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UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA

Curso de Pós Graduação em Teoria e


Prática Junguiana

Trabalho sobre Filosofia

Alunas: Christianne Rachel Aguiar

Claudia Maria Gama Leal

Julho 2014
1. INTRODUÇÃO

Nosso trabalho visa conhecer as diferenças entre o pensamento


ocidental e oriental, buscando o que embasa ser o cerne de cada cultura,
refletindo ou sendo o reflexo do psiquismo que a engloba.

Até o séc. VII a.c. não havia a divisão entre ocidente e oriente e,
tampouco, havia a filosofia, pois não se tinha ainda a intenção de desvendar os
mistérios do mundo. Vejamos sob qual contexto nasce a filosofia e o que
estabelecerá a divisão entre ocidente e oriente.

O fato de o pensamento filosófico científico começar a se estabelecer


na Grécia a partir do séc. VI a.c., não significa que anteriormente não haviam
formas de se entender o mundo, um exemplo disso, por volta do séc. VIII a.c.,
é o “Canto do Aedo”. Os poetas evocavam Mnemosine e as Musas para ser um
aedo, ou seja, um escolhido dos deuses para cantar a palavra sagrada.
Homero com a “Ilíada” e a “Odisséia” comprovam esse período, como nos diz
Carlos Alberto Nunes (1962) “Homero que, segundo a tradição grega, deve ter
vivido no nono século antes de Cristo, era um bardo cego que cantava os seus
poemas em praça pública”.

Para o aedo existir tinha que emanar o encantamento, ele não era
um detentor do saber, pois não sabia o mistério que iria cantar, pelo contrário,
esse mundo era o espanto que eles cantavam. A partir do séc. VII entraremos
no período mítico, um período em que o público e o social ainda não se
separam, onde tudo é divino e os deuses estão presentes no cotidiano. Sobre
esse período nos descreve Marcondes (2002, p.20):

Um dos elementos centrais do pensamento mítico e de sua forma de


explicar a realidade é o apelo ao sobrenatural, ao mistério, ao
sagrado, à magia. As causas dos fenômenos naturais, aquilo que
acontece aos homens, tudo é governado por uma realidade exterior
ao mundo humano e natural, superior, misteriosa, divina, a qual só os
sacerdotes, os magos, os iniciados, são capazes de interpretar, ainda
que apenas parcialmente. São os deuses, os espíritos, o destino que
governam a natureza, o homem, a própria sociedade. Os sacerdotes,
os rituais religiosos, os oráculos, servem como intermediários, pontes,
entre o mundo humano e divino. Os cultos e sacrifícios religiosos
encontrados nessa sociedade são, assim, formas de se tentar
alcançar os favores divinos, de se agradecer esses favores ou de
aplacar a ira dos deuses. (Marcondes, 2002, p.20).

Como dito acima, esses deuses não estão exteriorizados, mas atuam
como mediadores, filtradores, entre o homem e as forças excessivas da
natureza. Mas, um paradoxo urge através da poesia, visto que suas narrativas
começam a gerar revolta e indignação dos mortais perante os deuses, em
questões relacionadas à ferida diante do enigma da vida e da morte, que
somente eram explicadas através do sobrenatural e, portanto, do inexplicável.
O que nasce daí é um embrionário movimento, ao qual o homem ainda não
tem consciência, ou seja, de um si mesmo. É que, ao se espelhar em um deus,
ele percebe uma gama de possibilidades de existências subjetivas, que o
instiga a ir se tornando um indivíduo singular.

2. SITUANDO O NASCIMENTO E DESENVOLVIMENTO DA FILOSOFIA


OCIENTAL

Não poderemos compreender as diferenças entre o Ocidente e o


Oriente, muito menos alcançar a visão complexa de Jung sobre essa temática,
sem antes nos apercebermos do quão somos regidos e estamos imersos pela
dominância do pensamento ocidental.
Esse pensamento foi sendo instaurado, de modo cada vez mais
forte, a partir das angústias e argumentações dos homens em relação aos
deuses, como citado anteriormente. Tais questionamentos abriram vertentes
diversas, nascidas do exercício desse novo modo de pensar. Daí emergiu
questões como o princípio da vida e do mundo, trazendo divergentes olhares.

