ramais a situação é precária. As Igrejas são:
católicas (Nossa Senhora da Saúde) e evangélica (da Paz), para o lazer dos comunitários eles
contam com 1 campo de esporte e 1 barracão onde são realizadas as festas, não existe um
sistema público de abastecimento de água, quase todos os moradores têm um poço artesiano
em sua casa. A linha de ônibus é a mesma que faz viagem para o município de Mojuí dos
Campos.

A comunidade conta com 2 telefones públicos, mas a situação de uso é precária. Tem
4 PM Box, porém a polícia que presta serviço para a comunidade é de Mojuí dos Campos, a
comunicação via correio também é feita por Mojuí.

A escola Frei Rogério possui 1 diretoria e secretaria, sala dos professores, 1 cozinha, 1
refeitório, 2 banheiros (feminino e masculino), 6 salas de aula, sendo que a biblioteca é
dividida com a educação infantil, o espaço fica bastante reduzido.

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A escola Jarbas Gonçalves Passarinho fica localizada na comunidade do Tabocal, as


margens da BR 163 Santarém Cuiabá KM 22, pavimentada e em bom estado de conservação.
O sistema de abastecimento de água é feito através de micro sistema, onde cada comunitário
paga uma taxa para a manutenção. Possui iluminação elétrica e várias linhas de ônibus dão
acesso a este local.

A escola possui 9 salas de aula sendo que uma é de informática, 1 diretoria que é
dividida com a secretaria, 1 refeitório, 1 cozinha, 2 banheiros (feminino e masculino) e 1 sala
de professores. A sala de educação infantil não funciona na escola polo Jarbas Gonçalves
Passarinho e sim em um anexo localizada na comunidade de São José, onde funciona a
Associação dos Moradores.

Atualmente o município de Santarém conta com dezesseis unidades municipais de


educação infantil, sendo apenas uma delas localizada na zona rural do município, a UMEI
Ubaldo Corrêa que está localizada na comunidade do Tabocal. As quinze unidades restantes
estão localizadas na zona urbana localizadas por bairros da cidade: Floresta, Nova República,
Esperança, Santana, Matinha, Cohab, Interventoria, Santarenzinho, Maracanã, Urumari, Área
Verde, Aeroporto Velho, Santa Bárbara, Fátima e no bairro do Caranazal.

A partir do dia 14 de fevereiro do ano de 2009 as creches, como eram chamadas,


foram repassadas da SEMTRAS – Secretaria Municipal do Trabalho e Assistência Social para
a SEMED – Secretaria Municipal de Educação como relata a Coordenadora de Educação
Infantil do município:

Foi um momento difícil para nós também, porque essa transição era um momento
novo para todos que estão envolvidos no trabalho, coordenadoras, professoras, os
pais, passar da assistência as crianças para o educar. Então se passou apenas da
assistência a criança, onde o pai deixava as crianças na creche para poder trabalhar,
e lá era tratada a questão do banho da higiene dessa criança, do ficar com as crianças
enquanto os pais iam trabalhar, hoje não, hoje é feito todo um trabalho pedagógico e
nós temos até a proposta que é trabalhar em conjunto o educar, o cuidar e o brincar,
que está estabelecido no referencial curricular da educação infantil, sendo que o
cuidar não deixou de acontecer, mas nós trabalhamos esse tripé em conjunto. (C1)

Formação De Professores da Educação Infantil do Campo

A pesquisa teve um eixo primordial como objetivo de investigação: Analisar como se


dá a formação de professores para atuar na educação infantil na escola do campo em Santarém
– Pará

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As entrevistas individuais foram desenvolvidas em três escolas do campo e uma


Unidade Municipal de Educação Infantil, com quatro professoras que trabalham na educação
infantil e com a coordenadora da educação infantil do município de Santarém. Neste trabalho
serão utilizadas as seguintes denominações de P1 para a primeira professora entrevistada e
assim sucessivamente, P2, P3, P4, e C1 para a coordenadora da educação infantil.

De acordo com o Art. 62 da LDB 9.394/96 :


A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior,
em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos
superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do
magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental,
a oferecida em nível médio, na modalidade Normal.

Segundo o que diz a LDB, todas as professoras que participaram da pesquisa possuem
a formação mínima exigida (o magistério), porém a professora P2 afirma que há vinte anos o
Ensino Médio na modalidade normal lhe ajudou, mas para atualidade já não lhe serve tanto
devido os avanços na tecnologia:

Olha! O magistério que eu me preparei não me ajuda tanto porque agora nós já
estamos muito mais avançados do que no tempo que eu estude, é né, no tempo que
eu estudei era, nós tínhamos a didática a metodologia ai ensinava a gente como
trabalhar como dar aula só que hoje a realidade já é muito diferente do que no
tempo que eu estudei não tinha televisão era uma casa ou outra que tinha telefone
quase que a gente nem ouvia falar né então pra mim me ajudou naquela época.

A coordenadora da educação infantil de Santarém relata:


Todos hoje na nossa rede tem o magistério, quem não tem professor habilitado a
nível magistério só é as creches que são unidades, hoje a partir do momento que
passou para SEMED, mas nós só temos três professores que não tem magistério mas
elas estão atuando como auxiliar, e farão o Pró Infantil que é um programa do
governo federal que estará iniciando agora em julho e o resto todos tem habilitação
em magistério. Tanto da cidade quando do campo! (C1).

A entrevistada C1 afirma que todas as educadoras da educação infantil do município


de Santarém tem a formação mínima, porém os dados mostram que no Pará ainda existem
7,30% de professores sem o magistério.

O ingresso dessas professoras na docência (escolha da profissão) se deu após a


conclusão do magistério, porém sem nenhuma experiência de sala de aula, algumas optaram

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pela profissão por falta de opção na cidade e outras porque acabaram gostando da docência
após a entrada no magistério e universidade.
Olha de primeiro eu achava que eu não tinha paciência sabe, quando me colocaram
porque tu não estudas magistério? Eu? trabalhar com o filho dos outros nem um
pouquinho, mas depois eu vi que era bom porque comecei trabalhar com crianças e
sei lá elas se apegam assim muito com a gente entendeu? A gente já sente falta
quando eles não tão perto da gente e ai a gente vai se adaptando vai se acostumando
e vai gostando. (P2)

Depois que eu passei no vestibular... foi, ai eu acabei gostando. (P4)

A faixa etária dessas crianças que são atendidas é entre 4 e 5 anos que corresponde ao
Pré I e Pré II. A professora fala que a turma dela é do Pré I (4 anos) “ É de quatro e cinco
anos, essa é a turma de 5 anos porque muitos completaram 5 na metade do ano’’(P1).

Podemos perceber a ausência do planejamento em conjunto das atividades diárias,


segundo Queiroz (2003) o planejamento escolar tem o compromisso de orientar o trabalho do
professor no sentido de direcionar um caminho, o planejamento organiza, sistematiza, e
disciplina a liberdade individual e a coletiva. Segundo relatos das professoras cada uma faz o
seu e se vira como pode, até mesmo o planejamento anual eles não tiveram.

Não houve planejamento na escola de um modo geral ou só na educação infantil?

Não houve porque nós ficamos de planejar lá na serra que é a escola Santo Antônio,
na semana que nós fomos para planejar só houve uma reunião assim rapidinho e na
outra semana já começava as aulas e não houve e essa turma de educação infantil eu
peguei agora em agosto (P2).

A gente trabalha individual eu faço o meu planejamento individual a outra


professora faz o dela (P1).

A professora dentro de suas limitações tentam adequar seus conteúdos de acordo com
a realidade da zona rural. A professora P1 diz que “as vezes eu tento sim adaptar à realidade
deles”. Já a educadora P2 diz assim:
Por exemplo quando eu trabalho as vogais eu sempre vou focando as frutas o que
eles conhecem aqui, os animais entendeu?eu não procuro buscar outras palavras lá
dá onde eles nem conhecem, sempre que eu coloco a letra A por exemplo eu
enfatizo bem o Açaí o B a Bola do Boi eu vou sempre enfocando com a realidade
que eles conhecem com que eles vivenciam.

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Formação Continuada

Segundo dados da Secretaria Municipal de Educação a prefeitura fornece a formação


continuada para os educadores que atuam no meio rural, porém ela é oferecida na cidade e
cada professor é quem custeia suas despesas. Porém durante as entrevistas houve distorções
nas informações.
Na Pré-escola desde 2006 nós tivemos formação continuada para todos os
educadores, nas creches nunca teve formação, esse ano que passou para a SEMED
teve para todas, ai todas são deslocadas para a cidade (C1).

Olha ela oferece sim, mas nós é que temos de estar indo até a cidade por nossa conta
(P1).

Como ocorre a formação continuada?

Mais de uma vez por ano, teve o Pró-letramento mas eu não to fazendo porque eu
não sabia, quando eu fui já tinha começado e eu já tinha duas faltas ai, eu
não podia mais fazer (P1).

E o Pró Infantil a senhora está fazendo? “Eu não fiquei sabendo, esse aí eu não sabia
não, tem que ir lá ai fica difícil né porque eu só vou no final de semana para cidade, por que
eu estudo aos sábados e a SEMED só funciona até sexta feira” (P1).

Maninha depois que eu entrei aqui houve uma para turma da EJA, mas nós nem
soubemos quando soubemos já tinha passado, nós fomos convidadas para o Pró-
letramento esse ano que ia começar em junho como eu trabalhava com primeira e
segunda série, eu fui me inscrever para fazer o Pró-letramento só que depois
disseram que eu não podia mais fazer por eu já tinha deixado a primeira já tava só
com o ensino fundamental ai eu não fiz o Pró-letramento mas eu acho que é a único
curso que eles fazem é esse (P2).

Não... formação continuada mesmo não existe o que tem são algumas palestras isso
as vezes, muito difícil acontecer (P4).

O acesso a formação continuada para os docentes que atuam na escola do campo em


Santarém é muito precário, pois devido a distância da zona rural eles acabam ficando sem

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informações da formação que a SEMED oferece. Segundo Mizukami (2002) cursos dessa
natureza não se enquadram em formação continuada e sim em eventos.

Aprendizagem da Docência

Foi perguntado para as educadoras se a formação no curso de Licenciatura ajudou na


construção do aprendizado para lecionar na educação infantil, as respostas obtidas foram:
A minha formação era mais para Ensino Médio né mas ai, eu já tenho magistério
eu acredito que ele ajuda muito mais. Trabalho há 19 anos só de magistério,
educação infantil nessa idade e o primeiro ano (P2).

Com certeza com novas metodologias e teorias (P4).

A faculdade agora que to fazendo tá ajudando bastante eu vejo assim a diferença


dos conhecimentos que a gente vai adquirindo lá, ai já dá para repassar alguma
coisa nova pra eles já dá para usar aqui porque o conhecimento nunca para (P1).

O ingresso no curso de formação em nível superior para algumas professoras auxiliou


na construção do aprendizado para lecionar na educação infantil, para outras não auxiliou
muito, pois o curso de formação estava voltado mais para o ensino médio.

Quando perguntamos para as professoras como elas aprenderam a ser educadoras da


educação infantil na escola do campo obtivemos as seguintes respostas. A professora P1
falou:
Aprender mesmo aprendi na prática do dia a dia, mas só que já tinha um
conhecimento porque a minha mãe já era professora daquele antigo curso que tinha
MINERVA de 1ª a 5ª série ai ,professora, já se formava já podia trabalhar na sala de
aula ai, a mamãe sempre deu aula em casa para crianças pequenas ai eu morava com
ela já acompanhava e fui aprendendo um pouquinho. Antes de trabalhar aqui eu
nunca tive experiência, de sala de aula não, aprendi mesmo na prática e as colegas
em grupo uma vai ajudando a outra orientando eu no meu caso como é um trabalho
novo elas sempre me dão uma orientação uma ajuda assim né. No dia a dia ta sendo
construída e a faculdade agora que to fazendo ta ajudando bastante eu vejo assim a
diferença dos conhecimentos que a gente vai adquirindo lá ai já dá para repassar
alguma coisa nova pra eles já da para usar aqui por que o conhecimento nunca para
. O trabalho se torna difícil porque não tenho uma sala própria para trabalhar com as
crianças, trabalho com quinze crianças é muito difícil porque a gente não tem um
material adequado, quadro né um ambiente adequado para trabalhar com eles e
como é uma experiência nova isso já é uma dificuldade para ser enfrentada no dia a
dia.

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A professora mencionada acima fala que “o aprendizado a gente constrói no dia a dia”,
Freire (1995) afirma que “Todos nós temos que ser aprendizes. O bom professor é aquele que
aprende a cada dia”.

Durante a entrevista ela afirmou que as dificuldades são imensas, pois não tem sala
própria tem de passar o dever de cada um no caderno, eles ficam inquietos enquanto esperam
a professora terminar de todos, e na hora do lanche eles precisam se retirar guardar tudo, pois
é nesse ambiente que as crianças merendam. Não tem material pedagógico para fazer um
cartaz ou algo assim para diferenciar as aulas, se quiser fazer diferente tem que trazer material
de casa.

A educadora P2 relata como aprendeu e como está aprendendo:


Olha o magistério que eu me preparei não me ajudou tanto porque agora nós já
estamos muito mais avançados do que no tempo que eu estudei né no tempo que eu
estudei era... nós tínhamos a didática né metodologia ai ensinava a gente como
trabalhar como dar aula só que hoje a realidade já é muito diferente do que no tempo
que eu estudei não tinha televisão era uma ou outra casa que tinha telefone quase
que a gente nem ouvia falar né então pra mim me ajudou naquela época né mas
pra agora agente tem que...eu que vou construindo a cada dia com as crianças
trocando experiência com as outras professores até agora mesmo nos
meus planos de aula que eu fazia, eu fazia de um jeito ai eu fui com
uma outra professora que já trabalha com educação infantil da SEMED mesmo eu
disse colega como é que tu faz o teu plano de aula porque eu to fazendo dessa
maneira, não Maria2 não é assim é dessa maneira então eu to até refazendo o meus
planos todinhos to refazendo, a construção ta sendo feita a cada dia olha ai meus
planos agora que eu to passado eles todinhos porque eu fazia totalmente diferente
agora não, já tenho uma base eu não fazia assim, Isso a SEMED não orientou em
nada eu que tive que correr atrás para eu poder fazer a coisa direita.

A entrevistada P2 trabalha como professora há 19 anos, porém, na educação infantil


este é o primeiro ano, e está construindo seu aprendizado através de trocas de experiências
com as colegas de trabalho, segundo Ximenes-Rocha (2009, p. 67) “os primeiros anos são
cruciais para o desenvolvimento dos professores e, junto com o processo de aprendizagem da
profissão, o professor inicia o seu processo de desenvolvimento profissional”.

A professora P3 tem magistério e relatou o seguinte:

Bom eu fui convidada pela diretora da escola, devido o meu trabalho, eu trabalhava
com festinha de criança, me vestia de palhaça, e fazia toda a festa, os comes e bebes
as brincadeira e tudo, e eu sempre tive esse amor por criança, e daí a professora viu
o meu trabalho, e quando eu entrei em agosto de 2007 na escola na 4ª série, eu fiz
um trabalho com fantoche, ela me viu muito chegada com as crianças e então ela me
disse “o seu lugar eu acho que não é na 4ª serie e sim com as crianças na educação
infantil. Então ai eu comecei realmente construir os conhecimento para trabalhar
com as crianças.

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Podemos perceber que a docência ainda na atualidades é vista por algumas pessoas
como vocação em alguns momentos e não como profissão, pois se gosta de criança já pode ser
professora como é o caso dessa gestora.

A educadora P4 que tem graduação em Pedagogia e explica:

Bem eu aprendi né de acordo com as novas habilidades que estavam sendo propostas
pra mim e de acordo com o que eu estava vivendo também. Bem, a faculdade ajuda
sim em teoria com certeza e bem, agora a prática é complicado é totalmente
diferente porque a minha construção foi a partir do método ABL foi empurrado eu
tinha que aprender então foi essa a minha experiência (método ABL – partindo de
um texto bem longo o que eu vi era longo e ai que você teria que identificar aquelas
palavras de acordo com o que lhe pedia e ai você aplicaria isso né para o aluno e os
exercícios também teria que ser de acordo com o método da ABL), bem alguém me
deu o suporte e me mostrou está aqui segue isso ai né eu teria que seguir mesmo sem
ter conhecimento ai a gente vai aprendendo assim aos poucos, e é isso eu diria que o
conhecimento de várias coisas que nos colocam e pela busca também a gente vai
construindo isso daí.

Durante seu início de carreira docente foi complicado teve que ir aprendendo ao
poucos, buscado informações com os mais experientes na área, diz que na graduação tem
bastante teoria, porém prática é bem pouca.

Mizukami (et al, 2002, p. 22) fala do papel da formação inicial na formação docente.

[...] embora a formação seja condição necessária, mas não suficiente, em si mesma,
para conseguir melhores professores, ela é capaz de proporcionar um bom suporte, a
fim de prepará-los para atuar na profissão.

O papel da formação inicial segundo Imbernón (apud Mizukami, 2002) “é fornecer as


bases para construir um conhecimento pedagógico especializado, pois, constitui-se, segundo
ele, no começo da socialização profissional e da assunção de princípios e regras práticas”.

As entrevistadas relatam que estão aprendendo a docência no dia a dia, com ajuda de
outras profissionais que já tem mais experiências, e que a faculdade ajudou bastante porém,
reconhecem que não é suficiente e sentem a necessidade da formação continuada.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

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A problemática da formação de professores para atuar na educação infantil se


configura em todo o país, em especial na região norte, principalmente quando nos reportamos
para a formação de professores que atuam nas escolas do campo. Entende-se que a formação
docente precisa ser olhada como algo sério e necessário para melhorar a qualidade da
educação pública brasileira.

A pesquisa proporcionou uma análise dda educação na escola do campo em Santarém


- Pará. No campo não está acontecendo a formação de acordo como os estudiosos afirmam
que deve ser, e como pede o Referencial Curricular Nacional para educação infantil e a LDB.
Os docentes não estão tendo formação para melhorar as suas práticas educativas.

Os dados da SEMED mostraram que todas as educadoras da educação infantil que


lecionam na pré-escola da rede municipal, atualmente possuem a formação mínima, nas
creches as que não tem o magistério são auxiliares.

As capacitações ou treinamentos que são destinados aos professores da educação


infantil da escola do campo precisam ser revisadas, pois através desse meio pode-se resgatar e
fundamentar estratégias, meios ou metodologias que fundamentem com melhor abrangência a
vida da comunidade onde a escola ou unidade está inserida.

Percebeu-se também a ausência de um planejamento em conjunto das atividades a


serem desenvolvidas na escola. Cada um faz o seu e se vira como pode, os professores sentem
muitas dificuldades e questionam a necessidade desse planejamento para melhorar sua prática
docente.

Constatou-se ao longo do estudo que a formação continuada não chega até os


docentes, a Secretaria Municipal de Educação até fornece porém, devido as comunidades
serem distantes do centro urbano acabam ficando sem informações e acesso. Segundo relatos,
o que chega até eles não é formação continuada e sim uma palestra, entre outros que são
considerados eventos. Podemos afirmar que não está sendo efetivado o que está na LDB 9.
394/96 no ART. 67, no inciso, VIII “aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com
licenciamento periódico remunerado para esse fim”.

Averiguamos que mesmo com as condições precárias de trabalho, péssima estrutura


física da escola, falta de recurso pedagógico, local inadequado para morar, entre outros, as
professoras preocupam-se em estar buscando conhecimentos com os mais experientes na área,
para melhorar suas práticas pedagógicas, tentando sempre trabalhar de acordo com a realidade
das crianças.

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Os resultados apontam que se fazem necessárias políticas públicas que contemplem


essa educação, principalmente a educação infantil. E como sugestão para melhorar essa
problemática indicamos as seguintes:

Programas de formação continuada considerando a especificidade da docência na


educação infantil no campo; Melhoria da estrutura física das escolas de modo que permitam
ao professor acesso a melhores condições de trabalho; Melhores salários; Metodologia
adequada com a realidade do campo.

Espera-se que os resultados obtidos neste trabalho possam contribuir para os estudos e
reflexões acerca da Educação no campo.

REFERÊNCIAS

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BRASIL. MEC. Plano Nacional de Educação. 2000. Brasília

BRASIL. MEC. Lei de diretrizes e bases da educação. Lei nº. 9.394 de 20 de Dezembro de
1996. Brasília

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agricultores (MPA). www.adital.com.br acessado em 18/12/2005. Apud: Educação Popular
(Do campo, ambiental das relações étnico-racial) no cotidiano pedagógico. Jornada de
formação continuada – Santarém, Novembro/2009.

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Reformas Educacionais Brasileiras. In OLIVEIRA-FORMOSINHO, Júlia, KISHIMOTO,
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CANDAU, Vera Maria. Formação continuada de professores: tendências atuais. In:


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MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti. (orgs.). São Carlos: EdUFSCar,1996, p. 139-152.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São


Paulo: Paz e Terra, 1996.

MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti, et al. Escola da Aprendizagem da docência:


Processos de investigação e formação. São Carlos: EduFSCar, 2002.

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XIMENES-ROCHA, Solange, A formação docente na escola do campo na amazônia oriental:


relatos de pesquisas. In Ximenes-Rocha, Solange, Colares Maria Lilia Imbiriba Sousa (Org.).
Aprendizagem da Docência: reflexões sobre os cursos de formação, a inserção profissional e
as recentes pesquisas na área. Curitiba: CRV, 2009. cap.10, p. 145-152.

XIMENES-ROCHA (et al), Aprendizagens de professoras leigas na escola do campo: relatos


de pesquisas. In: XIMENES-ROCHA, Solange; COLARES, Maria Lília Imbiriba Sousa.
Aprendizagem da Docência: reflexões sobre os cursos de formação, a inserção profissional e
as recentes pesquisas na área. Curitiba: CRV, 2009. cap 4, p. 56-58.

ZEICHNER, Kenneth. A formação reflexiva de professores: idéias e práticas. Lisboa,


EDUCA.

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EIXO 3: RELATOS DE EXPERIÊNCIAS

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ANÁLISE DESCRITIVA DE UMA PRÁTICA DOCENTE EM GRADUAÇÃO NO


CURSO DE AGRONOMIA DO INSTITUTO EDUCAR
Jacir João Chies. Professor e Coordenador Geral no
Instituto Educar/ Pontão/RS. Mestrando no Programa de
Pós-Graduação em Sistemas de Produção Agrícola
Familiar, da Universidade Federal de Pelotas – UFPEL. E-
mail: jacirchies@yahoo.com.br
Jaqueline Mendes. Estudante de Agronomia no Instituto
Educar - UFFS. E-mail: jaquemnd@gmail.com
Mathias Cristofp Weber. Estudante de Agronomia no
Instituto Educar - UFFS. E-mail:
mathiaseducar@gmail.com
Cristina de Fragas. Médica Veterinária no Instituto
Educar. E-mail: fragascristina@gmail.com
Flávia Feldmann Flores. Estudante de Medicina
Veterinária – IDEAU. E-mail:
flavia_mtd_jovem@yahoo.com.br

Na abordagem sociocultural, o ato educativo não se restringe apenas a educação


formal, por meio da escola, mas a um processo amplo de ensino e aprendizagem, inserido na
realidade social. A educação é vista como um ato político, que deve provocar e criar
condições para que se desenvolva uma atitude de reflexão crítica, comprometida com a
sociedade e com a sua cultura. Portanto, deve levar o indivíduo a uma consciência crítica de
sua realidade, transformando-a (MIZUKAMI, 1992).
Dessa forma, o aspecto formal da educação faz parte de um processo sociocultural,
que não pode ser visto de maneira isolada, nem tampouco pode ser priorizado. Essa
abordagem tem origem no trabalho desenvolvido pelo educador Paulo Freire e no movimento
de cultura popular, com ênfase principalmente na alfabetização de adultos. Podemos assim
caracterizá-la como uma abordagem interacionista entre o sujeito e o objeto de conhecimento,
sendo o sujeito elaborador e criador do conhecimento (MIZUKAMI, 1992).
Tendo em vista estas considerações, o presente trabalho tem a finalidade de apresentar
a análise descritiva de uma prática docente desenvolvida durante uma aula ministrada no
primeiro semestre de 2018, no Instituto EDUCAR, a luz dos pressupostos que sustentam a
abordagem sociocultural de ensino, mais especificamente no referencial teórico-metodológico
de Paulo Freire.
A prática docente na abordagem sociocultural pressupõe que a relação entre professor
e aluno deva ser horizontal, ambos se posicionando como sujeitos do ato de conhecimento.
Ao professor cabe desenvolver a sua prática como um facilitador do processo e ensino e
aprendizagem, agindo como orientador quando solicitado, valorizando a subjetividade dos
alunos, seu potencial criativo, sua espontaneidade, crenças, valores, princípios e história de
vida.

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Partindo desta compreensão, o objetivo principal da aula ministrada consistiu em


desenvolver um processo educativo-reflexivo acerca das experiências vivenciadas pelos
educandos (as), seu protagonismo em relação ao processo de ensino e aprendizagem. O
levantamento de informações, ocorreu no primeiro semestre de 2018, baseando-se nos
princípios do Diagnóstico dos Sistemas Agrários este que é definido por Malzoier; Roudart
(2008) “como instrumento intelectual que permite compreender a complexidade e as
transformações históricas relacionadas ao modo de fazer agricultura no mundo”, para a
definição dos sistemas de produção representativos nas famílias que participam do projeto.
A referida atividade ocorreu no Instituto Educar, este fruto da construção de
movimentos sociais, com o objetivo de formar seus jovens pensando em tecnologias
apropriadas a suas realidades, desenvolvendo um processo pedagógico, pautado na pedagogia
da alternância com vistas ao ensino de seus (suas) educandos (as), conhecimentos ligados ao
desenvolvimento rural sustentável, dentro dos princípios da agroecologia e com enfoque na
agricultura camponesa. A oficialização do Instituto, ocorreu em janeiro de 2005, com uma
parceria entre o MST, INCRA e IFRS – Campus Sertão, localizado na Área 09 do
Assentamento da antiga Fazenda Anonni, no município de Pontão.
Dessa forma a aula ministrada contemplou uma atividade do Projeto de Extensão, que
conta com a assessoria importante de professores especialistas da UDELAR (Universidade da
República do Uruguai), e tem como objetivo diminuir a distância entre os estudantes do
Instituto Educar, com as famílias assentadas, proporcionando uma troca de saberes, de
tecnologias. Desse modo busca-se consolidar os conhecimentos obtidos em sala de aula e
ajudar aos estudantes para adquirir experiência para que possam contribuir com as famílias
camponesas em seus locais de trabalho depois de formados.
Para as famílias assentadas, o Instituto Educar é uma ferramenta de formação e
apropriação do conhecimento técnico para ser empregado e difundido nos assentamentos e
nas famílias camponesas, sobretudo na área da produção de alimentos sem uso de agrotóxicos.
Estas atividades foram realizadas durante a disciplina de Extensão Rural do Curso de
Agronomia com ênfase em Agroecologia, que é ofertado pelo Instituto Educar por meio do
Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – Pronera em parceria com a
Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS.
A partir daí se dá prosseguimento à disciplina de Extensão Rural juntamente com o
Projeto de Extensão unindo a teoria com a prática.
Vindo ao encontro do que MIZUKAMI (1992) refere sobre a escola na abordagem
sociocultural, que deve ser organizada e estar funcionando bem para proporcionar os meios
para que a educação se processe em seus múltiplos aspectos, sendo um local onde deva ser
possível o crescimento mútuo do professor e dos alunos, quer dizer, a escola deve ser uma
instituição que existe num contexto histórico de uma determinada sociedade.
No que tange à dinâmica da aula nesse dia, o ambiente de sala de aula foi preparado
inspirado na metodologia de Círculos de Cultura proposta por Paulo Freire, na perspectiva de
promover um espaço de trocas de experiências horizontalizado, sendo as

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classes/carteiras/cadeiras escolares dispostas em círculo para facilitar o fluxo de informações


e propiciar a interação entre os sujeitos ali envolvidos. Os Círculos de Cultura são indicados
para os trabalhos com grupos, porque viabilizam uma aproximação entre as pessoas que estão
vivenciando situações semelhantes, e assim contribuindo para o desvelamento crítico dessa
realidade (FREIRE, 1996).
Os Círculos são constituídos de etapas distintas que se inter-relacionam num
movimento que avança e retroage conforme a necessidade de cada situação, prevendo assim
as seguintes etapas: Temas ou Palavras Geradoras, Codificação, Decodificação,
Desvelamento Crítico. Essas etapas ocorrem de forma simultânea exigindo do
professor/facilitador um exercício de mediação para o acompanhamento e participação das
pessoas ativamente nesse processo. Percebe-se, que a partir da explicitação do tema gerador
ou palavras geradoras o processo de codificação, decodificação e desvelamento crítico
poderão ocorrer em um mesmo encontro ou não, dependendo do grau de conscientização dos
envolvidos (BRANDÃO, 1981).
Tendo em mente essas etapas que compreendem o Círculo de Cultura, a aula foi
planejada para ocorrer em três momentos distintos: o primeiro referente a uma apresentação
dos participantes na aula e à preparação da apresentação pelos grupos; o segundo a respeito da
socialização das vivências e apresentação das informações coletadas e, por fim o terceiro
momento compreendendo o debate/síntese destas vivências.
O primeiro momento, de apresentação dos participantes ocorreu de maneira informal e
permitiu que todos pudessem se conhecer, bem como suas expectativas em relação a aula a
ser desenvolvida. A divisão dos alunos em grupos seguiu certas orientações gerais e
específicas para a apresentação, bem como foi acordado o tempo de preparo e posterior
apresentação.
O segundo momento da apresentação pelos grupos, consistiu na socialização das
atividades realizadas nas visitas, onde os educandos realizaram trabalhos práticos ligados às
disciplinas que estão cursando e realizaram coleta de dados primários. Com os dados
coletados foi possível identificar os sistemas de produção que as famílias estão inseridas. Com
os sistemas de produção conhecidos as famílias foram agrupadas conforme a atividade que
imprime a dinâmica da unidade de produção.
Para essas famílias foram identificados os sistemas de produção que segue: grãos,
leite, hortas, outras rendas (aposentados) e Cooptar (Cooperativa de produção familiar).
Para a identificação dos sistemas de produção foi seguido o princípio dos sistemas agrários
onde a teoria dos sistemas agrários é um instrumento intelectual que permite apreender a
complexidade de cada forma de agricultura e de perceber, em grandes linhas, as
transformações históricas e a diferenciação geográfica das agriculturas humanas. Para
compreender o que é um sistema agrário é preciso, em princípio, distinguir, de um lado, a
agricultura tal qual ela é efetivamente praticada, tal qual se pode observá-la, formando um
objeto real de conhecimento, e, por outro lado, o que o observador pensa desse objeto real, o
que diz sobre ele, constituindo um conjunto de conhecimentos abstratos, que podem ser

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metodicamente elaborados para construir um verdadeiro objeto concebido, ou objeto teórico


de conhecimento e de reflexão.
Algumas das atividades coletivas realizadas foram: análise qualitativa de solos, croqui
da unidade de produção e coletas de amostras de água em dez pontos, sendo águas
superficiais (riachos e córregos), e poços artesianos que abastecem as residências das famílias
do assentamento. Essas amostras foram levadas para análise de qualidade no laboratório de
química da UDELAR.
E por fim, o terceiro momento de síntese das vivências e debates propiciados. Para
tanto, contamos com a participação de professores da UFFS, da UDELAR, UFRJ e da
Universidade de La Plata para contribuírem na mediação do processo educativo-reflexivo,
permitindo assim por meio de uma visão interdisciplinar enriquecer esse processo de ensino e
aprendizagem. Cada professor contribuiu apresentando elementos questionadores aos alunos,
o que resultou em seu futuro retorno as famílias para a busca desses outros olhares sobre a
vivência.
Ao encerrar a aula e retomando os ensinamentos de Paulo Freire percebe-se que essa
forma de desenvolver o processo ensino e aprendizagem constrói-se a partir de um esforço
permanente, através do qual os sujeitos vão se percebendo criticamente no mundo e, através
dessa percepção, poderão agir criticamente em sua prática cotidiana, no seu desvelamento,
podendo assim, ocorrer mudanças da realidade.
Os participantes de um Círculo da Cultura, em diálogo sobre o objeto a ser conhecido
e sobre a representação da realidade a ser decodificada, respondem as várias questões
estimuladas pelo professor/facilitador do grupo, resultando no aprofundamento de suas
leituras do mundo, ampliando a sua visão de mundo. O debate que surge daí possibilita uma
releitura da realidade que pode resultar no engajamento do grupo em práticas políticas com
vistas à transformação da sociedade.

Eixo temático: EIXO 2

Palavras-Chave: Abordagem sociocultural. Camponeses. Extensão rural.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é método Paulo Freire. 1 ed. São Paulo: Brasiliense,
1981.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia – saberes necessários à prática educativa. São


Paulo: Paz e Terra, 1996.

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Seminário Regional de Educação do Campo da Região Centro do Rio Grande do Sul

MAZOYER, Marcel; ROUDART, Laurence. História das agriculturas no mundo: do neolítico


à crise contemporânea. São Paulo: UNESP, 2008.

MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti. Ensino: as abordagens do processo. São Paulo:


E.P.U., 1992.

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OLHO D’ÀGUA: RECUPERAÇÃO E PRESERVAÇÃO DE NASCENTES

Pedro Valdir Da Conceição-UFSM (dile.joia@hotmail.com)


Cauana Peyrot Conceição-UFSM (cauanapc@hotmail.com)
Elaine Libardi Andreatta-UFSM (elainelibardiandreatta@hotmail.com)

O presente relato de experiências aborda o tema referente a água. O mesmo foi


escolhido a partir de um desafio lançado pela disciplina de Seminário Integrador I, do Curso
de Licenciatura em Educação do Campo, da Universidade Federal de Santa Maria,
(UFSM).Outro fator determinante para escolha do tema, foi um estudo que iniciou em agosto
de 2017, quando verificou-se a necessidade de realizar ações visando a sensibilização e
conscientização dos educandos das turmas de 4º e 5º anos da Escola Municipal de Ensino
Fundamental Conquista Dezesseis de Outubro do Assentamento Ceres, no município de
Jóia/RS. A escolha do tema emerge da conscientização à preservação da água, visto que a área
das ciências da natureza contempla estudos ambientais, os quais estão dispostos nos planos de
estudos da escola.
A partir do tema, nos reportamos a designação: “Terra das nascentes”, considerando
que Jóia é um dos municípios da região noroeste do Rio Grande do Sul que possui muitas
nascentes de água, que fazem parte de duas importantes bacias hidrográficas, bacia do Rio Ijuí
e bacia do Rio Piratini. Compreendemos que não faz sentido tal denominação se observarmos
nascentes sendo assoreadas ou contaminadas pelo uso indiscriminado de agrotóxicos, insetos
e animais.
Considerando que a maioria das famílias do Assentamento Ceres possuem em suas
propriedades nascentes de água sem a proteção adequada, o que facilita a contaminação do
lençol freático e diminui a qualidade da mesma. Ainda, nos deparamos com precariedade no
saneamento básico nas comunidades do campo, podendo acarretar em doenças ocasionadas
pela contaminação da água.
Diante do exposto, buscamos junto ao poder público municipal, parceria para
desenvolver o projeto: Olho d’Água: Recuperação e Preservação de Nascentes. Trocamos
algumas ideias com o Conselho Municipal de Meio Ambiente (CMMA), o qual demonstrou
interesse na proposta de trabalho. O CMMA nos auxiliou quanto análise os matérias

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necessários, a quantidade e orçamento dos mesmos. Os materiais utilizados foram custeados


com recursos do Fundo Municipal de Meio Ambiente.
Assim, foi sugerido a revitalização de quatro nascentes localizadas no Assentamento
Ceres. Em visita realizada pelo técnico da Secretaria Municipal de Agricultura, Pecuária e
Meio Ambiente e representante Municipal do comitê da Bacia Hidrográfica do Rio e
discussão com a comunidade, selecionamos duas nascentes para desenvolver o trabalho de
revitalização. A escolha deu-se por dois fatores determinantes, primeiro o tempo que
tínhamos para o desenvolvimento do projeto, segundo o fator socioambiental, uma vez que
essas nascentes estão localizadas na propriedade de uma família que ainda não possuía água
potável.
As nascentes revitalizadas encontram-se na propriedade do Senhor Gilmar Moises de
Moura, assentado na comunidade citada, localizada a 12 km da sede do município, com
núcleo familiar de 4 pessoas, sendo dessas, uma aluna do 5º ano. Após seleção da propriedade
e das nascentes, realizamos conversa com a comunidade escolar para definirmos os objetivos
do projeto e a transversalidade do tema na mediação pedagógica.
A primeira ação com o grupo de alunos envolvidos foi visitar o local das fontes para o
seu reconhecimento. Nesse momento foi verificado os materiais necessários para a
recuperação da nascente. Logo após da tomada de preço, foi realizada a aquisição e o depósito
dos materiais no local. Após essa etapa, iniciamos a limpeza das fontes e na sequência a
construção da parede de contenção, drenagem e o fechamento das fontes.
Concluídas as etapas desenvolvimento, retornamos com os alunos ao local,
oportunidade em que foram analisadas as alterações ocorridas em função da recuperação.
Comparamos alguns aspectos, como a mudança ao redor da nascente, coloração da água, a
importância da mata ciliar Nesse momento, houve questionamentos aos alunos quanto as
melhorias observadas no local e os pontos positivos que tal revitalização trouxe para a família,
e para o ambiente. Registramos o momento através de fotografias e bebemos a água das
fontes e ao voltar para a escola realizamos a sistematização de todo o trabalho realizado a
partir do projeto. 0
O trabalho de recuperação e preservação das nascentes, além de possibilitar a garantia
de água de boa qualidade, perpassa pela preservação do meio ambiente e a conscientização
dos alunos e comunidade envolvida. A relevância social e pedagógica desse projeto é

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grandiosa. Social, no sentido de estar beneficiando uma família, mas podendo ser ampliada
para outras, aproveitando o próprio declive do terreno e a capacidade das fontes. Pedagógica
pelo exemplo para demais famílias e comunidade assentada, dispostas a desenvolver projetos
nesse sentido. Ressaltamos que o projeto desenvolvido, contribui para o cumprimento de
metas prioritárias estabelecidas pelo CMMA.
Houve reciprocidade e envolvimento das famílias e educandos, uma vez que o projeto
passou a ser relacionado com o conhecimento científico e contextualizado a nível local,
regional e global, norteando outras ações implementadas pela escola. Foi fundamental para o
resgate das práticas ambientais e agroecológicas, proporcionando visibilidade a escola do
campo, movimentando os sujeitos ali inseridos para abordagens vinculadas às práticas de
agricultura sustentável.

