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REGIME POLíTICO E ESTRUTURA DO PODER

THEMÍSTOCLES BRANDÃO CAVALCANTI

Conceitos essenCIaIS; Noções de regime de sistema, de


tipo; O regime é um complexo de elementos ideológicos,
políticos, sociais; Democracia e ideologia; Classificações
diversas: Pablo Lucas Verdu, Shill, Duverger; Formas
de governo; O problema do subdesenvolvimento; As
democracias, condições, os sistemas parlamentar e presi-
dencial; Caracteristicas variantes; Democracia marxista:
características, a estrutura dos estados marxistas; O
executivo; Ditadura e tirania; Conclusão.

Como bem explica o título, o que vamos agora procurar definir


é a relação entre o regime político adotado pelo Estado e sua
estrutura política, ou, em outras palavras, o condicionamento de
determinada estrutura política ao regime instituído.
Na realidade, cada estrutura política deve corresponder a um
regime político que se define pelo seu conteúdo ideológico.
J á em outra oportunidade coloquei a democracia também
como ideologia, tal a força dos compromissos do homem na realiza-
ção de seus objetivos essenciais.
E esta afirmação tem tanto mais fundamento quando se con-
sidera as condições ideológicas que justificam os tipos conhecidos
de democracia - por exemplo, democracia liberal, democracia so-
cial e democracia popular, exprimindo tendências ideológicas di-
versas, de natureza política, social ou econômica.
As estruturas políticas nesses diferentes tipos de democracia
também diferem dos governos autoritários ou corporativos.
Mesmo nos países ocidentais que atendem ao mesmo tipo de
democracia, há distorções notórias, especialmente na distinção que
veremos adiante na estrutura do poder como por exemplo, na dife-
rença entre sistemas presidenciais e parlamentares.
Tipos de governos mais fortes são os das democracias chama-
das populares.

R. Cio pol., Rio de Janeiro, 7 (3): 45-63, jul./ set. 1973


Mas vamos ver o que se chama "regime".
Em suma, o que se chama de regime é um complexo de con-
dições políticas, sociais, econômicas, ideológicas, elementos desse
sistema.
Hoje não se confunde sistema com regime, como no século
passado. Cita-se como exemplo a expressão ancien régime, que
a revolução destruiu e que se assentava em um complexo de pri-
vilégios.
Tocqueville analisou de forma insuperável - Uancien régime
et la revolution - onde reconhecia manifestos conquistados por
esse ancien régime, mas sem as liberdades essenciais ao homem.
Foi dos poucos que deu à palavra o sentido exato.
A terminologia mais moderna, embora por vezes tergiver-
sante entre regime e sistema, prefere, entretanto, regime. Nossas
constituições se referem a regime democrático, regime repre-
sentativo.
Já procurei fixar, contrariando opiniões válidas, notadamente
a de Burdeau, que a democracia é uma ideologia, pela posição
que assume no contexto político, mas com formas várias, como
veremos.
E isto é tanto mais verdade, quando se consideram as varie-
dades semânticas dessa palavra "democracia" acompanhando toda
a escala de ideologias conhecidas: democracia liberal, democracia
social, democracia popular, democracia totalitária, etc.
Isto nos conduz à corrente daqueles que consideram na defi-
nição de regimes ou sistemas políticos seu sentido ideológico, con-
trariando os que consideram regimes políticos apenas como for-
mas específicas de governo, sem nenhuma conotação ideológica.
Estes últimos são os autores mais antigos, da época em que a
penetração ideológica ainda não havia contaminado o direito cons-
titucional puro, em que os conceitos eram de preferêncIa formais.
O de que se cogitaria era apenas das formas de governo, sem bar-
reiras ideológicas fundamentais.
Novo tratamento teve que ser dado ao problema com a pene-
tração ideológica na formação dos poderes dos Estados.
A Itália teve talvez a primazia nesses estudos, com a defi-
nição do fascismo italiano como forma de governo de base ideo-
lógica.
Panuzo em seu livro 1 entende, por exemplo, que a idéia de
regime compreende todos os aspectos da sociedade: o político, o
econômico, o civil, o moral.
1 Panuzo. Teoria generale dello Stato fascista. 2. ed. 1939.

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o autor espanhol Pablo Lucas Verdu, em sua introdução ao
direito político, considera na definição do regime político três
elementos:
a) um conteúdo ideológico (liberal, socialista, comunista, demo-
crata cristão, fascista, etc.);
b) uma organização política concreta (estado unitário ou fe-
deral) ;
c) uma estrutura social, que integra a sociedade política.

É uma síntese de elementos ideológicos e políticos.


