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Ao falar, o jornalista Zuenir Ventura denuncia sua outra atividade profissional, de

professor. Suas respostas são claras, didáticas e pausadas. Com toda a paciência, não
deixa pergunta sem resposta.

• Parte 2: 1968 – Um ano para ser esquecido?


• Parte 3: As barricadas de 2008
• Parte 4: 1968 – Os conflitos de um ano que ainda não terminou

Ele acaba de lançar seu segundo livro sobre o ano de 1968 e nos concedeu entrevista por
telefone, do Rio de Janeiro. Zuenir fala das diferenças entre 1968 e 2008 e também das
heranças de 40 anos atrás.

“Hoje, só gay faz passeata”, diz Zuenir. Ele é taxativo sobre aquela que considera a herança
maldita daquele ano. “Eu acho que em 68 houve uma espécie de utopia ingênua em relação
às drogas”, diz.
Divulgação
No primeiro livro, “1968 - O ano que não terminou”,
lançado em 1988, Zuenir fez um trabalho
arqueológico para reconstruir os principais eventos
daquele ano no Brasil – desde o famoso “Reveillón da
Helô” – festa realizada em 1968 na casa de sua
amiga, a professora Heloísa Buarque de Hollanda –,
passando pelos protestos contra a ditadura, até o seu
triste epílogo, com a decretação do AI-5 – o Ato
Institucional número 5, que deu plenos poderes ao
governo militar e acabou com uma série de liberdades
individuais, como a liberdade de expressão.

Já em “1968 – O que fizemos de nós”, lançado em


abril deste ano pela Editora Planeta, com uma edição
revista do primeiro livro, Zuenir investiga o que
começou em 1968 e continua em 2008. Ganham força
as entrevistas com personagens daquele ano que se
mantêm em evidência hoje em dia – como Caetano
Veloso, Fernando Henrique Cardoso, Fernando
Gabeira e José Dirceu, entre outros. E alguns
20 anos depois, Zuenir lança novo livro sobre 68 fantasmas daquele ano são exorcizados, como o
trauma sofrido pela filha durante sua prisão. “O grilo maior dela era a rejeição, dela achar
que eu tinha feito a opção [de estar preso], que eu estava lá porque queria estar lá, e não em
casa”, conta.

É sobre as heranças de 68 que Zuenir fala na primeira parte da entrevista.

O que ficou de positivo e de negativo de 1968?

Vou começar pela herança maldita, que, eu não tenho a menor dúvida, é a questão das
drogas. Eu acho que em 68 houve uma espécie de utopia ingênua em relação às drogas,
achando que elas seriam um caminho para a ampliação do conhecimento, de
autoconhecimento, de expansão da consciência, todas aquelas ilusões, e o que se viu é que
as drogas são um instrumento de morte. Hoje, dominadas pelas multinacionais, são uma
fonte de renda, é um dos negócios mais rentáveis do mundo, portanto, uma fonte de
corrupção das forças policiais em todo o mundo. Um desastre. O combate também é uma
herança de 68, que é a política do Nixon, de enfrentamento das drogas. Esse certamente é o
pior legado, um flagelo do século passado e desse século também. Em relação às
conquistas, há muitas, sobretudo no plano do comportamento. Eu acho que avançou-se
muito nesse terreno, no terreno dos costumes, das liberdades individuais, sobretudo em
relação à mulher - a condição feminina avançou muito. Em quase todas as entrevistas que
fiz, perguntava sobre isso e a resposta quase sempre era em relação às mulheres. Eu conto
um episódio no livro. O Rio era uma cidade progressista, mas naquela época uma mulher
não podia entrar num bar sozinha. Nas relações também. Não digo o fim do autoritarismo,
mas houve um pouco a desmoralização do autoritarismo nas relações entre marido e
mulher, entre professor e aluno, entre pais e filhos. Acho que é no plano do comportamento
que você vai encontrar o que 68 teve de melhor.

Mais do que o aspecto político?

Mais do que o aspecto político. É curioso, porque aqueles jovens achavam que estavam
fazendo uma revolução política, queriam fazer, queriam mudar o mundo, transformar tudo
de um dia para o outro, e na verdade fizeram uma revolução de costumes, fizeram a
revolução sexual, fizeram realmente uma revolução comportamental.

