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NOSSA AMÉRICA:
INDOA/vIÉRICA
OLIVEIROS S. FERREIRA

No quadro da produção editorial brasilei-


ra voltada para os problemas da América
Latina, esta obra ocupará posição ímpar,
visto que preocupada mais com os aspec-
tos gerais da problemática do que com si-
tuações episódicas, ainda que relevantes.
Desde o início, embora buscando compreen-
der a ação e o pensamento de VfcTox RAÚL
HAYA DE LA TORRE, ela foi construída para
dar ao leitor uma visão coerente dos pro-
blemas subjacentes à permanente crise em
que vive mergulhada a Indoamérica: o pro-
blema da raça (a oposição do branco ao NOSSA AMÉRICA: INDOAMÉRICA
índio, do espanhol reinol ao crioulo ameri-
cano, e do ianque ao latino); o problema
da oposição das oligarquias locais ao Esta-
do, que procura afirmar sua unidade e
exercer suas funções, e a oposição entre a
economia retardatária e a expansão inexo-
rável do capital. E somados a todos êsses
problemas, o da expansão dos Estados Uni-
dos, primeiramente na América do Norte,
depois nas Antilhas e, finalmente, na Amé-

rica do Sul, dando origem a todos os movi-
mentos antiimperialistas de sentido demo-
crático e popular que floresceram nos anos
20 a 50.
Os leitores encontrarão, também, uma
longa análise teórica do problema da Ordem
e da Revolução. Nela, o AUTOR - doutor
em Ciências Sociais pela Universidade de
São Paulo e jornalista militante — pro-
cura estabelecer a nítida diferença entre a
atitude conservadora (a dos que defendem
a Ordem), a atitude reacionária (a dos que
formam no partido da ordem) e a dos revo-
lucionários. Por motivos de natureza expo-
sitiva, ele dá maior ênfase aos conserva-
dores e aos revolucionários, tornando como
exemplo latino-americano do conservantis-
mo HAYA DE LA TORRE, que buscou conci-
liar a Ordem e a Revolução, numa atitude
que o levou finalmente ao imobilismo. O
pensamento revolucionário é analisado em
JEAN-JACQUES ROUSSEAU, MARX e Taersxx.
O valor da contribuição de OLIVEIROS S.
FERREIRA é ressaltado pela cooperação da
EDITÓRA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. A
obra interessa não só aos estudiosos dos
problemas da América Latina, mas, tam-
bém, aos estudantes de Ciências Sociais e
a todos aqueles que se desejam situar dian-
te dos graves problemas do Continente.
Obra publicada
com a colaboração da

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

REITOR: PROF. DR. MIGUEL REALE

EDITÔRA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO



COMISSÃO EDITORIAL:

Presidente - Prof. Dr. Mário Guimarães Ferri


(Instituto de Biociências). Membros: Prof. Dr.
A. Brito da Cunha (Instituto de Biociências),
Prof. Dr. Carlos da Silva Lacaz (Instituto de
Ciências Biomédicas), Prof. Dr. Irineu Strenger
(Faculdade de Direito) e Prof. Dr. Pérsio de
Souza Santos (Escola Politécnica).
~À=/ s
rt /05/1 '2,5
BIBLIOTECA PIONEIRA DE Cif:NCIAS SOCIAIS OLIVEIROS S. FERREIRA
POLíTICA

Conselho Diretor:
PRoF. JoÃo DE ScANTIMBURGO

PRo F. OLIVEIROS S. FERREIRA


PROF. PAULO EDMUR DE SouzA QuEIROZ
NOSSA AMÉRICA: INDOAMÉRICA
A ORDEM E A REVOLUÇÃO
no pensamento de
Haya de Ia Torre

LIVRARIA PIONEIRA EDITORA


EDITORA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
SAO PAULO
,
Indice
Prólogo, 9

PRIMEIRA PARTE

INDOAMERICA: NOSSA AMÉRICA

1. Da Unidade à Desunião
A Sociedade e o Estado, 16. A fragmentação do Espaço, 22. O triunfo
Capa de dos localismos, 27.
MÁRIO T ABARIM
2. O Problema da 11
Comunicabilidade"

A natureza da "comunicabilidade", 36. A ideologia e a realidade, 40.

3. A "Legenda da Inferioridade Natural"


Os primódios da "legenda,, 48. O início da reação crioula, 56. Os dois
sentidos da Independência, 65. A teoria e a prática da Independência,
71. Os percalços da Independência, 79.

4. A América e o Capital
O "ethos" aristocrático e espírito capitalista, 88. As condições teóricas
da autonomia, 96. A regressão do capital, 107.

5. Nossa América e o Imperialismo


A superioridade dos inferiores, 115. O complexo expansionista, 120.
1971 O triunfo da oligarquia, 128.

TocWs os direitos reser1Jados por


SEGUNDA PARTE
ENIO MATHEUS GUAZZELLI & CIA. LTDA.
Rua 15 de Novembro, 228- 4.0 andar, sala 412
A REVOLUÇÃO E A ORDEM
Telefone: 33-5421 - São Paulo
Prólogo, 141
Impresso no Brasil
Prlnte4 in Brazi~
1. A Ordem e o 11
Partido da Ordem"
A visão estrutural e a visão política, 144. As distinções essenciais, 149.
2. A Ordem e a Revolução-
A racionalidade da história, 157. A referência da ação, 162. O problema
da vontade, 171.

3. O Problema do 14 Salto"
O 14 salto" em Rousseau, 181. A contradição do século XIX, 186. A
revolução de 1905, 198. A síntese de Trotsky, 209.

TERCEIRA PARTE
PRO LOGO
O INDOAMERICANO

Prólogo, 217

1. O Revolucionárjo da Ordem Que é Indoamérica? Geogràficamente, o território que se estende


González Prada e a Reforma, 235. O lo-ngo exílio, 244. O .sôpre cósmic~ do Rio Bravo a Magalhães; elnicamente, u'a mescla de tipos huma-
pedido aos mo-rtos, 248. Nossa América e os Estados Umdos, 253. Ate nos que ao longo dos quatro séculos de sua história não conseguiram
o golpe de 1962, 259.
alcançar a harmonia que resulta da fusão; politicamente, sociedades
que traduzem, na instabilidade que as domina desde o descobrimento,
2. Aprismo e Marxismo
a procura de uma forma de organização capaz de perntitir a incorpo-
Hegel contra Marx, 265. Lenin contra a l~ternacional, 272. ~.visão ração de populações sempre crescentes aos valôres que a civilização
aprista do marxismo, 275. O índio: tipo e m1to, 279. O grupo d1r1gente
do processo, 284. ocidental - que nela não teve berço, nem encontrou seu ~entro de
difusão - inova continuadamente e oferece como o ideal de progresso
material e humano a atingir; socialmente, uma região em que a pre-
sénça do indio e do negro - o grande exército industrial de reserva
do capitalismo crioulo - acomoda-se mal às fortunas que a oligar-
quia acumulou, permitindo o progresso das cidades, que fecundam a
planície ou o altiplano na afirmação da vontade incoercível do homem
de chegar aos céus; juridicamente, 20 Estados soberanos, abalados por
revoluções, pronunciamentos, golpes de Estado, regimes castrenses
- outras tantas formas de expressar a necessidade de adaptação das
estruturas sociais e políticas à racionalidade interna da economia de
mercado, e outras tantas maneiras de tentar afirmar uma liberdade
e uma individualidade, sobretudo uma nnidade com que Bolívar já
sonhara, mas que as ambições do caudilhismo e o contubémio da
oligarquia com o capitalismo situaram muito longe no tempo pela
divisão territorial e pelos obstáculos que colocam, dia a dia, no cami-
nho do reconhecimento de que, apesar de diversa, a América é uma.
É vocação democrática que se manifesta nos "comuneros" de antes
das guerras da Independência, mas também vocação exclusivista mo-
vida pelo "zêlo da raça" de que fala Luis Alberto Sánchez, a qual
continua na Independência - depois do furacão de Tupac Amaru - ,
persiste na "encomienda" republicana e bifurca-se no século XX;

9
quanto aos ibéricos que se reclamam, como Alfredo Palácios, dos rebelde e desorganizada, sociedade que nasceu sob o signo do Estado
valôres da raça latina, contrapõe-se o indio da APRA e do MNR e contra êle buscou, sempre em vão, articular-se. Há-de encontrá-la
boliviano, todos buscando, no mito, o pathns que fundamente a oposi- na articulação tentada da Sociedade contra o Estado, na oposição do
ção profunda ao anglo-saxão dominador. crioulo ao espanhol, do indio ao dominador, na luta dos desprotegidos
A raça, como a opressão e o Estado, marca a América desde contra os "encomenderos", da América tôda inteira contra a mani-
o descobrimento - pouco importa se simples ideologia para mascarar festação imperial do capitalismo moderno. Para verificar, afinal, que
interêsses sociais contrariados; os povos a viveram sempre não como não é mais. Hoje, o Leviatã e a inconsciência dos que se diziam
mito, mas como realidade. Por serem conquistadores sem tradição, homens livres transformaram-na simplesmente em mais um pedaço
menores diante daqueles que escravizam, para os quais a Cruzada mal do Terceiro Muruio. Talvez o maior e o mais promissor - mas não
consegue disfarçar a ambição; proprietários fundiários, liberais euro- mais do que isso.
peus por formação intelectual e não por expressão de existência, roídos O que se lerá a seguir é versão - espero que agora acabada -
pela má consciência da "encomienda" e da incapacidade de criar um da dissertação de doutoramento que apresentei à Faculdade de Filo-
ideal capaz de unificar a economia e a sociedade numa proposição sofia, Ciências e Letras da USP para a obtenção do título de Doutor
política grandiosa de futuro; letrados que na Europa e depois nos em Ciências Sociais na Cadeira de Política. Na atual redação foram
Estados Unidos buscam o modêlo em que traduzir suas angústias levadas em conta as ponderações da banca examinadora - Profs.
crioulas; por serem oprimidos que o analfabetismo, as endemias e a Lívio Teixeira, Michel Debrun, Ruy G. A. Coelho, Antônio Cândido
ascendência impelem para a "encomienda", ou as tantas "Vilas Misé- e Paula Beiguelman - , cuja colaboração agradeço.
ria" que a urbanização sem plano criou, outro valor não podem Na leitura do texto, as citações de obras de Haya de la Torre,
encontrar para justificar sua dominação, mascarar sua traição ou legi- quando não expressamente assinaladas, devem ser tidas como reti-
timar sua revolta que o valor que sabem concreto e apreensível ime- radas da coletânea em cinco volumes: Pensamiento Político de Haya
diatamente por todos. E foi em tômo dêle que se construiu Indoamé- de la Torre, Ediciones Pueblo, Lima, 1961, assinalando-se entre pa-
rica até o momento em que o Poder se impôs nu, reclamando seus rêntesis, em romanos, o número do volume, e em arábicos, o da
direitos, e então tudo se esfumou e apagou, e as opções não mais página. •
corresponderam ao passado dêsses povos sofridos, que buscavam afir- :llste livro, como a dissertação inicial, é dedicado a todos os que
mar-se contra os conquistadores, proclamando sua falência vital, mas confiaram, e confiando, esperaram. E especialmente a Lourival Gomes
sim passaram a ser feitas em função da luta travada entre as grandes Machado, que pouco antes de morrer, carinhosamente, enviou-me suas
potências pela disputa da hegemonia mundial. apreciações críticas sôbre a dissertação; a Paula Beiguelman, que
Do mito, Indoamérica acalentou seu sono até o instante em que sempre estimulou um trabalho dêste tipo; a Dora Bloem e Palmyra
a Revolução do século XX bateu às suas portas e as escancarou de de Almeida, que assumiram a ingrata tarefa de cuidar dos aspectos
golpe. O ianque de ontem não é o de hoje; ontem, se Sanclino se técnicos da impressão do original para a USP; a Rosa Rosenthal
transformava no "general de los hombres libres" ao travar sua luta Zucolotto, cuja simpatia estêve sempre presente em 13 anos de cola-
desigual contra os fuzileiros navais - que acabariam por criar as boração; a Leontina, minha mulher.
condições que permitiriam a Somoza impor-se a um povo humilhado In Memoriam de meus irmãos Renato e José Eduardo, e de
e traído - era porque Hnêle se concentravam o rancor coletivo contra meu filho Rodrigo Galvão F erreira, a quem a Parca não permitiu
a dura penetração imperialista, o esmagado orgulho do crioulo ante usufruir do conselho de Lólio L. Oliveira: "Nascituros, não poupeis
o invasor loiro, a afirmação de nossa autonomia política e espiritual, a vossa meninice".
em suma, o mais puro de nossa beligerância";* era porque a luta _era
nossa, latinos ou indios. Hoje, o Leviatã comanda o passo: "lzqmer-
da, derecha, alto!"
Onde está Indoamérica? E necessário refazer os caminhos para
encontrá-la, pura como a descobriram os conquistadores; dilacerada,
humilhada, mas não vencida como a encontrou a Europa pós-napoleô-
nica: insubmissa como sempre foi sonhada. Insubmissa e oprimida,
* Luis Alberto Sánchez, Exa.men Espectra~ de América Latina, Losada, Buenos
Aires, 1962, pá.g. 16.

10 11
I PARTE

INDOAMÉRICA: NOSSA AMÉRICA

"Toda esta América es temporal~


Con nuestros huesos se harán los
cimientos de una América futura, le-
vantada de piedra como la América
de los Estados indios. Acaso sólo los
indios vuelvan a hacer de .a.iedra la
América que los espafioles hicieron
de adobe."
Haya de la Torre
1

DA UNIDADE À DESUNIÃO

A América Latina incorpora-se ao ciclo civilizatório europeu gra-


ças à ação da aventura marítima ibérica, 1do mercantilismo hispano-
-portuguê~e do gênio de Santo Ignácio~ Da perspectiva da integração
do Nôvo Mundo na corrente civilizatória oriunda do Oriente, o pri-
meiro elemento é de duração relativamente curta: esgota-se tão apenas
os objetivos da descoberta e da conquista são realizados. Já os dois
últimos deixam marca profunda sôbre os povos e nem a expulsão dos
'. jesuiY!s pelas duas Coroas, nem a abertura dos portos no Brasil, nem
ãTndependência da América Espanhola alterará as condições em que
se deu a articulação dos diferentes grupos sociais e sua relação política.
É· para essas condições que se deve reparar a fim de compreender o
sentido mais profundo da América ou para buscar saber por que na . ,
Colônia espanhola a unidade dos ~ina~Q§ se rompeu, hagrnen- \ -c,+ •
tando-se até chegar às atuais 19 repúblicas, enquanto a portuguêsa
permaneceu una e indivisível apesar das fôrças centrífugas que nêla
atllllram a ~guaf títul~ que nas demais regiões. Compreensão tanto mais
difícil quàílllõseatenta para a circunstância de a realidade colonial
espanhola possuir, a um primeiro exame, condições suficientes para
permitir se não a constituição de um grande império unitário, ao menos
ajanficti{)!Jia}onhada por Bolívar e frustrada no Congresso do Panamá
a
de-1'826: lmgua comum e a religião igual para todos os setores poli-
ticamente decisivos; uma visão do mundo semelhante em todos os
setores cultos, permitida pela existência de inúmeros e importantes
centros universitários nas diferentes partes da Colônia; o mesmo e
igual sentir-se americano em contraposição ao europeu, as mesmas
formas administrativas e a mesma oposição da Colônia à Coroa, en-
quanto negação do Pacto Colonial e do exclusivismo administrativo
pelos setores dominantes da sociedade americana.
Apesar dessas identidades, dêsses fatôres unificadores e do ideal
dos próceres, a divisão foi-se fazendo à medida em que os exércitos
libertadores marcavam suas vitórias sôbre aquêles leais ao poder de
Espanha, sendo que a própria unificação de algumas repúblicas só
foi possível ao têrmo de um processo cruento de longa duração. Não
que se deseje, com isso, afirmar uma unidade fundamental, quase
imposição de elementos supra-humanos; pelo contrário, o real atual

15
é a desunião _ mas nem
o passado para ver qual o pmor ser assim é menos imstante m· ..
ram ' · omento em .---- qUinr Essa preeminência do Estado sôbre a Sociedade Civil não se
isso s: d~d~~~~nadtine~tal sugerida pel~u~s'~f:'~~pttsm- se opuse- l' y . afirma ao nível da análise teórica tão-só como recurso explicativo:
d . e e o sonho 0 · d a1 ·~WlllO , e como
;:"ot e naciOnalismos fala mais ait I e -: mas a realidade de cem resulta da própria realidade da agonia entre a Coroa e os núcleos
ad mgua e da religião comuns. e o que a umdade maior da geografia populacionais, aquela concedendo aos "adelantados" podêres que a ne-
ra a, acalentada sempre por al~n~omo sonho e ideal deve ser enca~ gavam enquanto unidade de dominação e origem do poder, para em
apague e possa um dia fecund poucos para que a chama n- seguida retomá-los seja por motivos de ordem estratégica local, seja
aos povos e aos governos com ar na c~~ciência de todos, impon~-== por considerações de poder e prestígio na Europa. O choque de inte-
texto _Para a identificação de a~:essana. Por enquanto é mero pre- rêsses entre a Coroa e os "adelantados", o Estado e a Sociedade Civil
:ambem o foi, só se tornando real ~~uco~~ como a Independência embrionária, registra momentos dinâmicamente bem marcados: num
oram capazes de aglutinar ara m t a em que êsses poucos primeiro passo, incapaz de prover ao custeio da colonização de uma
massas e de fazer nascer da / , . ~s batalhas decisivas as grandes terra, cujos frutos ainda lhe eram desconhecidos, a Coroa concede
de libertar a América d'a d ropna uta, o sentimento da necesst"dad aos colonizadores, como referiria depois Bolívar, que "fôssem senhores
u a m1mstração h e da terra, que organizassem a administração e exercessem a judicatura
m .momento em que o sonh espan ola. Houve, todavia
e fm logo depois de A'-·y·ac- h o pareceu corresponder à realidade , em apelação", estabelecendo-se em terras da América uma "espécie
. - , . uc o quando o I a! d . -
con dIÇao basica par~ o exercí~i d oc e nascimento não era de propriedade feudal"; num segundo momento, temendo que lhe fugis-
~?~des ideais libertadores oNeo P<:der, essa sendo a comunhão sem das mãos os recursos fiscais facilitados pela conquista, o Estado
espmtual na América a ual d .
sse mstante, houve uma unidade retoma dos "adelantados'' aquilo que lhes concedera, transformando
processo que tentare~os Çecons~fu~;~· logo depois, se rompeu. E. êsse as relações entre os conquistadores e a administração e entre os povos
submetidos e aquêles. É o que Ots Capdequí chama de reconquista
da América: "A pugna entre os interêsses privados dos conquista-
1 ' . dores e o interêsse político da Coroa havia de estalar, com violência
- A Sociedade e o Estado
maior ou menor, tão pronto como o Estado espanhol quisesse acen-
Para entender a América La . , tuar sua presença nesses territórios. Os reis, ajudados por seu\ fiscais,
a Sociedade Civil se articulou tina e. necessário ter presente como trataram de reivindicar os atributos essenciais de soberania, os quais
c•l•• pelo Estado espanhol ass no C_?nJunto do território delimitado em boa parte, por vias de fato ou de direito, haviam caído em
' , . , nn como nao perder de . t mãos dos grandes descobridores e de seus descendentes. . . A Amê-
' · rô ' •• ,. k ~~tenstJcas da conquista e d VIS a que, dadas as
uruca forma social ue a o povoamento a ela conseqüente a rica teve de ser reconquistada, quando apenas havia sido descoberta;
Sociedade Civil, dn!erada negava e. negou sempre foi o Estado., A e foram principalmente as hastes burocráticas, os ouvidores e os fiscais
m te di na agoma de grupos s .. das audiências, os relatores, os escrivães e os oficiais da Real Fazenda,
en spersos, que disputavam a do . - ?C•rus geogràfica- os verdadeiros animadores desta emprêsa reconquistadora, mais polí-
dade, pelo fato mesmo d d" - mmaçao, nao teve possibili-
or . a tspersao geográfica de . tica que militar";2 no terceiro momento, incapaz de acomodar a sua
gamzar-se segundo 0 princípio d d _ , atua1tzar-se e visão do destino da Amércia - por um lado moldada pela disputa
pôde construir a visão de a o~ enaçao; em outros têrmos não
d suas relaçoes com o E d , hegemônica na Europa e, por outro, função da mera ocupação buro-
e se~s grupos componentes entre si e d sr:aço, as relações crática do território - com o Espaço apreendido pela sociedade ame-
a Partrr da visão organizató . e suas relaçoes com o Estado ricana, o Estado cede ante suas conveniências enquanto poder espa-
Heller' chamaria de um " na e coordenadora daquilo que Hermann
nhol, capitulando aos empuxes do Jocalismo da sociedade que se rebela
Sociedade Civil não canse ~upo supo':'e". Dispersada no Espaço a
gum conslttmr-se po · ó . ' contra a burocracia dos ouvidores e dos fiscais, dos relatores e escri~
que encontrasse, em suas contr d. - . r st pr pna em Sujeito vães da Real Fazenda, destruindo com êles o elemento de referência
o Espaço, o Objeto que a ne a tçoes ~temas e na sua relação com
capazes de permitir a sua s:"::e,
pe.rmtti~do a construção das formas
negá-Ia e, conseqüentemente p elaça~, por Isso, apenas o Estado pôde
que lhe permitira até então afirmar-se íntegra e dissolvendo a unidade
vice-reinol em segmentos territoriais ainda assim marcados em seus
mesma. ' a so se reconheceu nêJe, não em si limites gerais pelo Estado espanhol.
A passagem do segundo para o terceiro momento, da unidade
1 Cf., Para a análise d jurídica e burocràticamente afirmada para a dispersão socialmente
Helier, Teoria dei Estado, F~~~'i;l~~~s en,,t.re a Sociedade Civil e o Estado H estabelecida e militarmente consolidada, já estava implicita no pri-
o, 7. . ermann
16 2 Ots Capdequi, E~ Estado Espaftol en las Indias, FCE. Méxlco, 1957, pá.gs. 50-1.

17
Essa preeminência do Estado sôbre a Sociedade Civil não se
é a desunião - mas nem por ser assim é menos_]n>.p~t~en:,;:: c' )Y afirma ao rúvel da análise teórica tão-só como recurso explicativo:
assado para ver qual o momento em que os&nva iSID~::~ resulta da própria realidade da agonia entre a Coroa e os núcleos
r~ à unidade continental sugerida pelo EstaãoesPãiJ!íol, e como
0
populacionais, aquela concedendo aos "adelantados" podêres que a ne-
issosedeu A um'dad ee, o sonho ' o ideal - · mas a realidade de cem
· d a geografJa, gavam enquanto unidade de dominação e origem do poder, para em
d . . alismos fala mais alto que a umdade mawr
seguida retomá-los seja por motivos de ordem estratégica local, seja
~~ofíngue~a~i~~ religião comuns; e como sonho e ideal dehvamesaerU:c~~ por considerações de poder e prestígio na Europa. O choque de inte-
alguns poucos para que a c
rada, acalentada sempre por .. ·a de todos impondo-se rêsses entre a Coroa e os "adelantados", o Estado e a Sociedade Civil
dia fec\IIldar na consCJenci •
~:~v~s~~~sn;yem~s n:ess~~ ~r c~':~a:t~n~e;,e~dê~~~~
embrionária, registra momentos dinâmicamente bem marcados: num
como primeiro passo, incapaz de prover ao custeio da colonização de uma
texto para a identificaçao de algu 1 : medida em que êsses poucos terra, cujos frutos ainda lhe eram desconhecidos, a Coroa concede
também o fm, só se tor?ando rea batalhas decisivas as grandes aos colonizadores, como referiria depois Bolívar, que "fôssem senhores
foram capazes de aglut~ar p~~ia":'uta o sentimento da necessidade da terra, que organizassem a administração e exercessem a judicatura
mas~as e de fa~:r ?~~~erda aad~~istraçã~ espanhola. Houve,. todavia, em apelação", estabelecendo-se em terras da América uma "espécie
de libertar a me nh areceu corresponder à realidade - de propriedade feudal"; num segundo momento, temendo que lhe fugis-
um momento e.m q~~ 0 so 0 . P d 0 local de nascimento não era sem das mãos os recursos fiscais facilitados pela conquista, o Estado
e foi logo deJ?OiS de _j-\yacucho: .qu';{:, ~oder essa sendo a comunhão retoma dos "adelantados" aquilo que lhes concedera, transformando
condição bási.ca ~anl: o e~erciclo N se inst~nte, houve uma unidade as relações entre os conquistadores e a admínistração e entre os povos
n<>S_ grandes ideaiS. liberta o~e~ o~ logo depois, se rompeu. 1'l êsse submetidos e aquêles. É o que Ots Capdequí chama de reconquista
espinTultl na Aménca, a qua ep . ' da América: "A pugua entre os interêsses privados dos conquista-
processb__,que tentaremos reconstrmr. dores e o interêsse político da Coroa havia de estalar, com violência
maior ou menor, tão pronto como o Estado espanhol quisesse acen-
tuar sua presença nesses territórios. Os reis, ajudados i)Or seus fiscais,
1 _ A ·Sociedade e o Estado trataram de reivindicar os atributos essenciais de soberania, os quais
. L tin , necessário ter presente como em boa parte, por vias de fato ou de direito, haviam caído em
Para entender a Am.énca a a e. to do território delimitado mãos dos grandes descobridores e de seus descendentes. . . A Amé-
a Sociedade Qvil se arti~ulou no c_?nJunrder de vista que, dadas as rica teve de ser reconquistada, quando apenas havia sido descoberta;
.·. pelo Estado espanhol, ~sun como na~o~ento a ela conseqüente, a e foram príncipalmente as hostes burocráticas, os ouvidores e os fiscais
caracteristicas da conqmsta e do po negou sempre foi o Estado. A das audiências, os relatores, os escrivães e os oficiais da Real Fazenda,
-..,,.,única forma social que a negava e. d grupos sociais geogràfica- os verdadeiros animadores desta emprêsa reconquistadora, mais polí-
Sociedade Civil, dilacerada na agomad ~inação não teve possibili- tica que militar";2 no terceiro momento, incapaz de acomodar a sua
mente dispersos, que disputav~m a_ o eográfi~a de atualizar-se e visão do destino da Amércia - por um lado moldada pela disputa
dade, pelo fato mesmo .da, ~JSP::•:de~ação· ~outros têrmos, não hegemônica na Europa e, por outro, função da mera ocupação buro-
organizar-se ~egundo _o pnncip!O rela ões com 'o Espaço, das relações crática do território - com o Espaço apreendido pela sociedade ame-
pôde constrmr a visao de suas 5 de suas relações com o Estado ricana, o Estado cede ante suas conveniências enquanto poder espa-
de seus grupos compon~nte~ entrec:,:denadora daquilo que Hermann nhol, capitulando aos empuxes do localismo da sociedade que se rebela
a partir da visão orgamza~,orJa e su rte". Dispersada no Espaç?•. a contra a burocracia dos ouvidores e dos fiscais, dos relatores e escri-
Heller 1 ch~ar~a ~e um gr.upoons~uir-se por si própria em SuJeitO vães da Real Fazenda, desttnindo com êles o elemento de referência
Sociedade C!Vll nao consegum cd' o-es internas e na sua relação com que lhe permitira até então afirmar-se íntegra e dissolvendo a unidade
t e em suas contra 1ç
que encon rass ,
_ das farmas
'ti do a construçao vice-reino! em segmentos territoriais ainda assim marcados em se'us
0 Espaço, o Obj~t? que a negasse, P;.r;~r nisso, apenas o Estado pôde
limites gerais pelo Estado espanhol.
capazes de permit~ a sua stuper~asÓ se reconheceu nêle, não em si A passagem do segundo para o terceiro momento, da unidade
negá-la e, consequentemen e, e jurídica e burocràticamente afirmada para a dispersão socialmente
mesma. estabelecida e militarmente consolidada, já estava implícita no pri-
Cl 11 e 0 Estado Hermann
1 Cf para a análise das relações entre a Sociedade v , 2 Ots Capdequf, EZ Estado Espaiíol en las Indias, F'C'E, México, 1957, págs. 50-1.
HeUer, T~oria deZ Estado, FCE, México, 1947.
17
16
meiro, o da conquista pelos "adelantados", especialmente em virtude dos domínantes), condicionou a restrição ainda maior da vzsao do
das condições em que se deu o povoamento e pelas relações que entre Espaço, pois não era tôda a Sociedade que se defrontava com a Natu-
brancos e índios se firmaram, ínclusive a partir do ''racismo legal", reza, mas apenas parte dela: exatamente aquêles afastados da criação
de que fala Luis Albert.o Sánchez,, IJ!llas e outr~ impossibilitando_o dos valôres e idéias, que se deveriam constituir na resposta do grupo
surgimento de lima sOCiedade organicamente articulada na extensao humano organizado no Espaço que o desafiava. O Destino que as
dos territórios dos vice-reinados. O fato de estar implícita, porém, comunidades assim se propuseram, da conquista à Independência, foi
não a fazia necessária, só se tornando imperativa em virtude de as necessàriamente acanhado enquanto projeto vital, pois não resultava
guerras de Independência, ao mesmo te':"po q~e o protesto dos "':ioul?s do esfôrço comum de todos para responder ao apêlo inquietador da
contra a dominação da Coroa terem s1do fe1tas contra a orgamzaçao geografia; era tão apenas a proposição de um pequeno núcleo, afastado
estatal mais ampla, que unia comunidades diversas num igual Destino do contato físico com a Natureza, à qual não se dispôs a domínar pelo
sem raízes na consciência profunda dos povos. trabalho próprio, e isolado de grande número que a procurava vencer
Se o povoamento disperso, ganglionar ou "claustral" contribuiu no rudimentar das técnicas colocadas à sua disposição pelo branco.
para o isolamento das populações, improindo que. um núcleo t~masse O grande número - excluído, legalmente pela côr e socialmente
conhecimento dos problemas dos dema•s - com eles se sohdariZando pelas oondições de trabalho, da participação dos contatos criadores
ou a êles se opondo - , a linha divisória entre o branco e o índio, - viu-se assim negada a condição de membro da sociedade e a
estabelecida socialmente pelas condições de exploração de mão-de-obra possibilidade de nos seus quadros mais gerais reivindicar por si a
e legalmente em função da condição social, 3 impediu que o grande transformação das posições políticas• relativas. Nessas circunstâncias,
número entrasse em contato criador com a "flor da sociedade" e.-os não estranha só ter podido afirmar sua existência autônoma enquanto
estratos inferiores da camada domiiUJilte, de tal forma que as relaçoes Sujeito pela via meramente insurrecional, desde a revolta de Enri-
sociais siguificativas, aquelas capazes de permitir a criação de formas quillo, em São Domingos (1519), até a de Condorcanqui, o Tupac
objetivas válidas para a sociedade como um. t<;><~o, deram-se apenas Amaru, caminho êsse propiciatório de uma visão do Destino retros-
numa pequena camada social. Para êsse. fato m1bldor do processo de pectiva e não prospectiva, para novamente submeter-se como no passa-
desenvolvimento social de uma comumdade, obngada a encontrar do, dada sua inferioridade militar.• Por êsses motivos, a s~iedade
em grupos restritos, freqüentemente rninoritári.os, os elementos huma- colonial debateu-se até a Independência prêsa de elementos confli--
nos com que construir as estruturas e os valores capazes de aba~car tantes e sem possibilidade de harmonização dialética - Espaços dif.!:-
0 Espaço socialmente reco~r:<' po~ ela como .um todo, contr•bm.am rentemente vistos e Destinos diversamente propostos pelos grupos so-
também as disposições legrus unpedi!Jvas da miStura de sangues dife- ciais e pelo Estado. E por êsses motivos, fragmentado o Estado durante
rentes e da vizinhança entre brancos e índios, e':"bora fôssem todos as guerras de Independência, tenderam a triunfar aquelas visões arrai-
obrigados, do ponto de vista moral, a pre~tar serviços correspondentes gadas na realidade social contra as que encontravam sua razão de
à sua situação social, inclusive os espanhms,. pots conforme acentuava ser em lima mera ocupação burocrática do solo e em uma proposição
Solórzano, "não se pode, nem de':e consentrr-se que todos [os es~a­ de Destino de fundamentação essencialmente jurídica e de sentido não
nhóis] possam ser iguais, e Cavalerros, passando àquelas t~rras. c;olSa americano, por europeu.
com que nos dão no rosto alguns estrangeuos,. e naturaiS, e nao a A estreiteza da visão de Destino da sociedade na Colônia não
permitiu república alguma b em govem ada . resultava apenas da pequena extensão do Espaço recoberta pelas rela-
Essa limitação do grupo gerador dos padrões e valôres reputados ções sociais criadoras. Decorria também de o tipo de povoamento não
socialmente dignos de consideração (a qual era agrava~a, co~?rme ter permitido - desde que se considere a relação que necessàriamente
acentua Sánchez, pelo fato de o castelhano ter permanecido o 1d1oma existe entre o Espaço juridicamente recoberto por um Estado e a
ação dos grupos humanos que nêle vivem, ocupando-o de maneira
3 "O tênno brancos, mais que tndlcativo de raça puramente des:-a cõ~a~
uma qualificação Legal que abarcava tatnintoh os i~~vguid~~n~~g~!:tam~~::'ado' ~om 0 5 Entendemos por posiçlto política a posição relativa ocupada na escala de
sttços. isto é as pessoas que am ,_.., fruiçâo dos va.lôres socioeconõmtcos: ser mais ou menos rico, ser mais ou menos
os me l !ti "t ,..., ,..,.,.. bastardia Subd1vid1am-se os brancos em nobres e
branco, eg mamen e v ... ,.-. · ) cujas fronteiras respeitado e homenageado pelas camadas superiores, fazer-se ou não obedecer pelas
do Estado lhano (no qual predominava a mestiçagem • grupo camadas inferiores. :t o usufruto conjunto dêsses três elementos, riqueza, prestigio
eram indeclsa.s" _ Arcaya, "Estudtos de SoclolD:gia Venezuelana", citado por Luis e autoridade, que define uma posiçlto política alta.
Alberto Sánchez ln Examen Espectral de AmériCa Latina, pág. 52. 6 o aspecto mllitar é significativo, pois fot êle que condicionou, enquanto
4 Cf., para 'o estudo da poslçi'i.o legal do indio na. sociedade americana, Ots expressA.o de cUltura, tôda a dependência do grande número. Ni'i.o fôra os con-
Capdequi, op. cit., e Js.vier Ma.lagón e Ots Capdequi, Solórzano y la PoliHca India- quistadores conhecerem o cavalo, o arcabuz e a couraça, enquanto o indto devia
na FCE México 1965 A citação é desta última obra, pág. 51. Sôbre o impedimento valer-se do arco e necha e da acha, e as relações entre os dois segmentos teriEtiD.
da' vtzmhançs. e' do ci-uzamento de sangues dtferentel5, a. refmncltt é d.e Hum.boldt, stà.o à.lferentes, pots a sltuaçA.o de dominado cUlturalmente não se teria acrescentado,
citado por Sá.nchez, ibidem, pág, 57. como fatalmente insuperável, à situação de m111tarmente vencido.

18 19
mais ou menos dispersa - que se estabelecesse~ co~tatos. constantes aos usos . e costumes aqui nascidos da nova freqüentação social. A
e duradouros entre os diferentes núcleos populaciOnais, cnando entre ~~!fi~ r~ahdade turbulenta,, que cria sua legalidade própria graças à
êles urna solidariedade de que resultaria afinal uma sociedade ci~il distancia que separa os nucleos de população uns dos outros e todos
que se daria, por "associação" (Rousseau), ~ Estado. ~ exten~ao dos centros de Poder, contrapõe-se apenas uma formação jurídica
do território dispersou os núcleos populaciOnaiS, to~do unposs~vel burocrática, fria, com a qual a vida real guarda nenhuma relação,
estabelecer entre êles qualquer contato duradouro: al~m dos lunttes ou urna mmto pequena. Naqueles lugares em que a administração
da mina ou da "encomienda", ou depois de onde termmava .a demar- se organiza, como nas cidades-sedes administrativas, a presença do
cação dos índios sujeitos às várias espécies de trabalho senu-escravo, braço da lei se faz sentir com rigor; basta, porém, que entre o vice-rei
ou semi-servil, tanto para o branco quanto para '? índio '? mund? era e os povos se estenda a lhanura ou se interponha a montanha para que
"ancho y ajeno". A América era - e talvez al!'da hoJe '? seJa - a lei permaneça mero orn=ento jurídico estranho à consciência cole-
a "so1edad poblada": "u'a mancha humana aqm, ~utn1; ah, e entre tiva dos nucleamentos de população, pois o seu que-fazer cotidiano
ambas 0 vazio, a zona morta em que o homem nao v1ve, e me~os não permitiu, nem a estruturação do Estado e da Sociedade permite
convive. Não é apenas que entre u'a mancha humana <1 outra eXIs~ que os indivíduos isolados no interior do país se sintaJU com direito
nada, mas sim que cada urna dessas manchas - qualquer que seJa a participar e influir nas decisões do Poder maior. O universo social
0 dos homens é o da "hacienda", ou da exploração mineira, não a
sua situação ou sua magnitude -:- é densa em ~eu. ~~tro e se .desva-
nece progressivamente ao aproxunar-se da ~e;ifena . 1.
Soc~edade, Sociedade demarcada pelos vice-reinados; nêle, o branco é o senhor -
dir-se-ia quase feudal em virtude da distância em que se acha o poder
nesse "continente vazio", não é uma, mas varzas: cada ~anch~ h.u-
mana" cria a sua solidariedade própri~, válida _do centro. a penfena, real constrangedor - e em seus domínios a Lei, quando chega, se
determinada pelas relações que o me10 geograf1co condiciOn_a, e. se acata, mas não se cumpre. 9
defrontam urrws às outras como sêres estranhos que !ztuaçao _vlt~l Constituiu-se, assim, no decorrer da conquista e mesmo depois
comum alguma aproximaria. Enquanto obrar humano, sao como rndi- dela, para usarmos a expressão de Ots Capdequí, urna legalidade con-
víduos fechados sôbre si, impermeáveis a qualquer conta!?, mcap:"'es suetudbuiria originária do isol=ento das populações, a qual tendeu
do gesto simples de dar - porque desconhecem, por. nao conviver, a opor-se à legalidade racionalmente definida do Estado o!spanhol;
aquêles que as negaJU. São universos dispares, que proVIeraJU de tron- foi a primeira, dada a organicidade que fluía das condições de exis-
cos diversos, s e não puderaJU, pelo isola!Uento, ao ~~o de~':olver tência dos povos, que tendeu a prevalecer ao longo dos anos rtas
seu "consensus" prospectivo, traduzido numa propostçao umtãria do "nranchas humanas", impondo-se a quantos conviviam na "soledad
Destino criar o elemento centripeto que os urússe por sôbre o desert~. poblada". Necessàri=ente, dado o regime de trabalho, a organização
Não estranha que antes de a Nação configurar-se pelo desenvolvi- familiar patriarcal e a posição subalterna da mulher, a figura do senhor
mento da solidariedade e pela eliminação da "soledad", o Estad? da terra ou mineiro tendia a sobressair a seu redor e às suas ordens
_ considerado como estrutura de dominação abarcando ~odo o tem- se jUntando os que nêle reconheci= a capacidade maior para aplicar
tório - tenha estabelecido sua marca profunda e,_ ao afir;n~r a um- 9 No que se refere à apiicação do Direito Indiano, Ots Capdequi assinala em
dade necessária a seus propósitos europeus, se ~aJa const1~do para seu El Estado Espafíol en la8 Ind.ias, pá.g. 54 e segs., como foram os vice-reis,
cada um dêsses núcleos, como afirmado mais acuna, no Objeto nega- especialmente os de Nova Granada, os que timbraram em executá-to, com isso pro-
tegendo os indios, enquanto os demais funcionários fizeram prevalecer os preceitos
tório e constrangedor. , do Direito espanhol histórico, inspirado no velho Direito Roma-no Justiniano: "De-
E,sse Estado constrangedor dos diferente~ segmentos, note:-s~, e fesa, sem limites, das faculdades dominicais do proprietário, com seus conhecidos
1m utendi, jus fruendi e tm abutenài". Nessa circunstância, cedendo a burocracia
de Castela cujo Direito se sobrepõe aos diferentes usos e drr:Itos aos interêsses dos latifundiários, há uma identificaçA.o entre os interêsses dos
situados nas posições politicas aitas com o estatuído peio Estado; mas ainda assim
focais espanhóis transplantados para a América com a populaçao e o essencial de nossa afirmação não se altera, pois o Direito Indiano era o prin-
cipal e o Direito Histórico espanhol o supletivo, devendo aquêie prevalecer sôbre
0 1 9
Ext~m~ :zm~~gi0~ ?! ?t!~~fJ,: ~~~~ã~!, ·Editorial
1
7 Cosia Vlliegas, de êsse. Foi especialmente no trato com os indios que a administração se contundiu
com os particulares, em boa medida porque muitos funcionários aproveitavam-se
Americalee, Buenos A es, 1 • ...,. ·
8 Cf. Luis Albert: ~ e~.r.g 36 . "Carentes de unidade idiomática, deixaram-
· b i ines até certo ponto de uma de sua tunçã.o para explorá.-ios em proveito próprio direto, como o caso dos corre-
-se [os conquistadores] ftene~ar f~io =asa!e~~r'!.r qÚe aprender o araucano é gedores que cobravam. preços excessivos pelos artigos que obrigavam os indios a
gramática araucana de ns 0 s c in Desprovidos de um conceito comprar, conduzindo, entre outros motivos, à revOlta de Tupac Amaru - cf. John
0 melhor exercício para dedicar-~ às de~~~giio ~ior importância que à pé.tria Lynch, La Administración Colonial Espa11ola, Eudeba, Buenos Aires, 1962, pág. 59 e
profundo da unidade nacional. avam u ou a rofundou mais ainda essas segs. Ao contundir sua açA.o com os lnterêsses dos latifundiários "encomenderos"
comum. O contato com o nOvo solo defini P a. radical diferença cultural e os proprietários das minas aos qua.ts se destinavam os indios "mitayos", a buro-
discrepâncias. Agrupados por ~i~!rendest~f~ci:u~J:~fis~~ -, delxam.-se a·rrastar por cracia nA.o-poiitica conduziu à privatizaçA.o do Estado e ao predomínio do senhor
- a escala ta desde o nnalfa e &nl a . id d se fOSSem homens atados p::lr SObre os povos, que nêle passaram a ter sua única g~rantla contra os próprios
seus preconceitos e lnterêsses com mais facil a~ queli ioso e 0 incentivo do botim. abusos administrativos, ou o exato cumprimento da Lei, e os outros senhores
tradição comum. O único que os unia era o v1nc o re g rivais.
Tudo o mats os dividia".
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a Justiça que a rudeza dos costumes exigia fôsse pron.ta e puni~i~a;
10
A empr~~ européia da ~~panha, por ter sido transplantada de
Assim, enquanto nas cidades em contato - pouco frequentes de m1c1o, forma burocratica para a Amenca, trabalhou assim contra a unidade
embora sempre certo, e mais constante ao avançarem os anos - com ?a Colônia sôbre. a qual a~~la repousava no fundamental, pois o
a Espanha e outras fontes de cultura, ?' cost.umes, especialmente. os Isolamento das diversas regtoes e os obstáculos levantados à livre
políticos, tendiam a se abrandar e o honzonte mtelectual a se amph~, circulação das riquezas, impedindo que a economia realizasse sua
prevalecendo a autoridade sôbre o poder pessoal, no campo o caudi- missão unificadora, cristalizaram regionalmente usos e costumes que
lho foi-se constituindo lentamente no representante da le1 do grupo, de outra forma se teriam tomado mais universais e estabeleceram uma
freqüentemente por êle mesmo feitau Entre as du~s repres~~tações visão do Espaço e uma proposição de Destino meramente locais. No
do Poder travou-se luta secular, pois se a reconqmsta penmtiu que século XVIII, quando muitas das restrições são levantadas a obra
conjunta da <?oroa e da geografia já havia estabelecido, e~tretanto,
0 Estado retomasse formalmente direitos que havia cedido aos "ade-
lantados", a distância fêz que, novamente, os perdesse de fato. os marcos mazores em que o Espaço se iria fragmentar: as Audiências,
as Governações, as Capitanias ~ as Intendências, isto é, as menores
expressões do Espaço recobertas por uma divisão administrativa. A
2 - A fragmentação do Espaço criação dos vice-reinados de Nova Granada e do Rio da Prata, no
setecentos, estabeleceu os limites máximos do Espaço que a Coroa
Ao longo do pr~cesso que ~es~revemos acim~, o Es~ado espanhol espanhola podia abraçar, renunciando a governar o Império a partir
_ isto é a racionahdade do Drrelto sobreposta a legalzdade consue- da Cidade do México e de Lima, sem comprometer o seu projeto
tudinária 'dos núcleos populacionais geogràficamente dispersos e social- europeu; não fôra a anterior divisão administrativa ter recoberto as
"manchas humanas" com uma estrutura burocrática fiscal e repressiva
mente isolados - cedeu passo a formas organizatórias que respondiam
que, para afirmar-se Estado, necessitava apenas dos podêres políticos
mais diretamente à realidade social, mas as exigências do Espaço per- e judiciários concentrados nos vice-reis e nas Audiências (bem como
maneceram integras. O Estado espanhol, ainda que d': ~ru:eir~ buro- a posterior criação das Intendências, que aperfeiçoam a máquina esta"
crática a elas havia respondido, sujeitando formas socm1s tao diversas tal vista de seu lado passivo), e os quatro vice-reinados poderiam
e dist;ntes a uma mesma legislação e introduzindo a Colônia no ter mantido a Unidade capaz de permitir que a América formulasse
cenário mundial como garantia de sua pretensão h~~emô':'ica na Euro- um Destino consentâneo com seu Espaço. A administração, para aque-
pa. Embora Objeto da emprêsa espanho~a, a Amenc~ vm formul:'do, las .,;ociedades não relacionadas umas com as outras, falou ~r~ais forte,
pela unidade burocràticamente estabelecida, um Destmo consentan':o porém, que a política; ainda assim, a visão do Destino imposta pelo
com seu Espaço, proposição de Destino essa que ganhou a~t~n<J?lla Espaço vice-reino! influiu nas decisões dos próceres, que não se con-
e marcou os Libertadores, dela conscientes ao fazerem sua a re•vmdica- formaram com limitar os novos Estados às divisões administrativas
ção de liberdade do mundo. Mas por ser bur~cráti~o. e não or~ico, menores estabelecidas pela Espanha, e procuraram, ao destruir-se
social, 0 projeto de Destino espanhol tendeu a mte':'~1ficar os part!cula- pelas guerras de Independência a unidade política -dos vice-reinados,
rismos mediante o refôrço do isolamento das re!l;10es produtoras e a reconstruí-la em suas campanhas libertadoras. 12 O exemplo do vice-
subordinação do Agro "ao exemplo e às necessidades da economia -reinado da Prata é ilustrativo a êsse respeito: reunida a Junta de
peninsular", como refere Ots Capdequí. Buenos Aires a 25 de maio de 181 O, ela desterrou o vice-rei e a
Cf Ots capdequ1, op. cit., pé.g, 120: "Segundo uma Real CédUla de 10 de
Audiência, afastou os funcionários espanhóis e convidou os intendentes
10 bro. de 1548 incorporada mals tarde à Recompilação de 1680, no delito de e cabildos a enviarem representantes para um Congresso Geral a
~~~~ério se h a vi~m de guardar as leis sem diferença entre espanhóis e mesti~os.
o ue dispunham essas leis, cuja observância se mandava, jã. o sabemos P as realizar-se em Buenos Aires. Cedo apareceram as dificuldades: Mon-
fon~s de direito espanhol de então: que a mulher que cometesse ad=ri!J=~ tevidéu reconheceu o Conselho de Regência da Espanha; o inten-
entregUe, juntamente coro seu amante, ao marido ofendidO, para que fi.
sôbre os cUlpados sua sêde de vingança. SOmente se exigia como condi~ o b~ue ~ 12 A destruição da estrutura burocrática do Estado espanhol em conseqüência
espôso ultrajado não podia dar morte a um dos adúlteros sem matar am m da sublevação fêz cair a administração em mãos de individuas diretamente ligados
outro''. Nas relações tndivlduais, o Direito privado espanhol era acatado por res- aos privatismos e que encontravam nos principios federalistas da época a corres-
ponder a uma mesma forma social de organiZação de costumes. . pondência exata ao triunfo da ''ba.t'bé.rie". 06 que combatiam os "salvajes unité.-
n "Entre espanhóis - dlz Garcia Morente em Idea d.e la Hispan~ - ls
0

trato pode mais que o contrato, e as obrigações de amizad~. pesa,'?


que as obrigações juridicas.,. Entre eapanhóis manda o que pode • n
io 0
:f":to
°ue seu
rios" não possuiam a visA.o do Espaço e a noção do Destino a ela correspondente,
as quais eram pecUliares dos burocratas espanhóis. :G:see fato expllca, também, em
por votação. A lei tem de ir acompanhada de outras fôrças socia.ls para q dos boa medida-, o esfacelamento da unidade americana. Em Lynch, op. cit., pág. XI.
predominlo seja efetivo. A st.roples abstração legal nã.o tem acesso no à~dr: d há elementos suficientes para fundar nossa anrmaçi.o de que foi a divisAo ad.mi-
htspanos propensos sempre a cotejar tôdas as coisas com a Intima rea e e nistra.tiva espanhola, aperfeiçoada em t6rmoo de descentrullzaçAo com a. crlaçAo
sua próPria personalidade individual" - e seu estreito horizonte social, acrescen- d.a.s Intendências, que contribuiu extraordinàrlamente para a fngmentação poste-
tariamos nós. Apud. Bánchez, op. cit., pág. 194. rlOr da- América.

22 23
dente de Assunção explorou o Jocalismo paraguaio contra as pre- tôdas as vantagens governos bem constituídos e hábeis nações ame-
tensões hegemônicas de Buenos Aires e a Intendência -do Paraguai ricanas unidas de coração e estreitadas por analogias políticas. 14
separou-se do antigo vice-reinado em 1811, quando Belgrano foi der- Não apenas a ameaça da Europa impelia os libertadores a recla-
rotado no campo de batalhá; a resistência da Intendência de Córdoba marem a confederação: havia também a consciência, própria da Ilus-
teve de ser reduzida pelas armas, enquanto na de Salta dei Tucumán, tração, de que a Lei seria bastante para impor aos povos os requisitos
as principais aglomerações urbanas aderiram sem maiores dificuldades sociais aptos a impedir as guerras nacionais, que se prenunciavam
à Revolução vinda de Buenos Aires. Já as Intendências que hoje inte- pelos Iocalismos transformados em nacionalismos disruptores da uni-
gram a Bolívia só ao fim das guerras de libertação se tomaram inde- dade e expansionistas, entre êsses requisitos ressaltando não apenas
pendentes - e afirmaram-se como um Estado soberano, ficando o a presença de um Exército permanente para dirimir as contendas filhas
projeto de reconstituição do vice-reinado inconcluso. 13 do caudilhismo, mas também a livre circulação de pessoas, bens e
O que as armas não conseguiram realizar, dada a predominância idéias entre os países recém-formados. O projeto das "Bases da Con-
dos regionalismos acentuados pela administração local espanhola, a federação Geral Americana", redigido pelos representantes do Peru,
vontade dos próceres procurou suprir a partir de Ayacucho pela con- é significativo dêsse estado de espirito e dessa visão de um Destino
vocação do Congresso do Panamá. Mais conservadoras que liberais, maior, pois com êle se objetiva a manter viva a idéia da unidade
êles tinham a idéia da importància de uma unidade político-jurídica fundamental da América mediante o livre trânsito de pessoas e mer-
sobrepondo-se às diferenciações locais para a realização do Destino cadorias e a eliminação de quaisquer requisitos, salvo o ser ameri-
comum da América confrontada com os Estados Unidos, já preten- cano, para ocupar funções públicas, considerando-se apenas como
dentes à hegemonia americana a partir da Doutrina Monroe, em 1823, formais as fronteiras estabelecidas no correr da libertação, bem como
e com a Europa legitimista. É a defesa da liberdade, alcançada a duras se pretende realizar um projeto defensivo contra o estrangeiro e o
penas, o elemento propulsor da idéia da anfictionia bolivariana: "Se inimigo interno, já pressentido no manejo dos caudilhos despertos
depois de saber-se na Europa o sucesso de Ayacucho e o término da pelo Iocalismo, que não tem mais a contê-lo o rigor burocrático do
Estado espanhol." Não era mais possível, porém, vencer sua insur-
guerra na América - escrevia o libertador a Santander, vice-presi-
gência, que a longa repressão subseqüente à rebelião contra ~ Coroa,
dente da Colômbia - os franceses empreendem ou continuam suas especialmente nos vice-reinados de Nova Granada e do Peru, trans-
operações contra nós, devemos preparar-nos para sustentar a contenda formara em algo mais que o simples apégo às tradições. A guerra,
mais importante, mais árdua e maior de quantas ocuparam e afligiram multiplicando contatos e permitindo o aparecimento na cena política
os homens até agora. Essa deve ser a guerra universal. Se depois de de homens até então restritos à dominação de seu pequeno Espaço,
uma vitória tão decisiva na ordem americana, os aliados persistem fêz que os caudilhos transbordassem o simples ater-se às tradições
em seu plano de hostilidade e não ouvem igualmente nossas proposi- locais e conferiu-lhes, na dinâmica da necessidade de um chefe sobre-
ções políticas, é uma prova evidente de que o plano definitivo é alcan- por-se a outro na condução da guerra e na obtenção da glória, a tarefa
çar em uma contenda geral o triunfo dos tronos contra a liberdade. maior de impor aos demais os seus valôres restritos como corporifi-
Então essa luta não pode ser parcial, de modo algum, porque se cação do próprio sentido de ser da luta libertadora. Necessàriamente,
cruzam interésses imensos espalhados em todo o mundo. O remédio tal proposição do Destino surgida da realidade bélica era menor que
paliativo a isso, se se encontra, é o Congresso de Plenipotenciários aquela imposta pelo Espaço vice-reino! - e a sistemática do pensa-
no Istmo [do Panamá] sob um plano vigoroso, estreito e extenso, mento liberal-federativo acabou por converter o localismo triunfante
com um exército a suas ordens de 100 000 homens ao menos, man- em nacionalismo agressivo, contrário a qualquer idéia de cessão da
tido pela Confederação e independente das partes constitutivas. Depois "soberania" local em favor de um projeto de Destino formulado em
dessa horrível guerra, em que ficaremos assolados, tiraremos por têrmos que lembravam, pelo Espaço que necessàriamente abarcava, a
13 É flagrante a lnfluêncla das demarcações adrnlnlstratlvas espanholas na unidade associada ao despotismo espanhol contra o qual se combatera.
fixaçM dos Umttes das repúblicas americanas - alterados para malor ou menor Os "intelectuais" que conduziram, exceto no México, o processo
em conseqüência das gUerras que se sucederam à Independência, mas conservando
até hoje, no essencial, sua antiga forma: a Argentina abrange boa parte do vice- de independência, viram frustradas por sua particular proposição te6-
·relnado do Prata, menos a Banda· Oriental, a Intendência do Paraguai e as do rica da libertação as possibilidades de seu triunfo, pois, embora fazendo
Batxo Peru, que se transformaram na Bolivla; o Chlle eorresponde à Capitania
Geral do Chile; o Peru, ao vlce-relnado do Peru, excluida a Caplta.nla Geral do a "gue"a de marte" em nome dos ideais liberais, outra visão organi-
Chlle; o Equador, à presidência de Quito; a Colômbia ao território abrangido pela
Audlêncla de Santa Fé de Bogotá.; a Venezuela, à Capltanla Geral da Venezuela. 14 "Cartas de Bolfvar". citado em Lé.zaro Barblerl. La Integrac\ón de Latino-
Apenas o vlce-relnado do México e a Caplta-nla Geral da Guatemala conservaram-se -américa, Troquei, Buenos Aires, 1961, pé.g. 21.
íntegros, a última sendo em seguida dlvldlda nas repúbllcas centro-americanas. 15 O projeto referido é citado em Barbieri, op. cit., pé.gs. 43 e 44.

24 25
zatória das novas sociedades não podiam propor aos povos senão a da conquista. Neste sentido, especificamente, Bolívar e os Libertadores,
Ilustração americana do século XIX, isto é, um despotismo esclare- buscando evitar que os povos recém-libertados se fizessem prêsa da
cido mitigado pelo amor que devotavam à liberdade civil dos povos. 16 "utopia revolucionária" representada, para as antigas Colônias, pela
É que para os generais-libertadores, a exemplo de Bolívar, o povo Democracia e pela Federação norte-americanas, dela ignahnente se
americano, "jungido. . . ao triplo jugo da ignorância, da tirania e do tornaram vítimas, pois tentaram constranger por um ato de vontade
vício, não pudemos adquirir nem saber, nem poder, nem virtude. o curso das paixões desencadeadas sem possuir a orgauização neces-
Discípulos de tão perniciosos mestres, as lições que recebemos e os sária a submetê-las e conduzi-las a bom pôrto. A única de que teriam
exemplos que estudamos são os mais destruidores. Pelo engano nos podido dispor - e da qual se serviram os fundadores do Império
dominaram mais que pela fôrça, e pelo vício nos degradaram mais no Brasil, e souberam criar os Pais da Constituição norte-americana,
que pela superstição". "Por isso, dizia em seu discurso de Angostura, a qual era o Estado com uma ampla visão de Destino moldada pelo
de 1819, nossos povos têm mister de governos paternais, tutelares, Espaço - fôra destruída pelas gnerras da Independência.
para evitar a anarquia e o despotismo. Não convenho no sistema Foi o desconhecimento do sentido profundo dessa insurgência
federal entre os populares e representativos, por ser demasiado per- dos localismos, associado ao de que as exigências estabelecidas no
feito e exigir virtudes e talentos políticos muito superiores aos nossos; Congresso do Panamá para os países confederados ultrapassavam, no
por ignal razão recuso a monarquia mista de aristocracia e democracia plano financeiro, as possibilidades reais de cada membro da Confe-
que tanta fortuna e esplendor trouxe à Inglaterra. Não nos sendo deração, que determinou o malôgro da "utopia revolucionária" boli-
possível lograr entre Repúblicas e Monarquias o mais perfeito e aca- variana.18 Mas o ímportante e decisivo nesse malôgro foi o tríunfo
bado, evitemos cair em anarquias demagógicas e tiranias monocrá- dos localismos, transformando-se em nacionalismo para justificar seja
ticas. Busquemos um meio entre os extremos opostos" .17 a ímposição da visão do mundo de um chefe sôbre a "fina flor da
Essa contradição entre fazer a Independência, tendo o federalis- sociedade" - tôda ela ímbuída do desejo de estabelecer governos
mo norte-americano conw modêlo organizatório a opor ao unitarismo liberais em uma sociedade à qual faltava tudo para que o liberalismo
do absolutismo espanhol, e a constatação da imaturidade dos povos imperasse como norma política de convivência entre os homens, a
americanos para a liberdade predicada pelos filósofos em nome de começar da comunicação social - , seja a pretensão hegem&,nica de
cujos ideais se fazia a guerra contra a Espanha, encontrava sua ra- uma região sôbre outra.
zão de ser na articulação da sociedade americana, desde a época d~
16 Possivelmente as situações de existência social doo Libertadores !Osse res-
ponsável pelo conteúdo conservador de suas prl)poa1ç6ea tnstituctonais. Todavia, 3 O triunfo dos localismos
Importa a.sslnlllar que se a !1llaçA.o l)llgárquica de muitos dêles 06 levava a desme-
recer a capacidade de autogestâo democrática do grande número, aproximação
corretamente possível em teoria, a prática de poder velo confirmar as previsões
que !aziam do tuturo que aguardava a América Latina, ou em vias de liberta- A comunicação entre os indivíduos e os grupos soc1rus não é
ção. Isso porque na América espanhola, da mesma forma que no Brasil, o conser- elemento necessário apenas à organização de uma sociedade, que fene-
vantismo europeu !ol exatamente a doutl"lna que permitiu o progresso civil dos
pi)V06 condiçft.o básica para a afirmação de suas liberdades politicas; e, inversa- ce quando ela cessa, ou não chega a ganhar forma, inexistindo a inte-
ment~. o liberalismo, transplantadl) sem maiores considerações teóricas, apenas ração humana; é também o princípio fundamental da sociabilidade
conduziu à tlranla, ou à demagogia, pols criou uma ficção jurldica de liberdade
polltlca sem que antes os povos tivessem a.dq~ri~o consclêncla, sequer, de seus política, entendend<rse como tal as diferentes maneiras pelas quais
direitos civis. Antes de cidaãao, o individuo é súcitto; e é ~tpenas depois de haver
aprendido na luta econômicl)-soclal de cada dia a reivindicar seus direltC>S de os grupos que ocupam ignal posição política se associam e criam
súdito, que êle pode reclamar seus direltC>S de cidad4o enquantl) sujeito de sua urna consciência de sua posição relativa na escala de fruição dos
própria ação.
17 Apud. Barbieri, op. cit., págs. 12 e 13. Compare-se, a tltull) de c~riosidade, valôres socioeconômicos, e se afirmam enquanto grupo por oposição
essa passagem de Bolivar com a "Dedicat6rla" do Discurso sllbre a De.ngutlldade, àqueles que difiCultam sua ascensão nessa escala, ou pretendem alterar
de Rousseau: "Não desejaria, de modo aigUIIl, ml)rar numa república ~e instituição
nova ainda que tivesse boas lels, temendo que o Govêrno, constitmdo talvez de sua posição relativa alta. A comunicação entre os diferentes grupa-
modo diferente daquele que devesse ser para o momento, não conviesse a.os novC>S
cidadãos, ou 06 cldadãC>S ao nOvo Govêrno, e ficasse o Estado sujeito a abalar-se mentos populacionais dispersos pelo território é, assim, a condição
e destruir-se quase desde o nascimento, pois acontec!! coro a liberdade o que se in<lispensável a que os diferentes segmentos possam superar os limites
dá. com êsses aliment06 sólldC>S e suculentos ou com esses vinhos generosos, apro-
priados para nutrir e fl)rtlficar C>S temperamentC>S robustoe que têm o hábito deles, sociais ímpostos pela pequena extensão do grupo incluso em que se
mas que abatem, arruinam e atordoam C>S !rac06 e delicados, que absolutamente situam e se afirmem unos no território juridicamente recoberto pelo
não lhes são afeitos. Os povos, uma vez acC>Stumados a possufrem senhores, nAo
conseguem viver sem êles. Se tentam sacudir o jugo, distanciam-se a tal ponto Estado. A "primeira e principal fonte das infelicidades do gênero
da liberdade que, tomandl) por ela uma licença desenfreada que lhe é oposta, humano e, sobretudo, das calamidades sem número que minam e
ws 5Utt5 revoluções quase sempre oa entregam a sedutores que só fazem agravar
suas cadeias" - Cf. J.-J. Rousseau. Obras, Vol. I, Edltôra Globo, Pôrto Alegre, 1958. 18 A êsse respeito, c!. Pereyra, car106, El Mito de Monroe, Ediclones El Buh'>,
pág. 153. Buenos Aires, 1959, pá.g. 57.

26 27
destroem os povos policiados", não deve ser buscada, como pretendia determinada), êle assume, enquanto estrutura de dominação a função
Rousseau nas "Considerações sôbre o Govêrno da Polônia", tão-só de. esta~el~ce~ o "consensus" ~a~ional, guardando, cada 'vez mais,
na extensão geográfica e popnlacional das Nações, a ela se contra- maior dJstancta dos grupo~ s.x;~ats e da própria sociedade tomada
pondo aquela extensão que permitisse a todos os cidadãos se conhe- co~o um todo. Se nos lmlltes fístcos e sociais do grupo isolado geo-
cerem mUtuamente e se verem uns aos outros. O essencial, no caso, gràf~c~ente, a vontade do chefe conforma-se numa certa medida às
não é o número dos indivíduos, mas sim a freqüência do contato tradtçoes e aos costumes grupais dos quais se faz defensor 0 mesmo
entre as partes, e dessa perspectiva, quanto maior aquêle, mais fre- ~ão se dá na extensão social recoberta pelo Estado - ~ujo limite
qüentes êstes. Nos pequenos Estados, todos os cidadãos se conhecem e o das suas front~tras ~~líttcas - , pois a desarticulação humana e a
e se vêem uns aos outros - e os grupos, por ser o Espaço limitado, falta de organiZaçao pohhca conseqüente impedem a existência de um
entram em agonia permanente; já nos grandes, tal não acontece, ne- "consensos" que constranja aquêles que lhe dão vida e 0 representam
cessàriamente, considerando-se como palco da ação coletiva o Espaço enq~adrando-os num mesmo Des~ino - se~ e da coletividade a qu~
sôbre o qual o Estado exerce sua soberania. É que nesses, sendo o d~mnnarn. O pod~r de Estado assun constttmdo, não resultando orgâ-
Espaço abarcável apenas pela idéia e não pela existência real dos mcamente da sociedade, no sentJdo de ser a expressão organizada da
grupos concretos, a comunicação entre as partes constitutivas da So- hegemoma de um "gr~po supor!~", a qual se expressa na ordenação
ciedade global faz-se mais difícil, fato que, tomando menos freqüentes ~as condutas dos demats grupos viVendo no mesmo território nacional,
os contatos organizatórios entre segmentos partícipes de igual posição e e."treman;tente forte e s~amente débil. Não encontrando grupos
política, constrange a organização política da sociedade pela pequena sOCiaiS. t;~Ionalmente orgamzados (isto é, organizados na extensão
articulação segmentar, de oposição, ou aproximação. É a inexistência do temtono recobe~o por seu _aparelho jurídico) êle tudo pode contra
dessa organização política que impede a transformação dos diferentes qualquer segmento ISolado, nao resultando, porém, de "consensus"
agrupamentos populacionais numa "associação", isto é, em um con- algull', mas, pelo contrário, devendo impor uma identidade de Destino
texto social amplo em que o Destino comum - noção coletiva infor- a grupos dive_rsos e dispersos, está sujeito às flutuações das disputas
mando a consciência de cada um - é produto de decisões adotadas pela hegemoma travadas entre êsses mesmos segmentos local ou regio-
por uma sociedade consciente de sua unidade, necessidades e aspi- nalmente organizados.
rações. É êsse fenômeno que se observa na América após a Iàdepen-
A constituição da "associação" não se apresenta como postulado dência: Batido, o Estado espanho~ nos campos de batalha, em seu
teórico; reveste-se do valor de exigência prática no plano das decisões l~g'!!; mstalaram-se es~turas políticas de dominação extremamentê
políticas, já que o poder coercitivo do Estado moderno obriga a Socie- debeJS,_ po~quanto deve~Iam satisfazer a divergentes interêsses locais,
dade Civil a articular-se nessa forma e não outra- mera "agregação" que nao tinh~ a um-los, pela ausência de comunicação, projeto
- a fim de poder chegar-se à identificação entre a Sociedade Civil algum de Destino. Com tsso, o Estado tornou-se prêsa dos mais
e o Estado, e à submissão da Razão dêste aos interêsses daquela. aud~es, que para responder, aos reclamos de hegemonia dos grupos
Não existindo a "associação", mas apenas a "agregação", o Estado l~ais, _que representavam, e aqueles do Espaço demarcado pela admi-
deixa de ser reflexo dos conflitos sociais para impor-se ativamente mstraçao espanhola - bem como aos novos relacionamentos com o
aos grupos humanos; é que, inexistindo o contato solidário entre os me~cado internacional - , tiveram de impor, aos qlle reclamavam
segmentos teoricamente dados como constitutivos da Nação, enquanto maior autonomia, a sua ditadura. Dividido pelo localismo, o Espaço
organização política, cada grupo populacional comporta-se como uma cobrou, logo após a Independência, o seu preço e os grandes caudilhos
"associação" particular em que segmentos e indivíduos situados em foram se~ instrumentos, embora pequenos diante da magnitude da
posições políticas altas podem ter consciência do "bem" ou do "mal" tarefa. A mcultura do grande número e a circunstância de a burocracia
que podem fazer (consciência essa aguçada pelo isolamento e pelo haver caído em mãos de indivíduos que respondiam antes aos inte-
caráter sagrado da organização social) e dos valôres que julgam dever rêsses privados do que à necessidade de construir-se uma estrutura
ser aceitos pelo grupo, mas inexiste a articulação solidária entre êsses P?lítica capa~ .de da~ coerência ao Espaço, vencendo-o pela coloniza-
çao, e organtctdade a Soctedade, pela articulação segmentar, impedi-
valôres e os criados pelos demais grupos.
ram que o Estado se alçasse novamente, em contexto político e social
Nessas circunstâncias, o Estado tende a ganbar em preeminência,
diverso, à CO_!l~ição de "cérebro s?Cial" que até certa medida fôra
pois, não se dando a articulação entre os diferentes grupos popula- a sua na Coloma, quando seu desvmculamento dos segmentos ameri-
cionais (portanto entre os segmentos que no conjunto do território ~anos .que desfrutav~ de posições políticas altas lhe permitira tentar
detêm uma mesma posição política alta, ou baixa, objetivamente unpedrr a subordmaçao humana do grande número aos crioulos, não
28
29
partilhada por outros grupos, aquêle grupo social que acaba detendo
e a subordinação política (em têrmos de posiç?es. políticas o Poder de Estado após as fragmentações do Espaço vice-reino! não
â~~;:tes) tivesse sido inevitável pela ex~nsão ~o temtó':'o e ~~ pode, por conseqüência, ter a visão da oposição, ou do inter-relacio-
já assinalada integração da burocracia adtmmstranva no umverso namento positivo nacional do país com o mercado internacional; o
"encomenderos" · ~ Ind ndência servindo único que é capaz de vislumbrar, quando em confronto com as novas
o Estado assim, privatizou-se apos_ ~
. ' , d
epe , . •
cuja atlVldade econonuca respo z
nd'a perspectivas que o livre-cambismo lhe abre, é o acôrdo ou a descon-
sempre CU!s mte~ess:~ t~s :;u::z;;ncias da articulação econômica da veniência desta ou daquela ação pora os seus interêsses locais, isto é,
de manezra mazs zre ado internacional. O exemplo argen- segmentarmente definidos. Não há, portanto, quem represente a Nação
América independente com o m_erc 'ficativo· em nome do "federalis- como um todo, pois inexistindo a "visão de classe", não há segmento
tin~, é, dessa pers_r:c~lV~r:e:~~, ~de Bue~os Aires, a" vont~e ~o
81 social algum que se possa reclamar da Nação por oposição ao exterior,
mo , Rosas zmpo . • . d U · em Caseros e da orgamzaçao conduzindo-a a um Destino que corresponda, em têrmos de Espaço,
pôrto e, apesar daCs VJtona;; _ " deri~~~ é 0 pôrto que acabará triun- a interêsses socioeconômicos bem definidos e pollticamente organiza-
nacional" com a onstltulçao ' ual culmina no dos em partido?0 Daí o Estado perder sua função diretora da conduta
fando ao longo de dolralor?so dprocessao Cdaep~~ a~~! as lutas pela e transformar-se em mero aparelho repressivo, no plano de suas rela-
·mstante em que ' fede .1zan o-se . -e enquanto • entreposto comerc1a· 1 ções com os súditos, e no instrumento de que se servem os priva-
unificaç~o, ~ B~enos Atres ~se_ ~J'eo mesmo nome e com ela estabe- tismos mais estreitos para garantir seus contatos com o mercado inter-
e megalopohs ~obr:' a provmc~ Nação A forma federal de govêmo nacional, sacrificando o desenvolvintento ora de grupos em posição
Ieee a hegemoma sobre o {''~to aconômi~as com o mercado interna- política semelhante, ora o da Nação como nm todo.
é assegurada, mas as re açoes et no 'rto é dêle o triunfo. Foi através dos privatismos assim definidos, dos segmentos da
cional, repousando exclusJv~en :' do ~stddo não corresponde, no "agregação" e niío das classes - enquanto expressão segmentar soli-
Esse processo_ de- pr~a j';';~t':' do Poder a um segmento social dária de uma "associação" - que o capitalismo penetrou na América.
enta:ao, à subordz~Ulifao a têrmos olíticos; niío é um segm:nto E é êsse fato que permite compreender como foi possível realizar-se
naczonalmente orgamzado em psi - politica alta, que afzrma nas sociedades periféricas do sistema capitalista aquilo que :ijaya de
da "associação", desfrutando de umat po c;:: posição política diversa. la Torre chama de contubérnio oligárquico-feudal-intperialista, isto é,
sua hegemonia sôbre outros seg""'::aos"agregação" que disputa com o capitalismo permitir a sobrevivência de relações tradicionaís, coq-
E: pelo contrário, um segmento s localis'-M 0 contróle do side.radas tipicamente como pré-capitalístas. Ou, em outros têrmos,
' · !mente presos ao .. ~•• como se deu a regressão do Capital.
outros segmentos, zgua b le mo norma do conjunto da Sacie-
poder de Estado para esta e cer co osi ão de Destino própria de fuse é o problema que examinaremos ao discutir como atuou,
dade submetida à coação est_atal a prop ~iculado orgànicamente os na América Latina, o princípio da comunicabilidade.
sua visão do Espaço. Por nao se te~e'!' o que vai ao Poder
núcleos populacionais s.ôbr<: o temt ..n~>._o d~kse" correspondente
eria dJZer uma vtsa • . . -
não tem o que se. pod . aJl• Possui isso siiD, uma vtsao
. - líuca segmentar-nacton . ' . . tal
a uma vtsao po ai D tino que é capaz de mturr e vez
política segmentar-loc ' e o- es assa o lintite geográfico de sua
propor de forma e:xyressaô n~o ui;,! tendo "atualidade" em têrmos
real dominação soc!OecoD mtb~atJ.. ente numa posição política com-
. . apesar de estar o Je vam
nacmnrus, tsto é ao
t.stê 1 politlca da classe, •
A "visão de classe" responde à. ex ~~ lnter&ses objetivamente ... ~:,fi­
19 rumos que possuem os m tárl ou não-propr1ewu~os
momento em que os rocesso de produção - proprle osecoberto pelO Estado
nldos por sua poslçA.o ~~nsão do território jurld.icamente ~unidade, "para. que
-, se ord;;!~za~s.:: lnterêsses. como dacent,~.;!.. e~ ~!~r o~ue seja uma nhdada_;
unit 20 Cf. Marx, Manifesto: "O resultado verdadeiro de suas lutas não é o êxito
para a t r em nome a c ....,......, da classe man e u.o. imediato, mas a união cada vez mais ampla dos operários. Es.sBI união é facUltada
a organização possa a ~~ tal seja é mister que os membros 0 que quer dizer
coletiva de sção;Js.ra.
no plano na.cton con
~tos organÍzatbriamente significativos
g1r _ visando 8 que as dlferen
t;
visões do mundo
mesma vlsâo
peio aumento dos meios de comunicação, que sAo criados peia grande indústria e
põem em relação os operários de diversas localidades. Mas basta que essas relações
se estabeleçam para que as numerosas lutas tocais, que têm por tôda parte o
conscientes dos fins d~v:!: espaços geográficos se dissolvama n~ portanto, é mesmo caráter, sejam centralizadas em uma iuta nacional, em uma iuta de classe.
~~::!~;~~~:~0 ~~~':a ~:!ac~m~:l~~~~ãon~~~;i~ó~~ ;i~~~;t=~~~ecs:::~Z;
Mas tõda luta de classe é uma luta política ( .. ,) O objetivo imediato dOS comu-
nistas [enquanto expressAo do pro1etarladoJ é a conquista do poder po1it1co [pelo
prec1so qu!ellbidade política da mesma forma que a soe , s partido]... Le Manifeste Com muniste, Altred Costa, Paris, 1947, págs. 72 e 81.
poisasoca ' t"
de oontatos freqüentes e constan es .
31
30
2

O PROBLEMA DA "COMUNICABILIDADE"

A unidade política da América, que se tentou formalizar no


Congresso do Panamá - esfôrço que foi logo em seguida vencido
pela emergência dos localismos que se apoderaram do aparelho do
Estado - realizou-se no terreno do espírito em dois planos distintos: o
das grandes massas índias e dos demais elementos do povo (negros,
mestiços, mulatos e cafuzos), excluídos legal e socialmente da direção
política da sociedade colonial, e aquêle dos crioulos, brancos por
ascendência, ou por autorização legal, excluídos politicamente da admi-
nistração dos negócios da Colônia." O índio forma a massa nacional
da América, se assim se pode dizer: ela é quechua, aymara ou azteca.
O fastígio das antigas civilizações ainda impressiona os conquistadores,
sobretudo aquêles que viveram depois da destruição dos gr~des im-
périos; daí ser o índio depositário de qualidades superiores ao negro,
escravo e sem história, e daí, entre outros motivos, ter-se firmado .. a
idéia de que "a instabilidade, a apatia, a degenerescência, todos os
sinais das raças esgotadas [encontram-se] mais freqüentemente no
mulato que no mestiço [que se distingue] por sua virilidade e seu
orgulho" ? 2 Mas apesar dessa valorização maior, que lhe permitirá de
quando em quando ascender individuahnente na escala social, o índio,
enquanto grupo, jaz à margem dos setores dominantes da sociedade
colonial: é a grande massa de manobras, a mão-de-obra farta e barata
que se explora na "encomienda", na "mita" ou através das repartições,
vivendo de suas tradições e dêste elemento nôvo e estranho, que é o
catolicismo, especialmente o ignaciano.
t!:sse isolamento a que a grande massa do povo foi condenada
determinou o aparecimento de dois tipos distintos de solidariedades
segmentares - um, a solidariedade dos que se sentiam quechuas,
aymaras e aztecas, mas não se podiam organizar para como tal apre-
sentar-se no contato com o branco dominador; outro, a dos que se
sabiam brancos e nas diversas e múltiplas formas de organização socio-
política - dos cabildos, ainda que sem função, às "sociedades de
21 Sõbre o problema da definição legal de raça na sociedade colonial, c!. Lula
Alberto Sánchez, op. cit., especialmente o capitulo nr, "El Racismo Contra la Unldad
y Essencla de América", pá.g. 47 e segs.
22 C!. F. Ge.rcla-Calderón, Les Démocratíes Latines de l' Amérique, Flammarlon,
Paris, 1912, págs. 335-36.

33
exteriores do culto) as almas indígenas. É preciso observar, entre-
. sua posição política e seu tanto, que se os ignacianos tinham a possibilidade de influenciar, no
amigos del país" - ~ consegwam expressar
sentido do pensamento dos séculos XVII e XVIII, o senso comum
desejo de transforma~!'!. olítica dêsses dois grandes segmentos, q~e das grandes massas - transmutando em palavras de ordem e expres-
À diferente posiçao p 't d Ma alhães ao Rio Bravo, obJe-
cortam a América Latma do E~trez o ees o~ iam diferentes visões do sões gráficas os conteúdos das novas doutrinas - a elas exatamente
tivamente determinada e defmtIda,. coerr p~derão dizer antagônicas por se opunham pelo que elas traziam de negação da F é e do poder
. quais no entan papal. Graças a êsse fato, o grupo intelectualmente mais avançado
umverso, as _ .' . o' .so sranl semelhantes nos seus con teu- ,
da colônia foi social e pollticamente incapaz de aumentar sua área
suas formulaçoes mtelectums,. pfms ead elo mesmo desafio não res-
dos mais amplos, porquanto zn orm d~ ~nadas pela maneira através de influência intelectual, e o único grupo possuidor das condições
'd d Espaço e igualmente con zcz d(l organizatórias capazes de vulgarizar os conteúdos intelectuais das novas
pond ' o o , . laç- dos diferentes grupos integrantes -
da qual se .d~u a artzcu- :;:: América no contexto mundial. A visa'?
posições doutrinárias niio o fêz por ser a ekls contrário. Assim, a con-
Sociedade Czvzl e a znserçaod. intelectualmente ao racionalismo e a jugação da necessidade de defender as posições políticas com a im-
do mundo do branco ten za h imento ligeiramente em atraso possibilidade de vulgarizar as idéias racionalistas deu como resultado
experiência - situando-se seu .con ec carn os do pensamento e da o isolamento social da r<intelligentzia" e seu envolvimento cada vez
sôbre os progressos que se fazlru;:. n,:nor rspecialmente a partir do maior pelas condições de que tirava o lazer necessário ao pensamento,
investigação na Europa ( defasaged t dição e da autoridade intelec- conduzindo à sujeição secular do índio e à separação perene entre os
século XVIII) - num renegar a !a ue a ui chegava de contra- dois grupos: um dominante, mas não dirigente - pois não fôra
tuais, o qual era própria da Ilu:~.ç~oiá ~que!~ da grande massa, se capaz de vulgarizar a doutrina que legitimava sua dominação e, con-
bando, ou tr~duzida _pelos esptm~~ào sem esp~ranças e a cateque~e seqüentemente, de fazer a realização dos valôres políticos a ela asso-
conformava a t~adzçao_ pela su o uando dirigido às camadas mais ciados tornar-se necessária; outro, dominado, mas até certo modo
dos jesuítas, cuJO ensmo, mesm ,;.trutura e processos, chegando a dirigente, pois seu pêso cultural específico era grande, não pelos való-
cultas, não se renovava em dsua d. putas verbais" e afastando-se do res que conseguia transmitir ao grupo dominante, mas pelo fato do
descambar "para o aparato as ~~ncia e nas matemáticas". 23 Dessa maior número de seus membros no corpo social alterar de td! formo
conhecimento "amparado na exper arava or sôbre a situação de a composição do meio social interno que os intentos para vivificá~{o
forma a visão intelectual do mundo sep co~trava com relação aos culturalmente malograram.
' .
dependêncza em qu
e a grande massa t seosendois segmentos, os brancos - Em outros têrmos e para outra situação, Antônio Sérgio descre-
. ár' aos brancos , tout . al'
propnet !OS e . - cour ,
declaradamente raczon Jsta e exp e- veu o mesmo fenômeno dos dominantes serem dirigidos pelos domi-
sofrendo, apesar de sua posiç~o . d s a influência niveladora da nados: "É que, nessas campanhas, pela mentalidade crítica que se
rimentalista aprendida nas UmversJda e! , am obrigados a construir a têm sucedido desde o Luís Verney, praticamos o êrro que foi tão fre-
and , mero sóbre o qua er XVIll qüente nas nossas campanhas coloniais. Avançava a coluna de opera-
pressão do gr e nu . . isso 0 espírito do século
teia de suas relações soctats. Por d 'uperiores hispano-arnericanas, ções; ganhava-se o combate, triunfava a tropa: mas, vencido o gentio
europeu, o qual iluminava as cama ~ s nquanto solicitação intelec- e acabada a guerra, não se desenvolvia metodicamente o trabalho
nelas deitava raízes que eram profu asrziência vital com a realidade; de ocupação do território, numa colonização de todos os dias, sem
tua/ mas superficiais enquanto corresp~ ·a socz'al não podiam extra- desfalecer e sem parar. ( ... ) Ora bem: na guerra da cultura tem
• _ d m· a uma vlvencz , nd sido assim. Deixamos sempre a possibilidade de um retôrno ofensivo
e que por nao respon ere . l que medravam e fecundar a gra e
vasar o estreito ambtente socw em da grei selvagem. ( ... ) Os argumentos de um Herculano, ou de um
massa espalhada ao redor. demais diante da grande massa verslty Press, Nova York, 2.• ed., 1963. Sôbre o problema da- forma mentis que
O grupo "ilustrado:' era pequ;~o rocesso político-social - peq~e­ inspirava o ensino jesulta, c!. Laerte Ramos de carvalho, As Reformas Pombalinas
da população, que Jazia a margemosi r, política que se encontrava zm-
no e. de tal forma czoso de sua p 'dç . l'ta'rz'o ou meramente escla-
cta Instrução Pública, S. Paulo, 1952, de onde é extraída a cltaçao acima (pág. 23),
Se, conforme acentua J. Lúcio de Azevedo em Os Jesuítas no GrO.o Pará, citando
Ranke, "seus métodos de ensino eram realmente superiores [a ponto de tornar-se
ad . o conteu o zgua ' ' d vlsiveiJ que os alunos dêles mais aprendiam em seis meses, que os de outros em
possibilitado d e tr uztr têrmos acessíveis ao senso comum as dois anos; até os protestantes iam a muito tonge retirar os fUhos dos ginásios,
para confiá-los aos jesuítas" (pág. 7), é preciso notar que na PenínsUla Ibérica,
recido, de seu pensamento. e'!' os 'esuítas a tinham - e de fato especialmente em Portugal, a- colocação de Aristóteles a serviço dos interêsses da
grandes massas. Essa posszbzlzdade, ~empre presidiu sua catequese religião católica, conduzindo às "dlsputaa verbais" e cedendo aos hábitos pedagó-
gicos então vigentes, fêz que "a Universida-de portuguêsa, que, com as primeiras
souberam, pelo instrumentahsmo que f almente para os aspectos iniciativas de D. João UI, parecia destinada- a palmUhar mais amplos e abertos
a América conquistar (atnda que orm ' caminhos, sUbitament-e Lenveredassel por nova direção e se [transformasse] no re-
n ' atina até a Independência, duto, fortemente garantido, dos ideais da Contra-reforma" (L. R. de Carvalho,
--,-,-.-ô-b-,e-a lnfiuêncta da. nustraçãot n~rt~rér~~aW~11taker, editor, COl'nell Uni~ op. cit., págs. 23 e 24).
v. Latin America and the Enllghtenmen , 35
34
sociedade secular realiza na sua d' • . .
1 - A IUltureza da "comunicabilidade" das perspectivas de todos os gru ntamlca evoluu:'a uma ampliação
da abstração indispensável à co:'';etor~ando-os, Igualmente capazes
Verney, convencem a pequeníssima minoria lusa dos homens inteli- da Sociedade, na prática o tipo ne! ensao C!entif!ca da Natureza e
gentes e sabedores, isto é, dos que não precisam ser convencidos, e e a posição política tende a cond· sempre se traduz em sua pureza
as trapaças soezes dos seus inimigos reforçam a reação da gente ignara, mundo. Ademais é reciso con . lClonar a amplitude da visão do
que vence por fim, mantendo a incultura tradicional. ( ... ) O que víduos situados ~m ~ma osi ~dera!. que, e!llbora ?s grupos e indi-
se impõe é o treino metódico, continuado, generalizado de grande 24 prestígio que cerca suas c~iaçbes i~~!~~~~:sa!~ alta ;::{.l~e~ciem, pelo
número dos nossos jovens nos melhores centros de investigação . .. ". sarnento daqueles que se encontram em . '- .men. 1 a e e o pen-
Assim, o contato entre a minoria crioula e o grande número foi alteração relativa de suas pos' - , poslçao mfenor, a agonia pela
marcado desde o início pela dificuldade de os grupos socialmente do- cada grupo pode ser consideradoes ~ um pr?cesso dialético em que
minantes transmitirem em sua inteireza suas idéias aos grupos domi- Objeto, o que obriga a ter em c~~t: de fato ;· a um te:npo Sujeito e
nados. Essa dificuldade, que ao longo do processo conduziu a que as do universo de pensamento do gru de que orma se da a adaptação
idéias ilustradas, ou liberais européias, terminassem por afirmar na A ideologia de uma é oca é po. ommante ao daquele dominado.
América a existência de formas sociais a elas antagônicas, explica-se, sôbre isso não há dúvida~ . , a ldeologm da classe dominante -
como veremos a seguir, pelo princípio da cofYUlnicabilidade. superiores têm condições d~ ~~ que apenas os estratos socialmente
A comunicabilidade das idéias e valôres dos segmentos que des- conse~üentemente propor ao c~;~n~~sd~en~~ Jo~ais da Cult~ra e,
frutam de uma posição política alta com os grupos sociais que se mane1ra de ver mundo M ,. . te a e uma particular
logias tomados0 de .. asod,se os conteud<;>S mtelectuais dessas ideo-
encontram em posição baixa, é fenômeno da maior importância quan- ' per Sl, P em ser refendos às · - l"
do se estuda a transferência de ideologias de uma situação social para que permitem a apreensão das .d" . . . . pos1çoes po 1t1cas
outra e sua implantação em um solo histórico diferente daquele que daquelas que, na época melho 1 :'as. mms slgniflcahv~s da Cultura e
lhes deu origem. 20 As idéias e valôres, especialmente as doutrinas polí- e da Sociedade, é preci~o nunc~ ;::J~~ d~ ~~;:'fre~~s: da Natureza
ticas, quando surgem, correspondem a uma determinada composição assegurar-se a direção intelectual e cultural da ~ied:dsua lu~ por
do meio social em que se insere o grupo intelectual do qual foram tando, portanto, a hegemonia com outras ideologias e ';J !Spu-
elaborados; traduzem, na forlrl(l mentis que deixam entrever, a pene- outros grupos igual~ente em posição política relati~ao .!ita e..':_ com
tração maior ou menor de uma visão do 111jundo que, teOricamente, grulpos Jlfetendentes a hegemonia são obrigados a proceder pela 've';.~
pode dizer se urbana ou rural, isto é, tendente à racionalidade dos
u~ive~so pe:':~~~) ~t~l:~~~~s ~::o a~
ba •zaçao, a uma acomodação d ,d . '
comportamento, ou à sua sujeição ao tradicionalismo; indicam a am- de discurso (portanto d;'
plitude do horizonte intelectual do maior número, tanto mais vasto q ai e sempre menos complexo e sempre menos atualizado em tê~o
quanto mais abstrata se faz a compreensão dos passos necessários d': progresso intel~ctual,que os próprios. Nesse processo: desde qu!
para dominar a Natureza e aumentar a participação dos diferentes nao. SI! p;rca d.e VISta que a Sociedade é um todo articulado, a com-
grupos sociais na fruição dos valôres socioeconômicos. Nas sociedades poslçao o,. mew...soem/· assume sua p/eiUl relevância · Realmene t se o
sagradas, o horizonte intelectual dos grupos de posição política alta grand
e numero Ja se zntegrou no universo de pensamento secuÍar
tende a confundir-se, dada a integração e a coesão sociais decorrentes mesmo que sua capacidade intelectual não seja desenvolvida e ; ;
da pequena diferenciação, com o horizonte do maior número, vale
dizer, daqueles que ocupam posições políticas baixas ou apenas rela-
umver;o. de discurso complexo - , a ideologia secular se verbaliz~
nun:; umco e mesmo "etfws", que informa tôda a Sociedade lt
tivamente inferiores. Nas sociedades seculares, pelo contrário, tenden-
do a diminuir e transformar, pela alteração da qualidade dos con-
~;oes p~ofundas que possa vir a sofrer nunca atingirão ~ :sc;:.;u;~
zn erna o P_ens':"'en~o - ela também reflexo ativo do horizonte
tatos, as primitivas coesão e integração, a posição política alta permite mental pec_ulwr a sociedade secular. No entanto, se o grande número
uma participação na cultura nem sempre acessível ao grande número,
pro~ede há pouco do meio sagrado, ou nêle vive, a verbalização deve
donde o aparecimento de dois horizontes intelectuais claramente dis-
se ar num universo de discurso que corresponda a um uethos" d'
tintos: um, abstrato, outro, concreto. Se na consideração teórica e
tomados o sagrado e o secular como tipos, é possível admitir que a verso daqu~le em que se gerou a ideologia - e na relação dialét~~
q~e dse esta elece entr~ a formulação das expressões verbais e a aceita-
24 Cf. Antônio Sérgio, Ensaios, tomo II, 2.• ed., PUblicações Europa América, çao o pensamento novo o "etlw " do nd ,
Lisboa, pág. 79.
1957, Loewenstein,
alterar a estrutura de p:nsament: d grupo gra epretendente
numero tende a influir e
à hegemonia,
25 Ka.rl In Teoria de la Constitución, Ed1ctones Arlel, Barcelona, 0
1964, pág. 30 e segs., estuda fenômeno semelhante no terreno das instituições polit1cas.
37
36
o menor número) pagava à "encomienda" e à "mil " " .
estrutura de pensamento essa que é secular. Essa alteração decorre da ass~ntava o principal de sua posição política F . a sofre as quazs
interação que o grupo aspirante à direção intelectual da sociedade é mats de exploração do trabalho b . OI nessas armas colo-
forçado a manter com o grande número a fim de impor-lhe as condutas dalbismo e~rop~u, outra combinand~m: e~~~:e~~~e~o~odêlo nl? .feu-
que lhe parecem normais, mesmo que ao nível dO$ contatos criadores am as se msenndo num universo e . . o sa ano e
suas relações não sejam freqüentes; ela decorre do péso da tradição, que limitado pelo tipo de atividade eco~ q~e ~ h~nzonte mtelectual era
operará com sentido regressivo enquanto as relações sociais não se am-
pliarem e se racionalizarem de forma a permitir a secularização do
pensamento do grande número. A alteração referida acima dá-se sobre-
:~~a/ ~~c~~:~~:l'::.::S:o ~e~~':z~i~~~s:~:E:~~?~t~rblll ~h~e í~~~~
embora as custas do ne co tçao umana,
segundo, às vêzes igual!~~o-~rrz::sa :~~~: S:::m~C:::i;~aa~or~ário; o
1
tudo na estrutura do pensamento, que adapta muitos de seus elementos
seculares aos sagrados, única forma de o grupo que aspiraJ à hegemonia co 1ocando a necessidade acima da virtude fazi d . azao, mas
ver suas idéias incorporadas ao senso comum.; raramente se verifica clamada um sofrimento eterno 28 N- , d ' a h e sua zgualdade pro-
. · ao e e estran ar dado 0 ·
na forma verbal, que aparentemente permanece idêntica à primitiva, se d tsse, que os ignacianos tenham an .' que aclffia
que no entanto recobre conteúdos mentais diferentes. poder temporal que advinha de sua g ha;Jo a dzsp~ta, ao perder o
E o grande número, portanto, que estabelece pelo seu pêso espe- Realmente, apesar de haver deixad m~s~~o catequellca na Colônia.
cífico no conjunto da população, pela inércia da tradição e pelo maior teção das autoridades - o os m tos entregues tão-só à pro-
vigor do "ethos" peculiar à sociedade sagrada, a direção intelectual e ciada pelas idéias esclarec~du: :_omento e~ ~ue a Coroa era influen-
cultural da sociedade em seu sentido mais real e profundo; não o grupo punham com os "encomender~s" as seus .mt~tstros n~s lndias se com-
socialmente dominante, que no entanto foi quem, inicialmente, propôs hábitos mentais que favoreciam -;-' a~s ]esu~tas ~avwm nêle.:. . bu;utido
a nova formulação verbal, superficialmente incorporada ao universo de quais se por um lado facilitavam tomallzaça~ da- obedtencm, os
econômica dos brancos (salvo adtarefa de dommaçao e exploração
pensamento do grande número, o qual continua prêso às antigas propo-
sições, essas sim integrando vitalmente sua maneira de ser. Quanto entre outro~,. inj,u~tiça atingii~:it~~ ci~~u~~~::~
a t
;;;,upact Ama~u,
mais a vulgarização da ideologia secular se fizer por meios e princípios
aristocráticos - isto é, quanto mais a atenção se fixar na mera verba-
f:/:Za 'J.:;l;;llo crzllco intel~~tual, o qual informava d ll~t:'a~Z :~1~:
lização, contentando-se o núcleo pretendente à hegemonia com a acei- triu~far; é :,.~a/:::~~r~0':,~1 e~za _ver~al, 0 jes':'íta tinha fatalmente de
no .essencial c~m . m nelra e vu 1ganzar a cultura coincidisse
tação apenas verbal, superficial de suas posições, da "liturgia mais do
que da fé", tanto mais o princípio da comunicabilidade tenderá a fazer a estrutura de pe::SaC:::e~:~o~t;:e ~c~gas. essencialmente a_ristocráticas),
que o passado triunfe sôbre o futuro e que o "ethos" sagrado vença sua, por ser êle o intérprete mais fi:;';/~:~'/!o';'!'to tzandnha de, ser a
o secular. 2 6 O fenômeno não se observa apenas nas sociedades estagna- - e do prevaleciment d f . ' o gr e numero
das, como no caso citado por Antônio Sérgio: também naquelas em democrático, que coe~ist~a ~m~l m~ntl: a transformação do conteúdo
processo de transformação, a comunicabilidade se impõe, embora o priamente autoritários, foi uma ::s ra{ao cor;n os seus. aspec!os prO-
predomínio do sagrado possa ser de mais curta duração: "Desde que o democratismo dos crioulos P_ so, avorecido pela ctrcunstancia de
o bolchevismo se recolheu espiritualmente à sua carapaça nacional, interna sentida e ser merament:ao ~o~responder a uma reivindicação
na grande propriedad ver ~a por assentar na "encomienda"'
tomou-se insustentável sua posição. O partido da revolução teve de se e, ou no comercio, meramente intermediário e
abaixar até o nível de seu meio semi-asiático. Foi obrigado a despren-
Segundo ots Capdequ[
-, a28" encomienda" - El Estado
é uma instituiçã d Es
Jafl.ol en las Ind.ias, FCE, México, 1957
der-se da tradição especificamente ocidental do marxismo, abrir-se à
=~~a~~~~~1!!·~~~~1~~~a·\s ur:dias, c:ra~terrs~~ca~e~v~:!: ~:aQu~ ~~:sluí~d~~~~ill~~
1

infiltração lenta e persistente da barbárie e do atraso indígenas, mesmo


rldade do espanhol "encomend~P. q~e fa:il~as de índios ficava submetido à auto-
quando lutava contra êles".
27 ços pessoais dos índios para as vâriase c~ qu ria o direito de beneficiar-se dos servi-
0
Na América Espanhola colonial, a vitória da "gente ignara ... mento de diversas prestações econô asses de trabalho e a exigir dêies
instrução religiosa. Já a "mita" é micasi Em troca·, deveria protegê-los e dai-.l~es
a a-

mantendo a in cultura tradicional", porém, não decorria tão-sàmente longo, do período colonial, apresent~~adi nstltuição de origem indígena, a qual ao
tayos eram sorteados para trabalhar du versas formas. Geralmente os índios "mi-
de seu maior número: era o pesado tributo que o grupo dominante e ~edlante o pagamento de salário rante um certo período com os espanhóis
supostamente dirigente (supostamente, pois não estabelecia para tôda ?üentes, tanto na "encomienda" ~~tr~lado ~~las fl;'!ltoridades. Os abusos foram fre~
alar de trabalho semi-escravo. an °
na mita e em ambos os casos se pode
a sociedade a sua direção intelectual e cultural, limitando-se a atingir
~':sB~erto Sé.nchez, op. cit pág ~~~s!!u~ ag índ11o e ao negro pelos jesuítas, diz
Com relação ao tratamento dis d
26 O problema da vulgarização aristocrática, ou não, de uma ideologia é discuti·
do por Antonio Gramsci, em oeuvres Choisies, Edtttons soctalea, Paris, 1959 pág. í~dlo de~!~~~o,d~~~c~~.s~~~ r::·~er~so Após~i~ :a:ir:d~:~~~=~~és~~/e~ ~
a ser criatura inferior por vida e a ~e dln justa sentença contra o negro, condenado
p .. r 1reito natural. .. e divino".
20 e27segs.
Isaac Deutscher, A Rússia Depois de Stalin, Agir, Rio, 1956, pág. 31.
39
38
dinâmicas que condicionam a mudança social nos centros hegemônicos,
dependente daqu~las, dadas as condições de articulação da América o grande número não são apenas os quechuas, os aymaras, os aztecas e
no sistema mundllll. os mestiços, mas a própria América colonial: índios, castas e crioulos,
indistintamente.
O capitalismo, quando chega à América, seja na fase comercial,
2 _ A ideologia e a realidade seja na época industrial, perde muito da velocidade transformadora do
"ethos" que o caracterizava nos países de origem. :Ble não tem, na
A comumca · b'l'dade
11
pode ser vista' assim, como transformação ~ América, formas sociais de igual ou superior complexidade, politica-
do conteúdo interno do pensamento sem que se altere sua e_xpr~;ao mente articuladas, que se lhe oponham, levando-o, na superação de
verbal exterior. Esse processo, que c_han;aremos de .regr:ssao, -se sua negação, a propor uma forma superior de vida e um horizonte
em vi;tude de dois fatos principais: przme~ro, a verbalzz~çao. d~ novas intelectual mais amplo ao conjunto da população. A colônia, dêsse
'd" fazendo-se com intuitos proselitistas (servmdo a Fe, a manu_- ponto de vista, é seu subproduto, porquanto interessa ao processo capi-
z ew:, si ões líticas altas, ou à razão de Estado), tende.a term_z-
tençao de po ç ti;". que não tem fim muito paciente e mmto sutil, talista em desenvolvimento apenas como fornecedora de matérias-pri-
nar em um comen ano ' - od ' m mas, ou de metais preciosos, e mercado de consumo de produtos aca-
- tomadas como definitivas e que nao se p em por e bados. A dinâmica do processo não impõe ao Estado metropolitano,
dd~ ~donce.rot~ forma que "tôda a vida intelectual [fica] reduzida a ao hacendado ou ao capitão-donatário no Brasil outra função, nem
uv1 a, e .. tar"29 que leva as
comentários ... comentar, subtibzar, recomen -:---- 0 estabelece necessidade criadora alguma ao sistema capitalista hegemô-
• #. der sua função transformadora e a zncorrer nos mes-
nico que não seja a de assegurar um fluxo regular de bens entre uma
=~~~~:':s ~::~elas que combatem; segundo o co_~te~to s_ot c;az m:::f;' e outra parte do oceano - e a própria destruição da organização pré-
nn.~sam a vicejar e a experzencza Vl a - -
comp Iexo em que elas y--· s esposam -colombiana dá-se por terminada logo que as grandes massas sejam
id I . l olítica a um tempo - dos grupos que a . jogadas na produção do que exportar, não importando que às formas
~es~: ~i::::'fw en%va, a qual é diversa daquela dos gruposd em 9tiueol!~eà pré-capitalistas de economia, com seu "ethos" particular, não se tenha
.
rom orzgem
O af-a prosell.tl.sta conduz ao pensamento
- .
ogrna c
·a~so ·~" de fato substituído uma forma capitalista acabada de produzir, defi-
esclerose d~ novas idéias independenteme~te no m::Io soct ~en~m':~~ nida não apenas por uma diferente e mais racional relação entre pos-
úl_:imo,é~~;s~:~~·0~v:~~:~~!~~:~!~ie~t:~~~~~ d~~~ dos instru- suidores e não-possuidores, mas também e sobretudo pela maneira
especial de ver o mundo.
:::'~n~~ de intervençã~ na realidade social capazes de alterar as con- A colônia não desempenha, nesse contexto, papel substantivo
diçõe~~d;::oa~~ colônia, a regressão não se apli~a- some~te às ]idéias algum no processo de produção capitalista - é assim mero objeto
da história do capitalismo europeu, porque não passa da extensão
.lo ue ocupa uma posiçao pohllca a ta na
~~~J~~~ ~~o~tq~~~~~ ~o;!frontado com a ma~sa nacional; aplica-se objetivada das monarquias européias; é na Europa que o processo se
joga, não aqni; lá é que se decide, ao longo dos séculos que vão da
a todo o complexo cultural europeu, quand~ podsto eml c~enstaetont~~~ descoberta até a I Guerra Mundial, a hegemonia, não na América.
, . - em outros t'ermos, da perspectiva . as
a colonta 1 re aço
" . cul
( t mado como complexo socta ' economlCo e A distância que separa as colônias das metrópoles e sua função
~~:'~~)li:~o~~:~?ct': col~nial essencialmente passivo no jôgo das fôrças
w

