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1 – Introdução
2 - Preâmbulo Histórico
A partir da Revolução Industrial temos um homem cada vez mais urbano, uma
vida mais mecanizada, uma relação com o tempo que é diferente. Vemos uma
fragmentação do gesto, onde o homem fica mais isolado da comunidade, do outro e da
natureza. Se ele faz parte de um todo, o homem agora é como uma peça numa
engrenagem.
Quando Agamben fala do início do cinema, não é exatamente sobre o silêncio que
ele se refere, mas sobre a potência que existe na capacidade do corpo de se sinalizar,
independente da presença da linguagem.
O gesto cinematográfico em sua forma pura não seria, então, nem a expressão do
ator de uma vida interior (psicológica) nem a ação que leva a uma conclusão da narrativa,
mas a própria exibição do corpo estando no meio, explorando seus limites e
possibilidades. Enumera experiências no campo da arte que se pautaram por uma tentativa
de recuperar os gestos perdidos: a dança de Isadora Duncan, o romance proustiano, a
poesia de Rilke e o cinema mudo aparecem como exemplos dessa investida em favor dos
gestos.
Os primeiros filmes produzidos na história do cinema estariam mais próximos do
gesto. Pode-se citar as primeiras gravações dos irmãos Lumière (A Saída dos
trabalhadores da fábrica e Banho de mar). Onde o que temos nesses primeiros filmes são
corpos apenas sendo, sem preocupações com o sentido da narrativa ou sua vida interior.
Puro gesto, portanto.
Giorgio Agamben coloca o cinema em uma posição de destaque na transição para
a biopolítica. Ele afirma que a comunicabilidade humana na forma do gesto é registrada
(pelo cinema) no momento do seu desaparecimento. O cinema surge de uma crise no
movimento dos corpos. Corpos esses que, estavam perdendo sua naturalidade,
caminhando para uma fragmentação do movimento.
Agamben mostra isso mais especificamente e localiza nas últimas décadas do séc.
XIX falando de algumas experiências científicas, mas especificamente do andar humano
e do falar e cita diversos relatos e tratados de experiências como a de Gilles de la Tourette
onde resulta em uma análise altamente detalhada, especializada do caminhar altamente
fragmentada. Mostra o quanto esse detalhamento se parece em essência com as
experiências nessa mesma época e que deram origem ao cinematógrafo, primeiras
experiências cinematográficas. Aqui então ele introduz o que vai ser o centro da sua
análise do gesto que é justamente a questão do cinema.
A partir da experiência cinematográfica é que vai se propor a pensar o significado
do gesto porque ele vê o cinema como registro da perda dos gestos. Mas por outro lado,
além de um registro dessa humanidade que perdeu os seus gestos por causa dessa crise
mais profunda é também uma tentativa de reapropriação do gesto e essa é a grande
importância pra ele: o cinema para pensar no gesto num sentido mais amplo.
Agamben parte do pensamento do que é o cinema pra pensar o que é o gesto.
Podemos conjecturar então que o cinema é não só o registro da perda, mas uma tentativa
de reapropriação do gesto. Parte de uma definição famosa de Gilles Deleuze que é uma
definição do cinema como imagem-movimento. Para Deleuze o cinema ultrapassa uma
espécie de oposição, dualidade entre imagem como realidade psíquica em movimento
como realidade física porque ele junta numa única realidade, uma única esfera, imagem
e movimento e se torna imagem-movimento. Tendo essa definição Agamben diz o que é
imagem. A imagem é classicamente uma espécie de paralisação e ele faz uma comparação
com a memória voluntária onde pode-se viajar com um “souvenir” ou lembrança, pode-
se selecionar um aspecto principal daquilo que se quer guardar, um momento privilegiado
que quer ser conservado, aquele momento que vai ser guardado que deve ser paralisado
e guardado na memória para a história.
A imagem é uma tentativa de conservação de um momento significativo, portanto,
ela tem uma certa aura mágica de isolamento, um pouco como as formas platônicas e
estátuas gregas. A imagem pode então ser pensada por um lado sob esse aspecto dessas
formas eternas, dessa imutabilidade que é retirar do tempo, da história e congelar, guardar.
Mas ele diz que a imagem pode ser pensada também como um fragmento de um todo, um
pedaço, algo que remete ao todo, a um antes e depois. A imagem também pode ser vista
no aspecto de reinserção no tempo, na história.
Como na imagem cinematográfica não há essa rigidez mística, não há essa
paralisação porque o cinema é por excelência imagem em movimento e podemos pensar
que no cinema, a imagem foi libertada dessa mágica paralisante e ela foi reinserida no
tempo. Isso é precisamente o que Agamben chama de gesto.