Pode-se falar mesmo de uma revolução sexual?

Acho que pode. Agora, é evidente que essa revolução foi castrada pela aids. Eu classifico a
aids como a contra-revolução, porque realmente barrou todos aqueles avanços, introduziu o
medo. Houve uma era de ouro nas relações sexuais em que você não precisava usar
camisinha.

De um modo geral, o que mais começou em 68?

Acho que houve a valorização do jovem. Talvez até em excesso. O jovem se descobriu
como personagem. E também foi descoberto pelo consumo depois. Era uma categoria
social. E existiu muito orgulho disso, era uma geração muito onipotente, muito cheia de si.
Tanto que se dizia “não confie em ninguém com mais de 30 anos”. Depois dos 30, tinha
acabado. Eu acho que essa categoria do jovem foi uma descoberta de 68, o chamado “poder
jovem”.

Pacifismo, homossexualismo, ambientalismo... É comum se dizer que esses


movimentos começaram naquela época, mas me parece que essas pautas não estavam
colocadas nesta época.

Há sementes que nem sempre aparecem, vão aparecer depois frutificadas. Acho que é o
caso da ecologia, que começa mais tarde, mas é trazida para o Brasil por um remanescente
de 68, que foi o [hoje deputado federal Fernando]Gabeira, que popularizou essa questão.
Quando ele voltou, para escândalo da esquerda, trazia uma outra agenda, como o culto ao
corpo, que foi aquele negócio da tanga [em 1980, logo após retornar do exílio, Gabeira
apareceu com uma tanga de crochê na Praia de Ipanema, no Rio, causando polêmica], e
introduziu essa questão do meio ambiente. Realmente é uma herança de 68 e talvez a que
mais tenha frutificado. Se bem que o movimento gay também ganhou muita importância.
Hoje talvez seja a única força social capaz de botar na rua 2,5 milhões de pessoas. Passeata
hoje quem faz são os gays.

Tem uma coisa que você coloca no livro, que a ditadura conseguiu unir aqueles grupos
que não se davam bem nunca: a burguesia nacional, os intelectuais, os estudantes...

Sim, uma grande frente ampla...

Que tem uma analogia com a festa do Reveillon na casa da Heloísa Buarque de
Hollanda...

Um negócio que é curioso, nessa busca de pegadas de 68 que eu empreendi nesse último
livro... Eu acabei encontrando até numa rave, que eu falo sobre isso em um capítulo, eu
chamo até de Woodstock do século 21, porque ela lembra muito a festa hippie, tem muito
um clima de festa hippie, um espírito hippie na festa rave...

Inclusive o ecstasy é uma droga que tem similaridade com o LSD...

Tanto que hoje as drogas da moda são o LSD e o Ecstasy. Pra mim foi realmente curioso
encontrar pegada de 68 até aí, na festa rave.

Você tem visto filmes recentes sobre aquele momento?

Vi um muito interessante, “O ano em que meus pais saíram de férias”, e um outro também,
que acabou inspirando um capítulo do meu livro que se chama “A culpa é do Fidel”. Eu fui
ver o filme por indicação da minha filha. A história tinha muito a ver com a história de cada
um de nós. Então eu fiz um capítulo chamado “A culpa é de 68”, pegando os filhos
daquelas pessoas, inspirado pelo filme. Começo pela minha filha. Nunca tinha desconfiado
como ela tinha sofrido enquanto eu estava preso. Um dos sofrimentos é que ela ia visitar a
gente... E olha que eu não fui torturado, nada disso, nem o sofrimento que teve o Caetano e
o Gil, que estavam presos na mesma época na Vila Militar. Tinha a violência psicológica,
as ameaças, mas nada físico. Então tinha uma época que eu podia receber visita. Minha
filha pequenininha ia lá visitar a gente e, para tranqüilizá-la, e também a meu filho, eu dizia
assim: “aqui está ótimo, eu estou feliz, com liberdade, a gente pode até jogar basquete, tem
15 minutos de sol por dia”. Aí isso grilava mais, porque na cabeça dela ela pensava o
seguinte: “então ele escolheu ficar aí, está gostando, não volta pra casa, porque aqui está
muito melhor do que em casa”. Isso teve um trauma pra ela, um efeito que eu jamais
desconfiei que pudesse ter, porque eu não queria deixar trauma nela, o choque de ver o pai
na prisão... E porque seu pai está preso, quer dizer, não é ladrão, não é criminoso... Mas o
grilo maior dela não era esse, era a rejeição, de achar que eu tinha feito a opção, que eu
estava lá porque queria estar lá, e não em casa.
Como você avalia a geração 68 no poder?