econômico-política extremamente reduzida não levam a América, en-


quanto grande número, a influir, alterando num sentido regressivo,
29 Antonio Sérgio, op. cit., págs, ~- 7 · idêntico fenômeno para o Direito Natural as fôrças sociais e as idéias no cenário que lhes é próprio, isto é, a
30 Lourival Gomes M~~hado assin!ao~e construção doutrinária, se tornará cada Europa; todavia, tão-logo essas formas e idéias se transplantem para
Moderno, ao mostrar que nessa: tncentos ordenadores e classtf1cadores, isto é, dos
vez mais notãvel o papel dOB eleme âo dos elementos novos, cuja tmportân- o Nóvo Mundo, alteram seu conteúdo e assumem novas funções, muito
crttérlos e normas responsáveis peta in~~ 10 0 depois exprimir-se nas untversali-
cta, de Inicio evidenciada emplrtcamen~~ base 'is regras normativas ( ... ) Stmultâ- embora mantendo uma aparência exterior igual, ou ao menos seme-
zações, a"B quais por seu turno ofere~:r estruturai do sistema estimula a inclinação lhante. Essa alteração e essa mudança não se dão apenas porque o meio
neamente, porém, a própr:a econom o fenômeno é constante e progressivo. Sempre
ao rigorismo e, como tendencia geral, nais a tentar a renovação, a modernização social interno em que se implantam é diferente, mas também e sobre-
surgido contribuições mais ou menos ar~ roporçáo contam os sinais de ancnose:
do direito natural, mas em muito ma 0 P ssam a dominar as glosas, e ao;; tudo porque a totalidade parcial a que estão referidas é diversa. O
tudo se aprisiona na pauta fixa do sistema, e Joa império dos mer06 compiladores, hacendado, na América Latina, muito embora possa ter as mesmas
glosas de glosa, até que entramos, francament~ ar e reexpor simpltficadamente o
cujo único subs[dio apreciãvei esteve no de~t nç ginais e achegas acomodadora.s" prerrogativas que um senhor feudal europeu no Seiscentos, e portanto
que já mal se lia no emaranhado das n?taç es ~a~J Rousseau", Fac. de Filosofia, com êle possa ser confundido ao se compararem as relações que o
- "Homem e Sociedade na Teoria Pollttca de . a. 12 e 13.
Ciências e Letras da USP, Boletim n.o 198, 1956, P gs.
41
40
cana encontraram um clima favorável à sua difusão na América do
indio "encomendado" guarda com o branco "encomendero" e as qut Sul, porque já havia, ainda que fôsse embrionàriamente, uma burguesia
mantinham os senhores com os servos, dêle dife~e, no entanto, num que? por cau.sa de suas necessidades e interêsses econômicos, podia e
aspecto essencial: o nobre europeu, por sua manerra de v_er o mundo, devm con,_ta~ar-se do ~mor revolucionário da burguesia européia. A
pela "maneira nobre de viver" em tôm? da qual ~~strum seu rode~ Independencm da Amenca Espanhola não se teria realizado certa-
declinante, e pelo privatismo inerente a sua cond1çao ':'obre, na~ _so mente, se não tivesse contado com uma geração heróica se~sível à
encarna a tradição e o "ethos" católico-medie~~l contr~JOs ao espírito emoção de sua éJXX:a, com capacidade e vontade para ~tuar nesses
do nascente capitalismo, como é seu adv~~s~o na dtsput~. da cons- povos uma verdadeira revolução. A Independência, dêsse aspecto,
ciência verbal dos povos; o "encomendero , amda que cat?lico .e tra: apresenta-se como uma emprêsa romântica. Mas isto não contradiz
dicionalista, ainda que criador de um "ethos" ru~~ de novo tipo, e a tese da trama econômica da revolução emancipadora. Os condutores
uma peça da engrenagem do sistema que destrm, .exat~ente, seu os caudilhos, os ideólogos dessa revolução não foram anteriores ne~
correlato europeu. Da mesma maneira e com senttdo dtferente, as superiores às premissas e razões econômicas dêsse acontecimen'to. O
poucas cidades coloniais e as camadas urb~as: .se, enq':'anto forma fato intelectual e sentimental não foi anterior ao fato econômico" }H
social exteriormente caracterizada, opõem-se a haclenda, ntss? se apro- ~ ,~rro. de apreciação radica, a nosso ver, em que o aparecimento das
ximando do burgo europeu, ao contrário. dêle, porém, não cnam nov~s Ideias ilustradas na Independência não indica necessàriamente a exis-
maneiras de pensar diferentes das dommantes _no Agro, porque nao tência de "uma burguesia que, por causa de 'suas necessidade~ e inte-
constroem novas maneiras de ser. As ctdades. sao, na Amenca Latma rêsses econômicos, podia e devia contagiar-se do humor revolucionário
colonial, 0 mero ponto de passagem .da riqueza e_xt:aída para o, mer- d~ bur~esia europé~":"· Essas idéias foram importadas da Europa e
cado consumidor europeu, ou a cadeia de transmissao en~ a... fabnc!l' na? cnadas na ~m;n~a -.e foram Importadas por setores sociais,
européia e 0 consumo do hacendado; elas não são organ~zaçoes !'oll- CUJa forma de existencta social não pode ser considerada "burguesa".
ticas antagônicas àquelas criadas pelo ~eu?o. Se ~ ~omercm fm, na No caso do Peru, em especial, a burguesia enquanto modo de pensar
Europa, um dos elementos que conduzm a .~estrmçao do feudo en- urbano talvez só apareça quando tem em Ricardo Palma e suas "Tra-
quanto modo de agir pensar e sentir, perm1tmdo uma nova estrutu-
dlclones Peruanas" (1872), aquêle que aceita as "vozes histoocas do
ração política da ~iedade, 31 na América. Lat~a não desempenhou povo", o crítico do espírito jesuíta e da nobreza, e encontra em Gon-
essa função: êle foi tão-só o age~te .de ligaçao. entre as peças do zâlez Prada o pensador que, além de reivindicar sempre a glória
sistema capitalista em ascensão, a fabriCa e a Juu:_Ienfa_· ob~~ra da mas~a,. como refen: Mariátegui, promove a agitação anti-
Quando José Carlos Mariátegui, um dos ~rus luc~dos pensadores
da América Latina, ao analisar a exp~essão social da htera~a perua- c.atohca, , sem duv1da alguma mfluenciado pelas idéias francesas no
na, afirma que sua "fraqueza, a ane~ta, a flaci?ez. . . provem d~ s~ua fim do seculo passado, mas também respondendo aos reais problemas
falta de raízes [pois] no Peru a literatura n_ao broto;' da t:adiçao, da sociedade .~:oana, agitaç:';" essa que assume aspectos de uma quase
guerra de rehg~ao, capaz de chegar ao lar, 'ao mais secreto da família
da história, do povo indígena, [mas] de uma ~por!~~? defliteradtura
~ a todos os. instantes da vida' ". Só avançado o século XIX, pois,
espanhola"32 e estabelece como causa dessa anem1a o a1o e a
e que o honzonte mental se abre - e é só então que talvez se
Revolução da Independência não ter sido, no Peru, obra de. ~ma bur-
possa falar numa "burguesia".a5
guesia mais ou menos sólida, por inexistente, o que perrmtm que a
As idéi~ iluminadas, que na Europa resultaram de um longo
aristocracia colonial e monárquica se metamorfoseasse, f?rmalmente,
process~ so:•al em que .as progressivas secularização do pensamento
em burguesia republicana, diz uma verdade,•• que contradiZ ao propor
e urbaruzaçao das manerras de viver - secularização e urbanização
um "Esquema da evolução econômica" do Peru,. n~ .9ual reconhec.e
~ue, pela dilatação do horizonte intelectual, permitiram ao pensamento
que "as idéias da Revolução Francesa e da Constitmçao norte-amen-
rmpregnar-se do racionalismo e do empirismo - na América medram
lhor até hoje caracterizou a estrutura
31 Durkheim talvez tenha- sido quem me ' ti ' d uma sociedade nada num meio social e hwnano que não é o seu, pois não é urbano, nem
polit1ca de uma· sociedade qualquer: "A estrutura poli ca e formam adquirem o
mais é do que o modo pelo qual 06 diversos segmentos que aicionalmente intimas. secu@, nem .crítico. A tal ponto que Miguel de Unamuno assim pôde
hábito de viver uns com os outros. S e as ~u:s:~oç~::á~~o i:.~em a se diferenciar" resumrr o un_•verso de pensamento em que, em 1905, via mergulhados
segmentos tendem a se confUn 0 1r; n
06 in ' l937 ág 1968
os mtelectuats htspano-americanos: "Os povos hispano-americanos, da
_ As Regras do Método sociológicO, Cla. Editora Nacio_nai, • P : Perua-
32 José Carlos Mariátegui, Siete Ensayos de Interpretactón de la Realtãad
na, Editorial Universitarla, Santlag~ ~o cC:ià~d; ;~!;ii/! Literatura Brasileira,
9 34 Mariátegui, op. cit., págs. 7 e 8.
33 Ibidem, págs. 184-85. Cf. Ant n ° n ' e a reclação do valot· 35 A citscâo acima ~contra-se em Miguel de Unamuno, Alounas aonsideracio-
prefácio da 2. 8 ed., Martins, São PaUlo, 1964· !ara u~~l~er;~~ciffca"mente à. Utera- nes sl?bre la Literatura Htspanoamericana, 2.• ed., Espasa-Calpe, Buenos Aires, I957,
da literatura colonial. Embora. suas observaç es se iodo Coleçao Austral, pág. 82 e segs.
tura colonial brasileira, podem ser aplicadas às literaturas do per ·
43
42
mesma forma que os de Espanha, e em geral os que chamamos povos submetê-los às suas leis. assim passar do r .
latinos, devendo chamar-se católicos, não saem da Igreja senão para pressão social acabada da raci~nalidade da ;~-camblsmo,. com? ex-
cair nisso que se chama livre-pensamento, que é uma atitude intelec- como expressão política superior, foi um as~oureza, ao liberalismo,
tualista em que jaz inerte, no fundo da mais alta espiritualidade, o era na Europa que se buscavam as • P pequeno, porquanto
fundo religioso. Educados no intelectualismo católico, em dogmas, em I raiZes com que se int
construções conceituais, em supostas provas lógicas da existência de ongo pr~esso agônico, a América no ciclo cultural do OciJgrtaraC, em
o que se mstalou o "Coloniaje mental" en e. om
Deus, em uma fé raciocinadora, quando a cultura científica e filosó- Augusto Céspedes, num grito de · lt .
fica os afasta dela, não sabem encontrar a verdadeira fonte da religio- da comunicabilidade da pers ti' drevo a, ass~ retrata os efeitos
sidade, nem sabem chegar à fé viva, à fé independente de dogmas. ded . ' pec va o grande numero triunfant
Ainda que sendo ateus, continuam no fundo sendo católicos, isto é, f.% c~~ ~~~~~::'da~=~lo, que c~llll!a de "do_utrina da Anticultur~"~
~~tr=;~ ~o~~: ~~o::;,~rd~~JF!:r~~~an~6s~~~~a u:O~o;e~~!~~
intelectualistas e dogmáticos" .36
O racionalismo ilustrado, que foi a culminância da grande trans-
formação na "Weltanschauung" européia, permitindo aos setores urba- mtento de legitimar-se como herdel'ras d . ' s c asseds altas, no seu
nos disputar com êxito o poder para afirmá-lo politicamente na "Gran- ·, o encomen ero' hi
~i:J::ta'ls~o e~,'~~\~;~~:irfr:U~:::~ P{ocur.a~am ,tra~splantar ~~%;:
A •

de Revolução", na América Latina transformou-se em mero intelectua-


lismo e dogmatismo, bastando ao único propósito, uma vez expulsos social ( ) A im 't - d . ' pohhca, a literatura e à vida
os espanhóis, de legitimar em nome da Razão o domínio social dos - . . . I açao re uzm-se [porém] à caricatur .
que se diziam brancos e ilustrados e por isso se arrogavam as prerro- §~o det transfusão ao ru;rasamento material dos vestígios adoe ;a;~~;;~-
men e uma raça nativa forte como a edra pôde . . , .
gativas do mando social e político. Esse foi o efeito maior da comu-
nicabilidade e aquêle que explica o caráter especial do liberalismo ~::;,ha~e d~vast~ção empreendida contra fia durante ~':;1~~ ~~~=

~~ir:,rtd_~r~~rr~~::i~i~:i:::!i~~:J~ti~~~f1~~?e/:iaF~r~:;
crioulo: as idéias "burguesas", surgindo antes da burguesia, tiveram
de amoldar-se à posição politica dos grupos dominantes, todos êles
participando de um "ethos" diverso daquele em que elas se haviam CISCo e la Paz arrancando arte d alh ran-
originado. E por isso que quando o liberalismo se realiza formalmente incrustar Ih ' b · P a t a de seu altar-mer para
após a Independência, tende a estabelecer e consagrar o latifúndio, que a impres;ã; f~~o :!alitedadue manufaturada em fábrica européia". E
. , q e escreveu transvazando 'd' l'b
em boa medida resultou, naquelns regiões onde o Direito Indiano euro,peiZado da República: "A na - li . b • o o lO ao I era!
espanhol assegurara a propriedade comum da terra aos índios, da ao analfabetismo, à não-comnnicaçç~
pedago . d tanb
c!:
Vlanasa pôdde salvar-se graças
su gran es massas com a
aplicação das idéias liberais sôbre a excelência da propriedade indi-
vidual - só acessível aos que tivessem a capacidade monetária de as quafslama~u oso~o~U:~o :;o~ su~s essências puras com
adquiri-la. ( ... ) encontraram no caminh~ do ind:~ mspu:~~ãod aos artistas que
E nesse contexto sociocultural que se entende como, tendo sido e mante~e n<; subconsciente a personalida~es~~~o~al'~ .~ua libertação,
o latifúndio consagrado juridicamente em nome do liberalismo, pude- O 'can:unho d • d' " ·
ram manter-se formas não-capitalistas de exploração do trabalho, as E êle q • o m lO marca a América desde o século XVII
ue convem agora refazer. ·
quais haviam impedido que, nas guerras da Independência, o libera-
lismo se tivesse tornado o sinônimo revolucionário da liberdade. Assi-
nale-se, ao mesmo tempo, que a posição de dependência da América
Latina no cenário mundial, aliada à inexistência de fôrças e formas
sociais vitalmente correspondentes às idéias defendidas pelos setores
dominantes, levou a que êsses fizessem do liberalismo europeu uma
suma das reflexões sôbre a Cultura, a Politica, a Economia, e a So-
ciedade, e a resumissem, por sua vez, no livre-cambismo. Exatamente
por exprimir uma posição vitoriosa diante do processo de produção
e distribuição das riquezas, o livre-cambismo parecia englobar todos
os demais aspectos da realidade - culturais, políticos e sociais - e
37 Augusto Céspedes, El Dictadar Sufcid
36 Ibidem, pág. 86. Editorial Univers1ta·r1a Santiago do Chil " - 40 A:tlos de Historia de Bolfvfa
' e, 19 56• págs. 50 e 57. '
44
45
3

A "LEGENDA DA INFERIORIDADE NATURAL"

Nos capítulos anteriores procurou-se estabelecer como as peculia-


ridades da articulação da Sociedade Civil indoamericana, durante o
período colonial, condicionaram, ao se afirmar a Independência, dois
processos que até hoje influem em nossa vida política. Um, o da pri-
vatização do poder de Estado e do contrôle do aparelho estatal pelos
localismos incapazes de organizar a cooperação social e humana com
vistas à proposição de um Destino concebido em têrmos nacionais.
Outro, a regressão das idéias liberais européias, em virtude da ausência
de comunicação entre os grupos sociais dispersos pelo povoamento
"claustral", da inexistência de contatos criadores entre a "flor da so-
ciedade" e o grande número e, finalmente, do maior pêso específico
do indio na sociedade - processo que acabou conduzindo peJ.a ação
da comunicahilidade ao estabelecimento governos republicanos verbal-
mente liberais sôbre relações sociais e de trabalho quase-feudais. :E:sses
dois processos - o triunfo dos localismos e a regressão ideológica .....:.
não~ se deram, no entanto, em um quadro em que as grandes massas
indígenas tivessem uma função estritamente secundária. Pelo contrário,
apesar de econômicamente subordinado e socialmente excluído dos
contatos criadores, a importância do indio no processo de afirmação
da América diante da Europa, primeiro, e dos Estados Unidos, depois,
foi sobremodo relevante no plano ideológico, marcando de maneira,
por assim dizer, indelével o processo da Independência e os movi-
mentos políticos que se seguiram à libertação da Coroa espanhola.
Deve-se reconhecer, no entanto, que o índio não teve consciência
do papel que desempenhou nesse processo; êle foi tão-apenas o pre-
texto da disputa entre os setores dominantes da América Latina e o
mundo exterior. Todavia, seu pêso específico na sociedade americana
era e é de tal ordem que foi na identificação real ou mítica do branco
com o índio - que se viu de repente ser humano a igual título que
o branco por haverem ambos nascido no Nôvo Mundo - que o
segmento americano dominante forjou a ossatura doutrinário-ideoló-
gica que lhe permitiu vencer, no momento crucial da insurreição con-
tra a Espanha, a "legenda da inferioridade natural", e, no século XX,
encontrar os fundamentos de uma nova cultura afirmada superior à
européia e à norte-americana.

47
É êsse processo, conhecido como a "disputa do Nôvo Mundo", 38 os primeiros a se preocuparem assim com o problema e a posição
que convém resumir agora, acompanhando sua variação nos diferentes que rui<;'~ marcará boa parte . do pensamento europe~, fornecendo
momentos históricos para compreender a posição da América contra aos ~hticos ~gumento;; P.ara afirmar sua dominação sôbre o homem
a Espanha, primeiro, e contra os Estados Unidos, depois. amencano, cnoulo ou mdio.
Buffon afirma a diversidade das espécies animais do Mundo
Antigo e da América Meridional - a diversidade e a inferioridade
1 - Os primórdios da "legenda" flagran~e dos q~e habitam_as terras ocidentais: "os elefantes pertencem
ao antigo contmente e nao se encontram no nôvo . .. ; aqui não se
Se as Grandes Navegações e os Descobrimentos, por um lado, acha sequer um animal que se lhe possa comparar pelo tamanho ou
contribuíram para alterar a visão que o europeu tinha da Natureza e pelo aspecto". O tapir brasileiro é talvez o único que lhe possa' ser
do Homem - em primeiro lugar "porque ao invés de reduzir espon- comparado - mas "éste elefante do Nôvo Mundo é do tamanho de
tâneamente as diferenças a um arquétipo universal, verificou-se a exis- ~ bezerro de seis meses, ou de uma mula muito pequena". Mas
tência do particular, do irredutível, do individual", e, em seguida, nao apenas no port':' e .nas características agressivas, a Natureza foi
porqne permitiram a introdução do Bom Selvagem no mapa intelectual madrasta com os arumrus americanos; também com os europeus para
da época - por outro lado, suscitaram um problema da maior ali tra.nsportados ela age com intuito perverso: "os cavalos, os burros,
importância no ajustamento do universo de pensamento europeu à nova os. bo~s, ~s ovelhas, as cabras, os porcos, os cachorros, todos ésses
realidade: "Perdido em seu continente descoberto tão tarde [o ame- anunaiS fiZeram-se ali maiS pequenos; e. . . aquêles que não foram
ricano] não era filho de Sem, nem de Cam, nem de Jafet; de quem transportados,_mas que para lá foram por si próprios, em uma pala-
poderia ser êle o filho? Os pagãos nascidos ~~ da ~ncamação. de vra, os que sao co~uns ~ ambos os mundos, os lobos, as rapôsas,
Cristo tinham ao menos sua parte no pecado ongmal, pms descendiam os cervos, os alces sao assrm mesmo notàvelmente menores na Amé-
todos de Adão: mas, os Americanos? E pnr que mistério ainda esca- rica que na Europa, e isso sem exceção alguma".••
param (ao dilúvio universal? - E isso não é tudo. Os Americanos . ,U:t_Da única expli,c~ção p~e,iustificar êsse fenômeno estranho de
eram apenas selvagens, como qualquer um sabe; quando se desejava infenond~de das especies anunrus: a natureza americana é h[>stil ao
imaginar o que eram os humanos antes da invenção da sociedade, to- desenvolvunento das e~pécies anir;u:is, pois "há ... na combinação dos
mava-se-os por modêlo, vaga horda de gente que andavam t~os nus. element?S e das demrus causas físicas, alguma coisa contrária ao en-
Mas eis que uma suspeita se afirmava: era o selvagem necessàriamente ~aJ!decunento da nat~eza viva neste Nôvo Mundo; há obstáculos que
uma' criatura inferior e desprezível? não havia selvagens felizes?"" ~pedem ? desenvolvune".'-to e. ta!.vez a f?rmação dos grandes germes;
Se as necessidades das lutas politicas européias levaram algnns ainda aqueles que, pelas mfluencias bemgnas de outro clima, recebe-
campos a ressaltar o aspecto do "selvagem feliz", e se o Bom Selvagem ram sua forma plena e sua extensão íntegra, se encolhem se tomam
chegou a transfonnar-se, no século XVIII, num dos mitos íntegrantes pequenos sob aquêle céu ávaro e naquela terra vazia, ond~ o homem
do processo intelectual que levaria à Grande Revolução, nas relações em .n~ero escasso, vivia disperso, errante; onde, em lugar de usar ~
da Metrópole com a Colônia nem sempre a;;sim se deu, isto é? n~ terntor!o ~om? .dono, tomando-o como domínio próprio, não tinha
sempre o Americano e sua terra foram ~alonzados .com? ": rea!izaçao sôbre ele unpeno algum; onde não se havendo submetido nunca a
do ideal passado do futuro que a humamdade devena atmgrr. Ao con- si próprio, nem aos animais, n~m aos elementos, sem haver domado
trário, a tônica tendeu a colocar-se exatamente sôbre os aspectos nega-
tivos daquela ''vaga horda de gente que andavam todos nus" - e isso os, m~es, n:m dirigi~ os rios, nem trabalhado a terra, não era êle
se deu em grande parte porque a existência do "pW:i.cular, do .irr~u­ propno senao ~ anunal de primeira categoria, e não existia para
tível do individual" veio chocar-se contra o espmto anti-hJ.Stonco a naturez~ senao co~o um ser sem conseqüências, uma espécie de
do pensamento ilustrado. Todavia, por mais que a realidade n.egas~e autômato unpotente, mcapaz de refonná-la, ou de secundá-la. A natu-
o esquema mental, êle estava ordenado de tal sorte que o ~esafi~ na.o r.eza tratou-o mais como ~adrasta que como mãe, negando-lhe 0 sen-
poderia ficar sem resposta e aquela terra e aquelas espécies anunaiS tnnento de amor e o deseJo vivo de multiplicar-se; pois ainda que o
sem uma adequada explicação. Serão os naturalistas, entre êles Buffon, selvagem do Nôvo Mundo seja pouco mais ou menos da mesma esta-
tura 9-u~ o homem ,?e nosso mundo, isso não basta para que possa
38 Para uma exame ponnenorizado do problema, vide Antonelo Gerbl, La Dis-
puta del Nuevo Mundo, FCE, Mé:dco, 1960. c?nstitmr uma ~xceçao ~ fato geral do empequenecimento da natureza
39 Cf, Paul He.za.rd, La Crise de la Conscience Européene, Editlons Contempo-
raines, Bovtn & Cie., Paris, 1935, pág. 13. As citações anteriores s6.o da mesma obra-,
VIVa em todo esse contmente. O selvagem é débil e pequeno pelos
págs. 12 e 13. 40 Apud Gerbl, op. cit., pégs. 3-5.

48
49
órgãos da geração; não tem pêlo nem barba, e nenhum ardor para e V?ltaire ac!escentará que o pequeno número de sêres humanos que
com sua fêmea . .. " 41 habitam o Novo Mundo decorre do fato de ser êle "coberto de pânta-
Na busca da causa dêsses fatos singulares, Buffon chega, no dizer nos que tomam o ar muito malsão" e porque a terra produz "uma
de Gerbi, à "explicação erótico-hidráulic~" da debilidade d_os ~omens quantidade prodigiosa de venenos"." Ao mesmo tempo, a frigidez dos
americanos: o selvagem é fraco porque e amorosamente fr1o; e quase índios continua a preocupar os europeus, a exemplo de Raynal, que
impotente porque a natureza f. pantanos_a, ~nnitind_o que ''os ~n~et~; assmala serem os americanos "degradados em todos os sinais de viri-
os répteis ... e tôdas as espec1es de amma1s ... CUJO sangne e agna lidade, debilmente dotados dêste sentimento vivo e potente, dêste amor
pululem na podridão com tamanho mruor q~e os do Velho ~undo, delicioso, que é a fonte de todos os amôres, que é o princípio de todos
e a natureza é pantanosa ~rque o home~ e amoros~ente frio, m; os carinhos, que é o primeiro instinto, o primeiro nó da sociedade,
capaz, portanto, de domina-la., A pantano_s1d~de do Novo Mundo so sem o qual os demais laços factícios carecem de fôrça e duração"46
pode gerar grandes insetos e repte1s, e anunrus de sangne quente pe- - preocupação que vai sempre acompanhada da constante referência
quenos: "em semelhante estado de abandono tudo langüidece, tudo à umidade, causa de todos os males.
se corrompe, tudo sufoca: o ar e a terra, carregad_os de v~ pôr~s ll;ID1dos É com o abade Cornélio de Pauw e suas "Recherches Philoso-
e daninhos não podem depurar-se, nem aproveitar as mfluenc1as do phiques sur les Américains" ou "Mémoires Intéressantes pour Servir
astro da vida; o Sol lança inutilmente seus mais vivos raios sôbre e~s~ à l'Histoire de l'Espêce Humaine", de 1768, que o denegrecimento da
massa fria, incapaz de responder a seu ardor, a qual não produztra natureza americana chega a seu ponto máximo. Para êle a sociedade
senão sêres úmidos, plantas, répteis, insetos, nem poderá nut?r sen~o - contràriamente à opinião que a Rousseau se atribuía em alguns
homens frios e animais débeis.42 E, conseqüente com sua postção, nao círculos, especialmente depois da publicação do Discurso sôbre a De-
hesita em afirmar que "dentro de alguns séculos, quando as terras sigualdade - é a condição do progresso humano: "o homem não
tiverem sido desbravadas, cortados os bosques, dirigidos os rios e con- é nada por si só: tudo o que é, deve-o à sociedade. O maior metafí-
tidas as águas, essa mesma terra chegará a ser a mais fecunda, a mais sico, o maior filósofo abandonado durante dez anos na ilha Fernán-
sadia, a mais rica de tôdas, como parece sê-lo já em tôda s as partes dez, dela regressaria embrutecido, mudo, imbecil, sem reconhecer nada
trabalhadas pelo homem". 43 em tôda a natureza". Daí seu juízo sôbre o selvagem americano:
A ciência natural lança assim seu anátema sôbre o homem ame- "Odeia as leis da sociedade e os freios da ed11cação", nada sendo
ricano: o Bom Selvagem, longe de ser o Hurão que se apieda do exatamente por faltar-lhe a cultura - mas não é imaturo, porém de-
"pobre civilizado, sem virtude, sem fôrça, incapaz de prover à _sua generado. Degenerou no clima hostil à sociedade e ao género humano:
alimentação e à sua moradia; degenerado e moralmente embrutec1do; a natureza america_na é decaída e decadente, débil e corrompida, débil
máscara de carnaval com sua roupa azul, suas meias vermelhas, seu por e•tar corromp1da, inferior por estar degenerada. Tudo é inferior •
chapéu prêto sua pluma branca, suas fitas verdes; morrendo a todo e depravado: no clima americano "muitos animais perdem a cauda,
instante, porciue se atormenta sem cessar P,.ara ,~dq~H:H b~ns e honra: os cães não sabem mais ladrar e os órgãos genitais dos camelos deixam
rias que deixam em sua alma apenas desgosto ,44 e mfenor porque e de funcionar. . . Os peruanos são como êsse camelos, pois são impú-
frio "menos sensível e contudo mais tímido e mais covarde", sem beres - 'prova de sua degenerescência, como ocorre com os eunu-
"vi~acidade alguma, nem atividade algnma na alma':; um ser cuja, ati- cos' ".47 Investe contra o Inca Garcilaso de la Vega e o homem ame-
vidade do "corpo não é tanto um exercício, um movlffiento voluntar10, ricano em geral; coloca êsse último no centro de sua investigação e
quanto uma urgência de ação causada pela necessidade". E a êsse atrai "dêsse modo sôbre seu terna e sôbre si a atenção pública, as
embrutecimento está condenado porque vive em urna natureza em réplicas e as reações iracundas"." Não apenas em Buffon (no que
estado bruto, cuja umidade e quantidade das ágnas correntes ou para- tange à inferioridade das espécies naturais) e em Sepúlveda (que afir-
das o impedem de desenvolver-se e che!\3:'" a ser como ,o _europeu: ma sua barbárie contraposta à elegância dos espanhóis) vai buscar
De nada adiantam os progressos realiZados na Coloma, :Specml- os argumentos com que balisar suas teses; nos próprios defensores dos
mente no México, em Nova Granada e no Peru - a llustraçao conti- mdios contra a opressão espanhola, a exemplo certamente de Las
nuará se assombrando de haver na América mais homens que macacos, Casas, encontra a prova de que são degenerados. Não afirmara, por
acaso, o Apóstolo das lndias, que os índios eram "as pessoas mais
41 Ibidem, pá.gs. 5 e 6, "
42 Ibidem, pã.g. 8. Gerbl aponta as influências da teoria da geração espon-
deliCadas, fracas e ternas em compleição, e que menos podem suportar
tânea" provocada pela p<>drl.dâ.o conseqüente à umidade como elemento lnformador 45 Apuà Gerbl, op. cit., pâg. 41.
do pensamento de Buffon, à pá.g. 9 e segs. 46 Ibidem, pág. 44.
43 Ibidem, pa.g. 13. 47 A anâUse d& obra de De Pauw encontra-se em Gerbl ap. cit., pá.g, 49 e segs.
44 Hazard. op. cit., pàg. 14. 48 Ibidem, pãg. 59. '

50 51
trabalhos pesados, e que mais fàcilmeute morrem de qualquer enfer- indios eram idólatras porque os céus da América "infundem incons-
midade" tão delicados que com êles sequer se podem comparar "os tância, lascívia e mentira" - nêles e nos espanhóis aqui nascidos,
filhos d~ príncipes e senhores [europeus], criados em regalos e deli- prova, como observa Gerbi, de que "a debilidade ou inferioridade
cada vida?"•• ~o continente tem uma de suas primeiras raízes nas especulações lega-
Autes mesmo que os jesuítas expulsos da América tomassem a listas e nos sofismas dos defensores do direito natural de senhorio
defesa do Nôvo Muudo e seus habitantes (o que se dará especiahuente que sôbre os indígenas têm os europeus chegados às lndias Novas"."
com o P .• Francisco Clavigero, em 1780-81 ), a reação dos cultores A afirmação dêsse "direito natural de senhorio" não se estendia
do Bom Selvagem se fêz sentir coutra De Pauw, notadamente da parte contudo, apenas sôbre os indígenas; à medida que a Coroa espanhol~
do beneditino Joseph Pemety, que em 1770 publicou sua "Dissertation ampliava seu poder sôbre os territórios conquistados, tendia a fazer-se
sur I'Amérique et les Américains, contre les Recherches Philosophi- contra tod~ ?S grupos ~~cos (nacionais) 9-ue. P?r ventura disputas-
ques de Mr. de P ... ",5° obrigando-o a replicar na "Défense des Re- sem o domm10 da Amenca, chegando a d1scrumnação a seu têrmo
cherches ... " do mesmo ano. Agora, já reconhece que a degeneres- com a exclusão dos crioulos das oportunidades de apropriação de
cência foi visível apenas no momento da descoberta, mas que os três mando econômico e administrativo, portanto social. ~sse processo é
séculos decorridos fizeram que os americanos progredissem sob a in- de melhor compreensão quando se tem em conta que a colonização
fluência das artes e do trabalho dos europeus, que cultivaram as terras, espanhola, apesar de ter-se realizado "mercê da iniciativa individual"
regularizaram os rios, criaram animais e drenaram as águas paradas. - . ao contrário da nort~americana, feita por "um grupo de homens
Mas, ainda assim, os índios continuam vis, pois, "quando foi preciso umdos por . ~a mesma fé, por um mesmo espírito de sacrifício (ao
combater os peruanos não mostraram a menor sombra de valentia, menos os dmgentes) e por uma mesma ética", e da brasileira, "orien~
e jamais 'se viu homens tão covardes no mundo inteiro".li 1 Ao que tada pela Coroa" - , retirando sua fôrça de um "equilíbrio instável
contraporá Buffon, em 1778, olvidando ou retificando suas afirma- submetido à ambição, à desconfiança, ao receio e, sobretudo, ao orgu:
ções anteriores, que os "antilhanos, os iroqueses, os hurões, os índios lho avassalador, ao heroísmo sem limites e à capacidade de dominio
da Flórida, os mexicanos. . . os peruanos, etc., são homens de nervo que o espanhol de então ostentava como seu mais alto mérito como
e músculos, e valorosíssimos não obstante a inferioridade das an:nas" ,52 sua razão ~e ser, de durar e de sobreviver",6 li teve de se cot\rormar
com o que o indio americano, impotente e débil antes das críticas de cedo aos d1tames da Coroa que reclamava o estabelecimento de uma
De Pauw, recupera as fôrças, perde seu caráter degenerado e tem a administração centralizada e extremamente rebuscada, capaz de fazer
distingui-lo do europeu apenas o ser "menos empreendedor" .53 frente "à capacidade de dominio" do conquistador e colonizador. A
A lista dos que emitem juízos desfavoráveis à América é longa afirmação da raça espanhola com a conseqUente exclusão das demais
e continua em aberto até Hegel; o essencial, porém, é estabelecido no etnias e do próprio espanhol filho da América não é, porém, um pro-
século XVIII, especialmente com De Pauw, em cujas "Recherc,he~" cesso que se dê tão-apenas à administração real que se estabelece nas
os defensores da maldade e corrupção do homem e degenerescencw terrl1;' .c?nquistadas. Pelos próprios elementos em presença, mLNiifesta-
da natureza americana encontrarão argrnnentos para opor-se aos que """~ mze~almente como negação do índio, das castas e dos estrangeiros·
postulavam a bondade e moralidade instintivas do Bom Selvagem. B só mais tarde é que a hispanidad se voltard contra os espanhóis d~
êsse clima intelectual que convém assinalar, pois será nêle que os América, identificando-os com os índios no que tinham de mais dege-
espanhóis irão buscar pretextos e argrnnentos para conservar o con- nerado e débil.
trôle dos pôstos administrativos na Colônia e manter a própria de- O ca~áter de emprês_a individual que distinguiria, segundo Luis
pendência coloníal. Observe-se, porém, que a afirmação de ser o clima Alberto Sanchez, a coloniZação espanhola, trouxe - em virtude da
a causa dos males que acometem a natureza e os homens não se faz heterogeneidade de tipos nacionais que aqui se estabeleceram desde
apenas no século XVIII; com efeito, se é Buffon quem afirma pela o início" - a impossibilidade de contrapor aos índios e estrangeiros
primeira vez nos círculos científicos da Europa a ~legenda da jnf~­ uma unidade idiomática e de costumes, pois o que os caracterizava
rioridade natural" e se é De Pauw quem apresenta, a Europa, o mdw era exatamente a heterogeneidade existente na Mãe-Pátria, a tal ponto
como degenerado' e incapaz de progressos morais pelo clima hostil, que "cada comarca do Nôvo Mundo calcou as divisões zonais da Es-
já em 1612 Frei Juan de la Puente, dominicano, sustentara que os panha matriz, [não se transferindo] para as lndias um povo unido,
49 Ibidem, pág. 62. 54 Ibidem, pág. 70.
50 Ibfd.em, pá.g. 74 e segs. 55 Luis Alberto Sánchez, op. ctt., pãg. 36.
51 Ibidem, pág. 80. 56 Ibfdem, pág. 34. o A. acrescenta.: •·o castelhano mantém [no momento da
52 Ibidem, pé.g. 140. unidade politica] com respeito ao catalão, ao baaco, ao asturlano, ao andaluz e ao
53 Ibtd.em, pág. 141. galego, preconceitos irredutiveis. Mais fenícios que gôdos, os catalães foram os ho.

52 53
mas ao contrário, um povo desunido". 57 Divididos assim pela proct;- êles em que o executassem por sua conta e risco, proibindo-os de
dência, pelas peculiaridades lingüísticas e de direito e pela ambição, fazê-lo às custas da Real Fazenda, e por essa razão lhes concederam
os conquistadores não tiveram outro caminho para legitimar sua con- que fôssem senhores da terra, que organizassem a administração e
quista perante as culturas índias, ao esplendor de algumas das quais exercessem a judicatura em apelação, com outras muitas exceções e
tiveram de render-se, se não invocar a religião católica e a raça hispâ- privilégios que seria prolixo relatar. O rei se comprometeu a não
nica, criação ideológica e artificial, mas tranquilizadora das consciên- alienar jamais as. províncias americanas, com o que a êle não tocava
cias e afirmadora da validade do domínio a igual título que os Manda- outra jurisdição que a do alto domínio, sendo uma espécie de proprie-
mentos. O mito da raça surgiu, assim, no primeiro estágio da coloni- dade feudal a que ali tinham os conqnistadores para si e seus descen-
zação, como fator de aglutinação social da comunidade multiétnica dentes" .59 Contudo, no início do século XIX, a situação já era objeti-
que para cá se transplantou, e elemento em tôrno do qual se construiu vamente diversa da que assinalava o Libertador: o primeiro momento
a barreira contra as demais etnias, negando-lhes o direito de "imiscuí- de afirmação etnocêntrica já tinha sido substituído por outro em que
rem-se no govêrno da América". E Luis Alberto Sánchez acrescentava, a disputa pelas situações de mando levara a Coroa a aceitar, antes de
explicando: "Não se esqueça êsse fato para julgar o processo de ani- a Europa havê-la plenamente formulado, a "legenda da inferioridade
madversão social que se realiza na Colônia durante três séculos. Nem natural" da América ~ dos americanos, oporulo à estirpe dos espanhóis
se esqueça que o espanhol desprezava - e despreza - os demais de E~panha aquela dos nascidos na Colônia - e Frei J uan de la Pu ente
povos como de inferior qualidade étnica, de têmpera menor, de menor talvez fôsse, da nova mentalidade, o anunciador em inícios do século
XVII e Aranda aquêle que em meados do XVIII a ela se tentou opor
coragem e menor hombridade. Então, êsses outros povos tinham menor sem êxito. 60
direito divíno - por hereges - e humano - por incapazes". 58
A exclusão dos hispano-americanos da raça espanhola verificou-
Nesse primeiro momento, o caráter privatista de que se revestiu se lentamente, à medida que a Colônia se desenvolvia e a Metrópole
a colonização reforçou a "sobranceria" e o sentir-se espanhol - e cerceava seu crescimento. Da parte da Espanha, foi mais uma reação
foi um fato comum a tôda a América espanhola (no tocante ao Brasil, que uma ação ideológica proposta; resposta a uma indagação mais
afirma-se o privatismo, embora o mito da raça não tenha chegado a que propriamente a afirmação de uma posição de princípios. EIJ.<iuanto
exercer qualquer função social de aglutinação, que se revelaria polí- não se desenvolveu entre os hispano-americanos a consciência dos
tica no processo de independência), pois o conquistador possuía a entraves que a administração de Madri colocava no caminho da "capa:
terra pelo trabalho próprio e escravo com que a amanhava, sem auxí- cida4e de domínio", que era a razão de existir do colonizador, a Coroa
lio régio ou qualquer compensação. Não é de estranhar, pois, que na não necessitou de justificar sua política de provimento dos quadros
defesa de seus privilégios, conquistados ao índio e reiterados pela administrativos e eclesiásticos quase exclusivamente pelos nascidos na
distância em que a Coroa se encontrava dos centros internos de deci- Espanha; tão-logo, porém, se deu a tomada de consciência e se pro-
são, tivesse considerado o govêmo da América como propriedade sua, curaram eliminar os embaraços colocados no caminho da alteração
fechada a todos aquêles que da emprêsa da conquista não tivessem das posições políticas dos colonos, a reação se configurou e o clima
participado. Teve razão, destarte, Bolívar, ao dizer em suas "Cartas": voltou a ser o fator responsável pelo mau caráter e as aptidões mal
"O imperador Carlos V firmou um pacto com os descobridores, con- formadas, e o ser americano elemento influente na exclusão dos qua-
quistadores e povoadores da América, que, como disse Guerra, é dros administrativos.
nosso contrato social. Os reis de Espanha convieram solenemente com O despertar da consciência dos obstáculos opostos pela adminis-
mens da viagem, do cãlculo e de. realização. Msls arábicos que ibéricos, os andaluzes tração real, a rigor, deveria ocorrer logo no início do processo da
compartiam a sensualidade e a fantasia do mourisco. Mais terra que sangUe, o caste- colonização, visto a Coroa perseguir objetivos contrários aos dos con-
lhano situa na ihanum parda seu céu e seu Inferno, dela extraindo mist1ca fé e
humana desesperança. O certo é que Espanha (hoje ainda mosaico de regiões e na- quistadores, enquanto proposição de Espaço e concepção das relações
ções) era uma marchetaria complexa: e divergente de tendências, culturas, linguagens
e sentimentos". entre os diferentes segmentos da sociedade colonial ( especiahnente os
57 Of. Ots Dapdequi, op. cit., pãg, 9: "lt sabido que ao se produzirem os desco- índios e os brancos), e entre a Colônia e a Metrópole.
brimentos colombianos, existia na Espanha, do ponto de vista político, uma unidade
dinãstica, mas nli.o uma unidade naciona:l. Apesar do matrimônio contraldo por Isa-
bel de Castela com Fernando de Aragli.o, seguiam êsses dois velhos reinos peninsu- 59 Ibidem, pãg. 37,
lares mantendo cada um dêles sua própria personalidade politica e administrativa. 60 "A opinião revolucionária [sôbre o estabelecimento das Intendências na colô-
Em terras de Castela, [os povos] continuavam regendo-se segUndo as normas jurl- nia, na discussão aberta pelo rei em maio de 1769] foi a de Aranda, que advogava
dicas peculiares ao direito castelhano. Nos velhos Estados que Integravam a Coroa com eloqüência em favor de uma incorporação ma.is genuína dos americanos, tanto
de Aragão, mantinha-se igualmente a vigênda dos seus direitos particulares: ara- lndigenas quanto crioulos, na vida política espanhOla na América, especialmente
gonês, catalão, valenciano e majorquino". aceitando-os nos cargos Públicos para os qua·is se deveria aplicar como únlco critério
58 Luis Alberto Sé.nchez, op. cit., pãg. 82. [de provimento] o do mérito pessoal", John t.ynch, op. cit., pãg. 57.

54 55
Todavia, a inércia da administração em muitos setores, por um Ahumada encontra os espanhóis infensos a abrir mão do mono-
lado, e a extensão territorial, dificultando os funcionários a agirem com pólio dos cargos públicos por dois motivos principais: um, o temor
rigor, por outro (além da proclamação da inadaptação das leis feitas de que a ligação da propriedade da terra com o poder administrativo
na Espanha às situações americanas, consubstanciadas no "acata-se, levasse os crioulos a acalentarem idéias de independência; outro, 0
mas não se cumpre"), contribuíram para que a consciência do proble- fato alegado de não serem europeus, mas filhos dos índios debeiados
ma e o atrito dela decorrente só se manifestasse bem mais tarde, na no decorrer da conquista. Os europeus, escreve êle, "dizem não ser
fase da "reconquista", especialmente depois que a Espanha se viu conveniente que se dê [os empregos públicos aos americanos] porque,
impossibilitada de impedir que o "estrangeiro secular" perturbasse a vendo-se com êles, poderiam conspirar contra V. M. que é nosso dono
tranqüilidade da sociedade americana, seja através da Universidade, e senhor natural. .. Depois, querem que [os americanos] não gozem
seja através do corsário: "A geografia povoou-se de continentes igno- dos mesmns foros que os espanhóis europeus, não os1 reputando como
tos por causa do corsário; a imaginação, de emprêsas impossíveis; o tais, embora seus pais ou antepassados o tenham sido". Com isso, diz
dogma, de heresias; a obediência, de descontentamento; o silêncio, de êle, os espanhóis demonstram grande ignorância, porque como da
vozes; o horizonte, de velas; a América, de novidade. Através do engô- Espanha passaram à América, "espanhóis a conquistar as tndias, crêem
do do corsário correram os negros; de suas façanhas, nasceram legendas que todos os habitantes daqueles países são descendentes dos debe-
que arrulhavam furtivamente no sonho dos crioulos. O índio mediu, iados, e que assim deverão ter o desejo de restituir seu antigo império
com a rasoura daquela ousadia, a insolência do hispano. O espanhol e costumes".
descobriu-se a si mesmo. A ilegalidade revelou a invalidez da lei vi- Os crioulos - constata Ahumada - não podem assumir os em-
gente ... [e] foi cavando seu sulco, e se transformou em contrabando pregos pretendidos na América apenas pelo fato de não serem espa-
libertador da exploração monopolista, em galhardia revolucionária nhóis; contra êles pesa também a incapacidade decorrente do único
adversa ao absolutismo",6 1 fato de "ali haverem nascido". Esses argumentos a seu ver são ridículos,
pois a experiência demonstrou que "apenas o Colégio Maior de Santa
Maria de Todos os Santos [formou] mais de cem pessoas, que pro-
2 - O início da reação crioula duziram aquêle plantei de Letras, insignes em sabedoria e virt~de", e
a razão aconselha que ainda que a suspeita de que a posse dos cargos
Se, em 1612, Frei Juan de la Puente insinua os rumos que assu- conduza a pensar em separação, êles devem ser atribuídos aos crioulos;
mirá a "disputa do Nôvo Mundo" transposta para o campo das rela- pois "Sêneca já ensinava que "com os benefícios, melhor que com as
ções políticas entre crioulos e reinóis, em 1725 encontrar-se-á, no dizer armas, se guarda o Império". Não apenas essas provas da experiência
de Francisco López Cámara, o "documento político mais extraordi- serão alegadas para reivindicar os privilégios administrativos; também
nário da consciência crioula da primeira metade do nosso século o Direito das Gentes, o Natural e o Espanhol serão invocados na telli-
XVIII" e o "testemunho escrito mais antigo e valioso da literatura tativa de demonstrar que os espanhóis são "peregrinos", estrangeiros
política da Colônia, precursora da Independência americana". Trata-se à América, e que, assim sendo, os empregos devem ser dados aos
da Representación Político-legal a la Majestad del Sr. D. Felipe V en nacionais (os que nasceram na América).63
favor de los empleos políticos, de guerra y eclesiásticos, de Juan An- Quarenta e seis anos depois, em 1771, quando o clamor contra
tonio Ahumada. 62 a discriminação se acentua, a resistência espanhola muda de tom; os
crioulos não são apenas os udescendentes dos debelados", nem contra
61 Luis Alberto Sãnches, op. cit., pãg. 114.
62 Cf. López Câmara, \La Génesi3 de La Conctência Liberal en Mexico, FCE, Mé- êles se argüe tão-só a possibilidade de virem a nutrir idéias de inde-
xico, 1954. Ahumada. e o exemplo de que a exclusAo dos crioulos da raça espanhola
e dos cargos públicos não exa a "attrmaçl'i.o de uma pOBlçl'i.o de principio" pois natu-
pendência desde que na posse dos cargos públicos; no quase me:io
-ral de Nova Espanha ocupou posições na Universidade, no Colégio Maior de Todos século passado da "Representação" de Ahumada, êles degeneraram
os Santos e na Real Audiência do México, passando depois às Côrtes, onde escreveu
sua Representaç4o, que tol editada em Madri. Em Lynch, op. ctt., também se en- suas naturez"" - como registra, cheio de indignação, o Ajuntamento
contram referências à oçupação de cargos públlcos por crioulos, 1t bem verdade que,
embora nãc houvesse obstAculos legais impeditivos da assunção dos crioulos à ad.ml-
do México, na "Representación que hizo la ciudad de México ai Rey
nlstraçA.OI colonial, a proximidade em que se encontravam os nobres do Rel e dos D. Carlos III en 1771 sobre que los criollos deben estar preferidos a
centros de declsA.o, aliada. à circunstância de as !unções administrativas, m111tares e
eclestâ.sticas poderem sempre servir de recompensa por serviços prestados e ser uma los europeus en la distribución de empleos y beneficios de estos rei-
maneira de aliviar pressões, determinava quase necessàrlamente o provimento da
maioria dos cargos por espanhóis. Alfred Barnaby Thomas. em sua Latin Amerlca 18 !oram crioulos; e talvez nA.o mais de cem espanhóis nascidos na América conse-
a Hf.starv (Macm.111an, Nova York, 1956), assinala que durante o periodo de guiram ocupar as 769 funções ecles1Astlcas de nomeaçA.o real.
domlnaçA.o colonial, dos 170 vice-reis e 602 capltA.es-generals e presidentes, apenas 63 As citações da obra de Ahumada são extraidas de López Câmara, pé.gs. 19-44,

56 57
nos": "Não é a primeira vez que a malevolência atacou o crédito dos glorificar-se as mais nobres, fiéis, zelosas e cultivadas nações da Eur<>-
americanos, querendo que passem por ineptos para tôda classe de pa; ~ que no graduar êstes nossos dotes em uma posição inferior com
honrarias. Guerra é esta que nos fazem desde o descobrimento da relação a outros vassalos de V. M., faz-se-nos, com a mais repreensí-
América. Nos índios, ou naturais que são nascidos e trazem sua ori- vel injustiça, uma grandíssima injúria".
gem dela, apesar das evidéucias, pô-se em questão até a racionalidade. A proposição ideológica espanhola, todavia, é extremamente cer-
Com não menos injustiça finge-se, dos que de pais europeus nascemos rada - por isso não basta acusar o índio e proclamar a zelosa lealdade
neste solo, que temos de razão apenas o bastante para ser homens". à Coroa; é preciso demonstrar também que não são abatidos como
E continua o Ajuntamento: "Não ignoramos que muitas pessoas, ou êles: "Diz-se desde logo - continua o Ajuntamento - que nosso
acaso corpos inteiros e comunidades interessadas em fazer passar euro- espírito é s_ubmisso e rendido; mas isto que poderia passar por elogio
peus à América aparentaram necessidade, e para fazê-la crer a V.M. de nossa virtude se azedou, figurando que decaímos no extremo do
e seus ministros, valeram-se do engenhoso pretexto de supor que há abatimento". O ônus da prova, neste momento da acusação, é atri-
pouca limpeza [racial] nestas partes, mas o que ditou a malícia e o buído aos espanhóis, porquanto "não há efeito natural sem causa
interêsse, para surpreender uma providência, não pode prevalecer con- capaz de produzi-lo, e em nossos espanhóis americanos nunca poderá,
tra as razões sólidas que desde logo se apresentam em uma ligeira mesmo o maior esfôrço de malevolência, apontar o princípio de sua
reflexão". demissão e vileza de espírito, recorrendo de um a outro quantos con-
O essencial para os crioulos, neste segundo passo, não é tanto correm a formar o caráter e o gênio dos homens". E cabe-lhes o
afirmar que "a provisão dos naturais com exclusão dos estranhos é ônus da prova, também e sobretudo, porque etnicamente os america-
uma máxima apoiada nas leis de todos os reinos, adotada por tôdas nos descendem dos es~anhóis e, assim sendo, "se. . . se concede à ge-
as nações, ditada por simples princípios que formam a razão natural ração e índole dos paiS alguma influência, sendo nossos pais os espa-
e impressa nos corações e votos dos homens", quanto provar que são nhóis europeus, é forçoso que por essa parte se nos concedam as mesmas
diferentes dos índios. Não se trata agora de reivindicar um "direito, qualidades, gênios e inclinação que aos nascidos na Antiga Espanha".
que se não podemos graduar de princípio natural, é sem dúvida comum E embora procurem assim responsabilizar o espanhol por seus defeitos
de tôdas as gentes, e por isso de sacratíssima observância"; os crioulos de caráter e aptidão, devem todavia reconhecer com os reinói& que o
vêem-se na defensiva, pois o.s espanhóis consideram-nos racialmente clima influi na formação dos homens: "O clima ou têmpera natural
iguais aos índios pela mestiçagem, que aqui na América se processou. influi sem dúvida na compleição dos homens, e pela dependência com
Cuidam, portanto, de marcar sua pureza étnica, ainda que ao preço que.opera o espírito dos órgãos do corpo tem também sua participa-
da degradação real do índio: "Os índios, ou bem por descendentes de ção ... nas inclinações e gênio". Mas o clima americano, que a Eur<>-
alguma raça a que Deus quis dar êste castigo, ou por indivíduos de pa reconhecia malsão e corruptor, não é tal - e os americanos, dêsse
uma nação subjugada, ou acaso pela pouca cultura que têm, ainda ponto de vista, levam vantagem. Mas o clima (Bu;ffon e De Pauw
depois de séculos de conquistados, nascem na miséria, criam~se na juntos) é elemento mais opinativo que a genética - e a marca inju-
rusticidade. . . vivem sem vergonha, sem honra e sem esperança; pelo riosa fica sôbre o crioulo, caracterizado como abatido da mesma forma
que, envilecidos e alquebrados de ãnimo, têm por caráter próprio o que o índio por êle repudiado com apoio nos "judiciosos autores'~ nos
abatimento. Disso falam todos os autores judiciosos, que depois de quais, sem dúvida, os espanhóis tinham ido beber os elementos para
uma larga observação e muito experiência deram aos índios com seus desacreditar seus descendentes americanos. 64
livros o epíteto de abatidos; e acaso a má inteligência ou precipitação No afã que o crioulo coloca em ser reconhecido como branco,
nas leituras dêstes escritos fizeram copiar mal suas expressões para pois era a mestiçagem argüida que lhe aparecia como elemento im-
acomodá-las aos espanhóis americanos". A aproximação feita pelos peditivo de sua ascensão na escala de fruição dos valôres socioecon/j..
europeus é errônea, pois a mestiçagem suposta não existiu, porquanto micos, sua reclamação do direito de ocupar os cargos administrativos,
no índio não havia nada que atraísse o espanhol: "Estas misturas só militares e eclesiásticos perde o sentido mais profundo de reivindicação
se fazem pelo atrativo de formosura, ou outras prendas naturais, ou de um princípio inserido na Ordem Natural - a qual, por definição,
pela cobiça da riqueza, ou o desejo de honra, e nada disto pôde arras- cobriria, protegendo por igual, indios e brancos, ambos parte da mes-
tar os espanhóis povoadores a misturar-se com os índios". E afirmam ma Natureza - para transformar-se em mero reconhecim't!nto do que
sobranceiros: "Isto basta para que o mundo entenda que nos espanhóis estava escrito na ordem social. Identificando no índio uma natureza
americanos há a mesma nobreza de espírito, a mesma lealdade, o mes- humana diversa e inferior à sua, o crioulo é assim incapaz, neste mo-
mo amor a V. M., o mesmo zêlo pelo bem público de que podem 64 Ibidem, pâgs. 49-61.

58 59
mento de suas relações com a Metrópole, de encarnar o sofrimento, colocado, nem ter consciência da contradição de fato existente entre
portanto o direito de tôda a sociedade americana - índios, mestiços, sua aspiração à posse dos cargos, surgida da prática de poder de cada
castas e crioulos a um só tempo - , sua reivindicação situando-se no dia (a qual se poderia dizer negatória, enquanto consci~ncia real, das
plano meramente político dos valôres materiais, e não no humano, dos estruturas jurídico-políticas espanholas), e a aceitação do Direito Me-
valôres éticos. Essa restrição do conteúdo ético da reclamação política tropolitano associada a uma interpretação restritiva do Direito Natu-
decorre em grande parte do fato de suas aspirações não serem total- ral. Nem sequer é capaz de ter a consciência perfeita de que ao afirmar
mente bloqueadas pelo universo jurídico-político da Espanha; vê limi- que as Leis das lndias seriam mais adequadas à realidade americana
tadas suas possibilidades de ascender ao mando administrativo, militar se fôssem elaboradas pelos que na América viviam, está implicitamente
e eclesiástico, e disso se ressente, mas tem abertas as portas para negando aquêle Direito que considera válido e no qual vai buscar o
manter se não melhorar sua posição diante do grande número, isto é, argumento para justificar a sua aspiração a exercer os empregos. Por
dos índios, mestiços e castas, que são exatamente aquêles com os quais não ser capaz de compreender sua real posição na articulação política
estabelece sua relação humana mais determinante. É por não se ver entre a América e a Espanha, e por não se reconhecer dominado ao
totalmente rejeitado pelas estruturas espanholas, que o crioulo reivin- mesmo tempo que dominante, é que o crioulo insiste em afirmar sua
dica nos quadros jurídico-políticos do pader que parcialmente o nega; e zelosa lealdade à Coroa e em denegrir aquêle que, por sua presença
é por encontrar nesse poder apoio para manter sua posição política anterior nas terras conquistadas e pela participação que tem na vida
diante do grande número que o crioulo se insere na visão espanhola do social americana, é a causa alegada pelos espanhóis - e reconhecída
mundo, do qual são componentes importantes a negação social do por êle - de sua frustração.
americano por etnicamente inferior e a fidelidade ao Rei.65 O crioulo, nesse quadro geral, não pode, por cultor ilustre que
E essa integração do crioulo no "ethos" espanhol que o impede seja do Direito Natural, fazê-lo brotar ex principiis hominis internis
de perceber a dupla relação objetiva a que está sujeito: no que tange e incluir o índio ua Humanidade; assim proceder significaria a um
aos índios, ao grande número, êle é o dominante; no que se refere tempo negar a armação ideológica sôbre a qual o branco assenta seu
aos espanhóis, o dominado, igual ao índio. Para êle, porém, sua posi- domínio sôbre a América, e rejeitar seu poder. Uma e outra operações
ção aparece sob luz muito clara: por ser etnicamente diverso e social- são difíceis de realizar: a primeira implica em reconhecer a proce-
mente dominante em relação ao grande número, é necessàriamente dência dos candentes argumentos com que se construiu a "legenda ne--
igual ao espanhol e nunca inferior. Sua posição política alta na socie- gra" da Conquista e em negar as virtudes superiores da raça espanhola,
dade colonial - a sua dominação exercendo-se sôbre o índio - não à qual insiste em pertencer; a segunda, desde que associada à pnmeira,
lhe permite compreender a trama dos interêsses reais em que está que faz do índio um ser igual ao branco, leva à subversão das posições
65 Gerbl discorda da proposição de que o americano é con&iderado inferior por
políticas, portanto à negação de si próprio como dominante. ContudO',
motivos étnicos. Para êle, a lnferlorida.de é de migem geográfiCa, mais que prôprta.~
mente racial, pois é o fato de haver nascido na América que torna o espanhol 1m-
perfeito - um jus soU negativo. Embora o problema possa ser vtsto dêsse ângulo
(e de fato é o clima. e nlo a etnia que de&favorece o americano na. prqpOBiçlo
teórica de Bu!fon e De Pauw), parece-nos que tal COlocação só é vãUda para as
I o problema não reside apenas nisso: a impossibilidade política em que
se encontra de dar ao Direito Natural uma interpretação ampla,
obriga-o também a aceitar, integrante que é do "ethos" espanhol, a
relações entre espanhóis e crioulos, nl!.o entre brancos e indlos, de maneira situação colonial - a dependência da América à Espanha com tôdas
geral. E possível que o índio tenha sido inicialmente con&iderado degenerado pelo
fato de ter nascido na América. e sofrer a influência de seu clima; mas depois êle as conseqüências dai decorrentes, entre as mais importantes delas não
é desconsiderado socia·imente pelo fato de não ser branco, de ser indio, tl!.o simples- estando apenas a exclusão dos cargos administrativos, militares e ecle-
mente. A rigor, a explicaçl!.o geogrãjica também é deficiente, po1s se poderia argüir
com maior exatldA.o que as restrições feitas aos crioulos decorrem do desejo de os siásticos, mas também o Pacto Colonial.
espanhóis conservarem o monopólio dos empregos na. Colônia, e, na mesma linha O sentir-se espanhol e o pensar como espanhol são fundamentais
de argumentação, que o índio é desprezado pelo fato de ser aquêle que se dedica
a.o trabalho manual, desprezado pelos que vivem "à maneira. nobre". A expllcaçA.o para caracterizar o comportamento daqueles que dentro em breve serão
do fato, porém, por mais correta que seja, não é o próprio fato, nem dã àqueles
que o vivem uma visão mais correta de como ordenar racionalmente o seu com- levados a opor-se à Coroa e jogar as cartas da Independência. Real-
portamento. Se o simples esclareCimento de que uma. ideologia é uma ideologia - mente, é essa participação na mesma visão do mundo que os impede
vale dizer, uma representação intelectual de determinados fatos que se pretende
conservar ocultos à consciência expressa - bastasse para alterar os comportamentoe de avaliar em seus justos têrmos o sentido profundo das reformas
humanos, o preconceito já teria cedido lugar à irmandade de todos oe homens. Isso econômicas realizadas pela Espanha a partir de 1764, quando se
não se deu e não se daTá, apesar da confiança que a ilustração colocava na Razlo,
nlsso seguida pelo sécUlo XIX, Pelo simples fato de que o Amor é privilégio dos estabelece um serviço de correio marítimo com Havana, as quais leva-
deuses e é no etnocentrismo que o .eer humano encontra a válvula de escape para.
as suas frustrações - tOdas e nl!.o apenas as de ordem econômica. Assim. Preferimos rão, mediante diversas medidas de liberalização que se estendem até
situar o problema. em têrmos étnicos, pois as relações entre brancos e indloe sob 1789, ao abandono de regulamentações comerciais consideradas sa-
êsse signo se Processaram - a menos que o prestigio do Inca conseguisse colocar em
segundo plano sua origem. gradas por mais de dois séculos, com o objetivo não de "afrouxar
60 61
os laços entre a Espanha e as lndias, mas pelo contrário [de] tomá-los não se pode negar como dominante, não pode negar o rei - e é por
mais complexos e sobretudo [de] adequá-los à nova estrutura econô- isso que, ao invés de atribuir ao espanhol, "peregrino na América",
mica de Espanha", aumentando o contrôle econômico sôbre as colô- todos os "defeitos da sociedade", com êle se identifica, inverte os dados
nias e atribuindo-lbes "um papel nôvo no conjunto da economia espa- da questão, transforma o índio no "objeto de repulsa geral" e se imo-
nhola"." O conteúdo dessas inovações não chega a ser percebido se- biliza enquanto dominado.
quer pelo grupo dos economistas portenhos no início do século XIX A integração do crioulo no universo mental do espanhol - a
e_m espec!al Vi~y~es e Manuel Belgrano, os quais, exatamente por s~ qual é decorrente de sua identificação com a posição política do euro-
ftliarem a tradtçao tlustrad,a espanhola, não hesitam em "exigir a peu (identificação subjetiva, mais que objetiva) e da aspiração de
tut:la de um forte poder. pol~ttco, que é no mundo hispãníco a Coroa", tomar essa igualdade presumida uma igualdade de fato, acrescida da
a fun de reahzar seus tderus de modernização da economia do Rio impossibilidade real de reconhecer no índio uma natureza humana igual
da Prata. 6 ' .
à sua, é que o leva, assim, a aceitar a proposição jurídico-política do
Nesse clima intelectual e social, o crioulo está imobilizado e não espanhol e a jurar fidelidade ao Rei. Importa notar, todavia, que sendo
f!.ode negar o Rei t;ruJuanto fonte legítima da Lei que o constrange; a integração ideológica, da mesma forma que a fidelidade à Coroa,
ele se mtegra naqUilo que Halperin Donghi chama de "sobrevivência conflitante com a prática de poder na América, o equilíbrio nas rela-
da f~ mon_árq"}ca", a qual "constitui na Espanha do setecentos um fato ções entre crioulo e espanhol, Colônia e Metrópole, é instável, bastando
de vtg~ncza nao apenas formal", pois caracteriza a a tendência mística que um dos elementos componentes da relação de fôrças se modifique
do pensame;uo político espanlwl", que como tal se espraia pela Amé- para que a resultante se altere. Da mesma forma, a relação com o
riCa. Em Cordoba, antes que em Buenos Aires os economistas defen- indio: sua negação pelo crioulo decorre, por um lado, do desejo de
dess;~ a C~roa, Frei José Antonio de San Alberto, bispo, elabora ser visto como branco pela Coroa, a fim de merecer seus favores,
na ultuna decada do setecentos uma "Instrucción para los Colegios já que reconhece o poder espanhol como legítimo, e por outro da
de Nifios y Nifias" com o objetivo principal de ensinar o "respeito necessidade de manter uma posição política que, no quadro colonial,
ao Soberano"; e três anos antes, na oração fúnebre por ocasião da é sobretudo assegurada pela presença do Direito Espanhol na América.
morte de D. Carlos 111, o deão Funes, na mesma cidade, havia assi- Bastará, portanto, que a fidelidade e o reconhecimento da legi/imidade
nalado que o "Príncipe é como uma rocha ... onde o Vassalo está a não existam, ou entrem em crise por motivos epis6dicos, ou que a
e
coberto das tempestades e furacões: é a voz viva a alma pública dominação venha a assentar em fundamentos outros que o Direito mê-
troÍJOlitano para que a perspectiva seja diversa e a relação política,
que anima e dirige a multidão". 68 O crioulo reconhece, pois, por
identidade ideológica ou em função de uma posição deco"ente do Pa- mentalmente estabelecida com o índio, diferente.
droado, os fundamentos absolutistas do poder real, por uma parte, e a O exemplo mais típico, nesse período, talvez seja o do P.' Fran-
estrutura jurídico-política em que o Monarca se ampara para dominar cisco Javier Clavigero, S. J., expulso do México em 1767, e que pu-
a Colônia, por outra - e não pode negar uma nem outra, opondo-se à blica na Itália, em 1780-81, sua História Antiga do México, ins-
Coroa, pois é dela que retira o apoio legal para legitimar a seus pró- pirada na hostilidade a De Pauw. Sua dupla condição de jesuíita e
prios olhos a "encomienda'' e a ((müa", ou então por nela vislumbrar exilado político permite-lbe romper a solidariedade com o rei, a domi-
a proteção indispensável a realizar os ideais de progres.<o da Ilustração. nação branca e o "ethos" colonial do fim do século, o que lbe toma
Nos têrmos em que o problema das relações entre a Coroa e a fácil a tarefa de devolver aos europeus os argrunentos usados contra
Colônia, o espanhol e o crioulo, se coloca no último quartel do século os americanos, e ver o índio por um prisma sem dúvida ainda defor-
XVIII, êsse último necessitaria ser americano para negar o rei; mas, mante, mas que fornece, humanamente pelo menos, uma imagem mais
para sê-lo, sentindo-se tal, deveria aceitar que o índio, homem igual próxima da realidade. Dirigida contra a deturpação que De Pauw fêz
a êle e como êle natural da América, reivindicasse uma posição poli- do homem americano, a polêmica de Clavigero não se detém na defesa
tica mais alta, invertendo assim as relações reais de poder entre a raça do crioulo, isentado de passagem, no entanto, de qualquer mestiçagem,
oprimida e a socialmente opressora. Como não pode fazê-lo, porque pois "nascemos de pais espanhóis e não temos afinidade, ou consan-
66 Sôbre o problema, vide John Lynch, op. cit., cap. I, passim; as citações sã.o
güinidade algruna com os indios"; seu objetivo mais alto é resgatar
de TUiio Halperin Donghl, Tradición Politica Espaiíola y Ideologia Revolucionaria de o indígena - e o salva fundado não na especulação abstrata, mas na
Mayo, Editorial Unlversitaria de Buenos Aires, 1961, pág. 158.
67 Halperin Dongh1, op. cít., pág. 152 e segs. experiência: " .. . rtratei intimamente com os americanos; vivi alguns
68 Ibidem, págs. 110-32.
anos em um seminário destinado à sua instrução ... ; tive depois alguns
62
63
~dios entre meus discípulos ... , [pelo que] protesto a De Pauw e a pelos mesmos meios êles a restituirão aos mesmos índios. . . o pro-
tôda a Europa que as almas dos mexicanos em nada são inferiores jeto do cura Hidalgo constitui runa causa particular de guerra civil,
às dos europeus; que são capazes de tôdas as ciências ainda as mais de anarquia e destruição, ainda assim eficiente e necessário entre os
abstratas". Os índios não são débeis, nem feios nem' lactíferos nem índios, castas e espanhóis, que compõem todos os filhos do pais". 70
impúber:S. "Se De ~auw tivess:_ visto! co~o eu, ~s enormes pes~s que
levam sobre as espáduas. . . nao tena tido valor para atirar-lhes na
cara sua debilidade". Os índios lavram a terra, cortam as árvores, 3 - Os dois sentidos da Independência
constroem as casas, abrem os caminhos e fazem todos os misteres mais
pes~dos: "isto fazem os débeis, poltrões e inúteis americanos, enquanto Em fins do século XVIII, o poder real aparece sensivelmente
o v•goroso De Pauw e outros infatigáveis europeus se ocupam em enfraquecido perante a consciência crioula - e é essa fragilidade que
escrever invectivas contra êles". E no tocante à frigidez amorosa do permite o rompimento do equilíbrio nas relações entre Metrópole e
homem, não obstante reconhecer que "o amor do marido pela mulher Colônia e conduz insensivelmente ao furacão de 181 O. A queda do
é muito menor que o da mulher pelo marido", é forçado a afirmar prestígio da instituição monárquica era sentida por todos: desde Bolí-
ser "comum (não geral) nos homens o inclinar-se mais para a mulher var, que a narrativa mostra escandalizado com a licença que encontra
alheia que para a própria ... "." na côrte de Carlos IV, passando pelos economistas portenhos já refe-
A posição dos jesuítas, em particular, e a de uma porção dos ridos, os quais começam a ter consciência, ainda imperfeita sem dúvida,
demais membros do clero, especialmente os não integrados na hierar- de que a Economia reclama seus direitos sôbre a Política, invertendo
quia, em geral, ao afirmarem teàricamente a igualdade do índio e ao a relação estabelecida pela ilustração, pois não aceitava mais as restri-
combaterem sua sujeição ao crioulo (descontada a circunstância do ções estabelecidas de acôrdo com um plano racionalmente elaborado,
rellÍn:'e social estabelecido pela Companhia em suas reduções, pois o impondo-lhe, pelo contrário, as suas exigências, até Frei San Alberto
que nnporta, neste passo, é o reconhecimento do índio como ser hu- que, preocupado com os avanços subversivos dos revolucionários par-
mano), é função, assim, de uma ampliação do ângulo de apreensão tidários dos franceses, em 1791, dirige-se diretamente ao Papa Pio VI
do universo fornecido pelo Direito N aturai, da posição de hostilidade para informar Sua Santidade do que faz para perseguir a rebelj.ão e a
ao poder real e da independência das posições políticas diante dos heresia. Essas mudanças de atitude mental são possíveis na Colônia
qua~os institucionais que a maioria crioula reconhecia ser a sua ga- porque se haviam retirado as conseqüências necessárias da falêncil}
rantia. E apenas quando se dá a conjunção dêsses três fatôres - a da autoridade monárquica; conforme assinala Halperin Donghi no caso
universalização do Direito Natura!, a hostilidade ao rei e o sentimento de Frei San Alberto, a comunicação direta do Papa, implicitamente
de que a posição politica independe do quadro jurídico-político espa- reconhecendo a autoridade espiritual e temporal da Igreja, coisa incon-
nhol - que o crioulo pode. rejeitando êsse último, identificar-se ao cebível alguns anos antes, só foi possível de acontecer porque "o
indio, fazendo-o participar da mesma natureza humana e sentir-se - papel do monarca católico começa a apagar-se; sua figura, que ocupava
êle, crioulo - realmente americmw, passando a ser, na circunstiincia o primeiro plano na constelação dos podêres político-eclesiásticos co-
o "intelectual" do grande número e seu guia político na Revoluçã; meça também a ser deixada para segundo têrrno", e no caso dos
economistas, como Belgrano, porque "a Coroa, então, não só não é
reden:ora. E ?. caso do _cura .~idalgo, que, realizando pràticamente
essa smtese, dina aos nativos: Abn os olhos, considerai que os euro- uma fôrça com a qual os ilustrados possam contar incondicionalmente;
o mais grave é que estava deixando de ser uma fôrça". 71
peus pretendem colocar-nos a lutar crioulo contra crioulo retirando-se
A fraqueza do Estado espanhol vinha não apenas da crise estru-
êles a observar o exército desde longe, e em caso de s~ir favorável tural que se verifica na península, a qual a obra de Carlos 111 não
apropriar~se tôda a glória do vencimento, fazendo depois mofa d~ conseguiu resolver; 72 ela decorre, especialmente no govêmo de Carlos
todo o cnoulismo, e daqueles mesmos que o defenderam ... "; como
70 López Câmara, op. clt., págs, 130 e 137.
serão ~le"e seus '~sequazes", no diz:r do bispo de Michoacán, os que 71 Cf. Halperln Donghi, op, cit., pâ.gs. 138-60.
tentarao persuadrr e persuadem os mdios de que são donos e senhores 72 Cf. John Lynch, op. clt., pág. 12: "O movimento de refomle; radical alcançou
seu apogeu durante o reinado de Carlos m (1759-1788}. o qual se converteu no
da terra, da qual os espanhóis os despojaram por conquista, e que exemplo do assim chamado "despotismo esclarecido" na Espanha do sécUlo xvnr.
Mas freqüentemente se exageram .suas realize;ç6es. ( ... } E Instrutivo recordar que
69 A obra do P.e Clavigero é analisada in Gerbl, op. cU., pág, 176 e sega. Assi- o maior obstáculo ao progresso agricola e ao bem-estar das massas rurais de Espa-
nha, os latifúndios baldios e o rigoroso morgadio, continuavam intatos à. sua morte.
nale-se a diferença, entre a apreciacA.o de Clavigero e Las casas· enquanto ê.sse para Mais ainda, seu absolutismo era menos imponente na prê.tica que na teoria: em
defender o indio da escravidão, proclama-o débil, aquêle, para' reivindicar o a'meri- 1787, ainda havia na Espanha mais de dez m11 povoados e cidades sUjeitas a. Jurlsc11-
cano contra o europeu, aponta-o como vigoroso, çAo senhorial da nobreza e, portanto, fora do contl'Õle real direto".
64 65
IV, t~mbé~ da_ consciência que se descortina lentamente aos povos _ pela transformação do conteúdo ético das relações políticas !'~~e
- seJa a mmona espanbola dos afrancesados, seja os crioulos ilustra,. os crioulos e o grande número, onde se deu como mera transferencta
dos.-:- de que os fundamentos_ teórico-ideais em que a monarquia de soberania da Casa Real para os hacendados e encomenderos, que
cato!Jca se assentava eram se nao falsos, ao menos movediços e ins- se diziam povo - sem que se alterassem as relações políticas básicas
t~ve!s: A paz de 1795 com a França revolucionária, ímpia e regicida, entre os segmentos, e onde, não havendo o índio nem o escravo como
stgmf1ca, talvez, o momento em que se configura à consciência do elementos ponderáveis na massa da população, estabeleceu-se uma so-
pequeno número pensante - e atuante - a contradição entre a legi- ciedade meramente de proprietários e agregados sem que o problema
timação da Coroa e sua prática cotidiana de poder, n com o que a fé étnico pudesse ter influências na proposição teórica e no ajustamento
na Coroa, característica do "ethos" espanhol, se rompe. concreto dos diferentes segmentos sociais.
Essa perda do sentido místico de que se reveste o poder real vem Sendo a transformação do conteúdo ético das relações políticas
acofl!panhada da pe~da da P?sição de, d?minio que a Espanha possui (a universalização do Direito Natural pela integração do índio na natu-
no Sistema de re!açoes ~etropole-Coloma. A posição hegemônica da reza humana e a legitimação das posições políticas feita por êsse Di-
E_spanba nesse sistema Ja apresentara sinais de evidente declínio no reito Natural renovado e não mais pelo direito positivo espanhol) o
seculo ~V!l, sem que sua J?OSição de donúnação se abalasse, pela elemento característico e distintivo do conteúdo revolucionário ou con.
permanenci~ d_a crença colellva na Coroa; êsse declínio se refletira servador da emancipação, o que importa registrar na gesta a Inde-
na ~~~cunstancta de o comércio da Metrópole com as Colônias da pendência não é a referência expressa aos ideais ilustrados, ou à Re-
A~enca, embora formalmente dirigido por espanbóis, fazer-se na sua volução norte-americana, mas, slm, que posição social se assumiu diante
~"'?r parte por conta e ordem de franceses, genoveses, holandeses, do problema da liberdade concreta dos indivíduos. E por isso que o
mgleses, flwne~g':s e ha~bur~eses .. A perda da posição hegemônica único movimento revolucionário - elevação do indio ao mesmo plano
decorreu da propna organiZaçao do SIStema colonial espanbol, tão estri- humano do branco, hostilidade declarada ao rei e negação das posições
t~ento regulafl!e!'tad~ para ~xpulsar o estrangeiro das relações comer- políticas altas dos espanhóis e dos crioulos a um tempo - é o mexi-
Ciw;> ~om a Amenca e llllpedir a troca de mercadorias entre as próprias cano, que se inicia a 10 de setembro de I810 com o "grito de J;>olores"
colon.as desde qu~ concorressem com as espanholas, que teria fatal- e termina com o fuzilamento de Morelos, em dezembro de 1lH5, se-
me~te de s_ucumbrr à coml":tição estrangeira, pois a Espanba, na guindo no sacrifício a Hidalgo, passado pelas armas em julho de 181].
realidade,_ nao estava em condições de abastecer o mercado americano·
O movímento mexicano é ímportante não apenas por haver proposto
~:;~_ 7:'"smala Lynch, a lei era tão perfeita que não podia ser cum~ a transformação das relações políticas entre os segmentos componentes
da sociedade de Nova Espanba; talvez sua maior relevància radique
. O _enfraquecím:nto do poder real conduziu ao rompímento do
equilíbno nas relaçoes entre o crioulo e o espanbol _ m c _ · no fato de constituir êle a prova de que a Igreja era, realmente, na
Em I 8 I O, no momento decisivo ~ c~ise, quando a realidad':," .:~i~~ Colônia, o núcleo hegemônico do grande número (como tentamos
~laramente o problema do Poder, meXJstindo a Casa Real como fonte demonstrar no capítulo 2), pois onde ela assunúu, contràriamente ao
e on~e emanava a autoridade de seus representantes, re ões
México, uma posição de apoio aos espanhóis, os indios com êsses
dos crwulos dar-se-ão nos quadros de ,._ D · 't N 108 ~ formaram no processo de libertação e o poder real pôde resistir por
. - . ""'" zrez o atura restnto e mais tempo, a exemplo do Peru, onde apesar da rebelião de Tupac
as pos1çoes políllcas serão vistas ainda dependerem do D · "t E '
nhol Iss . "f" lrel o spa- Amaru, da revolução de Murillo, em Chuquisaca, no Alto Peru ( 1809),
. o Slg!U lCa que o crioulo continutl rejeitando o índio
cons~rvar seu poder, dêle só se aproxímando quando, no caso :a~~ da separação das províncias do Prata e do abalo sofrido em Nova
de Hidalgo, nada tem a perder com a extensão dos atributos da natu- Granada, Venezuela e Nova Espanba, a idéia da Independência não
reza humana aos descendentes de quechuas aymaras e aztecas alcança círculos maiores que aquêles onde se tomava chocolate e se
tramava a adesão de regimentos reais, sendo necessário que Bolívar,
?e~de que feito a essa luz, o exame do' processo de emanci~ção
permitira assmalar onde a Independência se verificou como Revolução San Martin e Sucre unwn suas fôrças para, apenas em 1824, em Aya-
cucho, dobrar o poder espanhol em seu últímo, poderoso e decisivo
73 ~ra o ~roblema da perda de prestigio da Coroa espanhola em têrmos de reduto na América.
legit~~çao teórlco-ideal, cf. Halperin Donghl, op. cit., cap. IV, Desagregaçtlo da
Tradtçao Política da Monarquia Espanhola, pág, 133 e segs. Os demais movimentos que se processam a partir de 1810 são
74 Para o sécUlo XVII, cf. Juan Reglá, "Spaln and her Emplre" in The New conservadores, seja porque mantêm as bases socioeconômicas sôbre
Cam.bridge Modem History, V, The Unlverslty Press, Ca.tnbridge, 1961.' A clt&ÇAo de
Lynch é de op. cit., pág. 17. as quais os crioulos sustentavam o essencial de sua posição política,
66 67
seja rorque ~a a eman~ipação se faz através da organização de Jun- um comércio inteiramente livre com certas preferências em favor dos
tas diSpostas. a JUrar fidelid~ ao rei legítimo nos quadros doutrinários espanhóis; 5 - que a nomeação na América de vice-re~s,. go::emado-
que n~ prática estavam reJeitando. Halperin Donghi assinala, a êsse res, etc., será conferida a americanos. e europeus. sem d_JS!ulçao;. 6 -
pr~ito, que "a p~esença de elementos ideológicos tradicionais é ... que a administração e o govêmo intenor na ~énca sera~ depositados
mevi!ável na Argentma, que começa sua aventura revolucionária assim nas Assembléias locais e chefes das provmcias respectivas; que ~
como em todo o mundo hispânico atravessado pela crise de qu~ nossa membros das Assembléias serão eleitos pelo povo e que os espanhóiS
revolução é parte", tanto assim que no Cabildo de 22 de maio de europeus residentes e estabelecidos no.país também serã,?. elegív~is;
1810,, em Buenos Aires, "mais que a opinião de qualquer doutrinário 7 _ que a América, depois de haver Sido posta n? ~xerc~CiO de dita
~evena pesar ~ recordação, por exemplo, do estabelecido na lei 9 do representação nas Côrtes e de todos seus outros drreitos, reconhecerá
titulo I. da p~tida segunda: 'A segunda [maneira de ganhar o senhorio a Fernando VII como a ~eu soberano, e lhe jurará obediência e fideli-
do Remo] e quando o ganha por anuência de todos os do Reino dade; 8 - que a América também rec_?nhecerá a soberania .so? o
que o es~olheram. P?r Senhor, não havendo parente, que deva herda; nome de Fernando VII depositada nas Cortes, sendo estas cons!itmdas
o Senhono do Rei finado por direito' ". 75 com todos os representantes da América; ( ... ) 11 - que a América
~ão. é só por se terem processado no quadro doutrinário espanhol também convirá em mandar liberais auxilias à península para empregá-
e no .~bi~O das Juntas que os movimentos de 1810 são conservadores. los contra o inimigos comum" .78
~ util12;'çao do Direito e das instituições legais para subverter a lega- O processo de Independência, para a grande maioria dos crioulo_s
lidade e uma das técnicas de ir ao Poder, e houve aquêles crioulos que nêle se envolveu, é de sentido conservador por ser a mera. contz-
qu~ ~e pretenderam ~ervir da aparê~cia legal para melhor realizar seus nuação das reivindicações do século XVIII no tocante ao controle dos
~~Je!ivos. ~e separaçao (pela consciência da relação desfavorável das quadros administrativos, militares e eclesiástico_s (a e!~ se som~~o,
orças ~ili~res), como os conspiradores de abril de 18 Jo em Caracas pela perda da heg~onia espanhola n~ relaçoes Metropole;Çolon~~·
os qu~s- dispersos entre "o povo expectante e atônito", responden:: o desejo de comercmr livre das travas Impostas pelo monopolio, alms
ao capi!ao-general Emparãn, que perguntava· "Quereis-me po já bastante suavizadas em relação ao período anterior a Cru:los III);
governador?" _
"N- , ·
ao o queremos , com o que o representante do Poder
r vosso e mais não podia ser porquanto o "ethos" em que os cnoulos se
Espanhol n~o tem como manter-se em sua posição. ~sses são no inscreviam e a defesa que reputavam necessária de sua posição política
ent~to, assmale-so; de passagem, apenas a minoria audaz e român'tica diante do grande número impediam-nos de pôr em xeque, por um ato-
e ~o conseguem tri~ar. ao Iong~ dos anos, transformando o autonU.: da maioria da Sociedade, as estruturas políticas, jurídicas e doutriná-
mismo em s_eparaçao e mdependencia, porque a Coroa moveu-lhes a rias do Estado espanhol. Por isso é quel a emancipação se inicia através
guerra ao nao compreender que estava diante de uma grande . . das Juntas, que devem ser convocadas, conforme acentua o Ajunta-
de ~úditos leais e desorientados, que apenas desejavam adm. .~amna mento da Cidade do México, para exercer a soberania no momento
autonomamente sem a · t rf • . d llllS rar-se em que o rei está prêso e o Império não tem mais direção política
des nomead m. e erencill; e um vice-rei e demais autorida-
d a~ r?r Madn e escolhidas apenas entre espanhóis além legítima; e é por isso que se caracteriza como "fidelista'', pois, como
e ter. ~ JJ?"Sibilidade de poder comerciar livremente com o ~ d dizia o Licenciado V erdad, no México, "haverá ouvidos tão delicados
A~ ~eiv~ndicações apresentadas pela Junta de Caracas âs Côrt~~ ~~ que se encham de escândalo ao entender que o povo nestes momentos
CãdJZ sao esclarecedoras dessas posições de fidelid d . de interdito extraordinário recobra a Soberania, a faz sua, reflui natu-
"~ - Cessação de hostilidades de ambas as
bloquems; 2 - anistia geral e esquecimento
;a::· · · d
es, me1um o os
ralmente para si e a transmite às pessoas de sua confiança para devol-
vê-la depois a seu Senhor?",77 da mesma forma que " ... as provincias
do G ê anh 1 d para sempre por parte da Venezuela, sem mais ambição que a de manter-se unidas, sem mais
.ov mo esp o e todos os atos de hostilidade cometidos pelos
amenca~os contra ~ .Espanha e os espanhóis, como também contra
pretensão que a de não ser escravizadas, se conservarão fiéis a seu
as aut~nd~es e mmJStros empregados na América; 3 _ que todos augusto Soberano". 78 Nos podêres que os deputados venezuelanos
~s direitos Já declara:tos aos america~os são confirmados pelas Côrtes 76 O documento aclma Citado está. transcrito em La Doctrlna d.e: la Bevohwión
post~ em e~ecuçao; que os amencanos terão uma representação Emancipad.ora en eZ "Correo dei Orinoco", Biblioteca de la Academia de Historia,
Caracas, págs, 49-50. O Correo deZ Orinoco foi, a partir do estabelecimento de
!'len~, JUSta e hberal nas Côites e que seus Deputados serão eleitos Bolivar em Wngostura, em 1817, o órgã.o de divulgação dos atos do govêmo revolu-
cionário e de artigos doutrinários. O livro em aprêço reúne algumas das peças mala
lffiedmtamente pelos distritos da América; 4 - que a América terá Slgniftcatlvas nêle publ1cadas.
77 ct. López Cámara, op. cit., pág. 73.
15 Halperin Dongh1, op. cit., págs. 180 e 181. 78 La Doctrina de la Bevolución Emancipcãora, cit., pág. 53.

