Вы находитесь на странице: 1из 12

1

A IDEOLOGIA DA REFORMA ADMINISTRATIVA DO ESTADO E DO MODELO


GERENCIAL SOB A VISÃO DA TEORIA CRÍTICA DA ADMINISTRAÇÃO

Carlos Alberto do Espírito Santo Júnior,


Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC),
carlosalberto.espiritosanto@gmail.com

RESUMO

A reforma gerencial da administração pública, liderada pelos países anglo-saxões sob a


bandeira da New Public Management ou nova gestão pública, tomou para si os conceitos da
administração de empresas como parte do pensamento neoliberal apresentado para solucionar
a crise do modelo keynesiano de administração e adicionalmente resolver as disfunções da
administração burocrática, substituindo-a pelo modelo gerencial.
Entretanto, a partir de uma análise mais cuidadosa, à luz da teoria crítica da
administração, apresentam-se claramente as conexões entre a ideologia neoliberal e a reforma
administrativa, assim como os seus desdobramentos, através das experiências de implantação
tanto nos países anglo-saxões quanto no Brasil.

Palavras-chave: Reforma administrativa. Burocracia. Gerencialismo.

1 INTRODUÇÃO

A partir da década de 1980, a propagação de ideias favoráveis a mudanças e reformas


no setor público teve espaço na agenda pública de diversos países, sob o referencial da nova
gestão pública (NGP) (Ferlie et al, 1996). Esse movimento reformista teve entre seus expoentes
alguns países anglo-saxões, especialmente Grã Bretanha, Estados Unidos, Austrália e Nova
Zelândia e posteriormente foi assimilado também na Europa continental e Canadá (Abrucio,
1997). De acordo com Kettl (2000), esses países foram os precursores da New Public
Managment (NPM) e da “Reinvenção”.

No contexto das reformas citadas, o modelo de estado vigente no período compreendido


do pós guerra até a década de 1970 (início do pensamento reformista) ruiu-se. Tal modelo
2

baseava-se em 3 dimensões principais: Econômica, social e administrativa, todas interligadas.


Abrucio (1997)

As atribuições do estado, à época, podem ser entendidas, de maneira sucinta, como


pertencentes ao modelo keynesiano, surgido em resposta à crise econômica de 1929. Assim, de
acordo com Fonseca (2006), nas políticas formuladas por Keynes e pelos pos-keynesianos
“Objetivava-se, portanto, a superação das causas que levaram tanto à grande depressão
econômica quanto (no que tange aos fatores econômicos) à guerra, ao mesmo tempo em que se
construía um “novo” mundo, com direitos sociais universalizados. (Fonseca, 2014, p. 36)

No modelo keynesiano, em relação à economia, o Estado buscava garantir a geração de


empregos e atuar em setores estratégicos para o desenvolvimento nacional através da
intervenção. Em sua dimensão social, o welfare state ou estado de bem estar social visava
garantir o suprimento das necessidades básicas da população, como por exemplo, educação,
saúde ou educação. Por fim, a dimensão administrativa relacionava-se ao funcionamento do
estado em sua maneira de organizar-se. Essa forma de organização era realizada a partir do
modelo da burocracia weberiana, onde seu funcionamento pautava-se na impessoalidade,
neutralidade, racionalidade, dentre outros valores propostos por Weber. (Abrucio, 1997)

No entanto, embora esse modelo de estado esteja relacionado à “era dourada”, em que
países capitalistas e socialistas alcançaram altas taxas de crescimento, 4 fatores
socioeconômicos são apresentados por Abrucio (1997) para entendermos a crise do estado
contemporâneo e a sua relação com a ascensão da reforma administrativa no mundo, conforme
a quadro 1 abaixo.

Quadro 1. Fatores da crise do estado contemporâneo

Crise econômica As crises do petróleo, inicialmente em 1973 e posteriormente em 1979 culminaram no período
mundial de recessão enfrentado por diversos países nos anos 1980.
Depois desses episódios, a economia mundial não conseguiu retomar as taxas de crescimento
alcançadas na década de 50 e 60.

