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XII Seminário de História da Cidade e do Urbanismo

Outubro de 2012
Porto Alegre - RS - Brasil

FORMAÇÃO DA REDE URBANA DO VALE DO PARAÍBA PAULISTA

Pedro Ribeiro Moreira Neto (UNIVAP) - pedroribeiromoreira@gmail.com


Arquiteto e Urbanista, doutor em Geografia Humana e História Social, docente do Programa em Pós-Graduação em
Planejamento Urbano e Regional

Valéria Zanetti (UNIVAP) - vzanetti@univap.br


Historiadora, doutora em História Social, docente/pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Planejamento
Urbano e Regional / Universidade do Vale do Paraíba UNIVAP

Charles Lima (UNIVAP) - charlesdelimah@gmail.com


Historiador, mestre em Planejamento Urbano e Regional, docente/pesquisador
FORMAÇÃO DA REDE URBANA DO VALE DO PARAÍBA
PAULISTA

Resumo
Este artigo analisa o desenvolvimento da rede urbana no Vale do Paraíba Paulista em sua
perspectiva histórica e demonstra como as atividades rurais engendravam um modelo
distributivo, que tendia ao equilíbrio da estrutura regional. Seu início, como expansão de São
Paulo e seu desenvolvimento ocorreram a partir de atividades rurais: a penetração no sertão, a
agricultura de subsistência dos pioneiros, a produção de excedentes em alimentos para as
regiões mineradoras e finalmente a cafeicultura, cultura e modo de produção responsável por
um equilíbrio na distribuição espacial de população e atividades econômicas, no mundo rural e
urbano de então, em grau de homogeneidade que jamais seria recuperado. Sua proposta
metodológica consiste na comparação entre os processos de colonização e ocupação do
espaço, relacionado à evolução das subsequentes fases econômicas vividas pela região.

Abstract
This article analyses the development of the urban network in the Paraiba River Valley, in Sao
Paulo section, in its historical perspective. It shows how rural activities engendered a distributive
model, which tended to balance the regional structure. By the time of initial expansion of Sao
Paulo it occurs as a result of rural activities: the penetration in the hinterland, the subsistence
cultures of pioneers farmers, the production of surpluses for the mining regions and finely the
coffee. This culture and mode of production accounts for a balance in the spatial distribution of
population and economic activities, in fields and cities, then in degree of homogeneity that
would never happen again. His methodology consists in comparing the process of colonization
and occupation of space, related to the economic development of subsequent phases
experienced by this region.

Palavras-chave: estrutura regional; rede urbana; Vale do Paraíba Paulista

Keywords: Regional structure. Urban network, Paraiba River Valley

Introdução
A região hoje conhecida pelo nome genérico de Vale do Paraíba Paulista – que aqui
se entende como todo o conjunto urbano/regional do leste do Estado de São Paulo,
inclusive o Litoral Norte – traz um histórico de urbanização bastante significativo em
termos de relações entre processos econômicos e estruturas regionais de organização
do espaço. Suas várias fases e modelos de desenvolvimento se manifestaram em
diversos surtos aos quais correspondem efeitos específicos sobre a estrutura do
espaço regional, na escala de cada cidade e no conjunto da região. Este texto
pretende estudar as relações entre os modelos de desenvolvimento econômico e as
respostas espaciais observadas, a cada etapa, na estrutura regional, buscando
elementos que ilustrem e colaborem com estudos análogos e que ousem o
desenvolvimento de propostas para novos arranjos regionais. Trata-se da análise do
seu processo histórico, desde as fases de exploração (século XVI) e ocupação (século
XVII), atravessando o período de fornecimento de víveres às atividades da mineração,
quando se dá a consolidação dos centros urbanos regionais (século XVIII) e a fase
cafeeira (século XIX), momento da mais ampla e equilibrada ocupação dos campos e
estabelecimento da rede de cidades, antes de adentrar, ainda no do século XIX, o
caminho da industrialização.