68 69
transmitem às Côrtes, sua missão é claramente formulada como segue seja porque "no comércio, como em tôdas as coisas há uma fôrça de
pelo do:umento r<:r~ebendo-se claramente que, inclusive no tocant~ preocupação e de hábito, à qual é impossível resistir. Seu curso, como
as relaçoes comerciais com as demais nações a Junta de Car o dos grandes rios, uma vez mudado não retrocede até à bôca da
conforma à sua "situação política": ' acas se
antiga fonte. Tudo é já inglês entre nós [o documento deve datar de
"Incumb; _à delegaçã? _do povo de Venezuela reformar no ssí- 1818, quando a guerra na Venezuela ainda não estava decidida], e
vel to_dos, os _vicias da administração anterior, proteger 0 culto fcJ:en- mesmo as produções e mercadorias de outros países nos, vêm por suas
tar a mdustrt~ ( ... ) estender as relações mercantis enquanto ~ permita mãos. A gratidão fortifica mais cada dia êste gôsto e estas inclinações.
noss~ s1~aç: J?".lítica, definir as que devemos ter com as outras O comércio inglês nos subministra com mão liberal todos os meios
~~~t:sd o peno. espanhol e as que podemos conceder aos nego- de conquistar nossa Independência e o comércio inglês obterá, sem
, . os povos aliados ou neutros ( ... ) , reprimir as tentativas da necessidade de tratado algum, uma preponderância eterna neste Con-
e~plTltos que desejariam levar mais adiante as inovações tr 't s tinente".82
vmculos das Prov' · , es e1 ar os
. " m~tas e, em uma palavra, dispor quanto estime Apesar de todo o conteúdo conservador do pensamento crioulo,
convemente a estes Importantes objetos: conservação dos direitos de
no~so_ augusto Soberano, declaração e gôzo dos nossos defesa da
presente na recusa em atribuir a soberania ao povo - é o caso de
rehg:mo que professamos, felicidade e concórdia geral".79' Frei Melchior de Talamantes, que critica Rousseau por não reconhecer
Apesar da solicitude demonstrada pelos americanos , que a soberania deve radicar nos "tutores" do povo, "seus verdadeiros
:~~~~~~eeinflexíveis, entre outros motivos porque a aut~n~~i;op~:~ e legítimos representantes" 83 - , em estender a natureza humana ao
grande número e em reformular suas posições políticas relativas, o
sem dÓ 'd ~ernplo da que o Brasil obtivera anos antes em situação índio não pode ser ignorado, pois êle e a América forneceram aos espa-
VI a versa, mas que se poderia ap .
escapasse do erário real uma fon . ~ roximar, permitiria que nhóis os elementos ideológicos com que negar aos crioulos o acesso aos
o tributo devido pelos indios te ap~ecmvel _de rendas, a qual era pastos de mando, isto é, não reconhecê-las espanhóis. No século XIX,
são aparentados: "Quanto ~ ~ ~nais ~ cnou__Ios, uma. ~ez mais, quando a crise institucional se manifesta na Espanha, é para o índio
cussão nossa solicitude de ~ue esta o~se~m-se fosse admitida à dis- que se voltarão todos quantos pretendem aproveitar-se da fraquez'l. da
nhecesse parte integrante dela - conf eta e da ~onarqma se reco- monarquia para ver satisfeitas suas reivindicações, produzindo-se,
e se declarasse sua igualdade d d' _mua o cromsta venezuelano - então, neste passo, a divisão do movimento emancipador entr~ revolu-
se imprimiu em Cádiz e na Ilh: drreito~ com a ~mtra metade, nada cionários e conservadores: aquêles que no índio encontram um ser
indecente contra os americanos e Lea~ que nao _fôsse uma sátira hwnano concreto que deve ser vingado socialmente, e aquêles que nêle
~as Côrtes os debates, não se ~u~ir: me:.essete _dias qu~ duraram vêem o se_r mítico que permitirá aos brancos americanos a sua vingança
eles [os deputados americanos] . " . que ~propénos contra política contra a Espanha.
dizia o deputado V alente a , InJur!as e doestos. Amda não se sabe
am · .. ' que genero de animais pert '
encanos. Arguelles recordava a estólida doutr. d erre~ .os
eram escravos por natureza Torr . ma e que os mdtos
· · em direitos porque então
Iguais · nãoero opmava . que
. n-ao pod'mm ser 4 - A teoria e a prática da Independência
tava se os americanos eram b paga;I~m tnbuto. López pergun-
tados, ou mais néscio o Condr~c~ e catohcos, e, mais obstinado que No quadro da polêmica travada em fins do século XVIII em
priv~da, que primeir~ votaria epe~ ;~~ rot;~tava, até_ e_m sociedade tômo do direito de acesso aos cargos públicos, o crioulo se afirmara
sua Igualdade com a Espanha" so p t e to. a a America, que por espanhol a igual título que os reinóis, rejeitando qualquer ligação racial
eu [Am, . ] · os as as cOisas neste pé não "f · ou histórica com o índio, por êle também considerado inferior. Essa
enca quem me separei dela [Espanha]. f · 1 ' UI
por um ressentimento temerário me re e . ' o! e ~ mesma quem posição de rejeição social do grande número, no entanto, não provara
seio quando eu ab . p hu, com mao VIolenta, de seu útil, pois contra os crioulos continuava pesando o serem originários
' " ·
E na guerra e morte"d na os braços para estreitá-la em meu coraça-o" s1
· · da América, êsse simples fato sendo suficiente para confundi-los com
, . , . que se segum, a reconciliação tornou-se im-
possivel, seJa pelo adiO mortal que separou a ColÔnia da Metrópole, os indígenas e fazê-los partilhar de tôdas as suas más qualidades. No
século XIX, o caminho a seguir deve ser outro: desde que o espanhol
79 Ibidem, pâg. 54 (grifas nossos)
80 Ibtàem, pág. 57. ·
81 Ibidem, pâg. 58. 82 Ibidem, pâg. 72.
83 Cf. López Câmara, op. cit., pâg. 77.
70 71
recusa aceitar o crioulo como membro de igual direito da raça e da a seus sacerdotes: "Nas conversações privadas e familiare~ de:'eis
sociedade dominantes, há de opor um ao outro e ao grito de "Mueran promover a paz, a união e a concórdia de tôdas as classe~ de Cida~aos,
los gachupines!" sublevar as populações americanas contra aquêles que proscrevendo para sempre os nomes de gachup~s e errou/o~,. ongem
as oprimem. de tôdas as discórdias que amarguraram as mocentes delíc.as que
O "gachupin" é o estrangeiro, o que veio usurpar os direitos que Deus preparou ao h ornem na socie 'dd"86
a e .
os americanos, os naturais têm sôbre o país e suas coisas. São piores :E: inútil, porém, que o Estado e a Igreja se unam oo~tra os
que os americanos, pois o único móvel de sua ação é a avareza: "Credes insurgentes; com a excomunhão de _Hidalgo e Mor~l~, a IgreJa abre
- pergunta Hidalgo - que ao atravessar imensos mares, expor-se à caminho à existência de duas IgreJas, a que prestlgia os sem terra,
fome, à desnudez, aos perigos da vida inseparáveis da navegação, o índios ou americanos e a que defende os poderosos. E o Estado não
empreenderam [os gachupines] para vir fazer-vos felizes? Enganai-vos, consegue deter a m.a'rcha do processo ideológico, pois o crioulo, se
americanos. Abraçaram êles êsse cúmulo de trabalhos para fazer feli- anos antes reivindicava o direito de ser espanhol, nada quer ter, agora,
zes homens que não conhecem? O móvel de tôdas essas fadigas não é com êsse e vai buscar na História da América os elementos capazes
senão sua sórdida avareza: êles não vieram senão para despojar-nos de provar urbi et orbe que a terra ~ sua, os cargos são seus. e sua a
de nossos bens, para retirar-nos nossas terras, para ter-nos sempre única maneira válida de ver as cOisas. Antes, quando desejava ser
espanho~ diziam-no americano; agora, q~e. quer ser ~eric~o, afir-
avassalados sob seus pés". E não hesita em propor: "Unamo-nos, pois,
mam-no espanhol - igualmente sem direitos. PoiS ele rra mostrar
todos os que nascemos neste solo ditoso, vejamos desde hoje como
que "três séculos de opressão e tirania. . . nos fizeram conhecer o
estrangeiros e inimigos de nossas prerrogativas a todos os que não são
despotismo injusto de outro tanto tempo, e o reclamamos". E irão
americanos''.IU;
reclamar conforme assinala o bispo de Michoacán, dizendo que "os
A Juta, porém, não pode limitar-se a reclamar a expulsão e a espanhói~ são usurpadores do domínio do país, do qual despojaram
morte dos gachupines, pois êles têm iguaís direitos a dominar a Amé- os índios. Oh! negra inveja, que não só te tiras um ôlho, mas os dois,
rica que os crioulos: "Há maís que alegar em favor dos poucos espa- por cegar a teu inimigo". 87
nhóis americanos insurgentes que pretendem a Coroa da América? A América autêntica, neste passo, já não é mais aquela ~oloni­
- pergunta-se um homem de letras, refutando as posições crioulas. zada pelos espanhóis; a verdadeira é a índia, que foi usurpada despô-.
Vejamo-lo: ... há duzentos e noventa e um anos que se conquistou a ticamente pela Espanha: "Amados irmãos - declara Morelos - nossa
Amêrica. . . onde estavam, nessa data, os espanhóis americanos? No sentença não é outra senão que os crioulos governem o Reino e que
estado de possibilidade; nem ainda em potência estavam certamente os gachupines se vão à sua terra, ou com seu amigo o francês . . . Nós
na América, porque ainda não a tinham pisado seus país". E mais juramos sacrificar nossas vidas e fazenda em defesa de nossa Religião
ainda, "Sua indústria e seus afazeres [dos europeus] frutificaram Santa e nossa Pátria, até restabelecer nossos direitos que 300 anos
sempre em favor de seus descendentes, e êstes não são outros que nô-los têm usurpados os gachupines". 88 Tôda a história da descoberta
os espanhóis americanos. Os vínculos sociais dessa grande família são até a insurreição é, pois, falsa, uma história que escondeu a ve,rdadeira
imprescritíveis. Esta é uma verdade política apoiada nos princípios face da América, que é a América pré-colombiana - e por um íns-
mesmos da natureza". 85 Contra a reivindicação da autonomia do crioulo tante, para largas camadas, ser "crioulo" significou ser ''índio", natu-
falam, pois,
'
a Razão e a etnia - como haviam falado também.
quando ele se reclamava espanhol e, como tal, com direito a exercer
. ral, autóctone. Não apenas no México, a América pré-colombiana e
seus faustos são relembrados para combater o poder espanhol tirâ-
cargos públicos. O cêrco ideológico colonialista fecha-se sôbre êle nico e ilegítimo. Se em Nova Espanha o reconhecer das lndia& dá-se
servíndo-se a Metrópole de todos os elementos capazes de neutraliz~ concomitantemente à sublevação, no Rio da Prata verificar-se-á pouco
s~a ação insurgen~e no plano ideológico: "Deponham-se as preocupa- depois - a demora cronológica sendo explicável pelo pequeno pêso
çoes_ - ~o~a o bispo de Puebla - parte da debilidade do espírito, específico do índio na sociedade rio-platense. O P.' Domingo Victo-
~a mgratldao, ou da cega paixão; rompa-se o muro que divide a rio de Achega, em 1812, na catedral de Buenos Aires, "apresenta a
filha, da mãe; não se ouçam jamais os odiosos nomes de crioulos e 86 Ibkl.em. pá.g. 132.
gachupines; sejamos todos espanhóis, uns europeus e outros america- 87 Ibidem, pág. 136.
88 Ibidem, pAg. 137. :S: curiosa a referência- ao "francês". Uma das palavras de
nos; mas todos verdadeiros espanhóis". E outro prelado recomendava ordem usadas por Hldaigo e Moreios em sua luta contra a dominação é que os
espanhóis europeus haviam pP.rdido a fé, eram hereges e procuravam entregar o
lU Ibidem, págs. 126 e 128. México aos impios e ateus franceses - os mesmos que os espanhóis acusavam. de
85 Ibidem, pAgs. 134-35. haver influenciado os insurgentes.
73
72
conquista como obra da escravização e recusa àqueles que a justificam e me cobriu de feridas para roubar-me o ouro que eu lhe prodigava e
como momento necessário para a evangelização da América ... [e] fazer-se senhora de minha casa, em que a infame era recebida como
acusa os conquistadores de haverem introduzido o cristianismo na amiga! Mas, que espetáculo de horror se apresenta à minha vista? O
América ,pela violência, 'como la lei de Mafoma'; a guerra como meio maior o mais ilustre de meus filhos, Montezuma, exalando o seu
de impor conversões nunca foi um modo de catequese aceitável para ú1tim~ suspiro sob a segure do aleivoso e bárbaro Cortés; Quatimotzin
os cristãos ... ". E o deão Funes, o mesmo do elogio fúnebre de ardendo, os benéficos incas afogados em seu sangue, zipas, caciques,
Carlos III, defendia, em 1814, a Revolução como "instrumento da todos os soberanos, todos os príncipes de um mundo e suas espôsas e
Providência 'para vingar os tronos americanos' dêsses conquistadores seus ternos filhos degolados; chefes, sacerdotes, magistrados, tudo mor-
ultramarinos que 'dormindo insolentemente sôbre as cinzas dos virtuo- re; doze milhões de homens expiram sob o punhal espanhol; se alguns
sos incas adotaram o sistema bárbaro e inumano de repartir os indios se reservam é apenas para gemer e perecer obscura e lentamente sob
co':lo escravos' ". Comprometida na Revolução de Mayo, a Igreja vai o pêso dos mais duros trabalhos, e, por outra parte, as cidades em
mais longe, e do púlpito da matriz de Santiago de! Estero, J. A. Neyrot, chamas, os palácios, os templos ruindo, as produções mesmas. do
ao lado de ver com ela extintos os monopólios da Europa e aberto o Gênio e os monumentos do saber antigo desaparecendo no fumo desse
livre comércio, canta as perfeições do antigo Peru, cujos governantes,
universal incêndio. Grande Deus! É esta uma invasão da Espanha, ou
assim como os mexicanos anteriores à descoberta, foram legisladores
uma erupção do inferno? .. . ". 91
comparáveis a Minos e Licurgo: "Não faltou [ao Peru] -diz Neyrot
A rebelião é, assim, a reivindicação da superioridade da terra
- para que fôsse o noviciado dos céus senão a religião católica", pois
em que nasceu e da igualdade da raça que a povoou. Contudo, como
nêle existiu a lei agrária sonhada desde tempos imemoriais, a êle é uma rebelião feita por duas categorias distintas de homens: os que
sucedendo, no entanto, "o duro domínio espanhol, que espanhóis sá- afirmam a necessidade de agir de acôrdo com as normas de um Di-
bios, integros e despreocupados denunciaram como tirânico na origem reito, cuja legitimidade não radica .na História, nem em atribuições,
e no exercício".S9
liberdades, ou privilégios reconhecidos em um passado remoto, ou
O jus so/i negativo, que havia excluído os crioulos das posições recente, e os que, pelo contrário, fazem das ~d~ias ilu~t.radas q_ue rece-
de mando, transforma-se agora em autêntica reivindicação da cons- bermn 0 só pretexto para conservar suas postçoes poltttcas e aumentar
ciência nacional, como assinala López Cámara, ou patriotismo, como sua participação na escala de fruiçã? dos valôres soc!"7conômic~s peja
refere Halperin Donghi. Num e noutro casos, é a América do passado assunção aos cargoi, e como o tnunfo cabe aos ultimas e nao aos
indio, mítico, que se opõe a uma Espanha em crise; uma América priffieiros, a terra fica vingada, mas ~ o grande número. qu;' .a habit~.
que se levanta em armas não apenas para se libertar da opressão do Por haver reivindicado seus drret!os nos quadros JUrtdtcos-polí-
monopóli~ comercial e do exclusivismo administrativo, mas também ticos do Estado metropolitano, por incluir-se no "ethos" espanhol,
para se vmgar da "legenda da inferioridade natural"; que se ergue por não considerar o grande número como integrante de sua sociedade
"contra uns homens, cuja soberba e despotismo sofremos com a maior e pelo fato de a vulgarização de suas idéias ilustradas ter-se d~do d;
p~ência pelo espaço de quase trezentos anos, depois de haver sido forma aristocrática - não se estabelecendo, portanto, os canais polí-
vttunas de sua cobiça, insultados e provocados por uma série conti- tic<rorganizatórios de comunicação ideológica ascendente e descen-
n~~?a de desp~ezos. e ultrajes, e degradados à espécie de insetos rép- dente entre a "élite" e a massa - , o crioulo inserido no sistema de
teiS , como diZia Htdalgo, ou, como afirmava um insurgente anônimo relações estabelecidas entre a Colônia e a Metrópole não pôde vingar
contra aquêles chefes europeus que tratavam os crioulos como "gent~ o indio; e não pôde fazê-lo porque não pretendeu disputar a hegel-
de outra espécie".Do morria ao espanhol dominante. É que alêm de já havê-la de fato per-
A v~g~ça, no entanto, não pode fazer-se sem que o espanhol, dido no instante da Independência para o "ethos" espanhol e para
o gachuP_m seJa exposto ao mundo como realmente é: cruel, impiedoso a maneira jesuíta de vulgarização das idéias, não soube criar, apegado
e destruidor das grandes civilizações: "Oh memória! - exclama a às suas posições políticas e ao seu sentir-se branco e espanhol, novas
Am.érica ~iante da Europa. Oh, dia de maldição aquêle em que con- crençaS populares e um nôvo senso comum, donde uma nova cultura
cedt a maiS generosa hospitalidade a essa miserável aventureira, que fundada orgânicamente na fusão da tradição índia com a herança espa-
apenas recostada em meus braços sacou do seio seu pérfido punhal, nhola, a qual no momento da crise do poder espanhol pudesse deitar
89 Ha-Iperin Dongbt. op. cit., pé.g. 184 e segs. raizes na consciência popular com a mesma fôrça e o mesmo caráter
90 López Câmara, op. cit., pág. 143.
91 La Doctrina de la Revoluctón Emancipadora, cit., pág. 83.
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trinário ilustrado não tem mais em que se apoiar - e os economistas
imperativo das crenças tradicionais. Em outras palavras, o crioulo não são .obrigados a inverter sua posição, a exemplo de Belgrano, que
elaborou, ao longo dos três séculos de dominação, uma visão do mundo em JUnho de 1810 proclamava que a maior causa do atraso "da agri-
nova e coerente (teoria e prática) ajustada à sua realidade, na qual cultura p~~tenha era, a falta de proprieda~e da terra por parte dos
a proposição verbal de transformação das relações políticas entre a lavradores , e em. agosto do mesmo ano afrrmava que seria "errôneo
Metrópole e a Colônia, explicitada em têrmos dà ideologia liberal euro- buscar por essa Vi': [a de refm;mas jurídico-administrativas que asse-
péia, coincidisse com a proposição real de transformação das relações gurassem a extensao da propnedade] o progresso da agricultura, e
políticas na sociedade americana no sentido mais profundo das idéias que se o encontrará, pelo contrário, impondo maior disciplina aos
que brandiam como sua maior arma doutrinária contra a Espanha. trabalhadores assalariados, graças à qual poderá reduzir-se o custo da
Em Buenos Aires, onde a constituição do Vice-reinado do Prata m-a~de-o~b~a" .92 ~ ~~se proc~sso em que a formulação teórico-crítica
(que subordinou administrativamente a rica região de Polosi à capital) ced~. à prallca acnllca ';'fi virtude da necessidade de manter as posições
e as medidas liberalizadoras adotadas no reinado de Carlos III haviam pohllcas, revela-se mais esclarecedor, no Rio da Prata, nas relações
produzido um progresso econômico que acabaria conduzindo à des- entre os bra.ncos e as cast~, ':"omento '.'m que os homens de Mayo
truição de fato do monopólio mercantil espanhol, a Representación ~e mostram ~capazes de asslDlilar os socialmente não-brancos ao con-
de los Hacendados, escrita por Mariano Moreno (editor de Rousseau) JU~t~ da_ sociedade, perseverando, os conservadores, nas práticas dis-
em 1809, em nome de 20 mil proprietários, configura o momento teó- cnmmatonas herdadas da Colônia, e os mais revolucionários consul-
rico da conversão dos ilustrados ao liberalismo caracteristico do regime tando a Junta sôbre se podem conferir a um oficial negro 0 prêmio
de produção da nação então hegemônica no sistema mundial. A pro- de chamar-se Don por sua conduta heróica ... ••
posição prática, porém·, é coerente com a teórica apenas nos aspectos A co~tra?ição e~tre a formulação teórica e a prática de poder,
pràpriamente econômicos da doutrina européia, pois no que tange à contudo, ~ao e própna apenas do Rio da Prata; no antigo Vice-reina-
reformulação das relações de poder entre os segmentos que compu- do, especialmente na depois província de Buenos Aires, é mais mar-
nham a sociedade rio-platense predominaram os interêsses dos que se cante o ~ontras~e pelo fato de ali o índio não ter constituído um pro-
situavam nas posições altas. A realização do liberalismo, cujo fim últi- blema a ~guallltulo que no Peru (Alto e Baixo) ou no Méxi<!o onde
mo aparecia iJ Europa de então como a possibilidade da extensão da as necessidade~ da produção obrigavam brancos e índios a convfverem
propriedade a todos, ffJra vista até o enfraquecimento ostensivo da no m~smo, ~~1ver~o. ~,sico e social. No Rio da Prata, foi a pecuária,
Coroa e&panhola corrw tarefa que ela deveria cumprir como Poder assecmda !'- barbane a que se referiria Sarmiento que triunfou sôbr
Ilustrado, entre outras coisas fazendo que a pecuária não dominasse ~ ll~straçao. portenha, impedindo que através de!~ se realizassem o:
a região. Os economistas portenhos são disso o exemplo, pois, embora i~erus lib':"ms. JY.las ali, em virtude das próprias condições da articula-
reconhecendo que a pecuária terminaria, por fôrça das leis econômicas, çao eco~onn~a mterna e da República com o mercado internacional
a tudo subordinar a seus interêsses, procuravam evitar, pela sugestão e por nao. g~rarem as relações do crioulo com o índio em tômo d~
de medidas administrativas, que tal ocorresse, sabendo que as conse- terr~, o lzber_alzsmo per~ceu sempre com ideal revitalizador da
qüências decorrentes do exclusivismo da atividade econômica contra- Socze~ad~, trzunfando afmal, nos estreitos limites impostos pela arti-
riariam seu ideal ético e político. :esse ideal político, embora ilustrado, culaçao mterna e a dependência externa, e triunfando por causa disso
ressalta Halperin Donghi, "não é muito diferente do que está nos
supostos da economia liberal moderna: o ideal político é o de urna
92 Cf. Haiperin Donghi op cit
economistas portenhos,. em' sua" f~ 1 á 156
g. e segs. Observe-se que a posição dos
textos referidos por Halperin Donghi t Iu~tradf a quanto se pode depreender dos
sociedade livre, que encontra seus equilíbrios graças à soma dos esfor- realizar tarefas compatíveis com 8 ~ ~d :.a éazer do Poder politico mn meio para
Ora co ss1 i ei:D.s ticos, mais do que um t·m o1
ços individuais daqueles que a integram; o ideal ético é o do trabalho • mo a na a Heckscher em seu Mercantil" (G t em ·
dres, 1955, vol. II, pá.g. I?), 0 fazer do Poder u~~e· eorge Allen & Unwin, Lon-
produtivo colocado a serviço da conquista do mundo material". Como, 1
guia, entre outros elementos. 0 mercantilismo do u : 0~ mn fim é o que dlstin-
eco.nômlca. Para Adam Smlth acentua ,. 0 pod eraertmo enquanto proposição
porém, uma série de exemplos concretos lhes havia ensinado que essa para fi • • er era c amente apenas um meio
0 m, como pode ver-se de modo assaz claro do titUlo de seu uvro e das
realização não podia ser objeto do jôgo automático das fôrças econô- ~ras e quase insignificantes exceções à regra geral que êle concede em b~neficio
micas, pois êsse conduzia com freqüência à destruição do que se ti segurança. Os mercantilistas usualmente acreditavam no contrário e 0 mercan
~~~op~f~~mn slstema de poder era, assim, primeiramente mn slste~a para colo:
supunha ser a sociedade futura, era necessário "exigir a tutela de um econ 0 m 1ca a serviço do poder como mn fim em 61" Ass1m sendo a
nustração portenha, ao contrário da espanhola de que se orlglnara ·até certo pon'to
forte poder político" para sanar os inconvenientes já presentes no Agro tendeu mais ao llberallsmo que ao mercant111smo. que marcou na Espanha o despo~
ricrplatense. t18mo esclarecido,
93 Ibtdem, pág. 205.
Quando a Coroa perde seu prestígio e autoridade, o quadro dou-
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como Ilustração com Mitre e Sarmiento - povoar e criar escolas. dispersos de nossos primeiros repúblicos. Foram êles a flor de nossa
Já naquelas regiões, porém, em que a terra se constituiu no nexo rela- vida social; contra êles, representantes de nossas mais belas tradições,
ciona/ entre os setores sociais com posições politicas diferentes e etni- levantaram-se os grosseiros instintos das massas ignorantes, conduzidas
camente diversos, a Ilustração propôs-se apenas como fato verbal, e o pelo crime. Morte ao branco, gritavam as hostes de Boves [o caudilho
Liberalismo serviu exatamente para reforçar o domínio antiliberal e realista]; morte ao branco, isto é, ao aglutinante cultural que traba-
oligárquico da minoria crioula sôbre o grande número. No Peru, como lhava para realçar os valôres populares, que amava a êsse. . . povo
assinala Mariátegui, o "caráter individualista da legislação da Repú- incapaz de compreender os benefícios daquela transformação feita
blica favoreceu, fora de tôda a dúvida, a absorção da propriedade indí- com absoluta boa fé para redimi-lo de suas misérias, tanto morais,
gena pelo latifúndio. A situação do indio, a êsse respeito, era contem- quanto materiais, que havia proclamado a abolição da escravatura, a
plada com maior realismo pela legislação espanhola. . . [e] a reforma recompensa ao mérito eminente, a gratuidade da instrução". 97
jurídica não tem mais valor prático que a reforma administrativa, Feita a Independência, o isolamento entre a "flor da vida social"
frente a um feudalismo intato em sua estrutura econômica. A apro- e o "povo incapaz" persistiu, e fôra essa circunstância que, já durante
priação da maior parte da propriedade comuna! e individual indígena a revolução emancipadora, havia permitido aos espanhóis afirmarem
está já cumprida", numa antecipação do que aconteceria pouco mais a "ignorância e incivilidade" dos povos que se pretendiam tornar inde-
tarde na Bolívia, onde as comunidades indígenas foram inicialmente pendentes, acrescentando que a tal ponto eram incivis e ignorantes
usurpadas e depois, em nome do liberalismo, vendidas em hasta públi- que não podia governar-se a si próprios.
ca de tal forma que apenas a oligarquia pôde adquirir as terras, e os
índios não. 94 Com isso, frustrado o movimento agrarista de Hidalgo
e Morelos no México, longe de permitir, como nos Estados Unidos, 5 - Os percalços da Independência
uma revolução traduzida na derrubada do Establishment e na distri-
buição das terras da Coroa e de algumas famílias entre os Patriotas Libertando-se da Espanha e abrindo seus portos ao comércio com
Americanos, o que enfraqueceu o poder da antiga classe conservadora tôdas as nações, a América independente não se viu, no entan\,o, reco-
aristocrática, a Independência na América espanhola serviu apenas nhecida como igual pelos povos que como ela haviam sido considerados
para reforçar a posição política dos senhores latifundiários.•• inferiores e dos quais, no afã de mostrar-se igual, havia copiado formas
Se essa não-integração do grande número na cultura e na socie- de organização política opostas àquelas do absolutismo, que identifi-
dade que os próceres tentaram construir, por um lado aconteceu em cavam com a monarquia que tinham derrotado nos campos de batalha.
virtude de o liberalismo, que animava os setores dominantes, ter servi- Deixando de fazer, das guerras da Independência, a revolução que per-
do antes à preservação de suas posições políticas relativas do que à mitisse a integração, ainda que longinqua, da maioria da população
extensão da propriedade e do sufrágio, por outro resultou do sonho nos valôres monopolizados pela "flor da sociedade", o crioulo não
de construir sôbre "povos que estão na infância da liberdade, empa- resolveu o problema ético-político de sua convivência com o grande
pados dos vícios da escravidão e sem os costnmes, as virtudes e a número, sendo em conseqüência incapaz de eliminar as contradições
civilização que elas exigem", instituições políticas apoiadas nas "teorias entre a constituição escrita liberal, que se dera e à sociedade global,
praticadas com tanto êxito da liberdade nos Estados Unidos do Nor- e a constituição real oligárquica, que afirmara ao longo da conquista
te";96 foi, sobretudo, conseqüência de a elite dirigente não ter podido na "encomienda", na "m.ita" e na grande propriedade pecuária. Dai,
estabelecer o vínculo social de comunicação doutrinária com a massa, apenas vencido o espanhol que o humilluua, assistir a uma nova versão
que ficou assim entregue ao domínio do caudilho, quando não da da "legenda da inferioridade natural": o crioulo, que antes era "abati-
Igreja. Luis Correa reconheceu o malôgro da emprêsa liberal, incapaz do", agora é <Cincivilizado", Uignorante." e Uincapaz" de viver as formas
de se comunicar com o grande número: "Para os trabalhos do Gabi- superiores de organização política exemplificadas na Federação norte-
nete, Bolivar [tomada Angostura em 1817 e anunciada ao mundo a -americana, às quais busca copiar como expressão superior da convi-
constituição da Terceira República da Venezuela] pensa nos restos vência pacífica dos povos, talvez exatamente para afirmar sua supe-
94 Cf. Marit\tegul, op. cit., pã.g. 31, e Augusto Céspedes, op. cit., pág. 33. rioridade sôbre o espanhol e seu repúdio às formas não-democráticas
95 Pal'a o problema norte-americano, c!. Arthur A. Eklrch Jr., The American de organização política. Nessa nova versão da ulegenda", não é o
Democratic Tradition - a HistOTJI, Macmtllan, Nova York, 1963.
96 Discurso de Fernando de Pefíalver sôbre a natureza do Senado Constttuclo-
nal, in La Doctrina de la Revolución Emancipad.ora, cit., pág. 239.
97 Ibidem, pág. 29.

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clima, nem a geografia que o faz inferior e o predispõe ao abatimento; A auto-atribuição dessa missão civilizadora decorre da consciên-
êle não é mais considerado incapaz de exercer funções administrativas, cia, por parte dos setores dominantes das nações hegemônicas, da
cujo exclusivo alguns poucos peninsulares desejam manter; é incapaz superioridade de suas instituições políticas, aliás tomadas como mo-
de praticar a própria democracia que inscreve em suas Constituições dêlo em todo o sul, cedo ou tarde: "Essas repúblicas latino-americanas
copiadas dos povos anglo-saxões - que substituíram a Espanha como - dizia um secretário de Estado norte-americano - são politicamente
dominantes e dirigentes - , e assim é porque convive com o grande nossos filhos, por assim dizer. . . Não só nos observam, como nos
número "inferior física, intelectual e moralmente''. 9 8 têm como modêlo. Está escrito que muito se exige de quem muito
O problema da "inferioridade natural" é suscitado, no século dá, e êste país [os Estados, Unidos] faltará a seu dever se não fizer
XIX, de maneira diferente do período anterior: na "disputa do Nôvo mais que qualquer outro na obra de companheirismo e de irmandade.
Mundo", o crioulo era inferior porque nascera na América e o acusa- O mandamento estabelece 'Ama teu próximo como a ti mesmo'. :B o
vam de mestiço; na nova versão da polêmica, é "incivilizado" porque único preceito a partir do qual podemos construir com segurança, e
não sabe organizar-se apesar de branco e descendente de espanhóis. por isso desejamos ser amigos dêsses países e ajudá-los". 100 Se a vida
:Ble é apontado como vencido pela "atividade revolucionária e disper- democrática das repúblicas latino-americanas é politicamente débil, é
siva da política sul-americana, apisoada e revolta pelas gauchadas dos natural que se procure ensiná-las a "eleger bons homens", 101 sobretudo
caudilhos", vivendo em repúblicas em cuja gente se lobriga "a sobre- quando a instabilidade política que as toma dependentes decorre do
vivência dos menos aptos, a evolução retrógrada dos aleijões, a ex- pretorianismo e do caudilhismo, fenômenos desconhecidos nos países
tinção em tôda a linha das belas virtudes do caráter, transmudadas anglo-saxões, e cuja explicação, entre outros fatôres, só pode encon-
numa incompatibilidade à vida, e a vitória estrepitosa dos fracos sôbre trar-se nas "características geográficas que tomavam difícil um govêmo
os fortes incompreendidos ... ", 99 ordenado, [na] composição racial da população (a alta porcentagem
Durante a colônia, no afã de obter os cargos públicos, o crioulo de índios, negros e sangues mesclados), [na] pobreza e ignorância das
renegara socialmente o índio para em seguida exaltá-lo miticamente, massas .. . ". 102
fazendo sua a narrativa dos horrores cometidos pelos espanhóis du- A ameaça à Soberania nos séculos XIX e XX vem, não da Me-
rante a conquista; assim procedeu porque o nexo de relação com trópole, habitada por homens da mesma raiz étrúca, que se .J'ligavam
aquêle que o negava residia na posse ou não de um símbolo de superiores apenas para não dividir com os crioulos as posições políticas
poder, cuja chave era detida pela Espanha, e na possibilidade ou não altas que ocupavam na Colônia, mas de "dois grandes capitalismos ãe
de comunicar-se livremente com o mundo, segrêdo êsse que também lwmens da mesma raça [diversa da latina, pois são anglo-saxões, que
era detido pela Metrópole. Foram êsses elementos que levaram o criou- se] disputam nossos mercados e ameaçam e abatem nosso orgulho". 10•
lo a reclamar-se da América e de sua raça, opondo-se como um único Ela se configura, assim, aos americanos do sul, com um duplo sentido
corpo ao espanhol, "estrangeiro" e "peregrino". Na República, não étnico e político, diante do qual se deve tomar posição. Há os que,
são mais os cargos administrativos que se disputam (pois nem sequer como Alcides Arguedas, verão na "sujeira, ignorância, localismo, pre-
sua distribuição depende do poder estrangeiro à América), nem a guiça, politiquice, tristeza e todos os vícios universais . .. " do "povo
possibilidade de comerciar livremente com todo o mundo, é o que enfêrmo" a prova da incapacidade de redenção do grande número,
se reclama; o nexo de relação reside agora no exercício pleno da Sobe- portanto da própria América Latina, ao invés de atribuí-la, como pro-
rania, que se conquistou nas guerras, da Independência, e o objeto testa Céspedes, "à desnutrição forçada pela mineração". 104 Mas houve
negatório não é mais a Metrópole, que detém a chave do comércio os que remontaram à tradição da Independência, quando a América
com o mundo, mas são as nações hegemônicas do sistema mundial, espanhola, imaginando-se diante do Areópago europeu que iria dirimir
as quais pretendem orientar a política interna dos países abaixo do sua disputa com a Espanha, reivindicou para si, desde que livre, a
Rio Bravo de acôrdo com os interêsses de seus grupos dominantes, 100 Discurso do secretário de Estado J. W, Bryan na AssoclaçA.o Estatal de Ne-
braska., em agOsto de 1913, apttd Arthur S. Llnk. La Politica de Estados Unidos en
as imposições de sua segurança e a missão civilizadora que se atribuem, América Latina, FCE, México, 1960, pâg, 25.
enquanto Nação. 101 A expressA.o é de Woodrow Wllson em palestra- com Slr Wl111am Tyrrei, secre-
tário privado de Slr Edward Grey, secretário do Foreign Ojjice, citada. em Llnk,
op, cit., pãg. 72.
98 EEsa é a tmsgem que, segundo Daniel Coslo Vlllegas, op. cit., pâg. 49, os 102 C!. Edwln Lleuwen, Armas 11 Politica en América Latina, SUR, Buenos Aires,
norte-americanos faziam doe mexicanos. 1960, pág, 41.
99 A cltaçl\o é de Euclldes da. CUnha., que sumaria a. op1n1A.o de setores a.nglo- 103 C!. Al!redo Paiâclos, Nuestra América 11 el Imperialismo, Ed. Palestra, Bue-
-saxOes sObre a. Amérlca do Sul, "Solidariedade Sul-americana", in Oontrastca c Oon- nos Aires, 1961, pãg. 240.
jrontos, 9.• edlçA.o, Lello & IrmA.os, Põrto, s/d, pâg. 167. 104 Augusto Céspedes, op. cit., pâg. 51.

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libertação do mundo. E aos que, como Emerson, abalados pela depres- o resultado da fusão de suas diferentes culturas e tradições, englobando
são de 1847, afirmavam com evidente pessimismo e desespêro: "Se a o espírito aborígine. E se temos de ser sinceros, declaremos que hoje
coragem da Inglaterra se vai com a eventualidade de uma crise comer- somos nós, precisamente - com nosso atraso e nossa indolência -
cial, eu voltarei a Massachussets e às minhas tendências indigenas, e os representantes verdadeiros da América; os que nos mesclamos à
direi a meus compatriotas que tôda a antiga raça desapareceu, e que gente da terra, aos humildes autóctones, depositários, afinal, da raiz
a flexibilidade e a esperança da humanidade devem, doravante, repou- e da essência da terra; os que adquirimos as qualidades e os defeitos
sar na Cordilheira do Allegheny, ou em parte alguma"' 0• contrapõem dos que encarnam a tradição, realmente americana, e nos arraigamos
a missão redentora de tôda a América - de raça latina, india ou mes- neste solo e, por isso, crescemos mais lentamente, mas com mais pro-
tiça. Missão redentora, pois a América Latina, ao contrário dos anglo- fundidade também e com uma índole própria. Porque é um extremo
-saxões que em virtude de sua formação puritana dividem os homens absurdo e irritante pensar que um continente que já estava povoado
nos eleitos do Senhor e naqueles condenados à danação eterna, está por raças e civilizações antiquíssimas, como a incaica, a azteca, a
aberta a todos os homens e é dêles o cadinho de um só e o mesmo maya e a araucana. . . deva ser representado, e ainda em caráter limi-
destino: "Há ... duas maneiras contrapostas e excludentes de con- tativo, por uma raça de origem européia, que se jacta de seu espírito
siderar a vida. A raça anglo-saxã é egoísta, julga-se privilegiada e excludente e de seu procedimento de transplante".'()\)
superior a tôdas as outras raças. Nós, pelo contrário, sentimo-nos No período colonial, o crioulo era dominado com relação ao espa-
irmãos de todos os homens, e i'micamente poderemos sentir consciên- nhol e dominante quando confrontado com o grande número, indo
cia racial quando tivermos concebido a possibilidade de realizar um buscar no Direito Espanhol, que o excluía dos cargos, os elementos
destino próprio".' 06 A redenção não é tão-só da raça latina: é tam- com que fortalecer sua posição política interna. Nessas condições, a
bém da religião e dos valôres maiores da civilização, pois os america- libertação do grande número só foi possível de ser tentada quando, com
nos não-saxões não podem imitar os Estados Unidos que, como Fausto, Hidalgo e Morelos, êle se opôs ao crioulo, que desfrutava posições
venderam "sua alma em troca da riqueza e do poder, degenerando em políticas altas, e ao espanhol, indistintamente. No período republicano,
plutocracia", 1o1 porquanto "o monroísmo, o Destino Manifesto, o big não são os cargos, mas a Soberania afirmada nas guerras de Inde-
stick, a politica do dólar, o panamericanismo, a boa vizinhança, tõdas pendência o que está em causa. Para obter aquêles, salvo b.o caso
essas etapas evolutivas do plano imperialista, assim como sua culmi- do México, rompeu-se com o poder constritor do desenvolvimento
nação na etapa atual de luta pela dominação politica do mundo, devem da Colônia em nome do Direito por êle encarnado; para conservar
entender-se e interpretar-se à luz dos ideais hispânicos de salvação essã, rejeita-se uma imaturidade política unilateralmente atribuída e
da catolicidade e dos valõres do espírito em meio à crise da civilização consagrada pela Doutrina Monroe e seus corolários, os quais consti-
moderoa".1os tuíram, desde 1823, o fundamento jurídico para a intervenção - e
Os próprios intelectuais que desta ou daquela forma se filiam rejeita-se a imaturidade independentemente ou não de propor-se a
ao marxismo, como Alfredo Palácios, não recuam diante do nôvo transformação das posições políticas. A Soberania, porém, tal como
desafio da "legenda da inferioridade". Tendo o capitalismo norte- os cargos, não é sentida como uma abstração jurídica em nome da
-americano decidido que não existe outra América geográfica senão qual se disputa simplesmente; o que ela configura é uma constelação
os Estados Unidos da América do Norte, é preciso levantar a luva: cultural, cuja defesa só pode ser feita atentando-se para as raízes
"O fato de que a América Latina constitua as duas têrças partes da étnicas em cujo nome, e no das condições sociais porque é tida como
superfície dêste nôvo mundo carece de importáncia, em virtude de responsáve~ é exatamente negada.
sua própria desunião. E de que esteja esta terra ocupada por uma A intervenção na Soberania é, destarte, vista como a manifesta-
raça distinta da do Norte, de tradição cultural mais antiga e depurada, ção imperialista de potências que primeiro abatem "nosso orgulho"
é um pormenor incômodo e transitório, cuja existência convém [a e depois constrangem o desenvolvimento autônomo dos países latino-
êles, norte-americanos] dissimular. A América vivente brotará da -americanos tomados como um todo econômicamente considerado -
união de tôda a América - desde a do Norte até a do Sul - e será com o que se volta à tradição de 1810 (salvo no México), quando
105 Citado por Max Lerner, Civilização Norte-americana, Fundo de Cultur~. Rio
a posição relativa do grande número na escala de fruição dos valôres
de Janeiro, 1960, vol. I, pág. 47. socioeconômicos era fator secundário na gesta libertadora, pois se
106 Alfredo Palácios, op. ait., pág. 114. tratava primordialmente de negar a "legenda da inferioridade natural".
107 Ibidem, pág. 87.
108 Julio Ycaza Tigerino, Sociologia de la Politica Hispano-amerícana, Instituto 109 Carta. de Paiácios à juventude norte-americana, 1927, in Nuestra América v
de Estudos Po11tlcos, Madri, 1962, pág. 312. el Imperialismo, cit., pág. 171 e segs,

82 83
E por isso que o latino, que se sente etnicamente injustiçado, só pode formação das posições políticas internas a condição da defesa da So-
reclamar sua vingança como o representante da América Latina en- berania. É por isso que "Carranza, dizia Acuiia [secretário de Relações
quanto comunidade étnica oposta aos anglo-saxões - não como o Exteriores do Govêrno Constitucionalista do México, em 1915], não
intelectual de "la enorme y funeral canalla I que ofrece su sonrisa a poderia consentir 'em uma discussão sôbre os assuntos internos da
la metralla" como referia Manuel Ugarte. Para êsse latino, o essencial República por mediação ou iniciativa de qualquer govêrno estrangeiro'.
é "apagar o estigma de inferioridade com que os europeus sempre A aceitação da oferta [de mediação] panamericana causaria graves
marcaram os sul-americanos'', sendo para isso necessário que a Amé- danos à independência mexicana e estabeleceria um precedente para
rica seja capaz de levar ao mundo a sua mensagem, rompendo com a intervenção estrangeira na solução de questões internas. O Primer
um passado já morto: "Nossa América até hoje viveu da Europa, Jefe, prosseguia Acuíia, não só era o guardião da soberania mexicana,
tendo-a por guia. Sua cultura a nutriu e orientou. Mas a última guerra mas também o dirigente de uma 'genuína revolução que se propõe
[1914-'1918] tornou evidente o que já se adivinhava: que no coração destruir os últimos vestígios da época colonial e satisfazer as nobres
dessa cultura iam os germes de sua própria dissolução. Sua ciência aspirações do povo mexicano, encaminhadas ao bem-estar e ao pro-
estava a serviço das minorias dominantes e alimentava a Iuta do gresso'. Jamais poderia sentar-se em uma mesa de paz com o homem
homem contra o homem. Ciência sem espírito, sem alma, cega e que havia procurado corromper e destruir a Revolução [Villa], nem
fatal como as leis naturais ( ... ) . Seguiremos nós, povos jovens, essa permitiria que êsses inimigos do povo mexicano tomassem parte direta
curva descendente? Seremos tão insensatos que empreenderemos ... no govêmo, como tampouco poderia permitir que estrangeiros, por
um caminho de dissolução? Deixar-nos-emos vencer pelos apetites e amistosos que fôssem, conduzissem os destinos da Pátria" .112
cobiças materiais que arrastaram à destruição dos povos europeus?
(pág. 87) . . . a democracia do mundo e o bem da humanidade são
contrários aos interêsses dos plutocratas ianques; é o dominio do
mundo o que perseguem e no que já estão assaz adiantados (pág. 169).
Mais humano, vivo e idealista é nosso lema de 'A América para a •
humanidade'; pois se, com efeito, a América há-de alcançar realidade
universal e corresponder à época presente, como genitora do futuro,
deve ser uma experiência que supere essencialmente o fenômeno euro-
peu e que integre a contradição dos têrmos, de oriental e ocidental,
em uma altíssima síntese de integração humana, que pratique a sim-
biose e a fusão espiritual, ao invés da competição darwinista própria
do campo biológico (pág. 173)". 110
Mas, como em 1810, também houve os que se propuseram a
liderar o grande número para superar os vestigios do passado colonial,
compreendendo, como observa Lieuwen, que "a economia latino-ame-
ricana continuou sendo essencialmente colonial. Proporcionava mine-
rais e gêneros alimentícios aos países industriais, dos quais dependia
para os produtos manufaturados. A aplicação de capital estrangeiro
em emprêsas de mineração e de transporte reforçou a posição econô-
mica da oligarquia rural, porque essa última, como produtora de co-
lheitas de exportação, também se beneficiava com o estimulo do
comércio exterior. Contudo, o aumento do intercâmbio e da produti-
vidade não se refletiu em uma elevação dos níveis de vida para
tôdas as classes da América Latina, como ocorrera em geral nas
nações industrializadas"."' A compreensão da articulação da América
com o sistema mundial tornou necessário para alguns fazer da trans-
uo Alfredo Palâclos, op. ctt.
111 Ll.euwen. op. cit., pág. 56. 112 Apu.d Link. op. c'it., págs. 207 e 208.

