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Avançado de
Vida
EDIÇÃO 2015 DAS RECOMENDAÇÕES ERC
7ª Ed i ç ã o
Suporte Avançado de Vida
Advanced Life Support Portuguese translation
Agradecimentos
Ilustrações por Jean-Marie Brisart, Het Geel Punt bvba, Melkouwen 42a, 2590 Berlaar, Bélgica
(hgp@hetgeelpunt.be) e Mooshka&Kritis, Bélgica (info@mooshka.be).
Capa e formatação por Studio Grid, Bélgica (info@studiogrid.be).
Agradecemos a Oliver Meyer pela preparação digital das tiras de ritmo de ECG e a Annelies Pické
(ERC) pela coordenação administrativa.
A Thomas Dorscht pela filmagem e optimização de figuras.
Este manual é baseado no manual de SAV de 2010 do RC (UK) e tem como autores: Editores: Jerry
Nolan, Jasmeet Soar, Andrew Lockey, Gavin Perkins, David Pitcher, Carl Gwinnutt, David Gabbott,
Mike Scott, Sarah Mitchell. Colaboradores: Jerry Nolan, Jasmeet Soar, Andrew Lockey, Gavin
Perkins, David Pitcher, Carl Gwinnutt, David Gabbott, Mike Scott, Sarah Mitchell • Contributors:
Gamal Abbas, Annette Alfonzo, Alessandro Barelli, Joost Bierens, Leo Bossaert, Hermann Brugger,
Matthew Cordingly, Robin Davies, Charles Deakin, Sarah Dickie, Joel Dunning, Hans Domanovits,
James Fullerton, David Gabbott, Marios Georgiou, Carl Gwinnutt, Anthony Handley, Bob Harris,
Sara Harris, Jenny Lam, Freddy Lippert, Andrew Lockey, David Lockey, Carsten Lott, Oliver Meyer,
Sarah Mitchell, Koen Monsieurs, Jerry Nolan, Elizabeth Norris, Peter Paal, John Pawlec, Gavin
Perkins, David Pitcher, Rani Robson, Helen Routledge, Maureen Ryan, Claudio Sandroni, Mike
Scott, Gary Smith, Jasmeet Soar, Karl-Christian Thies, David Zideman.
Publicado pelo European Resuscitation Council vzw, Emile Vanderveldelaan 35, 2845 Niel, Bélgica.
IISBN: 9789492543219
Depot: D/2016/11.393/035
© European Resuscitation Council 2015. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução, armazenamento em qualquer meio, ou
transmissão de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrónico, mecânico, fotocópia, gravação ou outros, sem consentimento escrito
prévio do ERC. O conteúdo deste manual baseiase nas recomendações ERC 2015, no conteúdo de manuais anteriores, evidência existente na
literatura, recomendações existentes e consenso de peritos.
AVISO LEGAL: O conhecimento e a prática em suporte de vida em geral e em reanimação cárdio-pulmonar em particular continua a ser
um domínio da medicina e das ciências da vida em constante desenvolvimento. A informação fornecida neste manual é apenas para fins
educacionais e informativos. Este manual de curso não pode ser considerado, em qualquer circunstância, como uma fonte atualizada de
informação, científica, médica ou de outro tipo. A informação contida neste manual não deve ser utilizada como substituto do parecer de
um prestador de cuidados de saúde qualificado e certificado. Os autores, o editor e/ou a editora deste manual incitam os utilizadores a con-
sultar um prestador de cuidados de saúde qualificado para o diagnóstico, tratamento ou resposta a questões médicas pessoais. Os autores,
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responsabilidade por qualquer perda, lesão e/ou dano a qualquer pessoa ou propriedade direta ou indiretamente relacionada em qualquer
forma pela utilização deste manual de curso e/ou pelos tratamentos, métodos, produtos, instruções, ideias ou outro conteúdo aqui contido.
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Suporte Avançado de Vida
Tradução para Português
Editores
Conselho Português de Ressuscitação
Tradução
Miguel Santos
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
Revisão
Adelina Pereira
Isabel Santos
Ernestina Gomes
Paula Gonçalves
Agradecimentos
Luis Costa , pela coordenação administrativa
Esta publicação é uma tradução do manual original Suporte Avançado de Vida (ISBN 9789079157839). A tradução foi real-
izada por iniciativa e sob a supervisão do Conselho Português de Ressuscitação (Rua Sá da Bandeira, 819 1º esq. 4000-438
Porto), único responsável pelo seu conteúdo. No caso de surgirem questões relacionadas com a exatidão das informações
contidas na tradução, por favor referir à versão Inglesa do manual, que é a versão oficial do documento. Quaisquer dis-
crepâncias ou diferenças surgidas na tradução não responsabilizam o European Resuscitation Council e não têm efeitos em
termos de obrigações legais.
This publication is a translation of the original manual Advanced Life Support (ISBN 9789079157839). The translation is made
by and under supervision of the Conselho Português de Ressuscitação Rua Sá da Bandeira 819 1º esq - 4000 - 438 Porto -
Portugal, solely responsible for its contents. If any questions arise related to the accuracy of the information contained in the
translation, please refer to the English version of the manual which is the official version of the document. Any discrepancies
or differences created in the translation are not binding to the European Rescuscitation Council and have no legal effect for
compliance or enforcement purposes.
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Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
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Conteúdos
APÊNDICES
Apêndice A Fármacos usados no tratamento da
paragem cardíaca 315
Apêndice B Fármacos usados no período peri-paragem 318
Apêndice C Websites úteis 324
5
Glossário
AAS Ácido Acetilsalicílico EB Excesso de Base
AEsP Atividade Elétrica sem Pulso ECG Eletrocardiograma
AINE Anti-Inflamatório Não Esteroide EEG Eletroencefalograma
A-P Ântero-posterior EEM Equipa de Emergência Médica
APD Acesso Público a Desfibrilhação ETCO2 Dióxido de Carbono Expirado
ARA Antagonista dos Recetores da FA Fibrilhação Auricular
6
NIRS Espetroscopia de Infravermelho SCA Síndrome Coronária Aguda
Próximo
SDRA Síndrome de Dificuldade
NPSA National Patient Safety Agency Respiratória do Adulto
O2 Oxigénio SEM Serviços de Emergência Médica
OVACE Obstrução de Via Aérea por SPC Simulação de Paragem Cardíaca
Corpo Estranho
SPECT Tomografia Computorizada de
PA Pressão Arterial Emissão de Fotões
PaCO2 Pressão parcial arterial de SpO2 Saturação Periférica de Oxigénio
Dióxido de Carbono
SU Serviço de Urgência
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
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8
Capítulo 1.
Suporte Avançado de Vida
em perspetiva
1. O problema
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
9
Capítulo 1
Suporte Avançado de Vida em perspetiva
em 18 % dos casos, e destes sobrevivem até à alta 44 %; após AEsP ou assistolia, sobrevivem
até à alta 7 %. Estes dados preliminares do NCAA são baseados em 3.184 adultos (idade
≥16 anos) de 61 hospitais participantes (número crescente entre Out 2009 e Out 2010)
com ritmo inicial/apresentação conhecido e dados completos sobre retorno de circulação
espontânea (RCE) e sobrevivência até à alta hospitalar. Todos estes indivíduos foram sujeitos
a compressões torácicas e/ou desfibrilhação por equipas de reanimação em resposta a uma
chamada de emergência interna. Muitas paragens cardíacas não preencheram estes critérios
e não foram incluídas. Muitos doentes que sofrem paragens cardíacas intra-hospitalares
têm comorbilidades significativas, o que influencia o ritmo inicial e, nestes casos, torna as
estratégias de prevenção da paragem cardíaca particularmente importantes.
Figura 1.1
Cadeia de sobrevivência
o precoce e ós-reanima
ment dos p
eci ped ida ção
onh ido Cu
c
Re
de
ce
fib
da
es
D
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en
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ara - pa qua
gem
c ardía ca ra re sta urar a
o
-p çã
ara - pa ora
gan ha
r te m po r a re inici ar o c
10
No hospital, o reconhecimento precoce do doente crítico que está em risco de paragem
cardíaca e a ativação da equipa de emergência médica (EEM) permitirá o início de tratamento 1
para prevenir a paragem cardíaca (capítulo 3). Deveria ser adotado em todos os hospitais um
número universal de chamada da EEM. Se ocorrer uma paragem cardíaca, a desfibrilhação não
deve ser atrasada até à chegada da equipa de reanimação. O pessoal clínico deve ser treinado
no uso do desfibrilhador.
a probabilidade de sobrevivência após paragem cardíaca por FV. Realizar RCP apenas
com compressões torácicas é melhor do que não realizar qualquer RCP. Apesar de a sua
importância ser bem aceite, na maioria dos países europeus a RCP é efetuada apenas numa
minoria dos casos (cerca de 30 %). Na paragem cardíaca intra-hospitalar devem-se iniciar
de imediato compressões torácicas e ventilações, mas não devem atrasar as tentativas de
desfibrilhação de doentes em FV/TVsP. As interrupções às compressões torácicas devem
ser minimizadas e devem ocorrer de forma muito breve apenas durante as tentativas de
desfibrilhação e avaliações do ritmo.
11
Capítulo 1
Suporte Avançado de Vida em perspetiva
12
Figura 1.2.
Suporte Avançado de Vida no Adulto
1
Chamar Equipa de
Reanimação
RCP 30:2
Ligar monitor/desfibrilhador
Minimizar interrupções
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
Avaliar ritmo
1 choque
Retorno de circulação
Minimizar
espontânea
interrupções
CP extracorporal
n R
13
Capítulo 1
Suporte Avançado de Vida em perspetiva
LEITURA ADICIONAL
• Perkins G et al. European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015
• Section 2: Adult basic life support and automated external defibrillation 10.1016/j.resuscita-
tion.2015.07.015; p81 - p98
• Soar J et al. European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015
• Section 3. Adult advanced life support 10.1016/j.resuscitation.2015.07.016; p99 - p146
• Atwood C, Eisenberg MS, Herlitz J, Rea TD. Incidence of EMS-treated out of hospital cardiac arrest in
Europe. Resuscitation 2005;67:75-80.
• Berdowski J, Berg RA, Tijssen JG, Koster RW. Global incidences of out of hospital cardiac arrest and
survival rates: systematic review of 67 prospective studies. Resuscitation 2010;81
• Hollenberg J, Herlitz J, Lindqvist J, et al. Improved survival after out of hospital cardiac arrest is
associated with an increase in proportion of emergency crew—witnessed cases and bystander
14
Capítulo 2.
Competências não técnicas e
qualidade em reanimação
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
• o papel dos fatores humanos na reanimação
• como usar ferramentas de comunicação estruturada como a SAAR e CHSP
• o papel do registo de incidentes de segurança e das auditorias na melhoria dos
cuidados aos doentes
1. Introdução
Competências como desfibrilhação, compressões torácicas eficazes, capacidade de ventilar
e reconhecimento do ritmo cardíaco de paragem são componentes importantes para uma
reanimação bem-sucedida - são habitualmente designadas como competências técnicas.
Estas capacidades são adquiridas de muitas formas diferentes, incluindo através de cursos.
Apesar de existir consenso que estas competências são necessárias para a reanimação, surgiu
recentemente outra categoria de competências ou fatores igualmente importantes. Os termos
“fatores humanos” e “competências não técnicas” têm sido usados como equivalentes, mas cada
um tem uma definição específica. As competências não técnicas são as capacidades cognitivas
e de relação interpessoal que permitem um trabalho em equipa eficaz; estima-se que 70-80 %
dos erros em cuidados de saúde podem ser devidos a uma deficiência nestas capacidades. As
competências não técnicas incluem as capacidades interpessoais de comunicação, liderança
e de seguir a liderança (ser um membro da equipa), além das capacidades cognitivas tais como
tomada de decisões, avaliação da situação e gestão de tarefas. Estas competências fazem parte
dos chamados fatores humanos. Os fatores humanos são um termo lato para a análise à forma de
interação dos profissionais de saúde com tudo o que existe no seu ambiente de trabalho, tais como
recomendações clínicas, políticas e protocolos, equipamento e gestão de stress. Ainda incluída
nos fatores humanos está a melhoria de actividades clínicas quotidianas, através da avaliação
dos efeitos do trabalho de equipa no comportamento humano e à sua aplicação em contexto
clínico. As competências não técnicas examinam especificamente a interacção entre os membros
da equipa, pondo de parte os restantes elementos dos fatores humanos. Tanto competências não
técnicas como fatores humanos começam a ser reconhecidos como sendo de igual importância na
reanimação, mas geralmente são pouco abordados em cursos formais, durante o treino hospitalar
e durante qualquer avaliação.
15
Capítulo 2
Competências não técnicas e qualidade em reanimação
Foram desenvolvidos vários sistemas com o objetivo de garantir uma utilização aceitável das
competências não técnicas, como por exemplo o formulário de avaliação da dimensão de equipa
ou a Medição de Competências Não Técnicas de Oxford. Os princípios utilizados no curso de SAV
para a promoção de boas competências não técnicas baseiam-se no Team Emergency Assessment
Measure . A Taxonomia proposta em CNT, adotada pelo ERC, está ilustrada na tabela 2.1.
2. Liderança
Na realidade, a liderança é um atributo extremamente difícil de definir. Vários autores de
referência definiram liderança de formas distintas. As definições concordam que um líder eficaz
é um indivíduo com perspetiva global da situação que enfrenta, e que como tal atribui diferentes
papéis aos vários membros de equipa de forma a atingir a referida perspetiva. A literatura médica
concorda que a liderança não é um traço de personalidade, e que pode ser atingida com treino
contínuo. Em equipas de reanimação, o líder de equipa precisa de:
1. Garantir que a equipa sabe exatamente o que é esperado de si. Isto envolve um grau
elevado de capacidade de avaliação da situação, de competência na atribuição de tarefas
aos membros da equipa em função da sua experiência, de tomada de decisão baseada em
evidência médica e de verbalização clara dessas decisões. Um bom líder conhece e dirige-
se aos membros da equipa pelos seus nomes, e é capaz de ser um exemplo para a equipa
evoluir.
2. Manter um nível elevado de perspetiva global. Na prática, isto significa executar um plano
estabelecido pelo líder. Enquanto os membros da equipa efetuam as suas tarefas, o líder
monitoriza de forma cuidadosa a sua execução. No contexto de reanimação cardiopulmonar,
o líder deve ser sempre capaz de ouvir a informação que os membros da equipa lhe
estão a transmitir. Deve ainda ser capaz de monitorizar continuamente a execução dos
procedimentos clínicos, e fornecer orientação enquanto os mesmos decorrem, mantendo-se
de “mãos-livres”. Garantir a execução de todos os procedimentos em segurança, tanto para
o doente como para a equipa de reanimação, é responsabilidade do líder. O líder de equipa
deve ainda ser empático com os outros profissionais de saúde e possuir competências de
comunicação interprofissional.
16
3. Planeamento de sucesso. Durante a RCP, o líder de equipa deve ser capaz de planear as
próximas ações, tanto pela filtragem da informação disponível, como por antecipação dos
cenários mais prováveis. A prontidão da equipa e a execução rápidas das instruções do líder
são elementos essenciais para garantir RCP de elevada qualidade.
2
Tabela 2.1.
Taxonomia das Competências Não Técnicas adaptada e modificada de Cooper et al (2010) para utilização
em cursos de SAV. Ver http://medicalemergencyteam.com/ para maior detalhe.
TRABALHO DE EQUIPA
A equipa comunicou de forma eficaz, utilizando tanto
comunicação verbal como não verbal.
Exemplos: transmitir achados relevantes, partilhar
preocupações, utilizar nomes dos membros, linguagem
corporal apropriada
A equipa trabalhou em conjunto para completar as tarefas
de forma atempada
Exemplos: coordenação da desfibrilhação, manter
compressões torácicas, assistência mútua
A equipa atuou com compostura e controlo.
Exemplos: desempenhar as tarefas alocadas, aceitar
críticas
A equipa adaptou-se às mudanças de situação.
Exemplos: adaptação a mudanças de ritmo, deterioração
do doente, mudança de papéis
A equipa monitorizou e reavaliou a situação.
Exemplos: mudanças de ritmo, RCE, quando terminar a
reanimação
A equipa antecipou ações potenciais.
Exemplos: desfibrilhação, abordagem da via aérea,
administração de fármacos
17
Capítulo 2
Competências não técnicas e qualidade em reanimação
GESTÃO DE TAREFAS
A equipa estabeleceu prioridades nas tarefas.
Exemplos: compressões torácicas contínuas,
desfibrilhação, abordagem da via aérea, administração de
fármacos
A equipa seguiu as recomendações aprovadas.
COMENTÁRIOS
Exemplos: Que aspeto foi bom? Qual o aspeto que precisa
de melhorar?
18
4. Adaptação a mudanças de situação. A gestão da paragem cardíaca é um procedimento
dinâmico. Doentes em paragem cardíaca são, por definição, extremamente
instáveis mesmo quando atingem o Restabelecimento de Circulação Espontânea
(RCE). Durante a RCP a equipa deve estar confortável com mudanças de papel (p.
ex. a alternar a pessoa da via aérea com a das compressões) e deve ser capaz de se 2
adaptar a mudanças de ritmo, quando estas ocorrem. Adicionalmente, a adaptação
ao cenário é crucial na otimização de cuidados de elevada qualidade. Os membros
devem conseguir adaptar-se a qualquer cenário de paragem cardíaca, incluindo a
UCI, sala de emergência ou uma sala de enfermaria pouco espaçosa.
5. Reavaliação da situação. Em RCP, isto significa não só a reavaliação contínua do
doente mas também consenso sobre quando a tentativa de reanimação deve ser
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
4. Gestão de tarefas
Durante a reanimação de qualquer doente, tanto em situação de periparagem como após a
ocorrência da paragem cardíaca, existem numerosas tarefas que devem ser desempenhadas
pela equipa. Incluem-se:
1. Priorizar as tarefas que devem ser executadas de forma simultânea ou sequencial.
Esta competência inclui definir tarefas, e organizá-las por prioridade e sequência.
O conhecimento e utilização eficaz dos recursos disponíveis são fatores adicionais
importantes.
2. Adesão às recomendações atuais e às práticas aprovadas. Isto inclui desvios quando
apropriado.
3. Assegurar cuidados pós-reanimação de elevada qualidade, e transporte atempado
para o laboratório de hemodinâmica ou unidade de cuidados intensivos. Os membros
de equipa devem estar aptos a continuar tratamentos pós-reanimação em diferentes
cenários, incluindo a UCI, enquanto entregam o doente a pessoal especializado.
19
Capítulo 2
Competências não técnicas e qualidade em reanimação
Figura 2.1
Gestão de tarefas
A gestão local da RCP pode ser melhorada por um debriefing pós-RCP, com o intuito de
apurar erros na qualidade da RCP e mitigar a sua repetição em tentativas de reanimação
subsequentes. Exemplos destes erros são a frequência ou profundidade insuficiente das
compressões torácicas, interrupções prolongadas das mesmas, e ventilação excessiva. As
instituições são encorajadas a submeter os dados da RCP de forma padronizada a auditorias
nacionais e/ou registos internacionais, com o objetivo de melhoria contínua da qualidade.
Estas práticas já conduziram ao desenvolvimento de modelos validados de predição de
resultados, o que pode facilitar o planeamento antecipado de cuidados. Adicionalmente,
uma análise prévia de dados de registos quantificou a frequência de erros do sistema
de reanimação, e o seu impacto na mortalidade intra-hospitalar após paragem cardíaca
desfibrilhável e não-desfibrilhável. Os resultados dos registos têm mostrado melhorias
significativas dos resultados em paragem cardíaca entre 2000-2010.
20
A evidência publicada sugere que a infraestrutura de reanimação baseada em equipas,
a auditoria institucional a múltiplos níveis, o registo pormenorizado das tentativas de
reanimação a auditorias nacionais e/ou a registos internacionais, e a análise de dados
subsequente e feedback desses resultados pode contribuir para a melhoria contínua da
qualidade da RCP intra-hospitalar e dos resultados da paragem cardíaca. 2
Trabalho de equipa eficaz e competências de comunicação são fatores críticos para o sucesso
durante a RCP; comunicação insuficiente vai diminuir a eficácia da equipa e as taxas de
sobrevivência. Isto geralmente acontece devido à variação dos membros de equipa de dia
para dia, o que afeta de forma séria as competências de comunicação. Consequentemente,
a comunicação da equipa pode ser otimizada por treino de elevada qualidade, durante o
qual podem ser implementados conceitos de comunicação eficaz, e respetiva aplicação,
focados em diferentes abordagens, interação em equipa e gestão de relações.
21
Capítulo 2
Competências não técnicas e qualidade em reanimação
Tabela 2.2.
22
Ferramentas de comunicação SAAR e CHSP
SAAR CHSP Conteúdo Exemplo
Recomendação Plano • Dizer explicitamente • E stá a fazer fluidos IV e vou
aquilo que se pretende administrar antibiótico.
que faça a pessoa a quem • P reciso de ajuda – pode 2
se está a telefonar. por favor vir ver o doente
• O quê e quando? imediatamente?
• Frases úteis:
- Vou começar o seguin-
te tratamento; sugere
mais alguma coisa?
- Vou pedir os seguintes
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
23
Capítulo 2
Competências não técnicas e qualidade em reanimação
24
• a definição de paragem cardíaca (p. ex. inclusão de paragens respiratórias primárias)
• disponibilidade de equipas de reanimação ou de emergência médica
Em segundo lugar, existe falta de uniformidade no registo do processo e dos resultados
das tentativas de reanimação; por exemplo, a definição de sobrevivência é reportada como 2
restabelecimento de circulação espontânea, ou sobrevivência aos 5 min, 1h, 24h, ou até à
alta hospitalar. A falta de uniformidade no registo de paragens cardíacas torna difícil avaliar
o impacto na sobrevivência de fatores individuais, tais como novos fármacos ou técnicas.
Novas intervenções que aumentem a taxa de sobrevivência, mesmo que apenas de forma
ligeira, são importantes porque existem muitas vítimas anuais de paragem cardíaca. É
pouco provável que hospitais ou sistemas de saúde locais tenham um número suficiente
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
de doentes para identificar estes efeitos ou eliminar fatores de confundimento. Uma forma
de contornar este dilema é adotar definições uniformes, e colher dados padronizados tanto
do processo, como do resultado, da reanimação de um número elevado de doentes e de
múltiplos centros.
A maioria dos países europeus tem uma auditoria nacional para as paragens cardíacas intra
e extra-hospitalares. Estas auditorias monitorizam e reportam a incidência e resultado da
paragem cardíaca, para influenciar a prática clínica e as políticas de saúde. O seu objetivo
é identificar e promover melhorias na prevenção, prestação de cuidados e resultados da
paragem cardíaca.
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
• Os fatores humanos são importantes durante a reanimação.
• Usar SAAR ou CHSP para comunicação eficaz.
• O
relatório de incidentes de segurança e a colheita de dados da paragem
cardíaca ajudam a melhorar os cuidados aos doentes.
25
Capítulo 2
Competências não técnicas e qualidade em reanimação
LEITURA ADICIONAL
• Youngson GG. Teaching and assessing non-technical skills. Surgeon, 2011;9: S35-37.
• Glavin RJ, Maran NJ. Integrating human factors into the medical curriculum. Medical Education.
2003; 37 (supp 1): 59-64.
• Dunn EJ, Mills PD, Neily J, Crittenden MD, Carmack AL, Bagian JP. Medical Training: Applying Crew
Resource Management in Veterans Health Administration. The Joint Commission Journal on Quality
and Patient Safety 2007; 33, 6: 317-325.
• Flin R., O’Conner P, Crichton M. Safety at the Sharp End: A guide to non-technical skills. Aldershot:
Ashgate Publishing, 2008.
• Catchpole K. Towards a Working Definition of Human Factors in Healthcare. www.chfg.org/news-
blog/towards-a-working-definition-of-human-factors-in-healthcare (Last accessed: January 7 2015.)
• Leape LL. Error in medicine. JAMA 1994; 272:1851-1857.
26
Capítulo 3.
Reconhecimento do doente em
deterioração e prevenção da
paragem cardiorrespiratória
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
• a importância do reconhecimento precoce do doente em deterioração
• a s causas da paragem cardiorrespiratória nos adultos
• c omo identificar e tratar doentes em risco de paragem cardiorrespiratória
utilizando a abordagem ABCDE (Via Aérea, Respiração, Circulação, Disfunção
Neurológica, Exposição)
1. Introdução
O reconhecimento precoce do doente em deterioração e a prevenção da paragem cardíaca
constitui o primeiro elo da cadeia de sobrevivência. Uma vez ocorrida a paragem cardíaca
intra-hospitalar, menos de 20 % das vítimas sobreviverão até à alta. A prevenção da
paragem cardíaca intra-hospitalar requer formação do pessoal, monitorização dos doentes,
reconhecimento dos doentes em deterioração, um sistema para pedir ajuda e uma resposta
eficiente.
A maioria das paragens cardiorrespiratórias no hospital não são nem súbitas nem
imprevisíveis: em aproximadamente 80 % dos casos existiram sinais de deterioração clínica
nas horas que antecederam a paragem. Estes doentes têm muitas vezes uma deterioração
lenta e progressiva, nomeadamente com hipóxia e hipotensão (ou seja problemas do ABC)
que passam despercebidos do pessoal clínico ou foram reconhecidos mas tratados de forma
inadequada. O ritmo de paragem cardíaca neste grupo é habitualmente não desfibrilhável
(AEsP ou assistolia) e a taxa de sobrevivência até à alta hospitalar é muito baixa.
27
Capítulo 3
Reconhecimento do doente em deterioração e prevenção da paragem cardiorrespiratória
28
Figura 3.1
Cadeia de Prevenção
o
Mo
nitorizaç d
dido e ajud
ão Pe a 3
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
Tabela 3.1
Exemplo de sistema de pontuação de alerta precoce (PAP) – estes valores servem como guia genérico e
podem variar em populações específicas de doentes.*
* Adaptado de Prytherch et al. ViEWS - Towards a national early warning score for detecting adult in-patient
deterioration. Resuscitation. 2010;81(8):932-7
Pontuação 3 2 1 0 1 2 3
91 - 111 -
Pulso (min-1) ≤ 40 41-50 51-90 ≥ 131
110 130
Frequência res-
≤8 9-11 12-20 21-24 ≥ 25
piratória (min-1)
35.1 - 36.1 - 38.1 -
Temperatura (°C) ≤ 35.0 ≥ 39.1
36.0 38.0 39.0
PA Sistólica
≤ 90 91-100 101-110 111-249 ≥ 250
(mmHg)
Saturação de
≤ 91 92-93 94-95 ≥ 96
Oxigénio (%)
Oxigénio Ar Qualquer
inspirado oxigenoterapia
29
Capítulo 3
Reconhecimento do doente em deterioração e prevenção da paragem cardiorrespiratória
respiratória, pode ajudar a prever uma paragem cardiorrespiratória. Para auxiliar na deteção
precoce do doente crítico, muitos hospitais usam critérios de activação de equipas de
emergência ou sistemas de pontuação de alerta precoces (PAP). Sistemas de pontuação de
alerta precoce definem momentos para avaliação dos sinais vitais com base no seu desvio
dos valores considerados normais. O peso ponderado da pontuação de uma ou mais
observações de sinais vitais, ou o total da PAP, indicam o nível de intervenção necessário,
por exemplo o aumento da frequência da avaliação dos sinais vitais, ou contactar o médico
da enfermaria ou a equipa de reanimação. Um exemplo de um sistema de PAP é mostrado
na tabela 3.1.
Pontuações de alerta precoce são dinâmicas e alteram-se com o tempo pelo que pode
ser necessário aumentar a frequência das avaliações para monitorizar a melhoria ou a
A PAP de um doente é calculada com base na tabela 3.1. Um aumento da pontuação indica
um aumento do risco de deterioração e de morte. Os graus de resposta à pontuação devem
ser definidos por protocolo em cada hospital (Tabela 3.2).
Mesmo quando os médicos são alertados devido a uma condição fisiológica anormal de
um doente, há muitas vezes um atraso na observação do doente ou na sua referenciação
para níveis de cuidados mais elevados.
Qualquer profissional de saúde pode chamar a EEM. O envolvimento precoce da EEM pode
reduzir o número de paragens cardíacas, mortes e admissões não programadas em UCI,
e pode ainda facilitar decisões de limitação de tratamento (p. ex. decisões de não tentar
reanimação [NTR]). As intervenções das equipas de emergência médica envolvem tarefas
simples como iniciar administração de oxigénio ou fluidos intravenosos. Os benefícios do
sistema de EEM está ainda por comprovar.
30
Tabela 3.2
Exemplo de protocolo de escalada de observação baseado em pontuação de alerta precoce (PAP)
Tabela 3.3
Critérios de ativação de Equipa de Emergência Médica (EEM)
31
Capítulo 3
Reconhecimento do doente em deterioração e prevenção da paragem cardiorrespiratória
Todos os doentes em estado crítico devem ser admitidos numa área onde possam
receber a melhor vigilância e o mais elevado grau de suporte de órgãos e de cuidados de
enfermagem. Isto é habitualmente feito numa área de cuidados críticos, por exemplo UCI,
unidade de cuidados intermédios (UCINT) ou sala de reanimação. Os profissionais destas
áreas devem ser médicos e enfermeiros especializados em reanimação avançada e com
competências no cuidado ao doente crítico.
5.
Causas de deterioração e de paragem
cardiorrespiratória
Deterioração e paragem cardiorrespiratória podem ser causadas por problemas primários
da via aérea e/ou respiração e/ou cardiovasculares.
5.1.1. Causas
A obstrução da via aérea pode ser completa ou parcial. A obstrução completa da via aérea
causa rapidamente paragem cardíaca. A obstrução parcial antecede frequentemente
a obstrução completa. A obstrução parcial da via aérea pode causar edema cerebral ou
pulmonar, exaustão, apneia secundária e lesão cerebral por hipóxia e, eventualmente,
paragem cardíaca.
32
Causas de obstrução de via aérea
• Depressão do sistema nervoso central
• Sangue
• Vómito
3
• Corpo estranho (p. ex. dentes, comida)
• Trauma direto da face ou da garganta
• Epiglotite
• Laringospasmo
• Broncospasmo – causando obstrução das vias aéreas de menor calibre
• Secreções brônquicas
• Obstrução de traqueostomia
Em alguns indivíduos, as vias aéreas superiores podem obstruir durante o sono (apneia
obstrutiva do sono). Isto é mais frequente em doentes obesos e a obstrução pode agravar-
se na presença de outros fatores (p. ex. uso de sedativos).
5.1.2. Reconhecimento
Deve avaliar-se a permeabilidade da via aérea em todos os indivíduos com risco de
obstrução. Um doente consciente queixar-se-á de dificuldade em respirar, pode estar
engasgado e estará angustiado. Com uma obstrução parcial da via aérea, os esforços
respiratórios são ruidosos.
33
Capítulo 3
Reconhecimento do doente em deterioração e prevenção da paragem cardiorrespiratória
5.1.3. Tratamento
A prioridade é assegurar que a via aérea permanece permeável. Deve tratar-se qualquer
problema que coloque a via aérea em risco, por exemplo, aspirando sangue ou conteúdo
gástrico das vias aéreas e, exceto se contraindicado, colocando o doente em decúbito
lateral. Deve administrar-se oxigénio logo que possível para atingir uma saturação de
oxigénio arterial, por oximetria de pulso (SpO2) entre 94-98 %. Independentemente da
causa, deve assumir-se que um indivíduo com depressão do nível de consciência tem, ou
irá ter, obstrução da via aérea. Devem por isso tomar-se medidas para salvaguardar a via
aérea e evitar outras complicações, tais como a aspiração de conteúdo gástrico. Isto pode
incluir colocar o doente em decúbito lateral ou com elevação da cabeceira. Podem ser
necessárias manobras simples de desobstrução da via aérea (extensão da cabeça/elevação
5.2.1. Causas
Uma respiração ineficaz pode ser aguda ou crónica. Pode ainda ser contínua ou
intermitente, e suficientemente grave para causar apneia (paragem respiratória), o que
causará rapidamente uma paragem cardíaca. Frequentemente, a paragem respiratória
ocorre devido a uma combinação de fatores; por exemplo, num doente com insuficiência
respiratória crónica, uma infeção respiratória, fraqueza muscular ou fratura das costelas
podem levar à exaustão, deprimindo ainda mais a função respiratória. Se a respiração for
insuficiente para oxigenar adequadamente o sangue (hipoxémia), poderá vir a ocorrer uma
paragem cardíaca.
• Estímulo respiratório
A depressão do sistema nervoso central pode diminuir ou abolir o estímulo respiratório. As
causas são as mesmas que condicionam obstrução da via aérea por depressão do sistema
nervoso central.
• Esforço respiratório
Os principais músculos respiratórios são o diafragma e os músculos intercostais. Estes últimos
são inervados ao nível das costelas respetivas e podem ser paralisados por uma lesão da
medula espinal acima deste nível. A inervação do diafragma dá-se ao nível do terceiro, quarto
e quinto segmentos da medula espinal. Com uma lesão grave da medula cervical acima deste
nível, a ventilação espontânea não é possível.
O esforço respiratório insuficiente, causado por uma fraqueza muscular ou uma lesão
nervosa, verifica-se em muitas doenças (p.ex. miastenia grave, síndrome de Guillain-Barré e
esclerose múltipla). A malnutrição crónica e as doenças graves prolongadas podem também
contribuir para uma fraqueza generalizada.
34
A ventilação pode também ser comprometida por anomalias restritivas da parede torácica
como a cifoscoliose. A dor provocada por costelas ou esterno fraturados não permitem a
respiração profunda ou a tosse.
• Doenças pulmonares
A função pulmonar pode ser comprometida por um derrame pleural muito volumoso,
um hemotórax ou um pneumotórax. Um pneumotórax hipertensivo causa insuficiência 3
rápida nas trocas gasosas, redução do retorno venoso ao coração e diminuição do débito
cardíaco. A doença pulmonar grave compromete também as trocas gasosas. As causas
incluem infeção, aspiração, exacerbação da doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC),
asma, embolia pulmonar, contusão pulmonar, síndrome de dificuldade respiratória aguda
(SDRA) e edema pulmonar.
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
5.2.2. Reconhecimento
Um doente consciente queixar-se-á de falta de ar e estará angustiado. A anamnese e a
observação indiciam, geralmente, a causa subjacente. Hipoxémia e hipercápnia podem
causar irritabilidade, confusão, letargia e diminuição do nível de consciência. Pode ser
visível cianose, mas é um sinal tardio. Uma frequência respiratória rápida (> 25/min) é um
indicador útil e simples de problemas respiratórios. A oximetria de pulso é uma forma
simples e não invasiva de avaliar a adequação da oxigenação (ver capítulo 15).
5.2.3. Tratamento
Deve administrar-se oxigénio a todos os doentes críticos com hipoxémia e tratar a causa
subjacente. O oxigénio deve ser administrado a 15 L/min com uma máscara de alta
concentração com reservatório. Depois de o doente estabilizar, deve mudar-se a máscara
de oxigénio e ter como alvo SpO2 entre 94-98 %. Por exemplo, deve suspeitar-se de um
pneumotórax hipertensivo num doente com história de traumatismo torácico e confirmar
o diagnóstico através de sinais clínicos e sintomas. Se diagnosticado, deve proceder-se à
descompressão imediata inserindo um cateter de grande calibre (14 G) no segundo espaço
intercostal, na linha médio-clavicular (toracocentese com agulha).
Os doentes com dificuldade respiratória ou que comecem a ficar cansados irão necessitar
de suporte ventilatório. A ventilação não invasiva com uma máscara facial ou capacete
pode ser útil para evitar a entubação traqueal e a ventilação mecânica. Nos doentes que
não conseguem respirar adequadamente é necessário sedação, entubação traqueal e
ventilação controlada.
35
Capítulo 3
Reconhecimento do doente em deterioração e prevenção da paragem cardiorrespiratória
5.3.1. Causas
Os problemas circulatórios podem ser causados por uma doença cardíaca primária ou
por anomalias cardíacas secundárias a outros problemas. Os problemas circulatórios em
doentes agudos são mais frequentemente devidos a hipovolémia. Em termos cardíacos
pode ocorrer paragem súbita ou ocorrer um período de débito insuficiente antes da
paragem.
36
5.3.2. Reconhecimento
Os sinais e sintomas de doença cardíaca incluem a dor torácica, dispneia, síncope,
taquicardia, bradicardia, taquipneia, hipotensão, má perfusão periférica (tempo de
preenchimento capilar prolongado), alteração do estado mental e oligúria.
