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Conselho Consultivo
Alisson Flávio Barbieri
Elza Salvatori Berquó
José Alberto Magno de Carvalho
Luiz Antonio Pinto de Oliveira
Marta Maria do Amaral Azevedo
Moisés Alberto Calle Aguirre
Conselho Fiscal
Cláudio Santiago Dias Junior
Humberto Corrêa
Joice Melo Vieira
Apoio
unfpa – Fundo de População das Nações Unidas
Harold Robinson – Representante
Taís de Freitas Santos – Representante auxiliar
FICHA CATALOGRÁFICA
ELABORADA PELA BIBLIOTECÁRIA ADRIANA FERNANDES
ISBN: 978-85-85543-26-6
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Nota dos organizadores
ficará claro para o leitor, o objetivo foi alcançado, o que faz deste trabalho um registro documental
do atual estado da arte das ideias sobre as questões populacionais no Brasil.
Assim, os textos de Gavin Jones, George Martine e Eduardo Rios-Neto abordam o debate
tradicional da relação entre população e desenvolvimento, além de integrar novas relações a este
tema, decorrentes das mudanças demográficas e do desenvolvimento das atuais agendas nas áreas
de direitos humanos e meio ambiente. Massimo Livi-Bacci, Marcia Castro e Rosario Cárdenas apre-
sentam alguns dos atuais desafios para a demografia no século XXI, bem como uma reflexão sobre
as novas bases de dados, as inovações metodológicas e o tipo de treinamento necessário para a
formação dos futuros pesquisadores da área. Tratando especificamente do Censo de 2010, Wasmália
Bivar, Leila Ervatti, José Alberto M. de Carvalho e Elisabete Bilac discutem as mudanças introduzidas
nos instrumentos de coleta da principal base de dados do país e suas potencialidades para a análise
da dinâmica populacional brasileira.
Nas seções do livro elaboradas a partir das mesas redondas, Neide Patarra, Rosana Baeninger
e Marcia Sprandel promovem uma discussão sobre a relação entre migrações internacionais e os
direitos humanos, em especial como as políticas migratórias devem ser definidas no sentido de ga-
rantir os direitos dos migrantes. Heloísa Costa e Eduardo Marandola Jr. apresentam o debate sobre os
efeitos das mudanças ambientais nas populações urbanas, as incertezas envolvidas neste processo
e sua relação com os conceitos de vulnerabilidade e desigualdade. Em seguida, Cristiane Soares,
Joanílio Teixeira e Ivan Targino abordam a relação entre a dinâmica demográfica e o desenvolvimen-
to socioeconômico no Nordeste do Brasil.
Em outro conjunto de artigos, Elza Berquó, Sandra Garcia, Maria Coleta Oliveira e Massimo
Livi Bacci apresentam suas reflexões teóricas e análises empíricas sobre a chamada segunda tran-
sição demográfica, com foco, principalmente, nos novos padrões demográficos de nupcialidade e
fecundidade no Brasil e nos países desenvolvidos. Carmem Campos, Maria Coleta Oliveira e Hildete
de Melo refletem sobre a igualdade de gênero tanto na esfera pública quanto na privada, do ponto
de vista teórico e político. Na seção que trata dos impactos das mudanças nas famílias sobre o mer-
cado de trabalho, Lilia Montali expõe os resultados de sua pesquisa sobre a relação família-trabalho
durante a segunda metade dos anos 2000 e Simone Wajnman discute a relação entre os arranjos
familiares e as mudanças e limites nos diferenciais de rendimento por sexo. Maria Helena Mueller e
Paula Miranda-Ribeiro abordam o papel dos jovens no diálogo político e a construção de políticas
públicas para este grupo etário, em um país cuja população envelhece rapidamente. Finalmente,
Rodrigo Soares, Mônica Andrade, Cristina Rodrigues e Ana Carolina Maia tratam do impacto das
políticas sociais e das mudanças demográficas nos indicadores de saúde dos brasileiros e os futuros
desafios para o sistema público de saúde do país.
Divulgando estes trabalhos, a Abep busca contribuir para a construção e o fortalecimento da
agenda científica na área de estudos populacionais. Esperamos também que as análises direcionem
o desenvolvimento de políticas públicas na promoção da equidade. Por fim, não poderíamos deixar
de agradecer aos autores pelos excelentes trabalhos e pelo entusiasmo e prontidão para a realização
da tarefa que lhes foi proposta. Gostaríamos também de fazer uma menção especial ao apoio do
UNFPA no processo de elaboração deste livro.
Cássio M. Turra
Vice-presidente da Abep, 2011-2012
The last 50 years have seen the most dramatic changes in the world’s population ever recor-
ded in any 50-year period in human history. Although population grew enormously over this period,
fertility also fell sharply and remains really high only in sub-Saharan Africa and in some parts of South
Asia. As fertility has declined and population growth rates slowed, population has disappeared from
the radar screen of the international development establishment, except in the two high fertility
regions. This in no way means that population-development relationships have ceased to be impor-
tant. The relation between population growth and development will always be a topic of concern, as
it has been since the time of Condorcet and Malthus. But the ways the relationships are seen and the
particular focus of attention in the debate can and do shift.
It is interesting to compare the demographic transition in East and Southeast Asia with that
in Latin America. Fertility rates fell faster and to lower levels in the East Asian countries than in Latin
America. Some in the family planning field argued that this was the result of slower adoption of
family planning programs in Latin America, but it must be borne in mind that levels of economic de-
velopment in East Asian countries were also higher, and their pace of economic development during
the 1970s and 1980s was extremely rapid. The fertility experience of Southeast Asian countries was
more varied, with Thailand going below replacement level fertility in 1990, Vietnam, Indonesia and
Myanmar reaching replacement around the present time, and Malaysia, the Philippines, and Cambo-
dia lagging in the fertility transition.
What we need to keep in mind is that the relationship between population and development
is a two-way street. This was rather ignored by the family planning establishment, until at the Bucha-
rest Conference, the slogan “development is the best contraceptive” underlined the point. Attempts
to sort out the role of family planning programs in fertility declines are greatly complicated by the
fact that significant declines in infant mortality and significant socio-economic changes were taking
place in parallel with FP program inputs. All these factors interacted to lower fertility in Asia and Latin
America from the high peak of the 1960s.
11
Population and development Garvin W. Jones
When Latin American and East and Southeast Asian countries are compared in relation to a
number of indicators, some important points emerge:
• population densities are considerably higher in Southeast Asia than in Latin America –
but not as extreme as those in East Asian countries (including parts of China), or much
of South Asia. This may have influenced the extent to which governments felt a sense of
urgency in getting fertility rates down;
• we can observe some degree of inverse correlation between levels of economic and
social development and fertility rates. But the correlation is far from perfect. Some
examples are relatively high fertility in Malaysia and the Philippines; and remarkably
low fertility in Vietnam and Myanmar, relative to their levels of economic and human
development;
• in general, poorer countries in East and Southeast Asia have lower levels of fertility
than countries with equivalent levels of economic development in Latin America. This
is clearly the case when we compare China, Thailand and Vietnam with Latin American
countries with equivalent per capita income levels;
• nearly all the countries in both regions have now reached low levels of fertility. The
only countries with TFR remaining above 3 are Paraguay, Bolivia and Guatemala in Latin
America and Philippines and Cambodia in Southeast Asia. Of these, only the Philippines
is a really populous country.
So the issue so prominent from the 1960s to 1980s – the need to get fertility rates down - is
now no longer relevant to discussion of issues of population and development in most of Latin Ame-
rica and East and Southeast Asia – unless we accept the view of some environmentalists that popu-
lations are already well in excess of sustainable levels. The first demographic transition is essentially
over. What should therefore now be the focus of our consideration of population and development?
Ultra-low fertility
Based on the East Asian situation, one could make the case that the overriding concern from
now on will be the issue of ultra-low fertility. In East Asian countries, TFRs have sunk to remarkably
low levels, in the range of 1.0 to 1.4, and the labour force has already been shrinking for 15 years in
Japan and is about to start shrinking in South Korea. Total population is projected by the UN medium
projection to decline from 127 million in Japan in 2010 to 102 million in 2050 (and to 90 million in
the low projection). Over the same period, South Korea’s population is projected to decline from 48.5
million to 44.1 million (and to 38.7 million in the low projection).
How serious are these issues of population decline? Looking at it from one point of view, the
projected 2050 population would only bring Japan’s population back to the number it had reached
in 1968 and South Korea’s to its 1993 number. In both cases, many commentators in these countries
at that time considered Japan and South Korea to be overpopulated. So why the disquiet about
falling back to such levels? Clearly, because the issue is not just one of population size but also one
of population structure and population trajectory.
• The structure of the population would be altered in problematic ways, with the share of
the elderly (age 65+) reaching proportions not yet seen in any country of the world (in
the case of Japan, rising from an already high 22.6 per cent in 2010 to 37.8 per cent by
2050; in South Korea, rising from only 11.0 per cent in 2010 to 34.2 per cent by 2050).1
Not only do such increases raise difficult issues about the sustainability of different kinds
of income support programs, and care for the disabled and frail elderly, but also there is
potential here for inter-generational conflicts.
• In contrast to some countries in Europe, where some fertility “recuperation” appears to
be taking place, no such fertility recuperation is in evidence in the East Asian countries,
and there are good reasons for arguing that such a recuperation is unlikely in the
medium-term future (FREJKA; JONES; SARDON, 2010).
• If TFR continued to remain below 1.5, a continuing downward trajectory of population
would be followed, with each generation about one third smaller than the previous
generation. Continued over a few generations, the population would shrink dramatically.
No country can be expected to welcome such a decline.
What has caused these declines in fertility, and what can be done to redress them? I have
discussed this in detail elsewhere (JONES, 2007), so will only make the points briefly in point form.
• These are countries whose economic success has stunned the world. Their economic
success is built on a model of enhanced human capital, with very high levels of education.
• Delayed and non-marriage, both voluntary and involuntary, has played an important
role. Involuntary non-marriage has to do with the changing gender balance in different
marriageable age groups as a result of the educational advances just noted, the tradition
of hypergamy, and the time taken to get established in a career. Voluntary non-marriage
has to do with the diminishing priority given to marriage as a result of various factors
noted below, and the lack of appeal to women of the East Asian “marriage package”.2
• Women want to be in the workforce to take advantage of their education, and because
rising expectations mean that two-income households are perceived to be necessary.
Governments in the region also want them to be in the workforce to boost economic
growth rates. But workplaces are family-unfriendly, thus posing great conflicts for
women who want to combine a career with raising a family
• Men are continuing to hold traditional attitudes toward the gendered division of labour
in the household.
1
By contrast, the proportion aged 65+ in Brazil is projected to increase from 6.9 per cent in 2010 to 22.5. per cent in 2050.
2
This is “the entire package of marital roles for the wife including children with their intensive care needs, a heavy house-
hold task load, and co-residence with parents-in-law, which is potentially included in the bargain” (BUMPASS et al., 2009,
p. 218).
• Children are very costly, in terms of financial, time and emotional investment.
• Appropriate policies to support child-rearing have been lacking until recently, and even
now are not comprehensive.
Looking ahead, should planners in Brazil be anticipating a similar need for policy interventions?
I am not well qualified to judge whether there is really potential for fertility in Brazil to fall as low as in
many European and East Asian countries. I do note that fertility in Brazil is already clearly below repla-
cement level and that TFR in the Southeast and the South is already down to 1.7 (POTTER et al., 2010).
As already noted, for East Asian countries, it is hard to see forces that will raise fertility to
anywhere near replacement in the foreseeable future. There is always, however, the potential role of
migration in preventing the populations of the high income, low fertility countries from falling too
rapidly. While there is no shortage of potential migrants, if we are not too concerned about the skill
levels, ethnicity and religion, the populations in Europe, Japan and South Korea show little appetite
for the changes in their ethnic and religious composition that such immigration would bring. Even
populations of countries such as Singapore, Australia and the USA, all noted for their ethnically va-
ried populations deeply influenced by migration over long periods, are currently making it clear to
their political leaders that they are not happy about high levels of immigration.
Coleman (2006) is concerned that the comfortable assumption that immigrants will gradu-
ally lose their distinctive identity by converging towards the behaviour and belief patterns of the
majority population, and creating a “hybrid” population through inter-marriage, will not necessarily
hold in the case of Europe. The resistance of European countries to immigrants is no doubt partly
because the origins of these inflows differ markedly from those to the United States, Australia or Ca-
nada and are seen as more problematic in terms of integration. Brazil certainly falls within the ranks
of countries heavily influenced by immigration, and its population is ethnically very mixed, which
should make its capacity for accepting migrants greater than that in very homogeneous populations
such as those of many European countries and of Japan.
Urbanization
Latin America is well ahead of Southeast Asia in its level of urbanization (80% urban compa-
red with 42% urban). Levels of economic development appear to explain most, though not all, of the
difference. For example, Thailand is considerably less urbanized than the Latin American countries
at much the same level of economic development (though a restrictive definition of urbanization in
Thailand explains part of this).
Given that the greatest economic dynamism tends to be in the large urban agglomerations,
considerable importance attaches to understanding the dynamics of change in population and em-
ployment in such urban agglomerations. I note that very sophisticated analysis has been conducted
on Brazilian cities (summarized in MARTINE et al., 2008). There would be some value in collaborations
between those working on these issues in Brazilian cities and those conducting related analysis on
the mega-urban regions of Southeast Asia – Jakarta, Manila, Bangkok and Ho Chi Minh City. One
fertile area for collaboration would be in better identifying urban agglomerations and studying the
dynamics of change in mega-urban regions. The United Nations Population Division recognizes the
problems they face in having to accept whatever urban agglomeration data are supplied by the
member states. A recent study which attempted to define urban agglomerations according to a sim-
ple but comparable set of criteria produced widely different estimates of urban agglomeration data
for the largest Southeast Asian cities in 2000 than those used by the United Nations (Jones; Douglass,
2008).3
Population and development is all about lifting people out of poverty. Poverty means having
inadequate income to maintain a minimally acceptable quality of life. But is that all it means? There
is a need to broaden the concept. Poverty is not only a lack of income and productive assets but
also a lack of access to essential social and economic services and a lack of power, participation and
respect. These dimensions of poverty are interrelated and need to be addressed simultaneously to
make a significant impact.
Development in very poor countries is about providing the basic necessities of life – food,
clothing and shelter. The MDGs of the United Nations and the World Bank go further, but they are still
about meeting basic necessities, viewed a bit more broadly, admittedly – to include universal prima-
ry education, improving maternal and child health and combating various diseases. As incomes rise
and the bulk of the population rises above subsistence level, there is more possibility of focusing on
other things as well – such as developing a richer cultural life.
What does a broader view of both poverty and development entail? One approach to pover-
ty is to consider it “disadvantage”. The notion of social exclusion emphasizes the multidimensional
aspects of disadvantage, and focuses particularly on relational issues, such as inadequate social par-
ticipation, lack of social integration and lack of power. But if we manage to measure “disadvantage”
according to some objective criteria, will this measure correlate with people’s wellbeing?
3
The figures were: for Manila, 16.24 million, compared with the United Nations figure of 11.63 million; for Jakarta, 17.78
million, compared with the United Nations figure of 9.21 million.
There has been a ferment of discussion over the best ways of measuring human wellbeing.
Because of dissatisfaction with measures of wellbeing that rely on economic output, such as per
capita GNP, new measures have sprung up, such as the Gross Happiness Index. When we ask people
about their level of life satisfaction, beyond a certain threshold there appears to be little correlation
between “self-evaluated happiness” and GDP per capita (EASTERLIN, 1995; DEINER; BISWAS-DEINER,
2002); in other words steady economic growth does not appear to have raised happiness levels in
rich countries. At the same time, though, the risk of unhappiness is much higher for poor people in
poor countries (DEINER; BISWAS-DEINER, 2002), thus providing support for efforts to raise incomes
and increase equality in these countries.
Education is a key element in attacking capability deprivation. The key role of education in
economic growth has long been accepted, though the case is made in different ways by different
authors (e.g. EASTERLIN, 1995; SCHULTZ, 2002; LUTZ, 2009). There are many reasons why education is
not always given the role it deserves in development by governments, communities and househol-
ds. For example, we see in South Asian countries a significant lag in providing equal educational
opportunities to girls and boys. This is related to the patriarchal structures in Hinduism and South
Asian Islam, which militate against providing education to girls.
In relation to the argument that development must be seen in broader terms than merely
elimination of dire poverty and raising of per capita income levels, there is much to be said about
education as a key vehicle for expanding opportunities, tackling capability deprivation and enabling
a broader participation in cultural life. Some of the issues are particularly important, I feel, in large
countries with many pockets of rural poverty and isolation, including Brazil and many other coun-
tries in Latin America, as well as Indonesia, the Philippines and other countries in Asia.
Unfortunately, equality of opportunity in education remains a distant dream. In Indonesia, for
example, 1998 data show that if we compare the proportion of young people aged 16-18 (the ages of
upper secondary education) in school according to the education level of the head of household, the
proportion was about 25 per cent where the household head had none or incomplete primary educa-
tion, but over 80 per cent if the head had upper secondary or higher education. The poorest schools
and least trained teachers tend to be found in the poorest and most isolated areas. Students from
these areas have enormous difficulty in moving up through the school system and entering tertiary
education. In Indonesia, the key dropout point in the education system is the transition from primary
to lower secondary education. But transition from lower secondary school to upper secondary school
is also extremely difficult, because of high costs at this level, including both the high cost of school fees
and other payments, and the need for children from isolated areas to somehow board in town, because
such schools are not available within commuting distance (JONES et al., 1998).
One would hope that the disadvantages faced by children in city slums and in poor and
isolated rural areas would be counteracted, at least to some extent, by the pattern of government
spending on education. Unfortunately, often this is not the case, and patterns of educational spen-
ding by governments actually exacerbate the prevailing educational inequalities. In many countries,
the small group of students which reaches post-secondary education receives heavy public subsidi-
zation. A high proportion of this group is from white-collar backgrounds, with higher family income
levels. In other words, public funds are being used to benefit those who are already advantaged by
socioeconomic background. The Indonesian study I just mentioned argued that the goals of both
equity and efficiency would be furthered if the government adopted a scheme to provide scholar-
ships for bright but poor children to proceed into and through secondary school (JONES et al., 1998).
In East Asian countries that have progressed economically, parents tend to accord gre-
at importance to the educational progress of their children. I want to sound one discordant note
in assessing what is generally considered to be a commendable trait in parents and indeed in
whole societies. In the ultra-low fertility countries of East Asia, among the many factors making for
low fertility, the single-minded emphasis on pushing one’s child to succeed in the highly competitive
education systems is, I contend, an important factor that has pushed fertility to unsustainably low
levels. For many of those contemplating becoming parents, the high expectations placed on them
to raise quality children, and the heavy investment of time and money in arranging coaching and
other out-of-school activities become reasons not to have children at all, or to have only one or two.
The economic success achieved in these East Asian countries has much to do with the high
quality human capital they have achieved through just such an emphasis on pushing children to
strong educational performance. The dilemma is that the advanced economy so created will be en-
joyed by increasingly fewer citizens and may itself be put at risk by the downward spiral in labour
force and (with some delay) in population size. It is ironic that the pressure to prioritize economic
growth and the factors that can contribute to it – long hours of work, involvement of women in the
workforce on much the same terms as men, strong pressure on children to perform outstandingly in
school, and the extra tuition and coaching that is considered indispensible for reaching this goal –
contain the seeds of an inability of the population to replace itself.
Conclusions
Let me pull together a few of the threads of my argument, and leave with you with one key
issue for East Asia that may have some bearing on discussions of population and development in Brazil.
(1) The successful East Asian economies are placed at risk by a shortage of people to continue to power
the economies and enjoy their fruits, as a result of ultra-low fertility generated by the very factors that
have resulted in the growth of these economies in the first place. (2) In these wealthier countries, eco-
nomic growth is not raising happiness levels. (3) The pattern of economic growth that they have been
following is endangering environmental sustainability. Therefore I think we have grounds for some
serious questioning of the model of economic growth that we have been following.
References
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case of Japan. Asian Population Studies, v, 5, n. 3, p. 215-235, 2009.
COLEMAN, D. Immigration and ethnic change in low-fertility countries: a Third Demographic
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DEINER, E.; BISWAS-DEINER, R. Will money increase subjective well-being? Social Indicators
Research, v. 57, n. 2, p. 119-169, 2002.
EASTERLIN, R. Will raising the incomes of all increase the happiness of all? Journal of Economic
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FREJKA, T.; JONES. G. W.; Sardon, J. East Asian childbearing patterns and policy developments.
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JONES, G. W.; SUMONO, L. N.; HANDAYANI, T. The expansion of high school education in poor regions:
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JONES, G. W.; DOUGLASS, M. Mega-urban regions in Pacific Asia – urban dynamics in a global era.
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MARTINE, G. et al. (Eds.). The new global frontier: urbanization, poverty and the environment in the
21st century. London: Earthscan, 2008.
POTTER, J. E.; SCHMERTMANN, C. P.; ASSUNÇÃO, R. M.; CAVENAGHI, S. M. Mapping the timing, pace
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SCHULTZ, T. P. Why governments should invest more to educate girls. World Development, n. 30,
p. 207-225, 2002.
21
Direitos em questão: população, meio ambiente e o Cairo George Martine
uma destruição sistemática das suas fontes de sustentação. É impressionante registrar o quanto essa
ameaça tem se intensificado nos últimos quatro anos!
A ciência hoje em dia é incontrovertida a respeito da ameaça das mudanças climáticas.
Somente os conservadores mais empedernidos e os avestruzes podem continuar negando as evi-
dências acumuladas nos relatórios do Lord Stern e, sobretudo, do IPCC (Painel Internacional sobre
Mudanças Climáticas). Entretanto, interesses poderosos continuam manipulando a mídia a respei-
to desta ameaça, tentando tampar o sol com a peneira. O que talvez seja menos óbvio é que as
questões relacionadas com as mudanças climáticas não são apenas técnicas, mas também éticas. As
questões de direitos conflitantes − os meus direitos versus os seus; os direitos ao desenvolvimento
versus as obrigações com o planeta; os direitos desta geração comparados com os direitos de ge-
rações futuras; os direitos ao consumo dos países desenvolvidos versus os direitos dos países que
querem se desenvolver consumindo – são essenciais em qualquer discussão desse tema.
Foi o desenvolvimento dos países já industrializados que nos colocou na situação crítica em
que vivemos agora. O alcance de níveis parecidos de desenvolvimento e consumo, mesmo que seja
por uma parcela relativamente pequena da população dos países em desenvolvimento, seria su-
ficiente para exaurir definitivamente a capacidade do planeta como fonte de recursos naturais e
sumidouro de gases carbônicos.
A dinâmica demográfica é muito importante nessa equação, mas as relações não são lineares
nem simples. As transformações demográficas são parte integral do processo de desenvolvimento
e, portanto, afetam e são afetadas pelas mudanças ambientais. Nessas relações, temos que olhar
separadamente os processos de crescimento, distribuição e composição.
Muitos têm voltado a falar do crescimento populacional como um dos principais fatores que
está acelerando o processo de mudanças climáticas, levando à crença de que o problema poderia
facilmente ser resolvido com programas de planejamento familiar. Entretanto, os impactos do cresci-
mento populacional dependem, fundamentalmente, da sua conexão com a trajetória do desenvolvi-
mento. Sozinhos, programas de planejamento familiar obviamente não resolvem a questão do cres-
cimento populacional, pois dois terços deste são inerciais neste momento histórico. Muito menos
resolveriam o problema ambiental no curto prazo: os grupos populacionais que apresentam maiores
níveis de fecundidade, na atualidade, são os que consomem menos. Portanto, vale revalidar o direito
à saúde sexual e reprodutiva e repudiar novamente qualquer alusão ao controle populacional.
Entretanto, dependendo do êxito das nações nos seus esforços de desenvolvimento, os au-
mentos populacionais certamente se tornam críticos no médio e longo prazos. As últimas décadas
mostraram como países pobres podem rapidamente transformar-se em países de consumidores.
Quando esses países têm uma população de grandes dimensões, como a China, a Índia e mesmo
o Brasil, basta que uma parcela de sua gente passe a consumir nos mesmos padrões que os países
desenvolvidos para a situação mundial ficar insustentável. Já temos sete bilhões de pessoas na Terra
e estima-se que um bilhão delas consumam no estilo “desenvolvido”, e esse número cresce diaria-
mente. Na outra ponta, existe um bilhão de pessoas pobres que sofrem de fome crônica e que serão
as mais prejudicadas pelas mudanças climáticas.
Isto demonstra que o atual modelo de desenvolvimento, baseado no aumento permanente
da produção e do consumo, encontra-se numa encruzilhada. A redução da pobreza é um objetivo
essencial da humanidade, mas a generalização das práticas de produção e consumo dos países de-
senvolvidos levará a aumentos intoleráveis de emissões de gases. Por outro lado, a manutenção da
iniquidade entre países ricos e pobres por questões ambientais seria impensável. As soluções efeti-
vas a esse dilema passam, inevitavelmente, por mudanças na cultura de consumo e no próprio mo-
delo de desenvolvimento. É um fato de difícil aceitação e, por isso, panaceias aparentemente menos
dolorosas, como a da redução do crescimento populacional, sempre aparecem como mais atraentes.
E a urbanização?
O crescimento urbano também tem sido citado como um dos culpados pela ameaça climá-
tica. Esta ilação também parece óbvia, já que as cidades absorvem, em nível agregado, praticamente
todo o crescimento populacional mundial, geram entre 80% e 90% do PIB dos países e representam
o lócus mais importante dos processos modernos de produção e consumo. Entretanto, esta asso-
ciação entre urbanização e ameaça climática é espúria, pois as cidades simplesmente representam o
centro nevrálgico da civilização moderna que conhecemos e o sítio onde o atual modelo de desen-
volvimento se expande da maneira mais eficiente. As cidades crescem mais porque oferecem mais
oportunidades de mobilidade social; elas são os centros de produção porque apresentam vantagens
de escala e proximidade; finalmente, a população urbana consome mais porque é mais rica.
Mas, ao mesmo tempo, as cidades apresentam vantagens importantes, pois a concentração
reduz a demanda per capita de terra, de energia e de recursos naturais. Por isso, estudos recentes
mostram, por exemplo, que a pegada ecológica do residente da cidade de São Paulo, apesar de esta
cidade ser a maior e mais poluída do país, é menor do que a do brasileiro médio. Isto nos dá uma
ideia de que qualquer tentativa de desconcentração ou de redução do processo de urbanização
tenderia, portanto, a agravar o problema ambiental.
Por outro lado, não há dúvida de que o processo desordenado de crescimento urbano e o
descaso dos políticos com a gravidade das questões sociais e ambientais no processo de crescimen-
to urbano constituem um fator que agrava desnecessariamente os seus efeitos negativos. No caso
brasileiro, esse tipo de atitude teve um efeito cascata que impediu o exercício do direito à cidade
Temas como as mudanças climáticas e muitas outras questões que emergiram desde a CIPD
de 1994 precisam ser incorporados na agenda de direitos. A Plataforma de Ação da CIPD do Cairo re-
presentou uma mudança de paradigma e deu uma contribuição histórica para a humanidade, quan-
do passou a tratar população, desenvolvimento e ambiente sob a ótica dos direitos. Suas resoluções
no Plano de Ação abordaram quase todos os aspectos relevantes das relações entre população e de-
senvolvimento. Entretanto, nem todos esses temas mostravam os mesmo avanços ou receberam os
mesmos apoios políticos. Na realidade, somente os temas de saúde reprodutiva e empoderamento
das mulheres tiveram apoios políticos significativos em nível global, seja pelo movimento de mulhe-
res, seja por organismos internacionais como UNFPA ou Unifem.
Nesse momento em que se inicia a discussão a respeito da era pós-Cairo e se analisa o que
deve ser feito para estender ou substituir a CIPD, vale a pena reavaliar a importância das questões
que ficaram para trás nesses 15 anos − aquelas referentes à população e ao desenvolvimento lato
sensu. Uma das recomendações mais claras do PoA diz respeito à necessidade de incorporar os fato-
res populacionais em todas as instâncias de planejamento. No Brasil, sob a liderança da CNPD e com
a colaboração da Abep, houve um esforço importante nesse sentido, mas temos que reconhecer
que esta preocupação não tem sido generalizada no mundo e que os resultados têm ficado bastante
aquém do potencial.
Esta situação, a meu ver, tem três causas relacionadas. Primeiro, a própria discussão dos te-
mas centrais às questões da relação entre dinâmica demográfica e desenvolvimento é bastante desi-
gual no PoA, ou seja, o tratamento de alguns temas – inclusive o significado da própria recomenda-
ção de “integrar os fatores demográficos no planejamento” – era bastante precário na época do Cai-
ro. Segundo, essas debilidades e limitações da nossa “bíblia” foram se acentuando com o passar do
tempo, pois, inevitavelmente, os cenários de desenvolvimento foram se alterando, até por causa de
transformações demográficas que não poderiam ter sido previstas em 1994. Terceiro, a falta de um
patrocinador financeiro – entidade ou movimento social realmente interessado em atualizar infor-
mações, análises e políticas a respeito das relações entre população e desenvolvimento – contribuiu
para a estagnação dessas temáticas em muitos países. Aqui no Brasil, isso não é tão grave, graças à
atuação da CNPD e da Abep e das lutas dos seus associados para ampliar cada vez mais o seu raio de
ação, mas a nossa situação não é típica.
No meu entender, o desafio que se apresenta nesse momento é de fortalecer o espírito do
paradigma estabelecido na CIPD do Cairo − ou seja, a compreensão das relações entre população e
desenvolvimento pela ótica de direitos −, mas avançando em dois sentidos complementares: supe-
rar a concentração estreita nos únicos dois temas que tiveram respaldo financeiro ou político (saúde
reprodutiva e empoderamento da mulher); e revalidar a concepção da CIPD, na qual “população e
desenvolvimento” constituía o conceito genérico que abrigava todas as preocupações relacionadas
com dinâmica e direitos na área populacional.
Nesse sentido, é necessário promover sistematicamente (como o faz a Abep) a geração de
informações e análises que ajudem a compreender melhor e de forma atualizada essa relação entre
população e desenvolvimento e, portanto, aumentar a nossa capacidade de contribuir para o pro-
cesso de desenvolvimento. Em alguns setores existe a ideia de que ampliar o escopo de atenção no
período pós-Cairo e enfocar também os temas em que a dinâmica populacional afeta ou é afetada
por processos sociais, econômicos, políticos e ambientais constituiria um golpe contra os avanços
conseguidos nas áreas de saúde reprodutiva e equidade de gênero. As discussões a respeito da ne-
cessidade de aumentar as iniciativas em população e desenvolvimento frequentemente geram uma
reação negativa baseada na percepção de que isto iniciaria uma competição por recursos escas-
sos. Nada poderia ser mais equivocado! Não se trata de dois temas ou setores em competição. Esse
dilema é totalmente falso porque avanços numa área beneficiam claramente a outra. Precisamos,
portanto, trabalhar juntos para revalidar os princípios do Cairo, enquanto fortalecemos nossa con-
tribuição para políticas que enfrentem de maneira eficaz os grandes problemas atuais e futuros das
nossas sociedades.
Este pequeno ensaio visa resumir a apresentação feita na Sessão Plenária 1 do Encontro da
Abep de 2010, na qual foi discutido o significado atual de população e desenvolvimento. Para tanto,
torna-se necessária uma revisão do debate tradicional no campo da demografia econômica entre
crescimento populacional e renda per capita, uma discussão do arcabouço unificado do crescimen-
to econômico e da perspectiva do desenvolvimento humano, uma integração da perspectiva de
direitos, derivada do ciclo de conferências das Nações Unidas, e uma incorporação, ao debate, das
políticas sociais e do Estado de Bem-Estar Social (EBES), bem como da pobreza e desigualdade.
27
O significado de população e desenvolvimento Eduardo L.G. Rios-Neto
1
PIA: população em idade ativa; POP: população.
-análise de Headey e Hodge (2009), não sendo corroborado pelos estudos empíricos. Já o resultado
mais robusto é o crescimento da renda per capita decorrente da redução na razão de dependência
infantil, que é a consequência imediata da queda na fecundidade. A redução da fecundidade afeta
não só a razão de dependência infantil no nível macro, mas também esta razão no nível domiciliar,
um efeito sugerido pioneiramente por Leff (1969).
Em uma linha paralela aos modelos de estimativa da relação negativa entre crescimento
populacional e aumento da renda per capita, Oded Galor, junto com colegas como David Weil, de-
senvolveu o arcabouço unificado do crescimento, que distingue três regimes de crescimento econô-
mico: a era malthusiana; o regime de crescimento pós-malthusiano; e o regime moderno de cresci-
mento sustentado.
A era malthusiana é caracterizada pela “lei de ferro dos salários” ou “armadilha da pobreza”;
segundo a qual, no longo prazo, o progresso técnico se reverte em um maior tamanho populacional
com nível de subsistência constante. Grande parte dos ganhos salariais durante o período pré-indus-
trial decorria de crises exógenas de mortalidade, tais como as pestes. Uma contribuição recente na
análise da era malthusiana foi feita por Gregory Clark (2007), que procura explicar a revolução indus-
trial por intermédio da dinâmica da era malthusiana pré-industrial na Inglaterra, que teria favorecido
uma espécie de darwinismo social, com maior capacidade reprodutiva dos mais ricos. Se a releitura
da armadilha da pobreza malthusiana tem contribuído para os modelos macroaplicados aos países
atrasados contemporâneos e para estudos de demografia histórica, visões modernas sobre o “círculo
vicioso da pobreza” contemplam o contexto de alta fecundidade. A pobreza poderia gerar um me-
canismo de “autoperpetuação” quando as famílias pobres decidem ter muitos filhos, o que acabaria
afetando negativamente a decisão de investimentos em saúde, nutrição e educação de cada uma
destas crianças. Este problema é agravado quando há uma discriminação de gênero, em detrimento
das meninas e em favor dos meninos. Nesses casos, a literatura sugere a criação de mecanismos que
contribuam para romper com os incentivos perversos (SACHS, 2005).
O regime pós-malthusiano é caracterizado pela combinação do crescimento populacional
com o aumento da renda per capita. Uma das possíveis explicações para esta transição entre a era
malthusiana e o regime pós-malthusiano seria o próprio crescimento populacional e a elevação da
densidade demográfica, o que teria favorecido o progresso tecnológico no século XIX. Esta explica-
ção indica que, pelo menos na experiência histórica, o crescimento populacional foi positivo para a
expansão econômica na ruptura do regime malthusiano via progresso tecnológico. A hipótese de
Clark, mencionada anteriormente, seria uma alternativa não excludente para explicar a revolução
industrial.
se consolidasse. Entender esta evolução é importante para colocar o debate entre população e de-
senvolvimento numa perspectiva contemporânea.
