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ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

MECANISMO ESTADUAL DE PREVENÇÃO E COMBATE À TORTURA

Diagnóstico sobre as condições de detenção nas unidades de regime semiaberto no


sistema prisional do Rio de Janeiro, diante da proibição da tortura e maus-tratos

Informe para a Corte Interamericana de Direitos Humanos para o caso das


Medidas Provisórias a respeito do Brasil: assuntos da Unidade de Internação
Socioeducativa, do Complexo Penitenciário de Curado, do Complexo Penitenciário de
Pedrinhas e do Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho

Organização autora:

Membros do MEPCT/RJ:
Alexandre Campbell, Fabio de Almeida Cascardo, Graziela Contessoto Sereno,
Vera Lucia Alves, Patrícia de Oliveira e Renata V. Côrtes de Lira

Rio de Janeiro, 17 de maio de 2017

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Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura
Rua Primeiro de Março, S/N. Sala 208. Centro. Rio de Janeiro-RJ. CEP: 20010-090
Tel. 25881385. Fax 25881563 Email: mecanismorj@gmail.com
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MECANISMO ESTADUAL DE PREVENÇÃO E COMBATE À TORTURA

Sumário

1. Apresentação…………………………………………………………………...…..04

2. O MEPCT/RJ……………………………………………………………………....05

3. O regime semiaberto na execução penal brasileira …………………………....…..09


a. A execução penal brasileira …………………………………………….…09
i. Direitos do Preso…………………………………………………...12
ii. Órgãos da Execução Penal……………………………………....…15
iii. Regimes de Cumprimento de Pena………………………………...15
iv. Regime Fechado………………………………………………....…16
v. Regime Semiaberto………………………………………………...17
vi. Regime Aberto……………………………………………………..17
vii. Progressão de Regime……………………………………………..19
viii. Requisitos Formais………………………………………………...21
ix. Progressão de Regime nos Crimes Hediondos…………………….22

4. As unidades de regime semiaberto da SEAP……………………………………....22


a. Capacidade e efetivo prisional das unidades……………………………….25
b. Condições de detenção……………………………………………………..28
i. Alimentação………………………………………………………..30
ii. Higiene e acesso à água………………………………………….…32

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iii. Atividades físicas, intelectuais e laborais…………………………..36


iv. Saúde……………………………………………………………….41
v. Disciplina e punição física………………………………………....47
vi. Superlotação………………………………………………………..52

5. Considerações finais……………………………………………………………..…55

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1. Apresentação

O presente informe tem como objetivo subsidiar a Corte Interamericana de Direitos


Humanos (doravante “a Corte”) nas Medidas Provisórias exigidas em face do Estado
brasileiro, relativas à Resolução de 13 de fevereiro de 2017, sobre a unidade de internação
socioeducativa, do Complexo Penitenciário de Curado, do Complexo Penitenciário de
Pedrinhas e do Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho - SEAPPC, todos espaços de
privação de liberdade em território brasileiro.

Mais especificamente, o Mecanismo estadual de Prevenção e Combate à Tortura do


Rio de Janeiro (doravante “o MEPCT/RJ”) apresentará à Corte dados concernentes ao
sistema prisional do estado do Rio de Janeiro, para que sirvam como elementos factuais a
auxiliar nas decisões relativas às medidas provisórias sobre o Instituto Penal Plácido de Sá
Carvalho - SEAPPC, localizada no Complexo Prisional de Gericinó, no Rio de Janeiro.

Desse modo, o MEPCT/RJ visa oferecer um ​diagnóstico sobre as condições de


detenção nas unidades de regime semiaberto no sistema prisional do Rio de Janeiro, diante
da proibição da tortura e maus-tratos​. Ao fazê-lo, leva-se em consideração a forma como
se organiza o sistema prisional fluminense, que possibilita a transferência de presos entre
diferentes unidades prisionais por mero ato administrativo da Secretaria de estado de
Administração Penitenciária (doravante “a SEAP”), desde que respeitado o regime de
cumprimento de pena de determinado preso. Desse modo, as pessoas ora custodiada no
Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho - SEAPPC podem em tese, a qualquer momento,

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passar a cumprir pena em outros dez estabelecimentos penais do sistema prisional, tornando
pertinente apresentar as condições de detenção nos mesmos.

Tal diagnóstico leva em consideração a metodologia de trabalho adotada pelo


MEPCT/RJ, em estrito cumprimento aos ditames adotados no Protocolo Facultativo à
Convenção contra a Tortura da ONU, a partir das visitas regulares de monitoramento de
espaços de privação de liberdade realizadas nos últimos seis anos, todas de acordo com as
boas práticas indicadas no guia ​Monitoramento de Locais de Detenção: Um guia prático ​da
Associação para Prevenção à Tortura.

2. O MEPCT/RJ

O Mecanismo estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro é um


órgão criado pela Lei Estadual n.º 5.778, de 30 de junho de 2010. O órgão está vinculado à
Assembleia Legislativa do estado do Rio de Janeiro (doravante “a Alerj”) e tem como
objetivo planejar, realizar e conduzir visitas periódicas e regulares a espaços de privação de
liberdade, qualquer que seja a forma ou fundamento de detenção, aprisionamento,
contenção ou colocação em estabelecimento público ou privado de controle, vigilância,
internação, abrigo ou tratamento, para verificar as condições em que se encontram
submetidas as pessoas privadas de liberdade. O intuito do trabalho desenvolvido pelo
MEPCT/RJ é prevenir a prática da tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos
e degradantes.

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O MEPCT/RJ resulta do processo de estabelecimento, pelo Estado Brasileiro, das


diretrizes contidas no Protocolo Facultativo à Convenção contra Tortura e Outros
Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes da Organização das Nações
Unidas (OPCAT), ratificado pelo país no ano de 2007. ​O referido Protocolo decorre do
acúmulo estabelecido na Conferência Mundial de Direitos Humanos da ONU realizada em
1993, na qual se declarou firmemente que os esforços para erradicar a tortura devem,
principalmente, concentrar-se na prevenção, designando para tanto, o estabelecimento de
um sistema preventivo de visitas regulares a centros de detenção.

Além disso, a criação de Mecanismos Preventivos de monitoramento dos locais de


privação de liberdade integra as prerrogativas do Plano de Ações Integradas para a
Prevenção e o Combate à Tortura no Brasil, de 2006, bem como o Plano Nacional de
Direitos Humanos III da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.
Neste sentido, o estado do Rio de Janeiro coloca-se em posição de pioneirismo na
Federação, salientando o compromisso com a implementação do referido ​Plano​ de ​Ações​,
com a defesa dos direitos humanos e a consolidação de princípios democráticos.

De acordo com o OPCAT, os mecanismos têm como atribuição recomendar


medidas para a adequação dos espaços de privação de liberdade aos parâmetros
internacionais e nacionais e acompanhar as medidas implementadas para atender às
recomendações. Nesse sentido, entende-se como trabalho de prevenção à tortura e outros
tratamentos ou penas cruéis, desumanos e degradantes​“desde a análise de instrumentos
internacionais de proteção até o exame das condições materiais de detenção, considerando

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políticas públicas, orçamentos, regulações, orientações escritas e conceitos teóricos que


explicam os atos e omissões que impedem a aplicação de princípios universais em
condições locais”​.1

Portanto, o propósito fundamental do mandato preventivo é o de “​identificação do


risco de tortura”2, que se dá a partir da ação proativa de monitoramento de centros de
privação de liberdade, buscando prevenir que as violações aconteçam. O enfoque
preventivo do MEPCT/RJ se baseia na premissa de um diálogo cooperativo com as
autoridades competentes para coibição da tortura e outros tratamentos desumanos,
degradantes e cruéis à pessoa privada de liberdade. Desta forma, como expressa o inciso II,
do art. 2º da Lei n.º 5.778/10 que o institui, busca-se a ​“a​rticulação, em regime de
colaboração, entre as esferas de governo e de poder, principalmente, entre os órgãos
responsáveis pela segurança pública, pela custódia de pessoas privadas de liberdade, por
locais de longa permanência e pela proteção de direitos humanos”​.

O MEPCT/RJ deu início às suas atividades em julho de 2011, após a nomeação de


seus membros pelo presidente da Alerj e desde então vem realizando visitas e relatórios
sobre os mais diversos espaços de privação de liberdade. Conforme destacado pela

1
Protocolo Facultativo à Convenção da ONU contra a Tortura: manual de implementação. (p.73). San José,
Costa Rica: Associação para Prevenção à Tortura e Instituto Interamericano de Direitos Humanos, 2010.
2
Declaração do Subcomitê de Prevenção à Tortura da ONU ao apresentar o segundo relatório anual do SPT
ao Comitê contra a Tortura. Vide “Committee against Torture meets with Subcommittee on Prevention of
Torture”, Comunicado de imprensa de 2 de maio de 2009, disponível em:
www.unog.ch.http://www.unog.ch/80256EDD006B9C2E/(httpNewsByYear_en)/02A16C255B95E900C1257
5B40051FA5A?OpenDocument
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Associação para a Prevenção à Tortura (APT), na publicação ​“Monitoramento de locais de


detenção: um guia prático”​, compete aos mecanismos nacionais e locais, no âmbito de seu
monitoramento preventivo, elaborar o relatório anual, relatórios de visitas regulares,
relatórios de visitas de seguimento e, por fim, relatórios de visitas temáticas.

A equipe do MEPCT/RJ responsável pela confecção do presente informe é


composta pelos ora subscritos Alexandre Campbell, Fabio de Almeida Cascardo, Graziela
Contessoto Sereno, Vera Lucia Alves, Patrícia de Oliveira e Renata V, Côrtes de Lira.3 Aos
membros do MEPCT/RJ é garantida independência em sua atuação, tal qual a
inviolabilidade das posições e opiniões adotadas no exercício de suas funções, bem como a
garantia de seu mandato pelo período de quatro anos, permitida uma recondução. O
MEPCT/RJ atua consoante os princípios da proteção da dignidade da pessoa humana,
universalidade, objetividade, igualdade, imparcialidade, não seletividade e não
discriminação, bem como os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência, dispostos no caput do artigo 37, da Constituição Federal.

3
A confecção deste informe não teria sido possível sem a informação de relatórios produzidos por equipes
anteriores do MEPCT/RJ, a quem registra-se aqui os agradecimentos, para além das notas de referência.
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3. O regime semiaberto na execução penal brasileira4

a. A execução penal brasileira

O objetivo da execução penal, conforme preconiza o artigo 1​º da Lei de Execução


Penal (Lei n.​º 7.210 de 1984), é ​efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e
proporcionar condições para a harmônica “​integração social​” do condenado e do internado.
Como pressuposto é necessária a existência de aplicação de uma sanção penal na sentença
criminal, sendo esta uma pena privativa de liberdade ou medida de segurança. O Direito
Penal pátrio adota a teoria mista ou eclética acerca das funções da pena, pressupondo que a
pena tem tanto o condão de retribuir o mal causado, como prevenir futuros delitos. Neste
particular, é importante salientar que:

“o arrefecimento ditatorial não surtiu grandes efeitos na realidade penitenciária brasileira,


preterida pela tendência liberalizante da sociedade brasileira. Do mesmo modo, a Lei de
Execução Penal e o Regulamento do Sistema Penal do Rio de Janeiro, não obstante terem
preenchido o hiato de legalidade penitenciária até então verificado, não lograram afastar, em
definitivo, os paradigmas político-criminais arraigados em nosso ordenamento.”5

4
Todo esse item do presente informe é reprodução do conteúdo produzido pelo MEPCT/RJ em “Noções
Introdutórias ao Relatório: A Progressão de Regime no contexto do Grande Encarceramento”, in ​Análise da
Progressão de Regime no Cumprimento da Pena no Sistema Penitenciário do Rio de Janeiro (Rio de Janeiro:
MEPCT/RJ, 2013).
5
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Direito e Prática Histórica da Execução Penal no Brasil. 1ª edição. Rio de
Janeiro: Ed. Revan, 2005, p. 125.
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A Lei de Execução Penal foi aprovada em 1984, inaugurando avanços para o


sistema penal vigente no Brasil. Entre os avanços consideráveis está a observância ao
princípio da humanidade da pena, pelo qual, segundo Paulo Lúcio Nogueira, “​deve-se
entender que o condenado é sujeito de direitos e deveres, que devem ser respeitados​”6.

