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Conversação e Aprendizagem Organizacional: perspectivas para a

investigação

Autoria: Yeda Swirski de Souza

As teorias da aprendizagem organizacional, através de suas aplicações, tem atribuído à


conversação nas equipes de trabalho um papel destacado. No entanto, as expectativas com
relação à conversação se dão sem que esta seja interrogada como um processo de linguagem
e, deste modo, com características e propriedades específicas. Neste artigo, são analisadas as
relações entre conversação e aprendizagem organizacional, levando-se em conta: (i) que a
ação, individual ou coletiva, apresenta uma teoria ou um sentido intrínseco ; (ii) que a
conversação, levados em conta os aspectos performativos e discursivos da linguagem, tem a
propriedade de agir no campo semântico e, assim, na transformação ou recriação do sentido.
Considera-se, assim, a conversação, integrada à cooperação e interação intrínsecas ao
trabalho, como um processo de construção de sentido e, portanto, de reinvenção da ação. As
reuniões de trabalho são destacadas como um contexto privilegiado para a investigação das
relações entre conversação e aprendizagem organizacional.

Conversação e Aprendizagem Organizacional: pressupostos

No escopo das teorias da aprendizagem organizacional, a análise dos processos através


dos quais as organizações estabelecem as estratégias, as políticas de ação, as rotinas de
trabalho, a integração entre pessoas e tecnologias, etc. tem tido ênfase crescente nos últimos
anos. Através da análise desses processos, espera-se adquirir maior domínio sobre os fatores
que favorecem ou dificultam a ação, ao mesmo tempo individual e coletiva, que se
desenvolve nas organizações. Em um contexto de competitividade e mudanças tecnológicas
acentuadas, o ajuste fino dos processos de trabalho está na base do aprimoramento continuado
ou mesmo da sobrevivência de organizações.
A conversação tem sido considerada como um processo nuclear à mudança e base para
os processos de decisão e de integração das equipes de trabalho nas organizações que se
inspiram nas teorias da aprendizagem organizacional. Schein (1993) afirma que “o diálogo
tornou-se um elemento central de qualquer modelo de transformação organizacional (p.40)”;
Encontramos diferentes referências ao processo de conversação, ou ao diálogo, na
literatura que divulga o modelo das learning organizations i.
Isaacs (1993), escreve sobre o Dialogue Project associado ao Organizational Learning
Center do MIT ii. A conversação é valorizada como um meio para desenvolver a compreensão
sistêmica dos problemas.
A preocupação com a conversação é bem exemplificada no texto onde De Geus (1998)
relata sua experiência na direção da Shell e a influência que os estudos sobre aprendizagem
organizacional exerceram em seu trabalho e na empresa. Nas palavras do autor:
Afinal, o que acontece em reuniões decisórias? As pessoas falam. Técnicas
analíticas, tais como valor presente líquido, cálculos de capacidade de gerar lucro
e modelos de otimização podem ser incluídas no preparo de informações para tais
reuniões. Mas, em si mesmas, elas são um solo árido para decisões. As decisões
crescem no solo fértil das conversas formais e informais – por vezes estruturadas
(como nas reuniões do conselho no processo orçamentário), por vezes técnicas

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(dedicadas à implementação de planos ou práticas específicas) e por vezes ad hoc
(p.46).
Para compreender porque a conversação é valorizada, é preciso que se revejam alguns
conceitos da teoria da ação inspiradora das concepções atuais da aprendizagem
organizacional.
Um dos modelos mais reconhecidos na literatura concernente à aprendizagem
organizacional é o desenvolvido por Argyris e Schön (1978). Trata-se de um modelo
experiencial da aprendizagem focado na ação organizacional. Nesse modelo, a aprendizagem
nas organizações ocorre a partir de duas situações básicas: (a) quando há o encontro entre os
resultados e o plano de ação; e (b) quando erros se produzem, ou seja, os resultados não
atendem ao plano de ação e procedem-se ações corretivas.
No primeiro caso, quando os resultados atendem às expectativas, a tendência é a
repetição da ação. No segundo caso, o erro torna-se uma oportunidade de aprendizagem e
transformação da ação.
Para o segundo caso, ou seja, quando ocorre o erro, esse modelo, inspirado na
cibernética, propõe ainda que as aprendizagens podem ser de dois níveis distintos: single-loop
e double-loop, que passam a ser designados como aprendizagem simples ou complexa, ou
ainda, como aprender ou aprender- a- aprender.
Uma aprendizagem do tipo single-loop ocorre quando um sistema apresenta as
seguintes características:
- capacidade de perceber, monitorar e perscrutar aspectos significantes de seu
ambiente;
- aptidão para relacionar esta informação às normas operacionais que guiam o
comportamento do sistema;
- aptidão para detectar desvios significantes destas normas;
- aptidão para realizar ação corretiva quando discrepâncias são detectadas (Morgan,
1986).
As aprendizagens do tipo double-loop supõem, além dessas características, a
capacidade de revisão dos princípios orientadores da ação, ou seja, um nível anterior ou
prévio ao monitoramento do ambiente (Argyris, 1992a). Deste modo, os sistemas tornam-se
capazes de aprender - a - aprender.
O diagrama abaixo proposto por Argyris (1992a) representa essas duas estratégias da
aprendizagem:

AS ESTRATÉGIAS DE APRENDIZAGEM iii


ACERTO

CONSEQUÊNCIAS
VARIÁVEIS ERRO
AÇÕES
ORIENTADORAS

aprendizagem simples (single-loop)

aprendizagem complexa (double-loop)

Nesse modelo, um aspecto que adquire interesse especial para o presente estudo é a
relação estabelecida entre a ação e uma teoria ou microteoria a ela subjacente ou intrínseca.
Assim, a ação transforma-se à luz das alterações dessas microteorias, sobretudo no caso das
aprendizagens complexas.