Nos anos 1970, a renda per capita monetária já era criticada por abordagens do Banco Mun-
dial, que defendiam a satisfação das “necessidades básicas” como estratégia de desenvolvimento. Na
década de 1980, o conceito de capacidades desenvolvido por Amartya Sen serviu como inspiração
de organismos internacionais, sendo a base teórica para a criação do famoso “Índice de Desenvol-
vimento Humano” (IDH). Pobreza, na concepção de Sen, é a falta de capacidades para se adaptar ao
meio social e, portanto, a falta de liberdade para se viver dignamente. Pobreza é a privação de auto-
nomia para construir perspectivas de futuro. O conceito de capacidades incorpora tanto a possibili-
dade de escolha dos ativos necessários ao desenvolvimento, como também a capacidade de desem-
penho da pessoa (functioning). A abordagem das capacidades gira em torno de três termos centrais:
funcionamentos, capacidades e agência. Nos anos 1990, a multidimensionalidade da pobreza foi
radicalizada, inclusive com a incorporação da participação política por meio da operacionalização
do conceito de “voz” (voice).
Há uma ligação entre o conceito de capital humano e o de capacidade humana. O primeiro
está estritamente focado no impacto produtivo do capital humano, enquanto o segundo centra-se
nas condições que as pessoas têm para fazer as escolhas adequadas de acordo com os seus objeti-
vos. As características distintivas do capital humano constituem o foco na formação da renda indivi-
dual ou familiar e a ideia de uma “escolha” de investimento com retorno privado e pessoal.
tidores demarcaram um claro embate entre os defensores dos direitos sexuais e reprodutivos e as
vertentes religiosas, tanto islâmicas quanto o Vaticano e grupos cristãos conservadores.
O conceito de desenvolvimento humano possui uma perspectiva mais ampla do que a mera
renda per capita monetária, de tal forma que o outro lado da moeda desta nova perspectiva é a
importância de políticas sociais e da implementação de um Estado de Bem-Estar Social (EBES) no
mundo em desenvolvimento.
O Estado de Bem-Estar Social é a responsabilização da esfera pública pelo bem-estar indi-
vidual. Sua introdução permite a discussão de transferências públicas, incluindo a possibilidade da
discussão de transferências intergeracionais. Nos países em desenvolvimento, o EBES começa com
a seguridade social para a cobertura de riscos, principalmente de aposentadoria, assim como outras
perdas de rendimento, muitas vezes implementado de forma regressiva, numa perspectiva “bismar-
ckiana”. A universalização dos direitos sociais foi alcançada apenas em poucos países em desenvol-
vimento, fazendo com que a política social seja truncada e que políticas sociais focalizadas ou resi-
duais sejam desenvolvidas para ampliar a cobertura social. A ampliação de uma cidadania política,
até se consolidar nos direitos sociais, é um objetivo perseguido em várias sociedades em tela.
O grande desafio para a consolidação de um EBES em países subdesenvolvidos ou de renda
média é a sustentabilidade do gasto público. Num debate sobre universalização versus focalização,
é óbvio que o primeiro é preferível ao segundo, mas nem sempre os recursos orçamentários garan-
tirão esta possibilidade. Uma saída neste contexto é adotar uma perspectiva “desenvolvimentista”,
dentro da formulação do EBES, em que o gasto público viabilizaria ou potencializaria o crescimento
econômico futuro.
O foco nas políticas sociais e no EBES, para reduzir as desigualdades e aumentar a cobertura
dos riscos sociais da população, traz novamente à baila o debate sobre a relação entre combate à
pobreza e crescimento econômico. A marca de alguns regimes de bem-estar é reduzir as desigual-
dades, sendo que o crescimento econômico não é condição necessária para a redução da pobreza e
dessas desigualdades. As políticas sociais possuem relativa autonomia; entretanto, quanto menor for
a desigualdade de renda obervada na sociedade, maior será o impacto do crescimento econômico
na redução da pobreza.
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2005.
SOARES, R. R. Mortality reductions, educational attainment, and fertility choice. American Economic
Review, v. 95, n. 3, p. 580-601, June 2005.
1. Knowledge of methods & models, statistics & mathematics is essential. But before,
acquire a good understanding in a substantive disciplinary area in the humanities or
social sciences or biology.
2. Make of crossing disciplinary borders a habit, rather than an exception. Don’t be cowed
by the heigth of disciplinary fences or by the precision of disciplinary perimeters. Borrow
and use (not blindly) concepts, methods, results – but understand properly their limits,
significance, area of application.
3. Any (good) punctual analysis (related to a specific time or geographic area) maybe
relevant. But put the results in perspective, across time and space.
4. Macro and micro approaches to population issues are not in competition, but must be
integrated. Macro trends influence micro (individual) behaviors and viceversa. Examples:
malthusian models, density dependent phenomena, etc.
5. Relate and integrate the various demographic phenomena into a “demographic system”.
Phenomena are not independent but interdependent via the functioning of the system.
Systems change over time.
6. Demographic behaviors (entering a union, having children, mobility, healthy behaviors,
survival…) are essential, basic components of human capital. They are abilities,
capabilities, prerogatives (see A. Sen)
7. Do not be discouraged if there are no “appropriate data”, or the needed “database” is not
available at a click of your PC. “Quod non est in numero non est in mundo”?
8. Do not change subject of study just because there is plenty of reasearch money in a
different field (Contraception, family planning, AIDS, ageing...).
9. On any topic there might be relevant literature in languages different from English.
10. Demography is central to social sciences, it is not a subservient, ancillary, peripheral
discipline.
37
Demographic challenges for the 21st century
Marcia C. Castro
In the past three decades, discussions around demographic challenges for the 21st century
were often centered on the trends and consequences of population growth (EHRLICH; EHRLICH, 1990;
VAN DE KAA, 1990). Recently, the discussion has expanded to a diverse range of topics, including:
international migration, below replacement fertility in Europe, assessing demographic components
in conflict areas, patterns of urbanization, extreme climatic events and population mobility/
displacement, aging populations (and the pattern of mortality, diseases, and disability in the elderly
population), future impact of HIV/AIDS on population structure, and factors that make populations
vulnerable or resilient to demographic changes (CHRISTENSEN et al., 2009; Lutz; SKIRBEKK, 2008;
SURKYN et al., 2008). While these issues are of utmost importance for understanding current and
future trends of the population, their proper measurement, analysis and modeling depends on two
factors: availability of proper methodologies; and training of demographers on those methodologies.
This paper prioritizes these two factors, and therefore discusses the methodological and training
challenges that the field of demography may face (and therefore needs to address) on the 21st
century.
Methodological challenges
Measurement
One could argue that any analysis of population issues necessarily requires good quality data.
However, many countries have incomplete and/or defective data, and do not have a vital registration
39
Demographic challenges for the 21st century Marcia C. Castro
system (or have one that lacks full coverage) (SETEL et al., 2007; MAHAPATRA et al., 2007). In an
attempt to overcome these difficulties, demographers have devised ways to produce mortality and
fertility estimates from incomplete and defective information through the use of indirect methods
(BRASS et al., 1968; UNITED NATIONS, 1983). Although these methods have been largely used, and
several refinements have been proposed recently (MURRAY et al., 2003; RAJARATNAM et al., 2010),
the estimation of mortality (e.g., maternal, neonatal, post-neonatal, infant and child) and of fertility
indicators for developing countries still carries much uncertainty. This has direct implications for the
proper formulation and evaluation of population and/or public health policies, for the assessment
of progress toward the achievement of the Millennium Development Goals, and for the generation
of good population estimates. Therefore, there is still room for improvement both in properly
accounting for vital events and for producing indirect estimations.
Another challenge regarding measurement relates the assessment of the demographics
of conflict areas. It is extremely difficult to count vital events in a conflict area, and there is no
recommended protocol on how numbers could be collected. Estimates of death in Iraq during the
war generated much polemic (BROWNSTEIN; BROWNSTEIN, 2008; BURNHAM et al., 2006; HICKS, 2006;
McPHERSON, 2005; ROBERTS et al., 2004), and the real numbers remain unknown. Also challenging is
the measurement of population in the aftermath of natural disasters (STONE, 2008).
The proper measurement of migratory events faces difficulties in almost any setting.
Recent increase in extreme climatic events (GEMENNE, 2010) and in conflicts has resulted in
voluntary and involuntary migration, involving both international movements (some as refugees)
and internal migration (some as internally displaced people). In addition, population displacement
consequential to infrastructure projects has been significant (CERNEA, 2008). Indeed, future patterns
of migration (and the costs and benefits they may produce in sending and receiving areas) are likely
to gain much importance regarding future demographics (GOLDIN; CAMERON; BALARAJAN, 2011).
However, there is no systematic mechanism to consistently record human migration, and therefore
the comprehensive understanding of the driving forces of migration, as well as its modeling and
prediction both locally and globally still require improvement.
Causality
needs to be flexible to accommodate many variables, and the data need to have the appropriate
format that would allow for the assessment of causal relationships.
Causal inference in demography have focused mainly on the individual level or, what
could be called, micro-demography (BHROLCHÁIN; DYSON, 2007). Yet, the core of the discipline
is on analyzing aggregated events, and assessing population composition and change over time,
which one could call macro-demography (LEE, 2001). While both are important, macro studies in
demography have received less attention recently. As a result, much knowledge is being generated
regarding individual behavior and decisions, not accompanied by aggregated studies that assess
population processes and dynamics (BHROLCHÁIN; DYSON, 2007; LEE, 2001).
Spatial effects
The use of spatial analysis in demographic studies has been growing recently, with many
applications on the study of fertility, mortality, and migration, the analysis of population size, change,
and distribution, and on varied applied demography research (CASTRO, 2007). Spatial methodologies
facilitate the appraisal of regional inequalities, the investigation of diffusion processes during the
demographic transition, and the identification of clustering patterns of demographic indicators, to
name a few. Results obtained from spatial analyses provide unique information for the formulation
and implementation of targeted policies.
The challenges, however, are many. First, available data are not always appropriate for
meaningful spatial analysis due to the sampling frame and/or spatial coverage. Second, the spatial
scale of the data may be too coarse, and therefore not useful for improving current knowledge and
aiding policy making. Third, combining data from different sources in one spatial database may be
imperiled by the spatial scale in which they were collected (GOTWAY; YOUNG, 2002). Fourth, some
applications of spatial methods in the social sciences have failed to establish a sound conceptual
framework linking the importance of spatial effects to the outcome of interest, leaving room to
much criticism. It is imperative to hypothesize (and test for) the possible mechanisms through which
space would impact varied population indicators – a good example is presented by Voss (VOSS et al.,
2006) – as well as how this impact could vary depending on the adopted concept of neighborhood
(FOTHERINGHAM; WONG, 1991). When appropriate, the assessment of causal effects in a spatial
framework would also be useful.
Potential areas of future applications of spatial analysis include the understanding of processes
and patterns related to fertility and mortality, modeling of migration, improved small-area population
estimates, and the regular release of spatial demographic data, which could facilitate research in many
different fields (e.g., health, education, and social security). Examples of such data include the Gridded
Population of the World (CIESIN; COLUMBIA UNIVERSITY; CIAT, 2004) and the Global Rural-Urban
Mapping Project (CIESIN; COLUMBIA UNIVERSITY; IFPRI; THE WORLD BANK; CIAT, 2004).
Multidisciplinary approaches
Training challenges
These challenges in training suggest that a core curriculum should be considered by all
programs that provide training in Demography, so that new generations of professionals would have
the basic tools to apply methodologies that will be in high demand in the future, but also to develop
much needed novels ones that could improve the measurement and analysis of population events.
The area of Applied Demography was the first in the discipline of Demography to claim the need
of specific training, and a Ph.D. program was developed to provide the necessary skills needed by
applied demographers (MURDOCK; ZEY, 2008).
Discussion
The world is at almost 7 billion, mostly urban, showing striking demographic contrasts:
below replacement fertility in some European countries vs. high fertility in parts of Africa; countries
where population momentum will play a role in population growth for decades to come vs. countries
struggling to avoid shrinking numbers; and older populations facing the burden of chronic diseases
vs. younger populations facing the double burden of infectious and chronic diseases, to name a few.
These and many other contrasts certainly characterize the nature of the demographic challenges
for the 21st century. However, in order to understand these contrasts, and to formulate policies that
mitigate their negative effects, demographers will need to be equipped with comprehensive data
and methodological approaches, and will need to have proper training to use them; these are, indeed,
additional challenges of the discipline for the 21st century, which were addressed in this article.
The agenda of demographers in the decades to come should include attempts to improve the
recording of vital events in different settings; to better measure migratory movements; to develop
new indirect methods of estimation; and to incorporate varied analytical approaches (e.g., Bayesian
analysis and fuzzy modeling) that could facilitate the assessment of causality and spatial effects, and
that could make it possible to conduct multidisciplinary analysis. Concurrently, it would be advisable
that Populations Centers providing training in Demography start planning for future demands, and
establish a core curriculum that would provide skills for the coming generations of demographers
to conduct both micro and macro analysis, and therefore pave the way for future methodological
developments in the field.
It is important to note another potential challenge that relates to decisions regarding the
survey format and the amount of information collected in censuses. The 2010 Census in Canada
was surrounded by much controversy when the government decided to change the long-form
questionnaire from mandatory to voluntary (http://www.statcan.gc.ca/survey-enquete/household-
menages/5178-eng.htm), introducing sample selection bias. In the same year, a committee from the
Republican Party in the US questioned the amount of information asked in the American Community
Survey, calling it an invasion of privacy (ROBERTS, 2010). If these problems become more frequent
and result in discontinuity of data collection and/or drastic reduction of information gathered in
surveys and/or censuses, then the discipline would face a step backwards toward the goal of better
understanding processes that result in current population structure and composition, and would
have limited capabilities to properly inform policy making.
In conclusion, the demographic challenges for the 21st century are many. Although the focus
has been on specific challenges related to population structure and dynamics, methodological and
educational challenges are equally important. Indeed, all three challenges are related: well trained
generations of demographers have the skills to apply current methods and to develop new ones,
which ultimately would facilitate the analysis and mitigation of population-specific challenges.
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El objetivo de este documento es hacer una reflexión alrededor de algunos aspectos que
se consideran de importancia para el desarrollo de la demografía, particularmente a la luz de las
consecuencias derivadas de las transformaciones en la dinámica poblacional ocurridas en las últimas
décadas del siglo pasado y los avances tecnológicos.
I. Percepción de la sociedad respecto al quehacer demográfico. Una dificultad que enfrente
la demografía es hacerse visible como disciplina frente a la sociedad. Es innegable que
los resultados del trabajo demográfico son críticos para el bienestar de la sociedad. Sin la
producción de información demográfica y su consecuente análisis con un enfoque de
dinámica poblacional no es posible llevar a cabo la planeación de acciones de gobierno,
evaluar el impacto de éstas, así como tampoco identificar prioridades. Sin embargo el público
no necesariamente reconoce la existencia de la demografía ni como campo de trabajo ni
como un grupo de científicos cuya labor deriva en un mejoramiento de su calidad de vida.
De aquí que sea imperativo visibilizar frente a la sociedad el quehacer que los demógrafos
llevamos a cabo. La sofisticación del entrenamiento demográfico y amplitud de aplicación
de estas herramientas son dos elementos que requieren ser subrayados. De igual forma es
necesario propiciar usuarios adicionales de los resultados de la investigación demográfica.
II. Espacios de trabajo de la demografía. Tradicionalmente, los demógrafos se desenvuelven en
ámbitos académicos o en espacios de gobierno dedicados a la producción de información
estadística. No es habitual que estudiosos de la población laboren en áreas de toma de
decisión. Dada la importancia del uso riguroso de información demográfica para la planeación
de acciones gubernamentales, sería deseable ampliar la participación de nuestro gremio en
estos espacios. Asimismo, colaborar laboralmente en las organizaciones de la sociedad civil y
promover la inserción de demógrafos en espacios de la iniciativa privada.
47
La demografia frente al panorama del siglo XXI: puntos para una discusión Rosario Cárdenas
III. Grandes temáticas de trabajo. Sin menoscabo de temas específicos que requieren atención,
es necesario reconocer que un conjunto de grandes temáticas ocupa hoy en día nuestro
quehacer, con las implicaciones que ello conlleva tanto para el entrenamiento de recursos
humanos como para la producción de información estadística particular. Algunas de estas
temáticas son resultado de la propia inercia demográfica o las transformaciones aceleradas
en su dinámica, pero otras mas devienen de diferencias entre grupos o regiones o rezagos
en la cobertura de satisfactores básicos. El envejecimiento, las desigualdades social o de
género, las desventajas registradas entre poblaciones indígenas o minorías, la persistencia
de patrones de reproducción en condiciones de riesgo o con afectación a trayectorias de
vida, los flujos migratorios y sus modificaciones en volumen, composición y puntos de origen
y destino ejemplifican algunos de estos grandes problemas.
IV. Métodos y aproximaciones. El entrenamiento en análisis demográfico debe continuar
siendo una de las piezas medulares en la formación de los demógrafos. Las herramientas
que lo conforman no sólo dan especificidad a nuestro quehacer, sino también proporcionan
una aproximación que no acompaña otros campos de estudio: una perspectiva dinámica
que considera el efecto resumen de modificaciones en cada una de las piezas que componen
la situación que se analiza, sea ésta, por ejemplo, el impacto de las distintas tasas de
mortalidad en la estimación de una esperanza de vida o los componentes demográficos en
la elaboración de proyecciones de población. Sin embargo, es necesario reconocer que cada
vez más la formación demográfica requiere ir acompañada bien del entrenamiento en el
uso de técnicas estadísticas o en el de aproximaciones derivadas de la socioantropología o
inclusive de ambas.
V. Información sociodemográfica. A las fuentes de información sociodemográfica
habitualmente disponibles en los países de latinoamericanos del Caribe tales como los
censos de población, registros administrativos y encuestas con temas específicamente
demográficos, se añade la necesidad de conformar registros administrativos particulares, por
ejemplo para enfermedades determinadas, o la organización de sistemas de información que
articulen el uso conjunto de varias fuentes, así como la urgencia de ampliar los esfuerzos para
contar con un mayor número de encuestas longitudinales en la región. Un elemento que sería
deseable contemplar en torno a la producción de información estadística es fortalecer los
esfuerzos de colaboración entre países del área a fin de contar con datos comparables entre
éstos particularmente con relación a fuentes complementarias a los censos poblacionales y
las estadísticas vitales. La iniciativa internacional de documentación acelerada de bases de
datos constituye un paso en esta dirección.
VI. Investigación. Dos son los aspectos en torno al desarrollo de la investigación en población
sobre los cuales esta propuesta de reflexión intenta llamar la atención. El primero se refiere
a las fuentes de financiamiento. Es un hecho que los indicadores sociales, económicos
y demográficos de los países de nuestra región apuntan hacia, en promedio, mejores
condiciones de vida para los habitantes de Latinoamérica y el Caribe en comparación con los
de otras áreas del mundo. Lo anterior puede colocar a la región en una situación de desventaja
Tal como el título indica, el listado de aspectos antes presentado busca promover una discu-
sión de la situación que enfrenta la práctica de la demografía en la región y las oportunidades para
su fortalecimiento. El conjunto presentado ha intentado señalar que los desafíos que enfrenta van
desde el reconocimiento de su especificidad hasta la aplicación ineludible de esfuerzos por lograr un
mayor uso de sus herramientas y resultados en la toma de decisiones.
“Man has spread widely over the face of the earth, and must have been exposed, during
his incessant migration, to the most diversified conditions. The inhabitants of the Tierra del Fuego,
the Cape of Good Hope, and Tasmania in the one hemisphere, and of the Arctic regions in the
other, must have passed through many climates, and changed their habits many times, before they
reached their present homes. The early progenitors of man must also have tended, like all other
animals, to have increased beyond the means of subsistence; they must, therefore, occasionally have
been exposed to a struggle for existence, and consequently to the rigid law of natural selection”.
(DARWIN, n.d., p. 421). This is a quote from Darwin’s “Descent of Man”, a rather appropriate quote, I
believe, since we tend to forget, two centuries after his birth, how pervasive migration has been –
and continues to be today - in mankind’s geographical distribution, living circumstances, numerical
growth, biological and social evolution. Indeed, in our century, we tend to consider migration (in its
international manifestation) not as a prime and essential mover of human society, but rather as an
unruly component to be dealt with, a deformed piece of a global puzzle that does not fall into place,
a background “noise” disturbing the placid humming of social life.
Yet, migration continues to be a major player on the world’s scene. In 2005, the United
Nations estimated the “migrant stock” at 190 million, about 3 percent of the world population. But
the “migrant stock” as so defined includes only the first generation of migrants (persons born in a
country different from the country of residence; or people carrying a “foreign” passport who are also
mostly first generation migrants). Should the second or third generations be included, the “migrant
stock” would be much more numerous. Suffice to say that in the United States Hispanics alone
51
International migration: a global force, ungoverned Massimo Livi-Bacci
(mostly first and second generation migrants) were estimated at 42 million in 2005, while the total
“foreign stock” (all places of birth in Latin America) numbered 20 million.1
Several forces are at work sustaining the view that international migration will continue to
expand in the next few decades. In the first place, because of increasing interconnection among
countries, both at the regional and at the global level. The EU, now enlarged to 27 countries, is an
area where migration is practically unhindered within the European space – and maybe, in the
future, other regional common spaces will do the same, thus lessening the “partitioning” of the
world. Economic globalization is another powerful force that generates new opportunities and
modes for the exchange of people: workers circulating between branches of multinational firms and
institutions; the liberalization of services that entails movements of dependant workers from one
country to another in order to provide the required services; circular migration of the professionals,
the highly skilled, and technicians. The cultural integration of the world, the rising of English as a
global language, easier and cheaper communications and transports are all factors that lower the
psychological, cultural and monetary cost of moving across countries, reducing the cost of migration,
and gradually including populations (once closed or isolated) in the various migratory systems. And
there is also another prime mover, traditionally stronger than frontiers: people of different countries
get in touch, fall in love, intermarry and have children.
The second powerful engine of migration is the increasing inequality between countries
and, as a consequence, the expanding inducement to migrate from poor to rich countries. In 1973
per capita income (expressed in 1990 PPP dollars) was 16,700 in the USA and 4,900 in Mexico; 30
years later, in 2003, 29,000 and 7,100. As a consequence, the difference in GNP per capita between
the two countries has increased from 12,300 in 1973 to 21,900 in 2003; the ratio, that was 3.4:1 in
favour of the USA in 1973, only marginally decreased to 3.1:1 in 2003. If we compare Western Europe
and Sub-Saharan Africa the divergence in opportunities is even more striking: per capita income
was 11,400 and 1,400 respectively in 1973 and 19,900 and 1,550 in 2003. The difference expanded –
between 1973 and 2003 - from 10,000 to 17,350, and the ratio from 8.1:1 to 12.8 (MADDISON, 2007).
Introducing more sophisticated measures, expanding comparisons across countries, varying time
periods would not fundamentally change the fact that differences between rich and poor countries
have been increasing and will probably continue to do so for a time, since growth depends heavily
on innovation and innovation gives most benefits to the countries sitting high on the hierarchical
scale of knowledge and technical progress.
A third powerful factor of migration is demography. Until the world completes its transition
to less unequal patterns of fertility and mortality – which will take several decades on a business as
1
Available in: <http://www.census.gov/population/socdemo/hispanic/cps2005/2005_tab1.1a.xls>.
usual course – the demographic unbalance between rich and poor regions will remain conspicuous.
Poor countries where fertility decline has initiated only recently will generate an exuberant inflow of
young people into the labour force for decades to come, while rich countries where fertility fell below
replacement decades ago, will continue to produce young cohorts conspicuously less numerous
than those of their parents and, in some instances, of their grandparents. One example: between
2010 and 2030, the population aged 20 to 40 (the age group to which the overwhelming majority
of migrants belongs) will decline 26 percent in Europe and increase 56 percent in Africa (UNITED
NATIONS, 2008a).
While the forces that generate migration persist unabated, barriers – metaphorical and
physical – are raised in the attempt to regulate and reduce international flows. Yet, according to a
2007 United Nations survey, only 19 percent of world governments considered their immigration
too high, down from 41 percent in 1996. In the more developed part of the world, in 2007, only 4
governments out 49 considered immigration too high, as against 29 (out of 48) in 1996. (UNITED
NATIONS, 2008b, p. 64). But closer scrutiny of actual policies reverses this rosy picture. In many
rich countries, policies tend to become more restrictive. Restrictions take different forms, such as
reduction of quotas; less generous criteria for family reunification; revision of the qualifications for the
legal admission of immigrants; attempts to reduce unskilled immigration while selecting the highly
skilled ones; more stringent criteria for the admission of refugees. On the other hand, governments
seem to be powerless in managing the phenomenon of irregular migration, and the growing stock
of undocumented (or illegal) immigrants runs into the tens of millions: 11-12 in the US, 5 to 8 in
EU-27, 5 to 10 in Russia. In Europe irregular (non European) immigrants determine an unresolved
legal conundrum: EU regulations do not permit mass expulsions nor do they allow mass amnesties.
Expulsions or regularisations must be on an individual basis and decided within a complex juridical
frame, but the legal systems are unable to cope with a great number of cases, so that the problem
remains unsolved and irregularity remains high. In the USA, the Bush administration has been unable
to push legislation through Congress in order to address the problems of an illegal population the
size of Pennsylvania’s. In Russia – the flow of immigration of returning Russian nationals is now almost
over – but irregular workers from central Asia worry the authorities. Everywhere no efforts are spared
in order to control illegal inflows so that irregular stocks are not inflated: stringent border checks,
walls and physical barriers, terrestrial and maritime patrols, electronic surveillance, air monitoring –
besides the obsolete passport visas or inefficient internal police checks.
As far as regular migration is concerned, two trends are emerging among rich countries. The
first – as said above – is selectivity, in the effort to attract the highly skilled and boost the contribution
of immigrants to growth. Needless to say that selectivity implies a symmetrical negative effect for
sending countries, deprived of valuable “human capital”. Selectivity is an official policy in countries
with a long history of immigration: Australia, Canada and New Zealand, have a “points system” based
on the characteristics of candidates, such as age, family status, knowledge, language and professional
skills, etc. Only those that accumulate a certain number of points are considered for admission.
This system is spreading to Europe as Denmark, the United Kingdom and Germany have recently
adopted new regulations in this vein. The other tendency favours temporary and circular migration.
The (official) rationale being that these forms of migration minimise the losses caused by the brain
drain to sending countries while maximising the benefits of remittances for those left behind. But
there is a hidden rationale, as well: the hope that the demand for unskilled labour also be satisfied on
a temporary basis migration, minimizing the drain on welfare budgets and, more generally, avoiding
that low skilled, less educated people and their families – supposedly more difficult to integrate –
become permanent residents or candidates to citizenship. European institutions are supporting a
“Policy Coherence for Development” and migration, where temporary and circular migration have
a central place. But it is difficult not to agree with the conclusions of OECD’s authoritative report on
international migration:
The expectation of temporary stay by labour immigrants does not appear to be a foundation on which
one can construct a solid migration policy. Some labour needs, both high and lesser skilled, are of a
permanent nature and need to be addressed by longer term migration […] Likewise some returns of
high-skilled migrants to their countries of origin do occur and will undoubtedly continue to do so. But
it is illusory to expect that migrants will return just because they are able to do so without jeopardising
their status in the host country. Little from recent migration experience suggests that this is a major
phenomenon, especially when the entire family is involved and when economic conditions in the
country of origin remain difficult. (OECD, 2008, p. 20)
Conflict
So let us resume the situation. First, global forces sustain global migratory flows:
globalization, increasing interconnection of cultures, decreasing costs of travel and – above all –
growing divergences in wellbeing among countries and demographic differentials. The impending
crisis, whose duration and gravity nobody is able to forecast, adds to the complexity of the situation.
Second, restrictive legislations tend to be enforced in rich countries in order to control and decrease
regular migration flows. In many countries, new legislation tends to favour the highly skilled, changing
the composition of immigrants, and to privilege temporary and circular migration as alternative to
a long term one. Third, irregular migratory stocks are on the rise and attempts to stabilize or deflate
them by contrasting irregular inflows are often frustrated.
These trends, roughly and incompletely summarized, add to the conflicts of interest between
the macro players (sending and receiving countries) and the individual protagonists (immigrants and
citizens of both receiving and sending countries). Sending countries lament the depletion of their
valuable human capital but have an interest in expanding the emigration of part of their numerous
and growing young cohorts entering the labour force. They also deprecate the obstacles to permanent
integration of immigrants in the countries of destination and the restriction to family reunification, but,
on the other hand, valuable remittances are maximised when migration is temporary and migrants leave
families behind. Countries of immigration, on the other hand, are distressed by the lack of cooperation
of sending countries in the control of illegal migration and by their unwillingness to readmit deported
illegal aliens onto their soil. But the real victims are the migrants themselves, caught in the quagmire
of regulations, unable to exploit in full the opportunities opened by their decision to move, often in an
illegal situation and therefore more vulnerable to exploitation. It is common place to say that migration
is a positive-sum-game, where everybody gains something. It may be so, but contrasting interests and
policies, the lack of cooperation between countries (not to say the absence of governance) detracts
from the gains that the various actors may reap through migration.
[…] international governance requires acknowledging that different states have different goals,
compromising where possible, and building first on recognized common objectives - the need for
more knowledge and understanding of migration phenomena, fewer deaths of migrants in transit,
reduction of the influence of criminal networks, minimizing tensions between migrants and host
communities, greater safety and dignity for migrants, increased national security, the maximum
mutual benefit from migration, and a general capacity to implement policies that have been embraced.
(NEWLAND, 2005, p. 17).
As is well known, there is a fundamental difference between the globalization process that
took place between 1870 and 1920 and the globalization wave of the last half a century. The first
wave involved capital, goods and people: America was rich in land, and endowed with natural
resources, but poor in labour; Europe was rich in labour and poor in land. The mass migration from
Europe to America entailed a rise in the standard of living of the sending and receiving countries,
as well a closing of the gap in the standard of living in the two continents. The modern process of
globalization has been one of goods and finance, and less so of people. In comparison to the tens
of millions who left Europe for America – and other regions of the world in the final decades of the
nineteenth and the first of the twentieth centuries – immigration in the developed world in the last
decades has been relatively modest. The United States receive today approximately the same number
of immigrants that – with a population two thirds smaller – arrived a century ago. Between 1960 and
2005, the foreign stock in Europe (when corrected of the effects due to the changes in borders after
the dissolution of USSR and Yugoslavia) increased at a rate that is a fraction of the rate of increase of
international trade. Indeed, notwithstanding the strengthening of those global forces of migration
mentioned at the beginning of this paper, the increase of immigration has been moderate – and the
perception of an immigrant avalanche submerging Europe is wrong and deformed. The fact is that
economic globalization has been sustained by a cultural and political action in favour of free trade
and lower tariffs, and the setting up of a regulating institution like the WTO. But barriers to migration,
in the meantime, have been raised, and the action of global forces checked, for a time. No shared
vision of common good has emerged and calls for international cooperation – not to say governance
– have been feeble. It is a telling fact that few states have ratified the two ILO conventions (n. 97
of 1949 and n. 143 of 1975) dealing explicitly with migrant workers, and that the United Nations
Convention on the Rights of Migrants Workers and their Families needed 13 years to enter into force,
and that – as of the beginning of 2009 – has been ratified by only 43 states (only one in Europe).
Too strong are the conflicting interests, too feeble the voice of migrants, too weak the perception of
common, long term interests.
The Global Commission on Migration and Development, created by Kofi Annan in 2003, after
two years of consultation and debates, came up in 2005, with a rather timid proposal: the creation
of an Inter-agency Global Migration Facility (IGMF) with the objective of facilitating a “coordinating
and integrating policy planning in areas that cross the mandates of several institutions, for example
human trafficking, the migration-asylum nexus and the developmental implications of international
migration, including remittances” (GLOBAL COMMISSION ON INTERNATIONAL MIGRATION, 2005, p.
77). In other words, the IGMF should coordinate functions that are carried out by various agencies
(that would continue to carry out those functions) both belonging to the United Nations family –
such as UNCHR or ILO – and outside the UN, like IOM, WTO etc. Areas of IGMF competence should
be capacity building, policy planning and analysis, development, data collection, promoting
consultation with regional bodies, NGOs etc. But even this modest proposal for coordination of
dispersed capacities and functions – four years after the report – has remained unheeded. As for
bringing together the “disparate migration-related functions of existing UN and other agencies
within a single organization” this was left, in the Report, for a “long term approach”, meaning, by that,
the deferral to a far away nebulous future.
If even minimalist proposals have been set aside, what about the idea of gradually building
up a supranational institution – of the nature of WTO – to which governments might cede parts
(even minimal at the beginning) of their sovereignty in migration-related issues? Proposals of this
nature do not seem to be popular in the international debate and are left to the initiative of isolated
voices. “The world badly needs enlightened immigration policies and best practices to be spread
and codified. A World Migration Organization would begin to do that by juxtaposing each nation’s
entry, exit and residence policies toward migrants, whether legal or illegal, economic or political,
skilled or unskilled. Such a project is well worth putting at the center of policymakers’ concerns”
wrote economist Jagdish Bhagwati a few years ago (BHAGWATI, 2003). Few voices have joined the
debate.
Yet, this Forum of Academies, in view of the G8 meeting this coming July in Italy, seems to be
the right place to take up with force the issue of the need for a global governance of migration. Let
us leave aside the complex problem of the nature of the institution to be invested with regulating
powers: whether a new autonomous Agency – a World Migration Organization - or a merge of
existing Agencies (such, for instance, UNCHR and IOM); whether within or outside the United Nations
family, etc. But let us for a moment think of the functions that an Agency of this type could subsume.
