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REGIA
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AUTONOMA
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A AUTONOMIA
,
XX ANIVERSARIO
Breves No tas Históricas
Alberto Vieira

GOVERNO REGIONAL DA MADEIRA


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REGIA
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AUTONOMA
DA MADEIRA

A AUTONOMIA
,
XX ANIVERSARIO
Breves No tas Históricas
Albe rto Vieira

GOVERNO REGIONAL DA MADEIRA


SECR ETARIA REG IOI\AL DOS ASSUNTOS PAR LAMENTAR ES E COMUN ICAÇÃO
Edição: Sect·etada Regional dos Assuntos Pat·lamentares e Comunicação

Autor: Alberto Vieit·a


I
Depósito Legal n. 0 : 101542/96

Execução Gráfica: lmpt•ensa Regional da Madeira, E.P.

Exemplat·es: 1.000

1 de Julho de 1996
Autonomia é para nós uma palavra mágica. Diz tudo o que sentimos

A e nada do que ficou lavrado na definição dos velhos dicionários e


enciclopédias.

A Autonomia é uma realidade vivencial que não se compadece com a frieza


dos conceitos.

A Autonomia pertence-nos e só nós a entendemos, através da sua fruição


diária. É o reconhecimento do estatuto de diferença dentro da unidade
nacional. Sim, porque a autonomia hoje implica necessariamente esta relação
umbilical.

A Autonomia não é geradora de consensos: amada por uns, é odiada e incom-


preendida por outros. Esses outros que maldizem o nosso estatuto de diferença
estão do lado dos que sempre nos amordaçaram.

A Autonomia, segundo M.Pestana Reis(1921), "não é grito de revolta, mas sim-


plesmente petição de justiça". Também, não deve ser entendida como uma con-
quista do momento mas sim a concretização de um direito histórico. A conjun-
tura realça apenas a necessidade da sua concretização como via para ultrapas-
sar o diálogo de surdos entre o centro e a periferia, isto é a metrópole e a "coló-
nia". Aqui, abre-se a ferida da orfandade só sarada com o reconhecimento deste
estatuto de diferença. Entre a metróple e a "colónia" fala-se de uma forma de
escravidão, cujas mordaças só serão cortadas com a autonomia. Para o homem
da primeira metade do século XIX, empenhado na luta pela abolição da escra-
vatura, tudo o que indiciasse uma relação de subordinação era condenado e
anametizado com o epíteto de escravatura.

A Autonomia cresce e frutifica-se na consciencialização política e cultural dos


intervenientes e projecta-se no pleno exercício dos orgãos de governo próprio.
A Celebração dos vinte anos da autonomia deve ser, por isso mesmo, uma
forma de apelo a essa ancestral aspiração que todos nós temos a felicidade de
ver concretizada.

A Autonomia mantem-se viva através da pratica e do conhecimento que dela


temos. Daí a necessidade de sondar o passado para compreender o presente e
construir o futuro. Divulgar a História e debater a realidade sócio-política que
ela encerra é também construir a autonomia.

A Autonomia, na verdade, não se esgota na dimensão política, pois precisa da


histórica e cultural que a enformam e lhe retiram a carga negativa do imedi-
atismo.

A Autonomia, enfim, é uma conquista fruto de várias batalhas do passado e


presente. Recordá-la é carregar energias para embates presentes e futuros .

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20 de Outubro de 1922 lia-se no Diário de Notícias que "no dia em

A
r_ que for decretada a completa autonomia, ter-se-á descoberto a
Madeira pela segunda vez". O momento era oportuno para esta asso-
ciação. Comemorava-se, então, o V Centenário do descobrimento da Madeira.
A isto juntava-se o fervor dos intelectuais e políticos madeirenses na defesa da
autonomia. Os jornais abriram-se ao debate, marcado pela defesa de uma
ampla autonomia, condição necessária para a evocação do sucesso destes cinco
.séculos de História. Daqui surgiu a ideia dos partidos regionalista que, depois,
se desfizeram com o fascínio do Estado Novo.
Num folheto evocativo do quinto centenário do descobrimento da ilha, coorde-
nado pelo Padre Fernando Augusto de Silva, foi feito o panegírico à autonomia,
pela pena de Manuel Pestana Reis. Aliás, o autor começa o seu texto com a evo-
cação da descoberta henriquina:" Ha quinhentos anos as caravelas do infante
entregaram às penedias da ilha, os primeiros povoadores.( ... )Em quinhentos
anos a arvore genealógica dos primeiros povoadores desenvolveu-se em linha
recta. Os madeirenses não podem renegar a Patria pela razão natural de não
poderem negar a Raça" . Daqui resulta que a História estabelece esta relação
umbilical mas também projecta a autonomia, a nossa carta de alforria.
Nada disto era estranho à sociedade madeirense da década de vinte, um dos
mais promissores momentos de debate e reivindicação da autonomia. A crise
económica foi a origem de tudo isto, porque era nestes momentos que mais se
fazia sentir o opressivo abandono a que a ilha fora votada pela metrópole. E a
situação era mais grave quando as receitas do estado arrecadadas na ilha eram
conduzidas para Lisboa e usadas em empreendimentos, como o do porto de
Leixões. A história da autonomia tem neste primeiro quartel do século uma
página dourada.
Lamentavelmente, este debate foi sol de pouca dura pois que se afogou na
esperança adiada, que foi o Estado Novo. Este apagou a autonomia o político e
procurou trazer para o seu seio alguns dos principais arautos, como foi o caso
de Manuel Pestana Reis. A autonomia ficou adormecida até que nova mudança
política veio trazer ao de cima esta ancestral reivindicação que nos possibilitou
as armas para vencer os desafios do presente e projectar os rumos do futuro .
Não sabemos se aqueles que estabeleceram o dia 1 de Julho, como o da Região
Autónoma e, acima de tudo, da autonomia tiveram por inspiração o texto de
Manuel Pestana Reis e todo o debate da década de vinte. Copiada ou original,
esta decisão merece o nosso aplauso. A 1 de Julho evoca-se (ainda que para
muitos esta data da descoberta oficial ofereça dúvidas) o descobrimento por-
tuguês da Madeira. É o momento de encontro dos navegadores quatrocentistas
com o espesso negrume. Este singelo gesto permitiu que a Ilha se projectasse no
mundo luso como a primeira jóia atlântica.
A autonomia, finalmente conseguida com a constituição de 1976, é a segunda
descoberta da Madeira. Isto é, a Europa descobriu este estatuto de diferença e o
madeirense revelou-se a si próprio nas suas capacidades de autogoverno. Deste
modo autonomia combina com descobrimento e a esta coincidência num só dia
de comemoração não deve ser entendida como ocasional. Abril de 1976 trouxe-
nos a segunda descoberta. Agora, resta saber se o futuro nos reserva novas
descobertas para que a autonomia continue a sua marcha.

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A autonomia pode ser enquadrada na tradição localista, materializada no
municipalismo. A criação desta estrutura descentralizada de poder obedece
precisamente a essa necessidade de aproximação dos governados aos gover-
nantes. Note-se que antes das transformações ocorridas no século dezanove
reconhecia-se ao município o carácter autónomo da administração, sendo o seu
poder assente na jurisdição local (foral e posturas) e no exercício dos magistra-
dos eleitos. Por isso, recordar a autonomia será também o recordar desta multi-
ssecular instituição.
A autonomia é hoje a mais perfeita materialização da dimensão regional e a
melhor via para a solução dos seus problemas. Ela fundamenta-se na História,
afirma-se pela consciencialização política e cultural dos seus intervenientes e
projecta-se no pleno exercício dos orgãos de governo próprio.
Hoje podemos dizer que a autonomia política não é uma palavra vã e que nos
foi dada a possibilidade de afirmação da nossa vontade e especificidades
próprias. E, tal como referiu M. Pestana Reis em 1922, podemos repetir hoje
com segurança que " a autonomia não é um grito de revolta, mas simples
petição de justiça. Adquirimos direitos, exigimos que os reconheçam e nos
garantam o seu livre gozo e exercício".

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A CRIAÇÃO DO CONCEITO
E A REALIDADE ENVOLVENTE

utonomia é um conceito polifacetado com mútiplos significados,

A todos de acordo com a posição do seu emissor. Fala-se em autonomia


política, administrativa, da junção das duas; da autonomia especial ou
ordinária(caso da constituição italiana de 1948); da autonomia ao nível filosófi-
co e psicológico.
O político, o economista, o historiador poucas vezes estão de acordo sobre isso.
Cada qual vê o fenómeno pelo seu primaz, intecionalmente reducionista. Para a
historiografia o conceito adquire varias matizes conforme o momento histórico
a que se orienta a nossa análise: no antigo regime tem contornos jurídicos-insti-
tucionais distintos daqueles que terá com o advento do movimento liberal. É,
aliàs, em fins do século XIX que o conceito ganha a necessária consistência
jurídica, sendo para ingleses e americanos o "home rule".
A autonomia é a mais perfeita materializaçao dos nossos ensejos e a melhor
soluçao para os seus problemas. Ela fundamenta-se na História, afirma-se pela
consciencializaçao política e cultural dos seus intervenientes e projecta-se no
pleno exercício dos orgaos de governo próprio.
O conceito, na sua expressão actual, é uma conquista do século dezanove mas
não será anacronismo o seu uso para momentos anteriores, desde que lhe seja
atribuído um significado adequado. Anacrónica é sim a projecção do seu actual
significadom às conjunturas passadas. Deste modo, a primeira preocupação do
historiador está em questionar a documentação para extrair a definição que
mais se coaduna com o ambiente da época.
A autonomia( o nomos do grego pode significar região, província, usos e cos- ·
tumes), que surgiu na Grécia antiga por oposiçao à alteronomia e anomia, é o
direito de uma região governar-se por leis próprias. Filipo foi o primeiro exem-
plo disso.
De acordo com S. Tomás de Aquino a sociedade assemelhava-se a um organis-
mo cujo bem estar resultava do exercício autónomo das suas funçoes. Esta visao
antropomórfica da sociedade tinha implicaçoes na organizaçao política da
autonomia funcional, que quer significar "jurisdictio", isto é, poder de fazer leis
e posturas, julgar e emitir ordens. É a partir daqui que se extrai a ideia coopera-
tiva de sociedade que marcou a evoluçao das nossas instituiçoes. Por isso
mesm, ao longo do processo histórico variam apenas as formas da sua
expressão institucional.
A outro nível importa destacar que a autonomia não é só nossa, ela expressa-se
de uma forma difusa em diversos espaços e tem um porvir semelhante em
regiões insulares ou não. Deste modo a análise da "nossa" autonomia deve ser
enquadrada no contexto global: a nossa e a dos outros, próximos ou afastados.
Este é um posicionamento que não temos visto no discurso histórico e, também,
político, da autonomia. É necessária uma nova postura, aberta aos outros, e um
reenquadrar do fenómeno no contexto do mundo actual e da sua emergência
no devir histórico global, com especial relevo para o espaço mediterrânico, aqui
considerado como o berço da autonomia.

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A actual autonomia das regiões insulares portuguesas ficou consagrada na con-
stituiçao de 1976. Os argumentos justificativos deste processo não são novos,
nem tão pouco se esgotam com o texto da nossa constituição. À partida esta
argumentação leva-nos a colocar algumas questões para reflexão. Serão as
"históricas aspiraçoes autonomistas das populaçoes insulares" mera criação e
mistificação abrilista, como o afirma Fernando Jasmins Pereira, ou então uma
realidade palpável do nosso devir histórico ? Só quem desconhece o debate
resultante da Revolução liberal e da Republica poderá ficcionar esta realidade.
Todavia, o parágrafo da constituição nao restringe o fundamento da autonomia
apenas a isso, pois fala também em especificidades de ordem económica, social
e cultural(este último acrescentado com a revisão). Sao estas também invençao
do legislador?
No te-se que a região não se define apenas por uma homogeneidade de
condiçoes eco-sistémicas. Ela é mais do que isso, sendo uma realidade sentida e
vivida pelos seus habitantes. É, no entender de André Frémont, o "espaço vivi-
do". A isto acrescenta Juan Beneyto a dimensão histórico e cultural. A história é
mesmo o cimento desta solidaridade. Por isso, nao sao apenas as condiçoes de
uniformidade do espaço que a definem, mas, acima de tudo, a consciência
colectiva daí resultante. A regiao é uma totalidade espácio-humana.
A ilha assume-se como uma região particular, tendo uma identidade própria. É,
no entender de Lucien Febvre, um "pequeno quadro natural". É por si só uma
unidade social, económica e política, constituindo uma forma singular de ser
mundo. O mar, factor de aproximaçao e isolamento, é o principal gerador dessa
individualização. Por tudo isto é possível falar do mundo insular, assente
numa singular personalidade, numa particular cosmovisao, ou melhor ainda,
numa forma de ser e estar no mundo.
Folheando os múltiplos textos que definem o processo autonómico na bacia
mediterrânica é evidente a valorização das dominantes geográficas e históricas.
Para a constituição italiana(1948) existem dois tipos de regiões, às quais é
atribuída uma autonomia diversa. A espanhola de 1982 diferencia três formas
de expressão: 1. regiões definidas por "características históricas, culturais e
económicas comuns"; 2.os territórios insulares; 3.as "províncias com identidade
regional histórica". A constituição apresenta-a, ainda, comO resultado de uma
"entidade regional histórica". depois os estatutos de cada região dão a justifi-
cação: em 1982 nas Canárias a autonomia é apresentada como a "expressão da
sua identidade", enquanto nas Baleares em 1983 fala-se em "identidade históri-
ca". Entretanto em França os estatutos da Córsega de 1982 definem uma organi-
zação político-institucional específica, fundamentada na geografia e História.
A distância geográfica e a diferença territorial inviabilizam uma eficaz acçao
governativa desde o centro (o Terreiro do Paço). Est~s condiçoes radicam o
direito à diferença na orgânica governativa e são factor de promoçao do desen-
volvimertto. A ideia está expressa na lei fundamental, mas também foi percebi-
da pelos defensores da autonomia em épocas anteriores: Aristides da Mota para
os Açores(1892) e Manuel Pestana Reis na Madeira(1922).

