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WILSON, M. D. Knowledge of Self and Bodies. In: ______. Descartes.

London/New
York: Routledge, 2005, pp. 44-87.

Algumas teses defendidas na Segunda Meditação


1) Sabe-se certamente que o “eu” (cogito) existe, ainda que não se saiba com
certeza da existência dos corpos: o conhecimento do “eu” é primário e não
envolve os sentidos
2) Há uma apreensão da natureza do corpo que não envolve os sentidos. Tal
apreensão é superior àquela que se obtém através dos sentidos
3) O conhecimento do cogito e da natureza do corpo é claro e distinto
A tese (3) implica segundo a autora em duas afirmações: (a) será o fundamental para a
defesa da separação real entre mente e corpo; (b) a consciência de nossos pensamentos é
imediata, ou seja, há uma transparência epistemológica do pensamento.

Interpretação ingênua do cogito (baseada na formulação do Discurso e dos Princípios): a


proposição “eu existo” adquire sua indubitabilidade através da indubitabilidade da
proposição “eu penso”. A indubitabilidade do “eu penso” é algo dado (datum). Tal
certeza não está, no entanto, na consciência de outras ações realizadas como, por
exemplo, “eu ando”, “eu falo” e etc. Estas ações só poderiam ser indubitáveis se fossem
entendidas como parte do pensamento, ou melhor, se fossem entendidas do seguinte
modo: “eu penso (ou tenho consciência de que) que ando”, “eu penso (ou tenho
consciência de que) falo”.

Problema da interpretação ingênua: esta interpretação necessita de um princípio que


permita partir do “eu penso” para o “eu existo”, pois do contrário, tal inferência será
inválida. Este princípio oculto seria o seguinte: “tudo o que pensa, existe”. Ora, mas se é
necessário uma premissa universal que garanta a inferência de uma premissa particular
para uma conclusão particular, então o “eu penso, logo eu existo” é um silogismo, o que
é rejeitado por Descartes (posição de André Gombay). A autora apresenta a seguintes
observações a este problema
a) De fato, Descartes assume a importância deste princípio universal, ora pondo-o
como algo que está implicitamente presente na inferência “eu penso, logo eu
existo”, ora pondo-o como uma conclusão posterior a esta inferência
b) O fato de o “eu penso, logo eu existo” ser uma inferência, não significa que ele
seja um silogismo [não entendi: explicação no ponto (c)]
c) O fato de Descartes negar que o “eu penso, logo eu existo” seja um silogismo
talvez leve a pensar que a inferência “eu penso, logo eu existo” seja
simplesmente uma instância (um exemplo, uma aplicação) do princípio
universal “tudo o que pensa, existe”
d) De fato, Descartes oferece um princípio (ou princípios) que garante (ou
garantem) a passagem do “eu penso” para o “eu existo”. Contudo, como salienta
Harry Frankfurt, permanece sem justificativa o seguinte: por que o “eu penso” é
certo e indubitável, enquanto que “eu ando e “eu como”, por exemplo, não o
são? Por que, deste modo, só posso passar para o “eu existo” a partir do “eu
penso” e não a partir de outras ações realizadas por mim? O que garante a
indubitabilidade da experiência de pensar? De acordo com M. Wilson, Descartes
faz uma diferenciação entre a existência do pensamento e o conteúdo do
pensamento, defendendo que a existência do pensamento é indubitável e certa.
Assim, não haveria necessidade de justificar a certeza do “eu penso”, ele é
imediatamente percebido pelo intelecto como tal.
As opiniões aqui apresentadas solucionam um problema, mas deixam outro. Por um
lado, não falta algo que garanta a passagem do “eu penso” para o “eu existo”: há, de
fato, um princípio que garante esta passagem, a saber, o princípio “tudo o que pensa
existe” (não importa aqui se ele é uma conclusão posterior ao “eu penso, logo eu
existo” ou um princípio implícito presente no “eu penso, logo eu existo”). Por outro,
falta algo que justifique a indubitabilidade da experiência de pensar e a
dubitabilidade da experiência de outras ações: isto é, de fato, afirmado por
Descartes, sem qualquer defesa ou fundamentação.