A maioria das mortes súbitas cardíacas (MSC) ocorrem em indivíduos com doença cardíaca 3
pré-existente, mas que pode não ter sido previamente diagnosticada. Apesar do risco ser
maior em doentes com doença cardíaca grave conhecida, a maioria das MSC ocorre em
indivíduos com doença não diagnosticada. A doença cardíaca assintomática ou silenciosa
pode incluir a cardiopatia hipertensiva, doença valvular aórtica, miocardiopatia, miocardite
e a doença coronária.
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37
Capítulo 3
Reconhecimento do doente em deterioração e prevenção da paragem cardiorrespiratória
5.3.3. Tratamento
Deve tratar-se a causa subjacente da insuficiência circulatória. Em muitos doentes, isto significa
a administração de fluidos por via intravenosa para tratar a hipovolémia. Devem despistar-se
uma síndrome coronária aguda (SCA) nos doentes com dor torácica. No Capítulo 4 é feita uma
descrição completa da abordagem da SCA.
A maioria dos doentes com dor cardíaca isquémica ficará mais confortável estando sentados.
Em alguns casos, estar deitado pode provocar dor ou agravá-la. Deve ponderar-se a utilização
de um antiemético, especialmente se existirem náuseas.
O tratamento da causa subjacente deverá prevenir muitas paragens cardíacas secundárias; por
exemplo, uma terapêutica precoce com o intuito de otimizar a perfusão dos órgãos vitais na
sépsis grave diminui o risco de morte.
6. A abordagem ABCDE
38
6. Utilizar todos os membros da equipa. Isso permitirá que as intervenções (p. ex.
avaliação, monitorização, acessos intravenosos) sejam efetuadas em simultâneo.
7. Comunicar eficazmente – utilizar a abordagem SAAR ou CHSP (ver Capítulo 2).
8. O objetivo do tratamento inicial é manter o doente vivo e alcançar alguma melhoria
clínica. Isto permitirá ganhar tempo para tratamentos adicionais e para fazer o
diagnóstico. 3
9. Ter em atenção que podem passar alguns minutos até que o tratamento funcione.
39
Capítulo 3
Reconhecimento do doente em deterioração e prevenção da paragem cardiorrespiratória
40
6.4. Respiração (B)
Durante a avaliação imediata da respiração é essencial diagnosticar e tratar imediatamente
as situações potencialmente fatais como, por exemplo, asma aguda grave, edema pulmonar,
pneumotórax hipertensivo, derrame pleural massivo, rigidez do tórax após queimaduras
torácicas graves e hemotórax massivo.
1. Ver, ouvir e sentir os sinais gerais de dificuldade respiratória: sudorese, cianose 3
central, utilização dos músculos acessórios da respiração e respiração abdominal.
2. Avaliar a frequência respiratória. A frequência normal é 12 a 20 ventilações/min. Uma
frequência respiratória elevada > 25/min ou a aumentar é um marcador de doença e
um sinal de que o doente poderá vir a deteriorar subitamente.
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41
Capítulo 3
Reconhecimento do doente em deterioração e prevenção da paragem cardiorrespiratória
42
6. Palpar o pulso periférico e o central, para avaliação de presença, frequência,
qualidade, regularidade e simetria. Um pulso central difícil de palpar é sugestivo de
débito cardíaco insuficiente enquanto um pulso saltão pode ser indicador de sépsis.
7. Avaliar a pressão arterial do doente. Mesmo em choque, a pressão arterial pode ser
normal, porque os mecanismos compensatórios aumentam a resistência periférica
em resposta à diminuição do débito cardíaco. Uma pressão diastólica baixa sugere
vasodilatação arterial (como em caso de anafilaxia ou sépsis). Uma pressão de pulso 3
estreita (diferença entre as pressões sistólica e diastólica; no normal 35 - 45 mmHg)
sugere vasoconstrição arterial (choque cardiogénico ou hipovolémia) e pode ocorrer
com taquiarritmia.
8. Auscultar o coração. Há sopros ou atrito pericárdico? Os sons cardíacos são difíceis de
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
43
Capítulo 3
Reconhecimento do doente em deterioração e prevenção da paragem cardiorrespiratória
44
6.7. Exposição (E)
Para examinar o doente convenientemente poderá ser necessário expô-lo completamente.
Deve respeitar-se a dignidade do doente e minimizar a perda de calor, durante esse
procedimento.
• A
maior parte dos doentes que sofrem uma paragem cardíaca intra-hospitalar
tiveram sinais e sintomas de alerta antes da paragem.
• O
reconhecimento e tratamento precoce do doente em deterioração permite
prevenir algumas paragens cardiorrespiratórias.
• D
evem utilizar-se estratégias como o sistema de Pontuação de Alerta Precoce
(PAP) para identificar doentes em risco de paragem cardiorrespiratória.
• P
roblemas ao nível da via aérea, respiração e circulação podem provocar
paragem cardiorrespiratória.
45
Capítulo 3
Reconhecimento do doente em deterioração e prevenção da paragem cardiorrespiratória
LEITURA ADICIONAL
• Armitage M, Eddleston J, Stokes T. Recognising and responding to acute illness in adults in hospital:
summary of NICE guidance. BMJ 2007;335:258-9.
• Soar J, et al. European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015. Section 3. Adult
Advanced Life Support. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.016; p99 - p146
• Soar J, Callaway CW, Aibiki M, et al. Part 4: Advanced life support: 2015 International Consensus on
Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care Science With Treatment
Recommendations. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.042; e71 - e122
• DeVita MA, Bellomo R, Hillman K, et al. Findings of the first consensus conference on medical
emergency teams. Crit Care Med. 2006;34:2463-2478.
• DeVita MA, Smith GB, Adam SK, et al. “Identifying the hospitalised patient in crisis”— a consensus
conference on the afferent limb of rapid response systems. Resuscitation 2010;81:375-82.
46
Capítulo 4.
Síndromes coronárias agudas
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
• o processo patológico que provoca as síndromes coronárias agudas
• como distinguir as diferentes síndromes coronárias agudas
• tratamento imediato das síndromes coronárias agudas
• tratamento dos doentes após recuperarem de uma síndrome coronária aguda
1. Introdução
As síndromes coronárias agudas (SCA) incluem:
• angina instável
• enfarte do miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST (EAMsemST)
• enfarte do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (EAMcomST)
Estas síndromes clínicas são parte de um espectro do mesmo processo patológico. Na
grande maioria dos casos, este processo tem início com a fissura de uma placa de ateroma
numa artéria coronária, provocando:
• hemorragia para dentro da placa, causando aumento do seu volume e restringindo
o lúmen da artéria;
• contração do músculo liso da parede arterial, provocando constrição adicional do
lúmen;
• formação de trombos na superfície da placa, que podem causar obstrução parcial
ou completa do lúmen da artéria, ou embolia distal.
O grau de influência que estes eventos têm na diminuição do fluxo de sangue para o
miocárdio determina largamente as características clínicas da SCA que daí resulta.
47
Capítulo 4
Síndromes coronárias agudas
48
1.2. Enfarte agudo do miocárdio sem supradesnivelamento ST
(EAMsemST)
O enfarte agudo do miocárdio apresenta-se geralmente como uma dor torácica sentida
sob a forma de peso, aperto ou desconforto tipo indigestão, no tórax ou no abdómen
superior, que habitualmente se mantém durante pelo menos 20-30 min e, frequentemente
mais tempo. A dor/desconforto torácico irradia frequentemente para a garganta, para
um ou ambos os braços, para as costas ou para o epigastro. Alguns doentes sentem
maioritariamente o desconforto numa ou mais destas zonas e não no tórax; este é por 4
vezes acompanhado de eructações o que pode levar à interpretação de ser uma indigestão
a causa do desconforto.
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Quando os doentes têm dor torácica sugestiva de EAM, há indicação de lesão miocárdica
pela presença no ECG de alterações inespecíficas, tais como depressão horizontal ou
descendente do segmento ST ou inversão da onda T (Figuras 4.1 e 4.2), ou por vezes, um
ECG normal e exames laboratoriais que mostram libertação de troponina (com ou sem
concentrações plasmáticas elevadas de enzimas cardíacas). Este quadro é conhecido como
EAMsemST. Nesta situação é menos provável que tenha havido oclusão súbita e completa
da artéria “culpada” do que no EAM com supradesnivelamento ST (EAMcomST).
Estes achados indicam quase sempre lesão do miocárdio em evolução por oclusão aguda
completa da artéria coronária “culpada” (após rutura inicial da placa). Se não for tratada,
é provável que a lesão do miocárdio aumente na área da artéria ocluída, o que se reflete
geralmente no ECG com o aparecimento de ondas Q e perda de amplitude das ondas R.
Durante a fase aguda do EAMcomST existe um risco substancial de taquicardia ventricular
(TV), fibrilhação ventricular (FV) e morte súbita (figura 4.3).
49
Capítulo 4
Síndromes coronárias agudas
A observação pode identificar outras alterações importantes (p. ex. sopro cardíaco ou sinais
de insuficiência cardíaca) que podem influenciar a investigação e as escolhas terapêuticas.
Em doentes com dor torácica aguda lembrar também de pesquisar dissecção da aorta,
especialmente se se planeia tratar com fibrinolíticos. A dissecção da aorta pode ser sugerida
por sinais físicos, como perda de pulso ou assimetria dos pulsos nos membros superiores,
regurgitação aórtica aguda ou sinais de AVC por envolvimento da artéria carótida. Suspeitar de
dissecção da aorta nos doentes com dor torácica acompanhada de hipotensão marcada sem
evidência óbvia de EAM no ECG. No entanto, num doente com uma boa história e evidência
característica de EAMcomST no ECG, não se deve adiar a terapêutica de reperfusão na ausência
de evidência clínica sólida que justifique a exclusão prévia de dissecção da aorta.
A observação inicial também serve para estabelecer valores basais, para que possam ser
detetadas as alterações por progressão da doença subjacente ou em resposta à terapêutica.
Suspeitar também de enfarte extenso do ventrículo direito (VD) em doentes com EAMcomST
inferior ou posterior que apresentem pressão venosa jugular elevada mas sem evidência de
edema pulmonar. O sinal de Kussmaul pode ser positivo (aumento da PVJ à inspiração). É
frequente estes doentes estarem hipotensos.
50
Figura 4.1
ECG de 12 derivações com infradesnivelamento ST agudo provocado por isquemia miocárdica num
doente com SCA sem supradesnivelamento ST
I aVR V1 V4
4
II aVL V2 V5
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III aVF V3 V6
RHYTHM STRIP: II
25 mm/sec: 1 cm / mV
Figura 4.2
ECG de 12 derivações com inversão de ondas T num doente com EAMcomST
I aVR V1 V4
II aVL V2 V5
III aVF V3 V6
RHYTHM STRIP: II
25 mm/sec: 1 cm / mV
51
Capítulo 4
Síndromes coronárias agudas
Figura 4.3
ECG de 12 derivações com o início de FV num doente com EAMcomST ântero-septal
I aVR V1 V4
II aVL V2 V5
RHYTHM STRIP: II
25 mm/sec: 1 cm / mV
Figura 4.4
ECG de 12 derivações com EAMcomST ântero-lateral
I aVR V1 V4
II aVL V2 V5
III aVF V3 V6
RHYTHM STRIP: II
25 mm/sec: 1 cm / mV
52
Figura 4.5
ECG de 12 derivações com EAMcomST inferior
I aVR V1 V4
II aVL V2 V5 4
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
III aVF V3 V6
RHYTHM STRIP: II
25 mm/sec: 1 cm / mV
Figura 4.6
ECG de 12 derivações com EAMcomST posterior
I aVR V1 V4
II aVL V2 V5
III aVF V3 V6
RHYTHM STRIP: II
25 mm/sec: 1 cm / mV
53
Capítulo 4
Síndromes coronárias agudas
As precordiais direitas devem ser obtidas em todos os doentes com EAMcomST inferior de
forma a detetar extensão do enfarte ao ventrículo direito. A depressão isolada de ST ≥ 0.05 mV
nas derivações V1-V3 representa EAMcomST na porção ínfero-basal do coração, o qual pode
ser confirmado pela elevação do segmento ST nas derivações posteriores (V7-V9). O ECG pré-
hospitalar ou no SU é diagnóstico quando interpretado por profissionais treinados.
Se a interpretação do ECG pré-hospitalar não puder ser feita no local, é aceitável fazer a
interpretação computorizada ou a transmissão remota. Obter e transmitir um ECG com
qualidade diagnóstica demora habitualmente menos de 5 minutos. Quando a interpretação
computorizada é utilizada, esta pode aumentar a especificidade no diagnóstico de
EAMcomST quando comparado com clínicos inexperientes na leitura de ECG. Este benefício
está dependente da acuidade do relatório automático; relatórios incorretos podem induzir em
erro profissionais inexperientes. Assim sendo, a interpretação computorizada do ECG deve ser
um auxílio, mas não deve substituir a interpretação por um clínico experiente
54
2.2.2. Biomarcadores
Na ausência de supradesnivelamento ST no ECG, a presença de história sugestiva e
concentrações elevadas de biomarcadores (troponinas, CK e CKMB) são características do
EAMsemST, e distinguem esta entidade do EAMcomST e da angina instável, respetivamente.
A determinação de troponina cardíaca é usada de rotina pela sua maior sensibilidade e
especificidade. Concentrações elevadas de troponina são particularmente úteis por
identificarem doentes com maior risco.
Não é recomendado usar hs-cTn às 0 e 2 horas como medida única de exclusão de SCA,
definido como < 1 % de eventos adversos cardiovasculares major nos 30 dias seguintes. A hs-
cTn negativa às 0 e 2h pode ser usada para excluir SCA em conjunto com uma estratificação
de baixo risco (pontuação 0 ou 1 na escala de risco TIMI). Também a troponina regular pode
ser utilizada para excluir SCA, sendo medida às 0 e 3-6 horas e enquadrada em conjunto
com estratificação de muito baixo risco (pontuação 0 na escala de Vancouver ou pontuação
0 na escala na escala North American Chest Pain Rule e idade < 50 anos).
55
Capítulo 4
Síndromes coronárias agudas
Além disto, podem ser identificados diagnósticos diferenciais como dissecção da aorta,
3. Avaliação de risco
A escolha do tratamento é amplamente determinada pela extensão da lesão do miocárdio
e pelo risco precoce de novos episódios coronários.
Os sistemas de pontuação mais usados são o GRACE (Global Registry of Acute Coronary Events)
e o TIMI (Thrombolysis In Myocardial Infarction). Numa meta-análise recente, apenas o TIMI
e o GRACE foram validados em múltiplos contextos clínicos, com o GRACE a demonstrar
melhor desempenho.
Não se pode excluir com segurança uma SCA com base apenas numa avaliação isolada,
mesmo se antecedentes pessoais, exame físico, ECG e troponina forem normais. É necessária
uma reavaliação posterior para fazer um diagnóstico e tomar decisões terapêuticas.
56
4. Tratamento imediato
VD
• o alívio da dor é muito importante pelo que deve ser administrada morfina
intravenosa (ou diamorfina), titulada para controlar os sintomas, evitando, no
entanto, sedação e depressão respiratória
• ponderar terapêutica antitrombótica com heparina não fracionada (HNF), heparinas
de baixo peso molecular (HBPM) ou com fondaparinux
A maioria dos doentes com dor isquémica cardíaca sentir-se-á mais confortável com o
tronco elevado. Nalguns casos, estar deitado pode provocar ou agravar a dor. Se o doente
tiver náuseas, administrar um antiemético com os opióides.
A relação risco/benefício para a terapêutica de reperfusão é-lhe favorável nos doentes com
maior risco de lesão major imediata do miocárdio e morte.
4.3. Oxigénio
Os doentes com dor torácica aguda suspeita de poder corresponder a SCA não precisam de
oxigénio suplementar a menos que apresentem sinais de hipóxia, dispneia ou insuficiência
cardíaca. Existe evidência crescente que a hiperóxia (excesso de oxigénio) pode ser prejudicial
57
Capítulo 4
Síndromes coronárias agudas
nos doentes com enfarte de miocárdio não complicado. Na SCA complicada de PCR, desenvolve-
se rapidamente hipóxia. A lesão cerebral isquémica é um dos principais determinantes da
sobrevivência com funções neurológicas intactas. Assim, é essencial uma oxigenação adequada
durante a RCP. Após RCE, devem-se evitar hipóxia e hiperóxia (mais detalhes em cuidados pós-
reanimação). Deve-se usar 100 % de oxigénio inspirado até se obter uma medição fiável da
saturação arterial de oxigénio. Posteriormente, deve-se titular o oxigénio inspirado para obter
uma saturação periférica entre 94-98 %.
• Podem ser administrados fibrinolíticos para tentar dissolver o trombo que, ao ter
ocluído a artéria, desencadeou o EAM.
58
Quando não existe ICP-P imediatamente disponível, a necessidade de alcançar reperfusão
logo que possível continua a ter prioridade elevada e para esses doentes o tratamento
inicial com fibrinolíticos pode ser a melhor hipótese de se alcançar reperfusão precoce.
O tempo até à ICP-P pode ser encurtado de forma significativa por uma melhoria dos
sistemas de saúde:
• Deve-se adquirir e interpretar um ECG pré-hospitalar assim que possível. Isto reduz
a mortalidade tanto em doentes que vão ser submetidos a ICP-P como a fibrinólise.
• O reconhecimento do EAMcomST pode ser feito por transmissão do ECG ou então 4
por interpretação no local, por médicos ou enfermeiros ou paramédicos com treino
específico, com ou sem recurso a interpretação informatizada.
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
59
Capítulo 4
Síndromes coronárias agudas
Tabela 4.1
Indicações para reperfusão imediata no EAM
60
O tratamento com fibrinolíticos acarreta risco de hemorragia, incluindo hemorragia
cerebral, e nem todos os doentes podem ser medicados com esta terapêutica em segurança.
A tabela 4.1 enumera as indicações típicas para terapêutica de reperfusão, enquanto as
contraindicações para os fibrinolíticos podem ser vistas na Tabela 4.2. A maioria destas
contraindicações são relativas; um médico experiente será capaz de decidir se o benefício
do tratamento com fibrinolíticos ultrapassa o risco para cada doente individual ou se a
angiografia de emergência com vista a ICP primária é mais adequada.
A figura 4.7 descreve as opções para terapêutica de reperfusão no EAMcomST sob a forma
de algoritmo. 4
fibrinolítica
61
Capítulo 4
Síndromes coronárias agudas
• Clopidogrel
O clopidogrel melhora o prognóstico quando administrado nas SCAsemST de risco elevado,
para além de heparina e AAS. Em estratégia conservadora, utiliza-se dose de carga de
300 mg; se está planeada estratégia invasiva com ICP, é preferível uma dose inicial de 600
mg. Não existem estudos de grande dimensão sobre o pré-tratamento com clopidogrel,
quando comparado com a sua administração apenas peri-intervenção – tanto com dose de
300 mg como de 600 mg.
• Prasugrel
O prasugrel (dose de carga 60 mg) apenas pode ser administrado em SCAsemST após
coronariografia com documentação de estenoses passíveis de ICP. Devem ter-se em
atenção as contraindicações (história prévia de AVC/AIT) e o balanço risco-benefício em
doente com risco hemorrágico elevado (peso < 60 kg, idade > 75 anos).
• Ticagrelor
De acordo com as últimas recomendações da ESC, o ticagrelor deve ser administrado a
todos os doentes com SCAsemST de risco moderado ou elevado, quer esteja planeada ou
não uma estratégia invasiva. Quando se opta por estratégia conservadora nas SCAsemST,
deve-se administrar ticagrelor ou clopidogrel assim que se confirma o diagnóstico. Quando
a estratégia inicial é ICP, não existe evidência suficiente para recomendar a favor ou contra
o pré-tratamento com estes fármacos.
62
4.7. Tratamento da angina instável e EAMsemST
Está recomendada em doentes com SCAsemST a anticoagulação parentérica na altura
do diagnóstico, além dos antiagregantes plaquetares, porque reduz a taxa de eventos
cardiovasculares major.
Figura 4.7
Acesso à terapêutica de reperfusão no EAMcomST
4
EAMcomST
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
Ambulância ou
hospital sem ICP
Falhada Bem
sucedida
ICP de resgate
ICP primária (Imediata – pode
(imediata) precisar de trans- Angiografia ± ICP
ferência emergente (durante o mesmo
para hospital com internamento)
ICP 24/7)
63
Capítulo 4
Síndromes coronárias agudas
Os doentes com EAMsemST devem ser considerados como grupo de alto risco, com
indicação na maioria dos casos para coronariografia precoce no mesmo internamento
hospitalar, idealmente no prazo de 72 h.
Muitos doentes nestes dois grupos podem beneficiar da revascularização por ICP; alguns
poderão necessitar de bypass coronário (CABG).
Os sistemas formais de avaliação de risco como o GRACE (Global Registry of Acute Coronary
Events) devem ser utilizados para orientar a abordagem clínica. Os doentes com risco mais
elevado obtêm os maiores benefícios de uma intervenção precoce no que se refere à
diminuição da recorrência de episódios cardíacos major.
5.3. EAMcomST
Quando é utilizada fibrinólise, muitos doentes podem manter ainda uma estenose grave
ou placa instável na artéria coronária “culpada”. A ICP pode estabilizar esta situação e
diminuir o risco de nova oclusão da artéria e de outros enfartes do miocárdio, paragem
cardíaca ou morte súbita. A coronariografia e, quando indicada, a ICP devem ser efetuadas
precocemente durante o mesmo internamento.
Em doentes com EAMcomST que não tenham sido tratados com terapêutica de reperfusão
(p. ex. por apresentação tardia) é normal recomendar-se que sejam submetidos a
coronariografia durante o mesmo internamento. Apesar dos benefícios de reabrir
tardiamente uma artéria ocluída envolvida após EAMcomST serem duvidosos, há
frequentemente doença noutros vasos coronários que pode provocar eventos coronários
major nos meses subsequentes. Caracterizar a gravidade e a anatomia dessa doença pode
ajudar a identificar os doentes com risco mais elevado, nos quais a intervenção precoce
pode diminuir o risco.
64
rritmia ventricular como complicação de síndromes coronárias
5.4. A
agudas
Quando uma arritmia ventricular vem complicar uma síndrome coronária aguda, o seu
significado deve ser interpretado de acordo com o contexto clínico preciso e com o momento
em que ocorreu. Quando ocorre paragem cardíaca com FV/TVsP nas primeiras 24-48 h
após EAMcomST e a recuperação subsequente não é complicada, o risco de nova arritmia
ventricular é relativamente baixo, sendo determinado por outros fatores, especialmente
pela gravidade da disfunção ventricular esquerda. Se a paragem cardíaca com FV/TVsP 4
ocorrer no contexto de SCA sem supradesnivelamento do segmento ST, pode haver risco
mantido de nova arritmia ventricular. Se a arritmia tiver sido provocada por isquemia grave
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
Doentes com paragem cardíaca em FV/TVsP como complicação tardia após enfarte do
miocárdio, ou fora do contexto de SCA, estão em risco de paragem cardíaca recorrente e
devem ser observados urgentemente por um arritmologista para que lhes seja colocado um
CDI antes da alta hospitalar.
Estudos observacionais indicam que os melhores resultados após PCEH se obtêm com uma
combinação de controlo de temperatura e ICP, que podem ser combinados num protocolo
pós-paragem cardíaca para melhorar a sobrevivência com funções neurológicas intactas.
65
Capítulo 4
Síndromes coronárias agudas
66
doentes quando chegam a ter alta hospitalar. A estratégia invasiva precoce (i. e. ICP
primária ou ICP precoce após fibrinólise) está indicada nos doentes que são candidatos a
revascularização. Mesmo que se utilize habitualmente, não existe evidência que suporte a
utilização de balão intra-aórtico no choque cardiogénico.
67
Capítulo 4
Síndromes coronárias agudas
68
A cardioversão elétrica ou desfibrilhação é a intervenção de escolha para terminar
em arritmias ventriculares em doentes com síndromes coronárias agudas (SCA). A
administração precoce de bloqueadores beta (possivelmente IV) ajuda a prevenir
recorrência de arritmias. A terapêutica antiarrítmica com amiodarona deve ser
ponderada apenas se existirem episódios frequentes de TV ou FV e que já não
se controlam por desfibrilhação ou cardioversão elétrica sucessiva. A lidocaína
intravenosa pode ser utilizada em casos recorrentes de TV mantida ou FV que não
responde a bloqueadores beta ou amiodarona, ou quando há contraindicações à
amiodarona. A TV polimórfica recorrente que degenera em FV pode responder a
bloqueadores beta. A sedação profunda pode ser útil, de forma adicional, para 4
reduzir os episódios de TV ou FV. A utilização de outros fármacos em SCA (p. ex.
procainamida, propafenona, ajmalina, flecainida) não é recomendada.
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
• A
s síndromes coronárias agudas incluem angina instável, enfarte do miocárdio
sem supradesnivelamento do segmento ST e enfarte do miocárdio com
supradesnivelamento do segmento ST.
• D
eve-se administrar aspirina, nitroglicerina e morfina aos doentes que se
apresentem com síndromes coronárias agudas.
• U
ma avaliação inicial rápida com história, observação e ECG de 12 derivações
ajudará a determinar o diagnóstico e o risco imediato.
• C
onsiderar terapêutica de reperfusão imediata nos doentes com enfarte agudo
do miocárdio acompanhado por supradesnivelamento do segmento ST ou BRE
de novo.
• A
avaliação eficaz e o tratamento imediato dos doentes com síndromes
coronárias agudas diminuem o risco de paragem cardíaca e morte.
69
Capítulo 4
Síndromes coronárias agudas
LEITURA ADICIONAL
• Nikolaou N. et al, European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015 Section 8. Initial
management of acute coronary syndromes 10.1016/j.resuscitation.2015.07.030; p263 - p276
• Nikolaou N, Welsford M, Beygui F, et al. Part 5: Acute coronary syndromes: 2015 International
Consensus on Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care Science With
Treatment Recommendations. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.043; e123 - e148
• Bassand JP, Hamm CW, Ardissino D, et al. Guidelines for the diagnosis and treatment of non-ST-
segment elevation acute coronary syndromes. Eur Heart J 2007;28:1598-660. www.escardio.org
• Department of Health 2008. Treatment of Heart Attack National Guidance. Final Report of the
National Infarct Angioplasty Project (NIAP). www.dh.gov.uk
• Silber S, Albertsson P, Aviles FF, et al. The Task Force for Percutaneous Coronary Interventions of
the European Society of Cardiology. Guidelines for Percutaneous Coronary Interventions. European
70
Capítulo 5.
Reanimação intra-hospitalar
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
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1. Introdução
Após uma paragem cardíaca intra-hospitalar, a divisão entre o suporte básico de vida e o
suporte avançado de vida é arbitrária; na prática, o processo de reanimação é um contínuo.
A comunidade leiga espera que o corpo clínico seja capaz de executar manobras de
reanimação cardiopulmonar (RCP). Para todas as paragens cardíacas intra-hospitalares,
deve-se garantir que:
• a paragem cardiorrespiratória é reconhecida de imediato
• é pedido auxílio através de um número de telefone padronizado
• a RCP é iniciada de imediato e, se indicado, é tentada desfibrilhação logo que
possível (dentro de 3 minutos, no máximo).
Este capítulo destina-se principalmente aos profissionais de saúde que constituem a
primeira resposta em caso de paragem cardíaca intra-hospitalar, mas também se pode
aplicar a profissionais de saúde que exerçam a sua atividade noutros contextos clínicos.
2. P
orque é que a reanimação intra-hospitalar é
diferente?
A sequência exata de ações no caso de paragem cardíaca intra-hospitalar depende de
diversos fatores, que incluem:
• localização (áreas clínicas/não clínicas; áreas monitorizadas/não monitorizadas)
• competências dos primeiros profissionais envolvidos
• número de profissionais
• equipamento disponível
71
Capítulo 5
Reanimação intra-hospitalar
2.1. Localização
Nos doentes sob vigilância apertada, a paragem cardiorrespiratória é geralmente
identificada com rapidez. Por outro lado, os doentes que se encontram em áreas sem
esta possibilidade de monitorização podem ter um período de deterioração e sofrer
uma paragem não presenciada. Todos os doentes de elevado risco de paragem cardíaca
deverão ser assistidos numa área monitorizada, onde esteja disponível equipamento para
reanimação imediata. Os doentes, visitantes ou funcionários podem também sofrer uma
paragem cardíaca em áreas não clínicas (p. ex. parques de estacionamento, corredores). As
Uma revisão do Resuscitation Council (UK) sobre incidentes de segurança graves associados
à RCP e deterioração do estado clínico dos doentes, reportados à National Patient Safety
Agency, mostrou que são frequentes os problemas relacionados com o equipamento
(p. ex. falta ou falha do equipamento). Todos os equipamentos de reanimação devem
72
ser verificados regulamente, de forma a garantir que estão prontos a utilizar. Deve ser
ponderada a colocação de DAE, em áreas clínicas e não clínicas, onde os profissionais
não tenham competências para reconhecimento de ritmos ou raramente utilizem um
desfibrilhador.
Após uma reanimação bem-sucedida, os doentes poderão precisar de ser transferidos para
outra área clínica (p. ex. unidade de cuidados intensivos) ou para outros hospitais. Para
que isso seja possível, deverão estar disponíveis equipamentos de transferência e fármacos.
Estes deverão incluir capnografia para os doentes com intubação traqueal e ventilados (ver
capítulo 7).
5
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Figura 5.1
Algoritmo de reanimação intra-hospitalar
Doente colapsado/crítico
RCP 30:2
com oxigénio e
adjuvantes da via aérea
Chamar equipa de
reanimação se indicado
Aplicar placas/monitor
Tentar desfibrilhação, se
indicado
73
Capítulo 5
Reanimação intra-hospitalar
74
• Tomar cuidado com doentes expostos a tóxicos. Evitar ventilação boca-a-boca
e ar exalado em envenenamentos por cianeto de hidrogénio ou por sulfito de
hidrogénio.
• Evitar o contato com químicos corrosivos (p. ex. ácidos fortes, alkali, paraquato) ou
com substâncias tais como os organofosforados, que são facilmente absorvidos
através da pele ou das vias respiratórias.
• Não existem relatos de infeções adquiridas durante treino de RCP. Contudo, devem
ser tomadas precauções de forma a minimizar potenciais infeções cruzadas a partir
dos manequins. Devem limpar-se os manequins regularmente, e desinfetá-los
minuciosamente após cada utilização. Para simplificar a limpeza, alguns manequins
5
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
Figura 5.2
Abanar e gritar
3.3 A. Se há resposta
• É necessária avaliação médica urgente. Pedir ajuda de acordo com os protocolos
institucionais, o que pode significar ativar a equipa de reanimação (p. ex. EEM).
• Enquanto se espera pela equipa, deve-se avaliar o doente através da abordagem
ABCDE (Via aérea, Respiração, Circulação, Disfunção neurológica, Exposição).
75
Capítulo 5
Reanimação intra-hospitalar
Figura 5.4
Pesquisa de respiração e qualquer outro movimento
76
3.3 B. Se não há resposta
• A sequência exata vai depender do treino e experiência na avaliação da respiração e
circulação em doentes críticos. Respiração agónica (ventilações ineficazes ocasionais,
respiração lenta, difícil ou ruidosa) é frequente nas fases iniciais da paragem cardíaca,
e é um sinal de paragem cardíaca, pelo que não deve ser confundida com um sinal
de vida.
Mantendo a via aérea permeável, ver, ouvir e sentir (figura 5.4) para determinar se a vítima
respira normalmente. Este exame é rápido, e deverá demorar menos de 10 segundos
(ventilações ineficazes ocasionais, respiração lenta, difícil ou ruidosa não constituem
respiração normal):
-- Ver se existem movimentos torácicos
-- Ouvir junto da boca da vítima se existem sons respiratórios
-- Sentir, na face, se sai ar da boca da vítima
• Procurar sinais de circulação:
-- Pode ser difícil ter a certeza que não há pulso. Se o doente não tiver sinais de
vida (consciência, movimentos intencionais, respiração normal ou tosse), ou
em caso de dúvida, começar RCP de imediato até à chegada de ajuda mais
diferenciada, ou até que o doente tenha sinais de vida.
-- É improvável que seja prejudicial realizar compressões torácicas num doente
com batimento cardíaco espontâneo. Por outro lado, os atrasos no diagnóstico
de paragem cardíaca e no início de RCP irão afetar desfavoravelmente a
sobrevivência, e devem ser evitados.
77
Capítulo 5
Reanimação intra-hospitalar
3.4 B. Se o doente não tiver sinais de vida e/ou não tiver pulso palpável
• Um profissional inicia RCP enquanto outros chamam a equipa de reanimação e
reúnem o equipamento de reanimação e o desfibrilhador. Se estiver apenas um
elemento sozinho, terá de abandonar o doente para o fazer.
• Fazer 30 compressões torácicas seguidas de 2 ventilações.
78
• Comprimir a uma profundidade de aproximadamente 5 cm, mas não mais de 6 cm.
• As compressões torácicas devem ser realizadas a uma frequência de 100–120 por
minuto
• Permitir que o tórax descomprima completamente após cada compressão; não se
deve manter o nosso corpo “apoiado” no tórax.
• Minimizar as interrupções, e garantir compressões de elevada qualidade.
• A realização de compressões torácicas de elevada qualidade por um período
prolongado é cansativa; deve-se tentar alternar o elemento que realiza compressões
torácicas a cada 2 minutos; minimizando as interrupções.
5
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
79
Capítulo 5
Reanimação intra-hospitalar
80
Figura 5.6
Chamar a equipa de reanimação
5
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
Figura 5.7
Posição das mãos para as compressões torácicas
81
Capítulo 5
Reanimação intra-hospitalar
Figura 5.8
Mãos colocadas no meio da metade inferior do esterno
82
3.4 C. Se não está a respirar e tem pulso (paragem respiratória)
• Ventilar os pulmões do doente (como acima descrito) e verificar o pulso a cada 10
ventilações (aproximadamente a cada 1 minuto).
• O diagnóstico de paragem respiratória só pode ser feito se estiver confiante para
avaliar a respiração e o pulso do doente, ou se o doente apresentar outros sinais de
vida (p. ex. quente e bem perfundido, preenchimento capilar normal).
• Se existirem dúvidas acerca da presença de pulso, devem iniciar-se as compressões
torácicas até à chegada de ajuda diferenciada.
• Todos os doentes em paragem respiratória irão sofrer paragem cardíaca, se esta não
for tratada rápida e eficazmente.
5
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
• A
sequência exata de ações após paragem cardíaca intra-hospitalar depende
da localização, das competências dos primeiros profissionais envolvidos, do
número de profissionais, do equipamento disponível e do sistema hospitalar de
resposta à paragem cardíaca e às emergências médicas.
• R
ealizar compressões torácicas de elevada qualidade. Comprimir a uma
profundidade de cerca de 5 cm, mas não mais de 6 cm, ritmo de 100-120/min,
permitindo que o tórax descomprima totalmente entre compressões.
• M
inimizar as interrupções das compressões torácicas para outras intervenções
– isto significa que todas as interrupções devem ser planeadas antes de parar as
compressões.
83
Capítulo 5
Reanimação intra-hospitalar
LEITURA ADICIONAL
• Soar J, et al. European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015. Section 3.
Adult Advanced Life Support. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.016; p99 - p146
• Soar J, Callaway CW, Aibiki M, et al. Part 4: Advanced life support: 2015 International Consensus on
Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care Science With Treatment
Recommendations. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.042; e71 - e122
• Sandroni C, D’Arrigo S, Antonelli M. Rapid response systems: are they really effective? Crit Care
2015;19:104
• Nolan JP, Soar J, Smith GB, et al. Incidence and outcome of in-hospital cardiac arrest in the United
Kingdom National Cardiac Arrest Audit. Resuscitation 2014;85:987-92.
• Nolan JP, Soar J, Smith GB, et al. Incidence and outcome of in-hospital cardiac arrest in the United
Kingdom National Cardiac Arrest Audit. Resuscitation 2014;85:987-92.
84
Capítulo 6
Algoritmo de Suporte Avançado
de Vida
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
• a função do algoritmo de suporte avançado de vida (SAV)
• a importância de compressões torácicas de elevada qualidade, minimizando as
interrupções
• o tratamento de ritmos desfibrilháveis e não desfibrilháveis
• quando e como administrar fármacos durante uma paragem cardíaca
• as causas potencialmente reversíveis de paragem cardíaca
1. Introdução
Os ritmos cardíacos associados a paragens cardíacas dividem-se em dois grupos: os
desfibrilháveis (fibrilhação ventricular/taquicardia ventricular sem pulso [FV/TVsP]) e os
não desfibrilháveis (assistolia e atividade elétrica sem pulso [AEsP]). A principal diferença na
abordagem a estes dois grupos de arritmias é a necessidade de tentar a desfibrilhação em
doentes com FV/TVsP. As ações subsequentes, incluindo compressões torácicas, abordagem
da via aérea e ventilação, acessos venosos, injeção de adrenalina e a identificação e correção
de fatores reversíveis, são comuns a ambos os grupos.