Kathleen Newland has suggested, for a first phase, the areas of data collection and monitoring of
trends, policy research and development, technical assistance and training, provision of services,
platform for discussion, support for negotiations, anti-trafficking initiatives, promotion of migration-
related initiatives. These are functions relatively free from clashes of interests that could form the
basis for the initial action of an international institution that needs to develop cooperation among
states. But other functions must also be gradually (but not too gradually) included if an embryo
of governance is to be developed: again, drawing from Newland’s list “protection of migrant’s
rights, standard setting, immigration law enforcement and border control, compulsory returns, and
facilitation of migration”, issues for which, at present, “divisions among states […] are too pronounced”
(NEWLAND, 2005, p. 7). Just think of the issue of migrant’s identification; of certifying their place of
birth and their nationality, age and family relations; their skills and education; their knowledge of
languages; their possible criminal record… Or the importance of ensuring that remittances can be
freely circulated, with a minimum of cost and a maximum of security; that pension rights are not lost;
that work contracts conform to minimum standards. Or the importance of seconding, supporting
and eventually enforcing bilateral and multilateral agreements for the reunion of family members
or readmission of lawfully deported migrants… And, above all, the protection of migrants rights
of those who have migrated lawfully and of those – tens of millions – who live illegally in foreign
countries. Even legal migrants live – in several countries – in a state of semi-servitude, their passports
being retained by the authorities or by their employers. Fortress Europe has counted 13,500 certified
migrant losses of lives in the attempt to reach Europe in the last 20 years.2 This is only the tip of the
iceberg of total migrant losses, most of which go unrecorded, along desert routes or during sea
crossings; the Mexico-US border is an equally dangerous area for the illegal migrant. These are not
victims of wars but of peaceful movements.
Global forces are behind the growth of migration. Conflicting interests are on the rise. So is
the need for global cooperation and governance.
2
Available in: <http://fortresseurope.blogspot.com/>.
References
O Censo Demográfico, realizado a cada dez anos, é a principal fonte de dados para os estudos
de população, sendo possível obter informações únicas para os estudos demográficos e socioeconô-
micos para níveis mais desagregados, como os municípios, áreas de ponderação e até bairros, per-
mitindo o conhecimento da realidade local para fins de planejamento e monitoramento de políticas
públicas.
A Abep tem com o IBGE uma longa relação de parceria, sempre apoiando os projetos inter-
nos, em especial o do Censo Demográfico, o que pode ser comprovado pela participação de três abe-
pianos como membros da Comissão Consultiva do Censo Demográfico, além da presença de técni-
cos do IBGE em diferentes grupos de trabalho da Abep, os quais influenciaram algumas das questões
abordadas no Censo, com destaque para o Grupo de Trabalho de povos indígenas e o de migrações.
No Encontro Nacional da Abep de 2008, foi apresentado um questionário, que era um con-
solidado das demandadas recebidas pelo IBGE e que foi aplicado na prova piloto. Este questionário
tinha o dobro do tamanho daquele que foi a campo. Na ocasião, a Abep colocou com muita pro-
priedade a necessidade de o IBGE incluir no Censo 2010 questões que seriam fundamentais para
preencher lacunas existentes nas informações obtidas por meio dos registros administrativos. É ine-
gável que a participação dos ibgeanos nos encontros científicos, especialmente na Abep, contribuiu
significativamente para as questões abordadas no Censo.
O Censo Demográfico é um trabalho complexo que exige uma negociação a cada questão
envolvida, sendo que as escolhas inerentes ao processo não são fáceis. Várias reuniões foram realiza-
das em inúmeras esferas: Comissão Consultiva, especialistas de diferentes áreas, usuários diversos,
Ministérios, ONGs, representantes de governos estaduais, etc. A escolha das questões que constam
hoje no questionário não levou em consideração a legitimidade do tema, uma vez que todos eles
eram legítimos, mas sim a factibilidade dos temas e sua relevância nos níveis geográficos mais desa-
gregados, em especial para os municípios.
61
Censo 2010: avanços e alcances Wasmália Bivar e Leila Ervatti
A realização do Censo Demográfico brasileiro torna-se muito complexa diante das dimen-
sões e heterogeneidade observadas no território nacional:
• 27 Unidades da Federação;
• 5.565 municípios;
• mais de 190 milhões de pessoas;
• 8,5 milhões de km2.
As inovações adotadas neste Censo buscaram proporcionar tanto um aumento na qualidade
e agilidade do trabalho de coleta, quanto ganhos na capacidade analítica das informações, seguindo
uma tendência que vem sendo adotada no IBGE.
Estratégias de coleta
As informações dos questionários do Censo Demográfico 2010 foram obtidas por meio de en-
trevistas presenciais, com a utilização de cerca de 220 mil computadores de mão equipados com GPS,
além da possibilidade de preenchimento do questionário pela Internet, pelo próprio entrevistado.
Aos recursos humanos do IBGE somaram-se cerca de 200 mil recenseadores, 23 mil supervi-
sores e 2,5 mil técnicos para apoiar as atividades administrativas e operacionais.
Foram criadas 1.280 subáreas (unidades de controle), responsáveis por 7.000 postos de tra-
balho, que foram equipados com desktop, notebooks, impressoras e Internet, objetivando controle
da coleta, apuração e transmissão das informações à sede do IBGE.
A base cartográfica é reforçada como instrumento de apoio essencial à realização das opera-
ções censitárias, por meio da incorporação de informações atualizadas sobre a delimitação político-
-administrativa e das características do território nacional, contribuindo para o planejamento, orga-
nização e controle da execução dos trabalhos e a divulgação dos resultados.
Totalmente digitalizada, incluindo imagens orbitais e integrada ao Cadastro Nacional de
Endereços, a base cartográfica torna-se fonte e veículo de informação e de representação territo-
rial, com capacidade inédita de interatividade e espacialização. Para realizar este trabalho, o IBGE
necessitou:
• rever todos os limites municipais, de acordo com a legislação vigente;
• inventariar e incorporar imagens orbitais e informações cartográficas e cadastrais
disponíveis: públicas (prefeituras, ministérios, órgãos públicos, etc.) e privadas (empresas
de roteamento e concessionárias de serviços);
• associar o elemento gráfico que representa cada face de quadra com o Cadastro Nacional
de Endereços.
Aglomerado subnormal
Pré-coleta
A pré-coleta foi uma das inovações no Censo Demográfico 2010, que consistiu no percurso,
pelos supervisores, nos cerca de 180 mil setores classificados como urbanos (exceto aglomerados
subnormais).
O trabalho da pré-coleta aconteceu três meses antes da data do Censo, etapa em que foram
contratados e treinados os 23 mil supervisores e montados os postos de trabalho para a execução
desta tarefa e do próprio Censo.
De posse dos mapas dos setores em papel e digitalizados nos computadores de mão, os
supervisores passaram ao reconhecimento organizado da área que ficaria sob sua responsabilidade,
percorrendo os setores e registrando os endereços, com a identificação da natureza de cada um de-
les, se residencial ou não residencial.
Além do registro dos endereços, por setor, a pré-coleta também levantou algumas caracte-
rísticas que foram diretamente observadas na face e/ou na face confrontante de cada quadra:
• iluminação;
• meio fio, guia;
• calçada, passeio;
• rampas nas calçadas para cadeirantes;
• pavimentação da rua;
• rua arborizada;
• bueiro boca de lobo;
• identificação do logradouro;
• lixão, depósito de lixo tóxico ou perigoso ou acúmulo de lixo;
• esgoto a céu aberto ou vala.
Essas informações irão compor uma base de dados importante para inúmeros temas que vão
desde a área da saúde, planejamento urbano e investimentos até avaliação de políticas públicas. Es-
ses dados, cruzados com aqueles oriundos do próprio Censo, potencializarão a capacidade analítica
dos diversos temas abordados no Censo 2010.
Foram inúmeras as vantagens da pré-coleta: com a montagem dos postos para essa tarefa, a
estrutura do Censo já estava pronta quando a coleta propriamente dita começou; os supervisores já eram
conhecidos antes do início do Censo e foram treinados na época da pré-coleta; os supervisores conhe-
ceram sua área de trabalho antes da ida dos recenseadores a campo, além da obtenção do número de
endereços residenciais nas áreas urbanas que são de extrema importância para a coleta do Censo.
A escolha das informações a serem investigadas em cada tema no Censo 2010 e da forma
como seriam levantadas não foi tarefa fácil, já que duas questões importantes deveriam ser consi-
deradas: manter a série histórica por meio da comparabilidade com as informações coletadas nos
Censos passados e, ao mesmo tempo, abordar temas emergentes e importantes para o conhecimen-
to da realidade do país, e que eram demandados pela sociedade em geral. O resultado alcançado
após incontáveis reuniões foi positivo, levando-se em conta que as grandes questões nacionais não
ficaram sem resposta.
brasileira e, como as duas perguntas estavam interligadas, optou-se então pela manutenção somen-
te da posse do domicílio.
Foram incluídas duas perguntas no bloco sobre as características dos domicílios: material
predominante nas paredes externas; e existência de medidor de energia elétrica.
Algumas modificações foram introduzidas em perguntas já existentes em 2000:
• forma de abastecimento de água: passou de três para dez categorias investigadas;
• energia elétrica: investigação sobre a fonte (se proveniente de distribuidora ou de outra
fonte);
• bens duráveis: inclusão da existência de telefone celular, microcomputador com acesso
à Internet e motocicleta. Retirada da investigação sobre a existência de vídeo cassete,
forno de microondas e aparelho de ar-condicionado.
• Sexo
• Idade
• Religião
• Cor ou raça
• População indígena: etnia e língua falada
• Registro de nascimento
• Nupcialidade (estado conjugal; estado civil)
As perguntas tradicionais sobre sexo, idade, cor ou raça, religião e nupcialidade foram man-
tidas, sendo que a questão sobre cor ou raça foi incluída no questionário básico, investigada para
toda a população.
Houve uma grande demanda pela investigação das línguas faladas no país e das línguas de
formação da população brasileira. Dada sua baixa frequência, essa informação teria que ser abordada
no questionário básico, o que se mostrou inviável, pois houve grande aumento do tempo de aplicação.
Manteve-se a etnia e a língua falada apenas para a população indígena no questionário básico.
Foi incluída a pergunta sobre existência de registro de nascimento para as pessoas com até
dez anos de idade, com o objetivo de localizar regiões no território nacional onde ainda persistem
altos níveis de sub-registros de nascimentos.
Famílias e domicílios
No Censo 2010 não foi incluída a investigação sobre existência de família convivente no do-
micílio. Esta decisão foi tomada após várias discussões baseadas em estudos que concluíram que
a composição das famílias conviventes, identificada neste tipo de investigação (Censo 2000 e an-
teriores), era resultante de um “acordo” entre o recenseador e a pessoa entrevistada, com base em
hipóteses influenciadas pela formação cultural de ambos.
No entanto, será possível a reconstituição da quase totalidade dos tipos de famílias convi-
ventes, com a combinação da relação de parentesco com o responsável pelo domicílio e mais duas
perguntas diretas que foram incluídas com este objetivo:
• se tem mãe viva. Se sim, perguntou-se se a mãe mora no domicílio e o nome da mesma;
• no bloco de nupcialidade, foi investigado o nome do cônjuge para as mulheres que não
eram pessoa de referência no domicílio ou seu cônjuge, como forma de identificar todos
os cônjuges existentes no domicílio.
Fecundidade
• Data de nascimento do último filho tido nascido vivo, se este ainda vivia na data de
referência do Censo; mês e ano de falecimento deste filho caso ele tenha falecido.
• Total de filhos nascidos mortos, por sexo.
Deficiência
• Visão
• Audição
• Mobilidade
• Cognição
Mortalidade
Foi incluída no questionário básico uma pergunta sobre óbitos ocorridos no domicílio nos
últimos 12 meses anteriores à data de referência do Censo, por sexo e idade ao falecer. Espera-se,
com esta informação, obter um nível e um padrão de mortalidade para o Brasil e áreas geográficas
mais desagregadas, sendo possível compará-los aos registros administrativos.
Educação
• Alfabetização.
• Frequência à escola.
• Rede de ensino: pública e privada.
• Nível de instrução da população.
• Espécie do curso superior, mestrado ou doutorado concluído.
Trabalho
Deslocamento
Renda
A supervisão foi programada no computador de mão, de forma que cada setor era submeti-
do a até três pedidos de supervisão, dependendo:
• da situação do setor:
• urbano: 1 a 3 pedidos;
• rural: um pedido no final da coleta;
• dos indicadores gerenciais: resultados dos pedidos anteriores.
A supervisão é realizada por meio da aplicação de um questionário ao entrevistado (pessoa
que forneceu as informações), com perguntas-chave relacionadas a cada bloco do questionário, de
forma que sejam detectadas omissões de pessoas e/ou falhas no preenchimento do questionário.
Conclusão
Considerado um dos Censos mais ricos do mundo em termos de informações, o Censo De-
mográfico 2010 foi planejado de acordo com as recomendações internacionais, buscando a compa-
rabilidade com as informações coletadas nos outros países, mas sem abrir mão das questões espe-
cíficas para compreensão da realidade sociodemográfica do Brasil. Ainda assim, algumas questões
não puderam ser contempladas, ficando o IBGE com o compromisso de tratar esses assuntos em
pesquisas específicas, a exemplo do tema família e nupcialidade.
Além disso, o IBGE vem testando a implementação do SIPD (Sistema Integrado de Pesquisas
Domiciliares), que engloba a PNAD e a POF contínua, o que possibilita a abordagem de temas espe-
cíficos a partir da aplicação de suplementos, e ainda testando uma nova forma de censo, já imple-
mentada em outros países, que é a coleta contínua.
Tanto a PNAD contínua quanto os testes para um possível censo contínuo possibilitarão um
melhor planejamento do próximo Censo, de modo que contemple questões extremamente relevan-
tes para a compreensão da realidade brasileira nos municípios e áreas mais desagregadas.
71
Duas importantes inovações no questionário básico do Censo 2010 José Alberto M. de Carvalho
que estes são dirigidos, como única opção, aos residentes nos domicílios brasileiros em 2010, por-
tanto sobreviventes e não emigrantes internacionais.
Emigração internacional
3.01 – Alguma pessoa que morava com você(s) estava morando em outro país em 31 de julho de 2010?
Se sim,
3.02 – Nome
3.03 – Sexo
3.04 – Ano de nascimento
3.05 – Ano da última partida para morar em outro país
7.01 – De agosto de 2009 a julho de 2010, faleceu alguma pessoa que morava com você(s)?
Se sim,
7.02 – Nome
7.03 – Mês e ano de falecimento
7.04 – Sexo
7.05 – Idade ao falecer
Como as informações referem-se aos óbitos ocorridos em um período curto, recente e bem
definido, provavelmente os problemas nos dados dos óbitos declarados serão menores do que
aqueles apontados nos dados da emigração internacional, no que diz respeito à dupla contagem
e à não declaração. No entanto, no caso de mortes, não serão declaradas aquelas ocorridas entre
pessoas que não residiam em domicílios particulares, o que levará a uma subestimativa dos óbitos,
principalmente de pessoas idosas que moravam em domicílios coletivos.
Como a justificativa maior para a introdução dos quesitos sobre óbitos no questionário bá-
sico foi a premente necessidade de se conhecer o padrão da mortalidade no Brasil, desconhecido
principalmente nas idades avançadas, seria fundamental que se fizesse um estudo para se estimar,
por idade, o peso relativo dos óbitos que ocorrem nos domicílios coletivos. Com isso, se consegui-
riam elementos objetivos para corrigir a estrutura, por idade, dos óbitos declarados pelos residentes
dos domicílios particulares no Censo de 2010.
1
Provavelmente em função da discussão sobre a inclusão das famílias secundárias no déficit habitacional.
75
Considerações a respeito das informações sobre família no Censo 2010 Elisabete Doria Bilac
para a fecundidade, mas também para a identificação de alguns (mas não todos, como será visto
posteriormente) dos eventuais “núcleos reprodutivos” presentes, que não sejam o da pessoa respon-
sável pelo domicílio, isto é, outros casais, casais com filhos, grupos mãe/filhos.
Nupcialidade
Embora sejam duas instituições sociais distintas, casamento e família são complementares
e indissociáveis. Uma diz respeito ao princípio da aliança, a outra ao princípio da filiação. Portanto,
as demandas aqui colocadas dizem respeito à importância de se entender a nupcialidade para se
compreender a família.
Em nosso país, onde as uniões consensuais correspondiam a 28% do total no Censo 2000, o
Registro Civil em si mesmo não pode dar conta dos padrões de nupcialidade. Estudiosos da família
dependem fortemente do Censo, já que as pesquisas amostrais do próprio IBGE há 15 anos não co-
letam nenhuma informação sobre a natureza das uniões.
As questões do Censo 2010 retomam as três já existentes em 2000:
6.37 Vive em companhia de cônjuge ou companheiro(a)? Com três opções de respostas: 1 – vive; 2 – já
viveu; 3 – nunca viveu.
6.39 Qual é a natureza da união? Com quatro opções de resposta: 1 – casamento civil e religioso; 2 – só
casamento civil; 3 – só casamento religioso; 4 – união consensual.
6.40 Qual é o estado civil? Cujas opções são: 1 – casado(a); 2 – desquitado(a) ou separado(a) judicial-
mente; 3 – divorciado(a); 4 – viúvo; 5 – solteiro.
Mas, ao lado destas, apresenta-se como novidade o quesito 6.38: Nome do cônjuge ou
companheiro (a), que permite a identificação do cônjuge para mulheres cuja relação com o res-
ponsável pelo domicílio varia entre as posições de n. 04 a 19 e também para mulheres indígenas
em Terra Indígena. Da perspectiva da organização dos arranjos domésticos, esta questão supre em
parte a retirada do quesito sobre relação com o chefe da família, existente no Censo 2000 e que
possibilitava a identificação dos casais e respectiva prole, assim como de grupos mãe/filhos, pai/
filhos. A identificação dos cônjuges das mulheres residentes representa um segundo elemento a
contribuir para identificação de eventuais núcleos de reprodução que não sejam aquele do res-
ponsável pelo domicílio.
Se tomarmos como referência o Censo de 1991, já em 2000 houve uma grande redução
dos quesitos sobre nupcialidade que resultou desastrosa. Com as três questões restantes (feliz-
mente mantidas em 2010) não se pode ir muito longe: é possível estimar a distribuição e o volume
dos diferentes tipos de união, mas continuaremos sem saber nada sobre o número de uniões para
homens e mulheres ou a duração delas. Por exemplo, é real a menor duração das uniões consen-
suais em relação às legais? É verdade que algumas medidas podem ser estimadas indiretamente,
mas não se equivalem a ter o dado direto. Lamentavelmente, os quesitos do Censo de 1991 não
voltaram:
1. mês e ano de início da primeira união;
2. natureza da união atual/ última;
3. mês e ano de início da união atual;
4. total de uniões.
Estes dados seriam fundamentais para um maior avanço no estudo da nupcialidade e forne-
ceriam subsídios importantes para a análise da família, em particular daquelas reconstituídas, e da
formação dos domicílios de chefia feminina.
Nunca é demais enfatizar que o desconhecimento sobre os processos de reconstituição fa-
miliar compromete o conhecimento geral dos processos de transformação da família brasileira. Ao
não se separarem tais famílias daquelas de primeira união, estamos pintando um quadro de exces-
siva estabilidade da família conjugal, quadro este que o próprio senso comum coloca em dúvida.
Cabe lembrar ainda que os dados de nupcialidade são fundamentais para a recuperação das
trajetórias de vida (life course). Tais eventos fornecem marcações importantes para identificação da
quantidade e da duração das transições entre estágios nas carreiras contingentes dos indivíduos.
Infelizmente, o Censo fornece os marcadores da fecundidade e da mortalidade, mas não os mar-
cadores das uniões, que são fundamentais na reconstituição do life-course.
Um fato extremamente positivo é que a permanência da coleta da informação sobre o esta-
do civil (e não apenas o conjugal), no Censo 2000, possibilitará a elaboração de projeções de popu-
lação por estado civil, permitindo um melhor uso dos dados anuais do Registro Civil e, portanto, um
conhecimento um pouco melhor sobre a nupcialidade legal, a duração das uniões, as chances de
divórcio e de recasamento.
e as demais “secundárias”, sendo que tais domicílios correspondem a uma parcela inferior a 10% do
total nacional.
Primeiro, é preciso reconhecer a indiscutível validade do argumento de que a maioria das
“famílias conviventes” corresponde a uma única configuração familiar. Na verdade, considero que
as assim chamadas “conviventes de parentes” constituem um tipo particular de família ampliada ba-
seada na ocorrência de mais de um núcleo de reprodução. São famílias polinucleares. Portanto, o
conceito de famílias conviventes oculta a ocorrência de configurações familiares mais complexas,
reduzindo-as a várias famílias nucleares. Na contagem do número de famílias residentes em um mes-
mo domicílio, quando se emprega a variável relação com o chefe de família e não a relação com o
responsável pelo domicílio, esta concepção produz um claro viés, aumentando o número de famílias
em geral e, de modo particular, o número de famílias nucleares.
Contudo, reconhecer o equívoco conceitual não quer dizer abrir mão da contagem dos nú-
cleos de reprodução. Sem isto não é possível captar a real importância do parentesco para as famílias
brasileiras, uma vez que não se pode reconstruir a complexidade da configuração que é particular-
mente importante entre as famílias de chefia feminina. No Censo 2000, a identificação dos diferentes
núcleos das famílias polinucleadas era relativamente fácil, bastando combinar as variáveis número
da família (404) e relação com o chefe de família (403). Este foi o dilema trazido pela exclusão destas
variáveis no Censo 2010: como identificar estes núcleos? A maioria deles pode ser recuperada pela
combinação das seguintes variáveis:
• 5.01 a 5.03 Relação de parentesco ou de convivência com o chefe do domicílio −
importante para identificar a existência de parentesco entre os eventuais responsáveis
pelos demais núcleos e o responsável. O detalhamento desta questão permite, entre
outros aspectos, o aprofundamento da análise da ampliação vertical da família e se ela
ocorre do lado matrilinear ou patrilinear;
• 6.04 Tem mãe viva e 6.05 Nome – estabelecem relações de filiação existentes no
domicílio;
• 6.37 e 6.38 − estabelecem as relações de aliança.
Pela combinação, não muito fácil, entre estes quesitos, como se vê, podemos chegar à iden-
tificação de quem é mãe de quem, quem está unido a quem e verificar as relações de parentesco
com o responsável pelo domicílio.
Deve-se observar, porém, que há uma perda: em certos casos de paternidade solteira, é pra-
ticamente impossível identificar os membros de outro núcleo reprodutivo que não o do responsável.
Por exemplo, suponha-se a família apresentada no quadro a seguir.
Censo 2010
5.01 Nome do morador 5.02 Qual é a relação de parentesco ou de convivência com a pessoa 5.03 Nº ordem
responsável pelo domicílio?
O Censo 2000 teria trazido as seguintes informações para o mesmo grupo doméstico:
5.01 Nome do 5.02 Qual é a relação de parentesco 5.03 Nº ordem XXX Qual é a relação Nº da
morador ou de convivência com a pessoa de parentesco ou de família
responsável pelo domicílio? convivência com a
pessoa responsável pela
família?
CÓD. Relação com o responsável
No exemplo acima, enquanto no Censo 2000 a filiação do neto do responsável pelo domicílio
está perfeitamente identificada, no Censo 2010 não é possível identificá-la. A criança tanto pode ser
filha de um dos filhos homens do responsável, residentes no domicílio, quanto de uma filha ou filho
não residente. A resposta ao quesito 6.04 (tem mãe viva) seria, em todos os casos, uma alternativa
entre 02 e 04 e jamais 01( sim e mora neste domicílio).
Evidentemente, em termos quantitativos, esta perda deve ser mínima, mas gostaria de lem-
brar que já em um artigo de 2002,2 analisando de modo comparativo os dados das PNADs 1991 e
2
BERQUÓ, E. Perfil demográfico das famílias de chefias femininas no Brasil. In: BRUSCHINI, C.; UNBEHAUM, S. Gênero,
democracia e sociedade brasileira. São Paulo: Fundação Carlos Chagas e Editora 34, 2002, p.243-265.
1998, Berquó chamava a atenção para o fato de que, embora as famílias monoparentais masculinas
representassem em 1998 apenas 2,7% do total, tal percentual significa um aumento relativo de cerca
de 29% da paternidade sozinha em relação a 1991. Não teremos mais como captar sua ocorrência
quando este núcleo integrar, de forma subordinada, uma família ampliada polinuclear, dificultando
assim o acompanhamento de sua evolução.
Cabe lembrar ainda que, para a reconstituição destes núcleos, a complexidade do proces-
samento necessário é muito maior do que o exigido quando se dispunha das informações sobre a
relação com o chefe da família e o número da família.
Finalmente, do ponto de vista dos estudos de família de um modo geral, há que se lamentar
a perda da série histórica a partir de 1980 computada pelos quesitos excluídos.
Desse modo, todos os novos quesitos são extremamente interessantes e representam, em
vários aspectos, um avanço nos estudos de família. Mas a retirada das informações sobre a relação
com o chefe e o número da família não deixou de trazer certa desvantagem que as inovações intro-
duzidas não podem substituir completamente.
O contexto
85
Políticas e gestão das migrações internacionais Neide Lopes Patarra
Já na Declaração Universal dos Direitos Humanos encontra-se a garantia dos direitos dos
migrantes, embora se afirme a autonomia decisória do Estado a respeito de quem pode entrar ou
residir em seu território. Esta Declaração, em sua interpretação mais tradicional, serviria para regular
apenas a relação entre os Estados e seus cidadãos. Com o crescente reconhecimento do indivíduo
no campo internacional e o aumento do número de imigrantes no mundo, no entanto, tornou-se
cada vez mais frequente sua utilização como um parâmetro para regular as relações entre os Estados
receptores e os imigrantes.
Na série de Conferências Internacionais da ONU dos anos 1990, é na Conferência do Cairo
sobre População e Desenvolvimento que se explicitam as recomendações aos países para o delinea-
mento de programas e ações que tentem minimizar os conflitos entre países receptores e países ex-
pulsores. Já se identificam, aí, os ingredientes que compõem os baluartes das proposições que desde
então se colocam: associação entre migração internacional, pobreza e degradação ambiental; asso-
ciação com conflitos internacionais e regionais; e ancorar ações e programas em direitos humanos.
O primeiro organismo internacional a produzir uma legislação específica sobre as migrações
foi a Organização Internacional do Trabalho (OIT), que elaborou, em 1949, a Convenção sobre os
Trabalhadores Migrantes (n. 97) e, em 1975, a Convenção sobre os Trabalhadores Migrantes – dis-
posições complementares (n. 143). Os dois documentos recomendavam um esforço dos Estados
no sentido de divulgar informações que pudessem facilitar o processo de imigração e procuravam
garantir que os imigrantes recebessem o mesmo tratamento e tivessem os mesmos direitos que os
trabalhadores nacionais, independentemente de sua nacionalidade, raça, religião ou sexo. A grande
diferença da segunda Convenção, em relação à primeira, é a inclusão de artigos relacionados à ques-
tão da imigração ilegal e do tráfico de pessoas, bem como parágrafos relativos a direitos culturais.
Os direitos culturais são um dos pontos mais polêmicos das novas convenções sobre direi-
tos de imigrantes e de minorias, tanto em termos da legislação internacional como da doméstica.
Em sua definição mínima, direitos culturais são concebidos como aqueles que facilitam “a integra-
ção dos trabalhadores migrantes e suas famílias ao ambiente social dos Estados receptores sem
perda da sua identidade cultural” (ONU, 1990, p. 6). Esses direitos normalmente envolvem políticas
que visam a preservação da língua, da religião e de outros elementos da cultura dos grupos imi-
grantes. A partir dos anos 1960, com o fortalecimento da ideologia do multiculturalismo, também
cresceu a preocupação com os direitos culturais tanto de imigrantes como de outras minorias
autóctones. A discussão sobre os direitos culturais ocupa cada vez mais espaço nos debates in-
ternacionais e domésticos, pois lida com aspectos bastante controversos, como cultura nacional e
direito à diferença, entre outros.
As duas convenções da OIT têm uma baixa taxa de ratificação, principalmente a segunda (47
países, a primeira, e 23, a segunda). Nos dois casos, grandes países receptores de imigrantes estão
ausentes, como Austrália, Estados Unidos e França.
Em 1985, o Conselho Econômico e Social da ONU aprovou uma declaração na qual reconhe-
cia a necessidade de maior regulamentação internacional sobre o tema. Em 1990, após um longo
período de negociações, foi aprovada a Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de
todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias (18/12/1990), na assembleia ge-
ral da organização. Em 1993, a Convenção atingiu o número mínimo de ratificações necessário para
entrar em vigor, contudo, importantes países envolvidos nos fluxos migratórios contemporâneos
não são seus signatários.
A Convenção exige que os imigrantes legais sejam tratados no trabalho da mesma forma que
os nacionais, que sejam informados de seus direitos numa língua que eles entendam, que tenham
direito de recorrer ao Judiciário em caso de deportação e também estabelece regras para o recruta-
mento de estrangeiros. Um dos pontos mais controversos é o que exige que os trabalhadores imi-
grantes tenham seus direitos respeitados, independentemente da sua situação legal. Importantes
tópicos, como a migração familiar, foram deixados de lado pela Convenção, por falta de consenso.
É importante ainda destacar que a relação entre direitos humanos e migração também en-
volve a afirmação de um direito de não migrar, ou seja, ao indivíduo devem ser oferecidas condições
para que obtenha seu sustento e construa sua vida no seu país natal.
de capital importância nas negociações que levaram à assinatura de vários acordos no âmbito do
mercado comum, tais como o acordo de residência do Mercosul.
Destacam-se também os grandes esforços empreendidos pelo Ministério das Relações Exte-
riores (MRE), no sentido de capacitar a estrutura consular no atendimento e identificação dos brasi-
leiros residentes no exterior. Além disso, fica evidenciada a preocupação do governo brasileiro em
tratar mais adequadamente a questão da emigração internacional, por meio da inovação projetada
para o Censo Demográfico de 2010; pela primeira vez na história dos censos brasileiros houve um
conjunto de quesitos específicos para identificação de brasileiros residentes no exterior.
As políticas, ações e programas oficiais (do governo) voltados para essa questão vêm trans-
formando a antiga percepção do imigrante como ameaça à segurança nacional e ao trabalhador
nativo em uma postura de maior aceitação e de desenvolvimento de políticas ancoradas na ótica
dos direitos humanos consagrados internacionalmente. As esparsas resistências por parte de repre-
sentantes do governo vão paulatinamente escasseando e pode-se vislumbrar uma continuidade na
vida nacional em que já se incorporou o fato de o Brasil ser um país de emigração e de imigração. A
recente demanda nacional por trabalhadores estrangeiros qualificados e o expressivo aumento na
regularização e obtenção de vistos no âmbito do Ministério do Trabalho evidenciam as mudanças
ocorridas.
Por outro lado, o MRE procurou criar canais para ouvir a comunidade de brasileiros no exte-
rior e, neste aspecto, possuem especial importância a realização, na cidade do Rio de Janeiro, de três
conferências “Brasileiros no Mundo” e o apoio a iniciativas de debates locais sobre a situação dos bra-
sileiros em diversos países do mundo. Outro passo importante foi a criação do Conselho de Repre-
sentantes das Comunidades Brasileiras no Exterior, que será formado por conselheiros residentes no
exterior eleitos pelos seus pares. O Conselho tornou-se órgão consultivo do Itamarty nas questões
de interesse dos brasileiros no exterior.
Essa postura é nitidamente reforçada pelas tratativas do Mercosul e, mais recentemente, sob
a ótica da Unasul, que vem ganhando força em função da política externa brasileira, dos objetivos de
integração sul-americana e da crescente liderança do atual governo, no contexto de transformações
e novos alinhamentos no âmbito da América do Sul.
Muito se há de avançar, no entanto, no tratamento dos migrantes não documentados para
além da anistia e flexibilização de sua entrada entre os países do Mercosul e de sua ampliação no
âmbito da Unasul. Faz-se necessário reforçar, de imediato, medidas que permitam o acesso dos mi-
grantes e dos membros de suas famílias, principalmente, à escola pública e à saúde, o que é decidido
no nível das unidades da Federação e, muitas vezes, obstaculizado sob a argumentação da falta de
recursos humanos e instalações para essa extensão dos serviços públicos.
Em relação à saída de brasileiros, as autoridades nacionais voltadas ao tema manifestam-
-se muito favoráveis à emigração, apoiando e ampliando as atividades consulares e outras formas
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As migrações internacionais, no século XXI, adquirem, cada vez mais, papel importante no
cotidiano social, nos mercados de trabalho, nas sociedades de chegada e de partida, nos fluxos fi-
nanceiros e na mobilidade da força de trabalho (SASSEN, 1998), tornando-se a expressão social dos
processos recentes da divisão internacional do trabalho e de seus impactos territoriais.
As notas a seguir, pautadas nas primeiras reflexões e discussões da mesa redonda da Abep
2010, procuram focalizar o tema da cidadania para o enfrentamento dos desafios presentes na rela-
ção entre migrações internacionais e direitos humanos, baseando-se em conceitos de Hannah Aren-
dt para analisar o fenômeno social. Para Arendt (1987) “cidadania é o direito a ter direitos”.
As políticas para as migrações internacionais estão pautadas no processo de assimilação dos
imigrantes na sociedade receptora, no controle dessa população. Esse contingente somente passará
a ter direitos à medida que se “integrar”, se “assimilar” à sociedade de destino. Tais políticas seguem
estatutos de legalização e proteção jurídica a estrangeiros, concedendo, quando assim o fazem, di-
reitos restritos.
Nesse sentido, o conflito social emerge pela “não assimilação” dos contingentes imigrantes
nos moldes ditados pelas sociedades receptoras, tanto pelas especificidades das migrações interna-
cionais, quanto pela sua diversidade temporal e espacial. Nesse caso, pode-se usar a interpretação
de Laffer (1997, p. 57) acerca do pensamento de Hannah Arendt: “a ruptura no plano jurídico surge
quando a lógica do razoável que permeia a reflexão jurídica não consegue dar conta da não ra-
zoabilidade que caracteriza uma experiência como a totalitária. Esta não resultou de uma ameaça
externa, mas foi gerada no bojo da própria modernidade, como um desdobramento inesperado e
não-razoável de seus valores.”
O direito a ter direitos passa a ser buscado por outros caminhos. Como afirma Patarra (2006,
p. 12), “enfim, a questão migratória internacional ‘explodiu’ e sua governabilidade necessariamente
passa agora pelos movimentos sociais [...] daí o papel imprescindível dos movimentos sociais e ou-
tras vozes da sociedade civil organizada”.
93
Migrações internacionais e cidadania Rosana Baeninger
Essa possibilidade de mobilização nas migrações internacionais recentes parece ter seu ca-
minho nas redes sociais (MASSEY, 1993), que não só conectam lugares de origem e de destino – ge-
rando redes de informação – como também permitem a (re)criação de redes nos espaços sociais
dessa imigração nos países de destino.
Segundo Massey et al. (1990), as principais redes de relações sociais são aquelas formadas
por laços de parentesco, de amizade e de locais de origem, as quais possibilitam aos migrantes com-
partilharem experiências em locais diferentes daquele de origem; ao longo do tempo, tais experiên-
cias e as próprias redes adquirem novos significados e definições a partir de cada contexto migrató-
rio. Para Truzzi (2008), as redes sociais constituem elemento decisivo para prover informações.
