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ABSTRACT
Key words: Youngsters and Adults Education. Language. Mother tongue. Teaching.
I INTRODUÇÃO
Tendo em vista a necessidade de expormos nossos pontos de vista, para nos
posicionarmos nas diversas situações interlocutivas das quais participamos, nos
voltamos à educação de jovens e adultos, cujo maior objetivo é refletirmos sobre as
práticas curriculares docentes no ensino da língua materna para a 4ª etapa dessa
modalidade de educação, em uma escola da rede municipal de Itapema/SC.
Como a educação de jovens e adultos possui caráter singular, isso porque
esses alunos já possuem experiências de vida diferenciadas dos alunos do ensino
fundamental regular, reforçamos a relevância de um processo de ensino que
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valorize as vivências desses sujeitos e que possa estar contextualizado aos seus
anseios, às suas expectativas, às suas realidades.
Apesar dos avanços do número de pesquisas que abordam o ensino voltado
a essa modalidade de ensino, percebemos como ainda precisamos lançar um olhar
mais sensível para a EJA, pois esses alunos, que voltam aos bancos escolares
depois de algum tempo fora da escola, já são leitores de mundo, já possuem uma
significativa bagagem cognitiva. Precisam ter reconhecidos seus conhecimentos,
pois, muitas vezes, possuem baixa autoestima, devido a visão que esses sujeitos
têm de si próprios. Por meio de entrevistas, Valino (2006), coletando dados para sua
dissertação de mestrado em Educação, realizada junto a uma turma voltada à
modalidade de jovens e adultos da rede particular, no interior de São Paulo, ao
acompanhar quinze alunos entre 16 e 58 anos de idade, ao longo de um ano letivo,
pôde entender aspectos relacionados à autoestima desses sujeitos, aspectos esses
relevantes e que contribuem para fornecer peculiaridades inerentes aos estudantes
que frequentam a EJA. Tentou compreender que tipos de imagens esses alunos
faziam de si mesmos, vejamos o que a pesquisadora relata sobre os entrevistados:
Percebeu-se que todos os entrevistados atribuíram qualificação negativa à
sua condição, avaliando-a como “ruim”, “difícil”, “terrível”, “trágica”,
“horrível”, “triste”, entre outros adjetivos. Não saber ler e escrever foi
apontado como fato gerador de dependência, humilhação e insegurança.
(VALINO, 2011, p.104)
1O termo “libertadora”, nesse contexto de fala, refere-se à educação que predispõe o aluno a ser
agente de sua aprendizagem. Que dê a ele subsídios para não só “estar no mundo”, mas “agir no
mundo” de forma responsiva e consciente.
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2 Cidadania, nesse contexto, significa formação que privilegia a criticidade do sujeito, permitindo que
o mesmo se posicione frente às diversas situações sociais, de maneira autônoma em defesa de seus
direitos e na execução de seus deveres.
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3O Instituto Paulo Montenegro é uma organização sem fins lucrativos, criada em 2000 para
desenvolver e disseminar práticas educacionais inovadoras que contribuam à melhoria da qualidade
da educação. Disponível em: < http://www.observatoriodopne.org.br/metas-pne/9-alfabetizacao-
educacao-jovens-adultos/analises/alfabetizacao-e-alfabetismo-funcional-dos-adultos-no-pne> Acesso
em 02.07.2016 às 10h e 15 min.
4Esses dados demonstram o grande número de crianças e adolescentes fora das escola. Disponível
em: < http://g1.globo.com/educacao/noticia/2012/09/pais-tem-35-milhoes-de-criancas-e-adolescentes-
fora-da-escola-diz-ibge.html>. Acesso em 17.06.2016, às 15h. e 10 min.