O algoritmo de SAV (figura 6.1) é uma abordagem padronizada da paragem cardíaca. Esta
tem a vantagem de permitir que o tratamento seja efetuado de forma expedita, sem
discussões demoradas. Permite que cada membro da equipa de reanimação antecipe e
prepare a etapa seguinte do tratamento do doente, aumentando assim a eficiência da
equipa. Apesar do algoritmo de SAV ser aplicável à maioria das paragens cardíacas, podem
estar indicadas intervenções adicionais para paragens cardíacas causadas por circunstâncias
especiais (ver capítulo 12).
85
Capítulo 6
Algoritmo de Suporte Avançado de Vida
86
13. Se a FV/TVsP persistir, repetir os passos 6-8 descritos acima e aplicar um terceiro
choque. Sem reavaliar o ritmo ou procurar sentir o pulso, retomar RCP (30:2)
imediatamente após o choque, começando pelas compressões torácicas.
14. Se já se tiver conseguido um acesso IV/IO, durante os 2 minutos seguintes de RCP
administrar 1 mg de adrenalina e 300 mg de amiodarona.
15. A utilização de capnografia pode permitir detetar RCE sem pausas nas compressões
torácicas, e pode ser usada como um modo de evitar a administração de um bólus
de adrenalina após se ter obtido o RCE. Se se suspeita de RCE durante a RCP, protelar
a adrenalina e administrar apenas se se confirmar paragem cardíaca na próxima
avaliação de ritmo.
16. Administrar 1 mg de adrenalina IV após choques alternados (i. e., na prática, uma vez
a cada dois ciclos do algoritmo)
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
Figura 6.1
Aplicação de choques 6
87
Capítulo 6
Algoritmo de Suporte Avançado de Vida
Figura 6.2
Algoritmo de suporte avançado de vida no adulto
RCP 30:2
Ligar o monitor/desfibrilhador
Minimizar interrupções
1 Choque
Restabelecimento de
Minimizar as
circulação espontânea
interrupções
n Controlo de temperatura
88
O intervalo entre a suspensão das compressões e a administração de um choque tem
de ser minimizado e, idealmente, não deve exceder 5 s. Interrupções mais prolongadas
das compressões torácicas reduzem a probabilidade do choque restabelecer a circulação
espontânea.
Se não se obteve RCE com este 3º choque, a administração de adrenalina pode melhorar o 6
fluxo sanguíneo miocárdico e aumentar a probabilidade de desfibrilhação bem-sucedida
com o choque seguinte. Apesar da utilização generalizada da adrenalina na reanimação,
não existe nenhum estudo controlado com placebo que mostre que a utilização por rotina
de qualquer vasopressor, em qualquer fase da paragem cardíaca no humano, aumente
a sobrevivência livre de lesões neurológicas à data da alta hospitalar. A evidência atual é
insuficiente para suportar ou refutar a utilização por rotina de qualquer fármaco específico
ou sequência de fármacos. Apesar da ausência de dados em humanos, a utilização de
adrenalina continua a ser recomendada, maioritariamente com base em dados de estudos
animais e no aumento de sobrevivência a curto prazo no homem.
89
Capítulo 6
Algoritmo de Suporte Avançado de Vida
Figura 6.3
Administração de choques
Quando o ritmo é verificado 2 min após a administração do choque, se existe um ritmo não
desfibrilhável e se o ritmo é organizado (complexos regulares ou estreitos), deve-se tentar
palpar o pulso central e procurar outras evidências de RCE (p. ex. aumento súbito no ETCO2
ou evidência de débito cardíaco num equipamento de monitorização invasiva). A avaliação
de ritmo deve ser breve, e a verificação do pulso só deve ser feita quando se observa um
ritmo organizado. Se for visualizado um ritmo organizado durante o período de 2 min de
RCP, não se devem interromper as compressões torácicas para palpar o pulso a não ser que
o doente mostre sinais de vida sugestivos de RCE. Em caso de dúvida sobre a existência de
pulso num ritmo organizado, reiniciar a RCP. Se o doente tiver RCE, iniciar cuidados pós-
reanimação. Se o ritmo do doente mudar para assistolia ou AEsP, ver abaixo os ritmos não
desfibrilháveis.
Se houver dúvidas acerca do ritmo ser assistolia ou FV muito fina, não se deve tentar
desfibrilhar; em vez disso, continuar com compressões torácicas e ventilações. A FV muito
fina, que é difícil de distinguir de assistolia, tem poucas probabilidades de ser desfibrilhada
com sucesso para um ritmo com perfusão. A continuação de RCP de elevada qualidade pode
90
melhorar a amplitude e a frequência da FV, e aumentar a probabilidade da desfibrilhação
subsequente resultar num ritmo com perfusão. A aplicação de choques repetidos na
tentativa de desfibrilhar o que se pensa ser uma FV muito fina vai aumentar a lesão do
miocárdio, tanto diretamente pela corrente elétrica, como indiretamente pelas interrupções
no fluxo miocárdico. Se o ritmo for manifestamente de FV, então tentar a desfibrilhação.
cubital do punho bem cerrado, aplicar um impacto seco na metade inferior do esterno
desde uma altura de cerca de 20 cm, e recolher o punho de imediato para criar um estímulo
semelhante a um impulso. Há casos descritos, raros, de um murro pré-cordial ter convertido 6
um ritmo compatível com perfusão num ritmo não compatível.
91
Capítulo 6
Algoritmo de Suporte Avançado de Vida
podem ser tratadas (ver abaixo). A sobrevivência após uma paragem cardíaca em assistolia
ou AEsP é improvável, exceto se for encontrada uma causa reversível e tratada de forma
rápida e eficaz.
92
Sempre que é feito um diagnóstico de assistolia, deve-se avaliar cuidadosamente no ECG se
há ondas P, pois esta situação pode responder a pacing cardíaco. Não há qualquer benefício
em tentar pacing na verdadeira assistolia.
3. Durante a RCP
Durante o tratamento de uma FV / TVsP ou AEsP/assistolia persistente, a ênfase é colocada
nas compressões torácicas de elevada qualidade entre tentativas de desfibrilhação, no
reconhecimento e tratamento de causas reversíveis (4 H e 4 T), na obtenção de uma via
aérea segura e no acesso vascular.
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
Durante RCP numa relação 30:2, o ritmo subjacente pode ser visto distintamente no
monitor quando as compressões são interrompidas para permitir a ventilação. Se
for detetada uma FV nesta breve pausa, (quer seja no braço desfibrilhável ou não
6
desfibrilhável do algoritmo), não se deve tentar a desfibrilhação nesta fase; pelo contrário,
deve continuar-se com a RCP até o período de 2 minutos estar completo. Sabendo que o
ritmo é FV, a equipa deve estar preparada para aplicar um choque sem mais demora no
final do período de 2 minutos de RCP.
Assim que se obtenha uma via aérea segura, devem continuar-se as compressões torácicas
sem pausas durante a ventilação. Para diminuir o cansaço, trocar o reanimador a cada 2
min ou mais cedo se necessário. Quando disponíveis, devem utilizar-se dispositivos de RCP
com comandos e/ou feedback. Notar que alguns dispositivos podem não ser capazes de
compensar a compressão do colchão durante a RCP, ao fornecer o feedback.
93
Capítulo 6
Algoritmo de Suporte Avançado de Vida
4.
Utilização de acesso intraósseo (IO) durante a
paragem cardíaca
4.1. Introdução
A perfusão intraóssea (IO) como meio de acesso vascular é reconhecida há cerca de um
século, e reapareceu na última década particularmente para a utilização na reanimação
de adulto (figura 1). Isto deve-se em parte a um número de estudos que sugerem que é
uma alternativa viável ao acesso intravenoso (IV), mas também ao desenvolvimento de
dispositivos automatizados para a inserção da agulha, uma técnica recentemente suportada
pelos resultados de uma revisão sistemática. O acesso intraósseo é também mais rápido
94
que o acesso venoso central em doentes em quem não é possível a colocação de um acesso
venoso periférico. Mais ainda, a utilização de cateteres venosos centrais (CVC) durante a
reanimação requer competência considerável e pode levar a interrupções prolongadas
nas compressões torácicas. As recomendações atuais são para estabelecer um acesso IO
se o acesso IV não é possível, ou se a tentativa de o obter demora mais que os primeiros 2
minutos da reanimação.
• tíbia distal
• úmero proximal
6
Deve-se avaliar a presença de contraindicações para a utilização de acesso IO. Estas são:
• fratura ou prótese no osso pretendido
• IO recente (últimas 24-48 h) no mesmo membro, incluindo tentativa prévia sem
sucesso
• sinais de infeção no local de inserção
• impossibilidade de localizar as referências anatómicas
4.1.2. Inserção
O treino com o dispositivo que se irá utilizar na prática clínica é essencial. O local de inserção,
a identificação das referências e a técnica para inserção variam dependendo do dispositivo
utilizado. Erros na identificação das referências ou na técnica de inserção aumentam o risco
de insucesso e complicações.
1. Uma vez inserido, deve confirmar-se o posicionamento correto antes da infusão
de fármacos ou fluidos. A agulha deve ser aspirada; a presença de sangue IO
confirma o posicionamento correto, a ausência de conteúdo aspirado não implica
necessariamente uma tentativa falhada. Há relatos da utilização de sangue IO para
análises laboratoriais, incluindo glucose, hemoglobina e eletrólitos. As amostras
têm de ser identificadas como aspirado de medula óssea antes do envio para o
laboratório.
2. Deve-se fazer flush na agulha IO para garantir a sua patência, avaliando-se nessa
altura se há fuga ou extravasamento A melhor forma é utilizar um prolongamento,
preenchido com soro fisiológico a 0.9 %, conectado à extremidade da agulha antes
de a utilizar.
3. Após confirmação do acesso IO, podem-se perfundir fármacos de reanimação
incluindo adrenalina e amiodarona. Podem também administrar-se fluidos e
hemoderivados, mas será necessária aplicação de pressão para atingir fluxos
razoáveis, utilizando uma manga de pressão ou uma seringa de 50 ml.
95
Capítulo 6
Algoritmo de Suporte Avançado de Vida
Figuras 6.4
Exemplos de dispositivos intraósseos
96
5. Causas reversíveis
Em qualquer paragem cardíaca, devem-se ter em conta as potenciais causas ou fatores de
agravamento para os quais existe tratamento específico. Para facilitar a memorização, estes
estão divididos em dois grupos de quatro, baseados na sua primeira letra – o T ou o H
(figura 6.5). Mais detalhes sobre cada uma destas situações são discutidos no capítulo 12.
• Hipóxia
• Hipovolémia
• Hipercaliémia, hipocaliémia, hipoglicémia, hipocalcémia, acidemia e outras
alterações metabólicas
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
• Hipotermia
• Pneumotórax hipertensivo
6
• Tamponamento
• Tóxicos
• Trombose (embolia pulmonar ou trombose coronária)
Figura 6.5
Os quatro H e os quatro T
Hypoxia
Hipóxia Hypothermia
Hipotermia
Hipercaliémia Hipovolémia
Hyperkalaemia Hypovolaemia
Tamponamento
Tamponade
T
Pneumotórax
Tension Trombose
Thrombosis
Pneumothorax
hipertensivo
Toxins
Tóxicos
97
Capítulo 6
Algoritmo de Suporte Avançado de Vida
• Os quatro H
Deve minimizar-se o risco de hipóxia ao assegurar que os pulmões do doente estão
devidamente ventilados com oxigénio a 100 %. Garantir que há expansão torácica adequada
e sons respiratórios bilaterais. Através das técnicas descritas no capítulo 7, verificar
cuidadosamente que o tubo traqueal não está incorretamente colocado num brônquio ou
no esófago.
A atividade elétrica sem pulso causada por hipovolémia deve-se geralmente a uma
hemorragia grave. A evidência de hemorragia pode ser óbvia, p. ex. traumatismo (capítulo
12), ou oculta p. ex. hemorragia gastrointestinal ou rotura de aneurisma aórtico. O volume
intravascular deve ser rapidamente restabelecido com fluidos e sangue, juntamente com
cirurgia urgente para parar a hemorragia.
• Os quatro T
O pneumotórax hipertensivo pode ser a causa primária de uma AEsP, e pode seguir-se
a tentativas de inserção de um cateter venoso central. O diagnóstico é feito clinicamente.
Deve fazer-se uma descompressão rápida por toracotomia ou toracocentese com agulha,
e inserir posteriormente um dreno torácico.
98
a fibrinólise por embolia pulmonar aguda, em casos que exigiram mais de 60 min de RCP.
Se se administrar um fibrinolítico nestas circunstâncias, deve ponderar manter-se a RCP
durante um mínimo de 60-90 min antes de terminar as tentativas de reanimação.
7. Sinais de vida
Se durante a RCP se verificarem sinais de vida (tais como esforço respiratório regular,
movimento espontâneo) ou leituras da monitorização dos doentes compatíveis com RCE
(p. ex. aumento súbito no dióxido de carbono expirado ou onda de pulso arterial), deve-se
parar brevemente a RCP e verificar o monitor. Se houver um ritmo organizado, pesquisar
pulso. Se houver pulso palpável, continuar os cuidados pós-reanimação e/ou o tratamento
de arritmias periparagem, se apropriado. Se não houver pulso palpável, continuar a RCP.
99
Capítulo 6
Algoritmo de Suporte Avançado de Vida
8.
Capnografia durante o suporte avançado de vida
8.1. Introdução
O dióxido de carbono (CO2) é um produto residual do metabolismo; são produzidos cerca de
400 L por dia. É transportado no sangue até aos pulmões, onde é expirado. A concentração
no sangue mede-se como pressão parcial de CO2 (PCO2), e no sangue arterial (PaCO2) é
normalmente 5,3 kPa (4,7-6,0 kPa) = 40 mmHg (35-45 mmHg). A concentração de CO2 também
pode ser avaliada no ar expirado, e expressa-se ou em percentagem por volume, ou em
pressão parcial, sendo ambos muito semelhantes em termos numéricos. A concentração
varia durante a expiração, sendo máxima no final da mesma, e é este valor, o CO2 no final da
Figura 6.6
Capnografia
RCP RCP RCP RCE
CO2 expirado / kPa
Intubação Tempo/minutos
8.2. Nomenclatura
Os termos que descrevem as medições do dióxido de carbono derivam do grego ‘capnos’,
que significa fumo. Um capnómetro é um dispositivo utilizado para medir a concentração
do CO2 e dá um valor numérico da % ou pressão parcial (kPa) da concentração do CO2.
Um capnógrafo é um dispositivo que exibe uma onda, referente à concentração de CO2 à
medida que esta varia durante a expiração, bem como um valor numérico. Esta capnografia
de onda é geralmente denominada apenas por capnografia, e é o dispositivo de medição
de CO2 de maior utilidade na prática clínica.
100
8.3. Equipamento
De forma a analisar a concentração de CO2 no ar expirado, a maioria dos capnógrafos
utilizam amostragem em fluxo de derivação. Interpõe-se um conector (peça-em-T) no
sistema respiratório, geralmente na extremidade do tubo traqueal ou do dispositivo
supraglótico (DSG). Este tem uma pequena porta lateral onde se conecta um fino tubo de
amostragem. É aspirada uma amostra contínua de gás (cerca de 50 ml/min) e analisada pela
propriedade de absorção de luz infravermelha. A quantidade absorvida é proporcional à
concentração da molécula absorvente (neste caso o CO2), e esta é comparada com um
padrão definido, permitindo que a concentração do CO2 seja determinada. Um sistema
alternativo é a amostragem do fluxo principal, em que a fonte e o detetor de infravermelhos
estão contidos numa célula ou compartimento que se coloca diretamente no sistema
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
101
Capítulo 6
Algoritmo de Suporte Avançado de Vida
2. Qualidade da RCP
Quanto mais eficientes as compressões torácicas, maior o débito cardíaco, o que leva
mais CO2 para os pulmões de onde ele é exalado, gerando assim uma concentração
de dióxido de carbono expirado mais elevada. As compressões torácicas de elevada
qualidade resultarão tipicamente em valores de ETCO2 de 2,0-2,5 kPa (15-18,8 mmHg).
5. Prognóstico
Um ETCO2 mais elevado durante a reanimação associa-se a maior probabilidade de
RCE e de hipótese de sobrevivência à alta hospitalar. Num estudo, um ETCO2 < 1,9 kPa
(14 mmHg) durante a reanimação teve uma sensibilidade e especificidade de 100 %
na predição de não-sobreviventes. Após paragem cardíaca e RCP durante mais de
30 minutos, os valores de dióxido de carbono expirado diminuem e podem chegar
a zero. As diferenças interindividuais, a influência da causa da paragem cardíaca,
os vieses dos estudos (como o das profecias que se cumprem a si próprias), a nossa
falta de confiança na acuidade da quantificação seja do que for durante a RCP, e a
necessidade de uma via aérea avançada para medir o CO2 expirado de forma fiável,
limitam a nossa confiança na sua utilização para estabelecer um prognóstico. Assim,
recomendamos que um valor específico do CO2 expirado durante a RCP não deve ser
usado isoladamente para terminar os esforços de RCP. Os valores do CO2 expirado
devem ser considerados apenas como parte de uma abordagem multimodalidade
na previsão do prognóstico, e na tomada de decisão, durante a RCP.
102
Após paragem da RCP, deve observar-se o doente durante no mínimo 5 min antes de
declarar a morte. A ausência de função cardíaca mecânica é geralmente confirmada através
da combinação de:
• ausência de pulso central à palpação
direta
• ausência de atividade contrátil pesquisada por ecocardiografia
6
Qualquer regresso de atividade cardíaca ou respiratória durante este período de
observação obriga a mais 5 min de observação, a contar do momento seguinte de
paragem cardiorrespiratória. Após 5 min de paragem cardiorrespiratória contínua, dever
ser confirmada a ausência de resposta pupilar à luz, de reflexos da córnea e de qualquer
resposta motora à pressão supraorbitária. A hora da morte é registada como o momento
em que estes critérios são preenchidos.
103
Capítulo 6
Algoritmo de Suporte Avançado de Vida
Figura 6.7
Capnografia
“A: Início da Expiração; B: Final da Expiração = ETCO2“
CO2
B
5
Figura 6.8
Respiração espontânea
ONDA CO2
CO2 WAVEFORM
0
TREND CO
CO2TENDÊNCIA
2
Figura 6.9
Doente ventilado
8 etCO2 RR
5.3 11
7 30
4 3 8
104
Figura 6.10
RCP de elevada qualidade
8 etCO2 RR
2.3 11
7 30
4 3 8
Figura 6.11
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
8 etCO2 RR 6
1.3 11
7 30
4 3 8
Figura 6.12
ETCO2 com o RCE
8 etCO2 RR
5.6 11
7 30
4 3 8
Figura 6.13
ETCO2 persistentemente baixo – associado a mau prognóstico
8 etCO2 RR
1.3 11
7 30
4 3 8
Figura 6.14
Desconexão
8 etCO2 RR
5 11
7 30
4 3 8
105
Capítulo 6
Algoritmo de Suporte Avançado de Vida
LEITURA ADICIONAL
• Soar J, et al. European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015. Section 3. Adult
Advanced Life Support. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.016; p99 - p146
• Soar J, Callaway CW, Aibiki M, et al. Part 4: Advanced life support: 2015 International Consensus on
Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care Science With Treatment Rec-
ommendations. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.042; e71 - e122
• Truhlar A, Deakin CD, Soar J, et al. European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015
Section 4 Cardiac Arrest in Special Circumstances. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.017; p147 - p200
• Weiser G, Hoffmann Y, Galbraith R, Shavit I 2012 Current advances in intraosseous infusion – A sys-
tematic review. Resuscitation 83 (2012) 20– 26
• Reades R, Studnek JR, Vandeventer S, Garrett J. 2011 Intraosseous versus intravenous vascular access
during out-of-hospital cardiac arrest: a randomized controlled trial. Ann Emerg Med. Dec;58(6):509-16.
106
Capítulo 7.
Via aérea e ventilação
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
Secção 1
Abordagem básica da via aérea e ventilação
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
• as causas e o reconhecimento da obstrução da via aérea
• técnicas para abordagem da via aérea no início da reanimação
• a utilização de adjuvantes simples para manter a permeabilidade da via aérea
• a utilização de dispositivos simples para a ventilação pulmonar
1. Introdução
Os doentes que necessitam de reanimação têm frequentemente obstrução da via
aérea, geralmente devida à perda de consciência, mas que, no entanto, pode ter sido a
causa primária da paragem cardiorrespiratória. A avaliação imediata, com controlo da
permeabilidade da via aérea e ventilação quando necessária, é essencial. Isto irá ajudar a
prevenir a lesão hipóxica secundária do cérebro e outros órgãos vitais. Sem oxigenação
adequada, pode ser impossível restabelecer um ritmo cardíaco organizado e com perfusão.
Estes princípios podem não se aplicar a paragens cardíacas primárias presenciadas,
ocorridas na proximidade de um desfibrilhador; neste caso, a prioridade é a desfibrilhação
imediata, seguida de atenção à via aérea.
107
Capítulo 7
Via aérea e ventilação
por corpos estranhos. A obstrução laríngea pode ser causada por edema decorrente de
queimaduras, inflamação ou anafilaxia.
A estimulação da via aérea superior pode causar um espasmo laríngeo. A obstrução da via
aérea abaixo da laringe é menos comum, mas pode ser causada pelo excesso de secreções
brônquicas, edema da mucosa, broncospasmo, edema pulmonar ou aspiração do conteúdo
gástrico.
108
3.1. Doentes com traqueostomias ou estomas traqueais permanentes
Um doente com um tubo de traqueostomia ou um estoma traqueal permanente
(geralmente após laringectomia) pode desenvolver obstrução da via aérea por oclusão do
tubo de traqueostomia ou do estoma – nestes doentes não ocorre obstrução da via aérea
a nível da faringe. Deve retirar-se qualquer corpo estranho visível do estoma ou do tubo
de traqueostomia. Se necessário, retirar o tubo de traqueostomia ou, caso exista, trocar
a cânula interna do tubo de traqueostomia. Caso um tubo de traqueostomia obstruído
seja removido, deverá ser possível ventilar os pulmões do doente vedando o estoma e
utilizando uma máscara facial aplicada à face, ou entubando a traqueia por via oral com um
tubo traqueal normal. Num doente com estoma traqueal permanente, deve administrar-se
oxigénio e, se necessário, ventilar através do estoma e não da boca.
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3.2. Engasgamento
A obstrução da via aérea por corpo estranho (OVACE) é uma causa incomum, mas
potencialmente tratável, de morte acidental. Como a maioria dos episódios de
engasgamento estão associados com a alimentação, são frequentemente presenciados.
7
Como as vítimas estão inicialmente conscientes e reativas, há muitas vezes oportunidade
para intervenções precoces que podem salvar a vida.
3.2.1. Reconhecimento
Os corpos estranhos podem causar obstrução ligeira ou grave da via aérea. Os sinais
e sintomas que permitem distinguir entre obstrução ligeira e grave da via aérea estão
resumidos na tabela 7.1.
109
Capítulo 7
Via aérea e ventilação
Tabela 7.1
Sinais de engasgamento
110
Figura 7.1
Algoritmo de engasgamento no adulto
Avaliar a gravidade
111
Capítulo 7
Via aérea e ventilação
Figura 7.2
Extensão da cabeça e elevação do queixo
Na maioria dos casos em que a obstrução da via aérea é causada pela perda de tónus
muscular na faringe, estes simples métodos de posicionamento são bem-sucedidos. Após
cada manobra, deve verificar-se o resultado através da sequência ver, ouvir e sentir. Se não
se conseguir permeabilizar a via aérea, devem então procurar-se outras causas de obstrução
da via aérea. Utilizar um dedo para limpar e remover possíveis corpos estranhos visíveis na
boca. Devem ser retiradas dentaduras postiças partidas ou deslocadas, mas deixam-se as
que estiverem bem fixas, já que ajudam a manter os contornos da boca, facilitando uma
boa selagem para ventilação com técnicas boca-máscara ou insuflador- máscara facial.
112
Figura 7.3
Protrusão da mandíbula
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
113
Capítulo 7
Via aérea e ventilação
114
Figura 7.4
Calcular o tamanho de um tubo orofaríngeo
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
7
Figura 7.5
Inserção de um tubo orofaríngeo
115
Capítulo 7
Via aérea e ventilação
Figura 7.6
Introdução de um tubo nasofaríngeo
116
6. Oxigénio
Durante a RCP, administrar a máxima concentração possível de oxigénio inspirado. Um
insuflador manual pode ser conectado a uma máscara facial, a um tubo traqueal ou a um
dispositivo supraglótico (DSG). Sem oxigénio suplementar, o insuflador manual ventila
os pulmões do doente com ar ambiente (21 % de oxigénio). A concentração de oxigénio
administrada pode ser aumentada para cerca de 85 % se se utilizar um sistema de
reservatório e se se conectar oxigénio a um fluxo de 15 L/min. Após o RCE, assim que seja
possível monitorizar de forma fidedigna a saturação arterial de oxigénio (por gasimetria
arterial e/ou oximetria de pulso), deve-se titular a concentração de oxigénio inspirado para
manter a saturação arterial de oxigénio na ordem dos 94-98 %. Deve-se evitar a hipoxémia,
que também é prejudicial – deve garantir-se uma avaliação fiável da saturação arterial de
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7. Ventilação
A ventilação mecânica deve ser iniciada logo que possível em doentes nos quais a 7
ventilação espontânea é insuficiente ou inexistente. A ventilação com ar expirado (boca-
a-boca) é eficaz, mas a concentração de oxigénio expirado de um reanimador é de apenas
16-17 %; portanto, deve ser substituída logo que possível por ventilação com ar enriquecido
com oxigénio. Apesar da ventilação boca-a-boca ter a vantagem de não exigir qualquer
equipamento, a técnica é esteticamente desagradável, especialmente quando existe
vómito ou sangue, e o reanimador pode estar relutante em colocar-se em contacto próximo
com uma vítima que pode não conhecer.
Os relatos de indivíduos que adquiriram infeções após realizar RCP, p. ex. tuberculose e
síndrome de dificuldade respiratória aguda grave (SARS), são raros. Nunca foi reportado
qualquer caso de transmissão de VIH durante RCP. Estão disponíveis adjuvantes simples
para que seja evitado o contacto direto pessoa-a-pessoa; alguns destes equipamentos
podem minimizar o risco de infeção cruzada entre o doente e o reanimador.
A máscara de bolso é semelhante a uma máscara facial de anestesia, e permite a ventilação
boca-máscara. Tem uma válvula unidirecional, que afasta do reanimador o ar expirado
pelo doente. A máscara é transparente para que o vómito e o sangue do doente possam
ser vistos. Algumas máscaras têm uma entrada para oxigénio. Quando são utilizadas
máscaras sem entrada para oxigénio, pode ser administrado oxigénio suplementar através
da colocação de um tubo de oxigénio debaixo de um dos lados da máscara, desde que
seja garantida uma selagem adequada. Devem utilizar-se as duas mãos para maximizar a
selagem com a face do doente.
Se o volume corrente ou o fluxo inspiratório for demasiado elevado, podem ser criadas
pressões elevadas nas vias aéreas, predispondo à distensão gástrica e ao risco subsequente
de regurgitação e aspiração pulmonar. Quando se verifica distensão gástrica, a compliance
pulmonar reduz-se ainda mais, tornando a ventilação mais difícil. A possibilidade de sofrer
distensão gástrica aumenta com:
117
Capítulo 7
Via aérea e ventilação
118
através de um orifício na outra extremidade. Quando é utilizado sem oxigénio suplementar,
o insuflador ventila os pulmões do doente só com ar ambiente (concentração de oxigénio
21 %). Quando é conectado oxigénio em alto débito diretamente ao balão do insuflador,
esta concentração aumenta para cerca de 45 %. Pode alcançar-se uma concentração de
oxigénio inspirado de cerca de 85 % se houver ligação a um sistema com reservatório, e
se o débito de oxigénio for aumentado para o máximo. Quando o insuflador se volta a
expandir, enche-se com oxigénio tanto do reservatório como do débito contínuo do tubo
de oxigénio que lhe está ligado. A utilização de válvulas de controlo com um insuflador
permite concentrações de oxigénio próximas dos 100 %.
Apesar do insuflador com máscara facial permitir ventilação com altas concentrações de
oxigénio, a sua utilização por um único indivíduo exige uma perícia considerável. Quando é
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
utilizada com uma máscara facial, é frequentemente difícil obter uma boa selagem entre a
máscara e a face do doente e manter a permeabilidade da via aérea com uma mão enquanto
a outra mão aperta o insuflador. Qualquer fuga significativa vai causar hipoventilação e, se a
via aérea não estiver permeável, o gás pode também ser empurrado para o estômago. Isto
irá diminuir ainda mais a ventilação e aumentar consideravelmente o risco de regurgitação e
aspiração. Existe uma tendência natural para tentar compensar as fugas com a compressão
7
excessiva do insuflador, o que causa pressões de pico na via aérea elevadas forçando a
entrada de mais ar no estômago. Alguns insufladores têm válvulas de regulação de fluxo
que limitam a pressão de pico na via aérea de forma a diminuir a distensão gástrica.
É preferível que a ventilação com insuflador e máscara facial seja feita com dois reanimadores
(Figura 7.7). Um dos reanimadores fixa a máscara facial fazendo protrusão da mandíbula
com as duas mãos e um assistente comprime o insuflador. Assim, é possível obter melhor
selagem, e os pulmões do doente podem ser ventilados com maior eficácia e segurança.
Figura 7.7
Técnica de ventilação com insuflador e máscara facial e dois reanimadores
119
Capítulo 7
Via aérea e ventilação
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
• A
permeabilização da via aérea e a ventilação dos pulmões são componentes
importantes da RCP.
• A
utilização de manobras simples de abordagem da via aérea, com ou sem
adjuvantes básicos, permite frequentemente a sua permeabilização.
• D
eve administrar-se oxigénio em alta concentração a todos os doentes até a
saturação arterial de oxigénio ser mensurável.
120
Secção 2
Dispositivos alternativos da via aérea
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
• o papel dos dispositivos supraglóticos na via aérea durante a RCP
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1. Introdução
Para ser eficaz, a ventilação com insuflador e máscara facial exige um grau razoável
de destreza e de experiência: a inexperiência leva facilmente a volumes respiratórios
ineficazes e causa distensão gástrica, com risco de regurgitação e de aspiração pulmonar. 7
O tubo traqueal tem sido geralmente considerado o método ótimo de abordagem da
via aérea durante a paragem cardíaca. Há evidência de que, sem formação adequada
e sem experiência, a incidência de complicações, tais como intubação esofágica não
detetada (2,4-17 % em vários estudos envolvendo paramédicos) e deslocação do tubo,
é inaceitavelmente elevada. Tentativas prolongadas são prejudiciais; a interrupção
das compressões torácicas durante esses períodos irá comprometer gravemente a
perfusão coronária e cerebral. Já foram utilizados diversos dispositivos alternativos da
via aérea na abordagem da via aérea durante a RCP. Comparativamente à ventilação
com insuflador e máscara facial, a utilização de dispositivos supraglóticos (DSG) pode
permitir uma ventilação mais eficaz e diminui o risco de distensão gástrica. Além disso,
os DSG são mais fáceis de introduzir do que um tubo traqueal.
Não existem dados que suportem a utilização por rotina de uma abordagem específica
da via aérea durante a paragem cardíaca. A melhor técnica depende das circunstâncias
específicas da paragem cardíaca e das competências do reanimador.
2. Máscara laríngea
A máscara laríngea (ML) consiste num tubo de diâmetro largo, com um cuff elíptico insuflável
desenhado para vedar a abertura laríngea. A ML original (LMA Classic [cLMA]), reutilizável,
foi estudada durante a RCP, mas nenhum destes estudos foi comparado diretamente com
o tubo traqueal. Apesar da cLMA continuar a ser de utilização comum na prática anestésica
eletiva, foi largamente substituída por diversos DSG de 2ª geração que têm características
mais favoráveis, particularmente quando utilizadas na abordagem da via aérea de
emergência. A maioria destes DSG são de utilização única e atingem pressões de selagem
orofaríngea mais elevadas que a cLMA, e alguns deles têm um canal de drenagem gástrica
incorporado.
121
Capítulo 7
Via aérea e ventilação
122
Figura 7.8
Introdução de máscara laríngea
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
4. Tubo laríngeo
O tubo laríngeo (TL) é outro dispositivo supraglótico, utilizado frequentemente em
anestesia e em ambiente pré-hospitalar. É um tubo de lúmen único, com cuff esofágico e
faríngeo. Um único balão piloto insufla ambos os cuffs simultaneamente; está disponível
em diversos tamanhos. A taxa de inserções bem-sucedidas e as pressões geradas na via
aérea são comparáveis às da ML, quando efetuadas por não anestesistas. Estão também
disponíveis TL de duplo lúmen com um orifício esofágico, e uma versão descartável (TL-D).
123
Capítulo 7
Via aérea e ventilação
• A extremidade do TL deve ser colocada contra o palato duro, abaixo dos incisivos.
Fazer deslizar o TL pelo centro da boca, para baixo, até encontrar resistência, ou até
o dispositivo estar quase todo inserido. Quando o TL está bem inserido, a segunda
linha negra no tubo deve estar entre os dentes do maxilar superior e os do maxilar
inferior.
• Insuflar o cuff para uma pressão de 60 cm H2O. Isto pode ser feito com um insuflador
de cuff, ou com uma seringa de 100 ml com marcas para os volumes recomendados
para cada tamanho do TL.
• Se, após 30 segundos, o TL não tiver sido inserido com sucesso, ventilar o doente,
com uma máscara de bolso ou com insuflador e máscara, antes de voltar a tentar a
sua inserção.
124
5. Limitações de todos os DSG
• Quando existe resistência elevada das vias aéreas ou baixa compliance pulmonar
(edema pulmonar, broncospasmo, doença pulmonar obstrutiva crónica), existe
risco de fuga significativa em redor do cuff, o que provoca hipoventilação. A maior
parte do gás que escapa à volta do cuff sai geralmente pela boca do doente, mas
pode verificar-se alguma distensão gástrica.
• Não existem dados que demonstrem se é possível, ou não, fazer ventilação
adequada com DSG sem interrupção das compressões torácicas. É provável que
as compressões torácicas contínuas causem, no mínimo, alguma fuga de gás em
redor do cuff do DSG quando se tenta ventilar. Inicialmente devem-se tentar aplicar
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
125
Capítulo 7
Via aérea e ventilação
Secção 3
Intubação traqueal e cricotiroidotomia
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
• a s vantagens e desvantagens da intubação traqueal na reanimação
cardiopulmonar
1. Intubação traqueal
Não existe evidência suficiente que suporte, ou refute, a utilização de qualquer técnica
específica para manter via aérea e ventilar adultos em paragem cardiorrespiratória. Apesar
disto, a intubação traqueal é considerada como o método ótimo para obter e manter
uma via aérea permeável e segura. Só deve ser executada por profissionais experientes e
competentes.
126
O pessoal de saúde que realiza intubação traqueal pré-hospitalar só o deverá fazer dentro
de um programa estruturado e monitorizado, que inclua treino nessa competência e
oportunidades regulares de atualização. Os reanimadores devem avaliar o risco/benefício
da intubação traqueal, em relação com a necessidade de aplicar compressões torácicas
eficazes. A tentativa de intubação pode exigir alguma interrupção das compressões
torácicas, mas assim que se obtém uma via aérea avançada já não é necessária nova
interrupção. Os indivíduos com competências na abordagem avançada da via aérea
devem ser capazes de realizar uma laringoscopia sem parar as compressões torácicas; só
será necessária uma breve pausa nas compressões torácicas no momento em que o tubo
passa através das cordas vocais. Em alternativa, e para evitar interrupções das compressões
torácicas, a tentativa de intubação pode ser adiada até haver RCE. Nenhuma tentativa de
intubação traqueal deve interromper as compressões torácicas durante mais de 5 segundos;
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
se a intubação não for conseguida dentro destes limites, deve recomeçar-se ventilação com
insuflador e máscara. Após a intubação, a posição do tubo deve ser confirmada, e a sua
fixação assegurada.
