Вы находитесь на странице: 1из 21

Por que os Por que os acadêmicos

tendem a ser de esquerda?


Publicado em fevereiro 13, 2015
Os acadêmicos – pesquisadores e professores universitários-, principalmente nas ciências humanas,
são conhecidos por tenderem a ser de esquerda. Qual a explicação para esse fenômeno?

Como toda questão politicamente sensível, essa gera respostas polarizadas.

Uma resposta, comumente formulada pela direita conservadora, é de que existe uma captura das
instituições educacionais por uma esquerda que deseja o poder acima de tudo. Uma versão influente,
que foi propagada pelos seguidores de Olavo de Carvalho, é que trata-se do “marxismo cultural”,
derrubando valores ocidentais para implantar o marxismo. Em texto do mesmo nome, Olavo explica
essa ideia:
“Desmentido pelos fatos, o marxismo iria à forra por meio da auto-inversão: em vez de transformar
a condição social para mudar as mentalidades, iria mudar as mentalidades para transformar a
condição social. (…)

Em poucas décadas, o marxismo cultural tornou-se a influência predominante nas universidades, na


mídia, no show business e nos meios editoriais do Ocidente. Seus dogmas macabros, vindo sem o
rótulo de “marxismo”, são imbecilmente aceitos como valores culturais supra-ideológicos pelas
classes empresariais e eclesiásticas cuja destruição é o seu único e incontornável objetivo.
Dificilmente se encontrará hoje um romance, um filme, uma peça de teatro, um livro didático onde
as crenças do marxismo cultural, no mais das vezes não reconhecidas como tais, não estejam
presentes com toda a virulência do seu conteúdo calunioso e perverso.

Tão vasta foi a propagação dessa influência, que por toda parte a idéia antiga de tolerância já se
converteu na “tolerância libertadora” proposta por Marcuse: “Toda a tolerância para com a
esquerda, nenhuma para com a direita”. Aí aqueles que vetam e boicotam a difusão de idéias que os
desagradam não sentem estar praticando censura: acham-se primores de tolerância democrática.

Por meio do marxismo cultural, toda a cultura transformou-se numa máquina de guerra contra si
mesma, não sobrando espaço para mais nada.” (CARVALHO, Olavo, 2002)

O grande problema dessa visão é que ela exige acreditar em uma conspiração em curso contra os
ditos valores ocidentais, cujo objetivo seja a subversão das bases da sociedade. Isso pressupõe,
primeiro, que você já acredite que os valores conservadores são os melhores para fundamentar a
ordem social, além da escassa evidência de que, mesmo se os soviéticos ou os marxistas
internacionais tivessem um plano para ‘subverter’ valores e tornar mais fácil a revolução em outros
países, que as tendências culturais mais amplas na sociedade ocidental realmente esteja sob controle
de um pequeno grupo com objetivos políticos bem definidos. Marxismo cultural é teoria da
conspiração.

Outra versão, dessa vez vinda da esquerda, é que os acadêmicos tendem a ser de esquerda porque, se
você estuda mais e realmente pesquisa a fundo, você perceberá que a esquerda tem ideias melhores
para a sociedade. Uma previsão disso também é que pessoas de esquerda tendem a ser mais
inteligentes que as pessoas da direita.
De fato, que os auto-identificados como de esquerda tendam a ser mais inteligentes que os auto-
identificados como de direita é confirmado em pesquisas realizadas nos Estados Unidos
(ressalvando-se que lá a esquerda geralmente não professa o marxismo, mas uma forma de
liberalismo social estatizante, que tende à social-democracia, tanto é que são denominados de
“liberais”), mensurando o Q.I médio de ambos os grupos.

Contudo, Steven Pinker, em seu livro “Os Anjos Bons da Nossa Natureza”, mostra que a correlação
não ocorre com qualquer ideia de esquerda, mas com aquelas ideias de esquerda que são comuns ao
liberalismo clássico:

“Em primeiro lugar, na medida em que a inteligência está relacionada com a classe social, qualquer
correlação com o liberalismo [leia-se: esquerda política dos EUA], caso não seja estatisticamente
controlada, pode simplesmente refletir os preconceitos políticos da classe média alta. Mas a
restrição decisiva é que a escada rolante da razão prevê apenas que a inteligência se relacionaria
com o liberalismo clássico, que valoriza a autonomia e o bem-estar dos indivíduos acima das
restrições de tribo, autoridade e tradição. Espera-se que a inteligência tenha relação com o
liberalismo clássico porque este é em si uma consequência da intercambialidade de perspectivas que
é inerente à razão enquanto tal. A inteligência não precisa ser correlacionada com outras ideologias
que se amontoam nas coalizões de centro-esquerda contemporâneas, como o populismo, o
socialismo, o politicamente correto, as políticas de identidade e o movimento verde. Na verdade, o
liberalismo clássico é às vezes inerente às facções libertárias e contrárias ao politicamente correto
nas atuais coalizões à direita do centro. Mas no conjunto as pesquisas de Haidt mostram que são as
pessoas que identificam suas políticas com a palavra “liberal” que mais se inclinam a enfatizar a
equidade e a autonomia, virtudes supremas do liberalismo clássico, em detrimento da comunidade,
da autoridade e da pureza. E, conforme vimos no capítulo 7, os autodenominados liberais estão nos
primeiros postos nas questões ligadas à autonomia pessoal, com as posições que eles iniciaram
décadas atrás sendo cada vez mais aceitas pelos conservadores de hoje.

(…) Entre mais de 20 mil jovens adultos que tinham participado do National Longitudinal Study of
Adolescent Health, o QI médio se elevava de modo constante, dos que se identificavam como “muito
conservadores” (94,8) para os que diziam ser “muito liberais” (106,4). A pesquisa General Social
Survey mostra uma correlação semelhante, embora contendo um acréscimo de que a inteligência
acompanha mais de perto o liberalismo clássico que o liberalismo de esquerda. Os entrevistados
mais inteligentes eram menos inclinados a concordar com a afirmação (esquerdista, mas não liberal
clássica) de que o governo tem a responsabilidade de redistribuir a renda dos ricos para os pobres,
enquanto se inclinavam mais a concordar que o governo devia ajudar os negros americanos a
compensar a discriminação histórica que sofreram (uma posição liberal que é especificamente
motivada pelo valor da equidade).” (PINKER, p. )

Portanto, o problema dessa visão é que a correlação não é com ideias de esquerda em geral, mas com
noções mais libertárias de autonomia. Outra questão é que também evidência adicional seria
requerida para sustentá-la.

Mas nós não precisamos nos restringir a essas hipóteses. Principalmente porque o mais importante é
se já temos algum teste sistemático de uma série de hipóteses formuladas em ciência social acerca
disso. Nós já o temos. Ele encontra-se no paper “Why are professors liberal?“, por Neil Gross e
Ethan Fosse.
Antes de explicar o teste produzido no paper, é preciso deixar claro aqui que o questionamento é
porque os professores universitários tendem a ser mais liberais que a população em geral, em
contraposição ao conservadorismo dentro do espectro esquerda-direita nos Estados Unidos. Essa
tendência à esquerda é bem mensurada lá.

Para dar uma perspectiva visual, apresento abaixo um gráfico do pesquisador Adam Bonica, o qual
mediu a tendência pró-esquerda (liberal) e pró-direita (conservador) de uma série de ocupações
profissionais nos Estados Unidos, por intermédio das contribuições financeiras a candidatos
específicos. No caso, o eixo horizontal mede o quão liberais ou conservadores em média são os
candidatos (conforme votos dos mesmos enquanto congressistas) aos quais esse grupo ocupacional
faz doações financeiras, e o eixo vertical mede o quão grande é a doação realizada. Veja que os
“professors” estão bem mais à esquerda do centro do que uma série de outras ocupações:

(Imagem originalmente aqui)


Dito isso, o paper de Gross e Fosse analisa uma série de hipóteses já feitas (mas nunca dantes
testadas) sobre o porquê da academia americana ter essa configuração política, sendo que há
evidências de que isso também ocorre em vários outros países.

Para ficar mais claro ao leitor como eles procederam ao teste, irei listar abaixo cada uma das
hipóteses e quais foram os resultados encontrados em relação à hipótese (confirmando-a ou não em
maior ou menor medida), para, depois, descrever a conclusão dos pesquisadores no sentido da
necessidade de uma nova hipótese para dar conta dos resultados, mas que precisa de mais testes.

