Академический Документы
Профессиональный Документы
Культура Документы
Além da Normose
A patologia da normalidade
Guillaume Le Blanc[1]
Pierre Weil afirma que uma grande parte das opiniões, das atitudes e dos
comportamentos sobre os quais recai um consenso social, na realidade conformam
tipos de normoses. Este consenso constitui uma pressão social que modela um
processo de adaptação a normas mórbidas. Um exemplo é o conceito de guerra
justa, com um apoio legal, onde as pessoas envolvidas adquirem o direito de matar
os que consideram inimigos. Neste contexto, aprende-se a matar por meio do
serviço militar, às vezes obrigatório. Um consenso análogo a este existia,
antigamente, em torno do duelo, como um caminho legítimo de lavar a honra
ferida. Atualmente essa prática é considerada ilegal, inconcebível e, até mesmo,
ridícula. “Quando a guerra será considerada como um duelo coletivo? ”, indaga
Pierre Weil.
Esta nova qualidade de uma evolução cultural, muito além da biológica, através de
um intento consciente e responsável, característica ímpar do ser humano, é
sustentada por significativas cartografias da consciência contemporâneas, em
ressonância com as tradições iniciáticas milenares. É o que encontramos nas
pesquisas de Abraham Maslow[5], de Carl Rogers[6], de Stanislav Grof[7] e de
Ken Wilber[8], citando apenas alguns poucos marcantes representantes do
movimento humanista e transpessoal da ciência psíquica. Também são muito
significativas as pesquisas de Teilhard de Chardin sobre a evolução do Fenômeno
Humano, juntamente com as obras do Sri Aurobindo, de Gurdjieff e de Graf-
Dürckheim, criador da terapia iniciática.
Por outro lado, com relação ao tema evolutivo, Basarab Nicolescu[13] sustenta que
a nossa evolução é uma autotranscedência e que ninguém nem nada pode nos
obrigar a evoluir, já que as forças naturais da natureza, que determinaram a
evolução biológica humana, não atuam mais, o que levou a evolução biológica ao
seu final. No seu lugar surgiu um novo tipo de evolução, ligado à cultura, à ciência,
à consciência e ao encontro humano. Neste sentido, a normose se caracteriza por
uma ausência de investimento no potencial psíquico, ético e noético, ou seja, por
um estado de estagnação da evolução consciente, propriamente humana.
Falando a respeito das doenças do ser humano normal, Le Blanc[16] afirma que a
normalidade é, no início, uma criança na qual o sonho de ar fresco é levado em
conta pelos julgamentos dos pais e dos adultos, sendo que os seus desejos e a sua
vida psíquica são construídos neste estado de sujeição e de modelagem.
Considerando que a personalização é um processo de fornecer um sentido às
nossas atividades, Le Blanc postula que falar de um ser humano normal é
precisamente encerrá-lo nas clausuras de uma identidade definitiva, que o priva de
toda a possibilidade de alteridade. Neste sentido, o horror da doença é o grande
temor da novidade, quando a angústia se torna o modo de ser da pessoa considerada
5
O Complexo de Jonas
Por outro lado, falando do problema de Jonas com relação à tensão entre o trágico
e o trivial, Arthur Koestler[20] afirma que o simples mortal passa praticamente
toda a sua existência no plano banal, exceto em algumas ocasiões excepcionais,
como durante as turbulências da puberdade ou numa aventura passional ou no
confronto com a morte, quando acontece a súbita queda no abismo do trágico. Para
Koestler, a força dos hábitos e das convenções nos aprisiona nas correntes quase
imperceptíveis do fator trivial, esta dinâmica transcorrendo no nível subconsciente.
“São as normas coletivas, os códigos de conduta, as matrizes axiomáticas que
determinam as regras do jogo e nos fazem avançar quase todos, quase sempre, nos
traços do hábito, reduzindo-nos ao estado de autômatos bem vestidos, que os
behavioristas apresentam como a verdadeira condição do ser humano”, sustenta o
autor, esboçando um resumo muito perspicaz da normose.
Notas:
[1] Le Blanc G., Les maladies de l’homme normal, VRIN Matière Étrangère, Paris, Librairie
Philosophique J. VRIN, 2007.
[2] Weil, Pierre; Leloup, Jean-Yves; Crema, Roberto. Normose, a patologia da normalidade.
Campinas: Verus, 2003; Petrópolis: Vozes, 2011.
[3] Leloup, J-Y. Normose e o medo de ser. In: Weil P.; Leloup J-Y; Crema R., Normose, a
patologia da normalidade. Campinas: Verus, 2003; Petrópolis: Vozes, 2012.
8
[4] Crema R., Três fundamentos da normose, In: Weil P.; Leloup J-Y; Crema R., Normose, a
patologia da normalidade. Campinas: Verus, 2003; Petrópolis: Vozes, 2012.
[5] Maslow A., Vers une psychologie de l’être, Paris, Fayard, 1972.
[6] Rogers C., On Becoming a Person, A therapist’s view of Psychoterapy, Boston-New York,
Houghton Miffllin Company, 1995.
[7] Grof S., Pour une psychologie du future, Paris, Dervy, 2002.
[11] Morin E., Os Sete Saberes necessários à Educação do Futuro, São Paulo, Cortez Editora,
Brasília, UNESCO, 2002.
[14] Kuhn T., La structure des Révolutions Scientifiques, Paris, Flammarion, 2008.
[15] Thoreau H. D., Walden ou la vie dans le bois, Paris, Flammarion, 1990.
[18] Maslow A. H., Vers une psychologie de l’être, Paris, Fayard, 1972.
[19] Leloup J-Y., Caminhos da Realização – Dos medos do eu ao mergulho no Ser, Petrópolis,
Vozes, 1996.
[20] Koestler A., La quête de l’absolu, Commentaires d’Arthur Koestler traduits par George
Fradier et Muriel Zygband, Paris, Calmann-Lévy, 1981.