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Argyris (1992a, 1992b), tendo em conta esse modelo, apresenta uma proposição de
intervenção junto a pessoas responsáveis por decisões nas organizações, sobretudo decisões
estratégicas. Essa intervenção baseia-se em relatos de conversação que se processam em torno
da análise de problemas que demandam decisões cujo encaminhamento não é programado ou
evidente.
A análise da conversação se dá através de uma técnica chamada estudos de caso. Em
sessões dedicadas a esta tarefa, gerentes são convidados a relatar casos que consideram
críticos para sua atividade. Especialmente, é solicitado que uma conversação relacionada a um
problema crítico seja descrita. A descrição deve se fazer acompanhar por observações sobre
pensamentos e sentimentos não comunicados relacionados à conversação. Ou seja, trata-se de
enunciados que, de algum modo, portam não-ditos, pensamentos ou sentimentos mantidos em
reserva ao longo da conversação, numa espécie de diálogo interior. Espera-se que, através
desses elementos menos evidentes da conversação, seja facilitado o acesso às microteorias
sustentadas pelo sujeito em questão. Deve-as destacar que os pressupostos da ação, as
microteorias, nem sempre são conscientes ou assumidas pelos agentes da ação.
Nessa perspectiva, todo um processo argumentativo torna-se improcedente, bem como
as ações decorrentes improdutivas, quando baseia-se em microteorias diferentes daquelas
efetivamente implicadas na ação.
Esclarecer as premissas que estão na base da ação e, com isso, possibilitar
aprendizagens do tipo double-loop é o objetivo dos estudos de caso.
Uma segunda inspiração para se considerar o papel nuclear da conversação na
aprendizagem organizacional está nas idéias do físico David Bohn iv. Segundo Senge (1992,
p.217), “ a maior contribuição de Bohn, que levou a descobertas importantes no campo do
aprendizado de grupo, é o fato de ver o pensamento como um fenômeno coletivo”. Para Bohn,
no que se refere à suposições e crenças, agimos de modo semelhante social e individualmente;
ou seja, consideramos nossas suposições como a verdade, recusamos a tomar consciência do
que as interroga e as defendemos apesar de suas óbvias incoerências. Esses mecanismos de
defesa agem também a serviço da estabilidade da sociedade, mesmo que o preço seja sua
destruição (Bohn & Edwards, 1991 in Cayer, 1997).
A conversação, definida como diálogo, constitui-se para Bohn num meio através do
qual se pode interrogar essas suposições e crenças, assumidas no plano individual e coletivo, a
partir de uma atenção focada nos processos de pensamento.
O sentido atribuído à palavra diálogo deriva do grego, dia significando através e logos
significando a palavra. A essência do diálogo é uma “corrente de sentido fluindo entre e
através de um grupo de pessoas” (Bohn, 1990, p.1, in Cayer, 1997). O diálogo tal como é
desenvolvido por Bohn é uma forma de livre falar e pensar em grupos de vinte a quarenta
pessoas que se encontram para trazer a tona as suposições individuais e culturais que podem
fazer obstáculo à comunicação efetiva ou ao desenvolvimento de significados compartilhados.
As sessões dedicadas ao diálogo constituem-se num espaço no qual os participantes podem
individual e coletivamente prestar atenção especial ao modo como funciona seu pensamento
e aos preconceitos, idéias, crenças e sentimentos que sutilmente controlam as interações
humanas.
Espera-se que as sessões de diálogo, ou seja esses grupos de 20 a 40 pessoas,
representem uma microsociedade com as características dos fenômenos que aparecem na
sociedade, a saber: pressão para conformidade à norma; medo de ser julgado ou excluído do
grupo; polarização de opiniões; distribuição de papéis como líder, seguidor, opositor, etc...
Bohn et. al. (1991 in Cayer, 1997) considera que o importante para o grupo não é
tentar escapar, evitar, negar ou mesmo analisar esses fenômenos, mas sim, observar e explorar
como o pensamento coletivo trabalha e como as relações interpessoais se desenvolvem. No

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âmago dessa exploração e do diálogo propriamente está a suspensão de pensamentos,
impulsos, julgamentos, opiniões, suposições, etc.. Suspensão envolve atenção, escuta, olhar e,
essencialmente, a auto-exploração das reações, sentimentos, pensamentos mobilizados ao
longo das conversações.

Conversação , Linguagem e Aprendizagem Organizacional

As proposições acima referidas, embora façam destaque a conversação não a interroga


efetivamente como um processo de linguagem em suas propriedades intrínsecas e, tampouco,
em suas relações com os processos organizacionais propriamente ditos.
Argyris espera que o diálogo orientado possa levar o sujeito a dar-se conta, ganhar
consciência e revisar as microteorias que orientam sua ação, possibilitando, com isso,
desenvolver as aprendizagens do tipo double-loop. Em outras palavras, espera que novos
sentidos se produzam a partir das trocas conversacionais, mas isto se dá sem que estas e o
processo mesmo de produção de sentido sejam investigados.
As idéias de Bohn partilham de princípios semelhantes, e acrescem ainda, um modelo
para o estabelecimento de sessões coletivas de diálogo. Novamente, há grande expectativa em
torno dos efeitos da conversação mas, mais uma vez, sem a integração de um exame mais
detido dos atributos do processo de conversação propriamente dito, ou mesmo de uma
avaliação de seus efeitos enquanto expressão espontânea das relações interpessoais.
Em suma, apesar da conversação e do diálogo assumirem posições chave nessas
proposições, isto se dá: (i) sem que se considere a conversação como intrínseca aos processos
interativos e cooperativos do trabalho; (ii) sem que os estudos sobre a conversação
espontânea, a linguagem em uso e os efeitos de produção de sentido próprios aos processos de
linguagem sejam considerados.

