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1. PREÂMBULO
Este trabalho propõe investigar a produção poética de Antônio Cícero. Serão
abarcados como corpus toda a sua produção poética: Guardar - datado de 1996; A Cidade
e os Livros, lançado seis anos após o primeiro livro de poesia; Livro de Sombras: Pintura,
Cinema e Poesia, de 2010 e, por fim, Porventura, em 2012. O desenvolvimento deste
projeto procura tecer uma leitura da trajetória poética, bem como das temáticas mais
recorrentes. Cícero se apresenta como uma exatidão nada hermética: um rigor na
linguagem, porém, sem perder a comunicação e a musicalidade levadas ao leitor. O leitor
se vê assim diante de uma poética marcada, especialmente, pela reflexão do ser-no-
mundo, em certa medida, um olhar filosófico adquirido através da formação acadêmica
do poeta. Como declarou Santiago: “O poeta Antônio Cícero é, ao mesmo tempo, herdeiro
das superfícies e das profundezas” (SANTIAGO, 1996, orelha do livro). No que tange à
linguagem poética - verifica-se a presença de elementos culturais, mas, também, a busca
do poeta pela compreensão de si e do universo circundante.
Para uma primeira discussão recorro ao livro Como e por que ler poesia - a
poesia brasileira do século XX, de Ítalo Moriconi (2002), em busca de uma definição do
que vem a ser poesia:

“Toda a linguagem tem seu quê de poesia. Mas a poesia é onde o “quê”
da linguagem está mais em pauta. A poesia brinca com a linguagem.
Chama a atenção para possibilidades de sentido. Explora
significativamente coincidências sonoras entre palavras. Fabrica
identidades por analogia, através das imagens ou metáforas: mulher é
flor, rapaz é rocha, amor é tocha [...] Ocorre que a palavra poesia
abrange sentidos que vão além da linguagem verbal, oral ou escrita”.
(MORICONI, 2002, p. 8).

Nesse sentido, entende-se que a linguagem poética ultrapassa o livro, uma vez
que se relaciona com o mundo, com a vida. A poesia de Cícero, por sua vez, recebe
melodia e ela vira canção, na voz da sua irmã Marina Lima.
Cabe, assim, formal e sequencialmente, apresentar de forma abrangente esse
estudo, começando então pelo primeiro capítulo. Procura-se fazer uma leitura
interpretativa, com registro das circunstâncias conhecidas das publicações de Antônio
Cícero; associação das leituras feitas acerca do poeta e de sua obra poética, buscando,
acima de tudo, pensar o fazer poético. Pode-se, ainda, perceber em grande parte dos seus
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textos poéticos um diálogo com a filosofia. É nesse universo literário que surge a
compreensão de poesia - no que tange o seu valor simbólico visto a partir de Bourdieu.
O que se expõe, no segundo e último capítulo, é a análise-interpretativa de duas
temáticas recorrentes presentes em alguns poemas da produção poética de Cícero, como
a poesia-pensante e a poesia anacrônica. A linguagem poética de Cícero vai para além da
realidade circundante, oferecendo assim para o leitor uma miríade de possibilidades de
leitura.
Por fim, vale entender, segundo Roland Barthes (1970, p. 33) em seu ensaio
“Escritores e Escreventes” - o escritor vive como um legítimo pensador, pois abre as
portas da percepção, desvenda segredos, sempre a questionar o desconhecido, em busca
de si mesmo.

2. TRAJETÓRIA POÉTICA

O termo contemporâneo é, por natureza, elástico e


costuma trair a geração de quem o emprega.
Alfredo Bosi

Para Barthes (2003, p. 355), o contemporâneo compõe-se de um tempo


fraturado, um tempo que não coincide com presente. Friedrich Nietzsche (2003, p. 7), em
sua obra Consideração Intempestiva, entende por contemporâneo um tempo de que não
se pode fugir mesmo adiando a sua existência nele. É Giorgio Agamben (2009, p. 59) que
relata sobre esse anacronismo presente no contemporâneo:

“A contemporaneidade, portanto, é uma singular relação com o próprio


tempo, que adere a este e, ao mesmo tempo, dele toma distâncias, mais
precisamente, essa é a relação com o tempo que a este adere através de
uma dissociação e um anacronismo. Aqueles que coincidem muito
plenamente com a época, que em todos os aspectos a esta aderem
perfeitamente, não são contemporâneos porque, exatamente por isso,
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não conseguem vê-la, não podem manter fixo o olhar sobre ela”
(AGAMBEN, 2009, p. 59).

