Вы находитесь на странице: 1из 9

Como chegamos a um estado de tanta desinformação - Nexo Jornal 07/10/2018 12(43

ENTREVISTA (HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/ENTREVISTA/)

Como chegamos a um estado de tanta desinformação


Matheus Pimentel 06 Out 2018 (atualizado 06/Out 21h07)

‘É curioso que pessoas muito bem informadas difundam notícias falsas. Algumas porque caíram na
esparrela, outras porque acham que vale a pena’, diz Eugênio Bucci, professor de comunicação da USP,
nesta entrevista ao ‘Nexo’

FOTO: PHIL NOBLE/REUTERS

! "

# (mailto:?
subject=Informa%C3%A7%C3%A3o%20clara%20e%20bem%20explicada%20voc%C3%AA%20encontra%20aqui.%20Nexo%2C%20leitura%20obrigat%C3%B3ria%20para%20quem%20quer%20entender%20o%20contexto%20das%20principais%20not%C3%ADcias%20do%20Brasil%20e%20d
chegamos-a-um-estado-de-tanta-desinforma%25C3%25A7%25C3%25A3o%3Futm_source%3Dsocialbttns%26utm_medium%3Darticle_share%26utm_campaign%3Dself)

% (whatsapp://send?text=https%3A%2F%2Fwww.nexojornal.com.br%2Fentrevista%2F2018%2F10%2F06%2FComo-chegamos-a-um-estado-de-tanta-desinforma%25C3%25A7%25C3%25A3o%3Futm_source%3Dsocialbttns%26utm_
Informa%C3%A7%C3%A3o%20clara%20e%20bem%20explicada%20voc%C3%AA%20encontra%20aqui.%20Nexo%2C%20leitura%20obrigat%C3%B3ria%20para%20quem%20quer%20entender%20o%20contexto%20das%20principais%20

& CELULAR COM APLICATIVOS DE MENSAGEM

https://www.nexojornal.com.br/entrevista/2018/10/06/Como-chegamos-a-um-estado-de-tanta-desinformação Page 1 of 9
Como chegamos a um estado de tanta desinformação - Nexo Jornal 07/10/2018 12(43

O Brasil vive um clima geral de desinformação


(https://brasil.elpais.com/brasil/2018/10/03/politica/1538583736_557680.html)
durante a campanha de 2018. Boatos e mentiras que favorecem este ou aquele candidato
têm sido espalhados pela internet para tentar influenciar o resultado da eleição. É difícil
medir o tamanho dessas redes, quem está por trás da difusão, quanto dinheiro está
envolvido, ou mesmo o impacto que esses conteúdos falsos têm na decisão final do
eleitor.

O canal mais importante (https://www.nexojornal.com.br/grafico/2018/10/02/Como-


informa%C3%A7%C3%B5es-pol%C3%ADticas-circulam-no-WhatsApp-segundo-esta-
pesquisa) para disseminar boatos no Brasil é o aplicativo de mensagens instantâneas
WhatsApp. Em grupos ou conversas particulares, é comum receber uma enxurrada de
conteúdo político, em texto, imagem ou vídeo. Em muitos casos, são montagens ou
mentiras para enganar o eleitor.

Grupos políticos no WhatsApp costumam ser um bombardeio de mensagens,


compartilhadas por uma pequena minoria dos usuários — por volta de 10%, de acordo
com um estudo da PUC de Minas e da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). A
grande maioria só visualiza ou participa pouco da conversa.

66%
dos eleitores brasileiros usam o WhatsApp, a
rede mais popular, segundo o Datafolha

120 milhões
é o número de usuários do WhatsApp no Brasil,
segundo a empresa

Notícias falsas são em geral extremamente chamativas e espetaculosas. A tendência é


acreditar nelas (https://www.nexojornal.com.br/podcast/2018/05/27/P%C3%B3s-
verdade-fake-news-e-as-elei%C3%A7%C3%B5es-no-Brasil), quando reforçam ideias e
crenças pré-existentes — como rejeitar determinado político ou partido. A isso se dá o
nome de viés de confirmação, um padrão nos nossos cérebros de tender a aprovar tudo o
que corrobora nossas visões de mundo e paixões, dando menos peso à racionalidade. Em
muitos casos, ser verdade ou não pouco importa para quem vê o boato.