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A HISTÓRIA DA AUTONOMIA

aspiração da autonomia nasceu com o homem, mas foi com a civiliza-

A ção grega que ela mereceu a necessária teorização política e aplicação


prática. As cidades-estados, as províncias romanas, poderão ser a sua
expressão. As primeiras têm continuidade nas cidades italianas, situação só
desfeita no século dezanove com a formação do reino de Itália(1856-70). O
Senhorialismo medieval deu continuidade a esse processo. Mas tudo se
esborou com o advento dos tempos modernos. As teses de Maquiavel € Jean
Bodin foram o seu suporte. O caso da vizinha Espanha em 1492, com a con-
quista de Granada e a total unificação dos reinos, é exemplo disso.
Mas o movimento continuou Europa fora. As disputas autonómicas entrararam
na ordem do dia da política europeia a partir do século XVII, dando-nos exem-
plo a Irlanda.Todavia, foi só em 1885 que se descutiu o "Home Rule" por
Charles Parnell, aprovado só em 1893 e levado à prática em 1914. Esta política
surgira nos EUA em 1872 com John F. Dillon. Antes disso tivemos em 1755 na
Córsega o movimento automonista liderado por Pascal Paoli que conduziu ao
projecto não concretizado da independência a 8 de Maio de 1769.
A Revolução francesa não deu continuidade às teorias federalistas dos EUA,
antes pelo contrário, procurou reforçar a estrutura centralista do poder. Esta
onda varreu, no século seguinte, toda a Europa. A oposição a isso surgiu ape-
nas nos alvores do século XX, contrariada, pelo comunismo e nazismo (1933-
45), e a conjuntura difícil das guerras mundiais. Passada a guerra, a autonomia
foi um facto e o regionalismo passou para a ordem do dia: a Sicília tornou-se
região autónoma em 15 de Maio de 1946; os ideais regionalistas passaram para
a ordem do dia do debate político, a partir da década de setenta.

AUTONOMIA NA HISTÓRIA DE PORTUGAL

egundo Borges de Macedo a tradiçao de ampla autonomia dos "poderes

S~ .
. políticos periféricos" é antiga e está enraizada na História Portuguesa.
Mas, nãosucede apenas entre nós, também em Espanha e Itália. Aliás o
nascimento de Portugal radica-se nessa opção autonomista do antigo regime.
Em Itália, tenha-se em consideração o peso das cidades-estado e o reverso da
medalha com o movimento de reunificação do século XIX. Na vizinha Espanha
as Cortes de Tortosa em 1400 são os marcos emblemáticos da autonomia da
Catalunha, Aragão e Valença, sendo 1492 o princípio do uniformismo peninsu-
lar, que tem em 1580 o seu ponto máximo. E o processo regressivo da autono-
mia continuou até ao século XX. Ela é cerceada com o avanço do processo
histórico, demarcado, primeiro pelo despotismo iluminado e, finalmente, com o
liberalismo, o momento máximo dessa tendência do processo de centralizaçao
do poder. A república mais não fez que dar-lhe continuidade.
A tradiçao localista, materializada no municipalismo, não chega, por razães
várias, a adquirir uma dimensão regional. Tudo isto foi resultado do processo

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de transformação do edifício institucional do Antigo Regime. Neste contexto a
conjuntura política que serve de base aos descobrimentos, momento de apareci-
mento das ilhas, é o início do esmorecimento desta virtual autonomia, o princí-
pio para a afirmaçao da centralizaçao expressa nos séculos XVII e XVIII. O regi-
mento das eleições de 1670 materializa essa opção ao definir uma maior inter-
venção da coroa na estrutura institucional. Esta situação é secundada pela lei de
16 de Maio de 1832, que retira todos os poderes executivos aos municípios. O
município subordina-se ao provedor, funcionário de nomeação régia. Depois, é
o aparecimento dos distritos pela lei de 25 de Abril de 1835, fundamentado pelo
código administrativo de Passos Manuel(1836) que define uma hierarquia insti-
tucional: 1. distritos, 2. municípios, 3. freguesia.A perda de autonomia do
município acentua-se na República e prolonga-se com o Estado Novo(1936) .
Mesmo assim as ilhas usufruíram, no século XV, de condiçoes especiais que as
diferenciam das demais partes do reino. Surge, assim, o senhorio e a capitania
(1433). As cartas de doaçao definem a precaridade desse processo e a capaci-
dade de mandar e julgar e nunca de legislar. Neste último aspecto deveriam os
capitães sujeitar-se aos forais ou regimentos gerais do reino. Esta capacidade de
legislar surgiu apenas com a afirmaçao do rnpnicípio. As posturas sao a materi-
alizaçao desse anseio, sendo os seus capítulos uma tentativa de dar voz às legí-
timas aspiraçoes de uma regiao, no caso a área do município. A criaçao desta
estrutura descentralizada de poder obedece precisamente a isso. A ela se recon-
hece o carácter autónomo da administraçao, sendo o seu poder assente na juris-
diçao local (foral e posturas) e no exercício dos magistrados eleitos. Destes últi-
mos, os juizes estavam acometidos de alguma capacidade jurisdicional.
A afirmação desta capacidade autonómica avança de acordo com o progresso
sócio-económico da ilha e das dificuldades de alcançar os centros de decisao.
Mais uma vez a geografia é condicionante. Sucede assim na Ponta do Sol
(1501), Calheta (1502), S. Vicente (1743). No caso de Santa Cruz (1515) sao mais
razoes sócio-económicas. Em todas as cartas de criaçao dos três primeiros
municípios é expressamente referida a dificuldade de comunicaçao com a sede
do município, no Funchal ou em Machico.
Os alvores do século XVI marcaram um passo atrás neste movimento. Há uma
nítida afirmaçao do poder régio: acabou o senhorio (1498), surgem nova figuras
institucionais subordinadas à coroa (corregedor, Provedoria ... ). Tudo isto abriu
caminho para o palco da centralizaçao régia. A situaçao piora com o domínio
filipino, ao surgir uma figura- o geral- que centraliza todos os poderes na ilha,
tendo continuidade até ao século XVIII. O sistema definido pelo Marquês de
Pombal em 1766 é a materializaçao disso. O primeiro golpe contra o centralis-
mo político absolutista teve lugar em 1822, mas depois desfez-se no calor da
luta partidária. Depois, foi o desabrochar da consciênc~a dos interesses locais e
a luta por uma alteraçao da orgânica de poder, apagados com a República e
Estado Nóvo
A crise económica da segunda metade do século XIX foi a ambiência geradora
deste movimento. Ora, sendo a autonomia indissociável do problema de como
governar o arquipélago, é natural que ela surja, com maior evidência, em
momentos de crise. É precisamente que se sente a distância entre os centros de
decisao e o lugar. Todavia, a autonomia nao é resultado disso, mas é a partir daí

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que ela emana e toma-se inteligível, por consequência, nao é uma necessidade de
momento, mas uma aspiraçao e um direito histórico. É, aliás, nestas conjunturas
difíceis que o discurso autonomista se enraiza na classe política e na população,
expressando-se em revoltas(do leite, da farinha ... ) contra a intervenção central-
izadora do governo, ou nos discursos e manifestos inflamados dos políticos.
O discurso autonomista, difundido na imprensa ou nas tribunas parlamentares,
é quase sempre o mesmo. A crise é resultado da situaçao institucional, que nao
permite respostas rápidas, por isso era necessário encontrar uma alternativa,
através de um governo próximo, capaz e eficiente. Depois, este ideal reforça-se
com o sentimento base de desprezo, manifesto na ingratidao da pátria, na
imagem de um povo sofredor e orfao, sendo a autonomia o caminho para a
metrópole assumir da adequada paternidade.
A análise da maioria das intervençoes evidencia a falta de originalidade na pro-
duçao ideológica. Acresce também que este movimento nao adquiriu a adequa-
da consciência política capaz de fazer singrar essa opção política em pleno. O
grande momento de debate entre nós foi o primeiro quartel do nosso século.
A principal diferença entre o processo autonómico nos Açores e Madeira radi-
ca-se na fraca dimensao do movimento político-cultural que lhe serviu de base.
Nos Açores a sua expressao, sobre a forma de bairrismo das ilhas ou distritos
do arquipélago, favoreceu a discussao e a anterior elaboraçao de uma autono-
mia administrativa em 1895. O debate sobre a divisão administrativa do
arquipélago, desde a revolução liberal, favoreceu essa discussão. Mas, também
foi o bairrismo o principal obstáculo à sua afirmação.

PARA A HISTÓRIA DA AUTONOMIA


POLÍTICO-ADMINISTRATIVA NA MADEIRA

A verdadeira consciência da autonomia, da qual somos hoje herdeiros, nasce na


ilha no primeiro quartel do nosso século e tem, de certeza como vaga de fundo
o processo desencadeado nos Açores a partir de 1895 e a ingente crise económi-
ca que então se vivia.
O caso da nossa ilha é significativo. A Madeira que, desde muito cedo, adquir-
iu a sua consciência política viu-se, de repente com o Estado Novo envolta
numa quase secular penumbra. A crise, que se arrastava desde meados do
século XIX, não encontrou na presente centúria qualquer resposta concreta da
sociedade política. A pertinácia de alguns, na luta por um projecto integrado
de desenvolvimento, como foi o caso do Visconde da Ribeira Brava não encon-
traram na sociedade política capacidade para carrear estes desafios.
A ilha, no limiar do primeiro quartel do século, es~ava a braços com uma pro-
funda crise: a aguardar solução para as suas tradicionais exportações (vinho,
bordados e vimes) com uma agricultura moribunda a aguardar por grandes
projectos de aproveitamento hídrico e traçado viário, ficará por algum tempo
entregue a si própria. Algo se avançou neste domínio mas muito mais ficou a
aguardar solução.

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Tardavam as soluções mas também os gritos lancinantes do ilhéu não chegam ao
Terreiro do Paço. Esta conjuntura de crise foi o alento gerador dos ideais
autonómicos, o cadinho onde germinou a consciência política da autonomia,
brevemente abafada pelo Estado Novo. As opções estavam perfeitamente delin-
eadas. A concentração e distancia do poder não favoreciam a pronta resposta aos
problemas e geravam nos madeirenses a desconfiança aos políticos centralistas.
O centralismo, que ficou conhecido pela designação de Terreiro do Paço, é o
estigma que cavou o fosso multissecular entre nós, insulares, e a terramãe. Esta
condição foi considerada pelos liberais madeirenses como uma forma de
escravidão. Em 1822, dizia o articulista do Patriota Funchalense, "A escravidão
consiste em viver algum sujeito absolutamente à vontade de outrem; uma
província, que deve sujeitar seus interesses aos da metrópole, que a seu turno a
não interessa, deixa de ser província, he de facto colónia e vive escrava". E para
soltar os grilhões que mantinham esta histórica servidão, o madeirense bateu-se
em diversos momentos sem o alcançar. Na Madeira a autonomia ganhou letra
de forma no plano constitucional em 8 de Agosto de 1901, quando Hintze
Ribeiro assinou o primeiro decreto concedendo à Madeira o estatuto atribuído
em 1895 aos distritos de Ponta Delgada e Angra do Heroísmo.
A crise agravou-se e as soluções ficaram a vegetar nos gabinetes. Com isto adveio
a desconfiança popular: a revolta da farinha (Ffvereiro de 1931) e do leite ( 1936).
E, neste intervalo de tempo, tivemos de suportar a culpa de uma revolução falha-
da dos deportados do regime (a 4 de Abril de 1931), onde os ideais autonomistas
se misturaram com a militancia republicana dos deportados. O governo da
ditadura procurou desvalorizar a reivindicação autonómica expressa por muitos
dos madeirenses aderentes ao movimento, acusando-os de independentistas.
Estes são alguns dos espinhos que atingiram o Estado Novo e testemunham a
nossa luta pela liberdade e democracia. Nada disto foi esquecido pelo Dr.
Oliveira Salazar que como ministro das Finanças e, depois, presidente do con-
selho, resolveu vingar-se da rebeldia insular com o ataque à autonomia e no
abandono a que fomos votados, não obstante algumas medidas de cosmética
que não conseguiram solucionar os problemas mas apenas adiar. Mais, tentou-
se apagar a forte consciência autonómica que animou a politica madeirense nos
anos vinte.
A Junta Geral é a expressão desta nova realidade, adquirindo nas ilhas uma
estrutura distinta na sua organização e funcionamento. Todavia esta autonomia
administrativa não convenceu os madeirenses. À crise política junta-se a
económica, esta última agravada com a primeira grande guerra. O isolamento a
que ficou votada a ilha testemunha mais uma vez a orfandade da mãe-pátria.
Deste modo em 1917 a autonomia surge como uma emanação prática. A
solução da crise passa por uma autonomia, aqui considerada como a via para a
solução desses problemas. No post-guerra mantiveram-se os problemas a aca-
lentar a opção autonómica. As comemorações do descobrimento da ilha em
1922 serviram de pano de fundo para nova reivindicação da autonomia. No fol-
heto evocativo da efeméride Manuel Pestana Reis lançou o mote. O debate pas-
sou às paginas dos jornais. Foi o resonsável da comissão executiva da Junta
Geral, Dr. Fernando Tolentino da Costa, quem reclamou perante o presidente
da RepúbÚca de passagem na ilha, a revisão do estatuto de autonomia das
ilhas.
A intenção era criar um grande movimento em prol da autonomia, trazendo
também os açoreanos para esta causa. Em 16 de Dezembro os madeirenses, con-
vocados pela Junta Geral, reunem-se em assembleia para discutir a questão da
autonomia. Das opções postas na mesa sobressaem as de Manuel Pestana Reis