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O aluno da EJA não é uma extensão da criança que foi; trata-se, pois, de
um sujeito que possui uma história de vida significativa. E essa história se
traduz em uma carga de conhecimento que alimenta desejos, objetivos e
expectativas bem diferentes, se comparados aos de uma criança. Essa
peculiaridade da EJA, de certa maneira, torna específico o aluno que
frequenta essa modalidade de ensino.
do que se pensa. De acordo com essa ótica, podemos concluir que pessoas que não
conseguem se expressar não pensam.
Na 2ª concepção, a linguagem é entendida como um instrumento de
comunicação cuja concepção está ligada à teoria da comunicação. Aqui, a língua é
compreendida como código (conjunto de signos que se combinam segundo regras)
capaz de transmitir ao receptor determinada mensagem.
Já, a 3ª concepção, defende ser a linguagem forma de interação. O foco
dessa concepção, ao ir além da visão de que a linguagem é transmissão de
informações de um emissor a um receptor, coloca-a em um lugar especial nas
interações humanas, ou seja, defende que somente na/pelo/com o uso da língua, o
falante age sobre o ouvinte, constituindo compromissos e vínculos que não
preexistiam à fala.
Nossa proposta de trabalho enfoca a linguagem como o lugar de constituição
de relações sociais, em que os falantes se tornam sujeitos. Essa concepção de
linguagem traz em seu bojo a dialogia, muito enfatizada por Bakhtin em seus
estudos.
A teoria enunciativo – discursiva de Bakhtin (1988), com respeito a linguagem,
opõe-se aos paradigmas tradicionais, isto é, a primeira e a segunda concepções de
linguagem explicitadas por Geraldi (2004). Isso porque nesses dois paradigmas, a
língua é tratada como um sistema abstrato, irreal, idealizado, fechado em si mesmo,
não mantém nenhuma relação com os aspectos sociais e culturais. Nessas duas
concepções de linguagem (a 1ª concepção vê a linguagem como expressão do
pensamento e a 2ª concepção expressa que a linguagem está ligada à teoria da
comunicação) a língua não é trabalhada sob o enfoque dialógico. Partindo desses
modelos desatualizados e descontextualizados de linguagem, Bakhtin (1988)
elabora um modelo contrário, ou seja, modelo que prima por uma visão de
linguagem que vê a língua como instrumento de interação, criação e sentido e, por
isso, esse modelo de linguagem dialógico de Bakhtin coincide com a terceira
concepção de linguagem enunciada por Geraldi (2004). Sendo assim, para Bakhtin
(1988, p.123):
a verdadeira substância da língua não é constituída pelo sistema abstrato
de formas linguísticas nem pela enunciação monológica isolada [...], mas
pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação
ou das enunciações.
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Portanto, para Bakhtin, quem fala tem a intenção de suscitar uma resposta de
seu interlocutor, tem um ponto de vista a defender e espera, com seus argumentos,
que seu alocutário lhe dê o feedback, concordando ou não com o seu discurso.
Em nossa convivência junto aos jovens e adultos, observamos a grande
necessidade desses alunos em contextualizar as diversas disciplinas às suas
vivências ou experiências cotidianas. Assim sendo, Freire (1996) defende a
adequação do ensino da língua materna à realidade do aluno. E, sendo assim, o
ensino na língua materna numa perspectiva dialógica favorece o aprendizado do
caráter funcional da linguagem, pelo educando.
Freire (1996) orienta que o estudo da língua materna tenha como ponto de
partida a vivência, a experiência, a realidade dos alunos. Dessa forma, o ensino
contextualizado com suas necessidades, anseios, expectativas desenvolve-se
naturalmente, isto é, prioriza fases durante o aprendizado, que levam em
consideração as competências específicas de cada educando, assim como, suas
habilidades, seus conhecimentos.
Acreditamos que há necessidade que compreendamos que o professor deve
ter o conhecimento dos conteúdos específicos de sua área de atuação, mas também
conhecimento pedagógico, inerente à sua função, e conhecimento pedagógico do
conteúdo, o que implica entender que os saberes e as concepções docentes de
aprendizagem e de ensino terão implicações sérias e contundentes na construção
do conhecimento pelo aluno.