GRUPOS(EIXOS) TEMÁTICOS (GTS): RELATO DE EXPERIENCIA.

Palavras-Chave: Revitalização de nascentes; Educação socioambiental; Escola do


Campo

REFERÊNCIAS:

BARBIERI, J.C.; SILVA, D. Desenvolvimento sustentável e Educação Ambiental: uma


trajetória comum com muitos desafios. Ram, ver. Adm. Mackenzie, v.12, n. 3, Edição
Especial, São Paulo. 2011.

BRASIL. Manual de compostagem doméstica com minhocas. Edição Blue. São Paulo.
2014. CARNITATTO, I.; MULLER, J.M.; GALLEGO, R.C. A utilização da compostagem na
escola como eixo norteador no ensino de ciências. Atas do Evento Os Estágios
Supervisionados de Ciências e Biologia em Debate II. s/d.

DICK, B. (2003). Como conduzir e relatar a pesquisa-ação. In: Richardson, R. J. Pesquisa-


ação Princípios e Métodos, João Pessoa: Editora Universitária/UFPB

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MARAGNO, E.S.; TROMBIN, D.F.; VIANA, E. O uso da serragem no processo de


minicompostagem. Eng. Sanit. Ambient. Vol. 12, nº 4, p. 355-360, 2007. PELICIONI,
M.C.F. Educação ambiental, qualidade de vida e sustentabilidade. Saúde e Sociedade 7(2);
19-31, 1998.

SIQUEIRA, T.M.O.; ASSAD, M.L.R.C.L. Compostagem de resíduos sólidos urbanos no


Estado de São Paulo [Brasil]. Ambiente & Sociedade. V.XVIII, n. 4, p. 243-2664. São
Paulo. 2015.

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O FECHAMENTO DAS ESCOLAS DO CAMPO EM CONTRADIÇÃO AOS


DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Graciela Gobbi Guterra - UFSM – graciela.guterra@gmail.com


Ederson Cleber da Silva – URI – ederson.cleber@hotmail.com
Juliane Paprosqui Marchi da Silva - UFSM – juliane_paprosqui@hotmail.com
Liziany Müller Medeiros – UFSM – lizianym@hotmaol.com

O relato de experiência apresentado a seguir é resultado de um projeto de pesquisa


desenvolvido por acadêmicos do curso de Licenciatura em Educação do Campo da
Universidade Federal de Santa Maria – UFSM e do curso de Direito da Universidade
Regional Integrada – URI campus Frederico Westphalen. A temática diz respeito ao
fechamento das escolas do campo do município de Seberi/RS em contradição aos direitos da
criança e do adolescente. O projeto buscou compreender quais os motivos levaram ao
fechamento das escolas do campo, para a partir daí refletirmos sobre implicações desse
processo na vida dos sujeitos do campo. Para tanto, utilizou-se uma abordagem quali-
quantitativa com a utilização dos métodos da Pesquisa-Ação. Como instrumento para coleta
de dados utilizou-se observação in loco, e entrevistas semiestruturadas com a gestão
municipal. O interesse pela problemática parte da realidade que vivenciamos no município de
Seberi/RS. De acordo com o levantamento de dados realizados pela pesquisa, em 2016 tinha-
se 5 (cinco) escolas municipais ativas no espaço rural do município de Seberi porém,
segundo os dados obtidos, do final de 2016 até o final do primeiro semestre de 2018, 3 (três)
escolas municipais localizadas nesse espaço foram fechadas, possuindo apenas 2 (duas)
escolas em funcionamento hoje. Com o fechamento das escolas Doutor Túlio Luiz Zanchet,
da Linha Carmo, Ministro Tarso Dutra, da Linha Lajeado Bonito e da escola José Ciotti, da
Linha Ciotti, a maioria dos alunos foram transferidos para a Escola Municipal de Ensino
Fundamental Professora Doutora Ada Maria Hemielewski, localizada na área urbana do
município, que atualmente conta com cerca de 580 alunos. Quando fechada a escola Dr. Túlio
Luiz Zanchet contava com cerca de 75 (setenta e cinco) alunos. Já a escola Ministro Tarso
Dutra contava com cerca de 50 (alunos) e a escola José Ciotti contava com apenas 30 (trinta)
alunos. As justificativas apresentadas pela administração municipal atual para o fechamento
das escolas se concentram na inviabilidade financeira em manter tais escolas diante do
número reduzido de alunos. Com a construção da nova Escola Rosa da Silva Braga,
localizada na Linha Nova, todos os 50 (cinquenta) alunos da Escola Alfredo Ramos, da Linha
Chico Domingos, serão transferidos para esta escola. Sendo assim, futuramente teremos
apenas 1 (uma) escola do campo em funcionamento no município de Seberi. O processo de
nucleação das escolas do campo não é algo novo, esse processo proporcionou o fechamento
de algumas escolas do campo. Dados elucidados pela entrevista semiestruturada apontaram

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que para a administração municipal os motivos que levaram ao fechamento das escolas, são: a
quantidade de alunos atendida pelas mesmas, a melhoria do investimento na educação o que
levou ao processo de nucleação das escolas, economizando em transporte e contrato
temporário de professores. Os dados também revelaram que tal iniciativa pelo fechamento
colaborou com infraestrutura das escolas ativas com melhores condições para os laboratórios
de informática e ciências e também com a capacitação continuada dos professores e com
acréscimo de aulas de música e inglês, desde os primeiros anos das séries iniciais. Como
vimos, no município de Seberi as crianças e adolescentes oriundos das comunidades do
interior foram agrupados em núcleos escolares tanto da área rural quanto urbana, e o
transporte escolar se tornou uma condição primordial para que a educação aconteça, em nome
de uma suposta qualidade no processo educativo. Contudo, o fechamento das escolas do
campo foi imposto para as comunidades com argumentos superficiais, que em nenhum
momento levaram em consideração as especificidades dos sujeitos do campo. Apenas a
comunidade da Linha Lajeado Bonito se manifestou primeiramente sendo contra o
fechamento da Escola Ministro Tarso Dutra, porém posteriormente acabou aceitando a
proposta da gestão municipal. Nas demais escolas não houve discussão com a comunidade
que tiveram suas escolas fechadas. Apenas procedeu-se pelo fechamento sem que houvesse
uma discussão acerca dos impactos que essa mudança causaria na comunidade e na vida dos
sujeitos que ali vivem. Como possíveis impactos podemos citar o deslocamento diário dos
alunos para a cidade, que em alguns casos, impulsionou as famílias a abandonarem o campo,
contribuindo para aceleração do êxodo rural. Outro ponto importante é a segurança destas
crianças. As mesmas são deslocadas de suas comunidades em transporte escolar, muitas vezes
superlotados, sem monitores nos ônibus, e com péssimas condições das estradas, colocando
em risco suas vidas. Isto indica uma agressão a qualquer princípio de educação de qualidade.
Além disso, o deslocamento pode prejudicar qualitativamente o desempenho escolar destes
alunos que tem idades entre 4 e 14 anos, pois, saem de suas casas bem cedo, muitas vezes sem
alimentação, percorrendo longas distâncias até a escola, contrariando o disposto no Estatuto
da Criança e do Adolescente – ECA, no qual o artigo 53º, inciso V, estabelece que é direito da
criança “o acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência”. Bem como o artigo
1º das diretrizes operacionais para a educação básica nas escolas do campo, onde diz: “a
educação do campo compreende a educação básica em suas etapas de educação infantil,
ensino fundamental, [...] Esta sendo oferecidas nas próprias comunidades rurais, evitando-se
os processos de nucleação em escolas e de deslocamento de crianças”. Portanto, o argumento
de qualificar a educação, ter poucos alunos ou ter classes multisseriadas não justifica o
fechamento das escolas. Segundo o artigo 23º da LDB, a educação básica poderá organizar-se
em séries anuais, períodos, semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos,
grupos não seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma
diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o
recomendar. Constatou-se que ao longo da história da educação as escolas do campo foram
vistas como aquelas escolas isoladas, sem qualidade no ensino, carência de estrutura física e

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materiais didáticos pedagógicos, fato ainda presente na atualidade. Cabe ressaltar, que a
concentração de alunos em escolas da área urbana ofende os direitos básicos das crianças e
adolescentes, trazendo uma série de prejuízos à identidade cultural e ao processo de
ensino/aprendizagem. Assim, o fechamento das escolas do campo contrariam as legislações
que regem a educação, principalmente nos artigos 1º e 54º do ECA, que estabelecem proteção
integral, especialmente no que se refere à matrícula e frequência obrigatória em
estabelecimento oficial de ensino fundamental. Segundo a Constituição, o fechamento das
escolas do campo fere quatro dimensões do direito a educação: a disponibilidade, a
acessibilidade, a aceitabilidade e a adaptabilidade. É preciso que a educação nas escolas que
ainda restam no campo, leve em consideração as particularidades dos sujeitos, sua cultura,
seus saberes, sua produção e sua vivência. Ao contrário da nucleação escolar que não respeita
estas particularidades, os sujeitos do campo tem o direito de estudar no lugar onde vivem.
Infelizmente o que se presenciou é um desrespeito ao cumprimento do que determina a
Constituição, o ECA, a LDB, o Plano Nacional de Educação e os pareceres e decretos
vigentes no que diz respeito aos sujeitos do campo.

Eixo temático: Resumo expandido.

Palavras-chave: Educação do Campo. Fechamento das Escolas do Campo. Nucleação.

Referências

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB nº 9394, 1996. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/lei9394_ldbn1.pdf>. Acesso em: 13 jul. 2018.

BRASIL. Plano Nacional de Educação – PNE, 2000. Disponível em:


<http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/L10172.pdf>. Acesso em: 13 jul. 2018.

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. São Paulo: Cortez, 1990. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/lei8069_02.pdf>. Acesso em: 10 jul. 2018.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 41 ed.


Brasília/DF: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2014. 466 p.

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AS CONSEQUÊNCIAS DA NÃO REGULAMENTAÇÃO DO ENSINO MÉDIO NA


ESCOLA NÃO URBANA RISOLETA QUADROS

Vera Regina Nuñes Gonçalves


UNIPAMPA - Dom Pedrito
reginanunesdp@gmail.com
Maria Alice Xavier Giacomini
UNIPAMPA – Dom Pedrito
maxgiacomini@hotmail.com
José Guilherme Franco Gonzaga
UNIPAMPA – Dom Pedrito
josegonzaga@unipampa.edu.br

O presente trabalho traz um relato de experiência, vivenciando durante o estágio II do


curso em Licenciatura em Educação do Campo, nos anos de 2017/2018, na Escola Estadual
de Ensino Fundamental Risoleta Quadros, localizada na Vila São Sebastião, no sub-distrito
Torquato Severo, distante 67 Km da sede do município de Dom Pedrito R.S. Atualmente a
referida Escola atende as séries iniciais e o ensino fundamental, o ensino médio funcionava
como extensão da E. E. N. Senhora do Patrocínio, localizada na área urbana de Dom Pedrito.
O curso Licenciatura em Educação do Campo da Universidade Federal do Pampa -
UNIPAMPA- está estruturado no regime de alternância, conforme seu PPC (Projeto
Pedagógico do Curso), ocorrendo em dois tempos, TU (tempo universidade) que corresponde
aos meses de janeiro a fevereiro, e de julho a agosto; e TC (tempo comunidade) que
corresponde aos meses de março, abril, maio, setembro, outubro e novembro. De acordo com
Gimonet (2007) o sujeito em formação no regime da pedagogia da alternância não é um
docente em formação tradicional, mas um formador exercendo múltiplos papéis. Na
pedagogia da alternância são consideradas as experiências dos educandos, educadores e os
saberes populares dos sujeitos pertencentes à comunidade como aporte para a emancipação
humana. Desta forma, dialoga com a lógica freiriana que rompe com a educação bancária,
fortalecendo a relação prática – teoria – prática.

Além de criar um clima facilitador da aprendizagem, garante aos sujeitos da


alternância uma melhor qualidade de vida com ênfase nas relações éticas e
democráticas. A alternância, nesse sentido, oferece aos estudantes inúmeras
possibilidades de mudanças, intensamente (re)vividas na estreita relação entre
escola, comunidade e apoio familiar (GIMONET, 2017, p. 48).

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No primeiro semestre letivo do corrente ano, período correspondente ao TC, o estágio


foi interrompido na Escola Risoleta, pois a mesma havia suspendido o atendimento ao Ensino
Médio em suas dependências por tempo indeterminado. Os alunos que frequentavam a Escola
Risoleta, tiveram que ser realocados em escolas urbanas e não urbanas em cidades da região,
dificultando o acesso dos estudantes a educação.
Há dados do próprio Ministério da Educação e Cultura que demonstram uma
substancial queda de matrículas em escolas em contextos não urbanos entre os anos iniciais e
anos finais do ensino fundamental e uma queda ainda maior em relação ao ensino médio. De
acordo com o último Censo Escolar, um percentual de 12,9% e 12,7% dos alunos
matriculados no 1º e 2º ano do Ensino Médio, respectivamente, abandonaram a escola,
tornando a etapa a mais afetada pela evasão, o 3º ano apresenta índice de 6,8% (MEC, 2017).
Outro dado importante a ser levado em consideração é o fato de que a Escola Risoleta
Quadros era a única escola de Ensino Médio em contexto não urbano de Dom Pedrito. Diante
do exposto objetivou-se conhecer as problemáticas que permearam a desativação do Ensino
Médio na Escola Risoleta.
Sob a óptica do estágio, entende-se este como uma atividade de extensão da vivência
acadêmica, onde os graduandos têm a oportunidade de apreenderam com a sociedade sobre
seus valores e cultura de forma que não os viole, havendo uma troca de saberes entre a
universidade e a comunidade. Para Silva (1997) a comunicação da universidade com outras
realidades possibilita a renovação da sua própria estrutura, seus currículos e suas ações. Por
entendermos a relevância desta integração entre os espaços - comunidade e universidade – no
processo de formação dos licenciandos optou-se por estagiar na escola não urbana com o
intuito de dar veracidade à formação acadêmica, vivenciando o contexto do campo, tendo a
prática como referência. De acordo com Brandão, somente podemos conhecer um local se
tivermos inserido em seu contexto.

Quando você quer apenas contemplar a harmonia de uma noite estrelada, bastam os
seus olhos. Se eles estiverem como os meus, será bom usar óculos. Se você pretende
examinar com mais detalhes uma constelação, vai precisar de um bom binóculo. Se
você deseja examinar mais de perto uma única estrela, procure um telescópio. Mas,
se o seu objetivo é descobrir novas galáxias, vá viver noites sem sono em algum
grande observatório. (BRANDÃO, 2003, p. 97).

Na fala o autor expressa que para analisarmos profundamente a real problemática


existente no âmbito a qual estamos agregados, e se almejamos corroborar de alguma maneira
eficaz, devemos conviver nesses espaços. Seguindo esta linha de raciocínio, deu-se inicio a
busca de dados capazes de trazer o entendimento do motivo da desativação do Ensino Médio
naquela escola. O funcionamento do Ensino Médio era por classes multisseriadas, em média
atendia em torno de 15 alunos, sendo o mais jovem de 17 anos de idade e o mais velho de 52

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anos de idade. O grupo de alunos era composto por adolescentes, alguns filhos de
funcionários de agropecuárias e outros pertencentes às famílias de agricultores da região,
haviam também duas senhoras matriarcas de famílias de agricultores familiares. O quadro de
professores era composto por dois (2) professores pertencentes aquela localidade e o restante
advindos das cidades vizinhas Bagé e Lavras do Sul.
A coleta de informações, as quais nos levassem a entender o motivo do fechamento do
Ensino Médio na localidade, aconteceu em entrevistas com uma professora da Escola Risoleta
e um secretário da Escola Patrocínio. Conforme os relatos da professora o motivo do
fechamento deu-se pela não regularização da extensão com a Escola Patrocínio. A professora
ainda explicou que este sistema de funcionamento é provisório podendo ser exercido por no
máximo três (3) anos, depois de decorrido este tempo devem ser feitas adequações
documentais e estruturais. A referida etapa de ensino funcionou neste sistema desde o ano de
2003 até o ano de 2017, e, não foram realizadas as devidas adequações, fato atribuído a má
gestão do corpo de dirigentes que atuaram junto a Risoleta Quadros ao longo destes quatorze
(14) anos. O secretário informou entender que a Escola Risoleta, visando possibilitar o Ensino
Médio aos alunos daquela localidade, sem estar devidamente habilitada para tal, se valeu da
Escola Patrocínio para poder dar regularidade ao curso, uma vez que as aulas eram
ministradas naquela instituição e por professores da localidade, sendo realizados apenas os
registros na Escola Patrocínio, razão pela qual os históricos de conclusão e demais
documentos eram emitidos por essa escola.
Ao analisarmos o cenário atual de fechamento de escolas no país conclui-se que esta
prática tornou-se comum. O fechamento de escolas em contexto não urbanos acarreta
consequências irreversíveis que perpassam pela a evasão escolar até o êxodo rural. Uma das
principais causas da evasão é atribuída aos deslocamentos realizados por estradas precárias,
consequentemente, ocorrem índices elevados de infrequências, prejudicando, sobremaneira, o
processo de aprendizagem. Desta forma, os estudantes sentem-se desmotivados a dar
continuidade à vida escolar, evadindo, ou, abandonando o campo na busca por continuidade a
sua formação em escolas urbanas.
Muitas vezes a escola é a principal referência da comunidade, fechar escola é crime!
De acordo com TAFFAREL e MUNARIM (2015, p. 45) o fechamento de escolas do campo
“configura-se um crime contra uma nação e sua classe trabalhadora, em especial aos povos do
campo, florestas e águas.” A fala dos autores traz com clareza o desrespeito aos povos do
campo e aos povos de origem, evidenciando a necessidade de lutas por políticas públicas que
assegurem os direitos destes povos, sobretudo, o direito a educação de qualidade. Para
Munarim pensar uma educação para o campo implica em pensar as especificidades dos
sujeitos que integram este campo.

A educação do campo deve compreender que os sujeitos possuem história,


participam de lutas sociais, sonham, têm nomes e rostos, lembranças, gêneros, raças
e etnias diferenciadas. Cada sujeito individual e coletivamente se forma na relação

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de pertença à terra e nas formas de organização solidária (MUNARIM, 2008, p.


11).

Nesse caminhar, vamos compreendendo que por muitas décadas o descaso histórico e
legal do Estado brasileiro, em atendimento a um plano educacional para as comunidades do
campo, e ao mesmo tempo, analisando os muitos estudos que contemplam esta temática,
percebe-se como o Brasil rural, tem apresentado concepções de educação que provocam altos
índices de analfabetismo e baixo nível de escolaridade. Não obstante, compreende-se que o
Ensino Médio da Escola Risoleta sofreu as consequências do descaso supramencionado,
prejudicando sobremaneira os estudantes.

RELATO DE EXPERIÊNCIA

Palavras-Chave: Educação do Campo, Fechamento de Escolas, Ensino Médio.

REFERÊNCIAS:

BRANDÃO, C. R. A Pergunta a várias mãos: a experiência da pesquisa no trabalho do


educador. v.1. São Paulo: Cortez, 2003, p. 97.

MEC Ministério da Educação e Cultura. Disponivel em <http://portal.mec.gov.br/ultimas-


noticias/211-218175739/50411-evasao-no-ensino-medio-supera-12-revela-pesquisa-inedita>
Acesso julho de 2018.

GIMONET, J. C. Praticar e compreender a pedagogia dos CEFFAs. Petrópolis: Vozes, 2007,


p. 48.

MUNARIM, A. Movimento nacional de educação do campo: uma trajetória em construção.


17f. Trabalho apresentado no GT 3: Movimentos sociais e educação, 31ª Reunião Anual da
ANPEd, Caxambu, MG, 2008. Disponível em http://
file:///C:/Users/Windows%207/educacao-do-campo: . Acesso em: 20 Jul. 2018.

SILVA, O. O que é extensão universitária. Integração: ensino, pesquisa e extensão. São


Paulo, v. 3, n. 9, p. 148-9, maio 1997.

TAFFAREL, C. Z.; MUNARIM, A. Pátria educadora e fechamento de escolas do campo: o


crime continua. Revista Pedagógica, Chapecó, v. 17, n. 35, p. 41-51, maio/ago. 2015.

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APRENDENDO SOBRE A CULTURA LOCAL NA ESCOLA

Luan Teixeira de Oliveira, Universidade Federal do Pampa,


luanteixeira@gmail.com
Sarah Bianca Soares da Silva, Universidade Federal de Santa Maria,
sarahbianca.ss@bol.com.br
Luciane da Rosa Soares, Escola Municipal de Ensino Fundamental São Judas,
soaresluciane@bol.com.br

Introdução

A importância de se conhecer e preservar as raízes culturais do povo, para afirmar sua


identidade e para se manter viva na memória do povo. A historia e a cultura não são apenas
trabalhos arqueológicos, mas sim para manter vivo os símbolos, movimentos, contos, lendas
das regiões.
Os conceitos de cultura são de grande numero. De forma colocada no dicionário cultura é
definida, como, todo aquele complexo que inclui o conhecimento, a arte, as crenças, a lei, a
moral, os costumes e todos os hábitos e aptidões adquiridos pelo ser humano não somente em
família, como também por fazer parte de uma sociedade da qual é membro. Sendo assim a
cultura não é fácil de ser conceituada, pois cada individuo tem uma forma de definição de
cultura.
Arias (2002, p. 103) afirma que a cultura é construída através de diálogos do dia a dia das
pessoas, interação social, que se acaba construindo símbolos e significados que tem sentidos a
essas pessoas e são compartilhadas entre as mesmas, esta comunidade fica então repleta de
elementos e significados que identificam este povo como naturais de uma determinada região,
comunidade, surgindo assim a identidade cultura.
Para Coelho (1997, p.54) diz que a cultura faz parte da forma de vida de uma comunidade,
onde são inseridos contextos como hábitos, costumes, valores princípios, manifestações e
expressões culturais e entre outros.
Por Sonia Rodrigues (2008, p. 01), define cultura como “uma forma particular de ser, de
estar, de viver e de sentir o mundo, onde está inserido uma somatória de costumes, tradições e
valores”.
Célio Turino (2006) a define como “uma composição de coisas, um pouco de
entretenimento, de Belas Artes, de alta cultura, erudita, hermética, como também, a história,
costumes, condutas, desejos, reflexões”. Onde a cultura representa uma junção de coisas
desde a visão clássica até a mais popular.

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Quando se conhece a própria cultura, o ser compreende a importância de manter viva a


memória, valorizando e protegendo segundo Barros (2008) proteger não significa defender o
isolamento ou fechamento para outras culturas, mas sim achar meios de promoção de sua
própria cultura, para preservar o quem somos.
Pedroso (l999) afirma que. “Um povo que não tem raízes acaba se perdendo no meio da
multidão. São exatamente nossas raízes culturais, familiares, sociais, que nos distinguem dos
demais e nos dão uma identidade de povo, de nação”. A importância de conhecer sua própria
cultura ajuda na formação da identidade do cidadão sabendo situar-se na sociedade. Pedroso
(1999), cita que "Quem não vive as próprias raízes não tem sentido de vida. O futuro nasce do
passado, que não deve ser cultuado como mera recordação e sim ser usado para o crescimento
no presente, em direção ao futuro. Nós não precisamos ser conservadores, nem devemos estar
presos ao passado. Mas precisamos ser legítimos e só as raízes nos dão legitimidade", dando
importância novamente para a importância de se conhecer a sua cultura. O ser quando
conhecimento de sua cultura e raízes tende a passar e dar valor a este conhecimento de
geração para geração, não sendo esquecidas pelo povo. SILVA, B. S. (2010).
Pode-se destacar alguns aspectos em relação à cultura: através dos meios de transmissão,
na família, na escola, com os professores, na igreja e outros; a cultura deriva de componentes
da existência humana, ou seja, são elementos que colaboram para formar a cultura dentro de
uma sociedade, são diversos os elementos como por exemplo: os ambientais, os psicológicos,
sociológicos, históricos, etc; a cultura é formada de elementos que dão forma a cultura
caracterizando-a, por exemplo: a organização social, a língua usada, as idéias religiosas, o
sistema de ensino etc; a cultura é contínua vive se modificando mas não quebra a sua
permanência na sociedade de origem; a cultura é um instrumento de adequação do homem ao
ambiente, ou seja, o homem se integra ao meio em que vive através dos valores culturais.
(Enciclopédia Barsa, 1972) A escola te grande importância social pois possibilita o aluno
vivenciar todos os dias a diversidade cultural, tendo contato com professores, colegas e
outros. Portanto acredita-se que conhecer suas raízes culturais contribuem para melhorar a
consciência coletiva e o convívio entre as comunidades, onde o cidadão se torna mais sensível
as suas raízes mantendo-as vivas na sociedade em questão.
O objetivo principal do projeto foi promover o conhecimento das características do
município em que a pessoa, criança, vive ampliando seus conhecimentos acerca da historia da
cidade de Caçapava do Sul, Rio Grande do Sul, Brasil.

Material e métodos

Em sala de aula foi desenvolvido atividades com livros, jornais, revistas com aulas
expositivas. Após as aulas em sala de aula os alunos tiveram a possibilidade de visitar locais
importantes para a cultural e formação da mesma no município.

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Resultados e discussão

A educação pode ser considerada um instrumento responsável pela reprodução de valores


sociais, que abrange estruturas políticas, culturais, ideologias, econômicas, religiosas dentre
outra, como observado nas imagens abaixo pode-se verificar que os alunos tiveram contato
com varias destes pontos, integrando assim aspectos atuais originais do passado do município,
como foi contado no museu da cidade, por exemplo.
Na opinião de Azevedo de Jesus (2004), a formação do ser está diretamente implicada,
criticamente, ao seu contexto local, nacional e internacional, porque para se situar no mundo,
é necessário saber sua origens. Valorizando assim sua cidade e aprendendo a ver os lugares
com olhares diferentes.
Carlos (1996) diz que o lugar é um produto de relações humanas e entre homem e natureza,
sendo construído por relações sociais, ao longo dos anos, garantindo assim uma rede de
sentidos e significados que são produzidos pela historia e pela cultura de uma dada sociedade,
produzindo sua própria identidade, uma vez que é nesse espaço que o homem se reconhece
porque é o lugar da vida. A experiência dos alunos em poder ver o nascimento e historia tanto
dos monumentos quanto de pessoas é de grande significado para a sociedade e para a escola
também, pois agrega muita cultura. Furquin (1993), chama a cultura escolar de “mundo
social” da escola, ou seja, “características de vida próprias, ritmos e ritos, sua linguagem,
imaginário, seu regime próprio de produção e de gestão de símbolos”.

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Conclusão

Ao fim do projeto foi relato de forma informal, em sala de aula, pelos alunos, que alem de
poderem aprender em aula com os livros, jornais, entre outros materiais disponibilizados,
assuntos referentes e cidade, e o por que de certos costumes e o poder que cada monumento
teve na cidade, fugindo um pouco da aula didática, sendo de grande interesse e atenção pelos
alunos e também para os familiares que acabaram por aprender um pouco mais sobre a
historia da cidade, sendo contada por seus filhos em casa. A apresentação da historia, pessoas
e os lugares importantes para a historia, economia, cultura, costumes foi de grande
aprendizado alcançando assim o objetivo principal de promover o conhecimento sobre a
cultura de Caçapava do Sul. Onde seus alunos perderam aprender mais sobre sua cidade natal,
oportunizando as crianças a desvendarem lugares, belezas e resgatar elementos constituintes
da identidade do município.

EIXO 2. A educação do campo e a educação dos camponeses (educação escolar e não


escolar).

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Referências

ARIAS, P. G. (2002). La cultura. Estrategias Conceptuales para comprender a identidad,


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Ediciones Abya-yala.

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político da educação do campo. In: MOLINA, M. C.; AZEVEDO DE JESUS, S. M. S.
(Org.). Educação para a construção de um projeto de educação do campo. 5. ed. Brasília:
UnB, 2004. v. 5. p. 109-130. (Educação do Campo).

CARLOS, A. F. A. O lugar no/do mundo. São Paulo: HUCITEC, 1996. 150 p.

COELHO. T. (1997). Dicionário crítico de política cultural: cultura e imaginário. São


Paulo Iluminuras.

DUARTE, Moacir. Disponível em: www.recantodasletras.com.br/poesias


dedicatorias/231710>. . Acesso em: 20 de março de 2018. Enciclopédia BARSA. Volume 5.

Enciclopédia Britânica editores Ltda. Rio de Janeiro, São Paulo.

FURQUIN, Jean-Claude. Escola e cultura: as bases sociais e epistemológicas do


conhecimento escolar. Tradução: Guacira Lopes Louro. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.

Guia turístico de Caçapava do Sul, disponível em: http://turismocacapavadosul.com.br/.


Acesso em 20 de março de 2018.

SILVA, B. S. (2010). A Importância das raízes culturais para a identidade cultural do


individuo; disponível em: https://meuartigo.brasilescola.uol.com.br/artes/aimportancia-das-
raizes-culturais-para-identidade-.htm, acesso em: 22 de março de 2018.

Significados, disponível em: https://www.significados.com.br/cultura/, acesso em: 22 de


março de 2018.

TURINO, C. Uma gestão cultural transformadora. Proposta para uma Política Pública de
Cultura.

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OS SABERES E OS FAZERES DE UMA FAMÍLIA DO IRAPUAZINHO,


CACHOEIRA DO SUL/RS: RELATO DE EXPERIÊNCIA E DE PERMANÊNCIA DA
AGRICULTURA FAMILIAR FRENTE AO AGRONEGÓCIO

André Giovanni Klinkoski – UFSM


klinkoski@yahoo.com

Este relato de experiência traz informações colhidas junto a uma família de agricultores
familiares residentes na localidade de Irapuazinho, distrito da Cordilheira, município de
Cachoeira do Sul/RS. Procura, a partir da busca de dados, apresentar a realidade específica de
uma família que ocupa uma região na qual a posse da terra familiar é quase uma exceção, e
como a Educação do Campo pode oferecer apoio na manutenção desta família no campo, seja
enquanto oferecimento de currículo contextualizado ou com a valorização identitária
camponesa. O presente trabalho surgiu como consequência de uma atividade da disciplina
Agricultura Familiar e Desenvolvimento Rural Sustentável do curso de Licenciatura em
Educação do Campo da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) no primeiro semestre
de 2018, e utilizou roteiro pré-elaborado para a entrevista a ser aplicada em uma propriedade
de agricultores familiares, cujos objetivos são apresentados neste relato: conhecer o cotidiano
familiar, seus modos de vida, trabalho e produção, a circulação de saberes, o oferecimento de
serviços públicos, presença ou falta de assistência técnica e a presença e relevância da
Educação do Campo vivenciada pela geração familiar atual em comparação com a Educação
Rural percebida pelos integrantes mais antigos da família. A família entrevistada foi a
Oliveira Lima da Silva, residente na localidade de Irapuazinho, cuja propriedade fica
aproximadamente a 84 km do centro de Cachoeira do Sul, saindo da cidade são 29 km de
asfalto, depois cerca de 40 km de chão batido em estado razoável (Estrada geral da
Mineração) e mais 14 km de estrada de chão batido mal conservada. As entrevistas foram
realizadas por mim nos dias 18 de maio e 20 de junho de 2018 com Jheriton de Oliveira da
Silva de 15 anos, meu aluno no 9º ano do Ensino Fundamental, as informações também foram
colhidas em conversas informais com Francele de Oliveira Lima da Silva (mãe do Jheriton).
Os integrantes da família são: Jheriton de Oliveira da Silva, que além de estudar participa das
atividades domésticas, cuida do gado, ovelhas, da estufa (cuja produção será detalhada
depois) e das plantações de mandioca e de milho; Francele de Oliveira Lima da Silva, 32
anos, possui Ensino Fundamental, participa das atividades domésticas, cuida das ovelhas e da
estufa; Jerri Adriani Oliveira da Silva (pai), 42 anos, Ensino Fundamental incompleto,
trabalha como marcador de mato na Todesflor Agro Florestal e Pecuária, empresa responsável
pelo reflorestamento das atividades ligadas ao grupo moveleiro Todeschini, participa das
atividades domésticas e cuida do gado, ovelha e das plantações; Ezequiel de Oliveira Lima
(tio do Jhériton), 33 anos, Ensino Fundamental completo, motorista de transporte escolar,
trabalha com carteira assinada, pois não é o dono do veículo e tem criação de porcos, ajuda na

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criação do gado e ovelha e também nas plantações; e Ione de Oliveira Lima (avó), 52 anos,
Ensino Fundamental completo, também cuida das ovelhas e das plantações, e recebe
aposentadoria por tempo de trabalho rural. Todos residem na propriedade. Esses proventos
fixos provenientes do trabalho assalariado ou aposentadoria são mais ou menos importantes
conforme o período, pois os mesmos são mensais e a regularidade dos pagamentos tem um
caráter relevante, pois a principal fonte de renda das atividades agrícolas da família é a venda
de gado, então entre o período de crescimento dos animais, até a venda, as fontes de renda
não-agrícolas têm peso no orçamento. A quantidade de animais comercializados é variável
conforme o ano. Sobre a infraestrutura, há na propriedade duas casas, um trator, uma estufa,
dois galpões para maquinários e um galinheiro. Sobre as características geomorfológicas, em
torno da maior parte da propriedade há duas sangas (riachos), o solo é em maior parte argiloso
e em menor parte, pedregoso. O terreno é majoritariamente plano, com alguns cerros. A
propriedade tem 165 hectares, mas está dividida entre a avó e os filhos, embora na prática
todas as atividades ocorram em sociedade entre todos. Há boa diversidade produtiva, a família
planta mandioca e milho, e na estufa tem hortaliças conforme a época, no momento da
entrevista havia alface, repolho, cebolinha e pimentão. Este cultivo é para consumo próprio,
não sendo comercializado. Na propriedade há criação de 120 ovelhas, em torno de 100
cabeças de gado Braford e oito porcos. A criação é para consumo próprio e também
comercializada, além de ocorrerem trocas: quando um animal é carneado, ele é dividido com
algumas outras famílias, assim como quando as outras famílias carneiam, dividem com a
família entrevistada. Para o lazer, em torno de duas ou três horas diárias são destinadas, sem
considerar o período do sono. E os domingos normalmente são livres, sem atividades no
campo. Aos finais de semana ocorre o encontro da comunidade nas missas, esporadicamente
há bailes nos salões das comunidades e a família vai até a parte urbana de Cachoeira do Sul
para encontrar outros familiares. Como há internet via satélite, também é uma opção para o
lazer. Sobre a prestação de serviços e infraestrutura pública, o posto de saúde mais próximo,
que se localizava cerca de 30 km da propriedade foi desativado, atendimento médico ou
dentista apenas no núcleo urbano da cidade ou em Santana da Boa Vista (mais próxima que
Cachoeira do Sul), tampouco há visitação por agente comunitário de saúde. A escola, nível
fundamental completo, mais próxima também fica a cerca de 30 km. Para o ensino médio é
necessário o deslocamento até a cidade, o qual ocorre por transporte escolar, com embarque
entre nove e dez horas, que chega em Cachoeira às 13 horas, sai da cidade por volta das 18
horas e retorno à residência por volta das 20 horas, rotina diária para quem está no ensino
médio e mora nas localidades próximas. Os serviços funcionam bem, a grande dificuldade é o
acesso a eles se consideradas às distâncias percorridas e o estado precário das estradas locais.
Sobre a presença e atuação de assistência técnica, teve atendimento da EMATER na
propriedade, mas há, pelo menos, cinco anos. De acordo com as lembranças comentadas,
foram informações relacionadas à produção, diversidade produtiva, épocas indicadas para
cultivo e colheita. O pai, Jerri Adriani, teve dois cursos oferecidos pela empresa na qual
trabalha sobre criação de ovelha e gado ministrados na própria Todesflor por um professor de

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Cachoeira do Sul, mas não ligado à EMATER. Por parte da prefeitura, houve visita para fazer
teste da água utilizada na propriedade. O Sindicato Rural participa no controle das vacinas e
das respectivas épocas, a família compra as vacinas na veterinária e apresenta as notas no
Sindicato, dependendo do tipo da imunização o veterinário do Sindicato vai até a propriedade
para a aplicação. Sobre a educação formal, todos os integrantes da família estudaram em
escolas localizadas no campo, Francele e Ezequiel estudaram durante o Ensino Fundamental
na atual escola do filho e sobrinho, EMEF Nossa Senhora de Fátima. Mas segundo as
informações colhidas através da entrevista, na época a escola não realizava atividades em
conjunto com a comunidade, ou sequer propunha um currículo contextualizado à realidade
dos alunos. O pai, Jerri Adriani, estudou em Encruzilhada do Sul, também em escola situada
no campo mas em situação semelhante à anterior, sem maiores evolvimentos da escola no
cotidiano, esta escola não está mais em funcionamento, vítima de processo de nucleação.
Portanto, as escolas da região historicamente possuíam o perfil da Educação Rural, pensada
fora do campo, por pessoas sem ligação com o mesmo e a partir de uma perspectiva da
cidade, que percebe o campo apenas como espaço produtivo e caracterizado pelo atraso
material e cultural frente a uma sociedade considerada evoluída e tecnológica. Mas no caso da
geração atual em idade escolar, estuda na EMEF Nossa Senhora de Fátima, a qual pensa suas
práticas e seu currículo para questões do campo como agroecologia, educação ambiental,
agricultura familiar, empreendedorismo rural e sustentabilidade. Atualmente o currículo da
escola é pensado a partir de projeto global, com os professores trabalhando em conjunto
interdisciplinarmente a partir de temas geradores e subtemas. Algumas práticas do campo são
trabalhadas nas aulas que ocorrem nas salas, no pátio (que conta com ambientes de estudos),
na horta, no galinheiro, na composteira da escola, em trilhas pelo campo. Há palestras e
oficinas ministradas por entidades ligadas ao campo e também por agricultores familiares,
bem como visitas de estudo nas quais são estimuladas atividades de levantamento de
informações acerca de época de plantio, técnicas de criação e outras atividades, como pomar
(enxertia) e composteira, por exemplo. Para tanto, inicialmente são levantadas informações
trazidas pelos alunos, como criações e culturas preferenciais e/ou desejadas pelas famílias. A
vivência em uma escola que coloca em prática a Educação do Campo supera a tendência de
partir para a cidade após a conclusão dos estudos, pois entre os planos futuros está manter a
propriedade para continuar investindo e trabalhando nela. A família entrevistada destoa das
características da população das localidades do distrito da Cordilheira, a grande maioria não é
proprietária do local onde mora, e sim são funcionários de empresas ou fazendas, como
caseiros, serviços gerais, então ocupam casas cedidas ou alugadas. E aqueles que possuem
casas próprias, vivem em localidades (chamadas vilas) com pequenas propriedades, de meio
hectare ou menos, todas muito próximas entre si, impedindo o cultivo ou criação. As
empresas de celulose, reflorestamento, extração de resina, exploração de calcário, entre
outras, geram pequenas periferias temporárias, que se enchem ou se esvaziam de gente
conforme os interesses do mercado. Portanto a maioria dessa população não é fixa, é grande a
rotatividade entre os moradores, pois geralmente são contratados para serviços específicos e

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depois vão para outras localidades, portanto é bastante perceptível a expulsão das pessoas do
campo pelo agronegócio. Os integrantes da família em ambas situações de entrevista
demonstraram bastante satisfação com a vida no campo, com o planejamento futuro de
continuar trabalhando e investindo na propriedade. Inclusive o Jheriton, que concluirá o
Ensino Fundamental este ano, pretende continuar os estudos mas retornar e aplicar aquilo que
aprendeu no local onde reside. Os pontos negativos observados foi a infraestrutura de serviços
públicos, principalmente nas estradas, pois o centro de Cachoeira do Sul fica a 84 km da
propriedade, e Santana da Boa Vista a 46 km. Ambas estradas estão em estado de conservação
precário, o que dificulta bastante as atividades da família, sejam elas pessoais ou ligadas às
questões agrícolas. Sobre as condições da propriedade e do agroecossistema como um todo,
fica clara a importância da permanência das gerações da família no campo, na primeira
entrevista foi comentado como cada geração é capaz de melhorar ou aprimorar as atividades
desenvolvidas e assim, oferecer boas condições para as próximas gerações. Pela percepção
obtida, as atividades agrícolas são realizadas com as informações de dentro da própria família,
com a troca de experiências entre vizinhos, e paulatinamente o conhecimento discutido na
escola do campo (a partir da Pedagogia da Alternância, por exemplo) também é aplicado. Se
houvesse assistência técnica contínua, haveria margem para uma melhora nas condições da
família, embora a qualidade de vida atual possa ser considerada muito boa pelos relatos e
observações realizadas.

