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A LITERATURA AFRICANA EM SALA DE AULA: FERRAMENTA NO

ENSINO-APRENDIZAGEM EM HISTÓRIA

Anne Cristine Prats Silva


Jennifer da Silva

Grupo de Trabalho – Cultura, Currículo e Saberes


Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo

A pesquisa apresentada tem como objetivo principal a reflexão acerca da utilização da


literatura africana em sala de aula, partindo da aprovação da Lei nº 10.369 que de forma
obrigatória insere nos estabelecimentos de ensino, o estudo sobre História e Cultura Afro-
Brasileira, incluindo também, o estudo da História da África, bem como a História dos
Africanos e a cultura negra no Brasil, assim como as contribuições deste para a formação
sociocultural e econômica que se tornam pertinentes à História do Brasil. Levando em
consideração, que a aprovação desta lei é recente, são poucas as ferramentas e metodologias
para a inclusão do ensino da História da África em sala de aula, pensando nesta defasagem
que nos propomos à elaboração desta pesquisa. Dentre a gama de escritores africanos que
poderiam ser utilizados para a fundamentação, optamos por autores de relevante importância
em seus países mátrios, pois os mesmos visam à quebra do paradigma eurocêntrico,
representando uma África contemporânea, são eles Agostinho Neto, Chinua Achebe e
Pepetela, autores esses de resistência ao colonialismo, desenvolvendo um discurso político e
buscando a reestruturação da identidade africana, temas esses que são pertinentes ao ensino
de História e passíveis a interdisciplinaridade com a Literatura. Iniciamos com a análise da
representação literária como fonte histórica e a empregabilidade da mesma em sala de aula.
Concluímos que a utilização da Literatura africana em sala de aula se torna uma ferramenta no
ensino e aprendizagem de História do Brasil, para uma melhor compreensão e reflexão da
nossa própria História, elucidando as inter-relações entre o continente africano e o americano.

Palavras-chave: História da África. História e Literatura em sala de aula. Ensino-


aprendizagem.

Introdução

Com a aprovação da Lei nº 10.6391, dia 09 de janeiro de 2003, que de forma


obrigatória insere o estudo da história e cultura afrodescendente e a cultura afro-brasileira, no

1
A lei nº 10639, de 09 de janeiro de 2003, altera a lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e passa a vigorar
acrescida dos seguintes arts. 26-A 79-A e 79-B: "Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e

ISSN 2176-1396
22859

ensino básico brasileiro, ou seja, Ensino Fundamental e Médio inicia-se, uma série de
discussão e reflexão acerca do tema, possibilitando uma educação multicultural brasileira.
Embora essa área de pesquisa já tenha sido abordada por diversos pesquisadores na área de
humanas, as crianças e os adolescentes ainda não têm um contato com essa temática, como
coloca o doutor em história da educação da Universidade de São Paulo, José Ricardo Oriá
Fernandes:

Todos, a par de suas diferentes posições político-ideológicas, são unânimes em


concordar que a característica marcante de nossa cultura é a riqueza de sua
diversidade, resultado de nosso processo histórico-social e das dimensões
continentais de nossa territorialidade. (FERNANDES, 2005, p. 379)

A diversidade da cultura brasileira possibilita a quebra do pensamento eurocentrista 2, e


essa nova lei capacita os docentes a terem um contato prévio com a História africana, por
conseguinte através de uma reflexão proposta pelos professores, terem uma visão
multicultural assim como é seu país.
A História da África no currículo básico é importante também para os mestiços e
negros, esses que são maioria na população brasileira, segundo o último Censo do IBGE do
ano 2010, é apontado um número maior de negros e mestiços no Brasil. Pelos dados, aqueles
que se declaram brancos são 47,73% (91 milhões da população) enquanto aqueles que se
declaram como negros ou mestiços atingem 50,7% da porcentagem (97 milhões), portanto
novamente se faz relevante o ensino de História da África para que essa população tenha
consciência de suas raízes culturais e históricas.
A relação do Brasil com a África historicamente vem desde o período colonial quando
os escravos negros chegaram ao litoral brasileiro, como coloca o autor Visentini: “A História
da África e do Brasil estão intimamente relacionadas desde o momento em que os
colonizadores portugueses ocuparam as duas margens do Oceano Atlântico Sul, no século
XVI” (2014, p. 188), além desta ligação e conectando com o alto número de pessoas que se
consideram negro como consta nos dados do IBGE, podemos colocar assim como o autor

Médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira. ß 1º O
conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluir· o estudo da História da África e dos
Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional,
resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil. ß
2º Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira ser„o ministrados no âmbito de todo o currículo
escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras". Art. 79-B O
calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacional da Consciência Negra. (PLANALTO DO
GOVERNO)
2
O eurocentrismo é aqui pensado como ideologia e paradigma, cujo cerne é uma estrutura mental de caráter
provinciano, fundada na crença da superioridade do modo de vida e do desenvolvimento europeu-ocidental.
(BARBOSA, 2008, p. 2)
22860

Visentini, que o Brasil passou por uma africanização: “Como visto antes, durante a colônia e
a maior parte do império, milhões de africanos foram trazidos para o Brasil, fazendo com que
a europeização das novas terras fosse acompanhada por uma africanização. A historiografia
destaca a contribuição africana para a formação da sociedade brasileira na cultura, arte e
religião [...]” (2014, p. 189).
Assim como demostra o historiador a cultura africana contribuiu para a construção da
cultura brasileira e, para melhor compreensão de nossa cultura, a partir do estudo de História
da África e dos africanos, podemos notar as semelhanças entre o nosso país e esse continente.
No que diz respeito à influência cultural foi expressiva, no caso da comunicação popular onde
nos aproximamos mais do negro do que do nosso indígena, como coloca a autora Castro,
baseando-se em Gladstone Chaves de Melo:

Temos que a influência africana no português popular do Brasil foi mais profunda
que a do Tupi embora menos extensa. Explico-me. O negro escravo terá atingido
mais facilmente e mais intensamente a fonética e a morfologia da língua que o índio,
que por sua vez legou um vocabulário muito mais considerável e numeroso. Eu diria
que a influência tupi foi mais horizontal ao passo que a africana foi mais vertical.
Simplesmente a África veio ao Brasil para se abrasileirar. O azeite de dênde (o
dendêm da Angola) temperou nossa comida; as palavras molambo, moleque, caçula,
quiabo e as próprias cacimbas com a mesma origem do cachimbo, o pequeno forno
de fumar que tem a mesma forma dos poços africanos, enriquecem a língua
portuguesa. (CASTRO, 1981, p. 196).

São exemplos como o que autora coloca que devemos passar aos nossos alunos para
que de forma prática e cotidiana, para que eles percebam a influência africana no seu dia-a-
dia.
Com isso em mente colocamos o uso da literatura africana como fonte histórica, sendo
a partir dessa apresentada as representações da África por autores africanos, demostrando a
visão do africano por sua terra, seu povo e sua cultura, cultura essa que é um mescla de outras
culturas é que por meio de sua literatura e seu discurso busca romper o seu colonialismo e
demostrar quem são e como é sua terra nas suas perspectivas:

Sendo o continente africano uma mescla de culturas e tendo sofrido permanente


exploração e saques dos povos que ali aportavam, os quais deixaram suas marcas ao
impor a visão do colonizador, foi preciso que vozes se insurgissem para retomar
aquilo que lhes pertencia: sua terra. E coube àqueles que se fizeram ouvir, sacudir,
pela linguagem, as mentes amedrontadas e entorpecidas pela servidão. São, pois, os
autores que, pretendendo a reconquista do território através da palavra, dão aos seus
textos um caráter de posse e de pertencimento. E é explorando esse discurso, cuja
função referencial pode obscurecer o poético ou ser obscurecida por ele, é que
compartilhamos a vida de seus habitantes. (BARRETO, 2005, p. 61).
22861

A Literatura africana pós-colonial se baseia, no romantismo e modernismo brasileiro,


mas um aspecto que nos aproxima da cultura africana e dos africanos, o autor Chaves coloca
que após 22 anos da sua independência o autor Pepetela para construção do nacionalismo na
Angola:

Com décadas de diferença, os escritores angolanos passam pela experiência que


viveram os nossos românticos e reviveram, de maneira diferenciada, os nossos
modernistas: fazer uma literatura que interviesse no processo de definição do país.
Se a questão parece-nos antiga, há que recordar que o país é novo: passaram-se
apenas 22 anos desde a sua independência e o problema da função da obra literária e
do papel social do escritor se recoloca, senão com outras cores, pelo menos, com
novos matizes. (CHAVES, 1999, p. 218)

Foi desta maneira que desenvolvemos o PIBIC3 da PUC-PR durante o ano de 2014,
onde buscamos nas representações literárias conceitos socioculturais apresentados pelos
autores em suas respectivas obras, apresentaremos os resultados de nossa pesquisa também
nesta comunicação e a empregabilidade dessa pesquisa na sala de aula, pois foi durante este
projeto que conseguimos observar a representação da África por africanos e fazer uma quebra
de paradigma4 e descobrir uma África que busca por sua identidade, que se difere da África
tribal que estamos habituados a conhecer.

História e Literatura em sala de aula

A interdisciplinaridade5 possibilita que o professor de história trabalhe paralelamente


com a literatura, a partir de autores que utilizamos em nossa pesquisa conseguimos obter
alguns resultados que abordam a literatura africana em sala de aula, utilizamos o poeta
Agostinho Neto, os romancistas Pepetela e Chinua Achebe, os quais representam uma África
contemporânea e os embates que os africanos sofrem neste nos contextos abordados. Com
essa metodologia História/Literatura damos aos docentes uma visão crítica da realidade e
compreensão da busca da literatura africana por uma autonomia: “Parece ser a escrita literária
a que possibilita a leitura crítica da realidade, ao revolver as camadas profundas do imaginário
social e cultural. Todas as denominações que possam surgir em relação à literatura africana,

3
Projeto de Iniciação Cientifica
4
Definido geralmente como modelo, exemplar ou padrão [...] (OUTHWIT, 1996, p. 554)
5
A interdisciplinaridade no campo da ciência corresponde à necessidade de superar a visão fragmentadora de
produção do conhecimento, como também de articular e produzir coerência entre os múltiplos fragmentos que
estão postos no acervo de conhecimentos da humanidade. “Trata-se de um reforço no sentido de promover a
elaboração de síntese que desenvolvam a continua recomposição da unidade entre as múltiplas representações
das unidades da realidade”. (LUCK, [s.d.], p.23)
22862

talvez sejam o reflexo das muitas tentativas de reconhecimento e de aceitação de sua


autonomia.” (BARRETO, 2005, p. 62).
Para uma leitura histórica e crítica das obras proposta é ideal elucidar alguns aspectos
em relação ao autor como, do seu contexto e sua temporalidade, assim como deixa claro o
autor Santos:

No que se refere à instância da escrita ou da produção do texto, o historiador volta-


se para saber sobre quem fala de onde fala e que linguagem usa. Já ao enfocar o
texto em si, o que se fala e como se fala são questões indispensáveis. No trato da
recepção, visa abordar a leitura de um determinado receptor/leitor ou de um grupo
de receptor/leitores, tratando das expectativas de quem recebe o texto, de sua
contemplação, ou seu enfrentamento ou resistência a ele. (SANTOS, 2009, p. 03)

As questões apontadas pelo historiador á cima devem ser repassadas, pelo professor e
compreendidas pelos alunos, assim conseguiram fazer uma reflexão mais aprofundada em
relação aos textos e captar a relevância do contexto para os autores, tal como os indivíduos
são influenciados por seus contextos.
No caso do Agostinho Neto em suas obras: “Á reconquista”, “Do povo buscamos a
força” e “Ninguém nos fara calar Ninguém nos poderá impedir” (NETO, 1985, p. 58), que o
autor representa o racismo6, nacionalismo, a negritude e pôr fim a identidade africana que
neste contexto eles tentavam desenvolver. Por serem poemas curtos, em média seis estrofes
por poema facilita o uso em sala de aula e coloca o aluno a vivenciar a análise de fonte
primária, já mantendo contato a produção histórica. Deve-se destacar que a literatura poética
foi o que prevaleceu durante o período e também o que se destacou pela busca da identidade:
“No que diz respeito à produção literária, prevalece o trabalho poético, no período que
antecedeu à independência das colônias africanas, cuja temática estava voltada à busca da
identidade, às raízes africanas. É uma poesia engajada, acusatória e de caráter social.”
(BARRETO, 2005, p. 62-63).
Dentro da análise de Agostinho Neto também poderemos trabalhar sua relevância
histórica, já que o autor, foi o primeiro presidente da Angola, fazendo um paralelo em como a
população via esses guerrilheiros, levando em consideração que o primeiro presidente da
Angola livre foi um guerrilheiro, e trabalhar também a tentativa de um marxismo na África.