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que remetem para uma autonomia administrativa muito mais ampla. Uma das
apostas era a capacidade de legislar, só conseguida em 1976. Este entusiasmo
levou mesmo à ideia de criação de partidos regionais. Todavia, a conturbada
vida política nacional fez acicatar as rivalidades e intriga política, esmorecendo
a autonomia. Deste modo as intenções de revisão do estatuto das ilhas ficou
adiado até ao Governo saído do golpe de estado de 1926. Foi em 1928 que as
ilhas tiveram novo estatuto. Os poderes das juntas são ampliados mas estão
longe das propostas avançadas em 1922. Isto marca o início da solução política
que tomará corpo com o Estado Novo. O fervor autonomista foi abafado pela
retórica do principal apaziguado do Governo da Ditadura, o Dr. Oliveria
Salazar. Os autonomistas de 1922, como Manuel Pestana Reis, acomodaram-se
a um estatuto de fiéis seguidores do novo regime.
A constituição de 1933 dava mostra de deliberado empenho de Estado Novo
em conter o movimento autonómico ao declarar a intenção de estabelecer um
estatuto especial para as ilhas, o que veio a acontecer em 1939 com o estatuto
dos distritos autonómicos das ilhas adjacentes, da responsabilidade do Prof.
Marcelo Caetano. A isto sucederam-se revisões em 1940 e 1947.
Neste lapso de tempo esmoreceu a reclamação autonomista e só em 1969 surge
com novo vulgar através de uma exposição de um grupo de cidadãos apresen-
tada ao governador a 22 de Abril. A questão do Planeamento Regional, estab-
elecido por decreto de 11 de Março é o mote para este debate que tem reflexo
nas páginas do jornal "O Comércio do Funchal", e, depois, estende-se ao "Eco
do Funchal" e "Voz da Madeira". Entretanto, nos Açores sucederam-se as sem-
anas de estudo que aglutinam as forças perdidas do movimento autonómico. A
comunhão de interesses deu origem à cimeira insular no Funchal, convocada
pelo nosso governador para 29 a 31 de Maio de 1970. A "primavera marcelista"
foi apenas uma fugaz esperança e a consagração da figura da região autónoma,
da revisão constitucional de 1971 só abrange o Ultramar. As ilhas tiveram que
esperar mais cinco anos.
Em todos os momentos da nossa História recente havia consciência plena da
importancia que assumia para o arquipélago a tão almejada autonomia, mas só
com o processo democrático decorrente de vinte e cinco de Abril de 1974 foi
possivel a sua concretização. Para trás ficaram as camufladas opções do Estado
Novo e a humilhante designação de ilhas adjacentes. A constituição de 1933
previa um estatuto especial, estabelecido em 1940. Aqui ficou expressa a visão
corporativista do estado que fez passar à História algumas conquistas anteri-
ores. Foi na chamada Primavera marcelista que se deu um passo em frente com
as chamadas estruturas de Planeamento Regional, que pretendia fazer o levan-
tamento dos problemas e o equacionar das soluções ao nivellocal.
A luta contra o regime político caido em 1974 esteve muitas vezes ligada à
batalha pela autonomia. Desde a década de vinte que se haviam bloqueado
todas as saidas. Por isso a queda do regime abriu a porta para a afirmação dos
impulsos autonomistas, refreados por mais de cinquenta anos. O vinte e cinco
de Abril é o principio do processo de mudança, legitimado em pleno com a
Constituição da República de 1976. Pela primeira vez na História de Portugal a
autonomia política não é uma palavra vã e às ilhas foi dada a possibilidade de
afirmação da sua vontade e especificidades próprias. Deste modo, para nós,
madeirenses, o vinte e cinco de Abril de 1974 é também sinónimo de autono-
mia. Ele pode ser definido pela seguinte trilogia: liberdade, democracia e
autonomia. Foi, na verdade, um virar de página e, por isso, assume particular
significado. Para trás ficou um passado de sofrimento e de angústia, mas tam-
bém de luta permanente pelos nossos interesses e direitos políticos.

11
Foi o começo de uma nova era na História do nosso arquipélago. Em 1922
autonomia confundia-se com descoberta, ansiando-se por uma segunda
descoberta da ilha. Hoje, passados setenta e quatro anos, podemos testemunhar
esse momento histórico, consequência do vinte e cinco de Abril. Estamos per-
ante a segunda descoberta da Madeira. Nos princípios do século XV os por-
tugueses revelaram ao mundo este rincão e colocaram-no na periferia dos
grandes centros económicos e políticos. Com isto agravou-se a situação de
dependência e abandono. Com a autonomia, consagrada na Constituição de
1976, fomos confrontados com uma nova descoberta. Isto é a Europa descobriu
o estatuto de diferença e o madeirense revelou-se a si próprio nas suas capaci-
dades de autogoverno.
O império desfez-se. A metrópole deixou de deter o total controlo político sobre
a periferia. O nosso sonho tornou-se realidade. As nossas frustrações passaram
a desafios. A autonomia, uma aspiração incessantemente adiada ou camuflada
de acordo com a conjuntura e interesses políticos, foi assumida e concretizada,
possibilitando-nos as armas para vencer os desafios do presente e projectarmos
os rumos do futuro.
Não mais a solução dos nossos reais problemas terá de passar pelo crivo de
alguém distante. Todos eles têm ou podem ter resposta no momento certo em
instituições próprias. É esta capacidade de opção, de definir o rumo e de encon-
trar soluções para o dia a dia. que nos permite aquilatar quão importante é para
nós esta data. Ela não deve ser entendida como um corte com o passado, mas
sim a passagem daquilo que nos impuseram para o que queremos ser e estamos
a construir.
Hoje somos uma região autónoma, com governo e assembleia legislativa
própria, e os resultados desta nova realidade política são evidentes ao nível da
economia. As grandes vias de caminho para o futuro estão lançadas. Os proble-
mas que no passado deram força ao movimernto autonómico, de um modo
geral, estão sanados e a sua solução é a prova mais evidente do reforço e defesa
da autonomia.

12
CRONOLOGIA

1892/Março/ 31 Aristides de Mota apresenta à Câmara dos deputados o


projecto de regime autonómico para os Açores.

1895/Março/ 2 Decreto concedendo a autonomia administrativa aos


Distritos Açoreanos.

1901/Maio/ 22 Carta de lei modificando algumas das disposições do


decreto de 2 de Março de 1895 e autorizando o governo a
torná-las extensivas à Madeira.

1901/Agosto/8 Decreto estabelecendo a autonomia administrativa ao dis-


trito do Funchat de acordo com o decreto de 2 de Março
de 1895, alterado pela lei de 12 de Junho de 1901.

1913/Agosto/7 Lei no 88 em que se mantêm o decreto de 1895, de autono-


mia dos distritos.

1928/Fevereiro/16 Decreto no 15:035 do governo da ditadura criando o lugar


de delegado especial do governo da República nos distri-
tos do Funchal, Ponta Delgada e Angra do Heroísmo.

1928/Julho/31 Decreto no 15:805 do governo da ditadura que estabelece


a forma de transiçãodos serviços dos ministérios para as
Juntas Gerais.

1931/Fevereiro/4 Greve e manifestação popular no Funchal contra o decreto


n °. 19273 de 26 de Janeiro, conhecido com o decreto da
fome e do monopólio da farinha.

1931/Abril/4 Revolta da Madeira, iniciada pelos militares e que contou


com a adesão dos populares e dos políticos republicanos.
Até 2 de Maio a ilha esteve sob a miragem de um governo
local.A autonomia confunde-se aqui com independência

1935/Maio/23 Carta do Dr. Oliveira Salazar ao governador do distrito do


Funchal, Dr. João Abel de Freitas, apresentando soluções
para a críse e a sua resposta às reclamações de autonomia.

1936/Agosto/6 Revolta do leite. A população das freguesias rurais mani-


festa-se contra o decreto n°.26655, sobre os lacticínios.

1938/Abril/30 Lei n° 1967 estabelecendo as bases de administração do


território das ilhas adjacentes.

1939/Dezernbro/22 Decreto-lei n°.30214 que aprova o estatuto dos distritos


autónomos das ilhas adjacentes e a lei orgânica dos
serviços das respectivas juntas gerais

1940/Dezernbro/31 Primeiro estatuto dos distritos autónomos das ilhas adja-


centes.

1947/Agosto/4 Estatuto definitivo dos distritos autónomos das ilhas adja-


centes, que se manteve até 25 de Abril de 1974.

13
1969/Março/11 Decreto -lei n°.48905 criando a Comissão de Planeamento
Regional

1969/Abril/22 Exposição apresentada por um grupo de madeirenses ao


governador em que analisa a situação da região e reclama
por autonomia

1970/Maio/29 Reunião no Palácio de S. Lourenço dos governadores e


deputados dos distritos insulares a fim de estudarem a
revisão do estatuto dos distritos autónomos.

1974/Maio/6 Chegada ao Funchal do Tenente Coronel Carlos Azeredo,


investido nas funçoes de comandante militar da Madeira.

1974/Maio/9 Chegada ao Funchal do novo bispo do Funchal, D.


Francisco Santana

1974/0utubro/29 O Dr. Alberto J. Jardim assume a direcção do Jornal da


Madeira, dando início à Tribuna livre

1975/Janeiro/5 O movimento de Autonomia das Ilhas Atlânticas divulga


o seu programa, em qu~ preconiza o fim de estatuto de
colónia e oestabelecimento do regime de autonomia.

1975/Março/11 Decreto-lei n °.139 /75, criando a Junta de Planeamento,


constituída pelo governador civil e mais quatro vogais,
ficando sob a sua tutela a junta Geral e a Comissão
Regional de Planeamento.

1975/Março/25 Tomada de posse da Junta de Planeamento para a


Madeira.

1975/Agosto/5 A Junta de Planeamento pediu a exoneração ao governo.

1975/Dezembro/13 Anunciada a criação da Junta Governativa e de


Desenvolvimento Regional da Madeira, directamente
dependente do Primeiro-Ministro, por decreto-lei
n°.101 / 76 de 3 de Fevereiro. A tomada de posse teve lugar
a 20 de Fevereiro de 1976.

1976/Abril/2 Aprovação pela Assembleia Constituinte da constituição


da República Portuguêsa, que no parágrafo segundo do
artigo 6° define os arquipélagos dos Açores e Madeira,
como" regiões autónomas dotadas de estatutos·político-
administrativos próprios"

1976/Abril/29 Aprovação pelo conselho de ministros do Estatuto pro-


visório da Madeira, publicado no dia 30 no Diário da
Republica, alterado em 1 de Junho. ·

1976/Junhó/27 1as eleições para a Assembleia Regional.

1976/Julho/19 Aprovação da constituição da República


Inauguração da Assembleia Regional

1976/Setembro/6 Lino Miguel, o primeiro Ministro da República para a


Madeira

14
1976/Setembro/16 Anúncio do 1 o Governo Regional, chefiado pelo Eng.
Ornelas Camacho

1976/0utubro/1 Acto de posse do 1o Governo ~egional da Madeira.

1977/Janeiro/18 Aprovado o decreto regional que cria o Instituto do


Bordado, Tapeçarias e Artes da Madeira.

1977/Março/8 Aprovado o decreto que cria o Jornal Oficial da Região.

1977/Março/15 Início da discussão do projecto de estatuto definitivo da


região.

1978/Março/3 Remodelação no Governo Regional. O Dr. Alberto João


Jardim assume a presidência.

1978/Março/7 Assembleia aprovou o projecto de decreto regional das


insígnias da região, publicado no Diário da República a 11
de Agosto.

1978/Novembro/1 A bandeira da região é içada pela primeira vez no edifício


do Governo Regional à Avenida Zarco

1980/Fevereiro/27 A Assembleia Regional aprovou o projecto de Estatuto


político-administrativo da região.

1980/Julho/15 Aprovação do hino da região.

1982/Abril/29 O plenário do Governo Regional aprovou o projecto de


recuperação do edifício de Alfândega da ilha para insta-
lações da Assembleia Regional.

1983/Julho/1 Primeira comemoração do dia da Região Autónoma.

1986/Julho/1 Lançamento da primeira pedra do monumento à autono-


mia política da Madeira em Santa Cruz.

1987/Julho/1 Inauguração do Monumento à Autonomia em Santa Cruz.

1987/Dezembro/17 O plenárlo da Assembleia Regional estabeleceu o dia 4 de


Dezembro como "Dia da Assembleia Regional".

1989/Julho/7 Promulgação do decreto da Assembelia Regional que


aprova a 2a revisão Constitucional.

1990/Fevereiro/22 Aprovação da proposta de estatuto político-administrati-


vo da RAM, a submeter à Assembleia da República.

15
BIBLIOGRAFIA

Os estudos sobre a autonomia na Madeira são ainda esparsos, sendo necessária


uma maior aposta na investigação desta temática. A publicação, a exemplo do
que sucedeu nos Açores com J.Reis Leite, das principais peças que dão corpo ao
nosso processo autonómico pode ser um bom princípio para essa necessária
valorização do te_m a.