No campo dos direitos do condenado, a Lei de Execução Penal, traz em seu art. 41,
um importante rol que reconhece juridicamente o apenado como sujeito de direitos,
reafirmando a progressão de regime insculpida no Código Penal, e trazendo importantes
disposições no que se refere ao trabalho, à educação e às saídas temporárias.

Entretanto, significativa parte dos direitos e garantias inerentes à pessoa privada de


liberdade são açambarcados por uma realidade de exponencial aumento do encarceramento,
decorrente do acirramento das contradições sociais a partir dos anos 90 com a adoção de
políticas de ajuste neoliberais.

Até 1984, ano de aprovação da Lei de Execuções Penais (LEP), o legislador


brasileiro nunca havia se pronunciado acerca da finalidade da pena em nosso ordenamento
jurídico. No âmbito doutrinário, por outro lado, a grande maioria dos autores se
posicionavam na defesa de uma teoria mista (ou unitária) que conciliasse a retribuição (o
Estado reage com um mal ao mal cometido pelo apenado) à prevenção de novos delitos.

6
NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal. 3ª edição. São Paulo: Ed. Saraiva, 1996,
p. 7.
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Sobre a prevenção, a doutrina brasileira ainda atribui duas classificações de suma


importância para a sua compreensão: a prevenção geral; e a prevenção especial.

A prevenção geral refere-se à idéia de que a mera existência de previsão legal da


aplicação de uma pena em caso de cometimento de condutas tipificadas contribuirá para a
prevenção destas mesmas condutas, servindo, na verdade, como intimidação.

Já a prevenção especial indica que o cumprimento da pena deve contribuir para que
o apenado não volte a cometer outros crimes. É ela a tão mencionada função
ressocializadora da pena.

A LEP (Lei 7.210/84), em seu artigo 1º dispõe sobre os objetivos da execução penal
no direito brasileiro, atribuindo-lhe o cumprimento da função de prevenção especial, além,
é claro, da efetivação do disposto na sentença condenatória, como podemos ver a seguir:

Art. 1º - A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão
criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do
internado.

Deste modo, extrai-se que, se a função da pena exercida pela execução penal
refere-se à prevenção especial, a retribuição e a prevenção geral devem ocorrer em outra
fase, no momento da sentença, como bem afirma o artigo 59 do Código Penal:

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Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à


personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem
como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para
reprovação​ e ​prevenção​ do crime:
I - as penas aplicáveis dentre as cominadas;
II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos;
III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade;
IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se
cabível. (Grifo Nosso)

i. Direitos do Preso

Inicialmente, faz-se imperiosa a apresentação da íntima relação do Direito Penal


brasileiro com o Direito Constitucional, uma vez que a Constituição de 1988 “fornece” a
fundamentação necessária ao Direito Penal em nosso ordenamento jurídico, como nos
ensinam Zaffaroni e Pierangeli:

A relação do direito penal com o direito constitucional deve ser sempre


muito estreita, pois o estatuto político da Nação – que é a Constituição
Federal – constitui a primeira manifestação legal da política penal, dentro de
cujo âmbito deve enquadrar-se a legislação penal propriamente dita, em face
do princípio da supremacia constitucional7.

7
ZAFFARONI, E. R. e PIERANGELI, . Manual de Direito Penal. (2004, p. 220)
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O princípio básico que orienta o cumprimento das penas privativas de liberdade é a


ideia de que o interno é sujeito de direitos, dotado da dignidade da pessoa humana à qual a
constituição elevou ao status de fundamento do Estado brasileiro. Assim sendo, podemos
afirmar que são assegurados ao apenado todos os direitos não afetados pela sentença penal
condenatória, restando assim garantidos os direitos à vida, à integridade física e ao acesso a
serviços de saúde, educação, dentre muitos outros.

O artigo 5º da Carta Constitucional traz diversos direitos e garantias individuais que


são asseguradas a todas as pessoas, assim como algumas limitações para os mesmos.

Por estar privado de liberdade, o preso encontra-se em uma situação especial que lhe
impõe uma limitação de direitos previstos na Constituição Federal e na normatividade
infraconstitucional. Neste sentido, a LEP assim dispõe:

Art. 40 - Impõe-se a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral dos


condenados e dos presos provisórios.

Art. 41 - Constituem direitos do preso:


I - alimentação suficiente e vestuário;
II - atribuição de trabalho e sua remuneração;
III - Previdência Social;
IV - constituição de pecúlio;
V - proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação;

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VI - exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores,


desde que compatíveis com a execução da pena;
VII - assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa;
VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo;
IX - entrevista pessoal e reservada com o advogado;
X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados;
XI - chamamento nominal;
XII - igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da pena;
XIII - audiência especial com o diretor do estabelecimento;
XIV - representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito;
XV - contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de
outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes.
XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade da
autoridade judiciária competente.

Parágrafo único. Os direitos previstos nos incisos V, X e XV poderão ser suspensos ou


restringidos mediante ato motivado do diretor do estabelecimento.

A partir da análise do artigo 41 da LEP, concluímos que o sujeito preso no Brasil


conta com um enorme rol de direitos legalmente constituídos e que, muitas das vezes não
são efetivados, podendo ainda sofrer suspensão ou restrição por mera discricionariedade do
diretor da unidade prisional na qual encontra-se privado de liberdade, o que acaba por
contribuir para a arbitrariedade de medidas disciplinares.

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ii. Órgãos da Execução da Pena

A LEP define como órgãos da execução penal o Conselho Nacional de Política


Criminal e Penitenciária; o Juízo da Execução; o Ministério Público; o Conselho
Penitenciário; os Departamentos Penitenciários; o Patronato; o Conselho da Comunidade; e
a Defensoria Pública.

Cada órgão da execução penal possui a sua atribuição bem definida pela LEP (artigo
61 e seguintes), mas todos têm em comum a função de monitorar e fiscalizar algum aspecto
do sistema prisional, cumprindo um papel fundamental para o cumprimento dos direitos
dos presos.

iii. Regimes de Cumprimento da Pena

O art. 33 do Código Penal prevê três tipos de regime de cumprimento das penas:
fechado, semiaberto e aberto. Ainda no que tange ao disposto no artigo 33 do Código Penal,
é expressa a vedação de determinação do regime fechado inicial em caso de crime cuja
pena prevista seja de detenção. Cabe dizer que, ao contrário da detenção, a pena de reclusão
pode iniciar seu cumprimento em regime fechado.

A fixação do regime inicial fica a cargo do juiz da ação penal, devendo o mesmo
atender a todos os requisitos legais objetivos e subjetivos. Neste ponto, a doutrina aponta
como fatores que incidem na determinação inicial do regime: natureza da pena (detenção

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ou reclusão); quantidade da pena aplicada (tempo); e reincidência. Se a observância destes


não determinarem qual o regime inicial, deverão ser observado o disposto no artigo 59 do
Código Penal:

Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à


personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem
como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para
reprovação e prevenção do crime.(...)
III – o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade.

A sentença condenatória deverá dispor expressamente sobre o assunto,


fundamentando, o magistrado, a sua decisão.

iv. Regime Fechado

É aquele no qual a execução da pena ocorre inicialmente em estabelecimento de


segurança máxima ou média, as chamadas penitenciárias. Em regra, é aplicável, como
regime inicial, ao condenado à pena superior a 8 anos de reclusão.

O regime fechado pode ser aplicado em razão da quantidade da pena, da


reincidência do condenado ou de características próprias do tipo penal. Pelo disposto na lei,
pode ser cumprido através do trabalho comum interno (regra), ou em obras públicas
externas (exceção) durante o dia, e pelo isolamento durante o repouso noturno (art.34 CP),

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devendo constituir o alojamento em ambiente salubre, cela individual com pelo menos seis
metros quadrados, constando dormitório, aparelho sanitário e lavatório (art.88 da LEP).

v. Regime Semiaberto

No regime semiaberto, a pena deve ser cumprida em colônia agrícola, industrial ou


estabelecimento similar, devendo ser aplicado, como regra, como regime inicial, ao
condenado a pena maior que 4 anos e inferior a 8 anos. Consiste em um regime de rigor
intermediário.

Deve ser cumprido em celas coletivas, com a possibilidade de freqüentar cursos


profissionalizantes, de instrução de ensino médio ou superior (art. 35). Permite o trabalho
interno ou externo e admite a autorização de saída da unidade prisional (art. 122 da LEP).

vi. Regime Aberto

A execução da pena no regime aberto ocorre em casa de albergado ou


estabelecimento adequado devendo ser aplicado, desde o início, ao condenado a pena igual
ou inferior a quatro anos, em regra.

Consiste na restrição mínima a liberdade do condenado, sendo um regime menos


rigoroso. Tem por fundamento a autodisciplina e o senso de responsabilidade (art.36 caput
CP). Caracteriza-se pela liberdade sem restrições para o trabalho externo, freqüência a

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cursos e outras atividades autorizadas durante o dia e pela liberdade restringida durante a
noite e dias de folga.

O ingresso no regime aberto pressupõe que o mesmo trabalhe ou tenha condições de


trabalhar; seja possível o seu ajustamento neste regime; e aceitação das condições impostas
pelo juiz.

Além do disposto acima, a LEP prevê algumas condições gerais e obrigatórias para
a concessão do regime aberto, facultando ao juiz a determinação de outras que julgar
necessárias, como observa-se ao ler o artigo 115:

Art. 115. O juiz poderá estabelecer condições especiais para a concessão de regime aberto,
sem prejuízo das seguintes condições gerais e obrigatórias:
I - permanecer no local que for designado, durante o repouso e nos dias de folga;
II - sair para o trabalho e retornar, nos horários fixados;
III - não se ausentar da cidade onde reside, sem autorização judicial;
IV - comparecer a Juízo, para informar e justificar as suas atividades, quando for
determinado.

Excepcionalmente, é possível o cumprimento do regime aberto em caráter


domiciliar, como verificamos a seguir:

Art. 117. Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em


residência particular quando se tratar de:

18
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I - condenado maior de 70 (setenta) anos;


II - condenado acometido de doença grave;
III - condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental;
IV - condenada gestante.

Importante destacarmos que este rol taxativo do artigo 117, por expressamente vetar
outras circunstâncias em que poderia ser aplicado o regime aberto domiciliar, pode
contribuir para a violação dos direitos dos presos, pois em caso de inexistência de casas de
albergado suficientes para atender a todos os que fizerem jus a este regime, resta aos
mesmos permanecerem em unidades prisionais inadequadas. Seria muito mais razoável
prever o regime aberto domiciliar em caso de inexistência de estabelecimento próprio, do
que submeter os presos atuais a condições precárias de cumprimento da pena.

xii. Progressão de Regime

Tributário do sistema progressivo de cumprimento de pena, o instituto da progressão


de regime constitui direito público subjetivo do apenado. O Código Penal de 1940
introduziu no ordenamento jurídico brasileiro o sistema progressivo irlandês, que previa
três etapas no cumprimento da pena antes da liberdade condicional.