6
RACISMO (in. Racialism. fr. Racisme. ai. Rcissisnws; it. Rnzzismo). Doutrina segundo a qual todas as
manifestações histórico-sociais do homem e os seus valores (ou desvalores) dependem da raça; também segundo
essa doutrina existe uma raça superior ("ariana" ou "nórdica") que se destina a dirigir o gênero humano.
(ABBAGNANO, 2007, p. 822)
22863

Os poemas de Agostinho Neto podem ser discutidos em sala de aula em relação à paz:
o autor deixa claro em um dos seus poemas que a paz, em “A reconquista” tem a aspiração
pela paz, no fechamento do poema: “Vamos com toda humanidade conquistar o nosso mundo
e a nossa paz” (NETO, 1985, p.58), esses versos podem ser a tentativa de transmissão da paz
aos seus leitores.
O autor Pepetela desenvolve em “A geração a Utopia” representações sobre a
guerrilha, o que torna mais fácil direcionar esse livro ao Ensino Médio, levando em
consideração o seu conteúdo mais adulto e apresentar conteúdo do tipo sexual. No entanto seu
romance transmite todos os aspectos presentes nos poemas de Agostinho Neto, porém por
distanciamento do fato, já que Pepetela publica 10 anos mais tarde seu livro. Portanto,
podemos notar uma maior reflexão acerca do tema desenvolvido: Descolonização e
Independência da Angola.
Os dois autores foram guerrilheiros da luta pela independência e com o uso de suas
literaturas o professor pode também abordar suas bibliografias para melhor compreensão da
representação que eles abordam, ou em outra possibilidade elaborar uma pesquisa na turma,
onde os estudantes iram buscar as biografias dos autores, podendo essa pesquisa ser
individual ou em grupo e para finalizar exposta aos colegas e ao professor em uma aula
dialogada.
Os dois autores são angolanos e fazem parte da escola literária angolana denominada
de Negritude:

Entre os frequentadores dos salões literários da Tia Andreza figuravam, além de


Agostinho Neto, outros angolanos, como Mário Pinto de Andrade, Lúcio Lara e
Humberto Machado, os poetas santomenses Francisco José Tenreiro e Alda do
Espírito Santo, o guineense Amílcar Cabral e a poetisa Noémia de Souza. A todos
animava, segundo Mário Pinto de Andrade, “o retorno ás fontes, a redescoberta do
“eu” africano e a reafricanização”. Trata-se a final, da réplica lisboeta de um
movimento universal de afirmação da identidade cultural africana (liberado por
Nicolás Guillén, Sédar Senghor, Aimé Césaire e outros), que se implantaria com o
nome de “negritude” e que em Luanda encontraria equivalência na corrente literária
“Vamos descobrir Angola”. (BARRADAS, 2005, p. 26)

Como abordado por Barradas, à escola literária nasce na busca de uma identidade
nacional e cultural, o interessante é mostrar ao aluno a proximidade da Angola com o Brasil,
não só por compartilharem o mesmo colonizador ou a mesma língua, mas sim uma cultura
muito próxima: como destacamos, anteriormente.
A literatura da negritude se baseou no modernismo brasileiro, para quebrar com o
colonialismo e, buscar uma interlocução que encontraram no modernismo brasileiro: “Em
22864