Esse ponto de vista de um tempo anacrônico ao perpassar pelo obra literária,


constitui um diálogo que se constrói e se reconstrói, confluindo nele tempos diversos,
conduzindo assim o leitor à criação de novas significações, novos sentidos ao texto. De
acordo com Karl Erik Schollhammer (2009, p. 10), a literatura contemporânea não
necessariamente vincula-se à “atualidade, a não ser por uma inadequação, uma estranheza
histórica que a faz perceber as zonas marginais e obscuras do presente, e que se afasta de
sua lógica”, isto é, a experiência com a linguagem literária assume uma conversa não
apenas com o presente, mas com o passado, com a tradição. Para esse autor, ser
contemporâneo é orientar-se na escuridão mesmo vivendo no presente. Aquele que
produz a literatura contemporânea anda na contramão das tendências, enxerga a realidade,
mas não consegue captá-la, talvez porque ele mesmo faça parte dela. Utiliza-se de uma
escrita que “urge” – algo que se dá sem demora e ao mesmo tempo, essa escrita ambiciona
alcançar “determinada realidade”. Assim o escritor contemporâneo sente dificuldade de
compreender o que o circunda, a história atual é vista por ele como descontínua
(SCHOLLHAMMER, 2009, pp. 10-11).
Na poesia, segundo Agamben (2009, p.62), o poeta contemporâneo “é capaz de
escrever mergulhando a pena nas trevas do presente”, percebendo a obscuridade do seu
tempo - entre um “ainda” e um “não mais”, como acontece com as poesias de Antônio
Cícero – ele escreve no seu tempo e mantém relação com outros tempos através da poesia.
Cícero “É um homem que absorve radicalmente o porquê do mundo num como escrever”
(BARTHES, 1970, p.3). Segundo a nossa leitura interpretativa, é desse modo que a poesia
se presentifica diante do olhar do poeta.

3. A ESCRITA POÉTICA DE ANTÔNIO CÍCERO

Poesia não tem exatamente um sentido, mas antes um


sentido do acesso a um sentido a cada momento ausente
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e, transferido para longe. O sentido de poesia é um


sentido sempre por fazer.
Jean-Luc Nancy

A poesia de Antônio Cícero faz da escrita performance - pensa o fazer poético no


agora. Em O mundo desde o fim - obra filosófica de Cícero – o autor descreve mais
detalhadamente essa ideia do agora. Assim diz Cícero (1995, p. 16):

“[...] o agora em si, o agora enquanto agora, a essência deste instante,


que é o que buscamos. Mas o que é este instante? Este instante consiste
numa expressão dêitica, isto é, tal que seu significado se determina
mediante referência à instância de enunciação do discurso” (CÍCERO,
1995, p. 16).

Viver o agora, procurando se distanciar dos juízos de valor, fazendo da poesia um


campo a ser pensando, um território a ser desterritorializado, embora procure manter uma
“[...] uma dicção classicizante, com métricas fixas, citações mitológicas, sintaxes
invertidas e uma atmosfera muitas vezes epicurista” (JAFFE, 2007, p. 13).
Alguns poemas que serão apresentados reverberam o modus faciendi de Antônio
Cícero, recorrente temáticas surgem em sua obra poéticas: a poesia como força criadora
– é uma delas; outra temática e presença da tradição e da modernidade no poema. Para
demonstrar a maneira pela qual isso se dá, é necessário, utilizar Nancy, Agamben, entre
outros.

3.1. A poesia-pensante em Antônio Cícero


Evoca-se um registro de poesia-pensante, em Antônio Cícero, entendida como
uma quase-filosofia. O processo de criação de Cícero se torna assim inerente ao outro.
Desse modo, a poesia é pensada como força criadora, uma unidade que se ergue na
pluralidade. Como o singular-plural de Jean-Luc Nancy (2006, p.36) cuja linguagem
segue em diálogo com ela mesma. Mas, afinal, o que significa singular/plural para Nancy?
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“Ser singular plural: estas três palavras fixas, sem sintaxe determinada
– “ser” é verbo ou nome, “singular” e “plural” são nomes ou adjetivos,
tudo se pode combinar -, assinalam por sua vez uma equivalência
absoluta e sua articulação aberta, impossível de voltar a fechar sobre
uma identidade. O ser é singular e plural, de uma vez, indistintamente
e distintamente.
[...] Isto mesmo não constitui um predicado particular do ser, como se
fosse ou como se tivesse um certo número de atributos, entre os quais
este, duplo, contraditório ou quiasmático de ser singular-plural. O
singular-plural (ou o singular plural) forma ao contrário a constituição
de essência do ser: uma constituição que desfaz ou que desloca, em
consequência, toda essência una e substancial do mesmo ser” (NANCY,
2006, p.44).