I – A ocupação primitiva
O processo de ocupação da região é de certa forma, tributário de sua célula mater,
São Paulo de Piratininga, centro inconteste de irradiação dos primeiros movimentos de
ocupação do interior brasileiro. Gilberto Freire anotou São Paulo e Pernambuco como
“os dois grandes focos de energia criadora nos primeiros séculos da colonização, os
paulistas no sentido horizontal, os pernambucanos no vertical” (FREIRE, 2003, p. 73),
especificando que neste caso, vertical e horizontal não era empregado no sentido puro
e restrito sociológico. Para ele, a atividade vertical dos pernambucanos se refere “à
concentração regional de esforço no estabelecimento da cultura da cana e da indústria
do açúcar, na consolidação da sociedade escravocrata e agrária”, que se contrapõe à
atividade paulista, ou antes, “a mobilidade horizontal dos caçadores de escravos e
ouro, dos fundadores de fazendas de criar nos sertões e dos missionários” (FREIRE,
2003, p.126). Assim, os primeiros “centros urbanos” da região, se assim pudessem ser
chamados, inseriam-se no padrão típico de aldeamento do sudeste brasileiro o que
levou Sérgio Buarque de Holanda a classificá-las como obra de “semeadores”,
dispostos ao longo do caminho do sertão, incipientes entrepostos, local de descanso
para uma viagem maior. No fundo, tais núcleos pioneiros poderiam ser qualificados
como cidades paulistas, modelo que ditaria um padrão de ocupação generalizado para
a área da expansão de Piratininga, percurso de expedições até que fossem
alcançadas, finalmente, as minas, estivessem elas em Goiás, Mato Grosso ou
propriamente nas Minas Gerais. No entanto, como esclareceria mais tarde Nestor
Goulart Reis Filho, o modelo sugerido por Buarque de Holanda, apesar de dominante,
não seria único (REIS FILHO, 1968, p. 16).
A ocupação das terras paulistas havia se iniciado ainda no século XVI, primeiramente
com alguns pontos do litoral, mas que, em meados do século XVII, já se estendia para
o interior, particularmente em função da outorga da Coroa aos donatários os principais
encargos da urbanização como solução de colonização e domínio. Em outras
palavras, tratava-se de estimular, indiretamente e às expensas desses últimos, a
tarefa de ocupação do território da Colônia. Assim como a bacia do rio Tietê, a
ocupação inicial da calha do rio Paraíba do Sul também surge neste contexto, do
esforço da atividade horizontal paulista como resposta às necessidades da conquista e
manutenção das terras do interior.
No caso valeparaibano em especial, a conformação regional, além da expansão de
São Paulo, correspondia ao papel que tais centros iriam exercer, a partir de então,
como pouso para as expedições que deixavam Piratininga a procura de pedras e
metais preciosos no sertão além da Serra da Mantiqueira (MÜLLER, 1969, p.12).
Portanto, não foi ao acaso que a primeira estrutura regional correspondia a um
corredor, significativo das rotas de passagem entre a cidade de São Paulo, as minas e
o litoral situado ao norte de São Vicente. Resolvidas as questões fundamentais para a
fixação de cada povoado – fortificações, igrejas, construções perenes – a região se
consolida com base no modelo econômico da agricultura de subsistência desenvolvida
em torno dos primeiros núcleos urbanos, respectivamente Taubaté, Guaratinguetá e
Jacareí, todos situados às margens do rio Paraíba do Sul.
Durante esse período, mais que os fatores de ordem econômica, as características
geofísicas constituiriam os principais fatores condicionantes de sua organização
espacial. É certo que a origem do processo estava na doação de sesmarias, contudo,
a própria conformação da região, em forma de canal por onde corriam as águas do rio
Paraíba do Sul, favorecia a localização dos primeiros povoados. Era o que hoje se
classifica como vantagens competitivas naturais da região (MANOLESCU, 2008,
p.156). Esta conformação tornava mais fácil e eficiente a locomoção e o transporte,
então feito em lombo de burro, ou por via fluvial pelo próprio Paraíba e seus principais
afluentes. Tanto quanto a calha do vale, eram também fundamentais elementos como
as escarpas dos planaltos e as passagens que permitiam a transposição das cadeias
de montanhas. De certo modo se pode dizer que os principais elementos que
favoreceram o estabelecimento dos primeiros povoamentos mantinham um
alinhamento geométrico natural, representado pelas paralelas do rio Paraíba, a calha
do vale, a planície das várzeas, as cadeias de montanhas, entrecortadas apenas por
algumas gargantas e pontos de travessia do rio.
Durante o período de consolidação dos primeiros núcleos a atividade econômica se
restringia, na prática, à produção de gêneros típicos da agricultura de subsistência.
Esta situação possibilitava a fixação da população em algumas aldeias na medida em
que garantia a subsistência de pequenos grupos. Em outra abordagem, apesar da
incorporação de práticas agrárias da tradição nativa, como a coivara, não se pode
considerar a presença dos primeiros colonos como fato extremamente grave em
relação às alterações no ambiente natural. Afinal, as práticas e a escala da pequena
agricultura se inseriam quase perfeitamente às noções que atualmente são definidas
como quadros de sustentabilidade.
Portanto, a convergência dos aspectos geoecológicos e interesses socioeconômicos
gerais tenderiam a estabelecer os primeiros núcleos urbanos a partir de uma lógica
comum a todos, com semelhantes modos de ocupação do espaço e idênticos
resultados de forma urbana. No entanto não é o que se observa.
Como já citado, consideradas as datas de elevação a vila, os três primeiros centros
foram os de Taubaté, Guaratinguetá e Jacareí, sendo que Taubaté, além de preceder
as demais, se origina da sesmaria recebida pela família de Jacques Felix que,
segundo Gilberto Martins teria pretensões – e obrigações – que exigiam maior
perenidade de seu núcleo original (MARTINS, 1973). Assim, mais que simples pouso e
entreposto, Taubaté seria um trampolim para expansão, fato que seria confirmado
posteriormente. Para tanto, foram escolhidos o local, alto e plano, para a construção
das casas, seguindo um traçado urbanístico específico. Ao contrário das demais vilas
da região, que seguiriam o padrão “semeador” descrito por Buarque de Holanda, em
Taubaté a nova conformação urbana imposta por Felix reorganizaria antigas choças
existentes anteriormente em ruas bem traçadas, arejadas pelos ventos de todos os
quadrantes, como propunha a Lei das Índias (BUARQUE DE HOLANDA, 2000, p.96).
A simples análise do esquema de arruamento dessas primeiras vilas é eloquente da
sugestão dos diferentes objetivos propostos.