O modo como o professor ensina comunica aos estudantes o que é
essencial e o que é periférico na matéria lecionada e aponta para modos de
construir o conhecimento numa área. Suas atitudes e valores, portanto,
influenciam a compreensão dos seus alunos (SHULMAN, 1986, p. 228).
aluno, pois não o prepara para a vida. Como exemplifica Silvio Gallo6, objetivo
externo ao indivíduo é àquele que é projetado para fora do sujeito, como, por
exemplo, passar no vestibular, ter uma profissão rentável. Sendo assim, a educação
conteudista, a nosso ver, é oposta à educação para a liberdade, que prima pela
formação holística do sujeito-aprendiz preparando-o à vida.
Portanto, nesse contexto, o educador bancário dará lugar ao educador
problematizador, para, assim, dar caminho a uma educação conscientizadora e, ao
mesmo tempo, crítica.
Reproduziremos o diálogo entre a professora e um aluno, por meio de
fragmentos de falas audiogravadas em aula realizada no dia 19. 09. 2013,
salientando que esse diálogo é expressivo em relação à concepção de ensino, bem
demarcada pelas seguintes falas:
Professora: “Aí eu vou/, porque nós aprendemos a classificar os sujeitos, né? Simples,
composto, indeterminado, oculto. Na próxima aula nós vamos começar aprender a trabalhar
as palavras dentro do predicado. A classificar as palavras que estão dentro do predicado e,
na outra aula, aí em cima das palavras que a gente vai aprender a classificar, eu vou ensinar
a classificar predicado”. Aluno: “Que confusão”. Professora: “Que confusão, né seu
“fulano”? Concordo com o senhor”. Aluno: “E será que eu vou usar isso?”
Professora: “Vai, se você for prestar concurso você vai usar”. Aluno: “Só vestibular.”
A fala docente “vai, se você for prestar concurso você vai usar/” embute uma
postura epistemológica atrelada ao ensino de normas gramaticais, cujo teor denota
um caráter conteudista, em que explicita a importância de se estudar os conteúdos
ministrados para realização de concursos, para vestibulares. É como se o aluno
precisasse “dominar” a norma culta da língua somente para prestar concursos e não
para utilizá-la em suas vivências diárias. Por outro lado, a fala do aluno “e será que
eu vou usar isso?” evidencia a sua visão em relação ao conteúdo dado, isto é, o
aluno demonstra que não entende o porquê de se estudar àqueles conteúdos
(sujeito e predicado). Isto acontece porque o ensino de gramática é
descontextualizado da realidade do aluno, sendo assim, Travaglia, Araújo e Pinto
esclarecem (1995, p.15):
O método tradicional, desvinculado de uma base linguística, pedagógica e
psicológica, atua trabalhando a língua de maneira fragmentária, ou seja,
apresentando palavras e expressões fora de contexto (linguístico e/ou
situacional). Além disso, enfoca a língua analiticamente, o que dificulta uma
“Professora: É::::vou deixar tocar a música uma vez para ouvir, né? Para os que já
conhecem relembrar e os que não conhecem, ouvir o som. E depois, eu vou ler dois
depoimentos de duas pessoas diferentes dando uma interpretação pra essa música (sobre a
interpretação dessa música). E no finalzinho, uma atividade um pouquinho diferenciada hoje.
Aluno: O negócio é a nota no final do ano.”
Apesar da fala discente não ser o nosso foco de análise, por considerarmos
interessante o valor conteudista presente “no dizer” do aluno, a transcrevemos no
sentido de enriquecer a presente análise, pois ela reforça a visão discente sobre o
assunto trabalhado em sala de aula pela professora, isto é, o conteúdo é relevante à
obtenção de nota.