Problema da interpretação ingênua: o argumento do cogito é uma petição de


princípio (objeção de J. Hintikka e Bernard Williams). A circularidade parece estar
no seguinte: a indubitabilidade da existência é posta antes mesmo de ser provada. O
“eu penso, logo eu existo” começa pela afirmação da experiência de pensar (“eu
penso”) e culmina na afirmação da existência do pensante (“eu existo”). A
indubitabilidade da existência do pensante (“eu existo”) é garantida pela
indubitabilidade da experiência de pensar (“eu penso”). Entretanto, o que garantiria
a indubitabilidade da experiência de pensar (“eu penso”)? Segundo esta crítica, a
resposta estaria na indubitabilidade da existência do pensante (“eu existo”): mesmo
que eu duvidasse desta experiência, não poderia negar que existo enquanto realizo
este ato de duvidar. Assim, o “eu penso” justifica o “eu existo” e o “eu existo”
justifica o “eu penso”.
Segundo Wilson, duas coisas poderiam mostrar que não há tal circularidade: (a) esta
bi-implicação não está envolvida no momento em que se realiza a passagem do “eu
penso” para o “eu existo”. A indubitabilidade do “eu penso” é mais imediata do que
a indubitabilidade do “eu existo”. Depois de feito o “eu penso, logo eu existo” é que
se percebe que a indubitabilidade do “eu existo” garante a do “eu penso”. Em outras
palavras, o que a autora parece estar dizendo é que existem dois momentos
diferentes envolvidos: em um primeiro momento, há o próprio raciocínio pelo qual
se prova a existência do cogito (no qual se percebe o “eu penso” como imediato e
daí se conclui o “eu existo”); em um segundo momento, há a reflexão sobre o
raciocínio realizado (na qual se percebe que a imediaticidade e indubitabilidade do
“eu penso” vem do fato de que o “eu existo” não pode ser posto em questão).
Assim, a indubitabilidade do “eu existo” não está implicitamente presente no
momento em que a prova da existência do cogito está sendo realizada [pergunta: isto
evita que o raciocínio seja circular? O raciocínio não seria circular desde o início,
embora isto só seja percebido depois?]; (b) a indubitabilidade do “eu penso” não se
sustentaria somente na indubitabilidade do “eu existo”, mas também em outras
razões como, por exemplo, no fato de que não se precisa conhecer o corpo para se
conhecer que o “eu penso” é indubitável.

Problema da interpretação ingênua do cogito: o que garante legitimidade à própria


inferência de que se sei que X pensa, então X existe (crítica de Anthony Kenny e J.
Hintikka)? De fato, Descartes admite que se possa saber com clareza e distinção
certos conteúdos, ainda que não se possa, a partir daí, concluir que estes conteúdos
existam (basta pensar na diferença entre persuasão e conhecimento: posso estar
persuadido de que “a soma dos ângulos de um triângulo é 180º”, mas a partir disto
não posso conhecer a existência dos triângulos). O fato de saber algo com clareza e
distinção (verdade subjetiva) não garante imediatamente que este algo exista
(verdade objetiva). Assim, eu posso saber com clareza e distinção que (ou seja,
posso estar persuadido de que) eu penso, ainda que não saiba se (ou seja, ainda que
não conheça se) eu existo ou não. Em outras palavras, esta crítica ataca diretamente
o princípio “tudo o que pensa, existe”.
Para responder a isto, a autora apresenta as seguintes possibilidades: (a) Descartes
aplica este princípio somente a ações e não a propriedades. Assim, se uma ação é
verdadeira, então a existência daquele que a realiza também é. Por exemplo, só
posso ir de “Scooby-Doo está latindo” para “Scooby-Doo existe” se for comprovado
que de fato Scooby-Doo está latindo: caso sim, então se pode inferir que “Scooby-
Doo existe”; caso não, então não se pode inferir que “Scooby-Doo existe”. Isto não
se aplica a casos como “o triângulo tem a soma de seus ângulos em 180º, logo o
triângulo existe”, porque “ter a soma dos ângulos em 180º” não é uma ação, mas
sim uma propriedade do triângulo. [problema: isto já não pressuporia a existência de
Scooby-Doo antes mesmo de prová-la?]; (b) Descartes aplica este princípio a
propriedades atualmente percebidas. Assim, se uma propriedade é atualmente
percebida de modo claro e distinto, então existe algo que possui esta propriedade
(este movimento é usado, por exemplo, para conhecer a existência da substância a
partir de seus atributos).