Hipótese 1: As características sociodemográficas dos acadêmicos explicam sua tendência à


esquerda
Descrição: a tendência à esquerda dos acadêmicos estaria relacionada com grande proporção da
geração dos baby boomers dentro da academia, tendência a ter menos filhos que a média da
população, aumento das mulheres na academia, residência em áreas urbanas, subrepresentação do sul
dos Estados Unidos entre as origens/localizações dos acadêmicos, maior probabilidade de
nascimento no estrangeiro ou de ter morado um período no estrangeiro.
Mecanismos: a geração dos baby boomers viveu uma intensificação da tendência à esquerda dentro
da academia; ter mais filhos relaciona-se com conservadorismo na medida em que conservadores
religiosos dão maior valor a ter filhos e maiores famílias são mais caras, direcionando apoio para
menos impostos e menos descontos sobre o salário (pautas defendidas pelo Partido Republicano);
mulheres tendem a ser mais de esquerda que os homens; residentes de áreas altamente urbanas
tendem a ser mais de esquerda que os de áreas rurais ou menos urbanizadas; o Sul dos Estados
Unidos tende a ser mais conservador que as outras regiões do país; ter nascido em outro país ou ter
vivido por um período em outro país significa maior exposição a outras culturas e maior
internacionalismo.
Variáveis usadas para teste da hipótese: pertença à geração baby boomer; número de crianças que
os respondentes tinham; ser do sexo feminino; ter vivido em uma grande cidade aos 16 anos; viver ao
tempo da entrevista fora da região Sul dos Estados Unidos; ter vivido em outro país aos 16 anos; ter
nascido no estrangeiro.
Resultado do teste para a correlação entre variáveis e carreira acadêmica: Acadêmicos tendem
a ter menos filhos, são mais prováveis de ter residido em uma área urbana ou país estrangeiro
enquanto estavam crescendo, e mais prováveis de ter nascido no estrangeiro, entretanto, as mulheres
permanecem subrepresentadas na academia ao longo de todo o período e professores são muito
semelhantes aos outros americanos em termos de pertença à geração baby boomer e residência fora
da região Sul dos Estados Unidos.
Resultado do teste para o quanto as variáveis explicam a tendência à esquerda entre aqueles na
carreira acadêmica: ajustando para outros fatores, os únicos fatores sociodemográficos que dão
conta de mais que 1% da diferença política entre acadêmicos e não acadêmicos são o número de
crianças e viver em uma área urbana aos 16 anos. Juntos esses dois explicam 5,6% da diferença.
Contudo, se for especificado o número de mulheres com formação para além da pós-graduação (o
que é distinto do número de mulheres na academia, e combina esta variável com a variável de
realização educacional da hipótese 2), isso explica 10,5% da diferença, o que significa que quase
todas as mulheres na academia tendem mais à esquerda que homens com credenciais educacionais
equivalentes.
Hipótese 2: Altos níveis de realização educacional entre acadêmicos explicam sua tendência à
esquerda
Descrição: Quanto mais anos de educação as pessoas têm, mais confortáveis elas tendem a ser com
diversidade social, mais tolerantes com dissidência política, menos tradicionais em seu pensamento e
orientação para ação, mais tendentes a serem céticas em relação à religião e mais coerentes e
delimitadas em suas visões de mundo. Acadêmicos tendem a ter mais anos de educação que as
demais pessoas.
Mecanismo: socialização na cultura iluminista institucionalizada nas escolas; ganhos cognitivos
(cognitive upgrading); exposição à cultura dos pares e a estudantes de diversas formações e
origens; processos de diferenciação de classe pelos quais estudantes de classe média-média e média-
alta simbolicamente abraçam tolerância para distanciar-se a si mesmos da cultura putativamente
autoritária da classe trabalhadora; alguma evidência para a experiência da educação superior como
politicamente e socialmente transformadora (alargamento de horizontes) para alguns estudantes e em
alguns tipos de escolarização.
Variáveis usadas para teste da hipótese: grau em que a formação dos respondentes vai além da
graduação.
Resultado do teste para a correlação entre variáveis e carreira acadêmica: Acadêmicos são 12
vezes mais prováveis que não-acadêmicos de terem formação para além da graduação.
Resultado do teste para o quanto as variáveis explicam a tendência à esquerda entre aqueles na
carreira acadêmica: ajustando para outros fatores, maior realização educacional entre acadêmicos
explica 19,8% da diferença política entre acadêmicos e não acadêmicos.
Hipótese 3: Mais altos níveis de intelectualismo entre os acadêmicos explicam sua tendência à
esquerda
Descrição: Os intelectuais, caracterizados por terem mentes criativas, críticas e contemplativas, são
frequentemente críticos sociais, especialmente dentro das humanidades, recorrendo a concepções
gerais do desejável que muitas vezes conflitam com as práticas institucionais e políticas
prevalecentes. O intelectualismo está relacionado com a tendência à esquerda.
Mecanismo: Hierarquias de status na academia criam grandes grupos de acadêmicos perpetuamente
frustrados que canalizam ressentimento e alienação na crítica social; o ceticismo organizado dentro
da estrutura normativa da ciência; concentração maior de intelectuais geograficamente e socialmente
intensificando sentimento político. (Na prática, a hipótese costuma ser apresentada de modo a
identificar tautologicamente intelectualismo com convicções de esquerda, o que é criticado por Gross
e Fosse)
Variáveis usadas para teste da hipótese: pontuação em uma escala de um teste de habilidade
verbal (vocabulário); pontuação em escala padronizada medindo a tolerância à expressão de ideias
controversas (especialmente aquelas que seriam controversas mesmo para um viés de esquerda).
Resultado do teste para a correlação entre variáveis e carreira acadêmica: Acadêmicos possuem
habilidade verbal acima da média e exibem mais altos níveis de tolerância à expressão de ideias
controversas.
Resultado do teste para o quanto as variáveis explicam a tendência à esquerda entre aqueles na
carreira acadêmica: ajustando para outros fatores, maior habilidade verbal não explica nada, mas o
maior nível de tolerância explica 10,3% da diferença política entre acadêmicos e não acadêmicos.
Contudo, se for combinado maior habilidade verbal com formação para além da graduação (variável
da hipótese 2), isso explica 59,4% da diferença, e, se for combinado maior tolerância com maior
realização educacional, isso explica 19% da diferença.
Hipótese 4: As características religiosas dos acadêmicos explicam sua tendência à esquerda
Descrição: A academia é composta por mais judeus, protestantes não conservadores e céticos do que
a média da população. Estes grupos tendem mais à esquerda que outros grupos religiosos.
Mecanismo: A politização do protestantismo conservador, mais forte entre as comunidades de classe
média baixa e de classe trabalhadora, envolve um maior conservadorismo político, e essas crenças
religiosas limitam escolhas ocupacionais e aspirações educacionais vistas como perigosas à fé, de
modo que estão sub-representados entre os acadêmicos; judeus são sobre-representados entre os
acadêmicos, e mais prováveis que os não-judeus de serem de esquerda; ceticismo em relação à
religião é mais comum entre acadêmicos.
Variáveis usadas para teste da hipótese: identificação dos respondentes como judeus, sem
afiliação religiosa, ou membros de denominações protestantes não teologicamente conservadoras.
Resultado do teste para a correlação entre variáveis e carreira acadêmica: Judeus e pessoas sem
afiliação religiosa estão sobre-representados na academia, enquanto protestantes conservadores estão
sub-representados.
Resultado do teste para o quanto as variáveis explicam a tendência à esquerda entre aqueles na
carreira acadêmica: ajustando para outros fatores, as três variáveis juntas explicam 14,7% da
diferença política entre acadêmicos e não acadêmicos, sendo a ausência de afiliação religiosa a
variável mais significativa. Acadêmicos sem afiliação religiosa ou protestantes não teologicamente
conservadores com formação para além da gradução (variável da hipótese 2) tendem mais à esquerda
que membros de outras religiões com equivalente realização educacional.
Hipótese 5: As posições de classe dos acadêmicos explicam sua tendência à esquerda
Descrição: Na concepção mais influente, intelectuais são definidos estruturalmente pela posse de
altos níveis de capital cultural e níveis moderados de capital econômico (Bordieu). Essa característica
determina uma tendência à esquerda. Outras concepções: maior dependência econômica aos gastos
governamentais com educação, serviços sociais, artes, etc.; acadêmicos não são auto-empregados;
maior sindicalização entre os acadêmicos.
Mecanismos: na concepção mais influente, privados de sucesso econômico em relação àqueles no
mundo empresarial, intelectuais são menos prováveis de desejar a preservação da ordem
socioeconômica e mais dispostos à redistribuição e podem abraçar visões políticas ou sociais não
convencionais para distinguirem-se culturalmente das classes empresariais, mas sob a limitação de
que seu sucesso material depende de manter o domínio da alta cultura que as elites usam para
legitimar sua dominância; campos nos quais acadêmicos tendem a vir de posições de classes menos
elevadas (como ciência social, humanidades e ciência natural) tendem mais à esquerda que aqueles
nos quais o contrário é verdadeiro (Direito, medicina, administração de empresas); acadêmicos
aspirantes que percebem sua mobilidade bloqueada tendem ao radicalismo; outras
concepções: interesse econômico direto em maior gasto governamental defendido pela esquerda; o
auto-emprego induz a maior apoio à transmissão intergeracional do capital e menores impostos;
sindicatos tem maior afinidade com visões à esquerda.
Variáveis usadas para teste da hipótese: medida de inconsistência de status, primeiro
padronizando anos de educação e renda familiar constante e criando uma variável que seja a soma de
ambos (medindo o total nível de capital econômico e cultural), e, segundo, criando uma medida que
reflete a diferença entre educação padronizada e renda padronizada (medindo a disparidade da renda
em relação ao nível de educação); medida da realização educacional parental; variável indicando se
respondentes “dificilmente teriam” confiança nas empresas grandes dos Estados Unidos (medindo
grau de diferenciação das classes empresariais); grau em que respondentes são empregados públicos,
auto-empregados e membros de sindicatos.
Resultado do teste para a correlação entre variáveis e carreira acadêmica: Acadêmicos tendem
a vir de famílias melhor educadas e exibem maior disparidade entre seus níveis de educação e sua
renda, são muito mais prováveis de estarem empregados no setor público, muito menos prováveis de
serem auto-empregados, e em algum grau mais prováveis de pertencer a sindicatos, mas não são mais
prováveis de faltar confiança nas grandes empresas.
Resultado do teste para o quanto as variáveis explicam a tendência à esquerda entre aqueles na
carreira acadêmica: ajustando para outros fatores, a variável de inconsistência de status explica
13% da diferença política entre acadêmicos e não acadêmicos, mas as demais variáveis juntas
explicam apenas uma pequena proporção.
Hipótese 6: Intelectualismo à parte, os “valores de emprego” distintivos dos acadêmicos
influenciam suas convicções políticas, explicando sua tendência à esquerda
Descrição: Estudantes que colocam valor mais alto em fazer um trabalho significativo do que em
ganhar tanto dinheiro quanto possível optam mais pela carreira acadêmica.
Mecanismo: As pessoas que colocam mais alto valor em ganhar tanto dinheiro quanto possível ao
invés de em fazer um trabalho significativo, e optam pelo meio empresarial, tendem a ser mais
conservadoras, o que diminui a representação do conservadorismo na academia.
Variáveis usadas para teste da hipótese: resposta à pergunta se “trabalho significativo” é a mais
importante coisa em um emprego, relativamente ao potencial de renda, grau de segurança no
emprego, ou boas oportunidades de promoção.
Resultado do teste para a correlação entre variáveis e carreira acadêmica: enquanto 80% dos
acadêmicos reportam que trabalho significativo está entre as mais importantes qualidades que eles
procuram em um emprego, aproximadamente 60% dos não-acadêmicos pensam o mesmo.
Resultado do teste para o quanto as variáveis explicam a tendência à esquerda entre aqueles na
carreira acadêmica: tudo o mais igual, preferência por um trabalho significativo aumenta a
diferença política entre acadêmicos e não acadêmicos, mas, ajustando para outros fatores, não a
explicam.
Conclusões de Neil Gross e Ethan Fosse:
Quanto à existência de uma tendência à esquerda entre os acadêmicos:confirmaram o que
muitos estudos já haviam mostrado antes, especificamente em sua amostra os resultados
apresentavam que a diferença em auto-identificação política entre acadêmicos e não acadêmicos era
1,5 vezes aquela entre negros e brancos, cerca de duas vezes maior que aquela entre os 10% mais
ricos e 10% mais pobres medida pela renda familiar constante, e mais que sete vezes maior que
aquela entre homens e mulheres. Entre uma lista de 136 ocupações, para o período 1974-2008, estão
juntos com a categoria “escritores e jornalistas” como sendo as ocupações de maior proporção de
auto-identificados como de esquerda (liberais) e, no período 2000-2008, chega a ser sozinha a de
maior proporção.
Quanto à divergência no grau de tendência à esquerda entre questões sociais e questões
econômicas: estudos anteriores já haviam encontrado que acadêmicos são mais robustamente
tendentes à esquerda nas questões sociais do que nas questões econômicas, e eles confirmaram isso
também em sua amostra, contudo, o resultado achado (nenhuma diferença entre acadêmicos e não
acadêmicos em tendência à esquerda nas questões econômicas) deve ser interpretado com cautela,
dado alguns dados faltantes no estudo longitudinal utilizado (e em face de outros estudos que
detectam uma diferença, mesmo que menor do que daquela para questões sociais).
Quanto às variáveis que melhor explicam a diferença política entre acadêmicos e não
acadêmicos: Acadêmicos são mais de esquerda que não acadêmicos porque uma maior proporção
deles possuem credenciais educacionais avançadas (para além da graduação), exibem uma
disparidade entre seus níveis de educação e renda, identificam-se como judeus, não religiosos ou
protestantes não teologicamente conservadores, e expressam maior tolerância para ideias
controversas.
Quanto à confirmação ou não das hipóteses revisadas: apesar das variáveis acima serem
relevantes para explicar a diferença política, as hipóteses revisadas não o são, porque 1) a associação
das variáveis com a diferença política pode ser direcionada por diferentes mecanismos causais, e as
hipóteses não especificam bem processos causais pertinentes; 2) pelo menos uma das hipóteses que
recebeu apoio empírico – a do intelectualismo – têm problemas conceituais, não sendo claro o que
exatamente esse apoio implica; 3) desde que mais de uma (não todas) hipóteses receberam apoio
parcial, e foram descobertas algumas intrigantes interações com credenciais educacionais para além
da graduação, surge a indagação sobre como todas as hipóteses, e os mecanismos causais subjacentes
às mesmas, devem ser pensadas juntas, e nenhuma delas nos ajuda a responder isso; 4) quanto à auto-
identificação política (excetuando o que diz respeito às atitudes sociais), os modelos utilizados
deixam ainda uma porção significativa da diferença política inexplicada.
Quanto à sugestão de uma nova hipótese a partir dos dados encontrados: eles propõem uma
hipótese pela qual a tendência dos acadêmicos americanos à esquerda é uma função de um
sistemático “crivo” (sorting) entre jovens adultos que já são inclinados à esquerda para dentro da
academia e jovens adultos que já são inclinados à direita para fora da academia, respectivamente. O
“crivo” funcionaria por meio de um processo de aspiração ocupacional e educacional que é
direcionado pela reputação política de certas profissões, mediada por meio de representações
culturais tais como “estereótipos vocacionais” ou “imagens ocupacionais”. A aquisição de uma
reputação política pela profissão acadêmica é uma questão histórica complexa que se desenvolveu ao
longo do século XX.
Por outro lado, pessoas jovens formam suas aspirações educacionais e ocupacionais a partir de uma
exposição cultural a um arranjo abrangente de modelos ocupacionais, mas suas circunstâncias sociais
limitam o número de opções que consideram seriamente para si mesmos. Entre as pessoas jovens
com identidades políticas mais salientes, seu liberalismo (esquerdismo)
ou conservadorismo (direitismo) limitam os horizontes de possibilidade ocupacional e educacional,
tornando incogitável ou mais difícil de cogitar entrar em certos ramos. A filtragem realizada pelo
crivo depende, portanto, de uma auto-seleção.
O crivo funciona junto com outras variáveis que moldam aspirações como status socioeconômico
familiar, raça e gênero, é sensível a variações intergeracionais na proporção de pessoas jovens
politizadas, e provavelmente tem uma aplicabilidade restrita a certas profissões (nem todas detém
uma reputação política).