EIXO 1. O trabalho do camponês, reprodução social e produtiva dos camponeses e


comunidades tradicionais.

Palavras-chave: Modo de vida camponês; Reprodução social e produtiva dos camponeses;


Educação do Campo.

Referências Bibliográficas

ARROYO, M.G. Políticas de formação de educadores (as) do campo. Cad. Cedes, Campinas,
vol. 27, n. 72, p. 157-176, maio/ago. 2007.

CALDART, Roseli Salete. Movimento Sem Terra: lições de Pedagogia. Currículo sem
Fronteiras, v.3, n.1, pp. 50-59, jan./jun. 2003.

ESCOLA MUNICIPAL DE ENSINO FUNDAMENTAL NOSSA SENHORA DE FÁTIMA.


Proposta Pedagógica. Cachoeira do Sul, 2015. 20 p.

ESCOLA MUNICIPAL DE ENSINO FUNDAMENTAL NOSSA SENHORA DE FÁTIMA.


Projeto Identidade Rural – À luz da Pedagogia da Alternância. Cachoeira do Sul, 2018. 19 p.

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GADOTTI, Moacir. Educar para a sustentabilidade. São Paulo: Instituto Paulo Freire, 2008.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2004.

TRINDADE, Glademir Alves; VENDRAMINI, Célia Regina. A relação trabalho educação na


Pedagogia da Alternância. Revista HISTEDBR On-line, Campinas, n.44, p.32-46, dez. 2011.

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HORTA EDUCATIVA - UM ESPAÇO PARA CONSTRUIR E RESSIGNIFICAR AS


APRENDIZAGENS NA ESCOLA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO BÁSICA
EUCLIDES ARANHA – BORORÉ/MAÇAMBARÁ

JESUS, Loana Martins – E. M. E. B. Euclides Aranha


loanajesus@hotmail.com
LIMA, Natauan Bianchin - E. M. E. B. Euclides Aranha
natauanlima@hotmail.com
VIANA, Andrio Sander Rodrigues - E. M. E. B. Euclides Aranha
andriosandersv@hotmail.com
SCHMITT, Alice Ferreira – IFFar
alicefschmitt@hotmail.com

1-INTRODUÇÃO
No contexto atual é de extrema urgência mostrar para os educandos a importância
de produzir alimentos livres de agrotóxicos em pequenos espaços de terra, pois assim se estará
promovendo práticas sustentáveis aliada a promoção humana, consequentemente deixar-se-á
um ambiente mais sadio para as gerações futuras.
A Horta Escolar é um espaço para promover aprendizagens significativas e visa
mudar concepções buscando transformações entre os atores envolvidos bem como permitir as
abordagens dos diferentes conteúdos curriculares de maneira significativa e contextualizada
buscando integração das diversas áreas do conhecimento.
Ao implementar a horta na escola busca-se o pensamento sistêmico
interdisciplinar, ou seja, ao desenvolver as práticas de cultivo e produção possibilita-se
compilar os inúmeros conhecimentos existentes visto que os educandos são oriundos do
campo, devido a isso tornou-se necessário trabalhar questões relacionadas a realidade dos
alunos que interliguem os diferentes conhecimentos.

2-OBJETIVOS

OBJETIVO GERAL

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Desenvolver atividades didático-pedagógicas do currículo escolar contemplando a


Horta Educativa como um espaço pedagógico contextualizado e significativo.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Promover a construção do conhecimento acerca do meio ambiente como: solo,
água, plantas, cultivo.
Identificar o valor nutricional dos alimentos bem como a segurança alimentar
visando melhor qualidade de vida.
Estabelecer o vínculo educativo entre professor e o aluno a partir das atividades
realizadas levando em conta os saberes das diversas áreas do conhecimento.
Registrar e sistematizar as aprendizagens desenvolvidas promovendo a
interdisciplinaridade pelos sujeitos envolvidos.

3-JUSTIFICATIVA
Este projeto compreende a implementação da Horta Educativa como um espaço
de atividades didáticas-pedagógicas integradas, buscando um novo olhar sobre as práticas de
cultivo de forma ecológica e sustentável.

Precisamos nos tornar (…) ecológicamente alfabetizados. Ser ecológicamente


alfabetizados, ou “ecoalfabetizados”, significa entender os princípios de
alfabetização das comunidades ecológicas (ecossistemas) e usar esses princípios
para criar comunidades humanas sustentáveis (CAPRA, 1996, p. 231).

A Horta Escolar pode-se configurar em um local com aulas diferenciadas aliando


a teoria com a prática despertando o senso crítico e o manejo correto do solo dos recursos
naturais, adubação orgânica, espécies vegetais, desenvolvimento das plantas, fotossíntese,
insetos, luminosidade, temperatura, geração de renda, alimentação, etc. bem como destaca
Capra (2003):
Plantar uma horta e usá-la como recurso para o preparo de refeições na escola é um
projeto perfeito para experimentar o pensamento sistêmico e os princípios da
ecologia em ação. A horta restabelece a conexão das crianças com os fundamentos
da alimentação na verdade, com os próprios fundamentos da vida ao mesmo tempo
em que integra e torna mais interessante praticamente todas as atividades que
acontecem na escola.

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Portanto trata-se de um projeto inovador no âmbito escolar que irá permear por
todo o currículo escolar buscando atividades transformadoras, sustentáveis e significativas.

4-REVISÃO TEÓRICA
Trata-se de sujeitos em construção é necessário desenvolver a importância de uma
educação significativa, bem como despertar valores pertinentes ao ser humano como
paciência, colaboração, interesse, participação, espirito de grupo, criatividade, organização e
também saber produzir com o esforço do seu proprio trabalho se sentindo sujeito
transformador da realidade.

Um pequeno jardim, uma horta, um pedaço de terra, é um microcosmos de todo o


mundo natural. Nele encontramos formas de vida, recursos de vida, processos de
vida. A partir dele podemos reconceitualizar nosso currículo escolar. Ao construí-lo
e cultivá-lo podemos aprender muitas coisas. As crianças o encaram como fonte de
tantos mistérios! Ele nos ensina os valores da emocionalidade com a Terra: a vida, a
morte, a sobrevivência, os valores da paciência, da perseverança, da criatividade, da
adaptação, da transformação, da renovação (GADOTTI, 2003, p. 62).

As aprendizagens adquiridas vem de encontro com a realidade dos alunos, pois os


mesmos são advindos do campo e precisam manter essa relação de amorosidade e
permanência com o campo.
Segundo CALDART (2004) Os povos do campo tem o direito de serem educados
nos lugares onde vivem tendo uma educação pensada e vinculda as questões sociais, culturais
e humanas.
Entende-se por educação do campo uma formação que contextualiza a realidade
da comunidade e tem como finalidade promover mudanças desejaveis e estáveis nos
individuos, mudanças que favoreçam o desenvolvimento integral do homem e da sociedade.

5-METODOLOGIA
Este trabalho partiu do interesse em criar um projeto vinculado a realidade dos
alunos e tem como metodologia trabalhar as questões campesinas ressaltando que através das
formas geométricas se busca dinamizar a matemática inovando as práticas educativas
interdisciplinares levando em conta as vivências dos sujeitos do campo, com isso buscando a
promoção humana.

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O projeto foi dividido nas seguintes etapas: escolha do local, manejo do solo,
plantio, irrigação e colheita. Sendo que, a escolha local foi vinculado a disponibilidade do sol,
água, condições de terreno e proteção de ventos fortes e frios, o manejo do solo deu-se a partir
da estruturação dos canteiros e adubação do solo, o plantio esta ocorrendo de acordo com o
clima, pois cada hortaliça se desenvolve de uma forma, a irrigação ocorre duas vezes ao dia,
sendo que a mesma esta sendo realizada com mangueiras próprias de irrigação e a última
etapa que é colheita será de acordo com o período de maturação de cada hortaliça.

6-RESULTADOS

A horta inserida no ambiente escolar possibilita o desenvolvimento de diversas


atividades pedagógicas em educação ambiental e alimentar unindo a teoria com a prática de
forma contextualizada, auxiliando no processo de ensino aprendizagem.
Através dessa atividade espera-se que os alunos levem em conta a realidade e o
potencial existente e que possam associar com suas vivências em seus cotidianos, ou seja, no
meio o qual estão inseridos.
A partir desse ambiente surgiu a possibilidade dos professores das diferentes
disciplinas utilizarem a horta como instrumento interdisciplinar relacionando os diferentes
conteúdos com as mais variadas disciplinas, tendo como exemplo a disciplina de matemática
onde a docente construiu os canteiros a partir das formas geométricas, assim trabalhando
medidas, áreas, ângulos, etc.
Portanto, os alunos participam das atividades de forma envolvente, pois sabem
que as aprendizagens adquiridas e relacionadas irão lhes servir como base para outros
conhecimentos.

Palavras-chaves: Horta Escolar, Interdisciplinaridade, Educação do Campo.

7-BIBLIOGRAFIA
______. Alfabetização Ecológica: O Desafio para a Educação do Século 21. In:
TRIGUEIRO, A. (coord.) Meio Ambiente no Século 21: 21 especialistas falam da questão
ambiental nas suas áreas de conhecimento. Rio de Janeiro: Sextante, 2003.

CALDART, Roseli Salete. Pedagogia do Movimento Sem Terra – 3ª Ed. – São Paulo:
Expresso Popular, 2004.

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CAPRA, F.. A Teia da Vida: Uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. São
Paulo: Editora Cultrix, 1996.

GADOTTI, Moacir . Boniteza de um sonho: ensinar-e-aprender com sentido. Novo


Hamburgo: Feevale, 2003.

APROVEITAMENTO DO SOLO PARA UMA ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL NA


ESCOLA RURAL

Sarah Bianca Soares da Silva, Universidade Federal de Santa Maria,


sarahbianca.ss@bol.com.br,
Luciane da Rosa Soares, Escola Municipal de Ensino Fundamental São Judas Tadeu,
soaresluciane@bol.com.br.

Resumo

A alimentação saudável nas escolas tem sido muito discutida por órgãos federais, municipais
e por grande parte da sociedade, pois a escola é o lugar onde os alunos passam maior parte do
dia e aprendem conceitos fundamentais sobre a pessoa que serão futuramente. A educação
alimentar ser mais abordada nas escolas pois o grande aumento de alimentos da baixa
qualidade, fast-food, lanches comercias e com altos teores de açúcar e gordura, vem
resultando em crianças e adultos com hábitos alimentares maus e de baixa qualidade. O
trabalho teve como objetivo disponibilizar aos alunos produtos perecíveis e de qualidade
aproveitando o solo presente na própria escola. Os próprios alunos com ajuda da comunidade,
familiares e professores, construíram uma horta, com diversas variedades de legumes e
verduras. Verificou-se que a horta tanto para os alunos disponibilizou um aprendizado
diferente como para a comunidade que pode levar suas sabedorias do campo para a escola,
ensinando vizinhos amigos e filhos. A partir dos resultados obtidos pode-se verificar que a
horta alcançou o objetivo principal melhorando não somente a alimentação dos alunos mais
também unindo a comunidade rural em um todo, abrindo os olhos de todos sobre espaços
disponíveis para produção sustentável.

Palavras chaves: alimentação, conhecimentos e comunidade.

Introdução

O uso do espaço escolar na escola para a aquisição de alimentos mais saudáveis, que
possam suprir as necessidades nutricionais diárias dos alunos. O problema a nível mundial é o

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desenvolvimento, ou melhor, a ausência de desenvolvimento, em contraposição do mundo


urbano e industrializado. Esta maneira de colocar a questão supõe a “naturalização” do
processo de desenvolvimento e que se traduz, na atualidade, por um acréscimo simultâneo, e a
nível planetário, da pobreza, do desemprego e da desigualdade (FRIEDMAN, 1996).
Hoje alem de questões sociais e nutricionais, vemos no âmbito escolar que a alimentação
dos alunos, não é de grande qualidade, na questão de verduras e legumes. Observa-se também
que em escolas localizadas na zona rural de cidades, dispõem de espaço e menos poluição que
ser utilizado. O projeto a ser implantado trabalha com os alunos de uma Escola Municipal de
Ensino Fundamental, onde os alunos são ensinados a reaproveitar e utilizar os espaços
disponíveis de forma natural e saudável, aonde possam se beneficiar com os produtos obtidos,
interagindo com o solo e com sua própria alimentação.
As transformações de ordem econômica, social e demográfica, das ultimas décadas, da
sociedade brasileira afetaram consideravelmente o perfil nutricional e educacional da
população, onde a alimentação industrializada e o grande consumo de alimentos processados
vêm ganhando espaço, como no âmbito escolar e dentro de casa. O que revela que a sociedade
vem crescendo, observando e vendo que as áreas de plantação de alimentos, que aumentando
a cada ano, com alimentos modificados e transgênicos, onde afetam o solo e ambiente.
A sociedade que cresce ano após ano, observa um roteiro de produção gigantesco das
indústrias, onde grandes áreas são plantas e fertilizadas, depois são processadas e vendidas em
grande escala, para mudar essa visão esta geração necessita que em sua construção civil, veja
como espaços em lugares diversos podem ser utilizados de forma que não agridam o meio
ambiente e que ofertem alimento de qualidade e em proporções adequadas sem o um grande
excesso de alimento, também aprender e ver que o resíduo do mesmo pode ser utilizado como
adubo para o alimento que vai ser plantado e consumido posteriormente.
A escola é um espaço muito desafiador, complexo, onde, muitas praticas escolares são
realizadas e observadas, como, a alimentação escolar, esta entre outras é uma das atividades
cotidianas nas escolas, tendo horário, preparação, distribuição e consumo bastante particular
de cada escola, as refeições podem ocorrer nas próprias classes, refeitórios, podendo ainda ser
realizada em pé e também há os que por opção não utilização desse serviço.
De acordo com Bourdieu, afirma-se que há hábitos, que se institui no espaço escolar
referente à alimentação dentro da escola. Grazini (1996) destaca que em países desenvolvidos,
estão sempre atentos e preocupados com a formação ou modificação de hábitos alimentares ao
decorrer da adolescência, por causa de doenças decorrentes do grande excesso de consumo
alimentar e falta de nutrientes adequados. As regiões rurais dispõem de um conjunto de
valores culturais e ambientais que lhe são intrínsecos, mas relativamente “invisíveis” na
lógica de mercado.
O desenvolvimento do projeto da horta na escola, com a plantação de hortaliças, legumes
e o desenvolvimento de uma compoteira, onde contribui para o consumo de alimentação
saudável dos alunos, de forma positiva. Um exemplo de que o Governo brasileiro vem
querendo mudar a qualidade da alimentação nas escolas é o Programa Nacional de

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Alimentação Escolar – PNAE onde dispõe da gestão da alimentação escolar, do Conselho de


Alimentação Escolar, dos refeitórios e cozinhas das escolas e o trabalho dos nutricionistas e
da educadora na escola (BRASIL, 2010).
Segundo Magalhães (2003), a relação direta de consumo de alimentos impróprios
contribui para um comportamento alimentar das crianças não são direcionadas a alimentos
saudáveis e naturais, pois as propagandas de produtos industrializados e processados do tipo
fast-food, são criativas induzindo a compra e consumo. O autor afirma que a utilização da
horta escolar como estratégia, visando estimular o consumo de hortaliças, feijões e frutas,
onde é possível adequar à dieta.

De acordo com Silva (1990), todos os processos envolvidos após a colheita, como,
manipulação, transporte, entre outras causas de percas consideráveis na qualidade do
alimento, pois necessita de descongelamento e manutenção em temperatura elevada por
longos intervalos de tempo, podendo mudar consideravelmente o sabor característico do
alimento. Um dos grandes ganhos do uso de espaço para a plantação de verduras e legumes, a
disposição de alimentos sadios e perecíveis. Os alimentos podem ser levados para a sala de
aula, transformando em elementos pedagógicos, onde as crianças possam participar das ações
de educação alimentar desenvolvidas (MAGALHÃES; GAZOLA, 2002). Um grande aspectos
observados em outros trabalhos, é que os produtos cultivados na horta fazem muito sucesso
entre os alunos, pois todos querem experimentar.
Uma boa alimentação evita doenças que são causadas pela eficiência ou carência de
vitaminas das frutas, verduras e legumes em geral, como por exemplo as hortaliças. Por tanto
o tratamento complementar através de uma alimentação saudável aumentando a imunidade
com a ingestão de legumes de raízes, ácidos graxos Omega-3 legumes de folhas verde-escuras
(SELEÇÕES, 2002).
O projeto teve como objetivo utilizar os espaços disponíveis, da escola, para plantar
alimentos saudáveis, pelos alunos.

Materiais e Métodos

O projeto foi desenvolvido em uma Escola Municipal de Ensino Fundamental, localizada


na região rural de Caçapava do Sul- Rio Grande do Sul. Sua realização foi juntamente com a
direção, alunos e familiares que manifestaram interesse pelo projeto, em torno de 40 alunos
participaram do projeto, das series iniciais, 1° ao 5° ano escolar. Foi escolhido um local para
ser colocada e horta na escola, onde os alunos e a comunidade construíram sem causar
grandes danos ao ambiente, uma composteira, com os resíduos da própria alimentação da
escola ou de resíduos gerados em casa, foram adicionados na mesma, e também houve a
plantação de diferentes sementes de legumes e hortaliças.

Resultados

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A horta inserida na escola tornou-se um laboratório vivo, o que causou uma comoção,
principalmente nas crianças, de verem seu trabalho crescendo o gerando frutos. O projeto
pode impulsionar diversas atividades pedagógicas de alimentação e plantio, unindo teoria e
prática.
Como visualizado nas imagens abaixo, podemos concluir que o objetivo do projeto foi
alcançado com êxito, pois os espaços disponíveis foram ocupados, com a horta, para
disponibilizar alimento saudável. Os produtos gerados foram uma composteira para fornecer
adubo, pés de alface, couve, espinafre, ervilhas, beterraba, cenoura, salsinha, cebolinhas e
morango.
O projeto teve um papel importante na comunidade, pois possibilitou que houvese a
cooperação de todos, não somente os alunos, podendo assim passar os ensinamentos de
compostagem, formas de produção de alimentos, solo, manutenção, para todos, podendo
promover hábitos melhores e produção melhor. O projeto teve resultados positivos, com os
resultados esperados alcançados.

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EIXO 1. O trabalho do camponês, reprodução social e produtiva dos camponeses e


comunidades tradicionais. Nesse eixo também são incluídos o viver, a sustentabilidade no
campo, cultura, patrimônio e diversidade no campo, resistência e saúde.

Referencias Bibliográficas

BRASIL, Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Programa Nacional de


Alimentação Escolar. Disponível em:
http://www.portaltransparencia.gov.br/aprendaMais/documentos/curso_PNAE.pdf. Acesso
em: 10 de setembro de 2017.

BOURDIEU P. O poder simbólico. Lisboa: Difel; 1989.

GRAZINI, J. T., 1996. Analogia entre Comerciais de Alimentos e Hábito Alimentar de


Adolescentes. Dissertação de Mestrado, São Paulo: Escola Paulista de Medicina,
Universidade Federal de São Paulo.

MAGALHÃES, A. M. A horta como estratégia de educação alimentar em creche. 2003.


120 f. Dissertação (Mestrado em Agros ecossistemas) - Universidade Federal de Santa
Catarina, Florianópolis, 2003.

MAGALHÃES, A. M.; GAZOLA H. Proposta de Educação Alimentar em Creches. In:


Congresso Internacional de Educação Infantil 1. 2002, Bombinhas. Anais. Bombinhas:
PMPB, 2002.

SELEÇOES, do Reader’s Digest. CURANDO AS DOENÇAS DO DIA-A-DIA: Métodos


Naturais. 1ª Edição, dezembro 2002. p190-250.

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SILVA, M. E. P., 1990. Teores de Vitamina C em Alimentos de Consumo Habitual na


Região de São Paulo. Dissertação de Mestrado, São Paulo: Faculdade de Ciências
Farmacêuticas, Universidade de São Paulo.

Sobre Caçapava do Sul/RS. Disponível em: http://www.cacapava.rs.gov.br/, acesso em: 16 de


setembro de 2017.

RELATÓRIO III DE TERRITÓRIO E TERRITORIALIDADE

Fernanda Mena – Unipampa, fernandamenasevero15@gmail.com


Jaqueline do Espirito Santo – Unipampa, jaque.espirito14@gmail.com

O Resumo Expandido

Território e Territorialidade, da Licenciatura em Educação do Campo, da Universidade Federal do


Pampa. O objetivo é conhecer a realidade da escola do campo do município para que possamos
entender as dificuldades de uma escola do campo. É uma pesquisa de campo e estudo de caso com
abordagem qualitativa. A pesquisa bibliográfica e os dados empíricos, coletados através de
observações, visitações e entrevistas com a comunidade da escola Sucessão dos Moraes, em Dom
Pedrito- Este estudo sobre a educação no/do campo, é feito a partir das disciplinas do eixo RS,
revelaram uma diversidade de representações sociais sobre Território e Educação do Campo e o
esforço da comunidade para uma educação de qualidade. Concluímos assim que e de suma
importância conhecer a realidade da escola do campo e o território em que ela esta inserida.

Dados da experiência:
Este trabalho é uma pesquisa do curso de Licenciatura em Educação do Campo -
Campus Dom Pedrito, o qual visa formar docentes direcionados para campo.
Deste modo, o objetivo desta pesquisa é conhecer a realidade de uma escola rural do
município para que possamos entender na prática – vivenciando as dificuldades de

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funcionamento de uma escola do campo, estudando as várias possibilidades que o meio rural
proporciona aos moradores da escola pesquisada, além de entender o que os professores
fazem, intuitivamente ou com conhecimento teórico, buscando a construção de identidade e
conhecimento dos seus alunos, bem como funcionam diferentes escolas do campo.
Esta investigação ocorreu no território da Escola Municipal Rural de Ensino
Fundamental Sucessão dos Moraes, no município de Dom Pedrito, na localidade Estrada do
Ponche Verde, a distância de 27 Km (vinte e sete) da cidade .
O diagnóstico, uma perspectiva da metodologia qualitativa, a qual observamos e
entrevistamos membros da escola: professores e alunos, além de moradores da localidade a
qual a instituição pertence.

A partir desta pesquisa, podemos compreender uma das tantas realidades rurais do
nosso município e, com isto, poderemos nos tornar profissionais mais preparados para atender
a demanda da cidade de Dom Pedrito-RS.
A escola em si começou a desenvolver-se mais e a ganhar mais independência sob a
gestão da atual direção, pois a nucleação abrangia apenas algumas localidades, como Ponche
Verde, o Boliche da Pedra, Upacaray e o Vacaiqua. Com o passar dos anos foi crescendo,
sendo feitas ampliações no prédio, aumentando as rotas de transporte escolar e hoje se estende
ao Corredor dos Correias, as Três Vendas a Vila Indart, o Peral, passando o Obelisco e o
Banhado do Gusmão, sendo essa clientela formada por crianças com carências econômicas e
socioculturais.
O difícil acesso para a escola, com estradas bastante irregulares, agrava-se mais
quando chove, tornando-se impossível a trafegabilidade, bem como a segurança das crianças e
dos veículos, esse é um dos maiores problemas enfrentados pela escola.
A Escola Municipal Rural de Ensino Fundamental Sucessão do Moraes conta no
presente ano com cerca de setenta e nove (79) alunos, divididos em anos iniciais e anos finais
e está localizada no interior do município de Dom Pedrito - RS, no 3º Subdistrito Upacaray, a
27 km deste município. A escola é muito importante para aquela comunidade, famílias que
residem no campo e que pretendem permanecer lá, precisam ter uma escola para seus filhos,
pois muitos já têm a conscientização de que o conhecimento é importante para promover
melhores condições de vida e dignidade para o cidadão que mora no campo.

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Com relação ao desenvolvimento rural durante a trajetória de visitação no território


onde a escola está inserida, observou-se uma mudança produtiva relacionada à agricultura
familiar e uma perspectiva positiva no Desenvolvimento Rural, é um complexo conjunto de
novos processos sociais e econômicos associados à expressão globalização que veio para
alterar a estrutura societária dos países e seus modelos convencionais de interpretação,
oriunda da sociedade civil.
Bastaria associar este fato a extraordinária revolução tecnológica e o modo de vida
rural. Novos mercados se abrem, resultado de uma busca para converter estas atividades em
mercadorias.
O desafio é superar a dicotomia entre produção e proteção ambiental por meio da
integração dos objetivos e instrumentos das políticas ambientais e agrícolas dentro do marco
geral do desenvolvimento sustentável.
A partir do diagnóstico do território onde a escola está inserida, podemos perceber que
há uma forte influência de grandes propriedades, com produção de lavouras, sendo assim,
percebemos que são poucas as pequenas propriedades que ainda existem no entorno.
Com os relatos que obtivemos da comunidade, o fator primordial deles são as estradas.
Na nossa persepção um dos motivos principais seja o descaso do Poder Público e a
despreocupação com aquela população que ali reside. Podemos também perceber que há uma
grande conveniência de grandes produtores com o Poder Público.
Sendo assim escolhemos como fator principal de problematização mais importante, as
estradas e o transporte, que causam problema dentro da escola, dificultando o êxito das aulas
e a frequência dos alunos. Na escola rural Sucessão dos Moraes, no interior do município, os alunos
têm aulas semana sim, semana não, o calendário será cumprido da seguinte forma: terças e quintas os
alunos terão aula em período integral, manhã e tarde e também aos sábados, e o não fechamento dos
dias letivos implica na recuperação ao final do ano, muitas vezes prepassando a primeira quinzena do
mês de janeiro, no momento essa foi a solução encontrada para evitar um atraso ainda maior no ano
letivo. Oito das 28 rotas de transporte escolar não estão operando. Com isso, os ônibus próprios da
prefeitura estão se dividindo para atender as 13 escolas na zona rural. Desde o início das aulas, um
grupo de pais de alunos pressiona o poder público por uma solução definitiva.
A infraestrutura física da rede escolar, das estradas e do transporte escolar deve
merecer destaque nas políticas públicas destinadas a assegurar o acesso e a permanência do

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educando na escola, com dignidade, justificando os investimentos financeiros em obras de


construção, recuperação e manutenção de estradas e transporte digno para esse alunos.
Os professores também acreditam que o intervalo entre as aulas compromete o
aprendizado. "Acho que é uma coisa que prejudica muito o andamento dos trabalhos, uma
incerteza diária que eles têm se amanhã haverá aula ou se não haverá por causa do tempo e
ainda se semana que vem terá ou não terá transporte", lamentam.
Os estudantes costumavam contar com quatro linhas de transporte. Esse ano, são só
duas até agora, mais um ônibus emprestado. Os veículos estão estacionados na frente da
escola.

A falta de transporte não é o único problema. Quando chove, as péssimas condições


das estradas impedem que os veículos passem. Para compensar os dias em que as aulas são
suspensas por causa das estradas, os estudantes têm dois dias de aulas por semana, em período
integral.

"Quando tem a semana deles, se chove, não tem aula, porque se a estrada está embarrada,
não tem condições", relata outra mãe. (MÃE B)

Essa situação se deu através de denuncias feitas no ano de 2017 ao Ministério Público,
onde foram encontradas várias irregularidades no transporte escolar no Munícipio de Dom
Pedrito-RS. Essas irregularidades vão desde licitações forjadas com o oferecimento de
empresas fantasmas, ônibus sucateados, desvio de verbas públicas e etc......
Após essa denúncia houve uma quebra de contrato com a empresa que disponibilizava
o transporte, deixando assim vários estudantes do campo sem acesso a escola.
Não há até o presente momento empresas interessadas na licitação ofertada pela
prefeitura municipal, pois o valor repassado aos mesmos é muito baixo, ficando assim toda
comunidade escolar sem ter muito o que fazer, pois sem o transporte disponibilizado pela
prefeitura, a única solução encontrada para que os estudantes não perdessem o ano letivo, foi
de dividir o transporte próprio do município com outras escolas em regime de alternância,
transporte próprio esse que deveria estar nas estradas de péssimas condições do interior, e não
em cima do asfalto, pois esses ônibus possuem tração, ou seja, são próprios para as estradas
esburacadas.

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Ao finalizarmos esta pesquisa ficou muito claro para nós o descaso com os estudantes
do campo, pois a demora do poder público em encontrar uma solução para este problema, nos
remete a pensar que a solução nunca chegará, afinal é mais vantajoso fecharem a escola do
campo, trazendo assim os estudantes e suas famílias para a cidade. Notamos também que a
Escola Rural Sucessão dos Moraes ainda mantém suas portas abertas, devido a colaboração de
uma família de grande poder aquisitivo, que detém a maior parte do território onde a escola
está inserida; Afinal eles precisam de mão de obra para suas propriedades, e muitas vezes seus
empregados possuem filhos em idade escolar, necessitando desta escola.

Um olhar diferente da Educação do Campo com base nos conceitos de:


Desenvolvimento Rural, Capital Social e o Campo da Educação do Campo com o objetivo de
fazer uma reflexão dos estudos realizados.
Os principais desafios foram conhecer o capital social e a rede social desse território, e
qual a sua contribuição para esse educandário.
A ideia inicial era que o trabalho seria prazeroso, mas no seu desenrolar foram surgindo
obstáculos e vimos um desgaste emocional que nos levou a uma frustração.
O estudo da diversidade da vida propicia aos educando um conhecimento maior sobre
todas as formas de vida existentes como, por exemplo: mata nativa, fauna, reino plantae, no
local onde vivem além de buscar em todo o seu desenvolvimento, o diálogo entre os saberes
da escola e aqueles presentes na comunidade e desta forma trazer uma nova abordagem sobre
as questões ambientais.
No entorno da escola há uma rica diversidade na flora com mata nativa: dama-de-
noite, salsos, eucaliptos, chirca, capim anoni, acácia etc....
Pretendeu-se nesse trabalho proporcionar de forma muito sintética por objetivo e
estruturante uma familiarização com os principais pontos de uma nova Educação do Campo.
Palavras-chave: Território; Território e Territorialidade; Educação do Campo.

Referências Bibliográficas
SHNEIDER, Sérgio. A abordagem territorial do desenvolvimento rural e suas
articulações externas. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/soc/n11/n11a06.

SAQUET, Marcos. Campo território. Disponível em: <http://www.seer.ufu.br/index.


php/campoterritorio/article/viewfile/11780/6894>.

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http://www.mg.gov.br/governomg/port Acesso em 20 de abril de 2018.

Http://www.infoescola.com.sociedade.capitalsocial Acesso 23 de abril de 2018.

FERNANDES, Bernardo Mançano. Diretrizes de uma caminhada. In: ENCONTRO


NACIONAL DE ENSINO DE GEOGRAFIA,5. , 2003, Presidente Prudente. Anais...
Presidente Prudente: Unesp, 2003.

SABERES E FAZERES NA ESCOLA DO CAMPO

Laura Leite Moreira


EMEF José Paim de Oliveira
lauraleitemoreira@gmail.com

Jaqueline da Costa Braz


EMEF José Paim de Oliveira
jackcostabraz@gamil.com

Silvia Rossi Rocha


EMEF José Paim de Oliveira
rr.silvia@hotmail.com

A EMEF José Paim de Oliveira, em Santa Maria-RS, escola núcleo, na qual


estudam alunos oriundos, em sua maioria, da zona rural, com turno integral em dias
alternados (AI e Educação infantil: terças e quintas-feiras integral e sábado pela manhã e AF
segundas, quartas e sextas-feiras, turno integral), deste município está voltada para a formação
integral do aluno, como pessoa que vivencia a realidade do campo e busca desenvolver
práticas pedagógicas que apresentem os benefícios deste vida no campo. Sendo assim, o
objetivo deste relato é apresentar as vivências que ocorrem a partir da Educação Infantil e vão
até os Anos Finais do Ensino Fundamental, com projetos pedagógicos.
A comunidade que integra a escola localizada no 2° Distrito de São Valentim faz
parte, em sua maioria, do meio rural, pequenos agricultores dedicados à criação de gado,
ovelha, cavalo e na produção de hortifrutigranjeiros e variedades alimentícias para consumo
próprio e para comercialização na zona urbana da cidade de Santa Maria – RS. Há também
um pequeno número de chacareiros e pessoas que trabalham em indústrias como engenho de
arroz, câmera armazenagem de grãos e areia. Baseado nos recursos e clientela escolar busca-

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se o sucesso e permanência do aluno na zona rural, sendo ele o atuante e mediador de nossa
comunidade.
A escola é um lugar de convívio que acolhe diversas realidades sociais e culturais
onde acontecem trocas de experiências significativas, necessárias à transformação social,
permitindo ao sujeito envolver-se em todos os sentidos.
Como é inserido no meio rural, comprometida com o fazer pedagógico singular,
procura oferecer além de conteúdos, projetos voltados a uma economia familiar sustentável
que valorize e dê sentido à fixação do homem no campo, evitando o êxodo rural.
A escola na visão de Paulo Freire deve ser o lugar de harmonia entre docência e
discência, onde um aprende com o outro através de suas experiências. É uma escola que
rompe com o autoritarismo, mas que limita eticamente a liberdade. Nesta linha de pensamento
FREIRE (1996, p. 12) explica que "Não há docência sem discência, as duas se explicam e
seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um
do outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender. Quem ensina
aprende e ensina alguma coisa a alguém".
Segundo SACRISTÁN (2000, P.14), “O currículo, não é um conceito, mas uma
construção cultural. Isto é, não se trata de um conceito abstrato que tenha algum tipo de
existência fora e previamente à experiência humana. É, antes, um modo de organizar uma
série de práticas educativas”.
Partindo deste princípio, a partir do planejamento coletivo de todos os envolvidos,
de acordo com a legislação vigente definida nas Diretrizes Curriculares Municipais o
currículo da escola refere-se essencialmente:

– a construção do conhecimento e das práticas produzidas em dinâmicas sociais,


políticas, culturais, nas relações intra e interpessoais, [re] significadas em cada contexto
histórico;
– ao contexto social do estudante, na intenção de promovê‐lo na sociedade como ser
ativo, criativo, crítico e autônomo, partícipe dos processos de transformação e inovação
socioculturais;
– ao desenvolvimento de propostas pedagógicas construídas compartilhadamente.
A escola tem como missão proporcionar à comunidade escolar, motivos que
justifiquem a permanência no campo, melhorando assim sua qualidade de vida.
E a visão de ser relevância em educação do Campo em Santa Maria, como formação
de cidadãos que tem conhecimentos e defendem a qualidade de vida, vivendo no campo.

Com o intuito de desenvolver um trabalho com vistas à missão e visão da Escola,


foram escolhidos os temas integradores para basearem as práticas pedagógicas dos
professores, desde a Educação Infantil e, gradativamente, até os anos finais do Ensino
Fundamental. Entende-se que a Escola deve ser “do campo” e não apenas estar localizada “no
campo”.

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Projeto Ressignificando espaços de aprendizagem: práticas alternativas para o sucesso


escolar

O objetivo do referido projeto, que é desenvolvido na educação infantil e nos Anos


Iniciais, é disponibilizar novos espaços de aprendizagens, oferecendo aos alunos
possibilidades alternativas para construir, ampliar e consolidar os conhecimentos não
efetivados no cotidiano da sala de aula, a fim de contribuir para a efetivação do processo de
inclusão escolar.
A proposta do projeto é atender de forma significativa os alunos que compõem a
Educação infantil e Anos Iniciais, para que possam superar suas dificuldades em consolidar os
conhecimentos necessários para o domínio nas áreas linguísticas e lógicomatemática,
favorecendo o desenvolvimento de sua aprendizagem, autoestima e participação ativa no
contexto escolar, aspectos fundamentais para a efetivação do processo de inclusão escolar.
Os ambientes disponibilizados são os seguintes:

 O lúdico na alfabetização;
 Alfabetização através de diversas expressões;
 Aprimorando a alfabetização;
 Consolidando a alfabetização;
 Matemática e o uso das tecnologias;
 Espaço de produção textual;
 Harmonização.

Projetos Pedagógicos: vivenciando o ser, o saber e fazer do campo

O ato educativo constitui-se além das atividades normais, com o oferecimento de


projetos que identificam a escola com o meio que está inserida. Projetos esses que

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contribuem para o conhecimento de vida do homem do campo, assim como sua saúde
financeira, visando viver e conviver com dignidade.
O objetivo geral dos projetos é proporcionar aos alunos dos anos finais da escola,
vivências que contribuam para a autopromoção do homem do campo, a partir de seu contexto
cultural, que estimule a permanência do aluno no meio rural e apresente para cada integrante
da comunidade escolar diferentes maneiras de inserção neste meio.
Os projetos são desenvolvidos nas quartas-feiras, no turno da tarde, cujos temas vão
ao encontro da missão e da visão da Escola, que priorizam a permanência do indivíduo no
campo, melhorando sua qualidade de vida. Os projetos desenvolvidos na escola no ano de
2017 foram:
Identidade Rural: a identidade do lugar é algo valoroso, e despertar nos alunos o
sentimento de pertencer e valorizar o meio em que vive é de suma importância para que o
espaço seja cuidado e reconhecido.