Figura 1 – Plantas de Taubaté, Guaratinguetá e Jacareí, século XVIII.


Fonte: Nestor Goulart Reis Filho. Imagens de Vilas e Cidades do Brasil Colonial.

Ao findar o século XVI estava montada a primeira configuração urbana do Vale do


Paraíba, a linha de centros que ao longo do rio Paraíba do Sul seguia para o sertão.
II – O ouro e a ocupação do Alto Vale
Com a descoberta do ouro - façanha atribuída aos taubateanos - e a expansão das
Minas Gerais a região deixa a etapa de subsistência e passa à produção crescente de
excedentes dando início a uma atividade de escala mais propriamente econômica – a
exportação de gêneros alimentícios e produtos artesanais para as regiões
mineradoras, acarretando maior complexidade em sua estrutura econômica. O
impacto da exploração das minas acaba por tornar, de modo análogo, igualmente mais
complexo o espaço regional do Vale do Paraíba. Para Paul Singer, “o primeiro impacto
da exploração das minas na economia de subsistência ‘paulista’ foi tão considerável
pelo fato de que o único acesso conhecido para as Minas Gerais, pelo sul, saía de São
Paulo, passando por Taubaté e transpondo a Mantiqueira pela Garganta do Embaú”
(SINGER, 1977, p. 23). O corredor de passagem e a linha de povoados às margens do
rio tornam-se então insuficientes para o desenvolvimento das novas atividades
econômicas que iniciam um movimento de expansão das funções urbanas na direção
das áreas de planalto. Surgem assim vários núcleos dispersos tanto nas rotas que
estabeleciam ligações com o litoral – Paraibuna, São Luís do Paraitinga, Cunha e
Bananal – como na continuidade da via de penetração ao longo do vale – Cachoeira
Paulista e Areias – ou ainda nos principais cruzamentos com as rotas para a região
mineradora como Lorena. Este período, marcado pela distribuição de atividades
urbanas e pela ocupação de zonas ainda não exploradas, configura o fluxo de
mercadorias como fator de união do conjunto que passa a constituir uma unidade
econômica regional que, aos poucos, abandona a produção de subsistência, local,
pela integração a um complexo econômico internacional.
Ao garantir o suprimento de alimentos e demais gêneros para as regiões mineradoras,
o Vale do Paraíba possibilitava a essas a concentração nas atividades da extração
mineral. O produto das minas, especialmente ouro, atravessava então a região do
Vale para chegar aos portos de Parati, Angra dos Reis e próprio Rio de Janeiro que a
partir desse momento ganha expressão como centro urbano de importância nacional
substituindo paulatinamente Recife, a “metrópole” do Nordeste e Salvador, então
Capital da colônia. Portugal, por sua vez, reforçava o comércio triangular com a Grã
Bretanha realizando a inserção dos produtos brasileiros no sistema capitalista
internacional que então se organizava.
Datam desta época as primeiras ambiguidades produzidas pelo modo de integração
do desenvolvimento econômico brasileiro - e consequentemente do Vale do Paraíba -
à economia mundial. Enquanto as minas se esgotavam e o ouro do Brasil colaborava
para a consolidação econômica do Império Britânico (FRANK, 1978) em nível local se
notava certa euforia. Comparada ao marasmo das atividades de subsistência do
período anterior, o dinamismo econômico no Vale do Paraíba do século XVIII se
confundia com um desenvolvimento real. Entretanto, a abertura do Caminho Novo,
nova rota de escoamento que ligava diretamente as regiões produtoras ao porto do
Rio de Janeiro, seguida da própria exaustão dos veios auríferos, iriam decretar o fim
do breve entusiasmo experimentado na região impondo um retrocesso à agricultura de
subsistência do modelo anterior. Esta fase de retração das atividades econômicas iria
perdurar até últimos anos do século XVIII quando a expansão da cultura cafeeira,
descendo das terras fluminenses chega enfim ao Vale Paulista. Assim teria início não
apenas a recuperação econômica da região, mas, também, uma série de
transformações que iriam alterar significativamente as estruturas e o modo da vida
local como um todo.