Crise Fiscal As crises econômicas vivenciadas por vários países do globo na década de 80, levaram muitos
Estados à crise fiscal. Após terem experimentado o crescimento por décadas, os governos não
dispunham mais de fontes para financiar seus déficits a partir de então.
Esse quadro de desajuste fiscal tornou-se mais tenso quando, principalmente nos EUA e Grã-
Bretanha, os contribuintes começaram a questionar a cobrança de tributos, pois não
enxergavam retorno na melhoria dos serviços públicos.

Ingovernabilidade A ingovernabilidade traduzia-se, na linguagem da época, na incapacidade de ação dos governos


que de um lado viam o esvaziamento de seus cofres devido à crise e de outro viam-se
compromissados com todas as responsabilidades derivadas da política keynesiana e do estado
de bem estar social.
3

Globalização e Por fim, as mudanças no setor produtivo desencadeadas pela transformações tecnológicas
transformações também afetaram o modelo de estado vigente até então. Houve, nesse contexto, o
tecnológicas enfraquecimento do poder dos Estados nacionais para controlar fluxos financeiros e comerciais.
Paralelamente, houve ainda o aumento do poder das multinacionais, levando assim à
dificuldade por parte dos governos em realizar políticas macroeconômicas.

Fonte: elaborado pelo autor adaptado de Abrucio (1997).

Bresser-Pereira, ex-ministro do governo Fernando Henrique Cardoso e responsável por


implementar a reforma gerencial no Brasil também compartilha essa visão ao reforçar esse
entendimento. Em um de seus trabalhos em que apresenta a reforma gerencial, ele afirma que:

A atual reforma está apoiada na proposta de administração pública gerencial, como


uma resposta à grande crise do Estado dos anos 80 e à globalização da economia –
dois fenômenos que estão impondo, em todo o mundo, a redefinição das funções do
Estado e da sua burocracia. (BRESSER-PREIRA, 1996, p. 1)

Paes de Paula (2009) sintetiza esse entendimento, ao declarar que “Nas últimas décadas,
transformações econômicas e sociais trouxeram a reforma do Estado e de sua administração
para o centro da agenda política de diversos países”. (PAES DE PAULA, 2009, p. 1) Sendo
assim, este ensaio é estruturado a partir dessa visão da reforma administrativa, como
consequência das transformações socioeconômicas da sociedade.

Embora tais afirmações estejam praticamente sacramentadas como verdades absolutas


quanto aos motivos que conduziram as crises do estado da década de 1970, James O´Connor
(1977), revisitando a teoria marxista, enxerga a crise tinha como causa a contradição intrínseca
ao próprio modelo e a

[...] produção capitalista – o fato de a produção ser social enquanto que os


meios de produção são de propriedade privada [...]. A longo prazo o capital
monopolista socializa, mais e mais, os custos de capital e as despesas de produção.
Entretanto, os lucros não são socializados. (O'CONNOR, 1977, p. 51).

Logo, utilizando-se desse contraponto, estabelece-se um elo importante para entender


os motivos pelos quais tais preceitos foram aceitos e incorporados às agendas de diversos
governos. Esse processo só foi possível graças ao estabelecimento da ideologia neoliberal como
ideologia dominante.
4

2.1 IDEOLOGIA

Analisados o contexto e as condições que ensejaram as reformas, cabe-se, então, analisar


também sua ideologia, bem como a maneira pela qual a mesma foi disseminada.

Para tanto, é necessário definir o que é ideologia. Alves (1996) definiu ideologia como
“um conjunto de significados relacionados a um interesse concreto de poder que expressam a
prática de um determinado grupo social em uma instituição”. (Alves, 1996, p. 43). Nesse
sentido, Motta (1992) complementa que por trás do conceito de ideologia “está o conflito de
classes, o regime político, a tradição nacional e a herança de uma cultura. Isto quer dizer que
para entender a ideologia é preciso fazê-la historicamente e a partir de seu núcleo, que é a
divisão social do trabalho” (Motta, 1992, p.42).