“These considerations should draw our attention to one important point. When
Descartes says that ‘cogito’ is indubitable he surely is assuming some kind of direct
awareness of an actual thought-process. The existence or actuality of thought should
surely be construed as part of the datum of the cogito. Therefore, Descartes’s
principle, ‘whatever thinks exists,’ should perhaps be read along something like the
following lines: whatever is actually thinking, has actual thoughts, must itself be an
actual being, an existing thing. When it is read in this way worries about predication
of possibles (or fictitious entities, or essences) do not seem to obtrude” (p. 58).

Outro problema, ao qual a autora não visa responder, é o seguinte: Descartes, em


alguns momentos, dá a entender que o princípio da prova da existência do cogito é
“há, neste momento, um pensamento” e não “eu penso”. Isto leva à dificuldade de
saber como passar de “há um pensamento sendo realizado” para “eu penso”. Mesmo
que se admitisse que a partir do atributo pensamento é possível inferir a existência de
uma substância no qual ele inere (a saber, “eu”), isto faria com que o “eu penso” não
fosse imediatamente evidente: os atributos do “eu” seriam evidentes e não o próprio
“eu”.
Além da interpretação ingênua, existe também a interpretação performativa do
argumento do cogito (defendida por J. Hintikka) que, em linhas gerais, é a seguinte
segundo a leitura de Wilson. A proposição “eu não existo”, quando emitida por mim,
é em si mesma contraditória, pois: (a) esta proposição causará naqueles que me
ouvem a certeza da veracidade da proposição oposta, a saber, “eu existo”; (b) esta
proposição causará em mim a certeza da proposição oposta, a saber, “eu existo”.
Portanto: “He [Descartes] seems to be arguing that to think the thought ‘I do not
exist’ is to engage in an intrinsically absurd performance, and that the observation
that this is so is the essential content of Descartes’s ‘insight’ concerning the certainty
of ‘I exist’” (p. 61).
A interpretação performativa tem alguns problemas: (a) ela não envolve a relação
entre “eu penso” e “eu existo”; (b) ela pressupõe a existência, ao menos, das pessoas
que me ouvem, o que levará à afirmação da existência de alguma coisa antes mesmo
de isto ser provado; (c) nada previne que a hipótese do Deus Enganador aja sobre o
raciocínio a cerca da proposição “eu não existo”, de modo que o Deus Enganador
poderia me fazer acreditar que ela leva à proposição oposta.

Segundo a autora, o cogito carrega em si 5 teses: (1) eu penso; (2) eu sou uma coisa
que pensa; (3) o pensamento é uma das minhas propriedades essenciais; (4) o
pensamento é a minha única propriedade essencial; (5) eu sou essencialmente uma
coisa pensante, mas não essencialmente material.
Quais delas são afirmadas no argumento do cogito presente na 2ª Meditação?
Segundo Wilson, a 2ª Meditação afirma (1), (2) e (3). Ademais, Descartes defende
uma versão atenuada das teses (4) e (5), a saber: (4*) O pensamento é a única
propriedade que sei ser essencial a (ou inseparável de) mim; (5*) Eu não sei se o
pensamento é idêntico a alguma propriedade corporal.
A tese (4) não é afirmada ainda em seu sentido forte, porque, na 2ª Meditação,
Descartes inclui no pensamento atividades corporais como sentir.
A tese (5) não é afirmada, porque não se sabe ainda se os corpos existem e, portanto,
só poderá ser demonstrada na 6ª Meditação.

Objetivos do argumento da cera: (a) mostrar que o conhecimento dos corpos que se
adquire através dos sentidos e da imaginação não é mais claro e distinto do que o
conhecimento da mente; (b) mostrar que os corpos só são conhecidos clara e
distintamente através do pensamento, e não dos sentidos e da imaginação; (c) mostrar
qual é o conteúdo do conhecimento claro e distinto que se pode ter da natureza do
corpo; (d) mostrar mais detalhes sobre a natureza da mente (opinião de Wilson); (e)
fundamentar a distinção entre mente e corpo que será defendida na 6ª Meditação.

O motivo de os sentidos não poderem prover um conhecimento claro e distinto sobre


algo material (como um pedaço de cera) se deve, segundo a autora, ao fato de eles
perceberem somente qualidades sensíveis particulares: esta cor, este tamanho, este
formato e etc.

Dificuldade em entender a clareza e a distinção do conhecimento que se tem da cera:


ao que parece o conhecimento claro e distinto da cera se dá pelo fato de o intelecto
apreender as propriedades permanentes e imutáveis da coisa. Entretanto, o
conhecimento dos modos mutáveis da mente é considerado por Descartes um
conhecimento claro e distinto da mente.