Com a reforma promovida em 1984, com a provação da LEP, este sistema sofreu
profundas modificações, sofrendo novas alterações com a vigência da Lei Nº 10.792/2003,
como a exclusão da necessidade de um parecer da Comissão Técnica de Classificação, e do

19
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exame criminológico8, que representam avanços no sentido de efetivação da progressão de


regime como um direito do preso, eliminando assim aspectos subjetivos que pudessem
retardar a sua “concessão”. Por outro lado, a criação do Regime Disciplinar Diferenciado
(RDD) ​representou um retrocesso à humanização do sistema prisional, por não instituir
critérios bem definidos para aplicação de sanção disciplinar, entre outros.

A LEP prevê, em seu artigo 112 os requisitos para a progressão do regime,


conforme podemos observar a seguir:

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a
transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver
cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento
carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a
progressão.
§ 1​o A decisão será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e
do defensor.
§ 2​o Idêntico procedimento será adotado na concessão de livramento condicional, indulto e
comutação de penas, respeitados os prazos previstos nas normas vigentes.

Deste modo, após o cumprimento de um sexto da pena, contando o apenado com

8
O MEPCT/RJ costuma recomendar “À Vara de Execuções Penais e ao Ministério Público do Estado do Rio
de Janeiro – recomendar a não obrigatoriedade de realização do exame criminológico para progressão de
regime, visto que tal instituto não configura requisito imprescindível desde o advento da Lei Nº 10.792 /2003,
bem como para a concessão das autorizações de saída, prevista no art. 123 da Lei de Execução Penal”.
Recomendação feita no relatório ​Análise da Progressão de Regime no Cumprimento da Pena no Sistema
Penitenciário do Rio de Janeiro​ (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 2013).
20
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bom comportamento, será direito seu a progressão do regime. No entanto, a autoridade que
atesta o seu bom comportamento é a direção da unidade prisional em que cumpre a pena,
possibilitando assim uma discricionariedade indesejada, tornando-se um procedimento
eivado de questionamentos.

Especificamente no que se refere à progressão para o regime aberto, para além do


disposto no artigo 112 da LEP, observar-se-á o preenchimento dos requisitos do artigo 114
da mesma lei, conforme a seguir:

Art. 114. Somente poderá ingressar no regime aberto o condenado que:


I - estiver trabalhando ou comprovar a possibilidade de fazê-lo imediatamente;
II - apresentar, pelos seus antecedentes ou pelo resultado dos exames a que foi submetido,
fundados indícios de que irá ajustar-se, com autodisciplina e senso de responsabilidade, ao
novo regime.

xiii. Requisitos formais

A Lei n.º 10.763/2003 excluiu a exigência do exame criminológico e do parecer da


comissão técnica de classificação, mas permanecem contidos nos artigos 7° e 8° da LEP em
virtude da necessidade de se enfatizar a imperiosa individualização da pena.

21
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ix. Progressão de Regime nos crimes hediondos

A lei dos crimes hediondos (Lei n.º 8.072/90) proibia a progressão de regime para
estes tipos penais. O Superior Tribunal Federal decidiu pela inconstitucionalidade deste
dispositivo legal, por ofensa à individualização da pena e por ferir expressamente o sistema
progressivo instituído pelo código penal.

Após esta decisão do Supremo, o Congresso Nacional aprovou a Lei n.º 11.464/07
que alterou a lei de crimes hediondos no sentido de: determinar o cumprimento inicial da
pena em regime fechado; determinar que a progressão de regime nesses crimes se dê após o
cumprimento de dois quintos da pena, em caso de apenado primário, e em três quintos em
caso de reincidente.

4. As Unidades de Regime Semiaberto da SEAP

A Secretaria de estado de Administração Penitenciária do Rio de Janeiro (SEAP)


possui onze unidades para o cumprimento de pena em regime semiaberto para presos do
sexo masculino. Ao longo dos últimos anos, o MEPCT/RJ produziu relatórios completos
sobre seis desses estabelecimentos penais. Esses relatórios são documentos públicos e
foram entregues a diversas autoridades no âmbito estadual, dentre as quais as organizações

22
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estatais e da sociedade civil que compõem o Comitê estadual para Prevenção e Combate à
Tortura do Rio de Janeiro.9

As seis unidades mencionadas são: Instituto Penal Plácido Sá Carvalho - SEAPPC,


inspecionado em 2012;10 Instituto Penal Vicente Piragibe - SEAPVP, inspecionado em
201111 e 201312, Presídio Diomedes Vinhosa Muniz - SEAPVM, inspecionado em 201613;
Presídio Carlos Tinoco da Fonseca - SEAPCF, inspecionado em 201514 e 201615;
Penitenciária Moniz Sodré - SEAPMS, inspecionado em 201116; Instituto Penal Ismael
Pereira Sirieiro - SEAPIS, inspecionado em 201717.

Muitas vezes o MEPCT/RJ realiza visitas de monitoramento que não possibilitam

9
O Comitê estadual para Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro, órgão também criado pela Lei
estadual n.º 5.778/10, é composto de forma paritária entre o poder público e a sociedade civil, conforme o art.
3º da Lei.
10
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Instituto Penal Plácido Sá Carvalho em 31 de janeiro
de 2012 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 22 de março de 2012), acervo institucional
11
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Instituto Penal Vicente Piragibe em 05 de dezembro
de 2011, (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 05 de Janeiro de 2012), acervo institucional
12
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Instituto Penal Vicente Piragibe em 05 de fevereiro de
2013 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 06 de fevereiro de 2013), acervo institucional
13
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Presídio Diomedes Vinhosa Muniz em 24 de maio de
2016, Rio de Janeiro (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 08 de julho de 2016), acervo institucional
14
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Presídio Carlos Tinoco da Fonseca em 16 de setembro
de 2015 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 16 de setembro de 2015), acervo institucional
15
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Presídio Carlos Tinoco da Fonseca em 23 de maio de
2016 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 23 de maio de 2016), acervo institucional
16
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Penitenciária Moniz Sodré em 29 de abril de 2014
(Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 03 de junho de 2014), acervo institucional
17
Este relatório de visita ainda não foi concluído, de modo que as informações colhidas durante a inspeção
estão sendo expostas pela primeira vez no presente documento. A visita de monitoramento ao Instituto Penal
Ismael Pereira Sirieiro - SEAPIS se deu em 18 de abril de 2017.
23
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uma avaliação integral da unidade prisional inspecionada, de modo que os locais


supracitados foram também visitados pela equipe do MEPCT/RJ em outras oportunidades,
sem que essas gerassem um relatório completo de visita. Isso se dá, por exemplo, quando o
MEPCT/RJ se dirige até uma unidade para apurar uma denúncia específica, para algum
diálogo (seja com pessoas presas, diretores, funcionários das equipes técnicas etc.) ou para
acompanhar a fiscalização de outros órgãos, que não seguem o protocolo de visitas de
monitoramento adotado pelo MEPCT/RJ e, portanto, não permite a confecção de um
relatório completo. Essas visitas não estão sendo consideradas, ao menos diretamente, no
presente documento.

O mesmo pode se dizer dos outros cinco estabelecimentos penais que recebem
presos em regime semiaberto, que são a Colônia Agrícola Marco Aurélio Vergas Tavares
de Mattos - SEAPAM, o Instituto Penal Cândido Mendes - SEAPCM, o Instituto Penal
Edgard Costa - SEAPEC, Instituto Penal Benjamin de Moraes Filho - SEAPPBM e a
Penitenciária Inspetor Luis Fernandes Bandeira Duarte - SEAPBD. Apesar de não
apresentar, neste documento, informações detalhadas dessas últimas cinco unidades, o
MEPCT/RJ já esteve em todos os locais de cumprimento de pena em regime semiaberto da
Secretaria de estado de Administração Penitenciária do Rio de Janeiro, sejam eles para
pessoas do sexo masculino ou feminino. Diante da impossibilidade de que os internos do
Instituto Penal Plácido Sá Carvalho - SEAPPC sejam transferidos para estabelecimentos

24
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penais destinados à mulheres, essas unidades não foram consideradas no presentes


documento.18

a. Capacidade e Efetivo Prisional das Unidades

Tendo em vista que nem todas os estabelecimentos para regime semiaberto atendem
exclusivamente a essa etapa de cumprimento de pena (misturando regime fechado,
semiaberto, aberto, provisório e temporário), não é possível dizer ao certo, a partir das
tabelas confeccionadas pela SEAP, quantas vagas estão disponíveis para essa finalidade.19

Segue abaixo a tabela com os locais e datas das inspeções feitas pelo MEPCT/RJ,
seguidos da capacidade de lotação, efetivo na data da inspeção e o efetivo atual das
unidades para regime de semiaberto. Os dados são fruto tanto das inspeções quanto dos
números divulgados pela própria Secretaria em 06 de fevereiro de 2017:

Local e ano Efetivo na Capacidade Efetivo


de inspeção data da de lotação atual
inspeção atual

18
No relatório Mulheres, Meninas e Privação de Liberdade no Rio de Janeiro, o MEPCT/RJ expõe a situação
das unidades para presas mulheres. Disponível em
<https://drive.google.com/file/d/0ByIgDzCTzaAEeGo3dDVhM0cxaU0/view>
19
Uma das principais recomendações feitas pelo MEPCT/RJ em seus diferentes relatórios tem sido, no âmbito
estadual, para que seja garantida a transparência e a produção de dados por parte dos órgãos do sistema de
Justiça, à luz da Lei de Acesso à Informação (Lei n.º 12.527/11), que obriga a produção e acesso a dados
relativos a violações de direitos humanos.
25
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1. SEAPPC, 1.570 1.699 3.640


2012

2. SEAPVP, 2.135 1.444 1.694


2011

SEAPVP, 2.617 1.444 1.694


2013

3. SEAPVM, 850 466 780


2016

4. SEAPCF, 1.500 84220 1.627


2015

SEAPCF, 1.555 84221 1.627


2016

5. SEAPMS, 2.396 1.32022 2.798


2011

6. SEAPIS, 670 36823 626


2017

20
Quando o Mecanismo inspecionou a unidade a capacidade declarada pela direção foi de 898 presos
21
Quando o Mecanismo inspecionou a unidade a capacidade declarada pela direção foi de 898 presos
22
​Quando o Mecanismo inspecionou a unidade a capacidade declarada pela direção foi de 1.364 presos
23
​Quando o Mecanismo inspecionou a unidade a capacidade declarada pela direção foi de 352 presos
26
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A fim de proporcionar um panorama completo da relação capacidade de


lotação/efetivo prisional, seguem abaixo os dados divulgados pela secretaria com relação às
unidades faltantes, mesmo que não inspecionadas integralmente pelo MEPCT/RJ:

Local Capacidade de Efetivo atual


lotação

7. SEAPAM 140 63

8. SEAPCM 246 148

9. SEAPEC 383 699

10. SEAPPBM 912 999

11. SEAPBD 432 312

Nota-se, portanto, que com exceção de três unidades, todas as demais encontram-se
superlotadas. Em alguns casos, essa chega a passar do dobro da capacidade, como no caso
do Instituto Penal Plácido Sá Carvalho - SEAPPC, o que não torna menos dramática,
necessariamente, a situação para as pessoas aprisionadas nas demais unidades, que também
funcionam muito acima do que permitiria a sua estrutura. Conforme se verá a seguir, as
condições de detenção nesses espaços são motivo de preocupação para o MEPCT/RJ.

27
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b. Condições de Detenção

O que motiva o envio deste informe, como explicitado em sua apresentação, é a


oportunidade de subsidiar a Corte com elementos factuais, colhidos ao longo do tempo (seis
anos) nos locais destinados à custódia de presos em regime semiaberto no estado do Rio de
Janeiro, bem como realizando uma intensa agenda institucional junto à órgãos do sistema
de Justiça e de organizações que acompanham a realidade prisional no Rio de Janeiro.

