ai, amor!”. Ũa pastor se queixava muit’estando noutro dia, e sigo medês falava Pero Gonçalves de Portocarreiro e chorava e dizia Par Deus, coitada vivo com amor que a forçava: pois nom vem meu amigo; “par Deus, vi-t’en grave dia, ai amor!” pois nom vem, que farei?
Ela s’ estava queixando, Meus cabelos, com sirgo
come molher con gram coita eu nom vos liarei. e que a pesar, des quando nacera, non fôra doita, por en dezia chorando! “Tu non és se non mia coita, ai, amor!” Pois nom vem de Castela,
Coitas lhi davam amores, nom é viv', ai mesela,
que non lh’eran se non morte, ou mi o detém el-rei; e deitou-s’antr’ũas flores e disse con coita forte: mias toucas da Estela, “Mal ti venha per u fores, eu nom vos tragerei. ca non és se non mia morte, ai, amor!” (NUNES, 1973, p. 1-2).
Uma pastora estava a queixar-se
muito estando noutro dia, Pero m'eu leda semelho, e consigo mesmo falava nom me sei dar conselho; e chorava e dizia com amor que a forçava: amigas, que farei? “por Deus, vi-te em penoso dia, Em vós, ai meu espelho, ai amor!” eu nom me veerei. Ela estava se queixando, como mulher com grande sofrer e que apesar, desde quando nascera, não fora ensinada, porém dizia chorando! Estas doas mui belas, “Tu és senão o meu sofrer, ai, amor!” el mi as deu, ai donzelas,
nom vo-las negarei;
Amores causavam-lhe sofrimentos, que lhe eram como a morte, mias cintas das fivelas, e deitou-se entre umas flores e disse com dor forte: eu nom vos cingerei. “Maldito sejas por onde fores, disponível em: http://cantigas.fcsh.unl.pt/cantiga.asp?cdc ant=925.
“Dez chamamentos ao amigo” é uma série de poemas do livro “Júbilo, memória, noviciado da paixão”, publicado em 1974.
I E amavio contente o amor teria sido.
Se te pareço noturna e imperfeita Olha-me de novo. IV Porque esta noite Minha medida? Amor. Olhei-me a mim, como se tu me olhasses. E tua boca na minha E era como se a água Imerecida. Desejasse Minha vergonha? O verso Escapar de sua casa que é o rio Ardente. E o meu rosto E deslizando apenas, nem tocar a margem. Reverso de quem sonha. Te olhei. E há um tempo Meu chamamento? Sagitário Entendo que sou terra. Há tanto tempo Ao meu lado Espero Enlaçado ao Touro. Que o teu corpo de água mais fraterno Minha riqueza? Procura Se estenda sobre o meu. Pastor e nauta Obstinada, tua presença Olha-me de novo. Com menos altivez. Em tudo: julho, agosto E mais atento. Zodíaco antevisto, página Ilustrada de revista II Editorial, jornal Ama-me. É tempo ainda. Interroga-me. Teia cindida. E eu te direi que o nosso tempo é agora. Em cada canto da Casa Esplêndida altivez, vasta ventura Evidência veemente Porque é mais vasto o sonho que elabora Do teu rosto. Há tanto tempo sua própria tessitura. Ama-me. Embora eu te pareça V Demasiado intensa. E de aspereza. Nós dois passamos. E os amigos E transitória se tu me repensas. E toda minha seiva, meu suplício De jamais te ver, teu desamor também III Há de passar. Sou apenas poeta Se refazer o tempo, a mim, me fosse dado E tu, lúcido, fazedor da palavra, Faria do meu rosto de parábola Inconsentido, nítido Rede de mel, ofício de magia Nós dois passamos porque assim é sempre. E naquela encantada livraria E singular e raro este tempo inventivo Onde os raros amigos me sorriam Circundando a palavra. Trevo escuro Onde a meus olhos eras torre e trigo Desmemoriado, coincidido e ardente Meu todo corajoso de Poesia No meu tempo de vida tão maduro. Te tomava. Aventurança, amigo, Tão extremada e larga VI Foi Julho sim. E nunca mais esqueço. O ouro em mim, a palavra VIII Irisada na minha boca De luas, desatino e aguaceiro A urgência de me dizer em amor Todas as noites que não foram tuas. Tatuada de memória e confidência. Amigos e meninos de ternura Setembro em enorme silêncio Intocado meu rosto-pensamento Distancia meu rosto. Te pergunto: Intocado meu corpo e tão mais triste De Julho em mim ainda te lembras? Sempre à procura do teu corpo exato. Disseram-me os amigos que Saturno Livra-me de ti. Que eu reconstrua Se refaz este ano. E é tigre Meus pequenos