O cinema reconduz a imagem para pátria do gesto, e ele acrescenta à noção de
Deleuze de imagem-movimento à noção de gesto. Essa recondução, essa libertação da
imagem para o contexto por uma história é propriamente a transformação da imagem e o
gesto como se um animal empalhado voltasse a vida. Portanto, podemos também nesse
sentido aproximar o gesto de uma memória involuntária. A imagem paralisada é a
memória involuntária, o souvenir é o gesto de um lampejo de uma memória involuntária
como algo que aparece sem que fosse planejado e desejado. A partir, portanto então dessa
aproximação entre cinema e gesto que ele vai apresentar a sua reflexão levando em
consideração uma série de movimentos.
Agamben introduz em sua filosofia a descoberta do gerere, gênero do qual a
palavra gesto, conceito que nos interessa explorar, deriva etimologicamente.
Uma observação de Varrão faz uma indicação relevante e descreve de uma forma
intrínseca o gesto como ação e distingue do agir e fazer. Fazer é uma espécie de um meio
para um fim, fazer para obter um produto. Agir por outro lado é uma finalidade em si,
sem meios. Pode-se fazer algo e não agir. Então há uma distinção entre fazer e agir. Assim
como o ator age o drama, mas não o faz, assim como o imperador, magistrado que possui
poderes políticos. Esse magistrado nem faz e nem age, mas a sua função é gerir e gerir
significa: realizar, cumprir, mas também suportar. Suportar no sentido de ser responsável
por alguma coisa e essa é a etimologia do próprio gesto. O gesto está dentro desse âmbito
de gerir, gestar. Justamente por causa desse parentesco etimológico Agamben traz essa
passagem de Varrão(que não é sobre gesto) que não é nem fazer, nem produzir e nem um
meio para alcançar um fim mas também não é um agir, um praticar, ou seja, um fim em
si mesmo sem meios, é portanto, um meio em si sem nenhuma finalidade. Não é um meio
que se torna fim, ele é um meio sem fins. Ele rompe essa polarização entre meio pra o
fim e fins sem meios apresentando esse terceiro elemento que tem a função de
medialidade. Ele não se torna um fim, é um meio simplesmente que não aponta para nada
fora dele.
Não devemos então compreender o gesto nem como um meio para o fim, ou seja,
o gesto não é um andar de A para chegar em B por exemplo, e nem como um fim em si
mesmo. O gesto é para tornar visível o meio como o tal ou expor essa medialidade, essa
exibição da medialidade.
Para tentar mostrar de uma maneira mais concreta o que ele entende por exibição
da medialidade ele faz uma analogia bastante interessante que é com a “Gag” e pensando
a Gag em inglês, que significa mordaça, o que impede a pessoa de falar.
Essa Gag, Agamben faz questão de frisar isso, tanto no sentido de mordaça que
impede a fala tanto no sentido de uma fala que aparece para preencher uma lacuna na
memória ela é justamente exibição de uma medialidade porque no plano da linguagem
ela não é comunicação de um conteúdo, não é falar alto, não é comunicar uma coisa que
deve ser dita que está fora da linguagem mas é justamente o mostrar-se da linguagem
enquanto linguagem. Uma palavra que se mostra enquanto está a exibir o dizer. Não é o
que está sendo dito, é o dizer que se mostra na Gag, que aparece nu e cru na Gag. Portanto
a conclusão de Agamben é que na Gag o que aparece é o homem como o ser na linguagem,
o ser que é linguagem que não pode estar fora da linguagem. É o dizer de que se diz, de
que sempre se diz de que o homem é um ser da linguagem. Portanto, é a comunicação da
própria comunicabilidade e não a comunicação de um conteúdo a ser dito, mas a
comunicação do fato de que se comunica sempre. Essa analogia com o gesto é estrita, o
gesto é Gag, o gesto é para o corpo o que a Gag é para fala, ou seja, o gesto é a exibição
de uma comunicabilidade, de uma medialidade. O gesto é a exibição do fato de que o
homem é em um meio sempre, é sempre na linguagem, é sempre num meio, sempre um
“ser no mundo”, ser em meio a, e ser em meio a é ser num mundo e mais a.
O que caracteriza o gesto é que, nele, não se produz nem se age, mas se assume e
suporta. O gesto abre a esfera do ethos(ética) do conjunto de traços e modos de
comportamento que conformam o caráter ou a identidade do homem. A ênfase de
Agamben é ser em meio às pessoas, ser em meio a uma sociedade a ser como outra sempre
junto de, sempre em meio a, meio as coisas, as pessoas e a sociedade. O gesto é a exibição
de uma medialidade, o tornar visível do meio como tal. Ele faz aparecer o ser em um meio
do homem e, desse modo, abre-lhe a dimensão ética.
O cinema antes de ser pensado como um fenômeno estético tem de ser pensado
como um fenômeno ético-político porque ele exibe enquanto gesto, exibição do fato de
que somos em meio a.
Aquilo que o cinema faz com o gesto é o registro da perda, é a tentativa de
reapropriação, portanto é a reflexão sobre o gesto.