Na integração com os colegas o aluno poderá desenvolver sua criatividade,


comunicação e expressividade além de sua sociabilidade e elevação da autoestima.

Cozinha Experimental: este projeto visa desenvolver com os alunos a ideia de que
o aproveitamento e reaproveitamento de alimentos pode favorecer uma alimentação saudável
e balanceada, priorizando os materiais da região onde a Escola se localiza.
Para a realização das receitas, serão convidadas pessoas da comunidade escolar, bem
como conscientizar os alunos da necessidade de higiene e cuidados dos alimentos. E, também
a conscientização de que a matemática está presente nas receitas e apresentar aos estudantes o
vocabulário em inglês referente aos ingredientes e utensílios utilizados nas receitas.

Cultura Popular Gaúcha: prática de jogos e brincadeiras populares, de forma sadia


e criativa, bem como estudos de danças típicas gaúchas e prática do jogo da bocha.
A criatividade em confeccionar os próprios brinquedos (pernas-de-pau, esquis de
madeira, bonecos de argila...) ressignificando assim, o conceito de jogar e brincar.

Horta Escolar: com a implantação do projeto, a escola busca construir um tipo de


homem que aprecie o seu lugar de origem, permanecendo no campo, valorizando a agricultura
e produzindo o seu próprio sustento.

Artesanato Rural: o presente projeto pretende propor alternativas para


complementação de renda ao homem do Campo através do aproveitamento da riqueza de
materiais disponíveis na comunidade tais como: sacos de estopa, sacos de aniagem, sacos de
algodão, sacos de juta, couro, palha, cipós, lã, madeira, sementes, minerais, porongos enfim
uma gama de produtos que passam despercebidos pelo olhar não treinado.

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A Escola e as pessoas que nela trabalham estão envolvidas e comprometidas com a


aprendizagem de qualidade, sendo que a diversidade de alternativas decorrentes dos projetos
possibilitam uma reconstrução da alegria e do prazer em aprender.

Enfim, esta é a Escola José Paim de Oliveira, uma Escola onde estar no campo vai
muito além de localização geográfica, é um sentimento ímpar de pertencer a um lugar
encantador e especial. Que no fazer pedagógico não esquece de semear o amor e o carinho ao
próximo, as aprendizagens são mais do que de conteúdos científicos mas também, de
valorização do ser humano, com suas peculiaridades e singularidades.

EIXO 2: A Educação do Campo e a Educação dos Camponeses (educação escolar e não


escolar).

PALAVRAS CHAVE: Educação do Campo, Projetos Pedagógicos, pertencimento.

REFERÊNCIAS:

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa. 13. ed.
Rio de Janeiro: Concepção Curricular. Paz e Terra, 1996.

SACRISTÁN, J. Gimeno. O currículo. Porto Alegre: Artmed,2000.

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OFICINA TEMÁTICA DE REUTILIZAÇÃO DE GARRAFAS PET NO INTERIOR


DO MUNICÍPIO DE JÓIA/RS

¹Alice Natália Maccari


²Juliana Limana Malavolta
¹Estudante do Curso de Licenciatura em Educação do Campo, IFFar - Campus Jaguari
²Orientadora, servidora docente da área de Química do IFFar - Campus Jaguari.

1. INTRODUÇÃO

A cultura pela utilização e consumo de produtos industrializados tem feito com que
nosso planeta viva um momento de grade produção de resíduos acarretando em alterações e
impactos ambientas, quando jogados no meio ambiente poluem e se transformam em
pequenas partículas plásticas que podem ser confundidas com alimento e ingerido pelos mais
diversos animais do planeta causando danos a saúde e extinção dos mesmos.
Atualmente segundo dados do SENGE-RS (2012), no Rio Grande do Sul cerca de
50,6% municípios já possuem um programa de coleta implantado pela administração
municipal, sendo que destes 52,58% tem abrangência total, 36,25% só na área urbana e o
restante em bairros selecionados, sendo que em comunidades do interior dos municípios, não
contam com o serviço de recolhimento de lixo, o que as leva a realizar o descarte destes de
forma incorreta, causando danos enormes ao meio ambiente como a destruição e poluição do
meio ambiente, extinção de espécies de animais afetando a sociedade. Assim, a reutilização

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desses materiais, no intuito de diminuir os impactos ambientais e dar utilidade aos mesmos,
tem se tornado importante ferramenta de desenvolvimento social.
Em geral, o ato de descartar resíduos de forma inadequada ocorre por falta de
conhecimento acerca do tema e, consequente despreparo para destiná-los adequadamente.
Neste contexto, o conhecimento desenvolvido em Instituições de Ensino, como o IFFar
Campus Jaguari, pode colaborar como multiplicadores do conhecimento e modificar tais
concepções, fomentando o debate e o desenvolvimento de ações positivas da população em
geral.
Dentre as abordagens que contribuem para o processo de ensino-aprendizagem,
destacam-se as Oficinas Temáticas que, conforme Marcondes (2008), representa uma
proposta de ensino-aprendizagem, na qual se buscam soluções para um problema a partir dos
conhecimentos práticos e teóricos. Nessa perspectiva, a utilização de temas geradores
constitui-se como ferramenta importante para o ensino pelo fato de dar sentido social,
econômico e político aos temas estudados, proporcionando o desenvolvimento de
competências e habilidades que permitam uma melhor compreensão do cotidiano.
Nesta perspectiva, o presente estudo tem o objetivo de relatar atividade desenvolvida
durante o Tempo Comunidade da disciplina de Metodologia do Ensino, cursada no quinto
semestre do Curso de Licenciatura em Educação do Campo Ciências da Natureza no IFFar
Campus Jaguari, foram desenvolvidos conhecimentos acerca de temas como: reutilização de
latas, garrafas pet e lixo orgânico; elencados pela comunidade de onde os alunos são oriundos
por meio de oficinas temáticas.

2. MATERIAL E MÉTODOS

As atividades foram desenvolvidas durante o Tempo Comunidade da disciplina de


Metodologia do Ensino, cursada no quinto semestre letivo do Curso de Licenciatura em
Educação do Campo Ciências da Natureza no IF Farroupilha Campus Jaguari, no período de
fevereiro a julho de 2018. O público atendido por meio das atividades desenvolvidas foram
moradores do assentamento Rondinha, localizado no interior do Município de Jóia/RS
localidade de onde a acadêmica que realizou a oficina é oriunda e que futuramente deseja
realizar os demais estágios assim construindo um conhecimento prévio das especificidades da
comunidade na qual irá desenvolvê-lo.
As atividades foram desenvolvidas em três etapas distintas, considerando os objetivos
do trabalho e as aprendizagens construídas na disciplina de Metodologia do Ensino acerca de
metodologias e procedimentos de ensino. A Figura 1 ilustra as etapas citadas:

Coleta do Tema Planejamento de Desenvolvimento


Gerador na Oficina Temática de de Oficina
comunidade acordo com o tema Temática

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Figura 1: Representação das etapas desenvolvidas no projeto de TC.

Para a coleta do tema gerador desenvolveu-se um percurso de levantamento preliminar


da realidade local, seguida de análise das situações identificadas e delimitação do tema. Tendo
coletado o tema gerador, passou-se então ao planejamento das atividades e posterior
desenvolvimento das mesmas, constituindo-se de leitura e debate acerca do tema e oficina de
confecção de materiais de usos diários por meio da reutilização de garrafas Polietileno- PET.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Considerando as três etapas previstas no desenvolvimento das atividades deste


trabalho, foi organizada a sequência didática:

Primeira etapa: foi a realização da coleta do tema gerador na comunidade, sendo que para
que esta fosse cumprida foi percorrido o caminho:

- Levantamento preliminar da realidade: coleta de dados junto à comunidade com o objetivo


de compreender o cotidiano dos sujeitos. Esta etapa foi desenvolvida através da aplicação de
questionário que indagava, por exemplo, escolaridade, problemas na comunidade, meio de
sustento, crenças, cuidados com a saúde, hábitos alimentares, entre outros.

- Análise das situações e escolha das codificações: a partir dos dados coletados na etapa
inicial construiu-se uma rede temática, com o propósito de identificar as principais situações
significativas da comunidade. Nesta etapa os possíveis temas geradores foram identificados.

A metodologia utilizada para análise dos dados considerou a frequência das palavras
utilizadas pelos sujeitos, assim, as palavras foram organizadas em ordem decrescente de
frequência. Nesta pesquisa, as palavras mais frequentes foram utilizadas como categorias para
análise e problematização da realidade, portanto, a partir dessa análise criaram-se as
categorias: reciclagem do lixo, garrafa pet, conscientização.

- Círculo de investigação temática: teve como objetivo confirmar se as situações levantadas na


etapa anterior eram as mais significativas para a comunidade. Nesta etapa foi proporcionado
novo encontro com a comunidade para problematizar os possíveis temas geradores e delimitar
o tema que deverá ser trabalhado, tendo em vista que o tema mais frequente utilizado na etapa
anterior (reciclagem) ser um tema amplo. Esta etapa foi desenvolvida através da explanação
dos temas identificados e discussão acerca dos mesmos, confirmando o tema reciclagem e
delimitando que tipos de materiais seriam os mais interessantes de se estudar a reutilização.

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O gráfico 1 traz a delimitação do tema reciclagem após debate com a comunidade:

15
10
5
0
Reciclagem de Reciclagem de Reutilização do
garrafa pet latas lixo orgânico.

Gráfico 1. Delimitação do tema gerador.

Durante o debate para delimitação do tema procurou-se interrogar o porquê da escolha


por reciclagem de garrafas PET e as respostas obtidas eram de que as latas eram vendidas e o
lixo orgânico destinado à alimentação de suínos, no entanto, as garrafas PET eram queimadas,
mesmo a comunidade sabendo dos riscos e danos à saúde e meio ambiente e que mesmo após
queimadas as garrafas podem armazenar água que servirá de depósito, por exemplo, larvas de
insetos, as quais podem afetar a saúde dos humanos e animais.

Segunda etapa: após o desenvolvimento acima citado, encerrou-se a coleta do tema


gerador, o qual foi definido como sendo a reciclagem de garrafas PET, e passou-se ao
planejamento das atividades a serem desenvolvidas na comunidade.

O planejamento da oficina foi desenvolvido visando promover o entendimento sobre a


importância de reutilizarmos as garrafas pet, bem como os demais lixos que podem ser
reciclados, procurando trabalhar com materiais que estivessem de fácil acesso para a
comunidade, respeitando as limitações encontradas pelos moradores, pois na comunidade
encontramos a dificuldade de locomoção até a cidade para a compra dos materiais, e isso me
levou a retirar alguns dos objetos que seriam confeccionados pela falta de materiais, buscando
auxiliar estes com a confecção desses materiais para o uso diário de forma prática e simples.
Que através de seus valores possibilitem um olhar crítico e reflexivo com as ações diante a
destinação inadequada do lixo, buscando alcançar a mudança e correção dessas ações
incorretas.

Pardo-Díaz (2002), argumenta que “a educação é a chave para renovar os valores


sociais, desenvolvendo uma consciência e um comprometimento que possibilitem a mudança
desde as pequenas atitudes individuais até a participação e o envolvimento na resolução dos
problemas mundiais”

Neste contexto, a atividade foi planejada com dois momentos distintos:

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- Conscientização acerca do tema abordado: atividade de conscientização acerca do descarte


de resíduos sólidos e dos impactos ambientais causados pelo descarte incorreto por meio de
leitura de texto e debate.

- Desenvolvimento de oficina de reaproveitamento de garrafas PET: confecção de materiais


de uso diário fazendo uso de garrafas PET, cola quente, EVA, tecido, linha, agulha e canetões,
construindo objetos através de técnicas fáceis e com o uso de materiais acessíveis.

Terceira etapa: execução da oficina planejada; no dia em que foi marcada a


realização da oficina (dia 09/06/2018, sábado) chovia muito na localidade, o que acarretou em
um pequeno número de participantes (seis), no entanto, mesmo com poucos participantes foi
de grande valia na construção de novos conhecimentos e, durante o passar dos dias, muitos
que não conseguiram se fazer presentes no dia solicitaram uma nova data para que também
pudessem ter conhecimento dos trabalhos desenvolvidos, assim estamos recolhendo garrafas
para marcarmos uma nova data para a oficina com uma outra turma de participantes.

Neste terceiro momento foi feito o debate a partir de um texto sobre lixo, dando
destaque para os impactos gerados pelas garrafas pet em diferentes esferas do mundo (saúde
humana, animais e meio ambiente), o qual gerou grande espanto pela comunidade devido ao
tempo que uma garrafa leva para se decompor que em média é de 400 anos, bem como as
doenças causadas por estas causar problemas em homens como diabetes, e obesidade e em
mulheres pode-se desenvolver problemas hormonais e de ovários (endometriose e síndrome
do ovário policístico). Os participantes levantaram questionamentos e fizeram colocações,
diante da conversa entre todos ficou claro que com o passar dos anos os problemas com o
lixo, apontaram como motivo principal que com a modernidade veio diversas facilidades e
comodidades, mas com a mesma o consumismo cresceu e a partir deste o aumento
desenfreado de lixo tanto sólido, liquido ou gasoso. Os participantes fizeram comparações
com o passado considerando que antigamente não se tinha a produção de tantos resíduos, pois
as coisas eram mais duradouras e comercializadas de uma forma mais “simples”, e que hoje
em dia temos o contrário acontecendo, muitas embalagens, e mercadorias mais frágeis que
ocasionam o aumento dos resíduos de lixo.

Cabe ressaltar que os participantes da oficina foram bem participativos no debate


possibilitando uma troca de conhecimentos e saberes entre os de maior idade e os de menor
idade.

Posteriormente, passamos para a construção dos materiais com garrafa pet, foram eles:
puxa saco, vasos para o plantio de flor, vassoura e flores de EVA para a decoração, todos
tendo como material principal garrafas pet. Os objetos foram feitos pelos sujeitos com o
auxílio da acadêmica responsável pela realização da oficina e, abaixo, a Figura 2 mostra as
atividades desenvolvidas.

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Figura 2. Alguns materiais confeccionados na oficina.

4. CONCLUSÃO

Após o desenvolvimento das atividades contribuíram para a formação acadêmica de


maneira que o processo ensino-aprendizagem foi efetivado, qualificando a formação como
acadêmica do Curso de Licenciatura em Educação do Campo e futura docentes, além de
proporcionar uma melhor aproximação da realidade do Campo, por meio dos questionários e
vivências desenvolvidas.

Como futuras profissionais da área educacional foi possível perceber que com a
educação é possível modificar uma comunidade. Com uso racional dos recursos naturais
utilizando o reaproveitamento de Polietileno na transformação de novos produtos, retirando
materiais que antes seriam depositados como rejeitos em aterros sanitários sem utilização.

Palavras chave: reutilização, confecção de materiais, proposta, tempo comunidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

LAPA, R. O impacto ambiental das garrafas plásticas. 2017.


http://segurancatemfuturo.com.br/index.php/2016/08/26/o-impacto-ambiental-das-garrafas-
plasticas/. Acessado em: 21 de junho de 2018.

MARCONDES, M. E. R. Proposições metodológicas para o ensino de química: oficinas


temáticas para a aprendizagem da ciência e o desenvolvimento da cidadania. Em Extensão,
Uberlândia, V. 7, 2008.

PARDO DÍAZ, A. Educação ambiental como projeto. 2a ed. Porto Alegre: Artmed, 2002.

SENGE-RS. 32,3% DOS MUNICÍPIOS BRASILEIROS TÊM COLETA SELETIVA


DE LIXO, DIZ IBGE. 2012. http://www.sengers.org.br/site/noticias/940/323-dos-

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municipios-brasileiros-tem-coleta-seletiva-de-lixo-diz-ibge. Acessado em: 24 de junho de


2018.

Tempo de decomposição.
https://dgi.unifesp.br/ecounifesp/index.php?option=com_content&view=article&id=16&Itemi
d=11. Acessado em: 24 de junho de 2018.

PROJETO IDENTIDADE RURAL – À LUZ DA PEGAGOGIA DA ALTERNÂNCIA

Vanessa Ribeiro de Morais – EMEF Nossa Senhora de Fátima. E-mail:


vanessamorais.pessoal@gmail.com
André Giovanni Klinkoski – EMEF Nossa Senhora de Fátima. E-mail:
klinkoski@yahoo.com
Elke Quilião de Oliveira – EMEF Nossa Senhora de Fátima. E-mail:
elke.quiliao@gmail.com
Fernanda Gabriela Bitencourt Wommer – EMEF Nossa Senhora de Fátima. E-mail:
fernandawommer@hotmail.com
Joceimar Campos da Silva – EMEF Nossa Senhora de Fátima. E-mail:
joceimaref@gmail.com

A educação, especialmente no século XXI, talvez seja o segmento da sociedade que


tenha mais metas a serem alcançadas. No decorrer das últimas décadas, foram várias as
conquistas, principalmente ao que se refere ao acesso à educação como um direito de todos.
Os índices apontam para um grande avanço quanto ao número de matrículas, com políticas
públicas que garantem o acesso e a permanência na escola, contudo, bastante ainda há de ser
feito com relação à qualidade desta educação. Por qualidade entende-se, também, um modelo
educacional que considere os sujeitos em sua diversidade, respeitando as diferentes culturas,
raças, identidades, religiões, etc., e garanta para estes os direitos previstos para todos, mas
com olhar especial para as suas especificidades. Neste sentido, a modalidade de educação no
campo vem ganhando cada vez mais atenção no cenário educacional brasileiro. A demanda

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dos povos do campo está exigindo novos olhares e definições mais precisas para atender, de
fato, suas necessidades. E foi com base nesta percepção que a EMEF Nossa Senhora de
Fátima compreender que precisava ressignificar sua prática urgentemente. Assim, desde o ano
de 2014, a escola desenvolve o Projeto Identidade Rural, procurando voltar-se cada vez mais
para as questões oriundas do campo, trabalhando com problemáticas que relacionam-se com
os temas Agroecologia, Educação Ambiental, Agricultura Familiar, Empreendedorismo Rural
e Sustentabilidade, norteando-se pela Proposta Pedagógica da escola e tendo como ponto de
partida para seu desenvolvimento as “Cinco Etapas da Investigação Temática”, descritas pelo
pesquisador Demétrio Delizoicov, que orientou as ações realizadas em busca de informações
da realidade em que se encontra para, assim, planejar as intervenções pertinentes. O objetivo
geral do projeto é propor a mudança de postura e trabalho que se é realizado na escola,
utilizando elementos da Pedagogia da Alternância para o fomento e a valorização da
identidade rural na mesma e na comunidade. E, possui como objetivos específicos: despertar
o interesse de toda a comunidade escolar para a relevância da metodologia de alternância para
a aprendizagem dos estudantes; estabelecer uma relação de compromisso mútuo entre escola e
família no processo de formação dos alunos; incentivar o desenvolvimento da comunidade
local através de práticas difundidas nas residências; promover momentos de capacitação sobre
Pedagogia da Alternância e educação do campo para os professores e equipe diretiva; realizar
reuniões de planejamento de atividades e trocas de experiências entre os professores; realizar
reuniões com os professores, funcionários e equipe diretiva para discussão e avaliação das
atividades realizadas; proporcionar ao aluno o reconhecimento do seu espaço, valorizando o
meio onde vivem; oportunizar aos alunos a vivência e o contato direto com elementos que
fazem parte de sua realidade; promover, através das atividades curriculares e
extracurriculares, um espaço de estudo, descoberta e aprendizagem; desenvolver de forma
lúdica e multidisciplinar conteúdos das diversas áreas do conhecimento, relacionando à sua
realidade; proporcionar aos alunos o conhecimento básico de técnicas agrícolas e temas
relacionados; promover atividades como palestras, oficinas e viagens de estudo para os alunos
e comunidade escolar que sejam relacionadas ao meio rural e à vida no campo; construir
parcerias com entidades voltadas ao meio rural e desenvolvimento e permanência da vida no
campo. O Projeto Identidade Rural baseia-se fundamentalmente nos pensamentos de Paulo de
Freire e Demétrio Delizoicov, que acreditam que é necessário que a realidade do aluno seja
conhecida, que seja desvendada e que, a partir dela, deve-se começar a utilizar estas
informações para que se construam os conhecimentos. “O respeito, então, ao saber popular
implica necessariamente o respeito ao contexto cultural. A localidade dos educandos é o
ponto de partida para o conhecimento que eles vão criando do mundo. ‘Seu’ mundo em última
análise é a primeira e inevitável face do mundo mesmo”. (FREIRE, 1997) Desta forma, após,
nestes anos de experiência, introduzir estes preceitos na prática pedagógica da escola, no ano
de 2017 tivemos a oportunidade de conhecer a Pedagogia da Alternância, pela qual houve um
encantamento por parte da equipe diretiva e professores, pois foi vista na metodologia de
alternância uma possibilidade de potencializar ainda mais o trabalho da escola dentro do
propósito de promover uma educação “no” campo “para” o campo. Assim, o projeto foi
reformulado, com uma nova organização pedagógica e um novo título: Projeto Identidade
Rural – À Luz da Pedagogia da Alternância, onde em sua nova organização introduziu-se
fundamentos da Pedagogia da Alternância (PA), fazendo adaptações de algumas práticas
desta metodologia para a realidade da escola. Para a operacionalização desta dinâmica, que se
sustenta na interação dos indivíduos em formação com o meio em que vivem, construindo

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seus conhecimentos com base na relação do cotidiano da vida no campo e as aprendizagens


mediadas pela escola, utilizam-se alguns instrumentos didáticos, sendo estes: tema gerador,
plano de estudo, caderno da realidade, tutoria, visitas às famílias, viagem de estudo e serão.
Estes instrumentos são comuns a qualquer escola onde se trabalhe com a PA, podendo ser
adaptados à cada realidade, de acordo com os objetivos estabelecidos. Sendo assim, foi a
partir do conhecimento e reflexões sobre experiências da PA que se concluiu que esta
metodologia seria uma possibilidade de avanço na prática pedagógica da EMEF Nossa
Senhora de Fátima e seu objetivo de solidificar a identidade rural da escola. Para tanto, este
projeto organiza e apresenta adaptações realizadas pertinentes à realidade da escola para
introduzir a alternância em seu trabalho, visto que muito ainda há de ser estudado sobre a PA
e o caminho para fazer uma escola organizada administrativa e pedagogicamente sustentada
na alternância é uma realidade ainda distante. Como o projeto é baseado em elementos da
Pedagogia da Alternância, foram necessárias adaptações de alguns destes elementos, visto
que, para adotá-la por completo, com períodos de alternância menores e internato, a escola
necessitaria de suporte da rede de ensino do município na parte logística, referentes a
transporte escolar, dormitórios, alimentação, monitores, entre outros. Em consequência,
também é preciso alguns ajustes quanto à estrutura pedagógica, adequando algumas práticas
(principalmente os instrumentos didáticos) à nossa realidade – daí o título do projeto com o
complemento “À luz da Pedagogia da Alternância”. O projeto irá atingir todas as turmas, de
Educação Infantil a 9º ano, porém, neste ano, como projeto-piloto, a alternância será apenas
para as turmas de 4º a 9º anos, por agruparem-se no mesmo turno no calendário letivo. Nas
demais turmas, de Educação Infantil a 3º ano, o Projeto Identidade Rural será desenvolvido
seguindo a mesma sequência didática, trabalhando tema gerador e subtemas propostos, mas
sem o uso dos instrumentos didáticos adotados e sem a semana de alternância, tendo, ao final
de trimestre, a semana de culminância. O Projeto Identidade Rural, anualmente, estipula
metas que serão perseguidas durante o ano letivo, onde estas metas são traçadas de acordo
com as necessidades apresentadas pelos alunos e pela comunidade escolar. Isso ocorre por
meio de reuniões e principalmente através das respostas obtidas na pesquisa
socioantropológica e diagnóstico socioambiental que as famílias respondem no início do ano.
Num primeiro momento, a definição do tema gerador e subtemas para o ano letivo será feita
pelos professores e coordenação pedagógica, até que se tenha segurança e maturidade para,
conforme a proposta da metodologia de alternância, o tema ser definido juntamente à
comunidade e alunos, discutido em momentos específicos. O tema gerador será trabalhado em
três subtemas, um a cada trimestre. Neste período trimestral, os professores irão desenvolver
seu projeto didático para organizar suas atividades dentro do Projeto Identidade Rural. De
Educação Infantil a 5º ano, os projetos serão feitos pelos professores regentes das turmas,
podendo trabalhar de forma conjunta com os professores dos componentes de Educação
Física e Arte. Já nos Anos Finais, os professores de cada componente têm liberdade para
desenvolver seu projeto de maneira individual ou em conjunto com qualquer outro
componente com que consiga desenvolver um trabalho em comum. Ao final de cada
trimestre, colocado em prática todos os projetos, acontecerá a semana de alternância, quando
alunos do 4º ao 9º levarão para suas residências um pouco do que foi trabalhado durante o
trimestre, ao mesmo tempo que, no retorno à escola, trarão elementos da sua vivência para dar
sequência ao trabalho. Durante estes dias, os alunos receberão acompanhamento por meio de
visitas dos seus professores tutores, para apoio ao desenvolver as atividades a distância e
também estabelecer um vínculo maior da escola com a família, que tem fundamental

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importância nesta nova proposta de trabalho da escola. Durante todo o projeto, as atividades
serão fundamentadas nos princípios da educação contextualizada, da pesquisa e da aliança da
teoria com a prática, a fim de que todo o conhecimento construído por meio da escola faça
sentido na vida dos alunos enquanto aprendizes e, sobretudo, indivíduos. Os instrumentos
didáticos adotados e adaptados à realidade da escola, de acordo com nossos objetivos, são:
Tema gerador – O tema gerador se trata do ponto de partida do trabalho, o qual vai englobar
subtemas ligados a ele. Projeto didático – Os professores irão elaborar um projeto de trabalho
por trimestre, organizando suas atividades dentro do projeto, de acordo com sua disciplina.
Tutorias – É o acompanhamento e assessoramento dos alunos no processo de ensino-
aprendizagem. Caderno da Realidade – É um caderno de registro das atividades dentro do
projeto, principalmente as realizadas no período da alternância, com acompanhamento e
assinatura dos pais. Viagem de Estudos – Permitem observar, conhecer e comparar uma
realidade diferente da escola do meio em que vive, servindo como recursos didáticos. Visita
às famílias – Durante o período de estudos em casa, os alunos serão visitados pelos
professores a fim de acompanhar as atividades realizadas e dar suporte às famílias, então
responsáveis pela aprendizagem neste momento. No que refere-se à avaliação dos alunos,
além do realizado permanentemente dentro do projeto, considerando aspectos qualitativos,
também será reservada uma parcela atribuída de modo quantitativo, acrescentada à média do
trimestre e elaborada em conjunto pelos professores da área nos Anos Finais. Na Educação
Infantil e Anos Iniciais, a avaliação será expressa em itens no parecer descritivo elaborado
pelo professor regente de cada turma. Como resultado do projeto, neste ano de 2018, tivemos
a primeira semana da alternância entre as atividades desenvolvidas no 1º trimestre escolar. A
semana da alternância possibilitou aos alunos permanecerem em suas propriedades e
desenvolverem atividades anteriormente solicitadas pelos professores, estas atividades
envolveram a construção de uma composteira e o cultivo de hortaliças em canteiros
alternativos (PET). Os alunos durante a semana da alternância receberam seus tutores em suas
propriedades e explicaram todo o processo de construção e manejo das atividades
desenvolvidas, assim como receberam instruções de melhorias a ser feitas nas atividades
desenvolvidas. Juntamente com parte prática, os alunos tiveram que elaborar relatórios
descritivos sobre os procedimentos adotados, como por exemplo: tipo de material utilizado na
construção da composteira, medidas, quantidade de regas, tipos de substrato, presença de
pragas, principais dificuldades encontradas e entre outras previamente relacionadas. Desta
forma, concordamos com Teixeira et al. (2008) que diz “A Pedagogia da Alternância atribui
grande importância à articulação entre momentos de atividade no meio socioprofisional do
jovem e momentos de atividade escolar propriamente dita, nos quais se focaliza o
conhecimento acumulado, considerando sempre as experiências concretas dos educandos”.

Eixo 2: A educação do campo e a educação dos camponeses.

Palavras-chave: Educação do campo. Pedagogia da alternância. Identidade rural.

Referências:

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DELIZOICOV, D; ANGOTTI, J. A.; PERNAMBUCO, M.M. Ensino de Ciências:


fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2002.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. Rio


de Janeiro, Paz e Terra, 1997.

TEIXEIRA, E. S.; BERNARTT, M. de L.; TRINDADE, G. Estudos sobre Pedagogia da


Alternância no Brasil: revisão de literatura e perspectivas para a pesquisa. Educação e
Pesquisa, São Paulo, v.34, n.2, p. 227-242, maio/ago. 2008.

PROJETO MORANGUINHO: PRESERVANDO O GOSTO PELA ALIMENTAÇÃO


SAUDÁVEL
Lisandri Chaves Zampieri
EMEF Adelino Roso
lichavesz@gmail.com

Este trabalho tem como finalidade apresentar o relato de experiência desenvolvido com os
alunos da pré-escola, na Escola Municipal de ensino Fundamental Adelino Roso na localidade
de Colônia Borges, tendo como eixo principal “a educação transformando a sociedade através
do projeto sobre a alimentação saudável”. O projeto tem como objetivo preservar o gosto pela
alimentação saudável, para que não se perca essa cultura que é cultivada no interior. Para
desenvolver o objetivo proposto foi utilizado a metodologia de projetos do “Programa União
Faz a Vida”, onde no primeiro momento realizou-se uma expedição investigativa na horta da
mãe de uma aluna, onde o grupo de alunos pode investigar e conhecer vários tipos de
hortifrúti, além terem contato com frutas e verduras, também saborearam as frutas locais. No
retorno da visita, os alunos juntamente com a professora se reuniram em uma roda de
conversa para relatar sobre a ida à horta, do que mais gostaram, quais mais gostaram de
degustar. Conversamos também sobre os alimentos mais saudáveis e seus benefícios para
nossa vida. Após essa roda de conversa concretizamos nossos aprendizados em um cartaz
com os alimentos saudáveis e não saudáveis. A partir daí, planejamos e combinados as

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atividades que seriam desenvolvidas durante o andamento do projeto, que se deu no ano de
dois mil e dezessete. Como atividades pedagógicas foram trabalhadas em sala de aula:
colagem com recortes de frutas onde exploramos a cor, tamanho, forma, quantidades, colheita
das bergamotas nos fundos da escola para produzirem suco, salada de frutas coletiva onde
cada criança trouxe uma fruta para a salada, a música “Salada de Fruta”, hora da leitura com a
história do sanduíche da Maricota, onde os alunos produziram o seu sanduiche na cozinha da
escola. Além disso, refletimos sobre a preservação do meio ambiente, onde foi trabalhado o
cuidado com as flores e a horta da escola, os alunos ajudaram a plantar, e cuidar das plantas e
flores, pintura nos pneus e por fim foi confeccionada uma cesta de piquenique onde as
crianças levavam para casa materiais para a confecção de frutas de sua preferência juntamente
com a família, escolhiam uma fruta e na volta para a escola faziam o relato contando a
atividade. Após as atividades finalizadas, foi promovido pela escola um Mostra Pedagógica
para apresentar para a comunidade escolar o trabalho desenvolvido durante o ano, com uma
apresentação artística dos alunos. “O que nos dá a certeza de que a busca do conhecimento
não é, para as crianças, preparação para nada e sim vida aqui e agora.” (FREIRE, 2007, p. 50).
Através da experiência na escola, foi possível colocar em pratica o que aprendemos na teoria.
Percebemos a importância da interação família-escola, que foi imprescindível a participação
nas atividades propostas, além disso, foi constatada que o projeto contribuiu para o
desenvolvimento e aprendizado das crianças através de atividades pedagógicas com o tema
“alimentação saudável”. Observou-se que o objetivo do trabalho foi alcançado, pois além do
incentivo diário para uma alimentação saudável, o trabalho atingiu um dos pontos principais
que se busca atualmente no meio escolar, que é a participação ativa das famílias nas
atividades escolares.

PALAVRAS CHAVE: Alimentação Saudável; Interação; Educação Infantil

REFERÊNCIA:

FREIRE, Madalena. (2007). A paixão de conhecer o mundo. São Paulo, Editora Paz e Terra.

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REFLEXÕES SOBRE A CARTA DA TERRA EM UMA ESCOLA DO CAMPO

Marcia Eliana Migotto Araujo


Universidade Federal de Santa Maria
meliana12003@yahoo.com.br

O presente trabalho teve por objetivos apresentar “A Carta da Terra” para alunos de uma
Escola do Campo. A metodologia utilizada foi uma apresentação fílmica. A atividade
aconteceu em uma Escola do Campo, na região de Santa Maria, rs. Como resultados
observou-se o interesse e também a preocupação do alunos em relação ao meio ambiente.
Suas preocupações salientaram-se em relação a preservação do meio ambiente e da
importância em perceber o meio ambiente global, não apenas as florestas e os animais.

O trabalho relaciona-se ao Eixo Temático 2- Educação do Campo.

Palavras-chave: A Carta da Terra; Educação do Campo; Discentes.

REFLEXÕES SOBRE A CARTA DA TERRA EM UMA ESCOLA DO CAMPO

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O trabalho relata uma atividade realizada sobre “A Carta da Terra”, em uma Escola do
Campo, com o objetivo de debater com os alunos os princípios abordados na presente Carta. A
escola é um espaço de relações, de conhecimento e vivências, neste cria-se e recria-se
relações humanas que podem transformar o mundo e a si mesmos. Para tanto, necessita-se
conhecer, vivenciar e experienciar conhecimentos e ideias.
A Carta da Terra é uma declaração de princípios éticos para a construção de uma
sociedade global, justa e sustentável, para o século XXI. Este documento foi elaborado por
centenas de indivíduos de diferentes segmentos e países. A história da Carta da Terra, iniciou-
se na Rio-92, porém, não houve consenso.
No ano de 1995, na Holanda em Haia, encontraram-se aproximadamente 60
representantes de diferentes áreas do conhecimento formando um comitê, este objetivou uma
consulta mundial por dois anos. Como resultado foi construído os “Princípios de Conservação
Ambiental e Desenvolvimento Sustentado”.
O primeiro delineamento da Carta da Terra foi escrito por Maurice Strong (ONU) e
Mikhail Gorbachev (Cruz Verde Internacional), em 1997. Nos anos de 1998 e 1999, aconteceu
um debate em diversos países, escolas e ministérios. Steven Rockfeller em 1999 escreveu o
segundo esboço do documento. Em 2000 a Carta da Terra foi aprovada. O professor, escritor e
ambientalista - Leonardo Boff é o representante da América Latina, na comissão da Carta da
Terra.
O documento é dividido em dezesseis princípios agrupados em quatro tópicos:
primeiro Respeitar e cuidar da comunidade da vida; segundo Integridade ecológica; terceiro
Justiça social e econômica e o quarto Democracia, não violência e paz. Estes possuem vários
temas e subtemas relacionados a uma visão global e planetária sobre o meio ambiente.
Nasceu por meio de uma transformação de postura ética e moral, que tem como finalidade
tornar-se planetária. Porém o documento apresenta uma realidade preocupante, na qual é
visível o desrespeito ao meio ambiente global e também as possibilidades sustentáveis para o
planeta Terra.
Para Moacir Gadotti (2018) “o cenário não é otimista, o meio ambiente está em risco”,
afirmando que podemos destruir toda a vida no planeta neste milênio que se inicia,
salientando a necessidade de uma ação conjunta global e um movimento coletivo
construirmos uma ideia planetária e sustentável.
Necessitamos de um paradigma fundado numa visão sustentável do planeta
Terra. Até o momento os paradigmas baseados em uma visão industrialista devastadora,
antropocêntrica e uma política de desenvolvimento com base no crescimento industrial sem
preocupação ambiental, estão gradativamente consumindo o meio ambiente, prejudicando o
presente e o futuro planetário (GADOTTI,2018).
Devido a estas questões “A Carta da Terra” é um alerta para nos responsabilizarmos
pelo desenvolvimento e cuidado do nosso planeta. O documento final data do ano 2000 e é
amparado por milhares de organizações ao redor do mundo, inclusive no Brasil. Porém
poucas instituições escolares trabalham com este documento.
O objetivo da atividade foi apresentar “A Carta da Terra” e posteriormente debater
com os alunos a sua importância.
É uma pesquisa qualitativa que se preocupa com os aspectos da realidade que não
podem ser quantificados (CRESWELL,2007). Essas pesquisas partem da ideia de que “há
uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o
sujeito e o objeto (CHIZZOTTI, 2006).

