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EDITORA UFMG
Diretor Wander Melo Miranda
Vice-Diretor Roberto Alexandre do Carmo Said
CONSELHO EDITORIAL
Wander Melo Miranda (presidente)
Ana Maria Caetano de Faria
Danielle Cardoso de Menezes
Flavio de Lemos Carsalade
Heloisa Maria Murgel Starling
Márcio Gomes Soares
Maria Helena Damasceno e Silva Megale
Roberto Alexandre do Carmo Said
REPENSANDO A LÓGICA
Uma introdução à filosofia da lógica
André Porto
Revisão técnica
Belo Horizonte
Editora UFMG
2014
Este livro ou parte dele não pode ser reproduzido por qualquer meio sem autorização
escrita do Editor.
_________________________________________________________________________
R284t.Pr Read, Stephen.
Repensando a lógica: uma introdução à filosofia da lógica /
Stephen Read ; tradução de Abílio Rodrigues Filho. – Belo Horizonte :
Editora UFMG, 2014.
335 p.: il. – (Humanitas)
EDITORA UFMG
Av. Antônio Carlos, 6.627 - CAD II | Bloco III
Campus Pampulha | Belo Horizonte/MG | CEP 31.270-901
Tel.: +55 31 3409-4650 Fax: + 55 31 3409-4768
www.editoraufmg.com.br editora@ufmg.br
Apresentação 9
2. O poder da lógica
Consequência lógica 51
A concepção clássica 53
Compacidade 61
Conteúdo e forma 69
Relevância 75
Resumo e sugestões para leituras 83
3. O poder de um se
Teorias de condicionais 87
A tese conversacionalista 91
Probabilidade condicional 100
A abordagem por semelhança 110
Resumo e sugestões para leituras 122
4. O olhar incrédulo
Mundos possíveis 127
Platonismo modal 130
Atualismo 138
5. A barba de Platão
Sobre o que há e o que não há 157
Descrições 160
Lógica livre 169
Sobrevalorações 176
Resumo e sugestões para leituras 184
REFERÊNCIAS 305
GLOSSÁRIO 315
ÍNDICE 321
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Reducionismo
A segunda dúvida diz respeito ao reducionismo central ao
tratamento de Wittgenstein. Aqui há um contraste bem demar-
cado com a teoria de Russell. Era perfeitamente claro para Russell
que seria absurdamente extravagante supor, por exemplo, que
além dos fatos correspondentes a duas proposições verdadeiras,
digamos, “Kennedy é presidente” e “Oswald matou Kennedy”,
haveria um terceiro fato, algum tipo de fato conjuntivo, que
tornaria verdadeiro o enunciado conjuntivo “Kennedy é presi-
dente e Oswald matou Kennedy”. Se já sabemos dos dois fatos
separados, nenhuma informação adicional é fornecida pela sua
conjunção. “Já sabíamos” seria a pronta resposta. Não há um
fato extra por detrás da conjunção “A e B” de duas proposições
verdadeiras A e B, além dos fatos separados que tornam A e
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Teorias da verdade
Nossa questão original era: qual é a diferença entre propo-
sições verdadeiras e falsas? Fomos levados, pela ideia de que
para saber se uma proposição é verdadeira deveríamos olhar
para os fatos, a propor uma teoria geral segundo a qual
proposições verdadeiras correspondem a fatos, enquanto que
as falsas, não. Mas talvez uma metáfora nos tenha fascinado
e enganado. Com efeito, parece agora que um erro filosófico
muito comum foi cometido.
Considere a proposição “A baleia é um mamífero”. Claramente,
em um certo sentido, nós estamos falando acerca de baleias –
toda baleia é um mamífero. Mas por que a sentença está no
singular? De qual baleia nós estamos falando? De nenhuma
em particular. Entretanto, é tentador construir a proposição
como se referindo a algum arquétipo. Lembre-se das histórias
de Rudyard Kipling sobre como o camelo adquiriu sua corcova
e o elefante sua tromba. Nessas histórias, um elefante particular
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S é verdadeira se e somente se p,
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Notas
1
Optamos por traduzir a distinção type/token por tipo/espécime, conforme a
Enciclopédia de termos lógico-filosóficos (João Branquinho, Desidério Murcho
e Nelson Gonçalves Gomes (ed.), São Paulo, Martins Fontes, 2006) [N.T.].