A conversação nos processos interativos e cooperativos do trabalho


Em uma perspectiva diferente, Nonaka (1994), ao propor elementos para uma teoria
da criação do conhecimento organizacional, confere grande importância ao diálogo contínuo
entre participantes de equipes de trabalho. O autor parte do ponto de vista de que não se pode
mais pensar na organização como um receptor/produtor passivo de inputs e outputs, ou como
um sistema de processamento da informação e solução de problemas, sugerindo, então,
investigar os processos de criação de informação e de conhecimento. A necessidade da
inovação é uma das situações destacadas para justificar este curso da investigação. A
inovação não pode ser explicada através de um modelo organizacional que enfatiza apenas a
noção de processamento da informação.
Ao desenvolver conceitos sobre a criação de conhecimento organizacional, Nonaka
critica as abordagens orientadas para as trocas conversacionais, acima apresentadas, que
visam o estabelecimento de aprendizagem do tipo double-loop, ou seja, a aprendizagem
calcada na revisão dos pressupostos orientadores da ação ou no questionamento e
reconstrução das perspectivas existentes, esquemas interpretativos, ou premissas para decisão.
Para Nonaka, nessas práticas, fica assumido de modo implícito que as aprendizagens do tipo
double-loop são difíceis para a organização implementar por si mesma e que, para superar
esta dificuldade, algum tipo de artifício é necessário. Além disso, é assumido implicitamente
que alguém de dentro ou de fora da organização sabe “objetivamente” o momento e métodos
certos para colocar a aprendizagem do tipo double-loop em prática. Com isso, uma visão
mecânica da organização fica subentendida.
Desde o ponto de vista da criação do conhecimento organizacional, a aprendizagem do
tipo double-loop não é uma tarefa especial e difícil, mas uma atividade cotidiana nas
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organizações pois elas continuamente criam conhecimento novo, reconstruindo as
perspectivas existentes, esquemas interpretativos prévios ou premissas.
O contexto de interação que se estabelece em equipes que se auto-gerenciam, nas
comunidades de prática - comunidades que refletem o modo como as pessoas efetivamente
trabalham, independente do cargo que ocupam -, é, na visão de Nonaka (1994), altamente
favorecedor para a criação do conhecimento e aprendizagem. O esforço em resolver
problemas gera laços entre os indivíduos que podem prover informação útil. A troca e
desenvolvimento da informação nessas comunidades facilita a criação de conhecimento
através da ligação entre o trabalho rotineiro, a aprendizagem ativa e a inovação.
A importância da conversação e do diálogo na criação do conhecimento e da
aprendizagem organizacional é, desse modo, percebida considerando-se os contextos de
interação próprios aos processos sociais da organização.
Zarifian (1996) faz observações que reforçam a idéia de se considerar as trocas de
linguagem nas interações como efeito das formas de organização do trabalho. Para Zarifian, o
interesse pela linguagem na pesquisa no campo organizacional está associado à emergência
do que o autor qualifica como paradigma da cooperação , ou seja, um apelo a cooperar que se
faz desde o topo gerencial às equipes de trabalho do chão de fábrica, no caso da indústria.
A emergência do paradigma da cooperação pode ser exemplificada a partir:
- da promoção das equipes autônomas, em geral responsáveis pela busca de seus
objetivos, que se auto-regulam e se auto-controlam para assumir esta responsabilidade;
- da abertura entre as funções, das interações, do diálogo entre serviços que até
agora se ignoravam;
- do desenvolvimento de organizações por projeto ou grupos de
desenvolvimento multifuncionais, permitindo às diferentes especialidades e às diferentes
fontes de especialidade trabalhar de modo simultâneo e convergente;
- da racionalização dos processos transversais e descoberta de que o essencial
dos ganhos de produtividade vem da melhoria (e da redução) das interfaces constituintes do
processo;
- da passagem da subcontratação à parceria, fundada sobre uma intensificação de
trocas e a realização de trabalho em comum e sobre uma busca de relações de confiança entre
empresas diferentes (Zarifian, 1996).
Em suma, as formas renovadas de organização do trabalho, nas quais a interação e a
cooperação nas equipes ou entre equipes são valorizadas, coloca em evidência os processos de
linguagem e suas potencialidades.
Ainda, na mesma perspectiva de Nonaka (1994) situamos a proposição de Dixon
(1997), que toma as conversas de corredor v como uma metáfora para os processos de
construção coletiva de sentido nas organizações. Na exploração dessa metáfora, Dixon
interroga sobre as razões que levam as conversas de corredor parecerem, às vezes, muito mais
interessantes e significativas do que tudo que se passou ao longo de um encontro formal. A
autora sugere que a explicação pode estar associada ao afastamento das limitações impostas
pela hierarquia, ao convite a múltiplos pontos de vista, à liberdade para mudar de assunto,
entre outros aspectos. Sugere também que corredores podem ser vistos como os espaços nos
quais o sentido coletivo é construído nas organizações. A conversação e o diálogo são, nesta
via, tomados como inerentes aos processos organizacionais, em seus corredores e espaços de
interação.