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Inicialmente discentes assistiram ao vídeo sobre “A Carta da Terra”, posteriormente


realizou-se uma reflexão sobre o vídeo e para finalizar os alunos foram convidados a
produzirem uma obra artística sobre o que assistiram.
A atividade foi realizada na Escola Estadual de Ensino Fundamental Arroio Grande,
que está localizada na RS 511 em Arroio Grande no 4 distrito. Foi fundada no dia 13 de
novembro de 1940 surgiu por uma necessidade da comunidade que na época estava se
constituindo, no local fundou-se uma Igreja, um cemitério e alguns bolichos.
Atualmente a escola possui Ensino Fundamental: educação infantil, séries iniciais e
finais; conta com 150 alunos. Exercem à docência 16 professores, todos graduados e a
maioria com pós-graduação. As características são de uma escola urbana, porém a maioria dos
alunos são provenientes da zona rural, atualmente a região possui transporte escolar para os
alunos que necessitam.
A atividade foi realizada em quatro turmas do Ensino Fundamental, anos finais. Como
resultados percebeu-se os discentes assistiram atentamente ao vídeo “A Carta da Terra”. Na
reflexão dos discentes foi abordado a poluição dos mares, a extinção de alguns animais, a
fome e a violência. Também salientaram a necessidade de se viver em harmonia e que as
escolhas realizadas na vida são fundamentais para a sobrevivência do meio ambiente.
As produções artísticas dos discentes demonstram preocupação e também respeito
com o meio ambiente. Em algumas obras também foram escritas frases. Apresento a seguir
algumas frases dos discentes:
“Não jogue lixo no chão porque ele vai para os rios e as árvores que fica perto dos rios,
vamos cuidar da nossa natureza” A1.
“Cuide do meio ambiente como você cuida d seu celular”; “Respeite o meio ambiente como
se fosse seus pais” A2.
“Meio Ambiente: valorize, cuide, abrace, respeite, preserve e ame”A3.
“O mundo precisa de nós para viver vem com a gente para fazer o bem isso vai ser bom” A4.
“Cuidar do meio ambiente é o principal meio de viver na terra” A5.
Paul Freire (1963) afirma que “de seu esforço criador e recriador. O homem, afinal, no
mundo e com o mundo, como sujeito e não como objeto”. Reforça-se a ideia de que o discente
pode ser o construtor de seu espaço de seu espaço, que cultura são as formas de comportar-se,
além de que cultura é criação humana.
Segundo Moacir Gadotti(2018) “A sensação de pertencimento à Terra não se inicia na
idade adulta e nem por um ato de razão. Desde a infância, sentimo-nos ligados com algo que é
muito maior do que nós”.
Nesse sentido, a educação escolar pode inserir questões filosóficas, propor aos
discentes uma reflexão sobre a sua vida, sobre suas vivencias no meio ambiente, sobre o
sentido de sua vida e principalmente propor uma reflexão a respeito da importância de
suas/nossas ações práticas, de sua/nossa vivência no planeta Terra.
É necessário ter consciência de que nossa vida está ligada ao planeta terra, que é
durante nossa trajetória que aprendemos, construímos, ou destruímos nosso meio ambiente.
Busca-se atualmente uma cultura da sustentabilidade, uma educação para a ética e para uma
cidadania ecológica.

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BIBLIOGRAFIA
CARTA DA TERRA. Disponível em
<http://www.mma.gov.br/estruturas/agenda21/_arquivos/carta_terra.pdf >Acesso em 20.nov.2017.
CARTA DA TERRA. Disponível em < https://www.youtube.com/watch?v=Pd1guqYgOCQ >Acesso
em 20.jun.2018.
CHIZZOTTI, A. Pesquisa qualitativa em Ciências Humanas e Sociais. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2006.
CRESWELL, John. Projeto de Pesquisa: métodos qualitativo, quantitativo e misto. Porto Alegre.
Artmed, 2007.
FRANCO, M. A. S. Pedagogia e pesquisa-ação. Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31. n. 3,
set./dez. 2005.
FREIRE, Paulo. Conscientização e Alfabetização: uma nova visão do processo. Revista de Cultura da
Universidade do Recife. Nº 4; Abril-Junho, 1963.
GADOTTI, Moacir. Ecopedagogia e Educação Sustentável. Disponível em
<http://gadotti.org.br:8080/xmlui/bitstream/handle/123456789/440/AMG_PUB_03_007.pdf?s
equence=1&isAllowed=y > Acesso em 10.jul.2018.

MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. Tradução de Catarina Eleonora F. da


Silva e Jeanne Sawaya; revisão técnica de Edgard de Assis Carvalho. São Paulo: Cortez; Brasília:
UNESCO, 2000.

VIVÊNCIAS DE CICLISMO EM UMA ESCOLA DE CAMPO ATRAVÉS DE AULAS


DE EDUCAÇÃO FÍSICA
Lecimara Scherer Vieira/EMEFIMR/PMSM/Educador, lecixerer@gmail.com
Larissa Schlottfeldt Hofstadler Deiques/UFSM/CCR/Escola, lari_shd@hotmail.com

O Resumo Expandido trata-se de um relato de experiência sobre um projeto de aula de


educação física desenvolvido com alunos do 6º ao 9º da Escola Municipal de Ensino
Fundamental Intendente Manoel Ribas, caracterizada como escola de campo, localizada na
zona rural da cidade de Santa Maria, no estado de Rio Grande do Sul, dentro do País Brasil. O
objetivo do trabalho foi ampliar os espaços pedagógicos para além da sala de aula
promovendo qualidade de vida, aos educandos, explorando a comunidade local através de
aulas de ciclismo. Foram utilizadas bicicletas oferecidas pela escola e equipamentos de
segurança tais como, capacetes e joelheiras, visando o bem estar dos alunos, as rotas a serem
seguidas foram traçadas de acordo com a preferência do alunado. Os resultados a partir da
experiência nos permitiu constatar que o interesse e motivação dos educandos em participar
das aulas aumentaram significativamente, proporcionando conhecer espaços dispostos pela
comunidade e explorá-los pedagogicamente. Portanto compreender a prática educativa
buscando o pleno desenvolvimento do educando sem o distanciar do contexto do qual está
inserido.

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Palavras-chave: Educação; Ciclismo; Escola do Campo.

1 INTRODUÇÃO

A Educação do campo, por atender um público específico, necessita de formas


diferenciadas de abordagem de conteúdos, que precisam se adequar com a realidade rural,
visando atender as especificidades dos educandos que vivem neste meio (FREIRE, 1997).
De acordo com a Resolução CNE/CEB 1 de 2002 as propostas pedagógicas das escolas
rurais, respeitadas as peculiaridades e o direito à igualdade, levarão em conta a diversidade do
campo em todos os seus âmbitos: sociais, culturais, políticos, econômicos, de gênero, geração
e etnia.
Ainda conforme a Resolução CNE/CEB 1 de 2002 Art. 7º:

§ 2° As atividades constantes das propostas pedagógicas das escolas, preservadas as


finalidades de cada etapa da educação básica e da modalidade de ensino prevista,
poderão ser organizadas e desenvolvidas em diferentes espaços pedagógicos, sempre
que o exercício do direito à educação escolar e o desenvolvimento da capacidade
dos alunos de aprender e de continuar aprendendo assim o exigirem.

A educação é repleta de uma grandiosa essencialidade dentro do processo histórico e


constitutivo do ser humano, através dela é possível entender a função da educação na
sociedade de classes, pois a educação do indivíduo é o resultado da ação do meio ambiente, se
o homem transforma o ambiente, então deve transformar a educação (TRINDADE;
VENDRAMINI, 2011).
De acordo com Gohn (2006) apud Anschau et al :
A princípio podemos demarcar seus campos de desenvolvimento: a educação formal
é aquela desenvolvida nas escolas, com conteúdos previamente demarcados; a
informal como aquela que os indivíduos aprendem durante seu processo de
socialização - na família, bairro, clube, amigos etc., carregada de valores e culturas
próprias, de pertencimento e sentimentos herdados; e a educação não-formal é
aquela que se aprende "no mundo da vida", via processos de compartilhamento de
experiências, principalmente em espaços e ações coletivos cotidianas. (GOHN, 2006
apud ANSCHAU et al ).

Repensando a prática educativa nas aulas de educação física, para esta modalidade de
ensino, entendemos a importância de ampliar os espaços pedagógicos para além dos
oferecidos na escola. Com este objetivo foi oferecidas aos alunos aulas de ciclismo pela

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comunidade local, visando à melhoria da qualidade de vida, o incentivo à prática de


atividades físicas, explorando diferentes espaços pedagógicos integrados ao contexto rural.
Os objetivos específicos buscados com a oficina de ciclismo foram visados através do
desenvolvimento do educando nos âmbitos cognitivos, físicos e afetivos sociais, sendo
baseado do incentivar a atividade física a fim de promover a saúde, promover a cooperação e
interação social dos alunos; Proporcionar qualidade de vida; Motivar os alunos
intrinsecamente e extrinsecamente a participar das aulas; Promover a inserção do aluno ao
contexto social rural; Ampliar os espaços pedagógicos; e Fomentar o pensamento crítico e
reflexivo dos educandos através da participação efetiva da elaboração das aulas.
Dessa forma, pretende-se por meio deste trabalho descrever um relato de experiência de
professores que lecionam em uma Escola do campo Municipal de Ensino Fundamental
localizada na zona rural de Santa Maria RS sobre as aulas de ciclismo oferecidas na disciplina
de educação física.
A partir das aulas práticas se desenvolveu a oficina de ciclismo com os alunos das séries
finais, e por meio destas, foi elaborado este relato de experiência tendo a finalidade de
compartilhar as atividades desenvolvidas nas aulas de educação física.

2 MATERIAIS E MÉTODOS

Este trabalho trata-se de um relato de experiência nas aulas de educação física, ocorridas
em uma escola de campo localizada no Estado do Rio Grande do Sul, no município de Santa
Maria, em zona rural, situada na Rua Estrada para São Martinho, SN, cujo CEP 97017-997,
estabelecida ao norte, no 10º distrito da cidade o Santo Antão.
O nome da escola é Escola Municipal de Ensino Fundamental Intendente Manoel Ribas
(EMEFIMR), considerada uma escola de campo, fundada em 02 de maio de 1953 a
EMEFIMR em sua proposta pedagógica valoriza os saberes do campo, com a união da teoria
dada em sala de aula e com a prática do campo agregando conhecimento por meio de
metodologias diversificadas, tornando o aprender significativo e produtivo.
A ideia de explorar a comunidade através de aulas de ciclismo surgiu da necessidade
da ampliação de espaços pedagógicos para além da escola, a fim que houvesse a valorização
dos espaços não formais disponíveis na comunidade local, aproximando ainda mais o aluno
ao contexto rural.

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Em primeiro momento quando surgiu o interesse de realizar a oficina de ciclismo na


escola, no terceiro trimestre de 2017, foram verificados os materiais disponíveis e se seriam
suficientes para todos os alunos em suas respectivas turmas. Ao constatarmos que as
bicicletas e materiais de segurança (capacetes e joelheiras) eram satisfatórios para elaboração
da oficina, a mesma foi apresentada aos alunos como uma possiblidade de prática nas aulas de
educação física.
Em seguida, após a aprovação do projeto pela equipe gestora da escola, foram
encaminhados para os pais ou responsáveis autorizações para que fossem assinadas
declarando que estavam de pleno acordo com o deslocamento dos alunos pelas vias rurais da
comunidade.
Após serem tomadas as medidas legais cabíveis, foram traçadas as rotas a serem
seguidas, levando em consideração o interesse dos alunos e a segurança deles e dos
professores envolvidos. Ao fim de cada aula já traçávamos os caminhos a serem seguidos na
semana seguinte. Ressaltamos que as escolhas dos lugares eram feitas pelos educandos com
mediação dos professores, pois consideramos que deve haver uma mediação entre
professor/aluno para que aprendizagem seja efetiva e reflexiva. Segundo Freire (2003) ensinar
não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a
sua construção.
Segundo Anschau et al. (2016):

A educação não formal destaca os processos educativos que têm uma


intencionalidade na ação, pois prevê troca de conhecimento, envolve um processo
interativo de ensino e aprendizagem e colabora com a construção de aprendizagens
de saberes coletivos, que, por sua vez, não têm a formalidade do ensino regular [...] (
ANSCHAU et AL. 2016).

Portanto, podemos observar no decorrer da oficina, um aumento significativo no


interesse dos alunos em participar das aulas de educação física. Houve uma maior motivação
na prática de atividades físicas, como uma melhora na resistência muscular e
cardiorrespiratória decorrente das aulas de ciclismo. Notamos também o interesse dos alunos
em participar efetivamente escolhendo e indicando os lugares a serem percorridos na oficina.
Ao encontro dessa experiência Freire (2011) relata que o aprendizado deve ser educado por
meio de um compartilhamento de pessoas, mediatizados pelos saberes do mundo.

Figura 1: Aulas de ciclismo realizadas na escola, 2017.

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Fonte: As autoras.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Através das aulas de ciclismo podemos ressaltar a importância da escola do campo se


da por meio do entendimento relacionando os saberes diversificados expresso na parceria
entre a escola e o campo no desenvolvimento de uma aprendizagem contínua, pois o aluno
aprende em todos seus espaços de convivência, não somente no ambiente escolar. Acredita-se
que se não ocorrer à parceria entre ambas, a educação será falha, por ser um processo
ininterrupto.
Salientamos também que a experiência de expandir os espaços pedagógicos da escola
para a comunidade foi extremamente satisfatória, pois houve uma mudança no
comportamento dos alunos em relação às aulas de educação física, sendo mais participativos,
críticos e reflexivos. Acreditamos ter alcançado os objetivos propostos para a oficina de
ciclismo, que será repensada e melhorada para continuar atender as especificidades do aluno
do campo.

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Contudo, acrescenta-se que educar é um ato grandioso para quem educa em qualquer
meio social e etapa da vida futura do educando, portanto a educação deve ser continuada,
humanizada e respeitada.

REFERÊNCIAS

BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Institui Diretrizes Operacionais para a


Educação Básica nas Escolas do Campo - Resolução CNE/CEB n.º 3 abr. 2002.
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/escola-de-gestores-da-educacao-basica/323-
secretarias-112877938/orgaos-vinculados-82187207/13200-resolucao-ceb-2002> Acesso em:
20 jun. 2018.

TRINDADE, G. A.; VENDRAMINI, C. R. A Relação Trabalho e Educação na Pedagogia


da Alternância. Revista Histedbr On-line, Campinas, n.44, p.32-46, dez. 2011.

FREIRE, P. Pedagogia Da Autonomia - Saberes Necessários À Prática Educativa. São


Paulo: Paz e Terra, 2003.

FREIRE, Paulo. Pedagogia Do Oprimido. 50 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
2011.

ANSCHAU, C. et al. A Prática Pedagógica Em Espaços Não Escolares: Uma Nova


Perspectiva De Atuação. Disponível em:
<http://eventos.seifai.edu.br/eventosfai_dados/artigos/semic2016/381.pdf> Acesso em: 10 jul.
2018.

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VIVÊNCIAS DE OFICINAS DE SABÃO EM UMA ESCOLA DE CAMPO ATRAVÉS


DE AULAS DE TURNO INTEGRAL

Larissa Schlottfeldt Hofstadler Deiques/UFSM/CCR/Escola,


lari_shd@hotmail.com
Lecimara Scherer Vieira/EMEFIMR/PMSM/Educador,
lecixerer@gmail.com
Luciane Maffini Schlottfeldt/EMEFIMR/PMSM/Diretor,
Luciane_schlottfeldt@yahoo.com

O Resumo Expandido trata-se de um relato de experiência sobre uma escola de campo que
desenvolve através do turno integral oficinas temáticas, entre elas o reaproveitamento de
matérias orgânicas que seriam descartáveis no meio ambiente, como o óleo de cozinha, pelo
qual é aplicado na oficina de sabão, para a realização do mesmo, com os alunos do 1º ao 9º da
Escola Municipal de Ensino Fundamental Intendente Manoel Ribas, caracterizada como
escola de campo, no estado do Rio Grande do Sul, localizada na zona rural da cidade de Santa
Maria, dentro do País Brasil. O objetivo do trabalho foi ampliar os espaços pedagógicos para

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além da sala de aula promovendo qualidade de vida, aos educandos, explorando o


reaproveitamento dos alimentos que seriam descartáveis através de aulas de turno integral.
Foram utilizados materiais de proteção individual para cada aluno oferecidos pela escola tais
como, óculos, avental, luvas, e mascaras, visando o bem estar dos alunos, a receitas utilizada
para a fabricação do sabão foi desenvolvida a partir da professora, porém acompanhadas por
todos os professores. Os resultados a partir da experiência nos permitiu constatar que o
interesse e motivação dos educandos em participar das aulas aumentaram significativamente,
proporcionando conhecer a importância do reaproveitamento dos alimentos, e do lixo para
com o meio ambiente pedagogicamente. Portanto compreender a prática educativa buscando o
pleno desenvolvimento do educando sem o distanciar do contexto do qual está inserido.

Palavras-chave: Educação; Oficina de Sabão; Escola do Campo.

1 INTRODUÇÃO

A Educação do campo, por atender um público específico, necessita de formas


diferenciadas de abordagem de conteúdos, que precisam se adequar com a realidade rural,
visando atender as especificidades dos educandos que vivem neste meio (FREIRE, 1997).

De acordo com a Resolução CNE/CEB 1 de 2002 as propostas pedagógicas das escolas


rurais, respeitadas as peculiaridades e o direito à igualdade, levarão em conta a diversidade do
campo em todos os seus âmbitos: sociais, culturais, políticos, econômicos, de gênero, geração
e etnia.

Ainda conforme a Resolução CNE/CEB 1 de 2002 Art. 7º:

§ 2° As atividades constantes das propostas pedagógicas das escolas, preservadas as


finalidades de cada etapa da educação básica e da modalidade de ensino prevista,
poderão ser organizadas e desenvolvidas em diferentes espaços pedagógicos, sempre
que o exercício do direito à educação escolar e o desenvolvimento da capacidade
dos alunos de aprender e de continuar aprendendo assim o exigirem.

A educação é repleta de uma grandiosa essencialidade dentro do processo histórico e


constitutivo do ser humano, através dela é possível entender a função da educação na
sociedade de classes, pois a educação do indivíduo é o resultado da ação do meio ambiente, se
o homem transforma o ambiente, então deve transformar a educação (TRINDADE;
VENDRAMINI, 2011).

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De acordo com Gohn (2006) apud Anschau et al :

A princípio podemos demarcar seus campos de desenvolvimento: a educação formal


é aquela desenvolvida nas escolas, com conteúdos previamente demarcados; a
informal como aquela que os indivíduos aprendem durante seu processo de
socialização - na família, bairro, clube, amigos etc., carregada de valores e culturas
próprias, de pertencimento e sentimentos herdados; e a educação não-formal é
aquela que se aprende "no mundo da vida", via processos de compartilhamento de
experiências, principalmente em espaços e ações coletivos cotidianas. (GOHN, 2006
apud ANSCHAU et al ).

Repensando a prática educativa nas oficinas de sabão, para esta modalidade de ensino,
entendemos a importância de ampliar os espaços pedagógicos para além dos teóricos
oferecidos na escola. Com este objetivo foi oferecidas aos alunos oficinas de sabão, visando o
reaproveitamento dos alimentos, à melhoria da qualidade de vida frente ao meio ambiente, o
incentivo à prática de atividades físicas, explorando diferentes espaços pedagógicos
integrados ao contexto rural.

Os objetivos específicos buscados com a oficina de sabão foram visados através do


desenvolvimento do educando nos âmbitos cognitivos, físicos e afetivos sociais, sendo
baseado do incentivar o cuidado com o meio ambiente a fim de promover o descarte correto
dos alimentos e do lixo, promover a cooperação e interação social dos alunos; Proporcionar
qualidade de vida; Motivar os alunos intrinsecamente e extrinsecamente a participar das aulas
e oficinas; Promover a inserção do aluno ao contexto social rural; Ampliar os espaços
pedagógicos; e Fomentar o pensamento crítico e reflexivo dos educandos através da
participação efetiva da elaboração das aulas.

Dessa forma, pretende-se por meio deste trabalho descrever um relato de experiência de
professores que lecionam em uma Escola do campo Municipal de Ensino Fundamental
localizada na zona rural de Santa Maria RS sobre as oficinas de sabão oferecidas no turno
integral de uma escola de campo.

A partir das aulas práticas se desenvolveu a oficina de sabão com os alunos das séries
iniciais e finais, e por meio destas, foi elaborado este relato de experiência tendo a finalidade
de compartilhar as atividades desenvolvidas nas oficinas de sabão.

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2 MATERIAIS E MÉTODOS

Este trabalho trata-se de um relato de experiência desenvolvido a partir das oficinas de


sabão, ocorridas em uma escola de campo localizada no Estado do Rio Grande do Sul, no
município de Santa Maria, em zona rural, situada na Rua Estrada para São Martinho, SN, cujo
CEP 97017-997, estabelecida ao norte, no 10º distrito da cidade o Santo Antão.

O nome da escola é Escola Municipal de Ensino Fundamental Intendente Manoel Ribas


(EMEFIMR), considerada uma escola de campo de turno integral, fundada em 02 de maio de
1953 a EMEFIMR em sua proposta pedagógica valoriza os saberes do campo, com a união da
teoria dada em sala de aula e com a prática do campo, agregando conhecimento por meio de
metodologias diversificadas, tornando o aprender significativo e produtivo.

A ideia de desenvolver o reaproveitamento dos alimentos descartáveis por meio da


oficina de sabão surgiu da necessidade e cuidado com o meio ambiente, e através da
ampliação de espaços pedagógicos para além da escola, a fim que houvesse a valorização dos
espaços não formais disponíveis na comunidade local, aproximando ainda mais o aluno ao
contexto rural.

Em primeiro momento quando surgiu o interesse de realizar a oficina de sabão na


escola, no ano de 2017, foram verificados os materiais disponíveis e se seriam suficientes para
todos os alunos em suas respectivas turmas. Ao constatarmos que os materiais de segurança
eram satisfatórios para elaboração da oficina, a mesma foi apresentada aos alunos como uma
possiblidade de prática nas aulas onde integrava as teorias dadas em sala de aula com as
práticas do campo.

Em seguida, após a aprovação da oficina pela equipe gestora da escola, foram


encaminhados para os pais ou responsáveis autorizações para que fossem assinadas
declarando que estavam de pleno acordo com o desenvolvimento das mesmas.

Após serem tomadas as medidas legais cabíveis, foram realizadas a oficina de sabão,
levando em consideração o interesse dos alunos e a segurança deles e dos professores
envolvidos. Ao fim de cada oficina foi reforçado em aula teórica a importância e

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conscientização das mesmas, pois consideramos que deve haver uma mediação entre
professor/aluno para que aprendizagem seja efetiva e reflexiva. Segundo Freire (2003) ensinar
não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a
sua construção.

Segundo Anschau et al. (2016):

A educação não formal destaca os processos educativos que têm uma


intencionalidade na ação, pois prevê troca de conhecimento, envolve um processo
interativo de ensino e aprendizagem e colabora com a construção de aprendizagens
de saberes coletivos, que, por sua vez, não têm a formalidade do ensino regular [...] (
ANSCHAU et AL. 2016).

Portanto, podemos observar no decorrer da oficina, um aumento significativo no


interesse dos alunos em participar das aulas teóricas e dos saberes, ligado com as teorias e
práticas demostrados pelo comprometimento diário expressos em seus cotidianos escolares no
decorrer das aulas tanto teóricas como as práticas, havendo uma maior motivação. Ao
encontro dessa experiência Freire (2011) relata que o aprendizado deve ser educado por meio
de um compartilhamento de pessoas, mediatizados pelos saberes do mundo.

Figura 1: Produções das Oficinas realizadas na escola em 2017.

Fonte: Quadro de fotos das oficinas temáticas praticadas pela Escola Intendente Manoel Ribas – Direção da
Escola, 2017.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Através das oficinas de sabão podemos ressaltar a importância da escola do campo que
se da por meio do entendimento relacionando os saberes diversificados expresso na parceria
entre a escola e o campo no desenvolvimento de uma aprendizagem contínua, pois o aluno
aprende em todos seus espaços de convivência, não somente no ambiente escolar. Acredita-se
que se não ocorrer à parceria entre ambas, a educação será falha, por ser um processo
ininterrupto.

Salientamos também que a experiência de expandir os espaços pedagógicos da escola


para a comunidade foi extremamente satisfatória, pois houve uma mudança no
comportamento dos alunos em relação às aulas teóricas e práticas, sendo mais participativos,
críticos e reflexivos. Acreditamos ter alcançado os objetivos propostos para a oficina de sabão
que será repensada e melhorada para continuar atender as especificidades do aluno do campo.

Contudo, acrescenta-se que educar é um ato grandioso para quem educa em qualquer
meio social e etapa da vida futura do educando, portanto a educação deve ser continuada,
humanizada e respeitada.

REFERÊNCIAS

BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Institui Diretrizes Operacionais para a


Educação Básica nas Escolas do Campo - Resolução CNE/CEB n.º 3 abr. 2002.
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/escola-de-gestores-da-educacao-basica/323-
secretarias-112877938/orgaos-vinculados-82187207/13200-resolucao-ceb-2002> Acesso em:
20 jun. 2018.

TRINDADE, G. A.; VENDRAMINI, C. R. A Relação Trabalho e Educação na Pedagogia


da Alternância. Revista Histedbr On-line, Campinas, n.44, p.32-46, dez. 2011.

FREIRE, P. Pedagogia Da Autonomia - Saberes Necessários À Prática Educativa. São


Paulo: Paz e Terra, 2003.

FREIRE, Paulo. Pedagogia Do Oprimido. 50 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
2011.

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ANSCHAU, C. et al. A Prática Pedagógica Em Espaços Não Escolares: Uma Nova


Perspectiva De Atuação. Disponível em:
<http://eventos.seifai.edu.br/eventosfai_dados/artigos/semic2016/381.pdf> Acesso em: 10 jul.
2018.

RELATO DE TEMPO COMUNIDADE: Controle biológico de pragas como abordagem


para o ensino de microbiologia em escola do campo do município de Bossoroca, RS.

Madalena de Oliveira
Rita de Cássia da Silveira Mendes
Juan Marcel Frighetto

Instituto Federal de Ciência e Tecnologia Farroupilha- Campus Jaguari, RS

magdalenaoliveira98@gmail.com
mendesritinha8398@gmail.com
juan.frighetto@iffarroupilha.edu.br

Relato de experiência

1. INTRODUÇÃO

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ISSN 2595-8372
Seminário Regional de Educação do Campo da Região Centro do Rio Grande do Sul

No curso de Licenciatura em Educação do Campo Ciências da Natureza ofertado pelo


Instituto Federal de Ciência e Tecnologia Farroupilha campus Jaguari se tem por objetivo
levar a realidade dos discentes em relevância no ato de mediar as aulas. Ou seja, o nosso curso
forma educadores pensantes que tenham em conta a cultura e necessidades dos educandos nos
planejamentos e mediações das aulas, porque a Educação do Campo tem em sua essência o
fato de que na Licenciatura em Educação do Campo não se estuda para ser educador de
sujeitos distantes, mas de sujeitos semelhantes, de companheiros (Antunes-Rocha; Martins;
pg. 21).
Além disso, o curso funciona através da metodologia Pedagogia da Alternância, que é
uma maneira de ensino que se preocupa com a formação do sujeito e o desenvolvimento de
seu meio, de sua comunidade (Pacheco; Grabowski; 2012). Essa metodologia proporciona a
nós, discentes do curso, e futuros educadores a possibilidade de nos aproximarmos de nossa
comunidade, de trocar conhecimentos com os moradores da mesma, levando até eles os
saberes da academia, Tempo Escola (TE) e recebendo deles os saberes populares, obtidos
através de suas experiências e heranças familiares durante o Tempo Comunidade (TC).
Sendo assim, no decorrer desse texto traremos um relato de experiência de um
trabalho o qual é oriundo de um Tempo Comunidade da disciplina de Microbiologia do curso
de Licenciatura em Educação do Campo Ciências da Natureza do IFFar Campus Jaguari. As
ações desse trabalho se concretizaram em um estudo focado no objetivo o qual é foi
conscientização das crianças desde cedo que os agrotóxicos são maléficos ao meio ambiente e
consequentemente a nós, e, que produtos agroecológicos são úteis no controle e até mesmo
combate de pragas. Através desse, se trabalhou com os discentes do ensino fundamenta
multisseriado da Escola Municipal de Ensino Fundamental Paulo Freire do Assentamento
Primavera no município de Bossoroca –RS, sobre o controle de pragas sem o uso de produtos
químicos (Agrotóxicos), mas com produtos agroecológicos, que nesse caso é o uso de
microrganismos eficientes, ou seja, menos danosos ao meio ambiente.
Como justificativa para a escolha desse tema é o uso abusivo de produtos químicos
pelos moradores do assentamento Nova Primavera, comunidade onde a escola Paulo Freire se
localiza, sem contar que a mesma recebe só os filhos dos assentados.

2. MATERIAL E MÉTODOS
A escolha desse tema veio através de um trabalho de química, disciplina a qual
tivemos no segundo semestre do curso, onde foi confeccionado e aplicado um questionário
amplo que perguntava sobre as principais culturas produzidas na comunidade, destino dos
resíduos gerados pelos moradores, uso de venenos, dentre outros, através desse questionário
percebemos que o uso de agrotóxicos era enorme pelas famílias residentes no assentamento.
Depois desse levantamento de dados tivemos a oportunidade de voltar para a escola a
qual já foi citada para colocar essa ideia em prática segundo o objetivo, assim dessa maneira
realizando o Tempo Comunidade de Microbiologia. Com esse trabalho podemos tratar com
mais detalhes o malefício dos produtos químicos com as crianças filhas dos assentados como
meio de conscientizá-las desde bem cedo sobre o assunto.

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Para isso planejamos uma aula com metodologia dos três momentos pedagógicos que
tratava sobre assuntos de Biologia microrganismos eficientes e seu funcionamento (Reinos
Monera e Fungi) e Química para então comentarmos o tema em foco: venenos e suas
consequências, e foi realizado também uma prática de criação de microrganismos eficientes
com os educandos.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Como acima foi mencionado, usamos conteúdos da área das ciências naturais para
comentarmos sobre produtos químicos e microrganismos eficientes. Para que isso tudo fosse
possível planejamos uma aula, onde usamos como base principal conceitos de biologia e um
material sobre como funcionam os microrganismos eficientes.
O plano de aula foi dividido de acordo com os três momentos, de acordo abaixo,
anexado na página 10.
Como problematização inicial foi realizado um diálogo com os educandos sobre os
microrganismos eficientes (fungos, bactérias) funções, utilidades, malefícios etc. E foi anotando no
quadro o que eles sabiam do assunto, depois disso realizou-se a montagem de um mapa conceitual em
forma desenho sobre o entendimento da aula, o mesmo foi exposto em sala de aula. A organização do
conhecimento se deu através de um texto explicativo que abordava sobre os microrganismos eficientes
contendo as principais suas principais características.
Para aplicação do conhecimento desenvolveu-se uma atividade prática de criação de
microrganismos com os educandos, e para finalizar a avaliação se deu através do recurso didático,
dinâmica estoura balão (foram divididos em grupos para responderem perguntas de acordo com o
conteúdo).
Seguem abaixo as imagens que ilustram o trabalho final feito pelas crianças (Figura 1) e a
cultura dos microrganismos (Figura 2).

Figura 1. Trabalhos apresentados pelos alunos.

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Figura 2. Cultura microbiana.

4. CONCLUSÃO
Concluímos esse texto afirmando que o curso de Licenciatura em Educação do Campo
em Pedagogia da Alternância nos tem proporcionado que cresçamos como pessoas e como
futuras educadoras, pois nos têm permitido que aprendamos enquanto ensinamos, ou seja,
enquanto trocamos conhecimentos e experiências.
Esse Tempo Comunidade nos permitiu experimentar mais uma vez a prazerosa
sensação de estar com as crianças que aprendem e se expressam de forma simples e
maravilhosa, como acima mostrado nas imagens.
Através das pesquisas e leituras realizadas com esse tempo comunidade pudemos
apreender muito sobre os malefícios do uso exacerbado de produtos químicos em nosso
cotidiano. Esse trabalho também permitiu que nos horrorizássemos com o uso de agrotóxicos
pelos moradores do assentamento Nova Primavera, e pelos brasileiros de um modo geral, e
consequentemente as doenças que isso causa nos seres vivos (plantas, animais/ser humano) e
a infertilidade que causa no solo também.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANTUNES-ROCHA, Maria Isabel; EVANGELISTA, Aracy Alves Martins (Org.) Educação
do Campo: Desafios para a formação de professores. 2. ed. Belo Horizonte; Autêntica, 2007.
207 p. (caminhos da educação do campo).
CADERNO DOS MICRORGANISMOS EFICIENTES. Disponível em:
estaticog1.globo.com/2014/04/16/caderno-dos-microrganismos-eficientes.pdf. Acessado dia
14/03/2018.
PACHECO, Luci Mary Duso; GRABOSWKI, Ana Paula Noro. O Impacto sócio educacional
da pedagogia da alternância na construção de um novo rural: um olhar sobre o egresso da casa

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Seminário Regional de Educação do Campo da Região Centro do Rio Grande do Sul

familiar rural de Frederico Westphalen. Vivências: Revista Eletrônica Extensão da URI. Vol.
8, N 14: p 137-157, Maio/2012.

A ARTE COMO FORMA DE CONSCIENTIZAÇÃO E PRESERVAÇÃO DO MEIO


AMBIENTE

Alice Ferreira Schmitt, IFFar- Campus Alegrete


(alicefschmitt@hotmail.com)
Andrio Sander Viana, E.M.E.B Euclides Aranha
(andriosv@hotmail.com)

O presente projeto foi desenvolvido na Escola Municipal de Educação Básica Euclides


Aranha, situada na localidade do Bororé, Zona Rural do Município de Maçambará∕RS. A
Instituição atende aproximadamente 150 (cento e cinquenta) alunos da Comunidade, bem
como, os oriundos das fazendas e granjas situadas nos arredores. A falta de conscientização

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sobre a preservação do Meio Ambiente e o destino adequado para o lixo eram fatores
preocupantes, já que na maioria das vezes o lixo que poderia ser reciclado e se tornar arte, não
tinha o destino correto. Algo tinha que ser realizado para que nosso Meio Ambiente se
tornasse mais limpo e saudável, e para obter melhores resultados, mobilizamos e
incentivamos os alunos, professores e funcionários para que juntamente com suas famílias,
realizassem a coleta de garrafas pets para que as turmas dos anos finais do Ensino
Fundamental e as do Ensino Médio em sala de aula construíssem enfeites de Natal para
embelezar a Escola, através da Arte-Educação. As pessoas do mundo contemporâneo estão
produzindo lixo de maneira acelerada e não estão sabendo organizá-lo de forma consciente
para tornar o Meio Ambiente mais agradável para se viver. Ao pensar em criar um projeto que
realmente fizesse a diferença na aprendizagem dos educandos em relação a educação
ambiental e na conscientização de toda a comunidade um dos principais objetivos era
mobilizar o coletivo e assim romper com o hábito cultural de que o lixo pode ser jogado em
qualquer local, ou até mesmo ser queimado, e mostrar que através da arte podemos
transformar o local em que vivemos preservando assim o meio ambiente. A arte-educação
contemporânea, representada pela Proposta Triangular do Ensino da Arte concebida por Ana
Mae Barbosa, a qual traz elementos da teoria freiriana, propõe a interdisciplinaridade como
forma de construção de conhecimento. Temos que nos aliar a outros especialistas na luta em
busca do equilíbrio entre preservação e desenvolvimento, que conduz a uma melhor qualidade
de vida e do meio ambiente natural. A educação ambiental somente terá sucesso se envolver
um grupo multidisciplinar em processo interdisciplinar de ensino/aprendizagem, pois, Ana
Mae diz que “a arte ajuda a criar um ensino ativo”. Através dessa perspectiva metodológica
foram realizados trabalhos de arte-educação e meio ambiente através de recorte e colagem
onde foi produzido uma árvore de Natal, guirlandas e brinquedos com o lixo retirado da
Natureza. O lixo é composto de resíduos de nossa cultura, de objetos que não são mais
utilizados. No entanto, estes objetos podem ter novo valor nas mãos das crianças e
adolescentes. As atividades propostas tinham que ser atraentes, e não apenas fazer por fazer, e
sim, fazer para aprender. E foi através da Arte que os educando mostraram criatividade e
perceberam que podiam transformar o que incomoda e prejudica nosso Meio Ambiente em
algo para embelezar nossa realidade. A Arte-Educação torna o educando um sujeito capaz de
refletir e criar hábitos de preservação do meio em que vive através da produção artística de
objetos reciclados e para contextualizar a arte∕reciclagem foi apresentado aos educandos
imagens das obras do artista Vicente José de Oliveira Muniz, mais conhecido como Vik
Muniz. Então, a partir da visualização das imagens foram realizadas as produções artísticas.
Ao desenvolver o projeto pretendia-se que toda a comunidade escolar se envolvesse na coleta
de garrafas pets, pois, quanto mais fosse retirado do Meio Ambiente, menos poluição haveria
e nada melhor que a iniciativa partisse da escola, que tem papel importantíssimo na sociedade,
porque é ela que viabiliza todo ensino-aprendizado entre professor-aluno-comunidade,
formando assim, sujeitos capazes de zelar pela sociedade em que vivem e assim o êxito foi
alcançado, pois, foram recolhidas mais de 4.000 (quatro mil) garrafas. Sendo assim, todas as

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disciplinas são de suma importância para levar os educandos a refletir sobre todo esse
consumismo do mundo contemporâneo, estimulando uma consciência de preservação e
interação do ser humano e o Meio Ambiente utilizando práticas educativas lúdicas e criativas,
as quais eles tenham prazer em realizá-las. Acreditamos que a partir da aprendizagem
adquirida na escola os seres humanos irão tornar-se conscientes que, para nossa sobrevivência
temos que respeitar o Meio Ambiente e realizar ações que levam a participação de toda a
comunidade.

Eixo temático: Relatos de Experiências.

Palavras-chave: arte∕educação, Meio Ambiente, aprendizagem.