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Relevância
Por fim, vamos deixar os casos nos quais a lógica clássica
produz menos inferências válidas do que deveria, isto é, não
reconhece como válidas consequências que intuitivamente são
válidas, e considerar os casos em que a lógica clássica produz
mais inferências válidas do que deveria, isto é, casos em que
inferências intuitivamente inválidas tornam-se válidas segundo
o critério clássico. O mais notório é o chamado ex falso quodli-
bet (EFQ), que já foi mencionado. Ele permite a inferência de
qualquer proposição a partir de uma contradição. Sua forma
é “A e não-A, logo B”. Quaisquer que sejam as proposições
colocadas nos lugares de A e B, não há uma circunstância em
que a premissa seja verdadeira e a conclusão, falsa, simples-
mente porque nenhuma proposição da forma “A e não-A” é
verdadeira. (Alguns lógicos, in extremis, negaram esse ponto
– ver o Capítulo 6. Mas, por ora, vamos deixar isso de lado.)
Logo, de acordo com o critério clássico, a inferência é válida.
Isso significa, por exemplo, que deveríamos aceitar como válida
a seguinte inferência:
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Ou ainda pior:
E:
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E:
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Suponha A e não-A
Então, por simplificação, temos A
e por adição A ou B
Mas, por simplificação de novo, temos não-A
e pelo silogismo disjuntivo B
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A B A ou B
V V V
V F V
F V V
F F F
A B AeB
V V V
V F F
F V F
F F F
isto é, “e” mapeia o par <V, V> para V e os pares <V, F>, <F,
V> e <F, F> para F.
A visão padrão dos condicionais é a de que eles também são
vero-funcionais, isto é, a de que seus valores de verdade são
determinados pelos valores de verdade de seus constituintes.
Isso se segue imediatamente da equivalência entre condicionais
e disjunções, e da natureza vero-funcional da disjunção. Desse
modo, a tabela de verdade da condicional é a seguinte:
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A tese conversacionalista
Entretanto, tratar condicionais como sendo vero-funcionais
leva a vários problemas. Suponha que a libra será desvalorizada,
mas a recessão, contudo, irá continuar. Isso já seria o suficiente
para corroborar a afirmação de que se a libra não é desvalorizada,
a recessão continuará? De acordo com o tratamento vero-funcio-
nal, a resposta é positiva. Traduzida em termos da disjunção, a
condicional diz que ou a libra será desvalorizada, ou a recessão
irá continuar. Se a libra for desvalorizada, essa disjunção é verda-
deira; por outro lado, se a recessão continuar (independentemente
do que aconteça com a libra), a disjunção é verdadeira. Mas a
condicional sugere uma conexão mais direta entre o antecedente
e o consequente. O tratamento vero-funcional implica que a
condicional é verdadeira simplesmente em virtude dos valores de
verdade de seus constituintes. Mas em geral, quando pensamos
sobre isso, assumimos que condicionais adquirem seus valores de
verdade em virtude de uma conexão entre antecedente e conse-
quente. Mas vemos agora que pode não haver conexão alguma,
muito embora, no tratamento vero-funcional, os valores possam,
por coincidência, ser tais que impliquem a verdade da condicio-
nal. Portanto, surgem dúvidas de se o tratamento vero-funcional
consegue captar a história toda.
O argumento oferecido em defesa da vero-funcionalidade foi
sucinto: ele dependeu da equivalência entre a condicional “se A,
então B” e a disjunção “ou não-A, ou B” e da vero-funcionalidade
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Por exemplo:
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Logo,
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Se A, então B. A e C. Logo, B
e
Se A, então B. Se B, então C. A. Logo, C
e
Se A, então B. Se B, então C. Logo, se A, então C.