Chaui (1991) compartilha deste entendimento ao afirmar que:

Os homens produzem ideias ou representações pelas quais procuram explicar e


compreender sua própria vida individual, social, suas relações com a natureza e com
o sobrenatural. Em sociedades divididas em classes (e também em castas), nas quais
uma das classes explora e domina as outras, essas explicações ou essas ideias e
representações serão produzidas e difundidas pela classe dominante para legitimar e
assegurar seu poder econômico, social e político. Por esse motivo, essas ideias ou
representações tenderão a esconder dos homens o modo real como suas relações foram
produzidas e a origem real das formas sociais de exploração econômica e de
dominação política. Esse ocultamento da realidade social chama-se ideologia.
(CHAUI ,1991, p. 24)

Logo, entende-se neste ensaio a ideologia desta maneira, ou seja, como a forma pela qual
uma classe dominante operacionaliza o processo de dominação das classes dominadas através da
criação e compartilhamento de significações e representações individuais e sociais.

Sendo assim, a ideologia relacionada à reforma administrativa e denominada genericamente


como neoliberalismo surgiu como resposta à crise do modelo keynesiano de Estado, surgindo nesse
processo uma nova forma de acumulação, denominada de “acumulação flexível”. Esse novo modelo
rejeita a manutenção das taxas estáveis de lucro do keynesiano fordista para combinar variadas
taxas de emprego, produção e consumo combinadas visando a maximização dos ganhos a partir de
diferentes formas (Harvey 1992).
5

Nesse processo, a terminologia “neo” liberal surge após a renovação do liberalismo clássico,
revigorado com novo corpo teórico e novas proposições, adaptadas ao novo cenário, no qual seu
embate travava-se não mais com o mundo do absolutismo feudal, mas com as formas de intervenção
do Estado na economia, o Estado de Bem-Estar social e o socialismo (Fonseca, 2014).

Sabe-se que a denominação “neoliberal” não representa um grupo homogêneo, pois o


neoliberalismo está relacionado principalmente a 3 escolas, cada qual com seu corpo
doutrinário próprio: A escola Austríaca, que reuniu intelectuais como Ludwig von Mises e
Friedrich von Hayek, a escola de Chicago, que, por sua vez, teve como seu expoente máximo
Milton Friedman, e por fim, a escola de Virgínia que tem em James Buchanan sua referência
maior (Fonseca, 2014). Entretanto, os pressupostos básico dessas 3 escolas convergem para os
temas apontados no quadro 2, que relaciona esses pressupostos às políticas deles resultantes.

Quadro 1. Pressupostos neoliberais e políticas

Pressuposto Políticas
Desestatização da economia Privatização de todas as empresas sob controle do Estado.
Preponderância da esfera privada sobre Liberdades individuais mais importante do que a esfera pública.
a esfera pública
Desestruturação do Estado de Bem- Visto como ineficaz, ineficiente, perdulário, injusto e autoritário e indutor de
Estar Social comportamentos que não valorizariam o mérito e o esforço pessoais.
Fim da proteção aos capitais nacionais Livre competição e concorrência com congêneres estrangeiros
Desregulação e desregulamentação Desregulação e desregulamentação da produção, da circulação dos bens e
serviços, do mercado financeiro e das relações de trabalho
Quebra do pacto corporativo entre Foco na liberdade de escolha individual e da soberania do consumidor
capital e trabalho
Liberdade de mercado Ausência de empecilhos à relação capital/trabalho e à livre realização dos fatores
produtivos
Valorização das “virtudes” do livre Tanto como instrumento para aumentar a riqueza - gerando natural distribuição
mercado de renda devido ao aumento da produtividade - quanto como única forma de
refletir os preços reais dos produtos e serviços.
Concepção instrumental de democracia Visão da democracia tão somente como possibilitadora do livre mercado e das
liberdades individuais
Relação sociedade indivíduo

Fonte: elaborado pelo autor adaptado de Fonseca (2014).

Percebe-se, notavelmente, que grande parte desses pressupostos constituíram-se em


agenda política de diversos governos ao longo do tempo, naturalmente adaptados a cada país,
conservando, no entanto, as matrizes que norteiam essa ideologia.