III – A cultura do café e a afirmação da rede urbana


A introdução do cultivo da rubiácea como produto de exportação ao mercado mundial
iria atingir de forma radical o ambiente natural, o modo de produção e a própria
estrutura social da região. A cultura cafeeira, realizada de maneira extensiva, foi
responsável pela transformação do ambiente natural, na medida em que demandava
por vastas áreas de cultivo perene, especialmente nas zonas de encostas e os mares
de morros que marcam as zonas do Alto Vale, incidindo na devastação das matas
originais para plantio ou a produção de carvão. Mas, maior transformação era
reservada pela introdução de um novo modo de produção, fundamentado no regime
escravocrata, que inseria na paisagem social um novo elemento, a figura do escravo
como trabalhador agrário. Se até então o escravo, bugre ou negro, se restringia ao
papel periférico das atividades econômicas, como serviçal de tarefas gerais, agora se
convertia no centro de um sistema cuja propulsão emanava de sua própria força de
trabalho.
A necessidade de braços iria incrementar consideravelmente a população dos campos
e modificar definitivamente sua constituição social e cultural da região. Por volta de
1840 o café dominava a economia regional, assinalando o apogeu dessa produção
entre os anos de 1836 e 1886. É neste período é que se conclui a ocupação de facto
de todo o território valeparaibano e se consolida uma verdadeira estrutura
urbano/regional, organizada em zonas de funções específicas - produtoras, corredores
de escoamento e portos. Na dimensão econômica o conjunto se definia como uma
unidade na medida em que a atividade da cafeicultura dominava praticamente toda a
produção.
Esta foi uma fase de grande expansão em todos os sentidos. À necessidade de vastas
extensões de terra cultivável se juntava à demanda por mão de obra, induzindo fluxos
migratórios oriundos das zonas de mineração - então decadentes - do litoral e outros
rincões da província. Se o campo recebia tamanho incremento populacional, cresciam
também os centros urbanos, pois, enquanto os escravos viviam nas próprias fazendas,
eram os núcleos urbanos que recebiam os homens livres - transportadores,
proprietários de carroças e tropas que faziam o transporte entre os locais de produção
e os terminais ferroviários então implantados, além de uma camada de profissionais
autônomos como carpinteiros, pedreiros, tecelões, seleiros, trançadores etc. Assim,
pequenos burgos se transformavam em vilas e cidades enquanto os derradeiros
núcleos pontuariam a partir de bairros rurais e entrepostos. A rede urbana
consolidava-se como estrutura funcional hierarquizada e distribuída em padrões de
homogeneidade como nunca antes visto e que tampouco, jamais se repetiria.
Em termos absolutos, evidentemente, se mantinham muitos aspectos que
diferenciavam cada centro urbano de outro, afinal, as cidades situadas na calha do
Médio Vale seriam sempre mais dinâmicas que os demais centros surgidos nas zonas
de planalto. A economia baseada no setor agrário fazia dos núcleos do Vale Superior
“cidades de fazendeiros” - entrepostos urbanos de maior ou menor movimento,
aglomerados de residências urbanas de uma população rural que acorria às cidades
apenas nos finais de semana para ofícios religiosos ou justificar algum brilho à vida
social. Mesmo assim, são de importância considerável centros localizados além da
linha da calha, em especial o trecho conhecido como “Vale Histórico”. Durante a fase
áurea do período cafeeiro cidades como Areias e Bananal – maior produtora de café
da região e segunda renda da província – eram relacionadas na mesma categoria de
suas congêneres do Médio Vale como Taubaté, Guaratinguetá, Pindamonhangaba e
Jacareí, onde eram desenvolvidas atividades mais típicas do setor terciário urbano,
funções administrativas e burocráticas, estabelecimentos de ensino, casas de crédito,
hospitais e até mesmo um teatro (MÜLLER, op. cit. p. 55-56).
Entretanto, este período de desenvolvimento econômico e urbano trazia de modo
intrínseco à sua estrutura uma prosperidade duvidosa, posto que implicava num ponto
de profunda vulnerabilidade – a dependência da atividade monocultora. O
esgotamento da produtividade do solo, devido à carência de técnicas de manejo e
diversificação de culturas, atingido o patamar de sua produção atira o sistema em
rápida decadência. A própria abolição da escravatura, usualmente considerada como
principal responsável pelo fim cafeicultura no Vale do Paraíba foi, em efeito, o golpe de
misericórdia em uma economia e um sistema de produção que se encontrava em
declínio. Entre 1854 e 1886 a produção cafeeira anual na região já havia caído cerca
de 30% (MILLIET, 1946, p. 41).
No plano espacial, o topo deste período configurou uma estrutura regional que pode
ser definida como uma grade onde cada movimento, ao tocar cada malha do sistema
era absorvido, de algum modo, pelo seu conjunto. Apesar das fragilidades de sua
constituição - como a monocultura ao nível econômico e a escravatura no plano social