84 85
4

A AMERICA E O CAPITAL

O exame da inserção da América Latina no ciclo civilizatório


da Europa não estará completo se não considerarmos como se deram
suas relações com o capital a partir do século XVI, e quais as in-
fluências negativas que as condições da articulação da Sociedade Civil
no Espaço e a comunicahilidade exerceram sôbre o caráter transfor-
mador dessa nova forma universalizadora das relações humanas num
sentido essencialmente secular e racional, Tal caráter transformador
e universalizador é assinalado por Schumpeter nas seguintes palavras:
"Todos êsses tipos sociais [o intelectual, o white collar, aquêle que
vive de rendas urbanas e o próprio operário] são modelados pelo
modo capitalista de produção, e tendem, por essa razão, a arrastar
consigo outros tipos - inclusive os camponeses - , fazend~os con-
formes a si próprios. ~sses novos tipos são agora lançados 'a êsmo
para fora da ordem fixa de outros tempos, do meio que prendia _e
protegia as pessoas durante séculos, das velhas associações dE; aldeia,
do feudo, do clã, várias vêzes até mesmo da família em sentido amplo.
Foram afastados das coisas que eram constantes durante anos, do
bêrço ao túmulo - instrumentos de trabalho, casas, o campo, espe-
cialmente o solo. Foram lançados às cidades, mergulhados na lógica
impiedosa do emprêgo lucrativo, meras gôtas dágua no vasto oceano
da vida industrial, expostos às pressões inexoráveis da competição.
Foram libertados do contrôle de antigos padrões de pensamento, do
pêso de instituições e órgãos que ensinavam e representavam essas
visões da aldeia, do feudo, da corporação. Foram removidos do velho
mundo, engajados na construção de um nôvo para si - um mundo
especializado e mecânico. Assim foram todos inevitàvelmente demo-
cratizados, individualizados e racionalizados. Foram democratizados,
porque a imagem do privilégio e do poder honrados pelo tempo cedeu
lugar a uma de mudança continua, posta em ação pela vida industrial,
Foram individualizados, porque as oportunidades subjetivas de moldar
suas vidas tomaram o lugar de fatôres objetivos imutáveis. Foram
racionalizados, porque a instabilidade da posição econômica tornou
sua sobrevivência dependente de decisões continuada e deliberadamente
racionais - uma dependência que emergiu com grande agudeza [à
87
cialmente ao "ethos" racional que lhe é próprio, levando-a a desprezar
consciência de todos]. Treinadas para o racionalismo econô'?ico,_ essas
os elementos materiais que teriam permitido ao país disputar com
oas não deixaram esfera alguma da vida sem ser rac10nahza~a,
êxito a hegemonia, 110 por outro, essa posição secundária na Europa
~~~ando tudo em dúvida a respeito de si próprias: a estr':tura soc1al, retirou o elemento exterior ao "ethos" racional indispensável à trans-
0
Estado, a classe dominante. As marcas desse processo estao gra_vadas formação da mentalídade coletiva, qual fôsse a possibilidade de o
em cada aspecto da cultura moderna. E êsse processo que explica as poder real afirmar, pela proposição da liderança européia, a necessi-
' ·
características b astcas dessa cultura" .113 dade de as camadas nobres integrarem-se na nova mentalidade. Os
Esse processo não é, note-se, particular ao capitalis?'o: enq~anto esforços feitos nos fins do século XVII para diminuir a influência da
direção política da economia caracterizada pela apr~pTl~çao, Pt;vada concepção do mundo da nobreza são baldados e a emprêsa exterior
dos meios de produção e distribuição das riquezas; ele e propTlO d? não consegue transformar a mentalidade interna, com o que a "ma·
capital que necessita reproduzir-se, independentemente da !orm~ poh- neira nobre de viver", própria do "ethos" aristocrático espanhol, e a
tica da direção da economia: " ... porque as. ~~ses!: tam~em o mcen- quebra do impulso à liderança européia vêm a refletir-se negativamente
tivo social para um decisivo avanço da c1vihza_ç~o ~es1~em apenas
na expansão gradual da produção além das ex1genc1as uned~atas e t
I
na emprêsa colonial da América. Da perspectiva da balança do poder
europeu, a América contava seja por sua própria extensão e riquezas,
em um continuo aumento da população da mesma forma qu~ e~ um seja pela possibilidade (graças a essas últimas) de constituir-se em
contínuo aumento de suas demandas" .1 u. O im~ortante, asslffi, e ter elemento útil à afirmação do poder europeu da Espanha, especiahnente
sempre em mente que 0 capital precisa reproduzrr-se para _que o pro- quando se dá, já no século XVIII, com Carlos III,' a emprêsa da
cesso civilizatório não se estagne - e não perder de. VISt': que as reconstrução no reino; da perspectiva do capitalismo em ascensão,
condições econômicas e técnicas dessa expans~o do cap1tal sao dad~ o "ethos" aristocrático moldou o desenvolvimento da economia e das
làgicamente, obedecendo àquilo que se podefl:' _chamar, com C~aus~. relações sociais na colônia, impedindo que se desse em terras espanho-
witz do "princípio da tendência aos extremos log~came~te conr:bl?~s • las o "salto" qualitativo que permitiu a transformação das Treze Co-
0
q~al deve, no entanto, conformar-se semp~e à realidade ~1stonca, lônias inglêsas num imenso império que já na primeira metade do
odendo aproximar-se ou afastar-se do tipo 1de"} e?'. que. e :uposta século XIX formula a sua proposição hegemônica sôbre todo o• conti-
~ar-se sua expansão com a democratização, a md1v1dualizaçao e a nente norte-americano e principia a afirmar seu Destino Manifesto a
racionalização dos comportamentos sociais e das relações humanas a controlar as Antilhas. ·
ela conseqüentes. ·o confronto entre o "ethos" aristocrático e o espírito capitalista
não é específico do mundo espanhol; enquanto expressão de relações
sociais em que a propriedade da terra conta não como valor econô-
1 _ O "ethos'' aristocrático e espírito capitalista mico, mas como valor social, portanto improdutivo da perspectiva da
racionalidade capitalísta para a qual a terra existe não como fonte de
A integração da América Latina no universo ~o :apitai é marcada prestígio, mas como capital (isto é, como "propriedade de livre dispo-
desde 0 início por dois fatôres negativos: em prrrnerro lugar~ a con- sição por parte de emprêsas lucrativas autônomas", como mercadoria
cepção que os grupos dominantes têm, na Espanha, da relaça~ ~n~e susceptível de ser transformada em moeda), o "ethos" aristocrático
status nobre e a atividade econômica - da qual um d_os prmc1pa1s foi o elemento normal em que se gestou o capitalismo. 116 O que é
0
elementos é 0 considerarem, as leis e os costumes espanhÓIS, o tr~balho especificamente espanhol é a circunstância dêsse confronto dar-se em
manual e a própria posse de bens de capital como incompatíveiS. com um país em que a frustração do Destino europeu impede o Estado
a honra. em segundo lugar, o malôgro do poder espanhol em afirmar 115 C!. RegitL, op. cit., pág. 372: "Nas vésperas da catástrofe financeira de 1680,
suas pr:tensões hegemônicas na Europa. Os dois fa~os _são correlatos: o tratadista (o teórtco social) Alfonso Nufiez de Castro escreveu: 'Delxal Londres
fazer as fazendas mais finas; a Holanda, a cambraia.; Florença. o llnho caseiro; a
se, por um lado, a ausência de mentalidade econmruca. da nobreza índia, as peles; MllA.o, os brocadoe; a Itália e Flandres, o linho ... PM'B que nossa
capital oe desfrute; porque isso apenas prova que tôda.s as nações produzem art1~
no período crucial para a afirmação espanJ:~ol~ no concerto europeu ffcioe para Madri, e ela é, pois, a Ralnha das Cidades, desde que todoe a servem e
ela serve a ninguém • ".
condicionou sua atitude de refração ao cap1tal!SffiO ascendente, espe- 116 Cf. Rosa Luxemburgo. op. cit., pág. 368: "O cap1tal1smo surge e se desen-
volve histOricamente no melo de uma SOCiedade nA.o-capltallsta. Na Europa Ocidental
113 Joseph Schum.peter, Imperialism anã Social azasses, Mertdlan Books, Nova é encontradO primeiramente num melo feudal do qual na realidade bTota - o siste-
York, 3,• lmpressã.o, 1958, pTâgsh .A67-8. ulatt~ ot CapitaL Routledge and Kegan PaUl ma de servidA.o nas áreas rurais e o sistema: de corporações nas cidadee - e mais
114 Rosa Luxemburgo, e ccum ..... , tarde, depois de haver devorado o sistema feUdal, existe principalmente em um
Ltd, Londres, 1951, pág. 4.1.
89
88
de absorver as fôrças do privatismo - essa não-absorção conduzindo condição de intermediário é fundamental para o desenvolvimento social
por sua vez ao malôgro da proposição do domínio europeu, sendo da América, porquanto a mentalidade que se transfere para as novas
assim o Estado impotente para "estabelecer uma monarquia absoluta terras é aquela própria à nobreza espanhola ou àquelas camadas que
capaz de impor sua vontade às instituições autônomas dos reinos não- na "maneira nobre de viver" encontravam o caminho de aparentar
-castelhanos. [Com o que], em essência, a estrutura constitucional que sua nobreza perante os demais. Em outras palavras, quando o capita-
os reis católicos deram à monarquia em 1479, quando - exceto no lismo dos séculos XVI e XVII chega à América espanhola, vem já
que se refere a Portugal, Navarra e Granada - unificaram a penín- marcado pela mentalidade não-econômica dos fidalgos espanhóis, à qual
sula, sobreviveu até inícios do século XVIII", 117 quando então já era se acrescenta, completando o quadro institucional e moral em que se
tarde demais para retomar a caminhada interrompida. dá a penetração do capital na América, o sentido religioso e espiritual
Essa falência do impulso para a monarquia absoluta típica da de que se revestiu o Direito Indiano, elaborado mais do que por "ju-
Europa do século XVII, bem como o malôgro da emprêsa hegemônica ristas e homens de govêrno, por moralistas e teólogos".
na Europa, impedem a Coroa de fazer do mercantilismo espanhol uma O papel que o Direito Indiano representou no atraso com que
política do poder de Estado; a predominância da mentalidade fiscal se dá a implantação do capitalismo na América espanhola (descontada
sôbre a econômica118 - por um lado decorrência do próprio "ethos" neste passo a resistênca dos aspectos negativos da "maneira nobre
aristocrático, mas por outro causa do recurso abusivo à taxação para de viver", entre os quais avultam, para os efeitos de nossa análise, o
prover às despesas do erário e da relutância em fazer apêlo, tornando consumo ostentário e a idéia da terra como valor de prestígio e não
efetivas, às medidas destinadas a revitalizar a economia - conduz a como capital) não pode ser negligenciado, especialmente se se tem
que o objetivo de Poder específico do mercantilismo não seja alcan- em vista que ao estabelecer as normas para a proteção do índio contra
çado, obrigando o Estado a fazer concessões de comércio a estrangeiros, o conquistador - que nêle via mais que o ser destinado à conversão
as quais chegam a tal ponto que, em 1691, dos 53 a 55 milhões de e à salvação eterna, o braço indispensável à realização dos trabalhos
libras esterlinas de mercadorias que chegam a Cádiz, apenas 2 milhões agrícolas, mineiros e domésticos - as Leis das lndias criaram condições
e meio pertencem a mercadores espanhóis, o restante dividind<>-se entre (sem dúvida alguma violadas na prática, mas ainda assim par,!e inte-
franceses, genoveses, holandeses, inglêses, flamengos e hamburgueses. grante da realidade em que se atuava) inibitórias do processo de des-
Não há, assim, na Espanha, ausentes a centralização do poder, a raci<>- truição da economia natural e da plena incorporação das populaçÕeJ!
nalidade econômica visando ao fortalecimento do Estado, e a consi- indígenas no processo produtivo capitalista. Se Marx assinalava, para
deração da terra como bem de produção e não como mera fonte de o caso norte-americano, que a acumulação e o modo de produção capi-
prestígio social para seu possuidor, elementos com os quais construir talistas são impossíveis de dar-se enquanto o "trabalhador pode acumu-
a teia básica de relações a fim de estabelecer os fundamentos do capi- lar por si - e isso pode fazer na medida em que permanece o possui-
talismo moderno - e isso às vésperas de sua irrupção na cena mundial. dor dos seus meios de produção" - , a terra não sendo assim capital
A Espanha, na constelação econômica e de poder da Europa, é assim e só se tornando tal quando serve ao mesmo tempo como "meio de
apenas o intermediário do capitalismo que procura, na América, o exploração e sujeição do trabalhador",- é que tinha em vista um pf(}-
campo em que realizar as condições de seu desenvolvimento na Europa; cesso em que o colonizador expulsara o índio da terra e passara a tra-
contudo, dadas as disposições legais peculiares à política colonial espa- balhá-la por seus próprios meios, dispensando a mã<>-de-obra assala-
nhola, é um intermediário que não só realiza as transações, como tam- riada ou escrava. 120 Um processo, em suma, em que os europeus im·
bém detém o privilégio de povoar as novas terras.'" Essa particular preguados da racionalidade do nôvo sistema defrontavam-se com uma
melo de camponeses e artesãos. isto é, em um sistema de produção simples de
economia natural não organizada politicamente, e em que a colonização
mercadorias, sejBI na agricultura, seja no comércio". resumia-se em expelir o índio cada vez mais para o interior do Conti-
117 Juan Reglá, op. cit., pág. 380.
118 A mentaiidade econômica é aquela que preside à "atividade orientada a pro- -volume que a penetração de estrangeiros logrou alcançar ao amparo das exceções,
curar 'utilidades' (bens e serviços) desejáveis, ou as probab111dades de dispor delas" ou por via. Clandestina.".
(Weber), visando a sua reprodução enquanto melo de apropriação de novas "utili- 120 Marx examina a. situação observada. nas Colônias, e posteriormente, nos Es-
dades"; a mentalidade fiscal, pelo contrário, é aquela em que a. a.proprl~ã.o das
probabil1dades de disposição sôbre as "utilidades" é um fim em. si, ou quando tados não escravistas dos Estados Unidos, ressaltando, especialmente, a circunstância
multo um meio para satisfazer necessidades não econômicas, isto é, nA.o reprodutivas. de a imensidão da terra oferecer enormes possib111dades parBI a Hberdade de movi-
119 Ots Capdequí, op. cit., pág. 22 e segs., assinala. as diferentes medidas res- mentos da popUlaçAo recém-imigrada., ou da que era paulatinamente expelida para a
tritivas à imigração de estrangeiros para a. América. Até 1596 as índias estavam. fronteira do Oeste. Sem dúvida alguma, na plantation, o processo dá-se de forma
~tbertas apenas aos castelhanos sendo nessa data os outros espanhóis da peninsula diferente, em. virtude do trabalho escravo. .Aa citações são do I volume do Capital,
equiparados àqueles; as restricões aos estrangeiros em. sentido estrito continua.rB.ID- cap. XXXIII, edição da. Modem Library, traduçAo inglêsa. de Samuel Moore e
sempre, com maior ou menor rigor, ''não se tendo investigado suficientemente o Edward AvelUng, de 1906.

90 91
nente, simplesmente tomando-lhes as terras e trabalhando-as em segni- - alteração profunda da "encomendación" castelhana - se por um
da o branco - sozinho ou com sua família, mas sempre por si e para si. lado, ~untamente com a_ "mita",_ lhe fornece a mão-de-obra de que
No caso da América espanhola - seja no Império Azteca, seja necessita para a exploraçao das mmas, ou da terra, por outro impõe-lhe
no Império Inca - as condições são outras, porque os conquistadores legalmente deveres conflitantes no plano jurídico com as leis da acumu-
vêm imbuídos de uma mentalidade totalmente diversa (a "maneira lação. Ademais - e nisso radica, ao mesmo tempo que os deveres im-
nobre de viver"), porque se chocam com estruturas estatais que dão postos aos "encomenderos", a importância do Direito Indiano - a
à organização social e econômica um outro sentido e, finalmente, por- Coroa, desejosa de prevenir abusos e de manter os índios cristãos
que não conseguem expulsar os índios para o interior do continente embora incapazes, fora do contrôle irrestrito dos brancos co~serva em
- e nem o desejam, pois o braço índio é visto como o único elemento muitos lugares a forma coletiva da propriedade da ted:a frustrando
produtor da riqueza que se deseja criar para a Europa. Esses elementos a destruição total da economia e da organização inca ou ~teca e im-
diferenciais contribuem para marcar, inicialmente, o maior avanço so- pedindo em conseqüência que o capital encontrasse reunidas ~s con-
ciocultural das colônitM espanholas sôbre as inglêsas, e, num segundo dições básica~ indispensáveis a seu desenvolvimento. Essas condições
momento, seu retrocesso e sua impossibilidade de acompanhá-las em c?nforme assmal~do por Rosa Luxemburgo, respondiam aos objetivos
seu desenvolvimento (descartada a riqueza do subsolo, elemento sem v1sados pelo capltal em seu processo de destruição da economia natu-
dúvida algnma importante, acrescido da descoberta do ouro ter-se veri- ral, e ~odem ser assim resumidas: 1. apoderar-se de importantes fôrças
ficado nos Estados Unidos quando o processo de acumulação já havia produtlv_as com? a terra, as florestas, os minérios, os metais preciosos,
dado seu arranque, após a Guerra Civil). E que nas colônias inglêsas, o etc .. ; 2. libe~ar força de trab.alho abundante para colocá-la a seu serviço;
branco conquistador, egresso de um meio já secularizado pela centrali- 3. mtroduz1r uma econonna de mercado, o que significa estabelecer
zação do poder real, por um mercantilismo dir-se-ia típico e pelo desen- a moe?~ co'!'o padrão de valor e a troca como meio de realização
volvimento de um "etbos" mais próximo do especifico do capitalismo, monetária desse .v~or: 4. separar. o Comércio da Agricultura, rom-
não teve de estabelecer contatos permanentes e duradouros com ele- pendo a auto-suf1c1encm das propnedades rurais e consagrando 0 ciclo
mentos humanos pertencentes a um outro universo de pensamento e econ~mico da mercadoria. 121 Ora, a organização política es11.anbola
organização; simplesmente tomou-lhes a terra e a ela imprimiu sua mar- espec1almente depois da "reconquista", impede que essas condiçõe~
ca racional e capitalista no limite da tendência de desenvolvimento. Em se cumpram em sua essencialidade, pois a propriedade da terra estêve
outras palavras, embora não tendo introduzido nas Treze Colônias uma
semyre ,sujeita à confirmação da Coroa, caracterizando-se tôda a legis-
economia de mercado, nem separado o Comércio da Agricultura (pela
auto-suficiência das emprêsas rurais do interior) nem libertado fôrça laçao sobre o assunto por um excessivo intervencionismo estatal e as
de trabalho para ser colocada a seu serviço, o europeu pôde estabelecer minas, durante o período de apogeu de sua produção, igualmente ~ujei­
um elemento básico para a realização do processo capitalista, qual fôsse tas à decisão real. sôbre quais eram as "ricas y de nación.'', que então
a apropriação, em têrmos de "mercadoria" e não de "prestígio", da passavam à propnedade da Coroa, e quais as "ordinárias", que podiam
terra e de seus produtos. Não importa, neste passo, que a terra fôsse ser exploradas mediante o pagamento do quinto. E no que se refere
sua propriedade e bastasse para sua acumulação particular; ela era ainda às minas, não obstante as alterações que sofreu durante a Colô-
vista como um bem alienável a qualquer instante dentro de uma visão nia, o direito mineiro manteve sempre com firmeza o princípio da
econômica do processo, com o que pôde ser explorada como capital separação entre o domínio do solo e o do subsolo.12•
e o capitalismo desenvolver-se a passos rápidos nos Estados Unidos, Não se cumprem, assim, na América espanhola, as condições para
quando se fizeram presentes as condições que até então haviam faltado. que a economia natural seja substituída pelo capitalismo; a imensidão
Já na América espanhola o processo foi diverso. O contato do do Espaço e o Direito Indiano impedem que isso se dê, conservando-se
conquistador com a economia índia sem dúvida criou as condições a auto-suficiência das emprêsas rurais perdidas na imensidão da "sole-
para que se desse a destruição da organização política azteca ou inca, dad poblada", e não se liberando, em têrmos capitalistas, a fôrça de
mas não levou à destruição imediatamente subseqüente da organização trabalho abundante para ser colocada a serviço do capital. Afirmar
social primitiva com a qual o espanlwl se via frente a frente. Pelo 'con- isso não significa dizer que o capitalismo aqui não se tenba estabele-
trário, êle foi obrigado em alguns casos a respeitá-la, incorporando ao cido; seria um contra-senso pretendê-lo, porquanto a América estava
seu processo de produção formas anteriormente empregadas pelos índios 121 Cf. Luxemburgo, op. cit .• ca.p, XXVII, pa.sstm,
(especialmente a "mita", assaz comum no Império Inca), as quais 122 Cf. Ots Capdequt op. cit., Las Institu.ciones Econ6micas. pág. 38 e segs.
Reglá, citando estatfsticas de Hamilton, situa o inicio do declinio da mlneraçAo em
coexistem com as novas que estabelece. A "encomienda" americana 1621.

92 93
inserida num contexto mundial em que funcionava - de maneira nos centros de origem do capital, impedindo, assim, a sua acumulação;
imperfeita, é verdade, mas sempre como expectativa a realizar-se no daí a necessidade em que se encontra o capital de promover a altera·
tempo - como mercado para a produção excedente européia e supri- ção profunda e rápida das condições restritivas de sua expansão.
dor de metais preciosos e de algumas das matérias-primas consumidas O tempo que decorre entre o contato do capital com as economias
pela indústria européia. É apenas quando se encara o problema da naturais e a ocasião em que essa transformação se faz necessária é
perspectiva do sistema global e da Europa que se pode afirmar, porém, medido pelo desenvolvimento do processo da acumulação nos países
que o capitalismo aqui se estabeleceu, ainda que com variantes essen- hegemônicos, não nos periféricos; em outros têrmos, a alteração das
ciais no ritmo de seu desenvolvimento; quando se vê a questão da condições sociais e econômicas dificultadoras do pleno desenvolvi-
perspectiva da América, verifica-se que a Colônia é um período em mento das f.ôrças proct_utivas, verifica-se quando a produção simples
que a estrutura social das populações pré-colombianas e a visão do de mercadonas~ ou o nao cumprunento de qualquer das condições atrás
mundo dos conquistadores, auxiliadas pelo Espaço que atuava como ~pontadas restnnge o desenvolvimento do capital nos países de origem:
verdadeiro deglutidor de homens e formas de organização superio- . Se o cap1tal l!vesse de repousar no processo da lenta desintegração
res, reduzem o ritmo de expansão do nôvo sistema e o transformam mt~ma [das estruturas so~Jals e das formas de apropriação não-capi-
numa espécie de subcapitalismo, ou mrcapitalismo incapaz de impor tali~t~s], o processo levana séculos. Esperar pacientemente até que 0
uma estrutura estatal condizente com suas necessidades de expansão, n_ta1s nnportante_ meio d." produção [a terra] seja alienado pelo comér-
CIO em consequencta desse processo, seria o mesmo que renunciar às
e, sobretudo, impotente para vencer as restrições das Leis das lndias
ao abuso da mão-de-obra índia e à destruição da propriedade comuna!. fôrças produtivas de todos êsses territórios em conjunto. Daí deriva
A ser correta essa análise, compreender-se-á melhor o jôgo das a necessidade VItal para o capitalismo, em suas relações com os países
fôrças tão-apenas econômicas no processo que culmina com a Inde- colomais, de apropnar-se dos mais importantes meios de produção.
pendência e sua ligação com os elementos políticos e ideológicos pre- Desde que as primitivas associações dos nativos são a mais forte
sentes na insurgência crioula; bastará ter presente que o triunfo do P;<>t~ção para. sua organização social e suas bases materiais pe exis-
capitalismo, enquanto forma de organizar a produção e a distribuição te~cJa, o cap1t~ de~~ começar pelo planejamento da destruição e
das riquezas, exige, quando em contato com economias naturais, que amqmlamento Sistemallcos de tôdas as unidades sociais não-capitalistiiS
se vençam algumas fases teôricamente estabelecidas e correspondentes que ergue.m obstáculos a seu desenvolvimento ... Cada nova expansão
ao cumprimento das condições assinaladas acinJa: a destruição da colomal e acompanhada, como um fato evidente, por uma batalha
economia natural com a conseqüente desintegração da organização sem tréguas do capital contra os laços econômicos e sociais dos nativos,
social a ela correspondente; a introdução da mercadoria e a erradi· que são violentamente roubados em seus meios de produção e fôrça
caç.ão da indústria rural da economia camponesa - isto é, o desapa- ?e tra?alho". 123 Na América, essa "batalha sem tréguas" foi se não
recunento do artesanato mral para que o camponês produza apenas nnped1da, pelo menos tomada menos cmel pela intercessão do Estado
aquilo que a terra é capaz de fornecer-lhe, devendo comprar da in- espanhol que, comprovando uma vez mais sua marginalização no pro-
dústria os instrumentos de produção e as demais mercadorias de que cesso c~pitalista europeu, contribuiu dessa maneira para marginalizar
necessita. a Aménca espanhola no passo subseqüente.
A realização dêsses passos acima descritos não significa, no en- A Independência assinala, pois, o momento em que a fôrça
tanto, o estabelecimento automático das condições necessárias a quo disruptora do capital rompeu os elementos que impediam sua plena
a acumulação capitalista se dê, pois se a economia natural pode ser expansão. De fato, é com as jornadas de 181 O e com o triunfo do
liberalismo crioulo que o Direito é finalmente reformulado em têrmos
destruída e a compra de mercadorias induzida (a obrigação de pagar
das novas tarefas reclamadas da mão-de-obra índia e das novas funções
tributos em moeda é um dos instrumentos políticos utilizados pelos
que a terra deve exercer no processo geral dt acumulação, e, também
colonizadores para forçar a transformação do universo produtivo dos
e sobretudo, cumprida a fase da destruição da economia natural, é com
nativos), a desintegração sociocultural é mais lenta e mais lenta ainda
a transformação da terra em bem de produção colocado a serviço do elas que se dá a erradicação da lndústria rural da economia campo-
nesa.t24
capital. A destruição da economia natural pode levar ao estabeleci-
mento de um sistema de produção simples de mercadorias - e foi de 123 Luxemburgo. op. cit., pág. 370.
124 Exemplos dessa erradicação da indústria rural da economia camponesa e do
fato o que prevaleceu na Colônia - , mas pode não criar automàtica- flm do artesanato logo após a Independência podem ser encontrados em Vivia·n Tria.s
mente as condições indispensáveis à realização da mais-valia produzida El Imperialismo en el Rio de la Plata, Editorial Cocoyacá.n, Buenos Aires, 1960, págs:

94 95
f
Da perspectiva econômica, a Independência pode ser vista teori-
camente como respondendo a duas necessidades: uma, a do capital
em geral, que não conseguindo, segundo Luxemburgo, "esperar pela
e contentar-se com a desintegração natural das formações pré-capita-
listas", procura atingir seus objetivos por meio de guerras e revoluções;
r valia". Como regra, maior produção de mais-valia resulta de um aumen-
to do capital, decorrente da adição de parte da mais-valia apropriada
pelo proprietário dos meios de produção ao capital original, não
importando, no caso, se essa "mais-valia capitalista é usada para a
expansão de uma velha emprêsa ou para fnndar uma nova" ( pág. 4 2),
outra, a do próprio desenvolvimento da economia americana que, en- pois o que se considera é o problema da acumulação do capital social
contrando nos embaraços do Pacto Colonial (aliás já assaz diminuídos total e não a acumulação de uma emprêsa particular. Não basta, entre-
na prática do fim do século XVIII) um elemento constritor, desejava tanto, que o capitalista deseje levá-lo a têrmo para que o processo se dê;
afirmar sua capacidade de comerciar livremente com tôdas as nações, "pelo contrário, é essencial que êle encontre no mercado as formas
ao mesmo tempo que reclamava o estabelecimento de estruturas estatais concretas que pretende dar à sua nova mais-valia": matérias-primas,
consentâneas com a nova realidade, que se havia forjado ao longo de máquinas, trabalho adicional, bens de consumo. Essas condições satis-
quatro séculos de ocupação do solo e violação diuturna do Direito feitas, uma nova se lhe impõe: "o nôvo capital, assim como a mais-
Indiano. Sempre teoricamente, os passos para a autonomia capitalista valia que êle criou, devem despir-se de sua forma de mercadoria, reas-
da América Latina - autonomia essa que pode ser dada como um sumir a forma de valor puro e assim reverter ao capitalista como
dos objetivos finais do capital - se haviam cumprido com a Inde- moeda" (pág. 44). O processo de reprodução do capital - que se
pendência: a abrogação do Direito Indiano, permitindo a destruição dá pela transformação da mais-valia em moeda, dessa em bens de
das comnnídades indígenas e a subseqüente liberação de maior fôrça- produção e de consumo e salários, dêsses novamente em mercadoria
-de-trabalho; a destruição da indústria ligada à economia camponesa, e dessa de nôvo em moeda, num perpetuum mobile - é controlado
forçando o estabelecimento de uma economia de mercado, e a penetra- pelo capitalista apenas em parte, pois no mercado ninguém estabelece
ção do sistema capitalista de produção na Agricultura."' Na prática, leis, nem prevalece o desejo ou a razão. Daí seguir-se que no processo
porém, os objetivos contidos na realização das condições não chegaram de reprodução da mais-valia, o capitalista individual depende "de um
a cumprir-se - em outras palavras, não se realizou a autonomia capi- mercado sempre maior para seus bens", no qual êle não tem o contrôle
talista nas nações americanas até então dependentes da Espanha. Esse "seja do aumento atual da procura em geral, seja da procura de sua
é o problema, crucial a nosso ver, que deve ser examinado antes de especial qualidade de bem" (pág. 45).
estudarmos o confronto da América independente com o imperialismo Essas "licença e anarquia do mercado" - as quais se por um
no século XX. lado fazem presente ao "capitalista individual que êle é dependente
da sociedade, da totalidade de seus membros produtores e consumido-
res", por outro eliminam a idéia de um desenvolvimento controlado e
2 - As condições teóricas da autonomia planificado da reprodução - conduzem o investigador a perguntar:
"como é possível a cada capitalista individual encontrar no mercado
O problema da realização da autonomia capitalista das nações os meios de produção e o trabalho de que necessita para realizar as
atrasadas está intimamente ligado ao problema da acumulação do mercadorias que produziu?" Quando se encara o problema do prisma
capital," 6 porque é a maneira em que ela se dá que permite compreen- do capitalista individual, a questão pode ser respondida, dizendo-se
der o maior ou menor atraso no desenvolvimento capitalista das nações que a cobiça do capitalista pela mais-valia, aumentada pela concorrên-
até ontem coloniais. cia, e os efeitos automáticos da exploração capitalista levam à produ-
O esquema desenvolvido por Rosa Luxemburgo 127 para explicar ção de não importa que espécie de mercadoria, inclusive bens de pro-
a acumulação do capital, parte do princípio de que "a produção capi- dução, e também ao aparecimento de uma classe sempre crescente
talista não é a produção de bens de consumo, nem é meramente a de proletários, que se tornam disponíveis para os propósitos do capital.
produção de mercadorias: é, predomiuantemente, a produção de mais- Todavia, do ponto de vista da reprodução do capital social, a questão
18-19, e em JUlio Tra.zusta, Influencia Económica Británica en el Rio de la Plata, é diversa, pois o essencial é saber como "a oferta não planificada no
Eu.deba., Buenos Aires, 1963, pãg. 21 e segs.
125 o:r., a êsse propósito, a. posição de Belgrano e os economistas portenhos mercado de trabalho e de meios de produção, e as mudanças não
sôbre o problema agrá.r1o no Rio da. Prata, refer1da supra.. planificadas e incalculáveis na procura provêem, no entanto, quanti-
126 Uma dLscussão sôbre os problemas teórtcos suscitados pela. a.cu.m.Ulaçâo do
capital encontra-se em Lucien Laurat, L' Accumula.tion áu Capital d' Aprês Rosa. Lu~ dades e qualidades adequadas de meios de produção, trabalho e opor-
xembourg, Mareei Riviêre, Paris, 1930, Prefácio.
127 Of. Rosa Luxemburgo, op. cit., passim. tunidades" (pág. 46). Mesmo quando se responde às questões ante-

96 97
riores, estabelecendo-se que a produção no setor que produz meios dades; no sistema capitalista, o ponto de partida não é um determinado
de produção determina idêntico processo no setor que produz bens número de trabalhadores e suas exigências, pois êsses fatôres flutuam
de consumo, o que permite o suprimento de bens de capital para constantemente sendo como "variáveis dependentes" das expectativas
êsse segundo setor e bens de consumo para ambos, permanece de de lucro dos c~pitalistas (pág. 133). Ademais, quando se considera
pé o problema crucial: de onde vem o aumento da procura, o qual que 0 aumento da população operária pode fornecer o aumento de
determina a reprodução? Em outras palavras, quem consumirá as procura responsável pela realização da mais-valia produzida no pro-
novas mercadorias produzidas seja pelo setor I (bens de produção), cesso de acumulação, é indispensável ter presente, também, que ou
seja pelo setor 11 (bens de consumo)? ~sse aumento de consumo o salário percebido pelo trabalhador permite o seu sustento e o de sua
não pode ser determinado pelos capitalistas; "pelo contrário, é da família (e portanto já está contido no capital variável, os filhos pouco
própria essência da acumulação que os capitalistas deixem de con- contando), ou é insuficiente e os filhos vão trabalhar (novamente pou-
sumir uma parte de sua mais-valia, que deve ser sempre crescente, co contando, pois são alimentados pelo capital variável). Tenha-se
e que a usem, ao invés de consumi-la, para fabricar bens para o presente, na discussão do problema, que assim como se admite um
consumo de outras pessoas. :É verdade que com a acumulação o con- aumento absoluto da mais-valia ao tomar-se a questão do prisma do
sumo pessoal da classe capitalista aumentará e que poderá haver consumo da classe capitalista que cresce, deve considerar-se um aumen-
mesmo um aumento no valor total consumido; contudo, ainda assim to absoluto do capital variável, isto é, dos salários pagos aos trabalha-
apenas uma parte da mai~valia será usada no consumo dos capita- dores, cujo número cresce. Mas o essencial é verificar que se a pro-
listas. ~ste, na verdade, é o fundamento da acumulação: a abstenção dução aumenta porque a população (capitalistas ou trabalhadores) au-
dos capitalistas do consumo de tôda a sua mais-valia". Os operários menta, volta-se sempre ao raciocínio anterior de um sistema em _que
também não poderão fornecer essa fonte suplementar de consumo, apenas existem capitalistas e trabalhadores, além de correr-se um nsco
pois "os trabalhadores comprando bens de consumo, meramente fazem na análise teórica, consistente em admitir que a produção no regime
retornar à classe capitalista o total de salários que receberam, sua capitalista aumenta porque aument.aram ~s ~ecessidades ~a pop_ula~ão
assignação sôbre o total do capital variável", com o que não têm - o que seria um contra-senso, po1s o obJetivo da produçao cap1tahsta
disponibilidade monetária para estimular a reprodução (pág. 132). não é atender ao aumento das necessidades, mas sim realizar..a mais-
O aumento da população poderia ser responsável pelo aumento -valia produzida. Faz-se mister, assim, buscar saber que setores conso-
da procura. "De fato, o aumento da população e de suas necessidades mem a mais-valia produzida no processo de acumulação; quais, ein
proviu o ponto de partida para nosso exame da reprodução ampliada smiía, as fontes suplementares de procura que levam, na irracionalidade
em uma hipotética sociedade socialista. Nessa, as exigências da socie- do mercado capitalista, a que cada capitalista individual se sinta indu-
dade podem servir como uma base adequada [para a análise] desde zido a aumentar sua produção, dando-se o processo da reprodução
que o único fim da produção é a satisfação de necessidades. Numa ampliada do capital social. _
sociedade capitalista, contudo, o problema é assaz diferente. Em que Talvez a explicação se encontre no consumo dos estratos nao-
espécie de pessoas estamos pensando quando falamos em um aumento -produtivos: o clero, os profissionais liberais, os funcionários públicos,
da população? Há apenas duas classes da população segundo o diagra- 0 Exército. Todavia, os rendimentos dêsses setores são proporcionados
ma de Marx: os capitalistas e os operários. O crescimento natural da - sob a forma de contribuição espontânea, imposta pelas necessidades
primeira é suprido por aquela parte da mais-valia consumida, que ou estabelecida pelo Estado - pelos dois estratos fundamentais em
aumenta em quantidade absoluta. De qualquer maneira os capitalistas que o diagrama de Marx divide a sociedade ao considerar o processo
não podem consumir o que sobra, porquanto o consumo pelos capita- de acumulação: capitalistas e operários (pág. 134). Da mesm~ forma
listas de tôda a mais-valia significaria uma reversão à reprodução sim- e no mesmo esquema, o comércio exterior não pode ser consulerado
ples. Isso deixa em cena os trabalhadores, sua classe também aumen- como criador de novas necessidades de consumo, pois como Marx
tando por crescimento natural. Contudo, uma economia capitalista afirmava "o mundo todo deve ser considerado como uma nação e
não está interessada nesse aumento em si como um ponto de partida [ deve-se] presumir que a produção capitalista está estabelecida
· d~ustna
por
· "12SS
para necessidades crescentes". Isso porque a produção de bens de con- tôda a parte e entrOu na posse de todos os ramos da m . e
sumo para o sustento dos trabalhadores nos dois setores não é um fim assim é, "como, e por quem será realizada a mais-valia acumulada?"
em si, como seria em uma sociedade em que o sistema econômico é Isto é, quem consumirá o que se produziu a mais?
dirigido pelos trabalhadores e adaptado à satisfação de suas necessi- 128 Karl Marx, op. cit., pág. 636, nota 1.

98 99
O esquema desenvolvido por Marx, afirma Luxemburgo, não per- tal". Dai "a emancipação da fôrça-de-trabalho de suas condições sociais
mite "outra interpretação [do processo de reprodução ampliada] que primitivas e sua absorção no sistema assalariado capitalista" serem uma
a produção pela produção", pois êle "desejou demonstrar o processo das bases históricas indispensáveis do capitalismo (pág. 362).
de acumulação em uma sociedade consistente só de trabalhadores e O processo de acumulação, pelo fato de apenas poder realizar-se
capitalistas, sob o domínio universal e exclnsivo do modo de produção num cenário não-capitalista, é em si um processo ~iole~to. <_?orno .a
capitalista" (pág. 333). Ora, "os trabalhadores e os capitalistas não economia natural, fundamento désses grupos e orgaruzaçoes nao-capl-
podem realizar aquela parte da mais-valia que deve ser capitalizada. talistas faz frente às "exigências do capitalismo ... com rígidas barrei-
Dessa forma, a realização da mais-valia para os propósitos da acumu- ras" êle deve travar "uma batalha de aniquilamento contra tôdas as
lação é uma tarefa impossível para uma sociedade que consiste apenas fo~as históricas de economia natural que encontra, seja a economia
de trabalhadores e capitalistas" (pág. 350). Nessas condições, não escravista, o feudalismo, o comunismo primitivo, ou a economia cam-
podendo a mais-valia ser realizada pela venda de mercadorias aos ponesa patriarcal" (pág. 369). Nesse processo, ~mtr.ando na po~se de
trabalhadores ou aos capitalistas, só o será se elas forem vendidas "a importantes fôrças produtivas como a terra, os minénos! os metais pre-
organizações ou estratos sociais cujo modo de produção não é capita- ciosos e os produtos da flora exótica, como a borracha; liberando fôrç~­
lista". Essas organizações e estratos adquirirão seja bens de consumo -de-trabalho e colocando-a a seu serviço; introduzindo uma. econ=
(a expansão da indústria algodoeira inglésa fundou-se no consumo por de mercado e separando o Comércio e a Agricultura, o ~p1tal é leva-
estratos e países não-capitalistas), seja bens de produção (o aço do a ampliar o seu "mercado intem~",~ 9 isto ~' a realizar a a_uto-
fornecido para a construção de estradas de ferro nos Estados Unidos nomia capitalista das nações não-capitalistas (pag. 419). Co~ ISSO,
e na Austrália, ou os corantes fornecidos pela indústria alemã para 0 "resultado geral da luta entre o capitalismo e a produção Sllllples
países de produção não-capitalista no século XIX) (pág. 352). de mercadorias é éste: depois de substituir a economia natural pela
A segunda condição para que a acumulação se dê - a primeira economia de mercado, o capital toma o lugar da produção simples, d~
sendo, como visto, a realização da mais-valia por estratos niio-capitalis- mercadorias. As organizações não-capitalistas provêem um solo f~rtil
tas - é que haja livre acesso aos elementos materiais necessários à re- para o capitalismo; mais estritamen~e: o ~apitai _nutre-.se .das• ~s
produção ampliada, isto é, a elementos materiais, que não podem ser dessas organizações e não obstante esse ITill!eU nao-cap1talista ser m-
restritos aos que são produzidos por métodos capitalistas: "elementos dispensável à acun::ulação, aquêle progride, apesar d': tudo, à ~us~
baratos do capital constante são essenciais para o capitalista individual, dêsse meio, devorando-o. Historicamente, a a~umul~a~ do cap1t~ e
o qual se esforça para aumentar sua taxa de lucros. Ademais, a verda- umá espécie de metabolismo entre a econo=a c~p1talis~ e aqueles
deira condição de contínuos progressos na produtividade do trabalho métodos pré-capitalistas de produção sem. os qu~ êle n~ se l'O'l;e
como o mais importante método de aumentar a taxa de mais-valia, desenvolver ~ aos quais, sob essa luz, corró1 e ass!IDila. Assun, o capi-
é a utilização irrestrita de tôdas as substâncias e facilidades concedidas tal não pode acumular sem o auxilio ?"
org~aç~es não-capitalistas,
pela natureza e pelo solo. Tolerar qualquer restrição a êsse respeito nem, por outro lado, tolerar sua contínua eXIStênCia lado. a lado c?m
seria contrário à própria essência do capital, a todo o seu modo de êle. Só a contínua e progressiva desintegração das orgaruzações nao-
existência. Depois de muitos séculos de desenvolvimento, o modo capi- -capitalistas toma a acumulação do capital possível" (pág. 416).
talista de produção ainda constitui apenas um fragmento do mundo O capital é o agente propulsor da transformação d~ !isio!'omia
total da produção" (pág. 357). das nações: "introdução da economia de mercado, industrializaçao dos
A terceira condição de reprodução ampliada é que o capital possa paises, revolução capitalista da .a~cul~a ?a mesma forma que a eman-
dispor sem restrições da fôrça-de-trabalho necessária a produzir uma cipação dos jovens estados capitalistas (pag. 420). Esses passos acom-
quantidade suplementar de mais-valia - que tenha à sua disposição
12.9 Cf Luxemburgo, op. cit., pãg. 366: "Nessa alturs, elevemos rever as con·
um "exército industrial de reserva''. "A mão-de-obra para êsse exército ões de' mercados interno e externo que foram tão importa-ntes na. controvérsia
é recrutada em reservatórios sociais fora do domínio do capital - : : e a. acumulação. l!:les são ambos vitais para o desenvOlvimento capltatlsta. e con-
tudo fUndamentalmente diferentes, pOsto que devem ser concebidos em têrmos é de
ela é atraída para o proletariado do assalariado apenas se a necessidade economia social mals que de geografia potitlca. A essa luz, o mercado interno o
disso aparecer." "Apenas a existência de grupos e países capitalistas mercado capitalista, a produçA.o comprando seus próprlos produtos e fornecendo seus
próprios elementos de produç6o. o mercado externo é o meto eocial nA.o-capltallsta,
não basta para atender às necessidades da acumulação (pág. 361)." que absorve os produtos do capltatlsmo e fornece bens de prodUÇA.o e fôrça-de-tra-
Como essa fôrça-de-trabalho, no entanto, "está em muitos casos rigi- balho para a produçA.o capltallsta.. Assim, do ponto de vista da economia, a. Alema-
nha e a Inglaterra trocam mercadorlas sobretudo em um mercado interno capita.llsta,
damente prêsa à organização pré-capitalista da produção", ela deve enquanto o dM' e tomar enWe a indústria aiemê. e os camponeses alemli.es é ~!etuu.do
ser "libertada" a fim de poder ser alistada "no exército ativo do capi- em um mercado externo na medida em que se considera o capital alemA.o ·

100 101
panham-se sempre dos empréstimos internacionais, inicialmente desti- nos países hegemônicos, ser compelido a lançar-se à emprêsa de desen-
nados à construção de estradas de ferro e portos, pois as vias de comu- volver, de acôrdo com as leis da economia de mercado, as regiões
nicação são a condição indispensável à introdução da economia de periféricas, onde a rentabilidade do capital é maior que nos países de
mercado, porquanto se o capital "pode despojar associações sociais origem. Destarte, enquanto houver nos limites nacionais de origem do
estranhas de seus meios de produção pela fôrça", não pode "forçá-las capital, jurídica e geogràficamente definidas, áreas não-capitalistas em
a comprar suas mercadorias, on a realizar sua mais-valia" (pág. 386). que a mais-valia possa ser realizada, aquêle não terá interêsse econô-
E serão ésses empréstimos - a um tempo o instrumento para a inde-, mico em realizar a autonomia capitalista das nações atrasadas, com o
pendência dos jovens estados capitalistas e o "laço mais seguro pelo que elas continuarão servindo apenas como "mercado externo" (da
qual os velhos estados capitalistas mantêm sna influência, exercem perspectiva socioeconômica conjugada com a geopolítica) em que se
contrôle financeiro e fazem pressões sôbre a política alfandegária, ex- realiza a mais-valia produzida nas nações hegemônicas do sistema, a
terior e comercial dos jovens estados capitalistas" - qne restringirão qual se capitaliza nessas e não naquelas. Da mesma forma, essa auto-
o âmbito da acumulação dos velhos paises, "criando nova competição nomia não se dará enquanto o aumento da produtividade do trabalho
para os países investidores", já que com a expansão do capital tendem compensar (pelo aumento da taxa relativa de mais-valia) novos inves-
a restringir-se (considerando agora também os interêsses de cada po- timentos nas nações hegemônicas, ou a concentração não chegar, nos
tência isoladamente e não exclusivamente os do capital) as áreas não- ramos industriais tomados isoladamente, a limites incompatíveis com
-capitalistas indispensáveis à acumulação (págs. 421 e 446). a rentabilidade, ou as pressões da luta de classes nas velhas nações
Essa progressiva emancipação capitalista das nações atrasadas (as não levarem o Estado a intervir no processo socioeconômico a fim de
jovens nações capitalistas) não pode ser reconhecida como aleatória; redistribuir pelo conjunto da sociedade - sob a forma de obras e
ela é necessária e se dá sempre, porque o "fim último [do processo
serviços - uma parte ponderável da mais-valia apropriada (a qual
de acumulação] é estabelecer o domfnio universal e exclusivo da pro-
será, em boa medida, retirada da porção destinada ao consumo dos
dução capitalista em todos os países e para todos os ramos da indús-
capitalistas). Só quando urna dessas quatro condições, ou tôdas elas
tria" (pág. 417). Essa necessidade ineludivel de expansão do capital
conduz ao imperialismo, isto é, ao estágio final da carreira histórica combinadas, se verifica - e apenas nessas circunstâncias - 6. que o
do capitalismo (pág. 417); aquêle momento em que, tendo-se redu- capital tem interêsse em realizar a autonomia das nações atrasadas em
zido as áreas não-capitalistas indispensáveis à acumulação, a política têrmos de economia de mercado.
do capital "cresce em violência e anarquia, seja na agressão contra -É apenas quando se considera o momento médio da acumulação
o mundo não-capitalista, seja em conflitos sempre mais sérios entre as nos países hegemônicos que se pode levar o pensamento de Luxem-
nações capitalistas competidoras" (pág. 446). Teõricamente, é o que burgo às suas últimas conseqüências no terreno da ação concreta do
resulta da análise: o mercado interno do capital tenderá a expandir-se capital em seu contato com a economia natural. Sem dúvida alguma,
enquanto houver estratos sociais e países não-capitalistas capazes de da perspectiva dos países capitalistas, a realização da mais-valia, o
fornecer matérias-primas e fôrça-de-trabalho, e de realizar a maiscvalia livre acesso às matérias-primas e a libertação da fôrça-de-trabalho nos
produzida pelo capital. Esse processo, do ponto de vista econômico, estratos não-capitalistas são a condição necessária e suficiente à acumu-
é necessário, pois "é absolutamente indispensável para a acumulação lação do capital social total nas regiões hegemônicas, vindo a autono-
do capital que uma quantidade suficiente de mercadorias criadas pelo mia das regiões atrasadas como passo subseqüente - mas nem por
nôvo capital ["produzido pela adição de parte da mais-valia apropriada isso predeterminado no tempo - do processo de acumulação naquelas
ao capital original"] encontre um lugar para si no mercado e seja registrado; do ponto de vista dos países importadores de produtos ma-
realizada" (pág. 44). nufaturados, a realização da mais-valia e a libertação da fôrça-de-tra-
A plena autonomia capitalista das nações atrasadas não resulta, balho são necessárias tão-só a que se inicie sua passagem da economia
todavia, como se poderia inferir no exposto acima, de um processo natural à de produção simples de mercadorias, não sendo, no entanto,
automático regido Unicamente pelas leis específicas da acumulação - suficientes para que se realize sua autonomia capitalista e sua inde-
é, tão-apenas, no limite, o estágio a que chegarão pela ação do capital, pendência econômica. Luxemburgo assinalava, aliás, as diferenças "es-
que tem a tendência a expandir-se nos quadros do modo de produção paço-temporais entre as condições de realização da mais-valia e sua
que lhe é próprio. ~se limite, contudo, só é alcançado depois de o capitalização. Enquanto a realização da mais-valia requer apenas a
capital, conquistados os estratos e regiões não-capitalistas existentes extensão generalizada da produção de mercadorias - acrescentava - ,
102 103
sua capitalização exige a ultrapassagem progressiva da produção sim- verso abstrato próprio da economia de mercado e assim desligar-se das
ples de mercadorias pela economia capitalista, com o corolário de que práticas paternalistas e protecionistas que acompanharam o capitalismo
os limites, quer para a realização, quer para a capitalização da mais- em seus primeiros passos, opondo-se a elas como contrárias à dinâmica
-valia, se contraem cada vez mais". 1ao Todavia, mesmo que se conside- interna do modo de produção e irracionalmente limitativas de sua plena
rem essas diferenças - o que leva a afirmar que a autonomia capita- expansão econômica e realização social.
lista das nações atrasadas só se efetivará quando o capital houver O momento da acumulação não pode, no entanto, ser visto apenas
adquirido tal densidade no seu mercado interno (encarado da perspec- como o ótimo de alguns ramos industriais, quando se considera a ação
tiva socioeconômica) que tenha interêsse econômico em transformar do capital sôbre as economias periféricas. Sendo o poder político o
a produção simples de mercadorias em economia de mercado - , ainda instrumento utilizado pelo capital para destruir a economia natural e
assim, porém, é preciso considerar que a análise de Luxemburgo leva substituir a economia de produção simples de mercadorias pela econo-
em conta o processo de acumulação do capital social total. Da perspecti- mia de mercado, convém ter em mente que o Estado tende a ser o
va do contato do capitalismo com as economias naturais, é preciso representante do maior número de grupos, cujos interêsses econômicos
examiná-lo a partir do fato de que a maturidade do capital lWS paises são coincidentes com os seus interêsses político-estratégicos enquanto
de origem - no sentido de que a autonomia capitalista das nações Estado, realizando, em conseqüência, a política que lhe permita a um
atrasadas se apresenta como necessária ao seu próprio desenvolvi- tempo satisfazer sua razão e conservar o apoio do maior número possí-
mento, esgotadas as possibilidades de expansão- não se dd ao mesmo vel de estratos sociais politicamente ponderáveis. Daí ser necessário
tempo para tôda a indústria. Não é difícil verificar que alguns ramos ver o momento da acumulação não em alguns ramos isolados, técnica
industriais chegam mais rápido que outros ao que se poderia considerar e socialmente mais avançados, mas no conjunto das atividades indus-
o momento ótimo da acumulação - isto é, aquêle momento do pro- triais, cujo progresso têcnico médio, socialmente estabelecido pelas
cesso produtivo em que as exigências da racionalidade da economia condições de maturação do capital, observadas em seu mercado interno
de mercado se fazem presentes à consciência de alguns grupos domi- geopoliticamente considerado, fixará o que se pode denominar de mo-
nantes, os quais são levados a atendê-las sob pena de perecer em tempo mento médio da acumulação. O momento médio da acumulaçã~ esta-
mais ou menos longo, não importa, mas sempre perecer às mãos de belecido responde não apenas a uma exigência teórica - conciliar a
seus concorrentes. De um modo geral, pode se dizer que êsse momento acumulação do capital social total com as diferenças de progresso técni-.
ótimo é atingido primeiro por aquêles ramos industriais que se implan- co registradas nos diferentes ramos da produção - , mas também à
taram quando o processo de produção capitalista já ia avançado; aquê- coll1Preensão da realidade da ação estatal. De fato, ela só se tomará
les que foram menos permeados pelos hábitos e atitudes herdados do efetiva - no sentido reclamado pelo processo de reprodução ampliada
mundo pré-capitalista em que se gestou o capitalismo. Estando social- - quando as exigências da racionalidade da economia de mercado
mente mais distantes da natureza e tendo-se desenvolvido num mercado penetrarem a consciência do maior número de grupos produtores; só
interno competitivo, puderam integrar-se mais coerentemente no uni- então, o Estado usará os instrumentos de fôrça e pressão a seu dispor
para auxiliá-los na tarefa de promover a autonomia capitalista das ua-
130 Luxemburgo, op. ctt., pã.g. 421. :&: irrelevante n~ passo da aná.Use d.lscutir
a aflrmaçA.o de Luxemburgo sôbre a lnev1tabllldade d~ crise final do çapitalismo em ções atrasadas - desde que, evidentemente, os interêsses econômicos
conseqüência dessa contração crsscente da área destinada à acumulaçlo. Joan Ro- estabelecidos por êsse momento médio da acumulação não colidam com
blnson declarou, a êsse propósito, na Introdução da edlçA.o 1nglêsa de The Accumu-
lation of Capital, que a eminente teórica da. Soclal-democracta Alemã deu pouca os interêsses estratégicos e de segurança do Estado.
lmportãncla "ao aumento doa salários reais que se verl:fica à medida que o caplta-
Hsmo se desenvolve", e negou "a indução Interna e.o Investimento provido pelo Se a fôrça aparece para Luxemburgo como o único caminho
progresso técnico, dois :fatOres que auxU1am a salvar o capitalismo das d1:ficuldades aberto ao capitalismo para promover a passagem da produção simples
que se cril't", oom o que a aná1lse do processo de acumulaçllo do capital é incompleta.
Caberia observar, no entanto, que correspondendo o capital variável ao "trabalho de mercadorias para a economia de mercado, não é apenas como con-
necessário" à aquisição dos melas de subsistência dos operários, e que sendo êsse
"trabalho necessário" calculado socialmente, seu valor depende em grande medida seqüência da necessidade que tem o modo capitalista de produção de
"do grau de c1v1UzaçAo de um pais", nêle entrando, ao contrário das demais merca-
dorias, "um elemento histórico e moral", como dizia Marx. Assim sendo, se por um acumular e impor-se universalmente; resulta, paralelamente, do fato de
lado o progresso técnico aumenta a mals-<Valia relativa, permitindo uma redução do nos países atrasados o alistamento da fôrça-de-trabalho no "exército
preço doe valOres de uso de que se serve o trabalhador para sua subsistência, e se
por outro as condições especificas da luta de classes permitem, em contrapartida, industrial de reserva" ser feito pela combinação do sistema de salário
uma redução da mais-valia apropriada pelos capitalistas em virtude de conquistas
sociais :feitas pela classe trabalhadora, o aumento real dos salários ainda assim pode- com as formas anteriores de dominação política. Essa combinação,
ria ser responsável apenas por parte do aumento da procura reclamada pela necessi- aliada à persistência do "ethos" não-capitalista, consagra-se em uma
dade de acumulação. com o que, dentro de certos 11m1tes, o problema continua o
mesmo suscitado por Luxemburgo. estrutura estatal que impede o desenvolvimento do modo de produção
104 105
capitalista por inadaptar-se, enquanto unidade coletiva de ação, às exi- nomia de mercado e as estruturas de poder das sociedades periféricas
gências de racionalidade que lhe são peculiares,' 31 entre as quais a ex- será vencida em favor da primeira e a economia de mercado se esta-
pectativa de cada um de que o comportamento dos demais indivíduos belecerá em sua plenitude. Desde que malogradas, isto é, desde que a
envolvidos no processo de produção e distribuição das riquezas seguirá consciência do que se joga esteja ausente, persistirá a defasagem pela
sempre, em situações supostas sempre as mesmas, idênticas normas. permanência de elementos institucionais inibitórios da transformação
Essa circunstância, diretamente alheia ao processo econômico, econômico-social, exigindo o aparecimento de um nôvo grupo dirigente
constitui um dos grandes obstáculos no caminho da expansão do capi- que apreenda os reclamos da realidade e faça uma nova revolução.
tal, já que o Estado com o qual se defronta é histàricamente seu inimigo, A autonomia capitalista das nações atrasadas só se realiza, assim,
porquanto traduz, ao nível das superestruturas jurídicas, relações poli- quando se cumpre suficientemente sua condição: que o poder de Esta-
ticas que êle almeja exatamente transformar. É êsse antagonismo entre do, reorganizado em função das exigências da racionalidade interna
as relações políticas juridicamente consagradas - em um sentido que do capital, tenha reestruturado a sociedade e aberto os caminhos aos
se opõe à racionalidade inerente ao modo de produção - e a raciona- seus exércitos.
lidade peculiar ao capital que torna as revoluções inevitáveis, pois a
autonomia capitalista das nações atrasadas, para que se torne efetiva,
exige que sejam postas abaixo usuas organizaç~s políticas obsoletas, 3 - A regressão do capital
relíquias da economia natural e da economia de produção simples de
mercadorias", criandO-se em seu lugar {{u'a máquina estatal moderna As revoluções que se repetiram na América Latina desde a Inde-
adaptada aos propósitos [da racionalidade] da produção capitalista".!'' pendência podem ser vistas como tentativas de atendimento da necessi-
As revoluções nas nações atrasadas aparecem assim como a condição dade de as estruturas políticas se adaptarem à racionalidade interna do
sine qua non da afirmação da racionalidade plena de um sistema que capital, surgindo como a premissa de seu pleno estabelecimento. Nos
ainda não transformou sua liderança em dominação, isto é, ainda não países indo americanos, em particular, e nos periféricos, em geral, as
pôde fazer que sua direção intelectual e cultural se tornasse direção exigências dessa racionalidade não se fazem sentir com igual 'intensi-
política juridicamente estabelecida. dade que nos países hegemônícos, ou naqueles em que se tendo passado
Nesse sentido e não noutro é que deve entender, a nosso ver, à fase da capitalização da mais-valia, a correspondência entre as estru-
a afirmação de Marx, segundo a qual "a fôrça é a parteira de tôda turas estatais e o modo de produção deve ser estabelecida corretamente.
velha sociedade grávida de uma nova. Ela é em si uma potência Todavia, nem pelo fato de essa racionalidade não ser uma solicitação
econômica": 133 é que as revoluções trazem à luz um mundo nôvo que premente da realidade, deixa o princípio de ser aplicável, visto que o
se está gestando nas relações já estabelecidas no processo de produção, importante não é tanto a dinámica interna do modo de produção vigente
mas cuja verdadeira face ainda é desconhecida daqueles que dêle par- nos países periféricos, quanto a racionalidade do modo de produção
ticipam e da sociedade como um todo. Desde que bem sucedidas, isto imperante nos hegemônicos e, portanto, no sistema global. Pelo fato
é, desde que o núcleo dirigente do processo saiba compreender do que dêsse sistema ser um todo coerente uníficado pelo impulso à expansão
realmente se trata, a defasagem existente entre a racionalidade da eco- uníversal do capital, sua racionalidade é a que tende a prevalecer sôbre
131 Weber. na Historie Económtca- Genera-l, FCE, México, 1956, pá,g. 236 e segs.,
aquela de formas de produção que perderam vitalidade, ou não podem
estabelece como condição primordial para a existência do capitaHsmo a ·•contabili- disputar a hegemonía por anteriores, ou menos dinâmicas que o capital
dade racional do capital como nonna para tôdas a.s grandes emprêsas lucrativas que
se ocupam da satisfação das necessidades cotidianas", acrescentando que essa condi- em expansão. Por êsse motivo é que as revoluções se deverão confor-
ção só se dará depois de satisfeitas as seguintes premissas: 1. apropriação de todos
os bens materiais de produção como propriedade de livre disposição por parte das mar - reorganízando as instituições jurídico-políticas, especialmente
empresas lucrativas autônomas; 2. liberdade de comércio, isto é, liberdade do merca-
do com relação a qualquer limitaçã.o irracional do tráfico; 3. técnica. racional, isto é,
as vinculadas ao processo econômico- a essa racionalidade a cumprir-
contabilizável a.o máximo e, por conseguinte, mecanizada, tanto na produçA.o como -se no futuro e não a outras, já esgotadas no presente. 134 O malôgro
na troca, não só no que se refere à confecçã.o, mas também a todos os custos de
transporte dos bens; 4. direito racional, isto é, direito calculável: "para que a explo- dessas revoluções (no sentido do não-estabelecimento de instituições
ração eOOnômica cspitaltsta proceda racionalmente, precisa confiar em que a justiça
e a administração seguirão detenninadas pautas"; 5. trabalho Hvre, no sentido de 134 Em têrmos genéricos, ~reorganização das instituições deve tender a :procurar
que ha-ja uma camada social deserdada, que necessita vender de maneira formal- a sua secularização e conseqüente racionalizaçA.o, por ser o modo de produçao hege-
mente livre sua fôrça-de-trabalho, e 6. comercialização da economia, isto é, o uso mõnico essencialmente secular e racional apesar dos desvios que se possam constatar
geral de títulos de valor para os direitos de participação nas emprêsas, e igualmente entre sua ação real e seu padrão ideal de organização. Como a racionalidade - isto
para os direitos patrimoniais. é, a contablllzaçã.o daiS ações sociais dirigidas a. um fim - é a regra de ouro de
132 Luxemburgo, op, cit., pâg. 419. qualquer modo de produção de compiexida.de igual ou superior ao capitalista, o pro-
133 Marx, op. cit., pá.g. 824. blema da direçA.o poiitica dessa reorganização é de somenos importância na. discussão;

106 107
estatais modernas), tornando sua repetição uma quase obrigação cons- através do dumping), seja para realizar novos investimentos, com o
tante, decorre de seus grupos dirigentes não terem compreendido o es- objetivo de aumentar a mais-valia relativa pelo progresso tecnológico
sencial do que estava em causa, por um lado, e de não se terem feito - única maneira de fazer frente à pressão da organização da classe
presentes na realidade socioeconômica os elementos que tornassem ne- operária emergente dessa alteração estrutural. Nesse quadro, não é de
cessária a reorganização das instituições pollticas, por outro. Em boa estranhar que tôda a política colonial (no sentido mais lato da expres-
parte, essa ausência de elementos condicionantes deve ser procurada em são) das nações que ainda não chegaram a seu momento médio da
fatôres externos e internos, os quais se combinam para conduzir à acumulação seja exatamente impedir a transformação da economia
paralisia do desenvolvimento econômico e social dos países abaixo do das nações coloniais em uma economia de mercado. 18 G
Rio Bravo. Foi essa circunstância que obrigou o capital inglês, primeiro, e o
O fator externo, mais que a capacidade, ou a agressividade do norte-americano, depois, a realizarem sua primitiva "santa aliança"
capitalismo inglês, ou norte-americano em expansão, é o capital não com os setores dominantes indoamericanos, os quais ascenderam ao
ter tido até ontem necessidade econômica de promover a autonomia poder após as guerras da Independência e a vitória dos privatismos
capitalista das nações indoamericanas, bastando a seus fins de acumu- sôbre a Nação. De fato, foi nesses setores dominantes, na oligarquia,
lação a existência de uma economia com vitalidade apenas suficiente que o capital encontrou, no século XIX e inícios do XX, os instru-
para realizar a mais-valia produzida nos países velbos. Foi a ausência mentos políticos locais aptos a manter o status quo, que da perspectiva
do interêsse econômico do capital que conduziu à tragédia em que se estritamente econômica lbe era duplamente favorável: em primeiro
constituíram, especialmente depois da substituição da influência inglêsa lugar, permitia-lhe ter à sua disposição um vasto mercado onde realizar
pela norte-americana no primeiro após-guerra, as repetidas tentativas a mais-valia e um imenso reservatório de matérias-primas extraídas a
de modernização das estruturas sociais em /ndoamérica. Realmente, baixo custo dada a desorganização dos trabalhadores e sua conseqüente
enquanto o capital encontra nos países hegemónicos condições socio- exploração pela extensão da jornada de trabalho; em segundo lugar,
econômicas que lhe permitam investir em condições de rentabilidade não o forçava a investimentos que se faziam necessários nos países he-
e segurança tais que a redução da jornada de trabalho decorrente das gemônicos - necessárias também porque mais rentáveis, na rentabi-
pressões da luta de classes seja compensada, em têrmos de apropriação lidade entrando em boa medida a margem de segurança. ,
da mais-valia, pela redução do tempo de trabalho necessário, não exis~e Não se pode negar, quando se analisa o problema dessa perspecti-
interêsse ou necessidade econômica que o leve a realizar a autonolllla va, que a oligarquia cumpriu o papel histórico que era seu, ao abolir
capitalista das jovens nações periféricas. O porquê disso é simples: as r_estrições que o Direito Indiano opunha à livre exploração da mã<;
nos países velbos, o capital tem de se haver sempre com uma classe -de-obra índia e à livre disposição da terra e do subsolo, e ao d~strnlr
operária, cuja organização e consciência (pouco importa se meramente a incipiente manufatura que se estava desenvolvendo em diversas regiões
reivindicatória e reformista, ou revolucionária) - a par das imposi- da antiga Colônia, estabelecendo com os novos Estados uma estrutura
ções da concorrência - o obrigam a novos e constantes, investimentos jurídico-política consentânea com as exigências da economia mundial
para aumentar, ou no mínimo conservar, uma taxa de mais-valia rela- da época. 136 Fê-lo, porém, primordialmente, porque a tarefa respondia
tiva compatível com as exigências e as possibilidades do progresso a seus interêsses, coincidentes com os do capital, e fê-lo encarando
técnico. Ora, enquanto a manutenção de uma economia de produção o nôvo processo político e econômico no qual ingressava a Indoamé-
simples de mercadorias nas nações, periféricas permitir ao capital repro- rica de sua particular visão segmentar-local, isto é, a visão de segmen-
duzir-se nos países hegemônicos, êle terá interêsse econômico em que tos isolados na "soledad poblada", os quais retiravam o fundamento
as estruturas sociais dos países periféricos permaneçam inalteradas,
135 Essa afinnação não contraria o que se disse sôbre o problema d1t autonomia
porquanto qualquer alteração, visando a adaptá-las à racionalidade do ca.pitaUsta das nações atrasadas. A anãJ.ise anterior foi necessária a. fim de estabele-
cer a linha geral do processo, vale dizer, as tendências a. cumprirem-se no tempo. Ela
modo de produção, poderá obrigá-lo a um esfôrço econômicamente ilumina, mas não elucida cabalmente, os aspectos conjunturais concretos, problema
desinteressante, seja para competir pelo contrôle de áreas não-capita- que tentamos equaciona·r agora, tendo sempre presente que é mais perigoso confun-
dir os tempos dOS verbos (a Unha. gerai do processo com oa aspectos conjunturais)
listas (as quais poderá perder pelo protecionismo alfandegário impôsto em polltica do que em gramática.
pelos governos das nações periféricas em processo de transformação, 136 o estabelecimento das novas estruturas estatais nã.o é sumUltãneo à Inde-
pendência. Da. mesmR< maneira como as formas estatais correspondentes à economia.
ou conservar à cusJa de perdas substanciais, ainda que momentâneas, de mercado ainda hoje não vieram à luz em muitos Estados, aquelas adaptadas às
necessidades da expansão do capital só foram estabelecidas depois de vencido o cau-
em outros tênnos, uma reorganização com sentido socialista exige, Igualmente, a se- dilhismo, última. reaçã.o da economia- natural e da manufatura 11gada à Agricultura
CUlarização e a racionalização das condutas humanas, da mesma tonna. que uma reor- contra o capitalismo liberal do século XIX. Na Argentina, por exemplo, é com a
ganização com sentido capitalista, simplesmente. Constituição de 1853 e a "geraçã.o de 1880" que o processo chega a tênno.

108 109
de sua posição política de um processo de produção que completava tiva de uma acentuada predominância dos setores rurais sôbre os
o seu ciclo no mercado internacional. A posição dos "reacionários'·' urbanos e da direção intelectual, cultural e política ser exercida pelos
que se opunham a Mariano Moreno respondia a fôrças e tendências primeiros em detritnento dos segundos, contribuiu para retardar a auto-
econômicas que iam contra a marcha do capital; por isso foi fácil nomia capitalista de Indoamérica. Outro elemento de itnportância não
vencê-la, como fácil foi aceitar a dos "hacendados", que encontravam neg!igenciável foi o fato de o inimigo externo contra o qual se travaram
no lívre-cambismo a possibilidade pressentida de estabelecer seu domí- as guerras de Independência não ser uma nação hegemônica no nôvo
nio sôbre a nova República, apoiados no comércio itnportador para o sistema em ascensão, mas periférica. Com isso, as medidas econômico-
qual apenas o livre-cambismo poderia de jure estabelecer relações eco- -políticas destinadas a garantir a Independência recém-conquistada di-
nômicas que compensassem as vantagens ilícitas do contrabando. rigiram-se contra a nação não-industrializada, tendendo a favorecer,
Se o caminho de tôda a produção terminava na Inglaterra, ou dada a constelação de poder internacional, aquela industrializada e em
mais tarde nos Estados Unidos, estabelecendo-se assitn a lígação entre franco processo de expansão.
a oligarquia e o capital, havia outros que encontravam seu fim nas :f:sse fato influiu decisivamente para o fortalecitnento do Agro e
praias do oceano e que contribuíram num primeiro passo para marcar o estabelecimento de sua posição hegemônica, porquanto o intercâm-
a dependência daquela com relação a êsse, retirando dos setores domi- bio com o mundo exterior passou a repousar sôbre os produtos agro-
nantes a possibilidade de opor-se à penetração do capital e de reali- pecuários ou da indústria extrativa, assegurando aos setores sociais
zarem a transformação econômica de seus países: o "ethos" e a posição ligados a êsse tipo de produção uma posição de monopólio na com-
dos setores dominantes indoamericanos no quadro geral das relações posição da receita de cambiais do Estado nacional. Graças a essa
econ.ômicas com o mercado internacional. A propósito do primeiro, posição de monopólio, que veio se acrescentar ao "ethos" aristocrático
Manátegui assinalava que pesa "sôbre o proprietário crioulo a herança dos estratos dominantes, o Agro e a indústria extrativa disputaram com
e educação espanholas que o itnpedem de perceber claramente tudo 0 êxito a hegemonia aos setores urbanos, visto que a indústria desde o
~ue distingue o capitalismo da feudalidade. Os elementos morais, polí- inicio se viu colocada em posição de dependência econômica, pois era
licos, psicológicos do capitalismo parecem não haver encontrado aqui do que-fazer econômico diário daqueles setores, antagônico às pormas
seu clitna. O capitalista, ou melhor, o proprietário crioulo, tem antes da racionalidade vigentes no sistema global, que ela retirava as cambiais
o conceito de renda que o de produção. O sentitnento de aventura, com que itnportar as matérias-primas e as máquinas que lhe eram indis,.
o itnpeto da criação, o poder organizador que caracterizam o capi- pell$Íveis. Por sua vez, o Estado viu-se itnpossibilitado de alterar o
talista autêntico são entre nós quase desconhecidos". 1 37 Em outras curso das coisas; por um lado, seu aparelho havia sido domínado pelo
palavras, persistiu a "maneira nobre de viver" que se transferira da Agro e pelo comércio de itnportação ao longo das guerras de liberta-
Espanha para a Colônia, em virtude de a articulação da Sociedade ção e, por outro, o cerceamento da expansão da hegemonia rural e o
Civil itnpedir o aparecitnento de uma visão de classe, e do predo- estabelecitnento de medidas fiscais e jurídicas tendentes a favorecer
mínio do Agro e das atividades extrativas no processo econômico os setores nitidamente urbanos poderiam acarretar uma transformação
que se seguiu à Independência ter fortalecido os anteriores fundamentos das relações sociais que iria contra os interêsses políticos dos grupos
psicológicos da dominação econômica, eminentemente pré-capitalistas, em posição relativa alta na escala de fruição de valôres socioeconômi-
os quais se tomaram anticapitalistas, ao se inserirem num contexto cos, na medida que essas providências levariam à abertura de canais
mundial racional e capitalista.
de ascensão sociopolítica ao grande número. A ligação efetiva no plano
Em grande parte, essa persistência do "ethos" aristocrático foi
causa e conseqüência da permanência de muitas instituições econô- a maioria. dos latino-americanos de residência urbana. ignorá-las prova. sua indife-
rença e essa indica que, consciente ou inconscientemente, sentem-se parte do grupo
micas coloniais após as guerras de libertação, as quais, resultando da explorador": 1. "pongueaje" - o indio pongo trabalha cinco dias por semana as
terras do "hacendado" sem receber salário; pertence ao proprietário por razão de
"encomienda" e da "mita", fortaleceram o domínio senhorial, impe- senhorio; 2. "huasicama" - semelha-nte à anterior, combinando a. servidão agrária
com a doméstica. O indio recebe em uso um lote, o "huasipongo", em paga doa
diram a organização da fôrça-de-trabalho para reivindicar a transfor- trabalhos que realiza na terra. Seus flihos são destinados aos trabalhos domésticos;
mação de suas posições políticas relativas e fizeram a produção para 3. "porambia" - um trabalhador recebe um lote para cultivo, devendo dar ao pro-
prietário 144 dias de trabalho por ano; 4. "yanaconazgo" - forma. coletiva de concêr-
o mercado externo assentar, em muitos casos, no trabalho servil ou to. Os "yanacones" sã.o índios arrancados da comunidade situada na serra para serem
levados para. a- costa. o contrato de trabalho só tem obrigações para êies e nenhuma
semi-escravo. 138 Mas não apenas essa permanência do "ethos", indica- para o senhor da terra; não fixa a classe de tarefas que devem ser realizadas pelo
jornaleiro, nem o montante de seu salário, nem a duração do contrato, mas em com-
137 Mariátegui, op. cit., pág, 20. penl!lação êase é tran.sferivel de paiB para filhos. Cf. Victor Alba, "Paré.sitos, Mit05 Y
138 Victor Alba estabelece, entre outras, as seguintes formas de trabalho servil, Sordomudos", suplemento da revista Panorama, n.o 11, set.{out. de 1964, México, pt\g.
ou semi-escravo, ainda hoje existentes em Indoamérlca, assinala·ndo que "o fato de 50 e Begs.

110 111
do "ethos" e dos interêsses econonucos, e o acôrdo tácito no terreno soc1rus nela implícitas, inclusive o desenvolvimento livre da luta de
político entre setores produtivos teoricamente dados como possuindo classes.
visão do mundo e interêsses divergentes, condicionou assim todo o Em sua expansão, dadas a "licença e anarquia" que caracterizam
desenvolvimento econômico e social, permitindo que se estabelecessem 0
mercado capitalista e a defasagem entre os momentos de acumula-
sólidos laços entre os setores internos dominantes - incapazes de ção dos diferentes ramos indus~riais, .o capital defronta-se - apen~
formular um projeto nacional em decorrência de sua visão política ser realizada a aliança da nova ollgarqwa com os setores externos culo
segmentar-local e não de classes - e aquêles setores externos que con- momento de acumulação está abaixo do estabelecido como méd1o
tribuíam igualmente para a composição da receita cambial do Estado para 0 mercado interno. do _capital. ~ocioeco;"ômicamente. considerado
(ligados à indústria extrativa e à terra) ou realizavam inversões ten- - não mais com orgamzaçoes soc1a1s e pol.!ticas pré-.capi~alistas, m~s
dentes a aumentar o dominio do Agro, os quais retiravam de sua situa- com uma associação objetivamente caractenzável de rnteresses econo-
ção econômica nos países periféricos parte do fundamento de sua micos e políticos çapitalistas (estrangeiros ao mercado interno geo-
posição política nos hegemôuicos. político) e rur-capitalistas (situados no mercado exte~o encarad? _da
Essa dupla aliança do Agro com setores supostos urbanos e com perspectiva socioeconômica), para a qual a manu~en~ao das J;<lSlç~es
estratos capitalistas externos mais especialmente ligados à exploração políticas passa a ser mais .importante que a apr?pnaçao da ma1s-Val1~.
da terra e do subsolo, que não haviam chegado ao momento médio da f: que, pressupondo a raciOnalidade da econonna de mercado, a c~nsl­
acumulação vjgente em seus países de origem, transformou ao longo deração e a utilização econômica da terra como bem de produç~o e
do processo a função política da oligarquia. 139 Se num primeiro mo- não fonte de prestígio social, a livre disposição, ainda que nommal,
mento, que se inicia pouco antes da Independência e vai até meados da fôrça· de-trabalho pelos operários que a vendem no mercado de tra-
do século ~X, ela foi o sócio menor do capital interessado apenas balho e a possibilidade legal da livre organização política da clas_:;e
em ver realizadas na periferia as condições necessárias à acumulação trabalhadora sua realização conduz necessàriamente a uma alteraçao
nos países hegemônicos, num segundo momento, objetivamente mar- profunda da~ po~ições políticas asse_ntes n.a ausência de dinami~~o da
cado pela Conferência de Punta de! Este, em 1961, da qual resultou economia. O capital na sua expressao maiS acabada pode pel1Illlir a?s
a "Aliança para o Progresso", converteu-se no obstáculo à realização setores dominantes uma igual participação na apropriação da maiS-
das reformas institucionais e estruturais imprescindíveis à transforma- -valia; todavia, ao impor a modernização das técnicas d~ produção ~
ção das relações de produção no sentido mais favorável ao cumpri- das estruturas políticas, êle tende a transformar as condiçoes em que
mento da racionalidade da economia. Detendo o contrôle do aparelho se dá a dominação política, criando condições par~ que novos ~pos
d~ _Estado colocado a serviço de seus interêsses privatistas e de sua desfrutem de igual prestígio e autoridade em detnmento dos anugos.
v1sao segmentar-local do processo de produção e do mundo, a oligar- Para a oligarquia, pouco importa que a modernização do .Estado e a
qwa pôde ampliar nesse século os seus quadros, recobrindo não só abertura das estruturas políticas, necessárias à plena vigência do modo
os setores rurais, mas também muitos urbanos que iam buscar no de produção capitalista, sirvam também para mascarar a .d~~açã?
Estado o apoio efetivo para vencer a concorrência do capital forâneo social do capital; imediatamente, a realização dess~- cond15oes msti-
e limitar a ação reivindicatória da nascente classe operária trabalhada tucionais assume o caráter de um assalto à sua pos1çao polítlca atual,
pelos "estrangeiros seculares" chegados com a imigração européia. pois a oligarquia intui que se a República, como diria Marx, permite
Assim fortalecida, confundiu a defesa de suas posições políticas com sua mais completa dominação política, ao mesmo tempo mm~ ~s bases
os interêsses imediatos dos setores externos sem motivos econômicos sociais em que funda seu poder, opondo-a as clas~~s. opnnud'!!o da
para apressar o estabelecimento da racionalidade da economia de mer- sociedade e obrigando-a a enfrentá-las sem mtermediano algum. O
cado, impedindo assim que ela se desse com tôdas as conseqüências capital passa~ assim, a ser o seu inimigo, pois a violência que deve e~
139 Martátegul, op. cit., pág. 14 e segs., assinala que no Peru, após a Indepen-
pregar para estabelecer a prevalência do seu modo de produçiio devera
dência, os bancos nacionais, que financiavam emprêsas industriais e comerciais, se voltar-se em primeiro lugar contra ela e seus aliados. E n~ luta co~tra
enfeudaram ao capital estrangeiro e à grande propriedade rural, e que "sôbre um
solo feudal cresce uma economia burguesa que pelo menos em seu desenvolvimento 0 capital, a oligarquia mobiliza os setores ext~rnos ref~ndos, pois a
mental dà a impressão de uma economia retardada". Para o process:> argentino, su- manutenção do status quo aparece-lhes como rnd1spensavel à conser-
mamente ilustrativo do que acima se disse sôbre a ligação do Agro com o capital
estrangeiro e os setores teàricamente urbanos e tendentes à racionalidade capitalista, vação dos privilégios econômicos e sociais que lhes foram outorgados
cf. Torcuato D. DI Tella e outros, Argentina, Sociedad de Masas, Eudeba, Buenos
Aires, 1963, especialmente Cortês Conde, Problemas del crescimiento Im1:ustrial - 140 Karl Marx:, Le 18-Brumaire eLe Lauis Bonaparte, Editloll5 Sociales, Paris, 1949,
1870-1914, págs. 59-84, e Guido DI Tella e Manuel Zymalnan, Etapa8 t:Lel Desarrollo
Económtco Argentino, págs, 177-95. pág. 40.
113
112
por ela. Essa associação entre l" .
momento de acumulaç b . a o lgarqula e os setores externos com
"partido da ordem" da:"natõ':' ;-if~ 9ual se co~stitui. no verdadeiro 5
racionalidade da economia porq:
d o mund o em que se gestou e aind
enca~ - opoe-se a realização da
e seus
h . mtegrantes
. trazem a marca
mundo em que o a io d d , a ~Je VIve cercado o capital: um
fortalecer o seupoct!;'era r~~b~~d~presa~ do_ Estado. no_ ~entido de
micos e sociais destinad pela fixaçao de pnvilepos econô-
os a manter sempre alta a po · - ,.
estratos sociais em que o Estad . s!çao po1ltica dos NOSSA AMERICA E O IMPERIALISMO
marca não-capitalista, levando aooes~ :r'~va. A sobrevivência dessa
n.opólio e exclusivo político e econ~~~c:ento de tsltuaçdões de mo-
(mternos ou externos) f . ,a.os se ores ommantes
seja também álid ' az com que o pnnclpw da comunicabilidade Vistas, no capítulo anterior, as condições teóricas em que se veri-
mente, os cC::,po~~~~t~s ~o~~~~~;:íses periféri~os: ,manifes;a- ficou o contato da América Latina com o capital em expansão, cabe
agora examinar as condições concretas em que se deu a inserção dos
dert_rabalho e à racionalidade próprias do
po em respondem a moti
siste"!;~~ga.:~~:. ~;afçaotoes países situados abaixo do Rio Bravo no circuito do capital. Em outras
trad. . . ' '
desafi~ da mudança lançvg" llCJon~Is e reagem tradicionalmente ao palavras, examinar como foi possível que a influência norte-americana
. amtca
dm ' · mtema.
· a 0 pe 0 capital, cegamente obediente a' sua se tomasse predominante na política interna dos países latino-america-
nos e como, apesar dos grandes movimentos políticos da primeira nw-
tade do século XX, não se pôde reproduzir o ideal da anfictionomia
bolivariana, apesar de se ter feito claro, à consciência dos que dirigiam
a oposição aos Estados Unidos, que sem a união da América Latina
não seria possível opor obstáculos à penetração do capital norte-ame-
ricano e impedi-lo de exercer influência na condução dos n~~gócios
políticos internos dos países latino-americanos.
Esse exame, contudo, só pode ser feito à luz de dois princípios,
indispensáveis a que se tenha os elementos objetivos necessários a
pennitir que o entendimento decida sob o impulso do perigo e o acicate
da paixão: o de que a expansão do capital é intrínseca ao modo de
produção caracterizado pela reprodução ampliada, e o da formação
dos Estados Unidos. O primeiro foi examinado mais acima; nossa
tarefa agora é tentar esboçar as linhas gerais da evolução histórica
dos Estados Unidos, especialmente em sua relação com o mundo ex-
terior.

I - A superioridade dos inferiores

Tocqueville já assinalara, em La Démocratie en Amérique, a par-


ticularidade da história norte-americana: "A América do Norte é o
único país em que se pode assistir ao desenvolvimento natural e tran-
qüilo de uma sociedade, em que é possível precisar a influência
exercida pelo ponto de partida sôbre o porvir dos Estados" .141 :É que
sua origem está ainda presente a nosso olhos, permitindo captar os
141 Tocqueville, Alexis de, La DemOCTacia en América, FCE, México, 1957, pá.g. 28.
114
115
elementos delineadores de sua linha geral de desenvolvimento sem que venção de indivíduos mais ricos em expenencia política e conheci-
entre o observador e a realidade se tenha contraposto a poeira dos mentos práticos, dotados de uma visão mais profunda das fontes da
séculos, ou a nova visão do mundo decorrente de uma diferente pers- ação humana e da essência íntima dos governos. :e admirável realmente
pectiva. Um dêsses elementos, que Tocqueville apontou, reconhecendo- que num momento dado se pudesse encontrar, numa população de
-lhe o caráter propulsor na transformação das relações sociais, é a apenas quatro milhões de brancos, tantos estadistas genuinos":'" todos
igualdade de condições, pouco importa se real ou apenas jurídica, jovens (Hamilton tinha então 30 anos e Madison apenas 36), mas
portanto simbólica, e, como ta~ mera expectativa superestrutura! do em geral homens que se haviam educado na história e na teoria política,
real possível de se atingir amanhã. A condição de símbolo ou de rea- haviam feito a Revolução e sabiam-se destinada& a construir uma
lidade tem pouca importância, porque o fato de uma aspiração inscre- grande Nação - especiahnente isso. Homens que se reuniam não para
ver-se entre os sistemas simbólicos de uma dada sociedade é bastante "realizar belos ideais filosóficos de democracia e justiça, mas empre-
para fazê-la operante ao nível do senso comum das pessoas, tornando- gavam todos os recursos de sabedoria política para construir un:' siste-
-se real a igual título que a desigualdade política que lhe deu origem. ma estável e eficiente, protegidos por um lado contra o despotismo e
Ao lado dessa consciência interiorizada de cada indivíduo da igual- por outro contra o massacre das minorias ... Queriam [também] aci-
dade de oportunidades para afirmar a vida, garantir a liberdade e alcan- ma de tudo, proteger os direitos da propriedade privada contra as
çar a felicidade, desde os primórdios da fundação distingue-se na histó- tendências niveladoras das massas sem propriedade" .144
ria dos Estados Unidos a transparéncia dos propósitos, afirmados todos Não apenas a consciência a defesa da propriedade moveu os Pais
com clareza bastante para eliminar os s/úboletts distintivos e impedir da Constituição. Se assim tivesse sido, a observação de Beard sôbre
que se estabeleçam, entre o sujeito e sua ação, barreiras ideológicas a excelência dos constituintes de 1787 seria inspirada meramente pelo
capazes de desviá-lo de sua reta pretensão. Naqueles que fizeram a Re- "orgulho patriótico". Ao reunir-se no que foi chamado "o período
volução da Independência e travaram o grande debate político sôbrc a crítico da história norte-americana", êles não tinham apenas que vencer
Constituição de 1787, há uma visão lúcida e claramente enunciada dos a hostilidade geral ao Govêrno e à taxação (numa reação espontânea
problemas que deveriam ser resolvidos para fazer das antigas colônias à lembrança dos antigos contrôles inglêses), um populismo larvado,
uma grande nação, e os meios que as experiências prática e teórica co- que assumia às vêzes a forma de insurreição armada, traduzindo o•espí-
locavam a seu alcance, reinterpretados pela vívência tôda especial nas rito de "facção", e a "imbecilidade" da Confederação. Tinham de en-
terras condenadas por De Pauw. :e.les não eram meros teóricos racioci- frentarJ também, o desafio que a Revolução representava para os in-
nando sôbre como construir a sociedade do futuro, nem utópicos revo- surrectos, pois se é verdade que foi por causas políticas e não de estru-
lucionários simplesmente desejosos de contrapor à Europa uma forma tura governamental que boa parte dos colonos rompeu com a Ingla-
de govêrno que negasse a monarquia, enquanto tradução de relações de terra, a consciência da separação e da Revolução só penetrando as
poder sabidamente desiguais, mas tão-apenas homens que viviam o massas à medida que se processava a reação por parte da Coroa, tam-
presente real e possíve~ donde concreto. :e que, como observa Charles bém não é menos verdade que muitos de seus líderes sabiam que a
A. Beard, "os autores da Constituição Federal representavam os gran- forma de govêrno que conseguissem estabelecer IUU]uelas terras seria
des interêsses conservadores, financeiros e comerciais do país. . . [os ou não a resposta adequada à "legenda de inferioridade natural", que
quais] juntaram fôrças para criar um govêrno suficientemente forte através de De Pauw também atingira as Treze Colônias. Hamilton, que
para saldar a dívida pública, regular o comércio interestadual e inter- a rigor pode ser situado entre os "conservadores" do período, é um
nacional, assegurar a defesa, evítar flutuações do valor da moeda criadas dos que claramente ressente a marca infamante da "legenda" e cons-
por emissões de papel e refrear a propensão das maiorias legislativas truiu seu sistema político em resposta a ela:
a atacar os direitos privados". 142 Mas, ainda assim, talvez por isso "O mundo pode, política e geogràficamente, ser dividido em qua-
mesmo, o autor de A Suprema Côrte e a Constituição reconhece que tro partes, cada uma das quais tendo uma diferente área de interêsses.
"foi uma assembléia verdadeiramente notável a que se reuniu em Fila- Infelizmente para as outras três, a Europa, por suas armas e suas nego-
délfia, a 14 de maio de 1787, para abordar a tarefa de reconstruir ciações, pela fôrça e pela fraude, estendeu, em diferentes graus, seu
o sistema de govêmo. Não é o simples orgulho patriótico que nos dominio sôbre as outras. A África, a Ásia e a América caíram sucessi-
leva a afirmar que jamais na história das assembléias se viu uma con- vamente sob seu dominio. A superioridade que manteve por longo
142 Charles A. Beard, A suprema Córte e a Constituição, Forense, Rio de Janei- 143 Ibidem, pág. 96 (grlfos nossos).
ro, S/d, pág. 91. 144 Ibidem, págs. 97-8.

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tempo tentou-a a jactar-se como Senhora do Mundo e a considerar tro. 14 • :É o que Franklin escrevia a um amigo francês: "O estabelecer as
o resto da humanidade como criado para seu proveito. Homens admi- liberdades na América não apenas fará êsse povo feliz, mas terá alguns
rados como filósofos profundos atribuíram a seus habitantes, em têrmos efeitos em diminuir a miséria daqueles que, em outras partes do mundo,
diretos, uma superioridade física e afirmaram, gravemente, que todos gemem sob o despotismo, tornando-o mais circunspecto e induzindo-o
os animais, e com êles as espécies humanas, degeneram na América a governar com mão mais leve" .149
- que inclusive os cães deixam de ladrar quando respiram durante Nas 13 Colônias, a "legenda" foi ressentida de maneira diferente
certo tempo em nossa atmosfera [em nota de pé, vem a referência à do que fôra nas possessões espanholas - dai a referência a ela ser
obra maldita de De Pauw: Recherches Philosophiques sur les Amé- apenas episódica nos docwnentos da época, ao contrário do registrado
ricains]. Os fatos apoiaram por muito tempo essas arrogantes pre- nas Colônias espanholas, onde se constituiu na tônica da oposição e
tensões dos europeus. Cabe-nos vingar a honra da raça humana e ensi- da reclamação de direitos. Em boa parte, isso fêz com que, no Sul, a
nar moderação a êsse írmão fingido. A Uniiio nos capacitará a fazer "legenda" servisse à Coroa para identificar os crioulos com o grande
isso. A desunião acrescentará outra vítima a seus triunfos. Que os número e a partir daí negar-lhes participação nas posições administra-
americanos deixem de ser o instrumento da grandeza européia! Que tivas, que eram reconhecidas pela organização social colonial e pelo
os 13 Estados, unidos. em uma estrita e indissolúvel união, concorram Direito espanhol como politicamente altas, enquanto no Norte apareceu
para erigir um grande sistema americano, superior ao contrôle de tôda mais como expressão verbal da superioridade do habitante da potência
colonizadora com relação ao semelhante da Colônia. Como a articula-
a fôrça e influência transatlântica e capaz de ditar os têrmos de cone-
xão entre o velho e o nôvo mundo". 145 ção da sociedade não permitiu que os que ocupavam posições políticas
baixas se constituíssem, nas 13 Colônias, em elementos passivos na
Jefferson, embora não associasse a Federação a De Pauw, não afirmação jurídica da igualdade, porquanto inclusive participavam do
fica atrás no sentir o desprêzo que a Europa votava àqueles que aqui mesmo "ethos" dos segmentos com posição política alta, a afirmação
nasceram e em ter consciência da necessidade de proclamar a supe- política dos dominados pela Coroa não teve de estribar-se na conde-
rioridade do americano sôbre o europeu, no que é seguido por Paine, nação da superioridade verbal dos inglêses; pelo contrário, a insurrei-
que demonstra a excelência do Nôvo Mundo, "abrigo dos perseguidos ção se fêz tão-somente em têrmos políticos, como se pode vet pela
defensores da liberdade civil e religiosa de tôdas as partes da Europa. "Declaração da Independência", em que se expõem as razões que leva-
Para cá acorreram, não vindos do terno regaço matemo, senão da ram os futuros estados confederados a sublevar-se: "A história do·
crueldade do monstro ... Nesta extensa parte do globo, esquecemo-nos atual ·rei da Grã-Bretanha é uma história de agravos e usurpações
dos estreitos limites de 360 milhas (extensão da Inglaterra), e firmamos repetidas, que têm como objetivo direto estabelecer uma tirani~ abso-
a nossa amizade em escala mais ampla; reivindicamos fraternidade luta nestes Estados" .'•0 Mas exatamente pelo fato de o conflito ser
com qualquer cristão europeu, e exUltamos com a generosidade de tal visto apenas como politico, é que desde o início a causa da oposição
sentimento".148 E a um "indivíduo metafísico como o Sr. Burke", o à Inglaterra teve de ganhar politicamente as consciências, especialmente
autor de Common Sense mostrava que se os governos da Ásia, da aquelas que se poderiam contentar, como muitas haviam feito até
África e da Europa tivessem começado "com um princípio semelhante
148 oerbl, La Disputa deZ Nuevo Mundo, cit. Segundo o A., as Notes on Virgi-
ao da América, ou não houvessem sido muito cedo desviados dêles, nia de Jefferson respondem diretamente às teorias de BU!fon e se constituem numa
hoje tais países se achariam em condição assaz superior àquela em que secção representativa de tôda a América Setentrional. A propósito da reação norte-
-americana à "legenda", Gerbi refere a seguinte anedota de um jantar oferecido por
se encontram". 147 Franklln ao abade Raynal e alguns franceses e norte-americanos: "O abade entregou-