Conclusão do argumento da cera: mostra-se que certas propriedades da cera


pertencem a ela (e, portanto, não mudam) e que outras não lhe pertencem (e, por isso,
mudam). Não pertencem à cera propriedades como cor, flagrância, figura e etc., isto
é, os modos pelos quais a cera é percebida em um determinado instante do tempo.
Pertencem à cera as propriedades (a) de ser extensa; (b) de ser flexível; (c) de ser
mutável.

Ao afirmar aquilo que é clara e distintamente conhecido do pedaço de cera,


Descartes está mostrando aquilo que pertence ao conceito (ou à essência) do corpo, a
saber, extensão, flexibilidade e mutabilidade. O argumento da cera não visa (ainda,
pelo menos) mostrar a diferenciação entre qualidades primárias (figura e movimento)
e secundárias (cor, som, gosto e etc.).

De modo similar a Martial Gueroult, Wilson afirma que existe uma certa assimetria
ao tratar do conhecimento do corpo e do conhecimento da mente. No caso da mente,
há um conhecimento não só da sua existência, mas também da sua essência (ao
menos na 2ª Meditação, do pensamento e dos modos do pensamento; não se mostra
ainda que o cogito é essencialmente pensamento). No caso do corpo, há um
conhecimento da essência do corpo (a saber, do elenco dos atributos presentes no
corpo: extensão, mutabilidade e flexibilidade), mas não de sua existência.
Nas palavras da autora: “What we find distinctly given in ourselves, with respect to
ourselves, are both our essential faculties, and non-essential faculties and states.
What we find distinctly given in ourself, with respect to bodies, is only their abstract
concept” (p. 72).

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Obs. (1): Talvez, a 2ª Meditação só introduza a definição verdadeira do corpo e da
mente (a saber, aquela definição que elenca as propriedades de algo). A verdadeira
definição (ou seja, aquela definição que determina a propriedade principal e, logo, a
essência de algo) do corpo e da mente seja posta, respectivamente, na 5ª e na 6ª
Meditações.

Obs. (2): Extensão: segundo Descartes, ter largura, comprimento e profundidade. Os


modos são formas pelas quais algo pode ter largura, comprimento e profundidade.
Na escolástica, ter extensão significa (a) ser divisível em partes que ocupam espaços
diferentes (partes extra partes); (b) ocupar determinado espaço; (c) ser mensurável
tridimensionalmente (comprimento, altura e largura). A controvérsia entre os
escolásticos consistia em saber se a matéria era essencialmente extensa (posição de
Averróis, por exemplo) ou essencialmente inextensa (posição de Tomás de Aquino,
por exemplo)
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O Princípios da Filosofia (II, art. 3, 4, e 11) deixa claro o motivo de cor, som, figura,
tamanho e etc., não fazerem parte do conceito de corpo: pode-se abstrair estas
qualidades sem que o conceito de corpo seja diminuído; contudo, não se pode
abstrair a extensão sem que o conceito de corpo seja diminuído. Em outras palavras,
cor, som, figura e etc. não podem ser concebidos sem que seja pressuposto um corpo
e, consequentemente, uma determinada extensão; mas o corpo e a extensão podem
ser concebidos sem que seja pressuposto algum tipo de cor, figura e etc. O corpo e a
extensão podem ser concebidos sem incluir em si figura, cor e etc., mas cor, figura e
etc. não podem ser concebidas sem incluir em si corpo e extensão.
A autora parece querer responder à seguinte pergunta: porque o argumento da cera
liga não só a extensão à essência do corpo (algo que parece ser uma característica do
corpo enquanto tal), mas também a mutabilidade e a flexibilidade (algo que parece
ser uma característica de corpos individuais)? Interpretando Princípios da Filosofia
(parte II), a autora dirá que a natureza dos corpos enquanto tais consiste na extensão,
ou seja, no fato de ser composto de partes e de estas partes estarem sujeitas ao
movimento. As propriedades que são concebidas clara e distintamente do corpo (a
saber, os modos) se reduzem à extensão, ou seja, elas são explicadas pela interação e
pelo movimento destas partes. Assim, mutabilidade significa que um corpo está
sujeito a diferentes movimentos, pois estes movimentos decorrem dos movimentos
de suas partes; a flexibilidade significa, segundo Wilson, que um corpo pode assumir
diferentes formatos, pois esta mudança de figura decorre das diferentes
configurações que as suas partes podem assumir [dúvida: mutabilidade e
flexibilidade seriam, portanto, modos da extensão?].