Para tanto, o MEPCT/RJ não poderia se furtar de afirmar seu compromisso não
apenas com os parâmetros elencados em todo o ​corpus juris que compõe o Direito
Internacional dos Direitos Humanos, o qual ampara o MEPCT/RJ em sua atividade
cotidiana de prevenir e erradicar a tortura e os maus tratos. Nesse sentido, cumpre frisar a
importância das sentenças emitidas por esta Corte, estabelecendo parâmetros mínimos de
proteção da dignidade humana das pessoas privadas de liberdade, bem como dos
enunciados emitidos pelos demais mecanismos internacionais de salvaguarda dos direitos
humanos.

Desse modo também, o MEPCT/RJ salienta, em especial, os principais


compromissos, internos e internacionais, assumidos pelo Estado brasileiro em matéria de
direitos humanos e que versam sobre a proibição da tortura, a saber: a Declaração Universal
de Direitos Humanos (1948), o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (1966,
ratificada pelo Brasil em 1992), a Convenção da ONU Contra a Tortura e Outros
Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes (1984, ratificada pelo Brasil em

28
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1989), a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura (1985, ratificada pelo
Brasil em 1989), a Constituição Federal de 1988, a Convenção da ONU sobre os Direitos
da Criança (1990), a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969, ratificada pelo
Brasil em 1992), a Lei n.º 9.455 de 1995, que define a tortura como crime, o Protocolo
Facultativo à Convenção da ONU Contra a Tortura - OPCAT (2006), o Terceiro Plano
Nacional de Direitos Humanos - PNDH-3 (2009), a Lei n. 12.528 de 2011, que criou a
Comissão Nacional da Verdade (CNV) e, por fim, a Lei que Institui o Sistema Nacional de
Prevenção e Combate à Tortura (Lei n.º 12.847 de 2013). É, portanto, com base nos
múltiplos instrumentos de proteção do ser humano, no sentido de proibir todas as formas de
dominação e de poder arbitrário24, que se organizou o presente documento.

Isto posto, deve-se enfatizar que quando o Estado priva de liberdade um indivíduo,
tal ato carrega consigo o compromisso concreto e específico de proteger a dignidade
humana do prisioneiro.25 Ou seja:

Consequentemente, ainda que a privação de liberdade implique a restrição legítima de


certos direitos, a imposição de lesões, dano ou sofrimento desnecessário à saúde, que
resultem na deterioração da integridade física, psicológica ou moral, podem configurar
tratamento cruel, violando o artigo 5º (2) da Convenção Americana. Além disso, o Estado,
ao exercer seu dever de proteger o bem-estar dos prisioneiros, deve levar em consideração

24
Antônio A. C. Trindade, ​Desafios e Conquistas do Direito Internacional dos Direitos Humanos no Início
do Século XXI​, 411, acesso em 16 abr 2017,
https://www.oas.org/dil/esp/407-490%20cancado%20trindade%20OEA%20CJI%20%20.def.pdf
25
CIDH. “Menores Detenidos v. Honduras”, Caso 11.41, Relatório No41/99, CIDH, Relatório Anual 1998,
OEA/Ser.L/V/II.102 Doc. 6 rev. (1998), par 135.
29
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qualquer vulnerabilidade específica da pessoa detida, por exemplo, a de adolescentes e de


pessoas portadoras de deficiência ou sofrimento psíquico.26

No entanto, não é isso que se observa nas unidades prisionais de regime semiaberto
no Rio de Janeiro. Abaixo serão apresentados fatos testemunhados pelo MEPCT/RJ e que
dizem respeito a aspectos fundamentais da vida das pessoas presas, demonstrando graves
violações dos direitos inerentes à pessoa humana contra os prisioneiros. Cumpre
esclarecer, mais uma vez, que o conteúdo exposto a seguir está disponível nos relatórios de
visitas de monitoramento do MEPCT/RJ publicados ao longo dos últimos seis anos, bem
como relatórios anuais e temáticos produzidos pelo órgão.

i. Alimentação

As refeições fornecidas aos presos pela SEAP é um serviço terceirizado e que segue
o modelo de quentinhas, entregues diretamente nas celas, onde almoçam e jantam os
prisioneiros. Atualmente a SEAP está inadimplente (estima-se um débito total superior a
200 milhões de reais) com todos os fornecedores, em muitos casos desde os primeiros
meses de 201627, agravando o que já era um problema crônico no sistema prisional: a má
qualidade nutricional - quantidade e qualidade -, somada recentemente ao atraso no horário
de entrega das refeições.

26
Claudia Martin & Diego Rodríguez-Pinzón; “As condições de detenção”, in A Proibição de Tortura e
Maus-tratos pelo Sistema Interamericano: um manual para vítimas e seus defensores (Suíça: OMCT, 2006),
120.
27
Ver MP pede liminar para garantir alimentação de presos no Rio, em
<https://oglobo.globo.com/rio/mp-pede-liminar-para-garantir-alimentacao-de-presos-no-rio-21297970>
30
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Estes fatos foram notados no Instituto Penal Plácido Sá Carvalho - SEAPPC,


Instituto Penal Vicente Piragibe - SEAPVP, Instituto Penal Ismael Pereira Sirieiro -
SEAPIS e no Presídio Diomedes Vinhosa Muniz - SEAPVM, onde a comida estava sendo
servida fria e sem sabor. Neste último, os presos reclamaram bastante que as refeições
servidas continham os grãos mal cozidos, excesso de arroz e comida ruim, tendo sido
apontado como um dos aspectos prioritários, dentre todos os inspecionados, que
precisavam melhorar.

O relatório de visita ao Presídio Carlos Tinoco da Fonseca - SEAPCF28 retrata a


seguinte situação:

Como em todas as unidades da SEAP, há grande precariedade na alimentação, no acesso a


água, para beber e fazer a higiene, além da falta de materiais. No entanto, observa-se uma
grave piora na alimentação servida aos presos. Para além do intervalo entre a última
refeição do dia e a primeira do dia seguinte, às vezes superior a quinze horas, a alimentação
servida em quentinhas para os presos, muitas vezes, não está em condições de ser
consumida. Segundo os presos, é comum que os alimentos estejam mal preparados, o arroz
cru, a moela mal limpa, o feijão ralo, sem gosto e por vezes até com alimentos azedos.
Muitos presos relatam rápido emagrecimento após a prisão ​e o início de problemas de pele,
coceiras, furúnculo e caroços.

28
​MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Presídio Carlos Tinoco da Fonseca em 23 de maio de
2016 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 23 de maio de 2016), acervo institucional
31
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Há, portanto, uma uniformidade nesses relatos e que abrange todos os


estabelecimentos para regime semiaberto. Desse modo, a realidade da alimentação nesses
locais pode ser sintetizada como uma comida “servida fria e azeda, com cardápio repetitivo
e pouco nutritivo”, conforme exposto no relatório de visita do MEPCT/RJ à Penitenciária
Moniz Sodré - SEAPMS29, verificando-se episódios em que a comida encontra-se
imprópria para o consumo humano.

ii. Higiene e acesso à água

Os relatórios de visita de monitoramento do MEPCT/RJ dedicam um espaço


robusto para descrever os aspectos de higiene, considerando a higiene individual do preso e
a coletiva do espaço de detenção, assim como o acesso à água para consumo e para as
tarefas de limpeza. Nesse sentido, destacamos os seguintes trechos relativos ao Instituto
Penal Plácido Sá Carvalho - SEAPPC:

No cômodo de entrada das galerias, há grande quantidade de lixo. Os corredores e as celas


apresentam bastante umidade, infiltrações, mofo, rachaduras e na maioria dos casos fiação
elétrica exposta. Segundo relatos dos internos, a parte elétrica das celas deve ser feita de
modo improvisado pelos próprios presos. Há constante relato sobre a presença de ratos e
baratas, além de a equipe do MEPCT/RJ ter observado grande quantidade de percevejos,
mosquitos e moscas. A situação de mau-cheiro é constante.

29
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Penitenciária Moniz Sodré em 29 de abril de 2014
(Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 03 de junho de 2014), acervo institucional
32
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As instalações sanitárias são bastante precárias e devido à superlotação, há uma


proximidade entre os banheiros, que contem o “boi” (pequeno orifício de azulejo no chão)
para as necessidades fisiológicas, e o chão onde os presos dormem. As distribuições dos
alojamentos remetem ao aspecto de uma caverna.

Outro fator degradante é o precário fornecimento de água, sendo ligado o sistema de água a
cada três horas e por cerca de vinte minutos. À noite o fornecimento é interrompido. O calor
intenso e a grande quantidade de detentos tende a agravar tal situação. Em mais de uma
galeria o MEPCT/RJ ouviu relatos de que os presos tiveram que comprar de agentes um
barril para estocar água, no valor de R$ 100. Não há fornecimento de água potável aos
internos. Por vezes a água da torneira está barrenta.

Já na entrada, há um forte odor especialmente de urina e concentração de moscas além da


presença de acúmulo de lixo. O banho se dá através do auxílio de canecas, o forte calor é
intenso o que se agrava nesta época do ano marcada por altas temperaturas.

Alguns presos destacaram que o simples fato de reivindicar fornecimento mais adequado de
água é motivo para aplicação de sanções.

Dos relatórios de visita de monitoramento ao Instituto Penal Vicente Piragibe -


SEAPVP, destacam-se as seguintes denúncias:

No que tange ao kit de higiene pessoal e limpeza, os mesmos são oferecidos pelo Estado
uma vez por mês. A direção informou que o material fornecido não é suficiente e que já
solicitou o aumento da remessa de materiais. Este pedido, no entanto, ainda não foi

33
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atendido. Os presos corroboram com essa visão e se queixam que estes itens não são
fornecidos regularmente.

Os presos não têm acesso irrestrito à água e relataram que mesmo aquela disponível para
beber apresenta péssima qualidade. Segundo informou a Direção a caixa de água já deveria
ter sido limpa, mas ainda não tinha recebido resposta da empresa que efetua este serviço.
Ainda durante a visita do MEPCT o diretor recebeu a resposta marcando a limpeza da caixa
d’água para semana seguinte.30

O relatório de visita de monitoramento ao Presídio Diomedes Vinhosa Muniz -


SEAPVM demonstra situação muito semelhante, registrando-se as condições de detenção
abaixo, sem prejuízo do que dispõe o conteúdo integral do documento produzido pelo
MEPCT/RJ:

Os banheiros são insalubres, sem chuveiros e os bois estão sujos e invariavelmente


entupidos. A superlotação das celas termina por gradualmente agravar este cenário,
configurando um ciclo de violência contra as pessoas privadas de liberdade.

Há uma carência muito grande de colchões, roupa de cama, de banho e materiais de higiene.
Como o Estado não fornece, as famílias tem sido autorizadas a entregar este tipo de material
na chamada custódia. O MEPCT teve notícias de que há dois meses não chegava kit
higiene.

30
​MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Instituto Penal Vicente Piragibe em 05 de dezembro
de 2011 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 05 de Janeiro de 2012), acervo institucional
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Na Penitenciária Moniz Sodré - SEAPMS os relatos se repetem, de forma que vale


destacar a insalubridade do ambiente, propício a proliferação de doenças:

As celas encontram-se em estado muito precário, há visível infiltração e fiação elétrica


exposta. Apenas através de janelões com grades no alto da cela é possível entrar a
iluminação e ventilação natural. O ambiente é extremamente propício para proliferação de
doenças respiratórias e de pele. Há acúmulo de lixo próximo a entrada das celas, o que
possibilita o surgimento de insetos e roedores.