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A conversação como um processo de linguagem
No trabalho de pesquisa identificado pela caracterização geral linguagem & trabalho,
encontram-se importantes indicações para refletir sobre as relações entre conversação e
aprendizagem organizacional.
São estudos desenvolvidos de modo multidisciplinar e que levam em conta as
abordagens da linguagem enquanto fala, enunciação ou interação verbal que se desenvolvem
ora em contextos teóricos que buscam renovar a lingüística tradicional, ora em campos que
passam a fazer fronteira com essa disciplina.
Sem estabelecer compromisso com uma abordagem única ou exclusiva nos estudos da
linguagem, as investigações em curso constituem-se a partir de questões que emergem das
situações organizacionais e do trabalho e valem-se de diferentes abordagens dos estudos da
linguagem.
Girin (1990), em um artigo considerado como programático para os estudos nesse
campo, apresenta os avatares nos quais se apoiam os diferentes subtemas de investigação. O
autor destaca a insuficiência do que se designa a partir de Sperber e Wilson (1986, p. 2) como
modelo do código. Ou seja, a noção de que uma mensagem transita do emissor para o receptor
e porta um sentido definido desde um código compartilhado. Isto seria considerar que a
mensagem é “empacotada numa ponta, envelopada nas palavras e frases escolhidas pelo
locutor e desempacotada na outra ponta pelo auditor (Girin, 1990, p.54)”. Os problemas da
linguagem no contexto organizacional não podem, segundo Girin (1990, 1993), ser reduzidos
apenas a esta noção de troca de informações.
A linguagem apresenta diferentes dimensões que não podem ser negligenciadas em
favor de uma noção tão simplificada como é, em geral, privilegiada no contexto
organizacional ou empresarial. Tradicionalmente, as preocupações relativas à comunicação
repousam sobre uma concepção mecânica e instrumental fortemente inspirada na engenharia e
matemática da informação mas que não é suficiente para dar conta da multiplicidade de
questões colocadas pelos fenômenos da linguagem nas organizações.
A inserção dos estudos da linguagem no campo organizacional tem como propósito
alargar uma concepção que vê o sujeito como emissor e receptor de mensagens para uma
concepção de sujeito como ser de(da) palavra, cuja expressão não apenas o constitui, mas
também lhe provê de um sentido a tudo o que o rodeia e a sua própria existência.
A ampliação da abordagem dos problemas da linguagem no contexto organizacional é
atribuída a dois aspectos básicos: (1) trata-se, por um lado, do desenvolvimento dos estudos
que conjugam lingüística, filosofia analítica, sociologia e psicanálise; (2) por outro lado, como
já mencionado, as novas formas de organização do trabalho, com ênfase a partir do início dos
anos oitenta, trazem evidência aos problemas da linguagem, como nas práticas de gestão
participativa que são, por excelência, práticas da palavra.
As mudanças observadas no trabalho, no modo como este é organizado, coordenado e
realizado justificam, então, a atenção às questões relacionadas à linguagem. Há um verdadeiro
apelo a ela quando as diferentes modalidades das práticas de gestão participativa tornam-se,
não só, de uso corrente, como também, cruciais para a qualidade e a produtividade nas
organizações. Da demanda por sugestões às equipes semi-autônomas, passando por equipes
constituídas por projetos, times, equipes multifuncionais, entre outras, a participação que se
manifesta no convite a expressão é a moeda corrente nas atuais práticas de gestão.
Quando existe a preocupação de que um processo possa, efetivamente, atender
expectativas de um cliente, seja este interno ou externo, torna-se necessário que os agentes
que operam os processos tenham algum nível de autonomia de decisão. Para tanto é preciso
que se constituam espaços de mediação, ou seja, um relativo distanciamento que permita

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reflexão e decisão e, mesmo, deliberações coletivas vi. Mais uma vez, a expressão através da
linguagem está em questão.
A expectativa de que organizações tornem-se catalisadores de conhecimento e
criatividade estabelece ainda razões para a atenção aos fenômenos da linguagem, como
argumenta Nonaka (1994) antes referido.
Está, ainda, na base desses estudos, uma concepção da linguagem não só como
representação ou designação da realidade, mas partícipe de sua constituição. A linguagem não
é tomada como prévia aos processos reais, à ação, o que permitiria considerar que desejos,
intenções, motivos pudessem ser identificados em separado da ação propriamente dita. De
outro modo, propõe-se uma concepção expressiva, ou seja, uma relação intrínseca entre a
ação, expressão e intenção (Quéré, 1990).
Em suma, mais do que tomar a linguagem como um código ou veículo para
transmissão de informação, os problemas emergentes nas organizações e no trabalho
demandam compreender a linguagem enquanto campo de produção de sentido, ação e
expressão da subjetividade.
Considerando, então os elementos básicos próprios aos estudos que associam
linguagem, trabalho e organizações, pode-se identificar duas abordagens da linguagem como
as duas grandes balizadoras desse campo, a saber: (1) a linguagem como ação; e (2) a
linguagem como discurso.