- este sistema propiciou o único caso de organização regional composto por uma
população distribuída de maneira mais equilibrada, tanto entre sedes urbanas e zonas
rurais como no conjunto dos municípios. Tal configuração, entretanto, só seria mesmo
possível face à atividade econômica da agricultura expansiva e dependente do imenso
contingente de mão de obra rural. Assim, com um campo densamente povoado, todos
os núcleos existentes, representavam pontos de reunião e atração de atividades
urbanas, reforçando cada vez mais a articulação do conjunto do sistema.
Outro fator da proliferação de núcleos urbanos e bairros rurais é o sentido de
distância, como relação entre espaço e tempo, naquele mundo de velocidades pré-
industriais. Uma vez que a ferrovia somente passaria a servir a região a partir de 1877
– ainda assim, apenas parcialmente – a grande maioria dos deslocamentos se dava
por intermédio de veículos de tração animal, extremamente “lentos” quando
comparados aos meios mecânicos. Espacialmente, este modo de transporte exigia
maior proximidade e distribuição de pousos, entrepostos, pontos de convergência de
atividades sociais ou religiosas, induzindo à formação de inúmeros pequenos centros
de atividades urbanas e bairros que não encontrariam justificativa exceto naquela
realidade.
O fim do período de desenvolvimento da cultura cafeeira viria a afetar o sistema
regional nos níveis econômico e social como um todo. Não havia, naquele momento,
atividade agrária que representasse alternativa concreta às necessidades da região,
que fosse capaz de garantir continuidade ao dinamismo perdido. Ademais, a situação
no mercado internacional continuava favorável à cultura do café, tanto que seu cultivo
prosseguiu sua marcha para o centro e norte paulista. O que mudava era a base
econômica e social, que introduzia os colonos assalariados em substituição aos
antigos escravos, mas, também se introduziam novas técnicas de cultivo, favorecidas
pelo solo fértil e a topografia menos movimentada das novas áreas de expansão. Já
no Vale do Paraíba – e principalmente no Vale Superior – as grandes áreas
disponíveis pelo abandono do café forçavam a depreciação da terra enquanto fazia do
baixo custo relativo uma atração considerável para a introdução da pecuária leiteira.
Assim, um grande número de criadores deixaria as áreas mais próximas de Minas
Gerais para buscar, ao sul da Mantiqueira, terrenos baratos e mais próximos dos
mercados consumidores que se formavam no Rio de Janeiro e São Paulo, agora
conectados por via ferroviária. Como numa espécie de diáspora, muitos desses novos
fazendeiros seriam descendentes de exploradores paulistas que haviam migrado para
as minas na época mais efervescente da extração aurífera. Pouco a pouco, mais por
falta de escolha de que por alternativa programada, a pecuária de bovinos substituiria
o cultivo do café, transformando, mais uma vez, o ambiente natural valeparaibano que
passaria então para o domínio das pastagens.
Em termos de organização do espaço não caberia aqui a expressão “reestruturação”
urbana da região uma vez que não se tratava da introdução de uma nova atividade
econômica, mas sim, de uma modificação acrescida a estruturas mais arcaicas – um
sistema fragmentado mais próximo da ordem da ocupação primitiva e do
estabelecimento da agricultura de subsistência. Essa adaptação implicava na queda
do dinamismo econômico e social, mas, principalmente, desestruturava a complexa
organização e a lógica existente no conjunto regional exigido pela cultura do café. A
forma substitutiva encontrada deixaria a mercê de fatores fortuitos, sem controle, a
organização da nova ordem regional.
Apesar da qualificação de “cidades mortas”, cunhada por Monteiro Lobato, sugerir o
exagero de uma percepção pessoal, não restam dúvidas que a falta de atividade
intensiva de mão de obra agrária trazia, paradoxalmente, grande prejuízo à vida
urbana do Alto Vale. Muitas cidades iriam sofrer com a perda, em termos absolutos, de
parte de sua população, do dinamismo na economia e na própria vida social.
Se ao longo de todo o século XIX o movimento de ocupação urbana havia se dirigido
dos centros do Médio Vale para as zonas de planalto, no final deste período a situação
se inverte. Tal situação retira das cidades do Alto Vale parte importante de sua
autonomia enquanto, simultaneamente, reforçam os laços de dependência destas em
relação aos primeiros que passam a polarizar o conjunto da região. Enquanto, no
passado – em especial na época do fornecimento de gêneros alimentícios para as
regiões mineradoras – eram os centros do Vale Superior que se encarregavam da
produção, desta vez as mesmas regiões sentiam a inversão do fluxo de mercadorias
ao se transformar em importadoras de produtos outrora sob sua responsabilidade. Em
outra roupagem, o conjunto da região retoma o modelo estrutural dos centros
alinhados ao longo da calha do vale, desta vez, porém, comportando um excedente de
mão de obra que iria preparar sua passagem para o mundo industrial.