Assim, a importância das redes nos processos migratórios se dá em razão da circulação de
informações e da confiabilidade dessas informações obtidas por meio de contatos e relações sociais
inseridas no processo migratório (MASSEY et al., 1990; TRUZZI, 2008). As distintas densidades entre
laços fortes e fracos (GRANOVETTER, 1973) também podem ser utilizadas para entender as informa-
ções que perpassam as redes migratórias: a confiabilidade das informações advindas de laços fortes.
Truzzi (2008) faz uma distinção entre redes sociais e redes migratórias, considerando que as
primeiras já existem anteriormente às redes migratórias e, por vezes, as alimentam. Os processos de
reconfigurações das redes ao longo do tempo, em que as velhas redes podem propiciar o surgimen-
to de novas (TILLY, 1990), são fundamentais para a formação dos espaços da migração.
De fato, Truzzi (2008) considera que, além do papel de ligação entre origem e destino, há
também uma função estratégica das redes na sociedade receptora, por meio de vínculos que se esta-
belecem no período de integração à nova sociedade, a partir de padrões residenciais, ocupacionais,
matrimoniais e das associações étnicas. “Não são apenas as redes de relações tecidas anteriormente
à emigração que desenharão os vínculos étnicos na sociedade receptora: a própria experiência mi-
gratória por si só é capaz de propor e redefinir novas identidades e reconhecimentos que podem se
traduzir em novas redes” (TRUZZI, 2008, p. 211).
Nesse sentido, dois elementos centrais de Arendt para os direitos humanos podem ser rela-
cionados com as redes sociais da imigração: o espaço público e o direito de associação. Na perspecti-
va da autora, o direito é fruto da convivência coletiva; o acesso ao espaço público garantirá o direito
de pertencer a uma comunidade política (ARENDT, 1987). Laffer (1997), analisando Arendt, conclui
que o espaço público, de um lado, é simultaneamente o comum e o visível – o que garante o direito
à informação – e, de outro, por se constituir na base do agir coletivo, gera o direito de associação.
Nessa perspectiva, as redes sociais presentes nos processos migratórios podem abrir possi-
bilidades de mobilização, do direito à associação, do direito à informação, criando mecanismos que
conduzam à garantia dos direitos humanos. Laffer (1997, p. 64) ressalta, contudo, que as comunida-
des políticas não geram poder, pois são resultado da ação; ou seja, o alcance à cidadania, mesmo
assim, parecer ser limitado.
Outro ponto a ser destacado de Arendt (1987) para os direitos humanos e migração inter-
nacional refere-se à transgressão da lei, a qual torna o indivíduo um criminoso, mas “somente como
transgressor da lei, é que se pode ser protegido pela Lei”. De fato, considerando as informações do
Núcleo de Assistência a Brasileiros no Exterior, do Ministério das Relações Exteriores, em 2009, “as
principais causas que motivam os brasileiros a procurar o NAB são detenção, desaparecimento, fa-
lecimento, repatriação e deportação. Essas cinco causas geram mais de 60% dos contatos com o
Núcleo”. Nos países da Europa e das Américas ocorre a maior parte dos atendimentos, o que reflete
as políticas mais severas de controle migratório, chamando atenção as causas do atendimento, todas
ligadas à criminalidade: a proteção ao imigrante somente passa a ser possível pela transgressão à lei.
Referências
Inicialmente, agradeço ao convite de Abep para participar deste evento. Como antropóloga
e assessora do Senado, me preocupei em elaborar uma apresentação que atendesse a expectativa
de um público de demógrafos, provavelmente com pouca paciência para antropólogos e com pou-
cas informações sobre o processo legislativo.
Abordarei brevemente duas temáticas que têm me ocupado nos últimos anos:
• o papel dos organismos internacionais na construção das pautas nacionais na área
migratória, especialmente no que se refere ao Tráfico de Seres Humanos – TSH;
• as complexidades das pautas construídas de dentro, com ênfase na Política Nacional
de Migrações e no Projeto de Lei da nova lei de migrações que tramita no Congresso
Nacional.
Em 2004, o Brasil ratificou o protocolo adicional à Convenção das Nações Unidas contra o
Crime Organizado Transnacional relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas,
em Especial Mulheres e Crianças, do qual era signatário desde 2000. Em 2006, foi criada a Política
Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. De 2008 a 2010, vigorou o I Plano Nacional de
Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (PNETP). Em função do compromisso internacional firmado e
das políticas instauradas, ocorreram mudanças na legislação, capacitaram-se operadores de direito
e de segurança pública, produziu-se uma quantidade significativa de estudos qualitativos, foram
realizadas operações policiais e o tema ganhou espaço na mídia e nas preocupações da sociedade
civil organizada.
O fato de o tráfico de pessoas ser uma categoria exógena e homogenizadora levou a questões
hermenêuticas complexas, desagradando tanto ativistas antitrabalho escravo – em função de a nova
pauta ter se sobreposto às já consolidadas ações e debates em torno do tema – quanto prostitutas e
trans – pelo fato de que, para elas, o enfrentamento ao tráfico acabou significando, muitas vezes, o
aumento da repressão de suas atividades no mercado do sexo.
97
As pautas externas e as pautas internas das migrações internacionais Marcia Sprandel
Também foi grande a mobilização da sociedade civil brasileira, desde a década de 1990, para
que o Brasil assinasse a Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Traba-
lhadores Migrantes e seus Familiares, aprovada pela ONU em 18 de dezembro de 1990. O Instituto
Migrações e Direitos Humanos (IMDH) e o Centro Scalabrininiano de Estudos Migratórios (CSEM)
vêm, desde 1994, lutando pela ratificação da Convenção. Apenas recentemente o governo brasileiro
retirou alguns senões colocados pelo Ministério da Justiça e a assinatura está em estudo na Casa Civil
da Presidência da República.
Mas também no plano das Nações Unidas, a temática do tráfico avançou muito mais rapida-
mente do que a das migrações internacionais. Basta examinarmos o informe do secretário geral das
Nações Unidas, de 2 de agosto de 2010 [preparatório para o Diálogo de Alto Nível, que acontecerá
em 2013], intitulado Migração Internacional e Desenvolvimento.
O conteúdo do documento revela a tentativa de reafirmação de uma pauta já antiga, qual
seja:
• continuar os esforços encaminhados para aproveitar os aspectos positivos da migração
internacional nos países de origem e evitar ou reduzir suas consequências negativas;
• garantir o respeito aos direitos humanos dos migrantes e promover um enfoque
baseado nos direitos na gestão da migração internacional.
Não é objetivo desse texto analisar os motivos de também externamente os documentos
internacionais da área criminal avançarem mais rapidamente do que aqueles que garantem a pro-
teção dos direitos do trabalhador migrante. Assim, passa-se a examinar um pouco as nossas pautas
internas na área migratória.
Após acalorados debates públicos e outros – talvez mais tensos – internos ao próprio gover-
no, foi enviado ao Congresso Nacional, em 20 de julho de 2009, um novo Projeto de Lei de migrações,
o PL n. 5.655, que objetiva substituir a lei do estrangeiro em vigor, que é da época da ditadura.
O Ministério do Trabalho e Emprego e o Conselho Nacional de Imigração avançaram na cons-
trução de uma política migratória brasileira, por meio de uma sequência de seminários e reuniões,
que resultaram no documento Política Nacional de Imigração e Proteção ao(a) Trabalhador(a) Mi-
grante, colocado para consulta pública no primeiro semestre de 2010.
O presidente da Republica, em junho de 2010, assinou o Decreto n. 7.214, que estabele-
ce princípios e diretrizes da política governamental para as comunidades de brasileiros no exterior,
institui as Conferências “Brasileiros no Mundo”, cria o Conselho de Representantes de Brasileiros no
Exterior (CRBE) e dá outras providências.
Portanto, se na área do TSH as coisas aconteceram rapidamente, foi apenas 13 anos após o
primeiro encontro de brasileiros no exterior, em Lisboa, que suas principais reivindicações parecem
ter sido realizadas ou pelo menos tematizadas.
A Política Nacional de Imigração e Proteção ao(a) Trabalhador(a) Migrante tem por finalidade
estabelecer princípios, diretrizes, estratégias e ações em relação aos fluxos migratórios internacio-
nais, com vistas a orientar as entidades e órgãos brasileiros na atuação vinculada ao fenômeno mi-
gratório, contribuir para a promoção e proteção dos direitos humanos dos migrantes e incrementar
os vínculos das migrações com o desenvolvimento.
Trata-se de um documento progressista, que encaminha ações concretas para compor um
Plano Nacional específico, entre as quais se destacam, para fins de nosso ambiente de pesquisa:
• produção de informações, estatísticas e estudos qualificados que apreendam as
especificidades do cotidiano dos(as) migrantes e das redes sociais de migração
envolvidas;
• realização de seminários para divulgação dos acordos do Mercosul e outros relacionados
nas áreas migratória, trabalhista e previdenciária, visando fortalecer a integração
regional e a garantia dos direitos dos nacionais dos Estados-Partes;
• organização e consolidação de base de conhecimentos, com disponibilização de acesso,
contemplando sistema de informações estatísticas e o conhecimento qualitativo
existente mediante pesquisas, documentos, legislações e normas jurídicas nacionais e
internacionais. Na estruturação do sistema de informações estatísticas, os dados devem
permitir a verificação quanto às dimensões de gênero, nacionalidade e outros fatores de
influência na vulnerabilidade dos(as) migrantes.
Finalmente, apresenta-se uma brevíssima pincelada na tramitação do PL n. 5.655, de 2009,
já que este projeto foi objeto de consulta pública e de tensões internas dentro do próprio governo.
A matéria enviada ao Congresso traduz estas tensões. Uma crítica de ativistas brasileiros na área das
migrações, publicada no Le Monde Diplomatique, faz parte de uma longuíssima trajetória, que, ao
que tudo indica, este projeto terá no Congresso Nacional. Tentativa anterior do presidente Fernando
Henrique Cardoso de modificar a legislação migratória ficou, salvo engano, 13 anos na Câmara dos
Deputados, onde recebeu dezenas de emendas e foi retirada, melancolicamente.
O PL n. 5.655/2009 – ao que tudo indica – vai pelo mesmo caminho. Apresentado em julho
de 2009, encontra-se, desde setembro do mesmo ano, parado na Comissão de Turismo e Desporto,
tendo como relator o deputado pernambucano Cadoca, que tem o mandato ligado à indústria turís-
tica do Carnaval pernambucano e nenhuma relação anterior com a temática das migrações.
Por que não anda? Poderíamos dar uma resposta rápida e pouco elaborada: imigrantes não
podem votar e brasileiros no exterior só votam para presidente da República. Haveria, nesse sentido,
pouca pressão política para que a matéria seja colocada em votação com mais celeridade.
Mas a questão é bem mais ampla. Teremos um embate político duro no Congresso Nacional.
O PL foi um consenso construído com dificuldades dentro do próprio governo e isto pode se traduzir
em ênfases maiores ou menores na agilidade de sua tramitação. Se o artigo do Le Mond Diplomatique
critica uma aparente esquizofrenia do governo, em que o PL n. 5.655/09 não seria a tradução jurídica
da Política Nacional de Imigração, pelo seu viés burocrático, tenho certeza absoluta de que inúmeros
parlamentares vão considerar esse Projeto de Lei excessivamente permissivo. Há um setor impor-
tante do Congresso Nacional, conservador, que ainda vê no estrangeiro uma ameaça à soberania
nacional e aos nossos empregos.
Daí a importância de que, além das associações de migrantes e seus órgãos de apoio, tam-
bém as associações acadêmicas participem do processo legislativo, lendo atentamente os projetos
afetos às suas áreas, enviando críticas e sugestões aos seus autores e relatores nas distintas comis-
sões por onde tramitam e participando de audiências públicas e seminários. É preciso conhecer o
funcionamento do processo legislativo, conhecer com profundidade o texto constitucional e dar-se
conta de nosso papel como agentes formuladores de políticas.
O Congresso Nacional faz, aprova e modifica leis. Muitas delas afetam diretamente nossos
universos de pesquisa. Criticar o Congresso é saudável, mas modificá-lo é tarefa mais difícil, pois
passa pelo desafio de saber como se dá seu funcionamento e como influenciá-lo.
Se, historicamente, as Constituições surgiram para ser uma alternativa à violência, hoje, mais
do que nunca, cumprem o papel de conciliar posições liberais, que defendem o indivíduo diante da
ação do Estado, bem como posições que defendem a inclusão de massas maiores da população no
mundo dos direitos. Desse confronto do individual e do coletivo são negociadas as novas leis que
regerão nossas vidas, inclusive na área migratória. Daí a importância de uma participação política
qualificada, e daí meu convite a todos para exercê-la.
Estas notas apresentam uma contribuição tentativa e exploratória ao debate sobre mudan-
ças climáticas e desenvolvimento, a partir da perspectiva populacional, com ênfase na urbanização.
O debate, muito focado no campo das relações internacionais, adquiriu grande centralidade na aca-
demia e na mídia, mas é ainda pouco disseminado entre as pessoas de forma geral.
105
Mudança climática e desenvolvimento Heloísa Soares de Moura Costa
O debate em torno das mudanças ambientais, inclusive climáticas, emerge hoje do interior
deste campo polarizado, tendo como base os princípios da modernização ecológica, segundo a qual
a internalização de critérios ambientais constitui elemento central para os setores de ponta do pro-
cesso de acumulação, privilegiando-se a tecnologia e a internalização/redução de custos ambientais
para enfrentar a escassez de recursos. Os marcos regulatórios concebidos pelos princípios da cha-
mada economia ecológica pautam-se pela noção de valoração econômica da natureza e operam a
partir da busca pelo consenso. A generalização do valor de troca dos chamados serviços ambientais
e o estabelecimento de medidas compensatórias por perdas de qualquer ordem, individuais ou co-
letivas, contribuem para naturalizar o consumo e a transformação da natureza em mercadoria como
fundamentos da sociedade contemporânea. A maior parte da legislação ambiental, urbanística e
social recente, inclusive aquela que resultou de expressiva mobilização social – Estatuto da Cidade,
Lei das Águas, entre outras –, incorpora tais princípios.
Já a crítica à ecologia política destaca a ênfase no valor de uso, reconhecendo o acesso à
natureza, à cultura e ao espaço como um direito essencial das pessoas e das coletividades. Buscando
a radicalidade original, retoma o questionamento ao modelo civilizatório – produção, reprodução
e consumo – gerador de conflitos em torno do controle e apropriação de recursos desigualmente
distribuídos. As lutas que se estabelecem a partir daí têm caráter de emancipação social e empode-
ramento. Observa-se na prática que as duas visões coexistem, tanto nas políticas ambientais como
na pesquisa e debates acadêmicos. O campo de debates sobre população, espaço e meio ambiente
da Abep transita por ambas.
A partir deste quadro conceitual cabe, portanto, pensar o debate internacional e local sobre
mudanças climáticas e sua relação com o processo de urbanização e as políticas públicas.
Sobre urbanização...
Longe de ser um processo homogêneo e genérico, como frequentemente aparece nos mo-
delos e é assumido nas modelagens de cenários futuros, a urbanização brasileira é essencialmente
desigual e excludente, materializando-se em diferentes formas e intensidades. Para a presente dis-
cussão, duas dimensões merecem destaque. De um lado há a desigualdade entre indivíduos, famí-
lias e grupos sociais envolvendo a desigualdade socioeconômica e cultural, de direitos e de poder,
nas formas de acesso à terra e à habitação, nas possibilidades de apropriação da cidade e de seus
atributos, nas oportunidades de trabalho e acesso a serviços, entre outras. De outro lado, existe a
desigualdade entre os lugares e a capacidade de seus governos em implementar políticas públicas,
inclusive planejamento: desigualdade na capacidade financeira, administrativa e política, desigual-
dade para atrair investimentos produtivos ou culturais, para lidar com as demandas urbanas e so-
ciais, para influir na disputa pela apropriação de recursos naturais e bens ambientais.
A percepção da urbanização como expressão destes tipos de desigualdade articula-se ao
debate sobre mudanças ambientais por meio de algumas mediações importantes: além do planeja-
mento e das políticas públicas, os estudos sobre vulnerabilidade, das pessoas e dos lugares, com sig-
nificativa trajetória na área de população, espaço e meio ambiente (HOGAN; MARANDOLA JR., 2009),
ressaltam as dimensões humanas dos processos de mudanças ambientais, tendo o clima como um
elemento visível unificador da compreensão de tais mudanças que atingem a todos, porém com
diferentes intensidades e consequências.
A urbanização aparece frequentemente no debate ambiental – e é replicada na discussão
sobre mudanças climáticas – como necessariamente insustentável, muitas vezes reduzida ao sim-
plificador e despolitizado conceito de ”impacto antrópico”. Além das evidências de consolidação da
chamada transição urbana no país, que nesta perspectiva o colocaria como generalizadamente in-
sustentável, cabe sempre resgatar visões mais virtuosas do processo de urbanização, como o lugar
do encontro, da cultura, da festa, das múltiplas possibilidades de inserção na vida social.
A urbanização é fruto de um processo de produção e apropriação social do espaço, no qual
interagem agentes sociais com interesses distintos e do qual resultam diferentes configurações so-
ciais e espaciais. No caso da urbanização brasileira, marcada pela relação centro/periferia, assiste-se
atualmente a uma redefinição de tendências de configuração espacial: às tradicionais concentração
da riqueza e dispersão da pobreza, típicas da formação das metrópoles e suas periferias precárias,
vêm se superpondo atualmente a dispersão da riqueza e o adensamento seletivo da pobreza. As
implicações socioambientais de tais mudanças ainda estão para ser mais bem avaliadas. Em qual-
quer caso a urbanização periférica em termos socioespaciais constitui a norma e não a exceção, o
que requer um giro ontológico e epistemológico nas formas tradicionais de pensar a urbanização, a
sustentabilidade e o planejamento
Questões e desafios...
Muitas das questões que emergem deste debate podem tanto apontar para novas direções
de pesquisa, como pautar a ação do poder público e da sociedade civil. Como os efeitos das mu-
danças ambientais afetam diferentemente as populações urbanas? De que formas compreender a
urbanização brasileira como essencialmente periférica, no sentido desenvolvido no texto, e socio-
espacialmente materializada de muitas formas como expressão da desigualdade social, que afeta o
debate geral sobre as mudanças climáticas? Como e o que incorporar enquanto medidas de mitiga-
ção e adaptação, para usar a terminologia dominante no debate? Como associá-las ao planejamento
urbano e ambiental contemporâneo? Alguns desafios podem ser apontados.
Para os estudiosos das mudanças climáticas, é imprescindível compreender a natureza da
urbanização (brasileira), a diversidade dos processos de produção e a apropriação do espaço e da
natureza, bem como a intensidade das mudanças no padrão demográfico atual, de forma a intro-
duzi-las nas modelagens de cenários e outros instrumentos analíticos utilizados. Aos estudiosos de
população e urbanização, planejadores e formuladores de políticas e movimentos sociais, cabe pen-
sar o futuro e a transformação social a partir de múltiplas perspectivas demográficas e espaciais
em escalas que variam do global ao local, incorporando a análise crítica das mudanças ambientais
como um elemento importante da realidade social, desta forma contribuindo para avançar no deba-
te contemporâneo sobre a sustentabilidade na periferia do capitalismo e, em especial no caso aqui
destacado, no contexto da urbanização brasileira.
Em termos dos processos políticos em curso nas duas últimas décadas, tal esforço implica
reforçar a construção e implementação de uma ordem jurídico-urbanística que reconheça e englobe
a totalidade da cidade, suas formas e representações, expressa pela conflituosa trajetória da matriz
da reforma urbana. Implica também a luta pela construção de uma regulação ambiental pautada na
noção de direitos coletivos à natureza como valor prioritário, que avance no desenvolvimento de
mecanismos de compensação – valoração e prestação de serviços ambientais –, inclusive reforçando
a dimensão das particularidades territoriais, porém sem sucumbir à ideia de que tudo é compensá-
vel e pode ser reduzido a um valor monetário. Trata-se, portanto, do esforço de reconhecimento de
um campo de ação na esfera socioambiental que abrange agentes sociais distintos com posições e
interesses em conflito atuando a partir de instrumentos e mecanismos técnicos e regulatórios – aná-
lises de impacto, planos diversos – e de instâncias de mediação – conselhos, conferências, audiências
públicas –, que precisam ser permanentemente problematizados de forma a cumprirem seu papel
de lócus de discussão e de formulação de políticas. Por fim, trata-se ainda de um esforço de constru-
ção de uma epistemologia que incorpore teoricamente este conjunto de questões, de forma crítica
e propositiva.
Referências
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periferia. In: HOGAN, D.; MARANDOLA Jr., E. (Orgs.). População e mudança climática: dimensões
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Campinas: Editora da Unicamp,1993.
PEET, R.; WATTS, M. (Eds.). Liberation ecologies. Environment, development, social movements.
New York: Routledge, 1996.
O tema mudança climática, que se tornou onipresente em todo o debate ambiental, toca os
estudos populacionais de forma muito direta, já que se encontra em seu seio a possibilidade de novos
malthusianismos. Tornar a população vilã de suas mazelas e, pior, das mazelas dos problemas ambien-
tais em escala global só é menos problemático do que ocultar sob um discurso macroestrutural nexos
causais e dados da realidade que revelam nuances da produção e distribuição de desigualdades.
Estou me referindo ao termo-chave escolhido para acompanhar a discussão sobre mudanças
climáticas: vulnerabilidade. Como todo termo que ganha rápida repercussão e é eleito como central
no tema da “moda”, vulnerabilidade se espalhou pelas páginas dos textos e cartilhas institucionais
internacionais, replicando-se definições, delimitações, componentes, índices, indicadores e tudo que
se pode imaginar. A mídia se apropriou do termo, as diferentes ciências e o jargão da gestão pública
também.
Há dois cuidados que devemos tomar diante deste cenário:
• não ceder a um senso comum acadêmico sobre os significados do termo, tomando-o
como uma tábua de salvação que a tudo explica, ou que a tudo resolve;
• não se furtar a uma reflexão detalhada e rigorosa sobre os sentidos do termo e,
principalmente, as consequências de sua adoção enquanto categoria analítica em
nossas pesquisas e na formulação de diretrizes ou das próprias políticas públicas.
Este segundo ponto é especialmente relevante no contexto das mudanças climáticas, já que
temos sido demandados e chamados a responder a uma sociedade sedenta por informações sobre
mudanças, impactos, perigos e, no jargão político atual (motivado pela bibliografia do Painel Inter-
governamental sobre as Mudanças Climáticas, IPCC), quem são e onde estão as populações mais
vulneráveis. Apesar da incerteza inerente à compreensão dos processos de risco e perigo, espera-se
que os cientistas sejam capazes de orientar de forma tecnicamente eficiente a aplicação de recursos
e de políticas públicas para mitigar e, quiçá, promover a adaptação diante dos cenários de mudanças
futuros que, a cada dia, se tornam mais presentes.
111
A retórica da vulnerabilidade e as mudanças climáticas Eduardo Marandola Jr.
Não vou discutir a pretensão desta expectativa, e quão mal preparados estamos, tanto o apa-
rato institucional quanto acadêmico, para responder a tais anseios. O que vou focalizar neste texto é,
digamos, um problema anterior, que penso estar na raiz de parte da profusão de discursos acerca da
mudança climática e dos perigos e riscos a ela associados: a retórica da perda que predomina e cerceia
a discussão sobre vulnerabilidade.
Essa retórica tem dois principais componentes, os quais irei desenvolver:
• um entendimento substancialmente negativo associado à vulnerabilidade, tornando
qualquer transformação em perda e, consequentemente, em vulnerabilidade;
• a contínua consideração da população como mero número, reflexo da insistência em
não se considerarem as heterogeneidades e resiliências ou capacidades adaptativas
acumuladas ou inerentes a contextos específicos, sejam estes demográficos, espaciais
ou ambientais.
Estes dois pontos precisam ser enfrentados se queremos nos desvencilhar deste discurso
monótono que domina a discussão sobre mudanças climáticas e suas vulnerabilidades, o qual limita
a questão da sustentabilidade e do desenvolvimento a simplesmente conseguir prever impactos e
promover a diminuição da vulnerabilidade pela adaptação.
A retórica da perda
Em favor da heterogeneidade
Para isso, precisamos olhar para os contextos em busca da heterogeneidade, procurando en-
tender as relações causais complexas que envolvem população, espaço e ambiente. Cada um destes
termos, no entanto, precisa ser “dissecado”, visto em sua diversidade constitutiva interna, senão não
escaparemos das simplificações retóricas.
População, por exemplo, continua, infelizmente, sendo vista como uma tábula rasa do nú-
mero. Se é verdade que população sempre esteve incluída na discussão de mudanças climáticas
(HOGAN, 2009), sempre o foi pela pressão e pelo absoluto, nunca pelas suas características internas.
Não é demais lembrar que, tão importante quanto ver as características próprias que ex-
põem a riscos, é entender quais estruturas familiares ou trajetórias permitem às pessoas responde-
rem a perigos específicos. Ou seja, além de falar apenas que idosos e crianças serão mais afetados
pelas mudanças climáticas, porque são mais vulneráveis aos extremos de temperatura e às doenças
a ela associadas, devemos nos perguntar quais os arranjos familiares que estão relacionados a este
tipo de urbanização dispersa e fragmentada que temos hoje, e que contribuem decisivamente para
as transformações no modo de vida, padrões de mobilidade e da produção e consumo do espaço?
Se já sabemos que a família mudou, que não vivemos mais com um casal progenitor e dois filhos,
como os novos arranjos contribuem para o enfrentamento dos perigos?
As trajetórias migratórias também constituem um tema fundamental que permite aprofun-
dar a dimensão populacional da equação. Se elas são mais fluidas, irregulares, envolvendo copre-
sença, idas e retornos, sazonalidades diversas, como isso opera enquanto recurso de proteção ou
de fuga? E quais os impactos para a produção e distribuição de perigos? Quais as repercussões nos
padrões de uso e ocupação do solo e na produção da própria cidade?
Precisamos fazer o mesmo exercício com o Espaço. Dizer onde não é incluir a dimensão espa-
cial. Espaço tem que ser desmembrado, entendido em suas diferentes profundidades e significados,
pois ele é tanto impedimento (resistência) quanto potencialidade (abertura).
Isso pode ser feito ao utilizarmos categorias espaciais que se referem a regiões de sentido
distintas. Lugar, território, paisagem e região são quatro das mais importantes. Para ficar em dois
exemplos, reflitamos sobre lugar e território.
Lugar é uma circunscrição, é um microcosmo que permite, a partir de um contexto de re-
lações, compreender uma realidade fenomênica que lhe anima (HOLZER, 1999). Isso significa que,
quando olhamos para lugares específicos, a dimensão espacial refere-se à copresença, mesmo que
de elementos de escalas superiores, naquele ponto específico. O espaço aparece como topologia
(relações de proximidade e distância – não euclidianas) que permite entender a disponibilidade e
acesso, bem como as memórias e características compartilhadas (MALPAS, 2009). Não se trata de
uma escala homogênea, mas o estar-junto opera como um amálgama que se constrói, ou não, ao
longo do tempo.
Diferentemente, território envolve relações de controle e poder, que não precisam ser ne-
cessariamente políticas ou econômicas. Controle se exerce também pelo conhecimento, pela fami-
liaridade. Pensar em termos de território possibilita identificar limites e fronteiras, processos, apro-
priações, disputas, relações de pertencimento e segurança. Diferente do lugar, territórios podem
ser areais (muito amplos) ou conjuntos articulados de lugares e itinerários (BONNEMAISON, 2002),
podendo ser sazonais, móveis, fluidos (HAESBAERT, 2004). Construir territorialidades é pré-requisito
para enfrentar perigos e por isso tanto lugar quanto território ajudam a compor a dimensão geográ-
fica e espacial da vulnerabilidade.
Por fim, Ambiente também precisa ser compreendido em sua diversidade interna e não como
uma palavra que é autoexplicativa. Fora a divisão mais grosseira (ambientes urbano, rural e natural),
precisamos de mais detalhes para dar conta da heterogeneidade e das especificidades que cada um
deles tem em expor ou permitir recursos para o enfrentamento de perigos.
Em termos de mudanças climáticas, o ambiente costeiro ganhou uma dimensão própria, de-
vido ao propalado risco de aumento do nível do mar. Ilhas e ambientes lacustres também ganharam
um lugar à parte. Mas notem que o que a mudança climática coloca atualmente é a potencialidade
de haver migração de ecossistemas. Em tese, o que pode ocorrer é que áreas de desertificação mi-
grem, que determinadas formações vegetais, muito dependentes do regime de chuvas e das tempe-
raturas, desapareçam ou desloquem-se alguns graus de latitude. Tão importante quanto pensar na
migração de pessoas (indo atrás de água, por exemplo), devemos pensar na adaptação dos muitos
que não se mudarão, mas terão seus ambientes alterados. Quais as implicações para a vulnerabilida-
de? Como se relacionar com este novo ambiente, que mudará no intervalo de duas gerações?
Longe de homogeneidade, portanto, ambiente, população e espaço permitem pensar as
mudanças climáticas e os perigos de forma viva e dinâmica, com articulações e construções de dife-
rentes escalas e dimensões.
Referências
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UNFPA, 2009, p. 29-52.
Watts, M. J.; Bohle, H.-G. The space of vulnerability: the causal structure of hunger and famine.
Progress in Human Geography, v. 17, n. 1, p. 43-67.
1
Na apresentação a autora mostrou ainda a aplicação do índice a partir de dados mais recentes, utilizando a Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios de 2008.
121
Uma análise comparativa do desenvolvimento socioeconômico... Cristiane Soares e Joanílio Rodolpho Teixeira
necessidades básicas – que se concentram no acesso aos serviços sociais para uma vida decente. Vale
destacar, no entanto, que as críticas sobre os índices de desenvolvimento não se restringem aos as-
pectos conceituais, abarcando, também, o contexto empírico e metodológico.
Um índice de desenvolvimento social, muitas vezes, é visto como uma medida arbitrária ou
subjetiva, devido à falta de uma definição objetiva e operacional. Mas sua construção e aplicação,
de modo geral, atende a uma visão mais simples, como a de avaliação do crescimento da renda per
capita, ou outras com abrangência mais ampla, incorporando não somente as características dos
domicílios e das pessoas, mas também aspectos ambientais, econômicos, políticos e institucionais.
Nesse sentido, uma das principais críticas apontadas é a escolha das dimensões. Entretanto, enfati-
zamos que a incorporação de um maior número de dimensões ou indicadores não necessariamente
produz um índice mais adequado ou melhor. Mas o aspecto mais importante é a definição de desen-
volvimento adotada, pois é nesse contexto que as políticas públicas vão atuar e um índice sintético
terá grande utilidade.
O índice de desenvolvimento social proposto é composto por cinco dimensões, cuja formu-
lação se aproxima mais da ideia de necessidades básicas ou mínimas, que são moradia em um local
fora de risco social, com condições básicas de saneamento, um nível de renda que garanta à família
sua manutenção, um nível de escolaridade mínima do chefe da família e ausência de defasagem
idade-série das crianças da família, evitando um círculo vicioso de atraso escolar. Além disso, para
garantir uma renda mínima, é necessário que os responsáveis pela família estejam ocupados e em
ocupações não precárias. Logo, as dimensões selecionadas foram: geográfica − proporção de pesso-
as que vivem em domicílios situados em favelas ou assemelhados (aglomerado subnormal); domi-
cílio − proporção de pessoas que vivem em domicílios com alguma das condições de saneamento
inadequada;2 educação − proporção de chefes de família com menos de quatro anos de estudo, ou
filhos, enteados ou netos com dois anos ou mais de defasagem escolar; rendimento − proporção de
pessoas com rendimento familiar per capita até ½ salário mínimo; e trabalho − proporção de chefes
desocupados ou com trabalho precário.3
No Nordeste, os valores dos subíndices registraram o seguinte ordenamento entre as dimen-
sões, da pior para a melhor: saneamento, renda, trabalho, educação e localização geográfica. Embora
vários estudos apontem que o maior problema da Região Nordeste esteja relacionado com a educa-
ção, é possível verificar que este é o segundo melhor aspecto, enquanto as condições de saneamen-
to afetam muito mais o baixo desenvolvimento da região. Em 2000, no Nordeste, 68,9% de pessoas
2
A condição de adequabilidade dos domicílios é dada pela existência em conjunto das seguintes características:
abastecimento de água por rede geral, esgotamento sanitário ligado à rede geral e coleta de lixo.
3
A definição de trabalho precário é dada pelo número de pessoas na situação de empregado sem rendimento ou
empregado sub-remunerado (remuneração inferior a um salário mínimo) ou subocupado (jornada inferior a 30 horas).
rios segundo o grau de importância de cada dimensão;4 e no último o peso foi atribuído de acordo
com o valor do R2 nas regressões de cada indicador em relação à variação do índice. O maior R2 obte-
ve peso 5 e o menor teve peso 1.
No Nordeste, dois índices apresentaram valores superiores ao índice da ONU. O ordenamen-
to proposto para atribuição dos pesos nestes dois casos não tem nenhuma relação que permita ex-
plicar porque o índice assumiu um valor tão elevado. Por outro lado, o índice 5 foi o que apresentou o
menor valor. Neste caso, é possível arriscar uma explicação, considerando-se que os indicadores que
receberam os maiores pesos – nas dimensões de saneamento e renda – são aqueles em que a popu-
lação nordestina é mais “vulnerável”. Verificou-se que no Nordeste as variações nos indicadores de
saneamento e educação registraram maior poder explicativo para as variações do índice, enquanto
no Sudeste isso ocorreu com os indicadores de renda e de trabalho. Em contraposição, no Nordeste,
o indicador de renda pouco contribuiu para variação do índice. Esses resultados indicam que no
Nordeste, embora a renda seja um dos maiores problemas da região, o desenvolvimento pode ser
melhorado pelos investimentos nas áreas de saneamento e educação. Acerca da atribuição de pesos,
o que fica claro nesta análise é que uma estrutura de ponderação pode enviesar os resultados, parti-
cularmente para regiões que apresentam os piores indicadores.