Eis alguns dos textos publicados que merecem o nosso interesse.

CALISTO, Luís, Achas na Autonomia, Funchal, 1995.

CAMACHO, Augusto da Silva Branco, Em defesa d.a autonomia administrati-


va das ilhas adjacentes, Ponta Delgada, 1962
- Estatuto dos distritos autónomos das ilhas adjacentes, Ponta
Delgada, 1972

CARREIRO, José Bruno, A autonomia administrativa dos Açores, Ponta


Delgada, 1994

FERREIRA, Fenando Amâncio, As Regiões Autónomas na Constituição


Portuguesa, Coimbra, 1980

FREITAS, João Abel de, Madeira, Construir o Futuro, Lisboa, 1984.

JANES, Emanuel, "A implantação da República na Madeira" in Atlântico,


n° 18,1989.

JARDIM, Alberto João Jardim, Tribuna Livre. 1974-78, 3 vols., Ponta Delgada,
1995.

JOÃO, Maria Isabel, Os Açores no século XIX - Economia, sociedade e movi-


mento autonomista, Lisboa, 1991.

17
JORDÃO, Carlos A. R. Carvalho, Tutela administrativa dos Governos
Regionais sobre as Regiões Autónomas, Braga, 1980
- Administração regional autónoma- um percurso ao redor da
própria dinâmica evolutiva da autonomia, Funchal, 1983

LEITE, José Guilherme Reis, "A Autonomia das Ilhas Atlânticas, os Açores e a
Madeira. A experiência açoreana no século XIX" in Actas do I Colóquio
Internacional de História da Madeira, Vol. I, 1989.
-Sobre a autonomia dos Açores, Ponta Delgada, 1990
-"0 segundo movimento autonomista açoreano e a importância da
Madeira no seu desenvolvimento" in Actas do II Colóquio Internacional de
História da Madeira, Funchal, 1990.
-A Autonomia dos Açores na legislação portuguesa 1892-1947, Horta,
1987.
-Política e administração nos Açores de 1890 a 1910. O 1 o movimento
autonomista, Ponta Delgada, 1995.

MONJARDINO, Alvaro, As autonomias regionais em 10 anos de jurisprudên-


cia. 1976-1986, 2 tomos, Horta, 1987
-"Raízes da autonomia constitucional", in Actas do II Colóquio
Internacional de História da Madeira, Funchal, 1990.

MOITA, Aristides da, Autonomia administrativa dos Açores, Ponta Delgada,


1994

PEREIRA, Fernando Jasmins, O destino das ilhas, Lisboia, 1979

ROSA, Eduardo F.(introdução), Açorianidade e autonomia. Páginas


escolhidas, Ponta Delgada, 1989

VERÍSSIMO, Nelson, "Em 1917 a Madeira reclama autonomia" Atlântico, n o 3,


1985.
-"O alargamento da autonomia dos distritos insulares. O debate
na Madeira (1922-1923) in Actas do II Colóquio Internacional de História da
Madeira, Funchal, 1990.
-"A nossa autonomia", in Atlântico n° 19, Funchal, 1990.
-"Autonomia Insular - as ideias de Quirino de Jesus" in Is lenha,
n° 7, 1990.
-"Autonomia Insular - o debate na primavera marcelista"
in Islenha, n o 9, 1991.

18
ANEXO: TEXTOS E DOCUMENTOS

"A escravidão consiste em viver algum sujeito absolutamente à vontade de out-


rem; uma província, que deve sujeitar seus interesses aos da metrópole, que a
seu turno a não interessa deixa de ser província, é de facto colónia e vive escra-
va" (Patriota Funcl}.alense, 1822)

"Dar autonomia à Madeira, é construi-la em unidade política e administrativa.


(... ) É reconhecer que a Madeira pela sua situaçiio geográfica, pela qualidade e
número das suas relaçoes com o mundo, pelos usos e costumes do seu povo,
pelo grau de desenvolvimento moral, intelectual, agrícola, industrial e comer-
cial, adquiriu uma fisionomia própria e especiaes interesses colectivos próprios,
que a individualizam como regiiio e como agregado social. Daqui surge a
necessidade duma diferenciaçiio nos processos políticos e administrativos a
aplicar-lhe"(Manuel Pestana Reis, 1922)

19
REGIONALISMO
AUTONOMIA DA MADEIRA

a quinhentos anos as Caravélas do Infante entregaram ás penedias da

H Ilha, os primeiros povoadores. Gente portuguesa, o seu sangue e o


seu génio transmitiram-se de geração em geração sem mistura sensív-
el. Os actuaes habitantes da Madeira são portuguêses, portuguêsa é a sua lín-
gua, portuguêses são os seus costumes. P,or cá passaram hespanhoes e inglezes
em continuas caravanas de nómadas do cosmopolitismo, e a larga porta da
emigração espalhou pelo mundo colónias de naturaes cujo numero d' almas
deve ascender presentemente a bem um milhão. Todavia, a natureza étnica
deste povo permanece inalteravel. A fixidez dos caracteres específicos antropo-
logicos e psicologicos, resistu a todos os contactos, a todas as misturas, a todas
as infiltrações. Em quinhentos anos a arvore genealogica dos primeiros
povoadores desenvolveu-se em linha recta. Os madeirenses não podem renegar
a Pátria pela razão natural de não poderem negar a Raça.
Madeirenses e ingleses, madeirenses e americanos, são elementos que se
repélem. Não é só o facto do sangue que impéde essa união fantasiada, essa
osmóse repugnante de raças diferentes, mas uina civilização secular com raizes
profundas na vida e na historia.
Nestas circhnstancias, é tão impossível o separatismo ou independencia como
uma substituição ou troca de bandeira nacional.
Autonomia, quer dizer descentralisação, ou melhor, desconcentração politica e
administrativa, apenas. Isto significa que a sombra da bandeira de todos os por-
tugueses se levantará a bandeira regional, particular dos madeirenses, com seu
escudo e brazão d' armas.
Não é um grito de revolta, mas simpes petição de Justiça. Adquirimos direitos,
exigimos que os reconheçam e nos garantam o seu livre gôso e exercício.
Esses direitos e aqui está porque a nossa voz sôa a quebrado, - colidem, de
certo modo com os princípios da democracia pura. E digo de certo modo, por-
que o sistema politico, dito democratico, que nos rége, é manifestamente hí-
brido. Em bôa democracia a centralisação é a regra. Todas as funcções se con-
centram nas mãos do Estado. A Nação resume-se numa abstrata consciencia
colectiva que se define pela lei do numero que por sua vez, se concretiza nos
poderes legislativo e executivo. Uma republica individualista e egualitaria,
como parece ser a a nossa, só aberrativamente comporta uma, administração .
diferenciada e fraccionada por autonomias locaes. O Estado dividiu o Paiz em
províncias, distritos, concelhos e freguezias. Administrativamente a província
nada significa, é uma designação que ficou dos velhos tempos que se conserva
em atenção á historia. As restantes divisões sao arbitrarias. Criou-as o Estado
para escalonar e facilitar a sua administração. A sua base é o cadastro po-
pulacional. O Estado define-as e limita-as pelo numero de habitantes, de con-
tribuintes e d' eleitores. Por cada uma distribúe um numero certo de funciona-
rios que o representam e executam serviços em seu nome. Tudo isto é uniforme
e puramente mechanico.

21
As camaras municipaes gosam hoje duma tenue autonomia que se traduz na
consignação dum mínimo e dum maximo de faculdades que se exercem no
todo ou em parte conforme as necessidades locaes, criterio e vontade dos
vereadores. Mas o seu estatuto é o mesmo para todas. O mesmo acontece com
as Juntas Geraes, á excécão das Ilhas a que foram dadas atribuições especiaes.
Em tudo isto não se verifica a livre iniciativa ou a auto-determinação politica-
administrativa, condicionadas, que, a meu ver, deve ser a essencial carateristica
definidora da autonomia.
O hibridismo do regímen reside na incompleta equação entre os princípios e a
pratica. A uma republica individualista e egualitaria deveria repugnar a
exceção e a diferenciação. Todavia, inumeros exemplos podem apontar-se do
contrario, a começar no sufragio que é restrito, o mais restrito possível, apenas
extensivo aos dez ou quinze por cento da população masculina tida por saber
lêr e escrever, e a acabar nos novos cavaleiros da Ordem de Cristo.
Nem é preciso recordar a situação criada á Egreja Catolica, e, muito menos, a,
fenix dos tribunaes especiaes. Sob o ponto de vista administrativo, olhe-se para
as Colonias. Quão longe estamos d' aquela voz de puritano que num dos ulti-
mos parlamentos da monarquia bradava: - percam-se as colonias, mas
salvem-se os princípios!. ..
Não vem a preposito discutir se a republica neste andar de mala-posta aos sola-
vancos para a esquerda e para a direita, corre bom caminho. O que importa, e
constatar que este regímen politico em que se vive, deante do facto consumado
ou inevitavel, põe de parte os princípios para atender á realidade. Esta nossa
democracia, mau grado as aparencias, é um regime de bem facil acomodação as
necessidades e idêas novas dos novos tempos. O regímen, á medida que se
afasta do 5 d'outubro, reprodução serodia de 89, mais se aproxima do século
XX. E ainda bem. Posto isto, podemos esperar que sejam satisfeitas as nossas
reivindicações sem duras resistencias por parte do Governo e do Congresso da
Republica. Basta que todos os madeirenses queiram!
E todos os madeirenses hão-de querer quando tivérem uma consciencia esclare-
cida e forte dos seus direitos.
Mas não se pode querer, sem crêr. A fé transporta montanhas! É preciso, pois,
que este sentimento tenha a violencia da vára de Moysés batendo na rocha. O
milagre virá depois. Quaes são, porem, os nossos direitos?
Tem-se dito: são os da maioridade. São, portanto, aqueles direitos definidos e
compreendidos na capacidade de regermos a nossa pessoa e bens, ou seja a
auto-administração da nossa pessoa e bens. Mas porque se trata duma pessoa
colétiva, duma pessoa moral chamada de direito publico, esses direitos são
determinados e limitados pela sua natureza e fins.
Dar autonomia á Madeira, é constitui-la em unidade poli.tica e administrativa. E
outorgar-lhe a carta constituicional dos seus direitos políticos e publicos, com-
patíveis cdm os direitos de soberania nacional e em bases conformes com as
condições d' existencia do agregado regional. É reconhecer que a Madeira pela
sua situação geográfica, pela qualidade e numero das suas relações com o
mundo, pelos usos e costumes do seu povo, pelo grau do seu desenvolvimento
moral, intelectual, agrícola, industrial e comercial, adquiriu uma fisionomia
propria e especiaes interesses colectivos proprios, que a individualizam como

22
Região e como agregado social. Daqui surge a necessidade duma diferenciação
nos processos políticos e administrativos a aplicar-lhe.
Para que a autonomia que se pretende dar a Madeira corresponda a uma ver-
dadeira carta d'alforria, tem de assentar nestas ou semelhantes bases:
1. Função representativa: desempenhada por um governador civil que nno seja
exclusivamente um alter-ego do Ministro do Interior, mas apenas um repre-
sentante do Estado.
2. Função governativa: compreendendo um Conselho Legislativo e um
Conselho Executivo. As atribuições do Conselho Legislativo são especiaes,
restritas aos interesses puramente' regionaes, quer publicas, quer privados.
São-lhe interditas as questões de Soberania (formas de governo, exercito e
relações exteriores, a função judicial, a instrução secundaria e superior.
Eleição indiréta. O Conselho recutivo, saído do Conselho Legislativo por
eleição, recolhe e administra as receitas, orçamenta e fiscalisa as despezas.
Sob a sua direção, estão todas as obras de fomento e instituições de assisten-
cia distritaes (Junta Geral, Obras Publicas, Juntas autonomas, Região
Agrícola, serviços de saude e azilos)
3. Função administrativa: Camaras Municipaes.
4. Função educativa: Liberdade d'ensino. Instrução primaria a cargo dos
municípios. Proteção ás escolas livres sob forma de prémios ás que melhores
provas dérem no seu ensino. Escolas industriaes e profissionaes. Museus
regionaes d' arte e historia natural.
5. Função judicial: alteração no numero de comarcas e da sua jurisdição territo-
rial de modo a evitar-se a ausencia de magistrados de carreira e a facilitar-
lhes o accesso dos povos das varias freguesias da ilha. Uma possível criação
dum tribunal de 20 instancia no Funchal. Um juiz de paz em cada concelho
que desempenhe a mais as funções dos atuaes administradores.
6. Função d'Ordem Publica: Guarda Fiscal e Guarda Civil, compreendendo
esta uma Policia d'investigação Criminal, uma Policia de Segurança Publica.
Uma Policia rural e uma Policia Florestal.
7. Sobre o produto bruto das receitas criadas e arrecadadas no arquipelago,
será deduzida uma percentagem fixa para o Estado.
8. A organisação administrativa e social fundar-se-ha na familia (restrição do
divorcio e creação do homestead), parochia e município associações de
classe.
9. Religião: a catolica reconhecida e protegida como sendo a tradicional e a
unica capaz de produzir a unidade moral do agregado regional. Liberdade
de culto, d'ensino religioso e assistencia religiosa.
Estas bases são lançadas sem preocupações scientificas, apenas na intenção de
focar pontos de vista que me parecem fundamentaes quando se trata de elaborar
o estatuto autonómico da Madeira Outros aspectos ha a atender e os que ahi
ficam demandam um estudo mais detido e uma explanação mais detalhada. Isso,
porem, não cabe nos limites deste artigo destinado a suscitar ideas e a interpretar
sentimentos que andam na consciencia publica ainda em estado incoerente.
Na base 20 falo num corpo legislativo, Esta função é importante e essencial.
Basta atender-se ao que se está passando com as questões que mais interessam
a nossa vida economica. É já vasta a legislação especial aplicada unicamente á