A linguagem como ação


A noção da linguagem como ação está associada ao pensamento filosófico de J. L.
Austin que se insere na tradição britânica da filosofia analítica e, especialmente, a escola de
Oxford.
O trabalho de Austin pode ser situado, segundo Souza Filho (1990), na chamada
“virada lingüística”, característica de grande parte da atividade filosófica deste século a partir
da qual os problemas filosóficos tradicionais em teoria do conhecimento, teoria da percepção,
ética, etc. são investigados através da análise lingüística dos conceitos centrais destas áreas e
do uso dos mesmos na linguagem ordinária. Para Souza Filho, os efeitos do trabalho de
Austin estão nas visões renovadas com relação à linguagem e à noção de verdade. O autor
considera que o ponto central da concepção de Austin e sua principal contribuição à filosofia
da linguagem é a idéia de que a linguagem deve ser tratada essencialmente como uma forma
de ação e não de representação da realidade.
Para Borzeix (1987), a contribuição de Austin na análise da expressão em situações de
trabalho reside na interrogação sobre o que é produzido no curso das interações verbais. Ou
seja, ao considerar a enunciação como um ato, a questão não recai sobre o conteúdo do que é
dito, mas sobre o que se realiza através daquele ato de fala (Borzeix, 1987).
Segundo, Oswick, Keenoy e Grant (1997), o trabalho de Austin demonstra que, quase
invariavelmente, a linguagem serve não apenas para os propósitos descritivos mas também
incorpora um componente de ação, tornando-se, assim, muito difícil separar os processos de
proferir e de realizar alguma coisa. Os autores sugerem que o discurso e a atividade discursiva
precisam ser vistos como elementos vitais da ‘interação contextualizada’ que caracteriza a
vida organizacional.
A noção da linguagem enquanto ação faz com que se revisem concepções muito
disseminadas na cultura das organizações, segundo as quais falar é mais fácil que fazer ou
que ações falam mais alto do que palavras. Diferente disso, a noção da linguagem enquanto
ação permite perceber seu papel central em termos de construção da realidade.

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A linguagem como discurso
A noção da linguagem enquanto discurso também interroga a concepção simplificada
de comunicação corrente do contexto organizacional/empresarial. A metáfora empregada por
Girin (1990) é quanto a isto muito esclarecedora. Girin fala na “visão ferroviária” das
mensagens. O trem parte do expedidor para o destinatário com vagões cheios de materiais,
mas também com alguns vagões vazios! Ou seja, “ao edifício do sentido, o receptor deve
trazer sua pedra, completando o que a mensagem não contém (Girin, 1990, p.57)”. Em outras
palavras, os enunciados portam vazios e é através dos mesmos que os processos de construção
de sentido entram em jogo.
Um aspecto básico a esclarecer é a distinção entre enunciado e enunciação que
remonta aos trabalhos de Jakobson e Benveniste. Como lembra Borzeix (1987, p. 164) “a
expressão direta pode ‘ter efeito’ no sentido em que nós a compreendemos porque o sujeito
falante e as circunstâncias que envolvem sua palavra são levadas em consideração”.
Segundo Benveniste, a semântica, isto é, a questão do sentido, pertence ao domínio da
língua em ação. Este autor considera que os significados são constituídos a cada relação
enunciativa pela referenciação aos interlocutores e ao contexto da enunciação. O discurso é
entendido como a colocação em funcionamento de recursos expressivos da língua e enquanto
atividade que se dá em uma instância concreta e entre um locutor e um alocutário (Possenti,
1988; Martins, 1990).
Para Flores (1999, p. 190/1), “enunciar é transformar individualmente a língua – mera
virtualidade – em discurso. A semantização da língua se dá nesta passagem (...)”. Ou seja, a
enunciação refere-se ao modo como um falante apropria-se da língua, ou ainda, num sentido
amplo, às relações entre o falante e a língua.
Bakhtin ([1979]1997), com sua visão aberta das relações entre a língua e as relações
sociais, diz que “a língua penetra na vida através dos enunciados concretos que a realizam, e é
também através dos enunciados concretos que a vida penetra na língua (p.282)”.
Valoriza-se, assim, a noção geral de que o discurso constitui-se dos efeitos de sentido
produzidos a partir dos atos enunciativos. É preciso observar que só se justifica um estudo
sobre as relações entre aprendizagem organizacional e conversação se esta é entendida
como uma sucessão de atos enunciativos e, portanto, produtora de sentidos que não
existem antes de sua realização.

Os sistemas interpretativos
Sem poder atribuir à língua a função de um código definido, a busca de sistemas
interpretativos para os enunciados constiui-se, então, em preocupação básica nos estudos
sobre linguagem, trabalho e organizações. Borzeix (1994) sintetiza esta preocupação num
artigo que apresenta três sistemas interpretativos para a linguagem natural inspirados em
Grice (1979), Gumperz(1989) e Goffman ([1974]1991), cujo ponto comum é, a nosso ver, o
de atribuir às condições da interação e suas regras intrínsecas, a possibilidade de atribuir
sentido aos enunciados.
Grice (1979) defende a idéia que a conversação é apenas um caso particular ou uma
variedade de conduta intencional e racional. Propõe um modelo que busca a racionalidade da
conversação, supondo que os sujeitos nas trocas verbais agem com intencionalidade. A
conversação é comparada a uma relação contratual com regras e princípios próprios, as
máximas conversacionais e o princípio da cooperação.
Para Gumperz (1989), a inferência conversacional é parte integrante do ato mesmo de
conversar. O autor propõe que todo locutor indica, de modo direto ou implícito, a maneira
como um enunciado deve ser interpretado e mostra por suas respostas, verbais e não verbais,