2. Cricotiroidotomia
Por vezes, pode ser impossível ventilar um doente apneico com insuflador e máscara, intubar
com um tubo traqueal ou usar outro tipo dispositivo de via aérea. Isto pode acontecer em
doentes com traumatismo facial extenso, ou com obstrução da laringe por edema, p. ex.
anafilaxia ou corpos estranhos. Nestas circunstâncias, será necessário criar uma via aérea
cirúrgica abaixo do nível da obstrução.
128
A cricotiroidotomia cirúrgica estabelece uma via aérea definitiva, que pode ser usada para
ventilar os pulmões dos doentes até que seja feita forma semieletiva uma intubação ou
traqueostomia. A cricotiroidotomia por punção com agulha é um procedimento muito mais
provisório, que só permite oxigenação a curto prazo. Necessita de uma fonte de oxigénio de
alta pressão e de uma cânula rígida e de grande calibre, podendo causar barotrauma grave.
Tem tendência para falhar pelo facto de a cânula dobrar e não é adequada no transporte
de doentes.
129
Capítulo 7
Via aérea e ventilação
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
• Q
uando efetuada por profissionais com a capacidade e experiência adequadas,
a intubação traqueal é uma técnica eficaz de abordagem da via aérea na
reanimação cardiopulmonar.
• Q
uando efetuada por pessoal inexperiente, as interrupções prolongadas das
compressões torácicas e o elevado risco de insucesso e complicações (p. ex.
intubação esofágica não detetada) tornam as tentativas de intubação traqueal
potencialmente prejudiciais.
130
Secção 4.
Ventilação mecânica básica
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
• o papel dos ventiladores automáticos no período periparagem
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PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
• O
s ventiladores podem ser um adjuvante útil na reanimação cardiopulmonar,
apesar dos dados sobre a sua utilização serem limitados. A sua utilização segura
exige treino adequado.
131
Capítulo 7
Via aérea e ventilação
LEITURA ADICIONAL
• Soar J, et al. European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015. Section 3.
Adult Advanced Life Support. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.016; p99 - p146
• Soar J, Callaway CW, Aibiki M, et al. Part 4: Advanced life support: 2015 International Consensus on
Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care Science With Treatment
Recommendations. 10.1016/j.Resuscitation.2015.07.042; e71 - e122
• Nolan JP, Soar J. Airway techniques and ventilation strategies. Curr Opin Crit Care 2008;14:279-86.
• Wang HE, Simeone SJ, Weaver MD, Callaway CW. Interruptions in cardiopulmonary Resuscitation
from paramedic endotracheal intubation. Ann Emerg Med 2009;54:645-52.
132
Capítulo 8.
Monitorização cardíaca,
eletrocardiografia e
reconhecimento de ritmos
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OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
• as razões para monitorização do ECG
• como monitorizar o ECG
• a origem do ECG
• a importância de registar o ECG
• ritmos cardíacos associados a paragem cardíaca
• como identificar outras arritmias frequentes
1. Introdução
A identificação do ritmo cardíaco ajuda a determinar o tratamento correto durante a paragem
cardíaca, pelo que se deve proceder à monitorização tão cedo quanto possível. Em muitos
doentes que foram reanimados, existe um risco significativo de nova arritmia e paragem
cardíaca. Deve-se manter a monitorização cardíaca em doentes que foram reanimados até
haver segurança de que o risco de recorrência é muito baixo.
Alguns doentes apresentam arritmias que podem causar paragem cardíaca, ou agravamento
do seu estado. A deteção e tratamento precoces da arritmia podem evitar paragem cardíaca
nalguns doentes, e noutros evitar deterioração potencialmente fatal. Os doentes em risco
incluem aqueles com arritmia persistente associada a doença cardíaca estrutural, dor
torácica, insuficiência cardíaca, diminuição do estado de consciência ou choque. Em todos
os doentes com arritmia cardíaca persistente em risco de deterioração, deve-se estabelecer
a monitorização cardíaca e, sempre que possível, registar um ECG de 12 derivações de boa
qualidade. A monitorização, só por si, nem sempre permite o reconhecimento rigoroso
do ritmo cardíaco, e é importante documentar a arritmia para referenciação futura, se
necessário.
133
Capítulo 8
Monitorização cardíaca, eletrocardiografia e reconhecimento de ritmos
Alguns doentes têm sintomas (geralmente síncope) causados por arritmia cardíaca
intermitente que, se não for documentada e tratada, pode causar paragem cardíaca ou
morte súbita. Contudo, a arritmia pode não estar presente no momento da avaliação inicial.
Nos doentes que se apresentam com síncope deve fazer-se uma avaliação clínica cuidadosa
e registar-se um ECG de 12 derivações. Os indivíduos que sofreram perda de consciência não
complicada, síncopes situacionais (tais como a induzida por tosse ou a miccional) ou síncope
por hipotensão ortostática, não precisam de monitorização cardíaca nem, geralmente, de
internamento hospitalar. Nos que sofreram síncopes não explicadas, especialmente durante
a prática de exercício, ou têm evidência de doença cardíaca estrutural ou alterações do
ECG (especialmente prolongamento do intervalo QT prolongado ou QRS alargado ≥0,12
s), deve-se iniciar a monitorização cardíaca e pedir avaliação especializada por cardiologia.
134
Muitos sistemas permitem monitorizar outros valores importantes na avaliação dos doentes
em risco, tais como a pressão arterial e a saturação de oxigénio. O processamento digital do
ECG oferece a possibilidade de análise eletrónica do ritmo cardíaco. Se um doente precisar
de monitorização, deve-se garantir que se está a vigiar o monitor para que, caso o ritmo
mude, se possa atuar de imediato.
Figura 8.1
Posição de elétrodos para monitorizar o ECG com derivações dos membros modificadas
A maioria das derivações têm códigos de cores para auxiliar à ligação correta. O esquema
habitual (exceto nos Estados Unidos) usa vermelho para a derivação do braço direito,
amarelo para a derivação do braço esquerdo, verde para a derivação da perna (geralmente
aplicado no abdómen ou na parede torácica inferior esquerda) para derivações dos
membros modificadas.
Por vezes está disponível um quarto elétrodo, de cor preta (geralmente aplicado no lado
direito do abdómen ou na parede torácica inferior direita).
135
Capítulo 8
Monitorização cardíaca, eletrocardiografia e reconhecimento de ritmos
Começar por monitorizar na derivação II modificada já que, geralmente, esta exibe ondas P
sinusais e complexos QRS de boa amplitude; se necessário, mudar para outra derivação para
obter melhor sinal. Tentar minimizar os artefactos musculares e de movimento, explicando
aos doentes para que serve a monitorização e mantendo-os calmos e descontraídos.
Figura 8.2
Placas autoadesivas de desfibrilhador
136
Estes registos podem ajudar a interpretar o ritmo no momento, e são também úteis para
consulta posterior e planear o tratamento a longo prazo. Assim, a abordagem eficaz a
qualquer arritmia, incluindo a arritmia da paragem cardíaca, passa por obter registos ECG
de boa qualidade, e fazer a sua interpretação e o tratamento de forma atempada.
Figura 8.3
ECG de 12 derivações com taquicardia auricular, só claramente visível nas derivações V1-V2.
I aVR V1 V4
II aVL V2 V5
8
III aVF V3 V6
RHYTHM STRIP: II
25 mm/sec: 1 cm / mV
137
Capítulo 8
Monitorização cardíaca, eletrocardiografia e reconhecimento de ritmos
Figura 8.4
ECG de 12 derivações onde se pode ver o efeito da adenosina no flutter auricular. O bloqueio AV tran-
sitório demonstra claramente que esta taquicardia regular de complexos estreitos era um flutter auricular
com condução AV 2:1.
RHYTHM STRIP: II
I 25 mm/sec: 1 cm / mV
II
III
aVR
aVL
V1
V2
V3
V4
V5
V6
4. Eletrocardiografia básica
Em repouso, as células do sistema de condução cardíaco e as células do miocárdio estão
polarizadas. Entre o interior da célula (com carga negativa) e o seu exterior existe uma
diferença de potencial de cerca de 90 mV. Um fluxo súbito de iões através da membrana
celular provoca a despolarização, gerando o sinal elétrico que se propaga através do
sistema de condução e despoleta a contração das células do miocárdio.
Num ritmo sinusal normal, a despolarização tem início num grupo de células ‘‘pacemaker’’
especializadas, conhecido como nó (ou nódulo) sinoauricular (SA), localizado junto à
entrada da veia cava superior na aurícula direita. A onda de despolarização propaga-se
então do nó SA para o miocárdio auricular. Esta despolarização pode ser vista no ECG como
a onda P (figura 8.5). A contração auricular é a resposta mecânica a este impulso elétrico.
A transmissão deste impulso elétrico aos ventrículos faz-se através de tecido condutor
especializado (figura 8.6).
138
Figura 8.5 Figura 8.6
Componentes do sinal de ECG normal Condução elétrica no coração
Fascículo posterior
Posterior division
Nó sinoauricular
Sinoatrial node
Atrioventicular
Nó auriculoventricular
node
Feixe de
Bundle His
of His
Right
Ramobundle
direito
Ramo esquerdo
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Left bundle
Anterioranterior
Fascículo division
8
Em primeiro lugar, verifica-se condução lenta através do nó auriculoventricular (AV), seguida
de condução rápida para o miocárdio ventricular pelo tecido de condução especializado
(fibras de Purkinje). O feixe de His tem origem em fibras do nó AV, dividindo-se depois
em ramos direito e esquerdo, e espalhando-se através dos ventrículos direito e esquerdo,
respetivamente. A rápida condução ao longo destas fibras assegura que os ventrículos se
contraem de forma coordenada.
A despolarização do feixe de His, dos ramos e do miocárdio ventricular é vista no ECG sob
a forma do complexo QRS (figura 8.5). A contração ventricular é a resposta mecânica a este
impulso elétrico.
Quando um dos ramos está afetado ou lesado, não ocorre a condução rápida ao ventrículo
correspondente. O impulso de despolarização propaga-se mais rapidamente pelo ramo
“saudável” e respetivo ventrículo; e depois, mais lentamente, propaga-se através do tecido
miocárdico ao ventrículo que tem o ramo lesado. A esta situação chama-se bloqueio de
139
Capítulo 8
Monitorização cardíaca, eletrocardiografia e reconhecimento de ritmos
ramo. Dado que essa despolarização dos dois ventrículos demora mais do que o normal, é
vista no ECG como um complexo QRS alargado (0,12 s ou mais).
Observar o doente: tem pulso? Se o doente não tem pulso e continua a não haver
atividade no ECG, estamos perante uma assistolia (tira de ritmo 2). Geralmente ocorrem,
em simultâneo, assistolia auricular e ventricular, o que resulta numa linha sem deflexões.
Uma linha completamente reta, assim como uma linha reta descontínua (tracejado), são
geralmente indicativas de que um dos elétrodos se desligou. Na assistolia, o ECG mostra
geralmente uma ligeira ondulação basal e pode mostrar interferências elétricas provocadas
por movimentos respiratórios ou compressões torácicas.
Se o doente não tiver pulso e houver atividade elétrica, é necessário decidir se existem
complexos QRS reconhecíveis. Caso não existam, e se o ECG mostrar deflexões rápidas,
140
bizarras e irregulares, de frequência e amplitude aleatórias, estamos perante uma FV (tira
de ritmo 4). Na FV perde-se toda a coordenação da atividade elétrica e não há contração
ventricular eficaz, nem débito cardíaco detetável.
Por vezes, a fibrilhação ventricular é classificada como grosseira (tira de ritmo 4) ou fina (tira
de ritmo 5), dependendo da amplitude das ondas; se não houver a certeza se o ritmo é
assistolia ou FV fina, não se deve tentar desfibrilhar, mas sim prosseguir com compressões
torácicas e a ventilações. Uma FV fina que é difícil de distinguir da assistolia tem poucas
probabilidades de ser desfibrilhada com sucesso para um ritmo que produza débito
cardíaco. A continuação de RCP de boa qualidade pode melhorar a amplitude e frequência
da FV, e aumentar assim a probabilidade de sucesso de desfibrilhações subsequentes e
de retorno de circulação espontânea. A aplicação de choques repetidos na tentativa de
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desfibrilhar o que se pensa ser FV fina vai aumentar a lesão do miocárdio, tanto diretamente
a partir da corrente elétrica como indiretamente pelas interrupções no fluxo sanguíneo
coronário (capítulo 6).
Se o doente não tiver pulso e existirem complexos reconhecíveis no ECG (que seria de 8
esperar que pudessem produzir pulso), estamos perante uma atividade elétrica sem pulso
(AEsP), que exige RCP imediata. Não se deve adiar a RCP devido a uma análise prolongada
do ritmo.
141
Capítulo 8
Monitorização cardíaca, eletrocardiografia e reconhecimento de ritmos
Figura 8.7
Cálculo da frequência cardíaca a partir de tira de ritmo (20 ciclos cardíacos ocorrem em 30 quadrados
grandes = 200/min).
142
Se o complexo QRS da extrassístole é estreito (< 0,12 s), é provável que tenha origem acima
do miocárdio ventricular (i. e. do músculo auricular ou do nó AV).
Extrassístoles auriculares de complexos alargados podem, por vezes, ser identificadas por
uma onda P ectópica que as precede.
As extrassístoles ventriculares podem ser acompanhadas por uma onda P que ocorre
pouco tempo depois do complexo QRS, e que é causada por uma condução retrógrada dos
ventrículos para as aurículas.
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Uma arritmia que ocorre intermitentemente, intercalada por períodos de ritmo sinusal
normal, é descrita como paroxística.
143
Capítulo 8
Monitorização cardíaca, eletrocardiografia e reconhecimento de ritmos
mostrar alguns tipos de atividade auricular, inclusive ondas P sinusais e FA. As ondas P
sinusais são geralmente vistas com clareza na derivação II.
Podem existir outros tipos de atividade auricular. No flutter auricular, a atividade auricular
aparece como “ondas de flutter”, uma deflexão repetitiva absolutamente regular em forma
de “dentes de serra”, geralmente com uma frequência de cerca de 300/min, e que pode
geralmente ser melhor identificada nas derivações inferiores (II, III, aVF - figura 8.4).
Numa taquicardia auricular mantida, a atividade auricular pode não ser visível entre os
complexos QRS. Se o ritmo for de origem auricular (p. ex. flutter auricular ou FA) pode ser
possível revelar a atividade auricular diminuindo a frequência ventricular enquanto se
regista o ECG, preferencialmente em várias derivações. Por exemplo, se uma taquicardia
regular de 150/min se deve a um flutter auricular com condução 2:1, pode não ser possível
identificar ondas de flutter com segurança. Um aumento transitório do bloqueio AV, através
da estimulação vagal ou de um bólus intravenoso de adenosina, pode permitir evidenciar
as ondas de flutter e identificar corretamente o ritmo (figura 8.4).
A forma e a direção das ondas P ajudam a identificar o ritmo auricular. Por exemplo, as
ondas P sinusais são positivas nas derivações II e aVF. Em caso da ativação retrógrada das
aurículas, a partir de uma região do nó AV (i. e. o ritmo tem origem juncional ou ventricular),
as ondas P estão invertidas nas derivações II e aVF porque a despolarização auricular ocorre
na direção oposta à normal.
De notar que apesar do termo “intervalo PR” ser utilizado no texto, sabe-se que alguns
países europeus utilizam o intervalo PQ. Em termos de interpretação de ritmo, os dois
termos são idênticos.
144
auricular); a onda P ocorre pouco tempo depois do complexo QRS. Pode ser difícil distinguir
entre esta situação e a existência de um intervalo PR ou PQ muito longo.
Noutras circunstâncias, uma análise cuidadosa não deteta qualquer relação entre o
timing das ondas P e dos complexos QRS, o que indica que as despolarizações auricular
e ventricular ocorrem de forma independente, naquilo que por vezes se denomina
dissociação auriculoventricular. São exemplos:
• Bloqueio AV completo (terceiro grau), quando uma frequência auricular sinusal
normal é acompanhada por uma bradicardia regular com origem abaixo do nó AV.
• Alguns tipos de TV, nos quais existem complexos QRS alargados regulares, e onde
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podem também ser vistas ondas P regulares numa frequência diferente e mais
lenta, desfasadas dos complexos QRS.
Podem surgir dificuldades quando a relação entre ondas P e os complexos QRS varia com
um padrão recorrente, já que pode ser confundido com uma dissociação auriculoventricular.
Isto acontece mais frequentemente numa forma de bloqueio AV de segundo grau
(denominado Mobitz tipo I, ou bloqueio AV com fenómeno de Wenckebach). É necessário
analisar cuidadosamente uma tira de ritmo longa para identificar padrões recorrentes,
marcando e comparando o timing das ondas P e dos complexos QRS. Geralmente, num 8
bloqueio AV completo, o ritmo dos QRS é completamente regular.
Na FA, a atividade auricular é completamente irregular, pelo que não existe uma relação
identificável entre esta atividade auricular e o ritmo ventricular irregular que dela resulta.
Se a FA for acompanhada por um ritmo ventricular lento, completamente regular, é
provavelmente devido à existência de bloqueio AV completo.
No flutter auricular pode haver uma relação consistente entre as ondas de flutter e os
complexos QRS, originando condução 1:1, 2:1, 3:1, etc. Noutros casos, esta relação está
sempre a variar, causando um ritmo irregular; trata-se flutter auricular bloqueio AV variável.
145
Capítulo 8
Monitorização cardíaca, eletrocardiografia e reconhecimento de ritmos
Existem duas alterações do ritmo que, em determinadas circunstâncias, podem parecer FV,
uma vez que ambas originam um ritmo rápido e irregular, de complexos alargados:
Uma é a TV polimórfica (tira de ritmo 12), que pode causar paragem cardíaca e neste
Quando existe débito cardíaco (i. e. pulso palpável), o tratamento da TV deve seguir o
algoritmo da taquicardia de complexos largos descrito no capítulo 11.
146
variações na frequência cardíaca durante um episódio de TV (exceto se em resposta a
antiarrítmicos). A atividade auricular pode continuar a existir, independentemente da
atividade ventricular; a identificação de ondas P, dissociadas dos complexos QRS durante
a taquicardia de complexos largos, identifica o ritmo como TV e não como outro tipo de
taquicardia de complexos largos. Ocasionalmente, estes batimentos auriculares podem ser
conduzidos aos ventrículos, causando complexos de captura e de fusão (tira de ritmo 11). Um
complexo de captura traduz-se por um único complexo QRS de aparência normal, durante
uma TV monomórfica, que não interrompe a arritmia. Num complexo de fusão, ocorre ao
mesmo tempo uma onda de despolarização que sai do nó AV e uma onda de despolarização
sai do foco ventricular que originou a arritmia, o que resulta num complexo QRS híbrido,
causado pela fusão do complexo QRS normal com o complexo da TV monomórfica.
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
Figura 8.8
ECG de 12 derivações com fibrilhação auricular com pré-excitação num doente com síndrome de
Wolff-Parkinson-White
I aVR V1 V4
II aVL V2 V5
III aVF V3 V6
RHYTHM STRIP: II
25 mm/sec: 1 cm / mV
Quando existe bloqueio de ramo, uma taquicardia supraventricular (TSV) dá origem a uma
taquicardia de complexos largos. Após um enfarte do miocárdio, a maioria das taquicardias
de complexos largos são de origem ventricular. A abordagem mais segura é considerar
todas as taquicardias de complexos largos como TV até prova em contrário.
147
Capítulo 8
Monitorização cardíaca, eletrocardiografia e reconhecimento de ritmos
6.3. Assistolia
A aparência da assistolia já foi descrita (tira de ritmo 2). Por vezes não é claro se o ritmo
observado é assistolia ou FV muito fina. Nesta situação, o tratamento imediato é efetuar
7. Arritmias periparagem
São definidas em função da frequência cardíaca (bradiarritmia, taquiarritmia ou arritmia
com frequência normal), sendo o seu tratamento inicial definido por essa característica
(capítulo 11). No doente instável, a atenção deve colocar-se no tratamento precoce para
evitar a deterioração, e não em tentativas prolongadas de identificação do ritmo exato.
7.1. Bradiarritmia
Há bradicardia quando a frequência ventricular (QRS) é < 60/min (tira de ritmo 13). A
bradicardia pode ser um estado fisiológico em atletas ou durante o sono, ou pode ser o
resultado esperado do tratamento (com um betabloqueante, por exemplo). A bradicardia
patológica pode ser causada por disfunção do nó SA ou por falha, parcial ou completa,
da condução auriculoventricular. Alguns doentes com estes ritmos podem precisar de
implantação de pacemaker (tira de ritmo 14). O tratamento de emergência na maioria
das bradicardias é feito com atropina e/ou pacing cardíaco. Ocasionalmente pode ser
necessário utilizar fármacos simpaticomiméticos, tais como a isoprenalina ou a adrenalina.
A necessidade de tratamento depende mais do efeito hemodinâmico da arritmia e do risco
de desenvolver assistolia, do que da exacta classificação eletrocardiográfica da bradicardia.
Por vezes, a bradicardia extrema pode preceder paragem cardíaca, que pode ser evitada
com tratamento atempado e adequado. Neste contexto, a bradiarritmia mais importante é
o bloqueio auriculoventricular completo (ver abaixo).
148
7.1.1. Bloqueio cardíaco: bloqueio auriculoventricular de 1o grau
O intervalo PR é o período de tempo entre o aparecimento da onda P e o início do complexo
QRS (quer comece com onda Q ou R). O intervalo PR normal situa-se entre 0,12 e 0,20 s. Há
bloqueio auriculoventricular (AV) de 1o grau quando o intervalo PR é > 0,20 s, o que é um
achado frequente (tira de ritmo 15). Em alguns países europeus, usa-se o termo “intervalo
PQ” e, para efeitos deste manual, a expressão pode ser utilizada de forma idêntica a
“intervalo PR”. Representa um atraso na condução através da junção AV (o nó AV e o feixe
de His). Em alguns casos pode ser fisiológico (p. ex. em atletas profissionais). Existem muitas
outras causas de bloqueio AV de 1o grau, incluindo doença primária (fibrose) do sistema de
condução, diversos tipos de doença cardíaca estrutural, doença isquémica e utilização de
fármacos que atrasem a condução através do nó AV. O bloqueio AV de 1o grau raramente
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Qualquer doença que atrase a condução AV pode causar bloqueio AV de Wenckebach. Nalguns
casos pode ser fisiológico, como nos atletas de alta competição com tónus vagal elevado. Fora
deste contexto, o bloqueio AV de Wenckebach é geralmente patológico. As suas muitas causas
incluem o enfarte agudo do miocárdio (especialmente enfarte inferior). Se assintomático, não
precisa geralmente de tratamento imediato. A necessidade de tratamento é ditada pelo efeito da
bradiarritmia no doente, e pelo risco de desenvolver bloqueio AV mais grave ou assistolia.
150
7.2. Taquiarritmia
Uma taquicardia patológica pode ter origem no miocárdio auricular, junção AV ou no
miocárdio ventricular. A taquicardia sinusal não é uma arritmia, representando geralmente
a resposta a um outro estado fisiológico ou patológico (p. ex. exercício, ansiedade,
hemorragia, febre, etc.).
alargados quando existe bloqueio de ramo. Quanto ao ritmo, os complexos QRS podem ser
regulares, em muitos ritmos, ou podem ser irregulares, quando existe fibrilhação ou flutter
auricular com condução variável. A maioria das taquicardias com complexos QRS estreitos
tem prognóstico favorável, mas varia consoante as circunstâncias clínicas individuais. Estes
ritmos podem ser mal tolerados por doentes com doença cardíaca estrutural, e podem
provocar angina, especialmente quando existe doença coronária.
• Fibrilhação auricular 8
A fibrilhação auricular é a arritmia mais frequente na prática clínica. Caracteriza-se por
atividade elétrica desorganizada nas aurículas. Nenhuma das derivações mostra ondas P
reconhecíveis ou atividade auricular organizada (tira de ritmo 6). A linha de base é irregular,
e a atividade auricular caótica é melhor observada na derivação V1, na qual a onda auricular
é irregular tanto na amplitude como na frequência. O ritmo dos QRS é irregularmente
irregular (i. e. não há consistência na duração dos intervalos R-R). A frequência ventricular
depende do período refratário da junção AV. Na ausência de tratamento farmacológico
ou doença preexistente que afete o nó AV, a frequência ventricular resultante será rápida,
geralmente 120-180/min ou superior.
• Flutter auricular
No flutter auricular, é visível atividade auricular no ECG com uma frequência de cerca
de 300/min sob a forma de ondas de flutter, também chamadas “ondas F” (tira de ritmo
22). Observam-se melhor nas derivações inferiores II, III e aVF, onde têm uma aparência
em “dentes de serra” (figura 8.4). O ritmo ventricular depende da condução AV, mas
é frequentemente 2:1 (tira de ritmo 9) ou 3:1 (frequentemente referido como flutter
auricular com bloqueio 2:1 ou 3:1, respetivamente). Quando a condução é constante o
ritmo ventricular é também regular; uma condução variável causa um ritmo ventricular
irregular. Tal como a fibrilhação auricular, o flutter auricular está quase sempre
associado a doença subjacente. O flutter auricular tem origem geralmente na aurícula
direita sendo, portanto, uma complicação reconhecida de doenças que afetam o
coração direito, incluindo doença pulmonar obstrutiva crónica, embolia pulmonar
151
Capítulo 8
Monitorização cardíaca, eletrocardiografia e reconhecimento de ritmos
Os doentes com síndrome de WPW têm vias acessórias que ligam o miocárdio auricular
e ventricular. Verifica-se alguma condução auriculoventricular através destas vias, assim
como através do nó AV, o que resulta num alargamento dos complexos QRS com “ondas
delta”. Na presença de vias acessórias deste tipo, que fazem bypass ao nó AV, a FA pode
gerar uma frequência ventricular tão rápida que o débito cardíaco diminui drasticamente.
No ECG, o aspeto é o de uma taquicardia muito rápida e irregular de complexos largos, cuja
largura varia. Este ritmo pode ser diagnosticado incorretamente como TV irregular ou até
como FV. De uma forma geral, o ritmo é mais organizado do que a fibrilhação ventricular e
não tem o padrão de atividade caótica aleatória de amplitude variável.
8. Intervalo QT
Ao identificar e tratar alterações do ritmo é importante reconhecer causas subjacentes
prováveis, que podem influenciar uma escolha eficaz do tratamento. Estas causas podem
ser identificadas através de avaliação clínica (p. ex. enfarte do miocárdio), testes laboratoriais
(p. ex. alterações eletrolíticas) ou pelo ECG. O prolongamento do intervalo QT predispõe
para arritmias ventriculares, particularmente TV e FV.
O intervalo QT é medido desde o início do complexo QRS até ao final da onda T. Pode
ser difícil medi-lo rigorosamente, principalmente porque pode ser difícil identificar o final
da onda T. Isto acontece especialmente quando existem ondas U proeminentes, que se
152
fundem com o final da onda T. As ondas U podem ser características de algumas alterações
(p. ex. hipocaliemia), mas podem também existir em indivíduos saudáveis com corações
normais.
diminui quando a frequência cardíaca aumenta. Este valor pode ser corrigido, utilizando a
medição do intervalo QT e a frequência cardíaca para calcular o intervalo QT corrigido (QTc).
O limite superior da variação normal para o QTc é 0,42 s. Muitos eletrocardiógrafos modernos
medem automaticamente o QT e outros intervalos, e calculam o QTc. Estas medições só são
rigorosas se o registo do ECG for de boa qualidade. A maioria dos eletrocardiógrafos não
distingue entre ondas T e ondas U. Deve-se observar sempre o registo de ECG e garantir
que as medições atribuídas não são claramente incorretas. Em caso de dúvida, procurar um
especialista para ajudar na interpretação. 8
As alterações do intervalo QT podem ser observadas em diversas situações. Um intervalo QT
mais curto pode ser visto na hipercalcémia e no tratamento com digoxina. A hipocaliemia,
hipomagnesemia, hipocalcémia, hipotermia, miocardite e, nalguns casos, a isquemia
do miocárdio podem causar prolongamento do QT. Existe também uma longa lista de
fármacos que podem prolongar o intervalo QT, incluindo os antiarrítmicos de classe I e III.
Existem diversas alterações genéticas nas quais o intervalo QT não é normal, ou onde há
alterações da repolarização ventricular (principalmente as síndromes de QT longo, QT
curto e de Brugada). A alteração na repolarização coloca-os em risco de arritmia ventricular
e morte súbita. Estes indivíduos precisam de cuidados especializados para verificar se é
necessário tratamento para reduzir este risco. Para alguns, o único tratamento eficaz é um
cardioversor desfibrilhador implantável para tratar de imediato a FV ou a TV, se ocorrerem. É
especialmente importante que doentes com síndromes do QT longo não sejam medicados
com fármacos que possam prolongar ainda mais o QT.
153
Capítulo 8
Monitorização cardíaca, eletrocardiografia e reconhecimento de ritmos
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM:
• U
ma abordagem sistemática de análise do ritmo no ECG permite uma
avaliação rigorosa de qualquer alteração, suficiente para possibilitar um
tratamento seguro e eficaz.
• O
s registos de qualquer alteração do ritmo e do ECG em ritmo sinusal do
mesmo doente disponibilizam informação valiosa para diagnóstico, e ajudam a
escolher corretamente o tratamento a longo prazo.
• A
monitorização rigorosa do ritmo cardíaco é essencial em qualquer doente
• A
monitorização rigorosa do ritmo cardíaco é essencial no tratamento da
paragem cardíaca.
LEITURA ADICIONAL
• Blomstrom-Lundqvist C, Scheinmann M M (Co-Chairs). American College of Cardiology/American
Heart Association Task Force and the European Society of Cardiology Committee for Practice Guide-
lines. ACC/AHA/ESC Guidelines for the Management of Patients With Supraventricular Arrhythmias.
European Heart Journal 2003;24:1857-1897. www.escardio.org
• Fuster V, Ryden L E, Cannom DS, et al. ACC/AHA/ESC 2006 Guidelines for the Management of
Patients with Atrial Fibrillation: a report of the American College of Cardiology/American Heart
Association Task Force on Practice Guidelines and the European Society of Cardiology Committee
for Practice Guidelines (Writing Committee to Revise the 2001 Guidelines for the Management of
Patients With Atrial Fibrillation): developed in collaboration with the European Heart Rhythm Asso-
ciation and the Heart Rhythm Society. Circulation 2006;114:e257-354. www.escardio.org
• Zipes DP, Camm AJ, Borggrefe M, et al. ACC/AHA/ESC 2006 guidelines for management of patients
with ventricular arrhythmias and the prevention of sudden cardiac death: a report of the American
College of Cardiology/American Heart Association Task Force and the European Society of Cardiol-
ogy Committee for Practice Guidelines (Writing Committee to Develop Guidelines for Management
of Patients With Ventricular Arrhythmias and the Prevention of Sudden Cardiac Death) J Am Coll
Cardiol 2006;48:e247-e346. www.escardio.org
154
Tira de Ritmo 1
Ritmo sinusal normal
Tira de Ritmo 2
Assistolia
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
Tira de Ritmo 3
Assistolia de ondas P
Tira de Ritmo 4
Fibrilhação ventricular grosseira
Tira de Ritmo 5
Fibrilhação ventricular fina
Tira de Ritmo 6
Fibrilhação auricular
155
Capítulo 8
Monitorização cardíaca, eletrocardiografia e reconhecimento de ritmos
Tira de Ritmo 7
Extrassístole ventricular prematura
Tira de Ritmo 8
Extrassístole juncional de escape
Tira de Ritmo 10
Taquicardia ventricular monomórfica
Tira de Ritmo 11
Taquicardia ventricular com batimentos de captura e de fusão
156
Tira de Ritmo 12
Taquicardia ventricular polimórfica – Torsade de Pointes (TdP)
Tira de Ritmo 13
Bradicardia sinusal
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Tira de Ritmo 14
Ritmo de pacing
Tira de Ritmo 15
Bloqueio auriculoventricular de 1º grau
Tira de Ritmo 16
Bloqueio Mobitz tipo I ou de Wenckebach
Tira de Ritmo 17
Bloqueio auriculoventricular de 2º grau Mobitz tipo II (2:1)
157
Capítulo 8
Monitorização cardíaca, eletrocardiografia e reconhecimento de ritmos
Tira de Ritmo 18
Bloqueio auriculoventricular de 2º grau Mobitz tipo II (3:1)
Tira de Ritmo 19
Bloqueio auriculoventricular de 3º grau (completo)
Tira de Ritmo 21
Taquicardia supraventricular
Tira de Ritmo 22
Flutter auricular com bloqueio auriculoventricular completo
158
Capítulo 9.
Desfibrilhação
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OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
• o
mecanismo da desfibrilhação
• o
s fatores que afetam o sucesso da desfibrilhação
• a importância de minimizar as interrupções das compressões torácicas
durante a desfibrilhação
• c omo aplicar um choque em segurança, com um desfibrilhador manual
ou com um desfibrilhador automático externo (DAE)
1. Introdução
Quando ocorre uma fibrilhação ventricular ou uma taquicardia ventricular sem pulso (FV/
TVsP), o débito cardíaco cessa e no espaço de 3 minutos inicia-se a lesão cerebral hipóxica.
Para haver recuperação neurológica completa, a desfibrilhação precoce bem-sucedida, com
restabelecimento de circulação espontânea (RCE), é essencial. A desfibrilhação é um elo
essencial da cadeia de sobrevivência, e uma das poucas intervenções que demonstraram
melhorar os resultados na paragem cardíaca por FV / TVsP. A probabilidade de desfibrilhação
com sucesso diminui rapidamente com o tempo; por isso, a desfibrilhação precoce é um
dos fatores mais importantes para a sobrevivência a uma paragem cardíaca. Na ausência de
RCP por uma testemunha, a mortalidade aumenta 10-12 % por cada minuto que passa entre
o colapso e a tentativa de desfibrilhação. Quanto menor for o intervalo entre o início da FV/
TVsP e a aplicação do choque, maior é a probabilidade de desfibrilhação bem-sucedida
e de sobrevivência. Apesar de a desfibrilhação ser essencial no tratamento de doentes
com FV/TVsP, as compressões torácicas contínuas e ininterruptas são também necessárias
para otimizar as hipóteses de reanimação com sucesso. A análise da qualidade da RCP em
estudos de paragem cardíaca extra e intra-hospitalar demonstraram que interrupções
significativas são frequentes, e que devem ser feitos todos os esforços para as minimizar.
O objetivo deverá ser assegurar compressões torácicas contínuas durante a tentativa de
reanimação, com pausas unicamente para permitir intervenções específicas.
159
Capítulo 9
Desfibrilhação
2. Mecanismo da desfibrilhação
A desfibrilhação é a passagem através do miocárdio de uma corrente elétrica de magnitude
suficiente para despolarizar em simultâneo uma massa crítica de músculo cardíaco,
permitindo que o tecido de pacemaker natural retome o controlo. Para garantir isso,
todos os desfibrilhadores têm três características comuns: uma fonte de energia capaz de
disponibilizar corrente direta (DC), um acumulador que possa ser carregado até um nível de
energia predeterminado, e dois elétrodos de desfibrilhação (termo aplicado tanto para pás
manuais como placas autoadesivas) que são colocados no tórax do doente, em cada um dos
lados do coração, e através dos quais o acumulador é descarregado. A desfibrilhação bem-
sucedida é definida cientificamente como a ausência de FV / TVsP após 5 s da aplicação do
choque, apesar do objetivo final ser o RCE.
160
A presença de medicamentos transdérmicos no tórax do doente pode impedir bom
contacto. Além disso, podem ocorrer arcos voltaicos e queimaduras se os elétrodos
autoadesivos forem colocados sobre os transdérmicos. Se a sua remoção e a secagem
da zona antes da aplicação dos elétrodos for atrasar a desfibrilhação, então os elétrodos
devem colocar-se numa posição alternativa, de forma a evitá-los.
elétrodos vão ser colocados. No entanto, a desfibrilhação não deve ser atrasada caso não
exista uma lâmina disponível imediatamente. Em doentes com muitos pelos, a posição bi-
axilar dos elétrodos pode permitir uma desfibrilhação mais rápida.