A hipótese pode ser estendida para dar conta da variação política entre disciplinas e instituições de
ensino, uma vez que estas constroem identidades coletivas e reputações organizacionais não
simplesmente ao redor de imperativos intelectuais e organizacionais, mas também ao redor de
modelos culturais que incluem imagens idealizadas da personalidade intelectual, ou seja, noções
acerca das qualidades e características que fazem de alguém um ótimo acadêmico naquela área
específica. Isso significa que campos cujas imagens de personalidade intelectual sejam mais
inclinadas a incorporar aspectos tendentes à esquerda atrairão mais estudantes inclinados à esquerda,
como no exemplo da sociologia, que veio a ser muito definida como estudo de desigualdades de
classe, raça e gênero. E como instituições de elite buscam atrair aqueles acadêmicos que melhor
incorporem essas imagens idealizadas, terão um corpo docente mais tendente à esquerda.

Quanto à evidência para a hipótese proposta: os dados de seu estudo não fornecem evidência
direta, sendo necessários testes adicionais, mas já existe apoio advindo de evidência produzida em
outros testes. Um estudo encontrou que duas vezes mais estudantes de esquerda do que estudantes de
direita aspiram a completar o doutorado; estudantes conservadores em uma grande universidade
pública, entrevistados, manifestaram não buscar imitar o corpo docente; em estudo sobre a
religiosidade de cientistas acadêmicos em universidades de elite, foi detectado que os altos níveis de
ceticismo religioso não advém da socialização profissional, mas da maior tendência dos céticos
religiosos em tornarem-se cientistas; em uma análise de dados públicos, foi encontrado que
conservadorismo, adesão ao Partido Republicano e identidade evangélica são associados com menor
confiança na educação superior e diminuídas avaliações do prestígio ocupacional dos acadêmicos;
em entrevistas com 66 acadêmicos americanos em seis disciplinas, 81% dos que se identificavam
como de esquerda reportam que suas visões políticas foram formadas enquanto estavam crescendo
ou na universidade, bem antes que interesses de classe associados com o trabalho acadêmico futuro
pudessem plausivelmente exercer alguma influência.
Uma vez descrito esses interessantes resultados, uma coisa me chamou atenção: eles podem ajudar a
testar a hipótese avançada por Julian Sanchez em seu artigo “Why Do Intellectuals Favor
Government Solutions?” (tradução em português aqui), o qual tentou responder o questionamento
trazido por Robert Nozick em seu clássico artigo “Why Do Intellectuals Oppose Capitalism?”. Por
que os setores mais altamente educados e inteligentes das populações ocidentais não acatam uma
visão mais favorável em relação às economias de mercado livre, ao invés favorecendo intervenções
governamentais?
Sanchez discorda do que Nozick sugere que poderia estar por trás disso – os critérios dentro da
academia do que seria melhor (baseados principalmente em alta inteligência verbal) contrastam com
o fato que aqueles com resultados acadêmicos e intelectuais inferiores recebem maiores recompensas
materiais na distribuição de renda produzida por economias de mercado, o que assemelha-se às
noções que enfatizam a disparidade entre educação e renda -, e propõe uma hipótese bem semelhante
àquela de Gross e Fosse: as pessoas que já são mais favoráveis às soluções governamentais para
problemas sociais e econômicos tendem a optar mais pela carreira acadêmica.