No Instituto Penal Ismael Pereira Sirieiro - SEAPIS, em inspeção ainda mais


recente, as condições de higiene e acesso à água seguiam aterradoras. A equipe do
MEPCT/RJ constatou que o Estado não tem fornecido nenhum tipo de material aos presos,
salvo a alimentação e alguns colchões. Com isso, os presos que não recebem visitas e cujas
famílias não enviam a bolsa de mantimentos, ficam sem os materiais de higiene, uniforme,
roupa de camas e outros itens essenciais. A água na unidade, à exemplo dos demais
estabelecimentos penais, apresenta aspecto muito ruim e algumas partículas sólidas, tendo
sido relatado por alguns presos que os mesmos coam a água com as suas camisas. Durante
a conversa dos internos com a equipe do MEPCT/RJ, um rato foi morto do pátio.

Os trechos destacados a partir dos relatórios do MEPCT/RJ representam recortes do


que foi constado em cada um dos estabelecimentos de detenção. A partir do monitoramento

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feito, pode-se concluir, sem ressalvas, que o acesso à higiene e a água é precário em todas
os locais inspecionados. De fato, não existe água potável para as pessoas presas que estão
cumprindo regime semiaberto na SEAP. A água para consumo, para o banho, para a
higiene pessoal e para a limpeza do ambiente e para a descarga nos sanitários é a mesma. É
comum também os presos terem dificuldade para armazenar a água em garrafas ou baldes,
possibilitando o uso quando o fornecimento é interrompido. A regularidade na limpeza das
caixas d’água é outra dificuldade encontrada.

Outrossim, cumpre sublinhar que o fornecimento de kits de higiene pessoal e de


material de limpeza, que desde meados de 2016, está interrompido em todas as unidades da
SEAP. Desse modo, os internos passaram a depender única e exclusivamente da
disponibilidade de seus familiares para receber esses e outros materiais, entregues nas
portarias das unidades semanal ou quinzenalmente em bolsas de mantimentos. Os presos
que não contam com o apoio familiar encontram-se em estado de ainda maior abandono,
assemelhando-se a pessoas em situação de mendicância dentro dos estabelecimentos
penais.

iii. Atividades físicas, intelectuais e laborais

Por se tratarem de estabelecimentos penais destinados ao cumprimento do regime


semiaberto, supõe-se que a pena nesses locais deveria ser executada de forma que o
condenado pudesse exercer trabalho coletivo em período diurno – em colônia agrícola,
industrial ou estabelecimento similar –, conforme preconiza o art. 91 da Lei de Execução

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Penal brasileira (Lei n.º 7.210/84), bem como de modo a garantir acesso a cursos
profissionalizantes. Igualmente, pressupõe-se o acesso à educação formal para pessoas que
estão prestes a regressar ao convívio social, sem falar do direito, também garantido na Lei
de Execução Penal, de que detém o preso de remir parte do tempo de execução da pena por
estudo ou por trabalho.

Contudo, uma rotina ativa e produtiva dentro dos estabelecimentos penais é exceção
nos presídios de Rio de Janeiro, inclusive nas unidades para regime semiaberto. A regra do
confinamento absoluto se vê minimamente relativizada nas unidades destinadas
exclusivamente aos presos em regime semiaberto, onde o diferencial é basicamente o
acesso permanente ao pátio, onde permanecem durante o dia, entre 9h e 17h, interrompidas
pelo almoço na cela. Portanto, nessas unidades o ócio físico e intelectual é também a regra.

No Instituto Penal Plácido Sá Carvalho - SEAPPC o MEPCT/RJ registrou as


seguintes considerações:

A situação de ócio é constante na unidade. Tendo em vista se tratar de um regime transitório


à progressão de regime e livramento, deveria ser enfático o investimento em cursos e
atividades laborativas.

Há uma escola na unidade, mas de longe não supre a demanda dos internos. Atividades
laborativas são desempenhadas apenas por presos na condição de seguro.

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Outro fator emblemático no instituto é o precário oferecimento de atividades educacionais e


laborativas, constituindo um cenário de ociosidade.

No Instituto Penal Vicente Piragibe - SEAPVP ficou demonstrada a amplitude que


caracteriza a dificuldade na obtenção dos chamados “benefícios”, que consistem na
autorização por parte da Vara de Execuções Penais em conceder permissão para trabalho
extramuros, por exemplo. Nenhum dos presos em regime semiaberto gozava do benefício:

O IPVP [SEAPVP] é destinado ao cumprimento do regime semiaberto e por este


motivo, em tese, a pena de seus custodiados deveria ser cumprida em local onde o
condenado ficasse sujeito a trabalho coletivo em período diurno – em colônia
agrícola, industrial ou estabelecimento similar – conforme o art.91 da Lei 7210/84.
O trabalho externo bem como cursos profissionalizantes e cursos de ensino
fundamental, médio e superior também seriam permitidos. Contudo, como
explicitado nas “Informações Gerais” deste relatório, os presos do Vicente Piragibe
são aqueles que ainda não receberam “benefícios” [trabalhos extramuros] e, nesse
sentido, os mesmos têm acesso ao trabalho intramuros.31

O relatório de inspeção ao Presídio Diomedes Vinhosa Muniz - SEAPVM evidencia


a restrição ao pátio para presos em regime semiaberto, a diminuta proporção de presos que
conseguem trabalho dentro ou fora da unidade e a ausência de educação formal para os

31
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Instituto Penal Vicente Piragibe em 05 de dezembro
de 2011, (MEPCT/RJ: Rio de Janeiro,05 de Janeiro de 2012), acervo institucional
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presos. Considerando o total de 850 presos, a realidade se mostra semelhante a das demais
unidades:

Quanto às atividades laborativas, 25 presos realizam o trabalho como faxineiros ou


marceneiros durante 8 horas diárias, sendo pagos pela Fundação Santa Cabrini. Há ainda 4
presos trabalhando na padaria da unidade, da empresa Milano. Outros 21 presos, com
benefício extra-muros, saem para trabalhar, sendo três deles empregados na Companhia
Estadual de Águas e Esgotos (CEDAE).

Não há atividades educacionais na unidade.

Os banhos de sol ocorrem duas vezes por semana. Não foram mencionadas atividades
recreativas.

O mesmo se verificou no Presídio Carlos Tinoco da Fonseca - SEAPCF, o qual


possuía uma população de 1.555 presos em 2016, quando o relatório do MEPCT/RJ
apresentou a rotina de estudos, laboral e recreativa nos termos abaixo:

No presídio funciona o Colégio Estadual Theodoro Sampaio, onde estão matriculados 90


presos. Em relação à atividade laborativa, o único trabalho que existe na unidade é o de
faxina, 64 internos classificados.

Segundo informou o diretor, o banho de Sol é semanal e funciona em rodízio de galerias. Os


presos reclamaram que ficam muito “na tranca” e que diversas vezes não são retirados para
as atividades.

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Na Penitenciária Moniz Sodré - SEAPMS, onde convive a expressiva população de


2.396 presos, a situação constatada foi descrita assim:

No dia da visita foi informado pela direção da unidade que existem 110 presos trabalhando
como “faxinas” e em outros serviços administrativos. O trabalho é remunerado, o
pagamento é feito pela Fundação Santa Cabrini. Há ainda fábrica de pipa, administrado pela
Fundação Santa Cabrini; cursos de Hidráulica e Elétrica que duram de 3 a 6 meses, onde
matriculam 64 presos e é ministrado pelo Senai. Aos que trabalham é concedida remição da
pena.

Há escola na unidade, José Lewgoy. A equipe foi recebida pela coordenadora Sra. Denise
Jorge Reis, que informou que são ofertados ensino fundamental e médio, nos turnos da
manhã e tarde, ministrados por 24 professores. São 248 matriculados, com uma frequência
de 80%. Há uma fila de espera para a escola, já que há remição da pena.

Segundo o subdiretor, há banho de sol 03 vezes por semana, as segundas-feiras, terças-feiras


e sextas-feiras, das 9 às 12h e das 13 às 15h. Os presos são levados para o pátio, onde
podem realizar atividades recreativas. O banho de sol é liberado para apenas um número de
presos por cela a cada vez.

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iv. Saúde

A saúde, física e psíquica, das pessoas presas está condicionada a diversos fatores,
podendo-se considerar, para tanto, o somatório de todos os itens em destaque no presente
documento. No entanto, ao evidenciar o tema da saúde, o MEPCT/RJ chama atenção para
os serviços de saúde oferecidos para as pessoas privadas de liberdade, como equipes
médicas, medicamentos e, quando necessário, hospitais e o transporte adequado até esses
hospitais; além do risco de contrair doenças nesses ambientes.
O relatório de visita de monitoramento do Instituto Penal Plácido Sá Carvalho -
SEAPPC ressalta a dificuldade de obter medicação, a inadequação do espaço para pessoas
enfermas e portadoras de deficiências físicas, além do risco de contrair doenças:

Pelas condições já mencionadas, sabe-se que o exercício do direito à saúde é prejudicado na


unidade. Em relatos dos internos, pode-se constatar que há precariedade no fornecimento de
medicamentos. Há relatos de casos de tuberculose e pneumonia na unidade. Um deles
encontrava-se dormindo no chão, na cela A3. Existiam ainda três presos cadeirantes na
unidade, os quais não dispunham de nenhuma atenção especial.

Um dos fatores que mais vilipendia a situação dos internos na unidade visitada é a péssima
condição material. Umidade, precário fornecimento de água, fiação exposta, presença de
insetos, camas de alvenaria com estrutura desgastada, comida apresentando má qualidade,
ausência/precariedade dos colchões podem exemplificar o cenário do cotidiano dessas
pessoas privadas de liberdade bem como dos profissionais que lá atuam, sendo o risco de
contrair doenças perceptíveis.

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Quando inspecionado o Instituto Penal Vicente Piragibe - SEAPVP, o MEPCT/RJ


registrou as debilidades dos serviços de saúde, testemunhando que a e​nfermaria funcionava
em condições inaceitáveis, que remédios estavam em falta, presos com doenças graves sem
tratamento, ambiente propício à proliferação de doenças e baixa resolutividade nos atendimentos:

O estado de todos os pavilhões e celas é muito precário. Há visível infiltração e fiação


elétrica expostas e o aspecto alude o de uma “caverna” de tão escuro. Há acúmulo de lixo e
esgoto aberto, o que possibilita o surgimento de insetos e roedores e cria o ambiente
extremamente propício para proliferação de doenças respiratórias e de pele. Os membros do
MEPCT se impressionaram com o péssimo estado de conservação de todos os pavilhões.

Pôde-se observar a presença de baratas em alguns buracos que existem na parede do


corredor das galerias devido à péssima conservação. Além disto, os internos relataram que é
constante a presença de ratos e besouros.

Na ampla maioria das celas as instalações sanitárias são precárias e escorre água das
galerias para o corredor, formando poças de água e um ambiente altamente comprometido.

O MEPCT/RJ foi ao ambulatório médico e realizou entrevista com o médico – Sr. Pedro
Potássio – e a enfermeira que se encontravam presentes ao local. Foi relatada a total falta de
estrutura para o atendimento aos internos. A enfermaria está com pisos, paredes, teto e
mobiliário totalmente destruído e em condições inaceitáveis, assim como o local para
armazenamento dos remédios. Um dos maiores problemas apontados pelo médico é o tempo
dispensado na realização de exames de admissão, que, segundo ele, são feitos em média de

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70 por mês. Apontou, ainda, que desde 2008 a unidade tem 1000 presos a mais, o que
intensificou a celeridade na realização dos exames.

No momento da visita, segundo o profissional, não havia medicamento disponível, pois a


unidade recebe mensalmente uma quantidade muito aquém do necessário, já que se encontra
superlotada. O médico apontou graves problemas no que diz respeito à resolutividade dos
casos, apontando que as doenças graves não são tratadas e que não há saúde preventiva. Há
muitos presos com doença respiratória, alergia e doença de pele.