Todos esses autores substituíram por assim dizer, a preocupa-
ção das formas de governo por uma análise mais profunda dos
fundamentos ideológicos de cada Estado.
O moderno constitucionalista Antunes Amorth citado por Raul
Machado Horta "filia-se claramente a concepções ideológicas ao
asseverar que o regime político é instrumento da realização his-
tórica das diferentes ideologias modernas. O regime político é dado
do Estado ideológico, Estado comunista, Estado fascista, Estado
liberal, Estado democrático, correspondentes a regimes políticos
realizadores de ideologias próprias a cada tipo: regime comu-
nista, regime fascista, regime liberal, regime democrático".
Não se confunde com a forma de governo, embora exija for-
mas adequadas à realização dos seus objetivos.
Um estado democrático não tem a mesma estrutura do poder
que um estado comunista ou um fascista, etc.
Daí uma posição conciliatória de Buscaretti di Ruffia que
procura conciliar as duas coisas ao fazer a análise das estruturas,
em função do regime.
De Paya Cabera tem por sua vez um esquema bem imaginado
(Los regimes políticos contemporaneos) e com base ideológica
apresenta o seguinte esquema:

I. Com tradição democrática:


a) as grandes democracias: França, Grã-Bretanha, Estados
Unidos;
b) as pequenas democracias (Suíça, Bélgica, Holanda, Luxem-
burgo, Países nórdicos);
c) as democracias nascidas no Commonwea1th (Canadá, Nova
Zelândia, Austrália, etc.).

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lI. As monocracias marxistas:
a) a URSS;
b) as monocracias populares;
c) a Iugoslávia;
d) a China comunista.

III. O mundo hispano-americano:


a} Espanha;
b) Portugal;
c) Repúblicas hispano-americanas.

IV. Os países recentemente colonizados.


Esta é apenas uma das classificações e que cito por me parecer
mais ou menos completa, mas sujeita a críticas, pois é parte de
concepções um tanto supérfluas.
Na realidade, não distingue sistemas bem diferenciados e en-
globa o terceiro mundo em uma categoria única.
Não poderei deixar de mencionar também os autores fran-
ceses como Burdeau, Duverger, Vedes, Laubadere que cuidaram
do problema, e abandonaram o velho método das formas de go-
verno para preferirem os regimes políticos.
Poderíamos citar mais algumas opiniões: Shill, em Political
development of New States, divide os sistemas da seguinte forma:

a} democracia política:
pressupõe: direitos civis
oposição organizada
serviço civil organizado;
sindicatos organizados;
continuidade política.

b) democracia tutelada, quando uma elite reconhecendo a difi-


culdade do exercício da democracia, retém o poder através de
medidas institucionais;
c) oligarquia progressista: Sudão, Paquistão, Indonésia - polí-
tica populista que detém o poder para evitar a posse reacionária;

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d) oligarquia totalitária - oligarquia com ares democráticos;
e) oligarquias tradicionais - países novos não organizados por
falta de condições.

Paulo Buscaretti di Ruffia, a que já nos referimos, em seu


DiTitto constituzionale. p. 179 assim classifica:
a) Estados democráticos ou democrático clássico ocidental;
b) Estados autoritários - Espanha, Portugal e alguns países da
América Latina.
c) Estados de ditaduras marxistas ou progressistas.
Finalmente Duverger em seu livro sobre regimes políticos
mostra a dificuldade da opção entre os diversos esquemas.

Diz ele que se pode levar em consideração critérios como:


a) a escolha dos governantes;
b) a estrutura dos órgãos de governo;
c) a limitação dos poderes dos governantes.

E distingue três tipos de regimes políticos contemporâneos:


a) os do tipo inglês;
b) os do tipo americano;
c) os do tipo russo. Cada um deles tem suas variedades.

o processo para escolha dos governantes teria as seguintes


alternativas:
a) países de eleições livres: Inglaterra, Estados Unidos, França,
Alemanha, etc.;
b) países de eleições dirigidas (menciona os Estados balcânicos);
c) países de eleições publicitárias em que somente se apresenta
aos eleitores o candidato oficial restando-lhes apenas a possibili-
dade de votar em branco ou abster-se, e dá como exemplo a
União Soviética;
d) os países sem eleições como a Espanha, a China, etc.
Cita mais outra classificação: países liberais, semiliberais,
comunitários.
Essas classificações diferem pelo ângulo em que são tomadas.