O mecanismo proposto por Sanchez, entretanto, é diferente. Transcrevo:

Se as melhores soluções para os problemas sociais são geralmente governamentais ou políticas,


então em uma sociedade democrática, fazer o trabalho de um intelectual bom com as palavras é uma
maneira de contribuir essencialmente para a abordagem daqueles problemas. Se as melhores
soluções são geralmente privadas, então isso é verdadeiro em uma medida muito menor: as
maneiras mais importantes de se cumprir um dever cívico, nesse caso, são mais prováveis de
englobar formas mais diretas de participação, como doar dinheiro, voluntariado, trabalhar com
inovações tecnológicas ou médicas que melhorem a qualidade de vida, e vários tipos de atividade
empresarial socialmente consciente.

Você deve, portanto, esperar um natural efeito de seleção: Aqueles que se sentem de forma decisiva
moralmente motivados a contribuir para a diminuição dos males sociais naturalmente gravitarão em
direção a carreiras que reflitam sua visão sobre como isso é mais bem alcançado. A escolha de uma
carreira como um intelectual bom com as palavras pode, em si mesmo, ser o resultado de uma
crença prévia de que problemas sociais são mais bem abordados por meio de mecanismos que são
mais dependentes de argumento, persuasão e advocacia pública – isto é, mecanismos políticos.

Entretanto, parece igualmente possível que um desejo post hoc de justificar a escolha de tal carreira
possa ter um papel enviesador. Uma pessoa sem gostos materiais extravagantes pode viver de forma
bastante confortável como um acadêmico ou escritor, e o trabalho por si só é muito interessante e
intrinsecamente atraente. Mas empregos intelectuais desse tipo tendem a não deixar alguém com
recursos para devotar grandes quantias de dinheiro para causas beneficentes sem reduzir
significativamente o consumo de pequenos luxos: comer fora, shows, eletrônicos, viagens de férias,
cursos para crianças, etc.
Se o mundo é principalmente melhorado por meio da iniciativa privada, então o percurso mais
correto moralmente disponível para uma pessoa altamente inteligente de gostos materiais
moderados seria seguir uma carreira bem menos interessante por si mesma em negócios ou
finanças, viver um estilo de vida de classe média, e devotar sua riqueza para várias causas boas.
Nesse cenário, no final das contas, o intelectual que pudesse contribuir com milhões para caridade
tal como um financista ou um advogado de alto nível, mas que preferisse ter sua remuneração na
forma de tempo de leitura e de trabalho interessante, não é, obviamente, melhor do ponto de vista
moral que o advogado ou financista real que usa sua remuneração monetária para comprar
prazeres materiais. Ambos estão negando sacrificar satisfação pessoal em prol de ajudar aos outros
– apenas um tem escolhido uma forma de remuneração que não é facilmente tributada e
redistribuída. Se esforços privados são ineficazes ou relativamente desimportantes em comparação
com ação política, entretanto, o intelectual pode ter certeza que ele está satisfazendo suas
obrigações morais ao pagar impostos e escrever persuasivamente em apoio aos remédios políticos
apropriados. (Tradução em língua portuguesa)
Alguns poderiam objetar que Fosse e Gross forneceram evidência que vai contra esse mecanismo: o
mecanismo subjacente não é a maximização de uma preferência politicamente informada, pela qual
pessoas com tendência à esquerda e à direita procurariam características específicas do ambiente de
trabalho que refletissem seus visões de mundo e ideologias políticas, uma vez que não foi encontrada
evidência que uma preferência por trabalho significativo (ou priorização de mais alta renda, em
contraste) explicassem a diferença política entre acadêmicos e não acadêmicos, e, como já referido, a
formação de aspirações educacionais e ocupacionais por pessoas jovens é limitada por circunstâncias
sociais que diminuem o número de opções que elas consideram seriamente para si mesmas. Portanto,
não a teoria da escolha racional, mas a psicologia social da identidade, é que dirige o processo.

Mas deve-se observar que a evidência encontrada não necessariamente desconfirma a hipótese de
Sanchez.

Primeiro, porque o que conta como “trabalho significativo” pode ter diferentes significados para
acadêmicos e não acadêmicos; ambos valorizam isso em proporções parecidas, contudo, o que conta
como “trabalho significativo” pode diferir na maneira proposta por Sanchez.

Segundo, a hipótese de Sanchez é menos geral que a de Fosse e Gross: enquanto estes avaliam a
tendência à esquerda em geral (cujo principal efeito é fornecido pela tendência à esquerda nas
questões sociais) entre acadêmicos em geral, aquele avalia a tendência à esquerda exclusivamente em
questões econômicas, e foca sob um subconjunto dos acadêmicos, que seriam os “intelectuais”,
dentro dos campos das humanidades e das ciências sociais. Esses últimos campos poderiam ser
optados mais por aqueles que favorecem soluções governamentais porque, pelas características
intrínsecas a essas áreas, há mais espaço para discutir, criticar e propor formas de mudar a sociedade,
conforme Sanchez, e o modelo de personalidade intelectual nesses campos envolveria exatamente o
aprofundamento nesse tipo de argumentação e crítica, conforme Fosse e Gross.

Logo, penso que a hipótese de que pessoas já tendentes a alinharem-se com a esquerda optem mais
pela carreira acadêmica, pelos motivos acima discutidos relacionadas à reputação ocupacional e
representações culturais do que seria um acadêmico modelo, seja a real razão pela qual os
acadêmicos sejam mais tendentes à esquerda.

acadêmicos tendem a ser de esquerda?


Publicado em fevereiro 13, 2015
Os acadêmicos – pesquisadores e professores universitários-, principalmente nas ciências humanas,
são conhecidos por tenderem a ser de esquerda. Qual a explicação para esse fenômeno?

Como toda questão politicamente sensível, essa gera respostas polarizadas.

Uma resposta, comumente formulada pela direita conservadora, é de que existe uma captura das
instituições educacionais por uma esquerda que deseja o poder acima de tudo. Uma versão influente,
que foi propagada pelos seguidores de Olavo de Carvalho, é que trata-se do “marxismo cultural”,
derrubando valores ocidentais para implantar o marxismo. Em texto do mesmo nome, Olavo explica
essa ideia:
“Desmentido pelos fatos, o marxismo iria à forra por meio da auto-inversão: em vez de transformar
a condição social para mudar as mentalidades, iria mudar as mentalidades para transformar a
condição social. (…)
Em poucas décadas, o marxismo cultural tornou-se a influência predominante nas universidades, na
mídia, no show business e nos meios editoriais do Ocidente. Seus dogmas macabros, vindo sem o
rótulo de “marxismo”, são imbecilmente aceitos como valores culturais supra-ideológicos pelas
classes empresariais e eclesiásticas cuja destruição é o seu único e incontornável objetivo.
Dificilmente se encontrará hoje um romance, um filme, uma peça de teatro, um livro didático onde
as crenças do marxismo cultural, no mais das vezes não reconhecidas como tais, não estejam
presentes com toda a virulência do seu conteúdo calunioso e perverso.

Tão vasta foi a propagação dessa influência, que por toda parte a idéia antiga de tolerância já se
converteu na “tolerância libertadora” proposta por Marcuse: “Toda a tolerância para com a
esquerda, nenhuma para com a direita”. Aí aqueles que vetam e boicotam a difusão de idéias que os
desagradam não sentem estar praticando censura: acham-se primores de tolerância democrática.

Por meio do marxismo cultural, toda a cultura transformou-se numa máquina de guerra contra si
mesma, não sobrando espaço para mais nada.” (CARVALHO, Olavo, 2002)

O grande problema dessa visão é que ela exige acreditar em uma conspiração em curso contra os
ditos valores ocidentais, cujo objetivo seja a subversão das bases da sociedade. Isso pressupõe,
primeiro, que você já acredite que os valores conservadores são os melhores para fundamentar a
ordem social, além da escassa evidência de que, mesmo se os soviéticos ou os marxistas
internacionais tivessem um plano para ‘subverter’ valores e tornar mais fácil a revolução em outros
países, que as tendências culturais mais amplas na sociedade ocidental realmente esteja sob controle
de um pequeno grupo com objetivos políticos bem definidos. Marxismo cultural é teoria da
conspiração.

Outra versão, dessa vez vinda da esquerda, é que os acadêmicos tendem a ser de esquerda porque, se
você estuda mais e realmente pesquisa a fundo, você perceberá que a esquerda tem ideias melhores
para a sociedade. Uma previsão disso também é que pessoas de esquerda tendem a ser mais
inteligentes que as pessoas da direita.

De fato, que os auto-identificados como de esquerda tendam a ser mais inteligentes que os auto-
identificados como de direita é confirmado em pesquisas realizadas nos Estados Unidos
(ressalvando-se que lá a esquerda geralmente não professa o marxismo, mas uma forma de
liberalismo social estatizante, que tende à social-democracia, tanto é que são denominados de
“liberais”), mensurando o Q.I médio de ambos os grupos.

