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FORMAÇÃO DE AUTOCONCEITO,

AUTOIMAGEM E AUTOESTIMA
Parte II

Conteudista
Prof.ª Esp. Susana Zaniolo Scotton
IV. Autoimagem, autoconceito e autoestima
A autoimagem conta com uma estrutura advinda da infância, resultado
das interações afetivas com seus cuidadores, acrescida de mais uma parte
subjetiva, criada pela articulação da própria estrutura da personalidade. A
autoimagem é responsável pela a qualidade do autoconceito, que resulta da
mobilidade e vivacidade dessa imagem, diretamente dependente do
movimento, da forma pulsante em que se relaciona socialmente nas inter-
relações.
Essa qualidade encontrada na autoimagem - geradora de autoconceito -
resulta na autoestima do sujeito que se beneficia, então, de uma sensação de
bem estar e consequente capacidade estabelecida de produtividade e de se
relacionar de forma saudável.
A autoimagem conta com integração de duas formas de imagem
constituinte do ser humano: imagem de base e imagem dinâmica.
A imagem de base é a presença sensorial da imagem corporal em
repouso, que difere da imagem dinâmica, que ocorre em movimento, e nos
possibilita compreender que a autoimagem é o resultado da interação de dois
momentos. Por exemplo, tem gente que só se sente bem em atividade, porque
apresenta uma imagem dinâmica fortalecida, confia em si quando está em
movimento; e outros que se sentem inseguros quando o corpo está agitado;
são pessoas que encontram dificuldades em iniciar algo.
A imagem dinâmica está ligada ao desejar, agarrar, mover-se. Tudo que é
movimento expressa a imagem dinâmica. Essa vivacidade também depende da
imagem de base, da força que vem do momento em que se foi “um só” com a
mãe, do estar dentro, desde o ser que foi alimentado pelo cordão.
Todo neurótico tem desintegradas essas duas partes, ou seja, a imagem
de base que é o narcisismo e a imagem dinâmica, representada pelos desejos.
Quando há o desejo, mas a imagem de base é fraca, aparece o sofrimento, a
falta de movimento e uma provável baixa na autoestima, que passa por uma
crise de conflitos quando a pessoa se considera desinteressante. Por exemplo:
quando alguém tem um conceito de si desqualificado, há algo que o impede de
se mover em direção ao próprio desejo; essa situação é o resultado de uma
dificuldade em integrar a imagem de base à imagem dinâmica, o que geraria

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um autoconceito precário, advindo de uma confusão na autoimagem, e como
resultado é a autoestima fragmentada, cujo desfecho é o sofrimento.
Uma forma de combate a esse sofrimento são os mecanismos de defesa,
por meio dos quais se desenvolve uma imagem de ego grandiosa e cada vez
mais distante dos próprios sentimentos, do seu verdadeiro self.
Enfim, os mecanismos de defesa, que fortalecem o ego em detrimento da
distância com as emoções mais íntimas, são respostas na tentativa de se
proteger contra os fantasmas de não ser interessante para o outro, culminando
em medo de não ser amado. Esse momento é marcado pela introjeção das
emoções.
A história do sujeito e os vínculos de amor vão determinando o que se
pensa de si, que está de acordo com o que se ouviu de si vindo da boca do
outro, ou de acordo com as ameaças do mundo externo.
Na autoestima satisfatória, o sujeito tem interesse em si e nos outros e se
mantém sensível às suas próprias necessidades. Com frequência, o seu
comportamento é autoconstrutivo, investido em seu self, dirigido para si
mesmo, sem disputa e competitividade para se elevar.
O autoconceito tem uma estrutura ética, considera o outro sem se
negligenciar; busca conhecimento carregado de realismo em busca de uma
satisfação possível de ser alcançada, mantendo suas expectativas em um nível
possível de realização; reconhece suas dificuldades como algo a ser assistido
sem negação.
O conceito de si, ligado à educação, ao processo e ao desenvolvimento,
permite a presença de flexibilidade da forma. Quando o autoconceito está
ligado à força e flexibilidade, o resultado esperado é de uma autoimagem rica
em simbologia.
Uma situação que coloque o corpo em colapso, ou seja, uma
desestruturação acompanhada de baixa energia, gerada por um acontecimento
humilhante ou por uma sequência de pequenos acontecimentos
desestruturantes, ameaça toda a constituição da autorrepresentação do sujeito.
O organismo, nesse caso, perde a sua capacidade de elaboração e
mentalização com o aumento dos hormônios do estresse, como a adrenalina e
o cortisol. Afetada a capacidade de se autorregular, há uma interferência na
autoestima e toda a representação interna se vê ameaçada.
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[...] situações de estresse, em particular, as frustrações,
com seu implícito componente de medo, levam os mecanismos
homeostáticos a uma situação anormal, que incidirá
consideravelmente sobre o comportamento do nascituro. [...]
para se ter um caráter é necessário ter um “eu” e a formação
do “eu” começa no período fetal e se completa no período pós-
natal; durante o período neo-natal podemos falar de um “eu”
que existe, mas que ainda não “é”.
Isso se verifica na condição psicótica, em que é oportuno
falar de “fixações” embrionárias, fetais ou neo-natais, isto é,
ligadas ao temperamento (NAVARRO, 1995, p. 12).