161
Capítulo 9
Desfibrilhação
Figura 9.1
Posicionamento padrão dos elétrodos para desfibrilhação
162
3.4. Sequência de choques
Com a eficácia do primeiro choque de ondas bifásicas a exceder geralmente 90 %, o
insucesso na cardioversão da FV sugere a necessidade de RCP para perfundir o miocárdio,
em vez da aplicação de um choque adicional. Assim, imediatamente após a aplicação
de um único choque e sem reavaliar o ritmo ou procurar pulso, deve-se reiniciar RCP (30
compressões:2 ventilações) durante 2 min antes de aplicar novo choque (se indicado – ver
abaixo). Mesmo que a tentativa de desfibrilhação seja bem-sucedida no restabelecimento
de um ritmo compatível com perfusão, é muito raro conseguir palpar pulso imediatamente
após a desfibrilhação, e o atraso ao tentar fazê-lo vai comprometer ainda mais o miocárdio
caso não tenha sido restabelecido um ritmo capaz de o perfundir. Caso tenha sido
restabelecido um ritmo compatível com perfusão, a aplicação de compressões torácicas
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163
Capítulo 9
Desfibrilhação
Continua a não existir evidência para suportar tanto um protocolo fixo como um de escalada
de energia, apesar de um protocolo de escalada estar associado a menor incidência de “re-
fibrilhação”. Ambas as estratégias são aceitáveis; no entanto, se o primeiro choque não tiver
sucesso e o desfibrilhador tiver capacidade para choques com energias mais elevadas, é
razoável aumentar a energia em choques subsequentes.
Figura 9.2
Onda bifásica truncada exponencial
164
Figura 9.3
Onda bifásica retilínea
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
Não existe evidência de que qualquer uma das ondas bifásicas mais utilizadas seja mais
eficaz. Apesar da energia inicial do choque bifásico não dever ser inferior a 120 J para a BRL 9
ou a 150 J para as ondas BTE, recomenda-se, para simplificar, que o choque bifásico inicial
seja no mínimo de 150 J independentemente do tipo de onda bifásica.
165
Capítulo 9
Desfibrilhação
4. Segurança
As tentativas de desfibrilhação devem ser feitas sem risco para os membros da equipa de
reanimação, sendo este objetivo mais facilmente alcançável com a utilização de elétrodos
na forma de placas autoadesivas, já que estes eliminam a possibilidade de alguém tocar em
alguma parte do elétrodo. Deve ter-se cuidado com roupas ou áreas circundantes molhadas
O uso de luvas pode oferecer alguma proteção da corrente elétrica; assim, recomenda-se
vivamente que todos os membros da equipa de reanimação usem luvas.
166
não, durante tentativas de desfibrilhação em vítimas de paragem cardíaca. Os avanços na
tecnologia, especialmente no que se refere à capacidade das baterias e ao software de
análise de arritmia, permitiram a produção em massa de desfibrilhadores relativamente
baratos, de confiança, fáceis de utilizar e portáteis. Os desfibrilhadores com recomendação
de choque têm capacidade de análise de ECG, mas profissionais de saúde capazes de
reconhecer ritmos podem facilmente sobrepor-se-lhes manualmente.
Os DAE podem ser utilizados com segurança e eficácia por pessoas com um treino mínimo,
ou até sem treino, e tornam possível a desfibrilhação muitos minutos antes da chegada de
ajuda profissional. Os operacionais de RCP devem assegurar uma interrupção mínima de
compressões enquanto aplicam e utilizam os DAE. Devem ainda concentrar-se em seguir
imediatamente as instruções vocais, especialmente o reinício das compressões. Um DAE
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Apesar da evidência ser limitada, os DAE devem ser considerados no contexto hospitalar
como uma forma de facilitar a desfibrilhação rápida (no período máximo de 3 min após
o colapso), especialmente em zonas onde os profissionais não têm competências para
reconhecimento de ritmos ou nas quais a utilização de desfibrilhadores não é frequente.
Deve ser instituído um sistema eficaz de treino inicial e de manutenção. Deve ser treinado
um número suficiente de profissionais para que seja alcançado o objetivo de aplicar o
primeiro choque nos 3 min após o colapso, em qualquer local do hospital.
O treino para a utilização de DAE é muito mais fácil e rápido do que para o uso dos
desfibrilhadores manuais. Os equipamentos automáticos permitiram disponibilizar a
167
Capítulo 9
Desfibrilhação
168
Figura 9.4
Algoritmo de DAE
Sem resposta?
Pedir ajuda
Ir buscar um DAE,
ou pedir a alguém*
* Ligar 112*
RCP 30:2
Até à conexão do DAE
O DAE 9
avalia o ritmo
1 choque
169
Capítulo 9
Desfibrilhação
170
Figura 9.6
Funcionamento de um desfibrilhador com aviso de choque e RCP eficaz
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6. Desfibrilhação manual
Os desfibrilhadores manuais permitem que o reanimador diagnostique o ritmo e aplique 9
o choque rapidamente, sem ter que esperar pela análise de ritmo, o que vai minimizar a
interrupção das compressões torácicas. Muitas vezes, os desfibrilhadores manuais têm
funções adicionais tais como a capacidade de aplicar choques sincronizados e dispositivos
externos de pacing. A principal desvantagem destes aparelhos é que o reanimador tem de
ser experiente no reconhecimento de ritmos de ECG; assim, comparativamente aos DAE, é
necessário treino adicional.
171
Capítulo 9
Desfibrilhação
172
Figura 9.7
Aplicação de placas de desfibrilhação
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Figura 9.8
Carga durante compressões torácicas
Uma vez que as pás manuais de desfibrilhação ainda se encontram em utilização em muitos
países, emitem-se as seguintes recomendações para a sua utilização:
6.a. Confirmar FV, e se existirem dúvidas confirmar em tira de ritmo impressa; a pessoa
designada seleciona no desfibrilhador a energia adequada (energia máxima para os
monofásicos), deixa as pás no desfibrilhador e aciona o botão de carga.
6.b. Aplicar gel condutor no tórax do doente.
173
Capítulo 9
Desfibrilhação
7. Desfibrilhação pré-hospitalar
Existe evidência de que efetuar compressões torácicas enquanto se espera pela chegada,
e posterior carga, do desfibrilhador aumenta a probabilidade de sobrevivência. Os
operacionais dos SEM devem efetuar RCP de elevada qualidade enquanto esperam pela
chegada, conexão e carga do desfibrilhador. A desfibrilhação não deve ser adiada mais do
que o necessário para confirmar a sua indicação e carregar com a energia selecionada. Já
não se recomenda realizar um período pré-especificado de RCP antes da análise do ritmo
e da aplicação do choque.
Os leigos e reanimadores que utilizem DAE devem ligar o equipamento logo que possível
e seguir as instruções.
8. Cardioversão sincronizada
Quando se utiliza a cardioversão elétrica na conversão de taquiarritmias auriculares ou
ventriculares, o choque tem de ser sincronizado para ocorrer com a onda R (e não a T) do
eletrocardiograma. O risco de induzir FV é menor quando se evita o período refratário
relativo. A maioria dos desfibrilhadores manuais tem um botão que permite que o choque
seja ativado pela onda R do eletrocardiograma. Os elétrodos são aplicados na parede
torácica e a cardioversão é feita nos mesmos moldes da desfibrilhação, mas o reanimador
deve antecipar um ligeiro atraso entre carregar no botão e a aplicação do choque quando
a onda R seguinte ocorre. Não se podem mover os elétrodos do desfibrilhador durante este
período, senão o complexo QRS não é detetado. Os cuidados de segurança devem ser os
mesmos a ter na desfibrilhação.
A sincronização pode ser difícil na TV devido aos complexos alargados e às formas variáveis
de arritmia ventricular. Se a sincronização falhar, aplicar choques não sincronizados ao
doente instável com TV para evitar atrasos prolongados no restabelecimento de ritmo
sinusal. A fibrilhação ventricular ou a TV sem pulso requerem choques não sincronizados.
174
Antes de tentar cardioversão sincronizada, os doentes conscientes devem ser anestesiados
ou sedados.
causando queimaduras no local onde a ponta do elétrodo contacta com o miocárdio. Isto
pode aumentar a impedância no ponto de contacto e aumentar gradualmente o limiar
de pacing. Devem-se colocar os elétrodos de desfibrilhação à distância mínima de 8 cm
do pacemaker, para diminuir estes riscos. Em alternativa, podem-se colocar as placas na
posição ântero-posterior ou póstero-lateral, conforme anteriormente descrito. Se a
reanimação for bem-sucedida após a desfibrilhação, deve-se verificar o limiar do pacemaker
com regularidade durante os dois meses seguintes. Relatos recentes descrevem casos de
reanimadores que receberam choques de CDI quando estavam em contacto com o doente
durante a RCP. É especialmente importante usar luvas e evitar o contacto com o doente
durante a RCP, já que não há qualquer aviso antes do CDI descarregar.
9
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
• N
o doente com FV/TVsP a desfibrilhação precoce é a única forma eficaz de
restabelecer circulação espontânea.
• A
o usar um desfibrilhador, minimizar as interrupções das compressões
torácicas.
175
Capítulo 9
Desfibrilhação
LEITURA ADICIONAL
• Soar J, et al. European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015. Section 3.
Adult Advanced Life Support. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.016; p99 - p146
• Soar J, Callaway CW, Aibiki M, et al. Part 4: Advanced life support: 2015 International Consensus on
Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care Science With Treatment
Recommendations. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.042; e71 - e122
176
Capítulo 10.
Pacing cardíaco
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
• a s indicações para pacing cardíaco no contexto periparagem
• como fazer pacing por percussão
• como aplicar pacing elétrico transcutâneo, não invasivo
• problemas associados a pacing transvenoso provisório e como corrigi-los
• c omo tratar doentes com pacemakers permanentes e cardioversores
desfibrilhadores implantáveis nos contextos de paragem cardíaca e de
periparagem
1. Introdução
Em alguns casos de paragem ou periparagem cardíaca, a utilização adequada de pacing
pode salvar a vida. O pacing não invasivo pode ser utilizado para manter temporariamente
o débito cardíaco, enquanto se espera por ajuda especializada para estabelecer o
tratamento a longo prazo; pode ser iniciado rapidamente, e faz parte das competências de
um operacional de SAV.
177
Capítulo 10
Pacing cardíaco
Figura 10.1
Sistema de condução cardíaca
Nó sinoauricular
Nó auriculoventricular
Feixe de His
Ramo direito
Ramo esquerdo
Fascículo anterior
Quando ocorre bloqueio completo ao nível do nó AV, a atividade automática mais rápida
passa a ter origem nas células imediatamente abaixo do bloqueio, que se tornam o novo
pacemaker. A frequência intrínseca destas células é relativamente rápida (frequentemente
cerca de 50/min). O ritmo de escape que daí resulta é quase sempre relativamente estável,
com pouca probabilidade de falhar e causar assistolia.
Os complexos QRS que resultam deste tipo de bloqueio são estreitos, porque o impulso
é rapidamente transmitido aos ventrículos através do sistema de His-Purkinje, que está
intacto. Esta situação pode verificar-se como uma complicação de enfarte agudo do
miocárdio inferior. Neste contexto, um bloqueio completo de complexos estreitos pode
não necessitar de pacing porque, na maioria das vezes, a frequência cardíaca não é
particularmente lenta e o risco de assistolia é geralmente baixo.
Pode haver bloqueio completo na zona inferior do sistema de condução quando todas
as fibras dos ramos do feixe de His estão envolvidas, como por exemplo após enfarte do
178
miocárdio ântero-septal ou como resultado de outras doenças, nas quais estão incluídas a
fibrose degenerativa e a doença valvular. Qualquer atividade automática que tenha origem
abaixo deste bloqueio, nas fibras distais de Purkinje, será provavelmente lenta e instável.
Nesta situação, os complexos QRS resultantes são alargados, uma vez que o impulso passa
lentamente através do músculo ventricular, e não rapidamente através do sistema de His-
Purkinje. O ritmo de escape é instável, e pode falhar por breves instantes, provocando
síncope (episódio de Stokes-Adams), ou por completo, causando pausa ventricular e
paragem cardíaca. Bloqueios completos de complexos alargados exigem pacing cardíaco,
e a ocorrência de pausas ventriculares significativas tornam-no urgente já que implica risco
de assistolia. Deve ser sempre ponderado o possível risco de bloqueio AV mais grave e de
assistolia num doente admitido por síncope e com evidência eletrocardiográfica de atraso
na condução (p.ex. intervalo PR longo ou bloqueio de ramo). Estes doentes precisam, no
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
O pacing raramente é bem-sucedido na assistolia com ausência de ondas P, e não deve ser
tentado de forma rotineira nesta situação.
O estímulo ao miocárdio pode ser mecânico, como no pacing por percussão, ou elétrico,
como no transcutâneo e transvenoso. 10
Se um estímulo induz complexos QRS imediatos diz-se que houve “captura”. Confirmar
sempre que a atividade elétrica observada no ECG é acompanhada de atividade mecânica
capaz de produzir pulso palpável.
3. Métodos de pacing
Os métodos de pacing classificam-se em:
Não invasivos
• pacing por percussão (“pacing de punho”)
• pacing transcutâneo
Invasivos
• Pacing provisório transvenoso
• Pacing com dispositivo definitivo
Os dispositivos implantáveis definitivos que fazem pacing são: pacemakers convencionais
para tratar bradicardia, pacemakers biventriculares para tratar insuficiência cardíaca
(terapêutica de ressincronização cardíaca) e cardioversores desfibrilhadores implantáveis
(CDI), que também têm função de pacemaker.
179
Capítulo 10
Pacing cardíaco
Tal como a RCP, o pacing por percussão é um procedimento de emergência que é utilizado
para tentar manter a circulação aos órgãos vitais e permitir o restabelecimento de ritmo
cardíaco espontâneo ou ganhar tempo até ao pacing transcutâneo ou transvenoso. Uma
vez que não se trata de uma solução a longo prazo, deve-se procurar o apoio de peritos.
180
A maioria dos sistemas modernos de pacing transcutâneo funciona com “pacing on
demand”: os complexos QRS intrínsecos são identificados (sensing), e os estímulos elétricos
só são aplicados (pacing) quando é necessário (on demand). De notar que é necessária
monitorização simultânea adicional do ritmo do doente com os elétrodos do ECG habituais
(pequenos) para que a maioria dos equipamentos funcione adequadamente.
181
Capítulo 10
Pacing cardíaco
Para as posições A-P, colocar a placa autoadesiva anterior na parede torácica anterior
esquerda, lateral ao esterno, sobre as posições V2 e V3 do ECG. Colocar a placa posterior
entre a parte inferior da omoplata esquerda e a coluna, ao mesmo nível horizontal da placa
anterior.
182
Nesta situação, a causa mais provável é disfunção grave do músculo cardíaco, mas devem
ser ponderadas outras causas possíveis.
Quando o pacing transcutâneo gerar débito cardíaco adequado, deve-se procurar ajuda
especializada para discutir a colocação de um sistema de pacing transvenoso.
Figura 10.3a
Pacing transcutâneo. Aspeto de spike de pacing no ECG. 10
Pacing Spike
Artifact
183
Capítulo 10
Pacing cardíaco
Deve-se verificar diariamente o limiar de pacing nos pacemakers provisórios, para garantir
que o output programado é superior a esse limiar. Se assim não for, pode dar-se perda de
captura. No ECG esta situação reflete-se pela existência de spike de pacing sem complexo
QRS a seguir. A perda de captura pode ser intermitente, pelo que qualquer aparente ‘perda
de batimento’ deste tipo deve levar a uma nova verificação do limiar de pacing.
Deve-se garantir que todas as ligações entre o eletrocatéter e o pacemaker estão a fazer
bom contacto e estão bem fixas, para que não se desliguem facilmente, por exemplo por
pequenos movimentos do eletrocatéter ou do cabo.
184
pilhas não estão gastas. Caso nenhuma destas causas se confirme, é possível que haja uma
fratura no interior de um cabo. Esta última provoca falha de pacing de forma intermitente,
e geralmente ocorre no cabo de ligação ao gerador e não no eletrocatéter. Caso se suspeite
desta situação, trocar de imediato o cabo de ligação.
• Deslocação do elétrodo
A extremidade distal de eletrocatéter transvenoso é geralmente colocada no ápex do
ventrículo direito. O eletrocatéter deve ter uma folga adequada na sua passagem através da
aurícula direita para permitir mudanças na postura e movimentos respiratórios profundos,
mas não excessiva.
e penetrar no pericárdio sem que a sua mudança de posição seja óbvia na radiografia
do tórax. Muito raramente, pode provocar tamponamento do pericárdio, pelo que se
deve considerar esta possibilidade se um doente com um eletrocatéter recentemente
implantado sofrer paragem cardíaca em atividade elétrica sem pulso.
Quando se verifica deslocação ou perfuração, o ECG continua a ter spikes de pacing, mas é
provável a perda intermitente ou completa de captura do estímulo, pelo que os spikes não
são seguidos de forma consistente por complexos QRS. Quando um eletrocatéter se desloca,
mas permanece no ventrículo direito, pode desencadear extrassístoles ventriculares ou
arritmias ventriculares mais graves, incluindo TV e FV. Quando o eletrocatéter transvenoso
falha, há risco de pausa ventricular, que pode ser de duração curta e causar síncope, ou
prolongada e causar paragem cardíaca em assistolia. Numa situação deste tipo deve-se usar
pacing não invasivo até que seja restabelecida a eficácia do pacing provisório transvenoso. 10
Ao avaliar um doente com a abordagem ABCDE, verificar (no ‘E’) se existe um dispositivo
implantado. Estes dispositivos são geralmente implantados abaixo da clavícula, mais
habitualmente do lado esquerdo. Caso se detete um dispositivo, pode tratar-se de um
pacemaker ou um CDI; no caso do primeiro, deve-se tentar perceber se foi implantado para
tratar bradiarritmia ou insuficiência cardíaca.
185
Capítulo 10
Pacing cardíaco
Se um doente com um CDI sofrer uma paragem cardíaca que não é resolvida pelo próprio
CDI, deve-se efetuar RCP na forma habitual. Até há pouco tempo pensava-se que as
compressões torácicas podiam ser aplicadas sem risco para o reanimador mesmo que o
CDI aplicasse um choque interno ao doente durante as compressões torácicas. Contudo,
existem relatos raros de reanimadores que sofreram choques de um CDI. Este risco pode
ser minimizado com a utilização de luvas. Na presença de paragem cardíaca com ritmo
desfibrilhável e que não é resolvido pelo CDI, deve-se efetuar desfibrilhação externa
186
convencional, seguindo as mesmas precauções na escolha da posição para as pás do
desfibrilhador que se tomariam num doente com um pacemaker implantado. A imediata
avaliação e verificação do aparelho (CDI, pacemaker) por um perito são obrigatórias após
desfibrilhação externa ou reanimação.
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
pacing não invasivo pode ser realizado por qualquer indivíduo capaz de
• O
efetuar SAV, sendo o tratamento imediato de bradiarritmias com risco potencial
para o doente e que não responde à terapêutica farmacológica inicial.
pacing não invasivo é uma medida temporária para ser utilizada até ao
• O
retorno de um ritmo espontâneo estável e eficaz, ou até ser estabelecido pacing
transvenoso por um profissional experiente.
187
Capítulo 10
Pacing cardíaco
LEITURA ADICIONAL
• National Institute for Clinical Health & Excellence 2006. Technology Appraisal 95. Implantable
cardioverter defibrillators for arrhythmias. Review of Technology Appraisal 11. www.nice.org.uk
• Soar J, et al. European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015. Section 3. Adult
Advanced Life Support. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.016; p99 - p146
• Soar J, Callaway CW, Aibiki M, et al. Part 4: Advanced life support: 2015 International Consensus on
Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care Science With Treatment
Recommendations. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.042; e71 - e122
188
Capítulo 11.
Arritmias periparagem
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
• a importância das arritmias que podem ocorrer antes ou após uma paragem
cardíaca
1. Introdução
As alterações de ritmo que ocorrem no período periparagem podem ser classificadas em
duas categorias principais:
• Arritmias que podem provocar uma paragem cardíaca - muitas alterações de
ritmo ocorrem sem provocar paragem cardíaca: são uma complicação relativamente
frequente do enfarte agudo do miocárdio (EAM), mas são também frequentes
em doentes com outras doenças cardíacas ou até sem doença cardíaca coronária
ou estrutural. Quando não são tratadas, algumas destas arritmias podem levar
a paragem cardíaca ou a uma deterioração evitável do estado do doente. Outras
arritmias podem não necessitar de tratamento imediato.
189
Capítulo 11
Arritmias periparagem
2. Sequência de ações
Quando se suspeita ou já se confirmou a presença de uma arritmia, deve-se começar por
avaliar o doente através da metodologia ABCDE, incluindo monitorização cardíaca precoce
(ver capítulo 8). Deve-se ainda avaliar o doente especificamente para critérios de gravidade
(ver abaixo), colocar um cateter intravenoso e, se apropriado, administrar oxigénio. Sempre
que possível, regista-se um ECG de 12 derivações o mais precocemente possível. Isto
ajudará a identificar o ritmo exato, seja antes de iniciar o tratamento ou retrospetivamente,
3. Critérios de gravidade
A presença, ou não, de sinais ou sintomas de gravidade vai ditar a urgência e o tipo de
tratamento na maioria das arritmias. Os seguintes critérios de gravidade indicam que
um doente está instável e em risco de agravamento, seja total ou parcialmente devido à
arritmia:
• Choque - hipotensão (pressão sistólica < 90 mmHg), palidez, sudorese, extremidades
frias, confusão mental ou alteração do estado de consciência.
• Síncope - perda transitória de consciência, por diminuição global do fluxo sanguíneo
cerebral.
• Insuficiência cardíaca - edema pulmonar e/ou aumento da pressão venosa jugular
(com ou sem edema periférico e hepatomegalia).
• Isquemia do miocárdio - dor torácica isquémica típica, e/ou evidência de isquemia
do miocárdio num ECG de 12 derivações.
• Frequências cardíacas extremas – além das características previamente enunciadas,
poderá ser adequado considerar frequências cardíacas extremas como um sinal de
gravidade por si só, com necessidade de avaliação e tratamento mais urgentes do
que taquicardia ou bradicardia menos extremas e sem critérios de gravidade.
1. T aquicardia extrema: quando a frequência cardíaca aumenta, a diástole diminui
mais do que a sístole. As alterações de ritmo que provocam frequências cardíacas
muito rápidas (p. ex. >150 bpm) reduzem drasticamente o débito cardíaco (uma
vez que a diástole se torna muito curta e o coração não tem tempo para encher
apropriadamente) e o fluxo coronário (porque este ocorre maioritariamente
na diástole), provocando potencialmente isquemia do miocárdio. Quanto mais
rápida for a frequência cardíaca, menos será tolerada pelo doente.
190
2. B
radicardia extrema: geralmente, quanto mais lenta a bradicardia pior será
tolerada; frequências cardíacas inferiores a 40 bpm são frequentemente mal
toleradas. Isto acontece especialmente em indivíduos com doença cardíaca
grave que não conseguem compensar a bradicardia através do aumento
do volume de ejeção. Alguns indivíduos com doença cardíaca muito grave
necessitam de frequências cardíacas mais rápidas do que o normal para
manter o débito cardíaco, e mesmo uma frequência cardíaca “normal” pode ser
inapropriadamente lenta para eles.
4. Opções de tratamento
Em função do estado clínico do doente (i. e. presença ou ausência de critérios de gravidade)
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
191
Capítulo 11
Arritmias periparagem
6. Taquiarritmia
Este deve certificar-se que o desfibrilhador está regulado para aplicar um choque
sincronizado, para que este coincida com a onda R. Um choque não sincronizado pode
coincidir com a onda T e provocar fibrilhação ventricular (FV).
Para aplicar o choque, deve-se carregar no botão respetivo e mantê-lo pressionado até o
choque ocorrer; pode demorar um pouco até o choque ser aplicado.
Se for preciso um segundo choque sincronizado, pode ser necessário reativar o interruptor
de sincronização, dependendo dos desfibrilhadores
192
6.3. Se o doente não tem critérios de gravidade
Se o doente com taquicardia estiver estável (sem sinais ou sintomas de gravidade) e sem
tendência para deteriorar, é possível o tratamento farmacológico. Avaliar o ritmo com um
ECG de 12 derivações e medir a duração do QRS; se for igual ou superior a 0,12 segundos (3
quadrados pequenos em papel padrão de ECG), trata-se de uma taquicardia de complexos
largos. Quando a duração do QRS for inferior a 0,12 segundos, trata-se de uma taquicardia
de complexos estreitos.
11
193
Capítulo 11
Arritmias periparagem
Figura 11.1
Algoritmo da taquicardia
Estável
na se há evidência de insuficiên-
cia cardíaca
Anticoagular se duração >48h
Pedir ajuda
Conversão a ritmo sinusal normal? NÃO
especializada
SIM
As possibilidades incluem: Se taquicardia ventricular
n FA com bloqueio de ramo
(ou ritmo incerto):
tratar como as de complexos n Amiodarona 300 mg IV em 20-60
*A tentativa de cardioversão em doente consciente deve ser sempre efetuada sob sedação ou anestesia geral
194
6.4. Taquicardia de complexos largos
As taquicardias de complexos largos têm geralmente origem ventricular. Apesar de
poderem ser causadas por ritmos supraventriculares com condução aberrante, no doente
instável e em contexto periparagem deve-se assumir que se trata de taquicardia ventricular.
No doente estável com taquicardia de complexos largos, deve-se determinar se o ritmo é
regular ou irregular.
arritmia, deve-se administrar adenosina uma vez que pode converter o ritmo a sinusal e ajudar
a diagnosticar o ritmo de base.
Uma taquicardia ventricular num doente estável pode ser tratada com amiodarona 300
mg intravenosa durante 20-60 minutos, seguida de 900 mg em perfusão em 24 h. Deve-se
consultar um especialista antes de ponderar tratamentos alternativos como procainamida ou
sotalol.
195
Capítulo 11
Arritmias periparagem
196
auricular tem condução 2:1, ou até 1:1, e se acompanha de bloqueio de ramo, produz uma
taquicardia de complexos largos muito difícil de distinguir de TV. Tratar este ritmo com
fármacos como se fosse uma TV geralmente é eficaz, ou pelo menos abranda a resposta
ventricular e permite a identificação correta do ritmo.
197
Capítulo 11
Arritmias periparagem
mais apropriado será a cardioversão sincronizada imediata, pelo que esta é uma excepção
ao braço não desfibrilhável do algoritmo de SAV (capítulo 6).
7. Bradiarritmias
A bradicardia define-se como frequência cardíaca < 60 bpm em repouso. Pode ser:
• fisiológica (p. ex. em atletas)
• de origem cardíaca (p. ex. enfarte do miocárdio; isquemia miocárdica; doença do
nó sinusal)
• de origem não cardíaca (p. ex. vasovagal; hipotermia; hipoglicemia; hipotiroidismo,
aumento da pressão intracraniana)
• induzida por fármacos (p.ex. digoxina; antagonistas do cálcio).
As bradicardias são causadas por uma redução da frequência de disparo do nó sinoauricular
ou pela falência do sistema de condução auriculoventricular. A primeira situação ocorre
198
na bradicardia sinusal (causada por excesso de tónus vagal), pausa sinusal e doença do
nó sinusal. Já os bloqueios auriculoventriculares (AV) dividem-se em primeiro, segundo e
terceiro graus, e podem estar associados a múltiplos fármacos e alterações eletrolíticas,
assim como problemas estruturais causados por enfarte agudo do miocárdio e miocardite.
Um bloqueio AV de primeiro grau é definido por um prolongamento do intervalo P-R (>
0,20 s), e geralmente é benigno. O bloqueio AV de segundo grau divide-se em Mobitz
tipo I e II. No Mobitz tipo I, o bloqueio AV é no nó AV, e é geralmente transitório e pode
ser assintomático. No Mobitz tipo II, o bloqueio está habitualmente abaixo do nó AV, já
no feixe de His ou nos seus ramos, e é potencialmente sintomático e com potencial para
progredir para bloqueio AV completo. O bloqueio de terceiro grau (completo) define-se por
dissociação AV, que pode ser permanente ou transitória, dependendo da causa.
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• Avaliação inicial
Deve-se avaliar o doente com bradicardia segundo a metodologia ABCDE. Considerar a
causa potencial da bradicardia e procurar critérios de gravidade. Tratar as causas reversíveis
identificadas na avaliação inicial. Se existirem critérios de gravidade, começar a tratar a
bradicardia. O tratamento inicial é farmacológico, ficando o pacing reservado para os
doentes que não respondem aos fármacos ou que apresentam fatores de risco para assistolia
(figura 11.2).
Se a atropina não for eficaz, ponderar fármacos de segunda linha. Estes incluem a perfusão
de isoprenalina (dose inicial 5 mcg/min), adrenalina (2-10 mcg/min) ou dopamina (2,5-10
mcg/kg/min). Ponderar a utilização de teofilina (100-200 mg em injeção intravenosa lenta)
na bradicardia causada por enfarte agudo do miocárdio da parede inferior, lesão da medula
ou em transplantes cardíacos. A administração de glucagon intravenoso está indicada se
um betabloqueante ou antagonista do cálcio forem a causa provável da bradicardia. Não
administrar atropina a doentes com transplantes cardíacos - pode causar bloqueio AV de
grau elevado ou mesmo paragem sinusal.
O pacing transcutâneo pode ser doloroso e pode não conseguir obter captura mecânica
eficaz. Verificar se há captura mecânica (se palpa pulso) e reavaliar o estado do doente
199
Capítulo 11
Arritmias periparagem
(ABCDE). Usar analgesia e sedação para controlar a dor, e tentar identificar a causa da
bradiarritmia.
Se a atropina não for eficaz e não estiver disponível de imediato pacing transcutâneo, tentar
pacing de percussão como medida temporária até haver equipamento de pacing. Aplicar
murros rítmicos seriados com o punho cerrado sobre o bordo inferior esquerdo do esterno,
para estimular o coração numa frequência de 50-70 batimentos bpm.
200
Figura 11.2.
Algoritmo da bradicardia
SIM NÃO
n Fármacos alternativos*
OR
n Pacing transcutâneo
* Fármacos alternativos
incluem:
n Aminofilina
n Dopamina
n lucagon (em sobredosagem
G
de betabloqueantes ou
antagonistas do cálcio)
n licopirrolato pode ser
G
alternativa à atropina
201
Capítulo 11
Arritmias periparagem
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
• A
s arritmias que ocorrem após recuperação de paragem cardíaca e RCE
podem precisar de tratamento, para estabilizar o doente e evitar a
recorrência de paragem cardíaca.
• N
outros contextos, algumas arritmias podem necessitar de tratamento rápido
para evitar deterioração, incluindo progressão para paragem cardíaca,
enquanto outras não exigem tratamento imediato.
• A
avaliação de um doente com arritmia deve ser feita segundo a abordagem
ABCDE.
LEITURA ADICIONAL
• Soar J, et al. European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015. Section 3. Adult
Advanced Life Support. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.016; p99 - p146
• Soar J, Callaway CW, Aibiki M, et al. Part 4: Advanced life support: 2015 International Consensus on
Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care Science With Treatment Rec-
ommendations. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.042; e71 - e122
• Blomstrom-Lundqvist C, Scheinmann M M (Co-chairs). American College of Cardiology/American
Heart Association Task Force and the European Society of Cardiology Committee for Practice Guide-
lines. ACC/AHA/ESC Guidelines for the Management of Patients With Supraventricular Arrhythmias.
www.escardio.org
• Moya A, Sutton R (Co-chairs). The Task Force for the Diagnosis and Management of Syncope of the
European Society of Cardiology (ESC). Guidelines for the diagnosis and management of syncope
(version 2009). www.escardio.org
• Ryden L, Fuster F (Co-chairs). American College of Cardiology/American Heart Association Task Force
and the European Society of Cardiology Committee for Practice Guidelines and Policy Conferences.
ACC/AHA/ESC guidelines for the management of patients with atrial fibrillation. www.escardio.org
• Vardas P E (Chairperson). The Task Force for Cardiac Pacing and Cardiac Resynchronization Therapy
of the European Society of Cardiology. Guidelines for cardiac pacing and cardiac resynchronization
therapy. www.escardio.org
• Zipes D P, Camm J A (Co-chairs). A report of the American College of Cardiology/American Heart
Association Task Force and the European Society of Cardiology Committee for Practice Guidelines.
ACC/AHA/ESC 2006 guidelines for management of patients with ventricular arrhythmias and the
prevention of sudden death. www.escardio.org
202
Capítulo 12.
Paragem cardíaca em
circunstâncias especiais
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OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
1. Introdução
Em circunstâncias específicas, a reanimação precisa de ser modificada. O reconhecimento
precoce de sinais e sintomas, e o tratamento eficaz, podem frequentemente evitar uma
paragem cardíaca. Estas situações são responsáveis por uma grande proporção de paragens
cardíacas em indivíduos jovens, sem doença concomitante. A maioria destas condições vão
precisar da intervenção de especialistas, pelo que é essencial pedir atempadamente ajuda
diferenciada.
203
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
204
os efeitos das alterações do pH sobre o potássio sérico durante o tratamento da
hipercaliémia ou da hipocaliémia.
2.2.1. Hipercaliémia
A hipercaliémia é a alteração eletrolítica mais frequentemente associada à paragem
cardíaca, e é geralmente provocada pelo aumento da libertação do potássio das
células ou pela diminuição da excreção renal, por fármacos e por acidose metabólica.
Definição
Não existe uma definição universal. Definimos hipercaliémia como uma concentração
sérica de potássio > 5,5 mmol/L; na prática, hipercaliémia é um continuum. À medida
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Causas
As causas de hipercaliémia incluem:
• insuficiência renal (i. e. doença renal aguda ou crónica)
• fármacos, p. ex. inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA),
bloqueadores do recetor da angiotensina II (ARA), diuréticos poupadores
de potássio, anti-inflamatórios não esteroides (AINE), betabloqueantes,
trimetoprim
• destruição de tecidos (rabdomiólise, lise tumoral, hemólise)
• acidose metabólica
• doenças endócrinas (doença de Addison)
• dieta (pode ser a principal causa em doentes com doença renal crónica
avançada)
12
• factícia – pseudo-hipercaliémia (doenças hematológicas, demora no tempo de
transporte da amostra ao laboratório, más condições de armazenamento)
O risco de hipercaliémia aumenta quando existe uma combinação de fatores causais,
tais como a utilização concomitante de IECA ou ARA AINE e diuréticos poupadores de
potássio.
205
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
Reconhecimento da hipercaliémia
Excluir hipercaliémia em todos os doentes com arritmia ou paragem cardíaca. Os
doentes podem apresentar fraqueza com progressão para paralisia flácida, parestesias
ou diminuição dos reflexos tendinosos profundos. O efeito da hipercaliémia no ECG
depende da concentração sérica absoluta de potássio, assim como da velocidade do
seu aumento (figura 12.1).
206
Figura 12.1
ECG de 12 derivações com características de hipercaliémia
I aVR V1 V4
II aVL V2 V5
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III aVF V3 V6
RHYTHM STRIP: II
25 mm/sec: 1 cm / mV
Tratamento da hipercaliémia
Os cinco passos para tratar a hipercaliémia são:
1. proteção cardíaca
2. mover o potássio para dentro das células
3. eliminar o potássio do organismo
4. monitorizar a concentração sérica de potássio e de glucose 12
5. prevenção da recorrência de hipercaliémia
Quando existem fortes suspeitas de hipercaliémia, p. ex. quando existem alterações
eletrocardiográficas, iniciar o tratamento ainda antes de receber os resultados laboratoriais.
Envolver precocemente especialistas das equipas de nefrologia ou de cuidados intensivos,
especialmente nos doentes que possam necessitar de terapêuticas de substituição da
função renal (p. ex. hemodiálise). Continuar a monitorização do potássio sérico no mínimo
durante 24 horas após um episódio para evitar recorrência da hipercaliémia.
207
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
Figura 12.2
Algoritmo do tratamento emergente da hipercaliémia
Pedir ajuda
especializada
Alterações no ECG?
n Ondas T em tenda n QRS alargado n Bradicardia
n Ondas P aplanadas / n Ondas n TV
ausentes sinusoidais
NÃO SIM
Proteger o Cálcio IV
coração 10 mL de cloreto de cálcio 10% IV
OU 30 mL de gluconato de cálcio 10% IV
n Utilizar acesso IV de grande calibre e administrar em 5-10 min
n Repetir o ECG
n Ponderar repetir a dose após 5 min se as alterações do
ECG persistirem
Infusão de insulina–glucose IV
Glucose (25 g) com 10 unidades de insulina solúvel IV em per-
fusão de 15 min
25 g glucose = 50 mL de glucose a 50 % OU 125 mL de glucose a 20 %
Deslocar o K+ Risco de hipoglicémia
para dentro
das células
Salbutamol 10-20 mg em nebulização
208
Aumento ligeiro (5,5-5,9 mmol/L):
• Tratar a causa da hipercaliémia para corrigir e evitar novo aumento do potássio
sérico (p. ex. fármacos, dieta)
Aumento grave (≥ 6,5 mmol/L) COM alterações ECG tóxicas (figura 12.1): 12
• Procurar ajuda especializada.
209
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
Modificações ao SBV
Não há modificações no suporte básico de vida em casos de alterações eletrolíticas.
