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110.
� CENTENÁRIO
DA REPÚBLICA
1910'2010
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Aderente: 101, Desconto B4oo PARQU e SCOLAR
Para os republicanos, a aposta na educação do povo
constituiu um dos grandes vectores do seu ideário.
Entre os grandes desígnios da escola republicana,
contavam-se a educação laica, a educação para a cidadania,
o combate ao analfabetismo, a democratização da escola
e a adopção de novas metodologias em todos os níveis
de ensino. A aposta na educação como meio de formar
cidadãos livres e conscientes, capazes de intervir
civicamente, foi muito precoce na propaganda republicana.
Assim, ainda antes da República, essa acção educativa foi
desenvolvida pelos centros escolares republicanos, pelas \
universidades livres, pela Escola-Oficina n.º 1 e por uma
série de associações promotoras da educação.
EDUCAR. EDUCAÇÃO PARA TODOS.
A exposição
O ENSINO NA I REPÚBLICA pretende dar a conhecer
a obra republicana no .ensino. Ao longo das onze salas
que compõem o percurso, esta exposição pretende atingir
um leque diversificado de público, desde o público escolar
ao público em geral.
A exposição inicia-se por uma sala dedicada à obra educativa
dos centros escolares e organizações similares, ainda
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educativo, a educação cívica e patriótica e os manuais
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e profissional, a aposta no ensino científico e experimental,
a criação das novas universidades e a defesa de um novo
paradigma para o ensino superior. Dedicamos também uma
sala à importância do crescimento do ensino feminino
e terminamos com a sala da Festa da Á rvore, um dos
maiores símbolos das festividades cívicas da República.
CENTENÁRIO
r
........_ � -, DA REPÚBLICA
1910.2010
iiNCM
IMPRENSA NACIONAL CASA OA MOEOA
Apoio
PARQUeSCOLAR
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A I República, implantada em 2010 e derrubada por um golpe militar em 1926, deu uma
grande importância à educação. E se nem sempre as boas intenções se concretizaram, muito por
causa da instabilidade política daquele período, houve avanços significativos em vários campos.
E constitui-se um legado de valores que ainda hoje são da maior relevância.
A I República colocou na linha de prioridades a alfabetização e o desenvolvimento da ins
trução popular, a par da promoção de uma educação integral- abrangendo a educação cívica, social,
física e artística -, e de um ensino que contemplasse todos os ramos do conhecimento, pugnando
pelo desenvolvimento de uma cultura técnica e científica. A responsabilidade do Estado como ga
rante do acesso livre e universal à Escola também ocupou o debate e as reformas levadas a cabo
durante esses anos.
Não foi por acaso: os valores educativos e pedagógicos da I República assentavam nos
princípios da cidadania, democracia e autonomia característicos do republicanismo. Por isso eles
mantêm-se actuais, cem anos depois. Embora a transição da I República para a Ditadura Militar, e
depois para o Estado Novo, viesse introduzir profundas alterações ao pensamento pedagógico e às
políticas de Educação, os valores de base promovidos pelo republicanismo, integrados no quadro da
democratização do ensino e de valorização da cidadania que lhes estiveram associados, constituem
boje uma preciosa herança para os princípios educativos que orientam a Escola actual e futura.
É tendo presente esta herança que o Programa do Centenário contempla um vasto con
junto de iniciativas dedicadas à Escola, à Educação e ao Ensino, quer pelo convite à participação e
envolvimento das escolas de todo o País nas comemorações do Centenário da República, através
do eixo programático República nas Escolas, quer através de outras iniciativas associadas a diversos
programas temáticos, nomeadamente no âmbito das Exposições do Centenário.
A exposição EDUCAR pretende evocar o ideal educativo promovido pelo republicanismo por
tuguês e tem por objectivo divulgar este legado histórico e patrimonial da I República, contribuindo,
deste modo, para a construção do conhecimento sobre a história do Ensino e da Educação em Por
tugal.
O presente catálogo, que constitui também uma memória física desta exposição, reúne
importantes contributos científicos, com textos especializados dedicados à história do ensino e das
práticas educativas na I República, associando, assim, a memória desta iniciativa ao debate e à refle
xão história sobre esta temática decisiva para o futuro do País.
Janeiro de 2011
12 ANTES DA REPÚBLICA
18 OS PEDAGOGOS DA REPÚBLICA
22 A EDUCAÇÃO cfVICA E PATRIÓTICA
26 OS MANUAIS DE ENSINO
30 O ENSINO PRIMÁRIO
34 O ENSINO SECUNDÁRIO
OS LICEUS
40 O ENSINO PROFISSIONAL
46 O ENSINO CIENTiFICO E EXPERIMENTAL
52 O ENSINO SUPERIOR
56 A MULHER E O ENSINO
60 A FESTA DA ÁRVORE
70 O ENSINO PRIMÁRIO
Joaquim Pintassilgo
78 ENSINO TÉCNICO
UM ESPAÇO EDUCATIVO MARGINALIZADO
MAS "RESPONSÁVEL" PELO NOSSO ATRASO
Luís Marques Alves
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ll EDUCAR
EDUCAÇÃO PARA TODOS. ENSINO MA I REPÚBLICA
ANTES DA REPÚBLICA
ANTES DA #
REPUBLICA
O discurso estratégico dos republicanos, sobretudo a partir de 1870, apresentava-os como
a alternativa credível, moderna e regeneradora da Pátria também do ponto de vista educativo.
Propunha reduzir o analfabetismo (cerca de 80% em 1890), criar instituições de educação pré-escolar
adequadas, uma rede de escolas primárias eficaz, gratuitas, de frequência obrigatória e neutras
do ponto de vista religioso, com planos de estudo individualizados, aliando teoria e prática, trabalho
individual e colectivo.
Cresceu o movimento associativo junto dos professores, bem como o número de Sociedades
Patrióticas e Centros Republicanos, instituições fundamentais para a divulgação não só do ideário
político e cultural, mas também do ideário educativo republicano, muitas vezes apoiadas pela
Maçonaria. Tinham habitualmente salas de jogos, bibliotecas, escolas infantis e primárias associadas
e ofereciam, por vezes, educação para adultos ou jovens fora da idade escolar, em aulas nocturnas,
com o novo método de ensino da leitura, na Cartilha Maternal de João de Deus.
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rei rua raio raiva rijo rato ferro
jarro terra burro ira vara fera furo
jura puro ar ir vir for flor dar ver
verde perda pardo perto preto
prato bruto pobre irar virar
Edifício da escola d'A Voz
do Operário.
19... , Fotografia de Joshua Benoliel,
AML-AF, A8731. João de Deus,
Alunos da Escola Oficina n.º 1 Cartilha Maternal
e o seu cão, o ABC. ou Arte da Leitura.
Ilustração Portuguesa, n.• 219, Lisboa, Livraria Bertrand,
2 de Maio de 1910, p. 547, HML. 1876
JO!,O DE DEUS
CARTILHA MATERNAL
ou
ARTE DE LEITURA
J,I\.R:\Rl.\ BERTRAI"O
15 EDUCAR
EDUCAÇÃO PARA TODOS. ENSINO NA I REPÚBLICA
ANTES DA REPÚBLICA
- O Pedro, que é
do livro de capa verde,
que te deu o avô?
- Já o dei ao Jorge
a guardar.
- Vai lá pedil-o.
-Para quê?
-Para a tia Carlota ver
a gravura do caçador.
• •
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OS PEDAGOGOS #
DA REPUBLICA
No plano educativo, estava em causa a regeneração da Pátria, fazer da utopia uma realidade,
alcançar a plena cidadania, a dignificação de um Homem crítico e livre.
Alguns pedagogos encaravam a escola como um templo cívico que desenvolveria um projecto
de formação integral, auto-regulada, orientando os cidadãos na construção do seu próprio futuro,
contribuindo para a formação de um Homem Novo. Outros defendiam a criatividade, a autonomia
e contrariavam a função moralizadora, social e integradora do ensino, a manipulação educativa
pelo poder.
Apesar dessas divergências, a maior parte dos pedagogos associou a modernidade pedagógica aos
valores da Educação Nova: o aluno devia conhecer a realidade, valorizar a experiência,
sair do espaço escolar, aprender um ofício.
Surgiram escolas pedagogicamente diferentes das tradicionais, tentando conciliar as descobertas
da psicologia do desenvolvimento cognitivo com os recursos pedagógicos proporcionados
pelo meio, a adequação ao nível etário, o aperfeiçoamento da aprendizagem prática a partir
das "lições de coisas".
CIVICA
E PATRIÓTICA
A legitimação social da República utilizou diversos símbolos:
Um professor e um aluno
uns representam a herança histórica de uma nação, uma identidade
do Instituto de Surdos-Mudos
construída e mantida com o esforço de homens e mulheres, heróis da Casa Pia de Lisboa fazendo
do imaginário português; outros pretendem associar o novo regime a uma alguns exercícios.
modernidade renovadora.
Ilustração Portuguesa, n.0 63,
6 de Maio de 1907, p. 545, HML.
A nova bandeira reúne elementos historicamente consensuais, relacionados
Alunas da Escola Normal
com a independência nacional e os Descobrimentos e, por outro lado, as de Lisboa.
cores da batalha, do sangue e da esperança na mudança. O hino, por sua 1910, Fotografia de Joshua Benoliel,
AML-AF, A8939.
vez, é um canto patriótico que invoca períodos nobres da história de
O Presidente da República,
Portugal, a combatividade e a independência. Também a nova moeda se
Bernardino Machado, na cerimónia
legitima na esfera armilar e no rosto de uma mulher com um barrete frígio, de lançamento da primeira pedra
símbolo de liberdade. da nova Escola Normal de Lisboa.
1916, Fotografia de Joshua Benoliel,
Educar civicamente os cidadãos, republicanizá-los, era para os mais
AML-AF, A4286.
radicais um dever. O Estado deveria interferir na escola, fazer a apologia Aula na aldeia em que a professora
dos velhos e novos heróis, dos mais importantes acontecimentos históricos, mostra a bandeira portuguesa aos
D. Manuel li,
com sobrecarga "República".
Desenho e gravura: Domingos Alves
do Rego. Impressão: Tipográfica,
Casa da Moeda.
Circulação: de 1 de Janeiro de 1910
a 30 de Março de 1913. A sobrecarga
foi colocada a 1 Novembro de 1910.
Travessia aérea do Atlântico.
Data: 1923 I Autor não identificado.
Gravura e impressão: Litografado
na Waterlow & Sons, Londres.
Circulação: de 30 de Março a 1 de Abril
de 1923 e de 6 a 8 de Setembro de 1924.
Alunos do Jardim-Escola
João de Deus, em Coimbra.
O Ocidente, revista ilustrada de
A EDUCAÇÃO CíVICA, POIS QUE
Portugal e do Estrangeiro, n• 1243,
10 de Julho de 1913, p. 202, HML. É A EDUCAÇÃO DO CIDADÃO,
TEM DE SER IHFORMADA POR UM
ESPÍRITO DECIDIDAMEHTE REPUBLICAHO,
PROFUHDAMEHTE PROGRESSIVO,
E DEVE SER MIHISTRADA POR
UM PROFESSORADO AHTI-MOHÁROUICO
E AHTI-CLERICAL.
Lopes de Oliveira (relator), "Educação cívica na escola primária...",
in Relatórios do Terceiro Congresso Pedagógico, I 913, p. I 4·5
RUI>INt':�TOS DF. AGkiCl"o./URA 91
OS ANIMAES DA AGRICULTURA
FlJ!'. 00 -Oc-:wallo.
a :24} milhões de leg uas, dando o sua \'Oil.o em alurno (com os se us 8 .salêHit�) á dislaoeia de
:lMS milhões de leguas•• Je\'8ndo a dor a volta ao sol Alexandre Herculano Alfredo Keil
2:13 dias; a Ttrro (com o �u saléllile, a Lua}, o
229 ao.nos e 167 dias; Ura.no {com os seus 4 satéJ
Iilil.es) á distancia do i l O milhões de legoas, �s
mr reímidus no
Pouc.'ls '\'("'/.OS se j)Odcr-Jo encont
Português d e antes quebrar que torcer, Alexan mesmo m1ist..'l osta:s lt'ês p1·cndas ado1·(m.:!is: poe
t.aando no aeu glco á r<Kia do sol 8! auuos e 89 d•as ;
1\Nepluno(com o seu utêDile)dislanle do soliJ.liO mt ·
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dre Herc lano sustentou grandes lutas, defendendo sia, música e pint.ur;.l. Foi Alfredo 1\e.il. a êste res
ll lboes de. lfJguas, isto é, 30 ,·ezes mais longe do sol corajosa e triunfantemente as suas opiniões. peito, um ,·erdadciro J)l'i·
d,Jo que n6$., e gas tando para dar a volla com pleta IÍ Como soldado, bateu-se pela libes-dade, tornando ,;Jegiado, J>OI'CJUC foi poe·
rtrOdo. do .sol 164. annos e 281 dias, o.u seja mais de -se um dos mais a aixonad p os adversários do regí ta, mú ico c pintor.
�·seculo e m�io dos nossos! Um anno de Neptuno é men absoluto. Como histo )las foi sobr-etudo nu
llJ6t veze& mais comprido do que o nosso : quando riador produziu grandiosos divina orte dos. sons que
Oecaba o anoo de Nepluno, já a lerra lem coutado monumentos. que «vieram t:le mnis 5e notabilizou.
pper to de l6S annos ; e Mercurio 68 .f, quasi i eeeulos! desvendar mistérios da vida e em que mais profun
lao la
As velocidades dos p e s 6. roda do sol s.;iO antiga do seu país. e deSfa damente dci.xou gr::wado
!.� �� ; - .Uc/'Curio, 1 milhlo c J :.1 mil leg ues zer muitas lendas. que de hã o seu tino tcmpcmmento
wor dia ; l·enu.t, 750.000; a Terra, iJ()8.800; Narte. muito se su bstituiam à ver de tu'listo.
;))I .000; Jupiler, 'liS.i50 ; Saturno� :Z05.:!00; lJI'QIW, dad e». Foi tambêm poeta e 1\as suns mclodi:lS c
11-1 t.100; NepluJto, 1'16.000. . romancista, mas abandonou nas suas ópet-as., Wo in�
-me<h.das
.
Quem du,·tda de 'tUdo 'i&lo '!' Todas estas um dia a literatura, em que pirtldas, c por vezes liio originilis,�deixou·nos. o sau
odos ddTe-
�:-S:io os re:Sllll.ados c:ovcol'de:s de 6 -me"JJ ocupou. entre nós, lah·ez o d�o maestro pág inns de nn\sica l;'io beb� l'(Ue o
1rcnles. S�is cnminbos di,·ersos 1C\'8rt\ffi lodoS ao primeiro lugar, e retirou-se mnis cons.."tgrado compositor niio desdeuh�tda snb
cmes.mo ponto, signa1 de que s.io tão certos
a(1uelles
par·a Vol · d e -Lobos . sítio SCI"C'\Cr.
nnumero:;, como nós c�istirmos. O p der o
. meros
dos nu
l:rmo e triste nas proximidades do lugar de �-'\zóia E T<ell n�o errt só um grande músico; era um
' t:lo grande, <JUe fõram ettes� e s6 e ! les, que desc� de ·Baixo. a sete léguas de Santarêm. Aü, em sin grande nmigo da sua terra. era um poltu,guês de
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l b rir-�m 0 p a neta Neptuno. Sem sau do
seu gabt
os últimos anos.
gela habituçlio., deslisaram em paz lei. Apesar de Ute COJ'rer n as vc.i:t. s.sanguo eslron
mc.le, e nem sequer olhar p a ra o céo, o aslrODOlllO
- não do ilustre historiador. �ciro, pois scn J>ai era a lemão, a nenhuma ou
U.e Verrier - servindo-se apenas do cn lc ulo
Jaz no mosteiro dos Jerónimos, na antiga casa tl'a lel't•a dedicou mais arectos do que :10 no.::. -=.o
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�só pre,riu que 1.ara além do pl�oeln Urano ou t ro
37 milhões de Jcguas, fazendo o seu t,�ro completo
to er.�cto on d6 caprtulo, ond e se erigiu um magnífico e arlfs querido Po1'tugal. que o viu nascer. ::\êle vh·eu.
em 365 dias ; 1\fo.rle (coro os seus 2 sotélliles) A )lllaneLa de,•ia existir, mas.determmou o p
tico mausoléu pata guardar as cinzas de tão '-ene às befezo.1s naturais pediu in spir.:u;-ão para os
dislaocia de 56 milhões de lcguas, durando a sua o
tdo céo onde esse p la ela devia encontrar-se n um
�"lt:lS
- E momento, assos l.ado um rando ,,ulto. seus quadi'OS e para os seus ve1-so3, c foi ainda.
revolução t anno e 322 dias ; Jupit�r (com o seus ccerlO ·momento. o 'es!e
O EN SI NO PRI MARIO
dos Catraeiros do Porto
de Lisboa.
1926, Fotografia de Ferreira
da Cunha, AML-AF,
8094114.
A Reforma da Instrução de 29 de Março de 1911 insistiu sobretudo no Ensino Primário. João de Barros e João
de Deus Ramos desejavam implementar uma reforma pedagógica revolucionária que não atendia, no entanto, aos
constrangimentos financeiros e até culturais do País.
Foi criado oficialmente o ensino infantil para os dois sexos, jardins-escolas em cada um dos bairros de Lisboa e do
Porto, nas capitais de distrito e nas sedes dos principais concelhos.
O Ensino Primário, em regime de co-educação, distribuiu-se pelos graus elementar, obrigatório, dos 7 aos 9 anos,
complementar, de dois anos, e superior, de três anos.
Pretendeu-se que os Municípios se responsabilizassem pela construção e equipamento das escolas, bem como
pelo recrutamento e pagamento aos professores, e consignou-se o aumento do ordenado do professor primário
(que só entraria em vigor em 1917).
A ideia de que era fundamental formar os professores numa instituição pedagógica apropriada e digna consolidou
-se e, em 1918, a Escola Normal Primária de Lisboa passou do Calvário para Benfica.
BARBift,J TAS.
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J>ol�p yll• fullo P1uuu!Crandidieri
Paris.
11 AIIIIYFE R OS
41
A formação profissional foi uma das áreas a que a República prestou maior atenção. Reformulou-se o ensino industrial
e comercial- o Instituto Industrial e Comercial de Lisboa dividiu-se em Instituto Superior Técnico e Instituto Superior de
Comércio. Tentou regulamentar-se o ensino médio industrial e comercial e, em 1g14, surgiu a Escola de Construções,
Indústria e Comércio. Progressivamente, foram surgindo escolas para várias áreas do saber industrial, bem como escolas
para diferentes vertentes do ensino comercial. O objectivo era um ensino prático, centrado no "saber-fazer", mas que
fornecesse aos alunos uma cultura geral e contribuísse para a formação de um espírito empreendedor. Pretendia também
fornecer-se uma alternativa ao ensino liceal para quem, por razões diversas, não tinha possibilidades de frequentar o liceu.
Tentava reconhecer-se oficialmente as competências adquiridas naquelas escolas técnicas e, dessa forma, valorizar
socialmente aqueles profissionais.
( )O OBJECTIVO DOMINANTE
•.•
DO ENSINO, AO LADO DA
CULTURA MORAL DA NAÇÃO,
DEVE SER O AUMENTO DA
CAPACIDADE DE PRODUZIR, EM
TODAS AS ESFERAS DA DINÂMICA
SOCIAL; E QUE, PORTANTO,
COMO DIZIA HERCULANO,
SE DEVEM ��GENERALIZAR OS
INSTITUTOS DESTINADOS AO
APERFEIÇOAMENTO PARTICULAR
DAS CLASSES VERDADEIRAMENTE
PRODUTIVAS DA NAÇÃO".
Alves dos Santos, Um Plano de Reorgani:ação do Ensino Público, 1921, p. 10
Laboratório de Higiene e Tecnologia
do Instituto Industrial de Lisboa.
Ilustração Portuguesa, n.o 820,
5 de Novembro de 1921, p. 348, HML.