-se a uma de suas habltuals tiradas oratórias sObre a degenerescência dos anlmals e
Em um e em outro, como assinala Gerbi para o caso de Jefferson, do homem na América. o anfitrião, com seu costumeiro sorriso de bondade, propõ.s
resolver emplrlcamente a questão: 'let us try thls questlon by the fact before us ·
é patente que, ao fazer a Revolução e especialmente ao adotar a Cons- Fêz que se levantassem seus convidados e aconteceu que todos os americanos eram
tituição Federal, os norte-americanos demonstravam uma consciência altos e robustos, e os franceses singularmente minúsculos: o abade, desde logo, era
um sl.mples camarão ('a mere shrlmp'). Raynal defendeu-se. falando cortêsmente de
clara de que a filosofia inglêsa havia emigrado para a França, sua 'exceções', e, segundo outra versão. nada lnverossimel, objetando que os fatos e os
exemplos contam pouco em filosofia, para a qual valem apenas os conceitos e as
liberdade para a América, e que o sol de sua glória descia ràpidamente idéias: como se a tese bUffon-depauwlana já se tivesse transformado em exigêncl~
lógica que devia servir para dar coerência ao mundo, portanto em um artigo de fe
o horizonte, cabendo a Nôvo Mundo ser o herdeiro do gênio do mons- ao qlÍal não vale opor fatos meramente reais ... " (pág. 223). A análise da reação
de Palne e Jefferson à "legenda" vem das págs. 225-44 na obra citada.
145 Alexander Hamilton, "The Federallst, n.o 11", in The Federalist, The Modern 149 Apud Ekirch, cit., pá.g. 48. M 1s D
Library, Nova York, S/d, pág. 69. 150 "Declaração de Independência. 4 de Julho de 1776'',.ln Richard B. orr ' o-
146 'I'homaa Palne, Senso Comum, !brasa, São PaUlo, 1964, pág. 19. cumentO!J Fundamentale8' de la Historia de los Estados Uniàos de Ame7ica, Edltorlal
147 Paine, "Direitos do Homem", in Senso Comum, cit., pág. 105. Libreros Unidos Mexicanos S. A., México, 1962, págs. 41-7. A citação está à pág. 43.

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então, com uma "reparação nos têrmos mais humildes" - nesse pro- monárquico e a estabelecer por tôda a parte o regime democrático que
cesso de conquista da hegemonia devendo ser verbalizados os conteú- haviam criado ex-nihilo, partindo do simples princípio de que a repú-
dos da nova consciência que se fazia mister adquirir para partir para blica federal era o regime que melhor se adequava à espécie humana
a cruzada. Foi a necessidade de conquistar o grande número para a desde que ilustrada. A missão escatológica e a realidade da vida
causa da Revolução, cujos objetivos se inscreviam entre os valôres observam-se assim no plano das decisões de Estado, que a essa última
reconhecidos da consciência coletiva comum a todos, que levou os devia atentar solicitado pelo Espaço imenso, que se era promessa de
grandes propagandistas da época a encontrarem na igualdade prome- novas riquezas e caminho aberto à afirmação da liberdade do grande
tida das condições o solo em que germinasse, desenvolvendo-se a ponto número, e era também fonte segura de conflito com a Europa da qual
de tornar parte integrante da consciência coletiva da Nação, a idéia se desejava, exatamente, manter-se afastados. A predicação do isola-
de que em vez de ser inferior por colonizado, o homem americano era mento iguahnente feita por Jefferson - "Pois embora seja decidida-
superior aos europeus e por extensão aos demais povos pela natureza, mente de opinião que não deveremos participar das contendas na
pelo clima, pela extensão do território e, sobretudo, pelas instituições Europa, e sim cultivar a paz e o comércio com todos . .. " - chocava-
políticas que estava criando e dando como exemplo ao mundo. Paine -se, já para o autor das "Notas sôbre a Virgínia", com a realidade
afirmava nos Direitos do Homem: "O que Atenas foi em miniatura, maior da atividade econômica, a qual acabaria impelindo os Estados
será em escala grande a América. Uma maravilha do mundo antigo; Unidos a participarem dessas contendas tão temidas - " ... quem pode
outra vai-se tornando admiração e modêlo do presente" .151 evitar ver a fonte da guerra na tirania daquelas nações que nos privam
Essa consciência da superioridade e da missão redendora, porque do direito natural de comerciar com nossos vizinhos . .. " 153 - , e tam-
reformada e civilizadora, não corresponde a um sentimento coletivo bém com a presença das colônias inglêsas, francesas e espanholas no
no momento em que se propõe ao povo recém-independente - mas é Continente. E por isso significativo o fato de ter sido Jefferson -
uma semente que não morrerá jamais com o passar dos anos e que, cujas idéias, para os Federalistas, eram jacobinas e atéias - quem
lançada à terra por Hamilton, Paine e Franklin no último quartel do tenha proposto ao Gabinete, em 1808, que o govêrno que presidia
século XVIII, explode exuberante na última década do século XIX, fôsse autorizado a comunicar aos notáveis de Cuba e do Méxiw que
quando o êxito da democracia norte-americana é explicado por Andrew os Estados Unidos ficariam contentes se aquelas colônias permane-
Carnegie em função da "raça anglo-saxã, do superior meio físico da cessem sob o domínio da Espanha, mas se sentiriam chocados se pas- .
América do Norte e da dádiva da cidadania igual para todo o povo" .152
sassem para o dominio ou ascendência da França e da Inglaterra. E
mais, que na hipótese de escolherem o caminho da Independência,
2 - O complexo expansionista a ação norte-americana seria influenciada pela "forte repugnância em
vê-los sob a subordinação seja da França, seja da Inglaterra, política
O processo da expansão territorial dos Estados Unidos só poderá ou comercialmente".'" E que êle - que julgava ser o comércio o
ser cabalmente compreendido se se tiver em mente os elementos es- caminho que conduziria fatalmente os Estados Unidos à guerra, no
pecificamente ideológicos (mas inscritos no que se poderia dizer os instante em que a produção fôsse superior ao consumo interno -
valôres básicos da consciência coletiva) atrás referidos, e aquêles tinha presente que a insurgência do povo espanhol na Peninsula Ibé-
subjacentes ao conflito espiritual em que sempre se debateu o povo rica e as revoltas que seriam de prever-se nas colônias espanholas da
norte-americano desde a Revolução: o comércio e a missão redentora. América trariam, desde que os crioulos não optassem pelas duas gran-
O comércio, a que se devotava e do qual extrafa parte de suas riquezas, des potências da época, algumas vantagens notáveis para a segurança
aproximava o povo norte-americano de outros povos e fazia da guerra nacional (ainda em risco diante do poderio britânico) e para a expan-
seu destino natural e fatal - donde a recomendação ao isolamento são do comércio norte-americano: peJ?IlÍtiria a anexação das colônias
dos negócios da Europa presente no discurso de despedida de Washing- espanholas fronteiriças (objetivo de sua atividade diplomática desde a
ton. Mas, paralelamente a essa aproximação incoercível e a êsse desejo
Compra da Louisiana, em 1803), a abertura das demais colônias espa-
afirmado de isolamento, havia a consciência da herança recebida do
nholas ao comércio norte-americano e a eliminação da influência
gênio inglês, a qual se transmutava em quase chamado divino, obri-
gando os Estados Unidos a redimirem a humanidade do absolutismo 153 carta de Jefferson a Washington, datada de Paris, 4 de dezembro de 1778,
in Escritos Poltticos, Ibrasa. São Paulo, 1964, pá.g, 143.
151 Thomaa Pa.lne, Direitos cto Homem, cit., pá.g. 120. 154 samuel l"lagg Beml.s, The Lattn America-n poltcy oi the Un-ited States, Bar-
152 Cf. Ektrch, op, cit., pá.g. 161. court, Brace & Co., Nova York, 1943, pá.g. 27.

120 121
européia no Nôvo Mundo, a qual era sentida como capaz de colocar na natureza mesma da nova Nação: o comércio e a segurança interna
em risco as instituições recém-estabelecidas e sôbre cuja fortaleza se das novas instituições.
levantavam dúvidas suficientemente amplas para que a elas Jefferson A igutildade de condições é o mito que autoriza a expansão conti-
se referisse em seu discurso de posse de 180 I : "Sei, em realidade, que nental e fornece, revestida do caráter de missão redentora dos demais,
alguns homens honrados temem que um govérno republicano não possa a visão messiânica do futuro de um povo inicialmente isolado nos
ser forte, que êste govêmo não seja o bastante forte. . . Confio em estreitos limites das 13 Colônias e temente do contato com o Exterior,
que não seja assim" .155 fonte de preocupação e goerras. Foi o mito da igualdade de oportu-
O comércio é, assim, um dos elementos integrantes do complexó nidades, associado ao sentir-se superior aos europeus pelas institui-
determinante da expansão, e a êle devem ceder todos, inclusive Jeffer- ções políticas, que fêz a conquista do território e o domínio do Espaço
son, apesar de morahnente causar-lhe repugoância o destino que vis- constituírem-se na possibilidade da afirmação democrática do grande
lumbrava para seu povo: "Os verdadeiros hábitos de nossos compa- número excluído do sufrágio e do govêmo pelas condições restritivas
triotas, entretanto, prendem-nos ao comércio. Eles o exercerão por si que cada Colônia e depois cada Estado se reservava o direito de
mesmos. As goerras fazem parte de nosso destino ... ". 156 Antes da estabelecer. A conquista dos novos territórios (por mera ocupação,
segunda goerra com a Inglaterra, já ocupada a Flórida Ocidental em cessão mediante tratados, ou conquista militar) foi, mais que um ato
1810, a segurança interna e o comércio voltam a aparecer como deter- de fuga ou isolamento do conjunto da sociedade, hnpôsto pelas condi-
minantes conscientemente reconhecidos da ação política externa norte- ções políticas exemplarizadas nas diferentes Constituições estaduais,
-americana. Não mais, no entanto, ao nível das decisões de Gabinete, a afirmação dos ideais democráticos inscritos na Constituição Federal
autorizando e instmindo representantes presidenciais em suas negocia- e que pouco a pouco vão sendo aceitas pelos Estados federados. O
ções com os crioulos rebeldes; a "Non Transfer Resolution", de movhnento de expansão pelo território estêve asshn sempre associado
1811, é uma decisão política do Congresso, a qual, embora adotada à realização dêsses ideais - voto e propriedade - , e a própria ocupa-
por solicitação de Madison, compromete o Executivo e o Estado como ção de novas terras afigurou-se como a condição de os ind\víduos
um todo, fundamentando as ações futuras: "Levando em conta a pe- poderem estabelecer sua liberdade social. Ao invés de se verem reali-
culiar situação da Espanha e suas províncias americanas, e conside- zados os receios dos "Founding Fathers", que, como assinala Ekirch,.
rando a influência que o destino do território adjacente à fronteira temi'!!O que com a extensão da Nação por sôbre um território tão
sul dos Estados Unidos pode ter sôbre sua segurança, tranqüilidade vasto se perdessem os direitos individuais, aconteceu o contrário: a
e comércio, o Senado e a Câmara dos Representantes do Congresso expansão foi a condição da liberdade social e poli!ica e foi graças a
dos Estados Unidos resolvem que os Estados Unidos, nas peculiares ela que o conceito da democracia jeffersoniana, em que o Indivíduo
circunstâncias da crise presente, não podem, sem séria inquietação, primava sôbre o Estado, foi superado na revolução da Era Jackso-
ver qualquer parte do referido território passar às mãos de qualquer
niana, quando o Estado, embora ainda hesitante, inicia sua marcha
potência estrangeira; e que a consideração devida pela sua segorança
para reduzir o universo político sonhado por alguns.
os compelem a providenciar, sob certas contingências, a ocupação
A realização da igualdade de condições confundiu-se, assim, ao
temporária do referido território; ao mesmo tempo, declaram que o
nivel da consciência expressa, com a conquista te"itorial e a expansão
referido território deverá, em suas mãos, continuar sujeito a futuras
negociações" .157 concomitante do comércio e da atividade econômica em geral. Esta
Da conquista da Flórida, em 181 O, à goerra com o México, em é a razão que explica porque. a vocação imperial coexistiu com a visão
1896, a qual termina com o reconhecimento da anexação do Texas da igualdade e com a missão redentora dos demais povos: como a
à União e a cessão de boa parte do território mexicano no extremo defesa das instituições republicanas contra as potências européias e a
oeste, a política norte-americana com seus vizinhos do sul será orien- afirmação da liberdade consagrada no texto constitucional só se pude-
tada por êsses dois elementos, que se diriam permanentes por estarem ram dar mediante a ocupação dos territórios estrangeiros limítrofes,
a expansão tomou-se parte integrante do "ethos" do povo norte-ame"
155 "Discurso de Jefferson ao assumir a Presidência, 4 de março de 1801", in
Morris, cit., pág. 130. ricano e foi vista como natural, na medida em que era a condição
156 Jefferson, "Notas sõbre a Virgínia", quesito XXII in Escritos Políticos, cit., conscientemente reconhecida da afirmação da superioridade de insti-
pã.g. 174.
157 Citado em Bemis, op. cit., pág, 29. tuições políticas democráticas.
122 123
Nesse quadro, o comércio, por ser moralmente condenado como estendendo-se do Atlântico ao Pacífico, a qual, se havia feito da expan-
causa e fator de guerra, foi sempre visto como o sócio menor da são territorial no continente o seu Destino Manifesto até meados do
expansão. Não que fôsse esquecido - minimizar sua importância seria século XIX, deveria aceitar seu corolário inevitável, que era assegurar
estabelecer um manto impeditivo da transparência da conduta de quem as comunicações entre as duas costas: "O estabelecimento de uma Re-
se julga superior e votado a ensinar aos demais povos a arte de auto- pública Continental foi na verdade o Destino Manifesto dos Estados
governarem-se de acôrdo com os postulados da Razão e os ditames Unidos, o fundamento de tôda a nacionalidade e seu poder no mundo,
do Senhor. Furulamenta/mente, da "Non Transfer Resolution" a Theo- e devemos considerar o contrôle das comunicações entre as duas costas
dore Roosevelt, a segurança interna é o móvel consciente da expansão, através do Istmo como se tendo tornado um complemento fundamental
seguindo-se a ela o comércio e vindo depois, para consôlo de alguns do Destino Manifesto . .. ".160
poucos saudosistas do isolacionismo de Washington, ou da pureza São as exigências do Espaço, uma vez mais, que vão determinar
doutrinária de Jefferson, a missão civilizadora. E wna política externa a política norte-americana com relação a seus vizinhos depois de com-
que se traça e se faz sem "slúbo/etts", porquanto é consciente da, pletada a ocupação territorial. Não se trata, após a Guerra Civil, de
fôrça que a inspira - ela própria decorrência do Espaço que se con- defender as instituições republicanas contra o absolutismo monárquico
quistou, afirmando-se a liberdade dos que podiam sobreviver. Mas europeu - a aventura de Maximiliano no México não consegue levar
é também, impõe-se reconhecê-lo, uma política externa que só se o govêrno à intervenção, apesar da pressão do general Grant, dos que
compreende se se tem em mente a preocupação maior que vem dos a Guerra Civil havia deixado sem outra função e objetivo que a carrei-
"Founding Fathers": que o govêrno republicano não seja forte o ra das armas e daquelas que iam buscar a "Doutrina Monroe" o
suficiente para manter unido o Continente em uma mesma Nação, e fundamento para realizar a intervenção e uma eventual anexação; trata-
que as facções que nêle podem organizar-se realizem "uma conexão -se, isto sim, de assegur,ar a defesa das comunicações entre o Atlântico
apóstata e antinatural com qualquer potência estrangeira", 108 cuja e o Pacífico, afastando de seu contrôle qualquer influência européia.
influência deve ser, portanto, afastada da América, isto é, das frontei- O próprio episódio da guerra contra a Espanha, que marca o início
ras norte-americanas. É por isso que a "Doutrina Monroe" serve, em da era do imperialismo, só é possível de acontecer da forma IIJ.Ue se
sua forma original, apenas aos propósitos de manter afastada das deu: uma campanha em que o povo entre "alegremente na guerra com
fronteiras a influência política das monarquias européias, fazendo do a Espanha com o único objetivo de libertar Cuba da tirania espanhola",
isolacionismo a condição da solução dos problemas internos mais pre- enquanto alguns líderes como Roosevelt e Lodge, que partilhavam das
mentes e da consolidação da unidade nacional. Até que se dê a teorias de Mahan sôbre a supremacia naval, "saudavam a guerra como
ocupação do extremo oeste pela incorporação dos territórios do Ore- uma oportunidade de conseguir bases nas Antilhas e no Pacífico. Pre-
gon e os mexicanos, a famosa declaração do presidente James Monroe vendo o dia em que os Estados Unidos constituiriam um canal no istmo
ao Congresso, em dezembro de 1823, traduz uma posição meramente e necessitariam de bases navais para protegê-lo, defenderam a anexa-
defensiva em politica externa, sendo o fundamento juridicamente falho ção de Pôrto Rico, outra possessão espanhola nas Antilhas, e a con-
(da perspectiva do Direito Internacional e do próprio Direito norte- servação de bases navais em Cuba".l6 1
americano) do desejo de preservar a forma republicana de govêrno Em 1898, quando a expansão imperial coincide com a explosão
contra os assaltos mais temidos do que reais do absolutismo monár- industrial e comercial, que de 1861 a 1901 faz dos Estados Unidos
quico europeu. o principal produtor industrial e agrícola do mundo, o comércio vem
Em 1853, com a Compra Gadsden, que incorpora à União os airula em segundo lugar na consideração da política exterior, primarulo
territórios que constituem a atual parte sul dos Estados do Arizona essencialmente os motivos especificamente estratégicos e, em alguns
e do Nôvo México, os Estados Unidos completam aquêle Destino que casos, os políticos e humanitários. O motivo disso é simples: apesar
John Quincy Adams dizia ser seu, anos antes: "O mundo [deve] de no período entre 1850 e 1920 haver-se invertido o sentido da
familiarizar-se com a idéia de considerar o Continente da América do balança comercial, as exportações superando as importações em quase
Norte como nosso próprio domínio".H'i9 São uma república continental, 3 bilhões de dólares, a tonelagem da marinha mercante engajada na
navegação exterior havia caído depois da Guerra Civil e, fundamen-
158 "Discurso de Despedida de Washington, 17 de Setembro de 1796", in Morris,
cit., pl\g. 117. A preocupaçê.o das "facções" é também presente em John Jay, in 160 Ibidem, pãg. 93.
Federalist. 161 Arthur S. Llnk e Willtam B. Catton, História Moderna dos Estados Unidos,
159 Apuà Bemls, op. cit., pág. 74. Zahar, Rio, 1965, L pá.g. 231.

124 12~
ocupa, longe de achar-se êste [engrandecimento] no ponto máximo de de sentido, pois o que fôra um movimento imperial inspirado na
onde arranca o eclipse ou a imobilidade, começa apenas a conbecer observação do Espaço e na compreensão da necessidade de criar a
as molas de seu organismo férreo. A vitalidade e o poder que o ianque Marinha capaz de defendê-lo e à civilização e ao comércio que nêle
exterioriza só podem ser considerados como indícios. A fôrça, que floresciam (seguindo, pois, o contrário do conselho de Jefferson), trans-
soube tirar do nada o estado atual, conseguírá com maior razão, como form~se em um movimento em que o capital se ampara no Estado
os especuladores hábeis, produzir o rendimento supremo para seu te- para realizar seus objetivos, sempre apresentados como coincidentes
souro. Ninguém pode, pois, prever onde se deterá a energia que avança, com a estratégia global norte-americana, especialmente nas Antilhas.
capitalizando interêsses e multiplicando seu volume em um ímpeto verti- A intervenção de 1898 e o estabelecimento da Pax Americana abriram
ginoso. O único que cabe afirmar é que, lâmpada ou sol, os Estados o caminbo à penetração maciça do capital norte-americano no Mare
Unidos irradiam sôbre nossas repúblicas, que parecem, em compensa- Nostrum e no govêrno Taft (1909-1912), êle já estava em condições
ção, segundo a distância ou o volume, maripôsas ou satélites" (apud 11, de disputar a praça aos capitais europeus aplicados nas Antilhas e na
91). América Central, contando para isso com o apoio de setores domi-
Foi a situação de "maripôsas ou satélites" que as oligarquias nantes nacionais. Em 1914, os investimentos norte-americanos em Cuba
do início do século, especialmente no Mare Nostrum definido pelo e nas lndias Ocidentais eram quase sete vêzes maiores do que em
Corolário Roosevelt à "Doutrina Monroe", 166 escolheram como sua-
1897, enquanto na América Central haviam pràticamente dobrado no
e foi ela que facilitou, pelo jôgo dos conflitos internos, a progressiva
mesmo período. Na América do Sul, a substituição dos capitais euro-
dontinação norte-americana sôbre as Antilhas e a América Central,
estendendo-se paulatinamente ao resto do Continente. A situação, aliás, peus também iam crescendo: no ano da abertura do Canal havia 365,7
não era nova: o golpe de Roosevelt no Panamá fôra imediatamente milhões de dólares aplicados no continente - quase dez vêzes mais
sacramentado por tôda a América Latina, cujos governos - exceto o
que em 1897. Nas vésperas da Segunda Guerra Mundial, mais que
da Colômbia ( et pour cause) - reconheceram a nova república nascida dobrara com relação a 1914 o volume dos capitais aplicados nas
dos manejos de Bunau-Varilla e do "lobby" da Companhia do Canal Antilhas, e se haviam multiplicado por sete os investimentos na Amé-
nos Estados Unidos. Observe-se, no entanto, que no México, onde no rica do Sul: 2 513 milhões de dólares. '
inicio do século os investimentos norte-americanos eram quatro vêzes A pauta do comércio exterior dos Estados Unidos permite dar
superiores aos feitos em Cuba e nas lndias Ocidentais e quase decupli- a exata medida da importância econôntica do mercado sulino para o ·
cavam aquêles realizados na América Central, a firme deterntinação capital norte-americano: de 1820 a 1940, as exportações para a Amé-
de Carranza de impedir que uma potência estrangeira influísse nos rica Latina variam entre 10% a 19% do total de exportações dos
destinos da revolução foi suficiente para mostrar até que ponto o Estados Unidos, chegando a 19,7% no período 1915/1920, enquanto
poder nu pôde ir tendo a oposição daqueles a quem pretendia impor as importações de produtos latino-americanos variam de 30% em
normas democráticas de bem viver, e contando com a oposição da 1876/1880 a 23,4% em 1936/1940, chegando a 36% no referido
opinião pública doméstica. período de 1915/1920. 16' No ano de 1929, a Europa absorvia 44,7%
das exportações norte-americanas, a América do Norte (Canadá e
México) 26,6%, a Ásia 12,3% e a América Latina (excluído o
3 - O triunfo da oligarquia México) 10,3%. Embora os dados não se refiram aos mesmos perío-
dos, é interessante assinalar que, em 1914, os Estados Unidos tinbam
Com a guerra de 1898 e a conquista do Canal em 1903, o nôvo aplicados, em inversões diretas e títulos, 691,8 milhões de dólares na
"Destino Manifesto" encarnado por Maban, Lodge e Roosevelt chega Europa, contra 1 648,7 milhões na América Latina, dos quais 853,5
ao fim - mas o processo expansionista não se detém, apenas muda no México, seu campo de inversões preferido apesar da instabilidade
166 Em sua mensagem de 1905 ao Congresso, Roosevelt estabeleceu os prtncipios
política; em 1940, a Europa entrava na pauta de aplicações com
que passaram a constituir o "Corolário Roosevelt" à "Doutrina Monroe": para evitar 2 006 milhões e a América Latina com 4 023 milhões, dos quais 676
que qualquer potência européia controlasse as alfândega-s de qualquer pais ameri-
cano (especialmente nas Antilhas), a fim de assegurar-se o pagamento de dividas, no México e América Central e 834 milhões nas Antilhas. Esses dados
os Estados Unidos propuseram-se a assumir a fUnção de cobradores internacionais e parecem sugerir que mais que mercado para produtos manufaturados,
garantir êsses débitos, pelo contrôle das aduanas e, se necessário, pela ocupação mi-
litar. Foi a fase do biu stick, quando os Estados Unidos se transformaram na- "Poli-
ela do Ocidente". Sôbre a "Doutrina Monroe" e sua evolução até tempos recentes, 167 Cf. Dexter Perklns, Tne United States anã Latin Amertca, Loulslana State
vide Dexter Perkins, Historia de la Doctrina Monroe, Eudeba, Buenos Aires, 1964. University Presa, Baton Rouge, 1691, pâg. 89 e segs.

128 129
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Latina tendeu a ser uma área de preferência para a aplicação direta nos Estados latino-americanos, a circunstância de, a partir de 1930,
de capitais excedentes, setorialmente em virtude da alta rentabilidade haver mudado a origem do financiamento das inversões diretas, 168
que lhes oferecia, graças especialmente à renda assaz alta da terra, ao foi mais importante que a ocupação setorial condicionada pela renta-
~aixo custo dos fatôres de produção em geral, à desorganização polí- bilidade do setor, ou pela posição de monopólio que as emprêsas
tica da classe trabalhadora (a qual não podia impor a modernização podiam ocupar no oferecimento de bens e serviços no mercado. Isso
das técnicas para que se mantivesse estável a taxa de mais-valia rela- porque aquêles capitais que eram antes levantados no mercado finan-
tiva) e a um sistema tributário altamente oneroso para o consumidor, ceiro de origem, passaram a sê-lo no de aplicação, disputando aos
mas não gravoso para o produtor. nascentes setores médios o pouco capital disponível após o financia-
Se assim é, a ação governamental nas Antilhas e na América mento da agricultura e o consumo ostentatório dos setores dominan-
Central no período subseqüente a Roosevelt, afora não descurar do tes que "levantavam empréstimos sôbre as vendas em perspectiva,
problema do canal (complicado pelo tratado Bryan-Chamorro, que para edificar residências nas cidades e enviar suas famílias à Europa" .169
dera aos Estados Unidos a concessão de uma rota alternativa através Até 1930, segundo Felipe Pazos, o financiamento das inversões
do território da Nicarágua), dirigiu-se, pelo estabelecimento da Pax
diretas foi feito por particulares norte-americanos que dispunham de
Americana, mais a garantir os investimentos, e se possível sua renta-
bilidade, que pràpriamente a abrir as portas do mercado latino-ame- fundos abundantes e baratos; depois de 1930, no entanto, "essa prá-
ricano aos produtos manufaturados norte-americanos. Nesse quadro, tica foi progressivamente abandonada e os empréstimos se obtiveram,
convém assinalar que o México, o Canadá, a Terra Nova e a Europa sempre que possível, no país onde se invertia, ainda que a taxa de
são os territórios preferidos pelos investidores norte-americanos quan- juros fôsse mais alta e os fundos mais difíceis de obter. E-sse deslo-
do se dá o início da expansão no fim do século XIX (504,9 •milhões camento produziu-se como conseqüência do temor à nacionalização,
de dólares, dos quais 200 no México, contra I 08, I milhões aplicados aos contrôles de câmbio e à depreciação monetária, o qual induziu
nas Antilhas, América Central e América do Sul), e que, quando os empresários a reduzirem sua contribuição ao mínimo. No caso de
as aplicações diretas tendem a aumentar no sul, o capital já não tem depreciação monetária, a contratação de empréstimos no mercado
de se defrontar com uma economia natural, que se faz mister vencer local é uma boa prática financeira, porque é bom negócio tomar em-
para realizar a mais-valia produzida nos Estados Unidos, mas com prestado em uma moeda que se está depreciando. Nos paises df infla-
uma economia de produção simples de mercadorias apta a aceitar - ção, a taxa de juros é alta, mas geralmente não o suficiente para
tôdas as condições sendo tidas como ótimas - sua transformação em compensar a diminuição do valor, em têrmos reais, das somas em;
economia de mercado. O capital norte-americano, nessa ocorrência, prestadas; de fato, a taxa de juros em têrmos reais é às vêzes nega-
apenas substituiu o capital europeu no contrôle que exercia sôbre tiva';.17o Foi essa circunstância, entre outras determinantes, que con-
diferentes ramos da economia da América Latina - e o substituiu duziu a que o processo de oposição ao uestrangeiro", inicialmente pro-
apoiado num poderio econômico e numa presença militar que a Euro-
168 ar. Felipe Pazos, "Inversiones Publicas vs. Inversiones Privadas", comuni-
pa já não tinha. cação à Conferência. da. Associação Econômica Internacional, Rio de Janeiro, 1957,
As condições gerais da economia latino-americana, desde a Colô- tn EZ Desarrollo Ecanómico '11 América Latina, FCE, México, 1960, plt.g. 239 e segs.
Para. o A., a "inversão direta é uma. atividade empresarial reallzad~t por grandes
nia voltada para o mercado externo e ainda periférica no século XX, corporações que dispõem de tôda.s as condições e fac111dades - organização, expe-
determinaram os ramos em que os capitais norte-americanos se apli- riência, perfcta. técnica. e administrativa, patentes. marcas de fábrica, rêde de distri-
buição, etc. - para estabelecer novas unidades de produção, ou expandir as exl.s-
caram de 1898 a 1930, no amanhecer da crise: a agricultura, o petró- tentes com grandes possibil1da.des de êxito" (pág. 253). Os dados sõbre a. aplicação
setoriaJ. são do mesmo Autor, op. cit., pág. 259.
leo, a mineração, as estradas de ferro e os serviços públicos ( 93% 169 Cf. John J. Johnson, La Transtormactón Polttica de América Latina, Ha.-
chette, Buenos Aires, 1961, Segundo o A., "os setores médios são, evidentemente,
do total das aplicações em 1914 e 89% em 1929), controlando em qualquer coisa menos uma. camada social homogênea.. Não preenchem a. condição
boa parte êsses setores. As inversões nesses ramos continuaram en- central da classe: seus membros não têm uma. base comum de experiência.". O
A. reconhece que a. expressão "setores médios" é muito ampla., ma.s não encontra.
quanto êles apresentaram boas condições de rentabilidade, e tenderam outra capaz de definir grupos ligados pela educação, pelos preconceitos, pela. con-
duta, pela forma. de vida., pelo meio ambiente e pelos sentimentos estéticos ~
a diminuir ràpidamente quando se tornaram menos rentáveis (exceto religtosoe. Antes da transição para o semi-industrialismo, eram compostos de pro-
no caso da agricultura, onde, apesar da alta rentabilidade, as aplica- fissionais liberais, professôres, escritores e artistas; burocratas, membros do clero
secular da. Igreja Católica. e os graus médio e inferior das Fôrças Armadas, Com o
ções diminuíram de 1914 a 194415 3 de 19% para 5% do total das advento da industrialização, passaram a. ser integrados também por comerciantes.
industriais, dirigentes de emprêsa., técnicos e cientistas.
aplicações, tendo atingido seu máximo em 1929, com 24% ). 170 Cf. FeUpe Pazos, op. cit., pág. 243.

130 131
posto em têrmos culturais e étnicos, ao assumir uma forma claramente do desenvolvimento de indústrias dirigidas para o mercado externo -
econômica não tivesse conseguido êxito no impor restrições e normas portanto teoricamente competitivas com as européias e norte-ameri-
à penetração do capital estrangeiro no momento em que os setores canas - e criou uma situação industrial anômala que fêz, a certa
médios ganhavam em influência, após haverem denunciados, antes e altura do processo, quando também os bens de consumo duráveis pas-
depois da Primeira Guerra, a "associação das velhas elites com os saram a ser produzidos internamente, com que o próprio capital
estrangeiros em uma 'vasta conspiração' tendente a impedir que as estrangeiro defendesse, em nome do "nacionalismo econômico", a
repúblicas imaturas alcançassem sua maior potencialidade".' 71 :É que manutenção do protecionismo.
o desenvolvimento industrial latino-americano, incentivado pela Pri- No processo que tentamos sumariar não se.deve partir do press_u-
meira Guerra e ainda mais pela Segunda, deu-se concomitantemente posto de que o capital aplicado n~m detemnn~do ramo mdustrial
ao aumento da participação percentual das inversões diretas norte- representa o capital total, ou o capttal geral aplicado num setor do
-americanas no setor secundário (1914, 3%; 1929, 6%; 1943, 11%, pais de origem. Não se trata, já tJi]ui, ·do capital que se exporta, se-
e 1944/54, 26%) e teve de servir-se de patentes internacionais que, guindo as leis da acumulação expostas por Luxemburgo: são corpo-
juntamente com os financiamentos levantados no mercado local, asse- rações que buscam novos mercados para investir e que procuram
guraram a integração dos setores médios no circuito internacioruú do fechá-los a outras corporações do mesmo ramo de atividades, as quais,
capital. Essa associação, pelo financiamento e pelas patentes, apenas pela concorrência, podem fazê-las perder sua posição no ~ercado. A
reforçou a influência que o capital estrangeiro tinha nos países latino- industrialização na América Latina tendeu a ser monopolista - ten-
-americanos. Realmente, de 1898 a 1930, os ramos escolhidos para deu, portanto, a ser estacionária do ponto ~e vista técni~~' yois~ :'ao
a aplicação direta, embora respondendo aos interêsses do capital, amparo de elevados impostos e outras restnções ou prmbtçoes a Im-
haviam permitido que os investimentos norte-americanos ficassem em portação [e também a novas ap~icaç~s], difund!_ram-se práticas limi-
condição de terem uma posição de monopólio na composição das tativas da concorrência [as quats cnaram sttuaçoes em que] ao lado
receitas cambiais de muitos dos Estados latino-americanos, graças de estabelecimentos bem dotados funcionam outros de elevado custo,
sobretudo à estrutura monoprodutora que encontraram ao se instalar. num equilibrio tácito de vantagens recíprocas, uma vez que ('esses]
E foi essa posição de monopólio que contribuiu para tomar evidente asseguram sua subsistência marginal e aquêl~s o ganho vultoso da
a influência política do capital estrangeiro, dada a dependência do diferença de custos". 17• A proteção alfandegána e os tmpostos garan-
erário dos impostos sôbre o comércio exterior. 172 tiram não apenas as nascentes indústrias criadas com o capital local,
Há um outro elemento a ser considerado na compreensão dêsse mas também aquelas que se instalaram com capital forâneo contra
longo processo em que o "ethos" próprio da oligarquia acaba por novos investimentos em ramo similar, os quais iriam disputar um mer-
triunfar, refreando a ação transformadora dos setores médios e do cado consumidor e supridor de capitais necessários ao funcionamento
próprio capital e isolando o proletariado urbano no conjunto nacional das emprêsas já instaladas. E ao mesmo tempo permitiram a ~anu­
do grande número: a industrialização "para dentro" incentivada no tenção de hábitos arraigados, todos contrári~s à reno;.açã? da. te~m.ca
instante em que a guerra, primeiro, e a crise de 1929, depois, tornaram por suposta desnecessária, quando não destru~dora do equilfbno tactto
difícil importar no ritmo anterior. Como assinala Prebisch, essa indus- de vantagens recíprocas" assinalado por Prebtsch. .
trialização subsidiada pelo protecionismo alfandegário conspirou con- Foi nesse quadro, em que o capital conservou e não destrwu seu
tra a economia, "urna vez que se desenvolveram atividades para o inimigo histórico, que êle regrediu como elemento transformador e
mercado interno, cujos custos - cotejados com o nível internacional perdeu sua fôrça transformadora - e foi a combinação da prática pro-
- são superiores aos de outras que não puderam se desenvolver" .173 tecionista, da situação de monopólio na composição das receitas cam-
Ao orientar-se para o mercado interno, essa industrialização descurou biais do Estado (e por via indireta da própria receita fiscal), do mo-
171 Cf. John J. Johnson, op. cit., pé.g. 62. nopólio das patentes e do "equilibrio tácito" entre as emprêsas margi-
172 Cf. Victor Alba., op. cit .• pé.g. 68. Segundo o A., a. porcentagem dos impostos
alfandegários na composição dos impostos nacionais era., no inicio da presente década.. nais e as tecnicamente avançadas com a tomada de empréstimos no
a seguinte: Argentina, 32,1; Bolivia., 50,6; Brasil, 11,8; Gh1le, 21,8; Colômbia, 33,8; mercado local que conduziu à ligação política do capital norte-ame-
Costa Rica., 57,6; República. Dominicana., 43,6; Equador, 41,2; El Salvador, 60,7; Gua-
temala, 63,6; Haiti, 65,2; Honduras, 55,9; México. 27,5; Nicarágua, 60,6; Panamá, 44,2; ricano com a oligarquia crioula, isto é, com os setores sociais com
Paraguai, 20,8; Peru, 21,1; Uruguai, 37,2; Venezuela, il.
173 Raul Prebisch, Din4mica cto Desenvolvimento Latino-americano, Edltôra
Fundo de Cultura., R1o, 1964, pá.g. 41. 174 Ibidem, pág. 62.

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a existência de cada um dos seus. E foi por isso que pôde mais fàcil- estruturas dadas como assentes passou a representar igual perigo para
mente servir de ponto de apoio para os setores mêdios se alçarem a manutenção do status quo. E a partir de 1930, quando o anarco-
a urna posição de dominação - não contra a experiência de vida da -sindicalismo cedeu passo ao bolchevismo ou às idéias gerais do fascis-
oligarquia, mas ao lado dessa experiência e do grupo que a tivera, e a mo e do nacional-socialismo alemão na inspiração doutrinária da
seu serviço. ação dos movimentos reivindicatórios, a satisfação das solicitações eco-
No seu caminho para o poder, agindo inspirados por uma visão nômico-políticas da classe operária passou a confundir-se com eventuais
segmentar-local e não uma visão de classe, os setores médios não triunfos estratégico-militares da União Soviética, ou do 111 Reich.
apenas se apoiaram no proletariado, que souberam mobilizar, 17 S como Compreende-se, pois, como o temor do capital norte-americano (que
também alteraram a posição política de seus estratos superiores, permi- era o mesmo dos setores médios e da oligarquia) de que uma reivin-
tindo que êles integrassem, ainda que em situação subalterna, os gru- dicação de direitos conduzisse à subversão social, se transmitiu ao
pos com posição política alta. A êsse processo, que não é estranha Departamento de Estado, e compreende-se também como o govêmo
a "revolução do consumo" que a inflação fêz presente na megalópolis norte-americano passou a ver em qualquer tentativa de mudança nas
latino-americana, somou-se a predominância do Estado na condução posições políticas na América Latina o perigo da presença ativa da
do processo social depois que se produziu a aliança objetiva entre Europa em território americano, com o risco de graves repercussões
os setores médios e os estratos superiores do proletariado. Sendo o sôbre a segurança das instituições da república continental.
apoio da classe trabalhadora urbana indispensável à manutenção de São êsses elementos que, combinados, explicam porque os Esta-
suas posições políticas diante das antigas élites, às quais pretendiam dos Unidos passaram de uma política de franca intervenção, inspirada
substituir sem subverter a estrutura social, os setores médios cuidaram em motivos fundamentalmente estratégicos no período de Theodore
de fazer que o Estado atendesse a uma série de reivindicações mais Roosevelt, de determinantes financeiros no govêrno Taft e critérios
gerais do proletariado urbano. Com isso, por outro lado, criaram um financeiros e redentores na admirústração Wilson, para uma política
abismo entre as condições de existência da classe trabalhadora urbana geral de retirada surgida no govêmo Harding, continuada no de Coolid-
e as do grande número perdido na imensidão rural, e, por outro, ge (apesar das intervenções realizadas nas Antilhas, nesse peJiiodo)
retiraram das reivindicações operárias seu caráter econômico-corpora- e terminada na administração de Franklin D. Roosevelt. No período
tivo, transformando-as em ações políticas que só podiam ser atendidas do segundo Roosevelt, a "Boa Vizinhança" e a ajuda militar - a·
pelo interêsse benevolente da burocracia do Estado. O proletariado, mauvãise conscience do Destino Manifesto e do big stick - consa-
assim, não teve de reivindicar contra o patronato e êsse, por isso, graram a não intervenção e o predomínio do status quo, vale dizer,
não viu porque se preocupar com a renovação das técnicas para a subordinação do capital ao etfws oligárquico e a vitória das sobre-
manter estável sua taxa de mais-valia relativa, porquanto os ajustes vivências da época colonial sôbre a racionalidade da economia e as
salariais passaram a ser decretados pelo Estado para todo o setor leis de expansão do capital. 179
econômico, mantendo-se o "equilíbrio das vantagens" referido mais A rigor, a consideração estratégica (a presença alemã, ou sovié-
atrás. tica em solo americano) influiu pouco no que Samuel Flagg Bernis
Antes de 1930, por seu isolamento, os protestos operários foram chama de "liquidação do imperialismo" promovida pelos republicanos
sempre vistos como atentados à ordem estabelecida, mesmo que as a partir de 1920 e acentuada por F. D. Roosevelt. O desejo de con-
reivindicações da classe trabalhadora visassem apenas a uma trans- servar o status quo e de não se imiscuir sobremaneira nos assuntos
formação da posição relativa dos grupos sociais na escala de fruição latino-americanos - deixando o jôgo político entregue apenas às fôrças
dos valôres socioeconômicos; depois de 1930, especialmente após a
associação dos estratos superiores do proletariado aos setores mêdios 179 Cf. Edwin Ll.euwen, "Armas y Política en América Latina", cit., pág. 233
e segs.: "Até 1938, o treinamento dos exércitos sul-americanos foi um couto exclusi-
no poder, qualquer movimento reivindicatório conduzido fora das vamente europeu, em que predominavam missões do Eixo. Os oficiais alemães e
italhtno.s completavam seu conselho mUltar profissional aos corpo.s de oficiais locais
178 Cf. Johnson, op. cit., págs, 65-6: O beiicismo da nascente fôrça operária com o doutrlnamento poiitico nazi-fascista. Com o fim primordial de fazer frente a
Industrial foi a principio perturbador para. os elementos responsáveis da SIOCiedade. essa ameaça subversiva, os Estados Unido.s começaram um programa de missões mi-
Tanto os setores médio.s, quanto a elite ao trataram rudemente. ( ... ) NA.o obstante, lite.·res na América Latina em 1938. ( ... ) A reorganização das fôrças annadas da
quando os setores médios, por sua vez, sairam para a greve e começaram a dar América Latina patrocinada peio.s Estado.s Unido.s nA.o foi empreendida com o único
direção aos operários da cidade, converteram sua aspereza em valor politico. Os propósito de ministrar aos 'bons vizinhos' meios de defender-se contra possíveis ata-
trabalhadores da.s indústrias prestaram em tOdas as partes uma vauosa contribuição ques inimigos do exterior. As armas eram igualmente importantes para a manuten-
às vitória& inicials dos dirigentes dos setores médio.s". Em Victor Alba, cit., hâ tam- ça.o da ordem interna e a estabilidade ameaçadas por possiveis intentos de subven~a.o
bém uma longe. anAlise dêsse processo. interna por parte do Eixo•·.

136 137
internas e isentando o Govêrno norte-americano do compromisso de
intervir militarmente - manifestou-se pela primeira vez na adminis-
tração de Theodore Roosevelt, em 1907. Após o armistício entre a
Guatemala, El Salvador e Honduras, conseguido graças aos bons ofícios
do México e dos Estados Unidos, celebrou-se uma conferência de
paz em que as partes se obrigaram por tratado a não reconhecer novos
governos estabelecidos por via revolucionária, enquanto não fôssem
legitimados por eleições livres. Embora não fôssem signatários dos
acôrdos de Washington, os Estados Unidos viram-se moralmente obri-
gados a respeitá-los por terem sido co-patrocinadores da conferência,
juntamente com o govêmo mexicano, na época presidido por Porfírio
11 PARTE
Díaz. Essa foi a famosa "Doutrina Tobar", por alguns qualificada de
doutrina da intervenção indireta que, caída logo em desuso, foi revi-
vida em 1923, quando os países da América Central assinaram, sob
a presidência dos Estados Unidos, treze tratados de paz e amizade, A REVOLUÇÃO E A ORDEM
o mais importante dos quais foi aquêle que Bemis chama de "o tra-
tado com os artigos anti-revolução". 180 A denúncia dêsse instrumento
por Costa Rica e El Salvador, em 1934, toma-o sem efeito, mas nem "Elevar el comunismo primitivo sin
por isso deixa de ser representativo, como o de 1907, da tendência destruiria, dei tipo tribu al de un
vasto estado, es la misma obra que
do govêmo norte-americano a manter, a pretexto de não retomar as realiza la naturaleza ai unir células
práticas intervencionistas, o status quo nas regiões em que a aliança sin matarias, para construir tejidos y
entre a oligarquia e o capital se consolidam. órganos. Miremos que los In~as reali-
E êsse longo processo que permite compreender o malôgro da zaron aquello de conservar y progre-
sar con un sentido poJ.ítico esencial."
"Aliança para o Progresso": desejosa de reforçar a imagem não-inter-
vencionista de F. D. Roosevelt, e impelida pela necessidade mais estra- Haya de la Torre
tégica que propriamente econômica de elevar o nível de vida das
grandes massas da América Latina, a administração Kennedy não
pôde realizar a revolução que julgava devesse ser feita, ainda que em
têrmos do atendimento das necessidades de expansão do capital. E
não pôde realizá-la porque o capital já se havia aliado à oligarquia,
e as tarefas de transformação das posições políticas internas foi entre-
gue, exatamente, aos governos egressos dos setores dominantes im-
pregnados por uma visão não-econômica das relações sociais e já
comprometidos, em função da manutenção da mesma estrutura de
poder, vale dizer, das mesmas posições políticas, com a oligarquia e o
capital norte-americano.

180 Sa.muel Flagg Bemis, "The Lattn-Amerlcan Policy o! the United States•·, cit.,
pàg. 208.

138
PRóLOGO

A discussão do problema da "legenda da inferioridade natural"


feita mais acima, permitiu verificar que na constelação política da
América Latina podem distinguir-se dois tipos de proposições teóricas
destinadas a fazer face à versão moderna da "legenda" e à penetração
do capital. A primeira, preocupada essencialmente com resgatar a
raça da acusação de inferioridade e incapacidade feita por alguns
setores dirigentes dos países hegemônicos no sistema mundial, relega
a plano secundário à transformação das posições políticas mternas.
Assim, ao dissociar a "legenda" das posições políticas relativas, corre,
ao menos na proposição teórica, o risco de vingar a etnia sem alterâr
as Condições sociais em que se fundamentam, exatamente, os críticos
da "incapacidade" natural dos latinos-americanos. A segunda associa
a redenção da raça e a elaboração de novos marcos culturais opostos
aos europeus à transformação das posições políticas internas e ao
combate ao imperialismo. São posições nitidamente diferentes: uma
preocupa-se antes de mais nada com a rejeição étnica, vindo a consi-
deração do problema político interno em seguida; outra funde as duas
questões em uma mesma proposição transformadora, tendendo nos
casos extremos a fazer do grande número, responsabilizado pela deca-
dência civilizatória da América, a alavanca da transformação social.
que vislumbra não só necessária, mas indispensável.
Uma e outra posição, no entanto, assumem diante do problema
da História e do Poder atitudes que, por serem mais gerais que aquelas
proclamadas diante dos problemas concretos, merecem ser analisadas
destacadas do contexto social em que se manifestam. São, na Política,
como que categorias gerais informando a ação; maneiras de ver o
mundo que antecedem a tomada de decisões e condicionam não ape-
nas essas, como tôda a prática a elas subseqüente. Elaboradas teõri-
camente diante das solicitações da vida social, ganharam vigência
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acessórios, cuja presença ou ausência não importa para a produção
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do fenômeno essencial que se considera" (Lalande). estruturas e portanto molda à sua maneira o pensamento e a ação
Da perspectiva da análise política, pelo contrário, a realidade coletivas. E é essa fé nos valôres grupais que permite entender em tôda
é uma totalidade dialética em que tôdas as gamas, todos os mvets a sua profundidade o funcionamento do princípio da comunicabilidade.
em que Gurvitch a decompôs,' estão em interação constante, espe- Essa conexão, êsse apêgo à realidade concreta total que nos
cialmente os símbolos, as idéias e os valôres coletivos que as inspiram, inspira e anima por suas contradições e pela miséria ou tensões que
e as instituições, as superestruturas organizadas nas quais se realiza gera, destarte deve ser vista, mais do que em têrmos do condiciona-
a continuidade das criações do espírito humano, a que nos referimos mento do ideal e dos valôres pelas situações de existência empiri-
anteriormente. Essa realidade total não se compõe apenas de elementos camente verificáveis, em função de dois elementos básicos presentes
racionais ou racionalizáveis - e a simples menção a valôres e idéias nos valôres e no ideal: a consciência que se tem da realidade (se
já traz implícita essa constatação. Afirmá-lo não implica em atribuir histórica, ou não, tendo sempre presente que a realidade e a história
um sentido ou valor transcendente a tais valôres; siguifica tão apenas cobrem aqui não apenas o evoluir dos fatos mensuráveis e das trans-
reconhecer sua existência e dela não prescindir na elaboração de uma formações estruturais, mas também as próprias idéias e valôres que
política, ou na consideração de uma dada conexão entre o pensamento dão aos homens sua razão de ser e existir) e a totalidade a que se
e a realidade. refere a ação. Dessa perspectiva, é fácil estabelecer a distinção entre
Gramsci tinha bem presente o problema, estudando as relações a Ordem e o "partido da ordem", desde que se parta do registro de
da filosofia da praxis com a realidade e o senso comum das massas, que a Ordem corresponde, enquanto valor, a um princípio que se
ao dizer que "nas massas enquanto tais, a filosofia só pode ser vivida encontra em qualquer Sociedade, independente do tipo de solidarie-
como uma fé. Que se imagine, de resto, a posição intelectual de um dade que a mantém unida e da fonna de orgauizar a existência ma-
homem do povo; os elementos de sua formação são opiniões, convic~ terial de seus membros; enquanto consciência da ação, a uma forma
ções, critérios de discriminação e normas de conduta. Qualquer inter- de consciência que se poderia definir como "histórica", isto é, que
locutor que sustente um ponto de vista oposto ao seu, se é intelectual- refere a ação presente a um passado ( valõres, idéias e estruturas) que
mente superior, sabe apresentar suas razões melhor que êle, e fecha-lhe a inspirou e a um futuro que dela resultará, e enquanto consilleração
o bico 'làgicamente', etc. ( ... ) Sôbre que elementos se funda, então, da totalidade, a uma totalidade que se resume no próprio processo
sua filosofia? E sobretudo, sua filosofia na forma, que tem para êle histórico. ·
a maior importância, de norma de conduta? O elemento mais impor-
tante é indubitàvelmente de caráter não-racional, de fé. Mas fé em
quê e em quem? Antes de tudo, no grupo social a que pertence, na 2 - As distinções essenciais
medida que, de uma maneira difusa, pensa as coisas como êle: o
Se a menção da Ordem traz imediatamente à idéia o "partido
homem do povo pensa que u'a massa tão numerosa não se pode
da ordem", isto é, no dizer de Marx, a "sociedade das emprêsas" e
enganar assim, de cabo a rabo, como pretendiam fazer crer os argu-
os defensores do status quo, é porque os que se contrapõem aos
mentos do adversário. . . Ele não se recorda dos argumentos em sua
"inimigos da sociedade" (os que, no quadro de 1848, se manifesta-
forma concreta, e não saberia repeti-los, mas sabe que êles existem
vam contra a organização sociopolítica vigente em nome da Revo-
porque ouviu-os serem expostos e êles o convenceram. O fato de
lução proletária), os defensores da "propriedade, família, religião e .
ter sido convencido uma vez de uma maneira fulgurante é a razão ordem" costumam associar a preservação de suas concretas e atuais
permanente da permanência de sua convicção, mesmo se essa última condições de existência social à alegada conservação dos valôres for-
não sabe mais encontrar seus próprios pensamentos" .8 A fé do homem jados ao longo da luta do Homem contra a Natureza e seus semelhan-
do povo, dos simples 1UlS criações do grupo social a que pertence, é tes, fazendo essa depender daquela.
assim para êle tão real quarúo o próprio grupo, talvez em alguns Para bem distinguir a Ordem do "partido da ordem", é necessá-
casos mais que êsse último. Ela faz parte da realidade e dela não ' rio ver que a identificação entre as instituições atuais e as criações
7 Cf. Georges Gurv1tch, Las Formas de la Sociabilidad, especialmente "Ensayo de espirituais do homem, ou, em outros têrmos, entre a manutenção de
una Cla.ssificaclón Pluralista. de las Formas de la Scclabllldad", Editoria-l Losada S/A. uma determinada posição na escala da fruição de valôres socioeconô-
Buenos Aires, 1941.
8 Gramsc1, op. cit., págs, 36-7. micos e a preservação da "sabedoria da espécie" tende a retirar do
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O fato de a Ordem levar à aceitação de as coisas se deverem possibilidade objetiva de se proporem transformações mais radicais
dispor segundo relações constantes não contradiz o que acima se disse nas relações básicas da associação humana. Com o que a visão histó-
sôbre a compreensão que tem do caráter mutante do processo e da rica que teoricamente distingue a Ordem do "partido da ordem" pod~
necessidade de inovar, que se apresenta às sociedades. Pelo contrário, conduzir aquela na ação transformadora nas sociedades periféricas,
é exatamente essa compreensão da constância das relações que con- se não a identificar-se com, ao menos a aproximar-se dêsse.
fere à Ordem a sua maior autenticidade, pois é ela que permite ver
as fases históricas se sucederem num continuo processo de evolução
e num inegável movimento tendente a realizar, no futuro, as aspira-:
ções do passado. A Hconstância das relações" não se confunde com a
~'permanência das instituições" - identifica-se, isto sim, com aquilo
que é suposto imutável no processo, vale dizer, com a necessidade
de a transformação das instituições dar-se apenas no instante em que
estiverem esgotados, na forma atual de que se revestem, os elementos
de sua legitimação perante a consciéncia dos homens. A Ordem defi-
ne-se, pois, como uma concepção globalizadora do processo, na qual
a totalidade a que se reporta a ação é referida à história, vista como
uma sucessão de formas sociais.
Quando se transfere o problema do plano teórico para o da prá-
tica, e tem-se sobretudo em conta a ação a ser desenvolvida nas so-
ciedades periféricas do sistema capitalista, a distinção entre a Ordem
e o "partido da ordem" torna-se mais difícil. ~ que tendo estabele- •
cido que o processo histórico é uma sucessão de formas sociais -
cuja necessidade será dada pela adesão, ou não, dos homens a elas - ,
a Ordem é levada a estabelecer, aliás coerentemente, que as institui-
ções vigentes nas sociedades periféricas só poderão ser transformadas
depois de essas sociedades terem vencido as etapas econômico-sociais
já superadas pelas hegemônicas para atingir o estágio superior em que
elas hoje se encontram. Ora, se na consideração meramente teórica
a distinção pode ser feita, na ação, a Ordem corre o risco de con-
fundir-se com o "partido da ordem" a partir do instante em que insiste
em que se as etapas evolutivas forem queimadas, a continuidade da
sucessão histórica será quebrada e não se poderá mais dar a adequa-
ção dos meios aos fins, na medida em que uma das partes do sistema
global se propõe dar, às suas instituições e às relações de existência
social nela vigentes, formas e conteúdos que são antecipações do porvir
do sistema global. Essas novas formas sociais, para a Ordem, não
podem afirmar-se porquanto não se apresentaram, no espaço-tempo
histórico em que vivem as sociedades periféricas, as condições sufi-
cientes (econômicas, sociais, técnicas e culturais) para permitir o
"salto", que há-de aproximá-las das sociedades hegemônicas, as quais
se encontram em outro espaço-tempo histórico e têm, portanto, a

152 153
2

A ORDEM E A REVOLUÇÃO

Na análise das situações concretas de existência social - espe-


cialmente na consideração das relações entre as sociedades hegemônicas
e as periféricas - , a Ordem constata desde o início a contradição
insanável entre a coerência do processo histórico (teõricamente dada)
e a incoerência do sistema ( emplricamente observada) . Na conside-
ração teórica, sendo o processo histórico visto como um todo, as so-
ciedades concretas são tidas como realizando formas sociais típicas,
as quais podem ser comparadas umas às outras em sua sucessão na
história. ~ essa comparação de formas sociais típicas e sua sucessão
que autoriza afirmar a coerência do processo, que só avança um passo
quando logicamente se constata haverem-se feito presentes li\ condi-
ções para tanto. Na observação empírica, contudo, as formas sociais
perdem sua condição lógica e adquirem concreção - e é essa trana-
ferêpcia da observação do plano lógico para o do registro empírico
dos fatos que permite assinalar a incoerência do sistema. Realmente,
a análise empírica do sistema nos diz que nêle encontramos soei.,_
dades periféricas e sociedades hegemônicas, e que essas realizam con-
cretamente formas sociais ainda não observadas naquelas, além de
tentar impedir, na política de potência de cada dia, que as sociedades
periféricas alcancem o seu atual estágio evolutivo. Isso faz que a
realidade negue a teoria - e permite estabelecer que as relações
que se verificam entre as sociedades hegemônicas e as periféricas im-
pedem, negado o princípio do "salto", que a sucessão das formas
sociais concebidas logicamente se dê de acôrdo com o esquema teõri- ·
camente estabelecido.
~ assim, no propor objetivos concretos à consciência dos homens
na ação tendente a superar o antagonismo entre a coerência do pro-
cesso histórico e a incoerência do sistema, que a Ordem se distancia
da Revolução. Da perspectiva da Ordem, a Revolução se afirma como
anti-histórica por excelência. ~ que o revolucionário não se considera
geralmente "filho de seu tempo, mas se declara dêle inimigo; não
reconhece os vinculas que o ligam à sua época, mas afirma os motivos
!55
de antagonismo que o colocam em conflito com ela". 13 A Revolução, Nesse particular, o revolucionário vive mais intensamenJe a sua
pela atitude dos que nela crêem, nega pois a unidade e a continuidade idéia que o intérprete da Ordem, pois sua ação não se restringe por
do processo, já que o agente da ação parte do princípio de que todo outra fôrça que <1 concepção racional que faz do futuro e da liberta-
o existente até o momento purificador da Revolução (instituições e ção do Homem; já o segundo pauta suas atividades não apenas pelo
valôres, indistintamente) deve ser negado, se não destruído, desapa- ideal que tem do porvir, mas sobretudo pela necessidade de manter-
recendo portanto o ponto de origem e referência da ação política, -se, e ao curso do processa de que participa, fiel à "razão das gera-
que é o presente. Isso porque, para o revolucionário, "a vontade de ções mais antigas" e aos ritmos de desenvolvimento do sistema global
renovação se converte amiúde em uma aspiração a uma mudança em que se insere. Por isso o revolucionário, ao agir, não hesita em
radical e total, que faz tábu/a rasa da História, que se condena não desconsiderar, na evolução da.s sociedades concretas, as relações que
só em seu resultado atual, mas também em seu desenvolvimento passa- presidem a sucessão das formas sociais lOgicamente concebidas; em
do, opondo-o como realidade irracional e injusta à racionalidade e boa parte também porque tais formas só têm importância se verifi-
justiça ideais futuras". 14 cadas emplricamente. É que para êle a ação só se justifica quando
Esse afã de renovação que nega o presente e condena o passado referida ao futuro - e êsse poderá se realizar em qualquer uma
assenta, no entanto, da perspectiva da Revolução, num diferente cri· dessas sociedades concretas, independentemente da relação que guarda
tério do que seja a história e o alvo a que o progresso da humanidade seu estágio evolutivo com o quadro da evolução do sistema global,
deve conduzi-la ao longo de suas crises: a simples rejeição do pre- sendo como é uma projeção racional do presente no porvir: "A
sente, por um lado, já indica que o tem como prolongamento histó- Esperança! Eis nossa Páscoa da Ressurreição. Cada um de nós sabe
rico do passado, e, por outro, é ela que confere historicidade ao porvir, que é depositário de uma partícula de aurora. Eia pois! é por isso
porquanto o homem vencendo nêle a necessidade e afirmando a liber- que vai haver Revolução" .16
dade, a história realizar-se-á em tôda a sua plenitude. Ademais, se
no plano dar instituições sociais nega-se ao presente o caráter de
condicionante do futuro, 2/e é, no entanto, claramente afirmado no 1 - A racionalidade da história
plano dos ideais políticos. De fato, o revolucionário sabe que é no
presente que o homem constrói, a partir do conhecimento do passado, A diferença fundamental entre as concepções dos intérpretes da
o elo necessário entre êsse e o futuro, mediante a sujeição de su~ Ordem e da Revolução radica em que o primeiro age no presente com
ação atual ao ideal do porvir (por sua vez só possível de se ter a vistas ao que do passado não só se pode, mas se deve conservar, e
partir das condições presentes). É na prática - ação e pensamento o segundo olhando para o futuro. Como que temendo que o desvio
a um só tempo - que se_ estabelece, portanto, a ponte entre os dois da coerência evolutiva da sociedade concreta vista no seu quadro
momentos fundamentais do processo histórico, sem a qual a atividade histórico de referência e no quadro de evolução do sistema global
revolucionária perderia sua razão de ser, porquanto desligada intei- comprometa o futuro, o homem da Ordem náo pode conceber -
ramente das condições em que tem existência e se realiza. 15 apesar de a consciência histórica que informa sua atitude mental
tender a postular o futuro como presente possível - a correção dos
13 Ibidem, pág. 14.
14 Ibidem, pág. 41.
erros praticados no curso da ação presente pelo trabalho das gerações
15 Cf., a êsse respeito, a polêmica de Rosa Luxemburgo com Lenin e Trotsky futuras, processo corretivo êsse que, para o revolucionário, permite
a propósito da supressão da Assembléia. Constituinte na Rússia, em 1917. Trotsky
justificara a tnutilldade da Assembléia em período revoiuclonárlo, alegando que "o que a história realize seus fins. Essa correção é impossível para a
pesado meca.nismo das instituições democráticas é tanto mais incapaz de seguir essa.
evolução [da experiência poltttca das massas] quanto maior fôr o pais e mais 1m- Ordem não apenas porque os únicos objetivos postulados na história
perfeito seu aparelhamento técnico", ao que contrapôs Luxemburgo afirmando que são aquêles propostos pelos homens que hoje vivem seu drama, e não
"essa apreciação das instituições representativas exprime uma concepçAo um tanto
esquemática e rígida, que contradiz expressamente a experiência de tôdas as épocas os sugeridos pela razão ao inquirir a história; é impossível, também
revoiuctonãrlas do passado ... {a qual] mostra que o 'pesado mecanismo das insti-
tuições democráticas' encontra um corretivo poderO&O exatamente no movimento
e sobretudo, porque a história, para êle, nada mais é que a realização
vivo e na pressão continua das massas". Trotsky age, nesse piano, exatamente como dos homens concretos, de carne e osso, que nascem, vivem e morrem
o intérprete da Revolução a que se refere Mondolfo; mas, por outro lado, tôda a sua para afirmar a felicidade. Ela não se propõe fim algum a si mesma,
teoria revolucionária assenta na idéia de que é o ideal do porvir que inspira a ação
do presente, a qual só se adequa.rá àquele se levar em conta as circunstâncias histó- pois não é sujeito de sua própria ação: "A História nada faz, 'não
ricas em que o hoje foi engendrado pelo antem. Sua concepção da "revoluçA.o per-
manente", ailás, só se entende dessa perspectiva, como se verificará mais adiante. 16 Leopoldo Lugones, in Dardo Cúneo, ctt., pãg. 46.

156 157
possui riqueza imensa alguma', 'não trava classe alguma de luta'. O que vém na realidade de perspectiva diferente; para êle, como o exame
faz tudo isso, o que possui e luta é antes o homem, o homem real, do passado forneceu-lhe a chave do processo evolutivo e como o
vivente; não é, digamos, a 'História' quem utiliza o homem como acontecido é visto como o único que poderia ter sucedido (pois é o
meio para trabalhar por seus fins - como se fôra uma pessoa à que ocorreu), igual linha evolutiva se observará na passagem do hoje
parte - pois a História não é senão a atividade do homem que ao amanhã. Os fatos são assim interpretados com referência à cons-
persegue seus objetivos". 1 7 trução racional do futuro, e a possibilidade da intervenção dos fatô-
Ora, se assim é, se a realidade concreta é o homem e não a res que possam desviar o curso do processo - ainda que seja para
história, razão assiste à Ordem ao postular que a ação não se pode situá-lo no mesmo plano previsto, mas num ponto não pensado -
realizar, nem sequer pensar-se como se os fatos já tivessem cumprido é rejeitada a priori. 19 É como se o intérprete da Ordem construísse
seu destino, ou devessem cumprir apenas um, entrevisto na visão que a história para vivê-la, e o Revolucionário, embora dela participe,
o revolucionário tem do futuro. Levado pela racionalidade dos fins desconhecendo a trama de sonho e realidade de que se compõe, apenas
que propõe à sua ação, o revolucionário transfere essa racionalidade a observasse para escrevê-Ia depois, tão-só.
para a própria história, que é vista, enquanto ação concreta, como Não é demais introduzir nessas considerações outro elemento:
se já se tivesse cumprido em todo o seu desenvolvimento. Não que essa qne a visão da racionalidade da história a cumprir-se no futnro só
posição seja consciente; não que se afirme a inelutabilidade do pro- a tem o historiador, ou o filósofo - e o revolucionário é, por defi-
cesso de acôrdo com as premissas assentadas de início - não o é, nição, um e outro, por isso que várias vêzes visionário e profeta dos
nem isso se afirma, mas como tal se manifesta na medida em que novos tempos. Os homens, pelo menos o comum dos mortais, sabem
a interpretação que o revolucionário faz da sucessão das fases histó- que para atingir tais fins é mister empregar tais meios. Não têm
consciência dos motivos concretos que determinam sua ação, nem de
ricas leva-o insensivelmente a postular a fase atual, que está viven-
que ela, chegada a têrmo, ter-se-á afastado, pelas interações recípro-
do, como se já tivesse sido ultrapassada, bastando apenas dar-lhe
cas dos qne dela participaram, dos fins inicialmente propostos. Éles
o golpe final para que a agonia chegue ao fim. 18 O intérprete da
são impulsionados à ação pela reiterada afirmação dos objetivos con-
Ordem, pelo contrário, compromete-se na luta e apenas acredita - cretos a conquistar, a cnrto e a médio prazo - os quais, nas pala-
desconhecendo a que resultado último conduzirá cada um de seus vras de ordem, qne os retiram de sua natural inércia, e em sua ima-
gestos, mas tentando impedir que o fim último seja diverso do essen- ginação aparecem como a realização imediata do milênio. Os homens
cialmente fixado de antemão, e negando a necessidade da derrocada não lntam para fazer história, on cumprir seus desígnios apenas
do sistema global - na aplicação reiterada de si à realidade e nos perceptíveis aos iniciados, mas morrem para afirmam uma posição e
sonhos que consegue ter dêsse moldar e moldar-se constantemente a conquistar um objetivo de antemão coletivamente fixado e aceito,
novos sêres e situações. Como dizia Haya de la Torre: "A hora de ao qual deram sua adesão emocional. 20
nossos povos é hora de ação e para ela devemos dirigir nossas ativi-
19 Cf., a êsse propósito, a diBcussão :feita. por Mannheim das perspectivas post-
dades. Porque da ação feita luta, dor e vitória é de onde surgirá a -mortem e tn statu nascendi, que se aproxima bastante do problema que aqui trata-
verdadeira linha teórica que queremos ver clara e vigorosa e não ante- mos in Libertad y Plantjicación FCE, México, 1946, 2 ... edlçlo, pág. 190 e segs.
2o ct. Engels, Ludwig Feutd-bach e o Fim da Filosofia Clássica Alemã, Costes,
cipada excessivamente aos fatos, que são os que deverão determinar Parts, 1952: " ... na história das sociedades, os fatôres operantes são exclusivamente
homens dotados de consciência, agindo com reflexão, ou com paixão e trabalhando
seu verdadeiro ritmo" (II, 171-2, grifos nossos). Já o revoluciornírio, para. fins determinados ... MUito raramente se realiza aquilo que se quis; na maior
parte dos casos, os múltiplos fins desejados se entTecruzam e se opõem, ou êsses fins
mesmo admitindo a íntima relação entre a teoria e a prática, inter- sfi.o a. prlori irrealizáveis, ou melhor, são os meios que aparecem como insuficientes-.
( ... ) Os fins das ações sA.o desejados, mas os resultados que seguem realmente es<;.as
17 Marx-Engels, La Sagrada Fa.milia, Editorial Grljalbo S/A, México, 1958, pág. ações nA.o o &Ao, ou se parecem, de inicio, corresponder no enta·nto a~~ flns desejados,
159. têm finalmente conseqüências inteiramente diversas das que se quls (págs. 67-9). A
18 A propósito do socialismo, Georges Sarei dizia: "O socialismo é uma filosofia Ordem embora participe da visão orgânica do processo social, tende, nesse particular,
d.a história d.as instituições contempordnell8 e Marx sempre racioctnou como fllósofo por suá tendência a opor o "concreto" ao "concreto", a valorizar a Vontade enquanto
da história, quando polêmicas pessoais não o levaram a escrever fora das leis de seu elemento constritor do avanço revolucionârio, exatamente para impedir a discrepância
sistema. O socialista imagina, pOis, que foi transportado para um futuro mUito lon- entre os fins alcançados e os desejados, desvalorizando-a quando se trata de i.nlpul·
gínquo, de sorte que pode considerar os aconteci.nlentos atuais como elementos de sionar êsse mesmo processo. 1: por saber que "na maior parte dos casos ... os meios
um longo desenvolvimento Jã vencido, e que pode atribuir-lhes a côr que sfi.o sus- aparecem como insuficientes", que afirma sempre, em qualquer circunstância, sua
cetíveis de ter pa-ra um filósofo futuro. Tal modo de proceder supõe, certamente, insuficiência desde que se trate de romper a continuidade do processo. Jã com a
que ums parte muito grande seja,. deixada às hipóteses; mas não há filosofia social. Revolução dA-se o inverso, O revolucionário sabe que "na história das sociedades os
fatôres operantes são exclusivamente homens dotados de consciência, agindo com
consideração sôbre a evolução e mesmo ação importante no presente sem certas hipó- reflexão ou com paixA.o" mas sabe também que a con.sciência dos fins últimos, não
teaes sôbre o futuro" - in Réflext.cms sur La Vtotence, Llbrairie Mareei Rivlêre et Cie., a tem Ô conjunto da màsss., mas apenas seu mlcieo dirlgen~ que, entA.o, pela v~­
Paris, 1950, pág. 61. tade, pode suprir a 1nsufic1ência de meios. Cf. Trotsky, Htstcnre de la. .Révolutton

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tivo da ação, porque ela compreende que os homens agem, afirmando nas sociedades hegemônicas, impõe-se às periféricas a êle se confor-
ser "homens de carne e osso, homens que nascem, sofrem e ainda mar, pois não têm condições objetivas para rompê-/o - e a tentativa
que não queiram, morrem" para buscar "isto que chamamos a feli- do "salto" leva inevitàvelmente ao malôgro da ação tal com conce-
cidade", como dizia Unamuno, e porque na ação transformadora do bida, pois os homens não encontrarão na realidade as bases materiais
presente das sociedades periféricas, as possibilidades de opção e de sôbre as quais construir aqui!o que se propuseram como fim. :e a
acumularem-se os erros são maiores que nos períodos de acalmia, com posição, por exemplo, de Haya de Ia Torre: "E ... o biológico, por-
a agravante de, freqüentemente, não haver " 'crises' parlamentares tanto o vital, o profundo e o renovador é repetir o ensinamento eterno
e de govêrno" capazes de corrigi-los. Há apenas opções e erros, que da natureza, que desprende o fruto maduro, o filho feito, o ôvo denso
podem alterar o sentido de um processo. Na Revolução Russa, por para que sigam sozinhos a linha superadora da vida, que por negações
exemplo, a entrega da terra aos camponeses e a supressão da Assem- assim se emancipa e se torna perene" (II, 48).
bléia Constituinte foram escolhas, atos de vontade, que marcaram Por outro lado, o intérprete da Ordem encontra nas próprias socie-
para sempre a revolução; delas advieram, especialmente da segunda, dades periféricas, onde a Revolução vê a possibilidade objetiva do
como que cumprindo a previsão de Rosa Luxemburgo, "o terror e o "salto", a prova da sucessão inevitável das várias fases por que passa-
esmagamento da democracia''. 23 ram o sistema global e especialmente as sociedades hegemônicas; não
coexistem nas sociedades periféricas diferentes tipos de economia, desde
a simples troca até a expressão mais acabada do sistema global, que
2 - A referência da ação é o capitalismo do Estado? E essas formas mais elevadas de organiza-
ção da produção não tendem, ao longo do desenvolvimento do país,
A Ordem e a Revolução surgem, da análise precedente, como a superar - absorvendo ou destruindo - "naturalmente" as mais
concepções da ação semelhantes na forma e antitéticas pelo conteúdo. primitivas? Assim também nas relações das sociedades periféricas com
Semelhantes enquanto se propõem transformar o status quo das socie- as hegemônicas e com o sistema global: as formas mais adiantadas,
dades periféricas; antitéticas porque a relação do sistema global com já realizadas nas nações hegemônicas, tenderão a impor-se às formas
as sociedades periféricas é encarada de maneira diversa e, por conse- atrasadas vigentes nas sociedades periféricas, que também ·•natural-
guinte, os caminhos sugeridos à ação se apresentam diferentes. Para mente" atingirão os níveis de desenvolvimento que lhes são propostos
a Ordem, a totalidade a que a ação e a teoria se reportam é, mais COI[IO alvo a atingir e a êles deverão chegar para que sna evolução
que o sistema global, a continuidade do processo histórico, que se seja completa. Haya de la Torre exemplifica a posição:
repetirá apesar dos diferentes estágios de evolução das sociedades " ... não se deve esquecer que o sistema capitalista, do qual o
periféricas; para a Revolução essa totalidade é o sistema global, não imperialismo é a máxima expressão de plenitude, representa um modo
tal qual se apresenta com possibilidades reais de recuperação e adapta- de produção e um grau de organização econômica superiores a todos
ção, mas sim concebido como herdeiro do passado, encarnação do os que o mundo conheceu anteriormente e que, portanto, a forma
"mal" histOricamente já condenado por suas contradições internas, capitalista é passo necessário, período inevitável no processo da civi-
uma das quais e a mais importante, pois configura o elo mais fraco lização contemporânea. Não há-de ser um sistema eterno - porque
da cadeia, é a existência de sociedades periféricas que se desejam leva em si contradições essenciais entre seus métodos antitéticos de
libertar das hegemônicas. Para a Ordem, se a totalidade é o processo produção e apropriação - mas tampouco pode faltar na completa
histórico, cujo ponto mais alto de desenvolvimento se exemplariza evolução de qualquer sociedade moderna. Conseqüentemente, para que
23 Poder-se-ia talvez marcar o período que se inicia com a morte de Lenin e
o capitalismo seja negado, abolido, superado, deve existir, amadurecer,'
se consolida pouco depois com a eliminação da "oposiçã.o de esquerda" como aquêle envelhecer com maior ou menor aceleração, mas sua presença não se
que reforçou as posições da Ordem no mundo todo, fazendo que seus partidários em pode suprimir do atual quadro histórico do desenvolvimento humano.
muitas partes formassem ao lado do "partido da ordem" para impedir o esmagamento
da democracia em seus paises - aUança que não impediu o advento dos regimes As estupendas conquistas que sôbre a natureza conseguiram a ciência,
totalitârios nazi-fascistas. Grande parte do movimento social-democrático pós-revo-
lução encontrou no stalintsmo a justificativa prática do Teformismo, isto é, da trans- as descobertas e a técnica a serviço da grande indústria, e a obra
fonnação das condições de trabalho pela via parlamentar, objetivando salvaguardar emancipadora que está chamada a realizar a forma social que seu
a democracia representativa. Tal posição, no entanto, não teve, como se sabe, guarida
em alguns grupos revolucionários de social-democracia, especialmente os esparta- sistema plasma e organiza - o proletariado - são o legado da era
quistas alemães, que julgavam possível conciUar a democracia, enquanto forma capitalista. Com êles e por êles deverá alcançar-se a estruturação de
politica de pre&ervar a "liberdade do que pensa de modo d.lferente" com o socialismo,
isto é, a abolição da- propriedade privada dos meios de produção. uma nova ordem econômica" (li, 27, grilos nossos).
162 163
f: possível que nesse processo de "estruturação de uma nova apresentando elas traço algum que lhes seja comum a não ser a obri-
ordem econômica", o ultrapassar das velhas fases, que se apresentam gação de vencer as mesmas etapas da evolução; leva a fazer q~e as
ao lado das mais modernas no seio das sociedades periféricas, não partes do sistemfl não tenham consciência do todo, o que elimma o
se faça sem atritos; mas é exatamente dessa luta e dessa dor por ela consensus e permite agir na suposição de que os fatos registrados numa
gerada que surgirão novas condições capazes de permitir se supere determinada sociedade não afetarão de forma alguma as demais e,
a contradição de coexistirem ideologias antifeudais com uma organi- portanto, o sistema.
zação econômico-social fundada no latifúndio e na "encomienda", me- Ressalte-se, neste passo, que a identificação da totalidade com o
diante uma síntese que incorporará as "estupendas conquistas ... sôbre processo histórico, característica da Ordem,24 conduz a afirmar exata-
a natureza" e permitirá se complete a evolução dessas sociedades que mente essa incoerência e essa falta de solidariedade entre as partes
pretendem ser modernas: "O progresso impõe que depois da etapa integrantes do sistema, admitindo apenas, no limite, a identificação e a
feudal ou agrária venha a fase industrial. Mas propomos que, sob o solidariedade de povos e nações que participem de igual ciclo cultural,
contrôle das classes produtoras, o advento evite o aspecto cruento. tendo as mesmas raízes históricas e étnicas. É o que encontramos cla-
ramente enunciado em Haya de la Torre: "Isto não é exclusivismo,
E nos propomos, aproveitando a experiência histórica do mundo, obter
nem xenofobia, nem antieuropeísmo; é realismo. Se compreendemos
todos os benefícios da industrialização, procurando diminuir o quanto
que os graus de progresso, de cultura, de civilização. . . são diferentes
se possa tôdas as suas dores e todos os seus aspectos de injustiça e
e se. . . reconhecemos que êsses graus diversos estão determinados
crueldade" (li, 205).
por outra gradação da intensidades econômicas, não uniformes em
Para a Revolução, ao contrário, o ponto de referência da tota-
todos os povos, nem em todos os continentes, temos de aceitar dife-
lidade não é o processo histórico, mas o sistema global, que contudo renças. E se aceitamos diferenças de concepção ou de apreciação, logo
se considera como histórico, isto é, fase do longo processo de con- somos levados a reconhecer que são necessárias formas de ação corres-
quista do reino dilliberdade. Se a totalidade é o sistema global, a histó- pondentes a cada realidade, no político, no econômico, no social . .. "
ria realiza-se nos seus quadros mais gerais de acôrdo com as leis que (11, 189). Essas formas de ação, assim tão claramente anunciadas
a êle são próprias, e as sociedades concretas que o compõem não diversas, porque determinadas por ritmos diferentes de atividl!des de
necessitam vencer, tôdas, as mesmas fas~s em idêntica sucessão, pois um sistema econômico que não é universal - ". . . entre a Terra
essa restrição significa fazer de cada uma delas uma totalidade em si; do Fogo (parte da Indoamérica) e a Inglaterra (parte da Europa),
implica em que a história deva realizar-se nelas e não no sistema há -uma série de fases de produção e de troca que toma utópico
que por si é contraditório. Para a Revolução, fazer as sociedades peri- qualquer intento de aplicação das mesmas leis econômicas a essas
féricas respeitarem o processo histórico exemplarizado nas sociedades duas partes do mundo" (11, 35) - , não podem, em conseqüência,
hegemônicas do sistema global importa em reduzir a totalidade dêsse confundir-se com a ação seja nacional, pois não é de nações que se
último a tantas "globalidades parciais" quantas são as sociedades que trata, mas de povos-continentes, nem mundial, pois o sistema não
o integram, as quais passariam a ligar-se entre si, formando-o, apenas é solidário.
pela posição de mais débil ou mais resistente na luta pelo domínio O que o intérprete da Ordem tem em mente evitar é reduzir
dos mercados, e não, como se dá na realidade, pela própria essência a estrutura social ao que supõe ser um mero mecanismo, operação
nniversalizadora do tipo de produção que exatamente o caracteriza. mental que se no século XVIII decorria do "racionalismo abstrato,
Reduzir a totalidade do sistema à das sociedades que o integram, leva que vê o homem em si, isolado das múltiplas condições da vida cultu-
necessãriamente a reconhecer que o sistema global não requer para ral e civilizada e da ordem ·hierárquica dentro da sociedade organi- ·
sobreviver determinadas condições sem as quais necessàriamente sosso- zada", 25 no século XX, aparecerá como conseqüência da afirmação
brará. Aceitando-se essa redução, enquanto as sociedades periféricas da coerência do sistema e da existência de fatôres universalizadores
não tiverem cumprido, tôdas, o ciclo evolutivo vivido pelas hegemô- a êle inerentes, os quais conduzem à solução de problemas particul~­
nicas, o sistema deverá vigorar, a menos que nessas se transformem res "por decreto com as receitas importadas de países onde trus
as condições de existência e então não possam oferecer às periféricas característicos problemas não existem". Não que a Ordem negue a
alvos a atingir concordes com o que se supõe deva ser, para elas, existência de princípios gerais; pelo contrário, afirma-os, ressalvando,
dadas suas condições presentes, o estágio evolutivo imediato. Por
outro lado, o revolucionário tem presente que a redução da totalidade 24 Cf., a êsse propósito, Barth, op. cit., especialmente o estudo sõbre Edmund
Burk.e.
às sociedades concretas tende a tornar incoerente o sistema, não 25 Barth, op, cit., pág. 33.

164 165
no entanto, que entre os princípios gerais e sua apücação vai uma conhecimento dêsses; apenas que, afirmando na praxis humana o prin-
gama infinita de opções que devem ser feitas tendo em conta as cípio da contradição, reconhece que, "em virtude de o particular estar
realidades particulares de cada nação ou de cada continente: "Há prin- ligado ao universal, em virtude de não apenas o que é particular na
cípios gerais, enunciados universais, fórmulas de caráter mundial; mas contradição, mas também o que é universal serem inerentes a cada
há típicas expressões nacionais ou regionais da vida econômica e polí- fenômeno, o universal existe no particular". 28 E apenas a partir dessa
tica dos povos, as quais são determinadas e ditadas pela realidade. posição que se pode considerar a universalidade dos princípios dentro
Essas expressões são realidade que não se pode improvisar. Realidade de seu relativismo histórico, para não dizer histórico-geográfico -
que apresenta problemas, que não podem ser resolvidos por decreto em outras palavras, reconhecer como integrantes de um mesmo pro-
com as receitas importadas de países onde tais característicos proble- cesso elementos tão formal e aparentemente díspares como as econo-
mas não existem" (IV, 161). mias da Terra do Fogo e da Inglaterra, embora uma tenha atingido
A incoermcia do sistema vai encontrar na afirmação das "típi- grau que se poderia dizer máximo de desenvolvimento e noutra ainda
cas expressões nacionais. . . determinadas e ditadas pela realidade", coexistam diversos estágios evolutivos. E: que uma e outra desenvol-
sua cabal comprovação: não importa a existência de "princípios ge- vem-se segundo leis e principias que são universais não por mera
r~s", nem de "enunciados universais", pois tais princípios e enun- construção racional, mas que, como tal, se observam pelo tipo de
cmdos são apenas expressões de um "racionalismo abstrato", que relação associativa básica que em uma e outra região se estabelece.
tende a "comparar a ordem prevalecente no Estado com uma que É a comprovação dêsse elemento comum às várias sociedades,
acredita dever realizar-se porque é a única que corresponde à natureza independentemente do seu estágio evolutivo, e a afirmação da existên-
do homem [e ao espírito da história] e não apenas lhe prometerá, cia do particular no universal e vice-versa, 29 que permite dar o sistema
mas garantirá a salvação". 26 Os que advogam a adoção de decretos como coerente, bem assim afirmar a consciência do todo pelas partes
~eitos de_ a~ô~do COJ? "re~eit~ importadas", não se dão conta de que e dessas por aquêle; solidariedade que vai ao ponto de poder dizer-se
esses pnnc1p10s. umversrus nao podem ter sua aplicação nos casos que se "vem a cessar, a unidade formal a desfazer-se e as partes
particulares, po1s foram elaborados a partir de realidade diversa, num contíguas a só se prenderem, uma à outra, por justaposição", o sistema
"es~aç<>::tempo histórico" d~~rente daquele em que se deseja aplicá-los; perece. Essa solidariedade, decorrência de uma posição de cenheci-
e nao sao capazes de admitir que não há ''princípios universais infle- mento, não é afirmada a priori, nem se situa no mesmo plano em
xíveis e válidos para todos os espaços-tempos" (111, 38). A incoerên- que a Revolução vê a história; não é racionalidade_ a cumprir-se, 17J'09.
cia do sistema, que era antes simples registro de fato, aparece agora sim elemento bruto, racional e emplricamente apreendido, que in-
como decorrência lógica necessária de uma posição de conhecimento forma e condiciona êsse cumprir-se da razão no processo histórico.
mais ampla, fundada num relativismo antidogmático que, no caso de E a compreensão dêsse consensus e do seu porquê que permite ao
Haya de la Torre, implicitamente nega o princípio da contradição na revolucionário referir a totalidade ao sistema global e afirmar sua
praxis humana, embora o afirme teàricamente como necessário à expli- perfeita coerência, apesar de os diferentes níveis de evolução em
cação da negação dialética das receitas importadas. A "fé exorbitante que se apresentam as sociedades concretas mostrarem-no como con-
nas ciências naturais e [aos] pressupostos metafísicos inconscientes que traditório e incoerente.
caracterizam o positivismo de Comte e Marx" - e no caso em espé- Na realidade, a coerência assim como a solidariedade não são
cie a polêmica é com Marx - , cuja crítica já havia sido antecipada manifestas. A primeira reação do observador à existência de socie-
por Burke ao opor-se "ao dogmatismo autocrático e ao absolutismo 28 Ma.o Tsé-Tung: "El Ca.rater Especifico de la Contradlcción", in A Propósito
da filosofia política racionalista dos fins do sêculo XVI11",2 ' contra- de la Prática - En Torno a la Cantraàicci&n, Ed1c1ones Vlda Nueva, Santiago do
Chile, 1953, pá.g. 67.
põe-se agora o nôvo conceito de Relatividade derivado da Física 29 C!. Mao Tsé-TUng: "Por causa da imensa diversidade doa fenômenos e do
caráter Utmitado do desenvolvimento o que é universal em um caso pode converter-se
(111, 27 e segs.) o qual se estende à Política- ciência teórica e da em particUlar em outro. E ao contrá.rio, o que é particUla:r em um caso determinado,
ação - para negar a universalidade de determinadas formas básicas pode chegar a ser universal em outro caso determinado. A contradição entre o cará-
ter social da produção e a propriedade privada doa melas de produção, própria do
de associação e_ afirmar, portanto, a incoerência do sistema global. regime capitalista, é geral para todos os paises nos quais existe e se desenvolve o
. A ~evoluçao, _no entanto, ao afirmar a existência de princípios capitalismo. Contudo, essa contradição própria do capitalismo é um fenômeno ine-
rente a uma etapa histórica determinada no desenvolvimento da sociedade de classes
gerats umversrus, nao detxa de reconhecer a existência dos particulares em geral, e, do ponto de vista da contradição entre as fôrças produtivas e as relações
de produção n~ sociedade de classes em geral, essa contradição é especifica. Mas
- e impossível seria não fazê-lo, pois àqueles só se chega pelo depois de haver descoberto o caráter especifico de tôdas as contradições na sociedade
capitallsta, e por lsso mesmo, Marx descobriu, de maneira ainda mais profunda, m~ls
26 Ha.rth, op. ctt., pág. 32. complet~. o caráter universal da contradiçG.o entre as fôrças produtivas e as relaç6es
27 ldem, pág. 33. de produção na sociedade de classes em geral" - op. cit., pág. 66.

166 167
dades hegemônicas e periféricas - aquelas em fase de usufruir dos a economia de mercado e separar o comerciO da agricultura, a fim
frutos acumulados de seu desenvolvimento, essas em fase de obter de integrar no sistema global,_ como con.surnidores que ir~ realizar _a
os elementos que permitirão iniciar modestamente sua marcha para mais-valia, aquêles povos cuz a econorma natural o cap1tal destruiU
ten!ar dimi~uir. a diferença sempre crescente que as separa das pri- como condição indispensável à sua sobrevivência.
merras - e afirmar exatamente a falta de solidariedade do sistema. Para a Revolução, êsse ato de destruição da economia natural
E.ll_l outros têrmos, à p~imeira vista, o observador afirma a impossi- reveste-se de capital importância para a compreensão do desenvolvi-
bilidade de romper o Sistema pela cessação das comunicações entre mento subseqüente das sociedades periféricas. Realmente, se por um
suas partes e entre elas e o todo, impossibilidade essa que se traduz lado o imperialismo (que é a forma econômico-política de expansão
na proposi~ão teórica de que é aos J?aíses hegemônicos, poc já terem das sociedades hegemônicas), "'a última', 'suprema' ou 'superior'
~uperado todas as fases de desenvolvrrnento até agora conhecidas, que etapa do capitalismo nos países altam;onte indu~t':Íalizados ~em a. s_er
mcumbe a tarefa de dar o golpe de graça no sistema. a 'primeira' ou 'inferior' etapa nos pa1ses colomrus, ou semicolomaiS,
, _É apenas a presença dêsse elemento constante, que por sê-lo infra-industrializados" (li, 104 ), por outro lado, a introdução do capi-
e universaiiZa~or ~- a qual é a um !empo descoberta metodológica talismo nessas áreas faz-se em condições que não repetem o processo
e motor da açao histonca- que permite superar as diferenças formais em que se gerou nos países de origem.'l2 Com isso, a necessidade,
entre as várias sociedades e proclamar sua solidariedade num mesmo afirmada pela Ordem, de as sociedades periféricas vencerem os mes:
p~ocesso, vale ?izer, reconhecer possíveir várias formas de ação, talvez mos estágios evolutivos das hegemônicas, ou do sistema global, e
dzversas de pms para pais, talvez sempre as mesmas, mas inspiradas negada pela própria história dos paises periféricos, poiS a coexistência
t6dos por wn só princípio inflexível: "O desenvolvimento da lndia de formas primitivas e modernas de produção, longe de demonstrar
não é uma cópia do da Inglaterra; não é senão um suplemento. Entre- que essas absorverão "naturalmente" aquelas, afirma a possibilidade
tanto, para compreender o desenvolvimento combinado de países atra- de realizar-se a implantação de formas superiores antes que tenham
sados ; _dependentes com? ~ lndia, é necessário ter sempre presente amadurecido tôdas as virtualidades de transformação contidas nas
ao espmto o esquema classico que Marx traçou do desenvolvimento inferiores:
da Inglaterra. A lei do valor guia da mesma forma os cálculos dos "Um país atrasado assimila as conquistas materiais e ideológicas
especuladores da City de Londres e as trocas monetárias nos mais dos países avançados. Mas isso não significa que siga servilmente êsses
remotos rincões do Haidarabad, com a diferença de que nesse último países, reproduzindo tôdas as fases de seu passado. A teoria da r~J><;­
caso ela assume formas mais simples e mais astuciosas" .so A univer- tição- dos ciclos históricos - de Vico e, mais tarde, de seus disCl-
salidade dessa lei, apesar de as relações hwnanas por ela condicionadas pulos - apóia-se sôbre a observação dos ciclos descritos pelas antigas
~umirem formas diferentes conforme as sociedades em que se rea- culturas pré-capitalistas, em parte sôbre as primeiras experiências do
lzza o processa de troca - "na sociedade contemporânea, 0 principal desenvolvimento capitalista. O caráter provincial e episódico de tod_o
elo entre os homens" - , é compreensível e demonstrável se se tem o processo comporta efetivamente certas repetições de fases culturaiS
em conta que "as leis de Newton não são certamente anuladas pelo em centros sempre novos. O capitalismo, entretanto, assinala um pro-
fato de a velocidade da queda dos corpos variar em certas condi- gresso sôbre tais condições. Ele preparou e, em um certo senlldo,
ções, e de as órbitas dos planetas estarem sujeitas a perturbações''."' realizou a universalidade e a permanência do desenvolvimento da
Há assim, no sistema, um elemento comum que o torna universal: humanidade. Daí se excluir a possibilidade de uma repetição das
a produção e a troca de mercadorias, a qual só se explica e com- fOTmas de desenvolvimento de diversas nações. Obrigado a colocar-se
preende em. tôda a sua problemática pela lei do valor e pela necessi- a reboque dos paises avançados, wn pais atrasado não pode conformar-
dade nnper10sa que tem o sistema de repetir a cada instante o seu -se à ordem di!] sucessão: o privilégio de uma situação histàricament~
ato de produção. Essa repetição constante do ato de produção, em atrasada - êsse privilégio existe - autoriza um povo, ou mais exa-
outras pal~vras, a nec~ssidade de o sistema de reproduzir-se, implica
em destrurr a econorma natural dos países periféricos em qualquer 32 Haya de la Torre parte da definição de imperiall.smo vulgarizada por Lenin.
A concepção esboçada. por Rosa Luxemburgo em "A Acumulação do Capital", embora
de suas formas históricas para apropriar-se de importantes recursos mais ampla que a de Lenin com assaz vantagens interpretativas, não alteraria, no
de fôrças produtivas, libertar fôrças excedentes de trabalho, introduzir entanto o pensamento do líder aprista, que radica- na afirmação - correta, embora
1ngênu~ _ de que 0 ca-pitalismo surge em Indoamérica depois de ter-se desenvolvido
na Europa. Ingenuidade que não retira, no entanto, certa solidez à análise que das
30 Leon Trotsky, in Les Pages Imortelles de Marx Ed.itions Corrêa Paris 1947 relações politlcas nas sociedades 1ndoamericana.s faz em segUida, embora. a anrmaça.o
pé.g, 74, , ' ' '
básica. permitlsse também adotar uma posição semelhante à de Trotsky, desde que
:n Ibidem, pág, 37. A citação anterior encontra-se à pág, 15 da referida edição, se formulasse diferentemente o problema da totalidade.
168 169
lamente, força-o a assimilar-se completamente antes dos prazos fixa- no futuro, porque vive no possível.34 Compreende-se, assim, que, para
dos, saltando uma série de fases intermediárias. Os selvagens renun-
ciam ao arco e às flechas para empunhar logo em seguida 0 fuzil
a Ordem, a luta entre o capitalismo e o proletariado não tenha um
sentido mundial absoluto: é que o concreto é o individual, agora sim
sem percorrer a distância que separavam, no passado, essas diferent~ absoluto, pois diz respeito a apenas uma situação histórica dada,
armas. Os europeus que colonizaram a América não retomaram à enquanto nada tem de semelhante a outra, só podendo ter soluções
História em seus começos. Se a Alemanha e os Estados Unidos ultra- a ela peculiares. Nisso a Ordem distingue-se uma vez mais da Revo-