23
Madeira. O regime sacarino, o regime dos trigos e farinhas, o regime vinícola,
etc. Mas ha ainda o regime dos bordados, das manteigas, do turismo, das obras
e exploração do porto, afora as questões d'aguas, de colonia, de baldios, de flo-
restas e outras sobre que nos temos de pronunciar criando formulas jurídicas
que satisfaçam as suas especiaes condições e os seus fins. E não nos digam que
tudo isso nos póde vir por meio dum parlamento nacional! A mecanica e com-
posição do Congresso da Republica obstam a que taes assuntos sejam resolvi-
dos a nosso contento. O sistema parlamentar, entregue a partilhas partidarias,
pouco mais produz do que intriga politica. Os nossos interesses, as nossas
necessidades não são atendidas, porque se não cura do seu estudo e porque os
senhores deputados nos ignoram completamente, quando nos não desprezam.
Ora nós, se queremos viver e progredir, temos de fugir á intriga politica e aco-
modar-nos dentro de formulas politicas e administrativas que nos permitam
regular as questões regionaes por nós mesmos, livres da acção imoral de agen-
ciadores de votos.
A base 70 consigna uma percentagem fixa das nossas receitas para o Estado. É a
inversa do que se dá presentemente. Mas assim é que deve ser. O produto do
nosso trabalho, das nossas riquezas, deve ser aplicado em nosso proveito. O
que não faz sentido é que se esteja a con ribuir para as obras do Porto de
Leixões, para o sorvedoiro dos bairros sociaes e de todas as Revoluções que a
irrequieta gente da Capital queira fazer e alimentar.

(Manuel Pestana Reis, "Regionalismo. A autonomia da Madeira",


in Quinto Centenário do Descobrimento da Madeira,
Publicação comemorativa, Funchal, Dezembro 1922)

24
Hei por bem decretar, para valer como lei, o seguinte:

Artigo 1. 0 Os serviços dependentes dos Ministérios do Comércio e


Comunicações, da Agricultura e da Instrução e bem assim os dos
governos civis, polícia cívica, saúde pública, assistência e pre-
vidência dependentes dos Ministérios do Interior e das Finanças,
nos distritos do Funchal, Ponta Delgada e Angra do Heroísmo,
transitarão, a partir de 1 de Julho de 1928, com todas as suas
despesas e com todas as suas receitas privativas, para as juntas
gerais dos mesmos distritos, nos termos dêste decreto com fôrça de
lei.

Artigo 13. o As juntas gerais dos distritos autónomos serão constituídas por
quinze membros, dos quais nove electivos, sendo seis eleitos pela
maioria e três pela minoria, e os restantes seis vogais natos, que
serão os seguintes: o secretário geral do govêrno civil ou o fun-
cionário que o substituir, quando aquele exerça funções de gover-
nador civil; o reitor do liceu, o inspector de sanidade marítima, o
inspector de sanidade terrestre, o engenheiro director dos serviços
de obars públicas e o engenheiro agrónomo chefe dos servicos
respectivos ou o intendente de pecuária do distrito, pertencendo a
efectividade ao mais velho dos dois.

(Decreto do governo da ditadura, n°. 15805 de 31 de julho de 1928)

25
INDEPENDÊNCIA?

governo da Ditadura nem sequer procura defender-se com nobreza,

O JJ com elevação de processos, perante a opinião estrangeira. Deturpa,


, ~ falseia- não hesita em lançar o label de traidor sobre o povo da
Madeira, sobre este amargurado povo, sofredor e valente, tão arreigadamente
português e tão afervoradamente dedicado à sua Pátria. E que fez, pois, a
Ditadura? Através dos seus aráutos, cumplices do mesmo crime, atirou para
além-fronteiras a notícia infame - que o Movimento de 4 de Abril tinha
propósitos separatistas, que pretendíamos proclamar a independência da ilha!
Não, srs. da Ditadura! Não se atira assim, com tanta leveza de animo - por
que não dizê-lo?- com tanta insensatez, o brio, o orgulho, os claros sentimen-
tos patrióticos dos madeirenses, para a crítica severa do estrangeiro, que, de
boa fé, aceitará a informação, supondo-a correspondendo a uma verdade. Não,
oh srs. da Ditadura! Através das nossas paixões, das nossas relaçoes políticas,
uma coisa deve haver a pairar mais alto: a unidade da nossa dedicação à Pátria,
o desejo ardente de todos os portugueses - st!ja qual for o torrão que pisem -
de bem servir a Pátria, de engrandecer e dignificar Portugal. Para os
estrangeiros, para a opinião estrangeira, deve-se sempre acentuar, firmemente,
esta verdade: nas nossas lutas, mesmo no seu entrechoque mais vivo ou mais
sangrento, nunca esquecemos o nosso orgulho de sermos portugueses- por-
tugueses acima de tudo! Por febril patriotismo, que é bem do nosso feitio e tim-
bre de Raça, e até- por elegancia moral.
O que disse o Governo da Ditadura para o estr~ngeiro - foi uma calúnia. Uma
calúnia grave, ignominiosa, que repetimos!
É certo que a Madeira tem ainda o seu problema local por resolver; é certo que
a Madeira pugna, e tem pugnado, sem desfalecimentos, para que os Poderes
Públicos lhe dêem aquela necessária autonomia administrativa que permita
desenvolver as suas estupendas fontes de riqueza, as suas extraordinárias pos-
sibilidades económicas; é certo também que o povo madeirense possue um
vibrante sentimento regionalista, um grande amor por este sagrado torrão, que
é uma maravilha bemdita da Natureza. É absolutamente verdade! Mas, autono-
mia política, mas independência política, não a desejamos, não a queremos.
Orgulhamo-nos tanto de ser portugueses, que só uma História nos serve - a
de Portugal!

(Notícias da Madeira, 17 de Abril de 1931)

26
«Desde a extrema-direita à esquerda, se ainda há disso na política daí, desde os
bons conservadores aos revolucionários ou conspiradores de profissão, desde
os católicos aos indiferentes e aos ateus- todos em comevodora unanimidade
assentaram ou estão assentando em que a Madeira é uma "filha enjeitada". E
não tenho visto que ninguém com os factos, só com os factos, tenha contrariado
a campanha[ ... ]

E porque compreendo esse fenómeno, é que a Madeira continua sendo tratada


como terra civilizada e com paciência, ao menos enquanto se não desman-
darem demais. Porque, se o fizerem, é conveniente não esperar a doçura da
repressão usada da outra vez. E podem continuar dizendo à vontade que os
abandonam [ ... ].

Todos os partidários da autonomia supuseram que esta consistia simplesmente


na liberdade de gastar, dando o Poder Central quanto fosse necessário para isso
[ ... ].

A autonomia não é a autonomia de gastar, mas a de administrar um património


ou uma receita, tirando de um ou de outra o maior rendimento. Do facto de a
receita não chegar para tudo o que apetece ou há mesmo necessidade de fazer,
não se segue que é ao Governo que incumbe cobrir as diferenças.

Perdoe-me V. Ex.a a extensão desta carta. Ela lhe provará [ ... ] o cuidado que me
merece essa Madeira encantada e infinitamente ingrata. Em toda a parte há
gente que não sabe agradecer, mas uma terra inteira, cheia de benefícios e
desconhecedora deles, só a Madeira. E porquê? Porque no fundo deseja o que
não pode ter, quer o que não é capaz de realizar e faz ideia que é ao Governo
que cabe a responsabilidade dos erros e dos crimes praticados pelos seus natu-
rais.

(Carta do Dr. Oliveira Salazar, de 23 de Maio de 1935,


ao Presidente da Junta Geral do distrito, Dr. João Abel de Freitas)

27
2. Parece desnecessário insistir na conveniência de um regime administrativo
insular diverso do adoptado para o continente: estão os dois arquipélagos
dos Açôres e da Madeira separados de Portugal continental pelo Oceano,
longe portanto das vistas directas dos governantes e ligados a Lisboa por
comunicações marítimas muito espaçadas (sobretudo com os Açôres); con-
stituem-nos um grande número de pequenas ilhas que não mantêm entre si
laços de tam estreita cooperação como por vezes se pensa, mas que são
solidárias pela posição geográfica, pelo estado social e pelas necessidades
dos seus habitantes, cuja índole e modo de viver diferem bastante dos do
maior número das populações continentais; por isso, a descentralização se
impõe e a desconcentração também-uma e outra em benefício dos povos e
com vantagem para a boa administração.( ... )

6. Queixam-se os distritos insulares de que o regime de 1928 lhes é incom-


portável, porque as receitas não chegam para cobrir as despesas, e há quem,
perdendo de vista o equilíbrio que tem de haver entre a riqueza existente e a
satisfação das necessidades públicas, sustente que se deve progredir ainda
na autonomia, negando-se ao Estado o direito de ir buscar um ceitil que seja
' de um vicioso .particularismo
à economia das ilhas. E êste modo de ver fiiho
regional, que esquece a solidariedade que liga as diversas partes da Nação e
a existência de órgãos políticos e administrativos de interêsse geral, para
cuja manutenção todos os cidadãos têm odever de contribuir. A adminis-
tração das circunscrições está longe de ser um circuito fechado entre as suas
receitas próprias e as próprias despesas: o Estado unitário compreende e
indissoluvelmente liga as comunidades locais, acorrendo com os recursos
da Fazenda Pública onde fôr mais conveniente e útil para o interêsse
nacional. Formam as ilhas adjacentes um todo com o continente, é o mesmo
o seu sistema de administração e govêrno, como o mesmo é o grau de civi-
lização dos habitantes e de progresso social: seria, pois, contrário ao bem
comum consagrar uma forma egoísta de plena autonomia financeira que
parecesse realizar a desintegração do Estado de - uma parte do seu território
metropolitano.

(Lei n°. 1967 de 30 de abril de 1938


bases da administração do território das ilhas adjacentes)

28
A Madeira e os Açôres, situados em pleno Atlantico, a alguns dias de viagem
de Lisboa, estão fora do contacto, da influência directa do Govêrno; as suas
economias têm caracteres próprios, que as diferenciam das províncias do conti-
nente: o espírito das suas populações, pela natureza insular do território, pelo
clima, pelo intercambio com o estrangeiro, pela sua vida económica e social,
oferece, em certos aspectos, uma feição típica.

Para governar e administrar as nossas ilhas adjacentes é indispensável conhecê-


-las na intimidade, ter não só a inteligência dos seus problemas, mas também o
sentido da sua sensibilidade.

As dificuldades que destas circunstancias resultam para a administração cen-


tral, na apreciação e resolução dos assuntos insulares, na adaptação dos
serviços às necessidades locais, na adopção de medidas urgentes ou peculiares,
impõem evidentemente um sistema que torne, principalmente, dependente de
órgãos locais a direcção dos negócios administrativos das ilhas.

Só assim se podem evitar em grande parte os inconvenientes que a 263 morosi-


dade burocrática, que a falta de conhecimento directo dos assuntos, a divergên-
cia de informações, a luta de influências determinam, em regra, quando as
questões insulares se subordinam inteiramente à mecanica das repartições ou
serviços centrais.

Ninguém ignora, de resto, as relações que existem entre a vida económica e


política de determinada região e a sua organica administrativa: inter-influen-
ciam-se continuamente e os defeitos do meio podem, muitas vezes, I ser ate-
nuados ou corrigidos pela virtude do sistema.

(discussão na Assembleia Nacional da proposta de lei


do regime administrativo das ilhas adjacentes
ordem do dia 3 de Março de 1938. Intervenção Favila Vieira)

29
A autonomia administrativa vem de mais longe. Nasce com o próprio povoa-
mento das ilhas adjacentes e processa-se desde então. O Infante D. Henrique,
sempre com larga visão de homem genial, depressa se convenceu de que não
poderia de tão longe governar as ilhas descobertas ou «encontradas». Razões
imperativas da geografia assim o recomendavam.( ... )

As cartas de doação a que o ilustre autor se refere são, quanto a nós, os


primeiros instrumentos públicos definidores de uma amplíssima autonomia,
então, plenamente aceitável. Ao seu conteúdo faremos a seguir uma breve
referência, bem justificável para o ponto de vista em que nos colocamos.( ... )

Repetimos a conclusão a que, então, chegámos: n «a relativa autonomia de que


gozam actualmente os distritos das ilhas adjacentes, tem uma tradição tão
longínqua que vai encontrar as suas mais profundas raízes no período das
descobertas e se prolonga até ao regime liberal que, com a introdução do tipo
uniforme de administração, cerceou aquelas liberdades de acção dos governos
locais que não eram concessões de favor ou privilégios, mas antes resultavam
de uma experiência feita de longos anos, onde o bom senso e o tino de bem
servir os povos sempre estiveram presentes.»

(Augusto Branco Camacho,


Em defesa da autonomia aministrativa das ilhas adjacentes,
Ponta Delgada, 1962, pp. 20-23)

30
TITULO I Da divisão do território

Art. 1. o O território das ilhas adjacentes divide-se, para efeitos administra-


tivos, em concelhos, que se subdividem em freguesias e se agrupam
em distritos autónomos.

