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Impressões pessoais do documentário Loki - Arnaldo Baptista

“Transito entre dois lado


De um lado
Eu gosto de opostos
Exponho meu modo
Me mostro [...]”

Loki é ruptura. É grito. É transformação da angústia em beleza. Faz-me surgir à


memória a composição “Esquadros” de Adriana Calcanhoto, a qual nos faz refletir sobre o
vínculo que estabelecemos frente ao enquadro social marcado por desigualdades, injustiças,
loucuras enquadradas (aceitas), a não aceitação do espectro de carnavais fora de época. Um
controle que exclui outros modos de ser e estar no mundo.
No documentário Loki, Arnaldo Baptista é esse ser que transita entre dois lados, é um
ser que gosta de opostos, íntimo à sensibilidade traduzida em uma sabedoria de vida que as
pessoas estão à parte, porque cultua-se um saber acadêmico acima de todos os outros saberes.
Ele mostra-se na música, na arte, no processo de criação. Expõe seu modo a um mundo
enclausurado, que não consegue compreender seu jeito de ser.
Na porta divisória entre loucura e genialidade, Arnaldo parece ter perdido a chave ou
utilizado um modelo diferente. Mas talvez, diante de tanto estranhamento do mundo a sua
sabedoria intraduzível essa porta nem exista. Justamente porque temos de nos questionar que
loucura é essa.

“Juro que é melhor


Não ser normal

Se eu posso pensar que Deus sou eu


Se eles tem três carros, eu posso voar
Se eles rezam muito eu já estou no céu.

Mas louco é quem me diz e não é feliz, não é feliz

O documentário, ao fazer a ligação entre o passado e o presente da vida de Arnaldo


mostra que o uso da arte possibilita o encontro com o imprevisível, o encontro com o Eu, cuja
importância atinge ainda o processo de cura, pois possibilita transformar a angústia em beleza.
Mostra ainda o significado da movimentação, o quanto a experimentação do excesso de
liberdade é prejudicial, assim como o excesso de repressão. Faz-se questionar o que é possível
extrair da relação com o Outro, qual a importância desse Outro e qual a importância do afeto
e da atenção no processo de cuidado.

LOKI

Expressão do incompreendido (incessantes)


Por um triz, loucura
Por outro, genialidade
Arte

O diálogo de um coração com o outro


Corpos esburacados por histórias e contexto
Pelo abandono do que nunca foi certeza

Uma angústia perpassada pelo discurso do outro


Dos outros.
Quais outros?

Tudo por um triz

Universos de loucuras contidas


Pela linha invisível de estruturas sociais
Falidas em si mesmas

Transformações em pequenas medidas


Afinal, rompimentos carregam medos.
Loucura vista como revolução
Mas quando individualizada: não aceitação.

Sentimentos à flor da pele


Uma sensibilidade tamanha para com as questões do universo
reduzidas à lágrima que percorre o sorriso

Qual sua realidade percebida?


Qual sua verdade intuitiva?

O passado preso na fotografia


Que reverbera pelo mundo
Histórias cruzadas
Perpassadas por erros
Sentimentos conflitantes
Envoltos pela perspectiva da fuga iminente
O colorir que surge da maré de melancolia

Excessos e limites
Como um arco íris em construção
Onde está o equilíbrio?

Loucura como estado de ser, estar e viver


Loucura porque faz a diferença
Carnaval ininterrupto com marchinha de individualidade
protagonizada por um eu e por um outro
Uma análise de Arnaldo Baptista e do caso Scheiber

A vida de Arnaldo Baptista exposta no documentário e as observações freudianas do