Regime político 49
Tentaríamos o seguinte:
a) estados democráticos que funcionam dentro de um sistema
plural e vigoram as liberdades democráticas;
b) as chamadas "democracias" autoritárias onde não existe re-
gime representativo, porque o mecanismo partidário é simples e
não existem os pressupostos democráticos;
c) os regimes democráticos, onde o mecanismo eleitoral funcio-
na dentro dos moldes democráticos, mas com restrições que carac-
terizam uma democracia dirigida;
d) os regimes autoritários onde não existe a participação livre
que permita a opção popular na escolha dos governantes;
e) as formas corporativas.
Nenhuma dessas formas têm características próprias e ne-
nhuma obedece a uma tradição histórica, como é o caso da In-
glaterra e, dentro de um período da história mais reduzido, os
Estados Unidos.
A França é um caso típico oe ajustamentos periódicos da
estrutura do poder de acordo com a conjuntura e as imposições
de movimentos internos mais ou menos profundos.
Cada situação nova e cada revolução criaram nova estrutura
do poder. Podem ser citadas as seguintes constituições: a de
1791, a do ano III (cinco partidos), a do ano VIII (22 primário),
a de 1814 (Carta Constitucional), o ato adicional de 1815, a Carta
de 1830, a de novembro de 1848, a de janeiro de 1852, a de 12 de
maio de 1870, a de 22 de outubro de 1946 e a vigente de 1956.
São 11 constituições em 160 anos.
Por outro lado, o exame dos regimes vigentes nos diversos
países denuncia, desde logo, uma diferença de estrutura nos países
desenvolvidos e nos que estão em transformação ou em desen-
volvimento.
Naqueles existe uma tradição, uma estrutura social e econô-
mica relativamente estável, o que se altera é a estrutura política
como ocorre na França, na Alemanha, esta com três regimes dife-
rentes desde 1919 até agora. Pode-se dizer que os casos da Ingla-
terra e Estados Unidos são excepcionais.
A infra-estrutura dos países subdesenvolvidos ou em trans-
formação é muito mais fraca e muito menos resistente às forças
da decomposição. As mudanças se processam de forma muito mais
dramática, e a subversão tem largo campo de ação, em uma
sociedade que não dispõe de resistência necessária.

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É da classificação dos regimes políticos que podemos tirar as
formas de governo, porque a forma é apenas uma conseqüência
do ajustamento da competência, distribuição e organização do
poder, não somente à ideologia do regime, mas às condições so-
ciais, econômicas e políticas em que ele se vai realizar.
Diríamos que a forma de governo é uma estrutura que se deve
adaptar ao espírito do regime, à sua ideologia, seja ela democrática
ou marxista, ou obedeça a qualquer inspiração política ou filosófica.
Fundamentalmente ou essa forma se baseia em uma estrutura
que permita a participação do povo na organização do poder, ou
essa participação é mais restrita, ou não é exigida.
A estrutura do poder há de se ajustar necessariamente ao
regime político.
A estrutura do poder compreende:
a) a organização do Estado;
b) a distribuição da competência entre os poderes;
c) as relações entre os poderes;
d) a forma pela qual se compõe o poder;
e) a determinação do focus do poder, isto é, quem detém o con-
trole dos poderes.

É talvez a determinação do focus do poder um dos critérios


mais importantes para a definição do sistema político, pois sua
forma obedecerá precisamente ao critério para a distribuição da
competência entre os poderes.
O focus pode estar:
a) no poder executivo;
b) no poder legislativo;
c) na congregação dos dois poderes.

No sistema democrático, o focus pode estar:


a) no poder executivo em um regime presidencial;
b) no poder legislativo em certos regimes parlamentares como
o inglês e o italiano porque o chefe do governo é uma expressão
do parlamento;
c) em certos regimes parlamentares como no francês, há um equi-
líbrio porque a participação do governo é maior na escolha do
chefe do seu chefe.