DA ARVORE
As ideias de solidariedade, afectividade, fraternidade
e regeneração foram centrais na República.
A "Festa da Árvore" associava-se simbolicamente à regeneração da
sociedade e tinha sido divulgada pela Maçonaria ainda antes de 1910.
No entanto, após a República, aquela festa-metáfora foi promovida
a nível nacional pel'O Século Agrícola, a partir de 1913, e permaneceu
uma constante, sobretudo até finais da I Guerra.
A Festa Nacional da Árvore realizou-se por todo o País e foi divulgada
como uma festa cívica e democrática, reunindo todos os grupos sociais.
Servia também para consagrar novos símbolos do regime, como
a bandeira e o hino, e para reafirmar a importância que a escola tinha
para a formação do carácter, no amor pela natureza e pela vida.
MOTAS
Os Centros Escolares Republicanos. in Museu Virtual da Educação, Comemorações do Centenário da República, República
e Educação.
ln Oliveira Marques, Portugal da Monarquia para o Repúblico- Novo História de Portugal. vol.XI, Lisboa, Editorial Presença,
1991. O papel educativo dos centros republicanos, bem como o seu peso na alfabetização e na cultura cívica dos cidadãos,
ainda não foi estudado entre nós, e não será despiciendo realçar a importância de uma investigação sobre a actividade
cultural das diversas associações republicanas, nas duas últimas décadas do século X X
I , para a compreensão do fenómeno
do republicanismo e do papel da educação na formação do seu ideário.
Cf. Fernandes, Rogério, Uma Experiência de Formação de Adultos no 1. • Repúblico. A Universidade Livre poro o Educação
Popular 1911-1917, Lisboa. C ML,1993, p.10. Discorrendo sobre o assunto.o autor afirma: "Tratava-se de uma instituição cla
ramente propagadora da ideologia republicana, com fortes conotações maçónicas, a atentar nos principais colaboradores."
Fernandes. Rogério, Bernardino Machado e os Problemas da Instrução Pública, Lisboa, Livros Horizonte, 1985.
Fernandes, Rogério, A Pedagogia Portuguesa Contemporâneo, Lisboa, Instituto de Cultura Portuguesa, Biblioteca Breve,
1979. pp.lll-120.
Idem, pp.43-llO.
Fernandes, Rogério, As Ideias Pedagógicas de Adolfo Coelho, Lisboa, Instituto Gulbenkian da Ciência. 1973.
Fernandes, Rogério, João de Barros, Educador Republicano, Lisboa, Livros Horizonte, 1971.
Veja-se Fernandes, Rogério, "O pensamento pedagógico em Portugal", op. cit., p.126.
10
Aeste respeito, veja-se, Pintassilgo, Joaquim, República e Formação de Cidadãos. A educação cívica nas escolas primárias
da Primeira Repúblico Portuguesa, Lisboa, Colibri, 1998.
11
Cf. Sampaio. José Salvado, "Escolas móveis (contribuição monográfica )", in Boletim Bibliográfico e Informativo, Lisboa, CI P
da Fundação Calouste Gulbenkian, n.2 9, 1969, pp. 9-28.
12
João de Barros, Atlântido, n.2 42/43, p. 740.
71
Nos anos subsequentes, o Governo foi procurando resolver, através de legislação complementar,
os problemas práticos colocados pela nova situação, mas foi confrontado, em permanência, com o
descontentamento da imprensa e das associações de professores, que não viam com bons olhos o
controlo mais próximo das câmaras e sofriam na pele os atrasos no pagamento dos vencimentos. Na
verdade, nem todas as vereações tinham a sensibilidade e a competência para lidar com os problemas
educativos. A República acabará por recuar relativamente a esta opção a partir de 1918 (Carneiro &
Afonso, 2008; Sampaio, 1975).
Data do ano seguinte a segunda grande reforma republicana do ensino primário,
concretizada por via do Decreto n.º 5787-A, de 10 de Maio de 1919. O respectivo regulamento
consta do Decreto n.º 6137, de 29 de Setembro de 1919. Merecedora dos maiores encómios, à
época como pela posteridade, esta reforma sofreu do mesmo mal da sua antecessora - parte
substancial do seu conteúdo não ultrapassou o mero registo retórico. A reforma alarga a
escolaridade obrigatória dos incumpridos 3 anos para uns ambiciosos 5 anos, correspondentes ao
agora chamado ensino primário geral, teoricamente em regime de co-educação. Mantém-se, na sua
continuidade, o ensino primário superior com 3 anos de duração, de vocação profissional e adaptado
às actividades regionais. Representando um dos projectos mais interessantes do período republicano
e uma das bandeiras de pedagogos inovadores, o ensino primário superior teve um percurso
acidentado, restrito aos últimos anos da República, não conseguindo generalizar-se e enraizar
-se na realidade educativa do País. No que se refere à administração do ensino, a reforma opta
por uma solução intermédia, ainda que tendencialmente descentralizadora, entregando parte das
responsabilidades às chamadas juntas escolares, que incluem representantes dos municípios e
das freguesias, mas também professores e o inspector do círculo ou um seu delegado. Só as juntas
escolares de Lisboa e do Porto é que gozavam de autonomia financeira. Entre as suas competências,
estavam a construção, arrendamento, manutenção e equipamento das escolas e o pagamento dos
professores. Esta modalidade de descentralização já contou com o apoio habitual dos professores,
que passaram a ter um maior protagonismo, o que não obstou a que as juntas tivessem uma existência
também ela algo atribulada até à sua extinção nos alvores da Ditadura Militar (Carneiro & Afonso,
2008; Sampaio, 1975).
No âmbito da reforma de 1919, são, finalmente, publicados novos programas, os primeiros
do período republicano, através do Decreto n.º 6203, de 7 de Novembro, em correspondência com o
plano de estudos então definido. Os programas de 1919, claramente marcados pelas perspectivas da
Educação Nova, constituem, na óptica dos seus comentadores actuais, um documento de extrema
ambição e de grande qualidade pedagógica, embora a sua plena concretização fosse, à época,
virtualmente impossível, por via do provável desajustamento em relação às limitadas circunstâncias
(humanas, financeiras e materiais) da sua implementação. Este facto terá ditado o carácter efémero
dos programas de 1919. Dois anos após, o Decreto n.º 7311, de 15 de Fevereiro de 1921, publica novos
programas, mais comedidos na ambição retórica de que dão mostras e no radicalismo das observações
pedagógicas, para além de pragmaticamente simplificados nos seus conteúdos, ainda que mantendo
alguns dos traços inovadores dos seus antecessores, por exemplo no que se refere à presença das
novas áreas curriculares, como os trabalhos manuais, a música, a educação física (para ambos os
sexos), ou à sugestão de estratégias, como as lições de coisas, os passeios, excursões e visitas a
museus ou os trabalhos de horticultura e jardinagem (Correia, 2005; Sampaio, 1975).
Em 1923, foi publicado um documento mítico da história educativa portuguesa, a "proposta
de lei sobre a reorganização da educação nacional", apresentada ao Parlamento pelo ministro João
Camoesas e que não chegou a ser aprovada, apesar de não lhe terem faltado os elogios públicos de
muitos dos protagonistas do campo educativo, alguns deles, como Faria de Vasconcelos, colaboradores
na sua redacção. A proposta, que aspirava ser uma lei da bases da educação, tem como um dos seus
traços mais marcantes o ser portadora de um olhar de conjunto, articulado e harmonioso, sobre o
sistema educativo no seu todo, para além de sistematizar as principais ideias inovadoras difundidas
nos anos anteriores e dirigidas aos vários sectores do referido sistema. A proposta Camoesas ficou,
para a posteridade, como bandeira da inovação pedagógica, mas representa, simultaneamente, um
testemunho claro das contradições e fragilidades do período republicano, contraponto frustrante das
utopias então sonhadas e que tanto mobilizaram as vontades de homens e mulheres da educação
(Nóvoa, 1987; Sampaio, 1975).
No que diz respeito aos espaços escolares, como noutras áreas, a República situa-se
mais na continuidade do que na ruptura. Desde as últimas décadas do século XIX que vinham sendo
construídos edifícios próprios para serem escolas-escolas Conde Ferreira, escolas centrais, escolas
Adães Bermudes-e que as preocupações com a higiene, a adequação e a qualidade dos espaços, no
que diz respeito à localização, iluminação, circulação do ar ou equipamento, vinham sendo afirmadas,
apesar de persistir a utilização de muitos espaços sem condições para a função educativa. As novas
escolas do período deram continuidade, em particular, ao que vinha sendo feito a partir do projecto
-tipo Adães Bermudes. Como documento mais marcante, pode destacar-se o diploma, publicado
em 1917, contendo um conjunto de normas técnicas, higiénicas e pedagógicas que deviam orientar
as construções escolares, o qual expressa, com maior acuidade, as referidas preocupações e, em
consonância com a forte presença do discurso médico-pedagógico no campo educativo, enfatiza as
condições ligadas à promoção de práticas higiénicas entre os alunos -banho, instalações sanitárias,
refeições, etc. - ou a necessidade de serem criados espaços próprios para actividades como a
educação física ou os trabalhos manuais. Os projectos de edifícios desenvolvidos tendo por base estas
normas só têm conclusão, mesmo assim parcial. nos primeiros tempos do regime ditatorial (Beja,
1987; Felgueiras, 2007).
Em relação à organização do tempo escolar, é possível darmos conta de idêntica continuidade.
Esta dimensão da forma escolar vinha sendo construída, na óptica da modernidade, igualmente desde as
últimas décadas do século XIX, implicando uma padronização e uma racionalização tanto do calendário
escolar como da organização dos horários lectivos (semanais e diários). As transformações mais
visíveis trazidas pela República, relativas ao calendário escolar, são, principalmente, as decorrentes
do processo de laicização, implicando a supressão dos feriados religiosos e a sua substituição por
feriados de cariz laico. A reforma de 1919 procura aperfeiçoar a articulação entre o tempo de trabalho
e o tempo de descanso, para além de pôr termo à tradição da pausa de 5.ª feira. Quanto ao horário das
actividades lectivas, para além da continuidade, podemos destacar a intensificação das preocupações
com a sua elaboração, tendo por base critérios de natureza científica, pedagógica e higiénica,
procurando evitar a sobrecarga e a fadiga do aluno e potenciar o rendimento escolar. No entanto, esta
atenção ao interesse do aluno e a uma "escola por medida" nem sempre foi facilmente conjugável
com as necessidades decorrentes da afirmação do modelo escolar, processo para o qual a República
contribuiu inquestionavelmente (Correia & Gallego, 2004; Pintassilgo & Costa, 2007).
Idêntica ambivalência podemos encontrar no que se refere às práticas pedagógicas de
senvolvidas nas escolas. Nesse terreno, a vontade política e pedagógica de promover rupturas
confrontou-se, seguramente, com as rotinas estabelecidas no trabalho dos professores e na re
gulação do quotidiano escolar. A República foi o período em que maior circulação tiveram em Por
tugal as ideias e as práticas da chamada Educação Nova, tendo conduzido ao aparecimento de
experiências exemplares desse ponto de vista, muitas delas no terreno privado, como a Escola
-Oficina n.º 1, a Casa Pia de Lisboa, o Instituto Feminino de Educação e Trabalho ou os Jardins-Escola
João de Deus, entre várias outras, e à generalização de práticas educativas mais ou menos inovadoras,
como as "lições de coisas", os "métodos activos" ou o "self-government" escolar. Acentuou-se, igual
mente, a vontade de aproximação em relação ao ideal de educação integral, implicando a valorização da
educação física, dos trabalhos manuais educativos, da educação estética ou de práticas educativas em
proximidade com a natureza. A crença na afirmação de uma ciência da educação trouxe, a par de um me-
75 EDUCAR
EDUCAÇÃO PARA TODOS. ENSINO NA I REPÚBLICA
O ENSINO PRIMÁRIO
JOAQUIM PINTASSILGO
Lhor conhecimento do aluno, uma intervenção mais profunda e um controlo mais apertado do seu quo
tidiano, na conjugação dos olhares médico e pedagógico, por via dos testes mentais, da racionalização
da alimentação, da higiene e da saúde escolares. Embora os pressupostos da Educação Nova se tenham
tornado o discurso "politicamente correcto" dos especialistas da educação e dos professores, difundindo
-se os seus Lugares-comuns amplamente pela imprensa pedagógica, mais discutível é a sua genera
Lização pelo conjunto do tecido escolar, em confronto com a resistência da "cultura escolar" tida por
tradicional (Nóvoa, 1987; Pintassilgo, 1998; 2006).
Se há algo que dá mais especificidade à escola primária republicana e que impregna a sua
cultura, é o que decorre da implementação, no seu quotidiano, dos símbolos, rituais e festividades
de carácter cívico, surgindo como a alternativa Laica às práticas culturais católicas anteriormente
presentes no espaço escolar. Essas práticas, paralelas à presença da educação moral e cívica de
inspiração Laica no currículo formal da escola primária, procuravam contribuir para a formação dos
cidadãos republicanos e patriotas necessários à consolidação da nova ordem . O projecto republicano
assumia o patriotismo como a ideologia capaz de gerar o consenso e de contribuir para a interiorização
de uma memória colectiva que servisse de base ao fortalecimento da identidade nacional. Assim se
compreende a importância então assumida, designadamente no contexto escolar, por manifestações
como o culto da bandeira e do hino ou o culto dos heróis da pátria (Catroga, 1991; Pintassilgo, 1998).
Ao nível da escola primária, a principal de entre as festividades cívicas fomentadas pelo
republicanismo foi, no entanto, a festa da árvore, que retomava a tradição inaugurada pela Revolução
Francesa e institucionalizada, naquele país, pela III República. Em Portugal, as festas da árvore
começaram a ser celebradas nos últimos anos da Monarquia, tendo conhecido uma grande expansão
na sequência da proclamação do novo regime, atingindo a maior expressão na "Festa Nacional da
Árvore", celebrada em 1913 a partir da iniciativa de O Século Agrícola. Nos últimos anos da República,
a festa foi perdendo o seu dinamismo inicial. Celebrada na Primavera, a festa da árvore representava
o paralelismo entre a regeneração da natureza e a regeneração social então almejada. A árvore, tal
como era celebrada neste contexto, possuía um simbolismo complexo onde cabiam diversos valores
caros ao republicanismo, como pátria, Liberdade, solidariedade ou vida. Um elemento importante era o
cortejo cívico que percorria a Localidade, dirigindo-se para o Local de plantação das árvores, passando
pelos pontos centrais da toponímia republicana. Um outro aspecto a realçar é o que se refere ao papel
de destaque assumido pelos professores primários na organização da festa, o que nos remete para a
missão que a República Lhes atribuía como guias espirituais das comunidades. Protagonistas centrais
eram, igualmente, os jovens alunos das escolas primárias, o que decorria, porventura, da proximidade
entre a sua juventude e a ideia de regeneração. Apesar de organizada por essas mesmas escolas, a
festa da árvore extravasava o âmbito estritamente escolar, oferecendo-se como espectáculo cívico no
espaço público (Pintassilgo, 1998).
Uma outra estratégia, tendo em vista a formação de cidadãos republicanos e patriotas, foi
a representada pela instrução militar dos jovens alunos das escolas primárias. Vindo de França, o
exemplo dos batalhões escolares chegou a Portugal no final do século XIX, tendo um novo impulso após
a implantação da República. O Decreto com força de Lei de 26 de Maio de 1911 publicou o regulamento
e o programa da chamada Instrução Militar Preparatória. São editados, posteriormente, manuais de
apoio a esse programa. O plano de estudos do 1.º grau - que englobava a escola primária - incluía, para
além da preparação militar propriamente dita, a educação cívica e, significativamente, a ginástica e o
canto coral. Aspirava-se à formação do carácter, à aquisição de hábitos de disciplina e à "regeneração"
física da "raça portuguesa", juntamente com a interiorização do espírito patriótico. Como em França,
a instrução militar dos jovens alunos da escola primária tinha em vista, também, a sua participação
nas festas cívicas, através dos batalhões escolares. Não obstante a polémica desencadeada por este
projecto de militarização da juventude, em particular no campo pedagógico renovador, foi visível o
esforço, especialmente nos primeiros anos da República, para o difundir no seio das escolas primárias
portuguesas. Apesar de ter chegado a conhecer um relativo sucesso, o mesmo acabou por não ter
uma real continuidade. Convém não esquecer, no entanto, o contributo positivo que a iniciativa terá
dado para a difusão da educação física em Portugal, acabando esta por se libertar da tutela militar a
que surgiu associada na fase inicial (Pintassilgo, 1998).
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LUIS MARQUES ALVES Apesar de algum alheamento em relação ao Ensino Técni-
UNIYERSIDADE DO PORTO co, vários dirigentes republicanos pronunciaram-se sobre a
importância deste ensino (Brito Camacho, no relatório que
acompanha o Decreto de 23 de Maio de 1911, afirma que
"(... ) o nosso atraso provém, apenas, de insuficiência do nosso ensino técnico, insuficiência que ontem
era um mal e hoje é um perigo, dada a luta de competência que é preciso suportar na concorrência aos
mercados de todo o mundo"1) e defendem algumas alterações que consideram imprescindíveis a um
desenvolvimento adequado do País e como resposta às expectativas educativas de muitos alunos.
Defende-se, na sequência do que vinha sendo afirmado ao longo do século XIX, uma maior
interacção entre as escolas do ensino técnico elementar e o meio local, uma maior confiança dos em
presários na formação veiculada pelas escolas, empregando os seus alunos, a necessidade de passar
os serviços do ensino técnico para a alçada do Ministério da Instrução Pública (estavam adstritos ao
Ministério do Fomento), um maior investimento em instalações e equipamento (nomeadamente nas
Oficinas), a necessidade de se desenvolver o ensino nocturno (embora adequando o seu currículo)
e, sobretudo, intervenções legislativas que procurassem adequar o ensino técnico às suas funções
sociais e económicas2.
O espaço legislativo onde se procuram equacionar todas estas necessidades ocorre quando,
a propósito do Decreto de 1 de Dezembro de 1918, se coloca uma série de questões relativamente ao
percurso do ensino técnico:
" ( .. . ) Qual tem sido o espírito que presidiu a toda a nossa extensa legislação sobre o en
sino industrial e comercial? Há nela indícios reveladores duma infiltração progressiva e
metódica no seio das massas populares e da indústria e do comércio? Há elementos de
monstrando que corresponde às necessidades sociais e lhe pertence papel importante nos
progressos da indústria e no desenvolvimento do comércio? Tem desempenhado missão
educativa e civilizadora? ( ... )"3
Estas questões, formuladas pelo secretário de Estado João Alberto Pereira de Azevedo
Neves no relatório de justificação de uma nova organização do ensino industrial e comercial, publicada
em 1 Dezembro de 1918 (Decreto n.º 5029), procuram enquadrar as mudanças efectivadas: desenvol
vimento do ensino comercial através da criação de aulas e escolas comerciais; leccionação do ensino
industrial elementar em escolas de artes e ofícios, escolas industriais, escolas preparatórias, escolas
de arte aplicada; flexibilização dos programas dos cursos em função dos interesses das localidades;
maior ligação às corporações industriais; divisão em cursos de aprendizagem e de aperfeiçoamento.
Estas alterações sintonizavam com os interesses do patronato, representado no Conselho de Ins
trução Industrial e Comercial, que defendia um ensino mais prático, com métodos experimentais e,
sobretudo, mais de acordo com as necessidades locais e regionais.
