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A HISTORICIDADE DA LÍRICA MODERNA: A RESPOSTA DE JOÃO

ALEXANDRE BARBOSA A ROLAND BARTHES

Joanita Baú de Oliveira1

Resumo: O presente trabalho aborda as relações entre lírica moderna e historicidade a partir do
confronto entre as concepções teóricas de João Alexandre Barbosa e Roland Barthes. Em Existe
uma escritura poética?, texto integrante de O grau zero da escritura, o crítico francês
classificou a linguagem do poema moderno como puro exercício de estilo, que exclui a função
socializadora da língua e recusa à História. Em perspectiva oposta, Barbosa, no ensaio As
ilusões da modernidade, que abre o livro de mesmo nome, argumenta que as transformações na
linguagem poética moderna decorrem de fatores socioculturais, de modo que, longe de ser uma
negação, constituem a marca de sua historicidade. Mediante a comparação dessas duas
perspectivas distintas, objetiva-se compreender os argumentos orquestrados por Barbosa a fim
de defender sua posição teórica e levantar a importância de seu trabalho na compreensão das
especificidades da lírica moderna em contexto brasileiro. Para tanto, realiza-se apreciação das
mencionadas bibliografias, elencando os principais pontos da argumentação de ambos os
pesquisadores. Não obstante, convoca-se também para o diálogo outras vozes que trataram das
questões concernentes à poesia e modernidade, tais como Walter Benjamin, Theodor Adorno e
Hugo Friedrich, a fim de esclarecer os meandros desse debate. Ao final das análises, revela-se
que, embora as concepções teóricas de Barbosa não sejam originais, posto que retoma o
pensamento dos filósofos da Escola de Frankfurt, elas têm o mérito de deslindar as razões do
hermetismo da lírica moderna para o leitor brasileiro e, assim, reorientar a recepção crítica deste
tipo de produção poética no âmbito nacional.

Palavras-chave: Poesia; Modernidade; Historicidade.

A linguagem hermética da poesia moderna é alvo de muitas reflexões e debates


entre os críticos literários. Diversos pesquisadores buscaram entender as causas e
consequências do isolamento social do poeta, o qual, após meados do século XIX,
deixou de ser o representante de uma coletividade, abdicando da narração dos grandes
feitos heroicos e do uso de referentes encontráveis na mitologia e nos fatos históricos,

1
Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Letras da Universidade Federal de Pernambuco. Bolsista
do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq. Joanita.bau@outlook.com.
em favor da expressão de seus próprios conflitos interiores e do emprego de metáforas
baseadas em suas experiências cotidianas.

Roland Barthes, por exemplo, em Existe uma escritura poética?, texto integrante
de O grau zero da escritura (publicado pela primeira vez em 1953), classificou o poema
moderno como puro exercício de estilo, que exclui a função socializadora da língua e
recusa à História, em decorrência do rebuscamento que passou a caracterizar a
linguagem da poesia na modernidade.

Também tratando sobre a lírica moderna, João Alexandre Barbosa, no ensaio As


ilusões da modernidade, que abre o livro de mesmo nome, publicado em 1986, afirma
que o poema moderno busca a universalidade, isto é, a transcendência espaço-temporal,
ao invés de ser a expressão de determinada coletividade, situada em tempo e lugar
específico. Entretanto, tal fato, na concepção de Barbosa, não implica a recusa da
História, posto que a própria configuração do poema deixa entrever, mediante a
oscilação entre uma linguagem compartilhada por todos e a autonomia criativa da arte, a
consciência de sua historicidade.

Embora não mencione o nome de Roland Barthes, o ensaio de João Alexandre


Barbosa soa como uma resposta ao crítico francês. Considerando essa premissa, o
presente trabalho aborda as relações entre lírica moderna e historicidade, a partir do
confronto das reflexões expostas em Existe uma escritura poética? e As ilusões da
modernidade. Ao relacionar esses textos, demonstrando que se ancoram em concepções
e perspectivas divergentes, objetiva-se elencar os argumentos orquestrados por Barbosa
para defender sua posição teórica, bem como deslindar a importância de seu trabalho
para compreensão das especificidades da lírica moderna no contexto brasileiro.