Regime político 51
N os sistemas das chamadas democracias populares o focus do
poder está nitidamente no executivo ou se preferem, no partido,
porque a autoridade do governo é da essência do mecanismo.
Diga-se, entretanto, de passagem, que se apurarmos demais o
processo teremos dificuldades em determinar o focus do poder.
A verdade, entretanto, é uma tendência natural para fixar no
executivo o focus do poder, porque dele depende, afinal, a política
nacional, os meios de sua execução e a política internacional.
Como órgão coletivo, o parlamento não pode exercer essa
função e transfere regularmente a ação política ao executivo por ele
indicado, de acordo com um mecanismo baseado na maioria par-
lamentar.
Nos países de tradição democrática, e não são muitos, esse
mecanismo pode funcionar de forma mais ou menos regular, com
uma tendência a racionalizar o processo parlamentar, como na
Alemanha e França.
Há, entretanto, uma conjuntura especial a considerar nos paí-
ses subdesenvolvidos e que se manifesta especificamente nas insti-
tuições do governo e na estrutura política.
A experiência dos países africanos nesse terreno é bastante
esclarecedora com a substituição do regime parlamentar que ha-
viam adotado logo na sua independência pelo regime presiden-
cial. Este foi aperfeiçoado ainda em alguns países, até pela possi-
bilidade da dissolução do Parlamento o que não é, como se sabe,
prática inerente a esse sistema de governo.
Observa o Prof. André Hauriou, talvez generalizando demais,
mas, em todo caso, referindo-se aos países em vias de desenvolvi-
mento, que na falta de uma unidade nacional sólida não se deve
valorizar demais a oposição, quebrando a autoridade do governo
que é, afinal, o responsável direto pelo desenvolvimento que se
deve processar sob sua direção.
Na sua opinião o regime parlamentar é muito frágil e compli-
cado para esses países, que nem sempre compreendem que duas
pessoas exerçam o poder executivo (o Presidente, e o Chefe do
Governo) cuja autoridade é necessário manter.
O regime parlamentar exige, por outro lado, uma estrutura
política mais complicada e a existência de partidos.
A necessidade de um executivo forte conduz ao sistema pre-
sidencial que tem sua base em uma estrutura democrática, sem-
pre preferível a uma solução autoritária, fora das normas consti-
tucionais.

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o drama dos países africanos é o subdesenvolvimento, que no
terreno político se traduz pela dificuldade de tornar realidade o
processo de representação, já que parte da massa é incapaz de
exercer o direito de escolha.
Na realidade, esse ato de escolha pressupõe um mmlmo de
qualificação da massa eleitoral para se organizar politicamente,
com a criação de partidos e formação de correntes de opinião.
A alfabetização deficiente do povo, a falta de tradição política,
e ainda a vinculação às formas primitivas de organização tribal,
tornaram quase impossível a realização do ideal que encontravam
nas estruturas políticas criadas de acordo com o modelo tradi-
cional europeu.
Uma das dificuldades foi, por exemplo, a criação de mais de
um partido. Muitos escolheram, por isso, a solução do partido
único, mas não do tipo das estruturas autoritárias em que o co-
mando se faz de cima para baixo. O partido único dos países
africanos é de origem popular; a unidade está na sua organização
mas não na sua composição, pois as diversas correntes de opinião
se formam dentro do partido, dominando o grupo mais forte.
As mudanças de regime que se verificam nos países que
ainda não têm condições perfeitas para o exercício da democracia
deve-se, em grande parte, à inconsistência do sistema represen-
tativo, à falta de solidez de suas estruturas econômicas e sociais.
Por isso o sistema representativo deve-se adaptar às condi-
ções de cada país, valorizando a parte do eleitorado com capa-
cidade plena para o exercício do direito do voto, e evitando cor-
rompê-la com a soma de votos de um eleitorado sem condições
mínimas de exercer o direito de escolha com pleno conhecimento
de causa.
O quadro constitucional dos paíse-s africanos é melancólico.
O regime parlamentar fracassou entre outros nos seguintes
países: Síria, Egito, Sudão, Paquistão, Iraque, Jordânia.
Suspensas foram as seguintes constituições: Africa Central,
Alto Volta, Burma, Gana, Marrocos, Serra Leoa, Togo, Síria.
Outros países em número superior a 11, como Uganda, Congo,
Gabão, Iemen, Sudão, Nigéria, reformularam ° sistema consti-
tucional.
As democracias
Com o nome genérico de democracia existem dois regimes bem
diversos.

Regime político 53
o primeiro é a democracia pura que pressupõe a partici-
pação do povo na organização do poder, em um regime de liber-
dades e de partidos múltiplos (dois ou mais) que permitam uma
opção do eleitor.
O outro é o da democracia formal que se baseia no partido
único que não dá opção.
A participação é fictícia e se baseia em um consenso mais pas-
sivo do que a expressão de uma vontade.
Richard Walkein 2 reduz aos seguintes princípios os funda-
mentos geralmente considerados essenciais à democracia.
1. A regra para o gozo de qualquer forma de autoridade
política é a educação moral. No terreno da igualdade as oportu-
nidades devem ser extensivas ao maior número e na democracia,
a todos: este argumento que se encontra originariamente em Aris-
tóteles, mas no âmbito da cidade, torna-se, na extensão do mundo
moderno, de prática difícil.
2. O segundo argumento é de que a opinião verdadeira em
questões morais ou políticas é privilégio do homem comum. Sendo
assim, o poder na comunidade deve ser atribuído a ele; e isto
ocorre somente em uma democracia, o que prova também sua
superioridade.
Esse argumento é fundamental na concepção grega de demo-
cracia. No pensamento moderno recebeu apoio em virtude de certa
teoria de ordem toda emocional do valor da natureza humana que
não se corrompe pelo bem-estar, luxo e educação.
Em sentido contrário, a democracia tem sofrido críticas pela
descoberta da irracionalidade do homem, pela moderna psicologia.
3. Uma versão mais materialista do argumento precedente
é de que o homem comum é o melhor juiz não do direito da comu-
nidade, mas dos seus próprios interesses.
Em conseqüência, se ao povo é permitido controlar o governo,
então o interesse do povo é dominante.
4. O outro argumento contraria os anteriores. Segundo este,
é impossível a qualquer um saber o que é o certo para a comuni-
dade ou onde se encontra o verdadeiro interesse de seus habi-
tantes. Daí sucede que a cada um seria permitido fazer o que dese-
jasse, contanto que fosse socialmente possível. Ora, a única socie-
dade em que isto se tornaria possível, seria a democrática. Uma
2 Walkein, Richard. Democracy. Apud: Political thought since world waT.
v. 2, p. 122.