Em 1918-19, a rede escolar incluía 9 escolas de desenho industrial, 11 industriais, 10 industriais
e comerciais,3 elementares de comércio e 2 preparatórias (total: 35). A rede prevista no diploma de Aze
vedo Neves é con stituída por 19 escolas de artes e ofícios, 9 industriais, 2 preparatórias, 7 comerciais e 7
aulas comerciais (total: 44). A maioria das escolas de artes e ofícios resultavam da conversão de escolas
de desenho industrial (7) e do desdobramento de escolas industriais e comerciais em aulas comerciais (e
escolas de artes e ofícios) (também 7). Em 1921, há alterações: 5 escolas de artes e ofícios são converti
das em industriais; surge uma escola industrial e comercial, por fusão, apesar de este tipo de escola não
estar previsto na reforma de 1918. Em 1922, surgem mais 2 escolas industriais e comerciais por trans
formação de uma de artes e ofícios e outra comercial; são criados vários cursos para operários da indús
tria gráfica na Escola Industrial Infante O. Hen rique. Em1924, surgem mais 4 escolas industriais e co
merciais a partir de 3 aulas comerciais, 1 escola comercial e 2 industriais. Uma de artes e ofícios passa a
industrial (criando-se só o curso de montador electricista), e uma aula comercial passa a escola. C ria-se
ainda uma escola industrial e comercial. Em 5 escolas, 2 industriais e comerciais, 2 industriais e 1 de artes
e ofícios, são criados novos cursos, destacando-se o de montador electricista, justificado pela crescente
utilização da energia eléctrica. Em Outubro e Novembro, um conjunto de diplomas decreta a criação de 8
escolas industriais e comerciais e 1 industrial. São convertidas 2 escolas de artes e ofícios em escolas in
dustriais; surgem 2 industriais e comerciais, 1 de artes e ofícios, 1 industrial e 2 de artes e ofícios. A desac
tivação, em certas localidades, de escolas do ensino primário superior (implementado a partir de 1919-
-20, apesar de criado desde 1911) permitiu que os edifícios e o pessoal passassem para o ensino técnico
elementar.
(. )
.. ( . . .) ( . .)
. 1922-1923 9 861 344
deveres do Estado democrático é assegurar a todos os cidadãos, sem distinção de fortuna, a possibili
dade de se elevarem aos mais altos graus da cultura ( .. .)"5. A nova escola surgia na sequência do papel
educativo desempen hado pela Academia Politécnica, desde meados do século XIX, e englobaria uma
Faculdade de Ciências com uma Escola de Engenharia anexa, e a Faculdade de Medicina com uma
81 EDUCAR
EDUCAÇÃO PARA TODOS. ENSINO NA I REPÚBLICA
ENSINO TÉCNICO
LUÍS MARQUES ALVES
Escola de Farmácia . Acabava assim a proximidade hierá rquica com o Instituto Ind ustrial e Comercial,
que chegou a justificar propostas de fusão (Instituto Politécnico d o Porto), embora se mantivesse a
proxi midade física pela partilha de instalações, que ainda se vai ma nter durante mais algum tempo.
No mesmo ano, a 23 de Maio, uma outra medida aj udará a clarificar o novo papel que a Re
pública pretendia atribuir aos Institutos. A preocupação de justificar e esclarecer o novo espaço é clara
no Relatório do decreto que criará o Instituto Superior Técn ico:
" ( . . . ) Somos, na Europa, o país que conta o maior número de analfabetos, e não supor
ta confronto o nosso ensino médio superior e técnico com ensino similar aos países que
trabalham e progridem. ( . . . ) No que diz respeito ao ensino técnico, considerado nos seus
diferentes graus, a nossa miséria é confrangente, a despeito da multiplicidade de institutos
em que tal ensino se faz, não obstante a farfalhice dos programas respectivos. As nossas
aptidões originárias revelam as dos povos que já Lograram atingir um alto desenvolvimento
i ndustrial, e que são, cumpre notá-Lo, os de mais Larga e mais intensa cultura científica. O
nosso atraso provém apenas da insuficiência do nosso ensino técnico, insuficiência que
ontem era um mal e hoje é um perigo, dada a Luta de competências que é preciso suportar
na concorrência aos mercados de todo o mundo. ( . ) ..
Os institutos de ensino técnico médio preparam mal os seus alunos para as carreiras a que
se destinam, sendo notável a sua falta de cultura geral, não obstante a profusão de cadei
ras e de exames a que os obrigam. O ensino técnico superior é uma sofismação grosseira
de que têm encargos as Politécnicas e os Institutos, estabelecimentos em que, na frase do
i lustre professor Lepierre, muito se ensina e muito pouco se aprende. O ensino da enge
nharia química e o da engenharia electrotécnica não existe, e todavia a importância deste
ensino é hoje enorme, e de cada vez maior, industrial como é a fase ou ciclo de civilização
que vamos percorrendo ( . )
. . .
Carecemos de ter bons engenheiros, e não só é mau, por ser deficiente, o ensino que faze
mos da engenharia, mas até alguns ramos e dos mais importantes, desta ciência aplicada,
não figuram no quadro dos nossos estudos (...)."6
O Instituto Industrial e Comercial de Lisboa dava origem ao Instituto Superior Técn ico e ao
Instituto Superior de Comércio, mas, mais do que o simples desmem bramento, im porta referir não só
a sua "vertente" su perior, como as justificações que são aduzidas para este acto Legislativo. T i n ha-se
u ltrapassado a fase de algum sincretismo profissional, e as escolas técn icas secundárias, implementa
das a parti r de 1884, começavam a fornecer alunos com alguma am bição educativa. Criar um ensino
técn ico médio constitu ía uma necessidade, não só sob o ponto de vista de aspiração social, como
sobretudo económica. Nos Loca is onde não fosse possível a coexistência entre um I nstituto Superior e
uma Faculdade Técnica, as instituições que vinham de meados do século XIX dariam origem a escolas
de ensino médio, obrigatoriamente sem a "fa rfalhice dos programas" e tentando dotar o País de novos
técnicos - cond utores ou, de preferência, auxi liares de engenharia - num quadro profissional em efer
vescência nos inícios da República?_
É neste âmbito que deve ser entendido um conj unto de outras medidas - aprovação das
bases do Instituto Superior de Comércio de Lisboa (1913) , criação da Escola de Construções, Ind ústria
e Comércio (1914), criação da Faculdade Técnica do Porto (1915), por exemplo - que de alguma forma
preparam e aj udam a entender as reformas de 1918 e 1919, estas já com incidência nas novas funções
destinadas ao Instituto Ind ustrial do Porto.
Regressemos então ao Decreto n.º 5029, de 1 de Dezem bro de 1918, e perscrutemos as
justificações e o a lcance das medidas relativas ao ensino industrial (e comercial}, agora na sua nova
vertente de ensino técnico médio.
A sua componente profissiona l tem que ser óbvia e imediata: " ( . . . ) Do ensino resu lta a profis
são ( . . . ). A escola cria a profissão. O ensino, quando bem orientado, é o maior moralizador do povo (...).
É mister organizar o ensino técnico em moldes que o tornem essencia lmente prático e útil ( . . .}."8
A sua ligação à localidade ou ao espaço onde está inserida tem de ser "osmótica", não só
para facilitar eventuais a rticulações com as Associações comerciais e industriais, como para garantir
o "tirocínio" nas empresas: "(...) O sistema de ensino técn ico é uma linha recta parti ndo da nacionali
dade e terminando no mundo. (...) É mister desenvolver as artes e as indústrias genui namente portu
guesas a fim de não desnacionalizar a nossa terra (. ..).9"
'
O sentido prospectivo e profissional tem de garantir a possi bilidade de o País caminhar pró
ximo das nações mais industria lizadas: "( . . . ) serão os países de orga nização escolar mais prática, os
que vencerão nas lutas da indústria e do comércio, os dois grandes e fundamentais elementos da
prosperidade d um povo. O país que possuir melhores operários, melhores engenheiros e melhores
comerciantes e que tiver a felicidade de organizar ra pidamente a sua indústria e o seu comércio fruirá
as glórias do triu nfo ( ... )"10.
Passando à pedagogia, à didáctica e aos conteúdos, o relatório transforma-se num ma
nifesto d o papel do ensino e do espaço educativo técnico: ( ...) O ensino deve fazer-se na escola, no
"
vera e que sofre assim, agora, o mesmo processo de degradação estatutária de alguns a nos a ntes em
Lisboa. O Porto vê ainda a criação do seu ISC, uma escola que Levará u m a existência a rrastada até ser
extinta pelo Estado Novo."15
A regulamentação do Instituto Ind ustrial do Porto (Decreto n.º 6099, de 15 de Setembro de
1919) explicita e adapta um conju nto de aspectos, genericamente já referidos, mas agora adaptados
às suas funções educativas.
Sobre o ensino, ele devia ser "teórico", constituído sobretudo por prelecções dos professo
res, " prático", em gabinetes, Laboratórios ou através de visitas, missões de estudo, trabalhos de campo,
ou outras actividades entendidas como convenientes, e "profissional" (art.os 9 a 12) , contando para isso
com as oficinas anexas ao Instituto (de carpi ntaria geral e moldes, de serralharia mecânica e de fundi
ção e forja). Para complementar esta vertente profissional, estavam previstos "tirocínios" obrigatórios
(art.º 15) em estabelecimentos do Estado ou em particulares, contando-se aqui com a colaboração da
Associação Industrial.
Era visível uma grande preocupação em explicar a qualificação, mas tam bém a importância
social e profissiona l da certificação. O curso geral era correspondente ao curso com plementar dos
Liceus; os cu rsos especia lizados permitiam que os seus frequentadores pudessem ser professores das
escolas ind ustriais (nas especialidades correspondentes), habi litava-os para os Lugares de cond utores
(desig nação já u ltrapassada) ou engenheiros auxiliares de obras públicas e em minas, para profissio
nais dos correios e telég rafos (o curso de electrotecnia e máquinas) e para chefes de oficinas, caso
frequentassem o curso de especialização de indústrias q u ím icas (art.º 17) . Acresce a esta explicitação
o facto de uma das finalidades da referida Comissão de Aperfeiçoamento do Ensino, prevista no art.º
90, ser " mostrar as vantagens para o país da existência de i ndivíduos d iplomados com os cursos mé
d ios industria is". Daqui resultava a estreita Ligação à i mprensa diária, nomeadamente O Comércio do
Porto e O Primeiro de Janeiro, onde pu blicitavam cursos, in iciativas, alunos d iplomados, participação
em exposições, entre outras actividades.
U m dos aspectos a que os vários reg ulamentos deram sempre uma g rande importância foi
o espaço que neles aparece consagrado aos "estabeleci mentos a nexos". Por um Lado, é a corporização
de uma pedagog ia e de uma didáctica mu ito próprias; por outro, sign ifica o espaço privilegiado que
eles ocuparam no âmbito do Instituto, com os inerentes i nvestimentos em novos recursos, objectos
ou materiais; por outro ainda, e neste regulamento com particular ênfase, porque "os Laboratórios e
oficinas do Instituto, além da sua missão pedagógica, poderão executar também análises, ensaios
e trabalhos que forem solicitados por entidades oficiais ou particu lares" (art.º 46). Se associarmos
a estes Laboratórios, gabinetes e ofici nas a biblioteca e a incorporação no Instituto dos objectos do
exti nto16 M useu Industria l e Comercial do Porto (Lei n.º 445, de 25 de Abril d e 1914) , entendemos o
riquíssimo património que ficou ao serviço dos estudantes, do tecido empresarial e d a popu lação e m
geral, e que ai nda hoje pode constituir um espólio único, tanto no contexto do ensino técnico n acional
como até internacional.
As d ificuldades de instalações, a exigu idade dos recu rsos financeiros, a ausência d e mo
deração nas negociações que se seg u i ra m à reforma, a i ntromissão dos governos na nomeação de
alguns di rectores sem receptividade j unto do corpo docente17 e, até, algumas tomadas de posição
políti cas18, no contexto da instabilidade da I República, tornara m particularmente difícil a vida do(s)
lnstituto(s) d u rante este período. As i ncom patibilidades provocaram m esmo a reu nião dos dois Ins
titutos, novamente debaixo da desig nação de I ndustrial e Comercial, a partir de 1924 (31 de J u lho) .
Pelo menos a justificação é " politicamente correcta" - "( . . . ) considerando que esta j unção terá d e
su bsistir enquanto naquela ci dade não for possível possuir edifícios separados para o s dois institu
tos, traz a vantagem pedagóg ica de uma di recção única para dois estabelecimentos d e ensino, que
aproveitam o mesmo material escolar e uma notável economia de pessoal, tanto docente como
admi n istrativo e menor" - mas quem conhece a vida atri b u lada d estes esta belec i me ntos, d u ra nte
este período, sabe que as razões eram mais profu ndas e mais graves do que o preâmbulo do Decreto
n. º 9951 fazi a entender.
Em 1925, através de novos diplomas (Decretos n.as 10 849, de 16 de Ju n ho, e 11 304, de 9
de Dezembro), dá-se corpo à nova orga nização dos cursos, do "velho" Instituto Ind ustrial e Comercial
do Porto. Paralelamente, merece referência a indefinição profissional dos diplomados nos Institutos
Industriais. A sua categorização, que era de "engenheiro auxiliar" pela Lei n.º 1638, de 23 de Julho de
1924, passou a "agente técnico de engenharia" em 1926 (Decreto n.º 11 988, de 29 de J u lho).
Nesse mesmo ano (em Maio) , a I República tinha chegado ao seu termo, institucionali
zava-se a Faculdade de Engenharia do Porto (Dezembro) e suspirava-se pelo fim da provisoriedade
governativa instalada após o golpe de 28 de Maio.
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sino, entre ensino teórico e utilitário, dirigindo-se para a construção do homem completo,
considerando os germes da individualidade, no seu trabalho, que, dentro das duas divisões
capitais dos cursos, permite ainda diferenciações secundárias, para o que será proposto
um sistema de classificações especial, em oposição com a velha rotina" (Coelho, 1913).
no modo como distribu íam e escalonavam os vários saberes, tendo em conta os d iferentes índices de
fadiga intelectual. Por fi m, no capítulo disciplinar, condenava-se absolutamente o castigo e a repressão
corporal, em favor de regulamentos disciplinares positivos, isto é, dominados pelo princípio da auto
regulação do aluno.
Para as autoridades republi canas foi-se trata ndo, no essencial, de Legislar e tomar outro
tipo de medidas no sentido de executar completamente o regi me de classes, aprofu nda ndo-Lhe tanto
a unidade científica e disciplinar, quanto a sua coerência pedagógica. Ainda em 1914, aq uela que surgia
como a "su perior" necessidade de subordinar todos os " métodos e processos de ensino" a uma mesma
concepção de ensi no-a prendizagem Levou à publicação de uma portaria que, no conspecto geral das
i niciativas de todos os executivos dos sécu los XIX e XX, se destaca pela mi núcia das recomendações
e pela força clarificadora do trabalho de professores e alunos. De facto, o documento apresenta u m
vasto conj unto de "instruções para o reg ime de classes", procurando melhorar o rendi mento d o ensino.
A ors pedagogica tomou então a dia nteira na regu lamentação do trabalho docente, e pode afirmar
-se, sem exagero algum, que nem antes nem mesmo depois o leg islador se deteve de modo tão
circu nsta nciado neste tipo de consid erações que antecipam e prescrevem os sentidos da prática. A
" norma inflexível" ou o "dever mais proeminente" do mestre, aos quais se subord inariam totalmente
"as condições de ensi no", consistiria agora em "diligenciar para ser com preendido" e "verificar a todo
o instante" se efectivamente o fora. O Governo recomendava que camin hasse em passos lentos,
todavia seg uros, não olvida ndo, por um instante sequer, que a "qualidade" do ensino pri maria sempre
sobre a "quantidade". I m portava sobremaneira que o professor fosse claro. Além disso, todas as prá
ticas de ensino deveriam submeter-se ao incontornável da modernidade, isto é, que o fim do ensino
secu ndário estava menos na "soma e variedade de conhecimentos adqui ridos" que no "desenvolvi
mento das facu ldades do espírito". Desta maneira, "a elevação e proveito do ensino" dependeriam da
"forma" como ele era min istrado e não tanto da "sua própria essência". Dito de outra maneira: mais
"dos métodos adoptados e seguidos" que da "perfeição dos progra mas e excelência dos Livros". O
saber técnico-pedagógico sobrepujava defin itivamente todas as competências académicas do pro
fessor. Se a aula era o "lugar por exce lência dos estudos", o mestre deveria, para esse fi m , " preparar
convenienteme nte a lição dos alunos, resolvendo-lhes todas as dificuldades e faci litando-lhes o es
tudo". O "ensino das crianças e os modernos processos pedagógicos" demandavam, pois, em simul
tâneo, uma " paciente d i ligência" e a pormenorizada " preparação em casa da lição do dia" (Portaria
n.º 230, de 21.9.1914) .
A forma de ensi no, fosse qual fosse a disciplina, tinha por "principal objectivo" cativa r a
"atenção da colectividad e", o que se comprovava repetidamente pelo i nterrogatório d i rigido à classe.
Com ele pretendia-se desenvolver o "espírito de i niciativa dos a lunos", considerado este pelo leg isla
dor como um dos mais "brilhantes e proveitosos dotes do espírito". Enu nciando a pergu nta a todos e
cada um, o professor não visava apenas ampliar a "nítida compreensão da matéria ensinada"; estava
igua lmente a "habituar o aluno a dizer francamente" o que não com preendia ou a pedir, a esse res
peito, "uma explicação suplementar". A educação dos espíritos devia ser dirigida a conseguir que eles
tivessem "a consciência do seu saber", a dizer "bem" o que pensassem e, sobretudo, a " pensar com
discernimento" tudo o que tivessem a dizer. Esta ponderação-explicitação pública da verdade do sujei
to aprendente deveria mesmo ser premiada: as notas de aproveitamento dos alu nos não reflectiriam
apenas os trabalhos escritos dos alunos, mas igualmente a "série de perg untas e respostas dadas"
aos diferentes i nterrogatórios. De resto, considerava-se que era no interrogatório, "animado, guiado
passo a passo pelo professor", que os alunos exercitariam "especialmente as suas aptidões especiais",
aprendiam "a expor os seus conhecimentos" e a "servir-se dos seus recursos intelectuais". "Os erros
corrigidos e as deficiências am pliadas prontamente pelos condiscípu los", contin uava o leg islador, se
riam "o melhor guia e o incitamento preferível para a boa direcção do estudo de cada aluno" (Portaria
n.º 230, de 21.9.1914) . Por aqui se depreende que todos os movimentos e intervenções do aluno liceal
passaram a estar em constante exame ou que a avaliação se un iversalizou no quotidiano escolar.
E não era tudo. Uma aula estruturada em torno do interrogatório teria o efeito de i nstaurar a nova
relação disciplinar, aquela cuja eficácia dependia do jogo da sedução e da emoção sensível, a única,
aliás, susceptível de resolver o desvario e outros defeitos de origem psicológica de alguns discípu los
de menor idade.
Como se verifica, as autoridades republicanas concebiam os professores como ga
rante, em primeira instância, da coesão e uniformidade do tecido social, e os que trabalhavam
nos liceus não seriam também excepção. I mportava que tudo fizessem para que, na avaliação da
prestação dos seus discípulos, se não registassem grandes divergências ou variações. Todas as
classificações seriam "acordadas em conferência" dos docentes da classe. E cada um dos pro
fessores i nvestidos de cargos de di recção do liceu deveria "tomar nota", caso a caso, de todos os
alu nos que revelassem "aplicação desigual nas diversas discipli nas", a fim de d iligenciarem fazê
-los "aproveitar ma is" naquelas em que se mostrassem "atrasados". Mas esta responsabi lidade não se
ficava por ali, estendendo-se a todos os docentes. Era a Li nguagem normalizadora na sua expressão
pura que aqui de novo i rrompia. Era obrigação do docente diligenciar para que a classe progredisse
"com pacta e homogénea no ensino, sem deixar após de si retardatários". Logo que um desses fosse
" notado", deveria " investigar qual a natureza da deficiência" que dominava nesse aluno, para que pu
desse ser "uti lmente aplicado" o processo de combate. Foi neste ponto, neste exacto instante de des
coberta do que se afastava da norma, que novas formas de registo documental surgiram, implicando
todas as cadeias hierárqu icas da institu ição. Não era permitido aplicar uma nota de aproveitamento
"i nferior a suficiente", sem que o docente da disciplina tivesse "i nformado por escrito" o professor
nomeado responsável pela classe dos motivos - "não em termos indefi nidos e vagos, mas com espe
cificação da causa su posta, ou seja, falta de atenção e aplicação, má compreensão e aplicação" - da
fa lta de rendimento. Por sua vez, esta segunda figura deveria transmitir a informação "num boletim" à
reitoria, documento esse em que relataria todos os meios e métodos que haviam sido accionados para
combater a "deficiência", bem como o balanço da sua "eficácia ou ineficácia". Nesta ú ltima situação, o
reitor informaria a família do aluno, "devendo ficar reg istada esta comunicação". Da mesma maneira
se procederia quando um estudante recebesse uma " nota inferior a bom em comportamento". Para
que as i nformações referentes a esse alu no-problema fossem efectivamente "completas", importava
que o professor conferenciasse "também com os professores da classe", procurando, "na opin ião" que
estes tivessem do mesmo discípulo, "completa r o seu próprio conceito". Tudo porque, na " moderna
orientação do ensi no", os sim ples esforços isolados eram "deficientes" (Portaria n.º 230, de 21.9.1914) .