Se a pessoa tem capacidade de lidar com frustrações poderá se


recuperar e resgatar a autoestima em curto espaço de tempo, sem gerar
nenhum prejuízo para sua estrutura psíquica.
Caso contrário, pode ocorrer de uma pessoa passar por um período da
vida com autoimagem fortalecida, autoconceito estabilizado e autoestima capaz
de passar exuberância e energia e, em outra época, surpreender as pessoas
de sua convivência com uma queda que a desqualifique em todas as suas
atividades.
No entanto, é necessário que não passe muito tempo em situação de
desqualificação para que não fiquem marcas que modifiquem a arquitetura
psíquica e a autoconfiança. Nesse caso pertencer a grupos sociais, ter
estabelecido bons vínculos inter-relacionais, amizades bem ancoradas, etc.
fazem um suporte e um diferencial para sair rapidamente do estresse sem abrir
um quadro de patologia.
O corpo tem um papel importante no que se refere à autorrepresentação.
A satisfação do corpo, com boa autoestima, com sensações de dignidade,
possibilita o resgate da libido em seu lugar de origem: pulsando no corpo.
Isso significa que autoconceito, autoimagem e autoestima qualificados,
bem simbolizados e atuando de forma pulsátil no organismo, integram corpo e
psiquê. Quando o movimento e a flexibilidade do corpo físico pulsam em
direção ao prazer, resgatamos a chance de devolver a estima, a imagem de
base e a esperança de poder viver uma vida de dignidade e importância ao
indivíduo.
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O quadro de autoestima depende da somatória do autoconceito advindo
da autoimagem e é por aí que podemos organizar a possibilidade de pensar
caminhos que busquem a reparação de possíveis rebaixamentos da
autoestima na vida de um sujeito.
Segundo Reich (1989), um novo repertório só pode ser trabalhado no
momento em que se descobre de onde deriva a defesa do ego. Um
conhecimento do ego nos levará a um aperfeiçoamento de nossa habilidade
técnica muito mais do que um conhecimento do id; mas também a partir da
compreensão de como funciona o transtorno, de como a pessoa reage nas
relações, de como surgiu e se desenvolveu o sintoma; para que, assim, se
possa pensar no afrouxamento da defesa para poder surgir as emoções
represadas, que impulsionam o transtorno.
A natureza da autoimagem, base para a autoestima, nutri-se do
autoconhecimento individual, a partir da capacidade de compreender os
acontecimentos, as frustrações, as perdas. Essa capacidade depende do
amadurecimento diante das separações necessárias, em que o direito do outro
está preservado em sua forma de se relacionar.
O resultado desse amadurecimento é o de saber chorar as tristezas,
expressar as raivas sem destrutividade; saber se proteger quando estiver com
medo e buscar, “agarrar”, seus desejos enquanto tiver chances de realizar.
A adolescência, marcada pela inclusão ou pelo isolamento social, é o
momento em que esses conceitos (autoconceito, autoimagem e autoestima) se
estabelecem em direção à vida adulta. Elementos da experiência infantil se
manifestam e se reeditam ou não, e se confirma ou não o estado de menor
valia e despotencialização do eu.
O desenvolvimento da autoimagem é obrigatoriamente interativo, um
continuum de autocuidado que deverá estabelecer uma luta com as neuroses
trazidas da infância. Os medos básicos que trazemos da infância se
manifestam diante de situações semelhantes às cenas traumáticas, em que
autonomamente ocorre uma associação sensorial e se materializa uma
realidade passada como se fosse uma realidade “presente”. A esse mecanismo
a psicanálise chama de projeção.
[...] podemos dizer que o caráter neurótico, tanto em seus
conteúdos como em sua forma, é composto inteiramente de
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comprometimentos, tal como o sintoma. Contém a exigência e
a defesa de instinto infantil, que pertence aos mesmos ou a
diferentes estados de desenvolvimento.
O conflito infantil básico continua a existir, transformando
em atitudes que emergem numa forma definida, como modos
automáticos de reação que se tornaram crônicos e a partir dos
quais mais tarde têm de ser destilados pela análise (REICH,
1989, p. 159).