Essa geração traiu um valor que era muito caro em 68, talvez seja um termo forte, “trair”,
mas desvirtuou um valor sagrado de 68, que é o valor da ética. Diz que fez isso em nome da
governabilidade, em nome do pragmatismo, porque se vive uma época muito mais
pragmática do que onírica, de sonho. Você tem de, de certa maneira, na política, sujar um
pouco as mãos. Minha principal crítica, e não tenho tolerância com relação a isso, é que foi
desvirtuado esse valor. A ética como uma prática e como um valor. Nada justifica isso. A
política não pode ser idealizada, ela exige uma visão mais pragmática, mais realista – por
isso eu não faço política. Entendo até que tenha essa lógica, mas acho que tem limites. Uma
coisa é você fazer acordos políticos, parcerias em função do bem público. Agora, tem
limites, há coisas que você precisa dizer: “a partir daí não faço nada”. Esses limites foram
ultrapassados. Transgredidos.

O presidente francês Nicolas Sarkozy, quando ainda era candidato, conclamou os franceses a romperem
com o “cinismo” do maio de 68, que teria “acabado com a diferença entre o bem e o mal, entre o verdadeiro
e o falso, entre o bonito e o feio”. Daniel Cohn-Bendit, principal líder do maio de 68 na França, lançou neste
ano um livro intitulado “Forget 68” – literalmente, “Esqueça 68”. No Brasil, o deputado federal Fernando
Gabeira, ardoroso defensor da luta armada na época, e um dos responsáveis pelo seqüestro do embaixador
dos EUA, Charles Elbrick, disse no início de 2008 que gostaria de não voltar ao assunto “1968”.

 Parte 1: 1968 – A herança bendita e a herança maldita


 Parte 3: As barricadas de 2008
 Parte 4: 1968 – Os conflitos de um ano que ainda não terminou

Na segunda parte da entrevista sobre 1968, Zuenir Ventura nos ajuda a compreender uma outra reação atual sobre
o tema: a tese segundo a qual é preciso esquecer 68 ou romper com seu espírito.

Sarkozy declarou recentemente que é preciso romper com 68, e o próprio Cohn-Bendit afirmou que é hora
de esquecer 68. É preciso romper com o espírito de 68? Este é um ano para se esquecer?

Eu não acho nem que tenha que romper nem que tenha que esquecer. Você tem de superar isso historicamente. Eu
acho que realmente o País não pode ficar atrelado a um ano a vida toda. Agora, não adianta tentar esquecer. A
amnésia não é a melhor coisa para a história. Aliás, um dos problemas do Brasil é que ele sofre de amnésia crônica.

Tem até essa citação em um dos seus livros, de 15 em 15 anos...

É do Ivan Lessa, está na apresentação do primeiro, dizia isso, “o Brasil, de 15 em 15 anos, esquece os últimos 15
anos”. Isso é uma tragédia. 1968 está aí como um enigma e tem de ser decifrado, tem de ser superado...

Interessante que, ao mesmo tempo em que a cada 15 anos se esquece os últimos 15, 1968 continua aí...