Modificações ao SAV
Seguir o algoritmo de SAV. A hipercaliémia pode ser rapidamente confirmada se estiver
disponível um equipamento de gasimetria.
210
cardíaca é maior na primeira sessão de hemodiálise da semana (i. e. às segundas ou
terças-feiras) uma vez que as variações de volume e de eletrólitos têm um pico após
o intervalo do fim de semana.
• Chamar a equipa de reanimação e pedir ajuda especializada de imediato.
• Seguir o algoritmo universal de SAV.
• Um enfermeiro especializado em diálise deverá ser destacado para a máquina de
diálise. Parar a ultrafiltração (i. e. a remoção de líquido) e administrar um bólus de
fluidos. Reinfundir o volume de sangue do doente e desconectá-lo da máquina de
diálise.
• Deixar o acesso de diálise patente e utilizá-lo para administração de fármacos de
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2.2.2. Hipocaliémia
A hipocaliémia é a alteração eletrolítica mais comum na prática clínica. É observada em
até 20 % dos doentes hospitalizados. A hipocaliémia aumenta a incidência de arritmias,
particularmente em doentes com doença cardíaca preexistente e nos doentes tratados
com digoxina.
Definição 12
A hipocaliémia define-se como potássio sérico < 3,5 mmol/L, e a hipocaliémia grave como
potássio < 2,5 mmol/L, podendo ter sintomatologia associada.
Causas
As causas de hipocaliémia incluem:
• perdas gastrintestinais (diarreia)
• fármacos (diuréticos, laxantes, esteróides)
• perdas renais (doença tubular renal, diabetes insípida, diálise)
• doenças endócrinas (síndrome de Cushing, hiperaldosteronismo)
• alcalose metabólica
• depleção de magnésio
• insuficiente ingestão na dieta
211
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
Reconhecimento da hipocaliémia
Deve-se excluir hipocaliémia em todos os doentes com arritmia ou paragem cardíaca. Nos
doentes em diálise, a hipocaliémia é frequente no final de uma sessão de hemodiálise ou
durante o tratamento com diálise peritoneal contínua ambulatória (DPCA).
Os doentes com défice de potássio podem também ter défice de magnésio. A repleção
dos níveis de magnésio permite uma correção mais rápida da hipocaliémia, pelo que é
recomendada em casos graves de hipocaliémia.
212
Tabela 12.1
Doenças do cálcio e do magnésio
Paragem subjacente
cardíaca
12
213
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
* O cálcio total normal varia entre 2,2 e 2,6 mmol/L. O cálcio normal ionizado varia entre 1,1 e 1,3 mmol/L. Os
valores do cálcio devem ser interpretados cuidadosamente. Em caso de dúvida pedir ajuda especializada. O
cálcio total depende dos valores séricos da albumina, e deve ser corrigido para valores baixos de albumina (cálcio
total corrigido). Os valores do cálcio ionizado são frequentemente medidos por equipamentos de gasimetria. É
importante não confundir os valores de cálcio ionizado, cálcio total e cálcio corrigidos.
214
3. Intoxicação
A intoxicação raramente é causa paragem cardíaca ou morte, mas é uma causa frequente de
admissão hospitalar por coma não traumático.
215
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
216
• A alcalinização da urina (pH da urina > 7,5) pela administração de bicarbonato de sódio
IV pode ser útil na intoxicação moderada a grave com salicilatos, em doentes que não
precisem de hemodiálise.
• A hemodiálise remove fármacos ou metabolitos com baixo peso molecular, baixa
ligação proteica, pequenos volumes de distribuição e elevada hidrossolubilidade. Em
caso de hipotensão, utilizar em alternativa hemofiltração venovenosa contínua (CVVH)
ou hemodiálise venovenosa contínua (CVVHD). Procurar ajuda especializada e/ou
consultar o centro antivenenos para informação sobre o tratamento.
• Ponderar emulsão de lípidos na paragem cardíaca por toxicidade com anestésicos
locais (ver abaixo).
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217
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
3.3.2. Benzodiazepinas
Complexos QRS alargados e desvio direito do eixo indicam risco acrescido de arritmias (figura
12.3). Administrar bicarbonato de sódio (1-2 mmol/kg) no tratamento das alterações da
condução ventricular induzidas por tricíclicos. Apesar de nenhum estudo ter investigado qual
o valor ótimo a alcançar para o pH arterial com o bicarbonato, tem sido habitualmente aceite
um pH de 7,45-7,55.
218
ventricular. A toxicidade pode ser potenciada pela gravidez, em idades extremas ou na
hipoxémia. Nos casos de paragem cardíaca, podem ser necessários tempos prolongados
de RCP para alcançar RCE.
3.3.6. Betabloqueantes
A toxicidade por betabloqueantes provoca bradicardia e efeitos inotrópicos negativos que
são de difícil tratamento, e que podem resultar em paragem cardíaca.
12
3.3.7. Digoxina
Embora os casos de toxicidade por digoxina sejam em menor número que os de
antagonistas do cálcio e betabloqueantes, a taxa de mortalidade associada à digoxina
é bem mais elevada. Deve administrar-se o tratamento específico, os fragmentos de
anticorpos específicos para a digoxina (Fab-digoxina). Administrar 2-10 ampolas de Fab-
digoxina (38 mg por ampola) IV durante 30 min.
219
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
Figura 12.3
ECG de 12 derivações característico de toxicidade grave por antidepressivos tricíclicos
I aVR V1 V4
II aVL V2 V5
RHYTHM STRIP: II
25 mm/sec: 1 cm / mV
4. Hipotermia
4.1. Definição
Existe hipotermia quando a temperatura central do organismo é inferior a 35 ºC, e é
classificada arbitrariamente como ligeira (32-35 ºC), moderada (28-32 ºC), ou grave (<28
ºC). O sistema suíço de estadiamento baseado nos sinais clínicos pode ser utilizado pelos
socorristas no local para descrever as vítimas: estádio I – consciente e com calafrios; estádio
II –alteração do estado de consciência, sem calafrios; estádio III – inconsciente; estádio IV –
paragem cardíaca ou estado de baixo débito e V – morte por hipotermia irreversível.
220
4.2. Diagnóstico
A hipotermia acidental pode ser subdiagnosticada em países com climas temperados.
Em indivíduos com termorregulação normal, pode desenvolver-se hipotermia durante a
exposição a ambientes frios, especialmente em situações de chuva ou vento, e em indivíduos
que estiveram imobilizados ou após imersão em água fria. Quando a termorregulação está
comprometida, por exemplo, nos idosos e nos muito jovens, pode haver hipotermia após
“agressão” ligeira. O risco de hipotermia aumenta também com a ingestão de drogas ou
álcool, com a exaustão, doença, ferimentos ou negligência, especialmente quando há
diminuição do nível de consciência. Pode suspeitar-se de hipotermia pela história clínica ou
pela observação rápida de um doente colapsado. É necessário um termómetro de baixas
temperaturas para avaliar a temperatura central e confirmar o diagnóstico. A temperatura
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Deve ser-se cuidadoso a fazer o diagnóstico de morte num doente hipotérmico, já que
o frio, por si só, pode produzir um pulso irregular, muito lento e de pequeno volume e
12
pressão arterial não registável. Num doente hipotérmico, só a ausência de sinais de vida
(estádio IV de hipotermia do sistema suíço) não é suficiente para declarar o óbito. A 18º
C o cérebro pode tolerar períodos de paragem circulatória dez vezes mais prolongados
que à temperatura de 37º C. A dilatação das pupilas pode ter diversas causas, e não deve
ser considerada como sinal de morte. Foi reportada sobrevivência de boa qualidade, com
RCP prolongada, após paragem cardíaca e temperatura central de 13,7º C após imersão em
água fria.
221
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
222
• Os equipamentos de gasimetria fornecem os valores dos gases arteriais para uma
temperatura de 37 °C, exceto quando a temperatura do doente é introduzida no
aparelho. Na hipotermia, as pressões parciais do oxigénio e do dióxido de carbono
são menores porque os gases tornam-se mais solúveis conforme a temperatura
do sangue desce. Na prática clínica, é muito mais fácil fazer todas as medições
à temperatura de 37 °C, i. e., valores não corrigidos de temperatura. Depois é
necessário compará-los aos valores normais para 37 °C, mais bem conhecidos. Isto
vai também permitir a comparação das séries de resultados das amostras de gases
arteriais colhidas durante o reaquecimento.
4.4.1. Arritmias
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
Conforme a temperatura central diminui, a bradicardia sinusal tende a dar lugar a fibrilhação
auricular (FA) seguida de fibrilhação ventricular (FV) e, por fim, assistolia.
4.4.2. Reaquecimento
As medidas gerais incluem retirar a vítima do ambiente frio, evitar perda adicional de calor
e transferência rápida para o hospital mais adequado. O reaquecimento pode ser passivo
ou ativo, externo ou interno.
12
• No local, um doente com hipotermia moderada ou grave deve ser imobilizado e
deslocado cuidadosamente, oxigenado adequadamente, monitorizado (incluindo ECG
e temperatura central), e todo o corpo deve ser seco e isolado. As roupas molhadas
devem ser cortadas em vez de despidas; isto evitará mobilização excessiva da vítima.
223
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
Na generalidade, vítimas de hipotermia que estejam vigis, com calafrios e sem arritmias
podem ser transportadas para o hospital mais próximo para reaquecimento passivo e
observação. As vítimas com hipotermia e alteração da consciência devem ser transportadas
para um hospital com capacidade para reaquecimento ativo, externo e interno. Se
224
As vítimas de avalanches têm poucas probabilidades de sobreviver quando ficam:
• soterradas > 60 min (ou se a temperatura central inicial é < 30 ºC) e em paragem
cardíaca com via aérea obstruída no momento do resgate;
• soterradas e em paragem cardíaca no momento do resgate e com potássio sérico
inicial > 8 mmol/L.
O algoritmo de abordagem das vítimas de soterramento por avalanche encontra-se na figura 12.4.
Figura 12.4
Algoritmo de acidente por avalanche em vítimas completamente soterradas.
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SIM
Lesões letais ou congelamento total Não iniciar RCP
NÃO ≤ 60 min
(≥ 30°C)
Duração do soterramento Algoritmo universal
(temperatura central)1 de SAV2
NÃO
SIM ou em
Assistolia dúvida
NÃO
8 mmol/L
Ponderar terminar a RCP
1.
A temperatura central pode ser utilizada se se desconhecer a duração do soterramento
2.
Transporte dos doentes com lesões ou potenciais complicações (p. ex. edema pulmonar) para o hospital mais apropriado
3.
Avaliar se há respiração espontânea e pulso durante até 1 min
4.
Transportar doentes com instabilidade cardiovascular ou temperatura central < 28 °C para um hospital com CEC (circulação
extracorporal)
5.
Descontinuar RCP se o risco para a equipa de salvamento é inaceitavelmente elevado
6.
Lesões por esmagamento e utilização de relaxantes neuromusculares despolarizantes podem aumentar o potássio sérico
225
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
5. Hipertermia
5.1. Definição
Há hipertermia quando falha a capacidade que o organismo tem para regular a temperatura,
e a temperatura central excede a habitualmente mantida pelos mecanismos homeostáticos. A
hipertermia pode ser exógena, causada por condições ambientais, ou secundária à produção
endógena de calor.
A hipertermia relacionada com o ambiente verifica-se quando o calor, geralmente sob a forma
de energia radiante, é absorvido pelo corpo mais rapidamente do que pode ser eliminado pelos
A hipertermia maligna (HM) é uma doença rara da homeostasia do cálcio do músculo esquelético,
caracterizada por contraturas musculares e uma crise hipermetabólica potencialmente fatal
após exposição de indivíduos geneticamente suscetíveis a anestésicos halogenados e a
relaxantes musculares despolarizantes.
226
• temperatura central 40 °C ou superior
• pele quente e seca (em metade dos casos de golpe de calor por esforço há sudorese)
• os sinais e sintomas iniciais incluem: fadiga extrema, cefaleias, desmaios, rubor
facial, vómitos e diarreia
• disfunção cardiovascular, incluindo arritmias e hipotensão
• disfunção respiratória, incluindo SDRA
• disfunção do sistema nervoso central, incluindo convulsões e coma
• insuficiência hepática e renal
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• coagulopatia
• rabdomiólise
Devem ser consideradas outras patologias, que incluem:
• toxicidade farmacológica
• síndrome de abstinência farmacológica
• síndrome serotoninérgico
• síndrome maligno dos neurolépticos
• sépsis
• infeção do sistema nervoso central
• doenças endócrinas (p. ex. tempestade tiroideia, feocromocitoma)
5.2.3. Tratamento
A base do tratamento é a terapêutica de suporte, baseada na otimização do ABCDE e no
rápido arrefecimento do doente. 12
• Iniciar o arrefecimento antes do doente chegar ao hospital. Apontar para a rápida
diminuição da temperatura central para cerca de 39 ºC. Os doentes com golpe de
calor grave devem ser tratados em unidades de cuidados intensivos.
• Usar a monitorização hemodinâmica para orientar a terapêutica com fluidos; podem
ser necessárias grandes quantidades de fluidos. Corrigir as alterações eletrolíticas.
• Em caso de paragem cardíaca, seguir os procedimentos padronizados para suporte
básico e avançado de vida e arrefecer o doente. Caso se aplique, tentar desfibrilhar
de acordo com as recomendações atuais, enquanto se continua a arrefecer o
doente. Estudos em animais sugerem que o prognóstico é pior, comparativamente
à paragem cardíaca em normotermia. O risco de resultados neurológicos
desfavoráveis aumenta para cada grau da temperatura corporal > 37 °C.
• Efetuar os cuidados pós-reanimação padronizados (capítulo 13).
227
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
6. Afogamento
O afogamento é uma causa frequente de morte acidental. A pior consequência do
afogamento é a hipóxia; a paragem cardíaca é geralmente um evento secundário. A duração
da hipóxia é um fator essencial para determinar o prognóstico da vítima. Submersão de
duração inferior a dez minutos associa-se a elevada probabilidade de desfecho favorável,
enquanto que submersão superior a 25 minutos se associa a baixa probabilidade de
sobrevivência. A idade, o tempo de resposta dos sistemas de emergência médica (SEM),
água doce ou salgada, temperatura da água e presença de testemunhas não são úteis
como preditores de sobrevivência.
228
De lembrar que alguns doentes podem ter tido paragem cardíaca primária (p.ex. provocada
por enfarte do miocárdio enquanto nadam). A morte por afogamento é mais frequente
em jovens do sexo masculino, sendo a primeira causa de morte acidental na Europa neste
grupo etário.
6.1. Definição
O afogamento é definido como um processo que culmina em disfunção respiratória
primária por submersão/imersão em meio líquido. Está implícita nesta definição a presença
de uma interface líquido/ar à entrada da via aérea da vítima, impedindo-a de respirar ar. A
vítima pode sobreviver ou morrer após este processo, mas, qualquer que seja o desfecho, a
vítima esteve envolvida num incidente de afogamento.
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A submersão ocorre quando a face está debaixo ou coberta por água. A asfixia e a paragem
cardíaca ocorrem em minutos. A imersão, pelo contrário, é quando a face fica acima da
água, na maioria dos casos pela utilização de um suporte como um colete salva-vidas. Na
maioria das situações de imersão, a vítima permanece imersa com uma via aérea permeável
e desenvolve hipotermia, embora possa ocorrer aspiração de água se a água atingir a face
ou se a vítima ficar inconsciente com a face dentro da água.
6.3. Tratamento
O tratamento de uma vítima de afogamento envolve quatro fases. Estas consistem em:
1. salvamento aquático
2. suporte básico de vida
3. suporte avançado de vida
4. cuidados pós-reanimação.
229
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
Ventilação
• A sequência do SBV no afogamento salienta a importância fulcral da diminuição
rápida da hipoxémia. O início imediato de ventilações ou de ventilação por pressão
positiva aumenta a sobrevivência.
• Administrar cinco ventilações iniciais assim que possível. A insuflação deve demorar
cerca de 1 segundo e ser suficiente para provocar uma elevação do tórax. Se possível,
complementar a ventilação com oxigénio.
• A aplicação de pressão cricoideia por indivíduos com treino e competência nas
vítimas sem uma via aérea protegida pode diminuir a insuflação gástrica e melhorar
a ventilação no afogamento.
• Indivíduos treinados poderão iniciar ventilação dentro de água, idealmente com
o apoio de equipamento de flutuação. Se um reanimador, em geral um nadador-
salvador, encontrar uma vítima de afogamento não reativa em águas profundas, se
treinado para tal poderá iniciar ventilação antes de trazer a vítima para terra ou para
uma embarcação de resgate.
Compressões torácicas
• Logo que a vítima seja retirada da água, verificar a respiração. Se a vítima não respirar (ou
emitir sons agónicos ocasionais), após as 5 ventilações iniciais, começar compressões
torácicas imediatamente. Continuar RCP numa relação de 30 compressões para 2
ventilações. A maioria das vítimas de afogamento sofre paragem cardíaca secundária
à hipóxia. Nestas vítimas é provável que a RCP só com compressões seja menos eficaz,
e deve ser evitada.
230
Desfibrilhação
• Secar o tórax da vítima antes de aplicar os elétrodos. Devem ser seguidos os
procedimentos padronizados para desfibrilhação com um DAE ou com um
desfibrilhador manual.
231
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
Circulação e desfibrilhação
• Saber distinguir entre paragem respiratória e cardíaca na vítima de afogamento é
particularmente importante. Atrasar o início das compressões torácicas quando a
vítima está em paragem cardíaca diminui a sobrevivência.
• A típica respiração agónica pós-paragem é muito difícil de distinguir dos esforços
respiratórios iniciais de uma vítima de afogamento em recuperação espontânea. A
palpação do pulso como único indicador da existência, ou ausência, de paragem
cardíaca é pouco fiável. Sempre que estejam disponíveis, devem obter-se
informações adicionais de outros instrumentos de monitorização, tais como traçado
de ECG, ETCO2, ecocardiografia para confirmar o diagnóstico de paragem cardíaca.
• Se a vítima estiver em paragem cardíaca, seguir os protocolos de suporte avançado
232
7. Asma
Mundialmente, cerca de 300 milhões de indivíduos de todas as idades e etnias sofrem
de asma, verificando-se uma elevada prevalência em alguns países europeus (Reino
Unido, Irlanda e Escandinávia). O número anual de mortes por asma, em todo o mundo,
foi estimado em 250.000. A taxa de mortalidade não parece estar correlacionada com a
prevalência de asma. A maioria das mortes ocorre antes da admissão hospitalar.
Esta recomendação foca-se no tratamento de doentes com asma quase fatal e paragem
cardíaca.
O risco de ataques de asma quase fatais não está necessariamente relacionado com a
gravidade basal da doença.
Os doentes com maior risco incluem aqueles com:
• história prévia de asma quase fatal, exigindo intubação e ventilação mecânica
• internamento ou cuidados de urgência por asma no ano anterior
• utilização reduzida ou nula de corticosteroides inalados
• aumento do uso e dependência de agonistas beta-2
• ansiedade, depressão e/ou insuficiente adesão à terapêutica
• alergia alimentar num doente com asma
233
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
Tabela 12.2
Gravidade das exacerbações da asma aguda
Gravidade da asma
234
• Os sibilos são um achado físico frequente, mas a sua gravidade não se correlaciona
com o grau de obstrução das vias aéreas. Outras causas de sibilos incluem: edema
pulmonar, doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC), pneumonia, anafilaxia,
corpos estranhos, embolia pulmonar, massa subglótica.
• O doente com asma aguda grave precisa de tratamento médico agressivo para
evitar a deterioração. Estes doentes devem ser tratados por clínicos experientes,
numa área de cuidados críticos. Doentes com SpO2 < 92 % ou com características
de asma potencialmente fatal têm risco de hipercápnia, e requerem análise da
gasimetria arterial.
• Usar uma concentração de oxigénio inspirado que permita atingir uma SpO2 de
94-98 %. Pode ser necessário oxigénio por máscara de alto débito. A ausência de
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235
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
236
(orifício cirúrgico na parede torácica e pleura) pode ser mais rápida e mais eficaz
para descomprimir o pneumotórax (ver a secção sobre trauma).
• Ponderar sempre pneumotórax bilateral nas paragens cardíacas relacionadas com
asma.
• Seguir as orientações padronizadas para os cuidados pós-reanimação.
8. Anafilaxia
8.1. Definição
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8.2. Etiologia
A anafilaxia envolve geralmente a libertação de mediadores inflamatórios dos mastócitos
ou basófilos, desencadeada pela interação de um alergénio com a imunoglobulina E (IgE)
ligada a células. A libertação de mediadores não-mediados por IgE, ou não-imunes, pode
também ocorrer. A libertação de histamina, assim como de outros mediadores inflamatórios,
é responsável pela vasodilatação, edema e aumento da permeabilidade capilar. 12
A anafilaxia pode ser precipitada por uma vasta gama de desencadeantes, sendo os mais
frequentes os alimentos, fármacos, picada de insetos e látex. As reações aos alimentos são
as mais frequentes nas crianças, enquanto que nos adultos são aos fármacos. Virtualmente
qualquer alimento ou fármaco pode ser o implicado, mas alguns alimentos (frutos de casca
rija) e fármacos (relaxantes musculares, antibióticos, anti-inflamatórios não esteroides e
aspirina) causam a maioria das reações. A causa é idiopática num número significativo de
casos de anafilaxia.
O risco de morte é superior nos indivíduos com asma, especialmente se estiver mal
controlada, ou em asmáticos que não fazem ou atrasam o tratamento com adrenalina.
Quando a anafilaxia é fatal, habitualmente a morte ocorre muito pouco tempo após o
contacto com o fator desencadeante. As reações fatais aos alimentos provocam paragem
respiratória tipicamente após 30-35 min; as picadas de insetos provocam colapso por
choque após 10-15 min; e as mortes provocadas por medicação intravenosa ocorrem
237
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
geralmente dentro de 5 min. A morte raramente ocorre mais de seis horas após o contacto
com o desencadeante.
8.3. Reconhecimento
• É provável estarmos perante uma anafilaxia quando um doente que é exposto a
um fator desencadeante (alergénio) desenvolve doença súbita (habitualmente nos
minutos que se seguem à exposição), com alterações cutâneas de progressão rápida
e compromisso potencialmente fatal da via aérea e/ou respiratório e/ou circulatório.
A reação é geralmente inesperada.
De lembrar que:
• As alterações cutâneas ou das mucosas, não são, por si só, um sinal de anafilaxia.
• As alterações cutâneas ou das mucosas podem ser subtis, ou estarem ausentes,
em cerca de até 20 % das reações (alguns doentes podem apresentar unicamente
descida da pressão arterial, i. e. um problema da Circulação).
• Podem também verificar-se sintomas gastrointestinais (p. ex. vómitos, dor
abdominal, incontinência).
238
• Habitualmente, o doente apresenta-se ansioso e pode ter uma sensação de “morte
iminente”.
• Rouquidão.
• Estridor – ruído inspiratório de elevada frequência (agudo) provocado por obstrução
alta da via aérea.
Problemas da respiração:
• dispneia – aumento da frequência respiratória
• sibilos
• doente a ficar fatigado
• confusão provocada pela hipóxia
• cianose – habitualmente um sinal tardio
• paragem respiratória
Problemas circulatórios:
• sinais de choque – palidez, sudorese
• taquicardia
12
• hipotensão – sensação de desmaio, colapso
• diminuição do nível ou perda de consciência
• a anafilaxia pode provocar isquemia do miocárdio e alterações eletrocardiográficas
até em indivíduos com artérias coronárias normais
• paragem cardíaca
Os problemas circulatórios (muitas vezes referidos como choque anafilático) podem ser
causados por depressão miocárdica direta, vasodilatação e aumento da permeabilidade
capilar, e perda de fluido da circulação.
Os problemas da Via aérea, Respiração e Circulação, referidos acima, podem alterar o estado
neurológico do doente (D, Disfunção neurológica) por diminuição da perfusão cerebral.
Pode haver confusão, agitação e perda de consciência.
239
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
240
de morte iminente e a falta de fôlego que leva a hiperventilação são, de alguma forma,
sintomas que se assemelham a anafilaxia. Apesar de não se verificarem hipotensão, palidez,
sibilos, exantema urticariforme ou edema, pode haver, por vezes, rubores ou manchas na
pele associados à ansiedade, que vão dificultar ainda mais o diagnóstico. A dificuldade em
diagnosticar pode também verificar-se nos episódios vasovagais após procedimentos de
vacinação, no entanto, a ausência de exantema, de dificuldade respiratória e de edema
são características que permitem a distinção, assim como o pulso (lento num episódio
vasovagal, rápido num episódio anafilático grave). Geralmente o desmaio resolve com
colocação do doente em decúbito e elevação dos membros inferiores.
8.5. Tratamento
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Como o diagnóstico de anafilaxia nem sempre é óbvio, todos os profissionais que a tratam
devem seguir a abordagem sistemática ABCDE. Tratar os problemas potencialmente fatais
conforme vão sendo detetados. Os passos essenciais estão descritos no algoritmo da
anafilaxia (figura 12.5).
• Todos os doentes devem ser colocados numa posição confortável. Podem preferir
estar sentados já que lhes vai facilitar a respiração; o decúbito dorsal, com ou
sem elevação dos membros inferiores, é útil nos doentes hipotensos (problema
circulatório). Se o doente tiver sensação de desmaio, não se deve sentar nem
levantar, já que tal pode provocar paragem cardíaca. Os doentes que estão a respirar
e inconscientes devem ser colocados de lado (posição lateral de segurança).
• Eliminar o fator desencadeante de uma reação anafilática se possível. Remover o
ferrão após uma picada de abelha/vespa. Descontinuar qualquer fármaco suspeito
de causar uma reação anafilática (p.ex. parar a perfusão intravenosa de um fluido
coloide ou de um antibiótico). Não adiar o tratamento definitivo se não for exequível
eliminar o fator desencadeante.
• Monitorizar todos os doentes com suspeita de anafilaxia assim que possível (p. ex. na
ambulância, no serviço de urgência). A monitorização inclui, no mínimo, oximetria
12
de pulso, pressão arterial não invasiva e ECG de 3 derivações.
• Durante a reanimação, administrar a mais elevada concentração de oxigénio
possível (geralmente superior a 10 L/min).
• A adrenalina é o fármaco mais importante no tratamento de uma reação anafilática.
Sendo um agonista dos recetores alfa, reverte a vasodilatação periférica e reduz
o edema. A sua atividade nos recetores beta dilata os brônquios, aumenta a força
da contração miocárdica e suprime a libertação de histamina e leucotrienos. A
adrenalina funciona melhor quando é administrada precocemente após o início
da reação, mas não é isenta de riscos, especialmente quando administrada por
via intravenosa. Os efeitos adversos são muito raros quando são injetadas as
doses corretas por via intramuscular (IM). As vias subcutânea ou inalatória não são
recomendadas porque são menos eficazes que a IM.
• A via intramuscular é a melhor na maior parte das situações em que se tem de
administrar adrenalina para tratar reações anafiláticas. Monitorizar o doente, como
acima descrito, logo que possível ajuda a avaliar a resposta.
241
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
• No adulto e na criança >12 anos, administrar uma dose inicial de 0,5 mg de adrenalina
IM (0,5 mL de 1:1000 adrenalina = 0,5 mg = 500 mcg). Podem ser administradas doses
adicionais com intervalos de cerca de 5 min, em função da resposta do doente.
• O melhor local para a injeção IM é a porção ântero-lateral do terço médio da coxa. A
agulha a utilizar na injeção tem de ser suficientemente comprida para assegurar que
a adrenalina é injetada no músculo.
• A adrenalina IV só deve ser administrada por profissionais experientes na utilização e
titulação de vasopressores na prática clínica normal (p. ex. anestesistas, intensivistas).
Em doentes com circulação espontânea, a adrenalina intravenosa pode provocar
hipertensão potencialmente fatal, taquicardia, arritmias e isquemia do miocárdio.
Os doentes aos quais é administrada adrenalina IV devem ser monitorizados – ECG e
242
• Os sinais e sintomas de apresentação da anafilaxia grave e da asma potencialmente
fatal podem ser os mesmos. Ponderar administrar também terapêutica
broncodilatadora com salbutamol (inalado ou IV), ipratrópio (inalado), aminofilina
(IV) ou magnésio (IV) (ver asma). De lembrar que o magnésio IV é vasodilatador e
pode agravar a hipotensão.
• A adrenalina continua a ser o vasopressor de primeira linha para o tratamento de
reações anafiláticas. Ponderar outros vasopressores e inotrópicos (noradrenalina,
vasopressina, terlipressina) quando a reanimação inicial com adrenalina e fluidos não
é bem-sucedida. Estes fármacos só devem ser usados em contextos especializados
(p.ex. unidades de cuidados intensivos) onde a sua utilização é frequente. O
glucagon pode ser útil para tratar reações anafiláticas em doentes medicados com
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betabloqueantes.
• A paragem cardíaca com suspeita de anafilaxia deve ser tratada com as doses
padronizadas de adrenalina IV ou intraósseas (IO) para a paragem cardíaca. Se isto
não for possível, ponderar adrenalina IM se a paragem cardíaca está iminente ou
acabou de ocorrer. Ponderar grandes volumes de fluidos intravenosos.
• A obstrução da via aérea pode acontecer de forma rápida na anafilaxia grave,
especialmente em doentes com angioedema. Os sinais de alerta são edema da
língua e dos lábios, rouquidão e edema da orofaringe.
• Ponderar intubação traqueal precoce; qualquer atraso pode tornar a intubação
extremamente difícil. Conforme a obstrução da via aérea progride, os dispositivos
supraglóticos da via aérea (p. ex. ML) são mais difíceis de introduzir. As tentativas de
intubação traqueal podem exacerbar o edema da laringe. O envolvimento precoce
de um anestesista experiente é obrigatório no tratamento destes doentes. Pode ser
necessária uma via aérea cirúrgica caso a intubação traqueal não seja possível.
12
243
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
Figura 12.5
Algoritmo da anafilaxia
Reação anafilática?
Diagnóstico – procurar:
n I nício agudo da situação clínica
Problemas potencialmente fatais da Via aérea e/ou Res-
n Pedir ajuda
n Deitar o doente com os membros inferiores elevados
(se não comprometer a ventilação)
Adrenalina2
2.
Adrenalina (administrar IM exceto se experiência com adrenalina IV)
Doses IM de adrenalina 1:1000 (repetir após 5 min se não houver
3.
Bólus de fluidos IV (fluid challenge)
melhoria) (cristalóide):
n Adulto 500 mcg IM (0.5 ml) Adulto 500-1000 ml
n Criança com mais de 12 anos 500 mcg IM (0.5 ml) Criança 20 mL/kg
n Criança 6-12 anos 300 mcg IM (0.3 ml)
n Criança com menos de 6 anos 150 mcg IM (0.15 ml) Parar os coloides IV se estes puderem ser a
causa da anafilaxia
Adrenalina IV só administrada por especialistas com experiência
Titular: Adultos 50 mcg; Criança 1 mcg/kg
4.
Clorofenamina 5.
Hidrocortisona
(IM ou IV lento) (IM ou IV lento)
Adulto ou criança com mais de 12 anos 10 mg 200 mg
Criança 6-12 anos 5 mg 100 mg
Criança 6 meses a 6 anos 2.5 mg 50 mg
riança com menos de 6 meses 250 mcg/kg 25 mg
244
8.6. Exames
O teste específico para confirmar o diagnóstico de reação anafilática é o doseamento da
triptase dos mastócitos. Na anafilaxia, a desgranulação dos mastócitos leva a concentrações
marcadamente aumentadas de triptase sérica.
245
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
9.1. Etiologia
Geralmente, há causas específicas de paragem cardíaca que são potencialmente reversíveis.
As principais causas de paragem cardíaca no período pós-operatório inicial incluem:
• tamponamento cardíaco
• isquemia do miocárdio
• hipovolémia
• falência do sistema de pacing
• pneumotórax hipertensivo
9.2. Diagnóstico
Para que seja possível uma intervenção rápida e reanimação com sucesso, é necessário que
seja imediatamente identificada a causa provável da paragem cardíaca. Os doentes na UCI
estão monitorizados, e uma paragem é assinalada pelos alarmes dos monitores na ausência
de pulsação ou de pressão de perfusão na linha arterial, perda de traçado do oxímetro de
pulso, de traçado da artéria pulmonar (AP) ou do CO2 expirado, e a rápida avaliação do
doente pode ser suficiente para indicar paragem cardíaca sem necessidade de palpar pulso
central. Pedir ajuda especializada precocemente, incluindo de um cirurgião cardiotorácico
e um anestesista cardíaco.
9.3. Tratamento
• As compressões torácicas externas podem provocar rotura do esterno ou lesão
cardíaca no contexto de pós-cirurgia cardíaca. Se se diagnosticar FV, administrar
imediatamente desfibrilhação externa. Uma paragem cardíaca com FV /
TVsP
testemunhada e monitorizada deve ser imediatamente tratada com até três tentativas
246
de desfibrilhação rápidas sucessivas (em sequência). Três choques falhados deverão
indicar a necessidade de re-esternotomia de emergência. Tentativas subsequentes
de desfibrilhação devem seguir o algoritmo de SAV; se entretanto tiver sido feita re-
esternotomia, a desfibrilhação deverá ser efetuada com pás internas a 20 J.
• Na assistolia, estabelecer pacing temporário de emergência, com a amplitude
máxima.
• Na AEsP, desligar o pacemaker para verificar que não existe FV subjacente que terá de
ser tratada com desfibrilhação.
• Nos restantes casos, iniciar de imediato compressões torácicas externas nos
doentes que sofrem paragem sem débito indicado pela monitorização. A eficácia
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247
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
É essencial que uma paragem cardíaca de causa primária médica não seja diagnosticada
erradamente como uma PCT, e deve ser tratada segundo o algoritmo universal de SAV. A
paragem cardíaca ou outras causas de perda súbita de consciência (p. ex. hipoglicémia,
AVC, convulsões) podem causar um evento traumático secundário. Alguns estudos
O commotio cordis é uma paragem cardíaca, ou quase paragem cardíaca, provocada por um
impacto brusco na parede torácica, sobre o coração. Uma pancada no tórax pode provocar
FV se o objeto do impacto atinge o tórax no intervalo de 20 ms após o pico da onda T. O
commotio cordis ocorre geralmente durante a prática desportiva e em atividades recreativas,
sendo as vítimas habitualmente adolescentes do sexo masculino. Seguir as recomendações
habituais de RCP. A desfibrilhação precoce é importante para a sobrevivência.
10.1. Diagnóstico
O diagnóstico da paragem cardíaca traumática é clínico. O doente apresenta-se com
respiração agónica, ou sem respiração espontânea, e sem pulso central.
248
menos prioritário em relação ao tratamento imediato das causas reversíveis, p. ex.
toracotomia, controlo da hemorragia, etc.
• Num contexto extra-hospitalar, devem ser realizadas no local apenas as intervenções
essenciais para a sobrevivência, seguidas de transferência rápida para o hospital
apropriado mais próximo.
• Se disponível, a ecografia irá ajudar no diagnóstico rápido de hemoperitoneu,
hemopneumotórax, pneumotórax hipertensivo e tamponamento cardíaco. Isto
requer um operador treinado e não deve atrasar o tratamento.
• Tratamento das causas reversíveis:
-- Hipoxémia – A permeabilização da via aérea e a ventilação eficazes
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12
249
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
10.2. Tratamento
Figura 12.6
Algoritmo da (peri) paragem cardíaca traumática
Doente de trauma
Ponderar toracotomia
Ponderar terminar Restabelecimento de circulação
NÃO de emergência de
a RCP espontânea?
imediato
SIM
Pré-hospitalar:
n Realizar apenas intervenções essenciais para
a sobrevivência
n Transporte imediato para o hospital
No hospital:
n Reanimação de controlo de danos (damage
control resuscitation)
n Controlo definitivo da hemorragia
250
garrotes se necessário e/ou aplicar agentes hemostáticos tópicos. A hemorragia
não passível de compressão é de mais difícil controlo. Utilizar talas (cinta pélvica),
hemoderivados, fluidos intravenosos e ácido tranexâmico enquanto se transporta
o doente para o controlo cirúrgico da hemorragia.
-- Pneumotórax hipertensivo – Realizar toracotomia bilateral no 4º espaço
intercostal para descomprimir o tórax na PCT. No caso de ventilação por pressão
positiva, as toracotomias têm maior probabilidade de ser eficazes do que a
toracocentese de agulha, e são mais rápidas do que a inserção de um dreno
torácico.