Em Existe uma escritura poética?, Barthes (1971) tem como propósito explicar
porque o texto poético moderno não pode ser classificado como escritura. Tal exclusão
advém da própria concepção barthesiana de escritura como resultado do cruzamento
entre língua e estilo. Para Barthes, a língua é um objeto social, que mantém a História
unida e completa. Já o estilo, sendo derivado do corpo e da memória do escritor, é um
atributo individual, que não encontra referentes na História e é indiferente à sociedade.

Conforme Barthes (1971, p.22), “pela sua origem biológica, o estilo situa-se fora
da arte, ou seja, fora do pacto que liga o escritor à sociedade”. Esse pacto só se realiza
através da escritura, na qual o escritor pode, mediante a utilização de um código comum
(a língua) socializar sua subjetividade, ligar a sua fala singular à história coletiva.
Assim, para Barthes (1971, p. 23) a escritura “é a relação entre a criação e a sociedade,
é a linguagem literária transformada por sua destinação social, é a forma apreendida na
sua intenção humana e ligada assim às grandes crises da História”.

Na modernidade, ainda segundo Barthes, o pacto entre poeta e sociedade se


rompe, implicando na perda do carácter de escritura e na recusa da História pelo gênero
lírico. A quebra das relações entre poeta e público é demonstrada a partir da
contraposição entre poesia clássica e moderna. A poesia clássica é compreendida como
uma prosa ornamentada por elementos específicos, como o ritmo, a métrica e a rima.
Sendo uma prosa enfeitada, ela era percebida como “fruto de uma arte (ou seja, de uma
técnica), nunca como uma linguagem diferente ou como o produto de uma sensibilidade
particular” (BARTHES 1971, p. 56). Ao contrário, a poesia moderna é concebida como
uma natureza diferente da prosa, uma linguagem outra, de tal modo que pode até
prescindir daqueles elementos decorativos que antes a caracterizavam. Na poesia
clássica o sentido das palavras não pode ser apreendido individualmente, mas mediante
as relações que ela estabelece com as demais no corpo do texto. Já na poesia moderna as
relações entre os vocábulos são abolidas de tal forma que, parecendo estar em estado
dicionarizado, podem lhes ser atribuídos qualquer um dos seus significados. Ao romper
com as relações entre as palavras, o poeta rompe também com a estrutura que lhes dá
sentido único e, por conseguinte, com o ato comunicativo. A ambiguidade da palavra
poética moderna exclui a função social da língua. A autonomia com que o poeta utiliza
os signos linguísticos, em busca de uma linguagem sonhada, corta os laços com a
historicidade, o que, consequentemente, impede que se possa falar em uma escritura
poética na modernidade. Nas palavras do semioticista francês,

Não há inconveniente em falar de uma escritura poética a propósito


dos clássicos e de seus epígonos, ou ainda da prosa poética ao gosto
das Nourritures Terrestres, onde a Poesia é realmente uma certa ética
de linguagem [...]. Mas quando a linguagem poética põe radicalmente
em questão a Natureza, pelo simples efeito de sua estrutura, sem
recorrer ao conteúdo do discurso, sem fazer parada numa ideologia,
não há mais escritura, só há estilos, através dos quais o homem se
volta completamente e enfrenta o mundo objetivo sem passar por
nenhuma das figuras da História ou da sociabilidade (BARTHES,
1971, p. 64).
Em síntese, na visão de Barthes, a opção da poesia moderna por uma linguagem
autônoma e plurissignificante assinala seu isolamento social e sua recusa à História. Em
contraposição, Barbosa procura demonstrar que as transformações na linguagem poética
moderna decorrem de fatores históricos, de modo que, longe de ser uma negação,
constituem a marca de uma historicidade.

O ponto de partida de Barbosa, na abordagem das questões entre lírica e


modernidade, será as relações entre poeta e linguagem da poesia e entre leitor e poema.
Na visão do crítico pernambucano, de fato, na modernidade as relações entre poeta e
leitor são alteradas, mas longe de serem dissipadas, elas são estreitadas, visto que o ato
de recepção é alvo da reflexão do poeta no momento mesmo da criação.

Essa preocupação com o leitor decorre da saturação da linguagem, que obriga o


poeta a repensar a viabilidade da armação de novos enigmas. Nesse sentido, para
Barbosa, a consciência do ato de leitura será caracterizadora da poética moderna: “O
que chamo de poesia moderna, é, sobretudo, aquela em que a busca pelo começo se
explicita através da consciência de leitura: a linguagem do poeta é, de certo modo, a
tradução/traição desta consciência” (BARBOSA, 1986, p. 14).