Contudo, Steven Pinker, em seu livro “Os Anjos Bons da Nossa Natureza”, mostra que a correlação
não ocorre com qualquer ideia de esquerda, mas com aquelas ideias de esquerda que são comuns ao
liberalismo clássico:

“Em primeiro lugar, na medida em que a inteligência está relacionada com a classe social, qualquer
correlação com o liberalismo [leia-se: esquerda política dos EUA], caso não seja estatisticamente
controlada, pode simplesmente refletir os preconceitos políticos da classe média alta. Mas a
restrição decisiva é que a escada rolante da razão prevê apenas que a inteligência se relacionaria
com o liberalismo clássico, que valoriza a autonomia e o bem-estar dos indivíduos acima das
restrições de tribo, autoridade e tradição. Espera-se que a inteligência tenha relação com o
liberalismo clássico porque este é em si uma consequência da intercambialidade de perspectivas que
é inerente à razão enquanto tal. A inteligência não precisa ser correlacionada com outras ideologias
que se amontoam nas coalizões de centro-esquerda contemporâneas, como o populismo, o
socialismo, o politicamente correto, as políticas de identidade e o movimento verde. Na verdade, o
liberalismo clássico é às vezes inerente às facções libertárias e contrárias ao politicamente correto
nas atuais coalizões à direita do centro. Mas no conjunto as pesquisas de Haidt mostram que são as
pessoas que identificam suas políticas com a palavra “liberal” que mais se inclinam a enfatizar a
equidade e a autonomia, virtudes supremas do liberalismo clássico, em detrimento da comunidade,
da autoridade e da pureza. E, conforme vimos no capítulo 7, os autodenominados liberais estão nos
primeiros postos nas questões ligadas à autonomia pessoal, com as posições que eles iniciaram
décadas atrás sendo cada vez mais aceitas pelos conservadores de hoje.

(…) Entre mais de 20 mil jovens adultos que tinham participado do National Longitudinal Study of
Adolescent Health, o QI médio se elevava de modo constante, dos que se identificavam como “muito
conservadores” (94,8) para os que diziam ser “muito liberais” (106,4). A pesquisa General Social
Survey mostra uma correlação semelhante, embora contendo um acréscimo de que a inteligência
acompanha mais de perto o liberalismo clássico que o liberalismo de esquerda. Os entrevistados
mais inteligentes eram menos inclinados a concordar com a afirmação (esquerdista, mas não liberal
clássica) de que o governo tem a responsabilidade de redistribuir a renda dos ricos para os pobres,
enquanto se inclinavam mais a concordar que o governo devia ajudar os negros americanos a
compensar a discriminação histórica que sofreram (uma posição liberal que é especificamente
motivada pelo valor da equidade).” (PINKER, p. )

Portanto, o problema dessa visão é que a correlação não é com ideias de esquerda em geral, mas com
noções mais libertárias de autonomia. Outra questão é que também evidência adicional seria
requerida para sustentá-la.

Mas nós não precisamos nos restringir a essas hipóteses. Principalmente porque o mais importante é
se já temos algum teste sistemático de uma série de hipóteses formuladas em ciência social acerca
disso. Nós já o temos. Ele encontra-se no paper “Why are professors liberal?“, por Neil Gross e
Ethan Fosse.
Antes de explicar o teste produzido no paper, é preciso deixar claro aqui que o questionamento é
porque os professores universitários tendem a ser mais liberais que a população em geral, em
contraposição ao conservadorismo dentro do espectro esquerda-direita nos Estados Unidos. Essa
tendência à esquerda é bem mensurada lá.

Para dar uma perspectiva visual, apresento abaixo um gráfico do pesquisador Adam Bonica, o qual
mediu a tendência pró-esquerda (liberal) e pró-direita (conservador) de uma série de ocupações
profissionais nos Estados Unidos, por intermédio das contribuições financeiras a candidatos
específicos. No caso, o eixo horizontal mede o quão liberais ou conservadores em média são os
candidatos (conforme votos dos mesmos enquanto congressistas) aos quais esse grupo ocupacional
faz doações financeiras, e o eixo vertical mede o quão grande é a doação realizada. Veja que os
“professors” estão bem mais à esquerda do centro do que uma série de outras ocupações:
(Imagem originalmente aqui)
Dito isso, o paper de Gross e Fosse analisa uma série de hipóteses já feitas (mas nunca dantes
testadas) sobre o porquê da academia americana ter essa configuração política, sendo que há
evidências de que isso também ocorre em vários outros países.

Para ficar mais claro ao leitor como eles procederam ao teste, irei listar abaixo cada uma das
hipóteses e quais foram os resultados encontrados em relação à hipótese (confirmando-a ou não em
maior ou menor medida), para, depois, descrever a conclusão dos pesquisadores no sentido da
necessidade de uma nova hipótese para dar conta dos resultados, mas que precisa de mais testes.

Hipótese 1: As características sociodemográficas dos acadêmicos explicam sua tendência à