Os medos reeditados mais primitivos que nos ameaçam são a rejeição, o


abandono, a exigência, a humilhação e a traição. Na análise, através da
investigação dos relacionamentos e dos sentimentos suscitados por cada
situação, é possível “mapear” as cenas que são reeditadas com frequência e
que caracterizam a vida de determinada pessoa, considerando todas as
variáveis, para que a pessoa possa descobrir confusões que se manifestam.
A importância de que uma pessoa conheça basicamente os riscos que
ameaçam suas relações atua como profilaxia da neurose, mantendo assim
preservada as autorrepresentatividades fundamentais para a saúde física e
psíquica.
Por exemplo, se antes de ter um filho, os pais já frequentaram alguma
terapia e assim identificaram seus medos básicos, eles poderão diferenciar o
que é uma reação de defesa e quais são seus medos e desejos, para, desse
modo, terem mais chances de não reeditar traumas vividos em sua própria
infância.
Assim como os profissionais que trabalham com educação têm uma
importante responsabilidade no agravamento de um trauma gerador de
neurose ou podem ainda ocupar um lugar de construção de cenas reparadoras
de traumas de rejeição, abandono ou humilhação.
Se um professor tiver uma capacidade acolhedora e um olhar afetivo para
os acontecimentos, dificilmente irá apresentar uma desproporção na reação
diante um problema de disciplina. A irritabilidade é uma constante na vida de
um educador que está estressado, infeliz e consequentemente com baixa
autoestima. A autoestima positiva favorece a paciência, a ponderação e evita
situações desagradáveis que complicam a rotina diária.

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Muitas são as crises de autoestima negativa em ambiente escolar,
universitário. As pessoas entram em estresse e não sabem pedir ajuda, porque
na autoestima negativa, a capacidade de comunicação está diminuída e a
inibição paralisante agrava a busca de socorro.
As mulheres também parecem correr riscos graves na
contemporaneidade; perdem o foco de sua produtividade quando exigidas e
querem estar sempre bem, bonitas, atraentes e competentes e, para isso,
sofrem uma pressão multidirecionada, elevando assim as expectativas e
exigências capazes de abrir para um desequilíbrio emocional.