Segundo Barbosa, a reflexão sobre a possibilidade de continuação, atravessada


pela consciência do ato de leitura, deixa entrever a historicidade da poesia moderna. A
história do poema moderno, portanto, não pode ser apreendida externamente, a partir da
observação de apogeus e declínios, nem localizada nas circunstâncias espaço-temporais
do poeta. A história do poema moderno revela-se no seu componente intertextual, que
aponta para a releitura da tradição. A recusa da história pelas vanguardas modernas,
necessária à abertura de novos caminhos, foi apenas temporária. No momento seguinte,
o retorno aos textos anteriores foi a forma encontrada pelos poetas para tecer novos
enigmas, a partir da resolução transitória de enigmas anteriores.

Mas, segundo Barbosa, a tessitura palimpsesta do poema moderno não pode ser
atribuída à vontade individual ou à erudição do poeta. Ela resulta da tensão constante
entre o tempo do poeta e o tempo da linguagem da poesia. Ao traçar um roteiro
intertextual, o poeta promove interseções culturais, que apontam para a atemporalidade
do poema. Essa releitura da tradição só é possível mediante uma consciência
questionadora da linguagem da poesia, a qual é, inevitavelmente, marcada pelas
circunstâncias que a propiciam.

Ainda conforme Barbosa, a linguagem do poema, nascida na confluência entre o


tempo das circunstâncias e o tempo das intersecções culturais, é, notavelmente, crítica, o
que deixa entrever uma nova concepção acerca da poesia, do poema e do poeta. Essas
reflexões críticas, que surgem a partir de meados do século XIX, já não são feitas a
parte, mas instauradas no próprio corpo do texto. Embora possa manifestar-se de
diversas formas, o entranhamento da consciência crítica na própria criação é sempre
resultante do conflito entre a linguagem individual e solitária da poesia e a busca do
poeta de ser o intérprete da voz social.

Se este conflito sempre esteve presente ao longo da história, é notório que ele
ganhou novas dimensões na modernidade, mediante a laicização da linguagem da
poesia, fator que afeta diretamente a condição do poeta como oráculo social.

O descompasso na relação entre poeta, linguagem e sociedade afeta diretamente


o modo como serão criados e recepcionados os textos modernos. Citando Octávio Paz
(2006) e J. M. Cohen (1966), Barbosa assinala a diferença entre o hermetismo da poesia
clássica, que poderia ser resolvido mediante a busca de referentes na história e culturas
antigas, e o hermetismo da poesia moderna, que não pode ser resolvido pelo esforço da
erudição, dada ambiguidade da linguagem do texto poético.

Mas, a perda de um referente encontrável não pode ser tomada como elemento
exclusivo para a problematização acerca da poesia moderna. Tomando Roman Jakobson
(1980) como base, Barbosa lembra que a pluralização dos significados é própria da
função poética. O crítico alerta ainda que as ambiguidades recorrentes no poema não
podem ser atribuídas puramente à vontade individual do poeta. A ambiguidade da
linguagem poética moderna é apenas sintoma da crise no relacionamento entre poeta e
sociedade, advinda da dessacralização da linguagem da poesia.

É, pois, na percepção da inadequação deste relacionamento que Barbosa propõe


buscar uma descrição da modernidade na poesia. Para tanto, ele retomará as reflexões
que Walter Benjamin (2000) tece sobre Baudelaire. O foco de concentração se dará,
especificamente, sobre o modo como as novas relações entre poeta e público, mediante
a transformação do lírico em gênero, abre as portas para o uso da alegoria como
estratégia de articulação entre a linguagem da poesia e o leitor.

O procedimento alegórico permite ao poeta cifrar sua leitura pessoal da


realidade, de forma a provocar uma leitura plural. A novidade do poema moderno,
entretanto, não é o uso da alegoria, mas o fato de que agora ela não visa encobrir uma
verdade anterior, mas desvelar a própria consciência dos desvios da referencialidade. De
acordo com Barbosa, chega-se, assim, ao paradoxo fundamental para a caracterização
da modernidade na poesia. Se por um lado o poeta parece afastar o público, mediante a
construção de uma obra cujas metáforas não possuem um referencial previamente
disposto, por outro, ele necessita da cumplicidade do leitor na decifração de uma
linguagem que, pela sua plurissignificância, denuncia a crise da representação.