esquerda
Descrição: a tendência à esquerda dos acadêmicos estaria relacionada com grande proporção da
geração dos baby boomers dentro da academia, tendência a ter menos filhos que a média da
população, aumento das mulheres na academia, residência em áreas urbanas, subrepresentação do sul
dos Estados Unidos entre as origens/localizações dos acadêmicos, maior probabilidade de
nascimento no estrangeiro ou de ter morado um período no estrangeiro.
Mecanismos: a geração dos baby boomers viveu uma intensificação da tendência à esquerda dentro
da academia; ter mais filhos relaciona-se com conservadorismo na medida em que conservadores
religiosos dão maior valor a ter filhos e maiores famílias são mais caras, direcionando apoio para
menos impostos e menos descontos sobre o salário (pautas defendidas pelo Partido Republicano);
mulheres tendem a ser mais de esquerda que os homens; residentes de áreas altamente urbanas
tendem a ser mais de esquerda que os de áreas rurais ou menos urbanizadas; o Sul dos Estados
Unidos tende a ser mais conservador que as outras regiões do país; ter nascido em outro país ou ter
vivido por um período em outro país significa maior exposição a outras culturas e maior
internacionalismo.
Variáveis usadas para teste da hipótese: pertença à geração baby boomer; número de crianças que
os respondentes tinham; ser do sexo feminino; ter vivido em uma grande cidade aos 16 anos; viver ao
tempo da entrevista fora da região Sul dos Estados Unidos; ter vivido em outro país aos 16 anos; ter
nascido no estrangeiro.
Resultado do teste para a correlação entre variáveis e carreira acadêmica: Acadêmicos tendem
a ter menos filhos, são mais prováveis de ter residido em uma área urbana ou país estrangeiro
enquanto estavam crescendo, e mais prováveis de ter nascido no estrangeiro, entretanto, as mulheres
permanecem subrepresentadas na academia ao longo de todo o período e professores são muito
semelhantes aos outros americanos em termos de pertença à geração baby boomer e residência fora
da região Sul dos Estados Unidos.
Resultado do teste para o quanto as variáveis explicam a tendência à esquerda entre aqueles na
carreira acadêmica: ajustando para outros fatores, os únicos fatores sociodemográficos que dão
conta de mais que 1% da diferença política entre acadêmicos e não acadêmicos são o número de
crianças e viver em uma área urbana aos 16 anos. Juntos esses dois explicam 5,6% da diferença.
Contudo, se for especificado o número de mulheres com formação para além da pós-graduação (o
que é distinto do número de mulheres na academia, e combina esta variável com a variável de
realização educacional da hipótese 2), isso explica 10,5% da diferença, o que significa que quase
todas as mulheres na academia tendem mais à esquerda que homens com credenciais educacionais
equivalentes.
Hipótese 2: Altos níveis de realização educacional entre acadêmicos explicam sua tendência à
esquerda
Descrição: Quanto mais anos de educação as pessoas têm, mais confortáveis elas tendem a ser com
diversidade social, mais tolerantes com dissidência política, menos tradicionais em seu pensamento e
orientação para ação, mais tendentes a serem céticas em relação à religião e mais coerentes e
delimitadas em suas visões de mundo. Acadêmicos tendem a ter mais anos de educação que as
demais pessoas.
Mecanismo: socialização na cultura iluminista institucionalizada nas escolas; ganhos cognitivos
(cognitive upgrading); exposição à cultura dos pares e a estudantes de diversas formações e
origens; processos de diferenciação de classe pelos quais estudantes de classe média-média e média-
alta simbolicamente abraçam tolerância para distanciar-se a si mesmos da cultura putativamente
autoritária da classe trabalhadora; alguma evidência para a experiência da educação superior como
politicamente e socialmente transformadora (alargamento de horizontes) para alguns estudantes e em
alguns tipos de escolarização.
Variáveis usadas para teste da hipótese: grau em que a formação dos respondentes vai além da
graduação.
Resultado do teste para a correlação entre variáveis e carreira acadêmica: Acadêmicos são 12
vezes mais prováveis que não-acadêmicos de terem formação para além da graduação.
Resultado do teste para o quanto as variáveis explicam a tendência à esquerda entre aqueles na
carreira acadêmica: ajustando para outros fatores, maior realização educacional entre acadêmicos
explica 19,8% da diferença política entre acadêmicos e não acadêmicos.
Hipótese 3: Mais altos níveis de intelectualismo entre os acadêmicos explicam sua tendência à
esquerda
Descrição: Os intelectuais, caracterizados por terem mentes criativas, críticas e contemplativas, são
frequentemente críticos sociais, especialmente dentro das humanidades, recorrendo a concepções
gerais do desejável que muitas vezes conflitam com as práticas institucionais e políticas
prevalecentes. O intelectualismo está relacionado com a tendência à esquerda.
Mecanismo: Hierarquias de status na academia criam grandes grupos de acadêmicos perpetuamente
frustrados que canalizam ressentimento e alienação na crítica social; o ceticismo organizado dentro
da estrutura normativa da ciência; concentração maior de intelectuais geograficamente e socialmente
intensificando sentimento político. (Na prática, a hipótese costuma ser apresentada de modo a
identificar tautologicamente intelectualismo com convicções de esquerda, o que é criticado por Gross
e Fosse)
Variáveis usadas para teste da hipótese: pontuação em uma escala de um teste de habilidade
verbal (vocabulário); pontuação em escala padronizada medindo a tolerância à expressão de ideias
controversas (especialmente aquelas que seriam controversas mesmo para um viés de esquerda).
Resultado do teste para a correlação entre variáveis e carreira acadêmica: Acadêmicos possuem
habilidade verbal acima da média e exibem mais altos níveis de tolerância à expressão de ideias
controversas.
Resultado do teste para o quanto as variáveis explicam a tendência à esquerda entre aqueles na
carreira acadêmica: ajustando para outros fatores, maior habilidade verbal não explica nada, mas o
maior nível de tolerância explica 10,3% da diferença política entre acadêmicos e não acadêmicos.
Contudo, se for combinado maior habilidade verbal com formação para além da graduação (variável
da hipótese 2), isso explica 59,4% da diferença, e, se for combinado maior tolerância com maior
realização educacional, isso explica 19% da diferença.
Hipótese 4: As características religiosas dos acadêmicos explicam sua tendência à esquerda
Descrição: A academia é composta por mais judeus, protestantes não conservadores e céticos do que
a média da população. Estes grupos tendem mais à esquerda que outros grupos religiosos.
Mecanismo: A politização do protestantismo conservador, mais forte entre as comunidades de classe
média baixa e de classe trabalhadora, envolve um maior conservadorismo político, e essas crenças
religiosas limitam escolhas ocupacionais e aspirações educacionais vistas como perigosas à fé, de
modo que estão sub-representados entre os acadêmicos; judeus são sobre-representados entre os
acadêmicos, e mais prováveis que os não-judeus de serem de esquerda; ceticismo em relação à
religião é mais comum entre acadêmicos.
Variáveis usadas para teste da hipótese: identificação dos respondentes como judeus, sem
afiliação religiosa, ou membros de denominações protestantes não teologicamente conservadoras.
Resultado do teste para a correlação entre variáveis e carreira acadêmica: Judeus e pessoas sem
afiliação religiosa estão sobre-representados na academia, enquanto protestantes conservadores estão
sub-representados.
Resultado do teste para o quanto as variáveis explicam a tendência à esquerda entre aqueles na
carreira acadêmica: ajustando para outros fatores, as três variáveis juntas explicam 14,7% da
diferença política entre acadêmicos e não acadêmicos, sendo a ausência de afiliação religiosa a
variável mais significativa. Acadêmicos sem afiliação religiosa ou protestantes não teologicamente
conservadores com formação para além da gradução (variável da hipótese 2) tendem mais à esquerda
que membros de outras religiões com equivalente realização educacional.
Hipótese 5: As posições de classe dos acadêmicos explicam sua tendência à esquerda
Descrição: Na concepção mais influente, intelectuais são definidos estruturalmente pela posse de
altos níveis de capital cultural e níveis moderados de capital econômico (Bordieu). Essa característica
determina uma tendência à esquerda. Outras concepções: maior dependência econômica aos gastos
governamentais com educação, serviços sociais, artes, etc.; acadêmicos não são auto-empregados;
maior sindicalização entre os acadêmicos.
Mecanismos: na concepção mais influente, privados de sucesso econômico em relação àqueles no
mundo empresarial, intelectuais são menos prováveis de desejar a preservação da ordem
socioeconômica e mais dispostos à redistribuição e podem abraçar visões políticas ou sociais não
convencionais para distinguirem-se culturalmente das classes empresariais, mas sob a limitação de
que seu sucesso material depende de manter o domínio da alta cultura que as elites usam para
legitimar sua dominância; campos nos quais acadêmicos tendem a vir de posições de classes menos
elevadas (como ciência social, humanidades e ciência natural) tendem mais à esquerda que aqueles
nos quais o contrário é verdadeiro (Direito, medicina, administração de empresas); acadêmicos
aspirantes que percebem sua mobilidade bloqueada tendem ao radicalismo; outras
concepções: interesse econômico direto em maior gasto governamental defendido pela esquerda; o
auto-emprego induz a maior apoio à transmissão intergeracional do capital e menores impostos;
sindicatos tem maior afinidade com visões à esquerda.
Variáveis usadas para teste da hipótese: medida de inconsistência de status, primeiro
padronizando anos de educação e renda familiar constante e criando uma variável que seja a soma de
ambos (medindo o total nível de capital econômico e cultural), e, segundo, criando uma medida que
reflete a diferença entre educação padronizada e renda padronizada (medindo a disparidade da renda
em relação ao nível de educação); medida da realização educacional parental; variável indicando se
respondentes “dificilmente teriam” confiança nas empresas grandes dos Estados Unidos (medindo
grau de diferenciação das classes empresariais); grau em que respondentes são empregados públicos,
auto-empregados e membros de sindicatos.
Resultado do teste para a correlação entre variáveis e carreira acadêmica: Acadêmicos tendem
a vir de famílias melhor educadas e exibem maior disparidade entre seus níveis de educação e sua
renda, são muito mais prováveis de estarem empregados no setor público, muito menos prováveis de
serem auto-empregados, e em algum grau mais prováveis de pertencer a sindicatos, mas não são mais
prováveis de faltar confiança nas grandes empresas.
Resultado do teste para o quanto as variáveis explicam a tendência à esquerda entre aqueles na
carreira acadêmica: ajustando para outros fatores, a variável de inconsistência de status explica
13% da diferença política entre acadêmicos e não acadêmicos, mas as demais variáveis juntas
explicam apenas uma pequena proporção.
Hipótese 6: Intelectualismo à parte, os “valores de emprego” distintivos dos acadêmicos
influenciam suas convicções políticas, explicando sua tendência à esquerda
Descrição: Estudantes que colocam valor mais alto em fazer um trabalho significativo do que em
ganhar tanto dinheiro quanto possível optam mais pela carreira acadêmica.
Mecanismo: As pessoas que colocam mais alto valor em ganhar tanto dinheiro quanto possível ao
invés de em fazer um trabalho significativo, e optam pelo meio empresarial, tendem a ser mais
conservadoras, o que diminui a representação do conservadorismo na academia.
Variáveis usadas para teste da hipótese: resposta à pergunta se “trabalho significativo” é a mais
importante coisa em um emprego, relativamente ao potencial de renda, grau de segurança no
emprego, ou boas oportunidades de promoção.
Resultado do teste para a correlação entre variáveis e carreira acadêmica: enquanto 80% dos
acadêmicos reportam que trabalho significativo está entre as mais importantes qualidades que eles
procuram em um emprego, aproximadamente 60% dos não-acadêmicos pensam o mesmo.
Resultado do teste para o quanto as variáveis explicam a tendência à esquerda entre aqueles na
carreira acadêmica: tudo o mais igual, preferência por um trabalho significativo aumenta a
diferença política entre acadêmicos e não acadêmicos, mas, ajustando para outros fatores, não a
explicam.
Conclusões de Neil Gross e Ethan Fosse:
Quanto à existência de uma tendência à esquerda entre os acadêmicos:confirmaram o que
muitos estudos já haviam mostrado antes, especificamente em sua amostra os resultados
apresentavam que a diferença em auto-identificação política entre acadêmicos e não acadêmicos era
1,5 vezes aquela entre negros e brancos, cerca de duas vezes maior que aquela entre os 10% mais
ricos e 10% mais pobres medida pela renda familiar constante, e mais que sete vezes maior que
aquela entre homens e mulheres. Entre uma lista de 136 ocupações, para o período 1974-2008, estão
juntos com a categoria “escritores e jornalistas” como sendo as ocupações de maior proporção de
auto-identificados como de esquerda (liberais) e, no período 2000-2008, chega a ser sozinha a de
maior proporção.
Quanto à divergência no grau de tendência à esquerda entre questões sociais e questões
econômicas: estudos anteriores já haviam encontrado que acadêmicos são mais robustamente
tendentes à esquerda nas questões sociais do que nas questões econômicas, e eles confirmaram isso
também em sua amostra, contudo, o resultado achado (nenhuma diferença entre acadêmicos e não
acadêmicos em tendência à esquerda nas questões econômicas) deve ser interpretado com cautela,
dado alguns dados faltantes no estudo longitudinal utilizado (e em face de outros estudos que
detectam uma diferença, mesmo que menor do que daquela para questões sociais).
Quanto às variáveis que melhor explicam a diferença política entre acadêmicos e não
acadêmicos: Acadêmicos são mais de esquerda que não acadêmicos porque uma maior proporção
deles possuem credenciais educacionais avançadas (para além da graduação), exibem uma
disparidade entre seus níveis de educação e renda, identificam-se como judeus, não religiosos ou
protestantes não teologicamente conservadores, e expressam maior tolerância para ideias
controversas.
Quanto à confirmação ou não das hipóteses revisadas: apesar das variáveis acima serem
relevantes para explicar a diferença política, as hipóteses revisadas não o são, porque 1) a associação
das variáveis com a diferença política pode ser direcionada por diferentes mecanismos causais, e as
hipóteses não especificam bem processos causais pertinentes; 2) pelo menos uma das hipóteses que
recebeu apoio empírico – a do intelectualismo – têm problemas conceituais, não sendo claro o que
exatamente esse apoio implica; 3) desde que mais de uma (não todas) hipóteses receberam apoio
parcial, e foram descobertas algumas intrigantes interações com credenciais educacionais para além
da graduação, surge a indagação sobre como todas as hipóteses, e os mecanismos causais subjacentes
às mesmas, devem ser pensadas juntas, e nenhuma delas nos ajuda a responder isso; 4) quanto à auto-
identificação política (excetuando o que diz respeito às atitudes sociais), os modelos utilizados
deixam ainda uma porção significativa da diferença política inexplicada.
Quanto à sugestão de uma nova hipótese a partir dos dados encontrados: eles propõem uma
hipótese pela qual a tendência dos acadêmicos americanos à esquerda é uma função de um
sistemático “crivo” (sorting) entre jovens adultos que já são inclinados à esquerda para dentro da
academia e jovens adultos que já são inclinados à direita para fora da academia, respectivamente. O
“crivo” funcionaria por meio de um processo de aspiração ocupacional e educacional que é
direcionado pela reputação política de certas profissões, mediada por meio de representações
culturais tais como “estereótipos vocacionais” ou “imagens ocupacionais”. A aquisição de uma
reputação política pela profissão acadêmica é uma questão histórica complexa que se desenvolveu ao
longo do século XX.
Por outro lado, pessoas jovens formam suas aspirações educacionais e ocupacionais a partir de uma
exposição cultural a um arranjo abrangente de modelos ocupacionais, mas suas circunstâncias sociais
limitam o número de opções que consideram seriamente para si mesmos. Entre as pessoas jovens
com identidades políticas mais salientes, seu liberalismo (esquerdismo)
ou conservadorismo (direitismo) limitam os horizontes de possibilidade ocupacional e educacional,
tornando incogitável ou mais difícil de cogitar entrar em certos ramos. A filtragem realizada pelo
crivo depende, portanto, de uma auto-seleção.
O crivo funciona junto com outras variáveis que moldam aspirações como status socioeconômico
familiar, raça e gênero, é sensível a variações intergeracionais na proporção de pessoas jovens
politizadas, e provavelmente tem uma aplicabilidade restrita a certas profissões (nem todas detém
uma reputação política).

