Ao caminhar pelos trabalhos de Carlos Garaicoa percebemos à primeira vista
uma clara intenção de trazer à tona discussões históricas, políticas, socioeconômicas e
também do comportamento humano. Nosso “ser urbano”, por mais que viva em centros urbanos dos mais variados, grandes ou pequenos, onde existe e se expressa em volta a milhares de outros indivíduos, também tem um mundo próprio e à parte dentro das quatro paredes de sua casa. Pensando nisso e indo além, é possível dizer que o trabalho Partitura, do artista Carlos Garaicoa, traz a essa discussão um respiro poético e universal: a música. Essa língua falada, cantada e sentida nas mais variadas formas e que sempre esteve presente na sociabilização humana, desde ritos e comunhões. Em um trabalho realizado ao longo de 10 anos, o artista foi percebendo, durante suas viagens entre diversos espaços urbanos, como Madri e Havana, a existência de uma grande orquestra musical, regida despretensiosamente pelo acaso, em uma imensidão de apresentações de artistas de rua. Garaicoa consegue, com muita sensibilidade, perceber essa conexão, nos trazendo assim de forma organizada, essa bela canção tocada a inúmeras mãos. Para acompanhar a música, Garaicoa também cria uma série de desenhos, desempenhando o papel de codificar essa manifestação musical em forma de partitura. É interessante observar que ao criar uma representação específica para cada trilha sonora, um registro único do músico/instrumento ali transcrito, ao serem unidas e expostas na tela acaba por transcender e transbordar essa superfície rígida, tornando-se uma grande dança musical que envolve cada criatura que ali a observa. Nesse momento, é possível dizer que o trabalho do artista também nos conscientiza de que somos não só cidadãos da nossa cidade, ou só do nosso país, mas sim do mundo. Com a discussão sobre representatividade tão valorizada e recorrente nos dias de hoje, pode-se também debater o “sermos muitos e sermos um”, já que vemos aqui representados uma miríade de lugares e pessoas de diferentes etnias, gêneros, culturas,
etc. eternizadas no vídeo do trabalho. Por fim, são muitas as formas do ser urbano e de como ele existe e resiste, não só em suas particularidades, mas também em comunhão.