Qualquer observador atento notará que esta problemática não mais saiu da agenda da formação de
professores do ensino secu ndário nos anos posteriores.
Em minha opinião, é apenas no que diz respeito às funções de administração e inspecção
propria mente do liceu que se pode defender que a impla ntação da República teve intenção de cortar
cerce com as experiências anteriormente ensaiadas. Desde 1836 que a principal fig u ra, o reitor, era
ou o "professor mais velho" (decano) , ou então o "chefe do liceu", nomeado pelo Governo de entre
professores de ensino su perior ou secu ndário, estranhos ao corpo docente da escola; na sua última
fase, isto é, depois da Reforma de Jaime Moniz, a Monarquia reforçou e centralizou o poder dos reito
res, que se viram apoiados por um Conselho Escolar com posto por professores e com funções ape
nas consultivas. Logo após o 5 de Outubro, todos os reitores foram demitidos e su bstituídos por um
professor efectivo do próprio liceu e eleito pelo Conselho de Escola, que continuava a ser com posto
por docentes. A medida, inicialmente tomada a título provisório - tratou-se de um "saneamento polí
tico dos reitores nomeados no regime anterior" -, "foi regu lamentada em 1917, fica ndo estabelecido
que os reitores tinham um mandato de quatro anos, podendo ser reeleitos". Do mesmo modo, aq uele
órgão veria reforçadas as suas competências, passando a exercer "am plas funções deliberativas
em domín ios tão diversos como a nomeação do pessoa l, a organ ização dos horários, a avaliação de
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EDUCAÇÃO PARA TODOS. ENSINO MA I REPÚBLICA
O ENSINO LICEAL MOS AMOS DA I REPÚBLICA
JORGE RAMOS DO Ó
professores e alunos, a aprovação do orça mento e as matérias do foro disciplinar" (Nóvoa, Ba rroso
& Ó, 2002: 52).
Se passarmos agora a nossa atenção para os alu nos, é mister começar pela análise da fre
quência dos liceus. De imediato se verifica que os números alcançados em nada se ficaram a dever a
um esforço que possa ser visto como su plementar ou específico do poder republicano. No a no lectivo
de 1910-11, estavam inscritos 9740 alunos e, no de 1925-26, o número total ascendera a uns modestos
12 604. Cumpre ainda referir que o aumento de menos de 3000 efectivos atingido dura nte a I República
foi inferior ao obtido em igual período anterior- entre 1885-95 e 1909-10, passara-se de 3658 para
8691 inscritos - e idêntico ao que se registaria nos primeiros 16 anos do regime autoritário (Ó, 2009:
45-53). De todo o modo, o mais impressivo é imaginar um país onde os seus responsáveis concebiam a
formação e, sobretudo, a regeneração das classes dirigentes por intermédio de uma tão ínfima parcela
da sua população jovem. É um facto que os republicanos de todos os tem pos insistiram na tese segun
do a qual a aristocracia se mostrara exemplarmente incompetente para d i rigir uma sociedade de carac
terísticas modernas e progressiva, mas a verdade é que pouco ou nada fizeram para i nverter a herança
e construir condições objectivas no sentido da mobilidade social e de uma real substituição das elites.
A primeira experiência de reg ime democrático também ficaria con hecida, no campo educacional, pela
defesa do aumento do contingente de mulheres. Ora, também neste particular pouco ou nada se pode
registar. Somente nos chegam estatísticas com uma informação sobre totais de alunos por género a
parti r do ano lectivo de 1916-17, quando estariam matriculadas 2781 raparigas; 9 a nos depois, o total
elevara-se em apenas mais 179 alunas em todo o Continente e Ilhas.
Contudo, e à semelhança da instituciona lização do reg ime de classes, há a registar tam
bém, no período republicano, um conti nuado trabalho de equipamento cívico do alu no, quer d izer, a
entender as questões da conduta e da disciplina essencialmente como uma prática. Para um número
crescente de pedagogos e educadores do primeiro quartel do século passado, urgia intervir sistema
ticamente sobre as atitudes, disposições e comportamentos dos alunos. E o postu lado, que não mais
se abandonou até aos dias de hoje, era já então o de que o liceu teria de encontrar condições para
fabricar um tipo de actor social que devia, ele mesmo, ser sujeito da sua própria ed ucação. Em vez da
pregação e da inculcação livresca, começou a apontar-se para um quadro de acção em que se admitia
que os adolescentes só poderiam entrar num efectivo processo de aprendizagem quando tivessem a
capacidade de dominar internamente as várias experiências escolares em que se vissem envolvidos.
A educação secundária estruturou-se a partir desta conjuntura histórica como um trabalho sobre o
eu, sob a bandeira da autonomia dos educandos, numa desmulti plicação de actividades destinadas a
ocupar os jovens ao longo do dia. Mais do que a uma reflexão pedagógica ou a iniciativas de tipo legis
lativo, esta questão deu lugar a uma di nâmica essencia lmente de tipo político-organizacional, que se
estruturou primeiro loca lmente, a partir dos anos 10, e a lastrou para o sistema no seu conjunto já no
apogeu do Estado Novo.
Se houve em Portugal um espaço institucional onde a transposição destes pressu
postos viria a ser feita com pioneirismo, e também de forma mais criativa, através do desenvolvi
mento de novas práticas de aprendizagem fora do plano de estudos, foi sem d úvida o do Liceu
Central de Lisboa (3.ª Zona Escolar) , criado em 20 de Janeiro de 1906 e que, mais tarde, tomou a
designação de Liceu Central de Pedro N unes. Vale a pena determo-nos um pouco sobre esta ins
titu ição, posto que nela se foram estruturando as regiões que caracterizariam, depois, toda a pai
sagem liceal. A imagem, tanto interna como externa, deste estabelecimento de ensino ficou in
delevelmente associada à figura do seu primeiro reitor, António Sá Oliveira (1872-1954) , que
cumpriu dois longos mandatos, os quais cobriram as três experiências de governo político do
País que marcaram o século XX: a Monarquia, a República e o Autoritarismo. De facto, manteve
-se na reitoria desde a fundação do Liceu até Setembro de 1919, numa primeira vez, e de Outubro de
1930 a Outubro de 1941, numa segunda.
O Liceu Pedro N unes assumiu a centralidade da dimensão comporta mental do alu
no. O desenvolvimento de novas habilidades individuais, nos variados ramos em que a activi
dade física e cultural se pod ia decom por, passou a andar de par com uma mi ríade de situações
destinadas ao pensar, respeitar, valorizar e viver. Tratou-se, pois, de institucionalizar o "circum
-escolar", como então se dizia, emprestando-lhe um estatuto e uma formatação em nada disti nta do
ensino dos programas discipli nares. Como se a d i mensão socializadora, que a Reforma de 1894-95 já
havia consagrado, fosse então defi nitivamente ampliada, dando origem a uma i mensidão de acções
devidamente organ izadas dentro e fora da sala de aula, dentro e fora do território escolar.
Em 1915, o carismático reitor afirmava, peremptório: "O Liceu Pedro Nunes propõe
-se realizar uma empresa difícil, quer su bstitu ir a escola-fiscal de trabalho doméstico pela escola-
-casa de ensino, casa de estudo, casa de trabalho, casa de educação." Era com org ulho que afirmava
que o seu liceu fora aquele que afastara "da rua" os seus alu nos e lançara a ideia de que as escolas
não se pod iam " reduzir ao papel insign ificante e inglório de fábricas de exames e de d iplomas" (Oli
veira, 1915: 1) . Sá O liveira entendia que a consciência cívica individual só teria cond ições de se formar
se fosse acompanhada de uma educação social prática, e que esta com petia, em última análise, às
associações escolares. As tendências socializadoras que a escola procurava não tinham outra forma
de progressão que não através da diversificação de laços formais de solidariedade entre os alunos.
O associativismo escolar nasceu no ano lectivo de 1905-06, portanto com o próprio liceu,
dominado pela ideia de auto-educação, mas a sua implementação efectiva decorreria fundamental
mente nas novas i nstalações que seriam inauguradas em 1911. Do primeiro relatório e contas, fica a
saber-se que fora Sá Oliveira quem promovera a sua criação - ainda que os cargos da Direcção, bem
como do Conselho Fiscal, fossem desempen hados por alu nos - e lhe apontara os primeiros grandes
objectivos. Se atendermos aos primeiros Estatutos publicados em 1914 pela Associação Escolar do
Liceu de Pedro N unes, de imediato verificamos que se encontrava em desenvolvimento um conj unto
inédito de práticas educativas, as quais configuravam a própria estrutura organizativa. Havia naquela
Associação 7 secções em funcionamento: de Excursões, cujo fim era organ izar "visitas de estudo,
podendo ter anexo um grupo fotográfico"; Desportiva, que promovia "a cultura física, tendo em vis
ta a educação da vontade e a formação do carácter"; Literária e Científica, que promovia " leituras,
conferências, palestras científicas e pu blicações"; de Arte, que visava facilitar "a aprend izagem da
música, da dança e da declamação, do desenho artístico e pi ntura, a aud ição e execução de música
vocal e instrumental, a representação de pequenas obras de teatro"; de Cooperativa, que procedia
"dentro do liceu à venda de objectos de estudo e quaisquer outros artigos escolares"; de Jardinagem,
que desenvolvia no liceu "o gosto pelas flores e pela cultura da árvore"; de Trabalhos Manuais, que
facilitava "a sua aprendizagem". Havia, ainda, uma Caixa Económica, cujo fim era "cultivar a economia
como vi rtude". A sua admin istração pertencia à "Junta dos Delegados", a qual era composta de "só
cios efectivos eleitos para esse fim no princípio de cada ano lectivo". Esta eleição era feita "pera nte o
professor d i rector de turma" e seria "de um delegado por cada turma das três primeiras classes, dois
por cada turma da qua rta e quinta classes, e três por cada turma dos cu rsos com plementares". A
Associação tinha por fim "promover a educação geral dos seus associados" e adoptava, naturalmente,
para "sua d ivisa 'nós nos educaremos'" (Associação Escolar do Liceu de Pedro Nunes, 1914: 3 e 7). Foi
todo um programa da virtude mora l moderna que deste modo se objectivou. Os Mandamentos do Bom
Aluno, postos a circular no Liceu no ano lectivo de 1912-13, constituem seguramente umas das peças
discursivas em que melhor se percebe a ligação fusional entre li berdade e obed iência, em ordem a
um perfeito governo de si mesmo, que caracterizaria a educação dos jovens liceais ao longo de todo o
século XX. Tomem-se exemplarmente alguns deles:
"O bom aluno do liceu ama a sua escola e contribui quanto pode para que ela se aperfeiçoe.
O liceu não é apenas um edifício, onde o a luno vem receber Lições que pode repetir pelos
livros. O liceu é uma corporação formada por alunos dirigidos por professores, tendo u m
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EDUCAÇÃO PARA TODOS. ENSINO NA I REPÚBLICA
O ENSINO LICEAL NOS ANOS DA I REPÚBLICA
JORGE RAMOS DO Ó
reitor por chefe e empregados por auxiliares. Cada uma destas entidades é, de per si, im
potente para realizar os fins da escola; esta obra é ao mesmo tempo de todos, e todos são
solidários na sua execução.
O bom aluno respeita a casa do liceu como a sua casa. O edifício do liceu pertence ao
Estado, e o Estado cede-o à corporação Liceal, de que os alunos fazem parte, a fim de
que dele faça uso conveniente aos seus fins educativos. Assim, o aluno deve descobrir
-se respeitosamente dentro do edifício do liceu, não deve sujar nem riscar ou deteriorar por
qualquer outra forma as paredes, os móveis ou o material de ensi no. Se o fizer, desfalca
os bens da corporação a que pertence, bens que representam o produto do suor dos que
trabalham, e constitui-se por isso no dever de pagar os estragos que fez.
O bom aluno sabe respeitar os seus mestres e obedecer-lhes sem su bserviência. Os
professores exercem uma função superior, uma espécie de direcção espiritual, que tem
de ser olhada com respeito. Os a lunos devem-lhe obediência, não uma obediência cega,
passiva, como de cadáver, mas uma obediência raciocinada que se funda no convenci
mento de que obedecem para se conseguir a disciplina escolar. O espírito de insubm issão
é incompatível com a educação na escola. O espírito de su bserviência é uma baixeza
moral da pior espécie.
O bom aluno respeita a sua i ntegridade moral e a dos seus companheiros. Evita os vícios
e as más leituras e as más companhias e as más ocasiões que geram os vícios, e não
proporciona aos outros as más Leituras, nem as más companhias, nem as más ocasiões
de se perderem. O mau Livro é um veículo de veneno moral. Lê-lo é acção má, emprestá
lo é acção pior. As más companhias são a principal fonte de perdição para a mocidade.
O bom senso, a inteligência e a bondade de cada um revelam-se na escolha que faz das
suas companhias. A principal ocasião de contrair o vício é a ociosidade.
O bom aluno respeita a sua saúde e procura ser forte e bem equili brado, sob o ponto de
vista físico. Carecemos de ser saudáveis e fortes por nós, pela família a que pertencemos,
pela família que poderemos constituir, pela Pátria que nos cumpre defender, pela Humani
dade, para cujo aperfeiçoamento nos cumpre defender, pela Humanidade, para cujo aper
feiçoamento nos cumpre contribuir, pela Natureza, com cujos altos intuitos nos devemos
identificar. Há vícios que arruínam a saúde. O uso do tabaco é particularmente funesto aos
rapazes novos, é para eles um tóxico, que lhes diminui a memória e enfraquece o cérebro.
O melhor meio de evitar os vícios da mocidade é a cultura física bem dirigida.
O bom aluno não mente, não denuncia, nem consente que a outrem sejam atribuídas cul
pas que lhe pertençam a ele. A mentira é sempre uma cobardia, a denúncia inculca a alma
sem nobreza; grande cobardia moral é admitir alguém que um companheiro ou um grupo
de companheiros sofram castigo por delito que ele cometeu. A queixa contra um compa
nheiro perseguidor pode ser indispensável à legítima defesa, mas o recurso a ela deve ser
cuidadosamente estudado por cada um, a fim de evitar que se use dela inconvenientemen
te. Os que praticam furtos ou desonestidades estão fora de toda a solidariedade; ninguém
deve hesitar em queixar-se deles quando não se corrigem.
O bom aluno aproveita solicitamente todos os meios que o liceu lhe proporciona para se
educar. Acompanha as lições e revê-as em casa. Tem os seus livros bem limpos e asse
ados. Completa os trabalhos das aulas com a observação de tudo quanto se lhe depara.
Concorre às visitas de estudo e às excursões escolares, que são o melhor meio de desen
volver o espírito de observação e de alargar os seus conhecimentos práticos. Dedica-se
metodicamente a todo o género de cultura física compatível com a sua idade, como o
melhor meio de formar o carácter e fortalecer a vontade.
Dedica às boas leituras algum do tempo que lhe sobrar dos seus estudos ordenados e
adestra-se nas artes de falar e de escrever. Habilita-se a apreciar as manifestações artís
ticas, e ele próprio se dedica a aprender alguma arte para que tenha aptidões. Aperfeiçoa
e educa os sentidos e aproxima-se mais da Natureza, amando os campos e os jardins, as
árvores e as flores ( . .. ) .
Estas e outras palavras, carecemos de as repetir. É que há um certo número de alunos
a quem é preciso recordar que eles vieram ao liceu para se educarem, a quem é preciso
recomendar que não percam de vista que a divisa dos alu nos deste liceu é nós nos edu
-
A encerrar esta breve síntese, importa retomar a constatação de que a I República assumiu
abertamente o modelo educativo construído pelo regime que derrubara, mesmo que para o sucesso da
revolução muito tivesse contri buído o slogan de que a necessária mudança das mentalidades impunha
uma mudança radical da educação que estava em 5 de Outubro de 1910. Fácil é mostrar que, tam bém
em matéria de formação dos futu ros quadros e líderes, não foram conqu istados outros segmentos
sociais e que o País não assistiu, longe disso, ao aparecimento de uma nobreza de Estado entre aquele
dia e o de 28 de Maio de 1926. Julgo, assim, que não temos porquê continuar a inscrever na agenda da
nossa análise historiográfica as ambições republicanas como se de realidades se pudesse tratar ou, na
i nversa, a buscar em realidades de outro tipo - a instabilidade social, a crise, a guerra - as desculpas
habituais para os seus fracassos educativos. O que é histórico na história da escola, e que decorre da
história propriamente política, é a evidência de que em Portugal se fazia oposição agitando a bandeira
da captação de mais recursos do Tesou ro para a modern ização do sistema e para o a la rgamento da
oferta e que, am iúde, se leg islava na ilusão g randiloq uente que o futuro distante se encarregaria de
confi rmar, ou não. Eram características que acompanhavam o sistema público de ensino desde que,
em 1759, Pombal lançara as suas bases.
Mas seria um erro grosseiro olvidar que nesses anos se diag nosticaram e i nstituciona
lizaram soluções cuja força operativa ainda sentimos na sua inteireza. A lóg ica curricular-racionalista
do regime de classes, bem como o modelo de produção identitária do adolescente sob a premissa
do autogoverno, são traves-mestras do presente e foram intensamente problematizados durante os
anos que coincidiram com a experiência repu blicana em Portugal, embora a sua ra iz esteja mu ito mais
ligada à ci rculação e à homogeneização do pensamento científico-pedagóg ico internacional do que a
um pensamento político indígena. A genealog ia da escola é bem mais complexa e desafiadora que os
governantes dela.
REFER�HCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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COELHO, Francisco Adolfo (1913), Relatório da comissão encarregada da elaboração do projecto de reforma do ensino secun
dário (Primeira parte). Publicado no Diário do Governo n.Q 127, de 2 de Junho.
Colecção Oficial de Legislação Portuguesa.
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Teresa Santa-Clara, Liceus de Portugal, Porto, Asa.
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quartel do século X/X-meados do século XX), Lisboa, Educa.
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PROENÇA, Cândida (1997), A Reforma de Jaime Moniz: Antecedentes e destino histórica, Lisboa, Colibri.
95 EDUCAR
EDUCAÇÃO PARA TODOS. ENSINO NA I REPÚBLICA
O ENSINO LICEAL NOS ANOS DA I REPÚBLICA
JORGE RAMOS DO Ó
Dando curso a uma cidadania assente na a lfabetização escolar, um dos primeiros objec
J. tivos da República Portugu esa foi pugnar por uma escola rização un iversal e combater as e leva
das taxas de ana lfabetismo da popu lação a d u lta , em idade activa, posto que e ram um obstác u lo à
consolidação do ideário republicano e ao funcionamento da adm i n istração pública. A vu lgarização
e a un iversalização do leitor-escrevente seriam obtidas, em reg ra , j u nto das popu lações infantil
e j uven i l , através d a escola regular, e j u nto da popu lação adulta, pelo fomento d e M issões d e
Escolas Móveis, asseg uradas pelo erário público e pel a Associação de Escolas Móveis. Ainda que
destinadas a ad ultos e funcionando em horário nocturno, mu itas destas missões foram freq uen
tadas, d e forma i n d iscriminada, por crianças e jovens.