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como interpreta as respostas de um outro locutor, sendo que é a natureza dessas respostas,
mais do que o sentido enquanto valor de verdade dos enunciados particulares, o que orienta a
avaliação da intenção do interlocutor.
A originalidade do trabalho de Gumperz, segundo Borzeix(1994), é considerar que os
elementos extra lingüísticos que concorrem para a produção de sentido, modificam-se
continuamente no curso da interação, caracterizando, assim, um dinamismo na evocação de
referências sociais e culturais que não poderiam ser reduzidas a descrições estáticas ou prévias
dos contextos de conversação.
Goffman ([1974]1991) pretende isolar alguns esquemas sociais vii fundamentais que
permitem compreender os acontecimentos e analisar sua vulnerabilidade, ou seja, suas
transformações. Para Goffman, algo que em determinadas circunstâncias apresenta-se como a
realidade pode, de fato, ser uma brincadeira, um sonho, um acidente, um mal entendido, uma
ilusão, uma representação teatral, etc. O autor chama à atenção para o sentido das
circunstâncias e para aquilo que às submete a leituras múltiplas.
Em suma, estes sistemas interpretativos – as máximas conversacionais e o princípio da
cooperação de Grice; os contextos dinâmicos de Gumperz; os esquemas da experiência social
de Goffman – propõem caminhos que estão fora do léxico e da gramática para a atribuição de
sentido aos enunciados, mas sempre focando as idiossincrasias da interação.
Ainda, o trabalho de Oswald Ducrot, ao investigar o sentido dos enunciados a partir de
indicações encontradas na frase, embora não se estenda à ampla variedade da produção de
linguagem que se verifica no campo social, traz elementos que contribuem na atribuição de
sentido dos enunciados nas situações aqui em questão.
Para Ducrot (1980), o sentido literal de uma frase não evidencia o sentido que o
locutor quer imprimir a seu enunciado. Mais do que isso, refuta a noção do sentido literal
como elemento semântico mínimo contido no sentido dos enunciados de uma frase e ao qual
se agregará o sentido da situação particular de emprego. Salienta que é preciso considerar a
situação do discurso para que o sentido se estabeleça, sem que seja preciso conferir às
palavras uma significação específica. A noção que destaca é a de que a frase apresenta
instruções ao destinatário para que este busque o sentido. Por exemplo, a frase “Pedro chegou
mesmo? (Ducrot, 1980 p.12)”, transcende a informação sobre a vinda de Pedro, e isto é
indicado através do advérbio mesmo.
Inspirados em Ducrot, Glady e Meynard (1998) analisam o discurso das mensagens
eletrônicas que circulam em uma empresa, cujo objetivo formal é transmitir informações
sobre as atividades em andamento, mas, além disso, produzem efeitos de sentido associados à
cooperação e ao clima social da empresa.

A noção de sujeito
Deve-se observar que um dos aspectos que não encontra uma explicação satisfatória
nos sistemas interpretativos acima mencionados (sobretudo em Grice, Gumperz e Goffman) é
a noção de sujeito. Essas abordagens, privilegiando a interação a relação dos sujeitos em
presença, podem sugerir que o falante é sempre o indivíduo agindo em sua consciência e
intencionalidade.
Não se pode perder de vista, contudo, que outras dimensões estão presentes no
enunciados, o que designamos aqui por condição enunciativa do sujeito.
A condição enunciativa do sujeito é abordada de diferentes modos nas teorias da
enunciação e nos estudos sobre o discurso. Valorizando-se semelhanças, privilegia-se, aqui,
os conceitos de interdiscursividade e dialogismo, pretendendo que sejam representativos da
condição de heterogeneidade de todo enunciado. Ou seja, a presença intrínseca do outro, seja