No que diz respeito à relação de causalidade entre desenvolvimento social e crescimento
econômico, do ponto de vista teórico, autores, como Sen (1999), enfatizam que essa é uma via de
mão dupla, em que a privação de capacidades pode estar fortemente relacionada com o baixo nível
de renda e esta, por sua vez, pode ser razão fundamental do analfabetismo, das más condições de
saúde, etc. Por outro lado, do ponto de vista empírico, autores como Mancero (2001) e Adelman e
Taft (1965) ressaltam que o impacto do crescimento da renda no índice de desenvolvimento social é
baixo, não importando a relação de causalidade. Esse estudo também mostrou a baixa sensibilidade
dos índices de desenvolvimento às variações na renda. No entanto, o aspecto importante a ser enfa-
tizado em estudos que procuram distinguir entre crescimento e desenvolvimento é a ideia de pro-
cesso de desenvolvimento com face humana.5 No Nordeste, as cidades com 30 a 50 mil habitantes
foram as que mais cresceram economicamente (13%), mas do ponto de vista social a maior variação
do índice proposto ocorreu nas cidades com população entre 100 mil e 200 mil habitantes.
4
Foram atribuídos pesos de 5 a 1 para as sequências de indicadores de acordo com a prioridade ou importância no índice
de desenvolvimento. As sequências de indicadores/dimensões para índices foram: 1) renda→educação→saneamento→
trabalho→favela; 2) trabalho→saneamento→educação→renda→favela; 3) favela→renda→educação→saneamento→
trabalho; 4) saneamento→renda→educação→ favela→trabalho; 5) trabalho→educação→saneamento→renda→favela;
6) educação→trabalho→renda→saneamento→favela; 7) trabalho→favela→educação→renda→saneamento e 8) sanea-
mento→educação→trabalho→favela→renda.
5
Essa ideia de desenvolvimento com face humana tem sido reforçada por alguns economistas como Bhaduri (2006) que
considera um processo de desenvolvimento com dignidade a busca pelo pleno emprego.
Referências
ADELMAN, I.; TAFT, C. A factor analysis of the interrelationship between social and political variables
and per capita gross national product. The Quarterly Journal of Economics, v. 79, n. 4, p. 555-578,
1965.
BHADURI, A. Desenvolvimento com dignidade – a busca do pleno emprego. Brasília: Thesaurus
Editora, 2006.
IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2008. Microdados.
IBGE. Censo Demográfico 1991 e 2000. Microdados.
O objetivo central desta exposição é tecer algumas reflexões sobre os impactos do processo
de desenvolvimento do Nordeste brasileiro sobre a sua dinâmica populacional, dando particular
ênfase ao mundo rural. Para tanto, o texto está dividido em três partes: desempenho recente da
economia nordestina; principais tendências demográficas do Nordeste, com ênfase na migração de
origem rural; e notas conclusivas.
127
Desenvolvimento regional e tendências demográficas Ivan Targino
Considerações finais
O fenômeno da postergação do início da vida reprodutiva vem sendo registrado, nas úl-
timas décadas, nos países mais desenvolvidos. Ao estudar a idade da mulher ao ter o primeiro
filho, Beets (2008) encontrou aumento de até cinco anos, entre 1970 e 2005, considerando tanto
os Estados Unidos como vários países europeus. São muitos os fatores envolvidos no adiamento
da reprodução.
A literatura, seja de orientação econômica ou sociocultural, traz evidências de que o nível
educacional, a orientação para a construção de uma carreira profissional (BECKER, 1991), as normas
sociais de gênero (LESTHAEGHE, 1995), bem como a qualidade da relação com o parceiro (RIJKEN;
LIEFBROER, 2009), afetam as intenções e o comportamento reprodutivo.
Nesse sentido, alguns autores apontam como um importante determinante deste adiamen-
to na reprodução o investimento em educação que as mulheres precisam fazer para competir no
mercado de trabalho (SOBOTKA, 2004; BILLARI et al., 2006).
Para além da reflexão sobre os novos e constantes investimentos das mulheres em educação
diante das exigências de um mercado de trabalho competitivo, Hoem et al. (2006) mostram a neces-
sidade de analisar esses determinantes a partir de um quadro institucional mais amplo, consideran-
do a relação entre educação, mercado de trabalho, Estado e família, e seu impacto na fecundidade.
Mais recentemente, as explicações acerca das baixas intenções de fecundidade, bem como
a postergação temporária ou definitiva da maternidade, têm se voltado para a dimensão de gênero
como elemento essencial para compreensão desse fenômeno. A desigualdade nas divisões do tra-
balho doméstico afeta particularmente as mulheres que já têm uma carga de trabalho pesada. Por
outro lado, contextos caracterizados por ausência de instituições que permitam que trabalho, ma-
ternidade e paternidade possam ser conciliados reforçam a divisão desigual do trabalho doméstico.
Nesse sentido, a equidade de gênero dentro e fora da família se coloca como elemento fundamental
para se compreender o fenômeno da reprodução tardia (MILL et al., 2008).
135
Algumas considerações sobre a reprodução tardia no Brasil Elza Berquó e Sandra Garcia
Além disso, nas sociedades modernas, a decisão de ter filhos pode ser precedida por um
longo processo de discussão e reflexão entre os parceiros, uma característica central dos indivíduos,
fruto de uma sociedade altamente reflexiva (GIDDEENS, 1991).
Em nosso meio, embora ainda não se disponha de estudos demográficos detalhados sobre a
reprodução tardia, há indícios de que ela começa a mostrar sinais mais acentuados entre as mulheres
das classes econômicas mais elevadas e com maior escolaridade.
A Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde – PNDS 2006 permite caracterizar, do ponto
de vista sociodemográfico, as mulheres com 30 anos ou mais de idade quanto ao comportamento
sexual e reprodutivo. Essa pesquisa possibilita, também, estudar as razões alegadas pelas mulheres
para não terem engravidado antes dos 30 anos e investigar suas percepções sobre as repercussões
em suas vidas, levando em conta esta decisão (BERQUÓ et al., 2008).
O propósito da presente apresentação é trazer alguns resultados da PNDS 2006 sobre repro-
dução tardia, no sentido de contribuir para a discussão da transição da fecundidade.
Resultados
Tabela 1
Distribuição das mulheres de 30 anos ou mais, segundo perfis sexuais e reprodutivos
Brasil − 2006
Tabela 2
Distribuição das mulheres de 30 anos ou mais, por perfil sexual e reprodutivo, segundo
características sociodemográficas
Brasil – 2006
Em porcentagem
Características sociodemográficas G1 G2 G3
Anos de estudo
0–4 12,9 13,3 31,2
5–8 12,3 15;7 31,1
9 ou mais 74,8 71,0 37,7
Classe econômica
DeE 16,7 13,2 29,3
C 43,2 36,1 46,0
AeB 40,0 50,7 24,7
Situação conjugal
Nunca se casou/uniu 44,9 5,0 2,3
Atualmente casada/unida 44,1 84,5 82,9
Atualmente não casada/unida 11,0 10,5 14,8
Cor
Negras 45,9 50,6 56,1
Brancas 54,1 49,4 43,9
Fonte: Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde – 2006.
Considerando-se apenas as mulheres que iniciaram a atividade sexual antes dos 30 anos, os
resultados mostram que, entre 1996 e 2006, a proporção das que não tiveram filhos nascidos vivos
antes dos 30 anos aumentou de 5,3% para 9,2%, e a daquelas que os tiveram com 30 anos ou mais
cresceu de 4,8% para 6,7%. Já o percentual daquelas que tiveram nascidos vivos antes dos 30 anos
diminuiu de 90% para 84%, no mesmo período.
Analisando as razões dadas pelas mulheres para não terem tido nascidos vivos antes dos 30
anos de idade, nota-se que o motivo “queria estudar e ter profissão” apresenta as maiores propor-
ções, seguido por “queria aproveitar a vida antes”. Entre aquelas que tiveram filhos após os 30 anos,
é mais baixo o percentual de respostas “não quis ter filhos”, claramente apontando para a recusa
circunstancial da maternidade e a sua posterior realização (Tabela 3).
Tabela 3
Proporção das mulheres com 30 anos ou mais que não tiveram filhos antes dos 30
anos, por perfil sexual e reprodutivo, segundo razões por não terem tido filhos
Brasil – 2006
Em porcentagem
Razões por não terem tido filhos nascidos vivos antes dos 30 anos (1) G1 G2
Queria estudar e ter profissão antes de ter filhos 63,6 66,5
Queria aproveitar a vida antes de ser mãe 56,8 58,0
Nunca quis ou ainda não quer ter filhos 52,3 28,1
Companheiro não quis ter filhos 6,4 8,8
Nunca se casou ou não teve parceiro com quem quisesse ter filhos 35,7 25,8
Medo da gravidez e do parto 28,2 25,9
Aborto espontâneo - 14,5
Aborto provocado - 3,9
Fonte: Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde – 2006.
(1) Respostas múltiplas e estimuladas.
Em relação à resposta “nunca se casou ou não teve parceiro com quem quisesse ter filhos”, os
percentuais obtidos foram também significativos, demonstrando que, para uma expressiva parcela
das mulheres, a maternidade não é entendida como desvinculada de uma união ou casamento e a
preexistência de um parceiro faz parte da expectativa de uma sequência de eventos na trajetória
de vida antes de ter um filho. Também são dignos de nota os percentuais de respostas de ambos os
grupos relacionados à recusa do parceiro, mostrando que há um processo de negociação e ajuste
entre os parceiros, em que os interesses de ambos devem ser considerados.
Finalmente, esses resultados sugerem que a entrada tardia na maternidade ou o adiamento
circunstancial desta é fruto não só do desejo de prolongar um período de formação educacional e
profissional, em função de objetivos mais urgentes, mas também de uma dada condição da juventu-
de que se coloca em oposição à condição de ser mãe e assumir responsabilidades irreversíveis. Nesse
sentido, a expressão “aproveitar a vida” engloba uma série de significados e expectativas com um
período certo para terminar. Entre as expectativas, certamente, a fase de intenso aprendizado sexual
e afetivo, próprio da juventude, é uma das mais significativas, bem como a falta de vinculação com
tudo aquilo que possa comprometer ou interromper esse processo.
A percepção das mulheres quanto às repercussões em suas vidas do adiamento da gravidez,
em geral, é bastante positiva: puderam “aproveitar a vida” e alcançar objetivos profissionais e adquirir
independência financeira e autonomia pessoal. Ou seja, foram exitosas no planejamento reproduti-
vo e nos seus propósitos. Entretanto, há uma parcela expressiva de mulheres que consideraram que
o adiamento da maternidade as levaram a uma condição biológica de dificuldade para concepção
(33%) e a uma frustração por não terem realizado a maternidade (17%). É possível que essas mulhe-
res sejam futuras demandantes e/ou usuárias de serviços de reprodução assistida.
Por outro lado, aquelas que realizaram a maternidade após os 30 anos expressaram alto per-
centual de confiança no exercício da maternidade. Talvez essa confiança não se manifestasse tão forte-
mente, se o processo de afirmação pessoal e profissional tivesse sido interrompido antes do planejado.
Referências
BEETS, G. An introduction: late fertility and determinants of postponement behaviour. Genus, Roma,
Universitá Degli Studi di Roma “La Sapienza”, v. LXIV, n. 3-4, p. 195:17-31, July-December 2008.
BECKER, G.S. A treatise on the family. (Rev. Ed.). Cambridge, MA: Harvard University Press, 1991.
BERQUÓ, E.; GARCIA, S.; LAGO, T. Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da
Mulher. Brasília: Ministério da Saúde, 2008 (Relatório Final). Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.
br/bvs/pnds/img/relatorio_final_pnds2006.pdf>. Acesso em: 2010.
BILLARI, F.C.; LIEFBROER, A. C.; PHILIPOV, D. The postponement of childbearing in Europe: driving
forces and implications. In: PHILIPOV, D.; LIEFBROER, A. C.; BILLARI, F. C. (Eds.). Postponement
A chamada teoria da segunda transição demográfica tem atraído a atenção dos demógrafos
em todo mundo, especialmente, mas não só, nos países avançados. A STD, como tem sido referida,
é candidata a substituir a velha teoria da transição demográfica, à luz da qual se tentou interpretar
os processos de redução da mortalidade e da fecundidade nos países europeus, ao longo de um
período de 300 anos encerrados na Segunda Guerra Mundial (BILLARI; LIEFBROER, 2004). Formulada
com uma elegância semelhante à primeira, a STD distinguir-se-ia pela preeminência atribuída às
mudanças valorativas como motor principal da persistência da fecundidade em níveis muito abaixo
daquele requerido para a reposição populacional, em grande parte do mundo desenvolvido, a partir
da última década do século XX.
Também na América Latina, especialistas tem encontrado nas proposições da STD hipóteses
para entender as mudanças sociodemográficas em curso e por vir na região. Curiosamente, porém, se
as formulações da velha teoria provocaram intenso debate na região nos idos anos 1970, a nova teoria
parece capaz de animar a pesquisa e colocar no centro do debate os processos de formação da família,
pouco atraentes sob a vigência do paradigma anterior (ROSERO-BIXBY et al., 2009; CABELLA, 2006).
Estas notas – apresentadas para discussão em mesa redonda no XVII Encontro da Abep – têm
por objetivo discutir em que medida a nova proposição seria capaz de oferecer respostas às inda-
gações que têm ocupado boa parte dos demógrafos, estimulados pelas inquietações acerca do que
nos reserva o futuro, caso sejam mantidos os padrões e tendências atuais. Se, no passado, a ameaça
da explosão demográfica, especialmente no chamado Terceiro Mundo, fez proliferar estudos e deba-
tes sobre a primeira transição demográfica, agora, o espectro da implosão populacional, que ronda
as sociedades pós-industriais do Ocidente e parece avançar por regiões da Ásia e das Américas, cons-
titui a motivação principal (Caldwell, 2008; Berquó, 1993).
A natureza do debate é delineada em uma primeira sessão para, em seguida, discutir os
aspectos que incomodam na construção da STD como teoria, tendo em vista sua capacidade de
141
A segunda transição demográfica: nova teoria ou mais do mesmo? Maria Coleta Oliveira
resposta aos desafios colocados pelas evidências disponíveis. Finalmente, são feitas algumas breves
observações acerca da pertinência da STD para a análise das tendências de comportamento em
curso na América Latina.
A ideia de uma segunda transição demográfica foi inicialmente lançada por Lesthaeghe e
van de Kaa (1986), um artigo muitas vezes referido, mas, infelizmente, em idioma ao qual não tenho
acesso. A tese e a exploração de sua sustentação empírica foram retomadas em inúmeros outros tra-
balhos conjuntos, em separado ou com novas parcerias intelectuais. O debate provocado, as reações
críticas e favoráveis estimulam uma intensa produção até os dias atuais.1
Sem pretender atribuir a estes ou àqueles autores afirmações específicas – destacadas e refe-
ridas no texto para efeitos de argumentação em alguns momentos – um dos supostos fundamentais
da formulação interpretativa é a persistência no tempo da fecundidade em níveis muito abaixo da
reposição, especialmente no continente europeu e em outros países avançados. Para seus defenso-
res, trata-se de um fato novo a demandar uma nova teoria explicativa. A novidade estaria, além disso,
no fato de a mudança de valores que caracteriza a STD ser significativamente distinta da que teria
levado ou estaria presente na transição demográfica clássica, ou TD.
Resumidamente, são colocadas em destaque as seguintes evidências ou elementos: mesmo
que a postergação da procriação explique parte da fecundidade muito baixa, esta não se recupera
nas idades mais avançadas, fazendo com que fecundidade abaixo do nível de reposição passe a ser
norma; da mesma forma, a contracepção se generaliza, em uma situação em que ter filhos torna-se
matéria de decisão. Outros elementos referem-se à nupcialidade: cresce a proporção de coabitação,
isto é, de uniões sem casamento, aumentando também os nascimentos fora do casamento, suposta-
mente em razão de diferentes fatores ideacionais, especialmente novas motivações para o controle
dos nascimentos.
Philippe Ariès é declaradamente uma das fontes de inspiração dos teóricos da STD. Em tra-
balho publicado em 1980, resultado de uma apresentação em um seminário organizado pela IUSSP,
Ariès propõe uma caracterização das mentalidades que teriam marcado o processo de declínio dos
nascimentos no Ocidente (ARIÈS, 1980). Segundo o autor, o primeiro período de declínio, convencio-
nalmente chamado de (primeira) transição demográfica, teria sido motivado por um desejo “altruís-
ta” dos adultos-pais em proporcionar a seus filhos um melhor padrão e melhores oportunidades de
1
A importância da STD se manifesta no destaque que tem sido dado à sua discussão nos congressos das associações
científicas. Exemplos são o congresso da European Association of Population Studies – EAPS de 2003, em Varsóvia, o da IUSSP
de 2009, em Marrakesh, e o da Abep de 2010, em Caxambu.
vida. Desta motivação teria decorrido a adoção crescente de práticas de contracepção, mesmo antes
do advento dos anticoncepcionais chamados de modernos, em particular as pílulas hormonais. Ter
poucos filhos para poder cuidá-los bem! Fiel à sua interpretação sobre a importância atribuída à
criança na conformação da vida privada na modernidade, Ariès (1962 e 1978) enfatiza o fato de que,
na primeira transição demográfica, a criança reina.
A esta motivação de tipo altruísta teria se seguido outra, em que a criança deixa de ser o cen-
tro da vida dos adultos. Seriam motivações de tipo “egoísta”, que privilegiam a perseguição da reali-
zação e do bem-estar de cada adulto, mulher ou homem (ARIÈS, 1980). A importância das mentalida-
des na história sustentada pela perspectiva deste importante especialista atraiu demógrafos de há
muito persuadidos pela força das ideias nas transformações sociais. Como afirma Dirk van de Kaa, em
trabalho em que relata o surgimento e a construção da noção da Segunda Transição Demográfica,
Eu não discordo severamente dos estudiosos que destacam as mudanças estruturais quando buscam
uma explicação para as tendências populacionais observadas desde a metade dos anos 1960. Mas, com
Ariès, sinto que há mais nas mentes das pessoas do que o que diz respeito ao bem-estar econômico,
renda e recursos materiais.
(...)
Parece-me decisivo o que as pessoas querem de suas vidas. Qual é o estado final que aspiram? Como
se veem como seres humanos? Vivem eles a vida de modo a alcançarem uma vida após a morte
eternamente feliz e alegre? Ou reconhecem apenas a vida presente, a ser vivida aqui e agora? (VAN DE
KAA, 2002, p. 24, tradução nossa).
Como raiz das mudanças valorativas e comportamentais que distinguem a STD estaria a
emergência de um novo ethos individualista, pautado pela busca de autonomia e autorrealização do
indivíduo, com aspirações voltadas para o bem-estar dos adultos e não dos filhos. Seria o advento
de uma era pós-materialista em que, uma vez satisfeitas as necessidades básicas de subsistência e
bem-estar material (necessidades de “primeira ordem”), adquirem preeminência necessidades de
“segunda ordem” ou aquelas que têm a ver com a autonomia individual e o reconhecimento pelos
outros.
formuladores iniciais da STD estariam relacionados à emergência de uma nova visão de mundo em
múltiplos âmbitos, como trabalho, religião, política, família e sexualidade. Interesses e objetivos de
autorrealização e emancipação individuais permeariam as escolhas, em sociedades em que a afluên-
cia teria libertado suas populações da insegurança econômica (VAN DE KAA, 2002).
Em trabalhos mais recentes especialmente, seus formuladores não negam o que chamam
de “background social” das mudanças ideacionais e de comportamento, porém, defendem um papel
de protagonismo para as mudanças ideacionais, que nem sempre se explicam por mudanças estru-
turais. Eles criticam os que sustentam a importância das estruturas por não darem importância aos
valores. Note-se que estrutura equivale, nesta concepção, a fatores econômicos (VAN DE KAA, 2002;
LESTHAEGHE, 2010).
Dimensões de gênero vão sendo reconhecidas como importantes ao longo da sucessão de
artigos, aparecendo creio que pela primeira vez em um artigo de 1995, ainda que sem um papel
central (LESTHAEGHE, 1995). Estas dimensões surgem sempre como parte das mudanças valorati-
vas ou suas consequências (ex: modelo do homem-provedor/mulher-dona de casa como, em certo
período, mais adequado às crenças morais, religiosas ou não).
Para Lesthaeghe, as diversas teorias que privilegiam esta ou aquela mudança valorativa são
complementares e não excludentes. O importante é que a STD seria uma manifestação pública da
autonomia individual. As pessoas querem mais da vida em geral, inclusive do ponto de vista do pa-
drão de consumo, e querem mais das suas relações interpessoais. Impõem-se a autorrealização e a
autossatisfação como necessidade, situação em que autoritarismo e assimetria nos papéis de gênero
não se encaixam mais. O autor fala de três revoluções, que resumiriam a revolução multifacetada que
teria trazido a STD: revolução contraceptiva, revolução sexual e revolução de gênero (LESTHAEGHE,
2010).
A pergunta que me faço é o que a STD acrescenta e qual sua capacidade de nos fazer enten-
der os processos de que trata? De um ponto de vista teórico mais geral no contexto da disciplina,
vejo mais uma continuidade do que uma ruptura. Em meu entender, como já expresso em outro
momento deste ensaio, a partir do grande Projeto sobre a Fecundidade Europeia (COALE; WATKINS,
1986), passaram a dominar o campo teórico da TD hipóteses que privilegiavam os fatores ideacionais
(CLELAND; WILSON, 1987). Na verdade, segue na STD a primazia das mudanças de valores sobre os
constrangimentos oriundos dos modos de vida, já presente nas formulações dominantes sobre a TD.
A STD aggiorna o discurso, mantendo a preeminência ideacional nos processos de mudança.
Meu problema com este tipo de visão é a insistência em uma oposição, clássica nas Ciências
Sociais, entre estrutura e “agência”, ou seja, entre os constrangimentos provenientes das formas de
organização das relações sociais (modos de vida) e a capacidade de as pessoas inovarem do ponto
de vista de motivações, desejos, objetivos, orientações valorativas, estilos de vida, etc. Ora, valo-
res e modos de vida não são duas realidades independentes. Parece-me um tour de force fazê-los
independentes, o que empobrece a teoria e sua capacidade de dar conta de processos complexos
como aqueles expressos nas tendências demográficas.
As concepções de gênero oferecem um bom exemplo do que tenho em mente. Concep-
ções não subsistem sem práticas sociais concretas e, muitas vezes, estas práticas se alteram antes
das concepções, como experimentações ou adaptações às circunstâncias. Outras vezes, valores são
difundidos e as pessoas aderem a eles “da boca pra fora”, isto é, estes novos valores nem sempre se
atualizam imediatamente em práticas na vida cotidiana, não alterando modos de vida. A difusão de
novos valores de igualdade de gênero não impede – como apontam diversos trabalhos menciona-
dos anteriormente – que contradições no sistema de gênero em algumas sociedades conduzam a
uma aparente recusa em reproduzir. Restrições operam apesar de desejos.
Essas observações remetem a um segundo aspecto que me incomoda na STD. Trata-se justa-
mente da ideia de que as pessoas se movem por desejos, livres de constrangimentos. Longe de mim
negar a importância dos desejos. Mas até a leitura deste último texto de Lesthaeghe, publicado em
2010, a impressão que sua insistência no individualismo como matriz moral da contemporaneidade
sempre me deu era a de pessoas e classes sociais movendo-se livres, leves e soltas, como se o mundo,
numa tendência evolucionista, caminhasse sempre para o melhor. Livres dos constrangimentos, as
pessoas buscariam satisfações de “segunda ordem”, de tipo pessoal, individual.
Esta sensação é compartilhada por Caldwell em seu trabalho de 2008. Citando Gellner (1992),
o autor afirma se preocupar quando o “mundo confortável do scholar bem sucedido ocupa o lugar
do duro mundo do lado de fora”, referindo-se às pessoas comuns, que lutam para fazer face ao tipo
de sociedade que a Revolução Industrial trouxe. Declara aproximar-se de Gellner, para quem a tarefa
do analista “deveria ser entender os constrangimentos coercitivos e econômicos na sociedade” (CAL-
DWELL, 2008, p. 443).
Na última versão publicada da STD de que tenho conhecimento, Lesthaghe (2010, p. 220)
reconhece que o processo de mudanças foi mais duro para uns do que para outros, respondendo a
críticas insistentemente feitas à suas formulações. Permanece, contudo, a suspeita – ou pelo menos
a curiosidade – de como incorporar as camadas sociais subalternas – os crescentes contingentes de
imigrantes nos países da Europa, por exemplo – ao modelo de um pós-modernismo burguês.2 Os
teóricos da STD, de modo geral, concordam que existem diferenças inter e intrassociedades, que
seriam explicadas por diferenças de background histórico e/ou cultural. Fatores desta natureza ex-
plicariam porque sociedades em que a coabitação sempre foi maior no passado tenderiam a ex-
perimentar uma elevação mais acentuada da coabitação na STD. Ou mesmo, porque pode haver
2
O termo “pós-modernismo burguês” foi usado por Dirk van de Kaa (2002) para marcar o fato de que a orientação de
tipo pós-materialista que visa a autorrealização não necessariamente envolve a consciência dos pressupostos filosóficos e
ideológicos da ideia de pós-modernidade.
aumento da coabitação sem que, ao mesmo tempo, se aceite a reprodução sem casamento, como
seria o caso do Japão. O movimento seria, no entanto, sempre na mesma direção e tenderia a acabar
no mesmo lugar.
A teoria não dá conta (talvez nem mesmo pretenda...) dessas diferenças. E, mais do que isso,
não oferece elementos de explicação para movimentos e contramovimentos no processo histórico,
que, como sabemos – e os teóricos da STD também o sabem –, existem.
Por exemplo, ao discutir se os diversos ingredientes demográficos da STD se comportariam
como um todo coeso, Lesthaeghe (2010, p. 243-244) afirma que múltiplas variantes da STD emergi-
ram. Segundo ele, não haveria qualquer requerimento de correspondência de tempo (time lags) e de
espaço entre padrões de coabitação e adiamento da fecundidade, os dois indicadores principais da
STD, juntamente com a fecundidade abaixo do nível de reposição.
Mas o autor afirma também que “os valores associados com a STD constituem um pacote
coeso no que se refere aos efeitos no adiamento da parentalidade, mas não no que diz respeito à
recuperação” (LESTHAEGHE, 2010, p. 244), isto é, quando há um movimento reverso de antecipação
ou de rejuvenescimento da parentalidade. Refere-se à maior simetria de gênero e melhores serviços,
capazes de reduzir os custos de oportunidade de ter filhos para mulheres que trabalham, como fa-
tores que parecem ser os mais importantes nas situações da STD em que há maior recuperação da
fecundidade e, portanto, maiores níveis de fecundidade de período.
Ora, o que podemos entender disso? Antes, para o adiamento da reprodução, os constrangi-
mentos não pesam, mas a recuperação da fecundidade depende de aliviarem-se os constrangimen-
tos? Dois pesos e duas medidas em uma só teoria? Ou uma visão que, por alguma razão, decidida-
mente joga fora a criança com a água do banho?
Outro exemplo semelhante aparece na discussão do caso dos países mais avançados da
Ásia: Japão, Coreia do Sul e Singapura. Lesthaeghe (2010, p. 244) afirma que dados ao nível micro
mostram “consistência com as orientações valorativas comumente encontradas nos países euro-
peus”. Do ponto de vista dos dados agregados, todas as características, exceto a procriação sem
casamento, estariam presentes. Ora, não estaríamos aqui diante de situações em que constran-
gimentos de natureza cultural operam no sentido de restringir algumas alternativas de compor-
tamento? Os constrangimentos, no meu modo de entender, não são apenas ou necessariamente
econômicos.
Esta é uma das questões que penso ser cada vez mais importante. Não minimizo os tais fato-
res culturais. Só não consigo percebê-los soltos no ar! Do meu ponto de vista, eles podem, em certa
medida, fazer parte de estruturas. É o caso de certas matrizes culturais que tendem a se manter,
ainda que sob o impacto de mudanças nos modos de vida e da difusão de novos valores. A ideia de
que fatores estruturais seriam apenas materiais ou econômicos está, digamos, ultrapassada, mesmo
entre linhas de pensamento que Lesthaeghe chamaria de neomarxistas.
É interessante que, com toda a sua visão sobre a mudança valorativa no Ocidente europeu
e em outras partes do mundo avançado, o próprio autor revele certo conservadorismo. Para ele, o
futuro que a STD nos reserva é meio que ameaçador: envelhecimento cada vez mais acentuado, com
pressão sobre o Estado de Bem-Estar; maior dependência da imigração internacional e de todos os
problemas do multiculturalismo daí decorrentes; menor ênfase na coesão social, posto que o indi-
víduo reina; e maior incidência de instabilidade familiar e problemas concomitantes, como pobreza
entre os solteiros e famílias monoparentais. E Lesthaeghe se pergunta se famílias instáveis seriam
um bom ambiente para a criação de filhos. Por famílias instáveis leiam-se uniões sem casamento,
casamentos que se desfazem, dissolução por via do divórcio, etc. Ora, se este for um novo padrão
que veio para ficar e envolver maiorias da população, alguma solução terá que ser encontrada pelas
sociedades e provavelmente mudará a maneira de se criarem filhos. Não há porque manter o padrão
de avaliação (moral) do scholar bem-sucedido, como diria Caldwell. Não vejo como o fim do mundo!
Antes de prosseguir e finalizar, devo dizer que, revisando os trabalhos de ambos os autores
até onde pude avançar, encontrei em Lesthaeghe (2010) alguma flexibilização em sua maneira de
ver as mudanças. Especificamente, constrangimentos originados em concepções e práticas de gê-
nero são reconhecidos como eficazes para além da ideia da “revolução de gênero”. Contudo, persiste
a insistência na determinação pelas ideias, à custa de contradições como a apontada na análise de
casos de recuperação de níveis de fecundidade em países avançados.
nas camadas mais educadas (Oliveira; Marcondes, 2004; Guedes, 2006). Contudo, estes estu-
dos chamam a atenção para os conflitos em que se veem envolvidas as várias gerações femininas,
especialmente as mais jovens, entre seu papel de mães e seus interesses e necessidade de trabalhar
e seguirem carreiras profissionais.
Na verdade, já havia evidências das pressões sobre as mulheres a partir das alterações nos re-
gimes de trabalho mesmo agrícola, na segunda metade do século XX no Brasil (Oliveira, 2009), ainda
que se tratasse de mulheres com mais baixa escolaridade e envolvidas em trabalho manual. O regime
de trabalho em que um salário é pago em troca de jornadas contínuas, com penalidades para quem
não as cumpre, coloca constrangimentos ao desempenho de tarefas reprodutivas por parte das mulhe-
res. A questão é como as mulheres e o conjunto da sociedade respondem a esses constrangimentos.
A queda acentuada da fecundidade em período recente revela que certamente encontram-
-se em curso mudanças no significado dos filhos. As diferenças de fecundidade segundo nível de
instrução, já tratadas com base nos censos demográficos (Guedes, 2006), são reiteradas a partir dos
resultados da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher – PNDS-2006. Em
2006, enquanto a Taxa de Fecundidade Total para aquelas sem instrução alcançava quatro filhos por
mulher, as mulheres com escolaridade mínima de nove anos apresentavam valor pouco abaixo de
1,6 (Ministério da Saúde, 2008).
Acho difícil, porém, em sociedades muito desiguais e com um mix significativo de origens
culturais, encontrar compatibilidade com uma teoria como a da STD. Incorreríamos no risco a que
Caldwell se refere, de substituir a luta das pessoas no mundo que hoje se apresenta a elas pela visão
de especialistas bem-sucedidos!
Referências
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publications/VYPR2004/VYPR2004.shtml>.
Brazil, in the first decade of the third millennium, has joined the league of low-fertility
countries: total fertility is now below replacement level, and still falling. However, the meaning of
low fertility, is not evident as demographers believe. When discussing “low fertility”, we have to
ask ourselves: “low fertility, for whom?” Answers may differ, depending on the view point of the
individual, or subject, or party. Here are a few examples:
1) in the case of an individual, a couple, a family: “low fertility” means less children than
expected: ideals, preferences or expectations are being frustrated;
2) in the case of a clan, or a group: “low fertility” means that strategies, scopes or targets
are thwarted;
3) for populations, states: “low fertility” is linked to the fact that diseconomies might be
generated by the current fertility level;
4) for demographers: “Low fertility” is straightforward: any instance when R(0) < 1.
In case 1), 2) and 3), the concept of “low fertility” depends on the nature of the subject, or
group, or institution, as well as the circumstances in which the judgement is made. Therefore the
level of “low fertility” may change from subject to subject and from time to time.
1
From Webester’s Dictionary (Webster’s Seventh New Collegiate Dictionary, Merriam, Springfield, MA, 1971):
Fertile: “producing or bearing fruits in great quantity. Fertility implies the power to reproduce in kind, or to assist in repro-
duction and growth.
Reproduction: “The act or process of reproducing; Reproduction implies an exact or close imitation of an existing thing”
Replacement: “implies a filling of a place once occupied by something lost, destroyed or not longer usable or adequate”
151
Some considerations around the concept of low fertility Massimo Livi-Bacci
Graph 1 shows the relation between the “personal ideal” mean number of children of people
aged 20 to 39, interviewed in 2006, in 15 European countries, and the actual mean number of children
of the cohort born in the early ‘60s. In all countries (except one) the “actual” progeny is lower than the
“ideal” by a fraction comprised between .3 and .8. We can infer than in Europe fertility is “low” almost
everywhere if we follow the demographer’s definition (R(0) < 0), but it is also “low” in terms of the
individual’s opinion and perception.
Graph 1
Actual TFR (cohort late 60s) andpersonal ideal 25-39 (2006)
was plenty, needed high fertility, a large progeny and abundant manpower. An abundant offspring
would also generate manpower surpluses and new migrating waves into adjoining territories,
perpetuating the migration push. There are historical examples such as the Neolithic demic diffusion
(the diffusion of agriculture as the consequence of gradual expansion of agriculturalists into new
land); or the medieval German migration in the sparsely populated lowlands on the east (Drang
nach Osten); or the westward expansion of the American frontier in the XIX century. Adaptation
and success of migrants was linked to a high level of reproduction. On the contrary, in the urban and
industrial setting of the XIX and XX century – migrants fitness was enhanced by small families and
low reproduction, permitting mobility, flexibility and adaptability.
The demographer
For demographers, low fertility is the fertility that, in the long run (in a stable state), leads to
a decline of the population (to a negative intrinsic rate of increase). Graph 2 shows the “isogrowth”
curve corresponding to r=0 (each point of the curve represents a combination of E(0) and TFR giving
an intrinsic rate of growth equal to zero). The “oval” spaces show the “territory” of past and present
populations with reference to fertility and survival: populations falling below the line have “low
fertility” (even if TFR is 5 or more).