Essa unidade na singularidade pode ser vista através da arte poética de Antônio
Cícero, onde cada singularidade constitui-se enquanto parte de uma pluralidade. Como se
pode ver em Guardar, a poesia com o mesmo título configura-se como um labirinto,
buscando acessar o difícil da poesia, não o que está escondido, mas o que é possível
iluminar.

GUARDAR

“Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.


Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso melhor se guarda o vôo de um pássaro
Do que um pássaro sem vôos.
Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica,
por isso se declara e declama um poema:
Para guarda-lo:
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:]
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar” (CÍCERO, “Guardar”, Guardar,
1996, p. 14).

Guardar poema-título, escrito em versos livres, mostra a forma como o sujeito


do poema subverte o sentido de guardar, quando o vincula à arte: “Guardar uma coisa não
é escondê-la ou trancá-la. / Em cofre não se guarda coisa alguma. /Em cofre perde-se a
coisa à vista” - dá ao poema o sentido de vir à tona, estar à mostra, afim, de se iluminar o
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que está guardado no que tange à arte. “Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por/
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado”. Cabe assim ao leitor ao travar
contato com a poesia interpretá-la, divulga-la, absorvê-la e levá-la consigo guardada: “Por
isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica, /por isso se declara e declama um
poema/ Para guarda-lo. Cícero, na última parte, da poesia, traz à cena o poema-objeto, ou
seja, o que ele guarda dentro de si e ilumina - “Por guardar-se o que se quer guardar” -
registrando dentro de si a subjetividade do momento da inspiração.
É forte, além do pensamento que recaí acerca do entendimento do poema, na
poesia de Cícero, a musicalidade entre o som e a imagem, como acontece em

VOZ

“Orelha, ouvido, labirinto:


perdida em mim a voz ecoa.
Minto:
perversamente sou-a” (CÍCERO, “Voz”, Guardar, 1996, p. 15).

Esse poema de Cícero remete à sonoridade, a importância da oralidade para a


poesia: “Orelha, ouvido, labirinto: perdida em mim a voz ecoa”. Suspende-se o poema na
leitura do texto, da música: “perversamente sou-a”, implicando “um modo de ouvir” que
interfere na percepção do poeta. Nas palavras “sou-a, ecoa” – o sujeito do poema encontra
“eco” para as suas aspirações - o eco que aparece parece ser de “outro” - é uma voz externa
- quando, no entanto, se trata da sua própria voz - a voz da consciência, que assim se
materializa “perversamente”, criando uma confusão entre o “eu” e o “outro” - ambos
pertences ao sujeito do poema. Cícero constrói, dessa maneira, um espelho distorcido -
um “labirinto” - uma construção em que o sujeito do poema percorre com ele mesmo.
introspectiva, que seus limites, só existem, quando confrontados com seu lugar
na criação, pois percebe-se ínfimo ante o universo sem fim, “que não é feito de mim”,
porém, “isso é controverso/nos versos de um poema/ perverso sai o reverso. Isto é, no
“poema perverso” há “um reverso de sentido” (NANCY, 2005, p. 16) na qual o sujeito
do poema transmuta-se de uma realidade pretensamente grandiosa - “mundo imenso”
para um paralelo existencial da condição humana, nada é além de um grão de poeira no
infinito do universo. O “dilema”, a confusão permite assim ao poeta por meio do sujeito
do poema - “reconhecer” que “no fundo de mim sou sem fundo” - ou seja, sem nada que
constitua o seu eu.
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esse poema, de 9 estrofes, o sentido de sagrado que envolve a imagem mítica