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ele o interlocutor em presença, o outro imaginário, ou Outro inconsciente, ou todos ao
mesmo tempo como condição enunciativa e como produção de efeito nos enunciados.
O conceito de interdiscursividade está associado á vertente francesa da análise do
discurso (AD) e diz respeito à presença ou à penetração de sentidos ou discursos social e
economicamente sobredeterminados nos enunciados. O foco da AD é, num primeiro
momento, a análise do discurso político e seus compromissos ideológicos mas, trata-se de
uma abordagem que mais recentemente se estendido à diferentes discursos no campo social.
Defendendo a hipótese de não transparência da linguagem, Pêcheux ([1975]1995)
afirma que o sentido das palavras e dos enunciados depende de “todo complexo das
formações ideológicas (p.160)”. Esta dependência é explicada através de duas teses: (1) O
sentido de uma palavra, expressão ou proposição é determinado pelas posições ideológicas
que estão em jogo no processo sócio-histórico no qual são produzidas ou reproduzidas.
Pêcheux resume esta tese dizendo que “as palavras, expressões, proposições, etc., mudam de
sentido segundo as posições sustentadas por aqueles que as empregam”. Ainda, esta tese
sustenta que é a formação discursiva que numa formação ideológica determina o que pode e
deve ser dito. A formação discursiva é, assim, o lugar da constituição do sentido; e (2) “(...) o
próprio de toda formação discursiva é dissimular, na transparência do sentido que nela se
forma, a objetividade material contraditória do interdiscurso que determina essa formação
discursiva como tal (Pêcheux ([1975]1995), p.162)”.
O conceito de interdiscursividade, se adaptado ao contexto organizacional, é
importante para se considerar que os enunciados expressos em situação de trabalho não
podem ser integralmente atribuídos ao indivíduo em sua intencionalidade. É preciso que se
considere que a expressão mobiliza sentidos que dizem respeito tanto ao sujeito em sua
singularidade, como a todo tecido social e cultural implicado.
Da mesma forma, a noção de dialogismo, tomada em Bakhtin , traz esta noção da
presença de múltiplos discursos na expressão de um enunciado. Em Bakhtin, as relações entre
o eu e o tu (ou o outro) não são, necessariamente, as relações face à face entre o sujeito e seu
semelhante. Bakhtin propõe que o outro atravessa constitutivamente os enunciados já que
supõe o discurso enquanto plural, entendendo que todo discurso se tece a partir de outro
discurso. O monólogo torna-se impensável, levando-se em conta os pontos de vista de
Bakhtin sobre o discurso. Assim, o tu (o outro) presentifica-se no discurso integrado a sua
própria tessitura (Martins, 1990).
A noção de que todo enunciado mobiliza a tessitura de sentidos que tanto o antecedem
como o sucedem e que pode, por sua ocorrência, subverter esses sentidos é algo central para
se considerar a conversação e seus efeitos.
A conversação tomada, então, com uma sucessão de atos enunciativos apresenta tanto
uma dimensão de ação, assim como uma dimensão discursiva, sendo que uma e outra não se
excluem.
Pelo viés da ação, pode-se considerar que a conversação tem a propriedade de
consumar ações e pelo viés discursivo, a propriedade de produção de efeitos de sentido. Ou
seja, a expressão, além de por si mesma constituir-se e ação e, também, relação, traz a
oportunidade de renovação do campo semântico, já que mobiliza os discursos que a
antecedem e produz efeitos de sentido, ou seja, efeitos de renovação no campo semântico.
Com isso, soma-se à concepção de que os enunciados portam conteúdos ou
informações, uma concepção performativa, evocativa e transformadora dos processos de
linguagem.

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A investigação da conversação em reuniões de trabalho

As reuniões de trabalho podem se constituir em importante espaço para a


investigação das proposições que são aqui apresentadas. As organizações reservam
espaços privilegiados para o exercício da palavra e um deles é o da reunião de trabalho.
Assumindo os mais diversos estilos em aspectos como o número de participantes, o tempo
de duração, a freqüência dos encontros, a regularidade, a flexibilidade de agenda, o estilo
da coordenação, as reuniões são, de modo geral, consideradas como oportunidades para a
troca ou transmissão de informações. No entanto, como oportunidades para a conversação,
as reuniões podem produzir efeitos que transcendem à simples troca de informações.
Como vimos, a conversação, enquanto processo de linguagem, apresenta
dimensões discursivas e performativas. Assim, pode-se investigar os efeitos performativos
e discursivos de reuniões de trabalho. Ou seja, pode-se investigar as ações que se realizam
em reuniões e seus efeitos na produção de novos sentidos e, portanto, na produção de
novas bases para a ação.
Souza (1999) descreve investigação realizada ao longo de sete meses em reuniões de
trabalho semanais da média gerência de um departamento de uma companhia telefônica.
Nesse estudo, busca-se não só apreender os aspectos comunicacionais mais evidentes,
como também os não-ditos ou implícitos dos enunciados expressos nas reuniões. É proposto
que as reuniões de trabalho sejam analisadas segundo duas dimensões: (i) a dimensão
temática; e (ii) a dimensão discursiva. A dimensão temática refere-se aos aspectos mais
manifestos e formais da reunião. São os itens da agenda, destacados por cada um dos
participantes, os assuntos debatidos, os problemas tratados e os encaminhamentos propostos.
São, geralmente, assuntos que emergem de atividades e problemas rotineiros, cujas variações
refletem o andamento dos processos de trabalho. A dimensão discursisva refere-se àqueles
enunciados expressos ao longo das reuniões, cuja característica é o de suscitar sentidos menos
evidentes, implícitos, não-ditos ou meio-ditos:
Enunciados que propõem vazios de significação e que deste modo facultam ao
auditor a tarefa de produzir sentido. Esses enunciados aparecem entremeados aos
diferentes assuntos tratados, relacionados ou não com os temas formais ou oficiais
da reunião. São fragmentos de falas que se perfilam nas margens das falas
objetivas, ou seja, aquelas a que se poderia atribuir uma significação
aparentemente unívoca, como é o caso de dados numéricos, datas ou outros
indicadores. Através desses enunciados, que se abrem a efeitos de sentido, é que
parece possível apreender sobre o que se produz nessas reuniões, no que se refere
ao conjunto de crenças, princípios e valores em construção ao longo das
conversações e que, de um modo ou de outro, conferem sentido às mudanças e
ações em andamento (Souza, 1999, p. 147).
A dimensão temática é apresentada em uma associação entre as diferentes funções
gerenciais e os principais conteúdos desenvolvidos. Por exemplo, o tema básico desenvolvido
pelo gerente do departamento é a transmissão das estratégias e cenários propostos pela alta
administração; os temas básicos desenvolvidos por um gerente da área de produção são as
novas formas de organização do trabalho, as mudanças na tecnologia; os problemas com as
empresas terceirizadas; os temas básicos desenvolvidos pelo Gerente da Qualidade são as
ações do Comitê da Qualidade, o curso sobre 5s, a implantação do gerenciamento da rotina
nas lojas, a promoção de palestras, a publicação de Boletim; etc. ...
Na análise da dimensão discursiva, são apresentado enunciados colhidos ao longo das
reuniões e que suscitam sentidos menos evidentes, bem como proposições de atribuição de

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sentido aos mesmos. Um exemplo é o seguinte extrato da fala de um gerente da área de
produção, expresso em uma das reuniões:
“(...) precisamos saber onde estamos gastando pela primeira vez (...) pela primeira
vez estamos nos adequando ao programa (...) quanto cada Unidade gasta, quanto
cada unidade produz ...” (op, cit., p. 154).
É proposto como dimensão discursiva desses enunciados os seguintes sentidos:
- Não era antes preciso saber onde se gastava;
- Nunca se esteve adequado a um programa;
- Não se sabia onde eram investidos os recursos (op. cit., p. 154).