2.2 DISSEMINAÇÃO

Do período compreendido entre o pós crise de 1929 até o início da década de 1970, as
ideias de Keynes conquistaram progressivo espaço político e ideológico, tornando-se então
6

hegemônicas. Por conseguinte, aos ideais neoliberais restaram os espaços marginais nesse
período (Paes de Paula, 2009).
Nesse contexto, a ocupação desses espaços traduziu-se em verdadeira resistência dos
neoliberais em diversos países, culminando na organização de think tanks, definido por Fonseca
como “pessoas e ideias aglutinadas em instituições estratégicas, com forte capacidade de
espraiar seus pressupostos, que informam diagnósticos e proposições (gerais e tópicas), com
vistas a conquistar espaços crescentes para o campo neoliberal (no caso)” (Fonseca, 20014,
p.37)
Nesse mesmo sentido, Paes de Paula (2009) define os think tanks, seu público e sua
maneira de atuação como:
[...] centros de pensamento em geral dedicados ao estudo do Estado, das políticas
governamentais e do desenvolvimento econômico. Os think tanks tinham um objetivo
claro: aproximar as elites intelectuais e governamentais britânicas das visões de livre-
mercado. Realizando publicações e eventos dirigidos para este público, os think tanks
ajudaram a popularizar o neoliberalismo, inserindo suas ideias na mídia e na agenda
dos políticos convidados para lançamentos de livros, almoços, seminários e
conferências realizados. (Paes de Paula, 2009, p. 37).

Observa-se que, de acordo com os autores citados, a atuação dos think tanks foi
determinante para difundir os ideais neoliberais. Ainda sob essa visão, Coutinho (1979)
descreve o conceito de “guerra de posição”, criado por Antônio Gramsci (1891-1937) e a sua
consequente importância para a obtenção da hegemonia ideológica:

[...] nas formações ‘orientais’, a predominância do Estado-coerção impõe à luta de


classes uma estratégia de ataque frontal, ‘uma guerra de movimento’, voltada
diretamente para a conquista e conservação do Estado em sentido restrito; no
‘Ocidente’, ao contrário, as batalhas devem ser travadas inicialmente no âmbito da
sociedade civil, visando à conquista de posições e espaços (‘guerra de posição’), da
direção político-ideológica e do consenso dos setores majoritários da população, como
condição para o acesso ao poder de Estado e para sua posterior conservação
(COUTINHO, 1989, p. 89)

Nesse sentido, o próprio Gramsci (1988) entende que a luta pela hegemonia perpassa
pela conquista e manutenção de posições ou “trincheiras”, colocando o próprio Estado como
uma das muitas posições a serem ocupadas na busca da hegemonia ideológica, ao que declara:
“[...] O Estado era apenas uma trincheira avançada, por trás da qual se situava uma robusta
7

cadeia de fortalezas e casamatas, em medida diversa de Estado para Estado, é claro


[...]”(GRAMSCI, 1988, p.75).

Hayek também reforça essa teoria, pois para o autor “os interesses em conflitos
contemporâneos decididos pelo voto das massas, geralmente, têm sido decididos muito antes,
em uma batalha de ideias confinada a círculos estreitos” (Cockett,1995, pp. 104 e 5)

Logo, conclui-se que os think tanks desempenharam um importante papel estratégico na


formulação e disseminação da ideologia neoliberal. Instituições como o Institute of Economic
Affairs (IEA), o Centre for Policy Studies (CPS) e o Conservative Party Sector Research Unit
(CPSRU) no Reino Unido forneceram suporte ideológico ao governo Tatcher. (Cocket, 1995)
Já nos Estados Unidos, a Hoover Institution, American Enterprise Institute e, mais
notavelmente, a Heritage Foundation fomentaram políticas para o governo Reagan. (Smith,
1991)

3. GERENCIALISMO

As críticas à administração burocrática encontraram grande espaço com a ascensão dos


ideais neoliberais. Vicejava, não apenas entre os intelectuais ou a classe política mas também
entre o senso comum, uma visão majoritariamente negativa e anedótica da burocracia
(Abruccio, 1997).