Por um lado temos o devir, ou seja, o movimento de mudança


observado em toda natureza, postulado por Heráclito de Éfeso. Este afirma a
positividade do devir, como sendo o fundamento, ou modo natural de ser de
todas as coisas. Segundo Mosé (2011, p. 99):

O mundo nunca começou nem nunca vai acabar, ele é um eterno vir
a ser, um jogo no qual “todas as coisas trazem em si mesmas o seu
contrário”, a luz e a sombra o doce e o amargo estão ligados uns aos
outros como dois lutadores; a ladeira que sobe é a mesma que
desce; é uma só e mesma coisa a vida e a morte, o despertar e o
dormir, a mocidade e a velhice, o bem e o mal. (Mosé, 2011, p.99).

Constatamos que Heráclito justifica as contradições do mundo, e não


as afasta, pois, para ele, há fecundidade e força geradora na contradição. Em
vertente contrapartida a Heráclito, temos Parmênides de Eleia, que sustenta
que “existe uma realidade, imutável, única, e ela é o Ser” (MOSÉ, 2011). Diante
dessas polaridades, a visão de Parmênides – antagônica a de Heráclito -
predominou em nossa cultura. Ainda em Mosé (2011, p. 101):

(...) ao contrário dos seus contemporâneos, incluindo Heráclito, que


falavam por metáforas e intuições, ele vai inserir um discurso onde
quem fala é uma luz fria, distante. O que Parmênides terminará por
fazer é introduzir o domínio lógico-gramatical no discurso, permitindo
a instauração dos dois principais princípios lógicos: o princípio de
identidade, “o que é é”, ou “o Ser é”, e o princípio da não contradição:
“Se o Ser é, o seu contrário, o não Ser, não é”. (Mosé, 2011, p.101)

Com isso, elementos como, os afetos, as sensações, a intuição, o


corpo, não devem ser seguidos, pois, somente o que pode conduzir-nos ao
bem e à verdade são o pensamento e a razão. Essa idéia se tornará um
modelo de pensamento nomeado como razão, o que excluirá uma parte
considerável da vida.
Já no século V a.c. surgem as cidades e a democracia, e com isso a
palavra toma o poder. É a época dos sofistas, o que está em cena não é mais a
physis, mas o próprio pensamento: o homem. A contribuição desse momento
histórico é que, o movimento dos sofistas inaugura uma autonomia do
pensamento. A Filosofia é então o exercício do pensamento em si mesmo na
relação do homem com a vida. O que Sócrates vai fazer nesse momento
através da sua argumentação própria é retornar ao estado de ignorância para
criar consenso e se chegar com isso a conceitos universais. Surge a dialética,
em um momento histórico que se nomeou como antropológico, pois o homem
começou a olhar para si mesmo e não mais para a natureza, o foco se torna a
ética e a política.
Falamos agora do nascimento do domínio da razão, que irá se
consolidar em Platão e Aristóteles. A razão se caracteriza como uma faculdade
orientadora que faz o homem ir além de suas experiências e instintividade – daí
se diferenciando dos animais -, possibilitando criar códigos, conceitos,
argumentos e consenso entre si e na sua relação com o mundo. Ainda em
Mosé (2011, p.112):

(...) razão não quer dizer somente capacidade de falar e pensar; de


criar códigos e relacioná-los; mas de pensar de uma forma específica:
organizada esclarecida sem contradições distante das emoções e
tendo como alvo; o incondicional; o imutável o Ser; a verdade. A
razão neste sentido não se refere mais a potência de pensar; mas a
um pensamento com valores específicos e determinados. Foi este
sentido da palavra razão que os gregos clássicos criaram. (Mosé,
2011, p.112)

Para entendermos melhor como a razão continuou a ser fundamental


no pensamento ocidental, citaremos brevemente a influência de alguns
pensadores. Platão tem as idéias como formadora das coisas, pois elas contêm
seu conteúdo material. O Ser sendo conceito é captado pelo discurso, porque
este tem a capacidade de dizer o que é, de captar a essência do mundo. Nesse
sentido a idéia é o modelo de Verdade.
No entanto para Aristóteles isso não é o suficiente, pois mesmo
compartilhando com Platão a universalidade do discurso, difere deste ao
colocar que o conhecimento passa pela experiência, com suas sensações,
imagens e percepções, até alcançar as palavras e os conceitos. O discurso em
si se mostrará sempre ambíguo e precisará ser modelado por regras para
estabilizá-lo e torná-lo coerente, isto é, precisará de uma lógica. Esta manifesta
toda a ordem e essência das coisas, por isso é ontológica, ela “permite a
continuidade entre a linguagem e o ser” (MOSÉ, p.118)