Na imprensa e na sociedade civil, existem iniciativas para combater a desinformação.


Entre elas está o Comprova (https://projetocomprova.com.br/), do qual o Nexo e outros
23 veículos de comunicação brasileiros fazem parte. São verificados os principais boatos
da campanha presidencial que circulam nas redes.

https://www.nexojornal.com.br/entrevista/2018/10/06/Como-chegamos-a-um-estado-de-tanta-desinformação Page 2 of 9
Como chegamos a um estado de tanta desinformação - Nexo Jornal 07/10/2018 12(43

Do lado da Justiça, o Tribunal Superior Eleitoral criou em dezembro de 2017 um


conselho para lidar com as notícias falsas na eleição. O grupo não se reuniu durante toda
a campanha, não conseguiu chegar a conclusões nem tomar medidas
(https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/10/tse-falha-no-combate-a-fake-news-na-
campanha-de-primeiro-turno.shtml) concretas nessa área.

Todo esse panorama levanta algumas questões: o que levou o Brasil a esse estado de
desinformação e como ele afeta a democracia? O direito à liberdade de expressão permite
fabricar notícias falsas? Foi sobre isso que o Nexo conversou com Eugênio Bucci,
professor de comunicação da USP (Universidade de São Paulo) e ex-presidente da
Radiobrás, hoje EBC, empresa estatal de comunicação.

A eleição de 2018 é a eleição da desinformação?


EUGÊNIO BUCCI É uma eleição impulsionada por intolerâncias e preconceitos, alguns
carregados de ódio. Até aqui tivemos uma polarização clara. As maiores concentrações de
eleitores estão em dois extremos: de um lado Jair Bolsonaro e de outro Luiz Inácio Lula
da Silva, depois substituído por Fernando Haddad. O centro ficou pateticamente vazio.
Nesse ambiente prosperam manifestações de intolerância.

Note que tanto o lado do PT, em algumas de suas correntes — não todas —, como o lado
do Bolsonaro, em alguns de seus grupos, condenam a imprensa peremptoriamente,
batem contra a instituição. É curioso observar que, para um contingente de apoio a Lula e
Haddad, a imprensa não é confiável, principalmente a Rede Globo, porque estaria
comprometida com o capital financeiro, seria elitista, comprometida com o que há de
mais atrasado na sociedade brasileira — todos esses chavões são repetidos. De outro lado,
no bolsonarismo, a gente nota a condenação da imprensa, virulência, brutalidade verbal
ao se referir a jornalistas e meios de comunicação por motivos opostos — a Rede Globo
seria de esquerda, a Folha de S.Paulo seria comunista. Também há uma impaciência
contra a Globo porque ela fez a série “Os dias eram assim”, que seria, na visão desses
grupos, uma calúnia contra a ditadura militar, ou por colocar personagens homossexuais
em novelas, o que colaboraria para corroer a família brasileira.

Isso mostra uma incapacidade desses núcleos políticos de conviver com a verificação dos
fatos, de conviver com relatos jornalisticamente confiáveis e objetivos a partir dos quais
poderia se estruturar uma opinião pública. Ao contrário, esses polos de intolerância
rejeitam tudo aquilo que verifique fatos. Tendem a se apoiar no relato factual como se
fosse expressão de uma doutrina principista e moralista. Isso molda o debate público nas
eleições de 2018. Nós estamos lidando com fundamentalismos que hostilizam a verdade
factual. Nesse sentido, temos um ambiente de desinformação, se chamarmos de
“informação” o relato factual, confiável e objetivo.