Entretanto, a utilização de uma linguagem que se abre para múltiplas


interpretações não pode ser tomada como única configuração possível do poema
moderno. “Nem a abertura à multiplicidade das significações serve como roteiro de
definição, nem o poema moderno se esgota na sua caracterização como instrumento
procriador de espaços significativos” (BARBOSA, 1986, p. 23). Assim, aquilo que
configura a poética moderna deverá ser buscado no modo através do qual ambiguidade
e univocidade se relacionam como elementos instauradores da reversibilidade dos
significados, o que ocorre mediante a criação de um espaço intertextual, no qual está
presente a suspeita quanto à operacionalidade da metáfora e a consciência dos desvios
da referencialidade.

Conforme Barbosa, no poema moderno, a univocidade dos sentidos será limitada


pelo obscurecimento das relações entre imagens e referentes. A própria estrutura
metafórica da linguagem da poesia interpõe-se entre o poeta e a realidade circunstancial,
de modo que, embora o poema seja a expressão do poeta, a sua construção obriga o
leitor a recifrar o que é dito. Desse modo, a compreensão da metáfora, em sua
capacidade de estabelecer relações entre linguagem e realidade, é instrumento
privilegiado para a caracterização do poema moderno. A consciência crítica que a
modernidade tem das limitações da fabulação metafórica implica o rompimento com o
procedimento analógico e a abertura para a iconização e a alegoria.
A interiorização da alegoria no poema metalinguístico problematiza os
fundamentos analógicos da linguagem, construindo um texto no qual é possível
apreender quão duvidosas são as respostas unívocas para a relação entre poeta e
realidade. Sendo o procedimento analógico aquilo que está no cerne da palavra poética,
o poema moderno faz a crítica de si mesmo. Mas, ao por em questionamento a metáfora,
elemento que funda as bases de sua própria linguagem, o poema moderno permite
também levantar suspeitas sobre os dados da realidade. Assim, “a crítica da metáfora –
resultado da metáfora crítica, que é o poema moderno – desfaz os limites entre criação e
crítica” (BARBOSA, 1986, p. 28).

A consciência crítica, inserida no interior da própria obra, é fundamental para


renovação da linguagem lírica, a partir de formas poéticas anteriores. Na esteira das
questões apontas por Tynianov (1976) e Eliot (1989) acerca das alterações e
permanências nos sistemas literários, Barbosa aponta que os recuos e avanços do poeta
em relação a seus antecessores não dependem unicamente do talento individual, posto
que o encontro de novas possibilidades para a linguagem da poesia é mediatizado pela
releitura da tradição. Entre a tradição e o talento individual, a consciência crítica, opera
a tradução do passado, permitindo ler o novo no velho.

A tradução da tradição opera um duplo movimento. De um lado, permite a


renovação da linguagem, do outro, reata os laços do poema com a historicidade. Assim,
“se faltassem outros argumentos para uma afirmação das relações entre poeta moderno e
história, bastaria a existência do tradutor no poeta moderno para falar do grau de sua
historicidade” (BARBOSA, 1986, p. 29).

A recusa da história desfaz-se mediante a releitura das formas poéticas passadas.


Desse modo, a historicidade do poema moderno desvela-se nos procedimentos que
foram utilizados na sua criação. “Em seus casos mais extremados e dramáticos, é pela
paródia, pela montagem, pela citação alusiva, pelo pastiche, que a tradução encontra o
seu caminho interior no poema moderno” (BARBOSA, 1986, p. 30).

Segundo Barbosa, através do roteiro intertextual, criado pela tradução da


tradição, o poeta moderno cria uma linguagem que rememora as múltiplas linguagens
da poesia no tempo e no espaço. Desse modo, a poesia moderna será marcada pelas
ilusões da intemporalidade e da ubiquidade.
A ilusão da intemporalidade consiste na busca de ser de todas as épocas,
enquanto a ilusão da ubiquidade corresponde à vontade de ser de todos os lugares.
Ambas as ilusões culminam na busca do poema único, isto é, aquele que possa ser de
todos os tempos e espaços. Por isso, o poeta já não se vê mais como intérprete de
homens, mas da humanidade. Intemporalidade e ubiquidade convergem, portanto, para a
ilusão da universalidade.

A substituição do presente pela simultaneidade de todas as épocas não significa


a negação das circunstâncias do poeta ou do poema. Pela convergência da linguagem de
múltiplos textos, tempo e espaço não são negados, e sim integrados no poema. Pela
atualização das linguagens do passado, o poeta e o poema se tornam contemporâneos
das tradições que lhes antecederam e daquelas que lhes sucederão.