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variante estaria em não insistir em uma atitude, mesmo consi-
derada de interesse geral, se todos na comunidade não estiverem
de acordo.
5. No último degrau da escala deve-se reconhecer que todos
têm o direito de controlar o governo, mas que esse direito só é
reconhecido na democracia, daí ser esta a melhor forma de governo.
6. Finalmente, deve-se considerar irrelevante saber se a
democracia pode, de fato, melhorar o bem-estar, salvaguardar
direitos, etc., porque a verdade é que, nas condições modernas,
é a única possibilidade de desenvolvimento.
Em síntese são estes os argumentos válidos tirados da expe-
riência democrática.
A democracia tradicional caracteriza-se principalmente:
a) pela participação do povo na organização do poder;
b) na igualdade dos direitos;
c) na lei das maiorias;
d) no respeito às minorias.

Considero que toda estrutura política deve se assentar nesses


princípios.
A participação se realiza não somente pela representatividade
na constituição dos órgãos da soberania nacional, mas também por
um respeito à opinião pública dominante, que se constitui pela
integração de elementos que exprimem o pensamento popular nos
conselhos governamentais.
Não há nisso nenhuma deformação do princípio democrático
mas o reconhecimento da legitimidade da participação de ele-
mentos úteis e integrados no sistema de governo na realização de
uma obra destinada a servir à comunidade.
Todas as formas democráticas deverão necessariamente obede-
cer a princípios que permitam a realização efetiva dos funda-
mentos do regime democrático.
Há, entretanto, um princípio que não pode deixar de ser aten-
dido - o da separação de poderes.
Ele se inspirou no pensamento de Locke e de Montesquieu,
aquele influenciando mais o pensamento político anglo-saxônico
(como se vê no federalista), este inspirando as demais democra-
cias ocidentais.

Regime político 55
É este princípio a garantia suprema da liberdade política e da
civilização, comprometendo irremediavelmente o regime com a
democracia.
Ele se afirmou notadamente na fase constitucional dos siste-
mas políticos.
As estruturas são variadas e mesmo dentro das duas formas
mais importantes do sistema democrático - o presidencialismo e o
parlamentarismo - as variantes são muito grandes, havendo mes-
mo, no dizer de Duverger, formas mistas parlamentarismo-
presidencialista que procuram conciliar os dois sistemas de
governo.
Seria negar a evidência de uma realidade histórica deixar
de reconhecer que o sistema parlamentar foi elaborado por um
longo processo histórico de bases democráticas e politicamente
válido. Pressupõe, entretanto, para o seu funcionamento, um es-
quema político que assenta em instituições representativas válidas
e que não pode ser improvisado.
O sistema parlamentar de governo tem os seguintes elementos
essenciais:
a) uma colaboração maior entre os poderes, ao contrário do
sistema presidencial, caracterizado pela separação. Essa colabora-
ção se define melhor na responsabilidade política do governo, re-
presentado pelo gabinete, ou conselho de ministros, perante a
Câmara;
b) uma possibilidade atribuída ao governo de dissolver o parla-
mento quando não houver outra solução para a crise política;
c) o controle parlamentar através de moção de confiança ou
censura, cuja solução conduz à manutenção, ou não, do gabinete,
como expressão da maioria parlamentar.
As características principais do regime parlamentar têm suas
variantes:
a) o executivo é dividido - chefe de Estado e chefe do governo;
b) o chefe de Estado indica ou não o primeiro-ministro que pode
ser eleito, como na Alemanha;
c) o chefe do governo indica o ministério;
d) o ministério é um corpo coletivo;

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e) os ministros são geralmente membros do parlamento;
f) o governo é responsável politicamente perante a Assembléia;
g) o chefe do governo pode pedir ao chefe do Estado a dissolu-
ção do Parlamento;
h) o Parlamento é o poder supremo sobre os demais poderes;
i) o governo só responde indiretamente perante () eleitorado;
j) o Parlamento é o foco do poder.