passaram ecouômicamente a Inglaterra, é justamente em conseqüência lução, pois essa, ao postular a possibilidade ?~ rompiment?,d_o siste-
dos retardamentos de sua evolução capitalista. Pelo contrário, a anar- ma em qualquer de seus pontos - hegemomcos ou perífencos -
quia conservadora na indústria carbonífera britânica ( ... ) é 0 resgate portanto em qualquer situação his_tóric:' in~ividual: ~spira e s_abe ~e
de um passado durante o qu~l a Inglaterra ( ... ) possuiu a hegemonia só aspira porque sabe) que deseJa nao so subslltmr uma s1tuaçao
do cap1tahsmo. O desenvolvimento de uma nação historicamente atra- concreta por outra, mas ."prod~,zir outro ponto ~e parti~a sistemático
sada conduz, necessàriamente, a uma combinação original das diversas para posterior desenvolvnnento 35 e tra~s.formaçao_ do sistema gl?bal.
fases do processo histórico. A órbita descrita assume, em seu con- Delineia-se assim, na concepçãn teonca da açao (fruto das diVer-
junto, um caráter irregular, complexo, combinado".3s gentes posições diante do problema da contradição na praxis hum~a
Esse elemento universalizador do sistema global - o regime acima apontada), a diferença básica entre ~ _Ordem, e a Revoluçao:
de produção - determina, contràriamente à tese sustentada pela a primeira, fixando-se no concreto e no mdtvtdual, e levada a negar
Ordem, uma posição universal perante o problema da ação: apesar a presença de um elemento universalizador no sistema - do~de
de suas formas exteriores mais fàcilmente perceptíveis poderem ser afirmar sua incoerência e a impossibilidade de propor-se um llpo
diferentes segundo o meio social e as condições políticas em que de ação (a luta de classes) como universahnente válido; a segunda,
se exerce, seu conteúdo político (isto é, a relação objetiva, que traduz, exatamente afirma a coerência do sistema apesar de seus aspectos
entre os vários segmentos componentes da sociedade) é sempre o exteriores contraditórios, a qual se baseia num regime de produção
mesmo, pois se trata de alterar uma relação básica da associação hu- comum a tôdas as suas partes por distantes que estejam geogràfi-
mana determinada pelo regime de apropriação dos bens de produção, camente uma da outra, regime êsse que se funda na divisão .antagô-
o qual tende a universalizar-se pela necessidade interna de expansão nica da sociedade em proprietários e não-proprietários. É a desigual
e reprodução do capital. Essa alteração, dada a coerência do sistema participação dos indivíduos nos frutos da cultura, decorrência dessa
divisão, condicionando os "vários privilégios de que gozam alguns em
global, não pode se dar em um país ou em um continente; ela tende
necessàriamente a ser universal, porque a produção e a troca de mer- prejuízo de outros, como o serem mais ricos, mais homenageados ~o
que êstes, ou ainda por fazerem-se ?bed~er por êles",~ 6 que ?poe
cadorias se realizam, universalmente de acôrdo com a mesma lei.
em caráter mundial absoluto os propnetános e o proletanado, e e ela
Destarte, a luta de classes, que é a expressão política das relações que não apenas justifica, como também obriga a uma ação de igual
estabelecidas no processo de produção e distribuição de mercadorias conteúdo político, tanto nas sociedades hegemônicas quanto nas peri-
iguala, por seu conteúdo, a ação nas sociedades hegemônicas e peri~ féricas.
féricas, ao invés de dever assumir inelutàvehnente, como para alguns
intérpretes da Ordem, "diversos aspectos" que impõem "soluções dis--
tintas" já que "a luta ... entre o capitalismo e o proletariado não 3 - O problema da vontade
tem um sentido mundial, senão relativamente'' (VI, 25).
Aderindo ao imediato, ao atua~ ao concreto, a Ordem não pode A aderência ao concreto aparece como complemento necessário·
conceber sua substituição senão por outro concreto, com as mesmas à construção da história da perspectiva in statu nascendi, única capaz
implicações anti-revolucionária; e isto porque "experimentar e pensar de permitir uma avaliação mais posit~va dos erros poss!veis no de~?rrer
'co,nc~etam~nte' transformo"?·se no desejo de restringir o âmbito das da ação política, porquanto se propoe a considerar tôdas as var1ave1s
propnas at1v1dades ao ambiente que cerca imediatamente o indivíduo que intervêm no processo, não tanto por um excessivo apêgo à norma
e no qual êle se encontra, e de abjurar tudo que possa ter o sabor de agir apenas na posse de todos os dados do problema, quanto pelo
de especulação e hipóteses", ao contrário da Revolução, que vive
34 Mannhelm, "Conservatlve Tb.ought", ln Essays on Sociology and Social Psy-
noss~) .Leon Trotsky, Histaire de la Révolution Ru.ase, cit,, vol. I,, pág 5 . 16-7 (grifas chology, Routledge & Kegan Paul, Londres, 1959, pãg. 102 e segs.
35 Ibiàem, pã.g. 103.
36 J.-J. Rousseau, Discursos sObre a DesiguaUüuie, cit., pág. 165.
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pela história construída pelos que os antecederam, criam novas con- a adesão emocional dos homens que as devem sustentar - e tal se
dições, superando as antigas. O anti-voluntarismo dirigido contra a dá por pretender fazer da ação politica uma intervenção absolutamente
pretensão de "instaurar um novus ordus forjado na mente" 4 0 pode, racional no processo social. Já a Revolução, exatamente por reco-
levado às últimas conseqüências, impedir se tomem, nos momentos nhecer a importância da vontade na praxis humana e a necessidade
críticos da História, as decisões cruciais, que são fruto do sentido de negar as atuais estruturas, corre o risco inverso, podendo ser levada
da oportunidade e da vontade para não nos referirmos à V irtu do a tomar desejos por possibilidades reais, caindo no utopismo revo-
Secretário Florentino. E que em seu desejo de impedir o predomínio lucionário, vale dizer, no mais puro voluntarismo. Esse perigo, para
das tendências irracionais da vontade sôbre as idéias oriundas da a Revolução, decorre da natural defasagem entre os momentos "óti-
inteligência, inconscientemente - ou semi-conscientemente - o anti- mos" do ponto de vista das condições sociais objetivas (a matura-
voluntarismo pode levar a esquecer que o fato político por excelência, ção das fôrças produtivas) e do ponto de vista do efeito político
a transformaç~o das relações de dominação econômica, social e polí- da revolução, vale dizer, segundo Luxemburgo, da possibilidade obje-
uc~ numa soc1edade dada, niío obedece tão-só às leis da inteligência; tiva da conservação do poder: "Com efeito, uma sociedade não mo-
pms nos momentos em que se propõe aos homens o término do reino difica suas instituições à medida das necessidades, como um artesão
da desigualdade entram em jôgo - como aliás em todo o processo renova seus instrumentos de trabalho. Ao contrário: pràticamente,
de mudança social lato sensu - fôrças irracionais, seja psicológica a sociedade considera as instituições. . . como uma coisa estabele-
seja ~iolôgicamente concebidas, as quais ao irromper na superfíci~ cida para todo o sempre. . . São necessárias circunstâncias absolu-
da soc>edade buscam exatamente os canais sociais que permitirão sua tamente excepcionais, independentes da vontade dos indivíduos ou dos
racionalização. A proposição do fim da desigualdade, quer para con- partidos, para libertar os descontentes das peias do espírito conserva-
servar a razão das gerações mais antigas, quer para inaugurar o dor e levar as massas à insurreição". 4B
milênio, é um ato de fé em que o mítico e o místico primam sôbre, E nesses momentos que a Revolução mais se aproxima da utopia
o racional. Sem a crença num fim determinado, e êsse fim é em si revolucionária. A irrupção das massas organizadas na História, a
um afirmação não totalmente racional, é mera elocubração de um quebra de seu conservantismo por assim dizer inato, as transfor-
ser indivi~ual, não vindo a fazer parte integrante das condições obje- mações qualitativas que se observam em seu comportamento tx>lítico
nvas que informam o senso comum das pessoas e lhes permitem ter e mesmo em sua consciência profunda solicitam os chefes à ação:
delas ~onsciência; não é portanto necessária.•> Ademais, tal posição que rumo tomar? A questão não se resume em decidir entre con-
1rredut1vel contra o reconhecimento do papel desempenhado pelos quistar ou não o poder - no mais das vêzes, na efervescência revolu-
elementos irracionais no decidir e no agir decorre de uma falsa com- cionária, êle VeJili ter às mãos do grupo mais ativo e mais organizado;
prensão do problema da praxis humana, porquanto se tôda a ação, é, pelo contrário, avaliar corretamente a relação entre fins e meios
desde o início, é dirigida a um fim e estimulado pelo interêsse, rece- e saber discernir se são reais as possibilidades de conservá-lo, fazendo
b~ndo da. natureza do fim e dêsse interêsse sua determinação, ela
diferir a nova forma de dominação das anteriores pelo seu conteúdo
so se realiza plenamente com a intervenção da vontade no processo transformador das condições de existência dos homens, ou se, pelo
de s~per~_ão dos obstáculos que se antepõem ao homem42 - o que contrário, elas não passam de mera racionalização dos desejos in-
leva meVItavelmente ao problema do fim que se propõe à consciência conscientes, o mais profundo dos quais é o de provar a validade da
dos_ homens e dos. esf'?rços conscientes, ou semiconscientes, que apli- teoria que se abraçou. Mas não apenas isso acrescenta um drama
carao em sua realizaçao. 43 Trotsky, Histoire de la Bévolution Busse, cit., I, pág, 10. Convém ressaltar,
_Enquanto tenta, pois, evitar que o voluntarismo leve àquilo que no entanto, que Trotsky vê apenas uma parte do problema. Se as condições que
permitem a revolução realmente nli.o resultam de um ato deliberado da. vontade,
na lmguagem política cotidiana se convencionou chamar de "aven- nem por isso deixam de surgir em virtude de interações humanas em que se mani-
turismo de esquerda", a Ordem corre o risco do imobilismo diante festa, a uma análise mais profunda, a vontade- consciente, ou inconscientemente,
pouco importa. Talvez nli.o uma vontade traduzida em atos deliberados, fl'uto de
do Poder, e o de confundir-se com o "partido da ordem", do qual renex6o consciente, mas sempre vontade. E é preciso também não perder de vista.
se d1stingue exatamente pela proposição teórica da necessidade das que o aparecimento dessas "circunstâncias absolutamente excepcionais" nAo será de
valia. alguma se nli.o houver um grupo hegemõnico, que as saiba interpretar e agir
transformações estruturais desde que as instituições não consigam mais em conseqüência - bastando para tal apenas ter VirtU. O próprio Trotsky, aliás,
admite Implicitamente êsse fato ao fazer a história da revolUçli.o russa: tôda a atua-
40 Mondolfo, op. cit., pág. 84. ção de Lenin, desde o instante em que chega a Petrogrado até o momento em que
41 Sõbre o conceito da necessid.aàe, tal qual usado neste contexto cr Gramsci Lev Bronstein comanda a t.oona.da de poder, é um a-to deliberado de vontade, tio
op. cit., pág. 109. . . . deliberado e tão determinante, que Trotsky reconhecerá no seu Jaurnal d'ExU, de
42 cr., a êsse propósita, o estu<lo de Mondol!o sObre as relações entre Feuerbach 1935, que se Ul1anov não estivesse estado na Rússia. em 1917, na.o terla havldo a
e Marx, in Marx y Marxismo, cit. revoluça.o.

174 175
a mais aos outros que se desenrolam nestes momentos de crise e letariado industrial organizado em fôrça política de partido... [e]
decisão. Há por um lado o problema teórico: a certeza de que se a revolução russa. . . não consegue destruir o próprio sistema" (li,
as fôrças produtivas ainda não atingiram o ponto ótimo que permi- 13) - é, para a Revolução, especialmente seus intérpretes do século
tirá a transformação do conteúdo da dominação política, a Revolu- XX, o fator determinante dêsse esfôrço: " ... o proletariado russo
ção arriscar-se-á a seguir rumos diferentes dos propostos, e, por não se formou pouco a pouco, ao longo dos séculos, carregando o
outro, a consciência de que um ataque mesmo prematuro contra fardo do passado, como na Inglaterra, mas procedeu por saltos, por
as velhas estruturas é indispensável como passo histórico necessário mudanças bruscas de situações, de ligações, de relações, e por rup-
para apressar o momento em que os revolucionários poderão asse- turas violentas com o que existia na véspera. É precisamente assim
nhorear-se do poder e conservá-lo, realizando as mudanças propostas. - sobretudo no regime de opressão concentrada do czarismo -
Para a Ordem, o problema coloca-se de forma diversa, pois a que os operários russos tomaram-se acessíveis às deduções mais ousa-
questão não se cifra em considerar o socialismo como fruto das das do pensamento revolucionário, da mesma forma que a indústria
derrotas políticas da classe operária, o que impõe ao partido da
russa retardatária foi capaz de compreender a última palavra da
Revolução ir ao govêmo, seja como no caso da "Comuna de Paris,
em que o poder não foi conquistado pelo proletariado em seguida organização capitalista" .45
a uma luta consciente de sua finalidade, mas veio cair. nas mãos Para a Revolução, contràriamente à Ordem, a "conquista do
dêle de modo absolutamente excepcional, como um bem desprezado poder político pela grande massa popular consciente, ~~nquista e~sa
por todos", seja como uma imposição das próprias condições da que por si mesma só pode ser produto da decompos1çao da socie-
luta de classes, dialeticamente concebida;" para a Ordem, a questão dade burguesa", dá-se a qualquer momento, já que "a dinâmica dos
cifra-se exatamente, dada sua concepção concreta, em substituir um acontecimentos revolucionários é diretamente determinada por rápidas,
sistema por outro igualmente pronto e acabado: "Mas, apesar de intensivas e apaixonadas mudanças psicológicas das classes constituí-
sua categoria de grande nação européia, de contar com um milhão das antes da revolução". Ora, se essas "mudanças psicológicas rápidas"
e duzentos mil operários industriais e com mais de 25 mil usinas e dão-se nos momentos de crise, "a revolução prematura [a tomada
fábricas em 1917, [a Rússia] não conseguiu abolir o sistema capi-
do poder político "cedo demais" do ponto de vista de sua cons!!rvação]
talista na Europa, nem dentro do país. Por isso, talvez, o socia-
lismo russo deva considerar-se 'mais como uma questão de fé que ameaça-nos [aos socialistas] como a Espada de Dárnocles, e contra
como uma questão de fato'. A Rússia será socialista; ainda não o é" isSQ de nada servem orações e súplicas, transes e angústias" .46
(11, 32, citação de 1935, grifas nossos). É que a história, para a E, pois, o desejo de substituir uma sit~ão de exist~ncia social
Ordem, se tem finalidade, é a de cumprir o seu processo exempla- por outra igualmente pronta e acabada - ISto é, por so se lançar
rizado nas sociedades hegemônicas; ela é vista como simultaneidade à transformação das relações de produção depois que as fôrças pro-
de sistemas sociais, um buscando alcançar o outro, o que explica dutivas tiverem esgotado suas possibilidades de desenvolvimento (ma-
a incoerência do sistema global, a coexistência de várias fases de terial e social) nos quadros das relações que se nega - que detém
desenvolvimento social num mesmo "espaço-tempo histórico" e a im- o passo à Ordem, quando se propõe passar à ação transformadora.
possibilidade da ação libertadora dos "menos iguais" dar-se nas nações Desejo que resulta, como assinalamos, de sua aderência ao concreto
periféricas. e de sua maneira de ver a História em processo de elaboração e não
A coexistência de várias fases de desenvolvimento social num como fase já vencida pela proposição racional.47
mesmo "espaço-tempo histórico'', no entanto, se é para Haya de la
Torre, em particular, e para a Ordem, em geral, motivo de paralisia 45 Trotsky, op. cit., págs. 22-3. '
46 Rosa Luxemburgo, op. cit., pf.g. 67. A citação sõbre a dinâmica da revolução
de qualquer esfôrço de ruptura do sistema global - pois "Marx e é de Trotsky, op. cit., pé.g. 10.
47 Observe-se como esta concepção concreta tende, uma vez mais, a negar na
Engels sustentam que o capitalismo só pode ser destruído pelo pro- prática 0 principio da contradiçf.o, negação essa à qual se acrescentam dois elemen-
tos teóricos fundamentais para a informação da ação politica: um, que se poderia.
44 Rosa Luxemburgo, Re{C.YT'ma ou Revoluçao, Ed. Flama, São Paulo, 1946, pág. chamar de "desejo de perfeição absoluta", o qual se traduziria no 1mobll1srno, quando
67. Cf. a passagem seguinte, à pá.g. 68: "Mas ... a conquista 'prematura' do poder as circunstâncias não permitissem que o resultado da ação correspondesse Integral ou
de Estado pelo proletariado não poderá ser evitada; precisamente por isso que êstes quase integralmente aos 1deals propostoo; outro, o de nf.o reconhecer que um deter-
ataques 'prematuros' do proletariado constituem um fator, e mesmo fator multo minado momento "final" da história só pode ser concebido como resultado de mo-
importante, na criaçao das condições polttica.s da vitória final, pelo fato de só no
mentos parciais, por vêzes opostos e antagônicos ao objetivo final visado. É, em
curso da crise política que acompanhará a tomada do poder, no curso de tutas
demoradas e tenazes, POder o proletariado chegar ao grau de maturidade polittca. outras palavras, não reconhecer a possibilldade da correção dos "erros", posiçf.o ante-
que lhe permita obter a vitória definitiva da revolução" (grlfos noasos). riormente já asslnalada·.

176 177
O PROBLEMA DO "SALTO"

Tôda a distinção entre a Ordem e a Revolução resume-se, como


se pode inferir dos passos anteriores, em saber se o "salto" é teOri-
camente possível, vale dizer, pràticamente realizável sem perverter
a natureza mesma do objetivo colimado. A questão do "salto" en-
volve dois problemas em uma só proposição. Por um lado, há o pro-
blema teórico, da organicidade do processo histórico, cada forma
social surgindo após o completo fenecimento das anteriores que lhes
deram origem - e tal seria a posição da Ordem;48 ou da possibili-
dade de se estabelecer uma forma superior mesmo não se tendo ple-
namente realizado as que historicamente lhe deveriam dar origem
- e esta seria a posição da Revolução.•• Por outro lado, existe o
problema prático que impõe seja a necessidtule de tulequtJT os meios
aos fins que se procuram realizar, pois os fins são condicionados
pelos meios e por êles se revelam na realidade objetiva - ainda
uma vez mais, posição que por sua organicidade corresponde à essên-
cia do pensamento da Ordem - seja o sentido mítico e mJ.r.tico da
História como fato a cumprir-se necessàriamente, de tal forma que
a perversão caustula à natureza do fim proposto pelos meios de q~
48 C!. Gramscl: "1!:: o problema das retaçõea entre estrutura e superestrutura que
se deve suscitar e resolver exatamente para chegar a uma justa análise das fôrças
que operam na história. de um periodo determinado e definir sua relaç§.o. :t precisO
evoluir nos llmites de dois principias: 1 - a.quêle segundo o qual uma sociedade
não se prop6e tarefa alguma para a qual nAo existam já as condições necessárias
e suficientes. ou condições que estariam ao menos em vias de aparecer ou desenvol-
ver-se; 2 - aquêle segundo o qual sociedade algUma se dissOlve e nAo pode ser subs-
tltuida enquanto nrro se desenvolveram tOdas as formas de vida que estAo contidas
Implicitamente nessas relações. A partir da renexAo sôbre essas duas regras funda-
mentais, pode chegar-se a desenvolver uma série de outros princípios de metodologia
histórica"; op. cit., pãg. 236,
49 C!. Trotsky: "A teoria da revoluçAo permanente, renascendo em 1905, decla-
rou guerra a essa ordem de idéias e a essas disposições de espírito. Ela demonstrou
que, em nossa época, a reallzaçAo das tarefas democráticas a que se prop6em os
paises burgueses atrasados leva-os diretamente à ditadura do proletariado, e que essa
cOloca as tarefas socialistas na ordem do dia. A 1dé1a fundamental da teoria estava ai.
Enquanto a opinião tradicional considerava que o caminho para a cUtadura do pro- .
letariado passa por um longo período de democracia., s teoria da revoluçAo perma-
nente proclamava que, para os países atrasados, o caminho para a democracia passa
pela. cUtadura. do proletariado. Por conseqüência, a democracia. era considerada nAo
como um !1m em si, que deveria durar dezenas de anos, mas como o prólogo 1m.ed1a.to
da revolução socialista, à qual a prendia. um elo indissolúvel. De certa maneira, tor-
nava-se permanente o desenvolvimento revoluclonãrio que la da revoluçAo democrá-
tica. até a. trans!onna.çã.o sochtllsta ds sociedade"; in "iLa. Révolutlon Pennanent",
Idées, NRF, Galllma.rd, Paris, 1963, pága. 42-3.

179
se lançou mão para realizá-lo não impedirá se efetive o milênio - Assinale-se, todavia, e a retomada da observação parece-nos
e estamos novamente diante do pensamento revolucionário. pertinente a melhor distinguir a Ordem do "partido da ordem", que
O problema, contudo, não é tão simples, nem a escolha tão a oposição entre a Ordem e a Revolução só tem sentido se .as consi-
fácil entre os dois caminhos antes que se definam precisamente os derarmos como ações históricas e se, assim considerando-as, souber-
têrmos da equação. Em outras palavras, antes que se estabeleçam mos estabelecer como se deu que a oposição ao sistema global se
quais os fins a alcançar e em que consiste o "salto", que a Ordem traduzisse por concepções da ação semelhantes na forma e antitéti-
reputa teàricamente impossível, pois viola a organicidade da História, cas pelo conteúdo; em outras palavras, como foi possível conceber
e pràticanzente negativo, pois desvirtua os fins, r;o e que a Revolução a luta contra o sistema nas sociedades periféricas a partir de totali-
afirma não só pràticamente possível, como teàricamente necessário.rn dades e de referência tão diversas: urna, o processo histórico; outra,
O fim, quer para a Ordem, quer para a Revolução, é alcançar o próprio sistema de produção.
a liberdade. E bem verdade, contudo, que a totalidade referida por
uma e outra sendo diversa, o objetivo a que se dirige a ação não
~de ,ser c:onsiderado em têrmos absolutos. Para a Ordem, êsse obje- 1 - O "salto" em Rousseau
hvo e a hberdade possível nas sociedades periféricas, condicionadas
que estão por sua posição de dependência dentro do sistema global; O problema do "salto'" é um problema teórico e prático -
para a Revolução é a liberdade necessária a romper a solidariedade como tal, em sua particular história, corresponde a dois momentos
do sistema e precipitar o advento da sociedade socialista pela crise distintos, aos quais se faz mister compreender para explicar as po-
geral do capitalismo. 52 sições respectivas da Ordem e da Revolução: o momento crítico-
-teórico e o momento crítico-prático, os quais se podem referir aos
50 "Ninguém pode criar com êxito movimentos .sociais, ou políticos, contra 0 de-
tenninl&no da história. Mas é que o aprlsmo não é uma invençA.o fantástica, nem séculos XIX e XX, embora seja no século XVIII que se tenham
um capricho, nem um espasmo an·ârquico, nem uma conjuração criminosa. Mais gestado. Realmente, é no século XIX, com Karl Marx, entre outros,
fundo e mais forte, o aprtsm.o é o credo libertador de um povo que quer redimir-se"
(IV, 120-1); "Porque tão perigoso é viver imitando como tentar uma ruptura insólita que encontramos claramente formulada a origem comum da Ordem
e o desconhecimento simplista de todos os precedentes" (II 48). e da Revolução- mas é no século XVIII, com Jean-JacquesiRous-
51 "Marx esperava, ademais, que os franceses começa.s.s~ a revolução socialista,
que os alemA.es a tivessem continuado e ClS inglêses terminado, Quanto aos russos, seau, que vamos ter a primeira exposição do problema do "salto",
permaneciam longe da retaguarda. A realidade foi diversa. E tentar aplicar mecâni-
camente ao caso particular de; URSS, na fase atual de sua evolução, a concepçA.o
dado como teoricamente necessário e eticamente indispensável, pois-
histórica universal de Marx, é cair logo em inextricáveis contradições. ( ... ) o tempo é o momento ético-normativo que permitirá à História reencontrar
não é de form& alguma um fator secundário quando se trata do processo histórico: é
infinitamente mais perigoso confundir o presente e o futuro em politica que em a Natureza.
gramática, O desenvolvimento não consiste ... na acumulação planificada e' na "me- Contràriamente à tese sustentada por Rodolfo Mondolfo, que
lhora" constante do que é. Comporta transformações da quantidade em qualidade
crises. saltos para a frente e recuos". Trotsky, ·La Révolution Tra'hie, Publicações d~ afirma a inexistência, em Rousseau, da consciência histórica, pois
IV Internacional, Paris, S/d, págs. 42-3. não pensa em uma "renovação vinculada às condições históricas
52 Confronte-se a passagem abaixo de Haya de la Tôrre: "A tarefa imediata de
nosso Partido é exigir a liberdade de palavra, de imprensa, de organização em nome existentes e destinadas a cumprir-se paulatinamente, seja num difícil
dos direitos elementares de todo o povo que se chama livre. E essas liberdades não caminho de ascensão, que saia daquelas, seja na dura luta com elas",
as pedimos apenas para nós. Queremos que todos os cidadãos do pais possam exercê-
-las salvo os que estejam condenados pelos juizes. Conseqüentemente, reclamamos o pois a volta à Natureza "mediante uma imersão na inferioridade da
efetivo restabelecimento dos direitos individuais, não como graça, mas com'O justiça, 'consciência, instinto divino, guia seguro' ( ... ) exige uma liberta-
sem privilégios para· ninguém", Impresiones, pág. 140.
Com estas de Trotsky: ção dos vinculos e influxos das condições históricas", 03 pode esta-
"A criação espiritual tem necessidade de liberdade. A idéia comunista que
visa a submeter a natureza à técnica e a técnica ao plano para constranger a maté-
belecer-se no "Discurso sôbre a Desigualdade" e na "Economia Polí-
ria a dar ao homem, sem recusa, tudo aquilo de que êle necessita e mais que isso. tica" a vinculação da "renovação" às condições históricas - desde
essa idéia visa a um fim mais alto: libertar para sempre as faculdades criadoras do
homem de todos os entraves, dependência humilhante ou duras coerções. As relações que se considere o "salto" de uma perspectiva ética, portanto norma-
pessoais, a ciência, a arte, não deverão suportar piano algum lmpôsto, uma sombra tiva. 54 A consciência histórica impregna todo o "Discurso", e apenas
qualquer de obrigação, Em que medida a criação espiritual será individual, ou cole-
tiva? Isso depende inteiramente dos criadores. 1 Outra coisa, o regime transitório. A a consideração do caráter irreversível da passagem do Estado de
ditctdura exprime a barbárie passada e não a cultura futura. Ela impõe neces.sària- Natureza ao Estado de Sociedade permite entender porque o pri-
mente rudes restrições a tôdas as atividades inclusive à atividade espiritual" (pág
151). "Tal é a doutrina marxista ... Mas os' autores da constituição invocam ... ~ meiro "seguramente não existirá jamais": é que uma vez relacio-
programa do Partido escrito por Lenin. Ali se pode ler: ' ... A privação dos direitos
polittcos e as restrições, quaisquer que sejam, feitas à Uberdade só se impõem a titulo 53 Rod.olfo Mondoifo, "Espiritu revolucionaria ... ", ci.t., pé.gs. 16-7.
de medidas provisórias ... A medida em que desaparecer a possib111dade objetiva de 54 Cf. R. G. Oollingwood, The Idea of Histury, A. Galaxy Book, Oxford Untver-
exploração do homem pelo homem, a necessidade que impôs essas medidas provisó- slty Press, Nova York, 1956, pá.gs. 86-7: ''Rousseau era um fllho t1a nustra.çA.o, ma~~
rias cessará. de fazer-se sentir'", pág. 219, La Révolution Trahie, cit. pela sua reinterpretaçA.o de seus principios, tornou-se o pai do movimento romãntt-

180 181
nado - e portanto negado enquanto sujeito - a outro ser humano, sente a igual título que a natureza o foi no passado logicamente con-
o homem abandona a condição natural làgicamente postulada, per- cebido.
vertendo de tal forma sua natureza fundamental que não pode ter A proposição rousseauniana é fundamentalmente uma proposi-
mais esperanças, no plano estrito da história làgicamente concebida, ção revolucionária - e nisso Mondolfo tem plenamente razão. Mas
de reencontrá-la na vida social. Essa desesperança decorre do fato como a sua revolução, mais que histórica, é êticamente concebida,
de que foi a vida em sociedade que conduziu àquela especial depra- só se poderá dar no instante em que negar "as condições históricas
vação que marcará o Homem para todo o sempre, distinguindo-o existentes", as quais, pelo pêso da inércia, das tradições e da corrup-
de forma irretratável do animal com o qual, na pureza dos senti- ção gerada pela desigualdade impedem a volta do homem à Natu-
mentos e na ausência de necessidades secundárias, anteriormente se reza - isto é, seu reencontro consigo mesmo num plano histórico-
identificava. Mas não apenas nisso se faz presente a consciência his- institucional superior. O "salto" rousseauniano não principia pela ne-
tórica - a ligação orgânica entre o passado, o presente e o futuro: gação das estruturas, nem da condição humana deformada tal como
também e sobretudo no tocante à propriedade, que se no "Discurso" a estátua de Glauco. Afirma-se no terreno das instituições políticas,
é claramente denunciada como a origem de todos os males que acome- que é por onde devem começar as transformações que darão ao
tem a humanidade, na ''Economia Política" é reconhecida - em vir- homem uma nova natureza conforme não ao que existe, mas ao
bem, já não mais "natural", mas "social" - tal como o Direito
tude, exatamente, da organicidade e irreversibilidade do processo
Natural se formula diferentemente conforme o homem esteja no esta-
histórico - como indispensável a que se mantenha a coesão social
do de natureza, ou viva em sociedade. É a revolução, depondo o
a que deu, em última instância, origem. A renovação a que alude
tirano - que igualara os homens na ausência dos mais elementares
Mondolfo está, pois, estreitamente vinculada às condições históricas, direitos criados pelas necessidades da vida societária - que faz que
as quais, embora concebidas como lógico-históricas e não histórico- êles regressem a um estado de natureza não idêntico ao primitivo,
-sociais, nem por isso deixam de ser históricas.
mas eticamente diverso e superior, pois é aquêle em que por sôbre o
Ao inverso do que pretende Mondo!fo, portanto, a adesão ao torvelinho das paixões fala a voz do coração, a "consciência, instinto
esquema lógico-histórico deveria, esquecida a fundamentação ético- divino, guia seguro". É uma transformação que não se dá pela sim-
-normativa de todo o pensamento rousseauniano, levar não à reno- ples evolução normal, dir-se-ia "histórica" enquanto orgânica, das
vação, mas à perpetuação da desigualdade, já que a propriedade, condições reais de existência, mas por uma afirmação da vontade
origem do mal, é também condição indispensável a que o homem dirigida para um fim eticamente superior, a qual não estando presente
permaneça fiel ao contrato e viva em sociedade pelas normas que na proposição reiterada de estabelecer o govêmo justo mediante a
ela criou - das quais, aliás, dados os progressos do espírito humano, afirmação da revolução interior de cada um pela superação do "amor
não mais pode se apartar. 55 Todavia, importa notar que o esquema próprio" e pelo estabelec4'nento do "amor de si", será irrealizável
lógico-Jtistórico existe não por si e para si, mas enquanto fwuiamen- na prática.
tação da proposição renovadora; êle serve tão apenas como ponto O contrato social se faz, em Rousseau, por um ato de vontade
de referência da ação transformadora das condições de existência - individual e coletiva, porquanto resultante da tomada de cons-
atual do homem, e como elemento teórico capaz de estabelecer os ciência do todo pelas partes, das condições de existência social pelos
limites dentro dos quais a renovação se deve dar a fim de que não indivíduos que as constroem56 - sem o qual a superação da desi-.
seja fadada desde o inÍCio ao malôgro por desconforme à naturew gualdade é pràticamente impossível. É êsse ato de vontade que rompe
fwuiamental do homem e à sociedade, parte integrante dêle no pre- o processo "normal'' - a rigor, "patológico", co~n.o acentua Louri-
co. ( ... ) Por êsse aspecto de seu pensamento, o romantismo representa uma nova ss Cf. Lourival Gomes Machado, op. cit.~ pâg. 103: "O contrato nada mais é
tendência ~ ver um valor e um tnterêsse positivos nas civUizações multo diferentes senão a tra·nspos!çé.o, para o plano da consciência, da realidade social e a formUla.çA.o
da sua. lsBo por si só, pode conduzir a uma fút11 nostalgia. do passado, um desejo, explfclta, em regra racionalmente formUlada e voluntAriamente aceita, do processo
por exemplo, de trazer de volta a Idade Média; ma.s na verdade êsse desenvolvimento natural da formação dos grupos e da trans!lguraçA.o do individuo pelas relações so-
era contrabalançado pela presençtt, no romantismo, de outra concepção, qual seja, ciais. Como o único obstácUlo que poderia opor--ae a êsse avanço da consciência e
a concepçA.o da história como um progresso, um desenvolvimento da razão humana, à efetividade dessa regra, encontrar-se-ia nas resistências egoisticas, nos remanes-
ou a educação da humanidade. De acOrdo com essa concepção,, oe estágios passados centes da auto--auficiência indlvldual que continuassem a operar malgrado os com-
na história conduzem nece.ssàrlamente ao presente; uma dada forma de civilização só promissos da vlda rela.clonal, o contrato completa-se em um só dispositivo: 'essas
pode existir quando os tempos estão maduros para tal, e tem seu valor exatamente cláusUlas, bem entendidas, reduzem-se tôdas a uma só, a saber: a aUenação total
porque essas são as condições de sua existênCia", de cada associado com todos os seus direitos a tôda a comunidade'. Asslm, a apll-
55 A propósito do sentido ético-normativo dtt obra de Ro~au, c!. Del Vecchio, CB'ÇA.o dos principias à prática sempre representará a mais simples e direta expressão,
Persana, Eiitudv y Derecno, Inst1tuto de Estudlos Pollttcos, Madri, 1957, especial· em tênnoo de organização consciente, ou seja, polftlca, das leis natur~~.ls do proceMO
mente o estudo: "Sôbre la Teoria del Contrato Social", pág. 188 e segs. social. E, para torná-las ativas e operantes, hé. a vontade geral".

182 183
vai Gomes Machado - supostamente refletido nas condições pre- senta-se diversa, seja porque as instituições, mais que as estruturas,
sentes defendidas pelo "partido da ordem", para peffilitir que a podem ser estabelecidas pelo ato de vontade de um grupo, ou de um
história, à qual se atribuiu urna finalidade, possa reencontrar sua homem, seja porque é exatamente através delas que, '.'x~r~ndo o
estrada real apesar dos desvios e atalhos assinalados pela desigual- poder de Estado sua função coatora e ~o mes':?o tempo dlSC!plma<!ora
dade. das relações pode estabelecer (a partir da força que o caracteriZa)
A proposição do contrato significa, destarte, um rompimento novos canais pelos quais devam fluir as relações entre os homens,
com a história exemplificada nas "condições. . . existentes" - mas alterando-se destarte, sem contrariar a linha evolutiva do progresso
histórico, o~ elementos que nêle são aleatórios e não imutáveis. :f:
59
é o ~~salto" indispensável a que o verdadeiro e o justo encontrem
sua realização histórica concreta. O momento crítico-prático, depen- tôda a concepção que vem de Maquiavel e em Rousseau encontt:"a sua
dendo portanto da intervenção da vontade e traduzindo-se na rea- justificativa n? pl_:mo ético, ~m que_ o Secre,tár!o Flore~tino não o
lidade por uma nova instituição política, não nega o momento crítico- situara. Qual e, a esse proposlto, a açao do Prmcrpe, se nao, operando
-teórico, pois não perde de vista o desenvolvimento lógico-histórico "sôbre um povo disperso e pulverizado", nêle ~~suscitar e organizar
da natureza humana, nem deixa de reconhecer que a irreversibilidade a vontade coletiva", 60 mediante "a educação política de quem não
do processo exige que o já incorporado, como segunda natureza, à sabe, educação política não negativa ( ... ) mas pos!tiva, de. quem
pessoa moral do Homem seja conservado na nova sociedade - em- deve reconhecer determinados meios, ainda que propnos dos trranos,
bora servindo a objetivos diversos, pois as energias e os bens huma- como necessários a quem deseja determinados fins"? 61 É C: aspecto
nos serão colocados a serviço da igualdade e não mais da desigual- voluntarista e ativista do pen.samento de 11 Nostro que r.mpregna,
dade. 57 Em suma, o usa/to" resulta, no pensamento de Rousseau, assim, fundamentalmente tôda a teoria do ((salto" tal qual a enunciou
numa transformação in.stitucional profunda - política e educacional o século XVIII: voluntarista, porque a ação humana tran.sformadora,
- a qual permitirá a reorganização da sociedade tendo em vista o revolucionária é concebida como produto da vontade, que supera
que há de natural (social) no homem e a necessidade de reapro- as condições históricas "patológicas" para estabelecer as <(normaiS';
ximá-lo do que êle ainda conserva de natural (natural). :fl um ato ativista, porque é apenas o desejo, que se diria compulsão, de influir
de vontade - e como tal só pode se afirmar enquanto salto por no processo de transformação, a militância, em suma, que ,etmite
s~bre as con,?ições objetivas que o desaconselham por inatnral, ou superar as dúvidas quanto à viabilidade ética da revolução tran.sfor-
vmlador da ordem natural" das coisas." madora anunciadas por Rousseau na <(Resposta ao Rei da Polônia", 62
O ~'salto" anuncia-se, pois, em Rousseau, como um problema mediante o reconhecimento, por uma parte, da juridicidade- donde,
que só encontra solução no plano institucional - não estrutural. no pen.samento rousseauniano, da eticidade - do ato que depõe o
No campo das estruturas sociais - aquêle em que se gerou a desi- sultão, e por outra da necessidade de fazê-lo para permitir que se
gualdade mediante a distinção entre ricos e pobres - , a margem resolva "uma infinidade de problemas de moral e de política, que
de liberdade deixada ao homem é de fato limitada, porquanto a os filósofos não podem resolver". 63
ação transformadora está estreitamente condicionada pelo caráter cole- 59 o exemplo da propriedade é típico. Uma vez lnstituidEt entre os homens,
livo das estruturas e pelo processo histórico que, apesar de fruto da não se pode mais suprimi-la ao risco de não haver mais nada que garanta a adesão
do homem ao pacto social. Mas ao govêrno legitimo cabe regulamentar o seu uso
intervenção do homem na natureza e na própria sociedade, não pode de tal :rorma que se estabeleça a justiça- distributiva esquematizada na última nota
ser alterado a seu talante. Já no plano institucional, a questão apre- do Discurso sóbre a Desiguatd.aàe.
60 Gramscl, Note sul MacchtaveUi, sulla Politica e sullo Stato Moderno, E:l.naudl,
57 Engels, embora vendo em Roussea.u apenas o filóso:l'o da burguesia, reconhe- Turim, 1955, pág. 3.
cendo-lhe, todavia, o _caráter de prec~ de Marx em alguns campos, e apesar de 61 Ibidem, pág. 10.
apoiado apenas no Discurso sôbre a DeSlgualdad.e, chega a conclusões semelhantes. 62 "E com dor que pronunciarei uma grande e :ta-tal verdade. Só vai um passo
Ct. Anti-Duehring, Foreign Languages Pubiishing House, Moacou, 1962, pág, 192: "E do saber à ignorância e, :l'reqüentemente, as nações estão e:rn alternativa entre um
assim a desigualdade uma vez mais se trans:l'orm& em igualdade; não contudo, na e outro; nunca se viu, porém, um povo que tenha se corrompido, voltar à virtude.
primitiva igualdade do Homem primitivo que não possuia a linguagem, mas na igual- Em vão pretenderíeis destruir as :l'ontes do mal; em vão subtraríeis os alimentos da
dade superior do contrato socia1. 08 opressores são oprimidos.. Jt a negação da nega· vaidade, do ócio e do luxo; e:rn vão, ainda, reconduzirieis os homens a essa prim~ira
çã.o". Já Btarobinskl, Jean-Jacques Rousseau - la Transparence et l'Obstacle, Plon, igualdade conservadora da ignorância e :tonte de tôda a virtude; seus corações, uma
Paris, 1957, aproxima o "Discurso" do "Contrato" para chegar a idêntica- posiç&.o. vez corrompidos, o serão para sempre; ndo há mais remédio, a ndo ser uma grande
01. especialmente págs, 33-5. revolução quase tlto temível quanto o mal que possa curar, e que é censurável dese-
58 C:l'. Starobinski, op. ctt., pág. 13: "Ora, se a queda· é nossa obra, se é um jar e tmpossivel prever"; in Obras, I, cit., pág. 82.
acidente da história humana, dai resUlta também que o homem não está natural· 63 Discurso sóbre a Desiguatd.aàe~ ctt., pág. 210. 01. a observação de Lourival
mente condenado a viver na descon:l'iança, na capacidade e nos vicias que as escol- Gomes Machado (op. ctt., pág. 255, nota 119): "o tira.nlcídiO legitimo, isto é, o direito
tam. !:sses são obra dO homem, ou da SOCiedade. Não há, portanto, nada ai que de matar o mau principe, :I'Ora preocupaç&.o doutrinãria e - por que não? - pr&.tica
nos impeça de re:l'azer ou desfazer a história, tendo em vista reencontrar a transpa- de prtmelra importância ao tempo da consolldação das monarquias nacionais e das
rência perdida. ( ... ) Porque o acontcci:rnento dO mal :l'oi um :tato histdrtco a luta
contra o mal pertence ta:rnbém ao homem na história", ' lutas religiosas. ( ... ) Roussea-u aqui volta corajosamente ao tema- que se tornara.

185
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2 - A contradição da século XIX s1çao política do liberalismo, ao mostrar que a democracia repre-
sentativa, tal qual praticada na Inglaterra, submetia o povo, pela
O século XIX é chamado a resolver o problema da desigualdade, transferência de soberania implícita no esquema do jusnaturalismo
que fôra apenas aflorado pelo pensamento anterior e não fôra resol- moderno a um igual despotismo que as monarquias absolutas -
vido na Grande Revolução. O problema, para os pensadores pós- exceto n~ dia das eleições. No século XIX, a falência do ideal liberal
-revolução não é apenas teórico; é essencialmente prático, pois sua da igualdade juridicamente concebida, permitiu que as tendências
não-solução ameaçava a filosofia de ser negada pela realidade, que reformistas e revolucionárias ganhassem em preeminência e disputas-
se transformava em uma direção que todos reconheciam injusta e sem a hegemonia do processo ao liberalismo, substituindo-o como
não concorde com a proposição igualitária da Declaração dos Direitos soluções globalizadoras do problema da igualdade, a qual se deveria
do Homem e do Cidadão. Nesse século, são várias as tentativas de realizar não no plano juridico-institucional, mas no da igual opor-
resolver a questão: urnas deixam ao livre jôgo dos indivíduos, racio- tunidade real de apropriação das possibilidades econômicas e de
nais por definição, a procura das melhores soluções harmonizadoras mando - portanto, no plano das estruturas.
do conflito entre os que têm e os que não têm; outras pretendem Em 1844, a nova mentalidade faz a crítica da posição jurídico-
encontrar a solução para o problema da desigualdade mediante um -política: "O periodo clássico do intelecto político é a Revolução
ordenamento da vida social próximo da planificação, cabendo ao Es- Francesa. Ao invés de ver no princípio do Estado a fonte dos males
tado a tarefa não mais de assistir passivamente ao entrechoque das sociais, os heróis da Revolução Francesa, pelo contrário, nêles viram
paixões e dos apetites de domínio, mas de enquadrá-los numa mesma a fonte dos inconvenientes políticos. Assim Robespierre vê na grande
direção a fim de que das energias índividuais assim associadas pu- pobreza e na grande riqueza apenas um impedimento à democracia
desse resultar um esfôrço coletivo no camínho da superação da pura. E deseja estabelecer urna geral frugalidade espartana. Princí-
necessidade. Tôdas, porêm, por mais diversos que fôssem os meios pio da política é a vontade. Quanto mais o intelecto politica é unila"
teral, isto é, mais acabado, tanto mais crê na onipotência da vontade,
propostos para atingir o fim, estavam impregnadas pelo que de fun-
tanto mais é íncapaz, portanto, de descobrir a fonte dos males so-
damental havia no pensamento do século XVIII sôbre as relações ciais".65 ..
entre Indivíduo, Sociedade e Estado, e, especiahuente as planificantes O problema que se apresentava à consciência militante do século
por urna noção altamente valorativa do papel que ao Estado cumpria XIX não era, contudo, tão-só "descobrir a fonte dos males sociais'~
desempenhar no processo destinado a alcançar a liberdade - seja mas "também resolvê-los - embora sua solução dependesse do exato
a atual, seja a teoricamente postulada como ideal. conhecimento de sua origem. Era, assim, o momento crítico-prático
A realização da idéia liberal provou para a consciência militante o que solicitava a atenção dos reformadores e revolucionários - e
do século XIX a sua ínadequação à realidade: o Estado gendarme essa exigência militante só poderia ser satisfeita desde que o momento
viu-se incapaz, impedida que estava de intervir pela proposição teó- crítico-teórico conseguisse apanhar em tôda sua plenitude "a origem
rica, de resolver as crises sucessivas da economia em expansão, assim e os fundamentos da desigualdade entre os homens", como Rousseau
como a miséria a que a construção do capitalismo condenava, neces- batizara, cem anos antes, seu esfôrço criador.
sàriamente, largas camadas da população - prova evidente de que A fonte do mal para os revolucionários do século XIX, como
a racionalidade presumida do mercado não podia, sem sacrifícios para o cidadão de Genebra, é a "divisão do trabalho, onde tôdas essas
enormes, ser transferida para o terreno da organização política e contradições [entre o trabalho manual e o intelectual, a qual faz
social. 64 No século XVIII, Rousseau antevira a falência da propo-
poderoso e a concepção bastante larga para conc111ar em um mesmo princi~lo tôde.s
objeto das piores perseguições sob o despotismo esclarecido - e, assim, faz uma de as questões, tódas as op1n1ões, todos os lnterêsses, mesmo antagônicos, nao. fareif
suas maiores contribuições ao espírito revoiuclonãrlo em formação, rebaixando o senão aumentar a desordem. Faze1s a. tarefa- da democracia e atraiçoais a Republica. ·
rei à sua condlçã.o de homem falível e, sobretudo, de criminoso punível". Atente-se, A democracia supõe, a priori, a independência. absoluta dos cldad!.os. Só admite entre
porém, que o importante não é apenas punir o criminoso, maa fazer do ato de sua êles a. solidariedade que êies livremente consentiram, A idéia que ela. se faz da.
punição o inicio do processo de superação da desigualdade e do estabelecimento da sociedade é a de um contrato, expresso ou tácito, cujas ciâusulas sâo a expressão
sociedade legitima. de uma vontade sobel'tUla em si e inviolável. Ela só compreende a liberdade e a.
Igualdade à maneira bárbara, isto é, como direitos negativos, um de todo e qualquer
64 Cf. P. J. Proudhon, Textes Choisies, apresentação e comentários de J. Lajugie, impedimento, outro de tóda superioridade. Nelas ela não vê, com o economista:, o
Dalloz, Pa.rls, 1953, pá.g. 367 e sega.: "Se me fôsse permitido oferecer o tributo de produto de uma organizaçâo na qual ca'Cla existência. é a resultante de tôdas as outras
meus conselhos a M. Blanc, d1r-1he-1a-: 'A questão social permanecerá. para vós inso- existências. (,,.) Em uma tal disposição de espirlto e com tais idéias, como a ~~o­
lúvel enquanto a trat8.l'des pelo método democrático, materialista e dlvisionário a.o crac1a deveria considerar a questâo social? e como poderia pretender resOlvê-la. ·
invés de proceder de maneiro conjunta e sintêticamente. ( ... ) E necessário mudar 65 Marx e Engels, werke, Benlm, 1957, I, pâg, 402, apuà Galvano Della. Volpe,
de marcha ou renunciar à VOSS& emprêsa. Se não tendes o espirlto suficientemente Rousseau e Marx, Edl.tori R1un1ti, Roma, 1946, pá.g. 41, nota.

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pelo todo e pelas partes que o compõem, respeitando-se as conquistas e superiores não tomam jamais seu lugar antes que as novas condições
r~alizadas pela humanidade ao longo de seu processo evolutivo, inclu- materiais de existência dessas relações tenham sido incubadas no
SIVe aquelas que, como a propriedade, haviam contribuído para esta- próprio seio da velha sociedade"."
belecer a desigualdade (embora nesse respeitar estivesse implícita a A impossibilidade teórico-prática do "saUo", contudo, não radica
transformação das condições institucionais em que os homens exer- apenas em que se não possa, por um ato de vontade, abolir a pro-
ceriam seus direitos para que se pudesse estabelecer a justiça distribu- priedade e estabelecer a nova ordem; deve buscar-se muito mais na
tiva). Já para o pensamento marxista, a revolução só poderá propor- compreensão profunda de que sendo, o comunismo, a forma histà-
-se como possibilidade concreta no instante em que a realidade tiver ricamente superior da associação humana, só se poderá e só se deverá
produzido tódas ru condições - materiais, sociais e de consciência dar quando a abundância fôr tal que, desaparecendo a necessidade
- que permitirão exatamente superar aquêles estágios da evolução como mola impulsora da associação humana, o homem não mais seja
histórica que, como a propriedade, conduziram à alienação. Para levado a se reunir tlJo-só para superá-la, nws se associe aos outros
Rousseau, a transformação profunda do quadro institucional em que porque a associação com seus semelhantes decorre de um ato de von-
se move o homem - desde que se dê com a consciência coletiva do tade livre. Há uma passagem da Ideologia Alemã que elucida o
fim último a que se destina - é suficiente para alterar suas condições problema do comunismo como superação da necessidade, só podendo
de existência social - e dessa perspectiva, a critica dirigida a Robes- dar-se, portanto, como feito dos povos dirigentes, vale dizer, das
pierre igualmente lhe cabe; para Marx, tal transformação institucio- sociedades hegemônicas no sistema global, pois industrialmente desen-
nal só é possível quando as fôrças produtivas, alterando-se tenham volvidas: " ... por outro lado, êsse desenvolvimento da fôrça produ-
alterado as condições de existência social - certo, pela ação dos tiva ( ... ) é uma pressupasiçiio prática absolutamente necessária
homens que fazem a hi~tória, mas a fazem nos quadros mais amplos pelo próprio fato de que, sem êle, apenas a carência deveria ser gene-
'lue ela lhes traça, pms enquanto produto da ação coletiva ela é ralizada e de que, por conseqüência, com a necessidade deveria reco-
mcontrolável por um esfôrço da vontade, ainda que essa seja a de meçar a luta pelo necessário e tôda a antiga. . . sordidez se restabe-
um grupo. lecer. .. ". 78 A inevitabilidade do advento do comuni~mo, postulada
Ao assim proceder teôricamente, o Marx teórico estabelece ao como momento normativo e afirmada como exigência prática dã cons-
~ilitante que nêle existia, as limitações para a própria ação: "E/np!- ciência militante, encontra assim a sua limitação teórica no fato de
rwamente, o comunismo só é possível de um só golpe e simultânea- deverem existir, para sua efetivação, os "elementos materiais de umâ
mente se fôr o feito dos povos dirigentes, o que pressupõe o desen- transformação total, isto é, por uma parte, as diferentes fôrças de
volvimento universal da fôrça produtiva e as relações mundiais con- produção e, por outra, a formação de massa revolucionária" - ele-
comitcu:tes", '~ as~im .devendo ser, pois "enquanto ( ... ) as fôrças mentos sem os quais "pouco importa que a idéia dessa transformação
produti~as nao sa? amda bastante desenvolvidas no seio da própria tenha sido enunciada já cem vêzes", pois não se realizará, "conforme
burguesia para deiXar entrever as condições materiais necessárias à o prova a história do comunismo". 79
libertação do proletariado e à formação de uma sociedade nova, êsses Há, assim, pela colocação do problema da superação da desi-
teóricos Ços socialistas_ e os comunistas] não são senão utópicos que, guaidade no campo estrutural e não institucional (jurídico-político),
para obviar as necessidades das classes oprimidas, improvisam siste- uma contradição interna no pensamento revolucionário do século XIX:
mas e põem-se à procura de uma ciência regeneradora". 76 Não há, insistindo em que o essencial é libertar o homem da necessidade em
destarte, d7ssa perspectiva, possibilidade do "salto", porquanto "uma que o colocou o regime capitalista pela miséria crescente. e pelo agra-
sociedade Jamais desaparece antes que estejam desenvolvidas tôdas vamento constante de suas contradições internas, e em que apenas a
as fôrças produtivas que possa conter, e relações de produção novas eliminação da carência permitirá superar a necessidade, estabelecendo-
75 Ibidem, 177. Karl Korsch, condenado pela SOCial-democracia e pelo Komlntern -se a liberdade, o pensamento revolucionário, par um lado, postula
quase ao mesmo tempo que Lukacs, escrevia em 1950 em suas "Dez teses sôbre o
Marxismo, hoje": "6. 0 - PartiCUlarmente criticas são, no marxismo, os seguintes
a missão transformadora, ativista ~ miütante, da organização dos de-
PDD;tOS: a) o fato de ter estado pràticamente subordinado às condições econômicas e siguais, decorrente da tomada de consciência pelo proletariado da
POilticas pouco desenvolvidas, na Alemanha e em todos os outros países da Europa
Central e Oriental onde !ria adqUirir uma importância política; ( ... ) b) a aceitação situação histórico-social em que se encontra, missão essa que apena~
1ncond1cional de tomar o estado econômico avançado da Inglaterra como modêlo
para o futuro desenvolvimento de todos os países e como condição objetiva prelimi- 77 Marx, Contribuição à Critica da Economia Politica, "Prefácio", Ed. Flama, Sã.o
nar da tranSição ao soctalismo", in Korach, Marxisme et Philosophie, Les Editions PaUlo, 1946, pág. 31.
de Mlnuit. Paris, 1964, pág. 187. 78 Marx, Iãéologje Allemande, cit., pág. 176.
76 Marx, Miséria da Filosofia, Ed. Flama, São PaUlo, 1946. pág. 115. 79 Ibidem, pág. 186.

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tão valorizados: é porque no seu irromper se via a comprovação de Constrangido, assim, a se apoiar sôbre dados já ultrap~ssa?~>S
que as condições para que o socialismo se realizasse estavam dadas. •s no momento em que passava à ação, o pensamento revoluc10nano
O prefácio que Engels escreveu, em 1895, para a segunda edição do século XIX, na análise post-mortem das situações em que havia
de As Lutas ,de C~se na Fr~a, é exatamente a confissão de que antecipado o Milêni.o, encontrava a c:onfirrnação .d~s suru: t~es cen-
emp~egando esse metodo de analise, ao qual faltava a noção de hege-
trais sôbre a necessidade de maturaçao das cond1çoes ob]el!vas para
moma e que postulava a necessidade de se possuir uma "clara visão passar-se à transformação socialista .. E 51ue o. pensamento aplica~o
de conjunto da história econômica de um dado período", o político à realidade nela verificava que a históna havm demonstrado, apos
deve esperar, para propor normas à ação, a acumulação e seleção de os malogros de 48 e 71, "que o estado de desenvolvimento eco-
todo o material estatístico - o que impede, exatamente, que se atue nômico do continente ainda estava muito longe do amadurecnnento
corretamente nas situações atuais, porquanto se é obrigado a "tratar necessário para a supressão da prodnção capitalista"; mais do qne
a situação econômica existente 1W comêço do período estudado como isso, que passara "o tempo dos golpes de surprêsa, das revoluções
dada e invariável para todo o período". Essa limitação imposta pela executadas por pequenas minorias . conscientes à frente. d,as mass~
realidade, implicando num "inevitável desaprêço pelas modificações inconscientes". Esse ater-se à totalidade do processo h1stónco fazm
que se operam ao mesmo tempo na situação econômica isto é na mister ao encerrar-se o século, sob pena de repetir-se o êrro dos
própria base de todos os acontecimentos que se examin~, só pode jacobhtos, um "trabalho longo e perseverante" pa,~a que ~ massas
ser uma fonte de êrro". E o colaborador de Marx estende-se em compreendessem do que se tratava, porquanto a revoluçao. econ~,­
m~trar as sucessivas pr~vas a que o método foi submetido na prática,
mica que, a partir de 1848, ~poder<;>n-se de ,t<;><Jo. o contmente ,
assinalando com a humildade própria dos espíritos realmente devo- agravando as condições para a msurre1ção ol.?"rana, nnportava ~e~o­
tados, ao conhecime~to científico da realidade que " ... a história nhecer que, depois dela, "na I.uta de classes tôd":' as c~adas medias
tamb~m nos desmentm, revelando que era uma ilusão, nosso ponto
nnnca se agruparão de modo Jnte_!fament': e~c~usiVO e~ tomo ~o pro-
de Vista daquela época. Ela ainda foi mais longe: não só dissipon letariado a tal ponto que o parl!do reac10nano reumdo em tomo da
nosso êrro de então, mas, igualmente, subverteu de forma total as burguesi~ desapareça por completo. O 'povo' aparecerá, p~anto, sem-
condições nas quais o proletariado deve combater"•• pre dividido, e, assim, faltará u~a al~vanca poderosa, .tao ef1~~ em
. ~arale~a.meme, a condenaç~o do blanquismo pelo qne tinha de 1848".96 E 0 beira-mar revoluciOnário que se anuncia, assiiD, e~
drreçao pohllca 1solada do movnnento da classe operária - dir-se-ia 1895, o qual encontra, todavia, no Partido Soc!al J?emocrata, a "':'ssJ-
u~~ direção quase aristocrática - levava o pensamento revolucio- bilidade de inversão do fluxo, pois a organJZaçao do proletanado
nano a converter o movimento "que suprime o Estado de coisas alemão "fornece mais de mn quarto dos votos depositados" nas umas,
~tnal", na. própria finalidade da organização da classe operária; com tendo assim a possibilidade de converter-se "até o fim do século ...
I~so,. perdia-se de vista, no dizer de Luxemburgo, que "sà-mente a na fôrça decisiva do país, fôrça diante da qual terão de se inclinar,
fmahdade dá à nossa !:'ta socialista espírito e conteúdo, e faz dela queiram ou não, tôdas as outras". 97
mn.a luta. de classe. E nao devemos compreender por finalidade, como Assim, sôbre o pensamento revolucionário do século XIX, da
d !Z!a Heme, tal ou qual representação da sociedade futura e sim perspectiva da Revolução, "nevava copiosamente. U~ sudárw d~ neve
o que deve preceder a qualquer sociedade futura, isto é a ~on~uist~ envolvia os pinheiros. ( ... ) Ao anoitecer, mn dm, o carteuo ...
do poder políticon.95 ' trouxe mn volumoso pacote de jornais de Petersburgo. ( ... ) Era
93 A introdução do conceito de hegemonia na anáUse de situação corrente re-
como se mn furacão fnrioso se precipitasse dentro do quarto pela
vela-se altamente produtiva do ponto de vista da compreensão teórica da ação revo-
lucionária. lt êle que, permitindo formUlar o quadro geral ideal em que se desenvolve ].anela aberta. A greve avançava, estendia-se, se apoderava das cidades
- navegava de ve.Ias. <:_nf unadas " .98
um determinado processo de produção, dari ao analista e ao estrategista da ação mna após outra. ( ... ) A revoluçao
revol'::lcionâ~ia a possibUidade de sa·ber se esta ou aquela classe ainda conserva sua
posiçao dingente (em têrm.os de formUlação daa direções intelectuais culturais e
Era 1905, o reencontro da Revolução com as mstltUIÇOes e com a
politicas d~ sociedade) ou se é apenas dominante (no sentido de deter ~ contrôle do solução política jacobina, a subversão da praxis marxista do século
aparelho de Estado, mas sem influenciar o modo de as pessoas verem o mundo) É
a introdução do principio hegemônico - aiiado, sem dúvida, à circunstância d~ 0 XIX. 99
processo Jâ se ter vencido - que permitirá a GTamsci ( Oeuvres ChcYisies cit pâg
234 e segs.) afirmar que a hegemonia da burguesia se estende da Grande 'aev,;luçãÕ 96 Engels, "Introdução", cit., pág. 22.
à Comuna de Paris, motivo pelo qual, acrescentamos, é licito dizer, que todos os
97 Ibidem, pâg. 25. /d • 185
movimentos popUlares do século XIX realisaram-se sob a hegemonia burguesa para 98 Trotsky Minha Vtda Llv. José Olympio Edttôra, Rio de Janeiro, s ., p~g. ·
afirmar os objetivos. de dominação e direção da burguesia. 99 Cf. Mon:dolfo, Marx~ Marxismo, cit., pág, 13: "A ação tnovaâora e subversiva,
94 Engels, "Introdução", tn Karl Marx, As Lutas de Classes na França Ed Vltó- pois que a humanidade desenvOlve em qualquer campo, no curso de seu desenvolvt-
r i a, Rio de Janeiro, 1956, pâgs. 9-28. ' ·
men:to histórico, não se dirlge apenas à exterioridade objetiva, mas também, e mais
95 Rosa Luxemburgo, Reforma ou Revoluça:o, cit., pâg. 92 (grifas nossos).
197
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3 - A revolução de 1905 O essencial a reter do movimento de 1905 é que o proletariado
de um país periférico propôs-se, por um usalto" no :processo de ma-
A importância da revolução russa de 1905 não radica no ter turação de sua consciência, o problema do poder sem a interferência
sido ela o "ensaio geral" da grande transformação operada em 1917· de qualquer agrupamento político saúlo de suas fileiras: transformou,
está, isto sim, em haver possibilitado que, pela primeira vez, usand~ no processo de oposição de largos setores da sociedade global ao
o marxismo como "um método de análise das relações sociais, e não absolutismo, a concepção de sua posição política na sociedade e, por
[como] um método de análise de textos," 100 se formulasse a teoria essa autotransformação das condições subjetivas, suscitou o problema
do "salto" mediante a compreensão da peculiaridade do desenvolvi- da transformação das condições objetivas em que exercitava sua luta.
mento dos países periféricos na constelação do poder mundial. Que Essa nova consciência das relações, todavia, não se formulou, como
tem ela de diferente das outras revoluções' processadas seja na Europa não se formula, intelectualmente, ao nível da consciência expressa;
do século XIX, seja em outros países periféricos? Formalmente, pouco 0 conjunto da massa, mesmo antecipando-se à elaboração teórica
ou nada: é um processo que se inicia com uma greve de "tipógrafos de sua ação, joga-se na "revolução não com um plano. pronto e
que exigiam uma redução das horas de trabalho e um aumento de acabado de transformação social, mas com o amargo sentimento de
salário. Ela se estendeu logo a outros setores da indústria, e, de Pe- não poder tolerar por mais tempo o . antigo regime. É apenas o
tersburgo, ganhou as províncias". Mesmo no seu aspecto político exte- meio dirigente de sua classe que possUI um programa político que,
rior, o qual tomou de surprêsa os chefes da organização clandestina, contudo, tem necessidade de ser verificado pelos acontecimentos e
a diferença não é grande: "As reivindicações, com efeito, concerniam aprovado pelas massas" ,102 Essa regra é universal, mas para ser apli-
seja à redução das horas de trabalho, ao aumento de salários, seja cada é necessário que o "meio dirigente" dela seja consciente e, mais
à liberdade constitucional". O que, no entanto, ela trazia de nôvo - importante ainda, saiba, na análise de situação corrente, veri~i~ar se
e daí seu caráter essencialmente diverso, permitindo entrever um existem as condições objetivas e subjetivas capazes de pernntir dar
amodurecimento da consciência do proletariado mais rápido do que à massa a palavra de ordem da insurreição armada, forma política
a da consciência dos grupos políticos que diziam representá-lo - é de objetivar-se a Revolução, pois "uma revolução não é senão U?Ja
que "a extensão da greve provocou, fêz nascer uma instituição funda- conspiração inteligentemente preparada", que deve chegar ao ato físico
mental da revolução russa: a primeira assembléia dos deputados ope- da tomada do aparelbo de Estado, não podendo resultar "milagrosa-
rários, o Sovief'. O Soviet não era de criação nem bolchevista, nem mente" da greve geral. 103 O problema cifra-se, pois, em saber quê
menchevista, nem social-revolucionária; decorria da organização es- revolução o meio dirigente da classe, seu núcleo hegemônico, podia
pontânea da consciência reivindicatória da classe operária, a qual propor às massas russas que já haviam irrompido na história.
passou em breves meses de sua fase econômico-corporativa ( Grams- A todos os grupos políticos russos não comprometidos com o
ci) à compreensão do problema político mais alto, que é o do poder, czarismo, aparecia claro, em 1905, que essa revolução só poderia ser
fazendo-se intérprete das reivindicações políticas de tôda a sociedade uma: a que realizasse "os objetivos democráticos da Rússia atrasada,
russa não comprometida com o sistema de dominação czarista. Passa- tais como a liquidação da monarquia e de uma situação de quase
gem que se deu, convém assinalar, indiretamente através de uma servidão dos camponeses" .104 A revolução a si própria se definia
iniciativa do czar, que, ~~pós os acontecimentos de janeiro, constituiu como democrático-burguesa, pois êsses objetivos políticos e sociais,
uma comissão, presidida pelo senador Chidlovsky, para investigar a - a monarquia constitucional, ou a república parlamentar, e a trans-
causa das agitações, e essa comissão ordenou aos operários que ele- formação das relações sociais no campo - haviam sido realizados
gessem nas fábricas delegados que exporiam suas queixas".I0 1 na Europa ocidental pela burguesia ascendente, a ela devendo também
caber sua efetivação na Rússia desde que a tarefa dos comurustas
ainda, à interloridade subjetlv~ do ser humano social: praxis que subverte ou renova era se colocar ao lado da burguesia para "uma ação comum contra
o ambiente, enquanto, ao mesmo tempo, se renova ou se suQverte a 8i mesma.. Só
se transformando também a si mesma que a humanidade chega realmente a trans~ a monarquia absoluta, a propriedade fundiária feudal e a pequena bur-
formar as condições de seu viver~ sem a intima mudança da con.sctêncla e da orten~
tação espiritual não se produz mudança verdadeira e substancial alguma da vida e guesia", como vinha cominado no Manifesto. .
da sociedade humana. O mais profUndo significado da "atividade revolucionária ou A tarefa primordial não aparecia, portanto, como sendo realizar
prático-critica" de que fala a I Tese [sôbre Feuerbach] fica assim esclarecido; e a.
concepção marxista do processo histórico e de seu desenvolvimento dinâmico através 0 socialismo, isto é, superar dialeticamente a divisão do trabalho
de uma continua luta interior- que enquanto autotransforma·ção se c·onverte tam-
bém em transfonnação das condições existentes - aparece em sua total evidência". 102 Trotsky, Hi3toire de la Révolution Russe, cit., I, pá.g. 10.
100 Trotsky, "Balanço e Perspectivas, as Fôrças Motrizes da Revolução", apud 103 Deutscher, op. cit., pé.g, 196.
Isaac Deutscher, Trotsky - le Prophéte Armé, JUlllard, Parta, Ul62, pág, 213. 104 Trotsky, La Révolution Trahie, cit., pág. 7.
101 Deutscher, op, cit., pá.g. 177, As citações anteriores estão no mesmo lugar.
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pertenceu ao Estado traz implícita uma posição teórica do problema mente, não percorreu o ciclo dos países avançados, mas nêle se inse-
da ação totalmente distinta da postulada pelo marxismo tal qual divul- riu, acomodando a seu estado retardatário os resultados mais mo-
gado após a morte de Marx e Engels. O Estado, na perspectiva de dernos. Se a evolução econômica da Rússia, em seu conjunto, saltou
1905, não é mais o "aparelho de dominação de classe"; como na as épocas do artesanato corporativo e da manufatura, muitos de seus
velha tradição, é o elemento determinante da Sociedade Civil, o ramos de indústria também saltaram parcialmente certos estádios da
princípio unificador e constritor da Nação, já que foi modelado não técnica, os quais exigiram, no Ocidente, dezenas de anos". 111
"pelas exigências internas da sociedade russa", mas sim pela "pressão Essa ligação da indústria russa com o mercado monetário da
militar das grandes potências européias". "Desde os primeiros tempos Europa Ocidental, a qual se fazia através da íntima associação do
de sua existência, para resistir à dominação tártara, e depois às capital industrial com o capital bancário, retirava da burguesia a
invasões litnano-polonesas, o Estado russo exigiu do povo esforços possibilidade de romper os quadros sociais em que o Estado exercia
incríveis. Açambarcou uma parte considerável, desproporcionada, da sua hegemonia sôbre o conjunto da sociedade; concomitantemente,
riqueza social produtiva. Deteve a formação, já muito lenta, dos meios porém, forçava-a, pela modernização das técnicas bastante visível
de produção. Mas o Estado, porque tinha necessidade de uma estru- em inúmeros setores, a desenvolver um proletariado que se via colo-
tura hierárquica, foi levado a favorecer a diferenciação social. Assim cado face a face com os patrões pela inexistência, na Rússia, de uma
o czarismo ao mesmo tempo impedia e procurava estimular o desen- classe mêdia urbana capaz de interpretar os anseios de liberdade polí-
volvimento da sociedade russa. ( ... ) Até a mentoiidade e o pen- tica em têrmos de dominação de classe. A burguesia era uma classe
samento russos pareciam ser produtos do Estado".' 08 Nesse quadro, social incapaz, portanto, de realizar as tarefas que a história até então
a burguesia teve pequeno papel: "Para defender-se contra os inimi- assinalara deverem ser suas - e incapaz não apenas por sua fra-
gos melhor armados, o Estado russo foi obrigado a criar uma indús- queza política interna, mas também em virtude de sua subordinação
tria e uma técnica, a empregar em seu próprio serviço especialistas aos interêsses europeus ocidentais: "As condições em que se consti-
da arte militar, cunhadores de moeda e falsos cunhadores públicos de tuiu a indústria russa, a própria estrutura dessa indústria, determi-
moeda, fabricantes de pólvora, a procurar manuais de fortificação, naram o caráter social da burguesia do país e sua fisionomia política.
a instituir escolas navais, fábricas, conselheiros secretos e íntimos da A forte concentração da indústria indicava já, por si mesnta, que
Côrte. Se foi possível trazer do exterior os instrutores militares e os entre as esferas dirigentes do capitalismo e as massas populares não
conselheiros secretos, foi necessário, todavia, trazer os meios mate- havia hierarquia intermediária alguma. Ao que se acrescentava que
riais, a qualquer custo, do próprio país. A história da economia polí- as mais importantes emprêsas da indústria, dos bancos e dos trans-
tica russa constitui uma cadeia ininterrupta de esforços heróicos no portes eram propriedades de estrangeiros que não apenas realizavam
seu gênero, todos destinados a garantir os recursos indispensáveis à assim seus lucros às custas da Rússia, mas consolidavam sua influência
organização militar. Tôda a máquina governativa foi construída e, política nos parlamentos de outros países, e que, longe de impulsionar
de quando em quando, reconstruída no interêsse do Tesouro. A tarefa à luta por um regime parlamentar na Rússia, a isso se opunham fre-
dos governantes consistia em apoderar-se das partes, ainda que fôssem qüentemente. ( ... ) Tais foram as causas elementares e irredutíveis
as mais exíguas, do trabalho nacional e utilizar-se delas para os 'obje- do isolamento político da burguesia russa e de sua atitude contrária
tivos propostos" .109 .Bsse fato, associado à extensão do país, sua aos interêsses populares. Se, na aurora de sua história, ela não se
indigência, seu caráter selvagem, sua falta de coesão e à ambição mostrou muito madura para efetuar uma Reforma, não se encontrou
das classes privilegiadas, fêz que o absolutismo russo fôsse não a mais amadurecida quando chegou o momento de dirigir a Revolu-
expressão do equilíbrio existente entre as classes dominantes, como ção".112 Nesse quadro, não contando o campesinato, apesar de seu
no Ocidente, mais o resultado de "sua fraqueza social e de sua nuli- número, em virtude de seu pequeno pêso específico político - "mil
dade política" .11° Contudo, êsse absolutismo, confrontado com as ferroviários em greve pesam muito mais na balança política que um
potências européias, foi também o responsável pela modernização da milhão de aldeões dispersos" - , só restava o proletariado como classe
economia, pela introdução da grande indústria e pela associação da capaz de realizar as tarefas da revolução na Rússia. Mas um prole-
Rússia ao mercado internacional de bens e capitais, especialmente tariado que, tendo sua formação se processado por saltos, "por mu-
dêsses últimos, de tal forma que a indústria russa, "nascida tardia- danças bruscas de situações, de ligações, de relações, e de rupturas
violentas com o que existia na véspera", tornou-se acessível "às de-
108 Ibidem, págs. 209-10.
109 Trotsky, 1905, cit., pág. 25. Ul Trotsky, Histoire de Za RévoZutton Russe, cit., I, pá.g. 20.
110 Ibidem, pág. 28. 112 Ibidem, pág. 22 ( grl!oo nossos) .

202 203
duções mais ousadas do pensamento revolucionário, da mesma forma A classe operária russa surgia, à luz dessa análise, como a única
que a indústria russa retardatária mostrou-se capaz de entender a fôrça capaz de contrapor-se, em têrmos de hegemonia, ao absolutismo
última palavra da organização capitalista". 113 - mesmo que se reduzindo o conceito de hegemonia a uma acepção
Não se trata, para Trotsky, de saber se o proletariado, tendo meramente militar de fôrça. Não importava que fôsse nUlilêricamente
e_nunci~do através do. Soviet o desejo de transformar as relações poli- pequena no conjunto da população; seu pêso específico era grande,
ttcas vtgentes na soctedade russa, deve estabelecer limites para sua porque "na Rússia moderna a supremacia social da população indus-
tarefa transformadora; essa autolimitação, que implicaria abolir o trial em relação ao mundo rural é incomparàvelmente maior que na
absolutismo e o feudalismo a êle ligado sem inaugurar uma forma so- épocas das antigas revoluções européias, e, ao mesmo tempo, nas cida-
cialista d~ produção, não se pode dar, nem sequer pensar, pois a parti- des russas de hoje o caos da plebe cedeu lugar a um proletariado
cu~ar ar!tculação do sistema social russo e suas ligações com o capi- industrial claramente definido" .n• O dever do militante, nessa con-
taltsmo mternacional determinam, necessàriamente, que a tomada do juntura, não é enquadrar os fatos nos textos e nas doutrinas, mas
poder pelo .Pr.oletaria~o se dê como "ditadura proletária", a qual interpretar as situações à luz do método e, considerando que a revo-
terá por ~bje!lvo rea_Ju;ar, sob forma so~ialista, aquelas tarefas que lução só se realizará através da insurreição (o que implica, no limite,
a ~urguesta russa fot mcapaz de cumpnr - e o será sempre, de em reconhecer a validade prática do blanquismo), "organizar o cam-
acordo com a compreensão que tem de seu desenvolvimento histórico. po e ligâ-lo à cidade; unir-se fortemente ao exército; armar-se" -
A transformação socialista da sociedade econômicamente atra- breve, estabelecer a estratégia e as táticas que levarão o proletariado
sada, periférica no sistema mundial, aparece à consciência militante ao poder. Em 1905, sem dúvida, as condições para o triunfo da insur-
não com_o um ato de vontade individual, puro voluntarismo, mero reição não estavam tôdas dadas. Havia a impetuosidade das massas,
"aventunsmo de esquerda". E uma imposição da realidade - a dua- deitando abaixo as estrnturas políticas e as previsões dos doutrina-
lidade prática de padêres criada com a constituição do Soviet -·e dores, mas em compensação o mundo rural estava paralisado "pelo
u,ma exigência· teórica - o reconhecimento de que a burguesia russa excesso mesmo ·de sua miséria", e o "exército não fazia senão refletir
não poderá realizar as reformas democráticas, pois elas implicam a o mundo rural, imenso", conforme assinala Deutscher, além de a
solução do problema agrário, que toca fundo as relações dei domina- classe operária não estar armada. Contudo, o que não se havia 'dado,
ção existentes ·entre os proprietários e os camponeses, e a certeza de note-se bem, eram as condições para o triunfo da insurreição; aquelas
que o capital internacional aplicado na Rússia não poderá suportar, para a emergência revolucionária jaziam latentes no desenvolvimento ·
sem que se abale a posição política dos capitalistas europeus em seus peculíar da sociedade russa. Faltara, portanto, a técnica, a organização,
países, um desenvolvimento acelerado da indústria russa, mediante o e a prova de que assim foi é que, quando as três condições básicas
emprêgo das técnicas mais adiantadas de produção em todos os seto- acima apontadas - união do campo com a cidade, ligação com o
res. Ao revolucionário não seria lícito - louvando-se em considera- exército e o armamento do proletariado - se cumpriram, os bolche-
ções teóricas sôbre a participação numérica do proletariado no con- vistas foram ao poder, comprovando, doze anos mais tarde, a validade
junto da população, ou sôbre o grau de desenvolvimento das condições da proposição teórico-prática, e demonstrando que a Revolução era
materiais de existência - frenar o processo pelo qual o proletariado possível num país em que as fôrças produtivas não se haviam desen-
derrubava, por maturação espontânea de sua consciência, as barreiras volvido o suficiente desde que a classe operária - que a rigor se
do absolutismo, colocando na ordem do dia o problema do poder. Até pode incluir entre os elementos componentes das fôrças produtivas -
a greve geral e a constituição do Soviet, poder-se-ia pensar que a criasse a dualidade de pader e tivesse a dirigi-/a uma organização
burguesia ainda viria a assumir a função dirigente na sociedade russa, capaz de propor em têrmos técnicos a tomada do aparelha de Estado.
pots "pelo objetivo direto e imediato que a si própria se dá, a revo- A visão teórica do problema não se esgota aí, contudo, pois
lução russa é propriamente 'burguesa', porque tem por escopo libertar estabelecer a viabilidade de uma revolução apenas pela existência de
a sociedade burguesa dos obstáculos e das cadeias do absolutismo e
114 Trotsky, 1905, cit., pé.g. 71. As citações anteriores são da mesma. obra, mesmo
do próprio feudalismo". Mas a prova de fôrça entre o absolutismo lugar. Em "Três concepções ... ", Trotsky cita suas opiniões dos anos 1905 e 1906:
e o proletariado mostrou que "a principal fôrça motriz dessa revo- "Mas devemos pergUntar-nos já: deverá a ditadura do pro1etar1a.do arrebentar-se lne-
vltàvelmente contra os quadros da- revolução burguesa?, ou poderá, na base da sltua-
lução é constituída pelo proletariado - e é assim que, por seus mé- çlo hlstórlca existente no mundo, olhar para diante, para a. perspectiva da vitória.,
todos, a revolução é proletária". após quebrar essa fronteira limitativa? ... Uma. colsa pode ser dlta. com segura.·nça.:
sem o apoio governamental direto do proletariado europeu, a classe trabalhadora da
Rússta nao será capaz àe se manter no poder e àe transformar o seu reino tempo-
113 Ibidem, pág, 23. rário numa ditadura socialista duradoura ... "; in Stalin, cit., pág. 432.

204 205
seus elementos técnicos e de organização é reduzir o processo revolu- per o círculo vtcwso em que se debatem a economia e a política
cionário ao mero golpe de Estado. A revoluçãú nãú se confunde com russas. Tenha-se em conta, ademais, que a passagem do poder de
o golpe técnico ou o "pronunciamento"; êste resolve-se em horas e Estado para as mãos do proletariado não implica, automàticamente,
depois dêle basta aos chefes estabelecer as condições necessárias à a realização do socialismo, nem o inicio da revolução proletária;
sua perpetuação no poder. A revolução pode resolver-se, tecnicamen- a "ditadura do proletariado" nada mais é, dessa perspectiva de' análise,
te, também em àias, ou meses; depois da tomada do poder vem a que o instrumento político para o partido operário mais conseqüente
ingente tarefa de cumprir o programa enunciado, sob pena de mer- realizar sob forma socialista, isto é, p/anejadamente, as tarefas ditas
gulhar-se no caos e o revolucionário confundir-se com o vulgar aven- burguesas de transformação social, vale dizer, a industrialização.
tureiro, que jogou com vidas humanas para obter maior soma de A revolução proletária na Rússia só se desencadeará, enquanto
podêres. É preciso, pois, que na realidade se encontrem os elementos processo social, na medida em que, para realizar as tarefas da revo-
capazes de resolver os problemas suscitados pelo irromper do proleta- luçãú democrático-burgnesa, o proletariado fôr obrigado a "levar a
riado na cena histórica, transmudando-a por seu amargo sentimento luta de classes à aldeia, rompendo assim a comunidade de interêsses
de não ·mais poder suportar o status quo, não confundindo desejos que certamente existe entre todos os camponeses, embora dentro de
com possibilidades, nem ficando aquém das tarefas que a situação linhas relativamente estreitas". 117 Daí decorre que a característica dessa
reclama sejam cumpridas. É nesse preciso instante de propor teõri- revolução não é a tomada do aparelho de Estado pelo partido do
camente o problema da passagem de um estágio de evolução para proletariado; bem pelo .,contrário, o que caracteriza é o ato de levar
outro, que se evidencia a coerência do pensamento revolucionário ao campo a consciência das relações de classe definidas pelo esque-
do século XX, que sabe que "a realidade não perdoa um só êrro ma marxista, associado àquele de despertar os camponeses para a
teórico". compreensão de que suas reivindicações, enquanto segmento social
O ponto de partida da chamada "teoria da revolução permanen- incapaz de congregar-se politicamente dB maneira autônoma, só pode-
te" que inspira o pensamento de Trotsky desde 1905, é que "todo rão ser satisfeitas pelo proletariado organizado em poder de Estado.
partido político digno dêsse nome procura apoderar-se do poder para Essa passagem de um tipo de solidariedade camponesa a outra, mais
colocar o Estado a serviço da classe cujos interêsses defende",' 15 pois próprio das realidades urbanas, dá-se primeiramente no pl.aào da
o poder de Estado "não é em absoluto um reflexo passivo dos processos consciência política e das instituições que a espelham, nãú no da
econômicos, como o descrevem os sociais-democratas fatalistas. . . O mudança das relações de dominação e subordinação entre campo e·
poder pode adquirir uma importância enorme, reacionária ou pro- cidade (objetivo superior do socialismo), pois essa só se poderá reali-
gressista, segnndo a classe que o exerce. Mas o poder de Estado per- zar em sua plenitude desde que o progresso das fôrças prodmivas
manece, no entanto, uma arma do domínio da superestrutura", o que tiver permitido estabelecer uma nova forma de circulação dos bens
significa que "a passagem do poder das mãos do czarismo e da bur- econômicos.
guesia para as do proletariado nãú abole nem as leis, nem os pro- A revolução , proletária num país periférico, possível graças à
cessos da economia mundial" .116 É essa consideração político-insti-
compreensão teórica da lei do desenvolvimento desigual do capit<>-
tucional do papel do Estado na tarefa de transformação social que
lismo, reveste-se, portanto, de caráter político-social mais que eco ..
permite afirmar a necessidade da tomada do poder pelo proletariado
antes mesmo que a revoluçãú democrática se tenha realizado - nômico-social; é, pois, uma transmutação no conteúdo das relações
porque o Estado sendo visto em relação com a realidade sociopolí- políticas deco"ente do amadurecimento da consdência do proletariado
tica em que se insere no plano nacional (fragilidade política das clas- - a qual origina, por sua vez, um nôvo conteúdo da coerçãú exercida
ses dominantes, papel preponderante do Estado na direção da eco- pelo Estado enquanto aparelho de dominaçãú e unidade coletiva de
nomia) e no contexto econômico-social em que a nação sôbre a ação - , mais que de uma alteração na posiçãú relativa que as classes
qual afirma seu poder se situa no plano mundial (as ligações da ocupam na escala de fruição dos valôres socioeconômicos. Sem dúvida,
economia russa com o mercado internacional de capitais, traduzindo- a revolução, para ser tal, deve alterar essa posição relativa; mas ·a
-se em interêsses políticos do ocidente europeu em conservar o status transformação das relações de dominação decorrentes da diversa posi-
quo sociopolítico na Rússia), apenas a ascensãú de uma classe des- ção nessa escala resulta, nos paises periféricos que se lançam no cami-
vinculada das instituições políticas da sociedade czarista poderá rom- nho revolucionário, do diferente conteúdo que se dá às relações po-
líticas entre os indivíduos - conteúdo nôvo que se lhes empresta
115 Citado por Deut.scher, <,"ít., pã.g. 212.
116 Trotsky, La Révoluticm Permanent, cit., pág. 19. 117 Trotsky, "Balanço e Perspectiva", in La Révolution Permanent, cit., pág. 165.

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dirigente da classe deve estar preparado, não apenas técnica, mas
sobretnd? teoricamente. O problema econômico, porém, não é cir-
cunstancial, mas. permanente e sua solução não depende da vontade,
j Rússia entrou no caminho da revolução proletãria não porque sua
economia fôsse a mais madura para a transformação socialista, mas
porque essa economia não podia mais desenvolver-se em bases capi-
mas de um conJunto de situações historicamente dadas ou não. :E: talistas. A socialização dos meios de produção tornou-se a condição
por considerar inexistentes as condições que permitiria:n a solução necessária antes de Indo para tirar o país da barbárie: tal é a lei do
do problema econômico, que o pensamento marxista de I 905 marcava desenvolvimento combinado dos países atrasados. Tendo entrado na
passo, preferindo, a. solução da revolução democrático-burguesa ou .!\ revolução socialista como 'o elo mais frágil da cadeia capitalista' (Le-
da ditadura operano-camponesa, a qual, no fim de contas como nin), o antigo Império dos czares deve aínda hoje, dezenove anos
assinalava Trotsky, viria a conduzir ao mesmo resultado de ~ prole- depnis, 'alcançar e ultrapassar' - o que quer dizer alcan{"ar antes
tanado tomar o poder para entregá-lo, pouco depois, à burguesia. que outra coisa - a Europa e os Estados Unidos; resolver, em outros
Para o pensamento revolucionário militante só havia um caminho têrmos, os problemas da produção e da técnica que o capitalismo
a seguir, fôsse embora coberto de riscos, o êxito de sua ação depen- resolveu há muito tempo" .125
dendo de fôrças fora de seu contrôle e já sabidas conservadoras como O "salto", a realização da "ditadura do proletariado" num país
a. decisão ~~ social-democra~i~ européia de lançar-se à revol~ção a periférico, impõe-se, assim, para Trotsky, como necessidade histórica
fim de auxiliar a classe operana russa: aceitar o desafio das circuns- ineludível, a cuja compreensão se chegou por uma análise das ten-
tâncias e .~ssumir, ainda que fundado apenas na esperança, a plena dências gerais do :sistema global. ~le se caracteriza, antes de mais
responsabilidade do poder.''• nada, pela tomada do poder para, a partir do aparelho de Estado,
. A essa solução não se chega, contudo, por mero desejo de alterar-se o regime de propriedade com um duplo objetivo: realizar
afirmar, contra a "Fortuna", a VirtU de alguns príncipes. Sem dúvi- as tarefas de desenvolvimento das fôrças produtivas materiais, a qual
da, a consciência de que a Virti:t pode governar boa parte das ações o capitalismo é suposto incapaz de realizar nos países periféricos, e
humanas, mu?~do o c~_so normal das águas da história, está pre- por fim à desigualdade na distribuição, igualmente impossível de se
sente no espmto do militante - se não estivesse, êle se negaria fazer sob regime capitalista, seja nas sociedades hegemônicas, seja
como tal. Como ~xiste, tam!Jém, a clara consciência de que sendo nas periféricas. Há, portanto, um ideal ético informando a C<l<agem
o Estado uma unidade coletiVa de ação, pode constranger e alterar de ousar tomar o poder cedo demais, o qual se conforma ao ideal
o curso da ':ida social, especialmente quando, como era o caso russo, do progresso que animava o pensamento revolucionário do sécul<>
resultara ~Is da fraq~eza que da fôrça das classes sociais. A solnção XIX' "A ascensão histórica da humanidade, tomada em seu conjunto,
de o1111ar e levado, assim, por uma compreensão teórica profunda das pode ser resumida como um encadeamento de vitórias da consciência
relações entre as sociedades hegemônicas e as periféricas, bem como sôbre as fôrças cegas na natnreza, na sociedade, no próprio homem.
das possibilidades de desenvolvimento que, nas primeiras, se abrem O pensamento crítico e criador pode vangloriar-se dos maiores êxitos
para o capitalismo. Em poucas frases, Trotsky resumiu, em 1936, o até o presente na luta contra a natureza. As ciências fisicoquimicas
problema: chegaram já a um ponto em que o homem se dispõe, evidentemente,
"A história das últimas décadas atesta com uma fôrça particular a tomar-se senhor da matéria. Mas as relações sociais continuam
que, nas condições de decadência do capitalismo, os países atrasados se estabelecendo como attolls. O parlamentarismo iluminou apenas a
não poderão atingir o nível das velhas metrópoles do capital. Os civi- superfície da sociedade, e ainda assim com uma luz assaz superficial.
lizadores no impasse fecham o caminho àqueles que se civilizam. A Comparada à monarquia e a outras heranças do canibalismo e da
selvageria das cavernas, a democracia representa, bem entendido, uma
datada de EstocOlmo: "NQ aniversário do grande dia 9 de janeiro, não deve restar grande conquista. Mas ela não atingiu em nada o jôgo cego de fôrças
na Rússia. o menor traço das instituições czaristas",
124 Cf. Trotsky: "No que se refere até quanto a social-democracia provar-se-á nas relações mútuas da sociedade. :E: precisamente sôbre êsse dominio
capaz de executar a sua tarefa revolucionária, escrevi em 1906: 'Os partidos socia-
listas europeus - e em primeiro lugar, o maior dêies, o partido alemão _ desen- mais profundo do inconsciente que a insurreição de outubro [de
volveram o seu conservanti.smo, que se tru'lla maior na. proporção da grandeza das 1917] pela primeira vez levantou a mão. O sistema soviético deseja
massas abarcadas pelo socialismo e da eficiência da organização e disciplina dessas
mesmas massas. Em virtude disso, a social-democracia, como a organização que introduzir um fim e um plano nos próprios fundamentos da sociedade,
corporifica a experiênCia potítica do prOletariado, pode em um dado momento tomar- onde não reinavam até agora senão simples conseqüências acumula-
-se um obstácUlo imediato no caminho de um choque aberto entre os operários e a
reaça.o burguesa . .. '. Contudo, concluía a minha análise expressando a certeza de das" .126
que 'a Revolução no Oriente contagiará o proletariado do Ocidente com o idealismo
revolucionário, o.oordando neste o desejo de começar a falar russo ccnn o seu tntmí- 125 TrotSky, La Révolutlon Trah.te, c'tt., pé,g. 7.
go' ... ", "Três Concepções ... ", cit., pág. 432,
126 Trotsky, HistOire de la Bevolution Busse, cit., li, pé.g. 631.
210
211
);; êsse ideal ético de racionalizar os fundamentos mesmos da clássico, pois é precisamente no ato de decidir "ousar" que a Virtu
sociedade que leva o pensamento de Trotsky a constituir-se, nas con- e a fé na missão que incumbe às institnições políticas de reformular
dições objetivas de 1905, na síntese da Ordem e da Revolução conti- padrões de comportamento e normas de existir e pensar, se encontram
das no pensamento marxista original: dêle retém a noção fundamental com a necessidade de respeitar o desenvolvimento das fôrças produ-
de que a revolução só se poderá efetuar, no plano ético-normativo, tivas formando um todo coerente ao nível do sistema global. Sem
quando existirem as condições objetivas capazes de permitir que a essa' síntese - a um tempo teórico e prática -·o momento histó-
necessidade não volte a ser o móvel único das ações humanas; con- rico em que se dá a possibilidade de romper o consensus próprio do
tràriamente a êle, afirma que essa maturidade das fôrças produtivas sistema global pode passar desapercebido, e os que não ousarem
materiais niío deve ser buscada em cada pais isoladamente, mas ao deverão resignar-se à constatação melancólica de Kautsky, em 1919,
nível do sistema global. Com isso, respeita-se o processo histórico, quando o bolchevismo lutava por ímpor-se na União Soviética e a
característica fundamental da Ordem, pois se reconhece claramente revolução espartaquista era esmagada na Alemanha pela social-demo-
que a transformação socialista das relações sociais só se poderá dar cracia no poder: "Antes da gnerra, em uma grande parte da social-
quando a técnica mais adiantada dos países hegemônicos fôr colo- -democracia, havia se firmado a opinião de que a era das revoluções
cada à disposição dos países periféricos, mas, ao contrário da Ordem não só na Europa Ocidental, mas também na Alemanha e na Áustria,
. na maturação das fôrças produtivas materiais a condição'
que s1tua estava para sempre terminada. Quem pensasse de outra forma, era
sine qua non para a tomada do poder, em qualquer região, faz essa escarnecido como um romântico da revolução. Agora a revolução é
condição repousar na maturidade das fôrças produtivas sociais, no um fato e ela assume formas de tal brutalidade, que nem mesmo o
ímpeto transformador do proletariado. O processo histórico cumpre- mais fantástico dos românticos dentre nós teria esperado" ."8
-se, assim, no sistema considerado como um tcxlo integrado por socie- );; essa síntese, nessa instância decisória, prenhe tôda ela do
dades hegemônicas e periféricas, e é exatamente essa integração, essa drama da indecisão, da covardia, da ousadia e do radicalismo quase
solidariedade entre as partes, que, uma vez desencadeado o processo próximo a volúpia da ação pela ação, que caracteriza, no pensamento
nas sociedades periféricas, toma necessária a revolução mundial: "Vi- e na ação revolucionários do século XX, o "salto" que a Ordem
vemos sob a lei da história - dizia Luxemburgo em 1918 - e reputa irrealizável. •
a ordem socialista não pode estabelecer-se senão internacionalmente
( ... ) e seria um milagre uma revolução proletária modelar e impe-
cável num país isolado, esgotado pela gnerra, premido pelo impe-
rialismo, traído pelo proletariado internacional. O que importa é dis-
tinguir ... o essencial do acessório, a substância do acidente. Neste
último período, quando nos encontramos nas vésperas de lutas deci-
sivas no mundo inteiro, o mais importante problema ... é precisa-
mente ... a vontade de realizar o socialismo. Neste sentido ["colo-
cando seu verdadeiro e incontestável mérito histórico sob o acúmulo
de erros impostos pela necessidade"] Lenin, Trotsky e seus amigos
foram os primeiros a dar o exemplo ao proletariado mundial. Eles
são ainda os únicos que podem exclamar com Hutten: 'Eu ousei!' ", 12 7
Com o que êsse "ousar" caracteriza o momento em que a vontade
volta a ser o princípio da política, pois é ela que estabelece quando
o partido representante da classe deve ir ao Poder a fím de construir,
em condições econômico-sociais sabidas desfavoráveis no país em que
se jogam os dados, e em condições sociopolíticas supostas favoráveis
nos países hegemônicos, o regíme que exemplariza as condições má-
ximas futuras de desenvolvimento econômico-social dêsses últímos.
É nessa instância decisória que se realiza a síntese do pensa-
mento de Maquiavel, Rousseau e dos jacobinos com o marxismo 128 K. Kautsky, Terrorismo e Comunismo, FratelU Bocca Edltorl, Milão, 1946,
127 Rosa :Luxemburgo, A Revolução Russa, cit., pág. 39. pág. 9.

213
212
III PARTE

O INDOAMERICANO

"No me declaro imparcial. Seria


una tonta hipocresía pretenderia. En
la lucha dei Mundo tengo mi lado
y en la lucha de América tengo mi
puesto.''

HO!Jia de la "'Torre
PRóLOGO

Quando o aprismo começa a construir seu longo e doloroso


caminho para o poder, na segunda década dêste século, a América
Latina é marcada por três fatos lntimamente ligados: primeiro, a
guerra de 1914-1918, que transtornou os espíritos acostumados a
buscar na Europa sua inspiração intelectual e seu modismo literário
ou político; segundo, a abertura do Canal do Panamá, em 1914, pos-
sibilitando mais rápida comunicação entre a Costa Leste dos Estados
Unidos e a América banhada pelo Pacífico, comunicação essa" que,
no decorrer dos ano subseqüentes, permitiu a aceleração da substi-
tuição da influência inglêsa pela norte-americana na América do Sul; ·
terceifo, as sucessivas intervenções dos Estados Unidos nos paises
da América Central, dos Antilhas e no México, cujo inicio se bem
deva ser referido à questão do Texas na terceira década do' século
XIX, a rigor pode remontar (no que diz respeito à nossa análise)
à emenda Platt à Constituição cubana, em 1902, e ao desmembra-