Ainda assim é necessário destacar que a política de ampliação de vagas não resolve
problemas de extrema gravidade observados no sistema prisional, tais como: violência
institucional, tortura e maus tratos, deficiência de assistência material, dentre outros. Como
constatado no IPVP [SEAPVP], a arquitetura dos pavilhões está em péssimo estado, o que,
por si só viola direitos humanos. A condição do ambiente é insalubre: precária de
iluminação e ventilação, má conservação da rede de esgoto, das fiações elétricas, acúmulo
de lixo e a condição degradada das celas. É nítida a existência de maus tratos em virtude do
difícil acesso das pessoas doentes aos serviços de saúde, a não disponibilização de água
filtrada para o consumo dos detidos, a falta de camas, colchões, roupa de cama, uniformes,
materiais de higiene e remédios. O quadro encontrado nessa unidade evidencia o necessário
desenvolvimento de uma política criminal pautada na contraposição ao
superencarceramento e da ausência de alternativas – que representa o sistema prisional.32

32
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Instituto Penal Vicente Piragibe em 05 de dezembro
de 2011 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 05 de Janeiro de 2012), acervo institucional
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No Presídio Diomedes Vinhosa Muniz - SEAPVM a equipe do MEPCT/RJ apurou


as mesmas mazelas, enfatizando no recorte abaixo a preocupação com presos em
sofrimento psíquico, dependentes de um deslocamento de mais de 320km para obter
atendimento médico especializado, além da violência praticada pelos agentes responsáveis
pelo serviço de transporte da SEAP, denominado Serviço de Operações Especiais - SOE:

Entre os presos, houve reclamações sobre o mal atendimento prestado pelo serviço de
enfermagem e sobre a falta de remédios na enfermaria da unidade. Como não há psiquiatra
nos quadros da unidade, presos que demandam este tipo de atendimento são encaminhados
para o Hospital Penal Psiquiátrico Roberto de Medeiros, em Gericinó - Rio de Janeiro.
Além de estar a mais de 320 km da unidade prisional, os presos são levados para o hospital
pelo Serviço de Operações Especiais (SOE) da SEAP, alvo de sistemáticas denúncias de
tortura.

Nas inspeções ao Presídio Carlos Tinoco da Fonseca - SEAPCF, o MEPCT/RJ


descreveu a situação em que se encontravam os presos como alarmante, havendo
precariedade nos atendimentos médicos e alto índice de custodiados com tuberculose:

Considera que o maior problema da unidade diz respeito ao atendimento médico,


afirma que não tem médico na unidade e que isso agrava em muito as péssimas
condições do cumprimento de pena.33

33
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Presídio Carlos Tinoco da Fonseca em 23 de maio de
2016 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 23 de maio de 2016), acervo institucional
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A condição de saúde dos presos no Carlos Tinoco da Fonseca é alarmante. A


superlotação e a total insalubridade do local são potenciais produtores de doenças,
sejam elas físicas ou psíquicas.34

A equipe de trabalhadores da área de saúde é ínfima e na maior parte da semana há apenas


técnicos de enfermagem na unidade. Os internos fizeram inúmeros relatos de casos não
atendidos ou mal encaminhados em relação a problemas de infecção na pele, furúnculos,
problemas ortopédicos, dentários e respiratórios. Dizem que faltam trabalhadores, insumos e
medicações.35

O atendimento da equipe de saúde é precário. O médico é cedido pela Casa de Custódia e


vai uma vez por semana à unidade, restando somente uma técnica de enfermagem para
prestar o atendimento. Faltam trabalhadores, insumos e medicações. É grande o número de
presos doentes e, segundo os técnicos, havia 42 presos com tuberculose diagnosticados e em
tratamento na unidade. Para atendimento emergencial, segundo o diretor, os internos são
conduzidos ao Hospital Ferreira Machado.36

Há um número grande de presos doentes e é alto o índice de 42 pessoas com tuberculose


diagnosticada num universo de 1500, principalmente porque convivem em ambiente pouco

34
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Presídio Carlos Tinoco da Fonseca em 23 de maio de
2016 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 23 de maio de 2016), acervo institucional
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MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Presídio Carlos Tinoco da Fonseca em 23 de maio de
2016 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 23 de maio de 2016), acervo institucional
36
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Presídio Carlos Tinoco da Fonseca em 16 de setembro
de 2015 Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 16 de setembro de 2015), acervo institucional
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arejado e úmido.37

No relatório de visita de monitoramento da Penitenciária Moniz Sodré - SEAPMS


fora averiguadas as mesmas condições de detenção aviltantes:

Os presos doentes estão todos localizados na cela B3, sejam eles tuberculosos, soropositivos
ou cadeirantes, este local também possui todas as precárias condições das demais celas, o
que torna o tratamento aos enfermos ainda mais aviltante. Nesta cela não há rampa de
acesso para os cadeirantes.

Em entrevistas com os presos, são unânimes as reclamações no que se refere ao atendimento


médico, odontológico e de assistência social. Quase a totalidade dos presos destaca que,
apesar de inúmeros pedidos, é muito reduzido o número de presos que recebeu algum tipo
de atendimento.

O Mecanismo gostaria ainda de ressaltar que segundo informações dos presos, a


comunicação dos mesmos com qualquer profissional integrante da equipe técnica, inclusive
para atendimento médico, se dá através dos faxinas. Estes estão responsáveis por anotar os
pedidos de atendimento e repassar a equipe, portanto fica a critério dos faxinas determinar
quem irá receber atendimento psicológico, social ou médico.

37
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Presídio Carlos Tinoco da Fonseca em 16 de setembro
de 2015 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 16 de setembro de 2015), acervo institucional
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Outro relato que se destaca entre os internos diz respeito ao tratamento extremante violento
desferido pelo SOE no transporte de presos para o atendimento médico externo. Os presos
relataram que são deixados por muito tempo trancados no carro e que por vezes são
espancados pelos agentes do SOE. Em decorrência destas agressões, muitos preferem não
ser transferidos para atendimento médico.

Os serviços de saúde no Instituto Penal Ismael Pereira Sirieiro - SEAPIS, por sua
vez, se mostra totalmente dependente dos medicamentos trazidos pelos familiares dos
presos, tendo em vista a falta de fornecimento por parte do Estado. A situação dificulta o
acesso à remédios que exigem prescrição médica, visto que as receitas assinadas pelo
médico da unidade tem que ser entregue às famílias para que comprem em farmácias e,
enfim, possam levar o remédio no dia determinado pela direção da unidade prisional. Se
isso acarreta a demora no início da medicação de todos os presos, aqueles que não contam
com o apoio de familiares são obrigado a depender da assistência da SEAP, o que é ainda
mais incerto atualmente.

v. Disciplina e punição física

Os episódios de ameaças e agressões, físicas e verbais, são frequentemente relatados


à equipe do MEPCT/RJ, que com frequência verifica as marcas corporais dessas agressões
e de uso de armamento menos-letal nas celas e galerias dos estabelecimentos penais. Como
forma de disciplina, as unidades das SEAP costumam ter áreas chamadas de isolamento,
onde um ou mais presos podem passar até 30 dias cumprindo sanções disciplinares.

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Dependendo da situação, o preso pode cumprir sua sanção sozinho ou acompanhado. Essa
também é a realidade dos presídios destinados ao cumprimento de pena em regime
semiaberto.

Nesse sentido, no Instituto Penal Plácido Sá Carvalho - SEAPPC a equipe do


MEPCT/RJ colheu diversas denúncia de ameaças e agressões perpetradas pelos agentes do
Estado, mas também entre presos identificados com diferentes organizações do
narcotráfico. Cumpre salientar que, mesmo nesses casos - que podem ser entendidos como
violações provocadas por terceiros - o Estado pode ser responsabilizado por omissão,
conforme pressupõe a responsabilidade internacional objetiva. Destacam-se os seguintes
trechos do relatório publicado pelo MEPCT/RJ:

Vale destacar que os presos ainda relatam que os agentes da própria Unidade costumam
fazer uso de armas de fogo como forma de intimidação dos privados de liberdade. O
relatório da visita ao Plácido de Sá Carvalho realizada pelo Núcleo do Sistema Penitenciário
da Defensoria Pública descreve que “a unidade possui 02 revólveres calibre 38, 02
escopetas calibre 12 com munição não-letal e 01 fuzil de repetição”.

No tocante ao tratamento, um dos aspectos mais preocupantes observado foi a atuação do


Grupo de Intervenção Tática do Serviço de Operações Especiais (GIT/SOE) e de agentes da
própria Unidade ao utilizarem armas de fogo como forma de intimidação dos privados de
liberdade.

48
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Além disso, foi observada como uma situação vulnerável à tortura, a alocação de presos
ex-servidores em galerias muito próximas àquelas denominadas de “Terceiro Comando”
cuja separação é um pequeno alambrado, sendo de fácil acesso à passagem. Segundo relato
dos ex-servidores, por estes serem de número bastante minoritário em relação à facção
mencionada, a situação de estresse e ameaça é constante. Um deles que se identificou como
ex-policial relatou que foi reconhecido por um dos detentos da referida facção. Além disso,
foram relatadas situações de constante ameaça, como, por exemplo, uma intimidação com a
utilização de faca que foi contornada através de uma conversa entre os envolvidos no
conflito.

Segundo relatos dos presos, não há fornecimento de água no isolamento. Relatam, ainda,
que ocorrem agressões com cacetete quando os presos são para lá encaminhados.

Há ainda relatos de agressões físicas por parte de agentes. Segundo informado por alguns
internos, dias antes da visita do MEPCT/RJ um preso solicitou atendimento médico e foi
agredido por agentes por tal razão.

Como é regra no sistema prisional do Rio de Janeiro, os presos do Instituto Penal


Vicente Piragibe - SEAPVP também reportaram as agressões protagonizadas pelos agentes
do serviço de transporte da SEAP:

Um fator recorrente no relato dos detentos, no entanto, é uso contínuo e excessivo da força
por parte dos agentes do Serviço de Operações Externas – SOE –, tanto nas situações
ocorridas dentro da unidade quanto nas transferências realizadas pelo órgão. Um preso

49
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relatou que o SOE “esculacha muito” e que enquanto batem afirmam que “nós quebra e o
médico conserta”.38

Na inspeção ao Presídio Diomedes Vinhosa Muniz - SEAPVM frisou-se a


superlotação na cela de isolamento, o fato de presos estarem cumprindo sanção há mais
tempo do que o permitido pelo procedimento disciplinar (Decreto Estadual n.º 8.897/86) e
as agressões cometidas contra esses internos:

A unidade possui celas de isolamento e, neste local, haviam muitos presos. Tais celas
servem tanto para o cumprimento de sanções disciplinares quanto para isolar presos que
estariam em situação de risco se mantidos junto ao coletivo de presos. Nas celas de
isolamento encontramos superlotação, denúncias de que as sanções disciplinares já
superavam os 30 dias, presos sem colchão dormindo “na pedra”, presos sem cobertores e
cobrindo todo o corpo com a blusa durante a noite.

O Mecanismo não presenciou relatos sistemáticos de tortura e maus tratos. Porém, alguns
presos que estavam nas celas de isolamento denunciaram agressões físicas e verbais por
parte de inspetores.