Os diversos tipos de sistemas parlamentares são os seguintes:


A) Governo parlamentar clássico
a) tipo inglês;
b) tipo europeu continental.

B) Governo parlamentar racionalizado


a) de tendência diretorial;
b) de tendência presidencial;
c) de tendência equilibrada.

O item a não encontra aplicação atual na prática.


O item b na de Weimar e na francesa do Gen. De Gaulle.
O item c nas de Bonn de 1949, Japão de 1946 e italiana de 1946.

Em todo o regime parlamentar, a colaboração entre o executivo


e o legislativo se estabelece por intermédio do Conselho de Mi-
nistros, que divide com o chefe de Estado o poder executivo,
que depende da confiança do Parlamento para se manter no poder.
O governo está assim na dependência de maiorias parlamen-
tares.
Os efeitos prejudiciais de uma prática, ao pé da letra, do me-
canism.o parlamentarista, trouxeram consequencias graves nos
países em que existia um pluralismo político, caracterizado pela
multiplicidade de partidos políticos.
O jogo político tornou muito sensível a máquina parlamentar
e, assim, algumas medidas foram tomadas no sentido de racionali-
zar o sistema político.

Regime político 57
A Alemanha, por exemplo, adotou um sistema eleitoral que
reduz implacavelmente o número de partidos e o Chanceler do
Reich, que é o primeiro-ministro, é eleito pela Dieta por indica-
ção do presidente.
Mas na generalidade dos casos os dois instrumentos de esta-
bilidade, dentro da pluralidade do sistema, são:
a) a indicação do chefe do gabinete pelo presidente;
b) o poder de dissolução da Assembléia.

o poder presidencial se caracteriza:


a) por maior divisão e separação de poderes, senão sua inde-
pendência;
b) o executivo não depende do legislativo;
c) o Presidente da República é o chefe do governo e administra
com seus ministros;
d) não há interferência do legislativo na escolha dos ministros;
e) a Assembléia exerce seu poder com autonomia;
f) somente o poder judiciário julga os atos do executivo, bem
como os do legislativo;
g) é reconhecido o poder de iniciativa do Presidente da Repú-
blica, em escala que varia com as características do regime;
h) o Presidente da República responde perante a Constituição e,
em processo regular perante o legislativo pelos atos que praticar;
i) a Assembléia é órgão, antes de tudo, legislativo.

o presidencialismo representa uma filosofia de governo ba-


seada na independência dos poderes, o que significa que nenhum
poder está subordinado a outro, nenhum participa na organização
do outro, sendo autônomas suas funções.
O sistema foi-se aperfeiçoando através de uma colaboração
mais nítida entre poderes, quer na elaboração legislativa, quer no
aperfeiçoamento dos programas de governo, quando a participa-
ção do Parlamento hoje é maior.
O crescimento do poder executivo é fenômeno que decorre da
própria conjuntura, com o desenvolvimento da administração, a

58 R.C.P.3/73
multiplicação dos seus órgãos, o crescimento econolUlco, os pro-
blemas internacionais e tantos outros, cuja responsabilidade recai
sobre o executivo.
Por isso mesmo, também, o Presidente da República, se não
divide seu poder, pelo menos distribui os encargos com pessoas
de sua confiança, e, de mais a mais, se descentraliza o poder
dentro do executivo.
Não é aqui oportuno tratar de algumas das condições neces-
sárias para a prática democrática. A questão da representatividade,
por exemplo, é uma das principais para a valorização do voto.
Todavia, é praticando a democracia que se aperfeiçoa o sis-
tema, respeitando as prerrogativas de quem exerce o direito do
voto.
Por outro lado, é essencial ao mecanismo do regime, órgãos
legislativos bem estruturados e que exerçam efetivamente o poder
de sua competência. Serão, entretanto, órgãos de participação no
governo, entendida essa expressão no sentido mais largo, de cola-
boração e não de mera ação política. Não estaria, assim, longe de
admitir, como na Inglaterra, a institucionalização da oposição.
O meu pensamento se exprimiria melhor se recorresse à obser-
vação de Duverger que considera a facilidade com que as oposi-
ções nos países subdesenvolvidos se transformam em instrumento
de luta, não somente contra o governo, mas contra o próprio re-
gime. E isto pela debilidade de sua infra-estrutura econômica,
social, política.
O presidencialismo é o regime preferido por numerosos países.
Seu modelo é geralmente o dos Estados Unidos, com variantes
peculiaridades, principalmente na sua aplicação.
O nosso difere bastante do seu modelo.
Os Estados africanos que não puderam se acomodar a um
parlamentarismo europeu adotaram o presidencialismo: a Costa
do Marfim, Gana, com incursões por ditaduras, Gabão, Togo e
Argélia.
Os mecanismos não são ortodoxos - Togo, Gabão, Gana ad-
mitem, por exemplo, o direito de dissolução da Assembléia.
A análise que fez Schumpeter do problema - capitalismo -
socialismo - democracia - ainda é das mais lúcidas, não só quan-
do coloca a questão da democracia em face do capitalismo, em