A hipótese pode ser estendida para dar conta da variação política entre disciplinas e instituições de
ensino, uma vez que estas constroem identidades coletivas e reputações organizacionais não
simplesmente ao redor de imperativos intelectuais e organizacionais, mas também ao redor de
modelos culturais que incluem imagens idealizadas da personalidade intelectual, ou seja, noções
acerca das qualidades e características que fazem de alguém um ótimo acadêmico naquela área
específica. Isso significa que campos cujas imagens de personalidade intelectual sejam mais
inclinadas a incorporar aspectos tendentes à esquerda atrairão mais estudantes inclinados à esquerda,
como no exemplo da sociologia, que veio a ser muito definida como estudo de desigualdades de
classe, raça e gênero. E como instituições de elite buscam atrair aqueles acadêmicos que melhor
incorporem essas imagens idealizadas, terão um corpo docente mais tendente à esquerda.

Quanto à evidência para a hipótese proposta: os dados de seu estudo não fornecem evidência
direta, sendo necessários testes adicionais, mas já existe apoio advindo de evidência produzida em
outros testes. Um estudo encontrou que duas vezes mais estudantes de esquerda do que estudantes de
direita aspiram a completar o doutorado; estudantes conservadores em uma grande universidade
pública, entrevistados, manifestaram não buscar imitar o corpo docente; em estudo sobre a
religiosidade de cientistas acadêmicos em universidades de elite, foi detectado que os altos níveis de
ceticismo religioso não advém da socialização profissional, mas da maior tendência dos céticos
religiosos em tornarem-se cientistas; em uma análise de dados públicos, foi encontrado que
conservadorismo, adesão ao Partido Republicano e identidade evangélica são associados com menor
confiança na educação superior e diminuídas avaliações do prestígio ocupacional dos acadêmicos;
em entrevistas com 66 acadêmicos americanos em seis disciplinas, 81% dos que se identificavam
como de esquerda reportam que suas visões políticas foram formadas enquanto estavam crescendo
ou na universidade, bem antes que interesses de classe associados com o trabalho acadêmico futuro
pudessem plausivelmente exercer alguma influência.
Uma vez descrito esses interessantes resultados, uma coisa me chamou atenção: eles podem ajudar a
testar a hipótese avançada por Julian Sanchez em seu artigo “Why Do Intellectuals Favor
Government Solutions?” (tradução em português aqui), o qual tentou responder o questionamento
trazido por Robert Nozick em seu clássico artigo “Why Do Intellectuals Oppose Capitalism?”. Por
que os setores mais altamente educados e inteligentes das populações ocidentais não acatam uma
visão mais favorável em relação às economias de mercado livre, ao invés favorecendo intervenções
governamentais?
Sanchez discorda do que Nozick sugere que poderia estar por trás disso – os critérios dentro da
academia do que seria melhor (baseados principalmente em alta inteligência verbal) contrastam com
o fato que aqueles com resultados acadêmicos e intelectuais inferiores recebem maiores recompensas
materiais na distribuição de renda produzida por economias de mercado, o que assemelha-se às
noções que enfatizam a disparidade entre educação e renda -, e propõe uma hipótese bem semelhante
àquela de Gross e Fosse: as pessoas que já são mais favoráveis às soluções governamentais para
problemas sociais e econômicos tendem a optar mais pela carreira acadêmica.
O mecanismo proposto por Sanchez, entretanto, é diferente. Transcrevo:

Se as melhores soluções para os problemas sociais são geralmente governamentais ou políticas,


então em uma sociedade democrática, fazer o trabalho de um intelectual bom com as palavras é uma
maneira de contribuir essencialmente para a abordagem daqueles problemas. Se as melhores
soluções são geralmente privadas, então isso é verdadeiro em uma medida muito menor: as
maneiras mais importantes de se cumprir um dever cívico, nesse caso, são mais prováveis de
englobar formas mais diretas de participação, como doar dinheiro, voluntariado, trabalhar com
inovações tecnológicas ou médicas que melhorem a qualidade de vida, e vários tipos de atividade
empresarial socialmente consciente.

Você deve, portanto, esperar um natural efeito de seleção: Aqueles que se sentem de forma decisiva
moralmente motivados a contribuir para a diminuição dos males sociais naturalmente gravitarão em
direção a carreiras que reflitam sua visão sobre como isso é mais bem alcançado. A escolha de uma
carreira como um intelectual bom com as palavras pode, em si mesmo, ser o resultado de uma
crença prévia de que problemas sociais são mais bem abordados por meio de mecanismos que são
mais dependentes de argumento, persuasão e advocacia pública – isto é, mecanismos políticos.

Entretanto, parece igualmente possível que um desejo post hoc de justificar a escolha de tal carreira
possa ter um papel enviesador. Uma pessoa sem gostos materiais extravagantes pode viver de forma
bastante confortável como um acadêmico ou escritor, e o trabalho por si só é muito interessante e
intrinsecamente atraente. Mas empregos intelectuais desse tipo tendem a não deixar alguém com
recursos para devotar grandes quantias de dinheiro para causas beneficentes sem reduzir
significativamente o consumo de pequenos luxos: comer fora, shows, eletrônicos, viagens de férias,
cursos para crianças, etc.
Se o mundo é principalmente melhorado por meio da iniciativa privada, então o percurso mais
correto moralmente disponível para uma pessoa altamente inteligente de gostos materiais
moderados seria seguir uma carreira bem menos interessante por si mesma em negócios ou
finanças, viver um estilo de vida de classe média, e devotar sua riqueza para várias causas boas.
Nesse cenário, no final das contas, o intelectual que pudesse contribuir com milhões para caridade
tal como um financista ou um advogado de alto nível, mas que preferisse ter sua remuneração na
forma de tempo de leitura e de trabalho interessante, não é, obviamente, melhor do ponto de vista
moral que o advogado ou financista real que usa sua remuneração monetária para comprar
prazeres materiais. Ambos estão negando sacrificar satisfação pessoal em prol de ajudar aos outros
– apenas um tem escolhido uma forma de remuneração que não é facilmente tributada e
redistribuída. Se esforços privados são ineficazes ou relativamente desimportantes em comparação
com ação política, entretanto, o intelectual pode ter certeza que ele está satisfazendo suas
obrigações morais ao pagar impostos e escrever persuasivamente em apoio aos remédios políticos
apropriados. (Tradução em língua portuguesa)
Alguns poderiam objetar que Fosse e Gross forneceram evidência que vai contra esse mecanismo: o
mecanismo subjacente não é a maximização de uma preferência politicamente informada, pela qual
pessoas com tendência à esquerda e à direita procurariam características específicas do ambiente de
trabalho que refletissem seus visões de mundo e ideologias políticas, uma vez que não foi encontrada
evidência que uma preferência por trabalho significativo (ou priorização de mais alta renda, em
contraste) explicassem a diferença política entre acadêmicos e não acadêmicos, e, como já referido, a
formação de aspirações educacionais e ocupacionais por pessoas jovens é limitada por circunstâncias
sociais que diminuem o número de opções que elas consideram seriamente para si mesmas. Portanto,
não a teoria da escolha racional, mas a psicologia social da identidade, é que dirige o processo.

Mas deve-se observar que a evidência encontrada não necessariamente desconfirma a hipótese de
Sanchez.
Primeiro, porque o que conta como “trabalho significativo” pode ter diferentes significados para
acadêmicos e não acadêmicos; ambos valorizam isso em proporções parecidas, contudo, o que conta
como “trabalho significativo” pode diferir na maneira proposta por Sanchez.