deixa de existir – “Ariadne não fia o seu fio/ à frente mas atrás de mim” - uma forma
lúdica discorre acerca da história que envolve “Ariadne”. Inclusive, o sujeito do poema
se utiliza da narrativa para refletir sobre as limitações humanas, os anseios em busca de
resposta.
Na terceira, quarta e quinta estrofe - ao questionar-se, o sujeito do poema afirma
não ter certeza sobre suas escolhas, e, invariavelmente, sentindo-se preso ao seu destino,
discorre sobre sua inépcia em poder realizar qualquer escolha que lhe traga qualquer
forma de alívio: “É certo que me perco em sombras/ e que, isolado em minha ilha/ já não me
atingem as notícias dos jornais a falar de bolsas,/ tenta fugir de tudo e de todas as razões que
tornam o saber sobre o mundo, uma arte cinza, metálica, com um sabor ocre para seus
sentidos”.
Na sexta, sétima e oitava estrofes, o sujeito do poema, deixa claro que percebe
que justamente a consciência deste estado “É aqui mais real que as notícias, na própria
matéria”, permite no seu “delírio” poder questionar, desprezando tudo que percebe,
escolhe olhar para o outro lado em busca da única saída possível, o desvio, onde quer que
este o leve: “Para onde vou, de onde vim? Não sei se me acho ou me extravio. / Ariadne
não fia o seu fio à frente, mas atrás de mim. Não será a saída um desvio e o caminho o
único fim? (Cicero 2012, p. 45).
Nessa série de poemas, a tensão entre o presente e o passado segue
principalmente incorporada a uma linguagem informal, rompendo, na maior parte das
vezes, com a linha que separa o poema da prosa. Percebe-se ainda, em alguns momentos,
a construção de forma e ritmo tradicionais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Buscou-se fazer uma leitura da trajetória poética de Antônio Cícero que permitiu
pensá-la como uma espécie de “projeto poético-cultural”, pois a linguagem poética, os
versos dos poemas, desse autor, recebem melodia e (anti)musicalidade e se transformam
em música, com som e ritmo, como se pode ver nos livros Guardar, A cidade e os livros
e Porventura. Livro de sombras: pintura, cinema e poesia com a participação de Luciano
Figueiredo é um projeto, ainda, mais audacioso, pois agrega as artes plásticas e o cinema.
Cícero - filósofo, letrista, poeta - pode assim ser visto como um artista, ou um poeta plural.
Na poética de Cícero pulula, em um primeiro momento, uma poesia-pensante,
uma poesia que se ergue na pluralidade, um diálogo quase filosófico, que discorre acerca
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da condição humana, assim a poesia apresenta sentidos diversos, toma, por vezes, forma
de objeto - poema-objeto. E, por último, mostra como Cícero evoca a cultura clássica,
não com o intuito de um retorno nostálgico, ao contrário, aparece em seu discurso poético
elementos da tradição, que surgem no poema como um reflexo da vida, da cultura, do
tempo. Da mesma maneira que se utiliza de elementos da tradição como a métrica, as
figuras míticas, Cícero mantém uma linguagem coloquial no discurso poético, ele acredita
que todas as formas, inclusive, as tradicionais devem ser utilizadas, há uma liberdade de
escolha, e ele escolheu usá-las.
O encontro entre a poesia e a filosofia vai além da apresentação do mundo via
poema, Cícero leva, assim, de forma racional e concisa, o leitor, acima de tudo, a refletir
sobre o mundo, o tempo, as coisas. O sentido da poesia, para este autor, está para além
das palavras, dos conceitos.

REFERÊNCIAS

AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo? e outros ensaios. Chapecó, SC:


Argos, 2009.

BARTHES, Roland. “Escritores e Escreventes”. In: Crítica e verdade. São Paulo:


Perspectiva, 1970.
______. O neutro. Tradução de Ivone Castilho Benedetti. São Paulo: Martins Fontes,
2003.

SITES CONSULTADOS

ALVES, Áurea, DUMAS, Gustavo e GOMES, Celso. Entrevista exclusiva: Antônio


Cícero. Jornal Algo a Dizer. Disponível em:
https://www.algoadizer.com.br/edicoes/materia.php?MateriaID=105 Acesso em: 1 jul.
2018.

AIBNEWS. Release sobre a exposição do livro de sombras. Disponível em:


http://aibnews.com.br/noticias/plantao-rio/2010/09/oi-futuro-apresenta-exposicao-livro-
de-sombras.html?imprimir Acesso em 5 jul. 2018.

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