mento da Colômbia pela revolução de 3 de novembro de 1903, pela
qual Tbeodore Roosevelt "tomou o canal" e o Panamá se constituiu
em Estado independente.
São, pois, fatôres ideológicos, econômicos e estratégicos que con-
tribuem para criar na América Latina um clima político nôvo, que
na reação ao manifesto desprêzo demonstrado por alguns círculos
dirigentes norte-americanos em relação aos latino-americanos, vai en-
contrar sua vertebração nos valôres hispânicos e índios supostos respon-
sáveis pela corrupção e falta de medula a que aludia Tbeodore Roose-
velt referindo-se à Colômbia, para com êles construir uma cultura
mais humana e mais cristã e dar aos homens um nôvo sentido pro-,
fundo da vida. A êsses condicionantes, há-de somar aquêles elementos
propriamente indoamericanos, que completam o quadro em que atua
o pensamento político nos anos 20: a irrupção dos setores médios na
217
cena política, disputando a hegemonia aos senhores da terra, e o apa- los anhelos de un mundo igualitario I y rompe en su dramático
recimento do movimento operário organizado - a luta do capital que procenio 1 las cadenas de bronce dei salario. 1 Kropotkine, e! espíritu
se poderia considerar urbano contra a oligarquia rural, e o combate sin brida 1 semejante ai caballo de Mazeppa I atraviesa, Inchando
do trabalho contra o capital. São êsses dois últimos fatôres que emol- por la vida, I las nieves descoladas de la estepa" (Ricardo Rojas).
durarão a reação àqueles três, e será do acêrto ou êrro na interpretação Em 1938, Germàn Arciniegas resumiria o clamor de uma gera-
da relação que entre êles se estabelece, que os movimentos políticos
ção fechada nos estreitos limites da província latino-americana e ainda
traduzirão a realidade e proporão objetivos válidos à consciência cole- incapaz de alçar-se às alturas de guia do mundo: "Nossa cultura não
tiva, ou dela serão apenas deformações, com o que reforçarão ao
longo do processo o status quo. é européia. Estamos negando-a na alma a cada instante. As cidades
que pereceram sob o império do conquistador bem mortas estão. E
Na reação à intervenção norte-americana, os do sul não estão partidos os ídolos e queimadas as bibliotecas mexicanas. Mas leva-
intelectualmente sós: junta-se a êles um bom número de políticos
mos dentro de nós uma negação recôndita. Estamos nos descobrindo
e pensadores do norte, os quais já no pleito presidencial de 1900
a cada exame de consciência e não nos é possível submeter a parte
aglutinavam-se em tôrno de William J ennings Bryan contra McKenley
e os expansionistas, fazendo campanha em nome do antümperialis- de nosso espírito americano por mais silenciosa que pareça. Por
mo sob a alegação de que "a democracia e o imperialismo não podiam outra parte, é questão de orgulho. De não praticar um entreguismo
coexistir no mesmo sistema político, e que os Estados Unidos aban- que nos coloque como servis imitadores de uma civilização, que por
donariam a liderança moral do mundo se começassem a governar muitos aspectos nos satisfaz, mas que por muitos nos desconsola e
povos estranhos".' Passada a Primeira Guerra Mundial e frustrada engana" (apud I, 41). Anos antes, Alfredo Palácios já condenara a
a esperança da paz, novamente a América Latina se sentirá apoiada entrega do espírito e da civilização norte-americanas à plutocracia,
por aquêles críticos da diplomacia norte-americana em nome da mis- como Fausto. Os elementos dessa cultura não entregnista é que os
são mais alta dos Estados Unidos, os quais, num julgamento retros- intelectuais e políticos procuram encontrar, aglutinar e cimentar, pois
pectivo, verão em Theodore Roosevelt o representante da "energia êsse é o único caminho capaz de salvar Indoamérica da arrogância de
norte-americana na forma infantil do poder que faz dos Estados Uni- quem lhe dizia no Istmo em que Bolívar pretendera reunir '1. assem-
dos de hoje o protótipo dos povos mergulhados em uma decrepitude bléia anfictiônica: "Fora daqui! Eu te atravesso, te possuo, te des-
espiritual. A altaneria, a cobiça, a iguorància das vidas dos outros truirei. Minha mão basta".
povos e uma suprema habilidade no manejo das ferramentas tornam Quando funda a "Alianza Popular Revolucionaria Americanâ"
desapiedada a vontade pessoal que encarna. fi uma figura histórica no México, a 7 de maio de 1924, Haya de la Torre não é o único,
grande porque sua proesa - a menos que se retifique em uma forma nem está só. Sai do Peru para seu primeiro longo exílio depois que
última, como a criança se retifica no homem - pressagia o malôgro a Revolução Mexicana havia pago o preço de Vera Cruz e da quase
espiritual de sua nação". 2 invasão da expedição punitiva do general Pershíng, e no instante em
À Europa, que a guerra provara ser capaz de sucumbir espiri- que José Carlos Mariátegni chega da Europa, e de sua cadeira de
tualmente pela falta de um hurnamsmo real, e aos Estados Unidos; rodas inicia, em Lima, a pregação destinada a formar uma classe
que seus próprios filhos viam sem tonus espiritual capaz de fecundar revolucionária, indo buscar nos valôres indígenas da vida americana
a nova civilização que se afirmava ser preciso construir, corroídos que os materiais necessários a construir o nôvo homem e o nôvo mundo.
estavam pela ambição e pela cobiça, Indoamérica só pode, contudo, Haya de la Torre não subscreve, muitos menos, por ausente, o ma-
opor o seu passado mítico e a sua negação exaltada do passado real nifesto com que 24 intelectuais, entre êles Alfredo Palácios, José
e do presente triste e melancólico, identificando a Europa com Paris, Ingenieros e Amôal Ponce, fundam em 1925, em Buenos Aires, a ·
falando mal da Espanha em espanhol e indo buscar no socialismo e "Unión Latino Americana", para "coordenar a ação dos escritores,
no anarquismo europeus com que construir a oposição do "triste y intelectuais e professôres da América Latina como meio de alcançar
colosal rebaiío I sumido en las tinieblas de su engaiío" aos oligarcas uma progressiva compenetração política, econômica e moral, em har-
que "vão à Europa para deixar-se insultar pelos cocheiros famosos monia com os ideais novos da humanidade ... [e] orientar as nações
de Paris" - rastaquoi!ures: "Marx funde en los crisoles de su genio 1 da América Latina na direção de uma Confederação que garanta sua
independência e liberdade contra o imperialismo dos Estados capi-
1 Arthur S. Link e WUUam B. Catton, História Moderna dos Estados Unidos, cit.,
voi. I. pág, 43. talistas estrangeiros, uniformizando os princípios fundamentais do Di-
2 Wrudo Frank, América Htspana, Losada, Buen06 A1res, 1959, pág. 32. reito Público e Privado, e promovendo a criação sucessiva de enti-
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buscando praças para os produtos manufaturados; ora é o capital rágua (1927). Passando pelas incursões de Wilson pela política e
financeiro, desejoso de inversões, empréstimos ou concessões mais pelo território mexicanos - êsses fatos todos apareciam làgicamente
produtivas que aquelas oferecidas pelo abarrotado mercado interno; aos olhos dos latino-americanos não comprometidos com as ditaduras,
ora é o capitalismo trustificado, em sua ânsia de dominar as matérias- nem com a oligarquia dos senhoritos, como o prenúncio da ocupação
-primas fundamentais ... ora, finalmente, é o simples cálculo estraté- militar da América abaixo do Rio Bravo, sobretudo quando se admitia
gico dos silenciosos engenheiros, que preparam um colossal império que a função dos fuzileiros navais era proteger os investimentos norte-
político com vistas à hegemonia universal. Todos êsses fatôres de -americanos, e se sabia que êles iam crescendo. Da Europa, Haya
expansão, latentes em horas afastadas, adquiriram um vigor crescente, de la Torre escrevia: " ... generalizando, o caso de Nicarágua é o
que por último se converteu em necessidade biológica de dilatação" 8 de Cuba, de São Domingos, de Haiti, do Panamá e será o caso do
Há, entre os intelectuais e homens de ação da segunda década Peru, da Bolívia, da Venezuela, da Colômbia e de tôda a América
do século, o consenso de que a expansão norte-americana nas Anti- Latina ( ... ) . A tragédia não chegou ao desenlace. Mas de todos os
lhas e na América Central é parte de um plano mais vasto de modos, a sorte da China é nosso espelho"." Para opor-se a essa
ocupação territorial da América Latina, o qual decorre, em última penetração favorecida pelas ditaduras e pela oligarquia, só havia,
instância, da necessidade em que se encontra o capital de expandir- no pensamento antiimperialista dos anos 20, um caminho: "a nacio-
-se para além das fronteiras nacionais, e do apoio que a bancocracia nalização das fontes de riqueza, terras e indústrias", a qual "poria
encontra nos "silenciosos engenheiros" que preparam o colossal im- malha de aço sôbre os órgãos vivos de nossa economia, impedindo
pério. Mas não apenas a saturação do mercado interno e o cálculo a sucção imperialista", como referia Seoane, e a confederação dos
imperial frio permitem compreender todo o processo de expansão povos da América Latina, como reclamavam todos os pensadores não
norte-americana e de subordinação da América Latina; êle só ganha oligárquicos do período. O caminho, embora reto, era duplo e se
contornos realmente precisos se aos fatôres externos acrescentarmos fazia mister percorrer duas pistas a um só tempo: confederar a Amé-
a "ação traidora das ditaduras ... servilmente ajoelhadas ante o pode- rica Latina e nacionalizar as riquezas - apesar do "muito capital in-
roso vizinho, que lhes empresta dinheiro para seu sustento", 9 e a vertido, dos muitos órgãos entregues à garra nortista", e de serem
postura mental dos "senhoritas ou senhoritas da América Latina, escassas as possibilidades de que uma política de nacionalizaçlto fôsse
que vivem [em Paris] o escândalo do cabaré cotidiano" e que "nas realizada pelos governos que regiam a vida da maioria dos povos.
noites culminantes de agitação antiimperialista latino-americana em Se para os que se reúnem em tôrno da União Latino-ameri:
Paris .. nos diziam, bocejando, de algum café elegante: 'Que venham caná, seguindo o conselho de Ingenieros, o caminho deve ser trilhado
os ianques, homem; se esta é a única coisa que falta a êstes nossos "longe dos tumultos das assembléias e da incômoda promiscuidade
países: que nos conquistem' ". 10 dos elementos de luta", cada qual se comprometendo individualmente
O temor da expansão imperial não resultava tão-apenas da ima- na realidade promíscua, mas a União se preservando enquanto orga-
ginação exaltada dos que encontravam no protesto verbal o único nização, a ação política da APRA é diferente: dirige-se a conquistar
instrumento para impedir o avanço dos fuzileiros navais e mais tarde o poder para construir, onde se apoderou dêle, um "Estado antiim-
o sacrifício de Sandino na Nicarágua. O exame dos fatos passados perialista" capaz de servir de base de operações para a Confederação
mostrava uma progressiva expansão da presença militar norte-ame-
Latino-americana. Só assim, no entender de Haya de la Torre, será
ricana nos países estrategicamente situados com relação ao Canal do
Panamá: a ocupação permanente de Pôrto Rico, conquistado à Espa- possível enfrentar o mal maior, que não são as ditaduras, nem a
nha na guerra de 1898; a emenda Platt à constituição cubana, em oligarquia, nem os novos senhoritos que disputam o poder e Paris
1902; a partilha da Colômbia para que no território do Panamá se aos antigos rastaquoeures: "A tese do perigo maior . . . é elementar ·
construísse o canal (1903); a ocupação de Cuba (1906-1909); o em qualquer estratégia defensiva. O perigo maior para nossos povos
desembarque na Nicarágua (1909); a tentativa de controlar as alfân- é o 'imperialísmo', que ameaça os povos da América Latina não
degas hondurenhas, o contrôle das finanças da Nicarágua por bancos apenas como 'fôrça exploradora, mas também como fôrça conquis-
norte-americanos e o segundo desembarque fi!Il Cuba (1911); a tadora' - com o que ao fenômeno da expansão econômica determi-
Ocupação de S. Domingos (1916); a segunda intervenção na Nica- nado pela alegada estreiteza do mercado interno norte-americano (ex-
pansão que traz consigo a exploração econômica), liga-se também
8 Ibidem, pág. 15 e segs. (nota).
9 Seoane, prefácio citado ibidem, pág. 16. uma opressão de caráter nacional, que ameaça e abate o orgulho
10 Haya de Ia Torre, Impresiones de la Inglaterra Imperialista y la Rusia Sovié-
tica, Editorial Claridad, Buenos Alres, 1932, pá.g, 26. 11 Ibidem, pág. 24.

222 223
crioulo, sendo ressentida por todos, ou quase todos, como de caráter
étnico". 1
O que torna a ação de Haya de Ia Torre distinta da dos demais
intelectuais do período, é que êle constituiu um partido para levar
suas idéias à prática; o que em seu pensamento é original, ou mera
adaptação das teorias européias do período, as quais explicitamente
t
condena, tentaremos examinar nos capítulos que se seguem.
O REVOLUCIONARIO DA ORDEM

Víctor Raúl Haya de Ia Torre surgiu no panorama político da


América Latina como o pensador que buscou formular uma doutrina
que, negando dialeticamente a contribuição doutrinária da Europa,
fôsse capaz de interpretar corretamente nossa realidade e, mediante
uma adequação rígida da prática à teoria, permitir o desenvolvimento
de Indoamérica no quadro do capitalismo internacional. No instante
em que a "restauração republicana" nos Estados Unidos iniciava
aquilo que Samuel Flagg Bemis chama de "liquidação do imperialis-
mo" norte-americano, êle se propôs a uma dupla tarefa: por um
lado, seguindo a linha traçada por seus contemporâneos, negar o
primado da civilização européia, cujo nadir reafirma nos anos 30,
reivindicando para nossos povos a herança cultural do passado e o
lugar de guia, no futuro; por outro lado, disputar a hegemonia à
Terceira Internacional na constituição e liderança de um movimento
antiimperialista de âmbito continental, suficiente para realizar a uni-
dade política e econômica dos pafses situados abaixo do Rio Bravo,
estabelecer condições e limites à marcha do capital e assegurar a vi-
gência das formas políticas da democracia liberal transformada pela
democracia econômica. Essa negação da Europa e êsse afirmar da
América - "Nossa América, Indoamérica" - não se faz desconsi-
derando o que de fundamental a cultura e a civilização européia
nos legaram; mas tal reconhecimento implica, para ser legitimo e
produtivo, a capacidade e a possibilidade de dar a tal legado uma
nova forma e um outro conteúdo, adequado à realidade americana.
~se movimento político, a "Alianza Popular Revolucionaria Ameri- ,
cana" - APRA - , no entanto, só poderá existir e ter possibilidades
de oferecer tarefas concretas à consciência dos povos se reunir em
tômo da bandeira da contenção do imperialismo tôdas as classes
sociais de Indoamérica. A contenção e não a negação, pois negá-lo
significaria em última instância dar a nossos povos, periféricos na
constelação do sistema mundial, a função de "coveiros do capitalis-
mo", a qual é histOricamente superior, no pensamento de Haya de
Ia Torre, às possibilidades de ação dos povos indoamericanos.
224 225
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nanos ou esquerdistas. . . fazendo literatura estrangeirizante", que mente. A antítese alemã é a contra-história. A fórmula nacional-
fazem da tática a razão de ser da política.'O drama da doutrina que -socialista alemã nega a liberdade definitivamente. 'Já não é necessária
nos anos 20 e 30 irrompe como possibilidade vislumbrada de supe- a liberdade' - diz o nacional-socialismo. 'Não é necessária ·a liber-
ração historicamente superior de' uma realidade, cuja antinomia inte- dade em certos momentos, até que sejam alcançados os direitos eco-
rior percebera com grande lucidez, e que trinta anos mais tarde é nômicos' - diz o internacional-socialismo. ~sses dois postulados,
vista tão-apenas como necessária para superar o que das décadas do socialismo nacional e do internacional, adquirem fôrça de tremen-
anteriores se conserva nas estruturas econômicas, sociais e políticas da luta, de tensa puguacidade e constituem a grande tragédia ·pre-
das nações americanas, sem sugerir mais à' ação concreta dos homens cursora da guerra européia". Malgrado, porém, essa "funda diferen-
a possibilidade emocional do "salto" (que êle, aliás, enfàticamente, ça", as duas "fórmulas econômicas" 'dos sistemas russo e alemão
sempre negou) historicamente libertador com que antes, na oposição "politicamente incidem nos mesmos objetivos: antiparlamentares, an-
frontal aos Estados Unidos, fôra visto como tendo acenado aos povos. tidemocráticos e antiliberais. Uma invoca os direitos de classe; outra
Seria, contudo, de pouca valia limitar o cenário a essa reitera- invoca os direitos de raça. ( ... ) Mas êsses novos sistemas incidem
ção, que surge como necessidade interior da coerência de princípios; em um ponto extraordinàriamente interessante: a democracia é des-
êle se alarga e permite uma visão mais lúcida do drama se pensarmos bordo, é desorganização política que rebaixa tôda sistematização eco-
que a transformação da doutrina de utopia que foi (pela negação do nômica planificada. Donde ser imperativa a economia dirigida sob
contubémio oligárquico-imperialista e pela afirmação do capitalismo uma ditadura. Assim, o regime soviético lança a idéia do plano, e a
de Estado como fórmula salvadora) em ideologia que é (pelo reco- concepção nacional-socialista formula em seguida, como em ·contra-
nhecimento e respeito das leis de expansão do capital), se deveu e partida, também sua concepção de plano. Ambos os sistemas con-
poder-se-ia considerar inevitável em virtude das opções fundamentais cordam em que é necessário planificar a economia e imperativo reali-
feitas desde o início de sua pregação. Salvo, como mais adiante vere- zar essa planificação dentro de direções econômicas e políticas antili-
mos, a posição diante do problema do Poder e do índio, seu pensa- berais" (IV, 136). Essa opção pela liberdade não o impedira, todavia,
mento e sua ação nunca sofreram qualquer mudança; sempre foram em 1940, de ver os riscos que a América Latina correria, vencendo
conformados pela necessidade de tudo sacrificar àquilo que desde sem- os aliados a guerra, de ser novamente submetida à política do "big
pre acreditou dever ser o comêço e o fim da Revolução Indoameri- stick" e da "diplomacia do dólar"; afirmava, nessa ocasião, 'que se se
cana: pão com ~herdade. Princípio que, em 1954, resumia nestas conseguisse deter o avanço totalitário, os índoamericanos correriam,·
palavras a propósito da ação popular que "inaugurou e difundiu no para -vencer definitivamente o nazi-fascismo, o risco de ser levados
início do século em tôdas as nossas repúblicas a Reforma Universi-
!ári~": :E ~ela,. os fundad~res da APRA recolhemos duas vigorosas
,, a uma "apressada entrega ao contrôle norte-americano, cuja boa vizi-
nhança pode variar quando retornarem ao poder político de tendência
~prraçoes' idealistas transcntas por nós em palavras de ordem norma- imperialista" (1, 88).
llvas: tornar nossa geração independente do 'colonialismo mental' da Mas mesmo que se ampliasse o cenário para nêle incluir, con-
Eur?pa, .e a de unirmo-o?", trabalhadores intelectuais e manuais, para juntamente, a necessidade da coerência- e a adesão à liberdade, ainda
realizar ]untos uma atreVIda emprêsa de civilização democrática: con- assim estaria êle incompleto e não permitiria a compreensão cabal
federar nossos povos e conseguir para êles a justiça econômica, mas do problema, pois a história apresenta-nos a cada instante pensa-
sem menoscabo de sua liberdade" (11, 43). dores e militantes coerentes, os quais são capazes de reformular as
"Pão com liberdade" - fórmula que elaborou no correr dos táticas em que traduzem na ação o seu pensamento, a fim de con-
anos de exilio, de prisão e de luta política, a qual o faria escolher, formá-lo às novas exigências da realidade mutante. Diversos outros
sempr~, no_s momentos cru_ciais da história da América, o campo em elementos deveriam sem dúvida compor êsse cenário: a compreensão
qu~ VISlumbrasse e~tar a liberdade, que a êle aparece como o valor do problema índio na América Latina - a qual o faz preferir a
ma10r a ser defendido na luta política e social. Em 1945, analisando expressão Indoamérica para designar as repúblicas de comum origem
os resultados da guerra, apontava a "funda diferença" entre o '"socia- ibérica; a visão de que o esplendor dos impérios pré-colombianos deve
lismo internacional, primeira negação do capitalismo como organiza- fornecer, à nova Democracia, as formas básicas de conciliar o desen-
ção internacional", e o fascismo, negação do intemacionalismo socia- volvimento econômico e a democracia liberal com a tradição indí-
lista, mas agindo também sob "bandeira socialista": "A tese russa gena; o ideal de contrapor à Europa e aos Estados Unidos, 'povos-
não está contra a história. A fórmula internacional-socialista russa continentes por seu passado, quando não por seu porvir, o povo-
toma uma nova direção da história e nega a liberdade temporària- continente indoamericano. Mas, sobretudo, o drama só adquirirá con-
228 229
sistência e o espectador poderá acompanhá-lo e compreendê-lo se linha de pensamento, já havia dito: "O Estado antiimperialista con-
ti_ver em conta ~ue tudo isso se toma menor, na análise ideológica, tratará com o imperialismo? 1 Sim", (11, 151 ). O que confirma a coe-
dJante ~a t:nta!lva rea_Jmente ~usada por êle empree.ndida e na qual rência e, considerada sua idéia básica de que "o conteúdo da luta
consunnu toda a sua VIda: realizar um movimento político de esquer- antiimperialista em Indoamérica é antifeudal" (11, 109), permite dizer
da'• que emancipe os povos Iatino-aqtericanos do "imperialismo es- que Haya de Ia Torre se propõe a destruir as estruturas sociais,
trange~ro. . . ~em comprometer sua evolução, nem retardar seu pro- econômicas e políticas latino-americanas responsáveis pelo atraso e
gresso ',. r:spetta~a. ao me~ o t~mpo a. pre~issa teórica - expressão pela dominação política e econômica de Indoamérica pelo imperia-
de condiç~s, obJ~?vas traztdas ~. c~lfiSCI~nCia pela noção, do "Espaço- lismo, sem lutar teoricamente contra o regime capitalista. Em suma,
-tempo .Histó?co - de que nao ha de ser nos paises coloniais depois de haver proclamado a íntima associação da oligarquia com
ou semtcolomats, que apenas vivem sua primeira ou suas primeiras o imperialismo e o apoio que êsse presta à sustentação daquela, 14
etapas capitalistas, que o capitalismo pode ser destruído" (11, 30). deseja extinguir a primeira sem afetar a condição mesma de ser do
Sste é o alfa e o ômega do pensamento de Víctor Raúl Haya segundo. Quer, em outras palavras, fazer uma revolução que trans-
de. la To~: opor-se à -~anifestação_ imperial-expansionista do capi- forme radicalmente a fisionomia econômica, social e poi(tic"' da Amé-
tali~m?, libertar lndoamenca de seu JUgo, mas não propor aos povos rica Latina, mas que, ao mesmo tempo, não violente o que supõe
oprnmdos a luta direta contra o capital, já que essa tarefa cabe ao seja o curso nonnal da História, pois o "salto" - a passagem para
p~oletariado dos centros de o_rigem ~ dominação do capitalismo e o regime socialista - , dado como teOricamente impossível, tentado
nao aos trabalhadores dos pa1ses hoJe conhecidos como integrantes viria negar, na prática, os ideais mesmos pelos quais se luta. 10
do "terceiro mundo". Isso, aliás - segundo êle - , de acôrdo com De todos os seus escritos, transparece clara a consciência de
os ensinamentos de Marx e Engels: "Fácil é inferir [da frase de En- que a revolução de Indoamérica será a um tempo uma revolução so-
gels por êle citada, segundo a qual a abolição do sistema capitalista cial, na medida em que objetiva pôr côbro à miséria das massas e
será realizada pelo "proletariado que se apodera do Estado e trans- à dominação do contubérnio oligárquico-imperialista, e uma revolução
forma _d~sde Io_go os m~ios de pr~~ em propriedade dêste"] que política, em sentido estrito, porquanto deitará por terra as ditaduras
a aboliçao .rad:ical do SIStema capitalista não se pode cumprir senão e estabelecerá um regime verdadeiramente democrático, isto• é, em
onde o capitalismo chegou ao ponto zenital 'de sua curva vale dizer que as opiniões das minorias poderão ser livremente expressas, e em
n~ grandes países que marcham na vanguarda da indús~ia mundial: que o poder do Estado, adquirido pelo sufrágio popular livremente
CUJas bem contexturadas classes proletárias devem realizar a trans- expresso, será utilizado para o bem do povo e não contra êle: "A
cendente tarefa transformadora que o marxismo nos assinala" (11 palácio, qualquer um chega - dizia em 1931, depois da fraude elei-
30). Sem dúvida, tem consciência de que seu ·proposto "Estado anti~ toral que lhe roubou a presidência - porque o caminho que a êle
imperialista" propiciará o aparecimento de condições que poderão conduz se compra com ouro ou se conquista com fuzis. Só quando
levar, a longo prazo, a um debilitamento do sistema mundial, mas se chega ao povo se governa, desde baixo, ou desde!cima" (IV, 73).
~ã". se cans~ d~ repetir que "a teoria aprista reconhece que o impe- Essa revolução - que é duas em uma só: igualizar a todos
rialismo, pnmerra etapa do capitalismo em nossos países, traz a in- perante o direito, a liberdade só devendo ser limitada pela justiça
dustrialização, ainda que essa não seja senão unilateral. E representa (IV, 133), e criar a riqueza para quem não a tem (IV, 175)- não
um período de evolução econômica e civilizadora superior ao do pode ser vista como produto de uma insurreição, ou de uma quar-
feudalismo colonialista. . . Logo, o imperialismo, como fenômeno eco- telada, em suma, da violência: é um longo processo histórico, o qual
nômico, como 'primeira etapa do capitalismo em Indoamérica' - só encontrará efetivamente as condições sociais concretas de sua rea-
etapa de iniludível industrialização progressista - é tão perigoso lização quando se houver efetivado a unidade econômica e politica
quão necessário. Com êle corremos o risco da sujeição, mas sem de todos os povos da América Latina: "Tender à unificação dos
êle seria inevitável a paralisação e a retrogradação" (11, '123 e segs.). países indoamericanos para formar um grande organismo político
Essa posição não corresponde, como poderia parecer, a con- e econômico que faça frente ao imperialismo, tratando de contraba-
cepções elaboradas durante a "guerra fria", pois, em 1928, na mesma lançar um gigantesco poder para o contrôle da produção em nosso
14 " ... o feudalismo, e o lmperlailsmo uniram seus lnterêsses porque se servem
13 C!. U, 173: "A inspiração fundamental, a linha ideOlógica inspiradora da mUtuamente. Nem o primeiro poderia sobreviver nem o segundo abusar em uma
ação que é necessário levar avante organtzadamente assinala a direção de nossa Indoamérlca unida" (li, 133).
marcha: sabemos multo bem que va.l para a esquerda. 1!:sse é nosso rumo e o rumo 15 A dlscussi.o do progra.Ina do "salto" foi feita. na. II parte, "A Revolução e a
é que ilnporta'". A citação é de 1928, repetida por Haya em 195,4. Ordem".

230 231
Solo - é sem dúvida a tarefa inicial e necessária da APRA antes e racas a cuspir no então vice-presidente Richard Nixon, e nesta linha
depois de sua vitória política em qualquer de nossos países" (11, 119). de pensamento concluiu seu depoimento, sintetizando o pensamento
É uma revolução sui generis: a unidade de Indoamérica num povo- do grupo Haya-Betancourt-Figueres-Muiíoz Marin: "Agora, não se
-continente é indispensável a que se possa destruir o poder político sintam muito contentes os inimigos dos Estados Unidos por nada do
e econômico da oligarquia crioula e conter o imperialismo; mas é que disse nesta Comissão. Se meus juizos são nublados, se minhas
também uma revolução que não objetiva mais que o anunciado aci- expressões são ambíguas, minhas intenções são claras. Esta é estrita-
ma. E no máximo continental, não mundial. Embora afirmando a mente uma discussão em família. Refiro-me à família das repúblicas
falência da Europa com centro irradiador da Cultura e sua substitui- americanas. Talvez nos tempos clássicos os homens tenham dito: 'Com
ção por lndoamérica, dirige-se ao homem que vive na América, não razão ou sem ela, minha Cidade, meu Estado'. Durante muitos séculos,
ao que habita o globo, à humanidade teOricamente concebida. Cons- os cidadãos leais disseram: 'Com razão ou sem ela, minha Pátria'.
ciente do que julga serem as limitações e possibilidades de ação Está chegando a época em que começaremos a pensar: 'Com razão
impostas pela realidade, não se propõe a conter a expansão imperia- ou sem ela, minha Civilização' ".16
lista para, a partir daí, apressar num movimento coordenado a des- É essa adesão intelectual e afetiva aos valôres maiores da civi-
truição do capitalismo; pelo contrário, o expresso objetivo último lização ocidental que fundamentalmente marca o pensamento de Haya
dessa contenção é permitir o mais livre desenvolvimento das· poten- de la Torre - e é mister assinalar já aqui que não são todos os
cialidades de lndoamérica no contexto da civilização ocidental, a qual valôres que herdamos de nossos maiores europeus, mas apenas alguns,
se define a si própria como capitalista: "Ainda que déssemos rédeas e em especial os políticos, que se faz mister preservar, já que sendo
soltas à fantasia - dizia em 1928, repetindo-o em 1954 - e ima- "nossa realidade assim tão nossa, [êle, Haya, se coloca] francamente
ginássemos que [Indoamérica] chegaria a formar um conjunto de contra tôdas as espécies de maliciosos pseudo-revolucionários tropicais,
J>Otências _capitalistas rivais dos presentes impérios da Europa, Amé- que repetem discursos europeus para resolver nossos problemas" (I,
nca e Ásia, tal hipótese candorosa e complascente apresentaria as 29). Os valôres políticos- o sufrágio universal, direto e secreto, a
trágicas perspectivas de novas competições e de lutas incessantes e liberdade de culto e de expressão, as formas juridicas que garantem
ruinosas. Não necessitamos insistir, pois, em demonstrar que histo- a convivência dos indivíduos - , êsses devem ser respeitados Rorque
ricamente não chegou Indoamérica à hora da ditadura proletária são inerentes à própria pessoa humana e aceitá-los não significa aderir
nem mesmo à do comunismo sem classes e sem Estado ... " (li, 142): servilmente ao pensamento e à cultura européias. Já as ideologias e.
Em 1_958, voltava a insistir no mesmo tema: "Por outra parte, essas as fopnas de organização a elas ligadas devem ser rejeitadas dada a
reuruoes de nossos Estados teriam por objeto apresentar um progra- "ineludível caducidade da hegemonia da civilização européia e, con-
ma de possíveis relações com as grandes unidades econômicas dos seqüentemente, [do] deslocamento de seu primeiro meridiano cultu-
outros continentes e, para começar, com os próprios Estados Unidos ral para êste hemisfério" {li, 143). Essa oposição víscera! ao "colo-
do Norte, c~ os quais é preciso estabelecer um sistema de relações nialismo mental", à cópia servil dos modelos vindos da, Europa, como
sem hegemoruas, baseado e um verdadeiro 'interamericanismo demo- se europeu fôsse sinônimo de universal, não significa, em absoluto,
crático sem império', o qual, a partir da delimitação de nossas res- um rompimento com o passado - bem pelo contrário, é a procura
pectivas órbitas econ~cas - de uma zona superdesenvolvida junto daquilo que em nosso passado de Indoamérica temos de constante e
a ou~m: subdesenvolvida - , mantenha e resguarde nossa autonomia capaz de contrapor-se a uma civilização que já viveu seu ciclo, e a
e penruta a coordenação das duas, isenta de subordinações, a fim de um pensamento que não pode apreender nossa realidade por tão va-
que Indoamérica possa desenvolver-se livremente e em irrestrito trato riada, contraditória e rebelde às formulações acabadas tão de gôsto
com o resto do mundo. Esse programa não leva implícitas hostilidades dos europeus. É por afirmar a especificidade de Indoamérica, que
a q~em quer 9-ue seja: traz em si um propósito de progresso, uma recusa da Europa aquilo que lhe parece a expressão mais acabada
fmalidade de libe_rtação e a, melhor forma de incorporar nossos povos de seu "imperialismo mental", que é a exportação "de uma fórmula
conJunta. e ~rganizadamente no mundo econômico de hoje" (I, 193). radical que implique na abolição total do sistema capitalista" (Il,
Jose Figueres, ex-presidente de Costa Rica e companheiro de 13) e propõe a emancipação imediata dos "romantismos europeus,
Haya (ademais, ao contrário dêle, provado na luta armada contra russófilos, anglófilos, germanófilos ou italianófilos". " 'Deixemos de
os de~udadores da vontade popular expressa nas urnas), resumiu enterrar seus mortos' e pensemos em nós. Não soframos mais pelas
a 9 de Junho de 1958, perante a Comissão de Relações Exteriores do
Senado norte-americano, as razões que haviam levado o povo de Ca- 16 José Figueres, "No se Puede Escupir a una Politica E'xterlor", in Combate, n.o
1, jul./agôs., 1958, pá.g. 69.

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desditas alheias, que as temos aqui muitas, e abjurando de todo incon- mo devendo como dizia Rosa Luxemburgo, a locomotiva subir a
dicional europeísmo, sintamo-nos filhos da Grande Pátria lndoame- encosta histÓrica a todo o vapor sob pena de ser arrastada declive
ricana, impondo-nos a tarefa estupenda de uni-la e fazê-la forte" (1, abaixo por seu próprio pêso, é preciso regular a pressão de tal f<>ri?a
90). Mas essa "tarefa estupenda" - que se deve realizar num mundo que na arrancada revolucionária encosta acima não se esqueçam atras,
econômico, cuja realidade os apristas não estão em condições de alterar, por pesados e menos aptos a acompanhar o ritmo dado ao pro_c~sso,
pois "a abolição radical do sistema capitalista não pode cumprir-se se- aquêles valôres supremos pelos quais se optou desde o prmctpto e
não onde o capitalismo chegou ao zenite de sua curva, vale dizer, nos em cujo nome se fêz a revolução não para, 'nem pelos líderes, mas
grandes países que marcham na vanguarda da indústria mundial" (li, para e pelos homens de carne e osso. A magnitude da emprêsa reside
128) - impõe a todos responsabilidades históricas únicas, as quais em que se deve conduzir a Revolução para a. fren!e sem desbordar
consistiriam em promover a unificação de lndoamérica no marco do os limites traçados pelos fins a que se propos; nao marcar passo,
sistema capitalista mundial, liquidar o feudalismo e conter o imperialis- lançar a palavra de ordem mais radic~ e tirar de~a ~ô?as as suas
mo, seu sócio, sem violentar a realidade, isto é, sem propor a qualquer conseqüências - atitude própria do duna revolucwnano - , s.e~,
das três classes bàsicamente antümperialistas (o campesinato, o prole- no entanto, permitir que por um só instante se renegue a "tra~tç~o
tariado e a pequena burguesia) tarefas superiores àquelas que lhes são latino-americana" que nos ensina que "a revolução da lnde.IJ:Cndencm
possíveis dadas suas condições reais de organização política. foi um movimento geral contra a tirania. . . e a favor da hberdade,
A tarefa é estupenda porque se determina como supremo esfôrço expressa nos direitos do homem c dos cidadãos proclamados pela
da vontade: por um lado, visa a dirigir a transformação social até o grande Revolução Francesa" ? 0
limite que a consciência das possibilidades reais julga possível atingir Em suma, tendo presente. a experiência histórica, que lhe ensi-
sem comprometer a realização e a manutenção dos objetivos dados nara que o "uso da violência em política expunha aquêle~ que a e'!"-
como fundamentais desde o início, os quais são a não-violência e a
liberdade (como norma orientadora da ação), pois os fins se revelam
pregavam ao perigo de degeru;rar em d~perule'!tes exclus1vos da ;w-
lêncid', e a lição da Revoluçao Russa, ilustrativa do _fato de.~ .força
pelos meios na realidade objetiva; 17 por outro lado, busca construir usada pelos bolchevistas para chegar ao poder ter fetto que fossem
um Estado que garanta "a vida, a saúde, o bem estar moral e· ma- esquecidas tôdas as nobres metas da ~evolução", com:_erten~e:se a
terial, a educação, a liberdade e a emancipação econômica· das classes conservação do poder na "consideração tmportante em toda attvtdade
trabalhadoras, procurando abolir, segundo permitam as circunstâncias do govêmo russo" 21 Haya de la Torre propõe-se a fazer uma revo--
e de uma maneira gradual e paulatina, a exploração do homem pelo lução que, subvertendo o status quo. ~o contubémi~ olig~quico-im­
homem" .18 O caráter grandioso da derrota que a APRA se traça não perialista), não .violente o que a tradtÇao tem. de maiS legttimo. Uma
reside na realização das metas atrás apontadas; ao senso comum elas revolução que mstaure no Peru a democract;t. .qu~ nunc~ teve, s~­
aparecem exequíveis e mesmo como de nenhum conteúdo transforma- bendo-se que ela não se concebe como um premto a matundade poh-
dor da realidade. Surge, isto sim, quando se considera que par!~\ reali- tica dos povos, mas como "uma escola de adestramento p~ra o
zá-las se faz mister liquidar as diferentes etapas socioeconômicas que adolescente político [e] uma ferrament~, um meio de .~onsegu': um
coexistem no Peru e em Indoamérica - as quais dão a seu corpo progresso continuo". 22 :E o que se podena chamar de a rev?luçao da
social mna forma teratológica, em que cada aspecto deformado se Ordem"_ A origem dessa revolução é que veremos a segurr.
transforma em deformante, conservando "vitalidade suficiente para
gravitar sôbre o todo econômico-político" (11, 101) - sem eliminar
as conexões externas, única forma de assegurar um progresso material 1 - Gonzdlez Prada e a Reforma
dos povos. Transparece estupenda se se considera que a lei funda-
mental de tôda a grande revolução é "ou ir para a frente rápida e Natural de Trujillo, Haya de la Torre vê a luz em 1895, ano em
resolutamente, abater com mão de ferro todos os obstáculos e levar que Nicolas de Piérola dirige a insurrei,ção "civilísta" co~tr~ o gene-
seus objetivos o mais longe possível, ou ser jogado para trás de seu ral Andrés Avelino Cáceres, que atraves do general Justiniano Bor-
ponto de partida e ser esmagado pela contra-revoluç'ão";19 e que mes- goiío pretendia usurpar a presidência ao Dr. Pedro Ale.jandrino dei
Solar. O futuro chefe da APRA nasce e forma-se em ambtente conser-
17 Cf. Ha·rry Kantor, Ideologia y Programa del Movimiento Aprista, Ediciones
Humanismo, México, 1955, pág. 100. 20 Carlos Manuel cox, "Nota Preliminar", in IV, 13. .
18 "Pián de Acción Immediata o Programa Minlmo" da APRA, apud Kantor, op. 21 Declarações feitas em 1948 PO'l' Haya de la Torre a Harry Kantor, op. Cit., pág.
cit., pág. 119. 102
19 Rosa Luxemburgo, A Revolução Russa, cit., pág, 18. " 22 Manuel seoane, "Where do we go from here?", apud Kantor, op. cit., pá.g. 121.

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vador;23 aos 22 anos, porém, quando chega à capital, as inquietudes conjurados, unos siete. I Los delatores, unos quince"; quando morre,
manifestadas na adolescência se esclarecem e mergulha fundo na luta
em 1918, seu corpo é acompanhado por uns "velhos muito velhos e
revolucionária contra o "civilismo" oligárquico e o militarismo tendo
uns jovens muito jovens", convencidos de que o mestre deixara um
como inspirador Manuel Gonzáles Prada, o "panfletário e icon'oclasta
legado que era mister cumprir. E vão pô-lo à prova nas lu.tas pela jor-
acusador do passado", como o definiu José Carlos Mariátegui outro
de seus discípulos. O jovem de Trujillo encontra em González' Prada nada de oito horas e em San Marcos de Lima, onde no primeiro quartel
um "tigre real [que] apareceu com as garras ensangüentadas e levan- do século - Augusto Comte é a última palavra em Sociologia - as
do na bôca postas de carne humana"; aquêle que pela primeira vez novas doutrinas são desdenhosamente postas de lado e é permanente
lhe revela o verdadeiro Peru moderno, que não é constituído pelos a recusa constante em abrir os horizontes literários, a vetusta Uni-
"agrupamentos de crioulos e estrangeiros que habitam a faixa de terra versidade desconhecendo o conselho cosmopolita de quem procurara
situada entre o Pacífico e os Andes, [mas] pelas multidões de índios libertar a Literatura da Metrópole e rompera, fínalmente, com o vice-
d!ss~minados na banda .oriental da cordilheira"; a êle se liga como -reinado: "Deixemos de engatinhar e busquemos em outras literaturas
disctpulo e no seu pessnmsmo se forma - um pessimismo que se novos elementos e novos impulsos. Ao espírito de nações ultramonta-
no mestre talvez o inibisse de agir politicamente com maior desenvol- nas e monárquicas, prefiramos o espírito livre e democrático do século.
tura no discípulo se transforma em acicate a levá-lo sempre para a Voltemos os olhos aos autores castelhanos, estudemos suas obras mes-
frente, recusando os favores do Tesouro com que boa parte dos jovens tras, enriqueçamos sua língua harmoniosa; mas recor~eil_l<?S c.onstan-
de seu tempo suspiravam enquanto faziam "política" nas ruas ou nas temente que a dependência intelectual da Espanha s1gmhcana para
repartições públicas. ' nós o. . . prolongamento da infância" .25 E é em San Marcos, em
A influência de González Prada sôbre Víctor Raúl é marcante· 1919, que o movimento que sacudira a Universidade de Córdoba
~ que no mestre mordido pelo zêlo de Justiça, vê alguém que nã~ um ano antes, apanha Haya de la Torre e os estudantes que fazem
lumt~va seus golpes às pessoas, ou partidos, mas os dirigia contra a seu o ensinamento de González Prada: "Os velhos ao túmulo; os
totahdade da ordem vigente: "O Peru é um organismo enfêrmo; onde jovens, à obra!" :É a Reforma Universitária.
se aperta o dedo, brota o pus". Anderson lmbert assim o descreve A Reforma iniciou-se na Universidade de Córdoba, na Ar!ll'ntína,
demolidor: "Era ateu, anárquico, naturalista, partidário do índio ~ e dali se espraiou para as demais instituições de ensino superior da
do trabalhador. Seu único impulso conservador foi o nacionalismo ... Argentina e da América Espanhola. Ela foi antes de mais nada um
Rejeitou a metafísica e abraçou a ciência ... Ao contrário de outros movimento de cunho nitidamente corporativo; como diria mais tarde
cientificistas, contudo, colocava a liberdade e a igualdade acima da Mariátegui, "a ideologia do movimento estudantil careceu, de princí-
ordem e da ?ier~quia, e polemizou ;~ sociólogos positivistas que pio, de homogeneidade e autonomia. Acusava demasiado a ínfluência
falavam da ínfenondade rac1al dos mdws e do fracasso ínevitável da corrente wilsoniana" e apenas através da "colaboração cada dia
dos países hispano-americanos ... Em Marx 'viu um dos grandes agi- mais estreita com os sindicatos operários [nisso devendo ter-se feito
tadores do século XIX', mas se sentia mais próximo de Proudhon sentir a influência dos socialistas, que como Alfredo Palácios, deram
Tolstoi e Kropotkin ... Negou a tradição absolutista espanhola, de: seu prestígio de professor e político à arrancada estudantil], da expe-
nunciou a responsabilidade da Igreja Católica nas iniqüidades do riência do combate contra as fôrças conservadoras e da crítica con-
mundo, conde~ou os privilégios injustos - Exército, Propriedade, creta dos ínterêsses e príncípios em que se apóia a ordem estabelecida,
Estado - , ndtculanzou as academias ... ".24 podiam alcançar as vanguardas universitárias uma defínida orientação
:É González Prada quem rompe a torpitude do ambiente Iimenho, ideológica". 26 Os objetivos últimos de transformação contidos no des-
onde "En nuestras conjuraciones I La vieja historia se repite: 1 Los dobrar da luta pela Reforma Universitária não foram pressentidos
23 O esbõço de biografia política de Victor Ra úl Haya de la TOrre, exposto nestas pelos estudantes; ao lançarem-se à luta, suas reivindicações não ultra-
P~ginas, ~baseado na obra de Fellpe Cossio dei Pomar, V. R. H. de la T., El Indoame- passam os muros universitários, só se transformando em político-
ncano, ctt., de sentido panegirtco, dada a condição do A. de m111tante da APRA
desde 1926 e de Secretário de Cultura do Partido da Povo (denominação legal do -sociais porque "a oligarquia docente, mostrando-se zelosa de seu pres-
aprlsmo no Peru) no momento em que o livro era editado. o verbête "Haya dei la
Torre" da Encyclopaedia Britannica é reconhecido como verdadeiro pelo próprio tígio intelectual", não soube realizar na Universidade "o mínimo de
Haya. de la Torre. Há ainda uma biografia política do líder do apr1smo na obra de
Robert J. Alexander, Prophets o! the Revolution - Projiles oj Latin American melhora e modernização do ensino necessário para não correr o risco
Leaders, Ma~m111an, Nova York, 1926. Obviamente, citamos apenas as obras que
temos em maos. Pois a bibliografia sôbre Victor Raúl Haya de la Torre é extensa. 25 González Prada, "Páginas Libres", citado em José Carlos Mariátegui, Siete En-
24 Cf. E. AndersUil Imbert, "Historta de la Literatura Hispanoamer1cana", Breviá- sayos de Interpretación de la Realidad peruana, ctt., pág. 191.
rios, n.o 89. FCE, México, 1961, págs. 300-l.
26 Mar1átegu1, op. cit., págs. 90-1.
236
237
de uma ~ituação de _escandalosa insolvência".27 o autor dos Sete
Enscuos sobre a Realidade Peruana assim sumaria 0 moviment 0 d sociais no poder" e a entregar pelo sufrágio o "govêmo a homens
Reforma na América Latina: a pertencentes à classe média, organizados politicamente em tôrno do
? ~Q~is são as proposi~ões e postulados fundamentais da Refor-
Partido Radical, surgido três décadas antes"." Em sua contribuição
ma. ongresso InternaciOnal de Estudantes do México de 1921 para a história da Reforma Universitária na Argentina, Florentino V.
propug~J.Ou: ~- )0 pela )larticipação dos estudantes no govêmo das
0 Sanguinetti asim descreve a situação da Universidade de Buenos Aires
~mver~dades, J· ) pela lillplantação da docência livre e da freqüência
1v.re .•. s _estuo antes do <?llile decl~aram sua adesão aos seguintes
antes de 1918:
"Durante a primeira parte da vida argentina, a Universidade pro-
rr_m: 1P10S. I. ) autonom~a da Umversidade, entendida como insti- moveu modestas iniciativas de cultura e formou núcleos urbanos que
tmçao dos al~nos, professores e diplomados; 2.o) reforma do sistema deram à montonera o pensamento da unidade política e da ordem
d~ente, medmnte o estabelecimento da docência ]1'vre institucional. Sua provisão científica era muito escassa, mas bastava
gumte' d a frequencta
.. • · 1.
IVre dos alunos às aulas de Mrte
e, por conse- para as necessidades do meio e para impor as conquistas lentas e
de do· f • · • ~ que no caso surdas do gênio civil. Afirmada mais tarde nossa organização nacional,'
ls pro essor.es ensmarem a mesma matéria, a preferência dos
al~nos consagre livremente a excelência do melhor 3 o) revisão d a Universidade aristocrática e conservadora criou um nôvo tipo social:
metodos 7 do co.nteúdo dos estudos; e 4.o) extensã~ ~niv . • . os o doutor. Os doutores constituíram o patriciado da segunda repúblida,
~m~:J'0 t de Jm~lação efetiva da Universidade com a ~~!a::;i~l. substituindo pouco a pouco as dragonas e os caciques rurais no ma-
nejo dos negócios, mas saíam dos cursos sem a hierarquia intelectual
nesta fó::::u't~. e o uba concretua:am em 1923 suas reivindicações necessária para atuar com pontos de vista orgânicos no ensino, ou
d . · I. ) uma verdade1ra democracia universitária. 2 o)
un:'a ver aderra renovação pedagógica e científica. 3 o) um ' d. para dirigir o despertar improvisado das riquezas fornecidas pelo
de1ra popu1anzaçao· - do ensmo. · • ·
Os estudantes da Colômbia a ver a-
reei pampa e pelo trópico. Ao longo dos últimos cinqüenta anos, nossa
ram em seu progr d 1924 . ama- nobreza agropecuária foi deslocada, primeiro, do campo econômico
bas;s de independê~~ ; ti, .a or_ga':f"ção da Universidade sôbre pela competição progressista do imigrante, tecnicamente mais capaz,
e de novos métodos d~ ;abar Clpaçao os estudantes em seu govêrno e depois do campo político pela advento dos partidos de classe l{'édia.
~ae~n~v;f;dade t de Lima, le~ ~~- ~~c?r~~s~~:f:a~~sv:g~~f~
0
Necessitando então de cenário para manter sua influência, apoderou-
'. sus entaram em 1926 as seguintes plataformas. d f -se da Universidade, que foi logo um organismo de casta, cujos dire-.
d~ auto'_lonlla_das universidade~; participação dos estudantes ~a~~~ tores ~vitalícios se alternavam nos cargos de maior relêvo, e cujos
â:'::,i~oo~=n~~~~od: su:;espectivas ~~ersidade~ ou escolas especiais; docentes, recrutados por leva hereditária, impuseram uma verdadeira

~:te~e~~vaprç~~lilldoenstesomed·taso"!ctsa~stpeedn~a~~~~~s;d~~;;'~~efoe:r~~:~~~~=
servidão educacional de estreitos limites e sem infiltrações renovado-
ras".30 Alfredo Palácios, que não recuava diante da possibilidade
ras · mcorporaçã • · ·d revolucionária aberta pela luta estudantil, dizia: A Reforma Univer-
v~ôres extra-unive~sit,á~ios; socializ~ão da cult;a~ =~:~~~a~~ do~ sitária "terá atingido seus objetivos se depurar as universidades dos
p~ ares, etc. Os pnnclp!Os sustentados pelos estudantes arge tiu po maus professôres, que tomam o cargo como um emprêgo burocrático;
sao em grandes lmhas os n os · · ·
demais universidades latiuc::'::,';:,a::',\~ados pelos estudantes das se permitir - como sucede em outros países - que tenham acesso
ao professorado todos os capazes de sê-lo, sem excluí-los por suas
Na Argentina, a renovação das estrutur . . . . convicções sociais, políticas ou filosóficas; se neutralizar em parte,
relativa industrialização e pela grande m asd ~-"'18 prop1cmda pela
d · f assa e 1m1grantes hav1a leva pelo menos, o cluluvinismo e fomentar nos estudantes o há)lito das
o ao tnun o da classe média na eleição de 1916 e • , f d- investigações e o sentimento da própria responsabilidade. No melhor
ad· a1· . as re ormas 0
~ 9 ;~ ~moj rsstenorment~ fr~stradas pela revolução de Uriburu em
9
C. mU . , quando Hlpólito Ingoyen recém-iniciava sua pr~eira
dos casos, a Reforma retamente entendida e aplicada, poderá contri-
buir para evitar que a Universidade seja, como é de rigor em todos
ges ao,_ ~ mversJdade, apesar da vitória radical, ainda estava fechada os países, como o foi na própria Rússia - país onde havia, contudo,
ao ~~pmto qu~ ~ acentuada urbanização já fizera penetrar nas rei ões como em nenhuma outra parte, uma intelectualidade avançada, que
po~l!ica~, e SOCiaiS, forçan_do os elementos mais progressistas da o~­
qma a aceder de maneira pacífica à participaç-ao dos novos grupos 29 Cf. Glno Germani, "Hacia una Democracia de Masas", in Torcuato S. di TeUa
e outros, Argentina, Sociedad de Ma8a8, cU., pág. 219. No mesmo livro, há os estudos
27 Ibidem, pág. 101. de Roberto Cortes Conde, "Problemas de Crescimento Industrial", e Gustavo Beyhaut
e outros, "Os Imigrantes no Sistema Ocupacional Argentino", que auxHiam a escla-
28 Ibidem, págs. 94-5.
recer o quadro social em que se deu a Reforma Universitárla na Argentina.
30 Apud Mariátegul, op. ctt., pág. 96-7.
238
239
na hora da ação sabotou escandalosamente a revolução - uma Bas- a respeitar-nos; arejamo-Ia, levando-lhe os ventos argentinos: ventos
tilha da reação, esforçando-se por ganhar as alturas do século".at de forte e tremenda, mas salutar tempestade. Logo fomos ?'rus lonjle,
, . Mariátegui concluía a análise: "O movimento da Reforma tinha, e ao costado da Universidade rejuvenescida, mas apems reJUVenescida
log~c~nte: de atacar, antes de tndo, essa estratificação conservadora pela Revolução, criamos outra jovem, forte, e filha sua talvez, .mas
d~s uruvemda~es. ? provimento arbitrário das cátedras, a manuten- como filha 'zaratnstriana', filha vencedora da mãe: nossa Umver-
çao de professores meptos, a exclusão dos intelectuais independentes sidade Popular 'González Prada', onde fundimos nosso credo revolu-
e. renovado~es _se apr;sen~avam clar~ente como simples conseqüên- cionário e nossos esforços com a rebelião dolorosa dos trabalhadores.
Cias_ da docen~Ia ohg_arqmca. :esses VICios não podiam ser combatidos E assim como chamais a juventude operária a vossas páginas [ êle
sena_o por meiO da mtervenção dos estudantes no govêrno das uni- escrevia à redação de uma revista universitária ,arge~tina], .ali cha-
ve~dades e o estabelecimento de cátedras e da freqüência livres mamos a juventude operária a nossas aulas. So assun, urundo-nos
destmadas a _ass.egurar a eliminação dos maus professôres através d~ ao trabalhador, daremos à Revolução Universitária um sentido de
~~ ~onco,?"encm I_ea~ c::om homens mais aptos para exercer seu ma- perenidade e de fôrça futura. 'Nossa_~er;'\'ão' não ~ ~ossa g~ração
gJsteno. ~oda a his_tona ?a Reforma registra invariàvelmente essas estudantil ou intelectual; 'nossa geraçao e a frente u?IC::a das JUV~n­
duas reaçoes das ohgarqmas conservadoras: primeira, sua solidarie- tudes de trabalhadores manuais e intelectnais, frente umca revolucio-
dade recalcitrante com os professôres incompetentes, tachados pelos nária frente única que devemos formar, disciplinar e estender como
alunos, quando hc;m~e ?ep_:rmeio um interêsse familiar oligárquico; '
salvaguarda do futuro d e nossos povos"33
. .
e _segun:Ja, ~ua _res1stencm, nao menos tenaz, à incorporação de valôreS A Reforma Universitária surge aos que dela denvaram para a
n~. un~ver~Itános ou simplesmente independentes à docência. As duas luta revolucionária, como "o primeiro grito de eman~~pa!ão de nosso
reiVmdic~ç~e.s subst~tiv~s da Reforma resultam assim inconfundivel- 'colonialismo mental' - arauto de uma nova consciencm de Indoa-
mente dmietJcas, p~ns nao brotam de concepções meramente doutri- mérica, [que] qualificou expressivamente as ~e!Jtas ~niversidades ,e
nanas, mas de rems e concretos ensinamentos da ação estudantil" a2 seus métodos pedagógicos estagnados como os vice-remados do espi-
. No Peru, iniciando-se pela Faculdade de Letras cuja direção rito'" (11, 93). E assim aparece no momento. e~ que, a guerra
mtelectnal não so~bera substituir os catedráticos defusados com os sepultando as possibilidades de realizar-se a utopia _liberal do 'l!écul_o
progressos da sensibilidade e da produção literárias do pais, 0 movi- XIX e lançando a Revolução Russa as bases do triUnfo da <?~garu­
mento ~e propajlou . aos outros institutos, "onde também o interêsse zação sôbre o Indivíduo, a América Latina reconhece a fragili?ade·
e a r?tina ohgarqmcas mantinham professôres sem autoridade". A do pénsamento europeu e a impossibilidade de a Europa ser a reitora
ag~t~çao, chocando-se com a direção universitária e o govêrno, con- do mundo.
duzm ao fechamento de San Marcos por dois anos de 1920 a 1922. Apesar de longa, a citação de Haya d<: la !or!e resume as inter-
quando os. trabalhos ~versitários são reiniciado~, a par de algu~ r pretações mais freqüentes da Reforma Un~v:rsitána: . _ .
mas conqmstas estndantis consagradas em lei, há Uina outra reali- 'A Reforma fêz-se empurrada pela patxao, pela pruxao enunente
dad~ com a qual a veneranda universidade deve defrontar-se: as Uni- que move tôdas as grandes causas, especialme~te aquelas qu_e são
versi~~des Popul~s~ o~de os estndantes reformistas ensinavam aos causas caracteristicas da juventnde. ( ... ) Para nos, para nossa epoca,
op:rar10s, as qu_rus sao mstaladas em 1921 em decorrência da reso- a Reforma foi uma revolução. Uma revolução nossa, deslocada VIto-
luçao do pnmerro Congresso Nacional dos Estudantes reunido em riosamente para os planos da realidade. Uma revolução cujas causas
Cuzc~, em 19~?· e nomeadas em 1922 "Universidades Populares estavam determinadas por nosso ambiente americano, pelo grau de
Gonzalez Prada , em homenagem ao mestre. nosso desenvolvimento econômico, político e social, o qual deu ao
Po~cos anos mais tarde,_ Haya de la Torre escrevia a propósito movimento legitimidade e, malgrado a insistência com que negava e
da luta mgente de que parhcipou como presidente da Federação dos destrnia criou circunstáncias favoráveis à luta, facilitando seu triunfo.
Es_tudant~s do Peru,_ eleito em 1920: "E no Peru não fizemos outra "A' Reforma Universitária nasce na Argentina, mas tem um
cmsa. Prunei~o, areJam?" a velha e carcomida Universidade de san caráter legitimamente americano. Países onde os aUinentos de popu-
M~os de Luna, a m~Is velha : carcomida da América; arejamo-Ia, lação não se produziram tão ràpidamente como na Argentina, onde
deitando for~ dezesseis ~ofessores ... ; arejamo-la, mudando radi- a imigração é elementar, onde o irigoyenis~o não al_cançou resso-
calmente os siStemas e obngando a uma servil assembléia parlamentar náncia, foram também campos de luta, centros de açao e baluartes
31 Ibidem, pág, 91. 33 carta de Haya de la Torre à redação da revista Estudantiana, citada por
32 Ibidem, págs. 94-5.
Cassio del Pomar, op. cit., pág. 71.
240 241
da conquista do movimento Países d
c~ltores 'situada entre os l~tifundi, ~n e a classe dos pequenos agri- "Mas a Reforma, como a independência americana com relação
nao aparece tão vigorosa como n :._nos ~ os trabalhadores agrícolas'
à Espanha, move-se influída por novos movimentos na Europa, por
industriais e populações despro:m ~gen~na, onde não existem centros
contemporâneas crises profundas, crises de decadência da ordem ca-
ao resto da área nacional com ~mna am~nte densas com relação
profundamente a emoção ;eform~ta u;n~s AITes e Rosário, sentiram pitalista, do liberalismo burguês sangrentamente estabelecido pela
que de um modo geral a R f . en~ mais acertado recordar grande revolução francesa. A Europa, sempre mais à frente, influen-

gr_an des causas fundamentais e orma esta d ete rmmada.
· ···
. . por duas cia-nos e outra vez nos influencia imprecisamente, produzindo em
m_Ic? e social, contemporâne~. dec~ uns ao p~oblema global, econô- nós novos paradoxos. A guerra européia e a revolução russa são o
d~vida a Intensificação do em uxo iossa ;\menca. A primeira é sem crepitar gigantesco de um sistema já velho na Europa, nôvo ainda
pientemente desenvolvidos na Erdem ';lpenai_Ista em nossos meios inci- em nossa América, e são o anúncio de uma fase qne vem. A Reforma
Jue t~~z a grande indústria, 0 grandei~dus~n~l. ( · · ·) O imperialismo, Universitária, ampla, liberal, libérrima, recolhe as correntes de pen-
estr_oi ~r absorção a maior Parte das om~rcw ~ a ~ande agricultura, samento que êsses dois grandes acontecimentos históricos produzem
c?merCio, da pequena agricultura Ain~ enas mdustnas, do pequeno na Europa madura para uma nova crise. ( ... ) Tudo o que aparece
aJu~e em certos casos, pela lei ca .ita!" a quando, paradoxalmente, os de libertário se confunde nos lemas iniciais da Reforma. A classe
subJuga-os, emuralha-os Polltic!:n Ista da concentração, submete-os média oprimida pelo imperialismo sente sua comunidade com os
inst_ru~ento de opressã~ do im e~nt:, o E~tado se toma, pois, ~
opnmida. Quando existe luta de k ~sf.o sobre a massa nacional
VIlDento das classes médias imediat pena Ismos, a luta pennite o mo-
oprimidos da classe proletária. Inclina-se até ela. Busca em nossa
realidade os problemas da exploração industrial que produzem crise
na Europa e começam na América, e usam a linguagem de incita-
tc;>mar o Estado, utilizando a conc;:,ent~ opnmidas, que lutam para
VIlDentos políticos em que d encia. Essa luta determina mo- mento europeu, lançado por uma classe proletária definida e perfi-
ma!s. atingida pela primeira '::.:::"=nha. papel ~undamental a classe lada em longa luta. A mente agrária predominante na América saúda
politJ~o~ de classe média, ou e Je da ID1pen~hsta. Os movimentos ardorosamente todo clamor de liberdade que chega da Europa, sem
nos ul_tunos tempos na Argen~· q na burguesia, que se produziram distinguir qne classe de liberdade é, ou liberdade de qne classe. A
em mmha opinião conquistas ~: ~ no resto da América, não são Reforma incorpora os anelos múltiplos da hora inquietante. Li~eral
n;tentos defensivos de uma classe ma classe vitoriosa, mas movi- à liberdade absoluta, como uma enteléquia, como um noumeno, como
nsco, que se obtêm aproveitando a"f~ada,. capt~ras do baluarte em um dogma redentor que traz a magia de podêres misteriosos e augus-
por ~!guns dêles. u a dos Impenalismos: ou ajudado tos, portadores. . . da justiça final.
,I
A segunda causa. . . chamariam . "Essa inquietação, êsse estado de consciência confuso, lírico, do
estado de consciência, ou mental ( os pr~nam~nte espiritual, de qual pode mofar nm mau marxista, tem cansas determinadas. ( ... )
ser vertebral em nossos organi~~ · · ) , O liberalismo não chega a A Reforma como movimento intelectual, consumação retardada da
menta orgânicamente liberal, de , dpolíticos. Por isso, um movi independência política, surge das juventndes estudantis que são pre-
Apar
. ece mats . tarde, e aparece como
acor o com a .reafd d
I a e, se atrasa.
-
dominantemente de classe média. Empenhando-se por fixá-lo rigida-
~lite nos centros intelectuais d ~ IDOVIlDento moderno de mente em urna classificação de classe européia, pode ser originària-
hsmo que traz a democratização d0 pa1ses
e nossos . · ( · · · ) E o mdustria-
·
mente pequeno-burguês, mas não é um movimento de tendência defi-
Id~de Média, enquanto a produ - ~nsm~. Enquanto se vive na nidamente pequeno-burguesa. Posteriormente podem produzir-se nêle
s~Iba ler e escrever para rod _çao nao exige do trabalhador que
hi~!fárquico, dogmático· mEnop:a ':l~~or · · · a universidade é cimo tendências essas ou aqnelas. No Peru, a Refonna completa-se com
uma aliança de estudantes revolucionários com o nascente proletariado
tifica. ' m e ectualmente, dá rumos e pon-
"A Reforma Universitária é e .
e com as reivindicações do servos indígenas. Da Reforma partem,
a efetiva revanche do autêntico li~:r~~~al e l_egltimamente liberal. E pois, distintas direções. Dela surgem homens que buscam a direita
desenvolvimento de nossos Q Ismo mtelectual exigida pelo e a esquerda. No Chile e em Cuba, como na Argentina e no Peru, a
dade já a reclama .,., I povos. uando a Reforma insurge a reaii·- Reforma é o batismo de sangue de muitos líderes revolucionários,
. d · .c e a que a dete · E '
m ependência na ordem intelectual nnma. ~ c_o';lplemento da embora possa ser, em outros poucos casos, a espaldeirada de ordens
medievalismo intelectual. . Marca o prmcipiO do fim do dos neocavaleiros da reação."34
242 34 Apud Cossio del Pomar, op, cit.~ pãg. 60 e segs.

243
2 - O longo exíüo
É contra Leguía qu~ Haya de la Torre joga a carta que alteraria
Essa idéia da pequena indústria d , . sua existência: a 23 de maio de 1923, já conhecido por sua ação
pequena agricultura, que para sobrevlve o pequeno comercio e da nas lutas da Reforma e sindicais e nas Universidades Populares, é um
voltam para a classe operária e os estud r ao avanço d_o capital se dos principais oradores da manifestação operário-estudantil contra
ela que nos permitirá compreender a con":~s,_ de~ e s~ ~~ada, pois é a consagração do Peru ao Sagrado Coração de Jesus, manifestação
mo. No momento, importa assinalar u çao outrinana do apris- essa reprimida pelo govêmo. No conflito, há dois mortos e vários
se desenrolam as lutas da Reform q e o .Peru dos anos 20, no qual feridos; sôbre o sangue dos primeiros, um estudante e um operário,
pequeno- b urgueses e operários revol a e se. assiste
, . à aliança de est udantes construiu-se depois a Frente única dos Trabalhadores Manuais e In·
pulares, é um país s . ucmnanos nas Universidades Po- telectuais. A luta de rua, seguem-se três dias de encarniçada resistência
-1883), além da per~': r:rfar~Ivas; A G_uerr~ do Pacífico (1879- em San Marcos de Lima, enquanto o Arcebispado cancela a ceri-
Arica e Tacna para o Chile co d~a, regia;:' nca em nitratos, e de mônia de consagração prevista para 31 de maio. Perseguido, Haya
de ajuda mútua com a B J' . n uzrra o paiS, que honrara seu pacto de la Torre passa à clandestinidade sendo prêso a 3 de outubro;
As regiões produtoras de o~v~, a~ e~tad~ de, insolvência financeira. contra sua prisão, operários e estudantes paralisam Lima durante 48
dindo o Estado de buscar na r~ Ipo eca as a Casa Dreyfus, impe- horas numa greve até então inédita. No cárcere, a greve de fome é
despesas, o govêrno de Cáceres ~~~~~-~~~~~~ 1-o que ocorrer às suas sua única arma contra o arbítrio; ante o clamor popular e a resistência
tar empréstimos com a Co or - . m:_a obngado a contra- daquele jovem de 28 anos que há oito dias não come, Leguía é
c~ses e holandeses), conce2:nd';,:~~ Peruana (Imeresses ~giêses, fran- obrigado a ceder; exila-o para o Panamá. É o primeiro exílio, que
VIas do Estado durante 66 e em g_arantia o controle das ferro- só terminará em 1931, quando volta para disputar com Sánchez Cerro
dois milhões de toneladas q':od co~cessoes dpara exportar guano até a presidência da República. Antes de partir para o mundo, Haya
à Corporaç·ao, e o controle
-, da naevenam - ren 1er anualmente of:80 mi! de la Torre deixa sua mensagem à juventude peruana:
o Peru vê somar-se às anteri vegaçao no ago Titicaca. Em 1909 "Represento um princípio, um credo, uma bandeira de juven-
po~- arbitragem, fie~ apenas cooC:' ~0~ilpe~~ de riquezas. naturais;
3 tude. Agito e agitarei as consciências para a Justiça. Luto por condu-
rewao do Acre em litígio com B i! , dos 442 mil km' da zir a precursora revolução dos espíritos, e Dia!digo com todo o ca,lor
Em 1914, a guerra fecha os m o ras - e a b~rracha que se vai. de meu convencimento os exploradores do povo que fazem do govêmo
tmuação do ciclo de dese ercados de exportaçao do país na con- e da política um vil negócio culpável. Se hei-de ir para o destêrro,
na guerra alimenta I si"'.rança. A entrada dos Estados Unidos algum dia hei-de voltar. Retomarei a meu tempo, quando fôr chegado
(especialmente no~!",:,~;i~c,:!~)des concedalidas ao capital estrangeiro a hora da grande transformação. Disse e repito: só a morte será mais
-primas e expandir a rêde Ji .P,~a mst ar-se e extrair matérias- forte que minha decisão de ser incansável na cruzada libertadora que
Estado que, em 19!6 - epodrro~Iana, uma relativa euforia em um a América espera de suas juventudes em nome da Justiça SociaJ."3õ
· , · traz novamente
armtsticto ' nao d Ia pagar seus fun ctonanos. · ' · Mas 0 O exílio é fonte de reflexões, estudo e conhecimento de um
~çúcar e no comércio de ~po~:"'yrêgo _no li~obre, no petróleo, no mundo em transformação. No México, onde serve como "professor
mtraqüilidade em ça~ ~ e1es gado. Nesse clima de missionário" e depois secretário particular de José Vasconcelos, co-
tre e do gu~o e d~e r::~~a:;e me~~~erdeira do fastígio do sali- nhece de perto a insurgência do índio: "NenhuDia experiência histó-
ambições políticas, Augusto B ~en_ e ?a guerra começa a ter rica, em verdade, mais próxiDia e mais aproveitável para os indoame-
agora sua negação · gurn, cnatura do "civilismo'' e ricanos do que a que nos oferece o México. Em minha opinião, a
. , surge como a esperança d I
opnmidos e afastados do Poder· "L" d e argas camadas de Revolução Mexicana é nossa revolução; é nosso mais fecundo campo
grande cidade dentro de d . una eve converter-se em uma de ensaio renovador. Seus acertos e seus erros, seus malogros e seus
grama de irrigação dos ez anos, mas antes de tudo está meu pro- bons êxitos, suas contradições e seus impulsos contrutivos hão-de dar
agricultores e índios IstoP";"'pa~ e sua colonização por pequenos a nossos povos as Diais favoráveis lições. . . A portas do mais pode-
d , · e 0 Importante e imediato M · ·
~ver e ?Jelhorar a condição do índio" A c·d
pôde mats que seu caráter enér ·co· . ?e
I ade
contra o candidato "civili ta" ~ ' ao Poder, conqmstado )Das urnas
· . eu Ir.~lOr
Rets, porem, I
'
roso e imperialista país da Terra, o México fêz o que sua realidade
lhe permitiu fazer ... E não há-de esquecer que o México, em sua
luta revolucionária por sua independência econômica, foi até onde
golpe de Estado - e no p'ode' s cons:gue chegar em 1919 por um pôde ir. Nenhum país isolado de lndoamérica poderia ter ido Diais
quia que pretendera vencer. r se mantem até 1930, aliado da oligar- longe. Essa é a primeira lição que nos oferece a Revolução Mexicana.
244 35 Ibidem, pãgs. 99-100.

245
Suas _limitações e suas ?errotas são características de um povo, que
!uta Isoladamente P?r libertar-se do imperialismo e de seus aliados
1 ordem do comando, milhões de homens que haviam sido lançados à
greve por uma ordem, também voltaram ao ~ra~alho: ( ... ) Os
~:e'!'os sob. a pr~ss.ao do poder formidável e próximo de seu grande operários compreenderam a falta de. comando e mdhoe.s ~e!~ volt~ram
I~nnigo. O nnp;nahsmo é agora um risco terrível para o México e ao trabalho desiludidos com seus lideres. . . mas a dJSciplma pnmou
so se sal_var~. dele por go~pes _de in~tinto ou de ~beldia, ou por um sôbre tudo: se ela não tivesse sido capaz de levar quatro milhões
estudo Científico e uma drreçao ma1s segura e sabia de sua política de grevistas ao trabalho, teria sido incapaz de levar quatro milhões
que nesta luta não pode estar desligada do concurso revolucionári~ de trabalhadores à greve. E isto é o fundamental na luta de classes:
dos demas povos latino-americanos" (11, 129). a disciplina". 37
Na U~ião Soviética,. em 1924, entra em contato com os líderes Em Bruxelas, no Congresso Antiimperialista Mundial de 1927,
da revoluçao do proletanado, a qual criava uma juventude austera dá-se o rompimento da aproximação com o Partido Comunista e .a
e quase espartana:. "Enquanto no Ocidente se afirma que apenas Internacional e tem início a longa luta pela conquista da hegemoma
uma. cultura eleva~Issnn_a e, por conseguinte, difícil de alcançar _ do movimento antiimperialista na América Latina: "A despeito da
por ~so mesmo anstocratica - , pode renovar a consciência do mun- forte pressão comunista e da atJnosfera de fácil otimismo freqüente
do, limpando-a d~ !llesqu~ari_as e egoísmos, na Rússia, a simples nessas assembléias, mantivemos nossa posição ideológica e o caráter
mudan~a de cond1çoes economiCas, a simples educação do trabalho da APRA como uma organização política independente, tendendo
•<;m o Ideal d_o pêso ou do dólar criaram uma moralidade revolucio- a constituir-se em partido. . . no ponto nevrálgico da participação
nana .verdademm~ente ad~rável. ~ntre o operário adulto, que viveu das burguesias e das pequenas burguesias na luta antiimperialista,
na _Russia so~ .o jugo ~zansta, e o jovem, que foi educado pela revo- opusemos as objeções da APRA às palavras de ordem comunistas.
luçao, existe !a uma ~iferença profunda, embora ambos sejam igual- Foi então que se produziu uma das mais dramáticas polêmicas do
men!e comumstas. O JOve~.russo, por exemplo, não bebe, nem dança, Congresso. A delegação latino-americana teve de reunir-se em sepa-
a. nao ser _suas danças t1p1cas. ( ... ) A geração que surge sob 0 rado durante seis horas para convencer-nos. Mantivemos nossas reser-
Sist~ .social que a revolução vai implantando, repugna a Juta animal. vas. Delas dando constância, assinamos as conclusões do Congresso.
E n~o ; que renegue a violência. . . a juventude russa tem a noção Bruxelas definiu a linha teórica aprista e tomou bem claro 11ossas
da ;'IO!encm apenas como fôrça inteligente para acabar com a explo- diferenças com o Comunismo. ~ natural que desde então a APRA
raçao. ( ... ) Estou com Ingenieros: é uma revolução maior que a fôsse o alvo de críticas acerbas. Para o Comunismo não pode existir .
grande revolução francesa".aa
outro.partido de esquerda que não seja aquêle oficial da Terceira
Na Inglaterra, anos depois, encontra "o país .capitalista do mun- Internacional, de ortodoxia stalinista. Tôda a organização política que
d? .. ·. no qual pode perceber-se melhor a sucessão de suas etapas Moscou não comande deve ser execrada e combatida. Depois do Con-
hiStóncas de d~senvolvimento econômico. Em nenhum outro país gresso de Bruxelas, de 1927, a APRA foi tratada dessa forma". 38
se encontra mrus coml'leta, mais definida em todos os complicados No Panamá, de volta à América, experimenta de nôvo o arbítrio das
~etalhe~ de seu mec~msmo, a organização capitalista. Ianquelândia ditaduras e conhece o pêso da presença norte-americana no Panamá;
e o paiS on~e .o capitalismo é mais forte, mas a Inglaterra é 0 país impedido de retomar ao México, é embarcado à fôrça para Bremen.
onde o capitalismo é mais intenso". Mas observa também a disci- Na Alemanhã, assiste à ascensão popular do nazismo: "O espí-
plina de ferro d~ classe operária: "Há pontos derivados da greve rito das massas operárias [alemãs] está pronto para rebelar-se. Sua
[de 1926] que já são lições indiscutíveis. A primeira e mais im-
rebeldia será exacerbada pela opressão e pela falta de trabalho. ( ... )
portante de tôdas é a maravilhosa lição de 'solidariedade operária'
O nazismo tem um líder e um comando vigoroso, fascinante, que
que q~a~o milhões de proletários ofereceram ao mundo, apresentan-
do-se solidos como um homem' ao comando do Trade Union Con- sabe onde vai. Nem os comunistas, nem os socialistas puderam até
g~;ss,. sua autondade suprema. A disciplina, a organização, a cons-
agora opor um homem com grandes condições frente ao empuxo
ciencia de classe da gente obreira inglêsa manifestou-se nessa unidade nazista. Enquanto Hitler avança, os chefes da esquerda vacilam, bri-
~ · · · ) Essa disciplina explica a segunda conclusão que já se pod~ gam entre si e mostram tôda a sua incapacidade condutora. O resul-
tirar da gran~e greve geral inglêsa: a de seu malôgro imediato. A tado é previsível: as massas se lançam nos braços de Hitler. As massas
greve geral nao consegum nnpor suas exigências porque 0 comando querem insurgir, estão prontas para lutar, um sórdido desespêro leva-as
deteve a avançada e suspendeu o ataque, sacríficando tudo à paz. A 37 Ibidem, págs. 13, 49 e segs.
38 Ha.ya. de Ia. Torre, El Antiimperialismo y el APRA, apud Robert J. Alexan-
36 Haya de la Torre, "Impreslones ... ", ctt., págs. 106 e segs. e l13. der, op. cit., pág. 80.
246
247
a pôr-se às ordens de quem lhes ofereça pão, trabalho e libertação uma novela ... heróica; e os. leitores se sentiram protagonistas. Surgi-
dos jugos econômicos impostos pelos aliados. Hitler encontrou um ram as generalizações mais sim~les~ e. armaram-se. . ~udaz_me.nt: ~qu~~
léxico demagógico eletrizante. 'A Alemanha desperta' é seu chanJado. ções tão enfáticas, como falsas: Ru.ssta ~ Indo~m~ca sao tdentt~as ,
E êsse é o grito da desesperança". 'nosso índio e o mujik a mesma cmsa'; nosso mctpwnte prolet~ado
"O nazismo vai cumprindo a meias a etapa revolucionária alemã, e o proletariado russo, irmãos gêmeos', etc. ( ... ) E cmt~preendi 9ue,
que os dirigentes comunistas e socialistas não souberam interpretar, justamente na falta de uma autêntica interpretação mannsta da histó-
nem conduzir. O nazismo não é senão uma etapa reformada dessa ria mode,;a residia a desorientação. A Rússia seguiu seu curso, por-
revolução, um desvio, uma modalidade. Quando a classe operária que aprendeu a pôr em prática o pe':'samento di~lé!i~o d~ Ma~x. A
alemã se reajustar à máquina da história, sua marcha se cumprirá negar 0 que é necessário negar. A ajustar os pnncipiOs a reahdade
dentro do ritmo que Marx descobriu sem horóscopos cronológicos. e não a realidade aos princípios" (V, 20 e segs.).
Mas a dialética marxista explica bem o caso alemão, ainda quando A adaptação dos princípios à realidade exi?e que se aban_donem
coisa para mim já indiscutível - o nazismo [no original está "el as teses clássicas sôbre a socialização dos mews de produçao e a
marxismo"] tome o poder e realize seu plano de estadn totalitário hegemonia da classe operária; mais que um recuo estratégico, a posi-
e de hitlerização do Reich." (V, 53 e segs.) ção de 1931, que repete a de 1928, é uma retirada tática decorre~te
do reconhecimento de que o perigo maior não é a pequena burguesia,
de fôrça incipiente, ameaçada de destruição pelo imperialismo, mas
3 - O sôpro cósmico pedido aos mortos sim êsse último. À intransigência doutrinária da Internacional, opôe-se
o realismo do indoamericano: "Seria realista, pois, recusar a alianç.a
A 15 de agôsto de 1931, o desterrado entra triunfalmente em das classes médias com as classes operárias e camponesa na luta anti-
Lima: é o candidato dos "cholos baratos", dos estudantes, dos operá- imperialista? Certamente não. Ou seria possível. limit~r essa alia';'ça
rios que se congregam em tôrno da bandeira do Partido Aprista Pe- a protestos retóricos, a um mero trabalho de resistências; ou a agita-
ruano, secção peruana da "Aiianza Popular Revolucionaria America- ções sem qualquer plano realista e político? Obviamente, não". ~?
na", que fundara em 1924 no México. O programa máximo da APRA plano "realista e político" que Hay~ de la Torre tem a __ contr~~r a
resultara das experiências do jovem combatente da Reforma Univer- ditadura do proletariado da InteiTJacwnal é o Estado antnmper~ahsta:
sitária e do político exilado por Leguía: "1. Ação contra o imperia- algo parecido com o assim chamado "~apitalismo de Estado", .e que
lismo; 2. Pela unidade política da América Latina; 3. Pela nacio- irá buscar no proletariado, no campesmato e nas classes médias as
nalização das terras e indústrias; 4. Pela interamericanização do canal fôrças com que resistir ao imperialismo, para com êle poder tratar
do Panamá; 5. Pela solidariedade a todos os povos e classes oprimi- em condições de igualdade uma vez realizada a união de Indoamé-
das do mundo". O programa mínimo do PAP será exposto na Praça rica.
de Touros de Lima, onde cêrca de 30 mil pessoas pagam ingresso Nas eleições, que a APRA considerou fraudadas, Sánchez ~e~ro
para ouvi-lo enunciar sua plataforma de candidato. - que depusera Leguía e em segu~da fô~a deposto pelo ~xercito,
O homem que lhes anuncia as bases de reconstrução do Peru sendo chamado depois para opor-se a mare montante do apnsmo -
já sofrera, porém, o desencanto das fórmulas feitas e as peripécias triunfa. Em dezembro, em Trujillo, o partido se reúne. As bases
da luta pela hegemonia: "Durante aquela viagem [à Rússia] com- reclamam a insurreição para vingar a violação dos direitos do "Peru
preendi as projeções universais da Revolução Russa, mas dei-me conta aprista". Em meio a grande tensão, Haya de la Torre aconselha a
de que se tratava de nm fenômeno intransportável e intransferível. moderação e a que se aceite o resultado fraudado das urnas, apelando
Sovietizar e russificar o mundo, tal como ... o vêm proclamando pro- à disciplina com base em uma visão do processo político na qual a
pagandistas pueris, é um romantismo tão sincero, como ingênuo, pro- idéia do recurso às armas é excluída:
duto necessário de todos os impressionantes fenômenos históricos que "CO!llpanheiros, êste não é um dia triste para nós. É, melhor,
se põem em moda. E se na Europa Ocidental se equivocaram com a o dia inicial de uma etapa de prova para a Pátria. ( ... ) Afirmo que
anunciada propagação imediata da Revolução Russa, não há razão estamos mais fortes do que nunca. Porque governar não é mandar,
para surpreender-se com que em lndoamérica nossos estrepitosos não é abusar, não é converter o poder no palco de tôdas as paixões
porta-vozes da sovietização quebrem tantas vêzes os dentes contra o inferiores . . . Eles mandarão, mas nós continuaremos governando.
solo. Aqui, nossa adolescente mentalidade literária teve a atitude ( ... ) A .missão do aprismo é chegar à consciência do povo antes
de todos os adolescentes: tomou a história da revolução russa como que chegar a palácio. À consciência do povo se chega, como chega-
248 249
mos, com a luz de uma doutrina, com o profundo amor a uma causa das flutuações dessa economia, deve passar a ser representativo dos
de justiça, com o exemplo glorioso do sacrifício. . . Pela fôrça se
nos reduzirá. Correrá mais sangue aprista. Nosso martiriológico aumen-
tará sua lista imortal; o terror iniciará sua tarefa oprobiosa, mas o
1 interêsses econômicos das maiorias nacionais. ( ... ) Para 'naciona-
lizá-lo', para afirmá-lo na massa mesma da Nação, é preciso qne
represente e defenda os interêsses da Nação, ou de suas maiorias, qne
Aprismo mergulhará cada vez mais na consciência do Povo ... Espe- são as que determinam em uma organização democrática a verdadeira
rar? Sim, esperar. Esperar na ação, esperar no trabalho infatigável, fôrça diretiva política nacional. A êsse fim propenderia a reorganiza-
esperar com a convicção total de que os rumos do destino, nós os ção total de nossa economia, cujo passo inicial seria o Congresso
assinalaremos. ( ... ) Sejamos dignos do Povo e façamos que o Povo Econômico. Não à destruição ou aniquilamento da economia estran-
seja digno de nós. Só o aprismo salvará o Peru" (IV, 71 e segs.). geira [os capitais estrangeiros aplicados no Peru], porque, dentro do
Em fevereiro de 1932, "silenciada a voz da cidadania, amorda- sistema econômico predominante no mundo, ela cumpre uma função
çada a voz da imprensa, violada a imunidade parlamentar pela prisão histórica de desenvolvimento econômico no sentido da industrialização
em massa dos representantes da oposição aprista no próprio Palácio e da evolução social e política. Nem tampouco à destruição, ou aniqui-
do Congresso" e vivendo o país "horas de tirania vergonhosa", Haya lamento da economia nacional existente, porque sen desenvolvimento
de la Torre faz imprimir e circular clandestinamente o "Manifesto é necessário para equilibrar a influência da economia estrangeira pre-
de Fevereiro" em que volta a expor suas idéias: dominante e para a capacitação e progresso de nossas classes produ-
"Na gigantesca luta dos grandes imperialismos, a América Latina toras e consumidoras. O Estado . . . tenderia a conseguir e manter
é campo de batalha; sê-lo-á também no dia em que essa luta se o equilíbrio de ambos os setores da economia do país. . . A ausência
converter em conflagração armada. Não saber olhar o futuro, não de grandes capitais nacionais, a necessidade de equilibrar a influência
descobrir as grandes ameaças que pesam sôbre cada um dos países econômica estrangeira que se desenvolve sôbre bases de forte capita-
la tino-americanos . . . é renunciar à liberdade do porvir. ( ... ) Cremos lização e crédito que não são nossas, nem estão sob nosso contrôle,
que é necessário afirmar em cada país novas bases de vida econômica impõem a formação de nm vasto organismo cooperativo nacional com
e política. Cremos que há-de renová-las, transformá-las, fortalecê-las.
a decidida proteção do Estado. ( ... )
Nesse sentido somos revolucionários, dando à palavra revolução não "O Partido Aprista Peruano, representativo dos interês!les das
o sentido catastrófico do golpe militar, do motim ou da anarquia,
mas sua significação histórica e construtiva. Pode-se ser revolucionário três classe mencionadas [campesinato, proletariado e classes médias],
e fazer uma revolução sem recorrer à violência. ( ... ) O aprismo que constituem quantitativa e qualitativamente as fôrças vivas d!l
proclama a necessidade de chegar ao poder para, a partir dêle, fazer Nação, organiza-as, disciplina-as e educa-as, orientando-as para o
a revolução em um sentido de transformação, de evolução, de reno- domínio do Estado, ao qual tôdas elas ficariam definitivamente vin-
vação, mas sujeita sempre aos imperativos e limitações da realidade. culadas econômica e politicamente. ( ... ) O trabalhador manual in-
( ... ) tervém na direção e recebe os benefícios do Estado, que o educa e
"A intemacionalidade da economia é reconhecida pelas direitas capacita material e espiritualmente, reconhecendo sua missão primor-
e pelas esquerdas da política mundial. Oentificamente, é um absurdo dial de forjador da riqueza. O trabalhador intelectual presta seu
afirmar que, nesta época, qualquer país do mundo possa declarar-se auxílio técnico ao desenvolvimento total da economia nacional e con-
livre de sujeições ao domínio do sistema econômico internacional. E tribui direta e eficientemente para o trabalho diretor do Estado. O
se isso é assim, resulta lógico que frente ao grandes problemas da agricultor, o comerciante, o ~eiro, o pequeno proprietário e o
economia, os povos que contemplam problemas análogos tenham de técnico progridem sob o apoio do Estado e oferecem seu serviço de
coordenar sua solução no que têm de comum. ( ... ) experiência ao trabalho comum de desenvolvimento da economia na-
"Os pontos centrais [do programa máximo do aprismo] são a cional ...
defesa - econômica e política - latino-americana contra os avanços "Industrializar o Peru, como os Estados Unidos, a Inglaterra, a
dos imperialismos estrangeiros, a união política e econômica dos povos Alemanha ou o Japão, há-de ser por várias idades impossível. Im-
latino-americanos para poderem lutar contra o nôvo colonialista, e a possível ainda que imperasse o socialismo no mundo. Porque a com-
nacionalização das fontes de riqueza de cada país, cuja posse constitui petição e a superprodução industrial manufatureira de hoje não o
o objetivo da expansão imperialista. ( ... ) Segundo o programa do permitem; porque o custo de produção de uma indústria mannfatu-
Partido Aprista Peruano, [o] Estado, que econômicamente está sujeito reira no país não toleraria concorrer com o dos países qne alcançaram
à influência econômica estrangeira, dependendo quase integralmente um alto grau de evolução econômica, social e técnica. E mesmo que
250 251
o socialismo fôsse o sistema econom1co mundial, superindustrializar 1 bro de 1933, assassinado Sánchez Cerro e abertas as pnsoes com a
nossos povos seria retornar à 'anarquia da produção', que é o têrmo ascensão do general Oscar Benavides, Haya de la Torre rende, em
científico de Marx para assinalar, como origem das crises do capita- Trujillo, sua homenagem aos seis mil mortos da APRA: "Com pala-
lismo, o afã de produzir excessivamente, sob o aguilhão da concorrên- vras não posso. Com palavras não posso. Há-de extraí-las uma a
cia, mais do que o consumo do mundo necessita ou pode absorver." uma do fundo doloroso de dois anos, que parecem dois séculos, dois
(IV, 81 e segs.) séculos angustiosos, dois séculos pela intensidade prodigiosa da obra
Nessa mesma ordem de idéias acrescentaria mais tarde: "O Esta- realizada na evolução do espírito. Porque esta é a contribuição máxima
do deveria conseguir os capitais no estrangeiro sob sua garantia e de nossa obra nesses dois anos: obra de espírito. Porque isso é o
contrôle. Assim está considerado em nosso programa. Mas também que faltava a esta terra e a êste povo: faltava-lhes o sôpro cósmico,
podem formar-se e aumentar-se pela acumulação cooperativa dos que do eterno, do alto, do puro; e como não o tinham, foi preciso pedi-lo
podem trazer os capitais nacionais que fazem parte das classes médias aos mortos ... ". 41
acomodadas. No que se refere à industrialização do Peru ( ... ) , acre- Aos mortos, os apristas em breve deverão continuar pedindo o
ditamos em um tipo de industrialização que comece pelo campo e sôpro cósmico. A libertação dos prisioneiros político permitirá um
que impulsione a pequena indústria nacional conexa com nossa indús- rápido desenvolvimento das atividades do Partido Aprista Peruano,
tria de matérias-primas e semi-elaboradas. Para êsse fim, propugua- especialmente junto à juventude (a Federação Aprista Juvenil contava
mos pela formação de uma grande frente econômica latino-americana cêrca de dez mil membros quando de seu fechamento, sujeitos a estrita
por meio de tratados comerciais e aduaneiros". 39 disciplina, organizados no espírito dos boys scouts e obedientes ao
" ... o capital estrangeiro que vem a nossos países, necessita dêles lema: "Prepara-te para a ação e não para o prazer"), às mulheres,
tanto quanto nossos países necessitam do capital. Os capitais emigram aos operários e aos índios. Poucos meses depois de instalado no
dos países industriais para os de desenvolvimento elementar, obrigados poder, Benavides fecha novamente o Partido Aprista; até 1945, a
por uma lei econômica iniludível. Colocar nossos países em uma situa- APRA mover-se-á na ilegalidade. Serão onze anos em que Haya de la
ção de inferioridade com relação aos capitaís estrangeiros, é desco- Torre, na clandestinidade, dirigirá o partido de "Incahuasi" (A casa
nhecer essa lei em prejuízo de nossos países. Condicionar, limitar, do Inca), "simbólica casa de onde emana a vontade vigilante d(} Chefe,
sistematizar o ingresso de capitais estrangeiros em nossos países não a qual é a vontade da Nação inteira".42
é afugentá-los, como alguns crêem ingênuamente. O capital estran-
geiro vai mesmo para povos onde êle tem de suportar as mais severas
restrições. Como é natural, os capitais estrangeiros não vão se impor, 4 - Nossa América e os Estados Unidos
êles próprios, restrições. Esse papel cabe aos Estados que recebem
os capitais. Mas, para condicionar ou restringir as aplicações de A perspectiva da democratização extremamente remota; fixados
capitais estrangeiros, é necessário um verdadeiro plano científico eco- os programas máximo e mínimo do Partido, Haya de la Torre preo-
nômico e financeiro, ditado pelo Estado do país que recebe os capitais. cupa-se com o perigo que a ameaça do conflito europeu representa
Plano científico que supõe a organização interior da economia, tendo para Indoamérica, e com a posição que se deve assumir diante dos
em conta os interêsses nacionais, e isto é um nacionalismo econômico Estados Unidos. Na Inglaterra, em 1926, havia examinado a etapa
orgânico."40 atual da "agressões imperialistas":
A 5 de maio de 1932, a perseguição há tempos desencadeada "A Nicarágua e a China, a Asia e a América Latina são os
contra a APRA por Sánchez Cerro culmina com a prisão de Haya de dois grandes campos atuais das agressões imperialistas. Vivemos a
la Torre. Por mais que Haya exigisse disciplina e serenidade dos etapa agressiva. A hora em que Shylock reclama a libra de carne.
apristas - diz Cossio dei Pomar - não se podem impedir levanta- Passaram-se já os tempos do transitório benefício imperialista; o mi-
mentos e matanças. No oitavo dia, a esquadra se subleva. A 16 de nuto do empréstimo, o período de satisfação inconsciente em que o
maio, inicia-se o "processo Haya de la Torre". A 7 de julho, as prestamista recebe a prenda e dá o dinheiro. Esse é o único instante
bases apristas de Trujillo se insurgem contra o govêrno. Durante sete ell\ que os interêsses das duas partes em um negócio de usura podem
dias, mantêm a cidade: depois é a brutal repressão. A 18 de dezem- equilibrar-se. Logo vem a desproporção entre o que empenhou a
prenda, que se vai perder, e o que clama pelo dinheiro dobrado pelos
39 "El Processo Ha.ya. de la Torre", edição da APRA, apu.d. Cossio del Pomar, op.
cit., pã.g. 281. 41 Ibidem, pâg. 310.
40 Haya de la Torre, "lmpresiones ... ", op. cit., pág. 148. 42 Ibtdem, pâg. 321.

252 253
juros. Essas desproporções, tratando-se de negócios de Estado, tor- aliança aos Estados Unidos para garantir a paz e a ordem em terri-
nam-se gigantescas e insolváveis. A conseqüência histórica, lógica, tório nicaraguense]: Naturalmente que sim. Mas que conste que os
dentro da lógica da usura internacional, é que o Estado prestamista ou defensores 'da pátria', isto, os defensores da nação, da soberania da
concessionário-- imperialista no moderno e bom dizer marxista - n!lção, que é o povo, são os revolucionários, são os antiimperialistas,
torna-se agressor, torna-se insaciável, toma-se inimigo. ( ... ) sao as classes trabalhadoras, são os oprimidos. As burguesias e classes
"Se Ianquelândia é mais ou menos brutal que a Inglaterra, não de p~oprietários de terra, os 'patriotas', 'fascistas', 'leguüstas', a classe
nos interessa. Os fatos são paralelos: a Grã-Bretanha se baseia em dommante, em uma palavra, dos países dominados, ou ameaçados
um tratado, uma série de tratados para reclamar e intervir militarmente pelos grandes imperialismos, têm um duplo e triste papel histórico:
na China; da mesma forma que Ianquelândia na Nicarágua. Que êsses cúmplices do imperialismo e traidores de seus povos. ~ste é o papel
tratados tenham sido arrancados a governos tr'!idores, a governantes das burguesias coloniais Iatino-americanas".43
subornados, a oligarquia venais, é o caso também comum à China Dois anos depois, de nôvo feito o contato com a realidade ame-
e à Nicarágua. Que em nome dêsses tratados - neste caso, sim, ricana, escrevia: "Nossa experiência histórica na América Latina e
'pedaços de papel' - se produza a intervenção militar, o ataque à e~pecialmente a experiênci~ contemporânea muito importante do Mé-
soberania, o desembarque de tropas e fuzileiros navais, as chacinas, xico, mostram-nos que o Imenso poder do imperialismo ianque não
as violações, a colonização, é questão também :que não tem diferenças pode ser confrontado sem a unidade dos povos da América Latina.
nos casos da China e da Nicarágua. Ora, generalizando, o de Nica- Mas desde que contra essa unidade conspiram conjuntamente nossas
rágua é o caso de .Cuba, de São Domingos, de Haiti, do Panamá, e cl~sse~ governantes e ? imperialismo, e desde que o último ajuda as
será o caso do Peru, da Bolívia, da Venezuela, da Colômbia e de pnme1ras, o Estado, mstrumento de opressão de uma classe sôbre
tôda a América Latina. A Nicarágua já está por cair nas garras do outra, torna-se uma arma de nossas classes dominantes nacionais e do
prestamista, isto é, no último ato do 'mercador de Veneza'. Outros imperialismo para explorar nossas classes produtoras e manter nossos
países da América Latina já entregaram a .libra de c ame, e outros - povos divididos. Conseqüentemente, a luta contra nossas classes go-
como o Peru, a Bolívia, a Colômbia, etc. - estão fazendo o contrato vernantes é indispensável; o poder político deve ser tomado pelos
e recebendo o dinheiro. A tragédia não chegou ao desenlace. Mas de produtores; a produção deve ser socializada, e a América Latiita deve
todos os modos, a sorte da China é nosso espelho. ( ... ) constituir uma Federação de Estados. &se é o único caminho da
"Imperialismo é capitalismo, e capitalismo imperialista é agressão, vitória sôbre o imperialismo, e objetivo da APRA como um Partidô
conquista, sujeição. Antiimperialismo é anticapitalismo. E anticapi- Revolucionário Internacional Antiimperialista" .••
talismo é revolução, socialismo, levantamento dos oprimidos contra ~m 1935, refugiado em Incahuasi, volta ao problema: ''Mas
os opressores, dos exploradores contra os exploradores. ( ... ) em vrrtude de condições objetivas mais favoráveis e da elástica inter-
"De um lado, a fôrça agressora do imperialismo, que quer con- pre~aç.ão da doutrina Monroe, o imperialismo ianque mantém na
quistar para explorar melhor; de outro lado, a fôrça libertadora da mau~na dos. Estados indoamericanos indiscutidas prevalência e supre-
revolução nacionalista, que luta pela soberania e independência de macia. Por ~ss?, a oste~to~a autonomia de n~ssas repúblicas é apenas
seu país. ( ... ) Mas os povos que lutam contra os imperialismos têm aparente. Suditos econonucos dos grandes unperialismos, são êsses
uma grande arma: os interêsses dos imperialismos agressores, que se que controlam nossa produção, cotizam nossa moeda, impõem preços
acham nos países agredidos. Quando nos povos explorados surge uma a nossos produtos, regem nossas finanças, racionalizam nosso traba-
consciência antiimperialista e revolucionária, o imperialismo leva a lho e regulam nossas escalas de salário. E são os interêsses de 'suas'
pior em última análise. ( ... ) emprêsas e o proveito e prosperidade de 'seu' sistema que fixamente
"Para um 'patriota' conservador, burguês e fascista de nossos os obceca. Os b~nefícios que nossos povos recebem dentro da engre-
países, apresenta-se êste problema: de um lado, o imperialismo, que nagem dessas orupotentes organizações econômicas ficam em segundo
é o capitalismo, que é a agressão contra seu país, que é o conquista~ l~g~r. E como quem goven:'a a economia governa a política,, o impe-
dor estrangeiro; de outro lado, o antiimperialismo, que é a defesa da nalismo que controla o Sistema sangüíneo de nossas coletividades
liberdade de seu país, que é a guerra contra o conquistador estran- nacionais domina, também, direta ou indiretamente, seu sistema ner-
geiro. Qual é a posição de um 'patriota' conservador, burguês e voso. O Estado, expressão jurídica de sua ilusória soberania subsiste
fascista de nossos países? O papel de Díaz [Adolpho Díaz, de Nica- sob a égide dos podêres estrangeiros, que guardam as chaves de sua
rágua, empossado em 1926 com o auxilio dos Estados Unidos, e que
43 Haya de la Torre, "Impresiones ... ", cit., pág. 23 e segs.
se caracterizou por haver solicitado a conclusão de um tratado de 44 Ha.ya de la Torre, "El AntUmperlalismo ... '', apud Alexander, cit., pág. 83.

254 25.5
arca. A ação econom1ca do imperialismo projeta-se sôbre o campo dos Estados Unidos apóie tiranos e tiranetes e afaste de si a simpatia
social como o supremo determinante da vida política dos vinte povos dos povos oprimidos dêste lado do Continente. Uma Frente Norte-
em que se divide nossa grande nação. ( ... ) -indoamericana contra a Internacional Negra deve ser uma frente de