-- Tamponamento cardíaco – Quando há PCT e trauma penetrante no tórax ou
epigastro, a toracotomia de emergência (TE) com incisão clamshell (toracotomia
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• Nos últimos dez anos foi adotado o princípio de “reanimação de controlo de danos”
(damage control resuscitation) na reanimação em trauma com hemorragia não
controlada. A reanimação de controlo de danos combina a hipotensão permissiva
com a cirurgia de controlo de danos. Evidência limitada e consensos gerais suportam 12
a abordagem conservadora à infusão de fluidos intravenosos, com hipotensão
permissiva até que se consiga a hemostase cirúrgica. A hipotensão permissiva
permite a administração de fluidos intravenosos em volume suficiente para se manter
pulso radial presente. A reanimação hemostática é a utilização muito precoce de
hemoderivados como fluido de reanimação primário, para evitar a exsanguinação
devida à coagulopatia induzida pelo trauma. A relação recomendada de concentrado
eritrocitário, plasma fresco congelado e plaquetas é de 1:1:1.
Toracotomia de emergência
• O tempo constitui um fator crítico na realização da TE com sucesso. Um serviço
do Reino Unido recomenda que, em doentes com trauma torácico penetrante,
251
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
Os pré-requisitos para uma TE bem-sucedida podem ser resumidos como a ‘regra dos
quatro E’ (4E):
• Experiência: as equipas devem ser lideradas por um profissional de saúde altamente
treinado e competente.
• Equipamento: é mandatório ter o material adequado para realizar a TE, e para lidar
com as alterações intratorácicas encontradas.
• Espaço de tempo decorrido: o tempo desde a perda dos sinais vitais até iniciar a TE
não deve exceder os 10 minutos.
Se algum dos quatro critérios não se verificar, a TE é fútil e expõe a equipa a riscos
desnecessários.
11. Gravidez
A mortalidade relacionada com a gravidez é relativamente rara na Europa (estimada em
16 por 100,000 nados-vivos), embora haja uma grande variação entre países. O feto deve
ser sempre tido em conta quando ocorre um evento adverso cardiovascular numa grávida.
A sobrevivência fetal geralmente depende da sobrevivência materna, e os esforços de
reanimação iniciais focam-se na mãe grávida.
252
• embolia de líquido amniótico
• sépsis
• hemorragia
• gravidez ectópica
• doenças psiquiátricas.
As causas de paragem cardíaca nas mulheres grávidas podem ainda ser as mesmas
das mulheres na mesma faixa etária (p. ex. anafilaxia, sobredosagem com fármacos,
traumatismo).
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11.2. Tratamento
253
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
254
• Fármacos: Pode haver sobredosagem em mulheres com eclâmpsia medicadas com
sulfato de magnésio, especialmente se a doente ficar oligúrica. Administrar cálcio
para tratar a toxicidade por magnésio (ver alterações eletrolíticas potencialmente
fatais). O bloqueio do neuroeixo para analgesia ou anestesia pode causar problemas
devido ao bloqueio simpático (hipotensão, bradicardia) ou a toxicidade anestética
local (ver secção das intoxicações).
risco, tais como obesidade, idade avançada, paridade elevada, hábitos tabágicos,
diabetes, hipertensão pré-existente e história familiar de doença isquémica.
Neste contexto podem ter sintomas atípicos, tais como dor epigástrica e vómitos.
A intervenção coronária percutânea (ICP) é a estratégia de reperfusão de eleição
no enfarte do miocárdio com supradesnivelamento do ST na gravidez. Deve ser
considerada trombólise se não estiver disponível ICP de emergência. O número de
mulheres com doença cardíaca congénita que engravida tem vindo a aumentar.
255
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
da paragem cardíaca materna. A retirada do feto alivia a compressão da veia cava e pode
aumentar a probabilidade de reanimar a mãe ao permitir o aumento do retorno venoso
durante a tentativa de RCP. O parto permite também acesso à cavidade abdominal pelo
que é possível compressão ou clampagem da aorta. Depois do feto ser retirado, a sua
reanimação pode também iniciar-se.
12. Obesidade
A nível mundial, a obesidade mais do que duplicou desde 1980. Muitos estudos clínicos
relacionam o índice de massa corporal (IMC) com aumento do risco, numa grande variedade
de doenças cardiovasculares e não cardiovasculares. Os fatores de risco cardiovasculares
tradicionais (hipertensão, diabetes, perfil lipídico, prevalência de doença coronária,
insuficiência cardíaca, e hipertrofia ventricular esquerda) são comuns no doente obeso.
A obesidade está associada ao aumento de risco de morte súbita cardíaca. As principais
causas de morte são a cardiomiopatia dilatada e a aterosclerose coronária grave.
256
da desfibrilhação, pois nenhuma destas medidas está padronizada para o peso do
doente.
• O peso do doente deve ser tido em conta quando se organiza a reanimação
pré-hospitalar, em especial no que diz respeito ao apoio técnico e número de
operacionais de ambulância. Podem ser necessários mais socorristas que o habitual
para colaborar na mobilização do doente e para evitar a fadiga dos reanimadores,
particularmente na realização de compressões torácicas.
• As compressões torácicas são mais eficazes quando realizadas com o doente
deitado sobre uma superfície dura. Pode não ser seguro para o doente e a equipa de
reanimação mover o doente obeso para o chão, mas nem sempre é necessário, pois
sendo mais pesado o tronco fica mais afundado no colchão, com menos potencial
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13. Eletrocussão 12
A eletrocussão, apesar de ser relativamente rara, tem potencial para causar lesões
multissistémicas devastadoras, com elevada morbilidade e mortalidade. A maioria das
lesões elétricas em adultos ocorre no local de trabalho e está geralmente associada à alta
voltagem, enquanto que nas crianças o risco maior é em casa, onde a voltagem é inferior
(220 V na Europa, Austrália, Ásia; 110 V nos EUA e Canadá). A eletrocussão por relâmpagos é
rara, mas causa cerca de 1000 mortes anuais em todo o mundo.
Os fatores que influenciam a gravidade da lesão elétrica incluem: corrente alterna (AC)
ou direta (DC), voltagem, magnitude da energia descarregada, resistência à passagem de
corrente, trajeto da corrente através da vítima e área e duração do contacto. A resistência da
pele diminui com a humidade, o que aumenta a probabilidade de lesão. A corrente elétrica
segue o trajeto de menor resistência; os feixes neurovasculares condutores nos membros
são particularmente suscetíveis à lesão.
257
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
O contacto com corrente alterna pode provocar contração tetânica do músculo esquelético,
que pode impedir que a vítima se liberte da fonte de eletricidade. A insuficiência miocárdica
ou respiratória pode provocar morte imediata:
• A paragem respiratória pode ser causada por depressão respiratória central ou por
paralisia dos músculos respiratórios.
• A corrente pode precipitar FV se atravessar o miocárdio durante o período
vulnerável (semelhante ao fenómeno R-em-T). A corrente elétrica pode também
causar isquemia do miocárdio por espasmo das artérias coronárias.
• A assistolia pode ser primária ou secundária à asfixia após paragem respiratória.
Um relâmpago descarrega, em alguns milissegundos, uma corrente que pode chegar aos
300 kV. A maior parte da corrente de um relâmpago passa sobre a superfície do corpo num
processo conhecido como flashover externo. Tanto os choques industriais como a fulguração
por relâmpago causam queimaduras profundas no ponto de contacto – na indústria, os
pontos de contacto são habitualmente os membros superiores, mãos e punhos, enquanto
com o relâmpago são maioritariamente a cabeça, pescoço e ombros. A lesão pode também
ocorrer indiretamente através da corrente no solo, “salpicos” de uma árvore ou de outro
objeto atingido pelo relâmpago. A força explosiva gerada pelo relâmpago pode causar
traumatismo fechado.
13.1. Tratamento
Certificar-se que todas as fontes elétricas estão desligadas e não se aproximar da vítima
até que seja seguro. A eletricidade de alta voltagem (acima da energia doméstica) pode
fazer um arco e propagar-se através do solo até alguns metros ao redor da vítima. É seguro
aproximar-se e tratar as vítimas após fulguração por um relâmpago, mas seria mais sensato
258
transportá-las para um ambiente mais seguro. Seguir as recomendações padronizadas
para reanimação.
• A abordagem da via aérea pode ser difícil se existirem queimaduras elétricas na zona
da face e do pescoço. Nestes casos, deve intubar-se a traqueia precocemente já que o
edema das partes moles pode causar subsequente obstrução da via aérea. Imobilizar a
coluna cervical até que possa ser feita uma avaliação.
• A paralisia muscular, especialmente após alta voltagem, pode persistir durante várias
horas; durante este período é necessário suporte ventilatório.
• A fibrilhação ventricular é a arritmia inicial mais frequente após choque de alta voltagem
com corrente alterna; tratar com tentativa imediata de desfibrilhação. A assistolia é mais
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frequente após choque com corrente direta; usar as recomendações padrão para o
tratamento desta e de outras arritmias.
• Retirar o vestuário e os sapatos queimados para evitar mais lesões térmicas.
• Administrar fluidos se houver destruição significativa de tecidos. Manter um bom débito
urinário para aumentar a eliminação de mioglobina, potássio e de outros produtos da
lesão tecidular.
• Ponderar intervenção cirúrgica precoce em doentes com lesões térmicas graves.
• Fazer uma avaliação secundária cuidadosa para excluir lesões causadas por contração
muscular tetânica ou pela projeção da vítima devido à força do choque.
• A eletrocussão pode causar graves lesões profundas dos tecidos moles, com lesões
cutâneas relativamente insignificantes, porque a corrente tende a seguir os feixes
neurovasculares; procurar cuidadosamente sinais de síndrome compatimental, com
indicação para fasciotomia.
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
• A
s situações descritas neste capítulo são responsáveis por uma grande
proporção de paragens cardíacas em doentes jovens.
• U
sar a abordagem ABCDE para o seu reconhecimento e tratamento precoce a
fim de prevenir paragem cardíaca
• R
CP de elevada qualidade e o tratamento das causas reversíveis são o
fundamento do tratamento de paragens cardíacas por qualquer causa.
• P
edir precocemente ajuda especializada quando são necessários
LEITURA ADICIONAL
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12
261
Capítulo 12
Paragem cardíaca em circunstâncias especiais
262
Capítulo 13.
Cuidados pós-reanimação
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OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
• o
papel e as limitações da avaliação do prognóstico após paragem cardíaca
1. Introdução
O sucesso no restabelecimento de circulação espontânea (RCE) é o primeiro passo para
o objetivo de recuperação completa da paragem cardíaca. As alterações fisiopatológicas
complexas que se sucedem à isquemia generalizada durante a paragem cardíaca, e a
subsequente resposta de reperfusão durante a RCP e após a reanimação com sucesso,
foram designadas síndrome pós-paragem cardíaca. Dependendo da causa da paragem,
e da gravidade da síndrome pós-paragem cardíaca, muitos doentes irão necessitar de
suporte multiorgânico, e o tratamento que recebem neste período pós-reanimação
influencia significativamente o prognóstico global, e em particular a qualidade da
recuperação neurológica. A fase pós-reanimação começa no local onde se consegue o RCE,
mas, depois de estabilizado, o doente é transferido para a área de cuidados diferenciados
mais adequada (p. ex. serviço de urgência, laboratório de hemodinâmica ou unidade de
cuidados intensivos [UCI]) para continuidade das medidas de diagnóstico, monitorização
e tratamento. O algoritmo de cuidados pós-reanimação (figura 13.1) realça algumas das
intervenções essenciais para otimizar o desfecho destes doentes. Se existem dúvidas sobre
a função neurológica do doente, deve proceder-se à intubação traqueal e iniciar medidas
para otimizar as variáveis hemodinâmicas, respiratórias e metabólicas, juntamente com
controlo da temperatura, segundo o protocolo local de tratamento.
263
Capítulo 13
Cuidados pós-reanimação
Figura 13.1
Doente comatoso após restabelecimento de circulação espontânea
normocápnia
Circulação (C)
n ECG de 12 derivações
n O bter acesso intravenoso fiável
n Alvo de PA sistólica >100 mmHg
n Fluidos (cristalóides) – restabelecer a
Controlo da temperatura
n Temperatura constante 32-36 °C
Elevação ST no ECG de 12
SIM derivações?
NÃO
Diagnóstico
Internamento em
Tratar causas não cardíacas
Unidade de Cuidados
para a paragem cardíaca
Intensivos
Abordagem na UCI
n Controlo da temperatura: manter temperatura constante 32-36 ºC
Prevenção secundária
Seguimento e
i. e. CDI, rastreio de doenças hereditárias,
reabilitação
controlo de fatores de risco
264
1.1. A síndrome pós-paragem cardíaca
A síndrome pós-paragem cardíaca engloba lesão cerebral, disfunção do miocárdio,
resposta sistémica de isquemia/reperfusão e persistência da patologia precipitante.
A gravidade deste estado varia em função da duração e da causa da paragem cardíaca.
Pode nem se verificar se a paragem cardíaca for breve. A lesão cerebral pós-paragem
cardíaca manifesta-se por coma, convulsões, mioclonias, diferentes graus de disfunção
neurológica e morte cerebral. A lesão cerebral pós-paragem cardíaca pode ser agravada
por insuficiência microcirculatória, diminuição da autorregulação, hipercápnia, hipoxémia e
hiperoxémia, pirexia, hiperglicémia e convulsões. É frequente verificar-se uma considerável
disfunção do miocárdio após a paragem cardíaca, mas que geralmente resolve ao fim de
2-3 dias. A isquemia/reperfusão generalizada pós-paragem ativa as vias imunológicas e da
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2. Continuação da reanimação
Na fase imediatamente após a reanimação, enquanto se aguarda a transferência do doente
para a área de cuidados diferenciados adequada, o doente deve ser tratado seguindo a
abordagem ABCDE.
265
Capítulo 13
Cuidados pós-reanimação
Embora as estratégias de ventilação protetora do pulmão não tenham sido estudadas nos
doentes de pós-paragem cardíaca, tendo em conta que estes doentes desenvolvem uma
resposta inflamatória marcada, parece racional aplicar ventilação protetora do pulmão:
volume corrente 6-8 mL/kg (peso ideal) e pressão positiva no final da expiração (PEEP) de
4-8 cm H2O. Inserir uma sonda gástrica para descomprimir o estômago; a distensão gástrica
provocada pela ventilação boca-a-boca ou com insuflador e máscara facial pode comprimir
o diafragma e dificultar a ventilação. Administrar doses adequadas de sedação, o que irá
diminuir o consumo de oxigénio. É altamente recomendada a existência de um protocolo
de sedação. Podem ser necessários bólus de relaxante neuromuscular, em especial se se
2.2. Circulação
266
2.2.2. Abordagem hemodinâmica
A disfunção do miocárdio pós-paragem cardíaca causa instabilidade hemodinâmica
que se manifesta por hipotensão, baixo débito cardíaco e arritmias. Deve realizar-se
ecocardiografia precoce em todos os doentes, para detetar e quantificar o grau de
disfunção miocárdica. A disfunção miocárdica pós-reanimação muitas vezes requer
suporte inotrópico, pelo menos temporário. Com base em dados experimentais, a
dobutamina é a mais adotada neste contexto, mas a resposta inflamatória sistémica que
ocorre frequentemente nos doentes em pós-paragem cardíaca pode também causar
vasoplegia e vasodilatação grave. Assim, a noradrenalina, com ou sem dobutamina em
associação, e fluidoterapia constituem em geral o tratamento mais eficaz. A perfusão de
um volume relativamente grande de fluidos é extremamente bem tolerada pelos doentes
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267
Capítulo 13
Cuidados pós-reanimação
outros sistemas orgânicos rapidamente, para que os cuidados pós-reanimação possam ser
dirigidos às necessidades do doente. Para examinar convenientemente o doente, poderá
ser necessário despi-lo totalmente.
Mesmo que não tenha implicações imediatas para o tratamento do doente, deve avaliar-se
rapidamente o seu estado neurológico e registar o valor da escala de coma de Glasgow
(tabela 13.1). A máxima pontuação possível é 15 e a mínima é 3.
Tabela 13.1
Pontuação da Escala de Coma de Glasgow
2.5. Sedação
Apesar de ser uma prática frequente sedar e ventilar os doentes durante o mínimo de 24
h após RCE, não existem dados que suportem um determinado período de ventilação,
268
sedação e bloqueio neuromuscular após uma paragem cardíaca. Os doentes têm de estar
bem sedados durante o controlo de temperatura (TTM), portanto, a duração da sedação e
ventilação é influenciada sobretudo por esta. Não há dados que indiquem que a escolha
do tipo de sedação influencia o resultado, mas, geralmente, usa-se uma combinação de
opióides e hipnóticos. Os fármacos de ação curta (p. ex. propofol, alfentanil, remifentanil)
permitem uma avaliação neurológica precoce. A sedação apropriada vai reduzir o consumo
de oxigénio. Na hipotermia, a sedação óptima pode diminuir ou evitar os calafrios, o que
permite que a temperatura alvo seja alcançada mais rapidamente. A utilização de escalas
publicadas de sedação para monitorizar estes doentes (p. ex. as escalas de Richmond ou de
Ramsay) pode ser útil.
As convulsões são comuns após a paragem cardíaca, e ocorrem em cerca de um terço dos
doentes que se vão manter em coma após RCE. As mioclonias são mais comuns e ocorrem
em 18-25 %, tendo os restantes doentes convulsões focais ou tónico-clónicas generalizadas,
ou uma combinação de tipos de convulsão. As convulsões clínicas, incluindo mioclonias,
podem, ou não, ser de origem epilética. Outras manifestaçoes motoras podem ser
confundidas com convulsões, e há vários tipos de mioclonias, sendo a maioria não epiléticas.
Deve-se utilizar eletroencefalografia (EEG) intermitente para detetar atividade epilética
em doentes com manifestações clínicas de convulsões. Considerar EEG contínuo para
monitorizar os doentes com o diagnóstico de estado epilético, e o efeito da terapêutica. As
convulsões podem aumentar a taxa metabólica cerebral, e têm o potencial de exacerbar a
lesão cerebral causada pela paragem cardíaca: tratar com valproato de sódio, levetiracetam,
fenitoína, benzodiazepinas, propofol ou um barbitúrico. As mioclonias podem ser
especialmente difíceis de tratar; a fenitoína costuma ser ineficaz. O propofol é eficaz a
suprimir as mioclonias pós-anóxia. O clonazepam, o valproato de sódio e o levetiracetam
são fármacos antimioclónicos que podem ser eficazes nas mioclonias pós-anóxia. Após
o primeiro evento convulsivo, excluir potenciais causas precipitantes (p. ex. hemorragia
intracraniana, alterações eletrolíticas) e iniciar terapêutica de manutenção.
Não está recomendada a profilaxia das convulsões nos doentes em pós-paragem cardíaca
por rotina, pelo risco de efeitos adversos e pela má resposta a fármacos antiepiléticos em 13
doentes com convulsões clínicas e eletroencefalográficas.
269
Capítulo 13
Cuidados pós-reanimação
• Manter uma temperatura alvo constante entre 32-36 ºC nos doentes em que se
270
• contraindicações para o controlo de temperatura incluem: infeção sistémica grave
e coagulopatia preexistente (a terapêutica fibrinolítica não é uma contraindicação
para hipotermia ligeira induzida).
2.9.1. História
Obter uma história adequada tão brevemente quanto possível. Os intervenientes nos
cuidados do doente imediatamente antes da paragem cardíaca podem ser uma ajuda
(p. ex. operacionais de emergência pré-hospitalar, médico de família e familiares).
Nomeadamente, devem ser averiguados sintomas de doença cardíaca. Considerar outras
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2.9.2. Monitorização
A monitorização contínua do ECG, pressão arterial e possivelmente pressão venosa central,
débito cardíaco, frequência respiratória, oximetria de pulso, capnografia, temperatura central
e débito urinário é essencial para detetar alterações durante o período de instabilidade que
se segue à reanimação após paragem cardíaca. Monitorizar continuamente os efeitos das
intervenções médicas (p. ex. ventilação assistida, terapêutica diurética).
2.9.3. Exames
Inúmeras variáveis fisiológicas podem estar alteradas imediatamente após a paragem
cardíaca, e devem ser efetuados exames de diagnóstico bioquímicos e cardiológicos
urgentes (tabela 13.2). 13
• Gasimetria arterial
Orientações para a interpretação dos valores da gasimetria arterial encontram-se no
capítulo 15.
271
Capítulo 13
Cuidados pós-reanimação
pode não conseguir este aumento se a função respiratória estiver deprimida por sedativos,
diminuição do estado de consciência ou doença pulmonar significativa. Nestes casos, a
PaCO2 pode aumentar, provocando uma acidose mista respiratória e metabólica com
acidémia profunda.
272
Tabela 13.2
Exames após o restabelecimento da circulação
Hemograma completo
Para excluir a anemia como agravante de isquemia do miocárdio e para estabelecer valores basais
Bioquímica
ECG de 12 derivações
Radiografia do tórax
Para estabelecer a posição de tubo traqueal, gástrico e/ou de um catéter venoso central
Para procurar evidência de edema pulmonar
Para procurar evidência de aspiração pulmonar
Para excluir pneumotórax
Para detectar sequelas imprevistas da RCP (p.ex. fratura esternal ou das costelas)
Para avaliar a silhueta cardíaca (a avaliação rigorosa do tamanho do coração exige uma
radiografia padronizada PA em pé – nem sempre praticável em situações pós-reanimação)
Gasimetria 13
Para assegurar a adequação da ventilação e da oxigenação
Para assegurar a correção do equilíbrio ácido-base
Ecocardiografia
273
Capítulo 13
Cuidados pós-reanimação
** A função cardíaca ótima exige um ritmo sinusal normal. A contração auricular contribui
significativamente para o preenchimento ventricular, especialmente se existir
doença do miocárdio e doença valvular. A perda da contração sequencial auricular
e ventricular do ritmo sinusal pode diminuir substancialmente o débito cardíaco em
alguns doentes.
3. Prognóstico
A mortalidade nas UCI deve-se a lesão neurológica em dois terços das paragens cardíacas
extra-hospitalares, e em um quarto das intra-hospitalares. É necessária uma forma de prever
o prognóstico neurológico que possa ser aplicada individualmente a todos os doentes
imediatamente após RCE. Muitos estudos focaram-se em prever mau prognóstico a longo
prazo (incapacidade cerebral grave ou morte), com base em achados ou testes clínicos
indicativos de lesão cerebral irreversível, para permitir aos clínicos determinar a limitação
dos tratamentos ou a retirada de suporte vital. As implicações destes testes prognósticos são
tais que deveriam ter 100 % de especificidade, ou taxa zero de falsos positivos, i. e. nenhum
indivíduo deveria ter um “bom” prognóstico a longo prazo se lhe tivesse sido previsto um
mau prognóstico.
274
prognóstico com quase 0 % de taxa de falsos positivos (FP) em doentes submetidos, ou não,
a TTM (taxa de FP 1 [0-3] e 0 [0-8], respetivamente) e uma sensibilidade relativamente baixa
(19 % e 18 %, respetivamente). Resultados semelhantes foram documentados em relação à
ausência bilateral de reflexo da córnea. A ausência de reflexos vestíbulo-oculares às ≥24 h, e
uma pontuação motora na GCS igual ou inferior a 2 (resposta em extensão ou sem resposta
à dor) às ≥72 h são menos fiáveis. Outras manifestações clínicas, incluindo mioclonias, não
são recomendadas para prever mau prognóstico. A existência de estado mioclónico em
adultos está fortemente associada a mau prognóstico, mas foram descritos casos raros de
boa recuperação neurológica desta situação e o diagnóstico exato do estado mioclónico é
problemático.
3.2. Eletrofisiologia
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3.2.2. Eletroencefalografia
Nos doentes submetidos a TTM, a ausência de reatividade basal do EEG prevê mau
prognóstico nas 48-72 h após RCE. A maioria dos estudos de prognóstico sobre a reatividade
do EEG após paragem cardíaca provêm do mesmo grupo de investigadores. As limitações
da reatividade do EEG incluem falta de padronização na modalidade de estimulação e
uma concordância modesta entre investigadores. Para além da sua relevância em termos
prognósticos, o registo do EEG – quer contínuo quer intermitente – em sobreviventes de
paragem cardíaca que estejam em coma, tanto durante a TTM como após o reaquecimento,
é útil para avaliar o nível de consciência – que pode ser mascarado por sedação prolongada,
disfunção neuromuscular ou mioclonias – e para detetar e tratar contrações musculares 13
não convulsivas que podem ocorrer em cerca de um quarto dos sobreviventes em coma.
3.3. Biomarcadores
A enolase neuronal específica (NSE) e o S-100B são biomarcadores proteicos que são
libertados após a lesão dos neurónios e das células da glia, respetivamente. Os seus
valores após paragem cardíaca correlacionam-se provavelmente com a extensão da lesão
neurológica anóxica-isquémica e, assim, com a gravidade do prognóstivo neurológico. O
S-100B está menos documentado que a NSE. As vantagens dos biomarcadores em relação
ao EEG e ao exame clínico incluem resultados quantitativos e provável independência dos
efeitos da sedação. A sua principal limitação enquanto fator prognóstico é a dificuldade
em definir um limiar consistente para identificar os doentes que terão um mau prognóstico
com um elevado grau de certeza. As concentrações séricas dos biomarcadores são na
realidade variáveis contínuas, o que limita a sua aplicabilidade na predição dicotómica de
um prognóstico.
275
Capítulo 13
Cuidados pós-reanimação
O processo de recuperação cerebral após uma lesão pós-anóxia global está completo
dentro de 72 h após a paragem, na maioria dos doentes. No entanto, em doentes que
receberam sedação ≤12 h antes da avaliação neurológica às 72 h pós-RCE, a fiabilidade
do exame clínico poderá ser menor. Antes de se realizarem avaliações decisivas, os fatores
de confundimento major têm de ser excluídos; para além da sedação e do bloqueio
neuromuscular, estes incluem hipotermia, hipotensão grave, hipoglicémia e alterações
metabólicas e respiratórias. Suspender a sedação e os relaxantes neuromusculares durante
tempo suficiente para evitar interferência com o exame clínico. Os fármacos de curta
duração de ação são preferidos sempre que possível. Quando se suspeita de sedação
ou paralisia residuais, considerar a utilização de antídotos para reverter o efeito desses
fármacos.
Avaliar os preditores mais robustos em primeira instância. Estes incluem ausência bilateral
de reflexos pupilares às ≥72 h após RCE, e ausência de onda N2O bilateralmente em
potenciais evocados somatossensoriais (SSEP) após reaquecimento (este último sinal
pode ser avaliado às ≥24 h após RCE nos doentes que não foram tratados com controlo
de temperatura). Com base na opinião de peritos, sugerimos a combinação da ausência de
reflexos pupilares com a de reflexos da córnea para predizer mau prognóstico neste ponto
temporal. Os reflexos oculares e os SSEP mantêm o seu valor preditivo independentemente
da temperatura alvo. Se nenhum dos sinais acima referidos estiver presente para predizer
um mau prognóstivo, pode avaliar-se um grupo de preditores menos fiáveis, mas o grau
de confiança no seu resultado será menor. Estes incluem a presença de estado mioclónico
precoce (dentro de 48 h após RCE), valores elevados de enolase neuronal específica (NSE) às
48-72 h após RCE, um padrão não-reativo maligno no EEG (padrão surto-supressão, estado
276
epilético) após reaquecimento, TC cranioencefálica dentro de 24h após RCE com redução
marcada da relação substância cinzenta/substância branca (GM/WM) ou apagamento
dos sulcos, ou RMN cerebral 2-5 dias após RCE com alterações isquémicas difusas. Com
base em opinião de peritos, sugerimos esperar pelo menos 24 h após a primeira decisão
prognóstica, e confirmar o coma com uma resposta motora de 1-2 na GCS antes de utilizar
este segundo conjunto de critérios preditores. Também sugerimos a combinação de, pelo
menos, dois destes preditores para definir um prognóstico.
Figura 13.2
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Paragem cardíaca
TC
mioclónico
Controlo de temperatura
Estado
Dias 1-2
Reaquecimento
EEG - NSE
SSEP
NÃO
(1)
Às ≥24 h após RCE nos doentes não tratados com
controlo de temperatura
Prognóstico indeterminado
(2)
Ver texto para detalhes.
Observar e reavaliar
277
Capítulo 13
Cuidados pós-reanimação
4. Doação de órgãos
Deve ser ponderada a doação de órgãos nos doentes em que se conseguiu RCE e que
preenchem critérios de morte, segundo critérios neurológicos. Nos doentes em coma em
quem se toma a decisão de suspensão das medidas de suporte vital, a doação de órgãos
pode ser considerada após ocorrer morte circulatória. A doação de órgãos também se
pode ponderar em doentes em que a RCP não tem sucesso a obter RCE. Todas as decisões
relacionadas com a doação de órgãos têm de cumprir os requisitos legais e éticos locais,
pois estes podem variar.
O feedback à equipa de reanimação deve ser construtivo, e não baseado numa cultura de
culpa. Quer a tentativa de reanimação tenha tido, ou não, sucesso, os familiares do doente
requerem apoio considerável. Ponderar as necessidades de acompanhamento religioso de
todos os envolvidos na paragem.
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
• A
pós uma paragem cardíaca, o retorno da circulação espontânea é só a primeira
etapa no contínuo da reanimação.
• A
qualidade dos cuidados pós-reanimação vai influenciar significativamente o
prognóstico final do doente.
• A
síndrome pós-paragem cardíaca inclui lesão cerebral, disfunção miocárdica,
resposta sistémica isquemia/reperfusão e persistência da patologia
desencadeante.
• A
nossa capacidade para prever o prognóstico neurológico final dos doentes
que permanecem em coma após reanimação cardiopulmonar continua a ser
muito deficiente.
278
LEITURA ADICIONAL
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treatment, and prognostication. A Scientific Statement from the International Liaison Committee
on Resuscitation; the American Heart Association Emergency Cardiovascular Care Committee;
the Council on Cardiovascular Surgery and Anesthesia; the Council on Cardiopulmonary, Periop-
erative, and Critical Care; the Council on Clinical Cardiology; the Council on Stroke. Resuscitation
2008;79:350-79.
• Polderman KH, Herold I. Therapeutic hypothermia and controlled normothermia in the intensive care
unit: practical considerations, side effects, and cooling methods. Crit Care Med 2009;37:1101-20.
• Sandroni C, Cariou A, Cavallaro F, et al. Prognostication in comatose survivors of cardiac arrest: an
advisory statement from the European Resuscitation Council and the European Society of Intensive
Care Medicine. Resuscitation 2014;85:1779-89.
13
279
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
280
Cuidados pós-reanimação
Capítulo 13
Capítulo 14.
Paragem cardíaca pré-hospitalar
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
• o
papel da reanimação cardiopulmonar (RCP) por aconselhamento telefónico
• a posição atual sobre o que deve ser realizado em primeiro lugar, SBV versus
desfibrilhação
• c omo mudar eficazmente de um DAE para um desfibrilhador manual
• a importância da passagem eficaz de um doente à equipa hospitalar
• r egras para suspender a reanimação
• o
papel potencial dos centros de paragem cardíaca
1. Introdução
O objetivo de incluir esta secção pré-hospitalar no manual de curso de Suporte Avançado
de Vida (SAV) do European Resuscitation Council é compilar tópicos sobre reanimação
com relevância específica para os serviços de emergência médica (SEM) pré-hospitalar. O
aumento da ênfase na importância de compressões torácicas de elevada qualidade, com
o mínimo de interrupções, e na redução da pausa pré-choque, através da continuação das
compressões torácicas enquanto o desfibrilhador carrega, exige um programa de treino
bem estruturado e monitorizado para os profissionais dos SEM pré-hospitalar. Este programa
deve incluir treino exaustivo baseado em competências, assim como oportunidades
periódicas para renovar os conhecimentos. Sabe-se que na maioria dos casos a reanimação
pré-hospitalar tem de ser realizada por profissionais em menor número do que aqueles que
estariam normalmente presentes durante uma paragem intra-hospitalar; da mesma forma,
o transporte para uma unidade hospitalar acrescenta uma outra dimensão, sublinhando
a necessidade de uma abordagem estruturada e disciplinada. O curso de SAV do ERC
disponibiliza a plataforma ideal para desenvolver e praticar competências em reanimação,
e reforçar a abordagem das equipas multidisciplinares.
281
Capítulo 14
Paragem cardíaca pré-hospitalar
2. Pessoal e Intervenções
Na Europa, há grande variabilidade na estrutura e processos dos serviços de emergência
médica (SEM). Alguns países adotaram sistemas quase exclusivamente baseados em
paramédicos/técnicos de emergência, enquanto que outros incorporam médicos no pré-
hospitalar em maior ou menor escala. Embora alguns estudos tenham documentado taxas
de sobrevivência superiores após paragem cardíaca com sistemas de SEM que incluem
médicos experientes, comparando com os sistemas baseados em profissionais não-
médicos, outros estudos comparativos não encontraram diferença na sobrevivência entre
os sistemas de paramédicos ou de médicos como elementos de resposta. Sistemas não-
médicos bem organizados e com paramédicos altamente treinados também reportaram
elevadas taxas de sobrevivência. Tendo em conta a inconsistência da evidência, a inclusão
Os operadores devem dar instruções para RCP telefónica em todos os casos de suspeita
de paragem cardíaca, a menos que um reanimador treinado já esteja a fazer RCP. Se se
tratar de uma vítima adulta, os operadores devem dar instruções para RCP apenas com
compressões torácicas.
282
Se a vítima é uma criança, os operadores devem dar instruções aos interlocutores para
realizar tanto ventilações como compressões torácicas. Os operadores devem assim ter
treino para dar instruções para ambas as técnicas.
quando está disponível pessoal treinado, com elevado nível de experiência e de confiança.
Na sua ausência, a utilização de dispositivos supraglóticos de via aérea (DSG) durante a RCP
é provavelmente mais racional.
4.1. Ventilação
A maioria dos doentes submetidos a RCP no contexto pré-hospitalar é ventilado após a
abordagem da via aérea. Em função do equipamento disponível, são utilizados insufladores
manuais ou ventiladores simples. Para evitar potenciais problemas, como a deslocação
do dispositivo de via aérea ou problemas ventilatórios secundários, a monitorização deve
incluir capnografia de onda, sempre que disponível, e avaliação contínua da saturação.
Volumes correntes de cerca de 6-7 mL/kg de peso corporal ideal, com uma frequência de
10-12/min, proporcionam oxigenação e ventilação adequadas. A hipercápnia, assim como a
hipocápnia, deve ser evitada já que podem agravar o prognóstico.
5. Desfibrilhação 14
5.1. O
que deve ser realizado em primeiro lugar: SBV versus
desfibrilhação
A desfibrilhação é um dos elos da Cadeia de Sobrevivência, e uma das poucas intervenções
que demonstraram melhorar o prognóstico da paragem cardíaca por fibrilhação ventricular/
taquicardia ventricular sem pulso (FV / TV). A probabilidade de desfibrilhação com sucesso,
e subsequente sobrevivência à data da alta hospitalar, diminui rapidamente com o tempo,
pelo que a capacidade de desfibrilhar precocemente é um dos mais importantes fatores
para determinar a sobrevivência após paragem cardíaca.
283
Capítulo 14
Paragem cardíaca pré-hospitalar
Os profissionais dos SEM devem realizar RCP de elevada qualidade enquanto se prepara,
aplica e carrega o desfibrilhador. A desfibrilhação não deve ser atrasada mais do que o
necessário para avaliar a necessidade de desfibrilhação e para a carga. Não está recomendada
a realização por rotina de um período predefinido de RCP (p. ex. dois ou três minutos) antes
da análise do ritmo e a aplicação do choque.
Um pré-aviso deve ser rotina, e é essencial quando está a decorrer reanimação durante
o transporte, para assegurar que o pessoal do serviço de urgência e/ou a equipa de
reanimação hospitalar estão preparados para receber o doente. Isto dá tempo para que a
284
equipa de reanimação hospitalar designe um líder da equipa e atribua papéis aos membros
da equipa. Podem ser agilizadas intervenções específicas para tratar potenciais causas
reversíveis.
doentes.
285
Capítulo 14
Paragem cardíaca pré-hospitalar
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
• N
o adulto, a RCP só com compressões e por aconselhamento telefónico,
produz melhores taxas de sobrevivência do que a RCP convencional por
aconselhamento telefónico.
• O
s profissionais dos SEM devem fazer RCP de elevada qualidade enquanto se
prepara, aplica e carrega o desfibrilhador, mas não está recomendado, como
rotina, um período específico de RCP antes da aplicação do choque.
• A
intubação traqueal só deve ser tentada por profissionais com elevado nível de
competência e experiência nesta técnica.