Graph 2
TFT and E(0), r = 0
2
The data are the estimates derived from: United Nations, World Population Prospects. The 2008 Revision.
much the same in developed and developing environments) that change gradually in time. Countries
with the same “combination” of factors have very much the same survival. It is therefore difficult to
“catch up” delays and narrow gaps. For fertility it is a different story: culture, policies, preferences are
less stable and widely different situations may yield the same outcomes.
Figure 1
Brazil and average of 6 major developed countries (US, Jap, UK, Ger, Ita, Fr)
Graph 3
E(0) and TFR, 1950-55 to 2005-10,7 Latin American Countries
(Br, Ar, Ch, Co, Mex, Pe, Ve)
There are no reasons to believe that low fertility is forever, as many tend to assume. It is
reasonable to assume that given the high survival now prevailing, fertility may remain at moderate
levels (i.e., TFR below 3). But this does not rule out the possibility of long term cycles, with phases well
above replacement. Figure 2 summarizes the patterns of the western baby boom that determined a
consistent rise of fertility from a minimum occurring in the cohorts born at the beginning of the XX
century and a relative maximum of the cohorts born around 1930.
Figure 2
Western Baby Boom, XXth CenturyCohort TFR [Festy, 1979]
A Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) inaugurou um novo momento legislativo no Brasil,
ao romper com o tradicional tratamento legal dado aos casos de violência doméstica contra mulhe-
res. Até a edição da Lei, os crimes de violência doméstica eram tratados como de menor potencial
ofensivo1 e, por isso, os processos eram massivamente arquivados (CAMPOS, 2001) ou tinham como
pena a “cesta básica”. Essa concepção legal e tratamento jurídico dados aos casos de violência domés-
tica foram fortemente criticados por feministas (CAMPOS, 2001; 2003; 2006; BARSTED, 2011) e está na
base da formulação do anteprojeto da Lei Maria da Penha.
A nova concepção legislativa é, portanto, consequência do processo de criação da Lei. Surgida
a partir da proposição de um consórcio de ONGs (BARSTED, 2011; MATOS e CORTES, 2011), contou
com a participação da sociedade civil e do governo, do movimento de mulheres, do Fórum Nacional de
Juízes dos Juizados Especiais Criminais (Fonage) (LAVIGNE, 2011), do governo federal, a partir do Grupo
Interministerial e da Secretaria de Política para as Mulheres, além de outros interessados. A ampla par-
ticipação da sociedade civil nos debates que antecederam a aprovação da Lei conforma esse processo
como um dos mais democráticos na elaboração normativa do país.
A proposta da nova Lei desconstituiu juridicamente a concepção de delito de menor potencial,
ao retirar os crimes praticados com violência doméstica e familiar da competência da Lei n. 9.099/95,
impedindo, também, que os institutos despenalizantes (conciliação, transação penal e suspensão con-
dicional do processo) fossem aplicados. Ao afastar a competência dos Juizados Especiais Criminais, a
Lei rejeitou, ainda, a exigência de representação nos casos de lesão corporal de natureza leve, introdu-
zida pela Lei n. 9.099/1995.
1
Os crimes de menor potencial ofensivo são tratados pela Lei n. 9.099/1995.
159
Lei Maria da Penha: tensões entre o público e o privado Carmen Hein de Campos
2
HC 113.608-MG, Rel. Originário Min. Og. Fernandes. Rel. para o acórdão, Min. Celso Limongi (desembargador convocado
do TJ/SP), julgado em 05/03/2009.
3
Embargos infringentes em Apelação Criminal – Detenção e multa – n. 2010.022883-6/0001-00. Relator: desembargador
Dorival Moreira Santos, TJMS, 05/04/2011.
4
O Supremo Tribunal Federal decidiu que, nos casos de violência doméstica, é constitucional o artigo 41 da Lei 11.340/2006
e inaplicável a suspensão condicional do processo, independentemente da pena aplicada. Ora, se é inaplicável a suspensão
condicional do processo, é absolutamente inaplicável o princípio da bagatela.
como as do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, que, sob o pretexto de defender uma abstrata
família, negam concretude aos direitos individuais das mulheres e eficácia à Lei Maria da Penha.
Referências
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Janeiro, 2011, no prelo.
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CAMPOS, C. H.; CARVALHO, S. Violência doméstica e Juizados Especiais Criminais: análise a partir do
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LAVIGNE, R. M. R. Caso Fonaje: o ativismo de juízes integrantes do Fórum Nacional dos Juizados
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MATOS, M. C.; CORTES, I. O processo de criação, aprovação e implementação da Lei Maria da
Penha. Rio de Janeiro, 2011, no prelo.
163
Notas soltas sobre o mundo privado e os gêneros Maria Coleta Oliveira
sentia-se visceralmente ligado à sua filha. Ou seja, sentia-se como se tivesse gestado sua filha. A dis-
cussão é acirrada, expondo as contradições de certo período do debate feminista.
De outro ângulo, o corpo feminino como lócus de poder da mulher também fez e faz par-
te do repertório do feminismo. As mulheres podem decidir sobre seu corpo e mesmo os desejos
masculinos têm que passar pela decisão delas, pelo menos até agora. O que chama a atenção para
efeitos do que vimos discutindo é que o poder feminino pode ser visto nesse debate como originado
na biologia da maternidade. Mas não na prática social da maternidade ou da paternidade. Colocado
nestes termos, os poderes dos gêneros, como já sabemos, não são passíveis de desconstrução.
Mas este “poder feminino” parece ter sido pouco discutido no contexto das relações de gêne-
ro no mundo privado. A tônica das análises da perspectiva de gênero foi a da ausência de poder por
parte das mulheres, pelas razões que acabo de mencionar. É significativo que tenhamos cunhado o
termo empowerment ou empoderamento para tratar de ações que visam fazer com que as mulheres
passem a ter poder e mesmo que busquemos construir indicadores que expressem o poder femini-
no. Alguns dos indicadores frequentemente utilizados são a liberdade de movimento extradomésti-
co das mulheres, do ir e vir livre da vigilância de outros; a participação na tomada de decisão sobre a
alocação de recursos familiares ou a liberdade de uso da totalidade ou de parte dos rendimentos ob-
tidos eventualmente com seu trabalho; o próprio trabalho das mulheres, quando remunerado e fora
de casa, entre outros. Mais recentemente tem sido utilizada como proxy a diferença de idade entre os
parceiros, na suposição de que mulheres jovens, com parceiros mais velhos, teriam menos poder. Em
matéria de saúde reprodutiva há também indicadores que se referem a decisões e/ou capacidade de
negociação acerca da contracepção e da proteção contra DSTs, por exemplo.
Creio que haveria muito que caminhar no sentido de entendermos melhor os poderes femi-
ninos. Não estou segura se as mulheres estariam prontas a perder espaços de poder em um universo
– o doméstico – em que reinamos incontestes. Temos criticado este fato (do confinamento ao lar à
dupla jornada), mais do que refletido sobre suas implicações.
Recentemente, relendo um trabalho de Claudia Fonseca, antropóloga capaz de contraditar o
que se tem como assentado, pensei no viés que por vezes introduzimos em nossos trabalhos quan-
do tratamos da subordinação feminina. Confrontada com a superioridade financeira dos homens de
classe popular nas periferias de Porto Alegre, Fonseca (1987) perguntou-se se este fato dever-se-ia
ao contexto econômico (mercado de trabalho, etc.) ou a uma configuração cultural particular em
que a mulher, querendo trabalhar fora, carece de qualquer encorajamento. A autora constatou que
a mulher que sustenta marido e filhos com seu próprio trabalho só tem a perder. O olhar arguto de
Fonseca revela que, para as mulheres, trabalhar em troca de remuneração carregava duas implica-
ções: enfrentar uma dupla jornada, em casa e fora de casa; e liberar os companheiros do encargo do
provimento da família. Segundo relatos das mulheres, além de terem que despender seus ganhos
com o sustento da casa, elas continuariam responsáveis por todo o serviço doméstico e seus maridos
se tornariam ainda mais exigentes, ressentidos com a afronta à honra masculina representada pela
independência econômica de suas companheiras. O emprego remunerado feminino não aumenta
o status da mulher dentro de casa nessas camadas, na época do estudo. Pelo contrário, mancha a
imagem pública do marido que, envergonhado, faz a mulher pagar por sua vergonha. Além disso,
ao aliviar a responsabilidade do marido de sustentar os filhos do casal – a principal responsabilidade
que liga os dois –, o trabalho remunerado feminino abriria uma brecha para o investimento masculi-
no em outros laços afetivos fora de casa.
Essa releitura me fez lembrar o quanto me incomodavam as imagens sobre a família no Brasil
trazidas por estudos dos anos 1950, em que as mulheres eram sempre personagens passivos, depen-
dentes, até mesmo de certa forma reclusas no mundo da casa. Ou as descrições dos estudiosos da
arquitetura brasileira no período colonial, por exemplo, que explicam a distribuição dos cômodos
da casa (casa bandeirista, casas mineiras, etc.) como dispondo de um cômodo-sala frontal, aberto ao
exterior – onde as visitas ou estranhos eram recebidos –, seguido por uma porta que dava acesso à
parte destinada à convivência da família e definidora dos limites para a circulação feminina.
Estas imagens não batiam com certas histórias femininas, mencionadas em relatos ou mes-
mo contadas com alguma frequência a filhos e netos como parte de um folclore familiar. E não ape-
nas nas camadas mais abastadas. Relatos que davam conta de viúvas que tocaram com eficiência
os negócios do falecido e também relatos sobre a frequência da troca de parceiros por parte de
mulheres de camadas populares, muitas vezes tidas como “deixadas” por seus parceiros, mas hábeis
em formarem um novo par.
Uma das questões que ficam destas aparentes contradições é o quanto aplainamos a realida-
de quando pensamos em indicadores de gênero enquanto relações de poder no âmbito privado. O
quanto nossas teorias achatam a realidade, tirando-lhe as nuances contextuais e impondo parâme-
tros que, pelo menos em dado momento, não fazem parte dela.
De outra parte, em minha própria experiência de pesquisa em áreas urbanas com camadas
médias e populares, ao lado das queixas das mulheres sobre o que seus parceiros deixam de fazer ou
se negam a fazer, vem também o comentário cultural de que “homem em casa só atrapalha”. Uso esta
expressão dos antropólogos – comentário cultural – porque é muitas vezes na conversa informal que
são expressos valores e concepções que revelam dimensões fundamentais da cultura. Embora se
trate de universos sociais distintos, em ambos encontrei também outro tipo de comentário cultural,
o de que os homens não cuidam das crianças como as mulheres cuidam, que não sabem brincar
com os pequenos ou não são atentos ao que se passa com eles quando se encarregam de olhar ou
tomar-lhes conta, etc.
Estes tipos de comentários têm por objeto diferenças entre o feminino e o masculino que
refletem aprendizados de gênero diferentes. Apesar de frequentemente naturalizadas, não há nada
que assegure não serem passíveis de mudanças. O que interessa aqui chamar a atenção, contudo, é
o fato de revelarem também um espaço de poder feminino. A casa e o cuidado infantil seriam esferas
em que as mulheres podem mais e melhor. O preço é, sabemos, a sobrecarga das mulheres, de que
tanto se falou no passado recente e voltamos a tratar hoje: a questão das duplas e triplas jornadas
femininas.
Porém, agora, o tema é construído de outra forma. De um lado, o incremento da inserção
feminina nos mercados de trabalho por toda parte tem colocado em questão a chamada conciliação
entre reprodução (aí incluídas as tarefas de cuidado) e trabalho. O que está em questão é o cuida-
do, as tarefas de cuidado dos outros – de crianças e idosos – que se encontram mais a cargo das
mulheres do que dos homens. O Estado e o mercado estão sendo pressionados ou estimulados a
ampliarem a oferta de instituições de cuidado infantil na fase pré-escolar; jornadas flexíveis têm sido
propostas e por vezes implantadas por empresas, especialmente no setor de serviços, tendo como
público-alvo as trabalhadoras com filhos pequenos; várias alternativas de arranjos residenciais para
idosos têm sido experimentadas desde muito tempo nos países com populações mais envelhecidas;
ideias de exportação de seus idosos para países onde a mão de obra de serviços é mais barata foram
aventadas; planos de saúde em alguns países incluem entre seus benefícios o chamado home care
para pacientes com enfermidades fortemente incapacitantes, e por aí vai. Nas sociedades contem-
porâneas, a construção do mundo privado parece ser mais complexa. O mundo privado está em
questão. Mas de quem é este mundo privado?
Este mundo privado é eminentemente feminino, ainda. Isto pode estar mudando em alguns
países e em anos recentes, mas estamos longe de uma redefinição. As políticas de conciliação entre
trabalho e reprodução – hoje no centro das discussões sobre as maneiras de recuperar níveis de fe-
cundidade compatíveis com a reposição demográfica nos países europeus – têm como público-alvo
as mulheres. Mesmo países considerados mais avançados, como os da Escandinávia – onde com-
pulsoriamente os pais têm que usar da prerrogativa de licenças paternidade das mais longas que se
tem notícia –, a proporção de mulheres com trabalho em tempo parcial segue bem mais elevada que
a de homens. Contramovimentos conservadores não cessam de alardear os males do afastamento
das mães em relação à educação dos filhos. Ao que parecem, talvez com algumas poucas exceções,
as políticas postas em prática pouco afetam os modos de vida masculinos. Estes não fazem ainda
parte do debate. Um trecho de artigo de uma antropóloga feminista norte-americana a respeito de
sua pesquisa sobre as “famílias pós-modernas” na Califórnia, ao final dos anos 1980, expressa com
eloquência e indignação este debate:
Os demógrafos identificam um declínio drástico no número médio de anos que os homens vivem em
domicílios. Poucas das mulheres que assumem responsabilidade pelos filhos em 90% dos casos de
divórcio têm que batalhar pelo privilégio da custódia dos filhos. (...) E muito poucas pessoas adultas
cuidando de doentes e idosos são do sexo masculino. No entanto, ironicamente, a maior parte da
literatura alarmista e nostálgica acerca do declínio contemporâneo da família culpa as mulheres pelo
abandono da domesticidade, o outro lado de nossa entrada tardia na modernidade. O clamor público
ansioso acerca dos efeitos destrutivos das mães trabalhadoras, das altas taxas de divórcio, do cuidado
infantil por instituições ou da liberalização sexual sobre a família raramente investiga os comporta-
mentos dos homens. Vozes angustiadas, emanadas de todas as partes do espectro político, lamentam
as intervenções do Estado e do mercado que estariam enfraquecendo “a família”. Mas, de quem são os
vínculos familiares que estão enfraquecendo? Nós mulheres temos amplamente demonstrado nosso
permanente compromisso com a sustentação dos laços de parentesco. Se existe uma crise na família,
esta crise é da família dos homens (STACEY, 1992, p. 108, tradução nossa).
Por meio de outra experiência de pesquisa, esta dos anos 1970, com mulheres e famílias tra-
balhadoras nas culturas de cana-de-açúcar e de café no oeste paulista, quero expressar uma utopia.
Ali era geral a queixa de que as mulheres se sentiam sobrecarregadas e ocupando a posição mais in-
ferior na escala social. Era usada, reiteradamente, a imagem de uma escada, situando a mulher no úl-
timo degrau de baixo! Sua queixa era de que levantavam mais cedo que todos na família (para poder
preparar café e os farnéis dos que iam para a roça), e só se deitavam por último (após banhos, jantar,
colocar as crianças na cama e adiantar as coisas para o dia seguinte). E mais ainda: eram descontadas
do descanso remunerado semanal, previsto em lei para os trabalhadores que não faltassem nenhum
dia da semana.
De fato, por faltarem sistematicamente um dia na semana, eram consideradas trabalhadoras
temporárias. Na verdade, trabalhavam permanentemente como temporárias, com menores bene-
fícios trabalhistas. Como mulheres, reclamavam, tinham que faltar na segunda-feira para dar conta
da lavagem de roupa, a mais pesada das tarefas domésticas por causa da sujeira do canavial e even-
tualmente levar os filhos ao posto de saúde, tarefa também delas. Reclamavam, porém, menos do
fato de terem estes encargos do que do fato de “os homens” não compreenderem a vida das mu-
lheres. Eles, “os homens”, avaliavam as trabalhadoras pelos mesmos critérios e parâmetros usados
para avaliar os trabalhadores homens. O que mais as revoltava era a perda dos benefícios, que viam
obviamente como uma injustiça, fazendo-as sentir-se prejudicadas e desvalorizadas. Reclamavam
da inexistência de um estatuto específico para a mulher trabalhadora, com maior flexibilidade, mas
sem o que consideravam uma “punição”, embora não formulassem uma proposta clara.
Era evidente que, ali, o mundo privado estava menos em questão do que o mundo público,
mas obviamente as consequências eram sentidas no mundo privado, no âmbito da organização do
tempo feminino. O mundo privado era feminino e o mundo público, masculino, com regras percebi-
das como pouco adequadas às condições das mulheres.
Tudo que tenho lido e pesquisado me leva a acreditar que, sem mudanças profundas no
mundo público – especificamente no mundo do trabalho –, pouco se avançará no mundo privado.
Estes não são mundos à parte, mas em relação de imbricação. E isto, a meu ver, vale para homens e
mulheres.
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Silicon Valley. In: THORNE, B.; YALOM, M. (Orgs.). Rethinking the family: some feminist questions.
Boston: Northeastern University Press, 1992, p. 91-118.
Estas reflexões foram escritas quando participei como coordenadora de projetos na Secre-
taria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, no período 2009-2010, e atendendo
a um convite para participar de uma mesa redonda no Encontro Nacional da Associação Brasileira
de Estudos Populacionais (Abep), em 2010, sobre as questões de gênero no âmbito do público e
privado. Naquele momento, além de gestora de políticas públicas feministas, eu acumulava uma
participação na vida acadêmica e, em paralelo, longa militância feminista. Estas notas refletem esta
trajetória.
Após a anistia de 1979, o tímido movimento de mulheres que se aglutinava desde 1975
como resposta à I Conferência Internacional da Mulher, promovida pela Organização das Nações
Unidas (ONU), na cidade do México, foi um chamamento à atuação das mulheres no espaço políti-
co. O que fazer? As opções eram ingressar em partidos políticos ou permanecer nos movimentos
sociais e sindicais. Tudo estava em ebulição na sociedade; o movimento de mulheres no Rio de
Janeiro, desde 1978, organizava uma plataforma de luta – Alerta Feminista – com as principais
reivindicações femininas para as eleições. Esta plataforma pode ser entendida como uma das pri-
meiras elaborações feministas para a participação no espaço político. Na efervescência política da
virada democrática das eleições de 1982 e da eleição em 1984 do presidente civil Tancredo Neves
1
Uma parte deste texto baseia-se num capítulo elaborado pela autora em conjunto com Lourdes Bandeira e Luana
Simões Pinheiro, no livro Tempos e memórias – movimento feminista no Brasil, SPM/PR, dezembro de 2010. As três autoras
participavam na época da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM/PR), gestão 2007-2010.
171
Uma atuação feminista no Estado Hildete Pereira de Melo
e seu vice, José Sarney, estes eleitos comprometeram-se com o movimento de mulheres no sen-
tido de criar um órgão consultivo que elaborasse uma política feminista para o Estado brasileiro.
Assim, foi criado o Conselho Nacional do Direito da Mulher (CNDM), que ficou abrigado no interior
do Ministério da Justiça (setembro de 1985). O CNDM não era novidade, pois órgãos similares já
tinham sido instituídos pelos governos estaduais de Minas Gerais e São Paulo, depois das elei-
ções de 1982. Mas, um órgão de âmbito nacional marcará profundamente a participação feminista
no interior do Estado brasileiro. Uma das principais marcas desta atuação é encontrada na Carta
Constitucional de 1988, que foi bastante influenciada pela atuação do CNDM, bem como pelas
secretarias estaduais e, sobretudo, pelos movimentos sociais feministas e de mulheres atuantes
naqueles anos (1985-1989).
A despeito da mobilização cada vez mais intensa e da proliferação de espaços destinados
a estudar os temas de gênero, mulheres e feminismos, na década de 1990, o Conselho Nacional
dos Direitos das Mulheres foi sendo esvaziado. O Plano Collor de combate à inflação tirou a auto-
nomia financeira do CNDM, que acabou também perdendo a capacidade administrativa e o poder
de executar políticas diretamente. Em 1994, o Conselho foi reativado em virtude das reuniões
preparatórias da delegação brasileira para as Conferências do Cairo (1994) e de Beijing (1995).
Esta reativação também foi uma resposta à proposta encaminhada pelo movimento feminista aos
candidatos à Presidência da República nas eleições de 1994, referente à criação de uma Secretaria
vinculada à Casa Civil – da qual o Conselho também faria parte. Estas ações tinham como objetivo
a execução de um Programa de Igualdade e Direitos da Mulher. Mesmo sem as condições mínimas
necessárias ao seu funcionamento, o CNDM se fez presente na IV Conferência Mundial da Mulher,
em Beijing.
No final da década de 1990, um novo grupo de conselheiras foi formado, na tradição da
apresentação de listas tríplices por instituições da sociedade civil. Ainda sem orçamento e com
uma estrutura administrativa insuficiente, o Conselho passou a lutar pela criação de uma estrutu-
ra que resgatasse seu papel original, qual seja, o de executor de políticas públicas. De fato, uma
grande vitória do movimento feminista e de mulheres foi ter colocado na agenda pública não
apenas as principais demandas femininas, mas também a necessidade de institucionalização que
respondesse por elas.
É nesse contexto de acirramento da luta por políticas feministas que, em finais de 2002, foi cria-
da a Secretaria Especial dos Direitos da Mulher (Sedim), órgão vinculado ao Ministério da Justiça que, a
despeito da importância de sua criação, teve pouco tempo para desenvolver suas atividades. A eleição
de Lula mudou o quadro político e, em 2003, o governo iniciou um processo de institucionalização de
políticas públicas nas diferentes esferas governamentais e uma política feminista foi desenvolvida a
partir da Lei nº 10.683/2003, que criou a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), vincu-
lada diretamente à Presidência da República e dotada de status ministerial e de orçamento.
Inspirada no princípio de igualdade de condições entre homens e mulheres, a SPM propõe
estratégias para o desenvolvimento de políticas para as mulheres, baseadas no conceito da transver-
salidade, ou seja, incorporação da perspectiva de gênero e raça nas ações desenvolvidas por todos
os órgãos do governo federal. A criação da SPM legitimou a elaboração e implementação de polí-
ticas públicas para as mulheres no aparelho do Estado, com o objetivo de eliminar todas as formas
de discriminações e desigualdades de gênero e raça/etnia e consolidar plenos direitos humanos e
cidadania para as mulheres.
Para traçar esta ação, a SPM e o CNDM convocaram duas conferências nacionais, uma em
2004 e outra em 2007, que mobilizaram milhares de mulheres de todo o país. Destas conferências
resultaram os dois grandes instrumentos de luta política dentro e fora do Estado: os Planos Nacionais
de Políticas para as Mulheres, que definiram os eixos estratégicos da ação da política social feminista
no Brasil.
O I Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (I PNPM), lançado em dezembro de 2004, resul-
tou de um processo amplamente participativo e democrático que envolveu, direta e indiretamente,
120 mil mulheres de todo o país em conferências municipais, estaduais e na I Conferência Nacional
de Políticas para as Mulheres. A Conferência Nacional aprovou, em sua plenária final, os princípios da
Política Nacional para as Mulheres e um conjunto de 239 diretrizes que orientaram a atuação estatal
na construção de suas políticas públicas direcionadas às mulheres, representando o resultado con-
creto das discussões travadas em todo o Brasil durante o processo da I CNPM.
Em 2007, uma segunda Conferência Nacional foi convocada com o objetivo de avaliar a im-
plementação do I PNPM e revisá-lo segundo as principais demandas apontadas. Neste processo, do
qual participaram 200 mil mulheres, foram reafirmados os princípios e diretrizes do I PNPM e am-
pliadas as áreas estratégicas de ação, bem como as parcerias interinstitucionais. Isto significa que o
PNPM se renova por meio do processo de avaliação, sem perder a referência dos pressupostos, prin-
cípios e diretrizes que pautam a Política Nacional para as Mulheres e que norteiam os seus principais
objetivos e ações.
A partir das discussões travadas na II CNPM, foi lançado, em março de 2008, o II Plano Nacio-
nal de Políticas para as Mulheres, com um conjunto de 388 ações distribuídas em 11 grandes eixos de
atuação que, sem dúvida, fortaleceram a agenda social de gênero do governo federal. O II PNPM é
uma conquista de toda a sociedade brasileira impulsionada, especialmente, pela atuação do movi-
mento feminista e de mulheres, bem como pela ação silenciosa e contínua de mulheres anônimas
que enfrentam em seu cotidiano as dificuldades impostas por uma sociedade que ainda tem muito
a se desenvolver em direção à igualdade de gênero.
O olhar histórico sobre a efetivação das ideias libertárias feministas na sociedade brasileira evi-
dencia mudanças culturais expressas nos avanços legislativos, políticos, econômicos e culturais voltados
para a maior igualdade entre homens e mulheres. Estes foram mais acentuados na família, no trabalho
e são ainda tímidos em relação aos espaços de poder e decisão e ao acesso a direitos e oportunidades.
Como resultado destas lutas, as mulheres brasileiras no início do século XXI possuem pre-
sença crescente em todos os níveis de ensino no Brasil: tendo começado o século XX analfabetas,
hoje são a maioria no ensino médio, dominam o ensino de graduação e já detêm um número maior
de bolsas de mestrado e doutorado no país. Assim, as mulheres tendem a se qualificar mais do que
os homens para ingressarem no mercado de trabalho, o que, no entanto, ainda não se reverteu em
salários mais elevados ou em ocupações de postos de decisão e poder, como também não significou
a desobrigação das responsabilidades domésticas e dos cuidados familiares.
Os desafios para que alcancemos uma real igualdade entre homens e mulheres são múlti-
plos e complexos, pois envolvem desde aspectos relacionados à estrutura e à cultura organizacional
do Estado brasileiro, quanto valores sexistas e racistas que, disseminados pela nossa cultura, insistem
em ainda relegar as mulheres a um plano inferior na sociedade.
Na II Conferência Nacional, quando o I PNPM foi avaliado por mais de 200 mil mulheres em
todo o país, as principais demandas apontadas em relação à institucionalização da Política Nacio-
nal para as Mulheres e sua implementação foram: inexistência de organismos de políticas para as
mulheres em inúmeros governos estaduais e na maioria dos governos municipais; baixo orçamento
para as políticas para as mulheres; criminalização do aborto; falta de dados e informações estratégi-
cos para a tomada de decisões; baixa incorporação da transversalidade de gênero nas políticas pú-
blicas; ausência de compartilhamento, entre mulheres e homens, das tarefas do trabalho doméstico
e de cuidados; e maior participação das mulheres nos espaços de poder e decisão.
Importante acrescentar a esta lista o desafio apontado pelo Pacto Nacional de Enfrentamen-
to à Violência: a erradicação de todas as formas de violência contra as mulheres, a partir, entre outros
fatores, da construção de uma cultura de paz e de irrestrito respeito às diversidades de gênero e
valorização do feminino na sociedade.
Em 2010, as mulheres do Brasil e de todo o mundo comemoraram os 100 anos da histórica
Conferência da Dinamarca, que propagou pelo mundo inteiro o ideário da luta feminista, propondo
a diminuição dos poderes e privilégios dos homens, como nunca tinha acontecido até então na
história das mulheres. Mas a vitória foi parcial, pois, embora as mulheres de hoje sejam diferentes
de suas avós e mães, ainda persistem na economia e na cultura valores patriarcais que as mantêm
em posição de subordinação na sociedade. E estes aparecem até na política pública, a qual ainda é
acanhada com recursos sempre vulneráveis aos cortes frequentes da política econômica do Estado.
O tema da mesa redonda “O impacto das mudanças na família sobre o mercado de trabalho
e o desenvolvimento do Brasil” suscita muitas reflexões e torna-se relevante para a discussão dos de-
terminantes da relação família-trabalho, descartando o suposto de um determinante único. Sob essa
perspectiva, a relação família-trabalho é analisada neste artigo considerando-se múltiplos elementos.
Por um lado, leva-se em conta um conjunto de fatores que provocam modificações nos ar-
ranjos familiares, entre os quais destacam-se: as mudanças demográficas, tais como alterações nos
padrões de reprodução (redução da fecundidade e mudanças nas idades de ter filhos), nos padrões
de nupcialidade e o envelhecimento da população; e as mudanças nos valores sociais, especialmen-
te os relativos ao papel da mulher na sociedade, que também impulsionam as mudanças na família.
Tais modificações sociais provocaram, nas últimas décadas, alterações nas configurações familiares,
sobressaindo enquanto tendências: a redução do tipo de organização familiar predominante, cons-
tituído pelas famílias conjugais e casais com filhos; o crescimento da proporção de famílias mono-
parentais, tanto chefiadas por mulheres como por homens; e o aumento dos domicílios unipessoais.
Por outro lado, considera-se que as possibilidades de inserção no mercado dos componen-
tes, segundo posição na família, são afetadas pelas mudanças nos arranjos familiares e nas relações
de gênero. Ou seja, a disponibilidade dos distintos membros da família para inserção no mercado
de trabalho é definida pelas características do arranjo familiar ao qual pertencem, pelo momento do
1
Este trabalho apresenta resultados de projeto de pesquisa desenvolvido com apoio do CNPq junto ao Nepp/Unicamp. O
artigo contou com a colaboração de Marcelo Tavares, estatístico do Nepp-Unicamp.
177
Família e trabalho Lilia Montali
ciclo de vida familiar desse arranjo e pelas relações de gênero e de divisão sexual do trabalho vigen-
tes, que, por sua vez, afetam as atribuições dos componentes nas diferentes posições na família. Para
usar a linguagem dos economistas, este conjunto de fatores define a “oferta” da força de trabalho
para o mercado.
No entanto, as possibilidades de absorção desses componentes pelo mercado de trabalho
são afetadas, primordialmente, pela dinâmica da economia e pela organização da produção em de-
terminado momento histórico. Não se pode deixar de acrescentar que as relações de gênero vi-
gentes afetam os lugares de homens e de mulheres no mercado de trabalho, considerando-se que
tanto influenciam a disponibilidade dos mesmos para determinadas ocupações e vínculos (ou seja,
a oferta), como definem as possibilidades de absorção admitidas pelo próprio mercado de trabalho.
É importante reafirmar a não determinação unívoca da relação família-trabalho, uma vez que
ela é definida por um conjunto de determinantes que se alteram nos diferentes momentos históricos
e conjunturas econômicas.
Para discutir a relação família-trabalho sob a perspectiva de uma retomada do desenvolvi-
mento do país, a partir da metade da década de 2000, são apresentados resultados da nossa pesqui-
sa sobre a temática, abordando-se dois aspectos: as mudanças nos arranjos familiares e nos arranjos
familiares de inserção; e os desafios para a redução da desigualdade de renda entre os domicílios
caracterizados por distintos arranjos familiares. Deve-se ainda esclarecer que as unidades domicilia-
res são assumidas, neste estudo, como equivalentes a unidades familiares.
As alterações na configuração familiar nas regiões metropolitanas, nos anos 2000, evi-
denciam continuidade de tendências iniciadas em décadas anteriores para as famílias brasileiras.
Entre as mais importantes podem ser apontadas a redução do tipo de organização familiar pre-
dominante, constituído pelas famílias conjugais e casais com filhos, o crescimento da proporção
de famílias monoparentais, tanto chefiadas por mulheres como por homens, e o aumento dos
domicílios unipessoais.
Relacionada a tais mudanças, ocorre a redução do tamanho das famílias, que está associada
tanto à queda da fecundidade como ao crescimento das famílias monoparentais e dos domicílios
unipessoais.
Entretanto e apesar da tendência de redução acentuada nas proporções de famílias conjugais
na primeira década dos anos 2000, a configuração familiar predominante nas regiões metropolitanas
brasileiras permanece sendo do tipo conjugal com ou sem a presença de filhos residentes.
Com relação aos arranjos familiares de inserção, estudos anteriores (MONTALI, 2004 e 2006)
indicaram mudanças no período de acentuação da reestruturação produtiva e de baixo crescimento
econômico, com continuidade até 2003, que afetaram de maneira distinta os componentes das fa-
mílias, segundo as posições familiares e gênero, abalando o emprego e a qualidade do emprego dos
principais provedores da família. Para a Região Metropolitana de São Paulo, observou-se tendência
de alterações nos arranjos familiares de inserção no mercado de trabalho a partir dos anos 1990, de-
vido tanto a estas modificações no padrão de incorporação no mercado de trabalho nos anos 1990
quanto ao gradual processo de mudança dos valores em relação ao papel da mulher na sociedade.
As principais alterações verificadas referem-se à maior participação das mulheres cônjuges e das
chefes de família sem cônjuge no mercado de trabalho e também como provedoras ou coprove-
doras em seus domicílios (MONTALI, 2006). Padrões semelhantes de inserção familiar no mercado
foram encontrados nos estudos sobre regiões metropolitanas brasileiras (MONTALI; TAVARES, 2009).
Tabela 1
Distribuição das famílias e tamanho médio, segundo tipos de arranjos domiciliares
Regiões metropolitanas brasileiras − 2000-2008
Distribuição tipologia (em %) Tamanho médio
Tipos de Arranjos Censo PNAD PNAD PNAD Censo PNAD PNAD PNAD
2000 2004 2006 2008 2000 2004 2006 2008
Casais 67,2 63,9 62,9 62,4 4,0 3,8 3,7 3,6
Casal sem filhos 12,4 13,1 13,8 15,3 2,2 2,2 2,2 2,2
Casal com filhos e parentes 54,8 50,8 49,2 47,1 4,4 4,2 4,2 4,1
Casal até 34 anos com filhos e parentes 20,9 17,0 15,8 14,4 4,0 3,9 3,9 3,9
Casal de 35 a 49 anos com filhos e parentes 21,3 20,5 20,0 19,2 4,6 4,4 4,3 4,2
Casal de 50 anos e mais com filhos e parentes 9,1 9,8 10,2 10,3 4,6 4,4 4,2 4,1
Chefe mulher sem cônjuge 24,5 26,9 27,4 28,0 3,0 2,8 2,7 2,6
Chefe mulher sem cônjuge - e/ou filhos e/ou
19,0 20,5 20,8 20,5 3,2 3,3 3,3 3,2
parentes
Chefe mulher unipessoal 5,4 6,4 6,7 7,5 1,0 1,0 1,0 1,0
Chefe homem sem cônjuge 8,3 9,2 9,7 9,7 2,0 1,8 1,8 1,7
Chefe homem sem cônjuge - e/ou filhos e/ou
3,8 3,7 4,0 3,8 3,2 3,0 3,0 2,8
parentes
Chefe homem unipessoal 4,5 5,5 5,7 5,8 1,0 1,0 1,0 1,0
Total (1) 100,0 100,0 100,0 100,0 3,6 3,4 3,3 3,1
Fonte: IBGE. Censo Demográfico. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD. Elaboração do autor.