"O Aprismo situa o problema em têrmos mais concretos, mais povos. Que a Democracia seja sua bandeira, mas uma Democracia
realistas: se Indoamérica vive ainda as primeiras etapas da industria- não complacente com os tiranos em nenhum dos países compreendidos
lização, que deve continuar necessàriamente seu processo; se ainda pela frente antifacista ( ... )
não temos definitivamente formada a classe proletária, que imporia "Isso supõe excluir, de cada país que participe dessa grande
uma nova ordem social, e se devemos nos libertar da dominação aliança democrática, os tiranos e os métodos tirânicos que nêles apare-
subjugante do imperialismo, por que não construir em nossa própria çam. Porque o Fascismo é um sistema - um sistema de opressão
realidade 'tal qual é', as bases de uma nova organização econômica e e de penetração - e invade de muitas maneiras: à abissínia, à chinesa,
política, a qual cumpra a tarefa educadora e construtiva da industria- à austríaca, e, agora, à peruana . ..
lização ... ? ( ... ) "A Frente do Nôvo Mundo contra a Internacional Negra não
"Nossos povos devem emancipar-se do imperialismo, qualquer deve significar nossa submissa e irrestrita união com o 'bom vizinho'
que seja sua bandeira. Devem unir-se, transformando suas atuais poderoso. Não esqueçamos, ah! não esqueçamos!, que o 'bom vizinho'
fronteiras em meros limites administrativos, e devem nacionalizar pode tomar-se mau, e que já o foi ... Não esqueçamos que os inte-
progressivamente sua riqueza sob um nôvo tipo de Estado. As três rêsses imperialistas. . . são interêsses capitalistas, de exploração, de
classes oprimidas pelo imperialismo: nosso jovem proletariado indus- domínio, de sujeição e de absorção. E não esqueçamos tampouco
trial, nosso vasto e ignaro campesinato e nossas empobrecidas classes que os povos que são ricos e débeis como os nossos são cobiçados
médias constituirão as fôrças sociais normativas dêsse Estado. rue tanto pelo imperialismo fascista, quanto pelo imperialismo norte-ame-
não será já o instrumento do imperialismo, mas defensor das classes
ricano. ( ... )
que representa, vale dizer, das grandes maiorias da população indo-
americana. Assim a industrialização cientificamente organizada seguirá "O caminho verdadeiro de salvação aparece claro: abolir todo
seu processo civilizador. Tomaremos dos países de mais alta economia imperialismo em lndoamérica e uni-la econômica e politicj!mente.
e cultura o que requerem nosso desenvolvimento material e o engran- Nacionalizar progressivamente tôdas as suas riquezas e constituir uma
decimento de nossa vida espiritual. Negociaremos com êles não como grande república - federativa, ou anfictiônica - que aíirme sôli.-
súditos, mas como iguais. ( ... ) Criar a resistência antiimperialista damente a segurança e soberania de nossos povos sôbre bases consis-
indoamericana e organizá-la pollticamente para garantia de nossa inde- tentes de Democracia e Justiça Social" (I, 103 e segs.).
pendência e segurança de nosso progresso, é a missão histórica dêsses Em fins de 1940, comenta as alterações registradas na política
vinte povos irmãos. Assinalar realisticamente o caminho e dar os interamericana do Departamento de Estado. Um ano antes, ao assi-
primeiros passos, é tarefa histórica da APRA." (11, 26 e segs.) nalar o "Diário de Costa Rica" que, de inimigo dos Estados Unidos,
Em 1938, as posições ganham contornos mais nítidos, traçados êle se convertera em seu amigo, Haya de la Torre esclarecera que
pela política da administração do segundo Roosevelt e pela ameaça "os apristas não mudaram sua atitude, mas - afortunadamente -
nazi-fascista. Contra a Internacional Negra do fascismo, êle reclama o govêmo dos Estados Unidos sim". No artigo "Aspectos políticos
a constituição de uma Internacional Democrática para salvar Indo- e econômicos do Bom Vizinho", de julho de 1941, avança nas suges-
américa: tões entrevistas nos pronunciamentos anteriores.
"É evidente que o imperialismo nazi-fascista planeja conquistar "O presidente Roosevelt negou todos os prévios postulados inter-
os povos indoamericanos. Assim o demonstram os casos incontestá- vencionistas que pretendiam dar valor jurídico à expansão norte-ame-
veis dos Integralistas brasileiros, do general Cedillo, no México, e
ricana em nossos países. Negou a tese de Theodore Roosevelt sôbre
do general Benavides, no Peru, para não mencionar outros testas-de-
-ferro menores do Eixo nipo-ítalo-germânico. [A Frente Norte-indo- o direito de os Estados Unidos exercerem uma 'polícia política' em
americana afasta o perigo da Internacional Fascista no Nôvo Mundo] Indoamérica; negou o enunciado de Wilson, quando disse: 'há-de
na medida em que fôr efetiva e eficiente. Porque não basta uma ensinar os latino-americanos a eleger bons governos', e negou a inter-
Frente de puras palavras, ou de meras fórmulas burocráticas como a pretação unilateral da Doutrina Monroe, proclamada por Mr. Hughes
malfadada União Panamericana [hoje OEA]. Nem basta uma cumpli- em 1923, e sua fórmula sôbre o direito de 'interposição temporal'
cidade de tolerância com a qual, em nome da Democracia, o govêrno sustentada na Conferência de Havana de 1928. ( ... )

256 257
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direitos humanos e sociais dos povos, os quais são prevalentes e intan- democráticos contra o terror dos tiranos locais e a pressão organizada
gíveis. ( ... ) da Internacional:
"Assim, a 'soberania nacional do Estado' democrático pode ser "Que diferença há em que nos empreste [capital] a Rússia ou
considerada paralelamente à inviolabilidade do domicílio. Que apenas os Estados Unidos? O Imperialismo, em sua forma econômica, no
é inviolável enquanto dentro dêle não se cometem abusos ou crimes. que se refere aos movimentos de capitais, atua de acôrdo com leis
Da mesma forma, a autoridade dos governantes é comparável com similares, mas a política que traz consigo é diferente. Com o impe-
a dos chefes da família: respeitável enquanto não oprimem, deixem rialismo econômico do totalitarismo, vem o totalistarismo! Com o im-
passar fome ou matem aquêles que estão sob seu poder. Pois o direito perialismo econômico da Democracia, mantém-se a Democracia! Em
- chame-se policial, judicial ou de 'ação coletiva' - de intervir nesses um país totalitário, por exemplo, os direitos de organização operária
casos deve ser faculdade dos demais estados ou da entidade superes- e as greves são crimes. Em um país democrático, '?s direitos de or_ga-
lata! que êles constituírem para conseguir que prevaleçam os Direitos nização operária e as greves são direitos! Eis as diferenças. O capita-
Humanos já fixados na Carta Universal de 1948. lismo de Estado e o capitalismo privado trazem consigo uma concep-
"Assentado o princípio da Soberania do Estado no da Sobe- ção diversa e oposta dos direitos do homem. Um diz: 'tu produzes,
rania Popular, aquela não pode ser considerada legítima se não emana e se não produzires, és um animal contra o Estado'; o outro diz: 'tu
dessa. E se o povo é o verdadeiro soberano, deve prevalecer sua produzes, e se não quiseres produzir a êste preço, vamos negociar e
vontade como única base moral e jurídica da Soberania Nacional, e ver se é possível evitar a greve'. Ninguém, em um país submetido ao
seus problemas vitais, suas garantias cívicas, suas necessidades mate- contrôle soviético, pode dizer: 'Abaixo o imperialismo soviético!' Ai
riais e seus privilégios culturais como inspiração e regra da política dêle! A Sibéria o espera, senão o ataúde. Por outro lado, nos países
governamental". 45 onde estão os representantes do capitalismo privado, podemos, sim,
Em 1961, resume as lições do aprismo: "O Partido Aprista, que alçar o punho e dizer-lhes: 'Abaixo o imperialismo, aumentem-nos
saiu da Universidade Popular, jamais enganou o povo. Nunca a dema- os salários e vamos à greve!' Respeita-se o direito do trabalhador."
gogia, nunca a adulação! Jamais dizer ao povo que é merecedor de (IV, 211.) •
tudo, sem apresentar-lhe a realidade, isto é, que a democracia e a ~ natural, assim, que tendo apoiado Fidel Castro na serra, se
liberdade se conquistam sempre sabendo que cada garantia ocasiona desvincule do governante de Havana, desde o instante em que SI}"
uma responsabilidade, que a cada direito corresponde um dever, que proclama marxista-leninista e escolhe um caminho diferente do seu.
a cada privilégio uma obrigação. . . E que a democracia com a liber- ~ novamente a necessidade de disputar a consciência das massas que
dade neste mundo do progresso e da técnica é uma técnica também!" o leva a apelar para o realismo próximo do conservantismo. Curioso
(IV, 216). fenômeno, o dêsse líder que confia na fôrça de sua pregação para,
Na "guerra fria", já tomara partido, da mesma forma que na na hora da crise, não mudar de norte, buscando o êxito fácil do
guerra de 1939 I 45: escolhe o campo ocidental. ~ bem verdade que antiimperialismo da extrema-esquerda, e que prefere ser fiel à sua
essa escolha já se prefigurava desde o Congresso de Bruxelas, de verdade ainda que ao risco de ser tido como um homem de direita.
1927, quando a APRA decide não endossar as teses da Internacional Em 1962, Haya de la Torre é novamente o candidato da APRA.
e resolve trilbar seu caminho próprio, em oposição ao Partido Comu- Nenbum dos candidatos (Haya, Odria, Belaúnde Terry) obtendo maio-
nista. Assim, a disputa hegemônica e a escolha da forma democrático- ria, e cabendo ao Congresso decidir, o Exército teme que a escolha
-liberal de govêrno aproximam-no, no período mais crítico das rela- recaia sôbre o líder do partido que promovera a revolta de Trujillo
ções entre os Estados Unidos e a União Soviética, do pais que sempre em 1932. O golpe de Estado sanciona o rancor; Prado é exilado e
combatera; e a aproximação se dá porque "necessitamos de pão com novas eleições são realizadas pouco depois. O Congresso elege Be-
liberdade. Ou liberdade com pão". laúnde Terry.
E acrescentava, em 1962, sumariando o ponto a que haviam
chegado, na luta sem fim contra as tiranias apoiadas pelo imperialis-
mo, aquêles que dos anos 20 a 50, tiveram de defender sua inteireza
doutrinária e a frágil organização de seus partidos revolucionários e
45 Haya de la Torre. "Democracia e Interdependência en la América Latina", in
Combate, publicação do Instituto Internacional de Estudios Polit1co-soc1aies, San
José, Costa Rica, n.o 3, nov.jdez., 1958, pá.g. 3 e segs.

260 261
2

APRISMO E MARXISMO

Ao longo dos anos que vão de 1923 a nossos dias, observa-se


uma lenta mudança nas posições de Víctor Raúl Haya de la Torre
diante dos Estados Unidos, tomados êsses como grande potência e
expressão acabada do sistema capitalista. Todavia, se aquêle que, no
primeiro exílio, via na "lanquelândia" o inimigo maior, é levado
mais tarde a perfilhar posições que se aproximam, quando não são
idênticas às do Departamento de Estado norte-americano, não é por-
que se tenha alterado sua opinião a respeito dos Estados Unidos e
do imperialismo como alegam seus adversários políticos. Quando
Haya de la Torre, ao fazer o balanço de 30 anos de aprismo, diz
que o básico a reter é ter-se mantido inalterada ao longo dos anos
a doutrina fundamental da APRA, afirma uma verdade que nilo res-
ponde às conveniências do momento, nem obedece, seu gesto, à ne-
cessidade de 'dizer que não mudou para esconder uma alteração funda-·
mental em suas posições. Se se analisarem com atenção os textos em
que consubstanciou a doutrina do aprismo, ver-se-á que lhe assiste
razão ao afirmar nunca ter mercadejado com ela em troca de posi-
ções de poder. E razão lhe assiste porque, na teoria aprista estavam
já em germe, desde 1924, as posições que viria a assumir em 1964
- apenas que, quarenta anos atrás, as situações concretas não haviam
permitido que as contradições internas de seu pensamento viessem à
luz, nem a luta pelo poder mundial havia assumido o caráter de que
se revestiu a partir do momento em que, derrotado o UI Reich, o
mundo viu-se dividido entre o bloco democrático-liberal e o bloco
soviético. Do primeiro, Haya de la Torre conhecera, ao lado da pre-
gação democrática, as ditaduras crioulas, cuja manutenção não enten-
dia no contexto da política antifascista do segundo Roosevelt; do
segundo, experimentara as vicissitudes da luta pela hegemonia, as quais
o levaram desde cedo a formular uma teoria totalizante do processo
social, a qual fôsse capaz de se opor com vantagens interpretativas
ao marxismo - que já na época pressentia dogmático e esclerosado
- da III Internacional. A necessidade de disputar a direção do mo-
vimento antiimperialista e das massas americanas à Internacional,
sendo um problema mais vital que a oposição ao imperialismo (pois
263
se tratava de dirigir essa opos1çao e a luta dela decorrente), fê-lo veria dirigir o processo de transformação socioeconômico-político no
inclusive não tirar as últimas conseqüências da interpretação que Peru e realizar a tarefa de contenção do imperialismo.
dera do imperialismo como fenômeno econômico, isto é, uma decor-
rência necessária do processo de expansão do capital. Não se deve
perder de vista, porém, nesta análise, que se, em 1928, Haya de la I - Hegel contra Marx
Torre afirmou ser o imperialismo um fato econômico e pôde, a partir ··'I
dessa constatação, construir a ordem de sucessão histórica dos siste- O fato de Haya de la Torre haver jogado a cartada decisiva
mas sociais em Espaços-tempos históricos diferentes, sempre viu, de sua vida pública, a 23 de maio de 1923, contra Leguía, fêz
contudo, o imperialismo da perspectiva desesperada dos anos 20, mar- que a jogasse desde cedo contra o capital norte-americano; é que
cados pelos desembarques norte-americanos nas Antilhas. Essa visão, Leguía, segundo Waldo Franck, "pertenceu a uma nova classe de
que se integra sem dúvida alguma no contexto da reação à "legenda ditadores, cuja fôrça descansava não no contato instintivo com o
da inferioridade natural", é que obriga a ter a ação militar como povo, mas no contato mercantil com o que podem simbolizar Washing-
decorrência necessária da penetração econômica, e essa o prenúncio ton e Wall Street. ( ... ) Com o capital estrangeiro em suas mãos,
obrigatório daquela, e não como um fato contingente no processo de remove o pais: desvia para fora o cobre, o açúcar e o algodão. ( ... )
expansão do capital, inclusive podendo ser ditada por motivos outros Entram máquinas. Abrem-se rodovias, estendem-se estradas de ferro,
que os econômicos. Só dando a essa perspectiva desesperada - e instalam-se telefones e motores, c isso faz que o país se mova e pro-
romântica e desesperada porque impotente enquanto reação - a porcione empregos a todos os peruanos capazes de servir com lealdade
su.a. justa im~rtância, é que se compreende porque, cessada a ação ao ditador".'6 Por outro lado, o prestígio da APRA no Peru e o
m1htar a partir do segundo Roosevelt, a reação antiamericana perdeu renome latino-americano de seu fundador põem-no em presença das
em profundidade naqueles que se haviam constituído nos mais ferre- exigências hegemônicas da Internacional, o que o leva a definir-se
nhos adversários do big stick e da "diplomacia do dólar". li que diante do Partido Comunista para conservar sua independência de
desaparecendo a conseqüência, necessàriamente a causa já não existe, ação. li para o imperialismo e o marxismo que é levado, desde logo,
ou mudou de tal modo de conteúdo que não pode mais conduzir às a voltar suas preocupações intelectuais, sentindo a necessida~e de
situ~?es de humilhação coletiva e frustração individual que tôda a criar uma doutrina capaz de explicar a Juta que move contra o pri-
Amenca espanhola vivera com as invasões, prenúncio do drama de meiro sem identificar-se com o segundo (já que a identificação signi- ·
Sandino e mais tarde de Arbenz. ficaria. perder a hegemonia ao longo do processo), e de separar-se
Em outros tempos, embora postulando o imperialismo como dêsse sem sujeitar-se politicamente àquele (o que levaria a igual
um fato econômico, Haya de la Torre sempre o viveu como processo resultado). O caminho que encontra é a proposta superação ,do
militar de ocupação dos países de Indoamérica pelas fôrças norte- marxismo, e o atalho que a êle leva é demonstrar a inadequação
-americanas. Quando se propõe o New Deal e a "Política de Boa da fórmula marxista à América, especiahnente em sua variante Jeni-
Vizinhança", o aspecto econômico do imperialismo perde para êle nista da doutrina do imperialismo."
em importância decisória - ou melhor, ganha nôvo sentido, desta Contra o marxismo, Haya de la Torre vai opor o "método hege-
vez progressista, porque inscrito na ordem de sucessão dos sistemas Jiano, isto é, a dialética" (I, 52), o qual lhe revela que uma conoepção
econômico-sociais. Essa nova visão do imperialismo, no caso de Haya do mundo não é um dogma, e que o princípio fundamental na pro-
de la Torre, pode impor-se sem que se quebre a coerência interna do posição de qualquer teoria da ação deve ser o princípio da negação,
pensamento e sem que seja necessário alterar quer o programa má- ou seja, que "tudo flui, nega-se, está em processo de devir, em eterno
xnno da APRA, quer os fundamentos teóricos da ação do aprismo. retôrno. Nêle se funda a dialética da vida e da história" (II, 56).
Isso porque - e é o que tentaremos demonstrar em seguida - , por
um lado, a doutrina aprista, como acentuamos acima, nunca pre-
tendeu mais do que conter o imperialismo e, por outro lado, porque
• 46 Waldo Franck, "América Hispana", cit., págs. 150-51.
47 Assinale-se que o movimento de esquerda no Peru, no inicio dos anos 20,
girou em tõrno de dois homens, ambos discipuios de González Prada: Haya de la
sua fundamentação teórica, ao desconsiderar o problema da relação Torre e José Carlos M~rlátegui. Nota-se em ambos a forte infiuência de Prada, espe-
cialmente no tocante a buscar nas raizes históricas do Peru e da América com que
das formas sociais com a racionalidade do modo de produção vigente fundamentar uma posição de ação mais coerente com a realidade permeada pelos
estrangeirismos. Todavia, enquanto Marlátegui permaneceu fiel ao método marxista,
no sistema global, equacionou o problema político sem dar a devida Hay~ de la Torre procurou propor uma nova teoria para demonstrar a inadaptaçAo
ênfase à questão teórica da hegemonia; em outros têrmos, não esta- do marxismo a realidades diversas da européia, essa atitude devendo sem dúvida
ser explicada pelas solicitações da ação. Mariátegui morreu relativamente cedO, e até
beleceu teàricamente (vale dizer, pràticamente) que grupo social de- hoje comunistas e aprlstas reivindicam seu nome.

264 265
Assim "a doutrina da APRA significa, dentro do marxismo, uma da negação da negação. Reconhece assim o princípio universal do
nova ~ metódica confrontação da realidade indoamericana com a eterno movimento, mudança ou devir ( ... ) como um processo cons-
tese que Marx postulru;a desde a Europa e. c~~ resul:ado da reali- tante de contradições, negações e continuidade, mas reconhece tam-
dade europékl, a qual vtveu e estudou em pnncwws do secu/o passado. bém, no marxismo, uma escola filosófica sujeita à mesma lei por
Se aceitamos que a Europa e a América estão muito longe de ser ela descoberta e aperfeiçoada. ( ... ) Com efeito, quem adota o
idênticas por sua geografia, por sua história e por se_us presentes marxismo como norma filosófica não pode admitir suas conclusões
econômicos e sociais, é imperativo reconhecer que a apltcaçao global doutrinárias como dogrrwJS inflexíveis.•• Produto do pensamento hu-
e simplista a nosso meio de doutrinas e normas de interpretação ~uro­ mano, resultado do mundo objetivo, seria absurdo crer que o mar-
péia deve estar sujeita a profundas modific_aç_ões. . . N<;> que a mter; xismo está excluído do processo dialético que rege tôda a vida. Essa
opretação de uma realidade nova, caractenstiCa, complicada co11_1o e é a ~aracterística e a condição do marxismo filosófico, a qual garante
a nossa tenha de modificar os preceitos que se acreditaram uruver- precisamente sua perenidade" (III, 27 e segs.).
sais e efemos, cumprir-se-ão as leis da contradição do devir: a ~on~; Isso pôsto, Haya de la Torre passa à nova proposição: "Porque
nuidade condicionada pela negação. Essa atitude da APRA suscita ja o~ o marxismo é dogma rígido, inerte qual um ídolo, ou é devi;
uma total separação dos comunistas crioulos, rendidos ante o sancta VIVO e móvel ( ... ) [que] não pode ignorar os progressos incessantes
sanctorum de sua fria ortodoxia, cujo véu imutável não se atrevem da Ciência, o processo tenaz da civilização, o desenvolvimento cons-
a levantar" (11, 57). tante da humanidade e das idéias" (III, 29-30). Ora, êsse "desen-
O marxismo é, para Haya de la Torre, sobretudo uma concepção volvimento constante" obriga a considerar as contribuições do relati-
orgânica do história elaborada no cenário europeu, a qual estabelece vismo ?a Física, especialmente o nôvo conceito de "Espaço-tempo",
com rigor inescapável uma sucessão de fases históricas a que os povos que Jl:-1mkowsky, citado por Einstein, havia assim referido: "Daqui
se devem necessàriamente submeter, a última das quais, já evidenciada por diante, o espaço em si e o tempo em si fundem-se como sombras
na Revolução de 1917, é a "ditadura do proletariado". Por isso é e só uma espécie de união dos dois lhes preserva uma existência
que êle pode dizer, comentando a passagem célebre do prefácio do inde~n~ente". ~~sse nôvo princípio é a base de "uma nova concepção
primeiro volume do Capital sôbre o espelhismo da Inglaterra ("O geometnca e fis1ca do umverso" e, portanto, deve servir de ..base à
país que está mais desenvolvido industrialmente, apenas mostra o nova construção da Filosofia da História: o "Espaço-tempo histó-
caminho aos menos desenvolvidos, a imagem de seu próprio futuro"), ri~:·. O "Espaço-~~po histórico" é integrado pelo Hcenário geô-
que êsse foi um vaticínio europeísta, não cumprido, do p~ocesso eco- grafico (campo objetivo) e pelo 'tempo subjetivo' (lch-Weit) que
nômico mundial. "No 'espelho' ( ... ) apenas se refletiu a repre- o homem _concebe com relação a êsse espaço; e ambos, por sua vez;
sentação do porvir de muitos paises e de nenhum como exata réplica. com um ntmo dado de tempo objetivo ou econômico que, socialmente
A evolução do capitalismo tomou direções inopinadas nos últimos toma-se 'tempo histórico'. O cenário geográfico, base do conceit~
cem anos e algumas zonas não européias do planêta prosperaram 'Espaço histórico', está condicionado. . . especialmente pela distância
econômicamente sem assemelhar-se em nada ao singular método in- que me~eia entre as regiões menos civilizadas e aquelas que avança-
glês" (11, 59). Não cumprido o "espelhismo", e não se tendo tomado r~m. m~1s ~m s_ua ~volução e que marcam o índice do progresso. Essa
realidade a revolução mundial (especialmente européia) em 1917 e d~st~~Ia' já nao_ e apenas espacial, ~ também distância no 'tempo
1918, importa rever a concepção marxista, que os comunistas dão histor:co! que n~o se. mede por relógros ( ... ) . Assim, por exemplo,
como "verdades irrecusáveis de vigência universal" (11, 58), quando a distancia espacial drreta entre a Inglaterra e a Groenlândia pode ser
na realidade é, apesar de "antecedente histórico importante, mas não 48 ct. a seguinte passagem de Gramsci, op. cit., pãg, 226: "Em sua forma mais
inalienável", nada mais que uma doutrina "limitada e relativiz~a difundida de superstiçlo economista, a f1Iosof1a da praxis perde uma- grande parte de
pelas condições peculiares de seu Tempo e de seu Espaço, as quais sua expans1v1dade CUltural na esfera superior do grupo intelectual. enquanto ga·nha
entre as massas populares e entre os intelectuais da boa média que não desejam
determinaram sua negação dialética ao ser confrontada com uma rea- ~atigar o c~bro, mas que querem ter o ar muito esperto, etc .. Como escrevia Engels
multo comodo para muitas pessoas acreditM' que podem procurar, a bom preço ~
lidade diferente daquela da Europa" (11, 58). sem fadiga. alguma, e ter em seu bôlso tôda a história e tôd~t a ciência política e
Propondo-se negar a negação, êle é levado a reconhecer a dívida f1losóf1ca concentrada em duas ou três fórmulas. ( ... ) A atividade 'critica' reduziu-
-se a desvendar os truques, a provocar escândalos, a remexer mesquinhamente na
que tem para com o marxismo: "O Aprismo arranca filosàficamente vida pessoal dos homens representativos. Esqueceu-se, asslm, de que o •economismo'
do determinismo histórico de Marx e da dialética hegeliana por êle sendo, ou se presumindo tal, um canon objetivo de interpretaçlo (objet1vo-<:1entí-
f1ca), a procura dos interêsses imediatos deveria ser válida para todos os aspectos
adotada para sua concepção do mundo. ( ... ) O Aprismo funda- da- história, para. a.s homens que representau1 a 'te5e', ws.slm como para os homens
menta suas normas de metodização filosófica no enunciado dialético que representam a 'antítese' ".

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de se cair em "um nacionalismo cego e negativo, racial e atrasado" dalização nacional" (li, 122). Com o que se coloca o problema de
(li, 1I1). Essa exigência ética impõe uma linha de ação: o capita- saber que partido dirigirá essa transformação e em que classes sociais
lismo de Estado e a unilicação da América Latina. O capitalismo assentará suas bases. E: nesse ponto que Haya de la Torre completa
de Estado 50 será, exatamente, a forma capaz de assegurar que êsse sua separação da Internacional.
"impulso construtivo" não degenere num "nacionalismo racial", por- Há de começar pela análise da realidade, tal qual Sfl apresentava
que controlará a produção e distribuição da riqueza e será o órgão nos anos 20 e 30: "Os países de Indoamérica não são países indus-
de relação entre a nação e o imperialismo: "Malgrado tôdas as condi- triais. A economia dêsses povos é bàsicamente agrária ou agrícola-
ções [que impuser ao imperialismo] o Estado antiimperialista receberá -mineira. Examinemos as estatisticas. O proletariado está em minoria,
do imperialismo todos os produtos manufaturados que lbe sejam ne- em completa minoria, constituindo uma classe nascente. São massas
cessários e venderá as matérias-primas que a grande indústria sempre camponesas as que predominam, dando uma fisionomia feudal ou
necessita mais e mais". 51 Não será apenas essa a função do nôvo semifeudal a nossas coletividades nacionais. Um partido unicamente
Estado cientificamente organizado; cuidará também - respeitada a da classe proletária é um partido sem possibilidades de bom êxito
condição de zona produtora de matérias-primas que é própria de político nesses povos. Não esqueçamos a experiência histórica: nos
Indoamérica, cuja base econômica é a agricultura, sendo nossas in- três ou quatro países onde se formaram partidos comunistas, encon-
dústrias, por seu ritmo produtivo mais retardado, de colaboração (IV, tramos casos parecidos ao da Argentina, onde a secção da 111 Inter-
35) - de promover a industrialização de produtos manufaturados nacional, uma das mais antigas, dividiu-se em duas facções inconci-
sem, no entanto, contribuir para restabelecer, pelo desejo de romper liáveis, cuja Juta é tenaz e inflamada ... " (11, 64). "Para que uma
a harmonia do sistema, a anarquia da produção conseqüente à super- classe social em Indoamérica fôsse capaz de dirigir vitoriosamente
produção. Se o capitalismo de Estado é a resposta eco.Wmica ao por si só, nossos povos à Juta antümperialista, teria de chegar à con:
imperialismo, a unificação de lndoam.érica é sua condição política dição que Marx assinala para a efetividade do comando classista
nec;essária: "A APRA coloca o problema imperialista em seu verda- em uma revolução: 'Para que a emancipação de um povo coincida
derro campo político. Suscita como primordial a Juta pela defesa com a emancipação de uma classe dada dentro de uma sociedade
de nossa soberania nacional em perigo. Dá a êsse postulado um con- burguesa, é necessário que essa classe como tal represente• o total
teúdo integral e nôvo. E assinala como primeiro passo no caminho da sociedade'. E êsse, justamente, não é o caso de nossa nascente
de nossa defesa antiimperialista a unificação política e econômica classe proletária e, menos ainda, de nosso débil Partido Comunista .. ;"
das 20 repúblicas em que se divide a grande nação indoamericana" (11; 66).
(li, 118-11~). A _unificação 52 _responde à necessidade de expansão Pela incipiência do desenvolvimento industrial, classe alguma
do sistema mdustrial, a qual lffipõe que "o mais débil o menos pode dirigir o processo: o proletariado é jovem, o,campesinato "vasto
r:sistente, te':" de .cair. ( ·;:) Se para _deter essa "?rrente [da e~pan­ e ignaro", as classes médias "empobrecidas". O burguês, êsse está
sao econom1ca] e necessano buscar aJuda para afrrmar a resistencia afastado de qualquer ordem de considerações, pois "é ainda um resí-
há-de buscá-la. Se o perigo é igualmente sério para muitos há-d; duo semifeudal, afortunado, enriquecido e não o produto social de
procurar uni-los na defesa" (IV, 94). ' uma evolução classista condutora". Já a pequena-burguesia é a "por-
O essenciál, pois,.. na a~ã~ política, é chegar ao poder para esta- ção mais culta, mais consciente, mais alerta de nossas coletividades:
belecer o Estado antiimpenalista que dê seu primeiro combate ao superior à burguesia improvisada, ao capitalista crioulo tributário
imperialismo "em duas ações simultâneas: união continental e_ desfeu- do estrangeiro, geralmente ignorante, mentalmente apátrida e só vesti-
do e envernizado de homem culto. A essa classe média [os pequenos
so Apesar de refertr-se diversas vêzes ao tato de o "capitalismo de Estado" pre- proprietários, os pequenos produtores mineiros, os pequenos comer-
conizado pela APRA ser a versão indoamericana da "ditadura do proletariado" Haya
de la Torre - da mesma forma que os. apristas em geral - não chegaram 8. uma
perfeita csracterização política, social e econômica dessa forma de organizaç6.o d libertar-se do atraso e da submissão senão unindo todos seus Estados em uma
produ_çAo. HaTcy Kantor, op. cit., pá.g. 95, assim refere o problema: "Os escritos apris~ poderosa federação. Essa grande tareta histórica não pode ser empreendida pela atra-
tas nao são claros acêrca de como se levaria a cabo a nactonal1zaçAo mas sAo claros sada burguesia sUl-americana, representação completamente prostituída do imperia-
em que gostat"lam de vê-la reallsada". ' lismo, mas sim pelo jovem proletariado latino-americano, assinalado como tõrça dlri-
51 Haya de la Torre, Independência Econ.dmica de América Latina cit gente das massas oprimidas. Por isso, a palavra de ordem da luta contra as violên-
52 Em março de 1940, Leon Trotsky escreveu: "O monstruoso crésc~ento do cias e as intrigas de capital financeiro internacional e contra a obra nefasta das
armamentismo nos Estados Unidos é o antecedente lógico da violenta soluçAo das camarilhas dos agentes Iocats é: Pelos Estados Unidos Socialistas da América do Sul e
domplexas contradições existentes no Hemisfério Ocidental e n6.o tardará a suscitar Central'. Escritas há seis anos, essas Unhas adquirem agora uma candente atualidade"
categôricamente o problema do destino dOS paises latino-americanos. O Intervalo da - in Trotsky, Por los Estados Unido3 SI'X:ialistas de América Latina (cOletânea de
pol!tica de "boa- vizinhança" chega a seu fim. Roosevelt, ou o seu sucessor, não tar- artigos e entrevlBtas escritos e conced1d.OB durante seu exilio no México), Editorial
dará em mostrar o punho de ferro até agora coberto por luva de veludo. Dizem as Coyoacán, Buenos Aires, 1961, pãg. 30.
teses da IV Internacional: 'Os paises da América do Sul e Central não podem

270 271
dantes, os intelectuais, etc.] pertence também por consciência e tra- que fundamentar poúticamente a sua concepção de Estado antiim-
dição um bom setor de nosso proletariado mais capaz, ou de nosso perialista e seu Capitalismo de Estado, versão indoamericana da
artesanato mais antigo ... " (li, 216). "ditadura do proletariado". Não, contudo, no Lenin pré-revolucioná-
Essas três classes oprimidas pelo imperialismo e pelo semifeuda- rio, preocupado em conquistar o poder, nem mesmo no líder revolu-
Iismo devem compor o partido que realizará o capitalismo de Estado. cionário engolfado na imensa tarefa de sustentar o Estado arrebatado
"O partido procura formar a 'consciência antiimperialista' nas classes às mãos de Kerensky. E. no Lenin construtor, no chefe de govêrno
trabalhadoras. Consciência de que são elas as qne produzem para o voltado para a reconstrução da economia, preocupado com a escassez
imperialismo e são elas as que podem impor-lhes con<lições e constituir e tentando converter em êxito a experiência que parecia votada ao
uma fôrça de libertação, sem esperar que os proletários da Europa malôgro, que o chefe da APRA encontra as "grandes retificações"
e dos Estados Unidos destruam o sistema capitalista, origem do im- doutrinárias indispensáveis a permitir que o trato com o imperialismo
perialismo. A aliança com as classes médias reforça a ação das classes não pareça sujeição à "Ianquelândia" .5 3
trabalhadoras, especialmente as que são especificamente operárias, Em "O capitalismo de Estado e o impôsto em espécie", Lenin
jovens para o exercício das funções estatais, como jovem é na Amé- reúne uma série de documentos sôbre a conjuntura que conduziu à
rica Latina o sistema que determinou sua existência como classe" Nova Política Econômica e as decisões adotadas em conseqüência.
(li, 21). O proletariado deveria ser chamado a exercer o comando O principal a reter dêles, e que influenciará extraordinàriamente o
da luta se não fôsse jovem: "Um menino vive, um menino sente pensamento de Haya de la Torre, é a firmeza com que Lenin diz
dor, um menino protesta contra a dor; contudo, o menino não está e aceita que a "nova política econômica. . . assinala a passagem para
capacitado a dirigir-se a si mesmo. As classes sociais criadas como o restabelecimento do capitalismo em certa medida. Não sabemos
organismos econômicos, por sistemas também econômicos ainda em em que extensão. As concessões aos capitalistas estrangeiros. . . e os
desenvolvimento, produzem fenômenos semelhantes. As classes sociais arrendamentos aos capitalistas privados outra coisa não representam
vão formando sua consciência, vão-se definindo; e ainda que sofram senão o restabelecimento direto do capitalismo ... ". 54 Se se lançam
e aspirem, carecem, quando são muito jovens, da capacidade suficiente os dados, permitindo aos capitalistas estrangeiros e aos arrendatários
para interpretar o sentimento nacional e conduzir por si sós os destinos auferirem lucros de centos por cento, é porque não há outra s"olução;
da coletividade" (li, 206). Sua juventude faz com que as três classes em troca os operários aprenderão com êles a administrar a economia
nacional, única forma de poder criar a República comunista." Essâ
fundamentais (descontada a longa noite em que a Colônia e a Repú-
decisão deve ser adotada porque o nível cultural do proletariado
blica mergulharam o indio) não tenham diferenças fundamentais: russo é baixo, impedindo que, por um ataque frontal, se dê a mina
"Somos uma organização política que representa os interêsses das do capitalismo: "Com outro uivei de cultura, poder-se-ia 'resolver
três classes que hoje estão afastadas do Estado. Somos um Partido diretamente o problema, e pode ser que outros paises o resolvam,
de frente única: um Partido formado para a solução dos problemas quando chegar para êles a hora de construir repúblicas comunistas.
das três classes que se vinculam no que têm de comum e que se Nós, porém, não podemos resolvê-lo diretamente" .5 6 "Essa política
unem enquanto representam, verdadeiramente, problemas coletivos e de concessões, dirigida com a medida e a prudência necessárias, con~
nacionais, sacrificando as diferenças que não são de significação ime- tribuirá sem dúvida alguma para melhorar ràpidamente o estado de
diata ante o grande problema da salvação das maiorias nacionais; e produção. . . à custa, naturalmente, de certos sacrifícios e mediante
para que, sob a <lisciplina orgânica de um Partido, tomem o Estado a entrega ao capitalismo de dezenas e dezenas de milhões de puds de
para fazer dêle o instrumento que realmente nos governe e salve nossos meios valiosos produtos. ( ... ) As concessões são uma espécie
dêsse desiquilíbrio econômico em que vivemos, causa determinante de luta, uma continuação, sob outra forma, da guerra de classes, e
de nosso desiquihl>rio político e social" (IV, 40). 53 Em 1929, escrevendo de Berlim a César Mendoza, Haya de la Torre insurge-se
contra os que, no Peru, pretendiam apllcar as ldeologtaa ta.1a qua:l.s à realidade, sem
as retificações que essa impunha. Sem· a rettt1cação, diz êle, "tudo adormece, se
apaga, se prostitUi e a revolução se limita. a discussões meta!istcas ... ". "Por isso, a
2 - Lenin contra a Internacional um companheiro cusquenho, que se declara. turiosamente comunista, mas que acaba
de c':m!essar-me que não leu nem O Capital de Marx, nem sua Introdução à Eco-
n01ma, nem especialmente o magistral ttvro de Lenin O Capitalt.smo de Estado e o
ImpOsto em Espécie, que é o Uvro de suas grandes retl!tcações ... " - in cossto dei
Preocupado em assentar as bases de uma política capaz de permi- Pomar. op. cit., pé.g. 263.
54 Lenin, O Capitaltsmo de 'Estado e o ImpOsto em Espécie, Ed. Guaíra, Curitiba,
tir à APRA avantajar-se à Internacional na conquista das três classes 8/d. pé.~r. 137.
referidas acima, é em Lenin que Haya de Ia Torre vai buscar com 55 Ibidem, pé.g, 147.
56 Ibidem, pé.g. 148.

272 273
não de modo algum, uma substituição da luta de classes pela paz '' perialismo, Todavia, a análise não deve parar aí, na identificação das
ent;e as classes, (, , , ) Temos aqui um contrato escrito e formal com fontes do pensamento político dêsse "revolucionário da Ordem"; em-
o capitalismo ocidental mais cnlto e mais desenvolvido, ( , , , ) Pa~­ bora em Hegel, Marx e Engels encontre com que afirmar a impossi-
mos certo tributo ao capitalismo mundial, entregando-lhe uma quanna bilidade de compreender Indoamérica em têrmos de uma perspectiva
em determinado ponto e, em troca, recebemos imediatamente uma marxista, e em Leniu com que contradizer a Internacional, parece-nos
certa consolidação do Poder dos Soviets, uma certa melhora de nossa necessário estabelecer como compreendia êle o marxismo, e as dife-
situação econômica". 57 "Desde o momento em que somos incapazes renças entre o sen capitalismo de Estado e aquêle instaurado na
de passar imediatamente da pequena produção para o socialismo,_ o União Soviética pelos bolchevistas, Só então será possível verificar
capitalismo é inevitável como produto natural da pequena produçao se sua perspectiva realmente superou as doutrinas e as "receitas im-
e da troca . .. ", 58 e faz o papel de auxiliar do socialismo. "Desde portadas da Europa", fornecendo as bases de uma nova visão teórico-
que estamos em presença de um pais de pequenos camponeses, com prática do processo de integração de Indoamérica no mercado mun-
os transportes, principalmente, desorganizados, apenas saído da guerra dial, ou se simplesmente se limitou a formular em novas palavras
e do bloqueio, dirigido politicamente pelo proletariado, detentor tam- aquilo que antes já fôra dito, Mas em qualquer dos casos parece-nos
bém dos transportes e da grande indústria, as duas conclusõ~s, que que é na especial visão qne tem do processo social de Indoamérica
derivam dessas premissas são, antes de tudo, . . servrr o sOCialismo que se devem buscar as causas de não ser hoje, quase meio século
por meio do capitalismo privado (sem falar do capitalismo de Es- pussado do 23 de maio, o inspirador do entusiasmo antümperialista
tado )". 59 do passado, parecendo ter lançado, apenas, as sementes da afirmação
F; essa idéia de Lenin de que o poder operário ( econômicamente denwcrática viável em um período de calma, não de revolução.
representado pelo capitalismo de Estado em alguns ramos da pro-
dução, e pela produção socialista, em outros) pode - e não só ., 3 - A visão aprista do marxismo
pode, como deve - fazer concessões inclusive ao capital estrangeiro
(portanto ao imperialismo, para que explore econômicamente a União
Soviética), que inspira tôda a solução apresentada por Haya de la Torre O marxismo, para Haya de la Torre, é sobretudo uma filosofia
para o problema da luta antiimperialista na América Latina, A exem- da História construída na observação das condições gerais do capi-
plo do Estado Soviético, o Estado an~perialis:a, fará concessões, talismo inglês do século XIX, a qual se transformou, por obra dos
mas não perderá o contrôle da economia e da pohllca. O campo das repetidores, numa antevisão necessária do ful1rr0 da humanidade, ~
concessões pode ser qualquer um - desde matérias-primas, minas apenas essa redução do marxismo a um de sens aspectos constitutivos
e subsolo até fábricas - , porque apesar de "algumas centenas de que permite compreender porque Haya de la Torre fala de sua ina-
milhões, ou alguns bilhões empregados , em coocesOO:s feitas sôb~e dequação ao Espaço-tempo histórico de Indoamérica, bem assim da
uma parte de nossas imensas riquezas, a fnn de conseguirmos o auxílio inexeqüibilidade das fórmnlas de ação dêle decorrentes, quando apli-
do grande capitalismo progressista", logo tudo será recuperado com cadas a situações ·diversas da que lhe den origem, De outra forma,
juros,6• O Estado antiimperialista - nessa liuba de ação imposta a operação mental não teria sentido ou não teria encontrado com
pela "ciência, essa dura ciência, severa e, às vêzes, crue!",, q~e é o que se manter viva durante quase meio século, Tal redução, porém,
conhecimento do baiso nível cull11fal das massas - apoiara, nnpnl- não se explica tão-só por uma ótica distorcida do que se len em
sionará e intervirá para fiscalizar a ação das classes médias que, Marx e Engels; compreende-se também se se atenta para o fato de
tendo de escolher entre sna submissão ao imperialismo· ou sua inte- os seguidores de Marx, especialmente os da III Internacional, dada
gração no Estado antiimperialista, preferirão a segunda solução (IV, a subordinação da periferia ao centro moscovita, igualmente terem
lm), , reduzido o marxismo a quase ·.essa filosofia da história, exemplari-
Vê-se, assim, que, buscando negar dialêticamente o marx1s~o zando na Rússia dos Soviets o ful1rro imediato, concreto e possível
para enfrentar teoricamente a ação da Internacional, é em Lenm, da humanidade, desde que em cada pais, independente 'das reais arti-
exatamente, qne Haya de la Torre vai buscar inspi~a.ção ~ara elabo;ar culações das fôrças sociais, se aplicasse a receita bolchevista da toma-
sen programa e fundamentar teoricamente sua pratica diante do nn- da do poder, A posição de Haya de la Torre responde, pois, a uma
57 Ibidem, págs. 38-39.
compreensão teórica (a redução por êle operada) e a uma reação
58 Ibidem, pág. 46. prática à ação dos partidos comunistas ligados à Internacional, A êsses
59 Ib14em, pág. 52.
60 Ibidem, pág. 83. dois elementos, cabe acrescentar outro de não menor importância: a

274 275
redução só foi possível e a tentativa de superar o marxismo compreen- banal em que a atividade crítica se limitava a desvendar os truques
sível, porque o pensamento de Haya de la Torre se insere no quadro da história e os interêsses imediatos discemíveis atrás da ação de
mais geral do estilo de pensamento próprio da Ordem - e no caso cada homem importante, como comentava Gramsci, Haya de la Torre
em espécie, da Ordem indoamericana, chamada a responder, afora não soube apresentar senão elementos para a construção de uma
aos problemas específicos da Ordem, também ao secular desafio da nova teoria da História, os quais se revelaram insuficientes para
"legenda 'da inferioridade natural", e devendo demonstrar, pela afir- compreender a situação indoamericana a partir do instante em que
mação de que as teorias européias apenas à Europa se aplicam, que Indoamérica passou a integrar a realidade maior da economia de
tudo o mais que se disse e pensou sôbre Indoamérica foi falho, insu- mercado.
ftciente e falso. Só assim se compreende cabalmente a redução aprista: O pensamento de Haya de la Torre, exatamente por propor-se
sendo um ;pensamento que fundamentalmente adere ao concreto, não superar o marxismo - vale dizer, a visão reduzida que dêle tinha
pode abarcar em tôda a sua extensão um modo de pensar essen- - , defrontou-se desde logo com uma contradição observável em dois
cialmente sistemático, dêle retendo nada mais do que podem ter em momentos teóricos, a qual se refletiria necessàriamente na ação. No
comum (a visão do globalidade- realizando-se no processo histórico) primeiro, ao negar a impossibilidade da realização do comunismo em
Indoamérica ( aquêle sugerido por Marx, e mesmo o que Lenin tentava
e aquilo que a deformação dogmática fêz parecer igual, isto é, o
realizar na Rússia) em virtude da imaturidade da classe operária,
comunismo identificado ao Estado soviético.
explicitamente estabelece para os indoamcricanos a necessidade de
Dêsse ponto de vista, cabe assinalar que seja a deformação, ini-
vencerem as etapas já ultrapassadas pelos países hegemônicos do
cialmente da social-democracia oficial de antes da Primeira Guerra
sistema global antes de poderem propor a transformação revolucio-
Mundial e posteriormente da Internacional, seja a redução aprista que nária - admitindo, em conseqüência, no limite do desenvolvimento
se opunha às duas visões do marxismo, ambas acabaram por con- das fôrças produtivas de Indoamérica, a possibilidade de dar-se a
vertê-lo em uma doutrina incapaz de contribuições positivas ao conhe- sucessão que antes havia negado por ter sido estabelecida a partir
cimento do homem e da sociedade. Com efeito, se o marxismo dog- da realidade inglêsa do século XIX, ou se proposto em função das
mático acentuou freqüentes vêzes o aspecto econômico da construção condições especiais da Rússia de 1917. Nesse particular, o ~e há,
de Marx e Engels, caindo nos exageros do "economismo vulgar" pois, entre o marxismo e o aprismo, não é uma oposição de fundo,
referido por Trotsky, o qual levou a transformar uma possibilidade mas apenas de pormenor, de tempo - o comunismo será possível
real da ação humana (a revolução) em uma mera determinação amanhií, embora não seja hoje. Com o que se pode dizer que a posi-
inelutável da economia - princípio que por ser teõricamente falso ção da APRA responde à visão não-americana que enfàticamente nega
conduziu a regras de ação não concordes com a realidade - , e se e critica, mais especialmente ao pensamento da social-democracia
a social-democracia, acentuando a importância do "movimento" es- européia no comêço do século e à posição dos marxistas russos em
queceu o "fim", o aprismo, fazendo o caminho inverso, chegou ao 1905 e boa parte de 1917, exceto Trotsky. 61 No segundo momento,
mesmo resultado, ao insistir no que se poderia chamar de determinis- Haya de la Torre, proclama a fragilidade da fórmula de ação do mar-
mo histórico para mostrar a falência da utopia, ou quando menos xismo pelo fato de o desenvolvimento dos paises capitalistas não ter
sua inadequação à realidade americana, a qual só poderia ser captada seguido o exemplo fixado no prefácio d'O Capital (parecendo pre-
por métodos de análise forjados na própria América. tender, atitude que aliás condena, que nessa obra estivesse retratado
Enquanto o dogmatismo, especialmente, construía um corpo de o desenvolvimento linear de todos os países que tomariam a Ingla-
verdade universalmente aplicáveis à transformação de sociedades con- terra como modêlo ), reconhecendo, paralelamente, que o capital che-
cretas, o aprismo de Haya de la Torre fazia do marxismo uma mera gou a Indoamérica obedecendo às leis necessárias de sua expansão -
doutrina tendo em vista a sucessão das formas históricas: feudalismo, com o que aceita as leis do expansão e desenvolvimento do capital
capitalismo, comunismo, perdendo de vista o fato de a dialética mar- fixadas pelo, marxismo a partir do estudo da situação inglêsa, seja por
xista dirigir-se sobretudo a explicar, pela oposição de formas e fôrças j terem validade universal, ou significarem contribuições importantes
para a ciência econômica (11, 57), recusando, no entanto, as prenússas
sociais vivas e antagônicas, o processo do devir nas sociedades contem- •,
porâneas, o qual pode ser encarado diferentemente da sucessão neces- sôbre as quais se estabeleceram: a lei do valor e a luta de classes.
sária dada como presente na utopia. Assim, no processo de forjar A luta de classes não deve ser tomada pelo caráter que lhe é
a doutrina capaz de superar a posição doutrinária dos que, por con- emprestado na ação das organizações que se reclamam do marxismo:
veniências táticas, haviam reduzido o marxismo a uma vulgarização 61 Cf. a n parte: "A Revolução e a Ordem".

276 277
os operários explorados contra os burgueses exploradores. E exata- Estudo - já que é a partir do aparelho de Estado que se organiza
mente por constituir, da perspectiva metodológica, a fôrça motriz o consentimento ativo - e num tempo social mensurável pelo desen-
do desenvolvimento social, que a luta de classes é importante na com- volvimento máximo já alcançado pelo modo de produção em qualquer
preensão de qualquer momento histórico, mesmo que o proletariado ponto do sistema global, qne permite discernir que grupo social está
não seja o sujeito da ação que se analise ou se vive. E que ela res- em condições de aproximar uma nação periférica da racionalidade
ponde ao princípio da oposição de contrários, à luta entre as fôrças vigente no sistema global. Tarefa qne é tanto mais difícil de realizar
de expansão, cuja mola é sempre a necessidade que desperta e excita quanto o grupo intelectnal encarregado de traçar as diretivas necessá-
a atividade, e as formas sociais que a elas se opõem - sabendo-se rias à conquista da direção política não pode estar comprometido
que a constrição dessas últimas não corresponde apenas à sua mera - não tanto pelas posições políticas que ocupa quanto pela direção
inércia, enquanto formas, mas também à resistência passiva das fôrças intelectual e cnltnral de seu pensamento - com o "ethos" da classe
de conservação que elas encerram. Do ponto de vista da compreensão (formação concreta e ação social típica) qne age contràriamente a
do processo histórico, a noção de luta de classes responde, embora essa racionalidade. Todavia, como é sempre o "lado mau", isto é,
menos ampla, à da hegemonia e é apenas a partir dessa última que os privilégios, como referia Marx na Miséria da Filosofia, "que
se pode equacionar uma política, on fazer um exame de sitnação, produz o movimento qne faz a história, constituindo a luta",62 será
porquanto é ela qne nos dirá qual das fôrças sociais qne disputam sempre o grande número, "la grande y funeral canalla", o grupo
a direção política do processo (o estabelecimento do consentimento social chamado a ver na miséria o "lado revolucionário, subversivo,
ativo a que se refere Gramsci) tem maiores possibilidades de obtê-Ia que derrubará a velha sociedade" 63 - mas só a verá depois que a
por já ter estabelecido sôbre o conjunto da sociedade a sna direção compreensão dêsse "lado man" se tiver tornado explícita à sua cons-
moral, intelectual e cultnral. Em outras palavras, por já ter uma ciência, pela ação dos intelectuais, e o grupo se houver transformado,
conduta autiJnoma e não subordinada. pela vigência do princípio da ordenação, em nma unidade coletiva
Observe-se, no entanto, que se a noção de hegemonia pode ser de ação organizada sôbre a extensão do território. Em outros têrmos,
referida a uma classe, porquanto essa pode ser vista como o grupo depois qne o grupo social se honver transformado em uma classe
que transformará em condutas sociais sancionadas uma nova con- ponticamente definida. •
cepção do mundo - inclusive podendo ser tomada no sentido restri-
tivo em que a vê o bolchevismo clássico: a hegemonia da classe
operária manifestando-se na ditadora do proletariado - , ela só serve 4 ~ O índio: tipo e mito
aos fins da análise política s~ a classe é vista não ·como formação
social concreta, definida, entre outros elementos, pela posição que É nesse passo que talvez se possa localizar o drama maior do
os individuas ocupam no processo de produção ("senhores das má- pensamento e da ação de Víctor Raúl Haya de la Torre - porqne
quinas" ou "servidores das máquinas" na feliz expressão de Perroux), é diante do problema do poder que teve de optar entre a "grande
mas como unidade coletiva de ação típica. Em ontras palavras, a y fnneral canalla", isto é, o indio real e presente, e o indio tipo,
noção de hegemonia só é fecunda se considerarmos as ações sociais repositório da miséria e da tragédia de Indoamérica, dela sendo, por-
como referidas a uma organização ativa das condutas, orientada con- tanto, a negação. Tendo visto, influenciado por González Prada e
forme (para impor) ou contràriamente (para negar) à racionalidade por sua ação nas Universidades Populares e na organização clandes-
do modo de produção imperante no sistema global. Essa racionalidade tina de estudantes e trabalhadores, qne o indio era a negação da
não é apenas atribuída; pode ser emplricamente observada na apro- estrutnra social de Indoamérica nos anos 20, pois integrava a classe
ximação ou afastamento das condutas econômicas e do espírito que trabalhadora por algo mais que suas condições de vida, já que trazia
as anima daquilo que se pode considerar sua manifestação histórica ao proletariado "a fôrça histórica de sna raça" (I, 69), e tendo, por
típica. É por isso, aliás, que no melhor pensamento socialista, a luta outro lado, afirmado que a "nova revolução de nossa América será
da classe operária é uma ação destinada a partejar a plena raciona- revolução de base e sentido indio, de consciência ou de subconsciência
lidade do sistema de economia de mercado, isto é, a fazer que a indígena expressa em nma renovação econômica e social" (1, 27),
produção social das riquezas corresponda a apropriação social dos não acreditou, no entanto, fôsse a massa índia capaz de transformar
meios de produção. sua conduta subordinada em autônoma, por ser "a classe camponesa,
E a noção da classe como unidade coletiva de ação típica voltada
62 Marx, Miséria da Filosofia, clt., pé.g. 112.
para a realização de um "ethos" num Espaço recoberto por um 63 Ibidem, pág, 116.

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que constitui a grande maioria trabalhadora do país. . . em razão soldados e marinheiros, o povo em massa deve erguer-se e derrubar
de um só golpe o regime de terror que o imperialismo ianque nos
direta com as formas primitivas, feudais ou semifeudais da produção
impôs. Esse é o dever dos apristas peruanos e não devemos deixar
agrícola [uma] classe sem cultura geral ou técnica" (IV, I 04) .
de trabalhar um só dia até que o povo compreenda que seu dever
Ao exilado que afirmava: "Com nossos ossos se farão os cimen- não é submeter-se, mas rebelar-se", 65 detém os que querem ir à
tos de uma América futura, levantada de pedra como a América dos revolta: "Pela fôrça se nos reduzirá. Correrá mais sangue aprista.
Estados índios. Talvez só os índios voltem a fazer de pedra a Amé- Nosso martiriológio aumentará sua lista imortal; o terror iniciará
rica que os espanhóis fizeram de adôbe" (I, 71), acrescentando: "Os sua tarefa oprobiosa, mas o Aprismo mergulhará cada vez mais
propagandistas da inferioridade natural do índio têm garantida a imor- na consciência do Povo ... Esperar? Sim, esperar" (IV, 71 e segs.).
talidade na burla eterna. São como os que na Antiguidade acredita- O repúdio à violência - explicado inicialmente com~ o~e?iência
vam que na zona tórrida os mares ferviam" (I, 71 ), contrapõe-se à decisão da organização•• e depois transformado em pnnc1p10 nor-
o candidato: " ... e embora seja numêricamente a maioria da classe teador da ação - transforma a noção da hegen;oni~, que, ~ncerra
trabalhadora do país, em qualidade, por seu grau primitivo de técnica a possibilidade de luta para estabelecer a dommaç~o poht15a de
no trabalho de cultura [a classe camponesa] não está capacitada a um grupo, em um conceit? passtvo em qu~ a :onqmsta da . cons-
dominar por si a coletividade e conduzir o govêrno do Estado" (IV, ciência do povo" conta mats do que a orgaruzaçao do consentimento
37). E que, em 1931, já vislumbra a possibilidade de ter pela frente ativo e a correlata destruição, por absorção ou esmagamento, dos
a responsabilidade do Poder; não é mais, portanto, o contraditor de intelectuais dos grupos adversários. Ao assim proceder, Haya de la
Marx que fala, mas o postulante a resolver os problemas reais do Torre reduz a hegemonia tão-só ao estabelecimento da direção moral,
Peru, o seguidor do Lenin das "grandes retificações". Todavia, embora intelectual e cultural, descartando o problema da direção política,
dêle se reclamasse, não vira que apesar de Lenin considerar o prole- da dominação, que a seu ver só se poderá alcançar, respeitando-se
tariado russo retardatário no que se refere à sua cultura e ao seu as normas estabelecidas, mas não cumpridas, por aquêles a quem
grau de preparação material e industrial para o socialismo, •• o fato se combate. Esquecera-se, assim, da lição de Luxemburgo, em 1918,
de encará-lo não como formação concreta (ótica própria do intér- segundo a qual se o socialismo não pode ser introduzido por d""reto,
prete da Ordem), mas como unidade coletiva de ação social típica, supõe, no entanto, "tôda uma série de medidas violentas contra a
permitira ao fundador do Estado soviético exercer em seu nome o propriedade, etc ... ", impondo aos dirigentes, uma ve~ tomado o .
poder e procurar aproximar, nas grandes retificações da NEP, a eco- poder, "o dever e. a obri~ão de se entregaren; imed1~tam~nte à
nomia soviética do capitalismo alemão, tendo destruído o poder da aplicação das medidas socialistas da manerra mms enérg1ca, mexo-
burguesia russa. rável e brutal, por conseguinte, de exercer a ditadura, mas uma dita-
Diante do poder, Haya de Ia Torre comporta-se como se nêle dura de classe e não de um partido ou grupo; ditadura de classe com
já estivesse, obrigado a realizar a Justiça e a Democracia para negar a mais ampla popularidade e a participação mais ativa e ilimitada
a conduta dos governos anteriores, principalmente a ditadura de Le- das massas populares em uma democracia completa". 67 Sem dúvida,
guía. E afirmando a Democracia e a Liberdade sôbre a virtualidade e o problema está perfeitamente situado em Luxemburgo, a hegemo-
da violência, reduziu a visão do papel revolucionário do indiq à cons- nia se exerce "mergulhando na consciência do Povo" - isto é, tra-
tatação de sua incultura e imaturidade - sem deixar de referir-se à zendo as massas até então ignaras e não afeitas ao govêrno da coisa
importância que o grande número tem para a definição histórica de pública à participação mais irrestrita e livre na formulação da polí-
Nossa América, Indoamérica - para exercer, através de um partido tica que interessa aos seus destinos. Mas êsse passo, se é necessário,
que o organizasse como raça oprimida e classe explorada, o poder 65 Haya de Ia Torre, "Impresiones ... ", pág. 168.
66 A mUdança de orientação politica de Haya de la Torre dá-se exatamente
em nome de tôda a Sociedade. nesse perlod.o de 1931 a 1932. Em 1929, na carta dirigida a César Mendoza, e que é e
A organização, porém, perdidas as eleições, coloca-o diante do principal peça de acusação no "Processo Haya de Ia Torre", êle deixa claro que ao
ser exilado julgava que a insurreição fôsse a única saída contra Leguia - e a insur-
problema: é que a APRA, justamente por sua pregação junto ao reição, segundo êle, não se efetivou apenas por falta d~e colaboração do grupo de
grande número, era o partido do índio e é com êle e por êle que Mariátegui. Na instrução do processo, afirma que as opinioes expressas pelos membros
do Partido não comprometem o Partido como um todo, que as recolhe para traça·r
tenta a revolução de 1932. Confrontando-se com a explosão rebelde a sua linha de ação. Essa, desde que o Partido Aprista se tornara legal no Peru, em
do inconformismo das bases ante a fraude eleitoral, o líder, que em 1931, é a linha de defesa da democracia e da predicação da não-violência. Essa linha,
não obstante, não impediu a revolta de TrujUlo, em 1932, e o levante de parte da
1925 escrevia de Londres: "Os trabalhadores manuais e intelectuais Marinha em Caliao, em 1948, movimentos êsses comprobatórios de que a base estava
disposta e lançar-se à insurreição, enquanto a direção permanecia prêsa ao forma-
do Peru, os operários, os índios camponeses, as classes médias, os lismo do jõgo democrático.
67 Rosa Luxemburgo, A Revoluçao Russa, cit., pá.gs. 35 e 37.
64 Cf. Lenin, "0 Capitalismo de Estado .. ,", ctt., pág, 25
281
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não é no entanto suficiente, a condição de suficiência apenas se ficas !tdaptadas à particularidade das condições de desenvolvimento
realizando atravês da conquista do poder com tôdas as suas impli- de cada sociedade, con:esponde uma e sempre a mesma fôrça social
cações e conseqüências. Do famoso "Eu ousei" a que se refere dirigente do processo: a burguesia industrial dos países hegemônicos,
Luxemburgo, citando Hutten. única capaz de trazer a industrialização e conseqüentemente de desen-
E., pois, o problema do Poder que faz Haya de la Torre tentar volver o proletariado e as demais fôrças sociais. Prêso à exigência
a conciliação entre a Revolução e a Ordem, afastando-se do revo- vi tal de combater teoricamente a Internacional, o líder da APRA
lucionário e aproximando-se do intérprete da Ordem, tal qual os não se deu conta de que ao reconhecer a burguesia industrial dos
caracterizamos em outr~t parte dêste estudo: mais exatamente, o ousar países hegemônicos como a única fôrça dirigente do processo evolutivo,
ou não enfrentar as tarefas suscit!tdas pela súbita tomada de cons- êle privava o sistema global da incoerência que lhe atribuíra, pois à
ciência, por parte do grande número, da impossibilidade de levar a coexistência de formas de produzir tão diversas e tão díspares como
têrmo suas reivindicações nos quadros estabelecidos pela ordem vi- as observadas na Terra do Fogo e na Inglaterra, contrapõe-se agora,
gente, e o decidir ou não ir ao Poder, sabendo não ter as condições em têrmos de hegemonia, uma fôrça social que repousa sôbre uma
ótimas para realizar os objetivos colimados. O problema- e aqui reto- forma de produção bàsicamente igual em qualquer país integrante
mados a discussão iniciada no exame das diferenças entre a Ordem do sistema global pelas relações necessárias que estabelece ao consa-
e a Revolução - não se coloca em saber se a experiência demonstrou grar juridicamente a apropriação privada dos bens de produção. Com
o acêrto ou o êrro daqueles que preconizam o "salto", ou o condenam; o que êle, postulando a impossibilidade de realizar-se, nos países peri-
dessa perspectiva, Kautsky e Luxemburgo dão-nos o exemplo de como féricos, a transformação qualitativa reclamada pela Revolução, é for-
çad~ a reconhecer, quando se encara o problema do prisma da bege-
a decisão de tomar o poder pode ser vista de maneiras diversas con-
mama - e portanto da ação política - que o sistema, longe de ser
forme o observador se situa da perspectiva da Ordem, ou daquela mcoerente, possui um consensus, por êle anteriormente negado ao
da Revolução. ~le reside em que a Ordem a isto se recusa porque repudiar a introdução, num determinado país, de formas de ação
sua aderência ao "concreto" exige que só se substitua uma situação elaboradas para outros.
por outra, igualmente pronta e acab!tda. Contudo, se o intérprete Essa negação da tese explicitamente afirmada - a qual implica
da Ordem, dada sua concepção da História e sua concepção do uma grave contradição teórica, com reflexos ao nível da pràica -
mundo, é por um lado tentado a procurar, em esforços semelhantes está presente no fato de Haya de la Torre reconhecer, juntamente
já feitos, a prova universal da impossibilidade do "salto", levando com o pensamento revolucionário, que a lei básica do sistema capi-
a Ordem a confundir-se com o "partido da Ordem" - porquanto se talista é a do "desenvolvimento desigual", a qual não "substitui [ou]
deixa às fôrças socialmente dominantes a tarefa de realizar as trans- anula as leis da economia mundial [mas] inclina-se diante delas e a
formações das fôrças produtivas materiais que, ao longo do processo, elas se submete". 68 A partir da lei do desenvolvimento desigual é
hão··de conduzir à maturação das fôrças produtivas sociais e à colo- que Trotsky proclama a necessidade de se adotarem diferentes polí-
cação da transformação estrutural na ordem do dia - , por outro ticas para países diversos, pois "seria totalmente errado fundar a
lado, ao assim proceder, compromete teOricamente aquilo que cons- atividade [política] sôbre alguns traços gerais, isto é, sôbre um tipo
titui o fundamental de sua posição di=te da transformação dd sistema abstrato de capitalismo naciona1", 69 e é igualmente a partir dela que
global, isto é, a incoerência que lhe atribui. Haya de la Torre reconhece que "aplicar o princípio pelo princípio,
Realmente, referindo a totalidade ao processo histórico e fazendo sem ter em conta as condições da realidade em que se aplica e o
de cada sociedade periférica uma globalidade particular da mesma momento em que se deve aplicar, é cair em fanatismo político e
forma que as hegemônicas, o legitimo intérprete da Ordem deve esquecer que a eficiência é iniludível a tôda reforma que busque
admitir, em linha de inferência, que em cada uma dessas sociedades firmeza". 70 E exatamente essa lei do desenvolvimento desigual, rejei-
as fôrças sociais detentoras da hegemonia do processo são diversas tando todo "coloniaje mental", que impõe se descubra em cada país
das que se manifestam em sociedades diferentes daquela em que atua, periférico a fôrça hegemônica específica que pode romper o status
pois é apenas essa multiplicidade de fôrças hegemônicas que pode quo, a qual deve ser buscada na história nacional tal qual se desen-
ro~o~, com suas fôrças sociais e políticas reais e não aquelas supostas
justificar, em têrmos do pensamento do século XX, se postulem formas
de ação diferentes às peculiares condições de ser de cada uma dessas eXIstir por se enquadrarem nos modelos construídos idealmente a
sociedades. Tal não acontece, todavia, no caso de Haya de la Torre; 68 Trotsky, La Révolution Permanent, cit., pãg. 14.
69 Ibidem, pãg, 14.
à afirmação da necessidade de se adotarem as formas de ação especí- 70 Haya de la- Torre, ''Impreslones.,. ", cit., pág. 146.

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partir de situações totalmente diversas. E é essa procura das reais Com efeito, a ciência econom1ca contemporânea é tanto uma condi-
fôrças hegemônicas, as quais se estabelecerão mediante a meticulosa ção da produção socialista, quanto, por exemplo, a técnica moderna,
análise das relações políticas entre os diversos segmentos sociais, que, e apesar de seu desejo, o proletariado não pode criar nem uma, nem
no caso de Indoamérica, leva o jovem Haya de la Torre a dizer: outra; tôdas as duas surgem do processo social contemporâneo. Ora,
em Medas pensemos o portador da ciência não é o proletariado, mas os intelectuais bur-
"Em lugar de pensar em Persas nos gueses: com efeito, foi no cérebro de certos indivíduos dessa categoria
que nasceu o socialismo contemporâneo, e é por êles que êle é
em Egípcios Indios", comunicado aos proletários intelectualmente mais desenvolvidos, os
pois "o valor das raças em si não tem uma importância tão grande quais o introduzem em seguida na luta de classe do proletariado, ali
como quando à raça se une uma opressão. Então, o problema é dupla- onde as condições o permitem. Assim, a consciência socialista é um
mente sério e muitas vêzes complicado. Uma raça oprimida não é elemento importado de fora para a luta de classe do proletariado, e
apenas uma classe oprimida. Quando tivermos entendido isso, espe- não qualquer coisa que nela tenha surgido espontâneamente" .1•
cialmente os que saracoteiam com um plumacho de marxismo 'puro' O que distingue Haya de la Torre de Lenin e Kautsky é que
no coxis, começaremos a entender nossa realidade". 11 enquanto ambos partiam do princípio, segundo Lenin, de que a classe
Nessa ordem de idéias, a coerência interna do pensamento de operária tende, no movimento espontâneo de seus contatos com a
Haya de la Torre, não fôsse êle um intérprete da Ordem, deveria burguesia, a submeter-se à ideologia burguesa, mais antiga e mais
tê-lo levado a reconhecer que a totalidade de referência de seu pensa- acabada sob tôdas as suas formas, sendo mister por conseguinte, no
mento, por um lado, era o sistema global, a cujas leis é mister con- dizer de Kautsky, "introduzir no proletariado (literalmente: encher o
formar-se para impedir o malôgro da ação, e por outro, o processo proletariado - N. L.) a consciência de sua situação e a consciência
histórico da sociedade indoamericana, na qual o reencontro do "socia- de sua missão", 74 Haya de la Torre fixa-se claramente no conceito do
lismo incaico" com o passado Inca será realizado pela criação do espontaneísmo e da organicidade do processo. Ora, se associarmos
Estado Antiimperialista, forma específica indoamericana da "ditadura êsse elemento integrante da visão que a Ordem tem do mundo àquele
do proletariado". 72 Contudo, ao não dar ao problema teórico da hege- outro de ter da classe apenas a noção de sua representação cooncreta,
monia a importância merecida, Haya de la Torre tomou, na ação, fácil será perceber que, no pensamento original do fundador do apris-
o índio como fôrça social concreta e não como forma social de ação mo, os intelectuais chamados a conduzir a luta do grande número
típica - com o que a raça índia exaltada no exílio perdeu historici- rziú?. só deveriam provir da, mas situar-se, enquanto sua expressão
dade na prática revolucionária, e revelou-se mítica como aquela idea- orgânica e espontânea, na pequena burguesia, a "porção mais culta,
lizada pelos crioulos para os fins de sua rebelião contra a Coroa mais consciente, mais alerta de nossas coletividades", superior inclu...
espanhola. sive à própria oligarquia.
O problema talvez melhor se compreenda se se tiver em conta
que durante tôda a luta contra a velha oligarquia peruana, os setores
5 - O grupo dirigente do processo médios indubitàvelmente haviam afirmado sua capacidade de disputar
com êxito a hegemonia, intelectual e cultural do processo à oligarquia,
A concepção de hegemonia de Haya de la Torre, se teôricamente investindo contra seus dois redutos seculares: a Igreja, primeiro, a
se esgota na redução do conceito ao de direção intelectual e cultural, Universidade, depois. 75 Mais do que isso, dada a articulação do siste-
pràticamente tem conseqüências da maior relevância, além de, em ma social, conforme muito bem acentua Mariátegui, a luta pela reno-
boa medida, explicar a transformação do índio de "raça oprimida" vação de San Marcos acabou desaguando na unidade estudantil-operá-
em "classe sem cultura geral ou técnica". É que vendo a hegemonia ria, porquanto a Reforma Universitária se fazia pela democratização da
apenas como a direção intelectual e cultural, êle é necessàriamente Universidade - portanto também pela admissão dos trabalhadores
levado a encontrar o núcleo intelectual dirigente do processo revolu-
cionário fora do grande número. A posição não é nova e fôra susten- 73 Critica de Kautsky ao projeto do Partido Soclai-Democrata austríaco, Neue
Zeit, 1901-1902, XX, I, n,o 3, pág. 79, apud. ·Lenin, "Que !alre?", in Lenin, Marx, En-
tada por Lenin, que se apoiara nas "palavras profundamente justas gels, Mar.z:isme, Editions en Langués Etrangéres. Moscou, s/d, pág. 147.
e significativas de Kautsky": "A consciência socialista hoje em dia 74 Ibidem, pé.g. 147.
75 A propósito do surgimento, no Peru, da reaçâ"o burguesa enquanto "ethos",
só pode surgir sôbre a base de um profundo conhecimento científico. c!. pé.gs. 41 e 42. Palma e Gonzáles Prada são os precursores do nOvo espírito que
pretende apoderar-se do Peru, mas que se frustra em virtude da predominância do
71 Ibtdem, págs. 132 e 130. esp1rtto ol1gárquico e da associação da pequena burguesla com o capital estrangeiro
72 Ibidem, pág. 131. e a própria ol1garqu1a.

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nos seminários do ensino superior. Não foi difícil aos setores médios, geiro, a liberdade de comércio, a pequena propriedade no campo
dos quais igualmente provinha Haya de la Torre, liderar a luta reivin- e a cooperação na agricultura incentivada pelo Estado. Formalmente,
dicatória da clilsse operária - . e se a 23 de maio, o sangue selou seu programa tem grande semelhança com a NEP, mas a análise
de modo dramático a oposição em comum à Universidade, à dita- de conteúdo logo revela as diferenças fundamentais de concepção:
para Lenin, as "grandes. retificações" eram a condição necessária para
dura e à Igreja, estudantes e operários já vinham trabalhando juntos afirmar o domínio bolchevista sôbre o Estado e a economia e permitir
na conquista da jornada de oito horas e de outras reivindicações sociais a realização do socialismo; para Haya de la Torre, o capitalismo de
da classe operária limenha. Até 1923, portanto, são os estudantes Estado é a forma de organizar a produção para enfrentar o impe-
- expressão intelectual da pequena burguesia - que lideraram a rialismo sem ser obrigado a colocar a realização do socialismo na
luta política antiditatorial, antioligárquica e antiimperialista, marchan- ordem do dia.
do à frente dos operários e dos índios e procurando ilustrá-los nas O capitalismo de Estado leninista parte de um princípio básico:
"Universidades Populares González Prada". Por isso, no momento em o Estado fará as concessões ao capital estrangeiro, negociará com o
que formula a proposição teórica a que até hoje se atém - "E! anti- mercado internacional, procurará produzir aos níveis de produtividade
imperialismo y el APRA", de 1928, e o discurso programa de 1931 da Alemanha e de outros países capitalistas, mas o proletariado, por
- , Haya de la Torre pôde ver no imperialismo (que nas Antilhas intermédio do partido bolchevista, conservará sempre e firmemente
sustentava militarmente a oligarquia e era suposto dever repetir o a direção política do processo. Era êsse princípio que distinguia o
mesmo no Peru e em tôda a América Latina) o inimigo maior, e capitalismo de Estado russo dos demais tipos de intervenção estatal
pôde considerar a pequena burguesia, a grande vítima da expansão na economia. Ao discutir o problema da caracterização econômico-
do capital na América Latina (IV, 104 e segs.), como sua aliada -social do regime stalinista, Trotsky, embora se recusando a aceitar
- poisl de fato o fôra nas lutas de que ativamente participara. Há-de para a União Soviética a designação de "capitalismo de Estado",
reconhecer, todavia, que em virtude de ver na pequena burguesia a reconhecia, no entanto, que outra forma econômica não pôde ser
classe chamada a exercer o poder como classe dominante nos países realizada após a morte de Lenin senão aquela marcada pela concen-
manufatureiros - o que não correspondia à verdade dos fatos - tração dos meios de produção nas mãos do Estado. Mas r'i."saltava
Haya de la Torre, ainda que inconscientemente, é levado a temer que a característica que distinguia a experiência soviética das expe-
que, superado o problema do imperialismo, ela possa aspirar à domi- riências francesas de Leon Blum, do New Deal e do nazi-fascismo era
nação, convertendo-se em "fôrças incontroladas da exploração" (IV, exatamente a expropriação da classe capitalista russa. 76 Essa con-
I 07). :É por isso que não aceitando a fórmula bolchevista da "dita- cepção do capitalismo de Estado - expropriação da classe capitalista
dura do proletariado" - já que "nossa classe proletária industrial russa e concentração dos meios de produção nas mãos do Estado
sob a direção política do proletariado - está clara em O Capitalis-
é jovem, em formação, sem a cultura, nem a consciência que o mo de Estado e o lmpôsto em Espécie, e transparece igualmente
avanço ( ... ) da grande indústria manufatureira detemtina no pro- nítida dos principais documentos da oposição bolchevista, nos quais
letariado" (IV, I 05) - , propôe que a direção política de Indoamé- Trotsky e seus companheiros apontam os riscos do restabelecimento
rica seja entregue ao Estado Antiimperialista. :Ésse Estado, repre- do capitalismo privado na Rússia se o contrôle operário sôbre o
sentante e defensor da Nação ou de suas maiorias, isto é, o prole- Estado fôr substituído por um contrôle burocrático capaz de sofrer
tariado, o campesinato e a classe média, e que econômicamente se as influências mais diretas no renascimento capitalista que a NEP
estruturará como Capitalismo de Estado, além da "implantação pro- havia permitido. O essencial na política de Lenin, como na de Trotsky
gressiva de um sistema cooperativo de produção e de consumo" (IV, e da "oposição de esquerda, não são as concessões, nem a liberdade
109), será incumbido de apoiar e impulsionar, nelas intervindo, as de comércio, nem a propriedade privada na agricultura: é manter a
classes médias, e de defender as classes produtoras (o camponês e o "ditadura do proletariado", isto é, a organização do consentimento
operário) que "necessitam da escola experimental, do trabalho orga- ativo, sob a direção política do partido que representava a classe
nizado e tecnicamente aperfeiçoado para se desenvolver em têrmos operária, unidade coletiva de ação social típica.
de c1asse, enriquecendo sua consciência e elevando seu nível de cultu- No "Nôvo curso", de dezembro de 1923, Trotsky assim exa-
ra" (IV, 107). mina o futuro da revolução russa, que se defronta com a NEP:
Os fundamentos do Capitalismo de Estado de Haya de la Torre "Abstração feita da rapidez do desenvolvimento da revolução prole-
devem ser buscados no modêlo delineado por Lenin no Capitalismo tária no Ocidente, a marcha de nossa revolução será determinada
de Estado e o Impôsto em Espécie: as concessões ao capital estran- 76 Ct. Trotaky, La Bevolution Trahie, cít., pág. 204 e segs.

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pelo Crescimento comparativo de três elementos fundamentais de nossa elementos burgueses-oustrialovistas no país. A questão de saber qual
economia: a indústria soviética, a agricultura e o capital comercial e dos dois triunfará resume-se em uma luta de classe continua em
industrial privado. ( ... ) O proletariado é politicamente tão forte todos os setores da frente econômica, política e cultural - em favor
que, permitindo dentro de certos limites a formação de uma nova de um desenvolvimento socialista ou de um desenvolvimento capi-
burguesia a seu lado, faz a massa camponesa participar do poder talista ( ... ) , em favor da plenitude do poder proletário ou da di-
de Estado não por intermédio da burguesia e dos partidos pequeno- visão dêsse poder com a nova burguesia. No país, onde a imensa
-burgueses, mas diretamente, barrando assim à burguesia o acesso à maioria da população é constituída pelos pequenos e pelos muito pe-
vida política. ( ... ) O rápido desenvolvimento do capital privado, quenos camponeses, e em geral pela propriedade muito pequena, os
se se produzisse, significaria que a indústria e o comércio soviéticos, principais processos dessa luta se realizam subterrâneamente aqui e
compreendida a cooperação, não asseguram a satisfação das necessi- ali, até que de uma maneira súbita e inesperada irrompem à luz do
dades da economia camponesa. Ademais, mostraria que o capital dia: o elemento capitalista encontra, sobretudo, sua expressão na dife-
privado se interpõe mais e mais entre o Estado operário e os cam- renciação do campo e no crescimento da propriedade privada. ( ... )
poneses, adquire uma influência econômica e, portanto, política sôbre As múltiplas formas, aparentes ou ocultas, da exploração das massas
êsses últimos. E evidente que uma tal ruptura entre a indústria artesanais pelo capital comercial e pelo capital da indústria a domi-
soviética e a agricultura, entre o proletariado e o campesinato, cons- cílio, são a fonte, extremamente importante e sempre crescente, da
tituiria um grave perigo para a revolução proletária, um sintoma da acumulação da nova burguesia". 80 E mais adiante, depois de estabe-
possibilidade do triunfo da 'contra-revolução' ". 77 Mais adiante, volta lecer que a sorte da luta entre o socialismo e o capitalismo se deter-
ao problema crucial da revolução em países periféricos, o qual con- mina pela relação entre a produtividade dêsses dois sistemas, a opo-
siste na direção política da massa camponesa: "A questão pode e sição a Stalin afirmava: "O monopólio do comércio exterior é a
deve ser suscitada concretamente, isto é, do ponto de vista da relação arma indispensável da construção socialista, quando os países capi-
dinàmica das fôrças das diferentes classes. A questão que, politica- talistas possuem uma base técnica mais desenvolvida. Mas o mono-
mente, tem para a revolução uma importância considerável (decisiva pólio não pode proteger a economia socialista que se constrói, a não
em certos casos, mas diferente segundo os países) é saber se, no ser que no domínio da técnica, do preço de venda, da qiJillidade e
período revolucionário, o proletariado atrairá para seu lado o cam- dos preços dos produtos manufaturados, nos aproximemos continua-
pesinato e em que proporções. ( ... ) Mas em todos os países e sob mente do nível da economia mundial". 81
tôdas as condições, o traço essencial do oportunismo reside na super- A preocupação de Trotsky e de seus companheiros, destarte; é
estimação da fôrça da classe burguesa e das intermediárias e na subes- clãramente dirigida para o futuro da direção política da revolução,
timação da fôrça do proletariado"." que poderia ser perdida se se permitisse que o capital privado, ope-
Os riscos implícitos na NEP saltavam aos olhos de Trotsky como rando no comércio e na pequena indústria, se substituisse ao prole-
também haviam sido observados por Lenin: "O capital comercial tariado (ação social típica) como elemento de ligação entre o Estado
privado realiza agora lucros consideráveis. Ele se contenta cada vez e o grwuie número, vale dizer, o campesinato. A preocupação encon-
menos com operações próprias de intermediário. Tenta organizar o trava sua razão de ser no fato de a guerra civil haver desorganizado
produtor ou entrar na posse das emprêsas industriais•do Estado. Em a produção, e o comunismo de guerra ter, por assim dizer, suprimido
outros tênnos, recomeça o processo de acumulação primitiva, inicial- uma das fases do processo econômico, que era a distribuição. O essen-
mente no domínio comercial, depois no dominio industrial. E evidente cial, logo após a cessação das hostilidades, como assinalara Lenin
que cada malôgro, cada perda que experimentamos é um ganho para em "O capitalismo de Estado ... ", era fazer que as riquezas circulas-
o capital privado: primeiro porque ela nos enfraquece e, em seguida, sem, ainda que a sua distribuição fôsse entregue ao capital privado
porque uma parte dessa perda cai em mãos do nôvo capitalista".7• - pois se a circulação de bens não se desse, a experiência socialista
A "Oposição de esquerda", em sua famosa plataforma de 1927, seria votada econômicamente ao malôgro mais completo com a con-
assim comentava o problema do capitalismo de Estado obrigado a seqüente perda do poder pelo partido. Todos reconheciam, contudo,
fazer concessões ao capitalismo privado: "A palavra de ordem lançada os riscos implícitos na adoção da nova política, para a qual não
por Stalin, quando do XIV Congresso do Partido: Fogo à esquerda!, havia alternativa: a massa camponesa poderia vir a ligar-se à Cidade
apenas facilitou a reunião de elementos de direita no Partido e dos não por intermédio de mecanismos de distribuição socialistas, os quais
77 Trotsky, "Cours Nouveau", in Les Bolcheviks Centre Staltne, PubUcaçôes da
permitiriam, ao longo do processo, que uma nova visão da ordenação
IV Internacional, Paris, 1957, pãg, 29. 80 C!. "Plate-forme de l'()pposition de Gauche - 1927", in Les Bolcheviks
78 Ibidem, pág. 47. cit., pág. 88.
79 Ibidem, pãg, 78. 81 Ibtdem, pãg. 109.

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das relações sociais se impusesse ao Campo, mas através de um me- nomico à burguesia industrial dos países hegemônicos do siste~a
canismo capitalista, o qual tenderia a conservar as antigas idéias e global, o que, até certa medida, restabelece o consensus que havia
concepções, a manter o tradicional antagonismo entre a Cidade e o negado anteriormente. :B por negar explicitamente a solidariedade do
Campo e a reforçar a hegemonia do capital privado. Lenin sabia que todo com as partes e dessas com aquêle, que é possível a Haya de
nem todos os problemas estavam resolvidos e que o problema da dire- la Torre fazer uma política que, para conter o imperialismo, se apóia
ção política poderia voltar a ser suscitado: "Enquanto vivermos em no desenvolvimento do setor privado da economia, reconhecidamen~e
um país em que a maioria da população é constituída por pequenos o mais capaz, o mais dinâmico e o mais produtivo por ser o mats
camponeses, existirá sempre na Rússia, para o capitalismo uma base culto sem antes ter fixado com precisão e clareza a quem deve
mais sólida que para o comunismo; é necessário não s~ esquecer cabe; a direção política do pr~es~ -;- em outras palavras, '?u.e
disso. . . não extirpamos as raízes do capitalismo e os fundamentos espirito deverá o Estado procurar cmpnmzr aos comportamentos socuus
e as bases do inimigo interior não foram abaladas". 8 2 e às condutas econômicas .
. Essas pre<?cupações não existem para Haya de la Torre porque, Não será demais ressaltar, a essa altura, a importância que teve
aquilo que a ngor deve ser creditado à concentração do capital, era o exílio na formulação das teorias de Haya de la Torre: êle fica
por êle atribuído ao imperialismo, com o que o processo econômico ausente oito anos do Peru, exatamente durante aquêles anos em que
é. visto sob prisma inteiramente diverso: ":B [a classe média] que a política de Leguía começava a dar seus frutos no campo da inte-
aJuda [nos países manufatureiros] a grande indústria e 'faz circular' gração de alguns ramos da econo~ia pe':"ana ~o. mercado ':"terl!o
seus produtos no mercado consumidor. Em nosso país, êsse avanço do capital, considerado da perspectiVa soc10econonuca. O ex~10 nao
da classe média foi detido pelo empuxo invasor da grande economia lhe permitiu perceber a mudan~a profunda o_perada no_ carater ?as
estrangeira, que não só impõe um tipo de indústria extrativa ou de relações entre a pequena burguesia e a ohgarqma; e por nao percebe-l_a
matéria-prima ... mas também traz as grandes emprêsas comerciais é que continuou insistindo, em 1931, n'l necessidade de fazer o Capi-
distribuidoras dos produtos manufaturados no estrangeiro. Por isso, talismo de Estado para proteger a classe média da voracidade im~
nossa cl~se média, cada vez mais débil, cada vez mais oprimida, é rialista. Ora, se até o fim da I Guerra Mundm~ a classe média
progressiVamente empurrada para a proletarização, como resultado do peruana (o artesão e o camponês proprietários dos instrumentos de
fenômeno econômico que a ciência moderna denominou universal- produção o mineiro, o industrial, o capitalista, o comerciânte e o
mente imperialismo" (IV, 104-105). pequeno produtor), especialmente os grupos de posição polític_a m~s
:llsse enfoque todo particular do processo econômico, associado alta, podia ser vista como um setor social fora do mercado mtemo
à menor relevância dada à questão da direção política, leva-o a do -capital, produzindo num regime de produção simples de. merca-
fazer do inimigo o imperialismo e não o capital privado - e só dorias, depois de 1920, com Leguía e após êle, ela passa a mt.egrar
assim pode ser. Diferentemente era para os bolchevistas, apesar de ésse mercado graças a suas conexões com o capital norte-amencano
saídos da guerra civil e da intervenção: a luta principal niío é contra que se aplica nas estradas de ferro, na agricultura, na mineração e
o ~mperi;zi~smo, mas contra o capital privado interno; isso porque, se em alguns setores urbanos. Os efeitos dessa associação do capital
o unpenal1smo resulta da expansão do capital, desde o instante em peruano com o capital estrangeiro não foram ~ogo vis!veis, porquanto
que se consiga deter a marcha dêsse, pela transformação das condições ela se revestiu inicialmente do aspecto de mrus uma mtensa explora-
políticas em que se dá a acumulação, aquêle estará sendo afetado. ção do trabalho indio e da eliminação dos artesãos e dos pequenos
Mas essa posição de concentrar o fogo contra o "inimigo interno", proprietários pelo processo de concentração dela decorrente. São êsses
procurando na medida do possível tratar com o "inimigo externo", aspectos externos que os jovens da Reforma Universitária vêem e é
para dêle extrair os conhecimentos técnicos indispensáveis ao pro- contra êles que dirigem sua luta.
gresso do setor socialista da economia, só é possível se se tem uma Um outro aspecto dessa ligação merece ser assinalado: é que
clara visão da solidariedade do sistema, a qual nos ensina que se os setores médios conquistam seu lugar ao sol através de uma aliança
as comunicações entre as partes cessam, êle tende inelutàvelmente a com setores externos que se encontravam em um momento baixo de
perecer. acumulação, aos quais não interessava econômic~ente sofrer pressões
Ora, o pensamento da Ordem parte, como visto, exatamente da I destinadas a obrigá-los a aumentar seus investimentos na melhora
negação dessa solidariedade - embora, conforme igualmente assina- técnica das emprêsas. Daí a oposição movida contra a organiz~.ão
lado, Haya de la Torre tenda a atribuir a condução do processo eco- da classe operária e a repressão conseqüente de tôdas as suas reiVm-
82 Lenin, tomo XVII, pá.g. 427, apud "La Pla.te·forme de l'Opposit.lon de oau- dicações - e nesse processo dá-se exatamente, no plano de Estado,
che", Cit., pá.g. 90.
a aliança entre a oligarquia, o capital estrangeiro e os setores médios,
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partícipes de igual pr':cesso e~onômico-social e'.". que a real~ação rialista no grande número, mnmgo por igual da oligarquia e da pe-
do "ethos" capitalista so tendera a afetar a rentabilidade de seu m~es­ quena burguesia, e outro teria sido seu destino político. Os ~e!or~os
timento e, por extensão, sua posições políticas no Peru e no extenor. pequeno-burgueses que poderiam tê-lo apoiado, ?ada a pr.eemmenc;a
E essa aliança, nesse processo, que explica o triunfo do "ethos" oli- que lhes atribuía na condução do processo, temiam com JUsta razao
gárquico sôbre aquêle que teàricamente podia ser atribuído aos seto- aquela imensa massa de desiguais que formava na APRA. E tenderam
res médios em ascensão. sempre a abandoná-la, preferindo buscar n? _?xérci.to, 84 o~ em outros
Haya de la Torre viu êsse problema a meias: ao assinalar que movimentos menos radicais por sua compostçao soctal, os mstrumentos
o próprio imperialismo se "feudalizara" em contato com as formas com que continuar realizando o predomínio do "ethos" oligárq:Uico .e
feudais ou semifeudais de organização da produção na América Lati- sufocar o desenvolvimento da economia no sentido de sua racwnah-
na. Mas ao recusar a noção de luta de classes do marxismo clássico dade exemplarizada nas nações hegemônicas do sistema global.
- o que o levou a uma falsa proposição do problema da hegemonia Em certo sentido e até certo ponto, ao querer constrmr com o
- não pôde estender essa visão da "feudalização" do imperialismo apoio do grande número um sistema social em que a hegem_onia
(em outras palavras, da regressão do capital) à conduta econômico- pertenceria aos setores médios por sua educação e cultura, VIctor
-social da pequena burguesia. Raúl Haya de la Torre foi o precursor do espírito com que se fêz,
Exatamente por não ter reconhecido a ligação da pequena burguesia em 1961, a "Aliança para o Progresso". Mas da mesrr.'a forma c.omo
ao capital norte-americano, a qual se dá através de Leguía, 83 e de a "Aliança" malogrou por ter capitulado à sagrada aliança dos mte-
insistir em nela ver a grande vítima do imperialismo, é que Haya de rêsses oligárquicos e do capital com velocidade reduzida, a qual se
la Torre propôs a organização do capitalismo de Estado como solução consubstanciou no princípio da não-intervenção, a APRA, 40 anos
para os problemas da pequena burguesia, do protelariado e do campe- antes, pagara seu tributo de sangue à nã<>-;violência, esquecid'! de_ qu;
sinato. Ora, se para aquelas que êle chama de "classes produtoras", é na violência, e apenas nela, que o capztal gera as condzçoes msfz-
o capitalismo de Estado poderia rep~esentar uma possibilidade de, as- tucionais em que pode dar a hegemonia do processo aos grupos
censão social, com a pequena burguesia dava-se exatamente o contrano, integrados no "ethos'' racional e secular que lhe é próprio. Por re-
pois êle pretendia realizar uma forma de direção política da economia cusar a violência, sabedora de que ela destrói a democracia, a APRA
que se chocava com os interêsses da classe (formação social concreta) teve de ceder diante da barbárie de Sánchez Cerro e dos 1ditadores
a que pretendia guardar do imperialismo afetando sua posição política. que se lhe seguiram. Mas no sacrifício de Trujillo, o grande número
A imprecisão com que discute o problema das nacionalizações - já provou que, no fundamental e americano, as idéias do jovem ~aya
que o capitalismo de Estado, por definição, as pressupõe - contribuiu de ~a Torre que saíra do Peru nove anos antes, eram verdadeiras.
também para a incompreensão política que se fêz em tôrno da APRA
!
;l( Pois, embor'a pudessem e possam aparecer falhas à análise t.eórica,
desde o início, e que até hoje perdura. tiveram fôrça bastante para chegar ao senso comum dos stmples,
Procurando apoiar-se na pequena burguesia para combater o im- transformar-se para êles em artigos de fé e constituir-se em uma
perialismo, Haya de la To"e teve contra si, nesse quase meio sécu_lo idéia pela qual valeu a pena morrer.
de luta política, a aliança da oligarquia com a pequena burguesza, Enquanto expressão da insurgência do índio, da rebeldia do "cholo
já que ambas viram no combate ao imperialismo a maneira não de barato", do mestiço e do mulato, e da insubmissão do operário branco,
realizar a peruanização da economia, mas de alterar a participação o aprismo foi a doutrina do grande número, daqueles que vão "hacia
dos grupos sociais na escala de fruição dos valôres socioeconômicos, la cumbre donde ondea 1 e! estandarte rojo y nuestra idea", para
isto é, de fazer a revolução do grande número. "difundir la aurora que clarea 1 sin tasa para todos por los llanos".
Foi o amor do jovem estudante pelo índio que o perdeu, politi- É por isso que, enquanto intérprete dos anseios de libertação da
camente - e é apenas êsse amor que o salva perante a História. "grande y funeral canalla", é seu o futuro. Desde que um núcleo
Porque não fôra o fato de ter pretendido alicerçar sua luta antümpe- hegemônico consiga impor aos povos de Nossa América, lndoamé-
rica, a consciência de que ou nos capacitamos da tarefa a que nos
B3 Ravlnes, "América Latina ... ", cit., dlz o seguinte sôbre as ligações da classe
média: "A Classe Média ["o elemento da classe média é o que possui uma reservf.ll solicita a grandeza de nossas raças tristes e de nosso Espaço imenso,
econômica"] ... alçou-se em 1912 com Guilherme Bllllnghurst no Peru; derrotada, ou continuaremos dominados. Para todo o sempre.
regressa em 1919 com Leguia ... " (pág. 61). A pá,g. 160 e sega., afirma sôbre os con-
sórcios industriais e comerciais norte-americanos na América Latina: "Entrelaçam
de maneira tal seus interêsses com os dos nacionais que chegam a construir associa- São Paulo, novembro de 1966.
ções que participam das qualidades e dos defeitos nativos". E logo adiante apre:;enta
a W. R. Grace & Co., fundada em Callao no ano de 1850, como "uma das mais com- 84 Tenha-se sempre em mente que êste estudo fol terminado em 1966, antes que
pletas estruturas, e das melhores adaptadas, do lnversionismo norte-americano na as Fôrças Armadas am:;Umlssem diretamente o poder no Peru e Iniciassem sua revo-
América Latina, ... que debordou do Peru para a América do Sul". lução.

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isn LIVRO FOI COMPOSTO E IMPBESSO
NAS OFICINAS DE
ARTBB GRAFICAS BISORDI S. A.
(C. O. c. M. 1". N. 0 60.881.810).
À RUA SANTA CLARA, 54 (BRÁS),
sÃO PAULO,
EM OUTUBRO DE 1971.

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