Art. 2. 0 Os distritos autónomos do Funchal e de Ponta Delgada sãa de l.a


ordem; os restantes distritos autónomos são de 2.a ordem.

TÍTULO II Dos distritos autónomos

CAPÍTULO I Dos Órgãos ds administração distrital

Art. 3. o Cada distrito das ilhas adjacentes constitui uma pessoa moral de
direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira.

Art. 4. o O órgão d administração distrital autónoma é a junta geral, que


exerce as suas atribuições e competência directamente ou por inter-
médio de uma comissão executiva.

Art. 5. o O Governo da República é representado em cada distrito por um


governador civil, a cujo cargo está a gestão dos interesses politicas e
administrativos do Estado, a superintendência na policia geral e a
inspecção e fiscalização tutelar da administração distrital autónoma.

Art. 6. 0 As juntas gerais poderão deliberar a criação de quaisquer órgãos pri-


vativos de consulta, de carácter permanente ou transitório, com a
composição que determinarem e para fins relativos ao exercido das
suas atribuições e competência .

§único É obrigatório para os funcionários do Estado que desempenhem


funções no distrito autónomo a aceitação das funções dos órgãos
consultivos distritais para que sejam designados pela junta geral

Art. 7. o As juntas gerais poderão sempre solicitar o parecer dos órgãos con-
sultivos da administração central do Estado acerca de negócios dos
serviços públicos que lhes estejam confiados e sobre que tenham de
deliberar.

CAPITULO II Da Junta Geral

SECÇÃO I Composição, Constituição, Sessões e Reuniões

Art. 8. 0 A junta geral do distrito é composta por sete procuradores, dos quais
três natos e quatro eleitos quadrienalmente.

31
§ l.o A junta geral tem presidente, nomeado por quatro anos, pele gover-
nador do distrito, de entre os procuradores eleitos, podendo exce-
pcionalmente recair a nomeação em pessoa estranha ao corpo
administrativo desde que tenha revelado méritos extraordinários em
serviços prestados ao Estado

§ z.o Nos casos em que o governador do distrito use a faculdade conferida


na parte final do parágrafo anterior, o presidente acresce ao número
dos procuradores e tem os mesmos direitos e deveres.

§ 3.0 O presidente da junta geral pode ser reconduzido e a todo o tempo


exonerado ou demitido pelo governador do distrito

Nas suas faltas e impedimentos o presidente da junta geral será su-


bstituído por um presidente substituto, nomeado nos mesmos ter-
mos pelo governador do distrito, e na falta de um e outro exercerá as
funções o procurador mais velho.

As funções de presidente da junta geral são remuneradas conforme a


tabela anexa a este Estatuto.

§ 6.0 Os funcionários do Estado ou os funcionários administrativos que


sejam nomeados presidentes das juntas gerais serão considerados
em comissão extraordinária de serviço e com direito a optar pelo seu
ordenado ou pelo de presidente da junta geral, competindo a esta em
qualquer caso o respectivo pagamento.

§ 7.0 Aos funcionários na situação a que se refere o parágrafo anterior será


contado o tempo de serviço que prestarem na presidência das juntas
gerais, para todos os efeitos legais, como se fosse prestado nos
quadros permanentes a que pertencem.

Art. 9. 0 São procuradores natos à junta geral:

a) o reitor do liceu da sede do distrito;


b) o delegado distrital do Instituto Nacional do Trabalho
e previdência;
c) o engenheiro director técnico da Junta Autónoma dos Portos nos
distritos de Ponta Delgada, Angra do Heroísmo e do Funchal e o
engenheiro director das obras públicas no distrito da Horta.

§ 1. o Ós procuradores natos são substituídos, nas faltas e impedimentos


legais, por quem suas vezes fizer nos lugares públicos que desem-
penham.

§ 2. o Quando o Ministro das Obras Públicas considere inconveniente a


participacão dos engenheiros a que se refere a alínea c) nas juntas

32
gerais, serão substituídos por procuradores de nomeação do mesmo
Ministério, escolhidos de preferência de entre individuas diploma-
dos com curso superior de engenharia.

Art 10. o Os restantes procuradores serão eleitos, em lista completa e por


escrutínio secreto, pelas camaras municipais e organismos corpora-
tivos morais, culturais e económicos do distrito

§ 1. o Cada lista conterá quatro nomes para procuradores efectivos e qua-


tro para procuradores substitutos.

§ 2. o Enquanto não estiver completa a organização corporativa, a relação


dos organismos com direito de sufrágio será elaborada pelo gover-
nador do distrito, ouvido a delegação do 1. N. T. P. e por modo a dar
representação, tanto quanto possível, às diversas actividades sociais
do distrito.

§3o Elaborada a relação dos organismos, será publicada nos jornais


locais e afixada nos paços do concelho da sede do distrito durante
quinze dias, pelo menos, podendo os interessados reclamar contra
ela para o governador do distrito, que decidirá definitivamente.

§ 4. 0 As câmaras municipais e os organismos corporativos serão represen-


tados no acto de eleição pelos seus presidentes, juízes ou provedores.
Quando, porém, tenham sede fora da ilha onde estiver a sede do dis-
trito, poderão votar por correspondência.

§ 5. o Todas as listas serão encerradas num sobrescrito branco, fechado,


sem quaisquer dizeres e com as dimensões que forem fixedas.
Quando o voto seja por correspondência, será esse sobrescrito meti-
do noutro, também fechado, lacrado e endereçado, como corres-
pondência postal registada, aõ governador do distrito, com a menção
de só dever ser aberto no acto eleitoral. Neste caso, é ao go-vernador
que compete abrir o sobrescrito exterior quando chamado o eleitor
que o remeteu e depor na urna o sobrescrito nele contido.

§ 6. o O acto eleitoral efectuar-se-á em dia designado pelo governador do


distrito, entre 15 de Novembro e 5 de Dezembro, consoante as con-
veniências resultantes das comunicações marítimas

(Estatuto dos Distritos Autónomos das ilhas Adjacentes,


aprovado pelo dec-lei n°36453 de 4 Agosto de 1947)

33
TEXTOS DO DR. A. J. JARDIM
ALUSIVOS À AUTONOMIA

Há equívocos que convém desfazer até para evitar interpretações descabidas.


Mas certamente involuntárias.
Correm para aí boatos sobre "independência" da Madeira, e até se esgrime com
o nome .de pessoas, ligando-as a pretensos movimentos cuja existência
desconhecem. (... )
Tentar separar a Madeira do todo nacional, para além de ridículo constitui uma
machadada grave na consciência do País. E significa abandonar esta minúscula
porção de terra a ambições vorazes e estranhas, das quais não nos saberíamos,
nem nos poderíamos defender.
Também é de recusar uma autonomia que se destine a evitar a aplicação local
duma legislação de forte pendor social. O problema sócio-económico da
Madeira é grave, mas não se resolve nem pelo protelamento de situações injus-
tas, nem através de imprudências de espectacular alcance feérico que, na prá-
tica, virao traduzir-se em descalabros. E o descalabro gera bancarrota, desem-
prego, fome.
Porém, outra coisa é encarar a autonomia, já não com um sentido de defesa
política da parte de quaisquer grupos particulares, mas num sentido de solução
técnico-económico. Solução que nada tem que ver com a forma de regime
político que o Povo elegerá. Mas que se destina a procurar encontrar a melhor
fórmula de estruturar as ligações administrativas do Arquipélago com o
Continente e de encontrar as instituições locais mais apropriadas. Apropriadas
a quê? A justamente fazer também aplicar com eficiência à Madeira as leis
vigentes em todo o espaço português. Leis que esperamos virem a ser justas
porque de particular incidência na resolução dos problemas das classes mais
desfavorecidas.
Repare-se, portanto, que a palavra autonomia, neste sentido, já não se reveste
dum manto separatista, quiçás adverso a uma correcta política social. Antes,
autonomia aqui é solução de mero alcance técnico. Que só um incrível fenó-
meno de loucura colectiva poderia desprezar, face à evidente descontinuidade
geográfica entre os territórios em consideração. Mas a tecnicidade é um meio
para o objectivo comum-desenvolvimento nacional.
A melhoria das condições de vida da população não pode ficar dependente de
preconceitos de natureza partidária. O que se procura ao falar de autonomia em
relação à Madeira, é a solução estrutural que sirva a causa comum do progres-
so. Este não pode ser sustido por estratégicas de ocasião.

30-10-1974

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, p.12-13)

3.!
Num correcto esquema de autonomia o Arquipélago terá necessariamente que
dispôr de um poder executivo e de um poder fiscalizador que controle e
obrigue os órgãos executivos a uma acção no ambito demarcado pelos reais
interesses da população. Serão imprescindíveis dois órgãos: o Governador,
poder executivo. e uma Assembleia Regional, poder fiscalizador. Quaisquer
deles com representatividade de base.
O Governador numa região autónoma, deve ser eleito por sufrágio directo e
universal, e por maioria absoluta. Um período de quatro anos pode considerar-
-se razoável. mas o princípio da não.reeleição é útil porque não faz a gover-
nação cair numa rotina perniciosa, nem faz cultivar o gosto ou o vício pelo
poder. Na Madeira, poist uma vez vigente uma lei organica a subordinar este
território a uma estrutura efectivamente autónoma, seria num Governador
assim eleito que se centralizariam os Serviços Distritais. Ele responderia politi-
camente perante o eleitorado, e legalmente perante os Tribunais.( ... )
Por outro lado, o Governador, como efectivo detentor do poder executivo
regional. tem que ser o principal mandatário do Governo Central na execução
das deliberações cuja competência esteja centralizada em Lisboa. O que obriga
por outro lado a aceitar um eficaz sistema de controlo pelo Governo Central.
normal dado o direito de soberania. visto que a Madeira como região autónoma
elegeria o Governador, dentro do esquema proposto. O que leva o Governo
Central a ter como mandatário uma personagem não designada por Ele, mas da
base, pela população.

29-12-74

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, pp.BB-89)

Os princípios da democratização e descentralização regional. se efectivados na


plenitude do seu significado, permitem às populações serem realmente as titu-
lares dos seus destinos.
Ora para que uma região autónoma possa conscientemente planear o seu
futuro e repartir as receitas disponíveis pelas prioridades julgadas mais conve-
nientes. não ficando assim à mercê de contingências estranhas. há um sector
onde a autogerência deve indiscutivelmente manifestar-se. O campo financeiro.
Se dispusermos da faculdade legal de elaborarmos um Orçamento Regional ao
qual esteja adstrita a quase totalidade das receitas fiscais aqui cobradast isso
significa que serão os Órgãos mandatários da população local. porque por ela
eleitos, qrtem definirão os investimentos públicos prioritárias. de acordo com a
vontade popular.

31.12.74

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, p.90-91)

36
A especificidade da autonomia que o caso concreto da Madeira exige, não se
reduz a um mero esquema de descentralização igual ao de Vila Real ou de
Silves. Efectivamente não estão em causa os laços com a Pátria comum. Mas
corno Já foi afirmado: "A Madeira é com efeito, em certos aspectos, um
pequeno pai-s sob o ponto de vista económico, cercado pelo mar, exportando e
importando em parte directamente do estrangeiro, com urna fronteira alfan-
degária estanque. Condicionam sobretudo a sua economia e interdependência
dos sectores económicos locais, a mútua repercussão de suas actividades a va-
riável extensão do terreno por onde se expande cada produto agrícola segundo
a sua fortuita valorização os volumes de produção, consumo, rarefacção ou
pletora do seu bem delimitado mercado interno e a possibilidade de absorção
por parte dos mercados externos seus clientes

11.02.75

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, p.150-151)

Finalmente, o sistema de autonomia realiza um processo evolutivo de valoriza-


ção com o fito de dirigir o território geograficamente descontínuo para que este
assuma a defesa dos seus interesses próprios e diferenciados do restante espaço
nacional em que se institucionalizou, através de um auto-governo nesses sec-
tores.
No aspecto administrativo, o sistema de sujeição identifica-se com a centraliza-
ção, pois esta permite a subordinação permanente e total dos interesses especí-
ficos do território descontínuo à metrópole, o mesmo se dizendo no aspecto
económico. Só no aspecto financeiro é que não é de estranhar o aparecimento às
vezes de dois orçamentos diferentes, forma por exemplo de o território descon-
tínuo não onerar demasiado a Metrópole.
O sistema de integração traduz-se também numa forte centralização adminis-
trativa e numa ausência de especialidade legislativa. O que não quer dizer que
não possa existir descentralização, se for esse o esquen metropolitano, mas
agora só e exclusivamente numa óptica executiva. Política económica sem dis-
tinção, união aduaneira, ausência de orçamento regional, etc., são outras mar-
cas de um sistema integrativo.
O sistema de autonomia pressupõe poderes legislativos, que não meramente
executivos, em matéria de aspectos especificamente regionais, distintos do
todo nacional. Pressupõe urna política económica com o realismo de considerar
duas regiões de conjunturação diferente. Pressupõe urna política económica
com o realismo de considerar duas regiões « conjunturação diferente.
Pressupõe separação orçamental, embora haja participação do território
descontínuo nas despesas comuns do Estado que também aproveitam esse
mesmo território.