Aquilo que apareceu logo no início do governo de Donald Trump, de assessores do


presidente americano falando em “fatos alternativos”, é uma espécie de mantra para
esses polos mais fundamentalistas, cada um em sua oposição. Eles rejeitam o fato e
preferem a doutrina. Isso é desinformativo, porque convida o público a tomar decisões a

https://www.nexojornal.com.br/entrevista/2018/10/06/Como-chegamos-a-um-estado-de-tanta-desinformação Page 3 of 9
Como chegamos a um estado de tanta desinformação - Nexo Jornal 07/10/2018 12(43

partir de verdades que dispensam os fatos, verdades principistas, quase religiosas, não
verdades que são produto do exercício da razão. Sim, estamos numa eleição muito
poluída pela desinformação.

Mas precisamos diferenciar as coisas. Existe hostilização da imprensa na esquerda e na


direita. Num plano, ambas são mais ou menos equivalentes. Mas temos grandes
diferenças entre elas. As falanges da direita, neste momento, flertam de modo muito
explícito com saídas e soluções antidemocráticas. Nas manifestações desinformativas
dessas falanges da direita, existem inúmeras brincadeiras ou apologias de práticas como
tortura, desde declarações do próprio candidato Bolsonaro, como a que ele deu na
votação do impeachment contra Dilma Rousseff, em abril de 2016, na Câmara dos
Deputados. Bolsonaro elogiou o coronel [Carlos Alberto] Brilhante Ustra, disse que ele
era o “pavor” de Dilma [que sofreu torturas durante a ditadura], ou seja, explicitamente
elogiou o torturador. Não era um militar qualquer, mas um militar que torturava. Temos
inúmeras outras declarações, dele ou de seguidores dele, inclusive com uso de imagens de
tortura. Esse tipo de manifestação tem aparecido só à direita, não aparece assim nas
intolerâncias que surgiram à esquerda.

Há outros sinais de investimento no campo fora da democracia à direita. Manifestações


de discursos machistas, como as que legitimam o estupro ou as que pudemos ouvir de
novo do candidato Bolsonaro, por ocasião da polêmica dele com [a deputada federal do
PT] Maria do Rosário. Ele declarou que só não a estupraria porque ela era feia e não
merecia. Há uma série de manifestações da direita que glorificam o estuprador ou
ofendem, rebaixam as mulheres. O mesmo em relação aos homossexuais.

É uma postura extremamente


conservadora que rompe com a
democracia por uma razão muito
nítida: joga no lixo os direitos das
“A política foi enxovalhada
minorias e da liberdade de expressão.
Uma democracia, muito mais do que a
pela ação dos seus próprios
vontade da maioria, é o regime em que
protagonistas”
os direitos das minorias e as garantias
individuais são respeitados
plenamente. Democracia não é apenas prevalência da opinião da maioria nas decisões
gerais. Se uma força política atropela essas categorias, é uma força política que rompe
com a democracia da mesma maneira que uma corrente política que atropela a vontade
da maioria.

Estou dando exemplos dessa intolerância de direita que mostram que ela é
qualitativamente mais nociva e odienta do que a intolerância de esquerda. É necessário
diferenciar isso porque é preciso eliminar da análise uma terceira via de desinformação
que acontece no discurso eleitoral: a via de dizer que os dois extremos se equivalem. Isso
não é verdade, neste momento. Há dois fundamentalismos nos extremos, mas não são
exatamente equivalentes. O da direita rompe com a democracia. O da esquerda, por mais
que fique esperneando com a ideia de que Lula é totalmente inocente, o que é um pouco
ridículo, não rompe com a democracia. Essa terceira via no Brasil no momento é uma via
da desinformação, o que é um pouco caricato, porque consiste em dizer que os dois

https://www.nexojornal.com.br/entrevista/2018/10/06/Como-chegamos-a-um-estado-de-tanta-desinformação Page 4 of 9
Como chegamos a um estado de tanta desinformação - Nexo Jornal 07/10/2018 12(43

extremos se equivalem. Se houver segundo turno e o Brasil tiver que fazer uma opção, o
que vai se desenhando é claramente uma opção dentro do campo democrático e a outra
opção fora do campo democrático.