Exatamente o que eu ia dizer... E eu dizia quando estava fazendo 20 anos, em 88, e hoje você pode dizer a mesma
coisa. E provavelmente vai repetir quando fizer 50. Por que ele está aí? Por que ele ainda excita a imaginação,
provoca a discussão, provoca o debate? Porque tem coisas ali que foram realmente muito significativas. O próprio
Sarkozy só disse isso na campanha. Quando vai para o governo ele chama para ser ministro das Relações
Exteriores o Bernard Kouchner, que era um dos ícones de 68, em Paris. Claro que ele mudou de lado, foi a favor da
Guerra do Iraque, mas, de qualquer maneira, tem uma confusão que é muito própria do mundo de hoje. O que eu
queria dizer é o seguinte: não dá para você esquecer. Os militares tentaram isso com 68 durante muito tempo,
tentaram enterrar 68. A psicanálise explica isso. Você tem o retorno do recalcado. Nas histórias de cada um, por
exemplo, não adianta você tentar apagar aquele acontecimento, aquele mau passo de uma tia ou aquela coisa meio
misteriosa que ninguém te explicou direito o que aconteceu em determinado momento na sua família. Você não
sossega enquanto você não descobrir o porquê daquilo, o que houve, o que aconteceu. Não acho legal essa
tentativa de você ou acabar com 68 – como muita gente diz: “Ah, não devia nem ter existido”, ou então de exaltar –
também não é para sacralizar. Nem uma coisa nem outra. Nem é para fazer apologia nem para condenar 68 ao
esquecimento porque não adianta. Ele volta. Ele está há 40 anos voltando.

Por que tantos preferem ter essa atitude segundo a qual é preciso esquecer 68? O Gabeira, por exemplo,
disse em entrevista recente que gostaria de não voltar mais ao assunto...

É, mas ele vai falar... Porque tem uma hora que dá isso mesmo... A Helô [Heloísa Buarque de Hollanda] às vezes
diz também: “Graças a Deus terminou! Graças a Deus terminou!”. E fala o tempo todo de 68. E é natural, porque foi
um ano que marcou a vida de todos nós, da gente que viveu aquele ano. Enfim, foi um ano extraordinário. Como eu
escrevi um livro sobre 1968, as pessoas ficam às vezes me cobrando, como se eu fosse um advogado de 1968.

Tem também a coisa da patrulha intelectual, a utilização do terrorismo como prática política...

Sim, a utilização da violência, tudo isso foi muito ruim. Então você não pode ficar exaltando, como se fosse o Éden,
como se fosse o paraíso. Tem de olhar com certo realismo, mas claro que a gente olha sempre o passado
idealizando. O jovem, principalmente, que não viveu, sofre o fenômeno que eu chamo de “nostalgia do não vivido”.
Converso com jovens hoje de 16, 17 anos e eles têm uma nostalgia do 68 que ele não viveu, ele viveu pelos relatos,
pelas histórias, sobretudo dos pais, dos parentes... Mais até do que pela história oficial. Então eu acho que essa
visão de 68 tem de ser equilibrada.

Por que muitos têm essa atitude do romper com ou de esquecer 68?

Eu acho que tem muita gente que em vez de transformar o mundo foi transformado pelo mundo. Mudou, mudou de
idéia, mudou de direção, de rumo. Teve muito isso. Há muito isso de arrependimento. Acho isso péssimo, porque no
momento que você olha para trás e está rejeitando tudo aquilo que você viveu, deve ser uma sensação muito
desagradável. Não tem de ter apego ao passado. Eu, por exemplo, acho, como Paulinho da Viola, que meu tempo é
hoje. Essa nostalgia, “ah, eu queria ter vivido”, eu tento tirar isso da cabeça dos jovens, em palestras, em debates.
No novo livro eu perguntei ao Caetano: “Você acha que é possível um novo 68?” E ele dá essa resposta
absolutamente genial: “Olha, para ser parecido tem de ser absolutamente diferente”. É um pouco o que eu digo:
“Vocês não tem de repetir 68, mimetizar 68”. Porque tem de ser completamente diferente para seguir o espírito de
68. Eu acho que não tem de ficar voltado ao passado. Você tem de fazer permanentes balanços. O próprio Gabeira,
por exemplo, diz que não repetiria o que ele fez, a luta armada, mas ele mesmo não rejeita 68 como um todo. Aquilo
que deve ser rejeitado, sobretudo na história dele, que é a história da luta armada, que foi um grande equívoco.

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