A POSSE DA TERRA: REFLETINDO SOBRE OS CONCEITOS DE PROPRIEDADE

Amanda Moura de Fraga - E.M.E.F. Nossa Senhora de Fátima


amandamdefraga@gmail.com

Este trabalho constitui relato das atividades pertencentes ao projeto didático “A posse
da terra”. O projeto foi aplicado em uma turma de sétimo ano, da Escola Municipal de Ensino
Fundamental Nossa Senhora de Fátima, localizada no distrito de Mineração – Cordilheira, em
Cachoeira do Sul. O projeto foi desenvolvido pelos professores Amanda Moura de Fraga e
André Giovanni Klinkoski, durante as aulas das disciplinas as quais ministram: este, História

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e Geografia; aquela, Língua Portuguesa. Sendo a E.M.E.F. Nossa Senhora de Fátima uma
escola do campo, procura oferecer Educação do Campo, de modo a valorizar as práticas
camponesas. Dessa forma, o projeto ganha relevância, pois, ao levar o aluno a valorizar o
local em que mora, estimula o estudante a perceber a importância de ser camponês no mundo
atual. De maneira específica, o projeto “A posse da terra” procurou fazer com que o aluno:
reconhecesse diferentes espaços geográficos; identificasse e relacionasse diferentes culturas;
compreendesse diferentes relações e usos da terra; lesse e interpretasse textos de gêneros
textuais diversos; compreendesse a influência da Língua Tupi na constituição da Língua
Portuguesa falada no Brasil; elaborasse texto do gênero “lista” para elencar características do
lugar que habita; elaborasse texto descritivo sobre o local onde vive. Para que isso
acontecesse, de março a junho de 2018, durante os períodos das disciplinas de História,
Geografia e Língua Portuguesa, as aulas contemplaram assuntos específicos, relacionados ao
tema do projeto. Em algumas vezes, cada professor trabalhou um assunto diferente em suas
aulas; em outras, eles trabalharam o mesmo assunto, mas cada um ocupou o período de aula
de sua disciplina para isso; e em outras, ainda, os professores uniram os períodos de suas
disciplinas e trabalharam o mesmo assunto, juntos, em sala de aula. Para iniciar as atividades
do projeto, nos períodos de História e Geografia, o professor André apresentou aos estudantes
as características gerais dos principais povos indígenas do Brasil, através da exibição e
discussão do documentário “Índios do Brasil”. A professora Amanda e o professor André, em
seguida, trabalharam o contexto da chegada dos portugueses ao Brasil e o primeiro contato
entre indígenas e portugueses: ela utilizou a carta de Pero Vaz de Caminha para isso e fez
levantamento sobre as classes de palavras presentes em um trecho da carta, bem como sobre
elementos essenciais da oração; ele utilizou o globo para ilustrar aulas expositivas sobre o
assunto. Depois, a professora Amanda levou os alunos a refletirem sobre a influência da
Língua Tupi-Guarani na formação da Língua Portuguesa falada no Brasil atualmente,
estimulando pesquisa em sites da Internet a respeito de palavras de origem indígena usadas
pelos alunos em seu cotidiano. Em um quarto momento, o professor André apresentou
material digital sobre as mudanças no uso da terra e os conceitos de propriedade. Nas aulas de
História e Geografia, os alunos foram estimulados a conversar com seus familiares, de modo a
compreender o histórico da propriedade em que vivem. Por último, os dois professores se
uniram para ajudar os estudantes a elaborar listas com as características gerais das
propriedades que habitam e textos descritivos acerca de tais propriedades. Os conteúdos
envolvidos nas atividades foram: “povos indígenas do Brasil”; “expansão marítima europeia”;
“leitura e interpretação de texto”; “origem das palavras”; “estrutura de palavras”; “uso de
mapas”; “produção textual”; “conquista portuguesa”; “Brasil colônia”; “formação da
população brasileira”; “classes de palavras”; “elementos essenciais da oração”. Os resultados
foram verificados continuamente, durante a realização do projeto, à medida que os objetivos
previstos foram sendo alcançados. De forma especial, os estudantes analisaram criticamente
os conceitos de propriedade coletiva e propriedade privada, posicionando-se acerca do que
seria a melhor opção para a realidade rural em que vivem. Além disso, tiveram oportunidade

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de refletir sobre a relação que têm com as propriedades que habitam, já que a maioria dos
estudantes vem de famílias que vivem e trabalham em terras que não são suas. Eles discutiram
acerca das potencialidades dessas propriedades para a agricultura familiar, o que colaborou
para despertar nos estudantes o desejo de permanecer no meio rural, agindo favoravelmente
ao seu pleno desenvolvimento econômico e social.

Eixo 2: a educação do campo e a educação dos camponeses.

Palavras-chave: educação do campo; propriedade privada, propriedade coletiva; posse da


terra.

Referências bibliográficas

FAUSTO, Boris. História concisa do Brasil. 2. ed., 3. reimpr.. São Paulo: Editora da
Universidade de São Paulo, 2010.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo:
Paz e Terra, 1996.

SANTOS, Milton. O espaço da cidadania e outras reflexões. Porto Alegre: Fundação Ulysses
Guimarães, 2011.

PROMOVENDO A ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL EM UMA ESCOLA DO CAMPO


DE RESTINGA SÊCA-RS.

Marcia Medianeira Toniasso Righi


Escola Municipal de Ensino Fundamental Adelino Roso
marciatrighi@yahoo.com.br

Relato de Experiência

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Esse trabalho teve como objetivo incentivar os alunos dos Anos Iniciais a ter uma
alimentação mais saudável, cultivando verduras e legumes na horta da escola a fim de utilizá-
los na merenda escolar. Foi desenvolvido na Escola Municipal de Ensino Fundamental
Adelino Roso, com a participação de alunos do 4º e 5º ano, a professora regente e a
comunidade escolar. Obtivemos apoio da Secretaria Municipal de Educação do Município e
financiamento por meio do Sicredi, através do Projeto União Faz a Vida.
A Escola Municipal de Ensino Fundamental Adelino Roso fica localizada na área rural do
Município de Restinga Sêca, na localidade de Colônia Borges. A escola atende a alunos da
Educação infantil ao 5º ano, contando com a diretora (professora), 3 professores e 1 servente
(merendeira). Contando com 4 projetos em andamento ( três projetos pelo Projeto União faz a
Vida e 1 projeto de musicalização).
O trabalho surgiu porque a alimentação saudável é um tema atual e bastante discutido nos
útimos anos e a pela insistência da professora do 4º e 5º ano, já que a escola não tinha horta,
mas possuía espaço para a construção da mesma. Faltava apoio financeiro para compra dos
utensílios necessários e apoio da comunidade escolar. No decorrer do ano de 2016 foi
solicitado o apoio da direção da escola, sem sucesso. Naquele mesmo ano, a diretora se
aposentou e a professora assumiu a direção da escola. Então sua primeira ação foi conseguir o
apoio dos pais e CPM da escola para a construção da horta. Procuramos incentivar a produção
de alimentos, se não tiverem espaço, pode ser por meio de um vaso em seu jardim. Uma
escola com educação do campo tem um papel muito importante além de ensinar e também de
incentivar seus alunos a cultivar alimentos na escola e na sua propriedade. Concordamos e
incentivar os jovens a permanecer no meio rural, evitando assim a sua migração para a cidade.
No início do ano letivo de 2017 conseguimos colocarmos o projeto em prática, nossa primeira
ação foi visitamos uma horta de uma propriedade vizinha a escola, inclusive sendo da família
de uma aluna da educação infantil, onde os alunos puderam identificar as variedades de
hortaliças, frutas e verduras que estavam sendo cultivadas. Após ao retormarem a escola, os
alunos em grupos, representaram por meio de cartazes, o que eles esperavam encontrar e o
que encontraram na horta, com o objetivo de estimular o cultivo de variedades de verduras,
legumes na horta escolar.
O próximo passo foi estudarmos os tipos de solos e identificarmos quais variedades eram
mais adequada para serem cultivadas na horta escolar. As vitaminas que cada alimento
possuia. Os alunos foram divididos em grupos e cada grupo iria cuidar de um canteiro. Nesses
grupos foram incluídos os alunos da pré-escola, 1º, 2º e 3º anos. E que um dia por semana
todos iriam trabalhar juntos na horta, foi decidido por quarta-feira. O restante da semana os
alunos do 4º e 5º ano ficariam responsáveis pela irrigação e limpeza. Outro conteúdo
abordado foi a alimentação saudável e balanceada, através de pesquisa na internet e também o
estudo da pirâmide alimentar, onde os alunos criaram sua pirâmide. A alimentação é um dos
principais determinantes de saúde, sendo um traço de identidade cultural. Mas, além de ser
uma necessidade fundamental do ser humano, é um dos elementos do estilo de vida mais
determinantes no estado de saúde das pessoas. “Somos o que comemos” é um velho aforismo
que traduz bem este fato (NUNES e BREDA, 2001).
Os hábitos alimentares se formam na infância, desse modo incluímos os alunos menores da
escola no projeto, a fim de promover a inclusão de alimentos mais saudáveis. Grande parte
das aprendizagens em torno dos hábitos alimentares dá-se na infância, pois é a partir do olhar
e das vivências da criança que se memorizam os cheiros, os gostos, as sensações. Assim, os
sentidos guardam a lembrança dos sabores, dos odores e das cores (GIARD, 1997). Observa-

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se que os pais e os professores possuem um papel fundamental na educação alimentar das


crianças. Desde cedo, compete-lhes o papel de transmitir saberes, revelando condutas
alimentares que ajudem à posterior modelação de comportamentos salutares dos seus
filhos/educandos (BAPTISTA, 2006). O comportamento dos pais contribui para o hábito
alimentar de seus filhos, assim, os pais devem adotar hábitos que gostariam de ver em seus
filhos (GAGLIONE, 2003, apud LOPES; BRASIL, 2003). Dessa forma, os hábitos
alimentares corretos devem ser iniciados nos primeiros anos da vida da criança e são muito
importantes no período escolar. A introdução de hábitos alimentares corretos, através da
criança na idade escolar, é o melhor método de se atingir esse objetivo, pois, dessa maneira
está se preparando uma geração com os conhecimentos básicos sobre nutrição (MEZOMO,
2002, p.16-17).
Nos últimos anos, os hábitos alimentares da população brasileira e mundial sofreram algumas
mudanças. Entretanto, sabe-se que a alimentação influencia diretamente a saúde. Para termos
uma boa saúde, devemos ter uma alimentação equilibrada, isto é, saudável. A alimentação
deve ser a mais variada possível para que o organismo receba todos os tipos de nutrientes
(VALLE & EUCLYDES, 2003). Através do trabalho incentivamos a alimentação saudável
mostrando a importância do alimento que foi cultivado na horta.
Hoje em dia, percebe-se que as pessoas não têm uma alimentação correta, não é por falta de
informação, mas por falta de tempo, facilidade devido aos alimentos prontos, custo dos
alimentos. Deve-se aprender a se alimentar corretamente desde cedo, para assim conservar os
bons hábitos alimentares na vida adulta. Para Devincenzi (2004), a alimentação é importante
não somente para satisfazer as necessidades nutricionais da criança, mas deve ser vista
também como um fator educacional na promoção da mastigação, da deglutição e do contato
com novos sabores. As formas de aprendizagem da criança na alimentação se dão por
exposição repetida e apresentação de alimentos desconhecidos.
A escola pode influenciar diretamente na alimentação do aluno, por meio das aulas de
ciências e também pela merenda que é oferecida. Por meio da merenda escolar, pode-se
incluir frutas e legumes ao cardápio para incentivar as crianças a comerem alimentos mais
saudáveis, como abordado nas aulas de ciências e biologia. Neste sentido, a escola pode
contribuir de forma efetiva para modificar os maus hábitos alimentares dos alunos, mostrando
o valor de cada alimento, os benefícios que eles podem trazer para a saúde e como a má
alimentação pode prejudicar o desenvolvimento e o bem estar do estudante. Atualmente, os
padrões alimentares da população sofreram constantes mudanças, principalmente devido a
influências oriundas da industrialização e da mídia.
O projeto foi muito importante já que a produção de verduras e legumes cultivados na horta
conseguiu abastecer a merenda escolar e também incentivar os alunos que não costumavam
consumir verduras e legumes a incluir na sua alimentação, tornando assim a ter uma
alimentação saudável, esse conhecimento também foi disseminado pelos alunos para as suas
famílias. Mas a tarefa não foi fácil já que algumas crianças foram muito resistentes a inclusão.
O trabalho incentivou também aquelas familias que não tinham horta a construir a sua e a
produzir seus alimentos.
No início de dezembro fizemos uma mostra pedagógica onde foram expostas as ações dos
projetos desenvolvidos na escola, contamos com a presença da comunidade escolar, Secretaria
de Educação, Sicredi.

Palavras-chave: Educação, Campo, Horta Escolar.

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Referências

BAPTISTA, M. Educação alimentar em meio escolar: referencial para uma oferta


alimentar saudável. Lisboa: direcção geral de inovação e desenvolvimento curricular, 2006.

DEVINCENZI, M.U. et al. Nutrição e alimentação nos dois primeiros anos de vida.
Compacta Nutrição. São Paulo, v. 5, n. 1, 2004.

GAGLIONE, C.P. Alimentação no segundo ano de vida, pré-escolar e escolar. In: Lopes,
F. A.; BRASIL, A. L. D. Nutrição e Dietética em Clínica Pediatria. São Paulo: Atheneu,
2003, p. 61-62.

GIARD, L. Artes de nutrir. In: Certeau M, Giard L, Mayol P, organizadores. A invenção do


cotidiano 2: morar, cozinhar. Rio de Janeiro: Vozes; p.211-33, 1998.

MEZOMO, I. B. Os serviços de alimentação. São Paulo: Manole, 2002.

NUNES E BREDA. Manual para uma alimentação saudável em jardins de infância.


Lisboa: Direcção Geral de Saúde, 2001.

VALLE, J.M.N.; EUCLYDES, M.P. A formação dos hábitos alimentares na infância: uma
revisão de alguns aspectos abordados. A literatura nos últimos dez anos, Juiz de Fora - MG,
2003.

CARTOGRAFIAS DA EDUCAÇÃO BÁSICA: UM OLHAR SOBRE OS DIREITOS


HUMANOS A PARTIR DO ESTUDO DA ESCOLA DO CAMPO JOÃO VIANEY DO
MUNICIPIO DE IVORÁ

Lidiane Londero Perlin (lidiane.londero@hotmail.com) UFSM


Heliene Pimentel de Sousa (helieneufpa@hotmail.com) UFSM
Helenise Sangoi Antunes (professora@helenise.com.br) UFSM

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O estudo das cartografias da educação básica do campo é um projeto de pesquisa


desenvolvido com o objetivo de análise da realidade da Educação Básica do Campo por meio
das informações coletadas, relacionando-as com os Bancos de Dados do MEC, do INEP, do
IBGE, do IDEB, do Censo Escolar para o Estado do Rio Grande do Sul objetivando traçar o
perfil profissional dos professores do campo e produzir cartografias voltadas para as
comunidades e escolas do campo envolvidas que sejam pertencentes a 8ª Coordenadoria
Regional de Educação (8ª CRE), que assim permitirá o traçado das perspectivas educacionais
da região central do Rio Grande do Sul, com foco nas Escolas do Campo. A escola escolhida
para apresentar este trabalho é a Escola do Campo João Vianey, localizada em Ivorá. Através
da visita de campo e metodologia quanti-qualitativa, onde realizamos entrevistas
semiestruturadas. Diante disso, viemos através do olhar pedagógico discutir sobre os direitos
humanos e as políticas que atingem de maneira singular os sujeitos envolvidos na escola,
como professores e alunos. Pois, entende-se que a escola do campo segundo Arroyo;Caldart;
Molina (2009), as pesquisas sobre a educação no campo ficaram silenciadas nas pesquisas
sociais e educacionais, dados estes que são preocupantes, é como se os sujeitos do campo não
existissem, no qual seu direito por uma educação de qualidade no e do campo é negado.
Pensar em uma educação para os sujeitos do campo deve-se levar em consideração o
currículo, avaliação e organização pedagógica que contemple a realidade da vida do homem
do campo, para que assim tenham condições de modificar sua própria realidade enquanto
excluídos sem precisar se locomover para a zona urbana em busca de melhores condições de
vida. Atualmente, a escola funciona no turno da tarde e é pertencente a vida de seis
educandos, os quais constroem seus conhecimentos de aprendizagem através de classe
multisseriada, onde apenas uma educadora atende a todas as funções da escola (professora,
merendeira e faxineira). Esta educadora nos relatou que é apaixonada pelo que faz,
principalmente pela arte de ensinar. Nos declarou também que recebeu proposta para trabalhar
em outra escola, no entanto, a mesma preferiu continuar trabalhando na Escola do Campo
João Vianey, pois caso ela fosse trabalhar em outra escola teria que abandonar o trabalho que
exerce na Escola do Campo João Vianey, onde os seis educandos pertencentes a está escola
ficariam desamparados, pois é muito difícil encontrar educadores que se desloquem para dar
aula no campo e para assumir toda a responsabilidade de ser o “faz tudo” da Escola do Campo
João Vianey. Apesar das dificuldades por que passa na escola, ela evidencia que é motivada
pelo amor que tem por ensinar e mudar a vida dos educandos. Diante desta realidade percebe-
se a necessidade de Políticas Públicas que contemple as realidades do campo, pois é uma
realidade esquecida pelos gestores públicos.

EIXO 2. A educação do campo e a educação dos camponeses. (Educação escolar e não


escolar).

Palavras chaves: Educação do campo, Cartografias, Direitos humanos.

REFERÊNCIAS

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Seminário Regional de Educação do Campo da Região Centro do Rio Grande do Sul

ARROYO, Miguel Gonzalez; CALDART, Roseli Salete; MOLINA, Mônica Castagna (Org).
Por Uma Educação do Campo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.

A EDUCAÇÃO ALIMENTAR E NUTRICIONAL NA ESCOLA DO CAMPO: DA


CONSTATAÇÃO AO ESTÍMULO SIGNIFICATIVO.

Marilise Volpatto Campelo


Escola Municipal de Ensino Fundamental Ernesto José Annoni
marilisecampelo@hotmail.com
Daiane Ventorini Pohlmann Michelotti
Escola Municipal de Ensino Fundamental Ernesto José Annoni

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ISSN 2595-8372
Seminário Regional de Educação do Campo da Região Centro do Rio Grande do Sul

daimichelotti@yahoo.com.br

A escola é um lugar privilegiado para se desenvolver ações de estímulo à adoção de


hábitos alimentares saudáveis, por meio de atividades educativas que informem e motivem
escolhas conscientes para a promoção da saúde. Diante desta premissa, vemos no contexto da
escola do campo a necessidade desta intervenção, uma vez que este ambiente se configura, na
maioria das vezes, como o principal meio de interação social.
A Escola Municipal de Ensino Fundamental Ernesto José Annoni, localizada a 65 km
da cidade do município de São Gabriel, é um destes exemplos: os alunos vem à escola três
vezes por semana e permanecem na escola o dia inteiro, realizando pelo menos três refeições
desde que chegam.
Ao analisar a conduta destes alunos, em específico de um grupo de alunos do primeiro
ano do ensino fundamental, percebeu-se que, muitos deles, além de não comer o que é
oferecido pela escola que tem todo um cuidado nutricional, traziam lanches industrializados
como salgadinhos, bolachas recheadas e refrigerantes e os ingeriam regularmente.
Neste contexto, surge a inquietação do porquê e de como transformar este consumo,
uma vez que tantos produtos saudáveis poderiam ser consumidos por estes, provindos de suas
casas sem um custo oneroso.
Assim, iniciou-se o projeto de educação alimentar e nutricional com o objetivo
principal de fortalecer vínculos sociais considerando a realidade da educação do campo,
entendida aqui não como uma particularidade menor, mas como uma realidade com sujeitos
concretos que deve atender à lógica da vida no campo onde, segundo Caldart (2004) faz-se
necessário a projeção de uma outra concepção destas relações em uma perspectiva de
transformação social e de emancipação humana.
Emancipação aqui entendida na perspectiva de Freire (1996) como uma prática
libertadora onde os sujeitos, autônomos, assumem uma posição crítica de ação e reflexão
diante da realidade em que estão inseridos, remetendo-se à ideia de que um sujeito se
transforma a partir de suas vivências.
Segundo Freire (2016, p.128) “... os que são conscientizados tomam posse da própria
situação, se inserem nela para transformá-la, pelo menos no projeto e nos esforços que lhe são
próprios”.
Somado a estes pressupostos, temos a lei de segurança alimentar e institucional que
institui a todos o direito ao acesso a alimentos de qualidade (BRASIL, 2006 b) “ tendo como
base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que
sejam ambiental, cultural, economicamente e socialmente sustentáveis”
Na tentativa de concretizar estas premissas, foram desenvolvidas atividades com
vídeos educativos para a apresentação e sensibilização ao tema; contação de histórias para a
promoção e compartilhamento de ideias e reflexão; a execução de jogos como a trilha da
alimentação, o bingo das frutas; o preparo de um canteiro na horta escolar para o cultivo de
hortaliças e a prática onde todos, diariamente, são convidados a trazer lanches saudáveis com
alimentos cultivados e, ou, produzidos em suas casas.

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Com o desenvolvimento do projeto, percebeu-se uma mudança significativa dos


hábitos alimentares com uma maior valorização dos produtos que eles tem acesso em suas
casas. Cabe ressaltar como um ponto bastante positivo, a interação despertada e efetivada
durante os ditos lanches partilhados e espontâneos, onde os alunos, com iniciativa própria,
trazem frutas da época para que todos possam comer.
Além disso, o entusiasmo e a recorrente solicitação para o cultivo de hortaliças,
somadas à expectativa da utilização das mesmas em suas refeições escolares, comprova o que
Freire postula quanto ao papel fundamental da escola enquanto espaço onde aprender é um
espaço que se constrói, reconstrói e se constata para a mudança.

Eixo 1.

Palavras-chave: Escola do Campo – Nutrição – Interação social

Referências

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Coordenação-Geral da Política


de Alimentação e Nutrição. Guia alimentar para a população brasileira: promovendo a
alimentação saudável / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Coordenação-
Geral da Política de Alimentação e Nutrição. Brasília: MS, 2006b.
CALDART, Roseli Salete. Por uma educação do campo. Belo Horizonte: Editora Vozes,
2004.
CALDAT, Roseli Salete. Por uma educação do campo: campo, políticas públicas,
educação. Brasília: Incra MDA, 2008.

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São
Paulo: Cortez, 2011.

_____________. Conscientização. São Paulo: Cortez, 2016.

_____________. Educação e Mudança. São Paulo:Paz e terra, 2016.

_____________. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São


Paulo: Paz e Terra, 2011.

PESSA, R.P. Seleção de uma alimentação adequada. In: DUTRA-DE-OLIVEIRA,


J.E.;MARCHINI, J.S. Ciências nutricionais. São Paulo, Sarvier, 2008, p.21-51.

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REFLEXÕES TEÓRICAS SOBRE A FORMAÇÃO DOS ASSENTAMENTOS


RURAIS E AS CONDIÇÕES DE VIDA

Alessandra Regina Müller Germani. Professora


Magistério Superior na UFFS e Doutoranda no Programa
de Pós-Graduação em Extensão Rural na UFSM. E-mail:
alessandragermani@hotmail.com
Jacir João Chies. Professor e Coordenador Geral no
Instituto EDUCAR/Pontão/RS. Mestrando no Programa de
Pós-Graduação em Sistemas de Produção Agrícola
Familiar, na UFPel. E-mail: jacirchies@yahoo.com.br

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Ana Paula Schervinski Villwock. Doutoranda no


Programa de Pós-Graduação em Extensão Rural na
UFSM. E-mail: ana.agronomia@gmail.com

Os assentamentos rurais representam um novo momento no contexto da luta pela terra


desenvolvida pelos diferentes movimentos sociais. Significam que a terra já foi conquistada,
dando início a uma nova etapa da caminhada que envolve a organização das famílias a serem
assentadas e a estruturação de uma nova comunidade.

Frente ao exposto, entende-se a pertinência de apresentar este relato de experiência de


uma pesquisa bibliográfica realizada sobre a formação dos assentamentos rurais e as
condições de vida dos assentados, construída na perspectiva de contribuir com os debates
sobre este tema promovidos pelo Instituto Educar, UFFS e UFSM. Os dados foram coletados
durante o primeiro semestre de 2018, utilizando-se diferentes fontes bibliográficas, tais como
livros, revistas e manuais. E analisados utilizando-se o Método da Análise de Conteúdo, que
segundo a autora Bardin (2004), compreende o desenvolvimento das seguintes etapas: Pré-
análise, Exploração do material e Tratamento dos resultados. Neste sentido, a Pré-análise
consistiu na organização do material coletado, a Exploração do material, a escolha das
categorias teóricas partindo do objetivo elencado e o Tratamento dos resultados, na
apresentação das reflexões sobre os resultados encontrados.

Neste sentido, é possível compreender que a formação dos assentamentos tem sido a
principal resposta do Estado aos conflitos, às lutas populares e as demandas sociais pelo
direito de acesso à terra. É uma política pontual e localizada, que não enfrenta a desigualdade
social existente no campo, mas que contribui timidamente para atenuar conflitos e modificar,
mesmo que de forma modesta, a estrutura agrária do Brasil. Apesar dos percalços, vários
estudos apontam que os assentamentos apresentam resultados bastante significativos
(SAUER, 2005; BERGAMASCO e FERRANTE, 2005; MEDEIROS e LEITE, 2009; DE
FREITAS COCA, 2013; FIGUEIREDO E PINTO, 2014).

Analisando os dados disponíveis no Instituto Nacional de Colonização e Reforma


Agrária - INCRA referentes aos programas de assentamentos rurais identifica-se que, entre
1961 e 2009, foram implantados no Brasil, 8.637 assentamentos e que até maio de 2016 foram
assentadas 1.346.798 famílias. Já, os estudos de Spavorek (2003), nos mostram que até 2008
existiam no Brasil 4 milhões de famílias sem terra; 1,6% dos proprietários controlavam até
78% das terras, existiam 130 milhões de terras ociosas e 30 empresas transnacionais
controlavam a produção, a industrialização, a distribuição, e a comercialização dos produtos
agrícolas no país. Esses dados nos mostram que independente de ter viabilizado para as
populações excluídas acesso à terra, por meio do aumento do número de assentamentos e de
famílias assentadas, em nada alterou o quadro geral de concentração da propriedade da terra
no cenário nacional, evidenciando que há muito para se fazer em relação a desconcentração da

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terra no Brasil (SPAVOREK, 2003; BERGAMASCO e FERRANTE, 2005; MATTEI, 2013;


GUERRERO, BERGAMASCO e ESQUERDO, 2016).

A obtenção de terras para o assentamento se dá por meio da desapropriação de terras,


regularização fundiária, reconhecimento de projetos já existentes, reassentamento de atingidos
por grandes obras de infraestrutura, entre outros. Não são assentados somente camponeses
sem-terra, mas também comunidades tradicionais, posseiros, colonos, parceiros, seringueiros,
trabalhadores urbanos vivendo de ocupações temporárias e á margem do mercado de trabalho
formal, entre outros, demonstrando a diversidade dos assentamentos rurais e seus
beneficiários. Os assentamentos são implantados não só para aqueles que querem entrar na
terra, mas para aqueles que nela querem permanecer, com condições dignas de vida (SOUZA-
ESQUERDO e BERGAMASCO, 2011; DE FREITAS COCA, 2013).

A literatura sobre a diversidade dos atores envolvidos nos processos de criação e


consolidação dos assentamentos no país é vasta, além dos demandantes pela terra, que
também se apresentam sob diferentes formas (assalariados, parceiros, posseiros, etc); estão
presentes outros como governo federal, o INCRA, o Poder Judiciário, os governos estaduais e
seus respectivos órgãos de terra, as secretarias estaduais de agricultura e seus organismos de
assistência técnica, prefeituras, organizações não-governamentais, entidades vinculadas às
igrejas, entidades de representação como sindicatos, MST, Via Campesina, associações de
produtores, cooperativas, entidades patronais, entre outros. Cada um expressando seu
pensamento e força política em relação à implementação dos assentamentos (MEDEIROS e
LEITE, 2009).

Frente à diversidade deste contexto, as formas de luta pela terra e pela Reforma
Agrária no país se configuram de diferentes formas, sendo que a partir da década de 1990,
num contraponto as tradicionais estratégias de resistência que foram desenvolvidas pelos
camponeses frente à expropriação pelo capital na década de 1950 e, sobretudo entre 1970 e
meados da década de 1980 na fase de apogeu do avanço do capital sobre a agricultura
brasileira, e com as ações do MST, a ocupação seguida da construção de acampamentos
ganham visibilidade e consequentemente, projeção política e jurídica (MEDEIROS, 2004;
SOUZA-ESQUERDO e BERGAMASCO, 2011)

Os acampamentos são caracterizados como um momento de transição, de passagem


construídos em áreas que se pretende transformar em assentamentos ou do lado de fora de
fazendas, à margem das rodovias. Organizam-se internamente na forma de Coletivos, que são
instâncias coletivas de decisão, sobre os diversos assuntos pertinentes ao funcionamento dos
acampamentos, pois enfrentam muitas dificuldades, tais como doenças, fome, exposição às
intempéries, a fragilidade dos barracos, violência, entre outras. Este é um período, na qual as
pessoas, pelo convívio, rompem com as suas identidades anteriores, recriando relações e
valores, práticas sociais e formas organizativas. Como ainda não chegaram ao seu lugar

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definitivo, ainda não alcançaram a sua nova identidade, o de ser assentado (SAUER, 2005;
MARTINS, 2009; FIGUEIREDO E PINTO, 2014).

As pessoas lutam em busca de uma perspectiva que seja capaz de garantir-lhes, através
do trabalho e da produção, a liberdade, a sobrevivência e a continuidade da vida (reprodução
social). A busca pelo trabalho é parte fundante do processo de luta e conquista da terra. O
direito ao trabalho significa muito mais que um emprego ou ocupação, pois viabiliza
liberdade e fartura no sustento da família. Lutam, portanto, por melhores condições de vida e
por um lugar que lhes permita enraizamento e pertencimento. O acesso à terra representa,
portanto, um lugar de trabalho, de produção e de vida, um novo momento na experiência de
vida dos assentados (SAUER, 2005; BERGAMASCO e FERRANTE, 2005; FIGUEIREDO E
PINTO, 2014).

Neste sentido, os assentamentos podem ser compreendidos como um lugar onde


diferentes histórias de vida se cruzam se encontram ou, decorrentes dos acampamentos, se
reencontram. Desse momento, surge a construção de novos processos sociais de interação que
dão origem a identidade social de assentado. Esses atores sociais e políticos terão a
possibilidade de desenvolver processos organizativos internos que podem resultar na criação
de associações, cooperativas, grupos de produção, roças ou investimentos comunitários, etc.
Também a criação de outros mecanismos que permitam a interação do grupo social, como
igrejas, escolas, centros comunitários e de lazer, grupos de trabalho, entre outros, que
contribuem para a organização e sustentabilidade dos projetos de assentamento. Mesmo que
no interior do assentamento haja conflitos e diferenças culturais, isso não se constitui em
aspectos desmobilizadores (SAUER, 2005).

Em termos de conceituação, a referência à palavra assentamento surge pela primeira


vez no cenário político e social, em 1960, no contexto da Reforma Agrária venezuelana, e se
difundi por inúmeros países, inclusive no Brasil. De uma forma geral, os assentamentos rurais
podem ser definidos como um espaço social e geograficamente delimitado, de continuidade
da luta pela terra, criado por meio de políticas governamentais visando o reordenamento do
uso da terra em benefício de trabalhadores rurais sem terra ou com pouca terra. A criação dos
assentamentos, inclusive como lugares existenciais – geram uma nova organização social,
econômica e política (BERGAMASCO e NORDER, 1996; SAUER, 2005; MARTINS, 2009;
MEDEIROS e LEITE, 2009)

Do ponto de vista institucional, a Portaria MDA nº 80 de 24/04/2002, conceitua


assentamento como sendo a unidade territorial que é obtida pelo programa de Reforma
Agrária do Governo Federal, ou em parceria com os Estados ou Municípios, por meio da
desapropriação; arrecadação de terras públicas; aquisição direta; doação; reversão do
patrimônio público, ou por financiamento de créditos fundiários, que será destinada aos
indivíduos que são selecionados pelos programas de acesso a terra. E como assentados, todo o
candidato que se inscreve e após entrevista é selecionado para ingressar no Programa de

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Reforma Agrária, sendo concedido, portanto, o direito ao uso de terra identificada,


incorporada ou em processo de incorporação ao Programa (BRASIL, 2002; RAMIRO, 2008).

O esforço para padronizar os conceitos e ajustá-los à legislação faz emergir uma


definição meramente técnica do que seja assentamento e assentados. Neste sentido, sobre os
assentados, Guerrero, Bergamasco e Esquerdo (2016), fazem questão de mencionar que o
assentado é também a pessoa que busca seus direitos, coloca em risco a sua vida e a de seus
familiares na luta pela terra. Luta, portanto, por um pedaço de terra e pela conquista de seus
direitos.

A constituição dos assentamentos no país não foi acompanhada de um planejamento


prévio de localização e de oferta de bens sociais, de equipamentos e serviços públicos por
parte do Estado. Muitos enfrentaram e enfrentam situações adversas em relação às condições
de sua instalação, que dispersos geograficamente, desencadearam uma série de
reinvindicações ligadas principalmente à infraestrutura básica, como construção e/ou
melhorias de estradas, saúde e educação, condições para escoamento da produção, entre
outros. Com isso, fica evidente que a criação e manutenção dos assentamentos vêm
caminhando de forma lenta e fortemente dependente da vontade política dos governantes,
gerando consequências negativas na vida dos assentados (MEDEIROS e LEITE, 2009;
FIGUEIREDO E PINTO, 2014).

Assim, conclui-se com a realização deste relato de experiência dos resultados


encontrados durante a pesquisa bibliográfica, que para os assentados a conquista da terra não
significa o fim da luta, mas sim um ponto de partida, pois a estruturação dos assentamentos
significa uma nova etapa, a da conquista por condições plenas de vida e de produção; é um
momento de recriar a vida em comunidade e de seguir no caminho da resistência e luta pela
transformação do modelo de desenvolvimento econômico e social.

Eixo temático: EIXO 1

Palavras-chave: Formação; Assentamentos rurais; Condições de Vida.

Referências:

BARDIN L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2004.

BRASIL. Portaria MDA nº 80, de 24 de abril de 2002. Adota as denominações e os conceitos


aplicáveis ao Ministério do Desenvolvimento Agrário e sua entidade vinculada, o Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 25 abr
de 2002.

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BERGAMASCO, Sonia Maria Pessoa Pereira; FERRANTE, Vera Lúcia Silveira Botta. A
qualidade dos assentamentos da reforma agrária: a polêmica que nunca saiu de cena.
Brasília: NEAD, 2005.

BERGAMASCO, Sonia Maria Pessoa Pereira; NORDER, Luís Antônio C. O que são os
assentamentos rurais? São Paulo: Brasiliense, 1996.

DE FREITAS COCA, Estevan Leopoldo. Identidades dos camponeses assentados no


Território Cantuquiriguaçu, Paraná - Brasil. Revista Mercator, Ceará, CE, v.14, n. 1, p. 77-
88, 2015.

FIGUEIREDO, Gislayne Cristina; PINTO, José Marcelino de Rezende. Acampamento e


assentamento: participação, experiência e vivência em dois momentos da luta pela
terra. Revista Psicologia & Sociedade, v. 26, n. 3, 2014.

GUERRERO, Iris Cecilia Ordóñez; BERGAMASCO, Sonia Maria Pessoa Pereira;


ESQUERDO, Vanilde Ferreira de Souza. Reforma Agrária: contribuições para o
debate. Revista Eletrônica Retratos de Assentamentos, v. 19, n. 1, p. 351-380, 2016.

MARTINS, José de Souza. Travessias: a vivência da reforma agrária nos assentamentos. 2


ed. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009.

MATTEI, Lauro. A reforma agrária brasileira: evolução do número de famílias assentadas no


período pós-redemocratização do país. Estudos Sociedade e Agricultura, v. 2, 2013.

MEDEIROS, Leonilde Servolo de; LEITE, Sérgio. A formação dos assentamentos rurais
no Brasil: processos sociais e políticas públicas. 2 ed. Porto Alegre: Editora da UFRGS,
2009.

MEDEIROS, Leonilde Servolo de. As novas faces do rural e a luta por Terra no Brasil
Contemporâneo. Nómadas, n. 20, p. 210-219, 2004.

SAUER, Sérgio. O significado dos assentamentos de reforma agrária no Brasil. In: Caio
FRANÇA, Galvão de; SPAVOREK, Gerd. Assentamentos em debate. Brasília: NEAD,
2005.

SPAROVEK, Gerd. A qualidade dos assentamentos da reforma agrária brasileira. São


Paulo: Páginas & Letras. Editora e Gráfica, 2003.

SOUZA-ESQUERDO, Vanilde Ferreira; BERGAMASCO, Sonia Maria Pessoa Pereira.


Reforma Agrária e Assentamentos Rurais: perspectivas e desafios. V Jornada de Estudos em
Assentamentos Rurais, 2011. Campinas/SP. Anais V Jornada de Estudos em
Assentamentos Rurais. Campinas/SP: Feagri/Unicamp, 2011. p.01-23.

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RAMIRO, Patrícia Alves. Assentamentos rurais: o campo das sociabilidades em


transformação: o caso dos assentados do Nova Pontal. 2008. 156f. Tese (Doutorado em
Sociologia) - Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2008.

EDUCANDO PARA PRESERVAR: ANÁLISE SOBRE A IMPORTÂNCIA DA ÁGUA


CONSUMIDA NA ESCOLA DE ENSINO FUNDAMENTAL ALBERTO
PASQUALINI, EM AGUDO/RS
Pedro Alfredo Kegler
Licenciatura em Educação do Campo-UFSM
pedro-alfredo@hotmail.com
Celso Arnaldo Milbradt
Licenciatura em Educação do Campo-UFSM

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celsoarnaldo778899@gmail.com

Descrição da experiência

É muito importante debatermos sobre temas como a preservação ambiental, tanto nas
escolas como nas comunidades, assim como nas grandes cidades e no meio rural. Porém, se as
pessoas não se deram conta que um dia a água potável pode vir a acabar, com certeza pouco
poderá ser feito antes que nascentes venham a se extinguir, córregos de água passem a
carregar esgoto não tratado e lixo, principalmente nas grandes cidades.

No campo, que é o nosso objetivo neste trabalho, pode ser ressaltado a importância de
reciclar, além dos resíduos tornarem-se novamente matéria prima, os resíduos deixados por
um material descartado no meio ambiente permanecem por centenas de anos até serem
degradados, tal como recipientes de agrotóxicos passam a ser contaminantes do meio
ambiente, prejudicando não só a fauna e flora como até mesmo o ser humano.

O projeto foi desenvolvido em uma escola do campo, localizada no interior do


município de Agudo, mais precisamente na localidade de Rincão do Pinhal, Escola Municipal
De Ensino Fundamental Alberto Pasqualini. Essa escola do campo possui 205 alunos desde os
anos iniciais até o nono ano do ensino fundamental. Alguns professores residem próximos à
escola e tem como atividade paralela a agricultura, mas a maioria dos professores vem da
cidade para lecionar na escola.

O objetivo deste resumo é apresentar o trabalho desenvolvido sobre o tema da


preservação da água potável, com (dezesseis) alunos do sétimo ano do ensino fundamental da
Escola, onde foi avaliado o grau de conhecimento destes no que se refere origem d’água
consumida. Contribuindo para este objetivo, o aproveitamento d’água da chuva para irrigação
da horta da escola. Objetivo deste projeto, propor medidas de economizar a água do poço
artesiano da comunidade.

Caminhos metodológicos

Durante o mês de maio de 2018 foi disponibilizadas às crianças um questionário


contendo nove questões dissertativas aplicadas a 16 alunos do (sétimo) ano do ensino
fundamental com perguntas relacionadas ao meio ambiente, mais precisamente, sobre o
consumo e qualidade d’água. As questões foram aplicadas no horário de aula, com o
consentimento da professora e diretora da instituição, após a realização do questionário, foram
debatidas as questões com os alunos, que interagiram de forma participativa no debate das
questões aplicadas.