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Nota
1
Read denomina “princípio da condicionalidade” o que usualmente é chamado
“teorema da dedução”, isto é, dado um conjunto se sentenças Γ e duas sentenças
A e B, Γ implica logicamente A B se e somente se Γ e A implicam logicamente
B. Optamos aqui por usar a terminologia usual, “teorema da dedução”. [N.T.]
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Atualismo
A solução de Quine é restringir o campo de aplicação do
princípio de indiscernibilidade, e sua justificativa reside na
renúncia efetiva da lógica modal e da metafísica de mundos
possíveis, que vem junto com ela. A lógica é restrita ao paradigma
clássico do Capítulo 2, e a teoria das modalidades torna-se uma
teoria questionável, a ser rejeitada, em última análise, pelos
seus argumentos contra analiticidade e significado. Antes disso,
Quine constrói toda modalidade como sendo de dicto, e a toma
literalmente em termos de citação. Isto é, proposições modais
da forma “necessariamente A” são consideradas proposições
da forma Fa, onde a nomeia a proposição A e F é o predicado
“é necessariamente verdadeira”. Assim, “necessariamente 9 >
7” torna-se “‘9 > 7’ é necessariamente verdadeira”. Os nomes
“9” e “7” ficam então escondidos dentro da citação, protegidos
do princípio da Indiscernibilidade. Nem se discute se a citação
é “opaca” à substituição, como propõe Quine. Que Túlio seja
Cícero não nos permite inferir, do fato que “Túlio” tem 5 letras,
que “Cícero” também tem 5 letras.
Consideramos dois extremos: realismo extremo de um lado e,
do outro, a total rejeição do discurso modal. Entretanto, nenhum
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O necessário e o a priori
Isso pode parecer surpreendente, pois nem todos sabem que
Cícero era Túlio. Não se trata de uma verdade óbvia, mas sim de
uma verdade que precisa ser descoberta. Mas isso não significa
então que é uma verdade contingente? Não. Isso apenas mostra
que é uma verdade empírica, ou a posteriori (essas palavras
são equivalentes). “Necessário” significa “verdadeiro em todos
os mundos”; “contingente” significa “verdadeiro em algum,
mas não em todos os mundos” (logo, “contingente” significa
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Nota
1
Isaac Asimov, Os próprios deuses, São Paulo, Editora Aleph, 2010. [N.T.]
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Descrições
Quine e, antes dele, Russell recuaram um pouco ante a libe-
ralidade dessa sugestão. Um sentimento de realidade mais sólido
deve rejeitar a ideia segundo a qual qualquer coisa acerca da qual
podemos falar, ou mesmo pensar, deve em algum sentido ser. O
que não existe de fato não existe, e são falaciosos os argumen-
tos que pretendem mostrar que tais coisas existem. Mas, como
podemos diagnosticar essa falácia?
O diagnóstico de Russell o levou a formular sua teoria das
descrições que, como mencionei no Capítulo 4, forneceu um
estímulo essencial para todo o movimento da filosofia analítica
no século 20. Vamos passar em revista o problema. O signifi-
cado de sentenças significativas depende dos significados das
suas partes; mas, se x não existe, expressões que aparentemente
se referem a x não podem ter significado, e assim nada de
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Lógica livre
Uma resposta melhor a essa dificuldade talvez pudesse ser
obtida pela adoção de uma epistemologia não fundacionalista.
Mas, ainda assim, permanecemos com a primeira dificuldade, a
de responder ao problema da barba de Platão. Precisamos que
nossa teoria estabeleça uma distinção entre, por exemplo, de um
lado, “Rei Lear enlouqueceu” e “Rei Lear era Rei Lear” e, de
outro, “Rei Lear era Hamlet” e “Rei Lear matou Duncan”. Nem
a teoria de Russell, nem a de Frege, faz isso: a primeira diz que
todas são falsas; a segunda, que nenhuma tem valor de verdade.
Na verdade, estou usando a frase “barba de Platão” em
sentido um pouco diferente do de Quine. Para mim, essa frase
denota o seguinte problema: como é possível que sentenças com
nomes vazios tenham significado? Para Quine, “barba de Platão”
denota uma resposta particular para esse problema: que nomes
vazios, embora não devessem denotar coisa alguma existente,
no entanto, denotam algo – todos têm ser, muito embora apenas
alguns existam efetivamente. O mais famoso defensor dessa
concepção em tempos recentes foi o próprio Russell, que em
1903 escreveu “ser é o que pertence a tudo o que é concebível,
a todo objeto possível do pensamento”. Russell escapou dessa
extravagância com a sua teoria das descrições.
Essa concepção extravagante de Russell certamente foi resul-
tado da influência do filósofo alemão contemporâneo Alexius
Meinong. Mas essa não era a concepção de Meinong. Segundo
Meinong, muitos objetos estariam “além do ser e do não ser”.