Segundo, a hipótese de Sanchez é menos geral que a de Fosse e Gross: enquanto estes avaliam a
tendência à esquerda em geral (cujo principal efeito é fornecido pela tendência à esquerda nas
questões sociais) entre acadêmicos em geral, aquele avalia a tendência à esquerda exclusivamente em
questões econômicas, e foca sob um subconjunto dos acadêmicos, que seriam os “intelectuais”,
dentro dos campos das humanidades e das ciências sociais. Esses últimos campos poderiam ser
optados mais por aqueles que favorecem soluções governamentais porque, pelas características
intrínsecas a essas áreas, há mais espaço para discutir, criticar e propor formas de mudar a sociedade,
conforme Sanchez, e o modelo de personalidade intelectual nesses campos envolveria exatamente o
aprofundamento nesse tipo de argumentação e crítica, conforme Fosse e Gross.

Logo, penso que a hipótese de que pessoas já tendentes a alinharem-se com a esquerda optem mais
pela carreira acadêmica, pelos motivos acima discutidos relacionadas à reputação ocupacional e
representações culturais do que seria um acadêmico modelo, seja a real razão pela qual os
acadêmicos sejam mais tendentes à esquerda.
Por que os intelectuais odeiam
o capitalismo?
por Jesus Huerta de Soto. Artigo publicado originalmente no site do Instituto Mises
Brasil. Para ler o artigo original, clique aqui.

Por que os intelectuais sistematicamente odeiam o capitalismo? Foi essa pergunta que
Bertrand de Jouvenel (1903-1987) fez a si próprio em seu artigo Os intelectuais
europeus e o capitalismo.

Esta postura, na realidade, sempre foi uma constante ao longo da história. Desde
a Grécia antiga, os intelectuais mais distintos — começando por Sócrates, passando por
Platão e incluindo o próprio Aristóteles — viam com receio e desconfiança tudo o que
envolvia atividades mercantis, empresariais, artesanais ou comerciais.

E, atualmente, não tenham nenhuma dúvida: desde atores e atrizes de cinema e


televisão extremamente bem remunerados até intelectuais e escritores de renome
mundial, que colocam seu labor criativo em obras literárias — todos são completamente
contrários à economia de mercado e ao capitalismo. Eles são contra o processo
espontâneo e de interações voluntárias que ocorre de mercado. Eles querem controlar o
resultado destas interações. Eles são socialistas. Eles são de esquerda. Por que é
assim?

Vocês, futuros empreendedores, têm de entender isso e já irem se


acostumando. Amanhã, quando estiverem no mercado, gerenciando suas próprias
empresas, vocês sentirão uma incompreensão diária e contínua, um genuíno desprezo
dirigido a vocês por toda a chamada intelligentsia, a elite intelectual, aquele grupo de
intelectuais que formam uma vanguarda. Todos estarão contra vocês.

“Por que razão eles agem assim?”, perguntou-se Bertrand de Jouvenel, que em seguida
pôs-se a escrever um artigo explicando as razões pelas quais os intelectuais — no geral e
salvo poucas e honrosas exceções — são sempre contrários ao processo de cooperação
social que ocorre no mercado.

Eis as três razões básicas fornecidas por de Jouvenel.

Primeira, o desconhecimento. Mais especificamente, o desconhecimento teórico de


como funcionam os processos de mercado. Como bem explicou Hayek, a ordem social
empreendedorial é a mais complexa que existe no universo. Qualquer pessoa que queira
entender minimamente como funciona o processo de mercado deve se dedicar a várias
horas de leituras diárias, e mesmo assim, do ponto de vista analítico, conseguirá
entender apenas uma ínfima parte das leis que realmente governam os processos de
interação espontânea que ocorrem no mercado. Este trabalho deliberado de análise
para se compreender como funciona o processo espontâneo de mercado — o qual só a
teoria econômica pode proporcionar — desgraçadamente está completamente ausente
da rotina da maior parte dos intelectuais.
Intelectuais normalmente são egocêntricos e tendem a se dar muito importância; eles
genuinamente creem que são estudiosos profundos dos assuntos sociais. Porém, a
maioria é profundamente ignorante em relação a tudo o que diz respeito à ciência
econômica.

A segunda razão, a soberba. Mais especificamente, a soberba do falso racionalista. O


intelectual genuinamente acredita que é mais culto e que sabe muito mais do que o resto
de seus concidadãos, seja porque fez vários cursos universitários ou porque se vê como
uma pessoa refinada que leu muitos livros ou porque participa de muitas conferências
ou porque já recebeu alguns prêmios. Em suma, ele se crê uma pessoa mais inteligente
e muito mais preparada do que o restante da humanidade. Por agirem assim, tendem a
cair no pecado fatal da arrogância ou da soberba com muita facilidade.

Chegam, inclusive, ao ponto de pensar que sabem mais do que nós mesmos sobre o que
devemos fazer e como devemos agir. Creem genuinamente que estão legitimados a
decidir o que temos de fazer. Riem dos cidadãos de ideias mais simplórias e mais
práticas. É uma ofensa à sua fina sensibilidade assistir à televisão. Abominam anúncios
comerciais. De alguma forma se escandalizam com a falta de cultura (na concepção
deles) de toda a população. E, de seus pedestais, se colocam a pontificar e a criticar tudo
o que fazemos porque se creem moral e intelectualmente acima de tudo e todos.

E, no entanto, como dito, eles sabem muito pouco sobre o mundo real. E isso é um
perigo. Por trás de cada intelectual há um ditador em potencial. Qualquer descuido da
sociedade e tais pessoas cairão na tentação de se arrogarem a si próprias plenos poderes
políticos para impor a toda a população seus peculiares pontos de vista, os quais eles, os
intelectuais, consideram ser os melhores, os mais refinados e os mais cultos.

É justamente por causa desta ignorância, desta arrogância fatal de pensar que sabem
mais do que nós todos, que são mais cultos e refinados, que não devemos estranhar o
fato de que, por trás de cada grande ditador da história, por trás de cada Hitler e Stalin,
sempre houve um corte de intelectuais aduladores que se apressaram e se esforçaram
para lhes conferir base e legitimidade do ponto de vista ideológico, cultural e filosófico.

E a terceira e extremamente importante razão, o ressentimento e a inveja. O


intelectual é geralmente uma pessoa profundamente ressentida. O intelectual se
encontra em uma situação de mercado muito incômoda: na maior parte das
circunstâncias, ele percebe que o valor de mercado que ele gera ao processo produtivo
da economia é bastante pequeno. Apenas pense nisso: você estudou durante vários
anos, passou vários maus bocados, teve de fazer o grande sacrifício de emigrar para
Paris, passou boa parte da sua vida pintando quadros aos quais poucas pessoas dão
valor e ainda menos pessoas se dispõem a comprá-los. Você se torna um ressentido. Há
algo de muito podre na sociedade capitalista quando as pessoas não valorizam como
deve os seus esforços, os seus belos quadros, os seus profundos poemas, os seus
refinados artigos e seus geniais romances.

Mesmo aqueles intelectuais que conseguem obter sucesso e prestígio no mercado


capitalista nunca estão satisfeitos com o que lhes pagam. O raciocínio é sempre o
mesmo: “Levando em conta tudo o que faço como intelectual, sobretudo levando em
conta toda a miséria moral que me rodeia, meu trabalho e meu esforço não são
devidamente reconhecidos e remunerados. Não posso aceitar, como intelectual de
prestígio que sou, que um ignorante, um parvo, um inculto empresário ganhe 10 ou 100
vezes mais do que eu simplesmente por estar vendendo qualquer coisa absurda, como
carne bovina, sapatos ou barbeadores em um mercado voltado para satisfazer os desejos
artificiais das massas incultas.”

“Essa é uma sociedade injusta”, prossegue o intelectual. “A nós intelectuais não é pago o
que valemos, ao passo que qualquer ignóbil que se dedica a produzir algo demandado
pelas massas incultas ganha 100 ou 200 vezes mais do que eu”. Ressentimento e inveja.

Segundo Bertrand de Jouvenel,

O mundo dos negócios é, para o intelectual, um mundo de valores falsos, de


motivações vis, de recompensas injustas e mal direcionadas . . . para ele, o prejuízo é
resultado natural da dedicação a algo superior, algo que deve ser feito, ao passo que o
lucro representa apenas uma submissão às opiniões das massas.

[…]

Enquanto o homem de negócios tem de dizer que “O cliente sempre tem razão”,
nenhum intelectual aceita este modo de pensar.
E prossegue de Jouvenel:

Dentre todos os bens que são vendidos em busca do lucro, quantos podemos definir
resolutamente como sendo prejudiciais? Por acaso não são muito mais numerosas as
ideias prejudiciais que nós, intelectuais, defendemos e avançamos?
Conclusão

Somos humanos, meus caros. Se ao ressentimento e à inveja acrescentamos a soberba e


a ignorância, não há por que estranhar que a corte de homens e mulheres do cinema, da
televisão, da literatura e das universidades — considerando as possíveis exceções —
sempre atue de maneira cega, obtusa e tendenciosa em relação ao processo
empreendedorial de mercado, que seja profundamente anticapitalista e sempre se
apresente como porta-voz do socialismo, do controle do modo de vida da população e da
redistribuição de renda.

Вам также может понравиться