Regime político 59
que se inclui a maioria dos países do mundo ocidental, como tam-
bém em face do socialismo.
Ao mesmo tempo que afirma ser a democracia um produto
da prática democrática, mostra as dificuldades de conceder ao povo
o poder de decisão, e do processo básico para tomar essa decisão.
Na realidade, o exercício da soberania popular, e os processos
de delegação e representação, refletem um pouco mais do que um
postulado ideológico e alguns princípios de técnica legislativa; são
problemas de sociologia e de filosofia social no campo político.
Elas elaboram, evidentemente, entre outras coisas, uma teoria da
natureza do Estado e das razões pelas quais o Estado existe
(p. 24 e seg.).
Essas ponderações do grande economista e sociólogo mostram
fielmente as dificuldades do ajustamento das ideologias políticas
às práticas democráticas.
Não quer dizer que pela simples diferença de estrutura do
poder um povo seja mais feliz que outro.
Depende do tipo de consenso do povo ao sistema político que
vigora.
Democracia marxista
Em primeiro lugar é preciso uma explicação, porque, de acordo
como é ensinada pela generalidade dos autores e pelo sentido usual
entre nós, a democracia é um regime político que tem caracterÍs-
ticas de liberdade individual e politicamente representa um meca-
nismo fundado na participação do povo na organização do poder.
A democracia marxista é eminentemente ideológica, isto é,
parte de pressupostos filosóficos materialistas combinados com um
método dialético que tem suas bases bem nítidas nos ensinamen-
tos de Marx e Engels. Existe ali, portanto, uma filosofia e uma
doutrina que não conhecem as democracias ocidentais.
Seus propósitos sociais e econômicos visam uma mudança
profunda na estrutura das sociedades tradicionais.
O sentido pragmático de toda política tem feito evoluir essa
doutrina, partindo de Unin até os atuais donos do poder soviético.
Essa filosofia impõe uma estrutura peculiar do poder.
A estrutura dos estados marxistas repele a maioria dos prin-
cípios da democracia ocidental. Assim:
a separação de poderes não tem sentido porque estes se consti-
tuem de uma série de órgãos colegiados.

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Desde 1917, com a revolução russa, esse princípio foi substituí-
do pela "teoria da dimensão do poder", segundo a qual o poder
soberano poderia ser atribuído, em qualquer uma de suas três
manifestações, a um órgão representativo (soviet) em quantidade
maior ou menor, de acordo com a posição do órgão na escala
constitucional, subordinado ao órgão supremo em que encontra sua
representação a coletividade inteira dos cidadãos.
Mais recentemente a teoria dominante é a unidade do poder
estatal, que se exerce em um só nível, em sua integridade pelos
órgãos representativos estatais. Domina o princípio do chamado
centralismo democrático que estabelece o comando do poder mais
alto e do poder central sobre os órgãos das coletividades menores.
A China repele particularmente o princípio da separação de
poderes, mas a Iugoslávia em suas Constituições, desde 1963, criou
uma Corte Constitucional. Tratando do princípio da separação de
poderes, como o entendemos, o certo é que a forma marxista a
repele e notadamente o controle jurisdicional, porque o estado
de direito é ali desconhecido.
As eleições não têm o sentido das realizadas nas democracias
ocidentais pois obedecem a uma lista única de um único partido
ou mais de um, com o comando de cúpula, e representa apenas
uma autocrítica, nos limites da verdade científica admitida pelo
marxismo.
Não existe controle jurisdicional.
Os pressupostos democráticos são, portanto, bem diversos por-
que, desde o conceito de liberdade ao de representação, não têm
pontos de contato.
O direito constituciopal é, portanto, mera técnica. -.
Esses regimes e sistemas de Governo caracterizam-se pela
concentração do poder, não só nas mãos do Governo, mas este
dominado pelo partido único.
Mesmo quando existe mais de um partido, o majoritário do-
mina, sem possibilidade de controvérsia, os pequenos partidos.
O poder não se divide e, embora uma ou mais assembléias
sirvam para compor o mecanismo de Governo, o poder é realmente
exercido por um grupo dominante. A substituição faz-se geral-
mente com brutalidade e violência.
O consenso não existe na formação do poder, o que somente
seria admissível no regime político em que houvesse pelo menos
dualidade partidária.