Ele não acreditava, ao contrário do que frequentemente se diz,
que além das coisas que existem, todas as outras coisas “subsis-
tem”. Para ele, objetos concretos existem; objetos abstratos
subsistem; e, além disso, todo termo denota um objeto para o
qual a questão do ser nem deveria ser levantada. O princípio
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Sobrevalorações
Ainda assim, há algo insatisfatório com o domínio externo na
lógica livre, a saber, a bivalência. Ela não é apenas uma lógica
livre positiva, isto é, em que alguma proposição que contenha um
nome vazio é verdadeira; antes, toda proposição que contenha
um nome vazio ou é verdadeira ou é falsa. Isto é, a lógica livre
de domínio externo nos força a decidir, para toda proposição
acerca de um não existente, se ela é verdadeira ou falsa. Com
efeito, mesmo a lógica clássica exige que aceitemos a bivalência
para proposições acerca de objetos existentes, mesmo nos casos
em que não podemos decidir se a proposição é verdadeira ou
falsa. Por exemplo, “Oswald matou Kennedy” ou é verdadeira ou
falsa, assim como a conjectura de Goldbach, “todo número par
maior que 2 é a soma de dois primos”, uma famosa conjectura
da aritmética, ainda sem solução. O realista responde que tais
proposições são de fato verdadeiras ou falsas, independentemente
de sermos capazes de determinar seus valores de verdade. (Iremos
considerar no Capítulo 8 a rejeição antirrealista da bivalência.)
Essa resposta, plausível para objetos existentes, não é plausível
para objetos não existentes, personagens ficcionais, míticos etc.
Considere as proposições “Rei Lear podia assoviar”, “Pégaso
tinha 40 centímetros de altura” e “o cavalo que não é um
cavalo é um cavalo”. As duas primeiras poderiam nos compelir
a investigar a obra de Shakespeare, ou lendas e mitos antigos,
para obter uma resposta. Mas, se alguém seriamente acredita
que Lear e Pégaso são criaturas míticas, deve estar preparado
para que aquela pergunta não tenha resposta alguma. Se eles
outrora existiram, existem verdades objetivas acerca deles que
nós, entretanto, sem dúvida jamais saberemos. Caso contrário, se
eles não existiram, as respectivas proposições não são verdadeiras
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Nota
1
Laboratório OUSIA - UFRJ, disponível em <http://www.ifcs.ufrj.br/~fsantoro/
ousia/PARMENIDES%20I-VIII.rtf>, acesso em 20/04/2011.
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Aquele que passar por essa ponte, de uma parte para a outra, há
de dizer primeiro, debaixo de juramento, onde vai e para que vai. Se
jurar a verdade, deixem-no passar, e se disser mentira, morra na forca
que ali está, sem remissão alguma.1
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Ele tinha uma espécie de delicada pureza. Apenas uma vez consegui
fazê-lo dizer uma mentira e, mesmo assim, por meio de um subter-
fúgio. “Moore”, eu disse, “você sempre fala a verdade?” “Não”, ele
respondeu. Creio que essa foi a única mentira que ele disse na vida.
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A hierarquia da verdade
Talvez o caso mais simples em que esse paradoxo surge seja
o chamado paradoxo do mentiroso,
A proposição diz dela mesma que ela é falsa. Suponha que ela
seja verdadeira. Nesse caso, ela seria falsa, pois o que ela diz de si
mesma é que ela é falsa. Isto é, se ela é verdadeira, então é falsa.
Por outro lado, se ela for falsa, ela é verdadeira, pois ela diz de
si mesma justamente que ela é falsa. Logo, se toda proposição
é ou verdadeira ou falsa, segue-se que ela é simultaneamente
verdadeira e falsa.
Poderíamos pensar, portanto, que seria possível evitar esse
paradoxo em particular inferindo que a proposição em questão
não é verdadeira nem falsa. Talvez seja o caso de que algumas
proposições não são verdadeiras nem falsas. Por exemplo, pode-
ríamos considerar que “o atual reitor de St. Andrews é um bom
ciclista” não é nem verdadeira nem falsa, pois St. Andrews não
tem mais reitores.
Mas essa saída não funciona com todos os paradoxos.
Considere a proposição:
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1=1
Logo, este argumento é inválido.
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Fechamento semântico
Tentar aceitar a conclusão dos argumentos paradoxais e
acatar as contradições foi uma boa ideia que não deu certo.