37
Estamos, portanto, perante três sistemas diferentes, dos quais a autonomia, em
função do interesse nacional e da · realidade local, é indubitavelmente o que
deve ser prosseguido no Arquipélago da Madeira.
Autonomia que não é o mesmo do que descentralização. Esta é uma praxis que
é possível até desenvolver em sistemas de integração. bastando para tal uma
especial distribuição de tarefas ao nível dos vários postos da hierarquia admi-
nistrativa. Autonomia não significa uma mera execução mais responsabilizada.
Vai mais longe. Robustece os laços entre as parcelas do todo nacional, através
de um funcional Esquema de articulação em que os problemas específicos de
cada território são legislados localmente com realismo, permitindo aos órgãos
da cúpula nacional uma actuação mais preocupada com os problemas da comu-
nidade no seu global, na potencial certeza que, por sua vez, constitui até um
importante factor para uma actuação mais eficiente, mais à vontade, do poder
central.
Esta autonomia para as ilhas Adjacentes deve estar subordinada ao princípio
da solidariedade, ao principio da especialidade de legislação, ao princípio da
descentralização administrativa, ao principio da autonomia financeira, ao prin-
cipio da especialidade da organização politico-administrativa e ao princípio da
unidade política.
O principio da solidariedade, entendido como subjacente à autonomia para as
ilhas Adjacentes, resulta da participação destas na República Portuguesa e si-
gnifica contribuição destas no assegurar da integridade e defesa da República e
na realização dos fins comuns ao Povo português, da forma que for democrati-
camente definida.
O princípio da especialidade de legislação, para justamente permitir a existên-
cia de normas adequadas à específica conjuntura do território descontinuo.
O princípio da descentralização administrativa, através de uma repartição de
poderes às várias escalas hierárquicas da administração, consoante o esquema
mais adequado à situação da região em causa.
O princípio da autonomia financeira traduzido na existência de um orçamento
regional, privativo para o território descontinuo, diferente do Orçamento Geral
do Estado, onde no entanto se compreende também a participação desse ter-
ritório no encarar-se as despesas e receitas que estejam adstritas aos fins essen-
cialmente nacionais.
O princípio da especialidade da organização politico-administrativa, no fundo
quererá dizer que não será exactamente o mesmo o estatuto a aplicar em cada
Distrito das Ilhas Adjacentes, mas estabelecido consoante as características
próprias de cada um.

18.12.75

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, p.538-539)


I

38
É indubitável que um sentimento de sã autonomia é perfilhado pelos Povos dos
dois Arquipélagos atlanticos. A liberdade representa isto mesmo- os grupos
humanos resolverem os problemas que Thes são intrínsecos e administrarem os
bens que lhes pertencem. A não ser assim, a democracia considera-se viciada à
nascença.
E a política no seu sentido verdadeiro, naquela única concepção que suscita a
adesão das populações e a confiança indispensável à construção estável de um
futuro justo e próspero, exige que os problemas não sejam iludidos. Exige que
eles sejam encarados corajosamente nas suas reais dimensões e consequências,
tendo em vista as necessidades de quem depende das respectivas soluções. A
problemática das Ilhas só pode ser devidamente solucionada, se forem adop-
tadas as novas estruturas que são indispensáveis para que haja nestas regiões
um desenvolvimento integral-desenvolvimento simultaneamente económico,
social, cultural e moral que a todos e cada um beneficie, mas que essencial-
mente seja alavanca da promoção, no progresso, da igualdade de classes.
A História mais que comprovou que enquanto a Madeira não for governada do
Funchal e definirem os Madeirenses as estruturas tidas por mais convenientes,
as coisas correrão sempre mal no nosso Arquipélago, as necessidades populares
não estão célere e correctamente atendidas. Mais. O descontentamento assim
permanentemente gerado será sempre factor desagregador da sociedade por-
tuguesa, em vez de obter-se a meta almejada do robustecimento da República,
da Democracia e da Justiça Social.
Também a História tem provado que nós, Madeirenses, capazes de fazer tanta
coisa gigante em todo o canto do mundo como temos sabido executar, cá, den-
tro de casa, somos ilhas na Ilha. Ora, ou acabamos com o individualismo egoís-
ta, com os interesses de clãs, com os espíritos de classe, ou então nunca seremos
capazes de realizar cá dentro, a epopeia que diariamente erguemos em cada
esquina do mundo. E a hora em que presentemente vivemos é de desafio. Ou
arrancamos agora, mesmo no meio de uma crise ameaçadora, ou teremos de
esperar muito tempo. Muito tempo mesmo. Que os egoístas, os clãs, as falsas
elites ao menos deixem os outros trabalhar...
Há um grande problema que para já se põe. O Governo surge a tratar a
Madeira e os Açores como apenas duas províncias, entre as sete que cria na
regionalização administrativa do País. E está errado. A Madeira e os Açores
não são apenas mais duas províncias. São regiões distintas integradas na
República Portuguesa. As províncias do Continente, por serem contíguas, pelas
actividades que entre si e permanentemente integram, formam um todo har-
mónico e com tão íntimas interdependências que só para efeitos de gestão
administrativa se compreende a partilha de um todo que é um só.
Mas essa íntima interdependência, a ponto de formar um todo só, não pode ser
concebida em relação a áreas descontíguas, que forrnam uma individualidade
geográfica, um espaço próprio distinto do continental. As fronteiras do nosso
Arquipélago são tão radicalmente definidas, que o isolam como zona indivi-
dualizadíssima. insusceptível do mero tratamento de província em paridade
por exemplo com o Algarve em relação ao Continente, por exemplo.
Nós somos um inconfundível e diferente espaço atlântico que incontestáveis
laços colocam no mesmo projecto nacional-a República Portuguesa.

39
O Povo deste espaço ambiciona pela autonomia verdadeira, integrado no
espaço português, e acabará por tê-la. A não ser que Lisboa tenha mesmo
endoidecido e seja incapaz de alcançar as repercussões terríveis que terá na
vida nacional um conflito aberto entre o Povo das Ilhas e o Governo Central.

15.01.76

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, vol. II, p.29-30)

Vamos pensar a sério em nós, Povo Madeirense. Mas com o espírito aberto à
autenticidade e não ao sectarismo nem ao pacto com a mediocridade. A
Madeira será aquilo que os Madeirenses quiserem e fizerem. Por muito que
custe ou por muito que demore. Mas é preciso acima de tudo saber querer e,
principalmente saber fazer.

29-01-76

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, voZ. II, 1995, p.53)

Princípios a que tem de obedecer a governação local. Primeiro, em função da


actual situação do País e da vontade já expressa da população-ao da autono-
mia. Forma esta até (a única possível) de reforçar os laços da unidade dentro da
República Portuguesa.
Autonomia é uma solução política, feita através de opções, e só então depois
materializada tecnicamente. A Junta é um órgão de governo. Governar não é
uma mera questão. É optar. E optar é fazer política.( ... )
Foi para reivindicar a autonomia da Madeira e pela implantação a nível de go-
verno local de uma representatividade democrática que se lutou pelo derrube
da defunta Junta de Planeamento. Se lutou para que fossem os princípios de
política nacional mais escolhidos pela população Madeirense, a nortearem os
seus destinos. Daí que a única solução honrosa e COERENTE possível, fosse a
de estar em oposição a partir do momento em que houvesse quem entendesse
que o conjunto da nova Junta não oferecia garantias de reivindicar essa autono-
mia e a pa'rtir do momento em que ela não era representativa. E então mais, a
partir da ocasião em que um partido minoritário cá da Madeira, fazendo gala
da sua supremacia no Continente, recusou um possível acordo que faria já
reunir aquele mínimo de condições que abriria uma possibilidade de se avançar
no carnpo autonomista, e impôs a "sua" Junta a uma terra que lhe não re-
conhece representatividade para tal.( ... )

40
As Finanças são decisivas para a vitória da batalha da autonomia. Não posso
admitir que diante das camaras de televisão o Governador diga que não sabe o
que estava por detrás do interesse pelo pelouro das Finanças. Até pode ser acin-
toso. Para além da contradição, outra em que caiu, dizendo primeiro que não
havia números definidos quanto ao movimento de dinheiros do Funchal para
Lisboa e vice-versa, e daí a bocado apresentar um quadro onde financeiramente
a Madeira estaria esmoler do Continente. Então, há ou não há i números?

30.02.76

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, vol.II, p.87-89)

Mas é preciso também entender-se que a Autonomia é um meio necessário para


a construção de uma sociedade nova, mais justa, destruindo na Madeira certos
aspectos obscurantistas de hierarquismo social e de profundas e imorais dife-
renças de nível de viada. A Autonomia não é uma opção conservadora. É uma
opção progressista, no autêntico sentido da palavra, destinada quer a evitar a
marxização da Madeira, quer a continuidade de estruturas sócio-económicas
carcomidas pelo pó dos tempos.

16-05-7

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, vol.II, p.230-231)

Sou dos que venho criticando aqueles que tomam posições radicais nas
relações Continente-Ilhas.
Não embarco na história da "independência" porque nunca ninguém me
demonstrou ser esse o destino que tornaria mais felizes as classes mais desfa-
vorecidas do Povo Madeirense.
Creio mesmo que não existe o que se poderá chamar uma "consciência
nacional" com a generalização que ela por definição impõe. O que noto é que
há um sentimento fortemente regionalista a correr sérios riscos de se transfor~
mar em "separatismo" na grande maioria da população, se o Governo Central
continuar a fazer as asneiras que faz, continuar a praticar interpretações legais
prepotentes - como a dos casos em que os Governos Regionais têm que ser
ouvidos-se os problemas da Madeira andarem por mãos de políticos ou
autoridades que não sabem distinguir "regionalismo" de "separatismo"; que
não compreendem, por dentro, a consciência regionalista e autonómica do Povo
local.( ... )

41
O "separatismo" não se combate com represálias, nem com perseguições . Isso
é criar "mártires", criar "heróis", engrandecer uma ideia, alimentando-a. O
"separatismo" não se combate com a política do governo socialista em relação
às ilhas, esta a meu ver, hoje, o principal agente do separatismo. Não se com-
bate com as vergonhosas e escandalosas deturpações que a imprensa estatizada
e outra, tecem à volta da realidade Insular.( ... )
Se na verdade as Ilhas beneficiam da existência da ameaça 'separatista", se os
Governos Regionais podem na verdade beneficiar dessa força de pressão, lá
isso estou convencido que até se traduz num politicamente inteligente proveito
de circuntancias.

1.02.77

(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, vol. III p.S5-57)

42
TÍTULO VII
Regiões autónomas

ARTIGO 227. o (Regime politico-administrativo dos Açores e da Madeira)

1. O regime político-administrativo próprio dos arquipélagos dos Açores e


da Madeira fundamenta-se nas suas características geográficas, económi-
cas, sociais e culturais e nas históricas aspirações autonomistas das popu-
lações insulares.

2. A autonomia das regiões visa a participação democrática dos cidadãos, o


desenvolvimento económico-social e a promoção e defesa dos interesses
regionais, bem como o reforço da unidade nacional e dos laços de soli-
dariedade entre todos os portugueses.

3. A autonomia político-administrativa regional não afecta a integridade da


soberania do Estado e exerce-se no quadro da Constituicão.

ARTIGO 228. o (Estatutos)

1. Os projectos de estatuto político-administrativos das regiões autónomas


serão elaborados pelas assembleias legislativas regionais e enviados para
discussão e aprovação à Assembleia da República.

2. Se a Assembleia da República rejeitar o projecto ou lhe introduzir alter-


ações, remetê-lo-á à respectiva assembleia legislativa regional para apre-
ciação e emissão de parecer.

3. Elaborado o parecer, a Assembleia da República procede à discussão e


deliberação final.

4. O regime previsto nos números anteriores é aplicável às alterações dos .


estatutos.

ARTIGO 229. 0 (Poderes das regiões autónomas)

1. As regiões autónomas são pessoas colectivas de direito público e têm os


seguintes poderes, a definir nos respectivos estatutos:
a) Legislar, com respeito da Constituição e das leis gerais da República,
em matérias de interesse específico para as regiões que não estejam reser-
vadas à competência própria dos órgãos de soberania;
b) Legislar, sob autorizac,ão da Assembleia da República e com respeito
da Constituição, em matérias de interesse específico para as regiões que
não estejam reservadas à competência própria dos órgãos de soberania;

43
c) Desenvolver, em função do interesse específico das regiões, as leis de
bases em matérias não reservadas à competência da Assembleia da
República, bem como as previstas nas alíneas ns n), v) ex) do n. 0 I do arti-
go 168. 0 ;
d) Regulamentar a legislação regional e as leis gerais emanadas dos
órgãos de soberania que não reservem para estes o respectivo poder regu-
lamentar;
e) Exercer a iniciativa estatutária, nos termos do artigo 228. 0 ;
f) Exercer a iniciativa legislativa, nos termos do n. 0 I do artigo 170.0 , medi-
ante a apresentação à Assembleia da República de propostas de lei e
respectivas propostas de alteração;
g) Exercer poder executivo próprio;
h) Administrar e dispor do seu património e celebrar os actos e contratos
em que tenham interesse;
i) Exercer poder tributário próprio, nos termos da lei, e dispor de receitas
fiscais nelas cobradas e de outras que lhe sejam atribuídas e afectá-las às
suas despesas, bem como adaptar o sistema fiscal nacional às especifici-
dades regionais, nos termos de lei-quadr® da Assembleia da República;
J) Criar e extinguir autarquias locais, bem como modificar a respectiva
área, nos termos da lei;
1) Exercer poder de tutela sobre as autarquias locais;
m) Elevar povoações à categoria de vilas ou cidades;
n) Superintender nos serviços, institutos públicos e empresas públicas e
nacionalizadas que exerçam a sua actividade exclusiva ou predominante-
mente na região, e noutros casos em que o interesse regional o justifique;
o) Aprovar o plano económico regional, o orSamento regional e as contas
da região e participar na elaboração dos planos nacionais;
p) Definir actos ilícitos de mera ordenação social e respectivas sanções,
sem prejuízo do disposto na alínea d) do artigo 1 68 .o;
q) Participar na definição e execução das políticas fiscal, monetária, finan-
ceira e cambial, de modo a assegurar o controlo regional dos meios de
pagamento em circulação e o financiamento dos investimentos necessários
ao seu desenvolvimento económico-social;
r) Participar na definição das políticas respeitantes às águas territoriais, à
zona económica exclusiva e aos fundos marinhos contíguos;
s) Participar nas negociações de tratados e acordos internacionais que
directamente lhes digam respeito, bem como os benefícios deles deco-
rrentes;
t) Estabelecer cooperação com outras entidades regionais estrangeiras e
participar em organizações que tenham por objecto fomentar o diálogo e a
cooperação inter-regional, de acordo com as orientações definidas pelos
órgão5 de soberania com competência em matéria de política externa;
u) Pronunciar-se por sua iniciativa, ou sob consulta dos órgãos de sobera-
nia, sobre as questões da competência destes que lhes digam respeito.
2. As propostas de lei de autorização devem ser acompanhadas do antepro-
jecto do decreto legislativo regional a autorizar, aplicando-se às correspon-
dentes leis de autorização o disposto nos n. 0 S 2 e 3 do artigo 168. 0 •

44
3. As autorizações referidas no número anterior caducam com o termo da
legislatura ou a dissolução, quer da Assembleia da República, quer da
assembleia legislativa regional a que tiverem sido concedidas.