Assim, a ilusão da universalidade não nega a historicidade do poema, mas esta


só pode ser apreendida na tensão entre a linguagem única do poema e a linguagem das
circunstâncias (do poeta e do contexto histórico). Sabendo que esta última limita aquela
primeira, definir a modernidade na poesia implica compreender como o poema resolve
(ainda que temporariamente), no espaço do texto, essa tensão.

A oscilação entre a busca de uma linguagem singular e a necessidade de dar voz


a uma coletividade, entre a autonomia da arte e o carácter comunicativo da linguagem, é
solucionada pela consciência da arbitrariedade entre o nome e a coisa, que resulta em
alteração das significações do poema. “É esta alteração que instala o poema na história:
o que se transmite não é mais produto de uma escolha individual mas envolve as
variações que, de ordem semântica, marcam a presença da coletividade no texto”
(BARBOSA, 1986, p. 35).

Consciente da brevidade de seu tempo e espaço, o poeta moderno permite a


infiltração no corpo do texto de linguagens de outros tempos e lugares, a fim de
converter o particular em universal. Contudo, vale a ressalva de que,

Quando se afirma, pois, a universalidade como característica do


poema moderno não se está caindo no óbvio (desde que o perigo
existe: todas as épocas assinalam a universalidade como meta
possível): é a própria substância do poema moderno, vale dizer, a
discussão interna de sua viabilidade, que impede o isolamento e
arrisca o confronto não menos radical com a universalidade. A
afirmação desta, portanto, é dependente de uma leitura crítica
empenhada em articular os elementos de composição do poema.
(BARBOSA, 1986, p. 36).

Assim, a afirmação da universalidade do poema moderno requer uma crítica


comprometida em compreender como, na busca dessa universalidade, a composição do
poema articula a linguagem da poesia à linguagem da história. A crítica, portanto, deve
saber operar com a reversibilidade dos valores espaço-temporais e recusar esquemas
redutores, que classificam os poemas como mais ou menos importantes conforme a
expressão de nacionalidade. Enfim, a crítica deve compreender que a poesia é um
discurso que busca a libertação do temporal e do espacial via linguagem.

Após esta síntese de As ilusões da modernidade, torna-se claro que grande parte
das considerações de Barbosa sobre a lírica moderna está calcada em reflexões críticas
anteriores. Exemplo disso é que a afirmação da historicidade do poema moderno, pela
presença do veio intertextual no corpo do texto, encontra apoio nas questões levantadas
por Tynianov (1976) e Eliot (1989) acerca do necessário retorno à tradição pelos poetas
mais jovens.

Não obstante, conforme já apontado, é em Octávio Paz (2006) e Cohen (1966)


que Barbosa busca subsídios para diferenciar o hermetismo do poema clássico do
hermetismo do poema moderno, a partir do qual reafirma a perda de um referente
encontrável como um dos elementos configuradores da poesia moderna. A justificação
para os desvios da referencialidade e ambiguidade como resultante do relacionamento
problemático entre o poeta e sociedade, por sua vez, centra-se nas reflexões de
Benjamin (2000) sobre Baudelaire.

Embora citado apenas de passagem, as concepções de Adorno (2003) sobre o


gênero lírico moderno, em Palestra sobre lírica e sociedade, também percorrem sub-
repticiamente a argumentação desenvolvida em As ilusões da modernidade. O texto de
Barbosa compartilha com o texto do filósofo alemão a concepção de que, por mais
particularizada e individual que um poema lírico possa parecer, ele é sempre fruto de
uma ordem social.

Em Barbosa, a afirmação da historicidade da lírica moderna é sustentada pelas


mesmas concepções que regem o pensamento de Adorno e Benjamin sobre a vinculação
entre o estético e o social: as novas configurações do poema moderno são resposta a um
mundo fraturado, no qual não há mais espaço para a subjetividade, onde o poeta perdeu
sua condição de intérprete da coletividade, a linguagem foi dessacralização e instaurada
a consciência crítica dos desvios da referencialidade.