Entretanto, a burocracia — que à época imputava-se a raiz de todos os males — surgiu


como uma das principais instituições com o objetivo de separar a res pública e privada, em
contraste com o estado patrimonialista, onde os bens públicos e privados confundiam-se.
Pereira define a burocracia como “instituição administrativa que usa como instrumento para
combater o nepotismo e a corrupção — dois traços inerentes à administração patrimonialista
—, os princípios de um serviço público profissional, e de um sistema administrativo impessoal,
formal, legal e racional”, sendo inclusive avaliada por ele como “grande progresso” seu
aparecimento no século XIX (Bresser-Pereira, 1996, p. 9).

Nesse mesmo sentido, a administração gerencial teria emergido como uma resposta à
crise do estado a partir da década de 1970 e também como uma forma de adaptação ao zeitgest,
onde não bastaria apenas ao modelo ser efetivo em evitar o nepotismo e a corrupção, mas
8

também oferecer bens públicos e semipúblicos (Bresser-Pereira, 1996). Assim então, a


administração pública toma emprestado do setor privado os conceitos e práticas ocorridos no
século XX na administração de empresas para valer-se deles no exercício da administração
pública.

Surge então a chamada Nova Gestão Pública (NGP), que traduz a expressão inglesa New
Public Management. Na literatura internacional, esses termos referem-se justamente aos temas
abordados, ou seja, às reformas do estado a partir da década de 1970 e são baseadas no
pensamento gerencialista (Junquilho, 2010).

Apesar do objetivo deste ensaio não estar relacionado à discussão e revisão da literatura
sobre management, sintetizam-se aqui os principais traços da cultura do management com
objetivo de contextualizar a NGP.

De acordo com Paes de Paula (2009), esses traços são 1. A crença numa sociedade de
mercado livre, 2. A visão do indivíduo como auto-empreendedor, 3. O culto da excelência como
forma de aperfeiçoamento individual e coletivo, 4. O culto de símbolos e figuras emblemáticas,
como por exemplo palavras de efeito como inovação, sucesso e excelência e 5. A crença em
tecnologias gerenciais que permitem racionalizar as atividades organizadas grupais.

Autores como Bresser Pereira (1998a) e Abruccio (1997) afirmam que o gerencialismo
não converge num ideário homogêneo. Contudo, segundo Junquilho (2010), podem-se destacar
os principais enfoques da NGP nos 6 itens a seguir:

1. A ideia de gasto público como custo improdutivo e não como investimento


coletivo e social;
2. Rotulação dos servidores públicos como detentores de privilégios e defensores
dos próprios interesses;
3. Crítica a interferência negativa do estado no mercado (regulação e
regulamentação) e a ideia de que os mecanismos de mercado seriam os meios
mais eficientes de distribuição de bens e serviços à sociedade.
4. Definição do Estado com o papel principal de promotor e empreendedor, em vez
de provedor de bens e serviços sociais;
5. Importação das práticas administrativas gerenciais do setor privado;
9

6. Ênfase na mudança de papel dos administradores públicos para gestores


públicos.

Por conseguinte, percebem-se que as às ideias do management, advindas da


administração privada de empresas podem ser comparadas às máximas da administração
gerencial, materializadas na NGP. Tal fato mostra-se evidenciado quando comparam-se as
proposições acima de ambos os modelos.

Nesse sentido, alguns autores acreditavam não haver diferenciação conceitual entre a
administração de uma empresa privada e a administração pública (Murray, 1975). Porém,
outros autores como Osborne e Gaebler (propositores do movimento “reinventando o governo”)
reconheciam diferenças entre as duas atividades (Osborne e Gaebler, 1994). Entende-se, neste
ensaio que diversos elementos diferenciam e caracterizam as duas formas de administração.
Stewart e Ranson (1989) destacam as diferenças no quadro comparativo a seguir:

Quadro 1. Modelos de administração do setor privado e do setor público – principais diferenças