V. Autorrepresentação do Feminino
O desafio, aqui, é falar sobre sintomas que se manifestam pelas defesas
e exigências do feminino, às mulheres e à saga histórica na busca de valor
próprio e de seu lugar de poder. Dentro desse esquema, destacamos a grande
dificuldade em encontrar um prazer represado e a angústia de desamparo de
suas necessidades e consequente confusão alimentar no caso dos transtornos
alimentares.
A autoestima nas mulheres é alterada de acordo com as características
do pai. Por exemplo, um pai indulgente está mais apto a contribuir para o
estabelecimento de um caráter feminino do que um pai severo e bruto. Uma
menina reage à brutalidade do pai com a formação de um caráter masculino
duro. Nesses casos, a relação dessas mulheres está ligada à expectativa dos
pais, pela dinâmica desenvolvida na família e pelo espaço que a estrutura
feminina pode se firmar. As emoções verdadeiras estão represadas, recolhidas
e inibidas em sua manifestação nas inter-relações. Por exemplo, o transtorno
alimentar busca a paz e a autoestima de uma maneira confusa, apresenta
ambiguidade na fala e conceitos sobre si e sobre as situações, com impasses
relacionados à sexualidade.
Normalmente esse transtorno se manifesta quando a mãe se assusta com
o papel da maternidade, com toda a disposição necessária que a situação
exige. Muitas vezes, as necessidades da mãe entram em conflito com as
necessidades do bebê, sem que haja administração dessa situação.

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O transtorno alimentar ocorre como uma patologia na digestão do afeto
materno, no desencontro do amor materno com a necessidade da filha/
criança.
Segundo Maria Rita Kehl (1996, p.64),
[...] na própria identidade arduamente construída, ao
mesmo tempo em que exige que a mulher esteja inteira ali- e
quem tem filhos sabe de sua exigência, implacável, de que a
mãe esteja inteira ali. [...][...] Estranhamente, essas tarefas que
exigem uma participação afetiva tão intensa não são sentidas
como integradoras, e sim como atividades que roubam a
mulher algo de sua identidade e a fazem querer estar em outro
lugar [...].

Essa é uma forma de construirmos consciência para analisar o fenômeno,


físico, psíquico e social que devemos avaliar para compreender.
Que tenhamos, nós mulheres, conquistado o falo da fala,
preparando caminho para nossa própria existência, criando a
possibilidade de inscrever no inconsciente da espécie, nem que
seja daqui a duzentos anos, os signos de nossa subjetividade-
ambígua, sim; bissexual sim; incestuosa, também, tudo o que a
mulher parece-que-é-mas-não-pode-ser se torna possível na
medida que adquirimos existência também sublime, sublimada,
acesso ao simbólico, substituindo as possibilidades concretas,
limitadas, destinadas em grande parte ao recalque (KEHL,
1996, p. 66).

Kehl abre uma discussão importante para que nos aprofundemos, já que
não pretendemos, nos tratamentos da clínica na atualidade, aprofundar em
uma crítica indiscriminada da culpa da mãe, como muito já se fez em nossa
profissão. Sem uma visão sociológica, filosófica, sistêmica, corremos o risco de
construir uma clínica que busca os culpados, os responsáveis pelos
acontecimentos clínicos, pelas patologias e pelo sintoma.
Se isso se concretiza se constrói assim um problema secundário, uma
rebeldia, um inconformismo, na verdade uma oportunidade do paciente em
descarregar parte da energia libidinal através da raiva, da mágoa e da

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confusão de não poder se livrar de seu drama, sem que se livre dos culpados.
Essa situação gera uma confusão, em que a sensação retroage na espera
passiva de algo externo que teria que ser transformado.
É necessário que a mulher que, por tanto tempo esteve sem voz, sem
direitos e nem espaços de elaborações, encontre lugares para que possa viver
impulsos inaceitáveis, que precisam ser expressos pela sublimação.
As mulheres viveram patologicamente e sintomaticamente a sexualidade,
por não ter expressão aceitável de impulsos naturais, os chamados sintomas
histéricos, com corpos que se contorciam de tanto se segurarem para serem
aceitas.
A autora defende que o espaço doméstico é aquele em que a sublimação
é mais difícil, portanto, experimenta a mulher uma,
[...] possibilidade roubada, quando nos dedicamos aos
cuidados concretos dos filhos. É certo também que criar filhos
exige tarefas que são fruto do amor sublimado, da educação,
da conversa, em que a mãe aponta para o seu filho os
caminhos da simbolização- mas nisso o filho já não é da mãe.
Naquilo em que o filho é dela- posse e encargo da mãe- a
concretude está sempre por perto. [...] a saída incestuosa
perdeu recentemente sua contrapartida narcísica: os filhos não
são mais considerados por unanimidade o falo que glorifica o
destino feminino, desde que o feminismo, transformado em
ideologia mais ou menos dominante entre as mulheres da
classe média, instituiu uma espécie de desprezo pela
supermãe, pela “rainha do lar”, etc.(KEHL, 1996, p.66).