Apesar de As ilusões da modernidade retomar claramente o pensamento dos


filósofos da Escola de Frankfurt, Bonfá (2015) aproxima as análises críticas de Barbosa
àquelas desenvolvidas por Hugo Friedrich em A estrutura da lírica moderna. Neste
livro, Friedrich (1978) apresenta uma visão parcial do poema moderno, ao centra-se na
análise de obras obscuras, que perseguiam o conceito de poésie pure, tendência que não
dá conta de expressar a diversidade da lírica desenvolvida a partir de meados do século
XIX. Para Bonfá (2015, p. 23) embora Barbosa não negue o relacionamento do eu
poético com a realidade, “suas teorias da modernidade poética parecem, às vezes até de
forma radical, vislumbrar somente uma linha de desenvolvimento da modernidade
poética - a do hermetismo”.

Contudo, vale lembrar que Barbosa afirma, reiteradamente, que os desvios da


referencialidade, a intertextualidade, a metalinguagem, entre outros elementos
intrínsecos do poema moderno, não dependem unicamente da vontade individual do
poeta. Nesse sentido, a ressalva feita por Berardinelli (2007) a respeito da diferença
entre Adorno e Friedrich, no que tange a identificação entre lírica moderna e
hermetismo, é cabível também para Barbosa:

Embora Adorno esteja muito próximo de identificar, como Friedrich,


a poesia moderna com a lírica mais inclinada à não-transparência
comunicativa e ao ‘phatos da distância’, sua leitura da situação e da
relação lírica-sociedade segue a direção contrária. O que Friedrich
interpreta como potência da linguagem e da fantasia, como capacidade
da lírica de ‘destruir’ o real ou de servir-se dele com absoluta
liberdade para os próprios fins estéticos, em Adorno aparece em
termos invertidos. Essa aparente liberdade absoluta da ‘fantasia
ditatorial’ e da ‘linguagem autônoma’ é, para Adorno, constrição,
determinação social e histórica: situação extra-estética não superável
esteticamente [...]. O que distancia e opõe o mundo poético e mundo
real é também o que os enlaça em um vínculo mortal. Esse vínculo é
ao mesmo tempo estético e histórico: determina as formas não
comunicativas e antirrealistas da lírica moderna e denuncia o estado
das coisas na sociedade contemporânea (BERARDINELLI, 2007, p.
35-6).

Diante do exposto, torna-se notório que a argumentação desenvolvida por


Barbosa em As ilusões da modernidade está embasada em referenciais teóricos
anteriores, especialmente aquele desenvolvido pelos filósofos da Escola de Frankfurt. O
mérito do crítico pernambucano não reside em uma pretensa originalidade, mas em
orquestrar, através do diálogo explícito ou implícito com outros teóricos, a defesa da
historicidade da lírica moderna e de sua vinculação com a coletividade. Afastando a
visão Barthesiana de que, excetuando-se a vertente clássica, a poesia redunda em um
puro exercício de estilo, Barbosa aproxima o público brasileiro do poema moderno,
contribuindo para recepção mais arguta e profícua desse gênero no Brasil.

Referências

ADORNO, Theodor. Palestra sobre lírica e sociedade. In: Notas de literatura I.


São Paulo: Duas Cidades; Editora 34, 2003.

BARBOSA, João Alexandre. As ilusões da modernidade. In: As ilusões da


modernidade: notas sobre a historicidade da lírica moderna. São Paulo: Perspectiva,
1986.

BARTHES, Roland. O grau zero da escrita. São Paulo: Cultrix, 1971.

BENJAMIN, Walter. Sobre alguns temas de Baudelaire. In: A modernidade e os


modernos. Rio de Janeiro: Tempo brasileiro, 2000.

BERARDINELLI, Alfonso. As muitas vozes da poesia moderna. In: Da poesia à


prosa. São Paulo: Cosac Naify, 2007.

COHEN, J.M. Poetry of this age: 1908-1958. New York: Harper and Row, 1966.

ELIOT, T.S. Tradição e talento individual. In: Ensaios. São Paulo: Art editora, 1989.
FRIEDRICH, Hugo. Estrutura da lírica moderna: da metade do século XIX a
meados do século XX. São Paulo: Duas Cidades, 1978.

JAKOBSON, Roman. Linguística e Comunicação. 10. ed. São Paulo: Cultrix, 1980.

PAZ, Octávio. ¿Qué nombra la poesia?. In: Corriente alterna. México: Siglo
veintiuno, 2006.

TYNIANOV, J. Da evolução literária. In: TODOROV, T. (et.al.). Teoria da literatura:


formalistas russos. Porto Alegre: globo, 1976.

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