razão disso, tornou-se necessário estabelecer o diálogo com outro universo cultural, que não o
estreito mundo colonial e salazarista e a interlocução escolhida foram à produção cultural
brasileira, o que, última instância, propiciou a dinamização das reflexões sobre os caminhos
da sua própria produção literária.” (MACEDO, 2009, p.17-18). Portanto, apresentando esses
aspectos de semelhanças para os alunos na tentativa de aguçar a curiosidade em relação à
História da África e à literatura africana.
Já no que diz respeito ao conteúdo das obras literárias, destacaremos algumas
abordagens pertinentes à sala de aula. No caso de Agostinho Neto a exposição dos poemas
pode ser feita em sala de aula visando uma reflexão sobre a questão do negro, a quebra com o
eurocentrismo e a busca da identidade como o autor coloca: “Vem comigo África dos palcos
ocidentais descobrir o mundo real onde milhões se irmanam da mesma miséria atrás das
fachadas de democracia [cristianismo de igualdade]” (NETO, 1985, p. 58). A busca de
liberdade também é representada na obra do escritor: “Ninguém nos fara calar Ninguém nos
poderá impedir” (NETO, 1985, p. 58), a partir desse trecho podemos trabalhar com os
estudantes a importância de se posicionarem e lutarem por seus direitos. Por fim um trecho de
representação do racismo para Agostinho Neto: “Não chores África dos que partiram olhemos
com claro para os ombros encurvados do [povo que desce a calçada negro negro de miséria
negro de frustação negro de ânsia]” (NETO, 1985. p. 58), a questão racial pode ser abordada
com base nos direitos humanos e legislações a cerca de preconceito racial, o ideal é sempre
mostrar a proximidade do contexto com o nosso, elucidando com exemplos práticas, para
melhor compreensão do aluno.
O escritor Pepetela, por sua vez, em seu livro utiliza um viés bem interessante a ser
abordado por professores da área de humanas, ele retrata o racismo não somente como um
carácter pertinente ao negro, mas também ao branco africano durante o período de
descolonização e século XX: O autor elabora um casal inter-racial Sara (africana, estudante de
medicina, de classe alta que reside em Lisboa) e Malongo (africano, negro, residente de
Lisboa e tem como profissão jogador de futebol), e representa a dificuldade de um casal inter-
racial se relacionar na Lisboa que o escrito representa:
22865

[...] Caminharam até a paragem de autocarro. Estava uma grande bicha e as pessoas
olhavam sorrateiramente para eles. Sara leu reprovação nos olhos das mulheres.
Também já estou a entrar na paranoia, só nos miram por curiosidade.
Irresistivelmente fez uma coisa que geralmente evitava, por não ser comum em
Lisboa. Deu um rápido beijo na boca de Malongo. Ele admirou-se, mas
correspondeu. Beijo breve, um roçar de lábios apenas. Era impressão dela ou facto
houve um movimento de rejeição na bicha de espera? Um velho olhou agora
ostensivamente para os dois, parecia ia dizer alguma coisa. Sara convenceu-se, não
era paranoia dela, o velho não escondia a reprovação muda. (PEPETELA, 2000,
p.70)

A personagem Sara não sofre somente racismo por seu relacionamento, mas por sua
cor, sendo ela branca mesmo nascida e criada na África ainda sofre pela desconfiança de seus
conterrâneos:

[...] O racismo de um lado provoca o racismo do outro. Hoje o branco nacionalista é


olhado com desconfiança pelos nacionalistas negros. A cor a contar mais que as
ideias, que os comportamentos. É triste mas é uma realidade. Pode durar ou ser
ultrapassada quem pode adivinhar? (PEPETELA, 2000, p. 110)

Outra passagem ideal para trabalhar eurocentrismo com os alunos, é o inicio do livro
de Pepetela, o autor se coloca em primeira pessoa se mostrando ao leitor e descrevendo como
foi sua entrada na Faculdade de Letras em Lisboa, por meio de uma entrevista onde o autor
sofreu diretamente o eurocentrismo português:

Na prova oral de Aptidão á Faculdade de Letras, em Lisboa, o examinador fez uma


pergunta ao futuro escritor. Este respondeu hesitantemente, iniciando com um,
portanto. De onde é o senhor?, perguntou o Professor, ao que o escritor respondeu
de Angola. Logo vi que não sabia falar português; então desconhece que a palavra,
portanto só se utiliza como conclusão de raciocínio? Assim mesmo, para pôr o
examinado á vontade. (PEPETELA. 2000, p. 9)