Foi utilizado cerca de trinta minutos para a realização do questionário. Após o termino
foi debatido as questões com os alunos, sanada as dúvidas e questionamentos realisados pelas
crianças em todo esse procedimento houve interesse pelo conteúdo por parte dos alunos. A

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professora da turma sugeriu que as atividades aplicadas fossem realizadas com mais
frequência, pois incentivam a interação dos alunos e é uma forma deles expressarem seus
conhecimentos e debaterem sobre a realidade que vivenciam.

Resultados

Fazendo uso do conhecimento adquirido na disciplina Seminário Integrador II, do


curso Licenciatura em Educação do Campo, modalidade de Ensino a Distancia ofertada pela
Universidade Federal De Santa Maria. Através da observação da estrutura física da escola
nota-se que esta não possui uma forma de captação de água das chuvas. Pensando nisto e
buscando alternativas que vem de encontro á necessidade da comunidade escolar foi realizada
tal trabalho, com o objetivo de testar o conhecimento dos alunos e orienta-los sobre métodos
de preservação do meio ambiente estimulando a consciência ambiental.

No questionário foi perguntado aos alunos se saberiam de onde é obtida a água


consumida pela comunidade escolar, a maioria respondeu que é proveniente de um poço
artesiano que de atende toda a comunidade local, existindo uma rede de distribuição de água
encanada na comunidade, com baixo custo para os usuários.

Sobre a preservação do meio ambiente, as respostas foram surpreendentes, o que


demonstra que as aulas estão sendo bem desenvolvidas pelos professores naquela escola do
campo. Foi questionado o motivo de fontes naturais de água potável terem sido extintas em
diversas regiões onde havia um bom recurso hídrico anteriormente. Souberam responder clara
e objetivamente que a escassez de água é devido ao isso incorreto do solo para o cultivo de
plantações, uso de agrotóxicos, e principalmente ocasionado pela devastação da flora, o
desmatamento clandestino em áreas que deveriam ser preservadas para a proteção de fontes
de água.

Além disso, relataram que ao retirar as árvores, o solo fica exposto a condições
climáticas e as águas da chuva não conseguem atingir as camadas mais internas do solo para
abastecer o lençol freático, passando a escorrer livremente sobre a terra, ocasionando ainda a
erosão do solo e o enfraquecimento do mesmo. O que em pouco tempo acaba por dar fim
aquela nascente de água.

Quando questionados sobre o que fazer para reverter tal degradação da natureza, foi
consenso entre todos a necessidade de realizar o replantio de árvores nos locais devastados.
Os alunos acreditam que trazendo de volta a flora local, a natureza irar-se encarregar de
revitalizar o meio ambiente. Entretanto, as nascentes que foram extintas pelos desmatamentos,
poderão voltar a resurgir nos locais devastados. Houve controvérsias quanto ao uso de quais
plantas para o replantio do solo, pois um aluno levantou a possibilidade de transformar a área
descoberta pelo desmatamento em uma plantação de árvores de eucalipto.

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Foi um pouco difícil o entendimento das crianças que o plantio de eucalipto não seria
uma boa opção para a revitalização do solo, segundo eles, o solo estaria coberto, e a madeira
poderia servir como fonte de renda para a propriedade, e após o corte, as árvores poderiam
brotar e seguir seu desenvolvimento, continuando a ocupar o solo e auxiliando na penetração
d’água no solo e na purificação do ar.

Após um debate de aproximadamente vinte minutos, ouvindo as colocações dos


alunos, tentei explicar a eles que o eucalipto não é uma planta originária de nossa região, que
apesar de ela ser uma boa opção de renda em forma de madeira para a construção de móveis e
taboas e caibros para a construção civil, também lenha para a secagem do fumo e consumo
doméstico, é uma planta que retira muita água do solo, rebaixando o nível do lençol freático e
retirando muitos nutrientes do solo, causando o seu empobrecimento, ou seja, o eucalipto
consome mais do que pode devolver ao solo.

Questionado sobre qual seria a melhor espécie de árvore para o replantio nas nascentes
e áreas de proteção, sugeri o que aprendi quando eu estava em sala de aula como eles, as
melhores árvores para a revitalização do solo são as nativas encontradas na própria localidade,
como por exemplo, Canela, Açoita Cavalo, Angico, Branquilho, Cedro, Figueira, Pitanga, Ipê,
etc. Essas árvores não consomem tanto nutriente do solo, produzem uma grande quantidade
de raiz, o que favorece a penetração d’água ao solo nos dias de chuva, suas folhas quando
caem se degradam ao solo transformando-se em adubo orgânico começando novamente o
ciclo, servindo de nutriente para a mesma planta, acrescentando mais ao solo do que retira.

A prefeitura disponibiliza mudas nativas da região de forma gratuita no viveiro


municipal, as mudas são produzidas e cultivadas por colaboradores da prefeitura. Portanto, os
alunos foram orientados de qual forma de conseguir uma autorização na prefeitura para a
retirada de mudas no viveiro, até foi levantado à possibilidade de levar os alunos para
conhecer o viveiro municipal, ficando em pauta a sugestão para uma próxima ocasião, um
passeio ecológico para conhecer de perto as árvores nativas no seu ambiente natural e a visita
ao viveiro municipal.

Observado interesse por parte dos alunos, como sugestão para a continuação deste
trabalho, poderia ser convidado algum representante do meio ambiente com conhecimentos
em ecologia para ajudar na identificação das plantas e dos diferentes ecossistemas
encontrados no pátio da escola e na localidade em que eles residem. Além disso, propor
oficinas para implementação de formas de reflorestamento e do correto manejo do
ecossistema local, orientando os alunos de como recuperar nascentes que lá secaram e na
manutenção das que resistiram a degradação.

Outra questão abordada no questionário foi quanto ao uso d’água da chuva em suas
residências. Na maioria das residências dos alunos a água é utilizada de forma sucinta,
coletado com balde em calhas durante a chuva para ser utilizado para a lavagem de pisos e

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irrigação de flores no interior de casa, Foi debatido sobre a possibilidade de ser produzido um
sistema de coleta de água da calha para uma caixa d’água onde ficaria armazenado para ser
posteriormente utilizar em dias secos para a irrigação da horta, uso doméstico como lavagem
de roupas, piso, carro, ou suas bicicletas.

Comentamos também a proposta da escola em adquirir uma caixa de água de cinco mil
litros para armazenar a água da chuva para a irrigação da horta escolar, onde os alunos já
auxiliam no preparo e plantio de hortaliças consumidas na merenda escolar. Contudo, esta
caixa d’água já foi solicitada junto a administração municipal, e será providenciada a sua
instalação próxima da horta escolar, captando a água da chuva que escorre do telhado por
calhas já existentes no prédio, e canalizada com tubos de PVC até a caixa d’água, sendo
conduzida por gravidade, pois á caimento suficiente no local, não necessitando a utilização de
bombas elétricas.

Com base nisso, notou-se a vontade dos alunos em compartilharem tais conhecimentos
em casa, água da chuva obtida naturalmente sem a adição de cloro de forma gratuita. Alguns
alunos questionaram sobre a utilização dessa água para o consumo humano. No entanto,
expliquei a eles que essa água não era apropriada para o consumo devido a uma possível
contaminação com resíduos orgânicos encontrados no telhado, e até mesmo a poluição
atmosférica. Porém, essa água é melhor do que a tratada se administrada de outras maneiras,
por não ter cloro, é menos oxidante, sendo indicada para a lavagem de carros, também na
irrigação de plantas.

Ao término, foi questionado aos alunos sobre o que pensam para o futuro se pretendem
ficar no campo e o que pensam a respeito de estudar em uma escola do campo, todos os
alunos sem exceção relataram que gostam de estudar em uma escola do campo, que gostam
das atividades realizadas no turno inverso a aula que é atividade como preparo da horta
escolar, aulas de artes e música, laboratórios de informática, ginásio de esportes para
atividades físicas, tudo que poderia ter em outra escola e não abririam mão de estudar em uma
escola do campo para ir para a cidade. Porém, possuem ideias divididas quando questionados
sobre a possibilidade de ficarem no campo ou irem para a cidade. A maioria almeja estudar e
ter uma carreira profissional na cidade, restando apenas poucos alunos com o interesse de
seguir na atividade junto com seus pais, trabalhando no cultivo das terras ou comprar, ou
ainda arrendar, para ter a sua própria propriedade.

Essa atividade foi de suma importância, notou-se grande interesse e participação, ouve
um dialogo muito interativo, os jovens demonstraram interesse, tiveram grande participação
durante o debate, o que demonstra que essa geração está bem ciente da importância de
preservarmos o meio ambiente, não só no sentido de preservação de fontes d’água potável,
mas também no sentido de evitar a poluição das águas e do solo com resíduos mal destinados
após o uso.

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Notou-se uma satisfação muito grande por parte dos professores e diretora da escola
que ofereceram o espaço para o desenvolvimento de novos projetos, segundo relatou a
diretora do educandário, é de ideias novas que precisamos para formar uma escola do campo
melhor do que a que temos hoje. Todavia, que ampliem novos projetos no futuro como estes,
e que possam ser apresentados e debatidos com a presença dos pais dos alunos, levando o
conhecimento de preservação do meio ambiente para fora das paredes da escola envolvendo
de uma forma ou de outra os pais dos alunos, fazer com que eles venham até a escola e
participem, interagindo com seus filhos em sala de aula. Para que, experiências como esta
relatada neste questionário saiam do papel não só no âmbito escolar, mas no cotidiano das
famílias da comunidade.

Referências

SEMPRE SUSTENTÁVEL. Tratamento de efluentes com reuso de água. disponível em


<http://www.sempresustentavel.com.br/hidrica/aguadechuva/agua-de-chuva.htm>, acesso em
09/06/2018.

BRASIL ESCOLA. Aproveitamento d’água das chuvas Brasil Escola. Disponível em


<http://.m.brasilescola.uol.com.br/biologia> Acesso em 05/04/2018.

CANAL RURAL. Plantio de árvores nativas é alternativa para recuperação das áreas de
preservação permanente. Disponível em < http//canalrural.uol.com.br>, acesso em
10/04/2018.

EMBRAPA. Estratégia de recuperação de solo exposto realizado pela Embrapa:


disponível em <http://www.embrapa.com.br>, acesso em 15/05/2018.

AS POLÍTICAS PÚBLICAS E O PROGRAMA NACIONAL DO LIVRO DIDÁTICO –


PNLD NO CIEP DE DOMPEDRITO/RS

Marlene Corrêa Severo, Unipampa/Campus Dom Pedrito,


marleneseverobarreto@gmail.com
Vanessa Rocha da Silveira,Unipampa/Campus Dom Pedrito,
vanessasilveiramachado@gmail.com

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Resumo

O curso de Licenciatura em Educação do Campo da Unipampa – Campus Dom Pedrito,


propõe como um de seus eixos articuladores que os estudantes identifiquem as políticas
públicas existentes numa escola, bem como que selecionem uma delas para estudar de
maneira mais aprofundada. Neste sentido, estabeleceu-se como objetivo analisar o PNLD
(Programa Nacional do Livro Didático) na escola CIEP. Uma pesquisa de abordagem
qualitativa dos dados coletados por meio de pesquisa bibliográfica, análise de dados
secundários e entrevista com estudantes e gestores da escola, considerando-se a contribuição
das disciplinas de Políticas públicas e Gestão educacional, Teoria do currículo e Educação do
campo e Prática Pedagógica V. Após a pesquisa, identificou-se que na escola de referência a
política não tem apresentando algumas limitações em sua execução, porém destaca-se que tais
elementos não podem fazer com que se ignore sua importância, dado que, muitas vezes, essa é
a única forma de acesso dos estudantes, mesmo de suas famílias, a livros.

Palavras-chave: Políticas públicas, Gestão educacional, Educação do Campo

Introdução

Considerando que o eixo temático do quinto semestre do Curso de Licenciatura de


Educação do Campo - UNIPAMPA – Campus de Dom Pedrito, tem como objetivo registrar
as atividades desenvolvidas durante o projeto V, sendo estas realizadas na Escola Getúlio
Dornelles Vargas - CIEP, localizada na rua: Pedro Paz Sobrinho, 1991, bairro: Oscar Vicente
e Silva, em Dom Pedrito. Após a revisão de algumas leituras indicadas pelos professores
durante o TU (Tempo Universidade), as autoras fizeram um levantamento de dados através de
algumas perguntas que foram elaboradas e que beneficiam as escolas do campo e as urbanas,
bem como sua identificação e aplicação, passando por uma análise sobre seu funcionamento
desde sua origem até quem são as pessoas por elas beneficiadas, onde constatamos um
diferencial do livro didático. Através do mapeamento das políticas públicas, identificamos as
mais acessadas, passando a entender melhor sua importância e aplicação, bem como os
benefícios ofertados quando acessadas e implantadas corretamente, visto que política pública
é originada da demanda e necessidade, sendo um direito adquirido possibilitando melhores
condições de vida.
Segundo Freire (2015, p. 97),
Do ponto de vista dos interesses dominantes, não há dúvidas de que a educação deve
ser uma prática imobilizadora e ocultadora de verdades. Toda vez, porém, que a
conjuntura o exige, a educação dominante é progressista à sua maneira, progressista
“pela metade”. As forças dominantes estimulam e materializam avanços técnicos
compreendidos e, tanto quanto possível, realizados de maneira neutra. Seria
demasiado ingênuo, até angelical de nossa parte, esperar que a “bancada ruralista”
aceitasse quieta e concordante a discussão, nas escolas rurais e mesmo urbanas do
país, da reforma agrária como projeto econômico, político e ético da maior
importância para o próprio desenvolvimento nacional. Isto é tarefa para educadoras
e educadores progressistas cumprirem, dentro e fora das escolas. É tarefa para
organizações não governamentais, para sindicatos democráticos realizarem.

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Após estudo e análise das políticas públicas existentes e entrevistas com professores e
direção identificamos as políticas que são aplicadas e presenciamos o uso de algumas delas,
constatando que as mesmas são acessadas e mal distribuídas, pois o objetivo do livro didático
seria para ajudar os alunos a compreenderem melhor o conteúdo e facilitar seu entendimento,
porém nessa instituição podemos constatar que nem todos os professores trabalham com o
livro em sala de aula, pois alguns livros vêm com textos muito extensos e o tempo é muito
pouco para trabalhar.

Metodologia
Para construção do Projeto Interdisciplinar V, Contexto Socioeconômico,
Sociopolítico e Sócio educacional, foi aplicada uma pesquisa qualitativa na escola Getúlio
Dornelles Vargas - CIEP, comunidade do bairro Oscar Vicente e Silva. Os instrumentos
utilizados para coleta de dados foram, conversa informal com alunos, professores, supervisora
da escola e pesquisas de dados secundários.
Os perfis dos entrevistados diferenciavam-se pela idade e formação, abrangendo assim
faixas etária entre 18 a 60 anos, desde alunos do ensino fundamental até professores desta
comunidade. Possibilitando assim, dentro do tema proposto, verificar a perspectiva de
diferentes grupos acerca do PNLD. Após a análise dos dados iniciais, foi realizada uma
entrevista com supervisora da escola.
Passo 1- Conversa informal na escola que estagiamos com diretora , supervisora,
professor e alunos.
Passo 2- Mapeamento das políticas públicas voltadas para problemática em estudo.
Passo 3- Identificação das políticas públicas numa escola do campo ou urbana.
Passo 4- Análise de uma política pública escolhida na escola.
Passo 5- Pesquisar artigos e bibliografias sobre livro didático.
As entrevistas foram transcritas e analisadas a partir da utilização da técnica de análise
de conteúdo, sendo os resultados posteriormente interpretados a luz dos referenciais teóricos e
na inter-relação com os dados secundários levantados durante a pesquisa.

Resultados
Resolvemos fazer uma análise de como funciona o Programa Nacional Livro Didático
(PNLD) dentro da escola. Através de uma conversa com a supervisora, ela relata que acessam
essa política através da 13° CRE (Coordenadoria Regional de Educação) e que, juntamente
com o quadro de professores, através de uma lista com os nomes dos livros e disciplinas, cada
professor pode escolher até três livros para trabalhar durante o ano com os alunos. A partir daí
é feita uma lista com a quantidade de alunos por turma e os livros escolhidos por cada
professor, a qual é enviada para 13°CRE para a escola então receber esse material. Só que na
maioria das vezes eles mandam muito mais do que foi solicitado, mas isso ela não soube nos

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explicar o porquê. Ou, muitas vezes, a quantidade que algum professor pediu conforme o
número de alunos vem faltando e aquele aluno fica sem livro para trabalhar em aula.
Esses livros escolhidos pelo professor, eles trabalham em aula e podem ficar com eles,
levarem para casa, como de História, Matemática, relata a supervisora. Mas nem todos os
professores trabalham em aula com o livro didático, alguns usam somente para pesquisas ou
para complementar o conteúdo. Os livros que saem da escola e retornam são os que não
possuem muitos exemplares, como dicionário e outros, que o aluno faz o empréstimo na
biblioteca por alguns dias e depois faz a devolução para que outros possam usar.
A supervisora questiona a quantidade de livros que a escola recebe, pois não tem
espaço na escola para guardar, que o ano passado fizeram um documento para vender os
livros que tinham do ano anterior para ter espaço para guardar os que iam receber, no caso
desse ano. Com isso ocupam uma sala de aula para guardar os livros, fora os que se
encontram na biblioteca, onde a maioria deles encontram-se lacrados e sem uso. Relata
também que os livros não estão vindo tão bons, com textos muito extensos, com interpretação
que para trabalhar em 40min de aula é impossível.
A pergunta da supervisora é porque o estado, com esse dinheiro que investe no PNLD,
não investe em outros programas, como o PDDE (Programa Dinheiro Direto na Escola), que
seria acessado também através da 13° CRE para investir em setores que precisam como, por
exemplo, necessidades básicas da escola como o papel higiênico.
Perguntamos a supervisora se teriam acesso ao PDDE (Programa Dinheiro Direto na
Escola), mas não tivemos acesso a essas informações. Com relação ao PNLD, entendemos ser
muito importante nas escolas, pois incentiva nos alunos o gosto pela leitura, dado que, muitas
vezes, eles têm acesso somente na escola, porém constatamos que na escola onde o trabalho
foi realizado não estão sabendo utilizar de forma adequada.
O livro didático é muito importante para estimular o prazer e o gosto pela leitura, o
Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) foi melhorando ao longo dos anos 1980.
Voltado à educação básica brasileira, o programa tem como principal objetivo melhorar o
processo de aprendizagem e pedagógico dos professores e alunos, assim facilitando seu
conhecimento e fazendo com que o aluno tenha gosto pela leitura.
Já fazem mais ou menos dois séculos que começaram a ser produzidos no Brasil os
primeiros livros didáticos, eles passaram por muitas transformações, sempre visando melhorar
a dinâmica e contribuir muito para o aprendizado.
Considerações Finais
O tema, Contexto Socioeconômico, Sociopolítico e Socioeducacional constitui o eixo
do quinto semestre do Curso Educação do Campo, Licenciatura. Foi trabalhado em sala de
aula entre docentes e discentes durante o Tempo Universidade. Por meio deste Projeto
buscamos conhecer e apresentar as políticas públicas existentes relacionadas à educação, bem
como algumas que a Escola Getúlio Dornelles Vargas – CIEP tem acesso.
Após entender melhor as políticas públicas relacionadas à educação, identificamos a
necessidade de acessar elas e saber utilizar. O Programa Nacional do Livro Didático – PNLD

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tem como objetivo fundamental a disseminação de materiais didáticos para os estudantes e


professores, que permitam o desenvolvimento do ensino e da aprendizagem de forma
contextualizada. Desta forma, entende-se a importância de que os docentes aprendam e
familiarizem-se com a utilização do livro didático, porque ele é um instrumento valioso para o
acesso à cultura e o desenvolvimento da leitura e educação. Da mesma forma, entende-se que
os livros didáticos, em muitas residências familiares, são os primeiros a chegar, de forma que
colaboram com o desenvolvimento do hábito e do gosto pela leitura nos lares dos estudantes..
Reconhecemos que temos muito a aprender, a cada etapa vencida, um novo
aprendizado com o curso, para que futuramente possamos construir uma melhor sociedade
educacional que está em transformação. Com o que vivenciamos durante a coleta de dados na
escola em conversa com alunos, professores, direção e supervisão tivemos um crescimento
em nosso aprendizado tanto pessoal como profissional.

Referências Bibliográficas

Conteúdo das disciplinas Políticas Públicas, Prática V e Teorias do Currículo.


FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 2015.
Materiais usados durante o TU no curso.
Programa Nacional de Educação do Campo ... - Portal do MEC
portal.mec.gov.br/docman/maio.../13214-documento-orientador-do-pronacampo-pdf

ESCOLAS E A EDUCAÇÃO DO CAMPO EM SETE DE SETEMBRO – RS

Ana Carla Lenz - Universidade Federal de Santa Maria/UFSM


Cesar De David – Universidade Federal de Santa Maria/UFSM
Elizandro Luiz Adamski Pauczinski - Universidade Federal de Santa Maria/UFSM
anacarlalenz@gmail.com
cdedavid2009@gmail.com
elizandro.lap@hotmail.com

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Sete de Setembro está localizado no noroeste do estado do Rio Grande do Sul, são municípios
limítrofes Santo Ângelo, Giruá, Guarani das Missões e Senador Salgado Filho. De acordo
com dados do COREDE Missões (2016), a área territorial do município é de 130 km² e sua
população soma aproximadamente 2.169 habitantes, os quais em sua maioria habitam o meio
rural, em torno de 1630, enquanto 494 pessoas vivem na área urbana. Este fato denota que a
principal base da economia do município é a agricultura familiar. Entre os produtos cultivados
os mais expressivos são as hortaliças, em torno de 28%; a criação de gado leiteiro, somando
41% (COREDE Missões, 2012). Levando em conta os aspectos populacionais apresentados, o
presente ensaio tem por objetivo geral analisar a participação das escolas rurais do município
nas comunidades rurais e urbana. Assim como: a) mapear as escolas do município da área
urbana e rural; b) descrever a infraestrutura de cada escola; c) analisar as propostas
pedagógicas das escolas rurais, na perspectiva da educação do campo; d) compreender a
importância das escolas do meio rural para a comunidade local. A metodologia do trabalho foi
estruturada nas seguintes etapas: a primeira destina-se ao levantamento bibliográfico; a
segunda refere-se ao levantamento in loco (campo) e por fim a terceira constituiu-se na
análise e interpretação dos dados alcançados, assim como, para a redação do texto final da
pesquisa. O município possui quatro escolas ao total, uma no perímetro urbanos e as demais
localizam-se na área rural, são elas: a Escola Estadual de Ensino Médio São Roque, localizada
na área urbana, oferece Ensino Fundamental e Ensino Médio; A Escola Municipal de Ensino
Fundamental Gaúcha, da Linha Gaúcha, área rural; A escola da Linha Boa Vista, Escola
Municipal de Ensino Fundamental Sargento Pedro Krinski e a Escola Estadual de Ensino
Fundamental Nossa Senhora do Carmo da comunidade da Linha Barreira. (Secretária da
Educação do Município Sete de Setembro, 2018). As escolas possuem boa infraestrutura com
bibliotecas, salas de vídeo, refeitórios, sala de informática (apenas na Escola Estadual de
Ensino Médio São Roque), espaço para o lazer como: parquinhos e quadras de vôlei e futebol.
A importância das escolas das áreas rurais do município se dá por inúmeros fatores, porém o
mais citado pelos depoentes é o deslocamento, observam que a escola na comunidade facilita
o acesso à educação, além de estar localizada no espaço de vivência dos alunos, promovendo ,
de certa forma, a valorização do local, dos hábitos e costumes dessas comunidades em que
estão inseridas. Mas, nem sempre a escola desenvolve métodos de ensino que estimulam os
alunos a valorizarem as experiências vivenciadas por eles e seus familiares, como destaca o
depoente A, “a escola da comunidade da Linha Boa Vista não aborda assuntos referente a lida
no campo, muito menos sobre a nossa cultura. São valores que vão se perdendo, pois, as
nossas crianças observam outra forma de viver, mais fácil, do que o trabalho na lavoura e na
horta”. (Diário de Campo, 2018). “Os professores também não ajudam, poucos são os do
nosso município, e nem um é daqui da comunidade, muitos vêm de outros municípios da
região para lecionar no Sete de Setembro”, destaca o depoente B. (Diário de Campo, 2018).
“Uma das preocupações da comunidade da Linha Barreira é o reduzido número de crianças
em idade escolar, e a Secretaria de Educação do Município está cogitando a hipótese de
nucleação”, revela o depoente C (Diário de Campo, 2018). Os espaços rurais geralmente são

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territórios com pouca densidade demográfica, porém essa característica não se aplica ao
município de Sete de Setembro/RS, onde a população rural aumentou nos últimos anos.
Fenômeno pouco valorizado e explorado, tanto pelo poder público como pelos munícipes,
pois essas sociedades/comunidades produzem paisagens específicas, por meio do trabalho
cotidiano e estabelecem relações recíprocas entre os membros dessas comunidades com a
escola. Assim, a escola do campo poderia constituir-se como representante e reprodutora das
histórias, memórias do espaço em que está inserida, ou seja, incluir no processo de ensino e
aprendizagem as formas, cores, estruturas, cheiros, processos, funções e sabores, ou seja, os
traços daqueles e daquelas que construíram/produziram o espaço geográfico rural de Sete de
Setembro (RS).

Palavras-chave: Agricultura familiar; Espaço Rural; Cultura; Ensino e aprendizagem.

Referências

BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Ed.). IBGE. Disponível em:


<https://www.ibge.gov.br/>. Acesso em: 14 jul. 2018.

FEE. COREDE. Disponível em: <https://www.fee.rs.gov.br/perfil-


socioeconomico/coredes/>. Acesso em: 14 jul. 2018.

SETE DE SETEMBRO. PREFEITURA MUNICIPAL. (Org.). Prefeitura Municipal de Sete


de Setembro. Disponível em: <https://www.setedesetembro.rs.gov.br>. Acesso em: 14 jul.
2018.

IDENTIDADE RURAL: VALORIZANDO A CULTURA E CONSTRUINDO


CONHECIMENTO
Ruth Freitas Marques
EMEF José Paim de Oliveira
ruth.f.m@hotmail.com
Elizarlete Soares da Fontoura
EMEF José Paim de Oliveira
eliza.sdf@hotmail.com

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O presente relato de experiência traz a caminhada percorrida por educadores e educandos da


Escola Municipal de Ensino Fundamental José Paim de Oliveira - Escola Núcleo, situada na
localidade denominada Alto das Palmeiras, Distrito de São Valentim, Santa Maria – RS.
Sendo uma instituição inserida no meio rural, tem como missão proporcionar à comunidade
escolar motivos que justifiquem a permanência no campo, melhorando assim, sua qualidade
de vida. Neste contexto, o corpo docente da escola tem pensado e tentado propiciar uma
educação em que se respeitem os saberes e as peculiaridades do meio rural. Desta forma,
acredita-se que estaremos despertando nos educandos o sentimento de pertencimento e de
valorização do meio em que vivem. Assim como Lourenzi, Zanon e Santos (2012)
acreditamos que “o território do campo é a base fundamental de sustentação da Educação do
Campo, e este deve ser compreendido para muito além de um simples espaço de produção
agrícola. O campo é território de produção de vida”. Considerando esse aspecto foi
organizado o Projeto Identidade Rural, direcionado aos alunos dos anos finais do Ensino
Fundamental, e tem como objetivo a valorização dos saberes e da cultura do homem do
campo, resgatando seu espaço, suas histórias e suas memórias. Para alcançar estes propósitos
desenvolvemos uma série de ações que iniciaram com a investigação histórica e geográfica do
distrito em que está inserida a comunidade escolar, partindo de uma pesquisa documental e na
sequência realizamos uma caminhada para observar o lugar e suas riquezas paisagísticas. Para
dar continuidade, as famílias dos alunos envolvidos no projeto contribuíram respondendo um
questionário socioeconômico, dando conta da realidade que envolve a todos, tanto nos
aspectos positivos, quanto nos negativos. Diante do panorama construído até aqui,
propusemos como continuidade das ações, a elaboração de paródia, poesia e de uma peça de
teatro baseada na história da criação do Distrito de São Valentim, onde a Família Toniolo e os
Carreteiros tiveram fundamental importância. Analisando a riqueza das experiências vividas
por todos os envolvidos, resolvemos registrar o percurso do projeto na forma de um livro, que
tem por título: “São Valentim – Conhecer, Valorizar, Pertencer”. A obra foi lançada durante a
45ª Feira do Livro de Santa Maria – RS, em maio de 2018, oportunidade em que os alunos,
juntamente conosco, vivenciaram a experiência de assumir sua autoria e dar visibilidade a
uma comunidade escolar do campo. Podemos perceber que, durante o desenvolvimento das
atividades, houve grande relação de aproximação e interação do grupo e que, além do
conhecimento adquirido houve respeito e consideração dos participantes. E, a cada encontro o
entusiasmo brotava nos rostos, com sorrisos motivadores, na expectativa do que viria. Cada
um trazendo algo e formando um grande grupo: participativo e coeso, no saber ouvir,
aceitando e expondo suas ideias. Por fim, salientamos que o Projeto Identidade Rural continua
em plena atividade neste ano de 2018, com ações direcionadas aos 25 anos de Nuclearização
da Escola Municipal José Paim de Oliveira, que tem como evento a retomada das Carreteadas,
previsto para o mês de novembro deste ano. Tendo como foco inicial a gravação da paródia
“Quem chega”, que marca o quanto é rico e bonito o lugar, e também a valorização da Escola,
o teatro “A venda do Tinzo” que foi um sucesso e, que será adaptado, com uma versão real da
família Toniolo, declamações de poesias de autoria dos participantes e lançamento do livro:

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“São Valentim: Conhecer, Valorizar, Pertencer” para a comunidade do Distrito de São


Valentim. O encerramento do projeto culminará com mostras dos trabalhos e apresentações
orais.

EIXO 2: A Educação do Campo e a Educação dos Camponeses (Educação Escolar e Não


Escolar)

Palavras Chave: Educação do Campo; Identidade Rural; Valorização.

FEIRA DA AGRICULTURA FAMILIAR: DIÁLOGO DE SABERES E SABORES


Family agriculture fair: dialogue of knowledges and flavors

BRANDÃO, Eron1,2,3; CUPSINSKI, Marilene1,4; DUSO, Leandro2,5


1
Escola Estadual de Ensino Médio Antônio Conselheiro. 2Universidade Federal do Pampa;
3
eronbrandao@gmail.com; 4marilenecupsinski@gmail.com; 5dusoleandro@gmail.com

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Tema Gerador: Construção do Conhecimento Agroecológico.

Resumo

O presente texto tem como objetivo relatar a experiência da Feira da Agricultura Familiar
realizada na Escola E.E.M. Antônio Conselheiro localizada na zona rural do município de
Santana do Livramento-RS, em conjunto com as comunidades agrícolas dos assentamentos do
entorno. Juntamente com a comunidade, busca-se desenvolver projetos que estejam
vinculados com a realidade em que a escola está inserida. Neste sentido a escola desenvolveu
o tema “Alimentação saudável: um direito de todos”, sendo esse sugerido pelo setor de
educação do MST, que propiciou a oportunidade de organizar a feira agroecológica na escola
com produtos da agricultura local. Esse projeto surgiu com propósito de valorizar os produtos
da agricultura familiar e fortalecer o trabalho agroecológico da comunidade e a escola. A feira
é resultado do esforço dos produtores dos assentamentos, da articulação dos professores e dos
estudantes possibilitando o fazer pedagógico que permeia cada momento do processo
educativo.

Palavras-chave: Feira agroecológica; agricultura orgânica; educação; escola do campo.

Abstract

The objective of this text is to report on the experience of the Family Agriculture Fair held at
Antônio Conselheiro High School, located in the rural area of the municipality of Santana do
Livramento-RS, together with the farming communities of the surrounding settlements.
Together with the community, we seek to develop projects that are linked to the reality in
which the school is inserted. In this sense, the school developed the theme "Healthy food: a
right for all", which was suggested by the MST education sector, which provided the
opportunity to organize the agroecological fair in school with products from local agriculture.
This project arose with the purpose of valuing the products of family agriculture and
strengthening the agroecological work of the community and the school. The fair is the result
of the efforts of the producers of the settlements, of the articulation of teachers and students,
making possible the pedagogical work that permeates every moment of the educational
process.

Keywords: Agroecological fair; organic agriculture; education; Country school.

Contexto

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A Escola Estadual de Ensino Médio Antônio Conselheiro localiza-se no Assentamento Bom Será, no
Município de Santana do Livramento, Rio Grande do Sul. A escola é fruto de um longo processo de
luta que inicia em 1991 com a chegada do primeiro assentamento na região. No decorrer do tempo,
vários outros assentamentos chegaram à região, formando assim blocos de várias comunidades. O
aumento da população fortalece a luta pela escola. Em 2013 com o início do Ensino Médio a escola
passa a trabalhar em três turnos. No ano de 2014 a comunidade escolar conquista o Pré-escolar e a
Educação de Jovens e Adultos (EJA), que funcionam em parceria com o município. Nesta escola do
campo, estudam os filhos e filhas de assentados da Reforma Agrária e de pequenos agricultores, e
assim, se faz necessário valorizar a produção e os conhecimentos da realidade da comunidade escolar.
A escola tem como princípio básico a Educação do Campo e a Pedagogia do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), por estar localizada em uma área de Assentamento
da Reforma Agrária em que as famílias da comunidade escolar, em sua maioria, pertencem a
esta organização. Outro fator que garante a concepção de educação desenvolvida na escola,
vinculado ao Movimento Social, é a pertença e o comprometimento da comunidade escolar e
das pessoas que garantem a gestão da escola. Conforme o Caderno nº 4, Educação do Campo:
Identidade e políticas públicas:

Os povos do campo têm uma raiz cultural própria, um jeito de viver e de trabalhar,
distinta do mundo urbano, e que inclui diferentes maneiras de ver e de se relacionar
com o tempo, o espaço, o meio ambiente, bem como de viver e de organizar a
família, a comunidade, o trabalho e a educação. Nos processos que produzem sua
existência vão também se produzindo como seres humanos. A nova geração está
sendo deseducada para viver no campo, perdendo sua identidade de raiz e seu
projeto de futuro. Crianças e jovens têm o direito de aprender a sabedoria dos seus
antepassados e de produzir novos conhecimentos para permanecer no campo.
(KOLLING; CIRIOLI; CALDART, 2002, p.16-17)

Neste intuito, a escola tem como papel fundamental a busca pela valorização da cultura do campo, do
comprometimento com o resgate da cultura camponesa e a ousadia de organizar a educação de tal
forma que garanta esse fazer diferente. Nesta perspectiva surge a ideia da Feira na Escola, como
forma de garantir o objetivo proposto. No Projeto Político Pedagógico da Escola Antônio Conselheiro,
ressalta-se que:

Esta escola tem por objetivo geral participar de um projeto de humanização das
pessoas, que seja também um projeto histórico de transformação social, ajudando a
educar sujeitos capazes de construir um novo projeto de desenvolvimento do campo,
e um novo projeto de país. Um projeto que deverá incluir necessariamente uma nova
forma de pensar e de fazer a educação e a escola do povo, do campo e da cidade.
(PPP; 2014, p. 7)

Embasado neste objetivo busca-se fazer algo que venha ao encontro de um projeto diferente
resgatando e valorizando a cultura dos povos do campo. O desafio é aproximar o fazer pedagógico

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nesta relação escola-comunidade aliada ao processo de produção agrícola de forma agroecológica, na


qual valoriza o cuidado com o meio em que se vive e principalmente da saúde humana.

Partindo desses princípios, no ano de 2016 a escola iniciou o ano letivo com o projeto,
“Alimentação Saudável: um direito de todos”, o qual foi uma orientação nacional do
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Este tema buscou resgatar a importância da
agroecologia para uma alimentação saudável, incentivando assim práticas agroecológicas que
valorizem o meio em que vivem e consequentemente a saúde humana. Neste sentido é tarefa
deste educandário, valorizar e oferecer saberes necessários sobre o tema, para a comunidade
em que está inserida.

Descrição da experiência

A feira da Agricultura Familiar é resultado da articulação da comunidade com a escola. Processo este
articulado simultaneamente com os projetos desenvolvidos pela escola. Ao longo do tempo os
educadores da escola juntamente com a comunidade onde está inserida vêm discutindo o papel da
escola no desenvolvimento das famílias envolvidas e em especial da agricultura camponesa.
Na busca por um projeto que viesse ao encontro deste objetivo é que a escola aderiu como tema a ser
desenvolvido no ano de 2016, “Alimentação Saudável: Um direito de Todos”, tema este sugerido pelo
movimento social, o MST, do qual a maioria das famílias pertence. Dentre as várias atividades
desenvolvidas com os estudantes, desde a Educação Infantil até o Ensino Médio, surge a ideia de
convidar as famílias para levarem o que produzem para a escola. Isso no intuito de mostrar, trocar e
vender o que produziam em seus lotes.
No mês de maio de 2016 a escola enviou convite para todas as famílias da comunidade do entorno da
escola para participarem da feira levando o que cultivavam em suas propriedades. Já nesta primeira
experiência as famílias surpreenderam com a participação e com a quantidade e variedades de
produtos existentes. Sendo que foi organizado 16 grandes bancas de produtos, com a participação de
20 famílias. Nesta atividade de venda e troca de produtos envolveu-se as famílias como um todo,
sendo que mães e pais levaram seus filhos que participaram ativamente de todo o processo. A escola
organizou atividades artísticas e com a participação de um cantor da região entre outras apresentações
dos estudantes, que puderam mostras para a comunidade alguns dos trabalhos desenvolvidos na escola.
Os agricultores familiares puderam levar os diferentes tipos de cultivos produzidos na comunidade.
Nesta diversidade, enfatizamos os produtos da lavoura e horta, como: batata, mandioca, feijão,
aboboras, amendoim e diversas hortaliças. Apresentou-se também muitos produtos beneficiados de
forma artesanal, como: pães, cucas, bolachas, rapaduras, queijos, mel e doces e sucos em geral. E,
também uma grande diversidade de trabalhos de artesanato em lã.
Durante a execução da feira foi oportunizado um espaço de diálogo com as famílias participantes, para
discutir o modo de cultivo do mesmo e assim oportunizar a orientações de como poder cultivar com
melhor eficiência orgânica. Após a roda de conversa foi discutido caminhos de formação, buscando
parcerias para alavancar ainda mais aquela experiência que estavam vivenciando. Os participantes

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indicaram como positiva a iniciativa da escola e de que a feira deveria ser realizada uma vez por mês
no mesmo espaço da escola.
Nesta perspectiva, realizou-se a segunda edição da feira no mês de junho, na qual houve a participação
da administração da escola, professores, funcionários e estudantes da escola, bem como a participação
de estudantes e professores de Universidades da região como a Universidade Estadual do Rio Grande
do Sul (UERGS) e a Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA).
Quando ocorreu a terceira edição da feira na escola, começou-se a avaliar que seria necessário ampliar
a feira para além do espaço da escola pois ocorria um aumento significativo de participantes e da
quantidade de produtos e, a população da comunidade local não dava mais conta de absorver toda a
produção que se oferecia ocasionando uma diminuição da troca dos produtos que a maioria tem em
seu lote. Os professores, que se tornaram grandes consumidores dos produtos, não eram também
suficientes para a demanda apresentada.
Foi então que se buscou parceria com escolas da cidade, que fica localizada a 35km da escola, e foi
realizada uma grande feira em uma escola de um bairro. As famílias os seus cultivos e ofertaram o que
era produzido nos assentamentos da Reforma Agrária, possibilitando uma grande interação entre
campo e cidade, além da relação entre as escolas e as comunidades envolvidas.