Souza (1999) identifica nessas reuniões, formalmente voltadas à comunicação sobre o


andamento dos processos de trabalho, a produção de sentidos quanto às mudanças em curso
na empresa; à relação com os novos acionistas; à assimilação de novos métodos de gestão,
entre outros aspectos. Por mais repetitivas ou técnicas que possam ser, é considerado que
essas reuniões, facultando a expressão a seus participantes, colocam em movimento
possibilidades de produção ou construção que se, por um lado, afastam-se dos objetivos
formais ou explícitos da reunião, por outro lado, podem representar oportunidades para a
emergência de novos sentidos e, com efeito, aprendizagem organizacional.

Conversação e Aprendizagem Organizacional

No contexto das teorias da aprendizagem organizacional, é atribuído à conversação um


papel chave porque se espera que, através da mesma, as microteorias sustentadas pelo(s)
agente(s) da ação possam ser revistas. Especialmente, as aplicações, associadas ao
desenvolvimento das learning organizations, propõem que se pratique a conversação como
um exercício específico e controlado.
No entanto, nesse contexto, a conversação não é tomada como intrínseca às relações
interpessoais e ao dinamismo sócio-cultural da organização. Tampouco, é tomada como um
processo de linguagem e, assim, com propriedades e características específicas.
Uma vez que se considera a conversação como um processo de linguagem e,
especialmente, desde os estudos dedicados à linguagem em uso, surgem novas perspectivas
para a reflexão sobre as relações entre conversação e aprendizagem organizacional. Levando-
se em conta as potencialidades performativas e discursivas dos enunciados e definindo-se a
conversação como uma sucessão de atos enunciativos, pode-se estabelecer uma releitura do
papel da conversação na aprendizagem organizacional. A conversação, intrínseca aos
processos de trabalho, sobretudo, quando se realizam de modo participativo e cooperativo,
integra o tecido sócio-cultural e discursivo da organização. Os efeitos de mudança ocorrem
porque a conversação tem a potencialidade de renovar o campo semântico, ou seja, o sentido
e consumar ações.
Essas proposições foram investigadas no contexto de reuniões de trabalho, que mesmo
formalmente dedicadas a transmissão de informações, não deixam de fazer emergir em seus
interstícios novos sentidos e, mesmo, a consumação de atos específicos dadas as
possibilidades performativas da linguagem.
Esses estudos sugerem que a abertura de espaços para a expressão na organização são
favoráveis à aprendizagem, sobretudo quando se articulam aos processos de trabalho. Nos

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afastamos, assim, da concepção segundo a qual promover a aprendizagem organizacional, a
partir da capacidade de conversação, depende de exercícios específicos.

É interessante observar que a noção de aprendizagem organizacional expressa, como


propõem Weick e Westley (1996), uma contradição já que organizar e aprender são
essencialmente processos antitéticos. Aprender é desorganizar, quebrar padrões e aumentar a
variedade possível de respostas e soluções. Organizar é selecionar, classificar e ordenar,
deixando de lado algumas soluções, optando por outras, estabelecendo prioridades e, portanto,
reduzindo o espectro de variabilidade. È nessa tensão, em um movimento continuado entre
ordem e desordem que vemos a presença da conversação nos processos organizacionais. De
um lado, a conversação opera de modo ordenador produzindo a integração em torno de
objetivos comuns; promovendo o compartilhamento de significados; fazendo com que
imagens equivocadas se desfaçam. De outro lado, a conversação é desordenadora porque
abre-se ao campo de possibilidades para a criação, produção ou reinvenção dos sentidos.

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Notas:
i
Learning organizations refere-se a um modelo virtual de organizações que sejam capazes de
continuamente intensificar sua capacidade de aprender e criar e que operem de um modo ativo
na produção dessas capacidades. Esse modelo difundiu-se através de diferentes publicações e,
especialmente, através, do livro A Quinta Disciplina (Senge, 1992) .
ii
Massachusstes Institute of Technology.
iii
Fonte: Argyris (1992a), p. 8.
14
iv
Os textos de Bohn a seguir referidos a partir do artigo de Cayer (1997) são:

Bohn, D. (1990). David Bohn: On Dialoque. OjaI, CA: David Bohn Seminars.

_____ & Edwards, M.. (1991). Changing consciousness: Exploring the hidden source of the
social, political, and environmental crises facing our world. San Francisco: HarperCollins..

_____ & Factor, D. & Garrett, P. (1991). Dialogue: A proposal (disposível a partir de
Dialogue, Hawthorn Cottage, Broad Marston Lane, Mickleton, Glços. GL55 6SF Inglaterra).

v
Hallways exchanges, no original.

vi
Philippe Zarifian desenvolveu este tema em palestra no seminário "Langage & Travail",
CNRS, Gif sur Yvette, França em 10/10/1997.

vii
Frames, no original em inglês.

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