No Relatório já referido, Sobral Cid, ministro cessante, não sem comentar a necessidade de
um relato pormenorizado, contendo "considerações de carácter económico e pedagógico que tão útil
i nstitu ição requer", reiterava:
"Em todos os distritos administrativos do continente e ilhas adjacentes se estabeleceram
escolas móveis, de preferência nas localidades cujas corporações administrativas se res
ponsabilizaram pela sua instalação e fornecimento de expediente e luz ( . . . ). Das directa
mente subsidiadas e pagas pelo Estado, que foram 226, somente 8 ministraram o ensino
em dois cursos [na generalidade, funcionou apenas o curso nocturno) . Das 31 Escolas
Móveis da Associação João de Deus, 29 ministraram o ensino, de dia, a crianças e, de noite,
a adultos, e 2 somente a adultos em cursos nocturnos." 7
101 EDUCAR
EDUCJ,ÇÃO PARA TODOS. ENSINO NA I REPÚBLICA
A REPUBLICA E O LIVRO ESCOLAR
JUSTINO MAGALHÃES
A lóg ica destas m issões era a economia do tempo de aprendizagem, dando c u rso a
uma a lfabetização condicionadam ente política, pelo que era m o bj ecto de debates frequentes,
dentro e fora do Parlamento8. U m dos as pectos mais notórios da p rogressiva a p roximação entre
o elemento político e a in stru ção foi a defi nição e a esti lização de um a lfabetizado esco lar, leitor,
escrevente, con hecedor de u m noticioso básico sobre a origem e a evolução d a h istó ria pátrias,
e i nformado sobre aspectos funda me nta is da natureza e da agricultura. T in h a estad o em c u rso
uma m i n i m i zação curricular, i n stru mental, ideológica, pragmática. Como essa estilização cu rricu
la r foi correlativa de uma melhoria cie ntífica de cada u m destes d o mínios, u m a vez obtida u m a
i nformação elementar no livro de leitura, o a l u n o deveri a prosse g u i r o s e u conheci mento lendo e
estu dando os livros das d iferentes matéri as.
Assim, a lista constante do Decreto de 21 de Outubro de 1910 conti nha títu los de livros de
leitura, livros de desenho, cadernos de caligrafia, compênd ios de agricultura e compêndios de coro
grafia de Portugal. Os livros de leitura contin uavam a ser em maior qua ntidade, logo seguidos dos de
caligrafia. Havia livros de leitura para as 2.ª, 3.ª e 4.ª classes, e para algu mas destas classes estavam
aprovados mais que um livro. O mesmo suced ia com os livros aprovados para as restantes rubricas do
programa, onde também havia obras de mais de um autor aprovadas para os mesmos a nos. No que
respeitava ao ensino da caligrafia, a lista de livros e cadernos aprovados i ncluía quer a possibilidade
de uma prática de escrita d i reita (correspondendo a um movimento internacional, ao tempo mu ito em
voga), quer a man utenção dos métodos trad icionais.
O cotejo das listas de 1903 com as de 1910 revela que houve títu los e a utores que se man
4. tiveram e revela ta mbém um au mento sign ificativo da quantidade de livros aprovados para cada d i s
ciplina e para cada classe9. Há, não obstante e como foi referido, linhas de conti nu idade. O Livro de
Leitura, da autoria de O . João da Câmara , Maximi liano de Azevedo e Raul Bra ndão, foi um dos títulos
que se ma nteve da lista de 1903 para a de 1907 e que, na lista de 1910, foi a provado sob cond ição
"duma revisão m u ito cuidadosa como a Comissão indica". Todavia, o que a Com issão recomendou
foi tão-só uma revisão ortog ráfica, de acordo com a ortog rafia oficial da Língua Portuguesa em vigor
d esde 1908. Assim o y, em pa lavras como hygiene, passou defi nitiva mente a i; a generalidade das
consoantes duplas desapareceu - assim sucedeu com as palavras officioes, offlicto, em que passou
a existir apenas um f; a variação visinhonço/vizinhonço deu lugar à versão defin itiva vizinhonço10 .
A colecção de livros de leitu ra pu blicados por esta e q u i pa de a uto res foi ampliada nos
an os seg u i ntes. Na lista de 1908, foi aprovado o Livro de Leitura para o s Escolas d e Instrucção
Primária, paro a 4. ª classe e, em 1909, O Livro das Creanças Portuguezas e Brozileiras11. Este
ú ltimo título esta belecia um para lelo entre a h i stória e a geografia portuguesas e a h i stória e a
geografia do Brasil, propagando que ambos os países haviam tido heróis, tinham cidades, ti n h a m
u m m e s m o desej o de g ra ndeza: " Portuguezes e brazileiros s ã o irmãos, em bora nascidos e m p a i
z e s d i stantes; irm ãos pelo s a n g u e , pela língua e pelas aspirações. ( . . . ) Brazil e Portug a l hão d e
caminhar sem pre u n idos na mesma aspiração de grand eza." Com efeito, estes livros conti n h a m
u m noticioso h i stórico organizado n u m a perspectiva de evolução; m u itas referê ncias a cidades e a
reg iões; m u itas referências biográficas e i nformações sobre plantas, animais, efemérides. No caso
d o Livro de Leitura para os Escolas de Instrucção Primária, a a ctualização foi apenas n a ortogra
fia e nos aspectos g ráficos, designadamente com a i nclusão d e fotog rafi as. As referências mais
explícitas em termos estritam ente ideológ icos iam para a noção d e pátria e para o org u lho de ser
portug uês: " Portu gal é m u ito pequeno. - Portu gal foi grande nação. - Sua h i stória é bri lhante. -
M u itos Portu guezes foram i llustres. - Foram g randes na terra . - Fo ram mai ores no mar. - Deram
exe mplo ao m u n d o. - Q u ero ser bom portu guez."12
De igual modo representativa do tipo de alterações i ntrod uzidas com a adequação ao novo
reg ime político é a comparação de duas versões da Corogrofia de Portugal, da autoria de Vicente Al-
meida d ' Eça. Na versão de 1897, o Ponto 51 i ncidia sobre a Bandeira Nacional e vinha ilustrado com o
Escudo da Monarquia:
"Toda a nação independente tem uma bandeira especial que a representa, usando-se d'ella
nas fortalezas e edifícios públicos, nos navios, nos regimentos, etc. A bandeira portugueza
é azul e branca, em partes eguaes, tendo ao meio as armas reaes de Portugal, formadas
pelos sete castellos e as cinco quinas em cruz. À bandeira nacional se deve todo o respeito,
porque ella representa a nação a que pertencemos, livre e independente" (p. 52).
Este era também o último item da parte do livro relativa à corografia de Portugal Continen-
tal. Ao estudá-la, o aluno ficava i nformado e mergulhado num sentido patriótico:
"Com isto tem o alumno estudado o que há de mais essencial em relação á chorographia
da parte continental da monarchia portugueza, tanto sob o ponto de vista physico como
sob o político. Chorographia é, pois, o estudo geographico d'uma região especial, de entre
essas tantas em que se repartem as terras, como neste caso Portugal. E adquirindo estes
conhecimentos o alumno deve também apprender a estimar a sua pátria e a esforçar-se
por bem a servir" (p. 53).
Organ izado sob a modalidade de uma viagem, no decurso do livro, o autor vai i nterpela ndo o
aluno, como se ambos estivessem em presença, e fecha com um item que designa de conclusão:
"Tendo chegado ao fim dos seus estudos, por enquanto, de geographia e chorographia,
vê o alumno que Portugal, alem da metrópole, na Europa, e das ilhas adjacentes, com
prehende territorios muito extensos noutras partes do mundo, principalmente em Africa,
tão extensos que, sommados elles, teem umas poucas de vezes a superfície de Portugal
continental. Muitos d'esses territórios são ricos, n'elles podem os portuguezes d'hoje, des
cendentes dos que os descobriram e conquistaram, encontrar campo para a sua fortuna
e para o engrandecimento do nome de Portugal, não devendo o alumno esquecer que o
domínio e desenvolvimento das províncias ultramarinas é uma condição para que a nossa
Pátria possa continuar a existir livre e independente" (p. 97).
Em consequência da mudança de regime político, no Ponto 25, o a utor passou a incluir uma
i nformação específica sobre a República Portuguesa:
"Portugal é, pois, a nossa Pátria, a nossa nação, e o seu território está situado na parte mais
ocidental da Europa; é a parte continental da República ou o continente, à qual se junta,
para os efeitos administrativos, algumas ilhas do Oceano Atlântico que estão mais próxi
mas do continente, e que por isso se chamam adjacentes. Mas, além desses territórios, a
República Portuguesa compreende outros situados na África e na Ásia, e que são as suas
colónias ou províncias ultramarinas."
O livro escolar foi assunto frequente nos debates pa rla menta res. Nos primeiros meses
5 •
de 1912, nomeadamente na sessão de 23 de Janeiro, esta ndo p rese nte o m i n istro da J u stiça, foi
trazida à colação uma C i rcular chegada às mãos dos adm in istrad ores dos concelhos para que
"vigiassem e fiscalizassem as escolas femeni nas, por forma que nelas não fosse m i n istrad o o
ensino da doutrina cristã". O deputado q u e i ntrod uziu a q uestão vi sava denunciar que estavam a
" i nterferir na vida do ensino primário e na sua fisca lização, as autoridades a d m i nistrativas", mas
q u e o mais g rave era que, após a proibição do ensino d a re lig ião cató lica nas escolas e após a
p ro m u lgação da lei da separação entre a I g reja e o Estado, contin uassem a poder ser adoptados
livros que conti nham a doutrina cri stã15. Nas sessões su bseque ntes, a po lítica d o livro escolar foi
abordada em vários aspectos, sendo u n â n i m e a p ressão para u m a maior co rrecção dos conteúdos
e d a linguagem. Em 1913, foi publicada nova lista de livros, posto que, como j á ficou referi do,
parte sign ificativa das alterações esperadas tinha ficado circunscrita às alterações i ntroduzidas
logo na revisão ed itorial de 1910.
O Decreto n.º 2603, de 1 de Setembro de 1916, foi publicado na convicção de que a adop
ção de livros escolares " é melindroso assunto que requere cuidad osa atenção", para que não se
sobreponham outros i nteresses às "necessidades do ensino e às exigências dos progra m as" e para
" p revenir a desarmonia entre os livros escola res e os princípios e preceitos que reg em o ensino pú
blico". No art. º 1. º desse Decreto, lia-se:
" É criada uma secção especial no Conselho d e Instrução Pública para apreciação de livros
escolares, ficando o mesmo Conselho a ser a entidade que aprecia e julga do merecimento
pedagógico de todos os livros apresentados, quer em concurso, quer em todos os casos em
que o respectivo Min istro entenda dever submeter qualquer livro à sua apreciação.''
Sendo cond ição que a organização e a redacção de cada obra estivessem em " harmon ia"
com "as disposições Legais", "os programas" e "o carácter do ensino secundário", a secção técnica de
veria apreciar o parâmetro "doutrina", em função da "exactidão", e os parâmetros "clareza" e " método",
em função da "exposição".
Dando sequência à prática anterior, os livros escolares, uma vez aprovados pelas autorida
des pedagógicas, "serão su bmetidos à apreciação da Repartição de Sanidade Escolar" (art.º 221.º).
Este órgão tinha sido reestruturado pelo Decreto n.º 4695, de 14 de Julho de 1918.
Publicado em 27 de Novembro de 1918, o Decreto n.º 5002 conti nha os programas das
d isciplinas do ensino secundário e i nstruções muito precisas quanto ao tipo de livros escolares, suas
composição e designação por disciplina. Assim, por exemplo, a disciplina de História vinha estruturada
do segu inte modo:
"Biografias,para todas as classes. Compêndio de História Universal, para as classes III, IV
e V. Compêndio de História de Portugal, para a classe I I I . Compêndio de História de Portugal,
para as classes VI e VIl.
Nota. - As Biografias serão distribuídas por pequenos tomos, contendo uma ou mais, con
forme a sua extensão. Cada tomo será, quanto possível, i lustrado com o número máximo
105 EDUCAR
EDUC�ÇÃO PARA TODOS. ENSINO NA I REPÚBLICA
A REPUBLICA E O LIVRO ESCOLAR
JUSTINO MAGALHÃES
Estas determinações sobre cada uma das disciplinas (que davam sequência aos programas
respectivos) termi navam com uma observação gera l, sobre a abordagem da incerteza da actualidade,
nas disciplinas de Geografia e de H istória, e sobre a adopção dos livros pelos conselhos escolares.
"Observação geral. - Todos os livros vão designados pelos seus títulos. Todo o livro, de que
seja i ndicada divisão em volumes, deve ser obra do mesmo autor ou autores, não sendo
permitido aos estabelecimentos de ensino adoptar qualquer dos volumes dum livro com
exclusão dos outros ( ... ) . Os autores de livros de geografia ou de história apenas serão
obrigados a tratar dos assuntos relacionados com a guerra actual seis meses depois de
concluída a paz, ainda que daí resulte terem de suprimir volumes completos, como poderá
suceder em geografia. Quando se indique divisão de um livro em volumes, cada um destes
deverá ser vendido separadamente."
Ao contrário de alguns outros aspectos da legislação escolar, o assunto dos livros tendeu a ser
7. cumulativo e progressivamente mais rigoroso, nos planos pedagógico, didáctico e científico, i ndependen
temente do ti po de Governo. As variações quedavam-se pelos aspectos programáticos e de funciona
mento orgânico. No Diário do Governo de 30 de Março de 1921, foi publicado, com data de 15 de Fevereiro
de 1921 e relativo ao concurso aberto em 6 de Maio de 1920, o Relatório da Comissão de apreciação dos
livros para o Ensino Secundário. No preâmbulo, a Comissão justificava, de forma sumária, que "procurou
sempre evitar quaisquer considerações que, mal interpretadas, pudessem suscepti bi lizar os autores
ou entidades que vieram a este concurso". Justificou as suas decisões e houve casos em que, mesmo
estando as obras bem ordenadas, sendo "livros reconhecidamente dignos de figurar nas estantes de
todos os estudiosos, tiveram de ser rejeitados por não satisfazerem às exigências consignadas na lei".
Relativamente aos 5 livros de leitura apresentados, foi entendido que todos "oferecem aos
alu nos excelente leitu ra", devendo, no entanto, de um deles ser retirados dois textos "duma morali
dade muito discutível" e dois de um outro, um dos quais, "A decadência da monarqu ia", por ser um
artigo de jornal "com gramática mu ito pouco modelar". Das cinco g ramáticas portuguesas, duas fo
ram excluídas, pois que, em bora recomendáveis aos estudiosos, não estavam "em harmonia com os
programas e respectivas instruções". Das duas gramáticas de francês, foi rejeitada uma, por ser um
resumo, e aprovada outra.
Dos três livros apresentados para o ensino de Inglês, nenhum mereceu a provação. Dos dois
de Geografia, o primeiro não estava de acordo com o programa, nem com o método i ntuitivo, pelo que
foi rejeitado. Quanto ao segundo, a Com issão notou tais falhas que tornavam "impossível a sua adop
ção nas escolas". Para a disciplina de Ciências Naturais, concorreram 4 livros, o primeiro dos quais,
Curso Elementar d e Botânica, da autoria de António Xavier Pereira Couti nho, mereceu o segu inte co
mentário:
"( ... ) é um livro bem feito, obra de um autor consagrado e um dos nossos grandes mestres.
Está escrito em linguagem corrente, ao alcance da inteligência dos alunos a quem é des
tinado; não abusa dos termos técnicos e evita o mais possível as definições. Merece ser
aprovado."
O segundo livro, "escrito por um dos nossos botânicos", embora merecendo i nteresse, não
estava "isento de defeitos (abuso de termos técnicos e dos questionários, revisão mal cuidada"); ficou,
no entanto, aprovado. O terceiro livro, também de Botânica, não foi aprovado, e o quarto, Primeiro Livro
de Zoologia, ainda que "tentativa digna do maior Louvor ( . . . ) , apresenta bastantes defeitos", pelo que fo i
igualmente rejeitado.
Dos cinco Livros apresentados para Matemática, os três primeiros e o ú ltimo foram apro
vados. Quanto ao penúltimo, que " representa entre nós uma inovação cujos resultados a com issão
não pode prever", ficou também aprovado. Foram apresentados dois livros de Geometria, vindo a ser
rejeitado o primeiro e aprovado o segundo. Para a disciplina de Desenho, foram apresentados dois
compênd ios e dois atlas, não esta ndo os dois primeiros de acordo com os programas, pelo que foram
rejeitados.
A Com issão justificou, caso a caso, as suas decisões, de acordo com os princípios gerais que
enunciou no preâ mbulo e fazendo uma escru pu losa aplicação dos parâmetros e critérios em vigor
(com a cond ição de as obras estarem organizadas e redigidas em "harmonia" com as disposições
Legais e os programas; exactidão da "doutrina"; clareza e método da "exposição"). Deste tirocínio, re
sultou a rej eição de cerca de 50% das obras admitidas a concurso. Com efeito, das 29 obras adm itidas,
foram aprovadas 15, das quais 6 foram aprovadas com indicações de melhoria. Para as disciplinas de
I ng lês e de Geog rafia, não foi aprovada, respectivamente, qualquer das 3 e 2 obras propostas.
Na seq uência da Reforma da I nstrução Secundária, promu lgada em 18 de Junho de 1921,
foram consideradas as mudanças em relação à regulamentação anterior. Assi m, a aprovação dos
Livros escolares mantinha-se centrada na Direcção-Geral do Ensino Secundário, sendo a Comissão
de apreciação dos Livros presidida pelo di rector-geral do Ensino Secundário (art.º 145.º); a segunda
secção apreciava também os compêndios de Desenho (art.º 146.º). Não se manti nha a obrigatoriedade
de os livros aprovados serem su bmetidos ao organismo de sanidade escolar. Em 21 de Setembro de
1921, foi constituída a Com issão encarregada da escolha de Livros para o Ensino Secundário. Na mes
ma data, a Direcção-Geral do Ensino Secundário fazia publicar uma lista em que reunia, num só d iplo
ma, "as o bras aprovadas para o ensino das disciplinas que constituem o ensino secu ndário". Incluindo
as que haviam sido aprovadas no Relatório de 15 de Fevereiro daquele mesmo ano, eram um total de
60 obras, que vinham agrupadas em quatro séries:
O b ras aprovadas para o ensino das disciplinas que constituem a 1.ª secção do ensino
secundário: Total 21, repartidas por: Português 8 (6 de leitura e 2 g ra máticas); Francês
3 (2 de leitura e 1 de gramática) ; Ciências Naturais 2; Matemática 6 (5 de aritmética e 1
geometria), Desenho 2.
O b ras aprovadas para o ensino das disciplinas que constituem a 2.ª secção do ensino
secundário: Total 22, repartidas por: Português 3; Latim 9 (5 de método e exercícios e 4
gramáticas); Francês 3; Geografia 1; Ciências Naturais 1; Química 1; Matemática 2; Dese
nho 2 (1 atlas e 1 de história da arte).
Obras aprovadas para o ensino das d iscipli nas do cu rso complementar de Letras: Total
4, repartidas por: Alemão 1; Latim 1; História 1; Matemática 1.
Obras aprovadas para o ensino das disciplinas do curso complementar de Ciências: Total
13, repartidas por: Ciências Naturais 1; Matemática 11 (aritmética racional l; trigonome
tria 4; álgebra 2; geometria analítica 3; cosmografia 1); Desenho 1.
diferentes classes: para a disciplina de Zoologia, 4 obras; M i neralogia 2 obras; Geolog ia 1; Física 3.
Das disciplinas j á existentes, foi para H istória e para a Geog rafia que fora m apresentados mais livros
novos, respectiva mente, 11 e 5 - ainda que já contassem com livros a provados.