(...) Partindo da identidade afastando o que é contraditório e


vinculando a verdade a uma causa, a um princípio, Aristóteles
acredita estar garantindo a verdade da linguagem, o sentido. É dando
uma ontologia à linguagem; atribuindo ao discurso princípios
ontológicos, que ele acredita poder afastar o falso do verdadeiro.
(Mosé, 2011, p.118)

Posteriormente, em Descartes, é retomada a idéia de pensamento


crítico e argumentativo, já dentro de um espírito científico emergente, posto que
predominou o saber revelado por toda Idade Média. Nesta virada, o que traz
Descartes é que o pensamento não se sustenta sem o sujeito pensante.

Hoje, ao refletirmos acerca do pensamento e do sujeito pensante


encontrados em Descartes, é possível perceber que ele ao formular essa teoria
joga fora o bebê junto com a água do banho, já que nesse caso o que aparece
é um subjetivismo sem sujeito. Porque este retira da subjetividade – do penso –
toda densidade individual. Dando continuidade a esse pensamento faremos
referência a Nunes (1989, p.34):

Ele encontra-se imbuído na busca de um conhecimento superior


sublimado, trilhando um caminho de busca da perfeição, ligado a um
racionalismo puramente formal, no sentido da acuidade matemática,
na apologia da excelência das simetrias nas leis geométricas, onde
inclui até mesmo a idéia de Deus. (...) É aí que se instala o dualismo
mente/matéria levando a constituir-se uma idéia de fragmentação do
mundo, onde este seria passível de uma descrição puramente
objetiva, trazendo como consequência o aniquilamento do papel do
observador, como se a realidade existisse absoluta, lá fora, apesar
dele. (Nunes, 1989, p.34)

Duras críticas surgiram sobre Descartes, visto que, o pensar não se


dá como algo que pode ser atribuído ao sujeito, esse tipo de idéia seria uma
ficção. Pois os pensamentos surgem espontaneamente, deixando o sujeito
perplexo, sem capacidade de controlar totalmente os pensamentos. A partir
deste fato, perguntamos como se pode atribuir os pensamentos ao sujeito?

(...) Ao se pautar na identidade e na unidade subjetiva a racionalidade


isolou o homem em si mesmo, e o fez acreditar, especialmente a
partir da modernidade, que ele era princípio de suas próprias ações.
(...) Este homem moderno, consciente de si, sustentado em uma
racionalidade igualmente autônoma, vai, como vimos, realizar a
“morte de Deus” e efetivar seu projeto de “consertar” o mundo, de
impor sua vontade sobre a natureza. É este modelo de homem, em
que a razão é uma contra-natureza, que hoje parece desabar diante
do desgaste moderno, do seu fracasso, da sua exaustão. (Mosé,
2011, p. 133)

Influenciado por algumas fontes de conhecimento, como, o


empirismo, o experimental e o dedutivo e o matemático, encontramos Newton.
Uma das suas mais importantes contribuições foi conseguir sistematizar a
teoria com a prática, colocando o homem no encalço da supremacia com
relação à natureza.

A síntese newtoniana não é, pois, uma ruptura, mas sim uma


surpresa. É uma descoberta inesperada, perturbadora, que a cultura
comemora fazendo de Newton o próprio símbolo da ciência moderna.
Essa ciência supunha uma ordem universal, supunha que o método
laborioso de medida e de manipulação poderia descobrir a verdade
do mundo. E eis que, de fato, a natureza se deixa decifrar, eis que
responde, e bem além das expectativas daquele que a interrogava.
(Prigogine e Stengers, 1984, p.50)

Influenciado por algumas fontes de conhecimento, como, o empirismo,


o experimental e o dedutivo e o matemático, encontramos Newton. Uma das
suas mais importantes contribuições foi conseguir sistematizar a teoria com a
prática, colocando o homem no encalço da supremacia com relação à
natureza.