Regime político 61
Com essas características, a chamada democracia marxista tem
também uma estrutura de governo, eminentemente centralizada,
em que o poder se concentra em um órgão coletivo, de caráter
executivo e nominativo, que é chamado Presidium.
Na sua estrutura, porém, existe um conselho supremo (Soviet
Supremo) que é considerado teoricamente como o órgão supremo
do poder e dividido em duas Câmaras - o Soviet da União e
o Soviet das Nacionalidades - representando respectivamente o
poder central e os Estados federados.
Funciona, entretanto, muito pouco, pois só se reúne uma ou
duas vezes por ano.
Por outro lado, a expressão eleitoral é a do partido único,
pois só os membros do partido participam efetivamente do processo
eleitoral. Não tem esse Soviet nenhuma tradição representativa.
Teoricamente suas funções são muito importantes - revoga
os ministros, e os indica, cabendo-lhe assim, praticamente, consti-
tuir o governo.
Mas é um órgão extremamente numeroso com mais de mil
membros e suas funções são de fato delegadas ao Presidium
cujos membros são por ele nomeados.
Os informes sobre o funcionamento do sistema soviético não
são seguros. É assim que, conforme parece, desde 1955 há uma
revivescência do Soviet Supremo que teria até aceito a demis-
são de Malenkov naquele ano e nomeado Bulganin. Nos anos se-
guintes, suas sessões teriam sido um pouco mais freqüentes.
A verdade, porém, é que, pelo conhecimento que se tem da
política soviética, suas decisões são tomadas por órgãos de ação
muito mais atuante e eficaz.
O poder executivo soviético funciona como um colegiado deci-
dindo coletivamente e dentro de uma solidariedade política com
o partido.
Com o regime de concentração de poder nas mãos do executivo
sua autoridade é também muito grande pois decide as mais va-
riadas questões políticas e administrativas.
Não será um colegiado na forma de sua composição mas no
poder de suas decisões coletivas.
A estrutura do poder nos países em que domina a política de
um regime marxista se define pela concentração do poder, em-
bora, na realidade, eles procurem multiplicar os focus do poder,
como medida de segurança para sua estabilidade.

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As ditaduras são regimes de exceção pois não se enquadram
nas formas permanentes de governo, nem constituem, propria-
mente, sistemas de governo.
Não incluo os regimes autoritários como ditaduras, porque
aqueles se caracterizam apenas por uma maior concentração do
poder, enquanto que as ditaduras são situações que estabelecem
o poder num homem só que tem um poder absoluto, sem con-
trastes.
Com um pequeno livro publicado por volta de 1930, Cambo
escreveu interessante monografia muito em voga na ocasião, e
que examinava as ditaduras sob um ângulo favorável, realçando
os benefícios que algumas delas trouxeram, transformando os cos-
tumes, civilizando o povo e dando desenvolvimento ao país. Foi
o caso da Turquia com Kemal Pachá. Dá como exemplo também
a Espanha.
Não é o momento de examinar as vantagens e inconvenientes
das ditaduras. Em princípio elas são condenáveis, porque tiram
ao povo sua participação no poder, mas sem dúvida dependendo da
sua duração, dos seus objetivos, da maneira de serem exercidas.
É um sistema que merece ser estudado pelos que se dedicam
à ciência política, em seus diferentes aspectos.
É um regime, entretanto, que muitas vezes se aproxima da
tirania, tão bem analisada por Xenofonte no diálogo entre Hiervs
e Simonide.
O difícil da tirania é dela se desfazer. Nunca o tirano pode
reembolsar o que despojou e restituir a liberdade a quantos
oprimiu.
São observações que a história tem comprovado.
Em conclusão: os regimes políticos, em sua qualificação pró-
pria, são a base doutrinária das estruturas políticas.
Estas se adaptam às experiências dos regimes e às condições
peculiares a cada país, à sua filosofia e às suas condições pe-
culiares.
A teoria das formas de governo está superada pela diversidade
de estrutura do poder e dos regimes políticos de quase uma cen-
tena e meia de nações independentes.
Procuramos apenas identificar as dificuldades de uma análise
que se complica com a multiplicidade de nações e de regimes
políticos ora existentes no mundo.

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