Quando do Movimento de 28 de Maio de 1926, por Portaria de 8 de Junho de 1926, foi sus
penso o concurso aberto em 3 de Setembro de 1925, e a Comissão, entretanto nomeada, foi igualmen
te suspensa. Face aos interesses dos concorrentes e às necessidades d o ensino, o Governo assumiu a
adopção dum reg ime provisório para a escolha de livros:
"( . . . ) Artº. l.º É anulado o concurso de livros para o ensino secundário, aberto pela portaria
de 3 de Setembro de 1925, e d issolvida a comissão respectiva, nomeada por portaria de 15
de Agosto do mesmo ano.
Artº. 2.º Os conselhos escolares dos liceus, no início do próximo ano lectivo, escolherão
livremente os livros a adoptar para o ano de 1926-1927.
§ único. A escolha dos conselhos escolares deverá recair somente em obras de autores,
proprietários ou editores portugueses.
Art2. 3.º Fica revogada a legislação em contrário."
Ao findar a I República, foi adoptada para o Ensino Secu ndário uma medida semelhante
àquela que os republicanos tinham decretado em 1910: autorizar as escolhas de entre as listagens
aprovadas e confiar a adopção aos Conselhos Escolares. Ou seja, a matéria do livro escolar correu
sempre sob um quadro de rigor, vig ilância e controlo, pelo que nem a quebra do reg ime político forçou
a imediata suspensão de livros em vigor e consequente adiamento do i n ício do ano escolar. Os aspec
tos formais e o funciona mento dos concursos tinham, entretanto, passado para a Direcção-Gera l d o
Ensino Secundário, que recorria a um corpo de professores em efectivo exercício de funções no ensino
liceal. Organ izados em Com issão Técnica, estes professores deliberava m, proteg idos pelo escru puloso
cumpri mento da legislação. A regi mentalização tinha feito o seu camin ho.
A criação do professor do Ensino Livre (de que dependia, em boa parte, a d isseminação de
8. M issões de Escolas Móveis, intensificada a partir de 1912) fez reacender a dualidade entre a lfabetiza
ção escolar (leitu ra, escrita e contas) e instrução primária. O professor do Ensino Livre (ambulante)
ficava autorizado a definir o método e a escolher ou aceitar qualquer dos livros que estivessem oficial
mente aprovados. No final da missão, os a lunos deveriam ser examinados perante o inspector da zona,
e o professor deveria fazer uma exposição local dos trabalhos dos a lu nos. Cabia ao professor, através
de palestras, chamar a atenção dos alunos para a conveniência de prossegu irem a sua formação, pra
ticando a leitura de textos edifica ntes e portadores de um sentido patriótico.
Não obstante, como ficou su pra anotado, conti nuavam a ser utilizados, no Ensino Regu
lar e mesmo no Ensino Livre, livros que conti nham i nformação não revista de acordo com o ideá
rio republicano. O assunto foi objecto de recorrente debate no Parlamento, designadamente nos
anos de 1912 e 1913, sendo frequentes as propostas de uma revisão integral dos livros adopta
dos, como protecção da diversidade. Por contraponto, não raro ressaltava a argumentação so
bre a conveniência de um reg ime de uniformidade. Foi particularmente sobre o livro para a ins
trução primária que, ora com base numa argumentação política, ora com base numa argumenta
ção pedagógica, esta dualidade de posições se tornou mais notória. Nos termos do Decreto n.º
5787-A, de 10 de Maio de 1919, que conti nha o Regulamento do Ensino Primário, prom ulgado na
sequência da reorgan ização dos serviços de instrução primá ria levada a efeito pela Direcção
-Geral do Ensino Primário e Normal, ficou determinado:
"Art.2 9.2 O ensino primário geral deve ser essencialmente activo, partindo sempre da con
vivência do aluno com as realidades físicas e sociais.
§ 1.º Serão dispensados, quanto possível, os livros, especialmente os destinados ao ensino
do cálculo, da geometria, do sistema métrico, do desenho e das sciências naturais.
§ único A leitura deve porém fazer-se em mais de um livro."
Diversificar ou un ificar os livros escolares - eis duas pedagogias, duas perspectivas dis
'· ti ntas sobre a escola: uma escola de alfabetização ou uma escola estruturante da cultura letrada;
uma cultura escolar que representa uma corporação social hierárquica do mundo do trabalho para a
República das letras ou, ao contrário, que prefigura a modernização como uma dia léctica entre dois
modelos e dois mu ndos, enfim, como construção sociocultural e não como configuração segmentada
resu ltante da assimi lação e da convergência dos elementos social e cultural. De novo a regi mentali
zação, assimiladora e orgânica, tinha cumprido o seu caminho. Nada mais evidente para prová-lo que
verificar o destino histórico do livro escolar, cada vez mais retirado da sociedade e mais fechado numa
moldura técn ico-pedagógica. De facto, com chancela da Direcção-Geral do Ensino Primário e N ormal,
o Decreto n .º 10 597, datado de 28 de Fevereiro de 1925, elaborado sob uma atmosfera de urgência e
benignidade, consignava:
"Atendendo à necessidade e urgência de se fazer uma revisão dos programas do ensino
primário geral e primário superior, de modo a obter-se um maior rendimento do trabalho
produzido pelos respectivos professores e bem assim a ligação lógica e natural entre estes
dois g raus de ensino;
Convindo, simultaneamente, estabelecer as bases e consignar cuidadosamente os precei
tos a que devem subordinar-se as obras d idácticas a adoptar nas escolas primárias; ( . . . ) Hei
por bem ( ... ) decretar o segui nte:
Art.º 1.º A fim de se proceder à revisão dos programas do ensino primário geral e primá
rio superior, dos di plomas que regulam a distribuição dos serviços de regência nas várias
escolas, e bem assim à fiscalização e estabelecimento de normas a seguir para a adopção
dos livros de ensino, será nomeada pelo Governo uma comissão que funcionará junto da
Direcção-Geral do Ensino Primário e Normal.
Art.º 2.º Desta comissão, a que presidirá o respectivo d i rector-geral, farão parte os directo
res das Escolas Normal Superior e Normal Primária de Lisboa, dois inspectores escolares,
um professor de ensino primário superior e dois professores de ensino primário gera l."
NOTAS
J.M. Sobral Cid, Relatório do Ministério da Instrução, in Obras 1/. Outros Temos Psiquiátricos. Problemas· de Ensina e Outros
Temas, 1877-1941, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, pp. 363-400.
J.M. Sobral Cid, op. cit., p. 399.
ld., ibid.
Cf. Anexo.
Antoine Prost, "Quand savoir lire devient obligatoire, 2. Apprendre à lire pour les républicains", Le Monde de l'Éducotion,
Octobre 2008, pp. 64-65.
Para além das melhorias de carácter técnico, o manual republicano inseria-se num novo modo de ler, em que o tema era o
elemento organizador, quer quanto aos conteúdos, quer quanto à configuração do livro. Assim, ora o livro escolar remetia
para a complementaridade de informação e para a diversidade de opiniões, levando o leitor a circular de livro em livro, ora
congregava no mesmo livro diferentes tipos de texto referentes a u m mesmo assunto. No caso francês, ficou célebre a obra
escolar Tour de France, sucessivamente reeditada, que, organizada sob a modalidade de roteiro, continha todo o tipo de
informação útil para o viajante (escolar) conhecer e poder orientar-se em cada terra que visitava.
J.M. Sobral Cid, op. cit., p. 391.
Percorrendo os Debates Parlamentares do ano de 1915, verifica-se que a questão das Escolas Móveis foi recorrente nos
debates, quer por parte de deputados que entendiam dever ser mantida essa solução escolar, quer por parte de outros que
a denunciavam como precária e servindo conveniências políticas.
Cf. Anexo.
10
A versão aprovada foi a seguinte: Livro de Leitura para as Escolas de Instrucção Primária. Approvado por decreto de 4 de
Setembro de 1903 para a 2.ª e 3.ª classes e organizado por D. João da Câmara, Maximiliano de Azevedo e Raul Brandão,
Lisboa, Depósito Livraria Ferreira [Ferreira & Oliveira, Livreiros - Editores ] , 1904.
11
Cf. D. João da Câmara, José Antonio de Freitas, Maximiliano de Azevedo e Raul Brandão (orgs.), O Livro das Creanços Por
tuguezas e Brazileiras, Lisboa, Livraria Ferreira Editora, 1909, pp. 5-6.
12
Livro de Leitura poro os Escolas de Instrucção Primária. Approvado por decreto de 4 de Setembro de 1903 para a 2.ª e 3.ª
classes e organizado por D. João da Câmara, Maximiliano de Azevedo e Raul Brandão, Lisboa, Depósito Livraria Ferreira
( Ferreira & Oliveira, Livreiros - Editores] , 1904, p. 5.
13
Vicente Almeida d'Eça (lente da Escola Naval), Corografio de Portugal. Noções elementares, nova edição, Porto, Companhia
Portuguesa Editora, s/d.
14
Francisco Veyrier e José Vicente de Freitas [professor] , Nova Selecta do Ensino Primário (2. 2 grau). Livro de leitura poro a
4. ª classe, Lisboa, Corrêa & Rapoza, Editora, 1910.
15
Cf. República Portuguesa, Diário da Câmara dos Deputadas, 39.ª Sessão, 23 de Janeiro de 1912. Na sequência, o deputado
referiu que continuavam a ser adoptados os antigos livros e leu a página 21 de um deles, onde constava "Padre nosso, que
estais nos céus, etc.".
16
Faria de Vasconcelos, Obras Completos, vol. 11, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2000, pp. 55-56.
17
Proposta de Lei sobre a reorganização da educação nacional (Base 16.ª), in Diário do Governo, n.º 151, l i Série.
18
João Grave, Livro de Leitura para o 3. ª Classe, Porto, Livraria Chardron de Lelo & Irmão, Lt. Editores, Lisboa
-Paris, Livraria Aillaud e Bertrand, 1922.
19
Cf. Anexo l i - Gravura.
AIIEXO I
P R I M E I RA LI STA DE LIVROS APROVADA P E LA R E P Ú B L I CA
D I R ECÇÃO-GERAL DA I NSTR U ÇÃO P R I MÁRIA
2 . � R E PARTI ÇÃO
Nos termos do art2. 350.2 do regulamento de 19 de Setembro de 1902, foi remetido ao Conselho Superior de Instrução Pública o
processo sobre livros a aprovar, destinados ao ensino primário e normal, segundo os concursos abertos em 22 de Abril de 1909
e em 12 de Dezembro de 1908, e que são de leitura para a 4.ª classe, desenho, caligrafia, agricu ltura e corografia de Portugal.
Para cumprimento do §2.º do citado art2. 350.2, foi publicado no Diário do Governo o parecer geral da Companhia Técnica para
dentro de oito dias poderem reclamar os interessados;
Considerando que devem ser aprovados os livros que obtiverem parecer favorável da Comissão Técnica, fundamentado nos
pareceres especiais;
Considerando que devem ser aprovados os livros dos reclamantes que com boas razões fundamentaram o seu recurso;
Considerando que o Governo da República deve à memória de Trindade Coelho o reconhecimento do mérito dos seus trabalhos
sobre educação popular:
Hei por bem decretar o seguinte:
Artº. l."
São aprovados como Livro de Leitura para a 4.ª Classe das escolas primárias: O Terceiro Livro de Leitura, por Tri ndade Coelho;
as Leituras poro a 4. ª Classe, por José Bartolomeu Rita dos Mártires, José Nunes Baptista e António Francisco dos Santos, este
depois de satisfeitas as ind icações da Comissão Técnica; as Leituras do 4. ª Classe, por Filipe de Oliveira, este depois de também
haver satisfeito as indicações da referida comissão; o Livro de Leitura, por Amália L uazes dos Santos Monteiro Leite; as Leituras
Modernas, por um grupo de professores, este depois de suprimidos os trechos pela Comissão Técnica indicados; o Terceiro Livro
de Leitura, por Ulisses Machado, que deverá ser revisto conforme o parecer da mesma comissão; o Livro de Leitura, por D. João
da Câmara, Maximiliano Azevedo e Raúl Brandão, este depois de uma revisão muito cuidadosa como a Comissão Técnica indica;
o Livro de Leitura, por Júlio Brandão; o Livro de Leitura, por José de Carvalho e Silva, José Nunes da Graça e José Joaquim
Oliveira; as Leituras Escolares, por Fortunato Correia Pinto e José Nunes da Graça; o Livro de Leitura, por Manuel Pereira, este
depois de eliminados os trechos pela Comissão Técnica ind icados; a Nova Selecta, por Francisco Veyrier e José Vicente de
Freitas, com exclusão dos trechos indicados pela mesma Comissão.
Artº. 2.º
São aprovados para o ensino do desenho nas escolas primárias as segui ntes obras: Desenho, 1.ª, 2. ª e 3.ª Classes, por José
Vicente de Freitas; Desenho Escolar, por Manuel Antunes Amor; Elementos de desenho, por A F. Miranda Dinis e A Marinho da
Silva; Desenha escolar, por Emília Quintino Pinto; Exercícios graduados de desenho, por Albino Pereira Magno; Elementos de
desenho, por João de Avelar; Método racional de desenho, por Manuel Maria de Melo; Exercícios de desenho, por José Miguel de
Abreu; Desenho, por Augusto Ladeira; Desenho dos escolas primários, por  ngelo Vidal; Opúsculo de desenha destinado à 4.ª
classe, por José Vicente de Freitas.
Art2• 3.2
São aprovados para o ensino da caligrafia nas escolas primárias os Cadernos caligráficas n.0' 1-4, Pautas auxiliares n.o' 1-4,
Pautas elementares n.o s 1-4, Pautas de letras francesa e gótica, Trasladas de cursivo, Traslado de bastarda e modelos caligráficos,
de José Augusto Garcia Mourão, com a declaração de que à 3.ª classe se destinam os Cadernos caligráficos n.0' 1-4, as Pautas
auxiliares n.0' 1-4, as Pautas elementares n.0' 1- 4, e à 4.ª classe as obras restantes: A escrita das escolas primárias em cinco
III EDUCAR
EDUC�ÇÃO PARA TODOS. ENSINO NA I REPÚBLICA
A REPUBLICA E O LIVRO ESCOLAR
JUSTINO HAGALHÃES
cadernetas, por  ngelo Vidal; o Método de escrita direita, por António Lopes do Amaral; o Método prático de escrita usual, por
Aillaud & Cª; O novo método de caligrafia, por J. Monteiro; o Método de caligrafia em sete cadernos, por José Nunes dos Santos;
os Cadernos de escrito, por J. Cruz; e os Exercícios caligráficos, de Raúl Dória.
Artº. 4.º
São aprovados, para o ensino da agricultura das escolas primárias, os Rudimentos de agricultura, por António Xavier Pereira
Coutinho; os Rudimentos de agricultura prática, por O. Luís de Castro, e as Lições elementares de agricultura, por João da Mota
Prego, ficando este autor obrigado a rever cuidadosamente o seu livro, segundo as indicações do parecer do relator.
Artº. s:
São aprovados para o ensino da Corografia de Portugal nas escolas primárias os livros Corografia portuguesa, por José Nicolau
Raposo Botelho; Primeiras lições de corografia portuguesa, por Acácio Guimarães; Corografia sumária de Portugal, por Eurico
de Seabra, e Corografia de Portugal, por Vicente de Almeida de Eça.
Artº. 6:
Todos os livros que por este Decreto são aprovados deverão ser sujeitos a uma muito cuidada revisão e autorizados segundo as
novas Instituições Republicanas do Estado, dentro do prazo de q uarenta dias, passados os quais todos os livros poderão ser
postos no mercado, depois de previamente aprovados pela inspecção médica.
§ único. Fica entendido que, visto tratar-se duma reforma que torne o ensino primário condigno da educação, que o Governo da
República deve preparar ao povo português as aprovações agora decretadas são feitas sem prejuízo daquela reforma.
Paços do Govêrno da República, em 21 de Novembro de 1910. - O M i nistro do I nterior, António José de Almeida.
e recreativas, de instituições de apoio social, particulares) que proliferavam sobretudo nas cidades.
Assim, os/as professores/as oficiais reclamam pelo vencimento e regalias de funcionário, de acordo
com a importância das suas habilitações, embora sublinhem a dimensão ética do seu trabalho. Fazem
valer nessas reivindicações a sua formação e a natureza específica do trabalho - instruir e educar as
crianças, futuros cidadãos da República. Em 1920, a República equipara o seu vencimento ao dos 3.05
oficiais das repartições públicas (Decreto n.º 7125, de 17 de Fevereiro)3. Com uma alta consciência da
sua missão social junto das populações analfabetas, o professorado defende um estatuto específico,
mas recusa o modelo de profissão liberal, ciente de que a educação era uma obrigação do Estado.
Nesse sentido, estes homens e mulheres viram-se a si mesmos como obreiros da República e das
suas promessas de igualdade e progresso social.
O professorado particular, cuja formação era muito variada, dependendo do estrato social
de origem, leccionava em escolas particulares, próprias ou de outrem (investidores, familiares), e ti
nham geralmente um público-alvo bem definido. Muitas vezes assumia a forma de empresa familiar,
em que são mulheres que dirigem escolas em regime de internato e/ou externato, e os maridos ou
familiares masculinos assumem a direcção do negócio, tratando elas da pedagogia, do ensino e da
disciplina interna. Em alguns casos, essas mulheres associam-se para pôr a funcionar um colégio,
outras vezes, quando pensam em reformar-se, cedem as participações da empresa a alunas que
lhes foram próximas e se dispõem a seguir o mesmo modelo. A formação destas directoras, até aos
anos 20, não era certificada através de diplomas. Os colégios publicitam, nos jornais e através de
folhetos e brochuras, a abertura, fecho, actividades culturais que desenvolvem, como saraus, mas
são tardios a exibir as habilitações certificadas dos seus docentes. No Porto, referenciámos uma
família de professores em que o marido era professor oficial e a esposa dirigia um colégio, tendo
ainda a família a propriedade de uma livraria, e ele a direcção de um jornal para o professorado.
Apesar da tentativa de delimitação de professores oficiais e particulares, na realidade havia, mesmo
assim, aproximações a nível associativo e uma certa capilaridade entre estes dois modos de exercer
a profissão.
plementada a co-educação. Temiam, talvez, maior subordinação face aos professores. No Congresso,
questionaram a iniquidade da lei que as discriminava e o silêncio dos colegas homens perante uma
ofensa à sua competência como profissionais, incitando a que se demonstrasse que elas eram 'menos
capazes, menos responsáveis, menos cumpridoras, menos competentes que os seus colegas. Chega
ram a fazer uma representação ao Presidente da República sobre a co-educação e defenderam a "edu
cação da mulher pela mulher", desde o jardim-escola até à Universidade. Entre esse grupo figurava a
professora Amália Luazes, fundadora do Instituto do Professorado Primário Oficial Português, também
ela pertencente às primeiras levas de professoras formadas na Escola Normal Feminina-do Porto. Ain
da que o Congresso se tenha solidarizado com o movimento das professoras e assumido a sua defesa,
notava-se que aos professores não agradava "a educação da mulher pela mulher" e eram, em grande
parte, defensores da co-educação. Mas as próprias direcções da União foram quase exclusivamente
masculinas, tendo encontrado apenas o nome de uma professora, apesar de elas participarem activa
mente na organização e nos congressos. Era para "compor o ramalhete", como então e ainda hoje se diz.
A República, ao não reconhecer as mulheres como cidadãs de pleno direito no ensino, no
trabalho e na participação política, permitiu a afirmação de uma mentalidade patriarcal e conserva
dora, que se propusera combater, ao afirmar a necessidade de construir "o homem novo". Há, porém,
uma medida positiva, de grande impacto social, que foi a dispensa de serviço docente às professoras,
casadas ou não, por dois meses, no último período da gravidez e a seguir ao parto, conservando todos
os vencimentos e subsídios (Decreto n.º 6820, de 18 de Junho de 1920, e Decreto n.º 7704, de 7 de
Setembro de 1921). De algum modo, a forma como as professoras foram tratadas pela República
espelha as contradições e os impasses em que ela estava mergulhada.