A Escola de Laplace, no início do século XIX, se instaura com força


no meio científico. Fortalecendo, sistematizando e difundindo a ciência da
Newton, pois se tornará objeto de consenso entre os pensadores e cientistas
(NUNES, 1989, p.35). Embora houvesse o consenso, essas idéias não darão
conta de todo panteão que constitui os fundamentos do pensamento ocidental,
pois sempre houveram pensadores divergentes, colocados no obscurantismo,
por não restringirem a realidade a uma idéia fragmentada e reducionista.

Discorremos de maneira sucinta sobre os fundamentos do


pensamento grego e seu desenvolvimento, culminando no que hoje chamamos
de pensamento científico do Ocidente. Este se baseia na inclinação para a
fragmentação dos fenômenos contrária a inclusão de outros fenômenos
igualmente pertinentes à vida. Este último ponto é o que embasará a visão de
muitos pensadores da modernidade e da pós-modernidade, incluindo Carl
Gustav Jung.
3. DIFERENÇAS ENTRE A FILOSOFIA OCIENTAL E A FILOSOFIA
ORIENTAL

Ao fazer o comentário psicológico sobre “O Livro Tibetano da Grande


Libertação” Jung explicita diversas considerações sobre a diferença existente
entre o Pensamento Oriental e o Pensamento Ocidental. Ele traz à tona a
característica ocidental sobre a dicotomia entre ciência e religião. E, ao falar de
psicologia oriental, a coloca entre aspas – a “psicologia” – visto que,“ o Oriente
não produziu algo de equivalente à nossa psicologia, mas apenas uma
metafísica” (JUNG {1939} 1980, p.481, par. 759). Vejamos nas palavras abaixo
alguns efeitos dessas transformações:

(...) A filosofia crítica, que é mãe da psicologia moderna, é estranha


tanto ao Oriente quanto à Europa medieval. Por isso, o termo
“espírito”, no sentido em que é empregado no Oriente, tem uma
conotação metafísica. Nosso conceito de espírito perdeu este sentido
depois da Idade Média, e a palavra agora designa uma “função
psíquica”. Embora não saibamos nem pretendamos saber o que é a
“psique” em si, podemos entretanto ocupar-nos com o fenômeno
“espírito”. Não afirmamos que o espírito seja uma entidade metafísica
ou que exista alguma ligação entre o espírito individual (Universal
Mind) hipotético. Por isso nossa psicologia é uma ciência dos
fenômenos puros, sem implicações metafísicas de qualquer ordem. O
desenvolvimento da filosofia ocidental nos últimos dois séculos teve
como resultado o isolamento do espírito em sua própria esfera e a
ruptura de sua unidade original com o universo. O próprio homem
deixou de ser microcosmos, e sua alma já não é mais a “scintilla”
consubustancial ou uma centelha da “anima mundi” (Jung, 1980,
p.481)

Jung teve também por base, na época ao qual se dedicava aos


estudos sobre inconsciente coletivo, o texto “O Segredo da Flor de Ouro”. Este
é um texto taoista de ioga, além de ser um tratado alquímico. E quando se
refere a uma mudança do que vem a ser “espírito” a partir da Idade Média,
pôde certificar-se disso profundamente ao fazer o comentário europeu sobre o
texto. Constatando que “a alquimia medieval representa o traço de união entre
a gnose e os processos do inconsciente coletivo que podem ser observados no
homem de hoje” (JUNG, 2012, p.8).

Tendo em vista este fato, a psicologia emprega certo demérito às


pretensões e afirmações metafísicas, já que, em virtude do que não pode ser
explicado racionalmente “o espírito não pode constatar nem demonstrar o que
ultrapassa esses limites” (JUNG,1980,p.482). Como homem empírico e
ocidental Jung entende o bom senso que justifica reconhecermos os limites de
nosso espírito, mas aponta alguns paradoxos e sombras que emergem quando
se busca extirpar o todo.