Modelo do Setor Privado Modelo do Setor Público


Escolha individual no mercado Escolha coletiva na sociedade organizada
Demanda e preço Necessidade de recursos públicos
Caráter privado da decisão empresarial Transparência da ação pública
A equidade do mercado A equidade das necessidades
A busca de satisfação do mercado A busca da justiça
Soberania do consumidor Cidadania
Competição como instrumento do mercado Ação coletiva como instrumento da sociedade organizada
Estímulo: Possibilidade de o consumidor escolher Condição: Consumidor pode modificar os serviços públicos

Fonte: Stewart e Ranson (198)9

Não obstante, Paes de Paula (2009) corrobora o entendimento deste ensaio, pois a partir
do momento em que se relaciona o Estado e a esfera pública às orientações de mercado com
foco em resultados, a dimensão sociopolítica fica relegada ao segundo plano.

Por fim, cabe aqui uma breve reflexão sobre os limites do gerencialismo, pois como foi
visto anteriormente, a reverberação das reformas e a crença de que o modelo de gestão privada
– e consequentemente o gerencialismo – detinha as soluções para as disfunções burocráticas e
respostas mostrou-se ilusória.
10

Alguns anos após liderar a reforma administrativa no Brasil, o próprio Bresser Pereira
(2001) encarrega-se de deixar claro que:

[...] rapidamente se percebeu que a ideia de que as falhas do Estado eram


necessariamente piores que as falhas do mercado não passava de dogmatismo. As
limitações da intervenção estatal são evidentes, mas o papel estratégico que as
políticas públicas desempenham no capitalismo contemporâneo é tão grande que é
irrealista propor que sejam substituídas pela coordenação do mercado, nos termos
sugeridos pelo pensamento neoliberal. (Bresser-Pereira, 2001, p. 9).

Logo, resta claro que a panaceia difundida sobre as maravilhas que o modelo gerencial
poderia oferecer entrou em choque com a realidade, e consequentemente apresentou seus
limites. Paes (2009), após realizar exame da literatura sintetiza aponta alguns limites da
administração pública, como por exemplo a centralização do poder nas instâncias executivas e
a incompatibilidade entre a lógica gerencialista e o interesse público.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Autores como Abrucio (1997) e Bresser Pereira (1995) enxergam o gerencialismo como
um modelo pós burocrático, ou seja, entendem que com o advento do gerencialismo, o modelo
burocrático foi superado.

Todavia, essa suposição revela-se equivocada. Sobretudo quando analisamos a


burocracia sob a ótica de Weber (1999), em que é compreendida como consequência de um
processo histórico, adaptando-se para atender à classe dominante e seus interesses, podendo ser
entendida, em outras palavras, como um eficiente instrumento de poder e dominação.

Farias (2011) corrobora esse entendimento da burocracia como forma de dominação e


a vê como “[...] um instrumento da classe dominante que impõe sua ascendência sobre as
demais classes. Essa dominação é feita pelas organizações (empresas, escolas, partidos,
sindicatos e outros) e pelo Estado...”.

Portanto, apesar de algumas características flexíveis dos novos modelos organizacionais


apontarem no sentindo da ruptura do modelo burocrático, - como a descentralização,
estruturação em redes, uso intensivo de tecnologia da informação, reengenharia, downsizing,
11

dentre diversas outras características – essas novas roupagens organizacionais não configuram
o rompimento com o modelo burocrático de organização (Paes de Paula, 2009).

Primeiramente, é necessário destacar que a burocracia e o tipo ideal burocrático


idealizado por Weber – caracterizado pelo formalismo, impessoalidade, hierarquia e
administração profissional - não são sinônimos. Trata-se aqui de conseguir visualizar que o tipo
ideal nada mais nos apresenta que um tipo de burocracia.

Conclui-se, então, partindo-se dessas considerações que as organizações pós


burocráticas travestem-se de novas expressões da burocracia, adaptados aos novos contextos e
situações onde estão inseridos. Ressalta-se que, conforme descrito ao longo do ensaio, o cenário
moderno extremamente competitivo e com imperativa eficiência demandou que os funcionários
obtivessem maior controle sobre suas atividades, seguido de maior flexibilidade.