A REPÚBLICA E AS PROFESSORAS
Com a nomeação das primeiras mestras régias no início do século XIX, as escolas femininas
foram progredindo lenta mas consistentemente. A criação das Escolas Normais femininas, já no úl
timo quartel do século XIX, foi um momento decisivo para a conquista do espaço público de trabalho
por um número alargado de jovens mulheres. A experiência destas primeiras normalistas em escolas
dirigidas exclusivamente por mulheres deve ter contribuído para uma imagem de segurança no de
sempenho da profissão e de autonomia face ao mundo masculino, que atraiu ao ensino as jovens da
pequena e média burguesias, elas que foram inicialmente recrutadas em asilos e nas camadas sociais
mais pobres4. A entrada na Primeira Guerra Mundial ajudou a abrir à actividade profissional das mu
Lheres outros domínios sociais: telefones e telégrafos, enfermeiras militares, secretarias dos ministé
rios, além da indústria e do sector dos serviços, como os seguros e a banca. O campo de trabalho que
se lhes abria exigia alguma formação académica. Para o ensino primário, passou a ser necessário o 3.º
ano do curso geral dos liceus, ou o Curso Primário Superior, a que se seguiam três anos de formação
nas Escolas Normais. Contudo, a República manifestou grande desconfiança face às opções políticas
das mulheres, não lhes reconhecendo o direito de voto e reservando lugares de alguma relevância
social para os homens. Na fusão a que se procedeu das Escolas Normais Femininas e Masculinas em
escolas mistas, esta deu-se sempre a favor dos homens, que ocuparam os cargos de chefia, excluindo
deles as professoras. Nesse momento, já as raparigas eram em maior número que os seus colegas
masculinos. Também, na tensão gerada pela rarefacção do emprego no final da Guerra, a República
arbitrou a disputa a favor dos homens, reservando-lhes lugares no aparelho do Estado. No caso das
professoras, já francamente maioritárias na profissão, a Reforma de 1919 confina-as à docência da
1.ª à 3.ª classes e retira-lhes os lugares de direcção das escolas mistas, onde os professores detinham
a preferência. Só os poderiam assumir nas escolas femininas. Contra esta discriminação se insurgiram
as professoras no Congresso de Coimbra de 1920, assim como contra a forma como estava a ser im-
professores nas aldeias. Pelo sistema de colocações, os professores deambulavam pelo País, com as
dificuldades que isso significava de alojamento (poucas escolas tinham residência do professor, e as
juntas de freguesia não garantiam a habitação), de transporte dos seus pertences e de abastecimento
em povoados, onde por vezes não existia uma loja ou venda. Apesar de a legislação facilitar a coloca
ção dos professores nas suas terras de origem, no caso de os lugares estarem a concurso, pela apro
ximação dos cônjuges, quando funcionários públicos, isso não abarcava a maior parte dos docentes.
No meio rural, o alojamento e os bens de consumo eram escassos, os/as professores/as deslocados/
/as viviam em situações precárias, tendo necessidade de tudo comprar. As próprias populações com
preendiam as dificuldades dos professores enviando-lhes, através dos filhos, hortaliças e mercearia.
Em algumas povoações, permanecem até hoje festas de oferendas, cujo dinheiro daí resultante ou as
próprias oferendas eram destinados ao professor/a, como reconhecimento pelo seu trabalho e dedi
cação, com o intuito de eles não abandonarem a escola.
Os/as professores/as dos centros urbanos, com vida igualmente difícil, rendas de casa mais
elevadas, podiam dedicar-se a outras actividades, como revisores de provas tipográficas, fazendo
escrituração comercial, trabalhando em jornais, administrando papelarias a cargo do cônjuge ou de
outros familiares, colaborando com a indústria nascente dos livros e cadernos escolares. Estavam
perto da informação e dos equipamentos sociais próprios do espaço urbano. Teriam mais facilidade
em educar os filhos e filhas, pela proximidade dos liceus e a existência de alguns transportes, o que é
demonstrado pela procura das escolas nos centros urbanos, no momento dos concursos.
A origem social muito diversificada do professorado acaba por dar origem a estratificações
dentro da própria profissão docente. A partir da candidatura ao Instituto do Professorado Primário
Oficial Português, instituição criada pela professora Amália Luazes, inaugurada em 1916, foi possível
uma primeira abordagem às condições de vida do professorado das zonas rurais. Equacionamos aqui
alguns aspectos que ajudam a caracterizar a vida destes professores, no contexto de um País de débil
industrialização, permanência de estruturas económicas e sociais arcaicas.
Na República, abalada pela Guerra e pela pneumónica, com efeitos devastadores sobre a
população e o tecido económico, a tuberculose era um espectro sempre presente. A iniciativa de Amá
lia Luazes teve em conta a pobreza de muitos professores/as e a impossibilidade de educar os filhos e
filhas, sendo que a instrução das meninas era a primeira a ser sacrificada. A sua iniciativa mereceu o
apoio da classe. Nas lutas travadas para pôr em funcionamento o Instituto e pelo controlo da direcção,
verifica-se uma clivagem entre os professores: os mais carenciados, que queriam de imediato uma
instituição de apoio concreto; os que sonhavam uma instituição-modelo, com um projecto pedagógico
moderno, sem atender às condições reais do País e às possibilidades do professorado para o concreti
zar. Quando o Instituto começou a funcionar, todos os testemunhos salientam a extrema pobreza em
que lhes chegam as filhas dos professores/as. Na década de 20, os professores representavam ainda
46,5% do total de docentes que recorriam ao Instituto, sendo que se localizavam mais a norte do que
a sul do Mondego. Apesar da forte presença de mães professoras entre as candidatas ao Instituto, o
que revela a importância que a docência tinha adquirido para as mulheres, não significou necessaria
mente a afirmação feminina na esfera social. Esta conquista da docência é acompanhada de sintomas
reveladores da permanência da subordinação na esfera doméstica, com os maridos não-professores a
assinarem requerimentos que só elas podiam fazer, situação que se agrava nos anos da Ditadura.
ainda jovens, para zonas isoladas, viam os contactos sociais reduzidos e acabavam por relacionar-se
localmente, onde os homens dos ofícios, os proprietários rurais ou do comércio constituíam o campo
de recrutamento conjugal possível. Ainda que não se possa estabelecer uma relação mecânica entre
a origem social e as escolhas matrimoniais, emerge contudo uma certa articulação. Sinteticamente,
a evolução das profissões dos cônjuges destas mães professoras apresenta-se como se indica: nos
anos 20, eram maioritariamente não-professores, mas cuja profissão desconhecemos, seguindo-se
professores e patrões. Há uma ligação significativa, mais notória no Sul, aos proprietários, principal
mente agrícolas e de comércio. A ligação com o sector operário e os artesãos figura em quarto lugar,
cerca de 9,5% nas décadas de 20 e 30, o que não reproduz este grupo de origem, o qual, nos anos 20
e30, representava, respectivamente, 28,6% e 17,5% dos alunos-mestres estudados por Nóvoa para o
período de 1918-36.
Apesar da especificidade dos dados com que trabalhamos, pode-se inferir a existência de
uma promoção social, relativamente ao grupo de professores com origem no sector operário, pois,
ao constituir família, procuram outras áreas sociais. Os dados parecem evidenciar um restringir nos
grupos sociais de pertença em relação aos grupos familiares de origem, pela forte incidência do par
professora/patrão agrícola, comércio e indústria. Encontram-se entre as professoras algumas que es
colhem cônjuge com uma grande diferença de idade, o que por vezes pode ter ocasionado problemas
passionais, chegando até ao assassinato10. Relativamente ao estado civil do conjunto de pessoas con
siderado, a maioria é casada (7 2,4%). seguida de viúvos/as com 18,6%. Os solteiros, ainda que sempre
presentes, não têm expressão estatística e tendem a diminuir, sendo as décadas de 20 e 30 aquelas
que registam mais casos. Os dados indicam que a maioria dos viúvos/as permanecem nesse estado.
Mesmo de baixo valor descritivo, encontrámos entre 1920 e 1940 registos (11%) em que as esposas
eram mais velhas que os maridos. A diferença de idade situava-se, nestes casos, até quinze anos e pa
rece não alterar o calendário de casamento masculino, em meio burguês, identificado para o Porto1L
"casamento masculino mais tardio, a coincidência entre o casamento e o início da vida conjugal, uma
grande proporção de casamentos em que o noivo é mais velho que a noiva, um espaço mais vasto de
selecção do cônjuge e uma menor propensão para o recasamento feminino".
Na década de 20, cerca de 50% destas famílias têm três ou mais filhos. Mais notável é que
10% das famílias tinham sete ou mais filhos na mesma década, que passaram a 5 nos anos 30. Cru
zando as profissões dos cônjuges com o número de filhos, observa-se que é no conjunto domésticas
ou não-professoras/professor primário que encontramos os casos de mais de 10 filhos e a maior
percentagem de famílias com cinco ou mais descendentes. Pelo contrário, nos casais de professores,
acima de cinco filhos a percentagem é já insignificante, inferior a 1%. Estes dados corroboram de
algum modo a retórica associativa, que fazia referência à existência de famílias numerosas. Este é
um conceito muito variável, significando mais de 5 filhos neste universo e na década de 20, o que são
valores elevados, se tivermos em conta os dados actuais e que as taxas nacionais ocultam variações
muito significativas, conforme as regiões de um mesmo país. Ora, até aos anos quarenta, 10% destas
famílias tinham mais de 5 filhos, o que é uma percentagem significativa. Estes casos parecem ter fun
cionado como imagens-fantasma, que os docentes sentiam necessidade de exorcizar, tanto mais que
alimentavam a visão caricatural dos mestres. Era no Norte e também no Litoral que essas famílias
tinham algum peso numérico. Mesmo famílias com alguns rendimentos ficavam em situação difícil,
dado o número de filhos. Considerando o total das famílias, elas apresentam-se maioritariamente
como nucleares.
Defrontando-se com os seus baixos salários e os dos esposos, a precariedade de emprego, a
doença e a educação dos filhos, as professoras assumiam-se muitas vezes como a fonte de rendimento
da família. Muitas delas exerciam outras actividades, como dar aulas aos cursos nocturnos, explicações
e, mais tarde, também na edição de livros. Até aos anos 30, os únicos vencimentos de mães que apare
cem declarados nas candidaturas ao Instituto são os das professoras. Isto prova a dificuldade de acesso
das mulheres ao mercado de trabalho e também a invisibilidade social do trabalho feminino, quando
elas eram possuidoras de rendimentos ou executavam tarefas que não eram reconhecidas publica
mente. Verifica-se que, de um modo geral, os ordenados ou outros rendimentos dos maridos destas
professoras, que correspondem às profissões - desconhecida, trabalhador qualificado, patrões -, não
chegam para subir a média dos vencimentos do casal do índice 1 para o 2, até aos finais dos anos 50.
Deparámos com a existência de atestados de pobreza apresentados não por indigentes, mas por pro
fessores e professoras que trabalhavam e viviam apenas dos seus vencimentos. Passados por juntas
de paróquia, por administradores de concelho, pelas repartições de finanças e também pelo superior
hierárquico - delegado ou mesmo inspector escolar-, comprovam a pobreza ou a impossibilidade de os
professores/as poderem educar os/as filhos/as, por viverem só dos seus vencimentos e serem pobres.
Analisando a distribuição temporal e geográfica destes atestados, verifica-se a sua maior incidência nas
décadas de 20 e 30. Parece haver uma correlação entre a pobreza e o número de filhos, mais do que
com a profissão do cônjuge. Mas, considerando as profissões do par conjugal, aqueles que apresentam
mais atestados de pobreza são, sem dúvida, os casais de professores (13%), o que parece confirmar
a existência de um estrato de docentes vivendo extremamente carenciados. Outro factor associado é
o falecimento de um deles, uma vez que 41% dos atestados são apresentados por famílias sem pai, e
19,5 % sem mãe.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este conjunto de elementos indiciários e outros que a limitação de espaço não permite referir,
como a rede de relações sociais, etc., possibilitam restabelecer o quadro familiar dos/as professores/
as e suas famílias, como unidade de laços de parentesco, afectivos e de responsabilidade de sustento,
que trazem uma compreensão acrescida sobre as condições de vida, ajudam a explicar algumas das
suas práticas e a persistência das suas reivindicações. À frente de todas, sempre estiveram as ques
tões económicas e de apoio social. De um modo geral, os documentos comprovam uma situação real
de pobreza, até com um certo ar de evidência, que não necessita de demonstração, quando a família é
numerosa, um dos progenitores faleceu, é idoso ou está incapacitado para o trabalho. Como súmula de
argumentos, as declarações finalizam a enu meração dos quesitos com a afirmação "que é professor".
O que parece significar: está tudo dito. Ora, a persistência de uma vida degradada, a que se juntou o
desemprego de milhares de professores nos anos 20, defraudou as expectativas dos professores na
República. Sim ultaneamente, a rede escolar era frágil, e as condições de muitas das escolas, miserá
veis. O debate sobre as características dos edifícios escolares acompanhou o debate pedagógico, e a
República inclinou-se para a regionalização das construções, abandonando a edificação segundo uma
mesma planta. Muitas das construções projectadas, devido ao esforço de guerra, só se vieram a con
cluir no período da Ditadura Militar. Assim, a República da década de 20 vivia a contradição de ter pro
fessores desempregados, saídos das Escolas Normais, e ao mesmo tempo milhares de crianças sem
escola e um País em que cerca de três quartos da população era analfabeta. O regime republicano não
alterou o ritmo do crescimento económico, e o desenvolvimento educacional seguia as suas linhas12.
As constantes mudanças no Ministério e a consequente incapacidade governativa, as propostas irrea
listas, que não passavam da legislação, os sinais de cedência aos sectores conservadores enredaram
a República na inoperância e lançaram no descrédito os seus defensores. Entre os professores, come
çam a sentir-se divisões, que se vão afirmar no final da República (separação do Grémio de Lisboa da
União, 1924; organização dos professores católicos, com a separação de um grupo no Congresso de
Viseu, já em 1927). A divisão no seio dos professores vai facilitar a repressão que sobre eles se abateu.
O horizonte de esperança que a República representara desvanecera-se. Com a Ditadura, sobrevieram
dias de breu, ficando afinal na memória um tempo forte dos professores, do debate pedagógico, da sua
organização e resistência - a I República.
111 EDUCAR
EDUCAÇÃO PARA TQDOS. ENSINO NA I REPÚBLICA
O PROFESSOR PRIMARIO E AS SUAS IMAGENS
MARGARIDA LOURO FELGUEIRAS
REFER�NCIA.S BIBLIOGRÁFICAS
Cf. Araújo, Helena, Pioneiras da Educação. As professoras primários na viragem do século 1870-1933. Lisboa. li E, 2000,
Parte I, cap. 2; Nóvoa, A., Le Temps des Professeurs, Lisboa, INIC, 1987, vol. 11, p. 628.
Cf. Nóvoa, A., Os Professores. Quem São? Donde Vêm? Para onde Vão?, Lisboa, ISEF, 1989, pp. 43-55.
Na reforma dos vencimentos dos funcionários públicos de 1935, discorda-se das Leis de 1922 e de 1924, por terem
encurtado "a distância que devia normalmente separar as diferentes categorias de funcionários". Augusto Pires de Lima, em
1942, confronta os vencimentos dos professores com os dos funcionários camarários e verifica que um professor primário
agregado está equiparado aos contínuos de 2. � classe dos liceus, e um efectivo recebe menos que um aspirante da Câmara
e só ao fim de 30 anos atingirá o ordenado de 3.º oficial da Câmara. Cf. Sampaio, J.S., O Ensino Primário, vol. 11, p. 200.
Cf. Mogarro, Maria João; Martínez, Sílvia Alicia, "Os primeiros estudantes do ensino normal: origens sociais e formação de
professores na segunda metade do século XIX em Portugal", in Pintassilgo, J.; Serrazina, Lurdes (org.), A Escola Normal
de Lisboa e a Formação de Professores, Arquivo, História, fvtemória, Lisboa, Edições Colibri, 2009, pp. 64-70; Nóvoa, A. Le .
Reformista); e o Curso Superior de Letras, onde foi professor, entre outros, Teófilo Braga, um dos
patriarcas do republicanismo e primeiro presidente do Governo Provisório, assim como, por inerência,
Presidente da República.
e Sacadura Cabral. António José de Almeida era ainda Presidente da República. Foi, por assim dizer,
o único curso técnico criado em Coimbra, dado que os cursos de Engenharia só foram introduzidos na
década de setenta do século XX, gorada que foi a proposta do deputado António Alberto Torres Garcia,
apresentada em 27 de Setembro de 1923, de instituir na Universidade de Coimbra um Curso Superior
de Agricultura que tivesse como base o Instituto Botânico.
Surgirão, entretanto, as "universidades livres" (ou populares), de que já falavam há muito os
republicanos (como Bernardino Machado, na sua oração de Sapiência}, que constituem o verdadeiro
modelo de uma concepção de cultura democrática, socializada, aberta a todos os cidadãos. Tratou-se,
porém, de um projecto generoso mas de pequena repercussão, praticamente limitado aos meios ur
banos.
versidade e a sua inércia, ao Lado de alguns, poucos, professores de formação republicana ou de uma
formação de esquerda não partidária.
Serão eles, na Universidade, as primeiras vítimas do Estado Novo. Assim sucederá com
Sílvio Lima, da área da Filosofia, da Pedagogia e da Psicologia, e com o botânico Aurélio Ouintanilha,
da Universidade de Coimbra, com o historiador da Literatura Manuel Rodrigues Lapa, da Universidade
de Lisboa, e com o médico Abel Salazar, da Universidade do Porto, demitidos em 1935. Entretanto, em
1934, era extinta a Imprensa da Universidade de Coimbra, administrada pelo filósofo e historiador das
ideias Joaquim de Carvalho, que se manterá discretamente, mas de forma sempre clara, como um
republicano Liberal, de oposição ao regime salazarista. E a Associação Académica, fundada em 1887,
deixará, em 1936, de poder Livremente escolher a sua direcção durante Largo tempo.
Encerrava-se, assim, o ciclo da I República, que o Estado Novo criticava ferozmente, embo
ra, com habilidade, tivesse mantido constitucionalmente a "República" como regime ("Repúb�ica Cor
porativa" ), respeitando mesmo os seus feriados, como o 5 de Outubro e até o 31 de Janeiro. E preciso
119 EDUCAR
EDUCAÇÃO PARA TODOS ENSINO NA I REPÚBLICA
•.
A UNIVERSIDADE E A REPUBLICA
LUÍS REIS TORGAL
não esquecer que alguns republicanos de 1910, mas sobretudo dos anos 20, entraram no movimento
"republicano corporativo" de 1930, aceitando mesmo a proximidade do novo regime a uma concepção
de fascismo "original" - o que se pode chamar um "fascismo à portuguesa".
BIBLIOGRAFIA
imagens e textos dispostos A comunicação em suporte de imagens (projectadas ou impressas), complementada com
estaticamente e em escalas
informação em texto (sempre reduzido ao mínimo), são formas comunicacionais permanentemente
diversas? As possibilidades
são infinitas. presentes na exposição.