Pode-se colocar em xeque a afirmação do que vem a ser matéria, e


assim como Kant, se nos dispormos a fazer uma crítica à filosofia crítica da
ciência encontraremos julgamentos errôneos vindo por parte desta, tornando-a
portanto metafisicamente negativa, visto que a matéria, como sugerida por este
olhar, é tão somente uma hipótese. Outro paradoxo é que, apesar da crítica
excludente da teoria do conhecimento ao dito metafísico, ainda se conserva a
crença de que um órgão de fé valida ao homem à capacidade de conhecer a
Deus. Vejamos um esclarecimento maior:

O conflito surgido entre ciência e religião no fundo não passa de um


mal-entendido entre as duas. O materialismo científico introduziu
apenas uma nova hipótese, e isto constitui um pecado intelectual. Ele
deu um nome novo ao princípio supremo da realidade, pensando,
com isto, haver criado algo de novo e destruído algo de antigo.
Designar o princípio do ser como Deus, matéria, energia, ou o que
quer que seja, nada cria de novo. Troca-se apenas de símbolo. O
materialista é um metafísico “malgré lui”. O crente, por outro lado,
procura manter-se em um estado espiritual primitivo, por motivos
meramente sentimentais. Não se mostra disposto a abandonar a
relação infantil primitiva relativamente às figuras criadas pelo espírito.
Prefere continuar gozando da segurança e confiança que lhe oferece
um mundo em que pais poderosos, responsáveis e bondosos
exercem vigilância. A fé implica, potencialmente, num sacrificium
intellectus (desde que o intelecto exista para ser sacrificado), mas
nunca num sacrifício dos sentimentos. Assim os crentes permanecem
em estado infantil, em vez de ser tornarem como crianças, e não
encontram a sua vida, porque não a perdem. Acresce ainda que a fé
entra em choque com a ciência, recebendo deste modo a sua
recompensa, pois se nega a tomar parte na aventura espiritual de
nossa época. (Jung, 1980, p.483)

Ainda na questão do espírito no Ocidente, que antes era tido com


vastidão supostamente universal, perdeu esse caráter e foi restringido a uma
pequena parcela de reflexão individual por parte da consciência, ou seja, se
transformou na mentalidade de um indivíduo. Isso ecoa a impressão profunda
de encarceramento na própria psique. Diz Jung (1980) que “nos sentimos
propensos a admitir na psique a existência de coisas que desconhecemos e a
que denominamos “o inconsciente””.

O receio de cair nas ilusões desenfreadas das projeções fez com que
muitos cientistas e pensadores rechaçassem suas tendências religiosas, e
sacrificassem sua fé. E o gosto por fatos concretos foi cada vez mais sendo
incorporado, derivando o anseio de acessar uma enormidade de fatos, que de
tão gigantesca quantidade talvez tenha-nos impedido a visão quanto à
impossibilidade futura de “montar o quebra-cabeça” e dar sentido a toda essa
informação, a todo esse conhecimento.

Vejamos o que se concebe como espírito na mentalidade Oriental, e


o que fundamenta essa diferença:

(...) No Oriente, o espírito é um princípio cósmico, a existência do ser


em geral, ao passo que no Ocidente chegamos à conclusão de que o
espírito é a condição essencial para o conhecimento e, por isso,
também para a existência do mundo enquanto representação e ideia.
No Oriente não existe um conflito entre a ciência e a religião, porque
a ciência não se baseia na paixão pelos fatos, do mesmo modo que a
religião não se baseia apenas na fé. O que existe é um conhecimento
religioso e uma religião cognoscitiva. Entre nós, ocidentais, o homem
é infinitamente pequeno, enquanto a graça de Deus é tudo. No
Oriente, pelo contrário, o homem é deus e se salva por si próprio. Os
deuses do budismo tibetano pertencem à esfera do ilusório suceder-
se das coisas e às projeções produzidas pelo espírito, mas nem por
isso deixam de ter existência; entre nós, porém, uma ilusão
continuará sempre uma ilusão e, como tal, não é coisa alguma. É
paradoxal, mas ao mesmo tempo verdadeiro, o fato de que, para nós,
o pensamento não possui realidade em seu verdadeiro sentido. Nós o
tratamos como se fosse nada. Embora o pensamento possa ser
correto, só admitimos sua existência devido a determinados fatos
expressos por ele. (Jung, 1980, p.486)

Com isso o conceito de “realidade psíquica”, “espírito” ou “psique” se


tornou arbitrário, variando de grupo de pensadores para outro grupo.
Schopenhauer é uma das poucas exceções no Ocidente que considera que o
mundo assume a forma de uma imagem psíquica, pois se assim não fosse
seria praticamente impossível que o mesmo existisse. Todavia, não é segredo
que Schopenhauer foi influenciado pelos upanishads e pelo budismo.