Quando esteve no isolamento do Presídio Carlos Tinoco da Fonseca - SEAPCF, a


equipe do MEPCT/RJ também encontrou um cenário de flagrante violação de direitos:

No Presídio Carlos Tinoco da Fonseca, as condições de cumprimento de pena nas celas

38
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Instituto Penal Vicente Piragibe em 05 de dezembro
de 2011, (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 05 de Janeiro de 2012), acervo institucional
50
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destinadas ao isolamento de internos são terrivelmente ruins: não há colchões, roupas de


cama, kit higiene ou fornecimento de água, a iluminação elétrica não existe, e a solar é
precária por conta da estrutura das celas. Não há ainda para aqueles internos o banho de sol,
garantido por lei e fundamental para a vida saudável. A área do isolamento encontrava-se
muito suja. As celas não têm iluminação à exceção da luz do dia e de poucas lâmpadas no
corredor principal. As condições nas quais se encontravam o espaço demarcam sérias
violações no que tange à saúde física e mental dos internos.39

Na Penitenciária Moniz Sodré - SEAPMS o local destinado a cumprimento de


sanção disciplinar encontrava-se permanentemente alagado. Os presos denunciaram, ainda,
a violência cometida por agentes do serviço de transporte da SEAP:

Há na unidade uma pequena galeria com 8 celas designada para receber os presos em
isolamento. As condições destas celas é ainda pior, há água no chão de todo ambiente,
tornando o local bastante insalubre.

Segundo informações relatadas pelos presos, não há registros de uso de violência física por
parte dos agentes na Unidade. Contudo, conforme já foi explicitado, não diferente de outras
unidades já visitadas pelo Mecanismo, diversos relatos descrevem o reiterado uso
indiscriminado da violência por parte dos agentes do SOE no traslado para a Unidade, para
audiências ou para realização de atendimento médico externo.

39
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Presídio Carlos Tinoco da Fonseca em 23 de maio de
2016 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 23 de maio de 2016), acervo institucional
51
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vi. Superlotação

Embora a realidade de superlotação já tenha sido explicitada em números na tabela


acima, os efeitos que a superpopulação prisional acarreta na violação de direitos dos presos
merece maior detalhamento, haja vista a precarização das condições de detenção e o grave
sofrimento provocado por esta realidade.

No Instituto Penal Plácido Sá Carvalho - SEAPPC o quadro foi descrito pelo


MEPCT/RJ como o de um amontoado de seres humanos em condições aviltantes:

A superlotação das celas é um fator que salta aos olhos na unidade. Embora na ocasião da
visita muitos presos se encontrassem na parte externa da unidade gozando de banho de sol
ou praticando futebol, pôde-se observar nas instalações um amontoado de seres humanos
disputando pequenos espaços para se alojarem. A título de exemplo, vale fazer menção à
cela B5, a qual possui 86 presos, dos quais apenas 38 dormem nas camas de alvenaria, os
demais no chão. Devido às intensas infiltrações, em dias de chuva o chão fica repleto de
água e os presos não dormem.

O quadro de superlotação da unidade é gravíssimo. Há um cenário de aglomerado


populacional que avilta ainda mais as condições encontradas.

O relatório de inspeção ao Instituto Penal Vicente Piragibe - SEAPVP também


descreve a situação como grave:

52
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O número de presos nas celas chama muita atenção: em uma delas encontramos 60 presos
para 38 camas, 22 deles dormiam no chão. Em um corredor pequeno estes 22 dividiam os
colchões ou pedaços de colchão. Em outras galerias também pudemos testemunhar o
número muito alto de presos, como em uma delas que dos 70 presos, 24 dormiam sem
colchão.

O Instituto Penal Vicente Piragibe tem capacidade para 1.444 presos, mas tem superado o
número de 2.000 custodiados. A situação de superpopulação deste Instituto é muito grave.40

Idêntica situação penalizava os internos do Presídio Diomedes Vinhosa Muniz -


SEAPVM, tendo o MEPCT/RJ encontrado, como em todas as demais unidades para
cumprimento de pena em regime semiaberto, presos dormindo no chão:

A superlotação faz com que muitos presos sejam obrigado a dormir no chão. O Mecanismo
presenciou celas com 56 comarcas abrigando 86 internos.

Em ambos os relatórios de visita de monitoramento no Presídio Carlos Tinoco da


Fonseca - SEAPCF, chamou a atenção o alto percentual de superpopulação prisional, sendo
considerado, ainda, a pequena quantidade de agentes penitenciários responsáveis por levar
adiante toda a rotina de atividades da unidade, que terminam prejudicadas:

A Penitenciária tem capacidade para 898 e conta atualmente com 1.555 presos (174% da

40
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Instituto Penal Vicente Piragibe em 05 de dezembro
de 2011, (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 05 de Janeiro de 2012), acervo institucional
53
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capacidade). Há, portanto, superlotação. O número de agentes se mantém insuficiente, com


a rotina de seis agentes por turma. Nesta unidade, acontece um regime diferenciado de
trabalho, com plantões de 48/144 horas.41

A Penitenciária tem capacidade para 898 e conta atualmente com 1.500 presos (167% da
capacidade). Há, portanto, superlotação. O número de agentes é insuficiente, com a rotina
de seis agentes por turma. Nesta unidade, acontece um regime diferenciado de trabalho,
com plantões de 48/144 horas.42

A Penitenciária Moniz Sodré - SEAPMS, por sua vez, chegava a custodiar quase o
dobro do que o permitido por sua capacidade de lotação:

Segundo informações da direção a Penitenciária Moniz Sodré tem capacidade para abrigar
1.364 presos, contudo abrigava no dia da visita quase o dobro de sua capacidade, 2.396
presos. Muito embora as celas somente possuam até 62 comarcas, no dia da visita estas
chegavam a abrigar mais de 110 presos. Em muitas celas foi possível constatar que presos
dormem no chão. A direção acrescentou que em função do mutirão realizado pelo Conselho
Nacional de Justiça (CNJ), há meses atrás, 150 presos progrediram de regime, sendo
enviados ao Instituto Penal Vicente Piragibe.

41
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Presídio Carlos Tinoco da Fonseca em 23 de maio de
2016 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 23 de maio de 2016), acervo institucional
42
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Presídio Carlos Tinoco da Fonseca em 16 de setembro
de 2015 Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 16 de setembro de 2015), acervo institucional
54
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Na visita de monitoramento ao Instituto Penal Ismael Pereira Sirieiro - SEAPIS


também chamou a atenção a quantidade de presos dormindo no chão, em uma unidade com
capacidade para 368 prisioneiros, mas que custodiava 670. Em diálogo com a equipe do
MEPCT/RJ, tanto os presos quanto a direção da unidade chamaram a atenção para os
benefícios em atraso por parte da Vara de Execuções Penais do Tribunal de Justiça do
estado do Rio de Janeiro, apontando esse fator como causador do inchaço populacional.
Consideravam que, apesar de muito se falar em superlotação, não há prioridade em soltar
quem já está com os benefícios vencidos.

5. Considerações finais

Diante dos fatos apurados durante as Visitas de Monitoramento do MEPCT/RJ,


resta evidente que as condições de detenção a que estão submetidos os presos em regime
semiaberto no sistema prisional do Rio de Janeiro apresentam total inadequação em relação
aos padrões internacionais mínimos para o tratamento humano de prisioneiros.

Levando em consideração precedentes desta Corte, como no Caso Berenson-Mejía


versus Peru43, é possível afirmar que as condições de detenção em todas as unidades
equiparavam-se a tratamento cruel, desumano e degradante. É preciso dizer, ainda, que
resta inequívoca a falha do Estado brasileiro em alcançar o objetivo de “regeneração e
readaptação social” para as pessoas presas nesses locais, propósito pretendido quando da

43
Lori Berenson-Mejía v. Peru, sentença de 25 de novembro de 2004, Corte IDH, (ser C) No 119, par.
100;Caesar v. Trinidad e Tobago, sentença de 11 de março de 2005, Corte IDH, (Ser. C) No 123, par. 70.
55
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aplicação da pena, disposto no art. 5(6) da Convenção Americana e igualmente almejado


pela Lei de Execução Penal de 1984 ao prever, em seu art. 1º, a “integração social do
condenado e do internado”.

Todas as unidades para cumprimento de pena em regime semiaberto inspecionadas


pelo MEPCT/RJ apresentaram-se inadequadas para tal regime de execução. Conforme se
observou, apesar de indicadas para presos em regime semiaberto, esses estabelecimentos
oferecem tratamento compatível ao regime fechado, permitindo apenas a livre circulação
dos internos pelo pátio durante o dia, sendo esse tempo mais reduzido para aqueles que
estão no setor de isolamento.44 Nota-se que quatro estabelecimentos que recebem presos em
regime semiaberto também possuem presos em outros regimes de execução da pena, que
são o Presídio Diomedes Vinhosa Muniz - SEAPVM; o Presídio Carlos Tinoco da Fonseca
- SEAPCF; a Penitenciária Moniz Sodré - SEAPMS e a Penitenciária Inspetor Luis
Fernandes Bandeira Duarte - SEAPBD. Nesses locais, sequer o acesso mais flexível ao
pátio é permitido.

O regime semiaberto deveria ser realizado em Colônia Agrícola, Industrial ou


similar, mas o que se observa é uma mudança formal de nome, sendo as cadeias de regime
semiaberto (não exclusivamente) chamadas por Institutos Penais.45 Há, portanto, uma

44
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Instituto Penal Plácido Sá Carvalho em 31 de janeiro
de 2012 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 22 de março de 2012), acervo institucional
45
MEPCT/RJ. Relatório de visita de monitoramento ao Instituto Penal Vicente Piragibe em 05 de fevereiro de
2013 (Rio de Janeiro: MEPCT/RJ, 06 de fevereiro de 2013), acervo institucional
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situação anômala em que as unidades de regime semiaberto se constituem, em regra, à


semelhança dos estabelecimento de cumprimento de regime fechado.

A concessão de benefícios para trabalho extramuros, bem como o oferecimento de


atividades laborativas dentro das unidades, são extremamente reduzidos. Nesse sentido, há
sérios problemas no andamento dos processos judiciais na Vara de Execuções Penais, a
qual segue constituindo-se enquanto vara única no Tribunal de Justiça do estado do Rio de
Janeiro, estrutura já incompatível para atender a população carcerária do estado.46 Com
relação aos trabalhos intramuros, além da dificuldade em alcançar tal possibilidade, não há
variedade de funções - sendo sempre o trabalho na faxina -, bem como os pagamentos estão
permanentemente atrasados.47

Outrossim, é sabido que a superlotação carcerária tornou-se endêmica no Brasil,


segundo as palavras do Relator Especial da ONU contra a tortura, Sr. Juan Mendez, que

46
O MEPCT/RJ costuma recomendar “ao Tribunal de Justiça do estado do Rio de Janeiro: Promova em
caráter de urgência a descentralização da única Vara de Execuções Penais no estado, localizada na capital, de
modo a garantir que os processos de execução penal tramitem no foro da comarca onde se dá o cumprimento
da pena, como medida imperiosa à garantia do acesso à justiça e à celeridade processual”. Recomendação
feita no relatório Quando à Liberdade é Exceção: a situação das pessoas presas sem condenação no Rio de
Janeiro (Rio de Janeiro: Justiça Global e MEPCT/RJ, 2016), 78, disponível em
https://drive.google.com/file/d/0ByIgDzCTzaAEUkZGT2V1alZvZTA/view
47
O MEPCT/RJ costuma recomendar “à Secretaria de Estado de Administração Penitenciária, ao Tribunal de
Justiça do Rio de Janeiro e à Fundação Santa Cabrini, recomenda-se que: Garanta a todos os presos, inclusive
os provisórios, o direito à realização de atividades laborativas, esportivas, recreativas e educacionais, como
dispõe, respectivamente, a Seção I do Cap. III.e a Seção V do Cap. II do Título II da Lei de Execuções Penais
(Lei n.o 7.210/84) bem como a Medida n.o 210 do Plano Nacional de Política Criminal e Carcerária do
Ministério da Justiça”. Recomendação feita no relatório Quando à Liberdade é Exceção: a situação das
pessoas presas sem condenação no Rio de Janeiro (Rio de Janeiro: Justiça Global e MEPCT/RJ, 2016), 79,
disponível em ​https://drive.google.com/file/d/0ByIgDzCTzaAEUkZGT2V1alZvZTA/view
57
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esteve em visita oficial ao país de 2015.48 Se o encarceramento em massa já se mostra como


um fenômeno nefasto e que impacta centenas de milhares presos em todo o país, o mesmo
se verifica nas unidades de regime semiaberto do Rio de Janeiro, precarizando as condições
de detenção, de trabalho e de vida para internos, servidores públicos e familiares de pessoas
presas, respectivamente. Embora não seja possível afirmar, por meio das informações
disponibilizadas pela SEAP, a quantidade de vagas e de lotação relativas ao regime
semiaberto, resta evidente que elas refletem o excesso de presos em que se encontra o
sistema prisional do Rio de Janeiro. Nele, um total de 51.613 internos dividem as 28.158
vagas, numa lotação de 185%.