Regimentar a linguagem em uma hierarquia, uma linguagem-
-objeto e uma série de metalinguagens, também parecia uma boa
ideia, mas não é intuitivamente plausível. Como uma terceira
possibilidade, vejamos até onde podemos ir assumindo um
fechamento semântico, isto é, uma linguagem que contenha seu
próprio predicado-verdade. Evitamos o paradoxo ao separar as
condições de verdade das condições de falsidade, como fazem
os que defendem que há contradições verdadeiras. Isto é, vamos
voltar à ideia de rejeitar a bivalência, mas evitando, ao mesmo
tempo, o paradoxo do mentiroso fortalecido.
Essa ideia, que foi apresentada de modo bastante interessante
por Saul Kripke em meados dos anos de 1970, teve um grande
impacto no ambiente lógico e filosófico da época e motivou
vários trabalhos formais. Em essência, a proposta é bastante
simples. Seus detalhes técnicos podem ser omitidos aqui (apesar
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Notas
Adaptação da tradução de Conde de Azevedo e Visconde de Castilho de Dom
1
[N.T.]
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F(0) G(10,000)
Se F(0), então F(1)
Se G(10,000), então G(9,999)
Logo, F(1) Logo, G(9,999)
Se F(1), então F(2)
Se G(9,999), então G(9,998)
Logo, F(2) Logo, G(9,998)
Se... Se...
... ...
...Logo, F(10,000)
...Logo, G(0)
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Análise do sorites
Se aceitamos que a vagueza é endêmica em nossa linguagem,
deveríamos então nos render ao argumento sorites e à incoerência
que dele resulta, ou haveria uma falha no argumento que teria
passado despercebida? O movimento no sentido de tornar a
linguagem mais precisa se baseia em três argumentos; um deles
é o sorites, cuja conclusão devastadora aceitamos talvez rapi-
damente demais. Vejamos primeiro os outros dois argumentos,
começando pelo último, segundo o qual não é errado negar um
termo e seu contrário nos casos de fronteira.
O que precisamos é de uma distinção que é frequentemente
descrita como uma distinção entre negação interna e externa.
Contudo, essa terminologia faz alusão a uma distinção de escopo
que não está presente. Mas, ainda assim, é uma distinção que
precisamos em outros casos em que não há questões de escopo.
Considere a sentença “virtude é entretanto”, que não é bem
formada e não expressa uma proposição. Uma maneira de dizer
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distinguível
Fig.7.1
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distinguível
Fig. 7.2
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Lógica difusa
O quadro que vimos até agora é o seguinte: entre os casos
claros, positivos e negativos, em que certos conceitos podem ser
aplicados (por exemplo, “alto”, “vermelho”, “pouco”), existe
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Fig. 7.3
Tolerância
O que o fenômeno da vagueza sugere é que a malha que joga-
mos sobre a realidade não corresponde exatamente aos nossos
conceitos. Há uma certa espessura em nossa habilidade de discri-
minar, mas nossos conceitos não são definíveis a partir dela (ver
Figura 7.3). Essa situação levou ao desenvolvimento da noção
de “conjunto aproximado”, um conjunto cujos membros, e não
a relação de pertencer, são difusos. O que o sorites nos mostra é
que muitos de nossos conceitos correspondem a conjuntos apro-
ximados, e não a classes claramente distinguíveis de elementos.
Considere um universo de discurso U e uma relação R sobre U.
U poderia ser o conjunto das amostras de cores, ou de homens,
ou números. R, uma relação de tolerância, isto é, uma relação
que estabelece grupos de elementos de U que não podem ser
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Fig. 7.4
conceito X
Fig. 7.5
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O infinito
O argumento matemático diz respeito à natureza do infinito.
O infinito surge na matemática em dois lugares. O primeiro está
ao contarmos os números, ou números naturais, como são usual-
mente chamados. Não importa quão longe tenhamos contado,
é sempre possível contar mais um. O maior número natural não
existe – qualquer candidato poderia ser imediatamente superado
pela adição de 1. Portanto, não pode existir apenas uma cole-
ção finita de números naturais – tal coleção é infinita. O outro
contexto em que o infinito surge é o estudo da geometria. Uma
linha pode ser infinitamente subdividida. Qualquer intervalo
pode ser novamente subdividido em subintervalos. Mais uma vez,
é um processo que não tem limite. Não importa quão longe tenha
ido o processo de subdivisão, mais subdivisões são possíveis.
Note que a infinitude da repetição de ambos os processos
são ideais e conceituais, mas também essenciais. Suponha que
existam – como nos disseram – apenas 1080 partículas elemen-
tares no universo. Ainda podemos acrescentar a elas o número
de moléculas e estrelas formadas com elas, o número de pares
e cadeias de partículas, cadeias de cadeias, e assim por diante.