Ao falar do ser psíquico Jung (1980, p.486) alerta que é “uma


contradição considerar que a categoria do ser, uma das condições essenciais
de todo o existente, ou seja, da psique, seja real apenas pela metade”. Ao
invés de fazermos essa redução deveríamos assimilar que a única vertente do
ser da qual se possui um conhecimento imediato e direto é a do ser psíquico,
pois nada pode ser conhecido, apresentado diretamente se não for como
imagem psíquica.

Outra diferenciação entre Ocidente e Oriente diz respeito à


canalização da energia psíquica, se ela está orientada ao interior ou ao
exterior. Para Jung, o Oriental seria uma coletividade de seres introspectivos,
em sua tendência original, considerando as exterioridades fatores de ilusão.
Contrário a isso, o Ocidente se voltou, em sua historicidade, para o exterior. Ele
é coletivamente extrovertido chegando a considerar a introversão, segundo
Jung (1980, p.487), “como uma anomalia, um caso patológico, ou de qualquer
maneira, inadmissível”.

Cada atitude psicológica – introversão / extroversão – com suas


respectivas características e preconceitos são representados através dos
pontos de vista religiosos, mesmo para aquelas pessoas que julgam não ter
religião, a abandonaram ou nunca ouviram falar. Esclareceremos melhor
mencionando os aspectos religiosos do problema e de que modo e energia
psíquica movimenta a questão:

O Ocidente cristão considera o homem inteiramente dependente da


graça de Deus ou da Igreja, na sua qualidade de instrumento terreno
exclusivo da obra da redenção sancionado por Deus. O Oriente, pelo
contrário, sublinha o fato de que o homem é a única causa eficiente
de sua própria evolução superior; o Oriente, com efeito, acredita na
“auto-redenção”. (Jung, 1980, p.487)

O Oriente interiorizado está mais próximo ao inconsciente e


igualmente mais próximo de uma liberação de forças inconscientes, que para
nós são assustadoras e das quais nos defendemos violentamente. O budismo,
ao qual pertence o texto comentado, se refere à “natureza da mente”. Ao que
Jung faz analogia com a noção ocidental de inconsciente, não apenas como o
recalcado, mas algo pré-existente, e a noção de espírito do oriental, seria para
nós a “consciência reflexa” que não existe sem um eu capaz de percepção,
sendo o inconsciente percebido somente de forma indireta. No entanto o
oriente aborda esse tema da consciência perceptiva como avidya, isto é,
ignorância, sendo o verdadeiro estado de iluminação ou samadhi, como sendo
aquilo que está por trás da consciência reflexa, destituído de sujeito,
descentralizando o ego, sendo equivalente por isso ao inconsciente coletivo.

No entanto, o ocidente não pode fugir de sua subjetividade, “A psique


e sua natureza são bastante reais” (JUNG, 1980, p.492), pois ela está sempre
convertendo o mundo material em imagens. É dessa realidade profunda que
nasce um conhecimento verdadeiro da vida e suas leis fundamentais, sendo de
qualquer maneira, uma derivação disso, ou seja, a nossa maneira de entender
o mundo baseando-se na constatação de fatos e fenômenos exteriores,
comprováveis na pesquisa, na exatidão das descrições e comprovações de
hipóteses, deriva também dessa natureza profunda e obscura das imagens
inconscientes.