Conclusão
O processo de ocupação do Vale do Paraíba Paulista não pode ser considerado um
fenômeno isolado. Se originalmente este surge mais como necessidade local da
expansão de Piratininga do que um projeto nacional, como aconteceria com a
implantação da cultura canavieira no Nordeste. Seu desenvolvimento, contudo, deve-
se mais às contingências de ordem nacional, como a descoberta e a localização das
minas, e mesmo externas, tal o crescimento do mercado internacional do café, cuja
cultura teria penetrado em território paulista a partir das terras fluminenses, agregando
complexidade ao espaço entre as duas províncias. Dadas as suas particularidades
geomorfológicas o trecho paulista, paralelo à faixa litorânea em sua maior parte,
permitiu um modelo quase geométrico. Assim se estabeleceu uma linha de cidades a
cerca de 100 km da costa, com qual estabeleceu ligações a cada 50 km, segmentos
em que se estabeleceram novos centros urbanos a meio caminho, ou seja, 50 km. A
partir dessa grade, novos centros, vilas e bairros rurais vão surgir ao longo de todo o
século XIX. À exceção da ausência das ligações entre as últimas cidades, situadas no
Alto Vale, até hoje precárias, esta se tornou a base da rede urbana regional. Apesar
da homogeneidade de distribuição espacial, a chegada da industrialização só iria
desorganizar este modelo. A força da nova dinâmica, baseada na implantação
industrial, iria inserir o conjunto em nova lógica de organização que se mostraria cada
vez mais concentradora de atividades, subvertendo a antiga estrutura e destruindo,
talvez definitivamente, a coerência conseguida durante sua fase agro exportadora.

Referências Bibliográficas
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2000.
FRANK, A. G. L’accumulation dépendante. Paris: Anthropos, 1978.
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MANOLESCU, F. M. K; KROM, V. A dinâmica do desenvolvimento socioeconômico de
São José dos Campos. In: PAPALI, M. A. (org.) Histori(cidade)s: Um olhar
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MÜLLER, N. L. O fato urbano na bacia do rio Paraíba, Estado de São Paulo. Rio de
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REIS FILHO,N. G. Imagens de Vilas e Cidades do Brasil Colonial. São Paulo:
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