Este foi o único momento em que o escritor relata uma experiência sua durante o livro,
no entanto, é um aspecto á ser mencionado pelo docente aos seus discentes.
Com a leitura do livro e a percepção do racismo descrito pelo autor, há a possibilidade
de fazer uma discussão com os alunos sobre o racismo, destacar e elucidar sobre pontos de
vistas diferentes, acerca do mesmo tema podendo também fazer um paralelo com as obras de
Agostinho Neto.
O choque cultural, é um aspecto que o estudo e exposição da História africana
permitem, sendo o choque entre os negros e brancos no Brasil, ou dos europeus aos
subsaarianos durante o século XIV, o autor Pepetela traduz um pouco desse choque cultural
em sua obra, representando o choque com a personagem Sara em Lisboa, quando começa a
22866

conhecer a cultura africana em debates em uma casa de estudantes, que em sua maioria são
africanos:

Foram anos de descoberta da terra ausente. E dos seus anseios de mudança.


Conversas na Casa dos Estudantes do Império, onde se reunia a juventude vinda da
África. Conferências e palestras sobre a realidade das colônias. As primeiras leituras
de poemas e contos que apontavam uma ordem diferente. E ali, no centro do mesmo
império, Sara descobriu a sua diferença cultural em relação aos portugueses. Foi um
caminho longo e perturbador. Chegou à conclusão que o batuque ouvido na infância
apontava outro rumo, não o do fado português. (PEPETELA, 2000, p. 11)

Nesse trecho podemos notar também, a busca de uma identidade nacional e a


comunicação com o modernismo brasileiro.
No que diz respeito a busca de uma identidade nacional, suas formas de apresentação
de elementos de caracterização e construção, assim como as linhas que se cruzam entre os
valores tradicionais africanos e o mundo ocidental, outro autor que pode ser inserido nesse
âmbito é romancista nigeriano Chinua Achebe. Nascido no ano de 1930, em Ogidi uma
cidade localizada na Nigéria, é pertencente à etnia Ibo. No que se referem aos Igbo, os
mesmos viviam em pequenos estados, geralmente de forma igualitária e interligados por redes
de rotas de comércio de mercadórias. Em 1807, quando os ingleses adentram na região
conhecida como Nigéria, os mesmos tinham objetivos científicos e missionários cristãos. No
ano de 1953, formou – se em Letras na Universidade de Ibadan e após o massacre dos Ibos no
norte da Nigéria, no ano de 1966, Achebe aderiu à luta deste povo. Atuou na diplomacia
durante os conflitos entre o governo da Nigéria e o povo Ibo, que ocorreram no final da
década de 1960. No ano de 1972, a Universidade de Dartmouth, nos Estados Unidos, atribui-
lhe um título honorífico de Doutor em Letras, devido a sua contribuição para a literatura
mundial. A obra “O mundo se despedaça” (“Things fall apart” título original em inglês)
publicado em 1958, foi o seu primeiro romance e depressa se tornou conhecido, tornando
Chinua Achebe um autor à escala internacional, tendo esta obra traduzida em diversas línguas.
Em sua obra, Chinua Achebe trata da reconstrução da identidade africana, bem como
da identidade Igbo-nigeriana, a ideia de nação e o nacionalismo em sua emergência, os
aspectos culturais e suas principais características, costumes e ritos, o choque e
consequentemente a ruptura cultural entre os valores tradicionais africanos e o contato com o
mundo ocidental, após a chegada dos europeus na aldeia Igbo. Chinua Achebe também é
reconhecido por relacionar em suas obras História e Literatura, tal característica que também
pode ser inserida em sala de aula e proposta aos alunos, para que os mesmos possam refletir
de que maneira as duas disciplinas podem ser utilizadas e analisadas na obra do autor
22867

especificadamente, além disso, em “O mundo se despedaça” (Things fall apart), História e