4. Os decretos legislativos regionais previstos nas alíneas b) e c) do n. o I


devem invocar expressamente as respectivas leis de autorização ou leis de
bases, sendo aplicável aos primeiros o disposto no artigo 172.o, com as
necessárias adaptações.

ARTIGO 230. 0 (Limites dos poderes)

É vedado às regiões autónomas:

a) Restringir os direitos legalmente reconhecidos aos trabalhadores;


b) Estabelecer restrições ao transito de pessoas e bens entre elas e o
restante território nacional, salvo, quanto aos bens, as ditadas por exigên-
cias sanitárias;
c) Reservar o exercício de qualquer profissão ou acesso a qualquer cargo
público aos naturais ou residentes na região.

ARTIGO 231. o (Cooperação dos órgãos de soberania e dos órgãos regionais)

1. Os órgãos de soberania asseguram, em cooperaçao com órgãos de gover-


no regional, o desenvolvimento económico e social das regiões autóno-
mas, visando, em especial, a correcção das desigualdades derivadas da
insularidade.

2. Os órgãos de soberania ouvirão sempre, relativamente às questões da sua


competência respeitantes às regiões autónomas, os órgãos de governo
regional.

ARTIGO 232. o (Representação da soberania da República)

1. A soberania da República é especiaAmente representada, em cada uma


das regiões autónomas, por um Ministro da República, nomeado e exone-
rado pelo Presidente da República, sob proposta do Governo, ouvido o
Conselho de Estado.

2. Compete ao Ministro da República a coordenação da actividade dos


serviços centrais do Estado no tocante aos interesses da região, dispondo
para isso da competência ministerial e tendo assento em Conselho de
Ministros nas reuniões que tratem de assuntos de interesse para a respe-
ctiva região.

45
3. O Ministro da República superintende nas funções administrativas exerci-
das pelo Estado na região e coordena-as com as exercidas pela própria
região.

4. Nas suas ausências e impedimentos, o Ministro da República é substituí-


do na região pelo presidente da assembleia legislativa regional.

ARTIGO 233. 0 (Órgãos de governo próprio das regiões)

1. São órgãos de governo próprio de cada região a assembleia legislativa


regional e o governo regional.

2. A assembleia legislativa regional é eleita por sufrágio universal, directo e


secreto, de harmonia com o princípio da representação proporcional.

3. O governo regional é politicamente responsável perante a assembleia le-


gislativa regional, e o seu presidente é nomeado pelo Ministro da
República, tendo em conta os resultados eleitorais.

4. O Ministro da República nomeia e exonera os restantes membros do go-


verno regional, sob proposta do respectivo presidente.

5. · O estatuto dos titulares dos órgãos de governo próprio das regiões


autónomas é definido nos respectivos estatutos político-administrativos.

ARTIGO 234. o (Competência da assembleia legislativa re~ional)

1. É da exclusiva competência da assembleia legislativa regional o exercício


das atribuições referidas nas alíneas a), b) e c), na segunda parte da alínea
d), na alíneaJ), na primeira parte da alínea i) e nas alíneas j), m) e p) do n. 0
I do artigo 229. 0 , bem como a aprovação do orçamento regional, do plano
económico e das contas da região e ainda a adaptação do sistema ~iscai
nacional às especificidades da região.

2. Compete à assembleia legislativa regional elaborar e aprovar o seu regi-


mento, nos termos da Constituição e do estatuto político-administrativo
da respectiva região.
I
3. Aplica-se à assembleia legislativa regional e respectivos grupos parla-
mentares, com as necessárias adaptações, o disposto na alínea c) do artigo
178. 0 , nos n. 0 S 1, 2 e 3 do artigo 181. 0 e do artigo 182. 0 , com excepção do
disposto nas alíneas e) eJ) do n. 0 3 e no n. 0 4, bem como no artigo 183. 0 ,
com excepção do disposto na alínea b) do n. o 2.

46
ARTIGO 235. o (Assinatura e veto do Mínistro da República)

1. Compete ao Ministro da República assinar e mandar publicar os decretos


legislativos regionais e os decretos regulamentares regionais.

2. No prazo de quinze dias, contados da recepção de qualquer decreto da


assembleia legislativa regional que lhe haja sido enviado para assinatura,
ou da publicação da decisão do Tribunal Constitucional que não se pro-
nuncie pela inconstitucionalidade de norma dele constante, deve o
Ministro da República assiná-lo ou exercer o direito de veto, solicitando
nova apreciação do diploma em mensagem fundamentada.

3. Se a assembleia legislativa regional confirmar o voto por maioria absoluta


dos seus membros em efectividade de funções, o Ministro da República
deverá assinar o diploma no prazo de oito dias a contar da sua recepção.

4. No prazo de vinte dias, contados da recepção de qualquer decreto do go-


verno regional que lhe tenha sido enviado para assinatura, deve o
Ministro da República assiná-lo ou recusar a assinatura, comunicando por
escrito o sentido dessa recusa ao governo regional, o qual poderá conver-
ter o decreto em proposta a apresentar à assembleia legislativa regional.

5. O Ministro da República exerce ainda o direito de veto, nos termos dos


artigos 278. 0 e 279. 0 •

ARTIGO 236. 0 (Dissolução dos órgãos regionais)

1. Os órgãos de governo próprio das regiões autónomas podem ser dissolvi-


dos pelo Presidente da República, por prática de actos contrários à
Constituição, ouvidos a Assembleia da República e o Conselho de Estado.

2. Em caso de dissolução dos órgãos regionais, o governo da região é assegu-


rado pelo Ministro da República.

(Lei Constitucional n °.l/92 de 25 de Novembro


3a revisão da Constituição da República)

A Constituição portuguesa declarou o direito à autonomia dos arquipélagos


dos Açores e da Madeira, uma vez que reconheceu a existência de interesses
particulares das comunidades territoriais que neles habitam, assegurando-lhes
meios para a tornarem efectiva.
Como notas distintivas dessa autonomia relevam as seguintes:

a) Competencia para legislar em matérias de interesse específico para


as regiões, com respeito da Constituição e das leis gerais da
República;

47
b) Competência para regulamentar a legislação regional e as leis gerais
emanadas dos órgãos de soberania que não reservem para estes o
respectivo poder regulamentar:

c) Exercício de poder executivo próprio;

d) Superintendência nos serviços, institutos públicos e empresas


nacionalizadas que exerçam a sua actividade exclusivamente na
região e noutros casos em que o interesse regional o justifique;

e) Assunção de atribuições estaduais com a correspondente transferên-


cia de serviços periféricos dos órgãos de soberania;

f) Eleição das assembleias regionais por sufrágio universal, directo e


secreto, de harmonia com o princípio da representação proporcional,
abrangendo o colégio eleitoral apenas círculos eleitorais das respecti-
vas regiões.

(Fernando Amâncio Ferreira,


As Regiões Autónomas na constituição Portuguesa, Coimbra, 1980, pp.59-60)

«Desde a extrema-direita à esquerda, se ainda há disso na política daí, desde os


bons conservadores aos revolucionários ou conspiradores 'de profissão, desde
os católicos aos indiferentes e aos ateus-todos em comevodora unanimidade
assentaram ou estão assentando em que a Madeira é uma "filha enjeitada". E
não tenho visto que ninguém com os factos, só com os factos, tenha contrariado
a campanha [...]

E porque compreendo esse fenómeno, é que a Madeira continua sendo tratada


como terra civilizada e com paciência, ao menos enquanto se não desman-
darem demais. Porque, se o fizerem, é conveniente não esperar a doçura da
repressão usada da outra vez. E podem continuar dizendo à vontade que os
abandonam[ ...].

Todos os partidários da autonomia supuseram que esta consistia simplesmente


na liberdade de gastar, dando o Poder Central quanto fosse necessário para isso
[ ... ].
A autonomia não é a autonomia de gastar, mas a de administrar um património
ou uma receita, tirando de um ou de outra o maior rendimento. Do facto de a
receita nãó chegar para tudo o que apetece ou há mesmo necessidade de fazer,
não se segue que é ao Governo que incumbe cobrir as diferenças.

Perdoe-me V. Ex.a a extensão desta carta. Ela lhe provará [...] o cuidado que me
merece essa Madeira encantada e infinitamente ingrata. Em toda a parte há
gente que não sabe agradecer, mas uma terra inteira, cheia de benefícios e

48
desconhecedora deles, só a Madeira. E porquê? Porque no fundo deseja o que
não pode ter, quer o que não é capaz de realizar e faz ideia que é ao Governo
que cabe a responsabilidade dos erros e dos crimes praticados pelos seus natu-
rais.

(Carta do Dr. Oliveira Salazar, de 23 de Maio de 1935,


ao Presidente da Junta Geral do distrito, Dr. João Abel de Freitas)

PREÂMBULO: ESTATUTO POLÍTICO-ADMINISTRATIVO


DA REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA

A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea b) do anigo 164.0 , do


n .0 3 do artigo 169.0 e do artigo 228.0 da Constituição, precedendo proposta da
Assembleia Regional da Madeira, nos termos do n. o I do artigo 228. o e da alínea
e) do n. 0 1 do artigo 2'29. 0 da 'Constituição. o seguinte:

TITULO I

Art. 1. 0 - I O arquipélago da Madeira, composto pelas ilhas da Madeira,


do Porto Santo, Desertas, Selvagens e seus ilheus, constitui
urna região autónoma da Republica Portuguesa, dotada de
personalidade jurídica de direito publico.

2- A Região Autonorna da Madeira abrange ainda o mar circun-


darne e seus fundos, definidos corno águas territoriais e zona
económica exclusiva, nos termos da lei.

Art. 2. 0 - I A autonomia politica, administrativa e financeira da Região


Autónoma da Madeira não afecta a integridade da soberania do
Estado e exerce-se no quadro da Constituição e do seu Estatuto.

2- A autonomia da Região Autónoma da Madeira visa a partici-


pação democrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico e
social integrado do arquipélago e a promoção e defesa dos valores
e interesses do seu povo, bem corno o reforço da unidade nacional
e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses.

Art. 3. 0 - I São órgãos de governo próprio da Região a Assembleia


Legislativa Regional e o Governo Regional.

2 - As instituicões autonómicas regionais assentam na vontade dos


cidadãos, democraticamente expressa, e participam no exercício
do poder politico nacional.

49
Art. 4- I Representação da Região cabe aos respectivos orgãos de governo
proprio.

Biblioteca 2 - No ambito das competências dos órgãos regionais, a execução


A!bcrto Vieira dos actos legislativos no território da Região é assegurada pelo
Governo Regional.

Art. 5- I A Região tem bandeira. brasão de armas, selo e hino próprios,


aprovados pela Assembleia Legislativa Regional.

2 - Os símbolos regionais são utilizados nas instalações e activi-


dades dependentes dos órgãos de governo proprio da Região ou
por estes tutelados.

3 - Os símbolos regionais são utilizados conjuntamente com os


correspondentes símbolos nacionais e com salvaguarda da pre-
cedência e do destaque que a estes são devidos, nos termos da lei.

Art. 6. o A soberania da República Ponuguêsa é especialmente representa-


da na Região por um Ministro da Republica, nos termos definidos
na Constituição.

Art. 7. 0 A organização judiciaria nacional tomará em conta as necessi-


dades próprias da Região.

Art. 8. o - I A Região exerce poder tributário próprio nos termos da lei e dis-
põe das receitas fiscais nela cobradas, bem como de outras que lhe
sejam, atribuídas, nomeadamente as geradas no seu espaço terri-
torial.

2 - Nos termos da Constituição, a Região tem o sistema fiscal


próprio resultante da adaptação do sistema fiscal nacional às
especificidades regionais.

3 - Nos termos da Constituição, o sistema fiscal regional será


estruturado por forma a assegurar a a correcção das desigual-
dades derivadas da insularidade, a justa repartição da riqueza e
dos rendimentos e a concretização de uma política de desenvolvi-
mento económico e de justiça social.

(Lei n°.13/91 de 5 de Junho, Diário da República,


I n°.128, série IA de 5 de Junho de 1991)

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