(1) Inclui outros arranjos domiciliares.
Análise sobre o período recente de recuperação econômica (2004-2008), para as regiões me-
tropolitanas brasileiras (MONTALI, 2010), mostra que há continuidade do aumento da participação
das mulheres no mercado de trabalho, com destaque para as cônjuges. O estudo indica também
permanência das tendências observadas no período anterior no que se refere aos arranjos familiares
de inserção no mercado, com acentuação do partilhamento da responsabilidade pela manutenção
da família entre os componentes em todos os tipos de arranjos familiares.
Tomando-se como referência os domicílios nucleados pelo casal, verificam-se, como tendên-
cias, redução na participação dos chefes entre os ocupados da família (de 46%, em 2004, para 43%,
em 2008), elevação da participação do cônjuge (de 30% para 33%, no mesmo período) e participa-
ção dos filhos (cerca de 21%, com leve declínio) e de parentes (cerca 3%). Nestes arranjos familiares,
evidencia-se o partilhamento da responsabilidade pela manutenção da família entre os componen-
tes do domicílio, destacando-se o casal com maior participação. Os arranjos familiares de inserção
no mercado, nos domicílios nucleados pelo casal, apresentam composição específica quando consi-
derado o momento correspondente ao ciclo vital familiar: etapa da constituição, representada pelos
casais jovens (até 34 anos) com filhos; etapa da consolidação, caracterizada pelos casais com idades
entre 35 e 49 anos com filhos; e etapa do envelhecimento, representada pelos casais com idades a
partir de 50 anos, com filhos (Gráfico 1).
Destacam-se, nos dois primeiros ciclos, elevadas proporções dos cônjuges entre os ocupa-
dos, principalmente no arranjo dos casais sem filhos, com tendência de aumento no período estu-
dado (de 40%, em 2004, para 43%, em 2008). A tendência, no caso dos chefes masculinos (56% dos
ocupados em 2004), é de redução dessa proporção em cerca de 3 pontos percentuais entre 2004 e
2008 e, no de parentes entre os ocupados do arranjo, de manutenção em cerca de 4% (Gráfico 1).
Gráfico 1
Distribuição dos ocupados, por posição na família, segundo tipologia de arranjos
domiciliares
Regiões metropolitanas brasileiras − 2004-2008
As principais tendências nos arranjos domiciliares nucleados pela chefe mulher sem a pre-
sença de cônjuge foram de pequenas mudanças, que implicaram aumento da proporção das chefes
entre os ocupados, redução da proporção de filhos e pequena elevação dos parentes e não parentes
entre os ocupados. Em 2004, a chefe mulher sem cônjuge representava 45% dos ocupados da famí-
lia, os filhos eram 41% e os parentes e não parentes 13,4%; em 2008 os valores respectivos corres-
pondiam a 46%, 40% e 14%. Esses dados referem-se ao total das famílias chefiadas por mulher sem
a exclusão dos domicílios unipessoais femininos.
Dois outros indicadores explicitam a participação dos componentes familiares na provisão
familiar: a taxa específica de geração de renda; e a participação na composição da renda familiar. A
primeira leva em conta todas as rendas, sendo que a tendência entre 2004 e 2008 foi de aumento
dessa taxa para o total dos componentes do domicílio, bem como para o total de homens e de
mulheres (MONTALI, 2010); a exceção no período correspondeu às taxas específicas das chefes fe-
mininas, que não apresentam crescimento, mas registraram a segunda taxa mais elevada, superada
apenas pela dos chefes masculinos.
Já a análise da participação na composição da renda familiar (Gráfico 2) evidencia, como
uma tendência comum a todos os tipos de arranjos nucleados pelo casal, o aumento proporcional
da participação da cônjuge na renda familiar. As cônjuges, que vêm participando crescentemente
de atividades no mercado de trabalho no período, aumentaram também sua participação relativa na
renda da família (de 23,8%, em 2004, para 29,7%, em 2008), ao mesmo tempo em que a participação
dos chefes masculinos – que permanece como a mais elevada − apresentou tendência de redução
na renda domiciliar (de 62,5% para 56,4%, no mesmo período). A participação dos filhos oscila em
cerca de 11% e a dos parentes, em cerca de 2,5%. São observadas as especificidades desse indicador
nos arranjos nucleados pelo casal nos diferentes momentos do ciclo vital familiar (Gráfico 2). Não
ocorrem alterações importantes, no período, nos arranjos nucleados pela chefe feminina sem côn-
juge: as chefes, que são as principais responsáveis pela renda domiciliar, respondiam, em 2008, por
66%, os filhos por cerca de 22% e os parentes por cerca de 11% (Gráfico 2).
Este conjunto de informações evidencia a desfavorável inserção da mulher no mercado de tra-
balho, uma vez que, nos arranjos domiciliares nucleados pelo casal, as proporções da participação das
cônjuges na composição da renda familiar são mais baixas do que sua participação entre os ocupados
da família (Gráficos 1 e 2). A predominância de inserções precárias das mulheres cônjuges é uma das
explicações para essa disparidade (MONTALI, 2010), pois, considerando-se o total das famílias metro-
politanas brasileiras, mais da metade das cônjuges ocupadas apresenta inserção sob vínculos contra-
tuais precários. Situação distinta é encontrada entre os chefes homens ocupados, dos quais cerca de
um terço apresenta-se sob vinculações não precárias. Expressando a bipolaridade entre as mulheres
ocupadas (BRUSCHINI, 2007; LOMBARDI, 2009), também no caso das chefes mulheres, cerca da metade
destas em arranjos sem a presença de cônjuge se vinculam ao mercado de trabalho por meio de inser-
ções precárias (MONTALI, 2010). Neste caso e considerando-se sua maior responsabilidade na provisão
familiar (Gráfico 2), as inserções precárias refletem-se nos rendimentos mais baixos verificados nos ar-
ranjos domiciliares nucleados pela chefe feminina sem a presença de cônjuge. A vinculação precária ao
mercado de trabalho das mulheres cônjuges e chefes está em grande parte associada à divisão sexual
do trabalho vigente e às atribuições destas de cuidado dos filhos, levando-as a aceitar vinculações não
formalizadas, jornadas menores e ocupações intermitentes.
Gráfico 2
Participação na massa da renda domiciliar, por posição na família, segundo tipologia
de arranjos domiciliares
Regiões metropolitanas brasileiras − 2004-2008
Tabela 2
Índice de Gini
Regiões Metropolitanas Brasileiras, 2004-2008
lho, visando os diferentes arranjos domiciliares que remetem a momentos distintos do ciclo de vida
familiar e especialmente aqueles que apresentam maiores fragilidades para garantir a sobrevivência.
Elementos para essa discussão foram tratados em estudo anterior (MONTALI, 2008) e as informações
mais recentes evidenciam a necessidade do aprofundamento das análises e de novas propostas para
o aperfeiçoamento das políticas sociais.
Tabela 3
Rendimento domiciliar per capita médio, segundo tipos de arranjos domiciliares
Regiões Metropolitanas Brasileiras − 2004-2008
Referências
ARRIAGADA, I. Estruturas familiares, trabalho e bem-estar na América Latina. In: ARAUJO, C.;
PICANÇO, F.; SCALON, C. (Orgs.). Novas conciliações e antigas tensões? Gênero, família e trabalho
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BRUSCHINI, M. C. A. Trabalho e gênero no Brasil nos últimos dez anos. Seminário Internacional
Gênero e Trabalho. São Paulo e Rio de Janeiro, Fundação Carlos Chagas, 2007.
HIRATA, H.; KERGOAT, D. Novas configurações da divisão sexual do trabalho. Cadernos de Pesquisa,
v. 37, n. 132, p. 595-609, set./dez. 2007.
1
Ver Powell e Butterfield (1994) e Santos e Ribeiro (2006).
2
Ver Barros et al. (2006).
187
Relações familiares e diferenciais de rendimento por sexo no Brasil Simone Wajnman
Gráfico 1
Diferenciais de rendimentos e de salário/hora masculinos e femininos
Brasil – 1978-2008
Outro fator fundamental é a segregação alocativa, significando que homens e mulheres de-
dicam-se a ocupações econômicas distintas, com as atividades consideradas tipicamente femininas
reproduzindo, em grande medida, os cuidados no âmbito das relações pessoais, na forma de ativida-
des sociais, de saúde, educação e na prestação de serviços pessoais, especialmente os domésticos.
Essas atividades são frequentemente menos valorizadas, pagam salários menores, sendo justamente
nelas que se concentram as maiores diferenças salariais entre homens e mulheres, indicando haver
uma compensação salarial aos homens que se dispõem a trabalhar nas atividades identificadas com
as mulheres.3 O Gráfico 2 ilustra bem essa ideia, evidenciando que, no Brasil, nos grupos de ativi-
dades em que há maior prevalência de trabalho feminino, existe também maior diferença salarial
favoravelmente aos homens.
Contudo, a hipótese central a que se dedica essa nota é a de que o mercado de trabalho não
diferencia as mulheres por elas serem mulheres, mas sim pelo papel que elas ocupam em suas es-
truturas familiares. Assim, mulheres solteiras e sem filhos não recebem salários piores do que os ho-
mens na mesma situação, uma vez que sobre elas, tanto quanto sobre eles, não pesam as atribuições
domésticas que competiriam com o tempo dedicado às atividades remuneradas.4 Já as mulheres ca-
sadas, tendo ou não filhos, são penalizadas em termos de remuneração. Elas trabalham bem menos
horas do que as solteiras e, além disso, recebem um salário-hora inferior ao masculino (ver Gráficos 3
e 4). Mas é interessante notar que, de fato, a pior situação é a das mulheres com filhos e sem cônjuge:
3
Para uma discussão mais detalhada dessa questão, ver Wajnman (2006).
4
De fato, segundo a PNAD 2008, o salário-hora médio para mulheres solteiras e sem filhos era ligeiramente
superior ao dos homens na mesma situação, possivelmente devido à sobre-escolaridade feminina.
são as que trabalham o maior número de horas e para quem o diferencial salarial relativamente aos
homens é o mais elevado – nessa mesma condição, homens recebem em média, pela hora trabalha-
da, 38% a mais do que as mulheres. Possivelmente, para essas mulheres, o elevado número de horas
trabalhadas é uma necessidade, mas, ao mesmo tempo, suas reponsabilidades domésticas exigem
um tipo de vínculo mais flexível e, consequentemente, mais precário.
Gráfico 2
Diferenciais de salários masculinos e femininos e proporção de mulheres, segundo
grupos de atividades
Brasil – 2008
As diferenças nas horas trabalhadas segundo a situação familiar, exibidas no Gráfico 4, suge-
rem também a ideia de que as atribuições domésticas criam barreiras para o trabalho remunerado
das mulheres, enquanto para os homens ocorre justamente o contrário: quanto maior é o compro-
metimento das mulheres com atividades domésticas (casamento e filhos), menor é o número de
horas trabalhadas; já para os homens, o não comprometimento com responsabilidades familiares
libera-os para jornadas de trabalho menores e, possivelmente, mais horas de lazer, estudo, etc.
Diante dessas evidências, cabe perguntar em que medida a inserção mais restrita das mu-
lheres casadas e com filhos no mercado de trabalho seria uma questão de discriminação do empre-
gador, ou, ao contrário, um processo de autosseleção: mulheres com responsabilidades domésticas
optariam por menos horas de trabalho remunerado e ocupações de menor nível de comprometi-
mento. Evidentemente, essa é uma questão complexa, que exige um tipo de informação acerca de
uso do tempo e preferências, que não está disponível nas pesquisas domiciliares. Algumas evidên-
cias adicionais, no entanto, podem dar mais elementos para essa discussão.
Gráfico 3
Diferencias de salários/hora masculinos e femininos, segundo situação familiar
Brasil – 2008
Gráfico 4
Horas trabalhadas, por sexo, segundo situação familiar
Brasil – 2008
O Gráfico 5 é bastante sugestivo acerca da divisão de papéis e das trocas que ocorrem entre
homens e mulheres nas estruturas familiares. Considerando-se apenas as informações sobre chefes de
família e seus respectivos cônjuges, portanto casais, analisou-se como evoluem as horas de trabalho do-
méstico das mulheres e de seus parceiros, conforme aumentam as horas de trabalho remunerado das
mulheres. Como se observa, mulheres que não exercem trabalho remunerado ou que o fazem por menos
de nove horas semanais dedicam, em média, cerca de 33 horas semanais ao trabalho doméstico. Como
se espera, essa média diminui conforme aumenta o número de horas de trabalho remunerado, de forma
que, aquelas que trabalham mais de 36 horas despendem pouco menos de 20 horas semanais com o tra-
balho doméstico. O problema é que, ao mesmo tempo, não se observa o aumento esperado de trabalho
doméstico masculino como contrapartida. Ou seja, os homens que vivem com suas cônjuges ocupam-se
uma média de aproximadamente cinco horas semanais com o trabalho doméstico e isso praticamente
independe de suas esposas exercerem ou não trabalho remunerado. Resumindo aquilo que se depreen-
de do Gráfico 5: cada hora adicional de trabalho remunerado das mulheres corresponde a uma redução
de 21 minutos semanais em seu tempo de trabalho doméstico. “Compensatoriamente”, seus parceiros
aumentam em dois (!) minutos sua carga semanal de atribuições com moradia e família.
Ao menos em termos médios, portanto, o não compartilhamento das atividades domésticas en-
tre os membros das famílias representa uma significativa barreira à progressão das mulheres casadas e/
ou com filhos nas trajetórias profissionais. Assim, o caminho para uma maior equidade de gênero no
mercado de trabalho inclui, necessariamente, um maior comprometimento das famílias e da sociedade
em geral com as atribuições tradicionalmente vistas como exclusivas das mulheres.
Gráfico 5
Trade off entre horas de trabalho remunerado das mulheres e horas de trabalho
doméstico delas e de seus parceiros
Brasil – 2008
Referências
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no Brasil. In: BARROS, R. P.; FOGUEL, M. N.; ULYSSEA, G. Desigualdade de renda no Brasil: uma
análise da queda recente. Brasília: Ipea, 2006, p. 107-27.
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o factual promotions to top managment. Academy of Management Journal, v. 37. n. 1, p. 68-86,
1994.
SANTOS, R. V.; RIBEIRO, E. P. Diferenciais de rendimentos entre homens e mulheres no Brasil revisitado:
explorando o “teto de vidro”. Seminários de Pesquisa, 2006. Disponível em: <http://www.ie.ufrj.br/
eventos/seminarios/pesquisa/texto06_05_02.pdf>. Acesso em: 19 dez. 2011.
WAJNMAN, S. Mulheres na sociedade e no mercado de trabalho brasileiro: avanços e entraves. In:
PORTO, M. (Org.). Olhares femininos, mulheres brasileiras. Rio de Janeiro: Sesc, 2006, p. 77-108.
Gostaríamos de começar por questionar o título da sessão. Se o Brasil foi alguma vez o “país
da juventude”, o que isto significou para a própria juventude brasileira? E se o foi, por que deixou
de sê-lo se ainda em 2010 se mantêm expressiva, em termos absolutos e relativos, a população de
jovens (50,5 milhões de pessoas, que representam 17% do total de habitantes, contra 6,9% dos ido-
sos)? Na verdade, poucos exemplos existem da transformação do conceito de bônus demográfico
em política social. Nós demógrafos ainda não conseguimos sensibilizar e mobilizar adequadamente
os atores que se ocupam da formulação de políticas, no sentido de transformar a oportunidade em
política social.
Em matéria de política social para os jovens, começamos tarde e com pouco. Esta escassez não
se deu por falta de estudos de diagnóstico. Uma série deles foi produzida entre 1997 e 2007, sob a égi-
de da Unesco e outras agências das Nações Unidas. Do lado nacional, a Fundação Seade, o Ipea, o IBGE
e o Instituto Cidadania elaboraram perfis e importantes análises de diferentes aspectos da população
jovem. Finalmente, os estudos do Ibase1 e do Sesi2 levantaram questões que tocam mais diretamente
os jovens, tais como sua participação nas esferas política e pública, além das suas agendas, preferências
e caminhos de inclusão. No entanto, até recentemente, contamos com programas isolados, voltados
para prioridades pontuais, como emprego e educação, e que não deram conta do recado.
Por que a ausência de política pública quando havia argumentos para que ela acontecesse
tanto do lado positivo – o bônus demográfico – como do lado negativo – as enormes necessidades
da população jovem ilustradas nos vários diagnósticos? A meu ver influenciaram aí alguns fatores
que já vinham aparecendo em sociedades com problemáticas semelhantes. Em primeiro lugar, a
imagem do jovem na mídia. Alienado, irresponsável, viciado, arriscando sempre e violento, que
1
IBASE. Juventude brasileira e democracia: participação, esferas e políticas públicas. Jan. 2006.
2
DARELL, J. T.; GOMES, N. L. A juventude no Brasil., Sesi.
195
O fim de uma era – de país da juventude à terra de idosos Maria Helena Henriques Mueller
apoio social esta imagem pode convocar? A esta imagem, associa-se a presença marcante na juven-
tude de uma subcultura diferente, veiculada nas letras do funk e do rap, e que, mesmo tendo nascido
numa sociedade sumamente autoritária, questiona a sua ordem e valores sociais e defende relações
horizontais e informais. Por outro lado, a adaptação da juventude à intensidade e velocidade das
mudanças tecnológicas e a sua familiaridade com formas de comunicação à distância reforçam a
dificuldade da convivência pessoal com o jovem por parte das gerações anteriores, evidenciando
diferenças fundamentais nos agentes e padrões de socialização entre adultos e jovens. Esta caracte-
rização leva a um isolamento do jovem enquanto ator social e interlocutor político, o que dificulta
bastante sua organização para pleitear políticas sociais que atendam aos seus anseios.
E agora, quando já se anuncia o final do bônus demográfico e a preocupação com o cresci-
mento do grupo de 65 anos e mais, será tarde para que se possa recuperar a dívida social com os jo-
vens? O que fizeram outros países que enfrentaram mudanças demográficas na direção do envelhe-
cimento da sua população? Olhemos, por exemplo, a natureza do diálogo entre estruturas políticas
e de juventude na Europa, terra de idosos, onde existe uma boa documentação das suas políticas e
onde a política de juventude é vista como uma política de Estado.
Existem políticas de juventude em 27 países da União Europeia, que possuem como pilar
o princípio da cidadania ativa que se materializa em diferentes programas, entre os quais o de vo-
luntariado juvenil. O conceito de cidadania ativa implica amplas modalidades de participação dos
jovens nas decisões políticas, ilustradas no modelo de cogestão, e atualmente privilegia os temas
de cultura e desenvolvimento sustentável. Por seu lado, os jovens se organizam como interlocutor e
parceiro das estruturas políticas da União Europeia, por meio do Fórum Europeu da Juventude (FEJ),
que engloba conselhos nacionais de juventude e ONGs internacionais que trabalham com ou para
os jovens.
Um exemplo da presença política do FEJ aconteceu em 2009. Na ocasião da renovação por
voto direto do Parlamento Europeu, o FEJ publicou sua lista de demandas e a enviou a cada candi-
dato a deputado, solicitando seu posicionamento com respeito às questões apresentadas. Quando
chegaremos lá?
A meu ver faltam três passos importantes para fortalecer a capacidade dos jovens de agir
como interlocutor político, demandando mais políticas e mais espaços de participação:
1. pressionar mais por políticas de juventude, especialmente as que tocam as questões
de educação e participação. Para isso, é fundamental estabelecer novos pactos nos
âmbitos local, estadual e federal;
2. fortalecer a organização da juventude nos seus espaços de expressão e representatividade;
3. montar ambientes de informação e aconselhamento por meio de parcerias com
instituições que trabalham nas diferentes áreas de interesse específico dos jovens.
Sair da escola, entrar no mercado de trabalho, sair de casa, casar-se ou unir-se e ter filhos.
Independentemente da ordem em que ocorrem, são estes os eventos que caracterizam a transição
para a vida adulta. Estudos feitos para o Brasil, com dados de Censos Demográficos e PNADs, su-
gerem que a transição para a vida adulta é distinta para homens e mulheres (CAMARANO; KANSO;
MELLO, 2006; VIEIRA, 2008), brancos e negros (CAMARANO; MELLO; KANSO, 2006), residentes no
Nordeste e no Sudeste (CAMARANO; MELLO; KANSO, 2006), de maior e menor renda (VIEIRA, 2008).
Estes resultados indicam que a transição para a vida adulta varia segundo as especificidades de cada
grupo e as realidades nas quais os jovens vivem.
O objetivo deste trabalho é contribuir para esta discussão, apontando diferentes formas de
transição para a vida adulta entre jovens de camadas populares nos municípios mineiros de Alperca-
ta, Belo Horizonte, Esmeraldas, Governador Valadares, Marilac e Ribeirão das Neves, na perspectiva
dos próprios jovens. Os dados originam-se de 16 grupos focais2 conduzidos em junho e julho de
2009. Os 192 participantes, estudantes de 14 escolas públicas estaduais e, na sua maioria, cursando o
3º ano do ensino médio, foram selecionados pelas diretoras dessas escolas, que foram escolhidas entre
as 433 amostradas para a “Pesquisa Jovem”, survey conduzido pelo Cedeplar/UFMG com alunos do
ensino médio da rede estadual de Minas Gerais, entre 2007 e 2010.
1
Pesquisa financiada pela Sedese/MG – Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social de Minas Gerais.
2
Moderadoras: Paula Miranda-Ribeiro e Andréa Branco Simão (Cedeplar/UFMG e PUC-MG); assistentes: Marília Gomes,
Pamila Siviero e Vanessa Franceschini (doutorandas em Demografia no Cedeplar/UFMG).
3
Foram amostradas 20 escolas em Ribeirão das Neves e região (que inclui Belo Horizonte e Esmeraldas) e 23 escolas em
Governador Valadares e região (que inclui Alpercata e Marilac).
199
Todos os caminhos levam à vida adulta? Paula Miranda-Ribeiro
Organizado em torno dos cinco eventos que caracterizam a transição para a vida adulta e
recheado de relatos, este texto revela possíveis trajetórias, sempre na perspectiva dos jovens dos
seis municípios estudados (Figuras 1 a 3). Os resultados sugerem que há uma série de caminhos que
levam à vida adulta e, mais do que uma promessa de futuro, a vida destes jovens precisa ser pensada
no presente. Das falas dos participantes, ficam cinco desafios para aqueles que elaboram as políticas
públicas voltadas para este segmento populacional.
Figura 1
Locais pesquisados
Figura 2
Belo Horizonte, Esmeraldas e Ribeirão das Neves
Figura 3
Alpercata, Marilac e Governador Valadares
Escola
Diante da exigência, cada vez mais frequente, de ter o ensino médio completo, a educação
formal é vista pelos participantes como crucial para a entrada no mercado de trabalho. Nesse sentido,
quando questionados, os jovens associaram o estudo com futuro, emprego, responsabilidade, conhe-
cimento e oportunidades. No entanto, as falas revelam que estudar exige sacrifícios, o que faz com que
o estudo também esteja associado a cansaço, esforço, sofrimento e monotonia. O cansaço é, muitas
vezes, causado pelo fato de o jovem trabalhar e estudar, enquanto a monotonia está claramente rela-
cionada à má qualidade das aulas e à falta de didática e entusiasmo dos professores. Foi recorrente a
menção de que parece que muitos professores estão na escola por obrigação. Como melhorar as aulas
e o ânimo dos professores? Fica aqui o primeiro desafio para os formuladores de políticas.
Participante: A maioria dos empregos pede o ensino médio e se a gente não tem o
ensino médio, num vai ter um bom emprego.
[E.E. 1, Governador Valadares e região]
Participante: Aqui, eu não gosto de estudar não, mas é obrigado estudar. Eu tenho que
estudar senão se não estudar você não vai ser ninguém na vida.
[E.E. 2, Ribeirão das Neves e região]
O ensino superior é entendido, por alguns, como a garantia de uma vida melhor. A tese é cor-
reta, mas, na prática, ter um diploma esbarra na questão do vestibular. Muitos alunos afirmaram que
“faculdade” não é para eles, enquanto vários revelaram planos de fazer vestibular. No entanto, é pre-
ciso cautela, pois, diante de pesquisadoras identificadas com a UFMG, é possível que os participantes
tenham tentado, de alguma forma, agradá-las – o conhecido viés da desejabilidade social. Ainda as-
sim, fica claro que o curso superior não é percebido enquanto a panaceia que resolveria a questão do
emprego no futuro. Os jovens mencionaram outras duas alternativas: cursos técnicos e concursos
públicos, os quais substituiriam o diploma de ensino superior no sentido de garantir o futuro. Um
segundo desafio para os formuladores de políticas seria, portanto, a ampliação do ensino técnico de
nível médio com qualidade, a fim de aumentar as chances de empregabilidade dos jovens.
Participante: A maioria das escolas particulares aí, você faz um curso técnico e você
forma em técnico químico, técnico mecânica. Você já sai com um gatilho de dentro da
empresa. Têm muitas empresas que procuram dentro do Senai pessoas pra lá. Acontece
que pra você entrar lá no Senai é muito difícil pelas provas de seleção. Se eles fizessem
um trabalho parecido com o de lá, dentro das escolas públicas, porque espaço tem
demais, então assim, se fizessem um trabalho parecido com esse do Senai, dentro das
escolas públicas, seria...
[E.E. 3, Ribeirão das Neves e região]
Trabalho
Participante: Quanto mais cedo a gente começa [a trabalhar], a gente perde toda a
adolescência, a melhor parte da vida da gente que, na minha opinião, é a adolescência.
Eu acho entendeu, às vezes a gente perde as melhores coisas que tem na vida, né?!
[E.E. 1, Governador Valadares e região]
Quando perguntados sobre o que incentivaria o jovem a querer se formar no ensino médio,
uma das citações mais recorrentes diz respeito ao estágio, que possibilita adquirir experiência, uma
exigência cada vez maior do mercado de trabalho, além de ser uma fonte de renda alternativa – de-
sejável na perspectiva dos jovens – ao trabalho. Um programa de estágios é, portanto, o terceiro
desafio para os formuladores de políticas.
Participante: Eu acho que o que ia incentivar mesmo era falar, tipo, se desse curso
profissionalizante na escola e já a escola começasse a fazer uma interação com as
empresas que precisam de pessoas.
Participante: Estágio.
Participante: Fazer estágio, essas coisas...
Participante: Você já saía daqui formado.
Participante: ...você já saía daqui formado e com um lugar pra você ter uma base pra
você ir trabalhar ou fazer estágio. Eu acho que isso seria fundamental, todo aluno ia
formar. “Eu vou formar! Eu vou formar! Eu vou formar! Eu vou sair empregado, uê!”
[E.E. 3, Ribeirão das Neves e região]
Sair de casa
Participante 1: Eu penso que eu não quero casar, quero sair da casa dos meus pais
Participante 2: Você é um caso à parte.
Participante 3: Ou, você vai sair sozinho? Vai morar sozinho?
Participante 1: É. Meu sonho é morar sozinho.
Participante 3: Você é doido?
Participante 4: Isso daí é cabeça.
[E.E. 5, Ribeirão das Neves e região]
Casamento/união
O casamento continua fazendo parte da lista dos sonhos de muitos participantes. No caso
das mulheres, à primeira vista pode parecer que nada mudou com relação ao passado. Ledo engano.
As jovens de hoje almejam um casamento com independência financeira, em uma visão bastante
crítica da geração das suas mães e com mudanças nas relações de gênero.
Participante: Hoje em dia, muitas meninas querem trabalhar pra não ser sustentada pelo
marido.
[E.E. 4, Ribeirão das Neves e região]
Participante: ...tipo assim, igual lá em casa minha mãe sempre dependeu do meu pai, aí
eu já vendo aquilo, eu já não quero depender sempre de quem eu vou casar, eu quero
ter o meu dinheiro pra gastar e não ficar... assim, 18 anos, formou, vou casar. Hoje eu já
penso. Eu que quero casar, mas primeiro eu quero estudar, quem sabe ter minha própria
casa pra depois eu pensar em casar. Antigamente não, a mulher formou e qual que é o
futuro? Casar. Aí ficava dependendo do marido. Agora, hoje não, a maioria das mulheres
pensa primeiro conquistar seu futuro pra depois ver se realmente ela vai casar.
Participante: Ser independente.
Participante: Primeiro ser independente, né?
Participante: Independente.
[E.E. 6, Ribeirão das Neves e região]
Pensando nas políticas sociais, apesar da reversão do hiato de gênero na educação, ainda fica
a necessidade de que as aspirações femininas sejam levadas em consideração, de forma a garantir às
jovens mulheres as condições para que elas possam, no futuro, fazer escolhas e gerenciar suas vidas
de forma independente.
Filhos
A gravidez na adolescência costuma ser apontada como uma das razões pelas quais as jo-
vens saem da escola. Os participantes confirmam. Há vários relatos sobre ex-colegas de ambos os
sexos que saíram da escola devido à gravidez ou ao nascimento de um filho. Além disso, diferente do
que costuma ser dito, a fecundidade na adolescência pode funcionar como um incentivo a perma-
necer na escola, uma vez que concluir os estudos é visto como condição necessária para conseguir
um bom emprego e dar melhores condições de vida ao filho. Entretanto, continuar estudando só é
possível se a família puder cuidar da criança enquanto a jovem está na escola. O que acontece com
aquelas adolescentes cujas famílias não podem ou não querem assumir mais esta tarefa? Este é o
quinto e último desafio para aqueles que formulam políticas pública para os jovens: oferecer cre-
ches, de forma que as estudantes que são mães não precisem abandonar a escola.
Participante 1: Às vezes dá desânimo mesmo de parar. Tem dia que não tô [**] de vir à
escola, mas venho porque eu tenho que passar né, porque eu já tenho uma filha e se eu
não estudar o que que vai ser de mim e dela? Nada!
Participante 2: Tem que pensar no futuro. Questão de futuro. Você já tem uma filha, eu
vou parar de estudar só porque eu arrumei ela? Eu tenho que pensar em crescer pra mim
dar ela um futuro melhor. Pra mim ter condições de ela chegar e me pedir as coisas e eu
falar assim: “Não, eu posso te oferecer isso. Eu posso te dar isso”.
Participante 1: Igualzinho, eu também tenho condições mesmo de vim, o que não fez
desistir, foi minha família que me ajudou muito e tá me ajudando até hoje com minha
filha, pra cuidar dela, alguma coisa assim, porque fora isso, eu acho que já tinha parado.
É muito cansativo.
[E.E. 4, Ribeirão das Neves e região]
Considerações finais
Os relatos dos jovens participantes dos grupos focais sugerem que, em muitos casos, as aspi-
rações com relação à transição para a vida adulta parecem seguir um caminho tradicional. Indepen-
dentemente da ordem dos eventos, vários planejam se formar, entrar no mercado de trabalho, sair
de casa, se casar e ter filhos.
No caso das adolescentes do sexo feminino, há planos distintos que sempre envolvem a
conclusão dos estudos, o trabalho e a formação de novo domicílio, mas não necessariamente o ca-
samento e a maternidade. Em um dos grupos, o cuidado com o idoso é colocado como análogo ou
substituto ao cuidado com os filhos, reforçando o papel feminino de cuidadora e revelando uma
ligação clara e direta entre o país da juventude e a terra dos idosos.
Participante: Pelo menos eu, no meu caso, eu sempre idealizei a minha vida o seguinte:
eu vou estudar, vou começar a trabalhar, vou ter a minha casa com as minhas coisas. Eu
nunca idealizei um futuro glorioso demais, aquela coisa “eu vou ficar rica, eu vou ter um
marido bonitão, eu vou ter milhares de filhos...”. Eu não quero marido, não quero filhos,
eu quero ter a minha vida.
[E.E. 6, Ribeirão das Neves e região]
Participante: Eu quero ser muito feliz, solteira, sem filhos, zero filhos.
Participante: Eu também não quero casar não.
Participante: Não, eu quero cuidar da minha mãe, daqui a uns anos que eu tenho certeza
que ela vai ficar velhinha...
Moderadora: É?
Participante: Aí ela vai ser minha filha.
Participante: E quando você [*ruídos*] [envelhecer] quem vai cuidar de você?
Grupo: [*ruídos*]
[E.E. 8, Governador Valadares e região]
Por fim, é possível extrair dos relatos cinco desafios para os formuladores de políticas: melhoria
da qualidade das aulas, o que passa pelo aumento da motivação, qualificação e remuneração dos pro-
fessores; aumento da empregabilidade do jovem que se forma, a partir do aumento da oferta de vagas
em cursos técnicos; possibilidade de fazer estágios; ações voltadas especificamente para as adolescen-
tes do sexo feminino, que garantam independência e autonomia financeira no futuro; e incentivo à
permanência das jovens mães na escola, por meio da oferta de creches aos seus filhos. Estas lacunas, se
preenchidas pelas políticas públicas, certamente contribuirão para que os jovens e as jovens de cama-
das populares transitem para a fase adulta e lá tenham uma vida verdadeiramente melhor.
Referências
CAMARANO, A. A.; MELLO, J. L.; KANSO, S. Semelhanças e diferenças nas transições ao longo do ciclo
da vida por regiões e cor/etnia. In: CAMARANO, A. A. (Org.). Transição para vida adulta ou vida
adulta em transição? Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, 2006, p. 61-93.
CAMARANO, A. A.; KANSO S.; MELLO, J. L. e. Transição para a vida adulta: mudanças por período e
coorte. In: CAMARANO, A. A. (Org.). Transição para vida adulta ou vida adulta em transição? Rio
de Janeiro: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, 2006, p. 95-135.
VIEIRA, J. M. Transição para a vida adulta no Brasil: análise comparada ente 1970 e 2000. Revista
Brasileira de Estudos de População, v. 25, n. 1, p. 27-48, jan./jun. 2008.