caso Schreber caracterizam a ocorrência de psicoses, as quais são constituídas a partir da
foraclusão do nome do pai, definida como uma ausência do registro da castração, dado por
uma significante (figura paterna) que interdita a relação mãe-bebê, criando-se assim uma
falha no mundo simbólico porque a percepção da presença do nome do pai insere a criança na
relação entre os demais significantes (O que falta em mim que existe no outro? ). Quatro são
os referenciais que marcam as estruturas elementares da psicose: a invasão de gozo no corpo,
a linguagem na qual não há dialetização, logo haverá um sentido colado com uma verdade
colada a uma certeza e o automatismo mental.
Em ambos os casos a psicose foi desencadeada por uma perturbação significante. No
caso de Scheiber o desencadeamento ocorreu quando assumiu o cargo para presidente da
Corte de Apelação, o que acabou por gerar uma grande carga de estresse.
No caso de Arnaldo, líder e fundador dos mutantes, essa perturbação se iniciou com o
uso de LSD, com o término do namoro com Rita Lee - com a qual tinha uma relação intensa,
de um amor e carinho profundos - e consequentemente a saída dela da banda “O último show
que eu fiz com o Arnaldo foi no Tereza Raquel aqui no rio e quando acabou o show assim, ele
tava muito triste e foi para o camarim. Cheguei no camarim ele tava no chão chorando,
enfim… Chamando pela Rita. Acho que foi bem traumático.” (LOKI, 2009 - Liminha).
Acrescido a isso, Arnaldo resolveu sair da banda. E mais à frente pela quantidade de
internações.
“Acho que o Arnaldo foi uma criança que de repente teve um rompimento dessa
trajetória que ele tava, ele tinha aquilo como mutante mais como uma coisa da razão da vida
dele. Aí teve esse rompimento que mostrou que a vida não era aquela brincadeira constante
que eles faziam, aquela inocência que eles praticavam, e aí ele começou a ver que o buraco é
mais embaixo e ele sofreu muito. Ele perdeu tarde essa inocência. Essa inocência era coisa
que ele achava que seria pra vida inteira” (LOKI, 2009)
“Acho que ele passava uma fase crítica de angústia, de depressão mesmo. Porque não
era assim uma coisa... Não era um arrependimento de ter brigado com a Rita, nunca foi. Não
teve nada de qualquer problema que tenha tido com ele nunca foi por causa da Rita. Foi por
causa do cara se sentir de repente sem base, sem o pé no alto” (LOKI, 2009 -Dinho)
O desenrolar da psicose em Schreber vai se dar por uma história criada por meio do
delírio cuja matriz se sustenta na ideia de que ele tem uma missão redentora para com o
mundo e para tanto precisa ser transformado em mulher (emasculação). A linguagem terá uma
conotação pessoal e tomará a via imaginária, na medida em que ele cria novos sentidos ou até
mesmo neologismos para se proteger da angústia, o que implica um saber existente no delírio:
“[...] Afirma ter chegado a essa tarefa por inspiração divina direta, do mesmo modo
que os profetas; os nervos mais excitados, como foram os seus durante muito tempo, teriam a
propriedade de exercer atração sobre Deus [...] (O CASO SCHREBER, 1911, p. 16)
Assim, ao falar de Deus, nervos femininos, raios divinos, pássaros miraculados, entre
tantos outros, Schreber não usa a língua no sentido comum, ele mobiliza um processo de
significação da significação, ou seja, atribui um novo sentido às palavras que já existem e esse
novo sentido é o que vai valer para ele. É preciso investigar que Deus é esse, que os nervos
não são nervos referentes ao sistema biológico, que pássaros miraculados é uma expressão por
ele criada, dentre outros. Assim, tais sentidos carregados de certeza e verdade são
denominados de metáfora impotente. “[...] o paciente está tomado por idéias mórbidas que se
fecharam em um sistema completo, se tornaram mais ou menos fixas e parecem ser
inacessíveis a uma correção através da interpretação e julgamento objetivos da situação
real.[...] (O CASO SCHREBER, 1911, p. 14)
Um dos momentos emblemáticos no caso de Schreber é quando ele cria uma relação
imaginária com o prof. Flechsig “[...] era inteiramente natural que visse meu verdadeiro
inimigo apenas o prof. Flechsig [...]” (O CASO SCHREBER, 1911, p. 18). Schreiber colocou
o prof. em um lugar e este respondeu desse lugar que lhe foi dado, ou seja, acabou entrando
no história do delírio. Neste caso, o processo de transferência em Schreiber foi desencadeador
do surto.
No caso de Arnaldo, o documentário não explora muito o desenrolar do delírio, mas
por meio de uma das falas de Raphael Vilardi, um dos amigos dele, é possível perceber essa
característica do uso particular da língua na seguinte fala: “ele queria me contratar pra ser o
capitão da nave espacial que ele tava construindo”. De forma bem simplificada, Zélia Duncan
afirma que “Ele tá numa esfera que muitas vezes é uma esfera só dele “
Um dos elementos constitutivos da psicose é que a angústia é sentida no corpo.
Schreber [...] queixava-se de amolecimento cerebral [...], começava a mostrar uma notável
hiperestesia - grande sensibilidade à luz e ao barulho, [...] considerava-se morto e apodrecido,
doente de peste, supunha que seu corpo fosse objeto de horríveis manipulações de todo tipo
[...]” (O CASO SCHREBER, 1911, p. 13). [...] viveu muito tempo sem estômago, sem
intestinos, quase sem pulmões, com esofago dilacerado, sem bexiga, com as costela