Percepção clara e distinta do pedaço de cera: (a) a percepção do conjunto das


qualidades sensíveis da cera não é uma percepção clara, ou seja, não é uma
percepção que aparece à mente de modo tão forte que não está sujeita à dúvida. Só há
uma percepção clara e distinta da cera quando há uma análise de cada um dos
elementos que compõem este conjunto; (b) a percepção do pedaço de cera pelos
sentidos não é relevante para a percepção clara e distinta da cera e de sua natureza;
(c) a percepção intelectual da cera é distinta na medida em que ela é percebida em si
mesma, separada da mistura com as qualidades sensíveis.

“The point that Descartes is beginning to try to get across in the wax discussion is the
conclusion required (as he sees it) for his physics: that it is the nature of any body at
all (just) to be something extended, flexible and movable. And he thinks in
recognizing this we must necessarily recognize at the same time that it is ‘the mind’
rather than sense that perceives the nature of body” (p. 81).

O conhecimento da essência dos corpos oferece também uma nova informação sobre
a natureza da mente: ela tem capacidades que não se identificam com os processos
mecânicos que ocorrem na imaginação e nos sentidos. Em outras palavras, o
conhecimento que se tem do corpo pelo pensamento (ou pela mente) mostra que não
está na essência do pensamento (ou da mente) nenhum tipo de processo físico-
mecânico. Isto será importante para a distinção entre mente e corpo na 6ª Meditação.

O conhecimento da mente é mais evidente do que o do corpo: toda a vez que a mente
realiza um juízo sobre um determinado corpo, ela tem evidência imediata de que ela
existe (isto nada mais é do que um corolário do argumento do cogito). Entretanto,
este mesmo juízo não garante a existência deste corpo ao qual o juízo se dirige (tendo
em vista a hipótese do Gênio Maligno).

Cogitava-se que os corpos eram objetos mais distinta e claramente conhecidos do


que a mente, já que a fonte de conhecimento dos corpos eram os sentidos e a
imaginação. Entretanto, os corpos só são clara e distintamente conhecidos na medida
em que a mente os conhece, e não os sentidos e a imaginação. Deste modo, os
objetos conhecidos pela imaginação e pelos sentidos não são mais clara e
distintamente conhecidos do que a mente.

De que modo há prioridade, clareza e distinção não só no conhecimento da existência


da mente (algo que não é controverso, dado o raciocínio de Descartes até agora), mas
também de sua essência (algo que é problemático de se afirmar)? O argumento da
cera mostra somente a prioridade do conhecimento da existência da mente, mas não
da essência. Antes do argumento da cera, só foi oferecido um elenco de propriedades
da mente, o que não oferece uma definição precisa da natureza da mente (objeção de
Gassendi).
“Gassendi’s point then, is that Descartes claims a superior knowledge of his mind on
the basis of a catalogue of its most superficial properties—the sort of catalogue that
no one, least of all Descartes, would regard as establishing a distinct knowledge of
body” (p. 84).
Além disso, o argumento da cera mostra que só há um conhecimento claro e distinto
do corpo na medida em que se define qual é a sua essência (e não simplesmente se
elenca uma série de propriedades do corpo). No entanto, Descartes diz que o
conhecimento do conjunto de propriedades da mente é superior e mais claro e
distinto do que o conhecimento da essência do corpo. Há duas possíveis respostas,
segundo a autora, para o elenco das propriedades da mente ser prioritário e mais
claro e distinto do que o conhecimento da propriedade essencial do corpo: (a) estas
propriedades da mente são superiores ao conhecimento da essência do corpo, pois
elas são propriedades que não são físico-mecânicas. Só isto já garante a sua
superioridade em relação ao conhecimento do corpo como extensão e como,
portanto, sujeito a processos físico-mecânicos; (b) a mente é completamente
transparente a si mesma, de modo que ela não precisa de maiores explicações. O
simples elenco de suas propriedades já suficiente para determinar sua superioridade
em relação à essência do corpo, já que estas propriedades, além de serem elencadas,
são também imediatamente transparentes e, portanto, conhecidas pela mente.

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