É por isso que organizar uma
exposição como esta, desafio
similar a muitas outras, não
é simples e exige a atenção, METODOLOGIA DE TRABALHO E ORGANIZAÇÃO DOS ESPAÇOS
o método, o talento Encontrados os grandes temas considerados significativos de momentos, políticas e acções
e a dedicação de muitos referentes à Educação na I República, optou-se por dar grande ênfase ao ensino primário e secundário,
especialistas, de que
os historiadores
como pilares das alterações estruturais que o novo regime pretendia implementar. O facto de a
e os investigadores ocupam exposição ocupar um edifício com forte passado histórico como escola reforçou esta opção.
o Lugar central. A organização dos conteúdos e dos percursos foi sendo construída em colaboração directa
É a partir de um programa
com a equipa de arquitectura e design, sendo materializada com esboços interpretativos que permitiam
nuclear, por eles construído,
que se desdobram abordagens a toda a equipa visualizar as propostas apresentadas.
complementares mas A divisão em salas de pequena a média dimensão (em média, com cerca de 40 m2)
convergentes - propor uma condicionou a organização dos conteúdos, sendo reforçada a sua identidade, pela separação física das
nova abordagem sobre
uma época, sobre uma área diversas salas. Este facto obrigou a os conteúdos de cada sala possuírem autonomia discursiva em
do saber ou sobre as pessoas relação aos dos outros espaços.
que protagonizaram os A exposição inicia-se de uma forma gradual. A escadaria de entrada alberga elementos da
acontecimentos. Tudo isto -
conjugado com outras variáveis
história do edifício, apresentando igualmente uma proposta de ocupação futu ra.
cruciais como o espaço, Antecede o início formal da exposição uma zona de pré-show cujo objectivo é introduzir os
a Luz e o som, a Legibilidade, visitantes no espírito da exposição, servindo igualmente de zona-tampão na organização dos grupos
a mobilidade e a acessibilidade,
de visitantes. Alguns dos conteúdos apresentados serão retomados no interior da exposição.
o orçamento, a produção, quem
a realiza e o calendário - torna Não pretendendo apresentar uma descrição sistemática das propostas expositivas
uma operação como esta escolhidas, julgamos ser importante comentar, do ponto de vista comunicacional. algumas soluções
complexa, mas única encontradas.
e irrepetível.
Aprende-se muito na sua A procura da imersão total dos visitantes nos conteúdos é apresentada na Sala da Bandeira,
organização para que se possa, claramente vocacionada para um público juvenil onde o sobredimensionamento do estandarte (6 x 4 m),
também, aprender o máximo colocado como tecto da sala, envolve totalmente o visitante. O karaoke, com base no Hino Nacional,
possível quando se visita.
À medida que os novos gadgets constitui um forte apelo a uma interacção com o visitante.
surgem todos os dias Com a mesma lógica, embora com efeitos mais claros no público adulto, é apresentada
e a informação se fragmenta uma sala de aula de época, onde os materiais expostos são originais (Outubro de 1910, pertencentes
a uma velocidade difícil
à escola de Válega, Ovar).
de acompanhar, mais exigente
se torna o rigor nos conteúdos, A exposição apresenta igualmente, condicionadas pela naturezas dos conteúdos, algumas
sob pena de sermos engolidos salas mais contemplativas, embora as cenografias procurem criar ambientes que façam realçar o
pelo vazio. A atenção âmago das mensagens.
do visitante, bombardeado
na sua vida com milhares A Sala dos Manuais, com as suas quatro estantes forradas de livros, serve de cenografia para
de solicitações quotidianas enfatizar a importâncias dos manuais, apresentados em posição de destaque. Processo semelhante
e com uma progressiva perda é utilizado na Sala do Ensino Técnico, onde o sobredimensionamento e a envolvência cromática
de concentração, pode não ser
ganha se os dispositivos
procuram introduzir o visitante num ambiente claramente oficinal.
empregues não forem eficazes Embora apelando a outros elementos expositivos, a Sala da Árvore procura induzir o visitante
na comunicação. na temática a tratar (a importância da árvore na política educacional republicana), sem que ele tenha
Como mostrar, então, um
necessidade de ler qualquer texto.
espólio riquíssimo, como
é o do ensino no período da
I República, neste fantástico
espaço da antiga escola Veiga CONCLUSÕES
Beirão, que visitei tantas vezes
sem sequer sonhar que, um A exposição Educar. Educação para todos. Ensino na I República está organizada de forma
dia, iria desenhar para aqui esta a poder servir como introdução e factor de motivação para aprofundamento desta temática para todos
exposição? os públicos.
A visita de grupos escolares deve ser precedida de um trabalho de preparação, de forma a Como instalá-la sem agredir
a recuperação parcial que já foi
retirar as máximas potencialidades dos conteúdos apresentados. feita e que terá a sua conclusão
Os materiais apresentados são de natureza figurativa, não constituindo património perecível. quando a exposição for
A organização funcional do espaço foi fortemente condicionada pela natureza estrutural do desmontada?
Os esquissos que aqui se
edifício e pela natureza efémera da exposição.
publicam, selecção de tantos
A informação apresentada em suporte informático deve ser complementada com a existente que foram produzidos no
no conjunto de exposições comemorativas do Centenário da República. desenvolvimento deste
projecto, mostram que o traço
rápido procura agarrar a ideia
NOTAS dada por u m dos presentes nas
inúmeras reuniões de trabalho
1 Hominídeos e hominídeos. o família presumido, exposição temporária, Domus, Corunha. ou fruto dos habituais
desenvolvimentos de projecto.
Depois de uma primeira fase
em que o espaço global
disponível é dividido pelos
"capítulos" desta narrativa,
e de dar a cada um o seu peso
específico no quadro geral,
estuda-se e trata-se cada
momento de per se,
procurando nunca perder u m
f i o de Ariadne que dê ao
visitante uma história com
diferentes motivos de interesse
que provocarão tempos de
leitura e de pausa, sempre
diferentes também.
Não havendo dois visitantes
iguais, diversas serão também
as suas pausas ou a sua
atenção, tanto numa vista geral
de uma sala, como na leitura
da legenda de uma imagem.
Depois, o edifício, o espaço
e a informação da exposição
terão de ser fruídos pelo
visitante individual ou integrado
num grupo, especialmente de
estudantes, tornando possível
o diálogo entre o professor e os
alunos que o acompanham.
Sem discriminação no que
à acessibilidade diz respeito.
Por último, há que ter
a percepção de que estes
conteúdos terão, em
simultâneo, de migrar, com
outros tratamentos, para um
catálogo - este que tem agora
nas suas mãos -, outros
suportes impressos ou
os multimédia onde mais
informação poderá sempre ser
adicionada.
Aí, sim, poder-se-á conservar
como uma memória perene,
porque a exposição que lhes
deu origem será sempre
efémera.
Henrique Cayatte
Designer
EDUC.A.R
EDUCAÇÃO]'ARA TODOS. ENSIN9 NA I REPÚBLICA
CONSTRUÇAO DE UMA EXPOSIÇAO
PAULO TRINCÃO
IJ7 EDUCAR
EDUCAÇÃO PARA TODOS. ENSINO NA I REPÚBLICA
CRONOLOGIA COMPARADA
I DEZEMBRO
Inauguração da nova Bandeira.
alguns pedagogos.
11 SETEMBRO 17 JULHO
Reconhecimento internacional
li MAIO Ezequiel d e Campos propôs
da República.
Criação de Escolas Normais Superiores na Assembleia Nacional um Projecto
SETEMBRO
Reforma da ortografia.
EDUCAÇÃO FACTOS POLÍTICOS ECONOMIA, SOCIEDADE
E CULTURA
1'1'
4 SETEMBRO ? MARÇO António Carneiro p intou Pinheiros,
Reorganização do ensino técnico A Alemanha declara guerra a Portugal: e Amadeo de Souza-Cardoso pintou
ind ustrial e comercial nas Escolas entrada de Portugal na Grande Guerra. Par.Ímpar, óleos sobre tela.
I ndustriais, Escolas de Arte Aplicada, 16 MARÇO
IS MARÇO
Escolas de Artes e Ofícios e Escolas Criação do M i nistério do Trabalho
Governo da "União Sag rada", presidido
Comerciais.
por António José de Almeida. e Previdência Social. alargando
14 ABRIL
" U ltimatum futurista às gerações
portuguesas do século XX" - 1. �
Conferência Futurista de José de
Almada Negreiros, no Teatro República.
19 ABRIL
Linhas gerais d e um plano de obras
h i d ráulicas de iniciativa estatal.
Existiam 39 centrais eléctricas, quase
todas de alimentação térmica.
IJ MAIO
Aparições de Fátima (até Outubro).
l7 NOVEMBRO
Decreto que favorecia o
aproveitamento dos terrenos incu ltos
pertencentes a particulares,
estimulando a criação de associações
de agricultores para esse efeito.
5 DEZEMBRO
Onda de saques e assaltos.
9 DEZEMBRO
Comício da União Operária Nacional
proclama a utilização dos terrenos
i ncultos.
14 DEZEMBRO JUNHO
Atentado contra Sidónio Pais, de que Grande agitação social. Diversas
resultou a sua morte. Dirigia-se ao greves.
Porto para tentar disciplinar a Junta ? J U LHO
M i litar do Norte, restauracionista. Criada a Obra de Assistência
I& DEZEMBRO 5 d e Dezembro para administrar
O Congresso colocou de novo em vigor as "sopas económicas": criaram-se
a Constituição de 1911 na sua forma 33 "cozinhas económicas", também
original. O novo Presidente foi Canto chamadas "sopas dos pobres", que
e Castro. serviam uma média de 4000 refeições
diárias.
AGOSTO
Gripe Pneumónica, também conhecida
como "gripe espanhola" (surto que se
fez sentir de Agosto de 1918 a Ju n h o
de 1919). Morreram cerca d e 60 000
pessoas, entre elas Amadeo d e Souza
-Cardoso.
I? SETEMBRO
Autorização dada às Câmaras
M u n icipais e às Juntas de Freguesia
para parcelarem os baldios e cedê-los
temporariamente a quem os cultivasse.
18 NOVEMBRO
Greve geral, muito censurada
e reprimida.
18-11 NOVEMBRO
Trabalhadores rurais ocuparam terras
no Vale de Santiago, concelho
de Odemira. A Associação dos
Trabalhadores Rurais seria encerrada,
e os implicados perseg uidos e presos.
1919 MARÇO
Criação de quatro D i recções-Gerais -
I? JANEIRO
Restaurou-se a Monarquia do Norte,
MARÇO
Promulgou-se legislação que concedia
Ensino Primário e Normal; Ensino no Porto, com Paiva Couceiro: o reino crédito para a construção de bairros
Secundário; Ensino S uperior; d a "Traulitândia", como ficou conhecido. operários.
e Belas-Artes. 11 JANEIRO 17 ABRIL
17 ABRIL Monsanto foi alvo dos monárquicos. Nova Lei do In q u ilinato. Proibiu-se
Inauguração da U n iversidade Popular Ficaram isolados pelos republicanos. o aumento das rendas e permitiu-se
Portuguesa. FEVEREIRO a sublocação aos inquilinos.
Aprovação do regulamento do Instituto António José de Almeida foi eleito contra acidentes de trabalho em todas
lO MAIO
Criação de uma Inspecção-Geral dos
Serviços de Protecção a Menores.
JULHO-AGOSTO
Grande agitação social. Várias g reves
que se prolongaram no tempo.
OUTUBRO-NOVEMBRO
Grande agitação social.
Diversas greves.
18 JANEIRO 15 OUTUBRO
1 92 1
MARÇO
Escolas Su periores de Farmácia Surgimento do Partido Comun ista Aparecimento da Seara Nova, como
transformadas em Faculdades Português. As linhas gerais do seu resposta dos intelectuais republicanos
de Farmácia. programa foram publicadas em ao clientelismo em que tinha caído
DEZEMBRO JO MARÇO
1 911 O m i nistro da I nstrução Pública, I n ício da primeira travessia aérea
Leonardo José Coimbra, propôs do Atlântico Sul por Gago Coutinho
que fosse possível a reintrodução e Sacadura Cabral.
do ensino religioso em li SETEMBRO
estabelecimentos particulares. Reforma tributária. Criação de novos
A proposta não foi aprovada. i m postos, aumentando alguns
consoante o valor transaccionado.
14 FEVEREIRO
1 915
MAIO IS ABRIL
Suprimidas as J u ntas Escolares, com Conspi ração no Exército. Mais de 16 000 ha d e baldios foram
muitos protestos do professorado. 17 J U LHO partilhados.
Seriam restabelecidas um ano depois. Outra conspiração, desta vez liderada Ezequiel de Campos (ministro
JOAQUIM PINTASSILGO
Doutor em Geografia e História pela Universidade de Salamanca. Integrou a Comissão Instaladora do
Instituto de Educação da Universidade de Lisboa, sendo, actualmente, um dos seus Subdirectores,
para além de Presidente do Conselho Pedagógico. Autor de numerosas obras de História da Educa
ção, entre as quais A História das Disciplinas Escolares de fvlatemática e de Ciências (Escolar Editora,
2010).
JORGE RAMOS DO Ó
Professor Associado do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa e Professor Convidado da
Universidade de São Paulo-Brasil, instituições onde lecciona temáticas relacionadas com a história da
educação, história da cultura e análise do discurso. Tem escrito sobre história política, histórica cul
tural e das mentalidades, especialmente durante o período do Estado Novo, e também sobre história
da educação e da pedagogia, num período mais Longo e que se estende de meados do século XIX a
meados de Novecentos.
JUSTINO MAGALHÃES
Historiador da Educação, Professor Catedrático do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa,
Coordenador da Área de Investigação e Ensino de História e Psicologia da Educação, Coordenador do
Doutoramento em História da Educação. Autor de, entre outros, Ler e Escrever no fvlundo Rural do An
tigo Regime (1994), Alquimias da Escrita (2001) e Tecendo Nexos: História das Instituições Educativas
(2004).
147 EDUCAR
EDUCAÇÃO PARA TODOS. ENSINO NA I REPÚBLICA
NOTAS SOBRE OS AUTORES
L U ÍS MARQ U ES ALVES
Professor Associado com Agregação no Departamento de História - FLU P/UP. Autor de Ensino Téc
nico (1 756-1 9 73) (2009), ISEP - 150 anos: fvlemória e Identidade (2005) e O Porto no Arranque do
Ensino Industrial (1851-1910) (2003).
EXPOSIÇÃO
DIRECÇÃO E PRODUÇÃO SiTIO WEB
Comissão Nacional para as Comem orações
do Centenário da República - CNCCR COORDENAÇÃO
CNCCR com Sofia Macedo
COMISSÁRIA
Maria Cândida Proença DESIGN
Henrique Cayatte Design com Pedro Gonçalves
TEXTO E PESQUISA DOCU M ENTAL
Raquel Pereira Henriques DESENVOLVI M E NTO E I MPLEMENTAÇÃO
CNCCR com João Canas
PESQUISA ICONOGRÁFICA
Ângela Salgueiro F I LM ES
Cine mateca Portuguesa - Museu do Ci nema
MUSEOLOGIA Zoomofoco
Paulo Trincão
EDIÇÃO DE F I LM ES
COORDENAÇÃO GERAL A Fundição, com João Cayatte (realização
CNCCR com Cátia Carvalho, Mafalda Gouveia e produção), Flávio Matos e Ricardo Martins
e Maria Inês Queiroz (edição vídeo e áud io)
C N C C R com Zoomofoco
ARQUITECTURA
Daniela Ermano e João Carrasco VOZES DOS PEDAGOGOS
Manuel Wiborg
DESIGN Paulo Pinto
Henrique Cayatte Design com Ana Machado, Pedro Gil
Cristina Viotti, Manuel Cluny e Rita M ú rias
REVISÃO DE TEXTOS
AUDIOVISUAL E M U LTIMÉDIA António Massano
I NSTALAÇÃO ELÉCTRICA
Eurostand, Stands e Decoração de I nteriores, Ld a .
FOTOGRAFIA
José Manuel Vasconcellos
PLANO DE SEGURANÇA AGRADECIMENTOS E CRÉDITOS FOTOGRÁFICOS
EPPE, SA Antonieta Calvelas
Carlos Guerreiro
APOIO JURIDICO Cristina Oliveira
CNCCR com Adelaide de Andrade Silva Filomena Lobo
e Maria João Lamy José Baptista
José Neiva Vieira
DIVULGAÇÃO José Pereira Nunes
CNCCR com João Sacchetti, Fernanda Ribeiro Maria Francisca Amaral
e Mafalda Jardim Maria Helena Corrêa
Miguel Rodrigues
GESTÃO DA EXPOSIÇÃO Pedro Tamen
Rui Rosmaninho
COORDENAÇÃO
CNCCR com Luís Marreiros Agrupamento de Escolas Nuno Gonçalves, Lisboa
Arquivo Fotográfico da Escola Secundária Maria Amália
ASSISTENTES Vaz de Carvalho: AF-ESMAVC
Complet'Arte Arquivo Fotográfico da Escola Secundária
Maria Amália: AF-ESMA
Arquivo Municipal de Lisboa- Arquivo Fotográfico: AML-AF
Biblioteca da Universidade Católica Portuguesa
do Centro Regional do Porto
Biblioteca Histórica da Secretaria-Geral
do Ministério da Educação
Biblioteca Nacional de Portugal: BNP
Centro Escolar Republicano Almirante Reis: CERAR
Cinemateca Portuguesa- Museu do Cinema
Direcção-Geral de Arquivos- Arquivo Nacional
da Torre do Tombo: DGARQ-ANTT
Exército Português- Museu Militar de Lisboa: EP-MML
Grande Oriente Lusitano- Museu Maçónico: GOL-MM
Hemeroteca Municipal de Lisboa: HML
Grémio de Instrução Liberal de Campo de Ourique: GILCO
Ministério da Educação: ME
Museu Escolar de Marrazes: MEM
Museu Escolar Oliveira Lopes, Válega: MEOL
Museu Nacional da Ciência e da Técnica: MNCT
Parque Escolar, EPE
Teatro Nacional O. Maria 11: TNDM 11
Unidade de Gestão Florestal do Centro Litoral: UGFCL
ISI
CATÁLOGO
DI RECÇÃO E PRODUÇÃO AGRADECI M ENTOS E CRÉDITOS FOTOGRÁFICOS
Comissão Nacional para as Comemorações Antonieta Calvelas
do Centenário da República - CNCCR José Baptista
José Neiva Vieira
COORDENAÇÃO CI ENTIFICA Maria Helena Corrêa
Maria Cândida Proença Pedro Tamen
Rui Rosm a n i n h o
TEXTOS
Joaquim Pintassilgo Agrupamento de Escolas N u n o Gonçalves, Lisboa
Jorge Ramos do ó Arquivo Fotográfico da Escola Secundária Maria Amália
Justino Magalhães Vaz de Carvalho: AF-ESMAVC
Luís Marques Alves Arquivo Fotográfico da Escola Secundária
Luís Reis Torgal Maria Amália: AF-ESMA
Margarida Felg ueiras Arquivo Mun icipal de Lisboa - Arquivo Fotográfico: AML-AF
Maria Cândida Proença Biblioteca da U n iversidade Católica Portuguesa
Paulo Tri ncão (com notas de Henrique Cayatte) d o Centro Regional do Porto
Biblioteca Histórica da Secretaria-Geral
EDIÇÃO do M i n istério da Educação
Comissão Nacional para as Comem orações Biblioteca Nacional de Portugal: BNP
d o Centenário da República - CNCCR Centro Escolar Republicano Alm i rante Reis: CERAR
C i nemateca Portuguesa - M u seu do Cinema
COORDENAÇÃO EDITORIAL D i recção-Geral de Arquivos - Arquivo Nacional
Maria Inês Queiroz da Torre do Tombo: DGARQ-ANTT
Exército Português - Museu M i litar de Lisboa: EP-MML
REVISÃO DE TEXTOS Grande Oriente Lusitano - Museu Maçónico: GOL-MM
António Massano Hemeroteca M u nicipal de Lisboa: HML
Grémio de Instrução Liberal de Campo d e Ourique: G I LCO
DESIGN M i n istério da Educação: ME
Henrique Cayatte Design Museu Escolar de Ma rrazes: MEM
com Ana Machado, Cristina Viotti, Museu Escolar Oliveira Lopes, Válega: MEOL
Manuel Cluny e Rita Mú rias M u s e u Nacional da Ciência e da Técnica: MNCT
Parque Escolar, EPE
I M PRESSÃO E ACABAMENTO Teatro Nacional O. Maria 1 1 : TNDM 1 1
I m p rensa Nacional-Casa da Moeda U n i dade de Gestão Florestal do Centro Litoral: UGFCL
ISBN
978-972-27-1840-0
DEPÓSITO LEGAL
305203/10