esfaceladas [...] ( O CASO SCHREBER, 1911, p.16)
Regina Miranda narra o momento em que Arnaldo, em um encontro com ela, deixa
transparecer esse afeto no corpo: “[...] ele falou “como é que você aguenta, Regina?” E eu:
por que, como que eu aguento o que? E ele falou “porque isso tudo?” E ele abriu assim os
braços e falou: eu me sinto completamente esburacado por essa experiência, é como se eu
tivesse ... é como se pessoas tivessem dançando e passando por todos os meus poros.[...]” Tais
processos alucinatórios, dos fenômenos corporais, dos delírios são denominados de
automatismo mental, já que há um retorno no real do que é recusado no inconsciente. Um
outro exemplo seria quando Schreber diz que os nervos excitatórios do homem vivo exercem
atração sobre os nervos de Deus.
Arnaldo tem o momento de passagem ao ato, em que o afeto é transformado em ação.
“Eu já tinha sido internado quatro vezes antes, por diversas razões, então, de uma certa forma
me senti perdido na vida… eu tinha feito tantas coisa, tocado em tantos lugares e tava lá
perdido, internado cinco vezes, e aí então eu pensava, talvez ainda fique uns dez anos, então,
plenamente consciente e cansado de falar com os médicos, cansei disso e pensei: eu vou viver
livre. Me joguei da janela.”
O tratamento das psicose pode ser definido como o caminho para se chegar a uma
estabilização, na qual a angústia fica fora de foco e se dá por duas vias: uma pela via da
suplência e outra pela via da nomeação do gozo. O primeiro diz respeito a encontrar um
ponto de apoio, uma sustentação no âmbito da realidade do sujeito. Inicialmente a suplência
no caso de Schreiber era se apoiar no pai, quando o pai morre ele encontra esse apoio no
irmão. Quando o irmão morre ele se casa no ano seguinte. Após o estabelecimento do delírio,
a forma encontrada por ele para manter uma estabilização foi por meio da restauração
imaginaria: uma história produzida pela via imaginária para acalmar a angústia - ele se vestia
com adereços femininos em determinado momento do dia. [...]” as vezes eu sou encontrado
com o tronco seminu diante do espelho ou algum outro lugar , enfeitado com adereços um
tanto quanto femininos. Mas isso só acontece quando estou só, e nunca, pelo menos até onde
posso evitar, na presença de outra pessoa[...]” (O CASO SCHREBER, 1911, p. 20)
No caso de Arnaldo “Ele sublima a vida dele em forma de arte. É uma maneira de se
curar...E ele consegue fazer da arte uma maneira de se viver “ (LOKI, 2009). Casou-se
novamente, teve um filho: “Depois que a gente se separou, ele tinha uma preocupação com o
Daniel de querer entrar numa vida mais burocrática. E aí é que tava o confronto dele. O artista
querendo existir sem conseguir espaço. Porque tavam querendo um mito, mas ele deixou de
ser mito. Ele queria ser artista, queria ser gente. Ele tinha essa preocupação em relação ao
Daniel, também. Como que o Daniel ia vivenciar isso. E pra ele era a luz dos olhos dele”
(LOKI, 2009 - Martha). A suplência ocorria também com as tentativas de criar uma nova
banda, passou a pintar, entrou em uma nova banda e encontrou Lucinha que deu um impulso
para ele sobreviver. “ Interessante eu pensar em mim, agora, nesse momento em função do
quanto eu posso ir adiante na música, né... É um lado característico pra gente ver o quanto eu
influenciei, o quanto fui influenciado também e o quanto eu consegui botar pra fora e o
quanto ainda falta" (LOKI, 2009 - Arnaldo)”
Nomear o gozo é por a angústia em palavras, esvaziando um pouco da sua carga
afetiva, quando Scheiber nomeia um Deus perseguidor, quando diz que tem a sensação de ter
sido penetrado por nervos femininos ele está nomeando o gozo. No caso de Arnaldo, pode-se
dizer que ele nomeia o gozo por meio do disco Loki, o qual demonstra uma dor profunda.
Tanto Arnaldo quanto Schreiber passaram a viver muito melhor após a estabilização.
Não foi necessário buscar uma cura ou transformar psicose em neurose para enquadrar os dois
na normalidade que se espera que exista. Muito da tristeza que Arnaldo carregava era por não
compreender porque não era compreendido, pelo afastamento dos amigos, das pessoas
próximas, pela investida da mídia em notícias sobre sua vida, por uma falta de cuidado, de
afeto em muitos momentos. Falta de compreensão, escuta, falta de sensibilidade, de um olhar,
um abraço acolhedor.
Se aceitássemos as diferenças, as idiossincrasias do outro, se buscássemos entender ao
invés de julgar ou classificar como “louco” e “normal” muito do sofrimento, da angústia de
Arnaldo e Schreber, assim como das demais pessoas com suas mais diversas diferenças, seria
atenuado. É por meio de uma relação com do Eu com o Outro que o sujeito vai se
constituindo. Assim é de extrema importância que questionamos a todo momento qual a
importância desse Outro e nunca deixemos um diagnóstico descritivo reduzir a nossa
subjetividade e a subjetividade do Outro. SER, apenas.

REFERÊNCIAS

Obras completas - Observações psicanalíticas sobre um caso de paranoia relatado em


autobiografia (“O caso Schreber”). Artigos sobre técnica e outros textos (1911-1913). Trad.
Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. v. 10

Loki – Arnaldo Baptista. Direção: Paulo Henrique Fontenelle, Produção: Canal Brasil. 2008.

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