Contudo, tal controle não representa emancipação e os controles burocráticos vão adaptando-
se aos novos tempos. Se no famoso filme “Tempos modernos” de Charles Chaplin, o
funcionário tinha um rígido controle sobre suas atividades, com a evolução burocrática esse
controle passa a ser introjetado, num processo também descrito por outros autores como Michel
Foucault, que nesse sentido retrata a mesma realidade, apesar de não ter seu foco somente na
análise da burocracia.

REFERÊNCIAS

ABRUCIO, F. L. O impacto do modelo gerencial na administração pública: um breve estudo


sobre a experiência internacional recente. Cadernos ENAP, n.10. Brasília: ENAP, 1997.
______. Os avanços e os dilemas do modelo pós-burocrático: a reforma da Administração
Pública à luz da experiência internacional recente. In: BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos;
SPINK, Peter. (Org.). Referências Reforma do Estado e Administração Pública Gerencial. Rio
de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1998. p. 173-199.
Alves, M. A. (1996). As Organizações Sociais: um estudo sobre o discurso. Dissertação para
a obtenção do Título de Mestre em Administração de Empresas. São Paulo: EAESP/FGV.
BRESSER-PEREIRA, L.C. Da administração pública à gerencial. Revista do Serviço
Público, v. 120, n. 1, 1996c.
______. Reforma do Estado para a cidadania: a reforma gerencial brasileira na perspectiva
internacional. São Paulo: Ed. 34; Brasília: ENAP, 1998a.
12

______. A administração pública gerencial: estratégia e estrutura para um novo estado.


Brasília: ENAP, 2001.
CHAUÍ, M. O Que é ideologia. São Paulo: Brasiliense, 1991
COCKETT, Richard. Thinking the unthinkable: think-tanks and the economic counter-
revolution, 1931-1983. London: Harper Collins, 1995.
COUTINHO, Carlos Nelson. Gramsci: um estudo sobre seu pensamento político. Rio
deJaneiro, 1989.
FERLIE, E. et al. The new public management in action. Oxford: Oxford University Press,
1996.
FONSECA, Francisco. A Concepção Neoliberal de Justiça. REBAP. Revista Brasileira de
Administração Política, v. 12, 2014.
GRAMSCI, Antônio. Maquiavel, a Política e o Estado Moderno. Tradução de Luiz Mário
Gazzane. 6ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1988 (Série Política e Perspectiva do
Homem, v. 35).
HARVEY, D. Condição pós-moderna. São Paulo: Edições Loyola, 1992
JUNQUILHO, Gelson S. Nem “burocrata”, nem “novo gerente”: o “caboclo” e os desafios
do Plano Diretor de Reforma do Estado no Brasil do real. Rev. Adm. Pública, v. 38, n. 1, p.
137-56, 2004.
______. Teorias da Administração Pública. Brasília: CAPES: UAB, 2010.
KETTL, D. (2000), The global public management revolution: a report on the transformation
of governance. Washington DC: Brookings Institution.
MOTTA, F.C.P. (1992). As empresas e a transmissão da ideologia, in: Revista de
Administração de Empresas V.32 no 5, Rio: Fundação Getúlio Vargas, Nov/Dez.
MURRAY, M. (1975), Comparing public and private management: an exploratory
essay. Public Administrative Review, vol 34, n.4.
O’CONNOR, James. USA: a crise do Estado capitalista. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.
264 p.
OSBORNE, D.; GAEBLER, T. Reinventando o governo. Brasília: MH Comunicação, 1994
[1992].
PAES DE PAULA, Ana Paula. Por uma nova gestão pública: limites e potencialidades da
experiência contemporânea. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 2009.
RANSON, S. & STEWART, J.D. (1989) “Citizenship and government: the challenge of
management in the public domain”. Political Studies, n.37.
SMITH, J.A. The ideia brokers: think-tanks and the rise of the new policy elite. New York,
Toronto: The Free Press, Macmillan Inc., 1991.

Weber, M. Economia e sociedade. Fundamentos da sociologia compreensiva. Brasília, UnB,


1999. (v. 2)

Вам также может понравиться