3.4.2) Concepção de gramática da docente: o status da “língua de prestígio ou
norma culta” na voz da professora
quais eles estão em contato nas muitas situações interativas das quais participam
como falantes é oportuno, a fim de possibilitar o conhecimento da diversidade
linguística presente em nosso país. Reforçamos essa ideia, uma vez que em
nenhuma aula assistida por nós vimos a docente falar em variantes linguísticas. Isso
é tarefa necessária, a fim de não alimentarmos preconceitos, nem privarmos nossos
educandos de tornarem-se sujeitos autores (donos de seus dizeres). Quanto ao
domínio das diferentes variantes linguísticas pelos alunos, Bechara (2008, p.20)
argumenta:
[...] a língua não se esgota só na chamada Língua Padrão. A língua tem
suas variedades de acordo com as situações sociais porque passa o
falante. A nossa tese que é muito frequente na Europa, é transformar o
aluno poliglota na sua própria língua. Que ele possa dominar mais de uma
variante para estar capacitado a lidar com alguém analfabeto,
semialfabetizado ou alguém que domina a Língua Portuguesa, e usar a
linguagem para o bem conviver entre os seres humanos.
Transcrevemos o enunciado da professora, em que ela pede aos alunos que repitam
em voz alta as conjugações verbais, vejamos: “[...] nós vamos fazer agora como os
pequenininhos, nós vamos conjugar todos em voz alta, um por um, rapidinho.”9
(Grifos nossos)
Verificamos que essa prática se repetiu ao longo das aulas por nós
observadas:
“Como eu falei pra vocês no início da aula, eu vou começar com uns exerciciozinhos no
quadro, se der tempo nós já partimos para a folha, se não der tempo nós terminamos na
semana que vem, tá? Essa aula precisa de mais tempo e então fica um pouquinho
complicado.”12 (Grifos nossos)
14 Reguladora, nesse contexto, significa a ação docente que tende a regular e controlar o
comportamento do educando e não a orientá-lo.
15 Fragmento de transcrição da fala da docente de aula realizada no dia 03/10/2013.
16 Fragmento de fala da docente transcrita de aula realizada no dia 10.06.2013.
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Quanto a esse tipo de atitude, qual seja, dependência discente gerada por
práticas docentes, Oliveira (2007, p.88) assevera:
Não importando a idade dos alunos, a organização dos conteúdos a serem
trabalhados e os modos privilegiados de abordagem dos mesmos seguem
as propostas desenvolvidas para as crianças do ensino regular. Os
problemas com a linguagem utilizada pelo professorado e com a
infantilização de pessoas que, se não puderam ir à escola, tiveram e têm
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IV ÚLTIMAS REFLEXÕES
culturas, concepções, anseios, expectativas de uma vida melhor, mais justa e rica de
oportunidades nas diversas esferas em que transitam.
REFERÊNCIAS
ELIAS, Vanda Maria. Ensino de língua portuguesa: oralidade, escrita e leitura. São
Paulo: Contexto, 2013.
FERRAZ, Serafim Firmo de Souza; LIMA, Tereza Cristina Batista de; SILVA, Suely
Mendonça de Oliveira e. “Contratos de aprendizagem: Princípios andragógicos e
ferramenta de gestão da aprendizagem”. In: ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO
NACIONAL DE PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO-
ENANPAD, 28, 2004, Salvador. Salvador: ANPAD, 2004. 1 CD-ROM.
________. Cartas a Cristina: Reflexões sobre minha vida e minha práxis. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 2013.
---------------. O texto na sala de aula. 3.ed. São Paulo: Ática, 2004. (Coleção na sala
de aula)
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IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD): micro dados. Rio de
Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2008.
NEVES, Maria Helena de Moura. Que gramática estudar na escola? 4.ed. São
Paulo: Contexto, 2011.
VALINO, M. L. Quem não sabe ler nem escrever pede favor. Até quando?
Dissertação (Mestrado em Educação), Faculdade de Educação, Universidade de
São Paulo (Feusp), São Paulo (SP), 2006. Disponível em:
<http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48134/tde-20062007-113059/pt-
br.php> Acessado em 22.10.2015 às 12h: 45min.