Resultados

Esta atividade vem apresentando resultados surpreendentes para a escola, para o seu fazer pedagógico
e para a comunidade escolar. Sendo que no decorrer do processo as famílias foram se envolvendo de
maneira que possibilitou a participação de todos os membros da mesma, em especial os estudantes da
escola, pois puderam participar do processo inicial do cultivo de produtos da terra até a troca e a
comercialização da mesma.
Ocorreu uma aproximação da comunidade com a escola, na qual os agricultores familiares estão,
sempre que possível presentes no âmbito escolar. Um fator importante a ser destacado, é que a maioria
das famílias são assentadas e pertencem ao MST, movimento social que luta pelos direitos das famílias
e nesse processo as famílias tornam-se participativas e isso reflete também na escola e na própria luta
pela permanência na escola do/no campo.
Outro aspecto a ser ressaltado é o resgate da cultura camponesa, sendo que a partir desta primeira
experiência muitas famílias retomaram a produção de muitas culturas de cultivares e também de
beneficiamento de alimentos caseiros.
Ao falar de alimentação saudável, destaca-se a ênfase em produtos agroecológico, um dos critérios
para a participação na feira. Neste sentido, a escola se torna o um dos principais locais de formação
para a assessoria técnica, assumindo um papel fundamental. Sendo que a escola vem a algum tempo
desenvolvendo trabalhos que mostram os prejuízos para a natureza e para a saúde humana com o uso
de agrotóxico. No mesmo sentido a assessoria técnica, vem acompanhando as famílias apresentando
alternativas para a produção agroecológica.

A partir da terceira edição da feira, avaliou o caminho percorrido até o momento concluindo que a
experiência estava obtendo resultados positivos e que era necessário expandir para outras
comunidades. Neste intuito, a escola realizou parceria com escolas da zona urbana, com objetivo de
atingir um público maior. O resultado foi significativo, pois além desta parceria campo e cidade, pode-

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se citar a importância das famílias, em sua maioria assentadas da Reforma Agrária, oferecerem
produtos de qualidade para a população, obtendo o reconhecimento pelo seu trabalho e retorno
financeiro, motivando na ampliação e qualificação para o trabalho dos camponeses.
Entre todos os movimentos executados nesta experiência, houve parcerias importantes para o
desenvolvimento de um trabalho coletivo e de qualidade. Entre as parcerias pode-se destacar a
Assistência Técnica da Cooperativa de Prestação de Serviços Técnicos (COPTEC) da Universidade
Estadual do Rio Grande do Sul, campo de Santana do Livramento. A COPTEC, com assistência direta
aos produtores, em especial no desenvolvimento de técnicas agroecológica o que garante um produto
saudável e de qualidade. A UERGS, com debate para a formação da Organização de Controle Social
(OCS) na busca pela certificação orgânica, a qual promove um trabalho de confiança e
comprometimento entre os produtores.
Diante deste movimento da escola e comunidade, de articulação da escola, comunidade e parceiros, é
que a UERGS, vem desenvolvendo um projeto para a criação da OCS. Isso resulta que a Universidade
também está presente na escola e nas famílias assentadas, com o intuito de colaborar no
desenvolvimento do processo produtivo. E mais, processo este que garante a produção de alimentos
saudáveis e de qualidade para as famílias e para a população em geral.
Ressalta-se, que toda a organização da feira não se encontrou soluções imediatas, mas, que sem
sombra de dúvidas, foi uma grande iniciativa para a busca de alternativas para a produção
agroecológica na comunidade. Além disso, foi um espaço importante para a relação entre teoria e
prática nos trabalhos educativos da escola, articulando o trabalho pedagógico com as situações da
realidade.

Referências Bibliográficas

KOLLING, Edgar Jorge; CIRIOLI, Paulo Ricardo e CALDART, Roseli Salete (org.).
Educação do Campo: identidade e políticas públicas. Brasília, DF, 2002.

PPP. Projeto Político Pedagógico. Escola Antônio Conselheiro. Santana do Livramento-RS,


2014

DESAFIOS E PERSPECTIVAS DA EDUCAÇÃO DO CAMPO: O ENSINO DE


CIÊNCIAS NA ESCOLA PÓLO DE NOVO TESOURO, BAIÃO-PARÁ

Keise da Silva Moura.

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Universidade Federal do Pará/ kmoura.21@outlook.com


Tiago Correa Saboia
Universidade Federal do Pará/ tiago_saboia@yahoo.com.br

Área Temática: Relato de Experiencia

Modalidade: Resumo Expandido

OBJETIVOS
Como resultados das reivindicações em prol de educação com qualidade para os povos
do campo, houve a aprovação pelo Conselho Nacional da Educação, das Diretrizes
Operacionais para a Educação Básica nas escolas do campo, (resolução CNE/ CEB nº 1, de
03 de abril de 2002) e as Diretrizes complementares, normas e princípios para o
desenvolvimento de políticas públicas de atendimento da Educação do Campo (resolução
CNE/CEB nº 2, de 28 de abril de 2008). Essas diretrizes expõem o que as propostas
pedagógicas das escolas do campo devem contemplar, e abordam aspectos sobre formação de
professores para o exercício da docência nas escolas do campo, dispondo também sobre a
responsabilidade do poder público com essa educação diferenciada levando em consideração
a diversidade do campo.

Por tanto a educação do campo deve contemplar um ensino voltado a realidade de seus
alunos, em que o conteúdo curricular e as metodologias de ensino do professor devem ser
adequadas as necessidades e interesses dos alunos do campo, os quais precisam de um ensino
que valorize, dentre outros aspectos, a cultura do aluno que vive no campo e seus modos de
vida. Nessa perspectiva o que se espera do ensino de Ciência, é que através dele o aluno
contribua para o seu próprio desenvolvimento, e que seja capaz de questionar, refletir e
raciocinar.

Para Carvalho, 2000, a escola deve dotar as pessoas de condições teóricas e práticas
para que elas utilizem, transformem e compreendam o mundo da forma mais responsável
possível. Nesse sentido o movimento Ciência, Tecnologia e sociedade (CTS), é uma tendência
que contempla a estreita relação da ciência, com a tecnologia e a sociedade, cujos aspectos
não podem ser excluídos de um ensino que visam formar cidadãos mais atuantes e críticos.
Nesse sentido o presente trabalho tem como objetivo pôr em evidência as práticas

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pedagógicas do ensino de Ciências em uma escola de comunidade rural, no município de


Baião, e analisar em que medida há a presença de paradigmas da educação do campo nessa
escola.

METODOLOGIA
A presente pesquisa surge a partir do estágio docência I (fundamental maior) na
disciplina de Ciências, realizado na Escola Polo de Novo Tesouro, na Comunidade de Novo
tesouro, município de Baião-Pá.

A coleta dos dados para o desenvolvimento desta pesquisa foi realizada por meio das
observações realizadas a partir do estágio docência, na disciplina de ciências. Tendo como
fonte principal de coleta de dados o caderno da realidade, de entrevista semiestruturada junto
aos professores da escola. Foram feitos registros fotográficos.

RESULTADOS
Foram acompanhados dois professores de Ciências, um que trabalhava de 6 a 8 ano, e o outro
somente com o 9º ano. Onde o primeiro é formado em ciências naturais, foi contratado
recentemente, e o segundo é formado em pedagogia e matemática e trabalha há mais de 20
anos na escola. A carga horária do 6º e 8º ano são duas aulas de ciências por semana, o 7º e 9º
são três aulas por semana. As primeiras observações do estágio ocorreram no 6º ano, onde o
professor fazia a correção de exercícios relacionados a Pressão Atmosférica, e fazia
explicações referentes ao assunto. Um outro assunto trabalhado nessa turma tratava sobre o
Efeito Estufa, onde o professor ministrou sua aula usando o quadro branco.

Acompanhando o 7º ano o assunto abordado foi o Reino dos Fungos, o professor usou
o quadro para escrever alguns conceitos referentes ao tema, e desde o primeiro dia de estagio
pode se perceber que o tempo é um fator bastante significativo, pois a carga horária da
disciplina de ciências é mínima, e uma aula (45 min.), passa muito rápido, o professor deve
fazer um planejamento minucioso para que nesse pouco tempo ele consiga dar sua aula na
melhor maneira possível. Ainda no 7º ano, pude acompanhar a continuação dos estudos sobre
os fungos. Os alunos realizaram uma atividade de campo nos arredores da escola. De acordo
com Fernandes (2007), atividade de campo é toda atividade que envolve o deslocamento dos
alunos para um ambiente alheio ao espaço de estudos da escola.

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Nesta atividade os alunos deveriam identificar os diferentes tipos de fungos, conforme


já haviam estudado em sala. Para isso os mesmos foram separados em grupos para que
pudessem observar e coletar os fungos, para que posteriormente, em sala pudessem tentar
identificar as espécies desses fungos. Na aula de campo se pode observar uma melhor
interação entre os alunos e até mesmo com professor, questionando quando achavam algo que
parecia com alguma espécie de fungo.

O trabalho de campo possibilita o desenvolvimento de atitudes de preservação e


cuidados da natureza e a relação entre professor e aluno fora do ambiente formal da sala de
aula pode contribuir para criar cooperações agradáveis, produtivas e companheirismo
(PORTO,2009). A relação de companheirismo entre os alunos foi algo bem marcante na aula
de campo, era visível o entusiasmo, até mesmo porque os alunos já conheciam alguns dos
fungos que viam nos livros. De acordo com De Frutos. Et al (1996, pag. 15) a atividade de
campo permite com que o aluno se sinta protagonista do seu ensino. Desta forma o
conhecimento só passa a ser significativo a medida em que as novas informações se ligam aos
conhecimentos prévios dos alunos.

A ciência está por toda a parte, e quando o professor usa uma dinâmica diferenciada,
que permite que os alunos enxerguem esses elementos que fazem parte do seu dia a dia, a aula
começa a ter um sentido diferente, começa a ter significado para os alunos, eles começam a
entender que a ciência faz parte de sua vida. Essa foi uma das atividades em que os alunos
mais se empenharam e se mostraram bastante entusiasmado, faziam registro fotográficos, deu
para perceber o espírito de equipe, buscando descobrir e conhecer os fungos.

Na turma do 8º ano, começou a ser trabalhado o assunto sobre os Cromossomos, com


aulas expositivas usando o quadro, o professor distribuiu algumas atividades para que os
alunos ordenassem os pares cromossômicos, esta atividade trabalhou bastante com a
concentração dos alunos, e todos mostravam se empenhados em desenvolver a atividade. O
próximo assunto que foi trabalhado foi o DNA, onde o professor para exemplificar usou uma
dinâmica com os próprios alunos. A dinâmica em sala de aula é de suma importância para o
processo de aprendizagem, pois de forma descontraída o aluno aprende o assunto, no entanto,
devemos saber organizar a dinâmica e o assunto para que este momento se torne proveitoso.

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Na turma do 9º ano, o professor começou a trabalhar as leis de Newton, usando a lousa


o professor passa um breve conceito a respeito do assunto, os alunos são bastante prestativos,
em uma outra aula o professor explicou a Força de empuxo, e usou exemplos com os próprios
alunos para demonstrar o uso das forças.

Um dos maiores desafios do ensino de ciências é a adequação dos assuntos a realidade


do aluno, e a utilização de recursos disponíveis na localidade. Para Praia e Cachapuz (1984,
p351) os fatos não podem ser abordados de uma forma descontextualizada, mas antes
inseridas numa rede de razoes, ou seja, discutidas com os alunos de forma a desenvolver neles
o pensamento crítico e a capacidade de fundamentação e argumentação. Apesar de não ser
uma tarefa tão simples, em todas as turmas os professores se esforçam para fazer uma
abordagem que use o contexto da realidade dos alunos. É importante enfatizar que a maior
parte da aprendizagem é constituída a partir das relações sociais, e pode se perceber nas aulas
a boa relação entre os alunos e os professores de ciências, e isso com certeza é um estimulo
para que os alunos participem e interajam nas as aulas.

No que se refere aos recursos metodológicos, a escola dispõe de data show, note book,
no entanto a sala é muito clara e quente, por isso não apresenta condições para que sejam
usados esses equipamentos, de acordo com o professor se colocar cortinas na janela, fica
inviável continuar a aula por causa do calor, só enfatizando que o fundamental maior é
ofertado a tarde. Nesse sentido alguns conteúdos que seriam melhor abordados em slides, são
trabalhados com a ajuda do livro e da lousa.

A respeito das dificuldades que se encontra ao longo do trabalho docente, um dos


professores relata que, quando estamos estudando pensamos que vamos mudar o mundo, mas
quando chegamos em sala de aula a realidade é bem diferente. Durante o estágio, ocorreram
algumas greves dos professores, e dentre as reivindicações, estava o pagamento de salários
atrasados, essa situação demonstra o descaso das autoridades com a educação. Zaguri (2006)
enfatiza que nas salas de aula é preciso ocorrer, além de mudanças na metodologia, melhorias
nas condições de trabalho, na remuneração, na formação e atualização dos professores, além é
claro das condições dos educandos, para que ocorra um processo de ensino-aprendizagem
efetivo. E por conta das greves que ocorreram, a segunda parte do estágio que é a intervenção,
não pode ser concluída naquele momento.

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O estágio docência é um momento de suma importância para que se acompanhe de


perto as angustias e as expectativas dos docentes, bem como nos proporciona reflexões, e nos
faz repensar nossos conceitos a respeito das práticas pedagógicas, principalmente no que se
refere aos aspectos da Educação do Campo, uma vez que a pratica de ensino não começa e
nem termina na sala de aula, ela faz parte de uma prática docente mais ampla que tem por
base a compreensão da educação, da escola, e da sociedade como um todo.

Percebe - se que os aspectos da educação do campo estão sendo inseridos gradualmente


nas práticas do ensino de ciências. Pode se perceber o esforço e o compromisso não só dos
professores de ciências, mas de todo o corpo da escola, em desenvolver da melhor maneira
possível a aprendizagem dos alunos. A pesar dos entraves que permeiam o sistema de ensino,
os professores sempre buscam fazer com que as aulas tenham sentido. Muitas vezes os
professores desconhecem as diretrizes que regem a Educação do Campo, no entanto não
deixam de perceber a importância da contextualização dos assuntos com a realidade dos
alunos, e a valorização dos saberes locais. Por aqui finalizo com as palavras de Freire: “ Se
nada ficar dessas páginas, pelo menos esperamos que permaneça a nossa confiança no povo,
nossa Fé nos homens, e na criação de um mundo em que seja menos difícil de amar”.

Palavras-chave: Ciências. Ensino. Educação do campo.

REFERÊNCIA
BRASIL/MEC. Diretrizes Nacionais Para A Educação Do Campo, resolução CNE/CEB n
01, de 03 de abril de 2003.

BRASIL/MEC. Diretrizes Complementares, Normas E Princípios Para O


Desenvolvimento De Políticas Publicas Para O Atendimento Da Educação Basica Do
Campo. Resolução CNE/CEB n 21, de 28 de abril de 2008.

CABRAL NETO, Antonio (Org). Política Educacional: Desafios e Tendências. Porto


Alegre: Sulina, 2004.

CARVALHO, w (org.). Biologia: o professor e arquitetura do currículo. São Paulo:


articulação universidade/ escola. Ltda.

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DE FRUTOS, J.A. et al. sendas ecológicas: um recurso didático para el conecimiento del
entorno. Madrid: editorial CCS, 1996. In VIVEIRO, A.A; DINIZ, Renato Eugenio da
Silva. As atividades de campo no ensino de Ciências: reflexões a partir das perspectivas
de um grupo de professores. Editora: UNESP. Scielos livros.

Fernandes, J.A.B. Você vê essa adaptação? A aula de campo no ensino de ciências entre o
retorico e o empírico. São Paulo, 2007. Tese (doutorado em educação) faculdade de
educação. Universidade de são Paulo. São Paulo. 2007

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Editora: paz e terra, 1987.

MARQUES, M. O. Educação nas ciências: interlocução e complementaridade. Ijuí: Unijuí,


2002.

PORTO, Amélia. Um olhar comprometido com o ensino de Ciências/ Amélia Porto, lizia
Ramos, Sheila Goulart.1 ed. Belo horizonte: editora FAPI, 2009.

PRAIA, j, CACHAPUZ, f. un analisis de las concepiciones acerca de La naturaleza Del


conocimiento cientifico de los profesores portugijese de La enseñanza secundaria .
Enseñanza de las ciências, 1994, v 12, n.3. p.350-354.

ZAGURY, Tânia. O professor refém: para pais e professores entenderem porque a educação
fracassa no Brasil. Rio de janeiro: Record, 2006.p.39-71.

DIFERENTES OLHARES PARA A ESCOLA DO CAMPO: A EXPERIÊNCIA DE


FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORAS DO CAMPO NA REGIÃO DA
CAMPANHA GAÚCHA

Maretz Pamplona de Souza UNIPAMPA pamplonasou@hotamail.com

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Mari Seloi Ferreira Batista de Oliveira UNIPAMPA msfoliveira81@gmail.com


José Guilherme Franco Gonzaga UNIPAMPA joguigon@gmail.com

INTRODUÇÃO

No período dos meses de dezembro de 2017 a julho de 2018, aconteceu na


Universidade Federal do Pampa – UNIPAMPA, Campus Dom Pedrito-RS e Campus Alegrete-
RS um curso de aperfeiçoamento para professores de escolas do campo, sendo este,
denominado Curso de Aperfeiçoamento Refazendo Caminhos na Região do Pampa, realizado
com recursos descentralizados pela SECADI. O curso justificou-se pelas comunidades da
região apresentarem demandas acerca de formação de professores que atuam em escolas do
campo, ainda mais quando pensa-se nas especificidades da organização do trabalho
pedagógico contextualizado, diante disso, um dos objetivos foi aprofundar e debater temas
relacionados aos currículos e às práticas pedagógicas em escolas do campo da região.
O público-alvo desta ação foram professoras e profissionais da educação básica das
escolas do campo, contemplando docentes que estavam ativos em sala de aula e que não
possuíam formação específica para a modalidade, oportunizando também a gestores e outros
profissionais das instituições de ensino localizadas no campo. Ao todo, nas duas turmas
concluíram o curso cinquenta e três cursistas, sendo sete professores e quarenta e seis
professoras de escolas do campo pertencentes às redes dos municípios da região da pampa,
como Dom Pedrito, Bagé, Santana do Livramento, Rosário do Sul, Alegrete, Manuel Viana,
Uruguaiana. e das 10a, 13a, 19a, Coordenadorias Regionais de Educação da Rede Estadual do
Rio Grande do Sul. Dada a ampla maioria feminina optamos por nos referirmos às cursistas
no gênero feminino, como professoras.
As escolas do campo, em geral, trabalham para atender estudantes de seus territórios,
mesmo diante de tantos enfrentamentos quanto a estrutura, mobilidade e formação de
professores, e propor formação continuada é uma forma de pensar mudanças e melhorias na
educação.
Neste sentido, MELLO (2010, p. 72-73) nos diz:
Ao repensar a formação docente significa pensá-la como um continuum de formação
acadêmico-profissional. Essa formação vai se construindo constantemente nos
momentos de reflexão na e sobre a prática. O professor deve ser aquele que,
dialeticamente, reflete, sobre o que faz, como faz, por que e para quem faz,
interagindo com seus pares, construindo-se pessoal e profissionalmente.

Para atender a demanda formativa, o curso citado trouxe abordagens variadas, com
assuntos pertinentes à educação ofertada nas escolas do campo, como Políticas Públicas para
Educação do Campo, Marcos Teóricos na Educação do Campo no Brasil, Territórios e saberes
plurais frente a escolarização do campo, Teorias do Currículo e Educação do Campo,
Organização curricular e as experiências no campo brasileiro, Seriação e implicações no
ensino aprendizagem, Obras Freireanas no contexto da Educação do Campo, Pertencimento
étnico-racial, gênero e classe na Educação do Campo, Saberes tradicionais e envelhecimento
dos povos do campo, Educação inclusiva e Educação do Campo, Saberes escolares e não
escolares, Agroecologia e desenvolvimento rural, O ensino de ciências na Educação do

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Campo, A vida como laboratório do conhecimento e o conhecimento como laboratório de


vida.
A metodologia proposta, valorizou o diálogo com as cursistas, sendo avaliado como
pertinentes os temas abordados. Pode-se ouvir a voz das cursistas participantes, quanto as
diversidades de saberes escolares e não escolares, onde o olhar das professoras, atores sociais
de suas escolas e comunidades, puderam expor e compartilhar as alegrias e enfrentamentos da
vida docente. As diferentes realidades proporcionaram vivenciar as particularidade dos
contextos escolares. A diversidade de identidades dos estudantes do campo: quilombolas, sem
terra, peões de estâncias, agricultores e pecuaristas familiares proporcionaram às professoras
mementos de diálogos entre elas e com educadores da universidade.

OBJETIVOS
Contribuir com a formação de professores do campo e com a qualidade da Educação do
Campo.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Oferecer referencial para a qualificação da pratica pedagógica de professores das escolas do
campo.
Ampliar o conhecimento da prática dos professores, considerando os diferentes sujeitos do
campo e seus contextos.

METODOLOGIA
O curso foi desenvolvido de forma semipresencial com 180(cento e oitenta) horas,
sendo 120 (cento e vinte) horas presenciais com 80(oitenta) horas Tempo Universidade e 40
horas Tempo Comunidade e 60 horas a distância sendo contabilizadas pela plataforma moodle
e com duração de seis meses.
Esta formação continuada ocorreu em cinco módulos onde, cada um obteve encontros
presenciais quinzenais e atividades a distância (EaD) através do ambiente moodle, com estes
estudos se buscou contemplar e promover a reflexão das práticas docentes, motivando e
explorando de materiais e textos diferenciados, sensibilizando todos e todas a uma
aprendizagem dinâmica, interessante e acolhedora, e significativa. Para este processo de
ensino aprendizagem, foram desenvolvidas aulas expositivas e dialogadas com a utilização de
recursos como projetor multimídias e outros, além de sempre ocorrer a participação contínua
dos estudantes com seus relatos e troca de experiências.
As aulas presenciais no Tempo Universidade valorizaram o diálogo entre as
participantes que se deslocavam de diferentes municípios e regiões dentro do mesmo
município, sendo o encontro um momento de intercâmbio dessa diversidade, além de estudos
dos temas propostos proporcionados pelos professores da universidade. No Tempo
Comunidade foi proposto a construção de um mapa sócio-educativo, a partir das diferentes
visões do território aonde está inserida a comunidade escolar e suas potencialidades
educativas. Adaptando proposta de Cartografia Social (ACSELRAD, 2013), conforme
explicaremos a seguir.
Para as atividades em ambiente MOODLE foram propostos fóruns e postagens das
tarefas. Entretanto, observamos que várias cursistas relataram dificuldades em cumprir as

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tarefas em razão da dificuldade de acesso à rede, constatando que as atividades em EAD


talvez não sejam as mais adequadas para a formação em Educação do Campo.

RESULTADOS E CONCLUSÕES
Diante das descrições dos processos metodológicos que foram realizados no decorrer
do curso, destaca-se as atividades do Tempo Comunidade (TC) como um dos principais
momentos do curso. O Tempo Comunidade reforça a intencionalidade da Educação do campo,
quanto a valorização dos distintos saberes enquanto cultura e valores que acontecem também
fora da escola (ARROYO; CALDART; MOLINA, 2004) pois atividades nas escolas e
comunidade estão intrinsecamente relacionada com o mundo produtivo do conhecimento.
Essa percepção foi possível a partir dos mapas sociais, que tornou o TC real, pois com a
construção dos mapas pelos cursistas, professores e alunos das escolas foi possível
compreender as relações e percepções que se estabelecem nas comunidades frente ao processo
educativo. ACSELRAD (2013) diz que os mapas sociais são representações do espaço, feito
pelas pessoas que ocupam um território, nos quais os atores envolvidos representam a forma
como vivem e trabalham, os espaços simbólicos e afetivos.
Frente a construção dos mapas pode-se perceber o olhar de cada ator social para com
sua realidade, ou seja, o olhar do aluno e do professor. Percebeu-se diante das representações
cartográficas que o aluno traz características do seu território com riquezas de detalhes,
representando o que lhe é mais rico, frente aos meios de produção, lazer e afetividade, o que
leva a pensar o quanto lançar mão e contextualizar essa realidade no ambiente escolar pode
contribuir na produção do conhecimento. Entretanto, a representação cartográfica produzida
pelos professores traz elementos mais práticos e burocráticos quanto ao ambiente e território
escolar, sendo que na maioria das escolas o corpo docente é oriundo da zona urbana, ou seja,
deslocam-se diariamente da cidade para as escolas do campo, com isso, não sendo possível
uma visão mais familiar com o meio, trazendo dados mais sucintos quanto a comunidade da
escola, o que talvez, torne seus trabalhos menos contextualizados.
Pode-se constatar pela avaliação das professoras das escolas do campo participantes do
cursos, que a construção do mapa e a apropriação do território sócio-cultural-econômico do
contexto escolar, possibilitou às escolas uma reflexão da prática educativa e da necessidade de
melhor conhecer os diferentes olhares da comunidade aonde a escola está inserida.
Possibilitou ainda reconhecer que a escola do campo é mais do que a escola, é parte da
comunidade. No seminário de encerramento, aonde foram reunidas as duas turmas,
aconteceram relatos de que na escola a comunidade se encontra, aonde são realizadas trocas
de produtos, como feiras de economia solidária, compras de produtos da agricultura familiar e
da reforma agrária para alimentação escolar entre outras ações. Destacou-se ainda que apesar
das dificuldades de acesso, das péssimas condições das estradas, dos precários meios de
transporte, há uma luta diária dos estudantes das escolas do campo pela escola. Que mesmo
com todas as dificuldades os estudantes têm prazer de estar na escola. Nos levando a concluir
que a escola do campo é mais do que escola e tem uma função social que vai para além da
aprendizagem dos conteúdos escolares, sem destes abrir mão.
PALAVRAS CHAVE: Educação do Campo. Formação. Experiências.

REFERÊNCIAS:

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Seminário Regional de Educação do Campo da Região Centro do Rio Grande do Sul

ACSELRAD, Henri (org.) Cartografia Social, terra e território. Rio de Janeiro,


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ARROYO, M. G.; CALDART, R. S.; MOLINA, M. C. Por uma Educação do Campo.


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MELLO, E. M. B. A Política de Valorização e de Profissionalização dos Professores da


Educação Básica do Estado do Rio Grande do Sul (1995-2006): convergências e
divergências. Tese de Doutorado em Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação,
Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2010.

MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA: Agroecologia


enquanto resistência no fazer saúde do campo
Cristian Da Cruz Chiabotto
URI Santiago

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Seminário Regional de Educação do Campo da Região Centro do Rio Grande do Sul

cristianchiabotto.cristian@gmail.com

O seguinte resumo é um relato de experiência ocorrido no Assentamento Alvorada,


localizado no município de Júlio de Castilhos, Rio Grande do Sul. A vivência aconteceu
vinculada ao projeto VER-SUS (Vivências e Estágios na Realidade do Sistema Único de
Saúde), que visa possibilitar que estudantes das áreas de saúde possam ampliar as
possibilidades e debates sobre a produção e o fazer saúde nos mais diversos contextos,
culturas e territórios; compreendo as produções singulares destes no seu modo de existir a
partir das realidades locais, como é no caso do assentamento do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em questão, compreendendo a agroecologia também
como um caminho de resistência na produção hegemonicamente capitalista da alimentação,
possibilitando que a educação do e no campo sejam caminhos que enfatizem estas resistências
dos modos de existir campesino.

Diante destas perspectivas, pensar o MST enquanto um movimento socioterritorial


camponês, é também considerar os aspectos políticos que envolvem sua luta pela terra e o
viver pela resistência no campo, partindo das questões históricas que constituíram estes
movimentos campesinos, que é a desigualdade social dos países da América Latina, e o
histórico de privilégios das classes predominantes que se constituíram (principalmente no
Brasil) donos dos grandes latifúndios, que é uma das causas de êxodo da população do campo
para os centros urbanos. A questão então da dispersão destas populações para as cidades se
dão por duas vias: ou ficar no campo para se submeter à um trabalho de exploração
justamente por não conseguir acompanhar a capitalização do agronegócio, ou ir para a cidade
e abandonar a cultura campesina; e é neste sentido que surge a resistência política do MST
não só em ocupar uma terra para iniciar um processo de revolução parar reparar a
desigualdade e chegar na Reforma Agrária, mas também preservar os fazeres do campo em
seus diversos aspectos, culturais, sociais, geográficos e históricos.

Quanto aos objetivos desta experiência, partindo do projeto VER-SUS, a premissa


maior é de vivenciar o espaço do campo e em específico o assentamento MST para
compreender de que modo o movimento se organiza, explorando o viver do campo a partir da
imersão no seu território (geográfico e existencial) e compreendendo como as famílias
assentadas e membros do movimento compreendem o processo de saúde-doença e também o
cuidado em saúde, a partir das narrativas culturais do próprio campo enquanto um dispositivo
de promoção de saúde.

Neste sentido, surge a produção orgânica e a agroecologia como fazeres do campo


que são utilizados pelo MST também como resistência a hegemonia do mercado capitalista de
alimentação, mostrando que a produção das populações do campo também é um modo de
fazer e cuidar de saúde, partindo da perspectiva da agroecologia enquanto um modo de
produção livre de agrotóxicos e produtos que são prejudiciais à saúde, muitas vezes causa de

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doenças nas populações urbanas por consumirem alimentos exponencialmente modificados


geneticamente. A agroecologia então nesta perspectiva é resistência e é fazer saúde. O ato de
plantar o que se come também é uma questão educativa no campo, uma vez que neste ato se
pode pensar no cuidado à natureza (ao outro), a saúde (a si mesmo) e a troca de experiências
nos manejos necessários para que o plantio aconteça.

A metodologia utilizada na experiência foi através do estágio de imersão do projeto


VER-SUS, onde se vivencia as realidades locais (neste caso o assentamento Alvorada) por um
dia inteiro, fazendo rodas de conversas, entrevistas com as pessoas que moram no local e
também vivenciando os espaços do campo (escola, casas, plantações, reuniões do MST) para
compreender como se dá a produção de saúde a partir daquela determinada realidade.

Quanto aos resultados, pode-se pensá-los numa perspectiva qualitativa, que produz
algo em dois lugares: nos estagiários VER-SUS que vivenciaram o assentamento, e nas
famílias do assentamento MST. Quanto aos resultados produzidos nos estudantes, pode-se
ressaltar a conscientização e o conhecimento sobre a questão agrária, no seu sentido histórico
e político, despertando um novo olhar para as populações do campo e o fazer saúde além das
perspectivas teóricas e profissionais, mas no território e na produção singular de cada
população na sua relação com seus processos de saúde-doença. Na perspectiva das famílias
assentadas do movimento, propagar a luta não só no âmbito acadêmico, mas em específico
nas áreas do fazer saúde, e seguir cada vez mais resistindo no campo, uma resistência que diz
da luta pela terra, pela dignidade e preservação da cultura campesina e resistência à
hegemonia capitalista, fazendo da produção agroecológica um dispositivo que promove saúde
da população do campo de forma política e saudável.

EDUCAÇÃO AMBIENTAL APLICADA AOS RESÍDUOS SÓLIDOS NA ESCOLA


MUNICIPAL DE ENSINO FUNDAMENTAL ROSA DA SILVA BRAGA, SEBERI/RS.

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Graciela Gobbi Guterra - UFSM – graciela.guterra@gmail.com


Micheli Reis Barros- UFSM – barrosmicheli@bol.com.br
Renato Azevedo Borba- UFSM – renatoborba73@gmail.com

O presente trabalho é um relato de experiência de um projeto desenvolvido por


acadêmicos do curso de Licenciatura em Educação do Campo da Universidade Federal de
Santa Maria – UFSM. A temática deste trabalho é referente às ações de educação ambiental
aplicada aos resíduos sólidos na Escola Municipal de Ensino Fundamental Rosa da Silva
Braga, localizada no interior do município de Seberi/RS. O trabalho tratou de observar as
práticas utilizadas no ensino da educação ambiental, no referido estabelecimento de ensino, e
analisar se as práticas de ensino da educação ambiental que são aplicados aos resíduos sólidos
tem sido eficientes de maneira a proporcionar a aquisição de conhecimentos e habilidades
capazes de induzir mudanças de atitudes nos alunos, professores e no entorno escolar. Para
desenvolver o presente foi realizada uma revisão bibliográfica de modo a desenvolver
reflexões sobre conceitos específicos, que destaquem a importância das relações do ensino da
educação ambiental nas escolas do campo. Também, foi desenvolvido um estudo sobre os
Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNS e entrevistas realizadas na escola com alunos e
professores da escola em questão. Para isso, utilizou-se uma abordagem qualitativa com a
utilização do método da Pesquisa-Ação. Como técnica de coleta de dados utiliza-se
observação in lócus, entrevistas semiestruturadas, questionários e visitas para levantamento de
dados. Durante a execução do projeto, observou-se que as escolas trabalham a Educação
Ambiental através de temas transversais estipulados nos PCNs – Parâmetros Curriculares
Nacionais, porém não possuem um programa específico de educação ambiental focado nas
questões dos resíduos sólidos. Observou-se também que os PCNs são documentos de
referência para a Educação Básica e se constituem como propostas flexíveis com orientações
ao contexto escolar, bem como à prática pedagógica do professor, apresentando como função:
[...] orientar e garantir a coerência dos investimentos no sistema educacional, socializando
discussões, pesquisas e recomendações, subsidiando a participação de técnicos e professores
brasileiros, principalmente daqueles que se encontram mais isolados, com menor contato com
a produção pedagógica atual. (PCN, 2000, p.) De acordo com os Parâmetros Curriculares
Nacionais (1996) a escola é vista como espaço de formação e informação, de construção
coletiva e permanente, local privilegiado para o conhecimento por meio da educação formal e
não-formal. É inquestionável a necessidade das escolas trabalharem a temática da educação
ambiental, por meio da reflexão sobre a produção e descarte dos resíduos sólidos, ensinando
as crianças a cuidar do meio ambiente e a reaproveitar aquilo que já se utilizou e que ainda
gerará renda. Nesse sentido, a educação ambiental nas escolas do campo deve estar presente
nos objetivos e no planejamento da instituição de ensino, pois contribui para resgatar valores
diversificados fundamentais para uma visão e uma atuação abrangente. É preciso incentivar e
incorporar práticas de educação que contextualizem a realidade em termos culturais,
ambientais, sociais e econômicos, ou seja, que possuam uma visão interdisciplinar,

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contribuição para uma educação que abranja um conjunto de processos formativos já


constituídos pelos sujeitos do campo em seu processo histórico. Percebeu-se, através do
projeto proposto, que tais ações consolidam-se como conteúdo indispensável em sala de aula.
Durante a execução do projeto constatou-se que há falta de conhecimento por parte das
crianças e adolescentes no que se refere à preservação e conservação da natureza. A temática
é tratada de forma pontual, restringindo-se às informações dos livros didáticos, às datas
comemorativas e, em alguns momentos, ao plantio de hortas e separação do lixo e ainda a
atividades do Dia do Meio Ambiente, Dia da Água e Dia da Árvore, ou através de projetos,
por meio da Secretaria Municipal de Educação. Também foi elucidado que, somente de forma
esporádica, são realizados trabalhos com materiais recicláveis em salas de aula, desperdiçando
o potencial educativo, que estes desempenham na formação de consciência ambiental para a
reutilização e reciclagem, trabalhando com maquetes, objetos artísticos, brincadeiras,
reaproveitamento de embalagens, por exemplo, com intuito de ensinar aos alunos que é
possível o reaproveitamento de materiais pós-uso. Os resultados obtidos comprovam a
eficácia e a importância da temática ser refletida em ambiente escolar. Através das atividades
desenvolvidas pelo projeto os licenciados em Educação do Campo puderam vivenciar de
ações de educação ambiental aplicada aos resíduos sólidos voltados para o atendimento das
necessidades da comunidade escolar, trazendo reflexões acerca de como abordar conteúdos
importantes para a formação de cidadãos críticos e comprometidos com a preservação do
meio ambiente impactando na melhoria das condições de trabalho e na qualidade do material
que chega até o Consórcio Intermunicipal de Gestão de Resíduos Sólidos – CIGRES. Além
disso, atuou na sensibilização e conscientização da comunidade escolar, estimulando a
participação de crianças, adolescentes e professores nos processos coletivos. Sendo assim, a
iniciativa mostrou-se uma excelente ferramenta para ser trabalhada, principalmente no
ambiente escolar.

Eixo temático: Resumo expandido.

Palavras-chave: Educação Ambiental. Resíduos Sólidos. Formação de Educadores.

Referências

BRASIL. Lei no 9.795, de 27 de abril de 1999. Dispõe sobre educação ambiental, institui a
Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências. 1999. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/leis/L9795.htm>. Acesso em: 02 junho 2018.

_______. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.


Parâmetros Curriculares Nacionais: meio ambiente, saúde. Rio de Janeiro: DP&A, 2000.

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_______. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.


Parâmetros Curriculares Nacionais: introdução aos parâmetros curriculares nacionais.
Brasília: MEC/SEF, 1996.

___________. Conselho Nacional de Educação. Define as Diretrizes Curriculares Nacionais


para a formação inicial em nível superior (cursos de licenciatura, cursos de formação
pedagógica para graduados e cursos de segunda licenciatura) e para a formação continuada.
Resolução CNE/CP n. 02/2015, de 1º de julho de 2015. Brasília, Diário Oficial [da]
República Federativa do Brasil, seção 1, n. 124, p. 8-12, 02 de julho de 2015.

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