E qual é o motivo dessa desinformação?


EUGÊNIO BUCCI Houve um desgaste gravíssimo, uma corrosão cujas consequências são
difíceis de medir e prever. Eu falo de uma corrosão da credibilidade da atividade política.
Todos os políticos acabaram, mais ou menos, sendo postos no mesmo saco de agentes da
corrupção, de todos os partidos. A política foi enxovalhada pela ação dos seus próprios
protagonistas e, depois, pela incapacidade de esses protagonistas discutirem
politicamente os motivos que os levaram a agir como agiram no campo da corrupção.
Fala-se muito da ausência de autocríticas do PT, do PSDB e dos outros. Mas dos outros
quase não se pode esperar coisa nenhuma, é uma indigência de repertório. PT e PSDB
poderiam ter apresentado autocríticas. Com o PT foi um pouco pior, porque o PSDB pelo
menos não ficou insistindo na idolatria dos seus corruptos, como aconteceu com o PT.

A autocrítica é da responsabilidade dos agentes políticos, e a ausência dela ficou como um


atestado de que a política é incapaz de resolver democraticamente e por conta própria os
seus desvios, enfermidades e abusos. É como se a política não fosse o caminho para
resolver os males gerados pela própria política, daí o senso comum conclui que é
necessário buscar uma força externa para enquadrar e sanar a política, até mesmo
sacrificando a própria política.

Aí surge o ambiente de mentalidades que quase conclamam medidas autoritárias para


disciplinar os políticos. Isso agrava a desinformação por uma razão muito simples: é uma
espécie de absurdo, de inconsistência lógica esperar que uma autoridade autoritária
resolva o problema da corrupção. Não se encontra uma evidência, em nenhum lugar, que
corrobore essa expectativa. O autoritarismo não resolve o problema da corrupção. Pode
ser que ele resolva temporariamente e, mesmo assim precariamente, num território
pequeno, numa Singapura da vida, porque um tirano manda prender corruptos, mas isso
não é solução. Os maiores avanços no combate à corrupção, as iniciativas que realmente
prosperaram, se consolidaram em ambientes democráticos. Porque o combate à
corrupção requer transparência, para se tornar visível qualquer prática ilícita. Sem
transparência é impossível, em larga escala, haver como verificar práticas corruptas.
Transparência no Estado só existe em regimes em que a política acontece em bases
democráticas. Não há exemplo do outro lado. Essa é a primeira exigência do combate à
corrupção.

A segunda exigência é que exista liberdade tanto para o debate público em torno do
assunto, mas principalmente para as instituições do sistema de Justiça poder mover
ações, investigações, acusações, denúncias contra os suspeitos de praticar corrupção. Se
não há liberdade dos agentes públicos encarregados de combater à corrupção, esse
combate não pode existir. Eu me refiro à independência do Judiciário, do Ministério
Público, da polícia, comissões de inquérito no Congresso e em outras instituições. Regime
com liberdade de pensamento. Como esperar que num país do tamanho do Brasil uma
autoridade autoritária resolva o problema da corrupção? É um delírio gravíssimo, que
conduz à asfixia, não há sentido lógico. Trata-se de uma decorrência desse ambiente de
desinformação.

https://www.nexojornal.com.br/entrevista/2018/10/06/Como-chegamos-a-um-estado-de-tanta-desinformação Page 5 of 9
Como chegamos a um estado de tanta desinformação - Nexo Jornal 07/10/2018 12(43

Qual é o efeito de notícias falsas para uma democracia?