amores. A ciência E é verdugo. E que os amantes De me deixar amar Pensativos, glaciais Sem amargura. E que me dêem Ficarão surdos ao canto comovido. Enorme incoerência E em sendo assim, amor, De desamar, amando. E te lembrando De que me adianta a mim, te dizer mais? – Fazedor de desgosto – Que eu te esqueça. VII Sorrio quando penso IX Em que lugar da sala Esse poeta em mim sempre morrendo Guardarás o meu verso. Se tenta repetir salmodiado: Distanciado Como te conhecer, arquiteto do tempo Dos teus livros políticos? Como saber de mim, sem te saber? Na primeira gaveta Algidez do teu gesto, minha cegueira Mais próxima à janela? E o casto incendiado momento Tu sorris quando lês Se ao teu lado me vejo. As tardes Ou te cansas de ver Fiandeiras, as tardes que eu amava, Tamanha perdição Matéria de solidão, íntimas, claras Amorável centelha Sofrem a sonolência de umas águas No meu rosto maduro? Como se um barco recusasse sempre E te pareço bela A liquidez. Minhas tardes dilatadas Ou apenas te pareço Sobreexistindo apenas Mais poeta talvez Porque à noite retomo minha verdade: E menos séria? teu contorno, teu rosto álgido sim O que pensa o homem E por isso, quem sabe, tão amado. Do poeta? Que não há verdade Na minha embriaguez X E que me preferes Não é apenas um vago, modulado Amiga mais pacífica sentimento E menos aventura? O que me faz cantar enormemente Que é de todo impossível A memória de nós. É mais. É como um Guardar na tua sala sopro Vestígio passional De fogo, é fraterno e leal, é ardoroso Da minha linguagem? É como se a despedida se fizesse o gozo Eu te pareço louca? De saber Eu te pareço pura? Que há no teu todo e no meu, um espaço Eu te pareço moça? Oloroso, onde não vive o adeus. Ou é mesmo verdade Não é apenas vaidade de querer Que nunca me soubeste? Que aos cinqüenta Tua alma e teu corpo se enterneçam Que enriquece, clarifica Da graça, da justeza do poema. É mais. E atormenta a vida. E por isso perdoa todo esse amor de mim E que se fale do amor E me perdoa de ti a indiferença. Tão sem rodeios Assim como quem fala Do amor contente e muito descontente Dos inúmeros roteiros 4 De um passeio. Falemos do amor, senhores, Sem rodeios. [Assim como quem fala Cantares do sem nome e de partidas Dos inúmeros roteiros I De um passeio]. Que este amor não me cegue nem me siga. Tens amado? Claro. E de mim mesma nunca se aperceba. Olhos e tato Que me exclua de estar sendo perseguida Ou assim como tu és E do tormento Neste momento exato. De só por ele me saber estar sendo. Frio, lúcido, compacto Que o olhar não se perca nas tulipas Como me lês Pois formas tão perfeitas de beleza Ou frágil e inexato com te vês. Vêm do fulgor das trevas. Falemos do amor E o meu Senhor habita o rutilante escuro Que é o que preocupa De um suposto de heras em alto muro. Às gentes. Anseio, perdição, paixão, Que este amor só me faça descontente Tormento, tudo isso E farta de fadigas. E de fragilidades tantas Meus senhores Eu me faça pequena. E diminuta e tenra Vem de dentro. Como só soem ser aranhas e formigas. E de dentro vem também A náusea. E o desalento. Que este amor só me veja de partida. Amas o pássaro? O amor? O cacto, ou amas a mulher II De uma migo pacato? E só me veja Amas, te sentindo invasor E sorrindo No não merecimento das conquistas. Ou te sentindo invadido De pé. Nas plataformas, nas escadas E pedindo amor. (Sim? Ou através de umas janelas baças: Então não amas, meu senhor) Uma mulher no trem: perfil desabitado de Mas falemos do amor carícias. Que é o que preocupa E só me veja no não merecimento e Às gentes: nasce de dentro interdita: E nasce de repente. Papéis, valises, tomos, sobretudos Clamores e cuidados Eu-alguém travestida de luto. (E um olhar Memórias e presença de púrpura e desgosto, vendo através de Tudo isso tem raiz, senhor, mim Na benquerença. navios e dorsos). E é o amor ainda A chama que consome Dorsos de luz de águas mais profundas. O peito dos heróis. Peixes. E é o amor, senhores, Mas sobre mim, intensas, ilhargas juvenis Machucadas de gozo.