Similarmente, mesmo que o espaço físico seja “granulado” (não
admita distinções além de, digamos, 10-40), o espaço ideal da
geometria não é restrito dessa forma. E, ainda mais importante,
a “reta real”, o conceito de extensão espacial, atua como um
modelo para o tratamento matemático do tempo, velocidade,
massa, comprimento de onda e frequência, entre outras.
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1/p = 0,318309886...
1/2 = 0,4999999...
1/√2 = 0,707106781...
13/83 = 0,156626506...
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Intuicionismo
Russell e Zermelo – que aparentemente chegaram de modo
independente ao “paradoxo de Russell” – estavam entre os
líderes do trabalho de reconstrução da teoria de conjuntos
clássica. Russell introduziu uma hierarquia de tipos, Zermelo,
uma hierarquia de conjuntos, ambos restringindo a abrangência
do transfinito. Mas, para Brouwer e o grupo dos construtivistas,
os intuicionistas, que ele liderava e inspirava, os paradoxos da
teoria de conjuntos eram vistos como envolvendo muito mais do
que um problema restrito à teoria de conjuntos que pudesse ser
tratado por meios lógicos e conjuntísticos. Eles comprometiam
o empreendimento como um todo, remontando pelo menos a
Descartes, de tratar algebricamente conceitos geométricos, e a
introdução do infinito atual, que ele ensejava.
Ao lidar com coleções infinitas, podemos tratá-las tanto
extensionalmente quanto intensionalmente. Isto é, podemos
ou bem descrevê-las como a extensão de um conceito, ou bem
podemos considerar que são constituídas pelos seus elementos.
Considere um exemplo: suponha que asserimos que todos os
passageiros do voo para Fiumicino receberam seus jantares.
Poderíamos fazer essa asserção como um fato geral acerca de
passageiros de voos da Alitalia – tratando, desse modo, a coleção
intensionalmente. Cada membro da coleção cai sob um certo
conceito, uma intensão e, como tal, a ele será servido um jantar.
Mas podemos também fazer essa asserção como o resultado de ir
a cada passageiro e verificar que lhe foi servido o jantar – dessa
forma, podemos checar a asserção geral. Isso é tratar a coleção
extensionalmente, o que é possível com coleções finitas, mas
não com coleções infinitas, que somente podem ser tratadas
intensionalmente, como instâncias de um conceito geral. É isso
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Fig. 8.1
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... αn ...
... ... ...
... ...
Fig. 8.2
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O argumento lógico
O construtivista é um antirrealista, isto é, ele não vê a verdade
como uma característica objetiva de uma proposição, algo que
tal proposição possui independentemente de nós e que resulta de
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O argumento linguístico
Por fim, veremos agora o terceiro argumento usado pelo
construtivista para contestar o realista, que denomino “argu-
mento linguístico”. Seu foco é no chamado “desafio da exibi-
ção”: que direito temos de atribuir a falantes uma compreensão
de expressões que ultrapassam o que eles são capazes de
manifestar em seu comportamento linguístico? A forma dessa
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ex falso quodlibet: Literalmente, “do falso tudo (se segue)”. Nome tra-
dicional para a inferência de uma proposição arbitrária de uma
contradição, isto é, de “A e não-A” conclui B, para qualquer B.
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platonismo modal: A tese de que o modo pelo qual as coisas são (no
mundo real) é apenas uma de um sem-número de mundos pos-
síveis que existem concretamente.
proposição atômica: Uma proposição que não pode ser analisada logi-
camente em termos de proposições mais simples, por exemplo,
“Sócrates corre” ou “a neve é branca”.
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C Tarski 61, 62
contradições lógicas 75
calvo, paradoxo do 173, 183
contradições verdadeiras 158-163
ver também paradoxo sorites
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W
Walker, R. C. S. 92
Williams, C. 33
Williamson, T. 200
Wittgenstein, L. 12, 240
atomismo lógico 31, 48
objetos comuns a todos os
mundos 106
teoria figurativa do significado
14-15, 31-32, 98
argumento da linguagem
privada 231
fatos e proposições 12, 13-14
reducionismo 15-18
ceticismo acerca do significado
234
vagueza 177
Woodruff, P. 147
Wright, C. 34, 62, 200, 235
Z
Zadeh, L. 199
Zenão de Eleia 171, 207, 236
Zermelo, E. 213
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