O mundo simbólico, imaginário, substitutivo das angústias não mais lhe


pertence, e sim um mundo concreto onde as atividades tendem a perder o
encanto, “ali onde leite é leite, o seio é seio, as fezes são fezes, o corpo infantil
é corpo e precisa ser manipulado”, e como resultado encontramos a mulher
recalcada, com forte tendência incestuosa por ter no filho o seu único contato
de satisfação. Se incestuosa, perde o mundo adulto e se torna regredida.
Se esse é o modelo que, segundo Freud, encantava os homens, “bela
narcisista frígida e eternamente imatura”, hoje os homens e as mulheres
temem o encontro, temem o sofrimento, vivem o desencontro.
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Kehl (1996) destaca o quanto esse medo masculino do amor, associado
ao medo de ficar preso na maternagem, dificulta a erotização da sexualidade
do casal, remetendo a mulher de volta ao lugar de resignação e assim
podemos imaginar como fica a estima. Não apenas a autoestima, mas também
a estima que o mundo sente por ela; viver a partir desse quadro a sexualidade
insatisfeita por estar deserotizada, sem excitação, sem sonho, a não ser de
forma desinteressada com sua baixa libido.
Muitos são os sintomas sofridos pelas mulheres em função de vivermos a
transição feminina para se tornar pessoa de voto, de opinião, de desejos.
Para que a criança em seu desenvolvimento alcance o direito de ter
escolhas, de ter voz para dizer “eu quero”, “eu escolho”, seus cuidadores
precisam estar conscientes de seu papel e de seus limites na contribuição do
desenvolvimento.
Um momento bastante sensível, em que o adulto deverá enfrentar as
próprias angústias de impotência ao perceber que seus cuidados amorosos e
especiais já não suprem todas as necessidades evolutivas.
Entre tantas patologias vividas pelas mulheres estão as depressões,
tensão pré-menstrual e os transtornos alimentares. O que ocorre com a
autoestima na anorexia, na bulimia ou na obesidade? Esses casos também
compreendem a situação e o dilema vividos no ambiente em que a sexualidade
não pode ser experimentada com prazer, com descarga, com alívio, com
leveza.
O falo da mulher é dentro, para acessar a excitação, o desejo a mulher
precisa se visitar em seu mundo interno, a partir de um mergulho nas suas
profundezas. Diferente do homem que pode acessar sua sexualidade sem
contato com suas profundezas, porque seu falo é fora e, por isso, a mulher
pode assim lhe dar a chance de experimentar uma sensação de profundeza, de
conexão com os sentimentos.
Os transtornos alimentares são geradores de uma dinâmica que anula,
faz desaparecer a sensualidade, faz desaparecer a autoestima, gera uma
deformação na autoimagem. A mulher acometida pelo transtorno alimentar não
consegue compreender por que o desejo de ser bela e sensual não se
sustenta.