• A
capnografia de onda é o método mais sensível e específico para confirmar a
posição do tubo traqueal em vítimas de paragem cardíaca.
LEITURA ADICIONAL
• Soar J, et al. European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015. Section 3. Adult
Advanced Life Support. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.016; p99 - p146
• Soar J, Callaway CW, Aibiki M, et al. Part 4: Advanced life support: 2015 International Consensus on
Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care Science With Treatment Rec-
ommendations. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.042; e71 - e122
• Hupfl M, Selig HF, Nagele P. Chest-compression-only versus standard cardiopulmonary resuscita-
tion: a meta-analysis. Lancet 2010;376:1552-57.
• Nichol G, Aufderheide TP, Eigel B, et al. Regional systems of care for out-of-hospital cardiac arrest: A
policy statement from the American Heart Association. Circulation 2010;121:709-29.
• Rea TD, Fahrenbruch C, Culley L, et al. CPR with chest compresssions alone or with rescue breathing.
New England Journal of Medicine 2010;363:423-33.
• Svensson L, Bohm K, Castren M, et al. Compression-only CPR or standard CPR in out-of-hospital
cardiac arrest. New England Journal of Medicine 2010;363:434-42.
286
Capítulo 15.
Análise dos gases arteriais e
oximetria de pulso
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OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
• o
s termos utilizados para descrever os resultados da análise dos gases do
sangue arterial
• q
ual a ligação entre respiração e metabolismo
• p
rincípios da oximetria de pulso
• utilização segura e eficaz de oxigénio
1. Introdução
Saber interpretar a análise de uma amostra de sangue arterial, para determinar o equilíbrio
ácido-base de um doente e as trocas gasosas respiratórias, é uma parte essencial do
tratamento de qualquer doente crítico e, em particular, do doente em periparagem. Apesar
de ser frequente a tentação de tentar analisar os números isoladamente, é essencial ter
um método que assegure que nada passa despercebido nem é mal interpretado; tal como
acontece com a interpretação de um ECG, dever-se-á começar com a pergunta “Como
está o doente?”. Isto deverá incluir a história do doente, terapêutica em curso e aporte de
oxigénio atual.
287
Capítulo 15
Análise dos gases arteriais e oximetria de pulso
2. pH
A acidez ou alcalinidade do sangue (ou de qualquer outra solução) é determinada pela
concentração de iões hidrogénio [H+]; quanto maior a concentração, mais ácida a solução.
No organismo, a concentração de hidrogénio é extremamente baixa, geralmente cerca
de 40 nanomoles por litro (nmol/L), sendo uma nanomole a bilionésima parte de uma
mole (uma mole é o peso molecular de uma substância em gramas, i. e. para o hidrogénio
É óbvio que o sistema de tamponamento não passa de uma solução temporária para a
produção de ácidos; eventualmente, todos os tampões serão consumidos e os ácidos
começarão a acumular-se. É por isso necessário um sistema que elimine os ácidos,
regenerando os tampões. Este processo é levado a cabo pelos pulmões e rins.
288
3. Pressão parcial
Geralmente, utilizam-se percentagens para descrever a composição de uma mistura de
gases, sendo o ar um bom exemplo: 21 % oxigénio, 78 % azoto, 0,04 % dióxido de carbono.
No entanto, a melhor forma de descrever o número de moléculas de um gás numa mistura
é através da sua pressão parcial. A pressão parcial é a contribuição, numa mistura, de cada
gás para a pressão total. A importância de utilizar esta medida demonstra-se melhor
pelo fato de que, se duplicarmos a pressão total de uma mistura, as pressões parciais
dos constituintes duplicam, mas as percentagens permanecem as mesmas. Respiramos
gases à pressão atmosférica (ou 1 atmosfera), um valor muito próximo de uma pressão de
100 kiloPascal (kPa) ou 750 mmHg (1 kPa = 7,5 mmHg). Assim, quando respiramos ar, a
contribuição (pressão parcial) de azoto é 78 % de 100 kPa ou 78 kPa e a de oxigénio 21 % de
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
100 kPa ou 21 kPa. Quando respiramos 40 % de oxigénio, a pressão parcial de oxigénio no
gás inspirado é 40 kPa.
À pressão atmosférica, a pressão parcial de um gás numa mistura (em kPa) é numericamente
o mesmo da percentagem (%) do gás por volume.
Quando um gás é dissolvido num líquido (sangue, por exemplo), a pressão parcial no
líquido é a mesma do gás em contato com o líquido, o que nos permite medir a pressão
parcial do oxigénio e do dióxido de carbono no sangue.
4. PaCO2
O dióxido de carbono (CO2) é um importante produto de degradação do metabolismo.
Em circunstâncias normais, é transportado no sangue até aos pulmões onde é excretado
na expiração. Para ser transportado até aos pulmões, combina-se com proteínas ou
hemoglobina, ou dissolve-se no plasma onde reage com a água formando iões hidrogénio e
bicarbonato (HCO3-):
Nos pulmões, a reação é inversa: o CO2 é gerado e depois expirado. A partir desta reação,
podemos ver que o CO2 se comporta como um ácido: qualquer aumento da PaCO2
vai desviar a reação acima indicada para a direita, e aumentar a concentração de iões
hidrogénio com o subsequente desenvolvimento de acidémia. Obviamente, vai verificar-se
o mesmo aumento na concentração de bicarbonato, mas, como é só em nanomoles, tem
pouco efeito na concentração total global de 22-26 mmol/L. Se a produção metabólica de
CO2 for constante, o único fator que afeta a quantidade no sangue é a frequência pela qual
é retirada na ventilação alveolar. Uma diminuição da ventilação alveolar reduz a excreção
289
Capítulo 15
Análise dos gases arteriais e oximetria de pulso
Por outro lado, um aumento da ventilação alveolar que elimine o CO2 mais depressa do que é
produzido vai diminuir a PaCO2 e move a reação para a esquerda, reduzindo a concentração
de iões hidrogénio. Consequentemente, o pH aumenta e, se exceder 7,45, ocorre alcalémia.
Mais uma vez, a causa é respiratória pelo que se chama a este processo alcalose respiratória.
Assim, é fácil compreender como mesmo períodos curtos de apneia, como os que ocorrem
na paragem cardíaca, resultam em acidose respiratória. Contudo, em circunstâncias
normais, o centro respiratório no tronco cerebral é muito sensível à [H+] no sangue e, em
Os pulmões são o principal mecanismo através do qual a [H+] é ajustada pela regulação da
PaCO2.
5.1. Bicarbonato
O bicarbonato (HCO3-) é o tampão mais importante. É produzido pelos rins, e é facilmente
determinado numa amostra de sangue arterial. Pode considerar-se como o oposto de um
ácido e, como tal, também é chamado uma base. Quando o bicarbonato tampona os iões
hidrogénio, produz-se dióxido de carbono e água, e é por esta via que a grande maioria
dos ácidos (90 %) é diariamente excretada. Contudo, os ácidos não eliminados pelo sistema
respiratório podem também ser tamponados, como se mostra mais abaixo. A reação abaixo
dá-se para a direita, e o bicarbonato neutraliza o efeito do H+ e impede a diminuição do pH
plasmático.
H+ + HCO3- = H2CO3-
Caso haja um aumento agudo na carga ácida, apesar do sistema respiratório tentar
aumentar a excreção de dióxido de carbono, o bicarbonato diminui, já que vai tamponar o
H+ extra. Quando as reservas de bicarbonato são utilizadas, o H+ acumula-se, diminuindo
o pH. Contrariamente ao sistema respiratório, os rins respondem lentamente, pelo que
são necessários vários dias para produzir suficiente bicarbonato para tamponar o ácido
adicional. Se os rins não conseguirem produzir bicarbonato suficiente, a acidose metabólica
daí resultante vai fazer diminuir o pH para valores inferiores a 7,35 (acidémia).
290
Ocasionalmente, verifica-se um excesso de bicarbonato que vai originar um tamponamento
excessivo de iões hidrogénio, provocar alcalose metabólica e aumentar o pH para valores
superiores a 7,45 (alcalémia).
que significa que estes dois parâmetros se movem ambos na mesma direção). Pelo contrário,
um doente com um défice de bases de 8 mmol/L precisará de adicionar 8 mmol/L de bases
fortes para normalizar o seu pH (de novo, comparar com o bicarbonato, que deverá estar
diminuído). Infelizmente, usa-se correntemente a expressão “excesso de bases negativo” e
não “défice de bases” e, no exemplo acima, o doente teria um “excesso de bases negativo
de -8 mmol/L”.
6. A ligação respiratório-metabólica
Pelo texto acima pode ver-se que o organismo tem dois sistemas para assegurar um ambiente
interno estável e evitar o desenvolvimento de acidose. Uma proteção adicional prende-se
com o facto de os dois sistemas estarem ligados, e poderem compensar os desequilíbrios
mútuos. Esta ligação deve-se à existência de ácido carbónico (H2CO3), que está dependente
de uma enzima chamada anidrase carbónica, existente nos glóbulos vermelhos e nos rins, e
situada numa posição privilegiada para simplificar a ligação entre os dois sistemas.
291
Capítulo 15
Análise dos gases arteriais e oximetria de pulso
7. PaO2
É interessante notar que a PaO2 também diminui ligeiramente com a idade, chegando a 10
kPa (75 mmHg) à volta dos 75 anos, aumentando então novamente e estabilizando nos 11
kPa (83 mmHg) aos 85 anos.
8.1. Passo 1
Como está o doente?
Dá frequentemente pistas úteis para interpretar os resultados. Por exemplo, é razoável
prever que a análise do sangue arterial pouco tempo depois de reanimação com sucesso
mostre sinais de acidose respiratória, causada por um período de insuficiente ventilação, e
acidose metabólica, devida ao período de respiração anaeróbica com produção de ácido
láctico durante a paragem. Assim, é expectável que o doente tenha um pH muito baixo,
292
com alterações a nível da PaCO2 e do excesso de bases. Um doente com uma doença crónica
bem compensada vai geralmente apresentar pistas sobre a causa primária e a compensação
secundária. Sem história clínica, os resultados da gasimetria de um doente com DPOC podem
ser erradamente interpretados como alcalose metabólica primária com acidose respiratória.
8.2. Passo 2
O doente está hipoxémico?
A PaO2, respirando ar ambiente, deve ser 10,0-13,0 kPa (75-100 mmHg). Contudo, se o
doente estiver a receber oxigénio suplementar, a PaO2 deve ser interpretada em função da
concentração de oxigénio inspirado. Conforme já foi discutido, a pressão parcial de oxigénio
inspirado pode ser considerada como o equivalente numérico da concentração inspirada
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
(%). Se a diferença entre os dois valores for superior a 10, há um defeito na oxigenação,
proporcional à magnitude da diferença.
8.3. Passo 3
O doente está acidémico (pH <7,35) ou alcalémico (pH >7,45)?
Se o pH se encontrar dentro dos valores normais, ou muito próximo, é sugestivo de
normalidade ou de doença crónica totalmente compensada. Em princípio, o organismo
nunca sobrecompensa, o que deverá permitir determinar o problema primário. Se
necessário, procurar recolher mais informações clínicas acerca do doente.
8.4. Passo 4
Como evoluiu a PaCO2?
Por outras palavras, a anomalia deve-se total ou parcialmente à falha do sistema respiratório?
8.5. Passo 5
O que se passou com o excesso de bases ou com o bicarbonato?
Por outras palavras, a alteração deve-se total ou parcialmente a uma falha do sistema
metabólico?
293
Capítulo 15
Análise dos gases arteriais e oximetria de pulso
8.6.1. Exemplo 1
pH <7,40, com aumento da PaCO2 (> 6,0 kPa, >45 mmHg) e do excesso de bases (> + 2
mmol/L) ou do bicarbonato (> 26 mmol/L).
A tendência para acidémia indica ser este o problema primário, e o aumento da PaCO2 indica
acidose respiratória. O aumento do excesso de bases/bicarbonato representa alcalose
metabólica compensatória, trazendo o pH de regresso à normalidade.
8.6.2. Exemplo 2
pH < 7.40, com diminuição do excesso de bases (< - 2 mmol/L) ou do bicarbonato (< 22
mmol/L) e diminuição da PaCO2 (<4.7 kPa, <35 mmHg).
A tendência para acidémia indica ser este o problema primário, e a diminuição do excesso
de bases/bicarbonato sugere acidose metabólica. A diminuição da PaCO2 representa
alcalose metabólica compensatória, trazendo o pH de regresso à normalidade.
8.6.3. Exemplo 3
pH > 7,40, com aumento do excesso de bases (> + 2 mmol/L) ou do bicarbonato (> 26
mmol/L) e aumento da PaCO2 (> 6,0 kPa, >45 mmHg).
294
A tendência para alcalémia indica ser este o problema primário, e o aumento do excesso de
bases/bicarbonato sugere, em primeiro lugar, alcalose metabólica. O aumento da PaCO2
é a compensação respiratória que traz o pH de regresso à normalidade. Este quadro
observa-se quando o organismo perde ácidos, por exemplo, por vómito prolongado de
conteúdo gástrico (ácido clorídrico), ocorrendo também na hipocaliémia crónica. Neste
caso, o organismo compensa ao mover o potássio do espaço intracelular para o extracelular
em troca com iões hidrogénio. O pH aumenta e o CO2 é retido para tentar compensar.
8.6.4. Exemplo 4
pH >7,40, com diminuição da PaCO2 (< 4,7 kPa, <35 mmHg) e diminuição do excesso de
bases (< - 2 mmol/L) ou do bicarbonato (< 22 mmol/L).
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
A tendência para alcalémia indica ser este o problema primário, e a diminuição da PaCO2
sugere, em primeiro lugar, alcalose respiratória. A diminuição do excesso de bases/
bicarbonato é a compensação metabólica que traz o pH de volta à normalidade. Apesar
de este não ser um achado frequente, pode observar-se ao fim de alguns dias quando é
utilizada a hiperventilação para controlar a pressão intracraniana em doentes com lesão
cerebral.
Há ainda uma outra situação que merece ser mencionada e que é importante identificar:
um doente crítico, com um pH < 7,4, PaCO2 normal (4-6.0 kPa, 35-45 mmHg) e diminuição
do excesso de bases (< -2 mmol/L) ou do bicarbonato (< 22 mmol/L).
Isto representa, com grande probabilidade, uma situação de acidose metabólica num
doente com retenção crónica de dióxido de carbono. O doente tenta compensar baixando
o seu dióxido de carbono (causando alcalose respiratória compensatória), mas está a partir
de uma PaCO2 mais elevada. A sua doença pulmonar vai limitar a quantidade de CO2 que
pode excretar impedindo assim que diminua ainda mais. Mais uma vez se demonstra a
importância de ter informação acerca do doente desde o início.
295
Capítulo 15
Análise dos gases arteriais e oximetria de pulso
No contexto periparagem, pode ser mais fácil obter uma amostra de sangue arterial (numa
seringa heparinizada) da artéria femoral. A artéria radial pode ser preferível quando o
doente tiver débito cardíaco e pressão arterial adequados. A artéria radial é também o
melhor local para introduzir um cateter arterial, o que permite a monitorização contínua
10.1. Papel
A oximetria de pulso é um auxiliar fundamental para a avaliação da hipoxémia. O
reconhecimento clínico da diminuição da saturação da hemoglobina no sangue arterial
(SaO2) é subjetiva e pouco fiável, com os sinais clássicos de cianose a aparecerem tardiamente,
quando a saturação de oxigénio arterial se encontra entre 80-85 %. A oximetria de pulso é
fácil de usar, relativamente barata, não invasiva e oferece uma medida imediata e objetiva da
saturação do oxigénio arterial no sangue. A sua utilização encontra-se generalizada a todos
os contextos intra-hospitalares, e nos cuidados primários e em contexto pré-hospitalar está
também a aumentar. A saturação de oxigénio, “o quinto sinal vital”, faz agora também parte
de muitos sistemas de alerta precoce para identificar o doente em deterioração.
10.2. Princípios
O sensor do oxímetro de pulso, que contém díodos emissores de luz (LED) e um fotorrecetor
situado no lado oposto, é colocado de cada lado de um tecido, geralmente num dedo ou
no lóbulo da orelha. Uma parte da luz emitida atravessa os tecidos, enquanto outra parte é
absorvida. A relação entre a luz transmitida e a absorvida fornece a saturação de oxigénio
arterial periférico (SpO2) em valores numéricos, em forma de onda ou ambas. Em função
da rápida amostragem do sinal de luz, a leitura disponibilizada altera-se a cada 0,5-1 s,
exibindo a SpO2 média sobre os anteriores 5-10 s. A maioria dos oxímetros de pulso tem um
rigor entre +/- 2 % acima de uma SaO2 de 90 %.
A espessura do tecido deve ser, preferencialmente, entre 5-10 mm. As leituras inadequadas
podem ser melhoradas se forem tentados diferentes locais, locais aquecidos ou através da
aplicação de vasodilatadores locais.
296
disponibilizar informações sobre a frequência e onda de pulso (onda pletismográfica). Um
sinal insuficiente pode ser indicativo de baixa pressão arterial ou de insuficiente perfusão
tecidular pelo que o doente deve ser reavaliado.
fontes de erro.
10.3. Limitações
A relação entre a saturação do oxigénio e a pressão parcial do oxigénio arterial (PaO2) é
demonstrada através da curva de dissociação da oxiemoglobina (figura 15.1). A forma
sinusoide da curva significa que uma diminuição inicial de uma PaO2 normal não é
acompanhada por uma queda de igual magnitude da saturação de oxigénio no sangue,
pelo que a hipoxémia pode estar inicialmente mascarada. Quando a SpO2 atinge 90-92 %,
a PaO2 terá diminuído para cerca de 8 kPa (60 mmHg). Por outras palavras, a pressão parcial
de oxigénio no sangue arterial terá diminuído quase 50 %, embora a descida na saturação
de oxigénio seja apenas 6-8 %.
• icterícia (hiperbilirrubinémia)
• pigmentação cutânea
Figura 15.1
Oxygenparcial
Pressão partial
depressure
oxigénio (kPa)
(kPa)
10.4. Utilização
A oximetria de pulso tem 4 utilizações principais:
1. deteção/rastreio da hipoxémia
2. titulação de terapia com oxigénio
3. monitorização de rotina durante anestesia
4. diagnóstico (ex. apneia do sono)
298
11. Titulação de terapia com oxigénio
Deve ser imediatamente administrado oxigénio em alta concentração aos doentes críticos
que apresentem hipoxémia (SpO2 inicial < 85 %) ou em contexto de periparagem. Deve
iniciar-se a administração com uma máscara de oxigénio com reservatório e um débito
de oxigénio de 15 L/min. Durante a paragem cardíaca deve usar-se oxigénio a 100 % para
maximizar o oxigénio arterial e a sua distribuição aos tecidos.
Quando se conseguir o RCE e for possível monitorizar de forma fiável a saturação arterial de
oxigénio, deve ajustar-se a concentração de oxigénio inspirado de forma a manter uma SpO2
de 94-98 %. Se a oximetria de pulso não estiver disponível, deve continuar-se a administrar
oxigénio através de máscara com reservatório até que esteja disponível uma forma de
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
• Tipo II: PaO2 baixa (< 8 kPa, <60 mmHg), PaCO2 aumentada (> 6-7 kPa, <45 mmHg),
frequentemente descrita como insuficiência respiratória hipercápnica, é geralmente
causada por DPOC. Quando recebem oxigénio em excesso, estes doentes podem
desenvolver agravamento da insuficiência respiratória com aumento adicional da
PaCO2, e desenvolvimento de acidose respiratória. Se não for detetada, acabará por
levar à perda de consciência e a paragem respiratória e cardíaca. A saturação de
oxigénio a atingir nesta população em risco deverá situar-se entre 88-92 %. Contudo,
quando em estado crítico, deve administrar-se inicialmente a estes doentes oxigénio
de fluxo elevado; analisar então os gases do sangue arterial e utilizar os resultados 15
para ajustar a concentração de oxigénio inspirado. Quando os doentes estiverem
clinicamente estáveis e for possível obter um valor estável e fiável da oximetria de
pulso, ajustar a concentração de oxigénio inspirado para manter uma SpO2 de 88-
92 %.
Em doentes com enfarte do miocárdio ou síndrome coronária aguda que não estejam em
estado grave ou crítico, deve procurar manter-se uma SpO2 de 94-98 % (ou 88-92 % se o
doente estiver em risco de insuficiência respiratória hipercápnica), que poderá ser alcançada
sem oxigénio suplementar, o que representa uma alteração à prática previamente aceite.
299
Capítulo 15
Análise dos gases arteriais e oximetria de pulso
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
• O
s resultados da análise dos gases do sangue arterial devem ser
sistematicamente interpretados com a abordagem dos 5 passos.
• A
oximetria de pulso permite que a saturação de oxigénio no sangue arterial
seja continuamente monitorizada.
• D
urante a RCP, usar uma concentração de oxigénio inspirado de 100% até
alcançar retorno de circulação espontânea (RCE).
• A
pós alcançar RCE e quando a SpO2 puder ser monitorizada de forma fidedigna,
LEITURA ADICIONAL
• A Simple Guide to Blood Gas Analysis. Eds. Driscoll P, Brown T, Gwinnutt C, Wardle T. BMJ Publishing
Group. London 1997.
• O’Driscoll BR, Howard LS, Davison AG. BTS guideline for emergency oxygen use in adult patients.
Thorax 2008;63 Suppl 6:vi1-68.
300
Capítulo 16.
Decisões relativas à reanimação
Cópia pessoal de Nuno Miguel Lobeiro (ID: 609847)
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Compreender:
• os princípios éticos
• declarações antecipadas para recusa de tratamento
• quando não iniciar reanimação cardiopulmonar (RCP)
• a discussão de decisões sobre RCP com os doentes e os seus familiares/amigos
• quem deve tomar decisões sobre RCP
• quando parar as tentativas de reanimação
1. Introdução
As tentativas de reanimação bem-sucedidas prolongaram a vida, útil e preciosa, a muitos
indivíduos. Contudo, só uma minoria sobrevive e recupera completamente após a tentativa
de reanimação por paragem cardíaca. A tentativa de reanimação traz consigo o risco de
sofrimento e de prolongamento do processo da morte. Prolongar a vida a qualquer custo
não deve ser o objetivo da medicina. Idealmente, as decisões sobre o início da reanimação
cardiopulmonar (RCP) deveriam ser tomadas antecipadamente, como parte do conceito
global do plano de cuidados avançados. A maioria dos países europeus dispõe de
orientações detalhadas a nível nacional. O operacional de SAV deverá estar familiarizado
com essas orientações e guiar-se pelos seus princípios.
Todos os profissionais de saúde têm que exercer a sua atividade dentro dos princípios da
lei. No que se refere à RCP, a lei varia de país para país. Mesmo dentro de uma mesma
nação, pode haver diferenças entre diferentes regiões. O operacional de SAV deverá estar
familiarizado com os aspetos relevantes da lei do país onde vive e trabalha.
A discussão das decisões sobre RCP pode ser difícil e angustiante para os doentes e
seus familiares, assim como para os profissionais de saúde. Estas decisões podem ser
influenciadas por diferentes fatores, incluindo crenças e opiniões pessoais, influências
culturais ou religiosas, considerações éticas e legais e por circunstâncias sociais ou
301
Capítulo 16
Decisões relativas à reanimação
económicas. Alguns doentes, com capacidade para tal, recusam o tratamento e registam
antecipadamente a sua vontade (conhecido como “testamento vital”). O operacional de
SAV deverá compreender os princípios éticos e legais, assim como os aspetos clínicos que
estão envolvidos antes de iniciar uma discussão sobre RCP ou de tomar uma decisão.
2. Princípios
Os quatro princípios fundamentais da ética médica são resumidos em seguida:
• A beneficência exige que haja benefício, equilibrando simultaneamente benefício
e riscos. Habitualmente, envolve a tentativa de RCP, mas se os riscos ultrapassarem
largamente qualquer eventual benefício, isso significa não instituir a RCP. A
• Não maleficência significa não fazer mal. A RCP não deve ser tentada em indivíduos
nos quais não vai resultar, onde não há benefício provável mas onde o risco de
prejuízo é óbvio.
302
e as informações adicionais serão obtidas quando possível. Eticamente, não é difícil
suspender uma tentativa de reanimação já iniciada se os socorristas forem confrontados
mais tarde com uma declaração antecipada válida que recuse o tratamento já iniciado.
A decisão de não tentar reanimar levanta várias questões éticas e morais. O que constitui
futilidade? O que não se deve ser realmente efetuar? Quem deve decidir, e quem deve ser
consultado? Quem deve ser informado?
Inevitavelmente terão de ser feitos juízos, e existirão áreas cinzentas onde serão necessárias
opiniões subjetivas em doentes com comorbilidades, tais como insuficiência cardíaca,
doença respiratória crónica, asfixia, traumatismo major, lesão craniana e doença neurológica.
A idade do doente pode pesar na decisão, mas é somente um fator preditivo, relativamente
fraco, do prognóstico; os idosos, no entanto, têm geralmente comorbilidades significativas
que influenciam o resultado.
303
Capítulo 16
Decisões relativas à reanimação
4.3. Quem deve decidir que não é tentada reanimação e quem deve
ser consultado?
A responsabilidade global desta decisão é do médico mais graduado, após discussão com
os outros colegas envolvidos nos cuidados ao doente.
Faz parte das boas práticas envolver os familiares nas decisões, apesar de estes não terem
estatuto legal no processo decisório. Um doente com capacidade para tal deve consentir
que a sua família seja envolvida na discussão sobre DNTR. O médico deve respeitar a
decisão de um doente quando este não permite que sejam reveladas informações aos seus
familiares.
304
4.4. Quem deve ser informado?
Depois da decisão ser tomada, esta deve ser comunicada de forma clara a todos os
envolvidos, incluindo ao doente. A decisão também deve ser comunicada à família do
doente, exceto se este o impedir. A informação sobre a decisão, os seus fundamentos
e o registo dos que nela estiveram envolvidos, deve ser colocada nas notas médicas,
preferencialmente num formulário específico de DNTR, documentando claramente a
data na qual a decisão foi tomada. A decisão também deve ficar registada nos registos
de enfermagem, caso estes sejam distintos. A decisão deve ser comunicada a todos os
envolvidos nos cuidados ao doente.
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305
Capítulo 16
Decisões relativas à reanimação
A decisão de parar RCP é tomada pelo líder da equipa, mas deve seguir-se à consulta
dos outros membros. Em última análise, a decisão é baseada no juízo clínico de que a
continuação do suporte avançado de vida não irá reiniciar o coração nem a ventilação.
Mas quando é que a decisão de abandonar a tentativa de reanimação deve ser feita? Por
exemplo, os paramédicos treinados em SAV podem declarar o óbito quando o doente
permanece em assistolia após 20 min, apesar das intervenções de SAV? Em alguns países,
incluindo o Reino Unido, os paramédicos podem suspender a tentativa de reanimação
neste tipo de situação. O seu protocolo estrito exige que estejam ausentes determinadas
condições que possam indicar hipótese remota de sobrevivência (p. ex. hipotermia). A
existência de assistolia também deve ser claramente estabelecida e documentada nos
traçados do ECG (ver capítulo 14).
306
determinadas antes de serem necessárias, como parte do plano de cuidados avançados.
Em algumas situações, poderá ser pedido a enfermeiros experientes que participem nas
discussões necessárias, e que façam registo de DNTR em nome do doente e da sua equipa
de saúde.
9. Circunstâncias especiais
Determinadas circunstâncias, p. ex. hipotermia no momento da paragem cardíaca,
aumentam as probabilidades de recuperação sem lesão neurológica. Nestas situações, não
seguir os critérios habituais de prognóstico (tais como persistência de assistolia durante
mais de 20 min) e continuar RCP até à correção da situação reversível (p. ex. reaquecimento
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alcançado).
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
• C
aso exista uma declaração antecipada de vontade que recuse RCP, não iniciar
reanimação.
• S e continuar a RCP não se vai traduzir em sucesso, deve ser tomada a decisão
de parar.
• A
s decisões relativas a RCP devem ser tomadas cuidadosamente, registadas
exaustivamente e comunicadas eficazmente.
• A
s decisões relativas à RCP não devem evitar que os doentes recebam outros
tratamentos de que necessitem
16
307
Capítulo 16
Decisões relativas à reanimação
LEITURA ADICIONAL
• Bossaert L et al. European Resuscitation Council Guidelines for Resuscitation 2015
• Section 11. The ethics of resuscitation and end-of-life decisions. 10.1016/j.resuscitation.2015.07.033;
p301 - p310
• Baskett PJ, Lim A. The varying ethical attitudes towards resuscitation in Europe. Resuscitation
2004;62:267-73.
• British Medical Association, Resuscitation Council (UK) and Royal College of Nursing. Decisions
relating to cardiopulmonary resuscitation. 2007. www.resus.org.uk
• General Medical Council. Treatment and care towards the end of life. 2010. www.gmc-uk.org
• Lippert FK, Raffay V, Georgiou M, Steen PA, Bossaert L. European Resuscitation Council Guidelines
308
Capítulo 17.
Apoio a familiares no contexto da
reanimação
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
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Compreender:
• como apoiar os familiares que testemunham uma tentativa de reanimação
• como cuidar dos familiares em luto recente
• necessidades religiosas e culturais quando um doente morreu
• procedimentos legais e práticos após uma morte recente
1. Introdução
Em muitos casos de paragem cardíaca extra-hospitalar, o indivíduo que inicia a RCP é um
amigo próximo ou um familiar e pode querer permanecer com o doente.
Para muitos familiares, é mais angustiante estarem separados do seu parente nestes
momentos críticos do que testemunharem as tentativas de reanimação. Acompanhando
a tendência de uma prática clínica mais aberta, os profissionais de saúde devem ter em
consideração as preferências dos doentes e dos familiares.
Quando uma tentativa de reanimação falha, os familiares reconhecem diversas vantagens
na sua presença durante a reanimação:
• Ajuda-os a enfrentar a realidade da morte, evitando o processo de negação e
contribuindo para um luto mais saudável.
• Os familiares podem falar enquanto ainda há uma hipótese de a vítima os ouvir.
• Não se sentem angustiados por estarem separados do seu ente querido numa altura
em que sentem que devem estar presentes.
• Podem constatar que foi feito tudo o que era possível, ajudando-os a entender a
realidade da situação.
• Podem tocar e falar com o falecido enquanto o corpo ainda está quente.
309
Capítulo 17
Apoio a familiares no contexto da reanimação
• Pedir aos familiares que não interfiram com o processo de reanimação, mas permitir-
lhes tocar no doente quando lhes disserem que é seguro fazê-lo.
Se o doente morrer, informar os familiares de que poderá haver uma pausa breve para
retirar os equipamentos, após a qual poderão regressar para junto do falecido, em privado.
310
Em alguns casos particulares poderá haver indicação para que alguns equipamentos
não sejam imediatamente retirados. Dar tempo para compreenderem o que se passou e
oportunidade de colocarem outras questões.
311
Capítulo 17
Apoio a familiares no contexto da reanimação
• Preparar-se psicológica e fisicamente. Confirmar que a farda não está suja de sangue,
lavar as mãos e ajeitar o vestuário.
• Confirmar que se está a falar com os familiares da vítima, averiguando qual a
sua relação com o falecido. Descobrir o que sabem e, a partir daí, estabelecer a
comunicação.
• O tom de voz e atitude corporal devem corroborar as palavras. Um sorriso, um aceno,
contacto visual ou físico, expressões faciais e gestuais podem ajudar a sustentar a
comunicação verbal.
• Usar palavras simples e evitar terminologia médica e banalidades sem sentido para
os familiares.
312
a ultrapassar o processo de luto. Certificar-se que os familiares têm oportunidade de tocar/
abraçar o falecido. Os familiares devem ser acompanhados por profissionais durante a
visualização, que devem permanecer junto deles para os apoiarem ou para responderem
a possíveis questões.
PONTOS-CHAVE DE APRENDIZAGEM
• M
uitos familiares querem estar presentes durante a tentativa de reanimação do
seu ente querido, o que pode ajudar no processo de luto.
• A
comunicação com os familiares enlutados deve ser honesta, simples e de 17
apoio.
313
Capítulo 17
Apoio a familiares no contexto da reanimação
LEITURA ADICIONAL
• Bossaert L, Perkins GD, Askitopoulou H, et al. European Resuscitation Council Guidelines for Resus-
citation 2015 Section 11 The Ethics of Resuscitation and End-of-Life Decisions. 10.1016/j.resuscita-
tion.2015.07.033; p301 - p310
• Axelsson A, Zettergren M, Axelsson C. Good and bad experiences of family presence during acute
care and resuscitation. What makes the difference? Eur J Cardiovasc Nurs 2005;4:161-9.
• Kent H, McDowell J. Sudden bereavement in acute care settings. Nursing Standard 2004;19:6.
• McMahon-Parkes, K: Moule, P; Benger, J The views and preferences of resuscitated and non resus-
citated patients towards family witnessed resuscitation : a qualitative study. International Journal
Nursing Studies. 2009; 46 (2): 220-229.
• Moons P European Nursing Organizations stand up for family presence during cardiopulmonary
resuscitation: A joint position statement. International perspectives on cardiovascular nursing
314
APÊNDICE A
mL 1:1.000) IV
315
Apêndice A
Fármacos Usados no Tratamento da Paragem Cardíaca
316
Fármaco Ritmos Desfibrilháveis (FV/TV sem Ritmos Não Desfibrilháveis (AEsP/
Pulso) Assistolia)
A paragem cardíaca resulta em acidose mista respiratória e metabólica na
medida em que cessam as trocas gasosas pulmonares e o metabolismo
celular passa a anaérobio. O melhor tratamento da acidémia na paragem
cardíaca são as compressões torácicas; consegue-se algum benefício
adicional com a ventilação. O bicarbonato gera dióxido de carbono, que se
difunde rapidamente para o interior das células. Isto provoca os seguintes
efeitos:
• aumenta a acidose intracelular
• produz efeito inotrópico negativo no miocárdio isquémico
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317
Apêndice B
Fármacos Usados no Período Peri-paragem
APÊNDICE B
• Anafilaxia
Uma perfusão de adrenalina está indicada no período pós-reanimação
quando a administração de outros fármacos inotrópicos menos potentes
(p. ex. dobutamina) não permitiu aumentar o débito cardíaco de forma
adequada. Também está indicada na bradicardia com sinais de mau prog-
nóstico e/ou risco de assistolia, que não respondeu à atropina, se não estiver
disponível um pacing externo ou se o seu uso não tiver sido bem-sucedido.
318
Fármaco Indicação Dose
Amiodarona • C
ontrolo da TV monomórfica, TV • 3
00 mg IV em 1-60 min (depen-
polimórfica e taquicardia de com- dendo da estabilidade hemod-
plexos largos de origem indeter- inâmica do doente)
minada no doente hemodinamica-
mente estável • Seguidos de 900 mg em 24 h
319
Apêndice B
Fármacos Usados no Período Peri-paragem
Esmolol
• b
etabloqueante seletivo beta1 de
ação curta (semi-vida de 2-9 min)
• d
ose de carga IV de 500 mcg/kg
em 1 min
320
Fármaco Indicação Dose
nos tecidos.
321
Apêndice B
Fármacos Usados no Período Peri-paragem
• N
itroglicerina: sublingual 300-
600 mcg (spray ou comprimido);
comprimido para aplicação na
cavidade oral 2-5 mg; IV 10-200
mcg/min; mononitrato ou dinitrato
de isossorbida 30-120 mg oral/dia
(diversas preparações e frequên-
cias de doses)
• N
itroglicerina: sublingual 300-
600 mcg (spray ou comprimido);
comprimido para aplicação na
cavidade oral 2-5 mg; IV 10-200
mcg/min
• N
itroglicerina: iniciar com 10-200
mcg/min IV se dor persistente ou
edema pulmonar; titular para o
efeito na PA desejado mononitrato
ou dinitrato de isossorbida 30-120
mg oral/dia (diversas preparações
e frequências de doses); transdér-
mico 5-15 mg/dia
Após conversão para óxido nítrico, os nitratos provocam relaxamento do
músculo liso vascular. A dilatação resultante é mais marcada no lado venoso
do que no arterial da circulação, e é esta venodilatação que, ao diminuir a
pressão ventricular diastólica esquerda, é maioritariamente responsável
pelo alívio da angina. Os nitratos também dilatam as artérias coronárias e
aliviam os espasmos no músculo liso coronário. Os nitratos estão contraindi-
cados em doentes hipotensos (pressão arterial sistólica < 90 mmHg).
322
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323
APÊNDICES
Apêndice C
Websites úteis
APÊNDICE C
Websites úteis
www.erc.edu European Resuscitation Council
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325
Notas Pessoais
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