Além de configurar um problema em si, a superlotação desencadeia uma série de


problemas graves, constatados em todas as unidades inspecionadas. São eles: falta de
colchões, agasalhos cobertores, itens de higiene pessoal e coletiva; insuficiência no
abastecimento d’água; frequente obstrução dos encanamentos; instalações elétricas
expostas, improvisadas e sobrecarregadas; dificuldade de acesso à serviços médicos,
sociais, jurídicos, de transporte, de lazer, religiosos, educativos e profissionalizantes
oferecidos no ambiente prisional; entre outros. Nesse sentido, sublinha-se o que define o
guia Monitoramento de locais de detenção: um guia prático, da Associação para Prevenção
à Tortura:

48
ONU. Report of the Special Rapporteur on torture and other cruel, inhuman or degrading treatment or
punishment on his mission to Brazil. Human Rights Council. A/HRC/31/57/Add.4. Geneva, 2016, pár. 17.
58
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A ocupação do estabelecimento acima do número estabelecido de vagas será proibida por


lei. Quando desse fato decorra a violação de direitos humanos, deverá ela ser considerada
pena ou tratamento cruel, desumano ou degradante. A lei deverá estabelecer os mecanismos
para remediar de maneira imediata qualquer situação de alojamento acima do número de
vagas estabelecido. Os juízes competentes deverão adotar medidas corretivas adequadas na
ausência de regulamentação legal efetiva.

Diante da superlotação, a própria segurança de presos, seus familiares e agentes do


Estado se vê prejudicada, aumentando a probabilidade de que graves incidentes aconteçam.
O excesso de presos termina sendo utilizado como justificativa para a manutenção de
presos em unidades incompatíveis com o seu regime de cumprimento de pena, para a
simplificação da categorização de presos em razão da identificação de facções do
narcotráfico49 ou para manter juntos presos pertencentes a diferentes categorias, como em
razão de “idade, antecedentes criminais, razões da detenção e necessidades de tratamento”,

49
​É importante esclarecer que, embora muitos presos permaneçam custodiados em unidades prisionais
destinadas para uma determinada facção, nem sempre isso significa que existia o vínculo do preso com tais
organizações criminosas antes do momento da prisão. Contudo, dependendo da facção que domina o território
onde reside o preso ou sua família, ele (ou a própria SEAP) entende que só estará em segurança no sistema
prisional se escolher entre ir para uma unidade destinada a essa facção ou para uma das chamadas unidades de
seguro. Em regra, como as unidades de seguro oferecem condições de detenção muito duras, como, por
exemplo, altíssima superlotação, distância dos serviços prisionais do Complexo Gericinó e isolamento
territorial, os presos tendem a escolher cumprir sua prisão em unidades destinadas à facções. A partir desse
momento, mesmo quem não tinha contato com tais organizações do crime passa a ter, como passam também a
ser identificados como pessoas pertencentes à facção pelo sistema prisional fluminense. Nesse sentido, vale
lembrar que muitas vezes a SEAP pede que as pessoas presas assinem um termo de responsabilidade
indicando onde “escolhem” cumprir pena/prisão provisória dentro do sistema prisional. Apesar deste cenário,
muitos desses presos não desejam ter, não possuem e não possuirão papéis relevantes na estrutura dessas
organizações.
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conforme obrigam separar as Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de
Presos, em sua regra n.º 11.

Desse modo, ao afirmar que a superlotação das unidades de regime semiaberto no


Rio de Janeiro se apresenta na forma de tratamento ou punição cruel, desumano ou
degradante, o MEPCT/RJ tem como base o fato de que tal circunstância tem promovido
sofrimento, dano físico e psíquico, durante tempo prolongado:

La Corte Europea de Derechos Humanos ha sostenido que para que un trato sea
considerado como inhumano o degradante y, en grado extremo, como tortura, debe alcanzar
un mínimo nivel de severidad. La evaluación de este nivel mínimo es relativa y depende de
las circunstancias de cada caso, tales como la duración del trato y de sus consecuencias
físicas y mentales.50

O MEPCT/RJ ressalta que esse quadro de ilegalidades é administrado pela SEAP,


mas não deve ficar em segundo plano o fato de não haver oposição contundente a esta
realidade por parte dos órgãos que compõem o sistema de Justiça, como Tribunal de Justiça
e Ministério Público, que contribuem diretamente para o cenário de graves violações de
direitos humanos testemunhado nesses locais. Em referência ao quadro aqui exposto, o
MEPCT/RJ identificou os estabelecimentos penais como verdadeiras Torres de Babel,
avaliado mesmo por diretores de unidades prisionais como bombas relógio. Conforme

50
Corte IDH. ​Caesar v. Trinidad e Tobago​, sentença de 11 de março de 2005, Corte IDH, (ser. C) No. 123,
par 67. ​apud Cfr. Corte Europeia de Direitos Humanos, ​Irlanda v. Reino Unido​, No. 25 (1979-1980),
Julgamento de 19 de Janeiro de 1978, párrs. 162-163.
60
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expressou em nota a Pastoral Carcerária Nacional sobre as condições das prisões no Brasil,
o MEPCT/RJ entende que vem acontecendo no sistema prisional brasileiro não é fruto de
uma crise, mas de um projeto.51

Diante do enorme déficit de vagas, a destinação de recursos para a construção de


novas unidades prisionais deve ser uma medida em caráter de urgência, mas
definitivamente não pode representar uma solução exclusiva. A prioridade absoluta deve
apontar para a aplicação de políticas sociais de prevenção e o fomento de medidas
alternativas à pena de prisão – conforme possibilita a Lei 12.403/11 que altera o Código de
Processo Penal no que diz respeito à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais
medidas cautelares e dá outras providências –, por exemplo. É notório que o aumento
expressivo da população carcerária reflete políticas de segurança públicas empreendidas
sob a ótica repressiva; e a clara preferência da Justiça brasileira pela pena de prisão,
devendo-se ressaltar o enorme contingente a ocupar os presídios do Rio de Janeiro oriundos
de ordens de prisão provisória (41,83%).52

Não obstante todo esse cenário, já apontado como perpetrador de tratamento cruel,
desumano e degradante em face das pessoas presas, cumpre salientar os sistemáticos
episódios em que se constata uso excessivo da força e agressões contra prisioneiros

51
Ver nota em <http://www.a12.com/files/media/originals/nota_massacres.pdf>
52
Quando à Liberdade é Exceção: a situação das pessoas presas sem condenação no Rio de Janeiro (Rio de
Janeiro: Justiça Global e MEPCT/RJ, 2016), 78, disponível em
https://drive.google.com/file/d/0ByIgDzCTzaAEUkZGT2V1alZvZTA/view

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custodiados pela SEAP, inclusive nas cadeias para cumprimento de pena em regime
semiaberto. Tais fatos se enquadram no que proíbe a Convenção Interamericana para
Prevenir e Punir a Tortura, ao pressupor, em seu art. 2º, que haja a intenção do agente do
Estado, bem como a finalidade de intimidar, de castigar e de prevenir atos de terceiros,
dentre outras, para configurar a prática de tortura.

Considerando que as condições a que se veem submetidas as pessoas privadas de


liberdade no Rio de Janeiro extrapolam em muito “as dores ou sofrimentos físicos ou
mentais que sejam conseqüência unicamente de sanções legítimas, ou que sejam inerentes a
tais sanções ou delas decorram”, nos termos do art. 2(1) da Convenção Interamericana para
Prevenir e Punir a Tortura, o MEPCT/RJ chama a atenção não somente para a participação
de funcionários públicos que diretamente perpetram agressões, mas para toda a cadeia de
responsabilidades daqueles que contribuem para tais atos, tendo, em última instância, o
Estado como protagonista dessa violência.

Levando em conta o caráter institucional, reiterado e comprovadamente dirigido


contra um setor particular da sociedade brasileira - a população negra, pobre e que vive em
favelas/periferias - é importante classificar que a tortura e os maus tratos perpetrados no
bojo da atual política criminal e penitenciária configuram-se como uma prática de graves
violações de direitos humanos, as quais sujeitam o Estado brasileiro a ser responsabilizado
internacionalmente e seus autores a responderem pela prática de crimes contra a
humanidade.

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Em seus relatórios de visita de monitoramento, relatórios anuais, relatórios


temáticos, bem como informes para órgãos internos e internacionais, o MEPCT/RJ vem
apresentando diversas recomendações sobre mudanças de práticas e reformas institucionais,
que podem contribuir para a prevenção e erradicação da tortura. Contudo, objetivando o
presente informe apenas subsidiar a Corte Interamericana de Direitos Humanos, nas
Medidas Provisórias em epígrafe, com relação a elementos factuais que possam auxiliar nas
decisões relativas aos presos custodiados no Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho -
SEAPPC, o MEPCT/RJ não irá se estender nesse sentido, entendendo que este papel cabe
aos peticionário, ao Estado e à Corte no processo em questão.

Não obstante isso, o MEPCT/RJ aproveita a oportunidade para reforçar a


importância de que os juízes da Corte não somente levem em consideração o que foi
explicitado no presente informe ao estabelecer as Medidas Provisórias, mas que visitem ​in
loco as unidades de cumprimento de pena em regime semiaberto do Rio de Janeiro. Assim,
testemunhando o que foi demonstrado até aqui, a Corte irá constatar que uma eventual
transferência de presos do Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho - SEAPPC para outras
unidades de regime semiaberto não poderá, sem articulação com outras Medidas, garantir
para os beneficiados a efetivação dos direitos elencados na Convenção Americana sobre
Direitos Humanos, tendo em vista que tais direitos estão sendo sistematicamente violados
nos demais estabelecimentos penais. Certos da sensibilidade da Corte para essas questões, o
MEPCT/RJ avalia ser importante, na eventual transferências de presos para outras
unidades, que a Corte estabeleça Medidas para acompanhar e garantir a integridade pessoal

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dos mesmos nos demais estabelecimentos para cumprimento de pena em regime semiaberto
do Rio de Janeiro.

Para eventuais comunicados oficiais, o MEPCT/RJ solicita ser contatado no


endereço eletrônico ​mecanismorj@gmail.com​, no telefone n.º (55 21) 2588-1385 e no
endereço à Rua Primeiro de Março, s/n., sala 208, Palácio Tiradentes, Centro, Rio de
Janeiro - RJ, Brasil, CEP 20010-090, exclusivamente em nome de seus membros, ora
subscritos, Alexandre Campbell, Fabio de Almeida Cascardo, Graziela Contessoto Sereno,
Vera Lucia Alves, Patrícia de Oliveira e Renata V. Côrtes de Lira.

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Aproveita-se da oportunidade para manifestar os protestos de elevada estima e


consideração, deixando à disposição os meios de contatos abaixo discriminados para
eventuais esclarecimentos.

Rio de Janeiro, 17 de maio de 2017.

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