EUGÊNIO BUCCI Isso é muito interessante. As notícias falsas, nesse contexto que não é só
brasileiro, são um sintoma. É um erro supor que fake news sejam a causa do que vem
acontecendo. Claro que elas trazem aspectos que dão à figura da mentira na política um
alcance inédito na história. Sempre houve mentira e desinformação na política, mas
agora temos que lidar com esse assunto considerando duas “inovações”. A primeira é na
ordem da escala, volume e velocidade de desinformação. Em questão de horas, uma
população inteira pode tomar como verdade uma mentira esfarrapada, algo que não
havia antes, por causa da tecnologia. A segunda “inovação” é que as plataformas que são
base das redes sociais e do fluxo de mensagens remuneram aquilo que dá audiência e
engajamento, pois atrai olhares e, portanto, multidões de consumidores. Mentir virou um
negócio que dá um troco no fim de semana. São duas inovações que mudam o caráter das
mentiras no debate público e na sociedade.

Mas isso é um sintoma e não a causa


de um mal-estar mais profundo da
democracia. A democracia vem sendo
atacada, assim como a imprensa, em
“É curioso que pessoas muito
diversos países. Posso dar o exemplo
dos EUA, com o presidente Donald
bem informadas difundam
Trump; da Rússia, com Vladimir
notícias falsas”
Putin; e da Turquia, com Recep Tayyip
Erdogan. São figuras fortes, de traços
mais ou menos populistas, de direita. São três países onde a democracia está em declínio,
uma espécie de esgotamento da potência da política. Aquilo que deveria orientar o debate
público deixa de fazer isso, e nesse vazio prosperam as fake news. Elas são um sinal de
que as coisas não vão bem e, ao mesmo tempo, uma força para que as coisas não
caminhem bem mesmo.

Esses fundamentalismos brasileiros se valem de fake news, vivem de espalhar essas


mentiras. Eu recebo dezenas por dia, e é curioso que pessoas muito bem informadas
difundam notícias falsas, estou falando de pessoas com pós-doutorado. Algumas porque
caíram na esparrela, outras porque acham que vale a pena, que a verdade virou algo que
pode ser sacrificado por uma causa maior, que seria derrotar o outro lado. Nesse
ambiente temos uma epidemia de notícias falsas. Sempre lembrando: como um sintoma.
Não foram as fake news que produziram Bolsonaro, a idolatria, não foram elas que
levaram os países a abraçar soluções enlouquecidas. Por exemplo, houve um peso de
notícias falsas na decisão do Brexit [referendo em junho de 2016 que decidiu que o Reino
Unido deveria sair da União Europeia], mas também ali percebemos muito
ressentimento. Assim como a eleição de Trump, fruto de um grande ressentimento contra
o establishment, contra a imprensa, contra os políticos. É uma espécie de revanche dos
setores invisíveis que se sentem desprezados, pegam um populista qualquer e vêm com
ele. Notícias falsas ajudam nisso.

Criar notícias falsas pode estar incluído no direito à liberdade de


expressão?

https://www.nexojornal.com.br/entrevista/2018/10/06/Como-chegamos-a-um-estado-de-tanta-desinformação Page 6 of 9
Como chegamos a um estado de tanta desinformação - Nexo Jornal 07/10/2018 12(43

EUGÊNIO BUCCI Pode sim. A maior besteira que se pode fazer contra as notícias falsas é
chamar o Estado para regular, filtrar ou até censurar. Estamos num país em que isso é
perigosíssimo, porque a qualquer pretexto o Estado sai por aí regulando as coisas. É um
período em que está em vigência a proibição de um prisioneiro dar entrevista [referência
ao fato de Lula, preso pela Lava Jato, ter sido proibido pelo Supremo de dar entrevista a
jornais]. Vivemos num país em que o Estado adora a ideia de censura. A pior opção para
essa situação no Brasil seria o Estado censurar ou perseguir o que é notícia falsa.

