Академический Документы
Профессиональный Документы
Культура Документы
Vou brigar
até ganhar', diz Lula
Ex-presidente diz à Folha que está preparado para ser preso, mas acredita que será
inocentado
1.mar.2018 às 2h00
Mônica Bergamo
SÃO PAULO O ex-presidente Lula recebeu a Folha em sua sala no Instituto Lula,
na terça-feira (27), para uma rara entrevista exclusiva.
Com a Justiça prestes a decidir se ele vai ou não preso por causa da
condenação (http://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/01/1953026-tribunal-aumenta-pena-e-condena-lula-a-12-
anos-e-um-mes-de-prisao.shtml) no processo do tríplex, o ex-presidente afirma que é
“um homem muito tranquilo, que sabe o que está sendo traçado para ele”.
Ainda assim, Lula rechaça abrir qualquer discussão sobre uma candidatura
alternativa à dele no PT. “Se eu fizer isso, minha filha, eu tô dando o fato
como consumado.”
Com o gravador já ligado, Lula disse: “A senhora pode perguntar tudo o que
vossa excelência quer perguntar. Tá? Não tem pergunta sem resposta. A não
ser que eu não saiba. Se eu não souber eu vou dizer ‘não sei’ e você vai
perguntar para um candidato que sabe”.
A seguir, um resumo da conversa.
Então o que eu espero? Que o Supremo Tribunal Federal [que deve julgar
habeas corpus em que Lula pede para não ser preso] analise o processo, veja
os depoimentos, as provas e tome uma decisão. Por isso tenho a crença de
que vou ser candidato.
O STF não entrará no mérito da sentença. E não haveria nem tempo, caso
isso ocorresse, para garantir a candidatura.
A Justiça não é uma coisa que você dá 24 horas, 24 dias ou 24 meses. Ela tem
o tempo necessário para fazer a investigação correta e punir quem está
errado. E quem deveria ser punido era o Moro, o MPF, a PF e os três juízes
que fizeram a sentença lá.
A segunda questão: não acho que ninguém acredita na possibilidade de eu
ser candidato. Era mais fácil o Ciro dizer “tem gente que não quer que Lula
seja candidato”. E ele quem sabe se inclui nisso.
E é importante ter em conta que o Temer teve uma vitória quando derrubou
o golpe que a TV Globo, o [ex-procurador-geral Rodrigo] Janot e o
[empresário] Joesley [Batista] tentaram dar nele.
Aquele golpe tinha como pressuposto básico o Temer cair, o Rodrigo Maia
[presidente da Câmara dos Deputados] assumir a presidência e o Janot ter
um terceiro mandato [na PGR].
Acho. Eu acho.
Porque era importante manter o Janot. Era importante tirar o Temer. E era
importante colocar o Rodrigo Maia. Isso para mim tá claro.
Da Rede Globo.
Você acha que na Globo [primeira reportagem sobre a delação da J&F foi
publicada por O Globo] alguém faz jornalismo livre? O jornalista decide e faz
uma denúncia como aquela que foi feita contra o Temer?
No mesmo dia já tinha jornalista apostando na renúncia do Temer. E já tava
se discutindo quem ia assumir e o que ia acontecer.
O senhor hoje faz críticas à TV Globo mas, no governo, teve uma boa
relação com a emissora.
Para não ser ingrato com os outros meios, eu vou olhar bem nos seus olhos e
dizer: duvido que em algum momento da história desse país um presidente
tenha tratado os meios de comunicação com a deferência e a
“republicanidade” que eu tratei.
Eu tinha uma relação maravilhosa com o velho [Octavio] Frias [de Oliveira,
publisher da Folha morto em 2007]. Eu tratei bem o Estadão. Eu tratei bem
o Jornal do Brasil, a Globo, a Bandeirantes, o SBT, a Record. Você há de convir
que tenho comportamento exemplar no meu tratamento com a imprensa
brasileira.
Mas acho que eles não são honestos na cobertura.
A Folha, mesmo nos bons tempos, nos anos 70, 75, quando começou a ser
um jornal mais progressista, quando o pessoal de esquerda começou a ler,
mesmo assim a gente sentia [no jornal] uma espécie de ojeriza de falar bem
de uma coisa boa.
É uma necessidade maluca de não parecer chapa branca. Ah, se fez uma
matéria boa hoje, amanhã tem que fazer outra dando um cacete.
Nesse sistema em que “eles” mandariam, o senhor foi eleito, reeleito, fez
uma sucessora e a reelegeu. Tinha uma convivência boa com
construtoras e bancos. Como dizer que a elite é contra o senhor?
Eu não tive uma relação boa só com esse setor que você falou. Eu tive uma
relação boa com todos os segmentos sociais desse país.
Uma coisa são os donos do banco. Outra coisa é um bando de yuppies, jovens
bem aquinhoados que vivem ganhando dinheiro através de bônus, de não sei
das quantas, para vender papel sem vender um produto.
Quando eu falo “eles” e “nós”, é porque você tem lado na política brasileira.
Quando ganhei as eleições, fiz questão de conquistar muita gente. Criei o
Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social [com
representantes de empresários, trabalhadores e setores sociais]. Tinha gente
que achava que eu queria criar uma fissura na relação entre Senado e
Câmara com a sociedade. Eu falei “não, eu quero é estabelecer uma política
de convivência verdadeira com a sociedade”.