ficção são intencionalmente conjugadas. E, segundo a autora Alyxandra Gomes
Nunes7(2010), “um romance como Things fall apart, confirma a compreensão de que através da
história e da memória resistimos.” É válido ressaltar que ao realizar um estudo sob uma obra
literária em sala de aula, é importante a leitura atenta tendo como principal objetivo estar
identificando os principais elementos que caracterizam determinado texto, como por exemplo, a
sua literalidade, a mesma que pode ser compreendida como o principal conjunto de características
tidas como específicas (sejam elas linguísticas, semióticas, sociológicas, culturais, criteriosa) que
caracterizam o texto como literário.
Dentre os temas que podem ser abordados em sala de aula, levando em consideração à
análise da obra de Chinua Achebe, estão: a tradição do povo Igbo, neste caso a valorização de
suas tradições orais, provérbios, lendas e cantigas, a religiosidade e a doutrinação européia, o
nacionalismo Igbo-nigeriano, a função da mulher nessa sociedade, oposição cultural, a
formação de uma nação, bem como a sua resistência, a Nigéria em contato com os europeus,
como se deu a ruptura agenciada pelo colonizador, de que forma pode – se perceber a relação
entre o colonizado e o colonizador, além de outras perspectivas que giram em torno das
questões literárias e linguísticas que podem ser notadas durante a leitura da obra.
Sabendo que a produção literária advinda do continente africano, tendo em vista sua
variedade, bem como sua complexidade e sua riqueza tanto na questão literária quanto no que
se refere à tradição, é de extrema importância à análise das representações da África a partir
de sua literatura, pois a mesma possui vários níveis, do cultural ao social, do histórico ao
político. Após a descolonização, ocorreu um impulso no campo literário africano, o mesmo
que passou por um processo de reformulação. Sendo assim, a literatura africana tornou – se
mais acessível, mais procurada, mais lida e também estudada. Pode–se compreender a
literatura pós–colonial como um comprometimento através de um discurso político com a
crítica ao período de colonização. Tal crítica ocorre através das narrativas, como sustenta a
autora Rosase Vieira Pezzodipane 8:

7
Doutoranda em Estudos Étnicos e Africanos pela Universidade Federal da Bahia.
8
Graduada em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
22868

Na discussão de suas próprias histórias que vão sustentar essa crítica. Tendo
vivenciado a experiência colonial e os processos brutais que ela impõe: a
dominação, a desumanização, a realocação, a perda de identidade, a diáspora, o
preconceito racial, a tortura, a banalização da vida, enfim, toda a insensatez que a
natureza humana em desequilíbrio pode acionar, eles se tornam porta-vozes
legítimos do pós-colonial. (PEZZODIPANE, 2013, p. 89).

Além dos autores citados durante esta pesquisa, podemos utilizar outros autores como
Alda Lara, Costa Andrade, Eduardo Boavena, Armando Artur, Luís Carlos Patraquim,
Eduardo White, Jorge Barbosa, Corsino Fortes, Vasco Cabral, Hélder Proença, entre outros.

Considerações finais

Com a elaboração desta pesquisa, concluímos que o estudo de História da África é


relevante à criança e ao adolescente em diferentes aspectos e a utilização de literatura africana
em sala de aula possibilita um novo olhar sob a cultura africana, sendo esta uma das bases
socioculturais brasileira.
São diversas as possibilidades metodológicas da empregabilidade da literatura em sala
de aula, bem como da interdisciplinaridade entre História e Literatura, que possibilita um
diálogo e uma reflexão entre as outras áreas de humanas no currículo escolar, além de
fomentar a discussão e o debate acerca dos temas.

REFERÊNCIAS

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

BARRADAS, Acácio. Agostinho neto uma vida sem tréguas: 1922- 1979. Luanda:
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História da África e de Estudos da Diáspora Africana, São Paulo, n 1, p. 46- 63, 2008.
Disponível em:< file:///C:/Users/anne/Downloads/88723-126110-1-SM.pdf>. Acesso em: 13
jun. de 2015.

BARRETO, Eneida M.W.M. Literatura Africana em sala de aula. Cad. Cedes, Campinas,
vol. 25, n. 67, p. 378-388, set./dez. 2005. Disponível em:
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1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo
oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e
dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 10 jan. 2003.
22869

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Janeiro: Biblioteca do exército editora, 1981.

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FERNANDES, José Ricardo Oriá. Ensino de História e Diversidade Cultural: Desafios e


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