A liberdade de expressão inclui sim o direito de falar besteira, desde que as pessoas
respondam por isso depois. É assim desde a Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão [de 1789], em que se afirma que a liberdade de ideias é um dos mais preciosos
direitos das pessoas e cada um responderá na forma da lei pelos excessos que praticar.
Nós estamos nesse marco legal, não podemos sair dele. Isso inclui a liberdade de sátira e
até de contar mentira, dentro ou fora da ficção. Na democracia, o debate público
esclarece a verdade, é ele que põe as coisas no lugar. Não é porque estamos combatendo
notícias falsas que podemos remendar a liberdade de expressão, ela precisa ser mantida.

Mas na difusão de notícias falsas existem atos lesivos da própria liberdade de expressão,
porque elas não têm origem. É muito difícil saber de onde elas vieram. Então é
complicado exigir do debate público que o autor ou o veículo se corrijam. Se um jornal
publicou algo errado, o público exige que seja feita uma correção e isso é feito, para
proteger a própria credibilidade. Com as notícias falsas não é assim que acontece. O
estrago já está feito, sem possibilidade de esclarecimento. Nós temos um movimento
meritório e bem-sucedido de checagem de fatos, com redações já tradicionais ou
iniciativas da sociedade civil.

Passada a eleição, qual é o legado desse ambiente de


desinformação para o Brasil nos próximos anos?
EUGÊNIO BUCCI O Brasil vai ter um cenário muito pior pela frente. Qualquer que seja o
presidente eleito, ele vai ter enormes dificuldades e dificuldades novas para fazer uma
repactuação do país. Talvez nem seja viável fazer isso. Nós viemos de outras tragédias
políticas que corroeram a saúde e a credibilidade das instituições. O impeachment de
Dilma foi feito de maneira açodada, sem justificativa de substância. A história das
pedaladas fiscais era uma abstração impossível de ser explicada e compreendida por
quem não tem pós-graduação em contabilidade ou gestão pública. Não houve um debate
sobre desvios políticos mais graves. O impeachment foi por motivos contábeis, o que não
gera saldo político para o próximo fôlego.

Já entramos na era Michel Temer com uma carência muito séria de legitimidade. Temer
não tinha problema de legalidade, na minha perspectiva pelo menos. Tendo sido eleito
como vice-presidente, é ele quem deveria exercer a função na falta de Dilma. Ele tinha
um problema grave de credibilidade, o que só se agravou ao longo do governo dele. Uma
das provas disso, e há muitas mais, é que a popularidade dele nunca saiu do medíocre ou
do ridículo. Legitimidade não é igual a popularidade, mas popularidade pode ser um
indicador da crise de legitimidade. Recentemente, até Geraldo Alckmin [candidato do
PSDB à Presidência] disse que havia falta de legitimidade na figura de Temer.

https://www.nexojornal.com.br/entrevista/2018/10/06/Como-chegamos-a-um-estado-de-tanta-desinformação Page 7 of 9
Como chegamos a um estado de tanta desinformação - Nexo Jornal 07/10/2018 12(43

Isso trouxe muitos prejuízos para a possibilidade de a política, na nossa democracia,


articular consensos e pactuar os passos necessários para o desenvolvimento, para o
progresso, para combater as desigualdades sociais, para defender os direitos humanos. O
governo vai ficando uma figura patética, não confiável. Depois da posse de Temer,
tivemos casos gravíssimos de corrupção sendo apontados, inclusive contra ele, e que não
foram apurados. Isso também corroeu as possibilidades de o Estado de direito ter vigor
para pactuar a sociedade. Agora, estamos às vésperas de uma eleição em que a figura
mais votada, a confiar nas pesquisas disponíveis, é alguém que tem um discurso que
claramente prega uma ruptura com bases da democracia. Isso vai tornar o cenário muito
difícil. Seja quem for, o eleito vai herdar um país dividido, e mais do que isso, ressentido,
quase conflagrado. Como vai ser administrar e liderar essa sociedade? Acho que o quadro
vai ser pior. As funções que essas eleições teriam, de repactuar a sociedade, estão sob
ameaça.