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Na obesidade é como se uma capa de gordura encobrisse toda a
graciosidade e beleza; a sensualidade e a excitação se perdem em camadas
de gordura que eliminam a percepção e manifestação de desejo.
No caso da anorexia, metaforicamente podemos imaginar que a mulher
retirar excessivamente toda a “roupagem”, desnuda-se de suas camadas
arredondadas, atinge um estado seco, perde a umidade e, assim, a
graciosidade a sensualidade. Distante da vida, podemos visualizar a morte, os
ossos. A imagem cadavérica anuncia que a pessoa não pode se mover, não
pode ter dinamismo; porém algo lhe acalma, e essa calma vem de uma forma
de alucinação, de delírio, advindo de uma parte de sua consciência
“enlouquecida” que lhe diz, “você está linda e tem uma autoestima boa”, mas
essa premissa viria de onde? Vem da inferioridade que a levou a buscar a
perfeição? Perfeição para quê? Para quem?
Nesse caso, a autoimagem e o autoconceito são informações
deformadas, insanas. Muitas vezes a morte chega sem a chegada da
consciência ou às vezes chega tarde demais.
Nesses casos, a aparência da mulher se aproxima da imagem de uma
garota de 11 anos, assexuada. Uma grave situação que coloca em risco a vida.
Tem que ver com desejo inconsciente de morte ou uma negação da vida, do
pulso, da pulsão, do corpo.
Na obesidade, parece não ter ocorrido a desistência, a desesperança que
assistimos na anorexia. A obesidade tem uma parceira fiel, um elemento
frequentemente presente, que é a fome. Fome de quê? Tirar a fome pode ser
tirar rapidamente a única companheira. Que graça tem a vida do obeso sem a
fome? Que graça tem a vida do fumante sem o cigarro?
Nenhuma ação rápida pode ser eficaz sem um profundo cuidado e
conscientização. Quando o obeso precisa passar por uma cirurgia bariátrica,
para onde vai a fome?
Habitualmente têm surgido muitos casos da fome virar sede, desloca-se
assim da obesidade para o alcoolismo, isto é, o antigo obeso é um novo
alcoólatra. Parece que o obeso necessita de companhia, precisa de desejo;
necessita de parceria, por isso é alegre muitas vezes.
O obeso sorri enquanto gera aflição em quem o assiste feliz, e o
anoréxico parece calmo, enquanto o assistimos morrer. Se pensarmos, os dois
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casos vivem realidades de regressão de fase oral, vinda de diferentes fontes de
fixação. Na anorexia, o isolamento lembra uma forma de autismo, negação do
contato, e a presença de um mundo interno que não se relaciona com o mundo
externo, não se vincula, não põe a boca, não põe na boca. Basta-se. O tipo de
autoestima que está presente na consciência se mantém uma incógnita, assim
como a autoimagem equivocada e o autoconceito inflexível.
No caso da obesidade, não percebemos traços autistas, pois ocorre uma
vinculação, a boca aceita o contato com o prazer. Toda a libido parece se fixar
na região oral, mas também apresenta o sensorial aguçado. O olfato, os olhos
e o paladar estão na mesma direção. Isto é, satisfação rápida, prazer urgente.
A urgência de satisfação anuncia uma ansiedade e um investimento no prazer
sem descarga, só carga que leva o organismo ao caos, cada vez mais distante
do prazer real, sexual.
Mulheres obesas sempre fizeram parte da história de fartura e riqueza, e
as obesas adoradas pousaram para a arte com um toque incrível de
sensualidade, como demonstra a imagem retirada do texto de Busse (2004).

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Anorexia surge na Idade Média ligada ao jejum como uma atitude de
santificar-se, ou de se rebelar contra os casamentos arranjados. Freud, por
exemplo, fala em anorexia histérica, um sintoma de conversão.
Esses dois dados transtornos, o da “obesidade desafiadora” de um lado e
a “anorexia santa”, de outro, são o pano de fundo para falarmos da frequente
bulimia.
Clinicamente colocamos a bulimia entre a tendência de se render à
abundância, a fartura sonhada, e a negação do apetite alimentar/
(apetite/sexual). Retomamos, então, o lugar da autoimagem preservada,
porém, ameaçada; o autoconceito vulnerável, flutuante; e a autoestima
ancorada no narcisismo, ameaçado pela chegada de emoções assustadoras,
muito provavelmente.
Todos os casos, apesar de estudados de maneira globalizada,
necessitam de um olhar específico, individualizado para um bom diagnóstico,
advindo de uma escuta atenta, descomprometida e despretensiosa somada a
uma análise da normalidade social do momento, pois, para cada era, ocorre
uma forma de atitudes de maior aceitação, por isso, os sintomas psíquicos são
sintomas sociais.
Essa é uma atitude clínica a partir do pano de fundo da realidade para
compreender os sintomas. Seguimos uma ordem social que determina a
adequação ou a inadequação de nossos sintomas e das nossas atitudes. O
espaço feminino se modifica a cada era, e a conduta esperada de cada tempo
também determina a forma como a pessoa se sente e se comporta.
A feminilidade no corpo da mulher está em busca de um lugar calmo para
buscar prazer e satisfação em ser e pertencer à função feminina, materna,
intuitiva, sensível, nutridora, acolhedora e receptiva. Sentir autoestima feminina
é gostar dessas funções que nem mesmo a mulher consegue saber se ainda
têm valor.
A mulher se assegura na feminilidade impulsiva, compulsiva,
consumidora. Ela busca cirurgia plástica que retira seu abdômen ou arranca,
por exemplo, uma sua cicatriz de nascimento, retirando a sensibilidade para
que possa assim ser admirada; no entanto tais cirurgias talvez lhe tirem a
satisfação / erotização nas regiões amputadas. Pois talvez, o corte cirúrgico