Como dito até então, não há o que apoie em nossa raiz extrovertida
uma mudança de autoliberação do espírito. Entretanto, talvez através de uma
ciência inclusiva, de uma técnica analítica que promova um deslocamento na
atitude consciente, algo de novo e com efeito compensatório.
(...) Existe, entretanto uma forma bastante moderna de psicologia – a
psicologia dita analítica ou complexa – segundo a qual há
possibilidade de que, no inconsciente ocorram determinados
processos que compensam, com seu simbolismo, as deficiências e os
desnorteamentos da atitude consciente, que podemos falar de um
novo nível de consciência. (...) Mas o processo inconsciente em si
nunca atinge a consciência, sem a ajuda da técnica. Quando é trazido
à tona, revela conteúdos que formam um notável contraste com a
orientação geral das idéias e dos sentimentos conscientes. Se assim
não fosse, tais conteúdos não teriam efeito compensatório. Mas o
primeiro resultado é um conflito, pois a atitude consciente opõe
resistência á penetração de tendências aparentemente incompatíveis
e estranhas. (Jung, 1980 p. 494)

Ultrapassando esse primeiro momento de resistência fica claro nos


depararmos com o fato de que, nada mais são do que nossas próprias imagens
encontradas nos contos de fadas, mitos ou várias outras formas arcaicas de
pensamento e expressão. Porém, no Ocidente, como é valorado como inferior
o que vem do inconsciente, a perspectiva consciente termina por sucumbir tais
conteúdos.

Ultimamente, a maioria dos estudiosos tem admitido que conteúdos


aparentemente sem sentido, tidos como obscuros, não mais devem ser
recalcados e sim aceitos. A permissão dessa mudança de ação traz ao
indivíduo conflitos, que deverão ser suportados. No início a impressão é de que
nenhuma solução será possível, e o que há a fazer é continuar suportando tais
fatos com paciência.

A estase assim verificada “constela” o inconsciente – ou, em outras


palavras, o protelamento consciente provoca uma nova reação
compensatória no inconsciente. Esta reação, que se manifesta
geralmente nos sonhos, é levada, então, ao plano da realização
consciente. A consciência se vê, desse modo, confrontada com um
novo aspecto da psique, e isto suscita um novo problema, ou modifica
inesperadamente os dados do problema existente. Este modo de
proceder dura até o momento em que o conflito original é resolvido de
maneira satisfatória. Todo esse processo é chamado de “função
transcendente”. Trata-se, ao mesmo tempo, de um processo e de um
método. A produção de compensações inconscientes é um processo
espontâneo, ao passo que a realização consciente é um método. A
função é chamada “transcendente” porque favorece a passagem de
uma constituição psíquica para outra, mediante a mútua confrontação
dos opostos. (Idem, p.495)

Constatamos que o processo e o método descritos acima viabilizam


os indicativos de trilha a seguir “àquele espírito com o qual nosso texto se
relaciona” (Jung, 1980, p.495). Sendo, portanto, inteligível agora as
manifestações do sentimento religioso, dos estados oníricos, e os mitos
presentes em todas as culturas, inclusive na oriental. Pois a formação de
imagens é própria da natureza do fenômeno psíquico. Isso é estruturalmente
inerente a todas as formas de percepção.

Pela função transcendente podemos acessar a “Unidade” e, a partir


daí, compreender o que leva o Oriente a acreditar na capacidade da
“autolibertação”, da autotransformação. Posto que, ao modificar a condição
psíquica pelo viés da introspecção, ocasionam-se no consciente as realizações
das compensações inconscientes. O resultado disso é a possibilidade de
conquistar as soluções necessárias ao encontro dos conflitos.

Ao finalizar o texto Jung expõe uma meta comum, relevante, entre a


tendência extrovertida do Ocidente e a tendência introvertida do Oriente. A
conclusão ao qual se chega é que em ambos os casos, há um esforço
desgovernado por sucumbir o que a vida tem de natural, o “opus contra
naturam”, refletindo a jovialidade do homem, iniciando o uso “da mais poderosa
das armas inventadas pela natureza: o espírito consciente” (Jung, 1980, p.499).
Quem sabe o amadurecimento do homem, seu entardecer, traga algo ainda
não vivido? Talvez, possamos deixar de lado as conquistas...
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tentamos expor neste trabalho o máximo de conhecimento adquirido


nas aulas e o que nos foi possível apreender mediante as leituras citadas nas
referências, restando-nos pouco agora a ser falado. Escolhemos assim, e
apenas para ilustrar, algumas colocações de Jung que se encontram no livro
“O Segredo da Flor de Ouro”.