Não. Esse é um outro tipo de processo. Não é o processo do qual estou sendo
vítima.
Essa pergunta eu espero que seja feita em juízo, pelo Moro. Porque primeiro
disseram que o sítio era meu. Aí descobriram que ele tem dono. Então
mudaram [para dizer que] me fizeram favor. Se fizeram, não me pediram. Eu
fiquei sabendo desse sítio no dia 15 de janeiro de 2011.
Não, você não é juíza. Eu vou esperar o juiz. Porque se eu responder para
você, o Moro vai fazer outras. Aí, quer discutir a questão da ética, vamos
discutir. É um outro processo.
Eu quero saber onde eles vão chegar. Eu quero saber o limite da mentira.
Segundo uma pesquisa do Datafolha, 83% acham que o senhor sabia que
tinha corrupção no governo. Era possível não saber?
É possível não saber até hoje. Você tem filho? Sabe o que ele está esta
fazendo agora? Quando você esta na cozinha e ele no quarto, você sabe?
Muita gente pensa que eu sou contra a Operação Lava Jato. Eu tenho orgulho
de pertencer a um partido e a um governo que criou os mecanismos mais
eficientes de combate à lavagem de dinheiro e à corrupção nesse país.
Veja, o que ocorreu com a Lava Jato? Ela virou refém da imprensa e vice-
versa.
O senhor faz uma conexão entre tudo isso e o que acontece com o senhor
agora?
Mas o senhor acha, por exemplo, que os procuradores da Lava Jato vão
aos EUA e se reúnem com um mentor?
Eu acho. Agora mesmo o Moro está lá [no exterior] para receber um prêmio
dessa Câmara de Comércio Brasil-EUA. Ele foi lá para ficar 14 dias. Eu já
recebi prêmios. Você vai num dia e volta no mesmo dia.
Ô, querida, não me peça provas de uma coisa que eu não tenho. Eu estou
apenas insinuando que pode ser, tal é a proximidade do Ministério Público
com a Secretaria de Justiça dos EUA.
Eu não tenho que encontrar saída. O que vocês da imprensa têm que pedir
são provas. Vocês não podem retratar “ipsis litteris” [como está escrito] a
mentira da Polícia Federal.
Essa gente está me acusando há cinco anos. Essa gente não sabe o mal que
causou à minha família. Eu tenho todos os meus filhos desempregados.
Todos. E ninguém consegue arrumar emprego.
Essa gente já foi na minha casa. Ficaram três horas, levantaram o colchão da
minha cama, revistaram tudo e não encontraram nada.
E o Palocci?
É uma pena. A história dele se esvaiu com isso. O Palocci demonstrou gostar
de dinheiro. Quem faz delação quer ficar com uma parte daquilo de que se
apoderou. Não vejo outra explicação.
Ou quer a liberdade.
Deixa eu te falar: você está lidando com um homem muito tranquilo, que
sabe o que está sendo traçado para ele. Desde o impeachment eu dizia: eles
não vão tirar a Dilma e dois anos depois deixar o Lula voltar gloriosamente
nos braços do povo. Era preciso impedir o Lula.
O senhor diz que sabe o que está sendo traçado. Mesmo assim, não abre
brecha para a discussão de uma outra candidatura?
Não abro. Não abro. Se eu fizer isso, minha filha, eu tô dando o fato como
consumado. Eu vou brigar até ganhar. E só vou aventar a possibilidade de
outra candidatura quando for confirmado definitivamente que não sou
candidato.
Eu não ando vendo o que o Ciro tá falando porque ele anda falando demais.
Eu fico fascinado de ver como uma pessoa inteligente como o Ciro fala tão
mal do PT. Não consigo entender.
Vamos ser francos: pela direita, ninguém será presidente sem o apoio dos
tucanos. Pela esquerda, ninguém será presidente sem o PT.
Eu, se entendo um pouco de política, vou dizer uma coisa: a disputa deverá
ser outra vez entre tucanos e PT.
O senhor pode ser preso em breve, caso não obtenha um habeas corpus
nos tribunais superiores. Não tem medo?
Sabe por que não tenho medo? Porque eu tenho a consciência tão tranquila.
Sabe do que eu tenho medo de verdade? É se esses caras pudessem mostrar
à minha bisneta que fez um ano no domingo que o bisavô dela roubou um
real. Isso realmente me mataria.
Há quem defenda que o senhor faça uma greve de fome caso vá para a
prisão.
Até porque não vou me matar. Eu gosto da vida pra cacete. E quero viver
muito. Tô achando que eu sou o cara que nasceu para viver 120 anos. Dizem
que ele já nasceu, quem sabe seja eu?
E o povo na rua?
Você não leva o povo na rua para qualquer coisa. Mas também não duvidem
do povo na rua porque ele pode vir.
Ele nunca foi chamado! Eu sou um homem tão civilizado, acredito tanto nas
instituições que estou apostando nelas. Eu ando no Brasil, mas eu não ando
chamando o povo numa pregação contra ninguém. Eu ando chamando o
povo para ele acreditar que é possível esse país ser diferente.
Estante da sala do ex-presidente Lula, no Instituto Lula - Marlene Bergamo/Folhapress
A ESTANTE DE LULA
Alguns livros que o ex-presidente guarda
Direito Penal
Juarez Cirino
Obra do criminalista que, ao defender o ex-presidente no caso tríplex,
discutiu com o juiz Sergio Moro