VEJA TAMBÉM

SERVIÇO

(HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/SERVICO/) As
mentiras na eleição. E como se
prevenir no dia da votação
(https://www.nexojornal.com.br/servico/2018/10/06/As-
mentiras-na-elei%C3%A7%C3%A3o.-E-
como-se-prevenir-no-dia-da-
vota%C3%A7%C3%A3o)

MAIS RECENTES

https://www.nexojornal.com.br/entrevista/2018/10/06/Como-chegamos-a-um-estado-de-tanta-desinformação Page 8 of 9
Como chegamos a um estado de tanta desinformação - Nexo Jornal 07/10/2018 12(43

(https://www.nexojornal.com.br/lexico/2018/10/07/Ela-
(https://www.nexojornal.com.br/expresso/2018/10/06/Estes-
(https://www.nexojornal.com.br/estante/favoritos/2018/5-
(https://www.nexojornal.com.br/ensaio/2018/A-
%C3%A9-parente-da- s%C3%A3o-os-pontos-chave- livros-para-pensar-sobre-a- aus%C3%AAncia-do-meio-
intelig%C3%AAncia.-E- para-entender-as- democracia-brasileira) ambiente-nas-propostas-dos-
tamb%C3%A9m-da- elei%C3%A7%C3%B5es-de- presidenci%C3%A1veis)
FAVORITOS
neglig%C3%AAncia) 2018)
(HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/ESTANTE/FAVORITOS/)
ENSAIO
LÉXICO EXPRESSO (HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/ENSAIO/)
5 livros para pensar
(HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/LEXICO/)
(HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/EXPRESSO/)
sobre a democracia A ausência do meio
Ela é parente da Estes são os brasileira ambiente nas
inteligência. E pontos-chave para propostas dos
(https://www.nexojornal.com.br/estante/favoritos/2018/5-
também da entender as livros-para-pensar- presidenciáveis
negligência eleições de 2018 sobre-a- (https://www.nexojornal.com.br/ensaio/2018/A-
(https://www.nexojornal.com.br/lexico/2018/10/07/Ela-
(https://www.nexojornal.com.br/expresso/2018/10/06/Estes-
aus%C3%AAncia-
democracia-
%C3%A9-parente- s%C3%A3o-os- do-meio-ambiente-
brasileira)
da- pontos-chave-para- nas-propostas-dos-
Bruno Carazza
intelig%C3%AAncia.- entender-as- presidenci%C3%A1veis)
E-tamb%C3%A9m- elei%C3%A7%C3%B5es- Marcia Hirota e Mario
da- de-2018) Mantovani
neglig%C3%AAncia) Conrado Corsalette e João Paulo
Charleaux
Sofia Nestrovski

NAVEGUE POR TEMAS

POLÍTICA (HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/TAGS/TEMAS/POL%C3%ADTICA)

ECONOMIA (HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/TAGS/TEMAS/ECONOMIA)

INTERNACIONAL (HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/TAGS/TEMAS/INTERNACIONAL)

SOCIEDADE (HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/TAGS/TEMAS/SOCIEDADE)

CULTURA (HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/TAGS/TEMAS/CULTURA)

CIÊNCIA E SAÚDE (HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/TAGS/TEMAS/CIÊNCIA_E_SAÚDE)

TECNOLOGIA (HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/TAGS/TEMAS/TECNOLOGIA)

ESPORTE (HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/TAGS/TEMAS/ESPORTE)

MEIO AMBIENTE (HTTPS://WWW.NEXOJORNAL.COM.BR/TAGS/TEMAS/MEIO_AMBIENTE)

https://www.nexojornal.com.br/entrevista/2018/10/06/Como-chegamos-a-um-estado-de-tanta-desinformação Page 9 of 9

Вам также может понравиться