Um dos debates recentes no campo das políticas públicas voltadas para saúde refere-se ao
impacto decorrente de mudanças demográficas e epidemiológicas sobre os sistemas de saúde (FIN-
LAYSON et al., 2004). Diversos países têm passado por alterações na estrutura etária e no padrão
de mortalidade e morbidade de sua população, com consequências sobre custos e utilização de
serviços (LLOYD-SHERLOCK, 2000; REINHARDT, 2003; CUTLER, 2006; STRUNK et al., 2006). A transição
demográfica, que tem sido observada em vários países desenvolvidos e em desenvolvimento (GOL-
DSTEIN et al., 2009; BONGAARTS, 2008), é explicada por mudanças no comportamento histórico das
taxas de mortalidade e fecundidade, sendo o início de todo processo, em geral, a queda sustentada
da mortalidade (ALVES, 2008). No entanto, é a redução da fecundidade a grande responsável pela
desestabilização da estrutura etária, com encurtamento da base da pirâmide e aumento relativo de
idosos no conjunto da população, acarretando o denominado envelhecimento populacional (CAR-
VALHO; GARCIA, 2003).
No Brasil, a transição demográfica teve seu início tardio nos anos 1940, com o decréscimo da
mortalidade, intensificando-se a partir do final da década de 1960, com a queda vertiginosa da fe-
cundidade. A taxa de fecundidade total, de 5,8 filhos por mulher em 1970, passou para 2,4 em 2000,
o que representou um declínio de quase 59% (CARVALHO, 2004) e culminou em um rápido processo
de envelhecimento da população brasileira. Em 1940, as pessoas com mais de 60 anos correspon-
diam a cerca de 4% da população total, passando em 2000 para 8,6% (CARVALHO; GARCIA, 2003). Em
2050, estima-se que este subgrupo populacional represente aproximadamente 30% da população
brasileira, com mais de 64 milhões de idosos (IBGE, 2008).
Além da transição demográfica, observa-se também a transição epidemiológica, isto é, uma
mudança na importância das causas primárias da mortalidade e da morbidade (OMRAN, 2005). Na
209
Impactos das políticas sociais e das mudanças demográficas na saúde Mônica Viegas Andrade et al.
gundo Weisbrod (1991), quando uma tecnologia médica é introduzida, há um aumento da demanda
de pacientes e provedores por essa nova tecnologia, que altera o tipo e a intensidade dos proce-
dimentos adotados no diagnóstico e tratamento de doenças, medicamentos, bem como a forma
como o cuidado é oferecido. A tecnologia médica é percebida de modo bastante homogêneo entre
os diversos tipos de países. No setor saúde, diferentemente de outros setores industriais, o gap tec-
nológico é mais reduzido entre países com diferentes níveis socioeconômicos, o que se explica pelos
impactos diretos de bem-estar decorrentes da disponibilidade de oferta de serviços de saúde. O uso
mais intensivo de tecnologias é heterogêneo entre os tipos de cuidado e se dá de forma importante
principalmente nos serviços hospitalares.
Neste trabalho levantamos algumas questões relacionadas aos impactos das mudanças de-
mográficas no sistema de saúde brasileiro, em particular sob a ótica da utilização de serviços hospita-
lares e do financiamento. No Brasil, a demanda por serviços de saúde é financiada de forma pública e
privada, com participação praticamente igualitária. O financiamento privado ocorre de duas formas:
por meio de planos e seguros saúde e por desembolso direto. No sistema público, enfatizamos os
efeitos do envelhecimento sobre a utilização de serviços hospitalares, bem como os gastos com
serviços hospitalares, que representam maior parte da despesa pública com saúde e são majoritaria-
mente financiados no âmbito do Sistema Único de Saúde. No setor de planos e seguros saúde, abor-
damos o impacto do envelhecimento populacional na sustentabilidade das carteiras, considerando
principalmente os planos por adesão individual. Por fim, cabe também mencionar os impactos no
âmbito dos gastos pessoais com saúde, que constituem a terceira parte do tripé do financiamento
dos serviços de saúde no Brasil.
mudanças nas taxas de utilização de serviços hospitalares observadas na última década. O méto-
do que incorpora a tendência das taxas de internação emprega tanto a abordagem determinística
como a estocástica, segundo a proposta de Rodrigues (2010).
A análise das taxas de utilização de serviços hospitalares, entre 1993 e 2007, evidencia uma
tendência clara de redução das internações em Minas Gerais, que acompanha a tendência observa-
da para o Brasil (Gráfico 1). Em parte, essa diminuição deve-se às mudanças institucionais ocorridas
nesse período, como a fixação e redução gradual de quotas de autorizações de internações hospita-
lares no Estado. No Brasil, o financiamento público dos serviços hospitalares utiliza como critério de
distribuição dos recursos o tamanho da população. O volume de recursos repassado pelo Ministério
da Saúde é definido em função de um percentual da população preestabelecido. Historicamente, o
que se observou foi uma redução desse percentual no Estado de Minas Gerais. Por outro lado, de-
vem também ser ressaltadas as mudanças no modelo de cuidado, que reduziram principalmente as
internações sensíveis à atenção ambulatorial (PERPÉTUO; WONG, 2006).
Gráfico 1
Taxas de internação totais padronizadas por 100 habitantes
Estado de Minas Gerais e Brasil – 1993-2007
Fonte: Ministério da Saúde. Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH/SUS); IBGE. Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios – PNAD – 1993 a 2007.
Tabela 1
Variação no número de internações entre 2007 e 2050,
segundo diferentes modelos de projeção
Estado de Minas Gerais
Métodos de projeção Variação do número de internações entre 2007 e 2050 (%)
Efeito demográfico puro 58,50
Determinístico -3,60
Lee-Carter
Projeção média 4,30
Limite superior do intervalo de confiança de 95% -9,10
Limite inferior do intervalo de confiança de 95% 19,70
[Número de internações em 2007] 1.144.850
Fonte: Ministério da Saúde. Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde – SIH/SUS 1993 a 2007; IBGE. Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 1993, 1995 a 1999, 2001 a 2007. Censo Demográfico 2000; Cedeplar e Labes/Fiocruz (2008).
Isso mostra que não se pode atribuir à demanda futura um cenário que depende, exclusi-
vamente, do efeito demográfico, uma vez que este, isoladamente, não é o único responsável pela
demanda por serviços de saúde. Apesar de os idosos apresentarem as maiores taxas de internação
em relação aos outros grupos etários e constituírem o segmento com a maior taxa de crescimento
na população, são também aqueles que têm registrado uma das maiores reduções na taxa de inter-
nação entre os grupos etários. Por essa razão, o efeito demográfico sofre arrefecimento quando são
consideradas as mudanças nas taxas de utilização por grupo etário.
A dinâmica da utilização de serviços é parte de um sistema complexo com vários fatores in-
terdependentes. A utilização tem como elemento primário e central a necessidade pela manutenção
ou melhoria do estado de saúde, sendo a necessidade dada, principalmente, por características de-
mográficas e do estado de saúde. Como forma de satisfazer essa necessidade, as pessoas procuram
os serviços de saúde, cujos fatores para a busca dependem, também, de aspectos socioeconômicos,
culturais e institucionais, como a oferta de serviços. No caso do Brasil, é sabido que a redução obser-
vada nas taxas de utilização é, em grande parte, motivada principalmente por aspectos institucio-
nais do modelo de organização do cuidado do sistema público de saúde. Resta saber em que medida
essa tendência é sustentável ao longo do tempo. De qualquer forma, se continuar a tendência de
redução observada nos últimos 15 anos, os resultados são menos assustadores do que inicialmente
se apresentavam.
Tabela 2
Distribuição da população com plano de saúde privado, por tipo de adesão,
segundo grupos etários
Brasil – 1998-2008
Em porcentagem
Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 1998, 2003 e 2008.
Tabela 3
População com cobertura de plano privado, por tipo de adesão do plano,
segundo grupos etários
Brasil – 1998,2003 e 2008
Em porcentagem
Referências
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1991.
Gráfico 1
Esperança de vida ao nascer e projeções
Brasil – 1950-2050
1
Esta nota contém um resumo das ideias principais apresentadas na sessão Impacto das Políticas Sociais e das Mudanças
Demográficas na Saúde do Brasileiro: Desafios para o Sistema Único de Saúde Brasileiro, do Encontro da Abep 2010.
Agradeço aos participantes pelos comentários e sugestões.
219
Políticas sociais recentes e mortalidade no Brasil Rodrigo R. Soares
Parte dessa melhoria está associada ao crescimento econômico experimentado pelo país no
período, compreendendo o milagre econômico e grande parte do seu processo de industrialização e
urbanização. Mas esses avanços persistiram mesmo em momentos nos quais o país enfrentou estag-
nação econômica, como no final dos anos 1980 e na década de 1990. Isso ilustra o fato de que as me-
lhorias na saúde da população brasileira no período do pós-guerra não parecem ter sido derivadas
exclusivamente de melhorias econômicas. Uma parcela significante das reduções de mortalidade e
morbidade ocorreu de modo independente de melhorias na renda e nas condições materiais de vida
ao nível individual.
Nesta nota, é discutido o papel potencial das políticas sociais na determinação das mudan-
ças recentes de mortalidade no Brasil. Não se pretende fazer aqui uma revisão ampla da literatura
brasileira ou internacional, mas apenas apresentar algumas reflexões sobre o tema. O leitor interes-
sado pode encontrar uma discussão mais aprofundada nos vários artigos disponíveis sobre o tema,
como, por exemplo, Caldwell (1986), Hobcraft (1993), Palloni e Wyrick (1981), Preston (1980) e Soares
(2007b). Assim, na seção a seguir, é descrito, em um pouco mais de detalhe, o padrão de ganhos de
esperança de vida no país. Em seguida, discute-se o papel potencial de algumas políticas sociais de
importância particular na área de saúde pública. Posteriormente apresentam-se os desafios futuros
colocados por essas mudanças demográficos e, finalmente, são realizados alguns comentários finais.
Como mencionado anteriormente, uma fração relevante das melhorias recentes na saúde
da população brasileira parece não ter sido associada diretamente a melhorias de renda. O Gráfico 2,
reproduzido de Soares (2007a), explora esse ponto em mais detalhe, apresentando dados de espe-
rança de vida e renda per capita referentes a 1970 e 2000, para os municípios brasileiros, calculados
pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.2 O gráfico apresenta curvas logarítmicas ajustadas
à relação entre renda per capita e esperança de vida para os municípios brasileiros, em 1970 e 2000,
reproduzindo nesse contexto o exercício conduzido inicialmente por Preston (1975), na comparação
de renda e esperança de vida entre países.
As mudanças agregadas observadas no país durante esse período são substantivas: a renda
per capita cresce em 170%, enquanto a esperança de vida aumenta em mais de dez anos. Além disso,
o padrão das mudanças apresenta uma dimensão análoga ao que foi observado no contexto inter-
nacional: existe uma dimensão de melhoria na esperança de vida entre municípios brasileiros que
2
Para propósitos de comparação, a renda per capita foi normalizada de modo que o valor observado para o Brasil em 1990
correspondesse àquele da Penn World Table 6.1, medido em dólares internacionais de 1996. A esperança de vida, por
sua vez, foi normalizada de modo que a média para o Brasil naquele mesmo ano correspondesse à observada no World
Development Indicators.
não está associada a aumentos na renda per capita. Para níveis constantes de renda, a esperança de
vida no período aumentou tipicamente em mais de cinco anos. Isso significa que mais de 50% dos
ganhos em esperança de vida no Brasil durante esse período não foram relacionados a melhorias na
renda per capita. Esse resultado é mais forte do que aquele observado entre países no mesmo perío-
do, em parte em decorrência do efeito da Aids na África subsaariana.
Mas o padrão observado entre municípios brasileiros também é diferente do internacional
em um aspecto importante. A relação entre renda per capita e esperança de vida é muito mais incli-
nada quando comparamos diferentes países do mundo. Esse ponto é discutido em mais detalhe em
Soares (2007a), mas ele sugere que existe uma dimensão de variação nos determinantes de saúde
entre países que é mantida constante quando comparamos diferentes municípios do Brasil (evidên-
cia semelhante é apresentada para diferentes regiões do México em García-Verdú, 2005). É também
verdade que reduções em mortalidade foram muito mais homogêneas entre municípios brasileiros
do que entre países do mundo.
Gráfico 2
Renda per capita e esperança de vida
Municípios do Brasil – 1970-2000
Essas duas observações são particularmente relevantes porque a diferença no padrão de re-
dução de mortalidade entre países e dentro de um mesmo país pode revelar algo a respeito da pró-
pria natureza dessas reduções em mortalidade. Mudanças que tiveram papel mais homogêneo em
todo o território nacional são, portanto, candidatas naturais para explicar as melhorias em esperança
de vida observadas no Brasil. Sob uma perspectiva mais geral, bens públicos associados à saúde po-
dem estar por trás do comportamento diferenciado da relação entre renda per capita e esperança de
vida entre países e dentro de um único país.
Vale ressaltar também outro fato amplamente reconhecido. Os ganhos em esperança de vida
não foram devidos a reduções homogêneas na mortalidade em diferentes grupos etários. Na realida-
de, a maior parte da melhoria na esperança de vida registrada até hoje decorreu de reduções na mor-
talidade nos primeiros anos de vida, com um pequeno papel mais recente sendo também atribuído à
mortalidade em idades mais avançadas. O Gráfico 3 ilustra o padrão recente de queda na mortalidade
em três grupos etários entre 1994 e 2007: menos de um ano; entre 15 e 59 anos; e 60 anos e mais.
Gráfico 3
Taxas de mortalidade, por grupos etários (1)
Brasil – 1994-2007
Políticas sociais
Os padrões identificados na seção anterior colocam a questão sobre quais seriam os deter-
minantes das reduções de mortalidade observadas no Brasil ao longo das últimas décadas. Seriam
esses fatores ainda associados majoritariamente à primeira etapa da “transição epidemiológica”, se-
melhantes àqueles documentados na experiência anterior dos países desenvolvidos, ou haveria al-
guma diferença?
Uma possibilidade, por exemplo, é a expansão significativa no acesso a atenção básica e pre-
venção por uma parcela crescente da população. Esse é um fenômeno recente, associado em grande
parte à expansão do Programa Saúde da Família a partir de meados dos anos 1990. Mas mesmo
fatores que foram importantes nos 30 anos anteriores, tais como infraestrutura de saúde pública e
educação, podem ter continuado cumprindo um papel importante.
Análises sistemáticas dos estudos conduzidos nas últimas décadas, assim como novos estu-
dos com metodologias empíricas robustas e comparáveis, são necessárias para que essa pergunta
seja respondida de forma inteiramente confiável. Aqui, apenas são revistos alguns estudos relaciona-
dos ao tema, apontando-se as conclusões sugestivas que a leitura conjunta desses resultados oferece.
Soares (2007a) utiliza dados do censo e analisa reduções de mortalidade entre 1970 e 2000,
tentando entender o papel da infraestrutura de saúde pública, da renda per capita e da educação
na determinação das mudanças observadas. O artigo analisa dados municipais e faz uso de um pai-
nel dinâmico, aplicando a estratégia sugerida por Arellano-Bond para tentar tratar, ainda que muito
parcialmente, o problema de endogeneidade de algumas variáveis independentes. Os problemas
empíricos típicos nesse contexto são: (i) municípios podem responder a pioras nas condições de
saúde por meio de investimentos em infraestrutura de saúde pública, caso no qual as variáveis inde-
pendentes seriam endógenas a mudanças na mortalidade; e (ii) municípios com melhorias em deter-
minadas dimensões de política associadas à saúde podem estar experimentando avanços também
em várias outras dimensões não observáveis de políticas públicas, caso no qual o efeito das variáveis
independentes consideradas poderia ser sobre-estimado. A estratégia aplicada procura tratar desses
problemas potenciais da melhor forma possível. Os resultados do exercício sugerem que em torno
de 40% dos ganhos em esperança de vida observados entre 1970 e 2000 foram devidos a melhorias
no acesso a água e saneamento e reduções na taxa de analfabetismo. Melhorias na renda per capita
explicariam, adicionalmente, 35% dos ganhos registrados. Conjuntamente, os fatores considerados
seriam responsáveis por quase 80% dos ganhos em esperança de vida verificados no período (outros
artigos analisando temas correlatos incluem ALVES; BELUZZO, 2004; MERRICK, 1985).
Rocha e Soares (2010), por sua vez, estimam o impacto da expansão do Programa Saúde da
Família (PSF) sobre mortalidade em diferentes grupos etários e por várias causas de morte. O artigo
usa também dados municipais desde o início dos anos 1990 até final da década de 2000 e aplica uma
estratégia de diferenças-em-diferenças, explorando o processo gradual de expansão do PSF para
estimar seu impacto sobre a mortalidade. Os resultados apontam para um impacto significativo da
adoção do PSF sobre a mortalidade, principalmente a infantil. Entre outras coisas, os resultados indi-
cam que a expansão do PSF foi responsável por aproximadamente 65% da redução da mortalidade
perinatal observada desde 1994. Numa perspectiva mais geral, o artigo sugere que a expansão do
acesso à atenção básica, a partir dos anos 1990, pode ter sido parcialmente responsável pela intensa
queda da mortalidade infantil no período (outros artigos analisando diferentes dimensões do PSF
incluem AQUINO et al., 2009; MACINKO et al., 2006 e 2007).
Conjuntamente, os resultados desses e de outros estudos sugerem que uma combinação de
fatores tipicamente identificados nas primeiras reduções de mortalidade no Brasil (e em outras expe-
riências históricas relativas ao primeiro estágio da transição epidemiológica) e expansão no acesso
a serviços de atenção básica pode estar por trás dos ganhos em esperança de vida observados nas
últimas décadas.
Os Gráficos 4 a 7 mostram que a melhoria em algumas dessas dimensões desde os anos 1990
foi realmente substancial. A porcentagem de domicílios cobertos pelo Programa Saúde da Família,
por exemplo, aumentou de zero no início da década de 1990 para mais de 90% já a partir de 2005. A
cobertura média do programa por município foi de aproximadamente 40% da população em todo o
período. Ao mesmo tempo, a população vivendo em domicílios com acesso a água potável na rede
geral aumentou de menos de 70% no início dos anos 1990 para mais de 90% em 2007, enquanto a
população em domicílios com instalação adequada de esgoto passou de menos de 50% para apro-
ximadamente 70%. Finalmente, a população acima de 15 anos analfabeta foi reduzida de próximo a
20% para 10%.
Gráfico 4
Municípios cobertos pelo Programa Saúde da Família
Brasil – 1993-2006
Uma análise estatística cuidadosa é necessária para identificar o papel desses diferentes fa-
tores na redução recente da mortalidade no Brasil. Mas, a título de ilustração, podemos utilizar os
dados apresentados nos Gráficos 4 a 7 e as estimativas de efeitos obtidas a partir dos estudos citados
anteriormente para sugerir as magnitudes dos efeitos que, a princípio, podem ser esperados a partir
das mudanças retratadas nesses gráficos.
Gráfico 5
População em domicílios com acesso a água potável na rede geral
Brasil – 1988-2007
Gráfico 6
População em domicílios com instalação adequada de Esgoto
Brasil – 1988-2007
Gráfico 7
População acima de 15 anos analfabeta
Brasil – 1988-2007
Adotando esse tipo de procedimento para fazer um cálculo sugestivo do efeito dessas mu-
danças observadas ao longo das últimas décadas, podemos grosseiramente atribuir um papel aos
diferentes fatores e tentar decompor a redução de mortalidade entre 1995 e 2007 nos seus deter-
minantes potenciais. Para facilitar a discussão, concentremo-nos na mortalidade infantil. No período
em questão, foi registrada uma redução de aproximadamente 18 óbitos por mil nascidos vivos na
mortalidade antes de um ano de idade. As estimativas dos estudos citados anteriormente, junta-
mente com as mudanças registradas nos gráficos, sugerem que a implantação do Programa Saúde
da Família teria sido responsável por 28% dessa redução, enquanto a expansão de acesso a água
e saneamento e a melhoria educacional seriam responsáveis por outros 22% desse total. Ou seja,
conjuntamente, a melhoria na infraestrutura de saúde pública, na educação e no acesso a serviços
básicos de saúde primária teriam sido responsáveis por uma diminuição de 9 óbitos por mil nascidos
vivos na mortalidade infantil, aproximadamente 50% da mudança observada entre 1995 e 2007.
As reduções de mortalidade observadas no Brasil ao longo das últimas décadas trazem tam-
bém consigo implicações sobre a estrutura demográfica que colocam uma série de novos desafios à
continuidade das melhorias na saúde da população. O decréscimo recente da mortalidade infantil,
por exemplo, afeta diretamente a incidência de causas de morte e, portanto, implica que ganhos
futuros na esperança de vida deverão necessariamente advir de novas frentes.
De forma mais concreta, sabemos que a queda substantiva no número de mortes por afec-
ções no período perinatal esteve em parte associada ao papel essencial do PSF. Essas foram reduções
na mortalidade decorrentes da expansão inicial do programa e, dada a queda na incidência, é impro-
vável que decréscimos de semelhante magnitude na mesma causa de morte continuem sendo ob-
servados por muito tempo. Um pouco mais indiretamente, reduções de mortalidade implicam um
envelhecimento da população que, por si só, também acarreta mudanças na importância agregada
de diferentes causas de morte.
Gráfico 8
Distribuição da população, por grupos etários
Brasil – 1950-2050
Gráfico 9
Participação de algumas doenças no total de mortes
Brasil – 1996-2007
Gráfico 10
Participação de algumas doenças no total de mortes
Brasil – 1996-2007
Comentários finais
Mudanças como as discutidas na última seção, de magnitude tão grande num período de
tempo tão curto, refletem o fato de que o Brasil ainda passa por transformações demográficas pro-
fundas. Do ponto de vista da perspectiva futura de melhorias na saúde, isso implica que ganhos adi-
cionais serão muito provavelmente de natureza distinta dos ganhos observados desde o pós-guerra.
Bens públicos associados à infraestrutura de saúde pública permitem ganhos em larga escala na
população, sem a necessidade de melhoria imediata na renda ou condições materiais de vida dos
indivíduos. Mas, uma vez exauridas as reduções em mortalidade tipicamente associadas ao primeiro
estágio da transição epidemiológica, poucos ganhos adicionais podem advir dessas mesmas fontes.
A partir de então, é possível que decréscimos adicionais em mortalidade – inevitavelmente em ida-
des mais avançadas – passem a exigir mudanças de hábitos ou uso de novas tecnologias, ambas com
custos e benefícios sendo incorridos pelos indivíduos.
O Gráfico 11 ilustra o fato de que o nível de mortalidade infantil no Brasil, apesar de ainda dis-
tante daquele observado nos países desenvolvidos (OECD), tem se aproximado consistentemente des-
te ao longo dos últimos 30 anos. Mas, quando considerada a mortalidade adulta (ilustrada com o caso
feminino no gráfico), o gap aumenta consistentemente ao longo das últimas décadas. Isso reflete, por
um lado, todas as mudanças discutidas anteriormente e o progresso observado no Brasil nas últimas
décadas e, por outro, o processo já em andamento de redução de mortalidade em idades mais avan-
çadas nos países desenvolvidos, que ainda não se fez sentir fortemente no Brasil. Em outras palavras,
a infraestrutura de saúde pública gerou decréscimos substanciais na mortalidade, mas o escopo para
ganhos adicionais vai se tornar cada vez mais limitado (para uma discussão relacionada sobre tecnolo-
gias e reduções de mortalidade por causa de morte, ver VALLIN; MESLÉ, 2004).
Gráfico 11
Razão entre moRtalidade no Brasil e na OECD (países ricos)
1960-2008
A Tabela 1 ilustra esse ponto, apresentando a razão entre diferentes insumos de saúde no
Brasil e nos países desenvolvidos (um número igual a 0,9 na tabela indica que o valor da respectiva
variável no Brasil é 90% da média dos países ricos da OECD). Em dimensões como acesso a água,
imunização e subnutrição, os números brasileiros não parecem tão diferentes daqueles observados
nos países desenvolvidos (a despeito de uma porcentagem um pouco maior de crianças subnutri-
das). A exceção em termos de infraestrutura de saúde pública diz respeito a saneamento. Nesse caso,
ainda existiria espaço para melhorias consideráveis na cobertura da rede. Mas, além disso, quando
olhamos para insumos de saúde mais ”sofisticados”, tais como número de médicos ou leitos hospita-
lares por mil habitantes, a situação brasileira deixa muito a desejar.
Tabela 1
Razão de insumos de saúde entre Brasil e OECD (países ricos)
2005-2008
Água Subnutrição Imunização Saneamento Médicos Leitos
(%pop) (% pop) DPT (% pop) (1.000 hab) hospitalares
(1.000 hab)
2006 2006 2008 2006 2005 2005
0,91 1,2 1,02 0,71 0,43 0,39
Fonte: Cálculos a partir de World Bank. World Development Indicators – WDI.
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Ana Carolina Maia é doutora em Economia pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG e
graduada em Ciências Econômicas pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Professora
da Universidade Federal de Alfenas e pesquisadora da UFMG. Tem experiência na área de Economia,
com ênfase em Economia da Saúde, atuando principalmente nas áreas de regulação, sistemas de
saúde, sistema de saúde suplementar brasileiro, informação assimétrica, monitoramento e eficiência
hospitalar.
Carmen Hein de Campos é doutoranda em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica –
PUC-RS e mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC e Universidade de
Toronto, Canadá. Professora convidada do Curso de Especialização em Segurança Pública da PUC-RS.
Integrou o Consórcio de ONGs que elaborou o anteprojeto da Lei Maria da Penha. Coordenadora
Nacional do Comitê Latino Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher – Cladem/
Brasil.
Elisabete Dória Bilac é doutora em Ciências Humanas pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas da Universidade de São Paulo – FFLCH-USP e pós-doutora pelo Centre d’Études des
Mouvements Sociaux e pelo Núcleo de Estudos de População – Nepo/Unicamp. Professora
aposentada do Departamento de Sociologia da FLCH da Unesp campus Araraquara. Pesquisadora do
CNPq, junto ao Nepo/Unicamp, onde desenvolve atividades de pesquisa e integra, como orientadora
e responsável por disciplinas, o corpo docente do Programa de Pós-Graduação em Demografia.
Entre outras atividades realizadas na área de Demografia e Estudos de População, destacam-se a
coordenadoria da área de pesquisa do Programa Latino Americano de População – Prolap/Clacso
(1993-1996) e a representação e coordenação da área de Demografia no Comitê de Ciências Sociais
Aplicadas do CNPq (2005-2008).
Elza Salvatori Berquó é demógrafa, professora titular de Bioestatística da Faculdade de Saúde Pública
da Universidade de São Paulo – USP. Coordenadora da Área de População e Sociedade do Centro
Brasileiro de Análise e Planejamento – Cebrap. Fundadora do Núcleo de Estudos de População –
Nepo da Unicamp. Membro titular da Academia Brasileira de Ciências e da Ordem Nacional do Mérito
Científico, Classe da Grã-Cruz. Membro da IUSSP, da PAA e da Abep.
Gavin W. Jones é professor no Asia Research Institute da National University of Singapore. Foi
professor do programa de Demografia e Sociologia da Australian National University. Seus interesses
de pesquisa estão focados nas regiões Sudeste e Leste da Ásia e incluem temas como casamento e
família, determinantes da fecundidade, urbanização e desenvolvimento.
George Martine é sociólogo/demógrafo e autor de vários livros e artigos focados nos temas de
dinâmica populacional, desenvolvimento social e meio ambiente. Foi diretor da equipe técnica
do Fundo de População das Nações Unidas – UNFPA para América Latina e o Caribe, senior fellow
no Centro de População e Desenvolvimento da Universidade de Harvard, coordenador de vários
projetos de desenvolvimento social do PNUD e presidente da Abep. Atualmente trabalha como
consultor independente.
Ivan Targino é economista, doutor e pós-doutor pela Universidade de Paris I. Professor associado
do Departamento de Economia da Universodade Federal da Paraíba – UFPB, integrante do corpo
docente dos Programas de Pós-Graduação em Economia e em Geografia da UFPB.
José Alberto Magno de Carvalho é doutor em Demografia pela London School of Economics and
Political Science. Professor titular aposentado, professor emérito e pesquisador residente do
Departamento de Demografia do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional – Cedeplar
da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Foi fundador do Cedeplar, em 1967. Diretor
executivo do Instituto de Pesquisas Econômicas, Administrativas e Contábeis de Minas Gerais –
Ipead desde 2010. Diretor da Faculdade de Ciências Econômicas – Face/UFMG, gestão 2006/2010.
Presidente emérito da Internacional Union for the Scientific Study of Population – IUSSP – Bélgica.
Sócio-Fundador da Associação Brasileira de Estudos Populacionais – Abep e presidente entre 1978
e 1982.
José Marcos Pinto da Cunha é pós-doutor pelo Population Research Center, da Universidade do
Texas em Austin, doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp,
mestre em Demografia pelo Centro Latino Americano de Demografia e graduado em Estatística
pela Universidade de São Paulo – USP. Professor livre docente no Departamento de Demografia
do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas e pesquisador do Núcleo de Estudos de População,
ambos da Unicamp. Desenvolve pesquisas sobre os seguintes temas: dinâmica metropolitana e
vulnerabilidade sociodemográfica, segregação socioespacial, migração interna e urbanização.
Leila Ervatti é demógrafa e mestre em Estudos Populacionais e Pesquisa Social pela Escola Nacional
de Ciências Estatísticas – Ence/IBGE. Trabalha no IBGE desde 1979, em atividades de planejamento
e análise nos Censos Demográficos e na Pesquisa de Orçamentos Familiares. Atua na Gerência de
Análise da Dinâmica Demográfica do Departamento de População e Indicadores Sociais, trabalhando
com estimativa dos parâmetros demográficos com vistas às projeções de população. Como membro
do Comitê do Censo Demográfico 2010, participou do planejamento e supervisão das atividades
do Censo. Áreas de interesse: migrações internas e internacional, deslocamentos e projeções
populacionais.
Marcia Sprandel é doutora em Antropologia Social pela Universidade de Brasília. Assessora técnica
no Senado Federal. Integra o Grupo de Trabalho de Migrações Internacionais da Associação Brasileira
de Antropologia. Consultora da Organização Internacional do Trabalho nas áreas de trabalho infantil,
trabalho escravo e tráfico de pessoas.
Marcia C. Castro é doutora em Demografia pela Princeton University, mestre em Demografia pela
Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG e graduada em Estatística pela Universidade do Estado
do Rio de Janeiro. Assistant professor of Demography na Harvard School of Public Health e Faculty
Associate – Harvard University Center for the Environment. Áreas de pesquisa incluem: fatores de risco
para transmissão de malária (África e Amazônia Brasileira); urbanização, transformações ambientais
e saúde; implicações sociais e ambientais de projetos de desenvolvimento; aplicações de sistemas de
informações geográficas, sensoriamento remoto e análise espacial; métodos demográficos (ênfase
em mortalidade); e deslocamentos populacionais em função de eventos climáticos extremos.
Maria Coleta Oliveira é doutora em Ciências Humanas e Sociologia pela Universidade de São Paulo
– USP. Professora Livre Docente da Universidade Estadual de Campinas – Unicamp (Departamento
de Demografia/IFCH), pesquisadora do Núcleo de Estudos de População – Nepo/Unicamp, membro
do Conselho Consultivo da Associação Latinoamericana de População – Alap, associação na qual
integra a Rede Lafam de estudos sobre a família, membro da IUSSP. Presidiu a Abep de 2003 a 2004
e integrou o Council da IUSSP, seu órgão diretivo superior, no período de 2006 a 2009. Desenvolve
pesquisa especialmente nos seguintes temas: família, reprodução e gênero, fecundidade.
Maria Helena Henriques Mueller é doutora em Ciências da População pela Universidade de Harvard e
mestre em Demografia pela Universidade da Califórnia, Berkeley. Consultora e staff de agências das
Nações Unidas nas áreas de política social e de saúde, coordenadora das atividades de juventude da
Unesco e chefe da seção de Juventude dessa Organização, diretora do pavilhão das Nações Unidas
na Expo 2005, em Aichi. Desde 2008, aposentada, participa como voluntária de atividades nas áreas
de cultura e educação, no município de Paraty-RJ.
Mônica Viegas Andrade é pós-doutora pela Universidade Pompeu Fabra e doutora em Economia
pela Escola de Pós-Graduação em Economia Fundação Getulio Vargas. Em 2001 ganhou o prêmio
Haralambos Simeonidis de melhor tese no Brasil, concedido pela Associação Nacional de Pós-
Graduação em Economia – Anpec. Professora associada II do Departamento de Economia e do
Programa de Pós-graduação em Economia da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. A
pesquisa acadêmica concentra-se em economia aplicada, com ênfase em economia do bem-estar
social. É líder do grupo de pesquisa em Economia da Saúde e Criminalidade – GEESC no CNPq.
Neide Lopes Patarra é livre docente pelo Departamento de Sociologia da Universidade Estadual de
Campinas – Unicamp, doutora em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo – USP, mestre em
Demografia com ênfase em Estudos Populacionais pela Universidade de Chicago, bacharel e licenciada
em Ciências Sociais pela USP. Professora aposentada pela Unicamp e pesquisadora aposentada pela
Ence/IBGE. Tem experiência na área de estudos populacionais, atuando principalmente nos seguintes
temas: migrações internacionais e internas, distribuição da população, população e desenvolvimento
regional, população e espaço, urbanização, políticas migratórias.
Rodrigo R. Soares é doutor em Economia pela University of Chicago. Professor associado na Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-RJ. Foi por três vezes ganhador do Prêmio Haralambos
Simeonidis da Anpec (2002, 2006 e 2009) e, em 2006, ganhou o Prêmio Kenneth J. Arrow da
International Health Economics Association, pelo melhor artigo publicado internacionalmente na
área de economia da saúde. É também research fellow do IZA (Alemanha) e research affiliate do J-PAL
Latin America (Abdul Latif Jameel Poverty Action Lab, Latin America Office).
Rosana Baeninger é doutora em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp,
professora do Departamento de Demografia e pesquisadora no Núcleo de Estudos de População
– Nepo/Unicamp. A área temática de estudo refere-se às migrações internas e internacionais.
Coordenadora do Projeto Temático Observatório das Migrações em São Paulo (Fapesp/CNPq).
Sandra Garcia é doutora em Demografia pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp, mestre
em Gênero e Estudos do Desenvolvimento pelo Institute of Development Studies, Sussex University,
Inglaterra, e bacharel em Antropologia pela Universidade de Brasília. Pesquisadora sênior da Área de
População e Sociedade do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento – Cebrap. Membro da Abep.
Wasmália Bivar é Ph.D em Economia pela Universitá Commerciale Luigi Bocconi, Milão e mestre em
Economia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-RJ. Diretora de Pesquisa do
IBGE. Foi chefe da Divisão de Planejamento do Departamento de Indústria (Deind), do IBGE, gerente
de pesquisa, chefe da Divisão de Análise e Metodologia do Deind, coordenando a Pesquisa Industrial
de Inovação Tecnológica (Pintec), e coordenadora da nova base do Sistema de Contas Nacionais.