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corte o tecido físico, “cortando” parte de seu tecido psíquico, gerando uma
descontinuidade.
Os valores que regem o ser humano são construídos ao longo de sua
existência, e dependem diretamente dos cuidados recebidos desde a
concepção e todas as ocorrências de meninice, juventude e toda a vida adulta.
A autoestima, a autoimagem e o autoconceito se constroem no tempo e
no espaço a partir do amparo ou do desamparo vivido nas necessidades
básicas, fisiológicas e de ser amada.
Mas ser autoconsciente ou ter uma imagem do próprio self - a
autoimagem - não é ser narcisista, a menos que a imagem tenha certa medida
de grandiosidade. E o que é grandioso só pode ser determinado por referência
ao self real. Se uma pessoa tem uma imagem de si como atraente e sedutora
para o sexo oposto, a imagem não é grandiosa se essa pessoa for, de fato,
atraente e sedutora. Sendo assim, a autoimagem o autoconceito só pode ter
uma autoestima saudável se estiver de acordo com a realidade e adaptada ao
contexto social.

***

Encerrar o texto falando de realidade, de verdade, sem hipocrisia como a


cura contra a inteligência dissimulada que tortura a humanidade, veremos
Michel de Montaigne (1533-1592).
A propósito da autoestima, autoimagem e autoconceito, Montaigne, um
filósofo, descreve três tipos principais de inadequação, a primeira é a
inadequação física, seu sentimento de desconforto com seu próprio corpo;
depois a inadequação experimentada quando somos julgados ao termos
nossos hábitos e costumes desaprovados e, por fim, a inadequação intelectual
o sentimento de que somos pouco sagazes. Para as três, Montaigne propõe
soluções simples e muito úteis. Dizia ele que estamos cercados de modelos
equivocados, sem espaço para abarcar a maioria de nós, o que isso faz o
indivíduo odiar a si mesmo sempre que não se encaixa nesses ideais.
Por isso, ele escreveu um livro, “Ensaios”, para contar coisas comuns do
seu dia a dia, estimulando-nos a aceitar o aspecto corriqueiro de cada um de
nós. Ele nos fala, por exemplo, de como funciona a sua digestão, e que come
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tão depressa que acaba mordendo os dedos... Fala de banalidades, mas que
talvez nos façam lembrar que a natureza humana também tem aspectos
enfadonhos. Montaigne estabelece conosco uma relação de confiança, a ponto
de nos contar detalhes inusitados, sobre sua impotência ou sua flatulência; é
fácil imaginar Montaigne como um amigo, distanciando-o da imagem austera
de um filósofo típico. Ele diz: “A pior desgraça para nós é desdenhar aquilo que
somos” 1.

1
Michel de Montaigne e a autoestima: Parte 1/3: http://www.youtube.com/watch?v=GuT-ybaerok.

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REFERÊNCIAS

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1915). Trad: Margarida Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

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http://www.youtube.com/watch?v=GuT-ybaerok> Acesso em: 08/02/13.

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