A escolha se deu por elucidar através de seu conteúdo o lastro


necessário, a direção, para embasar sua psicologia. Valorizando a imagem, a
alma, a psique. Nas palavras do autor:

Minha admiração pelos filósofos do Oriente é tão indubitável quanto


irreverente minha posição relativamente à sua metafísica. Suspeito
de que fazem psicologia simbólica e seria um erro tomá-los
literalmente. Se se tratasse de metafísica, tal como pretendem, nada
seria mais inútil do que tentar compreendê-los, como também
tiraremos um grande proveito disso, porquanto essa assim chamada
“metafísica” tornar-se-á experimental. Se aceito que Deus é absoluto,
ultrapassando qualquer possibilidade da experiência humana, isso
me deixa indiferente. Não atuo sobre ele, nem ele sobre mim. Mas se,
pelo contrário, sei que é um poderoso impulso da minha alma, posso
tratar com ele; tornar-se-á importante, talvez de um modo
desagradável, na prática (por mais banal que isso possa soar), como
tudo aquilo que se manifesta na esfera do real. (JUNG, 2012, p.63).

Consideramos também a importância de colocar nessa conclusão,


filósofos não citados acima, tais como: Niesztche, Goethe, Paracelso, Nicolau
de Cusa - esses últimos expostos na tese de Nunes, citada como referência
bibliográfica neste trabalho -, e depois deles, tantos outros que vieram
juntamente com a revolução da física moderna, com suas consequências
transformadoras, criando assim a pós-modernidade, (citando Jung como um
dos seus precursores).
Mesmo sabendo que nas academias tais estudos são feitos
extensivamente, visando um olhar crítico acerca das ciências, ainda assim, o
pensamento objetificado sobre o mundo orienta nossas percepções. Com isso,
foi interessante perceber como várias críticas encontradas em nossa leitura se
fazem ainda tão atuais, já que, tanto Jung como demais pensadores fizeram
profundo questionamento desse olhar que “coisifica”, mexendo e
transformando silenciosamente as bases de nossos arraigados pressupostos
antropológicos. Vale ainda citar Jung no texto do Segredo da Flor de Ouro:

Tudo isto representa um degrau no processo de desenvolvimento de


uma consciência mais alta da humanidade, que se encontra a
caminho de metas desconhecidas, e não metafísicas em seu sentido
usual. Antes de tudo, nessa extensão, trata-se apenas de
“psicologia”, mas também nessa mesma extensão trata-se de algo
experimentável, compreensível e – graças a Deus – real, de uma
realidade com a qual podemos tratar, viva e rica de pressentimentos.
(JUNG, 2012, p.67)

Jung, além de tudo um grande observador, parece ter sido alguém


que entendeu nosso mundo profundamente e o aceitou como era. A partir de
nossas limitações, restrições, a partir da conformidade ao qual o cristianismo
faz parte, e, principalmente, de uma apropriação daquilo que ele se tornou
enquanto “filho” do ocidente. Viveu um mergulho em águas profundas do
mundo imaginal e retornava para nos contar. Confrontou o inconsciente, o
Ocidente, buscou entender o que havia do outro lado, no Oriente. Buscou
saber da Natureza.

“O poeta não morreu, foi ao inferno e voltou,


conheceu os Jardins do Éden, e nos contou.”

(Dulce Quental / Frejat, 1991)


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

HOMERO. Ilíada ([séc.XI/VII a.c.] 1959). Tradução de Carlos Alberto Nunes. 3ª


ed. São Paulo, SP: Edições Melhoramentos, 1962.

JUNG, C. G. Psicologia da religião ocidental e oriental. Petrópolis, RJ:


Vozes. 1980.

JUNG, C. G. / WILHELM, R. O segredo da flor de ouro. 14ª Ed. Petrópolis,


RJ: Vozes. 2012.

MARCONDES, D. Iniciação á história da filosofia: dos pré-socráticos a


Wittgenstein. 7ª ed. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar Ed., 2002.

MOSÉ, V. O homem que sabe: do homo sapiens à crise da razão. Rio de


Janeiro, RJ: Civilização Brasileira Ed., 2011.

NUNES; A. M. S. Possíveis implicações epistemológicas do conceito de


interação não-ordinária para a noção de sincronicidade de Jung.
Fundação Getúlio Vargas; Instituto superior de estudos e pesquisas
psicossociais; centro de pós-graduação em psicologia; Dissertação submetida
como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Psicologia. 1989.

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